Um fantasma parece rondar o PT - o fantasma da social-democracia. Desde seu nascimento - e no curso de sua história - o partido foi intimado por seus atentos observadores a escolher entre o "revolucionarismo arcaico do modelo leninista" e a "moderna social-democracia". Este problema, porém, antecede a própria formaço do Partido dos Trabalhadores. !uando nos ltimos anos da década de #$ sur%iu o novo sindicalismo, muitos viram no fen&meno a base social e pol'tica para o nascimento de uma social-democracia brasileira. To lo%o se frustraram tais previs(es, esses analistas buscaram em cada momento de dificuldade )ue atravessou o novo e inesperado Partido dos Trabalhadores a oportunidade para voltar a esta )uase obsessiva )uesto. *ssim foi depois da derrota eleitoral de +, ou )uando o PT, PT, no final de +/ e in'cio de +0, recusou-se a ir ao 1olé%io Eleitoral. *ssim ocorreu, i%ualmente, em +2, )uando o partido colocou-se na contracorrente do Plano 1ru3ado e colheu ma%ros dividendos eleitorais. *ssim aconteceu, finalmente, após a derrota de 4ula na eleiço presidencial de +. 5s mais catastrofistas vaticinaram em cada uma dessas circunst6ncias o fim do PT. 5utros cominaram o partido a optar pela social-democracia como forma de sobreviv7ncia. 5 tema no teria maior relev6ncia se ficasse apenas confinado 8s in)uietaç(es pós-modernas de editorialistas e 9ornalistas pol'ticos ou ao e:ame da academia. Passa a ter import6ncia na medida em )ue se transforma em preocupaço para %rande parte da milit6ncia petista )ue vive um estado de relativa perple:idade com as aceleradas transformaç(es em curso na U;<< e no 4este Europeu, e com as mudanças ocorridas no )uadro social e pol'tico brasileiro após a posse de 1ollor, )uest(es cu9as respostas incidiro sobre o futuro do partido. * discusso sobre o tema da social-democracia s ocial-democracia no PT no pode, no entanto, continuar subordinada aos doutos conselhos )ue lhe so re%ularmente ministrados nas p=%inas da %rande imprensa ou nos claustros acad7micos. >o pode re%ular-se tampouco pelo doutrinarismo de %rupos e tend7ncias )ue )uerem aprisionar o partido em conflitos e pol7micas )ue, ri%orosamente, no fa3em parte de sua história. 5 )ue une a)ueles )ue aconselham o PT a trilhar os caminhos da social-democracia e os )ue advertem para os "peri%os" desta parece ser o desconhecimento da história do socialismo democr=tico, da história do PT e, o )ue é mais %rave, da realidade brasileira. Estas notas procuram discutir )uest(es )ue permitam colocar o debate em um patamar distinto da)uele em )ue até a%ora se travou. <o observaç(es sum=rias e preliminares e seu ob9etivo é mais o de desencadear uma discusso do )ue o de encerr=-la. Partem, i%ualmente, da suposiço )ue o documento 5 socialismo petista, aprovado pelo #? Encontro >acional, com todos seus limites, constitui-se uma elo)@ente manifestaço do )ue 9= se p&de avançar a respeito no debate interno do PT. PT. Oposições
* oposiço entre social-democratas e leninistas, ou bolchevistas, data do fim da +A Buerra Cundial, )uando se consumou a diviso do movimento oper=rio e socialista, )ue mer%ulhara em %rave crise a partir do desencadeamento do conflito. Em ++/, o Partido
sistem=tica pela GG Gnternacional, particularmente a partir do 1on%resso de
o fim da %uerra, o Partido 5per=rio
Por tr=s desta profunda diviso )ue marcou nas décadas se%uintes o socialismo mundial, havia muito em comum entre social-democratas e comunistas.
5 problema, )ue sempre ocorre )uando a teoria se pretende onipotente para e:plicar e transformar a história0, é )ue os "fundadores" do mar:ismo haviam dei:ado e:plicaç(es incompletas sobre o capitalismo. Pouco discutiram sua or%ani3aço pol'tica e menos ainda uma teoria da aço do proletariado, para só citar al%uns - va3ios. CaisL o capitalismo avançado estava em acelerada mutaço e novas realidades econ&micas, sociais e pol'ticas sur%iam sem )ue para elas houvesse respostas e mesmo discusso consistentes. * herança intelectual e pol'tica dos fundadores entrava em contato com estas novas realidades e "o mar:ismo" concretamente passou a ser o resultado de distintas leituras e das correspondentes aplicaç(es da obra de Car:M En%els a estas realidades mut=veis. Dei:ava de e:istir, apesar dos esforços de manutenço da ortodo:ia, um mar:ismo. 5 processo de mundiali3aço do mar:ismo implicava o sur%imento de mar:ismos. Cuitos conhecem a famosa pol7mica )ue a%itou no final do século JGJ a social-democracia alem e, através dela, a de todo o mundo entre Nernstein e ;osa 4u:embur%o. 5 primeiro fe3 um forte ata)ue 8s teses de Car: sobre a tend7ncia 8 pauperi3aço absoluta da classe oper=ria e 8 desapariço das classes médias, ao mesmo tempo em )ue criticava a idéia de )ue a revoluço seria o resultado das contradiç(es insolveis do modo de produço capitalista. Em decorr7ncia ele advo%ava uma estraté%ia oper=ria fundada na con)uista de reformas sucessivas nos marcos do capitalismo, )ue desembocasse em uma sociedade nova sem a necessidade de uma ruptura revolucion=ria. ;osa criticou Nernstein, centrando seus ata)ues na iluso deste sobre as possibilidades de autotransformaço do capitalismo. 5 socialismo seria obra da classe trabalhadora, mas sua viabilidade estava inscrita na impossibilidade do capitalismo evitar sua própria bancarrota. Esta viso economicista do capitalismo e de suas possibilidades de transformaço acabou por revelar-se uma matri3 comum de toda a social-democracia. Era compartilhada pelos setores revolucion=rios, )ue advo%avam a tomada violenta do poder, e pelos reformistas, )ue defendiam as con)uistas por meios pac'ficos e )ue no aceitavam e:plicitamente as teses de Nernstein. ;eformistas e revolucion=rios, fi:ando-se ob9etivos distintos, partiam, no entanto, do mesmo supostoL havia "leis cient'ficas" do desenvolvimento capitalista. Uma "necessidade histórica" impelia o proletariado em determinada direço. 5 socialismo era uma ci7ncia. 5 )ue diferenciava uns dos outros eram os métodos e os ritmos. * partir da crise desencadeada com a posiço assumida pela maioria social-democrata em ++/, desenvolveu-se entre os revolucion=rios, sobretudo os russos, uma tend7ncia a radicali3ar a an=lise sobre o papel destes condicionantes históricos. 1ontra o evolucionismo moderado )ue dominava a social-democracia, depois de ++/, desenvolveu-se uma corrente voluntarista a partir da idéia de )ue o capitalismo vivia sua crise %eral e terminal. O= )ue as condiç(es ob9etivas para a revoluço estavam reunidas, restava apenas possuir uma direço pol'tica capa3 de potenciali3=-las. Nastava criar as condiç(es sub9etivasL novos partidos pol'ticos e uma nova Gnternacional. Cas o ar%umento a)ui %ira em torno de si mesmo. 1omo separar de forma to radical condiç(es ob9etivas das sub9etivas 5 elemento sub9etivo - a social-democracia - era o resultado da e:panso do capitalismo elemento ob9etivo. 5 próprio 4enin abraçou esta tese )uando formulou sua teoria sobre a "aristocracia
oper=ria". >ela, como vimos, ele admitiu )ue a direço do movimento oper=rio podia ser corrompida pelo próprio inimi%o bur%u7s, a ponto de fa3er a pol'tica deste. Cas se somente o partido de van%uarda era capa3 de operar no proletariado a transformaço de sua consci7ncia espont6nea reformista em consci7ncia de classe revolucion=ria, pela fuso da teoria revolucion=ria com a din6mica das lutas dos trabalhadores, como e:plicar )ue fora 9ustamente o partido mais preparado intelectualmente o
1om a con)uista do poder pelos bolchevistas, em outubro de ++#, consumou-se a diviso do movimento oper=rio e socialista internacionais. * partir da' a e:presso social-democrata passou a ter, para parte das es)uerdas, uma conotaço pe9orativa, um sin&nimo de conciliaço com a bur%uesia e de traiço 8 causa oper=ria. * Gnternacional 1omunista, fundada em ++, afirmava )ue a revoluço estava na ordem-do-dia. Kaltava apenas um partido com vontade pol'tica para diri%ir as massas )ue se levantavam contra seus opressores. 5 capitalismo, di3ia, a%oni3ava e somente sobreviveria se direç(es traidoras lhe dessem tré%ua. * revoluço passava pela constituiço de or%anismos de duplo poder na sociedade, se%undo a liço dos sovietes russos, e devia desembocar na ditadura do proletariado, forma superior de democracia, radicalmente distinta das "democracias bur%uesas" e:istentes no 5cidente. * derrota das breves e:peri7ncias soviéticas na Qun%ria e na Kinl6ndia, o fracasso das primeiras tentativas insurrecionais na *lemanha, a contenço do avanço das tropas do E:ército Rermelho sobre Rarsóvia e, principalmente, as enormes dificuldades internas )ue enfrentavam os soviéticos, determinaram o ar)uivamento dos planos de uma imediata e %enerali3ada revoluço na Europa. * va%a desencadeada pelo 5utubro soviético havia passado. Produ3ia-se um reflu:o "tempor=rio" )ue aconselhava uma pol'tica moderada e uma apro:imaço com a social-democracia. Cas a t=tica de Krente Snica, como ficou conhecida esta nova orientaço da Gnternacional 1omunista, fracassou sobretudo na)uele )ue seria o "laboratório" privile%iado de toda pol'tica oper=ria e socialistaL a *lemanha. >o cabe nesta reconstituiço sum=ria e es)uem=tica analisar em detalhe este per'odo e apurar as responsabilidades dos principais atores deste verdadeiro drama histórico. *os bolchevistas vale a cr'tica por suas tentativas de %enerali3ar a e:peri7ncia soviética, a partir de uma apreciaço discut'vel - teórica e empiricamente falando - da economia mundial, sem levar em conta a situaço concreta e as tradiç(es do movimento oper=rio em outros pa'ses, sobretudo na Europa 5cidental. poss'vel - ainda )ue discut'vel - )ue na ;ssia os valores da democracia representativa, )ue muitos chamavam impropriamente de "bur%uesa", no tivessem %rande si%nificaço para as massas. *final, os trabalhadores haviam, por duas ve3es +$0 e ++#, desenvolvido esta ori%inal e:peri7ncia dos sovietes, fora dos marcos institucionais vi%entes no 5cidente. Cas a verdade é )ue a ditadura do proletariado, em nome da )ual se dissolveu a *ssembléia >acional 1onstituinte eleita em ++#, e onde os bolchevistas ficaram em minoria, no teve e:ist7ncia real. 5s sovietes rapidamente dei:aram de e:istir, os partidos foram sendo sucessivamente suprimidos e, a pouco andar, a ;ssia se transformara em ditadura de um partido. * oposiço )ue e:istiu no foi entre democracia representativa e ditadura do proletariado, mas entre a)uela e a ditadura do partido. Cesmo considerando as enormes limitaç(es da democracia nos pa'ses capitalistas da Europa 5cidental, )ue no haviam che%ado na)uele momento se)uer a reali3ar plenamente as reformas liberais, no se pode desconhecer as con)uistas pol'ticas )ue os trabalhadores haviam obtido no
marco das instituiç(es vi%entes. >a pol7mica de 4enin com FautsV sobre a democracia e a ditadura do proletariado se op(em duas avaliaç(es distintas da si%nificaço da democracia para os trabalhadores. *)ueles valores )ue os bolchevistas e a Gnternacional 1omunista consideravam como instrumentos para en%anar os trabalhadores o sufr=%io universal. por e:emplo, em realidade haviam sido con)uistas duramente arrancadas 8s classes dominantes. Uma ve3 conse%uidas, elas permitiram aos trabalhadores ocupar um lu%ar distinto na sociedade. 5s direitos 8 sindicali3aço, 8 %reve, 8 liberdade de imprensa e or%ani3aço partid=ria, isto é, o acesso 8 cidadania, além de con)uistas materiais ine:istentes na ;ssia c3arista, confi%uravam um con9unto de valores caros ao 5cidente e haviam sido fundamentais para a classe oper=ria constituir sua identidade. 1ontra a social-democracia pesavam, no entanto, dur'ssimas acusaç(es. Em primeiro lu%ar, sua atitude frente 8 Buerra Cundial, cu9o preço foi pa%o essencialmente pelos trabalhadores, a %rande maioria dos )ue morreram ou foram mutilados nos campos de batalha. claro )ue a pol'tica da maioria dos partidos social-democratas no pode ser sumariamente 9ul%ada através de cate%orias como "traiço", "capitulaço diante da bur%uesia" etc. *inda )ue tudo isso tenha e:istido e provocasse e até ho9e possa provocar indi%naço, o problema fundamental é o de saber por )ue uma força oper=ria da import6ncia do