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Carlos Matus
Tomo II Faltam as páginas 482483, 486487, 490491 e 494495.
SECRETARIA DE PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E COORDENAÇÃO DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
ÍP
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In s t i t u t o d e P e s q u i s a E c o n ô m i c a A p l i c a d a
O IPEA é uma fundação pública vinculada à Secretaria de Planejamento, Orçamento e Co ordena ção da Pres idênc ia da República, cujas finalidades são: auxiliar o Ministro da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Coordenação da Presidência da República na elaboração e no acompanhamento da política económica e pro ver atividade atividade s de pesquisa económica aplicada nas áreas fiscal, financeira, externa e de desenvolvimento setorial.
PRESIDENTE Aspásia Brasileiro Alcântara de Camargo DIRETOR EXECUTIVO Aécio Gomes de Matos DIRETOR DIRETOR DE ADMINI ADM INISTRA STRAÇÃ ÇÃO O E DESENVOL VIMENTO INSTITUCIONAL INSTITUCIONAL Luiz Antonio de Souza Cordeiro DIRETOR DE PESQUISA Ricardo Varsano DIRETOR DE POLÍTICAS PÚBLICAS Heitor Cordeiro Chagas de Oliveira
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N° Registro:"" A ?-f>
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Matus, Carlos Política, planejamento & governo / Carlos Matus. — Brasília : IPEA ; 1993. 2 v. — (Série IPEA ; 143) 143) 1. Planejamento - Teoria. 2. 2. Planejamento Estratégico. I. Título. II. Série
338.9
A prod pr oduç ução ão edito ed itoria riall deste de ste volum vol umee conto co ntouu com o ap apoio oio fin f in a n c e iro ir o do P roje ro jeto to BRA 92/029 92/ 029 (PNUD (PNU D —Pro — Progra grama ma das Na Naçõ ções es Unidas Unida s par p araa o Dese De senv nvolv olvim imen ento to)) e do Programa Programa de Gerenciamento Gerenciamento do Setor Público - GESEP / BIRD. BIRD.
u. F R. J. biblioteca
Indice
i
P P U R
PREFÁCIO À EDIÇÃO BRASILEIRA
TOMO I PARTE I TEORIA SOCIAL E TEORIA DO PLANEJAMENTO 1.
O Planejamento como um Problema entre os Homens
2.
N ec ec e s s ita m os o s P la n e j a r ?
17
3.
Os Recursos de Cálculo do Planejamento e o Governo de Situações
29
4.
Como não se Pode Planejar
35
5.
Eu Planejo, Tu Planejas
49
6.
Os Atores Sociais Planejam em Qualquer Situação, mas com Métodos Distintos
55
7.
O Triângulo de Governo
59
8.
O Tempo no Planejamento
63
9.
E pi pis te mo m o lo lo gí gía do P la la ne ne ja ja me m e nt nt o
71
10.
Teoria da Ação e Teoria do Planejamento
81
11.
O Proc Proces esso so de Produ Produçã çãoo Soci Social al
99
12.
A Incerteza Domina o Processo Social
135
13.
O Cálculo Social Interativo
145
9
14.
Problemas Bem -Estruturados -Estruturados e Q uase-Estruturados uase-Estruturados
181 181
15.
O Conceito de Estratégia
191
PARTE II O S FUNDAMENTOS DO PLANEJAMENTO SITUACIONAL 1.
Em que Casos é Pertinente o Planejamento Situacional?
199
2.
O C on on c e ito de de S ititu a ç ã o
203 20 3
3.
Precisão e Medição de Situações
223 22 3
4.
Os Atores Sociais e a Mudança Situacional
227 22 7
5.
A Mudança Situacional
235 23 5
6.
Situação-Objetivo
243 24 3
7.
Programa Direcional e Cenários de Planejamento
247 24 7
8.
A Estrutura Modular do Plano: problemas e operações
255 25 5
9.
O Vocabulário Mínimo do Planejamento Situacional: cem palavras
285 28 5
TOMO II PARTE III OS QUATRO MOMENTOS DO PROCESSO DE PLANEJAMENTO SITUACIONAL 1.
O Conceito Co nceito de Mom ento
297 29 7
2.
O Momen Mo mento to Exp licativo licativo
303 30 3
3.
O Mom ento Norm ativo
335
4.
O Mom ento Estratégico
403 40 3
5.
O Mom ento Tático-Opera cional
481
PARTE IV CONCLUSÕES E GLOSSÁRIOS DE CONCEITOS 1.
Co nclusõ es Finais
557 55 7
2.
G lossário lossá rio de Conceitos Conc eitos
569 56 9
3.
Bibliografia
587
TOMO II POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GOVERNO
PARTE III OS QUATRO MOMENTOS DO PROCESSO DE PLANEJAMENTO SITUACIONAL
1
0 Conceito de Momento
0
conceito de momento indica instância, ocasião, circunstancia ou conjuntura pela qual passa um processo contínuo, ou em cadeia, que não tem começo nem fim definidos. A passagem do processo de planejamento po r um m om ento determinado é apenas o do m ínio transitório deste momento sobre os outros, que sempre estão presentes. No caso do processo de planejamento, os momentos encadeiam se e formam circuitos repetitivos para ajudaremse m utua m ente e passar sempre a um m om ento distinto. Nenhum m om ento é necessariamente ante rior a outro. Nenhum momento fecha ou termina o processo encadeado. Nenhum momento começa ou termina num tempo preciso. Nenhum momento fica definitivamente para trás nem se esgota numa só instância; ele volta a se re petir, para domin ar transitoriam ente várias vezes mais, no fu tu ro . Esses momentos são: i.
o m om ento explicativo (M l) —foi, é, te nde a ser;
ii.
o m om ento normativo (M2) —deve ser;
iii. o m om ento estratégico (M3) —pode ser; iv.
o m om ento tático-operacional (M4) —fazer.
Esses quatro momentos encadeiamse em seqüências que se alteram. Eles constituem um processo contínuo.
Política, Planejamento e Governo
2 9 8
M2
Cada problema do plano e o plano em seu conjunto desenvolvem se passando por esses momentos. O esquema apresentado mostra três características do conceito de momento: (1) desenvolvemse em cadeia continua, (II) desenvolvemse em qualquer orde m e (III) cada m om ento com preen de os demais. tx Pr o b l ema
1:
M4 — * M I
Problema
2:
M2 —
M3
Pr o b l ema
3:
MI —
M2
Pr obl ema
4:
M3 — * . M 4
i—
M 4 — ►MI
— *M 2 - ^ M 3 [ —
»MI
— *M 2
! — * M 3 — *.M 4
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
299
O encadeamento dos momentos produzse simultaneamente para uma grande diversidade de problemas e oportunidades, tal como indicado no esquema. Assim, nu ma ocasião concreta tx, o processo de planejam ento c ontém aspectos próprios de todos os m om entos: explicativo (M l), normativo (M2), estratégico (M3) e táticooperacional (M4). ETAPA 1 Diagnóstico
ETAPA 2 -»
Formulação do Plano
ETAPA 3 -»
Aprovação
ETAPA 4 -»
Execução
ETAPA 5 ->
Controle e Avaliação
o conceito de momento é próprio de um processo continuo e encadeado sistematicamente, em oposição ao conceito de “etapa” do planejamento normativo, mais pertinente a uma seqüência linear e direcionada, que começa com o diagnóstico, passa pelo desenho e aprovação do planolivro e culmina nas instâncias de execução, avaliação e controle. Além disso, no que diz respeito a um mesmo problema, o conceito de momento não segue uma ordem linear.
____ I
M2 ------------- ^ M 3 -------------
N este exem plo, o processo está conju ntu ra lm ente centrado no m om ento explicativo (M l), e mesm o assim todos os outros m om entos o estão apoiando e condicionando. A explicação da situação de hoje (M l) não é alheia à explicação do resultado do que foi executado ontem (M4); os problemas e oportunidades que nela destacamos supõem confrontar uma realidade com uma normaplano (M2) que é anterior; tal norma deve corresponder a alguma idéia preliminar quanto à sua viabilidade (MB).
3 0 0
Política, Planejamento e Governo
Na re alidade, cada m om ento do processo de planejamento está sempre presente, mesmo que um deles adquira importância decisiva em alguma instância concreta. Por isso não é fácil saber se Ml precede M2 ou o segue, como indicado no Gráfico. Os m om ento s são um a instância repetitiva, ou cíclica. Por isso to dos os momentos estão sempre presentes na situação. Os distintos pro blem as do plano podem estar em distintos m om ento s e cada pro blem a avança, em seu tratamento pelo plano, passando de um momento a outro, mas não deixando de estar em todos os momentos. Assim, os momentos são recorrentes para cada problema no processo de mudança situacional.
Observar a situação no momento explicativo é uma atividade que não cessa nunca, mesmo que ela repitase com diferentes conteúdos, propósitos, datas, ênfases e em diferentes conte xto s situacionais, como indicado no Gráfico. O mesmo ocorre com o desenho, o cálculo estratégico e o cálculo que preced e e preside a ação. O plano situacional está sempre pronto e sempre sendo feito. Só o conceito de momento permite compreender o significado desta frase aparentem ente contraditória. Em síntese, o conceito de momento no planejamento situacional perm ite captar o processo de cálculo <|iie pre cede e pre side a ação, com
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
301
suas descontinuidades e interações que rompem a linearidade direcionada. De forma abstrata, os momentos têm as seguintes características: i.
não seguem um a seqüência linear estabelecida;
ii.
formam uma cadeia contínua, sem começo nem fim definidos;
iii.
cada m om ento , quando dom inante, contém todos os outros m om entos, nos quais apóia seu cálculo;
iv.
eles se repe tem c onstantem ente, mas com distintos con teúdos, prop ósitos, datas, ênfases e contextos situacionais;
v.
num a data concreta do processo de planejamento, os prob lemas e oportunidades enfrentados pelo plano enc ontram se em diferentes momentos dominantes;
vi.
para cada m om ento existem instrum entos metodológicos que lhe são mais pertinentes, embora nenhum instrumento desti nese ao uso exclusivo de um momento específico.
O momento é uma forma mais complexa e apropriada que a etapa para ente nder a dinâmica do processo de planejamento.
O Momento Explicativo
M2
3 0 4
a.
Política, Planejamento e Governo
A Situação Inicial e Seus Problemas Relevantes
O que explicamos? A realidade à nossa volta, que é pertinente para a ação. Por isso explicamos a realidade como é para eles e para nós (M l), explicamos os fundamentos do desenho elaborado e os motivos pelos quais outros desenhos foram descartados (M 2), explicam os as dificuldades para construir a viabilidade de nosso desenho (M3) e explicamos como se dá a execução de nossas decisões (M/l). Dessa maneira, compreenderemos que explicar é também desenhar, fazer cálculo estratégico e avaliar o que foi feito antes. O momento explicativo é inseparável dos outros três momentos. Todos os momentos têm um a dimensão de explicação da realidade. A explicação da realidade é um dos primeiros problemas que o planejador enfrenta. No planejamento normativo, essa explicação denomi nase diagnóstico e supõese que deva ser uma e única, para poder ser rigorosa. Já reconhecemos a existência de oponentes com capacidade de explicar e planejar; não parece evidente que possa existir um diagnóstico da realidade, rigoroso e objetivo. É aqui que aparece a necessidade da explicação situacional. Numa p rim eira instância, as equipes encarregadas de m anter vigente a direcionalidade e o desenho do plano procuram entender a situação inicial e chegar a um acordo sobre os critérios gerais e as restrições a adotar. Para os efeitos que nos interessam, a situação inicial muda sem pre e é sem pre a situação de hoje. Hoje é a nossa linha de partid a para calcular nossa ação futura e é o único ponto no tempo em que a ação é possível. Amanhã é plano e ontem é história. Na prática, ex plicar a situação pre sente significa re consid era r a validade do conjunto de problemas relevantes com base nos quais viemos conduzindo nossa intervenção sobre o sistema. Na realidade, nunca selecionamos os problem as pela primeira vez, pois temos um a história que pesa so bre nós. Explicar significa também com pre ender o processo de interrelação entre os problemas, para ter uma visão de síntese do sistema que os produz. Alguns problemas são conseqüências de outros que, por sua vez, causam, reforçam ou amenizam os primeiros. Por conseguinte, explicar
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
305
é elaborar hipóteses sobre o processo de geração dos problemas identificados. Mas explicar também é precisar o valor que esses problemas têm para os distintos atores sociais e a população em geral. O valor de um pro blem a é a im portancia que ele tem no projeto de cada ator.
b.
0 Valor dos Problemas
Que problemas selecionamos para o nosso plano? Podemos responder, em primeira instancia, que um ator seleciona os problemas que irá enfrentar segundo três critérios: i.
o valor dos problemas para ele, ou seja, para a cúpula diretiva de sua organização, para as forças sociais que o apóiam e para a população que ele representa;
ii.
a eficiência, e sobretudo a eficácia ou efetividade com que ele pode enfrentálos;
iii.
a possibilidade e oportunidade de enfrentálos com éxito, que dependem também do valor perm anen te e conjuntural que esses problemas têm para seus oponentes, ponderados pelo peso ou força desses oponentes.
O espaço direcional de um ator delimita as fronteiras entre o que ele qualifica como problema e o que considera como realidades inevitáveis. Uma realidade inevitável passa a incorporarse à nossa paisagem social. Não se luta contra o inevitável. Já o prob lem a convida à ação. Ele é uma realidade insatisfatória, superável, que permite um intercâmbio favorável com outra realidade. O custo desse intercâmbio inclui o custo dos meios selecionados para enfrentar o problema. Se um ato r social incorp ora um pro blem a em seu espaço direcional, ele o converte numa demanda social. O espaço direcional deve ser coerente com o que chamaremos de mapa valorativo de problemas de um ator, o qual se baseia em suas ideologias, doutrinas, preconceitos, valores e teorias que acumulou ao longo de sua prática social. Esse mapa pode ser apresentado como um esquema topográfico de linhas de isovalor, entre as quais estão delimitadas faixas ou espaços nos quais cada ator situa os problemas que mereceram dele uma valoração equivalente.
Política, Planejamento e Governo
3 0 6
O nível mais alto de valoração (3) é expresso pela declaração “sim, ou nada”, que deve ser interpretada como “sim, este é um problema, ou então nada é um p roblema”. É a declaração valorativa mais forte. O segundo nível de maior valoração é expresso por “sim, sem dúvida”, que indica que não se tem dúvidas sobre a importância do pro blema. O terceiro nível é simplesmente “sim”, sem mais qualificação. É a declaração afirmativa mais fraca. Com os três últimos níveis de valoração afirmativa definese o es paço direcional do ato r. Mas esse espaço direcional te m uma fronte ira difusa: o nível O, que existe mediante a declaração de dúvida “diria que não”. Evidentemente, esse nível valorativo é um espaço de negociação com outros, pois sob certas condições essa valoração poderia significar “diria que sim” . MAPA VALORATIVO DE PROBLEMAS DE UM ATOR
NÃO, POR NENHUM MOTIVO NÃO
_
(-2) (- 1 )
DIRIA QUE NÃO
( 0)
SIM
(1 )
SIM, POR CERTO
(2 )
SIM, OU NADA
(3)
O nível (1) é simplesmente uma declaração negativa “não” (não é um problema para mim).
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
307
Finalmente, o nível (2) expressase pela declaração “não, por motivo algum”, que demonstra o alto valor que o ator atribui ao nãoreco nhecimento de uma realidade como p roblema. O espaço direcional é um espaço de admissão de problemas, operações e objetivos. Ele abrange, portanto, exclusivamente os níveis 3, 2 e 1, mas esses níveis estão cercados pelo nível zero de indefinições, seguido pelo cerco das declarações negativas em ordem crescente de valor. Se todos os problemas em debate numa dada situação forem mapeados sobre o mapa valorativo de cada ator social, teremos uma visão aproximada do espaço direcional dos atores. As declarações sobre os problemas ajudam a conform ar as linhas imprecisas que delimitam as fronteiras dos espaços direcionais das distintas forças sociais. Este exercício é útil para se conhecer a si mesmo e ao outro, o valor dos problemas para o outro e a intersecção de espaços direcionais. Se construímos o mapa do valor dos problemas para o outro e delimitamos seu espaço direcional, veremos de imediato que podem produzirse intersecções de distinto valor.
A
Z
*•— 0 OUTRO 0
1
2
3
2
1
0
Por exemplo, a intersecção A no esquema a seguir indica consenso sobre a existência de problemas de alto valor para e/e e para o outro. Já a intersecção Z significa possível acordo sobre um problema de menor valor.
Política, Planejamento e Governo
3 0 8
A valor das intersecções dos espaços direcionais dos atores sociais é uma variável de extrema importancia, como se verá mais adiante no estudo das estratégias de conflito e cooperação. As intersecções de alto valor e de mesmo signo revelam potencialidades de cooperação; se forem de diferentes signos, anunciam conflitos. As intersecções de baixo valor indicam zonas de cooperação ou conflito pouco estimulantes. Natu ralm ente , o consenso negativo sobre um problem a inaceitável não é mobilizador para uma ação concertada, caso não esteja acompanhado de um consenso positivo sobre a operação necessária para enfren tálo. E nesta distinção que tem origem a diferença entre potencialidade e efetivação d e um a cooperação.
c.
0 Arquivo de Problemas de um Plano
Quantos problemas selecionamos? Esta é urna perguntachave do ponto de vista estratégico, porque nem todos os problemas admissíveis no espaço direcional de um ato r podem e devem ser abordados no ho rizonte de tempo do plano. Alguns ou muitos problemas ficarão para mais tarde. Quais problem as seleciono, e quantos incluo? Para analisar as implicações desta pergunta devemos considerar dois tipos de critérios: i.
os critérios globais, que se relacionam com minha capacidade de enfrentar problemas e com a eficácia de tal enfrentameiuo, tend o em vista minha permanência ou continuidade política na condução do processo frente ao outro;
ii.
os critérios pró prio s de cada espaço de ação (geral, particular ou singular), a fim de que o plano seja um esforço criativo de compromisso para a ação em todos os espaços da prática social; o esforço que se deixa de fazer por excesso de centralismo é um desperdício de recursos e de oportunidades que está relacionado com o primeiro critério.
Estudemos o primeiro tipo de critério. É razoável pensar que devam ser considerados: (a) o valor dos problemas selecionados em relação ao valor dos pro blemas posterg ad os, para verificar se enfrentamos os pro
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
309
blem as que sao im portantes para a minha organização e para a população; (b) a concentração e dispersão de esforços e efeitos: m uitos pr o blem as dispersam esforços, poucos problemas concentram efeitos; (c) as restrições de recursos (de po de r, econôm icos, de tem po , etc.) em relação ao custo desses recursos no enfrentamento dos problemas por diferentes vias; destacase aqui a prioridade dos problemas que exigem poucos recursos e têm alto impacto; (d) a possibilidade de ob ter resultados de impacto dentro do horizonte de tempo do plano; muita concentração de efeitos para além do horizonte de tempo do plano fará com que a avaliação política da população façase antes da maturação dos re sultados da minha ação; inversamente, uma concentração de resultados dentro do horizonte de tempo do plano pode levar a uma hipervalorização dos problemas atuais e subvalorização dos problemas potenciais; (e) o equilíbrio na abordagem de problemas nos diversos dom ínios situacionais ou áreas problemáticas (política, economia, segurança, etc.), a fim de que o processo de mudança situacional mantenha certa harmonia e o processo de intercâmbio de problemas seja favorável; (1)
que a seleção de problem as não constitua um a atomização de frentes de abordagem, mas agrupe os problemas em áreas problemáticas coerentes, onde o ataque a cada problem a seja coerente em cada área e onde cada área problemática seja coerente com as outras, para dar racionalidade ao arquivo de problemas do plano; record ese que as áreas problemáticas constituem subplanos (módulos OP).
O segundo tipo de critérios aponta para a necessidade de liberar a imaginação, a criatividade e vontade de progresso em cada espaço do sistema social. Por esta via, as comunidades podem ser motivadas a im-
3 1 0
Política, Planejamento e Governo
porem se sacrifícios transitórios que ag reguem recursos adicionais para enfrentar os problemas. N este caso, haverá, pelo m enos, os seguintes critérios: (a) eliminar os bloqueios à imaginação, criatividade e liberdad e para em preender tarefas que não co ntradizem os pro pósitos gerais do plano; (b) deixar que cada espaço de ação expresse sua pró pria valoração dos problemas que o afetam e determine o limite dos recursos suplementares que podem ser obtidos para o enfrentamento desses problemas; (c) buscar um equilíbrio no enfrentam ento de problemas de alcance nacional, estadual e local, nos distintos espaços de ação e nos diferentes planos situacionais (regras, acumulação e fluxos). A M atriz Atores-P roblemas Se agregarmos num só arquivo os problemas selecionados por todos os atores sociais relevantes e os valores que lhes atribuem, teremos uma visão sintética do conjunto de temas problemáticos tomado como objeto de debate e valoração pelas distintas forças sociais. Designemos os problemas desse arquivo como problemas valorados num arco situa cional qualquer, ou no arco direcional do plano. Os problemas valorados constituem um inventário dos problemas que podem ser postos em situação por alguma força social em qualquer momento. Um problema valorado convertese num problema em situação quando é objeto de seleção, por algum ator social, para ser enfrentado na situação presente ou para fazer deste problema um tema de oposição ativa às forças prom oto ras de sua solução. A informação que relaciona os atores sociais com o arquivo de pro blemas valorados e os valores que cada ato r atribui a cada pro blema pode ser sistematizada num a matriz ato resp roblem as valorados. Cada célula da matriz indica o valor que cada ator social atribui a cada problema em seu espaço direcional. Esse valor não é constante; é um produto situacional e, portanto, alterase com o movimento situaci onal e com o papel que os atores sociais desempenham na nova situação.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
311
Nessa matriz cada célula deve ser objeto de explicação situacional, a fim de elaboraremse estratégias e táticas para promover ou dificultar o enfren tamen to dos problemas valorados.
d.
A Explicação Situacional de um Problema
Explicação situacional é uma reconstrução simplificada dos processos que geram os problemas destacados pelo ator, de tal forma que os elementos constituintes desses processos aparecem sistematicamente interconectados na geração desses problemas e de suas características particulares. Na análise situacional de um pro blem a, ou do conjunto de proble mas do plano, entram numerosas variáveis ligadas por diferentes tipos de relações. Por isso é preferível um método sistemático de trabalho para desvendar as relações sistêmicas que constituem o explicando do pro blem a, cujo veto r de definição é explicado. Essa técnica é o método de explicação situacional, cuja expressão gráfica é o fluxograma situacional. Como toda técnica, é simplesmente uma ajuda para sistematizar o conhecimento de uma realidade. Essa ajuda é, por vezes, desnecessária para pessoas experientes e com mente bem organizada. Mas se o planejamento deve sustentarse numa análise
Política, Planejamento e Governo
3 1 2
dos problemas q ue afetam a pop ulação, são necessários m étod os simples para que to dos co mpreen dam a gestação e o desenvolvim en to dos p ro blem as. N atu ralm ente, os m étodos de explicação situacional devem ser praticados com assessoria técn ica de pessoas com experiên cia nos p ro blemas. As pessoas que conhecem a técnica de explicação situacional mas não conhecem os problemas não podem obter resultados úteis. Inversamente, as pessoas que conhecem o problema por dentro muitas vezes se surpreendem com sua própria cegueira, por acreditar que poderiam compreender o problema num espaço restrito. Mas nem sempre tais implicações são transp arentes para todos. O método de explicação situacional pretende sistematizar a reflexão sobre as causas de um problema, exigir esta reflexão antes de adiantar soluções e reconhecer que esse problema pode ser explicado de diversos pontos de vista pelos atores que estão em contato (direto e indireto) com ele. Existe uma tendência a crer que as soluções são previamente conhecidas e que a explicação do problema deve acomodarse às soluções préconcebidas. Existe também uma tendên cia, em cada ato r, a cre r que sua solução e sua explicação são as corretas. Esses vícios de irreflexão opõem se ao planejamento como processo criativo e pene trante. Para compreender melhor a técnica do fluxograma situacional, ve jam os um exemplo baseado no problema da delinqüência juvenil. Suponhamos que uma comissão de moradores proponhase analisar esse pro blema e co mece suas primeiras explorações. A simplicidade dessas primeiras exploraçõ es permiten os apresentar o m éto do sem entrar na tram a com plexa de relações de um a análise mais acabada. A primeira dificuldade consiste em precisar o explicado, ou seja, o vetor de definição do problema. Suponhamos que os analistas decidam começar a discussão baseandose na seguinte precisão: i.
existem cerca de 30 mil delitos denunciados, po r ano, cujos autores têm menos de 21 anos de idade;
ii.
está com provado que não se trata de uma delinqüência ocasional, mas reiterada, pois em 40% dos casos registrados os autores estavam implicados em mais de um delito;
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
313
iii. a população constata impotên cia do sistema de vigilância policial, de repressão preventiva e de castigo para diminuir os delitos. A ação do Poder Judiciário reforça a delinqüência, porque as sentenças de condenação ensejam um sistema de aprendizagem do delito nas prisões. Para que este enunciado do VDP seja válido, é necessário precisar o espaço do problema em que se situam aqueles que o explicam. Por exemplo, na sua análise, a comissão de moradores poderia situarse no espaço singular ES, que se limita à área urbana que a comissão representa e às capacidades próprias de uma organização que pode apenas demandar soluções. Mas a comissão de moradores também poderia decidir analisar o problema colocandose na chefia de um Ministério da Família, ou seja, no espaço particular EP de um órgão público que tem responsabilidade sobre um conjunto de problemas familiares, entre os quais a delinqüência juvenil é apenas um dos âmbitos de ação. Finalmente, a comissão de m oradores pod eria quere r estudar o pro blema na perspectiva de um governo nacional, ou seja, no espaço EG das grandes determinações gerais. Para desenvolver o exemplo, suponhamos que a comissão de morado res decida analisar o problem a no espaço EP. O vetor de definição do problema (VDP) serve para chegar a um acordo sobre o problema. Devese ten tar en con trar uma m esma definição para ele. No en tanto, já sabemos que nem sem pre isso é, possível. O primeiro debate sobre o VDP permite constatar diferentes posições sobre o problema. O VDP expressa o consenso ou a divisão dos participantes em gru pos com diferenças de opinião e diferentes relações práticas com o problema. Recordese que o VDP não é uma explicação: é o enunciado do que deve ser explicado. O VDP é também um ponto de partida natural para centrar a ex plicação nas causas dos fatos enunciados. Na prim eira tentativa de explicação surgem outros fatos que têm relação de causalidade com o VDP. Por exemplo, a falta de oportunidade de trabalho produtivo para os jovens que vivem em zonas marginais, assim como a sensação de impotência, desorientação e frustração em que se vive, no nível individual e social, nos lares das famílias marginais.
3 1 4
Política, Planejamento e Governo
Constatase também que nas áreas marginais a voz da população pesa m uito pouco, ou nada, nas decisões nacionais. Como conseqüência, ela não pode canalizar sua demandas pela via normal, mas apenas através da rebeldia. A delinqüência juvenil é, assim, uma forma de re beldia, desespero e desprezo pelo que, na sua perspectiva, é o mundo injusto em que vivem. Isso permite uma primeira explicação no plano da produção dos fatos sociais. De im ediato surgem algumas perguntas: po r que as necessidades da população marginal não pesam nas decisões do governo? Toda a delinqüência juvenil provém das zonas marginais? Os membros da comissão de moradores refletem sobre essas perguntas e tentam dar algumas respostas provisórias. Dãose conta que há realidades mais estruturadas que a dos próprios fatos, que há realidades que constituem acumulações sociais. Por exemplo, a marginalidade social não é apenas algo que cresce a cada ano: ela constitui um sistema de vida, uma realidade vista como inevitável. Ela acumulase como realidade. Não só se produzem delitos: acumulase uma cultura do delito em certas camadas da população. Constatam eles que certas instituições e sistemas estão em crise. A família está em crise e produz jovens ressentidos e abandonados pelos pais. O sistema de justiça está em crise, não sanciona a todos por igual e as condenações levam às prisões, que são escolas de delinqüentes. A população marginal é incapaz de produzir fatos políticos que alterem sua situação; a causa está nas suas limitadas possibilidades de ação, e essas limitações devemse, por sua vez, ao pouco peso político dessa população. Surge, porém, outra realidade que não parece responder às mesmas causas. A delinqüência juvenil não é só produzida pelos filhos das famílias pobres, mas também pelos filhos das famílias “acomodadas”. Ali, onde há desequilíbrio entre riqueza acum ulada e cultura acumulada, prolifera também a delinqüência juvenil. Essas acumulações sociais aparecem, assim, como produtoras dos fatos. O crescimento da marginalidade social, a falta de oportunidades de trabalho, a imp otência e frustração juvenis ante a realidade que limita suas possibilidades e o pouco valor que se dá às demandas da população
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
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mais pobre são uma conseqüência da marginalidade social como modo de vida aceito ou ignorado, do tipo de cultura gerado na vida marginal, da crise da família em diversas camadas da população, do pouco peso político das comunidades marginais e da despro porç ão entre acum ulação econômica e acumulação cultural. Frente a essas causas a repressão, o castigo, a prisão e a vigilância policial são paliativos que atacam apenas as manifestações de causas mais profundas. Mas é também evidente que, em vários casos, os fatos reforçam as acumulações que os causam. O crescimento da população marginal reforça a marginalidade como meio de vida. A falta de oportunidades de trabalho reforça os aspectos negativos da cultura marginal. A delinqüência dos filhos reforça a crise familiar dos pais. As limitações p ara ser ouvido pelo governo reforçam a debilidade ou falta de peso político da população marginal e a sua rebeldia. Neste ponto da análise, a comissão de mora dores começa a tom ar consciência da complexidade do problema. Aqueles que solicitam mais vigilância e repressão , em bora não renun ciem a isso, co m preend em que essas medidas podem apenas manter um equilíbrio precário da situação. Por fim surgem as perguntaschaves, as interrogações genoestru turais, aquelas que nos levam às regras do jogo. Por que aceitamos a marginalidade como um sistema de vida, co mo parte da paisagem social? Como nasce a crise da família? Como é gerada a cultura de um povo? Por que se produz o desequilíbrio entre acumulação econômica e acumulação cultural? Por que 40% da população, que é marginal, não tem peso político, se o sistema é dem ocrático? Qual o alcance da nossa democracia? Diante dessas perguntas os membros da comissão de moradores intuem que estão se aproximan do do fundo do problem a. Deve haver algo nas regras básicas do sistema econômicopolíticosocial que produz esse tipo de acumulação, e não outros. Deve haver algo nas regras que nos regem que permite que esses fatos negativos sejam o resultado mais provável. Surge então, quase natu ralm ente, esta outra reflex ão : com outras regras seria possível evitar essas realidades? São inevitáveis com qualquer tipo de regras? Qual é a dimensão aceitável dessas realidades negativas?
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Mas ainda há algumas perguntas críticas. Alguns membros da comissão de moradores dizem: por que não mudar as regras? O que nos impede de mudálas? Surgem então as relações pelas quais as acumulações sociais se traduzem em relações de forças incapazes de produzir fatos que alterem as regras do sistema vigente. A relação que vai desde o nó “fraco peso político da população marginal” (fenoestrutura) até as genoestruturas do sistema indica que tais regras são coerentes com as relações de força prevalecentes. Essas forças sociais não podem produzir fatos (fluxos) que alterem as geno estruturas. O fluxograma situacional expressa essa realidade mostrando uma sincronia sem tensões entre os três planos situacionais. Nada ameaça a reiteração das genoestruturas vigentes. A discussão entre os membros da comissão de moradores começou de maneira parcial e simples, tornandose cada vez mais complexa. No entanto todos os membros seguem o debate, podem participar e enriquecer seu conhecimento sobre a realidade que os afeta. Isso tornaos mais conscientes so bre a natureza dos problem as e as limitações para sua solução. Durante o debate surge claramente a conveniência de delimitar o espaço do problema. Com efeito, alguns membros da comissão de moradores descobrem que a impotência, desorientação e frustrações dos jovens explicam, em parte , a evasão escolar, mas é necessário resistir à tentação de abordar o problema da educação. Por isso, ao elaborar o fluxograma situacional, consideram a evasão escolar como um nó condicionado, situado fora do espaço do problema. Eles se dão conta, também, de que o lento crescimento da economia influi negativamente nas oportunidades de trabalho, mas que o crescimento econômico é um problema distinto do da delinqüência juvenil. Assim, consideram a sua influência mas colocam esse nó explicativo fora do espaço do problema, como um nó condicionante. Esses nós situados fora do espaço do problema ficam ali como fios transitoriamente soltos, a serem posteriormente considerados quando outras equipes analisarem o problema da educação e o problema demo
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Após esse longo debate, um grupo da comissão de moradores transpõe a análise para um fluxograma situacional tal como o apresentado mais adiante. Tratase ainda de uma aproximação primária em relação à complexidade do problema. Colocam ali apenas o que lhes parece mais essencial para a compreensão do problema, como um sistema que produz os fatos enum erados no VDP. Concluído o prim eiro esboço eles o submetem ao debate, tentando um consenso. Com a discussão, verificam que há outras duas posições distintas. Decidem, então, formar três grupos de análise para que cada um elabore sua própria explicação situacional. Mais adiante verão onde há acordo onde não há. Também se perguntarão se essas diferentes posições igualmente se verificam nas relações entre as forças sociais, ou se são m era particularidade da equipe. Alguns insistem que não estão ali para mudar o mundo, e que a solução para o problema é mais vigilância e castigos mais severos; outros pensam que o sistema políticoeconômico do país gera a delinqüência e querem ir ao fundo do problema para erradicar suas causas. Argumentam a necessidade de sair do espaço do problema, já que a delinqüência juvenil é um “problemaconseqüência” de outros problemas de maior âmbito. Um terceiro grupo crê que o problema da delinqüência juvenil não é tão importante e que cada um deve saber como se defender. Sustentam que se deve aprender a conviver com a realidade tal com o ela é e não ficar esperando sempre soluções “de cima”. Após um debate muito intenso e acalorado, os moradores começam a tom ar posições. Formamse três tendências: i.
um gru po defende a necessidade de analisar, no espaço mais geral do sistema (EG), o problema das desigualdades políticas e da pobreza crítica;
ii.
um segundo grupo considera a posição anterior uma perda de tempo; querem analisar como reforçar a vigilância policial no bairro e como to rnar mais severas as sanções aos delinqüentes;
iii. um terceiro grupo estim a que suas capacidades estão limitadas a esse espaço particular da delinqüência juvenil, mas querem estudar mais a fundo o desenho das soluções para enfrentála com um conjunto de ações coordenadas e factíveis.
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FLUXOGRAMA DA SITUAÇÃO SOBRE 0 PROBLEMA DA DELINQÜÊNCIA JUVENIL
EX P L I CA N D O
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E X PL I C A DO
Sigamos por um momento o trabalho do terceiro grupo, pois ele nos a leva uma etapa intermediária com as técnicas de desenho de operações. Um dos moradores pergunta: o que pretendemos com essa análise? Como podemos sugerir ações mais eficazes para enfrentar a delinqüência juvenil?
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IBLIO I EGA
I PPUR Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situac ional
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Outro morador opina: eu creio que um problema não pode ser atacado apenas em suas causas de última instância, isto é, questionando as regras do sistema social. Isso seria mera ilusão, pois não temos força para mudar as regras; enquanto acumulam os mais força, devemos enfrentar o problema ali onde for possível. Eu não estou com o primeiro grupo, embora ele tenha razão quanto à erradicação do problema: este caminho não nos levará a ações possíveis. Quero, porém, estudar da melhor forma possível como alterar o VDP do problema. O VDP da delinqüência juvenil expressa a forma com o o prob lema relacionase conosco em termos de fatos cotidianos. O VDP é nossa relação direta com o problema. Vejamos então como alterar esses fatos alterando os nós explicativos do fluxograma. No fundo, cada nó explicativo é um sub pro blema que poderia ser atacado com ações do Ministério da Família. Mas tem sentido dispersar esforços, produzindo ações que alteram todos os nós explicativos do fluxograma? 0 PROBLEMA DA DELINQÜÊNCIA JUVENIL MOS DISTINTOS ESPAÇOS E PLANOS SITUACIONAIS
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Um terceiro morador sugere verificar se alguns nós explicativos ou subproblemas são mais importantes que outros. Por que não verificar, segundo nossa opinião, experiência e conhecimentos, o que ocorreria com os descritores do VDP se alterássemos as características de cada nó do fluxogram a situacional? A idéia parece correta, e a equipe passa a fazer a análise de sensibilidade do VDP em relação às mudanças nos nós explicativos do fluxograma. O trabalho é difícil e controverso. Não é fácil chegar a um acordo so bre a relação: Mudanças no nó Nx —> mudanças nos descritores do VDP
Após longas discussões, onde alguns trazem fundamentações estatísticas e outros emitem juízos qualitativos, a equipe consegue um certo consenso sobre os nós explicativos mais importantes. Esses são os nós críticos do fluxogram a situacional. Mas a equipe reflete imediatamente sobre a lógica usada para isolar os nós críticos. Verifica que às vezes há cadeias de nós fortemente relacionados e que alguns nós dessas cadeias são muito mais difíceis de mudar que ou tros. Intuem que há outro m undo de análise: o do cálculo estratégico para construir viabilidade para as mudanças. Entretanto, com base no senso com um , decidem revisar a seleção dos nós a fim de: i.
con siderar, em alguns casos, cadeias de nós;
ii.
eliminar aqueles nós que parecem m uito difíceis de alterar no horizonte de tem po do plano.
Com esta nova seleção dos nós críticos, voltam a fazer a análise de sensibilidade do VDP para concluir sobre a seguinte relação: Conjunto alterado dos nós críticos —> descritores alterados do VDP
Refletem agora sobre o resultado de sua exploração e perguntam se: como, ou com que ações, podemos mudar as características dos nós críticos?
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Em alguns casos é fácil desenhar as ações para mudar as características dos nós críticos; já em outros, a discussão não avança até se darem conta de que esse nó crítico é um subproblema, cuja complexidade é tal que é preciso aplicarlhe a mesma técnica de análise adotada para o pro blema da delinqüência juvenil. Além disso, não podem desenhar as ações para mudar as características do nó crítico, porque não há um consenso para explicálo. Assim, decidem isolar o subproblema do fluxograma e construir outro fluxograma situacional para ele. Dessa forma recomeça, em outro nível, a discussão sobre o VDP do subproblema, seus nós explicativos (subnós, com relação ao problema mais ampio), etc. O grupo II decidiu enfrentar o problema em seu espaço de competencia restrita. O grupo I decidiu dissolver o problema da delinqüência juvenil num espaço maior. Já o gru po três concordou em controla r o pro blem a pelas suas manifestações. Após essa breve explicação podemos voltar ao método. Era necessário um fluxograma para conhecer todo o problema? Evidentemente isto não seria necessário para uma pessoa experimentada ou especialmente preparada para analisar problemas. Mas os que participam de um plano não são necessariamente especialistas em análise de problemas. Em todo caso, um método de explicação situacional oferece algumas vantagens comparado à mera aplicação da experiência ao conhecimento de um problema. Essas vantagens estão alinhadas a seguir. (a) Sistematicidade O fluxograma situacional oferece uma sistematicidade cômoda. Qualquer analista sabe de antemão onde situar os elementos explicativos e verificar a existência de interconexões incompletas ou lacunas explicativas em determinados níveis si tuacionais. Oferece as vantagens de um mapa, no qual os es paços devem ser explícitos e as relações podem ser verificadas. (b) Visão sistêmica de conjunto A sistematicidade oferece uma visão de conjunto de toda a rede sistêmica causal. Cada nó explicativo influi sobre os ou
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tros e é por sua vez afetado por algum nó do sistema. Obriga também a explicitar as relações e as variáveis que um ator implicitamente usa no seu raciocinio para explicar o problema, o que torna mais fácil analisar suas virtudes e fraquezas. (c) Precisão dos níveis situacionais em que se situam as relações A relação A —> B não é precisa caso não se indique se A e B são genoestruturas, acumulações sociais ou fluxos de produção social. (d) Delimitação do espaço do p roblema A formalidade do método obriga a delimitar conscientemente o espaço do problema, com todas as suas conseqüências sobre a análise da possibilidade e conveniência de dissolver, enfrentar ou controlar um problema. (e) Articulação do qualitativo com o quantitativo Cada nó explicativo é um conjunto cuja precisão exige qualidade e quantidade, o que, por sua vez, dá significado às relações com outros nós precisados qualitativa e quantitativamente. (í)
Sensibilidade do VDP às mudanças nos nós explicativos
A técnica permite analisar que influência as mudanças nos nós explicativos podem ter sobre o VDP, segundo os especialistas ou o modelo que apóia o fluxograma. Por essa via selecionam se os nós críticos, no VDP (d l ,d 2,d 3, ... , dn) di(i = 1 até n) representa os descritores que podem ser alterados pelas mudanças nos nós críticos. (g) Análise da dificuldade de alterar as características dos nós crí ticos Como as relações sistêmicas estão mapeadas no espaço das genoestruturas, fenoestruturas e fluxos de produção social, é possível avaliar a dificuldade técnica, econômica e política de alterar as características do nó. Isso obriga também a tomar
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consciencia de que, em toda explicação, interagem nós explicativos pertencen tes aos três níveis situacionais. (h) Verificação das relações importantes O fluxograma situacional permite hierarquizar as relações entre nós explicativos, já que os hierarquiza como críticos e não críticos. Isto leva à necessidade de tentar autorefutar as relações mais relevan tes. (i)
Confrontação de distintas explicações
A sistematicidade do fluxograma situacional facilita a confrontação de diferentes explicações situacionais sobre um mesmo pro blem a, o que é uma necessidad e in erente à explicação situacional de diferentes pontos de vista. (j) Representação gráfica A explicação sistêmica pode ser expressa num fluxograma situacional, isto é, uma representação gráfica da explicação. Isto facilita a visão de conjunto e permite velocidade para mantêlo em dia, conforme a velocidade da mudança da realidade. (k) Elo metod ológ ico para a análise de um conjun to c om plex o de problemas A sistematicidade do método e o enunciado expresso dos nós explicativos relevantes que estão fora do espaço de cada pro blem a perm item elaborar análises situacionais que agregam um conjunto de problemas. Isso propicia a articulação da análise m icrossituacional com a macrossituacional.
e.
A Explicação da Situação Inicial do Plano: o arquivo dc pro blemas
Para explicar o conjunto dos problemas mais relevantes de um país é preciso ter uma idéia preliminar de como deve ser a realidade; por conseguinte, uma idéia aproximada da situação objetiva. De outra forma, não poderíamos identificar os problemas. Mas, ao mesmo
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tempo, a explicação situacional dos problemas é a base de análises para desenhar o “deve ser” no momento normativo. Deduzse, então, que a seleção coerente do arquivo geral de pro blemas estabelece um a relação dialética entr e a apreciação da situação global e o desenho calculado da situaçãoobjetivo. Como se estabelece, na prática, essa relação? A perguntachave no momento explicativo é a seguinte: como podem os verificar se nossa seleção de problem as é coe rente? Esta pergunta tem sentido porque o plano não pode ser uma simples agregação de problemas. A coerência global do enfre nta m ento de problemas parciais deve estar na interrelação e ntre os problemas. O sistema social que gera os problemas os produz também como um sistema. Uns problemas causam outros e esses últimos reforçam ou amenizam os primeiros. A descentralização e a criatividade no plano exige que se distribuam tarefas por problemas e subproblemas em diferentes espaços situacio nais. Mas devese também buscar a coerência global do plano numa síntese geral. Essa é a apreciação da situação global que, entre outras coisas, deve justificar a seleção dos problemas como áreas problemáticas interrelacionadas. Para isso podemos construir um fluxograma situacional global, que reconheça a unidade da realidade com o um grande problem a. A apreciação da situação global é a explicação do macroproblema que representa para nós a in terre lação sistêmica do conjunto de problemas selecionados para constituir o conteúd o do plano. Esse macroproblema tem um VDP, que requer uma explicação. A explicação será um modelo do sistema que produz o VDP, e as variáveis desse sistema serão os nós explicativos do macroproblema. Com o mesmo critério já explicado para análise de um problema, devemos selecionar os nós críticos do macroproblema. Cada nó crítico de um pro blem a e o conjunto de nós críticos dev em coincidir com o arquivo de problemas de alcance nacional do plano. Dessa maneira de análise do macroproblema, que sintetiza a situação inicial do plano, deduzemse os nós críticos que constituem os pro blem as de alcance nacional do plano; da explicação situacional desses pro blem as de alcance nacional su rg em os nós críticos dos pro blem as que
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constituem subproblemas do plano, seguindose assim até chegar aos miniproblemas. APRECIAÇÃO DA SITUAÇÃO GLOBAL, PROBLEMAS E SUBPROBLEMAS Situação Global (macroproblemas)
N /'
Os módulos explicativos do plano constituem, assim, um Sistema recursivo. SITUAÇÃO GLOBAL
NOS CRITICOS DO MACROPROBLEMA
NOS CRITICOS 00S PROBLEMAS
NÓS CRÍTICOS DOS SUBPROBLEMAS
£ > MACROPROBLEMA
4>
PROBLEMAS DE ALCANCE NACIONAL DO PLANO
SUBPROBLEMAS
MINIPROBLEMAS
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Como analisamos a coerência da seleção de problemas? Para res ponder a esta pergunta digamos prim eiro que a pro va de sensibilidade do VDP explicado, em relação às mudanças no explicando pertinente à apreciação da situação global, é esta: se são alcançados os vetores de resultados (VD R) em cada problem a, VD P —» VDR. Co m o m udam os descritores do VDP do macroproblema que representa a situação inicial global? Coincidem com m inha prop osta de situaçãoobjetivo? Se a resposta é afirmativa, a seleção dos problemas e as mudanças que se proc ura pro vocar neles parece coe rente. Se a respo sta é negativa, devo revisar minha situaçãoobjetivo ou mudar meu arquivo de problemas. O plano situacional, como plano estratégico, é necessariamente seletivo. Não se preocupa em contemplar explicitamente tudo no plano. Isso significa, por exemplo , que no plano econômico os recursos alocados vão em parte para operações que enfrentam problemas, mas outra parte destinase a alimentar módulos de continuidade e apoio ao funcionamento do sistema, os quais não constituem problemas explícitos. O plano só considera como problema aquelas áreas da realidade que merecem uma reflexão especial pela magnitude e valor da insatisfação que representam para um ator social. Já aquilo que funciona normalmente opera como uma base de apoio para o enfrentamento dos pro blemas. A divisão da realidade em dois espaços, o dos problemas e o da normalidade, é relativa à explicação situacional do ator e se altera com o m ovim ento da realidade. Veremos, mais adiante, que essa distinção é importante para o desenho normativo do plano e para a formulação de operações.
f.
Com que Perspectivas e Teorias Explicamos?
Todos nós explicamos por meio de teorias, velhas ou novas, fracas ou potentes, globais ou parciais. Não há explicação sem teoria. Na falta de uma teoria da produção social, cada um faz sua própria síntese situacional, guiado pela intuição e experiência. Naturalmente, essa síntese tende a estar dominada pelas teorias e razões dominantes na sua estru
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tura ideológica, que aparecem realizadas ñas particularidades de sua prática social. A análise da realidade pode ser feita de múltiplas perspectivas: i.
de um a perspectiva científica (económica, sociológica, po lítica, histórica, antropológica, etc.), dominada por uma razão científica particular ou global; ii. de um a perspectiva burocrática, ou seja, do hom em situado e modelado numa estrutura organizativa, portador de suas tradições e normas, subjugado por seus interesses nas relações de poder dentro da organização e re speitador de seus códigos operacionais; seu criterio explicativo será o da verificação dos desvios da realidade em relação à norma institucional; nessa explicação domina a razão burocrática, que é uma razão normativa incorporada ao deve ser de sua organização; iii. da perspectiva do contro le político, ou do homem de ação cercado por um vetor de diferentes recursos escassos, preocupado com as relações de forças e com o uso e acumulação de poder, no seu papel de conduzir em concorrência e em conflito com outros; na sua explicação domina a razão vital. O planejador técnico que apóia o hom em de ação não é um hom em especial no planejamento situacional, não tem uma perspectiva própria de análise. O planejador técnico assume a perspectiva do co nd uto r po lítico, do cientista, do gerente ou do burocrata. Ser planejador é uma condição acessória a qualquer prática social. O planejador situacional pode ser dir eto r de um centro científico, executivo de um gra nde órgão público ou um político. Record emos que planeja quem governa e governa qu em planeja. Mas o político dirige organizações e lida com problemas sociais que só em parte são abordados pelas ciências. O burocrata não vive numa organização vazia, mas numa realidade que se relaciona com as ciências, a ética, a religião ou a arte, e nessas organizações também se faz política. O cientista não é im une à prática buroc rática e ao mu ndo da política. Como conseqüência, a explicação de um ator social não é nunca uma razão pura e estritamente parcial; é sempre uma explicação dominada por uma razão central. Conforme sua capacidade intelectual e for
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mação cultural, aquele que explica enriquece a explicação com outras perspectivas. Essas outras perspectivas, porém , articulamse enquanto apoio à razão dominante. Em toda explicação do homem há uma razão articulado ra e razões articuladas. A razão científica pode estar dominada pela teoria política, teoria econômica, teoria das organizações, teoria da linguagem e da comunicação e alguma teo ria do domínio específico da realidade explicada (saúde, educação, defesa nacional, segurança, relações exteriores, economia, etc.). A razão burocrática pode estar conformada, em diferentes graus, pela prática política, prática econômica, prática organizacional, prática das relações hum anas ou prática profissional. A razão vital pode estar constituída pelo conflito político, conflito econômico, conflito organizacional, conflito comunicacional e conflito pessoal. Na explicação situacional domina alguma das três razões: a científica, a burocrática ou a vital. E dentro de cada uma delas existe também um fator dominante —político, econômico, organizacional, linguístico comunicacional ou um fator particular a um domínio situacional. O Quadro a seguir permite ver a correspondência entre os princi pais fatores de cada razão explicativa. Por exemplo , a te oria (razão científica) pertinente ao domínio da realidade explicada no caso da saúde (biologia, medicina, epidemiología, etc.) tem sua correspondência na razão burocrática com a prática profissional e na razão vital com o conflito pessoal. Essa reflexão coloca três perguntas centrais sobre a explicação de alguém sobre a realidade: i.
quanto pesa sua explicação? A resposta depende do peso, força e poder de quem explica, no espaço do problema explicado;
ii.
que razão domina sua explicação? A resposta pode ser obtida na prática social do sujeito que explica;
iii.
qual a amplitude de sua explicação? A resposta depende da variedade de perspectivas e atores sociais considerados na sua análise.
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PERSPECTIVAS DE ANÁLISE SITUACIONAL
RAZÃO CIENTÍFICA
RAZÃO BUROCRÁTICA
RAZÃO VITAL
Teoria Política
Prática Política
Conflito Político
Teoria Econômica
Prática Econômica
Conflito Econômico
Teoria Organizacional
Prática Organizacional
Conflito Organizativo
Teoria da Linguagem e da Comunicação
Prática de Relações Humanas
Conflito Comunicacional
Teoria do Domínio a Realidade Explicada
Prática Profissional
Conflito Pessoal
^1
vU EXPLICAÇÃO SITUACIONAL
g.
Temas e Perguntas de Verificação
Após terse analisado a situação presente, convém tentar descobrir insuficiências, incoerências e afirmações que não estejam bem fundamentadas. Para isso, devese questionar de forma sistemática. Os seguintes temas e perguntas podem ajudar a verificar a consistência da análise realizada. (a) Na base social: i.
exploração das interpretações das bases das organizações sociais sobre os problemas que as afetam;
ii.
identificação das demandas sociais na base, delimitadas por regiões, setore s e organizações. O im porta nte , neste caso, é identificar o tipo de compromisso vital para a po pulação e o que ela deseja ver assumido pelo governo.
(Na base social conhecemse muito bem os problemas, mas não é aí que surgem necessariamente as soluções mais eficazes ou as explicações mais profundas. O que nelas melhor aparece é o imediatismo do pro blem a.)
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(b) N o nív el institucional público: i.
explicação das instituições públicas mais significativas so bre a situação inicial;
ii.
demandas que surgem dessas instituições.
(Essas explicações e demandas expressam interesses nítidos e específicos de caráter institucional). (c) Forças sociais e instituições não-públicas (partidos políticos, igrejas, organismos empresariais, organizações de trabalhadores, etc.): i.
interp retaç ões sobre a situação inicial;
ii.
demandas que surgem dessas instituições.
(Essas explicações e demandas expressam os interesses e projetos ideológicos próprios da inserção de cada força no processo de produção social). (d) Em nível global macropolítico e macroe conôm ico (direção das forças políticas, equipes técnicas de síntese, instituições de pesquisa, etc .): i.
análise da situação inicial, com o macrovisão baseada num m odelo explicativo de certo rigor;
ii.
problema s e demandas considerados prioritários, com base no modelo explicativo e na visão e ideologia da direção da força social que desenha o plano.
(Nesse nível devese produzir explicações e projetos próprios a uma visão global e panorâmica, que transcende o plano do fenômeno e a unidimensionalidade das visões particulares.) (e) Exam e policên trico da realidade inicial: •
reexa m e da visão global central, tendo em conta o p ro cessamento das análises realizadas na base social, nas instituições públicas e nãopúblicas. Elaboração de uma situação inicial de síntese, como base preliminar de análise na qual o ator ce ntral do plano fixa sua posição e nela articula a explicação dos outros.
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(f) Análise dinâmica da situação inicial: •
a situação inicial é um m om ento de um processo dinâmico de mudança. A realidade de hoje tem uma história, e também os germes das tendências futuras. A explicação situacional deve captar a realidade de hoje como realidade em movimento, como um processo em curso.
Neste ponto, devem ser respondidas as seguintes perguntas: i.
como se produz iram, ao longo do tem po , os principais p ro blem as indicados na situação inicial?
ii.
Qual é, aproxim adam ente, o modelo explicativo sincrónico da situação inicial e como interagem os diversos problemas selecionados como relevantes?
(Para responder a estas duas perguntas é muito importante sistematizar de alguma maneira as principais relações que os analistas têm em mente. Uma forma consistiria em elaborar um fluxograma explicativo no qual apareçam as principais conexões entre os problemas destacados e os fatores que os causam. O esquema de análise pode ser um fluxograma situacional por problemas, e um fluxograma de síntese para o conjunto dos problemas do plano). iii. Quais as tendên cias situacionais? Q ue problem as tendem a agravarse e quais tendem a perder importância? Que problemas novos podem surgir? Como tende a mudar o valor dos problemas para as diferentes forças sociais? iv.
Qual a visão das diferentes forças sociais sobre esses prob lemas, e como ela mudaria caso se alterassem as tendências situacionais?
v.
Na esfera econômica, o que predo mina na situação inicial? Uma situação normal, de recessão, de expansão rápida? A situação é inflacionária, deflacionária ou de estagnação com inflação?
vi.
Que mudanças parecem mais prováveis no cenário internacional? Há surpresas à espreita? É possível, com a ajuda de especialistas, enumerar e imaginar que surpresas são possíveis?
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Para verificar o rigor da explicação alcançada sobre a situação inicial, vale a pena colocar as seguintes perguntas: i. se com param os a data da análise situacional com o período a que ela se refere e com a última informação recebida, qual o tempo de atraso que existe entre a informação e os acontecimentos reais? A explicação do problema representa bem a realidade do momento ou referese a um momento já superado? ii.
É um a explicação econômica ou é mais abrangente?
iii. A explicação rep orta se ao processo histórico de produ ção dos pro blemas destac ad os, à realidade sincrónica que m anté m e interage com esses problemas e às tendências futuras? iv. Há clareza quanto ao critério usado para selecionar certos pro blem as e desc artar outros? Quais foram os casos duvidosos? As dúvidas foram satisfatoriamente resolvidas? v.
É uma explicação egocêntrica ou policêntrica? São consideradas as explicações de outras forças sociais? Considerase a existência de oponentes ao plano?
vi.
É um a explicação que fica no nível dos fenô m eno s, restr ita ao plano dos fluxos sociais ou chega à essência genoestrutu ra l dos problemas selecionados? É uma explicação acadêmica ou tem sentido prático operacional?
vii. A explicação está bem fund am entad a com informação quan titativa ou precisões qualitativas? Qual é o rigor da fundamentação? viii. A explicação fornece causalidade sistêmica precisa ou é mera constatação factual de problemas? ix.
Da explicação situacional deduzem se claram ente os nós críticos que devem ser objeto de intervenção planejada?
x.
Q ue corp os teóricos ou ideológicos estão subjacentes à explicação situacional? O racionalismo científico? Os padrões de conduta burocrática? O imediatismo do conflito político? O futurism o idealista?
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xi.
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As afirmações da explicação situacional são verificáveis em algum plano empirico de análise? Foi realizada a verificação?
xii. Há relação de coerência en tre a precisão da informação que susten ta a análise e a precisão das conclusões dessa análise? xiii. Qual a técnica usada na explicação da situação inicial? Um modelo qualitativo? Um modelo quantitativo? Um modelo misto? Um mero relato? A opinião de especialistas? Há posições divergentes? Quais são as questões que provocam divergência? Conhecidas as diferentes visões internas e externas, a força social que desenha o programa a partir da situação inicial e suas perspectivas deve precisar alguns critérios básicos que orientam o desenvolvimento do trabalho. Esses critérios básicos devem referirse pelo menos às seguintes questões: i.
restriçõ es inevitáveis segundo a visão do ator. P or exemplo, podese estabelecer a inconveniência ou não de mudanças bruscas, a negação ou aceitação de mudanças nas regras geno estruturais, etc.;
ii.
aspectos de grande importância e de consenso, evidentes ou indiscutíveis para a equipe de trabalho e que ninguém questiona. Devese enumerálos e sistematizálos, verificar se convém questionálos e que incidência o questionamento teria sobre as conclusões;
iii. problemas reconhecidos como im portan tes, mas cuja abordagem é duvidosa ou conflituosa. Analisar o custo de adiálos, saber se podem ser solucionados por critérios aceitáveis e por que são conflituosos; iv.
critérios muito arraigados na força social que pro põ e o plano mas inadequados segundo as análises mais recentes da situação inicial. Conseqüentemente, uma ação eficaz implica um conflito interno ou um problema interno de inadequação da explicação do ator à realidade. Eles existem? Quais são?
3 O Momento Normativo
3 3 6
a.
Política, Planejamento e Governo
Programa e Plano
O momento normativo é a instancia de desenho. Desenho de quê? Do conteúdo propositivo do plano que precisa como deve ser a realidade, em contraposição aos problemas presentes. Mas o desenho normativo incide também sobre como deve ser a estratégia (M3), como deve ser a decisão e a execução do plano (M4) e como deve ser a norma que serve de referencia para explicar a situação pre sente (M l) e selecionar os problemas. Assim, emb ora o centro do m om ento normativo seja o deve ser do conteúdo do plano, os outros momentos do processo de planejamento estão sem pre presentes. O desenho do plano abrange diversos níveis de generalidade e es pecificidade. Começa com o programa (linhas e critérios), continua com o programa direcional (precisão global em nível de projetos de ação), prossegue com a desagregação do plano na ma triz geral problemas-operações, passa à subdivisão do plano em subplanos (os módulos 0P), para em seguida desagregar as operações em apões e as ações em subações. Essas partições derivam da necessidade de descentralizar para que o planejamento seja criativo e democrático, em bora devase ao mesmo tempo respeitar certos critérios de coerência global, indispensáveis para a eficácia da condução. Essa enumeração de diferentes níveis de precisão operacional não constitui uma seqüência necessária no desenho norm ativo. Há operações que antecedem o programa direcional, há ações que precedem operações. O importante não é seguir uma ordem lógica e formal estrita, que muitas vezes agride a racionalidade prática; im po rtante é perfazer as instâncias do processo de cálculo, equilibrando os critérios de coerência global e criatividade descentralizada. O programa é uma oferta de enfrentamento de alguns problemas. Essa oferta, se obtiver aceitação, convertese num compromisso. Mas a aceitação da oferta pela base que tem legitimidade para tal depende da apreciação que ela faz do valor dos problemas incluídos na oferta e da eficácia do processo de intercâmbio de problem as, que está implícito no caminho proposto pelo dirigente.
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Assim, os níveis básicos em que o ator faz seu desenho normativo são: Programa de Base
i Programa Direcional
4 Matriz Problemas-Operações
i Módulos O -P (subplanos)
4 Ações e Subações
O programa é também uma convocação à ação. Em nível político, pode ter a form a de um pro grama eleitoral: no nível de um dirigente, pode ser uma pro posta de desenvolvim ento da em presa; para um dirigen te sindical, a sua plataforma de luta p or novas conquistas para os tra balhadores. Essa proposta de ação compreende diversas dimensões políticas, econômicas e culturais. Como proposta ela se diferencia do plano, da mesma forma que uma idéia representa apenas o ponto de partida do projeto que perm ite realizála. Diferenciase também do processo de planejamento, da mesm a form a que um passo é apenas um ato repetitivo do processo de caminhar. O programa de governo é o ponto de partida de um processo que, num momento posterior, deverá traduzirse num sistema incessante de discussão e cálculo que precede e preside a ação da força dirigente. Na prática da luta política, norm alm ente cada força com pete com as outras com base num programa. Que diferenças há entre esse tipo de pro grama e o plano de governo? Chamemos programa àquele tipo de oferta social utilizada pelos atores sociais para com petir pela adesão de um a base humana à qual q uerem servir —adesão que também é necessária para somar força e legiti
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Política, Planejamento e Governo
midade. O programa estabelece um compromisso do dirigente com a base social que ele te nta repre senta r ou com a organização que ele p ro põe dirigir. O programa expressa a direcionalidade que um ator quer dar à mudança da situação presente. Mas essa proposta não cobre de maneira homogênea a totalidade relevante para a ação, nem tem dimensionamento rigoroso. Neste sentido, o programa é um enunciado de propostas que expressam a direcionalidade desejada por um ator social e refletem diferentes graus de avanço no estudo dos âmbitos que o integram, bem como diferentes níveis de precisão desses âm bitos no m om ento de sua declaração. O programa é formulado para que suas intenções sejam conhecidas e debatidas, permitindolhe ganhar adesão da base: ele não tem o objetivo de constituir um esquema rigoroso de apoio à ação. Não é um cálculo de apoio à ação, é um recurso de comunicação em busca de apoio. Por essa razão o programa admite ampla heterogeneidade de âmbitos e precisões, sem prejuízo de sua eficácia política como convocação à ação. Essa heterogeneidade revela, por vezes, as contradições internas do ator. Por exemplo, em alguns âmbitos aparecem posições mais gerais e flexíveis, enquanto em outros demonstrase extrema rigidez, reforçada por precisão detalhada de critérios e pro postas. A precisão e o detalhe de um programa servem também para descartar alternativas e reduzir o espaço de outras opções admissíveis. Pode também expressar uma ,;ie rarquia das preocupações do ator, como, por exemplo, a ênfase na questão ecológica, acompanhada de posições precisas, detalhadas e concretas sobre o tema. Essa precisão e detalhe colocam fora do espaço direcional do ator qualquer proposta que divergente de suas posições. Assim, o detalhe exclui possibilidades. A heterogeneidade do programa admite também o oposto: a ambigüidade, que oculta diferenças de posições entre as distintas tendências das forças que integram o ator. Uma posição muito geral acerca das relações exteriores, por exemplo, pode ter como causa a existência de fortes divergências sobre o tema —a convocação pragmática cobre essas diferenças recorrendo a critérios muito gerais.
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A heterogeneidade das propostas de ação no programa é uma “licença política”. Existe para permitir formalmente o consenso, e todos sabem que é preciso ler nas entrelinhas para distinguir os compromissos sérios dos comp romissos de opo rtunidad e, nos quais está ausente, desde o início, a vontade de cumprilos. Mas a linguagem do programa permite distinguir os compromissos das expressões sem força para a ação. Os enunciados não assumidos com seriedade expressamse com o o bjetivos ambíguos, sem indicação dos meios necessários para cum prilos. E sempre mais fácil para um ator obter consenso interno sobre os objetivos do que sobre os meios reque ridos. Por exem plo, n inguém discute o objetivo de redistribuir a renda, mas cada tendência tem sua idéia de com o e quando fazêlo. Essas idéias podem ser não apenas diferen tes, mas às vezes contraditórias. Como o programa não supõe nenhum a prova de imputação de efeitos, nem de consistência entre meios e objetivos, essas diferenças permanecem ocultas, veladas por uma fraseologia ambígua que admite várias interpretações, conforme a vontade das tendências em conflito. Por essa razão, q uando chega o m om ento da primeira prova de consistência na formulação do plano, as diferenças afloram e os conflitos escondidos no prog ram a aparecem com nitidez. Conseqüentemente, o problema de desenhar um plano supõe su perar a mera convocação política do pro gram a, legítima, para se construir uma proposta que resista às provas de consistência, coerência e viabilidade. A mera existência dessas provas exige do plano um grau de precisão qualitativa e quantitativa que o pro gram a não te m nem necessita te r, enqua nto instrum ento de convocação aberta. A principal função que o programa deve cumprir é definir um marco de direção viável, capaz de orientar posteriormente o processo de planejamento, entendendose este como método de condução para alcançar aqueles objetivos. O plano tem um triplo caráter: convocação, com prom isso e guia para a ação prática. As precisões anteriores levam necessariamente a distinguir entre dimensão pública e dimensão interna de um plano. Pode ocorrer que muitos pressupostos políticos e econômicos, bem como a maioria das considerações sobre a forma de construir a viabilidade política do plano, não devam nem possam ser públicas antes que se executem certas ações.
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Política, Planejamento e Governo
Mas é inevitável que a parte pública e normativa do plano esteja rigorosamente apoiada num conjunto de análises, supostos e hipóteses protegidos pela discrição com que usualmente são tratados alguns aspectos da política e da economia. Por esse m otivo, ao se abord ar mais adiante alguns problemas de m étodo para o desenho de um plano, d evese ter em conta que cada força política decidirá que parte ou aspectos da análise proposta são de uso inte rno, e quais devem constitu ir argum entação pública pre sente no discurso norm ativo do plano.
b.
Corno se Faz um Programa de Governo
A prática de formulação de programas de governo na América Latina tem sido, com freqüência, assistemática, frustante e com influência limitada à campanha eleitoral. Mais tard e, du rante o govern o, esse pro gram a é esquecido, pois em geral é im praticável, in coerente e alheio aos interesses das forças que pesam na tomada de decisões. Assim, o pro gram a de govern o to rn ase m era lembrança de promessas que não foram feitas para serem cumpridas. O estilo político latinoamericano é forte em recursos para ganhar eleições, mas fraco e até primitivo em capacidade para conquistar a po pulação através da eficácia no governo. Nele, o que se observa é que as promessas ambiciosas do programa dão lugar ao realism o passivo, tardio e acomodativo. Essa prática, erosiva da democracia, tem algumas características próprias. (a) A formulação do programa de governo não se apóia em m eto dologias que permitam analisar sua eficácia e coerência. Na realidade, não se apóia em metodologia alguma. A formulação fazse norm alm ente p or setores e políticas, med iante formulação de numerosas equipes que “diagnosticam” e propõem as coisas mais variadas, sem uma estrutura central que selecione prioridad es e indique direcionalidade consistente. Assim, o pro gra m a de governo tem os mesmos defeitos de um plano tradicional, acrescidos da ambigüidade, dimensão e incoerân cia freqüentes nas ofertas eleitorais. Tende a ser um conjunto
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de generalidades que não diferencia as ofertas eleitorais, não penetra nas causas reais dos problemas e não aponta para sai das imaginativas viáveis. (b) Não há sinceridade no con teúdo do programa de governo, pois é utilizado co mo m ero in strum ento eleitoral. Em geral os dirigentes não querem desviar sua atenção da campanha eleitoral para questões que, acreditam, poderão ser estudadas e decididas mais tarde. Está implicitamente suposto neste cálculo que o tempo dedicado ao programa concorre com o tempo necessário para ganhar as eleições. Não se procura vencêlas com um programa de governo, mas utilizálo apenas para ganhar eleições. (c) Não há correspondência entre os conhecimen tos, experiências, propostas e interesses que formam o projeto nacional da equipe de direção dominante e as que surgem das equipes que elaboram o programa, pois essas últimas são fundamentalmente um meio indiscriminado e assistemático de participação técnica, política e popular para reforçar a agregação de forças no momento da campanha. (d) Não há confrontação real de posições na elaboração do pr o grama, porqu e as equipes que efetivam ente e tradicionalmente pesam com suas posições divergentes sabem que convém es perar até o período de governo para, só entã o, dirim ir essas questões. Elas o farão apoiadas na correlação de forças vigentes na ocasião, que será distinta da predominante na campanha eleitoral. Já as equipes jovens, emergentes e mais audazes iludemse com o programa, porque naquele momento não encontram oposição às suas idéias renovadoras. O conflito entre continuidade e mudança fica, portanto, adiado para mais tarde, durante o governo, quando as forças da continuidade se revigoram e tendem a dominar sem contrapeso. Essa fuga tática do continuismo reforça a insinceridade do programa e re pro duz o ciclo re petitivo de programas ambiciosos e governos que desiludem.
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Política, Planejamento e Governo
(e) Há excessiva concentração no conteú do propo sitivo do p ro grama, e esquecimento da seleção de Quadros homogêneos, com capacidade política e técnica, que mais tarde deveriam ser o núcleo de funcionamento eficaz do governo. A realidade muda e isso obriga a revisões e traduções permanentes do pro gram a de govern o em planos flexíveis e diversos. A grande falta de condução na América Latina devese à extrema debilidade de equipes tecnopolíticas de alto nível. Mas o estilo do político latinoamericano personalista, im pro visador e acostumado a navegar na superfície, sem um bom suporte de análise situacional, não valoriza o permanente, as equipes de governo de boa formação; concentrase no transitório, o conteúdo do programa. O que faz um governo ser eficaz não é o pro gra m a ou o plano elaborado de uma só vez, com esforço anormal; é a capacidade das equipes de direção em fazer e executar uma seqüência de planos apropriados às circunstâncias variáveis de cada momento. O programa é um produto; as equipes são a capacidade acumulada de produzilo e renoválo para m ante r sua vigência. O período de form ulação do p ro grama deveria ser também o período de formação de novos Quadros do governo. Não podem os nesta obra abordar todos esses temas; devemos necessariamente concentrarnos no problema do método para formular programas. Nossa proposta de planejamento situacional orienta essas necessidades metodológicas no sentido de considerar os seguintes requisitos: Primeiro: o programa deve ser sincero e representativo. Isto supõe que ele deve realmente representar o proje to ín tim o da direção, as necessidades e demandas das forças sociais afins, e ter capacidade para gerar credibilidade. Nenhum desses requisitos deve ser confundido com ingenuidade; o programa tem um aspecto público de oferta eleitoral e um aspecto menos público de guia para a ação de go ver no. Esses aspectos enfatizam distintos matizes, mas não podem ser contraditórios. Este primeiro requisito exige que as equipes centrais de coordenação do p ro -
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grama sejam interdisciplinares, combinem capacidade intelectual com experiencia política e peso político com peso intelectual. Segundo: o program a pode e deve ser formulado com participação massiva da população, com base, porém, numa direcionalidade previamente definida e segundo métodos uniformes. A participação massiva faz da formulação do programa um instrumento de adesão e compromisso político, dotandoo de força e legitimidade. A direcionalidade e o m étodo são essenciais para conciliar as necessidades e demandas da base, perm itindo uma estratégia global eficaz e viável para governar em torno de um projeto político. A qualidade política e técnica de um governo não é garantida por equipes elitistas, que pensam pelos outros, mas por equipes de elite envolvidas no diálogo com a realidade política concreta, na base. Terceiro: para cumprir os requisitos anteriores o debate sobre o pro grama deve iniciarse simultaneamente em três planos: i.
no mais alto nivel político e técn ico, para selecionar os ma croproblemas que o programa abordará e que o governo, in divisivelmente, assumirá como responsabilidade coletiva;
ii.
no nível interm ediário, para selecionar os problemas de alcance nacional a serem abordados no programa, como responsa bilidades institucionais, nacionais e específicas;
iii. no nivel de base, para selecionar os problem as de alcance e responsabilidade regional e local. E preferível que as equipes de trabalho do programa formemse com base nesses problemas, e não po r setores ou por políticas. De qualquer forma, o conceito de setor aparecerá como um requisito de análise de alguns macroproblemas económicos. Todo este livro é uma defesa do enfoque por problemas, e não é necessário acrescentar aqui novas argumentações. Assim, pode haver entre seis e dez equipes para os grandes macroproblemas, de 20 a 30 equipes para os problemas de alcance nacional e centenas de equipes para os problemas de alcance regional e local. Uma equipe de coordenação central teria de se preocu par com a coordenação destes três níveis de trabalho e de seus m étodos.
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P olítica , P lane jam en to e. Governo
O conjunto de problemas selecionados marca, em princípio, a di recionalidade do programa de governo, cria exigências para os setores econômicos, atribui futuras responsabilidades institucionais e define os setores sociais afetados. Quarto: a equipe de coordenação central, com assessoria apropriada, atribuirá um valor políticotécnico a cada problema, considerando os seguintes critérios: i.
valor que a população e as forças sociais atribuem ao pro ble ma. Isto po de ser feito através de pesquisas, entrevistas, etc;
ii.
papel desem penhado pelo pro blem a na apreciação situacional de conjunto, ou seja, na trama de causalidades entre os pro blem as. Devese considerar, aqui, a possibilidade de dissolver alguns problemas em outros de maior hierarquia e dimensão;
iii. possibilidade de enfrentar cada problema com resu ltados significativos visíveis dentro do período de governo; iv.
custo econômico de enfrentar ou ignorar o problema;
v.
custo político de enfrentar ou ignorar o problem a.
Não há um a fó rm ula precisa que combine esses diferentes critérios num indicador único de prioridade; o juízo político é o elemento decisivo para selecionar o arquivo de problemas do programa. Após avaliar cada um dos problemas, deverá ser examinado o peso que têm no programa: i.
os problem as terminais, de alto valor para a população, em re lação à totalidade do arquivo de problem as;
ii.
os problem as atuais, em relação aos problem as potenciais;
iii. problemas cujo enfrentam ento produz resultados no período do governo versus problemas cujo enfrentamento só produzirá resultados valoráveis pela população num prazo mais longo. Esses critérios seriam aplicados centralmente para macroproblemas e problemas de alcance nacional, e descentralizadamente para problemas de alcance regional e local. Quinlo: as equipes organizadas por problemas, nos três níveis mencionado s, fariam uso flexível das técnicas de análise por problemas e
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desenho de operações, segundo suas capacidades e o treinamento rece bido. A medida que avançam os trab alhos das equipes, vãose aperfeiçoando as instruções e restrições vindas de cima e as demandas vindas da base. Assim, o prog ram a teria a seguinte estrutura : i.
um a apreciação situacional de con junto , de onde emanariam os critérios concretos para selecionar os problemas;
ii.
um a análise dos macrop roblemas que conformam o con texto geral do programa e as operações que os enfrentam;
iii.
um a análise dos problem as de alcance nacional e das operações destinadas a enfrentálos;
iv.
um conjun to de programas de govern o locais que constituem um compromisso de ação local, mediante operações locais complementadas com ações nacionais.
Esses compromissos locais podem ser bem utilizados na campanha eleitoral, pois em geral têm alto impacto político e são pouco exigentes em recursos de poder e recursos econômicos. A precisão, análise e valo ração das operações é matéria para o plano de governo; o programa apenas os apresenta de forma geral, a não ser que a precisão de algumas operações seja eficaz para os objetivos da campanha eleitoral. Sexto: a coerência do programa de síntese, no qual culmina todo esse esforço coletivo, fica, assim, garantida de antemão, pois: i.
os macro problem as e as operações que os enfrentam con stituem o marco de coerência dos problemas de alcance nacional;
ii.
discu tese a incidência local dos prob lem as de alcance nacional, bem como sua complementariedade em relação aos programas locais;
iii. trabalhase, desd e o início, com listas de pro blem as, avaliados segundo seu valor político e técnico, em cada caso. Sempre haverá questões de coordenação entre os três tipo de pro blemas indicados, bem como no in te rio r de cada tipo de pro blema. Mas, no que concerne à precisão de um programa de governo, essas questões são contornáveis, sem complicações metodológicas, pela equi
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pe de coordenação central. O grau de compromisso político que se alcança com essa proposta é muito maior, como o demonstram as experiencias de aplicação de técnicas descentralizadas de análise por problemas. O conjunto de problemas selecionados e seu enfrentamento com operações deve constituir uma estratégia. O programa não pode ser um mosaico de módulos inorgânicos. Essa é a tarefa mais complexa de urna equipe políticotécnica central, imaginativa e bem treinada. Nessa proposta , o pro gra m a de govern o to rn ase um marco de compromisso para o plano de governo. A população pode, assim, constatar a continuidade entre programa, plano e resultados, reforçando ou recuperando sua credibilidade nos compromissos políticos eleitorais. A mudan ça do estilo d e fazer política deve com eçar pelo abandono da tradição de insinceridade dos programas de governo. A melhor campanha eleitoral é aquela que antecipa com seriedade os compromissos realizáveis no governo, na qual a população participa da análise dos problemas, toma consciencia das restrições e possibilidades, de solucionálos e comprometese com o projeto que contribui para elaborar. Essa participação compromete mais que a propaganda e facilita a compreensão dos sacrificios e das soluções parciais. A insinceridade do pro gram a e os m éto dos pu blicitários do m ark eting político são um vicio que acaba por desprestigiar os partidos políticos e a democracia. O marketing político só tem sentido quando sustentado por um com promisso sé rio, que fortaleça a credibilidade do sistema político . A mentira, além de uma infração à ética política, é ineficaz quando repetida sempre pelas mesmas partes. O custo dessa prática é o descrédito dos partidos políticos e do sistema democrático. A idéia central de nossa proposta consiste em estimular as organizações de base e as organizações especiais a estudar os problemas de seu interesse e a trazer para o programa de governo as suas valorações e conhecimentos. A campanha eleitoral deve ser também um processo de reflexão da cidadania, em vez de mero estímulo a reflexos emocionais. O método de análise de problemas prestase maravilhosamente para m otivar a população de fo rm a responsável e com pro m etê la com determinadas soluções. Por esta via a população organizada participa da
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campanha eleitoral, não como massa conduzida e manipulada de cima, mas como governante de seu próprio destino. O compromisso que nasce dessa participação é bem mais firme e sólido que a adesão induzida pela publicidade . Por esse m éto do , os dirigentes da campanha eleitoral e o candidato presidencial em particular comprometemse com um programa de governo que não contém apenas frases gerais e ambíguas, mas também problemas meditados e prioritários, e operações e ações para enfrentálos. Os problemas e as operações constituem o tema central do programa, como um contrato social entre o futuro governante e os cidadãos que lhe delegam seu poder e lhe incumbem de uma tarefa. Tratase de uma mudança importante nas práticas políticas, mas é algo que se alcança gradualmente. Uma nova concepção do programa de governo pode ser o início de uma forma moderna e potente de fazer política, elevando também a maturidade dos cidadãos. As técnicas im portadas de mark eting político desvalorizam se dia a dia e terã o de ser substituídas por contratos ou compromissos de ação, assumidos de forma responsável com as forças e organizações sociais. O governante deve prestar contas à naçãosóbre o cumprimento de seu programa.
c.
A Direcionalidade do Plano e o Programa Direcional
O plano propõe uma direção que se expressa no arco direcional Si —> So indicado pelo dirigente. Sua convocação marca um a direção. Esse arco é uma linha direcionada que existe apenas em nossas cabeças. Não é um caminho que se descubra, é um caminho que se tem de fazer. Mais adiante, a estratégia consistirá em contornar os obstáculos para criar e percorrer o caminho indicado pelo arco direcional. Isto significa fazer o caminho ao andar, primeiro como simulação para prever possibilidades, depois como realidade, apre ndendo com cada experiência. Esse caminho criase e percorrese em ziguezagues, buscando situações intermediárias que melhorem as condições para seguir avançando até a situaçãoobjetivo. Mas, para não perder a orientação nesses ziguezagues e cair num desvio, é necessária uma bússola. Este é o papel do arco direcional e do prog ram a direcional, sendo este último um a relação
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mais precisa e completa que o arco direcional, pois define a cadeia meios —> produto —» resultados, em diversos cenários. A direcionalidade é o aspecto normativo do plano e desenvolvese no nível da argum entaçã o, análise e consistência do deve-ser. E nele que uma força social expressa sua vontade de alterar a realidade do é e do tende a ser, para materializar um deve ser distinto, com novas tendências e realidades. A direcionalidade do programa procura responder a perguntas como: para onde queremos ir com a mudança situacional? Que tipo de sociedade procuramos construir, com que características? Quais são os objetivos e metas razoáveis de se alcançar no período de governo, e que consistência têm na sociedade a que aspiramos? Nós nos aproximaremos ou nos afastaremos dela, durante o período de governo? As respostas a essas perguntas são complexas e envolvem problemas políticos, econômicos, sociais, ideológicosculturais, organizacionais, legais, ecológicos, éticos, estéticos, etc. Tampouco existem res postas científicas; podem os apenas procurar ser o mais rigoro sos possível na aplicação de nossas ideologias e nossos valores para a solução das questões colocadas. Para ser rigorosos devemos recorrer às ciências, mas essas não são suficientes. Temos de apelar para nossos valores, para a experiência e intuição, articulando na totalidade situacional os conhecimentos parciais que as ciências sociais, e todas as ciências em geral, fornecemnos. Por essa razão, o desenho de um plano é, principalmente, um ato político só parcialm ente fu ndamentado nas ciências. O plano não é um a investigação científica, nem mera aplicação de teorias aceitas e eficazes. Nessa análise, devem os evitar confu ndir direcionalidade com velocidade de mudança. Em algumas concepções econômicas mecanicistas o pro ble m a reduzs e a um crescimen to rápido da pro dução nacional. A velocidade, tanto da mudança situacional quanto do crescimento do produto nacional, é um aspecto adjetivo da direcionalidade; natu ralmente, a virtude da velocidade depende da direção. Podemos ir rapidamente para um abismo social. Não é melhor ir lentamente numa boa direção? Assim, crescer ou mudar com rapidez não é um objetivo em si, mas uma medida da magnitude da mudança por unidade de tempo. Mas
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essa mudança sempre se dá numa determinada direção. Não é possível avançar (ou retroced er) sem marcar um a direção. Toda opção direcional tem um custo alternativo. Esse custo é político, econômico, organizacional, ético, etc., e se relaciona com a distri buição do poder, da liberdade, do capital, do produto nacional, dos conhecimentos, da segurança individual e coletiva e de muitas acumulações que possuímos e valoramos de forma desigual. Por exemplo, se decidimos considerar a pobreza crítica e a marginalidade social como aspectos da paisagem social, para evitar agora conflitos com interesses poderosos, isso se pagará am anhã com acum ulação de problemas, maiores conflitos e soluções mais custosas. Eludir os problem as não traz benefícios a longo prazo. Apenas posterga e multiplica os custos. Assim, programar num espaço direcional limitado exclusivamente ao consenso trará, mais tarde, custos alternativos em acumulação de problemas e desacumulação de poder. O discurso normativo que marca uma direcionalidade é também um instrum ento para conscientizar e buscar consenso so bre a magnitude e a im periosa necessidade de solucionar determinados problemas e alcançar certos objetivos. A direcionalidade de um plano é marcada por três variáveis: i. ii.
a seleção dos problemas; a seleção dos meios políticos, econôm icos e organizacionais para enfrentar os problemas; iii. a busca de resultados, com o conseqüência do uso dos meios para enfrentar os problem as.
O programa direcional é a articulação dessas três variáveis. Ele assume a explicação da situação inicial (Si) para selecionar os problemas (Pr), precisa os projetos de ação (Py) para enfrentálos em seus nós críticos e esboça a situaçãoobjetivo que seria alcançável em conseqüência do efeito dos pro jetos de ação. Desta forma, o programa direcional de um ator social é o conjunto de meios ou atos de intervenção social capazes de gestar uma dinâmica causal de mudança situacional na direção e velocidade necessárias e suficientes para alcançar, com boa aproximação qualitativa e quantitativa, a situaçãoobjetivo assumida como compromisso.
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Em outras palavras, o programa direcional é um compromisso de ação e resultados; é uma proposta normativa. Através dele o dirigente pro cura estabelecer um novo eixo direcional que aponte para a situação objetivo e permita alcançála num determinado tempo. Chamamos pro jeto de ação ao conjunto de operações que enfrentam a situação de um a área problemática. O programa direcional não é uma estratégia e tampouco é uma política. Não é uma estratégia porque não indica a forma de construir a viabilidade do plano. Não é uma política porque, em nossa concepção, uma política é o modo de fazer ou desenvolver uma estratégia na prática. Nessa divisão de tarefas, a estratégia é um modo de pensar a política, e a política um modo de fazer uma estratégia. Já o program a direcional é o momento normativo de ambas. Se designarmos a situação inicial por Si, os problemas selecionados por Pr, a situaçãoobjetivo por So e por Py os pro jetos de ação selecionados para atuar no arco Si —» So, o prog ram a direcional pod erá ser expresso pela seguinte relação:
(Py1, Py2, Py3 ...... Pyk)
Si (Pr1, ..., Prj)
— >
So
Está aqui suposto que Sr, a situação resultante devido ao impacto do conjunto (Pyk) de projetos de ação, é aproximadamente igual à situaçãoobjetivo So. Na relação anterio r, PI | Si significa que PI é aplicado so bre a situação inicial Si ou alguma das situações intermediárias implícitas no arco Si —>So, e o signo —>indica um a implicância causal, indica que a conseqüência provável de Pi —>Si é So. A direcionalidade do plano é sintetizada na matriz Projetos de Ação —Problemas. Nela o dirigente define os alvos da realidade que orientarão sua ação e os projetos por ele selecionados para alterálos. Em relação a esses problemas e através desses projetos ele se compromete a alcançar os resultados que ele anuncia com a situaçãoobjetivo. As casas da matriz contêm os nós críticos que os projetos de ação enfrentam. O asterisco indica que o projeto de ação correspondente foi desenhado com o propósito preciso de afetar esse problema; conseqüen
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temente, essa célula contém todos os nós críticos que explicam o VDP do problema. Dessa forma, no sentido vertical qualquer projeto de ação que ataca o problema Prl referese a algum nó crítico incluído no con ju nto de nós da célula onde está o asterisco. MATRIZ PROJETOS DE AÇÃO - PROBLEMA S
PD1
ü
P 02
U
PD3
U . . . . PDJ — ^ P D M
No sentido horizontal estão as intersecções dos nós críticos enfrentados por um mesmo projeto. Aqui aparecem os nós críticos comuns a diversos problemas.
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A explicação dessas intersecções está em que os problemas super põese tal como se m ostra no esquema seguinte. Os problemas têm nós críticos comuns; os projetos de ação têm, por conseguinte, operações comuns e isso re sulta em im pactos de signo distinto sobre os descritores comuns dos VDP dos problemas. Em alguns casos os impactos são reforçados por efeitos com o mesmo signo, mas em outros os signos podem ser opostos. No desenho do programa direcional o que interessa, como critério de coerência global, é que o conjunto de projetos de ação que têm im pacto so bre um pro blem a tenha um balanço positivo sobre seu VDP, com intensidade suficiente para alcançar a situaçãoobjetivo do problema. Em outras palavras, se cada problema tem seu próprio programa direcional que afeta, com signo positivo ou negativo, os programas direcionais dos outros problemas, o programa direcional do macropro blema (PDM) global do plano só será consistente se o balanço de efeitos em cada coluna da matriz Projetos de Ação —Problemas coincidir com o program a direcional de cada pro blema. Uma forma prática de trabalho consiste em formular programas direcionais por problemas, que se conciliam com os programas direcionais por áreas problemáticas, fazendose esses últim os coere ntes com o PDM. Assim, o programa direcional do macroproblema é a união coerente dos programas direcionais por problemas: PD1 u PD2 u PD3 u ... u Pdj = PDM =
(Pyk)| Si
-> So
N atu ralm ente , tratase apenas de uma im putação causal probabilís tica, baseada num modelo explicativo dos problemas apresentados pela situação inicial. É, p ortan to, uma relação que pode te r sérias limitações. Podemos escrever a relação anterior na forma: ------------- » (Pyk) I Si v y ' 1
p, r, t, o, e, ' ) Sr = So
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onde p é a probabilidade do Sr coincidir com So, r indica o limite de recursos com que pode contar o conjunto de projetos (Pyk), t representa o horizonte de tempo em que a relação é válida, o indica a existencia de feixe de trajetórias dos Pyk em que a relação se verifica e e define o cenário particular a que se refere o programa direcional. Como podemos observar, a igualdade Sr = So depende do cum prim ento de cinco condições. A condição de ordem o merece uma explicação especial, que será com plementada na análise do m om ento estratégico. O program a direcional contém implicitamente numerosas trajetórias dos projetos de ação. Com efeito, o arquivo de projetos de ação pode estar ordenado em diferentes seqüências de execução. Primeiro, alguns projetos ou partes deles, depois outros. No entanto, algumas seqüências estão proibidas, outras são custosas ou arriscadas e algumas combinações talvez contradigam a situaçãoobjetivo perseguida. A condição o nos diz, portanto, que Sr=So apenas para algumas trajetórias de projetos Pyk. Essa questão pode ser ilustrada com um exem plo simples. Suponha que você esteja à margem de um riacho profundo e estreito num dia de muito frio. Você necessita atravessar o riacho porque o vento levou seu chapéu para a ou tra m argem. A seu lado há uma tábua de m adeira resistente, com extensão suficiente porém muito escorregadia. Sem sapatos, talvez possa utilizála como ponte. Examinemos agora o seu problema: Si So
— situaçao inicial: está sem chapéu no frio. — situaçãoobjetivo: voltar a estar abrigado com seu chapéu.
Operações selecionadas: 01 02 03 04 05 06 07
= tirar os sapatos; = colocar a tábua no riacho; = atravessar o riacho sobre a tábua; — pegar o chapéu; = voltar ao po nto de origem; = calçar os sapatos; — colocar o chapéu na cabeça.
Sao sete operações que podem ser ordenadas em diferentes seqüências ou trajetórias. O universo teórico de possibilidades é 7!, caso
Política, Planejamento e Governo
3 5 4
as operações devam ser realizadas uma a uma. As trajetórias possíveis são 5040, um número suficiente para desanimar alguém que quisesse examinálas e escolher a melhor. Tratase, po rém , de um problem a m uito simples, po rque a imensa maioria das trajetórias estão proibidas e as poucas que conduzem ao ob jetivo não apresentam diferenças de eficiência e eficácia. Po r exe m plo, as seguintes trajetórias são impossíveis: • Cru zar a po nte antes de colocar a tábua (03 >02). • Pegar o chapéu antes de tira r ou calçar os sapatos (04 —> 01) e (04 —> 05). • Pegar o chapéu antes de atravessar a po nte (0 4 —> 03), etc. Essas outras trajetórias são arriscadas: • • • • •
colocar o chapéu antes de voltar ao ponto de origem (07 —> 05). Atravessar a po nte antes de tirar os sapatos (03 —> 01), etc. Por últim o, há trajetórias que contradizem o objetivo perseguido: voltar ao po nto de origem antes de pegar o chapéu (05 >04). Tirar os sapatos e calçálos em seguida (01 —> 06), etc.
Natu ralm ente, esse exemplo é muito mecânico, de utilidade m eramente ilustrativa, porque as trajetórias de uma estratégia admitem muitas outras complexidades. Voltemos agora ao nosso problema central: a direcionalidade do plano. Num plano estratégico, o pro gram a direcional é flexível e mutável diante de cada nova situação. Cada vez que mudam a situação presente será necessário revisar a situação inicial, perguntarse sobre a conveniência de manter a situaçãoobjetivo e, conseqüentemente, readequar o conjunto de projetos selecionados.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situaciona l
355
O conceito de programa direcional sintetiza a normativa do plano global e é ab ase de todo o processo de planejamento. De forma simplificada, suponhamos que dois oponentes, de acordo com suas visões particulares da realidade, formulam seus programa direcionais da seguinte forma. Perspectiva do ator A l no governo Situação inicial
O partido no governo vive uma situação difícil. O país está em recessão econômica, há inflação e o desemprego cresce. As eleições para presidente da República estão próxim as e a popularidade do governo decresce. Situação-objetivo
O ator Al elabora um programa direcional em que considera necessário e possível recuperar adesão popular em grau suficiente para vencer as eleições presidenciais, destacando como resultados alcançáveis uma economia reativada, sem perder o controle sobre a inflação e sem deterio rar significativamente o nível de reservas internacionais. Projetos de Afão
PI — P2 =
P3 —
Programa de obras públicas para gerar emprego e aumentar a deman da interna. C ontrole de câmbio para evitar a perda de reservas e im posição de limites para o pagamento dos serviços da dívida externa. Escolha de um candidato a presidente com dimensão nacional, que transcenda a própria força do partido do governo.
Perspectiva do ator A2 na oposição Situação inicial
Condições favoráveis para recuperar a direção do governo nas próxim as eleições. O partido situacionista está desgastado, não pode reativar a economia, seu programa eleitoral não foi, em grande parte, cumprido, não encontra um candidato que o una, a inflação está em franca aceleração e os assalariados demandam reajustes de salários.
3 5 6
Política, Planejamento e Governo
Situação-objetivo
Ganhar as próximas eleições presidenciais e obter maioria no Congresso Nacional. Durante a campanha eleitoral, reorganizar o partido para ampliar sua base organizacional e elevar a qualidade de seus Quadros dirigentes. Projetos de ação:
Py4 •Py 5 Py 6 Py 7
— Bloquear o financiamento do orçamen to no Congresso Nacional. = Aprov ar um a lei de reajuste de salários. = Antec ipar a escolha do candidato presidencial. = Organizar e mo dernizar o partido.
Nesse exem plo simples, os problemas (pr) que o ator 1 seleciona são oportunidades (o) para o ator 2 e viceversa. A lista de problemas e oportunidades estão indicadas nos Quadros a seguir. Cada ator desenha uma matriz Projetos de Ação Problem a. Nas células dessas matrizes colocamos o signo do impacto do projeto de ação atribuído ou imputado pelo ator em seu programa direcional. Quando se trata de oportunidades, o signo (+) indica seu aproveitamento e o signo () indica seu nãoaproveitamento. Essas matrizes expressam bem a idéia de. que o normativo nunca pode ser estritam ente norm ativo; ele é sem pre afetado pelo estratégico. Problemas e oportunidades para A1
Problemas e oportunidades para A2
Pr1 = deterioração da popularidade do governo
021 = descontentamento popular
Pr2 = recessão econôm ica, inflação e desocupação
022 = responsabilldae do governo pela situação econômica
Pr3 = dispu tas internas para candidatura presindencial
023 = falta de unidade da oposição
011 = facilidades da oposição
Pr4 = passividade perante o governo
012 = eleitorado indefinido
Pr5 =
insuficiente adesão popular
357
Os Quatro Momen tos do Processo de Planejamento Situacional
O ator Al não pode deixar de pensar em A2 quando desenha seu programa direcional; o mesm o ocorre com A2. Um programa direcional se opõe ao outro . O que são problemas para mim são oportunidad es para o outro. Meus pro jetos de ação constituem problemas ou oportunidades para meu oponente. ATOR 1
PROBLEMAS
oportunidades
problemas
011/Pr4
Pr1 Pr2 Pr3
PROJETOS Py1
+
+
0
+
Py2
+
0
+
Py3
0
0
+
0
012/Pr5 +
+
Devese ter em conta, porém, que esse exemplo é um caso de conflito puro, em que as situaçõesobjetivo são excludentes e não há pro blemas de consenso. ATOR 2 problemas
oportunidades
021/pR1 022/pR2 023/pR3
Pr4 Pr5
PROBLEMAS
PROJETOS Py4
0
+
0
Py5
+
+
Py6
+
0
Py7
+
0
+ 0 +
+
0
+
+
+
+
+
+
Podemos agora voltar ao significado do programa direcional para entender seu alcance e coerência.
3 5 8
Política, Planejamento e Governo
A prova de consistencia de um programa direcional consiste em verificar se: ------------------------------ > (P1, P2, P3) | Si
Sr = So
A prova de consistencia deverá verificar se o conjunto de projetos selecionados é necessário e suficiente para materializar o arco direcional Si —> So. Caso isso oc orra, a situação resu ltante será m uito similar à sit uaçãoob jetivo. Mas como nada é fácil no processo social, o mais provável é que o pro gram a direcional não cum pra tal re quisito e reflita mais o volu ntarismo e a cegueira política que caracteriza esses cálculos. Nessas circunstancias:
-----------------------------> (P1, P2, P3)
|
Si
_ » So
isto é, o program a direcional conduz a um a situação re sultan te bem diferente da situaçãoobjetivo. Isso pode ocorrer por diversas razões: i.
pela cegueira inerente aos atores envolvidos num a situação;
ii.
po r má apreciação dos problemas e opo rtunida des, já que nos processos sociais complexos não há teorias, m éto dos e té cnicas que nos assegurem a possibilidade de um desenho correto dos projetos e do cálculo de seus efeitos num programa direcional;
iii. po r superestimação da pró pria força e subestimação das forças opostas; iv.
po r incapacidade cultural, científica ou técnica para desenhar proje to s adequados e pote ntes;
v.
por incapacidade de gestão e organização, que faz com que os proje to s bem desenhados sejam desvirtuados na prática.
Convém distinguir dois casos extremos, freqüentes na prática social:
Os Quatro Mom entos do Processo de Planejamento Situaciona l
359
i.
os determinados po r restrições de pod er e recursos econômicos;
ii.
os determ inado s po r limitações culturais e cognitivas, junto com as de gestão e organização .
CASO 2: deslocamento económico-político
\
RE
requisitos da operaçao
Wr
cci
capacidades do ator CO
Para tipificar estes dois casos, limitemos a análise às quatro seguintes variáveis: CCI
=
cultura , conhecimen tos e imaginação; é a capacidade de conceber co rretam ente a idéia de um a operação, a partir de um a explicação situacional potente, e desenhála apropriadamente nos planos e espaços situacionais eficazes;
P
=
po de r; é a capacidade política de decidir, exe cutar e m anter em vigência uma operação até que o objetivo confundase com as tendências situacionais;
3 6 0
Política, Planejamento e Governo
RE
— recursos econômicos; é a disponibilidade de fatores econômicos, capacidade de produção e financiamento da operação;
CO
— capacidade de gestão e organização; é a capacidade de com bin ar todas as capacidades anterio res para gerar, pro duzir, controlar e adaptar uma operação às circunstâncias em mutação.
Nenhum a dessas capacidades é constante no horiz onte de tem po do plano, mas no m om ento norm ativo elas aparecem com o restrições fixas, que desanimam o dirigente a tentar superálas. A estratégia é um a form a de superar essas restrições. N aturalm ente a estratégia supõe a vontade prévia de alcançar a situaçãoobjetivo. No prim eiro caso dessa tipologia o ato r te m poder e re cursos econômicos suficientes, mas carece de capacidades culturais e organizacionais. No segundo caso, o problema é o inverso: o ator tem capacidades culturais e organizacionais, mas carece de meios econômicos e políticos. A coerência do programa direcional depende da pertinência e potência dos projetos selecionados. A contribuição do plano dependerá dessas provas fracas e imperfeitas de consistência real, que chamaremos de eficácia direcional, e da nossa capacidade para corrigir as deficiências com base na ex periência acum ulada em sua aplicação. O programa direcional movese estritamente dentro da lógica do deve ser e, c onse qüen tem ente, os projetos Py selecionados são os proje tos necessários ao cumprimento do programa. Se são ou não possíveis, e se requerem outros projetos para facilitar a viabilidade dos projetos direcionalmente necessários, são problemas de análise da viabilidade e do momento estratégico do plano. N ote se que o cum prim ento da coerência ou consistência do p ro grama direcional é independente das provas de viabilidade. Um programa direcional pode ser ao mesmo tempo inconsistente e viável, ou então consistente porém inviável. Como conseqüência, o fato de o plano cumprir formalmente com o requisito técnico de não requ ere r mais recursos econô micos do que os disponíveis e, portanto, de fechar a contabilidade nacional a preços constantes, não assegura em absoluto que a direcionalidade do plano seja a necessária para se atingir a situaçãoobjetivo.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
361
N aturalm ente, se o program a direcional é inconsistente, to do o plano desmoro nará se persistirm os nele. Por isso é tão im porta nte o processo de aprendizagem, pelo qual ajustam os e calibramos, passo a passo, os meios às circunstâncias e aos objetivos.
situação inicial (é)
direcionalidade do Plano (deve ser)
->
^
situação-objeto
->
__________________
71
viabilidade (pode ser)
Assim, direcionalidade e viabilidade são duas provas distintas e independentes pelas quais o plano deve passar. Estas duas provas constituem o fundamento de todo o planejamento, em sua instância de conhecimento que deve fazer a mediação com a ação. Se nos perguntarmos agora pela relação entre o programa direcional e o arco direcional de um plano, veremos com facilidade que o programa direcional não é outra coisa que o arco direcional complementado pelos projetos causalm ente necessários para realizálo.
O arco direcional é:
O programa direcional é:
( ? )
|
Si
—> So
----------------------------------------
(P1, P2, ... Pn)
|
Si
> -> So
Em última instância, um plano e uma sucessão de planos se justificam s e a utopia concreta perseguida pelo ator está na trajetória real da mudança situacional. A utopia concreta é o sistema ideal, a situação ideal ou a sociedade ideal almejada pela força social que planeja.
3 6 2
Política, Planejamento e (Inverno
A existência ou inexistência de trajetórias viáveis, entre o encade amento de situaçõesobjetivo dos diferentes planos realizáveis no tempo e a utopia con creta persegu ida, constitui a prova última da racionalidade de todo o processo de intervenção social. Desenhar um programa direcional significa resolver um problema quaseestruturado. Conseqüentemente, não pode existir a segurança de que seu desenho seja potente e coerente. Só podemos nos aproximar de um desenho razoável, ao qual imputamos eficácia suficiente para alcançar a situaçãoobjetivo. Essa afirmação é importante para interpretar corretamente as condições de necessidade e suficiência serem cumpridas pelos projetos de ação e operações que compõem o programa direcional. A rigor, a condição de suficiência supõe a possibilidade de enumerar exaustivamente as variáveis que afetam a eficácia direcional; no entanto, isso é impossível quando se trata de problemas quaseestrutura dos. .1
d.
Formulação de um Programa Direcional por Aproximações Sucessivas
O programa direcional é construído por aproximações sucessivas e é constantemente corrigido. Ele é sempre um programa direcional pro visório, sujeito a aperfeiçoam ento. Pensamos ser necessário abordar aqui os aspectos a seguir. (a) Formulação de uma hjpótese de situação inicial de síntese, que destaque: i.
as relações de forças existentes (peso relativo das diferentes forças em luta, em relação aos principais projetos em jogo);
ii.
o cenário internacional prevalecente e suas relações com a situação inicial —as limitações que impõe e as perspectivas que abre;
iii. problemas sobre os quais há consenso nacional en tre as forças relevantes e problemas só destacados pela força que elabora o program a;
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
363
iv.
m odelo explicativo da origem dos problem as selecionados;
v.
principais obstáculos para solucionálos.
(b) Formulação de uma hipótese de situação-objetivo. A situaçãoobjetivo deve ser precisa em relação aos problemas e elementos destacados no modelo explicativo da situação inicial. E im porta nte aqui distin guir dois planos de relevancia distin ta. Por um lado, o desenho da situaçãoobjetivo deve cumprir certos requisitos de método e conteúdo, que possibilitem mais tarde as provas de coerência a que será submetido o programa direcional. Por outro lado, em contraste com a situação inicial, a situaçãoobjetivo constitui um recurso de difusão e conquista de adesão pop ular, jun to com o program a de base e com o discurso norm ativo do pro gram a direcional. Deste último ponto de vista, a situaçãoobjetivo deve poder ex pressarse em term os publicitários eficazes. Daí dev erm os falar da capacidade semiótica da situaçãoobjetivo. Assim, a situaçãoobjetivo é o guia direcional do processo de mudança situacional, assim como a norma com a qual o ator p rocu ra adesão popular. Devemos lembrar que falamos de situaçãoobjetivo, e não sim plesm ente de objetivos. Essa não é uma diferença m enor, ou apenas semântica. Com efeito, para tentar verificar a consistência do plano é útil conceberlhe os objetivos como o vetor de resultados (VDR) de uma nova situação: a situaçãoobjetivo. Em outras palavras, chamamos situaçãoobjetivo àquela nova situação futura que, devido à alteração das ge noestruturas, fenoestruturas e fluxos de produção, produz um novo VDP cujas características são muito semelhantes aos resultados desejados e que na situaçãoobjetivo chamamos de veto r de resultados. Assim, deve ser cum prida a seguinte relação: VDPsr = VDRso
Como conseqüência da aplicação do plano, o vetor de definição dos pro blemas na situação resultante (V DPsr) deve ser igual ao veto r de re sultados esperados na situaçãoobjetivo. Se concebemos os objetivos como uma situação, podemos seguir os rastros do vetor de resultados
Política, Planejamento e Governo
3 6 4
(VDRso) e ver as características das genoestruturas, fenoestruturas e fluxos de produção, na situaçãoobjetivo, capazes de produzir tais resultados. Em outras palavras, a situaçãoobjetivo compreende também um explicado (VDR) e um explicando (novas características dos nós críticos que explicam o novo VDP). Enquanto elemento do arco direcional do plano, a situaçãoobjeti vo precisa um a direção e um alcance da mudan ça situacional. A direção reflete a orientação do arco direcional para uma ou ou tra situaçãoobjetivo. O alcance dimensiona o grau de avanço ou retrocesso num a determ inada direção. Definir uma situaçãoobjetivo implica optar entre alternativas de direção e alcance. Os arcos Si —> Soa e Si —> Soc têm a mesm a direção, mas o alcance de Si —» Soa é maior que o de Si —> Soc. Po r o utro lado, a direção de Si —> SOB é distinta da de Si —> SOA. No Gráfico, as marcas de alcance são repre se nta das com a le tra x e as marcas de direção com a letra y. O cruzamento de marcas de direção e alcance define espaços direcionais, dentro dos quais os diferentes atores sociais escolhem diferentes situaçõesobjetivo.
3*1 direpoo
¥ ^
1
1
— ► X1
x2
X3
X4
alcance
*5
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
365
Uma vez feita a opçao por uma situaçãoobjetivo, convém verificar a decisão tomada, fazendo as seguintes perguntas: i.
Exploram os satisfatoriamente as possibilidades de acordos e alianças? O que ganhamos com os acordos e alianças? O que perdem os com eles?
ii.
Foram bem valoradas as indicações de direcionalidade e alcance? Estão bem perfilados os espaços direcionais dos diferentes atores sociais?
iii. Quais são os fatores críticos que restring em ou ampliam os limites de direcionalidade e alcance? iv.
Verificamos as possíveis reações da pró pria força diante das opções de direcionalidade e alcance?
v.
Estão claras as diferenças e os problemas, ou fomos ambíguos na definição da situaçãoobjetivo?
vi.
Q ue fraquezas apresenta nossa situaçãoobjetivo diante de um ataque dos oponentes?
vii. A situaçãoobjetivo é precisa, ten do em vista a análise po sterior de coerência concreta do program a direcional? viii. Nossa situaçãoobjetivo é coerente no tratamento dos objetivos políticos, econômicos, sociais, culturais, ecológicos, de segurança nacional, etc.? Não há contradições? Tratase apenas de objetivos econômicos? Reduzimos os outros objetivos a objetivos econômicos?
c.
ix.
E um a situaçãoobjetivo que mobiliza a vontade popu lar ou limitase a tratar de objetivos friamente técnicos? Os problemas urgentes são atacados ou eludidos?
x.
Nossos objetivos provocam coesão ou desarticulação de no ssos oponentes?
Nós Críticos, Operações, Ações e Subações
Explicar a situação inicial é identificar os nós críticos da rede sistêmica causal que explica a realidade sobre a qual atuará o planejador. Uma análise da sensibilidade da manutenção, eliminação ou ampliação
3 6 6
Política, Planejamento e Governo
dos problemas selecionados, caso se alterem as características dos nós explicativos, indicará quais desses nós são críticos para atacar os pro blem as selecionados. Esses nós críticos se converterão em centros de intervenção ou aplicação das operações e ações. Eles podem referirse a qualquer âmbito situacional, seja ele político, econômico, social, cultural, cognitivo, ecológico, etc. Os projetos de ação, operações, ações e subações são os atos de produção social realizados pelas diferentes forças sociais. Esses atos podem ser uma iniciativa dessas forças para desencadear uma dinâmica de mudança situacional, ou podem surgir como resposta a atos de produção de algum oponente. Uma vez explicada a situação inicial e esboçada a situaçãoobjetivo, ambas numa primeira aproximação, o problema que resta para nossa expressão simbólica do programa direcional é a definição dos projetos que, aplicados sobre a situação presente, serão capazes de provocar uma dinâmica causal de mudança situacional que conduza à situaçãoobjetivo com uma razoável probabilidade de êxito.
( ¿) I Si —
>
SO
Uma primeira forma de abordar o problema é enfrentar cada nó crítico do modelo explicativo da situação inicial com algumas idéias de ação sobre eles. Por esse caminho, podese conformar uma primeira aproximação, em nível de idéias gerais, sobre o inventário de projetos que formariam o programa direcional. A estrutura modular do programa direcional permite fundamentar o desenho dos projetos de ação nos nós críticos do macroproblema glo bal. Por sua vez, cada nó crítico do m acro pro blem a é um pro blem a do plano, cujo fluXograma situacional perm ite detectar seus nós. Esses nós críticos que surgem da análise dos problemas fundamentam as operações. Mas cada nó crítico que explica parcialmente um problema gera um subproblema. Os nós críticos dos subproblemas fundamentam as ações. Por fim, os nós críticos dos subproblemas geram miniproblemas, cujos nós críticos fundamentam as subações.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situaciona l
367
Por um lado, conformase um sistema que dá coerência ao arquivo de problemas, subproblemas e miniproblemas do plano em relação ao macroproblema de síntese; por outro, articulamse os módulos de ação como um sistema recursivo onde os projetos de ação decompõemse em operações, essas em ações e essas últimas em subações. Ambas as estruturas modulares guardam correspondência metodológica, pois os projetos de ação enfrentam o macroproblema global, as operações atuam so bre os problemas, as ações sobre os subproblemas e as subações sobre os miniproblemas. Macroproblema global
->
Nós críticos do Macroproblema
Projetos de ação
Nós críticos dos problemas
Operação
Nós críticos dos subproblemas
Ações
IZ Problemas
l¿ Subproblemas
l¿ Miniproblemas
f.
Nós críticos dos miniproblemas
->
Subações
Revisão da Coerência do Problema Direcional
Em geral, a convicção sobre o próprio plano e o empenho com que o assumimos criam uma falsa segurança quanto a seus fundamentos. Crerse dono da verdade é uma inclinação muito situacional. A consciência da cegueira parcial com que se explica a realidade e se desenha um pro gram a direcional obriga a um exame das fraquezas do próprio plano. A dúvida situacional deve ser um recurso de rigor, que não com pro m ete a vontade de empreender o plano. E preciso uma instância de revisão perm anente dos fundamentos do plano, como sistema de aprendizagem dá experiência.
3 6 8
Política, Planejamento e Governo
Em cada revisão deveriam ser abordadas algumas questões, como as listadas a seguir. (a) Aju ste do program a direcional à explicação de um marc o es tático e provisório da viabilidade. Os critérios muito gerais sobre as restrições vigentes para o programa direcional devem agora ser explicitados e precisados. Isso supõe: i.
a precisão de um marco geral e provisório de viabilidade política, econômica e institucional;
ii.
um a análise estática (por hora) das forças sociais, seus interesses e relações de peso frente aos projetos e atos de intervenção social propostos no programa direcional. Essa análise implica responder às seguintes perguntas: quais são as posições da própria força em suas diferentes tendências? O que ocorre com os interesses e pesos das outras forças, sejam elas aliadas ou oponentes? Quais são os limites econômicos e institucionais da mudança possível?
iii. Ajuste do prog ram a direcional provisório ao marco estático de viabilidade. (b) Análise de consistência e coerência do program a direcional. As provas de consistência e coerência do programa direcional consistem em analisar nossas crenças e convicções sobre as implicações causais dos diferentes projetos selecionados. Para isso devemos responder, com o maior rigor possível, às seguintes perguntas: i.
Qual a contribuição de cada projeto para atingir a situa çãoobjetivo? Qual o balanço entre efeitos procurados e efeitos contraditórios? Aqui, cada projeto é julgado segundo sua necessidade para alcançar a situaçãoobjetivo.
ii.
A situaçãoobjetivo é suficientem ente precisa para se pro ceder à análise de coerência e consistência do programa direcional sem ambigüidade? O grau de precisão é o estritamente necessário ou há um excesso de precisão,
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
369
desproporcional à solidez ou debilidade dos cálculos que a fundamentam? iii.
Qual a força das tendencias situacionais atuais em relação à nova dinâmica causal que os projetos do programa direcional procuram desencadear? São tendências muito arraigadas e antigas?
iv.
Quais são os limites de eficácia e potência dos projetos previstos? Tratase de m eros atos de interv enção feno produtiva? De alteração das fenoestruturas? De alteração das genoestruturas? A alteração das fenoestruturas perm ite alcançar a situaçãoobjetivo ou são necessárias mudanças genoestruturais? Que tipo de fenoestruturas e que tipo de genoestruturas?
v.
Todos os problemas relevantes são con sistentem ente atacados para se alcançar a situaçãoobjetivo? Os projetos, além de necessários individualmente, constituem um conjunto suficiente de implicações causais para se alcançar a situaçãoobjetivo?
O esquema a seguir sugere as relações entre condição de necessidade e condição de suficiência dos projetos para se atingir a situação objetivo. Essas condições, no entanto, devem ser consideradas com a incerteza própr ia de um problem a quaseestruturado.
3 7 0
Política, Planejamento e Governo
(c) Explicação dos supostos relevantes da análise. A essa altura da análise é importante que nenhum suposto relevante fique escondido ou implícito, a fim de detectar possíveis vulnerabilidades no desenho normativo. Para tanto convém responder às seguintes perguntas: i.
Q ue cenários internacionais foram considerados? Por que esses cenários foram considerados como os mais prováveis?
ii.
Q ue alianças e com portam entos das forças sociais foram previstos ou estão implícitos em algumas apreciações? Por que tais alianças e comportamentos foram considerados mais prováveis?
iii.
Q ue surpresas possíveis foram descartadas, po r serem consideradas improváveis? Qual sua incidência no desenvolvimento do plano?
iv.
O que assumiremos com o comprom isso político no pr o grama direcional e o que guardaremos como reserva flexível para fazer frente a contingências desfavoráveis ou favoráveis?
v.
Foi bem estudada a coerência en tre os problem as e one rações de alcance nacional, estadual, municipal e local.''
Nesse exame crítico é m uito im porta nte verificar o mais rig orosamente possível a validade dos pressupostos de grande risco, distinguindo entre os de baixa e os de alta probabilidade e alto custo de incidência. Foram consideradas variantes de ação para eles?
g.
As Operações como Módulos no Plano
No planejamento tradicional as categorias de pro gram as, políticas, critérios, projetos, recomendações, etc. podem ser ambíguas, porque não tentam esgotar o universo de sua proposta com módulos de ação homogeneamente definidos. O plano tradicional não pretende ser um meio ou instrumento de organização para a ação. Já o planejamento si
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
371
tuacional estabelece como principio básico que o plano expressese inteiramente em operações ou módulos de ação, a fim de garantir a continuidade metodológica entre as linhas gerais e os requisitos práticos, exigida no planejam ento operacional descentralizado. Desta maneira, um programa direcional é uma forma de seleção e articulação das operações do plano. O plano pode ser visto como uma estrutura comunicacional que contém um sistema articulado dos cinco tipos de atos de fala enunciados pela teoria das conversações. Ele contém asserções e apostas, pois a explicação situacional integra asserções puras com apostas causais, que devem ser confirmadas ou refutadas na experiência prática ou, até que chegue o tempo real de sua constatação na prática, sãolhe imputadas uma veracidade ou falsidade provisórias, m ediante a experimentação ou sim ulação de p rocessos. Contém expressões, pois o autor do plano qualifica os fatos mediante frases adjetivas que aceitam, rechaçam e hierarquizam as asserções. Por exemplo, momento explicativo congratulamonos por certos resultados, quando conseguimos um alto crescimento do PIB; lamentamos ou condenamos certas situações, quando declaramos inaceitáveis os níveis de pobreza crítica; e priorizamos problemas e operações; quando afirmamos que o problema do desemprego é mais importante que o da inflação. Contém declarações, porque designa encarregados ou responsáveis pelo desenho ou execução das pro postas nele incluídas. Contém diretivas, porque ordena a outros, designados pelas declarações, executar e assumir determinadas obrigações. Por exemplo, ordena a um ministro de Estado executar a operação 0 4 /0 7 . Por fim, contém compromissos de ação, porque as propostas operacionais do plano são, em última instância, compromissos que seu ator assume perante a população e as forças sociais de um país. No planejamento situacional, as operações são compromissos de fazer algo para modificar as características de um ou vários problemas. Num plano nacional, esses compromissos são assumidos pelo presidente da República, ou conselho de ministros, no momento em que aprova o plano. N atu ralm ente, e apenas para fins operacionais, o pre sid ente, m ediante uma declaração, delega a outros funcionários a responsabilida 110
3 7 2
Política, Planejamento e Governo
de de cumprir e validar tais compromissos. De maneira que o plano se compõe centralmente de compromissos, e complementarmente de declarações e diretivas relacionadas com os primeiros. Como o ámbito propositivo do plano situacional é composto exclusivamente de operações, devese definir agora com maior rigor o que é uma operação, para que os módulos do plano não tenham seu produto terminal expresso por asserções, expressões ou meramente diretivas e declarações. Sem dúvida, o plano é também um processo comunicacional que contém os atos de fala mencionados, mas estes não constituem seu pro pósito term in al. A operação é um compromisso de ação para alcançar um resultado, mas na produção da operação não bastam os recursos necessários para se obter o produto, o qual deverá ser capaz de alcançar o resultado pro po sto. Isso só é possível mediante um processo de conve rsações entre os atores envolvidos no processo de produção.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
373
Na realidade, uma operação é o produto term inal esperado de um processo de conversações, tal como se apresenta no esquem a a seguir. Nada se realiza na situação que. não seja mediado por uma interação de conversações. Assim, devemos ressaltar que a operação é um compromisso. Mas um compromisso para fazer o quê? Evidentemente não se trata de um compromisso para fazer outro compromisso, para fazer uma asserção, uma expressão, uma diretiva ou uma declaração. Tratase de um compromisso de ação. Que tipo de ação? Recordese que Austin e Searle precisaram recorrer ao conceito de ato de fa/a, porque o homem faz coisas com as palavras e a distinção entre fazer e dizer não é clara. Convém aqui fazer uma distinção entre ato e ação que seja pertinente ao nosso problema. Designemos por a tos os atos de fala que, na cadeia de produção, antecedem as ações. Por ações, o efeito que os atos provocam no sistema de produção social, mediante o qual certos meios são utilizados para motivar outras ações sociais, construir e alterar ca pacidades de produção social e alterar as regras de produção social. A ação é o instrumento do homem para mudar a situação e os atos são os instrumentos para produzir as ações. Se aceitarmos essas precisões podemos dizer que uma operação é um compromisso de realização de uma ou várias ações. Esse compromisso deve cumprir os seguintes requisitos: i.
definir claramente o responsável direto po r seu cum prim ento e os destinatários dos benefícios e sacrifícios;
ii.
precisar concretamente os meios que se utilizarão para alcançar os efeitos e resultados previstos;
iii. prever a dimensão e alcance dos resu ltados esperados em relação aos nós do vetor de definição do problema que se tenta enfrentar; iv.
dem onstrar, no m om ento do comprom isso, intenção de pr oduzir os resultados que se enunciam, pois um evento produzido por acidente, erro ou negligência pode alcançar resultados inesperados (positivos ou negativos);
37 4
Política, Planejamento e Governo
v.
exigir um a aplicação de recu rsos —algumas operações são exigentes em recursos de poder, outras em recursos econômicos e outras ainda em ambos os tipos de recursos;
vi.
estabelecer o horizon te de tem po em que devem ser execu tadas e no qual se pr op õe alcançar os resultados.
Podemos agora definir com precisão a categoria de operação. Uma operação é um compromisso para produzir ações, assumido por um determinado ator; ele se fundamenta, de forma intencional, numa previsão de que as conseqüências imputáveis aos meios selecionados coincidirão significativamente com os resultados esperados no horizonte de temp o do plano. A designação de uma operação deve expressar um compromisso de se fazer algo. De acordo com este princípio, o nome de uma operação pode sem pre ser su bstituído pela seguinte frase: “Comprometome a fazer (...)” Este princípio distingue claramente uma operação e uma ação de outros atos, tais como recomendar, adotar critérios de ação ou anunciar um fazer com conteúdo proposicional vago ou com autor indefinido. Por exemplo, as seguintes designações não são próprias de uma operação ou de uma ação: i.
“otimizar o uso dos recursos agropecuários” (não define concretamente um fazer e apenas enuncia um critério de ação —a otimização);
ii.
“estabelecer a conveniência de sub stituir a imp ortação de oleaginosas” (indica uma recom endação);
iii.
“reativar a economia” (faz alusão a um objetivo , e não aos meios para alcançálo).
As operações são a base modular do plano. Cada operação pode ter vários prédesenhos, que lhe dão elasticidade. Esses prédesenhos referem se ao cenário central do plano e podem ser os seguintes: i.
ampliação em dimensão ou alcance;
ii.
reduçã o em dimensão ou alcance;
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
375
iii iii.
dimensão e alcance segundo segun do o cenário cen tral do plano; plano ;
iv. iv.
desenhos de conteúdo conte údo distin to, confo rm e os cenários do pla p lann o .
De acordo com os cenários do plano, cada operação pode ter um desenho: i.
condicionado pela variante mínima;
ii.
condicionado pela variante máxima;
iii. ii.
condicionado pela variante central;
iv. iv.
rígido, nãocond icionado po r uma um a variante.
Ten do as operações operações um desenho elásti elástico co para resp ond er às diferentes variantes v ariantes utilizadas, quando quan do for f or necessário necess ário fazer algum ajuste —para aum entar ou restring ir a aloca alocaçã çãoo de recurs os econômicos ouo ouo usodo usodo po p o d e r — será se rá poss po ssív ível el aju aj u star st ar m o d u lar la r m e n te o plan pl anoo sem r e c o r r e r aos ajustes proporcionais, que ignoram as prioridades e agravam a ineficácia operacional, como é o cas casoo dos cortes orçam entários proporcionais. Os módulos de ação do plano são de dois tipos: i.
m ódu los comunicacionais;
ii. ii.
m ódulo ód uloss de ação ação operacional. oper acional.
Ne N e sta st a e s tru tr u tu r a m o d u lar, la r, os p r o jeto je to s d e ação d esa es a g reg re g a m se s e em operaçõ ope rações, es, as operações em ações ações e as as ações ações em subações. subações. Do ponto de vista estratégico, há duas classes de operações: i.
operações diretas (fatos (fatos políticos, serviços, investimen inve stimen tos, etc.). Essas operações atendem a um ou vários problemas de responsabilidade central e direta do ator que planeja e governa. Elas podem referirse a eventos políticos, como mobilizar a opinião pública, reorganizar o partido de governo, fazer acordos com outras forças, etc. No âmbito econômicosocial, po p o d e m s e r p roc ro c ess es s o s d e p r o d u ç ã o d e b e n s ou serv se rviç iços os p ú b lili cos. Por exemplo, o governo assume a responsabilidade de atender à justiça, à defesa e à educação básica mediante a produção de operações específicas nesses âmbitos;
3 7 6
Política, Planejamento e Governo
ii. ii.
operaç ões de regulação social social (mudanç as nas regras fenoes truturais e genoestruturais). Essas operações atendem um pro p ro b le m a d e form fo rm a in d ire ir e ta , m e d ian ia n te b u sca sc a d e re g ras ra s q u e pe p e r m ita it a m d e s c e n tra tr a liz li z a d a m e n te u m a solu so luçã çãoo pela pe la p ró p r ia ação aç ão dos afeta afetados. dos. Nesse caso, caso, as novas novas regras regras perm item um a inte ração entre os atores e um sistema de motivações, que elimina as causas do problema.
O Q uad ro a seguir precisa precisa os os conceitos e as relações en tre eles. eles.
OS MÓDULOS MÓDULOS DE DE AÇAO DO PLA PL A NO
Evidentemente, não se exclui a possibilidade e a conveniência de, em cada caso e problema, dosar ambos os tipos de operações na conformação de projetos de ação. Por exemplo, os projetos de regulação macropolítica e macroeconômica em geral combinam os dois tipos de operações. O peso de cada tipo de operação é um problema político conflitante, pois quanto maior a dose de operações diretas, maior é a part pa rtic icip ipaa ção çã o do E stad st adoo n a ec o n o m ia e na p o lític lí tica. a.
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BIBLIOTECA
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Os Quatro Quatro Mo mentos do Processo de Planejamento Situacion al
J 7 7
Como se verá mais adiante quando se tratar da articulação entre pla p lann o e o rç a m e n to , o univ un iver erso so da atri at ribb u içã iç ã o de rec re c u rso rs o s eco ec o nôm nô m ico ic o s não é inteiramente desagregável em operações, salvo se as transferências de recursos forem consider consideradas adas como um terceiro tipo de operações. Um a operação te m as seguintes seguintes característi características: cas: i.
é o m ódulo ódu lo de máxim a agregação, agregação, em nível nível operacional, operacion al, que cumpre os cinco requisitos estabelecidos para a estrutura modular do plano. Um conjunto coerente de operações constitui um projeto de ação ação;;
ii. ii.
é um âmbito de atividade atividade organizada, organizada, com agentes resp onsáon sáveis bemdefinidos para seu desenho, execução, avaliação e controle;
iii. iii. é um ato de produ pro dução ção em que qu e varia o rec urso urs o escasso escasso mais mais exigido (recursos econômicos, poder, conhecimentos, etc.); seus efeitos podem fenoestruturarse, perturbar os fluxos de produção social e genoestruturarse, afetando diversos domínios situacionais (o econômico, o político, o ecológico, etc.); iv. iv.
é uma unidade m odu lar desagregável desagregável em subm ódu los, chamados ações e subações, cuja lógica de constituição agregada é a coerência e potência do conjunto, enquanto ato de produção organizada com capacidade para alcançar o objetivo;
v.
é uma unidade m odu lar flexível, flexível, cujo desenho, desen ho, dimensionamento e formas de articulação com outros módulos são ajustáveis em função dos cenários do plano e da mudança situacional;
vi. vi.
é um m ódu lo articulável articulável com as as categorias categorias do sistema de o rçamento por programas. Ele se identifica, em geral, com um pr p r o d u to term te rm in a l de u m a inst in stitituu içã iç ã o;
vii. vii. é um agrupam agru pam ento consciente e reflexivo de eventos e, po rtanto, é o único meio inteligente de alterar a situação.
3 7 8
Política, Planejamento e Governo
O conceito de operação, segundo as características já apontadas, abrange qualquer tipo de ação que um ator pode realizar a partir de urna combinação complexa ou simples de diversos recursos escassos. Assim, algumas operações podem se referir apenas a processos de regulação social em que os recursos econômicos não contam, enquanto os recursos de poder são muito importantes. Outras referemse quase que exclusivamente à aplicação de recursos econômicos, ou a combinações de recursos econômicos e recursos de poder. Por sua vez, as operações que se referem a recursos econômicos po p o d e m c o n s titu ti tu ir oper op eraç açõe õess c o r r e n te s , oper op eraç açõõ es de inv in v esti es tim m e n to e operações mistas. Essas últimas são as mais comuns na estrutura modular do plano, pois quase sempre os investimentos são ações no interior de uma operação mais ampla, e a racionalidade e eficácia de tais investimentos só poderão ser avaliadas no contexto mais amplo da operação que os contém. Uma operação justificase pelo seu esperado impacto no vetor de definição de um problema (VDP) e responde a uma decisão de alterar as características de um ou vários nós críticos da explicação situacional. recursos —> A operação deve estruturarse como uma relação recursos — pr p r o d u t o —> resultados, na qual esses elementos devem ser precisados em qualidade e quantidade. Assim, uma operação típica tem a seguinte estrutura:
[(R1R2....,Rj
recursos
X1)] X1)] | Si(Nw ,...,Nz,VD ,...,Nz,VD Psi)
produto
-» VD PS r(N'w r(N 'w .... N'z) >
nós críticos críticos
eficiência eficácia direcional
resultados
379
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
OS MODULOS DO PLANO
MÓDULOS DO PLANO
I EXIGENTES EM RECURSOS ECONOMICOS
m I EXIGENTES EM EXIGENTES EM AMBOS RECURSOS GASTO CORRENTE INVESTIMENTO MISTAS DE PODER V v V
1. PROJETO DE AÇAO X
Cl
2.OPERAÇÃO Z
C2
Cl +11
RP1
Cl +I1+RP 1
12
C2+I2
RP2
C2-I-I2+RP2
C3
13
C 3 + I3
RP3
C3+I3+RP3
4.1 SUB-AÇÃO W
C4
14
C 4 + I4
-
-
4 . 2 S U B -A Ç Ã 3 M
-
-
-
RP4
-
15
-
-
-
-
-
-
3.1 A Ç Ã O Y
3.2 AÇÃO R
3 . 3 A ÇÃ O N
C5
11
3 8 0
Política, Planejamento e Governo
Por exemplo, uma operação destinada a alterar os índices de desnutrição infantil infantil poderia ser e struturada desta forma: forma: RI
—
(rec (r ecur urso sos) s)
—
25 un idad id ades es monetárias po p o r m e ren re n d a;
R2
=
(recursos)
—
uso da capa ca pacid cidad adee de decisão do Ministério da Saúde, Ministério da Fazenda e Congresso Nacio Na ciona nal;l;
nós críticos
=
características características do nó crítico w a ntes e depois dos efeitos da operação (composição da merenda);
N ’w , N w
N ’z, Nz
=
nós crític críticos os
=
caraterísticas caraterísticas do nó crítico z antes e d epois dos efeitos da operação (sistema de organização e distribuição das merendas);
XI
—
p ro d u to
=
n ú m e ro e qual qu alid idad adee das merendas efetivamente entregu es aos bene be nefic ficiá iário rios; s;
VDP
=
vetor de definiçã definiçãoo do problema
=
mudança nas nas características do índice de desnutrição infantil;
V D Psi
=
v e to r d e definição do problem pro blem a na situaçã situaçãoo inicia inicial; l;
VDPsr
—
v eto et o r d e defin de finiçã içãoo do p ro b lem le m a na n a situa sit uaçã çãoo resu re su ltan lt an te depois da aplicaçã aplicaçãoo do produ to XI (merendas); (meren das);
V D Pso
—
v e to r d e definição do problema na situaçãoobjetivo.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
381
N este exemplo, a eficiência econômica é a relação entre o custo das merendas e a dimensão e qualidade do prod uto X I . A eficiência política, por sua vez, é a relação entre o peso político usado na tom ada de decisão e o valor político do prod uto XI para o ator que planeja, num determinado horizonte de temp o. No enta nto , estas eficiências estão subordinadas à eficácia direcional, ou seja, à relação entre o produto XI e os índices de desnutrição infantil; em outras palavras, à relação do produto XI da operação e seus resultados sobre o VDP. Os requisitos e a estrutura das operações são também aplicáveis às ações e subações. Eficiência de produçã o e eficácia direcional de uma operação
Na seleção e desenho das operações é indispensável distinguir entre eficiência de produção e eficácia direcional. A eficiência na produ ção de um a operação é uma relação recu rsos — produto que satisfaz um critério de maximização ou minimização esta belecido. Assim, podese falar de minimizar os recursos para alcançar um produtometa ou de alcançar o máximo produto com um conjunto dado de recursos. No exemplo anterior, se o custo da merenda for reduzido para 23 unidades monetárias, mantendose a qualidade e quantidade do prod uto m eta, a operação tornase mais eficiente. A eficácia direcional é uma relação pro du to —vetor de definição do problem a, que indica a capacidade ou potência do produto da operação para alterar favoravelm ente o vetor de definição do problema. Por exemplo, podese reduzir o custo de uma merenda para 23 unidades monetárias e aumentar em 20% o número de merendas efetivamente entregues, mas a desnutrição infantil pode continuar aumentando. Nesse caso, a eficácia direcional da operação é baixa, nula ou mesmo negativa, embora seja executada com eficiência. Intersecção de operações
A experiência nos mostra que a intersecção entre as operações de um plano é algo comum, mas nem sempre essas intersecções estão bem definidas. Um dos requisitos já mencionados para o bom funcionam ento da estrutura modular do plano consiste em fazer com que as intersec-
3 8 2
Política, Planejamento e Governo
ções entre operações, ações ou subações sejam bem definidas. Por exemplo, uma operação de educação préescolar é também, em parte, uma operação de nutrição infantil. 01
i
A1 I
wmm 02
Essas intersecções criam a necessidade de desenhar as operações não apenas em relação a seus propósitos internos, mas para atender também os requisitos externos exigidos pelos propósitos da operação com a qual se interrelaciona. Assim, podemos falar de requisitos de desenho interno e externo. Naturalmente, a distinção entre interno e externo é relativa ao ator que desenha ou que é responsável pela operação. Assim, a operação 01 (entrega de alimentação infantil nas escolas) tem requisitos de desenho interno em relação ao VDP desnutrição in fantil, mas deve também respo nde r às exigências de desenho e xterno da operação 02 (educação préescolar). Nesse caso, admitese a perspectiva do gerente da operação 01, que define como sendo interno o âmbito de sua própria ação e externo o âmbito de ação do gerente da operação 02. Nesse desenho, as operações exigentes em recursos econômicos devem cumprir todos os requisitos de uma ação orçamentária, e devem precisar os órgãos responsáveis por cada nível re cursivo da estrutura de um a operação. N atu ralm ente , quem desenha uma operação não só deve concebê la como operação eficaz para alcançar norm ativam ente a situaçãoobjeti vo (eficácia direcional), mas deve também tentar que ela cumpra alguns dos requisitos de um a operação de alta eficácia processual. Na análise do m om ento estratégico será precisado o co nceito de eficácia. Ela indica a capacidade ou incapacidade de uma operação de construir viabilidade para as operações seguintes, na trajetória que forma o curso de ação da estratégia. Isso nem sempre é possível ou necessário para cada operação no horizonte do tempo do plano, mas deve
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
383
ser possível e é necessário para o conjunto de todas as operações naquele horizonte de tempo. N este sentido, o pro cedim ento para desenhar e executar um a operação é tão importante’quanto seu conteúdo e propósitos. A eficácia processual é, muitas vezes, obtida com um m odo adequado de desenhar, executar e controlar. As diferenças entre o centralismo elitista e a descentralização participativa na análise de problemas, o desenho de operações para enfrentálos e a organização para controlar sua execução constituem as determinantes da eficácia ou ineficácia processual. O desenho de uma operação implica inevitavelmente o desenho de um sistema para acompanhála, controlála e avaliála. Conseqüentemente, o desenho de uma operação compreende a precisão da árvore relacional da operação relativa aos problemas que pretende enfrentar. Essa árvore relacional será explicada no capítulo que trata da sala de situações.
h.
Requisitos da Estrutura Modular do Plano
Todo o plano situacional é modular, o que constitui uma grande vantagem. Um plano modular permite restringir ou ampliar as operações que o integram com base num programa prédesenhado, para reagir com eficácia à ocorrência das variantes previstas. A estrutura modular do plano multiplica suas possibilidades de ajuste e reduz o tempo desse processo. No enta nto , a estr utu ra modular do plano deve cum prir certo s re quisitos para que possa satisfazer a todas as suas funções. A estrutura modular exige uma ordem modular, a fim de evitar duplicações, ambigüidades, âmbitos sistemática e inadvertidamente nãocobertos por operações e falta de responsabilidade administrativa ou gerencial pelos módulos do plano. Conseqüentemente, a prática de desenho de um plano m odu lar requ er regras precisas para seu funcionamento. Para cumprir essas exigências, o planejamento situacional propõe se adotar cinco requisitos: i. ii.
recursividade; plenitude;
3 8 4
Política, Planejamento e Governo
iii. intersecção bem definida; iv. responsabilidade institucional definida; v. coord enação para as intersecções. A regra da recursividade estabelece um critério de partição dos módulos em submódulos, de tal forma que o sistema modular siga a estrutura de uma árvore taxionômica cujas primeiras ramificações são os pro je to s de ação. A regra de plenitude obriga a dividir todo o universo do plano em módulos, sem deixar espaços indefinidos ou superpostos ambiguamente. Toda proposta de ação incluída no plano deve ser um módulo ou um submódulo. A regra de intersecção bemdefinida estabelece que as intersecções entre módulos devem ser precisas, e para tal exige que essas intersecções sejam identificadas com algum submódulo. A regra de responsabilidade institucional definida estabelece que cada m ódulo e submódulo deve ter um responsável. A regra de coordenação para as intersecções coloca a necessidade de que um submódulo, que é parte de dois ou mais módulos, tenha um mecanismo de coordenação intra ou interinstitucional. Essas são as regras práticas que facilitam o trabalho com estruturas modulares e são essenciais na articulação do plano com o orçamento. Os Quadros a seguir sintetizam esses requisitos.
i.
Possibilidades de Ajuste de uina Estrutura Modular
Ajustar o plano às possibilidades que a realidade oferece é uma prática que pode facilitar ou dificultar, confo rm e o conceito de plano que utilizamos. A estrutura do plano situacional é modular justamente para facilitar sua adequação às contingências da mudança situacional. Dessa forma é possível revisar velozmente o plano, mudando sua com posição por problemas e operações. Qualq uer mudança nas re strições que afetam o ator que planeja, seja ampliando ou restringindo seus recursos, implica ajustes nos módulos do plano. A estrutura modular por operações apresenta vantagens notáveis em relação à necessidade de ajustar o plano à variação de disponibilidade de recurso s e necessidades da situação.
Os Quatro Mom entos do Processo de Planejamento Situacion al
385
REQUISITOS DE UMA ESTRUTURA REGULAR NO PLANO SITUACIONAL RECURSIVIDADE
1” REQUISITO
O universo de produção deve estar divido em módulos e os módulos em submódulos até chegar à unidade mínima neces sária para a precisão da estrutura da produção.
PLENITUDE
2" REQUISITO
Os módulos que compõem o universo de produção devem esgotar a totalidade do mesmo, sem deixar espaços indefinidos ou superpostos ambiguamente.
INTERSECÇÃO BEM DEFINIDA
3" REQUISITO
01
Se há intersecções dos módulos que compõem o universo do plano, elas devem corresponder a submódulos. Todo módulo deve ter fronteiras bem definidas.
4" REQUISITO
RESP. 2
RESP. 1
RESP. 3
RESPON SABILIDADE INSTITUCIONAL DEFINIDA
RESP. 4
Em algum ntvel de recursividade, os mó dulos ou submódulos devem ter institui ções ou unidades organizacionais bem definidas.
RESP. 5
COORDENAÇÃO PARA AS INTERSECÇÕES
5 ' REQUSITO
COORDENADOR
Se ocorrer uma intersecção de módulos num nível recursivo, deverá haver meca nismo de coordenação no nível recursivo imediatamente superior.
3 8 6
Política, Planejamento e Governo
Para realizar esse ajuste, a estrutura modular por operações perm ite as seguintes vias: i.
ajuste dos recurso s atribuidos a cada m ódulo e da dimensão de seus produtos. Esse ajuste por redimensionamento pode fa zerse aumentando a eficiencia para manter ou elevar o nivel de produção ou adaptando o nível de produção à mudança dos recursos atribuídos, mantendo constante a eficiencia; ii. ajuste de desenho dos módulos e de suas relações de conexão. É um ajuste qualitativo, derivado da necessidade de manter ou aumentar a eficácia de uma ou várias operações interrelacio nadas, ao mudar as circunstancias que fundamentaram seu desenho original. Em geral esse ajuste está relacionado com as mudanças nos nós críticos que causam os problem as; iii. ajuste do núm ero de m ódulos; é um ajuste drástico pelo qual são suprimidas ou criadas operações. Tratase de um ajuste que polariza as forças em qualquer uma das alternativas. No caso da criação de novas operações, haverá sempre concorrência pelos recursos ; no caso de supressão, surge a resistência dos afetados. O sistema de orçamento “base zero” é um caso extremo de aplicação dessa via no âmbito econômico; iv. ajuste da seqüência de execução dos m ódulos. É um ajuste dinâmico, que se fundamenta no fato de que a viabilidade í.a situação e o efeito das operações sobre os problemas não são independentes do lugar que elas ocupam na trajetória ou cadeia temporal de produção de eventos. Conseqüentemente, quando muda a situação pode ser necessário alterar a estrutura das trajetórias planejadas, adiando algumas operações e antecipando outras. Seguese, à próxima página, representação gráfica das quatro vias de ajuste da estru tura m odular do plano.
j.
0 Desenho Econômico: como deve ser a economia
Certamente, o econômico desempenha papel destacado nos processos de governo e planejamento. Os recursos econômicos são, em
387
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
AJUSTE DE UMA ESTRUTURA MODULAR PERANTE VARIANTES DO PLANO(REDESENHO)
a) Ajustar os recursos assinados a cada módulo
b) Ajustar os desenhos dos módulos e suas relações de enlace
1
2
3
4
c) Ajustar o número de módulos 1
—> 3
d) Ajustar a seqüência de execução dos módulos
2
3 8 8
Política, Planejamento e Governo
geral, uma das restrições mais fortes que afetam a governabilidade do sistema. Os objetivos econômicos incidem marcadamente sobre o bem estar da população, sua qualidade de vida e sua participação nos benefícios resultantes do en riquecim ento de um país. Ademais, o processo econômico redistribui poder, liberdade e bem e star material, confo rm e concentre ou dissem ine o controle das capacidades de produção e distribuição de renda. Como conseqüência, a dinâmica econômica pode reforçar ou debilitar o sistema democrático, pois as interrelações entre econômico e político são m uito fortes. Inversamente, as condições políticas criam o espaço de possibilidades do módulo econômico. O plano econômico, por sua vez, é o mais conhecido dos planos, o mais formalizado e aparentemente o mais preciso e quantificável. Na América Latina, os esforços teóricosmetodológicos concentramse no planejamento econômico, e por essa razão muitos associam o planejamento ao planejamento econômico. A esta altura da exposição nossa crítica às formas tradicionais de planejamento econômico deve estar clara para o leitor. O planejamento econômico não é eficaz se estiver isolado do planejamento político, pois este último é o centro do processo de governo de situações; tampouco é eficaz o planejamento econômico normativo, pois sua rigidez nega a riqueza, a criatividade, os conflitos e a incerteza do pro cesso social. Mas essa crítica não desmerece em absoluto a enorme importância do processo econômico na prática de planejamento de um ator social, nem as contribuições do planejamento econôm ico no rmativo à teoria do planejamento. Há um acervo teórico e um espaço conquistado na prática do planejamento que deve e pode ser adaptado e recuperado. Isso é especialmente válido para o planejamento do governo do Estado, no qual, por um lado, é inevitável a participação do Estado e, por outro, essa participação deve respeitar mecanismos delicados de equilíbrio dinâmico do sistema econômico. Planejamento econômico não é sinônimo de estatismo. Enquanto ferramenta de governo, ele pode operar com graus e meios de intervenção muito variados. Num extrem o, podese conceber um modelo de planejamento em que as forças dominantes no Estado seguem atentamente o efeito de de
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento S fu ac'on al
terminação das regras básicas do jogo económico (geroestruturas) so bre as acum ulações sociais, e avaliam os resultados do sistema pelas características dos fluxos de produção de bens e servidos. Esse modelo pode opera r com um nível baixo de participação do Estado no produto nacional, já que não entra no jogo económico em si: mantémse no plano da criação das regras que o regem. Se levado a sérío, esse estilo de desenho é muito potente, pois opera sobre as genoestruturas do sistema. Ele supõe, porém, uma força social dominante de características muito especiais e um sistema econômico altamente sensível à mudança genoestrutural, capaz de aproveitar suas potencialidades. Supõe tam bém a vontade real de adequar as regras aos resu ltados almejados do jogo social. No outro extrem o, podese imaginar um modele) de planejamento econômico que, após alterar drasticamente as gef>oestruturas, ou deixálas intactas, proced e a um co ntrole d ireto do processo de acum ulação econômica e de distribuição de renda , bens e sei viços produ zidos. Nos dois casos é um modelo em que o Estado, conduzido por uma rela ção de forças dominante, desconfia dos resultados da dinâmica do jogo econômico e decide que deve não apenas desenhar as regras, mas participar diretamente do jogo para assegurar o cumprimento dos planos. Logicamente esse modelo requer não só um alto controle das regras do jogo mas, principalmente, um controle dos rnovimentos e acumulações dos jogadores. É o modelo de planejamento de um jogo rigidamente controlado. A pergunta que esses dois extremos procuram responder não é se o Estado deve controlar o sistema, mas um a outra: c om o e ond e controlar o sistema? Em suas regras ou no próprio jogo? Entre as duas posições cabem todas as graduações possíveis, que observamos no mundo real. Nessas graduações comt>inamse de forma diversa três variáveis: i.
ii.
maior ou m en or velocidade de ajuste (retroalimen tação) das regras do jogo aos resultados do sistema, cCmparandoos com a norma; desenho das regras baseado num desen volvimento livre do j° go;
3 9 0
Política, Planejamento e Governo
iii. co ntro le direto do jogo a par tir de um desenho das regras. É certo que po r trás dessas respostas práticas perm anecem perg un tas. Estamos satisfeitos com nosso modelo econômico? Qual é nossa si tuaçãoobjetivo no âmbito econômico? As genoestruturas econômicas vigentes permitem alcançar nossa situaçãoobjetivo? Que projetos e operações econômicas são necessários? Quantos recursos econômicos requerem os projetos e as operações do plano? Quais são os requisitos do equilíbrio econômico no horizonte de tempo do plano? Quais são as relações entre eficácia política e eficácia econômica? O plano é factível do ponto de vista econômico? No plano econômico e no m om ento norm ativo surge a necessidade de definir a direcionalidade, com suas naturais implicações sobre as aspirações definidas como objetivos e o padrão ou estilo de desenvolvimento capaz de alcançálos. O desenho direcional do plano econômico coloca, pelo menos, quatro grandes temas: (a) o modelo econômico, definido pela especificidade das relações entre as genoestruturas, as acumulações econômicas e os fluxos de produção de bens e serviços. Esse modelo define o es paço das possibilidades eficazes do m odelo de planejamento; (b) o modelo de desenvolvimento , definido pelas relações entre as acumulações econômicas e os fluxos de produção de bens e serviços, e sua intersecção na econo mia mundial; (c) o padrão de distribuição econômica, definido pelas proporções em que as forças sociais e os grupos populacionais apro priam se das acumulações e dos fluxos, e co mo esse conflito resolvese no equilíbrio macroeconômico, setorial e regional; (d) o estilo de associação entre o modelo econômico e o modelo político, definido pelas relações entre poder econômico e pode r político que su stentam as relações de forças. Esses quatro grandes temas estão sempre presentes no plano e referem se a problem as filosóficos, éticos e ideológicos da teo ria social em geral e da teoria econômica em particular.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
391
(a) O desenho do m odelo econômico. Esse é o pon to chave para a resp osta de todas as questões seguintes. A pergunta central aqui é: as regras do jogo geram um espaço de possi bilidades consistente com as capacidades pro dutivas do sistema e as restrições do espaço de resultados sociais procurados? Esta pergunta envolve, de fato, outras duas: i.
ii.
O espaço de liberdade e motivações dem arcado pelas genoestruturas é prático do ponto de vista das possibilidades, vocações e restrições de produção do sistema? Esse espaço é am plo , porém inaproveitável ou desaproveitado? E estreito e comprime as forças produtivas do sistema? E possível criar essas vocações? Em que prazo? Explora as condições do cenário internacional ou chocase com elas? A dinâmica do aprove itamen to da vitalidade gerada pelas ge noestruturas produz uma modalidade de acumulação econômica que a concentra em poucas mãos? Essa dinâmica resolve os problemas sociais? Distribui poder, liberdade e renda de forma eqüitativa?
Essas duas perguntas conflituosas expressam a concorrência entre dois critérios: a geração de uma dinâmica criativa (DC) e eqüidade eco nômicapolítica (EEP). O Gráfico mostra uma curva de transformação de criatividade em eqüidade e dois desenhos possíveis de geno estruturas. O desenho A l, que privilegia a criatividade, e o desenho Bl, que privilegia a eqüidade. Ambos respondem a valorações distintas da criatividade e da eqüidade. Devese também explorar a possibilidade de o ponto Bl deslocarse para BO, com o nível Po de pro dução nacional inferior a P I . Essa curva de transformação expressa claramente o processo de intercâmbio de problemas em nível do macrop roblem a social. Se enfrento o problema de eqüidade, gero menos criatividade e dinamismo no sistema. Se enfrento o problema de liberar as forças produtivas e a criatividade individual, gero maior desigualdade. Que valor tem para a população o problema da eqüidade? Que valor tem a criatividade? A resposta a essas perguntas explica o ângulo das linhas tangentes à curva de transformação nos pontos Al e B l.
3 9 2
Política, Planejamento e Governo
O sistema completamente livre de travas às capacidades de ação dos indivíduos gera uma dinâmica agressiva de mudanças em todos os campos: ciencias, cultura, economia, organizações, sistemas, ideologias, etc., mas multiplica no nivel social as desigualdades das capacidades individuais, pois essas são acumulativas ao longo do tempo e transversais em todos os domínios situacionais. A concentração econômica concentra o poder político, o qual, concentrado, concentra a propriedade; um grupo social concentra a propriedade hoje, e isso permitelhe concentrar ainda mais amanhã. Esse é o ponto A sobre a linha OA, no qual conseguese o máximo de criatividade com sacrifício total da eqüidade. Já o sistema rigidamente regulado para produzir igualdade econômica, numa primeira e longa etapa de transição, concentra o poder político como meio para produzir mudança das genoestruturas; isso tende a congelar e restringir a distribuição de poder e liberdade. Ou é o despotismo “ilustrado”, cheio de boas intenções, ou o despotismo puro, que busca o poder pelo poder. Em essência, o excesso de contr ole inibe a criatividade e a dinâmica de mudança, produz passividade e hipervaloriza a segurança. E o ponto B sobre a linha OB , no qual a eqüidade é m áxima e a criatividade fica redu zida ao mínimo.
Os Quatro Mom entos do Processo de Planejamento Situacional
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O desenho do modelo económico deve procurar o equilibrio entre criatividade dinâmica e eqüidade social. É o conteúdo das regras básicas do sistem a que define esse equilibrio. (b) O m ode lo de desenvolvimento. No espaço perm itido pelo modelo econômico, uma sociedade por um lado opta e, por outro, é arrastada para um modelo de desenvolvimento. O modelo de desenvolvimento é um modelo do processo de acumulação e reprodução do sistema económico. Caracterizase pelos ám bitos produtivos em que se concentra a acumulação, pelas forças e gru pos sociais que a controlam, pelos mercados de destino da produção re sultante da acumulação económica e pelo tipo de financiamento desse processo de acum ulação. A chave desse processo de acumulação é o investimento, não necessariamente em capacidades materiais de produção. Muitas vezes o que define o processo de acumulação é o investimento em ciências, técnicas, treinamento de recursos humanos e criação de capacidades de governo, organização, planejamento e gerência. Esse processo de acumulação assume características diversas conform e seja predo minante a dinâmica da dem anda interna ou da e xterna, conforme adote uma agressividade de oferta ou de demanda. O processo de acumulação é um processo de criação e aproveitamento de oportunidades. A natureza dessas oportunidades marca o processo de acumulação. (c)
O padrão de distribuição econômica.
E a forma pela qual se resolve o conflito pela apropriação das acumulações económicas da produção. D entro do espaço estabelecido pelas genoestruturas, o desenho económico pode estabelecer subsistemas, normas, instituições e organizações que privilegiam as possibilidades de acumulação económica e de negociação de preços em certos mercados, e proced er de forma inversa em outros. O sistema tributáriofiscal desempenha, em geral, um papel delimitador do espaço de maior probabilidade de resultados na distribuição do produto. Ele pode reforçar ou atenuar a concentração da proprie
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dade e da renda. Gerase, assim, o padrão de distribuição do modelo econômico. Esse padrão gera a maioria dos problemas sociais e é a base do processo de intercambio de problemas. A disputa pela apropriação das acumulações e do produto cria urna serie de problemas macroeconômicos, setoriais, regionais e entre gru pos sociais. Esses problemas fo ra m, até agora, o centro do planejamento econômico. Os chamados métodos de planejamento econômico cum prem um papel im portante na simulação do equilíbrio macroeconômico e de suas condições, sob diferentes hipóteses de acumulação e distribuição do produto nacional. Mas esses métodos devem ser adaptados às particularidades do planejamento situacional, te ndo em vista sua articulação com u m a teoria mais geral do planejam ento da ação de governo. (d) O estilo de associação entre o modelo econômico e o modelo político. A articulação do econômico com o político dáse nos três planos si tuacionais: genoestruturas, acumulações sociais e fluxos de produção. As particularidades dessa articulação dependerão das bases dos poderes econôm ico e político. Num extrem o, as bases desses podere s são idênticas; em outr o extremo, é possível conceber um alto grau de autonomia do poder político em relação ao econômico. No plano dos fluxos de pro dução, esses modelos tê m suas contra partidas em casos onde a estabilidade e a força do sistema político condicionam o desenvolvimento do processo econômico, e outros onde a força do modelo econômico sobrepõese à instabilidade da situação política. (e) A adaptação do planejamento econômico ao marco teórico do planejamento situacional. O planejamento econômico normativo podese adaptar aos requisitos do momento normativo do planejamento situacional, a fim de dis por de um m éto do de planejamento econômico coere nte com o pla ne ja m ento econômico norm ativo. O objetivo deste texto não é o planejamento econômico; seus métodos não são tratados aqui com profundidade. Tampouco podemos
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deixar de tratar desse tema, mesmo que em linhas muito gerais. Iremos supor que os métodos de planejamento econômico são conhecidos, ou que o podem ser por o utras vias. Com base neste pressupo sto explicitaremos o tipo de adaptações que, em nossa opinião, o planejamento econômico normativo requer. As adaptações essenciais são esboçadas a seguir: i.
conceber o planejamento econôm ico norm ativo como m omento normativo do aspecto econômico do planejamento situacional, o que implica reconhecer o conceito de situação como categoria que contém a unidade do processo de governo em todos os domínios da realidade (político, econômico, etc.); adaptarse às exigências da estrutura modular do plano, utilizando as categorias de problemas e operações; flexibilizar a consideração do tempo no planejamento; assumir consistentemente a distinção entre problemas e operações bemestru turadas e problemas e operações quaseestruturadas; fazer do processo de planejamento por módulos uma altern ativa ao congelam ento do plano num livro; fazer prevalecer a dinâmica do processo de cálculo (que passa pelos momentos explicativo, normativo, estratégico e táticooperacional) sobre o conceito de plano com o um p rod uto acabado; ad otar bases de cálculo sobre o futuro suficientemente potentes para tratar a incerteza maldefinida, o que exige que a capacidade de predição seja acompanhada das capacidades de previsão, de reação veloz frente às surpresas e de aprendizagem com a história recente, além de pressupor o resgate do presente para o planejamento, a fim de fazer a mediação entre conhe cimento e ação;
ii.
recon struir o “diagnóstico” do planejame nto econômico no interior do momento explicativo do planejamento situacional, o que implica reconhecer a existência de oponentes que têm planos econômicos parcialm ente conflitantes, explicar situad onalmente a realidade a partir dos diferentes atores sociais que pesam no cum prim ento do plano de qualquer um deles e adotar como módulos explicativos os problemas, subproblemas e miniproblemas nos diversos espaços situacionais;
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iii. flexibilizar o m om ento norm ativo, adotando as categorus de situaçãoobjetivo, trajetórias, cenários, opções e variantes; trabalhando o plano global como matriz problemasoperações; desenhando o programa direcional com base nos diversos cenários e na idéia de que o momento normativo nunca se esgota e req ue r revisão e adaptação constantes; criando as técnicas de desenho e avaliação de operações a partir dos procedimentos similares aos dos projetos de investimento, valorando o critério de eficácia politica, descentralizando o processo de planejamento em subplanos (m ódulos O P ) e em subplanos dos subplanos, até chegar aos miniproblemas em seus espaços singulares; e, finalmente, fazendo do planejamento uma em presa de criação, imaginação e responsabilidade coletiva em todos os seus níveis; iv.
incorpo rar o m om ento estratégico ao planejamento econ ômico, considerando q ue é necessário construir a viabilidade do desenho normativo. Isso exige que as técnicas de modelagem econômica estejam acompanhadas por técnicas apropriadas ao tratamento de processos criativos, tais como a experimentação numérica, a simulação humana, os jogos, os ensaios, as negociações, o estudo do código operacional dos oponentes, etc.;
v.
trazer o planejamento para o pres ente, através do m om ento táticooperacional; conceber este momento como um cálculo que precede e preside a ação; eliminar as distinções artificiais entre direção, planejamento e gerência por operações; fazer do plano um instru m ento de organização para a ação; art icular as operações do plano com os programas orçamentários;; criar um sistema de suporte de informação e cálculo para a tomada de decisões (salas de operações ou de situações); identificar o sistema de informação com o sistema de petição e prestação de contas por problemas e operações, e fazer desse sistema o complemento natural do plano, uma distribuição delegaida de responsabilidades e compromissos para a ação.
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Todas essas mudanças são possíveis e nao apresentam grandes pro blemas metodológicos. (f)
É necessário o desenho econômico?
Há quem responda negativamente a tal pergunta. Há uma ideologia, baseada em teorias que amputam a realidade segundo a conveniência de seus métodos e de seu vocabulário limitado, que sustenta que o mercado basta, que o planejamento é desnecessário. Os defensores dessa tese dizem que o mercado “planeja” melhor que qualquer planejador. O planejamento, no passado, restringiuse ao planejamento econômico, o qual se considerou como alternativa ao mercado, excluindoo. Assim, surgiu um debate comparando as vantagens do planejamento socialista com as da econom ia de mercado livre. As bases desse debate são precárias e estão minadas por várias confusões. Primeiro, por um conceito ambíguo e pouco rigoroso do que é o mercado, as funções que cumpre e suas limitações. Segundo, por uma idéia rígida e estreita do que é o planejamento, suas possibilidades e funções. Terceiro, por uma visão dogmática e pouco científica do que pode ser o planejamento socialista. Como esta obra não visa o estudo do planejamento socialista, centraremos nossa atenção no mercado e no planejamento econômico pertine nte ao sistema capitalista. O mercado é um sistema de “votações”, em que pessoas “votam” na pro dução de determ inados bens e serviços, ao mesm o te m po em que são “votados” por outros que demandam trabalho. Para “votar” em bens e serviços usamos a renda ganha ou adquirida. Quando somos “votados” por aqueles que dem andam nosso trabalh o, ganhamos re nda. Nessa confluência de “votações” são ajustados os preços e as quantidades produzidas, e ninguém pode controlar as duas variáveis ao mesmo tempo. Abstraindo as particularidades situacionais e a história das acumulações, que diferenciam os “votantes”, podemos chamar essa função do mercado de relação mercantil. O mercado, como relação mercantil, é um computador social inigualável, pois está permanentemente em contato com as necessidades
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das pessoas. Esse é o aspecto flexível, ágil, democrático e eficiente do mercado. Mas o mercado não expressa em forma pura a relação mercantil, pois ela é inseparável do conjunto de relações sociais que se manifestam, no mercado, numa situação concreta. Chamemos a esse segundo aspecto do mercado de relação situacional, que filtra as necessidades e só perm ite que se expressem dem andas. A relação situacional pondera o sistema de “votações”, atribui um valor zero às necessidades que não dispõem de renda para converteremse em demandas e atribui alto valor às necessidades que, suportadas por altas rendas, pressionam o mercado. Assim, a relação mercantil faz destacar o mecanismo de preços, enquanto a relação situacional privilegia a ponderação da demanda. Dizse que o mercado cumpre três funções, que incidem sobre a alocação de recursos: i. igualar a produção à dem anda, com preços flexíveis; ii. efetuar um a distribuição de ren da en tre os votantes; iii. estim ular a divisão do trabalho. Essas funções importantes não são cumpridas apenas pela relação mercantil, mas pelo mercado como um todo, como expressão das relações sociais sintetizadas na relação situacional. Nesse sentido a relação mercantil e a relação situacional constituem dois aspectos indivisíveis do mercado como sistema real. Enquanto a relação mercantil expressa a dimensão democrática, a relação situacional representa a concentração de poder, da propriedade e dos rendimentos que ponderam, de forma desigual, as necessidades que a relação mercantil deveria refletir. Com base nessas distinções, podemos discutir as relações entre planejamento e mercad o. O planejamento não se opõe ao mercado enquanto relação mercantil; pelo contrário, deve e pode fazer uso eficiente do sistema de “votações” expresso no mecanismo de preços. O planejamento, no entanto, deve assumir o papel de corrigir a relação situacional com seus efeitos distorcivos na alocação de recursos, na distribuição de ren da e nas relações de poder. Conseqüentemente, a primeira função do planejamento em relação ao mercado é corrigir os efeitos das desigualdades, que afastam as necessidades das demandas.
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O mercado é, fundamentalmente, uma instituição de eficácia sincrónica. Em outras palavras, a relação mercantil opera eficazmente, oferecendo sinais dos problemas económicos em curto prazo. Mas as decisões de investimento que hoje determinam alocação de recursos em medio prazo exigem sinais de eficácia diacrônica. A relação mercantil não detecta bem os problemas que hoje são apenas potenciais e podem materializarse no futuro como um encontro desfavorável de tendencias. Só o planejamento po de detectar a tem po os problemas potenciais. Por co nseguinte, um a segunda razão q ue gera a necessidade de planejamento está nas deficiencias do mecanismo de preços em oferecer sinais adequados para os problem as potenciais. Quando dizemos que o mercado é eficiente enquanto relação mercantil, estamos afirmando que ele consegue o chamado ótimo de Pareto, ou seja, uma situação em que nenhum indivíduo no sistema pode enri quecerse sem que outro empobreça. No entanto, o ótimo de Pareto supõe, entre outras coisas, o pleno emprego do recurso mais escasso, aspiração que o mero funcionamento livre do mercado é incapaz de realizar. Assim, aparece uma terceira razão para defender a articulação do planejamento com o mercado: prom over a regulação macro econômica do sistema, a fim de alcançar um ritmo de crescimento adequado e um emprego razoável dos recursos mais escassos. Por último, o mercado é distorcido pela distribuição desigual da proprie dade, e sua vigencia não assegura boa distribuição de re nda. A quarta razão que podemos apontar para que mercado e planejamento complementemse reside, então, na necessidade política de alcançar graus razoáveis de democracia econômica. O mercado é urna grande ajuda, mas não resolve todos os problemas. E necessário evitar que se transfiram para a prática os fanatismos teóricos, baseados num excesso de pressupostos teóricos. Na realidade, as investigações teóricas mais rigorosas e profundas sobre o equilibrio geral no mercado deixam um imenso espaço para grandes dúvidas. Peter Alien, num trabalho bastante provocador, demonstra como o equilibrio entre oferta e demanda no mercado depende de pressupostos da teoria econômica dominante que não existem no mercado real, tais como inexistencia de nãolinearidades nas equações de equilibrio geral,
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isto é, a inexistência de economias de escala na produção de bens, por exemplo, a insignificância do tem po de reação dos agentes ec onômicos e a consideração de um sistema sem “história”, isto é, sem vantagens já adquiridas para alguns e desvantagens para outros. (P.M. Alien, The Evolutionary Paradigm o f Dissipative Structures, 1981, In The Evolutionary Vision, Ed. por E.Jantsch, Westview Press). A questão da historicidade é de grande importância, porque indica um exemplo de amputação da realidade feita com tanta elegância matemática quanto simplismo. Sobre este ponto, Alien acrescenta: (...) nosso estudo simples revela que quanto mais tarde uma empre sa chega ao mercado, maior é o investimento inicial necessário para se estabelecer. Conseqüentemente, qualquer que seja o equilíbrio de mercado num sistema particular, ele dependerá não apenas de sua história como também do tamanho dos investidores que até esse momento estavam fora do mercado, (op. cit. p. 57). (...) O fluxo de bens nu m determinado mercado po de ser qualitati va e quantitativamente diferente, dependendo apenas da história do sistema, (op. cit. p. 57). (...) Nosso modelo não mostra que o mercado livre não é igual m en te aberto para todos os agentes, pois a possibilidade de im plan tação, com êxito, num mercado existente depende do tamanho do investim ento inicial que deve ser feito. (op. cit. p. 57).
Não é necessário citar outros ex emplos; só as simplificações mais toscas do equilíbrio geral podem justificar o fanatismo ideológico pelo mercado como um mecanismo ao qual a razão humana deve ceder. O mecanismo do mercado é um su po rte para a razão humana, mas não sua alternativa. Essa discussão levanos a considerar três formas principais em que o planejamento pode interferir positivamente no funcionamento do mercado: i.
alterando os elementos com ponen tes da relação mercan til, através de subsídios, controles de preços, taxas de câmbio, regulamentações para o comércio e a produção, impostos indiretos, etc.;
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ii.
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alterando as ponderações das “votações” dos indivíduos, que fazem aumentar a discrepância entre necessidades humanas e demandas de mercado, prom oven do mudanças na distribuição da propriedade e da renda e nas relações de poder através da tributação direta, da política salarial, da distribuição da pro priedade e da democratização do poder;
iii. alterando as capacidades de financiam ento e de produ ção a médio e longo prazos, através de políticas diretas e indiretas de produção que enfrentem as vantagens e desvantagens historicamente acumuladas no sistema pelos diversos agentes econômicossociais. Em síntese, o planejamento deve usar e respeitar o mercado como relação mercantil, mas não deve aceitar que o mercado, como relação social concreta na situação, constituase em alternativa à vontade política do homem, em suas aspirações de bemestar, progresso e liberdade.
4 O Momento Estratégico
m4
404 a.
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A Viabilidade de uin Plano
O que é possível e necessário?. Deve ser mas não pode ser. Pode ser mas não deve ser. Este é o dilema central do dirigente. O momento estratégico concentrase no cálculo da articulação entre o deve ser e o pode ser (M3). Mas não é um ajuste passivo do deve ser ao espaço que perm ite o pode ser. O deve ser é dominante e persistente no dirigente com vo ntade de mudança. O c entro da preocupação estratégica é a análise da viabilidade do programa direcional do plano (M2), mas esse cálculo é ao mesmo tempo análise de viabilidade do arco de conjuntura no momento táticooperacional (M4) e é análise do que pode e não pode ser viável na situação imediatamente anterior (Ml). Desta maneira, o pro blem a da viabilidade está presente em todos os m om ento s do p ro cesso de planejamento, embora seja dominante no momento estratégico. O que significa viabilidade do program a direcional? Em nossas propostas de planejamento situacional, significa responder algumas perguntas. Grupo A: viabilidade política (estando suposto o contexto econômico e organizacional) (a) Os pro jetos políticos são politicam ente viáveis? (b) Os projeto s econômicos são politicamente viáveis? (c) Os pro jetos organizacionais são politicam ente viáveis?
Grupo B: viabilidade econômica (estando suposto o contexto político e organizacional) (a) Os pro jetos políticos são eco nomicam ente viáveis? (b) Os projetos econôm icos são econ om icam ente viáveis? (c) Os pro jetos organizacionais são eco nomicam ente viáveis?
Grupo C: viabilidade institucional-organizacional (estando suposto o contexto político e econômico)
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(a) Os pro jetos políticos são organizacionalm ente viáveis? (b) Os pro jetos econômicos são organizacionalm ente viáveis? (c) Os pro jetos organizacionais são organizacionalm ente viáveis? Grupo D: viabilidade de síntese (simultaneidade de planos) (a) Qual é a viabilidade, hoje, do programa direcional? (b) Podemos cons truir a viabilidade do prog ram a direcional no horizonte de tempo do plano?
Estas perguntas apontam para a dialética entre o necessário, o possível e a criação de possibilidades. O momento estratégico deve tentar respondêlas, considerando que nos processos criativos nada pode estar assegurado quanto ao futuro. Em outras palavras, o problema da viabilidade política é um problema quaseestruturado e, por conseguinte, é irredutível a um sistema de equações estruturadas num modelo político matemático de solução precisa e certa. Vejamos o significado dessas perguntas. Cada uma delas tem por trás outras três. Por exemplo, a pergunta Aa (Os projetos políticos são politicam ente viáveis?) pode ser interpretad a de três formas com plem entares: i.
Tem os capacidade política de prod uzir o pro jeto político X? Podemos fazêlo? (Capacidade ou viabilidade de decisão).
ii.
Temos capacidade política de op erar bem o pro jeto político X? O desenho do projeto X o permite? (Capacidade ou viabilidade operacional).
iii. Temos po der político para que o pro jeto político X opere es tavelmente? Podemos mantêlo operando sem que pouco tempo depois tenhamos de voltar atrás? (Viabilidade de permanência) . A cada uma dessas perguntas corresponde um tipo particular de análise de viabilidade. Com efeito, não só devemos responder se podemos tomar a decisão sobre algo e fazêlo formalmente, mas também se esse algo funcionará na realidade, com eficácia, e se esse funcionamento não será efêmero.
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Estas três dimensões da palavra viabilidade permitem precisar seu significado. Um projeto de ação (ou uma operação) é viável para nós se: (a) podemos decidir sobre sua produção; (b) podemos fazer com que opere eficazmente na realidade; (c) podem os fazer com que sua operação tenh a um a duração eficiente em relação a seu propósito. Estando suposta a factibilidade científicotécnica das ações analisadas, as respostas sobre essas capacidades abrangem, pelo menos, as dimensões política, econôm ica e organizacional. Ao cruzarmos, numa matriz, as dimensões da viabilidade (política, econômica e organizacional) com os planos de eficácia da viabilidade (decisão, operação e permanência), damonos conta da complexidade da análise da viabilidade —complexidade que é, ao mesmo tempo, debilidade, como veremos mais adiante.
Esta matriz indica com um X as provas que são pertinentes e com um NÃO as provas que não têm sentido. Por exemplo, a viabilidade de decisão é sempre uma viabilidade política, e não tem sentido o conceito de viabilidade econômica de decisão. O mesm o ocorre com a viabilidade organizacional da decisão, e também não tem sentido a viabilidade operacional instável, pois é da essência de uma organização a sua permanência e estabilidade no cum prim ento eficaz de uma função.
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Notese que nos três gru pos de perguntas (A, B e C) estão destacadas aquelas em que o recurso escasso considerado meio pertence ao mesmo ámbito que define a natureza do projeto examinado. Assim, re ferimonos à escassez de poder para realizar projetos politicos, à escassez de capacidades organizacionais para realizar projetos de reforma organizacional e à escassez de recursos económicos para realizar projetos económicos. As perguntas destacadas são as seguintes: (Aa) Os pro jetos políticos são politicamente viáveis? (Tem os capacidade política de pro du zir o pro jeto político X, fazer com que opere com eficácia e tenha estabilidade?); (Bb) O s pro jetos económ icos são economicam ente viáveis? (Temos capacidade econômica para realizar o projeto econômico Z, fazer com que seja rentável e tenha permanência?); (Cc)
Os pro jetos organizacionais são organ izacionalmente viáveis? (Temos capacidade organizacional para nos reorganizar e fazer com que as novas organizações operem com estabilidade?).
Estas três perguntas referemse às incapacidades internas que podem afetar um ator social. As outras seis perguntas referemse às inca pacidades econômicas e organizacionais para ab ordar pro jeto s políticos, incapacidades políticas e organizacionais para abord ar p rojeto s eco nô m icos e incapacidades políticas e econômicas para abordar projetos organizacionais. As perguntas sobre incapacidades internas colocam problemas de difícil solução, pois constituem círculos viciosos: algo como içar a si pró prio puxando os pró prio s cabelos. Como pode se organizar um ator social que não tem capacidade organizacional e que, portanto, está situacionalmente cego para tomar consciência de sua p rópria deficiência? Como pode crescer a economia de um país cuja debilidade é a escassez de recursos econômicos? Como poderá ter poder político um ator social que não pesa nas relações de forças?
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Estas perguntas sugerem impossibilidades. Pelo contrário, as grandes mudanças na história constituem rupturas desse tipo de círculo vicioso. A perguntachave é: como se rompem esses circulos viciosos? Este é exatamente um dos temas centrais da análise de viabilidade. Frente às restrições que a situação impõe aos atores sociais cabem três posições: aceitar as restrições e limitarse ao que hoje é viável; su perar as restrições, aumentando os re curs os escassos; ou ignorálas, agindo como se elas não existissem. No prim eiro caso, as tendências situacionais prevalecem sobre a passividade do ato r social; no segundo, tratase de construir a viabilidade do plano mediante estratégias politicas, econômicas e organizacionais que exigem vontade de mudança. O terceiro caso identificase com a aventura política, a inflação, os desequilíbrios econômicos e a im potência organizacional. O conceito de aventura política merece, no entanto, alguns comentários. Nos processos criativos com problemas quaseestruturados é muito difícil assegurar que uma operação que aparentemente ignora as restrições mais elementares é sempre uma aventura política. A história está cheia de aventuras políticas que fracassam num curto horizonte de tempo. No entanto, num processo mais longo, elas constroem a viabilidade de projetos bemsucedidos. Seria a aventura, por vezes, um tipo de sacrifício de lenta maturação? Domínios Vias possíveis
Política
Econôm ica
Organizacional
1.
aceitar as restrições
domínio das tendências políticas
dom ínio das tendências econom icas
domínio das tendências organizacional
2.
superar as restrições
estratégia política
estratégia economica
estratégia organizacional
3.
ignorar as restrições
aventura política
inflação e desequilíbrios econômicos
im potência organizacional
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b.
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Estratégias de Construção de Viabilidade
Tendose optado por reconhecer as restrições e procurar uma via para aum entar os recursos escassos, surge o pro blem a de conceber uma estratégia. Em grandes linhas, as possibilidades sãc: •
estratégias de cooperação com outros atores sociais;
•
estratégias de coop tação de atores sociais;
•
estratégias de conflito com ou tros atores sociais.
A cooperação supõe negociações para acordar vias comuns de ação. Os atores cedem parte de seus interesses em troca do resultado esperado como conseqüência da ação concertada. A cooptação, por sua vez, implica que um ator social ganhe a vontade de outros atores para sua própria posição, seja pelo seu peso como centro político, pelo peso de sua argumentação ou pela força de sua ideologia. MATRIZ DE ESTRATÉGIAS DOS ATORES A1 . A 2 E A3
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O conflito visa diminuir o peso relativo da força dos atores com interesses contrários. A cooperação, a cooptação e o conflito não são excludentes na estratégia de um ator social, pois essas vias estratégicas são relativas a vários outros atores sociais e aos diversos projetos e operações que fazem parte dos programas direcionais dos atores sociais relevantes. As combinações possíveis dessas vias são múltiplas e complexas; elas podem oc orrer no interior de um ator (luta entre tendências) e en tre diferentes atores sociais. Em teoria, podemos combinar os três tipos de estratégia para n atores sociais e j projetos de ação. As possibilidades são ainda maiores se os projetos de ação forem desagregados em submódulos e os atores sociais em tendências. /
ESTRATEGIAS NAS PERSPECTIVAS DE A 1,A 2
C00PERAÇÍ0
P]
C00PTACÃ0
P2
CONFLITO
P3
E A3
Pl.P 2 .P 3
Podese observar, nas matrizes que se seguem, como os atores Al e A2 adotam estratégias de cooperação no projeto PI e de cooptação no pro je to P2.
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O conflito aparece sob ferinas distintas. Há estratégias de conflito entre Al e A2 quanto ao projeto P3 e entre Al e A3 em todos os pro je to s. Na perspectiva de A2, há estratégias de cooperação e cooptação com Al nos projetos P1 e P2 e estratégias de conflito com Al no projeto P3 e com A3 nos projetos PI e P2. Na perspectiva de A3 não há estratégias de co operação e cooptação com os demais atores, uma vez que A3 está em conflito com estes em todos os projetos.
c.
Teorías Sobre a Cooperação e o Conflito
Jogar é uma forma de conhecer a realidade e suas possibilidades. Ao procurarmos uma teoria bemestruturada para tratar da cooperação e do conflito entre atores sociais encontraremos a teoría de jog os , com seu impressionante desenvolvimento. Se necessitamos de um método mais livre, flexível e adequado aos problemas quaseestruturados, podemos recorrer ao jogo que tem origem no kriegspiel alemão (jogo de guerra), e que na cultura inglesa denom inase gaming. O jogo é uma técnica de análise sem fundamentos teóricos muito rigorosos, porém muito interessante. Nossa convicção é de que o jogo, em suas diversas modalidades, especialmente na forma livre, ganhará terreno à medida que possamos construirlhe uma base teórica mais sólida (veja On Free-Form Gaming, William M. Jones, RAND/N2322 RC, 1985, e meu livro Jogos, C. Matus, Mimeo, 1985). A teoriamais formalizada sobre a cooperação e o conflito é a teoria de jogos, que coloca como um p roblem a bem estrutura do algo que, em sua essência, é quaseestruturado: a interação entre atores criativos. A teoria de jogos não deve ser confundida com o jogo, como já foi dito em outras partes deste livro. A teoria de jogos é uma teoria matemática bem estrutu rada, enquanto o jogo é uma fo rm a de simulação humana quaseestruturada. No enta nto , para os propósitos desta discussão, usaremos brevemente os elementos da teoria de jogos por razões estritamente pedagógicas, a fim de explorar as características dos casos de interação humana que tendem à cooperação em relação àqueles que tend em ao conflito.
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Política, Planejamento e Governo
A teoria de jogos realizou extensas análises sobre esse tema. Entre os estudos mais conhecidos e profundos estão os de J. Von Neumann e O. Morgenstein (1944), Theory of Games and Economic Behaviour, Princeton Univ. Press; o de T. Schelling, A Estratégia do Conflito (1960), Harvard University Press (Tecnos, 1964) e a obra notável e prolífica de M artin Shubick, em especial Game Theory In the Social Sciences, MIT Press, 1984. De forma simplificada e seguindo os autores mencionados, poderíamos dizer que a rica literatura sobre a teoria de jogos distingue os seguintes tipos: i.
Em relação ao tem po : • •
ii.
jogos instantâneos (de um só m ovim ento); jogos seqüenciais, ou superjogos.
Em relação à natureza da interação: ® • •
jogos de cooperação (soma distinta de zero); jogos de conflito; jogos mistos.
iii. Em relação ao nú m ero de jogadores: • jogos bilaterais (dois op on entes); • jogos multilaterais (vários oponentes). Interessanos, de acordo com o propósito desta introdução, os jogos segundo a natureza da interação. Sobre este ponto a teoria de jogos distingue , pelo m enos, as seguintes classes:
de coordenação
de cooperação Jogos
de pressão de credibilidade
mistos
de conflito
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Jo gos de Cooperação
O jogo de cooperação é aquele em que todos os jogadores ganham com a cooperação e todos perdem com o conflito. São jogos com soma distinta de zero, ou seja, soma positiva ou negativa. A cooperação é uma forma de interação muito complexa e variada. Ela compreende as tentativas de coordenação sem possibilidades de comunicação, coordenação com comunicação aberta, negociações, coordenação de planos, formação de coalizões em jogos com mais de dois oponentes, certas formas de desafio, comunicação de ameaças, dissuasão, acordos baseados na credibilidade, etc. Em geral, esses jogos implicam ação conjunta e coalizões. Apesar dessa enorm e variedade de jogos possíveis, há um a tipologia que caracteriza, em abstrato, os casos principais. Consiste em distinguir entre jo gos de coordenação, jo gos de pressão (chicken games) e jogos de credibilidade (do tipo “dilema do prisioneiro”). O jog o de coordenação
Suponhamos dois atores, eu e tu, que juntos fazem maioria no Parlamento, mas separados são derrotados pelas outras forças. Eu deseja fazer aprovar um projeto que enfrenta o problema A e tu um projeto que enfrenta o problem a B. Os dois projetos têm amplas áreas de coincidência, mas um é mais radical que o outro. Eu atribui um alto valor a A, enquanto tu atribui um alto valor a B. Há, portanto, um conflito entre eles, mas esse conflito estará subordinado à necessidade de coordenação. Se somarem seus votos eles poderão fazer aprovar A ou B, e ambos poderão realizar um intercâmbio favorável de problemas. Se dividirem seus votos não aprovam nem A nem B, com o que o valor dos problemas nãoresolvidos não diminui para eles. Para constru ir a matriz do jogo usaremos as seguintes convenções: •
Se um ator não consegue nenhum benefício no jogo, o valor deste resultado é zero (0); se obtém o máximo, o valor é 2; se consegue algo positivo, mesmo não sendo o ótimo, o va lor é 1.
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Política, Planejamento e Governo
•
O número antes da vírgula indica o resultado para eu, e após a vírgula o resultado para TU. MATRIZ DE UM JOGO DE COORD ENAÇÃO TU Vota por A
Vota por B
Vota por A
2, 1
0, 0
Vota por B
0, 0
1, 2
N este caso, há certam ente tendências à coordenação para alcançar os valores (2,1) ou (1,2). A cooperação é muito mais benéfica que o conflito. O jog o de pressão
Neste jogo um dos ato res assume que o outr o deve ceder, e, para que isto ocorra, deve manter suas posições até o fim, porém sem chegar ao conflito, já que este penaliza a ambos. O primeiro que cede é o que abre caminho à solução cooperativa do jogo, e é ele quem paga o custo da abertura. E isto que faz prolongar o jogo até atingir uma tensão extrema. Na literatura sobre teoria de jogos este caso é chamado chickert game , uma alusão ao jogodesafio enfrentado por James Dean no filme Juv entu de Transviada; o que cede prim eiro é “chicken”. Um jogo histórico deste tipo ocorreu em outubro de 1962 entre Estados Unidos (Kennedy) e União Soviética (Khruschev), conhecido como “A Crise dos Mísseis”, em Cuba. Recordese o livro já citado de G. Allison. É um jogo em que nenhum dos oponentes pode ceder completamente, pois seu custo seria muito alto; só podem ceder no que é estritamente necessário, para desviar a solução do jogo do custo extremo do conflito para a cooperação. A cooperação, aqui, não é uma solução ótima para ninguém; é apenas uma solução satisfatória.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
415
MATRIZ DE UM JOGO DE PRESSÃO Khrushchev (TU)
Kennedy (YO)
Vota p or A
Vota por B
Cede
2, 2
3, 1
Não cede
1, 3
0, 0 (guerra)
A casa “não cede/não cede” tem um valor (0,0), que representa a pio r das situações: a guerra nuclear, em que todos perdem . A casa (2 ,2 ) indica a negociação, à qual se chega apenas porque um dos oponentes dá o primeiro passo, interpretado como “cede” pelo seu oponente. Neste caso, a escala empregada é 3,2,1,0. O jogo de credibilidade
Este tipo de jogo ficou famoso com o nome de Jogo do Dilema dos Prisioneiros. O professor Schelling (A Estratégia do Conflito, p. 119) coloca o problem a desta forma: Existe uma versão do dilema dos prisioneiros para este jogo: dois cúmplices são presos antes de poderem combinar um álibi. São in terrogados separadamente e devem fazer coincidir os álibis que in ventam, caso contrário serão considerados culpados. Pode-se cons truir uma variante supondo-se que a confissão dá lugar a unia pena mais leve que a culpa não-confessada. Cada jogador dispõe de uma estratégia “mínim a" de confissão, e deve considerar qual álibi cons titui a melhor estratégia entre as que pode escolher, caso queira re correr a alguma; deve também considerar até que ponto o álibi é bom (no que se refere à probabilidade de coincidir com o álibi do companheiro) e se coincidem na decisão de adotar algum.
Um jogo do mesmo tipo, porém mais eloqüente, é o apresentado por Ian McLean (Public Choice, Blackwell, 1987, p. 131). E um jogo
4 1 6
Política, Planejamento e Governo
em que a União Soviética e os Estados Unidos negociam um acordo de controle e proibição de experiências nucleares, na ausência de uma autorida de internacional com capacidade real de fazer resp eitar o acordo. MATRIZ DE UM JOGO DE CREDIBILIDADE URSS (TU) Respeita o acordo
Burla o acordo
Respeita o acordo
2, 2
0, 3
Burla o acordo
3, 0
1, 1
Este é um jogo de credibilidade porque o acordo só é possível se resultar num benefício maior para ambos; esse cálculo gera a vontade de cumprir o acordo. Os jogos de credibilidade adquirem sua dimensão real numa seqüência de jogos, porque a tentação de burlar o acordo é alta quando o encontro entre os oponentes é único, não voltando a se repetir. Nos jogos de um só m ovim ento a burla pre dom in a sobre a cooperação. E o caso do indivíduo que vende diretamente seu automóvel de boa aparência mas mal de mecânica. A tentação de vendêlo sem advertir o com prador é m uito grande, porque a probabilidade de voltarem a encontrarse em outra negociação é muito baixa. Já a tentação de enganar é baixa se a negociação com o outro for repetitiva: a burla afeta a credibilidade e dificulta futuras negociações. O jo go de co nflito Sob este nome em que se eu ganho para am bos. Se a solução é com meu plano e tu
há uma gama de jogos de soma zero, ou seja, jogos tu perdes, de forma que não existe uma solução boa boa para mim, será ruim para ti. A alternativa é: eu com o teu. Não há lugar para ambos.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
4 1 7
MATRIZ DE UM JOGO SIMPLES DE SOMA ZERO Sai Coroa
Sai Cara
TU
TU
cara
coroa
cara
coroa
cara
-
0,1
-
1,0
coroa
1,0
-
0,1
-
O exemplo mais simples deste jogo é a aposta cara ou coroa no lançamento de uma moeda. Quem acerta ganha !.
d.
A Escolha entre Cooperação, Cooptação e Conflito
É inevitável optar por uma das vias indicadas. O estrategista deve escolher. Com que critérios fazse a escolha? A resposta varia conforme se adota o ponto de vista de como os atores sociais tomam esta decisão na realidade conc reta, ou o po nto de vista racionalista, interessado n o rmativamente nos critérios mais eficazes para resolver o problema. Na explicação real entram em jogo fatores ideológicos, culturais, emotivos e circunstanciais, para além do cálculo racionalista. Devese considerar também que a estratégia selecionada desempenha o papel de meio que diferenciará os resultados. A cooperação não conduz ao mesmo resultado situacional que a cooptação. Ambas po dem alcançar o mesmo objetivo particular, mas não a mesma situação objetivo. Por exemplo, é possível fazer aprovar um projeto de lei no Congresso Nacional por qualquer uma das vias, mas o contexto situacional resultante será distinto em cada um dos casos. Na estratégia de cooperação o balanço das relações, após a negociação entre os cooperan dos, será distinto daquele em que o oponente adere sem condições à outra posição. A diferença é ainda mais evidente quando se compara qualquer uma das estratégias nãoconflitantes com a de conflito, na qual um ator vence outro.
4 1 8
Política, Planejamento e Governo
Assim, não é possível comparar a eficácia relativa das diferentes vias estratégicas como se se tratasse de meios distintos para alcançar a mesma situaçãoobjetivo. Tampouco seria esclarecedor fazer a análise de conveniência a muito curto prazo, como, por exemplo, privilegiar ao extremo o êxito de se alcançar a situação seguinte sem ponderar as conseqüências sobre a situaçãoobjetivo no horizonte de tem po do plano. Os êxitos interm ediários terão um custo ou um benefício mais estável apenas se constituírem elos de uma cadeia de situações que se aproxima ou se afasta da situaçãoobjetivo. Valem aqui todas as considerações acerca da comparação e ntre eficácia tática e eficácia estratégica. A escolha entre estratégias de cooperação, cooptação e conflito de pende de três fatores: (a) a vontade de cum prir o plano num dete rm inado prazo, apesar dos conflitos que provoca; (b) a intersecção dos es paços direcionais dos atores que pesam na situação; (c) se os projeto s de maior valor para os atores relevantes estão situados nas intersecções com uns ou nos espaços direcionais exclusivos. A vontade de cumprir um plano audaz e transformador implica, quase sem pre, certa rigidez normativa, que despreza a concertação com outras forças. Essa rigidez normativa é, freqüentemente, geradora de conflitos, em especial nos casos de relações de forças que guardam certo equilíbrio entre si. A alternativa à rigidez normativa é a firmeza estratégica que implica, ao mesmo tempo, forte vontade de cumprir o plano e flexibilidade para negociar e realizar rodeios táticos. Dessa forma, o estrategista não é cegamente arrastado para os conflitos pela sua rigidez ideológica; ele escolhe o momento e a conveniência dos conflitos, levando em conta o risco de um desvio para outras situaçõesobjetivo. A vontade de cumprir o plano é condicionada por restrições situa cionais. Entre elas estão as diferentes valorações políticas e interesses dos atores sobre os projetos de ação em debate. O valor de um p rojeto para um ator em particular é sua apreciação do papel que o projeto desempenha em seu programa direcional, na coesão d e sua força e na ampliação da adesão popular do ator. O interesse por um projeto de ação é o signo atribuído ao valor; tal signo pod e ser de rejeição, aceitação, indiferença, etc.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
419
O valor e o interesse pelos projetos de ação em debate determinam sua localização nos diferentes espaços direcionais dos atores relevantes.
No Gráfico que se apresenta, os pro jetos PI e P2 são de consenso, enquanto que os projetos P5 e P6 são conflitantes. Os projetos P3 e P4 situamse nas fronteiras difusas dos espaços direcionais dos atores Al e A2. Os projetos PI e P2 possibilitam uma estratégia de cooptação sem esforços para os atores. Já os projetos P3 e P4 abrem caminho para uma cooperação mediante negociações. Por fim, os projetos PS e P6 aparentem ente são abordáveis apenas com estratégias de conflito. Mas as estratégias não são independentes. Nem sempre é possivel adotar, simultaneamente ou em seqüências contíguas, estratégias de cooperação, cooptação e conflito com outro ator social. Nessa questão, o valor que os atores atribuírem aos projetos desem penha um papel m uito importante.
4 2 0
Política, Planejamento e Governo
Utilizando o exemplo do Gráfico, podemos imaginar três casos: CASO 1: TENDÊNCIA AO CONFLITO
Valor dos projetos
1
II
H H
A
H H
M
B
III
F1 H Espaço (1) de intersecção entre A1 e A2
Espaço difuso (II) limítrofe entre A1 e A2
espaços direcionais excludentes (III)
No caso 1 pre domin a a tendên cia ao conflito, porq ue os pro jeto s de maior valor para ambos os atores situamse nos espaços direcionais privativos dos atores. N este caso, a zona IIIA de Al e A2 são espaços onde as posições ideológicas e os interesses são completamente divergentes, e é aí que se situam os projetos P5 e P6, os de maior valor para ambos os atores. Essa forte contradição na zona 1I1A domina as outras zonas, como IIM e IB onde, em outro contexto mais favorável, poderiam existir estratégias de cooperação e cooptação. A intensidade do conflito em IIIA impede a concertação em IIM e IB. No caso 2, pelo contrário , pre dom in a a tendência à cooperação e cooptação, porque a zona dominante é o quadrante 1A, onde se situam os projetos de maior valor (PI e P2). Já os projetos P5 e P6, conflitantes, têm pouco valor para os atores relevantes. Nesse caso, um conflito de baixa intensidade entre Al e A2 é compatível com estratégias de cooperação e cooptação entre ambos.
421
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional CASO 2: TENDENCIA A COOPE RAÇÃO E COOPTAÇÃO Consenso
Negociação
Conflito
1
II
III
Valor dos projetos
A
P1
P2
M
alto
P3
P4
médio
B
P5
P6
baixo
O caso 3 tenta mostrar as condições em que é possível, por conveniência dos atores Al e A2, isolar as estratégias de conflito das de cooperação e cooptação. Para isso é necessário que os projetos de consenso tenham um alto valor para ambos e que tal valor seja similar ao dos pro jeto s conflitantes. CASO 3: TENDENCIA A ESTRATEGIAS MISTAS Valor dos projetos
I
A
H H
M
B
ii
ui
j
H H
P5
j
j
P6
alto
médio
baixo
Nesse caso, os atores A l e A2 podem chegar a um acordo para delimitar o conflito aos projetos P5 e P6, promover conjuntamente os projeto s PI e P2 e negociar as diferenças a respeito dos pro jeto s P3 eP4.
4 2 2
Política, Planejamento e Governo
Ao procurar critérios normativosracionalistas para decidir entre estratégias de cooperação, cooptação e conflito, veremos que haverá concorrência entre eficácia (maior probabilidade de êxito), economia de tempo (velocidade para alcançar os resultados), custo político e econômico (eficiência baseada numa avaliação de benefícios e custos em relação à eficácia direcional) e segurança (evitar o risco de seguir um curso de ação sem alternativas, caso haja fracasso). As estratégias de cooperação e cooptação são suficientemente conhecidas. Para auxiliálas foram desenvolvidas diversas técnicas, en tre as quais cabe mencionar as técnicas de negociação e as técnicas de persuasão, enquanto instrumentos práticos de trabalho. Já a análise de estratégias de conflito político tem sido menos explorada no âmbito do planejamento, com exceção do caso extremo do planejamento de guerra. Por esse motivo nos concentraremos, a seguir, no estudo das estratégias de conflito.
e.
0 Processo de Construção de Viabilidade
E possível criar a viabilidade de um plano ou podese apenas analisar suas possibilidades? A análise de viabilidade é o exame das possibilidades de um ator social de construir a. viabilidade do plano a pa rtir de uma situação concreta. A viabilidade não está determinada, ela está aberta à nossa habilidade estratégica. Mas nem todo plano é viável em qualquer circunstância. Mesmo após esgotar nossa habilidade e nossa vontade, ainda existirá o impossível. O problema dinâmico da viabilidade é uma questão de criação de possibilidades. A perguntachave é esta: •
Como pode um ator com poucos recursos realizar projetos que exigem m uitos recursos?
A única resposta possível é: acumulando novos recursos. Mas a acumulação de novos recursos não é problema a ser resolvido mediante poderes mágicos ou divinos, como o milagre da multiplicação dos pães e do vinho. A acumulação de recursos só é possível mediante estratégias criativas persistentes, lentas, às vezes muito custosas, sempre em zigue zagues e alternando êxitos e fracassos.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
423
Nesse processo criativo, a rigidez norm ativa é caminho certo para o fracasso. É necessário adaptar os meios e os objetivos às circunstâncias de cada situação, às vezes ceder diante das restrições, buscar aliados, aplicar os meios a tempo e aproveitar cada oportunidade para ampliar o pró prio espaço de liberdade, fazendo retroceder as restrições. Tudo isso deve ser feito sem que se perca a direcionalidade última, dinamicamente eficaz; o êxito deve ser alcançado não pelo domínio da adaptação dos objetivos ao que é possível, mas pela criação de possibili dades que construam a viabilidade dos ob jetivos persegu idos. Num a situação Si, se o espaço de variedade dos fluxos de produção possíveis (EVPSi) não perm ite ao ato r Al produzir o pro jeto P2, a condição básica para construir a viabilidade de P2 é que A l deve ser capaz de desenhar e produzir antes um projeto PI viável dentro de EPVSi, cujos efeitos farão EVPSi mudar para EVPSj de modo que este novo es paço inclua em suas fronteiras o pro jeto P2.
( 1 ) A l : S i ( G i , FEL , F L i ) ------- ► E V P S i ------------- ►
P2 (2 ) P2
a
Si
(3 ) PI v Si
( P2
NAO E VIÁVEL EM S i )
( PI E VIA VE L EM Si )
( 4 ) A l : pTT sT ------- *• S j ( G j, F E j , F L j ) ------ ►EVPSj
onde: (5) P2 v Sj e a trajetória de viabilidade e': ( 6 ) P l - --------- ►P2
4 2 4
Política, Planejamento e Governo
Desta forma, o projeto PI não surge norm ativamen te da comparação da situaçãoobjetivo com a situação inicial, mas da necessidade de viabilizar a produção de P2. Essa função intermediária de construir a viabilidade do projeto que segue é conseguida graças à mudança do es paço vigente de variedade do possível. PI abre caminho a P2; sem P l, P2 é inviável. O processo de construção de viabilidade é uma aproximação indireta do problema, na qual certos projetos abrem caminhos para outros. Esse processo pode ser assim formalizado. O espaço de variedade do possível para um ator é um espaço de li berdade rodeado por um espaço de re strições. Assim, o processo de construção de viabilidade para Al é um processo de ampliação de sua liberdade de ação, que, em parte, restringe a liberdade de ação dos outros atores sociais. O processo de construção de viabilidade para P2 pode , no entan to, não seguir a reflexão e previsão do planejamento. Podem ocorrer mudanças no cenário internacion al, nas tendências situacionais ou , devido a eventos fortuitos, no próprio espaço de variedade do possível para um ator, tornan do viável o projeto P2.
Este caso destaca outro aspecto do planejamento estratégico: o aproveitamento oportuno das possibilidades abertas pela situação. As oportunidades de ação diante das possibilidade abertas por outros atores sociais, as tendências situacionais e os eventos fortuitos constituem uma
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situa cional
425
importante via complementar do esforço próprio para construir a viabilidade do plano.
f.
0 Necessário, o Possível e a Criação de Possibilidades
Nem sempre o necessário é possível numa situação concreta. Mas a realidade é dinâmica; e o necessário pode se aproximar do possível, e o possível pode se aproxim ar do necessário. Portanto , não precisamos, obrigatoriamente, renunciar aos objetivos que são impossíveis na situação presente. Mas um ator social não pode proporse objetivos sem sa ber em que situação eles são provavelm ente possíveis. Por isso, com o conceito de situaçãoobjetivo conseguese melhor precisão dos propósitos de um projeto de governo, pois este conceito situa os objetivos perseguidos no con texto de um a situação futura. A situaçãoobjetivo é um marco provisório na trajetória de construção de um modelo social. Não pode haver planejamento sem objetivos, pois sem eles não há problemas nem situação almejada, nem padrão de referência para avaliar a situação inicial. No entanto, esta afirmação aparentemente trivial tem, pelo menos, dois tipos de críticos: i.
os que crêem que o essencial é o movimento das coisas, e não para onde elas se movem; conseqüentemente, podem conce ber um planejamento “sem objetivos”, que desencadeia movimentos das forças sociais na esperança de que esses movimentos alterem a situação vigente e conduzam a condições mais favoráveis; ii. os que sustentam que o objetivo pode ser o de alcançar um meio, acumular poder, por exemplo; aquilo que aparece como meio é, no fundo, o objetivo.
As duas posições são idênticas, já que “desencadear planejadamente o movimento das forças sociais” é formalmente um objetivo, que tam bém pode ser considerado um meio para atingir outro objetivo não esclarecido. A polêmica só demonstra a relatividade dos conceitos de meio e objetivo. O movimento da situação em qualquer direção pode ser uma ação norteada por um propósito, e o que é meio para os que estão no co
4 2 6
Política, Planejamento e Governo
mando do governo de um país pode ser um objetivo para os que estão na oposição. As aspirações encarnadas num modelo social são um projeto sem horizonte de tempo definido para sua materialização e sem a precisão fenoménica que ele teria caso fosse imaginado como uma situação futura concreta. Já a situaçãoobjetivo é um momento concreto na construção do modelo social e, por conseguinte, tem como referencia o horizonte de tempo do plano, e urna determinada precisão fenoménica que surge da necessidade de coerência do plano e das exigências de se o bte r adesão e apoio diante das demandas básicas da população e das forças sociais. Assim, a situaçãoobjetivo convertese em referência, ou guia para a ação planejada. Tal guia concretiza uma direção do processo de desenvolvimento social e um alcance, ou grau de avanço nessa direção. Essa distinção entre direção e alcance da situaçãoobjetivo é importante, já que o problema do ator em decidir entre alternativas consiste, em parte, em selecionar uma direção dentro de um espaço direcional e selecionar um alcance de aproximação ao modelo social, dentro de um espaço de possibilidades cercado por limites que representam restrições. Essas restrições são fronteiras do processo de acumulação de poder, de capital e do tempo necessário para a ação. Esses limites dentro dos quais se move a possibilidade de desenho da situaçãoobjetivo estão representados no gráfico a seguir. ^ __ l imite de alcance m ínimo
T
D
C
limite ideológico superior
es p aç o d ir ec io n al d o a to r
•
|y il|Í|
....................................
A T
B
limite ideológico inferior limite de alcance máxim o
y
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
427
Os limites cercam um espaço de opções para o desenho da situaçãoobjetivo do quadrante ABCD, designado por espaço direcional do ator. Este espaço direcional tem dois tipos de fronteiras difusas: os limites de alcance e os limites ideológicos. Os limites de alcance DA e CB expressam o mínimo necessário e o máximo possível de avanço para a utopia con creta. O limite de alcance mínimo é determinado pela necessidade de manter a coesão na própria força do ator, coesão que não será alcançada caso os objetivos não corresponderem, em alguma medida, às demandas da sua base social. As próprias tendências situacionais impõem também um limite mínimo para determinados tipos de objetivos ou aspectos de diferentes objetivos. O limite de alcance máximo representa o avanço máximo possível, dadas as limitações de acumulação de poder, acumulação econômica e tempo necessário para a ação. A direção também é demarcada pelos limites de direção DC e AB; esses limites ideológicos são uma espécie de faixa de desvio do que é a direção de consenso central na base social e na estrutura orgânica do ator. Acima do limite ideológico superior as propostas do plano estão, digamos, demasiado à direita do consenso ideológico central do ator. Abaixo do limite inferior, as propostas do plano estão demasiado à esquerda do consenso ideológico central do ator. Os termos direita e esquerda poderão ter o significado que o leitor queira atribuirlhes. Assim, no espaço ABCD poderão ser avaliadas diferentes situações objetivo; elas constituem opções aceitáveis para um ator. Fora do espaço ABCD qualquer proposta prejudica a coesão das forças componentes do ator. Nem sem pre o desenho da situaçãoobjetivo pode se m over dentro do espaço de opções internas do ator, pois este deve buscar acordos ou alianças com outras forças sociais, ou deve ampliar sua base social. Em outras palavras, nas estratégias de cooperação e cooptação, o espaço direcional do ato r não é suficiente para precisar a situaçãoobjetivo. E ne cessário explorar os espaços direcionais dos outros atores que pesam na situação. A situaçãoobjetivo é um elemento de uma estratégia política e de uma estratégia econômica. Essa estratégia supõe a escolha de uma alian
42 8
Política, Planejamento e Governo
ça de forças necessária e possível. Essas alianças exigem que se leve em conta o espaço de opções da situaçãoobjetivo das forças com as quais se pode obter um consenso. Assim, o cálculo da situaçãoobjetivo já não deve apenas responder às perguntas: para alcançar o quê? Sob quais restrições? Mas também a outras: com quem? Para quê? Com que probabilidade de êxito? espaço direcional de A1
espaço ideológivo de consumo
espaço direcional de A3 espaço direcional de A2
As respostas a essas perguntas não são independentes; elas condici onamse umas às outras através das relações a seguir: (a) Relação aliança-objetivo Como as forças potencialmente aliáveis são heterogêneas e têm distintos espaços direcionais, quanto maior a amplitude da aliança, menor será o espaço de consenso; por sua vez, quanto menor o espaço de consenso, menor será a possibilidade de manter a coesão no interior da força que busca a aliança, porque o objetivo comum pode desviála em demasiado do objetivo próprio. (b) Relação de forças Quando uma força social com pouco poder desenha sua situação objetivo o mais próximo possível do seu ideal ou utopia, maior será a soma de forças opostas a seu projeto e menor a probabilidade de êxito.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
429
A causa está em que o espaço da aliança possível em torno desta força será mais estreito e, conseqüentemente, deixará um amplo espaço para que outras forças se somem como oponentes, forças essas que poderiam ser aliadas se os objetivos fossem parcialmente negociados. (c) Relação de interesses opostos Q uanto maior o alcance da situaçãoobjetivo de um ator em relação à sua utopia, maior será o “interesse negativo” ou resistência das forças adversárias, uma vez que seus interesses na situação presente estarão ameaçados de forma mais radical. O gráfico a seguir mostra a relação aliançaobjetivo, a relação de forças e a relação de interesses numa forma que permite vincular siste micamente as três perguntas básicas: com quem? Para quê? Com que probabilidade de êxito? A resposta a essas perguntas precisa a situação que o ator enfrenta no momento do desenho da situaçãoobjetivo. COM QUE M ?
PA RA QUÉ? ?
COM OUE PROBABILIDADE DE ÊXITO ?
4 3 0
Política, Planejamento e Governo
A situaçãoobjetivo te rá maiores possibilidades de materialização na medida em que o ator central, ou ator promotor, logre uma relação aliançaobjetivo tal que lhe permita somar força suficiente para enfrentar deslocamentos necessários de posição dentro do espaço direcional de desenho de sua situaçãoobjetivo, sem que isso provoque uma perda de coesão da sua força interna ou o fortalecimento das forças oponentes. Nesse cálculo, é im porta nte evitar ta nto o subdim ensionamento quanto o sobred imensionam ento da situaçãoobjetivo. Para fazer tal avaliação devemos considerar que a estratégia interna do ator supõe manter sua coesão e que sua estratégia externa supõe restringir o espaço de opções para a soma das forças oponentes. A relação de interesses opostos tem uma importância relativa à relação de forças. Com efeito, se a soma das forças oponentes diminui drasticamente e ao mesmo tempo aumenta sua motivação ou interesse negativo, esses elementos de poder estarão atuando em sentido contrário um ao outro. Mas se o ator central do nosso plano age de forma a aumentar o es paço para a soma de poder dos oponentes e, ao mesm o tem po, estim ular sua agressividade e interesse de oposição, os dois fatores tendem a mu ltiplicarse e podem gerar u m a ru ptu ra decisiva. Temos tratado, até aqui, dos limites de acumulação de poder, da acumulação econômica e da acumulação de tempo, sem explicar como precisálos. Esses três limites supõem antecipar o máx im o de mudan ça possível. Por sua vez, essa mudança é condicionada por determ inações genoestruturais e fenoestruturais que, ao serem alteradas, consomem tempo para que se efetivem as novas relações de determinação e de condicionamento dentro da nova variedade do possível e das novas ca pacidades de produção social. Norm alm ente, a situaçãoobjetivo desenhada não é realizável ou viável na situação inicial. O pro blem a consiste em desenhar uma situação objetivo que seja viável com a criação de novas possibilidades ao longo do horizonte de tempo do plano. Isso pressupõe determinado processo de acumulação de poder, de acumulação econômica ou de outros recursos capazes de alterar a determinação genoesírutural inicial (se necessário) ou os condicionamentos fenoestruturais. No gráfico a seguir, a determinação da situação inicial define um espaço m n de variedade do possível no fenômeno. O condicionamento
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
431
fenoestrutural demarca um espaço de capacidade de produção social xy. Nessas circunstâncias, só a parte A da situaçãoobjetivo é viável na situação inicial, sem alteração das genoestrutu ras e fenoestruturas.
Fenoesfrufuras na situação inicial
Capacidades de produção social
Os projetos, fatos e acumulações correspondentes a B, C e D só serão viáveis se forem alterados as determinações genoestruturais e os condicionamentos fenoestruturais. A construção de viabilidade consistirá em mudar o limite da determinação m e o limite de condicionamento y. Se o limite m é alterado mediante mudança das regras genoestruturais, sendo o o novo limite, apenas o aspecto C da situaçãoobjetivo se tornará viável, pois a inalterada capacidade de produção não permitirá aproveitar o espaço D de variedade do possível. Por outro lado, se for alterado apenas o condicionamento fenoestrutural y , passando o novo limite para z, a parte B da situaçãoobjetivo será viável, mas a determinação genoestrutural inalterada impedirá que a nova capacidade de produção se oriente para a realização de C e D. A conclusão é que apenas a remoção de ambos os limites, m e y, fará com que toda a situaçãoobjetivo seja viável num espaço de variedade e de capacidade de produção demarcado pelos limites o e z. Mas os limites o e z só são alcançáveis num processo que consome tempo, exige
4 3 2
Política, Planejamento e Governo
acumulação econômica e requer acumulação de poder suficiente a favor do ato r que aspira à situaçãoobjetivo. Assim, os limites o e z permitem explicar como se estabelece o limite resultante das restrições de tempo, poder a acumulação econômica.
g.
Os Diferentes Domínios de Análise de Viabilidade
Feito o desenho do programa direcional, surge a questão da viabilidade do inventário de projetos de ação (P), operações e ações. Devese verificar se, além de se justificarem por sua necessidade e suficiência para alcançar a situaçãoobjetivo, cum prem o requisito de serem politicamente possíveis, econômica e tecnicamente factíveis e organizacio nalmente realizáveis. Em primeira instância, isso reduz a análise de viabilidade ao inventário de projetos selecionados por sua eficácia direcional, o que é rigor osamente correto, desde que nos tenhamos previamente assegurado de que o programa direcional é coerente. No entanto, como veremos mais adiante, embora a análise de viabilidade refirase à estratégia para construir a viabilidade dos projetos de ação selecionados por sua eficácia direcional, é preciso complementar estes projetos com outros que tenham eficácia processual, ou seja, que sejam acumuladores de força para o conflito ou que facilitem a cooperação e a cooptação. Delimitado o campo de análise de viabilidade aos âmbitos da política, economia, tecnologia e capacidades organizacionais, convém definir genericamente estes domínios de estudo antes de nos aprofundarmos em cada um deles. A viabilidade política referese à administração dos escassos recursos de poder, a fim de aplicálos com eficácia na consecução dos objetivos possíveis com esta restrição política. Tratase, por um lado, de produzir operações e ações que acrescentem recursos de poder e, por outro, dimensionar o alcance e a direção da situaçãoobjetivo às relações de forças que se pode conseguir no horizon te de tem po do plano. A viabilidade econômica referese à escassez de recursos econômicos e financeiros; procurase elevar os recursos ao nível exigido pela situaçãoobjetivo, ou ajustar esta últim a às restriçõ es econômicas.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
433
A viabilidade tecnológica ou factibilidade técnica do programa direcional referese à disponibilidade presente e à capacidade de criação de técnicas capazes de realizar os processos econômicos, políticos e organizacionais exigidos pelo alcance e direção da situaçãoobjetivo. Assim, as tecnologias econômicas, políticas e organizacionais necessárias devem ser consistentes com o domínio e conhecimento que os atores sociais têm sobre eles, ou com sua capacidade de criação no horizonte de temp o do plano. A viabilidade organizacional e institucional referese às capacidades institucionais do sistema como um todo, e às capacidades particulares de gestão dos atores e das instituições envolvidas no processo de produção social. Por conseguinte, não basta que o programa direcional seja viável num dos domínios parciais apontados —por exemplo, o econômico; é necessário que esse prog ram a seja integra lmente viável. Esta afirmação coloca dois problem as comp lexos: i.
reso lver m etodolog icam ente a form a de fazer cada análise parcial de viabilidade;
ii.
estabelecer a form a de relação e interd epe ndênc ia en tre as viabilidades política, econômica, organizacional e tecnológica, a fim de chegar a uma conclusão de síntese sobre a viabilidade integral.
Dentre esses quatro tipos de viabilidade, centraremos nossa atenção nos três primeiros, pois eles apresentam problemas teóricometo dológicos cujas respostas ultrapassam em muito o âmbito tradicional das ciências. viabilidade política
O
l
viabilidade organizacional
viabilidade econômica
l
< ->
viabilidade tecnológica
Política, Planejamento e Governo
4 3 4
Já as estratégias para c onstruir a viabilidade tecnológica de um p ro grama direcional constituem um tema m uito especializado, que, em bora ultrapassando o âmbito das ciências naturais, está muito marcado pelas políticas seletivas de desenvolvim ento científico e tecnológico, com particularidad es que escapam ao tema central deste livro. As análises de viabilidade política, econômica e organizacional apresentam características próprias dos processos de criação e uso do poder, criação e uso da riqueza econômica e criação e funcionamento das organizações. Tratase de análises bem diferenciadas, embora constituam domínios situacionais fortemente interrelacionados. Esta última afirmação tem as seguintes implicações metodológicas: i.
se um projeto é viável num domínio situacional, o político po r exemplo, isso não implica, em absoluto, que seja viável nos outros domínios (o econômico e o organizacional); ii. devido ao po nto an terior, a análise de viabilidade deve realizar provas in dependentes para explo ra r a viabilidade política, econômica e organizacional; assim, um projeto é viável se passar pelas três provas mencionadas; iii. no entan to, a viabilidade política não é inde pen den te da econômica e da organizacional, e o mesmo é válido para cada tipo de prova de viabilidade. As condições situacionais requeridas e produzidas pela viabilidade política afetam a viabilidade econômica e organizacional. A situação econômica produzida pela viabilidade econômica gera situações políticas que podem contradizer ou reforçar as requeridas pela viabilidade política e organizacional. A viabilidade organizacional pode colocar exigências que correspondem ou contradizem as exigências da viabilidade política e econômica; iv. devido à implicação an terio r, as provas parciais para cada p ro je to e para cada domínio situacional são insuficientes; é necessária uma análise de síntese, em que as situações num determinado domínio da realidade são utilizadas como contexto situacional na análise dos outros.
Nos capítulos seguintes ab ordaremos tanto as análises parciais de viabilidade quanto as de c onjun to.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situa cional
h.
435
Viabilidade Política no Conflito
Analisar a viabilidade política de um plano supõe a possibilidade de comparar o poder das diferentes forças sociais e de simular ou prever a mudança de tais relações de poder no curso da mudança situacional. Nesse processo, alguns atores acumulam poder, outros perdem poder, surgem novas idéias sobre projetos e operações para as novas realidades, os atores mudam seus interesses e motivações, as alianças e oposições são redefinidas e as próprias fontes de poder de cada força social podem se alterar. Assim, tratase de uma comparação e de uma previsão muito complexa e de confiabilidade duvidosa. Mas essa análise deve ser feita a cada momento, superando o imediatismo da conjuntura situacional e explorando o futuro. Esta ex ploração é possível por várias razões. Primeiro, porque o governante ou o planejador não necessitam, hoje, uma resposta precisa sobre o que será viável amanhã; necessitam apenas um critério geral para incluir ou excluir do plano determinados pro jetos e operações. Segundo, porque a análise de viabilidade política, embora possa e às vezes deva fazerse explorando trajetórias de situações e projetos, não necessita, para ser válida, que tais trajetórias ocorram depois exatamente como foram exploradas; sua validade depende da correlação, em qualquer ordem, entre as situações futuras possíveis e os projetos e operações que nelas são viáveis. Terceiro, porque construir a viabilidade das operações e projetos do plano significa, em grande parte, estar previamente preparado para aproveitar as ocasiões propícias e não desperdiçar as situações favoráveis. Para tal, é preciso apenas desenhar com antecedência tais projetos, com base numa simulação das situações mais possíveis. Por último poderíamos assinalar que, num traçado difuso do espaço das situações mais possíveis que queremos criar com o plano, é muito mais importante dispor de projetos e operações viáveis, que explorem todas as oportunidades significativas, e menos relevante errar por excesso, com a inclusão de alguns projetos que posteriormente ficarão fora desse espaço de viabilidade. Tudo isso baseiase na idéia de que a prova última da viabilidade só é. possível na situação concreta presente, embo
4 3 6
Política, Planejamento e Governo
ra esta viabilidade deva ser co nstruída com base na previsão de possibilidades. Se assim não fosse, as oportunidades situacionais passariam diante de nós sem que soubéssemos aproveitálas. Nesse sentido, queremos re alçar que a ex ploração de trajetórias é apenas um meio para estimar o espaço das situações mais possíveis, e não um objetivo relacionado com a pretensão de se fazer uma estimativa prévia das seqüências mais eficazes ou possíveis. Em síntese, a análise de viabilidade política é um cálculo necessário ao processo de governo, sujeito a fortes elementos de incerteza. Essa análise não é um mero cálculo de predição, mas uma incursão simulada no futuro; ela expressa também nossa vontade de fazer, tentando criar situações favoráveis e antecipando o prédesenho dos projetos viáveis, com potencial para aproveitar as oportunidades abertas e alterar o curso da mudança situacional, num movimento de aproximação da situação objetivo. Como já assinalamos, a viabilidade política referese a três perguntas: i.
Os projetos políticos são politicam ente viáveis?
ii.
Os projetos econôm icos são politicam ente viáveis?
iii. Os projetos organizacionais são politicam ente viáveis? Delimitado o campo da análise de viabilidade política, é necessário precisar com mais rigor suas possibilidades e métodos. O problema da viabilidade política surge quando os atores que planejam coexistem na situação com outros atores sociais que têm outros planos, movidos por outros interesses; qualquer um dos ato res, isoladamente ou em aliança com outros, tem peso atual ou potencial suficiente para alcançar sua situaçãoobjetivo e ameaçar ou dificultar o cum prim ento da situaçãoobjetivo dos outros. O conflito de planos produz um jogo de interesses opostos em que, por vezes, o triunfo de uns é o fracasso de outros. Assim, é necessário enumerar, caracterizar e analisar os atores sociais relevantes para o êxito ou fracasso do nosso plano, identificando suas posições e interesses diante de nossos projetos de ação e as operações e ações que os conformam. Devemos tentar conhecer, mediante
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
437
uma simulação antecipada das situações futuras previsíveis, qual será nossa capacidade para materializálos e qual o peso dos obstáculos a serem colocados pelos atores sociais com outros planos, parcial ou totalmente distintos. Não se trata de um cálculo de predição da viabilidade política, o que é impossível nos processos criativos, mas de exploração dos cenários políticos possíveis a fim de estudar antecipadamente as opções pertinentes a cada caso, capazes de construir a viabilidade política do programa direcional. Admitiremos que os atores sociais apóiam, rejeitam ou são indiferentes aos projetos, operações e ações próprias e de seus oponentes, e que esses interesses, motivações ou intenções não são permanentes ou rígidos, mas mudam conforme a “trajetória” de situações seguida pelo movim ento da realidade em cada cenário político. O p onto de partida desta análise supõe que cada projeto e operação pode ser realizado numa situação concreta, caso os atores que os promovem sejam capazes de dobrar, anular ou fazer alterar as intenções dos que resistem ou rejeitam, ou de ganhar o apoio das forças sociais que mantêm uma atitude de indiferença. Essa capacidade de vencer uma resistência social passiva ou ativa é o poder de uns atores sobre outros. Por conseguinte, a viabilidade política de um plano referese às relações de poder entre os atores sociais, quer estes sigam a via de cooperação, da cooptação ou do conflito. No estudo da viabilidade política é necessário distinguir entre: i. as intenções do ator no conflito; ii. as capacidades de ação do ator no conflito; iii. suas afinidades com ou tros atores. As intenções de um ator dizem respeito ao valor, ao interesse que o ator atribui aos problemas. O valor que um ator atribui ao problema transferese à operação concebida para enfrentálo. Assim, podemos falar do valor de uma operação para um ator. O interesse é o signo da posição tomada pelo ator frente a um pro blema ou operação. Desta maneira, podemos dizer que o ato r A tenta atuar intensamente (alto valor da operação) para aprovála (interesse) e tornála realidade. Poderíamos dizer também que o ator B tenta permanecer passivo (valor) ante uma operação que o prejudica e,
Política, Planejamento e Governo
4 3 8
conseqüentemente, a rejeita (interesse). Diante da mesma operação, o ator C se mobiliza ativamente (alto valor) como oponente (interesse). O interesse é identificado com o signo (+) quando apóia, com o signo (O) quando é indiferente e com o signo () quando rejeita. A capacidade de ação de um ator está a serviço de suas intenções, podendo acompanhálas ou limitálas. Assim, há atore s com mais in te nções que capacidades em relação a um problema e outros com mais ca pacidades que intenções. A capacidade de ação de um ato r é algo m uito complexo que trataremos mais adiante, com a categoria vetor de peso de uma força. Cada ator tem um vetor de peso que expressa suas capacidades na situação. As afinidades estão determinadas pelo valor das intersecções dos espaços direcionais dos atores relevantes. Cada ator tem afinidades positivas (de atração) ou negativas (de rejeição) em relação a outros. Tudo depende do valor dos projetos e do interesse por eles. Dois atores têm afinidades se seus espaços direcionais se interceptam com projetos de alto valor; a intersecção indica um mesmo signo ou interesse. Dois atores se opõem se seus espaços direcionais nãointerceptados contêm projetos de alto valor; nãointersecção indica signos contrários. Em síntese, o outro é um ator se for um sujeito que cria e acumula intenções, capacidades e afinidades que são relevantes para minhas intenções, capacidades e afinidades. valor dos problemas e operações
intenções interesses pelos problemas e operações
Jogos
capacidade (vetor de peso)
afinidades (intersecçã o de espaço s direcionais)
i.
Capacidades de Ação de um Ator: seu vetor de peso
Neste caso, poder é a palavra precisa. Pode quem tem poder. Construir a viabilidade política é uma questão de ter poder ou acumular
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamen to Situaciona !
439
pro gressivam ente poder. Nossa análise de viabilidade política deve partir do conceito de poder, em toda sua complexidade teóricoprática, incluída a necessidade de enco ntrar um a categoria capaz de ser um indicador de poder. A categoria de poder é fundamental ñas ciencias políticas e seu im pacto devese à sua complexidade nebulosa. O que é poder? É um complexo de recursos de aplicação potencial? É uma acumulação que sintetiza todas as acumulações sociais possíveis para uma força social? É ao mesmo tempo uma relação social e uma acumulação? De onde emana o poder? Como se cria e se perde poder? Quais são os insumos sociais da produção de poder? As forças sociais apropriam se de um poder preexistente ou o poder só existe como atributo das forças sociais? Como o poder relacionase com outros conceitos como dominação, autoridade, habilidade para conduzir, etc. ? Como se relaciona o poder de uma força social com o uso do poder que ela faz numa situação? Liberdade de ação é poder? A variedade do possível para um ator expressa seu poder na situação? Quanto vale o poder? Seu valor é absoluto ou é relativo ao âmbito de seu uso? O poder é sempre relativo a outros? Qualquer acumulação social é redutível a poder? Então, o que não é poder? A informação, o domínio das ciências, o carisma, a simpatia, a organização, os recursos econômicos, a ideologia assimilável, os meios de comunicação, os meios de repressão, a adesão popular, os deputados e senadores no Congresso Nacional e o controle do aparelho de Estado são poder? Tudo isto, tão vago e tão complexo, pode ser expresso em categorias operacionais que sejam úteis para uma análise de viabilidade política? Essas perguntas são até hoje objeto de inúmeras análises, polêmicas e confrontos. Tentaremos abordar o conceito de poder e suas relações com a viabilidade política a partir de alguns pressupostos. (a)
O po de r é um conceito multidimensional.
O poder não se esgota num a dimensão precisa da realidade, com o a coerção, por exemplo; é uma forma de compreender toda a realidade. A adesão popular a um dirigente, o controle do aparato militar, a capacidade de criar teorias e ideologias convincentes, o acesso à informação, as capacidades legais e administrativas para tomar decisões, o controle
4 4 0
Política, Planejamento e Governo
dos meios de comunicação, o controle dos recursos econômicos, o carisma pessoal, a capacidade de organização, etc. são capacidades ou atri buto s que caracterizam o poder de um ator. O que os elementos dessa enumeração parcial têm em comum é que todos eles constituem uma capacidade de fazer ou influir sobre o que os outros fazem. O poder, por conseguinte, está relacionado à ação. O compromisso ideológico, a capacidade de persuasão e o intercâmbio económicopolítico são também dimensões sintetizadas ou as pectos da categoria central de poder. Por outr o lado, o poder é um a capacidade geral que surge da determinação genosituacional. Não é apenas uma questão de possessão de recursos de poder, pois também é poder a habilidade de ap roveitar a situação de classe para obter esses re cursos, usálos com eficácia ou empregar meios que façam os outros percebere m a existência desses re cu rsos. Podemos falar de poder político, poder econômico, poder militar. Por fim, poder também é a capacidade de produzir efeitos pela mera presença. (b) O poder é uma relação social que se refere sempre aos proje tos de outras forças sociais, embora tenha uma dimensão de síntese global. O poder é uma relação social que tem uma base genosituacional. Assim, as relações de classe são relações de poder. O poder indica os efeitos da genoestrutura sobre a prática de luta em nível do fenômeno. Por isso, o valor do poder de uma força ou classe social referese sem pre à confrontação possível ou efetiva com outras forças sociais. Daí surge o conceito de poder específico para realizar ou oporse a um determinado projeto. Desse valor específico, que muda segundo os pro jeto s e as situações, surge o conceito de poder geral em relação ao conjunto de projetos considerados no horizonte de tempo do plano ou da estratégia. O (c)
O pod er é pr od uto de uma acumulação social.
Uma vez que o poder baseiase nas relações genosituacionais, ele é um produto social, uma conseqüência dos processos de acumulação social.
.
t
K.
J.
Bi BL IOTECA
1P P U R Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
441
O poder surge do investimento ou consumo do poder préexis tente na produção dos fatos, na abstenção frente a fatos produzidos por outras forças ou no combate ou apoio a essas forças em condições situa cionais determ inadas. Esse uso ou nãouso do poder existente, com seus respectivos efeitos situacionais, produz a acumulação ou desacumulação de poder. Surge aqui uma distinção, difícil de se realizar na prática, entre investir e consumir o poder acumulado. (d) O po de r expressa-se nos diferentes planos situacionais. O poder expressase na genoestruturação, enquanto relações de determinação de toda a situação. Por isso, mudar as relações de determinação é. mudar as relações de poder na própria base. Mas o poder também se expressa nas fenoestruturas, como força condicionante da capacidade de produção de fatos sociais pelas diferentes forças sociais. Os fatos produzidos ou produzíveis na fenoprodução expressam o uso ou aplicação da força. O poder também se expressa como poder situaci onal nacional, e como poder ou deficiência de poder no cenário internacional. (e) O poder pode ser comparado de forma aproximada ou probabilística. O poder pode ser precisado e caracterizado como uma capacidade de produção de um ator social frente a outros e em relação a determinados eventos, numa situação concreta. Os recursos do poder constituem essa capacidade e. possibilitam a um ator um espaço de liberdade de ação, expresso numa combinação sistemática de ações possíveis numa situação concreta. A possibilidade de comparar o poder dos atores sociais tornase concreta no conflito. Nele, medemse as forças, comparandoas, porque em cada espaço de confrontação os oponentes selecionam os recursos mais eficazes para atingir seu objetivo. Na eminência do encontro, o poder convertese em força aplicável a um pro pósito específico. A questão da eficácia para atingir objetivos permite encontrar uma categoria e, por vezes, uma form a de medição homogênea e, portanto, comparável. Mas a possibilidade de comparação das forças não pode ser confundida
4 4 2
Política, Planejamento e Governo
com a certeza quanto aos resultados dessa comparação. O conflito é um pro cesso criativo e quaseestrutu rado, que não admite a certeza nem o cálculo ma temático preciso. (f)
O po de r pr od uz efeitos quando é usado e quando não é usado, porém percebido.
O poder exercese não apenas quando produz efeitos situacionais ao ser aplicado, mas tamb ém po r presença, ao ser percebido pelo o utro. Assim, a forma como o poder de uma força social é percebido pelas outras forças passa a ser um recurso de poder, real ou fictício. Como a presença do poder se m pre atua, ele nunca é usado em sua plenitude, salvo em situações de extrema tensão fenosituacional. Esses pressupostos, discutíveis sob vários ângulos, subsidiarão nossa definição de po der e o tratam en to que ele receberá ao se desenhar um método para analisar a viabilidade política de uma estratégia ou de um plano. (g) O conce/to de vetor de peso de uma força. No trabalho prá tico com o conceito de poder é necessário re duzilo a uma enumeração mais simples, relativo a capacidades de ação. O conceito de vetor de peso de uma força atende a tal fim. O vetor de peso de uma força é um indicador do poder de um ator e é representado pelas capacidades de produção social deste ator: F1 =(X11, X12, ... , X1m), onde cada elemento xij tem uma forma de precisão particular, de modo que, no sentido horizontal, a composição do vetor é heterogênea; não é possível realizar operações aritméticas entre os elementos componentes do vetor, de forma a reduzilo a um número. No entanto , é possível com parar, elem ento a elem ento , dois veto res de peso. Para isso, é necessário que o elemento X I 1 do vetor de peso da força 1 seja expresso da mesma fo rm a que o elem ento X21 da força 2. Assim, a coluna de elementos similares dos vetores de peso dos diferentes atores estará composta de elementos que poderão ser operados com as regras da aritmética.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
443
Pelas razões assinaladas, o vetor de peso de uma força é regido pelos seguintes princípios de análise: i.
Os elementos X I 1 e X I2, pertencen tes ao veto r de peso da força 1, só podem ser hierarquizados segundo sua eficácia ou pertinência de aplicação a um pro jeto determinado num a situação determinada; estes elementos são heterogêneos, daí não poderem ser objeto de operações aritméticas.
ii.
Os elementos X I 1 e X21 são iguais, mas fazem parte de vetores de peso de forças distintas; por serem homogêneos, sugei tam se às regras da aritmética.
iii. A comparação entre vetores de peso de diferentes forças só pode ser feita elem ento a elem ento, em relação a um projeto ou conjunto de projetos. iv. Alguns elementos do veto r de peso de um a força 1 referem se à adesão que ele recebe das outras forças 2 ,3 ,...z. v.
Quan do um a força calcula a conveniência de aplicar um ou vários elementos de seu vetor de peso na produ ção ou rejeição de um projeto, deve avaliar não só o efeito que ele tem sobre o propósito perseguido como também as conseqüências de tal aplicação sobre o valor dos elementos de seu vetor de peso.
vi. Cada elem ento do veto r de peso de um a força tem um campo ou espaço eficaz de aplicação, de forma que seu valor não é o mesmo para qualquer propósito; isso explica por que um ator com um vetor de peso fraco, mas com um elemento forte num campo de aplicação, pode vencer a resistência de um ator com um vetor de peso forte mas com elementos fracos aplicáveis nesse espaço particular. vii. A acumulação e desacumulação de força é expressa pelo aumento e diminuição do valor dos elementos do vetor de peso. viii. A hierarquia ou importância dos elementos do vetor de peso de uma força é relativa à situação; p or exemplo, o con trole do Congresso Nacional é muito importante para sancionar leis
4 4 4
Política, Planejamento e Governo
num a situação dem ocrática, mas é pouco im por tante para evitar uma greve e não tem nenhum valor diante de um motim militar. VALORES NUMÉRICOS DOS ELEMENTOS DOS VALORES DE PESO DAS FORÇAS SOCIAIS (% DE VALOR) ADESÃO DAS OUTRAS FORÇAS X1
FORÇAS
X2
X4
X3
X5
X6
X7
X8
X9
X10
X11
(A)
(C)
(D)
(E)
“A"
100
47
25
50
100
100
X
0
0
50
60
“B"
0
26
20
31
0
0
0
X
0
50
30
UC"
0
13
5
9
0
0
0
0
X
0
10
"D”
0
7
50
5
0
0
50
60
10
X
0
"E”
0
7
0
5
0
0
50
40
90
0
X
100
100
100
100
100.
100
100
100
100
100
100
TOTAL
VETOR DE PESO DE UMA FORÇA C VETOR DE PESO DE UMA FORÇA F QUALQUER, PARA F= A, B, D e E é: F
=
(X1 )X2,X3,X4IX5,X6)X7,X8,X9,X10,X11), onde;
X1
=
CONTROLE DO GOVERNO DO ESTADO
X2
=
CONTROLE DO CONGRESSO
X3
=
CONTROLE DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO
X4
=
ADESÃO POPULAR
X5
=
CONTROLE DO ORÇAM ENTO DO SETOR PÚBLICO
X6
=
CONTROLE DAS FORÇAS ARMADAS
X7
=
ADESÃO DA FORÇA (A) ÀS OUTRAS FORÇAS
X8
=
ADESÃO DA FORÇA (B) ÀS OUTRAS FORÇAS
X9
=
ADESÃO DA FORÇA (C) ÀS OUTRAS FORÇAS
X10
=
ADESÃO DA FORÇA (D) ÀS OUTRAS FORÇAS
X11
=
ADESÃO DA FORÇA (E) ÀS OUTRAS FORÇAS
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
j.
445
O Modelo de Calcagno
Ao rever as contribuições estimulantes que, na América Latina, abriram caminho a este tema complexo, é necessário citar Eric Calcagno. Seu trabalho sistemático deu os primeiros passos numa direção até então inexplorada na região. Calcagno desenvolveu m étod os que conduzem à idéia do planejamento político ( Estilos Políticos Latino Americanos — em colaboração com outros au tores, Buenos Aires, Ediciones Flacso, 1972, e Un M odéle p ou r Etudier 1’Action Réciproque entre les Forces Politiques et les Acts et Projets du Gouvernement. Paris, 1961, trabalho reproduzido em Desarollo Econômico, Buenos Aires, janeiromarço de 1962). Ele formulou um modelo de análise das, decisões políticas de grande interesse para o planejamento e fez as seguintes perguntas básicas: o que to rn a viável ou factível algumas ações prom ovidas pelas forças sociais? Que elementos influem nesse processo? Para responder a essas perguntas Calcagno concebeu um modelo de análise através da interrelação de variáveis políticas com um conteúdo muito preciso. A precisão dos conceitos não tem sido o forte das ciências políticas, de forma que o modelo de Calcagno tem um duplo mérito: ter construído um sistema útil para o planejamento político e ter articulado neste modelo um conjunto de categorias de significado preciso e isentas de ambigüidade. O modelo de Calcagno distingue atores, atos, interesses, recursos desses atores, que condicionam sua capacidade de produção de atos, e as mo tivações que os levam a valorar os atos de forma distinta. Como se trata de um modelo que procura assumir a dinâmica do processo político, supõese que a materialização ou rejeição daqueles atos alterem a realidade e seus próprios atores, suas novas propostas de atos, seus interesses, etc. As principais categorias utilizadas por Calcagno são: •
Forças políticas — os atores (indivíduos ou grupos) suscetíveis de exercer influência significativa sobre os atos de autoridade, estando ou não institucionalizada esta influência.
Política, Planejamento e Governo
4 4 6
•
A tos políticos —as medidas de governo, ou de simples poder, que influem na realidade política. Compreendem tanto as leis e decretos formais como as ações de grupos, como, por exemplo, decisões de investimento dos empresários, pressões de operários, revoltas estudantis ou motins militares. Esses atos políticos são produzidos pelos atores.
U M A V ER S Ã O G R Á F IC A DO M O DE L O C A L CA G N O
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
447
Controle —o domínio direto e especial que uma força política tem sobre os mecanismos de sanção e execução das atas. O controle sobre a sanção é um controle institucional, enquanto que o controle sobre a execução é um controle de fato. Valor de um ato —indica o grau de importância de um ato para um a força política. Interesse —referese à atitude positiva ou negativa de uma força política em relação à execução de um ato. Ação — mede a energia com que age uma força política. Essa energia depende do interesse da força e do valor do ato, e re presenta o que essa força tenta fazer. Pressão —é o grau de influência exercido po r um a força po lítica visando a sanção ou a rejeição de um ato. Em outras palavras, é a intensidade com que uma força política luta para que um ato seja adotado ou rejeitado. Essa pressão depende da ação exercida e do peso da força política. Incluise este último porque as pressões exercidas por uma força dependem não só do que ela própria quer, como tam bém do que pode . Assim, a pressão que uma força com peso ínfimo pode exercer não será grande, mesmo que tenha grande interesse positivo num ato de alto valor para ela. Solidez de wn ato —indica seu grau de firmeza, resultante das pressões das diferentes forças que o apóiam ou rejeitam. Factibilidade de um ato —indica as possibilidades de execução de um ato, que, por sua vez, depende do controle que uma força política tem sobre ele. O controle pode ser institucional ou de fato. Estabilidade de um ato — consiste na possibilidade de sua m a nutenção, sendo esta derivada do controle de fato. Anta gonismo — é a oposição ou rivalidade entre forças políticas, resultante da contradição de interesses em relação aos atos considerados. Afinidade —é a coincidência de interesses de forças políticas em relação aos atos considerados.
448
k.
Política, Planejamento e Governo
•
Transação —indica a conciliação entre forças políticas com interesses antagônicos no controle de um ato. Ela manifestase por um a mudança de interesse em relação à execução do ato.
•
Compulsão — é a coação que pode ser empregada nos casos de fraca estabilidade, tendo em vista mudar o interesse das forças opostas a fim de obter uma margem aceitável de estabilidade para o ato co nsiderado.
•
As relações en tre as principais categorias do m odelo de Calcagno são apresentadas no Quadro a seguir.
Uma Aproximação Metodológica à Viabilidade Política do Programa Direcional
Na pro cura de um m éto do que perm ita analisar a viabilidade política, podemos nos perguntar: que variáveis, entre as que controlamos, são capazes de ampliar nossas capacidades de produção social? Sabemos que os projetos de ação e as operações são os meios com os quais podemos tentar a mudança situacional. Assim, a análise de viabilidade consiste em precisar os requisitos situacionais necessários para que os projetos possam ser realizados, diferenciandose da análise de direcionalidade, na qual o problema é explicitar as conseqüências políticas, econômicas e culturais da materialização dos projetos, supondo possível sua realização. A análise de viabilidade exige que o problema de superar as restrições à materialização dos pro jetos seja abordado n um a tripla dimensão: i.
a insuficiência de po de r, ou peso da força pro m oto ra, para su perar a resistên cia das forças oponentes;
ii.
a insuficiência de recursos econôm icos em relação à dim ensão, escala ou custo dos projetos propostos;
iii.
a inadequação ou deficiência de capacidade operacion al das instituições que se responsabilizarão nela sua execução; mesmo tratandose de um problem a y o rta n te , não se analisa, nesta parte do trabalho, o prob lema de ■’bilidade resultan te de uma inconsistência dos valores e predisposições da popu
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situa cional
449
laçao em relação aos objetivos e comportamentos desenhados como normas. Como todos esses fatores e dimensões mudam com a situação, com a produção de projetos pelas forças sociais e com a alteração do cenário internacional, é indispensável uma análise dinâmica de viabilidade. Tal análise consiste em simular antecipadamente a mudança situacional mais provável, a partir de um ensaio de diferentes seqüências de execução dos projetos e dos possíveis cenários internacionais. No m om ento norm ativo, foi preciso desen har o pro gra ma direcional num espaço ou marco de viabilidade baseado num juízo preliminar do que parecia politicamente viável. A partir desse marco de viabilidade política, tom ado como um dado pro visório, o pro blem a consistiu em desenhar um prog ram a direcional coerente. No m om ento estratégico essas relações se in vertem; a viabilidade política, que antes era um dado pro visório, to rn ase a variável a ser calculada, assum indo o prog ram a direcional as características de um dado. Natu ralm ente, essa é a lógica metódica de uma interação das variáveis, necessária ao ajuste de um plano até tornálo normativamente coere nte e estrategicamente viável. VIABILIDADE DE QUE?
DIRECIONALIDADE
?
PROGRAMA
D O S P R O J E TO S D E A ÇÃ O
VIABILIDADE
MARCO DE VIABILIDADE DADOS
DIRECIONAL
PROGRAMA
POLÍTICA INICIAL
VIABILIDADE POLÍTICA DO ?
DADOS
DIRECIONAL PROGRAMA DIRECIONAL
4 5 0
Política, Planejamento e Governo
Já assinalamos que um projeto de ação é constituído por um conjunto de atos produzidos por uma força social, com coerência e massa crítica suficientes para conseguir uma mudança situacional numa direção e com um alcance determinado. No entanto , nem todos os pro jetos requerem um a análise de viabilidade política. Alguns têm o consenso das diferentes forças sociais, outros são conflituosos. O problema concreto consiste em construir a viabilidade dos projetos conflituosos. Para estudar a possibilidade de realizar os projetos conflituosos, devemos distinguir entre eles dois tipos, que cumprem diferentes funções no planejamento situacional: • •
os pro jetos de alta eficácia direcional, rep resentados pela letra P; os projetos de alta eficácia processual, identificados pela letra K.
Os primeiros são aqueles necessários e suficientes para materializar um arco direcional particular de um ator social, ou seja, são selecionados pela sua eficácia direcional, sendo, em geral, conflituosos. Já os segundos são necessários para que os projetos de alta. eficácia direcional sejam viáveis. Os projetos K cumprem a função de criar via bilidade para os pro jetos P e para si pró prios. Com a execução dos primeiros, aproximamonos da situaçãoobje tivo. A eficácia dos segundos permite que os primeiros sejam possíveis, além de necessários. No entanto, os pro jetos táticoprocessuais (K) podem não ser inteiramente distintos dos projetos de alta eficácia direcional. Com efeito, os projetos P e os projetos K, em geral, se interceptam parcialmente, e em alguns casos excepcionais, se interceptam totalmente, ou constituem conjuntos disjuntos. Assim, um encadeamento adequado de projetos K pode incluir todos os projetos P. Os projetos, operações e ações K são de extrema importância na estratégia e na tática do planejamento situacional. Em term os concretos, os projetos K são: i.
eventos de distração, cujo propósito é confundir ou desviar a atenção dos outros atores sociais ou da população em geral;
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
451
ii.
eventos de surpresa, cujo propósito é desconcertar os oponentes com ações imprevistas;
iii.
eventos de concessão, cujo propósito é agradar e ganhar adesão com ações de custo presente, não diretamente necessário para o sucesso norm ativo do program a direcional;
iv.
eventos de reação, que surgem como uma necessidade de res ponder a situações im previstas ou às iniciativas dos oponentes.
Natu ralm ente , esta é uma taxonomía pura dos projeto s K; na realidade eles podem consistir, simultaneamente, nos quatro tipos assinalados. *
OS PROJETOS K
TIPO DE EVENTOS
PROPÓSITOS
1.
EVENTOS DE DISTRAÇÃO
CONFUNDIR
2.
EVENTOS DE SURPRESA
SURPREENDER
3.
EVENTOS DE CONCESSÃO
4.
EVENTOS DE REAÇÃO
AGRADAR OU GANHAR ADESÃO RESPOSTA À AÇÃO DOS OPONENTES
O universo dos projetos K não pode ser planejado antecipadamente, pois apenas alguns são imagináveis e antecipáveis. Pensemos, por exemplo, no plano original para a tomada de Tróia. Seguramente era um plano militar clássico e bem concebido, mas diante da resistência pers everante e do desgaste das tropas, que assaltam uma cidade cercada de muros, alguém engenha uma operação K, que é um evento de distração e surpresa ao mesmo tempo: o cavalo de Tróia. Esse ato engenhoso é um entre muitos possíveis, e tem as características da “Operação Cavalo de Tróia” apenas no imediatismo da situação concreta.
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Política, Planejamento e Governo
O estrategista sabe que deverá recorrer circunstancialmente a engenhos desse tipo, mas não necessita nem pode concebêlos como se fossem projetos P. Estes são antecipáveis porque respondem a uma vontade normativa que serve de base à simulação possível do futuro. No entanto, não tem sentido e não é possível simular o futuro, como na antecipação de um vidente que nos faz viver previamente a própria realidade, com todos os seus detalhes anedóticos. Imaginemos agora um encadeamento de projetos K que rearticu lam o modo de apresentar, executar, com plementar e ordenar os projetos P para que estes sejam politicamente viáveis.
"p" E
O S P R O J E T O S
OS PROJETO S
V
A sagacidade, experiência e sentido de oportunidade do estrategista manifestase na forma como seleciona os projetos K e como os combina com um a determ inada seleção de projetos P. Assim, a pressão que os diversos atores aplicam sobre um projeto não se exerce sobre o projeto P, desprovido de acompanhamento táti coprocessual; a pressão se exerce sobre um projeto K que contém parte de um ou vários projeto s P. Como apresentado no Gráfico mais adiante, o poder expressase em força disponível na situação, da qual uma parte é aplicada para produzir ou dificultar a realização de um pro jeto K. Essa correlação de forças tem valor distinto para os diferentes pro jetos em diferentes situações, e para as diferentes instâncias do processo de viabilidade política.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento S ituaciona l
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Ter força suficiente para tomar a decisão não é o mesmo que garantir a vigência dessa decisão na realidade. Da mesm a form a, garan tir a vigência da decisão por um dia não re qu er a mesma força necessária para que a decisão seja irreversível ou estável no tem po.
DO QUE DEPENDE A VIABILIDADE POLÍTICA DE UM PROJETO CONFLITUOSO ?
Projetos do programa direcional e projeto s em situação
Numa dada situação, apenas uma parte dos pro jeto s selecionados dão lugar a jogadas ou movimentos dos atores sociais. Os outros estão à espera de uma situação favorável. Os projetos jogados numa situação denom inamse projetos em situação ou projetos em jogo. Serão sempre pro jeto s K, com alguma intersecção com os projetos P. A semelhança com o jogo de cartas é clara. As cartas que um jogador tem na mão são de dois tipos: (a) cartas que contam como pontos no jogo e (b) cartas que só servem para criar oportunidades de jogo às primeiras. Os pro jeto s do programa direcional são as primeiras, e os pro jetos K são as segundas. Em cada mom ento algumas cartas são joga-
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Política, Planejamento e Governo
das e outras esperam uma oportunidade. O critério de eficácia estratégica referese ao manejo das cartas que contam como pontos no jogo. A ordem ou seqüência em que os projetos e operações são colocados em situação constitui uma trajetória. Uma forma de pensar o método para explorar a viabilidade política do programa direcional consiste em simular as possibilidades e conseqüências d e diferentes trajetórias. 0 c a íc u l o
in t e r a t iv o
na a n á l is e
d e v i a bil id a d e
POLÍTICA ef ic a 'c ia
INVENTARIO DE PROJETOS DO ATOR A
|m j,
DIRECIONAL
EFICACIA PROCESSUAL ..
P2A ,
1 1 \ \ 1 JU
P3A ,
P4A , P5A
....
PROJETOS EM SITUAÇÃO OU JOGADAS I
INVENTARIO DE PROJETOS DO ATOR B
EFICACIA PROCESSUAL
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DIRECIONAL
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P2B , P3B , P4 B , P5B
Simulação de trajetórias de construção de viabilidade
Para simular trajetórias é preciso te r cu m prido os passos a seguir. (a) Análise geral das relações e interesses na situação inicial: i.
Identificação e precisão das forças sociais implicadas na decisão, materialização e efeitos dos projetos do programa direcional.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
ii.
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Precisão dos interesses das forças sociais relevantes para os projetos; pressupõe graduar, numa escala, os diferentes níveis de apoio ou rejeição a cada projeto para cada urna das forças sociais consideradas, e construir urna matriz de forças consideradas na simulação do processo.
iii. Estimativa dos pesos (ou ou tro indicador de po der) das forças sociais. Tal estimativa na situação deve levar em conta pelo menos dois aspectos: que o peso de urna mesma força social varia conforme o projeto que é objeto do conflito ou da busca de consenso, e que o peso de uma força social num mesm o pro jeto po de ser d istinto na instancia legítima de decisão e aprovação, na instância de execução e operação e na instância de manutenção ou estabilidade da produção materializada. Por isso, o peso de cada força deve ser estimado em relação a cada projeto e para cada instância relevante na análise; devese considerar que, em geral, o problema de viabilidade como com paração de pesos entre forças opostas não está na instância de decisão, mas na de execução, na permanencia ou estabilidade da decisão. iv.
Estimativa do valor e interesse que cada força social atri bui a cada proje to e a cada operação considerada conflituosa. Essa distinção é necessária, porque o impulso aplicado por um a força social sobre um pro jeto, a fim de ma terializálo ou evitálo, dependerá não só de seu interesse no projeto mas também do valor que ela lhe atribui, no conjunto de projetos em jogo.
(b) Análise da própria força Uma foi'ça social quase nunca é homogênea em seus interesses, pro postas, com portam ento s, reações e distribuição de poder. Por isso, é importante estudar o que se passa no interior da própria força, em relação aos projetos do programa direcional. Esse estudo deve permitir responder às seguintes perguntas:
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i.
Que tendências acen tuam se, dissipamse ou criamse no interior da própria força, caso sejam decididos e executados os projetos do programa direcional? Haverá maior unidade e coesão ou surgirão tendências de fragmentação?
ii.
Q ue possibilidades de alianças ou acordos despo ntam , tendo em vista somar forças para a aprovação e materialização de cada projeto? Como elas repercutirão na coesão ou fragmentação da força interna? Qual o custo destes acordos e alianças?
Simulação dinâmica da análise de viabilidade
Completando o estudo dos fatores relevantes para a análise de viabilidade na situação inicial, é possível abordar o estudo dinâmico da mudança situacional e da mudança nas possibilidades de obter decisão e materialização dos projetos do programa direcional. Tal análise implica simular trajetórias, tanto em suas condições de viabilidade em cada situação pre sen te quanto em seus efeitos para gerar arcos de co njuntura que pro duzam um a situação seguinte. Na nova situação criada será necessário examinar a viabilidade da operação que se segue na trajetória selecionada. Essa análise por trajetórias, e por operação dentro de cada trajetória, pode ser feita sob a forma regulamentada de um jogo ou com especialistas sentados em volta de uma mesa, discutindo e comparando suas opiniões, até chegarem a uma conclusão fundamentada. Neste último caso, voltase freqüentemente a discutir os fundamentos das opiniões emitidas para se verificar a sensibilidade dos resultados em relação a eles. Se após muita discussão não houver acordo, as diferenças devem ser consideradas como trajetórias distintas. Para visualizar os problemas e a seqüência lógica dos passos de uma análise de viabilidade política, imaginemos um caso muito simples, com as seguintes características: i.
existem dois atore s sociais, Al e A2, que conhecem bem as características um do outro;
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ii.
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o inventário das operações dos programas direcionais, incluindo os aspectos táticooperacionais, após uma análise estratégica exp loratória, é o seguinte: A1 = (K11, K12, K13); A2 = («21, K22).
O inventário de operações tem precisão suficiente, de forma a não necessitar ser desagregado em ações; ele é fixo, no sentido de que não é preciso revisálo ante cada nova situação; iii. cada ato r tem interesse negativo nas operações de seu op onente; iv.
todas as operações têm alto valor para os atores em conflito.
Tratase de uma confrontação com base em cinco operações, três de Al e duas de A2, que serão postas em situação pelos atores numa certa orde m . Neste caso, as trajetórias teóricas são S! — 120. N o enta nto, os especialistas que fazem a análise descartam a maioria, por não serem práticas. Restam apenas 12 trajetórias, que merecem ser estudadas em d etalhe e com profundidad e, para definir uma estratégia. Nessa seleção os especialistas são muito rigorosos, porque o estudo de cada trajetória é lento e custoso. Assim, descartam não só aquelas que não são práticas, mas também aquelas julgadas ineficientes. Tam bém deixam de lado as trajetórias que lhes parecem muito semelhantes, lundindose numa trajetóriatipo. O Quad ro apresenta as 12 trajetórias. Em sua parte superior ele pressu põe que Al to m a a iniciativa; na parte inferior, a iniciativa é de A2. Uma vez selecionadas as trajetórias práticas, é possível estudálas um a a um a. Para isso é necessário escolher uma ordem de experim entação. Essa ordem não é arbitrária, porque algumas trajetórias lançam luzes sobre outras na medida em que produzem situações semelhantes, com arcos de operações semelhantes. Suponhamos que a ordem mais eficaz de experimentação seja a de numeração no Quadro apresentado.
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TRAJETÓRIAS PRÁTICAS DE Al E A2
PRÁTICAS
Estudemos a primeira trajetória cuja seqüência é: K11 —> K13 —> K12 —» K21
Essa trajetória supõe a seguinte interação en tre os atores A l e A2: A1:
K11
K13
il
A2:
->
K12
71
K22
K21
Nossa primeira análise consiste em re sponder a duas perg untas: Primeira :
A operação K l 1 é viável na situação inicial do plano?
Segunda:
Se a resp osta à prim eira pergu nta for positiva, que arco direcional pro duz a materialização de K l 1?
N atu ra lm ente , se a re sposta à primeira pergunta fo r negativa, to da a trajetória deve ser declarada inviável, já que seu primeiro arco é im possível.
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459
Para responder à primeira pergunta devemos simular o jogo de pressões de Al e A2 sobre a operação Kl 1, atendonos às características da situação inicial. Na análise de viabilidade política de um projeto num a situação utilizaremos os seguintes conceitos, já explicados: V 1
= =
valor da operação, com um coeficiente variando de 0 a 1; interesse pela operação, identificado pelos signos (+ ), (O)e(-);
E R VP
=
explicativa sobre a pressão do outro , variando escala de 0 a 1; — pressão sobre uma operação; = veto r de peso.
numa
Dessa form a, as pressões de Al e A2 sobre K l 1 serão: R1
=
(V1xE1xVP1)¡l -> K11;
R2
=
(V2xE2xVP 2)i2 —> K11.
A operação Kl 1 será viável se: R1 (+) > R2 (-)
Ao produto de V e E chamaremos u. Este produto é um coeficiente de utilização da força acumulada. Recordese que um ator usa calculadamente sua força, e conforme a situação estará disposto a aplicar mais ou menos força. Se u—1, porque E—1 e V—1, o ator aplicará o máximo de sua força. Q ualquer valor de u m en or que 1 indica uma cautela no uso da força ou cálculo da intensidade suficiente para alcançar o resultado. Assim, a relação de viabilidade de uma operação na situação Si será: u1 (VP1) il ^
u2 (VP2) ¡2,
onde cada variável da relação tem um valor específico para cada situação e para cada ator. A dificuldade nesta relação está na comparação entre VP1 e VP2. No entanto , a e strutura do veto r de peso nos facilita a solução.
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Política, Planejamento e Governo
O v etor de peso de um a força compõese d e elem entos diversificados e heterogêneos quanto à eficácia nos diferentes campos de enfren tamento. Estes campos de enfrentamento são o âmbito de decisão, o âmbito da operação prática e o âmbito da estabilidade dos efeitos, num determinado espaço de um problema. Cada elemento do vetor de peso tem uma eficácia própria segundo o campo e o espaço de aplicação. O dirigente ou o estrategista não usa indiscriminadamente o vetor de peso de sua força; ele seleciona um ou vários elementos do vetor de peso conform e suas eficácias específicas para a operação, o campo e o espaço em que devem produzir efeitos. Alguns elementos do vetor de peso são m uito valiosos para certas coisas e inúteis para outras. O elemento do vetor de peso que eu seleciono para cada confrontação com o outro é um centro de pressão. Como cada elemento do vetor de peso tem um campo de eficácia limitado a um ámbito particular, o estrategista desloca seu centro de pressão de um elemento a outro à medida que se altera o campo de enfrentamento. VETORES DE PRECISÃO
Elementos de VP
Decisão
Operação
Estabilidade
x11 x12 x13 x14
ve to r
vetor vetor
xim
Por exemplo, se xl2 é a proporção dos deputados controlados pelo ato r Al e K ll é um a operação visando aprovar uma lei para controlar a evasão fiscal, xl2 está dentro do campo de eficácia da decisão sobre K ll e é selecionado para ser o centro do vetor de peso nesta
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confrontação particular. Mas, urna vez aprovada a lei, e deslocandose o campo de enfrentamento para o terreno prático da administração tributária, o elemento xl2 deixa de ser o centro e em seu lugar é selecionado o elemento xl3, que constitui o controle de Al sobre a capacidade administrativa do governo. Um ou vários elementos do vetor de peso são centros quando constituem o eixo de confrontação com o vetor de peso do oponente. Por conseguinte, a comparação entre vetores de peso de diferentes atores é sempre feita entre elementoscentro de uma estrutura comparável. No enta nto, o veto r de peso é ura sistema de elementos in te rre lacionados, e isso obriga o dirigente a efetuar um cálculo de conveniência sobre o uso de seu vetor de peso e seleção de centro de pressão. Todos os elementos do vetor de peso são um suporte para valorização do centro; por sua vez, a aplicação do centro pode valorizar ou desvalorizar os outros elementos do vetor de peso não diretamente aplicados no exercício da pressão. Por exem plo, o uso da maioria no C ongresso com o ce ntro de pressão para aprovar uma lei de controle fiscal conta também com o apoio dos meios de comunicação (xl4) controlados por Al. Por outro lado, Al é parte de urna matriz de intersecção de forças sociais —ou seja, é, em parte, com posto por outros atores e participa da estrutu ra de alguns deles. Assim, parte da força de Al depende do apoio que recebe das organizações empresariais e da adesão da população. Se o efeito do controle tributário penaliza muito os empresários e a população em geral, os elementos do VP que representam esses apoios perderão valor. Da mesma forma, um controle maior de eqüidade tributária e da inflação valorizará o elemento do VP que representa o apoio dos assalariados. São esses os elementos para fazer um cálculo, nada fácil, de conveniência ou eficácia política. Seguindo os métodos propostos, podemos dar uma resposta razoável à prim eira perg unta sobre a viabilidade da operação Kl 1 na situação inicial. Se a viabilidade for positiva, surge a segunda pergunta já mencionada: qual será o arco de conju ntura que produzirá a operação Kl 1? Podese respondêla recorrendo às simulações do plano sobre a relação básica de uma operação:
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Política, Planejamento e Governo
recursos —> produto —> resultados.
Tais resultados são o VDP ou o VDR da situação seguinte (Sj), referente a um problema particular ou à situação em geral. Assim, o arco de co njuntu ra será: Si
Sj
A nova situação Sj será a realidade na qual deveremos fazer a análise de viabilidade da operação seguinte na trajetória, isto é, K22. A seqüência gráfica de u ma traje tória seria a seguinte:
Mas na nova situação Sj poderá ter mudado o valor dos problemas e das operações para Al e A2, seus interesses pelas operações, suas ex pectativas recípro cas ou seus veto re s de peso. Se Al conse guir que essas mudanças lhe sejam favoráveis, ele estará eliminando a viabilidade da operação K22 de seu opo nen te e con struindo a viabilidade de sua op eração seg uinte na trajetória simulada. Uma trajetória é viável somente se todos os seus arcos são viáveis. Por conseguinte, a inviabilidade de um arco qualquer de uma trajetória invalidaa co m pletam ente. A relação de pressões sobre uma operação indica se ela é viável ou não. No primeiro caso, a análise continua arco por arco, considerando a viabilidade da decisão, operação e estabilidade. No caso de nãoviabi lidade do arco , é necessário descartar a trajetória 1 e ensaiar a seguinte. A análise de viabilidade da decisão é bastante simples, mas a viabilidade de operação e de estabilidade coloca questões bem complexas.
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Por exemplo, no caso de uma confrontação no Congresso Nacional, a diferença de pressões refletese na maioria dos votos. Mas, em geral, nos outros campos de enfrentamento não se trata de contar votos numa instancia de aprovação ou decisão; tratase da viabilidade da execução prática e controle da realidade com uma operação em que os critérios de êxito são mais complexos e a relação de pressões é mais difícil de ser estabelecida. Por exemplo, qual é a probabilidade de êxito de um governo impor um controle eficaz de preços de bens de consumo popular, caso as empresas resistam? Cada arco de conjuntura simulado deve ser analisado o mais profundamente possível pela equipe de estudo estratégico, a fim de fundamentar a simulação da situação seguinte Sj. Eis aqui alguns elementos imprescindíveis para caracterizar S2: i.
novas matrizes de interesse s;
ii.
novas matrizes de indicadores de peso e novas relações gerais de força;
iii. mudanças nas expectativas próprias e do outro , quanto ao uso da força; iv.
mudanças na valoração dos problem as e operações e das possibilidades de novos problemas e novas operações;
v.
apreciação do valor das operações que falta ensaiar; po r exemplo, se eu desacumulei poder e me falta ensaiar operações de valor muito alto, apresentase uma situação dilícil;
vi. precisar as novas tendências situacionais; vii. prec isar os novos acordos e coalizões possíveis. Tudo isso supõe uma relação explícita entre uso de força e acumulação ou desacumulação de força. Uma vez definidas as novas características situacionais, podemos continuar a simulação fazendo a análise da operação seguinte na trajetória. No final, se todos os arcos da traje tó ria 1 são viáveis, mas não sa bemos se haverá outras trajetórias viáveis e qual a m elh or, devem os re gistrar a trajetória 1 como viável e passar a analisar a trajetória 2.
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Política, Planejamento e Governo
O mesmo faremos com as trajetórias 3, 4 e seguintes, até chegar à trajetória 12. Se nenh um a trajetória for viável, devese rev er o program a direcional e as opções direcionais, pois não há força suficiente para realizar um pro gram a com aquele alcance de direcionalidade. O processo termina com a seleção de um curso de ação ou um feixe de trajetórias centrais. A escolha do curso de ação e a análise de cada trajetória supõe uma conjugação dos projetos P (selecionados pela sua eficácia direcional) com os projetos K (selecionados por serem acumuladores de força). Se selecionamos um feixe de trajetórias viáveis é necessário comparálas e escolher a de maior probabilidade. Cada trajetória pode também ser submetida a outras provas com outros critérios, como, por exem plo , o de risco mínimo e outros, indicados em Planificación de Situaciones (capítulo VIII, pp. 301352, Fundo de C ultura Econômica, México). Em síntese, a análise de viabilidade política supõe: i.
o desenho das situações e cenários possíveis, conform and o trajetórias prováveis de mudança situacional com diferentes probabilidades de êx ito;
ii.
a análise de viabilidade política para as trajetórias práticas;
iii.
a escolha de um curso de ação flexível e alterável, que sirva de guia para a ação;
iv.
o desenho antecipado de algumas ações engenhosas de caráter tático, utilizáveis no curso de ação selecionado;
v.
a revisão do program a direcional, caso a análise dinâmica de viabilidade o exija.
Com a análise de viabilidade do programa direcional, podese ter uma visão antecipada de algumas das possibilidades futuras de acumulação ou desacumulação de força para o ator que faz a análise. O conteúdo do progra m a direcional, quanto à sua eficácia para reso lver os prob lemas mais relevantes e o caráter conflitante ou consensual de sua materialização, caracterizará as conseqüências da análise de viabilidade em três ti pos clássicos de processo de acumulação política:
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ANÁLISES DE VIABILIDADE POLÍTICA NA AUTO-REFERÊNCIA DE A l
i.
um a trajetó ria de desacumulação de po der ou de desgaste do governo;
ii.
um a trajetória de acumulação de po der, de “construção de via bilidade” ou de crescimento no governo;
iii.
um a trajetória relativam ente equilibrada de conservação do poder inicial, com flutuações durante o período de governo.
A análise fria e rigorosa do tipo de trajetória considerada a mais provável na execução do pro grama de govern o é de im portância vital na estratégia de condução política. Com efeito, se a trajetória mais prová
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Política, Planejamento e Governo
vel é de desacumulação de força, os projetos mais difíceis e conflituosos deverão ser realizados no princípio do período de governo, quando a relação de forças é favorável. Nessa trajetória, é provável que não se alcance a situaçãoobjetivo e não se cumpra o program a de governo. Inversamente, se a trajetória mais provável é de acumulação de força, não só será possível e necessário realizar po sterio rm ente os pro jetos mais conflituosos (desde que viáveis), como também avaliar a possibilidade de se colocar objetivos mais ambiciosos que aqueles propostos no program a de governo. O problema mais complexo é prever com frieza as conseqüências das diferentes trajetórias consideradas sobre a acumulação ou d esacum ulação de força, pois a tendência normal do ator é enganar a si próprio. A vontade de crescer e a certeza de que todos os atos de governo pro postos são necessários e efetivos podem im pedir um a previsão ra zoável do aumento ou desgaste da força inicial disponível. O Gráfico a seguir exemplifica uma trajetória de desacumulação de força (T), qu^ condiciona a viabilidade de realização dos pro jetos P I, P2 e P3. CASO DE DESACUMULAÇÃO DE FORÇA OU DE DESGATE DO PODER
As linhas paralelas do Gráfico representam a força necessária para pro duzir cada um dos pro jetos. Assim, a última oportunidade para P2 é t l , e assim por diante. A medida que avança o tem po , reduzse o espaço
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de variedade de possibilidades de produção do ator. Se não fizermos um cálculo antecipado do que mais provavelmente ocorrerá no futuro com as relações de forças, ao se aplicar o programa direcional, correremos o risco de co m eter sérios erros na seqüência de execução dos projeto s. Por exemplo, é comum adiar para a última fase do governo uma reforma tributária, sempre impopular, na crença de que é possível evitar conflitos no presente, já que a situação estará melhor mais tarde. Em geral, mais tarde a situação estará pior. Feita com rigor essa análise, é preciso distinguir os diferentes com ponentes do peso de cada força. Uma força pode perder em poder de adesão, ganhar em poder de repressão e manter os recursos de poder buro crático e legal. Para uma análise mais precisa desse pro blema, ver Carlos Matus, Planificación de Situaciones, FCE, México, pp. 180221. A análise seria mais rica se fossem considerados os elementos do vetor de peso. O pólo oposto das considerações anteriores é o caso da construção de viabilidade ou de acumulação de força. Numa trajetó ria de construção de viabilidade, cada pro jeto realizado, ao acumular força para o ator que o produz, permite realizar um projeto seguinte para o qual não se dispunha de força suficiente na situação anterior. C A S O D E C O N S TR U Ç Ã O D E V I A B IL ID A D E
to
ti
Í2
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Política, Planejamento e Governo
N este exemplo , o projeto P3 não pode ser realizado antes de t2 , por ainda não ter acumulado força suficiente. O mesm o ocorre com o proje to P2 no m om ento t l . É im portante destacar que, seguindo a tra jetó ria um curso descendente, sua recupera ção é muito difícil; já a tr aje tória ascendente m uda facilmente de curso. Isto dá origem a dois novos casos teóricos: a trajetória tipo morro e a trajetória tipo rede. I P O T R A J E T Ó R I A “T R E D E " (T l )
E " T IP O M 0 R R 0 " ( T 2 )
A primeira é bastante comum como primeira etapr de uma trajetória de desacumulação de força, em que a mera expectativa de mudança e a euforia contagiante da vitória produzem um período inicial de acumulação de força. Já a trajetória tipo rede é de rara ocorrência, devido ao caráter, em geral irreversível, dos processos de desacumulação de força. No entanto, essa trajetória representa a ilusão de todos os governos que perdem seu prestígio popular. Um caso muito interessante de trajetória de desacumulação de força, apresentado em Planificación de Situaciones (op. cit), é aquele que produz uma zona de estrangulamento que põe em perigo a estabilidade do governo. Esta estratégia é típica dos processos revolucioná rios.
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T R A J E T Ó R IA C O M Z O N A D E E S T R A N G U L A M E N T O
Esse tipo de trajetó ria tem três zonas bem definidas: i.
um a prim eira zona (t o t l) de e ascensão e auge nas relações de força;
ii.
um a segunda zona de declínio, sobre tudo em força de adesão popular (tlt2 );
iii.
uma terceira zona (t2 em diante) de estran gulam ento, oriunda da desorganização provocada pelas mudanças ge.ioestrutu rais, enquanto as novas genoestruturas não se consolidam e não podem mostrar sua eficácia. Por esse caminho a desacu mulação de força pode ser muito grande, a pon'o de ficar abaixo do limite mínimo de legitimidade, co lo ar 'O em perigo a estabilidade do sistema.
Ocorrendo alguma das trajetórias de relações de força mencionadas, o programa direcional proposto desempenhará o um papel determinante, enquanto que a seleção da trajetória mais eficaz terá papel condicionante. O padrão a ser seguido pela trajetória será determinado pelos resultados e efeitos econômicos, políticos e ideológicoculturais
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Política, Planejamento e Governo
do programa direcional. C onform e o valor dos problemas enfrentados e a eficácia das operações para efetuar um intercâmbio favorável, as trajetórias exploradas serão de acumulação ou de desacumulação de força.
VARIEDADE DE UM PROGRAMA DIRECIONAL DESACUMULADOR DE FORÇA
básico da traje tória não se altera; as distintas alternativas de seqüência na execução dos projetos apenas produzem variantes em torno do referido padrão. Por exemplo, a traje tó ria T3 é mais desacumuladora de força que T l , mas ambas seguem um padrão de desacumulação. Para verificar a análise de viabilidade política, é necessário fazer as seguintes perguntas: i.
Foram bem caracterizadas as forças op onentes, as forças aliadas e as tendências da próp ria força?
ii.
Qual é a relação en tre as alianças possíveis e as alianças e ac ordos subjacentes na análise de viabilidade?
iii.
Que critérios usamos para imaginar e supor as estratégias dos oponentes? Elas foram desenhadas com rigor ou com negligência? Q uan to há de informação e qu anto há de dedução?
iv.
Quais poderiam ser os pontos fracos ou críticos com base nos quais fundamentamos nossa estratégia e calculamos a estratégia de nossos oponentes?
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
I.
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v.
Qual a sensibilidade de nossa análise de viabilidade diante dos ponto s fracos detectados?
vi.
Na estratégia adotada, quan to depe nde do nosso pró prio controle e quanto depende da precisão do cálculo de predição das reações ou iniciativas das outras forças?
A Viabilidade Econômica do Programa Direcional
Grande parte do planejamento tradicional preocupase com a via bilidade econômica. Mas a viabilidade econômica de um plano económico é algo mais limitado que essa mesma viabilidade no campo de ação geral de um ator social, em todos os dominios e ámbitos situacionais, como no caso do plano de ação de um governo. A viabilidade econômica coloca três perguntas para o planejamento situacional. Primeira:
os projetos políticos são eco nomicam ente viáveis?
Segunda:
os projetos econômicos são economicamente viáveis?
Terceira:
os projetos organizacionais são econo micam ente viáveis?
A primeira pergunta, em seu limite extremo, coloca o conflito entre o idealismo normativo de um desenho político e o positivismo aplicado ao individualismo econômico. Colocanos também, em relação a uma operação concreta, a questão da coerência entre um desenho político particular e o sistema econômico vigente. Pode o homem criar, com êxito, sistemas políticos que para seu funcionamento exigem um “homem econômico” diferente? Ou será que o sistema político deve respeitar e considerar como uma restrição o “homem econômico” tal como ele é? E possível moldar um “novo homem”, despojandoo de seu egoísmo e mesquinhez, motivandoo apenas por valores morais e intelectuais de serviço à coletividade, liberandoo da necessidade de acumulação individual, afastandoo da insegurança pessoal e do medo do poder do outro, fazendoo perder o medo de errar e de assumir responsabilidades, desprovendoo do apetite do poder e, ao mesmo tempo, tornando criativo, imaginativo, dinâmico e impaciente pelo progresso social? A consciência de servidor pú
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blico é suficiente para criar uma dinâmica de progresso, não estando essa consciencia acompanhada do desejo de reconhecimento público, do incentivo económico e do poder sobre seus concidadãos? Essas perguntas mexem com nossas mais profundas preocupações, e não sabemos o que responder porque não nos preocupamos em conhecer integralmente o homem. Pelo trabalho dos antropólogos, conhecemos civilizações primitivas que desprezam a acumulação individual e, por vezes, até mesmo o poder. Mas elas vivem ou viveram paralisadas em seu desenvolvimento, num ciclo vegetativo apenas capaz de resolver seus problemas de escassez e utilizando extensivamente os recursos naturais necessários. Nunca tiveram que recorrer à ciência, à tecnologia e às grandes organizações típicas do mundo moderno. Não se pode dizer que ali surgiu o “hom em ec onômico”, com suas inclinações para a propriedade e a apropriação individual. Os problemas não eram do indivíduo, mas da coletividade. Porém, a divisão do trabalho criou também a divisão dos problemas. Os problem as passaram a ser pessoais e suas soluções, individuais. A segurança do indivíduo ficou, assim, associada à sua autonomia para resolver seus problemas pessoais. A divisão do trabalho foi uma necessidade do progresso social frente às novas escalas geradas pelo aumento da população. O individualismo econômico é um produto do capitalismo ou de algo mais profundo e difícil de remover? Se decidirmos mudar o hom em , quanto tem po levaria? O que se passaria na transição? Para muitos, o individualismo econômico parece ser uma atividade defensiva frente à insegurança. Para alguns poucos, é um instrumento de poder e domínio sobre outros. Nos dois casos, existem forças motivadoras persistentes que se reforçam reciprocamente. O pequeno pro prietá rio ju ntase aos grandes e estes moderam seus conflitos com os pequenos, parque o individualismo econômico garan te um espaço de independência que é pequeno para uns e grande para outros. Assim, o desenho políticosocial chocase com essas forças individualistas e torn ase inviável, devido à resistência política oi ao funcionam ento deficiente da economia. A ética política não tem correspondência numa ética econômica. E um choque de valores de grande alcance, e não sabemos bím o que é possível ou impossível. Não sabemos bem se o hom em é um dado ou
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um a variáv variável el que pod e ser alterada. alterada. Não sabemos sabemos bem o custo de m udar o homem, nem se os problemas podem ser resolvidos sem mudálo. Ante tal dilema, o desenho político de projetos sociais alternativos não é algo que se experimente num laboratorio social, mas algo que vivemos nas lutas políticas e na vida cotidiana sob a forma de ideologias conflitantes. Por que não pensamos o sistema social e o sistema económico como uma macroorganização, que possa desenharse para que seja criativa na solução dos problemas e torne os indivíduos imunes à concentração do poder e à riqueza? Os únicos desenhos possíveis são os que agora estão em d ebate no mun do? É chegad chegadaa a hora do aparecim ento de urna nova onda de utopistas que, a partir do desenvolvimento das ciencias cias sociais, sociais, resga res gate te a idéia da engenh eng enharia aria soci social al?? Como se pode observar, a primeira pergunta só traz mais perguntas. E assim que os grandes problemas sociais passam a fazer parte da pais pa isag agem em.. Já a segunda pergunta aponta para o chamado planejamento econômico, a análise de eficácia econômica, a avaliação de projetos, etc. Supõe resolvido, de um modo ou de outro, o primeiro problema. Admitese normalmente que o sistema político e o sistema econômico só podem ser como são na realidade, e que é necessário verificar anteci pa p a d a m e n te, te , com co m base ba se ness ne ssaa rea re a lid li d a d e , se as o p era er a ç õ e s econ ec onôm ôm icas ic as do plan pl anoo são viáveis. viáv eis. Esse tema sugere duas questões: i. a eficáci eficáciaa ou rentabilida ren tabilidade de das operaç op eraçõe ões, s, sob o po nto nt o de vista vista econômico; ii. ii. a compatibi compa tibilidade lidade en tre os recursos recurs os econôm icos disponívei disponíveiss no sistema e os exigidos pelo programa direcional. Todo o desenvolvimento da teoria econômica moderna está voltado para essas questões. Por exemplo, é economicamente viável a redis tribuição de ren da pre ssupo sta no plano? plano? E possível possível financiar financiar sua taxa de crescimento? As operações do plano cumprem os requisitos mínimos de rentabilidade econômica? E possível o financiamento do plano sem que se ultrapasse um limite de inflação aceitável? O que ocorrerá com o balanço de pagamentos se o plano for executado? Qual o nível necessário de endividamento externo para que o plano se torne viável?
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A análise de viabilidade econômica deve responder a essas pergun p o d e ser se r indicado pelos tas, confrontando o deve ser normativo com o po comportamentos econômicos previsíveis. Nesse sentido, um modelo econômico matemático pode ser muito útil sempre que sua estrutura considere o máximo possível de equações de comportamentos, pois eles representam, no modelo, a resistência da realidade aos desejos do planejador. nejado r. Aqui surge um a dificulda dificuldade de próp ria da econom etria: não é fácil ácil saber se é a realidade que resiste a aceitar os parâmetros do plano ou se é o modelista que resiste a alterálos. Os processos criativos mudam os pad pa d rõe rõ e s d e c o m p o rta rt a m e n to ; no e n tan ta n to , p o d e m o s trab tr abaa lhar lh ar com co m variantes e cenários para explorar possibilidades sem fazer afirmações de pre p re d iç ã o . No N o o u tro tr o e x tre tr e m o e stão st ão os m o d e los lo s eco ec o n ô m ico ic o s que qu e só c o n têm tê m identidades (equações de definição) e que, portanto, não oferecem a menor resistência à manipulação do planejador, desde que se respeitem as identidades contábeis. Esses modelos não trazem nenhuma luz ao pro p robb lem le m a m acro ac roee con co n ô m ico ic o d a viabili via bilida dade. de. A terceira pergunta referese à viabilidade econômica das operações institucionais e organizacionais. A viabilidade econômica das operações institucionais coloca questões relativas à primeira pergunta, enquanto a viabilidade econômica das operações que alteram as capacidades de produção das organizações coloca as mesmas questões que a segunda pergunta.
in. Viabilidad Viab ilidadee Institucional Institucio nal e Organizacional Organizacional Recordemos que neste caso a perguntachave é: os projetos organizacionais, políticos e econômicos do plano são viáveis organizacional mente? O que significa projetos organizacionais viáveis organizacional mente? Qual a importância da viabilidade organizacional dos projetos polí po lítitico coss e econ ec onôm ômic icos os?? A primeira pergunta pode ser decomposta em várias: i.
Tem Te m os capacidades capacidades organizaci organizacionais onais para nos organizarm os m elhor? (Restrições organizacionais para reformar as organizações) .
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ii. ii.
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As novas organizações que desenham desen hamos os para fazer cum cu m prir o plan pl anoo são viáveis viávei s e efic ef icie ienn tes, te s, isto ist o é , capaze cap azess de sob so b rev re v ive iv e r e cumprir satisfatoriamente seu papel no sistema? (Capacidade das novas organizações em superar e afastar as velhas).
iii. iii. As atuais capacidades organizacionais pe rm item ite m a realização dos projetos políticos, econômicos e. de serviços prometidos pe p e lo plan pl ano? o? (Cap (C apac acid idad adee o pera pe ratitivv a dos do s órgã ór gãos os e x iste is tenn tes) te s).. iv. iv.
A estru tura institucional institucional é adequada ao funcionam funcio nam ento do sis sis-tema? (Adequação institucional ao processo de mudança situacional).
A primeira pergunta indica o ponto de apoio de uma alavanca que tenta mover a situação organizacional. Tal ponto de apoio elementar é a capacidade de um ator para detectar, reconhecer e superar suas deficiencias organizacionais. Detectar, reconhecer e superar são instancias interdependentes de urna autocrítica que se torna ação. Posso detectar erroneamente as deficiencias porque não sei bem como superálas. Por exemplo, no âmbito institucional e organizacional é muito comum atri bu b u ir às defic de ficien iencia ciass legais legai s os p rob ro b lem le m a s orig or igin inad ados os p elos el os p ro c e d im e n tos to s e hábitos burocráticos, pelas deficiencias de direção e gerencia ou pelas estruturas culturais. Detectar a restrição, portanto, não é independente de saber como superála. Quantas comissões de reforma na América Latina fracassam em suas vãs tentativas de reorganizar a estrutura do setor público devido às suas falhas em detectar as restrições e suas causas? Em quantos casos o formalismo vazio, após anos de trabalho, produziu como único resultado um planolivro normativo sobre as reformas necessárias? A pe rgunta rgu nta mais mais inci incisi siva va e irritante é: os reform ado res organizacioorganizacionais sabem o que reformar e como reformar? Se, como ocorre muitas vezes, a resposta for negativa, quem reforma os reformadores? Quem lhes indica o que devem fazer? Quem concebe uma estratégia de reform a organizacional organizacional?? Outra maneira de se enganar a si mesmo é atribuir a outros suas pró p rópp ria ri a s defic def iciên iência ciass d e orga or gani niza zaçã ção. o. Q u a n tas ta s vezes vez es v em o s os d irig ir igen ente tess pol p olítític icos os q u eix ei x are ar e m se s e d a c o rru rr u p ç ã o q u e eles el es m e sm o s gera ge ram m com co m sistemas administrativos deficientes, da falta de informação que eles pro
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duzem com sistemas de gerência primitivos e das resistências à mudança na burocracia que, na verdade, devese ao pragmatismo atrasado da cú pu p u la diret di retiv iva? a? O caso mais típico são as queixas por parte dos gabinetes presidenciais e dos conselhos de ministros sobre a ineficiência da organização estatal, sem daremse conta de que tais deficiências devemse às técnicas pri p rim m itiv it ivas as de d ireç ir eção ão,, p lan la n e jam ja m e n to, to , atri at ribu buiç ição ão de resp re spon onsa sabi bililida dadd es, es , pre p repp a raçã ra çãoo da agen ag enda da pre pr e sid si d enci en cial al e sist si stem emas as de p e tiçã ti çãoo e p rest re staa ção çã o de contas utilizados por aqueles gabinetes. A direção superior de nossos países paí ses é o ten te n d ã o de A quil qu iles es d e noss no ssas as d em o crac cr acia ias. s. Ela esta es tabb elec el ecee o limite de todas as capacidades. A experiência nos indica que reconhecer essas deficiências é proceder a uma autocrítica, o que não é prática da direção governamental. Por outro lado, superar as restrições organizacionais implica conceber estratégias certeiras, imaginativas, persistentes e práticas de reforma do aparelho de Estado. Em geral, essas estratégias resultam em propostas normativas e legais, meras declarações utópicas. Em outros casos, criamse comissões comissões deliberati deliberativas vas visando visando oferec er um espaço espaço de reflexão crítica aos reformadores e satisfazer suas vaidades. Naturalmente, essas comissões acumulam conhecimentos e informes na mesma medida em que se isolam da ação reformadora; elas são dominadas pelo espírito de investigação administrativa e legal, freqüentemente sem base teórica. Por essa via, os organismos oficiais de reforma tornamse centros de denúncia dos problemas, mas sem dispor de audiência para suas propostas. Marginalizados como oponentes, precisam enfrentar os próprios atores sociais que promovem essas organizações e que têm poder para tomar decisões. Assim, o pragmatismo político refratário às teorias e ciências transferese às funções organizacionais, impregnandoas com sua mediocridade me diocridade e seus vício vícios. s. A segunda pergunta aponta para o conceito cibernético de organização viável. Nosso desenho organizacional será eficaz e conseguirá se impor sobre os velhos procedimentos, vícios e hábitos burocráticos? As respostas têm as limitações inerentes ao precário desenvolvimento da teoria da organização. No entanto, certas organizações, na prática, são capazes de se estruturar e funcionar com efetividade; elas destacamse claramente da média das organizações estatais.
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Assim, a limitação principal não parece ser o estágio de desenvolvimento teórico, mas a capacidade e condições de aplicar as concepções conhecidas sobre organização. Nas organizações que tiveram êxito, constatamse algumas características comuns: souberam se defender do clientelismo político, têm estruturas financeiras saudáveis e estruturas organizacionais flexíveis, descentralizam capacidades e responsabilidades, articulam corretamente seus sistemas de direção, planejamento e gerência, têm sistemas de remuneração melhores que a média, demonstram razoável capacidade de adaptação às circunstâncias, são muito estritas na seleção e promoção de pessoal, mantêm um grau de informalidade na direção que incentiva a criatividade e desperta orgulho de pe p e r te n c e r à in i n stit st ituu içã iç ã o , e tc. tc . É preciso explicar como conquistaram essas características. Já nasceram como organismos de excelência? Quem cuidou de seu desenvolvimento? Como adquiriram esse respeito institucional que as liberou do clientelismo político? Na N a g ran ra n d e m aio ai o ria ri a dos do s casos ca sos a res re s p o sta st a é u m a lide li dera rann ça f o r te e consciente. Essas instituições tiveram, desde sua origem, uma condução consciente dos princípios de uma boa organização, com perspectiva de futuro, afastando, desde o início, os vícios típicos do contexto organizacional. O líder impôs a eficiência como norma interna e o respeito externo às regras da organização. Logicamente, tal líder sofre enormes pre p ress ssõe õess d o m eio ei o e, p ara ar a resi re siss tir ti r a elas, ela s, deve de ve s e r inv in v ulne ul nerá rávv el. el . A ssim ss im,, a criação de equipes de liderança organizacional é essencial nas estratégias de refo rm a organizacion organizacional. al. No N o â m b ito it o orga or gani niza zaci cion onal al,, a gra gr a n d e difi di ficu culd ldad adee p ara ar a am p liar li ar o r e duzido espaço das instituições de excelência está nas direções políticas part pa rtid idár ária iass e nas dire di reçõ ções es s u p erio er iore ress b u roc ro c ráti rá ticc as. as . Em g eral er al,, essas essa s d ir e ções têm escassos conhecimentos de organização e aplicam critérios de muito curto prazo nas suas decisões de caráter organizacional. A força força dess dessas as direções está está precisam ente no clientelism clientelismoo político e não no seu prestígio como gerentes públicos. A estabilidade de sua situação não depende de sua eficácia como gerentes, mas de sua capacidade de resposta resp osta às demandas políti políticas cas intermediárias interm ediárias e imediatistas. imediatistas. Por outro lado, a viabilidade de uma organização é construída dinamicamente, submetendoa a provas e adaptandoa às experiências que
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estas estas provas provas constituem co nstituem . Uma Um a instituição instituição é uma form a de organiza organização ção da relação recursos recu rsos —> prod pr od u to —>resultad >res ultad os, devendo deve ndo estar, esta r, p ortan or tan to, to , constantemente submetida à prestação de contas sobre a relação recursos sos » prod uto e a relaç relação ão prod uto —>resultados. Mas, se a direção superior do governo e o conselho de ministros não exigem eficiência e resultados quanto aos problemas mais relevantes, todo o sistema estará frouxo, aberto às pressões do clientelismo político e tratando dispersamente de problemas intermediários de alcance imediatista. A terceira perg un ta consiste em verifi verificar car a capacida capacidade de atual de p ro dução de operações das organizações existentes em relação às exigências do programa direcional. Se tal capacidade estiver abaixo das exigências do plano, será necessário desenhar operações organizacionais destinadas a elevála. Se existirem capacidades organizacionais para detectar corretamente as deficiências e desenhar as operações pertinentes, será necessário, mesmo assim, regressar à viabilidade política e econômica das operações, que podem ser necessárias, porém politicamente inviáveis e economicam ente m uito custos custosas. as. A quarta pergunta aponta um problema muito complexo: a adequação das instituições de um país aos objetivos do programa direcional. Aqui surgem perguntas como: o sistema eleitoral e o sistema partidário correspondem ao avanço do processo democrático? O sistema institucional é coerente com o objetivo de distribuição de poder e liberdade? A concepção e as estruturas organizacionais do Poder Judiciário permitem oferecer um a justi justiça ça comp rom etida com com o program a direc direcion ional al?? Os o rganismos econômicos do Estado são capazes de imaginar, desenhar e executar as operações de exportação anunciadas no plano? Já não se trata de capacidades de produção institucional, mas de coerência instit institucional ucional en tre as reali realidades dades de hoje e os comprom com prom issos do plan pl ano. o.
n.
Análise de Síntese da Viabilidade Viabilida de do Plano
O problema da viabilidade de um plano foi, até agora, analisado po p o r p arte ar tes. s. N a tur tu r a lm e n te, te , o proc pr oces esso so de d ese es e n h o do plan pl ano, o, com co m base bas e em diversas aproximações e ajustes sucessivos, gera a necessidade de uma fase de síntese em que se conciliem direcionalidade e viabilidade, e na qual se resolva o problema da coerência entre viabilidade política,
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econômica, institucionalorganizacional e tecnológica. Estas viabilidades são interdependentes, e qualquer ajuste numa delas pode obrigar a revisar a análise de viabilidade das demais.
DIAGRABA DA ANAUSE DE VIABILIDADE
SIMULAÇAO
PRESSUPOSTOS DE VIABILIDADE E EFICÁCIA
O Gráfico anterior mostra, sinteticamente, esta interdependência. A interdependência pode ser melhor entendida com um exemplo. Suponhamos que estejamos analisando a viabilidade de uma operação de construção de cem mil habitações populares por ano. Tal operação passou pelas provas de viabilidade política, institucional e organizacional, mas, ao fazerse a análise de viabilidade econômica, concluiuse que o
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custo das habitações é muito alto se comparado com a renda das famílias a serem beneficiadas. Por isso coloca a necessidade de um subsídio de 20% do c usto, para que o preço de venda esteja ao alcance da ren da das famílias pobres. É necessário considerar um financiamento adicional, o qual deve ter viabilidade política, econô mica e organizacional. Assim, a análise de viabilidade num âmbito coloca exigências de viabilidade em outros. Por isso, a análise de viabilidade fazse por aproximações sucessivas, até que o conjunto das operações do plano seja viável nas três dimensões indicadas.
5 O Momento Tático-0 p e raciona!
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OS PROCESSOS DE PRÉ-ALIMENTAÇÃO E R E T R O A L I M E N T A Ç Ã O N O P L A N O S IT IT U A C IO N A L
RETROALIMENTApÁO
A retroalimentação da tomada de decisões consiste em examinar o pass pa ssad adoo r e c e n te p ara ar a re d e f in ir a situ s ituaç ação ão inicia in icial,l, ante an tess q u e nova no vass m u d a n ças alterem a realidade. A experiência com os cálculos passados permite agir com conhecimento sobre a nova situação inicial e corrigir o plano seguinte. O centro do planejamento estratégico deve ser um sistema articulado de discussões e deliberações nos diferentes níveis sociais, resultando em fluxos incessantes de decisões que precedem e presidem a ação. A conciliação do planejamento de situações de conjuntura com o pla p lann e jam ja m e n to de situa sit uaçõ çõee s p rosp ro spec ectiv tivas as é um a q uest ue stãã o vital vi tal do p roc ro c ess es s o de planejamento. Um plano de médio prazo só se manterá vigente se seguir a conjuntura e se renovar em função dela. O planejamento da conjuntura, por sua vez, necessita a direcionalidade do plano de médio pra p razo zo . As duas du as insta in stanc ncias ias tem te m p o rais ra is do p lan la n eja ej a m e n to c o n s titu ti tuee m e s p e cialidades e experiências que requerem homens com diferentes vocações e aptidões.
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Assim, é necessário que os planejadores de conjuntura e de curto praz pr azoo c o n stit st ituu a m equ eq u ipes ip es d e trab tr abaa lho lh o dist di stin inta tass dos do s p lan la n e jad ja d o res re s d e m é dio e longo prazos. Argumentar em defesa desta afirmação nos afastaria do tema central, mas ela está confirmada por experiências concretas fora da América Latina, onde o planejamento de curto e médio prazos pu p u d e ram ra m ser se r real re aliz izad ados os p o r equ eq u ipes ip es espe es pecia cializ lizad adas as e sem se m que qu e u m a b so rvesse o outro. Quanto melhor cada equipe cumprir seu papel, mais difícil será a coordenação, pois o curto e o longo prazos geram visões distintas e conflitantes conflitantes dos problem as. Se esse esse conflito conflito fo r equilibrado, equ ilibrado, sem domínio persistente de um sobre o outro, o plano tornase mais prático e essa essa prática servirá s ervirá de b ase à direcionalidade.
b.
Conduzir Conduzir Planejam Plan ejamento ento
Só se conduz a partir do presente, e mediante a ação. Hoje é o tempo do homem prático, mas também é o tempo no qual o planejador, o estrategista e o dirigente se realizam. A fusão de ambos é também um pro p ro b lem le m a teó te ó r ic o . C o m o o p lan la n e jam ja m e n to cheg ch egaa ao p re s e n te e com co m o se converte em ação concreta? Como ampliar e enriquecer a visão do homem de ação com o cálculo de planejamento? Esta é a tarefa do momento táticooperacional: preocuparse com a mediação fentre o conhecimento e a ação. Diferentemente da investigação sobre o futuro, esta mediação dev e ser feita hoje e todo s os dias dias.. Até aqui o planejamento foi visto como se consistisse em conhecer a realidade, desenhar o futuro e estudar as possibilidades de realização do plano. plano. Na verdade, é um processo per m ane nte e incessante incessante de faze fazer, r, revisar, avaliar e refazer planos, e só conclui sua tarefa com a decisão concreta do dia a dia. A ação é sempre o produto final de um cálculo, mas não necessariamente o produto final do plano formalizado. Tal divergência deve ser resolvida pelo momento táticooperacional. Os três primeiros momentos devem estar articulados no processo de conformação das decisões e no acompanhamento do impacto das operações. O processo de planejamento tem um a dinâmica dinâmica semelhante semelhante à das ondas incessantes do mar. Cada onda é um processo de cálculo que apóia alguma ação concreta. As vezes o processo de cálculo precede e pre p resi sidd e a ação aç ão;; é o que qu e cham ch am am o s de p lan la n e jam ja m e n to. to . O u tra tr a s vezes vez es a ação açã o
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tas a seus ministros se não lhes pediu, previamente, planos de ação con p o s te r io r i e da avaliação cretos? Sem planos, qual o objeto da avaliação a po prév pr évia? ia? C o m que qu e d irec ir ecio ionn alid al idad ade? e? E m rela re laçã çãoo a q u e tare ta refa fass in t e r m e diárias? Uma coisa é a prestação de contas sobre o andamento e execução de um plano, a ser precisada mais adiante; outra, muito distinta, é a pre p rest staa ç ã o d e cont co ntas as d esc es c riti ri tivv a e a n e d ó tic ti c a s o b re o que qu e o c o r r e n u m â m bit b itoo p ro b lem le m á tic ti c o . O b s e rva rv a se s e aqui aq ui a im p o r ta n te funç fu nção ão de orga or gani niza zaçã çãoo que cumpre um plano modular por operações e o seu valor para o planejamento na conjuntura. A avaliação situacional e a avaliação prévia exigem modelos para interpretar a realidade e simular os efeitos das operações, bem como informação suficiente para alimentálos e corrigi p o ste st e r io r i , por sua vez, requer indicadores do grau de los. A avaliação a po cumprimento das operações com a qualidade e eficácia propostas no pla p lann o , e ind in d icad ic adoo res re s dos do s efei ef eito toss dessa de ssass o p e raçõ ra çõ e s s o b re a situ si tuaç ação ão em geral ou seus aspectos particulares. Mas essas operações só serão eficazes ou efetivas se incidirem sobre os VDP dos problemas selecionados. O p rincípio organ izador básico básico da condução condução do dia a dia consiste na convergênc ia de dois dois critérios: i.
concentração estratégica (que é dominante);
ii.
fle fl e xib xi b ilid il idaa d e tática tátic a (que é subordinada) no espaço de liberdade pe p e r m itid it id o p ela el a e s tra tr a tég té g ia, ia , até at é que qu e e sta st a se a lte lt e r e d ian ia n te das da s im im poss po ssib ibili ilida dade dess táti tá tica cas. s.
O primeiro critério exige concentração nos problemas e nas operações estratégicas. Isto implica que o sistema de condução deve contem pla p larr tra tr a ta m e n to s d ifer if eren enci ciad ados os p ara ar a os d ife if e ren re n tes te s tip ti p o s d e p rob ro b lem le m a s e operações. N e s ta dife di fere renc ncia iaçã ção, o, cabe ca be um pape pa pell m u ito it o im p o r ta n te a duas du as vari va riááveis: (a) o tempo e (b) o tipo de problemas e operações. Quanto ao tempo, é necessário distinguir entre processos normais de condução, desenvolvidos num contexto situacional de ritmo pausado e livre de tensões, e processos anormais, com ritmo acelerado e sob forte tensão situacional. Esses últimos requerem procedimentos especiais.
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Quanto ao tipo de problemas e operações, há também distinções. O tema é tratado com grande perspicacia por Keen e Scott Morton (Decisión Support Systems, 1978, AddisonWesley): Enquanto que qu e as as subtaref subtarefas as estrut estruturadas uradas possuem poss uem uma forma m e lhor de serem realizadas, as outras exigem do dirigente a aplicação de juízo ju ízo s situaci situacionai onaiss a pa partir rtir de uma perspectiva pessoal (p. 11).
Por definição, um problema completamente estruturado é aquele em que as três fase fasess —inteligê —inteligência, ncia, desenho e escolha escolha (os autores fa ze m alusão a Sim Si m o n) — são s ão todas estruturadas. Conseqüentemente, po p o d e m o s espe es peci cific ficar ar algo al gori ritm tmos os ou regras regr as de decisão decis ão qu quee no noss p e r mitam descobrir o problema, desenhar as soluções alternativas e selecionar a melhor solução. No N o pr p r o b lem le m a nã nãoo-es estr trut utur urad adoo som so m o s inc i ncapa apazes zes de d e fin fi n ir cond co ndiç içõe õess que nos permitam reconhecê-lo. Na fase do desenho, somos inca paz p azes es de espe es pecif cifica icarr c o m o criar cria r m etod et odol olog ogia iass para solu so luci cion onar ar o pro p ro b lem le m a qu quee fo i defin de finid ido. o. Na fase de escolha, escolh a, não tem te m o s crité cr itério rioss claros para escolher uma solução ótima entre aquelas que criamos. Se estas três fases forem totalmente não-estruturadas no processo de solução do problema e no sentido aqui definido, o problema in teiro será classificado como não-estruturado, (p. 95).
A partir desta definição central para o planejamento situacional, po p o d e m o s d isti is tinn g u ir e n tre tr e : i.
operações estruturadas, sobre as quais, em geral, não tomamos decisões uma a uma, porque há uma norma de procedimentos e cálculo estruturado que as resolve repetitivamente, sem intervenção do dirigente, salvo se ocorrer uma anormalidade que qu ebre a rotina; rotina;
ii.
operações não-estruturadas, que não podem ser tratadas em b l o a v e não nã o p o d e m s e r n orm or m aliz al izaa d as com co m p ro c e d im e n to s e struturados préestabelecidos; em conseqüência, requerem juízo ízo situacional situacional resolutivo resolu tivo do d irigente em cada caso caso;;
iii.
operações semi-estruturadas, que são uma combinação dos dois tipos anteriores; em parte respondem a procedimentos
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mos. Do contrário, o planejamento formal não passaria de um discurso norm ativo sem repercussão prática. Esquema normativo-estratégico
Cálculo tátlco-operacional
Para evitar os desvios mencionados, o plano deve preceder e presidir a ação na conjuntura, cujas conseqüências retroalimentarão o plano. Este não é apenas um desenho e uma sim ulação sobre o futu ro, mas principalmente um cálculo sobre as decisões presentes. Devese resgatar o pre sente para o planejamento. Uma diferença importante em relação ao planejamento tradicional, geralmente não observada, consiste em que o planejamento situacional obriga não só a sistematizar o momento do desenho normativo do planejamento, mas também a articular o desenho norm ativo com o desenho estratégico e, principalmente, coordenar o normativoestraté gico com o táticooperacional. Desta forma, o desenho é, a cada momento, dependente da mudança situacional real que é a resposta, na conjuntura, ao desenho normativoestratégico. Paralelamente, e em articulação com o processo incessante e permanente de revisão do desenho normativoestratégico, desenvolvese o processo de tomada de decisões concretas com base na préalimen tação (cálculo de exploração do futuro) e na retroalimentação (comparação plano —realidade no passado re cente).
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O que conta, afinal, é o que se faz na conjuntura; dal o centro do planejamento não ser o futu ro, mas o presente. Em síntese, devemos pensar a condução considerando as seguintes variáveis: i.
os dois subm om entos típicos do m om ento táticooperacional;
ii.
o ritm o com que muda a situação, junto com o grau de tensão situacional que acom panha esse ritm o;
iii.
os tipos de problem as que com põem o plano.
Podemos enriquecer a matriz anterior passando a considerar o ritmo de mudança da situação, o tipo de problema e o seu tratamento em cada submom ento. Aparecerão claramente dois tipos de avaliação da conjuntura e dois modos de resolução de problemas, segundo se trate de processos estru turados ou quaseestruturados. CASO A: RITMO DO TEMPO NORMAL Tipo de problemas submomentos
n
1. Apreciação situacional da conjuntura
processos estruturados
processos quase-estruturados
A
B
.
informação normatizada e auto-explicativa
C 2.
Resolução de problemas e operações
M odo A:
somente em caso de rupturas da normalidade
apreciação situacional
D juízo situacional deliberativo e resolutivo
informação autoexplicativa automatizada e normatizada da conjuntura, tanto dos problemas quanto das operações.
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ses, e esse investimento de tempo na criação de sistemas deve ser feito sem prejuízo da ação direta sobre os problemas terminais urgentes. Chamemos de direção estratégica esse, sistema de condução que propom os. A direção estratégica requer, pelo menos, os cinco subsistemas seguintes: i. de Planejamento na Conjuntura (SPC), que se intersecciona amplamente com sistemas conhecidos como de suporte às decisões (SSD); tal subsistema consiste, principalmente, no processo de mediação entre o conhecim ento e a ação, concentrase nos problemas e operações estratégicas e constitui o centro da direção estratégica; ii. de Gerência por Operações (SGO), que transforma o sistema de direção num sistema recursivo que se reproduz até os níveis operacionais na base, orientado pelo critério de eficácia na alteração dos VDP dos problemas. É um sistema flexível que normatiza os processos estruturados e trata os processos quaseestruturados com desenhos menos rígidos. Mesmo nos processos norm alizados, constitui uma força criativa contra as rotinas mecânicas, através da avaliação do cumprimento das normas e de sua recisão frente à mudança situacional. A gerência por operações converte os módulos do plano em módulos de gerência; iii. de Petição e Prestação de Contas (SPRC), que avalia o processo de mudança situacional segundo a distribuição de responsabilidades institucionais e organizacionais estabelecidas pela estrutura modular do plano, com tratamentos diferenciados para os módulos estrutu ra dos e os quasee strutu ra dos. Antes da designação dos responsáveis e do início das operações que estes conduzirão, o sistema estabelece os momentos, procedimentos e critérios de avaliação a serem usados na petição e prestação de contas ao nível hierá rquico im ediatamente su perio r. iv. de Orçam ento po r Programas (SPC), que formaliza a atribuição de recursos econômicos orçamentários aos módulos de planejamento (operações, ações e subações). Ele estabelece a
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correspondência entre os módulos orçamentários e os módulos do plano, e é um apoio fundamental para o sistema de prestação de contas, sobretu do no que concerne à eficiência (relação recursos p ro du to) ; v.
de Emergência em Sala de Situações (SDS), que cria métodos especiais para todos os sistemas anteriores quando se trata de emergências que ameaçam a perda de controle do tempo do dirigente, e quando a tensão situacional amplia a cegueira situacional dos atores envolvidos no conflito. SISTEMA DE DIREÇÃO ESTRATÉGICA
Esses cinco subsistemas criam os requisitos para o desenho das estruturas organizacionais. Eles se interceptam e se reforçam mutuamente. Suas fronteiras são imprecisas, mas têm uma especificidade que os identifica como subsistemas do sistema de direção estratégica. O sistema de direção estratégica é, ao mesmo tempo, o planejamento no dia a dia; nesse cálculo do presente, não é possível distinguir entre o planejamento e a direção e gerência.
4 98
e.
Política, Planejamento e Governo
Planejamento na Conjuntura e Sistema de Suporte para as Decisões O cála ¡o na conjuntura
Planejar na conjuntura e apoiar o cálculo com um sistema de suporte às decisões constitui o nó central do momento táticooperaci onal. O sistema de planejamento na conjuntura (SPC) tem as seguintes características: i.
é um cálculo de síntese, em que as instâncias explicativa, normativa e estratégica convergem para o cálculo que precede e preside a ação;
ii.
é o cálculo imediatamente anterior à ação, ou seja, é a última instância, de peso decisivo para orientar a ação;
iii.
é um cálculo diferenciado, que se adapta às particularidades dos três mo dos de direção já assinalados;
iv.
é um cálculo corretivo e adaptativo, em que cada apreciação e resolução é permanentemente ajustada segundo a avaliação dos antecedentes e das trajetórias residuais, às quais ainda se pode recorrer para alcançar a situaçãoobjetivo;
v.
é um cálculo submetido a pressões, porque nele se enfrentam diferentes visões e tendências, no interior da força que planeja e entre as forças em conflito na situação.
Com o nenhum governo é bastante homogêneo a pon to de impedir a geração de visões e tendências conflitantes em seu seio, uma boa decisão supõe argumentação e defesa convincentes dos diferentes pontos de vista sobre a situação, os planos e as diferentes opções que se abrem na conjuntura. Esse encontro conflitante de visões se concentrar à nos seguintes planos: i. ii.
eficácia econôm ica versus eficácia política; critérios de curto prazo versus cumprimento do programa de governo e da estratégia de longo prazo;
iii. tendências ideológicas, doutrinárias e éticas que se contrapõem e influem numa decisão;
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iv. apreciações, a pa rtir de diferentes perspectivas de análise, so bre a situação real, suas oportunidades e problemas e os meios eficazes para abordálas. A mediação entre conhecimento e ação, que deve ser realizada na conjuntura, exige: i.
ii.
iii.
iv.
v.
articular o cálculo estratégico com o processo perm anente de tom ada de decisões, o qual exige que o planejam ento seja concebido como um processo incessante que segue a conjuntura e em que há sempre um plano em elaboração, mas um plano que apóia as decisões; articular o político com o económ ico —o que supõe um en contro de visões por vezes conflitantes —para obter melhor apreciação da situação e melhor decisão; articular o curto com o médio e longo prazos, para que o cálculo sobre o futuro apóie a racionalidade das decisões presentes; por outro lado, as restrições e circunstancias favoráveis presentes levarão à revisão do arco direcional do plano; articular direção, planejamento e gestão segundo o principio de que se planeja, dirigese e operase em todos os níveis, embora com complexidade e ênfase distintas. O planejamento é uma necessidade da gestão e a gestão é a materialização do plano. Assim, é essencial evitar a dissociação entre planejam ento e gestão; articular os processos de préalimentação e retroalim entação no cálculo que precede e preside a ação planejada.
Evidentemente, não se trata de processos mecânicos e automáticos que corrigem instantaneamente o curso do movimento situacional para direcionálo à situaçãoobjetivo. O plano é uma intervenção humana e, portanto, a retroalimentação e a préalimentação resultam de um juízo de avaliação dirigido ao passado e ao futuro. A co njuntura e o plano anual
O plano anual é de longo prazo para o dirigente envolvido na ação; no en tanto, deve set sua referência direcional para a ação cotidiana.
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Política, Planejamento e Governo
O cálculo de planejamento deve ser realizado em diferentes horizontes de tempo, segundo a natureza dos problemas tratados. Em alguns casos, um horizonte de tempo anual é suficiente; em outros, é necessário exj' orar vinte ou trinta anos no futuro impredizível. Assim, a racionalidade do cálculo que precede a ação depende do cálculo de planejamento em arcos direcionais de alcance diverso. Não há uma regra fixa nessa questão. Nas obras de irrigação, ou na mudança da estrutura ideológica, os prazos são muito longos. Já no caso de se desvalorizar a moeda ou alterar um fluxo do comércio exterior, os horizon tes de tem po são mais curtos. Para ordenar e sistematizar a ação necessária em horizontes de tempo curtos, o planejamento situacional propõe articular o plano de ação anual com os planos na conjuntura . Para tratar os problemas típicos de arcos direcionais mais longos, toda a tradição do planejamento adota os planos de médio, longo e m uito longo prazos. Os métodos de planejamento eficazes para operar em arcos de conjuntura (planos do dia a dia) ou em arcos direcionais curtos (planos anuais) apresentam características muito distintas dos métodos para operar em arcos direcionais médios, longos e muito longos. Essas diferenças referemse às necessidades e possibilidades. Por exemplo, as necessidades de precisão são maiores nos arcos de conjuntura do que no médio e longo prazos. A possibilidade de precisão é também distinta. Num plano de médio prazo, a situação inicial genérica constitui um a realidade modal rela tivamente constante, na qual muitas vezes não importam os desvios ou flutuações temporárias com relação à moda. Por conseguinte, a realidade é conhecida enquanto algo que pertence ao passado recente. Mas num arco de conjuntura ou num plano anual, a situação inicial referes e a uma realidade que ainda não oco rreu e que se altera bastante. Aqui não basta o valor médio de uma variável; é preciso conhecer seu valor pontual. Por exemplo, num plano de médio prazo, não necessitamos saber com precisão o nível de reservas cambiais no mês de janeiro da situação inicial; basta um valor médio dos últimos meses. Mas no plano anual elaborado em meados do ano 1, é m uito im porta nte saber o nível de reservas cambiais no início de janeiro do ano 2.
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As diferenças são explicáveis. No caso extremo de muito longo prazo, tratase de orienta r a direção da ação; no outro extrem o, a con juntu ra exige um cálculo que precede e preside a ação concreta. Na América Latina o planejamento de prazo mais curto corresponde aos chamados planos anuais operativos, cuja vigência é precária e limitada a poucos países. Aí se esgota o espaço dos planejadores. Nos prazos mais curtos o pro blem a cabe aos executo res, sejam eles po líticos ou gerentes. Mas o pro blem a não se resum e ao horizonte de tempo dos planos. A questão central é o espaço de problemas que os planos cobrem. Todo este livro é uma defesa da idéia de planejamento integral da ação de governo, principalmente da articulação do cálculo político com o cálculo econômico. Ela se aplica, com muito mais razão, ao planejam ento de arcos de conjuntu ra e de arcos direcionais curtos. Por conseguinte, à idéia de planos anuais operativos, limitados ao econômico, devemos sobrepor uma concepção mais ampla de planos de ação anual, situacionais e mais flexíveis. Esses planos de ação anual seriam o elo de ligação entre os arcos direcionais médios e longos e os arcos de conjuntura. O plano de ação anual é um plano por problemas e operações. Ele abarca tod a a ação relevante do governo — na política internacional, economia interna, economia internacional, segurança, defesa, etc. E o compromisso de ação anual assumido pelo governo em todos os âmbitos de sua gestão. Aí se colocam todos os complexos problemas de governo, tendo em vista oferecer um conjunto de resultados para a população. Assim, o plano de ação anual é uma atribuição de tarefas e recursos, por operações e problemas, aos diferentes responsáveis pelas organizações do setor público e pelas forças políticas que apóiam a gestão governamental. Com base no plano de ação anual, o presidente da República pode pedir contas a seus ministros e dirigentes responsáveis por problemas e operações. Deles deve ser exigida eficácia direcional na gerência por operações e eficiência interna no uso dos recursos. Esse plano de ação anual, como plano econômico e político, requer critérios, orientações e métodos macropolíticos e macroeconômicos. Nele estabelecese o balanço entre o necessário e o possível, de acordo com as restrições de recursos de poder e recursos econômicos; nele faz
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Política, Planejamento e Governo
se também o balanço entre operações e benefícios políticos e operações e benefícios econômicos. Ajustado aos critérios macropolíticos e macroeconômicos, o plano de ação anual dispõe de alguns instrumentos práticos de cálculo, atribuição de recursos e controle e avaliação de resultados. Esses instrumentos são: i.
o plano macrossituacional, que exp lora os cenários de articu lação entre o político, o econômico e outras dimensões relevantes, conforme o caso; é o marco global de referência para os planos parciais;
ii.
o plano de gestão po r operações, instituições e problem as, que todo gestor público assume como compromisso perante a direção do governo;
iii. o orçam ento po r program as, no qual as operações, ações e su bações são orçamentadas numa co rrespondência precisa com os módulos orçamentários. Os recursos são atribuídos a programas, subprogramas e atividades com o compromisso de se produzir determinados resu ltados que co rre spondem às operações do plano. Para certas operações do plano, o orçamento por programas deve pre ver a atribuição de recursos por vários anos. No in te rior de cada um destes planos conciliamse os diversos instrumentos de planejamento exigidos pelos diferentes domínios situacio nais, como o econômico, a segurança, a defesa, as relações exteriores, as ciências, a tecnologia, etc. O sistema de sup orte às decisões Nós consideram os o sistema de suporte às decisões não como um a alternativa ao planejamento, mas como um sistema de reprocessamen to, na conjuntura, dos cálculos de planejamento feitos em arcos direcionais de maior alcance. O sistema de suporte às decisões (SSD), tal como o definem Keen e Scott Morton, referese a processos multidimensionais, criativos e com objetivos múltiplos, nos quais as variáveis que entram em jogo são pouco conhecidas. E um sistem a para apoiar o juízo situacional estraté
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SOS
gico, não para substituilo. Os sistemas automatizados, como o modo 1 de direção, substituem o juízo estratégico até que este os interrompa. Os autores citados afirmam que o SSD pode ser útil em situações com algumas das características seguintes: i.
a condução exige o manejo de urna base tão grand e de dados que o dirigente encontra dificuldades para acessála e manéjala conceitualmente;
ii.
há necessidade de algum tipo de cálculo com putacional para chegar à solução do problem a;
iii. existencia de pressão de tem po no processo de busca de urna solução; iv.
necessidade do juizo hum ano para reco nh ecer ou decidir em que consiste o problema e para criar alternativas de solução; o juízo pode ser necessário para conceber, imaginar ou identificar por tentativas a natureza das variáveis desconhecidas ou o valor a atribuir às variáveis conhecidas.
Em seguida, os autores citados dizem textualmente (p. 97): “De acordo com nossa definição, o SSD é um suporte computa cional para os gerentes que tomam decisões sobre problemas semiestruturados”.
Mais adiante, acrescentam: “Suporte implica que a primeira etapa no desenvolvimento do SSD é a análise de decisões, na qual o gerente define os problemaschaves de decisão”.
Isto reforça a idéia de que o dirigente deve, primeiramente, através do seu juízo, reconhecer ou identificar o problema semiestruturado. O sistema de suporte às decisões está concebido para proporcionar ao dirigente uma escala de níveis de ajuda, dos mais primários até os mais refinados. Keen e Mbrton distinguem quatro níveis de suporte. O prim eiro nível, o mais primário, proporciona ao dirigente acesso aos fatos; é um nível de informação primária classificada, porém muito pouco selecionada e elaborada; ela flui com putacionalm ente a um centro de análise. Por exemplo, um ministério de planejamento tem gran-
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des dificuldades de obter informações relevantes sobre os investimentos públicos em curso e sobre os novos in vestimentos que pode financiar. Em alguns aspectos, dispõe de enorme informação bruta, enquanto que em outros precisa perseguila como se se tratasse de uma investigação. Por meio de certas regras de análise préelaboradas e certos critérios de inclusão e normatização, o SSD pode proporcionar regularmente a tal ministério o acesso aos fatos relevantes. O segundo nível de su po rte implica uso mais inteligente da com putação, mediante o trabalho com padrões de reconhecimento e filtros autom áticos de seleção. Esse nível de suporte faculta ao dirigente a capacidade de solicitar ou receber regularmente informação seletiva com significado conceituai preciso, e abrange a informação que, no âmbito da gerência por operações; é expressa por indicadores, sinais e intervalos taxonómicos. A sala de operações, desenhada por Stafford Beer, em 1971, para a Corporación de Fomento, no Chile, trabalhava principalmente neste nível numa época em que não se dispunha de microcomputadores. O terceiro nível de suporte cria um sistema que opera como uma calculadora sofisticada, program ada para processar as principais ações do dirigente ao tratar de problemas sem iestruturados. O quarto nível de suporte, o mais complexo, se desenvolvido e usado com maturidade e eficácia, proporciona ao dirigente acesso aos modelos apropriados, desenhados especificamente para seu uso e de acordo com seu estilo de cálculo. Esses modelos podem ser de natureza diversa, segundo o tipo de problema que se pretende analisar. Sobre esta questão, Keen e Scott Morton afirmam (op. cit. p. 97): “Conseqüentemente, (esses modelos) podem ser mais simples e crus do que matematicamente sofisticados. Baseiam-se freqüen temente em regras heurísticas e em procedimentos-padrão de análise”. O importante é que o dirigente sintase confortável na interação com o sistema de suporte e incorp ore a necessidade de usálo. A eficácia do sistem a para o dirigente fará com que essa necessidade seja um hábito estável e cada vez mais exigente. Após algum tempo de uso, recorrerá ao SSD da mesma forma que a um telefone.
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Segundo essas características, os SSD são sistemas que se desenham à medida que são implantados e em estreita colaboração com o usuario. Eles evoluem com a experiência da implantação e com as novas demandas do dirigente; não com eçam de form a acabada e refinada. O sistema de decisões
O processo de tomada de decisões e de solução de problemas é um tema altamente controverso, sobretudo após as contribuições de Simon (A Behavioral M odel ofR ational Choice, 19S7, In M odcls o f Ma n , pp. 241260, Wiley), Allison (Essence o f Decisión, 1971, I.. Brown), Keen e Scott Morton (1978, op. cit.) e Winograd e Flores ( Understanding Co m puters and Cognition, 1987, Addison Wesley). Num a afirmação taxativa, Keen e Scott M orton dizem: “Uma séria deficiência de todo o estudo de management tem sido a ignorância e a falta de interesse sobre como se tomam realmente as decisões.” (p. 15).
Este não é o lugar para discutir o tema, mas é importante mencionar as diferentes concepções em debate. Em poucas palavras, existem pelo menos as seguintes posições teóricas: i.
a visão racionalista clássica da microeconomia, que ainda desfruta de grande importância, embora seja uma teoria normativa sobre como os homens deveriam decidir caso aluassem conform e a racionalidade econômica;
ii.
a visão do racionalismo limitado, elaborada por Simon como crítica ao racionalismo da microeconom ia; ela não rejeita a racionalidade como critério, mas duvida de sua possibilidade prática; isso leva ao abandono da idéia de uma solução ótima e sua substituição pela solução satisfatória;
iii. a visão de múltiplas perspectivas de análise, apresentada primeiramente por Allison e depois por Mitrof, Churchman e Lindstone, consistindo em aproximações a uma teoria situacional da tom ada de decisões. Entre essas múltiplas perspectivas
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o próprio Allison destaca a visão política, dominada pelo critério de negociação entre forças, a visão organizacional ou burocrática, dominada pelos procedimentos institucionais preestabelecidos, e a visão individual, dominada pela personalidade de quem toma as decisões; iv.
a visão da deliberação entre irresolução e resolução, elaborada por W inograd e Flores, baseada na teoria dos atos de fala e na teoría das conversações. A posição de Winograd e Flores tem muitos pontos de contato com a de Keen e Scott Morton e com a teoria das situações, mas é urna proposta teórica mais radical, que rejeita com pletam ente o critério de racionalidade, mesmo na forma limitada de Simón, e rejeita também o pró prio conceito de tomada de decisões.
A idéia central que queremos destacar aqui é que o espaço de possibilidades de solução de um problema é criado e limitado pelo ator social na sua perspectiva situadonal, a qual é cega para certas vias que podem ser soluções para o outro ; o espaço de soluções de um ator é previamente orientado para certas possibilidades, excluindo ou cancelando outras. O espaço de soluções de um problema é um espaço situacional mente limitado pelo ator, e isso é mais importante que a impossibilidade de enumerar ou imaginar todas as soluções possíveis. Em outras palavras, o dirigente não escolhe entre alternativas previamente existentes; ele gera alternativas a partir da sua apreciação situacional. Aquilo que a posição racionalista cham a de alternativas existentes são alternativas para quem, e em que espaço situacional? A teoria da tomada de decisões é mais complexa do que parece. No entanto, podemos entender que é um processo que varia conforme o tipo de problemas (estruturados, semiestruturados, inestruturados); é multidemensional, porque os problemas atravessam várias regiões da realidade; e possui múltiplos objetivos, porque sempre devemos considerar vários critérios de eficácia ou efetividade no enfrentamento dos problemas. Na dinâm ica da to m ada de decisões (ou processo de resoluções) entram em jogo as seguintes variáveis:
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i. distintos tipos de problem as; ii. distintas perspectivas situacionais de análise; iii. distintos modos de decisão; iv. distintos tipos de decisões e resoluções. O esquema a seguir m ostra as principais variáveis do processo de tomada de decisões. Ante tal variedade de perspectivas e modos de solução, numa situação concreta e diante de um problema específico, o ator que toma decisões adotará uma perspectiva dominante e um modo dom inante na sua abordagem.
PERSPECTIVAS DE ANÁLISE
E S = S N * N ° RMAS DE TRATAMENTO J p :S : COMBINAÇÃO DE NORMAS PROBLEMAS»::;:::; E j u íz o SITUACIONAL
SEMI-ESTRUTURADOS
JUÍZO SITUACIONAL PROBLEMAS INESTRUTURADOS
AÇOES NORMATIZADAS DECISÕES SEMI- ESTRUTURADOS DECISÕES , ESTRATÉGICAS
I I m MODOS DE DIREÇÃO
f.
0 Sistema de Gerencia por Operações
Dirigir não é só uma função superior de cúpula. Sem direção qualificada em todos os níveis não é possível conduzir com eficácia uma organização complexa. Tanto os macroproblemas quanto os miniproble mas necessitam de gerência. A importância da gerência por operações
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Política, Planejamento e Governo
está em distribuir e descentralizar as responsabilidades de direção. A gerência por operações é um sistema de direção e administração por objetivos, sendo, portanto, uma gerencia por módulos de ação, aqueles que podem e devem corresponder aos módulos do plano. A gerencia por operações é um sistema essencial da estrutura organizacional do sistema de planejam ento e govern o. A direção de um governo só poderá fazer coincidir suas ações cotidianas com os objetivos de seus planos se os módulos do plano (operações, ações, subações, ações de regulação, etc.) articularemse com os módulos orçamentários (programas, subprogramas, atividades, etc.), e ambos corresponderem a uma atividade gerencial organizada em todos os níveis para executálos com criatividade e imaginação (gerência por operações, ações, etc.). Por outro lado, como o plano diretivo não se ocupa previamente de tudo, nem a direção superior pode dirigir tudo, a gerência por operações resgata os espaços de autonomia e criatividade próprio s de uma organização que tr ata de problemas m uito específicos em cada nível. Por conseguinte, o requisito organizacional básico de caráter prático para que um governo funcione eficazmente, validando seus planos com fatos, está na existência do sistema triangular: plano modular —orçam ento p or programas —gerência po r operações. N atu ralm ente, o sistema de gerência por operaçõ es exige, por sua vez, um sistema de direção superior po r operações. Tal sistema leva à mudança de certos hábitos rotineiros, típicos das formas tradicionais de governo. Entre essas mudanças merecem ser destacadas: i.
novas modalidades de funcionamento do conselho de ministros, a fim de que ele acompanhe periodicamente a evolução dos problemas que as operações enfrentam; ii. novas modalidades de prestação de contas dos ministros sobre o andamento das operações sob sua responsabilidade; iii. novos proced imentos e critérios para discutir e aprovar o o rçamento p or programas no Congresso Nacional; iv. implantação de um sistema ágil e significativo de acompanhamento descentralizado do andamento das operações e ações, a
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v.
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fim de que os problemas de execução e de eficacia direcional das operações resolvamse descentralizadamente e só excepcionalmente cheguem aos ministros ou ao conselho de ministros; um sistema veloz de planejam ento de con juntura, para avaliar as novas situações e os resultados, ajustar o alcance e o desenho das operações, adotar novas operações e adequar oportunam en te as decisões a cada nova situação.
Mas este sistema de direção superior só poderá existir se estiver apoiado num sistema recursivo e descentralizado de gerencia por operações, nos diferentes níveis, em instituições e organismos do setor pú blico. Nem o plano nem o sistema orçamentário por programas podem operar substantivamente sem um sistema de gerencia por operações; sem ele, as operações do plano estratégico não têm agentes responsáveis efetivos e os programas do orçamento constituem mera fachada, que dissimula a prática tradicional de orçamentar por instituições e organismos, sem definir objetivos e sem estabelecer critérios internos e externos de produtividade e eficácia na gestão pública. Na América Latina é comum ver departam entos de orçam ento atuando como se fossem agentes de finanças, sem qualquer responsabilidade pela eficácia real da gestão pública. Não trabalham com objetivos e metas precisas, não estabelecem normas de custos nem de qualidade dos serviços, não acompanham a atividade real que está por trás do orçam ento por program as, nem tamp ouco se interessam pela eficácia direcional dos programas aparentes que financiam. A gerência por programas está ausente e encoberta por uma orça mentação por objetivos meramente formal, na qual o que interessa é fixar cotas de gastos que respeitem o limite das receitas. A gerência de cada módulo de gasto não está sujeita a padrões de normalidade e qualidade que realimentem o cálculo dos orçamentos seguintes. Tampouco se analisa a estrutura da rede de produção de operações de uma instituição para estudar sua eficácia e fazer de cada nó da rede um orçamento. Sobrepõese, simplesmente, ao nome de cada unidade administrativa, como uma etiqueta, o nome de um programa, subprograma ou atividade.
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O Congresso Nacional, por sua vez, discute e aprova o orçamento da nação como se fosse uma lista de recursos atribuídos a uma instituição, sem se preocupar com objetivos, custos ou qualidade. O orçamento não é analisado; ele é resgatado em função de negociações parciais e locais. O plano não é critério para exame do orçamento. Os recursos econômicos, financeiros, técnicos, organizacionais e legais à disposição de um organismo podem conduzir a ações de d iferentes resultados e propósitos. O sistema de gerência por operações permite que se volte a colocar o problem a da chamada rigidez do gasto público. Com efeito, dizse que 60% do gasto orçamentário correspond e a rem uneraçõ es, 15% a necessidades mínimas de funcionamento da administração pública, etc. Com essa argumentação pretendese apresentar uma imagem de alta rigidez na mudança de atribuição de recursos, pois mais de 80% do orçamento está comprometido. A fraqueza do argumento está em destacar a rigidez da estrutura dos recursos, esquecendo a estrutura dos objetivos perseguidos. Na realidade, o gasto público é bem menos rígido do que parece, pois com a mesma estrutura rígida de insumos podemos realizar diferentes estruturas flexíveis de operações. Por exem plo, um program a orçamentário de saúde com um a rígida estrutura de insumos pode estar enfrentando um problema em nós críticos equivocados, e pode realizar com o mesmo montante de recursos um a operação qualitativamen te distinta e muito mais eficaz. Tal realoca ção de recursos não está limitada por uma rigidez orçamentária, mas por rigidez cultural, b u r^ >ática, política, e tc., intensificada pela inexistência de um sistema de gerência por operações. Na análise da relação recursos > produto —>resultados, é possível visualizar várias alternativas na atribuição de um mesmo montante de recursos: i.
uma continuidade rotine ira para continu ar fazendo o m esm o, com a mesm a eficiência e a mesm a eficácia;
ii.
uma operação que visa ampliar a cobe rtura do sistema, atacar os mesmos nós críticos e procurar obter mais do mesmo produto aum entando a eficiência;
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iii. um a operação visando m elho rar a eficácia dos serviços pre stados pelo sistema, enfrentando nós críticos de maior impacto sobre o VDP do problema e procurando obter um produto distinto. Assim, um sistema de gerencia por operações pode criar novas operações ou elevar a eficácia das existentes, com um custo de oportunidade próxim o a zero. Os mesmos recursos que hoje são gastos por inércia, sem destino claro e sem enfrentar os problemas cuja solução o país demanda, podem ser empregados para realizar operações e ações que produzam resultados capazes de amenizar o u so lucionar tais problema s. A maioria dos serviços públicos são conduzidos pela rotina e, como conseqüência, não conseguem, intencionalmente, objetivos politicamente hierarquizados. Nesse caso, o processo de administração está invertido; a burocracia conduz seus dirigentes, e estes esgotamse na administração do cotidiano. Para estes gerentes sem objetivos o tempo é muito escasso, pois o desperdiçam em minúcias secundárias da conjuntura. Num organismo bem geren ciad o to dos os re cursos estão a serviço de objetivos precisos, e sua direção avalia constantemente a situação para efetuar correções. A única solução para dar eficácia ao gasto público é um sistema de gerência por operações. Isto é especialmente válido para as chamadas despesas correntes, principal componente do custo dos serviços públicos. Uma das vantagens do módulo de planejamento e gerência que designamos por operações está em que ele abrange tanto as despesas correntes quanto as de investimento, bem como aquelas ações que não requerem recursos econômicos (ações de regulação que definem políticas). O planejamento e gerência por projetos de investimento deve ser substituído pelo planejamento e gerência po r operações; caso con trário, mantémse a ineficácia do gasto corrente que, em vez de ser racionalizado, sofre sucessivas reduções irracionais, reforçando a estrutura desequilibrada do gasto do orçamento fiscal em privilégio do investimento público. Nesse círculo vicioso, os serviços públicos e a burocracia estatal
5 12
Política, Planejamento e Governo
deterioramse progressivamente, até o extremo de tornar o governo inativo. Devese considerar que a capacidade de produção dos serviços públicos depende significativamente das despesas correntes, e que as deficiências de dotação e uso dos recursos correntes subutilizam a capacidade de produção criada pelos investimentos. No te xto e na estrutura do planejamento tradicional, as categorias de programas, políticas, projetos, recomendações, critérios, etc. podem ser ambíguas, porque com elas não se procura esgotar o universo de decisões. Elas não constituem módulos de ação homogeneamente definidos. Já o planejamento situacional estabelece como princípio básico que o plano deve ser inteiramen te expresso po r operações ou m ódulos de ação. Desta maneira, um programa direcional é uma forma de seleção e articulação das operações do plano. Claro que esta seleção e articulação só pode ser feita em relação a uma estratégia de ação que lhe dê coerência e direção. O sistema de gerência por operações é um sistema recursivo, no sentido que Stafford Beer dá a esta palavra. O sistema exige uma organização e uma administração que articule os cinco níveis de atividade pro postos por Beer, e que em cada nível assumam se compromissos de ação repartidos em módulos de gerência. O módulo de gerência mais agregado é a operação, que se decom põe recursivam ente em ações e estas em outros módulos m enores, até chegar aos módulos significativos e práticos do primeiro nível de Beer. Os cinco sistemas ou níveis organizacionais propostos por Beer, traduzidos para a nossa linguagem, são: • nível 5:
direção e planejamento superior (estratégia e seleção de problemas e operações);
• nível 4:
gerência e organização (coordenação de um conjunto de operações);
• nível 3:
direção de cada operação (integrada po r ações);
• nível 2:
controle e regulação de ações e subações;
• nível 1:
produção de ações.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
513
Em term os práticos, a gerência por operações supõe um sistema de práticas de administração que exige:
OS CINCO NÍVEIS ORGANIZACIONAIS DE S. BEER
5 1 4
Política, Planejamento e Governo
i.
explicar o âmbito da realidade no qual são assumidas re sp on sabilidades em torno de uma seleção de problemas, e aplicar métodos sistemáticos para analisar estes problemas;
ii.
enfren tar os problema s med iante comprom issos de ação coerentemente estruturados por operações;
iii.
atribuir recursos po r operações ou po r mó dulos orça m entários que tenham um a correspond encia clara com as operações;
iv.
definir os responsáveis por desenhar, exe cuta r e co ntro lar o cumprimento das operações;
v.
estabelecer m étod os sistemáticos para o desenho e avaliação previa das operações, a fim de justificar sua inclusão no plano e sua seleção como unidade de gerencia;
vi.
criar urna red e com putadorizad a de arquivos po r operações e problemas;
vii. estabelecer um sistema de acom pan ham ento e avaliação das operações, distinguindo eficiência produtiva (relação insumo produto ), eficácia interna (cumprimento das metas de operação) e eficácia direcional (efeito das operações sobre o vetor de definição dos problemas ou sobre a situaçãoobjetivo); viii. no âmbito da eficiência produtiva das operações, o sistema exige controle de custos, comparação destes com custos padrão, estabelecimento e controle de normas de qualidade e controle de tem po e oportunidade; ix. no âmbito da eficácia interna, o sistema supõe um aco mp anhamento da execução física e financeira das operações, traduzindo os indicadores de execução em sinais de atenção e alarme que mostram, sinteticamente, o cumprimento das metas institucionais; x.
no âmbito da eficácia direcional, o sistema supõe um acom panhamento dos efeitos das operações sobre os nós críticos da explicação situacional dos problemas e sobre seus VDP; por conseguinte, essa proposta exige um sistema de prestação de contas por operações dos ministros perante o presidente da república; requer também, talvez uma vez por mês, que o
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515
conselho de ministros avalie a situação de cumprimento das operações e a evolução dos problemas; isto devese repetir a cada nível organizacional, até chegar ao primeiro nível de Beer; xi.
estrutu rar um sistema recursivo de prestação de contas po r operações que comece na base (primeiro nível) com os res ponsáveis pelas subações e chegue até o presidente da rep ú blica no conselho de ministros (quinto nível);
xii. es truturar as organizações e os pro cedim ento s administrativos conforme as necessidades da gerência por operações; xiii. articular o sistema de tomada de decisões no conselho de ministros ao sistema de planejamento modular por operações (préalimentação) e ao sistema de acompanhamento das operações (retroalimen tação). As tecnologias para montar esses sistemas são conhecidas, mesmo que em alguns casos sejam pouco difundidas e estejam fragmentadas em diversos domínios ou especialidades. Em alguns pontos muito especiais será preciso criar método s e técnicas. O estabelecimento da gerência por operações é a tarefa mais prática e urge nte para a reform a da administração do Estado. Uma mudança tão drástica na qualidade da direção e da gerência não pode ser efetuada extensivam ente, em toda a ação do seto r público, nem pode ser implantada de imediato. E preciso um a m udança gradual, selecionando organismos e operações críticas para avançar paulatinamente em profundidade e extensão. O gradualismo da reform a referese: i.
à definição de um processo po r etapas; na prim eira, as op erações incorporadas ao sistema são poucas e não cobrem o universo de ação do Estado; as operações selecionadas se constituiriam em núcleos prioritários de concentração de recursos, supervisão e racionalização administrativa;
ii.
ao estabelecim ento de procedim entos de execução especialmente flexíveis e ágeis, que constituiriam uma espécie de prê m io , um estímulo para que novas operações ingressassem
5 1 6
Política, Planejamento e Governo
escalonadamente no sistema, submetendose a uma racionalização administrativa e sujeitandose a um sistema de controle de qualidade de serviços públicos (NORCASEP); iii. ^ à implantação de um trata m en to privilegiado para organismo s e operações que se destacam quanto à racionalização administrativa; já as operações restantes só ingressariam no sistema se cumprissem prev iam ente dois requisitos: ter racionalizado suas estruturas administrativas para atender às exigências do sistema e ter se submetido ao sistema de controle de qualidade dos serviços públicos; iv.
à definição de um sistema de prem iação por ingressar no sistema de gerência por operações, conforme o avanço na modernização das estruturas e conforme os níveis de qualidade alcançados na pro duç ão dos serviços públicos.
Esse sistema de premiação pode ser constituído por: i.
estímulos mo rais, po r ser visto pela opinião pública com o classificado nos níveis mais altos de qualidade;
ii.
concessão de m aior flexibilidade, auton om ia de pro cedim en tos e prêmios p or eficiência;
iii. risco de perda desses benefícios, com reclassificação para categorias mais baixas do sistema, caso deteriorese o cumprimento das normas de qualidade e gerência. A gerência por operações oferece uma alternativa diferente para a reforma da administração pública; ela coloca mais ênfase nas práticas de produção e dá menos valor às grandes refo rm as gerais, às norm as extensivas e ao impacto das mudanças de legislação. O sistema de gerência por operações exige a avaliação permanente da situação na conjuntura e supõe, portanto, que se compare constantem en te a situação planejada com a situação real. Essas exigências mam demandas específicas para o sistema de su porte às decisões (SSD) e o sistema de petição e pre stação de contas
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
517
(SPRC). O SSD deve garantir o fluxo de informação e o cálculo necessário ao sistema de gerência por operações. O SPRC, por sua vez, cria a motivação para o bom funcionamento da gerência por operações e do SSD, pois a forma de pedir e prestar contas cria uma necessidade de informação gerencial de muito mais peso e formalidade que a informação m eram ente estatística. Tais considerações apontam para uma questão central nas estratégias de reforma organizacional. Com efeito, as reformas progressivas, sistema por sistema, onde a reforma de cada sistema abrange todo o universo do aparelho de Estado, ficam órfãs de apoio até que, anos mais tarde, empreendase a reforma dos outros sistemas. Nessa ocasião, porém, o sistema reformado já estará desvirtuado e burocratizado, numa prática isolada que gera pro cedim entos sem dem anda. No nosso entender, é mais eficaz progredir no sentido inverso: concentrarse em poucos organismos e operações, e reformar todos os sistemas indispensáveis para que o âmbito ou organismo reformado transformese num centro de excelência autosustentável, capaz de su portar os “vaivéns” da mudança política. Indicadores de co ntrole
Um indicador de con trole é uma informação elaborada, com posta e complexa, portadora de um significado preciso sobre um tópico importante para o acompanhamento de algum módulo do plano. O indicador pode ser qualitativo ou quantitativo. O conjunto de indicadores form am um sistema de apoio e interpretação para a direção do plano e a gerência por operações. Esses indicadores fazem parte , ao m esmo tem po, do nível 2 do desenho do sistema de supo rte às decisões (SSD). Tipos de indicadores
Há indicadores básicos ou primários, que identificam fatos (nível 1 do SSD), e indicadores compostos e “inteligentes”, que indicam inter pretações so bre o desenvolvim ento de um processo. O acompanham ento e controle do plano por operações exigirá diversos tipos de indicadores, en tre os quais podem se m encionar os alinhados a seguir.
5 18
Política, Planejamento e Governo
Indicadores situacionais gerais ou de macroproblemas ÂMBITOS DOS INDICADORES SITUACIONAIS
1) SITUAÇÃO GERAL
POLÍTICO
ECONÔMICO SOCIAL
X
X
2)
PROBLEMAS E SUBPROBLEMAS(VDP NÓS CRÍTICOS)
X
X
3)
EXECUÇÕES DE OPERAÇÕES
X
X
4)
INTENÇÕES E EXPECTATIVAS DOS ATORES SOCIAIS
X
X
5)
DESENVOLVIMENTO DE VARIANTES
X
X
i.
Econômicos.
Referemse à situação econômica geral. Por exemplo: emprego, desemprego, inflação, receitas e despesas públicas, balanço de pag amentos, financiamento in terno e exte rno, pro dução, consum o, etc. São indicadores básicos para o acompanhamento do plano global ou para situar as operações específicas em seu co ntexto. ii.
Políticos.
São usados como suporte na avaliação política da situação; indicam o grau de avanço ou de deterioração resultante de certas operações, bem como o grau de aceitação de outras: ®
de atitude;
•
de opiniões;
® de liderança; • sobre imagens de personalidade;
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
• • • • •
519
de aceitação ou rejeição de operações de govern o, através de pesquisas; de interesse da população pelos projeto s e operações do plano; de demandas sociais resultan te da avaliação da com unidade de problemas específicos; de valoração dos problem as para diversos atores; de previsão dos elem entos do vetor de peso das forças sociais.
Indicadores de cum prim ento e impacto das operações
i.
Cum prim ento das operações. Revelam se a operação está sendo realizada conforme as especificações do seu desenho. A operação pode estar sendo aplicada de forma correta ou de forma deficiente e inadequada. Por exemplo: o estabelecimento de refeitórios escolares para atender diariamente a 80 mil crianças do ensino primário; o indicador deve precisar quantos refeitórios iniciaram sua atividade, quantas crianças atendem, em quanto tempo foram instalados, quantos refeitórios estão sendo instalados e quantos com eçarão a ser instalados em breve.
ii.
Impacto das operações. São usados para conhecer as conseqüências positivas ou negativas de uma operação sobre os nós críticos e o VDP dos problemas. Por exemplo, no caso de uma modificação nos programas do ensino primário, o indicador mostrará se o nível de conhecimento do educando aumentou ou não como resultado daquela alteração.
Indicadores de atividade administrativa
Referemse às unidades administrativas com responsabilidades na execução, avaliação e controle das operações do plano. Eles indicarão o cum prim ento dessas responsabilidades e revelarão se essas unidades têm capacidade real para cumprir a função que lhes foi atribuída, se têm res
5 2 0
Política, Planejamento e Governo
ponsabilidade financeira ou se necessitam de uma refo rm a administrativa e orçam entária para cum prir sua função. Tratase, fundamentalmente, de um acompanhamento das conversações que antecipam a marcha das operações e do trabalho administrativo. Indicadores de balanços econômicos e da situação financeira
N este caso, são usados os conhecidos indicadores de controle de gestão econômicofinanceira, como, por exemplo: caixa, receitas e des pesas, nível de endividam ento, liquidez, solvência, rentabilidade, vendas, cumprimento de normas financeiras, produtividade, patrimônio, saneamento financeiro, etc. Indicadores de intenção e expectativas
São de caráter qualitativo e visam, fundamentalmente, prever a atitude futura dos principais atores do processo. Por exemplo: conhecer as decisões de investimento que os empresários pensam em tomar, em função de suas expectativas quanto à reativação econômica e à definição das regras da política econômica. Em outro nível, podese considerar a previsão do com portam ento dos consumidores frente a determ inados aum entos de preços. No mom ento em que se desenha e se faz a avaliação prévia de um a operação, devem ser desenhados os principais indicadores com os quais se acompanhará a evolução e o impacto da operação e se prestará contas ao nível superior. Indicadores e sinais
Em muitos casos, e certamente quando se trata de processos bem estruturados, os indicadores são composições complexas de grande significado que podem ser transformados em sinais. Para evitar que o dirigente ou o gerente fiquem submersos por uma avalanche de informações que não podem manejar com agilidade, é m uito im portan te o processo de redução da variedade: informação primá ria — > indicadores —> sinais.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
521
Milhares de dados primários podem ser convertidos em dezenas de isinais significativos. Esse processo de conversão e redução de variedade pode ser automatizado, no caso de problemas e operações bem estrutu radas. (vejase Stafford Beer, Decisión and Control, Wiley). Para os problemas semiestruturados, o exame do conjunto de indicadores e dos sinais serve de suporte para a avaliação parcial ou total de uma situação. No entanto , devese contar com algo que expresse a relação entre o indicador real e a no rm a estabelecida, um sinal que indicará o com po rtamento adequado ou inadequado da situação, operação, ação e projeto que se está avaliando ou controlando. Daí a conveniencia de considerar três tipos de sinais: i.
sinal de conformidade, que será emitido quando o indicador real se mantiver dentro da norma estabelecida; é um sinal tácito que ordena a transferência automática da informação ao banco de dados; ii. sinal de atenção, emitido quando se constata uma tendência clara de afastamento da norma; este sinal visa provocar urna reação do dirigente; iii. sinal de alarme, que será emitido quando o indicador real estiver fora da norm a.
Tal conjunto de sinais deve ser parte de um sistema interpretativo, o qual é parte do SSD. Em casos de emergência, ele passa para a sala de situações. Em seu nivel, cada dirigente deve avaliar os indicadores e sinais mencionados para tomar as decisões que corrijam os desvios constatados. Sinais e faixas automatizadas
O sistema de acompanhamento de problemas e operações apresentado é complexo e deve ser implantado progressivamente, em ordem crescente de dificuldade e capacidade de assimilação e utilização do sistema pelos executantes. Por exemplo, a conversão dos indicadores em sinais é um processo refinado, devendo ser praticado primeiramente de form a mais rud im entar, seletiva e manual.
5 2 2
Política, Planejamento e Governo
O sistema de sinais e faixas será possível se: i.
existir um plano m odu lar po r problema s e operações em que cada módulo é qualificado em função de indicadoresnorma precisos e significativos (IN ); esses indicad ores de norm a são parte indispensável do desenho das operações, para que estas sejam avaliadas como projetos antes de se decidir sobre elas;
ii.
existir um sistema de supo rte para as decisões que produza informação sobre a situação real com um atraso máximo E, definido expressamente para cada aspecto de um problema ou operação; cada informação significativa é um indicador real (IR), que corresponde conceitualmente a um indicador norma.
FAIXA DE INDICADORES NUM SISTEMA DE GERÊNCIA POR 0PERAÇ0ES ZONA DE A TEN ÇÍO tO
ti
12
13
ZONA DE SEGURANÇA
A comparação dos indicadores IN e IR permite transformar milhares de dados primários em poucos sinais de atenção e alarme. Se o indicador IN é uma faixa taxonómica ou de n orm alidade, o sistem a de sinais operará como indicado no esquema adiante. No exem plo,
P P tj '-
í
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
523
a faixa taxonómica tem teto e piso, mas em muito casos pode haver apenas um teto ou apenas um piso. SISTEMA DE FAIXA VARIÁVEL
No período to o indicador IR1 está dentro da faixa taxonómica IN; conseqüentemente, o sistema de sinais expressa um aviso tácito de conformidade, que não é registrado como sinal no painel de controle do sistema. No período t l , o indicador IR2 deslocase para o limite mínim o da faixa de normalidade, fazendo com que o sistema emita um sinal de atenção. No período t2, o indicador real IR3 situase fora da faixa de n ormalidade, o que levará o sistema a emitir um sinal de alarme. Devese considerar também que, em geral, a dinâmica da mudança situacional desloca a faixa de normalidade para cima ou para baixo. A emissão de sinais só manterá seu significado se a faixa taxonómica estiver atualizada, isto é, de acordo com a nova realidade. Isso cria uma certa complexidade técnica para o sistema de sinais, pois o programa de computação que os emite deve ser “inteligente”, receber as informações
52 4
Política, Planejamento e Governo
sobre as mudanças ocorridas e alterar automaticamente a faixa taxonómica. O software desenhado por Beer em 1971 para a Corporación de Fomento, no Chile, corrigia automaticamente as faixas de normalidade. Um refinamento realmente extraordinário para a época, ilustrando o que pode ser feito com poucos recursos e muita criatividade. O sistema de sinais alimentará a capacidade de análise do sistema de gerência por operações e, portanto, o plano, permitindo avaliar a situação através da resposta às perguntas: i.
Os problem as e opo rtunidades previstos no plano alteraram se na situação presente?
ii.
É preciso alterar as operações do plano para melhora r sua eficiência ou eficácia?
iii.
As operações do plano estão sendo executadas a tem po e com fidelidade?
iv.
Desenvolveram se variantes que prejudicam ou favorecem o impacto das operações sobre os problemas?
A avaliação do andamento das operações consiste numa análise si tuacional, a fim de: i.
verificar o grau de execução das decisões;
ii.
com pro var os efeitos das decisões sobre a situação em curso;
iii. fazer um a previsão dos resu ltados alcançáveis e das tendências situacionais mais prováveis. Como qualquer avaliação da situação, esse processo pode levar à revisão do plano. Os sinais conformarão um sistema interpretativo da situação e das suas tendências. Com efeito, os sinais de atenção e alarme sobre a situação geral (inflação, emprego, nível de reservas internacionais, crescimento do PIB global e por setores, indicadores de atividade econômica, aceitação política do govern o, grau de tensão política, relação de forças, etc .) devem guardar relação com um conjunto de sinais referentes a aspectos situacionais específicos, à execução das operações do plano e ao desenvolvim ento das variantes.
Os Quatro Mom entos do Processo de Planejamento S ituacion al
525
AVALIAÇÃO DA SITUAÇÃO MEDIANTE SINAIS
Já a projeção d e tendências da situação pre sen te deve estar relacionada com os sinais sobre intenções dos atore s sociais. Todos esses sinais devem ser interpretados e analisados. No esq uema apre sentado, as letras a,b,c e d re presenta m as rela ções entre indicadores. Essas relações podem responder a explicações como estas: —> Pertinênci a das operações (eficácia do desenh o geral ) —» Potênci a e eficácia das operações
(eficáci a direcional )
—» Ocor rência e execuç ão das operações
(eficácia da execuç ão )
b-> {-» Sensibilidade dos indicadores às variantes —> Sensibili dade dos element os do VD P aos nós críticos -» Preponderância de b Explicação situacional deficiente —>Articulação deficiente entre os Fluxogramas por Pro blemas e o d -» !
Fluxograma Situacional Geral >Preponderância de b
(macroproblema )
5 2 6
Política, Planejamento e Governo
O Gráfico mais adiante mostra uma forma de diagramar essas relações num a árvore relacional p or problemas.
ARVORE RELACIONAL DE UM PROBLEMA ( causas de E1) PROBLEMA X
VDP
El
E2
Ej
' indic adores)
OPERAÇOESE VARIANTES ( indicadores)
01 111
112
121
VI
V2
122
A 1
AÇOES indicadores ]
02
111
112
A2
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
527
Na árv ore relacional podemos procurar e inte rpretar a causalidade dos resultados obtidos, avaliar o efeito de atrasos na execução das operações, os efeitos não esperados das operações e o peso das variantes influentes que escapam ao controle do governante. A árvore relacional é manejada por computador, como parte do sistema de controle de pro blem as e operações. Em síntese: i.
cada operação terá um indicador para seu acom panham ento, devendo ter ele uma estrutura clara e lógica e devendo ser formulado por quem desenhou a operação;
ii.
para cada indicador deverá haver um desenho do fluxo, desde sua prod ução primária até sua chegada ao SSD para ser p rocessado; isto é, devese definir quem produzirá a informação, so bre que aspectos ela versará, quem a transm itirá, para quem e de que forma os indicadores serão estruturados, agregados e generalizados até chegarem ao nível onde serão usados como suporte à avaliação situacional, bem como filtrados para que só alguns deles continuem sua ascensão;
iii. cada indicador deve ser avaliado em relação à sua rep resenta tividade, de fo rma que a prática de planejamento na conjun tura constituase em elemento de retroalimentação para corrigir seu desenho; iv.
g.
cada indicador deverá ter um a forma explícita de interp retação, de acordo com os elemento que os compõem, a fim de evitar sinais ambíguos ou confusos.
0 Sistema de Petição e Prestação de Contas
Um sistema de informação para a gestão governamental só é viável e eficaz quando demandado pelo sistema de petição e prestação de contas (SPRC); este último, por sua vez, só tem sentido quando há gerência por objetivos sobre problemas, sendo estes o objeto de prestação de contas. Se assim não for, a demanda de informação terá um caráter meramente estatístico.
5 2 8
Política, Planejamento e Governo
O sistema de petição e prestação de contas transforma a demanda neutra de informação numa demanda de informação sobre resultados e gestão. Assim, o sistema de informação deixa de ser um âmbito da estatística, sem objetivo definido, para converterse num instrumento de gerencia por operações, de prestação de contas e de sistema de suporte para as decisões. A estrategia de montagem de um sistema de informação consiste em desenhálo como urna exigencia do sistema formal de prestação de contas. Os px'incípios fundamentais dessa concepção são os seguintes: i.
todo pro du tor de informação é usuário da informação que pro duz; ele produz a informação que necessita para sua gestão interna e para prestar contas ao nível superior (esse princípio cria a necessidade de pro duz ir a informação);
ii.
a informação deve se refe rir aos problem as, operações e variantes que influem sobre a eficácia das operações (esse princí pio confere ao sistem a de inform ação um a utilidade prática transparente);
iii. a informação produzida deve se expressar em indicadores suscetíveis de interpretação precisa; estes indicadores devem ser convertidos em sinais de atenção ou alarme, a fim de cumprir a lei de Ashby de redução de variedade (esse princípio aliviará o gerente de uma enor m e quantidade de informações inúteis); iv.
o sistema de informação deve ser pa rte de um sistema de pre stação de contas que obriga a usar a informação que se produz —com o que voltam os ao prim eiro princípio.
A efetividade do sistema de petição e prestação de contas depende fundamentalmente de: i.
sua aplicação rigo rosa e sistemática a partir da direção superior; começa pela prestação de contas dos ministros perante o pre sidente ou o Congresso, e culm ina com a prestação de contas pelo nível 1 de Beer ao nível imediatam ente sup erior;
ii.
sua formalidade legal, condição para participar do ritual administrativo latinoamericano;
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
h.
529
iii.
sua associação com estímulos de prestígio pe ran te a opinião pública, razão pela qual ele deve ser público ;
iv.
sua associação com outro s processos adm inistrativos relac ionados a estímulos m ateriais.
Sistema de Orçamento por Programas
Não se pode negar o avanço ocorrid o na América Latina quanto às técnicas orçamentárias; tal avanço, porém, é em grande parte formal e ainda rep res en ta pouco em relação às necessidades de mudança. A existência de um verdadeiro sistema de orçamento por programas é condição necessária para o bom funcionamento dos subsistemas de direção, sendo ao mesmo temp o resultante destes. Sem um sistema de gerência por operações não pode haver um bom sistema de orç am ento por pro gram as, e sem um bom sistema de orçamento por programas não podem funcionar bem todos os outros subsistemas d e direção. O sistema de orçamento por programas é uma forma de alocação de recursos econômicos públicos por objetivos. Ele expressa, em termos monetários, o processo de produção de bens e serviços dentro do espaço de capacidades de uma instituição. A instituição é uma acumulação social que se fenoestrutura como organização para satisfazer certas necessidades externas a ela. Nesse sentido, é útil colocar o princípio elementar que justifica a existência de qualquer organização: ela deve satisfazer necessidades fora do seu espaço institucional. Tal critério é necessário, mas não é suficiente, pois é preciso também que a instituição atenda a éssas necessidades com eficiência e eficácia. Natu ralm ente o orçam ento de uma instituição, segundo a te cnolo gia empregada, combina bens e serviços adquiridos fora do espaço institucional (II) para produzir uma variedade de produtos intermediários (12). A produção intermediária é obtida dentro do espaço institucional e satisfaz necessidades internas da instituição. Ela só se justifica como requisito tecnológico para produzir os produtos finais (PT), que constituem o objetivo último da instituição. A eficácia e a necessidade de uma instituição são avaliadas em função de seu produto final. O processo de produção deste produto requer
5 3 0
Política, Planejamento e Governo
não só os produtos intermediários obtidos dentro do espaço institucional como também outros produtos (13) vindos de fora da instituição, que são diretamente aplicados na obtenção dos produtos finais. 0 PRESSUPOSTO
Os produtos intermediários(I2) são um suporte interno e uma condicionante dos produtos finais, isto é, satisfazem a necessidades institucionais internas, enquanto os produtos finais satisfazem necessidades externas , geradas fora do espaço institucional. Os dois tipos de processos de produção necessitam de recursos humanos (Hl e H2). Assim, um pro gram a orçam entário é um a relação recurso s —» produto > resu ltados mais lim itada que aquela referente a uma operação do plano. Um program a orçamen tário é uma relação do seguinte tipo: (13, H2) —> PT —> Pr (N , VDP) recursos
— > produto
—> resultados
Os Quatro Mom entos do Process o de P lanejamento Situacional
531
Conforme esses conceitos, uma atividade orçamentária é uma relação como a seguinte: (11, H1) — > I2 — > PT recursos —> produto —> resultados
Já uma operação do plano po de ser expressa desta forma: (11, H1) -> I2 l > —> P O - » Pr (N, V D P ) RNP UI 3 J recursos —> produto —> resultados
onde RNP são os recursos nãoorçamentários (de diferentes tipos), PO é o produto da operação, VDP é o vetor de definição do problema que se pretende enfrentar e Ñ é o ou os nós críticos da explicação situacional do problema. O signo U indica a união dos dois tipos de recursos, pois eles não são passíveis de soma. Com as limitações próprias de relações orçamentárias que não correspondem a custos reais, o SPP trabalha com os seguintes critérios de avaliação: i.
eficiência de produção, como uma relação entre. (11, H1) —> I2 e (I3, H2) —» PT;
ii.
eficiência institucional, expressa na relação. (I2) —» PT, y
iii.
eficácia do program a, expressa na relação: PT —» Pr(Ñ, VDP).
Esses critérios orçamentários devem ser corrigidos e complementados com a análise de eficiência e eficácia da gerência por operações.
532
Política, Planejamento e Governo
A lógica de construção do orçamento por programas exige que se conceba a instituição como uma rede de produção (veja Matus, Makon e Arrieche, Las Bases Teóricas dei Presupuesto por Programas, AVPP, 1979 Venezuela). Essa rede permite distinguir entre insumos adquiridos fora da instituição, produtos intermediários e produtos finais. Fica fácil, assim, analisar a correspondência entre as operações do plano e os programas orçamentários, pois os programas referemse sem pre a prod utos finais, e as atividades a produtos intermediários. No entanto, a prática do SPP na América Latina não usa estes p ro cedimentos, e geralmente chama dr programa aquilo que é feito por qualqu er unidade organizacional. A vinculação do plano ao orçamento
A possibilidade concreta de vincular o plano ao orçamento depende do tipo de plano e do tipo de orçamento. Na América Latina tem sido muito difícil esta vinculação, porque o lipo de plano tradicional não se presta a isso, e o tipo de orçam ento , mesmo quando se adota a técnica por pro gra m as, não re speita o aspecto substantivo desta técnica. Conseqüentemente, não responde à necessidade de vincular os módulos operacionais do plano com os módulos programáticos do orçamento. Nessa ex periên cia histórica há três casos de tentativa de vinculação; o último deles constitui nossa proposta concreta, em termos de técnica substantiva de orçamento por programas e de planejamento situacional. O primeiro caso corresponde ao que é tradicionalmente aplicado na América Latina, e apresenta um modo de vinculação que fracassou. Com efeito, não é possível estabelecer uma relação precisa entre o texto ambíguo, nãomodular, do plano tradicional e a precisão do orçamento. A precisão heterogênea dos dois instrumentos só permite vincular os projetos de investimento, pois só eles estão formalmente definidos quer no plano, quer no orçamento. Recordese que o plano tradicional adota uma taxonomia inconsistente dos âmbitos de definição dos com promissos de ação, baseada em categorias que se in te rc eptam e que não esgotam o universo da produção do setor público. Por sua vez, o orçamento por programas tradicional não distingue claramente a produção final da produção intermediária.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
533
OPÇÕES DE VINCULAÇÃO ENTRE PLANO E PRESSUPOSTO
TIPO DE PLANO
MODO DE VINCULAÇÃO
TIPO DE ORÇAMENTO
CASO 1
Plano Normativo por setores com inventário de projetos de investimento
Orçamento por Programas tradicional
• • •
Só são vinculados os investimentos Não há plano modular Os módulos do PPP são inconsistentes
CASO 2
Plano Normativo por setores com Inventário de projetos de investimento
Orçamento por Programas com produtos terminais bem diferenciados
• •
Agrupados dos Programas orçamentários por setores Conciliação de os setores do plano com os setores do orçamento.
CASO 3
Plano Situacional Modular
Programas com produtos terminais bem diferenciados
•
Vinculação dos módulos do plano com os módulos do orçamento.
O segundo caso é constituído pelas tentativas de vincular o plano com o orçamento através da setorialização do orçamento. Com esse processo avançouse na reform a do sistem a orçam entário, mas não na do sistema de planejamento. A Lei Orgânica do Regime Orçamentário (LORP) da Venezuela tentou a vinculação plano —orçamento utilizando setores comuns de alocação de recursos. A idéia era agrupar por setores os programas orçamentados, setores esses que correspondiam àqueles do plano. Mas a dificuldade desse
5 3 4
Política, Planejamento e Governo
método resultava da falta de operacionalidade do conceito de setor. Tal conceito pertence a uma taxonomía para delimitar um âmbito da economia que não tem uma correspondencia evidente com os módulos de gerencia da administração pública. Assim como o primeiro, esse segundo caso vincula apenas os projetos de investimento. A lição de ambos os casos é clara: só é possível vincular os ámbitos modulares do orçamento com os módulos do plano que são precisos. A solução, então, parece óbvia: estruturar o plano anual em módulos precisos de gestão. O terceiro caso é a proposta de vinculação plano —orçamento sugerida pelo planejamento situacional. Tratase, no fundo, de homologar a estrutura modular do orçamento e levála ao plano, dandolhe maior precisão. Não basta, porém, que o plano tenha uma estrutura modular; é. necessário também que tal estrutura cumpra os requisitos de plenitude, recursividade, intersecção bem definida, responsabilidade institucional precisa e coordenação das intersecções. Exigidos pelo planejamento situacional, eles são requisitos metodológicos da estrutura do plano anual e do plano de médio prazo. O instrumento concreto de vinculação plano —orçamento será a matriz Instituições —Operações do Plano —Programas Orçam entários. Essa matriz de articulação plano —orçamento deve ser o instrumento básico de trabalho na relação entre os órgãos centrais de orçamento e de planejamento, ou entre os órgãos correspondentes em outros níveis. Nela são dimensionados os objetivos de cada programa e atribuemse os recursos necessários a cada um deles. É ela uma matriz operacional e muito concreta, na qual estão bem definidas as instituições responsáveis, a produção final que elas devem realizar, os recursos atribuídos, etc. No espaço de necessidades e possibilidades condicionado pela análise macroeconômica, o órgão central de planejamento deve construir a Matriz II Instituições — Operações , após selecionar essas últimas conforme os nós críticos da M atriz Nós Críticos — P roblemas. A matriz II deve refletir os módulos do plano (operações, ações e subações) a serem executados por cada instituição através das respectivas dotações orçamentárias e outros recursos requeridos pelas operações.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
535
MATRIZ DE VINCULAÇÃO PLANO-ORÇAMENTO
MATRIZ I I PLANO MODULAR POR OPERAÇÕES MATRIZ I ORÇAMENTO POR PROGRAMAS _
02
01
. . .On
03
Pr 41
IN I
R31
R11
R32
R22
IN2
Rn 2
IN3
i
/
Rn j
R lj
/
R22
L
Z11 = /
/
R32
/
Rn 2
R Ij
O
MATRIZ I I I OE ARTICULACÕES PLANO-ORÇAMENTO
A matriz II é a matriz básica do plano anual operativo. A matriz I é o orçamento por programas e a matriz III estabelece correspondência entre os programas orçamentários e as operações do plano. Por isso, a matriz III é a matriz de vinculação do plano com o orçamento. ESQUEMA DE COMPATIBILIZAÇAO ENTRE PLANO E ORÇAMENTO ORÇAMENTO
Pr2 RECURSOS DESTINADOS À PRODUÇÃO TERMINAL RECURSOS NAO DESTINADOS A PROGRAMAS ORÇAMENTÁRIOS
PR 4 RECURS OS DESTINADOS A PRODUÇÃO OPERAÇOES , DE PRODUÇÃO INTERMEDIÁRIA INTERMEDIÁRIA
XXXXXXXXXXXXXXXXXX
xxxxxx z xxxxxxxxx XXXXXXXXXXXXXXXXXX
RECURSOS DESTINA- RECURSOS REQUERIDOS DOS A PRODUÇÃO = PEL AS OPERAÇÕES DO TERMINAL SELECIO- PLANO(Or) NADA (Pr3 )
Onr
OPERA ÇOES QUE NAO REQUEREM RECURSOS ECONÔMICOS PLANO POR OPERAÇÕES
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Política, Planejamento e Governo
Por exemplo, na matriz apresentada a instituição 1 é responsável pelas operações 01 e 03, que exigem os re cursos orç amentários R ll e R31. As duas operações formam o programa orçamentário Pr41, que exige Z14 de recursos orçam entários, de tal form a que na matriz III te m os Z 14 = R l l + R 3 1 . No enta nto , essa m atriz de vinculação é mais complexa do que apare nt a à prime ira vista. O esquema a seguir pro cura exemplificar os espaços de c orres pon dencia e nãocorrespondência entre o plano por operações e orçamento por programas. Existem operações que não requerem recursos econômicos; são, fundamentalmente, ações de regulação, modificações legais e institucionais, etc. Apesar de importantes, não exigem recursos econômicos significativos, de modo a merecer dotações orçamentárias especificas. No esquema, estas dotações são designadas por Onr. Por outro lado, há recursos econômicos do orçamento que não correspondem a operações do plano. Uma parte dos recursos orçamentários não é atribuída a programas (Prl) e, conseqüentemente, a operações (transferências, contribuição a fundos, subsídios, etc.). Alguns deles são dotações que não podem ser imputadas a programas determinados no momento do cálculo orçamentário (provisões para contratos coletivos ou reajustes de salários, etc.), sendo essa uma situação temporária. Já outros não são destinados a programas concretos porque não cons tituem processos de prod ução (serviço da dívida pública, etc.). A área de recursos atribuídos à produção final (Pr2 + Pr3) mostra que nem tudo que é produção final no orçamento corresponde a operações do plano. Com efeito, listar as operações do plano é um ato de seleção que não esgota todas as dotações orçamentárias; por isso, alguns produtos finais do orçam ento não correspondem às operações do plano (fundamentalmente as operações rotineiras de serviços finais). A zona Pr4 referese à produção intermediária que não é diretamente imputável a nenhuma produção final, de modo que não é objeto de tratamento do plano (atividades nãoespecíficas na terminologia do orçamento por programas, como, por exemplo, as dotações aos setores de pessoal, compras, etc.). Assim, a zona Pr4 é um espaço de nãoco incidência en tre plano e orçam ento, em term os de operações.
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
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No enta nto, há algumas dotações à produção interm ediária que podem constituir operações do plano. No esquema, essas dotações corres pondem ao espaço Z. Por exem plo, as operações de re fo rm a organizacional e institucional estão no plano e, por vezes, requerem recursos destinados à produção intermediária, razão pela qual aparecem na zona Pr4; em outros casos, tais operações não requerem recursos econômicos nem afetam a atribuição de recurso s para a prod ução final. Por isso o espaço Z intersecciona Pr4 e Pr3. A compatibilização global entre plano e orçamento exige que se busq ue coerência na zona de intersecção do plano por operações com o orçamento por programas, através da igualdade entre os recursos atri buídos à pro dução final selecionada e os recursos re queridos pelas operações do plano. Daí a complexidade da vinculação plano —orçamento, pois, apesar da estrutura modular precisa do plano e do orçamento, seus respectivos módulos não têm necessariamente uma correspondência biunlvoca; só há um espaço de intersecção entre os dois conjuntos de módulos, que é o espaço P r3 = O r do esquema. Algébricamente, as relações indicadas são as seguintes: Orçamento = Pr1 + Pr2 + Pr3 + Pr4 Plano por operações = Or u Onr
(Or indica os recursos valorados em dinheiro e Onr os recursos não valorados em dinheiro. Para simplificar, supõese que todos os recursos econômicos requeridos pelas operações Or são recursos orçamentários. Evidentemente isto não é real, mas evita complexidades desnecessárias para o objetivo desta exposição.) A intersecção entre os recursos atribuídos pelo orçamento e os recursos atribuídos às operações do plano é: Pr3 = Or
Constatase o caráter seletivo do plano, em contraste com o caráter extensivo do orçam ento. Com efeito, Pr2 é a produç ão final coberta extensivamente pelo orçamento por programas, mas não incluída nas operações selecionadas pelo plano. Todo plano estratégico é um plano seletivo.
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Esse método de vinculação simplifica o problema, pois uma coisa é procurar vincular o plano com o orçamento com base em formas de o rçamento e planejamento já estabelecidas, e outra bem distinta é desenhar um sistema que, pela sua própria estrutura, produza a vinculação plano —orçam ento. Dessa maneira, a vinculação plano —orçamento desaparece como pro blem a metodológico e convertese em outro, de redesenho da concepção de plano anual e de adoção de procedimentos de coordenação institucional entre o órgão central de planejamento e o órgão central de orçamento. Nessa pro posta supõese <]ue o plano anual, na sua parte m odular, é formulado como uma matriz operaçõesinstituições que cumpre com os cinco requisitos já enunciados para a coerência do desenho modular do plano. Essa matriz operaçõesinstituições, trabalhada pelo órgão central de orçamento, constitui uma solução clara e simples para a vinculação do plano com o orçamento. No entanto, tal m éto do exige c]iie se cum pra um requisito a res peito da estrutu ra modular do plano e do orç am ento. Deve existir um a regra geral de desenho da taxonomía modular para que a vinculação seja possíve O senso comum nos diz que a correspondência entre os módulos do plano e os módulos do orçamento sempre será possível se a taxonomía recursiva dos módulos chegar a um certo nível de desagregação. Qualquer problema de articulação entre os módulos do orçamento e do plano poderá ser resolvido caso se obedeça à seguinte regra básica: o submódulo mínimo do plano corresponde a um ou mais submódulos mínimos do orçamento. Como a desagregação dos módulos em submódulos é uma questão de conveniência, as duas estruturas modulares podem ajustarse às necessidades de coordenação do plano com o orçamento. Uma vez adotados, com rigor substantivo e formal, o sistema de orçamento por programas e o plano situacional por módulos, e desde que a estrutura modular cumpra com os cinco requisitos enunciados, o problem a metodológico da vinculação piano —orçamento desaparece e transformase num problem a políticoprático.
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Uma boa articulação entre plano e orçamento lem como ponto de partida a existência de um sistem a de gerência por operações nas unidades organizacionais relevantes do setor público. Quem dirige uma unidade deve organizar sua atividade em termos de produtos, e isso é útil tanto para o orçamento quanto para o plano. () gerente preocupase, então, com o que deve produzir, com a qualidade do produto e com a eficácia e os custos para produzilo. Conseqüentemente, a gerência por operações gera um cálculo dos recursos, dos produtos e dos indicadores de eficiência necessários em cada unidade gerencial. Este cálculo alimenta os órgãos de planejamento e orçamento encarregados de coordenar os planos anuais institucionais e os orçamentos por programas em cada instituição, com a colaboração das equipes técnicas de planejamento e orçamento, a fim de cumprir as diretrizes e métodos exigidos pelo sistema nacional de planejamento. V I N C U L A Ç Ã O 0 0 P L A N O D E O RÇ A M EN TO PROJETO DE AÇÃO 1 \
PROJETO DE AÇÃO 2
PLANO 012
011 Al 1 ORÇAMENTO
\
Sa
Al 2
02 2
021
Al 3
Sb
PRODUTOS TERMINAIS PROGRAMA SUB-PROGRAMA 1 ATIVID ADE A ATIVIDA DE B PROJETO 1 PROJETO 2 OBRAI OBRA 2
NÃO REQUER RECURSOS ECONÔMICOS
ÂM BITO DE VINCU LAÇÃO DO PLANO AN UA L COM 0 OR ÇAME NTO
SUB-PROGRAMA 2 PRODUTOS INTERMEDIÁRIOS ATIVIDADE S COMUNS ATIVIDADES CENTRAIS RECURSOS NÃO DESTI NADOS A PRODUTOS
..
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Política, Planejamento e Governo
Esses planos e orçamentos devem chegar até o nível em que se tomam as decisões operacionais (ministros e chefes de órgãos autônomos). A seguir, plano e orçamento passam aos respectivos órgãos centrais. Enquanto isso, o órgão central de orçamento, em contato prévio com o de planejamento, estabelece a política orçamentária, e os responsáveis pelo planejamento global estabelecem, por sua vez, as diretrizes macroeconômicas do plano anual operativo, conformando uma matriz operaçõesinstituições. Aqui se dá o encontro, ou coordenação, entre as direções de planejamento e orçamento para elaborar um plano anual que, em sua parte operacional e modular, seja consistente com a estrutura modular do orçamento. Esses orçamentos e planos são submetidos ao presidente da República ou conselho de ministros. A vantagem de agir dessa forma é que o órgão máximo pedirá contas por operações aos seus responsáveis.
i.
Sistema de Emergência cm Sala de Situações
Acompan har a realidade a tem po , para pod er atuar a tem po . Este é um princípio simples, embora seja complexo colocálo em prática. Isso é especialmente válido em situações de emergência, quando a realidade muda repentinamente e tendemos a perder o controle do tempo. Nesse casos, o indicado é um a sala de situações. No conceito de sala de situações o menos im portante é a sala; o que importa são os sistemas que para lá convergem e que são manejados em alta velocidade. A idéia de uma sala de situações, sala de comando ou sala de o pe rações não é nova. O que é novo é a função que propomos que ela desem penhe no planejamento estratégico. Até agora, as salas de situações têm uma conotação militar, oriunda do conceito de sala de guerra. Mas as situações de tensão e de perigo de descontrole do tempo não ocorrem apenas no âmbito militar; é o caso de um conflito político grave, de uma situação econômica idem, de um a catástrofe natural, de um a negociação com prazo curto e fixo, de um problema de segurança interna ou de uma crise internacional. Em todas essas circunstâncias é muito importante a rapidez dos processos e a frieza de cálculo para resolver os pro blemas com eficiência e eficácia.
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Em geral, uma sala de situações é um local especialmente preparado para a discussão informada e sistemática, que deve culminar em decisões. As origens dessas salas de comando ou de situações vêm do objetivo de dispor de sistemas de informação em tempo real, ou muito próxim os do re al, capazes de alimentar perm anente m ente os modelos de análise que auxiliam o processo de decisões. E um sistema de su po rte às decisões sob grande pressão de tem po e sob alta tensão situacional. Assim, a sala de situações é geralmente um recinto fechado do qual se eliminam quaisquer possibilidades de perturbação dos participantes, e que dispõe de uma série de conexões com sistemas de informação previamente estabelecidos e funcionando com velocidade de emergência. Esses sistemas de informação podem compreender os quatro níveis já mencionados do SSD. Os fluxos de informação podem estar constituídos por estatísticas básicas, indicadores especialm ente desenhados para certos fins, modelos de análise preparados para verificar hipóteses que possam surgir na discussão, mapas, fotografias, organogramas, disposições legais, etc. A idéia é garantir que um conjunto relevante de informação e de instrumentos de análise esteja imediatam ente disponível na sala de situações. O fluxo de informação é permanente, com intervalos fixos de duração, calculado segundo a natureza do problema que origina o funcionamento da sala. Esses fluxos de informação alimentam permanentemente os equipamentos de computação. As telas desses equipamentos mostram um Quadro sinótico dos indicadores relevantes do problema e qualquer outra forma de representação, fixa ou animada, que permita visualizar o desenvolvimento dos acontecimentos. Naturalmente, esses sistemas requerem um software relativamente complexo, porém ao alcance das capacidades de desenho e programação da maioria dos países latinoamericanos. Na sala de situações, os participantes integram suas discussões e deliberações com o desenvolvimento visual dos modelos, que representam o curso dos acontecimentos no âmbito do problema estudado. Montar uma sala de situações é um trabalho complexo, mas com grande reto rn o em term os de eficiência. Leva tem po adequar a inform ação e os instrumentos de análise às necessidades de discussão de uma
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Política, Planejamento e Governo
direção superior do plano. Devido à proliferação de charlatões oferecendo salas de situações, é preciso ser prudente e exigente nesse trabalho. Procurando ser realista e considerando os graus variados —geralm en te altos de desorganização nos países latinoam ericanos, a sala de situações destinase a problemas selecionados, de grande importância e que possam gerar situações graves de tensão. Só em tais casos justifica se o custo de acompanhar um processo em tempo real, ou com atraso máx imo calculado de forma m uito exigente. Como as situações de tensão são exceções, surge o problema de capacidade ociosa cara. Daí a idéia de aproveitar o hábito da discussão e deliberação em sala de situações (com suas instalações e sistemas) para elevar a qualidade do processo normal de tomada de decisões. Em outras palavras, a sala de situações poderia operar nos três modos de direção já mencionados: os mo dos 1 e II, que co rrespon dem a situações norm ais, e o mo do III —situações de emergência. Assim, seria estendido o uso da sala de situações, e o manejo de fluxos de informação em tem po real seria a exceção. O sistema de sala de situações serviria também para elevar a capacidade de diálogo sistemático entre as decisões de curto prazo e a direção do plano de médio prazo. Apesar dessa discussão periódica na sala de situações também exigir informação oportuna e instrumentos eficazes de análise, eles não correspondem às exigências de informação em tempo real. Todo o sistema de direção ganharia em velocidade e qualidade. Velocidade na pré.avaliação significa bons modelos, excelentes sistemas de computação e sistema de informação oportunos. O ideal é existir uma préavaliação contínua das alternativas propostas nos gabinetes setoriais ou no conselho de ministros. Isto será possível caso se esta beleça uma disciplina de govern o em que a sala de situações, em sua forma normal ou de emergência, seja o centro nevrálgico de tomada de decisões e de controle das contas dos ministros. Seria preciso, também, “desrotinizar” esses organismos, que, por vezes, tendem a evitar a discussão dos problemas centrais e decisivos para o cumprimento do programa de governo.
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Já a velocidade de cálculo na avaliação a poste rio ri significa destreza dos analistas e informação no momento oportuno, para reinterpretar os indicadores a cada mudança de situação. Significa também capacidade de manter em dia o arco direcional do plano; ele servirá como referencia atualizada do futuro ao se avaliar a situação presente. Para ente nd er como opera urna sala de situações, imaginemos a sala de controle do Metrô. Ali, um pequeno grupo de pessoas acompanha o fluxo dos trens num monitor, ou num Quadro de fluxos simulados. Eles recebem informação em tempo real; não há praticamente atraso entre o movim ento dos trens e a respectiva imagem na sala de controle. A informação visual é usada para tom ar decisões diante de qu alquer emergência, pois a equipe de controle tem permanentemente a visão de conjunto do movimento de todos os trens. Além disso é provável que, para verificar algum pro blema num trem particular, a sala possa fazer uma aproximação detalhada, e ver o que se passa ali com certa precisão. Em todo caso, uma sala de controle ou uma sala de operações lida com problemas operacionais, previsíveis, re petitivos e, por vezes, semies truturados. Para atendêlos existem manuais, normas e procedimentos de ação prev iamente estabelecidos. Por isso, essa sala de contro le é um a versão muito simplificada de uma sala de situações. Obviamente, os sistemas sociais criativos não podem ser acompanhados visualmente, porque são mais complexos e porque muitas coisas imprevisíveis e inimagináveis ocorrem sob sua superfície visível. São necessários sensores, como numa sala de cirurgia. Nela, o cirurgião decide e atua, mas, ao mesmo tempo, acompanha em tempo real as reações do paciente através de indicadores de pressão, etc. Nesse caso, tampouco é possível um manual de respostas para todos os problemas que se podem apresentar, e nem todas as respostas serão de consenso. No nosso caso, o conceito de informação é mais variado e está su jeito a interp retações mais complexas. Mas o pro blem a da informação oportuna é o mesmo, ainda que, em muitos casos, não haja tempo real no sentido estrito . Podemos aceitar um atraso calculado. O atraso máximo é em função do tempo e do custo de reação exigidos pelas variáveis do sistema para corrigir com eficácia as tendências indesejáveis.
Política, Planejamento e Governo
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Em síntese, devem os realizar as seguintes atividades: i.
desenvolver capacidade de conh ecer a realidade con creta em cada situação, bem como as suas tendências, mesmo que a situação mude com grande rapidez e que estejamos com os nervos à flor da pele; esse é um prob lem a de informação, capacidade de análise, capacidade de antecipação das tendências si tuacionais e frieza;
ii.
fazer um cálculo op ortun o de préavaliação das operações a efetuar na situação, mediante técnicas adequadas de simulação (desenho e estratégias);
iii.
fazer um cálculo de avaliação a posterio ri, usando grande variedade de indicadores do grau de cum prim ento das operações e de seus efeitos sobre a situação (eficácia direcional do plano);
iv.
imp edir que a eno rm e variedade de informação recolhida nos confun da e anule nossa capacidade de análise;
v.
aproveitar a centralização da análise e a informação de síntese para examinar as pro postas e seus re sultados, a partir das diferentes perspectivas em conflito; o político versus o econômico, o curto prazo versus o período de governo, etc.
As funções essenciais da sala de situações são as mesmas do plane jam ento na conju ntu ra , mas co ncen tradas em áreas pro blemáticas e com tecnologias apropriadas para esfriar o ambiente de tomada de decisões, pro cessar inform ação e sistematizar as deliberações a um a velocidade co eren te com o ritm o acelerado da mudança situacional. Sob este ponto de vista, a sala de situações é um sistema de tratamento especial de problemas de alto valor que se convertem em nós de alta tensã o situacional. Isso exige que haja um “filtro negativo” na entrada da sala de situações da direção superior, para impedir a chegada de questões que podem ser resolvidas nos níveis inferiores, bem como um “filtro positivo”, para im pedir que uma decisão re levante seja desviada para canais não centrais ou fique estagnada em níveis inferiores.
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Assim, a sala de situações é um passo obrigatório para certos pro blemas e decisões; esses problemas devem ser, portanto, de núm ero reduzido, e merecerão o tratamento multidimensional e central característico da análise em sala de situações. Do ponto de vista físico, a sala de situações é um sistema de três salas que interag em : i. ii.
iii.
a sala D, ou sala de decisões, reservada à discussão em nível superior e à última decisão do nível correspondente; a sala C, ou sala de comando, centro que controla o sistema, alimentando e apoiando o funcionamento da máquina de análise e decisões; é o centro de contato com o sistema normal de supo rte p ara as decisões; a sala T, ou sala de trabalho, onde está a informação acumulada, a capacidade de processamento e a capacidade de análise. Ela pode operar precedendo a sala D, preparando uma sessão dela ou paralelo a ela, apoiando instantaneamente o processo de discussão e decisão. A sala T não termina seu trabalho enquanto houver tensão situacional.
A eficácia do funcionamento do sistema de salas dependerá: i.
da qualidade do sistema de sup orte para as decisões;
ii.
da capacidade das equipes técnicas para modelar a mudança situacional ou analisar problemas específicos desta mudança;
iii. da conexão da sala de situações com as unidades do gabinete de planejamento e de todo o sistema de planejamento e direção; iv. da crescente capacidade de aprendizagem da equipe da sala T, à medida que se implan ta o sistema e se trabalha com ele; v.
do sentido prático de seu desenho em relação ao estilo dom inante de governo.
Um p roblem a fundamental na sala de situações, e no SSD em geral, é a oportunidade da informação. Existe uma margem de tempo de atraso máximo p erm itido, que condiciona toda a eficácia do sistema.
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Política, Planejamento e Governo
Como a situação se altera com rapidez, a sala de situações necessita de informação rápida. Sobre este po nto p odem os transcrever o seguinte texto de Stafford Beer, um pioneiro no desenho de sala de situações (Stafford Beer, Platform for Change, John Wiley and Sons, 1975, p. 429): Estamos familiarizados com a idéia de que o m ovim ento econômico desenvolve-se em ciclos. Conseqüentemente, a informação atrasada não é apenas “tardia”; ela é pre cisam ente incorreta, po is representa uma tendência cíclica já superada; isto, porém, não é reconhecido.
No nosso exem plo , a inform ação chega à sala T com um tem po x de atraso. A dimensão do atraso faz com que a tendência recessiva verificada no período tO —>t l seja conhecida no períod o t2 , quando os fatos já m ostram uma tendência expansiva. Como a decisão para com bate r a recessão leva algum tempo, a medida antirecessiva será adotada no período t2 —>t 3 , isto é, em plen o auge da expansão. Com o conseqüência, o sinal de alarme emitido pelo sistema de informação em t2 (quando a recessão chega ao limite do perigo) conduzirá a uma política que reforçará, em vez de corrigir, as tendências inadequadas. Assim, em vez de resolver o problema podemos ampliálo, devido ao atraso da informação. ATRASO QUE INVALIDE A INFORMAÇÃO (TOMADO DE S.BEER)
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A informação atrasada só é compatível com o sistema burocrático de planejamento normativo, que escreve um livroplano onde o tempo é medido em anos. Se quisermos um sistema adaptado à exigência do conjunto no dia a dia, a serviço da tomada permanente de decisões em curto prazo, a única alternativa é um plano de informação, uma máquina de informação previam ente desenhada para operar em tem po eficaz.
j.
0 Dirigente Cercado e sua Agenda
Conduzse conforme os temas de uma agenda. O tempo da agenda é o uso do tempo do dirigente. Este é um princípio muito elementar, e freqüentemente violado nas práticas de governo. O dirigente não pode escapar da agenda, porque seu tempo é muito escasso. A agenda organiza o trabalho pessoal do dirigente, e este conforma sua agenda em função do que admite e como valora os problemas e oportunida des que sua inserção situacional p erm ite reconhecer. Por conseguinte, é muito importante o acesso do dirigente à realidade. Tal acesso, porém, não pode ser direto. Ele é intermediado pelo seu sistema de comunicação, um pequeno número de pessoas que lhe dizem como é a realidade. Assim, o dirigente valora os problemas e as opo rtunidad es com base, principalm ente, nos canais de o ,, n uni cação que utiliza para conhecer a realidade; ele conhece sua situação por via indireta. Todo homem tem à sua volta um cerco que lhe impede a visão de certas realidades em favor de outras. Essa situação do homem é semelhante ao facho de luz de uma lanterna: é um espaço de múltiplas possibilidades e, ao mesmo tempo, uma cortina que impede a visão e divide o mundo. O dirigente vive um mundo mais amplo, mas tem à sua volta um cerco mais fechado e menos impenetrável. Isso ocorre por várias razões. Primeiro, o dirigente tem necessidade do cerco; é uma necessidade psicológica funcional, tendo em vista sua autovalorização. O dirigente necessita gratificação e proteção para exaltar seu ego; precisa de sinais de conformidade, e procura se afastar dos sinais de inconformidade. Por isso, quer se rodear de equipes que o gratifiquem e protejam do mundo que não quer ver. O dirigente demanda um cerco.
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Política , Planejamento e Governo
Além disso, há uma razão de oferta. Por ser dirigente, ele recebe muitas ofertas de proteção e gratificação, inclusive aquelas já estruturadas, relacionadas ao formalismo e à segurança do cargo. A terceira razão é a inibição dos outros para tentar ultrapassar a cortina pro teto ra que imp ede o acesso ao dirigente. Assim, o dirigente é um homem solitário, conectado à realidade por um núm ero mínim o de canais de tip o m uito especial, pois seus ocu pantes precisam obte r m éritos perante o receptor da inform ação. Os fatos e as situações alteramse, mas os canais de comunicação perpetuamse e se reforçam. Conseqüentemente, toda a realidade chega ao dirigente através de um filtro constante, que produz uma distorção monótona. Essa “cortina” burocrática e ideológica assemelhase a uma cortina de ruído, que distorce as entradas e saídas de informação entre o dirigente e a realidade. Essa cortina de ruído tem muita importância, porque a análise da situação que a direção do governo recebe é algo distinto da avaliação situacional gerada pelo sistema. Por sua vez, as decisões do governo são deformadas ao ultrapassarem a cortina. Isso significa que a cortina de ruído faz uma espécie de tradução da avaliação situacional, e também uma tradução das decisões. Nesse sentido, o sistema de suporte para as decisões e o sistema da sala de situações procuram colocar seus sinais de atenção e alarme do outro lado da cortina de ruído, dentro do sistema de direção superior do governo. Esses sistemas procuram ser canais cuja valoração é impessoal. As propostas de operações que resultam da préavaliação de opções devem ultrapassar uma cortina de ruído muito densa e regressar, mediante u m a tradução distorcida, com o decisões tomadas. No período de deliberação (que te rm in a com a tomada de decisões) adquirem valor máximo os escassos canais de comunicação que ultrapassam a cortina de ruído que isola a direção do governo de seu próprio sistema de planejam ento e da realidade social em geral. E importante reconhecer que existe um sistema de geração de pro postas de ação e omissão, com preendendo, pelo m enos, os seguintes agentes: i.
o sistema formal de planejamento do governo;
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ii.
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os assessores e principais conselheiros do dirig ente;
iii. os dirigen tes das principais forças sociais e partidos políticos; iv. as personalidades com acesso ao interior da cortina de ruído ; v.
os m inistros e funcionários influentes, com propostas distintas das do aparelho formal de planejamento.
Esses agentes ocupam os canais de comunicação com a direção su perio r do govern o, e fazem com que o valor das pro postas de decisão não dependa apenas dos estudos e análises que as fundamentam, mas principalm ente do canal de comunicação usado pela pro posta. O valor de uma proposta (VP) é igual ao produto de seu valor por eficácia (VPE) pelo valor do canal de comunicação utilizado (VCC). Assim, se o canal de comunicação valer zero, a propo sta valerá zero para o dirigente, qualquer que seja seu valor científico, político, técnico ou organizacional. VP = VPE x VCC
O valor do VCC é a valoração do dirigente sobre as pontes de comunicação que cruzam o cerco que impede seu acesso direto à realidade. O cerco do governante está relacionado à sua agenda. Ela desem penha um papel muito im porta nte , porq ue é produto da cortina de ru ído, ao mesm o tem po que a preserva e a reforça. As agendas diárias do dirigente são como uma série de radiografias consecutivas, que revelam: i.
a estru tura de repartição e uso de seu tem po entre ações que o conduzem e ações com as quais ele conduz;
ii.
o espaço situacional que delim ita os prob lem as que ele aten de, ou seja, seu código de surdez e seu código de escuta;
iii. sua capacidade variável de decisão, con form e os canais pelos quais recebe as propostas de solução. Se a agenda persiste num mesmo tipo de temas e problemas, ela reforçará a perspectiva situacional anterior do dirigente, estabilizará va
55 0
Política, Planejamento e Governo
loração dos canais de comunicação que ocupam sua agenda e favorecerá as propostas que utilizam os canais mais valorizados. Por isso, os subsistemas formais de direção criam canais de comunicação privilegiados, e de peso proporcional à capacidade de análise do sistema de planejamento. Assim é limitada a improvisação pessoal, bem como o valor conjuntural inexplicável de algumas propostas de decisão mal preparadas. Quanto mais informal e assistemático for o sistema de direção, maior será o peso das decisões pessoais e improvisadas. Quanto maior a formalidade, a sistematicidade e o suporte técnico do sistema de direção, menor o valor dos canais pessoais e maior o dos canais institucionais. Mas ambos, afinal, são ocupados por pessoas.
k.
0 Plano só se Completa na Ação
O plano como cálculo prévio está semp re incom pleto, até que chegue o momento da ação. Assim, a mediação entre o conhecimento e a ação resolvese, em última instância, no próprio momento da prática. Essa resolução é, predominantemente, um cálculo prévio, já realizado ao qual chamamos plano, mas também é uma improvisação de momento, direcionada e condicionada pelo plano.
M1
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/s M 2
\ /
— > M4 < r-
M3 conhecimento
ação
Dessa maneira, o plano não é completamente oposto à improvisação. Ele só se opõe à improvisação pura, estruturada como um desvio autônomo do plano. A improvisação é tão necessária quanto inevitável. É necessária porque só ela estimula e potencializa a criatividade e a imaginação a serviço do plano no momento. Ninguém pode calcular tudo,
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com todos os detalhes e precisão. Limitarse ao cálculo previo, sem dar espaço ao cálculo e ajuste do momento (que só se conhece em profundidade quando o presente exige a ação) significaria impor uma camisa deforça e uma rigidez ao cálculo prévio, cuja conseqüência seria a ineficácia. Mas a improvisação é também inevitável. Está na essência do homem intuir o custo crescente e o benefício decrescente do cálculo prévio dos detalhes, e rebelarse contra a rigidez do plano total. A liberdade do homem exige um espaço de ação sem cálculo prévio. O plane jam ento , já o dissemos, é um instrum ento de liberdade e, como tal, exige também a liberdade de não calcular tudo com antecedência. Planejar é apenas traçar um caminho, definir os marcos principais: não implica, n em pod e implicar, cálculo prévio das particularidades e da totalidade situacional. A condução prática de uma estratégia exige necessariamente uma dose subordinada de improvisação, es pontaneidade e cálculo do m om ento . (...) A improvisação, a esp on taneidade e o cálculo imediatista não são um desvio do plano: são um complemento indispensável e natural de sua execução prática. (Carlos Matus, Planejamento de Situações, Fundo de Cultura Econômica, México, 1980, p. 353.)
A improvisação direcionada é a liberdade de ação dos atores sociais, e constitui um meio de ajuste entre o cálculo geral prévio e a ação precisa do momento. A ação resolve todos os detalhes e precisões que o cálculo prévio não pode abordar. A improvisação também promove uma retificação do cálculo. O alfaiate mede, corta e costura com base num cálculo prévio, mas ajusta tudo no momento da prova. O técnico e os operários que constroem um edifício ajustam e retificam os planos do engenheiro no momento da construção. No combate, o comandante improvisa e retifica seus próprios planos e os do estadomaior. Nenhum deles, porém, faz da improvisação ou do cálculo do momento um outro plano, com outros objetivos, baseado em meios distintos dos calculados. A improvisação direcionada é parte im portante do planejamento no dia a dia: ela completa o plano no momento da ação e manifesta a auto retificação do planejador no m om ento da prática.
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Política, Planejamento e Governo
O cálculo é incessante e permanente, porque a situação muda constantemente. A improvisação direcionada acompanha a dinâmica do plano do m om ento táticooperacional, para term inar de resolver os problemas da mediação entre o conhecimento e a ação. Quais os objetivos da mediação entre conhecimento e ação? Tratase, essencialmente, de: i.
traduz ir o conhecim ento do plano em propostas de ação para hoje, a fim de evitar a improvisação pura do m om ento;
ii.
com pletar o cálculo previo do plano, direcionando e condicionando a improvisação do momento para que ela constitua correção e criação em torno do plano (ajuste exante);
iii. garantir a correção dos desvios en tre resultado s calculados e resultados reais (ajuste ex-post ) , a fim de redirecionar permanentem ente a ação para a situaçãoobjetivo perseguida; iv. estrutura r a agenda do dirigente. O p rimeiro objetivo é alcançado através da seleção dos m ódulos do plano a serem usados na situação, criando assim um eixo direcional em torn o do qual se constrói e se tece a improvisação. O segundo objetivo perm ite articular o cálculo sistemático e previo com a improvisação do momento, para que os atores sociais possam conceber, a cada instante, os meios de ajuste entre o cálculo prévio e a realidade concreta naquele m om ento. O terceiro objetivo reconhece a impossibilidade do cálculo prévio preciso; por isso estabelece a necessidade de revisálo constantem ente, de acordo com as circunstâncias. Podemos nos equivocar na avaliação da situação, as características e causas dos problemas podem alterarse, os resultados atribuídos às operações do plano podem ser inferiores ou su periores aos verificados no m om ento presente, e podemos aprender com as circunstâncias, fazendo diminuir o espaço de nossa cegueira si tuacional. O plano não consiste em acertar num só cálculo, mas em conduzir acertando com as correções. Isso só pode ser feito no próprio momento da ação e da avaliação dos seus resultados. O quarto objetivo consistem em levar as prioridades do plano à agenda do dirigente, pois, do contrário, a tomada de decisões se daría
Os Quatro Momentos do Processo de Planejamento Situacional
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num espaço de conteúdo distinto do conteúdo das propostas do plano, gerando a distração tática. A execução do plano não pode ser concebida como uma máquina sincronizada, governada por um interruptor que a coloca em funcionamento conforme nossa vontade. Em todo sistema social criativo onde interagem eu e o outro, num contexto de forças históricas que condicionam o movimento e as tendências situacionais, o plano é, em parte, ação e movimento, e em parte espera da oportunidade de ação. O conhecimento convertido em cálculo estratégico e tático não se transforma automatica e necessariamente em ação. É necessário liderança e condução para que possamos influir na situação e para que o movimento de nossa ação mude o curso do movimento situacional, ou de um arco de conjuntura que tentamos fazer coincidir com nossos planos imediatos. Nesse movimento, porém, o plano não entra em execução na sua totalidade. Alguns de nossos movimentos são opções que não dependem das oportunidades oferecidas pela dinâmica situacional; outros, pelo contrário, devem esperar pela oportunidade, para poderem ser operações em situação. Sob este ponto de vista, convém distinguir entre operações dominadas p or opções e operações dominadas por variantes. 01 =
0o (OP ÇÕES, varian tes)
02 =
0v (opções, VAR IANTES )
Na operação dominad a pela opção, a necessidade, possibilidade e eficácia da operação podem adequarse a uma grande variedade de situações, embora não a todas. Mas a enorme variedade de situações em que a operação 01 é possível e eficaz faz com que ela possa ser executada à vontade, sem restrições de tempo de espera. Já a operação dominada por variantes não pode ser executada à vontade ao longo do tempo, porque não seria necessária, eficaz ou possível. A operação 02 só pode ser executada oportunamente. Ela exige uma situação oportuna, propícia ou favorável, para ser possível e eficaz. O plano p ode m eram ente considerar a espera de tal situação ou conside
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Política, Planejamento e Governo
rar operações para criála. Tudo depende da situação, se é desejada ou indesejada. Por estas razões, o ritmo do plano é sempre uma combinação de espera e ação. Em essência, a tática é a arte de combinar a espera e a ação no enfrentamento do outro, por intermédio de um arco de con ju ntura. OPERAÇÕES: AÇÃO E ESPERA
OPERAÇÕES TIPO DE OPERAÇÕES PROBLEMAS
ESTRUTURADOS
OPÇÕES DOMINANTES
VARIANTES DOMINANTES
Execuções à vontade
Execução oportuna
▼
T
▲
▲
SEMI-ESTRUTURADOS
NÃO-ESTRUTURADOS
Experimento à vontade
Experimento oportuno
Ao relacionar a classificação anterior com a classificação dos pro blemas em estrutu rados, semiestruturados e nãoestrutu rados, podemos compreender a variedade de ritmo e complexidade na execução do plano. Haverá operações que poderem os executar à vontade, operações que poderemos executar em certas oportunidades, experimentos que poderem os realizar à vontade e experim entos que só poderemos executar em certas oportunidades. Nesta classificação, consideramos que uma
PARTE IV____________ CONCLUSÕES E GLOSSÁRIO DE CONCEITOS
1 Conclusões Finais
/ k uem g overna deve fazêlo dentro dos limites das capacidades de 1 1 seu capital intelectual. Esse capital é, em parte, experiência e, em H parte, formação teórica, filosófica e ideológica. » Esses dois aspectos do capital intelectual não são ind epende ntes. A riqueza da experiência que se acumula depende da formação teórica do dirigente. Se essa formação é pobre, o homem acumula muita experiência pobre. A experiência será rica se sua formação teórica for ampla. Por conseguinte, se a formação intelectual congelase, a experiência desvalorizase. Os políticos e os técnicos envelhecem quando passam a viver de sua experiência. A formação intelectual do dirigente depende apenas em parte do ensino acadêmico formal. A formação intelectual também se adquire acumulando capacidade para superar o anedótico e navegar no mundo das abstrações. E uma capacidade para generalizar, superar a realidade como situação concreta e criar com base em novas possibilidades, projetando para outros âmbitos e outros tempos o conhecimento adquirido na prática, nos livros e nas discussões. O homem que na prática encontra apenas um espaço repetitivo para aplicar suas experiências deixa de ampliar sua fronteira intelectual, podendo chegar no máximo a ser um bom ad min istrador de diretivas alheias. O verdad eiro dirig ente, pelo contrário, encontra na aridez da sua prática um estímulo para interrogarse sobre suas convicções. Esse dirigente não envelhece.
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Política, Planejamento e Governo
Um dirigente é uma fenoestrutura como qualquer outra, ou seja, é uma acumulação de capacidade de produção. O que produz o dirigente? Direção de organizações, de partidos políticos, de empresas, de países, etc. Com o produz? Utilizando seu capital acum ulado e acumulando mais capital. O capital do dirigente é uma combinação de capital político e capital intelectual; de poder e de capacidade para saber usar o poder de condução da mudança situacional. Seu capital define seu espaço de capacidade de ação. Seu capital intelectual delimita o espaço de suas intenções e necessidades, bem como a eficácia do uso de suas capacidades. O capital político é capacidade de crescer ante seus rivais, enquanto o capital intelectual é capacidade de orientar e direcionar o uso de suas capacidades, de reconhecer necessidades nãoaparentes e de desenvolver novas capacidades. O dirigente poderá ver com maior ou menor profundidade aquilo que é necessário e o que deve ser feito pra conseguilo. Isso depende de seu capital intelectual, que impõe um teto para pensar e, conseqüentemente, para utilizar suas capacidades políticas numa proporção e numa direção adequadas. Assim, os dirigentes têm tetos intelectuais distintos. N aturalm ente, to do líder está cego para suas limitações, especialm ente quando se trata do seu capital intelectual. A autoestima é uma característica comum a todos os dirigentes. O dirigente considera que seu teto é o maior possível, e adequado às circunstâncias. A acumulação de capital político consome muito tempo, é muito absorvente e estafante, fazendo com que, freqüentemente, o capital político acum ulese em detrim ento do capital intelectual. A destreza e perseverança para acumular capital político são recursos muito escassos, e sua posse é altamente gratificante. O poder chama mais poder. Assim, a dinâmica de desenvolvimento do dirigente bemsucedido produz uma mudança de peso na relação entre capital político e capital intelectual. Se este último era inicialmente escasso, o desenvolvimento do dirigente gera um desequilíbrio perigoso; promove dirigentes capazes de ganhar eleições e progredir nas estruturas de poder, mas pouco capazes de conduzir e solucionar os problemas terminais do sistema social. Mais ainda, a descapitalização intelectual do dirigente não pode tomar consciência dessa necessidade e reconhecêla como uma demanda
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da realidade. Os dirigentes medíocres tendem a estar rodeados de equi pes medíocres. A formação intelectual é, assim, o capital mais apreciado de um dirigente. No entanto, será um capital inutilizável caso não se desenvolva com o capital político. Um acadêmico e político que marcou de forma polêmica sua ação na política exterior dos Estados Unidos na América Latina, mas sem dúvida um homem de boa formação no campo que estudamos, diz com m uita razão: Todo estadistã é, em parte, prisioneiro da necessidade, enfrenta uni ambiente que ele não criou e está condicionado por uma história pessoal que já não pode mais mudar. É uma ilusão achar que os di rigentes ganham em profundidade à medida que ganham em ex pe riência. Como já disse, as convicções que os líderes adquiriram an tes de chegar aos altos cargos são o capital intelectual que eles c on sumirão enquanto estiverem exercendo essas funções. Os líderes têm pouc o temp o para refletir. Eles estão envolvidos numa batalha interminável, na qual o urgente freqüente m ente se im põe ao im portante. A vida pública de todo político é uma luta contínua para resgatar um elemento de opção da pressão das circunstâncias. (Henry Kissinger, Mis Memórias, Editorial Adântida, 1979, p. 51.)
Com razão, temos nos preocupado até agora com a formação do capital de nossos países, mas refletimos pouco sobre a debilidade do capital intelectual de nossos governantes e dirigentes, assim como das organizações políticas. No entanto, os programas e planos de governo de nossos países supõem que esses dirigentes têm capacidade para nos conduzir e encontrar os caminhos para superar o subdesenvolvimento. Não duvidamos de que tenham vontade de nos govern ar e não apenas de administrar as realidades. Mas a vontade não basta. Tampouco basta a m era experiência na luta política. E difícil exagerar a importância da necessidade de elevar nossas ca pacidades de govern o. Ela é nossa principal limitação e nossa tarefa mais importante. E essa limitação que impõe um teto a todas as nossas possibilidades. A principal resistência cultural para mudar o estilo de governo está nas lideranças políticas tradicionais.
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Política, Planejamento e Governo
O desenvolvimento de sistemas de gestão estratégica potentes é urna par te do problema. A ou tra consiste em form ar Quadros dirigentes ñas ciencias e técnicas de governo. Entre estas, o planejamento da ação humana é a mais importante. Para isso, devemos superar os preconceitos e as limitações do planejamento normativo. Todo este livro po de ser sintetizado nessas quatro afirmações: Primeira: nossas capacidades de direção estão cada vez mais afastadas das necessidades advindas da complexidade de nossos sistemas sociais. Nossas democracias, jovens e débeis, correm o risco de naufragar num m ar de promessas fáceis e nãocum pridas, e de problemas crescen tes e desgastantes. Devemos levar à sério a tarefa de nos prepararmos para governar. Devemos exigir de nossos dirigentes políticos capacidades bem superiores. Os políticos devem duvidar de sua experiência e nós devemos duvidar de nossa ciência. Só assim atingiremos um nível superior de cooperação e de eficácia. O planejamento pode ser nosso instrum ento de convergência e superação. Segunda: as falhas do planejamento tradicional não se devem à sua prática deficiente, mas aos seus fundamentos técnicom etodológicos inadequados para tratar de sistemas complexos, em que abundam pro blem as quaseestruturados. Devem os repensar o planejamento como o centro de um sistema de gestão estratégica que apóia a condução da mudança situacional. Terceira: o objetivo do planejamento não é o futuro, mas sim o pre sente. O cálculo sobre o fu tu ro é apenas um meio para dar racionalidade ao cálculo sobre as decisões presentes. Ambos os cálculos completamse. O cálculo sobre o presente é dominante no plano da ação concreta que muda as situações. Poderemos, dessa forma, resgatar o sentido prático do planejamento. Quarta: o planejamento econômico é inseparável do planejamento político, na teoria e na prática. Os raros casos de uma prática correta do planejamento econômico, onde ele supera em parte, e de fato, suas limitações, devemse ao fato dele ter sido realizado com sentido político, sem aterse às restrições da teoria normativa. Essas boas práticas, porém , são ocasionais, m uito parciais e com resu ltados insatisfatórios quanto à eficácia de governo. Um caminho para reformular em teoria — e modernizar na prática —os sistemas tradicionais de p lanejamento con
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siste em começar por formalizar e enriquecer as boas práticas de governo. A crítica ao planejamento econômico vigente referese a um pressuposto básico que sustenta toda a teoria do planejamento normativo. Ele diz que “o ator que planeia está sobre a realidade ou fora da realidade planejada, e, conseqüentem ente, não coexiste nessa realidade com outros atores que também planejam”. A partir deste pressuposto, o planejamento normativo distingue artificialmente o sujeito que planeja do objeto planejado, restringese a um diagnóstico único como explicação da realidade, reduz o processo social a “com po rtam entos” rep resentad os nos “modelos analíticos”, limitase ao econômico, identifica o planejamento com o desenho do deve ser, ignora a incerteza, monopoliza o planejamento para o Estado e produz métodos com final fechado, nos quais a política econômica é auto suficiente para alcançar os objetivos predeterm inad os do plano. Se, pelo contrário, adotamos uma hipótese mais realista, que situa o ator que planeja dentro da realidade, e admitimos que ele coexiste ali com outros atores que também planejam, já não é possível distinguir claramente o sujeito do objeto do planejamento, porque o sujeito está no objeto e esse, por sua vez, contém outros atores que também plane jam. Aqui aparece o planejamento em situações de contradição, luta e conflito, onde o diagnóstico já não pode ser único e objetivo, mas uma mera explicação situacional. Ao reconhecermos o conflito surge, de imediato, um tipo de conduta nãorotineira baseada no juízo estratégico, ou cálculo interativo, irredutível a comportamentos sociais. Como conseqüência, já não é possível explicar a realidade conflitante usando apenas modelos analíticos. E preciso agora modelos de sim ulação humana, cuja origem rem ota é o ensaio, o treinamento e o jogo de guerra (Kriegspiel). Mas a aplicação da simulação humana nas ciências sociais é recente e não é amplamente reconhecida como um método para conhecer a realidade. Tampouco é uma técnica com boa fundamentação teórica. Nesse conte xto de conflitos é impossível identificar o planejamento como desenho normativo, porque, para executar seu plano, cada ator deve vencer a resistência dos outros atores e, portanto, o cálculo do
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planejador é algo mais que o de um desenhista do fu turo : deve ser o cálculo de um estrategista. Aparece, assim, o problema estratégicotático da viabilidade. Na teoria do plano é imprescindível considerar que os fatores políticos de poder são variáveis que influem e sofrem influência de todos os outros elementos considerados. O plano do pode ser está, dessa forma, articulado com a normativa do deve ser. Mas o problem a estratégicotático da viabilidade é tão sensível às mudanças da situação que o plano, para ser eficaz, deve se estender também ao cálculo imediato que precede e preside a ação na conjuntura. É aqui que se resgata o presente, surgindo o plano operacional da ação ou da vontade e oportunidade de fazer. N atu ralm ente, no planejamento situacional desaparece a certeza e o monopólio do Estado no planejamento; todos os atores sociais plane jam em situações de poder compartilhado. Se o planejamento confundese com o cálculo totalizante do processo de governo na ação concreta, essa ação deve resolver, então, quatro grandes questões: i.
O prim eiro problem a consiste em conhecer a realidade a pa rtir de várias perspectivas siluacionais, para poder responder às perguntas: como é a realidade para mim? Como é a realidade para o outro? Quais são minhas motivações, capacidades e necessidades na realidade em que estou inserido? Quais são as motivações, capacidades e necessidades do outro na realidade em que ele está inserido? Em síntese: qual é a minha situação? ii. O segundo problem a tem caráter norm ativo e referese ao de senho da direcionalidade para responder às perguntas: para aonde eu quero ir? O que devo fazer para isso? Qual a situa çãoobjetivo que desejo? iii. O terceiro pro blem a é de viabilidade, para enfrentar os desafios representados pelas restrições da realidade e pelos obstáculos colocados pelo outro, que se opõe ao meu plano. iv. O quarto pro blem a é de operacionalidade, e referese à per gunta: o que devo e posso fazer hoje, e todos os dias quando forem hoje, para que eu avance em direção à minha situação objetivo?
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Com base nesses fundamentos teóricos, é possível respaldar a crítica ao planejamento tradicional. Rejeitamos, por conseguinte, a idéia de identificar o planejamento com desenho normativo e de considerar o político como um m ero marco re stritivo do econômico. Pensamos que todo plano tem oponentes, o que nos obriga a falar de um planejamento político que compreende o econômico; conseqüentemente, rejeitamos a idéia de que o planejamento é uma técnica e uma técnica neutra; rejeitamos também o preconceito de considerar a teoria econômica como a ciência básica do planejamento. Pensamos que existem muitos recursos escassos que não são recursos econômicos, como o poder, a inform ação e as capacidades organizacionais. Afirm am os que existem múltiplos critérios de eficácia, irredutíveis uns a outros e cuja hierarquia não é clara nem estável nas diferentes situações. Conseqüentemente, a eficácia econômica concorre com outros critérios de eficácia na tomada de decisões dos diversos atores sociais. Não existe uma associação biunívoca entre Estado e planejamento. Na realidade, o Estado é apenas o locus a partir do qual se planeja, mas não é o único. O planejamento tradicional é importante para servir aos objetivos da mudança social, porque não tem teoria nem categorias para tratar o pro blem a do surg im ento, mudança e efeitos das estrutu ra s mais profundas, ou seja, das genoestruturas. Tampouco pode lidar com problemas típicos de sistemas complexos. Por último , p odese acusar o planejamento no rmativo de insinceridade, porque ele oculta a ambigüidade inconsistente de sua resposta à perg unta: caso se faça tu do o que está anunciado no planolivro, os ob jetivos serão alcançados? Mais ainda, a causa principal do nãocumpri mento dos objetivos não está no nãocumprirnento dos planos, mas no fato de que eles não conduzem aos objetivos que declaram. Para fundamentar rigorosamente essas afirmações podemos confrontar os conceitos, categorias e critérios do planejamento situacional com os do planejamento no rmativo. Em primeiro lugar, podemos confrontar o cálculo interativo ou o juízo estratégico, no contexto conflituoso do planejamento situacional, com o cálculo unilateral e dirigista do planejamento normativo, pelo qual um sujeito procura controlar um objetivo planejado.
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Em segundo lugar, podemos opor o cálculo que precede e preside a ação na conjuntura, próprio do planejamento de situações, ao cálculo de médio e longo prazo do planejamento normativo, cujo utilidade está submetida à do primeiro. Em terceiro lugar, podemos confrontar o cálculo situacional e a teoria de situações, que se referem à totalidade social relevante para a ação, com o cálculo econômicosocial que incide apenas numa parte dessa totalidade. Tal exame de contrastes nos conduz a problemas de maior transcendência para a teoria em geral e a ciência econômica em particular. Nesse sentido, identificamos algumas demandas. Primeira: necessitamos de uma teoria da totalidade social, que aborde as interações entre a economia, a ciência política, a sociologia e as outras ciências sociais, pois nenhuma delas preocupase com as implicações de umas sobre as outras —por exemplo, os efeitos políticos das ações econômicas ou as conseqüências econômicas dos eventos políticos. Segunda: necessitamos reconsiderar todas as teorias e métodos que supõem a primazia inevitável do critério de eficácia econômica; isso implica questionar os fundamentos clássicos da ciência econômica, do planejamento econôm ico e das técnicas econôm icas de avaliação de pro jetos. Terceira: necessitamos de uma teoria da produção social, e da mudança situacional, que permita analisar o problema do conflito de critérios de eficácia num mundo onde existem múltiplos recursos e múltiplas dimensões do conceito de produção. Assim, a produção econômica de bens e serviços tem um dimensão política, cognitiva, ecológica, etc .; para se materializar, ela requer recursos de poder, recursos econômicos, conhecimentos, valores, espaço, tempo, etc. A conclusão prática que emerge deste livro aponta para a necessidade de abandonar as práticas normativas e economicistas de planejamento, a fim de revalorizar a idéia do planejamento como instrumento de governo. A tarefa é complexa. Ela exige que se redefina o planejamento e que seu âmbito estendase a todo o processo de governo. Ao planejamento econômico normativo devemos opor o planejamento situacional da ação governamental. O planejamento normativo é
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demasiado simples para servir ao processo de governo de uma realidade complexa. Uma vez colocadas as relações entre plano e ação concreta no presente, tornase imprescindível explorar o problema da prática do plane jam ento situacional. O que propom os, no lugar do planolivro? Como é possível o planejamento na conjuntura? Como um planejamento mais com plexo pode ser mais prático? Nossas pro postas são as seguintes: i.
sub stituir os diagnósticos setoriais por explicações situacionais por problemas, e o diagnóstico geral por um a explicação situacional de síntese;
ii.
criar a instância de análise po r problem as, além dos níveis glo bal, setorial e regional;
iii.
substituir o planolivro por um a estru tura mod ular do plano, baseada na identificação das operações que devem ser realizadas para enfrentar os proble mas ; assim, a matriz problemas operações é o núcleo normativo do plano situacional;
iv.
transform ar o plano num ins trum ento de organização para a ação, mediante atribuição de responsabilidades precisas aos organismos públicos, em term os de problema s e operações;
v.
com plem entar os instrum entos macroeconô micos do plano com instrumentos capazes de dar conta da análise macropolí tica, para que o planejamento político e o planejamento econômico interajam no nível global;
vi.
adotar um sistema de gerência por operações, nos organismos públicos, que forneça praticidade significativa ao sistem a de orçamento por programas e ao sistema de planejamento modular po r problemas e operações;
vii. ado tar tecnologias de planejam ento compatíveis com a velocidade de m udança das situações reais, a fim de resgatar o val oído planejamento como um cálculo de antecipação; nesse sentido, o planejamento situacional deve se preocupar, em especial, com o sistema de suporte às decisões (SSD) e com sistemas de petição e prestação de contas (SPRC);
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viii. abordar racionalmente o problema da incerteza, usando a técnica de cenários, a velocidade de resposta, a aprendizagem e substituindo a predição pela previsão; ix. m on tar um sistema de análise e acomp anham ento das situações, problemas e operações capaz de apoiar a tomada de decisões na conjuntura, ordenar os sistemas de petição e prestação de contas e gerar as bases de um sistema ágil e veloz de informação significativa e selecionada; no lugar do planolivro, sugerimos a criação de um sistema ágil de manejo, avaliação e revisão, ou um arquivo de problemas e operações; x.
m on tar um sistema de emergência para situações tensas de rápido desenvolvimento, nas quais é essencial o controle do tempo. Esse é o sistema de sala de situações, que pode constituirse nu ma fo rma tecno logicamente mais avançada de funcionamento do conselho de ministros para problemas especiais e situações de emergência.
Para que as decisões do dia a dia não constituam “outro plano”, direcionado apenas pelas restrições imediatistas, propomos um sistema de pré-alimentação com o futuro que resgate os planos anuais, de médio e de longo prazo e crie a instância de planejamento na conjuntura. Analogamente, propomos um sistema de retroalimentação com o passado recente, para que o planejamento do dia a dia afine seu cálculo através da aprendizagem. Ambas as instâncias de cálculo só terão significado se apoiarem o momento tático-operacional, ou seja, o cálculo que precede e preside a ação na conjuntura . O governo e o planejamento não dão tempo para escrever livros. Só um sistema afinado de informação e decisões pode preceder e presidir os fatos na conjuntura. Nossa proposta constitui uma mudança radical nas concepções sobre planejamento e planejador, e, em certa medida, fará seu caminho quando uma nova geração de planejadores, com maior formação política, chegar à prática nos gabinetes de planejamento do futuro. As novas concepções sobre planejamento situacional ou estratégico resolvem muitos problemas velhos, mas geram outros novos. Por exe m plo, com que ciência social podemos abo rdar o problem a de plane
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jar uma totalidade social expressa como situação? É possível e é também um bom caminho desenvolver uma teoria da produção social que defina a produção econômica como um aspecto parcial de um processo mais amplo? C om o avançar na construção de um a teoria das situações? Com o torn ar mais rigorosa a análise de viabilidade política? Q ual o destino dos modelos políticos? Como tornar a simulação humana e, em particular, a técnica de jogos um instrumento mais rigoroso de experimentação social? Como articular o debate livre e sistemático de uma equipe de estrategistas com técnicas formais e parciais, tais como a opinião de especialistas, o choque de idéias, o método Delfi, etc.? No entanto , ninguém deve espantarse com o fato de que o avanço do pensamento crie tantos problemas quanto os que resolve. Se assim não fosse, a ciência se esgotaria em seu objeto.
2 Glossário de Conceitos
1.
Ação É a unidade imediata de desagregação das operações na estrutura modular do plano.
2.
Ação de Comportamento É uma ação da qual podese fazer uma predição certa ou probabi lística, porque responde a uma função de com porta m ento de um indivíduo, um agregado social ou um a instituição.
3.
Ação Estratégica É a ação alimentada por um juízo estratégico, num contexto de cálculo interativo; o estrategista não faz planos com base em com portam ento s, ainda que seja possível descobrir o código o peracional que fundamenta seu juízo estratégico.
4.
Ato de Fala É o módulo básico dos significados num discurso. Podemse distinguir dois tipos de ato de fala:
® Os a tos ilocutórios são os atos de fala no sentido estrito da palavra; re fe re m se às asserções, expressões, declarações, diretivas e compromissos; combinando esses atos de fala explicamos, qualificamos, advertimos, nos desculpamos, ordenamos a outros fazerem algo, nos comprometemos a fazer algo, etc. Nós conversamos e escrevemos combinando atos de fala.
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•
Os atos perlo cutó río s são os efeitos que nossos atos ¡locutórios produzem em nossos interlocutores, tais como persuadir, convencer, divertir, molestar, entristecer, animar, dar segurança, prov ocar ação ou passividade, etc.
Ator Social É uma personalidade, uma organização ou agrupamento humano que, de forma estável ou transitória, tem capacidade de acumular força, desenvolver interesses e necessidades e atuar produzindo fatos na situação. Agenda do Dirigente Ordena diariamente o uso do tempo do dirigente e expressa a seleção dos problemas aos quais ele atende, assim como seu encadeamento no tempo. Arco Direcional E o caminho imaginário que une a situação inicial à situaçãoobje tivo. E uma referência básica para manter o curso dos acontecimentos na direção da situaçãoobjetivo. Arco de Conjuntura E o caminho que se constrói entre a situação inicial e uma situação imediata seguinte. Ele expressa um movimento tático. Arco da Utopia E o caminho imaginário que marca a direcionalidade entre a situação inicial e a imagem objetivo. Arquivo de Problemas E o conjunto de problemas selecionados por um ator para serem enfrentados com um plano. Arquivo de Operações E o conjunto de operações que enfrentam os nós críticos dos problemas. Asserção Ato de fala que afirma como as coisas são, através de descrições, enunciados, etc. Seu critério de verificação está nas alternativas verdadeiro e falso.
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13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
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AutoReferência Perspectiva explicativa de um ator que indica a situação a partir da qual ele explica. Cálculo Interativo E um cálculo estratégico ou tático de previsão, em que a eficácia da ação de cada ator depende da ação que o outro tenha feito antes ou fará depois. Nesse cálculo, as eficácias são interdependentes e estão em função das ações recíprocas. Capacidade de Governo E o conjunto de destrezas, experiências, habilidades, teorias e métodos de direção de que uma equipe de governo dispõe. Código Operacional de um Aior t È o enunciado preliminar de suas ações mais prováveis diante das distintas situações contingentes. O código expressase da seguinte forma: se ocorrer tal circunstância, seus movimentos mais prováveis serão A l, A2 e A3. O código sistem atiza n. situações contingentes e um número variável x de ações possíveis em cada contingência. Compromisso Ato de fala pelo qual o declarante assume a obrigação de fazer coisas, como é o caso dos programas, promessas, votos e juramentos. O programa direcional de um ator é um compromisso. Verificase pelo seu cu m primento ou nãocum prim ento. Construção de Viabilidade Processo de mudança situacional pelo qual um ator, mediante um encadeamento de arcos de conjuntura, consegue uma relação favorável de interesses e forças para tornar possível uma operação que era inviável na situação inicial. Curso de Ação É a trajetória selecionada como central para a articulação tático estratégica; o curso de ação pode mudar em função das características reais seguintes da m udan ça situacional. Declaração Ato de fala que tem o efeito de mudar a realidade no momento em que se declara a mudança, como é o caso da demissão de um
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empregado, da abertura de uma sessão de trabalho, da nomeação de um ministro ou da abertura das sessões do Congresso Nacional. 21.
Definição de um Problema (vetor de) É a caracterização do problema no palco da fenoprodução, mediante a enumeração dos resultados ou eventos terminais necessários e suficientes para o distinguir de ou tro problem a.
22.
Desvio Estratégico Saída do espaço de rodeios táticos de uma trajetória, conduzindo a uma direcionalidade distinta.
23.
Dissolver um Problema Considerar o problema A, em análise, como uma conseqüência de um problema B distinto e mais amplo, e enfrentálo no espaço superior desse outro problema.
24.
Eficácia Direcional É o efeito ou impacto de um evento sobre a realidade, capaz de conduzila numa direção escolhida e expressa pela situaçãoobje tivo.
25.
Eficácia Política Impacto do produto de uma operação para atingir os objetivos políticos da situaçãoobjetivo.
26.
Eficácia Econômica Expressase pela relação recursos —produto; uma operação terá tanto maior eficiência quanto menor forem os recursos consumidos por unidade de produto .
27.
Eficiência Política Também chamada, no texto, de eficácia processual de uma operação, expressase pela relação entre poder aplicado por um ator para pro duzir um evento e poder acum ulado ou desacumulado por esse ato r em função dos efeitos políticos do evento.
28.
Expressão Ato de fala que revela sentimentos, atitudes e qualificações, tais como agradecer, pedir desculpas e elogiar. Seu critério de validação pode ser a sinceridade de quem em ite a expressão.
Conclusões e Glossário de Conceitos
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Evento Fortuito É aquele que está fora do espaço de imaginação, ou fora de toda probabilidade considerada pelos afetados; é produzido por um ator à margem do cálculo de planejamento, ou sem que exista um ator social a quem se possa atribuir sua produção. Explicação de um Problema É a postulação de uma rede sistêmicacausal que, em sua sincronia ou diacronia, gera ou cria o problema. É verificável pela coerência entre o explicando e o vetor de definição do problema enquanto explicado. A explicação é sempre uma hipótese, sujeita à validação na prática. A hipótese explicativa é previamente verificada através da opinião de especialistas ou de modelos matemáticos. Explicação Siluacional E aquela que se faz consciente da situação a partir da qual se ex plica e do papel que nessa explicação desempenham as explicações dos outros , nas suas próprias perspectivas. Espaço de um Problema E o âmbito explicativo pertinente a um problema, quer do ponto de vista de sua definição e explicação, quer da capacidade de ação do organismo ou ator que explica o problema. Em termos práticos, expressase numa indicação das fronteiras do fluxograma si tuacional que abrange uma explicação suficiente do problema. Espaço Direcional E o espaço que define o que é ideologica ou culturalmente admissível para um ator, quer se trate de problemas, operações ou valores. Espaço de Intenções É o espaço que define as aspirações e motivações de um ator. Ele perm ite conhecer ou formular hipóteses sobre as intenções que um ator tem ou deixa de ter. Espaço de Capacidade E o espaço que compreende o que um ator pode fazer ou produzir, independentemente de suas intenções e necessidades.
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36.
Espaço de Necessidade É o espaço que compreende as carências que um ator precisa satisfazer.
37.
Espaço Situacional E o âmbito no qual se faz a explicação situacional. O te xto distingue, em ordem hierárquica, o espaço geral, o espaço particular e o espaço singular. O espaço situacional pode coincidir com o es paço institucional.
38.
Espaço Institucional E aquele no qual se realiza o processo de produção de uma instituição. Nesse espaço ela coordena e combina fatores de produção. Fora dele, compra insumos e vende sua produção final, ou demanda e oferece bens, serviços e fatos no processo de intercâmbio social. O espaço institucional é normalmente formalizado p or norm as jurídicas.
39.
Cenário de Cálculo É uma articulação de opções e variantes centrais, selecionadas para evitar multiplicação das com binações possíveis de opções e variantes consideradas em cada problema.
40.
Cenário da Situação E o contexto externo no qual a situação se insere e com o qual interage. Os limites entre a situação e seu cenário são relativos à situação e aos objetivos do ator.
41.
Estratégia É o uso encadeado dos arcos de conjuntura no percurso do arco direcional que co nduz à situaçãoobjetivo.
42.
Estratégia de Cooperação É uma estratégia que busca o consenso en tre as partes m ediante a negociação; cada parte cede algo e consegue uma situação melhor.
43.
Estratégia de Cooplação E uma estratégia em que o ator A, por algum meio que não o conflito, consegue que o ator B adquira a sua proposta, sem mo dificála.
Conclusões e Glossário de Conceitos
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44.
Estratégia de Conflito É uma estratégia que se resolve através das relações de forças.
45.
Fluxograma Situacional É a gratificação metódica e sinóptica do conjunto de relações sis têmicocausais mais significativas para a explicação de um pro blem a ou de uma situação.
46.
Fenoprodução E o plano ou nível de situação a que correspondem os fluxos de eventos ou fluxo de produção social, como resultado da utilização da capacidade de pro dução social. Na explicação da situação, a fenoprodução é o plano da realidade em que os eventos ou fluxos de produção social aparecem como resultados, constatáveis e constatados, de d eterminad a capacidade de produç ão social.
47.
Feno-Estrutura E o plano da situação em que as acumulações sociais (humanas, físicas, valores fenoménicos, etc.) condicionam a quantidade e qualidade dos fluxos de produção social. A fenoestrutura é uma instância de represamento ou acumulação de diferentes tipos de capacidade.
48.
Geno-Estrutura E o nível de última instância da explicação situacional; nele conformamse, por acumulação social, as regras básicas do sistema, que determinam as características de toda a situação. Ele divide o espaço de possibilidades do sistema entre o permitido e o proi bido.
49.
Governabilidade do Sistema A governabilidade do sistema para um ator é a relação de peso entre as variáveis que controla e que não controla, em relação a seu plano.
50.
Imagem-Objetivo E a sitação geral escolhida como um objetivo de referência, siua do além do horizonte de tempo do plano.
51.
Incerteza E a impossibilidade de decidir ou calcular com certeza.
5 7 6
Política, Planejamento e Governo
52.
Incerteza Maldefinida É uma incerteza em que o universo de possibilidades está malde finido; nem todos os eventos possíveis podem ser definidos, sendo que para nenhu m deles, ou só para alguns, podem ser atri buídas probabilidades. No extre m o, só uma possibilidade é identificável —a continuação do presente, mas a probabilidade dessa continuidade é desconhecida.
53.
Instrução ou Diretiva Ato de fala que ordena a outras pessoas que façam coisas, como é o caso das ordens, disposições e sentenças.
54.
Intercâmbio de Problemas E o processo pelo qual se geram novos problemas, como conseqüência do enfrentamento dos problemas atuais. Esse intercâm bio pode ser favorável ou desfavorável, num determ inado horizonte de tem po.
55.
Interesse de um Ator p or... É o signo com o qual um ator aplica suas capacidades e dirige suas intenções; expressase como apoio, indiferença ou rejeição.
56.
Jogos (técnica de) Simulação humana sujeita a regras, baseada no desempenho de jogadores que devem resolver um pro blema análogo a um pro blema real, ou um pro blem a imaginário. O jogo mais conhecido e tradicional é o Kríegspiel, ou jogo de guerra.
57.
Jogos (teoria dos) Ramo da matemática que se refere ao cálculo interativo de processos estruturados. A teoria foi elaborada por von Neumann e Morgenstern.
58.
Juízo d e ... Razão que fundamenta uma avaliação situacional. O texto fala de juízo de necessidade, juízo de possibilidade, juízo de oportunidade, etc.
59.
Modo de Direção Forma particular em que se combinam os subsistemas de direção para governar, confo rm e se tra te de processos estrutura dos ou quaseestruturados, em tem po norm al ou em tem po acelerado.
Conclusões e Glossário de Conceitos
5 7 7
60.
Momento Instância repetitiva pela qual passa um processo encadeado e contínuo que não tem princípio nem fim bem definidos.
61.
Momento Explicativo Instância em que o ator explica a realidade tal como foi, é e tende a ser para ele.
62.
Momento Normativo Instância em que o ator desenha como deve ser a realidade no futuro, em contraste com a situação inicial.
63.
Momento Estratégico Instância em que o ato r elabora uma estratégia que articula o deve ser com o pode ser.
64.
Momento Tático-Operacional Instância do fazer. Nela produzse a mediação entre o conhecim ento e a ação.
65.
Módulo Explicativo Unidade parcial em que se divide a realidade, como totalidade indivisível, para explicála por partes. No planejamento situacio nal os módulos explicativos são problemas, subproblemas, mini pro blemas, etc.
66.
Módulo de Ação Unidade parcial em que se divide o programa direcional do plano. Os módulos são projetos de ação, operações, ações, subações, etc.
67.
Módulo 0 -P Módulo básico que integra módulos explicativos com módulos de ação; um módulo OP é um subplano, que pode ser útil para atribuir responsabilidades institucionais.
68.
Nó Crítico no Fluxograma Situacional E um subproblema explicado, representado no fluxograma por um nó cuja mudança quantitativa ou qualitativa origina uma alteração significativa das características do vetor de definição do pro blem a explicado. O VDP é altamente sensível às mudanças dos nós críticos.
5 7 8
Política, Planejamento e Governo
69.
Nó do Fluxograma Situacional É o conjunto semântico que contém variáveis quantitativas e variáveis lingüísticas que fazem parte da rede sistêmicacausal, formando o explicando do fluxograma.
70.
Opção Básica E uma alternativa na qual o ator que planeja tem a capacidade de decidir um caminho, entre vários que são excludentes entre si.
71.
Opção Condicionada por uma Variante E uma opção que pode ser tomada caso ocorra uma variante do plano. A decisão do planejador fica, assim, subordinada à ocorrência de um a variante.
72.
Operação É o meio privilegiado de intervenção do planejador na realidade, tendo em vista alcançar um objetivo do plano. A operação é a unidade básica do plano para atribuir recu rsos capazes de p roduzir um produto que traga resultados no enfrentamento dos problemas ou no aproveitamento das oportunidades.
73.
Operação K É uma operação selecionada por sua eficiência política ou eficácia processual, independentem ente de sua relação direta com o alcance da situaçãoobjetivo, ou seja, de sua eficácia direcional.
74.
Operação Estruturada É uma operação que enfrenta um problema bemestruturado; conse qüentem ente, é um a relação recu rsos —» prod uto —» resu ltados, bem definida, com regras claras sobre eficiência e eficácia.
75.
Operação Semi-Estruturada E uma operação em que só alguns dos aspectos podem ser definidos e bem estruturad os num a relação recursos —>p rod uto —>r e sultados.
76.
Operação Não-Estruturada E uma operação que enfrenta problemas nãoestruturados; por conseguinte, sua relação recursos —» produto —» resultados é incerta e ambígua.
Conclusões e Glossário de Conceitos
579
77.
Operação em Situação E uma operação recémjogada, ou de jogo iminente.
78.
Oponente A tor cujos objetivos são conflitantes com os meus. Esse oponente pode ser potencial ou atual.
79.
Centro de Pressão do Vetor de Peso Elemento do vetor de peso que, numa confrontação de forças, é selecionado por sua pertinência e eficácia direta em relação à natureza do confronto.
80.
Plano Modular E o plano constituído por um conjunto orgânico e coerente de operações, as quais enfrentam um arquivo de problemas. Os módulos explicativos e os módulos de ação têm uma capacidade (prédesenhada) de expandirse, restringirse ou redefinirse, em função das variantes e opções consideradas no plano. Os módulos esgotam o universo do plano.
81.
Plano Situacional Distinção feita na explicação situacional, que divide a realidade em três planos: o dos fluxos, o das acumulações (fenoestruturas) e o das regras básicas (gen oestrutura s).
82.
Pré-Alimentação Processo de análise que um ator realiza mediante cálculo pers pectivo que apóia racionalmente suas decisões no pre sente.
83.
Predição Capacidade ou tentativa de antecipar o que ocorrerá no futuro, anunciando o que ocorrerá amanhã.
84.
Previsão Capacidade ou tentativa de prever um espaço de possibilidades futuras, sem contudo arriscarse a anunciar o que ocorrerá.
85.
Processo Criativo Processo social que não se rege por leis, ou que não se rege por leis conhecidas.
5 8 0
Política, Planejamento e Governo
86.
Processo Contínuo Processo social sem começo nem fim definidos, cuja evolução não marca intervalos discretos claram ente reconhecíveis.
87.
Processo Complexo Processo social criativo, contínuo e conflitante que gera problemas quaseestruturados.
88.
Produção Social E a produção de eventos políticos, econômicos, sociais, culturais, de bens e serviços, etc., realizada pelos homens e pelas forças sociais. No processo de produção entram vários recursos escassos (poder, recursos econômicos, conhecimentos, etc.); suas conseqüências são multidimensionais, dando origem a vários critérios de eficácia (política, econômica, cognitiva, etc.).
89.
Problema É a formalização, para um ator, de uma discrepância entre a realidade constatada ou simulada e uma norma de referência que ele aceita ou cria.
90.
Problema Bem-Estruturado É um problema que podemos reconhecer e apresentar com precisão; ele permite que se desenhem alternativas para sua solução e escolhase a alternativa ótima, entre todas as possíveis. E um caso em que podemos especificar algoritmos ou regras que nos permitam descobrir o problema, desenhar as soluções alternativas e selecionar a m elhor solução.
91.
Problema Quase-Estruturado É um problema que não podemos definir nem explicar com precisão, por isso não sabemos bem como enfrentálo e muito menos conhecemos os critérios para escolher entre as opções que somos capazes de conceber para enfrentálo. A primeira dificuldade com tais problemas está em reconhecêlos.
92.
Problema Normativo E o problema que surge para um ator ao comparar o é com o c/eve ser.
Conclusões e Glossário de Conceitos
58 1
93. 93.
Problema Prob lema Estratégico É o problema que surge para um ator ao comparar o deve ser com o po p o d e ser. ser .
94. 94.
Problema Problem a Tático-Operacional E o problema que surge para um ator ao comparar a ação que realiza hoje com a ação que poderia realizar hoje para cumprir o pla p lann o .
95. 95.
Problem Pro blemaa Histórico Histórico E o problema que surge para um ator ao comparar o que foi fo i com o que pode po deria ria ter te r sido, sido , à luz das repercussões inteligíveis no presente. O problema histórico não existe como tal, ele fazse presente na situação por sua ação condicionante dos problemas atuais.
96. 96.
Problem Pro blemaa Atual Atual E o problema que surge para um ator ao comparar a realidade atual com um a no rm a de referência estabelecida estabelecida e váli válida da para ele. ele.
97. 97.
Problema Problem a Potencial E o problema que surge provisoriamente para um ator ao comparar o resultado de um encontro desfavorável de tendências com um a norm a de referênci referência. a.
98. 98.
Problema Prob lema Criati Criativo vo E um p roblem a que surge surge para um ator quando a norma de re ferência elevase muito acima da margem de consenso atual e com par p ara ase se com co m os fatos fa tos e x iste is tenn tes. te s.
99. 99.
Problema Problem a Terminal E um problema entre a população e a realidade em que vive; surge como uma necessidade insatisfeita, e às vezes como uma demanda da população. população.
100. 100.
Problema Problem a Intermediário E um problema que surge dentro do espaço das instituições do sistema e não en tre as instituições instituições e a população.
101. 101.
Problema Prob lema em Situação E um problema tomado como referência central no debate entre as forças sociais e no desenho das operações para enfrentálo.
58 5 8 2
102. 102.
Política, Planejamento e Governo
Programa Progra ma Direcional E o conjunto orgánico de projetos estratégicos, operações, ações, etc. que, aplicados sobre a situação inicial, vão alterála na direção da situaçãoobjetivo com um grau aceitável de correspondência e probabilidade. E a expressão coerente do desenho normativo. O p rogram a direcional direcional é expresso na forma: (P1, P2 ... ... Pn) Si -> So
103.
Projeto Proj eto Estratégico E um conjunto intencional, orgânico e seletivo de operações e ações de regulação que, por seu impacto totalizante, é capaz de impulsionar eficiente e significativamente a mudança situacional na direção da situaçãoobjetivo pretendida pelo planejador. O pr p r o je to e s tra tr a tég té g ico ic o inci in cide de g e r a lm e n te s o b re p ro b lem le m a s term te rm ina in a is, is , atuais atuais ou potenciais, po tenciais, de alto valor para a população.
104.
Projeto Proj eto de Governo Co nteúdo proposicional proposicional do do programa ou do plano plano de governo.
105. 105.
Projeto de Investimen Inves timento to E uma operação, ação ou subação cujo produto tem as características de um investimento.
106. 106.
Política Polít ica Instrum Ins trumenta entall ou Ação de Regulação E um ato de regulação sobre o sistema planejado, cuja característica essencial é produzir efeitos significativos usando insumos econômicos de valor insignificante. Como ato de regulação, ele implica uso do poder e praticamente não consome recursos econômicos para quem decide tal política.
107.
Reforma Mudança parcial das genoestruturas de um sistema, em que as regras alteradas são articuladas e dominadas pelas regras nãoalte radas.
108.
Relação de Força Forçass Comparação dos vetores de peso de duas ou mais forças no âmbito de uma ou mais operações. Numa primeira instância, é a com par p araç ação ão e n tre tr e os e lem le m e n tos to s cen ce n tra tr a is dos do s re s p e c tiv ti v o s v e to r e s de pes p esoo .
Conclusões e Glossário de Conceitos
583
109.
Retroalimentação Processo de análise realizado por um ator mediante cálculo retrospectivo que apóia suas decisões no presente.
110.
Rodeio Tático Sucessão de arcos de conjuntura para construir a viabilidade do arco direcional.
111.
Ritmo de Tempo Tem po Normal Normal Velocidade típica típica da mudança situacional situacional num sistema particular.
112. 112.
Ritmo de Tempo Tem po Acelerado Precipitação e acumulação de uma variedade sucessiva de eventos, numa cadeia de situações em tempo muito concentrado e com alta tensão situacional. Essa alta tensão manifestase no alto valor dos problemas e operações em situação.
113.
Sala de Situações Situaçõe s É um modo de análise e planejamento na conjuntura que recebe informação selecionada para préavaliar e pósavaliar a tomada de decisões, bem como conciliar os diferentes critérios de eficácia envolvidos em tais decisões, em situações de emergência ou em ritmo de tem tem po acele acelerad rado. o.
114. 114.
Sinal Sinal d e .... E um aviso emitido pelo sistema de suporte às decisões (SSD), ou pe p e lo s iste is tem m a da sala d e s itu it u açõ aç õ es, es , q ue surg su rg e p e la c om para pa raçã çãoo com co m um indicador indicador norm al. O sina sinall pode ser automatizado ou m anual. anual.
115.
Sistema Siste ma de Sinal Aberto Sistema criativo de regras amplas em que não é possível enumerar exaustivamente suas possibilidades de evolução futura e muito menos assegurar assegurar um um resultado.
116.
Sistema Siste ma de Direção E a conjunção sistêmica de diversos métodos de direção. No texto distinguemse os subsistemas de planejamento na conjuntura, de suporte às decisões, de gerência por operações, de petição e prestação de contas, de orçamento por programas e de emergência em sala de situações.
5 8 4
Política, Planejamento e Governo
117. 117.
Sistema de Planejam Plan ejamento ento na Conjuntur Conjunturaa Sistema de cálculo que faz a mediação entre o conhecimento adquirido nos distintos arcos direcionais do sistema de planejamento e a ação concreta no dia a dia.
118. 118.
Sistema de Suporte às Decisões Decisões Sistema de apoio à tomada de decisões baseado em fluxos de informação e cálculo especialmente desenhados para cada tipo de pro p ro b lem le m a e o p eraç er açãã o d o plan pl anoo .
119. 119.
Sistema de Petição Petiç ão e Prestação Prestaç ão de Conta Contass Sistema de avaliação periódica da eficiência e eficácia no tratamento dos problemas e no desenvolvimento das operações. Pedese e prestase contas por módulos ou submódulos OP. O resultado da avaliação é público.
120.
Sistema de Orçamento Orçam ento por Programas Programas Sistemas de orçamentos em que se atribuem recursos para alcançar objetivos bem definidos, controlando a eficiência e, quando poss po ssív ível el,, a eficácia ef icácia..
121.
Sistema de Gerência por Operações Sistema de administração por objetivos adaptado às necessidades de coordenação com o planejamento modular.
122. 122.
Sistema de Emergência em Sala de Situações Sistema de análise situacional e de tomada de decisões concentrado em problemas e operações de alto alto valor em situa situações ções de ritm o acelerado. Combina procedimentos automatizados com o juízo situacional.
123.
Situação E a realidade explicada por um ator que nela vive e explica em função de sua ação.
124.
Situação Situaç ão Inicial E a situação a partir da qual se conforma o plano. A explicação da situação inicial visa compreender as causas complexas dos pro ble b lem m as. as .
Conclusões e Glossário de Conceitos
585
125.
Situação Inicial Operacional É a situação inicial no exato momento em que se atua sobre ela através de uma operação concreta. Supõe que já se tenha, antes, definido com precisão a situação inici inicial al geral,
126.
Situação-Objetivo E a situação que se deseja alcançar com o plano; não é meta definitiva, mas um propósito pretendido em determinada situação inicial inicial.. Po r essa razão, razão , alterase à medida me dida que qu e tal situação varia. varia.
127.
Subação E a unidade imediata de desagregação das ações.
128.
Tática E o uso dos recursos escassos na construção de um arco de con jun ju n tu ra .
129.
Taxa Psicológica Psicológic a de Desconto do Tempo Temp o Porcentagem em que um ator valoriza ou desvaloriza os problemas futuros.
130. 130.
Transformação Transfor mação Social Social Mudança genoestrutural pela qual as regras alteradas passam a articular e dominar as velhas regras, que permanecem como resíduo dom inado e temporá rio do sistema. sistema.
131.
Trajetória E uma seqüência de situações ou projetos entre a situação inicial e a situaçãoobjetivo. E o encadeamento de arcos de conjuntura que começa com a situaçãoinicial e termina com a situação objetivo.
132.
Valor Valor de um Problema Prob lema (Verific ar com o original) Importância que que um problem a tem para para um ator.
133.
Valor de um Problema Proble ma (São (São iguais ) Importância da operação para mudar o VDP de um problema; depende do valor do problema que enfrenta e do papel de operações ções no enfrentam ento.
134.
Variante Alternativa de produ ção soci social al ou de mu dança situacional situacional em que o ator não tem capacidade de escolher uma trajetória ou um arco
5 8 6
Política, Planejamento e Governo
direcional; direcional; só pode imaginála e atribuirlhe um a probabilidade probabilidade de ocorrência. 135.
Vetor de Peso de uma um a Força Força Conjunto de elementos que enumeram e valoram as capacidades de ação de um ator.
136.
Viabilidade Possibil Possibilidad idadee de uma um a operação se r decidida, ex ecutada e m antida.
137.
Viabilidade Prática Possibilidade política de uma operação ser decidida, executada e mantida.
138.
Viabilidade Viabil idade Econômica Possibilidade econômica de uma operação ser executada e mantida com efic eficiên iência cia de ntro ntr o dos limites de recurso s disponíveis. disponíveis.
139.
Viabilidade Institucional-organizacional Institucional-organiz acional Possibilidade de uma operação ser coerente com a estrutura institucional do sistema, ou desenvolverse numa organização dentro dos limites de sua capacidade de produção.
140.
Viabilidade de Decisão Decisão Relação Relação de forças forças que p erm ite decidir.
141. 141.
Viabilidade de Operação Relação de forças que permite alterar o funcionamento do sistema no sentido sentido p retendid o com a operaç operação. ão.
142. 142.
Viabilidade de Permanê Per manência ncia Relação de forças que torna irreversível a mudança alcançada com a operação.
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