A ARQUITETURA VERNACULAR DAS 5 REGIÕES BRASILEIRAS
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Agno Eduardo; Daniella Leal; Marco Antônio Endo; Mariana Rodrigues; Roberta Ferreira
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Prof. Dr. Ângelo Arruda
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RESUMO Esse trabalho apresenta exemplos exemplos de arquiteturas vernaculares vernaculares existentes nas cinco regiões do Brasil. O objetivo é descrever os modelos construtivos encontrados e, a partir deles, traçar a si milaridade de alguns exemplares entre as diferentes localidades regionais. Através Através de pesquisa teórica, levantamento bibliográfico e de imagens foram abordados vários vários exemplos exemplos de arquiteturas tradicionais do território território nacional.
PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura. Vernacular. 3 Regiões Brasileiras. _________________________ _____________________ ____
INTRODUÇÃO O presente artigo destina-se à investigação dos tipos de arquiteturas vernaculares espalhados pelo Brasil. A chamada arquitetura vernacular está diretamente ligada à percepção de especificidade e de diversidade e diz respeito aos modos de construir em determinadas localidades a partir de materiais encontrados na região e, muitas vezes, utilizando técnicas passadas de geração em geração. Na região sudeste encontramos, nas áreas urbanas, as favelas como exemplos significantes de arquitetura vernacular. Na região norte, no Estado do Amazonas, por exemplo, encontramos predominantemente casas flutuantes e casas no formato de palafitas. Enquanto no nordeste, além das já citadas palafitas, casas de adobe, de palha e de taipa são localizadas;
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Através de pesquisa bibliográfica pretende-se esmiuçar os variados tipos de arquiteturas vernaculares existentes no Brasil. 2 Acadêmicos do curso de Arquitetura Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal d e Mato Grosso do Sul – Sul – UFMS. UFMS.
[email protected];;
[email protected] [email protected];; Email:
[email protected];
[email protected] [email protected];;
[email protected] [email protected] [email protected].. 3 Professor Doutor em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – Sul – UFMS. UFMS.
técnicas essas, encontradas também na região centro-oeste. No sul, por influência estrangeira, os modelos construtivos de enxaimel e de toras de madeiras são intensamente usados até hoje. A pesquisa relativa ao artigo objetiva conhecer as técnicas construtivas de cunho popular (vernacular ou tradicional) do Brasil, percebendo a similaridade e as diferenças de modelos existentes nas diferentes regiões e relacionando-os com as exigências climáticas das localidades. Especificamente, o grupo de pesquisa busca conhecimento relevante de métodos construtivos tradicionais de cada região brasileira. A dita arquitetura vernacular está intrinsecamente ligada aos conhecimentos populares do clima, dos materiai s construtivos mais adequados, da disponibilidade desses materiais e da relação da construção com a localidade, por isso buscamos compreender as estratégicas existentes nesse modo de construir para então relacionar a arquitetura vernacular das regiões com o clima da qual faz parte; elaborar uma linha de pensamento acerca de como a arquitetura vernacular ou tradicional influencia ou não a arquitetura erudita de mesma região; para então, aprender técnicas construtivas diferenciadas, as quais poderão ser aplicadas, futuramente, em nossa atuação, segundo as condicionantes projetuais exigidas. A realização dos objetivos do artigo envolve levantamento teórico de dados, com respectivo acúmulo de bibliografias relacionadas. Feito esse processo, a reunião de informações gerais e as especificações por região constituirão o corpo da pesquisa. Após as delimitações, a percepção das diferenças e das semelhanças de alguns modelos arquitetônicos a partir dos climas (chuvas, amplitude térmica, etc.) poderão ser percebidas.
1 REGIÃO SUL A região sul é a menor das regiões do país, formada pelos Est ados de Santa Catarina (capital Florianópolis), Rio Grande do Sul (capital Porto Alegre) e Paraná (Capital Curitiba). Predomina o clima subtropical na região, exceto no norte do Estado do Paraná, onde predomina o clima tropical. Porém, o clima na região sul apresenta grandes variações, sendo o responsável pelo registro das temperaturas mais baixas do Brasil no inverno. Em algumas localidades da região sul pode ocorrer até neve em determinadas épocas do ano devido a essas variações, como é o caso da região central do Paraná, do planalto 2
serrano do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, onde são registradas as temperaturas mais baixas. Nas regiões de clima mais ameno, a vegetação típica é a floresta de araucárias, enquanto que em boa parte do Rio Grande do Sul, podemos encontrar extensas pradarias, ou campos naturais, chamados de “pampas” ou “campos sulinos”. Esta configuração climática foi um dos fatores que fez com que a região sul do Brasil fosse o destino de grande parte dos imigrantes europeus, principalmente da Alemanha e Itália que vieram para a região trazendo consigo seus costumes e tradições celebrados até hoje em festas típicas da região sul. Tradicionalmente, a agropecuária é a principal atividade econômica da região sul. Mas esta região também conta com um contingente bastante desenvolvido de indústrias (principalmente alimentícias) e com a mecanização agrícola, que a colocam no segundo lugar brasileiro em geração de renda (perdendo apenas para a região sudeste). O reflexo de todas estas influências estrangeiras na arquitetura são as diversas técnicas construtivas utilizadas na arquitetura vernacular da região. O enxaimel é uma técnica que consiste em paredes montadas com hastes de madeira encaixadas entre si em posições horizontais, verticais ou inclinadas, cujos espaços são preenchidos geralmente por pedras ou tijolos. Os tirantes de madeira dão estilo e beleza às construções do gênero, produzindo um caráter estético privilegiado. Outras características são a robustez e a grande inclinação dos telhados. Na adaptação do enxaimel às características climáticas da região, foi necessária a implantação, por conta da elevada umidade local, de uma estrutura feita de pedra que sustenta as construções evitando que a madeira se molhe.
Figura 1. Foto: Casa Antiga Enxaimel – Joinville – SC. Fonte: http://www.radarsul.com.br/historia 3
As casas Luso Brasileiras tiveram suas origens no século XIX, sendo seu telhado inclinado para frente e fundos do terreno. Há varanda na face frontal e, nos fundos, um acréscimo para a cozinha. Denomina-se luso-brasileira por apresentar implantação semelhante as das casas urbanas construídas no período colonial.
Figura 2. Foto: Casa Luso Brasileira, Antonina – PR. Fonte: www.alltravels.com
Casas de Imigração datam do final do século XIX até as décadas de 1920/1930. Sua principal característica está na relação do telhado com a implantação no lote: ele é inclinado para as laterais do terreno e a entrada da casa fica em uma das laterais, geralmente protegida por varanda. Essas casas possuem área maior que as luso brasileiras e há aproveitamento do sótão para os quartos. As casas, construídas quase sempre em conjunto de seis, são cobertas de telhas fundas, o assoalho dos cômodos em terra batida, as janelas guarnecidas de postigo, sem vidro, à moda do país, bem leves, mas melhor do que tínhamos pensado; há somente a chuva contra a qual estamos protegidos; cada casa deve alojar 16 pessoas. Os italianos também chegaram ao sul do país introduzindo construções em cantaria, que é a pedra que, tendo sido afeiçoada manualmente, com o uso de ferramentas, apresenta-se pronta para ser utilizada em construções e equipamentos. Atua ora como elemento estrutural, ora como ornamentação e, muitas vezes, atende às duas funções. Posteriormente utilizaram da madeira, às vezes com exagerado dimensionamento de peças estruturais e cobertura de telhas de madeira fendida.
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Figura 3. Casa de cantaria de imigrantes italianos no sul do Brasil. Fonte: archdaily.com.br
Figura 4. Casa de madeira de imigrantes italianos no sul do Br asil. Fonte: archdaily.com.br
A arquitetura em madeira foi marcante e predominou nas paisagens paranaenses até metade do século XX. Na ocupação Sul marcou com suas construções em pinho (araucária angustifólia), desde a casa de troncos sobrepostos de origem polonesa até a casa de telhado empinado, marcada, quase sempre, pela presença de sótão e o uso de lambrequim nos beirais, conhecida popularmente como "casa do polaco".
Figura 5. Foto: Casa do Colono Polonês, Curitiba – PR. Fonte: pt.wikipedia.org
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2 REGIÃO SUDESTE Favelas Na região Sudeste do Brasil, em decorrência do grande número de habitantes, as cidades passaram por, a partir do iníco da instalação de indústrias nos grandes centros, um imenso inchaço urbano. Com isso, veio o êxodo rural e, com expectativas de melhorar de vida, os brasileiros acabaram aglomerando-se ao redor dessas indústrias. Contudo, como a mão-deobra ficou saturada, grande parte desse contingente acabou ficando na cidade. Dessa maneira surgiram, primeiramente os cortiços que, mais tarde viriam a se "transformar" nas favelas das grandes metrópoles brasileiras. Os cortiços surgiram com a Proclamação da República, em 1889, uma vez que a elite e os administradores do Rio de Janeiro queriam apagar do seu passado os vestígios de uma cidade colonial. Entretanto, com condições sanitárias quase nulas, essas estruturas foram demolidas na reforma de Pereira Passos. Sem ter outras opções de moradia os desabrigados, em sua grande maioria ex-escravos, foram obrigados a construir suas próprias casas, dando origem então, às favelas. As favelas se constituem através de um processo arquitetônico e urbanístico vernáculo singular, que não somente difere, ou é o próprio oposto, do dispositivo projetual tradicional da arquitetura e urbanismo eruditos, mas também compõe uma estética própria, uma estética das favelas, que é completamente diferente da estética da cidade dita formal e possui características peculiares. As casas são, geralmente, construídas em mutirões com materiais de baixo custo e fáceis de serem achados, como por exemplo tijolos furados aparentes, estruturas em concreto armado, esquadrias industrializadas, telhados de zinco e/ou amianto, pedaços de compensados industrializados, madeiras, latas, lonas, etc. Estas casas, no entanto, como seu principal objetivo é a moradia, tem sua estrutura inicial precária; com o tempo vão melhorandoa, processo denominado bricolagem (obras que nunca têm fim, pois não tem um projeto feito e estão em constante mudança, fragmentação).
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Figura 6. Favela da Rocinha. Google Imagens.
Arquitetura Colonial Outro grande exemplo é a arquitetura colonial, definida como aquela realizada no território brasileiro desde 1500 até a independência, em 1822. As tipologias arquitetônicas dessa época consistiam em casas térreas e sobrados, construídos sobre os limites do terreno com uma padronização das plantas. A cobertura era de telhado com duas águas de telhas cerâmicas, para que toda água da chuva escorresse para o fundo e para as ruas. Inicialmente, porém, as principais técnicas utilizadas eram da taipa de pilão e de pau-a-pique, uma vez que eram de rápida construção e usavam os materiais mais abundantes na colônia: o barro e a madeira. Logo se adotaram também a alvenaria de pedra ou tijolos de adobe para levantar paredes, que permitiam a construção de estruturas maiores e a inclusão de madeiramento para pisos e tetos. Mesmo nos séculos seguintes poucas igrejas foram construídas com fachadas integralmente de pedra. Nos primeiros tempos, as coberturas das casas eram feitas simplesmente com palha, como as ocas indígenas, o que ainda subsiste em áreas rurais. A telha de barro foi inicialmente utilizada nos edifícios mais abastados antes de popularizar-se. As arquiteturas deste período são rebuscadas, detalhistas e expressam as emoções da vida e do ser humano. O barroco brasileiro foi diretamente influenciado pelo barroco português, embora com o passar do tempo fosse assumindo características próprias. Com o progresso da colonização e o estabelecimento de uma estrutura urbana básica, passou a ser utilizado o adobe e a cantaria de pedra, com reforços de madeiramento e cobertura de telhas.
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Comparado aos séculos anteriores, no século XVIII aumentou a quantidade e qualidade dos edifícios civis, ainda que de maneira geral a arquitetura civil produzisse edifícios de muito menos vulto que a arquitetura religiosa. Os principais exemplos disso são as cidades de Ouro Preto, Congonhas e Tiradentes em Minas Gerias; Santo Antônio em São Paulo e Paraty no Rio de Janeiro.
Figura 7. Ruas de Ouro Preto. Fonte: http://i.olhares.com/data/bi g/19/197306.jpg
Arquitetura de Opys (casa de reza) Os índios guarani também praticam a chamada arquitetura vernacular. Os Opys, diferentemente das casas de moradia, não têm paredes internas dividindo ambientes, eles são apenas demarcados com tecidos ou esteiras . A estrutura é de madeira com apoios articulados às vigas da cobertura por cipós. O barro para vedação pode ser aplicado diretamente sobre a estrutura vertical de madeira (cedro ou palmeira, pois fornecem a palha para os telhados e os troncos para a estrutura vertical) ou sobre uma trama de paus delgados (taipa). A planta da casa é sempre retangular, eventualmente, com um semicírculo em uma das extremidades, cobertura de palha com duas águas e duas portas alinhadas s egundo os eixos leste/oeste ou leste/norte. Podemos encontrar exemplos no interior do Espírito Santo e do Rio de Janeiro.
Figura 8. Interior de um Opy. Foto: Carlos Penteado 8
3 REGIÃO CENTRO-OESTE A região Centro-Oeste brasileira é extensa em território, possui área de 18,87% do nosso país, por outro lado tem a menor ocupação populacional ( 6,85% do total ). Isso é reflexo da recente urbanização, crescente no século XX, nos estados de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e no Distrito Federal. Essa região é reconhecida por ter boa parte da ocupação de seu terreno destinada à agropecuária e agroindústria, logicamente sendo a principal fonte financeira e econômica, também sendo de grande importância para o mercado brasileiro. O relevo do Centro-oeste caracteriza-se por terrenos antigos e aplainados pela erosão, fato esse que desencadeou os chapadões na região. Em termos climáticos, a região Centro-Oeste apresenta um clima tropical semiúmido com duas estações bem definidas: um verão quente, úmido e chuvoso e um inverno ameno e seco. A vegetação, por sua vez, caracteriza-se pelo predomínio do Cerrado, além do Pantanal a oeste e partes da Amazônia em boa parte do Mato Grosso. A ocupação desse território, historicamente, ocorre no século XVI pelos espanhóis, aproximadamente na região entre Brasil e Paraguai (atualmente). Mas antes de falar sobre as influências históricas de outros, tratando-se de formas de construção, é preciso destacar na arquitetura local: a indígena. Os índios, antes dos colonizadores chegarem, eram os únicos habitantes do lugar, e se destacam nessa questão por utilizarem produtos da floresta, principalmente a madeira e folhas de palmeira.
Figura 9. Aldeia Yawalapiti - Parque Indígena do Xingu - Mato Grosso. Fonte: tyba.com.br
Na segunda metade do século XVI, os bandeirantes em busca de índios e metais preciosos, tomam o território, que fica anexado às terras brasileiras, segundo Tratado de 9
Madri (1750) entre Espanha e Portugal. No século XVIII, Portugal divide em capitanias Goiás e Mato Grosso, construindo também cidades além de seus limites, como Cáceres - MT e Corumbá - MS.
Figura 10. Casarão em Formosa - GO - séc. XVIII. Fonte: Google imagens
Taipa de pilão foi o método construtivo preferido do colonos paulistas e mineiros, ainda no século XVIII, e constitui boa parte da ar quitetura popular tradicional de boa parte de cidades do estado de Goiás e Mato Grosso, como Pirenópolis e Cuiabá, entre outras. No século XIX, com a República, ocorre o povoamento da região do Pantanal e expansão da pecuária, que mais tarde se dá também em Goiás.
Figura 11. Casa de Marechal Cândido Rondon - à beira do Porto da Manga - Corumbá – MS. Fonte: Google images
Em casas do Pantanal e próximas à margens de rios, é possível notar o uso da madeira e sua construção em palafitas, para evitar danos quando ocorre a cheia do rio.
No século XX, a produção de mate e a pecuária são atividades realizadas por imigrantes gaúchos. Ocorre, nesse período, a inauguração da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (Bauru - Corumbá), em 1905, que foi fundamental à integração da região, contribuindo para o seu desenvolvimento e da produção agropecuária. 10
Figura 12. Casa de adobe - Cuiabá – MT. Fonte: Google imagens
Pode-se concluir que a arquitetura vernácula no Centro-Oeste foi influenciada por seus vários habitantes vindos de outras regiões do país, principalmente do Sul e do Sudeste, e por europeus, colonizadores espanhóis e portugueses que colocaram em prática sua própria tipologia construtiva. Não nos esquecendo dos índios, que fazem suas habitações de forma única e com acentuada semelhança nas regiões Centro-oeste e Norte.
4 REGIÃO NORDESTE A Região Nordeste é a terceira maior região do Brasil e a maior em número de estados, possui nove: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe. De um ponto de vista histórico o Nordeste brasileiro representa a primeira zona de povoamento criada pelos conquistadores portugueses, que iniciaram a colonização a partir do litoral nordestino, a qual favorecia a ocupação em razão da presença de melhores condições naturais, como uma porção litorânea vastamente recortada, ideal para a navegação de cabotagem, e o relevo plano próximo ao mar. O cultivo da cana-de-açúcar (que obteve seu auge entre o final do século XVI e meados do século XVII), baseado no sistema Colônia-Metrópole, estruturou o comércio e o desenvolvimento das cidades nordestinas, principalmente na faixa litorânea, atualmente conhecida como Zona da Mata. A pecuária extensiva foi responsável, ainda durante o século XVII, pelo início da interiorização da ocupação no Nordeste. Afastado da Zona da Mata para não comprometer a 11
lavoura de cana, o rebanho bovino seguiu pelo Agreste – faixa transitória entre as áreas úmidas e as porções de clima seco – até alcançar o Sertão. Hoje em dia, como reflexo disso, cerca de 60,6% da população nordestina fica concentrada na faixa litorânea e nas principais capitais. No sertão e interior, os níveis de densidade populacional são mais baixos, principalmente por causa do clima semiárido. Ainda assim, a densidade demográfica no semiárido nordestino é uma das mais altas do mundo para esse tipo de área climática. Todos os estados do Nordeste são banhados pelo Oceano Atlântico e o clima varia de acordo com o local, podendo ser semiárido, tropical úmido ou equatorial. O trabalhador nordestino dependente das atividades exercidas na região - dentre elas a pesca, o comércio, a lavoura e a pecuária - sentiu a necessidade de construir, e assim como em outras regiões do país, essa construção foi feita a partir de elementos encontrados facilmente no local, que longe da técnica importada para a construção elaborada da época, satisfaziam as necessidades dos moradores. Na maioria dos casos as técnicas eram muito simples e se adequadavam perfeitamente às condições de vida da época. Nasceu assim, em torno do complexo formado pela economia do açúcar até o seu declínio, com suas ramificações comerciais e financeiras, e todos os complementos agrícolas e artesanais que possibilitavam a operação de um trabalho, comércio ou serviço, a forma de existência, a organização da família, as estruturas que não eram criações históricas, mas meras resultantes de opções exercidas para dar eficácia ao empreendimentos construtivos da moradia pela população, tanto original quanto surgida da fusão racial de brancos, índios e negros. Entre as influências construtivas na região Nordeste, de um ponto de vista étnico, podemos destacar os indígenas desenvolvendo tecnologicamente a construção com materiais vegetais; o uso da varanda coberta para fugir do calor (estrutura a partir da uma extensão da coberta em duas águas); palafitamento para fugir da maré ou cheia dos rios; utilização da tesoura romana como estrutura de telhado; planta retangular baseada em sequências de três pilares (sendo os do meio formadores da cumeeira); uso de forquilhas no madeiramento de apoio da coberta; cobertura em camadas de palha seca; trançado da palha (seja de coqueiro, carnaúba ou babaçu) e ausência de divisões internas na casa (objetos e utensílios em uso determinam o ambiente). Nessa região, a casa é o reino das mulheres; por isso, as plantas possuem dois acessos (únicas aberturas) e banheiro separado da casa, com piso elevado e livre de olhares por vedação.
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Já entre as contribuições negras estão: construção com terra (argila); plantas retangulares (cerca de seis por oito metros); cubatas (casas unifamiliares sem divisões internas); cubatas de sombra (cobertas sobre pilares de madeira para uso dos homens da tribo, servindo para reuniões e trabalho); uso da taipa; beiral saliente (com o objetivo de proteger a taipa das intempéries); alpendre (lussambo) diante da casa e poucas e pequenas aberturas. Por fim, os brancos influenciaram a construção com: alpendramento das fachadas principais; especialização do ambiente interno (cozinha e demais divisões internas); acabamento de fachada; elementos acessórios (portas e janelas) trabalhados e rebuscados; telha cerâmica e exacerbação do senso de privado. Uma reflexão mais profunda da construção sempre leva em consideração como uma característica geral das edificações: o clima do local, a proximidade ou afastamento do litoral e o que se pode tirar da natureza com proveito e rápida trabalhabilidade. Nas comunidades litorâneas – cerca de 40 vilas – mais isoladas, menos tocadas pelo turismo ou “corrompidas” pela cidade, partindo-se da constatação da desaparição da cultura pesqueira artesanal, observase que o meio ambiente é o fator determinante da arquitetura, dado os baixos recursos financeiros e construtivos, as difíceis formações geográficas (como falésias e restingas) e empecilhos como as grandes propriedades e as condições do meio, especialmente, a areia fina e móvel, o vento constante e erosivo, as chuvas, as tempestades e o regime das marés. Além disso, as restrições são impostas pelo ciclo da fauna pescada e coletada, pelo acesso à água potável, pelo mar, pela qualidade da madeira e do barro empregados como materiais de construção. Tais fatores levam à decisão de onde construir, como morar e ainda definem a duração dos edifícios. Existem os abrigos de trabalho como os “ranchos” para a vigília dos currais ou, se situados no mar ou nos rios maranhenses, para descanso e proteção nas tempestades. Sendo de uso coletivo, cada usuário precisa deixar o abrigo em bom estado para o próximo. Essas moradas temporárias, dedicadas ao trabalho, são mais simples; às vezes, apenas uma cobertura com vão único e mobiliário escasso é suficiente. A pesca em jangada é atividade exclusivamente masculina, cabendo à mulher a mariscagem e a pesca de linha. As casas “femininas” são então aquelas em que a família reside. Com perenidade maior, são mais complexas e asseadas. Nelas, o trabalho mescla-se à vida familiar. Há aquelas de vão único, com o parco mobiliário definindo uso do espaço. A casa ganha divisões internas com o crescimento dos filhos e seu casamento. Nesse caso, é a varanda que concentra a convivência do trabalho, da família e da comunidade. O banheiro fica fora da 13
casa e tem fossa simples, cavada no chão. A cozinha também fica fora, em uma construção mais simples e de material inferior. A formação dos assentamentos é marcada pelas distâncias pessoais e familiares, além de fatores como a existência de cursos d´água, linhas de maré e outros. Embora haja recém-chegados, o mais usual é que cresçam com o aumento das famílias, o que acarreta a partilha de espaços e instalações, como quintais e banheiros. De um modo geral, as casas estão sempre abertas, assim como os quintais, que só são fechados quando há criação de pequenos animais. As casas são retangulares, com cobertura em duas á guas com 10 a 20° de inclinação. Em geral, inicia-se pela sala, seguida dos quartos e da cozinha ao fundo, todos acedidos por circulação lateral. Aspecto fundamental é a proteção contra o sol e, principalmente, contra o vento com areia fina. A orientação da sala e dos quartos evita então o mar. Há poucas portas e janelas, com divisões internas em meias-paredes que permitem a ventilação por cima. Além dos beirais nas varandas, não raro aparecem anteparos verticais e o cascalho no piso ao redor da casa auxilia a fixar a areia fina. As fachadas são simples e, em muitos casos, sem janelas. Estas aparecem com folhas duplas de madeira, com dobradiças, ou com vedações em palha trançada, içadas como persianas. As portas, com “saia e blusa”( porta e janela ao mesmo tempo), em certos lugares, são elevadas para não entrarem os animais , ou rebaixadas, em decorrência do tamanho do telhado que assume, assim, proporções “indígenas”. Nas casas dos trabalhadores masculinos, como os pescadores, agricultores e peões, as portas são do tamanho da embarcação e as divisões internas são do mesmo material das paredes exteriores. Em alguns casos, são suspensas do piso, permitindo aeração por baixo. A taipa de mão é empregada do Ceará à Bahia e em regiões que se adentram ao sertão e onde há pecuária. A mesma arquitetura pode ser encontrada em outras pequenas comunidades dependentes dessa atividade e o princípio ainda é de usar os materiais locais para a construção, não raro, tendo a palha como revestimento e grandes beirais para proteger das chuvas e ventos. Encontrou-se o emprego, localizado, de lama do mangue na argamassa do pau a pique. A madeira pode ser roliça ou aparelhada com ripas vazadas ou com mata-juntas, por dentro ou por fora, pregadas, amarradas ou apoiadas com forquilhas. A palha, de coqueiro ou de buriti, é mais usada nos “ranchos”. Embora mais adaptada ao meio, degrada-se rapidamente.
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A mistura de terra local para a fabricação da taipa, a abundância de palmáceas, madeira aparelhada, madeira roliça e uma mistura de alvenaria com esse materiais, permitem que essas construções se adaptem ao meio sem muitos impactos.
Figura 13. Casa de palha. Pastos Bons - M A. Fonte: Google Imagens
Figura 14. Casa em Taipa, Redonda – RN. Fonte: Google imagens.
5 REGIÃO NORTE A Região Norte do Brasil é a mais extensa, com 3.869.637 km² e possui sete estados: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Além de ser a maior
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região territorial, nela está localizada os dois maiores estados do Brasil: Amazonas e Pará, respectivamente. O clima da Região Norte é bastante úmido, sendo de clima equatorial. As temperaturas são elevadas durante o ano todo, com baixa amplitude térmica, com exceção de algumas localidades de Roraima e Acre onde ocorre o fenômeno La Niña, que permite que massas de ar frio vindas do oceano Atlântico entrem na região pelo Mato Grosso até chegar nesses estados, abaixando sua temperatura. Isso ocorre porque o calor da Amazônia permite que exista uma área de baixa latitude que atrai massa polar. As chuvas na Região Norte são constantes, possuindo um período de estiagem de junho a novembro. As maiores incidências de chuvas são nas áreas do litoral do Amapá, foz do Rio Amazonas e algumas partes da Amazônia Ocidental. As chuvas de convecção ou de “hora certa” são características da região. No Brasil, observamos casas flutuantes nos rios amazônicos. São, na verdade, juntamente com as palafitas, a solução perfeita para o clima e o relevo da região norte. A floresta é densa, com árvores altas, o que já impõe uma barreira quase intransponível para o homem desprovido de tecnologia, como é o caso da população primordial não-indigena. Com as moradias tradicionais das populações ribeirinhas da Amazônia sendo de palafitas e de casas flutuantes percebemos o quanto essas construções são próprias para uma região regida por épocas de seca e cheia. Dentre os exemplos de arquitetura vernacular estão as construções sobre palafitas comuns, encontradas na região Nordeste e sobretudo na região Norte do Brasil. São estruturas de madeira, erguidas sobre estacas, nas quais são construídas casas e toda uma rede de edificações, as quais permitem a moradia sobre rios de diferentes dimensões. Nas coberturas são utilizados diversos materiais, desde os industrializados (telhas metálicas ou de fibrocimento) até as coberturas feitas com folhas secas trançadas. Além das palafitas, na região Norte encontramos casas flutuantes em profusão. Elas são construídas s obre toras de madeiras adaptadas para boiar.
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Figura 15. Representação esquemática de palafita.Fonte: Google I magens
Figura 16. Palafitas em Recife/PE. Fonte: Google Images.
Figura 17. Casa flutuante na região amazônica. Fonte: Google Images.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir do levantamento, da leitura e da análise da realidade da arquitetura vernacular brasileira - por regiões - constatamos a adequação dos ensinamentos arquitetônicos populares à arquitetura erudita; ambas misturam-se e influenciam-se, exemplo disso é o uso de beirais e de varandas, comuns a arquitetura trazida pelos portugueses e muito utilizadas nas regiões norte, nordeste e centro-oeste, para impedir a entrada da chuva e da incidência solar direta, sem a necessidade de obstrução das aberturas das habitações. Foi notado o uso contínuo de materiais e técnicas disponibilizados pelo próprio ambiente na construção da edificação vernácula. Essa situação levanta a bandeira da sustentabilidade na apropriação da natureza para o viver humano, pois utiliza parte dela sem ocorrer depredação do meio. Outro ponto a ser considerado é a sabedoria popular envolvida nesse tipo de construção. Através de cuidados intuitivos, vindos da experiência prática e da observação do clima, relevo, ciclo de cheias dos rios, comportamento das marés e do vento, a moradia vernacular constitui-se como um modelo eficiente de adaptação ao ambiente, com visível uso de estratégias para obtenção de conforto térmico e lumínico. Nota-se que os tipos de arquitetura vernacular das diferentes regiões brasileiras conversam entre si e com a situação climática na qual se encontram. Ambientes com similaridades climáticas apresentam, fatalmente, técnicas construtivas similares, as quais beneficiam o conforto de seu morador. Casas de taipa e de pau-a-pique, encontradas nas regiões sudeste, nordeste e centro-oeste são exemplos da habitação em que são levados em consideração clima e os materiais disponíveis pelo ambiente. O mesmo ocorre com as palafitas da região norte, habitação sujeita às cheias dos rios, e com as da região nordeste, localizadas em mangues, as quais têm seu olhar voltado às marés.
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