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Entenda o significado contido nas grandes obras.
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Alegoria da Sabedoria e da Força: A Escolha de Hércules FrançoisBoucher(sobreoriginalde PaoloVeronese)c. 1750
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VIRTUDE E APARÊNCIA (A CAMINHO DO MODERNO). Todo o significado de obras de Botticelli, Rafael, Tintoretto, Bosch, El Greco e outros grandes artistas dos séculos XIII ao XVIII. De terça a domingo,
das 11 às 18h: quinta até as 20h. Av. Paulista,
1578 :: (11) 3251-5644::
www.masp.art.br
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Mercedes-Benz
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SUMÁRIO CAPA:
O Ray Massey/Stone/Getty
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A psicologia da forma HELMUT E. LÜCK
A palavra Gestalt, alemã e sem tradução exata em português, refere-se ao que é "exposto ao olhar"; segundo a teoria, o todo "é sempre maior que a soma de suas partes"
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A neurologia da estética VILAYANUR s. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
Apesar da diversidade de estilos, há princípios universais da arte - uma espécie de "gramática" da estética, análoga às sintaxes propostas pelo lingüista Noam Chomsky
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e vai ignorar a outra
Buscas do olhar VILAYANUR S. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
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Experiências com pontos cegos indicam que nosso sistema nervoso detesta o vácuo - e procura fugir dele
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E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
Imagens especulares ajudam pessoas amputadas a amenizar ou eliminar a dor fantasma; experimento mostra a importância da comparação de informações sensoriais para a imagem corporal
Nuances do cinza ALAN GILCHRIST
Jogos de sombra e contraste fazem com que uma única forma acinzentada pareça ter diferentes tons, dependendo do que estiver ao redor
O fascínio do espelho VILAYANUR s. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-
Ilusões visuais atiçam a curiosidade e permitem diversas interpretações; o sistema nervoso, porém, anseia por respostas e se concentra em uma só alternativa
si, o cérebro dá importância à que parecer mais confiável,
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RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
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Imagens ambíguas VILAYANUR s. RAMACHANDRAN
Se duas fontes diferentes de informação são incoerentes entre com base em experiências acumuladas
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Paradoxos da percepção VILAYANUR s. RAMACHANDRAN
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Ver para crer VILAYANUR s. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-
RAMACHANDRAN
Ao alterar o sombreamento e a fonte de luz fazemos com que imagens pareçam mudar de forma e lugar. Não acredita? Experimentei
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Mecanismos da estabilidade visual VILAYANUR S. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-
RAMACHANDRAN
Por que o mundo não parece pular quando nossas retinasse movem?Essaadequaçãoaparentemente corriqueira exige trabalho cerebral específico
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Ilusões móveis VILAYANUR S. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-
RAMACHANDRAN
Ao "enganar"
neurôniosespecializadosem detectar
estímulos que se deslocam, certas imagens nos fazem perceber movimento onde ele não existe www.mentecerebro.com.br
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www.mentecerebro.com.br DIRETORGERAL:ALFREDONASTARI DIRETOREXECUTIVO:EDIMILSONCARDIAL DIRETORADO GRUPOCONHECIMENTO: ANACLAUDIAFERRARI ESPECIAL ARMADILHASDA PERCEPÇÃO REDAÇÃOMENTE&:CÉREBRO (
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A dança das listras VILAYANUR S. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
Buscamos padrões para apreender estímulos visuais; alguns experimentos simples elucidam processos neurológicos complexos usados para captar o movimento dos objetos
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Filtrosda percepção s. RAMACHANDRAN
VILAYANUR
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
A manipulação de imagens com algoritmos promove ilusões visuais surpreendentes e também explica como nosso sistema visual decompõe o que vê em diferentes freqüências espaciais
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Brincando com pesos e medidas s. RAMACHANDRAN
VILAYANUR
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
EDITORADEARTE:SimoneOliveiraVieira ASSISTENTES DEARTE:TatianeSantosde Oliveira, MarcellaSholle julianaFreitas PESQUISAICONOGRÁFICA:SilviaNastari(coordenação), GabrielaFarcettae MarianaCarneiro ASSISTEN]EDE~EDAÇÃO:ElenaReginaPucinelliRodrigues PRODUÇAOGRAFICA:MoysesJesuse EduardoSantos TRATAMENTODEIMAGEM:CarinaVieirae CintiaZardo
~ Spektrum der Wissenschaft Verlagsgesellschaft,Slevogtstr. 3-5 69126 Heidelberg, Alemanha EDITOR:Carsten Kõnneker DIRETORES-GERENTES: Markus Bosslee Thomas Bleck Mente&Cérebro é uma publicaçãoda Ediouro, Segmento-Duetto Editorial Ltda., com conteúdo internacional fornecido pela G&:G,sob licença de Scientific American, Inc. RuaCunha Gago,412 - cj. 33 - Pinheiros- SãoPaulo, SP CEP:05421-001- Tel.:(11) ) 2713-8150 Fax: (11) 2713-8197
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A ilusão visual confunde os centros neurais e nos faz crer que um objeto seja diferente do que realmente é; experiências simples e divertidas mostram como isso acontece
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No prumo certo s. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
Para calcular a posição relativa dos objetos, o cérebro usa estratégias complexas que comparam informações sensoriais antes de decidir o que está de pé e o que está de cabeça para baixo
Transparente e óbvio VILAYANUR S. RAMACHANDRAN
E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
Utilizamos recursos neurológicos sofisticados para processar informações sobre a cor e o brilho dos objetos - mas nem sempre nossas conclusões seguem as leis da física
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(
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COMITÊ EXECUTIVO JorgeCarneiro,EdimilsonCardial, LuizFernandoPedrosoe AlfredoNastari
Cores ilusórias JOHN S. WERNER, BAINGIO PINNA E LOTHAR SPILLMANN
Experimentos que envolvem percepções visuais sugerem que a noção de eor está associada às formas e à profundidade; os diferentes tons são sensações criadas pelo
cérebro
GERENTE DEPUBLICIDADE EPROJETOS ESPECIAIS: RobertaPalma EXECUTIVOS DECONTAS:Ana PaulaMiranda e WalterPinheiro (
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postagem. DIRETOR RESPONSÁVEL: Alfredo Nastari
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MENTE&CÉREBRO
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ARMADILHAS
DA PERCEPÇÃO
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NEM SEMPREÉO QUE PARECE
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uemnunca olhou para umafigura e jurou queelasemovimentava, quandona verda eestavabemparadaà suafrente?Ou ao contrário:teve(aindaqueporalgunssegundos) a certezadequeumcírculooucilindroestavam parados,mas,defato,giravam?Sim,realmente nossosolhospor diversasvezesseenganam- e nosconfundem. Mas também ajudama compreenderofuncionamentodocérebro. Experiênciascom pontoscegos,espelhos, cores,figurasgeométricas, obrasdearteimprováveistêmmostrado queépossível iludirosistema cerebral.Não poracaso,imagens quedesafiam a lógica,comoasdoartistagráficoholandês Maurits CornelisEscher(1.898-1.972)conhecido por suasxilogravuraselitografiasquerepresentam construções impossíveis, preenchimento regular doplano,explorações doinfinitoemetamorfoses depadrõesgeométricos queseentrecruzam e se transformamgradualmenteemformas completamentediferentes(veja imagensno sitewww. im-possible. info/english/art/index.html). Essasinteraçõesentrepercepção,sistema visual, leisdafísica eestéticatêmsidotemade estudodospesquisadores do Centrodo Cérebro eda Cogniçãoda Universidade da Califórnia, as eventuaiscontradições.Ou seja:é possível emSan Diego, Vilayanur S. Ramachandran apreciaro todo,aindaquealgumasdesuaspartes e sua mulher,Diane Rogers-Ramachandran nosincomodem Uustamente emrazãodenossa - autoresdamaiorpartedostextosdestaedição. impossibilidade cognitivadeintegrá-Ias).Nas Segundoosneurocientistas, apesarda idéiatão páginasa seguir,os estudiosos desses truques difundida quecremosnaquilo quevemos,por da percepção nosconvidama desvendar alguns vezesnossocérebrotrabalhatambémnosentido mistérios ea brincarcomosprópriossentidos, por inverso:enxergamos aquiloemqueacreditamos. meiodeexperimentos simpleseintrigantes. O mecanismo perceptualnosfaz compreender uma única Gestalt (ou forma), assimilando Boaleitura,boasdescobertas!
ASCENDING AND DESCENDING /
M. C. Escher
Gláucia Leal, editora g/aucia/ea/@duettoedítoría/.com.br
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A psicologia I
a orma
A palavraGestalt, alemã e sem traduçãoexata em português, refere-seao que é "exposto ao olhar";segundo a teoria, o todo "é sempre maior que a soma de suas partes" POR HELMUT E. LÜCK professor de psicologia da Universidade Distância de Hagen, Alemanha.
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ma rosa é uma rosa é uma rosa."A poetisa americana Gertrude Stein, autora desse célebre enunciado, não tinha muito a ver com a teoria da Gestalt. Não obstante, em seu célebre verso (do poema Sacred Emily, de 1913) ela dá vazão a uma constatação que sobreveio também a alguns psicólogos de seu tempo. As quatro letras r, o, s, a não constituem em nossa mente simplesmente uma palavra: evocam a imagem da flor, seu cheiro e simbolismo - propriedades não exatamente relacionadas às letras. Em suma: criam uma forma, uma Gestalt. A palavra, alemã, significa "0 que é colocado diante dos olhos, exposto ao olhar". Adotada hoje no mundo todo (e sem tradução para o português), referese a um processo de dar forma, de configurar. De acordo com a teoria gestáltica, não se pode ter conhecimento do "todo" por meio de suas partes - e sim das partes pelo todo, pois o todo é maior que a soma de suas partes. Isso equivale a dizer que "A+ B"não é simplesmente "(A+B)",mas simum terceiro elemento "C",que possui características pró-
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A esse aspecto se dá o nome de supersoma. Um segundo aspecto considerado pela Gestalt é a transponibilidade: independentemente dos elementos que constituem determinado objeto, reconhecemos ali uma forma (Gestalt). Admitimos, por exemplo, que uma cadeira é uma cadeira, seja ela feita de plástico, metal, madeira ou qualquer outra matéria-prima. Em outras palavras, a forma sobressai. O psicólogo austríaco Christian von Ehrenfels (1859-1932) apresentou esses dois critérios, supersoma e transponibilidade, pela primeira vez em 1890, em uma dissertação apresentada na Universidade de Graz. Um dos principais representantes da Gestalt da Escola de Graz (que também recebeu o nome de "teoria da produção") foi Max Wertheimer (1880-1943). Ele gostava de ilustrar os primórdios experimentais da psicologia da Gestalt com uma história que deve ter se passado por volta de 1910: no fipal do verão, Wertheimer viajava de trem de Viena para algum lugar do estado da Renânia. Duprias.
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MENTE&CÉREBRO ARMADilHAS DA PERCEPÇÃO
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AS LETRAS R, O, S, A constituem mais que uma palavra: evocam imagem, perfume e simbologia da flor
Quandoa ilusão de 6ptica era esclarecida aos voluntários do teste, a impressão não se dissipava: parecia se tomar ainda mais nítida 8
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rante o percurso, meditava sobre a visualização do movimento. Quando lhe ocorreu, num dado momento da viagem, que podia provocar aquelas percepções artificialmente com uma espécie de rápido piscar consecutivo de luzes, como é possível fazer no estroboscópio, Wertheimer desceu intempestivamente em Frankfurt e comprou um aparelho que na época era tido como um brinquedo para crianças e começou a realizar os primeiros experimentos. Em seguida entrou em contato com psicólogo Friedrich Schumann (1858-1940), da Universidade de Frankfurt, que enviou seu assistente Wolfgang Kõhler (1887-1967) ao quarto de hotel de Wertheimer. Não foi preciso muito para que todos os envolvidos se convencessem de que os professores deveriam realizar o experimento juntos no laboratório de Schumann. É difícil saber se tudo se
MENTE&CÉREBRO ARMADilHAS DA PERCEPÇÃO
passou exatamente assim. Talvez Wertheimer já tivesse anos antes a intenção de desenvolver um novo tipo de estroboscópio em parceria com Schumann. De qualquer modo, os primeiros experimentos do pesquisador da Gestalt de Franfkurt assumiram uma forma concreta no início do século XX. Em uma série de testes, Wertheimer mostrou aos voluntários do estudo dois estímulos, em rápida seqüência: no primeiro podia ser vista, do lado esquerdo de uma gravura, uma linha horizontal; no segundo, havia uma linha horizontal do mesmo comprimento, à direita. Se ambas as imagens fossem mostradas alternadamente, surgia a intervalos de cerca de 60 milésimos de segundos a impressão de um movimento aparente, como se as linhas oscilassem de um lado para o outro, como um limpador de pára-brisa. Nesse experimento, se a mudança de imagens for ainda mais rápida, os estímulos são vivenciados como simultâneos - ambas as linhas tremeluzem aparentemente ao mesmo tempo. Só quando a representação de determinada freqüência não é transposta se tem a impressão de continuidade: vê-se ora uma linha, ora a outra, cada qual em um local e posição. Wertheimer deu ao movimento percebido em seqüência mais rápida a denominação de "fenômeno phi". A tentativa de visualização do movimento por Wertheimer marca o início da escola mais conhecida da psicologia da Gestalt. Além de Wertheimer, fizeram parte dela Wolfgang Kõhler e Kurt Koffka (1886-1941). Nos anos 20, as pesquisas se expandiram pela
Alemanha e numerosos trabalhos deram novo impulso não só à pesquisa da percepção, mas à psicologia de forma geral. Nas origens das escolas de Frankfurt e de Berlim - diferentemente do que se tinha na de Graz - estavam formas (Gestalten). Segundo seus teóricos, as pessoas não as "produziam" como dados fundamentais dos sentidos e, tampouco, elas se constituíam paralelamente a estes; as formas eram consideradas elas próprias as unidades fundamentais da vida anímica. Desde o começo Wertheimer evitou falar em ilusão da percepção como fenômeno phi. Reconheceu que para o observador não importava se o movimento percebido era produzido por dois estímulos semelhantes e sucessivos ou por um deslocamento eficaz. Nem mesmo quando se esclarecia o efeito aos voluntários que participavam dos testes e a ilusão era" desmascarada", ela se dissipava pelo contrário: após o esclarecimento, o fenômeno phi era, não raro, percebido com maior nitidez.
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Adeus aos dogmas Os psicólogos da Gestalt desenvolveram um programa teórico para refutar dogmas da fisiologia dos sentidos. Pesquisas pioneiras de Wolfgang Kõhler com antropóides enfatizaram que não só a percepção humana, mas também nossas formas de pensar e agir funcionam, com freqüência, de acordo com os pressupostos da gestalt. Atendendo à solicitação do médico berlinense Max Rothmann, a Academia Prussiana de Ciências instalou em 1913, na ilha de Tenerife, nas Canárias,
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uma estação para o estudo do comportamento de macacos. No posto de experimentação eram estudadas as capacidades dos animais em condições semelhantes às naturais. O filósofo e psicólogo alemão Carl Stumpf (1848-1936) nomeou Kõhler diretor da estação, apesar de na época ele não ter mais que 26 anos e quase nenhuma experiência em biologia e pSicologia de animais. Os experimentos de Kõhler foram reconhecidos quando g comprovaram que os chimpan~ zés têm condições de resolver ~5 problemas complexos, como
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conseguir alimentos que estão
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fora de seu alcance: para pe-
~ ~ gar bananas de um cacho, por
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exemplo, em pilhavam caixas ~ e usavam varas. Um macaco ~ ~
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ruivo chegou a acoplar duas varetas de bambu a fim de se aproximar de uma guloseima.
I Fato menos conhecido é que, í mesmo antes de Kõhler, LeoI nard T. Hobhouse havia realisemelhantes
1 zado experimentos ~
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na Inglaterra.Kõhler procedeu
de maneira sistemática, prototodos ~ os resultados e filmou alguns. ~ Mais decisivo para o seu êxito,
I colou cuidadosamente ~ ~
entretanto, foi ter encontrado esclarecimentos convincentes
para as suas observações. Segundo o método de "tentativa e erro", para chegarmos à solução correta de determinado problema não é necessário um longo período de experimentação. Para os macacos, parece que a "ficha cai" muito rapidamente; a junção de objetivo e meios de auxílio permitem que se dê a Gestalt. Kõhler denominou o conhecimento resultante dessa experiência de "perspectiva". Quase concomitantemente aos estudos de percepção de Wertheimer, com quem Kõhler, de Tenerife, manteve estreito contato por correspondência, revelava-se a ação sagaz, movida pelo uso da inteligência, como fenômeno da Gestalt.
No zoológico Kõhler já havia pesquisado grande parte de seus chimpanzés submetidos a teste quando, em meados de 1914,irrompeu a Primeira Guerra Mundial. Mesmo a Espanha tendo se mantido neutra durante todo o conflito, ele só pôde deixar a ilha em 1920. Vez por outra, funcionários britânicos chegavam a cogitar que Kõhler seria um espião alemão e a pesquisa com os chimpanzés, nada mais que um pretexto para que se construísse nas Ilhas Ca-
nárias uma pista de pouso para aviões alemães. O plano original de construir uma estação para estudar animais dos trópicos naufragou com a inflação do pós-guerra. E em 1920 mesmo os macacos foram enviados para o zoológico de Berlim. Quando Kõhler publicou um livro sobre sua pesquisa, no ano seguinte, obteve grande visibilidade. Durante anos ele se esforçou para ter a comprovação de que nem só a percepção e o pensamento seguiam os princípios da Gestalt, mas também a atividade
PIONEIROSDA CESTALT: Kurt Koffka (1886-1941); Kurt lewin (1890-1947); Wolfgang Kõhler (18871967) e Max Wertheimer (1880-1943)
UMACADEIRAé umacadeira, seja ela feita de plástico, metal, madeira ou qualquer outra matéria-prima. Em outras palavras, a forma sobressai
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Na origem das escolas de Frankfurt e Berlimestava a preocupação coma percepção do que era captado pelos olhos; seus seguidores evitavam o /I ' /I I termo 1usao
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cerebral obedecia a uma lógica fundamental semelhante. Em 1922, Kõhler foi nomeado sucessor de Carl Stumpf na direção do Instituto de Psicologia de Berlim. Com isso, teve início a dinastia da psicologia da Gestalt. O periódico Psych%gischeForschung(Pesquisa psicológica), co-editado por Kõhler, era o seu principal veículo de divulgação. Outras importantes sedes da pesquisa psicológica da Gestalt na Alemanha foram a Universidade de Giessen, que em 1918 convidou Kurt Koffka para compor seu quadro docente, bem como a de Franfkurt, que acolheu Wertheimer em 1929. Este último trouxe contribuições significativas para a psicologia do pensamento. Seu livro póstumo de 1945 (edição alemã de 1957) sobre o pensar produtivo - hoje se falaria em criatividade - documenta o intenso intercâmbio intelectual entre ele e Freud até 1933. Já Kurt Koffka salientou a utilidade da teoria da Gestalt para a psicologia do desenvolvimento. Com isso sabe-se hoje que a leitura é um processo integral e que a seqüência de estágios das letras tomadas individualmente, passando pelas palavras, che-
Paciente não! cliente Na década de 40, o psicanalista berlinense de origem judaica Fritz Perls (1893-1970) deixou a Alemanha e mudou-se primeiro para a África do Sul e depois para os Estados Unidos, onde desenvolveu a Gesta.lt-terapia, em oposição à psicanálise. Com base na fenomenologia e no existencialismo europeus, com influências da obra de Sartre e Nietzsche, sua fundamentação parte da idéia de que o homem é o principal responsável por suas escolhas e pela forma como conduz sua vida. Segundo essa abordagem, a pessoa não é, portanto, um "paciente", mas um "cliente".
gando até as sentenças inteiras, pouco corresponde ao que se passa na percepção humana. Ainda antes da chegada dos nazistas ao poder Koffka emigrou para os Estados Unidos, onde se tornou um dos primeiros partidários da psicologia da Gestalt. Depois de o próprio Wertheimer e do psicólogo e filósofo Kurt Lewin (1890-1947) terem sido obrigados a deixar a Alemanha, foi a vez de Wolfgang Kõhler sair do país. Com isso, a psicologia da Gestalt perdia os pioneiros que a conduziam em território alemão.
Sem promoção Do outro lado do Atlântico, seus representantes depararam com um ambiente científico completamente diferente. Nos EstadosUnidos,havia por parte dos behavioristas inúmeras
Carta de protesto Wolfgang Kõhler foi o único professor acadêmico de psicologia na Alemanha a criticar abertamente o regime nazista, mesmo não sendo judeu. Quando muitos de seus colegas da universidade se aproximavam,da ideologia de Hitler e vários assistentes seus do Instituto de Psicologia de Berlim foram obrigados a se desligar, ele publicou, em 28 de abril de 1933, uma carta aberta no Deutschen AllgemeinenZeitung, criticando as perseguições a cientistas por motivos étnicos e políticos. Doisanos depois, porém, também emigrou para os Estados Unidos, onde lecionou e coordenou pesquisas no Swarthmore College, Pensilvânia. Morreu em 11 de junho de 1967, em sua fazenda em Enfield, New Hampshire.
críticas contra os psicólogos alemães da Gestalt que discordavam das teorias tradicionais da consciência defendidas por Wilhelm Wundt. A situação era agravada pelo fato de os exilados quase não poderem trabalhar em estabelecimentos bem conceituados - e nas pequenas instituições dificilmente tinham direito a alguma promoção. Por tudo isso, esse ramo da psicologia teve papel irrelevante durante muito tempo nos Estados Unidos. No fim da década de 50, quando houve intensa divulgação da psicologia americana na Alemanha, a Gestalt foi "reimportada", embora o interesse da geração mais jovem fosse direcionado principalmente
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para teorias behavioristas do aprendizado, diagnósticos e classificações da personalidade, pSicologia social experimental e psicoterapias.
Cenas de crianças Nos anos 20 havia outra "escola da Gestalt": a da psicologia da totalidade genética de Leipzig. Felix Krueger (1874-1948), assistente de Wundt em 1910, nomeado seu sucessor, defendeu a concepção de que os sentimentos tinham "qualidades gestálticas". Krueger contrapôs a isso, por um lado, a teoria dos elementos de seu professor, Wundt; por outro, criticou, nos experimentos da Escola de Berlim,o fato de a intuição não ser levada em conta. Hoje, a psicologia da totalidade de Leipzig é tida como metodologicamente obtusa e conceitualmente um tanto antiquada. Mesmo as contribuições de Krueger e de seu colaborador Friedrich Sander (1889-1971) caíram em descrédito, pois ambos estavam vinculados à ideologia nacional-socialista, para a qual chegaram a transferir suas idéias, imprimindo nelas o viés de um "todo popular". Sander, por exemplo, escreveu em 1937 que a "eliminação do verme parasitário do judaísmo tinha sua justificação profunda nessa vontade de uma forma (Gestalt) pura por parte do ser alemão". Considerando isso, é de admirar que ele e outros psicólogos da totalidade não tenham demorado a recuperar suas cadeiras logo aos primeiros anos da Alemanha do pós-guerra. Há ainda outra variante significativa da psicologia da Gestalt que não deve ser esque-
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~cida: a teoria dos campos. No início do século XX, as forças de campo já eram conhecidas da teoria da gravitação e da eIetrodinâmica; na década de 20, o conceito era utilizado pela física e pelas ciências sociais. Kurt Lewin se interessou pela idéia e tentou lhe dar denominações específicas: no início falou em "teoria dinâmica", depois em "psicologia de vetor topológico" e, por fim, adotou o termo "teoria dos campos". O cerne do pensamento de Lewin é bastante simples: uma pessoa (P) está em um espaço vital (Ev),onde há determinados elementos - lugares, objetos, outras pessoas - que apresentam a ela desafio positivo ou negativo (também chamado valência). A pessoa se sente atraída ou repelida por eles. Algumas áreas do espaço vital não oferecem acesso' direto; na verdade são obstruídas por barreiras e, para chegar a elas, é preciso transpor regiões com valência negativa. Além disso, duas áreas podem
assumir um caráter de desafio de força equiparável- e assim concorrerem umas com as outras. Lewin manteve a descrição matemática dos processos psicológicos bem no cerne de sua proposta. Ele tendia para uma linguagem "Iogicamente condicionada, que refletiria todos os outros meios de auxílio conhecidos da psicologia" e fazia uso da topologia. Durante muitos anos ele filmou documentários nos quais mantinha pessoas em "campos de forças" de seus afetos, conflitos e ações da vontade (em geral, crianças de sua própria família em situações de conflito), mas a maior parte de seus filmes caiu no esquecimento. Lewin filmava os seus pequenos sem que eles o percebessem, influenciado pelo cineasta russo Sergei Eisenstein (1898-1948). Por ter registrado cenas das crianças desde que eram recém-nascidas até a adolescência acabou criando um documentá rio de caráter único. nec
o CINEASTA Sergei Eisenstein (foto) influenciou o trabalho Kurt lewin
Isto é Gestalt. John O. Stevens.Summus Editorial,1977. 25 anos depois - Gestalt-terapla, pslcodrama e terapias neorelchlanas no Brasil. S. Perazzo, S. Ciornai e L. M. Frazão. Ágora,
1995. Arte e Gestalt - Padrões que convergem. Janie Rhyne.Summus Editorial,2000.
www.mentecerebro.com.br 11
de
A neurologia da estética Apesar da diversidade de estilos, há princípios universais da arte - uma espécie de "gramática" da estética, análoga às sintaxes propostas pelo lingüista Noam Chomsky POR VlLAYANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN Neurocientistas,
trabalham
no Centro do Cérebro e da Cognição da Universidade
da
Califómia em San Diego. Fazem parte do grupo de conselheiros da Scientific American Mind. TRADUÇÃO: Julio de Oliveira
O
fronteiras culturais, mas também de espécies. Seria uma coincidência acharmos pássaros e borboletas atraentes embora eles tenham evoluído para agradar seus iguais - e não a nós?
A resposta pode ser sim. Nós sugerimos que leis "universais"da estética podem transcender não apenas
Em 1994, meio que por brincadeira, criamos uma lista um pouco arbitrária das '1eis"da estética, da qual descreveremos seis: agrupamento, simetria, estímulos hipemormais, mudança de pico, isolamento e resolução de problemas perceptuais. Vamos considerar primeiro o agrupamento. Em A (verPág.14),você tem a sensação de seu sistema visual lutando para descobrir e juntar fragmentos aparentemente não relacionados de um único objeto - nesse caso um dálmata. Quando os fragmentos corretos se ajeitam em seus lugares, sentimos uma sensação gratificante. Sugerimos que essa experiência agradável seja baseada nas mensagens diretas enviadas para os centros de prazer do sistema límbico que reconhece: "Aqui está algo importante, preste atençãol" - uma exigência mínima para a estética. Estilistas e consultores demoda trabalham com o princípio do agrupamento -, mesmo sem se dar conta de que estão utilizando um
que é arte? É bem provável que existam tantas
definições quanto artistas e críticos. E se a palavra tem tantas conotações é melhor - do ponto de vista científico - nos restringirmos à neurologia da estética. Afinal, as formas percebidas como belas e artísticas variam de uma cultura para outra. E gosto não se discute. O aroma do marmite (pasta feita de levedura e extratos vegetais), por exemplo, é procurado de maneira ávida pelos ingleses, mas é considerado repulsivo para a maioria dos americanos. O mesmo se aplica às preferências visuais; pessoalmente, não encontramos nenhum apelo especial nas obras de Pablo Picasso. Mas é inegável que muitos se encantam com seu trabalho. Apesar da diversidade de estilos, muitos se perguntam se há algum tipo de princípios universais que regem produções consideradas artísticas. Teríamos uma "gramática" inata da estética, análoga às sintaxes universais para línguas proposta pelo lingüista Noam Chomsky, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts?
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MENTE&:CÉREBRO
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ARMADILHAS DA PERCEPÇÃO
princípio biológico ancestral para sugerir a combinação. E sugerem uma determinada echarpe para combinar com o vestido. O agrupamento evoluiu para derrotar a camuflagem e, de forma mais geral, detectar objetos em ambientes bagunçados. Imagine um tigre escondido atrás da folhagem (D/ na pág. 15). Tudo que seu olho capta são fragmentos de tigre. Mas seu sistema visual presume que todas essas partes não podem ser parecidas por cOincidência, e então ele as agrupa para "montar" a figura - e passa então a prestar atenção nela.
A evolução também tem um dedo na criação da atração da simetria. Na natureza, a maioria dos "objetos biológicos" (presas, predadores e parceiros) são simétricos.Éfundamental,portanto, ter um sistemade alerta precoce para chamar a atenção para a simetria
-
o que favorece a ação rápida
e apropriada em cada situação. Essaatração explica o fascínioda simetria, seja para uma criança quebrincacom um caleidoscópio, seja para o imperador Jahan, que construiu o Taj Mahal (B) para imortalizar sua bela esposa, Mumtaz. Essa característica também pode seratraente porque parceiros assimétricoscostumam ter maus genes ou parasitas.Já predadores simétricosparecemmaissaudáveis e podemrepresentarperigo maior, portantoé precisoficaratento; por outrolado, presasque apresentam esse aspecto costumam parecer mais apetitosas. Uma lei universal menos óbvia é a do estímulo hipemormal. O etólogo Nikolaas 11nbergen , da Universidade de Oxford, notou há mais de 50 anos que filhotes de gaivota suplicavam por comida bicando o bico da mãe, que é castanho-claro com um ponto www.mentecerebro.com.br13
Se filhotes de gaivota tivessem uma galeria, talvez pendurassem
uma vareta com faixas
na parede e provavelmente pagariam caro
para ter
essa obra
vennelho. Quando separados da mãe, os pássaros recém-nascidos também batiam de maneira fervorosa num bico sem nenhuma
por seu trabalho sobre padrões de comportamento animal.) Nós não sabemospor que esse efeito ocorre, mas provavelmente
bom retrato. Características que fazem um rosto específico (por exemplo, o de Tom Cruise) diferente da "média"de centenas de
gaivota conectada a ele, apresentado pelo pesquisador. Esse
resulta da maneira pela qual neurônios visuais codificam a infonnação
rostos masculinos são amplificadas de fonna seletiva, de maneira que
comportamento instintivo surgiu porque, com o passarde milhões de anos de evolução,o cérebro do filhote "aprendeu"que uma coisa longa com um ponto vennelho
sensorial.O modo como eles são programados pode fazer com que respondam de maneira mais poderosa a um padrão estranho, enviando com isso uma espécie
o resultado pareça mais com o ator do que seu próprio rosto. Em 1998,o filósofoWilliam Hirstein, do ElmhurstCollege, e um de nós (Ramachandran)sugerimosque as
significa mãe e comida. Tinbergen descobriu que po-
de choque de satisfação ao sistema límbico do pássaro.
células no cérebro do macaco que se sabe respondem a rostos indi-
deria produzir as bicadas sem um bico. Uma vareta longa com um ponto vennelho servia.Os neurô-
Mas o que tem um superbico a ver com percepção de fonnas e arte? Se filhotes de gaivota
viduais (tais como Joe, o macho '" iii alfa)irãoresponderdefonna ainda v maisvigorosa a uma caricaturado
nios visuais no cérebro do filhote obviamente não são muito deta-
rosto do que ao original. Essa forte resposta foi agora confinnada em experimentos por Doris Tsao, da Universidade Harvard.
descoberta incrível. Quando era mostrado um longo pedaço fino de
tivessem uma galeria, talvez eles pendurassem uma grande vareta com faixas na parede e provavelmente pagariam caro para ter uma obra dessas. A arte, de maneira parecida, estimula colecionadores
cartolina com três faixas vennelhas,
a investir milhares de dólares numa
Nós nos voltamos
o filhote mostrava preferência por esse estímulo estranho a um bico
pintura sem entender por que ela é tão cativante. Por tentativa e erro
real. Sem perceber, Tinbergen tinha topado com o que chamamos de "superbico". (Mais tarde, em 1973, ele recebeu o Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina
-
cípio: o isolamento. Certamente, muitos artistas concordarão que, às vezes, na arte, "menos é mais". Um pequeno rabisco de um nu pode ser bem mais belo do que uma fotografia 3-D em cores de uma mulher
Ihistas quanto às exigências exatas do estímulo. Mas então ele fez uma
01
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MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
...
e também por criatividade -, os artistas modernos descobriram
fonnas de utilizar aspectos idiossincráticos da gramática perceptual primitiva do cérebro, produzindo o equivalente,
para o sistema nervoso
humano, da vareta com faixas para o filhote da gaivota. Um princípio relacionado, chamado de mudança de pico, representa um papel na apreciação da caricatura ou mesmo de um
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Para resolver essa contradição em particular, precisamos lembrar de que nosso cérebro tem recursos de concentração limitados - um "engarrafamento" de atenção ocorre porque apenas
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um padrão de atividade neural pode existirao mesmo tempo. Aí entra o isolamento. Um rabisco ou esboço planejado de maneira inteligente (C) permite ao sistema visual deslocar toda sua atenção para o que é necessário - isto é, para o contorno ou forma do nu - sem ser "distraído"por todos os
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outros elementos irrelevantes (cor,
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o~ transmitidapor seustraços. ~ Evidências desse ponto de z ::J vistavêm de crianças autistascom habilidades especiais, tais como ::J Nadia. A menina produziu deseQ ~ nhos incrivelmente belos, talvez ~ porque, como a maior parte de ~ seu cérebro funciona de maneira
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mo pacientes adultos que sofreram uma degeneração dos lobos frontais e temporais (chamada de demência fronto-temporal) de repente desenvolveram talentos artísticos, possivelmente porque agora podem alocar toda sua atenção no lobo parietaL Outra "lei" relacionada à estética é o esconde-esconde (ou resolução de problemas perceptuais). No século IX, o filósofo indiano Abhinavaguptadescobriu o que o historiador de arte austríaco-britânico sirEmst Gombrich comprovou no século XX. Uma pessoa desnuda que tem apenas braços ou parte do ombro projetando-se detrás de uma cortina de chuveiro ou que está atrás de um véu diáfanoé muito maissedutora do que um nu completamente descoberto. Da mesma forma que as partes pensantes do nosso cérebro gostam da solução de problemas intelectuais, o sistema visual parece gostar de descobrir um objeto escondido. A evolução parece ter se encarregado de que o próprio ato de buscarum objeto escondido seja agradável, não apenas no "ahá"finalde reconhecimento - para não desistirmos cedo demais em nossa busca. De outra forma, não procuraríamos
uma presa ou parceiro potencial vislumbradoparcialmenteatrásde arbustos, de uma névoa densa ou de tecidos transparentes. Cada vislumbre parcial de um objeto (D) inspira uma busca -levando a um "míni ahá" - que envia uma mensagem de retorno para influenciar estágios iniciais do processamento visual. Essa mensagem em resposta incita mais buscas e
-
depois de várias
dessas iterações e "míni ahás" - chegamos ao prazer final do reconhecimento. O estilista de moda e artistas inteligentes tentam evocar tantas dessas sensações, ambigüidades, mudanças de pico e paradoxos quanto possível na imagem. Essa concepção comporta ainda aspectos mais evasivos da estética, tal como a "metáfora visual"- uma ressonância prazerosa entre os elementos visuais e simbólicosde uma imagem.Entre a estética dos filhotes de gaivota e a beleza sublimede um Monet, temos uma longajornada até realmente entender o processamento visuqlno cérebro. Enquanto isso, nossos estudos nos proporcionaram vislumbresirresistíveisdo que pode aparecer, inspirando-nos a
continuarnossabusca.
...
-==
Inner vlslon: an exploratlon 01 art and the braln. Semir Zeki. Oxford University Press, 2000. A brlef tour 01 human consclousness. V. S. Ramachandran. Pi Press, 2005.
www.mentecerebro.com.br15
Paradoxos,..;
daperCepçaO Se duas fontes diferentes de informação são incoerentes entre si, o cérebro dá importância à que parecer mais confiável, com base em experiências acumuladas - e vai ignorar a outra POR VILAVANURS. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
aradoxos - nos quais a mesma informação pode levar a duas conclusões contraditórias - nos oferecem, ao mesmo tempo, prazer e tormento. São fonte de fascinação e frustração, quer envolvam filosofia (considere o paradoxo de Russell, "Esta frase é falsa"),ciência ou percepção. O ganhador do Prêmio Nobel, Peter Medawar, disse uma vez que tais quebra-cabeças têm o mesmo efeito para um cientista ou um filósofo que o cheiro de borracha queimando tem para os engenheiros: deflagram uma vontade irresistível de descobrir a causa. Na condição de neurocientistas que pesquisam percepção, nos sentimos compelidos a estudar a natureza das contradições visuais. Vamos examinar o caso mais simples. Se duas fontes diferentes de informação não são coerentes uma com a outra, o que acontece? Certamente o cérebro dará importância para a que for mais confiável em termos estatísticos, e vai simplesmente ignorar a outra. Por exemplo, se você olhar a parte de dentro de uma máscara oca à distância, verá o rosto como normal- isto é, convexo - embora sua visão sinalize de maneira correta que a más-
P
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MENTE&CÉREBRO.
ARMADILHAS
DA PERCEPÇÃO
cara é, na verdade, oca e côncava. Nesse caso, a experiência acumulada do cérebro em relação a rostos convexos sobrepuja e veta a percepção da ocorrência - incomum - de um rosto oco. Mais irresistíveis são as situações nas quais a percepção contradiz a lógica, levando a "figuras impossíveis". O pintor e litógrafo britânico William Hogarth criou talvez uma das primeiras dessas figuras,no século XVIll (A) (verpág. 18). Uma breve visão dessa imagem não sugere nada de anormal. Mas uma inspeção mais atenta revela que ela é impossível em termos lógicos. Outro exemplo é o "forcado do diabo", ou enigma de Schuster (B).Tais imagens levantam questões profundas sobre a relação entre a percepção e a racionalidade. Nos tempos modernos, o interesse por tais efeitos foi em parte revivido pelo artista sueco Oscar Reutersvard. Conhecido como o pai das figuras impossíveis, ele desenvolveu inúmeros paradoxos geométricos, incluindo a "escadaria interminável" e o "triângulo impossível".Essesdois tan1bém foram desenvolvidos de maneira independente por Lionel e Roger Penrose, os famosos
pai e filho cientistas; a figura C, mostra sua versão do que é agora chamado comum ente de triângulo de Penrose. O artista holandês M. C. Escherencaixou de forma divertida tais figurasem suas gravuras explorando o espaço e a geometria. Considere a escadaria de Escher,figuraD: nenhuma parte isolada da escadaria parece incoerente ou ambígua, mas o conjunto todo é impossível em termos lógicos. Você poderia subir a escadaria eternamente e ainda assim andar sempre em círculos, nunca chegando ao topo. Isso simboliza a condição
humana: procuramos de forma perpétua a perfeição, mas nunca chegamos mesmo lá! Essaescadaria seriarealmente um paradoxo perceptual? Isto é, o cérebro é incapaz de construir uma percepção coerente (ou sinal de percepção) porque ele tem de simultaneamente considerar duas percepções contraditórias? Achamos que não. A percepção, quase por definição, tem de ser unificada e estável em qualquer dado instante, porque todo seu propósito é levar a uma ação apropriada da nossa parte guiada por uma meta. Realmente, alguns filósofosse referiram à percepção
como uma "prontidão condicio-
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nal para agir", o que pode parecer ~ ~ um exagero. .. Apesar da visão comum ~ " , . 2
1 d e nos vemosos aquIo em que ~:I acreditamos", mecanismos perceptuais estão realmente I»
no piloto automático enquanto computam e sinalizam vários aspectos do ambiente visual. Você não pode escolher ver o que quer ver. (Se eu lhe mostrar um leão azul, você vai vê-Io como azul. Você não pode dizer "Euescolho vê-Io como dourado porque é assim que deve ser".) Ao contrário, o paradoxo na figura D surge precisamente www.mentecerebro.com.br17
porque o mecanismo perceptual realiza uma computação estritamente local que sinaliza "escadasascendentes", enquanto seu mecanismo conceptual/intelectual deduz quê é impossível em termos lógicos para tal escadaria ascendente formar um circuito fechado. A meta da percepção é computar de forma rápida as respostas aproximadas que são boas o suficiente para a sobrevivência imediata; você não pode considerar se o leão está perto ou longe. A meta da concepção racional - da lógica - é tomar o tempo necessário para produzir uma avaliação mais precisa. Em conflito São as figuras impossíveis (com exceção do triângulo, ao qual voltaremos mais tarde) paradoxos genuínos dentro do domínio da percepção em si? É possível argumentar que a percepção em si permanece, ou parece permanecer, internamente consistente, coerente e estável e que uma percepção paradoxal genuína é um oximoro. A escadaria não é mais um paradoxo do que ver uma ilusão visual tal como a
Müller-Lyer (verfigura no canto inferioresquerdo), na qual duas linhas de igual comprimento parecem diferir - mas se medirmos
o 18
MENTE&CÉREBRO' ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
10
as duas linhas com uma régua poderemos nos convencer, pelo menos intelectualmente, de que elas são de comprimento idêntico. O conflito é justamente entre a percepção e o intelecto, não um paradoxo genuíno dentro da própria percepção. Por outro lado, "Esta frase é falsa" é um paradoxo inteiramente no campo conceitualllingüístico. Outra percepção cativante é o efeito colateral de movimento. Se você encarar por um minuto faixas movendo-se em
uma direção (ver "A dançadas listras",nestaedição) e então transferir o olhar para um objeto estacionário, o objeto parecerá se mover na direção oposta à em que as faixas se moviam. Esse efeito surge porque seu sistema visual tem neurônios de detecção de movimento que sinalizam direções diferentes, e as faixas que se movem o tempo todo em uma direção "causam fadiga" nos neurônios que normalmente sinalizariam aquele sentido. O resultado é um "ricochete" que faz até objetos estacionários parecer se moverem na direção oposta. No entanto, curiosamente, quando você olha para o objeto, ele dá a impressão de estar se movendo para um lado, mas não parece chegar a lugar
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nenhum; não há progresso para uma meta. Esse efeito é, com freqüência, apregoado como um paradoxo perceptual: como algo pode parecer se mover, mas não mudar de lugar? Mas, de novo, a percepção em si não é paradoxal; em vez disso, ela sinaliza com segurança que o objeto está se movendo. É seu e~ intelecto que deduz que ele não ~ e pressupõe c está se mexendo t um paradoxo. ~
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Há casos-limite, como o exemplificado no forcado do diabo. Nesse quadro, algumas pessoas podem "ver" o todo num único olhar. As próprias deixas perceptuais locais e globais são percebidas como uma única Gestalt com contradições internas. Ou seja, é possível compreender o todo num único olhar e apreciar sua natureza paradoxal sem pensar nisso. Esses quadros nos lembram que, apesar da natureza modular quase autônoma da percepção e de sua aparente imunidade ao intelecto, a fronteira entre a percepção e a cognição pode tornar-se indistinta. Com o triângulo impossível acontece algo semelhante. Como mostrado pelo neuropsicólogo Richard L. Gregory, da Universidade de Bristol, na Inglaterra, você pode construir um complicado objeto em 3-D (F) que irá produzir a imagem em G só quando visto de um ângulo particularmente privilegiado. Desse ângulo específico, o objeto parece ser um triângulo num único plano. Mas sua percepção rejeita tais eventos altamente improváveis, mesmo quando seu intelecto está convencido de sua possibilidade (depois de ter sido apresentado à visão em G). Portanto, mesmo quando entendemos conceitualmente
a forma incomum do objeto F, continuamos a ver o triângulo fechado (G), em vez do objeto (F) que na verdade o origina. Como alguém pode testar essas noções de maneira empírica? Na escadaria de Escher, é possível explorar o fato de que a percepção é virtualmente instantânea, enquanto a cogitação leva tempo. Alguém poderia apresentar o quadro por um período curto - um tempo insuficiente para que a cognição se ative - digamos, um décimo de segundo seguido por um estímulo mascarador (que evita a continuação do processamento visual depois da remoção da figurade teste). A previsão seria que a imagem não mais pareceria paradoxal a não ser que o estímulo fosse encompridado de maneira adequada. O mesmo pode ser tentado para o forcado do diabo, que tem maior probabilidade de ser um paradoxo perceptual genuíno. Nesse caso, a máscara poderia não ser capaz de "dissecá-Io" em dois estágios (percepção ou cognição) distintos, podendo se resumir a uma questão de escala ou complexidade. Quaisquer que sejam as origens do paradoxo, ninguém deixa de ficar intrigado por esses quadros enigmáticos. Eles excitam nossos sentidos e desafiam noções
de realidadee ilusão.
nec
o artista holandês M. C. Escher utilizou noções de espaço e geometria em suas gravuras, criando efeitos inusitados que simbolizam a condição humana: procuramos a perfeição, mas nunca a atingimos
A New amblguous figure: a three-stlck clovis. D. H. Schuster
em Americanjoumal of Psychology,vol. 77, pág.
673,1964. lhe Intelllgent eye. Richard L Gregory. McGraw-HiII,1970. Mais figuras ambíguas estão disponíveis em www.im-possible.info/ english/art/index.html
www.mentecerebro.com.br19
Buscasdo
olhar Experiênciascom pontos cegos indicam que nosso sistema nervoso detesta o
vácuo - e procura fugir dele POR VlLAYANUR S. RAMAOfANDRAN E DIANE ROGERS-RAMAOfANDRAN
emos o mundo de dois pontos privilegiados ligeiramente diferentes, que correspondem às posições de nossos dois olhos. Há pequenas diferenças entre as imagens captadas por cada um deles; diferenças que são proporcionais à profundidade relativa dos objetos no campo visual. O cérebro pode medir essas diferenças, operação cujo resultado é a visão estéreo ou estereopsia. Para ter uma idéia desse efeito, estenda um braço apontando para um objeto distante. Enquanto mantém o braço estendido, abra e feche cada um dos olhos alternadamente. Perceba
V
como seu dedo muda em relação ao objeto, fato 20
.
MENTE&CÉREBRO ARMADIlHAS DA PERCEPÇÃO
que ilustra a disparidade horizontal entre os globos oculares. Dispositivos de visualização que se aproveitavam da estereopsia para criar ilusões de profundidade em imagens de paisagens, em monumentos arquitetônicos e até em imagens pornográficas se tornaram populares nos salões vitorianos. As obras do artista holandês Maurits Cornelis Escher (1898-1972) são bom exemplo da estereopsia aplicada às artes gráficas. Um fato pouco comentado sobre a visão estéreo é que, ainda que vejamos duas imagens de um mesmo objeto - uma por meio de cada olho -, percebemos apenas um. De forma similar, se
tocamos a mesma maçã com as duasmãos, sentimos uma fruta e não duas. Assim, as imagens dos olhos devem ser "fundidas" em algumaparte do cérebro para dar origem à percepção de um item unitário. Podemos formular as seguintesquestões: o que ocorre quando os olhos contemplam coisas inteiramente diferentes? Perceberemos uma mistura? Tente o seguinte experimento. Pegue uns desses óculos de leitura que se compram em
farmácia. Fixe numa das lentes um filtro vermelho e na outra, um verde; depois coloque os óculos. O que você verá se olhar para um objeto branco? Se fechar um dos olhos, verá verde ou vermelho, conforme o esperado. Mas e se você abrir os dois olhos? As duas cores se misturarão no cérebro produzindo o amarelo, como o fariam se misturadas opticamente? (Vale lembrar que vermelho e verde produzem marrom
quando misturamospigmentos, ~
como tintas. Mas quando mis- ~ turamos luzes, projetando-as numa tela, essas cores resultam 1
1
no amarelo.)
~
Você vai ver uma coisa de cada vez. Surpreendentemente, o objeto surge alternadamente vermelho e verde. Os olhos parecem gentilmente se revezar, como se evitassem o conflito. O fenômeno é chamado de rivalidade binocular e o efeito é similar àquele que vemos no cubo
!
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o cérebro de Necker(verilustraçãoabaixo). Para a pessoa que vê, pode parecer que essas experiências perceptivas dinâmicas surgem porque o próprio objeto está mudando. Mas o estímulo é perfeitamente estável. O que altera é o padrão de atividade cerebral, que produz as alterações perceptivas e a ilusão de um objeto instável. É possível usar a rivalidade binocular como uma poderosa ferramenta para explorar a questão mais geral de como o cérebro resolve conflitos de
utiliza partes das imagens de cada olho que fazem IIsentidoll como um padrão holístico para combiná-Ias corretamente
percepção. Tentemos outro experimento. Em vez de duas cores diferentes, apresentemos à visão duas séries de listras perpendiculares entre si. O resultado será uma grade ou as séries entrarão em conflito? A resposta é: às vezes veremos as séries alternadas, às vezes um mosaico de listras, com as seções das imagens dos dois olhos entrelaçadas. Jamais veremos uma grade.
CUBO DE NECKER (obaixo):revezanAento dos olhos evita rivalidade binocular. Ao lado, fusão de inAagens: o cérebro extrai fragnAentos das Imagens que fazenA sentido
COnAO UnA
Teoricamente, poderíamos fazer esse experimento posicionando listras verticais para o olho direito e horizontais para o esquerdo em um visor estéreo. Mas se você não tiver um, podemos improvisar algo parecido (verilustração napág.aolado).Basta posicionar uma divisória, um pedaço de papelão, por exemplo, no limite entre duas imagens. Agora coloque seu nariz perto da divisória, de tal forma que o olho esquerdo mire exc\usivamente uma imagem e o direito, a outra. O que você vai ver são listras alternadas ou um mosaico flutuante, não uma grade. Com a prática, pode-se dispensar a divisória e aprender a "fundir livremente" as duas imagens, convergindo ou divergindo os olhos. Olhar para a ponta de um lápis a meio caminho entre as imagens e a face pode auxiliar esse aprendizado. Depois de aprender esse truque, novos experimentos serão possíveis. Sabemos, por
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padrão holístico
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exemplo, que diferentes áreas do cérebro estão envolvidas no processamento da cor e da forma das imagens. Podemos assim questionar: a rivalidade ocorre separada ou conjuntamente para esses dois aspectos? E se olharmos as listras do olho esquerdo através de um filtro vermelho e as do olho direito através de um verde? Haverá então uma rivalidade de cor e outra de forma. Elas ocorrem de maneira independente, de tal modo que a cor do olho esquerdo se emparelha com as listras do 'olho direito, ou elas sempre "concorrem" sincronicamente? A resposta é que as rivalidades ocorrem conjuntamente. Dito de outra forma: a rivalidade se dá entre os próprios olhos e não no processamento das cores ou formas.
Discos e baldes Mas nem sempre isso é verdade. Dê uma olhada nas imagens da página anterior. A figura apre-
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MENTE&CÉREBRO ARMADIUiAS DA PERCEPÇÃo
Z :J: !2. >z Z :J: !2.
~ QUANDOCADAOLHOvê diferentes padrões de listras, o resultado não é uma imagem entrelaçada, mas um mosaico
sentada a cada olho mistura a face de um macaco com folhas verdes. De forma intrigante, se o cérebro funde as imagens há uma forte tendência para completar o macaco ou a folhagem, mesmo que isso exija a reunião de fragmentos de cada um dos olhos para completar os padrões. Nesse caso, o cérebro utiliza partes das imagens de cada olho que fazem "sentido" como um padrão holístico para combiná-Ias corretamente. Retomemos à estereopsia, isto é, o cálculo da profundidade relativa de imagens provenientes de dois olhos cujas posições no espaço são
ligeiramente diferentes. Neste
~
iQ caso as imagens
se fundem e, ~ em vez da rivalidade, temos a 1 profundidade estéreo. É digno 5 de nota que durante milênios ~ as pessoas não reconheceram ~ a estereopsia, pressupondo, ~ provavelmente, que o benefício ~ de ter dois olhos reside no fato Q
] de que, se perdermos um, nos Ir . ;. restana outro. Esse argumento ~
tem pelo menos 500 anos,
~considerando
que foi usado
~%
w~
por Leonardo da Vinci. O fato de que o cérebro faz uso dela foi descoberto pelo médico inglês Charles Wheatstone (1802-1875). É possível elaborar um exemplo da descoberta dele com o desenho de um balde visto de cima. Quando fundimos as imagens dos dois olhos (usando a fusão livre ou um cartão divisório), surge um disco cinza que circunda o círculo externo, dando-nos a impressão de que estam os suspensos no ar. Mas precisamos realmente da fusão para que a estereopsia ocorra? A questão pode parecer ingênua, pois nossa intuição sugere que sim. No entanto, a intuição está equivocada. Três décadas atrás, Anne Treisman, da Universidade Princeton, L\oyd Kaufman, da Universidade de Nova York, e um de nós (Viláyanur) mostraram, de forma independente, que a rivalidade pode coexistir com a estereopsia, por mais que isso pareça paradoxal. Para entender o fenômeno, considere o diagrama da
imagem acima. Ele apresenta dois fragmentos de listras dispostas horizontalmente em direções opostas em relação aos círculos externos. Quando o cérebro funde esses círculos, algo extraordinário acontece. Veremos o fragmento inteiro flutuando, mas somente um fragmento por vez, porque as listras são ortogonais. Em outras palavras, o cérebro extrai o sinal estéreo dos fragmentos como um todo, interpretando as porções individuais como gotas, mas os fragmentos parecem rivalizar. A informação sobre a localização dos fragmentos na retina é extraída pelo cérebro e produz estereopsia mesmo que apenas a imagem de um dos olhos seja visível por vez. É como se a informação sobre uma imagem invisível pudesse, entretanto, gerar estereopsia. Essa "forma de rivalidade" ocorre em uma área do cérebro diferente da estereopsia, de modo que as duas podem coexistir em harmonia. A correlação entre elas na visão www.mentecerebro.com.br 23
Atenção para o vazio Nossa percepção do mundo depende, num grau surpreendente, do trabalho de adivinhação inteligente do cérebro. A imagem branca oval que excita sua retina pode ter sido produzida por um ovo, um disco indinado perfeitamente drcular, ou um número infinito de formas intermediárias colocadas no grau exato. Ainda assim, nosso cérebro "acolhe" instantaneamente a resposta certa. Faz isso utilizando certas premissas a respeito das estatísticas do mundo natural - suposições que podem ser reveladas por ilusões visuais. O modo como lida com vazios inexplicáveis na imagem retiniana - umproces-
o nívelde informação que o cérebro
so c"amado preenchimento -fomece um exemploadmirável desse prinápio. Vocêpode comprová-Io usando o ponto cego de seu olho. Examinea ilustração (a).Com o olho direito fechado, olhe para o centro do quadrado branco inferior.Segure a página a 30 em do rosto e lentamente aproxime-a e afaste-a. A uma certa distânda o discoà esquerda desaparece. Elecai no ponto cego do seu olho esquerdo, um pequeno fragmento da retina chamado disco óptico, desprovido de receptores. O físico vitoriano si, David Brewster ficou impressionado com o fato de o desaparecimento do disco não deixar uma sombra escura ou um buraco vazioem seu lugar.Aregião que corresponde ao disco é "preen-
assimila enquanto observamos o mundo é pequeno
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MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERcEPÇÃO
chida" pelo fundo colorido. Ele atribuiu esse processo a Deus,o "ArtíficeDivino". Até mesmo uma linha reta que corre através do seu ponto cego não é interrompida no meio, como se pode verfazendo o mesmo exerácio, desta vez, porém, olhando para o quadrado branco superior em (A). O segmento faltante da linha aparece completo. Écomo se o cérebro considerasse altamente improvável que duas linhas curtas pudessem ficar de cada lado do ponto cego por simples acaso. As células nos centros visuais são estimuladas como seriam caso a ba"a estivesse completa, e dessa forma você vê uma linha contínua. O ponto cego é surpreendentemente grande, quase do tamanho de nove luascheias no céu. Experimente fechar o olho esquerdo e olhar em volta da sala com o direito. Com alguma prática, você poderá "mirar" seu ponto cego para qualquer objeto pequeno e fazê-Io desaparecer do campo visual. O rei Carlos 11da Inglaterra costumava mirar seu ponto cego para a cabeça dos prisioneiros para "decapitá-Ios" visualmente antes da verdadeira degola. Qualé o grau de sofisticação do processo de preenchimento? Se o meio de uma cruz cair no ponto cego, ele será preenchido? E os padrões repetitivos do tipo papel de parede? Com
41)
apenas alguns pincéis atômicos coloridos e folhas de papel, você pode explorar os limitesdo preenchimento e as "Ieis" que regem o processo. Vou descrever alguns exemplos, mas tente inventar os seus. Em (8), o seu ponto cego cai no centro de um X formado por uma longa linha verde que cruza uma pequena linha vermelha. Se você for como a maioria das pessoas, verá que somente a maior das duas linhas é completada através do ponto cego. (No entanto, não é dlfídl preencher a parte faltante de linhacurta se elafor considerada em simesma.) Esseexerááo simples demonstra que, sob certas condições, o preenchimento baseia-se mais na integração de informação ao longo de todo o comprimento da linha que na informação espadalmente adjacente. Emoutras drcunstândas, o cérebro preenche apenas o que está imediatamente em tomo do ponto cego. Se você mira o ponto cego do seu olho esquerdo no centro de uma rosquinha amarela, verá um disco amarelo em vez de um anel; o amarelo faz o preenchimento. O mais notável é que a mesma coisa acontece em (C);a maioria das pessoasvê o discoamarelo saltar visivelmente contra um fundo de papel de parede de anéis amarelos. Emvez de extrapolar o padrão repetitivo de anéis, seu sistemavisualrealizaum cômputo estritamente locale preenche apenas o amarelo homogêneo no entomo imediato do disco. Porém isso nem sempre é verdade, como se vê em (D).Observe a ilusóriafaixaverticalque corre através das linhas horizontais paralelas.Mireo ponto cego do seu olho esquerdo no disco azul para fazê-Io desaparecer. Você preenche os segmentos ausentes das linhas horizontais
o que correm através do ponto cego?Ou preenche a faixailusória vertical?A resposta depende do espaçamento das linhas. Porque acontece o preenchimento? É pouco provável que o sistemavisual tenha desenvolvido essa capacidade com o único objetivo de lidar com o ponto cego (afinal, o outro olho normalmente faz a compensação). Opreenchimento deve antes ser manifestaçãodo que chamamos interpolação de superfície, uma habilidade que se desenvolveu para computar representações de superfíciese contornos contínuosdo mundo natural- mesmo aqueles às vezes parcialmente ocultos (por exemplo, um gato visto através de uma cerca de tábuasespaçadas,parece um gato inteiro,e não um fatiado). Fisiologistas(especialmente LeslieG. Ungerleider,do InstitutoNacional deSaúdeMental, RicardoGatass, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Charles D. Gilbert, da Universidade Rockefeller) começama explorar o mecanismo neurológico desse processo monitorando o modo pelo qual neurônios simples dos centros visuaisrespondem a objetos pardalmenteencobertos pelo ponto cegoou por ocIusoresopacos. Se ficar enjoado de brincar com seu ponto cego natural, tenteisto.No lado direito da tela dalV cole um pequeno pedaço
(0,5cm de diâmetro) de cartolina branca com um ponto preto no centro. Depois,ligue a TVem um canal que esteja fora do ar para que você possa ver apenas "pingos" brilhantes. Cole um pedaço grosso de papel-cartão cinza (o mais próximo possíveldo tom da chuva de pingos da TV)a cercade 12 cm do cartão branco. Fique a um metro do aparelho. Seabrir os dois olhos e olhar fixamente para o pequeno ponto preto durante 15 segundos, o quadrado cinza desaparecerá completamente, e a área "desocupada" será preenchida pelospingos-você tem alucinaçõescom os pingos onde eles não existem! O extraordinário é que se agora você olhar para uma parede cinza, verá um pedaço quadrado de pingos brilhando na região em que o preenchimento ocorreu. Até uma solitária bolha vermelha vista contra um fundo de bolhas verdes desaparece da mesma forma - as verdes fazem o preenchimento. O cérebro, ao que parece, detesta o vácuo. Essas experiências mostram como é realmente pequeno o nível de informação que o cérebro assimila enquanto observamos o mundo e o quanto ele próprio fornece. Ariqueza da nossa experiência individualé imensamente ilusória;na verdade, nós "vemos" muito pouco e dependemos do trabalho de adivinhaçãotreinado para fazer o resto.
binocular normal é uma coincidência, não uma necessidade. A descoberta de que determinada informação visual pode ser processada inconscientemente em um caminho cerebral paralelo lembra a enigmática síndrome neurológica da visão às cegas. Um paciente com lesão no córtex visual é completamente cego: não pode perceber um foco de luz. Mas ele pode alcançá-Io e tocá-Io usando um caminho paralelo que evita o córtex visual (necessário para a percepção consciente) e projeta diretamente para os centros cerebrais, que são uma espécie de piloto automático que guiam a mão. Um experimento similar poderia, em tese, ser elaborado para a rivalidade binocular. Quando a imagem de um olho é inteiramente suprimida durante a rivalidade, talvez fosse possível alcançar e tocar uma mancha apresentada àquele z
olho, aindaque elasejainvisível
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para o olho suprimido.
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O fenômeno da rivalidade
~ o é um notável exemplo de como
~ podemos usar experimentos
~ relativamente
simples para ~ obter grandes insightssobre o 2 processamento visual. ner:
Stereopsls generated wlth Julesz patters In splte of rlvalry Imposed by colour fllters. V.S. Ramachandrane S.
Sriram,em Nature, vol. 237, págs. 347348, 1972. Blnocular vlslon and stereopsls. lan P.Howarde Brian J. Rogers.Oxford UniversityPress, 1995. Blnocular rlvalry. David Alais e Randolph Blake (orgs.). MIT Press, 2004.
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o fascíniodo Imagensespecularesajudam pessoasamputadasa amenizarou eliminara dor fantasma;experimentomostraa importânciada comparaçãode informaçõessensoriais para a imagem corporal POR VlLAYANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
o
s espelhos inspiram fascínio peculiar desde que um dos primeiros ancestrais hominídeos olhou seu reflexo numa poça de água e percebeu uma misteriosa correlação entre os próprios movimentos (sentidos internamente por meio da propriocepção) e o feedback visual. Mais misteriosa ainda é nossa capacidade de "refletir" sobre nós mesmos, o que nos torna os primeiro primatas introspectivos. Esta habilidade é exposta de maneiras muito díspares: desde Narciso olhando o próprio reflexo num lago até a realidade virtual que, de certa forma, nos transporta para fora do corpo. Uma das mais intrigantes descobertas das neurociências foram os neurônios-espelho, que nos permitem "adotar o ponto de vista do outro", literalmente, e quem sabe até "olhar" a partir da posição estratégica de outra pessoa. É como se o cérebro estivesse examinando seu próprio espelho interno. Há cerca de dez anos os neurocientistas Eric L.Altschuler eSteve Hillyer, da Universidade da Califórnia em San Diego, e um de nós (Vilayanur) descrevemos uma nova síndrome neurológica
chamada agnosia especular. O problema é caracterizado pela incapacidade de pacientes - que sofreram derrames leves no hemisfério direito não saberem que a imagem de um objeto, refletida no espelho, é só uma imagem. Surpreendentemente, eles tentam pegar o "objeto" repetidas vezes, como se não conseguissem inibir um ato reflexo, embora, do ponto de vista mental, essas pessoas sejam absolutamente saudáveis. Esse fenômeno nos faz pensar nos mistérios entre realidade e ilusão, na fragilidade implícita nessa relação e no quanto os espelhos são profundamente enigmáticos. Sensações cruzadas Você pode brincar com reflexos para explorar a magia deles. Comece construindo uma caixa de espelho (verquadropág.28).Projetamosessacaixa originalmente para tratar pacientes que sofreram derrame ou que, após uma amputação, sentem dor no membro-fantasma; mas qualquer pessoa pode se divertir fazendo o experimento consigo próprio e com os amigos. Normalmente, nossos sentidos - como a www.mentecerebro.com.br 27
maneira que a mão refletida e a oculta estejam em perfeita sincronia. Então pare de movimentar apenas a mão esquerda (oculta) e, ao mesmo tempo, continue mexendo a direita lentamente: gire-a, faça um aceno ou agite os dedos - mas mantenha a esquerda imóvel. Agora vem o instante mágico: por alguns momentos você verá a mão esquerda se mover, embora a sinta imóvel. Surpreendente, não? O cérebro abomina contradições.
~ ~ visão, a audição e a propriocepção - trabalham em razoável concordância. Mensagens originadas nesses diferentes canais sensoriais convergem para os giros angular e supramarginal do lobo parietal do cérebro, onde construímos nossa "imagem corporal". Nos demais primatas, essas duas estruturas estão fundidas num único giro, no lóbulo parietal inferior. Na espécie humana, entretanto, dada a importância das interações sensoriais cruzadas - também chamadas intermodais -, esse lóbulo cresceu muito e se dividiu em dois. Foi
PERCEPÇÃO DA
própria imagem é atualizada com exerádos na caixa de espelhos
assim que esse macaco pelado se tornou capaz de tão vasta sofisticação tecnológica - um macaco que não tenta apenas 28
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MENTE&CÉREBRO ARMADIlHAS DA PERCEPÇÃO
alcançar os amendoins, mas também as estrelas. Voltemos à caixa de espelho. Comece com o lado reflexivo voltado para a direita. Depois coloque a mão esquerda no lado esquerdo do espelho, de modo que fique oculta da sua visão; e ponha a mão clireita no lado direito, de forma a mimetizar com precisão a postura e localização da mão esquerda escondida. Agora olhe no espelho o reflexo da mão direita; a sensação que se tem é de estar vendo a mão esquerda real, o que é obviamente uma ilusão. Continue olhando o espelho e mova as duas mãos de forma sincronizada - em círculos ou abrindo e fechando os dedos, por exempio - de
Incongruência sensorial Prepare-se para algo mais desconcertante: mova a mão esquerda oculta e, ao mesmo tempo, mantenha a direita imóvel. A sensação é ainda mais estranha quando visão e propriocepção "se chocam". A seguir, ainda olhando o espelho, peça a um amigo que segure sua mão direita. Você verá sua "mão esquerda virtual" sendo tocada, enquanto a mão esquerda real, atrás do espelho, permanece livre. Com este conflito sensorial peculiar, algumas pessoas sentem a mão esquerda como se estivesse anestesiada - porque vêem o toque, mas não o sentem. Um outro tipo de incongruência sensorial acontece quando você olha sua mão através de uma lente côncava, o que a deixa bem mais longa e menor. Isso por si só já provoca um estranhamento, mas se você movê-Ia ou agitar os dedos, a sensação se tornará ainda mais paradoxal e fantasmagórica. É como se esta parte do corpo não lhe pertencesse, uma espécie de experiência fora do corpo. O mesmo acontece se, durante uma caminhada, você
r
olhar seus pés através desse tipo de lente. Eles vão parecer mais longos, magros e elásticos, como se estivessem separados do corpo. Essas experiências podem ser muito divertidas, mas têm também grande importância teórica e clínica. Quando um braço é amputado, o paciente continua a sentir vividamente sua presença, a conhecida síndrome do membro-fantasma. Muitos deles acreditam poder movimentá-Io livremente. Como explicar essa sensação ilusória? Quando você move a mão, centros de comando motor na região frontal do cérebro enviam um sinal que atravessa a medula espinhal e chega até os músculos. Ao mesmo tempo, uma cópia desse comando vai para o lobo parietal, região que recebe feedback visual e proprioceptivo. Assim, se o membro é perdido, não existe feedback sensorial, mas, ainda assim, a cópia do comando é enviada ao lobo parietal e interpretada pelo cérebro como movimentos do fantasma. Por razões que não compreendemos completamente, alguns pacientes são incapazes de "mover" seu membro-fantasma e dizem que ele está "paralisado". Outros relatam dor ou "congelamento" em posição não usual. Mas como um fantasma pode estar paralisado? Muitos desses pacientes tiveram anteriormente uma lesão nos nervos que saem da medula espinhal e inervamos músculos do braço, o que deixou o membro paralisado,porém intacto. Sempre queo córtex pré-motor enviava o comando para movê-Io, recebiaum feedback visual e
proprioceptivo que dizia: "Não se mova".Essa mensagem acaba sendo gravada no cérebro como uma forma de "paralisia aprendida", uma espécie de memória que é transferida ao fantasma. Paralisia aprendida Seria possível trazer o fantasma de volta à vida fornecendo ao paciente um feedback visual toda vez que tentasse movê-Io? Essa estratégia poderia aliviar a dor? Em um artigo de 1996, descrevemos a técnica da caixa de espelho. O paciente "coloca" seu fantasma paralisado de um lado e a mão normal do outro; depois olha no espelho enquanto realiza movimentos simétricos (batendo palmas, por exemplo). O espelho da caixa dá a ilusão visual de que o fantasma foi ressuscitado e se move em perfeita sincronia com os comandos do cérebro. Em muitos pacientes, a sensação de cãibra desaparece pela primeira vez em anos; em outros, o fantasma some completa e permanentemente, junto com a dor. Sugerimos que tais procedimentos podem ser úteis também para outros quadros clínicos, como derrame ou distonia focal, doença neurológica que provoca contrações musculares involuntárias. Estes efeitos foram confirmados recentemente em ensaios clínicos realizados com técnicas de imageamento cerebral pela neuropsicóloga Herta Flor, do Instituto Central de Saúde Mental da Universidade de Heidelberg, Alemanha. A dor fantasma é muito desagradável, mas bem menos freqüente que o derrame, ou acidente vascular cerebral (AVC),
a principal causa de invalidez nos Estados Unidos. Causadas por problemas vasculares, lesões nas fibras nervosas que vão do córtex à medula espinhal podem levar à paralisia total de uma das metades do corpo. Será que existe algum componente da paralisia aprendida no AVO Talvez o inchaço e inflamação iniciaiscausem interrupção temporária da transmissão de sinais que, combinada com a evidência visual de paralisia, leva a uma forma de paralisia aprendida que se soma à paralisia real causada pela lesão nervosa. Em 1999, recorremos à caixa de espelho para tratar a paralisia secundária ao AVc. Testamos nove pacientes e constatamos uma recuperação incrível, considerando que esse tipo de paralisia geralmente é incurável. Imaginávamos que células multimodais (diretamente conectadas à saída vi-
PLASTICIDADE NEURAL: impacto na reabilitação de quem sofreu amputação ou derrame
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A mão fantasma Você pode ser convencido de que sente uma falsa mão como se fosse a sua própria. Para descobrir por si mesmo, peça a um amigo que se sente a uma mesa pequena. Use uma divisão vertical, como mostra a ilustração - um pedaço de cartolina é o bastante. Apóie a sua mão direita na mesa de forma que não possa vê-Ia, atrás da divisória. À vista, coloque uma mão de plástico - das que se compram em lojas de bugigangas ou de fantasias. Peça a seu assistente que toque sua mão escondida usando alternadamente a ponta do dedo e, com pequenos tapas, a mão aberta, numa seqüência aleatória de toques como tapa, tapa, tapa, ponta do dedo, tapa, ponta do dedo, ponta do dedo. Ao mesmo tempo, em perfeita sincronia, ele deve fazer o mesmo com a mão falsa. Se continuar nesse ritmo por 20 ou 30 segundos, algo fantasmagórico acontece: a estranha sensação de que você realmente sente a mão falsa. Por que acontece isso? Matthew Botvinicke Jonathan Cohen, então na Universida-
Em alguns casos, se o médico tocasse a mão verdadeira, o paciente não apenas via a fantasma sendo tocada, como também sentia esse toque
de de Pittsburgh e na Universidade Carnegie Mellon, reportaram a chamada ilusão da mão de plástico em 1998, sugerindo que a similaridade física entre a mão verdadeira e a do modelo é suficiente para enganar o cérebro e fazer com que ele atribua as sensações de toque aos membros falsos. Eles acreditam que essa ilusão é forte o bastante para superar a pequena discrepância entre a posição de sua verdadeira mão, marcada pela articulação de seu corpo e pelos receptores musculares, e a localização da mão de plástico registrada por seus olhos. Mas a história não acaba aqui. Maisou menos na mesma época em que Botvinicke Cohen observaram o efeito da mão de plástico,nós e nossoscolegas William Hirstein e Kathleen Carrie Armei da Universidade da Califórnia, em San Diego, descobrimos outra peculiaridade: o objeto tocado por seu ajudante não precisa sequer parecer com sua mão. Épossível produzir o mesmo efeito simplesmente acariciando a mesa. Faça a experiência: desta vez
peça a seu colega que acaricie e toque a superfície diante de você enquanto faz movimentos equivalentes em sua mão escondida. (Se a utilização da mesa não funcionar, pratique com uma mão de brinquedo e depois vá mudando para o móvelo)Com paciência,você vaiter sensações de toque proveniente da superfície de madeira à sua frente. A ilusão fica ainda mais intensa se você cobrir o tampo da mesa com uma toalha de plástico para imitar as qualidades táteis da pele. Essa ilusão é extraordinariamente arrebatadora na primeira vez que você a descobre. Mas como os cientistas podem ter certeza de que você agora assimilou a mesa à imagem do seu corpo de modo perceptível? No ano passado, Armei e um de nós (Ramachandran) descobrimos que, uma vez desenvolvida a ilusão, se você "ameaçar" a mesa ou a mão falsa fingindo que vai desferir-lhe um golpe, a pessoa estremece e até começa a suar, como faria se estivesse enfrentando uma ameaça verdadeira ao seu próprio corpo. Demonstramos essa reação objetivamente registrando uma súbita diminuição na resistência elétrica da pele causada pela transpiração - a mesma resposta da pele galvânica usada em testes de detectores de mentira. Écomo se a mesa fosse incorporada à imagem do corpo de forma a ~
~
se conectar com centros emo-
~ cionais do cérebro; a pessoa ~sente a ameaça contra a mesa como se fosse uma ameaça a ~ ela própria.
i
SENTE-SE À MESAe obstrua a visão de um de seus braços. Coloque à vista uma falsa mão. Se alguém tocar a mão artificial, você terá a impressão ilusória de perceber o toque
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MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERcEPÇÃo
A SENSAÇÃOilusória chega a
provocar alterações corporais como aumento da transpiração
Essas ilusões demonstram dois princípios importantes subjacentes à percepção. Em primeiro lugar, a percepção baseia-se amplamente na extração de correlações estatísticas dos estímulos sensoriais. Ao sentir que sua mão escondida sofre pequenos golpes e ver a mão de plástico ou a mesa sendo tocadas da mesma maneira, seu cérebro se pergunta "Qual é a probabilidade de que esses dois conjuntos de seqüências aleatórias (na mão escondida e na mesa ou mão falsa visíveis) sejam idênticos simplesmente por acaso? Nenhuma. Por isso, a outra pessoa deve estar me tocando" . Em segundo lugar, os mecanismos mentais que fazem essas correlações baseiam-se em processos automáticos pouco suscetíveis ao intelecto de nível mais elevado. Com informações reunidas por sistemas sensoriais, o cérebro faz seus julgamentos sem cognição consciente. Até mesmo o conhecimento de que uma mesa não faz parte do seu corpo é abandonado à luz da decisão da percepção ilusória de que é. O seu "conhecimento" de que isso é impossível não impede a ilusão. Essaexperiência foi inspirada por um trabalho anterior que realizamos com pacientes que tinham membros fantasmas. Depois que uma pessoa perde um braço por acidente ou doença, ela pode continuar a sentir sua presença. Com freqüência, o membro fantasma parece ter sido congelado numa posição estranhamente dolorosa. Pedimos a um paciente que pusesse seu braço esquerdo fantasma à esquerda de um espelho colocado em posição vertical numa mesa
à sua frente. Depois ele colocou seu braço direito intacto no lado direito, de forma que seu reflexo era visto no espelho superposto ao do fantasma, criando a ilusão visual de que o braço que faltava havia sido restaurado. Se o paciente movesse seu braço direito, ele via o fantasma se mover. O extraordinário é que isso "animava" o fantasma de maneira que ele o sentia moverse também - aliviando às vezes a câimbra. Ainda mais surpreendente: em alguns casos, se o médico tocasse a mão verdadeira, o paciente não apenas via a fantasma sendo tocada, como também sentia esse toque. Mais uma vez o cérebro considera pouco provável que essa combinação de impressões sensoriais seja coincidência; dessa forma, ele de fato sente o toque em sua mão fantasma. Considere as implicações dessas ilusões. Todos nós atravessamos a vida fazendo conjecturas como "Meu nome sempre foi José" ou "Eu nasci em São Paulo". Todas essas convicções podem ser questionadas por várias razões. Porém, uma premissa que parece estar além de qualquer questionamento é a de que você está ancorado em seu corpo. Entretanto, submetido durante alguns segundos ao tipo de estimulação correta, até mesmo esse fundamento axiomático é temporariamente abandonado, quando a mesa parece tornar-se parte de você. Como disse Shakespeare com propriedade, nós realmente somos "a matéria de que os sonhos
sual, proprioceptiva e motora, e similares aos neurônios-espelho), dormentes após o AVC, estavam sendo reavivadas pelo feedback visual ilusório do espelho. Este resultado foi também reproduzido em ensaios clínicos realizados por dois grupos independentes, um deles chefiado pela psicóloga Jennifer A. Stevens, à época na Universidade Northwestern e no Instituto de Reabilitação de Chicago, e o outro pelo neurologista Christian Dohle, do Hospital Universitário de Düsseldorf, Alemanha. Também sabemos que, embora fibras motoras do córtex cruzem até o lado oposto do corpo (orientação contralateral), outras inervam o mesmo lado (orientação ipsilateral). Por que fibras intactas não podem "substituir" as lesionadas quando ocorre um derrame é um enigma que persiste há muito tempo. Uma possibilidade é que elas sejam "recrutadas" pelo uso do espelho. Em caso positivo, concluiremos que os espelhos não são úteis apenas para os ilusionistas,mas também podem revelar como o cérebro integra diferentes informações sensoriais. Igualmente importante, o feedback visual - vindo de espelhos ou de realidade virtual - pode ser clinicamente útil para a recuperação de déficits neurológicos há muito considerados incuráveis. nec
~ Phantom limbs, neglect syndromes, repressed memories and Freudian psychology. V. S. Ramachandran, em Intemational Review of Neurobiology, vai. 37, págs. 291-333, 1994.
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Imagens
ambí uas
Ilusões visuais atiçam a curiosidade e permitem diversas interpretações; o sistema nervoso, porém, anseia por respostas e se concentra em uma só alternativa
POR VlLAYANUR S. RAMAOIANDRAN E DIANE ROCiERS-RAMAOIANDRAN
O
cérebro detesta a ambigüidade. Apesar disso, somos curiosamente atraídos por ela. Não é por acaso que tantas ilusões visuais famosas exploram a dupla conotação e excitam nossos sentidos. Resolver questões deflagra uma onda de prazer na mente, semelhante àquela que vivenciamos no momento em que resolvemos um problema. Tais observações levaram o físico, psicólogo e oftalmologista Hermann von Helmholtz (1821-1894)a mostrar que a percepção tem muito em comum com a resolução de problemas intelectuais. Mais recentemente, a idéia foirevista e defendida pelo neuropsicólogo Richard L. Gregory, da Universidade de Bristol, Inglaterra. As chamadasfigurasbiestáveis - como a ilusão dos rostos/vaso (verfiguraa na pág. 34) - são com freqüência anunciadas nos livros escolares como 32
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MENTt&CÉREBROARMADIlHAS
DA PERCEPÇÃO
exemplo básico da maneira como influências de cima para baixo (conhecimento ou expectativas preexistentes) de centros superiores do cérebro - em que códigos perceptuais são registrados - podem influenciar a percepção. Considere o simplescaso do cubo de Necker (ver figurae napág.35).Você pode ver essa ilusão de duas maneiras: com o cubo virado para cima ou virado para baixo. Com um pouco de prática, é possível alternar à vontade uma e outra dessas percepções intercambiáveis (ainda assim, é bastante divertido quando essa variação se dá de maneira espontânea, provocando a sensação de que se caiu numa "pega_ dinha"). Na verdade, o desenho é compatível não apenas com duas interpretações, como em geral se acredita; de fato há um conjunto infinito de formas trapezoidais que podem produzir exatamente a
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mesma imagem retiniana, mas o cérebro se concentra em um cubo sem hesitar. Observe que você vê apenas um ou outro de cada vez. O sistema visual parece lutar para determinar qual dos dois cubos o desenho representa, mas já resolveu o problema perceptual, muito maior, ao rejeitar as diversas outras configurações que poderiam surgir do padrão seguido pela retina (que chamamos de cubo de Necker). A atenção de cima para baixo e a vontade, ou intenção, pode apenas ajudá-Io a selecionarentre duas percepções
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- você não verá nenhuma das ou-
dador, por exemplo, caçar uma 5
tras possibilidades,não importa o quanto se esforce. Embora o cubo com freqüência seja usado para ilustrar o papel das influências de cima para baixo, ele, na verdade, prova o exato contrário: que a percepção em geral é imune a tais influências. Realmente, se todas as computações perceptuais se valessem principalmente dos efeitos de cima para baixo, elas seriam lentas demais para ajudá-lo em tarefas relacionadas à sobrevivência e à propagação de genes - escapar de um pre-
presa para se alimentarou con-
~
quistaruma parceira ou parceiro. ~ É importante reconhecer § que a ambigüidade não surge {~
apenas em quadros planejados ~ de maneira inteligente como
~
mostra a figurac (verpág. 34), na qual o sombreamento pode fazer os círculos parecerem convexos ou côncavos. Na verdade, ela é a regra em vez da exceção quando se trata da percepção; é normalmente resolvida por outras dicas de baixo para cima (diagonais talvez seja o termo mais adequado) que exploram www.mentecerebro.com.br 33
Vemos uma fonna de cada vez, mesmo que a figura ofereça várias possibilidades; o sistema visual segue o padrão da retina
o "conhecimento" estatístico embutido do mundo visual. Tal conhecimento é programado no circuito neural do sistema visual e empregado de maneira subconsciente para eliminar milhões de soluções falsas. Mas as informações em questão são relativas às propriedades gerais do mundo, não às específicas. O sistema visual tem um conhecimento estrutural de superfícies, contornos, profundidade, movimento, iluminação e assim por diante - mas não de perfumes, uvas ou dálmatas.
Controle de movimento
mas nunca das duas maneiras ao mesmo tempo - outro exemplo de ambigüidade. É preciso um esforço maior, mas, tal como ocorre com o cubo, você pode passar intencionalmente de uma para outra dessas duas percepções alternativas. Nós nos perguntamos o que aconteceria se você espalhasse vários estímulos de tais quartetos biestáveis numa tela de computador. Será que todos se mostrariam na mesma percepção quando você mudasse mentalmente a percepção de um
deles? Ou, dado que qualquer
um deles tem 50% de chance de A ambigüidade também surge da ser vertical ou horizontal, todos percepção do movimento. Em iriam mostrar uma percepção d (verquadro abaixo)começamos separada? Ou seja, será que a com dois pontos de luz brilhanresolução de uma ambigüidade do simultaneamente em cantos é global (todos os quartetos diagonalmente opostos de um parecem iguais) ou ocorre caso quadrado imaginário, mostrado a caso em partes diferentes do em 1. As luzes são então deslicampo visual? gadas e substituídas por pontos A resposta é clara: todas elas que aparecem nos dois cantos se mostram iguais. Deve haver restantes em 2. Os dois quadros efeitos semelhantes a um campo são então alternados de maneira global na resolução da ambigüicontínua. Nessa mostra, que dade. Você pode querer experichamamos de quarteto biestável, mentar isso no seu computador. os pontos podem ser vistos osciE perguntar: "Essaregra também lando na vertical (setas atravessadas) se aplica à ilusãoda sogra/esposa? ou na horizontal (setassólidas), E quanto ao cubo de Neckeri'.
É incrível o quanto se pode aprender sobre a percepção usando exemplos tão simples - é justamente o que torna esse campo de estudo tão sedutor. Precisamos tomar cuidado para não dizer que as influências de cima para baixo não têm nenhum papel. Em algumas figuras, você pode ficar preso em uma interpretação, mas consegue mudá-Ia quando alguém lhe diz, verbalmente, que há uma interpretação alternativa. É como se seu sistema visual - utilizando a memória de alto nível - "projetasse" um modelo (por exemplo, um rosto velho ou jovem) nos fragmentos para facilitar sua percepção. É possível argumentar que o reconhecimento de objetospode beneficiar processos de cima para baixo que utilizam essa seleção e memória atencionais. Em contraste, reconhecer contornos, superfícies, movimento
e profundidadeé algoque ocor-
Q
re principalmente de baixo para
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cima (você pode "ver"todas as
~
superfícies e cantos de um cubo ~ ~ ,. ' e ate estIcar a mao e agarra- Io ~ fisicamente e ainda assim não ~ percebê-Io ou não reconhecê-Io ~ como cubo). ~
Figurasque brincam com os olhos
e
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4)
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MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
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t tt t4 . t .~ .. . .. -4 t
Na verdade, ambos tivemos a experiência de examinar neurônios num microscópio o dia todo e então, no dia seguinte, "alucinar", vendo neurônios por todo lugar: em árvores, folhas e nuvens. O exemplo extremo desse efeito é observado em pacientes que ficaram completamente cegos e começam a ter alucinações em que vêem elfos, animais de circo e outros " objetos - o que é chamado de ~
síndrome de CharIes Bonnet.
i Nesses ~ ~ ~.
~
indivíduos,
apenas
dados de cima para baixo contribuem para a percepção - o processo de baixo para cima,
g ausente
porque
eles são cegos
(em virtude de degeneração ~ macular ou catarata), não pode o ~ ~
CUBO
~
é possívelenxergar vários desenhos, dependendo da forma como se olha
'!Iais limitar suas alucinações.
~ E quase ~ ~ :: Q
3 ~ ~
como se estivéssemos
tendo alucinações o tempo todo e o que chamamos de
percepção objetiva meramente envolvesse selecionaruma alucinação que combine melhor
~ com
os dados sensórios atuais,
iI; não importa se são fragmentários.A visão,em resumo,é uma :I
ó alucinação controlada. Mas essa declaração
i
~ contradiz ~
não
o que afirmamos antes
sobre a visão ser na maior parte
2
O~O
:.. ..: ,:
O~O 1
o
um processo de baixo para cima? A resposta para essa charada é que a "visão"não é um processo único; a percepção de objetos - seu contorno, a profundidade de superfície,como quando você vê que um cubo tem uma forma cúbica - se dá, em grande parte, de baixo para cima.
1
: ! :. ..
, 2
~
Como e o quê A fisiologia também apóia essa distinção. Sinais dos globos oculares são inicialmente processados no córtex visual primário na parte anterior do cérebro e então divergem em dois caminhos visuais: o caminho do "como" no lobo parietal do cérebro e o caminho do "0 que", ligado à memória, nos lobos temporais. O primeiro está relacionado com a visão e a navegação espaciais - esticar a mão para pegar algo, evitar obstáculos e buracos, desviar de projéteis e assimpor diante, nada disso exigindo que você
identifique o objeto em questão. Os lobos temporais, por outro lado, permitem o reconhecimento do que o objeto é na verdade (uva, dálmata, flor). Há casos híbridos nos quais há sobre posições. Por exemplo, com a ilusão dos rostos/vaso: há a tendência de ficarmos presos vendo só rostos. Você pode, porém, mudar a percepção e ver o vaso sem que alguém lhe diga de forma explícita para "procurar o vaso", se você for instruído a se concentrar na região branca e vê-Ia como uma imagem de primeiro plano em vez de uma imagem de fundo. Você pode experimentar com seus amigos. É possível também conceber quadros ambíguos, tais como os do artista plástico Maurits Cornelis Escher (1898-1972). Essas figuras paradoxais evocam assombro, prazer e frustração ao mesmo tempo - um microcosmo
da própriavida.
ne<
DE NECKER:
SAIBA MAIS:~..;
lhe perceptlon of apparent motlon. Vilayanur S. Ramachandran e Stuart M. Anstis, em ScientificAmerican,vol. 254, (126, págs. 102109, junho de 1986.
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Nuances . onza
Jogos de sombra e contraste fazem com que uma única forma acinzentada pareça ter diferentes tons, dependendo do que estiver ao redor POR ALAN GILCHRIST Professor de psicologia
da Universidade
Rutgers em Nova Jersey,
estuda percepção visual. É autor de Seeing block ond white (Oxford University Press, 2006).
uantas vezes você ouviu dizer que algo simples e evidente é "preto no branco"? Provavelmente muitas. Mas a aparente facilidade de perceber os dois extremos do espectro de cores esconde o formidável desafio com o qual o cérebro depara toda vez que olhamos para uma superfície.
Q
Nas mesmas condições de iluminação, por exemplo, o branco reflete mais luz que o preto. Mas uma superfície clara costuma refletir menos luz na sombra que uma superfície escura no sol. No entanto, de alguma forma conseguimos discernir com precisão qual é qual. Como? O cérebro usa o contexto para fazer tais julgamentos. O programa específico para interpretá-Io é cheio de mistérios que fascinam os neurocientistas. Estudos recentes ofereceram insights sobre como o sistema visual humano analisa os padrões de luminosidade que entram pelos olhos e calcula as sombras de objetos de maneira correta. Além de contribuírem para explicar como nosso cérebro funciona, essas pesquisas podem nos ajudar a projetar sistemas visuais artificiais para robôs. Os computadores são incrivelmente ruins nesse tipo de reconhecimento de padrões, algo tão natural para nós. Se os cérebros eletrônicos pudessem
36
.
MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
"ver" melhor, poderiam executar mais serviços, como identificar faces (o que seria muito útil para os sistemas de segurança), dirigir nosso carro, trazer o jornal, recolher o lixo etc. Especialistas em visão conseguem fazer o cérebro revelar seus segredos por meio de métodos psicofísicos. É como fazer perguntas com duas respostas possíveis: sim ou não. O ideal é começar com pelo menos duas hipóteses conflitantes. Precisamos então criarnma imagem que contenha uma superfície-alvo crítica que deve aparecer, digamos, cinza-claro de acordo com uma hipótese, e cinza-escuro segundo a hipótese conflitante. Em geral, o resultado são ilusões ~ adoráveis que você verá ao longo deste artigo. ~
Começarcomalgumaspropriedadesfísicasbási-
e
~
cas vai ajudar a apreciar a complexidade de ver uma superfíciecomo negra,branca ou cinza.Áreasbrancas .~ refletem a maior parte da luz que as atinge - cerca de
I
90%. Já nas negras, apenas 3% da luz é refletida. De § qualquer forma, essa luz arremetida contra nossas ~ pupilas atinge os fotorreceptores da retina. Até aí, ~
tudobem.Acontecequea luzprovenientedo objeto
~
para o qual olhamos não contém indicação alguma ~
. OS RETÂNGULOS têm a mesma tonalidade de cinza, mas o que está sobre o fundo preto parece maior
38
sobreos tons de cinzaquetambém foram refletidos.É aí que ascoisas começam a ficar interessantes. A quantidade total de luz que chega ao olho depende bem mais do nível de iluminação do ambiente que da porcentagem de luz refletida por uma dada superfície. Embora uma parede branca reflita cerca de 30 vezes mais luz que um objeto negro próximo dela e sob a mesma iluminação, à luz do Sol brilhante a parede pode refletirmilhõesde vezesmais luz que quando sob a luz da Lua. Realmente, uma superfície negra bem iluminada pode facilmente enviar mais luz para o olho que
.
MENTE&CÉREBRO ARMADILHAS
DA PERCEPÇÃO
uma superfíciebranca na sombra. É por issoque robô algumaté hoje conseguiu identificar o tom de cinza de um objeto em seu campo de visão.Ele pode apenas medir a quantidade de luz que um dado objeto reflete, o que é chamado de luminância. O psicólogo americano Hans Wallach (1904-1998) sugeriu,em 1948, que o cérebro determina o tom de cinza de uma superfície comparando a luz recebida de superfícies vizinhas. Wallach, que era primo distante de Albert Einstein, contribuiu muito para a compreensão da percepção visual e auditiva com estudos que realizou durante sua longa carreira no SwarthmoreCollege em Filadélfia. Ele demonstrou que um círculo homogêneo pode parecer ter qualquertom entre branco e preto apenas mudando o brilho da luz em volta dele, embora o círculo em si nunca se altere. Emuma ilusãoclássica,um re-
tângulo cinzarepousasobre fundo branco e uma forma idêntica, até mesmo na cor, fica sobre fundo preto ao lado da primeira (ver ilustraçãonestapág.).Se a claridade
percebida dependesse apenas da quantidade de luz refletida, as duas figuras pareceriam iguais. No entanto, a que aparece sobre a superfícieescura dá a impressão de ser mais clara, mostrando que o cérebro realiza comparações com as adjacências. Evidências mais recentes indicam que essa comparação de superfícies pode ser ainda mais simples do que Wallach imaginou. Em vez de medir a intensidadeda luz em cada ponto da cena, o olho parece começar a medir apenas a mudança na luminância nas bordas dela. O trabalho de Wallach mostrou que a luminância relativa de duas superfícies é uma peça importante do quebra-cabeça. Mas conhecer apenas essapropriedade não resolve outras ambigüidades. Colocando de outra forma:seuma parte da cena é cinco vezes mais brilhante queuma parte vizinha,o que isso significapara o olho? As duas áreas podem ser cinza-claro e preta, por exemplo. Ou branca e cinza-escuro,quem sabe. Assim, a luminância relativa pode dizer apenas o quanto duas regiões sombreadassão diferentesuma da outra, mas não qual é a tonalidade específicade cada uma delas.Para calcular o tom exato de cinza, o cérebro precisa de algo mais: um ponto de comparação em relação ao qual pode medirváriasnuances, o que os pesquisadoresagora chamam de regra-âncora. Duas regras-âncoras já foram propostas. O próprio Wallach e, depois, Edwin Land (19091991), o inventor da fotografia instantânea (mais conhecida como polaróide), sugeriram que
a luminância mais alta numa cena automaticamente aparece como branca. Se verdadeira, essa regra serviriacomo padrão pelo qual o cérebro compara todas as luminânciasmenores.Segundoa teoria do nível de adaptação, criada nos anos 40 pelo psicólogo Harry Helson (1898-1977), a luminância média numa cena sempre irá aparecer como cinzamédio. Tons mais claros ou mais escuros de cinza seriam reconhecidos por meio da comparação de outras luminânciascom essevalormédio. Aquelesque trabalhamna visãode robôs chamam isso de ''hipótese do mundo cinza". Quem está certo? Tentei desvendar esse mistério em meu laboratório em 1994. Eu e meus colegas da Universidade Rutgers planejamosuma maneirade testar essas regras nas condições mais simples possíveis:duas superfícies cinza que preenchem todo o cam-
po visualde um observador. Pedimos para voluntários colocarem a cabeça numa grande meia-esfera opaca com o interior pintado num tom de cinza-médio do lado esquerdo, e de preto, no lado direito. Suspendemos a meia-esfera dentro de uma câmera retangular maior com lâmpadas que criavam iluminações difusaspara o observador (verfotonapág.aolado). Lembre-se, o cérebro ainda não sa'beo que esses dois tons de cinza são - ele tem apenas a luminância relativa. Se a regra-âncora for baseada na luminância mais alta, então a metade cinza-médio irá parecer branca e a metade preta, cinza-médio.Mas sea regra fosse baseada na luminância média, então a metade cinza-médio pareceria cinza-claro, enquanto a parte preta se mostraria cinzaescuro. O observador não veria nenhum lado preto ou branco. Os resultados são óbvios. A
metade cinza-médio apareceu totalmente branca e a metade preta, cinza-médio. Assim, nossa escala de cinza percebida é ancorada no "alto", não no meio. Essa descoberta nos fala muito sobre como o cérebro calculaos tons de cinza em cenas simples. A luminância maior aparece branca, enquanto o tom de cinza percebido em superfíciemaisescuradepende da diferença-ou, maisprecisamente,
da proporção- entresuaprópria luminância e a da superfíciecom a maior luminância. E quanto às cenas bem mais complexas típicas da vida cotidiana? Esse algoritmo simples funciona? Talvez o leitor não se
A quantidade de luz que chega ao olho depende mais da iluminação do ambiente que da luminosidade refletida pela superfície
surpreenda em descobrir que não, que é mais complicado. Se o cérebro comparasse apenas a luminânciade cadasuperfíciecom a de toda a cena (que é bem mais alta), então uma área negra na luz brilhante pareceria ter o mesmo TRÊScíRCULOS IDÊNTICOS,aplicados em pontos da fotografia, parecem mais claros ou mais escuros: o cérebro capta âncoras diferentes em cada região de iluminação
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...... ...... ....... ...... ....... . . . . ....... ....... . . . . . .......
...... ....... ....... ...... A quantidade de luz que chega ao olho depende mais da iluminação do ambiente que da luminosidade refletida pela superfície
tom da superfície branca na sombra, levando em conta apenas que ambas têm a mesma luminância, como geralmente ocorre. Mas elas não têm, e nós podemos discemi-Ias, mas para isso o sistema visual precisa aplicar uma âncora diferente a cada região da cena. De fato, diversas pesquisas nesse campo mostram que a âncora varia mesmo. Se eu colar diversos discos cinza idênticos numa fotografia com várias áreas brilhantes e sombras, os posicionados nas regiões sombreadas parecerão muito mais claros que aqueles próximos da luz do sol (verilustraçãona pág. anterior).Eu os chamo "círculos de sondas", porque eles nos permitem sondar como o sistema visual calcula os tons de cinza em qualquer local de uma cena. Dentro de uma dada área iluminada, o local preciso do disco pouco importa; ele parece ter mais ou menos o mesmo tom de cinza. Em termos funcionais, cada região parece ter sua própria âncora - a luminância pela qual o cérebro percebe que uma superfície é branca. Mas programar um robô para processar a imagem dessa forma é um grande
desafio. Segmentar a cena em regiões com iluminações diferentes exige que o sistema visual determine quais bordas na imagem representam uma mudança no pigmento da superfície e como a linha formada pelo esboço de uma sombra significa uma alteração no nível de iluminação. Tal programa pode, por exemplo, classificar a borda como uma quebra de plano ou como uma área borrada que divide regiões com diferentes iluminações. Os neurocientistas Mark McCourt e Barbara BIakeslee, da Universidade Estadual de Dakota do Norte, argumentam que o sistema visual humano não precisa usar esse tipo de classificação. Segundo eles, há um processo menos sofisticado que chamam de filtragem espacial. Em nossa imagem com os círculos, por exemplo, eles sugeririam que o tom de cinza de cada um depende principalmente do contraste de luminância local na borda da forma, de maneira muito semelhante à proposta anterior de Wallach. Eles poderiam destacar que o tom aparente de cada círculo na fotografia depende só da direção e da força do contraste de luminância
entre cada círculo e seu fundo. Podemos testar essa idéia colocando alguns"círculosde sonda" num tabuleiro de damas com
umasombracaindosobreele (ver ilustração abaixo).Nós descobrimos que círculoscom contrastes locais idênticos dão a impressão de que são de tons diferentes. Por outro lado, círculos com contrastes locais diferentes muitas vezes compartilham a mesma tonalidade. Existeoutro truque visual que esclarece como o cérebro decide que elementos agrupar quando está ordenando padrões de luz. Imagineum sinalde mais (+) preto, com doistriânguloscinza (ver ilustração acima).Um dos triângulos se encaixa na curva da área branca da parte superior direita da figura; o outro se insere dentro da área preta de uma das barras. Aqui os dois triânguloscinza são idênticos, assim como a região próxima a eles. Cada triângulo faz fronteira com o branco pela hipotenusa (o lado mais comprido) e com o preto pelos catetos. Mas o triângulo inferior, dentro da barra preta, pertence à cruz preta, enquanto o triângulo superior parece parte
I"
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MENTE&:CÉREBRO
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ARMADILHAS DA PERCEPÇÃO
do fundo branco. Perceba as intersecções das fronteiras.Quando estas se unem para formar uma espécie de junção em 1; o cérebro define as regiões pela haste do T como fazendo parte da mesma coisa,mas não asregiõesdivididas pelo alto do T Essainterpretação dasjunções em T como uma maneira de o cérebroestabelecergruposé apoiada por outra ilusão, criada pelo artistaaustralianoMichaelWhite. Trata-se de uma série de barras pretashorizontaisempilhadascom espaços brancos entre elas. Nela, barras cinza estão mais rodeadas pelo preto do que pelo branco (ver partesuperior esquerda nafiguraacima)e
~
parecem mais escuras que as barras cinzas circundadas na maior parte pelo branco. Aqui asjunções T nos cantos das barras cinza sugerem que as da esquerda estão no mesmo
i
plano do fundo branco, enquanto
:
5 as da direita estão no mesmo plano
~.
= ~
~ ~ das barras pretas.
A neuropsicólogaPaolaBres-
~ ~
i- . san, da Universidade de Pádua, &
! ~ Itália, criou a ilusão de um "calaI
i~ ~
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~
~
bouço" que detalha ainda mais os mecanismos cerebrais de agrupa-
~ ~
mento. Os quadrados cinza do lado direito do quadro da página
j
anterior, acima, circundados por
~ ~
~
~~ preto, parecem mais escuros que ~ Q
I
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aqueles do lado esquerdo, confinados pelo branco.
g~ i ;~ ~
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1
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Esse efeito pode ocorrer porque os elementos cinza à direita
parecem estar no mesmo plano do fundo branco, em vez das barras pretas da janela do calabouço. Uma ilusão de contraste reverso do pesquisador Elias Economou, da Universidade de Creta, Grécia, defende o mesmo. A barra
cinza(vernoaltodestapág.,à direita), embora seja rodeada por preto, parece mais escura, possivelmente porque é membro de um grupo de barras brancas. Essas ilusões divertidas têm um lado sério: mostram que o cérebro não pode calcular os níveis cinza que percebemos simplesmente pela comparação das luminâncias de duas superfícies vizinhas. Em vez disso, o contexto participa de maneira muito complexa. O fato de a maioria das pessoas não estar ciente da dificuldade do problema atesta a incrível sofisticação do sistema visual humano.
Filtragem espacial O consenso de como o cérebro calcula o branco e o preto ainda está distante no horizonte científico. Asteoriasatuaisse dividemem três níveis:baixo, intermediário e alto. Teorias de nível baixo, baseadas em mecanismosde filtragem neural espacial que codificam o contraste local, falham em predizer os tons de cinza vistos pelaspessoas.Teoriasde alto nível tratam o cálculodos tons de cinza da superfície como um tipo de processo intelectual inconsciente
no qual a intensidade da luz que ilumina uma superfície é automaticamente levada em conta. Tais processos podem ser intuitivamente atraentes, mas não nos dizem nem o que buscar no cérebro nem como programar um robô. Teorias de nível intermediário analisam cada cena em múltiplos quadros de referência, cada um contendo sua própria âncora. Essas teorias especificam as operações pelas quais tons de preto, branco e cinza são calculados melhor do que fazem as teorias de alto nível, ao passo que explicam a percepção humana das superfícies cinza melhor que as teorias de nível baixo. Mas antes que possamos realmente compreender esse aspecto da visão - ou programar um robô para fazer o que o sistema visual humano faz -, precisamos entender melhor como as fronteiras são
processadas. O olho humano, como a câmera do robô, começa com uma imagem bidimensional da cena. Como ele determina quais regiões devem ser agrupadas e atribuídas a uma câmera comum? Pesquisadores da visão continuam a propor hipóteses e a testá-Ias com experimentos. Aos poucos, forçamos o sistema visuala nos revelar seus segredos. Decodificar a computação visual humana pode sera melhor maneira de construir robôs que podem ver e entender melhor como o cérebro funciona. ~
An anchoring theory of Ilghtness perceptlon. A. Gilchrist et 0/., em Psych%g;ca/ Rev;ew, vol. 106, J124,
págs.795-834,l999. Llghtness depends on Immedlately prior experience. V.Annan e A. Gilchrist, em Percept;on& Psychophys;cs, vol. 66, J126, págs. 943-952, 2004. Llghtness perceptlon. Alan Gilchrist, em M/TEncycloped;a of Cogn;t;veSciences. MIT, Press, 1999.
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Ver para crer Ao alteraro sombreamentoe a fonte de luz fazemoscom que imagenspareçammudar de forma e lugar.Não acredita?Experimente! POR VlLAVANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
magens visuais são essencialmente ambíguas. A imagem de uma pessoa na retina tem o mesmo tamanho se vemos um anão bem de perto ou um gigante de longe. A percepção depende, em parte, de empregar certas premissas sobre o mundo para resolver essas ambigüidades, e podemos nos valer de ilusões para descobrir quais são as regras e proposições ocultas no cérebro. Em(A) (verpág.44),os discos são ambíguos; o leitor pode ver a fileira de cima como esferas convexas, ou "ovos," iluminados pela esquerda, e a fileira de baixo como cavidades - ou vice-versa. Essa observação revela que os centros visuais no cérebro incorporam a suposição de que uma única fonte de luz ilumina a imagem inteira, algo que faz sentido, tendo'em vista que evoluímos em um planeta com um único Sol. Ao mudar conscientemente a fonte de luz da esquerda para a direita, você pode fazer com que os ovos e as cavidades troquem de lugar. Em (B), a imagem é ainda mais convincente. Aqui, os discos claros na região superior (ã esquerda)sempre parecem ovos, e os claros na
I
42
.
MENTE&CÉREBRO ARMADilHAS
DA PERCEPÇÃO
região inferior (ã direita)são cavidades. Assim, descobrimos outra premissa utilizada pelo sistema visual: ele espera que a luz brilhe de cimaVirando a página de cabeça para baixo, ovos e cavidades de imediato trocam de lugar. Surpreendentemente, a proposição segundo a qual o brilho da luz vem acima de nossa cabeça é preservada mesmo quando giramos o olhar t 80 graus. Peça a alguém para segurar a página na po~ição normal de leitura. Depois, olhe de cabeça para baixo. Você verificará que a mudança novamente ocorre, como se o Sol estivesse preso à sua cabeça e projetando a luz do chão para cima. Sinais do centro de equilíbrio de seu corpo - o sistema vestibular
-
orientados
pelas posições
de partículas de carbonato de cálcio presentes na orelha interna, denominadas
otólitos, viajam
até os centros visuais para corrigir a imagem (de
modo que o mundo continue a parecer de cabeça
g ~
1 1
para cima), mas não corrigem a posição do Sol. Com base nesse experimento, aprendemos que, apesar da impressão de perfeita unidade, ~ nossa visão é mediada por diversos módulos de ~
i
AS GAZELAStêm barriga branca e dorso escuro - portanto, um "contrasombreamento" - que neutraliza o efeito da luz do Sol incidente de cima para baixo. O resultado é uma redução no efeito de "saltar aos olhos". Por isso elas parecem menos apetitosas aos olhos de um predador
processamento de informações paralelos existentes no cérebro. Alguns dos módulos conectamse ao sistema vestibular; isso, porém, não acontece com o módulo que determina formas com base em seu sombreamento. A razão disso talvez seja que a correção do posicionamento de uma imagem em relação às chamadas coordenadas centradas no mundo seria demasiado dispendiosa sob o aspecto computacional e consumiria muito tempo. Nossos ancestrais normalmente mantinham a cabeça na posição ereta, de modo que o cérebro pode improvisar com essa simplificação (ou premissa simpli/1cadora).
o
c c
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t t t _ 44
.
MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
Se o leitor olhar para (C), verificará que é capaz, quase de imediato, de agrupar mentalmente todos os ovos, distinguindo-os das cavidades. Como os cientistas visuais descobriram décadas atrás, somente determinados aspectos elementares extraídos logo no início do processamento visual "saltam aos olhos" e podem ser agrupados dessa maneira. Por exemplo, seu cérebro pode discernir um conjunto de pontos vermelhos sobre um fundo
de pontos verdes, mas não é
fundo de "/1gurinhas zangadas". ~I" As cores, portanto, são um: aspecto primitivo separado no início do processamento, mas um sorriso, não. (Faz sentido, do ponto de vista da sobrevivência, ser capaz de reunir fragmentos de cores similares. Um leão oculto atrás de uma cortina de folhagem verde é visível apenas como fragmentos dourados, mas o cérebro visual
~
~~
~~
~
'8"...,.'8"~ ~
~~~
~
capaz de agrupar "/1gurinhas § sorrindo" distribuídas sobre um ~
.~
monta os fragmentos de modo a formar uma imagem dourada de leão inteiro e adverte: "Fuja imediatamente!") O fato de podermos agrupar os ovos em (C) implica que a informação de sombreamento, assim como as cores, é separada no início do processamento visual. Essa predição foi confirmada, nos últimos anos, mediante o registro da atividade nos neurônios de macacos e a realização de experimentos de imageamento cerebral em seres humanos. Em (D), onde os círculos exibem a mesma polaridade "claro versusescuro"que em (C), não podemos perceber os agrupamentos; esse fato sugere a importância da percepção de profundidade como um indício isolado no início do processamento visual.
~
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-~ -'~ .,
portanto, um "contra-sombreamento" - que neutraliza o efeito da luz do Sol incidente de cima para baixo. O resultado é uma redução no efeito de "saltar aos olhos". Por isso elas parecem mais magricelas e menos apetitosas aos olhos de um predador. As lagartas também exibem um contrasombreamento, e assim ficam mais parecidas com as folhas planas que comem. Um tipo de polvo é capaz até mesmo de inverter seu contra-som-
Bichos magricelas É evidente que, no curso de milhões de anos, a evolução "descobriu" e tirou proveito dos princípios de sombreamento que os pesquisadores começaram a explorar apenas recentemente. As gazelas têm barriga branca e dorso escuro
breamento: se suspendermos o polvo de cabeça para baixo, ele usará células produtoras de pigmentos existentes na pele, denominadas cromatóforos, que são controladas por seus sinais de entrada no sistema ves~ tibular, para inverter suas áreas ~ mais escuras e mais claras. ~
Charles Oarwin percebeu
f~ um notável exemplo do emprego do sombreamento, pela ~
Natureza,
nas proeminentes
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e
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manchas semelhantes a olhos existentes nas longas caudas de faisões argos. Com as penas da cauda em repouso horizontal, os "olhos" são matizados da esquerda para a direita. Mas ao se exibirem buscando um par para o acasalamento, as penas da cauda ficam eretas. Nessa posição, as manchas tornamse esmaecidas em cima, e seu colorido mais carregado fica abaixo, de modo que os discos parecem bojudos, como brilhantes esferas metálicas - são o equivalente avícola das jóias usadas por humanos. O fato de alguns círculos sombreados simples poderem evidenciar as premissas subjacentes a nosso sistema visual - e até mesmo como esses princípios desempenharam um papel na forma de adaptações evolucionárias - mostra como as ilusões visuais nos ajudam a compreender a natureza da
percepção.
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On the perceptlon of shape from shadlng. D. A. Kleffner e V.S. Ramachandran em Perceptionand psychophysics, vol. 52, 02 1, págs. 18-36, julho de 1992. Neural actlvlty In early visual cortex reflects behavloral experlence and hlgher-order perceptual sallency, Tai Sing Lee, Cindy F.Yang, Richard D. Romero e David Mumford em vol. NatureNeuroscience, 5, 02 6, págs. 589-597, junho de 2002. íntegra em áudio e transcrição das palestras Reith BBC2003 com Ramachandran: www. bbc.co.uk/radl04/ relth2003/
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Mecanismos da estabilidade visual Por que o mundo não parece pular quando
nossas
retinas se movem? Essaadequação aparentemente corriqueira exige trabalho cerebral específico
POR VlLAYANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
O
estudo da percepção é tão fascinante, entre outras razões porque por meio dele podemos obter ins;ghts profundossobreo funcionamento do cérebro utilizando experimentos relativamente simples. A experiência sensorial do mundo, porém, não envolve a transmissão fiel de uma imagem da retina para uma tela no cérebro, de modo que ela seja "vista" por um olho interior. Uma pequena evidência desse
fato é que a percepção de um objeto (figurana pág. 48: mudar radicalmente
são duasfacesou uma taça?) pode
46
.
Num primeiro momento, poderíamos pensar que o mundo não parece balançar porque todo movimento é relativo. As nuvens planam no céu ao crepúsculo, mas presumimos que elas são estáveis, e atribuímos o movimento ao objeto menor, a lua. Uma simples experiência desfaz essa idéia. Feche o olho esquerdo. Então, mantendo o direito aberto, use o dedo indicador direito para deslocar o globo ocular direito, movendo-o delicadamente de um lado para o outro em sua orbita. Você verá o mundo pular como num terremoto, embora não haja nenhum movimento relativo na retina.
mesmo se a imagem na retina for mantida constante, o que significa que até mesmo o ato mais simples de observação depende do julgamento do cérebro. Menos óbvio, mas igualmente importante, é o inverso. É possível que a percepção do mundo - ou de um objeto - também permaneça estável se a imagem mudar rapidamente na retina. Um exemplo é o modo como interpretamos uma cena quando a observamos.
Por que vemos um mundo estável quando giramos os olhos naturalmente, mas não quando movemos uma das órbitas com as mãos? A resposta veio do grande médico do século XIX, o físico e oftalmologista Hermann von Helmholtz. Ele sugeriu que quando o comando para mover os olhos é enviado dos lobos
Toda vez que percorremos um ambiente com o olhar, a imagemdança na retina a uma velocidade warp(de grande intensidade, que leva à distorção), de centenas de metros por segundo. Ainda assim, tudo parece firme como rocha. Por quê?
frontais para os músculos dos globos oculares, uma cópia fiel do comando (como uma "CC/ - com cópia - no caso de um e-mail) também chega aos centros visuais de detecção de movimento na parte posterior do cérebro. Como resultado, eles são informados
MENTE&CÉREBRO ARMADilHAS DA PERCEPÇÃO
com antecedência: "Vocês irão receber alguns sinais de movimento, mas eles não são causados por movimentos reais do mundo, por isso ignorem-os". Podemos falar de dois sistemas independentes no cérebro capazes de sinalizara sensaçãode movimento. Richard L. Gregory, professor de neuropsicologia da Universidadede Bristol,InglateJTa, chama-os de sistemaimagem/retina (causado pelo movimento da imagem na retina) e de sistema olho/cabeça(geradopelasensação do movimentoocular).Emgeral,o cérebro subtraium sinal do outro. Quando movemosos olhos, esses dois sinaisanulam-semutuamente e o mundo permanece estável. Sabemos que o sistema imagem/retina existe graças à experiência em que movimentamos o
olho com o dedo. Porém, como sabemos que o sistema olho/cabeça, independentemente, evoca uma sensação de movimento? Pense no que acontece quando os olhos seguem a ponta em brasa de um cigarro que se move em uma sala completamente escura. Corretamente, você a vê movendo-se por vários metros, embora a imagem do cigarro não se mova quase nada em sua retina. Já seus olhos estão percorrendo uma grande distância. Assim, o cérebro "conclui" que o cigarro deve ter se movido numadistância equivalente ao movimento dos olhos. Mais uma vez falamosdo movimento finalque percebemos como o resultadoda subtraçãodos sinaisimagem/retina(próximosde zero porque você segueo cigarro) dos sinais olho/cabeça (grandes,
porque os olhos movem-se numa ~
distância grande para manter a imagem do cigarro na fóvea). O
~
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resultado final é que você vê o ~ ponto avermelhado incandescente percorrendo vários metros. ~
;
Podemos produzir uma versão g
mais interessante desse efeito pedindo a um amigo que nos fotografe enquanto olhamos diretamente para oflash. O que vemos em seguida é uma pós-imagem do bulbo causada pela atividade contínua dos receptores, que permanece bem depois que a luz já se apagou. Essa imagem do flashfica "grudada" na retina; ela não pode se mover nem um pouco sequer. Mesmo que fôssemos para um quarto escuro e movêssemos os olhos, veríamos a pós-imagem movendo-se vividamente junto com os olhos. O sistema olho/cabeça sinaliza um www.mentecerebro.com.br 47
Cada vez que pensamos desvelar a verdade, tudo o que conseguimos " e uma provocante e breve visão de algo que se transforma em " outro veu
valor grande, mas o sinal imagem/retina é zero - assim, como resultado da subtração, vemos a pós-imagem movendo-se, embora ela esteja fixada e imóvel na retina. Se criarmos uma pós-imagem imóvel e semelhante sem flash fixando o olhar durante 30 segundos no "X"central da figura b, você verá a pós-imagem quando mover o olhar para uma folha de papel em branco. (Pisque os olhos para renovar a imagem, se necessário.) Próxima pergunta: Qual é a fonte dos sinais gerados pelo sistema olho/cabeça? Uma possibilidade, conhecida como feedforward, é que uma cópia do comando dos centros do movimento ocular é enviada aos centros sensoriais de detecção de movimento, de modo que eles esperarão
anularão
-
-
e, em seguida,
sinais de imagem/re-
tina falsos. Uma segunda opção, chamada teoria de feedback,é que receptores nos músculos oculares sentem o grau do movimento dos olhos e enviam a informação de "cancelamento" aos centros sen-
olhos fosse enviada (feedforward) às áreas que sentem o movimento para ser subtraída do movimento imagem/retina esperado. Porém, como não há nada para subtrair, o resultado final é o movimento
soriais de detecção de movimento. Qual está correta?
percebido na direção oposta. Há outra pequena evidência. Crie uma pós-imagem em uma retina usando j/ash (mantenha o outro olho fechado). O que acontece se em um quarto escuro você agora movimentar o globo ocular com o dedo? A resposta é... absoluta-
Para descobrir, Helmholtz paralisou os músculos dos próprios olhos usando uma anestesia local instilada ao redor dos globos oculares. Toda vez que tentava mover os olhos (sem sucesso, é claro), o mundo parecia se mover na direção oposta - embora nem a imagem nem os olhos estivessem se movendo. Ele concluiu
mente nada. Você não vê a pósimagem pulando. A razão é que na escuridão, quando movimentamos o globo ocular, a pós-imagem permanece perfeitamente imóvel na retina. Assim, não há sinais de imagem/retina nem nenhum sinal de comando dos centros motores do movimento ocular. Subtraia
que o modelo feedforwardestava correto. Não poderia ser o feedback, porque os músculos oculares não se moviam. É como se uma cópia da intenção de mover os
Detectores de movimento .Objeto
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4
do cérebro Comparação
Sinaisde movimento da retina No sistema imagem/retina (à esquerda), um objeto adona sucessivamente os receptores à medida que se move ao longo da retina enquanto o olho estiver imóvel. Por outro lado, no sistema olho/cabeça (à direita),o olho em movimento mantém o objeto parado na retina, mas uma pessoa percebe o movimento porque o cérebro monitora seus próprios comandos enviando sinais para o olho se mover.
48
MENTE&CÉREBRO. ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
Para julgar se um objeto está em movimento, o cérebro subtrai os sinais dos sistemas imagem/retina e olho/cabeça de duas formas. A teoria de feedforward (no alto) afirma que uma cópia do comando dos centros de movimento ocular é enviada aos centros sensoriais de detecção
de movimento,
de modo que eles esperarão
- e, em
segui-
da, anularão - sinais falsos. A teoria de feedback (embaixo) sustenta que os próprios receptores nos músculos oculares sentem o grau de movimento dos olhos e enviam a informação de "cancelamento."
zero de zero, e você tem zero. A experiência também é uma evidência indireta a favor da teoria de feedfonvard e contraa teoriade feedback (porque quando giramos o globo ocular, receptores de estiramento nos músculos oculares são ativados - se bem que não de maneiracoordenada). Vamosimaginaroutro cenário. Você entra em uma discoteca iluminada por uma luz estroboscópica. Com a freqüência estroboscópica certa, se você apenas mexer os olhos, o mundo inteiro - incluindo as pessoase a mobília - parecerá pular. Quando você move os olhos, os comandos do sistema olho/cabeça vão para as áreas de sensação de movimento. Normalmente, essas mensagens seriam canceladas pelos sinais de movimento de imagem/retina. Contudo, seus olhos, em essência, registram instantâneos estáticos a cada lampejo estroboscópico, captando amostras da imagem. Essas amostras se comportam efetivamente como pós-imagens. Se esse processo falhar,teremos a sensação de que o mundo está em movimento.
o mundo está pulando Melhor ainda,peça a um amigo que segure um pequeno ponto luminoso - como um cigarro aceso ou uma minúscula lanterna - sem se mover.Mexa seus olhos, e a pequena luz, é claro, parecerá parada. Se, em seguida, você usar luz estroboscópica na sala, toda vez que você mexer os olhos, seu amigo parecerá saltar, mas o ponto luminoso permanecerá exatamente no mesmo lugar. Isso acontece porque o ponto luminoso, tendo luz própria e sendo continuamente visível,gera sinais de movimento de imagem/retina que são cancelados pelos coman-
dos de olholcabeça. Por outro lado, o resto da sala e seu amigo, captados como "amostras" devido à luz estroboscópica, não geram movimento retiniano e, assim, pa. recem saltar junto com os olhos. A
o
surpreendente percepção paradoxal que você verá é o ponto luminoso voando para longe da pessoa. Nosso antigo mentor, o falecido Fergus W Campbell, fisiologista da Universidade Cambridge, descobriu uma engenhosa aplicação para esse efeito em uma boate de Londres. Ele orientou as dançarinas a usar exíguos biquínis luminosos em suas apresentações sob luz estroboscópica. Quando os espectadores movessem os olhos, eles veriam os biquínis luminosos voando tentadoramente, embora nada revelassem. A ilusão fez sucesso, além de ser perfeitamente legal, pois não havia nenhuma nudez verdadeira. Às vezes, desejamos saber se a própria ciência é assim também; cada vez que pensamos desvelar a verdade, tudo o que conseguimos é uma provocante e breve visão de algo que se transforma em outro véu. O leitor que seguiu nosso raciocínio até aqui perguntará: Quando movemos os olhos intencionalmente, os sinais "voluntários" são enviados às áreas sensoriais de movimento para cancelar o movimento de imagem-na-retina falsamente produzido. Contudo, por que o mesmo tipo de cancelamento ou subtração não ocorre quando usamos voluntariamente o dedo para mover o globo ocular? Por que não enviar sinais de "movimento do dedo" para os centros visuais de movimento? Afinal de contas, sabemos que estamos movendo o globo ocular. A resposta revela algo muito importante sobre a percepção. Embora às vezes ela pareça "in-
teligente" e possa se beneficiar imensamente do conhecimento de alto nível que armazenamos, em geral a percepção trabalha no piloto automático, porque evoluiu para fazer as coisas de modo rápido e eficiente. Embora saibamos que estamos pressionando o globo ocular, nenhum cancelamento ocorre
-
porque
diferentemente
dos cen-
tros de comando de movimento ocular
-
os centros de movimento
do dedo no cérebro simplesmente não enviam a cópia da mensagem (CC) para as áreas de sensação de movimento. Aparentemente, nossos antepassados desenvolveram conexões entre os centros de comando de movimento ocular e as áreas sensoriais visuais, porque freqüentemente movemos nossos olhos. Porém, nossos antepassados, com certeza, não andavam por aí batendo nos globos oculares com os dedos. Como conseqüência, nunca houve nenhuma pressão no processo evolutivo para modificar tais conexões. nec
Perceptual stablllty of a stroboscoplcally IIt visual fleld contalnlng self-Iumlnous obJects. D.M.MacKay,em Nature,vol.181,págs. 507-508, 15 de fevereiro de 1958. Eyeand braln: the Psychology of seelng. RichardL Gregory. Princeton University Press, 1997.
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Ilusões . ~
movels
Ao "enganar"neurôniosespecializados em detectar estímulos que se deslocam, certas imagens nos fazem perceber movimento onde ele não existe
PORVlLAYANURS. RAMACHANDRAN E DIANEROCiERS-RAMACHANDRAN
O
grande sábio e artista renascentista Leonardo da Vinci deixou um legado de pinturas que combinam deleite estético com um realismo sem igual. Ele tinha grande orgulho de sua obra, mas também reconheceu que a tela nunca poderia comunicar o sentido de movimento ou de profundidade estereoscópica - que exige que cada um dos olhos veja ao mesmo tempo imagens ligeiramente diferentes. Da Vinci reconheceu que havia limites claros para as imagens realistas que ele podia desenhar ou pintar. Cinco séculos depois, os limites para retratar profundidade na arte ainda permanecem, com exceção, é ~Iaro, de edições no estilo "olho mágico" que, por meio de múltiplos elementos semelhantes, entrelaçam as duas imagens que o cérebro capta, cada uma de um olho. Da Vinci também não poderia ter previsto o movimento Op Art dos anos 60, cujo foco principal era criar a ilusão de movimento usando imagens estáticas (verilustraçãonapág.52).Embora o mo50
.
MENTE&CÉREBRO ARMADILHAS
DA PERCEPÇÃO
vimento nunca tenha alcançado status muito elevado entre os críticos de arte, a maioria dos neurocientistas que trabalham com visão adora suas intrigantes imagens. Afinal, como imagens estáticas podem ser percebidas como movimento? O psicólogo e artista japonês Akiyoshi Kitaoka, da Universidade Ritsumeikan, em Tóquio, desenvolveu uma série de imagens chamadas "cobras girando", que são particularmente eficazes para produzir ilusão de movimento. Conforme você olha para a imagem ao lado, seu olho percebe círculos girando em direções opostas. Olhar de soslaio, isto é, usando a visão periférica, faz o movimento parecer ainda mais pronunciado. Manter o olhar fixo na imagem pode diminuir a sensação de movimento, mas mudar a posição dos olhos brevemente renova o efeito. Nessa imagem de Kitaoka, os círculos giram na direção dos segmentos coloridos que vão do preto para o azul, para o branco, para o amarelo e, de novo, para o preto. As cores, entretanto, servem apenas
Manter o olhar fixo na imagem diminui a sensação de movimento, mas uma piscada renova o efeito
para aumentar o apelo estético, pois não têm relevância para o efeito. Uma versão acromática (pág. 53) funciona igualmente bem desde que o mesmo nível de contraste da versão colorida seja preservado. Essas adoráveis ilustrações nunca deixam de intrigar homens e mulheres de qualquer idade. Mas por que essa ilusão acontece? Ninguém sabe ao certo. O que sabemos é que os estranhos arranjos baseados em contraste devem de alguma forma ativar "por engano" os neurônios que detectam movimento. Isto é, os padrões de claro e escuro enganam o sistema visual, fazendo com que se veja movimento onde nada se move. (Não se preocupe caso não veja o movimento; algumas pessoas realmente não conseguem percebê-lo e nem por isso são menos saudáveis.) Para explorar a percepção do movimento, é comum os cientistas realizarem testes com filmesmuito curtos, com no máximo dois quadros de duração.
Nesses filmes, no quadro um há uma grande matriz de pontos pretos dispostos de forma aleatória sobre um fundo cinza. Se, no quadro dois, você deslocar toda a matriz ligeiramente para a direita, verá uma porção de pontos saltando para a direita - isso ativa diversos neurônios
gem aos pesquisadores da visão que primeiro o exploraram. (A segunda pessoa foi Werner Reichardt, do Instituto Max Planck para Cibernética Biológica, em Tübingen.) Agora sabemos que esse paradoxal movimento reverso ocorre por causa de certas peculiaridades na maneira como os neurônios de detecção do movimento, chamados detectores Reichardt, operam em nossos
de detecção de movimento em paralelo. Essefenômeno, chamado movimento phi, é a base para os filmes, onde nenhum movimento "real" existe, apenas uma sucessão de fotos estáticas. Prosseguindo no mesmo experimento: se no segundo quadro você deslocar os pontos para a direita e também reverter o contraste de todos os pontos de maneira que eles fiquembrancos sobre um fundo cinza (em vez de pretos sobre cinza), verá o movimento na direção oposta - uma ilusão descoberta pelo psicólogo Stuart Anstis, hoje na Universidade da Califórnia em San Diego. Esse efeito é conhecido como phi reverso, mas prefiro chamá-lo de efeito Anstis-Reichardt, em homena-
centros visuais.
Como os neurônios de detecção de movimento são "configurados" para identificar a direção do movimento? Cada um deles recebe sinais de seu campo receptor: uma seção da retina, a camada de tecido neural que recobre internamente o fundo do globo ocular. Quando ativado, um grupo de receptores - por exemplo, no lado esquerdo do campo receptor - envia um sinal para a detecção de movimento, mas o sinal é fraco demais para ativar o neurônio que detecta movimento. Um grupo adjacente de receptores retinianos, no lado direito do campo receptor, também envia um sinal para o mesmo neurônio, mas, de novo, o sinal não é forte o suficiente.
OP ART,nos anos 60, tinha como foco principal criar ilusões de movimento
Somando
forças
Agora imagine que, entre a primeira região (esquerda) e o neurônio detector de movimento, seja inserido um "circuito de atraso". Do lado direito, nada muda. Assim, se o alvo se mover para a direita no campo receptor, a atividade da segunda região da retina irá chegar ao neurônio detector de movimento ao mesmo ~ tempo que o sinal retardado da 1
~
região esquerda. Juntos, os dois sinais irão estimular o neurônio
o de maneira adequada para que 52
MENTE&CÉREBRO
.
ARMADILHASDA PERcEPÇÃo
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ele dispare. Tal arranjo exige que os sinais sejam processados no circuito com certo atraso para garantir a especificação da direção e da velocidade. Isso, porém, é apenas parte da história. Temos de assumir também que, por alguma razão ainda não compreendida, quadros parados produzem ativação diferencial dentro do campo de recepção de movimento, o que resulta na ativação dos neurônios de movimento. O arranjo peculiar de alguns parâmetros da imagem, como contraste, em cada sub-região da mesma, pode ser crucial para a ativação "artificial" dos detectares de movimento. O resultado finalé que seu cérebro é enganado e vê movimentos onde eles não existem. Por fim, sabe-se também que imagens com certa repetição e regularidade estimulam grande número de detectares de movimento em paralelo, de forma que a impressão subjetiva é exacerbada. Um pequeno recorte desse quadro é suficiente para gerar um movimento perceptível, embora a imagem na
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íntegra produza uma ilusão bem
RECORTE
SEMCOR produz o mesmo efeito, mas com menor intensidade
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\ questão é: "Asimagens estáticas
mais pronunciada (verilustração como as serpentes girando 'enacima).Qualquer pessoa pode ganam' os neurônios detectares realizar alguns experimentos bem simples: a ilusão é mais forte com dois olhos do que com um? Quantas serpentes são necessárias para que as vejamos se contorcendo? Não se compreende totalmente como imagens estáticas criam impressões irresistíveis de movimento de uma forma quase mágica. Sabemos, no entanto, que elas ativam detectares de movimento no cérebro. Essa idéia foi testada fisiologicamente por meio da gravação da atividade de neurônios de duas áreas do cérebro de macacos: o córtex visual primário (V1),que recebe sinais da retina (depois de terem sido retransmitidos pelo tálamo), e a área temporal média (MT), na lateral do cérebro, que é especializada na visualização de movimento. (Danos à MT causam cegueira de movimento; objetos que se movem aparecem como uma sucessão de objetos estáticos, como se estivessem iluminados por uma luz estroboscópica.) A
de movimento?". A resposta inicial parece ser sim, como foi mostrado numa série de experimentos publicados em 2005 pela neurocientista RevilR. Conway, da Faculdade de Medicina da Universidade Harvard. Assim, por meio do monitoramento da atividade de neurônios detectares de movimento em animais e do estudo da percepção humana com engenhosos quadros projetados, tais como o de Kitaoka, os cientistas estão começando a entender os mecanismos cerebrais especializados na visão das coisas que se movem. Do ponto de vista evolutivo, essa capacidade tem sido um recurso de sobrevivência valioso que funciona como um sistema de aviso antecipado para atrair atenção - seja para detectar presa, predador ou companheiro (os quais se movem, diferentemente de pedras e árvores). É uma prova de como a ilusão pode abrir caminhos para a compreensão nec da realidade.
SAIBA MAIS.,
Phl movement as a subtradlon processo S. M. Anstis, em Visian Research,vol. 10, n212, págs. 1411-1430, 1970. Perceptlon of Illusory movement. A. Fraser
e K. J. Wilcox,
em Nature,vol. 281, págs. 565-566, 1979. Neural basls for a powerful statlc motlon lIIuslon. Bevil R. Conway et aI., em jaurnal af Neuroscience, vol. 25, n2 23, págs. 5651-5656,2005.
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A dança
daslistras
Buscamos padrõesparaapreenderestímulos visuais; algunsexperimentos simpleselucidam processos neurológicos complexosusadospara captaro movimentodosobjetos POR VlLAYANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
o
s primeiros psicólogos gestaltistas - entre eles Stuart Anstis da Universidade
da Califórnia, San Diego, e o falecido Hans Wallach - ficaram intrigados com aquilo que chamavam de llusão do Poste de Barbeiro
(A) (verimagem aolado).Um cilindro vertical, com listras vermelhas e brancas em espiral pintadas na superfície, que gira em um eixo maior. Em algumas regiões, o objeto também costuma ser usado em entradas de garagens de edifícios comerciais ou parques de diversões. O curioso é que mesmo que as listras estejam na verdade se movendo horizontalmente, em torno do poste, parece que elasse mexem verticalmente (àsvezes para cima, às vezes para baixo). A ilusão é uma demonstração poderosa do argumento que temos defendido repetidas vezes: a percepção não mimetiza a física. Envolve a interpretação do cérebro - derivada de uma imagem na retina localizada na região posterior do olho - para fazer um julgamento daquilo que estáacontecendo no mundo exterior. Mas o que causa a ilusão?
54
.
MENTE&CÉREBRO ARMADilHAS DA PERCEPÇÃO
Consideremos um caso mais simples: um cartão pintado com listras verticais movendo-se horizontalmente atrás de um orifício circular (B).Aqui, as margens externas do cartão listrado sãomostradas esquematicamente para deixar claro o que está acontecendo atrás do orifício. Elas não seriam visíveis, contudo, quando a apresentação real é vista. Você pode fazer esta montagem simples em casa,recortando de uma grande folha de cartolina um orifício circular, digamos, de 2,5 ou 5 em, de diâmetro. Em seguida, use uma segunda cartolina menor com listras verticais, alternando branco e vermelho, de quatro a seis listras para cada 2,5 em. Peça a alguém que mova a cartolina listrada para frente e para trás ao longo de qualquer eixo enquanto você olha as listras pelo orifício e julga a direção de movimento delas. Se a cartolina listrada for movida horizontal-
mente,então,não é nenhumasurpresa,vocêverá
g ~
que as listras parecem se mexer horizontalmente. { Mas, se as listras estivessem se movendo diagonal-
~
mente a grande velocidade, o estímulo na retina ~
nômeno explica a ilusão do poste de barbeiro. Você poderia dizer que o movimento não-ambíguo dá a dica para o cérebro e impõe que seja visto o padrão inteiro de listras se movendo (setas emC) juntamente com o comprimento do poste, quer este seja horizontal ou vertical. Podemos desafiar o sistema
o Mesmo que o estímulo visual seja ambíguo, nos esforçamos para tomá-lo claro; vemos figuras movendo-se como um 11 to do , atnda que não se mexam ll
"
seria exatamente o mesmo. De fato, existe uma "família" de vetores (isto é, movimentos direcionais) de velocidades e orientações variadas que produziriam a mesma imagem mutante na retina. Essesvetores são indicados na figura B pelas setas de diferentes comprimentos, que representam velocidade e direção. Contudo, mesmo que o próprio estímulo sejaambíguo, a percepção que temos não é: vemos listras movendo-se diagonalmente a uma velocidade maior. Ou seja, o cérebro recorre a uma espécie e "truque" para apreender o movimento.
Dentro da caixa
recem se mover verticalmente ao longo do eixo maior do orifício (como no poste de barbeiro). Por que isso acontece? Uma possível explicação seria que existe um fator adicional em operação neste caso. Perceba que mesmo que a direção (e a velocidade) na qual as listras se movem seja ambígua, as pontas (ou extremidades afiadas) das linhas vão para cima, ao longo do eixo (no caso, o cilindro do poste de barbeiro). Esse movimento pode ajudar a "desfazer" a ambigüidade da direção do movimento; as pontas "arrastam" as listras para cima, efeito que alguns pesquisadores chamam de "captura de movimento". Esse fe-
Reconsideremos agora um estímulo como o do poste de barbeiro - isto é, um no qual o orifício seja retangular e vertical e as listras tenham orientação diagonal (E). Ao tentar o mesmo experimento com esta nova montagem, você poderia esperar que a percepção-padrão fosse a mesma - de movimento perpendicular à orientação das listras. Mas não é; você não vê movimento diagonal. Pelo contrário, estas listras invariavelmente pa56
MENTE&CÉREBRO " ARMADILHAS
t t t
visual com a criação de uma montagem como aparece na figura D, onde é representado um grupo de orifícios verticais e horizontais aleatoriamente dispersos, atrás dos quais as listras estão se movendo diagonalmente. Se você se concentrar em qualquer um dos orifícios, verá listras se movendo horizontal ou verticalmente, como o esperado. Mas com um pouco de esforço, você pode se fazer ver a montagem inteira como um todo. Nesse caso, você perceberá um único e grande conjunto de listras movendo-se diagonalmente, visto através de uma cartolina opaca gigante da qual foram recortados orifícioshorizontais e verticais em locais aleatórios. Hierarquia visual Tomemos um novo exemplo. Em E, você tenderá a ver movimento de 45 graus para cima e para a direita e, em F, de 45
....
e
DA PERCEPÇÃO
\
...
como se as células estivessem integrando a saída de componentes sensíveis, empregando o algoritmo da interseção de restrições. Há um modelo alternativo
«:)
graus para baixo e para a direita, como indicam as setas. E se sobrepusermos as duas? Você as vê deslizando uma pela outra em ângulos retos? A resposta é não; veremos o xadrez se movendo horizontalmente (indicado pelasetaemG). Os pesquisadores de percepção Edward H. Adelson do Instituto de Tecnologia de Massachusetts e J. Anthony Movshon, da Universidade de Nova York, fizeram alguns experimentos interessantes para mostrar que, contrariamente à intuição ingênua, esse efeito não acontece simplesmente tirandose a média dos vetores das duas listras. Acontece por causa do
princípio que batizaram de "interseção das restrições". Cada movimento da grade é compatível com uma famíliade vetores e a região de sobreposição - onde as duas famílias se sobrepõem - é vista como a "verdadeira" direção do movimento. É intrigante que células sensíveis ao movimento nas áreas do cérebro em funcionamento no início da hierarquia visual do processamento de movimentos reajam separadamente à direção de cada grade de "movimento componente", enquanto as células em um nível superior respondam à percepção da direção global '" " do movImento do xadrez. É
à interseção de restrições. Perceba em G que, mesmo que o movimento das listras componentes seja ambíguo, as linhas estão se movendo horizontalmente sem ambigüidade. Esses pontos de cruzamento poderiam "capturar" e arrastar consigo as grades horizontalmente (analogamente ao papel das pontas afiadas no orifício vertical ou poste de barbeiro). Até agora, não existe nenhum motivo convincente para escolher um modelo em detrimento do outro; o primeiro (interseção de restrições) é matematicamente mais elegante e poderia agradar a um físico, enquanto o último (um "atalho" bagunçado) talvez fosse mais atraente para um biólogo. O padrão original do poste de barbeiro supostamente representaria sangue e bandagens, evocando uma era em que os barbeiros eram também cirurgiões. Eles mal desconfiavam que a ilusão era capaz de oferecer concepções de percepção humana do movimento tão
afiadascomo uma navalha. nec
Phenomenal coherence of movlng visual pattems. E. H. Adelson e J. A. Movshonem Nature, vol. 300, págs. 523525, 1982. Transparency and coherence In human motlon perceptlon. G. R. Stoner, T. D. Albright e V. S. Ramachandran, em Nature, vol. 344, págs.
153-155,8de março de 1990.
www.mentecerebro.com.br 57
Filtrosda
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percepçao A manipulação de imagens com algoritmos promove ilusõesvisuaissurpreendentes e também explica como nosso sistema visual decompõe o que vê em diferentes freqüências espaciais POR VILAVANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
I~
O
pintor espanhol EIGreco (1541-1614)costumava retratar em seus quadros objetos e figuras humanas alongados. Com base nisso alguns historiadores de arte sugeriram que ele era astigmático, isto é, que suas córneas eram maiscurvadas na direção horizontal que na vertical, fazendo com que a imagem na retina fosse esticada verticalmente. Essa idéia é totalmente absurda. Se fosse verdade, todos nós deveríamos desenhar o mundo de ponta-cabeça, porque a imagemretiniana é assim: a córnea a inverte, mas o cérebro processa e interpreta os estímulos que chegam à retina, de modo que vemos o mundo de cabeça para cima. Não há, no sentido literal, imagem nenhuma projetada na retina. Esse olho interior simplesmente não existe. Em vez disso, precisamos pensar nos incontáveis mecanismóS visuais que extraem informações da imagem e as processam, passo a passo, antes que essa atividade culmine na experi58
.
MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
ência perceptiva. Algumas ilusões são formidáveis para ilustrar o funcionamento do cérebro durante esse processamento. Compare os dois rostos mostrados na pág. 60. Se você olhá-Ios à distância de cerca de 30 cm, verá que a moça da direita está muito zangada, enquanto a da esquerda está tranqüila. Agora se você mover a página uns 2 metros para longe, verá que, surpreendentemente, as expressões mudam. A da esquerda sorri e a da direita está mais calma.
Como isso é possível?Parece quase mágico. Para ajudá-Io a entender, precisamos explicar como essas imagens foram construídas pelos
~ ~
~u ~
pesquisadores Philippe G. Schyns, da Uni- }
versidadede Glasgow,Escócia,e Aude Oliva,
~ o
do Instituto
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de Tecnologia
de Massachusetts.
Um retrato normal, fotográfico ou desenhado, contém variações das chamadas "freqüências espa-
~
ciais", que podem ser de dois tipos. As freqüências
.;;;;
~ o
espaciais "altas" se referem aos detalhes, aos traços finos de uma imagem. Já as freqüências espaciais "baixas" estão nas linhas largas e nas bordas embaçadas, sobretudo de objetos grandes. A maioria das imagens contém um espectro de freqüências que vão da alta à baixa, em proporções variáveis. Usando algoritmos de computador, podemos processar um retrato normal para remover seletivamentediferentes freqüências espaciais. Se removermos as altas, teremos uma imagem borrada. Este procedimento de embaçamento é chamado filtro passa-baixo, porque barra as freqüências altas (bordas precisas, linhas finas)e deixa passar as baixas. O filtro passa-alto, por sua vez, faz exatamente o contrário:
MUDANÇA DE Se você EXPRESSÃO: afastar a revista cerca de 2 metros verá que a mulher da esquerda "sorri" e a da direita parece "mais calma"
o sorriso
SÓ
é percebido quando as freqüências
H
capaz de processar os detalhes i:1~ finos; a expressão transmitida ~ d por eles esaparece e apenas as § ~
i S2
freqüênciasbaixassão expostas S e percebidas.
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dominantes; para isso é preciso olhar de soslaio para a boca da Mona Lisa MENTE&:CÉREBRO
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ge, seu sistemavisualnãoé mais ~
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b3})(3S são
60
mantém as bordas definidas e os contornos delicados e remove variações de larga escala. O resultado parece um pouco um esboço sem sombreamento. Esses tipos de imagens processadas por computador são combinadas, de maneira atípica, para criar os rostos misteriosos mostrados acima). Os pesquisadores começaram com fotografias normais de três faces, uma calma, outra brava e a terceira sorrindo. Eles filtraram cada rosto para obter tanto imagens passa-alto (contendo linhas finas e definidas) quanto passa-baixo (borradas). Depois combinaram o rosto calmo do passa-alto com a face sorridente do passa-baixo, o que resultou na imagem da esquerda. No retrato à direita, os pesquisadores
sobrepuseram o rosto carrancudo do passa-alto à expressão calma do passa-baixo. O que acontece quando os retratos são vistos de perto? E por que as expressões mudam quando você move a página para longe? Para responder essas perguntas, preciso contar mais duas coisas importantes sobre o processamento visual. Primeiro, a imagem precisa estar próxima para você ver as características mais definidas. Segundo, quando visíveis, elas "mascaram"objetos de larga escala (freqüências espaciais baixas) ou desviam a atenção deles. Assim, quando você traz a imagem para perto, as características definidas tornam-se maisvisíveis,mascarando aquelaspouco definidas. Como resultado, o rosto da direita parece nervoso, enquanto o da esquerda está relaxado. Você simplesmente não percebe as emoções opostas que as freqüências espaciais baixas transmitem. Então, ao deslocar a página mais para lon-
tO!
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h-
~~ ~ ~ ! ~
n p li I!:
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ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
o
experimento ilustra uma idéia originalmente formulada pelos cientistas Fergus Campbell
~
e]ohn Robson, da Universidade Cambridge. Eles demonstraram que informações de diferentes freqüências espaciais são para-
~
lelamente captadas por vários . "
~ I'!
receptivos são de variados ta-
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canaIs neuralS, cUJos campos
li g
S
manhos (o campo receptivo de ~ um neurônio visual é a porção da retina na qual um estímulo preci- ~ sa ser apresentado para ativá-Io). Isso também mostra que os cado da Vinci, como enigmática, nais não funcionam isolados. Ao em grande parte porque não a contrário, interagem de maneiras compreendem. Muitos deles na interessantes, por exemplo: as verdade preferem não entendêbordas definidas captadas por Ia,e resistem a qualquer tentativa pequenos campos receptivos de explicá-Ia cientificamente, mascaram as variações borradas talvez pelo receio de que esse de grande escala sinalizadas petipo de análise quebre o encanto de sua beleza. los campos receptivos maiores. Recentemente, a neurobiEnigma da Gioconda óloga Margaret Livingstone, Experimentos desse tipo remonda Universidade Harvard, fez tam ao início dos anos 60, quanobservações muito intrigando o cientista Leon Harmon tes. Ela percebeu que quando (1922-1982), dos Laboratórios olhava diretamente para a boca Reli, projetou o famoso efeito da MonaLisa(veresquema dapág. Abraham Lincoln. Harmon ao lado,painelcentral),o sorriso produziu a imagem de Lincoln não era evidente. Mas quando (verilustração nestapágina)a partir olhava para a periferia da imade uma foto comum que foigrosgem, ele voltava, e em seguida seiramente digitalizada (usando desaparecia à medida que seus olhos o focalizavam. Por causa pixels enormes). Mesmo quando do sombreamento nos cantos vista de perto, há informação suficiente nas variações de brilho da boca, o sorriso enigmático para reconhecer o presidente. só é percebido quando as freMas esses dados também são qüências espaciais baixas são mascarados por uma borda radominantes, e isso só ocorre zoavelmente definida. Quando quando você olha de soslaio você a afasta ou fecha e abre para a boca da Gioconda. os olhos, a imagem borra, perPara chegar a esta conclusão, dendo o contorno das bordas, Livingstone passou um filtro e Lincoln fica imediatamente passa-baixo(veresquema dapágina reconhecível. ao lado,painelesquerdo) e outro Filósofos e historiadores de passa-alto(nesta pág.,paineldireito) arte especializados em estética na Mona Lisa. Perceba que no com freqüência se referem à exretrato borrado (passa-baixo) o pressãodaMonaLisa,de Leonar- sorriso é mais óbvio que no ori-
I
ginal- ele pode ser visto mesmo quando se olha diretamente a boca. Já na imagem que parece um esboço (passa-alto),o sorriso não é evidente, mesmo quando se olha ao redor dele. Acombinação das imagens restaura a obra original e a natureza misteriosa de sua expressão. Agora entendemos aquilo que Da Vinci parece ter descoberto há muitos séculos e pelo qual provavelmente ficou fascinado: um retrato que parece vivo porque sua expressão fugaz, graças a peculiaridades de nosso sistema visual, hipnotiza os seres humanos há gerações. Vistos em conjunto, esses experimentos mostram que a percepção é muito mais do que o olho vê. Eles demonstram que a informação visual em freqüências diferentes pode ser extraída de uma imagem por canais neurais independentes e recombinada em estágios diferentes do processamento para criar a impressão final de uma imagem única
nasuamente.
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QUANDOVOCÊ a afasta ou fecha e abre os olhos, a imagem borra, perdendo o contorno das bordas, e Lincoln fica imediatamente reconhecível
Dr.Angry and mr. Smlle
- When
categorlzatlon flexlbly modlfles the perceptlon of faces In rapld visual presentatlons. Philippe G. Schyns e Aude Oliva, em Cognition,vol. 69, n2 3, págs.243-265,1999.
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Brincando
com~esos e
medidas
A ilusão visual confunde os centros neurais e nos faz crer que um objeto seja diferente do que realmente é; experiências simples e divertidas mostram como isso acontece
POR VlLAYANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROGERS-RAMACHANDRAN
O
grande físicoalemão Hermann von Helmholtz não apenas descobriu a primeira lei da termodinâmica (conservação de energia) como inventou o oftalmoscópio, e foi o primeiro a medir a velocidade dos impulsos nervosos. É também reconhecido como o fundador da "ciência da percepção visual humana". Com freqüência ressaltamos que, mais do que apenas ler os daqos sensoriais enviados pelos receptores, o mais simples ato de percepção requer a interpretação ativa- ouconjectura"inteligente" - do cérebro a respeito dos eventos do mundo. Na verdade, seguidamente a percepção imita aspectos dos processos de pensamento indutivo. Para enfatizar a natureza semelhante à do pensamento que a percepção tem, Von Helmholtz empregou a expressão 62
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MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
~ "inferência inconsciente". Os dados sensórios (por exemplo, uma imagem na retina no fundo do olho) são interpretados com base em seu contexto e na experiência e conhecimento de mundo do observador. O físico usou a palavra "inconsciente" porque, diferentemente de muitos aspectos do raciocínio, a percepção normalmente não requer nenhuma cogitação consciente. Em geral, ela funciona no piloto automático. Uma forte demonstração do poder profético da percepção é encontrada na ilusão tamanho-peso, ou ilusãoCharpentier-Koseleff(ver figuraA napág. à direita), que a maioriadas pessoaspode facilmente construir e usar para fascinaros amigos. Essetruque perceptual era um dos favoritos de Von Helmholtz. Para montá-Io, basta pegar dois objetos que te-
FIGURA
e
Experiência CharpentierKoseleff faz objeto maior parecer mais leve
nham formato,cor e textura semelhantes, mas tamanhos diferentes - como cilindros ocos de metal ou plástico. Esconda pesos suficientes dentro do objeto menor, de modo que o peso fique idêntico ao do objeto maior. Como os dois recipientes parecem iguais, com exceção do tamanho, os observadores irão naturalmente presumir que o maior é proporcionalmente mais pesado que o menor. Depois, é só pedir a alguém para pegá-Ios e comparar seu peso. Muito provavelmente a pessoa dirá que os objetos não têm
o mesmo peso físico. Vai insistir em dizer que o objeto maior parece mais leve. Continuará a afirmar esse fato incorreto ainda que você lhe peça para dizer o peso absoluto, não a densidade (peso por unidade de volume). Experimente você. É impressionante: embora saiba que os objetos têm o mesmo peso (afinal, você os construiu), terá a sensação de que o objeto maior é "realmente"mais leve em comparação ao menor. Como acontece com muitas ilusões, o conhecimento da realidade é
insuficiente para corrigir ou superar a percepção errônea. Nós, neurocientistas, dizemos que a percepção é imune à correção intelectual - isto é, ela é "cognitivamente impenetrável". Além disso, a informação visualsempre sobrepujaos outros sinais. A ilusão é impenetrável não apenas para o conhecimento de que os objetos pesam a mesma coisa, mas também para sinais básicos de outras fontes, tais como as informações dos receptores musculares, que lhe afirmam que o peso é o mesmo. www.mentecerebro.com.br 63
Da próxima vez que comprar uma mala de viagem, procure uma bem grande: " voce tera a sensação de que ela é mais leve
Você pode repetir o experimento muitas vezes, mas ainda assim terá
ilusão idêntica. Por que esse efeito ocorre? Quando você pega o objeto maior, espera que ele pese mais que o outro (dada a suposição de que os dois sejam feitos do mesmo material) e, por ter essa expectativa, exerce uma força maior sobre ele. No entanto, como ele tem o mesmo peso que o objeto menor (que você esperava que pesasse menos), você tem a sensação de que ele é mais leve. Fazendo uma analogia, imagine encontrar alguém que não pareça inteligente e, assim, você terá a expectativa inicial de que essa pessoa realmente não é lá muito esperta. Se ela começar a falar normalmente, vai parecer ainda mais inteligente do que a médiaI Se você "calibrar" seu
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julgamento das capacidades de uma pessoa de acordo com o que parece ser, sua "leitura" final das habilidades reais dessa pessoa - a partir de sua expressão verbal - será superestimada. FIGURA0 Embora as duas barras horizontais sejam iguais, a de cima parece maior
A ilusão tamanho-peso pode ser mais fácil de entender se utilizarmos uma ilusão visual mais familiar, a chamada ilusão
Ponzo,ou do trilho de trem (ver figura B, embaixo).Duas barras horizontais são mostradas entre duas linhasconvergentes maiores. Emboraasbarras sejamiguais,não é essa a impressão que se tem: a de cima parece maior que a de baixo. Essa constatação equivocada é um efeito visual chamado de constância do tamanho: se dois objetos de tamanho físico idêntico estiverem colocados em distâncias diferentes em relação ao observador, serão percebidos corretamente como de mesmo tamanho, embora as imagens lançadaspor elesna retina tenham dimensões diferentes.
De longe, de perto De forma bem simples, o cérebro "entende" que há uma compensação entre o tamanho da imagem formada na retina e a distância - e, na prática, conclui: "Esta imagem do objeto é pequena porque está longe, mas na verdade ele é bem maior". Para avaliar a distância, o sistema visual usa várias fontes de informação, são as "dicas" - perspectiva, paralaxe de movimento, gradientes de textura e estereopsia. E, com base nelas, aplica a correção apropriada para a distância a fim de julgar o tamanho real. Na ilusão Ponzo, no entanto, as duas barras horizontais são do mesmo tamanho físico na retina.
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E seusarmos como objetos de teste um disco e um anel do mesmo diâmetro externo (verfiguraC ao lado)e, da mesma forma que com a ilusão tamanho-peso padrão, os ajustarmos para que tenham o mesmo peso físico?É claro que, como antes, qualquer pessoa que pegar o anel vai esperar que ele ~ f pese bem menos, já que parece ~ ter um volume total menor. Mas 1 você (o experimentador, ciente da ~
ilusãotamanho-peso)preveriao
~
inverso - que o anel oco seria bem
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(como se você olhasse o trilho do trem e visse os dormentes numa
Hubbard, atualmente do Instituto Nacional Francês de Saú- ~ de e Pesquisa Médica (lnserm), ~
crescente).
Uma vez
que seu sistema visual "acredita" MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
Canecas de vidro
As linhas convergentes funcionam como um poderoso acionador para você as ler - de maneira falsa, nesse caso - como se estivessem em distâncias diferentes
distância
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que a linha de cima esteja mais longe, ele supõe que ela deva ser na verdade maior do que o tamanho que a retina indica (em relação à outra linha). Para explicar de maneira diferente: a escala de constância do tamanho permite que você note a dimensão dos objetos de maneira precisa quando percebe corretamente a distância desses objetos. Na ilusão Ponzo, no entanto, a dica de profundidade enganadora das linhas convergentes faz com que você apliqueerroneamente o algoritmo de constância, de modo que a linha de cima é vista como maior. O notável é que a ilusão ignora os sinais visuais da retina, que informam aos centros de julgamento de tamanho visual no cérebro que as duas barras têm o mesmo comprimento. Como esses mecanismos funcionam todos no piloto automático, saber que elas são idênticas não corrige a ilusão.
mais pesado que o disco sólido. ~ Porém, em colaboração com ~
o neurocientista Edward M.
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descobrimos
que, neste caso, a ~
e
FIGURA
Cérebro considera o diâmetro exterior e não o volume para inferir que figuras têm pesos iguais
pessoa não vivenciará a ilusão de tamanho-peso; ela julgará, de maneira correta, que os dois objetos pesam a mesma coisa. O cérebro pareceutilizarmeramente o diâmetro exteriorpara fazer o julgamento, e não o volume geral. Esse experimento mostra que o sistema visual não é sofisticado o suficiente para "entender" que o que importa é a massa total, e não apenas o diâmetro. Para antecipar o peso, o cérebro levaem conta outros aspectos além do tamanho. Porexemplo,se vocêpegarumacanecadecerv~a de plástico,elavai parecer excepcionalmente leve. Novamente, esse efeito ocorre porque não esperamos que ela seja feita de vidro e, portanto, pesada. A ilusão tamanho-peso original pode se mostrar absolutamente inata (não sabemos), mas com certeza a ilusão do peso da caneca de cerveja precisa ser aprendida, já que nossos ancestraishominídeos não foram expostos a canecas. Que outros insights podemos ter a partir dessa ilusão? Talvez haja uma aplicação prática. Se estamos diante de muitasescadas, esperamosnoscansarmaisrapida-
mente se corrêssemos para cima e para baixo com cargas pesadas do que se carregássemos cargas leves. O esforço físico aumenta à proporção que transportamos pesos maiores: o coração bate mais depressa, a pressão sangüínea sobe e transpiramos. Normalmente, presume-se que esse esforço extra aconteça porque os músculosconsomem maisglicose, e essa informação é enviada ao cérebro para gerar a resposta de taxa cardíaca acelerada, aumento da pressão sangüínea e suor a fim de permitir - e antecipar - o aumento do consumo de oxigênio resultante do trabalho pesado. Mas seria possível que parte dessapreparaçãoenvolvatambém o peso sentidodo objeto, enviando sinais cerebrais diretos para o corpo? Imagine correr para cima e para baixonumaescadariacarregando um objeto grande e, então, compare o grau de cansaço que você sente com aquele produzido quando leva um objeto bem menor, mas de peso idêntico ao do maior (e, portanto, com a sensação
de que essa carga é mais pesada por causa da ilusão).Será que o peso adicional sentido, em vez
do peso real, aumenta seu senso de esforço ou cansaço?Em outras palavras, a fadiga é determinada pelo esforço físicoreal? Se fosse assim, o esforço excessivo faria com que o cérebro meramente enviasse mais sinais para o coração a fimde aumentar a pressão sangüínea, a freqüência cardíaca e a oxigenação dos tecidos. Alguns trabalhos já relataram que repetidos exercícios imaginados podem aumentar a força muscular, mas ainda há pouca evidência disso. (Começamos recentemente a explorar essa área em colaboração com o neurocientista Paul McGeoch, da Universidade da Califórnia em San Diego.) No caso de constatar que o peso sentido determina quão cansado nos sentimos,da próxima vez que você comprar uma mala de viagem procure uma bem grande: assim, terá a sensaçãode que ela é mais leve, mesmo se enchê-Ia com a mesma quantidade de bagagem de sempre! As peculiaridades da percepção têm implicações teóricas profundas
-
mas também podem acarretar conseqüências práticas. ne<
The slze-welght IlIuslon, emulatlon, and the cerebellum. Edward M. Hubbard e Vilayanur S. Ramachandran, em Behavioral andBrain vol.27, págs. Sciences,
407-408,2004.
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No prumo ....
Paracalculara posiçãorelativados objetos,o cérebrousaestratégiascomplexasque comparam informaçõessensoriaisantesde decidiro que está de pé e o que estáde cabeçaparabaixo
POR VlLAYANUR S. RAMACHANDRAN E DIANE ROCERS-RAMACHANDRAN
muito difundida a idéia de que as imagens que entram por nossos olhos são projetadas de forma invertida nas retinas, o que não implica, felizmente, ver o mundo de cabeça para baixo. Muitas pessoas acreditam que essa imagem retiniana seja "girada"em alguma parte do cérebro para que enxerguemos o mundo como de fato ele é, ou seja, de cabeça para cima. Mas isso é uma falácia. Essa suposta rotação não ocorre porque simplesmente não há imagem alguma projetada na retina - tudo não passa de um padrão de impulsos nervosos que codifica algo que o cérebro interpreta como imagem, e não faz sentido girar impulsos nervosos. Deixando de lado essa armadilha que compara o olho humano ao de uma máquina fotográfica, ver as coisas de cabeça para cima envolve estratégias cerebrais muito mais complexas do que se pode imaginar e que começaram a ser estudadas na década de 70 pelo psicólogo Irvin Rock (19221995), da Universidade Rutgers em Nova Jersey, 66
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um dos pioneiros no estudo da percepção humana. Tais estratégias podem ser investigadaspor meio de algumas experiências muito simples. Em primeiro lugar, incline sua cabeça 90 graus, mantenha os olhos abertos e observe as coisas ao seu redor. Como era de esperar, os objetos não parecem ter se inclinado de repente; eles continuam na vertical. Agora, imagine virar uma mesa 90 graus, de modo que ela permaneça de lado. Você verá que ela de fato parece virada, como deveria. Nós sabemos que a percepção correta da mesa na vertical não é decorrente de alguma "memória"da posição habitual das coisas; o efeito funciona igualmente bem para esculturas abstratas em uma galeria de arte. O contexto ao redor também não é a resposta: se uma mesa luminosa fosse colocada de pé em uma sala totalmente escura e você inclinasse sua cabeça ao olhar para ela, a mesa ainda assim pareceria estar de pé. Seu cérebro descobre qual é o lado de cima das coisas porque recebe informações de feedback
.J enviadas pelo sistema vestibular - que é localizado dentro do ouvido e registra a todo momento o grau de rotação da cabeça até as áreas visuais. Em outras palavras, o cérebro leva em conta a rotação da cabeça para interpretar a orientação da mesa.
A expressão "leva em conta" é muito mais precisa do que dizer que o cérebro "gira"a imagem inclinada da mesa. Não há imagem no cérebro que possa ser "girada", e mesmo se houvesse, quem seria a "pessoinha"no cérebro olhando para a imagem invertida? Daqui para frente, usarei "reinterpretar" ou "corrigir" em vez de "girar". Embora não sejam termos
totalmente precisos, servem de atalho e evitam equívocos. Há limites definidos para a correção vestibular. Um texto impresso, como esta revista, por exemplo, torna-se muito difícil de ler se estiver de cabeça para baixo. Virea revista agora mesmo para conferir. Segure-a do lado certo de novo, curve o corpo e olhe-a por entre as pernas - de forma que sua cabeça e a revista fiquem de cabeça para baixo em relação ao mundo. A página continua difícilde ler,mesmo que o sistema vestibular lhe informe claramente que o texto está virado para cima em comparação com a orientação da sua cabeça. Do ponto de vista perceptivo, as letras são muito detalhadas para
serem auxiliadas pela correção
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vestibular,mesmoque a orienta- E ção geral da página sejacorrigida ~:! para estar voltada para cima. i Examinemos esses fenômenos mais de perto. Observe o <0 ~ quadrado da figura A, (verpág. 68).Gire-o 45 graus e você verá um losango. Mas, se inclinar a cabeça 45 graus, o quadrado continua parecendo um quadrado - mesmo que na sua retina eleseja um losangoja correção vestibular está em ação de novo. Agora considere os dois 10sangos vermelhos centrais mais abaixo, na mesma figura. Em B o losango parece um losango e em C,um quadrado, mesmo que a sua cabeça permaneça ereta, situação para a qual a correção
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Bush, na pág. ao lado. Trata-se, na verdade, de uma variante da ilusão de óptica criada pelo psicólogo Peter Thompson, da Universidade de York,Reino Unido, com a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher. Você não notará nada diferente entre as duas fotos se ambas estiverem vestibular não é necessária. Essa Quadrado ou losango: percepção da forma vermelha é influenciada pela correção vestibular.Figura D: as faces inclinadas sugerem que o efeito do "contexto" é enganoso. Figura E:A forma vermelha é ambígua, dependendo de como a percebemos em relação às linhas adjacentes. Figura F: é difícil saber qual face está zangada ou sorridente, até que se gire a imagem 180 graus
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simples demonstração mostra os efeitos poderosos do eixo geral da "grande" figura, que engloba os pequenos quadrados (ou losangos).Seria enganoso chamar esse efeito de "contexto" porque na figura D acima, com cinco faces inclinadas 45 graus, o quadrado central continua parecendo um quadrado, embora talvez menos que quando isolado. Também é possível testar os efeitos da atenção visual. Os losangos da figura E, acima, formam uma combinação. Neste caso, a forma vermelha central é ambígua. Se você prestar atenção na coluna vertical, a forma vermelha parece um losango; mas se percebê-Ia como integrante da linha oblíqua, ela se assemelha a um quadrado. Mais interessante ainda é a ilusãode óptica com o presidente dos Estados Unidos George W.
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DA PERCEPÇÃO
de cabeça para baixo.No entanto, se as girar 180 graus, perceberá imediatamente como uma delas foi grotescamente adulterada. Como explicar esse efeito? TrclC\):'o> oasicos Apesar de haver certa unidade nos processos perceptivos, o cérebro sempre analisa as imagens por etapas. Nesse caso, a percepção de um rosto depende em grande medida das posições relativas dos principais traços fisionômicos:olhos, nariz e boca. A face de Bush,mesmo invertida, é percebida como face, assim como uma cadeira de cabeça para baixo é identificada rapidamente como cadeira. Em contraste, a expressão transmitida por características secundárias depende exclusivamente da orientação delas (cantos da boca virados para baixo, distorção das sobrancelhas), independentemente
000 03 da orientação geral percebida da cabeça, isto é, o "contexto". O cérebro não é capaz de fazer a correção dos traços fisionômicos; eles não são reinterpretados de forma correta como ocorre com a imagem geral do rosto. O reconhecimento de certas características, como os cantos da boca e as sobrancelhas, é algo muito primitivo na escala evolutiva; talvez a habilidade computacional exigida para a reinterpretação simplesmente não tenha evoluído neste caso. Para o reconhecimento global do rosto apenas como rosto, por outro lado, o sistema pode ser mais "tolerante" com o tempo computacional extra exigido. Essa teoria explicaria por que o segundo rosto parece normal em vez de deformado; as feições são dominantes até que ele seja invertido. O mesmo efeito é demonstrado de modo muito simplesnas carinhas acima. De cabeça para baixo não é muito fácilsaber qual está feliz ou zangada, ainda que você as reconheça como rostos. (Pode-se deduzir pela lógica qual é o sorridente e qual está carrancudo, mas isso não é resultado de percepção.) Gire a revista
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180 graus e as expressões serão reconhecidas facilmente. Por fim, se você se inclinar e olhar as duas fotos de Bush por entre as pernas, as expressõesvão se tornar surpreendentemente claras, ainda que as faces continuem invertidas. Esse efeito é decorrente da correção vestibular aplicada de forma seletiva ao rosto, mas sem afetar a percepção das feições (que agora estão de cabeça para cima na retina). Independentemente da correção vestibular, o que conta é a forma dos traços na retina e as coordenadas "emsintoniacom o mundo" que tais correções permitem ao cérebro calcular. Movimento ignorado A correção vestibular também não ocorre quando percebemos forma e profundidade com base em pistas fornecidas pelo sombreamento. Ao lado, você vê uma série de "ovos"convexos espalhados por cavidades. Os centros cerebrais envolvidos na computação de sombreados tomam por regra que o Sol em geral brilha de cima, portanto as saliências seriam claras no topo e as áreas côncavas, claras embaixo. Se você gira a página, os ovos e as cavidades trocam de lugar instantaneamente.
É possível verificar esse efeito ao repetir a experiência de olhar por entre as pernas enquanto a página está de cabeça para cima (em relação à força da gravidade). Uma vez mais, os ovos e as cavidades trocam de lugar. Mesmo que o mundo como um todo pareça normal e de cabeça para cima (por causa da correção vestibular), os módulos do cérebro que extraem as formas com base nas premissas sobre os sombreados não são capazes de usar a correção vestibular. Esse fenômeno faz sentido do ponto de vista evolutivo porque em geral não se anda por aí de cabeça para baixo - de formaque é possível evitar o cálculo extra de corrigir a inclinação da cabeça toda vez que se interpretam imagens sombreadas. Como resultado, sua maquinaria perceptiva não tem sintonia fina perfeita, mas é confiável estatisticamente, além de freqüente e rápida o suficiente para permitir que você produza resultados, mesmo se a adoção de tais "atalhos" tornar o sistema falível vez por outra. A percepção é confiável, mas não infalível; é uma "caixinha de surpresas". Um último ponto: da próxima vez que se deitar na grama, ob-
~ ~ ~ ~~
~ ~
serve as pessoas andando ao seu redor. Parece que elas estão de pé e andam normalmente, claro. Mas agora olhe enquanto você estiver de cabeça para baixo. Se você pratica ioga, pode tentar a posição do cachorro olhando para baixo. Ou apenas deite de lado com uma orelha no chão. As
FIGURA ~ PARJ\ O CE.PIBRO,a luz vem sempre de cima, por isso os círculos côncavos e convexos trocam de lugar instantaneamente quando a imagem é vista de cabeça para baixo
pessoas ainda vão parecer de pé, como esperado, mas de repente você asverá balançando para cima e parabaixoenquanto andam.Esse movimento fica claro instantaneamente porque, após anos vendo as pessoas de pé, você aprendeu a ignorar a fIutuação para cima e para baixo de cabeça e ombros. Uma vez mais,ofeedback vestibular não consegue fazer a correção da
APARENTEMENTE IDENTICOS, os retratos bem distintos se vistos ao contrário
de Bush (acima) se revelam
cabeça balançando, mesmo que forneça correção suficiente para permitir a visão das pessoas de pé. Você pode estar confuso com tantos giros e inversões para entender tudo isso, mas no fim perceberá
que valeu o esforço.
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Orientatlon and tono. Irvin Rock. Academic Press, 1973. Margaret Thatcher: a new lIIuslon. Peter Thompson, em Perception,vol. 9, págs. 483-484, 1980.
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Utilizamosrecursosneurológicossofisticados para processarinformaçõessobrea cor e o brilhodosobjetos- mas nem sempre nossas conclusõesseguemas leisda física PORVlLAYANURS. RAMACHANDRAN E DIANEROGERS-RAMACHANDRAN
A
capacidade
humana
de perceber
cenas e
imagens sem esforço depende da organização .nteligentedosconhecimentosquetemossobre o mundo. Mas quão "esperto" é nosso sistema visual? Qual é seu QI? Ele trabalha, por exemplo, segundo as leis da física? Usa apenas a lógica indutiva (como muitos especialistas suspeitam) ou também pode fazer deduções? Como lida com paradoxos, conflitos ou informação incompleta? Quão adaptável ele é? Um insight da inteligência perceptual vem do estudo sobre transparências, um fenômeno explorado pelo psicólogo da Gestalt Fabio Metelli
(1907-1987). Ele chamou a atenção para o fato de que ilusões convincentes de transparência podem ser produzidaspelo uso de displaysrelativamentesimples. A palavra "transparência", porém, em geral é usada de forma vaga. Por vezes se refere a ver um objeto, como uma lente de óculos de sol; outras vezes, significa a possibilidade de ver algo através de vidro fosco, um fenômeno conhecido como translucência. Neste artigo vamos nos ater ao primeiro. Vamos considerar primeiro a física da transparência. Se você colocar um filtro retangular de densidade
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neutra, digamos óculos escuros, sobre uma folha de papel branco, esse filtro permitirá a passagem de apenas certa proporção de luz - por exemplo, 50%. Colocado de outra forma, se o papel tem brilho, ou luminância, de 100 candelas (cd) pormetro quadrado, a porção coberta pelo filtro terá luminância de 50 cd. Se você então colocar outro filtro, de maneira que ele parcialmente se sobreponha ao primeiro, a região de sobreposição receberá metade dos 50% originais de luz - ou'seja, 25%. A relação é sempre multiplicativa. Isso basta, no que se refere à física. E a percepção? Se, como em a (verPág.72),você tem apenas uma figura geométrica escura no meio de um quadrado claro (o primeiro com 50 cd e o segundo com 100 cd), o
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quadrado de dentro pode ser ou um filtro que corta a luz em 50%, ou uma forma escura que reflete apenas
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50% da luz incidente no ambiente circundante. Sem
~
informação
adicional,
não há meio de o sistema visual
saber qual condição existe - pelo fato de o último caso
ser de longe o maiscomum na natureza, isto é, o que estamos maisacostumadosa ver. Mas agora considere dois retângulos que formam
uma cruz com uma região sobreposta no meio (ver
; ~
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~ ~
zo ~
~
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pág. 72). Neste caso é concebível - e até mais provável - que essa configuração realmente consista em mais de duas peças retangulares sobrepostas do que de cinco blocos arranjados para formar uma cruz. Mas, se for o primeiro caso, o coeficiente de luminância deve ser tal que o quadrado cen-
o
tral (a região de sobreposição) seja mais escuro que os outros quadrados e, evidentemente, mais escuro que o fundo. Em particular, a luminância do quadrado central deveria ser uma função multiplicadora em relação aos dois filtros. Se as regiões não-superpostas dos dois retângulos representam, por exemplo, respectivamente 66% e 50% do fundo, o quadrado interno portanto deve ter 50% desses 66%, ou aproximadamente 33% (ou seja, 33 cd, considerando que o papel tenha tOOcd). Agora a questão é: o sistema vi-
.
de displays (B, C e D) nos quais o fundo e os retângulos tenham luminância fixa (tais como t 00 e 50 cd, respectivamente), enquanto mudamos apenas a luminância do quadrado interior. Em termos de luminância que existia com a transparência física, o quadrado interno deve ser escuro demais (B), apropriadamente escuro (C) ou claro demais (D). Se você olhar para essas figuras sem saber nada de física, verá os retângulos como transparentes em c, mas não em B e D. É quase como se seu sistema visual soubesse o que você não sabe (ou não sabia até ler este artigo). Esse experimento sugere que duas condições têm de ser preenchidas para que a transparência seja vista. Primeiro, deve haver uma complexidade da figura e uma segmentação que justifiquem essa interpretação (e daí a nãotransparência em A). Segundo, os coeficientes de luminância têm de ser corretos (nenhuma transparência é visível em B e D). As transparências são bem menos freqüentes que as sombras.
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00 «»
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sual tem um "conhecimento tácito" de todos esses fatores? Podemos descobrir utilizando uma série
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o
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É possívelque as "leis"da percepção que exploramos até agora tenham evoluído principalmente para lidar com as sombras e distingui-Ias de objetos "reais",que também produziriam diferenças de luminância na cena visual como resultado de diferenças na reflexão da luz (por exemplo, as listrasda zebra ou um gato branco em uma colcha negra). A sombra projetada por um objeto como uma árvore poderia, pelo menos em teoria, ser totalmente escura se houvesse uma única fonte de luz distante, sem dispersão ou reflexos.Comumente, no entanto, a luz ambiente do entorno cai sobre a sombra, de modo que resulta uma sombra escura,masnão negra.Se a sombra da árvore recai sobre uma calçada e uma grama mais escura (E), a maneira pela qual a magnitudee o sinalde luminânciavariam ao longo dasbordas da sombraé idêntica em ambos os lados, o da sombra e o da luz. Essa co-variação da luminância indica ao cérebro que se trata de uma sombra,não de um objeto, ou de uma textura. Acontece que as mudançasde brilho na transparência "imitam"
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compatíveis com o que ocorreria com as superfícies traJlslúcidas ver-
o aquelas que são vistas nas sombras. O sistema visual pode ter evoluído para descobrir e reagir apropriadamente às sombras, mais que a filtros transparentes. Se isso não tivesse ocorrido, você poderia tentar agarrar uma sombra, ou cautelosamente pulá-Ia, para evitar tropeçar, não percebendo de jeito nenhum que aquilo não era um objeto. O interessante é que, embora nossos mecanismos de percepção pareçam conscientes da física da transparência relativa à luminância, de forma geral, eles parecem cegos às leis relativas à transparência específica da cor. Em F e G, temos
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duas barras que cruzam, ambas com luminânciade, digamos,50% do fundo. Nós as projetamos para que em G a região de superposição tenha 25% da luminância do fundo, como deveria ser se estivés-
semos apenas lidando com pro-
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priedade. Mas, se as cores dos dois & filtros fossem diferentes - como de i'! ~ fato são -, a zona de superposição
r deveria ser totalmente negra, e f
~
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não cinza. A razão para isso é que
~ o filtrovermelho transmite apenas .~ comprimentosde onda longos(ver~ melhos) quando a luz o atravessa,e "i
~
o filtro azul transmite apenas comprimentos de onda curtos (azuis).
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Então,se você cruzar os filtros,
dadeiras (por exemplo, névoa em vidro fosco). O efeito será ainda maisimpressionantesehouver um componente cromático (K). Assim, mesmo que o sistema
o nenhumaluz
atravessará - a zona
de superposição seria, portanto, negra. Na verdade, a transparência é percebida não quando a zona do meio é negra, mas quando é de 25% (G). Aparentemente, o sistema visual continua a seguir a regra da luminância e ignora as incompatibilidades de cor. Um efeito curioso ocorre se você colocar uma cruz cinza sobre um fundo branco com o meio da cruz tendo um tom de cinza mais leve. Em vez de reconhecer a cruz mais clara pelo que ela é, o cérebro prefere "vê-Ia" como se fosse um pedaço circular de vidro tingido ou de um pergaminho superposto sobre a cruz cinza maior. Para conseguir essa percepção, o sistema nelVoso tem de "alucinar" uma área de um vidro fosco ilusório na porção que cerca a região central da cruz. E o efeito será especialmente convincente se você tiver um conjunto de cruzes como a que aparece na figura i. Mais uma vez, o coeficiente de luminância entre o entorno
(branco),a cruz (cinzaescuro)e a região central (cinza claro) tem de ser correto para que o efeito ocorra - se estiver incorreto, o efeito desaparecerá (1). Em outras palavras, os coeficientes devem ser
visual "não saiba"sobre a subtração de cores, se os coeficientes de luminância forem corretos, as cores serão reconhecidas juntamente com o espalhamento da luminância.
Da frente para o fundo Outro fenômeno intrigante, proposto pelo psicólogo italiano Caetano Kaniza, pode ser visto em I: o efeito do queijo suíço. Se olhar para ele casualmente, você verá um largo retângulo opaco com buracos superpostos por um retângulo cinza menor sobre um fundo negro. Mas, com algum esforço mental, pode-se começar a imaginar o retângulo cinzaclaro por trás dos buracos como na verdade um retângulo branco translúcido em frente dos buracos, e começar daí a perceber um retângulo transparente, atravésdo qual se enxergam manchas negras no fundo. Essailusãodemonstra o efeito profundo das influências"da frente para o fundo"na percepção de superfícies- o que se vê não é totalmente dirigidodo fundo para a frente, por meio de um processo hierárquico serial processado na entrada físicada retina. Tomadascoletivamente, essas demonstrações nos permitem concluir que no processo visual
Sistema visual evoluiu para . " reagIras variações de luz; por isso percebemos as sombras e não tentamos puláIas, para evitar tropeçar
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A realidade dos contornos ilusórios
As células ficam II 11 f atigada s com
o olhar firme " e continuo, que as toma hiperativas; então, um novo grupo celular é recrutado para o IItrabalho"
Os computadores podem fazer cálculos a uma assombrosa velocidade, mas não são páreo para a misteriosa capacidade do sistema visual humano de montar um quadro coerente a partir de fragmentos ambíguos de uma imagem. O sistema nervoso parece acertar sem nenhum esforço a interpretação correta, utilizando o conhecimento embutido nas estatísticas para eliminar as soluções improváveis. Esse aspecto "solucionador" de problemas da percepção é admiravelmente ilustrado pelo famoso retângulo ilusório do psicólogo italiano Gaetano Kanizsa e do neuropsicólogo Richard l. Gregory, ambos da Universidade de Bristol, na Inglaterra. O cérebro considera altamente improvável que algum cientista malicioso tenha deliberadamente alinhado quatro peças (chamadas
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pac-men) desta maneira e, pelo contrário, interpreta parcimoniosamente que é um retângulo branco opaco cobrindo parcialmente quatro discos pretos em segundo plano. O impressionante é que até preenchemos, ou "alucinamos", as bordas do retângulo-fantasma. O principal objetivo da visão, ao que parece, é segmentar a cena e descobrir os limites dos objetos para que seja possível identificá-Ios e reagir a eles. Ora, poderíamos pensar que a mera presença de bordas bastaria para o cérebro "preencher" o vazio, mas b derruba este argumento. Ao compararmos a ausência dos contornos ilusórios em b com sua presença em a, concluímos que a pista crucial é a oclusão implícita.
Em c e d, sobrepomos a em um fundo de tijolos. Percebamos que, em d, os contornos ilusórios desaparecem. O cérebro percebe que um retângulo deve ser opaco para ocluir os quatro discos pretos. Mas se for opaco, como os tijolos podem ser vistos através dele? Portanto, o cérebro rejeita essa percepção. Em c, os tijolos são alinhados para que as bordas coincidam com as bordas das peças. O retângulo ocluso volta a emergir; de fato, é realmente mais vívido que o contorno ilusório por si só. Quando várias fontes de informações sobre uma borda (neste caso, os lados definidos pela luminância dos tijolos e os ilusórios implícitos pela oclusão) coincidem espacialmente, o cérebro considera esta
concomitância uma evidência contundente de que a borda é real. Como, então, explicamos o desaparecimento do retângulo ilusório em e
-
que poderia
ser inter-
pretado logicamente com um retângulo texturizado ocluindo quatro discos cinza no segundo plano? Para entender esta anomalia, precisamos recorrer a uma explicação por meio de máquina (hardware)em vez de por meio de "programa" ("software"). Perceba que equiparamos a luminância média da textura àquela das peças. Os neurônios do cérebro que extraem as bordas ilusórias podem identificar apenas aquelas bordas definidas por diferenças na incidência da luz, por causa do modo como os neurônios evoluíram. Por serem peças da exposição definidas por uma diferença de granulação, não de luminância, não se vêem contornos ilusórios, mesmo que a lógica da situação determine que eles devessem ser vistos. Em f, sobrepomos um círculo ilusório sobre um simples gradiente de luminância. É intrigante que a região encerrada pelo círculo pareça se avolumar diretamente em nossa direção, especialmente se apertarmos os olhos para borrar ligeiramente a imagem. O cérebro deduz que o gradiente deve ter se originado de uma superfície curva iluminada de cima para baixo, e o círculo ilusório interage com esta impressão para produzir a interpretação final de uma esfera. Contudo, se
.. sobrepusermos um círculo "real", fino e de contorno preto, feito de uma borda real baseada em luminân-
8
t.
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cia, não surgirá nenhuma protuberância. Este achado leva ao aforismo paradoxal
que inventamos para irritar os filósofos - a saber, que os contornos ilusórios parecem mais reais que os reais. Tais bordas podem surgir no cenário visual por vários motivos- a presença de uma sombra, por exemplo, ou de listras de uma zebra. Não precisam necessariamente implicar limites de objeto. Em 1961 os neurobiólogos DavidH.Hubele Torsten N. Wiesel, ambos então na Universidade Harvard, descobriramo alfabetobásicoda visão (mais tarde, dividiram um Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina por seus esforços de entender o processamento de informações no sistemavisual);neurônios individuais da área 17 e da área 18 (do lobo occipital) disparam somente quando linhas de uma determinada orientação são exibidas num local específico da tela (o "campo receptivo"). Muitos deles reagirão somente a uma linha de um comprimento específico
- se ela for
mais longa, interromperão os disparos (end-stoppedcells,
,.
células interrompidas pela extremidade). O neurofi-
-
linha e assim, realmente, as
tar ou aceitar os contornos,
células reagiriam aos contornos ilusórios.
dependendo da coerência global da cena.
um de nós,
po-
rém, só pode demonstrar
-
a existência de tais células no próprio cérebro. Se você olhar fixa e continuamente no ponto vermelho à direita em c, perceberá que, depois de alguns segundos, o retânguio ilusório desaparecerá gradualmente, mesmo que você ainda enxergue os tijolos e os pac-men.As células sinalizadoras das bordas ilusóriasficam"fatigadas" com o olhar firme e contínuo, o que as tornas hiperativadas e esgota seus neurotransmissores químicos. Se você moveros olhos,elas reaparecerão porque será recrutado um novo grupo celular.Aparentemente, essas célulasde contorno ilusóriose fatigam maisfacilmente que aquelas sinalizadoras das bordas reais dos tijolos e das peças. Nas imagens mais comple-
oclusão implícita que estivesse efetivamente retalhando a
Cada
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xas, as células nos estágios iniciais do processamento visual podem sinalizar bordas ilusórias, mas a modulação de cima para baixo baseada na atenção visual pode rejei-
siologista Rudiger von der Heydt, da Universidade Johns Hopkins, sugeriu que elas estivessem sinalizando uma
.
- Tradução de Verade Paula Assis
.
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se encontram ligados um grau impressionante de "sabedoria" sobre as estatísticas, e leis físicas
da transparência, por meio de uma combinação de seleção natural e aprendizado. Mas há limites para essa sabedoria. O sistemavisualparecenão tolerar cores incompatíveis.É incapaz de aplicar a físicada subtração de
cores,em parteporquea capacidade de perceber matizes evoluiu
muito depois do aparato visual em primatase não se estruturou adequadamente, em parte porque
no domínioda luminância,a sobreposição de cor é muito menos
comumno mundo naturalque a transparência e a translucência. Podemos concluir que mesmo
que o sistemavisualpossafazer uso sofisticadode tais proprieQ
z
dades abstratas, como os coeficientes da física da luminância
z< u e as estatísticas de segmentação ... requeri das pela transparência, ele < u é "burro" no que se refere a outras iA:
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características, como a cor, por
ij VI causa da maneira fortuita pela qual ... Q
VI
seu hardware
(ou sua "imprecisão")
.g < evoluiu por meio da seleção natural- uma forte evidência contra o VI ;;;) "
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projeto
inteligente".
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lhe perceptlon of transparency. Fabio Metelli,em Sdentific
American, vol. 230, rPI4,
págs.90-98,1974.
Pen:eptlon of Iransparency In statlonary and movlng Images. D. J. Plummer e V. S. Ramachandran, em Spatial Vision,vol. 7, págs. 113-123, 1993.
www.mentecerebro.com.br
75
Cores ilusórias Experimentos que envolvem percepções visuais sugerem que a noção de cor está associada às formas e à profundidade; os diferentes tons são sensações criadas pelo cérebro POR JOHN S. WERNER, BAlNCIO PlNNA E LOTHAR SPlLLMANN Wemer é Ph.D. em psicologia,
e professor
da Universidade
da
Callfómia em Davls. Pinna é professor da Universidade de Sassari na Itália. Spillmann é coordenador do Laboratório de Pslcofísica Visual da Universidade
de Freiburg,
Alemanha.
mportantes informações são perdidas quando se vê o mundo em preto-e-branco. As cores não apenas nos permitem enxergar o mundo com mais precisão, mas também criam qualidades emergentes que não existiriam sem elas. A fotografia da página 78, por exemplo, revela folhas de outono nas plácidas águas de uma fonte,juntamente com reflexos de árvores e um céu vespertino azul-escuro atrás delas. Na mesma cena vista em preto-e-branco, as folhas se destacam menos, os reflexos de luz são fracos, a água é quase invisível e a diferença aparente de profundidade entre o céu, as árvores e as f<;llhasboiando não existe mais. Ainda sim, esse papel que as cores exercem e mesmo sua verdadeira natureza não são bem reco-
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nhecidos. Muitas pessoas acreditam que a cor é uma propriedade definidora e essencial dos objetos, que depende inteiramente dos comprimentos de onda de luz específicos que são refletidos deles. Mas essa crença é equivocada. A cor é uma sensação 76
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MENTE&CÉREBRO ARMADIlHAS DA PERCEPÇÃO
criada pelo cérebro. Se as cores que percebemos dependessem apenas do comprimento de onda da luz refletida, a cor de um objeto pareceria mudar drasticamente com variações de iluminação, com névoa, fumaça e luz de fundo. Pelo contrário, os padrões de atividade no cérebro mantêm a cor de um objeto relativamente estável,apesar de variações no seu ambiente. Muitos pesquisadores que estudam a visão sustentam que a cor meramente nos auxilia na discriminação de objetos, quando diferenças no brilho são insuficientes para tal tarefa. Alguns vão ainda mais longe e dizem que a cor é um luxo, e não realmente uma necessidade: afinal de contas,
pessoascompletamentedaltônicase muitasespé- o cies de animaisparecem se dar bem sem o grau ~ de percepção de cor que a maioriados humanos ~ tem. A via de reações cerebrais responsável pela 1 navegação e movimento, por exemplo, é essencial- 2 mente insensível às cores. Pessoas que deixam de :
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FOLHAS DE OUTONO E REFLEXOS em uma
enxergar cores após um acidente vascular cerebral parecem ter, fora esse problema, percepção visual normal. Tais observações têm sido usadas para defender a idéia de que o processamento das cores tem natureza insular
fonte revelam a riqueza de informações transmitidas pelas cores. Muitos detalhes desaparecem na versão em preto-ebranco da foto
e não auxilia na percepção de características visuais como profundidade e forma - ou seja, que as cores têm a ver apenas com matiz, saturação e brilho. Mas o estudo das cores ilusórias - que o cérebro é induzido a enxergar - demonstra que o processamento de cores no cérebro está atrelado ao processamento de outras propriedades, tais como formas e bordas. Por dez anos, tentamos compreender como as cores influenciam a percepção de outras propriedades dos objetos. Para isso, testamos uma série de novas ilusões, muitas delas criadas por nós. Elas têm nos ajudado a entender como o processamento neural de cores resulta em propriedades emergentes envolvendo formas e bordas. Antes de começar nossa discussão sobre essas
78
MENTE&:CÉREBRO
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ARMADilHAS DA PERCEPÇÃO
ilusões, entretanto, precisamos relembrar como o sistema visual humano processa as cores. A percepção visual começa com a absorção de luz - mais precisamente, a absorção de pacotes discretos de energia chamados fótons - pelos cones e bastonetes localizados na retina (verquadronapág.80).Os cones são usados para a visão diurna; os bastonetes são responsáveis pela visão noturna. Um fotorreceptor do tipo cone responde de acordo com o número de fótons que captura, e sua resposta é transmitida a dois tipos diferentes de neurônios, as chamadas células bipolares oneoff(palavras em inglês para ligado e desligado, respectivamente). Essesneurônios, por sua vez, fornecem input para células ganglionares on e off, que se encontram lado a lado na retina. As células ganglionares possuem os chamados campos receptores centro-periferia (em inglês, center-surround). O campo receptor de qualquer neurônio relacionado à visão é a área de
espaço no mundo físico que influencia a atividade desse neurônio. Um neurônio com um campo receptor centro-periferia responde de maneiras diferentes dependendo da quantidade relativa de luz no centro do campo e na região em volta do centro. Uma célula ganglionar on dispara intensamente (com freqüência mais alta) quando o centro é mais claro que a periferia, e fracamente quando o campo receptor é uniformemente iluminado. Células offse comportam da maneira oposta: respondem quando o centro é mais escuro que a periferia, e quase não disparam quando o centro e a periferia são uniformes. Esse antagonismo entre o centro e a periferia significa que as células ganglionares respondem ao contraste, e dessa maneira refinam a resposta do cérebro a margens e bordas. Os axônios das células ganglionares (fibras)transmitem seus sinais para o cérebro, especificamente para o núcleo geniculado lateral do tálamo (próximo ao
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centro do cérebro), e daí para o córtex visual (na parte de trás do cérebro). Diferentes populações de células ganglionares são sensíveis a atributos distintos dos estímulos visuais, tais como movimento e forma, e suas fibras conduzem os sinais com velocidades diferentes. Os sinais de cor, por exemplo, são levados pelas fibras mais lentas. Acredita-se que cerca de 40% ou mais do cérebro humano esteja envolvido no processamento de estímulos visuais. Nas áreas estimuladas no princípio do processamento visual (partes do córtex visual chamadas VI, V2 e V3), os neurônios são organizados em mapas que fornecem uma representação ponto a ponto do campo visual.
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Daí,ossinaisvisuaissedispersam
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o EFEITO AQUARElA
mostra a importância das cores na definição da extensão e forma de uma figura. O mapa do mar Mediterrâneo se destaca quando a tinta que anteriormente se espalhava pelo mar (acima) passa a cobrir a área do continente
interconectadaspor maisde 300 circuitos. Cada uma dessas áreas
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tem funções especializadas, como o processamentode cor,
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o efeito aquarela Um dos nossos primeiros experimentos com cor ilusória ilustra a importância das cores
para delinear a extensão e a forma de uma figura. Sob certas condições, a cor percebida muda em resposta à cor circundante; ela pode tornar-se mais distinta (o que é chamado contraste) ou mais semelhante (o que é chamado assimilação).O espalhamento de cores semelhantes (sensação de que uma cor se espalha por uma área maior do que a que ela realmente ocupa) já tinha sido notado em distâncias pequenas, em concordância com o achado de que a maior parte das conexões entre neurônios visuais no cérebro tem um alcance relativamente curto. Assim, ficamos surpresos ao descobrir que quando uma área sem cor é encerrada por duas linhas limitantes de cores diferentes - com a linha interna mais clara que a externa - a cor da linha interna parece se espalhar e preencher o espaço adjacente, mesmo através de distâncias bastante longas (ver ilustração nesta pág.). Porque a cor percebida como espalhada se assemelha a um véu
para mais de 30 áreas diferentes,
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uma qualidade perceptual. De alguma maneira, no final todas essas informações são combinadas numa percepção unitária de um objeto com cor e forma particulares. Os neurocientistas ainda não entendem com detalhes como isso acontece. É interessante notar que danos bilaterais a determinadas áreas visuais levam a déficits na percepção de forma e cor, o que fornece ainda mais evidências de que a cor não é desincorporada das outras propriedades de um objeto. A mistura dos sinais de cores no cérebro com sinais contendo informações sobre a forma dos objetos pode resultar em percepções que uma análise dos comprimentos de onda refletidos desses objetos não prevê que ocorram. As ilusões que utilizamos demonstram isso claramente.
movimento,
profundidade
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~ forma, embora nenhuma delas
~ seja
a mediadora exclusiva de www.mentecerebro.com.br
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Experimentos com macacos
diáfano, como o que é visto em algumas pinturas com aquarela, demos a essa ilusão o nome de efeito aquarela. Descobrimos que o espalhamento requer que os dois contornos sejam contíguos, de maneira que a cor mais escura possa agir como uma barreira que confina o espalhamento da cor mais clara ao interior, ao mesmo tempo que impede que essa se espalhe para o exterior. A figura definida pela aquarela ilusória parece densa e levemente elevada. Quando as cores do contorno duplo são invertidas, a mesma região parece levemente afastada, e com uma fria cor branca. O efeito aquarela define o que se torna figura e o que se torna fundo mais claramente que as propriedades descobertas
mostram que metade dos neurônios do córtex visual responde à direção do contraste; essas células têm o papel de perceber profundidade e distinguir figura e fundo
pelos psicólogos da Gestalt na virada do século XX, tais como proximidade, boa continuidade, fechamento, simetria e assim por diante. O lado do contorno duplo que tem a cor mais clara preenche o interior com a aquarela, e é percebido como figura, enquanto o lado que tem a cor mais escura é percebido como fundo. Assim, essa assimetria eliminaambigüidades na percepção de uma figura. O fenômeno é reminiscente da noção de Edgar Rubin, um dos pioneiros da pesquisa sobre figura-fundo, de que a borda pertence à figura, e não ao fundo. Uma explicação neurológica possível para a ilusão da aquarela é que a combinação de um contorno mais claro ladeado por um contorno mais escuro (sobre um
Como o cérebro percebe as cores A percepção das cores começa com a absorção de luz por células chamadas cones, localizadas na retina. A resposta dos cones é transmitida para células bipolares on e off. Por sua vez, estas fornecem input para as células ganglionares on e offtambém na retina.
As células ganglionares
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córtex visual responde à direção do contraste (se esse fica mais claro ou mais escuro), e portanto poderia delinear a borda. Esses mesmos neurônios têm um papel na percepção de profundidade, que pode contribuir para a distinção entre figura e fundo. Nossas investigações mostraram que linhas curvas e tortuosas produzem um espalhamento em aquarela mais forte que as linhas retas, provavelmente porque as bordas ondulantes ativam mais
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tipo centro-periferia. Uma célula ganglionar on dispara
célula off dispara intensamente quando o centro é mais escuro que a periferia e fracamente quando o centro e a periferia são uniformes. Os axônios das células ganglionares transmitem seus sinais ao cérebro, primeiro ao núcleo geniculado lateral, e daí para o córtex visual.
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neurônios
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têm campos receptores
fundo ainda mais claro) estimula neurônios que respondem apenas a um contorno que é mais claro no interior do que no exterior, ou a um contorno que é mais escuro no interior que no exterior, mas não a ambos. A posse da borda (se ela pertence à figura ou ao fundo) é provavelmente codificada nas áreas cerebrais Vt e V2, responsáveis pelos estágios iniciais de processamento no córtex visual. Em experimentos com macacos, neurofisiologistas descobriram que aproximadamente metade dos neurônios do
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MENTE&CÉREBRO ARMADilHAS DA PERCEPÇÃO
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orientação. A cor sinalizada por essas margens desiguais deve ser propagada por regiões do córtex que suprem grandes áreas do campo visual, continuando o espalhamento da cor até que células sensíveis a bordas do outro lado da área fechada forneçam uma barreira ao fluxo. Cor e forma são, portanto, ligadas inextricavelmente no cérebro
.
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e na percepção, nesse nível de análise cortical. A ilusão da linha radial fornece mais evidências sobre o papel que a cor exerce na distinção entre figura e fundo. Em 1941, o psicólogo alemão Walter Ehrenstein demonstrou que uma figura circular brilhante preenche visivelmente o espaço central entre uma série de linhas radiais. A figura e a borda circular que a delimita não possuem nenhum correlato no estímulo físico; elas são ilusórias. A superfície ilusória brilhante parece encontrar-se levemente à frente
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.
diais, e os exemplos que apresenfigura acima).Suspeitamos que tamos neste artigo representam esse efeito surge porque o anel os arranjos mais impressionantes silencia as células que sinalizam que encontramos(verasilustrações as terminações das linhas. Uma vez que deterContudo, se o ânulo é colonumeradas). minamos as características das rido, outras células podem ser linhas radiais que produziam o excitadas por essa mudança. círculo central maisbrilhante (A), Quando adicionamos cor ao experimentamos com variações ânulo, o disco branco não apenas pareceu muito mais claro nas propriedades cromáticas do espaço central. Primeiro, adicio(autoluminoso) que na figura de namos um ânulo, ou anel, de cor Ehrenstein, mas também tinha uma aparência mais densa, como das linhas radiais (verilustração preta à figura de Ehrenstein, e o se uma pasta branca tivesse sido nestapág.acima). brilho do espaço central desapareceu completamente - a ilusão O comprimento, a largura, aplicadaà superfície do papel (B). o número e o contraste entre foi destruída, como Ehrenstein Essefenômeno nos surpreendeu; as linhas radiais determinam a também já havia notado (ver qualidades de autoluminosidade intensidade desse fenômeno. A
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configuração espacial das linhas, necessária para que a ilusão tenha efeito, implica a existência de neurônios que respondem à ~ « terminação de uma linha. Tais =s células, chamadas end-stopped, já foram identificadas no córtex '" ~ I- visual, e talvez expliquem esse 9 efeito. Esses sinais locais se ~ combinam e viram inputspara ~ o um outro neurônio (de segunda ~ ordem), que preenche a área cen~ traI com brilho aumentado.
~
~Em nossos estudos sobre a ~ ilusão de Ehrenstein, avaliamos ~ variações no número, compri§. mento e largura das linhas ra-
o FIGURAS
CIRCULARES brilhantes
preenchem o espaço central de uma figura de Ehrenstein modificada para aumentar a ilusão de brilho. A figura de Ehrenstein (diagrama superior ao lado),
desenvolvida pelo psicólogo alemão Walter Ehrenstein, em 1941,foi a base para a invenção de novas ilusões. Quando se adiciona a ela um círculo (diagrama inferiorao lado),a ilusão de um círculo central brilhante desaparece
ebrilho INDUÇÃODE anômala: a adição de anéis coloridosfaz com que as figuras ilusóriaspareçam ainda mais brancas.
G
Lustro cintilante:
discos cinza produzem figuras circularescom um brilho trêmulo no espaço central
01NDUÇÃO DE ESCURIDÃO
anômala: discos pretos dentro de anéis coloridos parecem ainda mais pretos. G Contraste anômalo de cor cintilante: discos cinza envoltos por um anel roxo aparecem como luzes piscantes amareloacinzentadas quando o desenho ou os olhos se movem para um lado e outro
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e superfície normalmente não aparecem juntas, e são até mesmo consideradas modos opostos, ou mutuamente excludentes, de aparência. Chamamos esse fenômeno de indução de brilho anômala. Como no efeito aquarela, acredita-se que células nas áreas corticais primárias causem essa ilusão. Em seguida, inserimos um disco cinza no espaço central de uma figura de Ehrenstein The watercolor (C). Surgiu outro fenômeno effect: a new chamado lustro cintilante, no principie of grouplng and flgure-ground qual o brilho ilusório dá lugar à organlzatlon. B. percepção de um brilho trêmulo Pinna, J. S. Wemer e L que ocorre com cada movimento Spillmann,em Vis;on do padrão ou do olho. A cintiResearch,vol. 43, n21, lação pode surgir por causa da págs. 43-52, janeiro de 2003. competição que ocorre entre The visual os sistemas on e oII: o brilho neurosclences. induzido pela linha (incremento Editado por L M. ilusório) compete com o disco Chalupa e J. S. Wemer. cinza escuro (decremento físiMIT Press, 2004. Figure and ground co). Quando substituímos os In the visual cortex: discos brancos centrais dentro V2 combines dos anéis coloridos por discos stereoscoplc cues pretos e utilizamos um contorno wlth gestalt rules. preto (D), os discos ganharam F.T. Qiu e R. von der aspecto ainda mais escuro que Heyt, em Neuron, vol. a área circundante fisicamente 47, n2 1, págs. 155-166, 7 de julho de 2005. idêntica. O negrume parece 82
.
MENTE&CÉREBRO ARMADILHASDA PERCEPÇÃO
gerar um vazio, ou um buraco negro, que absorve toda a luz. Quando o disco central dentro do anel cromático era cinza em vez de preto ou branco, o disco parecia piscar e se tingir com a cor complementar do ânulo quando os olhos eram movimentados ou o padrão se movia - por exempl07de verde quando o anel circundante era roxo (E). O contraste anômalo de cor cintilante depende das linhas radiais e do ânulo cromático, da mesma maneira que os outros dependem, mas também possui qualidades únicas que não parecem ser simples combinação de outros efeitos conhecidos. Nessa ilusão, a cOfinduzida parece tanto autoluminosa quanto cintilante. Surpreendentemente, ela parece flutuar acima do resto da imagem. A cor da superfície e a cor autoluminosa não se misturam; pelo contrário, uma pertence ao disco na página, e a outra emerge de uma combinação das outras características dos estímulos. No contraste anômalo de cor cintilante, é possívelque as linhas radiais ativem neurônios end-
locais,como foiproposto stopped para o preenchimento de espaços pelos contornos ilusórios, mas a atividade dessas células não explica completamente a combinação de cintilação e cor complementar. Não está claro se as linhas radiais exercem um efeito direto sobre o contraste de cor, ou se a vivacidade da cor é derivada indiretamente do lustro e da cintilação causados pela combinação entre as linhas radiais e o centro cinza. Os conhecimentos atuais sobre o cérebro não permitem explicar tudo o que ocorre nesse processo ilusório. A complexidade da ilusão sugere que é improvável que ela resulte de um processo unitário, e sim que ela representa uma tentativa do cérebro de reconciliar sinais provenientes de múltiplas vias especializadas que rivalizam entre si. Muito trabalho ainda é necessário para entender como o cérebro percebe o mundo físico. Felizmente, pesquisas em andamento sobre cores ilusórias continuarão a oferecer instigantes vislumbres das complexidades
do sistemavisualhumano. ...
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MENTE,CÉREBRO E FILOSOFIA.
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