ESCOLA SECUNDÁRIA DE BENAVENTE FICHA INFORMATIVA Nº 3 GEOGRAFIA C – 12º ANO (Tema 2: Um Mundo Policêntrico) - A (re)emergência de conflitos regionais Tempo previsto para lecionação: 7 blocos de 90 minutos (7 aulas) Conteúdos: Os nacionalismos; Os fundamentalismos; As guerras da água. NOTA : No final deste subtema deves ser capaz de: Compreender a importância que assume a segurança mundial, na actualidade; Debater situações concretas que podem afectar a segurança mundial; Compreender quais os fatores potenciadores de tensões e conflitos regionais. PRINCIPAIS CONCEITOS/NOÇÕES BÁSICAS (que deves saber):
Fundamentalismo; Nacionalismo; Terrorismo.
Conflitualidades múltiplas O ser humano, apesar da sua racionalidade, não é menos agressivo do que a maioria dos outros animais. Bem pelo contrário, as lutas que trava são essencialmente com seres da sua espécie e o que o move não é somente a sobrevivência. A ciência avança, o "progresso" torna-se palavra de ordem, a mobilidade marca o nosso quotidiano, mas o desrespeito pelo outro (e pelo próprio meio ambiente) e a conflitualidade estão cada vez mais patentes e assumem contornos muito diversos.
Os povos das diferentes raças, línguas, religiões e culturas parecem ter muita dificuldade em conviver pacificamente no espaço Terra, em usufruir equitativamente (e de forma sustentável) dos recursos naturais, enfim, em viver civilizadamente e fruir a vida no contexto do planeta e do universo (fig. 1).
Fig. 1- O “caldeirão” da conflitualidade Se por vezes a sobrevivência está em causa - como em alguns casos da luta pela água, por solos férteis, etc.-, na maioria dos casos o que se pretende é mais poder, é afirmarmo-nos perante outros, é menosprezar o outro, é ... irracionalidade. Luta-se por um bem que escasseia, luta-se pela e para a afirmação de um território, luta-se pela afirmação de ideias, luta-se ...
O presente tema faz emergir algumas situações de conflitualidade, subdividindo-as em nacionalismos, fundamentalismos e guerras de água, embora as "fronteiras" entre alguns conceitos sejam ténues e na prática seja frequente conjugarem-se vários motivos. O conflito israelo-palestiniano é um bom exemplo deste imbricado de razões - a escassez de água e a existência de petróleo, o islamismo e o judaísmo, a ânsia de afirmação e "conquista" territorial das nações palestina e judaica, o percurso histórico conturbado, têm contribuído para a existência e persistência de uma das áreas mais problemáticas do Globo. É, pois, normalmente difícil associarmos um qualquer conflito mundial a uma só razão.
Os nacionalismos O nacionalismo é um conceito difícil de clarificar, que para uns assume conotação positiva, enquanto princípio político e doutrina e sentimento de exaltação da própria nação, e para outros apresenta uma conotação negativa, pois é considerado doença social, atitude agressiva, intolerante, xenófoba, que tende em si mesmo para o racismo. Facilmente "desliza" ou se associa a termos diversos: patriotismo, autodeterminação, separatismo... racismo! No século XX, principalmente na segunda metade, assistimos a dois marcantes e generalizados períodos nacionalistas de cariz independentista: - primeiro, num longo Pós-IIª Guerra Mundial, a descolonização levou à independência da maioria dos actuais estados africanos; - na fase terminal do século, na sequência do final da Guerra Fria, a Europa foi palco de profundas alterações do mapa político (a desintegração da ex-URSS, da ex-Jugoslávia e a divisão da Checoslováquia). Hoje, e num futuro próximo, qual o ponto da situação? As questões nacionalistas continuam na ordem do dia e podem encontrar-se num estádio de aparente letargia - Curdistão, Tibete, entre outros - ou assumirem situações de conflitualidade marcada - País Basco, Irlanda do Norte, Córsega, Cachemira, Cáucaso, etc.
Os Curdos, um povo sem Estado Os Curdos são um povo de origem indo-europeia, que têm uma longa História marcada por perseguição e subjugação. Concentram-se no Médio Oriente, principalmente na Turquia, Irão e Iraque (fig. 2). Esta distribuição geográfica resulta de convulsões várias associadas às sucessivas repressões a que o povo curdo tem sido sujeito.
Fig. 2- O povoamento curdo e o Curdistão autónomo. O Curdistão autónomo
(no Norte do Iraque) é
de
criação
recente e pode afigurar-se como
peça-chave no evoluir do xadrez geopolítico no Médio Oriente. Com efeito, no início dos anos 90, com a derrota do Iraque na Guerra do Golfo (Koweit), a minoria curda do Iraque revoltou-se contra Saddam Hussein. A repressão não se fez esperar e o êxodo para o Irão e Turquia foram a consequência imediata. A Turquia, por seu turno, não aceitava de forma alguma a existência de campos de refugiados curdos, pelo que, juntamente com países ocidentais, promoveu o regresso deles ao Norte do Iraque, para uma zona interinamente protegida. Assim, os Curdos na Turquia estão fortemente reprimidos, no Irão a República de Mahabad, que se formou em meados do século XX, foi demasiado efémera e somente no Iraque os Curdos gozam de certa autonomia. Este povo tem padecido também com as "guerrilhas" internas, nomeadamente no Curdistão autónomo, embora recentemente os líderes dos dois principais partidos - Partido Democrático do Curdistão (PDK) e União Patriótica do Curdistão (UPK) - tenham anunciado a reunificação oficial do território. Com os resultados eleitorais de 30 de Janeiro de 2005 no Iraque, com a possibilidade de o Irão constituir novo alvo dos EUA e com os esforços repetidos da Turquia para se integrar na União Europeia, a questão curda (sempre muito "abafada" nos media ocidentais) terá grande probabilidade de assumir outro protagonismo. A questão curda é, ainda, uma grande incógnita para os próprios curdos, para os países mais directamente envolvidos – Turquia, Irão e Iraque -, para todo o Médio e próximo Oriente e, talvez, para a União Europeia e o mundo ocidental em geral. O Curdistão enquanto Estado independente, previsto pelo Tratado de Sévres (1920), ocuparia essencialmente parte da actual Turquia, com possível extensão por território iraquiano. Contudo, a descoberta de jazigos de petróleo e o temor da influência soviética contribuíram para o descartar dessa hipótese. A Turquia, membro da OTAN e apoiada pelos EUA, empreendeu enorme repressão sobre os Curdos, proibindo a língua, a cultura e as instituições curdas. Em Janeiro de 1946 nasceu, no Norte do Irão, uma República Curda (República de Mahabad), que só resistiu durante 14 meses.
Os Curdos pós-Saddam Hussein Desde a queda de Saddam Hussein, os Curdos mostraram a sua determinação de reter um certo nível de autonomia no território dominado por eles há mais de uma década. Agora, após uma forte performance nas eleições do mês passado, os lideres curdos estão a declarar exigências específicas pela primeira vez. Do controlo das reservas à retenção da milícia curda e uma autoridade total sobre as taxas, os poderes exigidos representam uma autonomia que é difícil de distinguir de independência. Fonte: Edwar Wong - The New York Times, 18 de fevereiro de 2005
O País Basco, uma luta remota Euskadi (País Basco) compreende uma região essencialmente montanhosa junto aos Pirenéus, virada para o Golfo da Biscaia. Estende-se por terras espanholas – Hegoalde ou País Basco do Sul – e por território francês – o Iparralde ou País Basco do Norte (Fig. 3). A Constituição espanhola de 1978 considera a Comunidade Autónoma Basca (CAB) restringida a três províncias – Álava, Biscaia e Guipúzcoa -, sendo que Navarra constitui uma comunidade Autónoma.
Fig. 3 – Componentes territoriais do país Basco
O território basco é o mais antigo da Europa tal como a língua falada pelo seu povo (o euskera). O euskera ou vasconço é uma língua não latina, de origem desconhecida, muito diferente das restantes línguas europeias. A conflitualidade e um certo isolamento têm marcado a existência deste povo desde há muitos séculos. Contudo, no século XX os bascos foram particularmente oprimidos - a Guerra Civil Espanhola (19361939) e o regime franquista são disso exemplo.
Origens do reino basco A mistura entre a história e a ideologia acabou por tornar, inextricavelmente, o passado numa arma de combate. Nada é pacífico entre bascos e espanhóis. Nem hoje, nem no mais remoto dos séculos. A própria génese do nome "bascos" não é consensual, aceitando-se a tese segundo a qual se tratará de uma designação pré-céltica, proveniente da palavra "vascunes", que nomeava "os das alturas" ou "os da montanha". ( ... ) A Reconquista Católica, partindo das Astúrias para sul, provocou, por seu turno, ao desenvolver-se através da região de Navarra, importantes sistematizações no povoamento e na organização políticomilitar dos territórios "vascongados", Alava, Biscaia e Guipúzcoa, incluídos no ducado. Com essa origem, surgirá no século VII o Principado de Pamplona, onde os árabes chegaram no ano 732. O território permanecerá sob dominação muçulmana durante 102 anos, antes de ser resgatado por Iñizo Aritza, considerado o primeiro rei basco ( ... ). O Principado de Pamplona é entendido como "o primeiro Estado basco organizado na História". Fonte: Rui Pereira (2005) - Euskadi, a guerra desconhecida dos bascos, p. 32 e 33
Foi em finais do século XIX, com Sabino Arana Goiri, que culminou a teorização nacionalista com a criação do Partido Nacionalista Basco (PNV). Sabino fundou um nacionalismo alicerçado na ideia de "raça" e de "pureza de sangue". Com o desenrolar dos tempos, o PNV veio a dar origem a movimentos de afirmação nacionalista moderados e a movimentos de reivindicação separatista radicais. Destes últimos, o ETA e o Herri Batasuna (seu "braço" político) são os expoentes máximos do nacionalismo radical. O Movimento de Libertação Nacional Basco resistiu ao franquismo e ao pós-franquismo e conta com vários organismos e estruturas, a nível legal, paralegal e ilegal (onde se inclui a ETA). Embora inicialmente a ETA pretendesse defender a língua e as tradições bascas, nos anos 70 surgiu a sua facção armada, que tem levado a cabo várias acções terroristas. No início de 2005 foi promovida mais uma iniciativa nacionalista com o Plano Ibarretxe (nome do presidente do Governo autónomo) através da proposta de um novo estatuto para o País Basco, com direito a autodeterminação. Esta proposta, entretanto chumbada pelo Parlamento espanhol, não reuniu consensos no todo espanhol e na própria Comunidade Autónoma Basca. Para os nacionalistas independentistas bascos a Comunidade Autónoma Basca não o é efectivamente sem Navarra e as três províncias francesas. Contudo, nem Navarra nem as províncias francesas aderem a este movimento separatista. Em 1979, Navarra, através do referendo que ligou as três províncias bascas Álava, Biscaia e Guipúzcoa -, manifestou a sua vontade de não se unir ao território basco. Enfim, os nacionalistas bascos pretendem recuperar e unificar os territórios "originais", mas os habitantes desses territórios não são só bascos e nem mesmo todos os bascos o pretendem.
O Cáucaso, um caldeirão explosivo A implosão da URSS em 1991 fez-se acompanhar da constituição de três novos países na área caucasiana - Geórgia. Arménia e Azerbaijão - e da desestabilização na região norte caucasiana, com o recrudescimento de nacionalismos que se encontravam latentes. A reconfiguração territorial e o incremento de migrações têm acentuado a instabilidade e contribuído para uma incrível mistura etnolinguístico-religiosa (fig.4).
Fig. 4 – Os países caucasianos e as repúblicas russas norte-caucasianas. O Daguestão é um caso paradigmático desta mistura explosiva - causas etnopolíticas, geopolíticas, sociopolíticas e ideológicas contribuem para a existência de uma das áreas potencialmente mais perigosas do Globo (fig.5).
Fig. 5 – Causas de conflitualidade no Daguestão
Apesar de todo este perigoso conjunto de circunstâncias, o Daguestão tem-se mantido relativamente estável, ao contrário das suas vizinhas Tchetchénia, Inguchétia e Ossétia do Norte. O Cáucaso do Norte, uma "dor de cabeça" para a Federação Russa Os processos políticos no Cáucaso do Norte no período de 1999-2000 conduziram a uma profunda crise de soberania na região. As principais indicações deste facto residem nas novas formas (políticas, legais e organizacionais) de conflito entre o centro federal e o Cáucaso do Norte, o aumento do número de participantes no confronto tchetcheno e a luta entre grupos políticos de origem étnica com influência na região. Os problemas políticos mais agudos, resultantes de contradições entre o centro federal e as repúblicas nacionais do Norte do Cáucaso, encontram-se agora relativamente circunscritos à Tchetchénia. Fonte: Larissa Khoperskaia - "The Northen Caucasus: factors of confrontation and prospects for stability", www.ca-c.org
A Chechénia tem sido palco, nos últimos anos, de violência assustadora. O desmembramento da URSS, em 1991, fez reavivar antigas resistências e levou à autoproclamação de independência por parte desta república. Seguiu-se uma guerra com a Rússia (1994-1996), saindo esta derrotada. Contudo, novo ataque russo, em 1999, prolongou o controlo da Rússia na região, nomeadamente com eleições organizadas pelo poder central. Tchetchénia e nacionalismo caucasiano As autoridades russas recusam-se a admitir que o terrorismo e o islamismo com que hoje se encontram confrontadas no Cáucaso são apenas instrumentos, sendo o nacionalismo o seu problema principal nesta região. De todas as energias políticas, o nacionalismo apresenta-se como a mais poderosa e resistente. ( ... ) Na Tchetchénia, incapazes de vencer no terreno, os russos querem mostrar que nada se pode fazer sem eles em todo o Cáucaso, e o espectro de um "segundo Afeganistão" continua a obcecá-los. Uma nova derrota militar face à nebulosa islamita na Tchetchénia seria ainda mais humilhante (os tchetchenos são menos de um milhão ... ) e poderia incendiar o barril de pólvora que é o Cáucaso, traduzindo-se num desmembramento territorial. Daí a rejeição de quaisquer negociações, de um qualquer reconhecimento do direito à autodeterminação. E também a brutalidade de uma repressão que em troca fomenta terroristas prontos a todas as loucuras criminosas. Fonte: Ignacio Ramonet - "O labirinto caucasiano", Le Monde Diplomatique, Outubro de 2004
A instabilidade desta vasta área é uma realidade que se vai multiplicando num processo que parece infindável. Mesmo nos países que se tornaram independentes no pós-1991, existem regiões que reivindicam autonomia – a Abecásia e a Ossétia são disso exemplo. O petróleo do mar Cáspio e os oleodutos da região caucasiana não deixam indiferentes nem russos nem ocidentais, contribuindo para o agonizar dos problemas.
Os fundamentalismos Por fundamentalismo entende-se toda e qualquer doutrina ou prática social, que busca seguir determinados fundamentos tradicionais, geralmente baseados em algum livro sagrado ou práticas habituais. O fundamentalismo Em 1910, nos Estados Unidos, teólogos protestantes de tradição anglo-saxónica compilaram diversos artigos, de características teodoutrinárias, numa colectâ genérica de Fundamental. Os seguidores e defen
nea que recebeu a designação
sores destas confissões doutrinárias passaram a
ser designados de Fundamentalists. Defendiam o literalismo bíblico e procuravam afastar ideias novas ou inovadoras. Fonte: Eugénio Almeida (2003) - Fundamentalismo Islâmico - A ideologia e o Estado, Autonomia
Um fundamentalista vive na convicção plena de que a sua doutrina é a única verdadeira, desvalorizando as restantes. O fundamentalismo assume diversas faces, cujo denominador comum é uma absolutização do "eu" em detrimento do "outro". No contexto actual, algumas manifestações fundamentalistas ocupam um papel central, nomeadamente as representadas pela globalização imperante e pelo fundamentalismo suicidário. Naturalmente, o fundamentalismo suicidário, preconizado pelos radicais islâmicos, por romper com os marcos da globalização moderna, tornou-se desinteressante ao capitalismo e assim vai sendo combatido também ele com violência (no Afeganistão, no Iraque, na Tchetchénia e onde mais se manifeste).
A globalização imperante - uma manifestação fundamentalista? Um conjunto de acontecimentos, dos quais se destacam o final do confronto EUA-URSS, a queda do Muro de Berlim e a implosão da União Soviética, quebrou o sistema bipolar das relações internacionais, permitindo a emergência e a redefinição de uma nova arquitectura do poder e da ordem internacional. Em certa medida, o conceito da nova ordem "multipolar" perde consistência, a favor da consolidação dos EUA como a "hiperpotência", sem rival estratégico. Com o objectivo de reforçar o diferencial de poder relativamente a outras potências, os EUA circunscrevem as regras e condutas à sua vontade intrínseca, determinando os limites em função dos seus próprios interesses, mesmo que ultrapassem os organismos internacionais. A hegemonia dos EUA assume diversas faces do poder, estendendo-se muito para além do poderio militar, para áreas como a política, a economia, a ciência e a cultura. A situação de controlo e de poder para decidir é claramente favorecida pelo grande capital de influência e de "poder de atracção".
A área em que mais se destaca o efeito fundamentalista é a nível militar. A actual devastação do Iraque somada ao lento genocídio dos palestinianos, à colonização do Afeganistão e à penetração nas repúblicas do Cáucaso e Ásia Central são facetas de um vasto programa militar para controlar o Médio Oriente. O combate dos EUA contra os seus inimigos ou potenciais alvos promove a existência, à escala mundial, de uma guerra assimétrica. A assimetria militar Este conceito reside na oposição de dois adversários que dispõem de meios e capacidades totalmente desequilibrados, sendo que o mais fraco tem de recorrer a outros processos, expondo a sua desigualdade, para explorar todas as vulnera
-
bilidades do adversário, a fim de poder ser contundente. Fonte: Relatório ]anus, 2005
De certa forma, os atentados de 11 de Setembro de 2001 foram a manifestação mais expressiva do poder assimétrico. A Administração norte-americana em 20 de Setembro de 2002 publicou um documento definidor da "nova estratégia nacional de segurança". Essa estratégia, alicerçada na existência de uma força militar sem comparação, promove a autodefesa, a título preventivo. Após a identificação da ameaça iminente, a América intervirá antes mesmo que a ameaça se concretize. A guerra preventiva Se, para atacar, esperarmos que a ameaça seja verdadeiramente posta em execução, então temos esperado demasiado tempo. Devemos levar o campo de batalha para o terreno do inimigo, antecipar os seus planos e suprimir a ameaça antes que o inimigo possa pô-la em prática. Fonte: Ramonet Ignacio (2003) - O império contra o lraque
O 11 de Setembro foi o factor detonador, ao ser encarado como a justificação para os EUA expandirem o seu poder. A própria expansão assume-se como um elemento revelador do poder efectivo dos EUA e da dificuldade de relações transatlânticas e intereuropeias, nomeadamente na questão iraquiana. Paralelamente ao "factor detonador", o pensamento único, preconizado pela produção capitalista, justifica o alargamento do poder ao Médio Oriente, no sentido de garantir a "locomoção" da máquina económica. O alargamento militar/económico ao Médio Oriente, nomeadamente aos países do Golfo, associa-se ao factor estrutural de riqueza e de poder, que o domínio do mercado mundial de petróleo e gás natural representa especialmente quando se depende, em termos
energéticos, do mesmo.
A tentativa fundamentalista de dominação do Médio Oriente confronta-se com barreiras relacionadas com a incapacidade para prever a amplitude da resistência. Esta resistência, tal como a que aconteceu no Iraque, chocou com os interesses capitalistas que se iam esboçando. Como resposta à acção capitalista e neoliberal, promovida pelos EUA, e seguida por todos os periféricos globalizados, os actores assimétricos não estatais proliferam, especialmente as redes terroristas. As suas motivações resultam de uma deturpação do islamismo que provoca ódio aos "infiéis". Ao rejeitar as regras éticas e previsíveis, eliminam a fronteira entre a motivação ideológico-política e a associação criminal. Em conclusão, são dois os movimentos geoestratégicos que marcam o mundo actual. Por um lado, a guerra mundial contra o terror; por outro, o jogo de acções de terror como combate a essa guerra e à hegemonia económico-cultural do Ocidente.
Fundamentalismo religioso Por vezes o conceito de fundamentalismo religioso é identificado com o fundamentalismo islâmico, mas o primeiro não se restringe ao segundo. Apesar de o fundamentalismo religioso, enquanto doutrina, se centrar numa colectânea dos radicalistas norte-americanos de confissões protestantes, em termos históricos a Inquisição praticada pelos católicos na Idade Média assumiu-se como uma primeira forma de fundamentalismo religioso. O fundamentalismo acompanha a própria História da Humanidade, desde a Grécia e a Roma antigas até aos nossos dias. Contudo, verificaram-se algumas alterações, nomeadamente nos alvos preferenciais, nas motivações e nos métodos. O exacerbar do “eu”, esquecendo que o outro é um outro eu, por vezes assume contornos violentos, com recurso sistemático à destruição. No actual cenário mundial, o fundamentalismo de origem islâmica ganha expressão e notoriedade pelo impacto das suas manifestações, nomeadamente o caso de actos terroristas. O fenómeno do terrorismo despoletou as atenções dos governos. Actualmente é alvo de análises rigorosas desde o perfil psicológico dos indivíduos, passando pelas crenças religiosas e ideológicas dos grupos, até aos governos ou países que patrocinam, apoiam, treinam e protegem organizações terroristas. O fundamentalismo suicidário praticado por muçulmanos parte da convicção de que o seu inimigo é o Ocidente, porque este se baseia numa perspectiva materialista e imperialista. O termo Islão significa "submissão a Deus", etimologicamente com raízes na palavra saiam ou paz. A essência do Islamismo acaba por ser distorcida pelos radicais que praticam actos hediondos em nome do Islão.
Sob a égide da Jihad, ou guerra santa, grupos extremistas mostram-se empenhados numa luta global contra o inimigo, o Ocidente, tido como corrupto e opressor. No cenário mundial, muitos são os grupos que lançam o terror para fundamentar o seu querer, o seu acreditar, normalmente radicados em países com predominância religiosa muçulmana. Alguns grupos, multifacetados, paralelamente aos programas políticos e sociais, proliferam com a violência. Da acção destes grupos destaca-se a tentativa de impor a teocracia em terras muçulmanas e eliminar as influências "impuras" do Ocidente. Segundo a CIA, a face mais visível e mortífera deste proceder aparece associada a Bin Laden e à Al-Qaeda, com células identificadas ou suspeitas em 68 países (fig. 6).
Fig. 6 – Países com células da Al-Qaeda identificadas ou suspeitas. Para além da extensão mundial da rede AI-Oaeda, o clima de ameaça constante provoca um sentimento de insegurança generalizado, directamente proporcional à incerteza do acontecimento, não só temporal como espacial. O mapa do terror alarga-se à escala mundial, mas sempre focalizado no combate aos interesses ocidentais, o que resulta numa guerra aberta sem campo de batalha específico (fig. 7). Esta indeterminação do “onde” provoca no cidadão comum o receio dos terroristas fantasmas que estão em todo o lado e em lado nenhum. A ousadia crescente e a crueldade sem limites do terror são os maiores desafios enfrentados pelo mundo civilizado.
Fig. 7 – Os principais ataques terroristas desde 1995 até Setembro de 2005. Os ataques levados a cabo em Madrid, a 11 de Março de 2004, por um grupo com relações à rede Al-Oaeda são um exemplo de manifestação do fundamentalismo através de práticas terroristas. Alguns especialistas consideram que estes ataques se relacionam com uma vingança pela detenção de dezenas de suspeitos da Al-Oaeda no rescaldo do 11 de Setembro, bem como pela participação da Espanha na guerra contra o Iraque. Apesar da amplitude e repercussões do atentado de 11 de Março, as reacções souberam distinguir o acto isolado de um grupo de radicalistas dos muçulmanos, em geral, que habitam em Espanha. A Al-Oaeda possui um papel preponderante nas práticas fundamentalistas de carácter violento, estabelecendo contactos estreitos de colaboração com outros grupos que se destacam também pela violência exercida. Os rebeldes tchetchenos, na sua luta separatista, têm concretizado diversos ataques, independentemente das repercussões que os seus actos poderão alcançar (tal como o perpetrado por terroristas islâmicos tchetchenos e árabes em Beslan, na Rússia). Os responsáveis pelo ataque eram na sua maioria tchetchenos, militantes separatistas e alguns terroristas árabes, o que indicia a existência de uma conexão com a Al-Oaeda, extravasando a sua raiz nacionalista. O fundamentalismo religioso (manifestado em ataques terroristas) ultrapassa os limites da racional idade humana. Nesta rede intrincada de legitimações e justificações, a religião desempenha um papel central.
A centralidade da religião decorre da sua importância enquanto dimensão a que os povos se "agarram" para contrariarem a uniformização económica e cultural. A religião, factor de identidade A religião é um reservatório de identidade, atestando uma especificidade, uma história e, por isso, uma memória e uma solidariedade. Ser paquistanês é ser muçulmano, ser tailandês é ser budista; ser assírio-caldeu é ser cristão. Fonte: Atlas da globalização, 2003
Reconhecido e identificado o poder de reafirmação identitário da religião, a esfera política exerce uma tentativa de a instrumentalizar. As guerras de religião são o espelho das guerras políticas.
Entre o balanço e novas expressões O actual cenário mundial é dominado por dois "actores", que se assumem como combatentes do eixo do mal. A principal questão é que cada um desses actores reivindica a prática do "bem" para combater o outro. Por um lado, os EUA justificam as suas intervenções como resposta à ameaça do terrorismo; por outro, os movimentos radicais muçulmanos praticam actos terroristas a fim de estancar o domínio capitalista promovido pelos EUA. Paralelamente ao facto de se "alimentarem" reciprocamente, estes dois tipos de fundamentalismo dominam as atenções mundiais. Neste mediatismo coexistem muitas outras manifestações fundamentalistas. O fundamentalismo verde assume-se como um movimento de deslegitimação, na medida em que questiona a evolução civilizacional, promovendo algo originário, elementar. O originário não são as raças humanas, mas sim as espécies naturais da Terra e as suas condições naturais de sobrevivência. Este movimento ganha força e notoriedade, na medida em que o sistema capitalista põe em causa a sustentabilidade, ao degradar sucessivamente as condições naturais de vida. Em conclusão, na sociedade reflectem-se várias manifestações fundamentalistas, em domínios tão diversos como a economia, a religião e o ambiente. Apesar dessa diversidade, o seu eixo estruturante é que todas elas se consideram possuidoras da verdade e de legitimidade, mesmo que a imposição ao outro assuma um carácter violento.
As guerras da água Os recursos naturais também podem estar na origem de conflitualidades. Quando um recurso é valioso (petróleo, ouro, diamantes, etc.) ou essencial para a sobrevivência, a "luta" por ele pode degenerar em conflitos. A água é essencial à sobrevivência e simultaneamente escassa em algumas áreas do Globo estão, pois, conjugadas duas razões para que este bem possa ser fonte de discórdia, de tensão ou mesmo de guerra. A Terra é o "planeta azul", domínio da água. Contudo, esta "preciosa" substância não está igualmente repartida por todo o Globo, nem tem igual qualidade em todas as latitudes e longitudes, sendo mesmo muito escassa (em quantidade e qualidade) em várias áreas do planeta. Existem conflitos, quer na gestão das águas salgadas (mares e oceanos), quer no acesso e na gestão das águas doces (glaciares, rios, águas subterrâneas). Porque estas são as mais directamente requeridas pelo Homem e porque existe efectiva carência em algumas áreas, estão na origem de vários conflitos regionais.
Conflitos associados à partilha e gestão das bacias hidrográficas Nos conflitos relacionados com as águas superficiais destacam-se os que ocorrem em situações de águas partilhadas e, principalmente, quando a escassez é acentuada. São muito numerosos os rios internacionais. Números impressionantes Existem actualmente 263 rios que atravessam ou demarcam as fronteiras políticas de dois ou mais países. Em termos geográficos, a Europa possui o maior número de bacias internacionais (69), seguida de África (59), Ásia (57), América do Norte (40) e América do Sul (28). As 263 bacias hidrográficas internacionais cobrem quase metade da superfície terrestre do planeta, afectam cerca de 40% da população mundial e representam aproximadamente 60% do caudal global dos rios. ( ... ) As bacias internacionais são partilhadas por 145 nações. Fonte: Soromenho- Marques (2003) - O desafio da água no século XXI, p. 188
Os rios internacionais colocam, por vezes, problemas na demarcação fronteiriça: a fronteira estabelece-se segundo a linha do talvegue ou segundo as margens (direita e esquerda)? Em qualquer dos casos, como se faz o usufruto da água numa qualquer secção do rio pelas regiões das margens esquerda e direita, respectivamente?
Por outro lado, surgem frequentemente situações tensas ou mesmo litigiosas, fruto da relação com o que se passa a montante da fronteira - questões de retenção excessiva ou de poluição das águas podem ter repercussões nefastas no(s) país(es) a jusante. Sempre que a partilha da água, tendo em conta a relação entre a procura e a oferta (em quantidade e qualidade), é desfavorável a uma das partes, estão criadas condições para se instalar um conflito (fig . )8.
Fig. 8 – A origem e a resolução de conflitos hídricos. Dos variadíssimos rios internacionais, os que colocam, à partida, maiores problemas são os que percorrem áreas de certa aridez - Amudária e Sirdária (f i g .9), Nilo, Tigre e Eufrates, Jordão, etc. No entanto, também os que se inserem em áreas com excesso de precipitacão (e consequentemente de caudais) numa época do ano podem ser geradores de tensões (Ganges e Bramaputra, etc.).
Fig. 9 – As bacias dos rios Amudária e Sirdária.
Se atendermos às características climáticas desta região (fig. 10), ao volume de água disponível per capita e às características da agricultura irrigada, facilmente se compreenderá a importância crucial que a água assume nesta região.
Fig. 10 – Os problemas ambientais nos países da Ásia Central. Para uma melhor compreensão da "questão da água" nas bacias hidrográficas dos rios Amudária e Sirdária será necessário ter em linha de conta aspectos de natureza política, económica e social. Estamos perante novos estados emergentes, na Ásia Central, marcados por tensões étnicas, por crises políticas e sociais. Estão em processo de transformação para uma economia de mercado, sendo a agricultura um sector fundamental onde se recorre a sistemas de irrigação em grande escala. A estes dados é necessário acrescentar outros aspectos de natureza ambiental (fig. 10). A forma como a água é utilizada pelos diferentes estados foi, e continua a ser, a razão do conflito. O Tajiquistão, Estado situado a montante, valorizou a sua produção hidroeléctrica através da construção da barragem de Nurek, que alterou o regime do rio Amudária, originando uma certa "penúria" de água no Verão e cheias artificiais no Inverno. Esta situação coloca em perigo toda a prática da agricultura irrigada nos estados situados a jusante. Mesmo nos países situados a montante a agricultura irrigada continua a ser uma fonte de litígio dado que estes sempre se apresentaram com uma forte tradição hidráulica e geriram, a seu favor, a maior parte das reservas. O que sobra para os outros países são caudais cada vez mais reduzidos e irregulares. A curto prazo, esta prática poderá pôr em causa os perímetros irrigados a jusante do rio Seravshan e do canal Karakoram. O funcionamento e a existência destes "canais" fluviais poderão estar mesmo em perigo, dado que o Turquemenistão e o Usbequistão reenvidicam um aumento suplementar dos caudais dos rios Amudária e Sirdária, por forma a elevar o nível das águas do mar de Aral.
Nesta região a questão política continuará a marcar as tensões sobre o uso da água. Enquanto esta dupla bacia esteve sob gestão da URSS, a distribuição das águas foi mais igualitária. Actualmente, com a independência destes estados, os situados a montante passaram a exercer maior controlo sobre as águas, colocando os estados de jusante em situação desfavorável. No Egipto a "luta" pela água assume uma importância vital dado que 98% do seu território é ocupado pelo deserto. O Egipto, um dom do Nilo. Esta associação do Nilo ao Egipto é milenar e a questão dos "direitos adquiridos" sobre o uso das suas águas só se veio a colocar nos anos 30 do século passado. O problema da repartição das águas do Nilo surgiu a partir de 1929, altura em que os ingleses iniciaram a cultura do algodão no Sudão e impuseram a seguinte divisão de água: 4 km 3 para o Sudão e 48 km3 para o Egipto (fig. 11).
Fig. 11 – A rede hidrográfica do rio Nilo.
Em 1959, com a independência do Sudão, foi revista a anterior divisão da água, passando a ser de 55,5 km3 para o Egipto e 18,5 km3 para o Sudão. Qual a posição dos outros estados ribeirinhos? As possíveis objecções dos estados situados a montante não foram tidas em conta. Foi neste contexto que a Etiópia fez saber que considerava nulo o "acordo" de 1959. O conflito estava instalado. O Egipto, perante este cenário, decidiu construir a barragem de Assuão que lhe permitiria não só suplantar o dilema da falta de água como também conquistar terras ao deserto. Mas, acima de tudo, era uma tentativa para se libertar da chantagem exercida pelos países situados a montante. O Sudão, numa situação de compromisso com o Egipto, construiu a barragem de Roseires (fig. 12). Foi "projectada" também a construção do canal de Jonglei (projecto não concluído), destinado à irrigação e à produção de energia hidroeléctrica para ambos os países (fig.12). Com a vaga de independências dos anos 60, a luta pela água tornou-se uma questão de sobrevivência e de desenvolvimento: o rápido crescimento demográfico, a pobreza extrema, os movimentos forçados da população, as situações de guerra civil, a instabilidade política e as tensões étnicas que se vivem em alguns países da bacia do Nilo apontam para relações de grande conflito que poderão ser exacerbadas se tivermos em conta os índices de vulnerabilidade hídrica (relação oferta/procura, disponibilidade per capita e dependência externa) (doe.12).
Fig. 12 – Aspectos hídricos nos países da bacia do Nilo em 2001.
O rio Ganges nasce nos Himalaias e desagua na baía de Bengala sob a forma de um extenso delta. Se é verdade que a bacia hidrográfica do rio Ganges (fig. 13) é uma das maiores do mundo, não é de somenos importância o facto de ela ser considerada uma das áreas com maior densidade demográfica a nível mundial.
Fig. 13 – A bacia do Ganges e do Bamaputra. O rio atravessa vastas áreas urbanas e intensamente povoadas. Este facto reveste-se de particular importância dado que uma boa parte deste "formigueiro humano" depende das águas do rio Ganges, poluindo-o de uma forma catastrófica. Se se atender a que só a índia regista, por ano, mais de 18 milhões de nascimentos, compreender-se-á melhor como a luta pela água, mesmo em regiões de relativa abundância, poderá alimentar conflitos. A criação de gado e a agricultura empregam quase 80% do total da população em alguns países da bacia. Há que assinalar ainda o grande potencial hidroeléctrico do rio Ganges, que lhe confere uma enorme importância económica e é, ao mesmo tempo, causa de discórdia. A grande fonte de tensão surgiu no momento em que a índia, em 1961, decidiu construir a barragem de Farakka, a montante da fronteira com o Bangladesh. A partir desta data, o Bangladesh não cessou de protestar por considerar que aquela obra de engenharia hidráulica provocava graves danos na agricultura, na indústria e na ecologia do país. O mesmo projecto hídrico incluía a construção de um canal de 38 km de comprimento que desviaria a água da barragem de Farakka para o rio Hooghly, deixando o Bangladesh sem água suficiente nem para irrigar as terras, nem para manter o nível da toalha freática. Na realidade, a barragem servia para desviar os caudais do Ganges para a parte indiana, em período de seca, e em período de cheias o caudal seria debitado no Bangladesh. A gravidade do litígio tem-se agudizado de tal forma que em 1976 o Bangladesh colocou o assunto na Assembleia-Geral da ONU, que sugeriu que as duas partes chegassem a um acordo. Na sequência do pedido da ONU cada governo produziu um plano perfeitamente incompatível com o do seu adversário
Conflitos associados à partilha e gestão de águas subterrâneas A necessidade de aprovisionamento das águas subterrâneas é particularmente manifesta em áreas (sub)desérticas, como é o caso dos países do Norte de África (fig. 14). Por exemplo, a Líbia, em 1983, apresentou um projecto que visava a construção do Grande Rio Artificial (GRA) com o objectivo de transferir reservas de água subterrânea que se encontravam' no subsolo desértico, no Sul do país.
Fig. 14 – As reservas subterrâneas de água no Norte de África.
O conflito da água vivido pela Líbia assume contornos de natureza económica e ambienta!. Por um lado, a construção do GRA parece ser economicamente pouco viável (a água deste canal seria utilizada para a produção agro-alimentar de reduzido valor acrescentado); por outro, todo este investimento será aplicado em fontes aquíferas que não poderão renovar-se (a durabilidade da exploração está avaliada em cerca de 50 anos). Perante este cenário a questão problemática será: explorar as reservas fósseis de água ou deixá-las no subsolo? No caso da Líbia, a exploração dos aquíferos fósseis do deserto servirá para fomentar a cultura do trigo que lhe permitirá a redução da dependência alimentar. Dado que o aquífero que alimentará o Grande Rio Artificial é transfronteiriço (e estende-se essencialmente em subsolo argelino), a concretização deste projecto poderá desencadear um conflito líbio-argelino.
O conflito israelo-palestiniano – a convergência de múltiplas “razões” A situação no Médio Oriente, com toda a sua intensidade e multiplicidade de manifestações, é um exemplo de como várias causas se podem associar num mesmo conflito, gerando-o e alimentando-o. A região onde se insere a área actualmente ocupada por palestinianos e por Israel é tradicionalmente problemática foi o "berço" de civilizações antigas, origem de três crenças religiosas (cristianismo, judaísmo e islamismo), palco de variadíssimas disputas, área em permanente reconfiguração (fig. 15).
Fig. 15 – Israel e os territórios palestinianos ocupados. Com a criação (pela ONU) do Estado de Israel, em 1948, muitos palestinianos foram excluídos do seu habitual território (essa expulsão é usualmente conhecida por Nakba). A opressão e segregação do povo palestiniano agravadas pela ânsia expansionista de Israel têm contribuído para que a conflitualidade se mantenha na ordem do dia. O prometido Estado palestiniano tem tardado em ser reconhecido e se afirmar. Israel, que tem contado com o apoio dos EUA e de outros países ocidentais, tem-se imposto na região e no mundo. Por outro lado, os palestinianos vão tentando de forma diplomática, algumas vezes, de modo conturbado e armado, na maioria dos casos, afirmar a sua soberania na área.
A Organização de Libertação da Palestina (OLP), o Hamas, o Hezbollah (Partido de Deus) e a Jihad Islâmica têm sido os principais protagonistas (note-se que alguns são de cariz marcadamente fundamentalista). Se às tentativas de afirmação nacionalistas de ambas as partes associarmos a pretensa superioridade 9 0 S israelitas e a busca incessante pelo controlo dos recursos naturais (nomeadamente da água, bem muito escasso na região), é fácil compreendermos como todas estas circunstâncias alimentam uma guerra que parece não ter fim (fig. 16).
Jordão: o eterno conflito pelas suas águas A bacia do Jordão é uma das poucas bacias internacionais em que o conflito sobre a água foi uma das causas que conduziram, de forma directa, a hostilidades armadas entre alguns estados ribeirinhos, no pós-Segunda Guerra Mundial. Esta bacia apresenta-se como um dos mais complexos problemas hidropolíticos que a comunidade internacional enfrenta. Primeiro, porque nesta região a água é um factor que está intimamente relacionado com as questões da "alta política". Depois, porque se trata de um complexo de segurança directamente ligado a dois outros complexos hidropolíticos [Nilo e Tigre e Eufrates]. Fonte: Paula Pereira in Soromenho-Marques (2003) - O desafio da água no século XXI, p. 291
É um facto que Israel tem ocupado espaço palestiniano, não só pelo crescendo de colonatos como pela desigual densidade populacional que se verifica em Gaza e na Cisjordânia (em Gaza, a densidade populacional nos espaços palestinianos é da ordem dos 5450 hab./km2, enquanto que nos colonatos judeus desse território é de 48 hab./km2). Tem, ainda, controlado e desviado recursos hídricos da Cisjordânia. Por tudo isto não são de estranhar as manifestações de desagrado, por vezes muito violentas. Vários foram já os períodos de acalmia, mas o mais pequeno incidente acaba por "incendiar" novamente os ânimos.
Fig. 16 – A água no centro do conflito israelo-árabe (Fonte: Atlas da Globalização, 2003, p.169) No início dos anos 2000, a luta e a inflexibilidade agudizaram-se, o que se traduziu, nomeadamente, na construção de uma barreira na Cisjordânia, separando áreas ocupadas por israelitas das palestinianas. Este novo "Muro da Vergonha" é uma das faces visíveis da conflitualidade.
(Sobre)Viver cercado
As aldeias de Deir Ballut, Rafat e Zawaie tornar-se-ão um enclave e perderão grande parte dos seus terrenos agrícolas. A retirada de terra começou em 7 de Junho e os protestos são diários. No enclave vivem cerca de 11 700 pessoas, aproximadamente 780 das quais refugiados. ( ... ) Israel tem planos para construir uma dupla barreira na parte oriental do aeroporto de Ben -Gurion.( ... )
Fonte: UNRW A - Reports on the West Bank Barrier, Junho de 2004
Veremos se com a morte de Yasser Arafat (ex-presidente de Autoridade Palestiniana), em finais de 2004, e com o novo interlocutor saído das eleições palestinianas de Janeiro de 2005 - Mahmoud Abbas - se poderá, finalmente, concretizar um plano de paz para a região. Tem havido uma esperança contida desde a cimeira de Charm EI-Cheikh (Egipto), em 8 de Fevereiro de 2005, entre o então primeiro-ministro israelita (Ariel Sharon) e o presidente da Autoridade Palestiniana (Mahmoud Abbas), em que estes dois dirigentes se comprometeram a instaurar um cessar-fogo. Na sequência da mesma iniciou-se em Agosto de 2005 a retirada israelita de parte dos Territórios Ocupados. A vitória do Hamas (movimento radical) nas eleições palestianas do início de 2006 veio lançar nova incógnita sobre esta área do Globo.
Outros conceitos:
Xenofobia – aversão, frequentemente agressiva, face ao estrangeiro. Patriotismo – amor pela terra natal e pelos seus. ETA – (Euskadi Ta Azkatasuma) – Pátria basca e Liberdade. Talvegue – corresponde ao ponto mais baixo de uma secção transversal do leito do rio. OLP – organização da Libertação da Palestina, criada em 1964. Intifada – “Guerra das pedras”, grande levantamento dos palestinianos contra a ocupação israelita (1ª – 1987; 2ª – 2001).
Bom Estudo! Geografia C – 12º ano – prof. Joaquim Madruga