COLEÇÃO SINAL — 2
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É possível ser contra ou ser a favor, não é possível ser indiferente ao marxismo. Foi em 1867 que a Editora Otto Maissner, de Hamburgo, na Alemanha, lançou numa edição de apenas mil exemplares o 1.^ volume de O Capital, de Karl Marx. Cem anos depois, O Capital já foi traduzido em 47 línguas de 70 países, num total de 220 edições. Só na União Soviética, que come mora êste ano o 50.^ aniversário de uma re volução que se baseou nas idéias de Marx, já já saír sa íram am 167 ed ediç içõe õess de O Capit Ca pital al comple comple to, num total de mais de 6 milhões de exem plares. O marxismo está irresistivelmente di ante de nós, nas suas obras teóricas e nas suas conquistas práticas. É possível temê-lo, é possível repeli-lo; não é possível igno rá-lo. Milhões de homens vêem no marxis mo uma um a ameaça am eaça e uma um a tragédia. Porém Porém,, muitos outros milhões o encaram como uma mensagem, uma promessa, um comba te, uma esperança. Não conhecer o marxis mo é correr o risco de não compreender c mundo em que estamos vivendo e sobretu do o mundo em que viveremos nos próximos anos. Contudo, não é fácil conhecer o mar xismo. Não vai uma grande distância entre o marxismo de um Lênine e o marxismo de um Bernstein? Ou entre o marxismo de Stalin ou Politzer e o marxismo de Lukacs ou Gramsci? Já se disse: ^‘Nâo existe o marxismo, existem existem m arxism arx ismos” os”.. Porém, serão todos todos êsses marxismos igualmente marxistas? O próprio Marx Marx ter te r á sido sido marxism mar xismoo sempre? sempre? Ou será necessário reconhecer que o jovem Marx não era m arxist arx ista? a? Engels de dese senvo nvol l veu ou deformou o marxismo? E o leninismo, qual é sua situação em relação ao mar xismo? Velhos problemas, que já foram es miuçados uma e muitas vêzes, mas sempre
— ou quase — sem método, sem rigor, sem resultados convincentes e duradouros. Esta problemática tradicional do mar xismo está sendo revolucionada por um jo vem filósofo, professor em Paris. Seu nome: Louis Althusser. Sua intenção: explicitar e desenvolver a filosofia marxista que, na sua opinião, só existe até agora de forma implí cita e não-desenvolvida em algumas obras teóricas de Marx, Engels, Lênine e Mao Tse-tung, e nas aplicações práticas do marxis mo. Suas principais armas de combate: uma análise aguda do desenvolvimento intelec tual de Marx e uma leitura penetrante de O Capital. O que conseguiu até agora: reno var a fundo o estudo do marxismo e acen der uma polêmica veemente que sacode os meios intelectuais e marxistas da Europa. Althusser não pretende possuir as res postas postas acab ac abad adas as do doss árduo árd uoss problemas problem as que suscita. Ao contrário, sua pesquisa apenas começaram. Althusser não deve também ser convertido no patrono de uma nova ortodo xia. Ao contrário, seu pensamento é emi nentemente anti-dogmático. Mas uma coi sa é indiscutível: não há mais possibilidade de abordar o estudo e o debate do marxismo pret pr eten ende dend ndoo ign ig norar ra r a co contri ntribuiç buição ão indis indis pensável e decisiva decisiva de Althusser. Althusser. Daí a importância da tradução do ar tigo que abre êste livi’o. Trata-se de texto de curso, escrito escri to por Althus Alth usse serr em 19 1965. É uma síntese didática que introduz ao mes mo tempo nos princípios básicos do marxis mo e na problemática essencial das investi gações de Althusser. Para completá-lo, segue-se uma análi se das polêmicas surgidas em tôrno das obras de Althusser e sobretudo do confron to entre Althusser e um dos mais prestigia dos e conhecidos marxistas franceses, Roger Garaudy. O autor da análise é um fran6
ciscano, frei Raymond Domergue, um dos colaboradores permanentes da excelente revista Frères du Monde, feita por padres e leigos cristãos da França. O artigo é transcrito do n.° 45 da revista, de janeiro de 1967, dedicado aos “problemas atuais do marxismo”.
Marxismo,
Ciência
e
Ideologia
Louis Althusser
As reflexões que se seguem têm por finaldade apresentar, de uma forma tão clara e sistemática quanto possível, os princípios teóricos que funda mentam e guiam a prática dos marxistas no do mínio da teoria e da ideologia.
O MARXISMO É UMA TEORIA CIENTIFICA Um título célebre de Engels põe em evidência a diferença essencial que distingue a doutrina marxista das doutrinas socialistas anteriores: as doutrinas socialistas anteriores a Marx eram ntópicas, a doutrina de Marx é científica. Que re pres pr esee nta nt a uma um a d ou outr trin inaa socialista soci alista utópica utó pica?? É uma doutrina que por um lado propõe objetivos socia listas à ação dos homens, mas por outro basela-se em princípios não-científicos, princípios de inspiração religiosa, moral ou jurídica, vale dizer, princípios princí pios ideo ideológ lógico icos. s. A n a ture tu rezz a ideológica ideológica de seu fimdamento teórico é decisiva, pois repercu te sôbre a concepção que qualquer doutrina so cialista utópica faz não sòmente dos fins do so cialismo, mas também dos meios de ação a em preg pr egar ar p a ra real re aliz izar ar êsses êsses fins. As do dout utrin rinas as so so cialistas utópicas definem os fins do socialismo, isto é, a sociedade socialista do futuro, por cate gorias morais e jurídicas; falam do reino da igual dade e da fraternidade dos homens e traduzem êstes princípios morais e jurídicos em princípios econômicos e políticos tão utópicos quanto os an teriores, isto é, ideológicos, ideais e imaginários. Por exemplo, a distribuição integral dos produ tos do trabalho entre os trabalhadores, o igualitarismo econômico, a negação de tôda lei econô mico, o desaparecimento imediato do Estado etc. Da mesma maneira, definem como meios adequa dos para realizar o socialismo meios econômicos e políticos políticos utópicos, utópicos, ideo ideoló lógi gico coss e imagin im aginári ários; os; as co operativas bancárias de Owen, os falanstérios dos discípulos de Saint-Simon, o sistema bancário po pul p ulaa r de Proudh Pro udhon on — no domínio econômico; econômico; ou a educação e a reforma moral no domínio político, ou até a conversão ao socialisto do Chefe de Es tado . . . Ao fazer uma represe repr esenta ntação ção ideo ideoló lógi gica ca,, tanto dos fins quanto dos meios do socialismo, as dout do utri rina nass do socialism socialismoo utópico co cont ntinu inuam am ( com como demonstrou muito nitidamente Marx' prisionei ras dos princípios econômicos, jurídicos, morais e políticos da burguesia e da pequena burguesia: é por isso que não podem realmente sair do sis tema burguês, não podem ser verdadeiramente re10
volucionários. Permanecem anarquistas ou refor mistas. Com efeito, ao se contentarem com opor os princípios (morais, jurídicos) burgueses ao sis tema econômico-político burguês, as doutrinas utópicas continuam, queiram ou não, prisioneiras do sistema burguês. Não podem conduzir à revo lução. A doutrina marxista, ao contrário, é cientí fica. Isto quer dizer que ela não se contenta em aplicar os princípios morais e jurídicos burguêses (liberdade, igualdade, fraternidade, justiça etc.) à realidade burguêsa existente para criticá-la; a doutrina marxista critica tanto êsses princípios morais e jurídicos burguêses quanto o sistema econômico-politico burguês vigente. Essa crítica ge ral repousa então sôbre outros princípios que não os princípios ideológicos, religiosos, morais e ju rídicos) existentes: repousa sôbre o conhecimento científico do conjunto do sistema burguês exis tente, tanto de seu sistema econômico-político quanto de seus sistemas ideológicos. Ela repousa sôbre o conhecimento dêste conjunto, que cons titui uma totalidade orgânica, da qual a economia, a política e a ideologia são “instâncias” ou “ní veis” orgânicos, articulados uns sôbre outros se gundo leis leis específicas. Êste conh conhec ecime imento nto é qu quee permite per mite de defin finir ir os objetivos do sociali socialism smo, o, e con con-eebê-lo como um nôvo modo de produção que su cederá ao modo de produção capitalista, conce ber suas determina deter minações ções própr pró prias, ias, a forma for ma precisa de suas relações de produção, de sua superestrutura tu ra política polític a e ideol ideológ ógica ica.. Êste conhecimento conhecimento é que permite também definir os meios de ação próprios p a r a “fazer faze r a revolução”, meio meioss qu quee se baseiam baseia m n a na natu ture reza za da necessidade necessi dade histór his tórica ica e do desenvolvimento histórico, no papel determi nante em última instância da economia nêste de senvolvimento, no papel decisivo da luta de clas ses nas transformações econômico-sociais e no papel da consciência e da organização organiz ação n a luta lu ta politica. É a aplicação dêstes princípios princíp ios científicos que tem permitido definir a classe operária como a única classe radicalmente revolucionária, defi nir as formas de organização justas da luta eco nômica (papel dos sindicatos) e política (nature za e papel do partido de vanguarda da classe ope rária), definir enfim as formas da luta ideológica. Ê a aplicação dêstes princípios científicos que tem permitido romper não somente com os obje tivos reformistas das doutrinas socialistas utópi cas, mas também com suas formas de organização e de luta. É a aplicação dêstes princípios científi cos que tem permitido definir uma estratégia e uma tática revolucionária, cujos primeiros resul tados irreversíveis estão inscritos na história mun dial e que não cessam de transformar o mundo.
Em Nosso Programa (Obras Complestas, tomo IV, págs. 208-209), Lênin escreve: “Nós nos colocamos inteiramente sôbre o ter reno da doutrina de Marx; ela transformou pela prim pr imeir eiraa vez vez o socialismo socialismo de utop ut opia ia em uma ciência, lançou as bases indestrutíveis desta ciência e traçou o caminho a seguir pa ra desenvolvê-la e elaborá-la em todos seus detalhes. A doutrina de Marx revelou, a na tureza da economia capitalista moderna, ex plicando como como o salário salá rio,, a compra com pra da fôrça de trabalho, disfarça a escravização de mi lhões de não-proprietários por um punhado de capitalistas proprietários de terra, de fá brica, de minas mi nas etc. E sta st a dout do utri rina na mostrou como todo 0 desenvolvimento do capitalismo moderno tende a substituir a pequena pro dução pela grande produção, criando as con dições que tomam possível e necessária a es truturação socialista da sociedade. Ela nos ensinou a ver, sob o manto dos costumes ar raigados, das intrigas políticas, das leis sutis e das doutrinas astuciosas, a luta de classes, a luta que opõe as diversas classes proprietá rias à massa dos não-proprietários, ao prole tariado, que está à cabeça de todos os não proprie pro prietár tários. ios. A d o u trin tr inaa de Marx esclare escla re ceu a verdadeira tarefa de um partido socia lista revolucionário, que não é Inventar pla nos de reorganização da sociedade, nem pre gar aos capitalistas a necessidade de melhorar a situação dos operários, nem tão pouco tramax_conspiraçpes, mas organizar a luta de classes do prolefãriado e dirigir esta luta que tem por objetivo final a conquista do poder político político pelo prol pr olet etar aria iado do e a organização organ ização da sociedade socialista”. E Lênine acrescenta, após condenar os revi sionistas tipo Bemstein, que “não fizeram avan çar um passo a ciência que Marx e Engels nos re comendaram desenvolver”: “Não pode haver um forte partido socia lista sem uma teoria revolucionária que una todos os socialistas, da qual êles extraiam tôdas as suas convicções e a qual êles apli quem a seus métodos de luta e meios de ação”. De um extremo a outro da obra de Lênine, o mesmo tema se refete incansavelmente: “sem teoria revolucionária não existe ação revolucio nária”. E esta teoria revolucionária é definida de maneira exclusiva como a teoria científica que Marx produziu e à qual deu sua forma mais
profu pro fund ndaa n a “obra de sua vida vi da”, ”, esta es ta obra “sem cuja luz”, nas palavras de Engels, “estaríamos ainda na noite: O Capital”.
II A DUPLA TEORIA CIENTIFICA DE MARX Uma vez fixado êste princípio de que a ação revolucionária dos comunistas está baseada na teoria científica marxista, é necessário respon der à pergunta: Em que consiste a doutrina cien tífica marxista? A doutrina científica marxista apresenta a seguinte particularidade: ser constituída poi duas disciplinas científicas, unidas uma à outra por razões razões de princípio, m as efetiva efet ivame mente nte dis tintas uma da outra, já que seus objetos são dis tintos — o materialismo histórico e o materiaUs-: mo dialético. I O materialismo histórico é a ciência da his tória. Pode ser definido ainda com maior preci são como a ciência dos modos de produção, de sua estrutura própria, de sua constituição e de seu funcionamento, e das formas de transição que fazem passar de um modo de produção a outro. O Capital representa a teoria científica do modo de produção capitalista. Marx não nos deu uma teoria desenvolvida dos outros modos de produção — modo modo de produção produ ção das comunidades primitivas, primiti vas, modo modo de produção produ ção escravagista, escravag ista, mo do de produção “asiático”, modo de produção “germânico”, modo de produção feudal, modo de produção produção socialis so cialista ta e modo odo de produção comu nista — mas sòmente indicações ou esboços. Marx não nos deu tão pouco uma teoria das formas de transição de um modo de produção determinado a outro modo de produção, mas sòmente indica ções e esboços. O mais desenvolvido dêstes esbo ços concerne às formas de transição do modo de produção feudal feu dal ao modo modo de produção capi ca pital talis is ta (o capítulo d’0 Capital dedicado à acumula ção primitiva e muitas outras passagens). Possuí mos por outro lado algumas indicações preciosas mas raras sôbre aspectos das formas de tran sição do modo de produção capitalista ao modo de produção socialista (especlalmente na Crítica ao Programa de Gotha, onde Marx insiste na fase da ditadura do proletariado). A primeira fase destas formas de transição constitui o ob jeto je to de numeros num erosas as reflexões reflexões de Lênin em O Es tado e a Revolução e em todos os textos do pe ríodo ríodo revolucionári revolu cionário o e pós-revolu pós-revolucionário. cionário. Seu
conhecimento científico, com efeito, comanda ciretamente tôda a ação econômica, política e ideológica da “construção do socialismo”. Mais uma precisão no que concerne ao materialismo histórico. A teoria da história, teoria dos diferentes modos de produção, é, de direito, a ciência da totalidade orgânica em que consiste tôda forma ção social dependente de um modo de produção determinado. Ora, cada totalidade social com preende, co como mo ex expõ põee Marx, Marx, o con conju junto nto a r tic ti c u lado de seus diferentes níveis: a infra-estrutura econômica, a superestrutura jurídico-política e a superestrutura ideológica. A teoria da história, ou materialismo histórico, é a teoria da natureza específica desta totalidade, portanto do conjunto de seus níveis, e do tipo de articulação e de de terminação que une uns aos outros e que funda menta ao mesmo tempo sua dependência ein_ re lação ao nível econômico, determinante em últi ma instância, e o grau de autonomia relativa de cada um. É pelo fato de possuir esta “autono mia relativa” que cada nível pode ser considera do objetivamente como um “todo parcial” e converter-se no objeto de um tratamento científico relativamente independente. Ê por isso que num determinado modo de produção se pode legitima mente estudar à parte — tendo em conta esta “autonomia relativa” — seu nível econômico ou seu nível político, ou esta ou aquela de suas for mações ideológicas, ou suas formações filosófi cas, cas, estéticas estét icas e científicas. cien tíficas. Esta Est a precisão é de grande importância, pois é sôbre ela que se funda a possibilidade de uma teoria da história (rela tivamente autônoma, e com um grau de autono mia variável segundo o caso) de cada um rios ní veis ou realidades: por exemplo, uma teoria da história da política, da filosofia, da arte e das ciências etc. É também sôbre ela que está basea da a possibilidade de uma teoria relativamente autônoma do nível econômico de um modo de produção produçã o dado. O Capital, Capi tal, t a l co como mo existe em sua condição de obra inacabada (Marx queria também analisar o direito, o Estado e a ideolo gia do modo de produção capitalista), represen ta justamente a análise científica do nível eco nômico do modo de produção capitalista; e é por isso que é considerado geralmente, e a justo titu lo, antes de tudo, como a teoria do sistema eco nômico do modo modo de produção capi ca pital talist ista, a, Mas como esta teoria do nível econômico do modo de produção produç ão capi ca pita tali list staa supõe necessar nece ssariam iament ente, e, se não a teoria desenvolvida, pelo menos elementos teóricos suficientes sôbre os outros níveis do mo do de produção capitaUsta (o nível jurídico-político e o nível ideológico), O Capital não se limi14
ta à “economia”. Excede-a amplamente, em con formidade com a concepção marxista da realida de econômica, que não pode ser compreendida em seu conceito, definida e analisada senão como um nível, uma parte, um todo parcial inscrito orgâ nicamente na totalidade do modo de produção considerado. Por isso se encontra em O Capital elementos teóricos fundamentais para elaborar a teoria dos outros níveis (político, ideológico) do modo de produção capitalista, elementos a bem dizer não desenvolvidos, mas suficientes para guiar-nos em seu estudo teórico. Da mesma ma neira, é possível encontrar em O Capital, que no entanto só se propõe à análise “do modo de pro dução capitalista”, elementos teóricos concer nentes ao conhecimento dos outros modos de pro dução e das formas de trasição entre diferentes modos de produção, elementos também não de senvolvidos, mas suficientes para guiar-nos em seu estudo teórico. Tal é, lembrada de modo muito esquemático, a natureza da primeira das duas ciências funda das por Marx: o materialismo histórico. Ao fundar esta ciência da história, Marx fundou no mesmo ato outra disciplina científica: o materialismo dialético ou filosofia marxista. Aqui intervém, contudo, uma diferença de fato. Ao passo que Marx pôde desenvolver amplamen te o materialismo histórico, não teve tempo para fazer o mesmo com o materialismo dialético ou filosofia marxista. Pôde únicamente lançar suas base bases, s, seja se ja em rápidos rápido s esbo esboço çoss ( as Teses Teses sôbre sôbre Feuerbachj, seja em textos polêmicos (Ideologia Alemã Alemã e Miséria de Filosofia Filosof ia j, ou ain ai nda em um texto metodológico muito denso (a Introdução à Contribuição à Crítica da Economia Política, de 1857), e em algumas passagens de O Capitai (em par p arti ticu cula larr no Posfácio à segu se gund ndaa edição a lem le m ã ). Foram as necessidades da luta ideológica no ter reno da filosofia que levaram Engels anti-Duhring, Ludwing Feuerbach ou O Fim da Filosofia Clássica Alemãj e Lênine (Materialismo e Em piriocriticismo. Cadernos de Notas sôbre a Dialé tica, não publicados pelo autor) a desenvolver mais longamente os princípios do materialismo dialético esboçado esboçadoss por Marx. Marx. Porém, nenh ne nhum um dêsses textos, nem mesmo os textos de Engels e de Lênine, que são também, no essencial, textos polêm polêmico icoss ou textos de leitu le itura ra (as Notas de Lê nine), apresentam um grau de elaboração e de sistematicidade, portanto de cientificidade, com parável, paráve l, ain ai n d a que que de longe, longe, ao grau gr au de elab el abor ora a ção do materialismo histórico que possuímos em O Capital. Por isso, exatamente como o fizemos pa p a r a o mater ma teria ialis lism m o histórico, necessitam nece ssitamos os dis tinguir no materialismo dialético o que nos foi
dado do que não nos foi dado. para poder medir o que temos por fazer. O materialismo materialis mo dialético, ou filosofia filos ofia marxi ma rxiss ta, é uma disciplina cientifica distinta do materia lismo histórico. A distinção entre essas duas dis ciplinas científicas repousa na distinção de seus objetos. O objeto do materialismo histórico é cons tituído pelos modos de produção, sua constitui ção e suas transformações. O objeto do materia lismo dialético é constituído pelo que Engels cha ma “a história do pensamento”, ou pelo que Lênine chama a história da “passagem da ignorân cia ao conhecimento”, ou por aquilo que podemos chamar de história da produção dos conhecimen tos, ou ainda a diferença histórica enlre^.a ideo logia e a ciência, ou a diferença específica da cientificidade, problemas todos que abrangem ao grosso o domínio chamado na filosofia clássica teoria do conhecimento. Certamente, esta teoria não pode ser mais, como era na filosofia idealis ta clássica, uma teoria das condições formais, intemporais do conhecimento, uma teoria do “cogi to” (Descartes, Husserl), uma teoria das formas “a priori” do espírito humano (Kant), ou uma teoria teo ria do saber sab er absoluto (Hegel) (Hegel).. Do Do ponto de vis ta marxista, esta teoria do conhecimento não po de ser senão uma teoria da história do conheci mento, isto é, das condições reais do processo de produção do conhecimento (condições materiais e sociais por um lado, condições internas à prá tica científica por outro). A “teoria do conheci mento”, entendida desta maneira, constitui o co ração da filosofia marxista. Estudando as condi ções reais da prática especifica que produz os co nhecimentos, a teoria filosófica marxista é leva da necessariamente a definir a natureza das prá ticas não-científicas ou pré-científicas, as prá ticas da “ignorância” ideológica (prática ideoló gica) e tôdas as próticas reais nas quais se ba seia a prática científica e com as quais está em relação (a prática de transformação das rela ções ões soci sociai ais, s, ou práti pr ática ca política; a prát pr átic icaa de transformação da natureza, ou prática econômi ca). Esta última prática põe o homem em relação com a natureza, que é a condição material de sua existência biológica e social. A filosofia marxista, como tôda disciplina científica, se apre ap rese sent ntaa sob sob dois ois aspectos: uma teoria que exprime o sistema racional de seus conceitos teóricos e um método que expressa a re lação que a teoria mantém com o objeto era sua aplicação ao mesmo. Bem entendido, teoria e mé todo estão profundamente unidos e não passam das duas faces de uma mesma realidade: a disci plin pl inaa cientí cie ntífic ficaa em sua su a vida mesma. Mas é im im por p orta tan n te distinguídisti nguí-los los p a r a evita ev itarr quer uma inin -
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terpretação dogmática (teoria pura), quer uma interpretação metodológica (método puro) do materialismo dialético. No materialismo dialéti co se pode, esquemàticamente, considerar que é o materialismo que representa o lado da teoria e a dialética que representa o lado do método, Mas cada um dos dois termos inclui o outro. O materialismo exprime as condições efetivas da prá p ráti tica ca que produz o conhecimento, conhecime nto, em espec especial ial,, l.°) a distinção entre o real e seu conhecimento (distinção de realidade), correlativa de uma cor respondência (adequação) entre o conhecimento e seu objeto (correspondência de conhecimento), e 2.°) a primazia do real sôbre seu conhecimento ou primazia do ser sôbre o pensamento. Contudo, êstes próprios princípios não são princípios “eter nos”: são os princípios da natureza histórica do process processoo em que é produzido o conh conhecimento. ecimento. É por isso isso qu quee o materia mate rialism lismoo é chama cha mado do dialético: a dialética que exprime a relação da teoria com seu objeto, exprime esta relação não como a re lação entre dois têrmos simplesmente distintos, mas como uma relação interior a um processo de transformação, portanto de produção real. É isto que se afirma ao dizer que a dialética é a lei da trasformação, a lei do devir dos pro cessos reais (tanto dos processos naturais e so ciais, quanto dos processos do conhecimento). É nêste sentido que a dialética marxista só pode ser materialista, pois não exprime a lei de um puro processo processo imagin im aginári árioo ou pensado, pensado , mas a lei lei dos processos reais, que são certamente distintos e “relativamente autônomos”, segundo o nível de realidade considerado, mas que estão todos ba seados em última instância nos processos da na tureza m aterial. ater ial. Que o materialismo materialism o marxi ma rxista sta seja necessariamente dialético, é o que distingue a filosofia materialista marxista de tôdas as fi losofias materialistas anteriores. Que a dialética marxista seja necessariamente materialista, é o que distingue a dialética marxista de tôda dia lética idealista, em particular da dialética hegeliana. Quaisquer que sejam as relações históricas que possam ser invocadas entre o materialismo marxista e os materialismos “metafísicos” ou mecanicistas anteriores por um lado, e entra a dia lética marxista e a dialética hegeliana por outro lado, existe uma diferença fundamental de essên cia entre a filosofia marxista e tôdas as outras filosofias. Ao fundar o materialismo dialético, Marx realizou em filosofia uma obra tão revolu cionária quanto a que concluiu no domínio da história ao fundar o materialismo histórico.
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PROBLEMAS COLOCADOS PELA EXISTÊNCIA DESSAS DUAS DISCIPLINAS A existência destas duas disciplinas científi cas, o materialismo histórico e o materialismo dialético, levanta dois problemas: 1 — Por que a fundação do materialismo históri co acarretou necessariamente a fundação do materialismo dialético? 2 — Qual é a função própria do materialismo dialético? 1. Muito Muito esquemàti esqu emàticam camente, ente, pode-se dizer que a fundação do materialismo histórico, ou ciência da história, provocou necessariamente a fundação do materialismo dialético pela razão de princípio princí pio seguin seguinte: te: Sabe-se Sabe- se que que n a h istó is tóri riaa do pens pe nsam amen ento to hum hu m ano an o a funda fun daçã çãoo de uma um a nova ciência importante sempre abalou e renovou a filosofia existente. Sucedeu assim com as mate máticas gregas, que em grande parte provocaram a modificação que culminou na filosofia de Pla tão; com a física moderna, que provocou as mo dificações que fizeram surgir primeiro a filoso fia de Descartes (após Galileu), depois a de Kant (após Newton); sucedeu o mesmo com a inven ção do cálculo infinitesimal, que influiu grandemesme na revisão filosófica de Leibniz, e com a lógica matemática, que engajou Husserl no ca minho de seu sistema da fenomenologia trans cendental. Pode-se dizer que o mesmo processo aconteceu com Marx e que a fundação da ciên cia da história acarretou a fundação de uma no va filosofia. Contudo, é preciso ir mais a fundo para mos trar por que razão a filosofia marxista ocupa lu gar privilegiado em tôda a história da filosofia e fêz passar a filosofia do estado de ideologia ao estado de disciplina cientifica. cienti fica. A razão é que que Marx foi de certa maneira constrangido, por uma implacável lógica, a fundar uma filosofia radi calmente nova — porqeu foi o primeiro a pensar cientificamente a realidade da história, que tôdas as outras filosofias tinham sido incapazes de pen sar. Pensando cientificamente a realidade da his tória, Marx foi obrigado pela primeira vez a si tuar e tratar as filosofias como realidades que, mesmo visando à “verdade”, mesmo falando das condições do conhecimento, pertencem no entan to à história, não só por estarem condicionadas por ela, mas ma s també tam bém m porque aí desemp des empenh enham am uma função social.
As filosofias clássicas, idealistas ou materia listas, eram incapazes de pensar sua própria his tória: seja o simples fato de terem aparecido em um momento determinado da história, seja o fa to, muito mais importante, de terem tôda uma história atrás de si, e de serem em grande parte produto produto de tôd tô d a esta es ta hist hi stóó ria ri a passa pa ssada da,, devido devido à relação existente entre a história da filosofia e a história das ciências e das outras práticas so ciais. Mas a partir do momento em que um ver dadeiro conhecimento da história foi enfim pro duzido, a filosofia não podia mais ignorar, recu sar ou sublimar sua relação com a história; era-Ihe necessário ter em conta e pensar esta rela ção. Era-lhe necessário converter-se por uma re volução teórica numa filosofia nova, capaz de pensar pen sar,, n a próp pr ópria ria filosofia, filosofia, sua su a verda ve rdade deira ira r e lação com a história, ao mesmo tempo que sua relação com a verdade. Filosoficamente, daí em diante, as antigas filosofias da consciência, do sujeito transcendental, tanto quanto as filosofias dogmáticas do saber absoluto, não eram mais poss possív ívei eis. s. E ra neces ne cessár sária ia u m a nova nov a filosofia c a paz de p ensa en sarr a inserção inserçã o hist hi stóó rica ri ca d a filosofia n a história, sua relação real com as práticas cien tíficas e sociais (políticas, econômicas, ideológi cas), sem deixar de dar conta da relação de cor- nhectmento que mantém com seu objeto. Foi des ta necessidade teórica que nasceu o materiallsmo dialético, a única filosofia que trata o conheci mento como o processo histórico de produção dos conhecimentos e que reflete seu nôvo objeto no materialismo e na dialética simultâneamente. As outras transformações ocorridas na filosofia ha viam tido sempre por base ou a negação ideoló gica da realidade da história, sublimada em Deus (Platão, Descartes, Leibniz), ou uma concepção ideológica da história, concebida como a realiza ção da filosofia mesma (Kant, Hegel, Husserl): não alcançaram jamais a realidade histórica, uma um a vez que a deixavam deixavam sempre semp re de lado ou a desconheciam. Se a transformação que Marx im primiu prim iu à filosofia é real re alm m ente en te revoluc revo lucionár ionária ia do ponto pont o de vista vis ta filos filosóf ófic ico, o, é porque êle enca en caro rouu sèriamente, pela primeira vez na história, a rea lidade da história, e esta simples diferença aba lou de cima a baixo as bases da filosofia exis tente. 2. Quanto Qu anto à função função própria pró pria da filos filosof ofia ia,, à necessidade absoluta da filosofia para o marxis mo, ela repousa também sôbre profundas razões teóricas. Lênine as expôs com grande clareza no Materialismo e Empiriocritismo. Êle mostrou
desenvolvimento do conhecimento, e que a filo sofia marxista nada fazia se não reassumir êste papel pap el por sua su a conta, con ta, contan con tando do porém com meios meios que eram, em sua origem, infinitamente mais puros pur os e mais fecundos. fecundos. Sabemos Sabemos com efeito que que o conhecimento, que em sentido forte é conheci mento científico, não nasce nem se desenvolve num vaso fechado, protegido por não se sabe que milagre de tôdas as influências do mundo am biente. E n tre tr e esta es tass influên inf luências, cias, h á influên infl uência ciass sociais e políticas, que podem intervir diretamen te na vida das ciências, e comprometer grave mente o curso de seu desenvolvimento, quando não simplesmente simplesmen te sua existência Conhe Conhecem cemos os numerosos exemplos na história. Porém, há in fluências menos visíveis, mas também pernicio sas, se não mais perigosas ainda, porque passam geralmente despercebidas: as influências ideo lógicas. Foi ao romper, ao fim de um rude trabalho de crítica, com as ideologias da história existen tes, que Marx logrou fundar a teoria da história, e sabemos também, pela luta de Engels contra Duhring e de Lênine contra os discípulos de Mach, que, uma vez fundada por Marx, a teoria da história não escapou ao cêrco das ideologias, a suas influências e a suas agressões. Ê que tô das as ciências, e tanto as ciências da natureza quanto as ciências sociais, estão submetidas constantemente ao cêrco das ideologias existen tes, e em particular desta ideologia que desarma por seu c a r á ter te r apa ap a rent re ntee m e n te não-ideológico e na qual o sábio reflete “espontâneamente” sua próp pr ópria ria p ráti rá ticc a : a ideologia ideologia “emp “em p iris ir ista ta”” ou “posi tivista”. Como já dizia Engels, todo sábio, queira ou não, adota inevitavelmente uma filosofia da ciência, não pode passar sem uma filosofia. Todo o problema consiste então em saber que filosofia êle deve ter por companheira: uma ideologia, que deforma sua próprai prática ou uma filosofia científica que dá conta efetivamente de sua prá tica científica? Uma ideologia que o escravize a seus êrros e ilusões ou, ao contrário, uma filoso fia que 0 liberte das ilusões e lhe permita domi nar verdadeiramente sua prática? A resposta não deixa lugar para dúvidas. Ela é em seu princípio a razão que justifica o papel essencial da filoso fia marxista com relação a todo conhecimento: qualquer ciência, se está apoiada numa falsa re pres pr esen enta taçã çãoo das condiçõe condiçõess da p ráti rá ticc a científ cie ntífica ica e da relação da prática científica com as outras prát pr átic ica, a, corre o risco risco de r e tar ta r d a r seu progress progresso, o, senão de enfiar-se em becos sem saídas, ou en fim de tomar suas próprias crises de crescimento por po r crises da ciência ciênci a com como tal, ta l, e de oferecer ofere cer com isso argumento para tôdas as explorações religio-
sas e ideológicas concebíveis. Temos exemplos re centes disto com a ‘crise da física moderna” ana lisada por Lênine. Ainda mais, se uma ciência está nascendo, corre o risco de pôr a serviço de seus procedi mentos habituais a ideologia em que se banha: disto temos exemplos evidentes com as chama das ciências humanas, que quase sempre não passa pas sam m de técnicas, técnic as, bloqueadas bloqueada s em seu desenvol vimento pela ideologia empirista que as domina e que não lhes permite discernir seu verdadeiro fundamento, definir seu objeto e inclusive en contrar em disciplinas existentes, ainda que re jeita je itadd a s por po r proibições proibições ou preconceitos preconc eitos ideológi ideológi cos .(como o materialismo histórico, que deveria serVir de fundamento à maior parte das ciências humanas), seus verdadeiros princípios básicos. O que vale para estas ciências, vale em primeiro lu gar para o próprio materialismo histórico, que é uma ciência como as outras e, dêste ponto de vis ta, não goza de nenhum privilégio de imunidade. Êle também está constantemente ameaçado pela ideologia dominante, e conhecemos o resultado: as diferentes formas de revisionismo que, em sua origem e seja qual fôr a forma de sua existência (econômica, política, social, teórica), se relacio na sempre com desvios de caráter filosófico, isto é, com a influência direta ou indireta de filoso fias deformadoras, de filosofias ideológicas. Lê nine o mostrou claramente em Materialismo e Empiriocriticismo ao afirmar que a razão de ser do materialismo dialético consistia, precisamen te, em proporcionar os princípios que permitem distinguir a ideologia da ciência e portanto evi tar as armadilhas da ideologia até mesmo nas in terpreta terp retaçõe çõess do materia ma terialismo lismo histórico. histórico. Dêste Dêste niodo demonstrou que o que êle chama a “posi ção de partido em filosofia”, ou seja, a recusa de tôda ideologia e a consciência exata da teoria de cientificidade, era uma exigência absolutamente vital para a própria existência e desenvolvimento não só das ciências naturais, mas também das ciências sociais e acima de tudo do próprio ma terialismo histórico. Já se disse com acêrto que o marxismo é um\'-'< “gum para ação”. Êle pode ser êste “guia” porque nao é um falso guia, mas um guia verdadeiro, Iorque é uma ciência, e unicamente por êste mo tivo. Digamos com tôdas as precauções requeri das por esta comparação que, em numerosas circimstâncias, também as ciências têm necessidade de um “guia”, não de um guia falso, mas de um guia verdadeiro — e entre as ciências o próprio materialismo histórico tem uma necessidade vital dêsse “guia”. Êste “guia” das ciências é o mate-'^
acima do materialismo dialético, compreende-se que Lênine tenha atribuído à tomada de posição científica em matéria de filosofia uma importân cia absolutamente decisiva; compreende-se que 0 materialismo dialético exija a mais alta cons ciência e o mais alto rigor cientifico, a mais alta vigilância teórica, já que êle é, no domínio teó rico, 0 último recurso possível, ao menos para os homens que se libertaram, como nós, dos mitos da onisciência divina ou de sua religião profana; 0 dogmatismo. IV NA NATUREZA DE UMA CIÊN IÊNCIA, IA, CONSTITU ITUIÇÃ IÇÃO DE UMA CIÊNCIA, DESENVOLVIMENTO DE UMA CIÊNCIA, INVESTIGAÇÃO CIENTIFICA Se, como pensamos, a doutrina de Marx é uma doutrina científica, se todos os objetivos e todos os meios de ação dos comunistas se baseiam na aplicação dos resultados das teorias científi cas de Marx, nosso primeiro dever se refere na turalmente à ciência que nos dá os meios para compreender a realidade do mundo histórico e os meios para transformá-lo. Temos então o dever categórico de tratar a teoria de Marx (em seus dois domínios; materia lismo histórico e materialismo dialético) como o que ela é, como uma verdadeira ciência, tomando consciência do que implica a natureza de uma ciência, a constituição de uma ciência, e sua vida, ou seja, seu desenvolvimento. Êste dever comporta hoje exigências parti culares. Com efeito, não estamos mais na posi ção de Marx, simplesmente porque não temos de fazer denôvo o prodigioso trabalho teórico que Marx realizou; A teoria marxista existe para nós prim pr imei eira ram m en ente te co com mo um resultado res ultado,, contido contid o em certo número de obras teóricas e presente em suas aplicações políticas e sociais. Na ciência ciênci a ex exis iste tent ntee hoje, hoje , o trab tr abaa lho lh o teórico que a produziu hão é mais visível a olho nu, pas sou sou inteira int eiram m en ente te p a ra a ciência ciência constituída. constituída. É aí que se esconde um perigo, pois podemos ser tentados a tratar a ciência marxista constituí da ou como um dado ou como um conjunto de verdades acabadas: em suma, cair numa concep ção empirista ou numa concepção dogmática da ciência. Podemos considerá-la como um saber acabado, que não levanta nenhum problema de
desenvolvimento ou de investigação — e assim a abordaremos como dogmáticos. Podemos tam bém bém, j á que ela nos dá o conhecim conh ecimento ento do real, crer que ela o reflete direíamente e naturalmeníe, e que bastou a Marx ver, ler, enfim refletir bem em sua teor te oria ia a b s t r a t a a essência das coisas coisas dadas nas próprias coisas, sem levar em conta o enorme trabalho de produção teórica necessário pa p a ra cheg ch egar ar ao conhecim conh ecimento ento — e a abordarem abor daremos os então como empiristas. Em ambas as interpretações, a dogmática e a empirista, faremos uma idéia falsa da ciência, pois pois considera con sideraremos remos o conhecim conh ecimento ento d a verdade verd ade como 0 conhecimento de um dado puro, ao passo que o conhecimento é, ao contrário, um processo complexo de produção dos conhecimentos. Ora, a idéia que tivemos da ciêncfia será decisiva pa ra a própria ciência marxista. Se tivermos dela uma concepção dogmática, não faremos nada pa p a ra a desenvolve desenvolver, r, repeti rep etirem remos os inde in defi fin n idam id amen en te seus resultados, e a ciência não só não progre dirá, mas perecerá. Se tivermos uma concepção empirista, correremos o risco de ser igualmente incapazes de fazê-la progredir sèriamente, pois estaremos cegos sôtare a natureza do processo real da produção dos conhecimentos e permanecere mos reboque dos fato fa toss e dos dos acon ac onte teci cime mento ntos' s' — a reboque, isto é, atrás e era atraso. Se, ao con trário, formarmos uma idéia justa da ciência, de sua natureza, das condições da produção dos co nhecimentos, então poderemos desenvolvê-la e dar-lhe a vida a que tem direito, e sem a qual não seria mais uma ciência, e sim um dogma es tagnado e morto. 1. Sabe Sa berr o que é uma ciência ciênci a é saber, ante an tess de tudo,i^como ela se constitui, como é produzi da: tôda ciência é produzida por um imenso tra balho teórico especific especifico, o, por po r uma um a p ráti rá ticc a teóri te órica ca insubstituível, extremamente longa, árdua e di fícil. Dizia Marx (carta a Lachatre, 18-3-1872): “Não há estrada real, direta e larga, para a ciência e sòmente aquêles que não temem fatigar-se ao escalar suas sendas escarpadas terão oportunidade de chegar a seus cumes luminosos”, Esta prática supõe tôda uma série de condi ções teóricas específicas, em cujos detalhes não e possível entrar aqui. O ponto importante é que uma ciência, longe de refletir os dados imedia tos da experiência quotidiana e da prática quo tidiana, só se constitui com a condição de pô-los
mais o contrário das evidências da prática quo tidiana do que seu reflexo. Marx escreve: “As verdades científicas são sempre parado xais, quando a submetemos ao controle da experiência quotidiana, que apreende somen te a; aparência aparê ncia enganosa das co coisa isas” s” (Salá (S alá rio, Preço e Lucros, pág. 10). Engels diz a mesma coisa, quando declara que as leis da produção capitalista “se realizam sem que os interessados tenham consciências delas, e só podem ser abstraídas da prática quotidiana por um estudo teórico difícil" (Prefácio ao Livro II de O Capital, Tomo VI, pág. 34). Êste estudo teórico difícil não é uma abstra ção no sentido da ideologia empirista: conhecer não é extrair dag impurezas e das diversidades do real a essência pura que estaria contida no real, como se extrai o ouro da ganga de areia e de ter ra em que se achava contido; conhecer é produ zir o conceito adequado do objeto pela aplicação def meios de produção teórica (teoria e método) a uma matéria prima dada. Esta produção de co nhecimento em uma ciência dada é uma prática específica, que deve ser denominada prática teóri ca — uma prática especifica, isto é, distinta das outras práticas existentes (prática econômica, prá p ráti tica ca política, p ráti rá ticc a ideológica) ideológica) e em seu nível e em sua função absolutamente insubstituível. É claro que esta prática teórica está em relação orgânica com as outras práticas, está fundada e articulada sõbre elas, mas é insubstituível em seu domínio próprio: isto quer dizer que a ciên cia é produzida como ciência por uma prática es pecifica, a p ráti rá ticc a teórica, teóri ca, que nã nãoo po pode de,, a títul tít uloo nenhum, ser substituída por nenhuma das ou tras práticas. Êste ponto é importante, pois cons titui um êrro empirista e idealista dizer que os conhecimentos científicos são o produto da prá tica social em geral, ou da prática política e eco nômi nô mica ca.. Se no noss contentarmos contentarmo s em em fala fa larr da p rá rá tica em geral, u se falarmos sòmente da prá tica econômica e da prática política sem men cionar a prática teórica como tal, alimentareremos a idéia de que as práticas não-científicas produzem po porr si mesmas, espoit esp oitân ânea eame mente nte,, o equivalente à prática científica, e descuidare mos o caráter e a função insubstituíveis da prá tica científica. Marx e Lênine alertaram-nos para êste pon to, ao mostrar-nos, por exemplo, que a prática
eram, por si sós, incapazes de produzir a ciência da sociedade, e por conseguinte a ciência da pró pria pria p ráti rá ticc a prol prolet etári ária, a, e produziam produziam apena ape nass ideo logias utópicas reformistas sôbre a sociedade. A ciência marxista-leninista, que está a serviço dos interesses objetivos da classe proletária, não poderia ser o produto espontâneo da prática do prol proleta etaria riado do:: ela foi produz pro duzida ida pela práti rá ticc a teó te ó rica de intelectuais que possuíam uma alta cul tura tu ra,, Marx, Marx, Engels e Lênine, e foi foi traz trazid idaa “de fora fo ra”” à prática proletária, à qual em seguida modifi cou, transfo tran sform rman ando do-a -a profundame profun damente. nte. É um êrro teórico “esquerdista” dizer que o marxismo é uma “ciência proletária”, se se entende por isso que êle foi produzido ou é produzido espontânea mente pelo proletariado: êste êrro só é possível com a condição de silenciar sôbre a existência e a função insubstituíveis da prática científica, co mo prática produtora da ciência. Que esta prática científica trabalhe sôbre os dados da experiên cia da prática econômica e política do proleta riado e das outras classes, eis aí uma condição fundam fun damen ental” tal” da prát pr átic icaa científica. científica. Mas esta é apenas uma de suas condições: todo o trabalho científico consiste justamente em produzir, par tindo da experiência e dos resultados destas prá ticas concretas, o conhecimento delas, que é fru to de uma outra prática, de todo um trabalho teórico específico. Podemos fazer uma idéia da importância gigantesca déste trabalho e de suas consideráveis dificuldades, lendo O Capital e sa bendo qu quee Marx trab tr abaa lho lh ou d u ran ra n te t r i n t a anos pa p a ra lan la n çar ça r suas sua s bases e desenvolver desenvolver suas a n á li li ses conceituais. É necessário, pois, reter que não há ciência possív possível el sem a existência exist ência de uma um a p ráti rá ticc a especí fica, distinta das outras práticas: a prática cien tífica ou teórica. É preciso reter que esta prática é insubstituível e, como tôda prática, possui suas leis próprias e exige meios próprios e condições própr próprias ias de atividade. 2. Sabe Sa berr o que é um a ciência ciên cia é, ao mesmo mesmo tempo, saber que ela só pode viver com a condi ção ção de se de desenv senvolve olverr pe perm rman anen entem temen ente. te. Uma Uma ciência que se repete, sem descobrir nada, é uma ciência morta; não é mais uma ciência, e sim um dogma petrificado. Uma ciência só vive de seu desenvolvimento, isto é, de suas descobertas. Ês te ponto é igualmente muito importante. Pode mos ser tentados a crer que possuímos no materiallsmo histórico e no materialismo dialético, tais como nos são dados hoje, ciências acabadas e podemos ser tentados a desconfiar por princí pio de tôda tôd a descoberta desco berta nova. Certa Ce rtame ment ntee o mo
guarda contra os revisionistas, que sempre se ampararam com os títulos da “novidade” ou da “renovação” — mas esta defesa necessária não tem nada a ver com a suspeita em relação às des cobertas de uma ciência viva. Se caíssemos nêsse êrro, nosso atitude para com as ciências em ques tão seria dominada por êle, e nos dispensaríamos do que devemos fazer: dedicar todos os nossos es forços para desenvolvê-las e para forçá-las a produzi pro duzirr novos novos conhecim con hecimento entoss e novas descober descobe r tas. Marx, Engels e Lênine manifestaram-se a res peito dêste ponto pon to sem nen ne n hum hu m equí equívo voco co.. Quando Marx, em uma tirada célebre, dizia que “não era marxista”, queria dizer que considerava aquilo que havia feito como um simples comêço de ciên cia, e não como um saber acabado, pois um sa ber be r acabado acab ado é uma um a coisa sem sentido, que con co n duz mais cedo ou mais tarde a uma não-ciência. Engels diz o mesmo quando escreve, por exemplo, em 1877: “Foi paças às descobertas de Marx que o socialismo se converteu em uma ciência, que se trata agora de elaborar em todos os seus detalhes” (Anti-Duhring — pág. 58). Ou ainda: “...A economia política, como ciência das condições e das formas nas quais as diferen tes sociedades produziram e comerciaram... — a economia política, nêste nê ste sentid sen tido o amplo, continua ainda por ser feita. O que possuí mos até hoje de ciência econômica se limita ( qua.se .se exclusivamente exclusivamente à gênese gênese e ao desen des en volvimento do modo de produção capitalis t a . . ' . ” (Anti-Duhring (Anti-Duhring,, pág. pág. 18 182). Lênine proclama esta realidade, se possível, ainda com mais fôrça, em 1899: “Não poderia existir um partido socialista forte sem uma teoria revolucionária, que unisse todos os socialistas, da qual êles tiras sem tôdas as suas convicções e a qual êles aplicassem a seus métodos de luta e a seus meios de ação. Defender uma tal teoria, que se considera como profundamente verdadei ra, contra os ataques injustificados e as ten tativas de alterá-la, não significa, de modo algum, que se seja inimigo de tôda crítica. Nós não consideramos a doutrina de Marx como alguma coisa acabada e intangível; ao con trário, estamos convencidos de que ela lan
que os socialistas devem fazer progredir em tôdas as direções se não quiserem atrasar-se em relação à vida. Pensamos que sobretudo os socialistas russos devem absolutamente desen volver por si mesmos a teoria de Marx, por que esta indica apenas os princípios diretivos gerais, que se aplicam diferente a cada caso pa p artic rticuular, la r, à Ing In g late la terr rraa de modo modo dife di fere rente nte do que à França, à França de modo diferente do que à Alemanha, à Alemanha de modo dife ren re nte do que à Rússia” Rúss ia” (No (Nosso Progra Pro grama ma,, Obras completas, tomo IV, pág. 209-210). Êste texto de Lênine contém vários temas capitais: 1) No domínio teórico, Marx Marx nos deu as “pe “pe dras angulares”, os princípios diretivos, isto é, os princípio prin cípioss teóricos de base bas e de uma um a teori te oriaa que é preciso preciso ab abso solut lutam amen ente te desenvolver; 2) Êste desenvolvim desenvolvimento ento teórico é um dever pa p a ra todos todos os socialistas, um dever p a r a com sua ciência, sem a qual faltariam a seu dever para com o próprio socialismo; 3) É necessário nece ssário nã nãoo sòmente sòm ente desenvolver a teoria em geral, mas também saber desenvolver suas aplicações particulares, segundo a natureza próp pr ópria ria de cada ca da easomonc easo moncreto; reto; 4) E sta defesa e êste desenv desenvolvim olvimento ento da ciência marxista supõem ao mesmo tempo a maior firmeza contra todos os que querem arrastar-nos pa p a ra aqu aquém ém dos princípios princípi os científicos científic os de Marx — e uma verdadeira liberdade de crítica e de inves tigação científica, exercida com base nos princí pios pios teóricos de Marx, Marx, p a ra aqueles que podem e querem ir além: liberdade indispensável à vida da ciência marxista como de qualquer outra ciên cia. Noss Nossaa posição posição dev devee con consis sistir tir em t i r a r as con con clusõ clusões es teóricas teó ricas e prá pr á tica tic a s dêstes princípios. Em parti pa rticu cula lar, r, se o mater ma teriali ialism smoo histórico históri co e o m a tete rialismo dialético são ambos disciplinas científi cas, devemos necessariamente desenvolvê-los, fazê-los produzir conhecimentos novos, esperar dêles, como de tôda ciência viva, descobertas. Geralmente, admite-se que assim deve ser para 0 materialismo histórico, mas nem sempre se afirma isso com igual nitidez em relação ao ma terialismo dialético, porque não se faz uma idéia exata de seu caráter de disciplina científica, por que se permanece fixado à noção (idealista) de que a filosofia não é verdadeiramente uma disci pli de ráte rá te científico.
domínio do materialismo dialético, o qual per maneceu pràticamente no ponto a que Lênine o levou levou no Materiali Mat erialismo smo e Empiriocriticismo. Se assim é, trata-se de um estado de coisas a exa m inar in ar muito sèriamente sèriam ente e a retifi re tifica carr logo. Da mesma maneira, se o materialismo histórico se beneficiou co com m as grande gra ndess descobe desc oberta rtass teóricas de Lênine (a teoria do imperialismo, a teoria do parti pa rtido do comunis com unista, ta, o início da teori te oriaa sôbre sôbre a n a tureza específica da primeira fase da transição do modo de produção capitalista ao modo de pro dução socialista), não se vê que tenha sido, desde então, objeto de importantes desenvolvimentos teóricos, no entanto indispensáveis à solução dos problemas problem as levanta lev antados dos por no noss ssoo tempo: tem po: como, pa p a ra não c i tar ta r mais ma is do qu quee um, o problema proble ma das formas de transição dos modos de produção com plexos plexos combinados do doss países ditos “subde “su bdesen sen volvidos” ao modo de produção socialista. Da mesma maneira, a dificuldade para dar conta teoricamente de um fato histórico tão im po p o rta rt a n te co com mo 0 “culto à personalidade” decorre da insuficiência do desenvolvimento da teoria das formas de transição entre o modo de produção capitalista e o modo de produção socialista. 3. Se desenvolv desenvolver er a ciência m a rxis rx ista ta (em seus dois domínios) é um dever para os comu nistas, êste dever deve ser encarado em suas condições concretas. Para que uma ciência possa se desenvolver, é necessário em primeiro lugar que se possua uma idéia justa da natureza da ciência e em par ticular dos meios pelos quais ela se desenvolve, e portanto de tôdas as condições reais de seu de senvolvimento. É necessário assegurar à ciência estas con dições de desenvolvimento, em particular reco nhecer teórica e pràticamente o papel insubsti tuível da prática científica no desenvolvimento da ciência e, por conseguinte, definir nitidamen te nossa teoria da ciência, rechaçar tôdas as in terpretações dogmáticas e empiristas e fazer tri unfar nas idéias e nos fatos uma concepção exa ta da ciência. É necessário também assegurar pràticamente as condições de liberdade científica de que a pes quisa teórica necessita, e dar-lhe os meios mate riais desta liberdade (organizações, revistas teó ricas etc.). Enfim, é necessário criar as condições reais pa p a ra a pesquisa cientí cie ntífic ficaa ou pesquisa teóric te óricaa no próprio domínio do marxismo É a esta es ta preoc pre ocup upa a
centro de Estudos e Pesquisas Marxistas e a cria ção do Instituto Maurice Thorez. Mas é necessá rio também que tôdas estas diferentes medidas sejam coordenadas, sejam pensadas como medi das que fazem parte de um todo, e que seja con cebida e aplicada em matéria de teoria e de pes quisa teórica uma política de conjunto, que não pode pode vir senão do Parti Pa rtido do,, p a r a d a r ao m a ter te r iaia lismo histórico e ao materialismo dialético a pos sibilidade de se desenvolverem e de viverem uma verdadeira verdade ira vida vida científica, e assim assim produzirem conhecimentos novos. É necessário reconhecer que a pesquisa teó rica não pode consistir na simples repetição ou no simples comentário das verdades já adquiri das, e com muito mais razão, não tem nada a ver com o desenvolvimento de simples temas ideoló gico gicoss ou simples simples opiniões pessoais. A pesquis pesquisaa teórica só começa na zona qeu separa os conhe cimentos já adquiridos e assimilados em profun didade dos conhecimentos ainda não adquiridos. Para ser pesquisador, é necessário ter alcançado e ter ultrapassado esta zona. É necessário, por tanto, reconhecer que a pesquisa teórica exige uma sólida formação teórica para ser simples mente possível, e isso supõe a aquisição de uma elevada cultura, não sòmente marxista (que é ab solutamente indispensável) mas também cientí fica e filosófica em geral. É preciso, pois, encora ja j a r por todos os meios eios esta es ta formação form ação ge gera rall ao mesmo tempo que a formação teórica marxista, base prévia pré via indispensável indispe nsável a tôda tô da pesquisa teó te óri ri ca marxista e científica. 4. Podem Podemos os a d ian ia n tar ta r sem risco risco de êrro êrr o qu quee o desenvolvimento da teoria marxista em todos os seus domínios é uma necessidade de primeira urgência para nosso tempo, e uma tarefa atasolutamente essencial para todos os comunistas — e isto por duas ordens de razões. A primeira ordem de razões decorre da natu reza rnesma das tarefas novas que a “vida”, isto é, a história nos impõe. Desde a Revolução de 17 e a época de Lênine, imensos acontecimentos abalaram a história mundial. O crescimento da URSS, a vitória contra o nazismo e o fascismo, a grande revolução chinesa, a revolução cubana e a passagem de Cuba para o campo socialista, a libertação das antigas colônias, as revoltas do Terceiro Mundo contra o imperialismo, abalaram a correlação de forças no mundo — mas criaram ao mesmo tempo um número considerável de no vos . problemas, alguns algu ns sem preceden prec edentes, tes, p ara ar a cuja solução é indispensável o desenvolvimento
senvolvimento da teoria marxista das formas de transição de um modo de produção a outro. Esta teoria não se refere únicamente aos pro blemas econôm econômico icoss da tran tra n siçã si ção o (problemas (problem as das da s formas da planificação, da adaptação das forrnas da planificação aos diferentes estágios específi cos da transição segundo o estado particular dos países considera cons iderados) dos);; refe re fere re-s -see tamb ta mbém ém aos pro pr o blemas políticos (forma (fo rmass do Estado, formas form as da organização política do partido revolucionário, formas e natureza da intervenção do partido re volucionário nos diferentes domínios da atividade econômica, política e ideológica) e aos problemas ideológicos da transição (política no domínio re ligioso, moral, jurídico, estético, filosófico etc.). A teoria a desenvolver não se refere somente aos problemas prob lemas levan le vantad tados os pelos países ditos “subde senvolvidos” na sua passagem para o socialismo, mas também aos problemas dos países já engaja dos no modo de produção socialista (URSS) ou próximos a isso isso (China (Ch ina), ), a todos os problemas problema s d a planif pla nifica icação ção,, das novas form fo rmas as juríd ju rídica icass e polí ticas a definir, para fazê-las corresponder às no vas relações de produção (pré-socialistas, socia listas, pré-comunistas), e naturalmente a todos os problemas colocados pela existência de um campo socialista que apresenta relações econô micas, políticas e ideológicas complexas, em fun ção da desigualdade de desenvolvimento dos di ferentes países. A teoria a desenvolver refere-se enfim à na tureza atual do imperialismo, às transformações do modo de produção capitaiista na nova con jun ju n tura tu ra,, ao desenvolvimento desenvolv imento das forças força s p rod ro d u ti ti vas, às novas formas de concentração econômica e de governo político dos monopólios e a todos os problemas estratégicos e táticos dos partidos comunistas na fase presente da luta das cla,sses. Todos êsses problemas se referem, em última ins tância, ao futuro do socialismo e devem ser colo cados e resolvidos em função de sua definição e de suas estruturas próprias. Em todos êsses pro blemas, blemas, nós nos enco en cont ntra ramo moss no terre te rreno no mesmo mesmo do conhecimento que Lênine recomendava sole nemente aos comunistas que produzissem para cada país, desenvolvendo a teoria marxista a pa p a r t i r dos dos conhecime conhe cimentos ntos adquiridos, aquêles que são tidos como as “pedras angulares” das desco berta be rtass de Marx. arx. Mas não é sòmente a nova fisionomia da his tória e seus problemas que nos obrigam a desen volv volver er resolutamente resolutam ente a teoria marxista. P ara ar a isso temos uma segunda ordem de razões, que
ordem de Lênine — desenvolver a teoria para não ficarmos atrasados em relação à vida — toma aqui um relêvo paTticular. Se ficamos em difi culdades para citar, em numerosos domínios da teoria marxista, descobertas de envergadura des de os trabalhos de Lênine, nós devemos esta si tuação em grande parte às condições com as quais 0 movimento operário internacional esteve comprometido pela política do “culto”, pelas inú meras vítimas que ela produziu nas fileiras dos militantes, intelectuais e sábios de grande valor, pela destruição destr uição qu quee o dogmatismo dogmatis mo causou causou aos es píritos. píritos. Se a política do “culto” não comprometeu o desenvolvimento das bases materiais do socialis mo, ela sacrificou e bloqueou literalmente, du rante anos, todo desenvolvimento da teoria marxista-leninista, ignorou na prática as condições indispensáveis à reflexão e à pesquisa teórica e, pela suspeição suspeição politica co com m que en enca cara rava va qu qual al quer novidade teórica, desferiu pràticamente um golpe muito grave na liberdade de pesquisa cien tífica e em tôda descoberta. Os efeitos desta po lítica dogmática em matéria de teoria se fazem sentir hoje, não sòmente nos resíduos do dogma tismo, mas também, paradoxalmente, nas formas muitas vêzes anárquicas e confusas que revestem um pouco por tôda parte as tentativas de nume rosos intelectuais marxistas para retomar a pos se da liberdade de reflexão e de pesquisa de que tinham sido por tão longo tempo privados. Êste fenômeno está hoje relativamente es palhado não só em tôrno tôr no dos meios eios marxi marxistas stas,, mas também nos próprios partidos marxistas e até nos países socialistas. Porém, o maior mal, que ,se expressa diretamente nesses ensaios ge nerosos mas com freqüência atingidos pela con fusão ideológica, decorre de que o período do “culto”, longe de contribuir, ao contrário impe diu a formação teórica de tôda uma geração de pesquisadore pesquisadoress marxis ma rxistas tas,, cujas cuj as obras nos fazem falt fa ltaa hoje cruelmente. cruelmen te. É preciso tempo, tempo, muito tempo para formar verdadeiros teóricos, e todo tempo perdido se paga com uma ausência de obras, com um atraso na produção da ciência, com uma estagnação, quando não com um re trocesso trocesso _dos conheciment conhecimentos. os. Ainda Ain da mais mais porque as posições que os marxistas não souberam ocu pa p a r no domínio do conhecimen conhe cimento, to, não p erm er m a neceram vagas: foram ocupadas, sobretudo no domínio das “ciências humanas”, por “sábios” ou “teóricos” burguêses, sob a dominação direta da ideologia burguêsa, com tôdas as conseqüên-
efeitos desastrosos nem mesmo se suspeita sem pre. Portanto, não só temos que recuperar nosso próprio atraso atr aso,, mas também tam bém devem devemos os reocupar, por nossa conta, os domínios domínios que que nos cabem de direito, na medida em que dependem do materialismo histórico ou do materialismo dialético), e devemos reocupá-los em condições difíceis, já que devemos lutar por meio de uma critica lúcida contra os prestígios dos aparentes resultados ad quiridos por seus ocupantes de fato. Por esta dupla ordem de razão, histórica e teórica, é claro que a tarefa de desenvolver a teoria marxista em todos os seus domínios é uma tare ta reff a políti líticca") e teóri te órica ca de prim p rimeir eiraa ordem. ordem.
A IDEOLOGIA Para poder, tão rigorosamente quanto pos sível, deduzir as conseqüências práticas do que acaba de ser dito sobre a teoria científica mar xista, torna-se agora necessário colocar em seu devido lugar e definir um nôvo têrmo importan te: ideologia. Já vimos que o que distingue as organizações marxistas da classe operária é o fato de elas fundamentarem seus objetives socialistas, seus meios de ação e suas formas de organização, sua estratégia e suas táticas revolucionárias, nos princípios de uma teor te oria ia científic cien tífica, a, a de Marx, Marx, e não sobre tal ou qual teoria ideológica — anar quista, utópica reformista ou qualquer outra. Com isso, pusemos em evidência uma oposição e uma distinção cruciais entre a ciência de um lado e a ideologia de outro. Mas com isso colocamos também em evidên cia uma realidade de fato, tanto a propósito da ruptura que Marx teve de consumar com as teo rias ideológicas da história para fundar suas des cobertas científicas, como também a propósito da luta a travar contra a ideologia que ameaça tôda ciência: é que a ideologia não só precede tôda ciência, mas também se perpetua depois da constituição da ciência e apesar de sua existên cia. Mais ainda, constatamos que a ideologia ma nifesta sua existência e seus efeitos não só no terreno de suas relações com a ciência, mas tam bém num nu m domínio domínio infi in fin n ita it a m e n te mais vasto: vasto : a
sociedade inteira. Quando falamos em “ideologia da classe operária”, para dizer que a ideologia da classe operária, que era “espontaneamente” anarquista ou utópica em seus inícios, antes de se tornar geralmente reformista em seguida, foi pouco pouco a pouco pouco tra tr a n s f o rma rm a d a pela pel a influ influên ência cia e pela ação da teor te oria ia m a rxis rx ista ta em uma um a nova nov a ideo ideo logia; quando dizemos que hoje a ideologia de largas camadas da classe operária se converteu em uma Ideologia de caráter marxista-leninista; quando dizemos que devemos levar às grandes massas não somente a luta econômica (por meio dos sindicatos) e a luta política (por meio do par tido), mas também a luta ideológica — é claro que avançamos, sob o têrmo de ideologia, uma noção que questiona realidades sociais, uma no ção que, embora ligada a certa representação, port po rtan anto to a certo “conh conhec ecim imen ento to”” do real, t r a n s borda bor da no enta en tann to, to , ampla am plam m ente, en te, a simples simples ques tão do conhecimento, para pôr em jôgo uma rea lidade e uma função propriamente sociais. Temos, portanto, consciência, na utilização prá p ráti tica ca que fazemos d esta es ta noção, noção, de que que a ideo logia implica uma dupla relação: com o conhe cimento de um lado, com a sociedade de outro. A natureza desta dupla relação não é simples, e requer um esfôrço de definição. Êste esfôrço é indispensável se é verdade, por um lado, como vimos, que é sumamente importante para o mar xismo definir-se sem equívoco como uma ciência, isto é, como uma realidade absolutamente dis tinta da ideologia, e se é verdade, por outro lado, que a ação das organizações revolucionárias ba seadas na teoria científica do marxismo deve de senvolver-se na sociedade, onde a cada passo e a cada instante de sua luta, e mesmo na cons ciência da classe operária, elas se chocam com a existência social da ideologia. Para ver bem claro nesta questão capital, mas difícil, é indispensável retroceder e remon tar aos princípios da teoria marxista da ideolo gia, que faz parte da teoria marxista da socieda de. Marx mostrou que tôda formação social cons titui uma “totalidade orgânica” que compreende três “níveis” essenciais: a economia, a política e a ideologia ou formas da consciência social. O nível ideológico representa, portanto, uma reali dade objetiva, indispensável à existência de uma formação social, realidade objetiva, isto é, inde pende pe ndente nte d a subje su bjetivid tividad adee dos indivíduos que es es tão a ela submetidos, embora se refira a êstes
Como representar a realidade objetiva e a função social da ideologia? Em uma sociedade dada, os homens partici pam pa m d a produção econômica, econômica, cujos mecanismos mecani smos e efeitos são determinados pela estrutura das rela ções de produção; os homens participam da ati vidade política, cujos mecanismos e efeitos são regulados pela estrutura das relações de classe (a luta de classes, o direito e o Estado). Os mes mos homens participam de outras atividades, ati vidades religiosa, moral, filosófica etc., seja de uma maneira ativa, por meio de práticas cons cientes, seja de uma maneira passiva e mecânica, por po r reflexos, reflexos, juízos, juízos, atitu at itude dess etc. E stas st as últim últ imas as atividades constituem a atividade ideológica e são sustentadas por uma adesão voluntária ou involuntária, consciente ou inconsciente, a um conjunto de representações e crenças ,religiosas, morais, jurídicas, políticas, estéticas, filosóficas etc., etc., que forma for mam m o que se cham ch amaa o nível da ideologia. As representações da ideologia referem-se ao mundo em que os homens vivem, à natureza e à sociedade; referem-se à vida dos homens, às suas relações com a natureza, com a sociedade, com a ordem social, com os outros homens e com suas próp pr ópria riass atividades, ativid ades, inclusive sua su a p ráti rá ticc a econô mica e sua prática política. Contudo, estas repre sentações não são conhecimentos verdadeiros do mundo que elas representam. Podem conter ele mentos de conhecimento, mas sempre integra dos e submetidos ao sistema de conjunto destas representações, que é, em seu princípio mesmo, um sistema orientado e falseado, um sistema do minado por uma falsa concepção do mundo ou do domínio dos objetos considerados. Na sua prá tica real, quer a prática econômica, quer a prá tica política, os homens são efetivamente deter minados por estruturas objetivas (relações de produção, relações políticas polític as de class cla sse); e); sua su a p r á tica os convence da existência e faz com que êles percebam perce bam certos efeitos objetivos d a ação des des sas estru es trutu tura ras, s, mas dissimula a essência "de "delas las — por sua simples prát pr átic ica, a, os homens hom ens não nã o podem chegar ao conhecimento verdadeiro dessas estru turas, nem por conseguinte da realidade econô mica, nem da realidade política, em cujos meca nismos no entanto desempenham um papel de finido. O conhecimento do mecanismo das estru turas econômica e política só pode ser o resul tado de outra prática, distinta da prática econô mica ou política imediatas, a prática científica — da mesma mesm a m a neir ne iraa que que o conhec con hecime imento nto das leis da natureza não pode ser o produto da sim ples ráti rá ti técnic té cnic da percepção quais não
fornecem mais do que observações empíricas e receitas técnicas, mas é, ao contrário, o produto de práticas específicas, distintas destas práticas imediatas, as práticas científicas. No No enta en tant nto, o, os homens, mesmo mesmo sem conhec con hece e rem as realidades políticas, econômicas e sociais nas quais vivem e agem, têm de cumprir as ta refas atribuídas pela divisão do trabalho e não podem podem viver sem se guiarem guia rem por uma cert ce rtaa r e presen pre sentaç tação ão de seu mundo e de suas sua s relações relações com êste mundo. Esta representação, êles ao nas cerem já a encontraram feita, existindo na so ciedade, da mesma maneira que encontraram, existindo antes dêles, as relações de produção e as relações'políticas. Assim como os homens nas cem “animais econômicos” e “animais políticos”, pode-se dizer que que êles êles nascem nasce m também tam bém “anima “ani mais is ideológicos”. Tudo se passa como se os homens, par p araa existirem existire m com como seres conscientes consciente s e ativos n a sociedade que condiciona tôda sua existência, ti vessem necessidade de dispor de uma certa re presen pre sentaç tação ão de seu mundo, que que pode pode p erm er m a ne ne cer em grande parte inconsciente e mecânica, ou ao contrário ser mais ou menos consciente e re fletida. A ideolog ideologia ia aparece ap arece assim com como cert ce rtaa re- J prese pr esenta ntação ção do mundo, que que liga os homens home ns às ' suas condições de existência e os homens entre si na divisão de suas tarefas e na igualdade ou desigualdade de sua sorte. Desde as sociedades primitivas, onde as classes classes não nã o existiam, con co n st sta a ta-se já a existência dêste laço ou liame, e não é por casualidade que se pôde ver na primeira forma geral da ideologia, a religião, a realidade dêste laço laço (esta (es ta é uma uma das etimologias etimologias poss possívei íveiss da palavra religião). Em uma sociedade de clas se, a ideologia serve não não só só p a r a os os homens homens com- ■ preende pree nderem rem suas própria pró priass condiç condições ões de existência, executarem as tarefas qeu lhes são designadsa, mas também para “suportarem” seu estado, seja a miséria da exploração de que são as vítimas, seja o prestígio exorbitante do poder e da ri queza de que são os beneficiários. As representações da ideologia acompanham, po pois is,, consciente conscie nte ou inconsciente, inconsci ente, com como sinais sina is e vetores capegados de proibições, de permissões, de obrigações, de resignações e de esperanças to dos os atos dos indivíduos, tôda a sua atividade, todas as suas relações. Se representarmos a so ciedade segundo a metáfora clássica de Marx, como um edifício, uma construção, onde uma superestrutura jurídico-política repousa sôbre a infra-estrutura da base, dos alicerces econômicos, deveremos dar à ideologia um lugar muito par-
uma relativa autonomia em relação ao direito e ao Estado; mas ao mesmo tempo, para compre ender sua forma de presença mais geral, é pre ciso considerar que a ideologia se introduz em tôdas as partes do edificio e constitui êsse ci mento de natureza particular que garante o ajus te e a coesão dos homens em seus papéis, suas funções e suas relações sociais. De fato, a ideologia impregna tôdas as ati vidades do homem, inclusive sua prática econô mica e sua prática política; está presente nas atitudes face ao trabalho, face aos agentes da produção, face às restriç res trições ões d a produção, n a idéia que o trabalhador faz do mecanismo da produção; produ ção; está es tá pres pr esen ente te n a s atitu at itudd es e nos j u l gamentos políticos, no cinismo, na boa consciên cia, na resignação ou na revolta etc.; governa as condutas familiares dos indivíduos e seus com port po rtam amen ento toss com os outro outross homens, sua su a atitu at itudd e face à natureza, seu, julgamento sôbre o sentido da vida em geral, seus diferentes cultos (Deus, o príncipe, prínci pe, o Estado etc.). A ideologia ideologia se a c h a p r e sente em todos os atos e gestos dos indivíduos a tal ponto que é indiscernível de sua “experiência vivida”, e tôdas as análises imediatas do “vivido” são profundamente marcadas pelos temas da evidência ideológica. O indivíduo (e o filósofo empirista), quando julga estar às voltas com a percepção percep ção p u ra e desn de snud udaa d a próp pr ópria ria realida realidade de ou com uma prática pura, está na realidade às voltas com uma percepção e uma prática impu ras, marcadas pelas invisíveis estruturas da ideo logia; como êle não percebe a ideologia, toma sua percepção percep ção das coisas coisas e do mundo mun do pela pel a percepção percep ção das “coisas mesmas”, sem ver que esta percepção não lhe é dada senão sob o véu das formas insus pei p eita tada dass da ideologia ideologia e está es tá de fato fa to recob rec ober erta ta p e la invisível percepção das formas da ideologia. Aí reside, com efeito, o primeiro caráter es sencial da ideologia: como tôdas as realidades so ciais, ciais, ela só é inteligível por sua su a estr es truu tura tu ra.. A ideologia comporta representações, imagens, si nais etc., mas êsses elementos, considerados iso ladamente, não constituem a ideologia: é seu sistema, seu modo de disposição e combinação que lhes dá sentido, é sua estrutura que os determina em seu sentido e sua função. Assim como a estru tura das relações de produção e os mecanismos da vida econômica produzidos por ela não são imediatamente visíveis para os agentes da pro dução, da mesma forma a estrutura e os meca nismos da Ideologia não são imediatamente visí veis para os homens que lhe estão, no entanto,
nhecem nem sua estrutura nem seus mecanis mos: praticam sua ideologia (como se costuma dizer de um crente que pratica sua relgiião), não a conhecem. É por ser determinada por sua estrutura que a ideologia transcende como reali dade tôdas as formas nas quais é vivida subjetivamente por tal ou qual indivíduo; é por isso que ela não se reduz às formas individuais nas quais é vivida; e é por isso que pode ser objeto de um estudo objetivo. É por esta razão de prin cípio que podemos falar da natureza e da função da Ideologia, e estudá-la. Ora, seu estudo nos revela caracteres notá veis. 1. Constatam Con statamos os inicialm inic ialmen ente te qu quee o têrm ideologia recobre uma realidade que, embora es tando difusa por todo o corpo social, é divisível em domínios distintos, em regiões particulares, centradas sôbre vários temos diferentes. É assim que o dominio da ideologia em geral pode ser, em nossas sociedades, dividido em regiões relati vamente autônomas, no próprio seio da ideologia; a ideologia religiosa, a ideologia moral, a ideolo gia jurídica, a ideologia política, a Ideologia esté tica, a ideologia filosófica. Estas regiões não exis tiram sempre na história sob estas formas dis tintas, que aparecem pouco a pouco. É de se preTCr que certas regiões desaparecerão, ou se con fundirão com outras, no curso da história do so cialismo e do comunismo, e que modificações Intervirão nas divisões do dominio geral da ideo logia. Deve-se assinalar igualmente que a re gião da Ideologia que domina as outras no âm bito geral geral da ideologia ideologia varia ar ia segundo os períodos períodos da história (isto é, segundo os modos de produ ção), segundo as diferentes formações sociais existentes no período de um mesmo modo de pro dução, e segundo as diferentes classes sociais. É assim que se explicam, por exemplo, as ob servações de Marx e Engels sôbre a influência dominante da Ideologia religiosa em todos os mo vimentos de revolta camponesa do século XIV ao século XVIII e mesmo em certas formas primi tivas do movimento operário; ou ainda a obser vação, que não é uma simples tirada de Marx, de que “os francêses têm a cabeça política, os inglêses a cabeça econômica, os alemães a cabeça filosófica” — observação de grande importância pa p a ra compreender, compreend er, por exempl exemplo, o, certos proble pro ble mas próprios às tradições operárias nesses paí ses. Pode-se fazer observações da mesma ordem sôbre a importância da religião em alguns movi
nos Estados Estad os Unidos nidos.. O con conhec hecime imento nto das dife dif e rentes regiões existentes na ideologia e da região ideológica dominante (seja ela religiosa, política, jurí ju rídi dica ca ou moral, etc.) é de suma su ma impo im port rtân ânci ciaa política polí tica p a r a a estr es trat atég égia ia e a t á tic ti c a d a luta lu ta ideo ideo lógica. 2. Pod odem emos os co cons nstat tatar ar igualmente igualmen te uma ou tra característica essencial da ideologia. Em cada uma dessas regiões, a ideologia, que sempre pos sui uma estrutura determinada, pode existir sob formas mais ou menos difusas, mais ou menos irrefletidas ou, ao contrário, sob formas mais ou menos conscientes, refletidas e explicitameníe sistematizadas, formas teóricas. Sabe-se que pode existir uma ideologia reli giosa que possua suas regras, seus ritos, etc, mas sem teologia sistemática; o advento de uma leologia representa um grau de sistematização teórica da ideologia religiosa. Acontece o mesmo com a ideologia moral, política, estética, etc.: podem existir sob uma fórma não-teorizada, não-sistematizada, sob a forma de costumes, de tendências, de gostos etc., ou, ao contrário, sob uma forma sistematizada e refletida: teoria ideo lógica lógica moral, teo te oria ri a ideológica ideológica política polí tica etc. A forma superior de teorização da ideologia é a filosofia, que é muito importante, pois constitui h laboratório da abstração teórica, saída da ideo logia mas tratada por ela como teoria. É como laboratório da teoria que a ideologia filosófica desempenhou e desempenha ainda um pape pa pell de gran gr ande de impo im port rtân ânci ciaa no nascim nas ciment entoo das ciênc ciências ias e em seu desenvolvimen desenvolvimento. to. Vimos imos qu quee Marx não suprimiu a filosofia: por meio de uma revolução no domínio da filosofia, êle transfor mou a natureza da filosofia, desembaraçou-a da herança ideológica que a entravava e fêz dela uma disciplina científica, assim lhe proporcio nando meios incomparáveis para desempenhar seu papel de teoria da prática científica real. De qualquer maneira, devemos saber que, à exceção da filosofia em sentido restrito, a ideologia não se reduz em nenhum de seus diferentes domínios à sua expressão teórica, que só é acessível geral mente a um pequno número de homens, mas existe nas grandes massas sob uma forma não-refletida teoricamente, que predomina ampla mente sôbre sua forma teorizada. 3. Uma vez situ si tuaa d a a ideologia ideologia em seu co con n junt ju nto, o, uma um a ve vezz assi as sina nala lada dass suas sua s difer dif eren entes tes r e giões e identificada a região que domina as ou tras e conhecidas as diferentes formas (não-teó-
tido último da ideologia: definir o sentido de sua função social. Êste sentido só pode se tornar evidente quan do se concebe a ideologia, segundo Marx, como um elemento da superestrutura da sociedade e quando se concebe a essência dêste elemento da superestrutura em sua relação com a estrutura de conjunto da sociedade. Desta maneira, per cebe-se que a função da ideologia só é inteligí vel vel n a sociedade de de classes, classes, sôbre a base da d a exis tência das classes sociais. Tanto em uma socie dade sem classes quanto em uma sociedade de 'Classes, a ideologia tem por função assegurar a ligação dos homens entre sí no conjunto das for mas de sua existência e a relação dos indivíduos com as tarefas fixadas para êles pela estrutura social. Em uma sociedade de classes, porém, esta função é dominada pela forma que assume a di visão do trabalho na repartição dos homens em classes classes antagôn anta gônica icas. s. Percebe-se que que a ideolog ideologia ia se destina então a garantir a coesão das rela ções dos homens entre si e dos homens com suas tarefas na estrutura geral de exploração de clas se, que predomina sôbre tôdas as outras rela ções. A ideologia está então destinada acima de tudo a garantir a exploração econômica e a do minação de uma classe sôbre as outras, levando os explorados a aceitarem sua condição de ex plorados com como base ba sead adaa n a vont vo ntaaae ae u eus, eu s, n a “natureza” ou no “dever moral” etc. Mas a ideo logia não é apenas uma “bela mentira” inventada pelos pelos exploradores p a ra m a n t e r os explorados em sujeição e iludi-los: serve também para os indi víduos da classe dominante se reconhecerem co mo sujeitos da classe dominante e aceitarem co mo “desejada por Deus”, como fixada pela “natu reza”, ou até imposta por um “dever” moral, a dominação que êles exercem sôbre os exploraaos; ao mesmo tempo serve também para êles como laço de coesão social, para que se comportem co mo membros de uma mesma classe, a classe dos exploradores. A “bela mentira” da ideologia tem, porta po rtant nto, o, duplo emprêgo: exerce-se exerc e-se sôbre a cons cons ciência dos explorados para fazei que êles acei tem como “natural” sua condição de explorados; e se exerce também sôbre a consciência dos memros da classe dominante para que êles possan exercer como “natural” sua exploração e domi nação. 4. Chegamos aqui ao pont pontoo decisiv decisivoo que, que, nas
mas necessariamente falseada, porque é necessa riamente orientada e tendenciosa — e é tenden ciosa porque seu objetivo não é dar aos homens o conhecimento objetivo do sistema social em que vivem, mas ao contrário oferecer-lhes uma representação mistificada dêste sistema social, pa p a r a m antêan tê-lo loss em seu “lug lu g ar” ar ” no sistem sis temaa de ex ploração da clas classe se.. N atural atu ralme ment nte, e, seria se ria necessário examinar também o problema da função da ideo logia em uma sociedade sem classes — e nós o re solveriamos mostrando que a deformação da ideologia é socialmente necessária em função mesmo da natureza do todo social, precisamente em função de sua determinação por sua estru tura, determinação que o torna, como todo so cial, opaco para os indivíduos que aí ocupam um lugar determinado por esta estrutura. A opacida de da estrutura social torna necessariamente mí tica a representação do mundo indispensá,vel à coesão social. Nas sociedades de classes, esta pri meira função da ideologia subsiste, mas está do minada pela função social nova qeu a exsitência da divisão em classes lhe impõe, e que predomina então sòbre a função precedente. Se quisermos ser exaustivos, se quisermos levar em conta êstes dois princípios de deformação necessários, deve mos dizer que a ideologia é, numa sociedade de classes, necessariamente deformante e mistificadora, porque é produzida como deformante ao mesmo tempo pela opacidade da determinação pela e s tru tr u tura tu ra e pela existê ex istência ncia d a divisão divisão de classes. Era justamente até aqui que tínhamos de re montar para compreender porque a ideologia, como representação do mundo e da sociedade, é necessariamente uma representação deformante e mistificadora da realidade em que os homens têm de viver, uma representação destinada a fa zê-los aceitar em sua consciência e em seu com porta po rtam m ento en to imediatos, o lug lu g ar e o papel pap el que que lhes impõe a estrutura desta sociedade. Agora é pos sível compreender porque a ideologia dá da rea lidade uma certa “representação”, porque ela faz de certa maneira alusão ao real, mas porque ao mesmo tempo ela não oferece sôbre o real mais do que uma ilusão. A ideologia dá aos homens certo “conhecimento” de seu mundo — ou me lhor, permitindo-lhes “reconhecerem-se” em seu mundo, dá aos homens um certo “reconhecimen to” — mas ao mesmo tempo não os introduz se não em seu desconhecimento. Alusão — ilusão ou reconhecimento — desconhecimento: assim é a ideologia do ponto de vista de sua relação com o real.
Compreende-se então por que tôda ciência, ao nascer, tem que romper com a representação mistif mi stifica icada da — mist mi stif ific ican ante te da ideolo ideologia gia.. Co Com m preende pree nde-se -se também tam bém porque a ideolog ideologia, ia, em sua função alusiva — ilusória, pode sobreviver à ciên cia mado que seu objetivo não é o conhecimento, mas um desconhecimento social e objetivo do real. Compreende-se também porque a ciência não pode, em sua função social, substituir a ideo logia como acreditavam os filósofos da Ilustra ção, que só viam na ideologia a ilusão (ou êrro) sení ver a alusão ao real, sem ver a função so cial desta união — à primeira vista desconcer tante, mas essencial — entre a ilusão e a alusão, o reconhecimento e o desconhecimento. 5. Ê necessá necessário rio ainda ain da acres ac rescen centar tar uma im po portan rt ante te observaçã observação, o, rela el ativ ti va às sociedades de classes. Embora a ideologia expresse em seu con jun ju nto uma um a repre rep rese sent ntaç ação ão do real re al desti es tinnad adaa a consagrar uma exploração e uma dominação de classe, ela pode também, em certas circunstân cias, servir para a expressão do protesto das clas ses exploradas contra sua própria exploração. Por isso devemos agora precisar que a ideologia não está somente dividida em regiões, mas está também dividida em tendências, no interior de sua própria existência social. Marx mostrou que “as idéias dominantes são as idéias da classe do minante”. Esta simples frase nos coloca no cami nho da compreensão de que, assim como em uma sociedade de classes existe uma classe (ou várias classes) dominante e classes dominadas, existe também uma ideologia dominante e ideologias dominadas. No No inte in teri rioor da ideologia ideologia em geral, observa-se observa-se porta po rtant ntoo a existên existência cia de tendê ten dênc ncia iass ideológicas ideológicas diferentes, que exprimem as “representações” das diferentes classes sociais. É neste sentido que fa lamos de ideologia burguesa, ideologia pequeno-burguesa, ideologia proletária. Mas não devemos perder perder de vista, no caso do modo modo de produção capitalista, que estas ideologias pequeno-burguesa e proletária são ideologias subordinadas, e que, mesmo no protesto dos explorados, são sernpre as idéias da classe dominante (ou ideo logia burguesa) que predominam. Esta verdade científica é de primeiríssima importância para compreender a história do movimento operário e a prática dos comunistas. Que queremos dizer quando afirmamos, com Marx, que a ideologia burguesa domina as outras
estrutura e por conseguinte do sistema da ideo logia dominante burguesa, servindo-se em gran de parte de suas representações e noções de re ferência. ferên cia. Por exemp exemplo, lo, a ideologia ideologia do protes pro testo to operário se exprime “naturalmente” na forma da moral ou do direito burguês. Tóda a história do socialismo utópico, tóda a história do reformismo trade-unionista está aí para confirmar. A pres são da ideologia burguesa é tal, e a ideologia burguesa burgue sa é a tal ta l pon ponto to a ún únic icaa a forn fo rnece ecerr a m a téria prima ideológica, os quadros de pensamen to, os sistemas de referência, que mesmo a clas se operária não pode, por seus próprios recursos, libertar-se radicalmente da ideologia burguesa: ela pode, no máximo, manifestar seu protesto e suas esperanças, utilizando para isso certos ele mentos da ideologia burguesa, mas permanece prisio prisione neira ira de dest staa ideol ideolog ogia ia,, presa pr esa em sua e s tru tr u tura dominante. Para que a ideologia operária espontânea chegue a se transformar a ponto de libertar-se da ideologia burguesa, é necessário que receba de fora o socorro da ciência, e se transforme sob a influência de um nôvo elemen to, radicalmente distinto da ideologia: precisa mente a ciência. A tese leninista fundamental da “importação” no movimento operário da ciência marxista não é, por conseguinte, uma tese arbi trária ou a descrição de um “acidente” histórico: baseia bas eia-se -se n a necessidade, necessidade, n a n atu at u reza re za mesmo mesmo da ideologia e nos limites absolutos do desenvolvi mento natural da ideologia “espontânea” da classe operária. Tais são, muito esquemàticamente resumidas, as características próprias da ideologia. VI A UNIAO DA TEORIA CIENTIFICA DE MARX COM O MOVIMENTO OPERÁRIO O que acaba de ser dito, de um lado sôbre a teoria científica de Marx, de outro sôbre a natu reza da ideologia, permite compreender em que térmos exatos se pôs o problema do nascimento histórico e se põe ainda hoje o problema da exis tência e da ação das organizações operárias marxistas-leninistas. 1. O primeiro prim eiro grande gra nde princípio foi foi form fo rmul ulaa
burguesa, que aderiu à causa do proletariado, Carlos Marx.
O movimento operário que existia nos anos de 1840 na Europa estava submetido a ideologias nroletárias (anarquistas), ou mais ou menos peaueno-burguesas e utópicas (Pourier, Owen, Proudhon). Não podia por si só escapar ao cír culo de uma representação ideológica de seus fins e de seus meios de ação — e sabemos que, através da ideologia pequeno-burguesa moralizante e utopista, e portanto reformista, esta re presen pres entaç tação ão ideológic ideológicaa era er a e perm pe rman anec ecia ia domi nada pela ideologia dominante, a ideologia da burguesia. As organizações oper op erár ária iass socialsoci al-dedemocratas continuam até hoje prisioneiras desta tradição reformista ideológica. Para conceber a doutrina científica do socia lismo, eram necessários recursos de cultura filo sófica e científica e capacidades intelectuais ex cepcionais. Era preciso um sentido extraordiná rio da necessidade de romper com as formas ideo lógicas para escapar à sua influência e descobrir o terreno do conhecimento científico. Esta des coberta, esta fundação de uma ciência e de uma filosofia novas, foi obra do gênio de Marx, mas também de um trabalho encarniçado a que êle dedicou todas as suas forças e sacrificou tudo, no meio da pior miséria. Engels prosseguiu sua obra e Lênine deu a ela um nôvo impulso. Esta dou trina científica foi, no curso de uma longa e pa ciente luta, importada de fora para o movimento operário até então sob o domínio da ideologia, e transformou suas bases teóricas. 2. O segando grande gra nde princípio princíp io se refer ref eree à natureza da união histórica que foi assim estabe lecida entre a teoria científica de Marx e o mo vimento operário. Esta união histórica, que do mina tôda a história contemporânea com seus efeitos, foi tudo menos um acaso, ainda que fe liz. O movimento operário existia antes de Marx conceber sua doutrina; sua existência, portanto, nao dependeu de Marx. O movimento operário é uma realidade objetiva, produzida pela própria necessidade da resistência, da revolta e da luta econômica e política da classe operária, produ^da, por sua vez, como classe explorada, pelo mo do de produção capitalista. Ora, constatamos êste ato histórico indiscutível, que não somente re sistiu sistiu p piores piores provas provas (liquid (liquidação ação da Comuna Comuna -e - aris, guerras imperialistas, liquidação das or ganizações da classe operária na Itália, Alema
mais importante do movimento operário adotou corno doutrina a teoria científica de Marx e a aplicou com êxito tanto em sua estratégia e em sua tática, quanto em seus meios e formas de organização organiz ação e de luta. lut a. Esta Es ta adoção adoção não se deu sem dificuldades. Foram necessários dezenas e dezenas de anos, de experiência e de provas, e também de lutas, para que a história consagras se esta adoção. E ainda hoje a luta continua; a luta entre as concepções ideológicas chamadas “espontâneas” da classe operária, as ideologias reformistas anarquizantes, blanquistas, voluntaristas etc., e a doutrina científica de Marx e de Lcnine. Contudo, se o movimento operário adotou a doutrina científica de Marx contra suas tendên cias ideológicas “espontâneas”, que renascem sem cessar, e se adotou por sua própria vontade, sem que força alguma no mundo lha tenha im posto, posto, é porque uma um a necessidade necessid ade prof pr ofun unda da pres pr esi i diu a esta adoção, vale dizer, à união do movi mento operário com a doutrina científica de Marx, Esta necessidade reside ünicamente no fato de que Marx produziu o conhecimento obje tivo da sociedade capitalista, de que êle compre endeu e demonstrou a necessidade da luta de classes, a necessidade e o papel revolucionário do movimento operário, e proporcionou assim ao movimento operário o conhecimento das leis ob jetiv je tivas as de sua su a existência, exist ência, de seus fins fin s e de sua ação. E foi porque o movimento operário reco nheceu na doutrina marxista a teoria objetiva de sua existência e de sua ação, porque reconheceu na teoria marxista a teoria que lhe permitia ver claramente a realidade do modo de produção ca pita pi tali list sta, a, ver com com clareza clare za suas sua s próp pr ópria riass lutas, foi foi porque reconheceu reconh eceu pela pe la experi exp eriênc ência ia que esta es ta dou do u trina era verdadeira e dava à sua luta um fun damento e meios objetivos realmente revolucio nário ná rios: s: foi foi porque se se conheceu por p or meio dela del a que que se reconheceu nela. Foi a verdade científica da teoria marxista que selou em definitivo sua união com o movimento operário e tornou esta união definitiva. Nada neste fato histórico é re sultado de um acaso: tudo aí, ao contrário, re sulta da necessidade e de sua inteligência. 3. O terceiro tercei ro gran gr ande de princípi prin cípio o diz diz respeito ao processo pelo qual esta união foi finalmente produzida prod uzida e pelo pelo qual deve ser m anti an tida da,, refo re for r çada e ampliada sem cessar. Se esta “importa ção” da teoria marxista demandou um processo tao longo e tantos esforços, é justamente porque necessitou de um longo trabalho de educação e de formação na teoria marxista de um lado, e ao mesmo tempo de uma prolongada luta ideológica. 44
de outro. Foi preciso que Marx e Engels conven cessem pacientemente os melhores militantes operários, os mais conscientes e abnegados, da necessidade de abandonarem as bases ideológicas existentes e adotarem as bases cientificas do so cialismo. Êste longo trabalho de educação assu miu inúmeras formas: ação diretamente política de Marx e Engels, formação teórica de militantes na própria luta (durante o período revolucioná rio dos anos de 48 e 49), publicações científicas, conferências, propaganda etc., e naturalmente, de um modo muito rápido, desde que as condições pa p a ra isso isso foram for am reunidas, reun idas, medidas de orga or ganiz niza a ção no plano nacional e mais tarde no plano in ternacional. É possível, dêste ponto de vista, en carar a história da Primeira Internacional como a história da grande luta travada por Marx, En gels e seus partidários para fazer triunfar no movimento operário os primeiros princípios fun damentais da teoria marxista. Mas, ao mesmo tempo e ao lado dêste trabalho de educação e de formação na teoria científica, Marx, Engels e seus partidários se viram obrigados a travar uma grande, paciente mas rude luta contra as ideolo gias que dominavam então o movimento operá rio e suas organizações, e contra a ideologia re ligiosa, política e moral da burguesia. Formação teórica de um lado, luta ideológica de outro, eis duas formas absolutamente essenciais, duas con dições absolutamente essenciais que presidiram à transformação profunda da ideologia espon tânea do movimento operário — duas tarefas que não cessaram nunca, e não cessam de impor-se como tarefas vitais, indispensáveis à existência e ao desenvolvimento do movimento revolucioná rio no mundo, e que condicionam hoje a passa gem ao socialismo, socialismo, con constr struç ução ão do socialismo socialismo e mais tarde condicionarão a passagem ao comu nismo. Formação teórica, luta ideológica — duas no ções que devemos examinar agora em detalhe. VII FORMAÇÃO TEÓRICA E LUTA IDEOLÓGICA O problema que examinaremos agora é dis tinto do problema da natureza da ciência mar xista, das condições de exercício e de desenvolvi mento de sua prática teórica. Supomos agora que a ciência marxista já existe como uma verdadei ra ciência viva, que continua crescendo e enri quecendo-se com novas descobertas, relacionadas 45
com as questões levantadas pela prática do mo vimento operário e pelo desenvolvimento das ciências. Consideramos a ciência marxista como existente, como possuidora, em um momento da do de seu desenvolvimento, de um corpo definido de princípios teóricos, de análises, de demons trações científicas e de conclusões, isto é, de co nhecimentos. E nos fazemos a seguinte pergun ta; com que meios podemos e devemos fazer pas sar esta ciência ao movimento operário, com que meios podemos fazer passar esta doutrina cien tífica à consciência e à prática das organizações da classe operária? Para responder a esta questão, é necessário retroceder novamente, desta vez para examinar em que consiste a prática do movimento operá rio em geral, independentemente do caráter cien tífico dos princípios que lhe foram trazidos por Marx. A partir do momento em que o movimento operário adquiriu certa consistência e se dotou de um mínimo de organização, sua prática foi submetida a leis objetivas, fundadas nas rela ções de classe da sociedade capitalista e ao mes mo tempo na estrutura d equalquer sociedade. A prá p ráti ticc a do movimento movime nto operário, mesmo mesmo em suas formas de organização utopistas e reformistas, se desenvolve em três planos, correspondentes aos três “níveis” que constituem a sociedade: o plano econômico, o plano político e o plano ideológico Esta lei, além do mais, não é própria ao movi mento operário: aplica-se a todo movimento po lítico, seja qual fôr a sua natureza social e quais quer que sejam seus objetivos. É claro que a na tureza de classe dos diferentes movimentos ou part pa rtid idoo s políticos faz co com m que as formas form as de exis tência desta lei geral variem consideràvelmente, mas a lei se impõe a todos os movimentos polí ticos, até em suas variações. A ação do movimen to operário toma pois, necessariamente, a forma de uma trípUce luta: luta econômica, luta polí tica e luta ideológica. Sabe-se que a primeira a se desenvolver foi a luta econômica, de início de forma esporádica, depois cada vez mais organizada. Em O Capital, Marx nos mostra que as primeiras fases da luta econômica do proletariado es desenvolveram sôbre vários temas, dos quais os mais improtantes fo ram: a luta pela diminuição da duração da jor nada de trabalho,a luta pela defesa e pelo au mento do salário etc. Outros temas econômicos intervieram em seguida na história do movimen to operário; luta pela estabilidade do emprêgo, luta pelo seguro social, luta por férias remune46
radas etc. Em todos êsses casos, trata-se de uma luta levada a cabo sôbre o terreno da exploração econômica, portanto, ao nível das relações de produção. E sta st a lu luta ta corresponde à p rá ráti ticc a ime im e diata dos trabalhadores, aos sofrimentos que lhes impõe a exploração econômica de que são víti mas, à experiência direta desta exploração e à compreensão direta, nessa experiência, do fato econ econôm ômico ico da exploração exploração.. Na gra grande nde ind indús ústri triaa moderna, os trabalhadores assalariados, concen trados pelas formas técnicas da produção, perce bem di dire reta tam m en ente te a relação rela ção de classe de ex expl plora ora ção econômica e vêem no patrão capitalista aquêle que os explora e se beneficia com essa explo ração. A experiência direta do trabalho assala riado e da exploração econômica é incapaz de propor pro porcio ciona narr o conhecime conhe cimento nto do doss mecanismos econômicos do modo de produção capitalista — mas é suficiente para que os assalariados tomem consciência de sua exploração, e travem e orga nizem sua luta econômica. Esta luta desenvolveu-se no noss sindicatos oper operários, ários, qu quee fora foram m criados pe pe los próprios operários sem o auxílio da ciência marxista: êstes sindicatos podem subsistir e lu tar sem o auxílio da ciência marxista, e é por isso que a ação sindical constitui o terreno pre dileto do reformismo econômico, isto é, de uma concepção que espera da luta econômica sozinha a transformação revolucionária da sociedade; é esta concepção trade-unionista, sindicalista apolítica, que alimenta no movimento operário a tradição anarco-sindicalista de desprêzo à polí tica. Foi neste sentido que Marx pôde dizer que o trade-unionismo, isto é, a organização da luta econômica sôbre bases reformistas e a redução de tôda a luta do movimento operário à luta eco nômica, constitui 0 ponto máximo, o ponto-limi-| te da evolução do movimento operário “abando nado na do”” às suas próprias fòrças. fòrças. i Entretanto, a luta econômica choca-se sem pre, queira quei ra ou não, co com m re realid alidade adess políticas, qu quee intervém diretamente e violentamente no curso da luta econômica, ainda que seja apenas sob a forma da repressão às manifestações de protes to, greves e revoltas da luta econômica operária pelas fôrças do Estado e do dir direito eito burguês: a po po lícia, o exército, os tribunais etc. Daí a experiên cia, produzida pela própria luta econômica, da necessidade de uma luta política, distinta da luta econômica. Aqui as coisas se complicam, porque os trabalhadores assalariados não podem ter da realidade política uma experiência comparável à que têm, em sua prática quotidiana, da realidade da exploração econômica, dado que as formas de intervenção do poder político de classe, com exce47
ção de suas manifestações de violências abertas mas interminentes, são muito amiúde dissimula das sob a cobertura do “direito” e das justifica ções jurídicas e morais ou religiosas da existên cia do Estado. Estado . É po porr isso isso que a classe op oper erár ária ia tem muito mais dificuldade para conceber e or ganizar sua luta política do que sua luta eco nômica. Para travar e organizar esta luta sôbre seu verdadeiro terreno, é necessário ter reco nhecido, pelo menos parcialmente, a natureza e o papel do Estado na luta de classes, a relação que existe entre a dominação política e sua co ber b ertu tura ra jurí ju rídi dica ca de um lado, lado, e a exploração eco eco nômica de outro; para isso é necessário algo mais que a simples experiência interminente e cega de certo número de efeitos da existência do Estado de classe; é preciso um conhecimento do meca nismo da sociedade burguesa. Neste domínio, as concepções “espontâneas” do proletariado, que presidem a suas açõe açõess políticas, são consideràvelmente influenciadas pelas concepções burguesas, pelas categor cat egorias ias jurídic jur ídicas, as, políticas e morais da burguesia. Da Daíí o utopismo, o anarquis anarq uismo mo e o reformismo político que se pode observar não so nos inícios da luta política do movimento operário, mas em tôda a sua história. Êste Êste anarquismo e êste reformismo político se perpetuam e renas cem sem cessar na classe operária sob a influên cia da pressão das instituições e da ideologia da burguesia. Em seus esboços de luta política, e nos pró prios limites de desta sta luta lu ta,, o movimento operário se choca assim com realidades ideológicas, domiminadas pela ideologia da classe burguesa. Esta é a razão do terceiro aspecto da luta do movi mento operário: a luta ideológica. Nos conflitos sociais, o movimento operário, como todos os ou tros movimentos políticos, tem a experiência dêste fato; tôda luta implica a intervenção da ‘cons ciência” dos_ homens, tôda luta gera um conflito entre convicções, crenças, representações do mundo. Também a luta econômica e a luta polí tica implicam êsses conflitos da luta ideológica. A luta ideológica não se limita, portanto, a um domínio particular: através da representação que os homens fazem de seu mundo, de seu lugar, de seu papel, de sua condição e de seu futuro, a luta ideológica abraça o conjunto da atividade dos ho mens, o conjunto dos campos de sua luta. A luta ideológica está em tôda parte, já que não se dis socia da concepção que os homens fazem de sua condição em tôdas as formas de sua luta, e por conseguinte não se separa das idéias com que os homens vivem e pensam a sua relação com a so ciedade e com seus conflitos. Não pode haver luta
econômica ou política sem que os homens enga jem ne nela la suas idéias, ao mesmo mesmo tempo que suas fôrças. Contudo, a luta ideológica pode e deve ser considerada também como a luta em um domínio próprio pró prio:: o domínio da ideologia, ideologia, das idéias idé ias reli re li giosas, morais, jurídicas, políticas, estéticas, filo sóficas. Dêsse aspecto, a luta ideológica é uma luta distinta das outras formas de luta: tem por objeto e terreno a realidade objetiva da ideolo gia, e por meta libertar êste dominio, tanto quan to possível, da dominação da ideologia burguesa e transformá-lo para colocá-lo a serviço dos interêsses do movimento operário. Considerada dêste ponto de vista, a luta lu ta ideológica ideológica é também tam bém uma luta específica, que se exerce no domínio próprio da ideologia e deve levar em conta a natureza dêsse terreno, a natureza e as leis da ideologia. Sem o conhecimento da natureza, das leis e dos mecanismos específicos da ideologia, sem o co nhecimento das distinções interiores à ideologia, da predominância de uma região sôbre as outras, dos diferentes graus (não-teorização, teorização) da existência da ideologia, sem o conhecimento da natureza de classe da ideologia, sem o conhe cimento da lei da dominação da ideologia pela ideologia da classe dominante — a luta ideoló gica é conduzida às cegas, podendo-se obter re sultados parciais, mas jamais resultados profun dos e definitivos. É nêste domínio que aparecem do modo mais nítido os limites das possibilidades naturais, “espontâneas” do movimento operário, já j á que a luta lu ta ideológica “espo “es ponn tâne tâ nea” a” da classe classe operária, por falta do conhecimento científico da natureza e da função social da ideologia, é con duzida sôbre a base de uma ideologia submetida à influência insuperável da ideologia da classe burguesa burg uesa.. É no domínio da Itua ideológica ideológica qu quee se faz sentir acima de tudo a necessidade de uma intervenção exterior: a da ciência. Esta interven ção se revela ainda mais importante porque, co mo acabamos de ver, a luta ideológica acompa nha tôdas as outras formas de luta, e é portan to absolutamente decisiva para tôdas as formas de luta da classe operária, pois a insuficiência das concepções ideológicas do movimento operá rio abandonado a si mesmo produz a concepção anarquista, anarco-sindicalista e reformista de sua luta econômica e política. Podemos resumir esta análise da seguinte maneira: A própria natureza do movimento operário, independentemente de qualquer influência da teoria científica de Marx, engaja-o em uma trí49
plice luta lu ta:: luta lu ta econômica, luta lu ta política, luta lu ta ideológica. Na unidade dessas três lutas distintas, a orientação geral da luta é fixada pela represen tação que 0 movimento operário tenha da natu reza da sociedade e de sua evolução, dos fins a atingir e dos meios a pôr em prática. A orienta ção geral depende, portanto, da ideologia do mo vimento operário. É esta ideologia que comanda diretamente a concepção que êle tem de sua luta ideológica, portanto a maneira como êle a con duzz p ara du ar a tran tra n sfor sf orm m ar a ideol ideologi ogiaa existente. existente. É esta ideologia que comanda diretamente a con cepção que êle tem de sua luta econômica e polí tica, de suas relações mútuas, e por conseguinte a maneira como conduz estas lutas. A êste nível, porta po rtant nto, o, tudo dep depende ende do conteúdo da ideologia ideologia do movimento operário. operá rio. Ora, sabemos que esta es ta ideologia permanece prisioneira das categorias fundamentais (religiosas, jurídicas, morais e po líticas) da classe burguesa dominante, até na ex pressão que a ideologia “espon “esp ontâ tâne nea” a” da classe operária dá a sua oposição à ideologia burguesa dominante. Tudo depende, então, da transformação da ideologia da classe operária: de uma transforma ção que arranque a ideologia da classe operária à influência da ideologia burguesa, para subme tê-la a uma nova influência, a da ciência mar xista xi sta da socie sociedad dade. e. É precisame preci samente nte neste ponto que se funda e justifica a intervenção da ciência marxista no movimento operário, e a união da ciência marxista e do movimento operário. E é a próp pr ópria ria n atu at u reza re za da ideologia ideologia e de suas leis que determina os meios apropriados para garantir a transformação da ideologia “espontânea” refor mista do movimento operário em uma ideologia nova, de caráter científico e revolucionário. É a necessidade desta transformação da ideo logia existente, em primeiro lugar na própria classe operária, depois nas camadas sociais que lhe são naturalmente aliadas, que permite com pree pr eend nder er a n atu at u reza re za dos meios de desta sta tra tr a n s form fo rmaa ção: a luta ideológica e a formação teórica. Êsses meios constituem dois elos decisivos da união da teoria marxista com o movimento operário, por tanto da prática do movimento operário mar xista. A luta ideológica pode ser definida como a luta travada no domínio objetivo da ideologia, contra a dominação da ideologia burguesa, para a transformação da ideologia existente (ideolo gia da classe operária, ideologia das classes que podem se tom to m a r suas aliad al iadas as)) em um sentido senti do que sirva aos interêsses objetivos do movimento ope50
^íbli
rário em sua luta pela revolução e mais tarde em sau luta lu ta pela construçã con strução o do do socialism socialismo. o. A luta lu ta ideológica ideológica é uma luta lu ta na n a ideologi ideologia. a. Mas pa p a ra ser se r trav tr avaa d a sôbre uma um a base .justa .justa,, supõe co- mo condição absoluta o conhecimento da teoria científica de Marx, supõe portanto a formação teórica. Por conseguinte, êsses dois elos, luta ideo lógica e formação teórica, embora sejam ambos decisivos, não estão num mesmo plano; do ponto de vista de sua natureza, implicam uma relação de dominação e de dependência: é a formação teórica que comanda a luta ideológica, que é sua base teóric teó ricaa e prát pr átic ica. a. Na p r á tic ti c a da ação quoti qu oti diana, a formação teórica e a luta ideológica in teragem constantemente e necessariamente: po de-se então ser tentado a confundi-las e portanto a desconhecer sua diferença de princípio, ao mesmo tempo que sua hierarquia. Por isso é ne cessário, do ponto de vista teórico, insistir ao mesmo tempo na distinção de princípios existen te entre a formação teórica e a luta ideológica e na prioridade de princípio da formação teórica sôbre a luta idelógica. Foi pela formação teórica que a doutrina de Marx pôde penetrar no movimento operário e é pela forma for maçã ção o teórica teó rica perm pe rmaa nent ne ntee que ela con con tinua a penetrar e íortalecer-se no movimento operário. A formação teórica é uma tarefa essen cial das organizações comunistas, uma tarefa perm pe rman anen ente, te, que deve deve ser prosseguida prossegui da sem tré tr é gua, e que deve ser atualizada constantemente, levando em conta os desenvolvimentos e os enri quecimentos da teoria científica marxista. Con cebe-se muito facilmente que esta formação teó rica tenha sido absolutamente indispensável no passado pass ado p a ra g a n h a r o movimento operário operár io p a ra a teori te oriaa científi cien tífica ca de Marx. Marx. Concebe Concebe-se -se talvez talvez menos nitidamente sua importância hoje, quan do a teoria de Marx inspira diretamente as mais importantes organizações da classe operária e a vida inteira dos países socialistas. Contudo, a des peito dêstes dêste s resultad resu ltados os históricos histór icos espetacular espet aculares, es, nossa tarefa teórica não terminou, nem pode ter minar jamais. Quando dizemos que a ideologia da classe operária foi transformada pela teoria marxista, isto não pode significar que a classe operária, que outrora era “espontâneamente” re formista, se tenha hoje e definitivamente torna do marxista. Só a vanguarda da classe operária, sua parte mais consciente, possui uma ideologia marxis ma rxista. ta. A grande massa da class classee operária operári a acha-se ainda em parte submetida a ideologias de caráter reformista. E na própria vanguarda da classe operária existem grandes desigualdades nos graus de consciência teórica. Na vauguarda 51
da classe operária, só os melhores militantes pos suem, pelo menos no domínio do materialismo histórico, uma verdadeira formação teórica e os investigadores capazes de fazer progredir a teo ria científica marxista. È, portanto, esta cons tante desigualdade no grau de consciência teó rica que fundamenta a existência de um esfor ço renovado sem cessar e sem cessar posto em dia de formação teórica nas próprias organiza ções marxistas atuais. É também esta realidade que exige uma concepção exata, tão rigorosa mente definida quanto possível, da formação teórica. Por formação teórica entendemos o proces so de educação, de estudo e de trabalho, pelo qual um militante é posto na posse não só das conclu sões das duas ciências da teoria marxista (ma terialismo histórico, materialismo dialético), não só de seus princípios teóricos, não só de algumas análises e demonstrações de detalhe, mas de todo o conjunto da teoria, de todo o seu conteúdo, de tôdas as suas análises e demonstrações, de todos os seus princípios e de tôdas as suas conclusões, em sua su a ligação cientí cie ntífic ficaa indissolúv indissolúvel. el. Entendemos Entend emos formação teórica, portanto, ao pé da letra, como um estudo e uma assimilação aprofundada de tô das as obras científicas de primeira importância sôbre as quais repousam os conhecimentos da teoria marxista. Podemos, para representar êsse objetivo, empregar a propósito uma fórmula ad mirável de Spinoza. Spinoza dizia que a ciência das meras conclusões não é ciência; que a ver dadeira ciência é a das premissas (princípios) e das conclusões no movimento integral da de monstração de sua necessidade. A formação teó rica, longe de ser uma iniciação às simples con clusões, ou aos princípios de um lado e às con clusões de outro, é a assimilação profunda da de monstração das conclusões a partir dos princi pios pios,, a assimilação da vida prof pr ofun unda da da ciência em seu espírito e em seus métodos. A verdadeira formação teórica faz quem a recebe e adquire pa p a r til ti l h a r do espirito espiri to científico científic o qu quee co cons nstitu tituii a ciência, e sem o qual ela jamais teria nascido, nem conseguiria jamais desenvolver-se. A forma ção teórica é, portanto, uma coisa completamen te diferente da simples formação econômica, po lítica ou ideológica: estas últimas formações de vem ser graus prévios à formação teórica, devem ser esclarecidas por ela e fundadas sôbre ela, mas não podem ser confundidas com ela, porque não passam pas sam de graus grau s parciais. parci ais. P a ra dizer as coisas coisas de uma forma prática, não há formação teórica ver dadeira sem o estudo da ciência marxista (teoria da história, filosofia marxista) na sua existência 52
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mais pura, não só nos textos de Lênine, mas na obra em que todos os textos de Lênine se baseiam e à qual remetem sem cessar: O Capital de Karl Marx. Não é possível formação teórica verdadei ra sem um estudo atento, refletido e profundo do maior texto de teoria marxista que possuímos, e que está longe de já nos ter revelado tôdas as suas riquezas. É possível, sem dúvida, considerar a forma ção teórica assim definida como um ideal que não é accessível a todos, tendo-se em conta por um lado as enormes dificuldades teóricas que repre senta a leitura e o estudo d’0 Capitai, por outro lado o grau de formação intelectual dos militan tes, sem esquecer enfim o tempo limitado que êles podem co cons nsag agra rarr a êsse êsse traba tra balho lho.. Pode-se e deve-se absolutamente encarar concretamente os graus sucessivos e progressivos da formação teó rica, e deve-se dosá-los segundo os homens e as circunstâncias. Mas esta dosagem, para ser pe sada e realizada, supõe o efetivo reconhecimento da formação teórica, de sua natureza e de sua necessidade, supõe um conhecimento absoluta mente claro do objetivo último da formação teó rica: formar militantes capazes de se tornarem um dia homens de ciênci ciência. a. Para Pa ra alcanç alc ançar ar êste êste objetivo, não se pode olhar alto demais, e é vi sando à altura exata, que se poderá definir exa tamente os graus da progressão que pode condu zir a êsse objetivo, os graus e os meios apropria dos. Por que dar tanta importância à formação teórica? Porque ela representa o elo intermediá rio decisivo, que possibilita ao mesmo tempo de senvolver a teoria marxista e desenvolver a in fluência da teoria marxista na prática inteira do par p artid tidoo comunista, comun ista, e p o rta rt a nto nt o possibilita possib ilita a tra tr a n s formação profunda da ideologia da classe opera ria. Esta dupla razão é que justifica a importân cia excepcional que os partidos comunistas atri buíra bu íram m n a sua su a histó hi stóri riaa passad pas sada, a, e devem devem a t r i buir n a sua su a hist hi stór ória ia pres pr esen ente te e futu fu tura ra,, à form fo rma a ção teórica. É, com efeito, por meio de uma for mação teórica bem concebida que militantes, se ja qual fôr sua origem socia social,l, podem torn to rnaa r-se r- se intelectuais no sentido forte do têrmo, isto é, ho mens de ciência, capazes de fazer progredir ^dgum dia a investigação teórica teóric a marxis ma rxista. ta. E é também por meio do conhecimento preciso da ciência marxista-leninista, representado pela for mação teórica, que é possível definir e realizar a ação econômica e política e a luta ideológica do Partido (seus objetivos c seus meios) sôbre a ba se da ciência marxista-leninista. 53
Partido não se contenta em proclamar sua fidelidade aos princípios da ciência marxista-leninista. O que o distingue radicalmente das ou tras organizações operárias não é esta simples proclam pro clamação ação:: é a aplicação concreta, concre ta, práti pr ática ca,, da teoria científica marxista em suas formas de or ganização, em seus meios de ação, em suas aná lises científicas das situações concretas. Não se contentar em proclamar princípios, mas aplicá-los em seus atos — eis o que distingue o Partido das outras organizações operárias. Enfim, o que distingue o Partido é que, embora reconhecendo a especificidade e a necessidade da teoria, da prá p ráti ticc a teórica teóri ca e d a investigação teórica, e as condições próprias de sua vida e de seu exercí cio, o Partido se recusa a reservar, como um mo nopólio, o conhecimento da teoria para alguns especialistas, para alguns dirigentes e intelec tuais — ficando então sua aplicação prática abanbonada aos demais militantes. Muito ao con trário, 0 Partido quer, em conformidade com a próp pr ópria ria teoria teo ria marx ma rxist ista, a, unir un ir o mais ampla am plame men n te possível a teoria com sua aplicação prática, em proveito nao na o só da p ráti rá tica ca mas ma s também tam bém da teoria teo ria — e é esta es ta a razao raza o por que que êlíj deve deve querer que rer este es ten n der 0 mais largamento possível a formação teó rica ao maior número possível de militantes e educá-los constantemente na teoria, para que êles tenham ao mesmo tempo condições de ser militantes no sentido pleno do têrmo, capazes de analisar e compreender a situação em que devem agir e de assim ajudar o Partido a definir sua política, polític a, mas també tam bém m capazes de fazer faz er em sua próp pr ópria ria p ráti rá tica ca as observaçõe observaçõess novas e as expe riências novas que servirão como matéria-prima já j á elabora elab orada, da, sôbre a qual tra tr a balh ba lhar arão ão outros outro s mi litantes mais formados e os melhores teóricos e investigadores marxistas. o
Dizer que tôda a orientação e todos os prin cípios de ação do Partido rejiousam sôbre a teo ria marxista-leninista, e dizer por outro lado que a experiência prática da ação política das mas sas e do Partido é indispensável ao desenvolvi mento da teoria, é afirmar uma verdade funda mental, que só tem sentido se assumir uma for ma concreta, se um vínculo real e fecundo fôr criado nos dois sentidos, através das medidas de organização necessárias, entre a teoria e seu de senvolvimento de um lado, o a prática econômi ca, política e ideológica do Partido de outro. Criar êste vínculo nos dois sentidos, é a tarefa do Partido. O primeiro elo, absolutamente decisi vo, dêsse vínculo é a formação teórica mais apro fundada possível do maior número possível de militantes. 54
Em tódas essas matérias, é tão indispensável conceber a unidade de conjunto do processo orgânico que liga nas duas direções a teoria científica e a prática revolucionária, quanto a distinção específica dos diferentes momentos e a articulação desta unidade. Esta dupla concepção é indispensável, acabamos de ver, por razões positivas, ao mesmo tempo teóricas e práticas. É igualmente indispensável para previnir confusões negativas, tanto no campo da teoria quanto no campo da prática. Cairiamos no idealismo, puro e simples, se separássemos a teoria da prática, se não déssemos à teoria uma existência prática, não só em sua aplicação, mas tam bém na nass formas form as de organização organizaç ão e de educação que assegurem a passagem da teoria à prática e sua realização na prática. Cairiamos no mesmo idealismo se não permitíssemos que a teoria, em sua existência própria, se nutrisse de tôdas as experiências, de todos os resultados e de tôdas as descobertas reais da prática. Mas cairiamos em uma outra forma também grave de idealismo, o pragma pra gmatism tismo, o, se não reconhecéssemos reconhecéssemos a especificidade insubstituível da prática teórica, se confundíssemos a teoria com sua aplicação, se tratássemos, não em palavras, mas de fato, a teoria, a investigação teórica e a formação teórica como puros e simples auxiliares da prática, como “servas da política”, se voltássemos a teoria ao puro e simples comentár com entário io da p ráti rá ticc a política imediata. ime diata. Nestas duas formas form as de ideali idealismo smo,, vemos claramente que aos êrros de concepção res pondem diret dir etam amen ente te consequências p ráti rá tica cass n e fastas, que podem alterar gravemente, como a história do movimento operário mostrou e mostra ainda, não só sua própria prática, que pode tombar no sectarismo ou no oportunismo — mas também a própria teoria que pode ser abandonada à estagnação ou à regressão do idealismo dogmático ou pragmático. CONCLUSÃO A distinção justa entre a formação teórica e a luta ideológica é, portanto, essencial para não se cair em confusões que decorrem tôdas, em última instância, de se tomar a ideologia pela ciência, e portanto de se reduzir a ciência à ideologia. E assim, ao fim de nossa análise, reencontramos o grande princípio de que partimos: a distinção entre a ciência e a ideologia. Sem esta dis55
tinção, é impossível compreender a especificidade própria do marxismo como ciência, a natureza da união do marxismo e do movimento operário e tôdas as consequências teóricas e práticas que daí decorrem. Queremos deixar bem claro que esta análise, dentro de seus limites, não poderia ser exaustiva; que foi necessário simplificar e esquematizar e que fica em suspenso um número grande de pro blemas blem as impo im porta rtant ntes es.. Esperamos, de qualquer qualq uer modo, que ela possa dar uma idéia justa da importância decisiva da distinção entre a ciência e a ideologia, e da luz que esta distinção node lançar sôbre tòda uma série de problemas, teóricos e práticos, que as organizações operárias e populares marxistas têm que enfrentar e resolver em sua luta pela revolução e pela passagem ao socialismo. mo.
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o MARXISMO
É
UM
HUMANISMO?
Raymond Domesgue
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A questão do humanismo é atualmente uma das preocupações maiores dos intelectuais mar xistas. O Partido Comunista Francês lhe deu uma dimensão oficial com as resoluções da Reunião do Comitê Central em Argenteuil, de 11 a 13 de mar ço de 1966. Contudo, não se trata de um proble ma nóvo. É uma interrogação permanente dentro e fora do marxismo.
O “HOMEM TOTAL” DE GARAUDY Um breve retrospecto. — Limitemo-nos à história recente. A última guerra mundial põe a questão do humanismo na ordem do dia de modo dramá tico. O nazismo instala sua loucura no coração do Ocidente. A humanidade faz a experiência de ve rificar que 0 homem do século XX é capaz de in ventar e de justificar horrores como o genocídio dos judeus, os campos de concentração, as câma ras de gás. Isto levanta perante tôdas as consciên cias a questão do homem. Então, que é o homem? Que deve ser? Que significa ser homem? O huma nismo se torna um tema da moda. Em 1946, SARTRE pronuncia sua famosa con ferência de vulgarização: O Existencialismo é um Humanismo. No outono do mesmo ano, MARTIN HEIDEGGER escreve a Jean Beauffret a Carta so bre o Humanismo. No ano seguinte, em 1947, MERLEA LEAU-PO U-PONT NTY Y pu publ blic icaa Humanis Humanismo mo e Terr Te rror or.. No mesmo ano, EMANUEL MOUNIER faz o balanço de suas pesquisas sôbre o tema no manifesto Que é o personalismo? Os teólogos católicos não esca pam ao movimento. Em 1948, o pa padr dree DE LUBAC publica O Dram Dr amaa do Humanismo Human ismo Ateu. teu. S imul im ulta ta neamente, JEAN MOUROUX conclui seu Sentido Cristão do Homem. Estas obras pÕem em questão, direta ou indi retamente, 0 marxismo. Há, sem dúvida, diferen ças e matizes entre elas, mas tôdas afirmam certo primado prim ado do “homem” “homem ” e acusam acu sam o marxismo marxis mo de s a crificar a “subjetividade” ou a “pessoa” aos impe rativos do “primado da economia”, às exigências da luta de classes, à disciplina do Partido. O mar xismo, argumentam, nega ou coloca em segundo plano pla no a interio int eriorid ridad adee e a liberdade liberdad e individual indi vidual;; não é, portanto, plenamente um “humanismo”. Os intelectuais marxistas tentam algumas res postas. E ntre nt re outros, em 1945, R. MAUBLANC, O
Marxismo e a Liberdade, ROGER GARAUDY, O Comunismo e a Moral. Em 1946, PIERRE HERVÉ, “O Homem Marxista”, na obra coletiva Os Gran des Apêlos do Homem Contemporâneo, LUC SO- MERHAUSEN, O Humanismo Atuante de Karl Marx. Em 1947, JEAN KANAPA, O Existencialismo não é Humanismo. Em 1948, G. LUCKACS, Existencialismo ou Mpxismo? Mas os intelectuais marxistas de então não sabem ou não podem dar uma resposta proporcional às contestações; suas respostas não têm o alcance necessário para a abertura de um grande debate teórico. A “apologética” marxista de Garaudy. — A “guer ra fria” e as aberrações stalinistas tornam fáceis as acusações de anti-humanismo lançadas con tra 0 marxismo. Para ficar apenas na esfera dos autores de obediência cristã, podemos mencionar; em 1953, PIERRE BIGO, Marxismo e Humanismo; em 1955, JEAN LACROIX, Marxismo, Existencia lismo, Personalismo; ainda em 1955, ETCHEVERRY, O Conflito dos Humanismos, em 1956, CALVEZ, O Pensamento de Karl Marx. O tom destas obras de um modo geral é diferente dos ensaios mais “compreensivos” dos anos anteriores, como Significação do Marxismo, de C. H. DESROCHES. Os acontecimentos sangrentos de Budapest e a insegurança teórica nascida do processo de “desestallnização” multiplicam ainda mais os ata ques. Os intelectuais comunistas se sentem acua dos. Endurecem suas posições e se refugiam em certo dogmatismo. Êste recuo intensifica a crise de consciência de alguns, que se tornam “hereges” e abandonam o Partido. Em 1956, PIERRE HERVÉ pu publ blic icaa A Revolução e os Fetich Fetiches. es. Em 1958, HENRI LEFEBVRE rompe com o Partido por po r causa ca usa da pub publicaçã licaçãoo de Problemas Problem as Atuais do Marxismo. Em 1959, é a vez de FOUGEYROLLAS com O Marxismo em Questão. Os intelectuais comunistas devem defender -se. É preciso provar que o marxismo é um huma nismo; mais ainda, que é o único humanismo realmente aceitável. ROGER GARAUDY se entre ga a esta tarefa de maneira tõda particular. Em 1957, pu publ bliica Human um anis ism mo Marxi Mar xissta. ta. Em 1959, em Perspectivas do Homem, tenta mostrar que tôdas as questões levantadas pelas correntes fi losóficas contemporâneas conduzem inevitàvelmente ao marxismo. Para GARAUDY, portanto, não se trata de insistir num afrontamento estéril: o objetivo é chegar ao coração do existencialismo e do pen samento católico para aí encontrar os pontos de 60
contacto com o marxismo. Èle escreve: “O balan ço de nossa pesquisa do homem, do homem total, não nos parece negativo. Êle o seria se nos en contrássemos em presença de pensamentos irredutivelmente opostos ou mesmo indefinidamente paralelos, paralelos , sem possibilidades de encontro enco ntros. s. Ora, parec pa recee possível possível discernir, discer nir, en entr tree as diversas do dou u trinas contemporâneas, malgrado uma oposição fundamental ligada às perspectivas de classe, ele mentos de convergência” (1). Perspectivas do homem. — Esta convergência não tem valor em si mesma. Ela é interessante por que significa a existência de um fim único; “o homem total”. Na introdução de seu livro, GARAUDY 0 declara explicitarnente: Esta obra “se esforça para extrair, da análise crítica do existencialismo, do pensamento católico e do mar xismo, as convergências possíveis num esforço co mum p ara ar a apreen apr eender der o homem tota to tal” l” (2). (2). Há Há,, por conseguinte, conseguint e, u m a cara ca ract cter erís ísti tica ca unive uni versal rsal:: esta procura da realização total do homem. Êste “homem total” não está dado, não existe já pron to: êle se procura, êle se descobre, êle se cons trói. Cada escola de pensamento é a expressão desta procura; representa uma imagem, uma aproximação, uma “perspectiva” do “homem to tal”. Ainda que diferentes ou mesmo opostas, elas manifestam certos pontos de convergência. Ora, o marxismo é o humanismo verdadeiro porque se en enco cont ntra ra nu num m a situa situaç.ã ç.ãoo privileg priv ilegiad iadaa em face das outras filosofias. Sua superioridade decorre de seu caráter “dialético”, que o rorna capaz de integrar tôdas as descobertas humanas. “Uma crítica interna e compreensiva pode pelo menos sugerir o movimento dialético pelo cp.ial o marxismo, porque reflete a dialética objetiva, consegue superar, integrando-as, as contribuições mais vivas de nossa época à concepção do ho mem” (3). Não Não se t r a t a ap apen enas as de uma um a apologética. Olhando-a mais de perto, uma tal démarche im plica nu num m a concepção do humanism hum anismo. o. Para começar, ela rejeita uma visão “essencialista” dos homens e do mundo. Uma concep ção “essencialista” é uma concepção que afirma quee existe qu existe uma “naturez “natu rezaa h u m a n a ” anterior^ anterior^ ao desenvolvimento histórico e independente dele. Esta natureza humana permanente pode ser co nhecida pela inteligência. Adquirido êste conhe cimento, apreendida a “essência” do homem, tra ta-se de adaptar a esta definição as ações e as escolhas dos diversos seres humanos. O humanis 61
mo se toma então “dedutivo”: sabe-se o que é o homem; aplica-se êste saber à vida. De maneira mais simbólica: possui-se a maqueta do homem, trata-se simplesmente de providenciar para que a construção seja a mais conforme possível ao modèlo pré-estabelecido. Para GARAUDY, ao contrário, o homem se realiza passo a passo, à custa de descobertas progressivas que é preciso integrar e aplicar. Existe um futuro humano. O humanismo, nesta ótica, é tarefa do próprio ho mem, que deve em cada etapa encontrar sua ver dade, seu equilíbrio, sua plena expansão. O hu manismo é uma invenção perpétua. Segunda característica: não é no domínio das idéias que se joga o destino do humanismo. Isto porque 0 céu das idéias não existe. Não há um terreno próprio, um firmamento separado da ter ra e da vida, que seja o lugar da filosofia. A filo sofia não tem consistência em si mesma. Ela só tem realidade em função da prática. Deve, para não ser uma simples atividade estética, recusar o divórcio com a vida. “Ligar sempre mais estreita mente a teoria e a prática” (4). A superioridade do marxismo é que, para êle, êste divórcio é teòricamente impossível. A alma da filosofia marxis ta é a dialética “objetiva” (5). “Precisamente porque a dialéti dia lética ca objetiva obje tiva do mundo em desen des en volvimento é sua alma viva, é da natureza do marxismo jamais fechar-se num sistema, mas desdobrar sem fim uma dialética criadora que permite perm ite ap apree reend nder er o homem tota to tal,l, com suas di di mensões subjetivas e históricas, e acolher, como momentos de sua pesquisa, tôdas as conquistas do pensame pens amento, nto, da ação e das a r tes te s ” (6). Existe, por conseguinte, uma correspondên cia entre as leis da natureza e as leis do conhe cimento e da ação humana. O humanismo não é uma esfera à parte, separada do real. Suas ta refas incluem todos os domínios: econômico, ci entífico, entífico, político, político, cu cult ltur ural al etc. É tudo isso qu quee constitui o homem. O homem deve, portanto, bus car a si mesmo e se realizar em tudo isso e por tudo isso isso.. O human hum anism ismoo é a reconciliação em marcha entre o homem e a natureza, e en tre os homens. O humanismo não é aaplicação de uma doutrina ou de um dogma. E um movimento, a realização prática do poder que o homem possui de tornar seus todos os bens do passado pass ado e do prese pre sente nte em vista de um futuro fut uro mais completo. completo. O human hum anism ismoo nã nãoo é uma ortodoxia, nem uma dogmática. É uma busca, o exercício histórico da capacidade humana de assimilação e de síntese, sempre em vista de uma superação ulterior. 62
Isto explica o lugar primordial que o “diálo go” ocupa na démarche de GARAUDY; “Os con frontos de pensamento, as contradições, mesmo se não se consegue ainda resolvê-las, podem ser um meio meio de emulação emulaçã o e de cresci crescime ment nto. o. Só o diálogo entre filosofias é um lugar privilegiado do método dialético. O diálogo é o instrumento necessário do movimento do homem em direção ao homem total”. O homem total. — Esta expressão retorna sempre em GARAUDY. Ela designa o alvo, o horizonte do movimento movi mento que é o hu huma manis nismo mo.. Se se pode atribuir uma finalidade à série de conquistas que é o humanismo, esta finalidade é o “homem to tal”. Contudo, GARAUDY não dá um nome a êste “homem “h omem tota to tal”, l”, nem lhe descreve descreve os traços. traç os. Se quisermos saber mais precisamente o que êle en tende por êste têrmo — que antes de mais nada é muito vago — podemos consultar uma de suas obras mais recentes, seu estudo sóbre Hegel, Deus está morto (PUF, 1962). O último capítulo desta obra se intitula: “A filosofia do espírito e o ho mem total”. Aí é exam.inada a concepção hegeliana da história. Segundo GARAUDY esta con cepção pode ser reduzida a três características maiores: 1) A histór his tória ia é o resultado resu ltado da ação e do t r a balho; 2) O desenvolvimento desenvolvimento nã nãoo se efet ef etua ua de uma maneira linear, mas dialética, e o progresso é fi lho das contradições, das lutas, das crises, das revoluções; 3) Fruto Fru to do do trabalh trab alhoo e da luta, a histó his tória ria é necessariamente una. Ela é um conjunto que pro gride orgânicamente, um encadeamento racio nal, porque só existe um princípio, o qual se ex prime n a política, n a religião, religião, n a arte, art e, n a m ora or a lidade, na economia. Estas formas não passam da expressão de uma realidade única. É por isso que a história tem um sentido e pode ser objeto de ciência. Mas, acrescenta GARAUDY, estas teses estão radicalmente comprometidas porque Hegel lhes dá uma interpretação idealista. Êle assimila inde vidamente o “histórico” ao “lógico”. Todo o pro cesso histórico é compreendido como uma passa gem do abstrato ao concreto: falta alguma cotsa ao abstrato; esta falta leva cada momento abs trato à aspiração de um completar para ter acesso G3
à totalidade. Ora, esta totalidade, em Hegel, não é “aberta”. Ela está fixada e bloqueada no estado do mund mu ndoo ao tempo temp o de Heg egel. el. “Sua concepção historicamente grandiosa do homem total se en contra bruscamente restringida pelos limites de classe dêste humanismo que pretende parar a história no momento da dominação burguèsa” (8).
“A inversão ateista do hegelianismo por Feuerbach e a inversão materialista do hegelia nismo por Marx iriam logo em seguida rebentar a estreiteza especulativa do idealismo hegeliano sob 0 impulso da própria história que não podia conservar-se presa na “jaula da idéia hegeliana” e que rompeu os seus limites: depois de se ter reconhecido que não existia nada fora da cria ção contínua do homem e de sua história, era impossível parar a história em qualquer uma de suas realizações” (9). “As revoluções do século XIX provaram a infinitude da praxis humana: o evolucionismo, a infinitude do desenvolvimen to criador da matéria em todos os níveis, da físi ca à biologia” (10). O humanismo marxista se diz um humanis mo verdadeiro porque pretende assimilar e supe rar dialèticamente todas as conquistas huma nas. Êle se apresenta como o único caminho para o homem total. Êste homem total é o homem to tal hegeliano mas “invertido”, isto é, enraizado não n a idéia mas na realidade realidade materia m ateriall — e “aberto”, isto é, fundado na infinitude das posi bilidades hu hum m an anas as e mater ma teriais iais.. O humanis hum anismo mo marxista para GARAUDY é um humanismo sem limitação de horizonte. Um movimento sem che gada definida. Uma busca, guiada pela con.sciência de uma infinidade de superações possíveis. II O “ANTI-HUMANISMO TEÓRICO” DE ALTHUSSER A coexistência pacífica entre o Leste e o Oes te, a efervescência provocada nos meios cristãos pelo Co Conc ncilio ilio Ecumênico Ecumênico,, o desenvolvimento do processo processo de desestali des estalinizaç nização ão nos pa parti rtido doss comu com u nistas ocidentais, mudam o clima da contestação entre ent re marxistas ma rxistas e não-marxista não-m arxistas. s. Em ge geral ral,, o afrontamento já não se faz a partir de verdades dogmáticas acabadas. Os “diálogos” se multipli 64
cam; procura-se pesquisar em comum. Paralela mente, cada campo se questiona internamente. Nascem Nascem contrové cont rovérsias rsias e n tre tr e intele int electu ctuai aiss m arxi ar xis s tas. E assim, assim, é do inte in terio riorr mesmo mesmo do marxismo que vai ressurgir, com uma intensidade nova, a questão do humanismo. Que se deve entender por humanismo socialista? Ê possível um humanismo socialista? socialista ? Ao fim, fim, são teóricos m arx ar x ista is tass qu quee terminam por recusar ao marxismo a etiqueta de “humanismo”. Pode-se falar de um “humanismo socialista”? — O filósofo marxista francês LOUIS ALTHUSSER é um dos polos desta controvérsia. Publica na re vista italiana Crítica Marxista um estudo sòbrc Marx e o humanismo. Reeditado na França nos Cahiers de 1’Institut des Sciences Economiques Appliquées, o artigo produz simplesmente uma tempestade. A revista comunista La Nouvelle Cri tique, em seu número de março de 1965, aprovei ta a ocasião e abre um debate que se prolonga por po r um ano inteiro. inte iro. Un Unss quinze artigos, artig os, alguns alg uns importantíssimos, aparecem sôbre o tema. E tudo conduz a um amplo colóquio dos filósofos marxis tas e ao Comitê Central de 1966, inteiramente consagrado aos “problemas ideológicos e cultu rais”. Mas afinal, qual é a posição de ALTHUSSER? Em seu artigo, êle começa por descrever um processo processo que teve início com a experiê expe riência ncia so viética atual. Na URSS, com efeito, assiste-se a uma proliferação de palavras de ordem huma nistas: “tudo pelo homem”, “liberdade indivi dual”, “dignidade da pessoa”. Parece, portanto, que a acusação tradicional de anti-humanismo prof pr ofer erid idaa co cont ntra ra o marxismo marxi smo perde perd e seu fun fu n d a mento. O marxismo na sociedade comunista rus sa reencontra a preocupação da interioridade, da subjetividade. A pessoa volta ao primeiro plano. A URSS seria a demonstração prática da argu mentação apologética descrita acima. Esta cons tatação faz nascer um esquema de explicação que distingue duas etapas na realização do homem socialista. À etapa da revoluç.ão, da ditadura do prole tariado, da instauração das bases do socialismo, cori'esponde o humanismo do proletariado que se liberta: “o humanismo proletário”. Humanismo de classe, humanismo da dureza e do combate, vol tado para a obra comum a realizar, e que coloca 65
em segundo plano — sem negá-los — os proble mas pessoais. Edificadas as bases do socialismo, eliminadas da sociedade as classes antagônicas, o “humanis mo socialista da pessoa” pode fazer sua aparição. Operada a revoluç revolução ão das estru es trutu tura ras, s, o homem pode pode ocup ocupar-se ar-se de si mesmo esmo,, en enqu quan anto to indiví indi ví duoo ... du .. . No No encad enc adeam eamento ento destas des tas duas etapas eta pas,, enconenco ntrar-se-ia a confirmação da profecia de Marx: “O comunismo enquanto naturalismo acabado é igual a humanismo”. ALTHUSSER reage contra êste esquema e outi’os semelhantes. Reage como filósofo, como teó rico: “Não basta registrar o acontecimento e re gistrar os conceitos (humanismo, socialismo) nos quais 0 acontecimento se pensa a si mesmo. É preciso subme sub meter ter à prova prov a os títulos títu los teóricos do doss conceitos para ver se êles nos dão de fato um verdadeiro conhecimento científico do aconteci mento. Ora, Ora, a expressão expressão humanismo humanis mo socialista encerra uma desigualdade teórica chocante: no contexto da concepção marxista o conceito de so cialismo é um conceito científico, mas o conceito de humanismo não passa de um conceito ideoló gico” (11). Os conceitos de “humanismo” e de “socialismo” decorrem de dois sistemas de pen samentos diferentes, de dois níveis opostos. Um decorre da ciência, o outro da ideologia. Voltare mos mais adiante a esta distinção que é um dos eixos maiores do debate. ALTHUSSER vai se ex plicar pli car recorrendo recorrend o a Marx. arx. itinerário de Marx. — Para ALTHUSSER, há três etapas na evolução do pensamento de Marx. 1) Uma prim pr imeir eiraa etap et apaa “h u m a n ista is ta”. ”. O ,iovem Marx combate a censura, o despotismo prus siano. Êste combate, êle o fundamenta e justifica por meio meio de uma um a concepção do homem. Marx es es tá então muito perto de Kant e de Fichte. Define 0 homem como liberdade e razão. Critica a cen sura como negação da liberdade e as leis feudais por serem an antiti-rac racio iona nais is.. 2) Uma segunda etapa etap a “hu “hum m an anist ista”. a”. Marx Marx descobre Feuerbach. Aceita sua definição do ho mem como um “ser comunitário”. Nesta ótica, o homem só é êle mesmo em comunhão com os ou tros homens homen s e co com m a nature nat ureza. za. O homem só é liberdade e razão em sua relação e por sua re lação com seus semelhantes e com as coisas. Êle O
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é em seu princípio mesmo “comunitário”, intersubjetividade concreta, amor, fraternidade, “ser genérico”. É sôbre esta base que está fundada a teoria da “alienação”, categoria fundamental dos Manuscritos de 1844. Como ilustração desta démarche animada pelo conceito da alienação, to memos o trabalho humano. O homem é homem em e por sua relação com a natureza. O trabalho é a relação privilegiada do homem com a natu reza. É por êle que o homem adapta a natureza a suas necessidades e a seus fins: o trabalho hu maniza a natureza, mas também humaniza o ho mem. O homem se exprime, exerce seu poder, se realiza nesta dominação da natureza. No traba lho o homem exerce seu poder criador, sua cons ciência, sua liberdade, sua vontade. Ora, em re gime capitalista, o fruto do trabalho do homem se torna um objeto exterior ao homem e estra nho ao homem. O operário não tem nenhum di reito sôbre o produto de seu trabalho. O automó vel que êle fabrica não tem nenhuma referência a éle. O produto do trabalho é um mundo estra nho ao trabalhador, um mundo que o afronta co mo um inimigo. O homem que trabalha se toma estranho a si mesmo, se aliena em e por seu tra balho. Tôda ação políti pol ítica ca toma, tom a, então, sentido senti do a pa p a r t i r dêste divór divórcio cio.. É preciso co cons nstru truir ir um mundo em que o operário não se aliene em seu trabalho, onde êle possa de uma maneira ou de outra se apropriar do fruto de seu trabalho. Nu ma ótica mais ampla, o objetivo da revolução é “restituir ao homem sua natureza alienada na forma fantástica do dinheiro, do poder e dos deu ses”. Esta definição da revolução supõe, como se vê, uma definição do homem; setá baseada numa natureza humana. Constitui uma démarche “hu manista”. 3) A p a r ti r de 1845, Marx rompe rom pe com tôda tô da teoria que fundamenta a história e a política em uma definição prévia do homem, em uma “essên cia humana”. Rejeita a problemática de tôda a filosofia anterior e instaura uma problemática inteiramente nova. Realiza uma “ruptura epistemológica”. Esquemàticamente, epistemologia é o estudo dos métodos de conhecimento. Ela se aplica prin cipalmente ao estudo dos métodos do conheci mento científico. Assim Brunschvicg estudou e desenvolveu as formas do pensamenot matemá tico. Há ruptura epistemológica quando se opera uma mudança radical na problemática e no mé todo de conhecimento de um setor da realidade. 67
Antes de Marx, abordava-se a história partindo-se de uma definição prévia do sujeito humano. Marx recusa esta problemática “humanista” e êste método de conhecimento, e inventa outra pro blemá ble mátic ticaa e outro método, de c a r á ter te r “cient “cie ntíf ífi i co”. ALTHUSSER explica: “A prática teórica de uma ciência se distingue nitidamente da prática teórica ideológica de sua pré-história: esta dis tinção toma a forma de uma discontinuidade discontinuidade qualitativa teórica e histórica que podemos desig nar com Bachelard pelo termo de ruptura epistemológica” (12). A ruptura epistemológica que Marx realiza em 1845 lhe permite desembarcar na terra firme da ciência. ciência. Ela inclui também necessariamente necessariam ente uma crítica das posições anteriores. Marx critica radicalmente a pretenção de fundamentar tudo num conhecimento da essência humana. O hu manismo é uma ilusão. Êle se liga não ao domí nio da ciência, mas ao domínio da ideologia. A invenção da história como ciência por Marx re vela a verdadeira natureza do humanismo; êle não é ciência, mas ideologia. Donde Donde a conclu conclusã sãoo de ALTH ALTHUS USSER SER:: “Do “Do ponto de vista vis ta estrit est ritoo da teoria, teor ia, podemos podemos e deve mos abertamente falar de um anti-humanismo teórico de Marx e ver neste anti-humanismo teó rico a condição de possibilidade absoluta (nega tiva) do conhecimento (positivo) do mundo hu mano, e de sua transformação prática. Só pode mos conhecer alguma coisa a respeito dos ho mens com uma condição (absoluta): reduzir a cinzas o mito filosófico (teórico) do homem. To do pensamento, portanto, que se valesse de Marx pa p a r a r e s tau ta u r a r de uma um a m a neir ne iraa ou o utra ut ra uma antropologia ou um humanismo teórico não se ria teòricamente mais do que cinzas” (13). Estamos ao nível da teoria, ou seja, da ten tativa do homem para conhecer. Com seu anti-humanismo teórico, ALTHUSSER não quer di zer que é preciso desprezar na vida quotidiana o homem, a pessoa. Êle não define o marxismo co mo uma recusa de considerar as necessidades materiais, intelectuais, culturais dos indivíduos. Êle se situa ao nível do conhecimento. O concei to de humanismo designa certamente um con jun ju n to de realidades, realida des, mas ma s não perm pe rmite ite conhecê-las cientificamente, explicá-las. Partir de uma definição do homem, é regredir, é recuar a uma etapa pré-cientifica. 68
Pode-se falar de uma ruptura epistemológica no pens pe nsam amen ento to de Marx? — ALTHUSSER baseia bas eia o “anti-humanismo teórico” de Marx na novidade teórica radical do marxismo: novidade que é fru to de uma “ruptura epistemológica” entre a “fase humanista” e a “fase cientifica” de Marx. Esta ruptura torna-se, portanto, ura dos pontos de po larização do debate atual entre intelectuais mar xistas. Assim, Assim, JORGE SEBPRU SEBPRUN N escreve escr eve (14): (14): “A formulação de ALTHUSSER exige várias obser vações. Em primeiro lugar, tõda concepção dos progressos do pensa pen same mento nto como como rup ru p tura tu rass ou s a l tos qualitativos, malgrado sua aparência dialé tica, é contestável. O pensam pen samen ento to mais justo, mais racional (isto é, mais adequado à compreen são e à transformação real no mundo) não é ja mais uma revelação, mas uma elaboração onde a praxis pra xis repr re pres esen enta ta um pape pa pell mais ou me me nos importante (em Marx, êste papel foi de cisivo). Na análise cultural e ideológica, a noção de ruptura deve ser manejada com um cuidado extremo, se se quiser evitar os extremismos... Em segundo lugar, é evidente (uma simples críti ca filosófica dos textos o provaria imediatamen te) que não é em 1845 que Marx rompe radical mente com tõda teoria que fundamenta a histó ria ri a e a políti pol ítica ca num nu m a essência essê ncia do do homem omem.. .. Com semelhante teoria êle rompeu muito antes, e bem radicalmente”. Não Não vamos e n t rar ra r n a guerr gu errilh ilhaa dos dos debate deb atess em tôrno dêste segundo ponto. Saber se foi em 1845, antes de 1845 ou depois de 1845 que ocorreu uma mudança teórica capital no pensamento de Marx é um problema muito importante, mas se ria preciso um quadro multo mais largo do que êste artigo para abordá-lo eficazmente. Quanto ao primeiro ponto, SEMPRUN con testa a idéia de ALTHUSSER de uma “ruptura epistemológica” em nome de uma concepção di ferente do progresso do pensamento. O pensa mento não evoluiria por “saltos” ou “rupturas”, como diz ALTHUSSER, mas por uma “elabora ção” em que a “praxis” desempenha um “papel ’. Esta palavra “elaboração” nos parece bem vaga e imprecisa. Pode recobrir tudo. De qualquer mo do, acreditamos, está bastante afastada das con cepções tradicionais do marxismo que afirmam que Marx “inverteu Hegel”, “repôs a filosofia so bre os pés”. pés ”. O próprio SEMPRUN adm ad m ite que que Marx rompeu com uma ótica essenciallsta. 69
Achamos o conceito de “elaboração” muito fra co para designar esta mudança. Pois nos parece inteiramente possível que uma lenta maturação, “uma elaboração em que a prática desempenha um papel”, leve a produzir uma teoria que, na história do pensamento, corresponda reahnente a um “rup “ru p tura tu ra epistemológica”. Além lém disso isso,, SEMPRUN atribui a ALTHUSSER uma posição que êste jamais defendeu, a posição de uma rup tura que correspondesse a uma “revelação”; ALTHUSSEB jamais escreveu que a “ruptura” se explicaria por uma “revelação”. SEMPRUN, por tanto, parece-nos que passa ao lado do verdadei ro problema levantado por ALTHUSSER. Sem fazer referência explícita ao problema da “ruptura”, GENEVIEVE NAVARRI parece enga jar ja r-ss e nu num m a via inte in term rmed ediá iári riaa (15): “N “Não ão leio leio os Manuscritos como LOUIS ALTHUSSEH, que escre ve: “Do ponto de vista da dominação radical da filosofia sôbre um conteúdo que logo se tomaria radicalmente independente (a economia), o Marx mais afastado de Marx é êste Marx dos Manus critos econômico-filosóficos”. Não vejo nos Ma nuscritos a dominação radical da filosofia, mui to menos de uma filosofia da essência do homem, pois pois o que p a ra mim é evidente eviden te é êste conteúdo (de que fala ALTHUSSER, mas ao qual não dá nenhuma atenção), um conteúdo ainda impreciso mas que já é um saber”. Para ela, não há unida de teórica teór ica nos nos Manuscritos. Manuscritos. Querer encon enc ontra trarr uma unidade teórica, sob a forma de uma filo sofia da essência, é não compreender as “ques tões reais” de Marx. Ora, o que mais importa são estas questões. “Creio que o essencial para uma ciência é justamente êste momento em que uma questão real é colocada” (pág. 71). “Certamente, em um primeiro momento estas questões podem ser colocadas de maneira pré-científica, em uma linguagem tomada de empréstimo às teorias, às filosofias existentes; mas o essencial é que as ver dadeiras questões estão colocadas. Esta apreen são do verdadeiro problema é que põe em marcha o movimento da teoria estrita, a qual — por mais necessária que seja — não é senão um segundo momento” (pág. 71). Nos Manuscritos, a ausência de unidade teórica é justamente o índice de pre sença de um conteúdo novo. “É êste conteúdo nôvo que encontrará sua verdadeira forma na teoria acabada, na teoria da maturidade” (pág. 72). “Trata-se de uma es pécie de pré-sa pré -saber ber,, de uma um a aproximação aproxim ação do sa sa ber: d ian ia n te do ôlho j á nô nôvo vo de Marx, Marx, h á o ho70
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mem-mercadoria” (pág. 77). Donde a conclusão; “É preciso conservar a unidade dialética da obra de Marx: unidade de conteúdo, discontinuidade epistemológica” (pág. 76). A posição de GENEVIÈVE NAVARRI baseia -se, portanto, numa distinção entre o “conteúdo” e a “expressão” dêste conteúdo, entre o conteú do e as formas teóricas empregadas para trans crevê-lo. Daí a possibilidade de falar em “rup tura epistemológica”, guardando uma continui dade no conteúdo. Que valor tem esta distinção? Mais precisamente, qual é a natureza dêste con teúdo? Pode existir certa independência do con teúdo em relação às formas teóricas que o expri mem? Ao nível psicollgico, isto parece possível: todos experimentamos a dificuldade de encontrar as palavras exatas para traduzir nossos pensa mentos; mas não é disso que se trata aqui, esta mos a outro nível. A unidade de conteúdo signi fica que Marx teve sempre em vista o mesmo ob jetivo: con conhecer hecer melhor, compreender comp reender melhor melho r o homem? Ge é isto, continuidade de conteúdo é a mesma coisa que identidade de objeto d epesquisa, 0 que deve acarretar a afirmação de que há continuidade de conteúdo entre tôdas as inter rogações sôbre o homem: é a evacuação^ do pro blema. blema. A con continu tinuidad idadee esta es tari riaa no “gênio” de Marx, neste “olhar nôvo” que lhe permitia colo car as verdadeiras questões, as questões decisi vas? Ainda aqui o problema continua intocado pois pois,, se nã nãoo quisermos quisermos tom to m ba barr n a mitologia, mitologia, é preciso preciso e n co cont ntra rarr uma um a explicação p a r a êste “olhar nôvo”. Em suma, esta distinção entre o conteúdo e sua expressão teórica nos parece ne bulosa demais. demais. ALTHUSSER, em Pour Marx, critica uma po sição bem semelhante à de GENEVIÈVE NAVARRI: a posição dos qu eexplicam a evolução do pensam pen samento ento de Marx pe pelo lo recurso à contradiç cont radição ão entre conteúdo e forma, conteúdo e linguagem. Êle vê nesta posição uma atitude dialética (GE NE NEVIÈV IÈVE NAVARRI escrev escreve: e: “É preciso preciso co conse nser r var a unidade dialética da obra de Marx”). Mas esta dialética é a da “forma” e do “conteúdo”, vale dizer, que “é a abstração mesma do proble ma que é apresentada como sua solução”. Uma tal démarche corresponde especificamente à sis temática hegeliana; é, portanto, tipicamente pré-marxista. Tocamos aqui o nó do problema. Apoiado em contribuições de teóricos recentes como BACHE71
LARD, LÉVI-STRAUSS, FOUCAULT etc., ALTHUSSER tenta uma nova leitura de Marx. Es ta nova leitura deveria permitir identificar me lhor a contribuição científica, ao nível da teoria, do autor de O Capital. Ao tentar esta leitura, ALTHUSSER revoluciona a problemática tradicio nal do marxismo. Os que tentam defender a visão tradicional só podem fazê-lo atualmente na ótica antiga: travam o combate a um nível que é es tranho ao de ALTHUSSER e por isso êste pode fàcilmente reenviá-los a suas próprias fontes. O problema proble ma é, po porta rtant nto, o, sabe sa berr se estas est as fontes, es tas descobertas recentes são válidas e, neste ca so, se devem provocar uma redescoberta de Marx e um salto à frente do marxismo. O marxismo vive sua “crise modernista”. Uma nova compreensão do é “teoria”. — AL THUSSER tenta dar uma compreensão mais es trita do que é a teoria, o conhecimento humano sistemático. Vamos tentar resumi-la em grandes traços. _ 1) É preciso preciso ab aban ando dona narr a concepção concepção empirista do conhecimento humano. Esta concepção põe põe em cena cen a um “ob obje jeto” to” que é conh conhecido ecido e um “sujeito” que conhece. Para conhecer, o sujeito faz uma operação chamada “abstração”: êle “abstrai”, tira do objeto real sua “essência”. Isto implica que o objeto real possui em si mesmo, de uma maneira ou de outra, duas partes reais: a essência que a inteligência apreende e uma gan ga que envolve e esconde esta essência. O ato de conhecimento tem por finalidade separar os dois elementos que existem no objeto real, o essen cial e o inessencial. Quem reflete sòbre esta démarche percebe que ela implica uma confissão. “Quando o em pirismo designa n a essência essên cia o objeto do conheci conhe ci mento, êle confessa uma coisa muito importante que nega no mesmo momento: êle confessa que o objeto do conhecimento não é idêntico ao ob jeto real, po pois is êle co cons nsti titu tuii sòmente uma um a p arte ar te do objeto real” (16). 2) Portan Po rtanto, to, é preciso distinguir disting uir objeto real e objeto de conhecimento. Spinoza, um dos pri meiros filósofos da história, estabeleceu esta dis tinção. “Marx, no capítulo III da Introdução de 57, retomou esta distinção com tôda a fôrça pos sível” (17). Esta distinção, é preciso fazê-la não só para os objetos, mas também para os proces sos de produção dêsses objetos. Os objetos reais 72
têm um modo de produção próprio, uma gênese real. Os objetos de pensamento têm um modo de produção próprio própr io que não corresponde à sua su a gênese real. Aqui, tudo se passa no interior do processo do conhecimento, em um outro plano, em uma outra ordem. 3) O que acabou acabo u de ser dito implica a n e cessidade de considerar o conhecimento como prodnção. Uma ciência produz — no sentido forfo rte do têrmo — um objeto que não existia antes. Ela faz alguma coisa. O conhecimento não é um fenômeno de leitura ou de visão. É um ato de produção. 4) É po possív ssível el,, então, esquematiz esquem atizar ar a elaboração ou produção teórica em três momentos. Uma matéria prima, que não é o objeto real (matéria bruta), mas êste objeto real já transformado (por uma prática teórica ou ideológica anterior) em objeto de pensamento! por exemplo: os conceitos de “produção”, “trabalho”, “troca”). Esta matéria prima é chamada por ALTHUSSER Generalidade I (18). O resultado ou produto: a transformação da generalidade I em uma nova generalidade, em um nôvo sistema de conceitos mais “especificados”. Uma generalidade mais coerente, mais concreta, é obtida. Estamos diante de um nôvo ob jeto jet o de conhecimento. ALTHUSSER SER o ch cham amaa Ge Generalidade III. Um trabalho de produção, a prática teórica, que é reaUzado por alguém. O agente dêste tra balho é um “operário “operá rio”, ”, que utiliza utiliz a co com mo meios meios de trabalho um método e um corpo de conceitos que constitui a teoria da ciência no momento histórico em que o novo conhecimento está sendo produzido. ALTHUSSER chama a esta teoria de Generalidade II. II. Se, como acabamos de ver, tôda ciência tra bal b alha ha a p a r tir ti r de m ater at eria iais is prèvia,mente prèvia,mente elaborados — seja por uma prática ideológica, seja por uma prática teórica — isto equivale a dizer três coisas. Cada ciência elabora seus próprios fatos científicos. Ela 0 faz através de uma crítica dos elementos elaborados por uma prática ideológica precedente. prece dente. Ao elaborar seus próprios fatos científicos, elabora sua su a própria teoria. E assim assim só h á fato 73
científico em relação a um campo científico dado. O processo de avanço do pensamento huma no pode, então, ser descrito assim: “Quando uma ciência já constituída se desenvolve, ela trabalha sôbre uma matéria prima (generalidade I), cons tituída ou por conceitos ainda ideológicos, ou por conceitos já elaborados cientificamente, mas per p erte tenc ncen ente tess a um estágio an ante teri rioo r da ciência ciênci a (generalidade II, ex-generalidade III). III ). O pro pro gresso da ciência é o movimento que faz de uma generalidade I uma generalidade III, a qual se torna uma generalidade I para um nôvo progres so” (19). 5) É capi ca pita tall subl su blin inha harr que em todos todos os c a sos se trata de “generalidades”. Não pode existir objeto radicalmente isolado num processo de pensa pen same mento nto.. Um objeto só existe definido por urn “ca “campo po”” teóric teóricoo ou ideológico complexo. complexo. O próprio pen pensa same mento nto nã nãoo é ne nenh nhum um pod poder er soli tário ou isolado; é uma “estrutura” complexa que combina materiais complexos. “O pensamento de que se trata aqui não é a faculdade de um sujeito transcendental ou de uma consciência absoluta, a que o mundo real se contrapusesse como maté ria; o pensamento não é tão pouco a faculdade de um sujeito psicológico, ainda que os indivíduos humanos sejam seus agentes. Êste pensamento é o sistema històricamente constituído de um aparelho de pensamento, fundado e articulado na realidade natural e social” (20). Esta defini ção do pensamento como sistema, fundado sôbré um momento histórico, e não simples fruio dos sujeitos individuais, tem uma importância decisi va no quadro de um debate sôbre o humanismo, como veremos mais adiante. 6) Don Donde de a conclu conclusão são qu quee a priori prio ri teri te riaa p a recido inaceitável: “Ao pé da letra, não é o ôlho (0 ôlho do espirito) de um sujeito que vê o que existe no campo definido por uma problemática histórica: é êste campo mesmo que se vê nos obje tos ou nos problemas que êle define” (21). A “teoria” e a “prática” segundo ALTHUSSER. — A êste respeito, ALTHUSSER é muito criticado. Tôdas as comunicações — ou quase tôdas — fei tas ao Comitê Central de Argenteuil retomam ês te argumento: a posição de ALTHUSSER é ina ceitável porque conduz a uma dissociação da teo ria e da prática. prátic a. Estamos Estamos diante dian te de um julga julg a mento que volta sem cessar como um refrão. AL74
THUSSER afirma que é a coerência interna de uma ciência que funda a verdade de seus con ceitos. Retruca-se: esta posição nega o papel im porta po rtann te, te , cap ca p ital it al da práti pr ática ca,, quan quando do só a p ráti rá ticc a é que pode verificar um dado científico. ALTHUSSER faz um esforço para dar a maior precisão possível possível aos conceitos empregados. Diz-se: Diz-se: êle só pre p rest staa atenç ate nção ão ao aspecto “form “fo rmal” al” da ciência, nega sua vinculação com o real, dissocia prática e teoria etc. Estas objeções nos pareceríam pertinentes e definitivas se ALTHUSSER tivesse feito uma démarche idealista, construído sua pesquisa sôbre conceitos intemporais, desincamados. Mas não é o caso. Todo seu esforço está explicitamente ani mado pela consideração das condições históricas objetivas nas quais se efetua a operação de pen samento. Êste pensamento, êle o precisa com ve emência, é sem dúvida um “sistema real próprio”, mas não é um sistema sistem a qualquer. É um sistema siste ma “fundado e articulado sôbre o mundo real de uma sociedade histórica dada que entretém determi nadas relações com a natureza” (22). Êle comba te a posição que se volta para um poder de pen samento intemporal, para um “efeito de conhe cimento” originário, com isto se dispensando de estudar sèriamente os mecanismos do movimento atual do conhecimento. Quando Marx quer co nhecer a sociedade que o cerca, a sociedade burguêsa, êle não constrói primeiro a teoria das for mas anteriores da sociedade para daí tirar dedutivamente o conhecimento da sociedade em que viv vive. A inteli int eligên gência cia da sociedade bu burgu rguêsa êsa pass pa ssaa exclusivamen excl usivamente te pelo estudo estud o mais mai s ap apro rofu funn dado possível da estrutura atual da sociedade. Só em seguida e em função dos mecanismos atuais é que se pode tentar compreender as etapas an teriores. Custa compreender como ALTHUSSER pode ser acusado de “formalismo “formal ismo”” quand quandoo desen des en volve êstes princípios. As “formas” a que êle se pren pr ende de são as formas form as do mecanismo mecani smo con contem tempo po râneo, presentemente em ação. O que êle quer, é apreender em sua especificidade as estruturas atua at uais is da sociedade sociedade atual. atu al. Há nisso nisso dissocia dissociaçã çãoo entre prática e teoria? Parece-nos, ao contrário, que há introdução de um laço muito mais vigoroso do que em cer tas exposições tradicionais do marxismo. Sem dú vida, não se percebe êste laço imediatamente. O pensa pen same mento nto de ALTHU THUSSER não nã o permi per mite te a de dedu du ção imediata de palavras de ordem políticas ou 75
sindicais. Êste laço é posto num nível mais fun damental, no nível teórico no sentido forte da pala pa lavr vra. a. Os inte in tele lect ctua uais is marx ma rxis istas tas estão estã o deso rientados por esta novidade. Êles tomaram tão ao pé da letra o famoso axioma da destruição da filosofia por Marx, que parecem incapazes de re conhecer uma démarche propriamente teórica. Contudo, a questão que êles levantam é uma “verda “ver dade deira ira”” questão. Nã Nãoo queremos queremos resolvê-la no lugar dêles. Parece-nos evidente, contudo, que a contestação que fazem, neste plano, a ALTHUSSER é inoperante. Ao lê-los, fica-nos a impres são de que um velho reflexo surge espontanea mente: o reflexo de reconduzir tudo ao nível da ideologia, terreno que ALTHUSSER tenta deses pera pe rada dam m en ente te ab aban ando dona nar. r. O problema da ideologia. — ALTHUSSER pensa que o trabalho que resulta na produção dos ob jetos jeto s de pen pensam samen ento, to, o “efeito de con conhec hecim imen en to”, comprende pelo menos dois sub-objetos: o efeito de conhecimento científico e o efeito de co nhecimento ideológico. O efeito de conhecimnto idológico é, portanto, um autêntico efeito de co nhecimento. Seu ponto de impacto, contudo, é diferente do pont ode impacto do efeito de co nhecimento científico. Na ideologia a função prático-social predomina sôbre a função teórica. A ideologia deve, então, ser compreendida pela fun ção social que preenche. “Qual é a natureza desta função social? Para entendê-la, é preciso remontar à teoria marxista da história. Os sujeitos da história são socieda des humanas determinadas. Elas se apresentam como totalidades, cuja unidade é constituída por certo tipo determinado de articulação interna, po p o rtan rt anto to por um tipo tip o específico específico de complexidade, que põe em ação instâncias que podemos redu zir esquemàticamente, como Engels, a três — a economia, a política e a ideologia. Existe, por tanto, em tôda sociedade uma atividade econô mica de base, uma organização política e formas ideológicas ideológicas (religião, (religião, moral, filosofia filosofia etc. et c.). ). Por conseguinte, a ideologia como tal faz orgânicaniiente_ parte de tôda totalidade social. A ideolo gia não é uma aberração ou uma excrescência contingente da história: é uma estrutura essen cial à vida histórica das sociedades” (23). É possível dar mais um passo na compreen são da função social da ideologia? Certamente. A ideologia “é profundamente inconsciente, mesmo 76
quando se apresenta (como na filosofia pré-marxist xi sta) a) sob sob uma forma reflet ref letida ida.. A ideologia ideologia é, sem dúvida, um sistema de representações. Mas suas representações, na maioria das vezes, não tem nada a vêr com a consciência: em geral, são imagens, às vêzes, conceitos, mas é antes como estruturas que elas se impõem à imensa maioria dos homens, sem passar pela consciência dêles... Os homens vivem suas açõès (comumente rela cionadas pela tradição clássica com a consciên cia e com com a liberdade libe rdade j n a ideolog ideologia, ia, atrav at ravés és da ideologia e pela ideologia... A relação vivida dos homens com o mundo passa pela ideologia, ou antes, antes , é a própria próp ria ideologia,. ideologia, . . Com efeit efeito, o, na ideologia, os homens exprimem não suas rela ções com suas condições de existência, mas a ma neira como vivem suas relações com suas condi ções de existência: o que implica ao mesmo tem po po relação rela ção real rea l e relação relaçã o vivida, vivida, imagin ima ginada ada.. A ideologia é, portanto, a expressão da relação dos homens com seu mundo, isto é, a unidade (sobredeterminada) de sua relação real e de sua relação imaginária com suas condições reais de existên cia. Na ideologia, a relação real é inevitavelmen te revestida pela relação imaginária, e esta rela ção, mais do que descrever uma realidade, ex prime prim e uma um a von vontade tade (conservadora, (conserv adora, conformista, conformista , reformista ou revolucionária), ou seja, uma espe rança ou uma nostalgia” (24). Esta maneira de abordar o problema da ideo logia tem suscitado reações numerosas e varia das. Uma, contudo, nos parece co cons nstan tante. te. Não se aceita a distinção abrupta que ALTHUSSER opera entre ciência e ideologia. Em primeiro lu gar, parece insuportável que, em nome desta dis tinção, se qualifique estritamente de ideologia idéias desenvolvidas num contexto marxista. Es ta atitude pode parecer mais apoiogética do que teórica: no entanto, ela levanta uma questão im po p o rta rt a n te n a tradiç trad ição ão marxis ma rxista. ta. Não se pod podee a t r i buir bu ir o mesmo valor à ideologia ideologia do proleta pro letaria riado do e a quaiquer outra ideologia. Não se deve colo car no mesmo plano a tôdas as ideologias. Entre elas, é preciso fazer um discernimento, uma clas sificação. Certas ideologias participam menos do caráter de ilusão. Estão mais próximas da ciên cia. Que critério empregar para fazer tal divisão? O critério proposto é a referência à classe social de que as ideologias são expressão. Porém, pôsto êste critério, nem por isso o problema está defi nitivamente resolvido. É significativo que esta po sição seja sempre apresentada como um progra ma a realizar, uma pesquisa a empreender, e não 77
um conjimto conjim to de de dados dados j á elaborado elaborados. s. A questão continua ^mplamente aberta.,. Alguns, como GENEVIÈVE NAVARRI, re cusam 0 modo como ALTHUSSER coloca o pro blema. Se se pa part rte, e, escrev escreve, e, da indicação indica ção de ENGELS que afirma que a ideologia pode também ser ativa, chega-se a um impasse. A unidade da ideologia ideologia se desfaz. Encon En conti ti amo-nos amo -nos dian di ante te de uma gama infinita de Ideologias. Para GENEVIÊVE NAVARRI, portanto, é impossível elaborar um conceito único de ideologia que recubra tôdas as ideologias. Esta afirmação é uma escolha teórica que nos parece cheia de consequências. Equivale à recusa de uma posição estritamente teórica do problema. Isto se co conf nfirm irmaa quando ela explicita expl icita sua atitude em relação a ALTHUSSER. Recusa-se a aceitar a indicação que êle propõe de uma “sô brede bre dete term rmin inaçã açãoo do real re al pe pelo lo imag im agin inár ário io”. ”. Tal recusa é fundada, não sôbre argumentos teóri cos ou sôbre uma crítica da posição mesma, mas sôbre a impossibilidade da tarefa que a aceita ção da posição acarretaria, pois “o imaginário comporta em si mesmo a gama que vai do com plet pl etam amen ente te ilusório ao quase verdad ver dadeir eiro” o” (25). Como estamos diante de um dos problemas capi tais ta is do pe pens nsam amen ento to de AL ALTHUSSER — “ a sobredeterminação do real pelo Imaginário” é a defi nição que êle oferece da ideologia —, reencontra mos aqui a mesma recusa já assinalada anterior mente de entrar numa perspectiva profundamen te teórica. A solução que GENEVIÈVE sugere é uma diferenciação sem tentativa de precisão for mal. Como o caso anterior, é muito mais um pro grama que ela traça do que uma elaboração já em curso. No No fundo, êstes argum arg umen entos tos s ebaseiam ebasei am n a questão da “verdade”. “Verdade” da ideologia, “verda “ve rdade” de” do conhecim conhe cimento ento hu huma mano no.. MICH ICHEL SIMON 0 diz explicitamente: “Não se pode esca pa p a r ao problema probl ema d a verdade verd ade (exatid (ex atidão ão ap apro roxi xim m ativa) de tal ou qual representação” (26). Eis-nos de volta à fonte, ao famoso “problema do conhe cimento”, que é um dos eixos da filosofia de todos os tempos. Neste terreno, os intelectuais marxis tas de hoje se encontram desorientados. A teoria do conhecimento baseada no conceito de reflexo, por muito tempo do dom m inan in ante te en entr tree êles êles,, está es tá sen se n do agora abandonada e copiosamente criticada. GARAUDY tenta substituir o conceito de “refle xo” pelo conceito de “modêlo” — conceito de senvolvido recentemente pelo estruturalismo — mas, de acordo com a grande maioria dos filó78
sofos marxistas, esta tentativa é muito ambígua. O próprio de ALTHUSSER é querer superar êsse problema. problem a. P a ra êle, êle, a questão das ga gara rann tia ti a s da possibilidade do conh conhecim ecimento ento é uma questão ideológica. O verdadeiro problema é o do “me canismo da apropriação cognitiva do objeto real por po r meio meio do objeto de con conhec hecim imento ento”. ”. Os ad adve ver r sários de ALTHUSSER se recusam a mudar de terreno como êle. Nenhum o alcança verdadei ramen ram ente. te. Estamos em presença pres ença de um diál diálog ogoo de surdos. III II I O HOMEM, CENTRO DE TODAS AS COISAS? Pelo que sabemos, nenhum intelectual mar xista conseguiu contestar vàlidamente ALTHU SSER SSER até agora. agora. Nenhum o atingiu atin giu sèriamen sèria mente te no coração de seu projeto, que é uma mudança de terreno teórico. Como diz com algum humor MACHERAY, ao falar da resposta de SEMPRUN a ALTHUSSER: há uma ruptura epistemológica entre êles. Há um corte entre ALTHUSSER e seus contraditores. Um nôvo terreno. — Queríamos agora traçar muito esquemàticamente as linhas básicas dêste nôvo terreno. Já tratamos das questões da “teo ria” e da “ideologia”. Resta-nos analizar a ques tão do “humanismo”. Num primeiro tempo his tórico, o conjunto das interrogações sôbre o ho mem, sôbre o sentido da vida — e o conjunto das respostas dadas a estas interrogações — se vin culam à discussão da transcendência divina. Deus é o único recurso para uma explicação do ho mem. Êle é a base da n atur at uree za do homem e a chave de seu destino. A “modernidade” rompe es tes liames entre Deus e o homem. Na idade mo derna, o homem aprende a pensar a si mesmo co mo autônomo. Torna-se o centro de si mesmo e de tôda tôd a a realidade. É preciso preciso p a rtir rt ir do do homem p a ra explicar o homem, a história, a sociedade etc. Marx ultrapassa esta etapa. Para êle, não é do in divíduo, não é do homem que é preciso partir, rnas do “conjunto das relações sociais”. Estas relações são a realidade de base, o fundamento úiií99 bre o qual de deve ve ser co cons nstru truída ída qualquer ciência consequente. 79
ALTHUSSER leva a sério esta afirmação de Marx. Tôda teoria, tôda antropologia que se apoia sôbre dados tais como os “projetos” humanos, as “necessidades” humanas, os “desejos” humanos, tôda construção que parte do homem como fun damento, é uma construção pré-marxista, uma tentativa ideológica. Nisto Nisto êle êle é confir con firma mado do por tôda tôd a uma um a côrte de pesquisadores contemporâneos nos diversos setores da antropologia: na psicanálise (LACAN), na linguistica, na antropologia estrutural (LEVI-STRAUSS). na n a semio semiolo logi giaa (RO (ROLAND BARTHES). BARTHES). O homem não é o “centro” de si mesmo. — AL THUSSER encontra em PREUD confirmação do deslocamento deslocament o teórico operado por Marx. arx. Ma Marx rx acabamos de ver, afirma que o indivíduo humano não pode ser o centro da história. FREUD nos en sina que êste sujeito humano está em si mesmo “descentrado”. ALTHUSSER escreve; “FREUD descobre por sua vez que o sujeito real, o indiví duo em sua essência singular, não tem a figura de um ego, centrado sôbre o eu, a consciência ou a existência. Que o sujeito humano é descentrado, constituído por uma estrutura que também só tem centro no desconhecimento imaginário do eu, isto é, nas formações em que êle se reconhe ce” (27). LACAN, aproveitando-se do surgimento de uma nova ciência, a linguística, pôde dar à des coberta de FREUD um rigor teórico decisivo. Êle traz o testemunho de que as mais importantes aquisições da linguística entram de pleno direito na compreensão do “discurso inconsciente” e do discurso verbal do sujeito e da relação entre êles. As estrturas formais destacadas pela linguística nos oferecem as chaves teóricas do “tornar-se-homem” do pequeno animal humano. Elas es clarecem o processo pelo qual êle pode se afirmar como “eu”, como “sujeito”. Ao mesmo tempo, re velam a ilusão que consiste em dar uma consis tência a êste “eu”, em fazer dêste “eu” um cen tro real. A leitura de FREUD conduz LACAN a denunciar o “eu”, o “sujeito”, a “pessoa” como os “derradeiros fetiches introduzidos no sangue dos santos”. Para LACAN, não há um centro que se ria o eu, senhor de seu discurso, criador de sua realidade, mesm mesmoo imagin ima ginári ária. a. O vocabulário vocabulário da ciência psicanalítica, a ciência que define o in consciente como seu objeto específico, evacua tôdas as palavras da ética, do personalismo e do existencialismo (liberdade, projeto, opção, etc.i. O eu é apenas o lugar da palavra (e não o autor 80
da palavra). É uma unidade imaginária resultan te de identificações mais ou menos alienantes, é um vazio, uma ausência. LACAN demonstra e re pete qu quee 0 homem não está no centro de si mes mo, mas fora de si mesmo. O homem não é o “centro” da economia. — Ler corretamente Marx, diz ALTHUSSER, é recusar 0 conceito de homo economicus, a idéia do hoto, é suficiente retomar uma a uma as grandes mem como sujeito e fim da economia. Para tanregiões do “espaço” econômico. 1) O consumo. consumo. — “Pode parec ar ecer er à prim pr imei eira ra vista que o consumo está centrado sôbre o ho mem, já que sua finalidade é satisfazer às neces sidades humanas. Que se passa de fato? O con sumo é duplo. Inicialmente, designa o consumo dos indivíduos humanos de uma sociedade dada. Mas designa também o consumo produtivo ias matérias brutas, as matérias primas, os instru mentos e as máquinas que são consumidos pelas unidades de produção). Tôda uma parte da pro dução é consagrada não a satisfazer necessidades individuais mas ás necessidades da própria pro dução”. dução ”. Desta distinção distinçã o pode-se pode- se concluir duas coisas. “A proporção existente entre êstes dois con sumos em uma sociedade dada é comandada pela estrutura da produção desta sociedade. Em uma sociedade não-industrializada, o consumo indivi dual é o mais importante. Quanto mais uma so ciedade se industrializa, mais o consumo produti vo se torna importante”. “Por outro lado, o consumo individual é difinido, em última análise, não pela natureza humana, mas pelo nível de renda de que dispõem os indivíduos de uma sociedade dada. As necessi dades não são definidas pelo homem mas por sua solvabilidade: só se consome aquilo que se pode pode pag pagar. ar. Além lém disso isso,, êste consumo individua indiv iduall é função da capacidade técnica da sociedade em um momento dado. É esta capacidade técnica que determina a natureza dos produtos disponíveis, e também, ainda que indiretamente, seu modo de consumo. Portanto, falar de consumo individual é ser remetido às capacidades técnicas de uma so ciedade por um lado, e às relações sociais de pro dução que fixam a repartição das rendas, por ou tro. As necessidades estão submetidas a uma du81
i>la determinação estrutural: a que reparte o pro duto entre o setor I (consumo para a produção) e 0 setor II (consumo individual), e a que atri bui às necessidades seu conteúdo conteúd o e seu sentido (a estrutura da relação entre as forças produtivas e as relações de produção). Esta concepção re cusa, portanto, à antropologia clássica seu papel fundador da economia” (28). 2) A distribu dis tribuição ição.. — ‘‘Também Também a dis d istr trib ibui ui ção se apresenta sob um duplo aspecto: a distri buição das renda ren dass (que remete rem ete às relações relações de pro pr o dução); a distribuição dos valores de uso (pro duzidos pelo processo de produção)”. ‘‘Nos dois casos somos, portanto, remetidos às relações de produção e à própria produção”. Conclusão: como para o consumo, não é o homem o “sujeito” da economia, não é o homem que “funda” a economia, mas a determinação estrutural da produção. Reconhece-se a tese essencial de Marx: é a produção produç ão qu quee comand com andaa o consumo consumo e a distri dis tribu bui i ção, e não o inverso. Mas é preciso entender o que Marx queria dizer. Tentemos precisá-lo ago ra. ra . 3) A produção. — “Tôda produção é carac ra c terizada, segundo Marx, por dois elementos indis sociáveis: 0 processo de trabalho responsável pe la transformação que o homem inflige às maté rias naturais para convertê-las em valôres de uso, e as relações sociais de produção sob cuja deter minação êste processo de trabalho é executado”. O processo de trabalho — a transformação da natureza material é regido pelas leis da natureza e da tecnologia. “Esta determinação do processo de trabalho por suas condições materiais interdiz qualquer concepção humanista do trabalho hu mano como pura criação”. Por outro lado, a aná lise do processo de trabalho põe em evidência o papel do domi mina nante nte do doss “meios de tra tr a b a lho lh o ”. O qu quee distingue uma época econômica de outra é me nos o que se produz do que a maneira de produzir (os “meios de trabalho”). É nesses meios que se baseia a produtiv prod utividad idadee do traba tra balh lhoo hu human mano. o. Isto nos remete ao mesmo tempo às condições mate riais da produção (tecnologia, racionalização) e às relações sociais nas quais a produção se efe tua. 82
Quanto às relações sociais de produção, elas “não são de forma alguma redutíveis a simples relações entre os homens, a relações que só pu sessem em causa os homens e portanto corres pondessem a variações de uma um a m atriz at riz universal, a intersubjetividade. As relações de produção im plicam que que as relações dos homens home ns entr en tree si são determinadas pelas relações existentes entre os homens e os elementos materiais da produção. Em particular, a atribuição ou não-atribuição dos meios de produção aos agentes da produção (existência de proprietários e de operários). Exis tem grupos funcionais que ocupam um lugar de finido na produção (patrões e seu papei, assala riados e seu papel). pap el). Isto supõe supõe a existência de uma superestrutura jurídico-política e ideológica que ratifica o jôgo dêstes grupos. Tôda a super estrutura de uma sociedade dada se encontra as sim implicada e presente de uma maneira espe cífica nas relações de produção”. Conclusão: Conclusão: as relações relações de produção são es truturas. A estrutura das relações de produção determina lugares e funções. Êstes lugares e fun ções são frequentemente ocupados por indivíduos humanos, mas êles só ocupam êstes lugares e funções na medida em que são os portadores des tas ta s funções, funções, n a condiçã condiçãoo de “funcio “fu ncioná nário rios”. s”. Os verdadeiros “sujeitos” não são êstes indivíduos ocupantes ou funcionários (os “indivíduos con cretos”, os “homens reais”), mas a definição e a distribuição dêstes lugares e destas funções. “Os verdadeiros sujeitos são, portanto, as relações de produçã pro dução” o” (29). (29). Em todos os níveis — consumo, distribuição, produção — somos somos remetidos remetido s p a ra “fora “fo ra”” do h o mem, para uma realidade de tipo estrutural a fim de descobrir o sujeito e o fundamento da eco nomia. O homem não é o “centro” da história. — Para não alongar excessivamente êste artigo, não va mos reproduzir passo a passo o raciocínio de ALTHUSSER, mas simplesmente relatar suas con clusões. O marxismo não é um “historicismo”, como interpreta GRAMSCI. A tentação de pensar assim é grande, porque repousa sôbre uma “evidência”: não é a história de fora a fora um fenômeno hu mano? Esta “evidência” repousa contudo, sôbre um singular pressuposto: que os atores da histo ria são os autores de seu texto, os sujeitos de sua 83
produção. Êste pressuposto é um pressuposto ideológico. Êste pressuposto confunde o objeto de conhecimento com o objeto real. A “história” é uma categoria do “conhecer”, não é uma cate goria do “concreto”. Esta Es ta categoria catego ria do do “conhe “conh e cer” nos remete, não ao homem como autor da história, mas a uma estrutura complexa, a uma totalidade social que depende em última anáUse de um modo de produção determinado. Reen contramos o que foi dito no parágrafo preceden te acêrca da economia. “Desde Marx sabemos que o sujeito humano, o ego econômico, político ou filos filosóf ófico ico,, não é o centr ce ntroo da históri hist ória. a. Sabemos Sabemos além disso, contra os filósofos iluministas e con tra HEGEL, que a história não tem centro, mas possui possui uma um a e stru st rutu tura ra que só tem centro cen tro necessá nece ssá rio na perspectiva do desconhecimento ideológi co” (30). A posição de ALTHUSSER sôbre o anti-humanismo teórico de Marx não é simplesmente uma questão de vocabulário. Está alicerçada nos elementos que acabamos de resumir, a saber, que o homem não é nem o centro da história, nem o centro da economia, nem o centro de si mesmo. Portanto, partir do homem como “centro”, é se enveredar por um falso caminho: um caminho ideológico, um caminho anti-cientifico. Garaudy: o “poder criador” do homem. — No ex tremo oposto de ALTHUSSER, GARAUDY coloca resolutamente o homem no centro de tudo. Não certamente o homem individual, mas o homem explicado por sua relação com os outros. Êle parte da frase de Marx: “o indivíduo é o conjunto de suas relações sociais”. Explica-a por uma máxi ma de SAINT-EXUPÉRY: “o homem não passa de um nó de relações”. relações ”. A pessoa pessoa se tor to r n a uma síntese da humanidade: “Desde a primeira re flexão, desde o primeiro projeto, sou habilitado por tõda tõd a a hu huma mani nida dade de passad pas sadaa e a t u a l ” (31 (31). A característica maior do homem assim com preendido preendi do é seu poder criador. cria dor. Esta pa pala lavr vraa vol ta constantemente sob a pena de GARAUDY. Va mos dar alguns exemplos. 1) O ho home mem m se cria ri a a si mesmo, mesmo, eis o se se gredo de sua verdadeira natureza. — O marxis mo é um humanismo verdadeiro. Êle começa pela afirmação “da autonomia do homem, que tem por po r consequência consequênc ia reje re jeit itaa r toda to da ten te n tati ta tivv a de p r i var o homem de seu poder criador e auto-cria84
dor” (32). “O fim último de tôdas as nossas ati vidades, de todos os nossos combates, como mili tantes comunistas, é fazer de cada homem, um homem, isto é, um criador” (33). 2) As realida real idades des econômicas econômic as são o frut fr utoo do do poder criador criado r do homem. — É preciso nã nãoo consi cons i derar as realidades econômicas como coisas, rea lidades “naturais” que existem fora do homem e sem êle; é preciso considerá-las como seres criados pelo homem, quer se trate dos produtos ou das instituições (34). 3) O trabalho, categoria fundamental do marxismo, é o exercício dêste poder criador do homem — “A posição materialista de Marx é bas tante clara: o trabalho é o ato criador que não cria a natureza, mas cria o homem e sua histó ria e sua história no afrontamento do homem com a natureza” (35). 4) A hist hi stór ória ia tem co como mo centro cen tro o poder c ria ri a dor do homem. — “O pior êrro seria acreditar que, para o marxismo, o homem não existe e o que existe é um conjunto de relações sociais, que os homens não são os sujeitos da história mas so mente os efeitos e os suportes de um conjunto de relações sociais, que segundo Marx não há cen tro, sujeitos criadores de sentido, homens que fa zem história, concepção, por muito tempo difun dida pelos adversários do marxismo e hoje reto mada, sob uma forma nova, a partir de certa interpretação da linguística estrutural e do freudlsmo, por ideólogos que se dizem marxistas” (36). O texto tex to visa clara la ram m en ente te a ALTHUSSER SER. E permi per mitete-no noss medir med ir a dist di stân ânci ciaa qu quee sepa se para ra êstes dois pensadores marxistas. Já descrevemos lon gamente a démarche de ALTHUSSER. Ilustremos agora como, a partir de um dado comum (o estruturalismo), seus caminhos diferem bastante. GARAUDY também reconhece a importância das aquisições do estruturahsmo: “O terceiro tra ço característico do humanismo moderno é o pa pel do dorav ravan ante te prim pri m ordial ord ial qu quee nêle desem des empen penha ha a noção de estrutura” (37). Mas para GARAUDY a noção de estrutura veicula uma filosofia. A ca tegoria fundamental desta filosofia “não é mais a de ser, porém a de relação” (38). Em lugar de entrar no campo teórico do estruturalismo, como faz ALTHUSSER, GARAUDY o transpõe em uma 85
problem prob lemátic áticaa diferen dif erente, te, a proble pro blemá mática tica das “ca tegorias”. Pode assim assumir o estruturalismo, tanto mais quanto escreve que o estruturalismo é també tam bém m “um método mét odo”” (39). Métod Método o que que se pode utilizar como um instrumento. Trata-se para is so de realizar “uma aplicação rigorosa do racio cínio por analogia”. Tudo está pronto para que 0 estruturalismo seja definitivamente anexado ao reino do poder criador do homem. GARAUDY ter mina um dos capitudos de seu livro Le Marxisme du XXe Siècle com êste surpreendente acto de acrobacia filosófica: “O estruturalismo pode ser, como a cibernética, uma das maneiras de apreen der 0 mundo e de conceber o homem e sua ação criadora, que corresponde melhor ao espírito de nosso tempo, à elaboração de um nôvo humanis mo, o humanismo de que Marx precisamente foi o pioneiro, integrando tôda a aquisição do humanismo_ greco-romano e do humanismo judaico-cristão e superando um e outro na síntese nova da natureza do homem, do mundo exterior e da subjetividade, da lei necessária e da liberdade”. Mas afinal, quem é êste poder criador? — Reen contramos nesta última citação a démarche de GARAUDY que descrevemos na primeira parte dêste artigo. O que nos intriga é o significado que êle dá à palavra “criação”, que volta sem cessar. Temos a impressão de estar diante de uma pala vra mágica, dita, redita, reafirmada ao longo das pági pá gina nass sem que seu sentido senti do exato exat o seja se ja jama ja mais is precisado. Estamos em plena ple na ambiguidade. T r a ta-se de um têrmo que vale tudo, de um qualifi cativo simplesmente evocador sem alcance teó rico preciso? Trata-se de uma vontade de “in versão filosófica” para atribuir ao homem o que a religião atribui a Deus? Trata-se da descoberta de uma nova dimensão do homem? Não quere mos entrar em semelhante debate. Parece-nos claro, no entanto, que não é cultivando a obscu ridade que se consegue precisar os problemas e pen p ensa sarr corret cor retam ament ente. e. Se verda ve rdade deira irame mente nte a p a lavra criador tem um sentido para o homem, é necessário precisar teòricamente seu conteúdo. Não Não b asta as ta assumir assu mir as pala pa lavr vras as de uma ideologi ideologiaa pa p a ra assum ass umir ir o conteúdo destas des tas palavra pal avras. s. GA RAUDY parece-nos um habitué desta manobra: êle faz 0 mesmo com a palavra modêlo, com a pa lavra estrutura, com a palavra criação, com a pala pa lavr vraa trans tra nsce cend ndên ência cia etc. Tudo Tudo isto nos p a re re ce temeràriamente simples e fácil. Quer dizer, então, que tomamos partido por ALTHUSSER? Seria preciso antes entender a re futação de GARAUDY. 86
Um nôvo dogmatismo? — GARAUDY diz que o anti-humanismo teórico de ALTHUSSER “repou sa sôbre a ilusão de poder instalar-se no concei to e tratar as estruturas e as relações sociais fa zendo absctração das opções humanas” (40). Cor responde também a uma deformação da idéia marxista de “prática”. Esta prática comporta ao mesmo tempo o momento da análise conceituai e o momento propriamente humano (técnico e também moral) que implica uma superação, uma antecipação dos fins, uma iniciativa, um risco. A escola de ALTHUSSER é, portanto, uma va riante especificamente francesa do neo-dogmatismo. Uma confirmação suplementar é dada pe la atitude politica dos althusserianos defenden do posições revolucionárias para a América Lati na (como Debray) e excomungando num panfle to a resolução do Comitê Central do PCF em Argenteuil. Deixamos a GARAUDY a responsabilidade de suas análises e de suas etiquetas. Não quere mos decidir — não é nosso papel — se ALTHU SSER SSER é ou não nã o é um “neo “neo-d -dog ogmá mátic tico”. o”. Que os marxistas mesmos fixem os limites de sua orto doxia e excomunguem seus hereges! Para con cluir, queríamos simplesmente precisar três coi sas. CONCLUSÃO TRÊS PONTOS SÔBRE O HUMANISMO
1) Humanism Hum anismoo não significa ecletismo. ecletismo. — Pensamos que a demarche de GARAUDY ü fluida demais para ser convincente. Sua idéia de uma integração dialética dos dados anteriores e das contribuições contemporâneas da ciência pode ría ser considerada como uma hipótese válida. Infelizmente os desenvolvimentos de GARAUDY não trazem — ou não trazem ainda — a prova da validade de uma tal hipótese. Honestamente, estamos diante de uma construção que assimila de uma maneira hábil as palavras, mas não o conteúdo exato destas palavras. Êste fracasso nos conduz a levantar a questão da possibilidade de um humanismo universal. A dialética marxista não deu ainda prova de um tal poder de síntese e superação. Pensar que isto será possível no fu turo é um ato de fé. Atualmente estamos diante de humanismos que se afrontam, que têm em co87
mum algumas de suas formulações, mas sem dei xar de se excluírem radicalmente no fundo. A ho ra da reconciliação virá um dia talvez... tal vez. .. 2) A ciência ciênci a pode dizer dizer tudo tudo sêbre o ho h o mem? — A posição de ALTHUSER está solida mente e sèriamente alicerçada em dados cientí ficos contemporâneos. Mas trata-se de ciências que estão ainda engatinhando. É certo que o estruturalismo é uma contribuição considerável, mas é certo também que êle se coloca em um campo quase intemporal que torna difícil a inte gração da dimensão “tempo”. É certo que a lin guagem tem um alcance e uma significação imensamente mais importante do que se reco nheceu até agora, mas é certo também que a lin guagem não é a explicação última do homem. O tema althusseriano do conhecimento como “produção” é interessante numa ótica marxista, mas afasta definitivamente a antiga problemá tica da “verdade”? É suficiente para o homem constatar a existência do “efeito de conhecimen to” e desmontar seus mecanismos? Em uma ótica estritamente científica, talvez. Ainda assim, o ho mem de hoje procura ir além. Fenômeno de alie nação êste movimento, êste desejo de chegar até 0 ser das coisas? Talvez. Contudo, somos obriga dos a reconhecer que o homem de hoje é assim. Dizer que esta necessidade desaparecerá no fu turo, é fazer um ato de fé. Dizer que não desa pare pa rece cerá rá jamais jam ais,, qu quee subs su bsis istir tiráá sempre êste h i a to entre as questões do homem e as respostas dadas pela ciência, é levantar a questão dêste hiato. Como nos impedir de procurar o sentido desta “frustração”? 3) E se o homem £ô £ôr um grit grito: o: — “Prof “Profet etiismo” de GARAUDY, “rigor” de ALTHUSSER; duas démarches muito muito afas af asta tada dass uma da outra. No entanto, elas cristalizam tôdas as questões que 0 homem de hoje se coloca. As dificuldades que cada uma encontra, não são dificuldades que lhe sejam próprias. O “poder criador” de GARAUDY é a expressão da vontade que o homem tem de ser “homem”: vontade que busca seu meio de expressão, sua linguagem, sua realização e isto numa multidão de expressões, de linguagem, de 88
o p ç õ e s ... .. . A dificu dif iculdad ldadee do rigor de AL ALTHUSSER é a imperfeição da ciência contemporânea. Seu limite é o do conhecimento atual. atu al. Um fun fu n d a mento comum: êste instinto de pesquisa no coração do homem e das sociedades. E se fôr isto o homem: uma busca, um grito?
89
NOTAS
(1 )
P ersp ec tiva s de rH om m e, P U F , 19 1959, pág. 343,
(2) (2)
Ib . p ág . 1.
(3) (3)
Ib .. p á g . 1.
(4)
Ib ., p á g . 344.
(5)
Muito Muito apro xim ad am en te, a dialética dialética é um m étodo de p e s q u i s a q u e t e n t a e x p l i c a r , i n t e g r a r a s c o n t r a d i ç õ e s verificadas na realidade. Fala-se de dialética objetiva quando se pensa que a dialética não é simplesmente um método de pensamento, um meio de explicar e integrar as contradições ao nível das idéias, mas é um método que tem seu fundamento na realidade, O real é composto de uma série de contradições que, p o r m e i o d e s e u j ô g o , d e s e u s a n t a g o n i s m o s , d e t e r m i n a m u jn jn m o v im i m e n to to , u m a m u d a n ç a , u m a v i d a . A “dialética objetiva” é a lei de um real que possui como motor êstes antagonismos.
(6 )
P re sp ec tiv as de TH om m e, P U F , 19 1959, pág . 342.
(7) (7)
Ib ., p á g . 347.
(8)
D ieu e st m o rt, P U F , 19 1962, p ág . 3S1.
(9) (9)
Ib ., p á g . 428.
(10) Ib„ pág. 429. (11) (11) L a N ou ve lle C ritiq ue , n. n.® 16 1644, m a rç o de 1966, pá g . 4. (12) Pour Marx, Ed. F. Maspèro, 1965, pág. 163. (13) L a N ouv elle C ritiqu e, c it., pá g . 10. 10. (14) L a N ouvelle C riitque, riitque, cit., p ág . 27. 27. (15) (15) L a N ou ve lle C ritiqu e, n.® 168 68,, julho -a gô sto de 1965 65,, ,, p á g . 70. (16) Lire le Capital, Maspèro, 1966, tomo I, pág. 48. (17) Ib., pág. 49. (18) “ É prec iso insistir no fato de que um a ciênc ia, concont r à r i a m e n t e à i l u s ã o d e e m p i ri r i s m o o u do d o s e n s u a l is is mo, não trabalha jamais sobre um existente... Ela trabalha sempre sôbre o geral, mesmo quando êste toma a forma de um fato... Ela trabalha sempre sô b r e c o n c e i t o s . . . E l a n ã o t r a b a l h a s ô b r e u m p u r o d a d o objetivo, que seriam os fatos puros e absolutos” (Pour Marx, cit., pág. 187). (19) Pour Marx, cit., pág. 186. (20) Lire Le Capital, cit., t. I., pág. 50. (21) Ib.. pág. 27. (22) Ib. pág. 27.
(23) (23) L a No uve lle C ritique , n.» 16 164, m ar ço 12-13.
de
1965, pág s.
(24) Ib., págs. 13-14. ( 2 5 ) .La
Nouvelle
Critique,
n."
168,
págs.
79-80.
(26) La Nouvelle Critique, abril de 1965, pág, 125. (27) La Nouvelle Critique, n.» 161, janeiro de 1965, pág. 107. (28 )
.L ire le le Ca pital, tom o II, pág s. 139-140.
(29) As citações de todo o parágrafo são do capítulo VIII de Lir e le Capital, tomo II. (30) La Nouvelle Critique, n.» 161, pág. 107. (31) L e
Marxisme
(32) I b ., . , p á g . 117. 117. (33) Ib., p á g . 160. 160. (34) I b. b . , p á g . 61. (35) Ib., pá p á g ;
136.
(36) Ib.. p á g . 162. 162. (37) Ib.. p á g . 71. (38) I b ., ., p á g .
72.
(39) I b .. .. p á g .
77. 77.
( 4 0 ) I b ., ., p á g . 224.
92
Apresentação
........................................... ............................................... ....
^
Marxismo, Ciência e Ideologia —
Loui Louiss Althusser .............................. ..............................
9
I O Marxismo é uma um a Teoria Teori a Científ Cie ntífica ica
10
II A dupla dup la Teoria Científ Cie ntífica ica de Marx . .
13
I I I Problemas coloc colocad ados os pela Existência Exist ência dessas Duas Disciplinas .............. 18 IV Natureza Natu reza de de uma um a Ciência, Ciência, Consti Co nstitui tui ção de uma Ciência, Desenvolvimen to de uma Ciência, Investigação Cien tífica ..................................................
22
V A Ideo Ideolo logi giaa .......................................
32
VI A União da Teoria Teori a Cien Ci entíf tífica ica de Marx ......... com o Movimento Operário
42
VII
Formação Form ação Teórica Teóri ca e Luta Lu ta Ideológica
45
Conclusão .......................................... O Marxismo é um Humanismo?
Raymond Raym ond Domergue ................ ....... ................ ........... ....
57
I
O “Homem “Homem Tota To tal” l” de Garaud Gar audy y ......
59
II
“Anti-Humanismo Teórico” de Al thuss thu sser er ............................................... ...............................................
5^
o
I II O Homem, Homem, Centro Cen tro de tôda tô dass as Coisas?
^49
Conclusão — Três Pontos sôbre o Hu■ ........................................... manismo
87
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