Filosofia e história do nascimento da ciência moderna na Europa por Paolo RossiDescrição completa
Propõe-se, nesse trabalho, apresentar uma síntese das reflexões Edgar Morin a respeito de questões fundamentais para melhorar a educação no século XXI. Tais reflexões que compõem o texto intitulado...Full description
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O nasczmento das fábricas
Edgar de Decca
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by Ee!gas SaJvadori de 0oc<:a. 1962
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ISBN: 65-11· 02051·9 -10' ·· odição. 1982 ecf~. 1995 4t roi'npresão, 2004
Revisão· Na\vtOh T. L Sodré e Júbo O. Gaspar Capa: 123 (anHgo 27) M istos GnlfiCQs
Dentre todas as utopias criadas a partir do século XVI . nenhuma se realizou tão desgraçadamente como a da sociedade do trabalho. Fábricas-prisões. fábricas-conventos. fábricas sem salário, que aos nossos olhos adquirem um aspecto carica tural, fo· rnm sonhos realizados pelos patrões e que tornaram possível esse espetáculo atual da glorificaçã o do trabalho. Para se ter uma idéia da força dessas utopias realizadas impregnando todos os momentos da vida social a partir do século XVIII. basta considerarmos a transformação positiva do significado verbal da pró· pria palavra trabalho, que até a época Moderna sempre foi sinônimo de penalização e de cansaços insu· portáveis, de dor e de esforço extremo. de tal modo que a sua origem só poderia estar lignda a um estado extremo de miséria e pobreza. Seja a palavra latina e inglesa labor, ou a lrancesa rravail. ou grega ponos ou a alem li Arbeit. todas elas, sem exceção, assi·
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nalam a dor e o esforço inerentes à condição do homem, e algumas como ponos e Arbeit têm a mes· ma raiz etmol6gicn que pobreza (penia e Armut em grego e alemão, respectivamente) . Essa transformação moderna do significado da própria palavra tr abalho, em sua nova positi\·idade, representou também o momento em que, a partir do século XVI, o próprio trabalho ascendeu da " mais humilde e desprezada posiçlo ao nivel mais elevado e à mais valorizada das atividades humanas, quando Locke descobriu g ue o tr abalho era a fonte de toda a propriedade. Seguiu seu curso quando Adam Smith afirmou que o trabalho era a fonte de toda a riqueza, e alcançou seu ponto culminante no "sistema de trabalho" de Marx onde o trabalho pasSóu ã ser a fonte de toda a produtividade e expressão da própria humanidade do homem" (Hannah Arendt, La Con· dició11 Humano, p. 139). A dimensão crucial dessa glorificação do tra· balho encontrou s upor te definitivo no su rgimento da fábrica mecanizada, que se tomou a expressão su· prema dessa utopia realizada, alimentando, indu· sive, as novas ilusões de que a partir dela não hâ limites para a pn>dutividade humana. Essa descoberta delirante da fábrica como lu· gar, por excelência, no qual o trabalho pode se apre· sentar em toda a sua positividade nl!o s6 alimentou as projeções dos .apologistas da sociedade burgue.~a. como também a de seus próprios criticas. na medida em que ela foi entendida como o momento de uma liberação sem precedentes das !orças produtivas da
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sociedade. Assim, a fábrica ao mesmo tempo que confi.T1llava a potencialidade criadora do trabalho anunciava a dimensão ilimitada da produthidade humana a través da maquina ria. Para esse pensamento movido pela ct-e.nça do poder criador do trabalho organizado. a presença da máquina definiu de uma vez por todas a [ábrica como o lugat· da superação das barreiras d a própria condição humana. " A invenção da máquina a vapor e da máquina para trabalhar o algodão". escrevia Engels em 1844. "deu lugar como é sobejamente conhecido a uma Revolução Industrial, que transformou toda a sociedade civil. " Essa imagem crista· lizada já no pensamento dos homens do século XIX
apagou todo o percurso sinuoso da organ ização do trabalho da época Moderna, no reduzir d elinitivamente a fábrica a um acontecimento tec nológico. Contudo. os ecos das resistências dos homens pobres a se submeterem aos rígidos padrões do trabalho organizado são audh•eis desde o século XVII e assinalam a presença da fábrica a partir de um marco distinto daquele definido pelos pensadores do sé· culoXIX. Aqueles primeiros homens, que se viram cons· Lrangidos pela pregação moral do tempo útil e do trabalho edificante, sentiram em todos os momentos de sua >·ida cotidiana o poder destrutivo desse no>·o princípio normativo da sociedade. Sentiram na pró· pria pele a transform ação t'adical do conceito de trabalho, uma vez que essa nova positividade exigiu do homem pobre a sua submissão completa ao man·
do do patrão. lnlrojetar um relógio moral no coração de cada trabalhador foi a primeira vitória da sociedade bur· guesa, c a fábricu apareceu desde logo como uma realidade estarrecedora onde esse tempo útil encontrou o seu ambiente natural, sem qtte qualquer modificaç!lo tecnológica tivesse sido necessária. Foi através da poria da fãbrica que o homem pobre, a partir do sérulo xvm, foi introduzido ao mundo burguês. A reflexão que agora propomos visa ultrapassar a imagem cristali:znda que o pensamento do século XIX produziu sobre a fábrica, reduzindo-a a um acontecimento tecnológico. Nosso inruito é desfazer o manto da memória da sociedade burgues a e reencontrar a fâbrica em todos os lugares e momentos onde este,·e presente uma intenção de organizar e disciplinar o trabalho através de uma sujeição completa da figura do próprio trabalhador. Por isso, os leitores não devem se surpreender quando no decorret· do texto encontrarem no engenho de açt:lcar da colônia o esboço da fábrica que iria produzir o futttro operário europeu.
NUNCA TEMOS TEMPO PARA SONHAR '7odaJ as
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lhando nos leares metónicos tJt6o oU de modo forçado, porque não podem existir dr. tumlrum outrO modo: ••ia d~ r't.gf'Q são ,w..uoas cuja.t famflitu /orom destruidos t seus ilft«usses ar· rvinados... tim o tendbtcia ch ir como pequt· n(IS colôn(r,.s co/oniztJr tS.Ses
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Inspetor eo•·emamenW Inglês (1834)
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Quando nos deft·ontamos hoje com a impossibi· !idade de criar sit11açOes de conhecimento que interrompam ou inrertam a lógica de um processo, desig· nado real, podemos nos perguntar sobre os disposí· livos que regem a ordem de domfnio da sociedade. Sejamos explkitos desde o princfpio. Esta mos falando, no caso. de uma incapacidade imposta ao social, por ordem de um determinado dom(nio que
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relira dos homens a própria dimensão do pensar. como algo além do já dado. Dentro daqu ilo que nos interessa, delerminadas respostas já sao bastante conhecidas. Por exemplo, quando falamos da produção de conhecimentos téc· nicos que não couseguem se impor socia lmente, buscamos a resposta . via de regra, no nível do próprio mercado. Assim. uma tecnologia é ineficaz porque nllo consegue romper a barreira da concorrência im · poslu por uma o rdem implacável. Nesse sentido, n conclusão é imediata. Nao existem outras tecnologias além daquelas conhecidas, porque o próprio mer· cado se responsabiliza ern elim inar as "menos efi· cazes". Contudo. deve riamos ser menos ingên uos em questões que colocam explicitamerue em jogo as relações de dominação social. Em outras palavras, as relações de mcr.:ado vno bem mais além do que <~s puras determinações econômicas. O estabelecimento do mercado é também o estabelecimento de um dado registro do renl. no qual os homens pensam e agem conlomte determinadas regras do jogo. Assim. o mercado não s() impõe aos homens determinadas tecnologias "elica:res", como também impede que lhes seja possível pensar outras tecnologias. Daí falarmos em impotência social. Nilo é isto um mecanismo regulado por leis econômicas do mer· cado, mas uma wera de domlnio social na qual os homens se vêem impossibilitados de pensar além de registros que se impõem i\ vista de todos t'Omo uma ordem natural. Portanto, q uando nos seniimos incapazes de la-
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bricar balas, por exemplo, não signif!ca imediatamente que não tenhamos condições de impor téc· nicas de produção eficazes para a concorrência no mercado. Um outro mecanismo antecede e:ssa ilusão. O que nos é vetado. antes de mais nada, é justa· mente a possibilidade de pensarmos o ato mesmo de poder fabricar ba las. Alguma coisa jâ se bipostasiou, ganhou apar€neia de "condições objetivas": o fabricar balas já encontrou socialmente um determi· nado estatuto e, a não ser pnra alguns espirilos recalcitrantes que insistem em lazer festas, balas devem ser reconhecidas como produto da eficiência de indústrias altamente conceituadas, segundo seus pa· drões de qualidade. Somos induzidos, entl!o, a pensar dentro de uma lógica definida. que nlo é ditada por leis de mercado, mas sim regida por mecanismos sutis de controle social. Portanto, vejamos bem o que é esse pensar, pois há nisso tudo um modo de pen.sar, pró· prio da esfera desse controle. Até agora no s ~ferimos à possibilidade de emergência de saberes que inter· rompiam uma lógica de identificação social. Isto é, um nào·saber, porque se situa•·a na esfera daquilo que não poderia ser pensado. Pensar, portanto. é pensar segundo regras j á definidas, e o seu contra· ponto, no nível da sociedade, é justamente a impossibilidade de pensar além das ~gras. Portanto, ao falarmos em mercado ou em divi· são social do trabalho não estamos nos referindo à questão de maior ou menor produtividade do tra· balho, mas sim à apropriação mesma dos saberes.
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Deve, =im, existir um mecanismo social no qual aquele que detém um saber se torna imprescindível para a imposição do próprio processo de trabalho, já que aos outros lromms está \'etada a possibilidade desse saber. Evidentemente, a solução para este impasse não é reivindicar um direito para todos produtirem balas. jã que isto seria uma saída edulcorada para o problema. Contudo, nt~ nisso há uma dose de reflexão. Como restituir aos homens saberes que lhes foram retirados e que hoje servem para reger uma ordem de domíni o político, técnico. cultural etc., que lhes é estranha e .antagônica? Mas não estamos aqui para oferecer resposhts acabadas. Preocupemo-nos mais em levantar algumas questões que permitam pensar a 'problemática da tecnologia para além dos estreitos limites impostos pela lógica da eficácia, da produtividade e da neutralidade. Pensamos, isto sim, na apreensão do problema como uma estratégia de controle da sociedade imposta por uma determinada classe no momento mesmo do seu engendramento e afirmação no mundo. Assim, conc:eber uma classe de capitalistas e uma sociedade capaz de se engendrar e ser engendrada por ela supõe, de início, registros determinados pelos qu:üs se torne posslvel a criação de um mundo. Isto é, a sociedade, para se tornar reconhecida por ela mesma, passa pelo imperativo de mstituiçlo de mecanísmos capazes de identificâ-la. Contudo, luis mecanismos que permitem esse
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reconhecimento supõem a imposição de normas e valores próprios de determinados setores da sociedade e que vão aparecer dotados de tllliversalitlade. Por exemplo, quando pensamos o desenvolvimento da ordem burguesa no seio da sociedade feudal, logo imaginamos a in.vtiruiçào do mercado como esfera universa1izante e universalizadora de uma novu ordem que se impõe. Essa imposiçao de normas e valores por um determinado setor da sociedade pode ser percebida decisi,•amente quando tomamos a noção de tempo útil, produzida pela ampliação da esfera do mercado e que nllo só disciplina a classe burguesa como também procura se introjeta r no âmbito da ge nte trabalhadora. Essa introjeção de um relógio moral no corpo de cada homem demarca decisivamente os dispositivos criados por urna nova classe em ascensão. Autodisciplina, controle de si mesmo. crítica à ociosidade, silo exigências imperiosas para o comerciante que se envoh•e na esfera do mercado. "Utilize cada um dos minutos como a coisa mais preciosa. E empregue-os todos no seu dever." Pregações desse tipo ou aquelas em que o tempo se relaciona com o dinheiro nos mostram todo o artefato moral de uma clnsse de mercadores que se impõe a si mesma os c.-itérios de sua identificação: "Recordai quão recompensadora é a Redenção do Tempo ... no mercado, ou no coinerciar; na la,'oura ou em qualquer ocupação remuneradora; só nos resta dizer que o homem se torna
rico quando faz bom uso do seu tempo" (E. P. Thompson, Tiempo, Disciplina de Trabajo y Capirall'smo . p. 280). ou então; "Observai as horas de intercâmbio, atendei aos mercados; há épocas especiais que serão favoráveis para despachar vossos negócios com facilidade e I amora; ... as épocas de lazer ou receber bens não duram sempre" (E. P. Thompson, p . 281).
Cont udo, essa autodisciplina dç uma classe de mercadores que afirma o seu lugar no mundo através da insriruição do mercado aos poucos transforma-se em um artefato moral que procura prescrever urna nova disciplina para a gente trabaU1adora. Nessa medida, o destinatário do discurso moraliza.nte do tempo útil deixa de ser exclusinmente o mercador e a crítica à ociosidade p rocura atingir todas as esferas da sociedade. "Preguiça, silenciosa assassina, não mais tenha minha mente aprisionada Não me deixes nenhuma hora mais contigo, sono traidor" (E. P. T hompson, p. 282). Essa mudança de destinatário do discurso moralizante do tempo útil nos dã a medida de como as idéias de uma classe dominante torlláram-se as idéias
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domina ntes de roda a sociedade através de um persistente e minucioso trabalho de introjeção de novas normas e valores, isto é, pela introjeção definitiva da imagem do rempo como moeda no mercado de trabalho. "Posto que nosso tempo está reduzido a um Padrão . e os Metais preciosos do dia acunhados em horas, os industriosos sabem empregar cada parcela de tempo em ,·erdadeiro beneficio de suas diferentes p rofissões; e aquele que é pródigo com suas horas é, na realidade, um perdulário. Eu me recordo de uma mulher notável. que era muilo sensivel ao valor intt1nseco do tempo. Seu ma rido fazia sapatos e era utn exce. lente artesã.o , mas nAo se preocupava com a passagem dos minutos. Em vão ela inculcava-lhe que Tempo é dinheiro. Ele tinha muita destreza ( habilidade) para compreendê-la, e isto foi sun ruína. Quando estava na taverna com seus odososcompanheiros, se a lguém obsen·ava que o relógio havia tocndo (dado) onze horas, ele dizia, o que é isso para uós, companheiros? Se ela lhe mandava um a>iso por seu filho de que já passava das doze horas do dia . ele r·espondia, di:t.· lhe que fique tranqüila, que as horas não podem ser mais. Se havia dado uma hora, ele ainda respondia, peça-lhe que se console, que não pode ser menos" (E. P. Thompson. p. 2&3). Entretanto, a instituição do mercado também
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sul>«: desde o principio a di•isão social do trabalho, e portanto a arirmação da ci.c•se burgues.n. O me~ cado transforma-se, assim, em uma enbdadc umversa l através da qual os homens se ret·onheccm a s i próprios e se opõem a qualque~ dispositivo imaginllrio que coloque a ordem soctnl fora do âmbtto
desse n0\'0 Ul'liverso. Mas tenltamos cuidado com essas reflexões. Se esse ntercado designa o registro do real, pelo qual a sociedade reconhece a si mesma. isto é, torna-se a dimensão nonnn liva a partir da qual os homens pensam e agem, não devemos perder de vista que essa univcrsalizaçAo que ocorre no interior do social representa, fundamentalmente, o modo pelo q~al_as id6ias de uma classe dominante se tornam tdéta~ domina ntes para toda a sociedade. f'or isso podemos falar de tml imaginário do mundo burguês e, desde jã, descartar a idéia de que, por exemplo, os setores domiJ1ados desta mesma soc1edade estej am subrneliclos a uma enorme mentira ou n um engano uni· ,·ersal. isto porque a presença histórica das classes nessa sociedade se dá justamente o partir da uni~er snli
Portalll'o, há uma /urtl ali mesmo onde ns classes se produzem. Isto quer di1..er que. se pensarmos na gestação da sociedade burguesa. a ordem do mercado. dimensno na qual os homens pensam e agem.