Certificação em Agronegócios
Certificação em Agronégocios
Piracicaba, 2007
Programa de Educação Continuada em Economia e Gestão de Empresas
Escola Superior de Agricultura “Luis de Quieroz”
Organizadores Prof. Pedro V. Marques Daniel Y. Sonoda
Professores Autores Certificação em Agronegócios no Banco do Brasil Prof. Dr. Carlos José Caetano Bacha Prof. Dr. Sílvia Helena Galvão de Miranda Prof. Dr. Roberto Arruda de Souza Lima Prof. Dr. Pedro Valentim Marques Prof. Dr. Davi R. de Moura Costa
Editoração Maria Eugênia Cabral Martinez Capa Leonardo Maziero
Escola Superior de Agricultura “Lu is de Queiroz” Progr ama de Educação Continuada em Economia e Gestão de Empresas Av. Pádua Dias, 11 - Caixa Postal 252 - CEP 13400-970 - Piracicaba - SP Tel (19) 3429 8857 - Fax (19) 3429 8806
[email protected] - www.pecege.esalq.usp.br
Sumário Apresentação
07
Capítulo 1 – Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
09
Capítulo 2 – Comércio Internacional
31
Capítulo 3 – Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
57
Capítulo 4 – Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
79
Capítulo 5 – Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
101
Capítulo 6 – Cooperativismo e Associativismo
125
Capítulo 7 – Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
139
Apresentação
Nesta apostila de Certificação em Agronegócios faz-se um resumo de alguns dos principais assuntos que fazem parte do atual cenário do sistema agroindustrial brasileiro. Seu conteúdo foi dividido em sete capítulos que abordam definições, informações, teorias e métodos sobre os sistemas agroindustriais, comércio internacional, mercados futuros, crédito, cooperativismo e desenvolvimento rural sustentável. Embora se tenha procurado colocar os assuntos de forma didática, o processo de leitura e compreensão tornou-se bastante intenso exigindo muita atenção do leitor. A ordem dos capítulos foi montada de forma construtiva, ou seja, muitos dos assuntos abordados nos capítulos anteriores servem como base para os capítulos posteriores. Logo, é interessante que se estude seguindo a ordem dos capítulos para facilitar a compreensão do conjunto. Os textos trazem notas de rodapé que têm caráter explicativo sendo importante que não se passe despercebido por elas. Ao final de cada capítulo o leitor encontra uma relação de bibliografias, muitas delas disponíveis na internet, nas quais poderá obter mais informações sobre o tema. No final de todos os capítulos existem questões para testar o grau de aprendizado e compreensão. Desejamos ao leitor um bom aprendizado. Pedro V. Marques Daniel Y. Sonoda Organizadores
CAPÍTULO
1
EVOLUÇÃO DA AGROPECUÁRIA E DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL Carlos José Caetano Bacha
Professor Titular do Departamento de Economia, Administração e Sociologia - ESALQ/USP
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
CAPITULO 1 - EVOLUÇÃO DA AGROPECUÁRIA E DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL O objetivo deste capítulo é analisar a evolução recente da agropecuária e do agronegócio no Brasil, avaliando sua importância para o país. Inicialmente, há a definição do que é agropecuária e agronegócio, sendo que em seguida são apresentados alguns indicadores para avaliar a importância desses setores na economia brasileira e comparar com sua importância em outros países.
1. Definição e importância da agropecuária e do agronegócio na Economia Brasileira As atividades econômicas em qualquer país são, tradicionalmente, divididas em setor primário, setor secundário e setor terciário. O setor primário engloba as atividades produtoras de bens in natura ou pouco processados e que utilizam em grande quantidade os fatores terra e trabalho. Neste setor se encontram a agropecuária e a mineração, por exemplo. O setor secundário refere-se às atividades que reprocessam ou combinam os produtos primários da economia, elaborando novos produtos. No setor secundário há grande uso do fator capital. E o setor terciário refere-se ao conjunto de atividades que prestam serviços. Ao longo do tempo, esta classificação sofreu, no mínimo, duas modificações. A primeira delas foi a transferência da produção de minerais do setor primário para o setor secundário, considerando que a produção de minerais é, atualmente, uma indústria, com grande uso do fator capital. A segunda transformação foi o reconhecimento que atividades antes classificadas como pertencentes aos setores primário, secundário ou terciário mantêm fortes relações de dependência entre elas, as quais permitem um novo reagrupamento dessas atividades. Fruto desse novo reagrupamento tem-se o conceito de agronegócio. Agricultura e agropecuária têm sido utilizadas, tradicionalmente, como sinônimos na economia brasileira. Esses termos se referem ao setor produtivo baseado na atividade rural, que tem na terra um fator de produção essencial. No entanto, O Novo Dicionário Aurélio dá definições diferentes para esses termos. Define-se agricultura como sendo “ 1. Arte de cultivar os campos; cultivo da terra; lavoura; cultura. 2. Conjunto de operações que transformam o solo natural para produção de vegetais úteis ao homem ...”. Agropecuária é definida como sendo “Teoria e prática da agricultura e da pecuária, nas suas relações mútuas” (Ferreira et al., 1986, p. 65). Neste sentido, a agricultura deveria se referir apenas à produção vegetal e a agropecuária ao conjunto de produções vegetal e animal. A falta de consenso no uso desses termos tem diminuído em nível de Governo Federal nos últimos anos. O Governo Federal tem, por exemplo, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento , o qual já foi denominado de Ministério da Agricultura até a década de 80 do século passado. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), desde a década de 70 do século passado, tem preferido utilizar o termo agropecuária ao invés de agricultura. Este órgão tem elaborado os Censos Agropecuários a partir da década de 70, os quais antes eram denominados de Censos Agrícolas . No entanto, o uso dos dois termos, agricultura e agropecuária, como sinônimos ainda é bastante normal no meio acadêmico. Tem-se, por exemplo, a Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” – que não se restringiu, desde a sua fundação, a tratar apenas com lavouras - bem como diversos textos e livros que utilizam o termo agricultura como sinônimo de agropecuária. 10
Embora reconhecendo o uso como sinônimos desses termos por parte expressiva dos acadêmicos, o presente texto irá preferir o uso do termo agropecuária para denominar o grupo de atividades que usam a terra como fator de produção seja para o plantio de culturas, para a criação de animais, o plantio de florestas, a aqüicultura, por exemplo. A agropecuária representa todas as atividades realizadas dentro do estabelecimento agropecuário e que se comercializam através da identificação do produtor rural e empresas rurais. Assim, a agropecuária inclui agricultura, pecuária, silvicultura, sericicultura, extração vegetal, cunicultura e floricultura. Observe que agricultura passa a ser um subsetor da agropecuária, e a p ecuária é outro subsetor da agropecuária. O termo agronegócio é a tradução do termo agribusiness e se refere ao conjunto de atividades realizadas pela agropecuária e pelos setores vinculados com a agropecuária. O agronegócio envolve as atividades divididas em quatro segmentos. O segmento 1 constitui-se das “indústrias a montante”, ou seja, das empresas que ofertam insumos para a produção agropecuária. Parte dessas empresas compõe-se de indústrias de equipamentos e insumos, e outras se referem às prestadoras de serviços para a agropecuária, como bancos e outros fornecedores de créditos. A produção agropecuária compõe o segmento 2. Os diversos produtos da agropecuária são transformados por empresas que se situam no segmento 3 (as agroindústrias, que são indústrias que transformam um produto oriundo da agropecuária) ou diretamente consumidos no segmento 4. Alguns produtos transformados no segmento 3 são re-processados no segmento 4. Os quatro segmentos são supervisionados por entidades privadas e públicas. Isto aparece na parte superior da Figura 1.
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Entidades públicas e privadas supervisionando ou prestando serviços às atividades do agronegócio
Indústrias a montante
Exportação Agropecuária Mercado Doméstico Agroindústrias
Segmento 1
Segmento 2
Segmento 3
Segmento 4
Figura 1 – Distribuição das atividades no Agronegócio
Um exemplo da seqüência de atividades é a empresa Caterpillar do Brasil produzindo tratores utilizados na extração de toras de florestas nativas e que são transformadas em pranchas nas serrarias, que finalmente são utilizadas na indústria moveleira. A produção desses tratores da Caterpillar se insere no segmento 1, a produção de toras no segmento 2, a produção de madeira serrada no segmento 3 e a de móveis no segmento 4. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) supervisiona as atividades feitas pelos extratores e indústrias de transformação da madeira. O IBAMA é uma instituição pública regulatória e está na parte superior da Figura 1.
11
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
2. Importância da agropecuária e do agronegócio no PIB brasileiro A importância da agropecuária e do agronegócio na economia brasileira pode ser avaliada através de sua contribuição a três indicadores econômicos: produto interno bruto (PIB), emprego e balança comercial. Os fatores de produção se classificam em capital, trabalho e terra. Ao capital são pagos juros e lucros; à terra se paga aluguel; e ao trabalho se paga salários. O PIB corresponde ao valor monetário de bens e serviços finais produzidos em uma economia com capital, trabalho e terra situados dentro dos limites geográficos do país. Isto equivale à soma das remunerações pagas aos fatores de produção, ou seja, à soma dos lucros, juros, aluguéis e salários recebidos dentro de um país em determinado período. Por isso, pode-se dizer que o PIB é a renda gerada dentro do país em determinado período de tempo. Parte dessa renda pode ser gerada pela agropecuária, outra pela indústria e a terceira parte pelo setor serviços.
2.1 Análise da Participação dos Setores na Constituição do PIB O Sistema de Contas Nacionais do Brasil nos fornece o produto a custo de fatores (PIB CF) de cada setor da economia brasileira, ou seja, a renda gerada por cada setor da economia. Utilizando esses dados, é analisada a participação dos setores na constituição do PIB CF de toda a economia, dando maior ênfase à posição ocupada pelo setor agropecuário (ver tabela 1 e figura 2). A tendência da maioria dos países é da participação da agropecuária no PIB diminuir, pois a demanda de alimentos é inelástica à renda 1 e a maioria dos países privilegia o desenvolvimento urbano-industrial, o que faz a agropecuária ser tributária desse desenvolvimento. Isto ocorreu no Brasil de 1947 a 1993, mas de 1994 a 2004 a participação da agropecuária no PIB aumentou, o que não foi seguido pelos demais países. Observando a tabela 1 e a figura 2, constata-se que as participações da agropecuária e do setor serviços no PIB CF diminuíram no período de 1947 a 1986, enquanto a participação da indústria aumentava. A partir de então, as participações da indústria e da agropecuária caíram até 1993, enquanto aumentou a participação do setor serviços no PIB CF. De 1994 a 2004, a situação inversa ocorreu, ou seja, as participações da agropecuária e da indústria na composição do PIB CF aumentaram, enquanto as participações do setor serviço diminuíram. Em 2005 ocorreu uma crise da agricultura de grãos, o que levou à redução do PIB da agropecuária e à diminuição de sua importância no PIB do Brasil. O que ocorreu de 1947 a 1986 foram fenômenos interligados e se devem ao tipo de desenvolvimento adotado no Brasil. Isso privilegiou o desenvolvimento urbano-industrial e conduziu a agropecuária a consumir produtos e serviços elaborados pelo setor urbano-industrial. A diminuição da participação da agropecuária no PIB CF no período de 1947 a 1986 deu-se por etapas. No período de 1947 a 1955 essa participação sempre foi superior a 20%. De 1956 a 1968 reduziu-se significativamente. Nos anos de 1968 a 1974 ficou entre 11% e 13%. Forte flutuação ocorreu entre 1975 e 1986, quando ocorreram anos de crescimento e outros anos de diminuição da participação da agropecuária no PIB CF. Nos anos de 1987 a 1993, nova queda ocorreu na participação da agropecuária no PIB CF, seguida de aumento de 1994 a 2004. A recuperação de importância relativa da agropecuária no PIB CF nesses 11 anos é atribuída a quatro fatores: grande crescimento da produção agropecuária (devido,
1. Uma elevação de 1 ponto percentual na renda provoca uma elevação inferior a 1% na quantidade de alimento consumida.
12
principalmente, ao crescimento da produtividade), melhora da relação de preços agrícolas/ industriais, aumento da relação preços recebidos/preços pagos na agropecuária e pequena performance da produtividade da indústria (ver Brugnaro & Bacha, 2006).
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Tabela 1 – Participação dos setores no PIBCF (valores em percentagens) Ano
Agropecuária
Indústria
1947 1948 1949 1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959 1960 1961 1962 1963 1964 1965 1966 1967 1968 1969 1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
20,7 22,8 23,6 24,3 23,8 25,0 23,6 24,1 23,5 21,1 20,4 18,4 17,2 17,8 17,0 17,5 15,9 16,3 15,9 14,1 13,7 11,8 11,4 11,6 12,2 12,3 11,9 11,4 10,7 10,9 12,6 10,3 9,9 10,1 10,1 8,7 11,0 12,2 11,1 11,2 9,3 9,8 7,7 6,9 6,9 6,2 5,8 8,6 8,5 7,9 7,6 7,8 7,9 7,7 8,0 8,2 9,4 9,7 8,0
25,2 24,2 24,7 24,1 25,1 24,2 25,4 25,8 25,6 27,3 27,8 31,1 33,0 32,2 32,5 32,5 33,1 32,5 32,0 32,8 32,0 34,8 35,2 35,8 36,2 37,0 39,6 40,5 40,4 39,9 38,6 39,5 40,1 40,9 40,0 41,2 38,9 40,7 42,3 43,7 41,0 40,1 36,6 33,0 32,0 31,2 31,8 35,1 34,5 32,9 33,5 32,9 34,0 36,1 35,9 36,1 36,8 37,2 37,9
Serviços (total) Instituições Fin.
54,1 53,0 51,7 51,6 51,1 50,8 51,0 50,1 50,9 51,6 51,8 50,5 49,8 50,0 50,5 50,0 51,0 51,2 52,1 53,1 54,3 53,4 53,4 52,6 51,6 50,7 48,5 48,1 48,9 49,2 48,8 50,2 50,0 49,0 49,9 50,1 50,1 47,1 46,6 45,1 49,7 50,1 55,7 60,1 61,1 62,5 62,5 56,3 57,1 59,2 58,9 59,2 58,1 56,2 56,1 55,7 53,8 53,1 54,1
3,2 3,3 3,2 3,6 3,3 3,3 3,3 3,5 3,4 3,3 3,6 3,0 2,8 2,7 2,7 2,9 3,0 3,0 3,4 3,7 3,8 4,1 4,4 6,0 6,1 6,0 5,4 5,8 6,5 7,3 7,5 8,6 8,4 7,7 10,0 10,1 12,1 11,6 11,6 7,8 14,0 14,3 20,9 15,1 12,4 20,6 25,0 13,9 7,5 6,6 6,1 6,2 6,0 5,2 6,3 7,2 6,6 6,3
Adm. públicas
Outros Serviços
6,1 6,3 6,5 6,6 6,3 6,2 6,6 5,4 6,1 7,5 7,2 6,8 6,6 6,3 7,1 7,3 8,0 7,9 8,0 8,2 8,9 8,6 8,5 9,2 9,1 8,7 7,6 7,0 7,5 7,5 6,9 7,2 7,2 6,4 6,7 7,4 7,0 6,2 7,1 8,0 7,8 8,0 9,2 15,9 13,6 11,7 11,1 13,3 15,4 15,2 14,6 15,3 15,4 15,7 15,5 15,3 15,0 15,4
44 ,8 43,4 42,0 41,4 41,5 41,3 41,1 41,2 41,4 40,8 41,0 40,7 40,4 41,0 40,7 39,8 40,0 40,3 40,7 41,2 41,6 40,7 40,5 37,4 36,4 36,0 35,5 35,3 34,9 34,4 34,4 34,4 34,4 34,9 33,2 32,6 31,0 29,3 27,9 29,3 27,9 27,8 25,6 29,0 35,1 30,3 26,4 29,1 34,2 37,5 38,1 37,7 36,7 35,3 34,3 33,2 32,2 31,4
FONTE: Estatísticas Históricas do Brasil, IBGE - 1990, para os anos 1947 a 1979; Anuário Estatístico do Brasil para os anos 1980 a 1989; os dados de 1990 a 2000 são das Contas Nacionais. Os dados de 2001e 2005 são estimativas NOTA: As participações dos setores foram calculadas retirando as imputações dos serviços de intermediação financeira, que foram distribuídas proporcionalmente entre os setores.
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Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Figura 2- Participação dos setores na composição do PIB brasileiro – 1947 a 2005 Fonte: Dados da Tabela 1
A participação da indústria no PIB CF teve um comportamento diferente do da participação da agropecuária. A indústria passou de uma participação no PIB CF entre 24% e 26% nos anos de 1947 a 1955 para 32% a 33% do PIB CF entre os anos de 1959 e 1967. De 1973 a 1979, a participação da indústria no PIBCF flutuou ao redor do patamar de 40%. Na década de 80, aumentou até 1986 (quando atingiu 43,7% do PIB CF). De 1987 a 1993, caiu devido a dois fatores: crescimento do processo de terceirização e os ganhos financeiros propiciados pelas altas inflações anuais. A queda persistente da inflação a partir de 1994 levou a um novo aumento da participação da indústria na composição do PIB CF, pois os ganhos financeiros foram diminuídos. O principal ramo industrial que tem contribuído para este aumento da participação da indústria no PIB CF é o da construção civil. Na figura 3, tem-se a evolução da participação do setor serviços e de seus principais componentes no PIB CF no período de 1947 a 2004. As administrações públicas tiveram aumento de participação no PIB CF na década de 60 e diminuíram essa participação na década de 70 e na primeira metade da década de 80. De 1985 a 1990 ocorreu aumento da participação das administrações públicas no PIB CF, seguido de pequeno decréscimo até 1993, e de novo aumento a partir de 1994.
Figura 3 – Participação dos setores e de seus componentes no PIB de 1947 a 2004.
Fonte: Dados da tabela 1
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As instituições financeiras tiveram aumento de participação no PIB CF a partir de 1965 (ano em que foi implantada a reforma do Sistema Financeiro do Brasil). O aumento da participação das instituições financeiras no PIB CF foi grande em anos de inflação elevada, tendo tal participação declinado significativamente nos anos em que houve queda acentuada da taxa de inflação (observe as participações das instituições financeiras no PIB CF em 1986 e em 1990 e as compare com o dado similar do ano imediatamente anterior). Em 1993, ano caracterizado por elevada taxa de inflação e por grande especulação financeira, a participação das instituições financeiras no PIB CF foi de 25%, enquanto a participação da agropecuária noPIB CF foi de 5,8% (ver Tabela 1). A grande participação das instituições financeiras no PIB CF em certos anos está associada aos efeitos distributivos causados pela inflação no Brasil. Com a redução persistente da inflação a partir de 1994, a participação das instituições financeiras no PIB CF também diminuiu. A categoria “outros serviços” - que engloba comércio, transportes, comunicações, aluguéis e outras atividades terciárias - perdeu importância relativa no PIB CF até 1989, elevando essa participação a partir de 1990. Isso se explica pelo acelerado processo de terceirização que ocorreu na economia brasileira a partir de então e pelo crescimento do setor informal. O ano de 2005 foi caracterizado por uma crise na agricultura de grãos, causada pela queda dos preços desses produtos em reais, atribuída à valorização cambial (perdas climáticas, pragas/ferrugem asiática também incluíram significativamente) Em 2004, o PIB CF da agropecuária foi de R$ 159.643 milhões e caiu para R$ 145.829 milhões em 2005. Ao mesmo tempo, o PIB CF da indústria e do setor serviços aumentaram. Devido a isso, a participação da agropecuária no PIB CF passou de 9,7% em 2004, para 8% em 2005.
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
2.2 Participação do agribusiness no PIB brasileiro Denomina-se agribusiness ou complexo agroindustrial (CAI) ou sistema agroindustrial, SAG (termos normalmente usados como sinônimos) o conjunto de atividades realizadas pela agropecuária e pelos setores a ela vinculados. Portanto, o sistema agroindustrial é o conjunto formado pela sucessão de atividades vinculadas ao fornecimento de insumos e serviços, à produção e à transformação e distribuição de produtos agropecuários. O sistema agroindustrial (SAG) apresenta uma visão sistêmica da economia, evidenciando como certos segmentos fornecem insumos à agropecuária e outros segmentos procedem à transformação industrial e à distribuição dos produtos in natura ou transformados. Como já mencionado acima, os dados das Contas Nacionais sobre a participação da agropecuária no PIB brasileiro só computam as atividades realizadas da “porteira para dentro”. Se for adotado o conceito de sistema agroindustrial, tem-se uma participação maior do agronegócio no PIB.
2.3 Dimensão do agribusiness (agronegócio) no Brasil Em 2005, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) da ESALQ/USP, o agronegócio teve produto de R$ 538 bilhões, equivalentes a 27,9% do PIB brasileiro. Do PIB do agronegócio brasileiro neste ano, 6,21% foi gerado no segmento 1; 28,47% no segmento 2; 32,61% no segmento 3; e 32,71% no segmento 4. Analisando uma série não contínua de dados desde 1959, observa-se que as participações do agronegócio no PIB brasileiro vêm caindo (figura 4). No final da década de 50, o agronegócio respondia por 52,76% do PIB brasileiro, diminuindo para os 30,1% de 1995 e atingindo 27,9% em 2005. No entanto, observa-se que essa tendência não se verificou de 2000 a 2003, quando a participação do agronegócio no PIB brasileiro aumentou devido, fortemente, ao crescimento da participação da agropecuária no PIB. A participação do agronegócio no PIB aumentou 3,66 pontos percentuais entre 2000 e 2003, enquanto a participação da agropecuária no PIB aumentou 1,7 ponto percentual no mesmo período. 15
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
m e g a t n e c r e P
60 50 40 30 20 10 0 9 5 9 1
0 7 9 1
5 7 9 1
0 8 9 1
5 8 9 1
0 9 9 1
4 9 9 1
5 9 9 1
6 9 9 1
7 9 9 1
8 9 9 1
9 9 9 1
0 0 0 2
1 0 0 2
2 0 0 2
3 0 0 2
4 0 0 2
5 0 0 2
Figura 4 – Participação do agronegócio no PIB brasileiro Fonte: Montoya e Guilhoto (1999), Furuoso e Guilhoto (2001) e CEPEA.
A redução da participação do agronegócio no PIB é uma tendência normal de qualquer economia que tenha aumento da renda per capita . À medida que esta aumenta, o padrão de consumo das pessoas tende a elevar o consumo de produtos que não sejam alimentícios (como vestuário, habitação, lazer e saúde, por exemplo) mais do que proporcionalmente ao consumo de alimentos. Nos EUA, o agronegócio passou de 30,8% do PIB norte-americano em 1947 para 8,6% em 1996 (Jank, 2002, p. 21) e foi de 8,1% em 1997 (ver Tabela 2).
2.4 Importância da agropecuária e do agronegócio em alguns países e nos estados do Brasil A agropecuária e o agronegócio podem ter importância distinta em diferentes países. Mesmo dentro de um país, a agropecuária e o agronegócio podem ter importância distinta entre os estados. A tabela 2 traz a importância da agropecuária e do agronegócio para alguns países selecionados. Os dados dessa tabela devem ser analisados com cuidado, pois a metodologia de cálculo da dimensão do agronegócio não é a mesma para os distintos países, e os dados se referem a anos distintos, ainda que próximos entre eles. Não obstante, constata-se que quanto mais desenvolvido é um país, menor é a importância da agropecuária e do agronegócio no seu PIB. Por exemplo, nos EUA, em 1997, a agropecuária representava 1,6% do PIB e o agronegócio, 8,10%. No Reino Unido, em 1995, essas percentagens foram 1,3% e 7,10%, respectivamente. Já na Argentina, em 1997, essas percentagens foram 5,6% e 32,2%, respectivamente. No Brasil, em 1999, essas percentagens foram 7,9% e 28,07%, respectivamente. A tabela 3 traz a importância da agropecuária e do agronegócio no PIB brasileiro, em 1999, para os estados brasileiros. Observa-se uma grande diferença de importância desses setores entre os estados de uma mesma região. Por exemplo, no Centro-Oeste, a agropecuária atinge 28,44% do PIB do Mato Grosso do Sul e 20,96% do PIB do Mato Grosso, mas apenas 0,32% do PIB do Distrito Federal. Na região Norte, a agropecuária representou 23,54% do PIB do Pará e apenas 4,02% do PIB de Roraima. Tanto o Distrito Federal quanto Roraima têm muita presença de funcionalismo público determinando o PIB. Mas outros elementos também fazem a agropecuária ter pequena participação no PIB. No Rio de Janeiro, a agropecuária representou apenas 0,81% do PIB, pois o PIB fluminense é muito determinado pela indústria (baseada no petróleo) e pelo turismo. 16
Tabela 2 – Participação da agropecuária e do agronegócio no PIB de alguns países em anos selecionados (valores em percentagem) País
Participação da agropecuária no PIB
Participação do agronegócio no PIB
Ano de referência
1,30 5,60 2,50 1,60 7,90 2,60 8,50 14,30 12,80 2,90 4,40 1,60 3,60 3,20 8,50 3,20 4,90 3,10 5,20 9,00 4,10 1,30 2,30 7,00 5,10
5,10 32,20 5,70 5,80 28,07 15,30 32,10 32,10 32,50 11,10 10,60 8,10 10,70 8,50 19,90 8,70 16,20 7,00 24,50 31,80 13,80 7,10 5,50 34,80 20,50
1995 1997 1995 1995 1999 1995 1997 1997 1997 1995 1995 1997 1995 1995 1995 1997 1995 1995 1997 1995 1995 1995 1995 1995 1997
Alemanha Argentina Áustria Bélgica-Luxemburgo Brasil Canadá Chile Colômbia Costa Rica Dinamarca Espanha Estados Unidos Finlândia França Grécia Holanda Irlanda Itália México Peru Portugal Reino Unido Suécia Uruguai Venezuela
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Fonte: Guilhoto (2004, p. 9).
Tabela 3 - Participação da agropecuária e do agronegócio no PIB dos estados brasileiros em 1999 (valores em percentagem) Estado ou região Região Norte
Acre Amapá Amazonas Pará Rondônia Roraima Tocantins
Região Nordeste
Participação da agropecuária no PIB 12,70
4,54 5,02 2,24 23,54 16,72 4,02 18,28 8,18
Participação do Agronegócio no PIB 32,05
20,11 12,71 14,48 50,75 37,88 10,64 46,03
26,95
Alagoas Bahia Ceará Maranhão Paraíba Pernambuco Piauí Rio Grande do Norte Sergipe
8,17 8,53 5,31 17,16 11,13 7,33 9,13 3,23 7,78
38,55 24,23 24,12 40,24 33,68 23,74 33,94 15,44 40,05
Região Centro-Oeste
11,22
27,61
Distrito Federal Goiás Mato Grosso Mato Grosso do Sul
Região Sudeste
Espírito Santo Minas Gerais Rio de Janeiro São Paulo
Região Sul
Paraná Santa Catarina Rio Grande do Sul
Brasil
Fonte: Guilhoto (2004, p. 15).
0,32 15,99 20,96 28,44 4,66
3,09 41,08 50,34 61,19
21,22
7,46 9,19 0,81 4,47
34,38 26,10 11,93 22,10
12,81
41,39
13,00 12,87 12,61
37,01 49,10 41,33
7,90
28,07
17
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Em 1999, o agronegócio representou 28,07% do PIB brasileiro. No entanto, mais da metade dos estados brasileiros tiveram o agronegócio representando mais de 30% do PIB estadual. As maiores importâncias relativas estão para o agronegócio nos estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. No primeiro, o agronegócio representou 50,34% do PIB e no Mato Grosso do Sul, 61,19%. É possível ter outras medidas da importância da agropecuária e do agronegócio em um dado país do que apenas sua participação no PIB. Por exemplo, pode-se avaliar a importância desses setores no emprego e nas exportações brasileiras. Essas medidas darão maior dimensão do que a participação desses setores no PIB, como se verá nos próximos dois sub-itens.
3.
Import Imp ortânc ância ia da da agro agropec pecuár uária ia no emp empreg rego o
A agropecuária tem maior importância na geração de empregos do que na geração do PIB. Em 1990, a agropecuária gerou 25% do total de empregos no Brasil, enquanto gerou 6,9% do PIB. Em 2003, a agropecuária gerou 19% do total de empregos no Brasil e 9,4% do PIB. No entanto, como se observa na figura 5, a tendência da agropecuária é diminuir sua importância na geração de emprego direto, pois a modernização tem se acelerado neste setor. 28% 26% o ã 24% ç a p 22% i c i t r a 20% P
18% 16% 0 9 9 1
2 9 9 1
4 9 9 1
6 9 9 1
8 9 9 1
0 0 0 2
2 0 0 2
Figura 5 - Evolução da participação da agropecuária no emprego - 1990 a 2003 - Brasil
Fonte: Brugnaro & Bacha (2006, p. 25), citando dados do IBGE.
4. Importânci Importânciaa da agrope agropecuár cuária ia e da agro agroindús indústria tria no no comércio comércio exteri exterior or do Brasil A balança comercial é a diferença entre exportações e importações. A agropecuária e a agroindústria têm sempre gerado mais exportações do que importações, tal que sempre geram saldo comercial positivo para o Brasil (figura 6). Esse saldo comercial, crescente, foi em vários períodos essencial para a economia brasileira, pois os setores não vinculados com a agropecuária alternam períodos de saldo comercial positivo com saldo comercial negativo (figura 7).
18
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
35.000 30.000
$ S 25.000 U e 20.000 d s 15.000 e õ h l 10.000 i M
5.000 0
1 6 9 1
3 6 9 1
5 6 9 1
7 6 9 1
9 6 9 1
1 7 9 1
3 7 9 1
5 7 9 1
7 7 9 1
9 7 9 1
1 8 9 1
3 8 9 1
5 8 9 1
7 8 9 1
9 8 9 1
1 9 9 1
3 9 9 1
5 9 9 1
7 9 9 1
9 9 9 1
1 0 0 2
3 0 0 2
importação
exportação
Figura 6 – 6 – Evolução das exportações e importações de produtos de base pecuária de 1961 a 2004 Fonte:: FAO e IPEA Fonte
40000 30000 $ S 20000 U e d 10000 s e õ h 0 l i M 1 9 -10000 6 1
3 6 9 1
5 6 9 1
7 6 9 1
9 6 9 1
1 7 9 1
3 7 9 1
5 9 1 7 7 7 8 9 9 9 9 1 1 1 1
3 8 9 1
5 8 9 1
7 8 9 1
9 8 9 1
1 9 9 1
3 9 9 1
5 9 9 1
7 9 9 1
9 9 9 1
1 0 0 2
3 0 0 2
-20000 agropecuária
não-agrícola
total
Figura 7 – Evolução da balança comercial brasileira de 1961 a 2004
Fonte: FAO e IPEA Fonte:
Apesar de gerar exportações crescentes, a agropecuária e a agroindústria têm respondido por parcelas decrescentes das exportações brasileiras. Observa-se na tabela 4 que a agropecuária e a agroindústria respondiam, em 1965, por 81,9% das exportações brasileiras e, em 2004, por 25,6%. Tabela 4 – participação de alguns produtos no total exportado pelo Brasil – anos selecionados (valores em percentagens) Produtos 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2004 Açúcar Algodão Cacau Café em grãos Soja em grãos Celulose Papel Suco de laranja Produtos in natura e processados da agropecuária
3,55 5,99 1,73 44,27 0,46 0,40 0,00 0,12 81,9
4,62 5,64 2,84 34,29 0,99 0,21 0,10 0,54 75,2
12,68 1,13 2,54 9,86 7,90 0,35 0,24 0,95 57,8
6,40 0,06 1,45 12,35 1,96 1,81 0,85 1,68 50,6
1,44 0,30 1,41 9,24 2,97 1,08 1,42 2,92 39,9
1,67 0,41 0,41 3,52 2,90 1,91 1,94 4,67 32,6
4,13 0,20 0,06 4,24 1,66 2,24 1,47 2,38 35,6
2,18 0,06 0,00 2,83 3,97 2,79 0,98 1,85 29,0
3,22 0,04 0,33 2,13 5,59 1,97 1,38 0,90 25,6
Fonte: Dados trabalhados da FAO e SECEX
19
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
5. Caracterização das principais commodities do agronegócio brasileiro 5.1 Açúcar e Álcool Durante a primeira metade da década de 2000, observou-se um grande avanço do setor sucroalcooleiro em decorrência, dentre outros fatores, da alta do preço do açúcar no mercado internacional, do surgimento dos carros bicombustíveis ( flex fuel ) e das perspectivas positivas quanto ao aumento da utilização do álcool combustível no mundo. Nesse período, verificou-se um aumento de cerca de 70% na produção de cana-de-açúcar, crescendo de 255 milhões de toneladas na safra 2000/01 para 431,4 milhões de toneladas na safra 2005/06 (CONAB, 2006). O Brasil é o maior produtor mundial de álcool e açúcar de cana e ainda possui áreas disponíveis para sua expansão. Existem disponíveis no país 320 milhões de hectares agricultáveis, sendo que 60,4 milhões já são utilizados por diversas culturas. A produção de cana, proporcional à produção de álcool e açúcar ocupa, respectivamente, 2,7 e 5,4 milhões de hectares. Calcula-se que ainda exista uma área com aptidão à cultura de 90 milhões de ha (UNICA, 2006). Na última safra o país perdeu a primeira posição no ranking dos países produtores de álcool (15,9 milhões de m 3), sendo ultrapassado pela produção de etanol de milho nos EUA. No entanto, com o advento dos veículos flex fuel em 2003, o volume de etanol produzido aumentou mais de 200% durante 2004. O aumento das vendas desse tipo de veículo entre 2003 e 2004 foi superior a 580% e no período 2004 e 2005 foi de cerca de 150% (ANFAVEA, 2006). De acordo com Figueira (2005), grande parte das usinas instaladas no país está apta a produzir açúcar, álcool anidro e hidratado, conferindo certa flexibilidade ao sistema produtivo. Há no país 313 usinas operando, destas 186 unidades produzem álcool e açúcar, 107 fazem apenas álcool e 20 fazem somente açúcar. O Estado de São Paulo destaca-se por possuir 138 usinas produtoras de álcool, respondendo por aproximadamente 3/4 do açúcar e 2/3 do álcool da região Centro-Sul (ORPLANA, 2006). A produção de cana de açúcar paulista representou 60% na safra 2003/2004 do total produzido no país. O Estado de São Paulo representa 62,5% da produção nacional de álcool e 65% do total de açúcar produzido no país. Entre a safra 90/91 e 05/06 a elevação da produção foi de 251%, sendo que grande parte desta expansão pode ser em decorrência do crescimento da produção paulista, que passou de 3,5 milhões de toneladas para 16,76 milhões (UNICA, 2006). No comércio exterior do setor houve um elevado crescimento na quantidade exportada de álcool entre as safras de 1998/99 e 2004/05 e de açúcar entre 1996/97 e 2004/05. Nestes períodos, as vendas externas de álcool aumentaram em 1000% e de açúcar em 211,6%. Os principais destinos das exportações de açúcar são: Rússia, Índia, Nigéria, Emirados Árabes Unidos e Marrocos, que compram quase metade do volume de açúcar exportado (46%). Os principais importadores do álcool brasileiro são: Índia, Japão, Países Baixos, Estados Unidos, Suécia e Coréia do Sul, que representam 77% das nossas exportações (UNICA, 2006).
2. Este item contou com a colaboração de Daniel Y. Sonoda, doutorando em Economia Aplicada – ESALQ/USP e Vitor Luiz Vieira de Freitas, economista – ESALQ/USP
20
5.2
Complexo Soja
No início da década de 2000 o setor viveu uma época aura devido ao câmbio desvalorizado e ao preço elevado da soja no mercado internacional em decorrência das quebras de safra americana e da crescente demanda da China. Atualmente, o complexo soja vive um momento de crise em virtude da apreciação do real (diminuição da receita com as exportações e conseqüente perda de competitividade no mercado internacional), o aumento dos estoques internacionais de soja com diminuição da cotação desse grão no mercado externo, condições climáticas (estiagem) e fitosanitárias (ferrugem asiática) adversas nas últimas safras, os vencimentos do MODERFROTA, a alta nos valores do frete e o risco de redução da demanda (gripe aviária) foram os principais agravantes da crise da soja no país. No Brasil, verifica-se o crescimento da área cultivada com soja superior a 120% entre as safras de 1990/91 e 2004/05 alcançando 24 milhões ha. A região Centro-Oeste foi responsável por boa parte deste aumento, porém, na safra 2005/2006 houve uma redução da área de soja de 23 milhões ha em decorrência da atual conjuntura. A participação da região Nordeste na área plantada, apesar de pequena, aumentou significativamente entre 1990 e 2006, especialmente nas regiões de Balsas/MA e Barreiras/BA (MAPA, 2006). Na safra 2006/07 os Estados Unidos destacam-se por serem os maiores exportadores de soja em grão (29,7 milhões t), farelo (7 milhões t) e óleo (0,5 milhões t) de soja, e também são os principais produtores dos mesmos (79,7 milhões t). O Brasil ocupa a segunda posição entre os principais exportadores de soja em grão (25,4 milhões t) e é o segundo maior produtor mundial (56 milhões t). No ranking dos produtores de farelo (21,7 milhões t) e óleo (5,2 milhões t) de soja o país ocupa a quarta colocação. O Brasil é um exportador de soja em grão, produto com o menor valor agregado. A Argentina, por outro lado, privilegia a exportação do farelo e do óleo de soja (25,7 milhões t e 5,8 milhões t, respectivamente) de soja, produtos de maior valor agregado e que também contribuem para o desenvolvimento e modernização do parque agroindustrial e a geração de mais empregos e divisas (USDA, 2006). A China é a maior importadora de soja em grão (31,5 milhões t) e de óleo de soja (1,7 milhões t), embora seja o quarto maior produtor de soja (16,7 milhões t). A União Européia é a maior importadora de farelo de soja que é destinado principalmente ao consumo animal (USDA, 2006). Santos (2000) mostra a partir de dados do último censo agropecuário (1996) que no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo a participação das cooperativas no processo de comercialização é muito importante e representou respectivamente, 55,7%, 61,5%, 66,2% e 39,8% da soja comercializada em 1995. As cooperativas nas novas regiões produtoras tiveram uma participação menor na comercialização da soja: 5,2% no Mato Grosso, 13,4% no Mato Grosso do Sul, 12,5% em Goiás, 14,8% em Minas Gerais, 5,3% na Bahia e 27,8% no Maranhão. As indústrias processadoras foram o principal meio de comercialização de soja nas novas regiões produtoras. Em 1995, os Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, Bahia e Maranhão entregaram respectivamente, 40,2%, 34,7%, 50,9%, 47,1%, 71,1% e 28,6% da produção de soja às indústrias processadoras (SANTOS, 2000). Os intermediários, tiveram uma participação relevante no processo de comercialização nos estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais e Maranhão, representando, respectivamente, 51,1%, 47,7%, 33,8%, 31,8% e 41,4%. No Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e a Bahia, a participação dos intermediários ficou ao redor de 20% (SANTOS, 2000).
5.3
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Milho
O Brasil é o terceiro maior produtor mundial (41 milhões t - safra 2005/06). Os Estados de Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul representam 45% da área total cultivada com milho no país. 21
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
O milho destaca-se por ser um produto consumido e cultivado na maioria das propriedades rurais no Brasil. Isso ocorre em virtude de praticamente em todas as pequenas, médias ou grandes propriedades rurais existirem alguma atividade de criação de animais, sendo, portanto, o milho uma fonte importante de alimentação aos mesmos. Dados da Associação Brasileira de Milho reforçam essa afirmação ao mostrarem que mais de 60% da produção nacional de milho destina-se ao consumo animal, enquanto o consumo humano representa pouco mais de 3% da produção total de milho. Nesse sentido, nota-se que a cultura do milho exerce uma função fundamental para o desempenho da agropecuária brasileira. Deve-se salientar, todavia, que embora se encontre a produção de milho em quase todo o território nacional, a mesma divide-se em dois tipos, a saber: aquela realizada em pequenas e médias propriedades e voltada para produzir alimento ao rebanho e a produção em larga escala, encontrada principalmente no Centro-Oeste, executada em grandes propriedades, com uso intenso de tecnologia, sementes melhoradas e alta produtividade. Vale ressaltar que a cultura do milho, ao contrário da soja, ainda conta com grandes possibilidades de aumento de produção via crescimento de produtividade. Atualmente a maior parte do crescimento da demanda mundial por milho e derivados devese ao aumento de renda e, portanto, de padrão de consumo (maior consumo de proteínas) dos países asiáticos, em especial dos Tigres e da China. A taxa de crescimento do consumo mundial foi de 2,3% ao ano nos últimos dez anos. Nos Estados Unidos essa taxa foi de 3,1%, enquanto na China o consumo cresceu a uma taxa de 4,5%, puxado principalmente por carnes de frango e suínos, grandes consumidores de milho na sua produção. Outro fator que deve impulsionar a cultura do milho ao longo dos próximos anos será a sua utilização na produção de álcool combustível, especialmente nos Estados Unidos (USDA, 2006). Os Estados Unidos conseguem produzir uma safra aproximadamente sete vezes superior à brasileira com uma área 130% maior, devido a alta produtividade das lavouras de milho americanas, nas quais obtêm-se cerca de 10 t/ha (USDA, 2006). As exportações de milho nos Estados Unidos representam 70% do mercado mundial. Em segundo lugar está a Argentina com 14% e em terceiro a China com 5% das exportações. O Japão representa cerca de 20% das importações mundiais de milho. Apesar do Brasil ser o terceiro maior produtor de milho, atrás apenas dos EUA e da China, seu consumo interno do grão é extremamente elevado, de modo que os fluxos de comércio externo não são expressivos. Para a safra 2006/2007, estima-se que as importações serão de cerca de 850 mil toneladas. Semelhante à soja, ainda há diversas questões a serem solucionadas na produção nacional de milho como: sua padronização, corrigir as deficiências de infra-estrutura e armazenagem, a valorização cambial, o aumento nos custos de produção versus redução no preço, os vencimentos do MODERFROTA, a elevação dos valores do frete e a gripe aviária.
5.4 Algodão.
22
Nos últimos anos a cotonicultura brasileira apresentou um grande desenvolvimento. Alguns dos fatos que auxiliaram este aumento de produção foram: o apoio governamental em tecnologia no melhoramento genético de cultivares e no desenvolvimento de novos mecanismos de comercialização; a modernização e profissionalização do setor agrícola; a interferência da demanda da indústria têxtil e a concorrência da mesma com os asiáticos; a abertura comercial, o acesso aos mercados e as tarifas de exportação; em contrapartida aos problemas de pragas e edafo-climáticas (ALVES, 2006). Nos estados tradicionais, Paraná e São Paulo, a cultura do algodão tem diminuído continuamente. Após a produção nacional atingir seu nível mínimo na safra 1996/1997, a produção de algodão dos estados de São Paulo e Paraná não se recuperou. A cultura do algodão foi substituída por outras culturas nessa região, principalmente a cana-de-açúcar. O Centro-Oeste, por outro lado, tem aumentado, pois apresenta menores custos de produção e o custo da terra inferior ao dos estados tradicionais. Nos estados do Mato Grosso, Goiás e
Bahia a produção de algodão é feita de forma similar à americana, com uso intensivo de máquinas e tecnologia de ponta. O aumento da produtividade brasileira foi um reflexo da tendência mundial de buscar o uso intenso de tecnologia na cotonicultura. A produtividade mundial aumentou quase 200% entre as safras de 1970/71 e 2004/2005 e a área cultivada pela cotonicultura manteve-se praticamente estável no período. Os principais países produtores de algodão são: em primeiro lugar a China, (5,5 milhões de t na safra 2005/2006), seguida pelos Estados Unidos (5 milhões de t). O Brasil encontrase em sexto lugar (1,2 milhões t). A China (4,2 milhões t) responde por quase metade das importações mundiais de algodão, devido ao forte crescimento da sua demanda interna e do setor têxtil. Os Estados Unidos são os principais exportadores. No entanto, essa competitividade nas exportações de algodão está baseada numa dispendiosa estrutura de subsídios aos produtores agrícolas americanos (ALVES, 2006). Nesse contexto, o Brasil, apoiado por outros países exportadores e também países africanos, os mais prejudicados com os subsídios americanos, apresentou a Organização Mundial do Comércio (OMC) um estudo relatando os efeitos danosos ao comércio internacional e a produção de algodão gerados por esses subsídios. Os esforços brasileiros resultaram numa derrota dos Estados Unidos em 1º de julho de 2005, que foram obrigados pela OMC a reduzir aos níveis de 1992 o valor dos subsídios aos produtores de algodão (US$ 2 bilhões). Contudo, cabe um adendo, que a contrapartida americana nesse caso, foi a sobre taxação às exportações brasileiras de camarão e as ameaças de não facilitar a entrada de produtos agrícolas brasileiros com tarifa zero de importação. Diferentemente dos demais produtores mundiais de algodão, a estrutura de comercialização do Brasil apresenta uma peculiaridade, na qual as algodoeiras compram o algodão e o beneficiam para, posteriormente, revenderem à indústria têxtil. Nesse sentido, esses agentes representam um intermediário no processo de comercialização, enquanto em outros países eles agem como um apoio ao setor produtivo agrícola, por meio da prestação dos serviços de beneficiamento do algodão. Outro ponto relevante a ser destacado é armazenagem, pois em virtude das deficiências históricas brasileiras nessa área, a maior parte da colheita do algodão é comercializada na safra, período em que os preços se encontram nos menores patamares, pois os pequenos e médios produtores, principalmente, não possuem recursos para financiar a armazenamento da produção. Atualmente o processo de comercialização do setor está bastante modernizado e mais planejado. Um indicador é que a parcela da produção que é comercializada por meio de contratos no mercado interno e externo com até dois anos de antecedência têm aumentado. Contudo, uma parcela muito pequena dos produtores recorre aos contratos futuros para assegurar o preço de seu produto (ALVES, 2006).
5.5
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Café
O Brasil é o maior produtor mundial de café (2,2 milhões de t na safra 2006) e o segundo maior consumidor, atrás apenas dos Estados Unidos (FAO, 2006). Em relação à produção estadual, o estado de Minas Gerais destaca-se como o maior produtor nacional (1,2 milhões t), representando metade da quantidade de café produzida no país. Em segundo lugar o Espírito Santo (20% da produção nacional), e em terceiro e quarto lugar, os estados de São Paulo e Paraná, respectivamente. Esses quatro estados respondem por 88% do café produzido no país. Contudo nos últimos anos, outros estados, como o Acre, Rondônia e a Bahia têm crescido na produção de café, através da implantação de uma cafeicultura moderna e com alta produtividade (MAPA, 2006). 23
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Os brasileiros apresentam um consumo per capita semelhante ao dos americanos, contudo abaixo do observado nos países nórdicos e nos consumidores europeus mais tradicionais. O consumo doméstico aumentou significativamente entre 1990 e 2005, representando um crescimento de 90% ao longo desse período. Quanto ao crescimento do consumo per capita de café em pó torrado/moído, o mesmo evoluiu 51% durante os quinze anos analisados, passando de 2,71 kg/hab./ano para 4,11 kg/hab./ano (ABIC, 2006). O aumento do consumo de café explica-se por uma mudança no comportamento do consumidor em relação a essa bebida, no sentido de demandar características diferentes e novas formas de preparo do tradicional cafezinho. Identifica-se uma modernização do setor com maior cuidado no cultivo, crescimento dos cafés orgânicos, o lançamento de novos produtos ( capuccino , descafeinado, doces, sorvetes) e de novos blends , além de um grande aumento da quantidade de cafeterias (café gourmet) no país (FONTES, 2001). O conceito de café especial envolve diversas características, desde físicas até ambientais e sociais, dessa forma, não há um padrão internacional de classificação desses cafés, dado que em cada local ele adquire características próprias e peculiares da região de onde é proveniente. A rastreabilidade e a incorporação de serviços são fatores de diferenciação que também agregaram valor ao produto. Os maiores produtores mundiais de café em 2004, depois do Brasil são respectivamente: o Vietnã (1 milhão t) e a Indonésia (0,7 milhões t). Cabe destacar o grande crescimento da produção vietnamita entre o fim da década de 1980 e 2005. Os maiores exportadores são: Brasil (1,6 milhões t), Vietnã (0.9 milhões t) e Colômbia (0,6 milhões t); e os maiores importadores são Estados Unidos (1,4 milhões t), Alemanha (1,1 milhões t) e o Japão (0,4 milhões t) (FAO, 2006). Quanto ao processo de comercialização do café, o mesmo ocorre ainda predominantemente entre os produtores agrícolas e as indústrias, exportadores ou cooperativas, que em geral agem como intermediárias. Todavia, o café destaca-se entre as demais atividades agrícolas nacionais na utilização de instrumentos financeiros como os mercados futuros e a CPR (Cédula do Produto Rural).
5.6
Laranja
Em 2004, a produção mundial de laranja foi de aproximadamente 64 milhões de t e o Brasil responsável pela produção de 18,27 milhões de t (28,5% da produção mundial). Os Estados Unidos estão em segundo lugar, com uma produção de 11,68 milhões de t de laranja (18,2% da produção mundial) e, em terceiro, o México, que produziu cerca de 4 milhões t em 2004 (6,2% do total mundial) (FAO, 2006). Em 2005/06 o Brasil representou mais de 80% (1,3 milhões t) das vendas internacionais desse produto. Os Estados Unidos são os maiores importadores mundiais (0,2 milhões t), seguidos pelo o Japão (0,1 milhões t) e a Espanha (0,1 milhões t) (FAO, 2006). No Brasil, o estado de São Paulo destaca-se por apresentar a maior produção de laranja. A citricultura paulista, que ocupa 586 mil hectares, aproximadamente 9,4% da área cultivada do Estado, está atrás apenas da cana-de-açúcar (46,2%), milho (12,4%) e da soja (9,9%) e representa 81% do total de laranja produzido no país. Emprega 11,2% da força de trabalho agrícola do Estado. Os demais estados com alguma representatividade na produção de laranja são Sergipe, Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul (NEVES et al., 2005). A produção de citros do país concentra-se nas regiões Sul e Norte do estado de São Paulo e no Triângulo Mineiro, compreendendo o “cinturão citrícola”. Contudo, o avanço da cana-deaçúcar e a ocorrência de doenças nas regiões citrícolas do norte do Estado (a morte súbita e o amarelinho - CVC), têm levado o plantio para áreas novas no Sul e Centro do Estado. A área cultivada com a laranjeiras no Brasil vem diminuindo ao longo dos últimos anos. Contudo, a produção tem se mantido ao redor das 350 milhões de caixas, na média dos últimos cinco anos. Nesse ponto, o estado de São Paulo se destaca, por apresentar uma produtividade média 12,2% (25.079 kg/ha) superior à média brasileira (22.345 kg/ha). 24
A Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) representa o principal atacadista para a citricultura paulista, movimentando em torno de 8% da laranja comercializada no Estado. O principal canal varejista de comercialização do suco processado e da laranja in natura são os supermercados, seguidos pelas lojas de conveniência, feiras livres, armazéns e mercearias e padarias. As principais tendências do setor são: nos insumos verifica-se uma concentração dos fornecedores e uma diminuição na participação da citricultura nas vendas das indústrias de insumos; uma maior participação de cooperativas na distribuição de insumos e um aumento nos custos dos mesmos. Na produção, observa-se uma concentração dos produtores, a formação de cooperativas e associações, a diminuição da área plantada, o aumento dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, o avanço da cana-de-açúcar e a ocorrência mais freqüente de doenças na lavoura. Na indústria processadora e as packing houses (PH), nota-se a ocorrência de um processo de concentração industrial e eficiência no processo industrial. Todavia, verifica-se que há capacidade ociosa tanto nas PHs quanto na indústria e que ambas têm buscado o desenvolvimento de novos mercados no país e fora dele. Também tem sofrido com as tarifas impostas pelos países importadores, sobretudo os Estados Unidos. Na distribuição, observa-se a concentração da distribuição do suco industrializado nas grandes cadeias varejistas e parcerias com a indústria de bebidas para distribuir no mercado internacional. Por último, o consumo de laranja no país ocorre principalmente sob a forma caseira e o crescimento do consumo de sucos industrializados de outras frutas pode diminuir ainda mais a participação do suco de laranja no mercado nacional (NEVES et al., 2005).
5.7
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
Pecuária de corte
De forma geral, o principal destino da produção brasileira de carne bovina é o mercado interno, que pode ser dividido em dois grupos: os consumidores de baixa renda, que estão preocupados com a quantidade a ser consumida e com restrição de preço; e os consumidores de alto poder aquisitivo, preocupados com a qualidade do produto. Esses consumidores buscam serviços de confiança, alimentos sadios produzidos segundo os conceitos de sustentabilidade, respeito ao meio ambiente e bem estar animal. A partir de 2002 as exportações de carnes em geral começaram a apresentar altas taxas de crescimento, mantidas até 2005, embora tenham sofrido embargo de alguns países devido a problemas como a febre aftosa (bovinos e suínos) e o newcastle (aves). O setor de carnes no Brasil tem passado por modificações radicais nas últimas décadas. A pecuária bovina, apesar de ainda não incorporar tão rapidamente as novas tecnologias de produção e gestão, tem evoluído significativamente com o aumento da produtividade do rebanho e a modernização de muitas empresas rurais. O Brasil possui um rebanho de 204 milhões de animais (2004) e é o segundo maior produtor de carne bovina. É o líder mundial da exportação de carne sendo responsável por 25% do total mundial exportado (USDA, 2006). O setor tem apresentado, principalmente, aumento na exportação de carnes industrializadas. As exportações de carne bovina in natura e industrializada chegaram a US$ 2.457,3 bilhões em 2004. Em volume, totalizaram 1,9 milhões de toneladas e foram embarcadas principalmente para União Européia (37%), Rússia (13%), Egito (10%), Chile (9%) e Irã (5%) (ABIEC, 2006). Dados da CNA mostram que nos seis primeiros meses do ano de 2006 as exportações totalizaram US$ 1,717 bilhão, um aumento de 16,24% em relação ao mesmo período de 2005. O Centro-Oeste é a região onde se concentra a maior parte do gado brasileiro, 35% do total de cabeças de bovinos presentes no país. Embora os estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul sejam os maiores produtores, é no estado de São Paulo onde se abate a maior quantidade de cabeças. O Centro-Oeste é a região com o maior número de bovinos abatidos, porém apenas uma pequena parcela é consumida no mercado local, destinando-se a maior parte aos mercados paulista e fluminense (CEPEA, 2006). 25
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
5.8
Suinocultura
A criação de suínos no Brasil está concentrada na região Sul, com 44% do rebanhos brasileiros (IBGE, 2006). A produção nacional de carne suína pode atingir 2,82 milhões de toneladas em 2006 (122 mil toneladas a mais do que 2005). Mesmo assim, o volume produzido ainda ficará abaixo da capacidade instalada, avaliada em 3,0 milhões t (ABIPECS, 2006). A produção brasileira de carne suína destina-se, principalmente, ao consumo interno. Contudo o consumo per capita dessa carne pelo brasileiro vem diminuindo nos últimos anos. Por outro lado, as exportações têm apresentado taxas de crescimento positivas. O Brasil também registrou crescimento nas vendas externas de carne suína, que em 2005 atingiram US$ 1.657,4 bilhões e 876 mil t (ABIPECS, 2006). Considerando o período de agosto de 2004 a junho de 2006, os maiores importadores da carne suína brasileira são: Rússia, Hong Kong, Cingapura, Ucrânia, Argentina, República da Moldavia, Uruguai e Albânia, os quais são responsáveis por, respectivamente, 59%, 11%, 7%, 4%, 4%, 3%, 2% e 2% do total exportado pelo Brasil. A Rússia, embora seja a maior importadora, vem tentando barrar essas importações, visando estimular a produção interna (IBGE, 2006). Um detalhe importante que tem ocorrido com a criação de suínos é a redução dos plantéis de subsistência devido a fatores como a dificuldade de suprimento de insumos e de reprodutores, a baixa produtividade, os custos mais altos e a escala sem competitividade.
5.9
Avicultura
O setor avícola brasileiro possui um elevado grau de organização e coordenação, detendo vantagem comparativa em relação à carne de frango produzida em outros países. Nesse setor, os abatedouros atuam, freqüentemente, como integradores, estabelecendo contratos com os granjeiros. Nesses contratos, o abatedouro fornece a ração, que usualmente é fábricada em uma unidade própria e, muitas vezes, atuam também como “matrizeiros”. A região responsável pela maior parcela da produção de frangos é a região Sul (44%). A produção brasileira em 2005 foi de 4,4 bilhões de cabeças (ABEF, 2006). Em 2003, o Brasil assumiu a liderança do ranking dos maiores exportadores de frango. Em 2005, o total exportado foi de US$ 3.507,2 bilhão (ABEF, 2006). Para 2006, espera-se uma queda no valor das exportações devido a três fatores: superestocagem nos principais centros consumidores, queda do consumo mundial por conta da gripe aviária e superprodução de aves no Brasil. No passado, o mercado externo foi muito importante para o desenvolvimento da indústria nacional, pois o potencial produtivo foi um importante atrativo para investidores internacionais. Estas empresas se instalaram no país visando o mercado internacional. Nos anos subseqüentes, a auto-suficiência da União Européia e as crescentes barreiras comerciais fizeram com que esses grupos perdessem o interesse pelo Brasil e a indústria nacionalizouse. No entanto, o padrão internacional da indústria permaneceu. A nacionalização e o crescimento dos centros urbanos fizeram que o mercado nacional fosse considerado prioritário (6,5 milhões t em 2005). A modernizaçõe da indústria de carne avícola permite ao país sonhar com um aumento da participação no mercado internacional t), mas para isso três pontos precisam ser atacados: a padronização do produto, a estrutura fiscal e a estrutura administrativa das indústrias. A falta de padronização do produto nacional fere a credibilidade com relação à sua qualidade (ABEF, 2006).
5.10 Trigo A qualidade do trigo brasileiro melhorou significativamente. Contudo, as exigências do mercado também aumentaram e com a liberalização da comercialização, os moinhos passaram a ser mais criteriosos na aquisição da matéria-prima. De acordo com a Associação 26
Brasileira da Indústria do Trigo (ABITRIGO, 2006) “embora venham sendo lançadas variedades de glúten forte para RS e SC, essa região, com seus solos mais ácidos parece ter uma vocação para produzir trigos softs , enquanto o Norte e Oeste do Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul, estão vocacionados para a produção de trigo para pão. Dos Cerrados, sob irrigação em pivô central, esperam-se trigos melhoradores”. A partir da safra 2003, a quantidade produzida de trigo no Brasil alcançou novamente o patamar de 6 milhões t, semelhante ao nível de produção da segunda metade da década de 1980. Em 2003, o país chegou a participar do mercado internacional de trigo como exportador, ao vender 1,3 milhões t. Todavia, a reversão dos preços internacionais e a valorização do câmbio inviabilizaram as vendas externas e o governo interveio no mercado com a utilização do Prêmio de Escoamento do Produto (PEP). Em 2005 a produtividade de trigo foi de 2,12 t/ha, 300% superior a produtividade verificada em 1961. Entretanto, ao compararem-se os dados da produção de trigo no Brasil com os dados internacionais apresentados, nota-se a irrelevância do país no mercado mundial (1% da quantidade produzida de trigo no mundo), com produtividade média 36,6% inferior ao rendimento médio mundial. Verifica-se também que a área cultivada com trigo no mundo permaneceu estável ao longo dos 45 anos e que o aumento de 182% na produção mundial no período ocorreu devido ao aumento de produtividade. Em 2005, a China (96 milhões t), a Índia (72 milhões t), os Estados Unidos (57 milhões t), a Rússia (45 milhões t) e a França (37 milhões t) responderam por 50% da produção mundial de trigo. Na América do Sul, o Brasil (5.8 milhões t) é o segundo maior produtor, atrás apenas de Argentina (16 milhões t), com uma produção três vezes maior que a brasileira (FAO, 2006). O Brasil destaca-se por ser o terceiro maior importador mundial (5,5 milhões t) dessa com- modity (USDA, 2006). O maior fornecedor do país é a Argentina, que, em 2001, respondeu por 97% do trigo importado pelo país (EMBRAPA, 2006). Em termos de Brasil, a região Sul do país destaca-se por produzir mais de 90% do trigo nacional, sobretudo o estado do Paraná (58,3% da produção brasileira) (CONAB, 2006). As perspectivas da triticultura para as próximas safras não são muito boas visto que a cotação do trigo no mercado internacional inviabiliza as exportações, e que os mecanismos de proteção do governo são somente disponibilizados quando o preço de mercado está menor do que o preço mínimo, gerando perdas ao agricultor. Contudo, no longo prazo, as perspectivas podem ser favoráveis à atividade, na medida em que têm ocorrido progressos nas rodadas de negociação da Organização Mundial do Comércio sobre os subsídios aplicados à produção de trigo pelos países europeus, Estados Unidos e Canadá. Nesse sentido, a resolução dos problemas relativos aos subsídios abre uma oportunidade ao país de participar do comércio internacional de trigo como exportador e de ampliar a produção nacional.
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
6. Consideraçöes Finais A visão de parcela da economia (como a agropecuária ou o agronegócio) permite a análise de aspectos tais como as estratégias das empresas, a avaliação de impactos de fatores externos à economia e os impactos de política econômica com mais precisão de detalhes do que quando se considera toda a economia.
7. Bibliografia ABEF. Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frango. Disponível em:
. Acesso em setembro de 2006. ABIC. Associação Brasileira das Indústrias de Café. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. ABIEC Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. 27
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
ABIPECS. Associação Brasileira Ind Prod Exp Carne Suína. Disponível em:. Acesso em setembro de 2006. ABITRIGO. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DO TRIGO. Disponível no URL: . Acesso em 22 de setembro de 2006. ANFAVEA. Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. ALVES, L.R.A. Agronegócio do Algodão: Evolução, Importância Econômica, Mercados e Comercialização da Cadeia Produtiva do Algodão no Brasil . Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP), Piracicaba, 42p, 2006. BACHA, C. J. C. Economia e Política Agrícola no Brasil. São Paulo: Editora Atlas, 226p. 2004. BACHA, Carlos José Caetano. Macroeconomia Aplicada à Análise da Economia Brasileira . São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 264p. 2004. BACHA, C.J.C. Economia e Política Agrícola no Brasil. São Paulo: Atlas, 2004. BRUGNARO, R.; BACHA, C.J.C. “Analysis of Increased Participation of Agriculture in the Brazilian GDP from 1994 to 2004”, In Anais do 46th Congress of European Regional Science Association, Volos, Grécia, 2006. CEPEA. Centro de Estudos e Pesquisas em Economia Aplicada. Cadeia Agroindustrial do Boi. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. CONAB. Companhia Nacional de Abastecimento. Disponível em: Acesso em setembro de 2006. CNA. Confederação da Agricultura e Pecuária no Brasil. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. EMBRAPA. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. FAO. Food and Agriculture Organization. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. FERREIRA, A. B. H. et al. (1986) Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2a edição, Editora Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 1986. FIGUEIRA, S.R. Os Programas de Álcool Combustível nos EUA, no Japão e na União Européia e as possibilidades de exportação do Brasil. 246p. Tese (Doutorado em Ciências) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2005. FONTES, R. E. Estudo Econômico da Cafeicultura no Sul de Minas Gerais. Dissertação apresentada à Universidade Federal de Lavras, Lavras, 94p. 2001. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. JANK, M.S. Agricultura e Política Agrícola nos Estados Unidos da América, Tese de Livre-Docência, ESALQ/USP, Piracicaba, 2002. MAPA. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. MONTOYA, M.A. & GUILHOTO, J.J.M. Mudança Estrutural no Agronegócio Brasileiro entre 1959 a 1995 e suas implicações na Produção Rural: uma abordagem insumo-produto, In CD-ROM do XXXVIII Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, Foz do Iguaçu, agosto de 1999.
28
NEVES, E.M. Mercado de Citros – Perspectivas. Novembro de 2005. Disponível em:. Acesso em setembro de 2006. ORPLANA. Organização dos Plantadores de Cana da Região Centro Sul do Brasil Disponível em: . Acesso em setembro de 2006.
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
ROCHA, M. T.; BACHA, C. J. C. Evolução da participação da agropecuária no PIB brasileiro nas últimas três décadas. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. SANTOS, A. B. Evolução Diferenciada entre os Estados Brasileiros do Cultivo e do Processamento Industrial da Soja – Período de 1970 a 1999. 98p. Dissertação (Mestrado em Ciências) - Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2000. USDA. United States Department of Agriculture. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006. UNICA. União das Indústrias Canavieiras do Estado de São Paulo. Disponível em: . Acesso em setembro de 2006.
Questões de Revisão Classifique cada afirmativa abaixo como sendo verdadeira ou falsa. 1) A agropecuária inclui agricultura, pecuária, silvicultura, sericicultura, extração vegetal, cunicultura e floricultura. Observe que a gricultura passa a ser um subsetor da agropecuária, e a pecuária é outro subsetor da agropecuária. 2) O termo agronegócio é a tradução do termo agribusiness e se refere ao conjunto d e atividades realizadas pela agropecuária e pelos setores vinculados com a agropecuária. 3) A tendência da participação da agropecuária no PIB brasileiro de 1994 a 2004 é de diminuir. 4) As atividades de comercialização doméstica e externa de produtos da agropecuária e da agroindústria no Brasil são realizadas por empresas e agentes situados no segmento 1 do agronegócio. 5) Considerando o ano de 2005, o segmento de maior importância na composição do agronegócio brasileiro é o segmento 1. 6) O ano de 2005 presencia uma expressiva queda da participação da agropecuária e do agronegócio no PIB brasileiro. 7) A agropecuária e o agronegócio têm importância parecida entre os estados brasileiros. 8) Quanto mais desenvolvido é um país, maior é a importância da agropecuária e do agronegócio no PIB do país. 9) A importância da agropecuária na geração de emprego no Brasil é superior a sua importância na geração do PIB brasileiro. 10) A agropecuária e a agroindústria têm gerado saldo comercial positivo para o Brasil. V ) 0 1 ; V ) 9 ; F ) 8 ; F ) 7 ; V ) 6 ; F ) 5 ; F ) 4 ; F ) 3 ; V ) 2 ; V ) 1
: o t i r a b a G
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CAPÍTULO
2
COMÉRCIO INTERNACIONAL Silvia Helena Galvão de Miranda 1 Ricardo de Queiroz Machado 2
1. Professora do Departamento de Economia, Administração e Sociologia - ESALQ/USP 2. Mestrando em Ciências – Economia Aplicada - LES-ESALQ/USP
Capítulo 2 Capítulo 2 Comércio Internacional
Comércio Internacional
Este capítulo tem como objetivo apresentar alguns dados sobre o comércio internacional global e do Brasil, em particular para o agronegócio, bem como explicar alguns elementos da economia internacional, com objetivo de prover uma melhor compreensão da estrutura desse mercado. Pretende-se com isto, apresentar uma visão mais ampla sobre os desafios e oportunidades com os quais exportadores e importadores do Brasil se defrontam. Dentre estes desafios, além das políticas protecionistas tradicionais, destacam-se as relacionadas a questões sanitárias, técnicas e ambientais. Ao final, apresentam-se alguns conceitos cuja aplicação no comércio externo tem tido destaque em período recente, tais como o de qualidade, rastreabilidade e processos de certificação, os quais, embora não convencionalmente tratados na Economia Internacional, têm um papel crescente em definir o perfil das relações comerciais entre países (empresas).
1. Evolução do comércio do agronegócio brasileiro no mercado internacional No âmbito nacional muitas mudanças vêm ocorrendo desde meados da década de 80. Associadas ao contexto internacional, exposto no item acima, são determinantes do ambiente competitivo enfrentado pelo setor exportador e importador brasileiro. Primeiramente, é importante mencionar que a partir do governo Sarney, o Brasil iniciou um processo de abertura comercial, reduzindo suas tarifas e outras restrições à entrada de produtos estrangeiros bem como também o controle das exportações, caracterizado por quotas de produção e exportação sobre alguns setores (exemplo do sucroalcooleiro). O marco principal, contudo, desse processo de abertura foram as medidas liberalizantes do governo Collor de Mello no início dos anos 90. A busca da integração regional, não só no Hemisfério Sulamericano, mas também em outros continentes e uma postura mais pró-ativa nas negociações internacionais, em particular com liderança nas questões agrícolas, também fazem parte do contexto recente do setor. É evidente a importância dos resultados desse setor para a redução dos déficits comerciais nacionais na segunda metade da década de 90. Nota-se, também, o crescimento sustentado e significativo das exportações a partir de 1999, quando se alterou o regime cambial brasileiro, deixando de ser um regime fixo para um regime flexível (de flutuação “suja”) 1. Apesar do crescimento significativo do comércio brasileiro com o exterior nos últimos anos, sua participação no mercado mundial ainda é pequena, tanto no geral quanto nos produtos do agronegócio, tendo ficado na casa dos 4,0% em 2003 para o agronegócio. Em 1990, era de 2,7%. Além do market-share pouco expressivo no mercado internacional, outras características marcantes do comércio brasileiro devem ser mencionadas. Primeiramente, há a concentração da pauta comercial do agronegócio em um pequeno grupo de produtos. Em 2004, quatro complexos agroindustriais responderam por cerca de 56,8% de toda a exportação. A Tabela 1 mostra para o ano de 2005, os principais produtos do agronegócio exportados pelo Brasil. Couro, peles e calçados, papel e celulose, madeira e suas obras vêm se alternando no ranking dos 6 maiores complexos agroindustriais exportadores nos últimos anos. Considerando-se dados da publicação Balança Comercial Brasileira de 2005, apresentada pelo MDIC (2005) para os principais produtos brasileiros exportados, observa-se que o complexo 1. Flutuação “Suja” é considerada uma variante dentro do regime cambial flexível, no qual o governo permite uma flutuação livre no mercado de câmbio dentro de um determinado intervalo, intervindo apenas quando necessário para manter a taxa abaixo de um limite máximo ou acima de um mínimo.Ambos, limites informais.
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soja é o terceiro em valor, antecedido por material de transporte e produtos metalúrgicos. As carnes, o açúcar, calçados e couro e papel e celulose também são destaques. O setor sucroalcooleiro deve superar as exportações da soja e carnes em 2006, segundo as últimas estatísticas oficiais.
Capítulo 2 Comércio Internacional
Tabela 1 - Principais grupos de produtos do agronegócio exportados pelo Brasil. 2005 Capítulos
Carnes, miudezas e comestíveis Sementes e frutos oleaginosos Açúcares e produtos de confeitaria Madeira, carvão vegetal e obras de madeira Resíduos e desperdícios das indústrias alimentares Café, chá, mate e especiarias Pastas celulósicas Fumo (tabaco) e seus sucedâneos manufaturados Calçados, polainas e artefatos de couro Gorduras e óleos animais ou vegetais
Exportações (milhões US$)
Exportações do agronegócio
7.179 5.425 4.102 3.031
16,46% 12,44% 9,41% 6,95%
2.998 2.669 2.034
6,88% 6,12% 4,66%
1.707 1.512 1.486
3,91% 3,47% 3,41%
Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento - Secretaria de Produção e Comercialização.
Nas importações totais e do agronegócio brasileiras, deve-se destacar a crescente importância dos países asiáticos, que já estão na segunda colocação, após a União Européia como parceiros preferenciais, e deixando os Estados Unidos na terceira colocação, em 2005 no comércio global. Embora a UE e os EUA dominem ainda a pauta brasileira em termos de destinos de produtos em geral e do agronegócio, cumpre ressaltar que o comércio do Brasil com países em desenvolvimento está evoluindo favoravelmente. Dentre estes países, destacam-se: Argentina, China, México, Chile, Rússia, Coréia do Sul, Bahamas, Colômbia, África do Sul, Arábia Saudita, Índia, Argélia, Nigéria, Taiwan, Bolívia e México. Há também outros desafios no âmbito da busca da competitividade no exterior. A carga tributária elevada sobre bens agroindustriais, a falta de uma adequada infra-estrutura logística (armazenagem, transporte e distribuição) e a falta coordenação nas cadeias compõem partes importantes no “custo Brasil” 2. Isto implica que apesar da competitividade do agronegócio nacional dada pela eficiência econômica produtiva, na comercialização de seus produtos, o Brasil apresenta grandes gargalos. Um fator que parece prejudicar o país é a falta de cultura exportadora de modo geral. Isto exige, além dos já mencionados desafios, a identificação de meios para um melhor ajustamento do setor privado ao mundo do comércio internacional. Infra-estrutura, educação e capacitação, ações de marketing internacional são requisitos importantes, para os quais será necessário contar com a retaguarda do poder público, e os investimentos do setor privado.
2. A falta de coordenação da cadeia traduz-se pela dificuldade de articulação entre os segmentos das cadeias agroindustriais, devido a diversos fatores, dentre os quais citam-se os interesses divergentes entre segmentos e a dificuldade de abdicar de alguns ganhos para uma ação mais cooperativa em prol de interesses convergentes; a assimetria de informações entre segmentos distintos e a diferença de poder de mercado entre segmentos; a pulverização dos agentes que compõem alguns segmentos; dentre outros fatores que levam à dificuldade de unir segmentos e cadeias em ações que poderiam trazer benefícios globais. O Custo Brasil designa o conjunto de dificuldades estruturais, burocráticas e econômicas que encarecem o investimento no Brasil e as atividades econômicas em geral. A afirmativa no texto traz implícita a idéia de que a falta de coordenação entre agentes e segmentos das cadeias do agronegócio compõem o universo de dificuldades que contribuem para gerar ineficiências e elevar os custos das atividades econômicas.
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Capítulo 2 Comércio Internacional
2. Conceitos gerais e nomenclatura para comércio internacional No comércio internacional, um dos temas básicos poucas vezes tratado em sala de aula, ou mesmo pelos livros-texto, é a nomenclatura para comércio exterior. Contudo, quando se necessita utilizar estatísticas de comércio externo, um dos primeiros desafios é exatamente identificar os produtos e suas classificações para que se possa realizar a agregação necessária em grupos de produtos ou setores, ou mesmo quando se discute a incidência de tarifas e outras políticas comerciais. Assim, as nomenclaturas são instrumentos úteis para facilitar as transações entre países e agentes econômicos. Considerando que o Brasil é membro da Organização Mundial do Comércio (OMC), aqui se apresenta o Sistema Harmonizado de Designação e de Codificação de Mercadorias, ou simplesmente Sistema Harmonizado (SH) ou Harmonized System (HS), um método internacional de classificação de mercadorias. É composto por códigos com seis dígitos, que especificam os produtos (origem, matéria constitutiva e aplicação), apresentando um ordenamento numérico lógico, crescente e de acordo com o nível de sofisticação das mercadorias. Compreende 21 seções, compostas por 96 capítulos, além das Notas de Seção, de Capítulo e de Subposição. O SH é a base do sistema de nomenclatura utilizado pelo Brasil, a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), adotado conjuntamente pela Argentina, Uruguai e Paraguai, desde janeiro de 1996. A NCM é composta por um código com oito dígitos: os seis primeiros formados pelo SH, e os demais a desdobramentos específicos atribuídos no âmbito do Mercosul. Um exemplo da NCM é apresentado na figura 1. A União Européia adota um sistema com 10 dígitos e os Estados Unidos com 6 dígitos do Sistema Harmonizado, acrescidos de mais 4 dígitos referentes a sua própria classificação (Schedule B). Portanto, a harmonização que se busca com a adoção do SH acaba não sendo plena, uma vez que os países têm tido necessidade de discriminar mais do que seis dígitos para fins de suas políticas comerciais e controles tributários. Exemplo: Código NCM: 0104.10.11 – Animais reprodutores de raça pura, da espécie ovina, prenhe ou com cria ao pé. Este código é resultado dos seguintes desdobramentos: Seção Capítulo Posição Subposição Item Subitem
I 1 104 0104.10 0104.10.1 0104.10.11
à ANIMAIS VIVOS E PRODUTOS DO REINO ANIMAL à animais vivos à animais vivos das espécies ovina e caprina à Ovinos à Reprodutores de raça pura à prenhe ou com cria no pé
Figura 1 – Exemplo de aplicação da NCM . Fonte: Disponível em www.mdic.gov.br, 27/11/06
Uma aplicação prática importante da definição dos produtos do agronegócio é a agregação de estatísticas de comércio. Por exemplo, quando se comparam os dados de exportação ou importação do setor agronegócio, entre duas fontes diferentes, observam-se diferenças nos montantes. Muitas vezes, tais diferenças estão relacionadas à agregação que foi feita dos itens agroindustriais. Por isto, definir bem as categorias incluídas como agronegócio é um dos passos importantes para a sua análise. Os capítulos do SH considerados como agronegócio pela OMC são apresentados no Anexo I 3. 3. Para maiores informações sobre a classificação de produtos, acessar à página da OMC, em: http://stat.wto.org/CountryProfile/WSDBCountryPFTechNotes.aspx?Language=E e no Anexo I do Acordo sobre Agricultura, disponível em: http://www.wto.org/english/docs_e/legal_e/14-ag.doc
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3. Panorama geral do comércio internacional do agronegócio
Capítulo 2 Comércio Internacional
O comércio internacional de produtos do agronegócio está inserido em um contexto mundial mais amplo, cujas características e tendências gerais devem ser avaliadas para uma melhor compreensão da sua dinâmica atual e futura. Apesar do protecionismo mundial, o comércio mundial de bens e serviços cresce a taxas elevadas nos últimos anos, e, particularmente, a partir da década de 90. A Figura 2 apresenta a evolução do comércio de mercadorias. É interessante ressaltar que o comércio de bens e serviços é liderado pelos países desenvolvidos, Estados Unidos e União Européia, tanto nas exportações quanto nas importações, sendo que a China vem galgando posições mais elevadas nesse ranking em período recente. Uma outra constatação recente no comércio mundial é o crescente processo de integração regional que tomou conta dos cinco continentes, com mais força na década de 90, sendo elemento-chave do processo denominado de globalização. Outra tendência nas relações internacionais é o papel determinante das empresas transnacionais no perfil e no direcionamento de fluxos comerciais de bens e serviços, nos fluxos financeiros, em especial de investimentos diretos e na definição de padrões sanitários, técnicos e, de forma geral, de qualidade de produtos e serviços. 12000
10000
B O F s e õ h l i b $ S U
8000
6000
4000
2000
0 0 5 9 1
2 5 9 1
4 5 9 1
8 5 9 9 1 1 6 5
0 6 9 1
2 6 9 1
4 6 9 1
6 6 9 1
8 6 9 1
0 7 9 1
2 7 9 1
4 7 9 1
6 7 9 1
8 7 9 1
0 8 9 1
2 8 9 1
4 8 9 1
6 8 9 1
8 8 9 1
0 9 9 1
2 9 9 1
4 9 9 1
6 9 9 1
8 9 9 1
0 0 0 2
2 0 0 2
4 0 0 2
Figura 2 - Evolução das Exportações Mundiais de Mercadorias - 1950 a 2005.
Fonte: International Financial Statistics (FMI) e World Economic Outlook - September, 2002 e previsões de FMI (2005).
Segundo estudo da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), 29 das 100 maiores economias do mundo não são países, mas, sim, empresas multinacionais. Em 1990, as 100 maiores companhias representavam 3,5% do PIB mundial. Dez anos depois, as mesmas 100 empresas representam 4,3% da economia mundial, o que significa que cresceram a ritmos mais acelerados que os países nos últimos anos. (UNCTAD, 2002) Em termos percentuais, o comércio de máquinas e equipamentos para transporte representou a maior parcela do comércio total de mercadorias, correspondente a 16,4%; seguidos por combustíveis e minérios. A participação dos produtos agrícolas, em 2004, foi cerca de 9% no total dos bens transacionados globalmente (WTO, 2006). A concentração do comércio mundial em poucos países, e principalmente nos desenvolvidos, é característica também do comércio agroindustrial, o que pode ser comprovado 35
Capítulo 2 Comércio Internacional
pelos dados da Tabela 2. A União Européia domina tanto as importações de bens de origem agropecuária, quanto as exportações, com mais de 40% do total mundial em ambos. Tabela 2 - Os maiores Exportadores e Importadores mundiais de produtos agrícolas. 2005 Exportadores
Exportações (Bilhões US$)
Participação nas exportações mundiais (%) 2000 2005
União Européia (25)
369.71
41,5
43,4
Estados Unidos Canadá Brasil China Austrália Argentina
82.67 41.18 35.04 28.71 21.21 19,18
12,9 6,3 2,8 3 3 2,2
9,7 4,8 4,1 3,4 2,5 2,3
Importadores
Importações (BilhõeUS$ s)
Participação nas exportações mundiais (%) 2000 2005
União Européia (25)
398.88
42,3
44
Estados Unidos
95.80
11,6
10,6
Japão
65,95
10,4
7,3
China
45,19
3,3
5
Canadá
21.46
2,6
2,4
Russia
19.29
1,6
2,1
Coréia
16,77
2,2
1,8
Fonte: International Trade Statistics 2006 (WTO). Disponível em: http://www.wto.org/english/res_e/statis_e/its2005_e/its05_bysector_e.htm
4. Processos de integração regional e negociações internacionais 4.1
36
Negociação multilateral: GATT, OMC e os acordos multilaterais
No final da 2a. Grande Guerra Mundial, em 1944, o Acordo de Bretton Woods, firmado nos EUA, visando maior cooperação na área de economia internacional, fundamentou-se na proposta de formação de três novas instituições: o FMI; o Banco Mundial ou Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento e a Organização Internacional do Comércio - OIC. As duas primeiras foram formadas, mas a terceira falhou pois a Carta de Havana, que definia seus objetivos, não foi ratificada pelo Congresso norte-americano. Um acordo provisório foi negociado em 1947, entre 23 países, adotando apenas uma parte da Carta de Havana, referente às negociações de tarifas e regras sobre o comércio. Este Acordo foi chamado de General Agreement on Tariffs and Trade – GATT. Na prática, passou a funcionar como um órgão internacional. O sistema de regras do comércio internacional foi estabelecido ao longo de anos, a partir dessa data, por meio da realização de nove rodadas de negociações internacionais, as seis primeiras com objetivo de diminuir os direitos aduaneiros, por meio de concessões tarifárias recíprocas; e as três últimas, mais amplas. Apenas como ilustração, em 1947 a média das tarifas dos países-membros, aplicadas para importações de bens e mercadorias, era de 40% e, em 1994, com a Rodada Uruguai passou a 5%. As questões aduaneiras foram priorizadas nas negociações multilaterais, sendo que na Rodada Tóquio foram elaborados acordos visando reduzir também a incidência de barreiras não-tarifárias. Contudo, a questão agropecuária só foi tratada definitivamente a partir da Rodada Uruguai, iniciada em 1986, e encerrada com a assinatura, em 1994, do Acordo de Marraqueche. Nesta, os Acordos que compunham o GATT foram incorporados pela recém-formada Organização Mundial de Comércio (OMC).
A OMC defende alguns princípios básicos para o comércio internacional, incorporados do Acordo Geral do GATT-1947: Tratamento Geral de Nação Mais Favorecida (MFN) baseada na “Regra da Não-discriminação entre as Nações”; Tratamento Nacional; e Transparência. O GATT foi modificado, em 1968, para incluir princípios gerais para o comércio dos países em desenvolvimento e permitir assim seu crescimento econômico segundo recomendações da UNCTAD – “Tratamento Especial e Diferenciado”, associando comércio e desenvolvimento. A Rodada Uruguai de Negociações Multilaterais, foi marcada por duas visões bastante distintas, a dos países desenvolvidos, defendendo a introdução de serviços e propriedade intelectual no Acordo e a dos países em desenvolvimento interessados na inclusão de negociações em agricultura e têxteis. Em dezembro de 1990, prazo para encerramento da Rodada, houve um impasse em Bruxelas, na agricultura, bloqueando a Rodada, o que somente foi resolvido, no final de 1992, quando EUA e União Européia entraram em um acordo sobre o tema agrícola, no Acordo chamado de Blair House. Nessa Rodada surgiram o Acordo sobre Agrícola (AsA), bem como o Acordo para aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS) e o Acordo sobre Barreiras Técnicas (TBT), que serão tratados com detalhes. A Organização Mundial do Comércio traz em seus objetivos e estrutura, avanços para a condução do comércio internacional. Estabeleceu-se na Rodada Uruguai que só poderiam ser integrantes os países que aceitassem todos os acordos como um conjunto não dissociável (single undertaking ). Constituiu-se em foro também para discutir temas ligados ao comércio como meio ambiente, investimentos, concorrência, facilitação de comércio, comércio eletrônico e cláusulas sociais. Em novembro de 2001, os 144 membros da OMC, lançaram a nova rodada de comércio global, em Doha, no Catar, prevista para encerrar-se até janeiro de 2005, chamada Rodada do Desenvolvimento. Algumas das principais propostas contidas no documento interministerial referem-se ao compromisso com o desenvolvimento sustentável. Particularmente na agricultura, a Declaração reconheceu os trabalhos realizados nas negociações do Acordo Agrícola, que se iniciaram no início de 2000. Na 5a. Conferência Ministerial realizada em Cancún, em setembro de 2003, reunindo 148 países, pouco se avançou sobre os compromissos lançados em Doha. A UE insistindo em iniciar a discussão sobre os temas de Cingapura (investimentos, concorrência, transparência nas compras governamentais e facilitação do comércio) na OMC, manteve ainda, com o apoio dos EUA, a posição de defesa da proteção à agricultura. Segundo Jank (2003), a falta de acordo nos temas de Cingapura foi a principal razão do fracasso no avanço dessas negociações. Contudo, segundo ainda esse autor, um resultado favorável foi que o Brasil conseguiu coordenar com sucesso um grupo muito heterogêneo de países em desenvolvimento. Estes países constituíram o chamado Grupo dos Países em Desenvolvimento (G-22), deixando o Grupo de Cairns em segundo plano, e representando ao final da Conferência cerca de 57% da população mundial, 70% da população agrícola e 28% das exportações agrícolas (Jank, 2003). Embora os países membros da organização já tenham se disposto a retomar as negociações, que tinham como previsão de termino o final de 2004, a questão agrícola ainda emperra nas negociações.
4.2
Capítulo 2 Comércio Internacional
Formação de blocos regionais: etapas de integração, criação e desvio de comércio
A intensificação nos processos de integração entre blocos econômicos e países começou no período moderno, após a 2a. Grande Guerra Mundial, fundamentada nas teorias clássicas de comércio internacional, que defendiam o livre comércio como forma de aumentar o bemestar social, após uma fase de intenso protecionismo. A formação dos blocos regionais veio ao encontro à constatação de que os acordos do GATT não estavam surtindo os efeitos esperados na redução do protecionismo e no incremento do comércio. O GATT, em seu 37
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
artigo XXIV, estabelece alguns princípios para que a formação de áreas de livre comércio e uniões aduaneiras não prejudique o comércio com terceiros países. Segundo dados do Banco Mundial (2005), na década de 90, os acordos bilaterais e plurilaterais quadruplicaram, atingindo 230 em 2004, além de mais 60 em negociação junto a OMC. Ainda o mesmo estudo mostrava que o comércio entre parceiros em acordos regionais ou bilaterais, nesse mesmo ano, atingiu cerca de 40% do comércio global. A Figura 3 mostra a evolução dos acordos regionais no mundo todo. 30
300
25
250
o n a 20 r o p s o d r o c 15 a e d s o r e m10 ú n
200
150
100
5
0
s e t n e g i v s o d r o c a e d o r e m ú n
50
1 9 5 8
1 9 6 0
1 9 6 1
1 9 6 4
1 9 6 8
1 9 6 9
1 9 7 1
1 9 7 3
1 9 7 4
1 9 7 5
1 9 7 6
1 9 7 7
1 9 8 0
1 9 8 1
1 9 8 3
1 9 8 4
1 9 8 5
1 9 8 6
1 9 8 7
Número de acordos por ano
1 9 8 8
1 9 8 9
1 9 9 0
1 9 9 1
1 9 9 2
1 9 9 3
1 9 9 4
1 9 9 5
1 9 9 6
1 9 9 7
1 9 9 8
1 9 9 9
2 0 0 0
2 0 0 1
2 0 0 2
2 0 0 3
2 0 0 4
0
Total de acordos vigentes
Figura 3 - Número de acordos regionais no mundo.
Fonte: Banco Mundial (2005)
A classificação de Bela Balassa (1964) para os tipos de integração econômica, segundo um grau crescente de interdependência é a que segue (Carvalho & Silva, 2002):
Zona de Livre Comércio: países sócios concordam em eliminar as barreiras sobre o comércio recíproco, mas mantêm políticas comerciais independentes em relação aos demais; União Aduaneira: além da eliminação recíproca das barreiras sobre comércio, os sócios passam a adotar uma política comercial uniforme em relação aos demais países. Mercado Comum: a liberdade de deslocamento não se restringe aos produtos, mas abrange também os fatores de produção (capital e mão-de-obra), e a política comercial é uniforme em relação aos demais países. União Econômica: os acordos não se limitam aos movimen tos de bens, serviços e fatores de produção, mas buscam harmonizar políticas econômicas para que os agentes possam operar sob condições semelhantes nos países constituintes do bloco econômico. Integração Econômica Total: essa fase implica livre deslocamento de bens, serviços e fatores de produção, além de completa igualdade de condições para os agentes econômicos, pois o acordo prevê idênticas políticas econômicas e sociais, administradas por autoridades supranacionais.
O crescimento da importância do comércio intra-regional, decorrente dos processos de integração regional é evidenciado na Tabela 3. Cabe notar que o Mercosul não apresenta, mesmo como Mercado Comum, um significativo comércio intra-regional, como se observa para a UE e ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático). 38
Tabela 3 - Participação do comércio intra-regional4, 1990-2005 Exportações Intra-bloco Extra-bloco Intra-bloco Extra-bloco Intra-bloco Extra-bloco Intra-bloco Extra-bloco Intra-bloco Extra-bloco
Participação no comércio total do Bloco (%) 1990 1995 2000 NAFTA (3 países) 42,2 46 55,6 57,4 54 44,4 Mercosul (4 países) 8,9 20,5 21 91,1 79,5 79 Comunidade Andina (4 países) 7,7 4,2 12,2 92,3 95,8 87,8 União Européia (25 países) 67.3 64,9 64 32.7 35,1 36 ASEAN (10 países) 20,1 25,5 24 79,9 74,5 76
2005
Capítulo 1 Evolução da Agropecuária e do Agronegócio no Brasil
55,8 44,2 12,9 87,1 8,7 91,3 66,9 33,3 24,9 75,1
Referente
a Comunidade Andina com 5 países Referente a União Européia com 15 países
Fonte: International Trade Statistics. 2005 e 2004. World Trade Organization (WTO)
As teorias clássicas preconizam o livre comércio como forma de aumentar o bem-estar, mas a integração pode resultar em protecionismo fora do acordo e livre comércio dentro dele, e por isso o resultado incerto, embora, atualmente, se fale no regionalismo aberto que pressupõe que os países-membros dos blocos liberalizem seu mercado também com terceiros países. A integração provoca desvio de comércio e leva à redução do bem-estar quando um produto socialmente mais barato, importado de terceiros países, é preterido em favor do paísmembro da integração. Parece haver um consenso de que os acordos regionais de integração em agricultura trabalham mais a favor do que contra a liberalização do comércio agroalimentar, no âmbito multilateral. Contudo, os acordos comerciais regionais podem prejudicar os interesses de outros países (pela violação do princípio da Nação Mais Favorecida). Uma designação que vem sendo adotada usualmente é a dos Acordos Sul-Sul e Acordos Norte-Sul. Entende-se mais comumente que os Acordos Sul-Sul envolvem países em desenvolvimento e teriam como benefícios a ampliação do mercado interno e como desvantagens o fato de que, em geral, os insumos são importados de países desenvolvidos e, portanto, tais acordos teriam pouco efeito sobre redução de custos para os países envolvidos. Os efeitos de criação e desvio de comércio seriam pré-indeterminados. Há ceticismo sobre vantagens acordos Sul-Sul. Acredita-se que se um acordo produzir um efeito benéfico sobre sociedade, em conjunto, não é pela integração econômica em si, mas pela redução de barreiras comerciais frente a terceiros países (FAO, 2003). Segundo Grola et al. (2006), a UNCTAD (2004) relata que o comércio Sul-Sul representava, em 1990, 34% do comércio total dos países em desenvolvimento; e, em 2004, cerca de 43%. 4. Nafta – Acordo de Livre Comércio Norte Americano: Estados Unidos, Canadá e México. Mercosul – Mercado Comum do Sul: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Comunidade Andina – Comunidade Andina de Nações: Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. UE - União Européia: Composta por 25 países - Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Tcheca e Suécia. ASEAN – Associação de Nações do Sudeste Asiático: Maymar, Laos, Tailândia, Camboja, Vietnã, Filipinas, Malásia, Brunei, Singapura, Indonésia.
39
Capítulo 2 Comércio Internacional
Já os Acordos Norte-Sul, do ponto de vista dos países em desenvolvimento (PED), não se diferenciam de um acordo de liberalização comercial multilateral. A eliminação das barreiras gera incentivos para que empresas transnacionais se localizem no país relativamente mais pobre. O menor custo de insumos importados do Norte e a ampliação do mercado interno criam condições para explorar vantagens competitivas e economias de escala. Contudo, por outro lado, esses acordos passam a ser um fator de pressão sobre reformas econômicas.
4.3 Acordos preferenciais e acordos bilaterais O Sistema Geral de Preferências (SGP) é um exemplo de tarifa preferencial, que é aquela aplicada a um importador de acordo com sua origem geográfica. Foi negociado em 1968, durante a segunda Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Os países desenvolvidos, membros da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em acordo de outubro de 1970, estabeleceram o SGP, mediante o qual concedem redução parcial ou total do imposto de importação incidente sobre determinados produtos, quando originários e procedentes de países em desenvolvimento. Os países outorgantes beneficiam produtos agrícolas (capítulos 01 a 24 do SH) ou industriais (capítulos 25 a 97 do SH) que constem em suas listas positivas ou que não estejam expressamente mencionados em listas negativas. O SGP é outorgado por 14 países e pela União Européia (15 países) e respectivos territórios aduaneiros. O Acordo sobre o Sistema Global de Preferências Comerciais entre Países em desenvolvimento (SGPC) foi concluído em Belgrado, em abril de 1988. O Acordo entrou em vigor em abril de 1989, tendo sido ratificado ou assinado em definitivo por 40 países, incluindo o Brasil. A participação no Acordo está reservada exclusivamente aos países em desenvolvimento membros do Grupo dos 77. O SGPC foi criado com o objetivo de funcionar como uma instância para o intercâmbio de concessões comerciais entre os membros do Grupo dos 77 e pretende ser um instrumento para a promoção do comércio entre os membros do Grupo. Tal iniciativa tem o apoio da UNCTAD. Atualmente o Brasil participa de alguns acordos regionais e bilaterais. O principal deles é o Mercosul, criado através do Tratado de Assunção em 1991. O Mercosul surge inicialmente como zona de livre comercio entre os quatro países integrantes: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. O segundo passo foi estabelecer a Tarifa Externa Comum (TEC) visando estabelecer as bases para uma União Aduaneira. Através do Mercosul, o Brasil vem buscando uma série de acordos bilaterais: MercosulUE (ainda em fase de estabelecimento), Mercosul–Índia (comércio preferencial), Mercosul– União Aduaneira da África Austral (comércio preferencial), Mercosul–Egito, Mercosul–Marrocos, Mercosul–CCG (Acordo de cooperação econômica com o Conselho de Cooperação do Golfo), Mercosul- AELC (Cooperação em comércio, investimento e plano de ação com a Associação Européia de Livre Comércio) e Mercosul-Israel (Acordo – Quadro de Comércio)
4.4
Instrumentos de Política comercial: barreiras comerciais
A Política comercial é um conjunto de instrumentos de intervenção pública sobre o comércio exterior. O entendimento sobre proteção ou protecionismo está relacionado a medidas que visam a favorecer o produtor nacional frente aos concorrentes estrangeiros (quando estes são mais competitivos). Tradicionalmente, o instrumento de uso mais comum é a tarifa de importação. Em geral os países usam a tarifa de importação como um instrumento de proteção para aquelas indústrias que possuem desvantagens comparativas. Países como o Japão e EUA, que têm vantagem comparativa na indústria, dão mais proteção à agricultura. Já nos países que têm maiores vantagens comparativas na agricultura e recursos naturais, o protecionismo recai sobre os produtos manufaturados, como é no Brasil. 40
4.5 Barreiras tarifárias A tarifa é um imposto cobrado sobre uma mercadoria quando ela atravessa a fronteira. A tarifa mais comum é o imposto de importação, embora existam países que cobrem um imposto de exportação sobre commodities agrícolas. Nesse caso, em geral, o imposto de exportação é cobrado para aumentar as receitas do governo. No Brasil, um caso recente, é a cobrança do imposto de exportação sobre o couro wetblue (pouco processado) a fim de favorecer o fornecimento de matéria-prima barata para a indústria calçadista nacional, em detrimento da exportação e do favorecimento de outros países, e, também para estimular as exportações de produtos com maior valor agregado. Distinguem-se três tipos de tarifas: a) O imposto ad valorem é um percentual fixo do valor do produto; b) Um imposto específico é um valor fixo, monetário, sobre o preço do produto; e c) Um imposto composto é uma mistura dos dois sistemas anteriores. Há algumas variações na aplicação das tarifas. Por exemplo, na UE é comum o uso de tarifas sazonais para frutas e legumes, ou seja, por alguns meses do ano, o produto sofre uma alíquota, que pode até ser zero, e, em outras épocas do ano, o produto é taxado. O imposto ad valorem é mais justo do que o específico, isto porque no caso de um imposto específico seu peso sobre a importação do produto será tanto maior quanto menor for o preço unitário do bem. Assim, o efeito do imposto específico é proporcionalmente mais prejudicial quanto mais competitivo for o país. O imposto específico é mais fácil de ser calculado. O imposto ad valorem requer uma avaliação do produto importado. Em termos de negociações internacionais, o uso de tarifas específicas torna menos transparente os impactos comerciais das medidas e dificulta as negociações. Outra observação importante sobre as tarifas é que existem as tarifas aplicadas e as consolidadas na OMC. As tarifas consolidadas, base das negociações tarifárias multilaterais, consistem no teto (máximo) de imposto acordado entre os países para suas listas de produtos comercializados. As tarifas aplicadas são aquelas efetivamente implementadas pelos países. No que tange à forma como são implementadas as barreiras tarifárias, destacam-se dois mecanismos importantes na atualidade, que afetam significativamente o comércio internacional de produtos agroindustriais. São eles os picos tarifários e a escalada tarifária. Segundo Viegas (2003), teoricamente uma tarifa é considerada um pico tarifário quando é capaz de impedir o comércio de um bem ao qual ela se aplica. Não há um critério universal para definir picos tarifários, e cada organização (OMC, UNCTAD, FAO – Food and Agriculture Organization) ou pesquisadores assume aquele que considera mais correto. A escalada tarifária consiste na taxação proporcionalmente mais elevada de produtos com maior valor agregado do que a taxação das matérias-primas. Um exemplo é o do óleo de soja no Japão. A soja-grão sofre uma tarifa de 0% sobre a importação nesse país, enquanto a tarifa para o óleo é de 25%. Alguns outros casos em que é freqüente o uso da escalada tarifária são os produtos derivados do café, fumo e cacau. Um levantamento realizado pela SECEX (2001) e apresentado por Viegas (2003) visando a identificar as barreiras impostas pelos principais parceiros comerciais do Brasil, permite apontar as seguintes considerações para as importações feitas pelos Estados Unidos: mais de 130 itens tarifários com tarifas maiores do que 35% ; sendo 311 itens tarifários com mais de 15%; 29 itens sujeitos a tarifas entre 50 e 70%; e 35 itens com tarifas entre 70 e 350%. Cerca de 60% dos produtos exportados pelo Brasil são afetados por restrições nesse país. Quanto aos picos tarifários (considerando-se taxas entre de 200 a 300% “ad valorem”), destacam-se: o fumo, açúcar, suco de laranja. O grau de protecionismo conseguido pela tarifa pode ser estimado, a princípio, transformando-se num equivalente ad valorem todos os tipos de tarifas incidentes. Essa conversão é feita pela divisão do imposto cobrado pelo preço médio do produto no período anterior. Em segundo lugar, o grau de protecionismo de uma tarifa não pode ser medido apenas pela taxa nominal. Para se medir o grau de proteção de um setor protegido por tarifa,
Capítulo 2 Comércio Internacional
41
Capítulo 2 Comércio Internacional
é preciso considerar o nível de proteção dos insumos utilizados na sua produção. É o conceito de proteção efetiva. Existem outras ferramentas protecionistas usadas pelos países sobre o comércio dos produtos de origem agropecuária. São chamadas de barreiras não-tarifárias (BNT). Há diferentes formas de enquadrar as múltiplas barreiras não-tarifárias existentes. Miranda (2001) apresenta algumas dessas classificações, sendo que a SECEX (2001) também propôs uma classificação própria sobre os tipos de BNT.
4.6
Barreiras não-tarifárias
As Barreiras não-Tarifárias (BNTs) têm sido objeto de discussão nos fóruns internacionais há décadas. Na Rodada Uruguai do GATT, ocorreu o processo de tarificação das BNTs, com atenção especial para as quotas. Outros instrumentos usados para restringir ou dificultar as exportações de países em desenvolvimento e também considerados barreiras não-tarifárias são as restrições técnicas e sanitárias. Elas envolvem aspectos relacionados à qualidade de produtos, saúde da população, trabalho infantil, regras sobre concorrência, proteção ao consumidor, política de corporações, políticas sociais e ambientais. Os subsídios domésticos e às exportações, embora não consistam em barreiras comerciais propriamente, têm sido tratados também neste capítulo da política comercial e por esta razão serão apresentados como subitem das barreiras não-tarifárias. a) Quotas-tarifárias Uma política que, pelos seus efeitos significativos sobre o comércio e bem-estar dos países, é muito prejudicial consiste na quota pura. É uma restrição quantitativa explícita e/ou associada a tarifas (quota-tarifária). A quota pura é usada quando o governo, ao invés da tarifa, opta por uma restrição do volume de importações autorizadas para um determinado nível máximo. O limite absoluto é chamado de quota de importação. Durante a Rodada Uruguai, as quotas passaram pelo processo de tarificação, uma vez que foram consideradas como práticas desleais e proibidas. Esse processo visando eliminar as barreiras não-tarifárias, particularmente, as de natureza quantitativa como as quotas, acabou resultando nos atuais picos tarifários e quotas tarifárias. Para administrar a política de quotas o governo tem de intervir muito na economia. Tem de estabelecer um regime de licenças de importação. Pouca transparência é um dos problemas desse mecanismo. O comércio de produtos industriais está praticamente livre desse instrumento. Contudo, o comércio de produtos agrícolas mostra um quadro muito diferente. Quase todos os países industrializados colocam uma variedade de restrições quantitativas às importações de produtos agrícolas, que atualmente se transformaram nas quotas tarifárias. A quota tarifária é um mecanismo que associa um acordo de acesso a mercados (acesso mínimo ou acesso corrente) a duas tarifas, uma tarifa intraquota e uma tarifa extraquota. Um terceiro elemento das quotas tarifárias é o mecanismo de distribuição das licenças de importação dessas quotas. Considera-se que um dos maiores problemas com este instrumento de política comercial, e que seria uma das causas de seus impactos negativos é a falta de transparência e a complexidade dos mecanismos de distribuição. Este sistema, segundo levantamento das notificações 5 na OMC, é adotado em 43 países. Segundo Cunha Filho (2003), havia um total de 1425 quotas-tarifárias aplicadas por estes países e cerca de 924 não foram preenchidas no ano de 2002. Os derivados de plantas
5. Notificações são instrumentos de transparência criados pela OMC. Consistem na exigência de que os países comuniquem à OMC (por meio dos Comitês Técnicos dos Acordos) todas as mudanças que sejam estabelecidas em suas políticas agrícolas, sanitárias, técnicas, de subsídios, tarifas anti-dumping, etc domesticamente e, principalmente, aquelas que possam afetar o comércio entre países.
42
oleaginosas, o açúcar e seus derivados, as carnes e seus derivados, as frutas e vegetais, o tabaco, as fibras vegetais e o café, são exemplos de produtos para os quais o Brasil enfrenta a proteção das quotas tarifárias no mercado internacional. Países desenvolvidos e em desenvolvimento adotam tal restrição. Existem outros instrumentos de proteção comercial, como a Restrição Voluntária de Exportação, Controles Cambiais, Proibição de Importação, Monopólio Estatal, Leis de Compra de Produtos Nacionais, Depósito Prévio à Importação, Necessidade de Requisitos Locais, Subsídios de Crédito à Exportação, e as Barreiras não-tarifárias técnicas e sanitárias, que serão discutidas adiante.
Capítulo 2 Comércio Internacional
b) Subsídios domésticos e subsídios às exportações Os subsídios domésticos e os subsídios às exportações, apesar de terem objetivos originalmente distintos das barreiras comerciais, acabam tendo um efeito protecionista e, desta forma, serão discutidos dentro deste item. Mesmo porque, juntamente com as barreiras tarifárias e não-tarifárias (acesso a mercados) formam a lista tríplice de prioridades nas negociações multilaterais e regionais agrícolas. Os governos podem usar subsídios para estimular as exportações. O Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias (SCM) da OMC define como subsídio (proibido): i) qualquer contribuição financeira do governo (transferência direta; abdicação de receita por parte do governo; qualquer apoio à renda ou ao preço); ii) que haja um benefício conferido, oferecendo vantagem à indústria ou empresa; e iii) que seja específico, ou seja, limitado a certas empresas localizadas em uma região geográfica (neste caso, subsídio à exportação é específico). Portanto, são subsídios proibidos pelo Acordo SCM, excetuadas as previsões específicas do Acordo Agrícola, que serão tratadas abaixo, aqueles vinculados ao desempenho das exportações e vinculados ao uso de bens domésticos de forma preferencial a bens importados. Um subsídio à exportação é um pagamento pelo governo para uma empresa para cada unidade do produto exportado. Embora a OMC proíba tais subsídios, ainda são empregados pelos países. O uso dos demais tipos de políticas de subsídios é orientado pelo Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias da OMC e do Acordo Agrícola, para o caso específico dos produtos agropecuários. Caso o país que esteja dando os subsídios seja um país grande (ou seja, ele pode afetar o preço internacional com seus movimentos), ele incorre num custo adicional. Se, como resultado dos subsídios, aumenta sua oferta do produto no mercado internacional, de modo significativo e capaz de alterar os preços, os termos de troca se deterioram. Assim, seus preços de exportação se reduzem como resultado do aumento da oferta decorrente dos subsídios. No caso de que se o país que subsidia suas exportações for grande, melhoram os termos de troca para o país importador, e os seus consumidores se beneficiam dos preços mais baixos. Embora os subsídios do país exportador beneficiem como um todo o país importador, ocorrem também prejuízos em termos de distribuição de renda neste último. O caso dos subsídios do algodão aplicados pelos EUA e que foram proibidos pela OMC, prejudicam enormemente os países pobres da África, cuja economia é dependente dessa cultura, tal como Benin. Embora seus consumidores paguem preços menores e se beneficiem, o mesmo não ocorre com a mão-de-obra e o capital alocados nas indústrias que competem com as importações subsidiadas. Por essa razão, muitos países, nesses casos, adotam tarifas ou medidas compensatórias pelos subsídios praticadas nos outros países. Outra modalidade de subsídio se manifesta quando os países desenvolvidos, sob a guisa de ajuda externa, “escondem” crédito subsidiado às suas exportações para os países menos desenvolvidos. Além de subsídios diretos para promover as exportações, muitos governos optam por oferecer subsídios à produção ou então recursos para pesquisa e desenvolvimento. Embora
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Capítulo 2 Comércio Internacional
visando principalmente o mercado doméstico, as empresas subsidiadas acabam se aproveitando de suas vantagens internas para competir no mercado internacional. Um dos assuntos prioritários para os países nas negociações multilaterais (OMC) na atualidade é a revisão das políticas de subsídios domésticos, ou de apoio interno. Além do Acordo SCM, o tema de subsídios domésticos domést icos é tratado no Acordo sobre Agricultura da OMC, essas políticas são enquadradas em três categorias a saber: “caixa verde”: enquadram-se os subsídios não-acionáveis, que causam nenhuma ou mínima distorção na produção ou comércio. Não há, portanto, necessidade de impor limites para esse tipo de apoio. São subsídios não específicos e específicos que atendam às condições estabelecidas no Acordo: apoio para atividades de pesquisa; assistência para regiões desfavorecidas; apoio para promover a adaptação de instalações existentes para novas exigências de ambiente, impostos por lei. ii) “caixa amarela”: os subsídios “amarelos” ou acionáveis são considerados distorcivos ao comércio, ou seja, causam danos ao comércio ou produção e, por isso, estão sujeitos a acordos de redução. São determinados por uma política denominada AMS (Agregate Measure Measur e of Support – Medida do Valor Agregado), que é a quantia em dólares de todos os subsídios amarelos para todos os produtos. Incluem-se nesta categoria pagamentos diretos e políticas de apoio de preço, que corresponde à diferença entre o preço doméstico e o preço mundial de um produto quando essa diferença é criada a partir de intervençõe intervençõess do tipo tarifas. iii) “caixa azul” compreende subsídios permitidos ligados à produção, relacionados a subsídios pagos por área e por tamanho de rebanho. São considerados minimamente minimamen te distorcivos e, portanto, existe a imposição de um certo limite neste caso. i)
Os compromissos assumidos assum idos pelos paises no Acordo Agrícola da OMC, quanto à redução de subsídios domésticos, subsídios às exportações e tarifas estão apresentados na tabela abaixo (Tabela 4) Tabela 4 - Compromissos Assumidos pelos países no Acordo Agrícola da OMC Compromissos Assumidos
Países Desenvolvidos (95-00)
Paises em Desenvolvimento (95-04)
-36% -15%
-24% -10%
-20%
-13%
-36% -21%
-24% -14%
Tarifas:
Corte médio para todos os produtos Corte mímimo por produto Apoio interno (base 86-88):
Corte da MAS por setor Subsídio à exportação (base 86-90):
Corte no valor do subsídio Corte no valor subsidiado Fonte: OMC (1998)
Uma outra categoria mais recente vem sendo utilizada por diversos autores na classificação de subsídios. Trata-se da Special & Diferencial Box, que inclui subsídios com tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento. Na Tabela 5 é possível observar como é lenta a redução nos subsídios concedidos pelos países ricos aos seus agricultores, apesar de compromissos que foram assumidos pelo Acordo Agrícola, em 1994. Os valores são computados em milhões de dólares tendo se utilizado o Subsídio Equivalente Equivalent e ao Produtor (PSE) para medir as políticas de apoio à agricultura agricultura.. O PSE 44
consiste em uma medida para calcular os subsídios que são concedidos aos produtores rurais pelos governos dos países. Em porcentagem, indica a parcela que tais subsídios domésticos representam na renda do agricultor desses países. Em 2001, por exemplo, no Japão os subsídios responderam por 59% da renda do produtor (PSE%), enquanto nos EUA e UE, esse montante foi de, respectivam respectivamente, ente, 21% e 35%. Esses dados são calculados e divulgados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Recentemente, foram calculados para o Brasil, utilizando a mesma metodologia, obtendo-se que, no agregado, o nível de PSE no país para a agricultura foi, na média, de 3% do valor bruto das receitas dos produtores rurais para o período de 2002-04, enquanto a média para os paises da OCDE no mesmo período foi 30% (OCDE, 2005).
Capítulo 2 Comércio Internacional
Tabela 55- Estimativa total do suporte à agricultura, dado em Subsídio Equivalente ao Produtor (PSE) ( PSE) para alguns países da OCDE. País
1986-88
1990
Japão Coréia
41.839 93.719 49.498 12.120
51.256 51.256 99.343 51.980 18.170
OCDE
238.936
248.302
Estados Unidos UE
US$ Milhões 1995
2000
2005
55.433 115.330 53.809 18.335
49.333 89.617 54.888 19.337
49001 93.083 47.242 16.838
272.563
241.599
230.744
Fonte:: OCDE, 2006. Fonte
c)
Barreiras sanitárias e Barreiras técnicas
Há algumas dificuldades adicionais ao se tratar com barreiras sanitárias e técnicas. A primeira delas certamente é a disponibilidade de dados e sua organização, bem como da quantificação de seus impactos, já que diferem grandemente pela sua natureza qualitativa de barreiras tarifárias e de outras barreiras não-tarifárias, como as quotas. Em segundo lugar, como as medidas e exigências sanitárias e técnicas não são necessariamente políticas comerciais, nem sempre é fácil a comprovação de seu uso como um mecanismo adjacente dessas políticas. Finalmente, há um dinamismo inerente às questões de natureza biológica e tecnológica que dificultam uma avaliação mais pontual da magnitude de sua importância. Há dois acordos multilaterais, multilaterais , no âmbito da Organização Mundial de Comércio, que tratam desses temas. O primeiro é o Acordo para aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS) e o segundo, é o Acordo sobre Barreiras Técnicas (TBT). Cabe ressaltar que no SPS, os países são encorajados a adotarem como referência os padrões internacionais desenvolvidos por organizações científicas, designadamente o Office International des Epizooties (OIE), que trata de assuntos animais; a Convenção Internacional Internacional para Proteção de Plantas (IPPC), para vegetais; e o Codex Alimentarius, nos temas pertinentes a alimentos. O Acordo TBT contempla todas as normas técnicas, padrões voluntários e procedimentos para garantir que estes sejam atingidos, exceto quando consistem de medidas sanitárias ou fitossanitárias, fitossanitária s, conforme definido no Acordo SPS. Visa garantir que as normas técnicas, teste e certificação não criem obstáculos ao comércio, ou discriminem produtos/ fornecedores. Dentre os temas que estão, hoje, no escopo do TBT, destacam-se: certificação de origem, resíduos, avaliação de conformidade, rastreabilidade, embalagens, rotulagem, entre outros. A avaliação de conformidade pode ser entendida como exame sistemático do grau de atendimento por parte de um produto, processo ou serviços a requisitos específicos e as exigências em termos de comércio internacional sobre este tema são crescentes, inclusive sobre os produtos agroindustriais. O acordo apresenta como objetivos legítimos, que os países podem buscar ao elaborar os regulamentos técnicos, os seguintes: imperativos de segurança nacional; prevenção de práticas enganosas; proteção da saúde ou segurança humana; proteção da saúde ou vida animal ou vegetal; proteção do meio-ambiente; e outros. 45
Capítulo 2 Comércio Internacional
O Acordo SPS contempla todas as medidas cujo propósito seja proteger a saúde humana ou animal de riscos com alimentos; a saúde humana de doenças transmitidas por plantas e animais; animais e plantas de pragas e doenças, sejam estas, ou não, exigências técnicas. Nos seus principais princípios, dentre os quais alguns são também princípios gerais do GATT, têm-se: Artigo 2 (Provisões e Direitos Básicos): membros têm o direito de adotar medidas SPS necessárias para proteger a saúde ou a vida humana, animal e vegetal (artigo 2.1); Artigo 3 (Harmonização); Artigo 4 (Equivalência); Artigo 5 (Avaliação de Risco e Determinação do nível apropriado de Proteção Sanitária e Fitossanitária); Fitossanit ária); e Artigo 6 (Adaptação a condições regionais, incluindo áreas livres livre s de pragas ou doenças e áreas de baixa prevalência de pragas ou doenças). Dentre as medidas sanitárias que comumente podem resultar em barreiras sanitárias, podem ser destacadas: a imposição de determinados processos produtivos; a exigência de origem; quarentena; processos de inspeção e certificaç certificação; ão; requisitos de amostragem e análise; etiquetagem (relacionada à saúde); limites máximos de resíduos; e o controle sobre aditivos permitidos. Em período recente, as medidas sanitárias têm crescido em importância quanto a sua interferência no comércio internacional. Apenas para ilustrar, Lima, Miranda & Galli (2005) analisaram os efeitos da febre aftosa sobre o mercado de carne bovina e suína. Como exemplo, pode-se comparar a magnitude dos prejuízos tendo em conta que, em 2004, as exportações brasileiras de carne bovina in natura atingiram natura atingiram US$ 2 bilhões (1 o exportador mundial), e que nesse mesmo ano o Brasil deixou de vender carnes in natura para natura para mercados que compraram aproximadamente US$ 7,5 bilhões desse produto devido a restrições causadas pela febre aftosa. A Figura 4 evidencia a ainda pequena participação do Brasil nos 20 maiores ma iores mercados importadores de carne bovina do mundo. Um último ponto a ressaltar é o que permite entender os conflitos entre Estados Unidos e União Européia no tema de produtos que contenham Organismos Geneticamente Modificados. É o Princípio da Precaução, que estabelece que os Estados devem adotar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental quando haja ameaça de danos sérios ou irreversíveis, mesmo na ausência de absoluta certeza científica. Alguns entendem que o desenho desse princípio de precaução na OMC está previsto, mesmo que indiretamente, nos Acordos TBT e SPS.
1200000
1000000
800000 s a d a l e n o t
600000
400000
200000
0
l g i a i á r 5 u A i a i c o ã o l e i a i t a p E 1 o S K o n l á s h n a d l g é u d E U ú s s é x a C J a a U d g A R M C S a i a o n M é i a r H b á C o A r Outro Out ros s
l n o r a c a i a i n a n i a S u I r ã á r a p u u í â h g o d l a í g C o r S d L b n B u J i c a i C r f Á
Partic Par ticipa ipação ção Bra Brasil sil
Figura 4- Carne Bovina in natura : os 20 maiores importadores em 2004. Fonte: Lima, Miranda & Galli, 2005, com base em COMTRADE/SECEX/MDIC. Notas: 1) dados para a UE excluem o comércio intra-bloco; 2) para México, UE 15, Arábia Saudita, Irã e Líbano, foram usados dados do COMTRADE 2003; 3) Dados sujeitos à atualização na medida em que esses países notifiquem suas importações ao COMTRADE.
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O Princípio da Precaução é, originalmente, um Princípio do Direito Internacional Ambiental, previsto como o Princípio 15 da Agenda 21, da Declaração das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento. No caso dos transgênicos, as medidas impostas pela UE para controle dos OGM têm como fundamento esse princípio, enquanto os EUA defendem a chamada “equivalência substancial”. Esta consiste em avaliar se um produto geneticamente modificado é substancialmente equivalente ao alimento convencional (valor nutricional, risco à saúde etc). Assim, de acordo com o TBT, produtos similares devem ser regulamentados da mesma maneira, evitando problemas comerciais.
Capítulo 2 Comércio Internacional
5. Novos desafios no comércio internacional 5.1
Multifuncionalidade, bem-estar animal, exigências trabalhistas e ambientais
A Multifuncionalidade tem uma visão da propriedade rural como resultado da interação entre os sistemas de produção agrícola e dos ecossistemas que os rodeiam. Assim, a ela estariam associadas quatro funções essenciais: a Segurança Alimentar; a função Ambiental; a função Econômica; e a função Social. A UE e o Japão são os países que defendem a multifuncionalidade na OMC, e em termos de políticas de apoio doméstico estariam justificadas pela multifuncionalidade, as políticas relacionadas a objetivos como a manutenção do emprego rural, a ocupação e manejo do território, o equilíbrio das pequenas cidades, preservação do meio ambiente e a preservação da paisagem e da cultura rural. A defesa do caráter multifuncional da agricultura na OMC tem como objetivo, segundo alguns especialistas, a manutenção da chamada caixa azul (que permite alguns pagamentos diretos dos governos aos agricultores), a continuidade da cláusula de paz e das salvaguardas especiais e permite que os países desenvolvidos mantenham elevados subsídios e protecionismo, levando à depressão internacional dos preços agrícolas. Os argumentos ambientais, em particular, têm gerado muitas discussões recentes no âmbito do comércio. Podem ser usados com propósitos protecionistas, causando diferentes custos advindos de diferentes graus de exigências de preservação e conservação ambiental. Podem ser indiretamente utilizados quando se emprega uma política comercial para produzir mudanças nas políticas ambientais de outros países. Apesar de, desde a formação do GATT, ter sido criado um grupo para acompanhar os temas envolvendo comércio e meio ambiente, de fato, ao longo das últimas décadas, pouco se evoluiu neste contexto. Na Rodada Doha, novamente houve a formação de um grupo sobre Comércio e Meio Ambiente (CTE) na OMC. Um dos desafios principais para o CTE seria inserir os Acordos Multilaterais Ambientais (AMA) no âmbito das negociações comerciais da OMC e dos acordos multilaterais de comércio. É importante atentar que os AMA têm, por sua natureza e âmbito de negociação, o objetivo de solucionar problemas ambientais como a perda de biodiversidade, a destruição da camada de ozônio, o aquecimento global, entre outros. Dos 200 AMA existentes, 20 relacionam, em algum grau, comércio e o meio ambiente. Citam-se, dentre estes: a Convenção da Basiléia: controle de comércio e transporte de resíduos tóxicos (1989); a Convenção Internacional de Comércio de Espécies Ameaçadas (CITES) que regula comércio das espécies de acordo com seu grau de exposição à ameaça de extinção (1973); o Protocolo de Montreal que visa à proteção da camada de ozônio, com restrições à produção, consumo e exportação de aerossóis contendo CFCs (1987); o Protocolo de Persistência de Poluentes Ogânicos – POPs (1990); e o Protocolo de Quioto (1997) que trata de redução das emissões de Carbono pelos países. Um exemplo de como os conflitos nestes dois âmbitos acabam ocorrendo é que um requisito essencial para que haja comércio justo é a não-discriminação entre países. Contudo, uma questão muito debatida é a de que a adoção dos AMA violaria este princípio básico da OMC, pois alguns países importariam apenas produtos que não afetassem o meio ambiente. 47
Capítulo 2 Comércio Internacional
As contestações sobre a liberalização do comércio agrícola com argumentos ambientais referem-se ao receio de que essa liberalização possa estimular o uso mais intensivo de defensivos químicos nos países beneficiados. Por outro lado, há aqueles que argumentem que, ao promover uma liberalização, possa ocorrer uma redução do uso de insumos nos países em desenvolvimento; e que, assim, se valoriza a eficiência e os dividendos podem ser transferidos para o desenvolvimento de novas tecnologias. Quanto às questões relacionadas ao bem-estar animal, a UE se destaca novamente como a defensora do tema e vem regulamentando-o em seu território, o que, no futuro próximo, deverá impor uma série de novas exigências sobre as exportações brasileiras de derivados animais. A alegação da UE é que determinadas técnicas de criação e engorda podem causar efeitos negativos sobre a saúde e o bem-estar dos animais e portanto, devem ser proibidas ou controladas. Isto, certamente, causará aumento de custos para os produtores dos países exportadores.
5.2
Certificações de qualidade e Rastreabilidade
Inicialmente, é preciso diferenciar dois conceitos que vêm sendo confundidos na mídia e mesmo na literatura técnica: Food Safety ou Segurança do Alimento e Food Security. Food Safety trata da garantia de um alimento com atributos de qualidade e inocuidade, ou seja, está relacionado à segurança e saúde do consumidor; enquanto Food Security ou segurança alimentar é a garantia de abastecimento de uma população com alimentos, em que se pode pressupor que sejam alimentos de qualidade e seguros. Outras definições importantes tratam das designações de norma e regulamento. A Norma é um documento estabelecido por consenso e aprovado por um organismo reconhecido, que fornece, para um uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para atividades ou seus resultados, visando à obtenção de um grau ótimo de ordenação em um dado contexto. O Regulamento é um documento que contém regras de caráter obrigatório e que é adotado por uma autoridade. O regulamento técnico, portanto, é aquele que estabelece requisitos técnicos, seja diretamente, seja pela referência ou incorporação do conteúdo de uma norma, de uma especificação técnica ou de um código de prática. Como organismos regulamentadores no Brasil, podem-se citar o INMETRO (MDIC), a ANVISA (MS), a ANP e a ANEEL (MME) e as diversas secretarias específicas do Ministério da Agricultura. A Figura 5, por sua vez, exemplifica os diferentes níveis (âmbitos) de normalização técnica, desde a empresa até o nível internacional
ISO IEC
Internacional
Normas Regionais Mercosul CEN
Regional Nacional
Normas Nacionais ABNT BSI AFNOR DIN
Associação
Normas de Ass ociação SAE ASME ASTM
Empresa
Normas de Empresa
Figura 5 – Níveis de normalização e exemplos de organismos normalizadores. Fonte: Instituto de Tecnologia do Paraná – TECPAR (palestra de Júlio Félix, set/2004 – Conferência da Rastreabilidade).
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No Acordo de Barreiras Técnicas (TBT), embora os países só tenham competência para discutir e resolver sobre regulamentos técnicos, ou seja, na alçada de governos, alguns organismos de normalização atendem às reuniões do Comitê Técnico, participando das discussões, mas sem poder de voto. Mais além, é importante mencionar que o Acordo TBT preconiza que haja um esforço em busca da harmonização das normas, embora não tenha poder para atuar sobre tal atividade, já que as normas são de adoção voluntária.
Cabe, ainda, definir do que trata a qualidade. A Organização Mundial da Saúde (OMS, 2003) atenta para a diferença entre segurança do alimento e qualidade do alimento: “A qualidade inclui todos os outros atributos que influenciam no valor de um produto para o consumidor. Isto inclui atributos negativos como, deterioração, contaminação, descoloração, odores desagradáveis, e atributos positivos como denominação de origem, cor, sabor, textura e método de processamento do alimento” . Há diversas definições de qualidade, cada vez mais relacionadas à satisfação das preferências do consumidor, ao contrário da idéia de “perfeição técnica” antes prevalecente para os produtos agroindustriais A certificação, por sua vez, segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) tem por objetivo atestar publicamente e, por escrito, que um produto, processo, serviço ou sistema está em conformidade com requisitos específicos, normas ou regulamentos técnicos. Esses certificados têm prazo de validade, revalidado ou suspenso através de auditorias. As certificações têm caráter voluntário, sendo utilizadas muitas vezes pelas empresas como uma forma de diferenciação em seus mercados. Contudo, podem gerar custos adicionais, diferenciados entre as empresas, já que dependem de seu grau de ajustamento aos requisitos específicos relacionados à certificação. Os produtos com diferencial de qualidade devem, obrigatoriamente, assegurar a comprovação e a confiança do consumidor e isto pode ser obtido através de sistemas estruturados contemplando procedimentos de certificação, identificação de origem e rastreabilidade de processos produtivos adotados. Cabe, contudo, enfatizar que Rastreabilidade não é sinônimo de qualidade!
Capítulo 2 Comércio Internacional
Há três tipos básicos de certificação, segundo a ABNT:
Certificação de 1ª parte: quando os auditores internos registram a auditoria de 1ª parte, por meio de um relatório; Certificação de 2ª parte: os auditores dos clientes, na auditoria de 2ª parte, fornecem um relatório e na aprovação, fornecem, também, um Certificado de Qualificação do Fornecedor; Certificação de 3ª parte: as certificadoras independentes, na auditoria de 3ª parte fornecem um Certificado, acreditado nacional e internacionalmente.
A PIF (Produção Integrada de Frutas) é um exemplo de programa para certificação no setor do agronegócio. A Produção Integrada “É um sistema de produção baseado na sustentabilidade, aplicação de recursos naturais e regulação de mecanismos para a substituição de insumos poluentes, utilizando instrumentos adequados de monitoramento dos procedimentos e de rastreabilidade de todo o processo, tornando-o economicamente viável, ambientalmente correto e socialmente justo.” Isto garante que o produto esteja em conformidade com normas técnicas específicas; a higiene e segurança dos alimentos; a preservação ambiental; uso racional de defensivos químicos e respeito aos limites máximos de resíduos (LMR), segundo Andriguetto & Kososki (2004). No caso da PIF, na fruticultura, o sistema baseia-se em quatro elementos básicos: a qualidade no trabalho, pós-colheita, a cultura propriamente e o enfoque ambiental. No caso, por exemplo, a qualidade do trabalho envolve aspectos de qualificação pessoal, segurança do trabalho e segurança higiênico-sanitária; enquanto se podem destacar alguns aspectos relevantes na qualidade da cultura, envolvendo controle de pesticidas de herbicidas, controles de nutrientes, processos de plantio e cultivo e processo de colheita. A PIF, contudo, fundamentou-se no EUREPGAP. Tecnicamente o EUREPGAP é um conjunto de documentos normativos apropriados para serem acreditados a critérios de certificação reconhecidos internacionalmente tais como a ISO Guia 65 6. Representantes do mundo todo e de todos os estágios da cadeia de alimentos se envolveram no desenvolvimento desses 6. A ISO Guia 65 é uma norma internacional que apresenta os requisitos a serem atendidos por qualquer empresa que deseja certificar produtos.
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Capítulo 2 Comércio Internacional
documentos. Este processo gerou um protocolo que os produtores do mundo todo podem utilizar para demonstrar que estão de acordo com as Boas Práticas Agrícolas – BPA (EUREPGAP, 2006). Surgiu em 1997, quando uma associação de grandes varejistas europeus, a Euro Retailer Produce Working Group (Eurep), decidiu criar um programa que garantisse padrão de qualidade aos alimentos. Evoluiu para uma parceria entre produtores e varejistas e tendo como base desenvolver os padrões e procedimentos para uma certificação global das BPA (ou Good Agricultural Pratice - Gap), de onde se originou a designação Eurepgap. Atualmente quase todas as fazendas brasileiras que exportam frutas e vegetais para o mercado europeu seguem rigorosamente essa norma. Segundo Franco (2004), citado por Lacorte (2006) recentemente, o sistema alcançou a pecuária. A versão IFA (Integrated Farm Assurance – Segurança Integrada na Fazenda) foi criada especialmente para as propriedades com produção animal, e o interesse de pecuaristas e frigoríficos exportadores pelo sistema justifica-se pela estimativa de bonificação para a carne bovina com tal certificado (de 15% a 20%). O sistema é composto pelas seguintes exigências: Estabelecimento de uma Gestão Ambiental que garanta a minimização dos seus impactos ambientais, incluindo o aproveitamento racional dos recursos naturais. Garantia do Uso e Manuseio adequados de defensivos agrícolas. Estabelecimento de uma Gestão Ocupacional, visando redução e controle dos perigos e riscos aos quais os trabalhadores rurais estão sujeitos. Estabelecimento de uma Gestão de Qualidade do processo produtivo, garantindo a segurança dos alimentos produzidos. O “GAP” incorpora práticas do Manejo Integrado de Pragas (MIP) e o Manejo Integrado da Cultura (MIC), essenciais segundo os membros do EUREP, para a melhoria contínua e a produção agrícola sustentável. O protocolo também encoraja, para o caso de frutas e hortaliças, o uso do Hazard Analysis and Critical Control Points (HACCP), estabelecendo diretrizes para: armazenamento de registros, variedades e porta-enxertos, histórico do local e gerenciamento local, manejo de solo e substrato, uso de fertilizantes, irrigação, proteção da cultura, colheita, tratamentos pós-colheita, manejo de lixo e poluição, reciclagem e reuso, saúde dos trabalhadores, segurança e bem-estar, temas ambientais e formulário de acompanhamento (Oliveira, 2005). O processo de certificação do programa EurepGap consolida-se através da auditoria e certificação independente, a chamada de terceira parte. A rastreabilidade é definida pela ISO (definir em nota de rodapé) como : “A capacidade de traçar o histórico, a aplicação ou a localização de um item através de informações previamente registradas” (ISO 8402). Trata-se de um elemento essencial no escopo maior da qualidade total, sendo base para todo processo de certificação, mas não se deve confundi-lo com qualidade ou com segurança do alimento! Já Sarto et al. (2002) apresenta a definição de rastreabilidade de acordo com a EAN International – organização gestora de um sistema global de identificação e comunicação para produtos, serviços e locais, criada em 1977, para servir à Comunidade Européia – que diferencia os termos tracking (acompanhamento) e tracing (rastreamento): acompanhamento do Produto (tracking ) é seguir o trajeto deste ao longo da cadeia de produção enquanto ele é transferido entre organizações; e rastreamento do Produto ( tracing ) é identificar a origem de uma unidade ou lote de produto específico. A rastreabilidade é elemento indispensável para a diferenciação dos produtos, visto que alguns destes podem conter substâncias, ou passar por processos, ou ainda fazer parte de projetos sócio-ambientais que valorizam e diferenciam as firmas produtoras, que o consumidor desconhece e não consegue perceber facilmente (Golan et al., 2004). O modo de verificar a existências desses atributos é através dos registros que a rastreabilidade gera (Marins, 2006).
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Golan et al. (2004) caracterizam o sistema de rastreabilidade pela sua extensão, profundidade e precisão. A extensão é a quantidade de informação gravada no sistema, profundidade como “de que ponto à que ponto”, é a abrangência da rastreabilidade, o quanto para trás e o quanto para frente deve ser rastreado. Esta característica está intimamente ligada com a extensão, pois ao definir que atributos vão ser rastreados, fica definida a profundidade do sistema. A precisão é definida como a habilidade do sistema de localizar a fonte original do problema, é determinada pela unidade analisada no sistema e pela taxa de erro aceitável. Assim, se o sistema em que a unidade rastreável for um lote de ração ou um grupo de animais, ou com taxas de erro grandes, apresentará uma precisão ruim. Contudo, a definição do requisito de uma precisão acurada ou não, é dada pelo objetivo do sistema. Segundo Marins (2006), no modelo voluntário o Estado se afasta do mercado, e fica por conta das firmas regularem o setor em que atuam, definindo, cada uma ou em conjunto, normas e mecanismos para a aplicação e manutenção de um sistema de rastreabilidade. A fiscalização pode ser feita pela própria firma, por terceiros ou pelo governo. As firmas têm incentivos para usar sistemas de rastreabilidade que gerem diferenciação dos seus produtos, o que pode ser considerado um atributo positivo. Contudo, os sistemas de rastreabilidade não informam ou o fazem sem ênfase quando geram atributos negativos. O mesmo autor explica sobre o modelo mandatório, no qual o Estado tem papel fundamental como agente regulador do setor, impondo um sistema de rastreabilidade desenvolvido por ele ou em conjunto com os agentes do setor. Nesse caso, todos devem acatar o modelo ou são punidos com multas. A fiscalização é feita pelo próprio Estado. No Brasil, a experiência mais antiga é a do SISBOV, como sistema de rastreabilidade, embora se possa identificar que a PIF na fruticultura também contém o componente de rastreabilidade. Marins (2006) avalia que o SISBOV apresenta algumas limitações, já que o sistema não abrange a rotulagem como nos modelos europeus, não exigindo nem as informações compulsórias e nem as informações voluntárias, para a diferenciação do produto. Em termos de base legal, a Instrução Normativa nº 1, publicada pelo MAPA em 9 de janeiro de 2002, levou à criação do Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina - SISBOV, o qual estabelece os parâmetros e prazos para implementação da rastreabilidade no Brasil. Desde então, uma série de medidas foi promulgada pelo MAPA, alterando não só os prazos de ajustamento previstos para o setor privado, nas diferentes regiões do país, mas também alterando mesmo alguns mecanismos importantes do seu funcionamento (Tabela 6, próx. página). A última mudança no SISBOV, uma reforma da estrutura operacional do sistema, foi editada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) pela Instrução Normativa n. 17 (13/7/2006), que estabelece a Norma Operacional do Serviço de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos (SISBOV). O novo sistema institui o conceito de Estabelecimento Rural Aprovado no SISBOV e tem como principais requisitos a obrigatoriedade de identificação individual de 100% dos bovinos e bubalinos da propriedade, o controle sobre a movimentação de animais, de eventos sanitários e dos insumos utilizados na produção e a realização de vistoria de inspeção na propriedade a cada 180 dias no máximo. A Instrução n. 17 estabelece ainda que a partir de janeiro de 2009 a movimentação dos animais rastreados estará restrita a estabelecimentos aprovados. Os pecuaristas têm até 31 de dezembro de 2007 para se adaptarem às novas regras do SISBOV, data em que as normas do sistema antigo serão revogadas (CARTILHA DO, 2006). O sistema é de adesão voluntária, permanecendo a obrigatoriedade dos frigoríficos comprarem animais de Estabelecimentos Rurais Aprovados no SISBOV, nos casos de comercialização para mercados que exijam rastreabilidade, como a União Européia, Chile e Reino Unido. O novo modelo tem como principal avanço o conceito de propriedade certificada. Ou seja, a partir de janeiro de 2007, empresas que produzem carne bovina para exportação têm que credenciar a sua propriedade junto ao MAPA e contratar uma certificadora para validar todo oprocesso. No modelo atual, é permitida a convivência de animais identificados e não-
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Capítulo 2 Comércio Internacional
identificados dentro da mesma propriedade. O intuito é de que as propriedades comecem a se especializar em produzir carne rastreada tanto para o mercado externo como para o mercado interno (Marins, 2006). Segundo a Carneiro Sobrinho (2006), uma vantagem adicional do novo sistema está na gestão da propriedade, já que dentre as exigências a serem cumpridas, a fazenda aprovada deve apresentar à certificadora um plano de gestão, atentando para a qualidade da produção, manejos sanitário e alimentar e controle de informações referentes ao bem-estar animal. Tabela 6 – Evolução da regulamentação da rastreabilidade bovina e bubalina no Brasil Tipo Instrução Normativa n. 17 Instrução Normativa n. 52 Instrução Normativa n. 48 Instrução Normativa n.21 Circular n.3 Instrução Normativa n.88 Instrução Normativa n. 59 Instrução Normativa n.47 Portaria n.23 Instrução Normativa n.47 Portaria n.18 Instrução Normativa n.21 Instrução Normativa n.1
Data Publicação 14/07/2006 13/07/2004 21/06/2004
Ementa Estabelece a Norma Operacional do Serviço de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos (SISBOV), aplicável a todas as fases da produção, transformação, distribuição e dos serviços agropecuários. Altera, de 1º de agosto de 2004 para 1º de fevereiro de 2005, o prazo previsto no art. 15, do Anexo da Instrução Normativa nº 21, de 2 de abril de 2004. Altera o calendário de ingresso e permanência de animais na Base Nacional de Dados (BND) - SISBOV, aprovado pela Instrução Normativa nº 88, suprimindo a letra “a” do item 1, e a letra “b” do item 2.
06/04/2004
Aprova as Normas Operacionais do SISBOV e respectivos anexos.
17/03/2004
Procedimentos a serem adotados pelos SIFs junto aos matadouros de bovinos exportadores de carne e derivados com base na legislação do SISBOV.
15/12/2003
Aprovar o calendário de ingresso e permanência de animais na Base Nacional de Dados – SISBOV.
05/08/2003
Dispõe que os bovinos ou bubalinos importados para as finalidades de reprodução, cria, recria ou engorda serão obrigatoriamente incluídos no SISBOV.
11/06/2003
Aprova o Manual de Auditoria SISBOV.
26/03/2003
Instituir o Comitê Técnico Consultivo do SISBOV.
19/04/2002
Aprova as instruções complementares para regulamentação, implementação, promoção e supervisão da execução do controle operacional de entidades certificadoras credenciadas no âmbito do SISBOV. Institui no âmbito do SISBOV, a Coordenação Interdepartamental de Credenciamento - CIDC
27/02/2002
Estabelece as diretrizes, os requisitos, os critérios e os parâmetros para o credenciamento de entidades certificadoras junto ao SISBOV.
10/01/2002
Institui o Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina - SISBOV
07/08/2002
Fonte: Adaptado do Sislegis - Ministério da Agricultura, Pecuária e do Abastecimento. Jan./2007. Disponível em: http://extranet.agricultura.gov.br/sislegis
6. Considerações finais Embora muito se fale nos desafios das negociações internacionais em agronegócio, nas suas diversas esferas, bilateral, regional e multilateral, os maiores gargalos para o setor nacional são os domésticos. Estes podem vir a comprometer a competitividade brasileira nos próximos anos e já vêm, de alguma forma, afetando as exportações. Não só as questões tributárias e logísticas, que compõem o chamado “Custo Brasil”, mas também aquelas que se referem à qualificação dos produtos e agentes das cadeias agroindustriais no país. A qualificação 52
relacionada ao estabelecimento de padrões de classificação, de embalagem, ambientais, trabalhistas entre outros, que são a base dos sistemas de certificação, que, por sua vez, garantem ao consumidor os atributos desejados, como a segurança, qualidade e regularidade. Diante disto, certamente a maior tarefa que o setor privado e o setor público deverão enfrentar é a de sensibilização dos segmentos das cadeias do agronegócio e a sua capacitação para ajustar-se às novas exigências e também àquelas que já integram o mercado, ainda não plenamente absorvidas por uma parcela significativa dos agentes e segmentos do agronegócio brasileiro.
Capítulo 2 Comércio Internacional
7. Bibliografia ANDRIGUETTO & KOSOSKI (MAPA). In: Conferência Internacional sobre rastreabilidade de alimentos. São Paulo, 2004. BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO. BID. Além das Fronteiras – O Novo Regionalismo na América Latina – Progresso Econômico e Social na América Latina. Relatório 2002. BANCO MUNDIAL. Global economic prospects trade, regionalism, and development. Disponível em: . Acesso em 30 de novembro de 2005. BARROS, G.S.C.; BURNQUIST, H.L.; MIRANDA, S.H.G.; CUNHA FILHO, J.H. “SPS Issues of Agricultural Trade in the Western Hemisphere”. Relatório BID/CEPEA-ESALQ/USP. May/2002. 66p. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Preferências Tarifárias – SGP e SGPC. Material disponível no site www.mdic.gov.br . 2001 CARNEIRO SOBRINHO, V. SISBOV - Novo nome, novas regras e mesmo conceito. Cultivar Notícias 23/08/06. Disponível em: http://www.portaldoagronegocio.com.br/index.php?p=texto&&idT=758. Acesso: jan./2007. CARTILHA DO novo serviço de rastreabilidade da cadeia produtiva de bovinos e bubalinos- SISBOV. Brasília: SDC/ABIEC/CNA/ACERTA. 2006.20p. Disponível em: www.agricultura.gov.br CARVALHO, M.A. DE & SILVA, C.R.L. Economia Internacional. Editora Saraiva, 2000 EUREPGAP, The normative document for certification, “EUREPGAP Fruit and Vegetables” Version 2/ January 2004) www.eurep.org/fruit/index_html. Janeiro/2007. FELIX, J. Instituto de Tecnologia do Paraná – TECPAR. Conferência Internacional sobre rastreabilidade de alimentos. São Paulo, Set./2004.. FRANCO, M. Primeiro abate de bovinos com Eurepgap. Revista DBO, São Paulo – SP, ano 23, n° 288, outubro/2004, pp 20,21. GOLAN, E; KRISSOFF, B; KUCHLER, F. Traceability for food marketing & food safety: What´s the next step? Agricultural Outlook. Disponível em: . Acessado em 12 de setembro de 2005. GROLA, M.; PEREZ, P.L.; MIRANDA, S.H.G. O Brasil e a nova geografia do comércio internacional: o comércio Sul-Sul. 2006 (no prelo) JANK, M.S. Um BALANÇO DE CANCÚN. O Estado de São Paulo. 29/03/2003. P. A2. LACORTE, M. C. Estado das artes da certificação nos frigoríficos exportadores de carne bovina em São Paulo. Relatório de estágio supervisionado. LES-ESALQ/USP. 45p. Set./2006 (não publicado) LIMA, R. C. A.; MIRANDA, S. H. G.; GALLI, F. Febre Aftosa: Impacto Sobre as Exportações Brasileiras de Carnes e o Contexto Mundial das Barreiras Sanitárias. 2005. 31 p. Estudo do CEPEA/ICONE. Disponivel No link: Acesso em Junho de 2006 MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. MAPA – Sislegis. Disponível: http://extranet.agricultura.gov.br/sislegis-consulta Acesso: jan/2007. MARINS, R.L. Estudo comparativo de sistemas de rastreabilidade em alimentos e métodos para quantificação de seus efeitos. Relatório PIBIC. ESALQ/USP. 2006. 87p. 53
Capítulo 2 Comércio Internacional
MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR. FUNCEX. Barreiras às exportações brasileiras, Outubro de 1999, 261p. MIRANDA, S.H.G. Quantificação dos efeitos das Barreiras Não-Tarifárias sobre as exportações brasileiras de carne bovina. Piracicaba. 2001. 237p. Tese (Doutorado) – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Universidade de São Paulo. OLIVEIRA, L.A. A importância das normas internacionais para o comércio da fruticultura brasileira. Dissertação. ESALQ/USP: Piracicaba, Abril/2005. 168p. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO. OMC. Statistics Database. Technical Notes. Disponível em: http://stat.wto.org/CountryProfile/WSDBCountryPFTechNotes.aspx?Language=E 2006a. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO. OMC. Agreement on Agriculture. Disponível em: http:/ /www.wto.org/english/docs_e/legal_e/14-ag.doc. 2006b. ORGANIZATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT. OECD. Acesso: jan./ 2007. Disponível em: http://www.oecd.org/dataoecd/12/6/37002611.xls ORGANIZATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT. OECD. Brazil. OCDE Review of Agricultural Policies, 226 p. 2005. SARTO, F.M.; MIRANDA, S.H.G.; BRISOLA, C.S. Análise dos impactos econômicos da implementação do sistema de identificação e certificação de origem bovina e bubalina no Brasil. Estudos do CEPE., n.17. Jan/jun.2003. p. 109-130. United Nations Conferece for Trade and Development. UNCTAD. Disponível em: www.unctad.org. 2002. World Trade Organization.WTO. International Trade Statistics. Disponível em: http://www.wto.org/ english/res_e/statis_e/its2005_e/its05_bysector_e.htm. 2006.
Anexo Capítulos do Sistema Harmonizado 1e2 4 a 24 29 33 35
Questões de Revisão
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1) Considerando-se o âmbito do Mercosul, é correto afirmar quanto à nomenclatura usada que: a) Assim como nos Estados Unidos, é adotada uma nomenclatura com 10 dígitos. b) A Nomenclatura utilizada nos países do Mercosul utiliza 6 dígitos, como o padrão internacional. c) A Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) utiliza 8 dígitos, sendo que os 2 últimos são específicos do Mercosul. d) Como uma região de grande inserção no comercio internacional, a Nomenclatura utilizada no Mercosul é a mesma utilizada nos grandes países desenvolvidos.
2) Quanto ao comércio internacional de produtos do agronegócio, observa-se que: a) Os países em desenvolvimento são os maiores exportadores de produtos do agronegócio. b) A China, devido ao seu imenso tamanho, é o país que mais exporta produtos agrícolas no mundo. c) Os produtos agrícolas, dada a sua essencialidade, são responsáveis pela maior parte das exportações mundiais. d) Quando analisados em conjunto, os países da União Européia são os maiores compradores de produtos agrícolas do mundo.
Capítulo 2 Comércio Internacional
3) Analisando-se o período de 1989 a 2005 quanto ao saldo comercial brasileiro, é correto afirmar que: a) O Brasil passa ter saldos comerciais positivos a partir de 1994, com o Plano Real. b) O Brasil só passa a ter saldo comercial positivo a partir de 2000. c) O saldo comercial do agronegócio, para o período, sempre foi superavitário. d) Os recentes saldos comerciais positivos brasileiros não apresentam qualquer relação relevante com o saldo da balança comercial da agricultura. 4) Um dos mais importantes temas de negociação internacional refere-se à Multifuncionalidade, quanto a esse tema é correto afirmar que: a) As quatro funções essenciais da Multifuncionalidade estão relacionadas com a segurança alimentar, a proteção comercial, uma função ambiental e uma função social. b) A multifuncionalidade permite aos países desenvolvidos manter um elevado subsídio e protecionismo. c) A Multifuncionalidade rege que os governos não podem efetuar pagamentos diretos aos agricultores, uma vez que administrar de forma eficiente é parte das múltiplas funções que o agricultor deve exercer. d) A Multifuncionalidade é resultado da interação entre os sistemas de produção agrícola e os sistemas industriais que os rodeiam. 5) Da relação entre comércio e meio-ambiente é incorreto afirmar que: a) Apesar das reais preocupações ambientais, os argumentos de defesa do meio ambiente podem, eventualmente, mascarar ações protecionistas. b) Políticas comerciais criadas por um país podem gerar mudanças ambientais positivas em outros países. c) A liberalização comercial deverá gerar ganhos ambientais que mesmo os benefícios comerciais não podem suplantar. d) A liberalização comercial pode gerar benefícios comerciais para os países em desenvolvimento, bem como benefícios ambientais para os países desenvolvidos. 6) Sobre o Acordo Agrícola da OMC, assinale a alternativa incorreta: a) O tema de subsídios, embora tratado no Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias, é particularmente tratado no Acordo Agrícola com foco nos produtos agroindustriais; b) A caixa amarela de subsídios é aquela que contém os subsídios relacionados a pagamentos diretos aos produtores, em particular para que deixem de cultivar em algumas áreas e para estimular a proteção ambiental c) A caixa verde de subsídios é aquela que contém as medidas consideradas sem impacto relevante sobre o comércio. Ela vem sendo utilizada crescentemente pelos países que vêm reduzindo seu nível de subsídios via preços. d) Os países assumiram na Rodada Uruguai compromissos de redução de políticas de apoio interno (subsídios domésticos), de redução de subsídios às exportações e de tarifas. Os prazos de redução para países desenvolvidos foram menores do que os concedidos aos países em desenvolvimento.
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7) Dentre as alternativas abaixo qual apresenta apenas instrumentos hoje já regulamentados em acordos internacionais na OMC, consistindo em instrumentos que vêm sendo utilizados pelos países ricos para restringir ou dificultar as exportações de paises em desenvolvimento: a) Aspectos relacionados à qualidade dos produtos, market-share, regras sobre concorrência. b) Trabalho infantil, Trabalho informal e saúde da população. c) Proteção do consumidor, restrições técnicas e criação de obstáculos geográficos. d) Exigências sobre embalagens, medidas sanitárias e tarifas sazonais. 8) Quanto aos acordos integrantes da OMC, é correto afirmar: a) Os Acordo TBT e SPS foram introduzidos aos países membros da OMC logo após a Rodada Seattle, como resposta as insistentes manifestações ocorridas naquela ocasião. b) Os Acordos Agrícola, de Subsídios e Medidas Compensatórias, TBT e SPS incentivam os países a contribuírem com a normalização internacional, propondo novos padrões e critérios de avaliação, tornando o processo sempre atualizado e harmonizado. c) Os objetivos ditos legítimos para a criação de novas normas são: imperativos de segurança nacional, prevenção de praticas enganosas, proteção à saúde e/ou segurança humana, proteção da saúde ou vida animal ou vegetal, proteção do meio ambiente, além de outras. d) Ainda que não haja uma comprovação científica de que a medida adotada realmente atinja os objetivos a que se propõe, uma medida pode ser adotada desde que exista algum tipo de evidência ou desconfiança por parte das autoridades regulatórias. 9) Qual das seguintes alternativas não apresentam objetivos de proteção do SPS: a) A saúde humana ou animal de riscos com alimentos b) A saúde humana de doenças transmitidas por plantas e animais. c) Uso de embalagens não-biodegradáveis. d) Animais ou plantas de pragas ou doenças, sejam estas, exigências técnicas ou não. 10)Sobre barreiras tarifárias e não-tarifárias, assinale a alternativa correta: a) A quota tarifária é um instrumento composto de apenas dois elementos: uma tarifa intra-quota e uma tarifa extra-quota. b) O pico tarifário é definido pela OMC como uma tarifa ad valorem acima de 100%; c) As tarifas específicas são menos prejudiciais ao comércio de produtos agrícolas já que quanto mais baratos os preços dos produtos, menor é o seu impacto sobre o preço final. d) A negociação de barreiras tarifárias e não-tarifárias na Rodada Uruguai gerou o processo de tarificação que, dentre outros resultados, eliminou as quotas puras e gerou o aparecimento de picos tarifários e quotas-tarifárias.
) d ( 0 1 ; ) c ( 9 ; ) c ( 8 ; ) d ( 7 ; ) b ( 6 ; ) c ( 5 ; ) b ( 4 ; ) c ( 3 ; ) d ( 2 ; ) c ( 1 : o t i r a b a G
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CAPÍTULO
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CUSTOS DE PRODUÇÃO, ORÇAMENTAÇÃO E MEDIDAS DE RESULTADO FINANCEIRO Roberto Arruda de Souza Lima
Professor do Departamento de Economia, Administração e Sociologia- ESALQ/USP
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Capítulo 3 - Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro Neste capítulo será discutido como avaliar um projeto, mensurando seu resultado financeiro. Para tanto, inicialmente serão apresentadas noções de custos e orçamentação. A seguir, serão vistas as medidas mais utilizadas para avaliação de resultados financeiros, inclusive incorporando a discussão sobre risco.
1. Os cinco capitais Todo projeto envolve o uso de cinco tipos de capitais: humano, social, natural, físico e financeiro. A atividade geradora de renda é uma combinação na utilização do estoque desses capitais. Assim, a análise de uma empresa ou projeto inicia-se com o diagnóstico – levantamento de pontos fortes e fracos – da situação de cada um dos capitais. O capital humano é representado pelas pessoas envolvidas no projeto, considerando suas habilidades, atitudes, capacidades físicas e intelectuais. O treinamento, saúde e educação e experiência definem a qualidade desse capital. O capital social refere-se aos vínculos e relações entre os indivíduos, sendo o produto da confiança entre as pessoas. A distinção entre capitais humano e social pode ser representada pela figura de um polígono, em que capital humano seria representado pelos vértices e o capital social pelas linhas que conectam estes vértices. Capital social e capital humano freqüentemente são complementares. O capital natural é formado pelo solo, ar, água, fauna e flora. A grande diversidade do capital natural implica na necessidade de detalhado diagnóstico tanto para o planejamento do projeto quanto na definição de potenciais alternativas de investimento. Muitos riscos estão associados às variáveis do capital natural, como, por exemplo, ocorrência de seca ou de geadas. Este aspecto (risco) será discutido mais adiante neste texto. O potencial turístico, característica de alguns projetos, e o impacto ambiental também fazem parte da análise do capital natural. O capital físico está relacionado à infra-estrutura da empresa: benfeitorias, máquinas e equipamentos, veículos, animais de produção e de trabalho, etc. Avida útil e o estado de conservação são aspectos importantes na avaliação do capital físico. A proporção de uso, a fração de tempo alocado ao projeto, e o valor residual (isto é, ao final do projeto) devem ser adequadamente dimensionados para a correta mensuração de resultados econômico-financeiros. O capital financeiro é o foco deste texto. Refere-se ao caixa, às aplicações financeiras, estoques líquidos, contas a receber, contas a pagar, empréstimos e créditos de fornecedores. O momento em que ocorre a efetiva entrada de caixa ou desembolso é um aspecto muito importante do capital financeiro, conforme será visto, adiante, na discussão sobre fluxo de caixa.
2. Rentabilidade Um projeto só é viável, e uma empresa só é sustentável, caso apresente rentabilidade. Para compreendermos melhor a rentabilidade, algumas definições são necessárias. Receita Bruta é o valor do total da produção da empresa ou do projeto. É obtida pela multiplicação da quantidade física produzida pelo respectivo preço¹. Esta receita será utilizada para cobrir os diversos gastos (dispêndios) da empresa. Os gastos dividem-se em custos e despesas. Custos são os gastos incorridos no processo produtivo, como, por exemplo, na
1. O preço de títulos, ações, moedas estrangeiras e de mercadorias transacionadas em bolsas recebe a denominação de cotação (Sandroni, 2001).
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aquisição de matéria-prima e nos salários dos trabalhadores envolvidos diretamente na produção. Despesas são os gastos que não estão diretamente associados ao processo produtivo, como, por exemplo, comissões de vendedores e aluguel de escritório. A Receita Líquida é obtida subtraindo os impostos sobre vendas (ICMS, IPI, ISS) e outras deduções como vendas canceladas, abatimentos e descontos comerciais da Renda (Receita) Bruta. Subtraindo, no caso de produtores (indústrias), o custo dos produtos vendidos (ou os custos das mercadorias vendidas, no caso de empresa comercial) da Renda (Receita) Líquida, obtém-se o Lucro Bruto (Quadro 1). Neste momento, já é possível definir um indicador de rentabilidade, a Margem de Lucro Bruto: Margem de Lucro Bruto =
Lucro Bruto Receita Líquida
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
× 100
A partir do Lucro Bruto, deduzindo as Despesas Operacionais obtém-se o Lucro Operacional. As Despesas Operacionais dividem-se em comerciais (ou de vendas, relacionadas à comercialização e distribuição dos produtos); administrativas (relacionadas à gestão da empresa, como os gastos nos escritórios) e financeiras (juros, comissões bancárias, descontos). Usualmente, as despesas financeiras são apresentadas líquidas (isto é, deduzidas) das receitas financeiras. Assim, define-se outro indicador de rentabilidade: Margem de Lucro Operacional =
Lucro Operacional Renda Líquida
× 100
Acrescentando as receitas não operacionais e deduzindo as despesas não operacionais, a provisão para imposto de renda, contribuição social, as participações, de debêntures, de empregados, administradores e partes beneficiárias, e as contribuições para instituições ou fundos de assistência ou previdência dos empregados, chega-se ao lucro líquido (Quadro 1). A rentabilidade pode ser expressa através do indicador: Margem de Lucro Líquido =
Lucro Líquido × 100 Renda Líquida
Quadro 1 - Demonstração de Resultado (obtenção do Lucro Líquido) RECEITA BRUTA (–) DEDUÇÕES IPI ICMS Abatimentos (=) RECEITA LÍQUIDA (–) CUSTOS DOS PRODUTOS VENDIDOS (=) LUCRO BRUTO (–) DESPESAS OPERACIONAIS De Vendas Administrativas Financeira (–) Receita (=) LUCRO OPERACIONAL (±) DESPESAS/RECEITAS NÃO OPERCIONAIS Ganhos/Perdas Extraordinários (–) Provisão para o Imposto de Renda Participações de Debêntures, Empregados e/ ou Adm., Partes Beneficiárias, Contribuições e Doações (=) LUCRO LÍQUIDO (OU PREJUÍZO)
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Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
3. Engenharia de projetos Denomina-se engenharia do projeto o dimensionamento das operações (preparo do solo, ordenha, plantio, colheita, etc) associadas às atividades (milho, soja, produção de leite etc) previstas no projeto. A execução das operações exige a utilização dos cinco capitais anteriormente descritos. Para elaboração de orçamentos (e fluxos de caixa) é importante conhecer o tipo e quantidade utilizada de cada recurso, ou seja, é necessário conhecer os coeficientes técnicos. Usualmente, os coeficientes técnicos indicam as quantidades usadas de um insumo ou produto por unidade de área (por exemplo, 25 kg de sementes/ha). No entanto, o coeficiente técnico pode ser expresso em outras unidades, como, por exemplo, em quantidades por animal (exemplo: 5 kg ração/animal). Como serão discutidas adiante, as atividades envolvidas no projeto em analise devem ser bem caracterizadas, com conhecimento das especificações técnicas dos insumos e produtos, de modo a obter coeficientes técnicos corretos e adequados ao entendimento do projeto. Recomenda-se usar, sempre que possível, os coeficientes técnicos obtidos no controle operacional da empresa ou de empresas com características semelhantes. Quando os coeficientes técnicos não estão disponíveis (por exemplo: no caso de uma atividade nova na empresa), pode-se usar as informações de publicações técnicas ou de instituições especializadas 2.
4. Orçamentação. Na engenharia de projeto, conforme visto anteriormente, diversos coeficientes técnicos são obtidos, mas não há uma uniformização das unidades. Alguns coeficientes são expressos em kg/ha, outros em horas/mês e em muitas outras maneiras. Para uma análise correta de quanto é gasto ou recebido, para que possa ocorrer agregação (soma) de valores, é importante que todos os valores estejam expressos na mesma unidade. A orçamentação é justamente esta tarefa de transformar quantidades físicas – produzidas ou consumidas – em valores monetários. Um orçamento apresenta, para um determinado período, os gastos e recebimentos que irão ocorrer no futuro, expressos em unidades monetárias (reais, por exemplo). Para tanto, as quantidades físicas (quilos, litros, etc.) são multiplicados pelos respectivos preços (ou cotações). Embora o orçamento seja referente a eventos que ocorrerão no futuro, informações históricas, como os custos da empresa, são utilizadas para melhor estimativa dos coeficientes técnicos. Observe que para elaboração do orçamento é necessário conhecer as atividades e as especificações técnicas dos recursos necessários e dos produtos que serão obtidos. A coleta e a análise das informações necessárias para a elaboração do Orçamento devem ser feitas com muito cuidado. Para realizar uma avaliação econômica de um projeto é necessário elaborar um orçamento confiável. Para tanto, é essencial conhecer a operacionalidade da empresa e conhecer o mercado em que atua, tanto para venda de seus produtos e serviços quanto nos mercados em que adquire seus insumos. Informações básicas necessárias à análise estão destacadas na Figura 1.
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2. No caso do agronegócio, destacam-se como fontes: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA); CATI; institutos de pesquisa (Instituto Agronômico de Campinas-IAC, Instituto de Zootecnia, Instituto Florestal e Instituto de Tecnologia de Alimentos); as universidades públicas (ESALQ/USP e UNESP); o SENAR e as cooperativas.
Figura 1 – Informações básicas necessárias a orçamentação. quantidade e preços de insumos
Insumos
Processo Produtivo
custos de produção
quantidade e preços de produtos
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Consumidor Final
despesas de comercialização
É importante que os preços e cotações utilizados reflitam tendências de longo prazo, evitando o uso de preços excepcionalmente (momentaneamente) muito altos ou muito baixos. Outro aspecto importante, que nunca deve ser esquecido, é que os preços devem incluir os custos de transporte entre o local do projeto e os mercados onde são comprados os insumos e onde os produtos são comercializados. Após o levantamento das especificações técnicas do projeto é realizado o orçamento unitário. Em outras palavras, é elaborado um orçamento específico para cada gasto que será considerado no Orçamento. Assim, deve-se orçar o custo de cada fator de produção, como, por exemplo, o custo da hora máquina de operação de um trator. Nesta etapa, é importante considerar todos os custos envolvidos (depreciação, seguro, despesas operacionais etc.) na utilização de cada um dos fatores de produção. Por exemplo, considere que durante o ano seja utilizada uma máquina que vale R$ 50.000,00 no mercado e que possui uma vida útil de cinco anos. Estima-se que daqui a cinco anos ela terá virado sucata, e valerá apenas R$ 500,00. Esta perda de valor (depreciação) equivale a R$ 9.900,00 por ano (R$ 50.000,00 de valor atual – R$ 500,00 de valor residual é igual a R$ 49.500,00, que é dividido por 5 anos). Se esta máquina necessitar de manutenção anual que custe R$ 1.100,00, verifica-se que utilizar esta máquina implica em custo de R$ 11.000,00 por ano. Considerando que esta máquina seja utilizada em 200 horas durante todo ano, obtém-se seu custo hora dividindo o custo anual pelo número de horas utilizadas: R$ 11.000,00 = R$ 550,00/h 200 horas
Ou seja, o custo da hora máquina de operação é de R$ 550,00.
5. Fluxo de Caixa. Sem dúvida, o Orçamento é um instrumento importante, mas ele não considera uma variável importante nas decisões: o tempo. A análise do momento em que ocorrerão as despesas e as receitas permite que o empresário se antecipe aos movimentos de caixa 3 nos negócios, de modo que os problemas sejam detectados com antecedência para que sejam realizadas as devidas ações preventivas. Desta forma, pode-se determinar o momento certo de contrair uma dívida e por qual prazo (qual o melhor momento para que ocorra o pagamento da dívida). Da mesma forma, e de especial importância em épocas de inflação, pode-se identificar quando (e por qual prazo) se deve realizar aplicações financeiras com o eventual excesso de caixa. 3. Movimentos de caixa referem-se às entradas e saídas de dinheiro (cédulas, moedas e depósitos bancários em contacorrente) da empresa.
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Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
O demonstrativo que permite verificar estas informações, e muitas outras, é o Fluxo de Caixa. Nele são apresentadas, sinteticamente e por períodos (em geral, mês ou ano), as entradas e saídas de caixa. Ou seja, mostra a origem de todo dinheiro que entrou no caixa e, também, onde foi aplicado todo dinheiro que saiu do caixa. Assim, se as receitas ocorrerem somente no final do período do projeto, será necessário buscar recursos (próprios ou de terceiros) para viabilizar o empreendimento. Quanto antes ocorrerem as receitas, menor será a necessidade de buscar fontes de financiamento. Note que a análise do Fluxo de Caixa permite verificar a capacidade da empresa em pagar suas obrigações corretamente. Os fluxos das receitas (entradas) e os fluxos das saídas de recursos fazem parte dos fluxos de caixa, sendo que a diferença entre estes fluxos é denominada receita líquida esperada. As entradas no fluxo de caixa são compostas pelas receitas originadas no projeto, obtidas através da multiplicação do preço ou cotação de cada item pela respectiva quantidade física referente à: Vendas de produtos agrícolas Vendas de produtos animais Arrendamentos
Outras receitas
Os custos e despesas operacionais compõem as saídas. São considerados todos os desembolsos da empresa relativos à implementação de um projeto, obtidos através da multiplicação do preço de cada item pela respectiva quantidade física. Os custos e despesas operacionais compõem as saídas. São considerados todos os desembolsos da empresa relativos à implementação de um projeto, obtidos através da multiplicação do preço de cada item pela respectiva quantidade física. Os custos e as despesas podem ser divididos em dois grandes grupos. Os custos e despesas que ocorrem desde o momento inicial até o início da produção são denominados gastos com Investimentos. A partir do momento em que se inicia a produção os desembolsos referentes aos custos e despesas são denominados como Gastos Operacionais. Assim temse, por exemplo: (Tabela 1): Tabela 1 – Classificação de custos e despesas
Investimentos Terra Construções Equipamentos Máquinas Corretivos de solos Mudas de café e sementes Animais Outros investimentos
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Gastos operacionais Mão-de-obra Defensivos Fertilizantes Combustíveis e lubrificantes Vacinas e medicamentos Pintos de 1 dia Rações e sêmen Ensilagem Impostos e contribuições
Finalmente, considerados os valores das entradas e das saídas, pode-se elaborar o Fluxo de Caixa do projeto. Muitas outras informações extraídas do Fluxo de Caixa são importantes para a boa condução de um empreendimento, para análise econômico-financeira e para tomada de decisão. Na Tabela 2 é apresentado um modelo genérico como exemplo de planilha para elaboração do Fluxo de Caixa. Adicionalmente, deve-se estar atento a dois aspectos na elaboração do Fluxo de Caixa: os efeitos da inflação e o horizonte temporal do projeto.
Tabela 2 – Modelo de Fluxo de Caixa. Ano 0
Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4
ENTRADAS Vendas – Produtos agrícolas Vendas – Produtos animais Arrendamentos Outras receitas SAÍDAS Investimentos Terra Construções Equipamentos Máquinas Corretivos de solos Mudas e sementes Animais Outros investimentos Gastos operacionais Mão-de-obra Defensivos Fertilizantes Combustíveis e lubrificantes Vacinas e medicamentos Animais – recria/engorda Rações e sêmen Ensilagem Impostos e contribuições Outros gastos operacionais RECEITA LÍQUIDA Resultado Acumulado
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
A inflação, por definição, altera os preços dos insumos e dos produtos que são utilizados nos cálculos de entradas e saídas (receitas, custos e despesas). No entanto, é muito grande a dificuldade de estimar tanto o nível de inflação quanto a variação de preço de cada item (lembrando que a taxa de inflação é uma média, sendo que cada produto apresenta uma variação de preços diferente de outro, ou seja, há variação nos preços relativos). Na elaboração de fluxos de caixa é realizada uma simplificação: considera-se que os preços relativos não se alteram. Desta forma, deve-se estar atento no sentido que os preços correntes (aqueles que são praticados no dia-a-dia do mercado) poderão se alterar, o que pode implicar na necessidade de rever projeções e análises de fluxos de caixa. A definição do horizonte temporal do projeto é outro aspecto importante. Os empreendimentos rurais caracterizam-se por apresentar atividades de longo prazo. Assim, o fluxo de caixa deve compreender todo ciclo de produção. Projetos com horizonte de tempo longo, comuns no agronegócio, têm o inconveniente do período total ser divido em subperíodos não muito curtos (por exemplo, um ano). Por exemplo, pode-se considerar entradas e saídas anuais. No entanto, no mundo real, as entradas e saídas não são simultâneas. Uma atividade que apresente saída de caixa em janeiro e entrada de caixa em dezembro e outra, exatamente oposta, com entrada de caixa em janeiro e saída de caixa em dezembro apresentarão exatamente os mesmos resultados nos Fluxos de Caixa realizados considerando o saldo anual. No entanto, os reflexos para administração do empreendimento, no chamado capital de giro, serão bem diferentes! Portanto, este aspecto deve ser considerado, realizando os eventuais ajustes que reflitam a necessidade de capital de giro do empreendimento.
6. Custos de oportunidade e efeitos colaterais No item anterior, foi comentado que quando é elaborado o Fluxo de Caixa considera-se apenas as alterações nos desembolsos e nas receitas, obtendo as diferenças entre adotar o projeto ou não adotá-lo. Embora pareça simples verificar as alterações, na prática muitas vezes são cometidos enganos e erros. Muitas vezes, as causas destes erros estão relacionadas com dois fatores: custos de oportunidade e efeitos colaterais.
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Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Custos de oportunidade representam os benefícios que estamos abrindo mão em função da utilização de um fator de produção. Por exemplo, um produtor que possui uma gleba ociosa poderia imaginar que não teria nenhum custo referente à utilização daquela área para plantar, por exemplo, milho. Na realidade, a área que está ociosa poderia ter outros usos alternativos, como, por exemplo, ser arrendada. A receita que o produtor está deixando de receber por não ter arrendado representa o custo de oportunidade pela utilização da gleba. Os efeitos colaterais (ou secundários), que podem ser positivos ou negativos, são comuns na maioria dos projetos. Por exemplo, ao decidir plantar milho, o produtor estará reduzindo a disponibilidade de horas-máquina, horas-homem e até mesmo de terra, que poderiam estar sendo utilizadas em outras atividades. Assim, estas outras atividades serão impactadas (efeito colateral) pela decisão de plantar milho. Assim, muitas vezes é interessante compararmos o Fluxo de Caixa de toda empresa (considerando todas as atividades) em duas situações: com o projeto em análise e sem o projeto. A partir da comparação entre estes dois cenários, a análise (seleção de projetos) poderá ser feita com maior segurança.
7. Análise de projetos Há diversos métodos para análise econômica de projetos. Estes métodos podem ser classificados em diferentes categorias. É possível separá-los entre os métodos que consideram o valor do dinheiro no tempo e os que não consideram esta dimensão tempo. Não considerar o tempo é uma simplificação muito forte da realidade, mas que torna o processo de avaliação mais rápido. Assim, métodos que não incorporam o valor do dinheiro no tempo devem se restringir a projetos marginais, de baixo impacto financeiro na empresa ou como um indicador inicial para análises mais detalhadas. Esses métodos, independente de considerarem a dimensão tempo, dividem-se em deterministas e análises em condições de risco (mais realistas, incorporando incertezas no comportamento das variáveis estudadas). No presente texto, serão discutidos três critérios para análise de projetos. Em todos eles serão considerados fluxos hipotéticos denominados Projeto A, Projeto B e Projeto C, conforme tabela 3. Tabela 3 – Projetos A, B e C - saldos anuais Projeto A -50 10 15 20 20 20 20 20
Ano 0 Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Ano 6 Ano 7
Projeto B -1.000 0 200 200 300 250 250 500
Projeto C -1.000 500 500 300 300 200 200 200
8. Payback O payback é o indicador que mostra o período de recuperação do capital financeiro investido. Ou seja, determina o número de períodos (anos, por exemplo) necessários para que o saldo acumulado do fluxo de caixa iguale-se a zero. Matematicamente, tem-se: n
∑ Ft
=0
t = 0, 1, 2, Κ , N
N≥n
t =0
em que F t é o fluxo de caixa no período t; N é o número total de períodos do projeto e n é o payback . Para os projetos apresentados na tabela 3, tem-se: 64
Tabela 4 – Cálculo do saldo acumulado para os Projetos A, B e C. Projeto A Projeto B Saldo acumulado no Ano 0 -50 -1000 Saldo acumulado no Ano 1 -40 -1.000 Saldo acumulado no Ano 2 -25 -800 Saldo acumulado no Ano 3 -5 -600 Saldo acumulado no Ano 4 15 -300 Saldo acumulado no Ano 5 -50 Saldo acumulado no Ano 6 200
Projeto C -1000 -500 0
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
No caso do Projeto A, observa-se que passados três anos (isto é, no ano 3), o investimento não é recuperado, mas o saldo do ano 4 (R$ 20) é superior aos R$ 5 negativos acumulados ao final do ano 3, o tornou o saldo acumulado do ano 4 positivo (R$ 15). Considerando que o fluxo distribua-se uniformemente ao longo do ano, verifica-se que o saldo que é acumulado mensalmente no ano 4 corresponde a R$ 1,67 (isto é, 2012 ≅ 1,67 ). Ou seja, são necessários três meses para zerar o saldo negativo acumulado até ano 3 (isto é, 51,67 = 3). Assim, o payback do Projeto A é de 3 anos e 3 meses. No caso do Projeto B, observa-se que passados cinco anos (isto é, no ano 5), o investimento não é recuperado, mas o saldo do ano 6 (R$ 250) é superior aos R$ 50 negativos acumulados ao final do ano 5, o tornou o saldo acumulado do ano 6 positivo (R$ 200). Considerando que o fluxo distribua-se uniformemente ao longo do ano, verifica-se que o saldo que é acumulado mensalmente no ano 6 corresponde a R$ 20,83 (isto é, 25012 ≅ 20,83 ). Ou seja, são necessários 2,4 meses para zerar o saldo negativo acumulado até ano 5 (isto é, 50
20,83
= 2,4 ). Assim, o payback do Projeto A é de 5 anos, 2 meses 2 e 12 dias.
Já o Projeto C tem o saldo acumulado zerado exatamente no ano 2. Portanto, o payback do Projeto C é de 2 anos. A decisão de aceitar ou descartar um projeto com base no payback é subjetiva: elege-se um período máximo para que ocorra a recuperação do investimento. Projetos que apresentarem payback inferior a este período máximo são aceitos, caso contrário, são descartados. O payback é um indicador que apresenta a vantagem de ser relativamente fácil de entender 4 e, ao favorecer a liquidez, representa maior proteção com relação aos fluxos futuros, que tendem a ser mais incertos quanto mais distantes forem. Por outro lado, apresenta a desvantagem de desprezar fluxos posteriores à data da recuperação do investimento, que podem ser relevantes. Também apresenta a desvantagem de não considerar valor do dinheiro no tempo, ao contrário do que será apresentado nos próximos indicadores (Valor Presente Líquido e Taxa Interna de Retorno).
9. Valor Presente Líquido - VPL Inicialmente é necessário definir valor presente e valor futuro, o que permitirá verificar a variação do valor do dinheiro no tempo. Há uma diferença muito grande entre dispor de um valor monetário hoje e só poder dispor deste valor no futuro. Se um indivíduo desejar utilizar hoje um valor monetário que só estará disponível no futuro (por exemplo, o valor da produção de uma safra que ainda não foi colhida), deverá recorrer a um empréstimo, o que implicará em custos (encargos financeiros), que será liquidado quando 4. Comparado com os indicadores que serão discutidos a seguir: valor presente líquido e taxa interna de retorno.
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Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
a safra for comercializada e recebida. De forma semelhante, um indivíduo poupador adia seu consumo atual para consumir maior quantidade no futuro, pois espera que sua poupança (aplicação financeira) seja remunerada com juros positivos. Observa-se que há necessidade de relacionar um valor atual e um valor futuro, o que é feito através de uma taxa de juros. A aplicação dos juros permite a obtenção de uma equivalência de valores disponíveis em datas diferentes (presente e futuro). Por exemplo, para um poupador que aplica seus recursos com juros de 10% ao ano, é indiferente entre possuir R$ 100,00 hoje ou R$ 110,00 daqui a um ano. Considerando a metodologia de cálculo dos juros compostos, tem-se: n
FV = VP × (1 + i )
ou,
VP =
FV
(1 + i )n
em que,
FV = valor futuro VP = valor atual i = taxa de juros por período, na forma unitária n = número de períodos Na análise de projetos, utiliza-se a taxa de juros real 5, isto é, retira-se a taxa de inflação que está embutida na taxa de juros nominal: i=
(1 + j) −1 (1 + π)
em que,
i = taxa de juros real, na forma unitária j = taxa de juros nominal, na forma unitária p = taxa de inflação, na forma unitária O Valor Presente Líquido (VPL) nada mais é do que a soma do valor presente de todos os fluxos de caixa do projeto: N
VPL(r ) = ∑ t =0
Ft
(1 + r )t em que,
Ft = fluxo de caixa no período t N = número total de períodos do projeto r = taxa de juros relevante para empresa, na forma unitária Muita atenção deve ser dispensada na definição de qual é a taxa de juros relevante para empresa (r), ou seja, seu custo de oportunidade. Empresas tomadoras de recursos devem considerar seu custo de captação de recursos como sendo sua taxa de juros relevante, enquanto empresas capitalizadas, aplicadoras de recursos, devem considerar a mais alta taxa de retorno entre as alternativas disponíveis para suas aplicações como sendo a taxa de juros relevante. A decisão de aceitar ou descartar um projeto com base no Valor Presente Líquido consiste em verificar o seu sinal. Valor Presente Líquido positivo significa que o projeto irá acrescentar lucro para empresa e, portanto, deverá ser aceito. Valor Presente Líquido negativo significa que o projeto acarretará prejuízo para empresa e, portanto, deverá ser descartado. Para os projetos apresentados na tabela 3 e considerando que a taxa de juros relevante para empresa seja 10% a.a., tem-se:
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5. Considerando que os valores utilizados nos fluxos de caixa são reais, não incluindo projeções de inflação nos períodos futuros.
Tabela 5 – Cálculo do Valor Presente Líquido dos Projetos A, B e C. Projeto A
Projeto B
Projeto C
-50,00 9,09 12,40 15,03 13,66 12,42 11,29 10,26 34,15
-1.000,00 0,00 165,29 150,26 204,90 155,23 141,12 256,58 73,38
-1.000,00 454,55 413,22 225,39 204,90 124,18 112,89 102,63 637,78
Valor presente do Fluxo do Ano 0 Valor presente do Fluxo do Ano 1 Valor presente do Fluxo do Ano 2 Valor presente do Fluxo do Ano 3 Valor presente do Fluxo do Ano 4 Valor presente do Fluxo do Ano 5 Valor presente do Fluxo do Ano 6 Valor presente do Fluxo do Ano 7 VPL(10)
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
No exemplo acima, todos os projetos são viáveis, sendo que o Projeto C é, em comparação com os Projetos A e B, o que apresenta maior contribuição. Ou seja, se não fosse possível implementar todos os projetos, a prioridade seria o Projeto C. Como exercício, o leitor poderá verificar6 que se a taxa de juros relevante para empresa fosse 30% a.a., apenas o Projeto C seria aceito7. Observe que quanto maior for a taxa de juros, menor será o Valor Presente Líquido. Assim, à medida que se eleva a taxa de juros, projetos, antes viáveis, são descartados. Esta relação tem implicações macroeconômicas importantes. A elevação da taxa de juros da economia reduz os investimentos privados, ou seja, a demanda agregada. Nota-se que todos os fluxos de caixa do projeto são utilizados no cálculo do Valor Presente Líquido (o que não ocorre no cálculo do payback ). E, ao descontar (calcular o valor presente) dos fluxos de caixa, o Valor Presente Líquido considera o valor do dinheiro no tempo.
10.
Taxa Interna de Retorno - TIR
Conforme visto no item anterior, os projetos são aceitos quando o Valor Presente Líquido é positivo, o que ocorre com taxas de juros relativamente baixas. À medida que a taxa de juros se eleva, o VPL reduz-se, sendo que se torna negativo com taxas de juros elevadas. Pode supor, então, que há uma taxa de juros em que o VPL é igual a zero. Ou seja, uma taxa r* tal que: N
Ft
t =0
(1 + r *)t
VPL(r *) = ∑
=0
em que,
Ft = fluxo de caixa no período t N = número total de períodos do projeto r* = taxa de juros, na forma unitária, que torna o Valor Presente Líquido igual a zero. Esta taxa r* é, por definição, a Taxa Interna de Retorno. Para o cálculo da Taxa Interna de Retorno não há uma fórmula matemática que conduza a solução. Ë necessário realizar diversas tentativas e aproximações para descobrir a TIR. A alternativa para aqueles que não dispõem de tempo (e paciência) está na utilização de planilhas eletrônicas e calculadoras financeiras 8. Para os projetos apresentados na tabela 3, tem-se:
6. Roteiros para o cálculo utilizando planilha eletrônica e calculadora financeira estão apresentados no anexo ao final deste capítulo. 7. Para o Projeto A, tem-se VPL(30) = -4,61; para o Projeto B, tem-se VPL(30) = -486,78; e, para o Projeto C, tem-se VPL(30) = 49,24. 8. Vide roteiros para o cálculo utilizando planilha eletrônica e calculadora financeira apresentados no anexo ao final deste capítulo.
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Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Tabela 6 – Taxa Interna de Retorno dos Projetos A, B e C. Projeto A Taxa Interna de Retorno
26,4%
Projeto B
Projeto C
11,7%
32,6%
A decisão de aceitar ou descartar um projeto com base na Taxa Interna de Retorno comparando-a com a taxa de mercado. Considerando r m como sendo a taxa de juros de mercado, o critério será: Tabela 7 – Regras de decisão para Taxa Interna de Retorno. Perfil Investidor
Característica dos fluxos de caixa Critério Primeiro fluxo é negativo e todos demais fluxos são positivos Aceitar se TIR > rm Rejeitar se TIR < rm Tomador de Primeiro fluxo é positivo e todos demais fluxos são negativos Aceitar se TIR < rm empréstimo Rejeitar se TIR > rm
Alguns cuidados devem ser tomados ao utilizar a TIR. Primeiro, a TIR não representa a taxa de retorno sobre o capital inicialmente investido (F 0). A TIR representa a taxa de retorno do conjunto de entradas e saídas, de todos os fluxos de caixa do projeto. Adicionalmente, quando há alternância de sinais dos fluxos de caixa – isto é, períodos com fluxo de caixa positivo (negativo) intercalados com fluxos de caixa negativos (positivos) – pode haver mais de uma TIR. Por exemplo, considere um projeto que necessita de R$ 33 milhões de investimento inicial e que gera R$ 115 milhões de caixa no ano 1. No entanto, causa sérios impactos ambientais, que implicam no desembolso de R$ 100 milhões no ano 2 para recuperação da área e pagamentos de penalidades. Tal projeto apresenta dois valores de TIR: 66,67% e 81,82%. Para taxas de juros inferiores a 66,67% o VPL é negativo e para taxas de juros superiores a 81,82% o VPL também é negativo. No intervalo destas taxas, entre 66,67% e 81,82%, o VPL é positivo. Note como a tomada de decisão torna-se mais complexa com múltiplas TIR.
11. Projetos mutuamente exclusivos Muitas vezes nos deparamos com restrições que impedem o aceite de dois projetos ao mesmo tempo. As causas desta restrição podem ser financeira (não há recursos suficientes para soma dos projetos), espaço físico, entre outras. Neste caso, aceitar um projeto significa desistir do outro. A questão é: qual projeto deve ser escolhido? Conforme o indicador, VPL ou TIR, a resposta pode diferir! Neste caso, o mais eficiente é trabalhar com o fluxo incremental. Ao invés de analisar dois fluxos de caixa (um para cada projeto), é elaborado um novo fluxo, gerado pela diferença entre os fluxos, conforme ilustrado a seguir: Tabela 8 – Fluxo incremental
Projeto D Projeto E Fluxo incremental
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Ano 0 -100 -165 -65
Ano 1 50 80 30
Ano 2 50 80 30
Ano 3 50 80 30
TIR 23% 21% 18%
VPL(10) 24,34 33,95 9,61
Observe que o Projeto D apresenta maior TIR, mas o VPL, considerando taxa de juros de 10%, é menor do que no Projeto E. A análise do fluxo incremental (valores do Projeto E menos os valores do Projeto D) mostra VPL positivo e TIR superior à taxa considerada (10%), indicando que é interessante passar do Projeto D para o Projeto E (incremento). Assim, se os projetos forem mutuamente excludentes, o escolhido seria o Projeto E.
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
12. Análise de Sensibilidade Supondo a situação em que tendo sido avaliado um projeto e verificado que ele deve ser aceito, de acordo com os resultados obtidos nos cálculos do VPL e da TIR. Será que isto significa que o trabalho está encerrado e que se pode passar para avaliação de outros projetos? A resposta correta é: ainda não. Duas etapas importantes ainda devem ser realizadas. Primeiro, verificar (checar) se todos os dados e premissas do projeto estão realmente corretos. Em muitos casos, a estimativa é imprecisa por falhas nesta etapa. Este é o chamado risco de previsão, associado ao popular “ELSL” (“entra lixo, sai lixo”). Ou seja, erros nas premissas ou nos dados implica em resultados falsos. A confiabilidade de dados técnicos e preços são fundamentais para obtenção de boas estimativas e indicadores que permitam a correta tomada de decisão. A outra etapa refere-se a outros tipos de riscos. Os projetos do agronegócio possuem características particulares, principalmente por estar relacionado a atividades que se desenvolvem a céu aberto. Ocorrências de pragas e doenças, variáveis climáticas (como, por exemplo, temperatura e precipitação pluviométrica), entre outros eventos, implicam em dificuldades adicionais para estimativa das variáveis do projeto, tais como, entre outras, produção física nos próximos anos, níveis de preços. Assim, é importante que a análise incorpore os riscos. Tradicionalmente, o risco pode ser dimensionado através de estatísticas, tanto relacionadas a séries históricas quanto a projeções. As estatísticas mais utilizadas são média, desviopadrão, valores máximo e mínimo, destacando que é importante conhecer a distribuição (normal, Poisson, discreta, etc.) da variável. Para análise de sensibilidade, deve-se selecionar as variáveis que se apresentam como as principais fontes de risco do projeto. Em geral, estas variáveis são a produtividade e os preços dos produtos e dos insumos. O procedimento consiste em alterar, uma variável de cada vez9, substituindo-a, por exemplo, pelo seu valor médio acrescido ou deduzido de um desvio-padrão. A variação nos indicadores (VPL ou TIR) após esta alteração permitirá uma quantificação do risco do projeto. Adicionalmente, pode-se traçar diferentes cenários e verificar como os indicadores (VPL e TIR) se comportam em cada um deles. Um cenário pessimista pode ser elaborado considerando os custos pelo seu valor máximo e a produtividade e preços (faturamento) pelo seu valor mínimo. Um cenário otimista, por outro lado, pode ser elaborado considerando os custos pelo seu valor mínimo e a produtividade e preços (faturamento) pelo seu valor máximo. O cenário realista seria traçado utilizando os valores médios.
13.
Exemplo numérico
A empresa Omega Ltda está analisando dois projetos alternativos, mutuamente exclusivos. Esta empresa exige, no mínimo, retorno de 12% em seus investimentos e está enquadrada em alíquota do imposto de renda é 27%. O Projeto Alfa necessita de um investimento inicial de R$ 200.000, tem uma vida estimada de cinco anos e não possui valor residual. A depreciação do investimento inicial é linear, até zero (ou seja, não há valor residual). 9. Esta é a chamada condição ceteris paribus , ou seja, considerando todo resto constante.
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Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
O Projeto Beta necessita de um investimento inicial de R$ 250.000, tem uma vida estimada de cinco anos e não possui valor residual. A depreciação do investimento inicial é linear, até zero (ou seja, não há valor residual). Além disso, foram coletadas as seguintes informações: Quadro 2 – Dados do problema o t a e f j l o r A P
o t a e t j e o r B P
Vendas em unidades Preço unitário Custo variável unitário Custos fixos anuais Vendas em unidades Preço unitário Custo variável unitário Custos fixos anuais
Valor médio 6.000 80 60 50.000 5.000 100 70 40.000
Valor Mínimo Valor Máximo 5.500 6.500 75 85 58 62 45.000 55.000 4.800 5.200 90 110 67 73 35.000 45.000
Pode-se criar três cenários combinando os dados do quadro 2: (i) realista, considerando os valores médios; (ii) pessimista, considerando os valores mínimos de unidades vendidas e de preços unitários e os valores máximos de custos variáveis unitários e de custos fixos anuais; e, (iii) realista, considerando os valores máximos de unidades vendidas e de preços unitários e os valores mínimos de custos variáveis unitários e de custos fixos anuais. Quadro 3 – Cenários do problema. a f l A o t e j o r P
a t e B o t e j o r P
Vendas em unidades Preço unitário Receita Custo variável unitário Custo variável total Custos fixos anuais Vendas em unidades Preço unitário Receita Custo variável unitário Custo variável total Custos fixos anuais
Cenário Pessimista Cenário Realista Cenário Otimista 5.500 6.000 6.500 75 80 85 412.500 480.000 552.500 62 60 58 341.000 360.000 377.000 55.000 50.000 45.000 4.800 5.000 5.200 90 100 110 432.000 500.000 572.000 73 70 67 350.400 350.000 348.400 45.000 40.000 35.000
Inicialmente, calcula-se o lucro líquido e fluxo de caixa de cada período dos projetos, considerando cada um dos cenários. Em seguida, calcula-se o Valor Presente Líquido e a Taxa Interna de Retorno para cada fluxo: Tabela 9 – Projeto Alfa: cenário pessimista. Ano 0 Ano 1 Ano 2 Ano 3 Vendas 412.500 412.500 412.500 Custos variáveis -341.000 -341.000 -341.000 Custos fixos -55.000 -55.000 -55.000 Depreciação -40.000 -40.000 -40.000 Lucro Antes do IR -23.500 -23.500 -23.500 Imposto de Renda 0 0 0 Lucro Líquido -23.500 -23.500 -23.500 Fluxo de Caixa -200.000 16.500 16.500 16.500 VPL(12) -140.521 TIR -23,7% 70
Ano 4 412.500 -341.000 -55.000 -40.000 -23.500 0 -23.500 16.500
Ano 5 412.500 -341.000 -55.000 -40.000 -23.500 0 -23.500 16.500
Tabela 10 – Projeto Alfa: cenário realista. Ano 0 Vendas Custos variáveis Custos fixos Depreciação Lucro Antes do IR Imposto de Renda Lucro Líquido Fluxo de Caixa VPL(12) TIR
Ano 1
Ano 2
Ano 3
480.000 480.000 480.000 -360.000 -360.000 -360.000 -50.000 -50.000 -50.000 -40.000 -40.000 -40.000 30.000 30.000 30.000 -8.100 -8.100 -8.100 21.900 21.900 21.900 -200.000 61.900 61.900 61.900 23.136 16,6%
Ano 4
Ano 5
480.000 480.000 -360.000 -360.000 -50.000 -50.000 -40.000 -40.000 30.000 30.000 -8.100 -8.100 21.900 21.900 61.900 61.900
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Tabela 11 – Projeto Alfa: cenário otimista. Ano 0
Vendas Custos variáveis Custos fixos Depreciação Lucro Antes do IR Imposto de Renda Lucro Líquido Fluxo de Caixa VPL(12) TIR
Ano 1 552.500 -377.000 -45.000 -40.000 90.500 -24.435 66.065 -200.000 106.065 182.341 44,7%
Ano 2 Ano 3 552.500 552.500 -377.000 -377.000 -45.000 -45.000 -40.000 -40.000 90.500 90.500 -24.435 -24.435 66.065 66.065 106.065 106.065
Ano 4 552.500 -377.000 -45.000 -40.000 90.500 -24.435 66.065 106.065
Ano 5 552.500 -377.000 -45.000 -40.000 90.500 -24.435 66.065 106.065
Ano 4
Ano 5
Tabela 12 – Projeto Beta: cenário pessimista. Ano 0 Vendas Custos variáveis Custos fixos Depreciação Lucro Antes do IR Imposto de Renda Lucro Líquido Fluxo de Caixa VPL(12) TIR
Ano 1
432.000 -350.400 -45.000 -50.000 -13.400 0 -13.400 -250.000 36.600 -118.065 -9,6%
Ano 2
Ano 3
432.000 432.000 -350.400 -350.400 -45.000 -45.000 -50.000 -50.000 -13.400 -13.400 0 0 -13.400 -13.400 36.600 36.600
432.000 432.000 -350.400 -350.400 -45.000 -45.000 -50.000 -50.000 -13.400 13.400 0 0 -13.400 -13.400 36.600 36.600
Tabela 13 – Projeto Beta: cenário realista. Ano 0 Vendas Custos variáveis Custos fixos Depreciação Lucro Antes do IR Imposto de Renda Lucro Líquido Fluxo de Caixa VPL(12) TIR
Ano 1 Ano 2 Ano 3 500.000 500.000 500.000 -350.000 -350.000 -350.000 -40.000 -40.000 -40.000 -50.000 -50.000 -50.000 60.000 60.000 60.000 -16.200 -16.200 -16.200 43.800 43.800 43.800 -250.000 93.800 93.800 93.800 88.128 25,4%
Ano 4 500.000 -350.000 -40.000 -50.000 60.000 -16.200 43.800 93.800
Ano 5 500.000 -350.000 -40.000 -50.000 60.000 -16.200 43.800 93.800
71
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Tabela 14 – Projeto Beta: cenário otimista. Ano 0 Vendas Custos variáveis Custos fixos Depreciação Lucro Antes do IR Imposto de Renda Lucro Líquido Fluxo de Caixa VPL(12) 294.963 TIR 53,3%
Ano 1
Ano 2
Ano 3
572.000 572.000 572.000 -348.400 -348.400 -348.400 -35.000 -35.000 -35.000 -50.000 -50.000 -50.000 138.600 138.600 138.600 -37.422 -37.422 -37.422 101.178 101.178 101.178 -250.000 151.178 151.178 151.178
Ano 4
Ano 5
572.000 -348.400 -35.000 -50.000 138.600 -37.422 101.178 151.178
572.000 -348.400 -35.000 -50.000 138.600 -37.422 101.178 151.178
Resumindo os resultados obtidos (tabela 15), observa-se que o Projeto Beta é o mais interessante, inclusive com menor perda no cenário pessimista. Tabela 15 – Resumo dos resultados dos projetos Alfa e Beta. Cenário Pessimista Projeto Alfa VPL(12) TIR Projeto Beta VPL(12) TIR
14.
Cenário Realista
Cenário Otimista
-140.521 -23,7%
23.136 16,6%
182.341 44,7%
-118.065 -9,6%
88.128 25,4%
294.963
53,3%
Simulação de Monte Carlo10
A simulação de Monte Carlo é uma metodologia que possibilita a simulação de variáveis selecionadas do projeto, levando-se em consideração as distribuições de probabilidade destas variáveis assumirem valores diferentes ao longo da via útil do projeto. Grosso modo, a seqüência de cálculo deste método é a seguinte: identificação da distribuição da probabilidade de cada uma das variáveis relevantes do fluxo de caixa do projeto; seleção, ao acaso, de um valor para cada variável simulada, a partir de sua distribuição de probabilidade; cálculo do indicador de rentabilidade (por exemplo, TIR) do projeto hipotético construído com a utilização das variáveis obtidas no processo de simulação acima; e repetição do processo até a obtenção da confirmação adequada da distribuição da freqüência do indicador da escolha, ou até obter uma idéia aproximada do formato da distribuição. A partir desta distribuição torna-se possível verificar a probabilidade de sucesso ou fracasso do projeto. A qualidade das estimativas das distribuições de probabilidade dos indicadores econômicos determina uma melhor (ou pior) simulação dos possíveis fluxos de caixas. Por exemplo, um projeto possui um investimento inicial ( I ) de 10.000, com vida útil de 10
anos e seu fluxo de caixa é representado pela função: FC = p ⋅ y − w ⋅ x , onde FC é o Fluxo de caixa; p é o preço do produto; y é a quantidade do produto; w é o preço do insumo, e; x 10. Este item contou com a colaboração de Daniel Y. Sonoda doutorando - ESALQ/USP.
72
é a quantidade do insumo. Considere que a planta foi projetada para uma produção anual de 1.000 unidades de produto e, para tanto, consumo de 2.000 unidades de insumo. Seguindo os mesmos passos da metodologia acima: a) As variáveis mais relevantes para o processo de simulação para este caso são os preços do insumo e produto. Através de uma pesquisa de mercado descobriu-se que a distribuição de probabilidade do preço do produto ( p ) e do preço do insumo ( w ) variam segundo a tabela abaixo:
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Tabela 16 – Preços, e respectivas probabilidades de ocorrência, do produto e do insumo. p
13 12 11 10 9 8 7 6 5
freq (p ) w 0,025 5,0 0,050 4,5 0,075 4,0 0,150 3,5 0,300 3,0 0,200 2,5 0,125 2,0 0,050 1,5 0,025 1,0
freq (w ) 0,025 0,050 0,125 0,200 0,300 0,150 0,075 0,050 0,025
Observa-se que o preço do produto mais comum é 9 com uma freqüência de 0,3 e o preço do insumo mais comum é 3 também com freqüência 0,3. Estes seriam os preços utilizados para o cálculo do VPL e TIR para uma situação genérica. Observe que a soma de cada uma das freqüências é 1. b) A função FC = p . y – w . x foi repetida 1.000 vezes, variando-se apenas p e w aleatoriamente segundo a distribuição de probabilidade acima; c) A cada 10 anos foi calculado o VPL (taxa de desconto de 10%) e a TIR, sempre considerando no ano 0, I =-10.000. Foram obtidos 100 valores de VPL e TIR e os resultados obtidos foram: 30 25 20 %15
10 5 0 < 0
0 - 2 5 0 0
2 5 0 0 - 5 0 0 0
5 0 0 0 - 7 5 0 0
7 5 0 0 - 1 0 0 0 0
1 0 0 0 0 - 1 2 5 0 0
> 1 2 5 0 0
Figura 2 – Histograma dos valores de VPL obtidos na simulação. 73
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
A distribuição do VPL indica que existe uma probabilidade de 8% do projeto não ser economicamente viável, 26% de probabilidade do projeto obter um VPL entre 5.000 e 7.500 e 3% de probabilidade de se alcançar um VPL superior a 12.500.
45 40 35 30 25
%
20 15 10 5 0 < 0
0 - 1 0 %
1 0 - 2 0 %
2 0 - 3 0 %
3 0 - 4 0 %
> 4 0 %
Figura 3 – Histograma dos valores de TIR obtidos na simulação. A distribuição da TIR indica que existe uma probabilidade de 1% do projeto obter TIR negativa, 42% de probabilidade do projeto obter uma TIR entre 20% e 30% e 5% de probabilidade de se alcançar uma TIR superior a 40%. d) Por se tratar de um exemplo, não foram feitas mais repetições, porém este mesmo modelo poderia ser replicado 5.000 ou 10.000 para se obter uma distribuição de freqüência de VPL e TIR mais acurada.
15. Árvore de decisão A árvore de decisão é uma metodologia gráfica que permite verificar as conseqüências de decisões relacionadas a eventos aleatórios relacionados. Essa simulação é também muito utilizada em hedge. Considerando o exemplo numérico anteriormente apresentado (Projetos Alfa e Beta), podemos acrescentar as seguintes informações (dados): Tabela 17 – Probabilidade de ocorrência dos cenários Projeto Alfa Projeto Beta
Cenário Pessimista 5% 15%
Cenário Realista Cenário Otimista 80% 15% 75% 10%
A árvore de decisão pode ser utilizada para avaliar a vantagem de passar do Projeto Alfa para o Projeto Beta, sendo que o critério de decisão é o Valor Presente Líquido. Considere que adotar o Projeto Alfa é a alternativa 1 e adotar o Projeto Beta é a alternativa 2. A partir das informações das tabelas 15 e 17, tem-se:
74
Tabela 18 – Valor Presente Líquido dos projetos Alfa e Beta com diferentes cenários e respectivas probabilidades. Cenário Pessimista Cenário Realista Cenário Otimista Projeto Alfa VPL(12) Projeto Beta VPL(12)
-140.521 ´ 5% = -7.026 23.136´ 80% = 18.509 182.341´ 15% = 27.351 -118.065´ 15% = -17.710 88.128´ 75% = 66.096 294.963´ 10% = 29.496
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
A melhor alternativa é aquela cuja soma dos Valores Presentes Líquidos nos diferentes cenários é maior, que é o caso da alternativa 2. A árvore de decisão correspondente a este problema é apresentada na Figura 4.
Figura 4 – Árvore de decisão.
Por este critério, o investimento no Projeto Beta é a melhor alternativa, pois a soma dos Valores Presentes Líquidos, igual a R$ 77.883, é maior do que a soma dos Valores Presentes Líquidos do Projeto Alfa (R$ 38.834).
16. Considerações Finais Para a adequada mensuração do resultado financeiro de projetos, ou mesmo de empresas, dois aspetos se destacam: o valor do dinheiro no tempo e os cuidados na orçamentação, especialmente quanto aos custos de oportunidades envolvidos. Medidas como o Valor Presente Líquido e a Taxa Interna de Retorno podem apresentar indicações conflitantes e, em alguns casos, respostas múltiplas. Assim, a análise deve pautar-se na cautela e, sempre que possível, considerar as incertezas envolvidas nos projetos, utilizando ferramentas como a simulação de Monte Carlo e Árvore de Decisão.
17. Bibliografia ASSAF NETO, A. Finanças corporativas e valor. São Paulo: Atlas, 2003. 609p. BOEHLJE, M.D; EIDMAN, V.R. Farm management. New York: Wiley, 1984. 806p. MARION, J.C. Contabilidade empresarial. São Paulo: Atlas, 2003. 502p. NORONHA, J.F. Orçamentos e fluxo de caixa. In: Peres, F.C.; Canziani, J.R.; Guimarães, V.A.; Torres, P.L. (Org.) O programa empreendedor rural. Curitiba: SENAR-PR, 2003. p.327-359. NORONHA, J.F.; DUARTE, L.P. Avaliação de projetos de investimento em empresa agropecuária. In: Kfouri, A.C. (Org.) Administração rural. São Paulo: Paulicéia, 1995. p.213-251. SANDRONI, P. Novíssimo dicionário de economia.São Paulo: Best Seller, 2001. 75
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
Anexo Cálculo do Valor Presente Líquido utilizando o aplicativo Microsoft Excel: • Clicando na barra de ferramentas superior na palavra “inserir” e, na seqüência, em “função”, abrirá uma janela onde deverá ser selecionada a função “VPL” dentro da categoria “financeira”. Surgirá, então, o seguinte quadro:
• Basta digitar a taxa de juros (ou indicar a célula onde está digitada), na forma unitária,
e os valores futuros (a partir no ano 1, inclusive) nos respectivos campos. Atenção para não incluir o valor do fluxo no momento 0 (que, por definição, já é um valor presente). A seguir, deve-se somar o valor do fluxo no momento 0 ao resultado calculado pela função do Excel. • Alternativamente, pode-se digitar diretamente a fórmula: =VPL(r;F 1:FN)+F0. Cálculo do Valor Presente Líquido utilizando a calculadora HP 12C: • Inserir o valor do fluxo de caixa no momento 0 • Clicar as teclas “g” e “CFo”. • Inserir o valor do fluxo de caixa no momento 1 • Clicar as teclas “g” e “CFj”. • Repetir o procedimento C e D para todos os fluxos, na seqüência cronológica, até o momento N. • Inserir a taxa de juros, em pontos percentuais. • Clicar a tecla “i”. • Clicar as teclas “f” e “NPV”. Cálculo da Taxa Interna de Retorno utilizando o aplicativo Microsoft Excel: • Clicando na barra de ferramentas superior na palavra “inserir” e, na seqüência, em “função”, abrirá uma janela onde deverá ser selecionada a função “TIR” dentro da categoria “financeira”. Surgirá, então, o seguinte quadro: 76
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
• Basta digitar os valores (inclusive o valor do fluxo no momento 0) no respectivo campo. • Alternativamente, pode-se digitar diretamente a fórmula: =TIR(F0:FN).
Cálculo da Taxa Interna de Retorno utilizando a calculadora HP 12C: • Inserir o valor do fluxo de caixa no momento 0 • Clicar as teclas “g” e “CFo”. • Inserir o valor do fluxo de caixa no momento 1 • Clicar as teclas “g” e “CFj”. • Repetir o procedimento C e D para todos os fluxos, na seqüência cronológica, até o momento N. •
Clicar as teclas “f” e “IRR”.
Questões de Revisão 1) a) b) c) d) e)
Quais são os cinco capitais envolvidos nos projetos? próprio, bancário, governamental, familiar e internacional. humano, social, natural, físico e financeiro. fixo, variável, marginal, total e médio. divisível, indivisível, incremental, redutor e adicional. nenhuma das alternativas anteriores.
Para responder as questões 2 a 4, leia o problema apresentado a seguir. A empresa Vertical Ltda divulgou seu demonstrativo de resultado referente ao ano anterior. Ela apresentou os seguintes números: renda bruta = R$ 1.400; deduções de vendas = R$ 200; custo dos produtos vendidos = R$ 800; despesas operacionais = R$ 140; e, R$ 20 em despesa não operacionais.
2) a) b) c) d) e)
A Margem de Lucro Bruto da Vertical S.A. é de: 33,33%. 100,00%. 50,00%. 28,57%. nenhuma das alternativas anteriores.
3) a) b) c) d) e)
A Margem de Lucro Operacional da Vertical S.A. é de: 18,57%. 65,00%. 32,50%. 21,67%. nenhuma das alternativas anteriores. 77
Capítulo 3 Custos de Produção, Orçamentação e Medidas de Resultado Financeiro
4) a) b) c) d) e)
A Margem de Lucro Líquido da Vertical S.A. é de: 3,33%. 10,00%. 2,86%. 5,00%. nenhuma das alternativas anteriores.
5) a) b) c)
A árvore de decisão permite: verificar a estrutura organizacional da alta gerência. gerar números aleatórios para sorteio das alternativas potenciais. verificar as conseqüências de decisões.
6) Os custos e despesas podem ser classificados em dois grupos: investimentos e gastos operacionais. Qual dos exemplos destes dois grupos é falso? a) terra e mão-de-obra, respectivamente. b) pintos de 1 dia e defensivos, respectivamente. c) máquinas e rações, respectivamente. d) mudas de café, sementes e fertilizantes, respectivamente. e) construções e vacinas, respectivamente. 7) Um trator de 75 CV que vale R$ 30.000,00 no mercado e que possui uma vida útil de 10 anos, valerá R$ 3.000,00 ao final de sua utilização (valor residual). Esse trator consome, por ano, R$ 1.200,00 em óleo diesel, R$ 300,00 de óleo lubrificante e graxa, R$ 550,00 em peças de reposição e R$ 350,00 de gastos na oficina. Considerando que o trator seja utilizado em 216 horas durante todo ano, qual é o custo da hora máquina de operação desse trator? a) R$ 2,34. b) R$ 14,65. c) R$ 20,88. d) R$ 28,71. e) nenhuma das alternativas anteriores. 8) Custos de oportunidade: a) representam os benefícios que estamos abrindo mão em função da utilização de um fator de produção e devem ser considerados nas análises de investimentos. b) representam os benefícios que estamos abrindo mão em função da utilização de um fator de produção e não devem ser considerados nas análises de investimentos. c) representam os custos diretos que estamos incorrendo na utilização de um fator de produção e devem ser considerados nas análises de investimentos. d) representam os custos diretos que estamos incorrendo na utilização de um fator de produção e não devem ser considerados nas análises de investimentos. e) nenhuma das alternativas anteriores.
9) a) b) c) d) e)
78
Considere o fluxo abaixo para responder as questões 12 e 13: Ano 0
Ano 1
Ano 2
Ano 3
-1.000
200
700
500
O Payback é de: 1 ano 2 anos 2 anos e 4 meses 2 anos e 3 meses 3 anos
10)O Valor Presente Líquido, considerando taxa de juros de 10%, e a Taxa Interna de Retorno são, respectivamente: a) R$ 135,99 e 10,0% b) R$ 118,55 e 16,7% c) R$ 125,00 e 13,5% d) R$ 118,55 e 10,0% e) R$ 135,99 e 16,7% ) e - 0 1 ; ) d - 9 ; ) a - 8 ; ) e - 7 ; ) b - 6 ; ) c - 5 ; ) a - 4 ) d 3 ; ) a - 2 ) b - 1 : o t i r a b a G
CAPÍTULO
4
ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DOS MERCADOS FUTUROS AGROPECUÁRIOS Pedro Valentim Marques
Professor Titular do Departamento de Economia, Administração e Sociologia - ESALQ/USP
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Capítulo 4 - Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários Pretende-se mostrar o funcionamento dos mercados futuros e de opções agropecuárias e estratégias que possam ser utilizadas para administração de riscos de preços. Espera-se que ao final da leitura os alunos conheçam de forma teórica e prática e funcionamento dos mercados futuros e de opções agropecuárias; conheçam as principais bolsas de futuros agropecuárias de interesse do agronegócio brasileiro; conheçam as principais ferramentas de análise de informações de mercado; possam discutir estratégias atuais e potenciais com futuros e outros derivativos.
1. Riscos de mercado, mercados futuros e risco de câmbio A agropecuária é uma atividade produtiva que apresenta algumas características econômicas diferentes comparativamente aos setores industrial e comercial que dizem respeito, principalmente, à dependência dos fatores climáticos, ao elevado tempo em que algumas culturas e/ou criações permanecem no campo sem apresentar retorno ao investimento realizado, a dificuldade da comercialização devido à elevada perecibilidade dos produtos, bem como a volatilidade 1 e dúvida a respeito dos preços que serão recebidos. Estes fatores fazem desta atividade em certos momentos, um verdadeiro jogo de incertezas de elevado risco financeiro. Os mercados futuros de commodities agropecuárias são uma forma de propiciar um certo “seguro”, em meio a tanto risco, para o produtor rural, para a indústria agroprocessadora e para todos aqueles que detêm o produto ou contratos sobre o mesmo, possibilitando uma “garantia” quanto à queda ou a elevação de preços. Mercado futuro é um mercado onde são transacionados contratos de produtos agropecuários específicos com um preço determinado para uma data futura. Um contrato futuro é um acordo entre comprador e vendedor sobre realizar um negócio numa data futura e é bom frisar-se que, numa operação em mercados futuros, não se recebe ou paga nenhum valor adiantadamente, a não ser os ajustes diários, que são uma fração muito pequena do valor total do contrato. Para seu bom funcionamento, os mercados de futuros devem atender a alguns requisitos, destacando-se: Tanto a produção como o consumo de cada commodity devem estar distribuídos entre um grande número de compradores e vendedores, garantindo que ninguém, individualmente, pode ditar os preços praticados no mercado. Nos mercados futuros negociam-se, basicamente, incerteza com relações ao futuro. Se esta incerteza é diminuída ou eliminada pela ação do governo, ou se o mesmo intervém periodicamente, desaparecem as condições favoráveis ao bom desempenho dos mercados futuros que deixam de oscilações emdecorrências da oferta e demanda do mercado. Tabelamentos e outras formas de intervenção nos preços retiram o aspecto de volatilidade dos mercados agropecuários, não deixando lugar para as variações que são o incentivo para proteção e risco das negociações futuras na bolsa. Quando um produto é de difícil padronização a negociação torna-se inviável porque os lotes negociados precisam ser sempre previamente inspecionados e a avaliação da adequação do produto ao que foi negociado envolverá tempo e disputas, 1. A volatilidade é a medida da oscilação dos preços futuros com o passar do tempo. Ela é uma medida de risco; quanto maior a incerteza sobre o comportamento dos preços futuros do ativo objeto da negociação, maior o risco. Em geral, a volatilidade é medida estatisticamente como o desvio padrão de uma série histórica expressa em bases percentuais.
80
incorrendo-se em custos de transação que encarecerão o contrato e inviabilizarão sua negociação. Finalmente, a evolução dos contratos futuros é uma conseqüência da organização e aprimoramento dos mercados físicos. Enquanto neste perdurarem questões de classificação, padronização, falta de concorrência e de interesse na divulgação dos preços, os mercados futuros agropecuários não se desenvolverão.
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Um contrato futuro é uma obrigação, legalmente exigível, de entregar ou receber uma determinada quantidade de uma mercadoria, de qualidade preestabelecida, pelo preço ajustado no pregão. Desde sua origem no século XIX, a negociação com futuros tem sofrido alterações no que diz respeito aos objetivos dos agentes envolvidos. A diferença fundamental é que no início, a principal utilização do mercado era para viabilizar a entrega da mercadoria, sendo que hoje, menos de 2% dos negócios são concretizados com a entrega física da mercadoria. Por ser um termo extensivamente usado neste capítulo, define-se uma commodity como um produto passível de padronização no que diz respeito à qualidade, quantidade, peso, etc. Utiliza-se muito hoje em dia o termo derivativo como sinônimo de mercado futuro. Isto acontece porque os preços nos mercados futuros, na maior parte das vezes, dependem ou derivam dos preços vigentes nos mercados físicos. Os contratos futuros são negociados nas Bolsas de Futuros as quais são entidades privadas, geralmente sem fins lucrativos, constituídas pelos próprios corretores para realizarem negócios futuros. É importante dizer que eles são negociados ou a viva voz ou de forma eletrônica num pregão, que é um local organizado e sujeito às regras da Bolsa. A Bolsa apenas organiza e fornece o local de negociação e suas regras, não influenciando, de forma nenhuma, no preço ou em acordos entre compradores e vendedores. As operações em mercados futuros podem ser basicamente de hedge ou de especulação. Na operação de hedge , os envolvidos procuram travar preço de venda ou compra de mercadoria em operações inversas às realizadas nos mercados físicos. Assim, por exemplo, um produtor que comprou insumos, investiu na produção (está comprado), vai procurar realizar uma operação de venda futura (ou hedge de venda) para garantir o preço da mercadoria. Já um frigorífico que assinou um contrato de exportação para o futuro mas ainda não adquiriu a matéria-prima (está vendido), vai realizar uma operação de compra futura ( hedge de compra), para garantir o preço da matéria-prima.
2. Contratos Futuros Agropecuários no Brasil A Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), em São Paulo (SP), é a única Bolsa onde são realizados negócios com futuros agropecuários no Brasil e por esta razão, nos deteremos mais detalhadamente nela. A história da BM&F tem origem na Bolsa de Mercadorias de São Paulo (BMSP), primeira bolsa de commodities agropecuárias brasileira, fundada em 1917. Embora no início houvesse uma preocupação com os aspectos de produção, classificação, etc., no ano seguinte ela iniciou operações futuras de algodão. Nas décadas de 1970 e 1980, a BMSP lançou vários contratos agropecuários para negociação. Em 1986, constitui-se a Bolsa Mercantil & de Futuros (BM&F) que em maio de 1991 uniu-se à Bolsa de Mercadorias de São Paulo, dando origem à Bolsa de Mercadorias & Futuros (também com a mesma sigla BM&F). Em volume de contratos negociados, a BM&F classifica-se atualmente entre as dez maiores do mundo embora os contratos agropecuários participem atualmente com menos de 1,0% do total de contratos negociados. Os contratos agropecuários atualmente negociados na BM&F, suas medidas e datas de vencimento são mostrados na tabela 1. 81
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Tabela 1. Contratos futuros atualmente negociados na BM&F, novembro de 2006 Mercadorias/abreviaturas
Café Arábica (ICF)
Tamanho do Contrato
Cotação
Meses de vencimento
100 sc de 60 kg cada 250 sc de 60 kg
US$/sc
3, 5, 7, 9, 12
US$/sc
1, 3, 5, 7, 9, 11
R$/@ R$/animal
Todos os meses 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10
Açúcar Cristal (ISU)
330@ (@ de 15 kg) 33 animais (bezerro desmamado, macho, nelore ou anelorado, mínimo 170 kg) 270 sc de 50 kg
US$/sc
2, 4, 7, 9, 11
Álcool Anidro (ALA)
30 m3
R$/m3
450 sc de 60 kg
R$/sc
Todos os meses 1, 3, 5, 7, 8, 9, 11 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 11
Café Conillon (CNL) Boi Gordo (BGI) Bezerro (BZE)
Milho (CNI)
Soja em grão a granel 450 sc de 60 kg US$/tonelada (SOJ) (27 ton métrica métricas) Algodão (COT) 12,5 ton Cents de métricas = dólar por 27.557,50 libra peso libras-peso
3, 5, 7, 10, 12
Local de entrega
Município de São Paulo (SP) Região metropolitana de Vitória (ES) Araçatuba (SP) Campo Grande, Três Lagoas, Dourados e Coxim (MS) Estabelecimentos depositários credenciados no Estado de São Paulo Paulínia (SP) Campinas (SP) Porto de Paranaguá (PR) Estabelecimentos depositários localizados em São Paulo (SP)
Fonte: Site da BM&F, setembro de 2006. Os contratos mini não foram incluídos nesta lista.
No site da BM&F (www.bmf.com.br), podem ser encontrados os contratos completos de todas as commodities lá negociadas, sendo que nos deteremos apenas em alguns detalhes do contrato de soja: 1. Objeto de negociação: soja brasileira, com até 14% de umidade, máximo de 2% de impurezas, máximo de 8% de grãos avariados. 2. Cotação: US$ dólares americanos por saca de 60 kg. 5. Unidade de negociação: 450 sacas de 60 kg por contrato. 6. Meses de vencimento: março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro e novembro Os contratos vencem no nono dia útil anterior ao primeiro dia do mês de vencimento. Detalhes como data exata do vencimento do contrato, horário, etc., podem ser encontrados no tópico BOLETIM, no site da BM&F. 10. Day-trade : operações de compra e venda no mesmo dia. 11. Ajuste diário: ao contrário dos contratos a termo, onde os ajustes financeiros são efetuados ao final do contrato, nos contratos futuros agropecuários atuais, os ajustes são feitos diariamente de acordo com as fórmulas (1) e (2) do contrato:
82
AD = (PAt-PO) x 450 x n
(1)
AD = (PAt-PAt-1) x 450 x n
(2)
Onde n diz respeito ao número de contratos negociados, PA t é o preço de ajuste do dia, PO é o preço da operação (compra ou venda futura em t inicial e inversão da posição em tfinal) e PAt-1 o preço de ajuste do dia anterior. Estas fórmulas são usadas para operações de compra e venda e devemos lembrar que se a operação for de venda, o sinal da função será negativo; se for operação de compra, o sinal será positivo. 2
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
12. Ponto de entrega: quando se negociam contratos numa bolsa, os preços referemse a um determinado ponto, chamado local de entrega. No caso da soja BM&F, este ponto de entrega é o Porto de Paranaguá, no Paraná. 15. Hedgers: a bolsa considera hedgers produtores rurais, cooperativas, bem como fornecedores de insumos. 16. Margem de garantia: para garantir as operações, a bolsa exige que os participantes depositem um valor que será utilizado caso uma das partes não cumpra suas obrigações. Se tudo correr bem, ao final da operação este valor é devolvido integralmente. Aceita-se como margem: dinheiro, cotas de fundos de investimentos, etc. As Margens de Garantia podem variar de acordo com a volatilidade do mercado, isto é, quanto mais o mercado estiver oscilando, maiores podem ser as margens necessárias para manter a segurança do sistema e garantir todos os recebimentos. Por exemplo, no dia 21 de novembro de 2006 a Margem de Garantia de uma operação de hedge no contrato futuro de soja com vencimento em maio de 2007 era de R$ 436,48 por contrato. 17. Os custos de se operar variam de bolsa para bolsa, sendo que no caso específico da BMF existem três componentes de custos, pagos no início e no fim da operação por ambos, vendedores e compradores, os quais no total representam cerca de 0,64% do valor total da operação (preço médio x volume do contrato): • Taxa Operacional Básica (TOB) ou comissão do corretor, é calculada por 0,3% do
preço de ajuste do dia anterior do segundo vencimento em aberto. Trocando em miúdos, este é o valor pago para seu corretor assumir as funções de orientador e negociar na bolsa. • Emolumentos: 6,32% da TOB são as taxas recolhidas para pagar a estrutura da
bolsa. • Taxa de Registro, calculada por 20% dos Emolumentos, são as taxas recolhidas
para o governo.
3. Funcionamento básico dos mercados futuros 3.1
Agentes envolvidos nas operações
Nos mercados futuros de commodities agropecuárias existe uma série de agentes atuantes como os compradores, os vendedores, os especuladores, os corretores e os operadores. De forma didática, estes agentes estão mostrados na Figura 1. Os vendedores (1) geralmente são aqueles que têm o produto físico, como por exemplo, os produtores rurais e suas cooperativas. Como eles estão procurando um seguro contra uma eventual baixa de preços em uma data predeterminada no futuro (data da comercialização da safra agrícola) são chamados de hedgers . Estes hedger s entram no mercado vendendo contratos futuros referentes a uma quantidade de produtos agropecuários e mantêm uma posição de mercado chamada de posição vendida (S hort ).
2. O mecanismo de ajuste diário permite que as posições sejam ajustadas diariamente e não apenas no vencimento quando grandes diferenças poderiam colocar o sistema em risco devido à possibilidade de inadimplência. O ajuste diário sempre é liquidado em dinheiro no dia útil seguinte.
83
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Os compradores (2) geralmente são aqueles que necessitarão do produto físico em algum momento no futuro, como por exemplo, exportadoras. Estas, como estão procurando uma proteção ou seguro contra uma eventual alta de preços em uma data predeterminada no futuro (data de vencimento dos contratos de entrega e/ou exportação) também são chamados de hedgers . Estes hedger s entram no mercado comprando contratos futuros referentes a uma quantidade de produtos agropecuários e mantêm uma posição de mercado chamada de posição comprada ( Long ). Para efetuar uma operação no mercado futuro de commodities agropecuárias, tanto o vendedor, como o comprador, devem operacionalizar as suas intenções através de uma Corretora de Mercadorias (4) que seja membro da Bolsa de Futuros. Estas Corretoras são credenciadas a participar do Pregão da Bolsa através de seus operadores de pregão e além de executar as ordens de seus clientes acompanham também as suas contas e a sua posição junto à Câmara de Compensação da Bolsa ( Clearing House) . Operadores de pregão são aqueles que ficam dentro do pregão (3) e executam as ordens de compra e venda que vêm das Corretoras por ordem dos seus clientes. Neste mercado ainda existe um agente de fundamental importância estratégica para a liquidez dos negócios, que é o especulador (5). Este não deve ser entendido no sentido pejorativo, como “explorador” nas transações comerciais; na realidade, ele está interessado em auferir ganhos com a compra ou venda de contratos, não se interessando diretamente pela mercadoria física. O especulador tem o papel importante de equalizar oferta e demanda pois nem sempre o volume de hedger s procurando proteção contra queda de preços igual ao volume de hedger s procurando proteção contra alta de preços. Eles são atraídos pela oportunidade de realizar lucros se conseguem antecipar acertadamente a velocidade e direção das mudanças de preços.
Figura 1. Estrutura de negociação nos mercados futuros.
É interessante salientar que todas as transações de futuros precisam ser realizadas em pregão, obedecendo a regras rígidas de controle, transparência e ajustes financeiros. A Bolsa não participa de forma alguma no processo de formação de preços. Ela não compra ou vende e não tem nenhum interesse em que preços fiquem altos ou baixos em momento nenhum do pregão. O papel da Bolsa é apenas o de fornecer um local, denominado pregão, onde existem facilidades para a efetivação de negócios. A renda da Bolsa vem da venda de licenças para operação, taxas operacionais, etc.
3.2
Operando soja na BM&F
Dados retroativos extraídos do site da BM&F referentes ao dia 04/10/2005 (www.bmf.com.br) são apresentados na tabela 2. (Foram mantidos os formatos originais do site da BM&F para facilitar consultas posteriores) 84
Tabela 2. Resumo Estatístico Sistema Pregão, BM&F, contrato soja, 04/10/2005 Volume –
Dados VENCTO (1)
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
CONTR. ABERT.(1) (2)
CONTR. FECH.(2) (3)
NÚM. NEGOC. (4)
CONTR. NEGOC. (5)
VOL. (6)
NOV5
662
631
3
35
488.667
MAR6
409
419
7
43
565.217
ABR6
291
295
2
4
52.300
MAI6
936
951
3
16
209.509
JUN6
270
270
0
0
0
JUL6
40
15
1
25
331.002
AGO6
5
5
0
0
0
SET6
5
30
1
25
333.539
Fonte: Site da BM&F (www.bmf.com.br) em 21/11/06.
A primeira coluna mostra os meses para os quais existem vencimentos em aberto; assim, por exemplo, mai6 significa contrato futuro com vencimento em maio de 2006. A segunda coluna mostra o número de contratos em aberto na abertura do pregão que era 936 para maio enquanto a terceira mostra o número de contratos em aberto no fechamento do pregão daquele mesmo dia, 951 contratos, ou seja, houve um aumento de 16 contratos em aberto durante aquele dia (coluna 5). A quarta coluna mostra que estes 16 contratos foram negociados em 3 negócios.3 Finalmente, a sexta e última coluna mostra quanto representavam os contratos negociados em reais. Contratos em aberto são contratos que foram negociados (vendidos e comprados) e não foram ainda encerrados. O número de contratos em aberto é um indicador da liquidez do mercado ou da capacidade de se entrar e/ou sair do mesmo sem abalar significativamente os preços correntes. Nos EUA, a literatura considera que um mercado está líquido quando existem ao redor de 5.000 contratos em aberto e são negociados ao redor de 1.000 contratos diariamente. Tabela 3. Preços praticados no mercado futuro de soja BM&F em 04/10/2005. PREÇO ABERT. (1)
ÚLT. ÚLT. PREÇO PREÇO PREÇO ÚLT. AJUSTE VAR. OF. OF. MÍN. MÁX. MÉD. PREÇO PTOS. COMPRA (6) VENDA (2) (3) (4) (5) (7) (8) (9)
Nov 05 13,80
13,75
13,80
13,76
13,75
13,75
0,05-
13,75
13,80
Mar 06 12,95
12,90
13,05
12,96
13,05
13,05
0,20-
0,00
0,00
Abr 06 12,85
12,85
13,00
12,89
13,00
13,00
0,00
0,00
0,00
Mai 06 12,90
12,90
13,00
12,91
13,00
12,95
0,05-
0,00
12,95
Jun 06 0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
13,00
0,00
0,00
13,00
Jul 06 13,05
13,05
13,05
13,05
13,05
12,95
0,10-
12,75
12,95
Ag 06 0,00
0,00
0,00
0,00
0,00
12,89
0,11-
0,00
0,00
Set 06 13,15
13,15
13,15
13,15
13,15
13,03
0,07-
0,00
0,00
Fonte: site da BM&F, 21/11/06 (www.bmf.com.br)
3. Vencimento em aberto é um termo utilizado para denominar meses em que já há contratos sendo negociados. No site da BM&F, encontram-se o mês e o ano (Mai06 quer dizer maio de 2006, por exemplo), mas, internacionalmente, usa-se outra nomenclatura: Janeiro=F; Fevereiro=G; Março=H; Maio=K; Junho=M; Julho=N; Agosto=Q; Setembro=U; Outubro=V; Novembro=X; Dezembro=Z. Na CBOT, por exemplo, soja para maio de 2006 seria representada por SYK6 (Soybean, maio, 2006).
85
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
A tabela 3 é uma continuação da tabela 2 obtida para o mesmo dia 04/10/2005 . A primeira coluna mostra o preço na abertura do pregão, a segunda o preço mínimo daquele dia, a terceira coluna mostra o preço máximo, a quarta o preço médio, a quinta o último preço, a sexta mostra o preço de ajuste 4. A sétima coluna mostra a variação do preço de ajuste em relação ao dia anterior, a oitava mostra a última oferta de compra e a nona coluna, mostra a última oferta de venda no mesmo dia.
3.3
Exemplo de hedge de venda
Vamos agora resolver um exercício simples para se entender a movimentação financeira do processo. Alguns dados utilizados foram extraídos da tabela 4 e os demais foram extraídos do mesmo site e não serão mostrados aqui por uma questão de economia de espaço. Suponhamos que um produtor de soja localizado em Primavera do Leste, preocupado que o preço da soja caísse até a colheita em maio de 2006, calculou seus custos de produção e concluiu que ao preço de US$ 13,00 por saca teria uma boa lucratividade. Ele então entra em contato com seu corretor que consegue vender 10 contratos de soja na BM&F, para o vencimento maio de 2006 ao preço de US$ 13,00/sc. Vamos admitir por enquanto que o preço que ele vá conseguir na venda seja o mesmo praticado na bolsa, uma suposição quase inexistente, mas que será relatada mais tarde. Na tabela 4 colocam-se estas e outras informações compreendidas entre o período de 04/10/2005 e 06/04/2006 para simular uma operação. Tabela 4 – Simulação de fluxo de caixa para posição vendida futuro de soja, em US$. Data (1)
Operação (2)
Preço Operaçã o PO (3)
Preço Ajuste PA (4)
Ajuste Total (5)
Fluxo Caixa (6)
04/10
V10Mai06
13,00
12,95
AD = -(PAt - PO) x 450 x n = 0,05 x 450 x 10 = 225,00 AD = - (PAt - PAt-1) x 450 x 10 = 0 -225,00 ...
225,00
05/10 06/10
12,95 13,00
05/04 06/04
12,75 12,84
C10Mai06
12,85
AD = (PAt-1-PO) x 450 x n = 450,00
225,00 0 1125,00 675,00
Fonte: site da BM&F em 21/11/06
Na primeira linha mostra-se que o produtor deu a ordem de vender a futuro para Maio de 2006 e seu corretor conseguiu US$ 13,00/sc (PO na coluna 3). No final do dia, houve a apuração do preço de ajuste e o mesmo foi US$ 12,95/sc, resultando num ajuste total nos contratos negociados calculado pela equação (1) do contrato: – (PA t – PO) x 450 x n = US$ 0,05 x 450 x 10 = US$ 225,00 originando um fluxo de caixa de R$ 225,00 positivo. 5 Desta forma o vendido irá receber US$ 225,00 de ajuste o que faz sentido porque seu produto agora está valendo menos do que o originalmente contratado. Esta operação de acerto diário permite a todos os envolvidos no mercado zerarem diariamente suas posições. No dia 05 de outubro (segunda linha), o produtor continuava posicionado nos mercados futuros não mudando sua posição. O preço de ajuste para aquele dia, foi de US$12,95 o que resultou em zero de ajuste diário de acordo com a equação (2) AD = - (PA t-PAt-1) x 450 x 10 = -(12,95-12,95) x 450 x 10 = 0,00.
86
4. Durante um pregão típico, os preços negociados variam e a Bolsa precisa de um número que sirva de parâmetro para os acertos financeiros ao final do dia, nas contas correntes dos participantes, daí calcular-se o chamado preço de ajuste. O cálculo do preço de ajuste varia de bolsa para bolsa e também entre contratos mas de forma geral, pode-se considerar como uma média do que ocorreu no dia, sendo calculado como a média ponderada das cotações dos negócios realizados nos últimos 15 minutos do pregão. 5. O sinal negativo foi incluído na equação (1) do contrato porque esta é uma operação de venda. Se fosse de compra, a equação seria mantida no seu formato original.
No dia seguinte, 06 de outubro, o preço de ajuste foi de R$ 13,00, utilizando-se, ainda a equação (2) do contrato, obtém-se ajuste dado por AD = - (PA t-PAt-1) x 450 x 10 = -(13,0012,95) x 450 x 10 = -0,05x450x10 = -225,00, negativo porque o produto agora está valendo mais. Ou seja, no final daquele dia, o produtor pagaria US$ 225,00 o que, descontando-se do ajuste já recebido anteriormente, resultaria num resultado líquido de 0,00. Note que os resultados estão coerentes com a proposta de garantir um preço para o produtor de US$ 12,95/saca. Isto porque, naquele dia, o mercado estava acreditando que a soja, no final do contrato, estaria valendo US$ 12,95/sc, ou seja, o mesmo valor que o produtor queria garantir. No dia 05 de abril, o preço de ajuste do dia foi US$ 12,75. Suponhamos que no dia 06 de abril o produtor vendeu o produto no mercado físico na sua cidade por US$ 12,85 e mandou o corretor encerrar sua posição na bolsa conseguindo recomprar os 10 contratos pelos mesmos US$ 12,85. Neste caso, o produtor sofreria um último ajuste diário dado por AD = (PA t-1-PO) = 325,00, os quais, somados aos ajustes anteriores, resultaria num recebimento total na bolsa (ou através da Bolsa se preferirem) de US$ 675,00. 6 Observando a coluna (7), pode-se verificar que o produtor recebeu, no total, US$ 675,00, que, divididos pelo número de sacas hedgeadas (450 x 10) resulta em US$ 0,15 por saca, os quais, somados aos US$ 12,85 obtidos na venda do produto, fornece exatamente US$ 13,00, que é igual ao valor que o produtor queria garantir no início da operação. Esta é uma forma muito simples de conferir o raciocínio e as contas: pegue então o valor final da coluna (7), divida pelo número de sacas totais e some ao valor de encerramento da operação. Esse é um exemplo simples, mas que não leva em conta alguns componentes que devem ser considerados numa proteção, como é o caso do diferencial de base. Um dos aspectos interessantes dos contratos futuros é que não se precisa esperar pelo vencimento da operação para encerrar a operação. Existem três formas de encerramento dos contratos: a primeira e mais comum é pela reversão da posição, isto é, se está vendido, faz-se uma operação de compra, se está comprado, faz-se uma operação de venda; a segunda forma que ocorre em menos de 2% das operações é pela entrega e recebimento efetivo da mercadoria; a terceira forma, utilizada em alguns contratos, é a chamada de encerramento pelo indicador de preços a qual basicamente consiste em inverter-se a posição como na primeira forma de encerramento apenas que os envolvidos não têm opção de escolher o preço pretendido e o encerramento é feito com o uso dos chamados “Indicadores de Preços”. 7
3.4
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
O conceito de base
A base é definida como a diferença entre o preço no mercado físico em um determinado local e o preço no mercado futuro no ponto de entrega, previsto pela Bolsa, para um determinado mês de vencimento. Formalmente, a base é definida como: Base t = ( Preço no Mercado Físico t – Preço no Mercado Futuro t )
A base possui três dimensões: tempo, espaço e qualidade, ou seja, ela pode ser explicada pelo custo de carregamento de um mês para outro, transportar o produto da cidade onde se localiza para o ponto de entrega, impostos, qualidade do produto, demanda local, barreiras sanitárias, etc. Nas nossas discussões não nos preocuparemos em explicar os componentes da base, mas em reconhecer sua existência e mostrar como a mesma pode influenciar os resultados das operações com contratos futuros.
6. Note que, no encerramento da operação e utilizando-se as equações (1) e (2), se deveria fazer o ajuste de um dia para o outro e depois, dentro do mesmo dia. Entretanto, não é preciso esperar o anúncio do preço de ajuste do dia e prova-se que é possível fazer o ajuste final no caso da posição vendida utilizando-se a expressão (PO - PA t-1.) 7. Maiores explicações sobre indicadores de preços podem ser encontradas no site do CEPEA (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Esalq/USP). http//www.cepea.esalq.usp.br
87
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
A base pode ser positiva, significando que o preço na cidade é maior do que o preço da bolsa. Por exemplo, se no Porto de Paranaguá houver uma demanda por soja para completar um navio rumo à Europa, os exportadores estariam dispostos a pagar um preço local acima do ofertado na bolsa, para evitarem custos com espera do navio no porto. O caso mais comum é quando a base está negativa, significando que o preço local é inferior ao da Bolsa. A base pode ser calculada para a safra, entressafra, etc. Ela também não é um valor constante, por ser uma média de preços, e deve ser analisada juntamente com o desviopadrão. Costuma-se dizer que a base enfraquece quando torna-se mais negativa e que fortalece quando se torna mais positiva. A Figura 2 sistematiza estas informações.
ENFRA UECIMENTO DE -2
-1
0
1
2
FORTALECIMENTO DE
Figura 2 - Comportamento da base
O fortalecimento da base é bom para o vendido e ruim para o comprado. Já o enfraquecimento da base é bom para o comprado e ruim para o vendido (vide exemplo adiante). Dessa forma, ao iniciar-se um contrato futuro, deve-se considerar que há um diferencial de base cujo comportamento pode ser favorável ou não, dependendo da posição que o hedger se encontra (comprado ou vendido) mas cujo comportamento precisa ser considerado nas operações com futuros e seus derivativos.
3.5
Operando soja em Chicago (CBOT)
A Chicago Board of Trade (CBOT) reúne hoje o maior volume de operações com soja no mundo, chegando a movimentar 14 vezes a produção mundial de soja. O contrato de soja com base em Chicago é o mais negociado no mundo, devendo-se destacar que a soja negociada é a número 2 amarela para entrega em Chicago. A cotação é em cents de bushel por libra peso e a unidade de negociação dos contratos é de 5.000 bushels . É importante lembrar que as cotações de soja na CBOT são válidas para o porto de Chicago e para serem comparadas com as cotações brasileiras, devem ser internalizadas, originando uma base geralmente negativa, ou seja, o preço equivalente ao da soja CBOT em qualquer cidade do Brasil deve ser menor do que aquele cotado em Chicago. A Tabela 5 apresenta um resumo da tabela do site da CBOT que mostra os preços praticados durante o dia 28 de novembro de 2006 e por falta de espaço, nos deteremos apenas na análise das cotações referentes ao vencimento maio de 2007 (07May). Tabela 5 - Preços no mercado futuro de soja na CBOT, em cents de US$/bu. Exp (1)
Last 1 Net Open High Low Close Last 2 Chg (4) (5) (6) (7) (2) (3) 07May 708'0 -2'6 710'0 710'4 705'0 11:29 710'4 9:30 9:52 708'4 9:30 11:26 Table generated November 28, 2006 11:30 CST = Chart = Option
Fonte: CBOT.
88
Settle (8)
Prev Settle (9) 710'6
Hi/Lo Limit (10) 760'6 660'6
A coluna (1) mostra os meses de vencimento, sendo que clicando-se na figura obtémse o gráfico de comportamento dos preços naquele dia; clicando na figura obtém-se as opções para este vencimento (mercado de opções será visto adiante). A coluna (2) mostra os últimos negócios realizados ( Last 1) e o penúltimo negócio realizado ( Last 2 ). A coluna (3) mostra a variação do último negócio realizado neste vencimento em relação ao ajuste do dia anterior. Em seguida, temos a cotação na abertura (4), preço mais alto (5), preço mais baixo (6), preço no fechamento (7), preço de ajuste (8), preço de ajuste do dia anterior (9), limites máximos e mínimos que podem ser praticados naquele dia. Vamos agora verificar como interpretar a cotação soja na Tabela 5. Para isto, utilizaremos a última cotação de soja para maio de 2007 (Last 1 obtida às 11:29), 708’00. Este número apresenta o seguinte significado: 708+0/8 = 708,0 cents/bu = US$ 7,08 /bu. Da mesma forma, 710’4 = 710,5; 710’6 = 710+6/8 = 710,75. Um bushel significa 27,214 kg e então, por regra de três simples, tem-se:
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
1 bu —— 27,214 kg x —— 60 kg (1 saca) ou x= 2,20475 bu ou se quisermos obter direto em US$/sc, multiplicamos a cotação da tela por 0,02205. Assim, às 11:29 do dia 28 de novembro de 2006, o mercado estava esperando 708,0 x 0,02205 = US$ 15,61/sc para maio de 2007. A cotação CBOT significa soja colocada em Chicago. Se esta soja for comprada no Brasil, tem-se que deduzir custos como transporte, perdas, corretagens, etc, para se ter o equivalente na cidade onde o negócio está sendo realizado.
4. Fundamentos de opções sobre futuros agropecuários 4.1
Definições
Opções são negociadas em Bolsas ou em Balcão, e consistem em contratos que dão o direito, mas não a obrigação, da compra ou venda de um volume de contratos futuros de uma determinada commodity na data prevista no contrato, ou anterior a ela, por um determinado preço. As opções sobre físico referem-se a contrato de produto físico (por exemplo, as opções da Conab) já as opções sobre futuros referem-se a contratos futuros que vencem logo após o vencimento da opção. Quanto aos fins a que se destinam, existem dois tipos de opções: Opção de compra (Call ): dá ao titular o direito de comprar o produto, até certa data, por um determinado preço ( strike price, preço de exercício ou preço protegido). •
Opção de venda (Put ): dá ao titular o direito de vender o produto, até certa data, por um determinado preço ( strike price, preço de exercício ou preço protegido). •
Deve-se salientar que as opções dão ao seu titular (ou detentor) o direito, mas não a obrigação de vender ou comprar ao preço estipulado. Isto é, o titular da opção não é obrigado a exercê-la e isto é uma das principais vantagens da opção em relação aos contratos a termo nos quais o titular normalmente tem que cumprir a obrigação de vender ou comprar algo. Quanto ao prazo de exercício, as opções podem ser classificadas em Opção Americana: o titular pode exercer seu direito até a data de vencimento da opção (data de exercício) a qualquer momento que lhe interessar a partir do dia seguinte ao da compra da opção; Opção européia: o titular pode exercer seu direito somente na data de vencimento da opção. 8
8. Esta denominação não significa que estas ações somente são negociadas na Europa ou nos Estados Unidos. Muitas opções européias são negociadas nos Estados Unidos e muitas opções americanas são negociadas na Europa ou outros países.
89
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Define-se como titular, geralmente produtor rural, cooperativa, trading, agroindústria, o comprador da opção, aquele que tem o direito de exercício se lhe interessar. Já o lançador, geralmente um Banco ou uma Corretora, é o vendedor da opção, tem a obrigação de cumprir o contrato caso ele seja exercido. O lançador pode lançar opções de compra ou opções de venda. Quem compra a opção paga um valor (prêmio) para “ter”, adquirir o direito ou a garantia de vender ou comprar a um determinado preço no futuro (preço de exercício ou strike price ). Já o lançador recebe um valor (prêmio), para “dar, ceder” este direito e assume o compromisso de comprar ou vender a certo preço no futuro. Note que o preço de exercício é escolhido pelo comprador dentro de certos parâmetros (custo de produção, margem de lucro, diferencial de base, etc) dentre uma série de preços de exercício disponibilizados pela Bolsa. O prêmio é negociado entre as partes no pregão ao vivo ou eletrônico. O prêmio da opção no seu lançamento é calculado utilizando-se o modelo de Black & Schole (Hull, 2003) sendo cinco as variáveis básicas que influenciam o valor pelo qual as mesmas são negociadas: preço futuro; preço de exercício; tempo para o vencimento; volatilidade do preço futuro (variações, geralmente medido pela variância dos preços); taxa de juros. Quanto às margens, apenas os lançadores têm que se preocupar com isto. Resumindo, uma vez escolhido o nível de preço ao qual se quer assegurar a venda ou compra do produto, dá-se a ordem para o corretor apregoar a compra daquela opção naquele preço de exercício e no vencimento desejado. Ao mesmo tempo, alguém (o lançador da opção), faz seus cálculos utilizando suas habilidades de negociação (com cada vez maior uso de modelos matemáticos e estatísticos) e dá ordem para seu corretor apregoar no pregão a disponibilidade daquela garantia àquele preço. O preço será negociado e, havendo comprador do contrato, o negócio será registrado na bolsa. Opções dentro do dinheiro (aqueles que resultam num fluxo positivo de rendimentos para seu detentor) no último dia de negociação são automaticamente exercidas. Na CBOT, as opções dificilmente são exercidas porque o prêmio que se consegue ao revendê-las no mercado é maior do que ela renderia ao seu portador se exercida. Isto é devido à possibilidade da mesma sofrer uma eventual valorização entre o momento do negócio e seu vencimento. Assim, os titulares não apresentam margem de garantia, sendo o grande diferencial ante operar em mercados futuros. Contudo, o custo do prêmio (de 3% a 9% do valor protegido) em geral fica muito mais caro do que operar em futuros (0,64% do valor protegido)
4.2
Entendendo opções na CBOT
Tabela 6 – Commodities agropecuárias negociadas na CBOT
Fonte: CBOT (2005).
90
Existe um grande volume de opções sobre futuros de soja sendo negociado na CBOT e começaremos pela tela de entrada no site www.cbot.com. Devemos iniciar selecionando soybeans no lado direito do quadro conforme apresentado na Tabela 6. Clicando sobre soybeans , abre-se outra tela, representada pela Tabela 7, que mostra todos os negócios realizados naquele momento. Os meses seguidos pelo símbolo indicam que também são negociadas opções para aquele mês. Por simplificação foram excluídos os demais vencimentos e trabalharemos apenas com o contrato futuros e opções com vencimento em novembro de 2005.
Tabela 7 – Cotações no Open Auction (leilão viva voz) para contratos de opção de soja na CBOT, 13 de setembro de 2005. 06Mar Underlying Contract Price:602’2 (06Mar Future) Type (1)
Strike (2)
Last Net Chg (3) (4)
Open (5)
High (6)
Low (7)
Put
580'0
26'4
+1'0
Put
640'0
62'0
-0'4
Call
600'0
35'0
-2'4
27'0 9:43 62'0 11:06 33'0 9:47
27'0 9:43 62'0 11:06 35'0 12:47
26'4 10:55 62'0 11:06 32'0 10:10
Call 620'0 27'0 Unch Table generated September 13, 2005 13:00 CDT
Close (8)
Settle (9)
Prev Settle (10)
Hi/Lo Limit (11)
25'4
75'4
62'4 37'4
112'4 12'4 87'4
30'0
80'0
A Tabela 7 mostra vários preços de exercício para Puts e Calls . Por simplificação, são apresentados apenas alguns preços de exercício, no entanto, o site apresenta outros mais que também podem ser negociados. O termo Open Auction significa que estas opções são negociadas no leilão ao vivo e não no eletrônico. Na linha seguinte verificamos que esta opção vence em março 2006 (06Mar) e que o contrato futuro de março de 2006 é a referência para a mesma ( underlying contract price) . A cotação do contrato futuro de referência a esta opção era naquele momento a 602´2 cents/bushel ou 602,25 cents/bushel ou ainda, US$ 13,28 /sc. A primeira coluna mostra o tipo de opção, Put ou Call . A segunda coluna mostra os diferentes preços de exercício disponíveis (580´0, 640´0, etc). Conforme já explicado anteriormente, estes valores são escolhidos em função de variações históricas e colocados no sistema. Caberá aos interessados escolherem o nível de preço ao qual querem trabalhar e negociar o prêmio. A coluna 3 mostra o prêmio do último negócio realizado. Por exemplo, foram negociadas Puts com preço de exercício de 580´0 cents/bu ao prêmio de 26´4 cents/bu ou seja, comprar uma Put de preço de exercício US$ 12,789 por saca, custou naquele momento US$ 0,58433 por saca. A quarta coluna mostra se houve mudança no último negócio em relação ao preço de ajuste do dia anterior mostrado na 10ª. Coluna, sendo que, neste caso, houve um acréscimo de 1’0. A quinta coluna mostra a cotação na abertura e o horário em que houve apregoamento. A sexta coluna mostra o preço mais alto até o momento; a sétima mostra o preço mais baixo; a oitava, o preço no fechamento; a nona, o preço de ajuste (importante para os lançadores); e a décima coluna mostra o preço de ajuste do dia anterior (o que define se os lançadores pagarão ajuste ou não). Finalmente, a coluna onze mostra o valor mais alto/mais baixo pelo qual a opção poderia ser negociada naquele dia. Sendo Pf o preço futuro do contrato correspondente e Pe o preço de exercício da opção, diz-se que a Put está dentro do dinheiro e será exercida se PfPe, o Valor Intrínseco será zero e se esta situação persistir até seu vencimento, diz-se que a opção “virou pó”. No exemplo citado, Vi = 0 porque Pf>Pe para a Put de Pe=580’0. De outro lado, para a Put de Pe=640’0, Vi=Pe-Pf porque PfPe e o Valor Intrínseco será dado por Vi = Pf-Pe. Caso Pf
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
91
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
dispostas a pagar 26,5 cents/bushel ou 0,58 cents por saca numa opção que no momento não conduz a nenhum resultado positivo (Vi=0), na expectativa que com o transcorrer do tempo (de 02 de setembro de 2005 até o vencimento da opção em março de 2006), o preço da soja caia e esta opção se valorize e passe a render algo ao seu detentor.
4.3. Vantagens e desvantagens das opções Em comparação com as operações de proteção de preços dos mercados futuros, as opções, para os titulares, apresentam as seguintes vantagens e desvantagens: 1. As opções limitam os prejuízos ao valor do prêmio pago; 2. O comprador da opção não necessita se preocupar com o pagamento do ajuste diário; 3. Os compradores não depositam margem de garantia; 4. E, o mais importante, elas garantem contra queda ou subida de preços mas ao mesmo tempo, permitem ganhos extras caso o mercado se movimente favoravelmente; 5. Já as principais desvantagens das opções são que o valor do prêmio pode ser muito alto e também que as possibilidades de variações na base continuam existindo. As opções são de muito mais fácil entendimento e operacionalização pelo produtor porque uma vez pago o prêmio, não há mais com que se preocupar além de proporcionarem inúmeras possibilidades em termos de negócios. Entretanto, para que o mercado de opções se desenvolva, é preciso um mercado futuro com razoável volume de negócios, séries históricas confiáveis e principalmente, agentes de mercados dispostos a assumirem riscos com o lançamento das opções a preços (prêmios) razoáveis. As opções sobre futuros agropecuárias são negociadas na BM&F porém alcançando historicamente um valor razoável apenas no mercado de café Arábica.
5. O papel da informação nos mercados futuros 5.1
92
Previsão de preços e o papel das informações de mercado
Os mercados futuros partem de um princípio básico inerente ao ser humano, o de que possuidores da mesma informação chegarão provavelmente a resultados diferentes quanto as suas perspectivas no que diz respeito aos preços futuros. Existem duas formas básicas de se analisarem os mercados para se operar nos mercados futuros, ambas são complementares e não excludentes. Análise fundamentalista, a qual parte do princípio econômico básico de que o preço observado decorre do encontro das curvas de oferta e demanda e então a questão básica para se tentar antecipar o comportamento futuro dos preços é como se comportarão, para onde se deslocarão estas curvas no vencimento do contrato que nos interessa. Os fatores físicos determinam a oferta e demanda futura do produto, desta forma influenciam agentes comerciais e não comerciais a tomarem posições no mercado futuro de acordo com os eventos físicos determinados ou previstos através de estimativas. Para ilustrar a influência dos fatores físicos nos preços pode-se citar a estiagem prolongada no mês de setembro de 2006 nas regiões produtoras de café Arábica no Estado de Minas Gerais. No decorrer do mês de setembro e início de outubro a falta de chuvas provocou grande preocupação com a primeira florada do café, que determinaria a produção da próxima safra, desta forma rapidamente ocorreu a adição de risco climático aos preços do café, antecipando uma possível quebra de produção.
Informações sobre eventos climáticos são de fácil obtenção, entretanto o reflexo real de tais eventos só pode ser determinado através de estimativas realizadas por empresas particulares ou por órgãos do governo. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab, www.conab.gov.br/conabweb) e o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, www.usda.gov/wps/portal/usdahome) são as principais instituições que divulgam estimativas de produção de acordo com a situação presente dos sistemas produtivos. Além de estimativas que revelam as condições reais da lavoura existem dados de exportação e estoques, que possibilitam uma maior precisão nas estimativas de oferta futura de um determinado produto. A análise fundamentalista é uma análise de mais longo prazo, muito utilizada por hedgers e funciona mais como um sinalizador de tendências do que fornecendo um ponto futuro de preços. A análise grafista parte do pressuposto que movimentos passados que deram origem a determinados padrões de preços, precederão estes mesmos padrões nos próximos movimentos de preços. O grafista parte do pressuposto de que toda a informação disponível está se refletindo nos gráficos e cabe a ele buscar padrões de comportamentos que os ajudem a interpretá-los. A análise grafista é uma análise de curtíssimo prazo muito utilizada por especuladores. No Brasil a participação dos agentes primários do setor produtivo no mercado de derivativos é considerada muito pequena em comparação a outros países, fato este atribuído principalmente à falta de informações sobre o funcionamento do mercado. Para alguns produtos historicamente destinados à exportação o acompanhamento do mercado internacional é essencial para garantir a estabilidade econômica do sistema produtivo pela realização de operações financeiras que mantenham a margem de lucro do produtor. É por este motivo que a análise e interpretação de dados relativos à produção agrícola devem ser difundidas a f im de aumentar a participação dos agentes da cadeia produtiva no mercado futuro agropecuário proporcionando maior liquidez aos mercados e diminuição de riscos para os agentes em questão.
5.2
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Bolsas de interesse para o mercado brasileiro
Ao longo deste trabalho mostraram-se vários sites de interesse capazes de fornecerem informações imprescindíveis para todos que pretendam operar nos mercados futuros com conhecimento e segurança. Apresentam-se, à seguir, seis bolsas de futuros selecionadas pela sua importância para o mercado de commodities agropecuárias brasileiras. Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) www.bmf.com.br Única Bolsa brasileira de futuros agropecuários, colocada entre as 10 maiores do mundo, já vista neste trabalho. •
• Chicago Board of Trade (CBOT) www.cbot.com A CBOT iniciou suas operações em 1848 e hoje é a bolsa mundialmente mais importante em termos de negociação de commodities agropecuárias, sobretudo as temporárias, (foram negociados 674 milhões de contratos em 2005), chegando a negociar 14 vezes a produção mundial de soja. Na CBOT negociam-se contratos de futuros e opções de milho, soja, óleo de soja, farelo de soja, soja sul americana (formação de preço em Paranaguá), trigo, aveia, etanol, arroz com casca e mini contratos de milho. Recentemente, a CBOT foi adquirida pela Chicago Mercantile Exchange (CME). • New York Board of Trade (NYBOT) (www.nybot.com) A NYBOT é uma das maiores bolsas do mundo, negociando contrato futuros e de opções, principalmente de lavouras permanentes e seus produtos, tais como açúcar no. 11, açúcar no. 14, algodão no. 2, café, cacau, suco de laranja concentrado, (FCOJ), etanol, polpa de madeira. Recentemente, a NYBOT foi adquirida pela Intercontinental Exchange (ICE), de forma a operar continuamente por 24 horas, de segunda a domingo.
93
ROFEX (Rosário Futures Exchange – Bolsa de Futuros de Rosário, Argentina) http://www.rofex.com.ar/ A Bolsa de Comercio de Rosário negocia atualmente contratos de soja, trigo, milho, índice Soja Rosafé, Índice Milho Rosafé, Índice de Trigo Rosafé, Índice Futuro de Liniers (índice de preços futuros de boi). • Dalian Commodity Exchange (DCE) (http://www.dce.com.cn/portal/en/index.jsp) Estabelecida em novembro de 1993, a bolsa chinesa de Dalian já se situa hoje entre as 10 maiores bolsas do mundo, negociando contratos futuros de soja, farelo de soja e milho. •
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
• Zhengzhou Commodity Exchange (ZCE) http://english.czce.com.cn/ )
Estabelecida em 1990, é uma das três bolsas de futuros da China e negocia contratos futuros agropecuários de trigo, algodão e açúcar.
6. Operações estruturadas com futuros e opções 6.1
Hedge de soja em Primavera do Leste
Um produtor em Primavera do Leste vendeu 10 contratos futuros de soja para vencimento em Agosto de 2005 a US$ 14,10/sc. Sabendo-se que a base em Primavera do Leste é 2,65 abaixo (-US$ 2,65), ele estará aceitando como preço-objetivo US$ 11,45/sc (14,10-2,65). Vamos supor que o preço futuro caia até o vencimento na BM&F para US$ 12,00/sc e em Primavera do Leste para US$ 9,35, isto é, a diferença (base) permaneceu igual. Neste caso, ele venderá sua soja a US$ 9,35 em Primavera do Leste e receberá US$ 2,10 de ajuste diário, completando os US$ 11,45 esperados. Assim, pode-se dizer que, caso a base permaneça constante, não haverá alteração nos resultados esperados para o hedger. Vamos imaginar outra situação onde tenha ocorrido uma queda no preço na Bolsa de US$ 14,10/saca para US$ 12,00/saca, mas em Primavera, o preço da saca da soja tenha atingido US$ 9,00/saca. Neste caso, a base caiu da média histórica de US$ -2,65/saca para US$ 3,00/saca, ou seja, enfraqueceu. Como o preço na bolsa caiu, o produtor receberá US$ 2,10/ saca de ajuste, mas vai vender sua soja por US$ 9,00, tendo como resultado financeiro US$ 11,10/saca, abaixo do esperado. Vamos imaginar agora uma situação onde a cotação na Bolsa tenha caído para US$ 12,00/ saca, mas em Primavera caiu para US$ 11,00/saca, com conseqüente fortalecimento da base, passando a –US$1,00/saca. Como resultado final, o produtor venderia a US$ 11,00/saca, receberia US$ 2,10/saca da bolsa, resultando em US$ 13,10/saca, melhor do que o esperado. E se os preços subirem na bolsa? Neste caso, é de se supor que subam também em Primavera do Leste. Vamos supor, por exemplo, que os preços na bolsa tenham subido para US$ 15,10 e que os compradores estejam pagando agora US$ 13,00/sc em Primavera. Neste caso, a base fortaleceu, indo de -2,65 para -2,10 (13,00-15,10). O produtor pagará US$ 1,00 de ajuste na bolsa, venderá o produto por US$ 13,00 no mercado local e terá como resultado final US$ 12,00/sc, acima do preço-objetivo estabelecido inicialmente de US$ 11,45/saca. Resumindo, numa operação de hedge continua existindo o chamado “diferencial de base” que é o risco associado às variações na base. O conhecimento do comportamento do mercado orientará o produtor sobre o melhor momento para iniciar e encerrar suas operações.
6.2
Operações ex-pit
As operações ex-pit ainda não apresentam grande volume de operações na BM&F, mas com elas procura-se utilizar o mercado futuro para sanar as deficiências do contrato a termo tradicional no processo de precificação, no que se refere à rigidez do momento, visibilidade, transparência e hedge . Enquanto no modelo do contrato a termo tradicional os vendedores e 94
compradores não têm liberdade para determinarem o melhor momento de precificação, no ex-pit cada um, respectivamente, fixa seu preço de venda e de compra de forma independente e no momento que cada um achar mais interessante. Um dos pontos mais importantes desse modelo é que a reversão da operação de futuro é realizada através de uma operação direta sem a interferência do mercado, fora do pit de negociação 9, garantindo assim que ambos saiam de suas posições de hedge , não necessitando de liquidez na bolsa para a liquidação da operação. Daí que vem o nome de ex- pit . O grande diferencial das operações ex-pit é que não existe o chamado risco de base, pois o diferencial de base é negociado preliminarmente entre as partes e consta do contrato a termo que será registrado na Bolsa. Também a fixação de preços (hedge) é obrigatória para ambas as partes, embora possa ocorrer em momentos distintos. As operações expit podem ser realizadas de três maneiras: fixação pelo vendedor; fixação pelo comprador; fixação por ambos, sendo que nos deteremos no exemplo de ex-pit fixado pelo vendedor. Suponha a negociação de um contrato a termo em julho de 2005 entre uma Cooperativa de produtores de milho de Campinas e uma indústria processadora de milho de São Paulo, com preço a fixar na BM&F segundo o preço futuro do dia do contrato com vencimento em março. O tempo passa e em 15/01/2006 o preço do vencimento março alcança R$ 25,00/sc e a Cooperativa resolve fixar esse valor. Ela dá ordem e o corretor vende 10 contratos futuros de milho para o vencimento março de 2006 ao preço de R$ 25,00/sc, fixando as 270 toneladas, notificando a BM&F que se trata de uma operação ex-pit. No mesmo dia, ao final do pregão, a corretora comunica à BM&F que deseja passar uma operação ex-pit com as seguintes características: compra de 10 contratos do vencimento março de 2006 pela cooperativa e venda da mesma quantidade e mesmo mês de vencimento pela Indústria, ao preço de R$ 25,00/sc . Com isto, a posição de futuro passa da cooperativa para a indústria, deixa-a vendida no vencimento março de 2006. No dia 23/02/2006 o preço do vencimento março de 2005 atingiu R$ 18,00/sc e a Indústria considera que tal nível está satisfatório para a fixação. A corretora dá ordem de compra de 10 contratos de milho para o vencimento março de 2006 ao preço de R$ 18,00/sc. A cooperativa fixou o contrato a termo a R$ 25,00/sc e a indústria a R$ 18,00/sc. Resultados:
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
• Indústria: Pagou R$ 25,00/sc à cooperativa e recebeu R$ 7,00/sc em ajustes diários,
totalizando os R$ 18,00/sc que havia fixado. • Cooperativa: vendeu o milho por R$ 25,00/sc.
Neste exemplo a cooperativa fixou o preço de venda no momento que julgou mais apropriado, independente da indústria. Ela realizou uma operação de hedge e não ficou sujeita aos ajustes diários, pois o processador assumiu esses ajustes. Nessa operação a responsabilidade da Bolsa é a de exigir o contrato a termo e garantir a reversão da posição futura através de uma operação ex- pit . A liquidação do contrato a termo é de responsabilidade das partes.
6.3
A formação de preço da soja brasileira
Boa parte da produção brasileira de soja tem seu preço firmado em Bolsas de Futuros ainda no período de plantio. Ao se utilizarem das diferentes negociação nas formas a fixar, soja verde, troca-troca, CPR, o comprador basicamente olha o preço futuro esperado para a época da entrega do produto e o internaliza até a região onde está sendo feita a negociação, resultando no preço da soja na região de produção. A Tabela 8 apresenta um exemplo deste processo de formação de preço na época do plantio da soja brasileira (outubro de 2005) com soja a ser entregue em março de 2006 utilizando-se dados da CBOT. 9. Pit de negociação: local destinado aos negócios do pregão viva voz de bolsas de mercadorias.
95
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Tabela 8 – Internalização do preço da soja, CBOT Rondonópolis, soja Março 2006 Operação
Unidade
Valor
(1) Cotação futuro CBOT 05/10/05
US$c/bu
584,00
(2) Prêm io US$c/bu
US$c/bu
-20,00
(3) Subtotal
(1+2)
564,00
(4) Conversão para tonelada
Fator
0,367454
(5) FOB porto
US$/ton (3*4)
207,24
(6) Comissão corretor físico
US$/ton
0,50
(7) Receita bruta
US$/ton (5-6)
206,74
(8) Corretagem de câmbio
0,00
0,00
(9) Despesas portuárias
US$/ton
13,11
(10) Quebra de transporte
0,00
0,52
(11) Tributos (PIS, COFINS, etc)
Isentos
0,00
(12) Frete para o porto
US$/ton
71,58
(13) Paridade Rondonópolis
US$/ton (7-8-9-10-11-12)
121,54
(14) Paridade Rondonópolis
US$/sc ( 13/1000) * 60
7,29
(15) Cotação CBOT
US$/sc ((1/100) * 2,20626)
12,88
(16) Desconto em relação CBOT(base)
US$/sc (14-15)
-5,59
Observações: 2. Prêmio do porto que pode variar segundo o interesse momentâneo do importador e a efetividade do porto 4. Utilizou-se fator de conversão ANEC 13. Neste resultado não estão incluídos ganhos de performance 16. A Base pode variar de acordo com oferta e demanda na região, custos de transporte, etc. Fonte: elaborado pelos autores a partir de informações de tradings.
A soja que está sendo negociada antecipadamente na época do plantio em Rondonópolis e que será entregue em março de 2006 terá o preço fixado em Chicago por US$ 12,88 e será adquirida por US$ 7,29/saca de 60 kg em Rondonópolis. Esta diferença de US$ 5,59 em relação ao preço futuro é a “base” e varia de acordo com condições de transporte, oferta e demanda na região de produção, disponibilidade de armazéns, custo de armazenamento, impostos e qualidade do produto. Vamos imaginar que uma empresa em Rondonópolis forneceu 51.800 kg de semente de soja no valor de US$ 24.494,40 no dia 05/10/05 para serem pagas em sacas de soja em março de 2006. Como a soja CBOT futura para março de 2006 estava cotada a US$ 12,88, descontando-se a base a empresa teria a receber 3.360 sacos de 60 kg de soja grão no dia, ou seja, neste momento de negociação, a operação de financiamento equivalia a 3.360 sacas x US$ 7,29/sc ou US$ 24.494,40. Para ter certeza que em março de 2006, quando receber a soja a empresa terá mantido o valor do produto, ela deveria ter feito um hedge de venda de soja na CBOT para março 2006 a US$ 12,88. Vamos assumir que em março de 2006 a soja CBOT tenha caído para US$ 12,00/sc e que em Rondonópolis esteja a US$ 6,41/sc. A empresa vai receber a soja e vendê-la a este preço, recebendo adicionalmente da Bolsa US$ 0,88/sc, perfazendo um total de US$ 7,29/sc ou US$ 24.494,40 que era o valor da venda das sementes. Neste exemplo não se considerou a preocupação com respeito ao comportamento da taxa de câmbio para se transformar e internalizar os preços em US$ para R$ mas se poderia também fixar a taxa de câmbio para março de 2006. Com isso toda a operação seria fixada em reais e não em US$. A decisão de exposição a risco varia com o nível de aversão a risco dos produtores e de suas necessidades financeiras a serem cumpridas em débitos futuros. 96
6.4. Hedge de Compra de Milho para Granjas e Industrias de Ração O setor de rações (suínos e aves) representa 90% da demanda interna de milho, sendo que o milho participa com 65% a 80% na composição destas rações. Dados da Embrapa Suínos e Aves mostram que a ração representa 56,6% do custo de produção total do frango de corte. Desta maneira torna-se necessário à utilização de instrumentos financeiros para garantir a estabilidade das granjas produtoras de frangos. No dia 20 de setembro de 2006 a análise de fatores fundamentais do mercado de milho indicavam maior demanda internacional do produto para a fabricação de etanol e possível aumento de preços domésticos com a realização de leilões governamentais, foi possível identificar o início de tendência de alta, confirmada com a reação de preços no início do mês de setembro. Dada a relação direta entre os preços das rações e o preço do milho, a industria de ração ou granja tradicional compradora de milho ou farelo nos meses de novembro e dezembro, poderia realizar hedge de compra de contratos futuros de milho utilizando contratos com vencimento em Janeiro de 2007 de acordo com as informações a seguir:
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Total de aves: 18.000 Aproximação das sacas de milho necessárias: 1.350 sacas ou 3 contratos de 450 sacas Valor da Base (físico - futuro): -R$ 0,33/sc Preço objetivo pretendido pelo produtor para aquisição do milho: R$ 18,70/sc (BM&F) - R$ 0,33/sc = R$ 18,37/sc A tabela 9 mostra o resultado operacional da compra de contratos futuros de milho BM&F com vencimento em janeiro de 2007. Tabela 9 – Resultado da operação de hedge de compra de contratos futuros de milho na BM&F.
Data 20/09/2006 (BM&F) 30/11/2006 (BM&F)
Operação
Vencto.
Quant.
Cotação R$/sc
Total
COMPRA VENDA
JANEIRO JANEIRO
3 contratos 3 contratos
R$ 18,70 R$ 24,00
(R$ 25.245,00) R$ 32.400,00
R$ 7.155,00
RESULTADO BM&F 30/11/2006 (Campinas)
Compra Física
-
1350 sacas
R$ 24,44
RESULTADO BM&F + Compra Física
(R$ 32.994,00)
R$ 25.839,00
Como resultado da operação, a granja pagará R$ 19,14 por saca de milho bem menos do que os R$ 24,44/saca pagos pelos demais compradores que não efetuaram a operação na Bolsa.
6.5.
Possibilidades de ganhos mesmo com a venda antecipada de soja
Um problema que freqüentemente ocorre com a venda antecipada de soja ou troca insumo x produto, é o produtor não querer entregar caso o preço da soja suba. Vamos neste exercício mostrar uma operação que pode ser realizada para permitir ao produtor ganhar mesmo que o produto já não lhe pertença ou por tê-lo vendido antecipadamente ou por ter feito uma operação de troca insumo x produto. Por facilidade, vamos imaginar que o produtor vendeu a soja antecipadamente a US$ 9,85 /sc (US$ 13,28/sc em Chicago) e para se proteger, comprou uma Call Pe = 620 cents/bu = 13,67/sc pagando 0,60/sc. Na tabela 10 estão colocados alguns cenários possíveis no vencimento da opção.
97
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
Tabela 10 – Cenários possíveis no vencimento da opção Preço CBOT março 2006 US$/sc Preço venda antecipada Prêmio pago Call Ganho no exercício da Call Resultado líquido
12,78 9,85 -0,60 0 9,25
13,28* 9,85 -0,60 0 9,25
13,67** 9,85 -0,60 0 9,25
14,11 9,85 -0,60 0,44 9,69
14,99 9,85 -0,60 1,32 10,57
Ou seja, se os preços caírem, o produtor estará garantido porque já vendeu antecipado e poderá também revender a opção no mercado. Se os preços subirem, ele exercerá seu direito e receberá a diferença entre o preço pelo qual vendeu antecipadamente a produção e o preço vigente no mercado, lucrando com a subida do preço do produto, evitando-se problemas de não entrega por insatisfação com o negócio realizado.
7.
Considerações finais
Os mercados futuros e de opções oferecem formas de se administrar riscos de preços utilizando-se mecanismos privados de mercado. Eles ainda são pouco utilizados no Brasil por diversas razões: falta de conhecimento; falta de recursos para operar nas bolsas, principalmente para ajustes diários e margens de garantia; instabilidade econômica, histórico de inflação; intervenção governamental; alta concentração em alguns mercados. No nosso ponto de vista, falta principalmente treinamento e pessoas habilitadas para estruturarem operações economicamente viáveis. Outro ponto importante é que nossos produtores historicamente estão descapitalizados e por esta razão, vendem antecipadamente sua produção e conseqüentemente, perdem a chance de procurar oportunidades para assegurar melhores preços. No entanto, o Banco do Brasil, juntamente com a BM&F e a ESALQ vem ministrando palestras, workshop, cursos à distância e oficinas de treinamento, para os públicos interno e externo, de forma a disseminar e a incentivar as operações de hedge. Adicionalmente, o Banco do Brasil disponibiliza linhas de crédito para financiamento dos dispêndios com a proteção (margem de garantia, ajustes diários, prêmios de opções e custos operacionais).
8. Bibliografia FUTURES INDUSTRY INSTITUTE Curso de Futuros e Opções. São Paulo: Bolsa de Mercadorias & Futuros,1995. 258p, Tradução 1998. HULL, J.C. Options, futures and other derivatives. New Jersey, Prentice Hall, 5th edition, 2003. LEUTHOLD, R.M.; JUNKUS, J.C.; CORDIER, J.E.. The theory and practice of futures markets. Lexington Books, 1989. MARQUES, P.V.; MELLO, P.C.; MARTINES FO, J.G. Mercados Futuros e de Opções Agropecuárias. Piracicaba, S.P., Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Esalq/USP, 2006, Série Didática nº D-129. SCHOUCHANA, F.; MICELI, W.M. Introdução aos mercados futuros e de opções agropecuários no Brasil. São Paulo, BM&F, 3ª. ed. ver, 2004.
98
Questões de Revisão 1. Nos mercados futuros agropecuários a) são negociados contratos padronizados para entrega e recebimento futuro; b) são negociados contratos particulares entre compradores e vendedores para pronto pagamento e entrega; c) são negociados contratos do governo; d) são negociados contratos de troca de mercadorias por insumos.
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
2. O papel da Bolsa de Futuros é: a) repassar recursos do governo para o produtor; b) atuar como agente de intermediação e garantia, controlando e garantindo o fluxo de ajustes entre pagadores e recebedores; c) determinar os preços a serem pagos e recebidos; d) vender e comprar produtos. 3. Os recursos a pagar e a receber nos mercados futuros a) são acertados no final do contrato; b) são acertados diariamente durante o pregão; c) são contabilizados diariamente mas são pagos e recebidos no dia seguinte; d) são pagos pelo governo. 4. A Margem de Garantia nos Mercados Futuros a) é um valor utilizado para cobrir os ajustes diários b) é depositada por ambos, compradores e vendedores, sendo uma garantia dosistema, a ser utilizada caso uma das partes se torne inadimplente; c) é só depositada por compradores; d) é só depositada por vendedores. Uma fábrica de óleo de soja localizada em Primavera do Leste fez uma operação de hedge de compra de 10 contratos de soja na BM&F com vencimento Maio a US$ 12,80/sc dia 11/04/06 enquanto aguardava compra de matéria prima para processamento considerando que a base histórica local era de US$ 2,00 abaixo. Dia 17/04/06 a empresa comprou soja localmente a US$ 10,34 e encerrou a operação na BM&F a US$ 12,50/sc. 5. O preço objetivo da empresa no início da operação era a) US$ 12,80/sc b) US$ 10,80/sc c) US$ 14,80/sc d) US$ 10,34/sc 6. No encerramento da operação, a base local era a) US$ 2,16/sc acima b) US$ 2,00 abaixo c) US$ 2,16 abaixo d) US$ 2,00/sc acima 7.
O ajuste total por saca foi de a) recebeu U$ 2,46 b) pagou US$ 2,46 c) recebeu US$ 0,30 d) pagou US$ 0,30 99
Capítulo 4 Estrutura e Funcionamento dos Mercados Futuros Agropecuários
8. O resultado final ficou a) abaixo do preço objetivo b) acima do preço objetivo c) igual ao preço objetivo d) perto do preço objetivo 9. porque: a) a base fortaleceu b) a base enfraqueceu c) a operação de hedge estava errada d) todas erradas 10. A empresa gastou com ajuste total a) US$ 3,00 b) US$ 0,30 c) US$ 103,40 d) US$ 1.350,00
) d ( 0 1 ; ) b ( 9 ; ) a ( 8 ; ) d ( 7 ; ) c ( 6 ; ) b ( 5 ; ) b ( 4 ; ) c ( 3 ; ) b ( 2 ; ) a ( 1 : o t i r a b a G
100
CAPÍTULO
5
POLÍTICA DE CRÉDITO RURAL E NOVOS INSTRUMENTOS DE FINANCIAMENTO E COMERCIALIZAÇÃO Carlos José Caetano Bacha
Professor Titular do Departamento de Economia, Administração e Sociologia - ESALQ/USP
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
Capítulo 5 - Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização O objetivo deste capítulo é analisar o funcionamento dos novos instrumentos e dos tradicionais de financiamento e de comercialização do agronegócio. Para tanto, o texto é dividido em duas partes. Na parte 1, a política de crédito rural é analisada, dando atenção aos seus instrumentos tradicionais e novos. Na parte 2 é analisada a política de preços mínimos, também enfocando os tradicionais e novos instrumentos.
1. Política de Crédito Rural Trata-se de um mecanismo de concessão de crédito à agropecuária a taxas de juros e condições de pagamento diferentes das vigentes no mercado livre (e determinadas pela política monetária). A política de crédito rural no Brasil apresenta duas fases: de 1965 até meados da década de 90 foi dado ênfase à criação de mecanismos controlados pelo governo para concessão de crédito rural. A partir de meados da década de 90 e, com maior ênfase nos anos 2000, estão sendo criados instrumentos privados de financiamento da agropecuária.
1.1 Origem O Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) foi criado em 1965, através da Lei n o 4.829. Antes desse ano, a concessão de crédito rural já era feita pelo Banco do Brasil. Essa instituição criou, em 1935, a Carteira de Crédito Agrícola e Industrial (CREAI), que começou a operar em 1937. Contudo, foi a partir da segunda metade da década de 60 que o volume de crédito rural ampliou-se significativamente.
1.2 Tipos de crédito rural Temos, basicamente, três tipos de crédito rural, a saber: crédito de custeio, crédito de investimento e crédito de comercialização (vide quadro em anexo). O crédito de custeio se relaciona à necessidade de capital de giro para as atividades agropecuárias. O crédito de investimento refere-se aos recursos necessários para a construção de instalações e compra de equipamentos. E o crédito de comercialização está relacionado à política de preços mínimos, e às diversas linhas de apoio (LEC, Estocagem, Crédito Agroindustrial, Desconto de NPR, etc). Que serão abordadas na terceira parte deste texto.
1.3 Fontes de recursos para conceder o crédito rural Existem duas fontes básicas de recursos para fornecimento de crédito rural : as fontes com baixos custos de captação e as fontes com custos financeiros normais na captação. Os recursos com baixos custos na captação são: os oriundos da emissão de moeda, da obrigatoriedade de certa parcela dos depósitos a vista ser destinada a empréstimos à agropecuária (são os recursos das exigibilidades sobre os depósitos a vista) e as transferências de recursos do Orçamento do Tesouro. Esses três tipos de recursos, ao serem repassados ao sistema bancário, permitem a concessão de empréstimos sem grande preocupação com o custo de captação dos mesmos. Com isso, os bancos podem emprestar esses recursos a taxa de juros abaixo das do mercado livre. 102
Os recursos captados com custos financeiros normais são os oriundos da caderneta de poupança rural (poupança ouro do Banco do Brasil), os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), do Programa de Geração de Emprego Rural (PROGER-RURAL), os recursos captados no exterior e os recursos livres captados pelo sistema bancário (através, por exemplo, de Certificados de Depósito Bancário e Recibo de Depósito Bancário). Como esses recursos têm custo normal de captação (igual aos juros que o sistema bancário deve pagar aos proprietários desses recursos), eles só podem ser emprestados a uma taxa de juros igual à taxa de juros de captação acrescida de um spread (que cubra os custos administrativos e dê lucro aos bancos). Por exemplo, se os custos de captação são de 20% ao ano e o spread é de 8%, os empréstimos agropecuários serão feitos a 29,6% ao ano. De outro lado, se não houvesse custo de captação, os empréstimos poderiam ser feitos a taxa de 8% ao ano. É possível ao Governo Federal fazer a equalização da taxa de juros, a qual implica o governo pagar ao banco uma parte da taxa de juros que o banco cobraria do produtor rural. Considere, por exemplo, um banco que capte recursos da caderneta de poupança e deseja emprestar o recurso a 11,97% ao ano. No entanto, o Governo Federal propõe ao banco que ele empreste o recurso ao produtor rural a 8,75% a.a. e o governo paga ao banco os 3,22 pontos percentuais restantes (ver o exemplo de Morais, 2005, p.29). Essa política de equalização da taxa de juros tem feito com que os pagos aumentem as linhas de financiamento ao produtor rural, com consequente maior gasto do Governo Federal. Em 2004, o Governo Federal pagou R$ 1 bilhão de equalização da taxa de juros, mais do que o dobro do pago em 2000 (ver Morais, 2005, p. 32).
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
1.4 Critério para fixação da taxa de juros nominal Na experiência brasileira de crédito rural, tem-se presenciado dois tipos de critérios para a fixação da taxa de juros nominal: taxa de juros pré-fixada e taxa de juros pós-fixada. A taxa de juros nominal pré-fixada é aquela que o tomador do empréstimo fica sabendo no ato de tomada do empréstimo, e que não se altera até o pagamento final do empréstimo. Já a taxa de juros nominal pós-fixada é aquela em que há uma parcela atribuída a título de correção monetária acrescida de uma outra parcela a título de spread bancário. Por exemplo, em 1997, o crédito concedido, via o SNCR, ao micro e pequeno produtor rural era à taxa de juros de 6,5% ao ano; e, aos demais produtores rurais a taxa de juros cobrada era de 9,5% ao ano. Eram, portanto, taxas de juros nominais pré-fixadas. Contudo, critério diferente podia ocorrer com empréstimos fora do SNCR, nos quais se cobrava a correção da TR (Taxa Referencial) acrescida de algum spread. Em situações nas quais a taxa de inflação é bastante estável, o sistema bancário pode operar com taxa de juros nominal pré-fixada. Contudo, em situações nas quais a taxa de inflação comporta-se de modo bastante instável, o sistema bancário tem optado por trabalhar com taxa de juros nominal pós-fixada, como ocorreu na segunda metade dos anos 90 e nos quatro primeiros anos do século atual.
1.5 O montante de crédito rural distribuído no Brasil e o subsídio do mesmo Como já comentado, o volume de crédito rural concedido expandiu-se significativamente a partir da segunda metade da década de 60. A tabela 5 apresenta os valores totais desses créditos a preços de agosto de 1994 (5 a coluna) e por finalidade (2 a, 3a e 4a colunas). A década de 70 presenciou uma grande expansão do volume de crédito rural, que se reduziu significativamente nos quatro primeiros anos da década de 80, retomando valores crescentes em 1985 e 1986. De 1987 a 1996 ocorreram fortes reduções nos valores deflacionados do crédito rural concedido, sendo que em 1996 o valor total emprestado foi metade do valor emprestado em 1970. A partir de 1997, o valor anualmente emprestado tem crescido, pois novas linhas privadas de financiamento foram criadas, implicando em taxas de juros reais positivas (ver última coluna da Tabela 1). No entanto, os valores atualmente emprestados são muito inferiores aos picos de empréstimos concedidos em 1979 e 1986. Em 2004, o volume de crédito rural concedido (R$ 12,97 bilhões a preços de agosto de 1994) era equivalente a 33,1% do que foi concedido em 1979.
103
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
Os valores que aparecem na tabela 1 estão em reais com poder de compra de agosto de 1994. Para trazê-los a poder de compra de um mês específico (por exemplo, dezembro de 2005) basta multiplicar cada valor da tabela 1 pelo IGP-DI do mês desejado e dividir o resultado por 100. Por exemplo, em dezembro de 2005 o IGP-DI foi de 330,835. Assim, o montante total de crédito rural concedido em 1979 a preços de dezembro 2005 é: 39.205 × 330,835 = R$ 129.704 milhões 100
Tabela 1 - Crédito Rural Contratado segundo sua finalidade - 1970 a 2003 (valores em milhões de reais de agosto de 1994) Ano
Custeio
Investimento
Comercialização
Total
Taxa de juros real (em %)
1970
4.138
2.518
2.621
9.277
-1,85
1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
4.669 5.524 8.012 10.447 14.826 14.634 14.632 15.002 19.719 21.214 19.072 20.256 14.795 10.234 14.722 17.272 17.076 11.682 12.545 6.707 7.600 6.458 4.893 6.667 3.418 3.368 4.930 5.098 4.905 4.812 5.181 5.847 6.629 7.459
3.165 4.389 6.208 7.023 10.571 11.242 7.507 7.856 9.794 7.033 5.026 4.130 3.972 1.787 2.683 9.894 4.162 2.751 1.648 982 786 1.225 1.809 2.328 1.196 1.156 1.424 1.472 1.243 1.260 1.814 2.089 2.457 2.870
2.895 3.356 4.543 5.732 8.429 8.802 8.805 8.599 9.692 9.245 8.422 7.104 5.026 2.498 3.299 3.709 3.102 2.741 1.491 1.270 859 2.567 2.099 3.721 902 297 631 1.038 1.087 1.363 1.778 1.731 1.766 2.640
10.729 13.269 18.762 23.203 33.827 34.678 30.944 31.457 39.205 37.492 32.519 31.490 23.793 14.520 20.704 30.875 24.339 17.174 15.684 8.959 9.245 10.250 8.801 12.716 5.516 4.821 6.985 7.608 7.235 7.435 8.772 9.667 10.852 12.969
-2,34 -0,43 -0,61 -14,5 -11,13 -21,34 -14,99 -16,19 -31,72 -34,38 -25,72 -27,39 -30,13 0,93 -1,32 -29,72 -19,38 -6,2 24,18 -10,69 -21,39 11,87 21,05 1,7 27,54 10,31 6,06 16,16 0,2 2,87 1,88 -7,93 14,05 22,72E
Fonte: ALMEIDA(1994, p. 128) e Bacha et al (2005, p.9). Nota: E valor sujeito a revisão.
Durante a década de 70, a maior parte dos recursos do crédito rural era proveniente de fontes com baixos custos de captação. Isto permitia a concessão de empréstimos à taxa de juros nominal inferior à taxa de inflação, implicando taxa de juros real negativa. Esta última implica uma transferência de renda a favor do setor agropecuário. A equivalência entre taxas de juros real e nominal e a taxa de inflação obtém-se através da seguinte equação: (1+r*)×(1+Õ) = (1+r)
104
(1)
onde: r* é a taxa de juros real em valores decimais, Õ é a taxa de inflação em valores decimais e r é a taxa de juros nominal em valores decimais,
Da equação (1), tem-se r * =
(1 + r ) −1 (1 + ∏)
(2)
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
Considere o seguinte exemplo: r = 45% = 0,45 e P = 100% = 1. Nesse caso, a taxa de juros real é: r * =
(1 + 0,45) − 1 = −0,275 = −27,5% (1 + 1)
Uma taxa de juros real negativa significa um subsídio ao produtor rural, sendo que ocorre uma transferência de renda do agente que concede o crédito ao tomador de crédito. No exemplo acima, observe que o tomador de empréstimo deveria devolver, no mínimo, para cada R$ 1,00 tomado o valor de R$ 2,00 (correção de 100% devido à inflação). Porém, o tomador de empréstimo devolveu para cada R$ 1,00 apenas R$ 1,45. Assim, dos R$ 2,00, apenas R$ 1,45 foi devolvido, havendo a transferência de R$ 0,55 (para cada R$1,00 de empréstimo) do emprestador para o tomador de crédito.
1.6 Distribuição do crédito rural entre culturas, regiões e produtores Durante as décadas de 70 e 80 o crédito rural beneficiou, principalmente, as culturas de exportação, as regiões Sul e Sudeste e os médios e grandes produtores rurais. Essa associação se fez pela seguinte razão: o Governo Federal tinha como meta macroeconômica o incentivo às exportações. Por isso, fazia sentido incentivar as culturas de exportação. Por sua vez, a maioria dessas culturas situava-se no Centro-Sul do Brasil e eram conduzidas por médios e grandes produtores rurais. Além disso, esses possuem maior capacidade administrativa e maior patrimônio, de modo a facilitar a tomada de empréstimo. É importante ressaltar que, do ponto de vista de um estabelecimento bancário, o custo de concessão de um empréstimo é praticamente o mesmo, independente do volume de empréstimo concedido. Assim, entre conceder um empréstimo mais volumoso a um médio ou grande produtor rural (com propriedade legal da terra) e empréstimos menores e em maior número a pequenos produtores (muitas vezes sem a propriedade legal da terra), o sistema bancário optou pela primeira alternativa, pois tinha menor custo administrativo. Nas palavras de GOLDIN & REZENDE (1993, p,24-25): “... as principais culturas de exportação receberam cerca de metade do crédito total, enquanto cerca de 80% de todo o crédito foram alocados a seis culturas: soja, trigo, arroz, milho, café e cana-de-açúcar ... Um exame mais detalhado da distribuição de crédito revela que ele foi vantajoso principalmente para as culturas de exportação concentradas no Centro-Sul do país. Enquanto o Nordeste foi responsável por aproximadamente 22% do valor da produção agrícola vegetal no final dos anos 70, apenas 12% do total de crédito agrícola foram dirigidos para aquela região. Na mesma época, os três estados do Sul especializados em trigo e soja receberam 44% do crédito total, embora fossem responsáveis por 38% do valor total da produção agrícola brasileira. Em termos de crédito por hectare cultivado, os agricultores do Sul e Sudeste receberam três vezes o montante creditado aos agricultores do Nordeste. Dentro de cada uma dessas regiões, os grandes agricultores foram mais capazes de obter crédito do que os pequenos produtores. Estima-se que na década de 70 apenas entre 20 e 25% dos produtores agrícolas receberam crédito concedido pelo sistema oficial, e que menos de 5% dos agricultores receberam mais da metade do crédito total concedido ...”. 105
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
1.7 Efeitos possíveis do crédito rural A idéia básica do crédito rural é a de dar à agropecuária recursos a custos inferiores aos que teriam de ser pagos no mercado livre. Isto ocorre com base na argumentação de que os agricultores não fixam o preço de seus produtos, mas apenas tomam o preço de mercado. Isto é, a curva de demanda pelo produto de um agricultor é uma reta horizontal, ao preço fixado no mercado. A esse nível de preço, o produtor apenas decide o quanto quer vender. Assim sendo, custos financeiros elevados não podem ser repassados aos preços de produtos agrícolas, como é mais factível no caso de produtos industriais. Por isso, procura-se manter linhas de crédito à agropecuária a taxas de juros reais menores. Mas, o exposto acima não implica em subsídio real à agropecuária, como de fato ocorreu em vários anos das décadas de 70 e 80, como vimos pelos dados da Tabela 1. Esses subsídios ocorreram com o intuito de gerar grande expansão da produção agropecuária. A partir da década de 90, o crédito rural tem sido mais seletivo, havendo maior subsídio apenas para algumas categorias de produtores (como os pequenos agricultores, beneficiados pelo PRONAF). A tendência tem sido de se incentivar o setor privado a criar instrumentos de financiamento da agropecuária, cobrando juros reais positivos. Isto tem feito a taxa de juros real subir, tal como se observa na última coluna da tabela 5.
2. Instrumentos privados de financiamento do agronegócio O financiamento privado da agropecuária ocorre a longa data no Brasil, com a figura dos exportadores e atacadistas financiando o produtor e recebendo o empréstimo através de produto. No entanto, a formalização desse crédito ocorreu no Brasil em 1994 através da criação da cédula de produto rural (CPR), através do qual o sistema bancário pode atuar como avalista. No caso da CPR-Física, o produtor rural recebe de outro agente (exportador, agroindústria ou comerciante) os recursos monetários com o compromisso de entregar uma determinada quantidade de certo produto agropecuário, dentro de certa especificação, em data futura preestabelecida. O sistema bancário atua como avalista do devedor e garante ao credor o recebimento do produto no caso do produtor rural não honrar a CPR. Em 2000, foi criada a modalidade CPR-Financeira, através da qual o produtor rural recebe a vista e assume o compromisso de liquidar a CPR por um preço de resgate previamente negociado (fixo ou índice). Essa nova modalidade de CPR fez com que os bancos passassem a atuar como compradores de CPR e não apenas como avalistas das mesmas. A Lei no 11.076, de 30 de dezembro de 2004, instituiu os novos títulos de financiamento do agronegócio, os quais são: Certificado de Depósito Agropecuário (CDA), Warrant Agropecuário (WA), Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA). O quadro 1 apresenta um resumo das características desses títulos, bem como sobre a CPR, nas formas física e financeira. Os principais objetivos dos títulos expostos no quadro 1 são: a) aumentar a participação do setor privado no financiamento do agronegócio; b) aumentar a disponibilidade de capital para o setor; c) proporcionar um maior capital de giro dentro do próprio sistema; e d) aliviar os cofres públicos que não possuem recursos suficientes para atender toda a demanda por crédito rural.
106
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
108
O primeiro ponto importante a se destacar sobre os novos títulos (criados pela lei n o 11.076/ 04) é que suas abrangências deixaram de ser apenas a agropecuária, passando a envolver o agronegócio como um todo. Antes da mencionada lei, apenas os produtores rurais, cooperativas e associações, ou seja, os agentes que possuíssem o produto agropecuário é que poderiam se financiar tendo por base a produção agropecuária. Com a criação do CDCA, da LCA e do CRA, todos os agentes do sistema agroindustrial podem se financiar com a emissão destes instrumentos que se baseiam na produção agropecuária. De acordo com a lei n o 11.076/04, o CDA é definido como um título de crédito que representa a promessa de entrega do produto agropecuário, enquanto o WA é um título de crédito que confere o direito de penhor sob o produto representado pelo CDA. Ambos, o CDA e o WA, são emitidos simultaneamente de acordo com a solicitação do depositante dos produtos agropecuários em armazéns que atendam às exigências da nova lei de armazenagem (Lei n o 9.973/00) ou dos requisitos mínimos estabelecidos pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) - instrução normativa n o 32, de 12 de novembro de 2004 do MAPA ficando dispensado a emissão do recibo de depósito. Existem três formas de comercialização do CDA e do WA: 1) negociar o CDA juntamente com o WA, com o valor da mercadoria lastreada; 2) negociar apenas o WA, no qual é definido seu valor e a respectiva taxa de juros (devendo corresponder a uma porcentagem do valor da mercadoria depositada); e 3) negociar apenas o CDA, com o valor da mercadoria lastreada menos o valor do WA negociado. É importante ressaltar que no CDA não consta o valor da mercadoria depositada e sim a descrição e especificação do produto e o seu peso bruto e líquido. Estes títulos têm o potencial de proporcionar uma nova dinâmica à comercialização agropecuária, uma vez que eles permitem que os produtos agrícolas sejam negociados sem a transferência da mercadoria para o comprador. Em outras palavras, o armazém irá emitir um título lastreado no produto colhido e depositado e este título será comercializado com os investidores institucionais, que poderá negociá-lo no mercado secundário (negociações posteriores à primeira, com investidores em geral, via bolsa ou balcão), sem que ocorra a transferência física da mercadoria e a incidência de ICMS. A liquidação do CDA e WA e a retirada da mercadoria do armazém, que pode ser feita antes do vencimento dos títulos, só poderão ocorrer mediante a apresentação do CDA juntamente com o WA em nome do mesmo credor ou na situação em que o credor do CDA tenha depositado o valor do WA no respectivo custodiante. Aquele que possuir apenas o WA fica como credor do empréstimo assumido pelo dono do CDA e não poderá exercer o direito de ficar com a mercadoria uma vez que ele só possui o direito de penhor sobre a mesma. Em síntese, a liquidação do WA é feita através do pagamento, em dinheiro, do valor determinado no próprio título e no caso do CDA, sua liquidação se dá através da retirada do produto descrito no próprio título do armazém que o emitiu. O prazo de depósito com a emissão do CDA e do WA é de no máximo um ano, podendo ser prorrogado por mais um ano a pedido do respectivo credor. São obrigações do depositário: guardar, conservar e manter a qualidade e quantidade do produto, bem como entregá-lo na quantidade e qualidade descritas no CDA e no WA ao respectivo credor. Conclui-se, portanto, que a garantia do CDA é a confiabilidade no armazém emissor do título, ou seja, que não ocorra fraudes ou alterações na mercadoria definida como lastro do CDA. Já o WA, como representa uma dívida sobre o CDA, também possui como garantia a confiabilidade do emissor, uma vez que sua garantia é o CDA. A legislação permite que sejam concedidas garantias adicionais aos títulos emitidos, porém, estas garantias adicionais devem ser citadas no próprio título. Espera-se que CDA e WA devam atrair todos os tipos de investidores interessados, desde pessoa física à jurídica, em especial os fundos de investimento. A principal idéia destes títulos é trazer o capital destes investidores para os setores que compõem o agronegócio. Em especial, tanto o CDA como o WA, também deverão atrair as agroindústrias e demais investidores que necessitam do produto agropecuário. Os CDCA, LCA e CRA foram criados com o objetivo de envolver como emissores outros agentes do agronegócio que não os produtores rurais e, com isso, têm o potencial de ampliar
os recursos para o financiamento do agronegócio. Esses títulos possuem a mesma função, porém, com emissores diferenciados. O CDCA é de emissão exclusiva de cooperativas de produtores rurais ou pessoas jurídicas que exerçam a atividade de comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos e insumos agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária. A LCA é de emissão exclusiva de instituições financeiras públicas ou privadas. E o CRA é de emissão exclusiva das companhias securitizadoras de direitos creditórios do agronegócio. Com relação ao CRA, as companhias securitizadoras de direitos creditórios do agronegócio são classificadas como instituições não-financeiras que possuem o objetivo de adquirir e securitizar os respectivos recebíveis do agronegócio. Assim, estas companhias podem emitir e disponibilizar títulos de créditos lastreados nestes recebíveis a todos os investidores do mercado financeiro e de capitais. CDCA, LCA e CRA são títulos lastreados em recebíveis originados de negociação entre os agentes do agronegócio, sendo que cada título poderá ser vinculado aos direitos creditórios que o seu respectivo emissor possua, ou seja, é uma espécie de repasse destes recebíveis aos investidores privados antes dos seus vencimentos. De acordo com a lei que os criou, estes recebíveis foram denominados de Direitos Creditórios do Agronegócio (DCA). Dentre os possíveis recebíveis pode-se citar: Notas Promissórias Rurais (NPR), Duplicatas Rurais (DR), Cédula de Produto Rural (CPR), Certificado de Depósito Agropecuário (CDA) e o Warrant Agropecuário (WA), contratos de fornecimento futuro e outros títulos que a legislação permite que estas pessoas jurídicas emitam em suas operações comerciais. Os CDCA, LCA e CRA representam pagamento futuro em dinheiro ao respectivo credor, de livre negociação, lastreados nos respectivos DCAs. Nas suas liquidações ocorre o pagamento do valor de face do título, sendo que as garantias são os créditos do próprio emissor que, ao emitirem estes títulos, passaram a assumir o vencimento dos DCAs, ou seja, ao comprar estes títulos o investidor passou a comprar um DCA com risco do emissor do CDCA, LCA ou do CRA. A própria legislação, como no caso do CDA/WA, também permite que outras garantias sejam dadas aos respectivos títulos emitidos desde que descritas nos mesmos. Nesse ponto surge a vantagem da LCA, pois ela pode ter como garantia uma instituição financeira de porte e renome nacional, dando a ela maior atratividade ao comprador. O principal objetivo destes títulos é aumentar a disponibilidade de capital para os agentes do agronegócio que financiam e disponibilizam crédito para o produtor rural e as respectivas cooperativas. A emissão e negociação destes três títulos de crédito deverão constituir e concretizar um mercado secundário dos direitos creditórios do agronegócio, tendo o investidor institucional privado, pessoa física ou jurídica, como principal fonte de recurso deste mercado. Uma vez que os três novos títulos (CDCA, LCA e CRA) são lastreados por outros títulos de crédito e não mais pelo produto agropecuário - como no caso da CPR, do CDA/WA e dos outros DCAs - estes três novos títulos assumem um caráter derivativo, proporcionando uma maior facilidade e aproximação do setor financeiro com o setor agropecuário. Em síntese, pode-se dizer que os CDCA, LCA e CRA inovaram os títulos utilizados pelo setor em dois aspectos: (a) ampliou sua abrangência do setor rural produtivo para o agronegócio como um todo; e (b) estes títulos assumem um caráter derivativo. CDA, WA, CDCA, LCA e CRA podem ser negociados como ativos financeiros em bolsas de valores e de mercadorias e futuros ou em mercados de balcão autorizados pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Os títulos podem ser renegociados até o seu vencimento com outros investidores no mercado secundário.
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2.1 Desempenho dos instrumentos privados de financiamento da agropecuária Esse item analisa o volume negociado dos títulos privados de financiamento da agropecuária e do agronegócio (subitem 2.2) e as taxas de juros praticadas nessas negociações (subitem 2.3). Ênfase é dada à safra 2004/2005, ou seja, ao período de julho de 109
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
2004 a junho de 2005, pois a maioria dos instrumentos aqui considerados foi criada em dezembro de 2004. Devido à escassez de dados, apenas as operações realizadas pelo Banco do Brasil são analisadas.
2.2 Volume negociado dos títulos privados Não existe levantamento sistemático e oficial dos volumes negociados dos títulos resumidos no quadro 1. No caso da CPR, há registro das que são negociadas via instituições financeiras. No entanto, existem CPR negociadas diretamente entre produtores rurais e agroindústrias, entre produtores rurais e exportadores e entre produtores rurais e empresas de venda de insumos. Essas CPR não são, normalmente, registradas em cartório e são conhecidas como CPR de gaveta. As CPR que têm o aval do sistema financeiro são registradas em cartório de notas, sendo o Banco do Brasil a instituição financeira que mais opera esse instrumento. A figura 1 apresenta a evolução anual do número e do valor das CPR negociadas pelo Banco do Brasil desde 1994. É visível que o grande crescimento do volume de CPR aconteceu a partir de 2000 e se deveu à criação das CPR financeiras. Em 1999, foram negociadas 2.363 CPRs pelo Banco do Brasil no valor total de R$ 297,51 milhões (a poder de compra de dezembro de 2004). No ano seguinte, foram negociadas 13.293 CPRs ao valor total de R$ 1,070 bilhão (também a poder de compra de dezembro de 2004). Do valor negociado de CPR em 2000, 73,7% foi de CPR financeira. Em 2004, o valor total de CPR negociadas foi de R$ 4,7 bilhões (a preços de dezembro de 2004), das quais 90% foram de CPR financeiras. Pode-se concluir que o grande crescimento da emissão e compra de CPRs a partir de 2000 deveu-se à criação e negociação da CPR financeira. Esse título nada mais é que um empréstimo ao produtor rural, pois o comprador da CPR financeira recebe o valor emprestado em dinheiro. A vantagem para o produtor rural está em poder indexar o valor a ser pago na evolução do preço do produto que elabora, caso emita uma CPR com essa característica. 70.000 60.000 50.000 o r 40.000 e m ú 30.000 n
20.000 10.000 0
4 9 9 1
5 9 9 1
6 9 9 1
7 9 9 1
8 9 9 1
número
9 9 9 1
0 0 0 2
1 0 0 2
2 0 0 2
3 0 0 2
4 0 0 2
5.000,00 4.500,00 4.000,00 3.500,00 3.000,00 2.500,00 2.000,00 1.500,00 1.000,00 500,00 0,00
e 4 d 0 0 $ 2 R e e d d o r s b e m õ e h l i z e m d
valor real
Figura 1 – Volume de CPR negociadas pelo Banco do Brasil
110
O Banco do Brasil também foi a instituição pioneira no lançamento de LCA. A primeira negociação foi realizada em 24/02/2005, sendo que no mês de março ocorreram quatro negociações, em abril duas negociações, em maio uma única e em junho duas negociações de LCA. Os volumes mensais negociados estão na Tabela 2, onde aparecem, também, as negociações com CPR no último ano safra. Os dados da Tabela 2 indicam que as LCA corresponderam, no período em que foram negociadas, a cerca de 7% do volume negociado de CPR.
Tabela 2 – Volume mensal arrecadado com os instrumentos privados de financiamento do agronegócio – dados divulgados (valores em R$ milhões). Mês
CPR
Julho/04 Agosto/04 Setembro/04 Outubro/04 Novembro/04 Dezembro/04 Janeiro/05 Fevereiro/05 Março/05 Abril/05 Maio/05 Junho/05
475,26 454,58 448,98 465,59 608,80 607,95 315,29 337,28 437,60 488,46 562,93 409,80
LCA
CDA
27,53 34,92 22,47 16,17 52,82
5,0 -
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Fonte: Banco do Brasil e Armazéns Gerais Columbia S.A.
Não há ainda registro de negociação de CDCA e CRA, apesar de haver interesse demonstrado por agentes de mercados para emissão e compra desses títulos.
2.3 Taxas de remuneração dos títulos privados de financiamento A Tabela 3 apresenta um comparativo entre as taxas de juros praticadas nos instrumentos privados de financiamento da agropecuária e do agronegócio, no crédito rural oficial subsidiado e no crédito livre que a agropecuária e o agronegócio têm acesso. Este último está sendo avaliado pela parcela livre de aplicação da poupança captada pelo Banco do Brasil. Tabela 3 – taxas de juros praticadas por algumas fontes de financiamento da agropecuária e do agronegócio (percentagem ao ano) Mês
Julho/04 Agosto/04 Setembro/04 Outubro/04 Novembro/04 Dezembro/04 Janeiro/05 Fevereiro/05 Março/05 Abril/05 Maio/05 Junho/05
Crédito oficial A B Custeio Investimento
8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5 8 a 9,5
7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75 7,25 a 12,75
CPR Financeira 180 270 360 dias dias dias
23,53 23,53 23,54 23,41 24,10 24,33 24,62 25,54 25,26 26,72 27,03 26,99
25,26 25,26 23,94 23,58 24,15 24,23 24,44 25,42 25,04 26,62 26,91 26,67
26,99 26,99 24,39 23,84 24,33 24,25 24,23 25,28 24,90 26,55 26,71 26,27
LCA
CDA
19,12 19,66 19,94 20,06 26,39 19,75 -
Crédito Livre
20,23 20,31 19,91 17,29 17,87 19,61 19,28 18,26 21,14 19,50 21,42 22,21
Fonte: Bacha & Silva (2005b), citando Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (taxas para o crédito oficial de custeio e investimento), Banco do Brasil (CPR, LCA e a taxa de uso livre da poupança refletindo o primeiro dia útil de cada mês) e Armazéns Gerais Columbia S.A. (CDA). Nota: A- As taxas de crédito de custeio foram de 8%, 8,75% e 9,5% a.a. segundo o programa. B- As taxas para financiamento de projetos de investimento foram de 7,25%, 8,75%, 9,75% ou 12,75% de acordo com o programa e montante de crédito utilizado.
Constata-se que os custos financeiros dos instrumentos privados de financiamento da agropecuária e do agronegócio são, sem nenhuma dúvida, superiores aos do crédito rural oficial. Isto não é nenhuma surpresa, pois o crédito rural oficial é altamente favorecido ao tomador de crédito, sendo algumas vezes concedido à taxa de juros reais negativas. 111
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3 - Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) Trata-se de um mecanismo específico de política de rendas para a agropecuária, que visa minimizar as flutuações de preços recebidas pelos produtores rurais.
3.1 Origem Em 1943 foi criada a Comissão de Financiamento da Produção (CFP), transformada atualmente na Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Junto com a CFP foi instituída a Política de Preços Mínimos. Os primeiros preços mínimos foram fixados em 1945, referentes às culturas de arroz, feijão, milho, amendoim, soja e semente de girassol a serem colhidas em 1946.
3.2 Amplitude No início da década de 90, a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) abrangia 42 produtos, estando excluídos o café e a cana-de-açúcar, que na época eram sujeitos a política específica de preços mínimos. O número de produtos inclusos na PGPM tem variado de ano a ano. No ano safra 2000/01, houve a fixação de preços mínimos para 30 produtos e para 16 tipos de sementes. No ano safra 2001/02, os preços mínimos foram fixados para 34 produtos e para 16 tipos de sementes 1, alguns fixados para apenas algumas regiões e outros com valores diferentes por regiões.
3.3 Sistemática Os produtos da agropecuária estão sujeitos a uma sazonalidade de preços devido aos ciclos biológicos de produção. Assim, os preços são menores no período de safra (compare as figuras 2 e 3) e maiores no período de entressafra (compare as figuras 2 e 4). No período de safra, a oferta aumenta (deslocando a curva de oferta para a direita), o que causa a diminuição do preço de equilíbrio no mercado. Na figura 3 o preço cai de P o para P1. No período de entressafra, a oferta diminui (deslocando a curva de oferta para a esquerda), o que causa o aumento do preço de equilíbrio no mercado. Na figura 4 o preço aumento de P o para P2. P
P
P So
So
P
So S1 P2
E
E
P
P
D
D
Figura 2 - equilíbrio inicial
G E
F
P1
Qo
S2
Q
Q1 Figura 3 - equilíbrio na safra. A curva de oferta se desloca para a direita.
D Qo Q2 Figura 4 - equilíbrio na entressafra. A curva de oferta se desloca para a esquerda.
1. Os produtos com preços mínimos fixados para a safra 2001/02 foram: algodão em caroço, algodão em pluma, caroço de algodão, alho nobre, amendoim comum, arroz em casca tipo longo-fino, arroz em casca longo, aveia, canola, castanha do Pará com casca, castanha do Pará beneficiada, castanha de caju, cevada cervejeira, cera de carnaúba, feijão anão, feijão macaçar, girassol, guaraná em grão, julta/malva embonecada, julta/malva prensada, mamona em baga, mandioca em raiz, farinha de mandioca, fécula de mandioca, goma/povilho de mandioca, milho bruto, milho de pipoca, sisal bruto, sisal beneficiado, soja, sorgo, trigo, triticale e uva. As sementes com preços mínimos fixados na safra 2001/02 foram de algodão, amendoim, arroz longo-fino, arroz longo, cevada, feijão anão, feijão macaçar, girassol, julta/malva, milho híbrido, milho variedade, soja, sorgo híbrido, sorgo variedade, trigo e triticale.
112
Além disso, como há um grande número de produtores, não se consegue planejar a produção global de uma cultura. Por exemplo, se o preço atual de um produto está em nível bom, há aumento da área plantada daquele produto, aumentando a produção na próxima safra. Com isto, o preço do produto cairá na próxima safra. Se o preço atual de um produto está em nível baixo, há diminuição da área plantada daquele produto, diminuindo a produção na próxima safra. Com isto, o preço do produto aumentará na próxima safra. Visando diminuir as flutuações da renda da agropecuária (advindas da instabilidade de preços), ao longo de um ano-safra e ao longo dos anos-safras, foi criada a Política de Garantia de Preços Mínimos. A idéia é fixar antes do plantio um preço mínimo para cada produto, sendo que o Governo Federal se compromete a adquirir o produto, na época da colheita, a este preço mínimo se o preço de mercado ficar abaixo do preço mínimo. Essa é a versão AGF (Aquisição do Governo Federal) da Política de Garantia de Preços Mínimos. Para evitar do Governo Federal formar altos estoques, há a versão EGF (Empréstimo do Governo Federal). Nesse caso, o Governo Federal, na época da safra, viabiliza empréstimos aos produtores rurais para eles estocarem os produtos e vendê-los na época da entressafra. Havia duas modalidades de EGF: com opção de venda e sem opção de venda ao Governo Federal. O EGF/SOV é o Empréstimo do Governo Federal sem opção de venda ao Governo Federal. Nesse caso, vencido o empréstimo o produtor deve pagá-lo ao agente financeiro, não podendo vender o produto ao Governo Federal ao preço mínimo vigente. No caso do EGF/COV (Empréstimo do Governo Federal com opção de venda ao Governo Federal), vencido o empréstimo, o produtor poderia vender o produto ao Governo Federal ao preço mínimo vigente, se o preço de mercado fosse inferior ao preço mínimo (essa última modalidade não mais existe).
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3.4 Metodologia de cálculo do preço mínimo O cálculo do preço mínimo depende das intenções da política e das restrições orçamentárias do governo. A seguir, comentam-se dois casos factíveis de fixação de preços mínimos. Valores acima dos comentados a seguir implicam política de estímulo à produção e valores abaixo dos comentados implicam em política de desestímulo à produção. Em uma economia com poucas transações com o exterior, o preço mínimo pode ser calculado como sendo igual ao custo unitário variável. Isto é, consideram-se apenas as despesas variáveis (mão-de-obra, sementes, adubos, defensivos, sacarias, por exemplo) e não as despesas fixas (custo de uso da terra, por exemplo). A idéia é que cobrindo o custo variável unitário (CVMe), o produtor ainda continua na atividade econômica. O difícil na sistemática acima mencionada é elaborar planilhas médias de custos. No caso do Brasil, sempre houve muita discussão em torno dessas planilhas. Já em uma economia com mais transações com o exterior, o preço mínimo pode ser calculado como sendo o menor valor entre o preço de internalização do produto externo - ou seja, o preço internacional acrescido de despesas de transporte e convertido em reais – e o custo variável unitário (CVMe). Além dos esquemas acima citados, restrições legais podem criar outras formas de fixar os preços mínimos. No final da década de 70 e início da década de 80, os preços mínimos eram calculados a partir dos limites de crédito para custeio por hectare, os chamados VBC, valor básico de custeio (Goldin & Rezende, 1993, p 55). O governo fixava o VBC para cada cultura e os preços mínimos eram calculados a partir da seguinte fórmula: VBC = 0,6 x preço mínimo x produção por hectare. Quanto maior fosse o VBC, maior seria o preço mínimo.
3.5 Preço mínimo em uma economia inflacionária Durante boa parte da década de 80, com a aceleração inflacionária, houve a dificuldade de se fixar preços mínimos antes do plantio para vigorar na época da colheita. Os valores nominais calculados supondo uma inflação projetada ficavam defasados caso a inflação efetiva fosse maior do que a inflação projetada (o que de fato ocorreu em alguns anos).
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Para tanto, utilizaram-se, em alguns anos, mecanismos de indexação do preço mínimo. Ou seja, fixava-se no período de plantio o preço mínimo base e esse era corrigido por um índice de preços na época da colheita. O problema residia em: qual é o indexador melhor a ser utilizado? Tentou-se um indicador geral de inflação e um indicador de evolução dos preços dos insumos agrícolas. A partir da segunda metade da década de 90 isto não tem sido mais um problema.
3.6 Critério para venda de estoques O Governo Federal adquire estoques de produtos para, no momento oportuno, vendê-los no mercado. Teoricamente, o Governo Federal deve fixar dois preços: um preço mínimo e um preço de intervenção (de venda) para cada produto. Se o preço de mercado estiver abaixo do preço mínimo, o Governo Federal adquire o produto dos produtores. O preço de intervenção é o máximo preço que o Governo aceita para vigorar no mercado. Se o preço de mercado estiver acima do preço de intervenção, o Governo Federal leiloa seus estoques (veja a figura 5). preço Governo Federal leiloa os estoques P intervenção
P mínimo
mercado livre da intervenção do Governo Federal Governo Federal compra produtos quantidade Figura 5 - Sistema de Preços Mínimos
Mas, como fixar o preço de intervenção? Uma experiência adotada em 1987 e 1988 ilustra uma das alternativas. Foram considerados o arroz, feijão e milho, calculando como preço de intervenção para esses produtos o valor equivalente ao preço médio de atacado nos últimos 60 meses acrescido de 12% no caso de arroz e milho e de 17% no caso do feijão, a título de custo de estocagem (Goldin & Rezende, 1993, p. 27). Pode-se, para cada produto, variar qual é o valor equivalente ao preço médio de mercado (média de qual período?), bem como variar a taxa atribuída à cobertura do custo de estocagem.
3.7 Recursos necessários para executar a Política de Garantia de Preços Mínimos A Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) é uma política de caráter universal, ou seja, o Governo Federal se compromete, caso haja recursos, a executar AGF (Aquisição do Governo Federal) e EGF (Empréstimo do Governo Federal) para os produtos incluídos nessa política, caso o preço de mercado fique abaixo do preço mínimo. Contudo, a efetividade da PGPM pode ficar seriamente comprometida se não houver recursos suficientes, o que, de fato, aconteceu em vários anos da década de 90. Não há custos significativos ao produtor para optar por um AGF. O produtor apenas tem que depositar o produto em um armazém credenciado pelo Governo Federal e, de posse do recibo de armazenagem, procurar a CONAB para a formalização da venda. 114
Os recursos do AGF advêm do Tesouro Nacional, enquanto os recursos do EGF são do crédito de comercialização (dentro das regras do Sistema Nacional de Crédito Rural). Na década de 90 o Governo Federal reduziu os recursos para AGF e passou a desenvolver novas alternativas para garantia de preços, que serão vistas a seguir.
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
3.8 Os contratos de opção de venda e o prêmio para escoamento de produção A realização do AGF implica liberação de recursos por parte do Tesouro Nacional. Não havendo a liberação desses recursos, não se executa o AGF. Mas, ao executar o AGF, o Governo Federal passa a dispor de estoques de produtos, com custo de armazenagem, transporte e os encargos financeiros de se ter um produto estocado. Em 1997, o Governo Federal iniciou dois outros programas de garantia de preços com características seletivas. Eles são o Contrato de Opções de Vendas de Produtos Agrícolas (COVPA) e o Prêmio para Escoamento de Produto (PEP). Diferentemente das opções de bolsa ou de balcão (liquidação financeira), esses mecanismos envolvem entregas físicas de produto, quando exercidos. O Contrato de Opções de Venda de Produtos Agrícolas (COVPA) é um seguro contra a queda de preços, sendo que o produtor rural paga por este seguro. O Governo Federal, através da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), leiloa contratos que prevêm a aquisição de um produto específico 2, a ser feita em uma certa data, para produtos depositados em lugar específico e com preço predeterminado. O produtor rural (ou sua cooperativa) compra este contrato pagando um prêmio ao Governo Federal. Atualmente, cada Contrato de Opção de Venda envolve 27 toneladas dos seguintes produtos: arroz, milho, algodão e trigo. Normalmente, a venda de COVPA é feita no período de colheita, com vencimento agendado para o período de entressafra. Se no momento do vencimento do contrato o preço de mercado é maior do que o preço de exercício do COVPA, o produtor vende o produto no mercado e perde o prêmio pago por ocasião da compra do COVPA. Se, pelo contrário, o preço de mercado é menor do que o preço de exercício do COVPA, o produtor exerce o seu direito de vender à Conab. A partir de 1997, o Governo Federal também implementou o Prêmio para Escoamento de Produto (PEP). Nesse programa, o Governo Federal se compromete a comprar um produto agrícola a seu preço mínimo (via, por exemplo, AGF ou Contratos de Opção de Venda), mas evita de estocá-lo. Para tanto, o Governo Federal faz um leilão de prêmios para um arrematante adquirir o produto diretamente do produtor. Para entender o PEP, considere três agentes econômicos: Governo Federal, produtores (que podem ser representados pelas cooperativas) e arrematantes (comerciantes ou indústrias). O Governo Federal garante ao produtor a compra de um produto ao preço mínimo de x reais por unidade. Se o preço de mercado for menor do que este valor, o produtor deseja vender o produto ao Governo Federal. Para evitar a aquisição, o Governo Federal faz um leilão, entre os arrematantes, do menor prêmio que eles desejam receber do governo para adquirir o produto dos produtores ao preço de x reais por unidade. O governo seleciona a oferta com o menor deságio. A vantagem do PEP está no Governo Federal realizar a operação de garantia de preços mínimos, mas não incorrendo nas despesas de estocagem e transporte do produto.
3.9 Comparação de desempenho do AGF, EGF, PEP E COVPA A tabela 4 apresenta o quanto foi adquirido via AGF, EGF, PEP e COVPA em relação à produção dos principais produtos agrícolas no Brasil. É nítido que AGF e EGF foram muito importantes no quinquênio 1985 a 1989, diminuindo sua importância nos anos seguintes. No período de 1997 a 2004, COVPA e PEP passam a ser importantes para a comercialização de certos produtos. 2. O COVPA iniciou-se com operações para milho. Em 1999, já estavam sendo negociados COVPA para milho, arroz e algodão. Para a safra 2001/02, os produtos sujeitos a COVPA eram arroz, milho, algodão e trigo. Na safra 2002/03 ocorreram grandes operações de COVPA para café.
115
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
Tabela 4 – importância dos instrumentos de PGPM sobre a produção de culturas selecionadas – Brasil (valores em percentagens) Produto
Período de 1985 a 1989
Período de 1990 a 1996
Período de 1997 a 2004
AGF
EGF
AGF
EGF
AGF
EGF
PEP
COVPA
Algodão
6,3
47,6
n.d.
n.d.
0,76
0
7,33
1,52
Arroz
17,8
26,6
4,66
14,82
2,02
0
0
2,22
Café
n.d.
n.d.
n.d.
n.d.
0
0
0
1,46
Feijão
6,9
4,7
n.d.
n.d.
0,87
0
0
0
Milho
13,9
10,5
2,1
9,47
2,29
0
0,41
2,53
Soja
5,1
16,4
0
4,98
0
0
0
0
Trigo
n.d.
n.d.
n.d.
n.d.
6,22
0
10,3
3,6
Fonte: Os dados de 1985 a 1989 são de Goldin e Rezende (1993, p. 56), os dados de 1990 a 1996 são de Rezende (2002) e os dados de 1997 a 2004 são da Conab. Nota: Calculou-se a média das percentagens anuais. Os dados de 2004 são até 12/11/2004.
3.10 Novos programas de garantia de preços Baseado na idéia da subvenção a ser paga pelo governo ao setor privado no PEP e no lançamento de opções de venda criado pelo COVPA, o Governo Federal criou, em 2004 e 2006, novos instrumentos de subvenção ao setor privado para ele assumir o papel de garantia de preços. Eles são:
Contratos Privados de Opção de Venda e Prêmio de Risco de Opção Privada (PROP)
Prêmio Equalizador pago ao produtor (PEPRO)
Prêmio para Equalização de valor de referência da soja em grãos (PESOJA)
3.11 Contratos Privados de Opção de Venda e Prêmio de Risco de Opção Privada - PROP Esses dois instrumentos foram criados em 31/12/2004 através da Lei n o 11.076. O objetivo é estimular agroindústrias, exportadores e cooperativas a lançarem opção de venda física de produtos agropecuários. Esse novo mecanismo prevê a ocorrência de dois leilões. No 1o leilão há a ocorrência das seguintes etapas: 1) A agroindústria, a cooperativa ou o exportador credencia-se a receber uma subvenção do Governo Federal (por exemplo, R$ 3,00 por saca) para lançar uma opção privada de venda. 2) É feito um leilão do Prêmio de Risco para Aquisição de Produto Agrícola Oriundo de Contrato Privado de Opção de Venda (PROP). 3) Nesse leilão o arrematante não paga nada ao Governo (representado pela CONAB), mas apenas a corretagem do corretor e oferece um deságio em relação à subvenção. Ou seja, o arrematante oferece uma percentagem em relação à subvenção, por exemplo, 100% ou 95%, o que implica desejar receber 100% ou 95% do valor da subvenção. A Conab seleciona o arrematante que ofertar menor percentagem de deságio. 4) A agroindústria, cooperativa ou exportador selecionado a receber o PROP é obrigado a lançar uma opção privada de venda de produto agropecuário. 116
No 2o leilão ocorre: 1) a agroindústria, cooperativa ou exportador lança uma opção privada de venda, ou seja, um direito ao produtor de vender um produto específico a aqueles agentes. Para tanto, o produtor paga um prêmio ao lançador da opção. 2) o vencimento da opção, se o preço de exercício (por exemplo, R$ 20,00 por saca) estiver abaixo do preço de mercado (R$ 21,00 por saca, por exemplo), o produtor está desobrigado de entregar o produto ao lançador da opção (agroindústria, exportador ou cooperativa) e essa nada recebe do Governo Federal. 3) no vencimento da opção, se o preço de exercício (por exemplo, R$ 20,00 por saca) estiver acima do preço de mercado (R$ 18,00 por saca, por exemplo), o produtor vende o produto ao lançador da opção e este receberá do Governo Federal a diferença entre preço de exercício e preço de mercado até o limite fixado na apólice do PROP (no caso, R$ 2,00 por saca, dos R$ 3,00 possíveis).
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
É possível às cooperativas ter um papel maior na garantia de preços através dos Contratos Privados de Opção de Venda e Prêmio de Risco de Opção Privada – PROP. As cooperativas podem participar dos dois leilões. Elas podem tanto se habilitar a obter o PROP (no 1 o leilão) como a lançarem opções de venda a seus associados (no 2 o leilão).
3.12 Prêmio Equalizador Pago ao Produtor (PEPRO) Tanto no caso do PEP quanto do PROP, a subvenção é dada ao arrematante, que pode ser uma agroindústria, exportador ou até cooperativa. No caso do PEPRO, lançado em 21/06/ 2006, a subvenção econômica é dada ao produtor ou a sua cooperativa, para que ele venda a sua mercadoria ao preço de garantia fixado pelo governo menos o valor da subvenção. Segundo a CONAB, o PEPRO “é uma subvenção econômica (prêmio) concedida ao produtor rural e/ou sua cooperativa que se disponha a vender seu produto pela diferença entre o Valor de Referência estabelecido pelo Governo Federal e o valor do Prêmio Equalizador arrematado em leilão, obedecida a legislação do ICMS vigente em cada Estado da Federação. Para obter o PEPRO, o produtor tem que se cadastrar no Serviço Eletrônico de Comercialização (SEC) da Conab e ser representado por corretor.” O valor do PEPRO é fixo, e o produtor rural nada paga para obtê-lo, exceto a comissão do corretor que o representa no SEC. Obtido o PEPRO (por exemplo, R$ 3,00 por saca) o produtor se obriga a vender o produto pela diferença entre o preço de garantia do produto (por exemplo, R$ 20,00 por saca) e o valor do PEPRO. Assim, no exemplo acima, o preço comprovado em nota fiscal passa a ser R$ 17,00 por saca. Esse valor o produtor recebe do comprador e mais R$ 3,00 por saca do PEPRO, totalizando o preço de garantia (R$ 20,00 por saca).
3.13 Prêmio para Equalização do Valor de Referência da Soja em Grãos (PESOJA) A crise financeira vivenciada pelos produtores de soja no segundo semestre de 2005 e no primeiro semestre de 2006 levou o Governo Federal a criar o PESOJA, que combina alguns aspectos do PEP com um valor fixo de subvenção ao arrematante. No caso do PEP para a soja, o arrematante tem que ofertar ao governo um valor de subvenção que deseja (o valor y) de modo a comprar do produtor a soja por um valor x. No caso do PESOJA, o governo já define o valor do y e o arrematante se compromete a comprar a soja ao valor de x. No PESOJA, o arrematante também paga ao produtor o valor x para o produto situado em certa região, transporta o produto para outra região e no final do processo o arrematante recebe o valor acertado com a CONAB. 117
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
4. Considerações Finais Este texto analisou apenas duas políticas econômicas referentes à agropecuária e a parte do agronegócio, que são as de crédito rural (instrumenos tradicionais e privados) e a de preços mínimos
Bibliografia BACHA, C.J.C. Economia e Política Agrícola no Brasil. São Paulo: Atlas, 2004. BACHA, C.J.C.; SILVA, G.S. “Crédito rural: mudanças no modelo”. In Agroanalysis, vol. 25, n. 9, p. 34-35, setembro de 2005. BACHA, C.J.C.; SILVA, G.S. “Crédito rural: o desempenho dos instrumentos privados”. In Agroanalysis, vol. 25, n. 10, p. 44-45, outubro de 2005. GOLDIN, I. & REZENDE, G.C. A agricultura brasileira na década de 80: crescimento numa economia em crise. Rio de Janeiro, IPEA (série 138), 1993. MORAIS, E.J. Análise da sistemática da equalização da taxa de juros do crédito rural no Brasil. Monografia de conclusão do curso de especialização em MBA-Agronegócio, da ESALQ/USP e Banco do Brasil, Piracicaba, 2005.
Anexo3
3. Este item contou com a colaboração de Daniel Y. Sonoda, doutorando em Economia Aplicada – ESALQ/USP e Érica Regina Rodella Donatte, graduanda em Economia da UNIMEP.
118
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
a r t a i s e s i t . v e o s n i , e a a a r v a r p e d a r r d d r n g u o i o a i a h a o s t ã d n e t o n ç a e s m n u i o a d p r o c c e e l t a r n i m a o p a a r i n m a G i a f a d u c r d s a a A o n a a e . r l n n á u a r i u f r e c f g n a e e p a i A d v s s d l i e , : m o e s t 0 0 o l , g a 5 i s 0 5 ) i r r z , 2 1 e m a $ o e e t o r 2 : : f o r s e ; s í a 2 - i l u 0 R r , a s t i ( p : e a o o d u o r h õ ã r m c 6 a o t j s f o o a h i : e i ; l d g s n d B g e o l t o ; i 0 d d i f e i i a i r e l ; 9 r l i e c s e e d ; s m m r r , t i : s á i m g , , o u l m é a z c í a s e u m s ; 5 t e o é s r i d u i r d a o l e i õ c 0 1 g n i a a a ; e ç e 0 i ; a c ; r n l r p õ C m i r t i 6 : i o l t a p 5 e : m s g i i l a o s i s i i i m g P e 0 e 1 r r e , 0 m r d m , s e m e e u : d s 5 e a r n m , e e d 5 0 i L p o s o o , v t r d u s o a 0 a i 2 : a s 0 d l 0 o a o a o ã a 2 e o 4 a m ã s 4 i ; s o c o 0 t l r d s a h a r l d i o i i ç r i u i ã : r , 4 d i c n n 1 á s o a s e : e m n l u : s a o n d a : d u o o i m o h o ã o e n u a s a u c c r p é u a í n i r l ; j l ; f c t r s u o r m i j g m a q 0 j g l i v a i i L l a e u g e q o e e u o o i a i 0 o e e t r A m s 2 S n M m A M L f S m C P O a P A c P D S • • •
•
•
•
• • •
o o z l c d e m i 2 c n v o c e e o d a , d m s m s o a o u l e p o o d m , i z c a s e e x d c r á a a o r d d i d o a v a p m P r o i t i g a m o . c a c p s a s n o a r e z e a i r n n e u a d d f s o p a •
) 3 0 0 2 ( o i e t s u c o t i d é r c o d s a c i t s í r e t c a r a c s i a p i c n i r P – 2 o r d a u Q
o s a o r % o u 5 7 , n J 8 a •
; s a s s e a e o z i ; e m m a d d d ã e e o d e o c u o a o ç s r v l , , c ã a u ó o s l ; t ã s i o o a s s s f s i a n a e ç ç ç m ç i c t i i n i i o e r r u t u e v i c s a i s d e d m v r i f r d r e u n i e m c e a t o á o o e e p ; e i r r r s s d e o s r ; s v , , ã a i e i p i c u . p m u n e s s i o l a a a ç e o a d i f R s u e d o i e d ã r o c e a r t s s u e s a o o r á o ç u ã r d v a o d i n e a u o r t a u d a a a r ç e o ; ã i o p z e r l c p ã a s s a o r i ç ç s a i t i ã a z n i a n e , a n i r m B u e u s ç l u t a p i s t m e a i o o i e c c q l i v s s d p q a s f c o e ó p s d s d a i r o m e e o c t r x n e r o e u i s e ê r r e g r s n i m P c P m f P s a P m a u r P i E i f M •
•
o o i t i e t e d d s é r u C C
•
/ º e n d 3 0 0 N , 2 E 3 / N 8 6 C 0 / M A 0 . 5 C B 3 2
•
•
•
•
• •
• • •
F D P . O T I D E R C O T X E T / L A P I C N I R P _ L A R E T A L _ U N E M / L A P I C N I R P / A P A M / E G A P / s c o d / l a t r o p / s l p / r b . v o g . a r u t l u c i r g a . w w w / / : p t t h : e t n o F
119
Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização o o a e n n d l o o s , s ã . o o a l ç a a l ã s a a a d r d r c ç i i i e d t t a d e t i u i u r t r n m n e n m t m t o a e e o s m ô d d n i s i i i a d d e l a d o o r á r é e c é s r p n e g s r A c m a a r a A c
o n s l a d a r i t i u r m t o d i a d é s r A c
e s s d o o , d r a r o t o r d u l o e p s i a o t r s e c e o v o d n o i v e s e c t t d s a s e n r , o e o r s i s o r r o m c d á e u i t c a e c r i e n f e r d e e o p d e ã o n n e . ç o e d i ) p o s c b s i e r a a u o r o i d p q p e n m a t , a i r , a l e n r e l i a d o o u m t m d o i u a t i s c d s v t e o n o i o e n r d n r r d p i n m o i e a f z o r d e i e u t o c a u t r d p n . c i n a ( d l l a o i o m p r c a i n , i l 0 0 p m s r f s , u o r 0 0 o r e a v 0 0 i o o d t m t i d 0 o p 2 t i . l a a 0 i s d o r $ é s v é a e r 0 m R r r p c c p e é s 2 0 t m o o o b $ 0 A e d N o c o R 2 •
•
s e u o . õ s s i o e . ç a a n a z d r . i i a s c t t s r 5 o n o s e i a ê n é u t a r m m a e A 2 c A s n a • •
•
•
o n s l a d a r i t i u r m t o d i a d é s r A c
o n s l a d a r i t i u r m t o d i a d é s r A c
o i r á i c i f e n e b r o p l i m 0 5 1
o i r á i c i f e n e b r o p l i m 0 8
o i r á i c i f e n e b r o p l i m 0 5 1
•
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a 8 t a e a d t r a a o 6 d s s s e e e u e u e u a d õ d õ é c e t o o o s t . . . õ o s s s s s o a i r d i s ç s ç s i i i o e . ç o o o o n a . a . a a i m a e d a a a n a i z t n a i z t n a i z t r . n r . n r . a i l a d m i s i c t s a a i c t s a a i c t s 2 c i s s s c r r r i i i n r 8 o n o e a 5 2 n o e a 5 2 n o e a 1 ê p s s s ê ê e e s n ê é u é u é u é e o t a r m m t é t r m m t é t r m m t r a o r a n a n a n c e e e A 3 c A s a A A c A s a A A c A s a A C d a m n a • •
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o n a o a % 5 7 , 8
o n a o a % 5 7 , 8
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e m e o t ; r c s ; o s o l o s p t a s s a o n s d a g a r ; e d t a d o r , o l o g o e ã ã s d ç e ç i a s s s d i v n a u s r e e z q o e s g r a i a á v n t : t v o s a e c a r e p d a r r ; e e p o c d l d o a e r e o ã ç r d a u v ã z o ã o ç i R ã a t r o ç ç t a a e a i m c b p d e i t é u u c r l p d i e s C a a r s o r g a r e d o M
N E e 3 C d , 0 A 3 0 B 9 / 2 / 0 . 6 N 3 0 º / M 5 C N 2
. e u , j s s a o c o x , d i e e s f h d a s t o i u o r n t v u f t n n o e e m e o d o m ã s c m a i t ç , i e s s c a i i e t f c o v n é r i a p e e n l n i e p s : u b e j a m a r e e i a a d c d p r o a l m a t o r a r p n u t u s e c s u r m R o e t x a s o i r õ t f ç e o i - h a i d r a l é e m e f r e p r n C s m o i a t u r f e d o r P
s a i , r s o o . . t i n ; f e í a r u u s u t o e l r n e s , u o b o l s c ã f i e o ç n ü e d i a d q t o r a n p ã a s e a a l ç r c a p u z s a r t i m l n o t u i u l n r : c e i u a v c r e d o i a d o p o m e p a l d t e , a r n o a r u e o ã u ã ç R m l a t i u o a r ç u t c r r o t c i i h s a i d c l é n r e r a r C m o c p e s
º 3 o n e 0 r g d 0 2 N , / a / E 5 e 6 N C 9 / 0 d o M A 0 . 5 r C B 3 2 P
N E e 3 C d , 0 A 4 0 B 9 / 2 / 0 . 6 N 3 0 M º / 5 C N 2
e t i e l e d s e r o t u d o r P
o s u e s d e o o a u s s ã o a v a i ç s a d t t a a a n c r n i a i e l s t í p p s f o e s m d a o c i s o e a t a s s a s r e e a s r p õ p e o , ç s a i s l f i i a a c e r o r d u u r s r o s s ã e a , s e l r r ç n a o s a o e i t t t r c u i u u t s d d d n i í o o r a d r u r n P j p m i
N E e 3 C d , 0 A 8 0 e t / B 8 / 2 i 0 e . 6 l N 3 0 o º / r M 5 P C N 2
N E e 3 C d a , 0 r A 9 0 o B 8 / 2 l f / 0 . 6 p N 3 0 o º / r M 5 P C N 2
F D P . O T I D E R C O T X E T / L A P I C N I R P _ L A R E T A L _ U N E M / L A P I C N I R P / A P A M / E G A P / s c o d / l a t r o p / s l p / r b . v o g . a r u t l u c i r g a . w w w / / : p t t h : e t n o F
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Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
s o s s o d u m l i a l o e e s a n e s s , r p t o p e a e s e i r s a n c s õ a a i ç i a d i p m a i e d a s d t u c a r c a d r i a n i i t r g r o t g t a t i r s x s n r u a c o i n A e i f o a p P
a i t n a r a G
, e o l d a a u r s a a e d o i d p i d t v a i o t d t m e % s i 0 e n n i e l d o 6 s o t e o m o t i d o i t d d n s d é l e e e a t r u ; c i v m v s ; i l i ) r n m o i d i e $ o l l s n n i m e R b o , m 0 ( . e d o m o e 5 o e r o r t o c r i a . r 0 t t 1 p 0 r i e i o s o 2 : á s i s i o d d m i n o : . t e a é c e é e e r g i r p a i e i r á v s t f a a c i r r e e h t e u r n C c t t e d a c l i a d a n s e , i e p p e u f e B e e , d , o b l o a s o v i c d á i r l i ã e r n e e i t d t o o s t e o m r õ i t b r e i m s e a i d t p l e 0 g d o m 8 n , í e p o c o i 6 l e p d u r n c a é r ; : i 4 c i L l l a c s $ o a s i ; s P i m o o d a o ã o 8 R c t e t a l i õ m l n c d n u e : n u ; o m i 4 e 0 m i l e d o o a d i d 0 o t t e m o $ n e i m d i , a 5 0 g e n d r m r t l s o s 0 e e d a ó : 0 r ã e u p R t 0 : 4 s t r o n 4 u a i a 1 9 i m ó e d m b o t ã : a h i n : : s i t e i d o n n p a m e , s a r s i a a é t e t v o e d o h a r j f i m s e h p i g l s v n i j d l o a o a e e u v a n n m n O i n e A M S M S C L D C I e i r • • •
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122
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Capítulo 5 Política de Crédito Rural e Novos Instrumentos de Financiamento e Comercialização
Questões de Revisão Classifique cada afirmativa abaixo como sendo verdadeira ou falsa. 1) Crédito rural no Brasil só existe a partir de 1965. 1965. Antes dessa data, não se se concedia crédito à agropecuá agropecuária. ria. 2) Os recursos para concessão concessão do crédito crédito rural têm têm diferentes origens, mas podem ser classificados em dois grupos: recursos oriundos de baixo custo de captação e recursos oriundos de fontes com custos normais de captação. 3) Se a taxa de inflação for de 5% ao ano ano e a taxa de juros real for de 6% ao ano, ano, a taxa de juros nominal será exatamente de 11% ao ano. 4) Entre 1970 e 2004 o ano de maior volume de crédito rural concedido no Brasil foi o de 1979, mas o ano de menor taxa de juros real foi o de 1980. 5) O crédito rural sempre sempre foi equatativamente equatativamente distribuído no no Brasil entre entre os produtores e regiões, sendo que nenhum grupo de produtor ou região foi favorecido no recebimento do crédito rural. 6) A CPR-Fina CPR-Financeira nceira permite ao emissor, o produtor rural, liquidá-la com a entrega física do produto. 7) O produtor pode negociar a CDA e WA separadamente. 8) No período da safra, a tendência dos preços de produtos agropecuários é aumentar. 9) Prêmio é a denominação dada à garantia de preços que o produtor recebe ao adquirir uma COVPA. 10) A subvenção paga pelo governo no PEP vai ao produtor e no caso do PEPRO vai para o arrematante.
F ) 0 1 F ) 9 F ) 8 V ) 7 F ) 6 F ) 5 V ) 4 F ) 3 V ) 2 F ) 1
: o t i r a b a G
123
CAPÍTULO
6
COOPERATIVISMO E ASSOCIA ASSOCIATIVISMO TIVISMO Davi R. de Moura Costa
Doutorando em Economia de Empresas – EESP/FGVSP
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
Capítulo 6 -
Cooperativismo e Associativismo
Neste capítulo serão estudados temas como cooperação, cooperativismo, vantagens das organizações cooperativas e sua importância econômica. A relevância desse tema está relacionada ao papel que essas organizações desenvolvem no agronegócio nacional, tanto no que se refere à sua proximidade junto ao produtor cooperado, quanto no papel econômico que desempenha no mercado. Para a melhor compreensão do surgimento do cooperativismo como doutrina econômica, é preciso antes de apresentar as bases teóricas do cooperativismo, apresentar alguns conceitos sobre cooperação para enfim relacioná-los numa teoria e doutrina que explique as cooperativas sobre a ótica econômica.
1.
Cooperação
No dicionário a palavra cooperação está definida como ato de operar ou agir conjuntamente. Conseqüentemente é possível afirmar que a cooperação apresenta uma relação entre dois, ou mais, agentes econômicos ou seres vivos. No que se refere à definição econômica da cooperação, Menard (2005) aponta que se trata de uma voluntariedade entre os agentes econômicos para unir seus recursos próprios quando existirem benefícios para todos os envolvidos a partir dessa união. Diante dessa definição recorre-se a 03 importantes correntes teóricas da economia para explicar o surgimento da cooperação. A primeira delas é a microeconomia neoclássica que estuda o comportamento do consumidor e assume que esse tem racionalidade na sua escolha. Portanto, irá sempre querer maximizar seu nível de satisfação, representado por uma função utilidade 1. Assim, quando se considera o ato de cooperar como um bem, o consumidor irá optar em cooperar, se e somente se este bem lhe trouxer um maior nível de utilidade, quando comparado com outro bem – não cooperação. Portanto, o agente econômico irá cooperar se obtiver maior utilidade na cooperação. Pois, essa ação permitirá que compartilhe parte do capital envolvido no processo de produção implicando em alterações na sua função de produção permitindo-lhe uma expansão no seu nível de renda. A partir daí poderá atingir um nível de satisfação via consumo maior. Nessa mesma linha de definição Bialoskorski Neto (1994), citando Eschenburg (1983), diz que na formação da cooperação o indivíduo toma uma decisão só quando a cooperação possibilita uma maior satisfação de suas necessidades, comparando sempre a cooperação com outras possibilidades de ação que seria a não cooperação. Uma segunda linha teórica que explica a cooperação utiliza o ferramental matemático da teoria dos jogos. Primeiramente é preciso entender de uma forma bastante simplificada a “idéia” da teoria dos jogos, uma vez que sua formalização algébrica é um pouco mais complicada. Uma forma interessante de entender o conceito é o leitor, nesse momento, imaginar que está jogando o “jogo da velha” ou uma partida de xadrez. Note que para decidir qual movimento (decisão) deverá ser realizado, o passo inicial do jogador é considerar qual será a possível reação do oponente à sua jogada e da mesma forma seu oponente estará refletindo. 1. Para um aprofundamento consultar PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Microeconomia. 5 ed. São Paulo: Prentice Hall, 2002. 711p
126
Essa teoria divide os jogos em dois tipos: os não cooperativos e os cooperativos. O primeiro ocorre quando não é possível a negociação entre os participantes, enquanto que o segundo é caracterizado quando os agentes econômicos negociam entre si, ou seja combinam suas jogadas. O jogo de xadrez é um exemplo de jogo não cooperativo pois os jogadores não conseguem estabelecer qual será o lance mais adequado para todos, pois um deles sempre perde. As cooperativas, associações, inclusive cartéis, podem ser exemplos de jogos cooperativos, pois a premissa é que os “jogadores” conseguem combinar a melhor jogada. O exemplo clássico da cooperação surge na teoria dos jogos, quando Axelrod (1990) apresenta a estratégia “ tit for tat ” mais adequada para o dilema dos prisioneiros 2 e demonstra que haveria um equilíbrio melhor para todos os envolvidos quando a decisão de cooperar fosse a decisão tomada. Com base no conceito da cooperação via dilema do prisioneiro, Bialoskorski Neto (1998) aponta o “dilema do cooperante”, mas que para fins didáticos pode ser denominado como o dilema do produtor. Utilizando os mesmos conceitos é possível imaginar que os produtores rurais estando num mercado com imperfeições seriam levados a uma condição de decidir se deveriam cooperar ou não cooperar com os demais produtores, criando assim interdependência mútua das suas ações e com isso ficando definida uma matriz de retornos 3. Então, se espera que os produtores visualizem o melhor resultado na cooperação, haja vista ser esta a estratégia mais adequada para ambos envolvidos. A figura 1 apresenta o produtor diante das duas situações: ele precisa decidir entre cooperar ou não cooperar. Produto A Cooperar B r o t u d o r P
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
Não Cooperar
Cooperar
(3) , (3)
(0) , (5)
Não Cooperar
(5) , (0)
(1) , (1)
Figura 1 - Matriz de retorno advindos de uma decisão tomada pelo produtor entre cooperar ou não cooperar. Fonte: adaptado de Bialoskorski Neto (1998)
Observa-se na matriz que a melhor estratégia é a cooperação, pois se ambos os produtores cooperarem obtêm os melhores resultados conjuntamente, representados pelo ganho do jogador A (3) e do jogador B (3). Sendo essa uma posição de equilíbrio. A cooperação apenas por parte de A e a não cooperação por parte de B fará com que B tenha um melhor resultado (5) do que A (0). Ocorrendo o mesmo se A não coopera, enquanto B coopera. Complementando a análise ambos obteriam resultado (1) se não cooperassem. A terceira linha teórica para explicar o surgimento da cooperação é apontada como a nova economia institucional, sobretudo a economia dos custos de transação 4 por meio dos trabalhos de Williamson (1993) a partir das proposituras de Coase (1937). Por esta vertente teórica a cooperação surge à medida que reduz os custos de transação envolvidos numa atividade econômica, ou seja, dois produtores cooperam entre eles se e somente se essa cooperação reduz seus custos de transação.
2. Para maiores informações consultar Axelrod, R. The evolution of co -operation , Londom, Penguim Books. 1990. 223p. 3. Matriz de retorno é uma apresentação sintética usada na teoria dos jogos dos possíveis resultados a serem alcançados pelos agentes econômicos estudados à medida que adota determinada decisão. 4. A economia dos custos de transação (ECT) tem como enfoque de análise as empresas e as define como “nexo de contratos”, ficando caracterizadas como uma estrutura de governança e não uma função de produção como definia a teoria neoclássica. Os economistas que seguem a linha da ECT definem custos de transação como os custos de funcionamento de um sistema econômico.
127
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
128
Utilizando os conceitos teóricos apresentados acima é preciso entender em que ambiente a cooperação surge. Nesse sentido os trabalhos de Cook (1995) apontam que a cooperação surge na agropecuária sempre que existir excessos de oferta que provocam a depressão dos preços ou falhas de mercado 5, pois essas situações caracterizam um ambiente onde os agentes visualizam os benefícios de agirem de forma coletiva. De acordo com Williamson (1993), a cooperação pode gerar algumas vantagens para os envolvidos, dentre elas: economia de escala na aquisição da informação, mitigação da seleção adversa e risco moral e aumento da produtividade, devido ao senso de responsabilidade. A economia de escala na aquisição da informação ocorrerá sempre que o custo médio de longo prazo dos agentes econômicos envolvidos na transação se reduzirem à medida que aumenta a quantidade de informação levantada. Uma clarificação desse conceito pode ser dada apresentando o seguinte exemplo: suponha que existam diversos produtores de soja e que cada um deles precisa acessar a Internet para obter informações a respeito do comportamento do preço do produto na Bolsa de Chicago. Assim, cada produtor deverá ter um computador com acesso a Internet ou contratar um serviço de informações econômicas para saber o preço do produto. Então haverá um custo de obtenção dessa informação. Portanto, se eles cooperarem seus meios de comunicação, por exemplo o computador e a linha de acesso, haverá uma redução nos seus custos médios à medida que se aumente a quantidade de informação a ser obtida. A mitigação da seleção adversa e risco moral irá ocorrer à medida que a cooperação diminui a assimetria de informação entre os agentes econômicos participantes de um contrato. Retomando o exemplo dos produtores de soja, é provável que entre eles exista um nível de informação diferente sobre os preços. Assim, a partir do momento que passam a buscar conjuntamente a informação via cooperação, ocorre uma diminuição dessa assimetria informacional; com isso reduzindo a possibilidade da ocorrência de seleção adversa e risco moral6. Segundo o autor, da união desses agentes pode ocorrer o surgimento de diferentes arranjos contratuais, como, por exemplo, aliança estratégica entre firmas e organizações cooperativas. Em termos teóricos é possível, com base nas definições sobre empresas híbridas 7 apresentadas por Menard (2002), classificar as relações de cooperação entre as organizações em: redes de relacionamento (networks) entre os agentes econômicos e integração vertical de distintos processos produtivos, etc. Para RIBAULT et al. (1995) uma rede de empresas é um modo de agrupamento de empresas destinado a favorecer a atividade de cada uma delas sem que estas tenham necessariamente laços financeiros entre si. Portanto, pode ser caracterizado como um modo de cooperação por afinidade de natureza informal e torna cada empresa envolvida responsável pelo seu próprio desenvolvimento. As redes de relacionamento (networks) ocorrem na agropecuária brasileira em situações quase cotidianas, indo desde empréstimos de uma máquina, implemento, troca de dias de serviços entre os produtores, até a criação de canais de distribuição, desenvolvimento de produtos. A integração vertical é caracterizada como uma estratégia de cooperação que visa reduzir os custos de transação e garantir a oferta de insumos ou produtos. Nesse processo, ambos agentes acordam entre si todo o processo a ser realizado, bem como as penalidades caso os contratos não sejam seguidos. 5. Falhas de mercado que podem ocorrer na agropecuária são monopsônios, oligopólios, assimetria de informação e externalidades. Caso o leitor deseja obter mais conhecimento sobre o assunto é necessário consultar a literatura especializada de microeconomia e organização industrial. 6.Seleção adversa e risco moral são classificações dadas aos comportamentos dos agentes devido à existência de assimetria de informação. A seleção adversa ocorre quando a assimetria existe antes do contrato enquanto que o risco moral ocorre quando a assimetria passa a ocorrer posterior a realização do contrato. 7. Empresas híbridas são empresas que possuem uma estrutura de governança que está entre a forma hierárquica e a forma mercado, sendo definida com base na especificidade do ativo, nível de incerteza e frequência das transações. Para maiores detalhes consultar Willianson, O.E. Transaction cost economics and organization theory . Berkeley: University of California, Berkeley. 1993. 58p.
O sistema de integração como mecanismo de cooperação na agropecuária ficou famoso pelos exemplos do frango e do fumo, mas que também existem em outras atividades. Juntando esses dois conceitos de cooperação e analisando as vertentes teóricas do estudo de cooperativas apresentadas por Cook et al. (2004) é possível considerar cooperativa tanto como uma forma de network, quanto de integração vertical. Portanto, considerando que a cooperação na agropecuária ocorre se e somente se beneficiam todos os envolvidos, e que cooperativa é uma forma de cooperação, faz-se um convite ao leitor para refletir sobre a seguinte indagação: - o que levaria os agentes econômicos a se unirem para constituírem uma cooperativa? Cook (1993) elabora uma pesquisa junto aos produtores americanos e averigua que as cooperativas surgem para evitar as conseqüências negativas do poder de mercado das grandes empresas atuantes na agropecuária, buscar economia de escala na produção e comercialização de seus produtos, reduzir seus níveis de riscos, obtenção de serviços não fornecidos pelo governo e aumentar os ganhos marginais sobre os seus produtos.
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
2. Doutrina Cooperativista O cooperativismo, também denominado de cooperação cooperativa 8, tem se respaldado em questões teóricas e doutrinárias, sendo essas vertentes complementares. Schneider (2001) faz uma descrição do ambiente econômico e social em que surge a cooperação cooperativa que origina o movimento cooperativista de vertente Rochdaleana 9 enquanto doutrina. “O trabalhador era submetido ao trabalho de 14 a 16 horas por dia, inclusive as mulheres e crianças. Estas eram aproveitadas especialmente nas minas de carvão, prejudicando prematuramente sua saúde. Não havia nesta época nenhuma legislação trabalhista ou previdenciária, nem sindicatos que defendessem a classe trabalhadora. Estavam totalmente a mercê das condições impostas pelos empresários industriais. Por outro lado, os trabalhadores eram enxotados do interior rural para dar lugar à expansão das pastagens para a criação de ovelhas, cuja lã era demandada pelas indústrias de fiação e tecelagem, as industrias de ponta da época. Junto aos pólos de industrialização, os operários amontoavamse nas vilas operárias, sem ou quase nenhum serviço de infra-estrutura urbana por parte dos poderes públicos. E ali, na sua maioria analfabetos, eram explorados pelos comerciantes que os fraudavam nos pesos, nas medidas ou na qualidade das mercadorias.” Schneider (2001, p. 112) Pode-se perceber na descrição que existiam problemas de falhas de mercado que causavam profundas crises sociais no mundo, pós-revolução industrial do século XIX, e que isso motiva a criação em 1844 na Inglaterra, mais especificamente na cidade de Rochdale, da primeira cooperativa, denominada Rochdale Equitable Pionners Society Ltd. A atitude considerada pioneira para época foi baseada, em parte, de acordo com Bialoskorski Neto (1998), pelo pensamento econômico originado pelos socialistas utópicos 10, mas que tudo só foi possível graças à coragem e espírito pioneiro dos tecelões de Rochdale.
8. Pinho (2001) procura esclarecer que mesmo o nome sendo pleonástico ele vem de uma tradução de termos alemães que geram o real significado. 9. Schneider (2001) aponta que esse termo é dado às cooperativas que surgem seguindo os valores e princípios adotados pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI), que foram criados com base nas experiências frutíferas da Cooperativa dos Pioneiros de Rochdale. 10. Esse conceito será mais explorado quando for abordada a parte teórica da cooperação cooperativa.
129
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
A partir dos ideários dos socialistas utópicos, Pinho (2001) conclui que foram deles as principais características que nortearam os princípios que regeriam o movimento cooperativista. Segundo Amodeo (1999), Bialoskorski Neto (1994), e Pinho (2001) os mais importantes pensadores que contribuíram para o surgimento do cooperativismo foram: Robert Owen; François Marie Charles Fourier; William King; Philippe Joseph Benjamin Buchez; e Louis Blanc11. Diante do êxito da cooperativa de Rochdale e das idéias difundidas pelos socialistas utópicos, outras cooperativas começam a surgir e crescer culminando num movimento internacional de cooperativas que se consolida, em 1895, com a criação da Aliança Cooperativa Internacional (ACI) para representar todas as entidades cooperativas do mundo. A ACI define que “cooperativa é uma associação autônoma de pessoas que se unem, voluntariamente, para satisfazer aspirações e necessidades econômicas, sociais e culturais comuns, por meio de uma empresa de propriedade coletiva e gerida democraticamente”. A definição deixa claro que uma cooperativa é um instrumento de cooperação utilizado pelos agentes econômicos para poder realizar atividades que venham de encontro à suas necessidades econômicas e sociais, estabelecendo a partir daí um caráter doutrinário econômico ao movimento cooperativista, com base nos êxito dos pioneiros de Rochdale. A doutrina econômica, como proposta de reforma social, contém um projeto utópico, imaginário, de transformação da ordem social existente e de construção de uma sociedade considerada perfeita para seus realizadores (Pinho 2001) Com base nesta definição a autora escreve que, de modo geral, a doutrina cooperativista é uma proposta de mudança do meio econômico e social, que se concretizaria de modo pacífico e gradativo, por meio de cooperativas de múltiplos tipos e que se caracterizaria pela prestação de serviços sem fins lucrativos; eliminação dos assalariados, que passam a ser associados cooperativistas; substituição da competição pela cooperação, etc. Portanto, do novo desenho organizacional das relações econômicas entre os agentes e os meios de produção e de uma demasiada utopia surgiria o caminho para promover a reforma social e, portanto o cooperativismo como doutrina econômica. Para garantir a validade da sua definição e reforçar a ótica doutrinária do cooperativismo a ACI estabelece que todas as cooperativas de vertente Rochdaleana devem ser geridas com base em valores e princípios relacionados à cooperação, que foram redigidos com base no estatuto da cooperativa de Rochdale. Os valores fraternidade, igualdade, liberdade e solidariedade, têm como principal objetivo nortear as políticas de relacionamento entre os cooperados e desses com a cooperativa. Atualmente os princípios 12 que devem ser seguidos por todas as cooperativas filiadas movimento cooperativista vinculado a ACI são: I. Adesão livre e voluntária; II. Controle democrático pelos cooperados; III. Participação econômica dos sócios; IV. Independência e autonomia das cooperativas; V. Educação, treinamento e formação; VI. Cooperação entre cooperativas; e VII. Preocupação com a comunidade.
11. Maiores informações sobre esses pensadores podem ser encontradas no site da Aliança Cooperativa Internacional – ACI (www.coop.org) e em livros especializados em história do cooperativismo. 12. Os princípios e sua aplicação podem ser visualizado no site da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) (www.ocb.org.br)
130
3. Cooperativas no agronegócio brasileiro Para melhor visualização do cooperativismo no Brasil serão apresentados os números do cooperativismo, bem como seu sistema de representação e em seguida descrito o ambiente institucional que rege e caracteriza essas organizações.
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
3.1 A forma de representação e os números do cooperativismo O sistema cooperativista brasileiro é representado pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) que se estabelece nos Estados da federação por meio das denominadas Organizações Estaduais (OCE’s). A sua forma de representação é exposta na figura 02. Para constituir uma cooperativa são necessários ao menos 20 cooperados, conforme estabelece a lei 5764/71. As cooperativas singulares, no mínimo três, podem se constituir em cooperativas centrais ou federações, podendo uma central também estar vinculada a uma federação. Já as confederações são formadas por ao menos três federações, sendo que todas elas se filiam à organização estadual, que é a representante da OCB. Por fim a organização nacional está vinculada a Organização das Cooperativas da América (OCA) que se filia a ACI, constituindo assim o sistema internacional.
ACI OCA OCB OCE´s = 27 Confederações = 13 Federações = 76 Cooperativas Centrais = 81 Cooperativas singulares = 7.136 Cooperados = 6.159.658
Figura 2 – Sistema de representação do formato de organização das cooperativas brasileiras
Na tabela 1 são apresentados os números do cooperativismo brasileiro. Em 2005 existiam no Brasil 7.518 cooperativas que congregavam cerca de 6,7 milhões de cooperados, distribuídos em 13 ramos de atividade, e empregavam 199 mil pessoas e contribuíram diretamente para 6% do PIB brasileiro. A partir dos dados da tabela é possível apontar que os cooperados brasileiros estavam, na sua maioria, concentrados nos ramos consumo, com 33% do total, crédito, com 25% e em terceiro lugar o agropecuário, com 16%. O ramo com maior número de cooperativas era o de trabalho, 27%, seguido pelo agropecuário, com 21% e o crédito, com 15%. Em se tratando de empregados, o ramo que mais empregos diretos criava era o agropecuário, que contribuía com 61%, seguido pelos ramos crédito e saúde, cada um contribuindo com aproximadamente 13% do total. 131
Tabela 1 – Ramos do cooperativismo brasileiro em 2005. Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
Ramo de Atividade
Cooperativas
Associados
Empregados
Agropecuário Consumo Crédito Educacional Especial Habitacional Infra-estrutura Mineral Produção Saúde Trabalho Transporte Turismo e Laser
1.514 147 1.101 319 10 355 160 44 173 899 1.994 783 19
879.918 2.181.112 2.164,499 73.951 529 91.299 600.399 15.212 17.569 297.868 425.181 50.600 2.917
123.368 6.938 20.555 3.144 1.562 5.213 52 323 28.599 6.506 3.411 9
Totais
7.518
6.791.054
199.680
Fonte: Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) (2006) Dos ramos apresentados na tabela 1, o agropecuário e infra-estrutura são na sua totalidade vinculados diretamente ao agronegócio. Além desses, os ramos de crédito, trabalho, transporte, turismo e lazer possuem cooperativas também atuantes no agronegócio brasileiro. O ramo de crédito está vinculado ao agronegócio por meio das cooperativas de crédito rural, enquanto que o de trabalho e transporte por possuírem cooperativas compostas por profissionais que prestam serviços diretamente à esse setor. Já o de turismo e lazer por englobar as cooperativas de turismo rural. As cooperativas de crédito rural têm como objetivo promover a alavancagem financeira de seus cooperados, financiar recursos para a consecução das suas atividades, viabilizar adesão às novas tecnologias, propiciar acesso a crédito mais barato e prestar serviços financeiros aos associados. Já as cooperativas de eletrificação rural possuem como função criar condições de acesso a energia elétrica e prover a manutenção dos serviços básicos vinculados ao seu fornecimento. É importante ressaltar ainda a característica da distribuição geográfica das cooperativas, pois estão distribuídas em todas as regiões brasileiras. Na figura 3, é apresentado como se dá essa localização.
Nordeste 23%
Sul 19%
Norte 9%
CentroOeste
Sudeste 39%
10%
Figura 3 – Distribuição das Cooperativas nas regiões do Brasil em 2005. Fonte: Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) (2006)
132
É possível notar que 10% das cooperativas estavam na região centro-oeste, 22% no nordeste, 9% no norte, 39% no sudeste e 19% na região sul. De acordo com Bialoskorski Neto (2004) as cooperativas agropecuárias apresentam funções consideradas importantes aos produtores cooperados, entre elas: barganha por melhores preços; possibilidade de agregação de valor ao produto; acesso a mercados, inclusive internacionais; e possibilidade de acesso e adoção de tecnologias. A Tabela 2 apresenta a participação das cooperativas agropecuárias brasileiras na produção em 2005. Para dar suporte e agregar valor à produção do cooperado as organizações cooperativas executam diversas atividades, participando praticamente de toda a cadeia agroindustrial, ou seja, atuam de forma intensa no processo de produção, beneficiamento, armazenamento, industrialização e comercialização. Ainda, atuam como importantes instrumentos de difusão tecnológica e assistência técnica, acesso ao crédito rural e programas de conservação de solo, manejo de pragas e meio ambiente (OCEPAR) (2003).
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
Tabela 2 – Participação das cooperativas agropecuárias na produção agropecuária brasileira em 2005.
Participação das cooperativas agropecuárias na produção nacional Produto Participação Trigo Cevada Aveia Algodão Suínos Soja Café Milho
62% 44% 39% 39% 31% 29% 28% 17%
Fonte: OCB (2006) As cooperativas agropecuárias, por manterem estruturas de prestação de serviços de armazenamento e beneficiamento aos cooperados e quando possível a não cooperados mantinham, de acordo com a OCB (2006), um total de 2.568 unidades de armazenamento que correspondiam a mais de 18% do total do Brasil e aproximadamente 23,6% da capacidade estática instalada no país.
3.2 Vantagens da organização cooperativa O cooperativismo apresenta vantagens para o cooperado, mercado e sociedade de forma geral. De acordo com Cook (1993), Spear (2000) e Bialoskorski Neto (1994) a vantagem da cooperativa para o associado se caracteriza pelo aumento no seu nível de renda, acesso ao mercado, redução de riscos, dentre outras. O aumento da renda ocorre à medida que a cooperativa tem potencial para agregar as produções do cooperado, gerando economia de escala e com isso aumentando seu poder de negociação. Outro fator que contribui para esse aumento é a redução nos custos de transação do cooperado e otimização das suas estruturas de capital. Além desses fatores um outro fator que merece destaque é a possibilidade da cooperativa executar o retorno pró-rata, ou seja, a medida que não visa lucro. Pois, se ao final do período o resultado for positivo esse será levado à assembléia geral ordinária para decidir o que é feito com o recurso, podendo inclusive ser distribuído proporcionalmente à transação de cada cooperado. O acesso ao mercado é proporcionado pelo fato das cooperativas unificarem a produção dos cooperados e com isso garantir quantidade, qualidade e continuidade de entrega dos produtos. 133
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
A redução de risco ocorre a medida que a cooperativa promove a difusão de informação e tecnologia aos cooperados, por meio do fornecimento de assistência técnica e boletins informativos. Além disso, podem elaborar estratégias de hedge tanto cambial quanto de mercado. Para o mercado onde está inserida a cooperativa promove a padronização de produtos e nivelamento dos preços, pois sua presença faz com que as empresas concorrentes tenham como padrão mínimo de qualidade do produto ou preço aqueles praticados pela cooperativa. Já para a sociedade, as cooperativas contribuem à medida que geram empregos e divisas e contribuem para reduzir possíveis falhas de mercado, tais como poder de mercado e assimetria de informação. A redução do poder de mercado efetuado pelas cooperativas se caracteriza no momento que sua presença minimiza o efeito dos oligopólios que se estabelecem na atividade rural. Quanto à assimetria de informação o papel das cooperativas se verifica quando promovem fornecimento de informações e padrões de preços de compra e venda de produtos agrícolas, fazendo com isso que seja reduzido o desnível de informação entre os agentes de mercado e os cooperados.
3.3 Ambiente institucional do cooperativismo brasileiro No Quadro 1 são apresentadas, em ordem cronológica, as principais mudanças do ambiente institucional das cooperativas brasileiras e os instrumentos jurídicos que promoveram as alterações. Quadro 1 - Principais mudanças no ambiente institucional das cooperativas antes de 1988. Ano
Instrumento Jurídico
796, 869 e 1890 Decretos 1.429 1903 Decreto 979 1907 1932 1938 1941 1942 1943 1951 1966 1971 1983 1984 1988
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Fato Marcante
Permitiu a criação das sociedades ou companhias cooperativas.
Primeira referência às cooperativas de produção. Dá o disciplinamento jurídico para o funcionamento das Lei 1.637 cooperativas brasileiras. Permite às cooperativas poderem ser constituídas Decreto 22.239 independentes de autorização governamental, bastando apenas se registrar na Junta Comercial. Decreto 581 Promove a reedição do Decreto 22.239/32. Estabelece que as cooperativas passem a ser fiscalizadas, e o Decreto 22.239 registro no Ministério da Agricultura, além da Junta Comercial, (reeditado) passa a ser obrigatório. Regulamenta a forma como deveria ocorrer a fiscalização das Decreto 6.980 cooperativas. Estabelece o processo de intervenção nas sociedades Lei 5.154 cooperativas. Decreto-lei 5893 Cria a Caixa de Crédito Cooperativo Transforma a Caixa de Crédito Cooperativo no Banco Nacional Lei 1412 de Crédito Cooperativo Decreto lei 59 Cria o Conselho Nacional de Cooperativismo. Criação da atual lei que regulamenta o funcionamento das Lei 5.764 cooperativas. Divide a fiscalização das cooperativas entre INCRA, BACEN e Decreto 68.153 BNH. Ocorrência dos projetos pilotos de Autocontrole, entre INCRA e OCEPAR ou OCERGS. Transferência das atividades de controle, fiscalização e Decreto 90.393 intervenção das cooperativas agropecuárias do INCRA para o SENACOOP. Ocorrência do X CBC, que estabelece como prioridade a busca pela autogestão do sistema cooperativista. Constituição Federal A Constituição Federal estabelece que fica o Estado impedido de de 1988 interferir no funcionamento das cooperativas.
É importante, com base no quadro 1, destacar a Lei 5764 criada em 1971 e que regulamenta até hoje o funcionamento das cooperativas brasileiras, mas que a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 passa a ter algumas “lacunas jurídicas”, pois não se tem mais definido algumas questões relativas à fiscalização das atividades desenvolvidas por essas organizações. As alterações institucionais marcantes que merecem destaque para o cooperativismo, após a Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1988), são os atos do Governo Federal que estabeleceram o fim das atividades do Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC), por meio do Plano Collor I 13 e a não-nomeação dos integrantes do Conselho Nacional do Cooperativismo (CNC), acarretando na sua inoperância. No ano de 1998, outra mudança importante no ambiente institucional para o cooperativismo foi a criação do seu Sistema “S”, denominado de Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCOOP), por meio da Medida Provisória nº 1.715/98, reeditada posteriormente sob o nº 2168-40, com objetivo de fomentar a profissionalização da gestão das cooperativas brasileiras, funcionando junto à OCB. A partir de uma avaliação do principal instrumento jurídico (Lei 5764/71) que normatiza as cooperativas é possível caracterizá-las como sociedades que não possuem objetivo de lucro, (art. 3º da lei). Outras características institucionais importantes sobre as sociedades cooperativas são: não estão sujeitas à falência; devem ter mecanismos de governança específicos; regulamentos próprios; possuir sistema contábil adequado ao tipo de sociedade; e devem ter tratamento tributário adequado e serem estimuladas. No art. 4º da lei 5764/71 é definido que as cooperativas não estão sujeitas a falência, mas sim a um processo de liquidação estabelecido e descrito na mesma lei. Os órgãos de governança da cooperativa, bem como seu padrão mínimo de funcionamento e a relação entre eles também estão definidos na lei 5764/71. Os órgãos que compõe a governança são: assembléia geral; conselho de administração; e conselho fiscal. A assembléia geral é definida como a instância máxima de tomada de decisão da sociedade e divide-se em ordinárias e extraordinárias. A assembléia geral ordinária deve ser realizada uma vez ao ano para prestar contas aos associados, que devem aprovar os atos administrativos tomados nesse período, enquanto que a extraordinária poderá ocorrer em qualquer período do ano. Todos os membros integrantes do conselho administrativo e fiscal devem ser compostos exclusivamente por cooperados, ficando estabelecido que o primeiro tem por objetivo gerir a organização e o segundo fiscalizar os atos do primeiro. Em se tratando de regimento próprio, a lei das cooperativas obriga as cooperativas a ter o estatuto social, que deve conter todos os direitos, deveres dos sócios, bem como estar apto para dirimir dúvidas e solucionar conflitos oriundos da ação coletiva. No que se refere à contabilidade específica, as cooperativas brasileiras devem seguir a norma brasileira de contabilidade técnica (NBCT) 10.8, que regulamenta como deve ser feita e as nomenclaturas a serem utilizadas. A Constituição Federal de 1988 (CF-88), no Art. 146, alínea “c” e no art. 174, parágrafo 2º, estabeleceu respectivamente que as cooperativas deverão ter o “adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado (...)” e que a lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas associativas. No que se refere à regulação, apenas as cooperativas de crédito, independentemente de serem rural ou mútuo, as seções de crédito rural das cooperativas agropecuárias e as cooperativas de eletrificação rural continuam sendo reguladas.
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
13. O Plano Collor I foi o plano de governo do presidente Fernando Collor de Mello, editado no ano de 1991.
135
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
4. Considerações finais O cooperativismo no agronegócio é uma forma de cooperação que surge da decisão dos produtores rurais para corrigir possíveis falhas de mercado e promover o bem estar econômico e social do cooperado. Portanto, as cooperativas executam atividades econômicas e sociais em prol do cooperado. A partir do conceito de agronegócio, aumentam os tipos de cooperativas que atuam nesse setor da economia. Então cooperativas como as de crédito rural e eletrificação rural devem também ser conhecidas, uma vez que também são agentes econômicos efetivos onde atuam. As cooperativas têm participação significativa no agronegócio brasileiro e se tornaram agentes importantes do desenvolvimento da cadeia onde estão inseridas. Assim, conhecer suas particularidades é fundamental para aqueles que querem atuar no agronegócio. As particularidades estão referenciadas no ambiente institucional que compreende desde a legislação específica até os princípios e valores que norteiam e caracterizam-nas. Dessa forma, exige-se um novo formato para avaliar o desempenho dessas empresas.
5.
Bibliografia
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Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
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Questões de Revisão 1) A economia institucional, mais especificamente a economia dos custos de transação, aponta que a cooperativa somente surgirá se for para: a) reduzir o custo de produção da cooperativa. b) aumentar o custo de produção do cooperado. c) reduzir os custos de transação do cooperado. d) reduzir os custos de transação da cooperativa. 2) Porque os produtores rurais se tornariam cooperados? a) para gerar economia de escala, reduzir níveis de risco, evitar poder de mercado das grandes empresas. b) para gerar economia de escala, aumentar níveis de risco, comercializar seus produtos. c) para reduzir níveis de risco, ter acesso a serviços já fornecidos pelo governo, aumentar seus ganhos marginais. d) para reduzir níveis de risco, gerar deseconomia de escala, aumentar seus ganhos marginas. 3) São considerados socialistas utópicos os seguintes pensadores: a) William King, Robert Owen, Jaques Karl Max. b) Robert Owen, Louis Blanc, John M. Keynes c) Robert Owen, William King, François M. C. Fourier. d) William King, Louis Blanc, Adam Smith 4) São princípios do cooperativismo: a) Controle democrático pelos sócios, participação econômica dos sócios, dependência das cooperativas das ações do governo federal. b) Controle democrático pelos sócios, participação econômica dos sócios, preocupação com a comunidade. c) Participação econômica dos sócios, dependência das cooperativas das ações do governo federal, educação cooperativista dos sócios. d) Preocupação com a comunidade, autonomia e dependência das cooperativas, adesão livre e voluntária. 137
Capítulo 6 Cooperativismo e Associativismo
5) Formas como as cooperativas são vistas na teoria econômica: a) Cooperativas como firmas, Cooperativas como coalização entre agentes econômicos, cooperativas como empresa estatal. b) Cooperativas como empresas com objetivo de lucro, Cooperativas como coalização entre agentes econômicos, cooperativas nexo de contratos. c) Cooperativas como firmas, Cooperativas como coalização entre agentes econômicos, cooperativas como nexo de contratos. d) Cooperativas como firmas, Cooperativas como agentes econômicos independente do cooperado, cooperativas como empresa estatal. 6) São cooperativas que atuam no agronegócio brasileiro: a) Cooperativas agropecuárias, cooperativas de crédito mútuo, cooperativas habitacionais. b) Cooperativas agropecuárias, cooperativas de crédito rural, cooperativas de trabalho médico. c) Cooperativas agropecuárias, cooperativas de consumo, cooperativa de trabalho. d) Cooperativas agropecuárias, cooperativas de crédito rural, cooperativas de eletrificação rural. 7) Em relação ao sistema de representação das cooperativas aponte a alternativa correta: a) As cooperativas singulares têm seus interesses políticos defendidos pelas Organizações Estaduais. b) As cooperativas centrais são compostas por produtores e cooperativas singulares. c) Cooperados são filiados à Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB). d) Cooperativas singulares são compostas exclusivamente por cooperativas centrais. 8) Em relação à distribuição geográfica das cooperativas Brasileiras podemos afirmar que: a) A maior parte das cooperativas estão localizadas na região centro-oeste. b) A maior parte das cooperativas estão localizadas na região sudeste. c) A maior parte das cooperativas estão localizadas na região sul. d) A maior parte das cooperativas estão localizadas na região nordeste. 9) Pode-se dizer que as cooperativas apresentam as seguintes vantagens para os cooperados: a) Aumento do seu nível de renda, garantia de acesso ao mercado, aumento do seu nível de risco. b) Aumento do seu nível de renda, controle do mercado, aumento do seu nível de risco. c) Aumento do seu nível de renda, garantia de acesso ao mercado, redução do seu nível de risco. d) Aumento do seu nível de renda, garantia de acesso ao mercado, aumento do seu nível de risco. 10) São vantagens das cooperativas para o mercado e sociedade respectivamente: a) Padronização da qualidade dos produtos e redução do nível de empregos. b) Elevação do nível de preços da região e redução do nível de empregos. c) Nivelamento dos preços da região aumento das falhas de mercado. d) Padronização da qualidade dos produtos e redução das falhas de mercado.
) d ( 0 1 ; ) c ( 9 ; ) b ( 8 ; ) a ( 7 ; ) d ( 6 ; ) c ( 5 ; ) b ( 4 ; ) c ( 3 ; ) a ( 2 ; ) d ( 1 : o t i r a b a G
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CAPÍTULO
7
SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL – OPORTUNDADES E AMEAÇAS Prof. Dr. Ricardo Shirota
Professor do Departamento de Economia, Administração e Sociologia - ESALQ/USP
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Capítulo 7 – SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO RURAL – OPORTUNIDADES E AMEAÇAS O objetivo principal deste capítulo é apresentar os principais problemas, desafios e oportunidades da aplicação do conceito de desenvolvimento sustentável para a atividade agropecuária. Inicialmente, discute-se a noção de sustentabilidade e as suas três dimensões: ambiental, social e econômica. Em seguida, a agropecuária é analisada sob a perspectiva do uso de recursos, impactos ambientais e os resultados econômicos e sociais dela decorrentes. A última parte do capítulo apresenta as mudanças que o conceito introduz no mercado e as oportunidades potenciais de novos negócios para a agropecuária.
1.
A origem do problema
A análise da evolução da civilização humana mostra três fenômenos notáveis. O primeiro deles é o processo de crescimento populacional. No início 1, o número de humanos na Terra cresceu muito lentamente. Mas, a partir do início do Séc. XIX, com a melhoria nas condições de vida das pessoas – principalmente, o aumento da disponibilidade de alimentos – o número de humanos passou a crescer exponencialmente (Livi-Bacci, 2003). O segundo fenômeno de destaque é o avanço dos conhecimentos humanos. Da mesma forma que no caso da população, no início, os conhecimentos foram sendo acumulados muito lentamente. A descoberta (ou invenção) e uso disseminado de tecnologias consideradas básicas e fundamentais para a existência do padrão de vida da população atual – como ferramentas e agropecuária – demoraram muitos milhares de anos para acontecer. Porém, nos últimos 10.000 anos de sua evolução, o homem conseguiu obter um acúmulo sem precedentes no volume de conhecimentos científicos e tecnológicos. Esse fenômeno permitiu que o homem moderno conseguisse obter o domínio, controle e exploração dos recursos naturais para atender a crescente demanda de bens e serviços pela população (Roberts, 2001; Landes, 2005). A terceira característica marcante da evolução da humanidade – e que está relacionada com o fenômeno anterior – foi o crescimento econômico. De um lado, o aumento da população permitiu o crescimento “vegetativo” da economia. Mas, a principal fonte impulsionadora do crescimento foi o desenvolvimento e a aplicação prática dos novos conhecimentos científicos e tecnológicos. Como decorrência, houve aumento considerável da produtividade da mãode-obra e do acúmulo da capacidade de produção de bens e serviços. Graças a esses avanços, uma parte significativa da população passou a gozar de um nível de vida e de conforto sem precedentes na história da humanidade. Essas pessoas contam, atualmente, com garantias de suprimento de alimentos – em quantidade e qualidade – nunca antes possível no passado. A oferta abundante de outros bens e serviços permite que elas desfrutem de um elevado padrão de conforto material. Não menos importante, essas pessoas podem se dar ao luxo de gozar níveis de lazer não acessíveis para a grande maioria da população no passado. Nesse sentido, claramente, o crescimento econômico foi um processo que gerou muitos benefícios para um grande número de pessoas 2. 1. Estima-se que o homem moderno ( Homo sapiens ) tenha surgido há cerca de 100.000 anos. 2. O crescimento econômico ocorreu de maneira geral, em todo o Mundo, resultando no aumento da renda média per capita da população. Entretanto, é preciso reconhecer que algumas regiões e paises apresentaram desempenhos muito superiores a outros. Dentro dos países – mesmo aqueles menos desenvolvidos – alguns segmentos da sociedade conseguiram conquistar ganhos mais significativos.
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Entretanto, em razão dos diversos impactos negativos que isso tem causado, estão surgindo diversos questionamentos em relação à possibilidade que esse processo seja continuado e expandido para atender maior contingente de pessoas. Isto é, coloca-se em dúvida se é possível continuar o padrão de crescimento econômico no futuro. Em outras palavras, questiona-se a sua sustentabilidade. Esse tipo de inquietação fez com que – a partir de meados do Séc. XX – houvesse um aumento das discussões sobre as conseqüências de longo prazo do padrão de evolução da humanidade. Um dos pontos centrais das preocupações é a possibilidade de continuar (ou não) o processo de crescimento observado até agora. Desde então, a palavra sustentabilidade 3 passou a ser largamente utilizada, em diferentes situações e com significados diversos. Em geral, esse termo é empregado para representar a noção da possibilidade de continuar – ou melhorar – um determinado padrão de consumo humano (ou produção) com a simultânea manutenção de um meio-ambiente equilibrado e saudável. O problema central da ausência de sustentabilidade é que ela implica que o padrão de desenvolvimento atual não pode ser mantido, indefinidamente, no futuro. Este conceito tem um grande apelo para as pessoas na medida em que está, implícita ou explicitamente, relacionada com a noção de preservação da própria espécie humana. Um padrão de desenvolvimento “não-sustentável” sugere que, cedo ou tarde, haverá um limite ao processo e queda no padrão de vida das pessoas. No limite extremo, a ausência de sustentabilidade pode, mesmo, colocar em risco a preservação da espécie humana. Em razão disso, nos dias atuais, a absoluta maioria das pessoas tem uma postura favorável a sustentabilidade (Jain, 2003, 2005). E, em parte como conseqüência disso, esse conceito tem sido largamente utilizado em muitos contextos. Infelizmente, em grande parte dos usos, ela tem sido empregada de maneira errônea ou equivocada.
2.
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Sustentabilidade: definição, origem e suas dimensões
Uma das razões para o mau uso do termo sustentabilidade, é a falta de uma definição precisa do seu conceito. As definições freqüentemente utilizadas na literatura têm natureza mais qualitativa e apresentam grande apelo intuitivo 4. Elas embutem, também, princípios de comportamento – tanto dos consumidores como dos produtores – que contribuiriam para atingir a sustentabilidade. Entretanto, em razão da ausência de uma conotação mais precisa, na prática, elas não permitem análise ou mensuração quantitativa. Como conseqüência, objetivamente, a maioria dessas definições tem pouco valor. Isto é, não podem ser utilizados para construir indicadores de sustentabilidade visando o uso prático. Por exemplo, a pioneira e largamente utilizada definição apresentada pela Comissão Bruntland diz que: Desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades dos presentes sem comprometer a habilidade das futuras gerações em atender as suas próprias necessidades 5
Apesar de seu apelo intuitivo, essa definição não contribui para a resolução da questão na medida em que as determinações quantitativas das necessidades , presentes e futuras, apresentam uma série de dificuldades e problemas. Além disso, muitas outras questões – fundamentais para a sustentabilidade – não são nem mencionadas nessa definição. Entre outras, a velocidade do avanço tecnológico no futuro, o problema da distribuição de bem-estar entre a geração presente e as gerações do futuro, o problema dessa distribuição no presente etc., são algumas delas. 3. Além desse termo, são também muito utilizadas as idéias derivadas dele, tais como: capacidade de carregamento, capacidade de suporte; desenvolvimento sustentável; crescimento sustentável; consumo sustentável etc. 4. Talvez isso tenha sido feito propositalmente, visando aceitação mais ampla junto ao público. 5. World Commission on Environment and Development (1987).
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Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Em princípio, deve ser ressaltado que – do ponto de vista prático – a noção de sustentabilidade não é estática, absoluta e muito menos infinita. Ela não é estática por que depende da evolução da população, do seu padrão médio de consumo e da velocidade com que a tecnologia vai avançar no futuro. Ela, em geral, não é absoluta no sentido em que o atual padrão de desenvolvimento pode ter sustentabilidade em alguns aspectos, mas não em outros. Finalmente, não é infinito no sentido em que a previsão sobre o futuro distante tem muitas variáveis desconhecidas, de difícil estimativa num prazo médio ou longo. Apesar de, no passado, muitas civilizações terem sofrido problemas variados de escassez de recursos 6, a preocupação com a sustentabilidade – nos níveis atuais – é um fenômeno relativamente recente. No passado, durante boa parte da evolução da humanidade, a população era relativamente pequena e a capacidade de intervenção do homem no meio era restringida pela sua limitada força física. O início do fenômeno da explosão populacional, em fins do Séc. XVIII e começo do Séc. XIX, despertou a preocupação de muitos estudiosos 7. Foi nessa época que Thomas Malthus desenvolveu a sua famosa teoria 8. Na Inglaterra desse período, em que o aumento da produção de alimentos dependia basicamente da expansão da área de cultivo (que era limitada) havia uma real possibilidade de que a agricultura não seria capaz de atender à crescente demanda de alimentos e outras matérias primas. O resultado desse processo era claro para Malthus: fatores externos como fome, miséria, catástrofes, doenças, guerras etc. exerceriam um controle sobre a população e forçariam uma volta a um estágio de produção e consumo de subsistência. Mas, em grande parte, o pessimismo de Malthus não se verificou na prática. O acelerado avanço das descobertas científicas e os progressos tecnológicos em diferentes áreas do conhecimento9 permitiram a ocorrência da Revolução Industrial, iniciado no final do Séc. XVII e começo do Séc. XIX. Desde então, durante uma parte do Séc. XX, o rápido avanço das ciências e da tecnologia possibilitou o fortalecimento do sentimento de que a capacidade inventiva homem poderia suplantar as limitações impostas pelo meio. E, de fato, o crescente uso de máquinas, equipamentos e novos insumos permitiu que, cada vez mais, a humanidade conseguisse suplantar a escassez de recursos existentes anteriormente 10. Nesse ambiente econômico e institucional, não havia muita razão para preocupação com a perspectiva de esgotamento de recursos e os impactos do processo sobre o meio. Na época, uma grande parte da Terra era ainda inexplorada e os ganhos de produtividade resultaram em crescimento econômico sem precedente na história da humanidade. Como resultado, apesar do rápido crescimento da população humana, que acelerou a partir do Séc. XIX 11, um grande número de pessoas foi beneficiado pelo progresso obtido (Kennedy, 1989; Barzum, 2001; Landes, 2005). Alimentação, vestuário, saúde e nível de conforto e lazer melhoraram significativamente em muitas regiões. Por outro lado, a partir da primeira metade do Séc. XX, três grandes grupos de problemas começaram a ameaçar o padrão de crescimento observado até então. De um lado, a expansão da população continuava em uma tendência exponencial. Cada uma dessas pessoas demanda alimento, vestuário, abrigo, energia, transporte, educação, lazer etc. E, a oferta necessária ao atendimento da demanda desses bens e serviços depende 6. Diamond (2005) descreve alguns casos ilustrativos em que crises de grave escassez de recursos provocaram o declínio e desaparecimento de povos, no passado. 7. Davi Ricardo e Thomas Malthus, entre outros. 8. A sua famosa obra foi publicada, pela primeira vez, em 1798 (ver Malthus, 1985) 9. Entre outras áreas, tiveram destaques os avanços das descobertas na biologia, química, física, engenharia e medicina. 10. Esse fenômeno ocorreu em diferentes áreas. Na agricultura, o uso da tecnologia permitiu o aumento da produtividade das terras cultivadas e do uso de terras anteriormente improdutivas ou inacessíveis. O uso da máquina de vapor no transporte terrestre e marítimo fez com que o seu custo caísse consideravelmente. Além disso, o tempo gasto no transporte foi significativamente encurtado (Landers, 2005). O uso de máquinas para a construção de vias de transportes (ferrovias e hidrovias) encurtou as distâncias e permitiu ganhos ainda mais impressionantes. Fenômeno semelhante ocorreu na área de mineração e energia. 11. Ver, por exemplo, Livi-Bacci (2003).
142
do uso de quantidades crescentes de recursos extraídos da natureza 12. De outro lado, o padrão de crescimento estava – como continua até o presente – fortemente baseado no uso de recursos exauríveis 13. Como a quantidade desse tipo de recurso é limitada, existe perspectiva de que em futuro não muito distante, a sua escassez pode provocar – na melhor das hipóteses – uma parada no processo de crescimento econômico. Numa visão mais pessimista, essa escassez poderia provocar colapso no sistema de organização social, econômico e político da humanidade (“Futuro Mad Max”) 14. Em terceiro lugar, a combinação dos efeitos do crescimento populacional com a evolução do padrão de consumo e de produção, tem causado impactos ambientais não desprezíveis. Como conseqüência, sérias modificações – negativas – estão aparentemente ocorrendo em diferentes ecossistemas da Terra. Alguns deles, com impactos limitados em uma abrangência local ou regional 15. Outros, pela própria natureza, têm abrangência global 16. Como conseqüência, principalmente a partir de meados do Séc. XX, alertas mais contundentes com relação a esse tipo de problemas começaram a aparecer na literatura (Boulding, 1966; Meadows et al., 1972; Ehrlich, 1978; WCED, 1987). Neste contexto, a atividade agrícola está – direta ou indiretamente – envolvida com muitos desses problemas. Por outro lado, este setor pode também se beneficiar das oportunidades que surgiram em razão das modificações já mencionadas.
3.
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Agricultura: conceituação, evolução e situação atual
Define-se como setor rural aquele que engloba todas as atividades desenvolvidas além dos limites das áreas urbanas 17. A principal atividade deste setor é o cultivo da terra para a produção vegetal e animal. A produção desse setor é, tradicionalmente, voltada para atender a demanda de alimentos pelos consumidores e algumas matérias primas de uso industrial 18. Esta é a noção tradicional de agropecuária. Porém, atualmente, a produção agropecuária cobre uma ampla gama de produtos que extrapolam este conceito. A partir da segunda metade do Séc. XX, com o encarecimento das fontes tradicionais de energia, a agricultura passou a produzir energias alternativas. Mais recentemente, o efeito combinado do aumento da demanda por serviços relacionados ao lazer, a escassez de amenidades associadas com a natureza e o agravamento dos problemas ambientais, faz com que novas oportunidades de mercado estejam surgindo para o setor rural na área da produção de serviços ambientais 19. 12. O problema é agravado pelo aumento do consumo per capita , observado em muitas partes do mundo. Isso ocorre graças ao aumento da renda daquelas pessoas beneficiadas pelo processo de acelerado crescimento econômico. 13. Recursos exauríveis são aqueles existentes da natureza em determinada quantidade, em determinado lugar e o seu estoque não pode ser alterado pelo homem (Randall, 1987). Energia fóssil (petróleo, carvão, gás natural etc.), minérios e fertilidade natural dos solos são alguns exemplos ilustrativos. 14.“Futuro Mad Max” é uma visão bastante pessimista da capacidade da humanidade em resolver os seus problemas no futuro. Nesta perspectiva, os conflitos relacionados com a escassez de recursos provocarão falência das instituições e rompimento das regras de convivências entre os humanos. As relações humanas retornariam ao nível do que deve ter prevalecido nos estágios iniciais da civilização em que a “regra do mais forte” determinava as relações humanas. O oposto dessa visão é um futuro “Jornadas nas Estrelas”. Trata-se de uma perspectiva muito mais otimista, em que a maior parte dos problemas relacionados com pobreza, fome e falta de recursos não são mais preocupações imediatas. 15.Tipicamente, esse é o caso da poluição da água de rios e lagos, da erosão de solos e os impactos causados pelas atividades de mineração. 16. Nesse grupo estão incluídos os problemas como o buraco na camada de ozônio e o aquecimento global (que pode causar as mudanças climáticas). 17. Esta separação entre rural e urbano é baseado em critérios geográficos. 18. Por exemplo: algodão para a indústria têxtil; madeira para as produções de papel, móveis, construção civil etc.; óleos essenciais e resinas vegetais para as indústrias farmacêuticas e químicas; etc. 19. Entre outras, as seguintes atividades estão se tornando economicamente importantes: lazer rural e ambiental; preservação de recursos hídricos e da biodiversidade; seqüestro de carbono; etc.
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Apesar da agropecuária ser geograficamente delimitada, este setor não é estanque e separado das demais atividades da economia. Por exemplo, muitas atividades “nãoagropecuárias” são desenvolvidas no setor rural. Diversos tipos de processamento dos produtos – tipicamente realizadas fora do setor – podem ser feitos na própria propriedade. Além disso, alguns membros da família podem desenvolver atividades “não-agropecuárias” no meio rural (e.g., trabalhos manuais e artesanatos). Finalmente, em algumas regiões, muitos residentes na área rural obtêm parte significativa de sua renda em atividades desenvolvidas no setor urbano. Da mesma forma, muitas atividades urbano-industriais dependem fortemente do setor rural. No segmento chamado de “antes da porteira”, toda a indústria de insumos modernos (sementes, fertilizantes, agroquímicos etc.), máquinas e equipamentos, rações, medicamentos veterinários etc., tem sua produção voltada para as atividades desenvolvidas no setor rural. Do outro lado, no segmento chamado de “depois da porteira”, os setores de transporte e armazenagem de produtos agropecuários, processamento, mercados financeiros, exportação etc., também têm parte significativa de suas atividades voltadas – em maior ou menor grau – para o setor agropecuário. Atualmente, a agropecuária moderna é um complexo setor econômico 20. A sua atividade produtiva envolve a utilização de variados insumos, mão-de-obra e diversos recursos naturais como fatores de produção. De outro lado, os alimentos, fibras e outras matérias primas (e.g., madeira, resinas etc.) e energia produzidos entram em uma sofisticada cadeia produtiva cujos bens finais são consumidos tanto no mercado doméstico como exportados para o mercado internacional. A produção agropecuária primária compreende o setor responsável pelo cultivo do solo para a produção de plantas de interesse econômico. Pela sua própria natureza, a maior parte das atividades desenvolvidas nesse setor altera a cobertura do solo, transformando um determinado ecossistema natural em um outro, voltado para a produção econômica de alimentos, fibras e energia, entre outros (Malavolta, 1997; Paterniani, 2001). O desenvolvimento da agropecuária foi muito importante para permitir o aumento populacional humano, atendendo à demanda crescente de alimentos e outros produtos. Graças aos ganhos tecnológicos obtidos ao longo do tempo, as produtividades da terra e da mão-de-obra aumentaram muitas vezes em relação ao observado há cerca de 10.000 anos, antes de seu aparecimento. Na época em que o homem nômade vivia da coleta e da caça, estima-se que a capacidade de suporte do meio para suprir alimentos era de cerca de 8 pessoas por 5.000 km 2 (Eves, 2005). A invenção da agropecuária – ainda que primitiva – permitiu um grande salto na capacidade de suporte do meio em cerca de 100 vezes, atingindo a marca significativa de 800 pessoas por 5.000 km 2. De certa forma, esse fenômeno marca a ocorrência da primeira revolução na maneira como o homem passou a garantir uma oferta estável de alimentos. Na Idade Média, estima-se que a agropecuária demandava de 4 a 5 pessoas em dedicação exclusiva para produzir alimentos para si e um excedente suficiente para apenas mais uma pessoa. Atualmente, na agropecuária moderna 21, essa relação é de cerca de uma pessoa na agricultura produzindo o suficiente para si e para mais de 100 outras pessoas. No caso da mão-de-obra e do número de horas de trabalho necessárias para garantir o suprimento de alimentos, a evolução é igualmente impressionante. Antes da agropecuária, a vida do homem era uma luta incessante em busca de comida. A grande maioria das pessoas
20. Não confundir agricultura com o conceito mais amplo do chamando “agribusiness”. Este último, mais amplo, contém a agricultura como uma de suas partes. Ele abrange o conjunto das atividades que vai do setor de insumos, passando pela produção agrícola propriamente dita e estendendo até os segmentos de transporte, armazenamento, processamento e comercialização dos produtos finais. 21. Aquela com alta produtividade, que usa insumos modernos e adota, intensivamente, máquina e equipamentos. Tipicamente, esta é a agricultura praticada em partes dos EUA, Brasil, Argentina e Canadá, entre outros.
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gastava quase todo o seu tempo em busca de alimentos e quase não restava tempo para desenvolver outras atividades produtivas e de lazer. Mesmo assim, muito possivelmente, a maioria dos indivíduos consumia calorias e outros nutrientes em quantidades bastante limitadas, muito próximas das necessidades mínimas de sobrevivência.
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4. Agricultura e sustentabilidade ambiental 4.1 Desafios A agropecuária é, basicamente, uma atividade que depende da modificação da cobertura natural do solo. Isto é, ela transforma um determinado ambiente pré-existente, representado pelo conjunto de vegetação, microorganismos e animais de um local, para um outro ambiente favorável para a produção de uma determinada espécie vegetal de interesse econômico 22. Isso implica que a sua expansão ocorre, em geral, em novas áreas ainda cobertas por vegetação natural. Esse fenômeno ocorre em todo o mundo, desde os primórdios do desenvolvimento da atividade agropecuária. No Brasil, não foi diferente. A implantação da cana-de-açúcar durante o período colonial ocorreu ao longo da costa, substituindo a mata atlântica que era a vegetação predominante nessa região. Na mesma época, a expansão da atividade pecuária foi feita em regiões ocupada por pastagens naturais. Parte significativa da grande expansão da cafeicultura, na segunda metade do Séc. XIX e início do Séc. XX, avançou sobre áreas virgens nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Paraná, ocupando predominantemente, áreas de florestas 23. No início do processo de colonização de uma nova região, quando a maior parte do terreno está ainda ocupada por vegetação natural, à expansão da agropecuária não representa grande problema para a manutenção do ecossistema. Entretanto, à medida que a atividade se expande, a área de cobertura natural remanescente pode não ser suficiente para a manutenção de um fluxo satisfatório de serviços ambientais. Um caso extremo desse tipo de impacto é a Mata Atlântica. Após 500 anos da descoberta, resta apenas um pequeno percentual do total existente originalmente. A expansão agropecuária na região dos Cerrados e, mais recentemente, em direção à Região Amazônica, tem recebido muitas críticas por causa da rápida transformação que elas estão sofrendo. Entre os diversos serviços ambientais que uma cobertura natural do solo produz, destacam-se a preservação da biodiversidade e a manutenção do ciclo hidrológico. Visando garantir a preservação da cobertura vegetal, diversas ações foram estabelecidas. Uma delas, é a implantação de parques e reservas ecológicos mantidos pelo esforço isolado ou em conjunto de dois ou mais órgãos do setor público, organismos não-governamentais e/ ou iniciativa privada. Uma outra forma é a obrigatoriedade que os proprietários de terra tem de manter determinadas áreas com cobertura vegetal natural. Por exemplo, as áreas de mananciais e as margens dos corpos d’água (mata ciliar). Além disso, existem legislações obrigando a manutenção de um determinado percentual da propriedade com cobertura natural. No Estado de São Paulo, esse percentual é de 20%. Na Região Amazônica, ela chega a 80%. Um grande problema desse tipo de legislação – particularmente para o produtor rural – é a distribuição dos custos e dos benefícios da preservação. O proprietário é obrigado a abrir
22. É necessário enfatizar que, ao contrário do que é muitas vezes apresentado, os agricultores são agentes econômicos racionais e essa alteração não visa a destruição per se da natureza. Pelo contrário, trata-se de um comportamento racional que visa maximizar a produção e minimizar os custos. 23. Para uma visão ilustrativa do processo de ocupação do interior do Estado de São Paulo e, em particular, a expansão da sua cafeicultura, ver Monbeig (1984).
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mão de explorar, economicamente, um determinado percentual de sua terra para produzir um “bem-público” que beneficia toda a sociedade 24. Isto é, ele arca com todos os custos da preservação enquanto toda a sociedade recebe os resultados positivos 25. Além disso, os avanços tecnológicos na produção agropecuária têm aumentado o uso de diferentes produtos químicos. Grande parte do aumento da produtividade tem sido obtida graças ao uso intensivo de fertilizantes, inseticidas, fungicidas e herbicidas. A aplicação em excesso desses produtos tem causado uma série de danos ambientais como poluição do solo, da água e da biota 26. Da mesma forma, o uso intensivo de máquinas e equipamentos tem possibilitado o aumento da produtividade da mão-de-obra. Mas, o seu uso inadequado e em excesso tem causado sérios problemas de degradação dos solos. Os implementos utilizados para o preparo do solo no plantio convencional e para o cultivo das plantações têm causado sérios danos à sua estrutura física. Combinado com isso, a exposição do solo aos elementos – principalmente, chuva e vento – tem provocado o fenômeno da erosão que destrói a camada mais superficial e fértil da terra. Em casos extremos, as erosões por sulco e as voçorocas podem prejudicar – ou mesmo impedir – a própria atividade agrícola. A erosão provoca dois tipos de impactos, conhecidos na literatura pelo seu nome em inglês: efeitos “on site ” e “off site ”. Os danos “ on site ” são aqueles relacionados com os efeitos negativos sobre a produtividade agrícola e os custos de produção. Mas, além de destruir a capacidade futura de produção, a erosão é danosa por causar conseqüências negativas “rio abaixo” (danos “ off site ”). Os sólidos em suspensão na água, afetam a sua qualidade. O seu uso para o abastecimento urbano 27 e industrial pode ficar seriamente prejudicado. As partículas sólidas maiores são carregadas pelas enxurradas e depositadas nos leitos dos rios, causando danos diversos. Ambientalmente, o acúmulo de sedimentos pode alterar o ecossistema aquático, prejudicando a sua fauna e a flora. Do ponto de vista estritamente econômico, esses sedimentos podem diminuir a profundidade dos rios, prejudicando a navegação e os esportes aquáticos. As partículas menores ficam em suspensão durante mais tempo e podem, igualmente, causar prejuízos ao meio-ambiente e aos diversos usos da água, tanto para fins de abastecimento humano como para usos industriais. Por exemplo, elas podem causar desgastes prematuros nas bombas e nas tubulações de água. Além dos materiais particulados, a erosão carrega nutrientes e outros compostos químicos dissolvidos na água. Os nutrientes, principalmente nitrogenados e fosfatos, podem causar a eutrofização dos corpos d’água. Esse processo provoca um desequilíbrio no ecossistema aquático, resultando em crescimento excessivo de determinados organismos em detrimento de outros. A técnica de plantio direto utilizada na agricultura moderna minimiza os efeitos nocivos da erosão do solo e tem se mostrado também bastante vantajosa na redução de custos da lavoura, uma vez que muitas das operações do plantio convencional como aração e gradagem são utilizadas com uma intensidade muito inferior. O problema dos agrotóxicos é ainda mais grave. Eles podem ser absorvidos pelas plantas e microorganismos aquáticos que estão na base da pirâmide alimentar. O consumo deles 24. É importante lembrar que esse segmento é o menor entre os três setores da economia, gerando menos de 10% do PIB do País. 25. No âmbito do Estado de São Paulo, existe atualmente, um estudo – financiado pelo Banco Mundial – que visa mensurar o valor dos benefícios ambientais gerados pela preservação da cobertura vegetal. A idéia é analisar a possibilidade de remunerar o proprietário pelos serviços ambientais produzidos pelo seu esforço. 26.O fenômeno da contaminação da biota atingiu não somente as plantas, microorganismos e animais silvestres, mas também a própria espécie humana. Casos de intoxicação aguda, apesar de relativamente raros, têm ocorrido. O problema da intoxicação crônica – tanto de trabalhadores rurais quanto de consumidores de produtos contaminados – é menos visível mas, possivelmente, muito mais freqüente, devendo atingir também um grande número de pessoas. Para um exemplo ilustrativo, ver Duncan (2006). 27.A presença de partículas em suspensão na água encarece o processo de seu tratamento. Ele aumenta o tempo de retenção da água na estação de tratamento da mesma forma que exige a adição de maiores quantidades de produtos químicos. Como conseqüência, apesar de potável, a água tratada acaba ficando com cheiro e gosto desagradáveis.
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por outros organismos, transfere a contaminação ao longo de toda a cadeia alimentar, podendo prejudicar até mesmo espécies que não tiveram qualquer contato com a agricultura. Esse problema é agravado nos casos em que existe acúmulo do princípio ativo no organismo 28. Adicionalmente ao problema toxicológico, o uso de pesticidas na agricultura gera um efeito secundário associado às embalagens vazias. Infelizmente, por uma série de razões, o descarte da maior parte dessas embalagens era feita de maneira inapropriada, causando diversos riscos ambientais 29. Mais recentemente, o desenvolvimento da genética molecular permitiu a criação dos chamados Organismos Geneticamente Modificados – OGM 30. Trata-se de plantas e animais que sofreram manipulação em sua estrutura genética, visando obter determinadas características de interesse agronômico e/ou econômico. Potencialmente, os benefícios dos OGMs são consideráveis. Existe, por exemplo, uma semente de milho que não sofre ataque de uma determinada lagarta. Isso facilita a vida do produtor, que não tem que se preocupar com essa praga. Um outro aspecto positivo dessa semente é a eliminação do uso de inseticida para controle desse inseto. Uma soja transgênica com grande aceitação por parte dos agricultores é aquela resistente a um determinado tipo de herbicida chamado de glifosato. O uso combinado dessa soja com o glifosato faz com que o controle das ervas daninhas seja mais fácil e mais barato. Entretanto, existe muita pressão contra os OGMs, vinda de diversos grupos organizados da sociedade. De um lado, existem aqueles contrários com base em argumentos relacionados com a segurança alimentar. Na medida em que são organismos resultantes de manipulação genética, existe um risco potencial de que as alterações na estrutura do DNA possam produzir substâncias químicas prejudiciais ao organismo humano 31. Um outro tipo de preocupação em relação aos OGMs é o risco de que as alterações criadas artificialmente, venham a contaminar o banco natural de genes. Isto é, garantir que, uma vez liberado, não haja risco de que o processo de cruzamento natural 32 transfira as características artificialmente criadas para a população nativa. As críticas em relação aos impactos da produção animal sobre o ambiente não são menos contundentes. Estudo recente da FAO indica que a criação de animais é uma das três mais importantes causa dos maiores problemas ambientais (Steinfeld et al., 2006). Ocupação e degradação dos solos, perda de biodiversidade, mudanças climáticas, poluição do ar e escassez e poluição da água são alguns dos maiores problemas em que a criação de animais está diretamente envolvida 33. Um desafio adicional da pecuária moderna são os grupos de defesa do “bem-estar” e os grupos que defendem os “direitos” dos animais. Trata-se de grupos extremamente bem organizados, engajados politicamente, com poder econômico e grande penetração nos meios de comunicação. As campanhas de defesa dos animais são muito bem feitas, visando despertar simpatia entre a população, em geral 34. Os primeiros, que defendem o “bem-estar” dos animais são mais moderados. Em princípio, aceitam a idéia de criação e uso de animais para atender as necessidades humanas. Porém, eles buscam combater sistemas de criação e de manejo que provocam sofrimentos “desnecessários”35 às criações. Em geral, as suas causas procuram seguir princípios científicos e/ou práticas de manejo animal consideradas “humanas”.
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28. Esse é o caso dos organoclorados. Altamente tóxicos e largamente utilizados no passado como inseticida, atualmente, o seu uso é proibido em muitos países em razão dos problemas que ele causa. 29.No Brasil, existe atualmente legislação específica que regulamenta o retorno das embalagens vazias a postos de coleta localizados em centros urbanos. 30. Esses organismos são chamados, também, de transgênicos. 31. Apesar de, em princípio, esses riscos existirem, alguns transgênicos já foram liberados pelos órgãos responsáveis pelo seu controle em diversos países. Para garantir a sua segurança, basicamente, é necessário que se estabeleça regulamentação que verifique os impactos desses organismos antes de sua liberação para produção comercial. Até o momento, não se tem notícia de problemas causados pelos transgênicos à saúde humana. 32. Por exemplo, através da fertilização de uma planta nativa por pólen advindo de uma planta geneticamente modificada. 33. O estudo estima que a contribuição dos mais de 1,5 bilhão de bovinos para o aquecimento global é maior do que as emissões de toda a frota de automóveis. 34. Um exemplo muito criativo e ilustrativo pode ser encontrado em: http://www.meatrix.com 35. A definição precisa deste termo é assunto de controvérsias.
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O segundo grupo, que luta pelos “direitos” dos animais é mais radical e até violento. O principio que rege o movimento é a de que o uso de animais para atender as necessidades humanas é inaceitável. Este grupo é constituído por vegetarianos que combatem a criação de animais voltados à produção de carnes e leite para alimentação, couro, etc.
4.2 Oportunidades Se os problemas ambientais estão criando muitos desafios para o setor agropecuário brasileiro, por outro lado, esses mesmos problemas estão criando uma série de oportunidades. Por exemplo, já se mencionou o estudo sobre o pagamento pela geração de serviços ambientais. Os proprietários de terra que abrissem mão do uso de sua terra para fins produtivos, em benefício da preservação ambiental, seriam justamente compensados pelo valor dessa preservação. Uma outra possibilidade de ganho potencial para a agricultura é a produção orgânica 36. Para o produtor, esse mercado é interessante por duas razões. Em primeiro lugar, o mercado paga maior preço pelo produto orgânico. Trata-se de um “prêmio” pelo maior custo de produção e pela melhor qualidade. Além disso, em segundo lugar, muitas vezes o produto orgânico tem maior facilidade de venda no mercado. Entretanto, um problema potencial para os produtores que pretendem ingressar nesse mercado é o custo da conversão do sistema de produção convencional para o orgânico. Em geral, é um processo que demora alguns anos, principalmente, para descontaminação dos solos. Nesse período, o produtor enfrenta vários desafios. Em primeiro lugar, ele tem que arcar com os custos da mudança (certificadora, investimentos em tecnologia, mudanças no manejo, novos insumos etc.) para se adaptar as normas da certificação orgânica 37. Em segundo lugar, em muitos casos pode haver uma redução nos custos variáveis, porém a produtividade do orgânico é – geralmente – menor do que a da produção convencional. E, em terceiro lugar, durante o período da conversão, o produto não pode ser vendido como orgânico. Isto é, o produtor recebe o preço do produto convencional 38. Apesar disso, o aspecto positivo desse mercado é que, ao contrário do pagamento pela produção de serviços ambientais – que ainda está em fase de estudos –os orgânicos já contam com um varejo em franca expansão. Segundo o USDA, a produção orgânica é o segmento da agricultura americana que mais cresce atualmente. Ele atende um segmento do mercado consumidor preocupado com a qualidade dos alimentos, principalmente, com o efeito da alimentação sobre a saúde 39. Aparentemente, o mercado de orgânicos é potencialmente lucrativo. Boa parte dos consumidores de orgânicos é extremamente fiel a esse tipo de produto e pertence às camadas mais alta de renda. Esse fenômeno está ocorrendo tanto em países em desenvolvimento, mas principalmente, nos países desenvolvidos que possuem consumidores de maior poder aquisitivo. A preocupação com o fenômeno do aquecimento global 40 fez surgir a terceira oportunidade de mercado para a agricultura mundial, em geral, e a brasileira em particular. Segundo uma teoria largamente aceita na comunidade acadêmica, a grande quantidade de gases do Efeito Estufa lançada na atmosfera terrestre pode aumentar a temperatura média da superfície da Terra, através do fenômeno conhecido por Efeito Estufa. Esse aquecimento pode provocar mudanças significativas no clima, causando inúmeros problemas ambientais, médicos e econômicos. 36. Existem diversas modalidades de produção orgânica. Algumas são mais radicais e não permitem o uso de nenhum insumo químico industrial. Outras, permitem determinados produtos menos tóxicos e com menor nível de processamento, enquanto proíbem os fertilizantes químicos altamente solúveis e os pesticidas em geral. 37. Maiores informações nos sites: http://www.naturalrural.com.br/conteudo/agricultura_organica.pdf e http://www.ibd.com.br 38. Adicionalmente, deve-se mencionar também, que o produto orgânico – muitas vezes – não tem características visuais “atrativas” para o consumidor acostumado com o produto não-orgânico. Menor tamanho, irregularidades no produto, desuniformidade, cor, ferimentos e cicatrizes etc., são algumas características encontradas nesses produtos. 39. Outros consumidores justificam a compra desse tipo de produto por causa da suposta preocupação dos produtores orgânicos com a preservação ambiental. Outros argumentam que o produto orgânico tem melhor qualidade organoléptica. 40. Para maiores informações sobre o fenômeno do aquecimento global e os problemas potenciais sobre o clima, ver: http:// www.ipcc.ch/
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O Protocolo de Quioto 41 é um acordo entre um grande número de países que busca reduzir a emissão dos gases de Efeito Estufa. Numa primeira fase, os países do “Anexo I” assumiram o compromisso de reduzirem, no período entre entr e 2008 e 2012, as suas emissões em 5% abaixo das quantidades observadas em 1990. Para a agricultura dos países em desenvolvimento, o MDL (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo) é uma oportunidade de gerar renda adicional, utilizando os “certificados de seqüestro de carbono”. Em princípio, todo vegetal em crescimento absorve o gás carbônico – CO 2 – da atmosfera para produzir carboidratos. Assim, o cultivo de plantas pode contribuir para o esforço de retirar da atmosfera esse gás que é um dos mais importantes para o Efeito Estufa.
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Os projetos de MDL podem ser de três tipos: a)
fontes renováveis e alternativos de energia;
b)
eficiência e conservação de energia; e,
c)
reflorestamento e estabelecimento de novas florestas.
Existem diversos projetos de MDL em estudo no Brasil. Entre outros, destacam-se: tratamento de resíduos sólidos urbanos e aproveitamento do biogás de aterros sanitários; substituição de combustíveis e/ou aumento de eficiência no uso de energia em processos industriais; e, implantação de projetos de pequenas centrais hidroelétricas e eólicas. No caso da agricultura, agricultura, o potencial é considerável. Entre outros, destacam-se as seguintes iniciativas: co-geração de energia a partir da biomassa 42; uso de biodigestores para produção de gás metano em confinamentos de animais 43; implantação de reflorestamentos; e, mais recentemente, a produção de biodiesel. Todos eles podem, em princípio, receber a certificação que comprovam o seqüestro de carbono. No caso de uma granja de suínos, por exemplo, o produtor – além da venda de suínos – passaria a gastar menos em energia e fertilizantes, estaria gerando menor impacto ambiental e teria uma receita adicional com a venda dos certificados certific ados de seqüestro de carbono. Finalmente, o encarecimento das fontes tradicionais de energia – principalmente as de origem fóssil – tem tornado viável a produção e venda de combustíveis produzidas de fontes não tradicionais, como a biomassa. O exemplo mais destacado, no caso do Brasil, Brasil, é certamente o álcool produzido da cana-de-açúcar. Desde a década de 70, com a implantação do Pró-álcool, o País tem desenvolvido a tecnologia da produção deste combustível e tem, atualmente, o maior programa do mundo de uso deste combustível para o uso em automóveis. Os EUA, produzem uma quantidade quantidade significativa de álcool álcool a partir de milho. Outros países aproveitam a madeira como fonte de energia. Mais recentemente, existe um grande esforço visando à produção de óleo vegetal para uso em motores do ciclo diesel. Esse combustível é conhecido, genericamente, genericamente, por biodiesel. Atualmente, estão sendo estudadas diversas espécies vegetais produtoras de óleo. Entre outras, destacam-se os seguintes: dendê, soja, mamona e outras oleaginosas 44. Para o ambiente, uma das vantagens desse tipo de energia é a sua neutralidade em relação às emissões de gases do Efeito Estufa. Todo o gás carbônico liberado na sua queima foi retirado da atmosfera pelas plantas através do processo de fotossíntese. Além da sua atratividade econômica, econômica, ela gera benefícios ambientais que neutralizam os efeitos negativos da queima dos combustíveis fósseis. 41.Uma versão completa do Protocolo, em Português, encontra-se disponível em: http://www2.mre.gov.br/sei/protocoloquioto.htm 42. O caso mais promissor e avançado no Brasil é a da cana-de-açúcar 43. Este tipo de projeto, além do aproveitamento energético energético do gás produzido, tem a vantagem de contribuir para a resolver um grande problema ambiental que é a destinação final dos resíduos das granjas de criação de animais. animais. Particularmente no caso da suinocultura, o biodigestor elimina um sério poluente, gera o gás metano que pode ser aproveitado para fins energéticos e, além disso, o produto final é um fertilizante de excelente qualidade, contendo nutrientes essenciais para o crescimento das plantas. 44. Em razão da relativa novidade, ainda não existe existe clara definição da relativa relativa vantagem de uma fonte em relação às outras. Mas, com o passar do tempo, é possível que ocorra predominância de uma fonte por causa de suas vantagens. Esse fenômeno ocorreu com a cana-de-açúcar que é virtualmente, a única matéria prima para a produção de álcool no Brasil.
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5. Agr Agricu icultu ltura ra e a suste sustent ntabi abilid lidade ade soc social ial 5.1 Desafios Apesar do recente sucesso do setor agrícola no Brasil, em termos agregados, ele responde pela geração de menos de 10% do Produto Interno In terno Bruto – PIB, enquanto enquant o mais de 20% da População Economicamente Ativa – PEA do País depende dele para o seu sustento. Conseqüentemente, em termos médios, a renda per capita do setor agrícola é menos da metade da média do Brasil. É nesse setor, setor, também, que se concentra um contingente significativo dos mais pobres. Isto significa que a agricultura brasileira brasileira é caracterizada por por uma dualidade. dualidade. Neste setor, setor, convivem dois segmentos com características agronômicas, tecnológicas e econômicas opostas. Por um lado, podem ser identificados segmentos dinâmicos e modernos que adotam práticas agronômicas agronômicas e administrativas avançadas. avançadas. Esta parte da agricultura está inserida inserida no mercado, os seus produtores têm grande capacidade de investimento, são capazes de obter altas produtividades, têm baixos custos e são competitivos competit ivos tanto no mercado doméstico quanto internacionalmente. Neles, os produtores atuam como uma moderna empresa e conseguem obter altos retornos aos investimentos e gerar rendas consideráveis. consideráveis. Por outro lado, coexiste neste setor, um grande contingente de pessoas à margem desse progresso. Na maioria, são pequenos agricultores (com ou sem terras) caracterizados por uma ou mais das seguintes peculiaridades: baixo nível de educação; baixa qualificação da mão-de-obra; mão-de-ob ra; pequena escala de produção; nível tecnológico relativamente atrasado; baixa produtividade;; produção voltada – principalmente – para a subsistência 45; e, incapacidade de produtividade gerar renda significativa na atividade rural. Este segmento é economicamente desorganizado, não tem poder de barganha no mercado e, em geral, sobrevive na informalidade. informalidade. Eles não são capazes de manter manter uma oferta regular e a qualidade de seus produtos nem sempre atende o mercado consumidor mais exigente, que paga preços preços mais altos. Em razão disso, ficam a mercê de de intermediários com maior maior poder de mercado, agravando ainda mais a sua precária situação econômica. Esse contingente significativo de pessoas fica econômica e socialmente marginalizado, em uma posição posição de extrema extrema vulnerabilidade vulnerabilidade e dependência. dependência. Como conseqüência, conseqüência, 46 freqüentemente, freqüenteme nte, são vítimas de exploração econômica e política . Neste contexto, a sustentabilidade social está relacionada com esforços 47 na direção de tornar essas pessoas economicamente auto-suficientes, diminuindo a sua vulnerabilidade. Em última análise, na base desse movimento está a noção de que os agentes econômicos (consumidores, firmas, organizações etc.) têm responsabilidades perante a sociedade 48 (Berman, 1997). E, no processo de tomada de decisão, devem agir levando em consideração não apenas os interesses imediatos próprios, mas as conseqüências de suas ações sobre a sociedade como um todo. Em um mercado de competição pura, esse tipo de preocupação é absolutamente desnecessário49. Se os mercados fossem competitivos, competitivos, a Teoria da Mão-invisível de Adam 45. As vendas limitam-se, geralmente, à produção que excede a demanda familiar. 46.. Essas pessoas tornam-se dependentes de programas assistencialistas que as tornam reféns de políticos inescrupulosos. 46 47.. Em geral, esses esforços são coordenados por organizações não-governamentais, 47 não-governamentais, movimentos sociais, organizações de desenvolvimento e entidades religiosas. 48.. De maneira mais geral, essas responsabilidades 48 responsabilidades podem podem ter abrangência muito ampla. ampla. Elas podem significar significar desde o respeito da legislação trabalhista e civil das pessoas, aos direitos humanos e até o pagamento de impostos, de acordo com as normas vigentes. Discriminaçã Discriminaçãoo racial e de gênero, emprego de mão-de-obra infantil, desrespeito desrespeito às tradições culturais e religiosas etc. são alguns exemplos de atos condenáveis. 49. Friedman (1962) chega a afirmar que o único objetivo social da firma é a maximização do retorno aos acionistas e que a aceitação de responsabilidades sociais adicionais coloca em risco os fundamentos de uma sociedade livre.
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Smith garante que as ações conjuntas dos agentes econômicos no mercado, cada um procurando atender o próprio interesse, asseguram a maximização dos benefícios para a sociedade como um todo. Por exemplo, na teoria econômica neoclássica, uma importante pressuposição é a de que os consumidores buscam maximizar o próprio bem-estar, deixando de considerar os impactos dessas ações sobre o resto da sociedade (inclusive, gerando conseqüências negativas negativ as para outros indivíduos e o meio-ambien meio-ambiente). te). No caso das empresas, a mesma teoria postula que o objetivo único das empresas é a maximização maximi zação do lucro (diferença entre receita total e despesa total). Infelizmente, no mundo real, o mercado está cheio de imperfeições 50 e a Mão-invisível não funciona adequadamente. Isto é, ela não consegue assegurar que a ação conjunta dos consumidoress e produtores resulte consumidore resulte em uma alocação eficiente de recursos. recursos. Assim, alguns agentes econômicos conseguem obter benefícios muito maiores do que seria desejável do ponto de vista distributivo. distri butivo. Conseqüentemente, outros – menos favorecidos – acabam sofrendo prejuízos desproporcionalmente maiores. A noção de responsabilidade social busca combater esses tipos de situação e procura desenvolver iniciativas para corrigir o mercado. Isto é, segundo os preceitos da responsabilidade social, os consumidores deveriam estar dispostos a tomar determinados cuidados na hora da compra de bens e serviços, mesmo que isso implique no sacrifício de parte de seu bemestar (consumo). Da mesma forma, as empresas socialmente responsáveis responsáveis (ou preocupadas preocupadas com a sustentabilidad sustentabilidadee social) deveriam desenvolver relacionamentos relacionamentos mais equilibrados no mercado, mesmo que isso signifique sacrificar parte dos seus lucros. Os defensores desse tipo de comportamento apóiam a idéia de que na conduta socialmente responsável, estão embutidas duas noções: i) cond condutas utas nega negativas tivas,, i.e., os agent agentes es econômi econômicos cos devem devem deixar deixar de faze fazerr ‘coisas’ ‘coisas’ que que 51 prejudiquem a sociedade ; e, ii) cond condutas utas positiv positivas, as, i.e., i.e., eles devem devem tomar tomar atitudes atitudes que que contribua contribuam m para o bom 52 funcionamento da sociedade .
5.2
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Oportunidades
Um grande problema na adoção de uma conduta socialmente responsável é a identificação – no mercado – dos produtos que respeitam (e aqueles que não respeitam) respei tam) os seus preceitos. A certificação de produto foi um mecanismo desenvolvido para preencher essa lacuna. Um dos principais esforços nesse sentido é o movimento Fair Trade 53. Trata-se de um esforço internacional para estabelecer determinados padrões de igualdade e justiça no comércio internacional procurando beneficiar, principalmente, os mais desprotegidos e à margem do processo de desenvolvimento. Estima-se que as vendas sob a certificação Fair Trade tenham somado cerca de €1.1 bilhão em 2005, com um crescimento de 37% em relação ao ano anterior 54. No final deste ano, o certificado cobria 58 países em desenvolvimento com 508 organizações de produtos certificados. Estima-se que número total de produtore produtoress beneficiados diretamente seja de mais de 1 milhão ou mais de 5 milhões pessoas, se forem considerados os seus dependentes. A gama de produtos cobertos pela certificação inclui desde artesanatos, produtos naturais extraídos da natureza natureza até commodities agrícolas. Além da preocupação preocupação com o lado social e de equidade nas transações comerciais, o Fair Trade leva também em conta aspectos relacionados com a preservação ambiental. 50. Entre outras imperfeições de mercado, destacam-se: oligopólios, oligopsônios, economias de escala e informações imperfeitas (para maiores detalhes, ver Stiglitz e Walsh, 2003). 51. Por exemplo, deixar de comprar produtos que, sabidamente, são falsificados, não respeitam direitos autorais, prejudicam o meio-ambiente, sonegam impostos impostos ou que são produzidos com a exploração da mão-de-obra. Neste último caso, exploração da mão-de-obra pode ser, por exemplo, condições insalubres de trabalho, exploração da mão-de-obra infantil, desrespeito à legislação trabalhista etc. 52. Neste caso, espera-se que os consumidores e produtores façam ações que contribuam para o aprimoramento do convívio social, mesmo que isso implique em maiores custos e/ou despesas. 53. Para maiores informações sobre esse movimento, ver, por exemplo: http://www.fairtrade.net/home.html 54.. Dados extraídos de: http://www.fairtrade.net/faq_links.html 54
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Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Até o presente, o movimento está mais ativo no comércio entre países em desenvolvimento – que atuam como produtores – e os países desenvolvidos – que compram os produtos certificados. Para os consumidores, este tipo de certificação procura garantir o suprimento de bens que atendam as expectativas em termos de seus valores pessoais (princípios, ética, moral etc.) e qualidade dos produtos. Em países ricos, em que grande parcela da população tem alto poder aquisitivo, os consumidores buscam bens e serviços que embutem qualidades que extrapolam as características físicas e químicas 55. Esse tipo de comportamento pode abrir oportunidades para muitos agricultores e pequenos empresários de países em desenvolvimento. Entretanto, é necessário enfatizar que se trata de um mercado altamente exigente em termos de qualidade, garantia e constância de suprimento, etc. Além disso, existe todo o custo referente ao processo de certificação que, em muitos casos, não é desprezível.
6. Agricultura e a sustentabilidade econômica 6.1 Desafios A terceira dimensão da sustentabilidade – e, para a sobrevivência da empresa rural, a mais importante – é a econômica. Não adianta uma propriedade agrícola ser sustentável social e ambientalmente se ela não for lucrativa. Isto é, se as suas receitas não forem suficientes para cobrir todas as despesas. Na verdade, se ela não for economicamente viável, dificilmente haverá incentivo para preocupações com o lado social e ambiental da atividade. Grande parte do sucesso e da competitividade da agricultura brasileira pode ser creditada a três fatores principais: disponibilidade de grande área; fatores edafo-climáticos favoráveis para a agricultura; e, talvez a razão mais importante, o acúmulo de uma significativa capacidade de desenvolvimento de conhecimentos científicos e tecnológicos na agropecuária. Apesar de parte da agricultura brasileira ser altamente eficiente, competitiva e, conseqüentemente, lucrativa ela tem muitos problemas econômicos. Conforme já mencionado anteriormente, existe uma parcela considerável de produtores relativamente pobres, com baixo nível de educação, treinamento e qualificação da mão-de-obra, que adotam baixo nível tecnológico e, como conseqüência, tem baixa produtividade. Muitos deles dependem de programas governamentais de apoio que são, em geral, de natureza assistencialista e não garantem sua emancipação e transformação em produtores auto-suficientes. Esta situação não contribui para a imagem internacional do país e, particularmente, não ajuda a agricultura conquistar e manter mercados. Para atingir a sustentabilidade econômica desse segmento da agricultura, é necessário desenvolver esforços que possibilitem a sua viabilidade econômica. A parte moderna e competitiva (p.ex.: café, cana, soja, milho, algodão, pecuária bovina, aves, suínos, madeira, celulose e papel etc.) é representada pela parcela da agricultura que foi capaz de aproveitar o dinamismo dos mercados externo e interno e dos avanços da tecnologia, ocorridos – principalmente – a partir da década de 70. Ela foi capaz de incorporar diversas modernizações tecnológicas na produção (sementes melhoradas, fertilizantes, defensivos químicos, máquinas e equipamentos etc.) e ferramentas de administração e de comercialização. Graças a esse desenvolvimento, o País tornou-se um dos grandes produtores e exportadores de produtos agrícolas do mundo. Entretanto, esses também enfrentam diversos desafios. A sua expansão cria problemas relacionados com o ambiente. As mudanças na cobertura dos solos – principalmente o desmatamento da floresta amazônica e do cerrado – erosão de solos, contaminação de solo e água por fertilizantes e defensivos e adoção de transgênicos, são alguns dos problemas mais significativos. 55. Tais como: proteção do ambiente na produção do bem ou serviço, não exploração da mão-de-obra na sua produção etc.
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No mercado internacional, existem desafios econômicos igualmente complicados. Apesar do recente dinamismo no comércio de produtos agrícolas, existem diversos problemas ainda não resolvidos. Os subsídios recebidos pelos produtores dos países desenvolvidos e os diferentes tipos de barreiras ao livre comércio são dois dos mais sérios desafios para a agricultura brasileira.
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
6.2 Oportunidades A população humana continua crescendo a uma taxa muito alta – cerca de 1,0 bilhão de pessoas adicionais a cada 13 anos – e estima-se que o crescimento continue, pelo menos, nos próximos 50 anos. Além disso, observa-se um processo de rápido crescimento econômico em muitos países menos desenvolvidos. A combinação desses dois fenômenos faz com que haja forte pressão de demanda no mercado mundial de commodities agrícolas 56. Graças à sua grande extensão territorial, o Brasil é hoje um dos poucos países do mundo com significativa fronteira agrícola ainda inexplorada. Estima-se que o total de terras exploradas com agricultura seja de aproximadamente 60 milhões de hectares. Além disso, cerca de 220 milhões de hectares estão ocupados com pastagens. Desses, 90 milhões de hectares podem ser convertidos para a agricultura (Brito, 2006). Essas áreas estão localizadas, na sua maior parte, na região Centro-Sul do País e possuem condições de solo e de clima relativamente favoráveis para a agricultura. As chuvas são em quantidades significativas, durante um verão úmido e quente. O inverno subtropical ameno não apresenta temperaturas muito baixas. Apesar das chuvas ocorrerem em menor volume nesta época, em boa parte, é possível desenvolver uma segunda safra na mesma área da safra de verão 57. Finalmente, as diversas restrições climáticas e de solos foram suplantadas através do desenvolvimento de dois tipos de tecnologias que se complementam. De um lado, através da criação de sementes melhoradas e adaptadas às diferentes condições locais. De outro, o desenvolvimento de sistemas alternativos de manejo (de solo, pragas, doenças etc.) que – associados ao uso de insumos modernos e máquinas – permitiram ganhos de produtividade, redução de custos e, conseqüentemente, expansão da produção (Araújo et al., 2003). O conjunto desses fatores faz com que as perspectivas para o crescimento da agricultura brasileira seja bastante promissoras.
7. Considerações finais Este capítulo mostra que as três dimensões do conceito de sustentabilidade estão diretamente relacionadas com o setor rural e têm gerado desafios crescentes para a atividade agropecuária. As recentes transformações tecnológicas, no ambiente de negócio e nas estruturas de preferências dos consumidores têm causado modificações significativas no seu modo de operação. A sobrevivência e o sucesso do setor dependerá da capacidade de ajuste dos produtores frente às novas exigências do mercado. Por outro lado, essas mudanças estão criando novas oportunidades de negócios não tradicionais, mas potencialmente lucrativos. O significativo crescimento econômico observado no passado recente permitiu que parte considerável dos consumidores – principalmente dos países mais desenvolvidos – atingisse um alto nível de renda. Com isso, eles puderam atender não apenas as necessidades básicas de consumo, mas começaram também, a buscar novos atributos nos bens e serviços consumidos. O desenvolvimento sustentável da agropecuária brasileira dependerá de sua capacidade de se ajustar às modificações no mercado consumidor, oferecendo produtos de qualidade – tanto do ponto de vista físico e químico, mas também, do ponto de vista ambiental e social – a preços competitivos. 56. Uma indicação dessa pressão é a recente alta nos preços médios das commodities agrícolas e o dinamismo do comércio mundial de alimentos e matérias primas de origem na agricultura. 57. Esta tecnologia, chamada de “safrinha”, gera retornos econômicos positivos para os agricultores na medida em que permite amortizar mais rapidamente, os investimentos em terra, máquinas e equipamentos etc.
153
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
8.
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Questões de Revisão 1. Quais são os fenômenos notáveis no processo de evolução da civilização humana? a. Rápido crescimento populacional b. Avanço dos conhecimentos c. Crescimento econômico d. (a) e (c) e. (a), (b) e (c)
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
2. Quando ocorreu o início do fenômeno do crescimento exponencial da população humana? a. Há 100.000 anos. b. Em torno de 8.000 a.C. c. Na época das Grandes Navegações d. No início do Séc. XIX e. Em torno de meados do Séc. XX 3. a. b. c. d. e.
Sustentabilidade é um termo mal utilizado pelas seguintes razões: Falta de uma definição precisa. Uso predominante do termo em contexto intuitivo. Falta de indicadores quantitativos (de sustentabilidade). (a) e (c). (a), (b) e (c)
4. a. b. c. d. e.
Sustentabilidade é difícil de se definir pelas seguintes razões: Ela não é estática. Ela não é absoluta. Ela não é infinita. Ela não é quantitativa. Todas as anteriores
5. a. b. c. d. e.
Em relação à agricultura brasileira, pode-se afirmar: Ela responde por cerca de 10% do PIB. Sua população economicamente ativa é de, aproximadamente, 30% do total do País. O “agribusiness” responde pela geração de cerca de 30% do PIB do Brasil. (a) e (c). (a), (b) e (c).
6. a. b. c. d. e.
A sustentabilidade social está relacionada com os seguintes problemas. Pobreza. Exploração de mão-de-obra. Respeito às legislações. (a) e (b) (a), (b) e (c) 155
Capítulo 7 Sustentabilidade e Desenvolvimento Rural – Oportunidades e Ameaças
Marque V ou F nas questões abaixo
7. ( ) O desenvolvimento econômico observado nos últimos 500 anos gerou muitos benefícios para um grande número de pessoas. 8. ( ) A ausência de sustentabilidade pode resultar em um “futuro Mad Max”. 9. ( ) As previsões pessimistas de Malthus não ocorreram graças ao avanço dos conhecimentos científicos e tecnológicos verificados desde o início da Revolução Industrial. 10. ( ) Atualmente, o padrão de produção e de consumo humano não depende de nenhum recurso exaurível.
F - 0 1 V - 9 V - 8 ) o ã ç i u b i r t s i d a n e d a d l a u g i s e d e d a m e l b o r p o i r é s m u r i t s i x e e d r a s e p a ( V - 7 ) e - 6 ) d - 5 ) e - 4 ) e - 3 ) d - 2 ) e - 1
156
: o t i b a r a G