Bases e Fundamentos são as fundações, os alicerces em que todo o Universo da Ginástica está baseado/fundado. Seja qual for a modalidade, a técnica, o estilo, o continente, o país ou a regiã…Descrição completa
Descrição: Livro sobre mediação de conflitos em dinâmicas familiares
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Descripción: Fundamentos Da Astrologia Tradicional
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Ό Dr. Steven Lawson é um dos mais comprometidos e capazes expositores bíblicos desta geração. A veemência e a clareza do seu compromisso com a pregação bíblica ־com a verdadeira exposição bíblica ־constituem a marca dis*־ tintiva do seu ministério. Além disso, ele entende que o texto da Bíblia apresenta um consistente e coeso testem unho da soberania de Deus e a manifestação pano*־ râmica da glória divina. Isto fica bem evidente em seu ministério oral e escrito de exposição da Palavra. Dr. Lawson é um hom em extraordinário, movido por uma paixão extraordinária.” - Dr. R. ALBERT MOHLER, ]R., Presidente The Southern Baptist Theological Seminary , Lousville, ΚΥ.
“Em Fundamentos da Graça, o fiel pastor Steven Lawson percorre o rico e variado terreno da Bíblia e apresenta a você o Deus verdadeiro e seu amor salvífl· co, baseado em toda a Escritura, e o faz de um modo que talvez você nunca tenha apreciado antes. As doutrinas da graça e da soberania de Deus são verdades que alegram, transformam a vida, exaltam Cristo, glorificam Deus, motivam as mis*־ sões, incentivam a evangelização e promovem o discipulado. Se você pensa que o ensino sobre a soberania de Deus na salvação dos pecadores é ideia fabricada pelo homem, vai tornar a pensar sobre isso depois de andar através da Bíblia com o Dr. Lawson. Mas, cuidado! Esta verdade, quando entendida e abraçada, transforma a alma, anima o coração e altera a vida. O próprio Dr. Lawson é um hom em que foi transform ado por ela. Dr. Lawson a tem proclamado ousada, brava e alegremente, ao custo de alto preço pessoal, fazendo muito para a glória de Deus, para o bem da igreja e júbilo dos pecadores que foram encontrados pela maravilhosa graça de Deus. Prepare״se para se deleitar com a afetuosa bondade do Senhor, que dura para sempre!” - DR. ]. LIGON DUN CA N III, Ministro Sênior Primeira Igreja Presbiteriana de Jackson, Mississipi.
“Vivemos num a época c־m que a igreja se fez outra vez objeto da aguda crítica feita por M artinho Lutero a Erasmo, seu contemporâneo: ‘O seu Deus é por demais parecido com o homem.... Q ue Deus seja Deus!’ Cativo na m ente e no coração pelas verdades gêmeas da soberania absoluta de Deus e sua graça maravilhosa, Steven Lawson rastreia persuasivamente esses temas do começo ao fim da Escritura. Não há m elhor meio que esse de estudar e aprender teologia, e não há outro meio de m anter a verdade da Escritura com o equilíbrio da Escritura e no espírito da Escritura. A obra Fundamentos da Graça mostra, num a multidão de meios e modos, que a Escritura é ‘útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça . Espero que este livro ajude a igreja contemporânea a redescobrir aquele quadrivium divino!” - DR. SINCLAIR B. FERGUSON, Pastor Sênior Primeira Igreja Presbiteriana de Columbia, Carolina do Sul.
“Steven Lawson lança, clara e compreensivamente, o alicerce bíblico para as doutrinas da graça.” - D R. JO H N MACARTHUR, Pastor-Mestre Grace Community Church, Sun Valley, Califórnia.
C om o o conhecim ento que
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Dr. Steven Lawson tem deste assunto
mostra claramente, a soberania de Deus se faz manifesta em toda a Escritura Sagrada.... Q uando você term inar de ler este livro, pergunto-me e me preocupo sobre se você vai persistir em negar a plena m edida da soberania de Deus em nossa salvação. O Dr. Lawson m ostrou tão clara e conclusivamente que a salvação pertence ao Senhor e à sua graça soberana, que varreu de vez o pó do lugar que os oponentes desta doutrina uma vez ocuparam. Q uanto a mim, sou grato por esta obra realizada com amor, e pela elucidação e esperança que aqueles que a lerem vão ter em seu coração.” - DR. R. C. SPROUL, M inistro de Pregação e de Ensino Saint Andrew’s Chapel, Stanford, Flórida.
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ODAYR OLIVETTI p a r a a E d i t o r a F i e l , e m h o m e n a g e m a o Pr . R i c h a r d D e n h a m , c r i a d o r e m a n t e n e d o r d a E d i t o r a Fi el e d a C o n f e r ê n c i a Fi el . Á g u a s d a P r a t a , p r i m e i r o de n o v e m b r o de 2 0 1 0
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EDITORA FIEL
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Lawson, Steven J. Fundamentos da graça : 1.400 A.C. -100 D.C : longa linha de vultos piedosos : volume 1 / Steven J. Lawson; tradução Odayr Olivetti. ־־São José dos Campos, SP : Editora Fiel, 2012. Título original: Foundations of grace. ISBN 978-85-8132-029-8 1. Graça (Teologia) - Ensino bíblico 2. Vida espiritual I. Título. 12-10846
CDD-234.1
índices para catálogo sistemático: 1. Graça: Teologia dogmática cristã 234.1
F u n d am entos da G raça
Todos os direitos em língua portuguesa reservados p o r
Traduzido do original em inglês
Editora Fiel da M issão Evangélica Literária
Foundations of Grace p o r Steven Lawson P r o ib id a a r e p r o d u ç ã o d e s t e l iv r o p o r q u a is q u e r
C a ix a P o stal 1601 C E P : 12230-971 S ã o Jo sé d o s C a m p o s , S P
EDITORA FIEL
PABX : (12) 3 9 1 9 -9 9 9 9 w w w .e d ito ra fie l.c o m .b r
Em memória do
DR. S. LEWIS JOHNSON - distinguido professor, teólogo eminente, expositor preciso que chocou meu mundo com as doutrinas da graça.
D urante os anos da m inha formação, o Dr. Johnson pregava fielmente a Palavra de Deus - e, especificamente, as doutrinas da graça - na Capela do C rente (Believer’s Chapel), em Dallas, Texas. Embora inicialmente eu resistisse a essas verdades, o Senhor, em sua graça, prevaleceu e abriu meus olhos para a sua gloriosa soberania na salvação dos pecadores perdidos. Dom ingo após domingo, o Dr. Johnson fazia magistral exposição das Escrituras com precisão teológica. Mi׳ nha ideia a respeito de tudo foi m udada dramaticamente, e eu nunca mais fui o mesmo. Sempre serei grato ao Dr. Johnson por sua clara e convincente pregação sobre o nosso soberano Deus.
“Porque dele, e por meio dele, e para ele são codas as coisas.
A ele, pois, a glória eternamente. Amém.” (Rm 11.36).
ÍNDICE PRÓLOGO, DE JOHN M ACA R TH U R ..........................................................................11 A IMUTABILIDADE DIVINA E AS DOUTRINAS DA GRAÇA
PREFÁCIO DO A U T O R ................................................................................................... 29 A VERTENTE CONTINENTAL DA TEOLOGIA
1. LONGA LINHA DEVULTOS PIEDOSOS................................................................ 39 SERVOS DA GRAÇA SOBERANA: DE MOISÉS AO PRESENTE
2. ONDE A LONGA LINHA CO M EÇA........................................................................ 63 O LEGISLADOR MOISÉS: GÊNESIS
3. A GRAÇA SOBERANA NO DESERTO.................................................................. 103 O LEGISLADOR MOISÉS: ÊXODO A DEUTERONÔMIO
4. HOMENS FORTES COM U M A FORTE MENSAGEM PRIMEIROS LÍDERES: JOSUÉ A JÓ
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5. MONARCAS INCLINAM-SE DIANTE DO SOBERANO................................ 187 OS REIS DAVI E SALOMÃO: SALMOS, PROVÉRBIOS E ECLESIASTES
6. PORTA-VOZES DA GRAÇA SOBERANA.............................................................231 OS PROFETAS MAIORES: ISAÍAS
7. ARAUTOS DA REGENERAÇÃO D IV IN A............................................................ 263 OS PROFETAS MAIORES: JEREMIAS, EZEQUIEL E DANIEL
8.TEOLOGIA M AIOR DOS PROFETAS M ENORES............................................. 305 OS PROFETAS MENORES: OSEIASA MALAQUIAS
9 . 0 MAIOR EXPOSITOR DA G R A Ç A .....................................................................339 O SENHOR JESUS CRISTO: MATEUS, MARCOS E LUCAS
1 0 .0 MONTE EVEREST DA TEOLOGIA.................................................................. 383 O SENHOR JESUS CRISTO: O EVANGELHO DE JOÃO
11. QUÃO FIRME FUNDAM ENTO!........................................................................ 437 O APÓSTOLO PEDRO: ATOS E 1 e 2 PEDRO
12. POR SUA GRAÇA E PARA SUA GLÓRIA O APÓSTOLO PAULO: ROMANOS
487
13. PREGADOR DAS DOUTRINAS DA GRAÇA
545
0 APÓSTOLO PAULO: 1 e 2 CORÍNTIOS E GÁLATAS
14. ANTES DA FUNDAÇÃO DO M U N D O ..............................................................585 O APÓSTOLO PAULO: EFÉSIOSA 2TESSALONICENSES
15. COLUNA E BALUARTE DA VERDADE...............................................................633 0 APÓSTOLO PAULO: 1 e 2 TIMÓTEO ETITO
16. A EVANGELIZAÇÃO E A SOBERANIA D IV IN A ..............................................665 O MÉDICO LUCAS E O AUTOR DE HEBREUS: ATOS E HEBREUS
17. REGENERAÇÃO SOBERANA................................................................................ 709 TIAGO, O APÓSTOLO JOÃO, E JUDAS: TIAGO, 1,2,3 JOÃO, E JUDAS
18. PORTODOS OS SÉCULOS V IN D O U R O S.......................................................... 757 O APÓSTOLO JOÃO: O EVANGELHO DE JOÃO E APOCALIPSE
EPÍLOGO, DE R. C. SPROUL......................................................................................... 803
P ró lo go
A IMUTABILIDADE DIVINA E AS DOUTRINAS DA GRAÇA
____ 1, repetidamente e sem ser apologética, salienta o feto que Deus não muda. Na verdade, ele não pode mudar porque não pode melhorar em sua perfei׳ ção absoluta, nem sofrer declínio em sua natureza eternamente fixa. Sua pessoa não muda: “Porque eu, o SENHOR, não m udo” (Ml 3.6). Seus planos não mudam: Ό conselho do SENHOR dura para sempre; os desígnios do seu coração, por todas as gerações” (SI 33.11). Seu propósito não muda: “Querendo mostrar de forma bem clara a natureza imutável do seu propósito... Deus o confirmou com juramento” (Hb 6.17, NV1). Deus não muda de opinião: “A Glória de Israel não mente, nem se arrepende, porquanto não é homem, para que se arrependa” (ISm 15.29); ou suas palavras: “O Santo de Israel... não retira as suas palavras” (Is 31.1,2); ou o seu chamado: “Os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (Rm 11.29; cf. Hb 13.8; Tg 1.17). Absolutamente, não há mudanças em Deus, nem variações, nem surpresas (cf. Sl 102.27).
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Deus não aum enta nem dim inui. Não m elhora nem sofre declínio. Ele não muda por terem sido alteradas algumas circunstâncias - não há emergências imprevistas para aquele que é eternam ente onisciente. Seus propósitos eternos duram para sempre porque ele dura para sempre (SI 33.11). Ele não reage, somente age - e
0 faz conforme
lhe agrada (SI 115.3).
Claro está que, segundo a perspectiva hum ana, parece que Deus m uda seus planos ou suas ações baseado no que as pessoas fazem. Mas não é assim segundo o ponto de vista de Deus. Visto que conhece e sempre conheceü perfeitamente o futuro, tendo׳o planejado de acordo com o seu decreto inalterável, ele sempre age do m odo como planejou desde a eternidade passada. Enquanto que os hom ens não sabem como Deus vai agir, e às vezes se espantam quando veem revelados os planos divinos, Deus nunca é pego de surpresa. Ele continua trabalhando com o sempre fez, de acordo com o seu propósito eterno e o seu beneplácito (cf. SI 33.10-12; Is 48.14; D n 4.35; Cl 1.19-20). Com relação à hum anidade, Deus predeterm inou a redenção de um povo para sua glória. Nada pode frustrar esse plano (Jo 10.29; Rm 8.38,39). Conhecimento perfeito, perfeita liberdade influenciada, e poder perfeito e ilimitado para realizar tudo quanto ele quis e quer - santidade absoluta e perfeição moral movendo-o a ser plenam ente verdadeiro e fiel à sua Palavra - significam que o que Deus começou a fazer antes do princípio do tempo, está fazendo e completará depois que findar o tempo. Esta arrebatadora e gloriosa intenção de Deus foi revelada na Bíblia e foi entendida claramente através da história dos redimidos. A Palavra de Deus a descerrou inequivocamente e, desde quando se completou o cânon da Escritura, todos os firmes intérpretes da Bíblia têm crido e proclamado a gloriosa doutrina do soberano e imutável propósito de Deus. Esta verdade, muitas vezes chamada “doutrinas da graça”, teve início na determinação soberana de Deus na eternidade passada. Deus não pode mudar, sua Palavra não pode mudar, e seu propósito não pode mudar. Sua verdade é a mesma porque ele é a Verdade (cf. SI 119.160; Jo
Prólogo
A I m u t a b i l i d a d e D i v i n a c as D o u t r i n a s da (iraça
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17.17; T t 1.2; H b 6.18). Em contraste com a chamada teologia do telsmo aberto, que alega que Deus não conhece o futuro e, portanto, cabe-lhe adaptar-se às circuns tâncias à medida que se desenvolvem, a Bíblia apresenta Deus como o Soberano que conhece todos os eventos, passados, presentes e futuros. Nas palavras de Isaías 46.9b,10 (NVI):
Eu sou Deus, e não ha nenhum outro; eu sou Deus, e não há nenhum como eu.
Desde o início faço conhecido o fim, desde tempos remotos, 0 que ainda virá. Digo: Meu propósito permanecerá em pé, e farei tudo 0 que me agrada.
A JUSTIÇA DIVINA E A DOUTRINA DA ELEIÇÃO Apesar da clareza que a Escritura fala sobre este tópico, atualmente muitos cristãos professos estão em conflito com a aceitação da soberania de Deus - prin cipalmente quando se trata da obra eletiva de Deus na salvação. Naturalmente, seu protesto mais comum é que a doutrina da eleição é injusta, não é equânime. Mas essa objeção vem de uma ideia hum ana de justiça, e não do entendimento divino, objetivo, da verdadeira justiça. Para que possamos tratar apropriadamente do tema da eleição, devemos pôr de lado todas as considerações humanas e focalizar a natureza de Deus e seu justo e alto padrão. A justiça divina - é onde a discussão deve começar. Q ue é a justiça divina? Exposta simplesmente, a justiça é um atributo es sencial de Deus pelo qual ele faz infinita, perfeita e independentem ente, e com exatidão, o que ele quer fazer, quando e como o quer fazer. Um a vez que é
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padrão da justiça, pela própria definição, seja o que for que faça, isso será ine rentem ente justo. Com o W illiam Perkins disse há m uito tempo, “Não devemos pensar que Deus faz algo porque é bom e reto, mas antes que algo é bom e reto porque Deus o deseja e faz”. P ortanto, Deus define a justiça para nós porque ele é, por natureza, justo e reto, e o que ele faz reflete essa natureza. Sua vontade livre - e nada
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mais - está p or trás da sua justiça. Significa que: o que ele quer é justo; e é justo, não devido a algum padrão externo de justiça, mas sim plesm ente porque ele o quer. Visto que a justiça de Deus é algo que flui do seu caráter, não está sujeita às suposições que o hom em caído faz do que a justiça deve ser. O C riador não deve nada à criatura, nem mesmo aquilo que, em sua graça, deseja dar a ela. Deus não age por obrigação e compulsão, mas por sua prerrogativa independente. E isso que significa ser Deus. E porque ele é Deus, os seus atos livremente determinados são intrinsecamente retos e perfeitos. Dizer que a eleição é injusta, não som ente é inexato, com o tam bém é deixar de reconhecer a essência da verdadeira equidade. O que é equânim e, reto e justo é o que Deus quer fazer. Dessa forma, se Deus quer escolher aqueles que deseja salvar, fazer isso é inerentem ente justo. N ão podem os im por nossas ideias de equidade e justiça ao nosso en ten d im en to das operações de Deus. Em vez disso, devemos ir às Escrituras para ver com o Deus, em sua retidão perfeita, decide agir.
EM Q U E C O NSISTE A D O U T R IN A DA ELEIÇÃO? A ideia de que Deus faz o que quer, e justam ente porque é ele que o faz, torna o que ele faz verdadeiro e reto, e isso é fundam ental para o nosso entendim ento de tudo o que há na Escritura, a doutrina da eleição inclusive. No sentido amplo, a eleição se refere ao fato de que Deus escolhe (ou elege) fazer tudo o que faz por qualquer meio ou de qualquer modo que lhe pareça próprio. Q uando ele age, o faz somente porque, voluntária e independentem ente, escolhe agir. Em conformidade com sua natureza, com seu plano determ inado e com seu beneplácito, Deus decide o que deseja, sem pressão ou coação de nenhum a influência externa. A Bíblia defende este ponto repetidamente. No ato da Criação, Deus fez precisamente o que queria criar e da m aneira como queria (cf. G n 1.31). E desde a Criação ele tem prescrito ou permitido soberanam ente tudo o que faz parte
Prólogo — A I m u t a b i l i d a d e D i v i n a e as D o u t r i n a s da Graça
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da história hum ana, a fim de realizar o plano de redenção que tinha designado previamente (cf. Is 25.1; 46.10; 55.11; Rm 9.17; Ef 3.8Ί1). No Antigo Testamento Deus escolheu uma nação para si. De todas as nações do m undo, selecionou Israel (Dt 7.6; 14.2; SI 105.43; 135.4). Escolheu os israelitas, não porque fossem melhores ou mais desejáveis do que qualquer outro povo, mas simplesmente porque decidiu escolhê-los. Nas palavras de Richard Wolf: “Que coisa estranha Deus escolher os judeus!” Pode não ter soado bem, mas igualmente estranho seria Deus ter escolhido qualquer outro povo. Quem quer que Deus escolha, faz essa opção por razões que pertencem totalm ente a ele. Não foi somente a nação de Israel que, na Escritura, foi objeto da escolha eletiva de Deus. No Novo Testamento Jesus Cristo é chamado “o meu eleito” (Lc 9.35, ARA). Também se faz referência aos santos anjos como “anjos eleitos” (lT m 5.21). E os crentes do Novo Testamento são chamados “eleitos” ou “escolhidos de Deus” (Cl 3.12; cf. IC o 1.27; 2Ts 2.13; 2Tm 2.10; T t 1.1; lPe 1.1; 2.9; 5.13; Ap 17.14), significando que a igreja é a com unidade dos que foram eleitos ou escolhidos (Ef 1.4). Q uando Jesus disse a seus discípulos, “Vocês não me escolheram, mas eu os escolhi” (Jo 15.16), estava salientando essa verdade. E o Novo Testamento a reitera passagem após passagem. Atos 13.48b descreve a salvação com estas palavras: “creram todos os que haviam sido designados para a vida eterna”. Efésios 1.4-6 registra que Deus nos escolheu nele [em Cristo] antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença. Em am or nos predestinou para sermos adotados como filhos, por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade, para louvor da sua gloriosa graça, a qual nos deu gratuitam ente no Amado. Em suas cartas aos tessalonicenses, Paulo lembra a seus leitores que sabia que Deus os escolhera (lTs 1.4), e lhes declara que estava agradecido a Deus por eles, porque Deus os escolheu como seus primeiros frutos, para serem salvos (2Ts 2.13, NVI). A Palavra de Deus é clara: os crentes são os que Deus escolheu para a salvação desde antes do princípio.
I Ifi ןI U N D A M E N T O S 1)A G R A Ç A
O pré-conhecimento a que Pedro se refere (IPe 1.2) não deve ser confundido com simples previsão. Alguns ensinam essa ideia, afirmando que, na eternidade passada, Deus se inclinou e olhou para os saguões da história para ver quem responderia positivamente a seu chamado, e então elegeu os redimidos com base na resposta deles. Essa explicação torna a decisão de Deus sujeita à decisão do hom em , e dá a este um nível de soberania que só pertence a Deus. Faz de Deus alguém que é passivamente escolhido, e não alguém que escolhe ativamente. E essa explicação entende erroneam ente o modo como Pedro empre׳ ga o term o pré-conhecimento. Em lPe 1.20, o apóstolo emprega a forma verbal daquela palavra, prognosis no grego, para referir-se a Cristo. Nesse caso, o conceito de “pré-conhecimento” certamente inclui a ideia de escolha deliberada. É, pois, razoável concluir que a mesma verdade prevalece quando Pedro aplica prognosis a crentes noutros lugares (cf. lPe 1.2). O capítulo nove de Romanos tam bém reitera os propósitos eletivos de Deus. Ali essa prerrogativa é exposta claramente com referência a seu am or salvífico por Jacó (e pelos descendentes de jacó) em oposição a Esaú (e à linhagem de Esaú). Deus escolheu Jacó, e não Esaú, não com base em qualquer coisa que eles tivessem feito, mas de acordo com o seu propósito soberano, livre e não influenciado. A quem acaso protestasse dizendo: “Isso é injusto!”, Paulo simplesmente perguntava: “Q uem é você, ó homem, para questionar a Deus?” (versículo 20). Muitas outras passagens da Escritura poderiam ser acrescentadas a este estudo. C ontudo, honesta como a Palavra de Deus é, muitos continuam ente acham difícil aceitar a doutrina da eleição. A razão, repito, é que eles deixam que as suas noções preconcebidas sobre como Deus deveria agir (baseadas num a definição hum ana de justiça) se sobreponham à verdade da sua soberania nos termos firmados nas Escrituras. Francamente, a única razão que há para crermos na eleição é que essa doutrina se acha explicitamente na Palavra de Deus. Ela não foi originada por nenhum homem, nem por nenhum a comissão de homens. E como a doutrina das penas eternas, no sentido de que é conflitante com os ditames da mente carnal.
Prólogo
A I m u t a b i l i d a d e D i v i n a e <14 D o u t r i n a * da Graça
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Ela causa repulsa aos sentim entos do coração não regenerado. C om o acontece com as doutrinas da Trindade santa e bendita e do nascimento miraculoso do nosso Salvador, a verdade da eleição, visto que foi revelada por Deus, deve ser abraçada com fé singela e não questionadora. Se você tem uma Bíblia e crê nela, você não tem outra opção senão a de aceitar o que ela ensina. A Palavra de Deus o apresenta como o ser que controla todas as criaturas e delas dispõe (Dn 4.35; Is 45.7; Lm 3.38), como o Altíssimo (SI 47.2; 83.18), como o governador do céu e da terra (Gn 14.19; Is 37.16) e como aquele contra quem ninguém pode resistir (2Cr 20.6; Jo 41.10; Is 43.13). Ele é o Todo-Poderoso que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade (Ef 1.11; cf. Is 14.27; Ap 19.6), e como o Oleiro celeste que modela os homens em conform idade com o seu beneplácito (Rm 9.18-22). Em resumo, Deus é o ser que decide e determ ina o destino de todos os hom ens e controla todos os detalhes da vida de cada indiVíduo (Pv 16.9; 19.21; 21.1; cf. Êx 3.21,22; 14.8; Ed 1.1; D n 1.9; Tg 4.15) - o que é realmente outro modo de dizer: “Ele é Deus”.
P O R Q U E DEU S SE D E T E R M IN O U A ELEGER OS REDIM IDOS? Embora, num sentido geral, a doutrina da eleição se aplique a tudo
0 que
Deus faz, mais frequentem ente se refere, no sentido específico presente no Novo Testamento, à eleição de pecadores para se tornarem santos redimidos dentro da igreja. Neste aspecto particular, a eleição divina fala da escolha independente e predeterm inada feita por Deus dos que seriam salvos e colocados no corpo orgânico de Cristo. Deus não salvou certos pecadores porque estes
0 escolheram, mas
porque ele os escolheu. Mas, por que Deus fez isso? Por que, desde a eternidade passada, ele se determinou soberanamente a salvar um segmento da humanidade caída que comporia a comunidade dos redimidos? Para que possamos responder a essa pergunta sem injetar erroneamente nossas próprias noções preconcebidas, devemos ir à Palavra de Deus, pois foi ali que Deus nos revelou sua mente. Claro está que, como seres hum anos caídos, nunca poderemos compreender plenamente a sabedoria infinita
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de Deus quanto a este aspecto (cf. Rm 11.33-36). Não obstante, as Escrituras nos propiciam diversos vislumbres da motivação divina que há por trás da eleição. Por que, então, Deus decidiu salvar pecadores?
A ELEIÇÃO DIVINA E A PROMESSA DE DEUS *
A resposta começa com a promessa de Deus. Em Tito 1.1,2 lemos: “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus Cristo para levar os eleitos de Deus à fé e ao conhecim ento da verdade que conduz à piedade; fé e conhecim ento que se fundam entam na esperança da vida eterna, a qual o Deus que não m ente prometeu, antes dos tempos eternos”. Nesses versículos o apóstolo Paulo define sucintamente a plenitude da salvação e a liga diretam ente à promessa eterna de Deus. A salvação, em sua plenitude, consiste de três partes - justificação (a salva׳ ção, no m om ento da conversão, da penalidade do pecado por meio do sacrifício substitutivo de Cristo); santificação (salvação do pecador, contínua, do poder do pecado, nesta vida); e glorificação (a salvação final e completa do pecador, da presença do pecado na vida por vir). C om o m inistro do Evangelho, Paulo dava ênfase a cada um desses aspectos em seu ministério. Visto que Paulo entendia a justificação, ele pregava
0 Evangelho
“para le-
var os eleitos de Deus à fé”, com preendendo que, pela pregação da verdade, Deus justificaria aqueles que tinha escolhido salvar (cf. Rm 10.14,15). Visto que entendia a santificação progressiva, Paulo procurava fortalecer aqueles que já tinham abraçado a verdade, edificando-os pelo “conhecim ento da verdade que conduz à piedade”. E visto que ele entendia a glorificação, lembrava apaixonadamente aos que estavam sob seus cuidados a verdade relacionada com “a esperança da vida eterna” - a apoteótica consumação da sua salvação em Cristo. Paulo pregava o Evangelho de Cristo com grande clareza para que os eleitos pudessem ouvir e crer. Q uando eles criam, ele lhes ensinava a verdade para que pudessem tornar-se piedosos; e tam bém apresentava a eles a esperahça da vida eterna, o que lhes dava o incentivo e a motivação que necessitavam para viver como crentes fiéis.
Prólogo
A I m u t a b i l i d a d e D i v i n a e as D o u t r i n a s da Graça
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Tendo sumariado a salvação com três breves frases, Paulo term ina o versículo 2 com estas palavras: “a qual o Deus que não mente prometeu antes dos tempos eternos”. A tese do apóstolo é que todo o milagre de revelação da salvação, que culmina na vida eterna, baseia-se na promessa absoluta do nosso Deus, que é absolutam ente fidedigno. O fato de que Deus não pode m entir é evidente em si e por si, como também é atestado escrituristicamente (cf. N m 23.19; ISm 15.29; Jo 14.6, 17; 15.26). Na realidade, uma vez que Deus é a fonte e a medida de toda verdade, por definição “é impossível que Deus m inta” (Hb 6.18). Assim como o Diabo, quando fala mentira, “fala a sua própria língua, pois é mentiroso e pai da m entira” (Jo 8.44), tam bém sucede que toda vez que Deus fala, fala a verdade decorrente da sua própria natureza, porque Ele é o Pai da verdade. Este Deus da verdade, que é o único Deus verdadeiro, prom eteu há m uitas eras que aqueles escolhidos para justificação nesta vida, certa e seguram ente serão glorificados na vida por vir. A frase inglesa “before the ages began" (“antes dos tem pos eternos” T t 1.2) não se refere sim plesm ente à história hu m an a antiga. Traduz-se literalm ente “antes do tem po ter inicio”, e significa exatam ente isso. O certo é que Deus reiterou seu plano de salvação e da vida eterna a hom ens piedosos com o A braão, Moisés, Davi e os profetas, mas a prom essa original foi feita e ratificada na eternidade passada (cf. Ef 1.4,5; Hb 13.20). Foi antes de haver se iniciado o tem po que ele escolheu aqueles que abraçariam a fé (Tt 1.1) e prom eteu salvá-los por toda a eternidade (1.2). Mas, a quem Deus fez essa promessa? Se a fez antes do princípio do tempo, não pode tê-la feito a nenhum ser hum ano, nem a nenhum outro ser criado. Antes da criação do tempo, nada existia fora o próprio Deus. A quem, então, ele fez tal promessa?
A ELEIÇÃO DIVINA E O AMOR DO PAI Temos a resposta em 2Timóteo 1.9. Falando sobre Deus, o versículo declara que ele “nos salvou e nos chamou com um a santa vocação, não em virtude das nossas obras, mas por causa da sua própria determinação e graça. Esta graça
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nos foi dada em Cristo Jesus desde os tempos eternos”. A frase “desde os ternpos eternos” é a tradução da mesma frase grega traduzida praticamente com as mesmas palavras em Tt 1.2. Aqui também significa literalmente “antes de ter se iniciado o tem po”. Na eternidade passada, antes do alvorecer da história, Deus tom ou irrevogavelmente a decisão de conceder a salvação aos redimidos. Essa é a promessa que se vê em Tt 1.2, e é a promessa que Deus fez em conformidade com i
o seu propósito e graça independente. D ito com simplicidade, foi uma promessa que Deus fez a si próprio. Mais especificamente, com o veremos, a eleição divina envolveu uma pro׳ messa do Pai ao Filho. O plano de Deus, desde a eternidade passada, foi de redimir um segmento da humanidade caída por intermédio da obra do Filho e para a glória do Filho (cf. 2Tm 4.18). Houve um m om ento na eternidade passada (se é que podem os falar debilmente da eternidade em termos temporais) em que o Pai desejou expressar o seu perfeito e incompreensível amor pelo Filho. Para isso, escolheu dar ao Filho uma hum anidade redimida com o um presente de amor - uma agremiação de hom ens e mulheres cujo propósito seria, através de todos os éons da eternidade, louvar e glorificar o Filho e servi-lo perfeitamente. Só os anjos não seriam suficientes neste sentido, porquanto há características do Filho com vistas aos quais os anjos não podem louvá-lo propriamente, visto que nunca terão experimentado a redenção. Mas a humanidade redimida, formada por receptáculos diretos do seu favor imerecido, permaneceria para sempre com o um testamento eterno da grandeza infinita da sua misericórdia e graça. Portanto, o Pai determinou-se a dar ao Filho uma humanidade redimida com o uma expressão visível do seu infinito amor. Ao fazê-lo, selecionou todos os que comporiam aquela humanidade redimida e escreveu seus nomes no livro da vida antes do princípio do m undo (Ap 13.8; 17.8). Sua dádiva ao Filho compõe-se daqueles cujos nom es estão naquele livro - uma jubilosa congregação de santos não merecedores que vão louvar e servir o Filho para sempre. O Evangelho de João fala desta realidade maravilhosa com a maior clareza. Em João 6, por exemplo, Jesus afirma claramente que os crentes são uma dádiva do
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Pai. Ele diz a seus ouvintes: “Todo aquele que o Pai me der virá a mim, e quem vier a mim eu jamais rejeitarei”. E depois: “Ninguém pode vir a mim, se o Pai, que me enviou, não o atrair” (versículos 37 e 44). Noutras palavras, o Pai atrai pecadores para presenteá-los amorosamente ao Filho. Todos os que são atraídos vêm. A todos os que vêm, o Filho recebe e abraça. Eles nunca serão mandados embora porque o Filho jamais recusaria os que lhe são dados de presente pelo Pai. Sucede, pois, que a salvação não vem aos pecadores porque são inerentemente desejáveis, mas sim porque o Filho é inerentemente digno da dádiva do Pai. Afinal de contas, 0 propósito da redenção é que o Filho seja eternamente exaltado pelos redimidos - a redenção não é para a honra do pecador, mas para a honra do Filho de Deus. E, em resposta ao amor do Pai, o Filho aceita ardorosamente os que são atraídos, única e totalmente porque eles são uma dádiva do Pai, a quem ele ama. E sua gratidão perfeita que abre seus braços para que ele abrace aos perdidos. Em João 6.39, Jesus declara que o que foi prometido pelo Pai é protegido pelo Filho: “Esta é a vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum dos que ele me deu, mas os ressuscite no último dia”. Quando o Filho recebe aqueles que são atraídos pelo Pai, ele os mantém seguros, garantindo que um dia serão ressuscitados para a vida eterna (cf. Jo 5.29). Quando o Filho ressuscitar aqueles que vão servi-lo eternamente, cumprirá o propósito do plano que Deus fizera na eternidade passada. C om o Jesus diz no versículo 38: “Desci dos céus, não para fazer a minha vontade (não para cumprir algum plano que eu mesmo tenha feito], mas para fazer a vontade daquele que me enviou”. Jesus explica no versículo 39 que este plano abrange a ressurreição futura de todos aqueles que o Pai lhe deu. Sem contestação, a doutrina da segurança eterna é inerente a essa discussão porque é construída dentro do plano. Cristo protege os que foram escolhidos pelo Pai. Ele jamais perderá algum deles, porque eles são presentes de amor que o Pai lhe deu. Eles são preciosos, não devido à sua agradabilidade inerente, mas por causa da agradabilidade de Deus, que os deu. Por isso o Filho os mantém seguros, razão pela qual “nem morte, nem vida, nem anjos nem dem ônios, nem
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o presente nem o futuro, nem quaisquer poderes, nem altura nem profundidade, nem qualquer outra coisa na criação será capaz de nos separar do am or de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8.38,39). Essa verdade profunda é reiterada em João 17. Tendo a cruz som ente algumas poucas horas de distância, Jesus sabia que ia experim entar um período de separação do Pai (cf. M t 27.46), no qual ia ter sobre si a ira de Deus pelo pecado (cf. Is 53.10; 2Co 5.21). Reconhecendo que não poderia proteger os seus naquele m om ento, confiou essa salvaguarda ao próprio Pai que lhos tinha dado. Nos versículos 9 a 15, Jesus implora a seu Pai com estas palavras: Eu rogo por eles. Não estou rogando pelo mundo, mas por aqueles que me deste, pois são teus. Tudo o que tenho é teu, e tudo o que tens é meu. E eu tenho sido glorificado por meio deles. Não ficarei mais no mundo, mas eles ainda estão no mundo, e eu vou para ti. Pai santo, protege׳os em teu nome, o nome que me deste, para que sejam um, assim como somos um. Enquanto estava com eles, eu os protegi e os guardei no nome que me deste. Nenhum deles se perdeu, a não ser aquele que estava destinado à perdição, para que se cumprisse a Escritura. Agora vou para ti, mas digo estas coisas enquanto ainda estou no mundo, para que eles tenham a plenitude da minha alegria. Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, pois eles não são do mundo, como eu também não sou. Não rogo que os tires do mundo, mas que os protejas do Maligno.
No contexto, Jesus ora pelos seus que estão no m undo. Ele reconhece que os redim idos são aqueles que o Pai lhe deu, e reitera que ele foi fiel na proteção e preservação deles. Mas agora, com o vem à cruz, pede ao Pai que os proteja no m om ento em que não poderá fazê-lo. Na única ocasião, em toda a história da redenção, em que haveria, em potencial, oportunidade para o maligno interrom per o plano divino, o Filho confia os redim idos ao cuidado vigilante e am oroso de seu Pai. C om o Jesus, falando sobre suas ovelhas, tinha
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declarado anteriormente: “Meu Pai, que as deu para mim, é maior do que todos; ninguém as pode arrancar da mão de meu Pai” (Jo 10.29). O Filho estava confiante que os seus estariam seguros na impenetrável e forte mão do Pai. Em João 17.24, Jesus continua orando e pede: “Pai, quero que os que me deste estejam comigo onde eu estou e vejam a minha glória, a glória que me deste porque me amaste antes da criação do m undo”. Aqui o objetivo glorioso do presente de amor do Pai ao Filho é inequívoco - que a magnificente glória do Filho seja enaltecida e exaltada pelos redimidos. A motivação do Pai para dar tal presente também é clara evidenciar o amor que tinha pelo Filho antes do mundo ser criado. Evidentemente, há um agudo sentido em que a doutrina da eleição está m uito além da nossa capacidade finita de compreender. Som os apanhados por insondáveis e inexprimíveis expressões intra׳trinitárias de amor. E, quando nos são dados dim inutos vislumbres do propósito divino subjacente à eleição, somos repetidamente levados a lembrar que a salvação diz respeito a algo m uito maior do que a nossa felicidade pessoal. Em Romanos 8.29,30 nos é dada outra janela inspirada que se abre para esta realidade imensurável. Paulo escreve: “Pois aqueles que de antemão conheceu, tam׳ bém os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, também chamou; aos que chamou, também justificou; aos que justificou, também glorificou”. Embo׳ ra se possa dizer muita coisa sobre esses versículos, dois pontos são de primordial importância quanto à doutrina da eleição. Primeiro, quando Deus nos predestinou por seu propósito eletivo, não o fez meramente para o início da nossa salvação, mas também para o fim dela. Não fomos escolhidos só para sermos justificados. Fomos escolhidos para sermos glorificados. A fraseologia de Paulo não poderia ser mais simples e direta. O que Deus começou na eleição, continua através da vocação e da justificação, e, inevitavelmente, redundará na glorificação. O processo, que é efetuado por Deus, é imune à prova, porque é ele quem está por trás. Segundo, o propósito não é só Deus salvar uma humanidade escolhida e redimida, a qual glorificará e servirá o Filho para sempre; Ele está tornando os
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eleitos semelhantes ao Filho. Os redimidos em Cristo vão sendo conformados à sua imagem, o que não se realizará plena e finalmente enquanto não se der a glo׳ rificação deles (1J0 3.2; Fp 3.20,21). Tem-se dito acertadam ente que a imitação é a mais alta forma de louvor, pois esta será o supremo tributo dado ao Filho - Ele será o Primeiro e o Principal entre muitos que terão sido feitos semelhantes a ele. Os eleitos refletirão a sua bondade, porque serão semelhantes a ele, e proclamarão a sua grandeza quando o servirem incessantemente, por toda a eternidade.
A ELEIÇÃO DIVINA E O PAPEL DO FILHO Em lC oríntios 15.25-28, vemos uma notável conclusão de toda essa dis׳ cussão. Ali Paulo diz: Pois é necessário que ele [Cristo] reine até que todos os seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés. O último inimigo a ser destruído é a morte. Porque ele “tudo sujeitou debaixo de seus pés”. Ora, quando se diz que “tudo” lhe foi sujeito, fica claro que isso não inclui o próprio Deus, que tudo submeteu a Cristo. Q uando, porém, tudo lhe estiver sujeito, então o próprio Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, a fim de que Deus seja tudo em todos. Referindo-se ao fim dos séculos, esta passagem nos revela que virá o dia em que Cristo, o Rei dos reis, assumirá seu legítimo trono e reclamará o universo, que lhe pertence. Nesse tempo, tudo será posto em sujeição a ele, a m orte inclusive, e todos os redimidos serão reunidos na glória, alegrando-se na plenitude da adoração eterna. Q uando tudo isso for feito, “então o próprio Filho se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou [referindo-se ao Pai], a fim de que Deus seja tudo em todos”. Noutras palavras, quando o presente de am or completo, de uma hum anidade redimida, tiver sido dado a Jesus Cristo, ele tomará essa humanidade redimida e, incluindo-se neste presente, dará tudo de volta ao Pai, como uma expressão recíproca do am or infinito do Pai. Naquele mom ento, os propósitos redentores de Deus serão concretizados plenamente. Segue-se, pois, que a doutrina da eleição está no verdadeiro coração da his׳ tória da redenção. Não se trata de alguma doutrina insignificante, esotérica, que
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poderia ser trivializada ou relegada a debates nas salas de aulas dos seminários. Antes, ela é o centro pelo qual podemos entender a salvação e a igreja. A doutrina da eleição informa, instrui, modela a nossa evangelização, a nossa pregação e a nossa identidade como corpo de Cristo. Também nos ajuda a entender por que Cristo leva tão a sério a sua noiva, a igreja - esta é o presente de am or que o Pai lhe deu. A igreja é tão preciosa para Cristo, que ele se dispôs a suportar grandes tribulações e finalm ente a sofrer a m orte para receber o presente. “[O Filho) sendo rico, se fez pobre por amor de vocês, para que por meio de sua pobreza, vocês se tornassem ricos” (2C0 8.9; cf. Fp 2.5-11). Ele deixou de lado infinitas riquezas espirituais para que os seus elei tos herdassem essas mesmas riquezas (cf. Rm 8.17). Ele acatou a mais profunda pobreza possível, despindo-se de tudo o que lhe propiciava perfeito bem-estar e do uso independente dos seus atributos divinos, escolhendo abraçar a penalidade do pecado mediante seu sacrifício na cruz. Com o Paulo explica: “Deus [o Pai] tornou pecado por nós aquele [o Filho] que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus” (2Co 5.21). Jesus não era culpado de coisa alguma. C ontudo, na cruz, o Pai o tratou como se ele tivesse cometido pessoalmente todos os pecados cometidos por to dos os indivíduos que creram ou que viriam a crer. Apesar de isento de culpa, enfrentou a fúria total da ira de Deus, sofrendo a penalidade do pecado em favor daqueles que veio salvar. Desse modo, o Filho de Deus, sem pecado, tornou-se o substituto perfeito dos filhos dos homens, pecadores. Como resultado do sacrifício de Cristo, os eleitos se tornaram a justiça de Deus nele. Do mesmo modo como o Pai tratou o Filho como pecador, mesmo sendo ele sem pecado, o Pai agora trata os crentes, mesmo pecadores, como justos. Jesus trocou sua vida pelos pecadores a fim de cumprir o plano eletivo de Deus. E o fez para que, no fim, pudesse dar de volta ao Pai o presente de amor que o Pai lhe deu. M editando nestas verdades, nós nos vemos atirados nas imensuráveis profundezas dos planos e dos propósitos de Deus. Com o Paulo exclamou em Romanos 11.33-36:
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Ó profundidade da riqueza da sabedoria e do conhecim ento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e inescrutáveis os seus caminhos! “Q uem conheceu a mente do Senhor? O u quem foi seu conselheiro?” “Quem primeiro lhe deu, para que ele o recompense?” Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre. Amém. Tomados de temor e maravilhados, aqueles que amam a Deus só podem reagir com profundo desejo de adoração e hum ilde submissão. Eles sentem necessidade de louvá-lo por sua misericórdia, graça e glorioso propósito, que planejou isso tudo desde o início do tempo. E sentem necessidade de submeter-se à sua soberania, não som ente no universo em geral, mas também nos m ínim os pormenores de suas vidas diárias. Esse é o papel que eles desempenham com o parte do presente de amor dado pelo Pai ao Filho. Que o adorem e o sirvam é o propósito estabelecido para eles desde a eternidade passada. E é isso que eles continuarão a fazer perfeitamente, no inefável gozo da glória eterna. A realidade é, pois, que os crentes são simplesmente uma diminuta parte de um plano divino muito maior. O Pai, por causa do seu amor pelo Filho, determinou-se, antes do princípio do tempo, a escolher uma comunidade redimida que louvaria o Filho por toda a eternidade. E o Filho, devido a seu amor pelo Pai, aceitou este presente de amor do Pai, considerando-o precioso a ponto de entregar sua vida por ele. O Filho protege aqueles que o Pai escolheu para lhe dar, e promete levá-los para a glória, em conformidade com o predeterminado plano de Deus.
A LONGA LINHA DE VULTOS PIEDOSOS A história é o desdobramento deste plano de Deus - pois aqueles que ele escolheu são chamados, justificados e glorificados por m eio da pessoa e obra do Filho. A história com eçou quando Deus criou 0 tempo e o espaço de acordo com o seu plano redentor eterno. E terminará quando todos os seus propósitos para a sua criação forem concretizados de acordo com esse mesmo plano eterno. N ão surpreendentemente, os servos de Deus, através de toda a história, têm entendido e abraçado essa realidade. Desde Moisés até 0 presente, tem havi
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do, verdadeiramente, uma longa linha de vultos piedosos que demonstram essa certeza tanto com suas palavras com o com suas vidas. Tais servos de Deus são os nossos heróis da fé. Mas não é sua grandeza inerente que aplaudimos. Antes, é a grandeza e a glória do seu soberano Deus, refletidas em suas vidas e em seu ensino, que som os constrangidos a aplaudir. O tema destes volumes é, então, o caráter e a fidelidade de Deus nas doutrinas da graça. N o Volume 1, Steven Lawson, clara e compreensivamente, lança o alicerce escriturístico para as doutrinas da graça. Este volume nos dá a base bíblica de tudo
0 que se segue. Os Volumes 2 a 5 erguenvse com o colunas sobre aquele firme fun׳ damento - registrando os ecos da revelação divina através da história da igreja. No transcurso da obra, logo se torna patente que os escritores da Escritura, e os intérpretes que se lhes seguiram, sustentaram e ensinaram os mesmos dogmas imutáveis que constituem a salvação divina e soberana. Quando você ler os relatos sobre esses homens piedosos, ficará maravilhado, não pelo talento e pela habilidade deles, nem pelas circunstâncias singulares em que se achavam, mas por sua coerência em praticar e proclamar a mesma divina verdade das doutrinas da graça. Por conseguinte, a obra Longa Linha de Vultos Piedosos não é primariamente sobre hom ens, mas sim sobre o Deus de quem esses hom ens testificam. Enquanto que os hom ens piedosos vêm e passam, com o qualquer exame da história mostra claramente, o Deus que falou através deles nunca muda, e tampouco muda a sua mensagem. E isso que torna a obra produzida por Lawson tão rica e edificante. O Deus de Moisés, o Deus de Pedro, o Deus de Crisóstomo, o Deus de Lutero, o Deus de Edwards, o Deus de Spurgeon, e o Deus a quem servimos atualmente, manda׳nos proclamar as verdades imutáveis firmadas no passado. A imutabilidade de Deus e a eternidade das suas verdades, particularmente da doutrina da eleição soberana, formam a pedra angular dessa história.
John M acA rthur Los Angeles, 2006
P refácio
A VERTENTE CONTINENTAL DA TEOLOGIA
C )f ^ — / ^ - ^ /través das regiões ocidentais da América do N orte, corre um a linha geográfica imaginária que determ ina o fluxo das correntes para os oceanos. Essa linha é conhecida pelo nom e de Vertente C ontinental. Em últim a instância, a precipitação que cai no lado oriental desta grande vertente flui para o Oceano Atlântico. De igual m odo, a água que cai nos declives que ficam a oeste, avoluma-se na direção oposta até esvaziar-se finalm ente no O ceano Pacífico. E desnecessário dizer que um vasto continente separa essas imensas massas de água. Parece um tanto forçado ponderar que um a gota de chuva que cai no topo de um a m ontanha no C olorado fluirá para
0 Pacífico,
ao passo que outra
gota, caindo a um a dim inuta distância da primeira, fluirá para o Atlântico. Não obstante, uma vez que a água se derram e num lado particular desta grande vertente, seu trajeto está determ inado e sua direção é imutável.
ן ו0 וI I I N D A M H N T O S DA G R A Ç A
A geografia não é o único lugar em que encontram os uma grande vertente. Há, tam bém , um elevado terreno que corre através da história da igreja - um a V ertente C o n tin e n ta l da teologia. Esta grande vertente separa duas correntes distin tam ente diferentes de pensam ento que fluem em direções opostas. Para ser específico, este elevado terreno determ inativo é a teologia que se adota sobre Deus, o hom em e a salvação. Este é o mais alto de todos os pensam entos, e divide toda a d o u trin a em duas escolas. H istoricam ente, os dois m odos de pensam ento acerca de Deus e de sua graça soberana têm recebido vários nom es. Alguns os identificam com o agostinianismo e pelagianismo. O utros os têm denom inado calvinismo e arminianismo. A inda outros
os definem com o reformados e católicos, enq u an to outros têm em pregado os term os predestinação e Íiwe-arbítrio. Mas, seja qual for o nom e, estas correntes são determ inadas pela V ertente C o n tin en tal da teologia. Esta vertente metafórica difere da Vertente C ontinental geográfica em um aspecto-chave. Ao passo que as correntes que fluem para oeste e para leste, vindas das M ontanhas Rochosas, descem gradativamente às planícies e às terras baixas onde encontram os oceanos, o terreno nos dois lados da vertente doutrinária é m uito diferente. Em um lado, encontram os as sólidas terras altas da verdade. No outro estão os declives íngremes e escarpados das meias verdades e do erro total. Através dos séculos, os períodos de reform a e de avivamento da igreja surgem q u ando a graça soberana de Deus é proclam ada abertam ente e ensinada claram ente. Q u an d o um alto conceito de Deus era infundido nos corações e nas m entes do povo de Deus, a igreja se assentava nos elevados planaltos da verdade transcendental. Essa alta base é o calvinismo - a alta base para a igreja. As excelsas verdades que fluem da soberania de Deus propiciam a m aior e mais grandiosa visão de Deus. As doutrinas da graça se prestam para elevar a vida da igreja em todos os seus aspectos. O grande teólogo de Princeton, Benjam in Breckenridge W arfield, escrevendo há mais de um século, observou perceptivam ente: “O m undo deve com preender com m aior clareza que o m o
Prefácio
A Vertente C o n t i n c n h i l ilti I'colof/iu
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vim ento realm ente evangélico perm anece ou cai no calvinism o”.1 À prim eira vista, essa declaração surpreendente pode parecer um exagero, ou até uma hipérbole. Mas, qu an to mais o interessado ponderar sobre ela, mais perceberá que o legítimo m ovim ento evangélico - essa parte do corpo de C risto que cor retam ente adere à inerrância da Escritura, com plena aceitação das doutrinas da depravação total do hom em e da soberania de Deus em todos os aspectos da vida - sem pre tem necessidade das doutrinas ligadas à soberania de Deus para poder ancorar em base firm e e elevada. Pois, sem os ensinos da verdade reform ada concernente à soberania de Deus na salvação do hom em , a igreja se enfraquece e se torna vulnerável, para logo começar
0 inevitável
declínio,
descam bando para crenças inferiores, quer se dê conta disso quer não. Sempre que a igreja se torna crescentemente centralizada no homem, co meça a deslizar ladeira abaixo, muitas vezes sem recuperação, e sempre em seu detrimento. Assim que a igreja desiste da elevada base do calvinismo, uma igreja ab sorta em si mesma põe todo o seu peso na escorregadia encosta do arminianismo, resultando na perda da sua estabilidade fundamental. Tragicamente, porém, é raro a descida parar ali. Historicamente, a doutrina centrada no homem só tem servido como um catalisador que conduz a uma queda ainda maior. Com a arriscada descida pelos escorregadios declives do arminianismo, logo se vê a igreja afundar cada vez mais num tenebroso atoleiro de ideias heré ticas. Inevitavelmente, essa descida abre cam inho para o liberalismo, com sua completa rejeição da autoridade absoluta da Escritura. Do liberalismo - dando-se tempo suficiente - a igreja sempre mergulha mais fundo, indo parar no ecume nismo, essa filosofia m ortal que abraça todas as religiões considerando-as como tendo alguma parte da verdade. C ontinuando essa espiral descendente, a igreja cai no universalismo, a condenável crença em que finalmente todos os homens serão salvos. Pior ainda, o universalismo abre cam inho para o agnosticismo, a degenerada ideia segundo a qual não se pode nem saber se existe um Deus. Por i R. B. W arfield, citado em T ta Sovereignty o f God {A soberania d e D eus), de A rth u r C . C u stan ce (Phillipsburg, NJ: Presbyterian & Reform ed, 1979), 8 3 8 4 ׳.
I η
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último, a igreja cai no abismo mais profundo - nas chamas infernais do ateísmo, a crença em que não existe Deus. A apresentação das sublimes verdades do calvinismo neste livro é uma tentativa de restabelecer o firme alicerce da igreja no excelso fundam ento que outrora ela m antinha e defendia. Os capítulos que se seguem foram projetados es׳ trategicamente para m anterem firmes os pés da igreja no ápice de toda a verdade centrada em Deus: as doutrinas da graça. Em cada porção da Escritura, exami׳ naremos o que historicamente tem sido identificado como os cinco pontos do calvinismo: depravação total, eleição incondicional, expiação limitada, graça ir׳ resistível, e perseverança dos santos. Examinaremos virtualm ente todos os textos que ensinam cada uma dessas doutrinas principais e, ao fazê10׳, fortaleceremos as nossas convicções e consideraremos o seu poder de transform ar a vida do crente. Sopesaremos cuidadosamente o m odo como elas elevam drasticamente os minis׳ térios, expandem as missões, e, subsequentemente, alteram o curso da história. Nunca foi maior a necessidade de que as verdades relacionadas com a graça soberana sejam estabelecidas firmemente na igreja. O pensamento da igreja acerca de Deus necessita desesperadamente fluir na direção certa. Os adoradores pensam como a igreja pensa; e como a igreja adora, assim ela vive, serve e evan׳ geliza. O correto conceito da igreja sobre Deus e sobre a operação da sua graça modela tudo o que é vital e im portante. A igreja precisa recapturar a sua elevada visão de Deus e, com isso, ancorar na sólida rocha da absoluta supremacia divina em todas as coisas. Só então ela terá um a orientação teocêntrica em todas as ques׳ tões do ministério. Esta, creio eu, é a desesperada necessidade da presente hora. Embarquemos agora nessa busca que visa exaltar Deus e honrar Cristo. Em última análise, o nosso conceito de Deus está em jogo. O conceito que dele temos afeta tudo. Elevemos o nosso Deus em nossos corações ao lugar mais alto, o qual per׳ tence exclusivamente a ele. Somente a Deus seja a glória para todo o sempre. Amém.
Steven Lawson Mobile, 2006
RECONHECIMENTOS
Q uero expressar a m inha mais profunda gratidão ao Dr. John MacArthur. D urante vinte e cinco anos, o D t. M acArthur tem aguçado a m inha mente e alim entado a m inha alma por meio da sua exposição teocêntrica das Escrituras. Seu prólogo para este volume, “A Im utabilidade Divina e as D outrinas da Graça”, é, creio eu, inestimável. Também quero agradecer as palavras do Dr. R. C. Sproul, cuja influência pessoal sobre a m inha vida tem sido profunda. D urante os anos dos meus estudos para o doutorado, sentei-me para ouvi-lo, e cada uma de suas aulas ficou vividam ente gravada em m inha mente. Q ue ele tenha contribuído com o epílogo deste volume me torna hum ildem ente e grato. Um grupo especial de pessoas ajudou a tornar realidade a obra Fundamentos da Graça. Primeiro, devo m encionar os hom ens da Igreja Batista
C om unidade de Cristo (Christ Fellowship Baptist Church), que se reuniam comigo todas as sextas-feiras de m anhã por um ano inteiro de estudo das verdades destes capítulos. O com prom isso deles com as doutrinas da graça me anim aram grandem ente. Greg Bailey, editor-chefe da Editora Ligonier’s Reformation Trust, emprestou seus atentos olhos e sua habilidosa mão aos originais, m elhorando a acurácia e tornando a leitura mais agradável. Chris Larson, o criativo diretor do ministério “Ligonier”, é responsável pelos chamativos gráficos e pela atraente apresentação deste livro.
ן1) ן יI l l N D A M E N T O S DA G R A Ç A
Meu filho James Lawson fez considerável pesquisa no interesse deste livro. Keith Phillips, Chuck Finster, Chris Barksdale e Rick Holland, e seus alunos no Seminário do Mestre (The Master’s Seminary), fizeram, todos eles, úteis contribuições. Kay Allen, minha assistente executiva, desempenhou um papel especialmente significativo digitando todo o manuscrito e coordenando tudo, do começo ao fim. Muito im portante: Quero prestar meus agradecimentos à m inha esposa, Anne, e aos nossos quatro filhos, Andrew, James, Grace A nne e John, por seu im orredouro amor, aguentando-me em m inha pregação destas verdades que exaltam o soberano Deus.
Soli Deo Gloria.
?^ào é uma novidade, então, que eu estou pregando: nào é nenhuma nova doutrina. Gosto de proclamar essas velhas e fortes doutrinas, que levam o apelido de CALVINISM O, mas que são, certa e verdadeiramente, a verdade revelada de Deus como se vê em Cristo Jesus. Por meio desta verdade, eu faço uma peregrinação no passado, e, conforme vou caminhando, vejo, pai após pai, confessante após confessante, m ártir após mártir, se levantarem para apertar minhas mãos.... Assumindo estas coisas como 0 padrão da minha fé, vejo a terra dos antigos cheia de irmãos meus: contempio multidões que confessam as mesmas coisas que eu confesso, e reconheço que esta é a religião da igreja de Deus.1 Charles H. Spurgeon
1 C h a r le s H . S p u rg e o n , c ita d o p o r D a v id S teele e C u r tis T h o m a s e m The Five Points of C a lv in is m (P h illip s b u rg , NJ: P re sb y te ria n &. R e fo rm e d , 1963), 8.
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a p ít u l o
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LONGA LINHA DE VULTOS PIEDOSOS SERVOS DA GRAÇA SOBERANA: DE MOISÉS AO PRESENTE
omeçando com o antigo profeta Moisés e cruzando os trinta e cinco séculos passados até a presente hora, compareceu ao palco da história hum ana uma longa linha de homens piedosos, que mantiveram erguida a bandeira real das doutrinas da graça em suas respectivas gerações. Esses defensores modelares da soberania da graça de Deus compõem uma nobre procissão que se tem mantido inquebrável e ininterrupta durante milênios. Eles se levantam como um só - como um na verdade, na fé, nas doutrinas da graça. Embora tendo divergências em áreas secundárias do entendimento bíblico, não obstante falam com uma só voz sobre os temas principais de interesse doutrinário, a saber, sobre a suprema soberania pela qual Deus designou a graça salvadora para pecadores não merecedores e, contudo, escolhidos. E, o que é mais marcante, cada homem apareceu na história precisamente no tempo determinado por Deus, e cada um deles testificou a soberania divina na salvação do homem.
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Q uem são esses grandes homens da história? Eles foram os pregadores mais fascinados por Deus do seu tempo, os mestres mais saturados pela Palavra da sua época, os hom ens que, na maior parte, marcaram os seus tempos em sua ênfase na glória de Deus. Eles foram os heróis da fé, as colunas mais sólidas da igreja, homens que impactaram nações e influenciaram continentes por e para Cristo, homens que fizeram eclodir reformas e que acenderam despertamentos espirituais. Eles foram os valentes guerreiros do reino de Deus, que traduziram as Escrituras para as línguas maternas dos seus respectivos povos - e que foram presos a estacas e queimados por realizarem esse trabalho. Foram hom ens que fundaram denom inações baseadas na Bíblia e lançaram missões para a propa׳ gação do Evangelho - hom ens que legaram um impacto eterno sobre a vida da igreja. Eles estão entre os mais estimados pastores, os mais distinguidos teólogos e os mais prolíficos escritores das suas respectivas gerações. Eles foram os evange listas mais apaixonados, eruditos professores e veneráveis presidentes de colégios e seminários bíblicos - homens que defenderam o padrão das sãs palavras. São os hom ens que foram os verdadeiros campeões das doutrinas da graça. Nós testificamos sua marcha para o palco da história, sendo o m undo o seu teatro e a Escritura as suas linhas repassadas. Incontáveis núm eros desses hom ens apareceram nos m om entos mais prem entes do registro divino, nos dias em que a igreja estava mais fraca. Foi em tais períodos que esta longa linha de vultos piedosos se afinou mais. C ontudo, no meio dos tenebrosos dias de erro doutrinário, eles perm aneceram fiéis à Palavra de Deus e à sua mensagem, ousando até m archar fora do passo, destoando da cadência dos tempos. Estes resistentes mensageiros da verdade foram, deste ou daquele modo, os pequenos gonzos sobre os quais as grandes portas da historia da redenção giraram, levan׳ do a igreja inevitavelmente de volta ao sol nascente de um a brilhante m anhã. Sim ilarm ente, nos períodos das maiores reformas e dos maiores avivamentos da igreja, eles se puseram resolutam ente à testa como verdadeiros arautos, pro clam ando a veracidade da soberania de Deus na salvação dos hom ens para que todos ouvissem. Século após século, a inquebrável sucessão de valentes espiri
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tuais foi aum entando suas fileiras até se tornar um a grandiosa e imensa parada - um a longa linha de vultos piedosos, ininterrupta e intacta.
U M ALTO C O N C E IT O DA SOBERA NIA DE DEUS Qual é esse distante retum bar de tambores pelo qual estes hom ens marcham? O que os compele a mover-se para diante mais e mais, por Deus e por suas gerações? Q ue é que os impulsiona a capturar suas horas para Cristo? Que é que incendeia suas almas fazendo-as arder de paixão por ele e fazendo delas fulgentes tochas da verdade nas suas respectivas épocas? A resposta é clara e impositiva. Eles foram totalm ente dom inados por um alto conceito da soberania de Deus. Com uma transcendental e triunfante visão de Deus governando supremamente todas as coisas, compreenderam um exército de expositores e mestres, trom beteando o reinado sem rival de Deus sobre céu e terra. E isto que os torna extraordinariamente grandes. E que eles pregam um Deus infinitam ente grande, grande em santidade e grande em soberania. A grandeza destes hom ens não se acha neles, mas no ser supremo que os chamou para o seu glorioso emprego. Esses homens creem que Deus é Deus, não meram ente no nome, mas também num a viva realidade. São eles os fiéis mensageiros que se agarram à verdade central de que Deus fala, e o que ele diz certam ente se torna realidade. Eles proclamam que o que Deus se propõe realizar, acontece. Eles declaram que Deus chama, e é atendido. Eles marcham como arautos, anunciando que Deus planeja
e cumpre o que planejou. Não há força que possa resistir ao soberano Deus, nem no céu, nem na terra, nem debaixo da terra. Ele pronuncia o fim desde o princípio. Seu propósito será estabelecido infalivelmente. A mensagem destes hom ens funda׳se no testem unho inequivocamente claro da Escritura de que Deus é soberano sobre todas as coisas. Com esse fim os salmistas escrevem: “O Senhor desfaz os planos das nações e frustra os propósitos dos povos. Mas os planos do Senhor permanecem para sempre, os propósitos do seu coração, por todas as gerações” (SI 33.10,11); “O Senhor reina! Vestiu-se de majestade; de majestade vestiu׳se o Senhor e armou-se de poder! O m undo está
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firme e não se abalará. O teu trono está firme desde a antiguidade; tu existes desde a eternidade” (SI 93.1,2); “O Senhor estabeleceu o seu trono nos céus, e como rei dom ina sobre tudo o que existe” (SI 103.19); Ό nosso Deus está nos céus, e pode fazer tudo o que lhe agrada” (SI 115.3); e “O Senhor faz tudo o que lhe agrada, nos céus e na terra, nos mares e em todas as suas profundezas” (SI 135.6). Pode alguma coisa ser mais clara? O que quer que Deus queira, ele faz. A sabedoria de Salomão faz ressoar este mesmo dom ínio inescrutável de Deus. Salomão escreve: “Muitos são os planos no coração do homem, mas o que prevalece é o propósito do Senhor” (Pv 19.21); “Os passos do hom em são dirigidos pelo Senhor. Com o poderia alguém discernir o seu próprio caminho?” (Pv 20.24); “O coração do rei é como um rio controlado pelo Senhor; ele o dirige para onde quer” (Pv 21.1); e “Não há sabedoria alguma, nem discernim ento algum, nem plano algum que possa opor-se ao Senhor. Prepara-se o cavalo para o dia da batalha, mas o Senhor é que dá a vitória” (Pv 21.30,31). O profeta Isaías proclamou a soberania incondicional de Deus sobre todos os acontecimentos, sobre todas as circunstâncias e sobre todos os povos. Deus pes-
soalmente, por interm édio de Isaías, diz: “Desde os dias mais antigos eu o sou. Não há quem possa livrar alguém de m inha mão. Agindo eu, quem o pode desfazer?” (Is 43.13). “Eu sou Deus, e não há nenhum outro; eu sou Deus, e não há nenhum como eu. Desde o início faço conhecido o fim, desde tempos remotos, o que ainda virá. Digo: Meu propósito permanecerá em pé, e farei tudo o que me agrada... o que eu disse, isso eu farei acontecer; o que planejei, isso farei” (Is 46.911); e “Por am or de mim mesmo, por am or de mim mesmo, eu faço isso... Não darei a m inha glória a nenhum outro” (Is 48.11). Não há como entender mal esses versículos: Deus fará tudo o que planeja e todo o seu propósito será cumprido. O profeta Daniel e os mais poderosos governantes do seu antigo tempo afirmavam essa mesma altaneira soberania de Deus. Daniel registrou as palavras de Nabucodonosor, rei da Babilônia: “O Altíssimo dom ina sobre os reinos dos hom ens e os dá a quem quer, e põe no poder o mais simples dos hom ens” (Dn 4.17). N abucodonosor confessou hum ildemente: “O seu dom ínio é um dom ínio
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eterno; o seu reino dura de geração em geração. Todos os povos da terra são como nada diante dele. Ele age com o lhe agrada com os exércitos dos céus e com os habitantes da terra. Ninguém é capaz de resistir à sua mão ou dizer-lhe: ‘O que fizeste?’” (Dn 4.34,35). Dario, rei dos medos e dos persas, exaltou Deus proclamando: “Pois ele é o Deus vivo e permanece para sempre; o seu reino não será destruído, o seu dom ínio jamais acabará. Ele livra e salva; faz sinais e maravilhas nos céus e na terra” (Daniel 6.26,27). C om grandeza de tirar o fôlego e com esplendor de quebrar o queixo, esse é o grande e temível Deus que esses grandes hom ens proclamavam. Eles tonitruavam acerca de um Deus tão gloriosamente soberano que nada ou ninguém lhe pode fazer resistência com sucesso, nem o céu, nem o inferno, nem Satanás e os anjos caídos, nem o hom em e os anjos eleitos. Eles registraram seus testemunhos sobre um Deus que é Criador, C ontrolador, Sustentador e D eterm inador de tudo quanto há. Em resumo, eles proclamavam um Deus altíssimo em supremacia, um Deus que governa a história e ordena o fim desde o princípio. Esse é o Deus que eles defendiam diante dos olhos atentos do m undo inteiro. Eles procuravam cum prir fielmente os termos do urgente apelo do salmista: “Digam entre as nações: ‘O Senhor reina!’” (SI 96.10). Alguém ainda se espanta ou duvida que Deus abençoou e abençoa os seus esforços?
A SOBERANIA DE DEUS NA SALVAÇÃO As doutrinas da graça compõem um sistema coeso de teologia no qual a soberania é claramente demonstrada na salvação dos pecadores eleitos. Não só se reconhece que Deus reina sobre toda a história humana, micro e macro, mas também que ele é soberano na dispensação da sua graça salvadora. De Gênesis a Apocalipse, Deus é apresentado na Escritura como absolutamente determinativo em outorgar a sua misericórdia. Ele é exposto como tendo escolhido desde antes da fundação do m undo aqueles que quer salvar, e depois, dentro da história, fazendo isso acontecer. O apóstolo Paulo anunciou claram ente a graça soberana de Deus na salvação do hom em . Ele escreveu que, desde a eternidade, Deus escolheu,
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quis, decidiu e planejou salvar alguns pecadores. Eleger é escolher, e Deus escolheu os que seriam salvos. Paulo escreveu: “Pois ele diz a Moisés: ‘Terei
m isericórdia de quem eu quiser ter m isericórdia e terei com paixão de quem eu quiser ter com paixão’. Portanto, não depende do desejo ou do esforço hum ano, mas da m isericórdia de D eus.” (Rm 9 .15Ί6). Isso eqüivale a dizer que Deus decide quem vai salvar a fim de m anifestar sua glória: “Deus nos escolheu nele antes da criação do m undo, para sermos santos e irrepreensí׳ veis em sua presença. Em am or nos predestinou para sermos adotados como filhos, por meio de Jesus C risto, conform e o bom propósito da sua v o ntade” (Ef 1.4,5); “Sabemos, irmãos, am ados de Deus, que ele os escolheu” (lT s 1.4); “Deus os escolheu com o seus prim eiros frutos para serem salvos m ediante a obra santificadora do Espírito e a fé na verdade” (2Ts 2.13); Deus “nos salvou e nos cham ou com um a santa vocação, não em virtude das nossas obras, mas por causa da sua própria determ inação e graça. Esta graça nos foi dada em C risto Jesus desde os tem pos eternos” (2Tm 1.9); e “Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus C risto, para levar os eleitos de Deus à fé” (Tt 1.1). Os apóstolos Pedro e João ensinavam precisamente a mesma autoridade suprema de Deus na salvação dos eleitos. Pedro escreveu: “Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos de Deus, peregrinos dispersos no Ponto, na Galácia, na Capadócia, na província da Ásia e na Bitínia” (lPe 1.1); e: “Portanto, irmãos, em penhem ׳se ainda mais para consolidar o chamado e a eleição de vocês” (2Pe 1.10). O apóstolo João escreveu: “A besta que você viu, era e já não é. Ela está para subir do Abismo e caminha para a perdição. Os habitantes da terra, cujos nomes não foram escritos no livro da vida desde a criação do m undo, ficarão admirados quando virem a besta, porque ela era, agora não é, e entretanto virá” (Ap 17.8).
A GLÓRIA DE DEUS É PRIMORDIAL Neste sistema de teologia, a glória de Deus é central. Assim como todos os planetas giram em torno do fulgurante sol, todas as verdades da graça sobe׳ rana fazem sua rotação ao redor de um único ponto fixo - a glória de Deus. A
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preem inência de Deus, sem rival, permanece firme no ponto focal do universo teológico. Q ue Deus deve ser reconhecido como o principal objeto de louvor na manifestação da sua graça é o que energiza esse sistema solar da verdade. Assim como a bússola sempre aponta para o norte, assim tam bém as doutrinas da graça apontam constantem ente para cima, para as excelsas altitudes da glória de Deus. Q u e é a glória de Deus? A Bíblia fala da glória de Deus em dois aspectos prim aciais. Prim eiro fala da glória intrínseca de Deus, que é a som a total de todos os atrib u tos e perfeições divinas. Essa glória intrínseca é quem Deus é - sua grandeza in fin itam en te vasta. G lória, no A ntigo T estam ento (kabod), o rigin ariam en te significava “peso”, “im p o rtân cia”, ou “significação”. Pas׳ sou depois a representar a m aravilhosa m agnificência de certos objetos, tais com o o esplendoroso sol e a régia m ajestade o sten tad a pelos reis. Daí, o term o glória veio a ser em pregado para descrever o m agnífico esplendor e o form idável fulgor de Deus revelados ao hom em . N o Novo T estam ento a palavra para “glória” é doxa, que significa “um a o p in ião ” ou “um a estim ati׳ va” sobre algo. Q u an d o em pregada com referência à reputação de alguém, significa “im p o rtân cia”, “grandeza”, “re n o m e”, ou “significação”. A glória intrínseca de Deus é a revelação da grandiosidade dos seus atrib u to s às suas criaturas. Envolve a grandeza e a m agnificência de Deus m anifestada aos pecadores, especialm ente na salvação do hom em do jugo do pecado. N inguém pode acrescentar coisa algum a à glória intrínseca de Deus. D eus é quem ele é, n u n ca d im in u in d o , nu n ca au m en tan d o , sendo sem pre o m esm o, o soberan o G overnador que conhece tu d o , Todo-Poderoso, presente em toda arte, abso lu tam en te verdadeiro, sábio, am oroso, dadivoso em conceder sua graça, m isericordioso, justo e irado. E essa glória intrínseca que a Deus apraz dar a conhecer às suas criaturas. Segundo, a Bíblia fala tam bém da glória atribuída a Deus, ou seja, a glória que se lhe dá. Doxa tam bém se relaciona com o ato de expressar louvor a Deus baseado na revelação da sua majestade suprema. A única resposta correta à manifestação das perfeições de Deus consiste, necessariamente, em dar glória a Deus.
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O hom em deve apresentar-lhe o louvor devido a seu nom e. Deve prestar-lhe o culto que pertence exclusivamente a ele. A manifestação da glória intrínseca de Deus move o hom em a atnbuir glória a Deus. Q uanto mais o hom em contempla a glória intrínseca de Deus na salvação, mais o hom em atribui glória a Deus. Esta é, pois, a peça central do propósito salvífico de Deus no universo - a revelação e o engrandecimento da sua glória. E isto que está no centro do ser de Deus - o apaixonado em penho em demonstrar o seu esplendor para a sua própria glória. E isto que deve estar no centro de toda a vida humana - a promoção da glória de Deus, isto é, a contemplação e a adoração da sua glória. Isto é primário na salvação de todo pecador perdido - a revelação da glória de Deus para que os pecadores se regozijem nela. Não admira que o apóstolo Paulo tenha escrito: “Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre! A m ém ” (Rm 11.36).
É MANIFESTA NAS DOUTRINAS DA GRAÇA Essa resplendente glória intrínseca de D eus, formidável e magnífica, manifesta-se mais plenam ente nas doutrinas da graça. E nesta ordem da verdade, a glória atribuída é mais livre e plenam ente dada a Deus. Aqui todos os três membros da Divindade - Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo - trabalham juntos com o um só salvador, indivisivelm ente unidos na obra de resgatar pecadores corruptos. C onform e ensina a Bíblia, antes do princípio do tempo, Deus o Pai escolheu um povo, para ser um povo de adoradores da sua glória por se tornarem objetos da sua graça. C om o uma expressão do infinito amor por seu Filho, o Pai deu os eleitos a Cristo com o um presente de amor, um povo que o louvaria para todo o sempre. D epois o Pai com issionou seu Filho para vir a este m undo a fim de redimir hom ens e mulheres por m eio de sua morte sacrificial. O Pai, juntam ente com o Filho, enviou também o Espírito a este m undo para aplicar a obra salvadora do Filho a esse mesmo grupo de pecadores eleitos. Esse im enso número de santos redim idos - eleitos por Deus,
adquiridos por Cristo e chamados pelo Espírito - jamais cairão da graça. Todos
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eles serão transportados em segurança para o céu e serão glorificados para sempre. Esta é a vitória da graça soberana que dá honra a Deus. Falando biblicamente, essas verdades foram expostas em cinco principais títulos que, juntos, manifestam a glória de Deus na salvação do hom em . Cada uma dessas verdades está profundamente enraizada e solidamente fundada no rico solo da Palavra de Deus. Q uando a Bíblia é bem interpretada, graças a uma séria exegese, e é exposta cuidadosamente e explicada adequadamente, ela ensina claramente essas verdades. Elas são identificadas pelas seguintes expressões: depravação total, eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível, e perseverança dos santos. Essas expressões foram originariamente cunhadas no Sínodo de Dort (1618Ί619), na Holanda do século dezessete. Conhecidas com o os cinco pontos do calvinismo, constituíram uma resposta aos “remonstrantes” (1610), os seguidores de Jacob Armínius (Armínio), que formularam um resu׳ m o de doutrinas atualmente conhecido com o os cinco pontos do arminianismo. Estas formulações do pensam ento arminiano, completa antítese do calvinismo bíblico, têm os títulos: depravação parcial, eleição condicional, expiação universal, graça resistível e a possibilidade de queda definitiva dos santos. N unca dois sistemas de pensam ento foram tão polarizados. O primeiro sistema m encionado, o calvinism o, é teocêntrico e constitui um m odo de ver a salvação que exalta Cristo. U nicam ente Deus é o Salvador e, por conseguinte, unicam ente Deus é objeto de louvor. O outro sistema, o arm inianism o, apresenta uma perspectiva com pletam ente oposta. O arm inianism o, também historicam ente conhecido com o sem ipelagianism o e com o wesleyanismo, divide a glória entre Deus e o hom em na salvação da raça hum ana. Em consequência, ele dim inui a glória dada a Deus. N o primeiro sistema, que salienta as doutrinas da graça, a salvação é obra que pertence com pletam ente ao Senhor. Som ente Deus supre o pecador de tudo o que é necessário, ou seja, a graça e a fé. Mas, no segundo esquema, a salvação em parte pertence a D eus e em parte ao hom em . Nesse caso, Deus fornece a graça e o hom em fornece a fé. Segundo esse sistema, o hom em é cossalvador. N o primeiro sistema, toda a glória é
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dirigida unicam ente a Deus. Mas no segundo, o louvor é com partilhado por Deus e pelo hom em . Um problem a que logo sobressai é que Deus não divide sua glória com ninguém .
A DEPRAVAÇÃO DO HOMEM E A SOBERANIA DE DEUS Das principais doutrinas da graça, a primeira é intitulada depravação total ou radical. Esta é a doutrina da ruína do hom em causada pelo pecado, e serve de fundo, como um veludo negro, sobre o qual é exposta a graça salvadora de Deus. Toda a hum anidade nasce espiritualmente m orta em transgressões e pecados. O hom em caído é totalmente depravado. O pecado afetou radicalmente o hom em total. Q uer dizer, cada parte do hom em - sua mente, suas emoções, e sua vonta׳
de - está contam inada pelo pecado. Sua mente está obscurecida, o que o torna incapaz de ver a verdade acerca de Deus, de Cristo e de si próprio. Seu coração está contam inado, e não deseja Deus, mas, em vez disso, ama
0 seu
pecado. Sua
vontade está m orta e é incapaz de escolher o que é certo. Praguejados por essa incapacidade total, os pecadores se acham sujeitos ao pecado como seus escravos, incapazes de m udarem e se tornarem realmente bons. Estando espiritualmente m orto em seu pecado,
0 hom em
nem sequer consegue buscar o que é certo e
justo. Em resumo, o hom em não regenerado é totalm ente incapaz de praticar qualquer bem espiritual, nada pode fazer para remover
0 seu
pecado, e não pode
dar nenhum a contribuição em prol da sua salvação. Pior ainda: Deixado entre׳ gue a si mesmo, o hom em caído jamais procura Deus ou sua graça. A segunda importante doutrina é a eleição incondicional, ou eleição soberana. Porque nenhum hom em pode escolher Deus, é preciso que Deus escolha o ho׳ mem. A Bíblia ensina que, antes da fundação do mundo, Deus escolheu certos indivíduos para serem objetos de sua graça salvadora. Dos filhos caídos da raça de Adão, Deus selecionou os eleitos, aqueles que iria salvar. Sua escolha não se baseou em nenhum a obra boa ou fé prevista. Antes, a eleição divina foi feita exclusivamente pela escolha de Deus, por sua graça. Tendo escolhido os seus eleitos, então os entregou ao Filho como uma expressão do seu amor, e comissionou o Filho para
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adentrar o m undo e adquirir a salvação deles. Além disso, o Pai, juntam ente com
0 Filho,
encarregou
0 Espírito
Santo de regenerar os escolhidos. Antes do princí׳
pio do tempo, essa obra foi preordenada e predestinada pela vontade soberana de Deus. Essa é a graça salvadora de Deus o Pai na eternidade pretérita.
A REDENÇÃO REALIZADA E APLICADA O terceiro título das principais doutrinas mencionadas é expiação limitada, ou expiação definida. Tendo recebido os nomes dos eleitos pelo Pai na eternidade passada, Jesus Cristo veio a este m undo para adquirir a salvação deles. Na cruz, Jesus não tornou o m undo inteiro algo potencialm ente salvável. Antes, ele de fato salvou. Jesus assegurou realmente a vida eterna para suas ovelhas. M orrendo por todos os que lhe tinham sido confiados pelo Pai, propiciou a ira de Deus. Todos aqueles pelos quais Jesus m orreu foram verdadeiramente salvos por meio de sua morte. N enhum deles perecerá. Essa é a graça salvadora de Deus o Filho, há dois mil anos. A quarta verdade é graça irresistível ou vocação irresistível. O Pai e o Filho en׳ viaram o Espírito Santo ao m undo para convencer do pecado, chamar e regenerar todos os eleitos. A medida que
0 Evangelho é proclamado
no m undo, o Espírito
faz um chamado interior especial aos que foram escolhidos pelo Pai. O Espírito gera de novo as almas espiritualmente mortas. Ele ressuscita o pecador morto do túm ulo espiritual. Ele outorga arrependim ento e fé. O Espírito abre os olhos espiritualm ente cegos para que vejam a verdade. Abre os ouvidos surdos para que ouçam a verdade. Abre os corações fechados para que aceitem a verdade. Ativa as verdades mortas para que creiam na verdade. Aplica a morte salvadora de Cristo aos corações dos eleitos. Essa é a graça salvadora de Deus o Espírito Santo dentro do tempo.
SALVOS E SEGUROS PARA SEMPRE A quinta verdade é a perseverança dos santos, ou graça preservadora. A Bíblia ensina que todos os eleitos são guardados pelo poder do Pai. N enhum dos esco-
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lhidos do Pai se perderá. N enhum daqueles pelos quais o Filho morreu perecerá. N enhum dos que foram ou forem regenerados pelo Espírito cairá da graça. Todos quantos receberam ou receberem a graça salvadora de Deus serão conduzidos para a glória, protegidos e preservados para sempre. A ampla abrangência da salvação já está completa. Indo desde a eternidade passada e até a eternidade futura, a salvação é acertadamente vista com o uma única obra da graça. Aqueles que Deus escolheu antes do princípio do tempo são aqueles que salvará para sempre quando não existir mais o tempo. Todos os eleitos perseverarão porque o próprio Deus persevera dentro deles - e os habilita a apresentarem-se inculpáveis diante do seu trono. Esse ensino bíblico sobre a salvação revela claramente que a salvação é,
toda ela, pela graça. D o princípio ao fim cada aspecto da graça salvadora é dádiva gratuita de Deus, outorgada soberanamente a pecadores que não a merecem. Cada membro da Divindade age em perfeita unidade e harmonia nesse empreendimento. Primeiro, Deus o Pai escolheu os eleitos, por si e para si, na eternidade passada. Segundo, Deus 0 Filho redimiu todos esses escolhidos pelo Pai confiados a ele. Terceiro, D eus o Espírito Santo regenera esses escolhidos e redimidos. Juntas, as três pessoas - o Pai e o Filho e o Espírito Santo - salvam pecadores. Os cinco pontos da salvação bíblica se fundem para formar este único ponto dominante - Deus salva pecadores por sua graça e para sua glória. O que 0 pecador caído não pode fazer por si mesmo, Deus faz. O que os pecadores humanos nem sequer procuram, Deus procura e realiza. O nosso trino Deus ativa, realiza e aplica a graça salvadora a seus eleitos. Neste esquema, vê-se que a salvação é “dele, por ele e para ele” (Rm 11.36). Q uando se vê a salvação sob essa luz, só então, pode-se dizer: “A ele seja a glória para sempre! A m ém ”.
A LONGA LINHA COMEÇA AQUI E este realmente o ensino da Escritura? O certo é que estas verdades teocêntricas foram registradas nas páginas da Palavra por hom ens santos, começando com os rudes profetas e com os reis de Israel ungidos por Deus. Moisés escreveu
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os cinco primeiros livros da Bíblia, o Pentateuco, ensinando com muita clareza as doutrinas da graça divina. Essas mesmas verdades foram redigidas pelos escritores dos livros históricos e de sabedoria do Antigo Testamento - Josué, Samuel, Esdras, Neemias, Davi, os outros salmistas, e Salomão. Todos os profetas falam a um a só voz a respeito delas - Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel, Oseias, Amós, Jonas, Miqueias, Naum, Ageu, Zacarias e Malaquias. Cada um deles fez signifi־ cativa contribuição para o registro inspirado das doutrinas da graça. Depois, no Novo Testamento, a longa linha continuou com o ensino de Jesus nos quatro evangelhos, como tam bém com os de Pedro, Paulo, Lucas, o autor de Hebreus, Tiago, Judas e João. A doutrina da graça soberana estende-se literalmente de capa a capa na Bíblia. Estas doutrinas que exaltam Deus tam bém constituíram a posição bem estudada e firmemente adotada por um imenso exército de hom ens fortes através dos séculos. Os que abraçam essas verdades atualm ente podem estar em minoria, mas as doutrinas da graça eram a convicção daqueles que dirigiam a Igreja Primitiva. Em seguida aos autores bíblicos, vieram os pais primitivos da igreja - homens como Clem ente de Roma, Justino Mártir, Irineu, Atanásio, Agostinho e Jerônimo. Eles as ensinavam crendo que elas estão escritas na Escritura. Depois destes homens, muitas luzes brilharam na Idade das Trevas - fiéis servos de Deus como Gallo, Gostschalk, Pedro Waldo, Anselmo e Thom as de Bradwardine. A seguir, antes da aurora da Reforma, houve notáveis precursores, como João Wycliffe, João Hus, Savonarola e W illiam Tyndale. Todos esses hom ens proclamaram alto e bom som as doutrinas da graça soberana.
OS REFORMADORES CERRAM FILEIRAS Nos tempos sem precedentes da Reforma, na Europa do século dezesseis, houve gigantes espirituais que percorriam o C ontinente, hom ens destros nas Escrituras e instruídos pelo Espírito Santo - reformadores com o M artinho Lutero, M artin Bucer, U lrich Zwínglio, João Calvino, Beza, Francisco Turrretino, e aqueles que se encontraram na reunião do Sínodo de D ort, na Holanda.
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Para um hom em , eles eram fortes predestinacionistas. Sem vacilar, estavam firmem ente com prom etidos com as doutrinas da graça soberana. Som ente uma mensagem tão catalítica poderia ter feito a Europa virar de cabeça para baixo. Seguindo o despertam ento deles, surgiram os reformadores escoceses e ingleses - João K nox,1John Foxe, John Rogers, N icholas Ridley, Hugo Latimer, e outros sem elhantes - hom ens que mantiveram fulgentem ente acesa a tocha da verdade nas Ilhas Britânicas. Os testem unhos de muitos deles foram selados com sangue, sim plesm ente porque lutavam na fileira da frente, criam na graça soberana de D eus. D epois deles vieram os puritanos, valentes com o Thom as G oodw in, Richard Sibbes, Jeremias Burroughs, John O wen, Thomas W atson e Matthew Henry. Estes escoceses e ingleses proclamavam um Deus que dispensa livremente sua misericórdia salvadora a quem quer. A o m esm o tempo, foram levantados por Deus os Batistas Particulares, que também fizeram ressoar a nota da graça soberana - João Bunyan, Benjamin Keach e John Gil.
A LONGA LINHA CRUZA O ATLÂNTICO Na providência de Deus, as verdades das doutrinas da graça logo foram transportadas através do Atlântico por hom ens que buscavam liberdade religiosa. Os Peregrinos eram distintamente calvinistas, pois trouxeram com eles as suas Bíblias de Genebra e pregavam baseados nelas. Os primeiros líderes coloniais eram reformados sólidos e leais. Os que fundaram os primeiros estados - ho׳ mens com o John W inthrop, Thomas Hooker, Roger Williams, Increase Mather e C otton Mather - eram calvinistas, todos eles. Os primeiros colleges americanos - Harvard e Yale, eram calvinistas, e foram estabelecidos com a finalidade de treinar ministros reformados que deveriam pregar doutrina reformada. Quando as colônias se tornaram mais firmemente estabelecidas, as chamas do avivamento arderam brilhantemente na Nova Inglaterra. Na liderança desse movimento, conhecido com o o Grande Despertamento, estavam pastores, evan1 E m casos m ais c o n h e c id o s , a d a p to os n o m e s , c o m o J o ã o K n o x , J o ã o C a lv in o , etc. T a m b é m a d a p to o u tra s fo rm a s sim p le s, c o m o H u g h - H u g o . N o ta d o tra d u to r.
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ficilosos
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gelistas e educadores calvinistas. W iliam Tennent, e seus filhos G ilbert e William Tennent, foram os im portantes líderes presbiterianos que estabeleceram o Log Cabin College para instruir e capacitar pastores para pregarem a Bíblia. Jonathan
Edwards, de N ortham pton, Massachusetts, foi
0 mais
im portante pastor da épo-
ca, e um calvinista estrito da mais elevada ordem. George W hitefield, de Bristol, Inglaterra, foi, inquestionavelmente, o mais distinguido evangelista daquele tempo, talvez de qualquer tempo, e seu cerne era reformado. Q uando Harvard e Yale sucumbiram na escorregadia encosta do arminianismo, a escola de Princeton foi levantada para tornar-se o novo bastião do calvinismo. Foram estabelecidos outros colleges distintam ente reformados - Rutgers, D artm outh, e Brown. As ricas verdades da graça soberana saturaram o solo das primeiras colônias americanas. O calvinismo era a cosmovisão dom inante naquela época. C om a vinda da G uerra Revolucionária, os pensadores reformados conti׳ nuaram a liderar. A forma representativa de governo delineada na Constituição simplesmente era a verdade reformada sobre o governo por anciãos ou presbíteros, expandida e aplicada à nação. Muitos dos pais fundadores da nação eram calvinistas, John W itherspoon inclusive, o único pastor que assinou a Declaração de Independência. Depois da G uerra Revolucionária, o Segundo G rande Avi׳ vamento fulgiu através da Nova Inglaterra, com hom ens chaves como Timothy Dwight, presidente de Yale, e Asahel Nettleton, ambos fortes calvinistas, entre os líderes da corrente calvinista.
A TRIUNFANTE MARCHA NA AMÉRICA Q uando a jovem nação emergiu, o Seminário de Princeton foi logo fundado no campus da universidade. Por mais de cem anos, ele seria a influência dom inante em prol da verdade evangélica na América. O corpo docente de Princeton era um virtual exército de eruditos bíblicos, cada hom em um calvinista estrito. Esta linha começou com o seu fundador, Archibald Alexander, e se estendeu até sua derradeira voz forte, J. Gresham Machen. Entre o primeiro e o último, houve gigantes teológicos como Charles Hodge, que, em seguida a Jona׳
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than Edwards, foi o mais im portante teólogo da América; J. W. Alexander; J. A. Alexander, A. A. Hodge, e o lúcido Benjamin B. Warfield, o arquidefensor da fé e um teólogo reformado de altíssimo nível. Em meados do século dezenove foi fundada a Convenção Batista do Sul. Este grupo evangélico, atento às missões e formado em Charleston, Carolina do Sul, estava destinado a se tornar a maior denominação protestante do mundo. Era um corpo de crentes na Bíblia fundado por homens inabalavelmente comprometidos com as doutrinas da graça. Em seus primeiros cinqüenta anos, todos os seus presidentes eram calvinistas - William B. Johnson, R. B. C. Howell, Richard Fuller, Patrick Mell, e outros. Os fundadores do Seminário Teológico Batista do Sul, o primeiro seminário da denominação, criam e ensinavam abertamente as doutrinas da graça. Entre eles estavam James P. Boyce e John Broadus, que atendiam Princeton, e, mais tarde, Edwin Dargan. O Sumário de Princípios (Abstract of Principles) era - e continua sendo até hoje - o padrão doutrinário do Sul, e é um documento declaradamente calvinista. O fundador do Seminário Teológico Batista do Sul, B. H. Carroll, é outro homem que expunha a eleição incondicional de Deus. O próprio alicerce dessa grande associação de igrejas batistas foi lançado sobre a sólida rocha da graça soberana. Durante o mesmo século dezenove, os presbiterianos estavam conseguindo um forte e estratégico pé de apoio no Sul. Distinguidos teólogos e pastores, como William S. Plumer, Daniel Baker, Robert L. Dabney, James Henley Thornwell, Benjamin Palmer, e John L. Girardeau, deixaram sua marca em suas igrejas e em seus alunos com as verdades da graça soberana. Por terem adotado a Confissão de Fé de Westminster, não havia disputas sobre onde pastores e igrejas se posicionavam teologicamente. No Norte, W illiam G. T. Shedd, vigoroso teólogo da dogmática reformada, escreveu substantivos tomos de teologia e serviu de âncora das verdades reformadas durante anos.
A LONGA LINHA ABARCA O GLOBO O movimento de maior alcance da história do m undo, o movimento das missões modernas, viu missionários enviados a todos os cantos e recantos da
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terra no século dezenove. Hom ens vigorosos que eram grandem ente calvinistas. William Carey, que tem sido chamado pai desse movimento, foi um que abraçou a graça soberana. Ele acreditava que havia eleitos de Deus em todas as tribos e nações ao redor do m undo, e que os servos de Cristo deveriam ir alcançá-los com o Evangelho. O utros hom ens de persuasão reformada tam bém foram figuras importantes deste movimento histórico. Missionários como Luther Rice, Adoniram Judson, David Livingstone, Henry Martyn, Robert Moffat, e John Paton se lhes seguiriam, todos crentes na graça soberana. R etornando ao outro lado do Atlântico, à Escócia e à Inglaterra, a igreja do século dezenove tinha um aroma fortemente calvinista, principalm ente entre os líderes. Na Escócia, alguns dos mais fiéis pastores, teólogos, evangelistas e missionários que a igreja conheceu foram hom ens levantados por Deus. Homens briosos como Andrew Bonar, Thom as Boston, Robert Murray McCheyne, e Robert C andlish pastorearam igrejas. Robert Haldane e James Haldane ajudaram a providenciar que o Evangelho fosse propagado fora do país. Thom as Chalmers e James Buchanan foram brilhantes teólogos escoceses, impregnados da doutrina reformada, e também serviram como pastores. A astuta mente dos escoceses, com binada com seu zelo evangelístico e missionário, fizeram deles hom ens realmente notáveis. Nessa mesma época, dificilmente se poderá exagerar sobre o poder do púlpito dos pregadores calvinistas na Inglaterra. O mais proem inente de todos foi Charles H. Spurgeon, “o Príncipe dos Pregadores”, um declarado e ávido calvinista. A influência reformada deste hom em sobre a igreja foi considerável, e continua forte mesmo na presente hora através dos seus escritos. Em torno dele, noutras igrejas inglesas, havia expositores como Alexander Maclaren, John C. Ryle e Charles Simeon, e o notável protetor dos órfãos, George Mueller. Todos eles estavam comprometidos com a soberania da graça. Na Holanda, onde se reuniu o Sínodo de Dort, a proclamação da soberania de Deus na salvação do hom em continuou sendo forte, passando pelo século dezenove e adentrando o século vinte. Abraão Kuyper, que veio a ser o primeiro
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ministro da Holanda, foi uma im portante voz em favor das doutrinas da graça. Teólogos holandeses notáveis como H erm an Bavinck, G. C. Berkouwer e Louis Berkhof deixaram sua marca nas mentes evangélicas por meio da página impres׳ sa. William H endriksen e Simon Kistemaker, ambos de antecedentes holandeses, também nos legaram uma obra e tanto em sua série intitulada New Testament Commentary (Com entário do Novo Testamento).
A GRANDE PARADA ESTENDE-SE ATÉ O PRESENTE Tudo o que foi dito nos traz àqueles hom ens piedosos levantados mais recentemente por Deus, os quais têm sustentado fielmente as verdades bíblicas relacionadas com a graça soberana. Na primeira metade do século vinte, a prolífica pena de A. W. Pink foi um instrum ento excepcional para a propagação destas altas doutrinas. John Murray, presidente do Seminário Teológico Westminster, ajudou a preparar várias gerações de pastores, escritores e missionários calvinistas. Donald Grey Barnhouse, pastor da Décima Igreja Presbiteriana de Filadélfia, calvinista firmemente convicto, tornou׳se o expositor americano mais popular da década de 50. D. Martyn Lloyd-Jones, pastor da W estminster Chapei, de Londres, veio a ser
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inglês mais popular do século vinte. James
M ontgomery Boice, sucessor de Barnhouse na Décima Igreja Presbiteriana, foi o mais im portante pastor e defensor do calvinismo do século vinte. Até o dia de hoje, esses escrupulosos ministros, deixaram uma indelével marca sobre
0 pen-
samento teocêntrico de incontáveis legiões de pastores e líderes eclesiásticos dos tempos modernos. Esta presente hora não está sem campeões da graça soberana. Entre eles há valentes guerreiros que pugnam pela verdade como R. C. Sproul, fundador dos ministérios Ligonier, e D. James Kennedy, fundador da Evangelização Explosiva (Evangelism Explosion). A influência mundial do púlpito expositivo de John Ma׳
cArthur, pastor da Grace Community Church, Los Angeles, é incomparavelmente imensa enquanto ele expõe essas verdades para que todos a ouçam. O apaixo׳ nado zelo de John Piper, pastor da Bethlehem Baptist Church, Minneapolis, está
Longa I inlm
1/c I'ulio s
I'lutloso.·!
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influenciando atualmente toda uma geração utilizando a sua pena e a sua voz para proclamar a supremacia de Deus na salvação do homem. R. Albert Mohler, presidente do Semináro Teológico Batista do Sul, assoma como uma fonte de influência de altíssimo nível sobre a próxima geração de pastores, contagiando-os com uma alta visão de Deus. Estes são apenas alguns dos atuais hom ens notáveis que são calvinistas na doutrina e fortes na influência que exercem.
DEUS LEVANTA OS SEUS HOMENS C om o foi que cada um destes hom ens veio para o cenário da história humana? N ão tenham os dúvida, é o próprio Deus, o soberano Senhor da história, que levanta cada geração de líderes espirituais para se juntarem a esta longa linha de hom ens piedosos. Deus, o determ inador da história, prepara
0 hom em
para a hora e a hora para o hom em . C om o o único edificador da
sua igreja, o Senhor Jesus C risto designa o tem po quando e o lugar onde cada hom em se verá no grande palco da história. C om gênio infinito e propósito perfeito, Cristo escolhe soberanam ente os seus hom ens (Jo 15.16), chamando-os desde o ventre de suas mães (Jr 1.5; Lc 1.15; G1 1.15,16) para realizarem a obra específica que lhes caberá fazer (Ef 2.10). Até o próprio sucesso que eles gozarão é predeterm inado por Cristo, sendo que som ente ele é quem produz o crescimento (1C0 3.6,7). Jesus fez esta solene promessa: “Edificarei a m inha igreja, e as portas do inferno não poderão vencê-la” (Mt 16.18). Por meio dessa prom essa irrevogável, C risto está em penhado em construir soberanam ente a sua igreja, e nem a m orte poderá im pedir o seu progresso. Q uer dizer que, quando uma geração sai da cena, C risto fielm ente levanta a próxim a onda de hom ens para continuarem a sua obra. Sem pre que um Lutero ou um C alvino parte deste m undo, Deus tem a nova onda de trabalhadores em suas asas, prontos e preparados para levar avante a obra. Em parte alguma se vê mais claram ente esta verdade do que no co n tinuado suprim ento que Deus faz de pregadores das D outrinas da Graça.
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Boice escreve:
Essas doutrinas não foram inventadas por Calvino, nem tampouco foram características só do seu pensamento durante o período da Reforma. São verdades bíblicas ensinadas por Jesus e confirmadas por Paulo, Pedro e todos os demais escritores do Antigo e do Novo Testamento. Agostinho as defendeu contra as negações de Pelágio. Lutero cria nelas. Assim também Zwínglio. Isto é, eles criam o que Calvino cria e que posteriormente sistematizou em sua influente obra intitulada institutes of the Christian Religion (as Institutas). Os puritanos eram calvinistas; foi por meio deles e do seu ensino que tanto a Inglaterra como a Escócia experimentaram os maiores e mais completos avivamentos nacionais que o mundo já viu. Nesse número estavam os herdeiros de João Knox: Thomas Cartwright, Richard Sibbes, Richard Baxter, Matthew Henry, John Owen e outros. Na América outros foram influenciados por homens como Jonathan Edwards, Cotton Mather e, mais tarde, George Whitefield. Em tempos mais recentes, o movimento missionário moderno recebeu quase todo o seu ímpeto e a sua direção iniciais daqueles servos de Deus pertencentes à tradição calvinista. A lista inclui William Carey, John Ryland, Henry Martyn, Robert Moffat, David Livingstone, John G. Paton, John R. Mott e outros. Pois todas estas doutrinas da graça não eram um apêndice acrescentado ao pensamento cristão, mas eram, antes, centrais, abrasando e formando os seus esforços na pregação e na obra missionária.2
2 Ja m e s M o n tg o m e ry B oice, Foundations of the C h ristian Faith: A Comprehensive & Readable Theology (D o w n e rs G ro v e , IL In te rV a rsity , 1986), 519.
L o n g a L i n h a tie Vu lto s P i e d o s o s
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FU N D A M E N T O S D A G RAÇA: A SÓLIDA R O C H A DA PALAVRA
O foco destas páginas e destes capítulos visa autores bíblicos que lançaram o forte alicerce das doutrinas da graça na Escritura Sagrada. Q ual era o ensino deles? O que a Escritura expõe a respeito da soberania de Deus na salvação? T udo o que cremos e consideramos precioso acerca da supremacia de Deus na redenção dos hom ens caídos deve ser, necessariamente, a verdade da Palavra de Deus. O que estiver fora disso deve ser rejeitado. Então, o que diz a Escritura? C om eçando com os escritos do profeta Moisés e concluindo com o Apocalipse do apóstolo João, vamos traçar sistem aticam ente o desenvolvim ento das doutrinas da graça através das páginas da Escritura divina. Nos capítulos que vêm a seguir, assinalaremos a revelação progressiva da graça soberana através do A ntigo Testam ento, partindo de Moisés e passando a Josué, Samuel, Esdras, Neemias, Jó, Davi, Salomão, Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel, percorrendo tam bém todo o cam inho dos profetas menores, de Oseias a Malaquias. No Novo Testam ento trarem os à luz e docum entarem os as doutrinas nos termos em que são ensinadas pessoalm ente pelo Senhor Jesus C risto nos quatro evangelhos - Mateus, Marcos, Lucas e João. Cristo foi o maior pregador da graça soberana que já viveu na terra. Detalharem os, igualmente, o ensino sobre a s o berania de Deus na graça salvadora nos term os das instruções dadas por Pedro, Paulo, Lucas, o autor de Hebreus, Tiago, Judas e, finalm ente, João. Este exame de capa a capa da Bíblia lançará um alicerce inabalável para a graça soberana de Deus. C ada volume futuro desta série edificará sobre a rocha viva e proverá um passeio pela história da igreja, retratando os nobres hom ens que pregavam e ensinavam as doutrinas da graça. Mas, primeiro, observemos a lista de chamada destes servos de Deus que escreveram as Escrituras e registraram a soberania da graça de Deus. Com eçando com Moisés e indo até aos apóstolos, temos aqui um breve exame do início da longa linha de hom ens piedosos.
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CAPÍTULO U M PERGUNTAS PARA ESTUDO
1. Q ue verdade central une a longa linha de hom ens piedosos através dos séculos? Por que essa verdade faz isso?
2. Q ue efeito positivo a doutrina da soberania de Deus tem sobre os que a abraçam?
3. Q ue é prim ordial na soberania de Deus na salvação do homem? Por quê?
4. Descreva a diferença entre a glória intrínseca de Deus e sua glória atribuída. Qual influi na outra? Explique por quê.
5. Com o as doutrinas da graça manifestam singularmente a glória de Deus? Com pare esta manifestação com a das principais doutrinas do arminianismo. Qual sistema dá maior glória a Deus?
6. Faça um breve sumário dos cinco im portantes títulos das doutrinas da graça. C om o eles se desenvolvem, na continuidade do pensamento, de um ao outro?
7. Com o sucede que o equívoco sobre qualquer das cinco doutrinas da graça compromete as outras quatro? Explique por que acontece isso.
8. Você pode propiciar uma breve vista da história da igreja, destacando os hom ens mais expressivos que sustentaram as doutrinas da graça?
(lílvinista é o homem que vê Deus, e que, tendo visto Deus em sua glória, fica com uma das mãos cheia do sentimento da sua indignidade pessoal de estar na presença de Deus como criatura, e muito mais como pecador, e fica com a outra mão cheia de reverente encantamento porque, não obstante, este Deus é um Deus que aceita pecadores.1 Benjamin B. Warfield
1 B.B. W a rfie ld , C a lv in as a T h e o lo g ia n a n d C a lv in is m T o d ay , c ita d o e m A .N . M a rtin , The Practical Implications of Calvinism (E d in b u r g h , S c o tla n d : T h e B a n n e r o f T r u th T ru s t, 1979), 4.
C
a p ít u l o
2
ONDEA LONGA LINHA COMEÇA O LEGISLADOR MOISÉS: GÊNESIS
à frente dessa longa linha de hom ens piedosos, que ensinavam fielmente as doutrinas da graça, ergue-se o primeiro escritor da Escritura, o primeiro grande líder e legislador de Israel - Moisés. Este, que por um tempo foi príncipe do Egito, tornou-se o primeiro profeta de Israel, e, com isso, tornou-se o primeiro porta-estandarte da verdade da graça soberana de Deus. E certo que a mensagem da soberana graça de Deus não teve sua origem em Moisés. Tão sublime e encantadora teologia jamais teria surgido de dentro das profundezas do hom em pecador. Tampouco uma cosmovisão tão transcendental emergiu da decadente cultura do Egito, na qual Moisés foi criado. Ao contrário, foi preciso que a suprema verdade da inigualável supremacia de Deus lhe fosse revelada sobrenaturalm ente do alto. Uma mensagem que exalta tanto a Deus só pode ter vindo do próprio Deus. Este deu a conhecer ao primeiro profeta de Israel as verdades da sua majestosa soberania, principalm ente nas questões relacionadas com a graça divina.
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Na qualidade de primeiro escritor da Escritura, Moisés lançou as primeiras pedras do alicerce bíblico da graça soberana. Com o passar do tempo, outras pedras fundamentais da soberania divina, registradas de Gênesis a Deuteronômio, seriam edificadas pelo resto do Antigo Testamento, nos livros de Josué e seguintes, até Malaquias, e depois, pelo Novo Testamento, de Mateus ao Livro de Apocalipse. Pelo ensino dos reis e profetas de Israel, depois, pelos ensinamentos do próprio Senhor Jesus Cristo, e, indo ao clímax, pelo ensino dos apóstolos, guiados pelo Espírito, as verdades doutrinárias da graça salvadora de Deus seriam desenvolvidas mais completamente. Mas estas verdades foram ensinadas em sua forma mais básica nas páginas iniciais do Pentateuco escrito por Moisés, o legislador de Israel. Este desdobram ento gradativo da verdade bíblica é denom inado revela׳ cão progressiva, um conceito que reconhece o deliberado desenvolvimento e exposição das verdades ensinadas logo no início das Escrituras. C ertam ente, esse contínuo desvelar da verdade atuou no caso das doutrinas da graça. O que Moi׳ sés ensinou nos cinco primeiros livros da Bíblia, tam bém conhecidos como a Lei, simplesmente lançou o alicerce que seria ampliado pelos autores bíblicos que se seguiriam. Que firme fundam ento Deus lançou no início da Escritura por inter׳ médio de Moisés! A intenção deste capítulo é examinar as verdades doutrinárias da sobe׳ rania de Deus na salvação do hom em nos termos em que estão registradas em Gênesis. A longa linha de homens piedosos, o desfile dos porta-estandartes em prol da graça soberana, começa aqui com Moisés, o primeiro mensageiro destas mensagens preciosas. Aqui vamos considerar Moisés e o primeiro livro da Escritura que ele escreveu.
O LEGISLADOR MOISÉS “MESTRE DA SOBERANIA DE DEUS”
Moisés (1525-1405 a. C.), posta-se na primeira fileira desta sacra parada como o primeiro escritor da Escritura. Jesus afirmou pessoalmente que Moisés
O n d e a Longa L in h a Começa
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escreveu os cinco primeiros livros da Bíblia (Mt 19.8; Mc 12.26; Jo 5.46,47; 7.19), e assim tam bém fez o apóstolo Paulo (Rm 10.5). Com o Moisés escreveu de Gênesis a Deuteronôm io, ele foi o primeiro a registrar as doutrinas da graça. Ele foi educado “em toda a sabedoria dos egípcios” (At 7.22), tendo recebido essa educa״ cão no seio da família do faraó. Não obstante, Moisés não escreveu partindo de um ponto de vista pagão. Antes, ele registrou a sabedoria divina de tal maneira que esta só poderia ter vindo do alto, possibilitando uma percepção da realidade propiciada por Deus e que não era deste m undo. Ele escreveu palavras inspiradas por Deus, que puseram a descoberto uma perspectiva eterna. Moisés foi o grande libertador de Israel, quando do êxodo, designado por Deus; foi o líder da nação dos hebreus nas peregrinações pelo deserto durante quarenta anos; foi o recebedor da Lei no M onte Sinai; e foi o autor do Pentateuco. Com o era de esperar, é evidente que ele escreveu sobre a soberania de Deus e sobre a depravação do homem.
O LIVRO DE GÊNESIS “DEUS O C R IA D O R SO B E R A N O ”
O primeiro livro inspirado escrito por Moisés é Gênesis, o “Livro das Origens”. A narrativa da Criação e do princípio da história da hum anidade traça inequivocamente o supremo governo de Deus sobre todas as obras da suas mãos. A soberania de Deus na Criação, na eleição, na regeneração e na salvação é abertam ente exposta em Gênesis. O livro registra que Deus faz 0que quer, como quer e quando quer, e não somente na esfera física, mas tam bém em seu reino espiritual.
Em todas as esferas da criação, unicamente Deus é soberano. Mais especificamente, Deus é revelado como sendo absolutamente supremo ao outorgar a sua graça salvadora a um povo escolhido. Por que Deus criou? C ertam ente não por que tivesse necessidade de alguém
para amar. Em toda a eternidade, Deus gozou perfeito amor e íntim a com unhão dentro do seu próprio ser. As três pessoas da Divindade - Pai, Filho e Espírito
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- fruíam relações perfeitas e se bastavam completam ente uns aos outros. Assim, Deus não era interiorm ente solitário, nem pessoalmente vazio. Ele era um ser in׳ teiramente satisfeito, contente e contido em si mesmo. Portanto, Deus não criou por causa de alguma limitação em seu ser interior. Ao invés disso, ele criou tudo־ do nada a fim de expor a sua glória para o prazer dos seres por ele criados, e para proclamar a sua grandeza. Albert Barnes está certo quando diz: A razão ou a finalidade para a qual todas as coisas foram formadas... foi promover sua honra e glória.... Não foi promover a sua felicidade, pois ele foi e é eternam ente feliz; nem acrescentar algo a ele, pois ele é infinito. Mas para que agisse como Deus e recebesse a honra e o louvor que lhe são devidos.1 O Livro de Gênesis registra extraordinária demonstração da soberania: Deus chalriou a Criação à existência - e predisse sua redenção.
D O U T R IN A EM FOCO A SOBERANIA DIVINA Em Gênesis, Moisés registrou primeiro a estupenda demonstração da so׳ berania de Deus na criação. Deus não olhou para baixo, pelo túnel do tempo, para ver o universo evoluir do nada. Ele não previu uma grande explosão (um “big bang”), para depois adotar os caóticos resultados como seu plano eterno. Em vez
disso, Deus falou intencionalm ente, produzindo tudo do nada, com sua palavra. Ele não estava sob nenhum a coerção para criar. Não havia nenhum a pressão ex׳ terna sobre ele. Antes, seu ato de criação exibiu magnificamente a sua soberania imperial. N enhum a restrição externa pode ser imposta à suprema autoridade de Deus, nem por Satanás e seus anjos caídos, e, certam ente, por nenhum mero homem. A. W. Pink escreve com impressionante encantam ento sobre a extraordi׳ nária soberania de Deus anterior à Criação: 1 Albert Bnrnes, Notes on the New Testament, Vol. 10: Acts and Romans, ed. Robert Frew (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1983, 1884,1885), 260-61.
O nde a Longa L in h a Com eça
Na grandiosa expansão da eternidade, que se estende para trás de Gênesis 1.1, o universo não fora criado e a criação só existia na mente do grande Criador. Em sua soberana majestade, Deus permanecia totalmente só. Referimo׳nos àquele remotíssimo período anterior ã criação dos céus e da terra. Nesse longo período não havia anjos para entoarem os louvores de Deus, nem criaturas para ocuparem a sua atenção, nem rebeldes para serem trazidos à sua sujeição. O grande Deus estava totalmente só no meio do pavoroso silêncio do seu vasto universo. Mas, mesmo nesse tempo, se é que se lhe pode chamar tempo, Deus era soberano. Ele poderia criar ou não criar, a seu belprazer. Poderia criar desta ou daquela maneira; poderia criar um
mundo ou um milhão de mundos, e quem havia para resistir à sua vontade? Ele poderia chamar à existência um milhão de criaturas diferentes e colocá-las em condições de absoluta igualdade, dotando־as das mesmas faculdades e colocando-as no mesmo ambiente; ou, poderia criar um milhão de criaturas, cada uma diferente das outras, e nada tendo elas em comum, exceto a sua condição de criaturas, e quem estava lá para desafiar o seu direito? Se lhe aprouvesse, poderia chamar à existência um mundo tão imenso que as suas dimensões estariam completamente fora de toda possibilidade de computação finita; e, se quisesse, poderia criar um organismo tão pequeno que nada senão o mais poderoso microscópio poderia revelar sua existência a olhos humanos. Ele teve o direito de criar, de um lado, os exaltados serafins para refulgirem em torno do seu trono, e, de outro lado, o minúsculo inseto que morre na mesma hora em que nasce. Se o poderoso Deus preferiu ter uma imensa graduação em seu universo, do mais elevado ser angélico ao rastejante réptil, de mundos em revolução aos átomos flutuantes, do macrocosmo ao microcosmo, em vez de fazer tudo uniforme, quem estava lá para questionar o seu soberano arbítrio?2 2 A . W . P in k , The Sovereignty of Go d ( G r a n d R a p id s , M I: B ak er B o o k s, 1997, 1930), 28.
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A deslum brante dem onstração da soberania de Deus na C riação foi uma cartilha sobre o seu direito de governar nas questões da salvação. Deus, que m andou a luz aparecer no prim eiro dia da Criação, logo m andaria o Evangelho acender para ilum inar os corações entenebrecidos dos pecadores incapazes de ver. Deus, que separou as águas no segundo dia, produziria um abism o infinito para separar-se dos pecadores. Deus, que jun to u aáguas no terceiro dia, reuniria pecadores para si. Deus, que criou o sol, a lua e asestrelas no quarto dia, onipotentem ente criaria a fé salvadora. Deus, que com eçou a criar o reino anim al no quinto dia, por sua graça enviaria seu Filho para ser o C ordeiro de Deus e elim inar o pecado. Deus, que criou Adão e Eva no sexto dia, logo recriaria pecadores à sua imagem. Sua livre graça realizaria o segundo Gênesis na salvação de hom ens e m ulheres perdidos.
1.
Dia P rim eiro: “Haja Luz”. No primeiro dia da Criação, Deus, pelo
puro exercício da sua vontade, disse à luz que existisse, e esta extinguiu as trevas. Foi uma extraordinária manifestação da soberania divina:
No princípio Deus criou os céus e a terra. Era a terra sem forma e vazia; trevas cobriam a face do abismo, e 0 Espirito de Deus se movia sobre a face das águas. Disse Deus: “Haja luz”, e houve luz. - Gênesis 1.1-3
Tudo era escuridão, até que Deus ordenou à luz que aparecesse do nada - e assim foi. Essa luz “mais claramente revela e mais estreitamente aproxima a glória de Deus (cf. Dn 2.22; lT m 6.16; Tg 1.17; ljo 1.5)”.' Com o o próprio Deus, a luz ilumina e dá a conhecer todas as outras coisas. Sem luz, toda a criação seria fria e escura. A criação da luz, pelo ato de Deus, foi um leve ato da sua soberania. Não poderia haver impedimento algum nem resistência. Esta mesma onipotência é dem onstrada nos atos divinos de salvação. No dia do seu poder salvífico,
3 J o h n M a c A rth u r, The MacArthur Bible Commentary (N ash v ille, T N : N e ls o n R e fe re n c e S t E le c tro n ic , 2 0 0 5 ), 8.
O nde a Longa L in h a Começa
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Deus ordena que a luz espiritual apareça e ilumine sobrenaturalm ente a mente obscurecida do homem (2Co 4.4). A respeito deste primeiro ato da graça, J. C. Ryle escreve:
Um sentimento de pecado, culpa e pobreza de alma é a primeira pedra lançada pelo Espírito Santo, quando edifica o templo espiritual. Ele convence de pecado. A luz foi a primeira coisa chamada à existência na criação material (Gn 1.3). A luz, com relação ao nosso estado, é a primeira obra da nova criação.4
A vontade soberana de Deus faz que aqueles que são seus vejam a verdade do Evangelho e se tornem lima nova criação em Cristo (2C0 5.17).
2.
D ia Dois: “Haja um F irm am ento”. No segundo dia da Criação, Deus
de novo exerceu sua soberania divina, separando as águas pela criação do firma׳ mento:
Depois disse Deus: "Haja entre as águas um firmamento que separe águas de águas. Então Deus fez 0 firmamento e separou as águas que ficaram abaixo do firmamento das que ficaram por cima. E assim foi. - Gênesis 1.6-7
Deus m andou as águas se separarem, colocando um grande firm am en׳ to entre as que ficaram na terra e as que ficaram acima do firm am ento.5 Não pôde haver nenhum a resistência à sua ordem soberana. A irresistível voz de Deus cham ou à existência o que antes não existia, e depois ordenou e colocou no lugar o que tinha criado. Assim é na salvação dos eleitos. A vocação eficaz
4 J. C . Ryle, Holiness: The Nature, Hindrances, Difficulties, & Roots (M oscow , ID : C h a r le s N o la n P u b lis h e rs, 2001, 1877, 1879), 316. 5 M a c A rth u r, The MacArthur Bible Commentary, 9.
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de Deus é igualm ente irrevogável e igualm ente invencível. C om o na obra de Criação, Deus age na esfera espiritual na salvação de pecadores perdidos. Ele fala e chama, e acontece. No devido tem po, ele separa os escolhidos do m un׳ do, convocando-os para si. No tem po designado, eles vêm, em resposta ao seu cham ado irresistível.
3. D ia Três: “Cubra-se a Terra de Vegetação”. O terceiro dia da Criação trouxe ainda outra manifestação da soberania divina, quando Deus m andou surgir a vida vegetal:
E disse Deus: “Ajuntem-se num só lugar as águas que estão debaixo do céu, e apareça a parte seca”. E assim foi.... Então disse Deus: “Cubra-se a terra de vegetação: plantas que deem sementes e árvores cujos frutos produzam sementes de acordo com as suas espécies”. E assim foi. - Gênesis 1.9-11
Deus determ inou que as águas da atmosfera se juntassem. Além disso, Ele causou um levantamento cataclísmico da superfície da terra, dirigindo as águas para encherem os lugares baixos, form ando mares, rios e lagos. Os continentes, os montes e as ilhas tomaram forma. A vegetação, já com sua semente, começou a crescer. O princípio da reprodução foi estabelecido, cada qual produzindo seu semelhante. Cada semente começou a produzir vida segundo a sua espécie, tudo pela determinação divina. A mesma manifestação da soberania divina vê-se na regeneração dos pecadores. O exercício da suprema vontade de Deus cria vida espiritual em corações espiritualmente mortos. Este é o milagre do novo nascimento. Q uando a semente da Palavra de Deus é plantada no solo dos corações dos hom ens, Deus a faz germinar para a vida eterna. Somente Deus pode criar vida do nada, quer física quer espiritual.
4. D ia Q uatro: “Haja lum inares”. No quarto dia, Deus criou livremente
0 sol, a luz e as estrelas, colocando os corpos celestes nos seus respectivos lugares.
O nde a Longa L in h a Começa
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Disse Deus: “Haja luminares no firmamento do céu para separar 0 dia da noite. Siri/am eles de sinais para marcar estações, dias e anos, e sirvam de luminares no firmamento do céu para iluminar a terra”. E assim foi.
- Gênesis 1.14 ,1 5
A criação dos corpos celestes não foi um esforço conjunto de Deus com alguém ou alguma coisa mais. Deus não dependeu da cooperação de anjos e de hom ens para que a sua obra tivesse êxito. De fato, não existia nenhum homem nessa ocasião. Deus por si e para si meram ente falou, e assim foi. Este ato autôno׳ mo de Deus mostrou que a sua vontade independente e o seu poder infinito são irresistíveis. Este mesmo poder soberano é exposto na causação divina do novo nascimento, obra do Espírito Santo, sem ajuda do esforço ou da cooperação hum ana. Conhecida pelo nom e de monergismo, essa verdade diz que o Espírito Santo é o único agente que efetua a regeneração dos eleitos. A graça regeneradora de Deus opera independentem ente da cooperação do hom em , fazendo que o pecador m orto espiritualmente creia.
5.
D ia Cinco: “Haja A nim ais” . No quinto dia, Deus novamente de-
m onstrou autoridade suprema começando a criar o reino animal em sua grande variedade, equilíbrio e beleza:
Disse tambe'm Deus: “Encham-se as águas de seres vivos, e voem as aves sobre a terra, sob 0 firmamento do céu”. Assim Deus criou os grandes animais aquáticos e os demais seres vivos que povoam as águas, de acordo com as suas espécies; e todas as aves, de acordo com as suas espécies. E Deus viu que ficou bom. - Ge"nesis 1.20,21
Este ato criativo foi realizado pelo irrestrito exercício da soberana vontade de Deus. Ele criou os anim ais m arinhos e as aves precisam ente com o quis, cada qual com projeto e propósito únicos. Vê-se a mesma soberania na obra di-
72 ןI I ' l l N D A M H N T O S DA G R A Ç A
vina de salvação dos pecadores. Nos tempos por ele designados no transcorrer da história, Deus cria onipotentem ente o arrependim ento e a fé salvadora nos corações de todos aqueles que escolheu salvar. C om o na criação do m undo, existe grande diversidade entre os seus escolhidos, os quais são redim idos de toda tribo, língua, povo e nação (Ap 5.9), e de todos os aspectos da sociedade (1C0 1.26-29). Mas há um propósito específico para cada um dos escolhidos. N enhum ato de regeneração é incidental. C ada novo nascim ento é intencional no reino de Deus.
6.
Dia Seis: “Façamos o H om em ” . No sexto dia, Deus completou a cria-
cão dos animais, e então fez o homem singularmente à sua imagem, como o ápice da ordem criada: Então disse Deus: “Façamos 0 homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança. Domine ele sobre os peixes do mar. sobre as aves do céu, sobre os grandes animais de toda a terra e sobre todos os pequenos animais que se movem rente ao chão”. Criou Deus 0 homem à sua imagem, à imagem de Deus 0 criou; homem e mulher os criou. - Gênesis 1.26,27
Deus formou o corpo físico do primeiro homem, Adão, do pó da terra, e depois soprou nele o sopro da vida - e ele se tornou um ser vivo. C ertam ente Adão não formou o seu próprio corpo. Tampouco foi ele a causa que o trouxe à vida. Somente Deus poderia ter feito isso. Com um projeto específico, Deus fez o hom em de uma ordem superior à do resto da criação, com o nobre propósito de que o hom em o conhecesse e amasse. Assim, Adão foi criado singularmente à imagem de Deus, sendo dotado de razão ou mente, emoção e vontade. Deus realiza uma obra vivificadora semelhante na regeneração de pecadores perdidos. Ele sopra vida espiritual naqueles que salva, cada um em sua hora marcada. Aqueles sobre quem ele age bondosam ente por sua graça, imediatam ente tornam-se vivos no novo nascimento. N enhum pecador, espiritualmente morto, pode causar sua vivificação. Unicamente Deus pode realizar a obra da graça regeneradora.
O nde a Longa L in h a C om eça
7.
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U m a O rdem : “N ão C om a” . As primeiras palavras de Deus a Adão
revelaram, ademais, sua autoridade para definir o bem e o mal, e para ordenar à sua criação que recusasse o mal.
E 0 SENHOR Deus ordenou ao homem: “Coma livremente de qual■ quer árvore do jardim, mas não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal, porque no dia em que dela comer, certamente você morrerá”. - Gênesis 2.16,17
Som ente Deus tem autoridade para dar ordens e exercer controle so bre sua criação. C olocado no jardim do Éden, Adão respirava o ar de Deus, com ia alim ento de Deus, gozava o paraíso de Deus. C om o tal, vivia em direta obrigação de prestar contras a Deus, que lhe proibiu com er de um a única árvore, a árvore do conhecim ento do bem e do mal. A desobediência, Deus disse, resultaria em im ediata m orte espiritual. Esta ordem e advertência di׳ vina revelaram o direito absoluto de Deus de governar sua criação em todos os aspectos. C om o C riador soberano, Deus tinha o direito de estabelecer a ordem m oral do universo e de fazer desta um a exigência a Adão. João Calvino nos propicia o discernim ento do motivo que está por trás dessa ordem quan d o escreve:
Moisés agora ensina que o homem era o governador do mundo, muito embora ainda sujeito a Deus. A lei lhe fora imposta como sinal dessa sujeição, pois para Deus não faria diferença alguma se ele comesse indiscriminadamente de qualquer fruto que quisesse. Portanto, a proibição de uma árvore foi uma prova de obediência. E dessa forma Deus designou que toda a raça humana se acostu׳ masse, desde o princípio, a reverenciar a sua divindade.6 6 John C alvino, The Crossway Classic Commentaries: Genesis (W heaton, IL, e N o ttin g h am , Inglaterra: Crossway Books, 2001), 36
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K I N D A M E N T O S DA G R A Ç A
da história hum ana e continuou a fazer sua solicitação a outros para que pecassem, tentando Eva a induzir Adão a entrar na rebelião contra Deus. M artinho Lutero escreve:
Mas esta tentação - quando Satanás ataca a Palavra e as obras de Deus - é muito mais grave e mais perigosa, e é peculiar à igreja e aos santos. Segue-se, pois, que, aqui, Satanás ataca Adão e Eva dessa maneira para privá-los da Palavra e para fazê-los acreditar em sua m entira depois que perderam a Palavra e sua confiança em Deus.8
A sedução sofrida pelo primeiro casal foi sutilmente diabólica, levando-o a desobedecer provocativa e temerariamente à única proibição feita por Deus. 2.
D esobediência Tem erária. Preferindo desconsiderar o m andam ento de
Deus, Adão pecou - atrevida, intencional, deliberada e egoisticamente. Mergulhou de cabeça num provocativo e temerário ato de desobediência, com os olhos bem abertos:
Quando a mulher viu que a árvore parecia agradável ao paladar, era atraente aos olhos e, além disso, desejável para dela se obter discerni-
mento, tomou do seu fruto, comeu-o e 0 deu a seu marido, que comeu também. - Gênesis 3.6
Adão escolheu desafiar e desobedecer a Deus. O pecado foi concebido no ventre do seu coração e depois deu nascimento à insubordinação. Apesar de ter sido colocado num Paraíso, cercado de abundantes bênçãos de Deus, o hom em escolheu resistir ao direito de Deus de governar sobre ele. Sobre esta rebelião cósmica, R. Kent Hughes observa: 8 M a rtin L u th e r, Luther’s Works, Voí. I: Lectures on Genesis Chapters 1-5, ed . Ja ro slav P e lik a n (St. L ouis, M O : C o n c o r d ia P u b lis h in g H o u se , 1958), 147.
O nde a Longa L in h a Começa
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Adão pecou voluntariamente, com os olhos bem abertos, sem hesi tação. Seu pecado estava carregado de interesse próprio. Ele tinha observado Eva tomar o fruto, e viu que nada lhe aconteceu. Ele pe cou voluntariamente, supondo que não lhe viriam conseqüências de nenhum a espécie. Tudo estava de pernas para o ar: Eva seguiu a serpente, Adão seguiu Eva, e ninguém seguiu Deus.9
Ficou claro que o hom em não quis submeter-se à soberania de Deus.
3.
C onhecim ento C arnal. Tendo pecado temerariam ente contra Deus,
Adão e Eva im ediatamente perderam toda a inocência e entraram num estado de culpa interior:
Os olhos dos dois se abriram, e perceberam que estarnm nus; então junta ram folhas de figueira para cobrir-se. - Gênesis 3.7
Na mesma hora a vergonha entenebreceu as almas do primeiro casal e o moveu a querer esconder-se de Deus. O sentim ento de contam inação perturbou suas consciências. Hugues explica:
A palavra “culpa” expressa a relação que o pecado tem com a justiça, ou, como os teólogos mais antigos a explicavam, com a penalidade da lei. O pecador está em relação penal com a lei. ... A culpa do pecado de Adão, cometido por ele como chefe ou cabeça federal da raça humana, é imputado a todos os seus des cendentes. Isso é evidente pelo fato que, como a Bíblia ensina, a morte como punição do pecado, passa de Adão a todos os seus descendentes.10 9 R. K ent H ugues, Genesis: Beginning an á Blessing (W heaton, Illinois: Crossway Books, 2004), 71. 10 Ibid., 245,246.
ן78 ןl U N D A M E N T O S DA ΟΚ Ας ί Α
Seus olhos foram abertos para um entendim ento experimental do pecado. Seus corações estavam dom inados pela consciência da corrupção. Tal foi a devas׳ tação feita pelo pecado. Descrevendo este novo sentim ento de culpa interior, Barnes escreve:
Tão logo a transgressão é consumada, o senso de malignidade do ato precipita׳se na mente. O desprazer do grande ser cuja ordem tinha sido desobedecida, a irremediável perda que decorre do pecado, a vergonha de este ser visto pelos que estão por perto como algo que envolve culpa, juntam-se no panorama à vista. Toda a natureza, cada criatura, parece agora uma testemunha da sua culpa e vergonha, um juiz que condena, um agente da vingança divina. Esse é o conhecimento do bem e do mal que eles adquiriram com sua queda da obediência - essa é a abertura dos olhos que o seu mau proceder requeria. ... Eles agora notam que as suas pessoas culpadas estão expostas a olhos alheios, e eles recuam, afastando-se do alcance, ainda que de relance, de todo olhar condenatório.11
4.
M orte Espiritual. No m om ento em que Adão e Eva pecaram, morre-
ram espiritualmente. Sua relação pessoal com Deus cessou. Sua desobediência separou-os do criador:
Ouvindo 0 homem e sua mulher os passos do Senhor Deus que andava pelo jardim quando soprava a brisa do dia, esconderam-se da presença do
Senhor Deus entre as árvores do jardim. Mas 0 Senhor Deus chamou 0 homem, perguntando: “Onde está você?” - Gênesis 3.8-9
A íntim a com unhão que o homem e a m ulher tinham desfrutado com Deus no jardim foi rompida. Ocorrera a morte espiritual de suas almas. Agora 11 A lb e rt B arn es, A Com m entary on the Book of Genesis ( G r a n d R a p id s, M I: B ak er B o o k s, 1996, 1873), 114-115.
O nde a Longa L in h a Começa
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havia um corte e um a separação em sua c o m u n h ão com D eus - o D eus santo foi alienado do hom em pecador. Em conseqüência, A dão escondeu-se de Deus. Estes versículos revelam a profu n d a queda d o hom em no salário do pecado, que é a m orte. Lutero com enta: “O h , que grave e funda queda, m ergulhar do mais alto senso de segurança, da confiança e prazer em Deus, para um tão pavoroso terror, que o hom em recua e se afasta da vista de Deus mais do que da vista e da presença do D iab o ”.12 A dão deixou de buscar Deus, mas, ao contrário, passou a fugir dele - esquem a que infeccionou toda a raça hum ana.
5.
N atureza P ecam inosa. As naturezas de A dão e de Eva tornaram -se
radicalm ente pecam inosas. T odo o ser interio r deles subitam ente se to rn o u forte m ente inclinado para o pecado:
E ele respondeu: “Ouvi teus passos no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi”. - Gênesis 3.10
O pecado de Adão e Eva levou, n o m esm o instante, cada um deles a sujeitar
-se a um a natureza pecam inosa, que se to rn o u a força diretora em suas vidas. Por causa da natureza pecam inosa perm anente deles, o pecado dom inou suas vidas. De repente o tem or encheu o coração de Adão. A paz abriu cam inho para o tum ulto interior. O contentam en to foi substituído pela inimizade. John M acA rthur explica:
E significativo que, pela própria admissão de Adão, a razão de seu temor estava nele mesmo, não em Deus. Note-se que Deus veio ao jardim como sempre fazia antes - não com fúria ardente, mas gentilmente, com bondade, passeando na hora fresca do dia, desejoso de partilhar sua bondade com suas criaturas e de gozar comunhão com elas”.13 12 Lutero, Luther 5 Works, Vol. 1: Lectures on Genesis Chapters 1-5, 171. 13 John M acA rthur, The Battle for the Beginning, The Bible on Creation and the Fail 0/ Adam (N ashville, TN : W Publishing
I HO ןI ' U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
Em vez de fruir a presença de Deus, agora o hom em estava cheio de medo. Deus era a última pessoa que Adão queria ver. O resultado desses acontecimentos foi que Adão e Eva fugiram da santa presença de Deus, m odelo que subsequentemente seria seguido por toda a raça hum ana. Lutero, de novo, observa:
Aprendamos, pois, que esta é a natureza do pecado; a menos que Deus proveja imediatamente uma cura e chame de volta o pecador, ele foge interminavelmente de Deus e, escusando-se com mentiras, acumula pecado sobre pecado até chegar à blasfêmia e ao desespero. Assim o pecado, por sua gravitação, sempre traz consigo outro pecado e leva à destruição eterna, até que, finalmente, a pessoa pecadora preferirá acusar Deus a reconhecer o seu próprio pecado.14
Desse ponto em diante, nenhum pecador jamais procuraria
0 Deus
santo
por sua própria iniciativa.
6.
Negação Pecaminosa. Q uando foram confrontados com
0 seu
pecado,
o primeiro casal evitou confessá-lo ou mesmo reconhecê-lo:
Deus perguntou: “Quem lhe disse que você estava nu? Você comeu do fruto da árvore da qual lhe proibi comerV' Disse 0 homem: "Foi a mulher que me deste por companheira que me deu do fruto da árvore, e eu comi”. O Senhor Deus perguntou então à mulher: “Que foi que você fez?” Respondeu a mulher: “A serpente me enganou, e eu comi”. - Gênesis 3.11-13
C om eçou a m ascarada. Escusas foram apresentadas. Tanto o hom em com o a m ulher entraram a fazer uso da negação. Adão resistiu a assum ir a G ro u p , 1984), 214, 215. 14 L u te ro , Luther's Works, Voi. I: Lectures on Genesis Chapters Ι·5, 175.
O nde a Longa L inha Começa
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sua transgressão, preferindo em purrar a culpa para sua esposa. Ele até tentou ap o n tar um dedo acusador a Deus por lhe haver dado tal m ulher. Eva, igual׳ m ente, ten to u passar a culpa para Satanás. A natureza do pecado dentro deles fez que desconsiderassem com pletam ente qualquer responsabilidade pessoal por seu pecado. Evitaram a todo custo confessá׳lo. Nessa recusa a reconhecer o seu pecado, vemos o rum o que todos os hom ens seguem. Lutero anota per׳ ceptivam ente essa negação pecam inosa quando escreve: Veja׳se quão soberbamente a viciosa natureza do pecado é retratada aqui. De modo nenhum Adão pode ser forçado a uma confissão do seu pecado, mas o que ele faz é negar o seu pecado ou escusá10 ׳enquanto vê que há alguma esperan׳ ça ou mais algum tipo de escusa. Não é espantoso que, no princípio, ele esperava ser capaz de acobertar o seu pecado e que acusou Deus, em vez de reconhecer que tinha errado. Mas isto é espantoso: ele ainda persistiu em sua escusa depois que a sua consciência o tinha convencido e que ele tinha ouvido o seu pecado apontado por Deus.... E da natureza do pecado não permitir que a alma fuja de volta para Deus, mas, antes, forçá׳la a fugir para longe de Deus.15
7.
M o rte Física. Deus tinha dito enfaticam ente a A dão e Eva que a
desobediência à única proibição traria a m orte. Ele não m odificou essa pe׳ nalidade:
Com 0 suor do teu rosto você comerá 0 seu pão, até que volte à terra, visto que dela foi tirado; porque você é pó, e ao pó voltará. - Gênesis 3.19
Q u an d o Adão pecou, não m orreu de im ediato fisicam ente. C ontudo, o seu corpo começou a m orrer. Sujeito à m ortalidade, seu corpo com eçou a envelhecer, a deteriorar׳se, a decair. Em vez de durar para sem pre,
0 corpo
de A dão expiraria depois de 930 anos de vida. E a corrupção do pecado que há d en tro de todos os m em bros da raça de Adão que os leva a m orrer fisica׳ 15 Ib id , 177.
ן82 ןI ' U N D A M E N T O S DA Ci RAÇA
m ente. Sobre este fato, Louis B erkhof escreve: “A posição da igreja sem pre foi que a m orte, no pleno sentido da palavra, incluindo a m orte física, não é som ente conseqüência, mas, tam bém , penalidade do pecado. O salário do pecado é a m o rte”.16 Assim, em bora o corpo não m orra im ediatam ente, morre inevitavelm ente.
8.
Depravação Transm itida. Q uando Eva teve filhos de Adão, eles foram
concebidos à semelhança dele, com naturezas pecaminosas:
Aos 130 anos, Adão gerou um filho à sua semelhança, conforme a sua imagem; e deu-lhe 0 nome de Sete". - Gênesis 5.3.
Q uando nasceram filhos do prim eiro casal, a depravação radical das suas naturezas propagou-se à sua prole, e, subsequentem ente, a toda a raça hum ana, na hora da concepção de cada um (SI 51.5; 58.3). Esta depravação interior está em m arcante contrate com o estado de incontam inada inocência original de Adão. Adão foi criado à imagem de Deus (Gn 1.27), mas a sem elhança dele com Deus foi corrom pida pelo pecado. Dessa forma o hom em começou a perpetuar o pecado. Esta é um a das verdades básicas da teologia - a depravação da natureza pecam inosa dos prim eiros pais transm itida para a raça hum ana. Calvino explica:
Ao dizer que Adão teve um filho à sua semelhança, Moisés se referiu à origem da nossa natureza. Mas, ao mesmo tempo, aludiu à corrupção e à poluição dessa natureza, o que, devido ao pecado de Adão e à Queda, seguiu adiante passando a toda a sua posteridade. Portanto, segundo a carne Sete nasceu pecador.17
16 L ouis B e rk h o f, Systematic Theology (C a rlisle , PA, e E d im b u rg o , E scócia: T h e B a n n e r o f T r u th T ru s t, 1958), 2 6 0 [citação feita apud Teologia Sistem ática, tra d u ç ã o feita p o r O d a y r O liv e tti, I a. ed . 1990, p á g in a 2 62.] 17 C a lv in o , Genesis, 64.
O n d e a L o n g a L i n h a C otncça
| 83 j
A natureza da alma de todos os hom ens agora estaria, como está, prague׳ jada pelo pecado.
9.
Depravação Total. Cada filho nascido de mulher é dado à luz à seme-
lhança de Adão, com natureza radicalmente corrupta. Moisés descreve como era a natureza hum ana pouco antes do Dilúvio como segue:
O Senhor viu que a perversidade do homem tinha aumentado na terra e que toda a inclinação dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para 0 mal. - Gênesis 6.5
A depravação do primeiro casal passou para cada geração sucessiva, de cada pai à sua prole. Perto do tempo do Dilúvio, a depravação do coração humano estava correndo desenfreadamente para formas grosseiras de pecado irrestrito. Perversos e pervertidos, os homens permaneciam em torpe iniqüidade. Essa corrupção penetrou até o cerne dos seus seres, pois “toda a inclinação dos pensam entos do seu coração era sempre e somente para o mal”. A última palavra deste versículo, na Versão King James, “continuam ente”, descreve até que distância a natureza pecaminosa do hom em vomita o seu veneno. Sobre esta depravação, James M ontgomery Boice anota: “Uma pessoa cujo coração só pode inclinar-se para o mal, certam ente não procura nem pode procurar Deus”.18 Este é o fim a que chega a depravação do homem, se não recebe a restrição da graça de Deus. O coração hum ano persegue o mal sem descanso. Sobre este fato, M acArthur escreve: “Esta é uma das mais fortes e mais claras declarações acerca da natureza pecaminosa do homem. O pecado começa no pensamento. O povo do tempo de Noé era excessivamente iníquo, de dentro para fora”.19Astutamente, Ryle anota:
18 Jam es M o n tg o m e ry B oice e P h ilip G r a h a m R yken, The Doctrines of Grace: Rediscovering the Evangelical Gospel (W h e a to n , IL: C rossw ay B ooks, 20 0 2 ), 70. 19 J o h n M a c A rth u r, T ta M acA rth u r Study Bible (N a sh v ille , L o n d re s, V a n c o u v e r, M e lb o u rn e : W o rd B ibles, 1997), 24.
84 ןI M I N D A M E N T O S DA G R A Ç A
Há poucos erros e falsas doutrinas das quais o inicio não pode ser encontrado nas inseguras e fracas ideias sobre a corrupção da natureza hum ana. Ideias errôneas sobre a doença sempre trazem com elas ideias erradas sobre o remédio; ideias errône׳ as sobre a corrupção da natureza hum ana sempre trazem com elas ideias erradas sobre o grande antídoto e cura daquela corrupção.20
Calvino acrescenta:
A iniqüidade deles invadiu a terra inteira. Quer dizer que o tempo para a punição tinha chegado de vez. A iniqüidade reinava sobre toda a terra e a cobriu. Desse fato se vê que o mundo não foi engolfado por uma total enchente de águas enquanto não tinha sido primeiro imerso na corrupção da iniqüidade.21
10.
Depravação Inalterável. A natureza hum ana caída continuou inaltera׳
da depois do Dilúvio. A raça hum ana não ficou diferente, depois do Dilúvio, do que era antes dele (cf. G n 6.5):
"... pois 0 seu coração [do homem] é inteiramente inclinado para 0 mal desde a infância”. - Gênesis 8.21c
Uma família de pecadores entrou na arca - Noé, sua esposa, seus três filhos e suas esposas - e uma família de pecadores saiu da arca para repopularizar a terra. A depravação permaneceu inalterada. Apesar de viver num novo m undo, a raça hum ana continuava sendo iníqua e pecaminosa. O fato é que a depravação do
20 J. C . Ryle, c o n fo r m e c ita d o p o r D u a n e E d w ard S p e n c e r e m TULIP, The Five Points of Calvinism in the Light of Scripture, 2a. ed. ( G r a n d R a p id s, M I: R ak er B o o k s, 1979), 31. 21 C a lv in o , Genesis, 69.
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coração hum ano continua sendo a mesma até o dia de hoje. Sua natureza não está evoluindo para níveis mais altos, como muitos erroneam ente supõem. Sua disposição interior é tão exatamente iníqua como era no princípio. A respeito desta depravação imutável Calvino escreve:
Portanto, que os homens reconheçam que, visto que nascem de Adão, são criaturas depravadas, e por isso somente podem conceber pensamentos pecaminosos, enquanto não forem trans formados pela obra redentora de Cristo e não forem refeitos por seu Espirito para uma nova vida. Não se deve duvidar de que o Senhor declara que a própria mente do homem é depravada e está infectada pelo pecado, de maneira que todos os pensamen tos que procedem de sua mente são maus. Se a fonte mesma tem esse defeito, segue-se que todos os afetos e sentimentos do homem são maus, e que os seus feitos estão cobertos da mesma corrupcão... Pois, já que sua mente está corrompida com desrespeito a Deus, orgulho, amor próprio, e hipocrisia ambiciosa, todos os seus pensamentos estão contaminados com os mesmos vícios.... Os próprios afetos e sentimentos, que em si mesmo são louváveis, es tão viciados pelo pecado original... os homens nascem maus. Isto mostra que, tão logo chegam a uma idade em que são capazes de pensar, eles já têm mentes radicalmente corruptas... a depravação penetra os nossos sentidos. ...Ninguém deve culpar Deus por isso. A origem desta doença brota da deserção do primeiro homem, por causa de quem a ordem da criação foi subvertida. ...Conquanto todos corram para praticar maus atos, ninguém é forçado a isso, a não ser pela direta inclinação dos seus próprios corações. Q uando pecam, fazem isso porque querem pecar.22
22 Ibid., 85,86.
I H6 I I U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
A D O U T R IN A EM F O C O
'I
ELEIÇÃO IN C O N D IC IO N A L Em meio a esse registro de tão vergonhoso pecado, Moisés tam bém en-
sinou o segundo maior título das doutrinas da graça - a eleição incondicional de Deus. Esta doutrina ensina que Deus escolheu para si pecadores individuais caídos que quis salvar. Tendo mostrado que Deus se propusera criar o universo, a raça hum ana inclusive, Moisés vai adiante e expõe a soberania de Deus em sua generosa escolha de, por sua graça, resgatar um povo da massa da hum anidade caída para vir a ser a sua peculiar propriedade redimida. Vê׳se inequivocamente a graça soberana na escolha incondicional que Deus fez de salvar Adão, Eva, Abel, Enoque e Noé com sua família. Após a dispersão, por ocasião da Torre de Babel, Deus deu a conhecer sua soberana escolha de Abraão para ser o pai da nação escolhida, Israel. De dentro da nação de Israel, Deus salvou um remanescente que tinha escolhido, começando com Abraão. Deus fez esta escolha misericordiosa daqueles que, por slia misericordiosa graça, tinha trazido para si antes da fundação do m undo.
1.
Escolha Divina. No meio da massa da hum anidade, Deus selecionou
soberanamente Abraão e 0 tirou do paganismo de U r dos Caldeus para ser objeto de sua graça salvadora:
Então 0 Senhor disse a Abraão: “Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa de seu pai, e vá para a terra que eu lhe mostrarei. Farei de você um grande povo, e 0 abençoarei. Tornarei famoso 0 seu nome, e você será uma bênção. Abençoarei os que 0 abençoarem e amaldiçoarei os que 0 amaldiçoarem; e por meio de você todos os povos da terra serão abençoados”. - Gênesis 12.1-3
A escolha divina, com absoluta certeza, não se baseou em alguma fé prevista da parte de Abraão. Abraão nem sabia o nom e de Jeová quando vivia em Ur.
O nde a Longa L in h a Com eça
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A escolha de Abraão da manchada massa da hum anidade pecadora originou-se dentro de Deus, por razões que só Deus sabe. Deus exerceu e exercerá esta mes ma soberania absoluta na escolha de um remanescente salvo em todas as gerações dentro de Israel e dentre todas as famílias da terra. A verdade sobre a eleição de Abraão feita por Deus é a verdade a respeito da eleição de toda pessoa escolhida para a vida eterna. S. Lewis Johnson escreve:
Para se entender o sentido da vida e do ministério de Abraão, é fundamental entender sua eleição, tanto para a salvação como para o ministério designado para ele.... O chamado de Abraão, que chegou a um homem que estava no fundo do poço da idola׳ tria e da incredulidade, foi resultado da soberana determinação de Deus de elegê-lo para a salvação e para o serviço na causa de Deus. Ele e os seus jaziam no paganismo, servindo a outros deuses (cf. Js 24.2), quando o Deus da glória lhe apareceu em busca da reali zação de seu propósito de abençoá-lo e de extrair dele a semente na qual todas as famílias da terra seriam abençoadas. Por que o escolhido foi Abraão, e não Bilduk, o meshita, permanece dentro do inescrutável propósito de Deus, pois ele tem misericórdia de quem ele quer ter misericórdia.23
2.
Escolha D istintiva. Na geração que se seguiu, Abrão - cujo nom e Deus
depois m udou para Abraão - teve dois filhos, Ismael e Isaque, entre outros filhos. Deus escolheu Isaque para si:
Então Deus respondeu: "Na verdade, Sara, sua mulher, lhe dará um filho, e você lhe chamará Isaque. Com ele estabelecerei a minha aliança, que 23 S. Lewis J o h n so n , Expository Sermons on Genesis, “T h e C all o f A bram , o r Election, Effectual Calling, an d Final Perseverance” (serm ão inédito, Believer’s C hapel, Dallas, TX), 4
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será uma aliança etema para os sews futuros descendentes. E no caso de Ismael, levarei em conta 0 seu pedido. Também 0 abençoarei; eu 0 farei prolifero e multiplicarei muito a sua descendência. Ele será pai de doze príncipes e dele farei um grande povo. Mas a minha aliança, eu a estabelecerei com lsaque, filho que Sara lhe dará no ano que vem, por esta época”. - Gênesis 17.19-21
Apesar de Ismael ter nascido primeiro, Deus, não obstante, escolheu especificamente lsaque para ser o herdeiro da promessa. Deus escolheu lsaque e deixou
de lado Ismael num ato de prerrogativa soberana. Esta escolha distintiva
foi designada para mostrar que a salvação não seria conseqüência de um nascimento ou de uma linhagem natural. A salvação seria, antes, pela escolha da soberana graça de Deus. O nascimento milagroso de lsaque serviria como uma excelente figura da escolhq soberana de Deus na salvação e em sua obra sobrena׳ tural no novo nascimento. Concernente a este exercício da soberania divina na salvação, Calvino escreve:
Aqui fica evidente que Deus escolheu entre os dois filhos de Abraão. A um prometeu riqueza, posição social e outras coisas pertencentes a esta presente vida. Desse modo demonstrou que Ismael era um filho do ponto de vista humano. Mas Deus fez uma aliança especial com lsaque, aliança que se estendeu para além do mundo e desta frágil vida. Deus fez isso, não para cortar Ismael da esperança de vida eterna, mas para ensinar׳lhe que a salvação deve ser procurada no povo de lsaque, onde ela realmente está.24
3.
Escolha D eterm inada. Inseparavelmente ligada à doutrina da eleição
soberana está o fato de que Deus escolheu amorosamente Abraão para ser objeto de sua graça salvadora. A eleição tem suas raízes no am or divino: 24 C a lv in o , The Crossway Classic Com mentaries: Genesis, 170.
O nde a Longa L inha Começa
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“...Pois eu 0 escolhi, para que ordene aos seus filhos e aos seus descendentes que se conservem no caminho do Senhor, fazendo 0 que é justo e direito, para que 0 Senhor faça vir a Abraão 0 que lhe prometeu”. - Gênesis 18.19
A palavra h eb raica q u e M oisés em prega neste texto para “esco lh i” (yadah) significa “escolhi em a m o r”. B e rk h o f explica este p o n to q u a n d o escreve:
A palavra yadah pode significar simplesmente “conhecer” ou “tomar conhecimento” de alguém ou de alguma coisa, mas também pode ser empregada no sentido mais denso de “tomar conhecimento de alguém com amoroso cuidado”, ou “fazer de alguém objeto de amoroso cuidado ou de amor eletivo”. Nesse sentido se presta para expressar a ideia de eleição, G n 18.19.25
D eus escolheu soberan am en te colocar seu coração sobre A braão com am or distintivo e redentor, resu ltan d o em sua salvação. Por razões que só Deus conhece, ele escolheu ter com paixão de A braão. D entro da h u m an id ad e corrupta de A brão, não havia nada que atraísse D eus para amá-lo. Em vez disso, a origem de tal am or estava d en tro da soberana vontade de Deus. D eus am ou A braão sim plesm ente p orque escolheu amá-lo. Esta escolha determ inativa de am ar indivíduos pecadores está p o r trás de cada salvação. Deus escolheu am ar os seus eleitos com am or im erecido. 4.
Escolha D iferen te. A escolha de D eus na eleição frequentem ente é in-
com um , im ensam ente diferente da escolha que o hom em faria. A escolha de Jacó e não de Esaú é um exemplo; só pode ser explicada por eleição soberana:
Disse-lhe 0 Senhor: “Duas nações estão em seu ventre, já desde as suas entranhas dois povos se separarão; um deles será mais forte que 0 outro, mas 0 mais velho seroira ao mais novo”. - Gênesis 25.23 25 B erkhof, Systematic Theology, 111,112. |A pud Teologia Sistemdtica, tradução de O dayr O livetti, p. 113.]
90 ןI F U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
A escolha divina de Jacó não pode ser explicada pela ordem de nascim ento ou p or direitos naturais. Deus escolheu livrem ente Jacó,
0 mais
novo,
e não Esaú, o mais velho. Esta escolha foi o inverso do que era costum eiro. C alvino vê a escolha incom um de Jacó com o a de um representante da sele׳ ção soberana de pecadores: “Q ue poderia ele [Deus] prever, senão esta massa corrupta de A dão, que outro fruto não produz senão m aldição... Elim ine׳se a eleição, que restará? C om o tem os declarado, estarem os com pletam ente perdidos e am aldiçoados”.26 Temos aí dem onstrada graficam ente a prerrogativa jiú tô n o m a da soberania divina no ato de eleição (Rm 9 .9 Ί 3 , 18-23).
A D O U T R IN A EM FOCO '
EXPIAÇÃO LIMITADA Moisés não ensina somente a verdade sobre a eleição soberana; ele escreveu
também acerca do terceiro maior título das doutrinas da graça - expiação limitada. Esta é averdade divina segundo a qual Cristo morreria pelos pecados de
todos os
escolhidos por Deus. Quer dizer, Cristo daria sua vida especificamente pelo remanes׳ cente crente, tomando seu lugar na cruz e derramando seu sangue para cobrir as suas iniquidades. Sua morte redentora seria por aqueles que seriam introduzidos na famí׳ lia de Deus. Isso foi profetizado imediatamente após o pecado de Adão, prefigurado no animal que Deus imolou no jardim e previsto no sacrifício oferecido por Abel.
1.
M orte Específica. Depois que Adão pecou no jardim, Deus pronunciou
suas maldições sobre todos os participantes. Com eçou com a serpente, mas essa maldição continha um a clara alusão a um a expiação definida:
"...Porei inimizade entre você e a mulher, entre a sua descendência e 0 descendente dela; este lhe ferira a cabeça, e você lhe ferirá 0 calcanhar.” - Gênesis 3 .15 2 6 J o ã o C a lv in o , Sermons on Election and Reprobation ( A u d u b o n , N J: O l d P a th s, 1996), 3 0.
Onde a Longa L i n h a Começa
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No meio de um a série de juízos devastadores, há um refulgente diam an te da graça divina. Os teólogos o denom inam protoevangelium, que é a palavra grega para “a prim eira m enção do Evangelho”. Ali, no Jardim do Éden, Deus revelou perpétua inimizade entre a sem ente de Satanás - isto é, todos os in crédulos descendentes de Satanás (Jo 8.44; Ef 2.2) - e a sem ente da mulher, a saber, aqueles que estariam na família de Deus. Mas Deus tam bém profetizou a cruz, dizendo, m etaforicam ente, que Satanás feriria o calcanhar de Cristo, fazendo-o sofrer - mas que não seria derrotado. M ediante sua m orte, Cristo esmagaria o Diabo, dando-lhe um devastador golpe e lhe causando a derrota. Portanto, nesta prim eira m enção que a Bíblia faz da m orte de C risto, há o ensi no de um a redenção definida em favor da sem ente crente da m ulher. O Messias ferido m orreria especificamente por aqueles que pertenceriam a seu reino - isto é, por todos os crentes. C oncernente à primeira promessa de um Redentor, M acArthur escreve:
A maior bênção que está ligada à maldição é a promessa de Cristo, o Redentor, a Semente da mulher - Aquele que esmagaria a cabeça da serpente.... Primeiro, ele seria a Semente da mulher. Essa línguagem é significativa porque, normalmente, a prole é descrita como a semente de seus pais. Essa expressão parece uma sutil referência ao nascimento virginal de Cristo. Ele nasceu de mulher num senti do particular, mas Deus foi seu único Pai (Lc 1.34,35)_Segundo, haveria inimizade entre ele e a serpente.... Significa o continuado conflito entre Satanás e Cristo. Satanás, o destruidor das almas dos homens, opõe-se a Cristo, o salvador do mundo. O Maligno odeia o Santo e, por isso, coloca-se, e também a “sua semente” - todos os que pertencem a seu reino (demônios e seres humanos) - contra a semente da mulher. Terceiro, a semente da mulher sofreria. Satanás feriria o seu calcanhar. Isto fala do sofrimento de Cristo na cruz.... Quarto, o Salvador triunfaria. Poria fim à inimizade para sempre
92 ןI I ' U N D A M E N T O S DA G K A i / A
esmagando a cabeça da serpente. Satanás, a serpente, fez o que pôde para destruir Cristo, mas no fim só deixou um ferimento que seria curado. Cristo ressuscitou triunfalmente dos mortos, obtendo redenção... esmagando a cabeça da serpente, como fora prometido”.27
Por meio de sua morte, Cristo salvaria todos os que creem.
2.
Substituição Específica. No jardim, Deus tam bém ofereceu um quadro
simbólico da futura m orte de Cristo por seus escolhidos. Por iniciativa soberana, ele fez coberturas para a nudez do primeiro casal.
O Senhor Deus fez roupas de pele e com elas vestiu Adão e sua mulher. - Gênesis 3.21
O S enhor, pessoalm ente, m atou um anim al inocente e fez coberturas
para a nudez e para a culpa de A dão e Eva. Foi a prim eira m orte no m u n d o recentem ente criado por Deus - um sacrifício im olado. O anim al foi m orto nas mãos de Deus, que providenciou pele, de graça, para o p rim eiro casal com o um a expressão de sua graça salvadora. Suas roupas de pele representavam a provisão de D eus para a restauração da relação de Adão e Eva com ele. Este sacrifício cru en to representou a vinda de C risto ao m u n d o para redim ir seu povo. O Filho de Deus seria o C ordeiro de Deus, que tiraria o pecado de seu povo (Jo 1.29, 36). U nicam ente o seu sacrifício proveria um a co b ertu ra para a nudez exposta da culpa de A dão e Eva. Explicando a morte substitutiva, Boice assinala que ela simbolizou o sangue derram ado e a justiça perfeita de Cristo. Boice escreve:
Para fazer roupas de pele, Deus teve de matar animais. Foi a primeira morte que Adão e Eva testemunharam, quanto pode 27 M a c A rth u r, The Battle for the Beginning, The Bible on Creation and the Fall of A d a m, 218, 219.
O nde a Longa L in h a Começa
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mos saber. Deve ter-lhes parecido horrível e causado impressão indelével. “Então a morte é isso; é isso que o pecado causa!”, eles devem ter exclamado. Mas, ainda mais importante, a morte dos animais deve ter-lhes ensinado o princípio da substituição, o inocente morrendo pelo culpado, exatamente como o inocente Filho de Deus morreria um dia pelos pecados daqueles que Deus lhe deu. Quando Deus vestiu os nossos primeiros pais com peles de animais, Adão e Eva devem ter tido ao menos um tênue vislumbre da doutrina da justiça imputada.... Deus salvou Adão e Eva dos seus pecados vestindo-os com a justiça celestial de Jesus Cristo, que ele simbolizou vestindo-os com peles de animais.28
3.
Sacrifício Específico. Adão e Eva conceberam e tiveram dois filhos,
Caim e Abel (Gn 4.1,2). Q uando chegou a hora de eles fazerem oferendas ao Senhor, nunca dois sacrifícios foram mais opostos um ao outro. Deus rejeitou o sacrifício de Caim, mas aceitou o de Abel.
Abel, por sua vez, trouxe as partes gordas das primeiras crias do seu rebanho. O Senhor aceitou com agrado Abel e sua oferta. - Gênesis 4-4
Caim trouxe uma oferta do seu campo, uma oferta não cruenta, uma oferta não aceitável para Deus. Mas Abel trouxe as primícias do seu rebanho, um sacrifício cruento, que foi aceitável para Deus. Esta oferta foi uma previsão do sacrifício definido de Cristo, pelo qual o seu sangue seria derramado por muitos crentes. Esta narrativa mostra que os pecadores só podem aproximar-se de Deus mediante um sacrifício aceitável - aprovado por ele mesmo. Deus estipulou desde o princípio que o sacrifício seria - um sacrifício substitutivo, com derramamento de sangue - razão 28 Ja m e s M o n tg o m e ry B oice, The Glory of God's Grace, The M eaning of G o d ’s Grace - a n d H o w It C a n Change Your Life ( G r a n d R a p id s , M I: K regel P u b lic a tio n s , 1993), 14,15.
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pela qual Cristo Jesus teve de sofrer morte sanguinária e substitutiva. Matthew Henry escreve: “Abel trouxe um sacrifício de expiação, cujo sangue foi derramado para remissão, com isso assumindo que era pecador, suplicando misericórdia pela a ira de Deus e implorando o seu favor com um M ediador”.29 Este sacrifício cruento era exclusivo para o que crê.
A D O U T R IN A EM FOCO GRAÇA IRRESISTÍVEL Além disso, Moisés ensinou um quarto po n to im portante das doutrinas da graça - o irresistível cham ado de Deus. Deus inicia o cham ado dos pecadores eleitos por ele e assegura a desejada resposta deles. A verdade é que os não regenerados não podem nem querem buscar Deus enq u an to ele próprio não os cham ar eficazmente. Este é o irresistível cham ado de Deus, que sem pre assegura o resultado visado por Deus. Q u ando regenera e cham a um a pessoa, Deus revela o pecado que há na vida dela, induzindo-a a confessar e a ab an d o n ar o seu pecado. Foi o que aconteceu quando cham ou A dão e Eva no jardim : Fez um cham ado soberano ao prim eiro casal - cham ado que os im peliu à salvação.
1.
C ham ado Iniciado por Deus. Deus é o grande procurador de peca-
dores perdidos. O hom em perdido, pecador, contam inado pela culpa, escolhe esconder-se de Deus, não o busca. Por isso, na salvação, sempre é necessário que Deus tome a iniciativa:
Ouvindo 0 homem e a mulher os passos do Senhor Deus... esconderam■ ■se da presença do Senhor Deus entre as árvores do jardim. Mas 0 Senhor Deus chamou 0 homem, perguntando: “Onde está vocêV' Gênesis 3.8,9 29 M a tth e w H e n ry , M attheu ׳Henry’s Com m entary on the Whole Bible (P eab o d y , M A : H e n d r ic k s o n P u b lis h e rs, In c., 1998), 17.
Onde a Longa L in h a Começa
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Se Deus não procurasse e não salvas.se o perdido, ninguém poderia ser salvo. Mas Deus procura e salva pecadores perdidos, e, quando os encontra, chamaos para si. A parte do homem é fugir de Deus, e a parte de Deus é perseguir
0 homem
e
trazê-lo para si. Esta é a graça de I )eus, sua graça irresistível. O chamado de Deus a Adão e Eva figura, então, a salvação de cada um dos eleitos de Deus. Escrevendo sobre a verdade da graça irresistível de que falam estes versículos, Boice declara: Note׳se que, quando Deus chamou Adão, Adão respondeu! Quando Deus citou Adão e Eva, eles compareceram ao banco dos réus! Pode ser que não tenham querido fazer isso. Tinham se escondido, e preferiam ficar escondidos. Mas Deus os chamou. A vontade de Deus era que eles viessem à frente. E porque essa era a vontade soberana, poderosa e eficaz de Deus, Adão e Eva responderam e atenderam ao chamado, justamente como todos os homens e mulheres responderão e atenderão quando convocados pelo toque da trombeta de Deus.’0
Se pecadores hão de ser salvos, é necessário que Deus os persiga e chame. 2.
C ham ado que Expõe o Pecado. O chamado eficaz de Deus é sempre um
chamado que expõe o pecado, revelando a iniqüidade que separa dele o pecador.
E Deus perguntou: "Quem lhe disse que você estava nu.? Você comeu do fruto da árvore da qual lhe proibi comerV’ Disse 0 homem: "Foi a mulher que me deste por companheira que me deu do fruto da árvore, e eu comi”. O Senhor Deus perguntou então à mulher: "Que foi que você fezV’ - Gênesis 3.11-13 a
Este interrogatório divino foi feito com a intenção de revelar o pecado de Adão e Eva. Foi designado para fazê-los ver a si mesmos como Deus os via - quem
30 James Montgomery Boice, Gentis, An Expositionflí Commíntarj, Vol. 1, Gênesis 111 (G rand Rapids, M I: Baker Books, 2002), 193.
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eles eram verdadeiramente. Depois de receber de Adão uma desculpa defensiva, o Senhor voltou-se para questionar a mulher. Ele pressionou a indagação sondando o coração de Eva, com a intenção de trazer à superfície o pecado que ela estava reprimindo. Boice escreve:
Por que Deus fez essas perguntas? Não foi para obter informação, como tampouco o era quando perguntou a Adão: “Onde está você?” Foi para levar Adão e Eva ao ponto de confessarem o mal que tinham feito. Não era que Deus precisasse ser informado, mas sim que Adão e Eva precisavam ser humilhados.31
Esta exposição do pecado sempre acompanha o chamado que Deus dirige aos eleitos.
I
A D O U T R IN A EM FOCO PERSEVERANÇA DOS SANTOS Finalmente, Moisés ensinou, no Livro de Gênesis, o quinto ponto das
doutrinas da graça - a graça preservadora. Todos os que Deus escolhe e chama soberanamente para si na salvação, ele m antém em segurança eterna. Também conhecida como perseverança dos santos, esta doutrina ensina a verdade segundo a qual Deus mesmo persevera com os santos e neles, mantendo-os seguros em sua graça. Também se pode rotular esse ponto como graça perseverante, expressão que enfatiza que a obra redentora de Deus tem continuidade e que ele preserva para sempre todos aqueles que salva. Dos que são salvos pela graça de Deus, ninguém jamais perderá a sua salvação. Ele guardará todos os redimidos e os m anterá salvos e seguros por todos os séculos por vir. N enhum deles perecerá. A salvação é para sempre.
31 Ibid., 194.
O nde a Longa L in h a Começa
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1. Seguros no Céu. Vê׳se a graça preservadora no traslado de Enoque para o céu como um verdadeiro crente no Senhor. Ele foi levado para Deus como alguém que estava salvo eternam ente (Hb 11.5):
Enoque andou com Deus; e já não foi encontrado, pois Deus 0 havia arrebatado. - Gênesis 5.24
Moisés fez uso do verbo andar para falar da relação pessoal de Enoque com Deus e de sua íntima comunhão com ele. Enoque gozava comunhão com Deus, e o Senhor o tomou para si. Enoque foi diretamente para o céu, sem morrer. Seme׳ lhantemente, todos os crentes serão levados para o céu, quer quando morrerem quer por ocasião da volta de Cristo. Neste versículo vemos que o ato de Deus de arrebatar Enoque e o levar para o céu foi real, e que a fé salvadora é para sempre. Lutero escreve:
Esta é uma joia especial que Moisés quer que seja proeminente neste capítulo: que o Deus Todo-Poderoso leva para si, não gansos ou néscios, nem vacas, nem pedaços de madeira, nem pedras, e não os mortos, mas Enoque em pessoa, a fim de mostrar que foi preparada e separada para os homens outra vida, e melhor do que a presente vida, que é cheia de tantos infortúnios e males.’2
Devido a esta graça preservadora, todos os crentes têm a garantia de que estarão seguros no céu.
2. Salvos E ternam ente. A graça preservadora também é retratada na posi׳ cão de Noé na arca no dia da grande enchente:
Naquele mesmo dia, Noé e seus filhos, Sem, Cam e ]afé, com sua mulher e com as mulheres de seus três filhos, entraram na arca. As águas preva-
32 L u te ro , L uthers Works, Vol. 1: Lectures on Genesis Chapters 1-5, 34 6 .
I Ή» ןl:U N I ) A M L N T O S DA G R A Ç A
leceram, aumentando muito sobe a terra, e a arca flutuava na superfície das águas". - Ge'nesis 7.13,18
Assim como Noé e sua família foram libertados através das águas do Dilúvio do juízo de Deus, assim também eles, com todos os verdadeiros crentes, serão preservados por meio da ira divina do últim o dia, pela graça de Deus. Não importa quão tempestuoso foi o Dilúvio, Noé não pôde nem poderia cair da arca. Deus fechou a porta, selando todos os que estavam dentro. De igual modo, nenhum crente cairá jamais da graça, jamais perderá a sua salvação. Boice escreve:
Quando o Senhor fechou Noé e sua família na arca, eles ficaram totalmente seguros, e este fato veio a ser uma ilustração para nós da perfeita segurança do crente em Jesus Cristo. Vieram as chuvas. As águas se enfureceram. Mas nada pôde tocar nestes que foram selados na arca por Jeová. E interessante que Deus não disse: “Noé, é hora de fechar a porta. Chame seus filhos para que o ajudem a fazê-la correr e para porem as trancas”. O Senhor não coloca a segurança de seu povo em mãos alheias. Ele próprio põe as trancas. A respeito dele foi dito: “O que ele abre ninguém pode fechar, e o que ele fecha ninguém pode abrir” (Ap 3.7). O fechamento de Noé dentro da arca eqüivale ao fato de sermos selados com o Espírito Santo (Ef 4.30). À semelhança dele, não estamos somente salvos; também estamos seguros.’3 N enhum dos eleitos de Deus perecerá.
DEVOLTA AO P R IN C ÍP IO
As verdades bíblicas sobre a supremacia de Deus na salvação estão arraigadas e fundadas no rico solo do livro inicial da Escritura, o Livro de Gênesis. 33 B oice, Genesis, A n Expositiona! Com m entary. Vol. 1: Genesis M l , 3 44-45.
O n d e a I n n g a l. l n h i i P ii m tf u
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A igreja atual precisa desesperadamente recuperar este sólido ensino. Q uando pregadas, estas verdades rendem m uito mais fruto nos crentes e lima grande co lheita de almas dentre as que estão perecendo. Se um grande avivamentu vier, será precedido pela pregação da plenitude da graça soberana de Deus. Os que proclamam estas verdades sobre a soberania de Deus serão os pre cursores de um verdadeiro despertam ento espiritual nestes dias. O nde estão os hom ens que, como Moisés, estão ensinando as grandiosas verdades? O nde estão, entre nós, os que pregam a pureza da graça divina? E preciso que entre em cena, na presente hora, uma nova geração de líderes espirituais, hom ens que insistam em apregoar, alto e bom som, as doutrinas da graça. Nunca foi maior a necessi dade de que hom ens fortes proclamem a forte mensagem sobre a soberania de Deus. A hora clama por pregadores bíblicos que altam ente ocupem os púlpitos e proclamem as doutrinas da graça. A igreja necessita desesperadamente de hom ens que sejam prodam adores de todo o conselho da Escritura. Qualquer fiel exposição da Bíblia inevitávelmente apontará para a transcendental verdade sobre o direito que Deus tom de governar todas as obras de suas mãos. Se forem encontrados hom ens assim fiéis a Deus, eles se preocuparão em declarar as antigas doutrinas sobre a graça eterna de Deus. O nde estão esses hom ens atualmente?
I 100 I F U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
CAPÍTULO 2 PERGUNTAS PARA ESTUDO
1. Descreva a relação de Moisés com o Pentateuco, os cinco primeiros livros da Bíblia. Em que estágio da vida estava Moisés quando escre׳ veu estes livros? O nde ele estava?
2. Explique a soberania de Deus em Gênesis 1. Quais aspectos específicos da autoridade divina foram manifestados em cada dia da Criação?
3. Desenvolva um a resposta sobre o primeiro pecado de Adão e Eva. Com o esse pecado os afetou? Com o afetou a raça humana?
4. Discuta a doutrina da eleição em sua relação às vidas de Abraão, Jacó e Esaú. Que efeito ela teve sobre a salvação deles?
5. Q ue é o protoevangelium? Explique a profecia e a prefiguração da expiação no juízo de Deus sobre Adão e Eva no Jardim do Éden. Faça a mesma coisa quanto à história de Caim e Abel.
6. Foi Deus ou Adão que verdadeiramente procurou o outro no jardim? Daí para cá m udou alguma coisa?
7· Com o Enoque e Noé representam a verdade da graça preservadora de Deus?
8. Cite algumas das bênçãos que decorrem do entendim ento e da fé na verdade da segurança eterna dos crentes. Com o essa verdade impacta ou deveria impactar as nossas vidas?
Não sujeito a ninguém, não influenciado por nada, absolutamente independente: Deus age como lhe apraz, somente como Ibe apraz, sempre como Ibe apraz. Ninguém consegue frustrá-lo nem impedi-lo:'
A. W. Pink
1 A . W . P in k , The Attributes of G o d ( G r a n d R a p id s, M I: B a k e r B o o k s, 1975, 1979), 3 4 lA pud a v e rsã o p o rtu g u e s a d e ste tra d u to r, O s A tributos de Deus, p u b lic a d a p o r P u b lic a ç õ e s E v an g élicas S e le c io n a d a s (P E S ), 1985, p p . 31, 32.)
C a p ít u l o 3
A GRAÇA SOBERANA NO DESERTO O LEGISLADOR MOISÉS: ÊXODO A DEUTERONÔMIO
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ão impedida pelo hom em , não restringida por Satanás, a soberana graça de
Deus vence irresistivelmente todos os obstáculos para a salvação dos escolhidos. Não é preciso que as condições das vidas dos eleitos sejam plenam ente retas a fim de que Deus os leve para si. Q uer seja nos nobres tempos de um a grande reforma e avivamento, ou nos tempos inferiores, de fome espiritual na terra, quer no palácio de um rei quer na prisão de um pobre coitado, numa cultura cosmopolita ou num remoto posto, a soberana graça de Deus é capaz de atrair irresistivelmente aqueles que ele escolheu para a vida eterna. Não importa quanto pareça impossí׳ vel vencer o obstáculo que assoma no horizonte, quer forças satânicas quer dureza hum ana de coração, a graça de Deus é ainda maior. Talvez em parte alguma esta irreprimível vitória da graça soberana se veja mais claramente do que nos tenebrosos dias da experiência de Israel no deserto,
104 ןI K I N D A M l i N T O S DA G R A Ç A
sob a liderança de Moisés. No deserto Israel foi confrontado por muitos desafios e dificuldades. Na maioria dessas provas, falhou miseravelmente. Os israelitas se lamentavam e se queixavam contra Deus, mesmo em face de sua amorosa direcão. Eles viam a abundante provisão de Deus, e, contudo, caíam repetidamente na apostasia espiritual e em orgias sexuais. Q uando estavam prestes a entrar na Terra Prometida, caíram tragicamente em vil incredulidade e rebelião. Durante quarenta anos vaguearam sem propósito no árido deserto, até quando toda uma geração tinha perecido. Nunca Deus se defrontou com maiores obstáculos para o cum prim ento do seu plano de salvação. Todavia, até mesmo nestas penosas dificuldades, a graça soberana de Deus foi prometida e dada àqueles a quem se destinava na intenção de Deus. Apesar do torpe odor da incredulidade e da vertiginosa apostasia de Israel no deserto, a graça salvadora de Deus soprou como o sopro vivificante de novos ares. Ali, nos fundões do deserto, a veracidade da soberania de Deus foi claramente ouvida do céu e vista inequivocàmente na terra. Com o uma estrela radiante num a noite escura, a graça soberana de Deus fulgurou brilhantem ente no deserto. Esta é a triunfante verdade que Moisés registrou nos livros de Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.
O LIVRO DE ÊX O D O “DEUS, O R E D E N T O R SO B ER A N O ”
O
segundo livro da Escritura, inspirado por Deus e escrito por Moisés, foi
Êxodo, que contém a continuação da narrativa da história de Israel iniciada em Gênesis. Aqui, neste segundo livro, está registrado o relato dos poderosos atos de Deus na libertação de seu povo da rigorosa escravidão no Egito. Neste registro da redenção e libertação de Israel é revelado que Deus é absolutamente soberano sobre os corações, mais notavelmente sobre o coração de Faraó, então
0 homem
mais poderoso da terra. Também nas dez pragas soltas sobre o Egito por meio de Moisés (Ex 7-10), fica dem onstrada a soberania de Deus sobre todos os deuses
A G raça tiiibcnuia
110 D e s e r t o
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do Egito, sobre a natureza, e até sobre a morte. Foi, ademais, revelado que Deus governa todos os acontecimentos e todas as circunstâncias da vida, em especial o destino de Israel.
A D O U T R IN A EM FOCO
f
1
I A SOBERA NIA DIV IN A Os cinco títulos das doutrinas da graça - depravação total, eleição incon׳
dicional, expiação limitada, graça irresistível, e perseverança dos santos - todas repousam sobre o inamovível fundam ento da soberania de Deus sobre toda a Criação. Portanto, é estrategicamente im portante estabelecer a doutrina da sobe׳ rania divina. C om entando a soberania de Deus, Loraine Boettner escreve:
Em virtude do fato que Deus criou tudo quanto existe, ele é o pro׳ prietário absoluto e o final árbitro, que dispõe de tudo quanto fez. Ele exerce, não meramente uma influência geral, mas real e concre׳ tamente governa o mundo que criou. As nações da terra, em sua insignificância, são como o pó que resta na balança, comparadas com a sua grandeza, e muito mais facilmente 0 sol seria detido em seu cur־ so do que Deus impedido em sua obra e vontade. Em meio a todos os aparentes fracassos e inconsistências da vida, Deus de fato se move com imperturbável majestade. Até mesmo os atos pecaminosos dos homens só podem ocorrer por sua permissão. E desde que ele permi׳ te, não involuntária, mas voluntariamente, tudo quanto acontece - as ações e o destino final dos homens inclusive - só pode ser que tudo acontece de acordo com o que ele desejou e se propôs realizar.1
Esta verdade, a soberania de Deus, o sólido alicerce das doutrinas da graça, é
dem onstrada repetidamente no Livro de Exodo.
1 L oraine B oettner, The Re/ormed Doctrine of Predestination (Phillipsburg, NJ: Presbyterian & R eform ed Publishing C om pany, 1932), 30.
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1.
Sobre os Corações. Moisés registrou que o poder supremo de Deus foi
visto no controle do coração da filha do Faraó, movendo-a a cuidar de Moisés em sua infância:
Um homem da tribo de Levi casou-se com uma mulher da mesma tribo, e ela engravidou e deu à luz um filho. Vendo que era bonito, ela 0 escondeu por três meses. Quando já não podia mais escondê-lo, pegou um cesto feito de junco e 0 vedou com piche e betume. Colocou nele 0 menino e deixou 0 cesto entre os juncos, à margem do Nilo. A irmã do menino ficou observando de longe para ver 0 que lhe aconteceria. A filha do faraó descera ao rio para tomar banho. Enquanto isso, as suas servas andavam pela margem do rio. Nisso viu 0 cesto entre os juncos e mandou sua criada apanhá-lo. Ao abri-lo, viu um bebê chorando. Ficou com pena dele e disse: "Este menino é dos hebreus”. - Êxodo 2.1-6
Neste incidente se vê claramente que Deus está sobre as atividades da providência. Até o cuidado dado a um bebê faz parte do seu plano soberano, pois ele moveu
0 coração
da filha do Faraó a notar o bebê Moisés e prover o necessário
para o pequenino. Reconhecendo o plano divino, Pink escreve:
Uma prova extraordinária do poder de Deus de amolecer os corações dos seus inimigos viu-se no tratamento que a filha do faraó ministrou ao infante Moisés. O incidente é bem conhecido. O faraó tinha emitido um edito ordenando a destruição de todas as crianças do sexo masculino dos israelitas. Nasceu a um certo levita um menino que foi mantido oculto pela mãe durante três meses. Não podendo mais esconder o menino Moisés, ela o colocou numa arca de juncos e o deixou junto à margem do rio. A arca foi descoberta por nada menos que a filha do rei, que tinha descido ao rio para banhar-se, mas, em vez de dar atenção ao ímpio decreto
Λ G r a ç a S o h e r t i m i rto D e s e r t o
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do pai e de lançar o bebê no rio, é-nos narrado que “ela ficou com pena dele” (Êx 2.6). O resultado foi que a jovem vida foi poupada e posteriormente Moisés veio a ser filho adotivo dessa princesa! Deus tem acesso aos corações de todos os homens e os abranda ou endurece em conformidade com o seu propósito soberano.2
Vê-se, pois, que Deus é soberano sobre cada coração. 2.
Sobre a Criação. Moisés ensinou algo mais: que Deus é autoexistente
e autossuficiente em si mesmo, e que é absolutamente livre na operação da sua soberania:
Disse Deus a Moisés: “Eu Sou 0 que Sou. Ê isto que você dirá aos israelitas: Eu S o m me enviou a vocês”. - Exodo 3.14
Este nome, com o qual Deus se revelou a Moisés - Eu Sou o que Sou testifica sua autoexistência dinâmica e ativa. Ele não depende de ninguém nem de coisa alguma para sua existência, ao passo que todas as pessoas e todas as coisas são inteiram ente dependentes dele para tudo. Por esta dramática revelação que Deus fez de si, se fez conhecido como o ser eterno, independente, autônom o, imutável e soberano. Inalterável em sua pessoa, planos e poder, ele é Eu Sou o Q ue Sou - sem princípio, sem fim, nunca em processo de vir a ser, nunca melhorando, nunca declinando ou decaindo. Walter Kaiser escreve:
A fórmula... significa: “Eu sou verdadeiramente aquele que existe e que estará sempre dinamicamente presente em cada momento e ali, na situação para qual o envio”. Este ser não era um novo Deus para Israel; era o mesmo Deus de Abraão, de lsaque e de Jacó que estava enviando Moisés.... Seu “nome" era sua pessoa, seu caráter, autoridade, poder, e reputação. Tão entrelaçados eram a pessoa 2 A . W . P in k , The Sovereignty of Go d ( G r a n d R a p id s, M I: B ak er B o o k s, 1930, 1975), 147.
ן108 וl - U N D A M E N T O S DA Ü R A Ç A
do Senhor e seu nome, que eram frequentemente empregados de maneira interligada.3
Em tudo isso Deus estava afirmando sua soberania sobre tudo o que tinha feito. Estava asseverando que é o criador, sustentador e provedor de tudo, o rei da providência, o governador do universo. 3.
Sobre a N atureza. Além disso, Moisés revelou que Deus é soberano
sobre todos os elementos da natureza. Ele com anda todas elas, e elas fazem o que Deus ordena, sempre servindo a seus mais altos propósitos:
Moisés e Arão fizeram como 0 Senhor tinha ordenado. Arão levantou a vara e feriu as águas do Nilo na presença do faraó e dos seus conselhei-
ros; e toda a água do rio transformou-se em sangue. Os peixes morreram e 0 rio cheirava tão mal que os egípcios não conseguiam beber das suas águas. Havia sangue por toda a terra do Egito. Quando Moisés es tendeu a vara para 0 céu, 0 Senhor fez vir trovões e granizo, e raios caíam sobre a terra. Assim 0 Senhor fez chover granizo sobre a terra do Egito. Caiu granizo, e raios cortavam 0 céu em todas as direções. Nunca houve uma tempestade de granizo como aquela em todo 0 Egito, desde que este se tornou uma nação. O Senhor disse a Moisés: "Estenda a mão para
0 céu, e trevas cobrirão 0 Egito, trevas tais que poderão ser apalpadas!” Moisés estendeu a mão para céu, e por três dias houve densas trevas em todo 0 Egito. - Êxodo 7-20,21; 9.23,24; 10.21,22
Cada uma das dez pragas foi uma suprema manifestação da soberania de Deus sobre os deuses egípcios, que supostam ente controlavam aqueles elementos. Moises foi o instrum ento de Deus para dem onstrar a soberania divina sobre o tempo e sobre a natureza, principalm ente na primeira, na sétima e na nona 3 W a lte r C . K aiser, Jr., The Expositor's Bibie Com m entary, V ol. 2, e d ito r g eral F ra n k E. G a e b e le in ( G r a n d R a p id s, M l: Z o n d e rv a n P u b lis h in g H o u s e , 1990), 321.
A G raça S o b era n a no D eserto
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praga. Estas revelaram que Deus era soberano sobre o Nilo, sobre o granizo e sobre o sol. Pink escreve:
Um testemunho do absoluto (e soberano) controle de Deus sobre a matéria inanimada em conexão com as pragas sobre o Egito. A sua ordem a luz se tornou em trevas e os rios em sangue; caiu gra׳ nizo, e a morte desceu sobre a terra do Nilo, uma terra sem Deus, e até o seu altivo monarca foi compelido a gritar por livramento. Note-se particularmente como o registro inspirado aqui enfatiza o controle absoluto de Deus sobre os elementos - “Quando Moisés estendeu a vara para o céu, o Senhor fez vir trovões e granizo, e raios caíam sobre a terra. Assim o Senhor fez chover granizo sobre a terra do Egito”.4
4. Sobre os Animais. Moisés também documentou a soberania de Deus sobre o reino animal. Como o resto da criação, eles existem para fazer o que Deus manda:
Depois 0 Senhor disse a Moisés: “Diga a Arão que estenda a mão com a vara sobre os rios, sobre os canais e sobre os açudes, e faça subir deles rãs sobre a terra do Egito”. Assim Arão estendeu a mão sobre as águas do Egito, e as rãs subiram e cobriram a terra do Egito. - Exodo 8.5,6
E mais: nesta praga e nas subsequentes, de piolhos, de moscas e de feridas purulentas, Deus dem onstrou a sua soberania absoluta sobre os deuses egípcios exercendo controle supremo sobre as criaturas. Pink escreve:
À sua palavra, 0 rio produziu rãs abundantemente, e essas rãs entraram no palácio do faraó e nas casas dos seus servos e, con-
4 P in k , The Sovereignly of God, 4 5 4 6 .
110 ןI F U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
trariamente a seus instintos, entraram nas camas, nos fornos e nas amassadeiras (Ex 8.3). Enxames de moscas invadiram a terra do Egito... (Êx 8.24). Em seguida o gado foi morto, e sobre isso lemos: “Saiba que a mão do Senhor trará uma praga terrível sobre os rebanhos do faraó que estão nos campos: os cavalos, os jumentos e os camelos, os bois e as ovelhas”.5
Apesar da resistência do faraó à ordem de Deus que deixasse os israelitas saírem, Deus permanecia absolutamente no controle. 5.
Sobre a Vegetação. Moisés registrou, ademais, a soberania de Deus so-
bre a vegetação, m ostrando que podia fazê׳la crescer para alim entar o hom em ou eliminá-la:
Mas 0 Senhor disse a Moisés: “Estenda a mão sobre 0 Egito para que os gafanhotos venham sobre a
terra e devorem toda a vegetação,
tudo 0 que
foi deixado pelo granizo”. Moisés estendeu a vara sobre 0 Egito, e 0 Senhor fez soprar sobre a terra um vento oriental durante todo aquele dia e toda aquela noite. Pela manhã, 0 vento havia trazido os gafanhotos, os quais invadiram todo 0 Egito e desceram em grande número sobre toda a sua extensão. Nunca antes houve tantos gafanhotos,
nem jamais
haverá. -
Êxodo 10.12-14
Ao enviar um enxame de gafanhotos para destruir as lavouras dos egípcios, Deus mostrou que tem o poder e o direito de fazer com a vegetação da terra o que lhe parece bem. Considerando o controle de Deus sobre a vida vegetal, Pink escreve:
Consideremos agora o reino vegetal. Por que as rosas têm espinhos e os lírios não? Por que uma flor exala aroma fragrante e outra não tem cheiro nenhum? Por que uma árvore dá frutas saborosas e ou׳
5 Ibid., 49.
A Ci r a ç a S o h o r a i m n o D e s e r t o
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tra, venenosas? Porque uma vegetação suporta geada e outra não? Por que uma macieira se carrega de frutas e outra, no mesmo pomar e da mesma idade, não produz quase nenhuma? Por que uma planta floresce doze vezes por ano e outra só floresce uma vez num século? Verdadeiramente, “0 Senhor faz tudo 0 que lhe agrada, nos céus e na terra, nos mares e em todas as suas profundezas” (Salmo 135.6).6
6.
Sobre as Pessoas. Finalmente, Moisés escreveu que Deus exerce sobe׳
rania sem rival sobre todos os aspectos das vidas de todas as pessoas. Ele até determ ina o tempo da morte de cada um, como fez ao lançar a décima praga:
Então,
à
meia-noite, 0 Senhor matou todos os primogênitos do Egito, desde
0 filho mais velho do faraó, herdeiro do trono, até 0 filho mais velho do prisioneiro que estava no calabouço, e também todas as primeiras crias do gado. No meio da noite 0 faraó, todos os seus conselheiros e todos os egípcios se levantaram. E houve grande pranto no Egito, pois não havia casa que não tivesse um morto. - Exodo 12.29,30
Nessa praga final, Deus mostrou toda a magnitude do seu controle sobre a humanidade. Enviando o anjo da morte sobre a terra do Egito e matando os primo׳ gênitos, Deus demonstrou sua soberania sobre a vida e a morte. Por implicação, vê׳se que ele é Senhor sobre tudo quanto acontece entre a concepção e a morte. Cada vida está nas mãos do Senhor que faz com elas o que lhe apraz, e isso eternamente.
Ύ
A D O U T R IN A EM FOCO I
DEPRAVAÇÃO TO TA L Q uando escreveu Exodo, Moisés também tratou do assunto da depravação
total do hom em pecador. Talvez nenhum autor bíblico fosse mais qualificado do que Moisés para escrever sobre a corrupção radical do coração hum ano. Afinal de 6 Ibid., 37-38.
1
ן112 ןU N D A M E N T O S DA G R A Ç A
contas, ele suportou durante quarenta anos no deserto os pecados dos israelitas, e testem unhou a morte, em apostasia, de toda uma geração que não entrou na Terra Prometida. 1.
Coração Im penitente. Deixado em liberdade para seguir seu próprio
caminho, o hom em não regenerado sempre irá atrás do pecado e endurecerá o seu coração. A medida que o hom em rejeita repetidam ente a verdade de Deus, seu coração se endurece mais e mais, devido ao engano do pecado:
Contudo, 0 coração do faraó se endureceu e ele não quis dar ouvidos a Moisés e a Arão, como 0 Senhor tinha dito. Disse 0 Senhor a Moisés: “O coração do faraó está obstinado; ele não quer deixar 0 povo ir”. - Exodo 7-13,14
Dez vezes, na narrativa de Êxodo, Moisés escreveu sobre o endurecimento do coração do Faraó. Kaiser anota:
Ao todo, há dez lugares nos quais o “endurecimento” do Faraó e atribuído a Deus (4.21; 7.3; 9.12; 10.1, 20, 27; 11.10; 14.4,8,17). Mas é preciso declarar com igual firmeza que o Faraó endureceu pessoalmente o seu coração noutras dez passagens (7.13, 14, 22; 8.15, 19, 32; 9.7, 34, 35; 13.15). Por conseguinte, o endurecimento tanto foi ato do faraó como de Deus. Ainda mais significativo é o fato que unicamente o Faraó foi o agente do endurecimento no primeiro sinal e em todas as cinco primeiras pragas. Somente a partir da sexta praga foi que Deus tomou a iniciativa e endureceu o coração do Faraó (9.12), como tinha avisado Moisés em Midiã que faria [4.21 j.7
Assim é que, quando Moisés fala da soberania de Deus no endurecim ento do coração do faraó, também docum enta a responsabilidade pessoal do faraó
7 K aiser, The Expositor’s Bible Commentary, Vol. 2, 331.
Λ G raça S o b e r a n a no H cscrto
I 113 I
nessa questão. Os versículos aqui citados são representativos do efeito autoen׳ durecedor do pecado em todo coração não regenerado que é deixado livre para seguir seu próprio caminho. 2.
Coração Idólatra. O coração não convertido está cheio de idolatria,
desejando deuses por ele feitos, e não o único Deus vivo e verdadeiro:
O povo, ao ver que Moisés demorava para descer do monte, jun[ou-se ao redor de Arão e lhe disse: "Venha, faça para nós deuses que nos conduzam, pois a esse Moisés, 0 homem que nos tirou do Egito, não sabemos 0 que lhe aconteceu". Respondeu-lhes Arão: "Tirem os brincos de ouro de suas mulheres, de seus filhos e de suas filhas e tragam-nos a mim”. Todos tiraram os seus brincos de ouro e os levaram a Arão. - Exodo 32.1-3
Os israelitas se revelaram apóstatas, abandonando a sua identificação com o Senhor Deus e a sua lealdade a ele. A disposição para fazer um bezerro de ouro no sopé do M onte Sinai traiu sua confissão de fé no Senhor. Israel era religioso, mas estava perdido. O hom em pecador, em seu estado de não convertido, nunca ama Deus supremamente. Em vez disso, ele dedica seus afetos a outros deuses. Tal pessoa pode prestar culto de lábios ao Deus verdadeiro, mas em seu coração se recusa a dar ao Senhor o lugar de inigualável preeminência e de objeto de lealdade suprema.
A D O U T R IN A EM FOCO ELEIÇÃO IN C O N D IC IO N A L A escolha que Deus faz de pecadores não merecedores da salvação é uma expressão da sua vontade soberana e de sua graça livre. Deus não deve salvação a nenhum pecador. A graça salvadora é inteiram ente imerecida; nenhum a criatura pecadora tem direito a ela. Tudo o que o hom em pecador merece, com justiça, é a condenação divina. Portanto, a raça hum ana necessita desesperadamente de algo que ela não merece. Mas, visto que a graça é um presente, Deus é livre para
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concedê׳la a quem lhe apraz, sem violar sua justiça. Com o é absolutamente sobe׳ rano, escolhe quais pecadores quer salvar:
“Terei misericórdia de quem eu quiser ter misericórdia, e terei compaixão de quem eu quiser ter compaixão”. - Exodo 33.19b.
Nesta passagem, Deus nada diz a respeito de sua justiça. Só fala de sua misericórdia. Estes dois atributos - justiça e misericórdia - pertencem a catego׳ rias totalmente diferentes. A Eleição é sempre matéria de misericórdia soberana, não de justiça. Sem nenhum a obrigação de conceder graça a nenhum indiví׳ duo, Deus se mostra infinitam ente amoroso por escolher mostrar misericórdia a alguns. C aptando a profundidade deste versículo, M acArtur escreve: “Deus é absolutamente soberano e de fato elege quem irá salvar sem violar os seus outros atributos. Ele determ ina quem recebe misericórdia”.8 Albert Barnes acrescenta: “Jeová declara que a sua vontade será a base da graça que vai mostrar à nação. O apóstolo Paulo aplica essas palavras à eleição de Jacó, a fim de pôr abaixo a jactân׳ cia de justiça própria dos judeus (Rm 9.15)”.9 O ponto está claro: Deus escolhe, por soberana misericórdia, quem quer salvar.
ו ־ ן ךA D O U T R IN A EM FOCO
I
EXPIAÇÃO LIMITADA Para torn ar segura a salvação de seu povo escolhido, Deus comissionou
seu filho, Jesus Cristo, para vir ao m undo e m orrer pelos pecados deles. Esta expiação lim itada em favor do povo de Deus foi lindam ente retratada na m orte do cordeiro da Páscoa. Assim que o cordeiro foi m orto, seu sangue foi aplicado nos batentes das portas das casas do povo de Deus. O cordeiro não foi m orto em favor do Faraó e de seu prim ogênito. Tam pouco em favor dos egípcios. Também não foi oferecido em favor de nenhum povo das nações circunvizi׳ 8 John M acA rthur, The M acArthur Bible Commentary (Nashville, TN : N elson Reference &. Electronic, 2005), 1.537. 9 A lbert Barnes, The Bible Commentary Exodus to Ruth, ed. F. C. C o o k (G rand R apids, MI: Baker Books, 1996, 1879), 92.
A G raça S o b era n a no D eserto
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nhas. O cordeiro da Páscoa foi um sacrifício específico por um povo específico, escolhido por Deus. Esta m orte sacrificial foi um a bela ilustração da redenção particular que Jesus Cristo realizou por seu povo, os eleitos (Jo 1.29; IC o 5.7; Hb 9.22; lPe 1.19). 1. O C ordeiro Sacrificial. Q uando se aproximava o tem po da libertação dos israelitas da sua escravidão no Egito, Deus lhes ordenou que levassem cordeiros para seus lares. Estes cordeiros seriam sacrificados e seu sangue seria aplicado nos batentes das portas das casas do povo de Deus, um quadro descritivo da expiação definida realizada por Jesus Cristo, o C ordeiro de Deus, por seu povo:
“Digam a toda a comunidade de Israel que no décimo dia deste mês todo homem deverá separar um cordeiro ou um cabrito, fiara a sua família, um para cada casa. O animal escolhido será macho de um ano, sem defeito, e pode ser cordeiro ou cabrito. Passem, então, um pouco do sangue nas late■ rais e nas vigas superiores das portas das casas nas quais vocês comerão 0
animal”. - Êxodo 12.3, 5, 7
D urante o tem po em que os cordeiros estiveram nas casas, as pessoas ficavam ligadas a eles. Mas, no tempo designado, os israelitas deveriam matar os cordeiros. Depois deveriam aplicar o sangue nos batentes das portas e nas vergas de suas casas. A ideia de um a m orte substitutiva seria ensinada dram a׳ ticam ente por meio do sacrifício de um inocente que m orreria para poupar da destruição o povo de Deus. Claro está que Jesus é o C ordeiro da Páscoa, o C ordeiro Pascal, que m orreria por seu povo. Pela fé, seu sangue é aplicado às vidas dos eleitos de Deus. 2. M orte Salvífica. Com o Deus explicou a Moisés, o anjo da morte visi׳ taria o Egito e daria morte aos primogênitos dos egípcios. Mas, onde quer que o anjo visse o sangue aspergido, passaria adiante, deixando de lado aquela casa - de novo uma figura da m orte específica de Cristo pelos crentes:
ן116 ןI ' U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
“0 sangue será um sinal para indicar as casas onde vocês estiverem; quando eu vir 0 sangue, passarei adiante. A praga de destruição não os atingirá quando eu ferir 0 Egito". - Êxodo 12.13
A figura é inequívoca - o sangue dos cordeiros dos israelitas prefigurou
o de Jesus, o C ordeiro Pascal. O sangue foi derram ado em favor do povo escolhido de Deus - “vocês” - não em favor dos egípcios. A palavra “páscoa” (em inglês, passover) significa “passar por cim a”, “saltar por cim a” [eqüivale a “passar por alto”]. Na noite da praga final, o Senhor “saltou por sobre” ou “passou por cim a” das casas daqueles que tinham aplicado o sangue dos cordeiros pascais nos batentes de suas casas. Não havia sangue aspergido nas casas dos egípcios, em favor daqueles que permaneciam na incredulidade; som ente nas casas dos que criam. Igualmente, o sangue de Cristo foi dado som ente em favor dos cren׳ tes, não em favor dos que permanecem na incredulidade. M acA rthur escreve: “No Novo Testam ento, Jesus tam bém celebrou a festa da Páscoa com seus dis׳ cípulos (Mt 26.2, 18). Cristo foi
0 últim o
e suprem o C ordeiro Pascal quando
se sacrificou pelos pecados”.10Jesus m orreu pelos pecados do seu povo, e a ira de Deus passa por alto aqueles que aplicam seu sangue em seus corações pela fé nele (Rm 5.9).
( S J
A D O U T R IN A EM FOCO GRAÇA IRRESISTÍVEL Todos aqueles por quem Cristo, o Cordeiro Pascal, foi m orto são chama-
dos por Deus para que venham a ele. Ninguém é chamado onde não há sacrifício pelo pecado. Tampouco há sacrifício realizado por Cristo por quem não tenha sido chamado. Esta convocação para a fé salvadora é irresistível, o que significa que sempre garante o seu resultado visado. A vocação eficaz foi exemplificada na noite da Páscoa. Todos os que foram salvadoramente cobertos pelo sangue também foram chamados por Deus para fora do Egito: 10 M acA rthur, The MacArthur Bible Commentary, 102.
Λ Graça Sober ana no Desert o
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Assim como 0 SE N H O R passou em vigília aqu ela noite para tirar do Egito os israelitas... No m esm o dia
0 S E N H O R tirou os israelitas do Egito,
organizados segundo as suas divisões. - Exodo 12.42a, 51
E evidente que o SE N H O R não cham ou os egípcios, endurecidos de coração, para fora de sua terra. Se os tivesse chamado, eles teriam respondido pela fé e viriam. Tam bém não chamou pessoas das nações circunvizinhas. Antes, Deus em itiu seu poderoso cham ado a seu povo particular para sair do Egito. E quando fez este chamado, os escolhidos responderam positivamente. Puseram-se em marcha pela fé e seguiram Deus. Esta é um a bela figura da vocação eficaz do Espírito de Deus, convocando os seus escolhidos para que saiam do m undo e sigam Cristo. Todos aqueles por quem Cristo, o Cordeiro Pascal, m orreu, abandonam o mau sistema do m undo quando o Espírito os chama. A graça de Deus é verdadeiramente irresistível para os eleitos.
ץ־ 1
A DOUTRINA EM FOCO PERSEVERANÇA DOS SANTOS O s que foram cham ados soberanam ente por Deus, foram guiados para
fora do Egito e protegidos no episódio do M ar Verm elho. N inguém do povo de Deus se afogou q u an d o os israelitas passaram pelas águas repartidas - um a figura da graça preservadora:
Moisés respondeu a o povo: "Não tenham medo. Fiquem firm es e vejam livramento que
0
0 Senhor lhes trará hoje, porque vocês nunca mais verão os
egípcios que hoje veem. O Senhor lutará por vocês; tão som ente acalm em -se". Então Moisés estendeu a m ão sobre m ar e
0 mar, e 0 Senhor afastou 0
0 tornou em terra seca, com um forte vento oriental que soprou
toda aquela noite. As águas se dividiram, e os israelitas atravessaram pelo m eio do m ar em terra seca, tendo uma parede de água à direita e outra à esquerda. N aquele dia
0 Senhor salvou Israel das m ãos dos egípcios, e os
israelitas viram os egípcios mortos na praia. - Exodo 14.13-14, 21-22, 3 0
I IIH I I l I N D A M E N T O S DA G R A Ç A
Q uando o povo de Israel saiu do Egito,
0 Senhor foi pessoalmente adiante
deles em sua shekinah glória [a glória da sua presença], uma coluna de nuvem de dia e uma coluna de fogo de noite. A presença e o poder de Deus protegeu seu povo dos inimigos e o conduziu através de todos os perigos. Q uando os levou até o Mar Vermelho, nem um só israelita pereceu quando Deus dividiu as águas e os conduziu a salvo para o outro lado. Este livramento milagroso dem onstrou dramaticamente a graça preservadora de Deus na proteção dos escolhidos. Deus os conduz pessoalmente através deste m undo perigoso rum o à glória. N enhum dos seus eleitos perecerá.
7 ־
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A D O U T R IN A EM FOCO
REPROVAÇÃO DIVINA Se Deus escolheu alguns para serem salvos, a verdade pura e sim ples
é que o u tros não foram escolhidos dessa forma. M uitos são passados por alto e deixados de lado para sofrerem com justiça em seu pecado. Esta é a d o u trin a da reprovação, segundo a qual Deus tem direito de exercer juízo de condenação sobre os não eleitos por seus pecados. É um duro ensino, mas é a clara m ensagem da Escritura. U m exem plo escriturístico acha-se aqui, em Êxodo, on d e Deus exerceu um a clássica am ostra da justiça divina sobre o Faraó, en d u recen d o o seu coração pecam inoso. Deus escolheu dem o n s׳ trar sua au to rid ad e soberana no Faraó, levantan do׳o para então endurecer seu coração. Este ato retributivo foi p erfeitam ente justo, d em o n stran d o o suprem o direito que Deus tem de exercer controle sobre o hom em mais poderoso da terra.
Mas 0 SENHOR endureceu 0 coração do faraó, e ele se recusou a atender Moisés e Arão, conforme 0 SENHOR tinha dito a Moisés. O SENHOR disse a Moisés: "Vá ao faraó, pois tornei obstinado 0 coração dele e 0 de seus conselheiros...’’. Mas 0 SENHOR endureceu 0 coração do faraó, e ele não deixou que os israelitas saíssem. - Exodo 9.12; 10.1a, 20
A ( i r a ç a S o b e r a n a n o Deserto
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Com o Kaiser observou acima, lemos dez vezes que Deus exerceu seu poder soberano para endurecer o coração do Faraó (4.21; 7.3; 9.12; 10.1, 20, 27; 11.10; 14.4, 8,17). Este ato judicial foi executado sem nenhum a redução da responsabi׳ lidade pessoal do Faraó, pois a Escritura também diz que ele próprio endureceu seu coração. Permanece, porém, o fato que Deus realmente endureceu o coração do faraó, aplicando um justo juízo sobre o seu pecado, dem onstrando que ele permanece soberano sobre tudo e sobre todos, até sobre os corações dos homens. Q ue devemos concluir do endurecim ento do coração do Faraó? Pink expõe cinco verdades essenciais que se pode extrair desses versículos:
Primeiro, sabemos, de Êxodo 14 e 15, que o Faraó foi “extirpa׳ do”, extirpado por Deus, extirpado em meio à sua iniqüidade, extirpado não por doença nem por fraquezas que soem incidir nas pessoas de muita idade, nem pelo que os homens denominam acidente, mas foi extirpado pela mão direta de Deus em juizo. Se׳ gundo, está claro que Deus levantou o Faraó justamente para este fim - para “extirpá10׳.” ...Deus nunca faz coisa alguma sem prévio desígnio. Ao lhe dar o ser, ao preservá10 ׳através de sua infância e juventude, ao exaltá׳lo colocando-o no trono do Egito, Deus tinha somente um fim em vista. ...Terceiro, um exame dos procedimen־ tos de Deus para com o Faraó mostra claramente que ele de fato era “um vaso de sua ira preparado para a destruição”. Colocado no trono do Egito, com as rédeas do governo em suas mãos, ele se es׳ tabeleceu como chefe da nação que ocupava o primeiro lugar entre as nações do mundo. Não havia outro monarca na terra capaz de controlá׳lo ou de lhe ditar ordens. A tão estonteante altura Deus elevou esse réprobo! E esse curso era o passo natural e necessário para prepará10 ׳para o seu destino final, pois um axioma divino é que “o orgulho vem antes da destruição; o espírito altivo, antes da queda” [Pv 16.18]. ...Quarto, Deus “endureceu” o seu coração
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como tinha dito que faria (Ex 4.21). ... Como no caso de todos os outros reis, o coração do Faraó estava na mão do Senhor; e Deus tinha tanto o direito como o poder de mudá-lo para onde quisesse. E lhe aprouve mudá-lo para ir contra todo o bem. ...Finalmente, merece cuidadosa consideração observar que a víndicação de Deus em seu procedimento para com Faraó foi plenamente atestada. ...E mais: Temos o testemunho de Moisés, que ficou muito bem familiarizado com a conduta de Deus para com o Faraó. Ele tinha ouvido no princípio qual era o propósito de Deus com relação ao monarca; ele tinha testemunhado os procedimentos de Deus para com esse rei; ele tinha observado a “longanimidade” divina para com este vaso de ira preparado para a destruição; e, por último, ele o tinha visto extirpar Faraó em juízo divino no Mar Vermelho. Qual foi, então, a impressão que Moisés teve? Levantou um clamor lamentando uma injustiça? Ousou ele acusar Deus de injustiça? Longe disso. Em vez disso, estas foram as expressões de Moisés: “Quem entre os deuses é semelhante a ti, Senhor? Quem é seme-, lhante a ti? Majestoso em santidade, terrível em feitos gloriosos, autor de maravilhas?” (Êx 15.11)."
O LIVRO DE LEVÍTICO “DEUS, O SA N TIFIC A D O R SO B ER A N O ”
Assim com o Gênesis e Exodo, o Livro de Levítico foi escrito por Moises com o parte do Pentateuco. Mais de cinqüenta vezes em Levítico é dito que o Senhor falou essas palavras a Moisés, que as registrou pessoalm ente ou que as tin h a anotado (cf. Lv 4.1; 6.1; 8.1; 11.1; 12.1). Posteriorm ente Jesus afirmou a autoria mosaica de Levítico (Mc 1.44; cf. Lv 13.49). O Livro de Exodo 11 Pink, The Sovereignty of God, 197-110.
A Graça S ob eran a no Deserto
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concluiu com a construção do tabernáculo (Êx 35-40), mas perm anecia um a questão: C om o o povo de Deus deveria adorá-lo nessa estrutura? O Livro de Levítico foi escrito para trata r desse interesse chave. A revelação divina foi dada a Moisés du rante
0 período
de cinqüenta dias entre a m ontagem do
tabernáculo na base do M onte Sinai e a partida do povo rum o à Terra Prom e tida. Este im portante livro trata prim ordialm ente da santidade de Deus e de suas exigências de que seu povo seja santo com o ele é santo (Lv 11.44; 19.2). De form a suprem a e final, unicam ente Deus - o soberano santificador de seu povo - pode torná-lo santo.
־־j ־A D O U T R IN A EM FOCO
I
DEPRAVAÇÃO TO TA L A palavra impuro(a) aparece mais de cem vezes em Levítico 11-15. É uma
boa descrição da condição das pessoas; elas eram moralm ente impuras por deixarem de obedecer às ordens de Deus. O propósito da lei mosaica era, primei ramente e acima de tudo, revelar a santidade de Deus. Os Dez M andamentos, como também as leis cerimoniais e civis, tinham como finalidade m anter o povo de Deus diferente dos povos das nações idólatras da vizinhança. Essas leis faziam clara distinção entre o que era puro e o que era impuro. Mas Israel não conseguia cum prir essas leis perfeitamente. Em conseqüência, todos os israelitas eram espi ritualm ente impuros, todos e cada um deles:
"Pois eu sou
0 Senhor, 0 Deus de vocês; consagrem-se e sejam santos, por■
que eu sou santo. N ão se tornem impuros com qualquer an im al que se m ove rente a o chão. Eu sou ser
0 Senhor que os tirou d a ta r a do Egito para
0 seu Deus; por isso, sejam santos, porque eu sou santo. Essa é a re
gulam entação acerca dos anim ais, das aves, de todos os seres vivos que se
m01׳em na água e de todo an im al que se move rente ao chão. Vocês farão separação entre
0 impuro e 0 puro, entre os anim ais
e os que não podem". - Levítico 11.44-47
que podem ser comidos
ן122 ןK I N D A M l i N T O S DA G R A Ç A
Nesse texto representativo, Deus cham ou seu povo para ser santo,
se׳
parado de tudo o que é im puro (19.2; 20.7, 26). Por meio das leis sobre regime alim entar e sobre os rituais religiosos, Deus lhes estava ensinando a necessidade de se apartarem das contam inações do m undo. M acA rthur com enta: “Sacrifícios, rituais, dieta e até vestuário e artigos alim entícios foram cuidadosam ente ordenados por Deus para ensinar׳lhes que deveriam viver diferentem ente de todos os demais. Isto servia de ilustração externa para a separação do pecado em seus corações”.12 Mas ninguém conseguia cum prir essas leis perfeitam ente; quebrar um só ponto da lei era fazer-se culpado de toda ela (Tg 2.10). A lei servia para lem brar constantem ente aos israelitas a sua impureza q uando se colocavam diante do seu Deus santo. C ada parte da lei divina era um a acusação da sua pecam inosidade. Dessa form a a lei testificava sua separação m oral de Deus.
jT
A DOUTRINA EM FOCO
11 EXPIAÇÃO LIMITADA Porque Deus é infinitam ente santo, requer que o hom em seja igualm ente santo para que possa m anter com unhão com ele. Mas o hom em é totalm ente depravado, de m odo que não pode ser aceito na presença de Deus. Só por meio de um sacrifício o hom em pode aproximar-se do Deus santo e ser aceito por ele - um sacrifício prescrito por Deus e oferecido por um sum o sacerdote de Israel designado por Deus. Esse foi o propósito divino qu anto ao Dia da Expiação - um dia especial observado anualm ente para se fazer sacrifício pelo pecado - e quanto à instituição do sacerdócio. Ambas necessidades - um sacrifício substitutivo e um sacerdote interm ediário - prefiguravam a pessoa e a obra redentora do S enhor Jesus C risto, sendo ele tanto o sacrifício perfeito com o o grande sum o sacerdote em prol do seu povo. O Dia da Expiação incluía:
12 M acA rthur, The MacArthur Bible Commentary, 149.
A G raça S o b e r a n a
1.
11o
D eserto
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O ferta pelo Pecado. O sum o sacerdote oferecia uma oferta pelo pecado
uma vez por ano, no Dia da Expiação, um sacrifício vicário que figurava a morte de Cristo por seu povo escolhido:
“Receberá da comunidade de Israel dois bodes como oferta pelo pecado. Depois pegará os dois bodes e os apresentará ao Senhor, à entrada da Tenda do Encontro. E [Arão] lançará sortes quanto aos dois bodes: uma para 0 Senhor e a outra para Azazel. Arão trará 0 bode cuja sorte caiu para 0 Senhor e 0 sacrificará como oferta pelo pecado. Então sacrificará
0 bode da oferta pelo pecado, em favor do pow, e trará 0 sangue para trás do véu... ele 0 aspergirá sobre a tampa e na frente dela. Assim fará propiciação pelo Lugar Santíssimo por causa das impurezas e das rebeliões dos israelitas, quaisquer que tenham sido os seus pecados. Fará 0 mesmo em favor da Tenda do Encontro, que está entre eles no meio das suas impure■ zas". - Levítico 16.5a, 7-9, 15-16
No Dia da Expiação o sum o sacerdote lançava sortes sobre dois bodes e sacrificava um deles com o oferta pelo pecado em favor do povo. Então entrava no Santo dos Santos para espargir o sangue do bode im olado no propiciatório (ARA), realizando sim bolicam ente uma expiação cruenta pelo povo de Israel. Essa oferta pelo pecado era feita exclusivamente pelo povo de Deus, não p or todo o m undo em geral. Jamais teve o propósito de ser um sacrifício por todas as pessoas de todas as partes do m undo. C o m en tan d o a natureza definida da oferta, Pink escreve: “Este era um altar para todo o Israel - e para ninguém mais!”1' Essa oferta pelo pecado representava e punha em vista a futura m orte de Jesus C risto, que seria o C ordeiro de Deus m orto pelos pecadores eleitos do m undo inteiro. Louis B erkhof explica o sentido de expiação q u an d o escreve:
13 A . W . P in k , A n Exposition of Hebrews ( G r a n d R a p id s, M I: B a k e r B o o k s, 1954), 1.176.
124 וI I I I N I ) A M I i N T O S 1)A G R A Ç A
A palavra hebraica kipper (no piei) expressa a ideia de expiação do pecado pela cobertura do pecado ou do pecador. O sangue do sacrifício é interposto entre Deus e o pecador e, em vista disso, a ira de Deus é afastada. Tem, pois, o efeito de afastar do pecador a ira de Deus. N a Septuaginta e no Novo Testam ento os term os hilaskom ai e hilasmos são empregados num sentido conexo. O verbo
significa “tornar propício”, e o substantivo, “apaziguam ento” ou “meio de apaziguar”.14
Esta é a realização de C risto, m o rre n d o em favor do seu povo escolhido. O s pecados deles são cobertos pelo sangue de C risto e a santa ira de D eus é apaziguada. 2.
O B ode E x p iató rio de D eus. O s pecados do povo de D eus eram sinv
bolicam ente transferidos para o o u tro bode, o bode expiatório, e este era solto no deserto. Esse ato figurava tam bém a m orte de C risto, que tiraria os pecados do seu povo:
“Mas 0 bode sobre 0 qu al caiu a sorte para A zazel será apresentado vivo a Senhor para fazer propiciação, e será enviado para A zazel no deserto. Então [Arão] colocará as duas mãos sobre a cabeça do bode vivo e confessará todas as iniquidades e rebeliões dos israelitas, todos os seus pecados, e os porá sobre a cabeça do bode. Em seguida enviará
0 bode para 0 deserto aos
cuidados de um homem designado para isso. O bode levará consigo todas a iniquidades deles pra um lugar solitário. E deserto”.
0 homem soltará 0 bode no
- Levítico 16.10, 21-22
Q u a n d o o sum o sacerdote p u n h a as m ãos sobre o bode expiatório, esse gesto representava um a transferência sim bólica dos pecados do povo para este 14 Louis Berkhof, Systematic Ttaology (Carlisle, PA, e Edim burgo, Escócia: T he B anner o f T ru th Trust, 1958), 374 (aptui trad u ção de O dayr O livetti: Teologia Sistemática, ed. Luz para o C am inho, C am pinas, SP, 2a edição: 1992, p. 375).
A G ruça S o b c r u n u no D cscrto
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anim al inocente sacrificado. E ntão o bode era solto no deserto, lcvando sim bo׳ licam ente os pecados d o povo para longe deste. Este ritual anual prefigurava a m orte de C risto pelos pecados do seu povo - em favor de todos os que cressem. Q u an d o C risto ficou p en d en te da cruz, o Pai transferiu os pecados deles para Jesus, que os levou para longe deles. M acA rthur explica:
Esta “oferta em expiação pelo pecado” (Nm 29.11) retratava o sa crifício substitutivo de Cristo (w 21 e 22), resultando em que os pecados do pecador eram removidos (v 22). ... Este ato era mais do que um gesto simbólico; era uma figura da suprema e final “expiação substitutiva” cumprida pelo Senhor Jesus Cristo (cf. Is 53.5,6: 10.12; 2C0 5.21).15
3.
O S u m o Sacerdote. S om ente o sum o sacerdote de Israel entrava no
S anto dos Santos para representar o povo de Deus. Sua intercessão por Israel figurava a particular m orte de C risto em favor dos eleitos de Deus:
“Então sacrificará 0 bode da oferta pelo pecado, em favor do povo, e trará
0 sangue para trás do véu. Assim fará propiciação pelo Lugar Santíssimo por causa das impurezas e das rebeliões dos israelitas, quaisquer que te■
nham sido os seus pecados". - Levítico 16.15a, 16
U m a vez p o r ano, n o Dia da Expiação, o sum o sacerdote entrava atrás do véu no S anto dos Santos. Ele chegava “trazendo nos om bros o escudo e as pedras gravadas que representavam as doze trib o s” de Israel.16 Q u a n d o ele entrava no Santo dos Santos, representava o povo de D eus - não os cananeus, os egípcios ou os babilônios. Ele m inistrava em favor daqueles escolhidos por Deus, fazendo expiação pelos pecados deles. T u d o isso prefigurava o S enhor Jesus C risto, que 15 M acA rthur, The MacArthur Bibíe Commentar}, 154. 16 Ibid., 124.
I 126 I I UNI )A M I - N T O S DA G R A Ç A
seria o Sumo Sacerdote exclusivamente por seu povo. Não foi pelo m undo inteiro que Cristo fez expiação, pois, se assim fosse, o m undo todo seria salvo. Na verdade, Cristo fez expiação por todos aqueles que final e definitivamente seriam salvos, aqueles que foram escolhidos pelo Pai. Desde toda a eternidade, os nomes dos eleitos estavam gravados no coração de Cristo, e, na cruz, o Pai transferiu os pecados deles para Jesus. Com o o grande Sumo Sacerdote de Deus, Jesus se apre׳ sentou diante do Pai em favor deles, não em favor do m undo (Jo 17.9). 4.
Expiação C ruenta. O sacrifício cruento de um animal era necessário
para fazer expiação pelo pecado do povo - outra representação da morte de Cris׳ to pelos eleitos:
Pois a vida da carne está no sangue, e eu 0 dei a vocês para fazerem propiáaçáo por si mesmos no altar; é 0 sangue que faz propiciação pela vida. - Levítico 17-11
Neste versículo Deus estabeleceu que nenhum israelita poderia comer carne com sangue. O sangue representa a vida porque traz em si os elementos que a sustentam. Portanto, o sangue é o meio pelo qual é feita expiação pelos pecados. Esta representa uma vida dada em favor de outra. M acArthur escreve:
O Antigo Testamento iguala a vida ao sangue (Gn 9.4; Dt 12.23), o que ilustra vividamente a santidade da vida humana (Gn 9.6). De acordo com o Novo Testamento, “sem derramamento de sangue não há perdão” (Hb 9.22). Por conseguinte, a ênfase aos sacrifícios do An׳ tigo Testamento aponta para o sangue que Cristo derramaria, isto é, a vida que daria em favor do pecador crente (Rm 5.9; 1C0 11.25,26).17
Somente o sangue derramado de um substituto inocente, Moisés escreveu, expia o pecado em favor do pecador, deixando que ele escape da morte que me׳ 17 Ibid., 159.
A Graça S oberana no Deserto
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rece, e viva. Som ente a m orte vicária ou substitutiva de C risto pelos e rg u e s deixa que eles escapem da m orte eterna e recebam a vida eterna.
O LIVRO DE NÚMEROS: “ l)1:us,0 LÍDER SOBERANO”
N úm eros, o q u arto livro do Pentateuco, tam bém foi escrito por Moisés e dá co n tin u id ad e à narrativa da jo rn ad a de Israel do Egito à Terra Prom etida. Depois que Deus entregou a Moisés os regulam entos para o culto no santuário, registrados em Levítico, seu povo estava p ro n to para partir do M onte Sinai. Mas o que deveria ter sido um a cu rta excursão transform ou-se num vagar pelo deserto d u ran te trin ta e nove anos. O Livro de N úm eros faz cobertura da penosa via gem, com eçando pela saída de Israel do sopé do M onte Sinai e concluindo nas planícies de M oabe, à vista d o Rio Jordão. Tragicam ente, o livro está repleto de repetida incredulidade, idolatria e até apostasia. C o n q u a n to Deus, em sua sobe rania, ten h a perm anecido fiel a Seu povo, o que se vê mais claram ente no Livro de N úm eros é a d o u trin a da depravação total.
A DOUTRINA EM FOCO DEPRAVAÇÃO TO TA L D u ra n te as peram bulações de Israel n o deserto, a depravação radical do h o m em foi evidenciada no pecado do povo. Em m uitos aspectos, to d o o Livro de N úm eros é um registro d ram ático da d o u trin a da co rru p ção total do hom em . Tem os ali o pecado da in cred u lid ad e de m aneira vivida, com provada pelos pecados de rebelião, idolatria e apostasia. Em conseqüência disso, essa geração de israelitas m orreu n o deserto. A pesar dos seus m uitos privilégios espirituais, te n d o recebido a lei e visto o p o d er de Deus, co n tin u a ra m em sua rejeição da graça divina. Em sua m aior parte, essa geração não conheceu Deus. Era um povo ex terio rm en te religioso, mas in te rio rm e n te co rru p to . As marcas de Israel no d eserto são:
ן128 ןR I N D A M t N T O S DA ( i kAC/ A
1.
Corações Incrédulos. Os não convertidos não agem em obediência a
Deus porque não têm a fé salvadora:
Ma os homens que tinham ido com [Calebe] disseram: “Não podemos atacar aquele povo; é mais forte do que nós”. E espalharam entre os israelitas um relatório negativo acerca daquela terra. Disseram: “A terra para a qual fomos em missão de reconhecimento devora os que nela vivem. Todos os que vivem são de grande estatura. Vimos também os gigantes, os descendentes de Enaque, diante de quem parecíamos gafanhotos, a nós e a eles”. - Números 13.31-33
Apesar de Deus ter prom etido dar a seu povo a Terra Prometida, o relatorio de dez dos doze espias que tinham sido enviados a Canaã estavam dom inados pela incredulidade. Desconsiderando a promessa divina de vitória, clamaram ao povo dizendo que Israel era incapaz de vencer os seus inimigos e de tom ar posse da terra. Esses espias incrédulos só viam que os gigantes da terra eram muito maiores, comparados com eles. Não viram que os gigantes eram muito menores, comparados com Deus. Eles olharam para o m undo em redor com olhos naturais, não convertidos, não com os olhos da fé. Lamentavelmente, esses espias representavam um grande segmento do povo israelita, muitos dos quais eram inconversos e estavam cheios de incredulidade. O resultado do relatório covarde dos espias foi que o povo não confiou em Deus. Consequentem ente, uma geracão inteira foi proibida de entrar na Terra Prometida (14.27-30). O Novo Testamento olha retrospectivamente para esse episódio e vê nele uma ilustração da apostasia (1C0 10.5; Hb 3.16-19). Simon Kistemaker escreve:
Paulo com para o povo que pereceu no deserto com os membros da igreja de C orinto. Ele quer que os coríntios saibam que todos os israelitas receberam a provisão diária de Deus, e, contudo, pereceram por causa da incredulidade. Por analogia, ele quer que os
A ) זra ça S o h c r a n ii n o Deserto
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seus leitores saibam que o seu recebimento do batismo e da Ceia do Senhor não lhes garante a vida eterna. Sem o compromisso com Cristo, renovado diariamente, falta-lhes a segurança eterna em face da morte espiritual.18
N outras palavras, esses israelitas incrédulos representavam m uitos que são religiosos, mas que estão perdidos. Eles têm a form a da piedade, mas negam seu poder. Eles se recusaram a crer e a agir firm ados na Palavra de Deus.
2.
Corações Insubm issos. O s hom ens e m ulheres não convertidos podem
ser exteriorm ente religiosos, mas perm anecem insubm issos à vontade do Senhor e resistentes à sua direção:
Partiram eles do m onte H or pelo cam inho do m ar Vermelho, para con tor■ narem a terra de Edom. M as
0 povo ficou im paciente no cam inho e falou
contra Deus e contra Moisés, dizendo: “Por que vocés nos tiraram do Egito para morrermos no deserto? N ão há pão! N ão há água! E nós detestam os esta com ida m iserável!” - Números 21.4-5
N o d eserto , Israel era lim a n ação de g en te ap ó stata que tin h a caído de sua profissão de c o n fian ça em D eus. D avam prova disso p o r recusarem c o n s ta n te m e n te a Palavra de D eus, resistirem à v o n ta d e de D eus e serem insu b m isso s a seu se n h o rio . M esm o q u a n d o D eus os co n d u zia à T erra P rom e tid a, ap esar de seus co rp o s estarem n o d e se rto , seus corações perm an eciam n o Egito. N o u tra s palavras, seus afetos p e rm an e ciam no m u n d o . Q u a n d o ficavam ab so rto s em si m esm os, até falavam c o n tra D eus. N o E vangelho de João essa a titu d e é d escrita co m o re p re s e n ta n d o o estado de in cre d u lid a d e do coração n ã o c o n v ertid o (3.14-17). E x p lican d o os seus corações insubm issos, M a c A rth u r escreve: 18 S im on J. Kiste maker, Neu> Testament Commentary: Exposition of the First Epistle to the Corinthians (G ran d R apids, MI: Baker Books, 1993), 326.
I n o ןl ׳l I N I ) A M H N T O S I )Λ CÍ RAÇA
Deus lhes deu m aná para com erem e água para beberem, mas o povo não ficou satisfeito. Eles queriam mais variedade e mais especiarias. Eles se queixavam e se queixavam, questionando a bondade de Deus e pondo à prova a sua paciência. N ão se preocupavam em agradar a Deus, som ente em agradar a si mesmos.19
Seus corações d om inados pela vontade própria revelavam o seu estado de inconversos. Eles recusaram reconhecer a soberania de Deus sobre suas vidas. 3.
C orações Id ó latras. O s corações não convertidos procuram outros deu׳
ses, negando ao único Deus verdadeiro a lealdade devida som ente a ele:
Enquanto
0 povo estava em Sitim, 0 povo com eçou a entregar-se à imorali■
dade sexual com mulheres m oabitas, que os convidavam aos sacrifícios de seus deuses. O povo com ia e se prostrava perante esses deuses. Assim Israel se juntou à adoração a Baal-Peor. E a ira do Senhor acendeu-se contra Israel. - Números 25.1-3
D u ran te a prolongada peregrinação pelo deserto, virtualm ente toda uma geração de israelitas entregou-se à idolatria, à adoração de outros deuses. Q u a n d o Israel chegou a Sitim , a últim a parada antes da travessia do Jordão (Js 2.1), o povo passou a seguir Baal, o deus pagão local. Esse culto falso envolvia até prostituição com as m ulheres de M oabe, m ostrando que todas as espécies de mal ocultavam-se em seus corações ím pios. Todo esse mal dava prova do seu estado de não convertidos. O fruto podre da idolatria cresceu das raízes fenecentes de corações não regenerados. Peter C . C raigie observa:
Apesar da proibição da idolatria na lei hebraica, evidentem ente essa continuou sendo um a forma fundam ental de tentação através de toda a história de Israel, quer adorando falsos deuses por meio 19 John M acA rthur, ÍCorinthiün.s (Chicago, IL: M oudy Press, 1984), 224.
λ ( !’ r aç a S o h e r o n i t n o D e s e r t o
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de seus ídolos, quer reduzindo a adoração do único Deus verdadeiro a uma forma idolátrica. Dai, a denúncia da idolatria em suas várias formas é um tema recorrente, tanto na lei como nos profetas (Dt 7.25-26; 29.16-17; Is 40.18-23).20
Até o fim da sua jornada de quarenta anos, os israelitas dem onstraram possuir corações idólatras. Temos aí uma prova inequívoca da sua corrupção radical. Todos os corações não convertidos estão cheios dessa iniqüidade, quer a dem onstrem em seus atos, quer não.
q j ' A D O U T R IN A EM FOCO: ■
EX PIA Ç Ã O LIMITADA O único remédio salvífico para o estado desamparado do hom em em pe-
cado é o sacrifício expiatório de Cristo. Na cruz, o Senhor Jesus tornou-se pecado por seu povo, para que nele pudéssemos receber a salvação. Esta m orte substitutiva foi prefigurada no deserto pela serpente de bronze que Deus disse a Moisés que fizesse e levantasse num poste. Foi um remédio salvífico, não visando as nações circunvizinhas do m undo, mas exclusivamente para Israel. Se os que pertenciam a Deus olhassem, seriam salvos.
Então 0 Senhor enviou serpentes venenosas que morderam 0 povo, e mui■ tos morreram. O povo foi a Moisés e disse: “Pecamos quando falamos contra 0 Senhor e contra você. Ore pedindo ao Senhor que tire as serpentes do meio de nós”. E Moisés orou pelo povo. O Senhor disse a Moisés: “Faça uma serpente e coloque-a no alto de um poste; quem for mordido e olhar para ela viverá”. Moisés fez então uma serpente de bronze e a colocou num poste. Quando alguém era mordido por uma serpente e olhava para a serpente de bronze, permanecia vivo. - Números 21.6-9 2 0 P eter C . C ra ig ie , Evangelical D ictionary 0/ Theology, 2a e d iç ã o , e d . p o r W a lte r A . E lw ell ( G r a n d R a p id s, M l: B aker A c a d e m ic , 2001), 589.
ן132 ןI ' U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
Por sua graça, Deus providenciou um remédio salvífico para os israelitas que se achavam em pecado e tinham sido mordidos pelas serpentes ardentes que Deus lhes tinha enviado, aplicando o seu juízo. Essas serpentes venenosas administravam uma mordida letal - uma figura do veneno mortal do pecado. Mas Deus disse a Moisés que fizesse uma serpente de bronze e a colocasse numa pilastra. Q uando foi erguida, todos os que olhavam para ela, eram curados pela fé. Em conformidade com as próprias palavras de Cristo, essa serpente de bronze foi uma figura da sua morte vicária na cruz (Jo 3.14Ί5). Ela retratava a necessidade que
0 pecador tem de
olhar para Cristo com fé pessoal, fé salvadora, para salvação. Vendo a intencional conexão entre a serpente de bronze e Cristo, James Montgomery Boice escreve:
De igual modo, temos de olhar para a cruz de Cristo. Fomos mor־ didos pelo pecado, como aqueles israelitas. Estamos morrendo de pecado, como eles estavam morrendo. Deus enviou seu Filho na semelhança da carne pecaminosa e pelo pecado para que crêsse׳ mos nele e não perecêssemos. ... Este é o cerne do cristianismo. Deus providenciou salvação para você em Jesus Cristo.21
Na cruz, o Senhor Jesus Cristo se tornou pecado por todos os que creem ou cre׳ rem nele. A serpente de bronze não foi destinada aos cananeus, nem aos egípcios, que viveram e morreram na incredulidade. Foi, de fato, exclusivamente para aqueles que, pertencendo a Deus, olharam para ela e viveram. Assim é com a morte de Cristo. Ele morreu por seu povo, por todos aqueles que puseram ou puserem sua confiança nele.
O LIVRO DE D E U T E R O N Ô M IO “ DEUS,
o
LEGISLADOR SOBERANO”
Finalmente, o quinto livro de Moisés, o último do Pentateuco, foi Deute׳ ronôm io, a segunda publicação da lei. Depois que Deus deu a lei no M onte Sinai 21 James M ontgom ery Boice, The Gospel of John Volume I: The Coming of the Light, John 1 -4 (G ran d Rapids, MI; Baker Books, 1985, 1999), 224-225.
A Graça S oberana n o Des erto
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(Êx 20), os israelitas estavam prontos para ir para a Terra Prometida. Mas, devido à sua incredulidade (Nm 13), recusaram-se a entrar em Canaã e, conseqüente mente, vagaram pelo deserto pelos próximos quarenta anos. Antes da próxima geração de israelitas entrar em sua futura terra natal, Moisés deu-lhes a lei pela segunda vez. Embora se tivessem passado quatro décadas, sua teologia não mu dou nem um pouco. Q uando o legislador de Israel falou por Deus, ele tornou a declarar as verdades das doutrinas da graça.
׳.־־S , A D O U T R IN A FOCO
U '
DEPRAVAÇÃO TOTAL A corrupção total do coração não convertido foi um a verdade básica ensi
nada por Moisés. Esta doutrina não significa que todo hom em é tão mau quanto seja possível ser. Mas ensina que a depravação se espalhou por todas as partes do hom em caído, deixando-o com a incapacidade absoluta de agradar a Deus ou de chegar-se a Deus. Não há nada que o hom em possa fazer para recomendar-se a um Deus santo. Seu pecado o tornou incapaz de contribuir com o que quer que seja para a sua salvação. C om o Moisés escreveu, vê-se essa corrupção interior principalm ente na incapacidade total do homem de conhecer Deus ou de enten der qualquer verdade espiritual:
“Mas até hoje 0 Senhor não lhes deu m ente que entenda, olhos que vejam, e ouvidos que ouçam". - Deuteronômio 2 9 .4
Este versículo não se refere a defeitos físicos, como cegueira ou surdez. Moisés está, sim, falando de incapacidade espiritual. O hom em caído, em seu estado natural, não pode se aperceber retam ente da verdade nem crer verdadei ramente. Enquanto Deus não operar nele com sua graça, ninguém pode exercer a fé salvadora nele. Moisés declara que o coração inconverso não pode conhecer Deus, não pode ver sua verdade com discernim ento espiritual, e não pode ouvir in teriorm ente a Palavra de Deus. Esta é a doutrina da incapacidade hum ana, que é
I Π4 ןF U N D A M E N T O S DA ( J R A Ç A
o resultado inevitável da depravação total. É preciso que o Senhor dê ao hom em um coração espiritual para que ele conheça Deus, olhos espirituais para que veja a verdade, e ouvidos espirituais para que ouça a verdade - caso contrário, não haverá salvação para ele.
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ELEIÇÃO IN C O N D IC IO N A L
'י
Enquanto nenhum homem não regenerado pode escolher Deus, ele es׳
colheu muitos pecadores para serem salvos m ediante sua graça. Segundo sua infinita misericórdia, Deus bondosam ente, em sua graça, elegeu muitos para constituírem seu povo. Esta é a verdade bíblica da eleição soberana. Antes da fundação do m undo, Deus escolheu os seus, m uito antes de qualquer pessoa o escolher. João Calvino escreve:
Nunca estaremos claramente convencidos, como deveríamos, que a nossa salvação flui da fonte da gratuita misericórdia de Deus, enquanto não nos afinarmos com sua eterna eleição, que ilustra a graça de Deus com esta comparação: Ele não adota todos indiscri׳ minadamente para a esperança da salvação, mas dá a alguns o que nega a outros. Evidentemente, ignorar este princípio desacredita a glória divina e diminui a real humildade - Se, pois, precisamos ser relembrados da origem da eleição, para provar que não obtemos a salvação de nenhuma outra fonte senão o mero beneplácito de Deus, então, aqueles que desejam extinguir este princípio, fazem o que podem para obscurecer o que deveria ser celebrado magnífica׳ mente e alto e bom som .11
1. Escolha Feita por Amor. A escolha soberana de Deus baseia׳se em seu amor incondicional. E mais que certo que a eleição divina não se funda nalgum 22 J o h n C a lv in , n o s te rm o s e m q u e é c ita d o p o r B o e ttn e r e m The Reformed Doctrine of Predestination, 11.
I (Iraça Sohera n a no Des erto
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m érito ou nalgum a dignidade da pessoa escolhida, mas, sim, exclusivam ente em sua escolha baseada no amor:
“[Deus] am ou os seus antepassados e escolheu a descendência deles..." Deuteronômiu 4.3 7 a
Neste versículo, o am or e a escolha de Deus são tratados como sinônimos. Todos aqueles que ele pôs em seu coração para amar, também os escolheu para lhe per׳ tencerem. Apesar da infidelidade de Israel, Deus continuou a chamar um remanescente escolhido de dentro da nação para ser seu povo. Deus nunca m uda seu comprometi׳ mento com os escolhidos. Dentro dos limites do tempo, há sempre um remanescente de acordo com a escolha feira por I )eus em sua graça. Alguns querem argumentar con׳ tra esta doutrina bíblica dizendo: “Por que Deus só escolhe algunsΓ Mas a real pergunta é: “Por que Deus escolhe algum?” Deus não tinha a obrigação de escolher nem um só pecador. O fato de que ele escolheu uma imensa m ultidão que ninguém pode contar, é prova de um a misericordiosa graça que desafia a compreensão humana. C om relação a D eu tero n ô m io 4.37, Eugene M errill observa:
Nesta breve questão motivacional ocorrem duas das mais significa׳ tivas palavras pactuais do Antigo Testamento: “am or” e “escolha”. C om o term os técnicos, elas são virtualm ente palavras sinôni׳ mas, como m uitos eruditos o têm posto fora de dúvida. N outras palavras, “am ar” é escolher, e “escolher” é amar. O efeito desta com binação de term os é colocar em linguagem m uito enfática a doutrina da eleição, ao menos no que concerne à vocação e à fun׳ cão do Israel do Antigo Testamento. D euteronôm io salienta este tema repetidam ente (cf. 7. 733. 3 ;10.15 ;8)׳, mas ele encontra sua origem, como a passagem sugere, na vocação dos patriarcas para entrarem num a aliança de privilégio e responsabilidade.״ 23 Eugene H. M errill, The ׳New American Commentary, Deuteronomy (Nashville, TN : B roadm an & H olm an Publishers,
I I י)יI I U N D A M I . N T O S D A G R A Ç A
2.
Escolha Fiel. A escolha soberana de Deus baseia-se em sua fidelidade
no cum prim ento do seu plano eterno, um propósito revelado em suas promessas aos patriarcas:
"Pois vocês são um povo santo para
0 Senhor, 0 seu Deus. Ü Senhor, 0
seu Deus, os escolheu dentre todos os p o i’os da face da terra para ser povo ,
0 seu
0 seu tesouro pessoal. O Senhor não se afeiçoou a vocês nem os esco׳
lheu por serem m ais numerosos do que os outros povos, pois vocês eram m enor de todos os povos. M as foi porque
0
0 Senhor os am ou e por causa do
juram ento que fez aos seus an tepassados’’. - D euteronôm io 7■6-8a
Longe de ser uma doutrina dura, a verdade bíblica da eleição divina tem suas raízes e sua base no amor eterno de Deus por pecadores eleitos. Deus es׳ colheu pôr seu afeto num imenso núm ero de hom ens e mulheres que estavam contam inados e arruinados pelo pecado. Este am or eletivo vem de dentro do pró׳ prio Deus, não de qualquer coisa bonita que acaso houvesse dentro do homem caído. Deus ama os seus eleitos simplesmente porque é de sua escolha amá׳los. Explicando este im portante texto, Merrill escreve:
Esta lem brança da vocação de Israel está ligada, prim eiram ente, à graça eletiva do Senhor, e, depois, à sua fidelidade à sua promessa aos patriarcas (7.8; cf. 6.10, 23). Em acréscimo ao verbo fortem ente eletivo hahar (“escolher”) no versículo 6, consta o verbo pactuai igualmente evocativo aheh (“am ar” no versículo 8). Em contextos pactuais estes verbos são sinônim os, pois o Senhor escolhe aqueles que ama e ama aqueles que escolhe (cf. 4.37; 10.15; SI 47.4; 78.68). Logo, os que ele odeia são aqueles que rejeitou com o partícipes da aliança (Ml 1.2; cf. Rm 9.13).24 1994), Π 2. 24 Ibid., 180-181
Λ (!raça S o h e ra n a no Desert o
\ I V7 I
Acrescentando um com entário proveitoso, Pink declara:
E por que o Senhor escolheu Israel para ser seu favorito, seu povo especial? Os caldeus eram mais antigos, os egípcios eram mais sá׳ bios, os cananeus eram mais numerosos; contudo, foram deixados de lado. Q ual será, então, o motivo pelo qual o S enhor separou singularm ente Israel? E certo que não foi por causa de alguma excelência havida nele, como a totalidade da sua história mostra. De Moisés a Malaquias, os israelitas tinham dura cerviz e coração em pedernido, não apreciavam devidam ente os favores divinos e re׳ agiam irresponsavelmente à vontade divina. Sua eleição não pode ter sido por causa de alguma bondade existente neles: foi um a clara decisão da soberania divina.:י
3.
Escolha Afetuosa. A escolha que Deus fez dos eleitos não foi feita estoi׳
camente, de maneira mecânica e desapaixonada. Antes, Deus pôs seu coração em seus escolhidos com fervente amor:
Ao Senhor, 0 seu Deus, pertencem os céus, e até os mais altos céus, a terra e tudo
0 que nela existe. No entanto, 0 Senhor se afeiçoou aos seus ante■
passados, e os am ou, e a vocês, descendentes deles, escolheu entre todas as nações, com o hoje se vê. - D euteronôm io 10.14-15
Moisés faz aqui uma distinção entre a graça comum de Deus, uma bondade temporal, não redentora, mostrada para todo o povo, e o seu amor especial, redentor, para o remanescente salvo dentro de Israel. Calvino observa:
Um povo é peculiarm ente escolhido, para rejeição de outros: não se vê nenhum a razão para isso, exceto que Moisés, para privar a 25 A. W. Pink, The Doctrines of Eícction aníijusíi/iaUion (G rand Rapids, MI: Raker Books, 1975, 1976), 43.
ן138 ןI U N D A M E N T O S DA CÍKAÇA
posteridade de Israel de toda ocasião de gloriar-se, passa׳lhe o ensino segundo o qual a exaltação dos seus descendentes decorre totalmente do amor gratuito de Deus.26
Craigie acrescenta: Ό versículo salienta a soberania absoluta de Deus sobre todo o universo criado, incluindo céu e terra. C ontra o pano de fundo da soberania universal de Deus é expressa a eleição de seu povo, em am or”.27
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A D O U T R IN A EM FOCO GRAÇA IRRESISTÍVEL Em Deuteronômio, Moisés ensinou também o quarto importante título das
doutrinas da graça - o chamado irresistível de Deus. Centenas de anos antes de Moisés, Deus ordenara a Abraão que circuncidasse todos os elementos masculinos de sua casa. Para Israel, a circuncisão era uma figura do que é preciso que Deus faça ao coração não convertido. No novo nascimento, é preciso que Deus circuncide o coração endurecido pelo pecado, se é que o homem pecador vai amá-lo com fé salvadora. Por uma obra soberana do Espírito Santo, Deus necessariamente corta profundamente o coração não convertido e o separa sobrenaturalmente para si. Esta é a obra onipotente do Espírito Santo na regeneração. Novamente vemos, en׳ tão, que Deus é a única causa inicial da regeneração. O homem é passivo, ao passo que Deus é ativo neste passo vital do processo de salvação:
O Senhor, teu Deus, circuncidará 0 teu coração e 0 coração de tua descendéncia, para amares 0 Senhor, teu Deus, de todo 0 coração e de toda a tua alma, para que vivas. - Deuteronômio 30.6 (ARA)
Moisés apresentou a obra da graça soberana de Deus como uma circuncisão espiritual, do coração descrente. E um a obra penetrante da graça que remove 26 J o h n C a lv in , institutes 0/ the Christian Religion ( G r a n d R a p id s, M I: E e rd m a n s P u b lis h in g C o ., 1949), 176. 27 P eter C . C ra ig ie , The Book of Deuteronomy ( G r a n d R a p id s, M I: E e rd m a n s P u b lis h in g C o ., 1976), 20 5 .
Λ (ir a f a Soherinui no h e s e r to
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a incapacidade para crer e הsubstitui pelo verdadeiro arrependim ento e fé. A regeneração é uma cirurgia de peito aberto, um a obra de revitalização do Espírito que sonda até o nível mais profundo do ser da pessoa. C oncernente a essa obra de regeneração, Anthony I loekema escreve:
Que é que a Bíblia ensina acerca da regeneração? Já no Antigo Testamento ela nos ensina que somente Deus pode produzir a mudança radical que é necessária para habilitar os seres huma־ nos caídos a fazerem o que é agradável aos olhos divinos. Em Deuteronômio 30.6 vemos a nossa renovação espiritual descrita figuradamente como uma circuncisão do coração. ...Visto que o coração é o cerne da pessoa, a passagem ensina que é preciso que Deus nos limpe por dentro, antes de podermos amá-lo verdadeiramente.28
Explicando a natureza irresistível dessa obra divina, Craigie escreve: “Vê-se que é, de fato, um ato de Deus, e assim aponta para a nova aliança, quando Deus, em sua graça, trataria do problema espiritual básico do homem. Q uando Deus ‘operasse’ no coração, então, verdadeiramente, as pessoas seriam capazes de amar o Senhor e viver”.29
^׳׳T ) A D O U T R IN A EM FOCO: T
REPROVAÇÃO DIVINA Ao reeditar a Lei, Moisés ensinou tam bém a difícil doutrina da reprovação,
uma verdade segundo a qual Deus passa por alto alguns, deixando-os perdidos em seu pecado. Ele mostrou que Deus pode endurecer os corações dos réprobos, confirmando-os em sua incredulidade:
28 A n th o n y A . H o e k e m a , Saved by Grace ( G r a n d R a p id s, M l: E e rd m a n s P u b lis h in g C o ., e C a rlis le , R e in o U n id o : T h e P a te rn o s te r Press, 1989), 9 5 . (P u b lic a d o e m p o rtu g u ê s c o m o títu lo Saltos pela graça. N o ta d o rev iso r) 29 C ra ig ie , The Book of Deuteronomy, 3 6 4 .
ן140 ןF U N D A M E N T O S DA ( J R A Ç A
“Mas Seom, rei de Hesbom, ndo quis deixar-nos passar; pois 0 Senhor, ο Deus de vocês, tomou-lhe obstinado 0 espírito e endureceu-lhe 0 coração, para entregá-lo nas mãos de vocês, como hoje se vê". - Deuteronômio 2.30
Era prerrogativa soberana de Deus fazer o que lhe aprouvesse com esse rei, exatamente como fizera com o Faraó. Todo coração está em suas mãos onipoten׳ tes, para que o modele segundo a sua vontade. A Escritura ensina claramente que a má vontade de Seom, não perm itindo que Israel passasse por suas terras, foi causada pelo ato de Deus segundo o qual ele endureceu o coração deles para cum prir os seus propósitos eternos. M artinho Lutero escreve: “Aqui a glória e poder do livre-arbítrio é exaltada, a saber, para se ver que não é absolutamente nada”.’0 O que ele quer dizer é claro e direto: Por causa do pecado, o hom em não possui um verdadeiro livre-arbítrio. Somente Deus tem tal liberdade de escolha, pois fatores de constrangim ento são coisas que não se lhe impõem. Merrill explica:
Aqui Moisés deixou claro que a obstinação de [Seom] foi algo que o Senhor produziu nele, precisamente para prover uma ocasião para a sua destruição nas mãos de Israel (cf. 2.24). Moisés disse literalmen׳ te que o Senhor “tornou obstinado o seu espírito” e “endureceu o seu coração”. O primeiro verbo (qasa) ocorre com a mesma raiz em Êxodo 7.3, para dizer que o Senhor endureceu o coração do Faraó para prepará-lo para juízo. O segundo verbo (amas) geralmente ocor׳ re no sentido positivo de “encorajar”, mas aqui (e em 2Cr 36.13), tem conotação com o mesmo sentido de qasa, “tornar obstinado”. O significado altamente determinista da passagem é apropriado ao espírito de guerra santa na qual Yahweh, o comandante, empregava toda e qualquer arma do arsenal que escolhesse.31 3 0 M a rtin L u th e r, L uther’s Works, Voi. 9: Lectures on Deuteronomy, e d . Jaro slav P e lik a n , e d ito r a ssiste n te D a n ie l P o e llo r (St. L ouis, M O : C o n c o r d ia P u b lis h in g H o u s e , 1960), 36. 31 M e rrill, The New American Com m entary, Deuteronomy, 101-102.
A G raça S o b e r a n a no D es e r to
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U M FORTE IN ÍC IO EM PROL DA G RAÇ A
Moisés deu um forte início ao registro inspirado da graça soberana de Deus para o hom em . Nos cinco livros do Pentateuco há um inconfundível testem unho em favor das doutrinas da graça, verdades que especialmente engrandecem a gló׳ ria do inigualável nom e de Deus. Segue-se, pois, que Moisés ocupa o primeiro lugar da longa linha de hom ens piedosos que têm alçado altam ente a mesma bandeira que ele alçou. O resto da Bíblia simplesmente edifica sobre
0 sólido
alicerce lançado de
Gênesis a Deuteronôm io. A mensagem da Bíblia toda é a verdade da soberania de Deus na salvação dos pecadores perdidos e arruinados, e eleitos. E a mensagem que declara que Deus escolhe para si um povo por meio do qual quer mostrar sua graça, supremamente para a sua glória e intencionalm ente para o bem deles. Deus seja louvado para sempre.
142 ןI l U N D A M E N T O S DA GKA( , ’A
CAPÍTULO 3 PERGUNTAS PARA ESTUDO
1. Explique a soberania de Deus na vida e no ministério de Moisés. Sobre quais esferas da vida e da criação estende׳se a soberania de Deus? Esta inclui a salvação?
2. Descreva a doutrina da eleição como expressa em Êxodo 33.19. É uma doutrina dura, ou reflete amor?
3. Como a morte de Cristo foi prefigurada na Páscoa? Como a Páscoa representa uma expiação definida?
4. Em que consiste a doutrina da reprovação? Deus ter endurecido o coração do faraó foi justo ou injusto? Explique a sua resposta. Explique a diferença entre graça e justiça.
5. Descreva como o Dia da Expiação prefigurava a morte de Cristo. Que era o bode expiatório?
6. Como a obra do sumo sacerdote simbolizava uma expiação definida?
7. Que provas da depravação radical se veem no Livro de Números? Que advertência nestas provas deveriam ser ouvidas pelos membros de igreja não convertidos?
8. Que aspectos da doutrina da eleição são apresentados em Deuteronômio? Q uanto a você, como esta verdade afeta ou deveria afetar sua vida diária?
não ser que eu seja convencido pelo testemunho da Escritura ou por clara razão, pois não confio nem no papa nem em concílios isoladamente, visto que se sabe muito bem que eles têm errado e se contraditado muitas vezes. Estou preso às Escrituras que citei e a minba consciência écativa da Palavra de Deus. Não posso retratar-me, e não me retratarei de coisa alguma, uma vez que não éseguro nem correto ir contra a consciência. Não posso agir de outra forma: aqui estou. Deus me ajude. Amém.1 Martinbo Lutero
l M a rtin h o L u te ro , s e g u n d o c ita d o p o r S te p h e n J. N ic h o ls e m M a rtin Luther (P h illip s b u rg , N J: P &. R P u b lis h in g , 2 0 0 2 ), 41-42.
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a p í t u i .o
4
HOMENS FORTES COM UMA FORTE MENSAGEM PRIMEIROS LÍDERES: JOSUÉ A JÓ
s hom ens fortes sempre proclamam uma mensagem forte. Não leem os títulos e verificam as apreciações ou resenhas para então darem suas opiniões. De fato, eles não têm opiniões - têm convicções. Eles sangram por suas convicções. São hom ens fortes ancorados na forte Palavra de Deus, e, como tal, trazem uma mensagem séria e pungente. Q uando se levantam para falar, eles têm realmente algo para dizer - e o dizem, quer haja quem escute quer não. Q uando se assentam para escrever, eles não fazem rodeios em torno das questões - eles as enfrentam para valer! Q uando falam aos tempos e dos tempos em que vivem, não apalpam - esmunaml Não têm uma mensagem para um grupo e outra diferente para outro grupo. Aonde vão e com quem quer que falem, eles só têm uma mensagem - a mensagem de Deus. E isso que os faz fortes. O u eles falam a Palavra de Deus, ou não dizem nada.
ן14) יI I l I N D A M E N T O S DA G R A Ç A
Não existe mensagem mais forte que as verdades da soberania de Deus nas doutrinas da graça. Não há mensagem que mais exalte Deus e que mais glorifique Cristo do que essas verdades. E, todavia, não existe anúncio mais franco e corajoso contra o pecado, que mais esmague o pecado e que mais denuncie o pecado do que os cinco pontos do calvinismo. Nenhuma verdade é tão doce e preciosa para a alma humilde e submissa, mas nenhum a outra mensagem ofende mais a carne nem é mais abrasadora para a mente carnal do que estas doutrinas. Para o homem natural, esta mensagem é de fato insuportável - como às vezes é intolerável até para os salvos! É precisamente sobre esta mensagem impopular que Deus chamou alguns dos hom ens mais fortes para escreverem em sua Palavra. Ele comissionou os escritores da Escritura para registrarem a mensagem mais agressiva já revelada à raça hum ana caída - a mensagem que fala da depravação total do hom em e da eleição incondicional de Deus. Fiéis ao Senhor, eles escreveram precisamente isso na Es-
critura. Cada um dos escritores da Bíblia estava firm em ente com prom etido com as doutrinas da graça. Certam ente, os que primeiro apresentaram esta mensagem eram hom ens fortes com uma forte mensagem. Concede׳se que as verdades sobre a graça soberana que apareceram primeiro no Antigo Testamento às vezes eram redigidas em termos simples, e com linguagem sutil. C ontudo, na maior parte não havia como o leitor ou o ouvinte enganar׳se com o que os autores estavam dizendo. Embora estes ensinos não tenham sido sistematizados com a classificação de im portantes títulos ou capítulos da teologia, foram franca e abertam ente colocados nas primeiras narrativas bíblicas para que todos os lessem. Com o passar dos séculos, estas verdades centrais da graça soberana eram expostas em termos cada vez mais detalhados. Os escritores bíblicos posteriores expandiram e ampliaram os seus textos incluindo neles várias nuances e complexidades destas verdades. C ontudo, por ora
0 nosso
foco está nos livros que vão de Josué a Jó, no
Antigo Testamento. Queremos considerar os hom ens fortes que escreveram essas porções da Escritura inspirada e ver a forte mensagem que eles lançaram na Bí׳ blia para que outros seguissem.
H o m e n s F o n e s c o w i/um h i r l t M e n s a g e m
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LIVROS H IST Ó R IC O S: JO SU É A JÓ
Depois que Moisés escreveu o Pentateuco, um a segunda onda de escritores bíblicos adentrou o cenário da história - Josué, Samuel, Esdras, Neemias e Jó. Esses autores representavam uma rica diversidade em seus am bientes de origem; suas posições incluíam, respectivamente, um general militar, um profeta, um escriba, um governador e um patriarca rico. Num período de mais de mil anos (cerca de 1.400-400 a.C.), eles, como Moisés antes deles, registraram a verdade da soberania de Deus sobre as atividades e os destinos dos hom ens radicalm ente depravados.
JOSUÉ “ESCRITOR DA PRERROGATIVA DIVINA”
Josué é o p rim eiro hom em forte que co nsiderarem os nesta fase da h istó ria da redenção. Ele serviu fielm ente com o assistente pessoal de M oisés d u ra n te o ano que passaram ju n to ao M onte S inai (Ex 24.13) e c o n tin u o u a seu lado d u ra n te as q u atro décadas de peregrinação no deserto .
Seu nom e significa “Yahweh é salvação”. C om o re p re se n ta n te da
trib o de Efraim , ele fez o re co n h ec im e n to da terra de C an aã com os outros espias israelitas e, ju n to com C alebe, deu o relató rio da m in o ria concitando Israel a invadir o te rritó rio (N m 14). A ntes da m o rte de M oisés, Josué foi desig nado para ser seu sucessor (N m 27.18-23), e assum iu a liderança da nação q u a n d o Deus re tiro u dela o grande legislador. Foi Josué quem con d u ziu o povo através do Rio Jordão para dar início à co n q u ista da T erra P rom etida. Por todos os ângulos que se considere, Josué não foi tão so m en te um hábil general m ilitar, mas foi tam bém um hom em piedoso. C o m o alguém firm ado so lid am en te na lei de D eus, ele escreveu sob a m esm a perspectiva que a de M oisés.
ןI4H ןF U N D A M E N T O S DA (.!RAÇA
O LIVRO DE JO SU É “DEUS, C O N T R O L A D O R D O C O R A Ç Ã O H U M A N O ”
C ontinuando a narrativa do Pentateuco, o Livro de Josué descreve a con׳ quista e a divisão do território de Canaã sob o novo líder de Israel, Josué. O livro começa inform ando que Deus comissionou Josué e depois registra a travessia miraculosa que Israel fez do Rio Jordão, adentrando a Terra Prometida, e relata as numerosas vitórias sobre os cananeus que se seguiram. Tendo Deus como o seu C om andante Chefe, Israel conquistou C anaã e subsequentemente dividiu o território entre as doze tribos. O tema dom inante do Livro de Josué é a soberania de Deus. Foi Deus que garantiu a vitória dos israelitas sobre os seus inimigos, habilitando-os a herdarem a terra. Apesar dos impossibilitantes obstáculos que enfrentaram, Deus lhes mostrou que era maior do que todos os povos e nações. A narrativa de Josué conclui com o idoso líder reunindo o povo de Deus e declarando o direito divino absoluto de governar as suas vidas.
A D O U T R IN A EM FOCO REPROVAÇÃO DIVINA Se bem que Josué não falou sobre os cinco pontos das doutrinas da graça propriam ente ditos, ele escreveu a respeito da soberania de Deus sobre os cora׳ ções dos homens. O escritor mostrou que Deus é livre para endurecer os corações pecadores, a fim de levar a efeito os seus propósitos:
Pois foi 0 próprio Senhor que lhes endureceu 0 coração para guerrearem contra Israel, para que ele os destruísse totalmente, exterminando-os sem misericórdia, como 0 Senhor tinha ordenado a Moisés. - Josué 11.20
D urante o avanço de Israel dentro da Terra Prometida, Deus endureceu os corações dos cananeus para que os israelitas os vencessem e os destruíssem. Esse endurecim ento foi um ato de juízo divino. Deus levantou os cananeus [contra Is׳
H o m e n s F o r t e s c o m un it ! I'tirl! ׳M e n s u f l c m
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rael] para destruí-los. Tal ação revela o direito supremo que Deus u־m de agir nos corações dos hom ens como lhe apraz. João Calvino escreve agudamente:
Deus os endurece para este fim: encerrá-los fora da misericórdia. Por isso se descreve esse endurecimento com o obra de Deus, porque assegura a realizoção do seu desígnio. Se aqueles que imaginam que Deus só olha para baixo para ver o que agrada aos homens fazerem e que não pode nem suportar a ideia de refreá-los por sua livre e secreta intervenção fizerem alguma tentativa de obscurecer tão claro assunto, que outra coisa demonstrarão senão a sua presunção? Tais pessoas só atribuem a Deus um poder permissivo, e desse m odo declaram o seu conselho dependente do que agrada aos homens. Mas, que diz o Espirito? Que o endurecimento procede de Deus, que dessa forma precipita aqueles que pretende destruir.1
SAMUEL “REGISTRA D O R DA PROVIDÊNCIA DIVINA”
Samuel é o próximo a aparecer na linhagem dos autores bíblicos. Sendo ele o derradeiro juiz do período de 350 anos dos juizes, Samuel se fez conhecido como escritor (ISm 10.25) e é geralmente reconhecido como autor do Livro de Juizes e da parte de ISamuel que precede sua morte. Seu nom e significa “nome de Deus” e serve para nos lembrar que a graça soberana de Deus é para todos os que invocam o seu nome. Embora tenha m inistrado durante um dos períodos mais tenebrosos da história de Israel, o que Samuel escreveu em Juizes dá clara prova da autoridade suprema de Deus sobre todos. Samuel chamou o povo e apelou para que buscassem o Senhor durante um período em que eles precisavam desesperadamente aproximar-se dele. As verdades das doutrinas da graça foram registradas por Samuel tanto explícita como implicitamente. 1 J o h n C a lv in , C om m entaries on the Boole of Joshua ( G r a n d R a p id s, M I: B ak er B o o k s, 2 0 0 3 ), 174-175.
ן150 ןF U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
O LIVRO DE JU IZ ES “DEUS, D O A D O R DE UMA GRAÇA IM ERECIDA”
O Livro de Juizes revela quão trágica é a vida quando a pessoas se recusam a reconhecer a soberania de Deus e resistem a seu direito de governar suas vidas. Registrados estão nesse livro os instáveis acontecim entos do turbulento período da história de Israel que se estende da conquista da Palestina ao início da m onarquia (cerca de 1380-1050 a.C.). D urante esse tem po de decadência moral, Deus levantou “juizes” sobre Israel - hom ens que serviram com o líderes militares, civis e espirituais. Esses hom ens fortes, e entre eles Débora, governaram a nação num a época em que havia um a confederação nacional leviana e frouxa, viciosam ente maculada por um viver frouxo e leviano. D urante esses três séculos, a soberania de Deus e a depravação do hom em foram os principais temas teológicos.
A D O U T R IN A EM FOCO: SOBERANIA DIVINA O escritor de Juizes falava claram ente acerca da questão da soberania de Deus sobre o hom em rebelde. Apesar da anarquia espiritual do hom em durante esse tempo, o hom em rebelde não podia frustrar as operações soberanas de Deus na terra. Independentem ente do invasivo pecado de Israel, Deus estava livre e desim pedido para agir como desejasse. Em conform idade com os seus propósitos, Deus muitas vezes decidiu abandonar os pecadores e fazê-los seguir os seus interesses pecaminosos. No período dos juizes, Deus fez justam ente isso. No meio da extrema iniqüidade de Israel, o Senhor, em sua soberania, reagiu com juízo. As doutrinas da graça repousam sobre o firme fundam ento da soberania divina. 1.
D isciplinando Crentes. Num a reação santa e justa contra o pecado de
Israel, Deus decidiu entregar a nação nas mãos de hom ens maus. C om esse ato judicial, Deus se levantou contra o seu povo, causando a sua derrota:
Homens Fones com limn Ivrle Mrnsafjcm
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A ira do Senhor se acendeu contra Israel, e ele os entregou nas nulos df invasores que os saquearam. Ele os entregou aos inimigos ao seu redor, aos quais jâ não conseguiam resistir. Sempre que os israelitas saíam para a batalha, a mão do Senhor era contra eles para denotá-los, conforme lhes havia advertido e jurado. Grande angústia os dominava. - Juizes 2.14-15
Deus perm itiu que o seu povo fosse derrotado por seus inimigos a fim de trazê-los ao arrependim ento. Esse abandono divino dos israelitas, entregando-os Deus a nações iníquas em resposta ao pecado deles, era um a ocorrência repetida (Jz 3.8, 12-13; 4.2; 6.1; 10.7; 13.1). Sobre este ponto Daniel Block escreve:
A chocante realidade para Israel era que o seu real inimigo era Deus. Sempre que eles saíam, eram confrontados pela mão divina hostil, estando Deus determinado a tornar miserável a vida deles. De acordo com suas prévias advertências e com o seu juramento, lhes infligia dura aflição.2
Esse abandono divino era uma demonstração da autoridade suprema da vontade soberana de Deus sobre as vidas do seu povo. 2.
D irigindo Descrentes. Via-se tam bém a soberania divina no exercício
do controle supremo sobre os interesses e atividades humanos, até sobre os maus reis. Pelo livre exercício da sua vontade suprema, Deus fortalecia um rei mau para praticar o mal.
Mais uma vez os israelitas fizeram 0 que 0 Senhor reprova, e por isso 0 Senhor deu a Eglom, rei de Moabe, poder sobre Israel. Conseguindo uma aliança com os amonitas e com os amalequitas, Eglom veio e denotou Israel e conquistou a Cidade das Palmeiras. - Juizes 3.12-13 2 D a n ie l I. B lock, The American Com m entary, Vol. 6: Judges, Ruth (N ash v ille, T N : B r o d m a n &. H o lm a n P u b lish e rs, 1999), 127.
ן152 ןF U N D A M E N T O S DA ( Í UA ÇA
Em conformidade com essa passagem, Deus pode fortalecer incrédulos para capacitá-los a vencer o seu povo com vistas a seus propósitos. Dessa forma Deus usa gente não santa para realizar os seus santos planos para benefício do seu povo. Explicando essa verdade, Matthew Henry explana:
Deus os fez saber que ele tinha uma variedade de varas com as quais castigá-los: Ele fortaleceu Eglom, rei de Moabe, contra eles. ...Ali estava outro rei de Moabe que Deus fortaleceu contra eles; Deus colocou poder em suas mãos, apesar de ser ele um homem iníquo, para ser um açoite contra Israel. A vara em suas mãos, com a qual ele pôde surrar Israel, era a indignação de Deus [contra o Seu povo[.3
Em resumo, o controle soberano de Deus estende-se até aos descrentes, que ele pode usar para os seus propósitos superiores. 3.
D irigindo o Mal. Em sua soberania, Deus exerceu autoridade absoluta
sobre um espírito demoníaco e o usou para realizar os seus propósitos:
Fazia três anos que Abimeleque govemava Israel, quando Deus enviou um espírito maligno entre Abimeleque e os cidadãos de Siquém, e estes agiram traiçoeiramente contra Abimeleque. - Juizes 9.22-23
Esta passagem revela Deus controlando um espírito maligno para realizar os seus sapientíssimos propósitos. Segue-se, pois, que mesmo os espíritos malignos são subservientes à vontade soberana de Deus. Segundo toda a sua discrição, Deus pode enviar espíritos demoníacos para realizarem o seu beneplácito. O conhecido com entador C. F. Keil escreve:
Então Deus enviou um espírito maligno entre Abimeleque e os cidadãos de Siquém para que agissem traiçoeiramente em seu 3 M a tth e w H e n ry , M atthew H enry's Com m entary on the Whole Bible (P eab o d y, M A : H e n d r ik s o n P u b lis h e rs, In c., 1991), 3 3 2 .
H o m e n s Fortes com u m a h o r l t M tnsiiíjc ni
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interesse. “Um espírito maligno” não é meramente “uma dispo־ sição má”, mas sim um demônio, um espírito mau, que produzia discórdia e briga, como aconteceu quando um espírito maligno veio sobre Saul. ...Este espírito maligno Deus enviou para punir a iniqüidade de Abimeleque e dos siquemitas.4
Toda essa atividade demoníaca era orquestrada pela soberania de Deus.
A D O U T R IN A EM FOCO DEPRAVAÇÃO TO TA L Conform e a história se desdobra, revela que o estado do coração do homem caído não melhorou. Se houve algo, a natureza hum ana está transm itindo um estado cada vez mais corrupto. O hom em não está ascendendo em sua moralidade, mas está, sim, descendo em espiral para os mais baixos e torpes pecados. O autor de Juizes docum entou essa depravação crescente do coração hum ano por meio de ciclos do pecado recorrente de Israel. A história de Israel daquele tempo foi uma sucessão de fiascos morais. Uma e outra vez o povo de Deus se apartava do Senhor. Tal desobediência surgia a partir da natureza radicalmente corrupta do coração hum ano e dava prova dela. 1.
Trevas Espirituais. Assim como cada geração dá cam inho à próxima,
assim cada pessoa nasce neste m undo sem conhecim ento pessoal de Deus:
Depois que toda aquela geração foi reunida a seus antepassados, surgiu uma nova geração que não conhecia 0 Senhor e 0 que ele havia feito por Israel. - Juizes 2.10
No tempo dos juizes, cada geração sucessiva que entrava em cena não conhecia o Senhor. Esta é a prim eira verdade das doutrinas da graça. H erbert W olf 4 C . F. Keil e E. D elitzsch , Com m entary on the OM Testament, Vol. 2: Joshua, Judges, Ruth, 1 and 2Samuel (Peabody, M A: H e n d r ik s o n P u b lis h e rs, Inc., 1996, 1866-91),264■
154 ןI F U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
escreve: “Eles não conheciam Deus de maneira vital. Eles não viram os milagres sobre os quais os seus pais falavam. As pessoas não podem prosperar dependendo do poder espiritual de seus pais: cada geração precisa experim entar pessoalmente a realidade de Deus”. יTodos os homens nascem sem nenhum conhecim ento de Deus. O não regenerado pode conhecer algo sobre Deus, mas não o conhece. 2.
A fastam ento Espiritual. Todos nascem com uma ruim propensão para
abandonar o Senhor ou para deixá-lo de lado e seguir a prática do pecado:
Então os israelitas fizeram 0 que 0 Senhor reprova e prestaram culto aos baalins. Abandonaram 0 Senhor, 0 Deus dos seus antepassados, que os havia tirado do Egito, e seguiram e adoraram vários deuses dos povos ao seu redor, provocando a ira do Senhor. Abandonaram 0 Senhor e prestaram culto a Baal e a Astarote. - Juizes 2.11-13
Durante o período dos juizes, cada geração praticava o mal aos olhos do Senhor. O abandono de Deus por parte dos israelitas é descrito por uma frase sempre repetida no Livro de Juizes - “os israelitas fizeram o que o Senhor reprova” (Jz 2.11; 3.7, 12; 4.1; 6.1; 10.6; 13.1). Em vez de seguirem Deus, cada geração dedicou-se a seguir outros deuses. Sua depravação inerente os fazia seguir e praticar o mal. Sobre essa depravação Matthew Henry comenta:
Q uando eles abandonavam o único Deus verdadeiro, não se tornavam ateus, nem se faziam tolos a ponto de dizerem: Não há Deus-, mas seguiam outros deuses; enquanto ostentavam pureza
de natureza tendo um Deus, demonstravam ter natureza corrupta por multiplicarem deuses, adotando este ou aquele e seguindo a moda, não a norma do culto religioso.6
5 H e r b e rt W o lf, The Expositor’s Bible Commentary, Vol. 3, e d ito r g e ra l F ra n k E. G a e b e le in ( G r a n d R a p id s, M I: Z o n d e rv a n P u b lis h in g H o u se , 19 92 ),39 4. 6 H e n ry , M attheu ׳H enry’s C om m entary on the W hole Bible, 331.
H o m e n s F orte s c o m u m a F o rte M e n s a g e m
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Essas deserções espirituais d!> povo afastando-se de Deus não eram pertinentes unicam ente às gerações que viveram no tempo dos juizes. Uma disposição para a prática do mal aos olhos do Scnlior existe em todos os corações não regenerados. Aí está a depravação total, a primeira verdade das doutrinas da graça. 3.
Desobediência Ε φ ίπ ιικ ιΐ. Os não convertidos vivem num constante
estado de rebelião espiritual contra Deus. Recusando reconhecer a autoridade divina sobre suas vidas, fazem o que eles determ inam que é certo:
Naquela época ndo luiviti rei em Israel; cada um fazia 0 que lhe parecia certo. - Juizes 21.25
Neste último versículo de Juizes está registrado que as pessoas se negavam a submeter-se à autoridade suprema de Deus sobre suas vidas. Elas se fizeram sua própria autoridade, fazendo o que era certo em sua opinião. Block explica: “Para não suceder que o leitor deixe de captar a tese da narrativa final e do Livro de Juizes como um todo, a narrativa conclui com o refrão. ...São esses os israelitas apóstatas, que não reconhecem rei algum, nem divino nem hum ano”.7 Este é um diagnóstico válido da condição do coração de Israel. O povo padecia de grave pecado durante esse frio e árido período da sua história. E o problema continua sendo o mesmo quanto a todos os não convertidos, em todas as gerações. O não regenerado sempre vive num estado de rebelião contra o padrão objetivo da Palavra de Deus - rebelião que é fruto da depravação total.
O LIVRO DE 1SAM UEL “O DEUS Q U E CHAM A O S PEC A D O R ES”
Sam uel foi o prim eiro autor de ISam uel,
0 prim eiro
dos dois livros
que trazem o seu nom e, tendo escrito a parte inicial que antecedeu sua m orte (ISm 1-25). C om o o últim o juiz, Samuel viveu e escreveu du ran te o tem po 7 Block, 77t£ American Commentary, Vol. 6: Judges, Ruth, 583.
I 156 I F U N D A M E N T O S DA t ; ΚΛ(,’Λ
em que Israel estava em maré vazante espiritual. O sacerdócio era perverso (IS m 2.12-17, 22-25), a arca da aliança fora levada para longe do seu local próprio (ISm 4.3-7.2), prevalecia a idolatria (ISm 7.3-4), e m uitos m em bros da nação eram fraudulentos. Nessa época tenebrosa e difícil, Deus cham ou Sam uel para m inistrar a seu povo, fazendo uso dele par reverter a péssima atm osfera espiritual de Israel. Na vida de Sam uel vemos um breve, mas claro testem unho da graça soberana de Deus para resgatar o hom em caído do jugo do pecado.
T
A D O U T R IN A EM FOCO DEPRAVAÇÃO TOTA L Samuel conhecia muito bem a doutrina da depravação total. Ele viu essa
realidade espiritual em primeira mão. Ele conviveu com essa depravação, tornando-se um a epístola viva sobre essa verdade, e cresceu tendo-a diante dos seus olhos nos filhos de Eli. Samuel conhecia essa depravação e escuridão espiritual do coração hum ano não convertido. 1.
Depravação Espiritual. Todas as pessoas, ainda que criadas por pais
crentes, num ambiente religioso, herdam uma natureza corrupta, contam inada pelo pecado. As influências espirituais do lar e do culto público não são suficientes, porque a raiz do pecado vive nas profundezas do ser hum ano:
Os filhos de Eli eram ímpios; não se importavam com 0 Senhor. - ISamuel 2.12
Sam uel escreveu que os filhos de Eli eram o m elhor exem plo da depravação radical de todos os hom ens, m esm o os que foram criados num am biente religioso. A pesar de terem crescido recebendo a influência de um pai que estava no m inistério, os filhos de Eli eram ímpios, ou indignos, palavra que no original significa literalm ente “filhos de B elial”. O term o Belial é em pregado mais adiante na E scritura com o um nom e para designar
H o m e n s Fortes co m u m a t a r t é M e n xa tfcm
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S atanás em seu reino de trevas (2C 0 6.15). Segue-se, pois, que Sam uel estava dizendo que os filhos de Eli eram filhos do D iabo, nada ten d o de bom esp iritu alm en te. John M acA rthur com enta: ‘“ Filhos de B elial’ era um m odo h ebraico de dizer baixos, indignos ou iníquos. ...O s filhos de Eli eram , de fato, iníquos. ...O s filhos de Eli não tin h am nem experiência nem comunh ão pessoal com o S e n h o r”.8 Em vez de estarem em boas relações com Deus, eles eram de fato filhos de Satanás. Essa depravação in terio r é um a realidade q u an to a todos os não regenerados, en q u a n to não se converterem ao S en h o r (Jo 8.44; 2C o 4.4). 2.
Escuridão E spiritual. Os pecadores não convertidos têm conhe-
cim ento acerca de Deus, mas não o conhecem realm ente. Eles nascem na ignorância espiritual:
Ora, Samuel ainda não conhecia 0 Senhor. A palavra do Senhor ainda não lhe havia sido revelada. - 1 Samuel 3.7
Esse versículo afirma claramente que Samuel não conhecia o Senhor antes de ser chamado por Deus. Ele foi colocado num a posição religiosa diante do Senhor, mas não tinha relação pessoal com ele. Samuel estava na mesma condição de perdido dos filhos corruptos de Eli (2.12). O que é mais, a palavra de Deus ainda não lhe tinha sido revelada. Ele não conhecia Deus simplesmente porque não conhecia a palavra de Deus. C erto é que Samuel pode ter conhecido os fatos cognitivos da lei divina, mas ainda não tinha captado o seu verdadeiro sentido e a sua profunda relevância para a sua vida. Ele ainda não tinha sido iluminado por Deus quanto à mensagem salvadora da sua verdade. A ignorância espiritual da palavra de Deus deixou Samuel na escuridão. C ertam ente essa é a condição espiritual de todas as pessoas não convertidas. Todas as pessoas não regeneradas vivem sob essa m ortalha de escuridão espiritual, sem a luz da graça soberana ( 1 C 0 2.14; 2C0 4.4). 8 J o h n M a c A rrh u r, Th* M acA rth u r Bible C om m entate (N ash v ille, T N : N e lso n R e fe re n c e &. E le c tro n ic , 2 0 0 5 ), 30 6 .
! ןI F U N D A M E N T O S 1)A G H A i / A 58
A D O U T R IN A EM FOCO
II
GRAÇA IRRRESISTÍVEL Se algum pecador há de conhecer Deus, é preciso que Deus tome a iniciati-
va de buscá-lo e salvá-lo. Visto que os hom ens odeiam a luz, eles não vêm para ela (Jo 3.19); ninguém que esteja na escuridão espiritual procurará
0 Senhor por sua
própria iniciativa. Por isso é preciso que, soberanamente, Deus traga luz para o hom em perdido. E necessário que Deus se dê a conhecer àqueles que estão cegos espiritualmente. E preciso que busque o pecador. Aos que Deus busca, estende o seu chamado irresistível, sua poderosa voz de com ando pela qual atrai o pecador para a fé nele. Esse chamado divino torna Deus conhecido ao coração corrupto, induzindo o pecador à conversão. 1. C ham ado D ivino. Deus, pessoalmente, tom a a iniciativa de chamar a si o pecador. Não há ninguém que busque Deus; antes, é ele quem busca o pecador. Foi assim com Samuel:
Então 0 Senhor chamou Samuel. Samuel respondeu: “Estou aqui". E correu até Eli e disse: "Estou aqui; 0 senhor me chamou ?” Eli, porém, disse: "Não 0 chamei; volte e deite-se”. Então, ele foi e se deitou. 1Samuel 3.4-5
Descrevendo a sua conversão, Samuel escreveu que Deus
0 buscou
por sua
graça e que o fez soberanam ente. Afirmando essa verdade, W olf escreve: “Embora Samuel ainda não soubesse que era o Senhor que lhe estava falando (3.7), sua resposta foi típica do servo que ouve e obedece ao chamado divino: ‘Estou aqui’”.9 Se Deus tivesse esperado que Samuel o buscasse, o profeta nunca teria sido salvo. E sempre necessário que o pastor tome a iniciativa de procurar e chamar a si a ovelha, não vice-versa. A graça soberana é graça que busca. 2. C ham ado D efinido. Deus chama a si os seus eleitos individualmente. Esse chamado definido foi dirigido a Samuel: 9 Wolf, The Expositor’s Bible Commentary, Vol. 3, 591.
I lo m c n s Fortes c o m u m a F o rte M e n s a g e m
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De novo 0 Senhor chamou: "Samuel!" E Samuel se levantou e foi até Eli e disse: “Estou aqui; 0 senhor me chamou?” Disse Eli: “Meu filho, não 0 chamei; volte e deite-se".
ISamuel 3.6
Nessa convocação divina, Deus chamou Samuel pelo nome. Esse chamado foi feito a Samuel, e a ninguém mais. O Senhor Jesus chama as suas ovelhas pelo nome (Jo 10.3). Ele chamou Mateus individualmente, dizendo: “Siga-me” (Mt 9.9). Também chamou: “Zaqueu, desça depressa” (Lc 19.5). E quando esteve diante do túmulo de Lázaro, chamou: “Lázaro, venha para fora!” (Jo 11.43). Se Jesus não tivesse dito “Lázaro”, todos os sepultados naquele cemitério teriam saído dos seus túmulos. O convite externo do Evangelho é estendido indiscriminadamente a “todo aquele que quiser”, mas o chamado interior é feito individualmente pelo nome. 3.
Cham ado D om inante. Deus sempre assegura uma resposta favorável no
coração daquele que ele chama interiormente. Nesse sentido, o chamado soberano de Deus é sempre eficaz, sempre eficiente. Sempre leva a efeito o resultado desejado:
O Senhor chamou Samuel pela terceira vez. Ele se levantou, foi até Eli e disse: “Estou aqui; 0 senhor me chamouV’ Eli percebeu que 0 Senhor estava chamando 0 menino. - ISamuel 3.8
Samuel registrou o m odo como o Senhor procurou a desejada resposta em seu coração. Este chamado é uma convocação soberana, um com ando feito com autoridade que prende o coração com a onipotente graça divina, tornando o coração cativo de Deus. O chamado divino sempre obtém o tencionado efeito; não se lhe pode resistir final e definitivamente. Henry afirma esta verdade quando escreve: “O chamado que a graça determ ina tornar eficiente será repetido até que o seja, isto é, até que atendamos ao chamado; pois o propósito de Deus, segundo o qual somos chamados, certam ente permanecerá de pé”.10Esta é a gloriosa vitória da graça soberana nos corações dos eleitos. 10 Henry, Matthew Henry’s Commentary on the Whole Bible, 387.
ן160 ןI U N D A M E N T O S DA G R A Ç A
(SgB) A D O U T R IN A EM FOCO jl
REPROVAÇÃO DIVINA:
'
Samuel ensinou também a doutrina da reprovação relacionada com os
procedimentos de Deus para com os não eleitos. Eles são deixados de lado por Deus no que se refere à salvação, mas permanecem sob a sua influência. As vezes Deus os entrega a seu próprio pecado (Rm 1.24-32). O utras vezes Deus os envia a uma influência enganadora (2Ts 2.9-11). Ainda outras vezes Deus envia um espírito maligno para dom inar e dirigir uma vida. Foi o que se deu com Saul, o primeiro rei de Israel. C onquanto réprobo, não convertido, permaneceu sob o controle soberano de Deus. I.
Com issionando Dem ônios. Deus pode usar espíritos malignos, de-
mônios, para levar a cabo os seus propósitos na terra, enviando-os até para atorm entar réprobos:
O Espírito do Senhor se retirou de Saul, e um espírito maligno, vindo da parte do Senhor, 0 atormentava. Os oficiais de Saul lhe disseram: "Há um espírito maligno, mandado por Deus, te atormentando. Que 0 nosso soberano mande estes seus servos procurar um homem que saiba tocar harpa. Quando 0 espírito maligno, vindo da parte de Deus, se apoderar de ti, 0 homem tocará harpa e tu te sentirás melhor". - ISamuel 16.14-16
De acordo com este relato de Samuel, Deus enviou um espírito maligno para atorm entar Saul,
0 que
redundou em graves problemas mentais e emocio-
nais. Saul continuou sendo responsável por suas escolhas ou decisões, mas Deus controlou soberanam ente o uso desse espírito maligno contra ele. Esclarecendo essa difícil verdade teológica, Calvino declara:
Que o ministério de Satanás se ocupa em instigar os réprobos, sempre que o Senhor os dirige para lá e para cá por sua providência, pode-se provar suficientemente, mesmo de uma só passagem. Pois
H o m e n s F o r t e s c o m u n m F o r t e Ati'HKitifcni
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frequentemente se afirma em Samuel que um espírito maligno do Senhor, e um espírito maligno da parte do Senhor, ou agitava ou deixava Saul... para mostrar que Satanás reina no réprobo e que o Senhor opera neles dois.11
Q uer dizer que Deus controla o Diabo que, por sua vez, controla o pecador. Em tudo isso, Deus continua sendo absolutamente soberano sobre o hom em , sem contudo ser o autor do pecado. 2. D em ônios C ontroladores. Deus pode enviar um espírito maligno a um hom em , enfurecendo-o. E prerrogativa soberana de Deus fazê-lo:
No dia seguinte, um espírito maligno mandado por Deus apoderou-se de
Saul e ele entrou em transe em sua casa, enquanto Davi tocava harpa, como costumava fazer. Saul estava com uma lança na mão. - 1Samuel 18.10
Mais uma vez Samuel escreveu que Deus enviou um espírito maligno a Saul. Esse dem ônio é identificado como “ferino” [na versão utilizada aqui pelo autor]. O propósito divino no uso desse dem ônio foi ferir a alma de Saul. Esse comissionamento divino foi, então, um ato de juízo da parte de Deus. Alexander Maclaren reconheceu e declarou a profundidade aqui presente quando escreveu: “O escritor deste livro sentiu que Deus era a causa última e suprema de todas as coisas, e que todos os seres estavam debaixo do seu controle; e o seu devoto reconhecim ento desse fato levou-o ao aparente paradoxo de traçar a ligação de um ‘espírito maligno’ a Deus”.12 3. Corações C ontrolados. Deus pode usar um espírito maligno, um demônio, para endurecer um coração hum ano a fim de incitar esse coração a pecar. De novo, isso ocorre de acordo com o livre exercício da autoridade soberana de Deus: 11 J o h n C a lv in , Institutes of the Christian Religion ( G r a n d R a p id s, M I: E e rd m a n s P u b lis h in g C o ., 1949), 3 3 8 -3 3 9 . 12 A le x a n d e r M a c la re n , Expositions of Holy Stfipture, Deuteronomy, Joshua, Judges, Ruth, and First Book of Samuel (G ra n d R a p id s, M I: B a k e r B o o k s, 1984), 851.
ן162 ןl - U N D A M E N T O S DA CJRAÇA
Mas um espírito maligno mandado pelo Senhor apoderou-se de Saul quando ele estava sentado em sua casa, com sua lança na mão. Enquanto Davi estava tocando harpa, Saul tentou enaavá-lo na parede com sua lança, mas Davi desviou-se e a lança enaavou na parede. E Davi conseguiu escapar. - 1Samuel 19.9-10
Segundo esse texto, Deus mais um a vez enviou um espírito maligno para o endurecim ento do coração de Saul. Esse endurecim ento tinha o propósito de incitar o primeiro rei de Israel a atacar Davi. Em conformidade com a vontade soberana de Deus, ele usa Satanás e dem ônios para levar a efeito os seus propó׳ sitos pelo endurecim ento dos corações reprovados. Keil explica: “O pensamento expresso é que o aum ento da melancolia de Saul era um sinal da dureza de coracão à qual Jeová o tinha entregado por causa da sua im penitência”.1’ Em todos esses casos, o hom em continua sendo responsável por suas escolhas ou decisões, mas Deus continua soberanam ente no controle, dirigindo todas as coisas para os seus próprios propósitos.
O LIVRO DE 2SAM UEL: “DEUS, O C O N T R O L A D O R DE SATANÁS E D O MAL”
O curso da história de Israel em ISamuel continua ininterrupta em 2Samuel. Vemos aqui o tempo bastante antecipado de Davi assumir o trono de Israel, o que ocorreria após a morte de Saul. Essa entronização antecipada está registrada nos capítulos iniciais de 2Samuel, e o espaço de quatro décadas do seu reinado (1010-970 a.C.) é coberto pelo conteúdo da plena extensão do livro. Os sucessos de Davi são descritos aqui, como o de fazer de Jerusalém
0 centro m ilitar
e espiritual de Israel, como também são descritos os seus fracassos - os danosíssimos pecados de seu adultério com Bate׳Seba; o assassinato do seu marido, Urias; e a falsa confiança de Davi no recenseamento do povo. Por conseguinte, 2Samuel 13 Keil, Commentary on the Old Testament, Vol. 2: Joshua, Judges, Ruth, 1 and 2Samuel, 495.
H o m e n s F or te s c o m u m a Forte M e n s a g e m
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é mais um imbatível testem unho da depravação do hom em e da soberania de Deus. Enquanto a história da redenção continua a desdobrar-se, a soberania de Deus sobre os corações dos hom ens continua constituindo um foco de atenção.
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A D O U T R IN A EM FOCO SOBERA NIA D IV IN A O autor de 2Samuel afirmou o envolvimento soberano de Deus nas vidas
das pessoas, mesmo daquelas que tinham caído em pecado. Especificamente, ele tratou do assunto do controle de Deus sobre Satanás e sobre o mal para os seus propósitos. A noção absurda de que Deus e Satanás são superpotências iguais, não som ente é, teologicamente, um odioso fracasso, mas é tam bém blasfêmia moral. Este livro mostra que unicamente Deus é soberano absoluto sobre tudo e sobre todos, e que faz uso de Satanás e do mal como lhe apraz. 1. C ontrolando o Mal. Deus não é o autor do pecado, mas é preciso entender que ele usa o mal para levar adiante os seus propósitos:
“Assim diz 0 Senhor: ‘De sua própria família trarei desgraça sobre você. Tomarei as suas mulheres diante dos seus próprios olhos e as darei a outro; e ele se deitará com elas em plena luz do dia. Você fez isso às escondidas, mas eu 0 farei diante de todo 0 Israel, em plena luz do dia’”. - 2Samuel 12.11-12
O
mal em vista aqui era a conspiração de Absalão contra seu pai, Davi. Foi
um mal provocado por Deus. C ertam ente a revolta de Absalão foi pecaminosa, como pecaminoso foi ele tom ar as mulheres de Davi. Foi grave pecado de Absalão não honrar seu pai, quebrando o quinto m andam ento. Mas, apesar de Absalão ter pecado contra Deus, seus atos são aqui retratados como males levantados por Deus contra Davi. Edwin H. Palmer escreve: Davi cometeu adultério com Bate-Seba. Deus disse que ia punir Davi com