As Bucólicas são compostas de dez poema s, escritos em hexâmetros, curiosamente o mesmo verso da poesia épica (seja de Homero, seja do próprio Virgílio). Digo que isso é curioso porque se o gênero bucólico é ³humilde´ (genus humile), formalmente, deveria se esperar um tipo de verso distinto daquele da elevação épica (genus altum ). Por
seu turno, cada uma das bucólicas recebe o nome de écloga ou idílio (do gregoeidón/imagem, eidýllion é um pequeno quadro) e tais tai s termos referem-se referem-se basicamente à brevidade das cenas por eles descritas, assim As Bucólicas são, antes de tudo, o registro de pequenos quadros cujo motivo prim eiro é a vida simples dos campesinos, dos pa stores e pastoras em seu ambi ente natural. Daí o próprio Beethoven ter chamado a atenção para o fato fato de ser sua sinfonia uma pintura, uma fantasia sobre a qual a audi ência deveria imaginar cenas como que se a música pintasse um quadro. Sob
o aspecto da forma, os dez poemas, cuja extensão varia de 63a 110 versos, são marcados por uma regularidade estrutural diferenciada, isto é, os poemas ímpares são dialógicos, enquanto os pares são monólogos. Os diálogos são levados a termo por pastores de nomes gregos, propostos intertextualmente numa referência a Teócrito de Siracusa, e assim temos: Títiro e Melibeu (1ª écloga), Menalcas e Dametas (3ª écloga), Menalcas e Mopso (5ª écl oga), Melibeu e Córidon (7ª écloga) e Lícidas e Méris (9ª écloga). A citação de Teócrito fic a mais explicita quando na 4ª écloga, Virgílio propõe: ³Ó ³ Ó Musas da Sicília, erga-se um pouco o nosso
tom//nem todos prezam o arvoredo e os baixos tamarizes; //cantamos selvas; selvas sej am, pois, dignas de um cônsul ´ (Trad.: Péricles Eugênio da Silva Ramos). Vale lembrar que Siracusa
é uma cidade da Sicília.
Do ponto de vista da elaboração da obra, obra, um dos primeiros comentadores de Virgílio, Mauro Honorato no século IV, assevera: ³ Sua principal qualidade, por seu turno, é,
Sérvio
naturalmente o caráter humilde. De fato, dos três caracteres existentes: humilde, médio e grandiloqüente - encontramos todos eles no poeta. Porque, na Eneida, há o grandiloqüente; nas Geórgicas, o médio; e nas Bucólicas, o humilde conforme a qualidade dos temas e das personagens, pois, nesta obra elas são rústicas e estão satisfeitas com a simplicidade e às quais nada de elevado deve ser exigido .´ (Trad.: Paulo Martins) São também antigos os
comentários sobre a motivação de Virgílio para escrever As Bucólicas, Hélio Donato (século IV) diz que o poeta primeiro trata dos campos i n natura (Bucólicas), depois do seu manejo (Geórgicas) e mais tarde dos feitos humanos na terra (Eneida). Tal ordem segundo ele vai de encontro ao interesse do poeta: ³ele cantou primeiro os pastores; depois, os agricultores e, por último, os guerreiros ´. A natureza, em seu estado não-latente, portanto óbvio, e a vida que el a proporciona é oleitmotiv da obra. Melibeu na 1ª écloga diz: ³Ó ³ Ó Títiro, deitado à sombra de uma vasta faia,//aplicas-te à silvestre musa com uma frauta leve;//nós o sol o da pátria e os doces campos nós deixamos;//nós a pátria fugimos ( patriam fugimus ); tu, na sombra vagaroso,// fazes a selva ecoar o nome de Amarílis bela.´ (Trad.: P. E. da S. R.) O que temos nesses primeiros
cinco versos no diálogo entre Melibeu e Títiro é o programa da obra: Primeiro, o pastor despreocupado deitado sob uma vasta árvore. Segundo, sua aplicação na flauta suave, leve, logo, humilde. Terceiro, o abandono do campo. Assim, o lugar-comum lugar-comum do fugere urbem é apresentado pelo avesso. Por último, além da f unção de produzir, Títi ro ocupa-se ocupa-se em louvar l ouvar Amarílis, produzindo uma relação entre a vida campestre e a amorosa, que tão bem foi emulada por Tomás Antônio Gonzaga em Marília de Dirceu. Vale observar aqui o anagrama quase perfeito: Amarílis/Marília.
Já
o lema, que está ainda hoje presente na bandeira de Minas Gerais, foi deslocado e descontextualizado, uma vez que na origem, isto é, na 1ª écloga, assim aparece: ³ A liberdade que me viu ocioso, tarde embora,//quando, ao fazer a barba, esta caía j á mais branca ´. Assim os Inconfidentes deslocaram apenas parte do verso 27 para um contexto essencialmente político que não havia no texto virgili ano, além de romper com a estrutura sintática do período, soando sem nexo para aqueles que conhecem a língua latina. Entretanto a écloga mais famosa entre as dez é indubitavelmente a 4ª. A tradição a chama de ³Pólio´, nome daquele a quem Virgílio dirige os versos. Essa, que por muito tempo associou-se ao nascimento do cristianismo por tratar de um novo tempo, uma nova idade de ouro trazida pelas mãos de um menino, tem, sim, f unção política e não religiosa, celebrando a paz de Brundísio entre os discordes do 2º triunvirato (Marco Antônio e Otávio). Virgílio dessa forma vaza o poema com temas elevados, portanto distantes do gênero humilde, c onforme as regras estabelecidas para os Idílios, entretanto são magistrais seus versos finais: J á logo será tempo, marcha para as grandes honras, Cara prole dos deuses, grande fil ho, tu, de J úpiter! Vê como estão de acordo o mundo de pesada abóboda E as terras todas, e a extensão do mar, e o céu profundo! Vê como, com os séculos por vir, tudo se alegra. A última parte desta vida seja-me tão longa, Que para te dizer os f eitos não me falte o alento! O trácio Orfeu não poderá vencer-me nestes cantos, Nem Lino, ainda que a Orfeu a mãe Calíope socorra E por seu turno a Li no dê assistência o belo Apolo. Se competir comigo o próprio Pã, por juiz a Arcádia, Dar-se-á por vencido o próprio Pã, por juiz a Arcádia. Começa, criança, a conhecer a própria mãe com teu sorriso; Dez meses retiveram tua mãe em longo enfado. Começa, criança: aquele que não ri à própria mãe A mesa não terá de um deus, o leito de uma deusa.´
Públio Virgílio Marão (em latim Publius Vergilius Maro ), também conhecido como Vergílio ou Virgílio (Andes, 15 de Outubro de 70 a.C. -Brindisi, 21 de Setembro de 19
a.C.), foi um poeta romano clássico, mais conhecido por três obras principai s, as É clogas (ou Bucólicas), asGeórgicas e Eneida - apesar de vários poemas menores também serem atribuídos a ele. Filho de um agricultor, Virgílio chegou a ser considerado como um dos maiores poetas de Roma. Sua obra mais conhecida, Eneida, pode ser considerada um épico de Roma e tem sido extremamente popular a partir da sua publicação até os dias atuais. Foi considerado ainda em vida como o grande poeta romano e expoente da literatura latina. Seu trabalho foi uma vigorosa expressão das tradições de uma nação que urgia pela afirmação histórica, saída de um período turbulento de cerca de dez anos, durante os quais as revoluções prevaleceram
Vida e obra Estima-se que a tradição biográfica de Virgílio vem de uma biografia perdida de autoria de Varius, editor de Virgílio, que foi incorporada na biografia feita por Suetônio e os comentários de Sérvio e Donato, os dois grandes comentadores da poesia de Virgílio. Embora os comentários sem dúvida registrem muitas informações f actuais sobre Virgílio, pode-se mostrar que algumas das suas evidências conf iavam na inferência feita a partir de sua poesia e alegorização. Portanto, a tradição biográfica de Virgílio continua a ser problemática. [1] A tradição diz que Virgílio nasceu na vila de Andes, perto de Mântua,[2] na Gália Cisalpina.[3] Estudiosos sugerem que descendia de etruscos, úmbrios ou até mesmo celtas, examinando os marcos linguísticos ou étnicos da regi ão. A análise do seu nome deu ori gem às crenças de que descendendia dos primeiros colonizadores romanos. As especulações modernas, em última análise, não são apoi adas nem pela evidência narrativa nem por seus próprios escritos ou o de seus biógraf os tardios. Suposições etimológicas indicam que o seu cognome Maro tem anagramaticamente suas letras em comum com os temas de seu épico: amor e Roma. Macróbio diz que o pai de Virgílio era de uma f amília humilde, no entanto, os estudiosos em geral acreditam que Virgílio era de uma família de latifundiários equestres que puderam oferecer-lhe uma educação. Amigo de Horácio, como ele protegido por Mecenas, entrou em contato com o imperador, de quem recebeu o incentivo para escrever a Eneida. Admirador da cultura helênica, empreendeu uma viagem à Grécia, berço e viveiro da cultura, sonho que há muito acalentava: o destino c oncedeu-lhe a realização desse anseio, mas morreu no regresso, junto de Brindisi. O seu túmulo encontra-se em Nápoles. A obra de Virgílio compreende, além de poemas menores, compostos na juventude, as Bucólicas ou É clogas, em número de dez, em que reflete a influência do gênero pastoril criado por Teócrito. As Geórgicas, dedicadas ao seu protetor Mecenas, constam de quatro livros, tratando da agricultura. Trata-se de uma obra de implicações políticas indiretas, embora bem definidas:
ao fazer a apologia da vida do campo, o poeta serve o ideal político-social da dignificação da classe rural. Reflete a influência de Hesíodo e Lucrécio. Literariamente, as Geórgicas são consideradas a sua obra mai s perfeita. E finalmente, a Eneida, que o poeta considerou i nacabada, a ponto de pedir, no leito de morte, que fosse queimada, constitui a epopéia nacional. Esta refere-se à lenda do guerreiro Enéias, que, após a célebre guerra, teria fugido de Tróia , saqueada e incendiada, e chegado à Itália, onde se tornou o antepassado do povo romano. Epopéia erudita, a Eneida tem como objetivo dar aos romanos uma ascendência não-grega, formulando a cultura latina como original e não tributária da cultura helênica. O poema consta de doze livros e a sua construção serviu de m odelo definitivo às grandes epopéias do renascimento, nomeadamente para Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões, o que se percebe claramente comparando o primeiro verso das duas epopéia s:
Eneida: Arma uirumque cano... que significa: "As armas e o varão (herói) eu canto"; com
Lusíadas: As armas e os barões assinalados...
[editar ]Primeiros trabalhos Segundo
os comentaristas, Virgílio recebeu sua primeira educaç ão quando tinha cinco anos de
idade, indo mais tarde para Cremona, Milão e finalmente Roma para estudar retórica, medicina, eastronomia, que ele logo abandonou pela filosofia. Da admiração por Virgílio referida pelos escritores neotéricos Gaio Asino Pólio e Élvio Cinna, tem-se inferido que ele foi durante algum tempo associado ao círculo neotérico de Catulo. Segundo a tradição, Virgílio preferia sexo com homens e especialmente amava doi s jovens escravos,[4][5] entretanto colegas de Virgílio consideravam-no extremamente tímido e reservado, de acordo com
Sérvio,
e ele foi apelidado
de "Partênias" ou "donzela" por causa de seu distanciamento social. Virgílio parece ter tido pouca saúde em toda a sua vida e em algumas aspectos viveu como um inválido. Segundo o "Catalepton", enquanto que esteve na escola epicurista de Siro, o epicurista, em Nápoles, começou a escrever poesia. Um grupo de pequenas obras atribuídas ao jovem Virgílio pelos comentadores sobrevive coletados sob o título Appendix vergiliana , mas são largamente considerados espúrios pelos estudiosos. Um deles, oCatalepton, consiste em catorze poemas curtos,[6] alguns dos quais podem ser de Virgílio, enquanto outro, um poema narrativo curto intitulado Culex ( "O Mosquito"), foi atribuído a Virgílio já no século I da era cristã. [editar ]As Éc logas A tradição biográfica afirma que Virgílio começou o hexâmetro É clogas (ou Bucólicas) em 42 a.C. e acredita-se que a coleção f oi publicada em torno de 39-38 a.C., embora isto seja controverso.[6] AsÉ clogas (do grego "seleções") são um grupo de dez poemas aproximadamente modelados na poesia bucólica hexamétrica ("poesia pastoral") do poeta helenístico Teócrito. Após sua vitória naBatalha de Filipos em 42 a.C., onde lutara contra o
exército liderado pelos assassinos de Júlio César , Otávio tentou pagar seus veteranos com terras expropriadas de cidades no norte do Itália, supostamente incluindo, segundo a tradi ção, uma propriedade perto de Mântua pertencente a Virgílio. A perda da fazenda de sua f amília e a tentativa, por meio de petições poéticas, de recuperar sua propriedade têm sido tradicionalmente consideradas como os motivos de Virgílio para a composição das É clogas. Hoje isso é visto como uma inferência sem suporte baseada em interpretações dasÉ clogas. Nas É clogas 1 e 9, Virgílio de fato dramatiza os sentimentos contrastantes c ausadas pela brutalidade das desapropriações de terra através da expressão pastoral, mas não oferece provas irrefutáveis do suposto incidente biográfico. Os leitores muitas vezes fazem essa relação e por vezes identificam o próprio poeta com vários personagens e suas vicissitudes, quer a gratidão de um velho rústico a um novo deus (Ecl. 1), o amor frustrado de um cantor rústico por um menino distante (o animal de estimação de seu senhor, Ecl. 2), ou o pedido de um cantor do senhor para compor várias éclogas (Ecl. 5). Os estudiosos modernos em grande parte rejeitam esses esforços para reunir dados biográficos de textos fictícios, preferindo ao invés disso interpretar os diversos personagens e temas como a representação das próprias percepções contrastantes do poeta em relação à vida e pensamento de sua época.