ESTUDOS DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveillea Reveilleau u Tatiane de Souza da Anhaia
c
o
l
e
ç
ã
o
didática
UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO
José Carlos Carles Carles de Souza Reitor
Neusa Maria Henriques Rocha Vice-Reitora de Graduação
Leonardo José Gil Barcellos Vice-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação Pós-Graduação
Lorena Terezinha Geib Vice-Reitora de Extensão e Assuntos Comunitários
Agenor Dias de Meira Júnior Vice-Reitor Administrativo
UPF Editora
Carme Regina Schons Editora
CONSELHO EDITORIAL
Altair Alberto Fávero Alvaro Della Bona Ana Carolina Bertoletti de Marchi Andrea Poleto Oltramari Carme Regina Schons Cleiton Chiamonti Bona Elci Lotar Dickel Fernando Fornari Graciela René Ormezzano João Carlos Tedesco Tedesco Renata Holzbach Tagliari Rosimar Serena Siqueira Esquinsani Sergio Machado Porto Zacarias Martin Chamberlain Pravia
ESTUDOS DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau Reveilleau Tatiane de Souza da Anhaia
2011
Copyright © Editora Universitária Maria Emilse Lucatelli Editoria de Texto
Sabino Gallon Revisão de Emendas
Alisson Gampert Spanemberg] Produção da Capa
Sirlete Regina da Silva Projeto gráfico e diagramação
Mario Geovani dos Santos Desenhos
Este livro no todo ou em parte, conforme determinação legal, não pode ser reproduzido por qualquer meio sem autorização expressa e por escrito do autor ou da editora. A exatidão das informações e dos conceitos e opiniões emitidos, as imagens, tabelas, quadros e figuras são de exclusiva responsabilidade dos autores.
ISBN –
978-85-7515-463-2
UPF EDITORA Campus I, BR 285 - Km 171 - Bairro São José Fone/Fax: (54) 3316-8373 CEP 99001-970 - Passo Fundo - RS - Brasil Home-page: www www.upf.br/editora .upf.br/editora E-mail:
[email protected]
Editora UPF afiliada à
Associação Brasileira das Editoras Universitárias
À comunidade surda pela trajetória da aprendizagem...
Sumário Apresentação ..................... ........................................... ............................................ ............................................ ................................8 ..........8
1 Conhecer e reconhecer a diferença nas nas relações relações de aprendizagem .........10 .........10 Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
2 Indagações iniciais..................... ........................................... ............................................ ............................................12 ......................12 Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau Tatiane de Souza da Anhaia
3 “Ser surdo” ............................ .................................................. ............................................ ............................................ ..........................14 ....14 Ângela Mara Berlando Soares Monique Giusti Reveilleau
4 Retrospectiva histórica da educação e da cultura surda .................... ............................18 ........18 Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
5 Língua de sinais ................................ ...................................................... ............................................ .....................................22 ...............22 Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau
6 Sinais básicos das libras ..................... ........................................... ............................................ ....................................29 ..............29 Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau Tatiane de Souza da Anhaia
7 Perspectivas da educação de surdos ao longo da história Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Tatiane de Souza da Anhaia
8 Aquisição da linguagem pela criança surda ............................. ............................................... .................. 67 Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
9 O tradutor/intérprete de língua de sinais ................................ ..................................................74 ..................74 Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
10 Alteridade: constituição subjetiva do ser humano ......................... .................................... ........... 77 Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Referências ..................... ........................................... ............................................ ............................................ .................................79 ...........79 Sobre os autores ..................... ........................................... ............................................ ............................................ ......................... ... 81
Apresentação uando uma instituição como a UPF determina o cumprimento de sua excelência na formação docente, busca contemplar todos os espaços possíveis no eixo ensino-aprendizagem. Para isso, a Divisão de Graduação lançou o edital para participação no pro jeto Série de Livros Didáticos. Nesse sentido, o colegiado da disciplina de Libras do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), e profissionais vinculados ao Setor de Atenção ao Estudante (SAEs) 1 dedicaram-se à produção desta obra, processo que se fez com muito entusiasmo e enorme afinco.
8
Como toda língua, a língua brasileira de sinais (libras) é dinâmica, reformula-se constantemente, possui estrutura gramatical. Por esse motivo, a organização deste material teve o cuidado de propor um desenvolvimento gradual em contexto, dirigido aos alunos e futuros professores, em formato atual, acessível e prático. A equipe elaborou com propriedade textos pertinentes e ilustrações detalhadas, conjugando suas performáticas, características, crenças e verdades. Para aprender toda e qualquer língua, além de conhecer seus aspectos sintáticos, morfológicos ou fonológicos, é relevante integrar-se à cultura inerente à mesma, pois só assim é possível assimilar a capacidade de comunicação, a qual justifica a sua existência. O resultado não poderia ser diferente, porque desde o início houve clareza no objetivo: desenvolver uma obra que preencha a lacuna no processo de formação dos futuros professores, ora acadêmicos dos cursos de licenciatura, configurando-se como importante subsídio para sua aprendizagem sobre as temáticas da surdez e da libras. Na mesma medida, estende-se aos estudantes e professores dos demais cursos de graduação e pessoas interessadas, que, com o acesso às informações contidas na obra, têm a oportunidade de ampliar os conhe1
Setor da UPF que desenvolve programas programas e ações que garantem a acessibilidade das pessoas com deficiência. Estudo da língua brasileira de sinais
cimentos e ressignificar concepções acerca dos temas abordados, intervindo positivamente no processo de inclusão social e educacional. Despertar interesse em aprender libras é uma das conquistas desse projeto pela simples razão de que o planejamento levou em conta a importância do encantamento contido em toda linguagem. Dessa forma, esta obra apresenta técnicas para que os aprendizes consigam compreender e utilizar de fato os conhecimentos que a proposta oferece. A equipe pensa e atua com muita seriedade e competência. Dessa maneira, aprendendo a nos inserir no universo humano, podemos imaginar um mundo melhor. melhor. A linguagem humana, em sua abrangência e complexa diversidade, diversidade, nasce da necessidade de comunicação, de estabelecer as relações humanas e, sobretudo, cidadãs. Dora Angélica Segovia de Rodrigues Mestra em Letras, Professora da área de Línguas Estrangeiras e docente nos cursos de Letras e Secretariado Executivo da Universidade de Passo Fundo
9
Estudo da língua brasileira de sinais
1 Conhecer e reconhecer a diferença nas relações de aprendizagem Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
10
ara que a aprendizagem aconteça, a relação entre os protagonistas é de grande relevância. Se partirmos da premissa de que os sujeitos ora aprendem, ora ensinam, estabelecemos uma relação de complementaridade, de troca, de interação. Entretanto, En tretanto, como atingir esse ideal se os alunos são diferentes entre si, com muitas peculiaridades? A heterogeneidade é característica das sociedades porque o sujeito é, por natureza, singular, e nesse contexto nos deparamos com a diversidade de modos de ser, ser, de aprender, de construir o conhecimento. Nas relações de aprendizagem entre surdos e ouvintes, é fundamental conhecer a diferença, pois a partir dela compreendemos os processos de ensinar e aprender. Noutros tempos nos contentávamos com uma relação de ensino linear, linear, como se as pessoas aprendessem no mesmo tempo e de igual maneira, e insistíamos fortemente neste paradigma, no qual prevalecia a padronização. Ao conhecer e reconhecer a diferença, compreendendo-a como algo natural, não como déficit ou desvantagem, abre-se espaço para novas concepções acerca da aprendizagem. Pozo (2002), na sua obra Aprendizes e mestres, enfatiza que há novos cenários de aprendizagem, constituídos por novos perfis e modalidades de aprender, tornando-se emergencial um novo perfil de quem ensina e distintas possibilidades que viabilizem a aprendizagem.
Estudo da língua brasileira de sinais
Segundo Humberto Maturana (2009), ensinar é criar um espaço de convivência, sendo da competência do professor a condução do processo. Para isso, o acolhimento do aluno é de extrema importância. Ao acolher o sujeito, acolhem-se a dúvida, a curiosidade, a inquietação, quesitos necessários para que a aprendizagem ocorra. Para aprender é essencial a constituição constituição de um espaço propício e fecundo, no qual a especificidade do sujeito seja respeitada e possam ocorrer as relações de aprendizagem, nos vieses de ensinar e aprender. A constituição desse espaço ocorre à medida que os sujeitos se envolvem e convivem de maneira m aneira propositiva, questionando, duvidando, lidando com informações, materializando a rede invisível de conexões das ideias, teorias, conceitos até chegar ao conhecimento e sua aplicabilidade. Como protagonistas nas relações de aprendizagem, é importante lançar um olhar sobre os modelos educacionais e os referenciais teóricos que interferem nas concepções sobre a diferença entre surdos e ouvintes, seja nos aspectos culturais, seja nos linguísticos, os quais nortearam as práticas sociais e educacionais ao longo da história. Santos enfatiza que é premente compreender que “[...] temos o direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito a ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma um a diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades” (2003, p. 56). Os processos de ensinar e aprender dos surdos são temas profícuos nas instituições de ensino e nos diferentes espaços sociais, que pressupõem modificações profundas para que adquiram a dimensão e força de romper paradigmas de incapacidade ou deficiência e, simultaneamente, (re-)constituir espaços e relações que viabilizem a percepção das potencialidades do surdo e qualifiquem sua aprendizagem.
Estudo da língua brasileira de sinais
11
2 Indagações iniciais
Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau Tatiane de Souza da Anhaia
12 • Surdez é doença? Não. A surdez priva o surdo de ouvir, porém não o impede de se comunicar. municar. A surdez pode ter causa congênita ou ser adquirida adqu irida ao longo da vida. • Todo surdo é mudo? São muito raros os casos em que o surdo é mudo. Mudez nem n em sempre tem conexão com a surdez. “Surdo-mudo” é, provavelmente, a denominação mais arcaica e incorreta sobre a surdez. • O surdo consegue falar? O surdo tem capacidade de oralizar, que é fazer uso de sua capacidade fonadora por meio de exercícios fonoaudiológicos. Ao ser oralizado, o surdo não passa a “ouvir”, mas tem na oralização uma estratégia de comunicação com os ouvintes.
• O uso de aparelho auditivo é indicado para surdos? Cada caso tem suas peculiaridades. Por isso, é essencial uma investigação detalhada e a opção do surdo deve ser respeitada. • É possível o surdo fazer leitura labial?
Estudo da língua brasileira de sinais
A leitura labial é uma estratégia utilizada por alguns surdos oralizados. É importante salientar que nunca será possível ler na totalidade a sequência de palavras pronunciadas e que, provavelmente, haverá perdas de elementos, interferindo na compreensão do que foi dito. • Como o surdo se comunica? Os surdos podem utilizar diferentes modos de comunicação: expressões faciais e corporais, escrita, indicações (apontamentos) do que deseja. Entretanto, é importante salientar que a língua materna dos surdos é a língua de sinais. • O que são línguas de sinais (LS)? As línguas de sinais são sistemas linguísticos para a transmissão de ideias e fatos, capazes de expressar conceitos abstratos. São utilizados pelas comunidades surdas como sua língua natural, sendo diferentes em cada país. • Língua brasileira de sinais (libras): A libras é a língua materna dos surdos do Brasil. Tem estrutura gramatical própria, status de língua e é reconhecida como a segunda língua oficial do país pela lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002.
Para saber mais, visite os sites e blogs http://www.feneis.com.br http://www.editora-arara-azul.com.br http://www.filmeseducativos.com http://www.vezdavoz.com.br http://www.alfabetosurdo.com http://www.legendanacional.com.br http://www.deficienteonline.com.br http://www.acessobrasil.org.br http://www.dicionariolibras.com.br http://www.inilibras.com.br http://www.webartigos.com/articles/3639 http://ensinodelibras.blogspot.com http://aprendolibras.blogspot.com http://trabalhandocomsurdos.blogspot.com http://www.contextualizandoalibras.blogspot.com http://ensinandoeaprendendocomatiarose1.blogspot.com http://anacarolinafrank.blogspot.com www.tvararaazul.blogspot.com
Estudo da língua brasileira de sinais
13
3 “Ser surdo” Ângela Mara Berlando Soares Monique Giusti Reveilleau
presentamos algumas cenas para posterior análise e discussão. Os comentários partem da experiência de surdos e ouvintes ao se depararem com a condição da surdez: Cena 1 - Encontrando um surdo pela primeira vez
14
As pessoas veem os surdos conversando conversando em língua de sinais na rua, nas escolas e em outros espaços e demonstram diversos sentimentos: algumas ficam impressionadas, outras curiosas ou, ainda, compadecidas, com pena dos surdos, afinal eles não ouvem. A verdade é que os o s ouvintes nem n em sempre entendem e ntendem o que está acontecendo e suas reações são diferentes, geralmente por falta de informação.
Estudo da língua brasileira de sinais
Cena 2 - Surdos conversando em língua de sinais
É importante que a sociedade conheça o modo de vida dos surdos, que possui algumas peculiaridades, relacionadas a sua cultura e identidade. No entanto, é preciso aceitar a diferença do sujeito surdo, assim como é importante aceitar a diferença do ouvinte, compreendendo que todos têm capacidade de aprender, de emitir sua opinião, de expressar seus desejos e se comunicar. comunicar. As cenas 3 e 4 representam situações vivenciadas por Monique Giusti Reveilleau. leau.
Cena 3 - Insistência em oralizar
15
“Quando eu era pequena, tinha mais ou menos 10 anos de idade, eu ficava brava com Deus e queria saber: ‘Por que Ele fez isso comigo? Por que sou surda?’ Sofria muito, era muito nervosa, triste, e chorava muito porque minha fala não era boa o bastante, as pessoas tentavam me entender, mas não conseguiam. Já estava muito cansada de tanto falar. falar.”1
1
Neste contexto, falar falar significa oralizar, oralizar, que é a tentativa tentativa de reabilitação reabilitação da fala fala por meio de exercícios fonoaudiológicos Estudo da língua brasileira de sinais
Cena 4 - Surdo e a língua de sinais
“Não sabia nada sobre surdez... Aos 13 anos, descobri que a língua de sinais existia e era a língua natural de surdos... Fiquei encantada e maravilhada. Quando vi pela primeira vez a língua de sinais, percebi que existiam pessoas iguais a mim. Era como outro mundo e a partir desse momento mudei minha vida completamente... Meus olhos brilharam muito ao ver as mãos lindas se comunicando.”
16
3.1 Entender a condição da surdez para perceber as possibilidades A maioria passa por situações semelhantes semelhantes às das charges e a sociedade em geral carece de informações claras sobre a surdez e suas implicações. Na tentativa de “padronizar”, cometem-se erros, principalmente pela insistência de que o surdo “fale” do mesmo modo como os ouvintes. São inúmeras situações constrangedoras que interferem na construção da identidade do surdo, que é privado de se expressar pela sua língua materna (língua de sinais) e forçado a utilizar a língua oral.
Entretanto, existem casos em que se respeita a diferença linguística e cultural, inicialmente pelo grupo familiar, que se traduz pela aceitação da surdez, pelo investimento na trajetória de aprendizagem do sujeito e no incentivo à construção de sua autonomia. Essas ações, tão simples, mas importantes, estendem-se para o contexto educacional e social do qual o surdo faz parte. O posicionamento de Monique referenda o que salientamos anteriormente: A minha família sempre me apoiou muito, principalmente minha mãe. Ela sempre me acompanhou para fazer os temas de casa, trabalhos, estudar para as provas, etc. Ficava o tempo todo comigo e o meu pai com os meus dois irmãos porque era eu quem precisava mais ajuda. Hoje eu agradeço à minha mãe, que sempre me incentivou a estudar... Estudo da língua brasileira de sinais
Na escola tive muitas dificuldades, as pessoas não sabiam a importância da língua de sinais e a comunicação não acontecia. Depois de muitos anos, passei no vestibular para o curso de Pedagogia – Anos Iniciais na UPF. UPF. Foi muita alegria, principalmente porque eu e duas colegas surdas tivemos um tradutor/intérprete de libras (TILS) pela primeira vez. Loreni Lucas dos Santos, a TILS, participou de nossa formação profissional, possibilitando a comunicação e o acesso ao conhecimento. Hoje sou pedagoga, professora de libras, casada, mãe de dois filhos ouvintes, dedicada e realizada. Tudo o que eu consegui valeu a pena.
Desejo muito que outros surdos também lutem pelo seu futuro, sem sofrimentos e sem preconceito, que sejam respeitados e aceitos pela sociedade. Por isso, é importante nunca desistir dos seus sonhos!
17
Estudo da língua brasileira de sinais
4 Retrospectiva histórica da educação e da cultura surda Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
18
retende-se, a partir da retrospectiva histórica sobre a educação e cultura surda, buscar elementos para a compreensão do contexto da surdez, os quais permitirão analisar os processos de inclusão social e o desenvolvimento educacional dos surdos na atualidade. Para tanto, tomamos como base a pesquisa “Para uma cronologia da educação dos surdos”, realizada por Cabral (2001), professor de educação especial de Portugal, que apresenta, em ordem cronológica, os registros encontrados a respeito da história dos surdos no mundo.
4.1 Raízes do (pré)conceito Consta que no antigo Egito do séc. XVI a.C. os egípcios acreditavam que não era possível educar as pessoas surdas. O notável filósofo Sócrates, que viveu no século V a.C., afirmou que “os surdos têm que usar o gesto e a pantomina” 1 (Cabral, 2001), e Aristóteles teria concluído que, apesar de os surdos emitirem sons, seriam incapazes de falar, razão por que não teriam a capacidade de fazer o uso da razão.
1
Pantomina – representação de ideias por meio de gestos, sem os os recursos das das palavras, um modo de narrar com o corpo. Estudo da língua brasileira de sinais
Durante os séculos X a IX a.C., as leis permitiam que os recém-nascidos com sinais de debilidade ou algum tipo de má formação fossem lançados ao monte Taigeto Taigeto (Grécia Antiga). O imperador Justiniano, em 529 a.C. criou uma lei que impossibilitava os Surdos de celebrar contratos, elaborar testamentos e até de possuir propriedades ou reclamar heranças (com exceção dos surdos que conseguiam oralizar). (http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_dos_surdos). (http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_dos_surdos).
4.2 Protagonistas do início da mudança da história Considerado um dos primeiros relatos comprovando que uma pessoa surda pode ser educada foi o do holandês h olandês Rudolphus Agricola, filósofo, professor e considerado modelo humanista. Em seu livro De inventione dialectica (1479), publicou a experiência de ter ensinado uma criança surda a se comunicar oralmente e a escrever. Dessa forma, provou a capacidade de uma pessoa surda expressar seus pensamentos, suas emoções e opiniões. Era o início de uma influência positiva para a comunidade surda. No século seguinte, o médico médico Girolano Cardano (1501-1576) apresentaria a teoria de que a audição e o uso da fala não são condições para o desenvolvimento e compreensão das ideias e de que a surdez seria uma barreira à aprendizagem, não uma condição mental (Cardano apub Soares, 2005, p. 17). Seguindo a cronologia de Cabral surgiu o monge beneditino Pedro Ponce de León (1520-1584), considerado um dos pioneiros na educação dos surdos e que trabalhava com o método da datilologia, 2 da escrita e do oralismo. Ao longo dos séculos muitos foram os protagonistas de teorias a favor ou contra o uso da língua de sinais, do oralismo, da datilologia. Surgiram várias metodologias de ensino e suposições a respeito do desenvolvimento cognitivo das pessoas surdas, técnicas para o treino da fala, juntamente com novas descobertas científicas acerca da fisiologia da audição, procedimentos clínicos na tentativa de reverter a surdez muitas vezes resultando na morte das pessoas surdas submetidas a tais experimentos.
2
Datilologia – termo utilizado para para o uso do alfabeto manual.
Estudo da língua brasileira de sinais
19
4.3 Fatos que marcaram um novo capítulo na história
20
Em 1760 Charles Michel de L’Épée, educador filantrópico francês, abriu a primeira escola pública para surdos em Paris, a Institution Nationale des Sourds-Muets à Paris (Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris). A partir de então, os surdos passaram a receber uma formação com uma metodologia em sinais, desenvolvida pelo próprio L’Épée, que em 1776 publica um livro a respeito. Nesse período os surdos passaram a atuar de maneira propositiva em diversos países que adotaram o método de L’Éppé e, instruídos, começaram a trabalhar como educadores das crianças surdas na aquisição da linguagem em sinais. Pierre Desloges, um surdo que trabalhava como encadernador de livros, revoltou-se diante das colocações do religioso abade Deschamps, o qual afirma que a comunicação por sinais dos surdos não podia ser considerada uma língua e, portanto, era inadequada para a educação das crianças surdas. su rdas. Desloges, com o objetivo de “defender minha língua contra as falsas acusações desse autor” (Moody, (Moody, 1987, apud Wilcox, 2005, p. 37), sentiu-se desafiado a escrever um livro, Observações de um surdo-mudo (1779), explicando acerca das línguas de sinais utilizadas pelos surdos e descrevendo a ordem dos enunciados sinalizados, suas combinações e a precisão dos sinais. Foi essa uma tentativa empírica do jovem surdo em suas observações de sistematizar a língua de sinais, o que certamente deve ter causado um grande impacto na sociedade parisiense a respeito dos conceitos cognitivos que na época se tinha sobre o surdo.
4.4 Congresso em Milão A trajetória educacional do surdo foi fortemente marcada por uma imposição cultural ouvintista. 3 O ápice foi o Congresso de Milão em 1880, com a resolução de que a modalidade de ensino para os surdos passaria a ser a “oral”, considerada pelos participantes como superior à língua de sinais. A partir de então, os surdos que conseguiam “falar” eram considerados excepcionalmente inteligentes e, em consequência, os que sinalizavam eram marginalizados e depreciados por seus mestres, famílias e sociedade. O processo educacional dos surdos foi drasticamente comprometido pela imposição do método oralista, pois, 3
Os termos ouvintista, ouvintismo ouvintismo etc. são são derivações derivações de “ouvintização”, “ouvintização”, que, segundo a concepção de Skliar, Skliar, sugere “uma forma particular e específica de colonização dos ouvintes sobre os surdos. Supõe representações práticas designificação, dispositivos pedagógicos, etc., em que os surdos são vistos como sujeitos inferiores” (1999, p. 7).
Estudo da língua brasileira de sinais
ao contrário do que se pensava e se concluíra naquela época, essa imposição foi de encontro às primeiras pesquisas, que apontavam o método m étodo oral/auditivo como não sendo o canal de alcance da aprendizagem e significação do mundo dos surdos e, sim, por definição natural, o canal visual/gestual.
4.5 Educação dos surdos no Brasil Em 26 de setembro de 1857, por decisão de Dom Pedro II, foi aprovada a lei de nº 939/1857, que dispôs verba para a criação do Imperial Instituto dos Surdos-Mudos no Rio de Janeiro Brasil. O instituto iniciou com dez meninos surdos, instruídos pelo professor surdo Hernest Huet na Língua de Sinais Francesa – LSF. LSF. Em 1911, em em razão da influência da Europa, o INES adotou a modalidade educacional oralista, proibindo o uso da língua de sinais. Em 1957 o instituto passou a ser chamado de Instituto Nacional de Educação dos Surdos (INES), 4 como é conhecido atualmente. Os surdos, oprimidos no passado pela sociedade, constituída majoritariamente por ouvintes, carregam as marcas da história e das concepções que os rotularam como incapazes, dependentes, desprovidos de potencialidades. Essas ideias são confirmadas no cotidiano quando, em algumas situações, os surdos permitem a opressão e não se posicionam diante das dificuldades, aceitando ajuda ao invés da efetivação de seus direitos, especialmente do ser surdo, de ser respeitado como minoria linguística e reconhecido como cidadão. Na mesma medida, os ouvintes reforçam as concepções errôneas quando tendem a superproteger ou favorecer o surdo ao invés de acreditar no seu potencial e na capacidade de protagonizar a sua própria história e construir uma identidade autônoma.
4
http://www.ines.gov.br/Paginas/historico.asp .br/Paginas/historico.asp> Para saber mais acesse o site
Estudo da língua brasileira de sinais
21
5 Língua de sinais Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau
22
língua de sinais utiliza a comunicação visuoespacial. Por esse motivo, quase não se encontram registros da sua historicidade,sendo difícil localizar e comprovar sua origem. Os estudos linguísticos das línguas de sinais têm como marco os trabalhos realizados pelo linguista escocês William C. Stokoe em 1957, docente do Departamento de Inglês do Gallaudet College, em Washington, nos Estados Unidos. Quando iniciou na Gallaudet, Stokoe desconhecia a língua de sinais americana (ASL). Nessa época os professores da instituição eram ouvintes e ensinavam inglês aos alunos surdos; não havia aulas de ASL, porque era desconsiderada desconsiderada como língua. Ao observar a diferença entre a sinalização das palavras em inglês durante as aulas e a sinalização quando os surdos se comunicavam entre si, Stokoe percebeu uma autonomia na comunicação sinalizada. Ao conseguir um financiamento do governo norte-americano, teve a possibilidade de desenvolver pesquisas acerca das sinalizações produzidas pelos surdos fora das aulas. As conclusões de sua pesquisa demonstraram demonstraram que a sinalização não dependia de uma língua falada, no caso o inglês, e que seguia uma gramática própria. Assim Stokoe publicou em 1960 seus estudos na obra Language structure: an outline of the visual communication systems of the american deaf . A divulgação e a disseminação de seus estudos estud os revolucionaram a visão linguística, pois, ao mostrar que as línguas de sinais são línguas naturais, concedeu-lhes o status de língua.
Estudo da língua brasileira de sinais
5.1 Organização neural da língua de sinais Estudos desenvolvidos por Rodrigues (1993) sobre a organização neural da linguagem no cérebro, do ponto de vista biológico, enfatizam que ocorre de forma semelhante para línguas orais e línguas sinalizadas. As pesquisas nesse campo fornecem elementos para que possamos compreender como ocorre a linguagem para o surdo. Tomando como base a análise das testagens aplicadas em pacientes surdos com lesões cerebrais, Rodrigues constatou que existe uma separação entre linguagem e funções visuoespaciais, com forte evidência de que os aspectos gramaticais das línguas sinalizadas são lateralizados para o hemisfério esquerdo do cérebro. A organização da linguagem, tanto para um grupo de ouvintes como para um grupo gru po de surdos, apresenta semelhanças no período das primeiras aprendizagens. O canal de comunicação “natural” é distinto quanto à predominância no recebimento de estímulo para cada um desses grupos, ou seja, para o grupo de ouvintes é natural que a via de comunicação preferencial se dê pela audição au dição e pela fala, pois esta predomina no recebimento de estímulos, ao passo que no grupo de surdos, pelo fato de não ouvir, passa naturalmente a predominar o canal visuoespacial como principal via de comunicação. “[...] Essa maior m aior habilidade para discriminar e seguir estímulos, no caso dos movimentos das mãos, na periferia do campo visual é uma grande vantagem para o surdo, a qual não é aproveitada caso ele não utilize a língua de sinais” (Rodrigues, 1993, p. 16). Nesse sentido, é imprescindível a estimulação do canal visuoespacial com os bebês surdos, pois a aquisição da linguagem interfere no seu desenvolvimento geral, especialmente no aspecto cognitivo.
5.2 Língua brasileira de sinais Contrário ao modo como muitos definem a surdez [...] pessoas surdas definem-se em termos culturais e lingüísticos. Wrigley
A língua brasileira de sinais (libras) é a usada pela comunidade comu nidade surda no Brasil. A libras libras foi oficializada por meio da lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Art. 1o - É reconhecida como meio legal de comunicação comunicaçã o e expressão a Língua Brasileira de Sinais – Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais – Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora,
Estudo da língua brasileira de sinais
23
com estrutura gramatical própria, constitue um sistema lingüístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil (Decreto nº 5.626 de 22 de dez de 2005).
As línguas de sinais são basicamente produzidas pelas mãos e sua estrutura gramatical aporta os níveis linguístico, fonológico, morfológico, sintático e o semântico. As expressões corporais e faciais também desempenham importantes funções gramaticais. Como qualquer outra língua, possui regionalismos, dialetos, gírias e neologismos. Elementos essenciais da gramática da libras A - Alfabeto manual São representações do alfabeto latino produzido com as mãos escrevendo no ar, ar, por meio da digitação manual manu al chamada de “datilologia”, as quais juntando as letras, formam uma palavra. É usado como empréstimo da língua nacional para sinais que ainda não existem, como, com o, por exemplo, de cidades, nomes de pessoas, conceitos, entre outros. Por exemplo: Passo Fundo [P-A-S-S-O_F-U-N-D-O].
24 O alfabeto é característico de cada país. Confira o alfabeto da língua americana de sinais
e o da língua de sinais espanhola AlfaEspanhol>
Estudo da língua brasileira de sinais
25
Estudo da língua brasileira de sinais
B - Configurações Na estrutura gramatical da libras as configurações de mãos (CM) são unidades mínimas usadas na produção de um sinal.
26
Estudo da língua brasileira de sinais
Os sinais APRENDER e AMAR têm a mesma configuração de mão.
Aprender
Amar
C - Ponto de articulação São sinais produzidos no espaço (à frente, acima, abaixo, à esquerda e/ou à direita do corpo), podendo tocar alguma parte do corpo ou estar em um espaço neutro. Os sinais TRABALHAR e BRINCAR localizam-se no espaço neutro e os sinais ESQUECER e APRENDER, na testa
27
Trabalhar
Brincar
Esquecer
Aprender
D - Movimento Os sinais podem ter um movimento ou não. O sinal CACHORRO-QUENTE não tem movimento, e os sinais FALAR e BRINCAR têm.
Cachorro-quente
Falar Estudo da língua brasileira de sinais
Brincar
E - Orientação/direcionalidade
Os sinais têm uma direção com relação aos parâmetros acima. Os verbos IR e VIR, SUBIR e DESCER, ACENDER e APAGAR têm relação com a direcionalidade. F - Expressão facial e/ou corporal Por serem extremamente visuais, as expressões faciais e corporais são muito importantes nas línguas de sinais. A língua de sinais tem sentimento, emoção, como ALEGRE e TRISTE. Segundo Quadros e Karnopp (2004), algumas expressões marcam gramaticalmente as sentenças, como nos sinais COMO e AGORA. Salientamos que todos os itens abordados são de grande relevância para o aprendizado da libras, no entanto representam os elementos gramaticais básicos. A libras, como as demais línguas, é dinâmica e evolui de acordo com a comunicação que acontece na comunidade surda.
28
Estudo da língua brasileira de sinais
6 Sinais básicos das libras Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Monique Giusti Reveilleau Tatiane de Souza da Anhaia
PRONOMES 29
EU
NÓS
TU/VOCÊ
MEU/MINHA
Estudo da língua brasileira de sinais
ELE/ELA
TEU/SEU/TUA/SUA DELE/DELA
30
QUE
QUEM
POR QUE/PORQUE
COMO
QUANDO
QUANTOS
MAS
MAIS
ONDE
COM/JUNTO
JUNTO/PESSOAS Estudo da língua brasileira de sinais
31
Estudo da língua brasileira de sinais
CUMPRIMENTOS, SAUDAÇÕES E EXPRESSÕES
OI
32
BOA TARDE
BOM
DESCULPE
BEM/BOM
BOM DIA
BOA NOITE
BOA AULA
FIM DE SEMANA
OBRIGADO Estudo da língua brasileira de sinais
DE NADA
COM LICENÇA
DE NOVO
ENTENDEU
ENTENDEU/NÃO
ATENÇÃO
POR EXEMPLO
33
Estudo da língua brasileira de sinais
GRUPO FAMILIAR
FAMÍLIA
MULHER MULHE R
HOMEM
34 MENINA
PAPAI
MENINO
MAMÃE
FILHO (a)
Estudo da língua brasileira de sinais
BEBÊ
CRIANÇA
IRMÃO (a)
35 PRIMO (a)
PADRINHO/MADRINHA
VOVÓ/VOVÔ
SOBRINHO (a)
Estudo da língua brasileira de sinais
TIO (a)
MARIDO/ESPOSA
NAMORADO (a)
36
CUNHADO (a)
AMIGO (a)
SOLTEIRO SOLTEIRO (a)
NOIVO (a)
Estudo da língua brasileira de sinais
MARCAÇÃO DE TEMPO NA LIBRAS
PASSADO
AGORA AGOR A
FUTURO FUTUR O
37 ONTEM
MANHÃ
HOJE
TARDE
Estudo da língua brasileira de sinais
AMANHÃ
NOITE
ANTES
38
DEMORADO
ATRASADO
NUNCA
DEPOIS
RÁPIDO
SEMPRE
CEDO
TODOS OS DIAS
DIA
Estudo da língua brasileira de sinais
FIM
SEMANA
MÊS
ANO
MINUTO
39
Estudo da língua brasileira de sinais
irmão (ã)
DIAS DA SEMANA
DOMINGO
SEGUNDA-FEIRA
TERÇA-FEIRA
QUINTA-FEIRA QUINTA-FEIR A
SEXTA-FEIRA
40 QUARTA-FEIRA
SÁBADO
Estudo da língua brasileira de sinais
ESTAÇÕES DO ANO 41
VERÃO
OUTONO
PRIMAVERA
Estudo da língua brasileira de sinais
INVERNO
MESES
JANEIRO
FEVEREIRO
MARÇO
42 ABRIL
JULHO
MAIO
AGOSTO
Estudo da língua brasileira de sinais
JUNHO
SETEMBRO
OUTUBRO
NOVEMBRO
DEZEMBRO
VERBOS
43
ACEITAR ACEITAR
AMAR
ACORDAR
AJUDAR
APRENDER
BRINCAR
Estudo da língua brasileira de sinais
BUSCAR
COMPRAR
COMUNICAR
CONHECER
CONTINUAR
CONVERSAR
COPIAR
CORTAR CORTAR
DORMIR
ESCOLHER
ESPERAR
ESQUECER
44
Estudo da língua brasileira de sinais
ESTUDAR
GOSTAR GOSTAR
LER
PASSEAR
FALAR
GOSTAR-NÃO GOSTAR-NÃO
FAZER
LEMBRAR
MORRER
OUVIR
PEDIR
PERGUNTAR PERGU NTAR
Estudo da língua brasileira de sinais
45
PODER
PODER-NÃO
PRECISAR
PROCURAR
QUERER
QUERER-NÃO
RESPEITAR RESPEITAR
RESPONDER
SABER
46
Agosto
SABER-NÃO
TER Estudo da língua brasileira de sinais
TER-NÃO
TRABALHAR
TROCAR
VENDER
VER
VIAJAR
VIVER
47
Estudo da língua brasileira de sinais
CORES
AMARELO
AZUL
BRANCO
LARANJA LARANJ A
ROSA
VERDE
VERMELHO
PRETO
ROXO
48
Estudo da língua brasileira de sinais
ANIMAIS 49
CACHORRO CACHO RRO
CAVALO CAVALO
COELHO COELH O
COBRA
ELEFANTE
GATO
Estudo da língua brasileira de sinais
50
LEÃO
MACACO
PORCO
TARTARUGA
PÁSSARO
BOI
ALIMENTOS - BEBIDAS
ÁGUA
AÇÚCAR
ALFACE
ARROZ
AZEITE
BALA
Estudo da língua brasileira de sinais
BATAT BATATA A
BOLACH BOL ACHA A
CACHORRO-QUENTE
CAFÉ
CEBOLA
CHIMARRÃO
BOLO BOL O
CARNE
CERVEJA
CHOCOLATE Estudo da língua brasileira de sinais
CHURRASCO
51
FEIJÃO
52
OVO
MASSA
MEL
PÃO
PASTEL
PIPOCA
PIZZA
QUEIJO
SAL Estudo da língua brasileira de sinais
PRESUNTO
SANDUÍCHE
SOPA SOPA
REFRIGERANTE
TOMATE
Estudo da língua brasileira de sinais
VINHO
53
FRUTAS
ABACATE
54
BERGAMOTA BERGAMOTA
LARANJA
MAMÃO
ABACAXI ABACAX I
BANANA
COCO
FIGO
LIMÃO
MELÃO Estudo da língua brasileira de sinais
MAÇÃ
PÊSSEGO
UVA
MORANGO MORAN GO
PERA
CONTEXTO ACADÊMICO
55 UPF
CARAZINHO
PASSO FUNDO
CASCA
LAGOA VERMELHA
PALMEIRA DAS MISSÕES
Estudo da língua brasileira de sinais
56
SARANDI
SOLEDADE
FACULDADE
ALUNO/ESTUDANTE/ ACADÊMICO
PROFESSOR
SURDO
OUVINTE
LIBRAS
AMIGO
LÍNGUA DE SINAIS
TRADUTOR/ INTÉRPRETE
SETOR DE ATENÇÃO AO ESTUDANTE
Estudo da língua brasileira de sinais
DEDO DE PROSA
LABORATÓRIO LABORATÓRIO BILÍNGUE
UPF IDIOMAS
LIVRO
CADERNO
CANETA
LÁPIS
BORRACHA BORRA CHA
APONTADOR APONTADOR
COLA
TESOURA
Estudo da língua brasileira de sinais
57
ESCOLA
INTERVALO
58
Estudo da língua brasileira de sinais
BANHEIRO
CURSOS
CURSO
ADMINISTRAÇÃO
AGRONOMIA
ARTES VISUAIS
ARQUITETURA E URBANISMO
CIÊNCIA BIOLÓGICAS
CIÊNCIAS CONTÁBEIS
CIÊNCIAS ECONÔMICAS
CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO COMPUTAÇÃO
COMUNICAÇÃO SOCIAL E JORNALISMO
Estudo da língua brasileira de sinais
DIREITO
59
COMUNICAÇÃO SOCIAL PUBLICIDADE E PROP PR OPAGANDA AGANDA
60
EDUCAÇÃO FÍSICA
ENGENHARIA
ENGENHARIA AMBIENTAL AMBIEN TAL
ENGENHARIA DE ALIMENTOS ALIMEN TOS
ENGENHARIA CIVIL
ENGENHARIA ELÉTRICA
ENGENHARIA MECÂNICA
ENFERMAGEM
FARMÁCIA Estudo da língua brasileira de sinais
FÍSICA
FISIOTERAPIA
FONOAUDIOLOGIA
FILOSOFIA
GEOGRAFIA
HISTÓRIA
61
LETRAS
MATEMÁTICA MATEMÁTICA
MÚSICA
NUTRIÇÃO Estudo da língua brasileira de sinais
MEDICINA
ODONTOLOGIA
PEDAGOGIA
62
SECRETARIADO SECRETARIADO EXECUTIVO BILÍNGUE
PSICOLOGIA
SERVIÇO SOCIAL
Estudo da língua brasileira de sinais
QUÍMICA
CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA
AGRONEGÓCIO
ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS
COMÉRCIO EXTERIOR
63
DESING DE MOBILIÁRIO
DESING DE MODA
DESING GRÁFICO
ESTÉTICA E COSMÉTICA
FABRICAÇÃO MECÂNICA
GESTÃO COMERCIAL
Estudo da língua brasileira de sinais
64
GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS
LOGÍSTICA
PRODUÇÃO DO VESTUÁRIO
SISTEMAS PARA INTERNET
Estudo da língua brasileira de sinais
PRODUÇÃO CÊNICA
7 Perspectivas da educação de surdos ao longo da história Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna Tatiane de Souza da Anhaia
trajetória educacional do surdo no âmbito mundial passou por vários momentos históricos, que gradativamente ressignificaram as concepções sobre surdez e educação de surdos. As distintas modalidades colaboraram nos processos de ensinar e aprender, de modo que temos subsídios para implementar propostas educacionais condizentes com a especificidade do surdo. Os modelos que ao longo da história foram mais significativos são descritos na sequência.
7.1 Oralismo O oralismo é uma perspectiva educacional direcionada à reabilitação da fala. Dentre as várias metodologias desenvolvidas, a leitura labial é a principal técnica aplicada. Os sons e palavras emitidas pelo interlocutor são captadas pela leitura (interpretação) dos movimentos de seus lábios. Recentes estudos comprovaram que mesmo o leitor labial mais experiente consegue captar apenas em torno de 50% do que a outra pessoa pronuncia.
Estudo da língua brasileira de sinais
65
7.2 Comunicação total Com início na década de 1960, essa perspectiva de educação é uma combinação do oralismo com a língua de sinais simultaneamente como uma alternativa de comunicação; também inclui aspectos linguísticos, como os gestos soltos, leitura orofacial, 1 alfabeto manual, leitura e escrita. A comunicação total também prima por aproveitar resíduos auditivos que a pessoa possa ter, pelo uso permanente de aparelhos auditivos. Essa modalidade também é conhecida como “bimodalismo”, que é o uso da língua de sinais dentro da estrutura das línguas faladas.
7.3 Bilinguismo
66
A modalidade bilíngue é uma perspectiva de ensino recente, que qu e propõe a aquisição da linguagem dos surdos por meio das duas línguas no contexto escolar, lar, tendo como pressuposto que o aluno surdo seja bilíngue, adquirindo a língua materna, ou seja, língua de sinais como primeira língua, comprovadamente a língua natural do surdo, e a língua oral oficial do país como segunda língua. Nesta ideologia sugere-se que as crianças surdas tenham contato o mais cedo possível com pessoas fluentes na língua de sinais.
7.4 Pedagogia surda Esta perspectiva surge no viés da discussão que problematiza a melhor modalidade de ensino para a educação dos surdos. Estabelece uma educação para o surdo a partir de uma visão de sua especificidade de aprendizagem, como estimulação em libras na aquisição do conhecimento pelo canal de recepção visuoespacial, o uso de recursos visuais, metodologia com didática que proporcione a internalização do conhecimento e o respeito ao tempo diferenciado de aprendizagem do surdo. A pedagogia surda propõe que a aprendizagem é significativamente favorecida quando o surdo tem a oportunidade de estar constantemente em contato com seus pares.
1
Leitura da articulação dos lábios. Estudo da língua brasileira de sinais
8 Aquisição da linguagem pela criança surda Andréia Mendiola Marcon Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna
aquisição da linguagem no ser humano constitui-se a partir da interação, primeiramente com o grupo familiar e depois no âmbito social. A criança constrói sua identidade interagindo e se expressando por meio da língua. De modo similar, a aquisição da linguagem pelo surdo também se realiza por meio da interação com as pessoas e o meio do qual faz parte. É essencial que essa interação aconteça na primeira língua da criança surda (libras), a partir da qual os estímulos para a aquisição da linguagem devem ocorrer. É importante que a estimulação para a aquisição da linguagem ocorra desde a detecção da surdez, pois, quanto mais cedo, maiores serão as possibilidades de desenvolver a linguagem adequadamente. Nisso a família tem um papel de suma importância. Segundo Pettito e Marantette (1991, apud Quadros, 1997), “as vocalizações são interrompidas nos bebês surdos assim como as produções manuais são interrompidas nos bebês ouvintes, pois o input favorece o desenvolvimento de um dos modos de balbucia” (1997 p. 70). Nesse sentido, podemos compreender que tanto bebês ouvintes quanto bebês surdos apresentam balbucio oral e manual até um determinado tempo. Para melhor compreensão do exposto apresento um quadro comparativo sobre a aquisição da língua entre crianças surdas e ouvintes:
Estudo da língua brasileira de sinais
67
AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM Período aproximado Criança ouvinte Criança surda Primeiro a seis meses Balbucio manual e oral Balbucio manual e oral Primeiro a seis meses Balbucio manual e oral Balbucio manual e oral Dez meses Primeiras sílabas Apontamentos Um ano Combinam palavras isoladas Apontamentos referentes si mesma. Dois anos Aquisição de vocábulos pela fala Aquisição de sinais por meio visual Três anos Desenvolvimento da fala Desenvolvimento dos sinais Quadro 1 - Aquisição da linguagem
68
Dada essa contextualização, podemos verificar que o input na língua de sinais é muito importante para o desenvolvimento linguístico da criança. A percepção visual começa a ser forte fator para esta aquisição; por isso, hoje em dia é premente que os pais de surdos se interessem pela língua de sinais, bem como pelos aspectos relacionados à cultura surda. Cabe ressaltar que nesse estágio a criança surda está atenta às expressões faciais dos interlocutores, capta elementos que disponibilizam significados que mais tarde serão agregados à língua de sinais na fase de aquisição. Outro fator importante é a repetição dos sinais fazendo movimentos mais lentos; dessa forma, pode-se trabalhar o “foco”, ou seja, a questão do olhar e da direcionalidade do sinal com o bebê, proporcionando-lhe maior ênfase no seu input. Entretanto, por volta de dois anos de idade a criança surda começa a fazer suas primeiras combinações em língua de sinais e, por volta dos três, apresenta gradativa ampliação do vocabulário. É importante salientar três aspectos fundamentais para a aquisição da linguagem da criança surda: a) Contato com a língua de sinais Acredita-se que em todos os momentos a família e a escola devem proporcionar o desenvolvimento integral da criança surda por meio da sua língua materna, sendo importante que ela tenha contato diariamente com a língua de sinais em todos os momentos de sua vida. b) Contexto familiar No mesmo sentido, é importante que a criança surda tenha clareza real do seu contexto familiar, ou seja, que saiba de fato quais são os papéis exercidos pelas pessoas que a rodeiam. Como exemplo, o papel do pai, da mãe, dos irmãos e assim por diante.
Estudo da língua brasileira de sinais
c) Contexto espacial A criança surda necessita de muitos estímulos para significar seu mundo; então, não se pode deixar de lado o contexto espacial. A casa, seu local de referência, tem importante sentido; por essa razão, cabe instigar a curiosidade e o aprendizado acerca dos nomes dos cômodos e espaços. É adequado perguntar pergun tar ou falar à criança sobre a estrutura da casa: quarto, cozinha, banheiro, sala, etc.; salientar os objetos ou mobiliários que pertencem a cada local, sua utilidade, seu significado. Essas ações, aparentemente simples, proporcionam à criança estabelecer relações e associações, ampliando o vocabulário e desenvolvendo uma organização interna. São inúmeras as possibilidades para promover e incentivar a aquisição da linguagem da criança surda. Para tanto, a metodologia visual merece destaque, pois a criança que é estimulada desde tenra idade obtém ganho no seu processo de desenvolvimento cognitivo. d) Interação com outras crianças Deve se dar essencialmente com surdos, para que ocorra a aquisição da língua e a construção da sua identidade. e) Etiquetas com o nome dos objetos A partir desta estratégia a criança surda associa palavras aos objetos e atribui-lhes significados, finalidades; pode também usar palavras descritivas, como cadeira pequena, cadeira grande, cama branca, armário azul. f) Fotos da família Ajudam a criança a associar quem faz parte de seu grupo familiar - mãe, pai, irmãos, avô, avó, tio, tia, primos, padrinhos. É fundamental compreender a importância de viabilizar essas situações para a criança surda, pois, quanto mais informações claras e consistentes tiver, maiores serão as possibilidades de construir o sentido do mundo. Com isso, a criança começa a compreender o que de fato é significado (compreensão) em relação ao significante (objeto ou algo). Neste viés a criança surda su rda passa por um período de transição, no qual o que antes tinha caráter lúdico – formas, tamanhos, cores – adquire um status de compreensão; assim, começa a estabelecer relações acerca dos objetos e situações, que, à medida que se internalizam, geram valores cognitivos.
Estudo da língua brasileira de sinais
69
8.1 O processo de alfabetizaçã alfabetização o
70
Ao nos referirmos à terminologia “alfabetização”, geralmente, a primeira impressão está relacionada à apropriação dos códigos escritos. Entretanto, a alfabetização de crianças surdas decorre de processos específicos da surdez e da aquisição da língua de sinais. Quadros (2000, p. 3) aborda um conceito mais amplo do termo, enfatizando que a alfabetização é “um processo que resulta da interação com a língua e com o meio”. A aquisição da linguagem é primordial para a alfabetização da criança surda, e nesse sentido o grupo familiar possui papel de grande importância, especialmente nos primeiros anos de vida da criança. Posteriormente, outros personagens exercem papéis e cooperam para o desenvolvimento da criança, principalmente com o ingresso na escola e noutros espaços sociais. Na fase escolar, período marcado pela aprendizagem formal e intencional, a criança surda, por meio da língua de sinais, tem acesso às informações, estabelece relações e constrói significados. O professor, profissional com fluência na língua de sinais, é protagonista da aprendizagem da criança surda. Neste caso, o docente tem como desafio diário utilizar didática apropriada, proporcionando condições para que a criança compreenda e construa o conhecimento con hecimento a partir de sua língua materna. Na fase de alfabetização, a criança surda precisa ter acesso ao conhecimento de forma eficaz, razão pela qual as propostas devem ser claras, concretas e com recursos visuais. A internalização das informações ocorrerá na medida em que o docente de libras estiver atento, pois o mundo desta criança tem uma conotação visual maior em razão da surdez. É por meio da linguagem que a criança desenvolve o pensamento e outras relações cognitivas. Por isso, precisa de aulas com distintos materiais visuais, que sirvam para estimular e proporcionar maior propriedade na aquisição do conhecimento por meio da língua de sinais. De acordo com Quadros, “[...] a criança surda que está passando por um processo de alfabetização imersa nas relações cognitivas estabelecidas através da Língua de Sinais para a organização do pensamento, naturalmente passa a registrar as relações de significação que estabelece com o mundo” (2000, p. 11). No processo de aprendizagem alguns objetivos metodológicos são imprescindíveis:
Estudo da língua brasileira de sinais
•
explorar as funções do apontar para que a criança inicie e se habitue a
fazer relações; •
priorizar o “olhar”, especialmente trabalhando o foco, para que centre a
atenção na atividade que está desenvolvendo, e a visão periférica, ampliando as possibilidades de percepção; • •
explorar movimentos dos sinais (movimento interno e externo); usar expressões expressões faciais e corporais (interrogativo, positivo, negativo,
triste, feliz...); •
utilizar classificadores (inclui relações descritivas, como as formas de
objetos, pessoas e animais); • • • •
desenvolver estratégias para resolução de problemas; estabelecer relações e associações diversas; ampliar constantemente o vocabulário; explorar do alfabeto manual e as configurações.
As crianças surdas su rdas que qu e têm sua condição respeitada e são estimuladas no contexto familiar e escolar, com ensino a partir da língua sinais nas diferentes áreas do conhecimento, têm possibilidades de aprender tanto quanto as ouvintes. A diferença linguística não pode ser, ser, em nenhum nenh um momento, impeditiva para seu desenvolvimento cognitivo, pois a inclusão social e educacional parte da perspectiva de conhecer, conhecer, reconhecer e valorizar v alorizar a diferença.
8.2 Estratégias e recursos didáticos visuais Existem inúmeros recursos visuais que enriquecem o ensino dos surdos e que facilitam a aquisição da língua e o aprendizado. O aluno internaliza os conceitos e constrói significados, sendo imprescindíveis os recursos visuais nesse processo. Quadros (2000, p. 102-110) sugere algumas possibilidades: • fichário: consiste consiste em em uma caixa repleta repleta de fichas padronizadas, com figuras e palavras, de tudo o que se possa imaginar, que podem ser utilizadas em qualquer momento de aula, conversa ou brincadeira. O intuito é mostrar à criança “o nome das coisas” em português ou em libras; •
dicionário libras/português: são dicionários bilíngues, imprescindíveis
nas escolas e salas onde são desenvolvidas as propostas educacionais para surdos. O dicionário deve ser usado pelo professor sempre que houver dúvidas, incentivando o aluno à pesquisa;
Estudo da língua brasileira de sinais
71
•
Dicionário configuração de mão: a ideia apresentada aqui é a adaptação
deste modelo de dicionário em que a base da procura não seja a letra, mas a configuração de mão. A partir da configuração, a criança encontrará as páginas e nelas a figura, sinal e a palavra em língua portuguesa; •
Caixa de gravuras: consiste consiste numa caixa contendo inúmeras gravuras,
ricas em informações e visualmente atrativas, que serão utilizadas de diversas formas com o objetivo de desenvolver e explorar o pensamento e a criatividade da criança, representando grande auxílio au xílio para estimular a sua produção escrita; •
Caixa com com histórias em sequência: uma caixa com histórias em sequên-
cia, tendo o cuidado de ampliar gradativamente as possibilidades, o número de cenas e a profundidade dos temas.
8.3 Estratégias de avaliação
72
O ato de avaliar pode se configurar como mais uma possibilidade de aprendizagem. Entretanto, o processo de avaliação do surdo requer o entendimento sobre seu modo de aprender, como processa as informações, sistematiza o conhecimento e expressa o que pensa e entende. É importante compreender que a avaliação extrapola as dimensões somatórias, classificatórias ou eliminatórias. Pode, sim, ser entendida como uma oportunidade de rever, ressignificar, qualificar, ampliar ou aprimorar o que se aprendeu. Para avaliar o aluno surdo, é essencial verificar, observar e analisar todos os aspectos, estando atento às particularidades de cada aluno surdo. Skliar (1988, apud Thoma, 2000) cita alguns requisitos pertinentes ao assunto: •
organização de um contexto comunicativo apropriado às características
particulares do sujeito a avaliar (cabe lembrar que a língua de sinais não é um instrumento que utilizamos para ensinar ao surdo, mas implica uma língua que carrega com ela uma cultura e significados); •
uma análise sobre o que o sujeito estaria pronto a conhecer ou já conhece
e com quais instrumentos culturais o faz de acordo com uma obtenção prévia do meio que rodeia o aluno ou aluna surdo(a) (aqui penso que se insere a questão de o professor verificar o conhecimento prévio do aluno com base numa sondagem sobre o meio em que o surdo vive, o tipo de comunicação que se dá no meio familiar e, até mesmo, mesm o, a perspectiva dos pais com relação ao seu filho);
Estudo da língua brasileira de sinais
•
a valorização valorização do do desenvolvimento, desenvolvimento, tanto no que se refere que a criança
surda é capaz de resolver por si mesma, como ao nível de suas potencialidades, em uma situação de coorientação e colaboração com pares (lembra-se o que já foi afirmado quando ao nosso papel de medir a relação aluno-aluno); •
o registro de tudo aquilo que o adulto diz ou faz e que pode modificar, modificar,
criar obstáculos, atrasar e/ou adiantar o processo de desenvolvimento da criança (o próprio processo de avaliação, que muitas vezes não é adequado, cria esses obstáculos). Outrossim, estão em fase de construção os processos de ensinar e aprender e, consequentemente, o processo de avaliação. Não há modelos prontos, que determinem a melhor forma de ensinar e avaliar; se houvesse, estaríamos negando a diferença dos surdos entre si, pois não são uma “categoria” que aprende do mesmo jeito e no mesmo tempo, ao contrário, precisam ser respeitadas as peculiaridades enquanto minoria linguística. O fomento de pesquisas na área da surdez é essencial para que tenhamos mais elementos norteadores da pedagogia surda, que inclui os processos de ensinar, sinar, aprender e avaliar ava liar o surdo.
73
Estudo da língua brasileira de sinais
9 O tradutor/intérprete de língua de sinais Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna O corpo do Outro está diante de mim, mas quanto a ele, leva uma singular existência: entre mim que penso e esse corpo, ou melhor, junto a mim, a meu lado, ele é como uma réplica de mim mesmo [...]. (Merleau-Ponty, 2002, p. 167).
74
tradutor/intérprete de língua de sinais (TILS) é um profissional que faz a mediação linguística entre a língua de sinais e a língua oral e vice-versa. De acordo com o decreto n o 5.626, de dezembro de 2005, no capítulo V, V, artigo 18: Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste decreto, a formação de tradutor e intérprete de libras - língua portuguesa, em nível médio, deve ser realizada por meio de: I - cursos de educação profissional; II - cursos de extensão universitária; e III - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino superior e instituições credenciadas por secretarias de educação [...]. Entretanto, pelo fato de ser uma atividade em processo de legalização, é comum pensar que pessoas bilíngues em língua de sinais e língua oral são intérpretes, pois este profissional atua em diferentes esferas, dentre as quais educação, saúde, justiça, religião, recreações, eventos culturais, educacionais e esportivos, mercado de trabalho e também no contexto familiar. No entanto, esse é um grande equívo-
Estudo da língua brasileira de sinais
co, pois a formação do profissional TILS tem uma sistemática específica, que requer competência linguística, referencial e tradutória, ou seja, uma formação adequada. O TILS educacional tem um papel primordial para a comunidade surda, pois garante a acessibilidade de comunicação a uma minoria linguística e viabiliza a aprendizagem no âmbito escolar. A tradução/interpretação no contexto educacional difere das demais modalidades de tradução, porque requer interação, necessária para que se perceba se a tradução foi efetiva e eficaz. Elencamos alguns procedimentos específicos do TILS em sala de aula: a) ser imparcial na tradução/interpretação em contextos formais ou informais nos quais protagonizam alunos surdos, professores, colegas e funcionários das instituições de ensino; b) manter uma postura ética com o aluno surdo e demais pessoas da instituição, fazendo urgir o papel de profissional; para tanto, não cabe fazer comentários, emitir opinião sem ser solicitado, tampouco executar tarefas particulares, ainda que pertinentes às questões escolares, mas que são de responsabilidade exclusiva do aluno; c) primar pela discrição no modo de vestir-se, vestir-se, de posicionar-se posicionar-se no local local onde será feita a tradução/interpretação, pela pontualidade, pois, em razão da visibilidade inerente ao trabalho TILS, todos esses aspectos são de grande importância; d) construir e firmar uma postura clara quanto à relação aluno surdo/intérprete/professor, clarificando os papéis de cada um. O professor permanece com a responsabilidade do ensino; o TILS, com a incumbência de traduzir; o aluno, a de ser protagonista da aprendizagem; e) esclarecer aos profissionais da educação o modo da escrita do surdo, pois o registro da libras ainda está em construção, razão pela qual ao escrever o surdo apoia-se na língua portuguesa. Além desse fator, há que se ressaltar o déficit histórico da sua formação escolar, que muitas vezes compromete o processo de aprendizagem e seus resultados; f) estabelecer junto ao professor uma relação de mútuo auxílio, com o propósito de verificar com antecedência algumas adaptações necessárias, como: •
respeitar o tempo necessário para olhar olhar para o intérprete, para o
professor; anotar as informações do quadro e olhar para os materiais que o professor estiver utilizando em sala de aula; •
providenciar filmes legendados;
Estudo da língua brasileira de sinais
75
•
manter pequena iluminação durante a projeção de filmes ou slides
para que surdo e intérprete tenham preservadas as condições necessárias para a visualização da interpretação; • enviar ao aluno surdo o material para leitura leitura prévia, possibilitando-lhe sanar dúvidas de interpretação de texto e vocabulário; •
solicitar que quaisquer leituras sejam feitas em bom tom tom e ritmo
adequado, o que garantirá uma boa interpretação; •
esclarecer às pessoas pessoas que falem diretamente com o aluno surdo, não
com o intérprete; o aluno surdo saberá como proceder; g) pesquisar e aprofundar os conhecimentos referentes ao conteúdo a ser interpretado, pois, quanto mais propriedade o TILS tiver acerca do tema, maiores serão as possibilidades da tradução ser fidedigna. Traduzir e interpretar no universo de surdos e ouvintes significa despir-se das próprias concepções para dar espaço e condições para que a comunicação aconteça. Rompe-se a barreira da comunicação com a atuação profissional do tradutor/intérprete, que se compromete com esse fazer. fazer.
76
Estudo da língua brasileira de sinais
10 Alteridade: constituição subjetiva do ser humano Ângela Mara Berlando Soares Cristine Fátima Pereira Luna A pergunta que não quer calar: “Quem sou”? s redes de relacionamentos virtuais – blogs, blogs, Orkut, Facebook, Myspace, Twitter, Messenger, dentre outros – contêm a dilemática indagação: “Quem sou?”. A pergunta nesses veículos de comunicação é feita claramente ou aparece nas entrelinhas, com a sutil tentativa de esboçar um perfil, um pouco do que se é ou se pretende ser. O sujeito que protagoniza a rede de comunicação virtual elabora um perfil pessoal, social e profissional, que pode ser real ou apenas virtual, construindo uma espécie de identidade. Os estilos escolhidos para a apresentação do perfil são variados: dos poéticos aos filosóficos, dos mais jocosos e ousados aos comuns, ao passo que outros são restritos apenas a uma interrogação“?” A questão subjetiva subjetiva das descrições que cada membro apresenta apresenta na tentativa de responder a “Quem sou?” é de grande relevância, porque evi dencia a necessidade que o indivíduo possui de se mostrar ao outro como único, diferente, verdadeiro, evidenciando a singularidade. A intenção também pode ser demonstrar algo de si, “explicar-se” e causar algum impacto que irá acionar no outro sua aceitação ou rejeição. Com esse breve exemplo, pretendemos elucidar a seguinte questão: a constituição do sujeito se dá a partir da relação que se estabelece com os pares – os outros –, que são todas as pessoas do meio de relacionamento ou com as quais nos deparamos no decorrer de nossas vidas. O outro, que naturalmente é diferente, inscreve algo e interfere na formação da identidade e personalidade – que ocorre desde o nascimento –, provocando emoções e sentimentos diversos, como admiração, indiferença, empatia,
Estudo da língua brasileira de sinais
77
78
repulsa, preconceito, incômodo, dentre outros. Assim, o olhar do outro é que humaniza o indivíduo. Segundo Velho Velho (1986), a noção de outro ressalta que a diferença constitui a vida social, na medida em que esta se efetiva por meio das dinâmicas das relações sociais. A diferença diferença é, simul simultanea taneamente mente,, a base base da vida vida social social e fonte perman permanente ente de de tensão tensão e conflito. Assim, a opinião do outro provoca reações, razão por que é importante salientar que no contexto da surdez o grupo familiar tem papel fundamental, pois os primeiros registros que o bebê surdo tem são decisivos no processo de constituição de sua personalidade e refletirão em toda a sua vida; será inscrito, desde tenra idade, se é um ser capaz ou incapaz, apto ou inapto, competente ou incompetente. Esse processo adquire dimensão maior à medida que se ampliam as relações sociais – com outros familiares, no ambiente escolar, na sociedade em geral. O surdo, como qualquer outro indivíduo, constrói a sua historicidade a partir do olhar do outro, como explica Ciampa: “[...] cada indivíduo reconhece no outro um ser humano e é assim reconhecido por ele – sozinhos certamente não poderemos ver reconhecida nossa humanidade, consequentemente não nos reconhecemos como humanos. Ter uma identidade humana é ser identificado e identificar-se como humano!” humano!” (1998, p. 8). As relações relações sociais estão estão imbuídas imbuídas de significado significado e a construção construção da identidade identidade do sujeito depende – ou decorre – do ponto de vista do outro, da opinião, tornando possível sua formação individual. Bakhtin 12(1999), ao escrever diversos ensaios sobre o tema, afirma que o eu só existe em diálogo com os outros, e sem esta relação é impossível ou improvável definir-se ou constituir-se. O processo de autocompreensão ocorre por meio da alteridade, isto é, pela aceitação e percepção dos valores que o outro atribui, que ocorre desde o nascimento e se estende na sequência da sua vida. Para Arruda, “a diferença aparece como o contorno mais saliente e intrigante da alteridade. Sinuoso, ele tanto pode afastar como aproximar. O desenho do outro, mais que um retrato, talvez seja um holograma: uma projeção em movimento, e como tal, um pedaço de d e mim, prestes a esvaecer. A representação aplaca instantaneinstantaneamente o conteúdo perturbador do outro, trabalhando-o. Torna-se Torna-se assim, a diferença incorporada, dando forma ao holograma”. (1998, p. 17). O outro torna-se imprescindível, pois delimita e constrói o espaço de atuação do sujeito no mundo, representando o sujeito ideológico. Nessa perspectiva, “quem sou” depende de como o outro me percebe, e nesta relação é que se experimenta a possibilidade do acabamento, da completude, de complementaridade. Essa é a razão de se investir na capacidade, pois, respeitando a condição de surdez, maiores serão as possibilidade de aprendizagem e de uma vida autônoma. 1
Bakhtin (1895-1975) (1895-1975) linguista com reconhecimento a partir da década de 90, quando alcançou um grande prestígio; atualmente, é considerado um dos autores mais referenciados na teoria da alteridade. Estudo da língua brasileira de sinais
Referências (philosophy). Tübingen: AGRÍCOLA, Rodolphus (1479). De (1479). De inventione dialectica (philosophy). Niemeyer, 1992. linguagem. 12. ed. São Paulo: BAKHTIN, Mikhail. Marxismo Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. Paulo: Hucitec, 1999. verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2000. _______. Estética _______. Estética da criação verbal. 2005. Regulamenta a lei no BRASÍLIA. Decreto BRASÍLIA. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais Libras. Brasília, 2005. _______. Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Brasília, 2000. sinais. Rio de JaneiBRITO, Lucinda Ferreira. Por Ferreira. Por uma gramática de línguas de sinais. ro: Tempo Brasileiro, 1995. surdos. Disponível em: CABRAL, Eduardo. Para Eduardo. Para uma cronologia na educação dos surdos. . Acesso em: 12 fev. fev. 2010. Alteridade. Disponível em: . Acesso em: 6 nov. nov. 2009. EMMOREY, K.; BELLUGI, U.; KLIMA, E. Organização neural da língua de sis inais nais. In: MOURA, M. C.; LODI, A. C.; PEREIRA, M. C. (Ed.). Língua (Ed.). Língua de sinais e educação do surdo. surdo. São Paulo: Sociedade Brasileira de Neuropsicologia, 1993. diálogo: as idéias lingüísticas do círculo FARACO, Carlos Alberto. Linguagem Alberto. Linguagem e diálogo: de Bakhtin. Curitiba: Criar, 2003. contexto. Curso básico. Brasília: FELIPE, Tânia; MONTEIRO, Myrna. Libras Myrna. Libras em contexto. Ministério da Educação, 2001. s ocial e educação de surdos su rdos.. Rio de JaFERREIRA-BRITO, Lucinda. Integração Lucinda. Integração social neiro: Babel, 1993. sinais. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; ______. Por ______. Por uma gramática de línguas de sinais. UFRJ, 1995. KARNOPP, Lodenir; QUADROS, Ronice Muller de. Educação infantil para surdos. In: ROMAN, Eunilda Dias; STEYER, Vivian Edite (Org.). Acriança (Org.). Acriança de 0 a 6 anos e a educação infantil: infantil: um retrato Multifacetado, 2001. MATURANA, Humberto. Apostila do curso Biologia del Conocer. Facultad de Ciencias, Universidad de Chile, 1990.
Estudo da língua brasileira de sinais
79
80
Surdos – Revista PERLIN, Gladis; MIRANDA, Wilson. Surdos: o narrar e a política. Estudos política. Estudos Surdos – de Educação e Processos Inclusivos, Florianópolis, UFSC, n. 5, 2003. surdez: um olhar sobre as diferenças. ______. Identidades surdas. In: SKLIAR, C. (Org.). A (Org.). A surdez: Porto Alegre: Mediação, 1998. sociais: uma possível construção de PINHEIRO, Petrilson Alan. Bakhtin Alan. Bakhtin e as identidades sociais: conceitos. Disponível em: . Acesso em: 6 nov. nov. 2009. mestres: a nova cultura da aprendizagem. Trad. de Ernani POZO, Juan Ignácio. Aprendizes e mestres Rosa. – Porto Alegre: Artmed, 2002. portuguesa. QUADROS, R. M. O tradutor e intérprete de língua brasileira de sinais e língua portuguesa. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de Educação Especial, 2004. sinais. Canoas: Textura, 2000. _______. Alfabetização _______. Alfabetização e o ensino da língua de sinais. brasileira: estudos linguísQUADROS, R. M.; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua Becker. Língua de sinais brasileira: ticos. Porto Alegre: Artmed, 2004. QUADROS, R. M.; SCHIMIEDT, Magali L. P. Idéias para ensinar português para alunos surdos. surdos. Brasília: Brasíli a: MEC/SEESP, MEC/SEESP, 2006. RODRIGUES, N. Organização neural da linguagem. In: MOURA, M. C.; LODI, A. C.; PEsurdo. São Paulo: Sociedade Brasileira REIRA, M. C. (Ed.). Língua (Ed.). Língua de sinais e educação do surdo. de Neuropsicologia, 1993. pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 1961. ROGERS, Carl R. Tornar-se pessoa. vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. Trad. de Laura Teixeira SACKS, Oliver. Vendo vozes: Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. libertar: os caminhos do cosmopolitanismo multicultural. SANTOS, B. de S. Reconhecer S. Reconhecer para libertar: Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. Brasil. 2. ed. Campinas: Autores SOARES, Maria Aparecida Leite. A Leite. A educação do surdo no Brasil. Associados, 2005. sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1986. VELHO, Gilberto. Subjetividade e sociedade. cultura: notas para uma antropologia da sociedade contemporânea. ______. Individualismo ______. Individualismo e cultura: 6. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, Zahar, 1996. alteridade. Disponível em: . Acesso em: 28 nov. nov. 2009. ______.Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris. Disponível em: . Acesso em: 6 de nov. nov. 2009. ver. Trad. de Tarcísio de Arantes WILCOX, Sherman; WILCOX, Phyllis Perrin. Aprender Perrin. Aprender a ver. Leite. Rio de Janeiro: Arara Azul, 2005.
Estudo da língua brasileira de sinais
Sobre os autores Andréia Mendiola Marcon : mestranda em Letras, especialista em Libras, pedagoga, tradutora/intérprete de Libras da Universidade de Passo Fundo. Educação, psicopedagoga clínica e insÂngela Mara Berlando Soares : mestra em Educação, titucional, especialista em Educação Especial e Formação de Profissionais Integradores, coordenadora do Setor de Atenção ao Estudante da Universidade de Passo Fundo. Cristine Fátima Pereira Luna: Luna: graduanda do curso Letras Libras Bacharelado da Universidade Federal de Santa Catarina, tradutora/intérprete de Libras da Universidade de Passo Fundo. Docente nos cursos de Capacitação para tradutor/intérprete de Libras. Monique Giusti Reveilleau : pedagoga, especialista em Educação Especial, docente na disciplina de Libras da Universidade de Passo Fundo. Tatiane de Souza da Anhaia: Anhaia: pedagoga, especialista em Educação Especial, graduanda do curso Letras Libras Licenciatura da Universidade Federal de Santa Catarina, docente na disciplina de Libras da Universidade de Passo Fundo.
Estudo da língua brasileira de sinais
81