Eduardo Edu ardo Ferraz Ferraz
Por que a gente é do jeito que a gente é? Conheça-se melhor, entenda como os outros agem, gerencie sua vida e alcance melhores resultados.
Prefácio de Pedr Pedro o Mandelli
© Eduardo Ferraz 2010 Depsito legal unto à Biblioteca Nacional, conforme Lei n° 10.994 de 14 de dezembro de 2004 POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é? SONIA MARqUES Preparao dos originais EVERSON MIZGA Assistente de produo CELSO KOSSAKA Criao e confeco da capa Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP) Index Consultoria em Informao e Servios S/C Ltda. Curitiba - PR
F381
Ferraz, Eduardo Por ue a gente do eito ue a gente ? / Eduardo Ferraz.— Ferraz.— Curitiba : Edio do Autor, 2010. 197 p. ISBN 978-85-910662-0-9 1. Neurocincia cognitiva. 2. Psicologia. 3. Personalidade. 4. Inteligncias mltiplas. I. Ttulo. CDD (20.ed.) 153 CDU (2.ed.) 159.92 IMPRESSO NO BRASIL/PRINTED IN BRAZIL Servios de editorao ANTÔNIA SCHWINDEN Coordenao STELLA MARIS GAZZIERO Diagramao TATIANE BUSATTO Assistente de editorao
www.eduardoferraz.com.br
[email protected]
PREFáCIO Nestes útms 20 ans estams eapendend a da cm tdas as vaáves de nssa vda pessa e nssas pespectvas pfssnas. A famía, a esca, a fmaçã mta bgatóa, as espnsabdades assumdas na vda desde ced ns fazam adqu uma fundamentaçã de espet, espnsabdade e dsc pna que ns acmpanhava pea vda tda. Cm as mudanças destas nsttuções e as nvas egas ds negócs ns sentms desamads paa enfenta de manea pensada e nã casuístca s desafs que ns sã apesentads. Estuda, acmpanha e nsstentemente pcua ntev nesta nva fmaçã tem sd a bstnaçã d Eduad, seja cm pfess, nstut, cnsut, seja cm cnsehe de empesas. Tenh pessamente patcpad de váas de suas ncatvas sempe cajsas e até, às vezes, cm excess de eadade pcuand acda as pessas paa esse nv cntext. Esta ba anasa váas teas e as cca de uma fma denada dand ceta ógca a autcnhecment. Deve se da p tdas as pessas que pecsem u queam cnhece s fundaments de uma anáse sbe seu póp “jetã”, sua fma de se, e p me dessa cmpeensã ajusta-se a mund atua e suas pespectvas.
6
EDUARDO FERRAZ
É uma ba cajsa a pnt de evdenca as expeêncas d aut n assunt; é audacsa a tenta dena cnhecment sbe tema; é smpes e bjetva na anáse de cncet a cncet. Cncdênca u nã, esta é a pesnadade d aut: sua ba tem a sua “caa”. Paa fnaza, que dexa egstada a mnha satsfaçã e mnha hna em pefaca este esfç, esta bstnaçã, ps cnheç eamente as egítmas ntenções deste tabah e de nde patu. Um gande abaç, paabéns pea sua cagem de egsta pnões sentas. Cm muta admaçã e espet, Ped Mande Pfess e cnsut nas áeas de Gestã de Pessas e Mudanças.
SUMÁRIO
PREFáCIO - PEDro MANDElli
5
AUTOR PELO AUTOR
9
INTRODUçãO
15
Captulo 1
COMO TUDO COMEçOU
21
Captulo 2
A PSICOLOGIA NA GESTãO DE PESSOAS E NEGóCIOS
31
Captulo 3
COMO A PERSONALIDADE é CONSTRUíDA?
39
Captulo 4
A NEUROCIêNCIA E SUAS APLICAçõES PRáTICAS
45
Captulo 5
COMO FORMAMOS NOSSA REDE MENTAL
53
Captulo 6
é POSSíVEL ESTIMULAR CRIANçAS PRECOCEMENTE?
61
A PSICOLOGIA BáSICA E A FORMAçãO DA PERSONALIDADE
69
O ADULTO CONSEGUE MUDAR SUA PERSONALIDADE?
85
Captulo 7
Captulo 8
8
EDUARDO FERRAZ
Captulo 9
OS MODELOS DE MUNDO
Captulo 10
COMO USAR SEUS CONHECIMENTOS SOBRE OS MODELOS DE MUNDO
117
Captulo 11
A TEORIA DAS MúLTIPLAS INTELIGêNCIAS
121
Captulo 12
qI E qE
127
Captulo 13
AS jANELAS DA PERSONALIDADE: COMO NOS VEMOS E SOMOS VISTOS PELOS OUTROS
135
qUAIS SãO SEUS PONTOS FORTES E SEUS PONTOS FRACOS?
147
APRIMORAR OS PONTOS FORTES, OU CONSERTAR OS FRACOS? O qUE Dá MELHORES RESULTADOS?
155
Captulo 16
AS EMPRESAS E AS DECISõES CERTAS
165
Captulo 17
O qUE é MAIS IMPORTANTE PARA O SUCESSO: ESFORçO OU TALENTO?
179
Captulo 14
Captulo 15
95
REFERêNCIAS
189
BIBLIOGRAFIA
193
AGRADECIMENTOS
197
INtROdUçãO
Nos ltimos anos, mais do ue uma preocupao, tenho observado enorme angstia nas pessoas por uererem saber como so vistas pelos outros. Como precisam de referncias, acabam se comparando com colegas da empresa, com seus chefes, ex-colegas de escola e, principalmente, com exemplos de sucessos, ue todo dia aparecem em revistas, na televiso, em ornais, em livros e na internet. E as pessoas se perguntam (e muitas vezes perguntam a mim): por ue fulano, com idade e formao semelhantes às minhas, est to melhor posicionado, profissionalmente? Por ue meus amigos(as) tm relacionamentos estveis, e eu s arrumo confuso? que tenho feito de errado? Por ue as coisas parecem no dar certo para mim, como parecem dar para os outros? O problema muitas vezes consiste em tentarmos comparar “abacaxi com melancia”; ueremos achar alguma lgica onde no h. Comparamo-nos a pessoas com personalidades completamente diferentes das nossas e ueremos obter resultados iguais. Isso no faz o menor sentido. Para audar a compreender melhor “Por ue a gente do eito ue a gente ” e como acionar este nosso “eito de ser” da melhor maneira possvel, usarei como ferramentas a Neurocincia e a Psicologia.
16
EDUARDO FERRAZ
H vrias Neurocincias. A ue utilizaremos neste livro a Neurocincia comportamental: ela estuda os princpios fisiolgicos ue o crebro usa para processar a informao e nos auda a identificar como se forma o comportamento humano. A Psicologia estuda a personalidade e pode ser dividida em dois grandes segmentos: a Psicologia do senso comum e a Psicologia cientfica – trataremos de ambas. A Neurologia explica ue os comportamentos dependem da formao de sinapses entre neurônios no crebro. Auelas sinapses mais usadas na vida da pessoa desde a infância sero mais fortes e vo expressar sua personalidade. Por isso cada pessoa tem as reas onde demonstra maior facilidade de atuar e aueles setores nos uais sofre para fazer algo. Por exemplo: algum mais introvertido e detalhista ue tenta trabalhar com o pblico ou algum extrovertido e impaciente ue colocado para fazer trabalhos ue exiam pacincia e concentrao. Essas duas pessoas, se trocadas de lugar, provavelmente iro trazer melhores resultados para si e para as empresas onde trabalham. Vale a pena aperfeioar-se nas reas onde a pessoa demonstra facilidade, para ser ainda melhor e colher resultados mais rpidos. é uesto de foco. O livro fala do ue preciso para atingir a excelncia pessoal respeitando seu estilo nico de ser. Para ue os conceitos a serem expostos neste livro possam ser melhor assimilados, utilizarei algumas estratgias sugeridas por Howard Gardner, 1 cientista ue ganhou
POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é?
17
notoriedade ao propor a “Teoria das Inteligncias Mltiplas”. Ele afirma ue os seres humanos pensam em termos de conceitos e ue a mente est cheia deles. Alguns conceitos, por exemplo, so concretos (alimento, televiso, livro); outros, abstratos (personalidade, PIB, Fsica quântica). À medida ue um conceito fica mais familiar, ele se torna mais concreto, uase como algo ue possamos provar ou tocar. Gardner argumenta ue um adulto, para ser convencido sobre um novo assunto, um novo conceito, ou para mudar um preconceito (um conceito pr-estabelecido) precisa de, pelo menos, sete fatores ou “alavancas”: 1. Razo A Cincia compe-se de um conunto de conhecimentos obtidos de maneira programada, sistemtica e controlada, para ue se permita a verificao de sua validade. O uso da razo essencial para mudar um ponto de vista. Uma abordagem racional/lgica auda bastante a apresentar um novo conceito. 2. psquisa O uso de dados relevantes de pesuisa complementa a argumentao lgica, reforando a razo. Indicarei 22 referncias bibliogrficas de autores respeitados em suas reas de atuao, e mais 21 obras para uma consulta mais ampla.
18
EDUARDO FERRAZ
3. Rssonância Ela tem a ver com aspectos prticos ue nem sempre so baseados na cincia, mas na interpretao de hipteses. j ue no poderei usar a retrica (ue a alavanca mais poderosa), usarei minhas experincias de mais de 30.000 horas de trabalho no assunto, contanto alguns casos, histrias e adaptaes (para preservar a identidade das pessoas ou empresas citadas), ue faam a ponte entre a teoria e a prtica. 4. Rscriõs Para ue novos conceitos seam bem compreendidos, necessrio apresent-los sob diversas formas, para ue se reforcem mutuamente. Usarei abordagens e repetirei assuntos com certa insistncia. Estas repeties tm como obetivo relembrar os conceitos, para evitar ue voc necessite ir e voltar no livro para reler trechos, a cada captulo. 5. Rcomnsas Algumas vezes, voc se perguntar: “O ue eu ganho, se aprender este novo conceito?”, “Onde o autor uer chegar com este assunto?”. Confie em mim! Sei onde uero chegar e pretendo lev-lo unto comigo. 6. evnos o muno ral A maioria das pessoas no tem muita pacincia com abstraes, e nem tolera um assunto chato ou ue no tenha ligao com sua realidade de vida. Por isso, procuro aui trazer exemplos do dia a dia de pessoas comuns.
POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é?
19
7. Rsisências Algumas pessoas tm forte resistncia em mudar seus pontos de vista sobre certos temas. No desanime! Conforme o contedo for se desenvolvendo, os assuntos ficaro cada vez mais interessantes.
Resumindo, usarei a razo; mostrarei pesuisas; contarei histrias; repetirei assuntos de diferentes formas; proporei recompensas; trarei temas, ue fazem parte do mundo real; e com isso, certamente, diminuirei resistncias e preconceitos sobre a matria. Sero 17 captulos, nos uais haver uma abordagem propositalmente prtica e obetiva, aplicvel, portanto, no cotidiano.
CAPíTULO 1
COMO tUdO COMeçOU
O ue vem a seguir um peueno resumo de como vrios cientistas estimam ue se deu a evoluo humana. Muita gente aceita a teoria da evoluo desenvolvida inicialmente por Charles Darwin. Humanos descendem de seres, ue tambm deram origem aos macacos. Entretanto, poucos se do conta das implicaes psicolgicas desse fato. O primatlogo Frans de Waal 2 diz ue o Hm sapens parece, se move, respira, tem a fisiologia e tambm uma mente parecida com a dos primatas e afirma ue “consciente ou inconscientemente exibimos expresses faciais e comportamentos sociais em muitos casos idnticos ao de chipanzs”. Assim como os humanos, chipanzs lutam pela liderana, conspiram em busca de apoio, montam complôs, tm invea, sentem medo e so egostas. Alguma smlhana à visa? Muitos pesuisadores, entre eles o geneticista Andr Langaney3 , estudando o DNA de grandes primatas, estimam ue entre cinco e sete milhes de anos atrs um grupo de animais da mesma espcie se dividiu e deu origem a trs grandes linhagens: os gorilas, os chipanzs e os humanos.
22
EDUARDO FERRAZ
Uma das concluses de ue o cdigo gentico dos humanos 98,5% idntico ao dos chipanzs. A uase totalidade de nosso DNA (999 letras em 1000) se hibridiza com o DNA de um chipanz, rovano qu as uas sécis so muio róximas , orano, êm uma origm comum . O processo de seleo natural, ue culminou nos humanos atuais, foi tremendamente complexo, lento, desgastante e persistiu por mais de 200.000 graõs. Vou resumir essa epopeia de cinco milhes de anos, deixando de fora detalhes ue podero ser lidos nas obras sugeridas na bibliografia deste livro. Os primeiros “pr-humanos”, ue se diferenciaram desse ancestral comum, tiveram origem na áfrica Oriental: o Austaptecus afcanus (cerca de cinco milhes de anos), o Austaptecus afaenss (cerca de trs milhes de anos) e o Hm eectus (cerca de um milho e meio de anos). Finalmente, entre 150.000 e 200.000 anos atrs, a evoluo gerou uma “nova verso” do Hm eectus: a nossa atual espcie, o Hm sapens. Essa verso semiacabada do ser humano ainda tinha o crebro um pouco menor ue o atual, mas dominava o fogo e fabricava ferramentas de pedras polidas e afiadas. A configurao fsica e mental do ser humano atual comeou seu ltimo estgio de evoluo h cerca de 50.000 anos “apenas”. Os dados arueolgicos mostram ue nessa poca nossos ancestrais viviam em bandos de 20 a 30 indivduos. Eram caadores/coletores, deslocavam-se o tempo todo e tinham pouussimos filhos, porue era difcil
POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é?
23
aliment-los. Conviviam em ambientes extremamente perigosos. Enfrentavam escassez de alimentos, clima gelado e predadores ferozes. Para completar o drama, nossos ancestrais tinham menos fora fsica, menor velocidade, dentes peuenos, olfato rudimentar e viso limitada uando comparados aos predadores, e mesmo aos grandes herbvoros. Tampouco voavam ou respiravam debaixo d’gua. Seus filhotes demoravam anos para se virarem sozinhos, enuanto um filhote de zebra ficava independente em semanas, o filhote de leo, em meses. que vidinha difcil esse pessoal levava! Aina assim, com oas ssas svanagns, o sr humano conquisou um fio qu nnhuma oura séci gran or jamais consguiu. Aaou-s a oos os ambins o lana: desertos, geleiras, montanhas, florestas e savanas. Dominou o mundo devido a um grande diferencial: o aumno o snvolvimno o cérbro . H 50.000 anos, por exemplo, comearam a aparecer trabalhos manuais mais elaborados: pinturas rupestres, colares de conchas, anzis feitos de ossos e at vestimentas produzidas a partir do couro de animais. Nessa poca o ser humano provavelmente desenvolveu a habilidade de construir abrigos em climas gelados e de se comunicar verbalmente, e comeava a ter uma constituio fsica e mental muito parecida com a ue tem hoe. Usava mlhor o cérbro, mas aina agia como animal. A evoluo se deu lentamente, com os humanos se espalhando pelos cinco continentes, mas ainda vivendo como
24
EDUARDO FERRAZ
nômades, em peuenos bandos, at ue, finalmente por volta de 13.000 anos atrs, aconteceu um fato ue mudou de forma espetacular seu estilo de vida. Terminou a ltima Era Glacial e comeou o ue os gelogos chamam de Era Recente. A temperatura mdia do planeta subiu, geleiras descongelaram-se, solos ficaram mais frteis e a uantidade de alimento aumentou. O homem deu incio à agricultura rudimentar, espalhando e colhendo sementes de trigo e arroz. Os primeiros animais, como a cabra e o porco, comearam a ser domesticados. Nossos ainda pouussimos ancestrais comearam a ficar sedentrios. Os peuenos bandos comearam a se agrupar para viver em aldeias. Com a agricultura e a criao, era possvel ter mais filhos. Teve incio a propriedade privada e, com ela, surgiram a luta pelo poder, os chefes, a burocracia, os nveis hierruicos e o crescimento demogrfico. Em suma, as bases da sociedade organizada. Ufa! Ficamos civilizaos!
POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é?
25
O cientista Robert Winston4 comparara nossa histria na Terra com o comprimento de uma corda. A correlao a seguinte: cinco milhes de anos (uando comeamos a ornada) euivalem a cerca de 100 metros de corda (comprimento de um campo de futebol); treze mil anos (teve incio a agricultura e, portanto, as primeiras aldeias) euivalem a 20 centmetros (uma rgua escolar); cem anos (uando comearam os avanos tecnolgicos) euivalem à ponta de um lpis. Como se v, o ser humano tem apenas cerca de 0,001% de sua histria como “gente minimamente civilizada”. Portanto, em 99,999% dessa ornada, o ser humano foi um animal primitivo ue, muitas vezes, esteve róximo a xino. •
•
•
tmos oos a msma raa Nos ltimos 20 anos, tem-se estudado o DNA mitocondrial humano em todas as regies habitadas do planeta, incluindo povos primitivos da Amazônia, ue ficaram isolados por sculos. Descobriu-se ue somos, rigorosamente, da mesma espcie. No existem raas! Nosso cdigo gentico idntico porue as pesuisas provaram ue descendemos de um grupo de pouussimos indivduos. Entre 150.000 e 200.000 anos atrs, as presses ambientais foram to extremas ue poucas centenas (talvez dezenas) de indivduos permaneceram vivos. quando estavam muito, mas muito prximos da extino total algo mudou. Esse peue-
26
EDUARDO FERRAZ
no grupo de ancestrais conseguiu reproduzir-se, espalharse e dominar o mundo. Somos todos descendentes desses pouussimos sobreviventes pr-humanos. OK! po sar assano la caba o lior: “On s cara qur chgar, com ssa convrsa ré-hisórica?” Já xlico.
Meu obetivo mostrar ue as presses, às uais o ser humano foi exposto durante cinco milhes de anos de evoluo deixaram nele foríssimas marcas físicas mnais . Vrias dessas marcas, por muitas geraes, continuaro geneticamente impressas no ser humano. porano, é imoran nnr qu ssas caracrísicas aina s manifsam m forma nsamnos, comoramnos aõs smlhans àqulas qu inham nossos ancsrais. quando nossos antepassados trogloditas levavam um susto ou corriam perigo, a adrenalina acelerava seus batimentos cardacos, exatamente como hoe ainda acontece com o homem moderno. O sangue flua para as extremidades (pernas e braos) e ualuer sensao de dor, fome ou cansao desaparecia de imediato. Em segundos, ficavam fsica e mentalmente preparados para fugir, ou lutar pela vida. Foi assim por milhes de anos e, de certa maneira, assim at hoe. Continuamos a ter as mesmas reaes metablicas e mentais ue, no decorrer de uznas mil graõs , fizeram a diferena entre a extino da espcie e o domnio do planeta. Assim como no passado distante, a evoluo no programou o ser humano para avaliar o ue as coisas so de fato, programou-o para sobreviver.
POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é?
27
quando uma sombra, assemelhando-se a um leo se aproximava, nosso ancestral certamente corria. Nauela poca, provavelmente ningum se punha a filosofar sobre ual era a espcie de leo ou se o leo estava com fome. Os muito reflexivos acabavam devorados. qualuer tipo de alimento digervel era consumido. Sucsso significava inrrar raiamn o ambin ara rmancr vivo. para sobrvivr, o homm obrigava-s a nsar m curíssimo razo, quas nunca a lanjar. No temos mais ue correr de lees ou matar mamutes. Entretanto, continua havendo uma constante tenso entre nossos instintos da poca das cavernas e as necessidades da vida moderna. Veamos algumas reaes fsicas e mentais ue hoe no servem para nada, mas ue continuamos experimentando. O aumento exagerado dos batimentos cardacos antes de uma entrevista de emprego, ou do incio de um namoro; o suor frio antes de uma reunio importante ou competio esportiva; o estado de alerta imediato, uando ouvimos à noite um barulho inesperado; a exploso de raiva no trânsito; a excitao sexual embaraosa; a salivao abundante diante de um prato de comida. Provavelmente, nenhuma destas reaes vai salvar nossas vidas, mas continuamos a experiment-las, uerendo ou no. A verdade ue o corpo do ser humano moderno reage instintivamente como reagia h milhares de anos. Esses instintos continuam muito fortes! Insinos so comoramnos qu no so rsulao o arnizao nsa grao, mas a voluo a séci.
28
EDUARDO FERRAZ
A neurocientista jill Taylor 5 explica ue as “camadas mais profundas do crtex cerebral constituem as clulas do sistema lmbico. So essas clulas ue o homem tem em comum com outros mamferos e, em especial, com seus antepassados pr-humanos. É a ára o cérbro chamaa riliana ou cérbro mocional”. O interessante ue o sistema lmbico funciona durante a vida inteira, mas nunca amaurc. quando nossos “botes emocionais” so pressionados (situaes ue ativam os instintos), agimos da mesma forma ue nosso ancestral das cavernas, ao tomar um grande susto. essas raõs foram imrssas no sr humano, há milhars anos. O Proeto Genoma, concludo em 2001, mostrou ue o cdigo gentico humano tem uma lista de mais de 3 bilhes de letras em diferentes combinaes, e nesse cdigo est a receita para o desenvolvimento fsico e mental da pessoa. De cada 10.000 letras de nosso cdigo gentico, anas uma lra ser diferente de uma pessoa para outra. Essas minsculas diferenas respondem por grande parte das diferenas entre as pessoas, tais como altura, cor dos olhos, predisposio para algumas doenas, personalidade e centenas de outras caractersticas. Uma lra a caa 10.000 nos faz ifrns, mas 9.999 lras nos fazm iguais. Essa receita, tremendamente complicada, demorou milhes de anos para ser “preparada” e, por mais ue ueiramos, muito difcil alterar seus ingredientes, no curto prazo de uma gerao.
POR qUE A GENTE é DO jEITO qUE A GENTE é?
29
Carregamos pela vida uma bagagem gentica, ue vem pronta. é como se nascssemos com um “enxoval” ue vamos usar pelo resto da vida. No podemos ogar nenhuma dessas peas fora, mas podemos deixar de usar algumas, usar outras com freuncia, bem como combinlas conforme nosso estilo de vida e nosso livr arbírio. Na Pr-Histria, o estresse ocorria em situaes extremas. O estresse atual virou estilo de vida. A competio por espao profissional, a etiueta social, a obcecada procura pelo acmulo de bens, dentre outras necessidades, so relativamente recentes – menos de 13.000 anos – e ainda estamos nos acostumando a elas. Sob o ponto de vista da Psicologia e da Neurocincia, veremos nos prximos captulos: “Por ue somos como somos? Por ue as pessoas tm personalidades to diferentes, se a origem a mesma?” O ue possvel mudar em nossos instintos de “trogloditas”?