Poemas da segunda Parte da Mensagem e análise
"Padrão" - "Mensagem"
A técnica escolhida pelo "eu" para falar do «padrão» é partir do geral para o particular: deixa o padrão no area (1ª quadr qu adra); a); apr aprese esenta nta a sim simbo bolog logia ia ger geral al do pad padrão rão (2ª quadra); refere o valor das «Quinas» (3ª quadra) e da «Cruz» (4ª quadra). Subjaz ao último verso de cada quadra a ideia da eterna procur pro curaa ("p ("para ara dia diante nte"; "; "o por por-fa -fazer zer"; "; "o ma marr sem fim fim"; "; "sempre por achar") que se liga à "febre de navegar", à ânsia, à insatisfação. Mais importante do que a imperfeita obra realizada é o "porfazer", é a necessidade de navegar "para diante" , no "mar sem fim", na demanda do "porto sempre por achar".
"Navegar não pode ser entendido apenas no sentido literal. No poema, surge, também, como metáfora de toda a procura. Embora "ousada", a "obra é [sempre] imperfeita", por isso a exemplaridade do herói reside, sobretudo, na sua atitude de permanente insatisfação diante do já feito. É isto que o eleva acima da medida humana comum. O "eu" do poema é um herói predestinado: "A alma é divina", "O por-fazer é só com Deus", "Só encontrará de Deus [...] / O porto sempre por achar". O padrão não assinala a viagem conseguida, pois o importante não é chegar é partir. O padrão é o «marco sempre penúltimo da viagem começada».
Comentários: Este é outro dos poemas mais conhecidos de Mensagem e tal como os seus pares (Infante (Infante,, Mar Português, Português, e Mostrengo Mostrengo)) a linguagem é clara e quase não requer explicações. "o mar com fim..."- o Mediterrâneo; "o mar sem fim..."- o Oceano. "o que me há na alma (...) só encontrará, de Deus na eterna calma, o porto sempre por achar"irei sempre mais longe porque, por mais longe que vá, haverá sempre um porto por descobrir; só descansarei (só encontrarei esse porto) depois de morrer. palavras mantidas em ortografia antiga: deante= diante; signala= sinala (assinala); immenso= imenso; portuguez= português.
OCCIDENTE
Comentários:
Com duas mãos- o Acto e o DestinoDesvendámos. No mesmo gesto, ao céu Uma ergue o facho trémulo e divino E a outra afasta o véu.
Este poema, que refere as navegações para ocidente e, em particular, a descoberta do Brasil, chamou-se originalmente "Os descobridores do Occidente" e o texto final aqui apresentado tem diferenças apreciáveis em relação à primeira versão, que muito a melhoraram.
Fosse a hora que haver ou a que havia A mão que ao Occidente o véu rasgou, Foi alma a Sciencia e corpo a Ousadia Da mão que desvendou.
Fosse Acaso ou Vontade, ou Temporal A mão que ergueu o facho que luziu, Foi Deus a alma e o corpo Portugal Da mão que o conduziu.
Aborda um tema recorrente em Mensagem: a epopeia dos Descobrimentos foi o cu mprimento de um destino; e a obra portuguesa foi a corporização da vontade de Deus "foi Deus a alma e o corpo Portugal" (da mão que levantou o facho e rasgou o véu da ignorância). "Fosse acaso ou vontade, ou temporal..."- referência à dúvida quanto a se a descoberta do Brasil em 1500 foi ocasional, planeada para que fosse divulgado nessa data um território já anteriormente encontrado, ou causada por um temporal que teria desviado as naus da rota traçada.
FERNÃO DE MAGALHÃES
Comentários:
No valle clareia uma fogueira. Uma dança sacode a terra inteira. E sombras disformes e descompostas Em clarões negros do valle vão Subitamente pelas encostas, Indo perder-se na escuridão.
Este poema refere-se à viagem de circumnavegação da Terra, iniciada por Fernão de Magalhães e terminada pelo basco Sebastián Elcano após Magalhães ter sido morto em combate por nativos de uma das ilhas do arquipélago filipino.
De quem é a dança que a noite aterra? São os Titans, os filhos da Terra Que dançam da morte do marinheiro Que quiz cingir o materno vultoCingil-o, dos homens, o primeiroNa praia ao longe por fim sepulto.
Dançam, nem sabem que a alma ousada Do morto ainda commanda a armada, Pulso sem corpo ao leme a guiar As naus no resto do fim do espaço: Que até ausente soube cercar A terra inteira com seu abraço.
Violou a Terra. Mas elles não O sabem, e dançam na solidão; E sombras disformes e descompostas, Indo perder-se nos horizontes, Galgam do valle pelas encostas Dos mudos montes.
Como solução estilística recorrente, Fernando Pessoa não se refere directamente aos feitos do visado mas aborda apenas um momento da sua vida, mais precisamente a morte. Fará o mesmo em relação a Bartolomeu Dias e a Vasco da Gama. Presumivelmente trata-se da materialização da sua ideia de que uma vida sem sonho não vale a pena e de que é no momento da morte que se podem cont abilizar as valias de cada vida. Fernando Pessoa descreve uma dança de selvagens, presumivelmente dos guerreiros que o mataram (aliás em legítima defesa...) que compara aos titãs, antigos deuses da terra que, na mitologia grega, antecederam os deuses do céu. Simbolicamente, os seres da terra dançam da morte daquele que, concluindo o sonho do Infante, a rodeou tornando-a una e rasgando o último mistério (violando a Terra, como diz Pessoa). E doravante já ninguém, mesmo vivendo numa ilha remota, estará isolado. A Terra vingou-se da violação, através dos seus "filhos", com a morte do navegador. Mas eles não sabem que aquele que mataram acabou com o seu isolamento geográfico e porque não o sabem mantêm-se na solidão da ignorância. E a Terra, enfim desvendada para o Ocidente, é muda para eles...
A ÚLTIMA NAU
Comentários:
Levando a bordo El-Rei Dom Sebastião, E erguendo, como um nome, alto, o pendão Do Império, Foi-se a última nau, ao sol aziago Erma, e entre choros de ancia e de presago Mystério.
"aziago"- de um dia infeliz; de mau agouro. "erma"- desamparada, só. "ao sol aziago erma"- desamparada sob um céu de mau agouro; enfrentando sozinha um destino adverso.. "ancia"- ortografia clássica de "ânsia".
Não voltou mais. A que ilha indescoberta Aportou? Volverá da sorte incerta Que teve? Deus guarda o corpo e a forma do futuro, Mas Sua luz projecta-o, sonho escuro E breve.
"pressago"- que prediz algo, que é prenúncio de qualquer coisa. "Deus guarda(...) o futuro, mas(...) projecta-o, sonho escuro e breve"- só Deus sabe o futuro mas (como o Destino está traçado) por vezes permite aos homens entrevê-lo em breves lampejos indefinidos (escuros). "falta a alma"- estão desalentados.
Ah, quanto mais ao povo a alma falta, Mais a minh'alma atlântica se exalta E entorna, E em mim, num mar que não tem tempo ou 'spaço, Vejo entre a cerração teu vulto baço Que torna.
Não sei a hora, mas sei que há a hora, Demore-a Deus, chame-lhe a alma embora Mystério. Surges ao sol em mim, e a névoa finda: A mesma, e trazes o pendão ainda Do Império.
"e entorna"- e extravasa. "que torna"- que regressa. As duas últimas estrofes referem o regresso de D.Sebastião, que o poeta diz ser certo embora não saiba quando. E ao regressar vem ainda com a determinação de constru ir um império universal (se bem que não material, mas do espírito- como se depreende de outros escritos de Fernando Pessoa). Ver também, abaixo, uma versão inglesa que pode ajudar a compreensão uma vez que o conteúdo é idêntico mas, necessariamente, o estilo é diferente.
PRECE
Senhor, a noite veio e a alma é vil. Tanta foi a tormenta e a vontade! Restam-nos hoje, no silencio hostil, O mar universal e a saudade.
Mas a chamma, que a vida em nós creou, Se ainda há vida ainda não é finda. O frio morto em cinzas a ocultou: A mão do vento pode erguel-a ainda.
Dá o sopro, a aragem- ou desgraça ou anciaCom que a chamma do esforço se remoça, E outra vez conquistemos a DistanciaDo mar ou outra, mas que seja nossa!
Comentários: A quase totalidade dos poemas de Mensagem trata, até este ponto, da glorificação do esforço da Raça que cumpriu um destino que a levou a iniciar a grande Idade da Exploração Marítima e atingiu o seu apogeu no século XVI. O poema anterior a este faz a ponte entre o eclipse de Portugal, com o desaparecimento do rei D.Sebastião, e o tempo em que o poeta escreve. O presente poema conclui este ciclo de Mensagem fechando-o com uma invocação do poeta à intervenção divina. "Senhor, a noite veio e a alma é vil. Tanta foi...etc"- passou o tempo da nossa grandeza; tantos obstáculos vencemos que hoje perdemos a valia. "a mão do vento pode erguê-la ainda"- tal como o fogo quase extinto pode ser reavivado por um sopro, a Alma Portuguesa pode ainda levantar-se. "E outra vez conquistemos a Distância, do mar ou outra, mas que seja nossa!" (uma bela frase)sejamos de novo grandes entre as Nações!