Caracterização do Adamastor / Caracterização do mostrengo Ambas as figuras são disformes, poderosas e aterrorizadoras. O Adamastor surge de uma nuvem com uma figura " robusta e válida", como um monstro horrendo de tamanho descomunal, " De disforme e grandíssima estatura "; rosto severo e barba suja, desalinhada; olhos "encovados" e negros; cabelos " cheios de terra e crespos"; " boca negra" e " dentes amarelos". Apresenta uma " cor terrena e pálida", tem uma " postura medonha e má" e a sua voz é horrenda e grossa, " pesada " e amarga. Por sua vez, o mostrengo é caracterizado com uma figura que voa e chia, " imundo e grosso", que habita em cavernas, metáfora dos perigos do mar. Apresenta, assim, semelhanças com um morcego monstruoso.
Discurso do Adamastor/ Discurso do mostrengo O Adamastor
inicia o seu discurso com um tom assustador, como se pode notar,
por exemplo, em: " E da primeira armada, que passagem/ Fizer por estas ondas insofridas,/ Eu farei de improviso tal castigo,/ Que seja mor o dano que o perigo!" ( est. 43, vv.5-8) De igual modo, no discurso do mostrengo nota-se uma certa agressividade e um tom de ameaça, como é evidente nalgumas expressões, tais como: "Quem vem poder o que só eu posso,/ Que moro onde nunca ninguém me visse / E escorro os medos do mar sem fundo?»( vv.14-16) Todavia, deixa transparecer uma certa admiração e espanto, tal como o Adamastor, por este povo aventureiro que ousou o que jamais algum ser humano o fizera: " Ó gente ousada, mais que quantas/ No mundo cometeram grandes cousas,/ (...) Pois os vedados términos quebrantas/ E navegar meus longos mares ousas" (est. 42, vv.1-6) É de notar igualmente a presença de funestas profecias por parte do Adamastor e que contribuem para intensificar o momento de terror que está a ser vivido pelos argonautas portugueses:" Antes, em vossas naus vereis, cada ano,/ (...)/ Naufrágios, perdições de toda a sorte, / Que o menor mal de todos seja a morte!" ( est.44, vv. 5-8 ) Contudo, no final deste episódio, o Adamastor deixa de lado a figura assustadora e medonha para dar lugar a um ser sofredor e castigado, mostrando assim uma faceta muito humana. Se por um lado representa uma figura causadora de sofrimento,
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por outro assume-se como um ser vítima de um fracasso amoroso: "Da mágoa e da desonra ali passada,/ A buscar outro mundo, onde não visse/ Quem de meu pranto e de meu mal se risse." (est.57,vv.6-8) e " Comecei a sentir do fado immigo,/ Por meus atrevimentos, o castigo." (est.58, vv.7-8) Pelo contrário,
o mostrengo
não é autor de profecias e mantém a sua postura
horrenda do princípio ao fim, tendo sido vencido pela coragem e determinação dos Portugueses.
Reação de Vasco da Gama e seus homens / Reação do homem do leme A aparição do gigante mitológico, a que Luís de Camões chamou Adamastor e Fernando Pessoa o mostrengo,
suscitou reações semelhantes.
Vasco da Gama e os seus homens começam por sentir receio perante a visão horrenda do Adamastor: " Arrepiam-se as carnes e o cabelo / A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo "( est.40, vv.7-8). No entanto, esse sentimento é depois substituído por uma certa admiração : " Lhe disse eu : " Quem és tu ? Que esse estupendo / Corpo, certo, me tem maravilhado !" " ( est. 49, vv. 3-4 ). De igual modo, no poema de Fernando Pessoa, o homem do leme revela sentimentos de temor e receio: "E o homem do leme tremeu e disse" ( v. 17 ). Mas após as primeiras hesitações do homem do leme que sente vontade de fugir, de largar o leme, este acaba por reunir toda a sua determinação e permanecer no seu posto : "Três vezes do leme as mãos ergueu, / Três vezes ao leme as reprendeu " ( vv.19-20 ) . Ele sente que essa não é apenas a sua vontade, mas a do povo português por ordem de D. João II : " Aqui ao leme sou mais do que eu : / Sou um Povo que quer o mar que é teu ; / E mais que o Mostrengo, que me a alma teme / E roda nas trevas do fim do mundo, / Manda a vontade, que me ata ao leme, / De El-Rei D. João Segundo " ( vv. 22 a 27 ). O temor causado por esta figura não demoveu nem o homem do leme nem Vasco da Gama dos seus propósitos, terminando o episódio d’Os Lusíadas com um apelo de Vasco da Gama, pois mais horrendo que o aspeto do Adamastor eram as suas profecias para o futuro, tanto que pediu a Deus que lhes evitasse semelhante sofrimento.
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Simbologia do Adamastor e do mostrengo O Adamastor e o mostrengo, embora associados à representação do denominado Cabo das Tormentas, são
personificações do medo e do receio
que os navegadores revelavam ao enfrentar o desconhecido e o nunca antes navegado. Simbolizam também as histórias fantásticas relacionadas com seres monstruosos que habitavam os mares e que destruíam todos aqueles que tivessem a ousadia de entrar nos seus domínios, histórias essas em que os navegadores da época acreditavam. O monstro representa ainda o guardião, que se encontra a impedir o acesso ao "tesouro", obrigando assim o homem a praticar um ato heroico e a vencer o medo. Primeiro, Bartolomeu Dias e seus homens, no reinado de D. João II, superaram os seus receios e provaram ser possível navegar para além do Cabo das Tormentas, a partir daí conhecido como cabo da Boa Esperança, e Fernando Pessoa imortalizou-lhes o mérito em " O Mostrengo". Depois, Vasco da Gama e seus homens, no reinado de D. Manuel I, descobriram o caminho marítimo para a Índia, chegaram até ao "tesouro", e Luís de Camões imortalizou-os na sua obra épica.
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