FICHAMENTO: TREVOR-ROPER, Hugh. “Crise Geral do Século XVII”. In: A Crise do Século XVII. Religião, a Reforma e Mudança Social. Sobre as revoltas do século XVII: “Essas revoluções diferiam de lugar para lugar, e,
se estudadas em separado, parecem surgir de causas particulares, locais; mas, se as examinarmos em conjunto, têm tantos aspectos comuns que parecem quase uma revolução geral.” (p. 85) “A Guerra dos Trinta Anos, nos países por ela atingidos, sem duvida preparou o terreno para a revolução.” revolução.” (p. 88) “Do fim do século XV até meados do século XVII, temos um clima, o do Renascimento; a seguir, em meados do século XVII, temos os anos de mudança, os anos de revolução; e a seguir, por mais um século e meio, temos outro clima, muito diferente, o do Iluminismo.” (p. 90) Resposta marxista para as revoltas do XVII: “Segundo os marxistas, e outros
historiadores também que, embora não marxistas, aceitam sua argumentação, a crise do século XVII era no fundo uma crise de produção, e a força motivadora, por trás pelo menos de algumas revoluções, era a força da burguesia produtora, tolhida em sua atividade econômica pelo sistema produtivo obsoleto, devastador, restritivo, mas ciumentamente defendido, da sociedade „feudal‟.” (p. 93) “Segundo essa concepção, a crise de produção era geral na Europa, mas foi somente na Inglaterra que as forças do „capitalismo‟, graças a seu maior desenvolvimento e sua representação no Parlamento, foram capazes de triunfar. Consequentemente, enquanto outros países não fizeram avanços imediatos em direção ao capitalismo moderno, na Inglaterra a antiga estrutura foi esmagada e uma nova forma de organização econômica se estabeleceu.” (p. 93) Crítica do autor à análise marxista: “Acreditando [os marxistas], como parte da
doutrina [ideal marxista], que tal mudança [de modo de produção] não pode ser alcançada pacificamente, mas exige uma violenta irrupção de uma nova classe, uma „revolução burguesa‟, buscam tal revolução. Além do mais, vendo que o país que liderou esse processo foi a Inglaterra, buscam tal revolução na Inglaterra. E quando descobrem, exatamente a meio cominho entre esses datas extremas, a violenta Revolução Puritana na Inglaterra gritam [...] (Eureka!). Por isso as outras revoluções europeias se ajustam como revoluções burguesas abortadas.” (p. 96) As estruturas politicas do século XVI: “As estruturas politicas da Europa não são
modificadas no século XVI: são estendidas para pegar e manter novos impérios, às vezes novos e vastos impérios, mais vastos do que o que podem conter por longo tempo sem mudança interna. Todavia, até então não há essa mudança interna..” (p. 98) “Somente no século XVII a estrutura de governo é ajustada para dar conta da expansão territorial do século XVI na Espanha, na França, na Grã-Bretanha. Até então, o Estado
renascentista se expande continuamente sem romper seu antigo envoltório. Esse envoltório é a monarquia aristocrática, medieval, o governo do príncipe cristo.” (p. 98 99) O surgimento dos príncipes renascentistas: “Os príncipes surgiram à custa de alguém
ou de algo, e trouxeram em seu rastro o meio de garantir seu súbito e usurpado novo poder. De fato, surgiram a expensas dos órgãos mais antigos da civilização europeia, as cidades; e trouxeram junto, como meio de conquista, um novo instrumento político, a „Corte renascentista‟.” (p. 99 -100) “Sujeitando a Igreja, estendendo sua jurisdição, mobilizando o campo, os príncipes criam um novo aparato de poder, „o Estado da Renascença‟, com o qual podiam taxar a riqueza das cidades, apoiar e estender seu comércio, assumir e desenvolver sua arte e arquitetura.” (p. 101) Transformação das cidades em Cortes: “Em algumas das antigas cidades os príncipes
vitoriosos estabeleceriam suas novas Cortes: Cortes que sugavam a riqueza de todo o país e derramavam na cidade de sua residência. Essencialmente, o século XVI é uma época não de cidades, mas de Cortes: de cidades capitais tornadas esplendidas, menos pelo comercio do que pelo governo.” (p. 102) “Não foi como cidades industriais ou comerciais, mas como Cortes, que Bruxe las, Paris, Roma, Madri, Nápoles, Praga alcançaram seu esplendor no século XVI.” (p. 102) O que financiou o esplendor do século XVI: “O século XVI foi uma época de
expansão econômica. Foi o século em que, pela primeira vez, a Europa vivia à custa da Ásia, África e América.” (p. 104) Outra razão: “A razão pela qual essa expansão estava sempre dominada pelos
príncipes, não a suas expensas, pela qual os príncipes estavam sempre acima, não posto de lado, era que os príncipes tinham aliados que garantiam seu poder e os mantinham firmemente no lugar. Pois os príncipes nunca poderiam ter construído seu poder sozinhos. Quaisquer que sejam a fraqueza da sociedade que lhes dava oportunidades, eles deviam sua permanência à maquina do governo que tinham criado ou aperfeiçoado e ao capital investido que essa máquina favorecia.” (p. 104) “Essa máquina, meio e resultado do triunfo dos príncipes, é o Estado Renascentista [...]. Foi o Estado renascentista que, em grande parte da Europa, primeiro rompeu ou corroeu o antigo poder das cidades e depois, por sua vez, no século XVII, enfrentou sua própria crise e dissolveu.” (p. 104) Estado renascentista – como podemos defini-lo: “Quando vemos os fatos,
descobrimos que se trata, no fundo, de uma burocracia em expansão, um imenso sistema de centralização administrativa, provida de uma multidão sempre crescente de „cortesãos‟ ou „funcionários‟.” (p. 104)
A crise do XVII: “Além do mais, e cada vez mais à medida que o século XVII se
distanciava do XVI, essa multiplicação de cargos mais dispendiosos ultrapassava as necessidades do Estado. Originalmente, a necessidade criara os cargos; agora, os funcionários criam a necessidade.” (p. 113 -114) “Assim, o „Estado da Renascença‟ consistia, no fundo, em uma burocracia em expansão que, embora de início uma burocracia ativa, tinha se tornado no final do século XVI uma burocracia parasita; e essa burocracia sempre crescente era sustentada por uma margem de „desperdício‟ igualmente em expansão: desperdício que se situa entre as taxas impostas ao súdito e a receita coletada pela Coroa.” (p. 114) “Na década de 1620, o puritanismo – esse estado de espirito geral do puritanismo – triunfa em toda a Europa. Esses anos, podemos dizer, marcam o fim da Renascença” (p. 119) Motivos das crises do século XVII: “Vemos isso na França, acima de tudo, no Testament politique de Richelieu, escrito em 1629 e no início da década de 1630,
período em que os governos por toda parte enfrentam esses problemas, ou tentavam enfrenta-los, antes que fosse muito tarde. Essas exigências, esses problemas não relacionados com a monarquia ou a republica, a Coroa ou o Parlamento. E também não são econômicos: não estão relacionados com os métodos de produção.” (p. 121 -122) Medidas, descritas por Richelieu, para tentar sanar as crises no Estado francês:
“Essencialmente são exigências de emancipação da carga da centralização; de redução de impostos; redução de cargos inúteis, dispendiosos, inclusive – mesmo na Espanha – funções religiosas; abolição da venda de cargos („pois quem quer q ue arrende ou compre cargos vem a ser um extorsionário‟ e „os que compram cara devem vender caro‟); abolição da hereditariedade de cargos; abolição dos impostos ruinosos indiretos que rendem tão pouco para a Coroa, mas de cujo superabundante „desperdício‟ a franja sempre em expansão da Coroa se alimenta.” (p. 122) Ironia com suposições de alguns marxistas: “A monarquia francesa de Luís XIV não
era como a monarquia espanhola de Filipe IV e Carlos V. Não era economicamente parasita. A indústria, o comércio e a ciência floresceram e se desenvolveram na França, a despeito do „fracasso‟ da „revolução burguesa‟ , não menos do que na Inglaterra, a despeito de seu „sucesso‟. Ao que tudo indica, em 1670, na época de Colbert, o absolutismo e o ancien régime eram perfeitamente compatíveis com o crescimento e o poder comercial e industrial.” (p. 132) O fim do legado Richelieu – suas reformas: “Com o correr do tempo, o antigo peso
logo seria retomado: o reinado de Luís XIV ficaria famoso por seu imenso número de cargos e benefícios, multiplicados deliberadamente a fim de serem vendidos.” (p. 134) “No final do século XVII, Luís XIV estaria financiando suas guerras com criações maciças de cargos inúteis. Mas no começo do século a situação era diferente. Richelieu
e Mazarino sem dúvida tiveram outras vantagens em sua bem-sucedida luta para manter o ancien régime francês na era da revolta huguenote da Fronda.” (p. 134) “Tinham um aparelho de Estado que já havia sofrido alguma reforma salutar: um Estado que, no espirito de Richelieu e nas mãos de seu discípulo Colbert, podia tornar-se um Estado mercantilista, racionalmente organizado tanto para o lucro quanto para o poder.” (p. 134-135) A crise geral do século XVII: “Foi uma crise não da constituição nem do sistema de
produção, mas do Estado, ou melhor, da relação do Estado com a sociedade.” (p. 141) Os efeitos das crises em outros países: “Diferentes países descobriram como sair dessa crise de diferentes modos. Na Espanha, o ancien régime sobreviveu: mas
sobreviveu apenas como uma carga desastrosa, imóvel sobre um país empobrecido. Em outras partes, na Holanda, na França e na Inglaterra, a crise marcou o fim de uma era: o descarte de uma superestrutura do topo da sociedade, o retorno à politica mercantilista, responsável. Pois no século XVII as cortes da Renascença tinham crescido tanto, tinham consumido tanto em „desperdício‟ e tinham introduzido seus crescentes sugadores tão fundo no corpo da sociedade, que só podiam florescer por um tempo limitado, e em uma época, também, de prosperidade geral em expansão.” (p. 141-142)