UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
Graduação em Artes Cênicas – 3º 3º Ano. Disciplina: Teatro Brasileiro I – 2014. 2014. Professor: Alexandre Flory Acadêmica:
Andresa de Angeli Viotti R.A.: 77668
ANÁLISE CRÍTICA: O MAMBEMBE, ARTUR AZEVEDO.
O estudo a seguir terá como base a obra O Mambembe do autor maranhense, Artur Azevedo. Considerando suas características de subgênero burleta em relação com sua estética teatral, tal como as demais no século XIX. A segunda metade do século XIX foi marcada pela forma cômica e musicada de se fazer teatro. Em primeira instância, o Brasil tem contato com as Óperas, gênero que vinha, principalmente, da França, porém, se teve necessidade de tal ser adaptada ao contexto histórico brasileiro. O país viu subir aos palcos as Operetas, gênero que satirizavam as grandiosas Óperas, por sua vez, não era representado com poucos recursos. Em cena, articulavam-se cenários estruturados por maquinários, transições ricas e completas, além do mais, era um teatro popular. Buscando disseminar esse “teatro
popular ” que vinha se fazendo, e entendendo o público como “fregueses” que
necessitavam de obras culturais, o Brasil vê surgir, o Teatro de Revistas. Trazendo contextos políticos, econômicos e sociais do ano que havia se passado, em tom paródico e satírico. Observando que o núcleo dramático não era o centro das peças. As Revistas eram verdadeiros “shows de variedades” com artimanhas que deixavam a encen ação
mais fascinante aos olhos do público. Por apresentar um caráter de enredo um tanto especifico, pela relação direta com a vida social de determinadas regiões, não encontrava espaço para um longo tempo de duração, e não supriam a necessidade de movimentar tais obras para outros lugares, neste contexto se fez necessário nascer o que viria a ser o primeiro gênero verdadeiramente verdadeiramente brasileiro, a Burleta. A burleta, etimologicamente relacionada ao termo Burla, que vem da Farsa, definida como “ligeira representação cômica” pelo dicionário Priberam. Por
sua vez, a
burleta fora for a influenciada i nfluenciada por gêneros como Opereta, no que diz respeito às músicas, a grandiosidade do espetáculo – movimentação, maquinaria; Revista de ano pelas paródias, sátiras, núcleo dramático em segundo plano, suas variedades; variedades; Comédia de
Costumes por apresentar interesses e conflito entre as personagens e Mágicas
no que se
trata de modificações dos elementos que compõe a parte visual da peça. A obra que vamos ressaltar aqui, “O Mambembe” apresen tado
em 1904, na
então, capital federal, é uma peça que se enquadra no gênero burleta, pois a mesma é o “resultado das somas de características dos gêneros cômicos e musicados, então em voga” (FARIA, 2012, pg. 229). Faria, nos
diz ainda:
O mambembe escrita em colaboração com José Piza, e especialmente
para o ator Brandão, é uma obra prima do gênero Burleta e focaliza a história de uma companhia “mambembe” de teatro, em suas andanças
pelo interior do país (FARIA, 2012, pg. 230).
O enredo da obra de Artur Azevedo se dá nas circunstâncias pela qual a companhia itinerante (os “mambembes”) é submetida, juntamente com as confusões do dos protagonistas. No desenvolvimento da obra é contado os interesses de artistas que viajam para o interior em uma busca de reconhecimento por seu trabalho cênico. Mostrando a realidade dos artistas de tal época, vários conflitos econômicos acontecem no desenrolar na trama, e mesmo se tratando de uma companhia que está sempre indo de lugar para outro, buscando espaços para se apresentarem, se interessam por ter uma renda econômica estável e afirmação profissional. O autor maranhense utiliza muito de musicas neste trabalho, mesmo estas não sobressaindo ao desenvolvimento do enredo, pode-se dizer que em algumas partes elas fazem o papel de narração, contando à plateia o que está acontecendo. Mostrando assim, sua influencia das Operetas. Como, por exemplo, neste recorte, em que relatam o que acabara de acontecer. CORO — Um audaz ratoneiro, um bandido qualquer, O seu quarto invadiu, disfarçado em mulher, E dois contos de réis o ladrão lhe levou E estendido no chão, a correr, o deixou (Pg. 88).
O Mambembe assemelha-se da Revista de Ano quando relacionada à questão do núcleo dramático, que nesta situação também não é o centro do enredo, e o psicológico das personagens não são aprofundados. De caráter cômico, apresenta viés da comédia de costumes
quando diz respeito aos interesses econômicos de personagens (a exemplo,
quando a companhia mambembe aceitando ajuda do Pantaleão em troca de encenarem
um de seus dramas). E até mesmo, encontram-se vestígios das Mágicas quando, somos surpreendidos pelo conceito de “mutação”.
Dando sequência, falaremos brevemente sobre as personagens da obra que merecem destaque: Laudelina; Eduardo; Dona Rita, Frazão; Pantaleão e Vieira. Frazão, um empresário vive por emprestar dinheiro (a prazo) para conseguir viajar com sua companhia “Mambembe”, uma espécie de trupe itinerante.
Ao assistir a
encenação de Laudelina deseja ter a moça como a primeira dama se sua companhia, assim sendo, vai até sua casa para fazer o convite, então, nos deparamos com a Dona Rita, “madrinha” de Laudelina, quem a criou dep ois
de ser abandonada pelo pai,
também atriz de teatro, esta por sua vez, não concorda com a ideia de Laudelina viajar pelo interior do estado, pensando em todos os contras que essa viaja proporcionaria. Laudelina, jovem iniciante no âmbito teatral, têm pelo palco uma paixão tamanha, e fica fascinada com a ideia de viver pela sua arte e faz com que D. Rita concorde com a “viajem”. Como
solução, Dona Rita se oferece para ir junto. Eduardo, companheiro de
cena da Laudelina, tem a mesma paixão, porém pela moça. E quando descobre sobre a companhia de Mambembes, decide ir junto e fazer parte da companhia. O Coronel Pantaleão, aparece no segundo ato da peça, apresenta certa idade, é casado, apesar de ser “faceiro” e presidente da câmera nacional. E dando ar cômico à peça, é uma personagem apaixonada por dramas e é também dramaturgo, porém, sem muito sucesso com sua obra que quer tanto ver encenada e nunca conseguiu agradar ao público. A companhia Mambembe encontra em Pantaleão a solução, depois de não encontrarem hospedagem na cidadezinha. Aceitam encenar sua peça em troca de um lugar para ficarem e comida, porém por falta de público não se conseguiu dar continuação a peça, que devia ser encenada em duas noites (possuía 12 atos e 24 quadros). Em uma frase de Dona Rita, vemos o descontentamento da trupe com a situação: LAUDELINA — Mas por que está zangada comigo? DONA RITA — Se não fosses tu, não passaríamos por tantas vergonhas! Não sei como sair desta maldita cidade!... A passagem do Mar Amarelo, em vez de salvar a situação, agravou ela! ... Mas que peça! ... Que peça bem pregada (Pg. 55)!
O Coronel apresenta grande interesse pela moça Laudelina, aparecendo sutilmente no início e se intensificando no decorrer da obra. Por ser um senhor da alta
classe e casado, tal situação evidencia uma critica à burguesia, aos costumes, qual se mantinha por aparências. Mais à frente, isto se evidenciará quando Pantaleão tentará conquistar Laudelina pelo dinheiro, mas na verdade uma “peça” lhe é pregada e quem
vai ao seu encontro é Frazão vestido de mulher. Tal parte pode também ser considerado um clímax da obra. Pantaleão decide considerar tal ato um pesadelo, para não descobrirem qual era sua vontade com aquilo. Interessante lembrar que tal façanha e reversão de acontecimentos acontecem através de musica, nos trechos a seguir: TODOS — Sei o que foi: basta vê-lo! O coronel teve um sonho, Ou antes um pesadelo, Um pesadelo medonho. PANTALEÃO (Consigo.) — Sem os dois contos fico: Não posso me explicar, Porque se eu abro o bico, Se toda a coisa explico, Pancada hei de apanhar. (Alto.) Foi, foi, um sonho (Pg. 89)!
Vieira, o cômico da companhia e o trágico por “trás das coxias”. Vieira através de sua personagem faz crítica ao que circula a cerca dos atores, em uma sociedade que considera o artista um “vagabundo” . Seu personagem está sempre com um ar fúnebre fora dos palcos, pensando na família, na saudade que sente deles e como sua vida é amarga. Isso mostra à sociedade, que muitos dos artistas trabalham para seu próprio sustento e de outras pessoas, em suma, que teatro é profissão. VIEIRA — Vou sempre dar um giro até o tal cemitério. (Sai.) DONA RITA (Contemplando o Vieira, que não os vê.) — Pobre homem! Mire-se naquele espelho, Laudelina. Como o teatro é mentiroso! (Vieira sai.) LAUDELINA — Mentiroso, mas cheio de surpresas e sensações (pg 80).
Vieira, de forma radical mostra a realidade dos artistas, Laudelina em contraponto guia-se pela emoção, talvez, por ser uma iniciante. A personagem de Vieira me remete a uma frase, que transcrevo aqui, retirada do filme “A Viagem do Capitão
Tornado1”, onde a personagem Isabella diz: “O Teatro dá alegria a todos, exceto a quem o faz”.
Uma das características da Burleta é tornar tal estética um Teatro Popular, o que de fato era, então se observa nas transições de espaços grande detalhamento do cenário, por exemplo, e falas que expressam as particularidades das personagens, sem 1 Filme
de 1990, dirigido por Ettore Scola. Conta a história de uma companhia itinerante que atravessam a França levando um jovem Barão decadente até Paris.
aprofundamento psicológico, realizando aproximação do público com o que está acontecendo, e até mesmo, o que pode vir a acontecer. Há na obra bastantes conflitos secundários, como a contratação da banda de Carrapatini (que fica cobrando o restante do dinheiro que lhe devem); a prisão de Eduardo depois de um desentendimento com o Sr. Pantaleão e também, ao fim da peça, praticamente, quando Laudelina descobre que o imperador Chico Inácio, é seu pai e firmam, assim, o matrimônio de Laudelina e Eduardo. Pensando na “dramaturgia”, encontram-se
várias rubricas de ações e transições
de cenas, uma narrativa bem estruturada, assim como a linha cronológica que acontece através de mudanças de espaços, muitas vezes “Mutações” (características da Revista de
Ano). Todo o enredo se passa a pouco mais de um mês, acontecendo em vários espaços diferentes. Como: a sala da casa de D. Rita, na qual Frazão faz a proposta para Laudelina e ficamos sabendo das intenções de Eduardo com a moça; Botequim, onde se encontram vários artistas, e é considerado o “escritório” de Frazão, ironizando com a ideia da sociedade de que os artistas são “vagabundos” ; o corredor da pensão de Frasão,
em que chega o dinheiro que ele havia emprestado e aonde Eduardo vai para falar-lhe sobre seu ingresso na companhia; plataforma da estação central da estrada de ferro, representando a transição da Capital para as outras cidades; uma cidadezinha do interior, os artistas encontram-se desanimados por não encontrarem hospedagem e trabalho há algum tempo; a casa de Pantaleão; a Mantiqueira, para transição de espaço; o arraia na cidade Pito Aceso, em que volta a esperança da trupe, pois lá são um sucesso; a casa de Chico Inácio, onde acontece o que pode ser considerado o “clímax”
da peça; um palco improvisado, que acaba por desmoronar no meio do espetáculo, mostrando a fragilidade e o descaso que os artistas são tratados e o futuro Teatro Nacional, grande estima dos artistas em geral, um lugar fixo para eles se apresentarem. Compreende-se que a obra “O Mambembe” faz um panorama muito rico do que seria um subgênero “burleta”, proporciona ndo uma reflexão sobre os costumes da sociedade de época, seus anseios culturais, econômicos e até mesmo morais. Seduzindo o leitor/espectador a mergulhar em um contexto sem deixar de lado a reflexão, harmonizada pelos aspectos risíveis da peça.
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Artur. O Mambembe. Domínio público. Rio de Janeiro, 1904. FARIA, José Roberto. História do Teatro Brasileiro I . São Paulo: Perpectiva, 2012.