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A ÉTICA COMO PRINCÍPIO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA Sandra Pereira Eduardo José Legal Curso de Especialização em Psicopedagogia Resumo A educação e a ética caminham juntas na formação de seres humanos livres, respon sáveis, fraternos , solidários, em suas interrelações mútuas e com a natureza. Assim como a educação formal, o comportamento ético também se constrói concomitantemente com o desenvolvimento intelectual intelectual da humanidade no seu processo de busca do conhecimento. A educação (formal ou não) é o meio de construção e reconstrução de valores e normas. A ética é fundamental nas relações de aprendizagem, aprendizagem, pois, sendo uma conduta que permeia esses processos, à medida que o aprendente desenvolve conhecimento, conhecimento, aprende as regras e normas implícitas nele. Este artigo tenta contribuir para a reflexão social e pedagógica sobre os princ ípios éticos de vida e sua importância na formação do sujeito.
1. INTRODUÇÃO A conduta ética é uma conseqüência de um pensamento ético e isso implica considerar o bem-estar das outras pessoas, começando pelas mais próximas com as quais convivemos em nosso dia-a-dia. Agir eticamente é perceber percebe r que somos membros de uma comunidade, e não indivíduos isolados. Assim como uma estrela não brilha se não houver aurora, assim também uma ética não emerge se não houver previamente uma ambiência que permite sua formulação. O ethos assume então seu caráter originário de habitat humano, aquela parte do mundo que foi domesticada, amada, originada para ser a casa do ser humano, onde reencontra um útero protetor. Essa ambiência é formada pela ternura e pelo cuidado (BOFF, 2000, p.117).
Vivemos em um contexto pluralista. Há uma diversidade étnica e cultural bastante conhecida em nosso país. Neste contexto, a escola é, também, um lugar para o diálogo, construção const rução com o diferente (opostos), de aprendizagem sobre a convivência humana, do respeito. É um local rico em oportunidades para que os educandos trilhem o caminho da ética e da moral respeitando essa diversidade cultural. Nossa postura como educadores deve se pautar em uma consciência ética que se transmita por meio do nosso fazer profissional. Sabendo que a conduta ética se constrói durante as relações com seus pares, família e instituições, torna-se imprescindível que o trabalho do educador seja guiado pelos preceitos éticos. A escola é o primeiro espaço público que a criança vivencia e cuja organização é distinta da família. Novas N ovas experiências sociais colaboram para a construção moral. Neste sentido, a escola também participa, e a família não é a única responsável pela educação moral e ética das crianças e adolescentes. Todos nós queremos que nossas vidas sejam dignas e respeitadas. A lógica da transversalidade permite que questões éticas sejam abordadas pelos educadores com a colaboração das várias áreas do desenvolvimento do conhecimento. Todas as disciplinas escolares, em seus conteúdos, podem possibilitar a reflexão mediadora à luz de diferentes pontos de vista v ista (situações, conflitos, negociações, etc.). Em História, por exemplo, as guerras
podem ser exploradas como oportunidades para debater os interesses em jogo; em Português, os modos culto ou popular de falar nossa língua, assim como os vários sotaques, podem servir de ponte para a discussão das diferenças culturais e regionais; em Ciências, as questões ambientais, os cuidados com a saúde, etc. O presente artigo foi articulado em seis etapas. A primeira traz o entendimento sobre ética e moral enquanto palavra propriamente dita: Moral versus Lei e ética, em uma reflexão sobre a ação humana; uma síntese de idéias éticas numa visão dos grandes pensadores. A segunda etapa discorre sobre a importância do comportamento comportamento ético na sociedade e sua relação com as representações culturais. A terceira etapa apresenta a educação como o ato mediador e propiciador dos valores humanos e humanizadores e o professor como agente desse processo. A quarta etapa discute a importância do comportamento ético do educador na escola e na sociedade, ou seja, do modelo educacional. A quinta etapa reflete sobre a importância da escola no processo do desenvolvimento ético e moral dos aprendentes, possibilitando a formação de seres humanos mais críticos. Por fim, nas considerações finais, apresentamos sugestões suge stões sobre a postura que deve tomar o educador, trabalhando os valores éticos e morais na sua pluralidade cultural.
2. ÉTICA E MORAL: DISTINÇÕES NECESSÁRIAS Definir e compreender o que é ética se apresentam como um desafio que acompanha a humanidade desde que surgiu a preocupação com o bem-estar e a sobrevivência dos grupos organizados que ocupavam o planeta (SANTOS, 2001). Ética é tema de estudo e trabalho dos pesquisadores e estudiosos das relações e da organização humana no que se refere à manutenção e propagação da vida. Trata-se de um conhecimento que perpassa todas as ações humanas e que interfere diretamente no futuro do nosso planeta. A definição grega da palavra ética encontra-se em ethos, que quer dizer costume, disposição, hábito, e no latim, mos (moris ), significando vontade, costume, uso, regra, teoria da
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natureza do bem e como ele pode pod e ser alcançado. “A ética é a teoria ou a ciência do comportamento moral dos homens em sociedade, ou seja, é ciência de uma forma específica de comportament compo rtamentoo humano” hu mano” (VASQUEZ, 2000, p.23). A ética vai além da obediência às regras e normas sociais. Atua no campo dos conflitos das relações humanas. Não soluciona questões polêmicas, mas seu objetivo é justamente investigar, procurar a reflexão. A ética pressupõe uma busca racional de como as pessoas devem viver para ter uma vida boa. (SANTOS. 2001) O ser humano, de natureza organizativa, está em busca permanente de satisfação, prazer e bem-estar. Insatisfeito com as limitações impostas pela vida, norteada pelas características ambientais e por sua própria forma de encarar e lidar com os desafios com os quais se defronta a cada dia, o homem constrói, de forma ininterrupta e inacabada, uma sabedoria. Todas as organizações humanas têm suas leis que se norteiam também pelo ethos, como uma forma de vida melhor para elas. Boff (2000), ao definir ética, insiste ins iste ser necessário que os humanos se voltem ao sentido originário da ética e da moralidade. A ética pertence à natureza humana, presente em cada pessoa, enquanto a moral são as distintas formas de expressão cultural e histórica da forma como viabilizam a proposta da ética. A ética existe prioritariamente no singular, uma vez que pertence à natureza humana, presente diferentemente diferen temente em cada pessoa. Assim, a ética é diferente para cada um e é dependente do local onde ocorre. Fazer o bem implica, necessariamente, como e para quem. A moral, então, determina o modo como a ética deve ser exercida e com quem. VASQUEZ (2000, p.21) aponta que [...] a ética é teoria, investigação ou explicação de um tipo de experiência humana ou forma de comportamento dos homens, o da moral, considerado, porém, na sua totalidade, diversidade e variedade. Ela se ocupa de um objeto próprio: o setor da realidade humana que chamamos moral, constituído por um tipo peculiar de fatos ou atos humanos.
A ética não cria a moral, mas se depara com uma série de práticas morais já em vigor; ela é referência para que a escolha do sujeito seja aceita como um princípio geral que respeite e proteja o ser humano no mundo. A ética tem a moral como base de estudo, analisa as opções que os seres humanos fazem, verifica se essas estão de acordo com os padrões sociais ou com aquilo que se considera a melhor forma de agir coletivamente. Por meio da ética, podemos nos perguntar criticamente criticament e sobre a consistência e coerência dos valores que norteiam suas ações e busquem sua fundamentação para que elas tenham significado autêntico em suas relações sociais. A ética está sempre ancorada à qualidade de vida, não simplesmente com a vida. Ética está ligada à forma de vida e a comportamentos humanos que garantem garant em uma qualidade de vida melhor, que tem a ver com a proteção, com co m a provisão e com a segurança. Ao conjunto escolhido e organizado de problemas, soluções e respostas que a humanidade gerou para si dá-se o nome de cultura humana. Entre as várias possibilidades de atividades, há aquelas julgadas melhores e aquelas julgadas piores. As melhores são aquelas indicadas como mais eficazes
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para a realização dos indivíduos; piores são aquelas menos eficazes ou eventualmente ruinosas para a realização ou bem do homem. Moral é um conjunto de hábitos e costumes efetivamente vivenciados por um grupo humano, ou seja, por uma sociedade. Nas culturas dos grupos humanos, estão presentes hábitos e costumes considerados válidos porque são bons; bons porque são justos; justos porque contribuem para a realização dos indivíduos. Atos gerados conforme esses hábitos serão julgados morais ou moralmente bons. Por outro lado, há hábitos e costumes considerados inválidos porque maus; maus porque injustos; injustos porque atrapalham ou impedem a realização dos indivíduos. Esses atos gerados conforme esses hábitos serão julgados como imorais ou moralmente maus. Injustos porque atrapalham ou impedem a realização dos membros. Esta lógica vai estabelecer os padrões para a prática dos costumes e hábitos e o próprio grupo. Embora “moral” e “ética” sejam, na base, sinônimas, é possível aproveitar a existência de duas palavras para atribuir significados diferentes, mas sempre complementares às duas palavras. Segundo Taille (2001, p.68), “[...] pode-se chamar de moral as diversas regras e valores dos homens e de ética o estudo destas regras e valores [...]”. A moral refere-se às leis que normatizam as condutas humanas, humanas , e a ética corresponde aos ideais que dão sentido à vida. 2.1. LEI X MORAL E ÉTICA Moral é um conjunto de hábitos e costumes efetivamente vivenciados por um grupo humano. São considerados válidos porque são bons e justos, pois contribuem para a realização dos membros do grupo. Os hábitos e costumes inválidos são aqueles maus. A moral é cumprida por meio das leis, que são acordos de caráter obrigatório para garantir justiça e direitos mínimos do ser. Portanto, as leis e a moral possuem semelhanças como instrumentos de justiça humana, originando-se das necessidades humanas, partindo de sua história, do seu jeito de organizar-se e conviver. Enfim, ambas podem ser questionadas quando não conseguem promover a paz e o bem comum (SANTOS, 2001). Existem, também, diferenças entre a moral e a lei. A moral é um instrumento informal que apresenta possibilidades de variações conforme o grupo, indicada como conteúdo bom ou mau que pode ser escolhido pelo grupo. Quando Q uando é rejeitada por um membro, provoca a rejeição do grupo pelo transgressor. transgresso r. Já a lei é um instrumento formal, escrito e promulgado, que também se apresenta como sistema jurídico único para o grupo. A lei é passível, apenas, de interpretações variáveis e, ao ser transgredida, impõe penalidades. É, portanto, obrigatória. Ética é a reflexão sobre a ação humana. Ela não impõe moral e lei, mas propõe caminhos possíveis para o aperfeiçoamento aperfeiçoamento de ambas. Como salienta Vasquez (2000), por causa de seu caráter prático, enquanto disciplina teórica, tentouse ver na ética uma disciplina normativa cuja função prin cipal seria a de indicar o comportamento melhor do ponto de vista moral. A caracterização da ética como disciplina normativa pode levar – e, no passado, freqüentemente a levou – a esquecer seu
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caráter propriamente teórico. Certamente, muitas éticas tradicionais partem da idéia do que devem fazer, ditando normas ou princípios pelos quais pautam determinados comportamentos. O ético transforma-se, assim, em uma espécie de legislador de comportamento moral dos indivíduos e da comunidade. Mas a função da ética é a de teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade, elaborando os conceitos correspondentes. 2.2. IMPORTÂNCIA DO COMPORTAMENTO ÉTICO NA SOCIEDADE Visto que todo ser humano é um animal social dentro de muitos sistemas, a ética aparece como a ciência da conduta ideal dentro de uma comunidade. Seria incabível pensá-la para indivíduos isolados, pois po is a ética é gerada a partir da convivência com outros seres humanos. No meio social, tudo quanto o indivíduo faz projeta conseqüências conseqüênc ias que afetam a vida de outras pessoas. A existência do espaço social e do espaço individual é inegável. Indivíduos existem existem em grupos, como um no grupo, ou seja, é a célula mater geradora da sociedade e a gera para seu serviço. As instituições, formas organizadas das práticas sociais consideradas válidas por suprirem bem as necessidades individuais, são necessárias enquanto mecanismos do contrato de convivência. Para Aristóteles, as virtudes humanas eram funções que o indivíduo deveria esforçar-se em seu favor, no desenvolvimento pessoal, ou seja, fazer de si mesmo um elemento singular dentro de uma sociedade (SANTOS, 2001). Porém, a função funçã o ocupada pelo indivíduo deve existir a fim de melhorar melhora r a sua comunidade, pois aquele que se desenvolve bem e serve ao próximo é considerado um ser humano virtuoso. A ética social se faz necessária neste novo milênio como uma prática social participativa, mesmo que seja, inicialmente, em pequena escala, mesmo dentro das casas dos indivíduos. Ela é o objeto da reflexão ética porque permite questões de valores e os interesses que sustentam as formas de atuação social, por meio do ensino da cidadania, e dimensiona os limites a serem implantados ou ampliados. A troca entre os membros do grupo sugere uma aprendizagem significativa e, ao mesmo tempo, cria possibilidade de lidar com muitas verdades, ensinando o indivíduo a conviver com o diferente. O convívio social amplia as possibilidades iniciais e apresenta formas distintas de proceder no âmbito público, promovendo transformações efetivas nas atitudes e procedimentos, decorrentes também na resignificação de valores. Promover espaços participativos faz parte de uma atuação social comprometida com os princípios de liberdade, na pluralidade, e da colaboração. Tal compromisso traz implícita uma prática social empenhada com intervenções na realidade, capazes de provocar transformações nos modos de agir e pensar de um grupo social ou indivíduos que estejam expostos a um processo de formação intencional e deliberado. (NUNES; SCLIAR, 1998, p.4).
2.3. ÉTICA E EDUCAÇÃO A questão ética é universal e há necessidade de refletir
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sobre ela como um todo. As conquistas de uma sociedade secularizada, pluralista e voltada ao enriquecimento próprio fizeram o ser humano dar mais valores aos bens materiais do que ao valor pessoal e à vivência comunitária dos valores. Lembrando que ética deve estar presente na família e na escola, como no conjunto da sociedade, pais e educadores dev em assumir os princípios fundamentais da pedagogia ética. É neste momento que devemos refletir sobre a ética e a educação. Uma grande dificuldade encontrada pelos educadores é desenvolver um raciocínio moral e ético bem fundamentado, sem violar a liberdade e frustrar as aspirações dos educandos. Desde que se entenda por educação o conjunto das ações visando a permitir e facilitar ao educando o harmonioso e pleno auto desenvolvimento de si mesmo, tanto no campo da convivência como na construção do conhecimento, no equilíbrio dos sentimentos e nas habilidades indispensáveis ao provimento e satisfação de suas necessidades e da comunidade em que vive, não é difícil compreender que a educação envolve a totalidade do ser humano e se estende a todas as facetas do seu agir (CATÃO, 1997, p.120).
Observar a complexidade do ser humano é deixar perigosamente ocultos alguns aspectos integrantes do seu agir, restringindo a educação a determinados setores da vida humana, omitindo a relação com o outro ou, mesmo, negando-os. A educação anteriormente mencionada seria defeituosa, aleijada, pois estaria se concentrando somente no ensino teórico, na transmissão de conceitos e informações abstratas, abstratas, desprezando o lado psíquico-afetivo do educando e a sua sociabilidade. Portanto, essa escola seria, simplesmente, uma agência de mão-de-obra em função do mercado de d e trabalho. O processo mais indicado seria permitir aos nossos alunos a autonomia intelectual, ou seja, oportunizar que eles pensem criticamente sobre determinada situação, ao contrário de sobrecarregá-los com informações. Segundo Santos (2001, p.23), “O currículo que proporciona autonomia intelectual é amplo, isto é, lida com a dimensão humana global, informando amplamente e incentivando a investigação dos sujeitos a respeito de suas necessidades biológicas, sociais e transcendentais em pé de igualdade [...]” A relação íntima entre a educação e a ética é que ambas têm sua raiz no agir humano: “[...] educar é mais do que submeter às leis ou usufruir os próprios direitos, pois tanto a aquisição de conhecimento como a submissão às leis ou a reivindicação d os direitos deixam de ser humanizantes quando desvinculados da prática ética” (CATÃO, 1997, p.131). Trabalhar com ética não é simplesmente colocá-la no currículo escolar, como uma disciplina a mais, nem mesmo propor maior ênfase em outras disciplinas. A ética deve estar presente em todo o processo educacional, pautando-o e ajudando a desenvolver as ações humanas. A sala de aula é um espaço muito rico em informações, conhecimentos. conhecimentos. É um momento privilegiado de assimilação, críticas e aprimoramento. Santos (2001) salienta que q ue assimilar é apropriar-se das informações disponíveis no meio cultural, construí-las construí-las para si. Criticar é julgá-las se importantes, valiosas, necessárias, para si. Aprimorar é propor mudanças ou inovações inovaçõ es otimizadoras para a informação assimilada e criticada (SANTOS 2001). Professores e alunos são elementos únicos do processo mencionado por Santos. Portanto, devem assimilar, criticar e se apropriar juntos. O professor é o maior interessado em propiciar
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esse momento, pois é ele que inicia esse processo, não esquecendo, também, que é o principal exemplo para o educando. 2.4. A POSTURA ÉTICA DO EDUCADOR O que significa, hoje, ser educador em nossa sociedade brasileira? O que é necessário para o edu cador cumprir a sua postura ética de educador? O que compete ao educador na construção de nossa sociedade? Para responder a todos esses questionamentos, faz-se necessário levar em consideração as instituições onde se desenvolve a prática educativa. A escola é uma instituição instituição social que deve (pelo menos idealmente) transmitir o conhecimento sistematizado, ampliar a visão dos valores e da cultura co mo é entendida por meio do desenvolvimento de uma postura crítica. Essa postura crítica, por sua vez, intervém na realidade dos seres humanos transformando-a e transformando-os. A escola não é uma instituição abstrata.Tem suas características específicas e cumpre uma função determinada à medida que está presente e é constituinte de uma sociedade que se organiza e que a organiza também. É nesse espaço que o educador exerce sua profissão. A idéia de profissão nos remete à de ofício, guardando o sentido de dever, de obrigação. E o exercício relaciona-se à idéia de atividade, de trabalho. O educador, enquanto profissional, trabalhador de uma determinada sociedade, tem que desenvolver sua profissão com a o brigação de sério compromisso e responsabilidade. Arroyo (2000) mostra-nos que ser mestre é um modo de ser e um dever-ser. Ser pedagogo de nós mesmos. Ter cuidado cuida do com nosso próprio percurso humano para, assim, podermos acompanhar o percurso das crianças, adolescentes e jovens. É uma conversa permanente com nós mesmos sobre a formação. O educador tem a função de criar condições para que o educando aprenda sozinho. Assim sendo, o educador deve conhecer muito bem o assunto que está ensinando. Um fraco domínio do conteúdo resulta um ensino deficiente. Ensinar Ensin ar de fato não é passar conhecimento, mas estimular o edu cando a buscá-lo. A tarefa do educador é despertar a mente do educando, é estimular idéias por meio do exemplo, da simpatia pessoal e de todos os meios que puder utilizar para isso; é fornecer aos educandos lições objetivas para os sentidos e fatos para a inteligência. Educadores que vão para a sala de aula totalmente despreparados ou preparados em parte são como mensageiros sem mensagem. Faltam-lhes a energia e o entusiasmo necessários para produzirem os resultados que os alunos devem esperar de seu trabalho.
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e solidariedade sejam vivificados e compreendidos pelos educadores como aliados à perspectiva de uma “vida boa”. Dessa forma, não só os alunos perceberão que esses valores e as regras decorrentes são coerentes com seus projetos de felicidade, como serão integrados às suas personalidades (SANTOS, 2001). Outro dado importante refere-se ao fato de que não basta ensinar conceitos e valores democratizantes. É preciso que eles sejam “vivificados” no convívio intra-escolar, entre os pares da ação escolar, especialmente entre professores professor es e alunos. É esse, no nosso entender, o grande diferencial, ou ponto de partida , para uma discussão abrangente sobre a ética no terreno escolar. Construir o pensamento ético e moral no aluno não é algo visível nem imediato; esses valores se constroem constroe m no convívio com o outro, nas ações do dia-a-dia. Além de dedicar a atenção a determinados valores, o educador deve assumir o compromisso com a sua ação pedagógica. É de grande importância que o educador planeje atividades específicas para reflexão dos alunos sobre o comportamento humano, oportunizando, assim, que cada um se analise, se expresse e traga, para discussão em sala, exemplos de situações sem apontar o defeito de outro. Educação é a forma que as pessoas encontram para significar o seu mundo, entendê-lo e adaptar-se a ele ou, então, transformá-lo. Ahlert (1999, p .154) salienta que, [...] através de um processo de interação entre educadores e educandos, reproduz-se o modo de ser e a concepção de mundo que esses povos foram construindo ao longo de sua história. Nesse processo acontece a construção dos nossos novos conhecimentos, técnicas e formas para a reprodução da vida
É nessa criação e recriação de conhecimentos, em práticas cada vez mais diferentes, no sentido de mais diálogos, dinâmicas e participação, que vamos preparando novas gerações, preparando novas sociedades, sociedade s, transmitindo culturas e formas de trabalho, assim socializando processos produtivos. O ser humano, enquanto ser histórico, se constrói na relação entre a herança sistêmica dos mecanismos que dão funcionalidade às sociedades e as culturas, compreendida compreend ida como um reservatório simbólico construído pelas gerações passadas. Uma educação ética tem o desafio de refletir criticamente sobre as moralidades. Seu papel emerge no mundo da prática, nas interações sociais. A ética e a moral na educação de nossos alunos possibilitam a formação de um ser humano mais flexível. Um ser humano capaz de começar por uma profissão e adaptar-se a outra, com competência de aprendizagem permanente, interagindo com a realidade, tornando-se um ser humano criativo capaz de construir opções infinitas para uma cidadania globalizada. O objetivo ético é que os indivíduos indivíduo s possam realizar um desenvolvimento sustentável que satisfaça às necessidades das gerações presentes sem sacrificar as gerações futuras; que promova qualidade de vida sem comprometer a sustentabilidade 2.5. A ESCOLA NO PROCESSO DO dos ecossistemas; que estimule a vida comunitária e a cidadania; DESENVOLVIMENTO ÉTICO E MORAL que efetive o direito inalienável das crianças. Para isso, a educação precisa garantir um processo alfabetizador que ca pacite para a A necessidade de elaborar uma ética a partir do sujeito lectoescritura (leitura e escrita) e para uma alfabetização não tem a pretensão de modelar o educando, e sim de fornecer sociocultural (para viver em comunidade). elementos para que ele mesmo encontre o caminho da convivência A educação deve se agregar aos quatro pilares da na liberdade. educação: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver O trabalho de ensino e o convívio dentro da escola devem juntos e aprender a ser. Ahlert (1999) comenta que uma educação ser organizados de maneira que os conceitos de justiça, respeito com fins éticos constrói conhecimentos preocupados com a
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humanização e a realidade da vida, elimina o individualismo e o egoísmo da moral liberal e estimula a cooperação e solidariedade das novas gerações.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Vivemos momentos de conflitos familiares, guerras, incompreensões, egoísmo e tantas diferenças sociais, culturais, religiosas, políticas e econômicas que nada mais justo do que repensar a ética contemporânea. A escola é um espaço que propicia as relações humanas, permite que as crianças e os adolescentes possam conviver com as diferenças, aprender a respeitar os companheiros, compartilhar, compartil har, aceitar perdas e como lidar com hierarquias. A ética ilumina a consciência humana, sustenta e dirige as ações humanas, norteando a conduta individual e social. É um produto histórico-cultural e, como tal, define, para cada cultura e sociedade, o que é virtude, o que é o bem e o mal, certo ou errado, permitido ou proibido. Dessa forma, a ética é universal enquanto enqu anto estabelece um código de normas morais válidas para todos os membros de uma determinada sociedade e, ao mesmo tempo, tal código é relativo ao contexto sociopolítico, econômico e cultural onde vivem os sujeitos éticos e onde são realizadas suas ações morais. A falta de ética prejudica o doente que compra remédios caros e falsos; prejudica a mulher, o idoso, o negro e o índio, recusados no mercado ou nas oportunidades culturais; prejudica os analfabetos no acesso aos bens econômicos e culturais; prejudica as pessoas com necessidades especiais (físicas, mentais e espirituais) a usufruir a vida social; alimenta a discriminação e a humilhação. O valor ético do esforço humano é variável em função de seu alcance em face da comunidade. Se o trabalho executado é só para auferir renda, em geral, tem seu valor restrito. A educação deve sempre estar comprometida com os valores éticos. Portanto, educar não é somente informar ou transmitir conhecimentos, mas também integrar o educando em uma cultura com co m características particulares, com língua, tradições, crenças e estilos de vida da sociedade. Assim, o educador contribui na formação de seus educandos por meio de seu exemplo de comportamento ético, da sua própria história de vida, das regras de convivência que são estabelecidas ou construídas na sociedade. Temos que repensar qual sociedade estamos formando e qual queremos formar: Que postura devemos tomar? Quais são os valores éticos que podem ser compartilhados entre pais, educadores e educando? A nossa mudança de atitude contribuirá para a construção de uma nova sociedade e de uma nova ética que nos aponte um caminho melhor para dar um sentido mais profundo às nossas vidas. Vivemos em uma sociedade que parece esquecer seus cidadãos mais humildes ou, então, que deturpa o concei to de cidadania. Vivemos numa realidade social que é cruel para aqueles cujos direitos são negados, colocando-os à margem de uma vida digna. Este é o grande desafio da educação: formar os educandos para a cidadania ativa e para a consciência ética, criando instrumentos instrumentos para que possam atuar na transformação dessa realidade. Esse desafio inclui, também, os educadores que devem
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servir como exemplo de postura ética.
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