Novo D icionário I nternacional de
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VOLUME 4
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Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento C O R P O
E D I T O R I A L Organizador
Willem A. VanGemeren, PhD Professor de Antigo Testamento e Línguas Semíticas do Trinity Evangelical Divinity School Editores Associados Tremper Longman III, PhD Professor de Antigo Testamento do Westminster Theological Seminary
Richardson D. Patterson, PhD Professor Emérito da Liberty University
Elmer A. Martens, PhD Professor de Antigo Testamento do Mennonite Brethren Biblical Seminary
Bruce K. Waltkc, PhD Professor de Antigo Testamento do Regent College
Eugene H. Merrill, PhD Professor de Antigo Testamento do Dallas Theological Seminary
John Walton, PhD Professor de Bíblia do Moody Bible Institute Consultores
Robert P. Gordon, PhD Faculty of Oriental Studies University of Cambridge
J. Gordon McConville, PhD Professor de Antigo Testamento, Cheltenham e Gloucester
John E. Hartley, PhD Professor de Antigo Testamento da Azuza Pacific University
John N. Oswalt, PhD Professor de Antigo Testamento e Línguas Semíticas do Asbury Theological Seminary
Walter C. Kaiser Jr„ PhD Professor de Antigo Testamento e Presidente do Gordon-Conwell Theological Seminary
Gary Smith, PhD Professor de Antigo Testamento do Bethel Theological Seminary
Editor em Português Cláudio Antônio Batista Marra
Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento © 2011 Editora Cultura Cristã. Originalmente publicado nos EUA com o título New International Dictionary o f O ld Testament Theology and Exegesis © 1997 by Willem A. VanGemeren. Grand Rapids, Michigan, USA. Todos os direitos são reservados. 1’ edição, 2011 - 3.000 exemplares Conselho Editorial Ageu Cirilo de Magalhães Jr. Cláudio Marra (Presidente) Fabiano de Almeida Oliveira Francisco Solano Portela Neto Heber Carlos de Campos Jr. Mauro Femando Meister Tarcízio José de Freitas Carvalho Valdeci da Silva Santos
V253n
Produção Editorial Tradução Afonso Teixeira Filho Daniel Santos Heloísa Cavallari Ribeiro Martins João Paulo Thomaz de Aquino Marcos Vasconcelos Paulo Sérgio Gomes Paulo Corrêa Arantes Susana Klassen Tarcízio José de Freitas Carvalho Vanderlei Ortigoza Preparação de texto e lexicogrqfia Afonso Teixeira Filho Revisão Afonso Teixeira Filho Maria Tereza Buonafina João Paulo Thomaz de Aquino Paulo Corrêa Arantes Tarcízio José de Freitas Carvalho Marcos Vasconcelos Formatação Assisnet Design Gráfico Capas Magno Paganelli
VanGemeren, Willem A. Novo dicionário internacional de teologia e exegese / Willem A. VanGemeren; traduzido por Equipe de colaboradores da Editora Cultura Cristã. _São Paulo: Cultura Cristã, 2 0 11. 1328 p. Tradução de: New intemational dictionary ofo ld testament theology and exegesis ISBN 978-85-7622-353-5 1. Estudos bíblicos 2. Exegese 3. Teologia I. Título 230.041 CDD
€ 6 D IT O R R CULTUR A C R IS T fi Rua Miguel Teles Júnior. 394 - CEP 01540-040 - São Paulo - SP Caixa Postal 15.136 - CEP 01599-970 - São Paulo • SP Fones 0800-0141963 / (11) 3207-7099 - Fax (11) 3209-1255 www.editoraculturacrista.com.br -
[email protected]
Superintendente: Haveraldo Ferreira Vargas Editor: Cláudio Antônio Batista Marra
Sum ário G eral Colaboradores
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Abreviações
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Transliterações Verbetes lexicais
xxxii an
XXXUl
Dicionário Temático
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Colaboradores t Falecido ABEGG. MARTIN G., JR M. Div., M. Phil., Ph. D.; Professor Assistente de Antigo Testamento, Trinity Western University, Langley, British Columbia, Canadá AITKEN, KENNETH T, B. D., Ph. D.; Acadêmico em Hebraico e Línguas Semitas, University o f Aberdeen, Aberdeen, Escócia ALDEN, ROBERT L. t B. A., M. Div., Ph. D.; Ex-Professor de Antigo Testamento, Denver Seminary, Denver, Colorado, Estados Unidos da América ALEXANDER, T. DESMOND B. A., Ph. D.; Acadêmico em Estudos Semitas, The Queen’s University of Belfast, Belfast, Irlanda do Norte ALLEN, LESLIE C. M. A., Ph. D., D. D.; Professor de Antigo Testamento, Fuller Theological Seminary, Pasadena, Califórnia, Estados Unidos da América AMES, FRANK RJTCHEL B. A., M. Div., M. A. L. S., Doutorando; University Librarian, Colorado Christian University, Lakewood, Colorado, Estados Unidos da América ARNOI.D, B IIX T . B. A., M. Div., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Asbury Theological Seminary, Wilmore, Kentucky, Estados Unidos da América AUSTEL, HERMANN J. M. Div., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento no Northwest Baptist Seminary, Tacoma, Washington, Estados Unidos da América AVERBECK, R1CHARD E. B. A., M. Div., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Trinity Evangélica! Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América BAILEY, W ILM A A. B. S., M. Div., Ph. D.; Professor Assistente de Antigo Testamento, Messiah College, Grantham, Pennsylvania, Estados Unidos da América BAER, DAVID. A. B. A., M. Div., Doutorando pela University o f Cambridge, Reino Unido; Professor leitor de Antigo Testamento e Línguas Bíblicas, Seminário ESEPA, San José, Costa Rica BAKER, D. W. A. B., M. de Estudos Cristãos, M. o f Phil., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semícas, Ashland Theological Seminary, Ashland, Ohio, Estados Unidos da América
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Colaboradores
BALDWIN, JO Y C E G. t B. A., B. D.; escritor autônomo, Diretor falecido üo Trinity College, Bristol, Reino Unido BALOIAN, BRIICE E. B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor Associado, Azusa Pacific University, Azusa, Califórnia, Estados Unidos da América BECK, JO HN A. B. A., M. Div., Th. M., doutorando; Professor Assistente de Línguas Bíblicas, Concordia University Wisconsin, Mcquon, Wisconsin, Estados Unidos da América BEYER, BRYAN E. B. A., M. Div., Ph. D.; Reitor Acadêmico, Columbia Bible College, Columbia, Carolina do Sul, Estados Unidos da América BLOCK, DANIEL B. Ed., B. A., M. A., Ph. D.; Professor de Interpretação do Antigo Testamento, Southern Baptist Theological Seminary, Louisville, Kentucky, Estados Unidos da América BOSMAN. HENDR1K L. B. A. (Hons.), D. D.; Professor de Antigo Testamento, Universidade de Stellenbosch, Stellenbosch, África do Sul BRACKE. JO HN M. B. A., M. Div., D. Min., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento; Pró-Reitor Acadêmico do Eden Theological Seminary, St. Louis, Missouri, Estados Unidos da América BRENSINGER. TERRY L. B. A, M. Div., M. A., M. Phil. Ph. D.; Professor Associado de Estudos Bíblicos, Messiah College, Grantham, Pennsylvania, Estados Unidos da América BRISCO, THOM AS V. B. A., M. Div., Ph. D.; Professor Associado de Contexto Bíblico e Arqueologia, Southwestem Baptist Theological Seminary, Fort Worth, Texas, Estados Unidos da América BROOKE. G EORG E J. M. A., Ph. D.; Professor Acadêmico em Literatura Intertestamental, University o f Manchester, Manchester, Reino Unido BROWN. M ICHAEL L. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Adjunto de Antigo Testamento e Estudos Judaicos, Regent University School o f Divinity, Virginia Bcach, Virginia, Estados Unidos da América BURGE, GARY M. B. A., M. Div., Ph. D.; Professor de Novo Testamento, Wheaton College, Wheaton, Illinois, Estados Unidos da América BUTTERW ORTH, G EORG E M ICH AEL (MIKE) B. Se., B. D., M. Phil., Ph. D.; Pró-Reitor Acadêmico, Oak Hill College, London, Reino Unido CARAGOUNIS, C1IRYS C. B. D., Th. D.; Professor Associado, Lund University, Lund, Suécia CAREVV, M. DOUGLAS B. S., P. G. D. E., M. Div., doutorando pela Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois; Instrutor no Sierra Leone Bible College, Freetown, Serra Leoa CARPENTER, EUGENE E. A. B., M. Div., Ph. D.; Diretor de Estudos de Graduação: Professor de Antigo Testamento c Hebraico, Bethel College, Mishawaka, Indiana, Estados Unidos da América CARRO LL R., M. DANIEL B. A„ Th. M., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Denver Seminary, Denver, Colorado, Estados Unidos da América CARTLEDGE, TONY W. B. S., M. Div., Ph. D.; Pastor, Woodhaven Baptist Church, Apex, Carolina do Norte, Estados Unidos da América CATHCART, K. J. M. A., Doutor em Línguas Or., M. R. I. A.; Professor dc Línguas do Oriente Médio, University College, Dublim, Irlanda CHAN, KAM-YAU ALAN M. Div.; Th. M.: Pastor da Chinese Christian Union Church, North Highland Park, Illinois, Estados Unidos da América
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Colaboradores
CH H ETRI, CHITRA B. D., Th. M., cand. a Ph. D.; Diretor da Achram Bíblica do Nepal, Catmandu, Nepal CHISHOLM , ROBERT B. B. A., M. Div., Th. M., Th. D.; Professor de Estudos do Antigo Testamento, Dallas Theological Seminary; Dallas, Texas, Estados Unidos da América CLARK, DAVID G. B. A., Ph. D.; Diretor, diplomado em Estudos da Religião, Professor de Novo Testamento, Southern Califórnia College, Costa Mesa, Califórnia, Estados Unidos da América COLLINS, JA CK S. B., S. M., M. Div., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Covenant Theological Seminary, St. Louis, Missouri, Estados Unidos da América COOK, JOHANN B. A., B. Th., M. A., D. Litt.; Professor Associado, Departamento de Línguas Antigas do Oriente Médio, Universidade de Stellenbosch, Stellenbosch, África do Sul C O R N EU U S, I. D. Litt.; Professor Acadêmico, Departamento de Estudos Antigos do Oriente Próximo, Universidade de Stellenbosch, África do Sul CO TTERELL, PETER B. D., B. Se., Ph. D., D. Univ.; ex-Diretor da London Bible College, Londres, Reino Unido; Fellow of the Institute o f Linguists, Fellow o f the Royal Society o f Arts, Estados Unidos da América CREACH, JE R O M E F. D. B. A., M. Div., Th. M., Ph. D.; Professor Assistente. Barton College, Wilson, Carolina do Norte, Estados Unidos da América DENNINGER, DAVID B. A., M. Div., Ph. D., Trinity International University, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América DIAMOND, A. R. PETE B. S., Dip. em Estudos Cristãos, Th. M., Ph. D.; Coordenador de educação de adultos. Ali Saints Bythe-Sea Episcopal Church, Santa Bárbara, Califórnia, Estados Unidos da América DICKENS, OW EN P. B. A., M. A., M. Div., Ph. D.; Professor Associado de Religião, Asbury College, Wilmore, Kentucky, Estados Unidos da América DOCKERY, DAVID S. B. S., M. Div., M. A., Ph. D.; Presidente e Professor de Estudos Cristãos, Union University, Jackson, Tennessee, Estados Unidos da América DOMERIS, W ILLIAM R. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Acadêmico em Antigo Testamento, Universidade do Witwatersrand, Johanesburgo, África do Sul DREYTZA, MANFRED D. Th.; Professor Leitor em Antigo Testamento, Geistliches Rüstzentrum Krelingen. Walsrode, Alemanha DUMBRELL, W ILLIAM J. B. A., M. A., B. D., M. Th., Th. D.; Professor Acadêmico, Trinity Theological College. Singapura ELLIS, ROBERT R. B. S., M. Div, Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento e Hebraico, Logsdon School o f Theology, Hardin Simmons University, Abilene, Texas, Estados Unidos da América ELS, P. J. J. S. M. A., doutorando., D. Th., D. Litt.; Professor de Estudos do Antigo Testamento, University o f the Western Cape, Bellville, África do Sul ENNS, PETER B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Westminster Theological Seminary, Filadélfia, Pennsylvania, Estados Unidos da América FOULKES, FRANCIS M. Se., B. A., M. A., B. D.; antigo encarregado da St. John’s College, Auckland, Nova Zelândia FOUTS, DAVID M. B. A., Th. M., Th. D; Professor Associado de Bíblia, Bryan College, Dayton, Tennessee, Estados Unidos da América
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Colaboradores
FREDERICKS, DANIEL C. B. A., M. Div„ Ph. D.; Reitor e Vice-Presidente de Relações Acadêmicas; Professor de Estudos Bíblicos, Belhaven College, Jackson, Mississippi, Estados Unidos da America FRETHEIM , TEREN CE E. B. A., M. Div., Th. D.; Professor de Antigo Testamento, Luther Seminary, St. Paul, Minnesota, Estados Unidos da América FULLER, RUSSELLT. B. S., M. A., M. Phil., Ph. D.; Professor Associado de Estudos Bíblicos, Mid-Continent College, Mayíield, Kentucky, Estados Unidos da América FUTATO, M ARK D. B. A„ M. Div., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Westminster Theological Seminary in Califórnia, Escondido, Califórnia, Estados Unidos da América GIESE, RONALD, JR B. S., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Estudos Bíblicos, Liberty University, Lynchburg, Virgínia, Estados Unidos da América GORDO.N, ROBERT P. M. A., Ph. D.; Professor Régio de Hebraico e membro do St. Catharine’s College, University of Cambridge, Cambridge, Reino Unido GRISANTI, M ICHAEL A. B. A., M. Div., Th. M., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento do Central Baptist Theological Seminary, Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos da América HADLEY, JU DITH M.. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Assistente de Teologia e Estudos da Religião, Villanova University, Villanova, Pennsylvania, Estados Unidos da América HAGUE, STEPHEN B. A., M. A., M. Div.; doutorando pelos Bristol University and Wycliffe Hall, Bristol e Oxford, Reino Unido HALL, GARV H. B. A„ M. Div., M. Th., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Lincoln Christian Seminary, Lincoln, Illinois, Estados Unidos da América HAMILTON, VICTOR P. B. A., B.D., Th. M., M. A., Ph. D.; Professor de Religião, Asbury College, Wilmore, Kentucky, Estados Unidos da América HARMAN, ALLAN M. B. A., B. D., M. Litt., Th. M., Th. D.; Professor de Antigo Testamento, Presbyterian Theological College, Melboume, Austrália HARRISON, ROLAND K. t B. D., Th. M., Ph. D., D. D.; ex-Professor Emérito, Wycliffe College, Toronto, Ontário, Canadá HARTLEV, JO H N E. B. A., B. D., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento no C. P. Haggard Graduate School of Theology, Azusa Pacific University, Azusa, Califórnia, Estados Unidos da América HARVEY, JO HN E. B. A., M. C. S., Doutorando na Wycliffe College, University o f Toronto, Toronto, Ontario, Canadá HASEL, GERHARD F. t B. A., M. A., Ph. D.; Ex-Professor de Antigo Testamento e Teologia Bíblica; Theological Seminary, Andrews University, Berrien Springs, Michigan, Estados Unidos da América HAYDEN, ROY E. B. A., B. D., Th. M„ M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Oral Roberts University Graduate School o f Theology, Tulsa, Oklahoma, Estados Unidos da América HESS, RICHARD S. B. A., M. Div.,Th. M., Ph. D.; Leitor em Antigo Testamento, Roehampton Institute Londres, Reino Unido HILL, ANDREW E. B. A., M. A., M. Div., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Whcaton College, Wheaton, Illinois Estados Unidos da América H O FFM EIER, JA M ES K. B. A., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Arqueologia, Wheaton College, Wheaton, Illinois, Estados Unidos da América
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Colaboradores
HOLMSTEDT, ROBERT B. A., M. A., Doutorando pelo University of Wisconsin. Madison, Wisconsin, Estados Unidos da América HOOKS, STEPHEN M. B. A., M. Div., Ph. D.; Professor de Estudos Bíblicos da Atlanta Christian College, East Point. Geórgia, Estados Unidos da América HORSNELL, M ALCOLM J. A. B. A., B. D., Th. M., Ph. D.; Professor de Interpretação do Antigo Testamento, McMaster Divinity College, Hamilton, Ontário, Canadá HO STETTER, EDWIN C. B. A., M. A. R., Ph. D.; Professor de Estudos Bíblicos, Ecumenical institutc o f Theology, Baltimore, Maryland, Estados Unidos da América HOWARD, DAVID M., JR B. S., M. A., A. M., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América HUBBARD, ROBERT L., JR A. B., B. D., M. A., Ph. D.; Professor de Literatura Bíblica, North Park Theological Seminary, Chicago, Illinois, Estados Unidos da América JENSON, PH ILIP P. M. A., S. T. M., Ph. D.; Acadêmico em Antigo Testamento e Hebraico, Trinity College. Bristol, Reino Unido JO B, JO H N B. M. A., B. D.; Antigo Vice-Diretor e Acadêmico em Antigo Testamento do Immanuel College, Ibadan, Nigéria e do Cliff College, Calver, Reino Unido; Ministro em South Bedford e Ampthill Methodist Circuit, Reino Unido JOHNSTON, GORDON H. B. A., Th. M., Ph. D.; Professor Associado de Estudos do Antigo Testamento, Lancaster Bible College, Lancaster, Pennsylvania, Estados Unidos da América JO N K ER, LOUIS M. A., D. Th.; acadêmico em tempo parcial (e Ministro de Culto) da Universidade de Stellenbosch, Stellenbosch. África do Sul KAISER, WALTER C., JR B. A., B. D., M. A., Ph. D.; Professor Ilustre de Antigo Testamento do Colman M. Mockler, Presidente do Gordon Conwell Theological Seminary, S. Hamilton, Massachusetts. Estados Unidos da América KEOW N. GERALD L. B. S., M. Div., Ph. D.; Professor Associado de Interpretação do Antigo Testamento, The Southern Baptist Theological Seminary. Louisville, Kentucky, Estados Unidos da América KIUCHI, NOBUYOSH1 Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Universidade Cristã de Tóquio, Chiba, Japão KLEIN, G EORG E L. B. A., Th. M., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Semítica, Reitor de graduação, Criswell College, Dallas, Texas, Estados Unidos da América KLINGBEIL, GERALD A. B. A. em Teologia, B. A. honorífico, M. A., D. Litt.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas da Universidad Peruana Unión, Lima, Peru KLINGBEIL, MARTIN B. A., B. A. honorífico, M. A., D. Litt.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas da Universidad Adventista Bolivia, Chochabamba, Bolívia KONKEL, A. H. B. R. E., M. Div., Ph. D.; Presidente de Estudos Bíblicos, Providence Theological Seminary, Otterbume, Manitoba, Canadá KOOPM ANS, W ILLIAM T. B. A., M. Div., Th. M., Th. D.; Pastor da Cephas Christian Reformed Church, Peterborough, Ontario, Canadá KRUGER, PAULA. D. Litt., B. Th.; Professor Acadêmico da Universidade de Stellenbosch, Stellenbosch, República da África do Sul
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Colaboradores
LATOUNDJ1, DAV1D P. B. A., M. Div., Th. M., M. A., Doutorando pela Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América LONG, GARY ALAN B. A., M. A., Ph. D.; Professor Assistente de Línguas Semitas e Catedrático do Departmento de Língua Hebraica, Jerusalem University College, Mt. Zion Campus, Jerusalém, Israel LONG, V. PHILIPS B. A., B. S., M. Div., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Covenant Theological Seminary, St. Louis, Missouri, Estados Unidos da América LONGMAN, TREM PER, III B. A., M. Div., M.Phil, Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Westminster Theological Seminary, Philadelphia. Pennsylvania, Estados Unidos da América LU, JE FFR E Y S. B. A., M. A., M. Div., Ph. D.; Professor Adjunto do Logos Evangelical Seminary (Los Angeles, Califórnia) e Pastor Auxiliar da Atlanta Chinese Christian Church, Atlanta, Geórgia, Estados Unidos da América LUC, ALEX T. B. Th., B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Columbia Biblical Seminary and Graduate School o f Missions, Columbia, Carolina do Sul, Estados Unidos da América LUND, JE R O M E A . B. R. E., M. Div., M. A., Ph. D.; Estudioso Pesquisador Associado — Comprehensive Aramaic Lexicon do Hebrew Union College - Jewish Institute o f Religion, Cincinnati, Ohio, Estados Unidos da América MAGARY, DENNIS R. B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América MARTENS, ELM ER A. B. A., B. Ed., B. D., Ph. D.; Professor Emérito de Antigo Testamento, Mennonite Brethren Biblical Seminary, Fresno, Califórnia, Estados Unidos da América MASON, REXA. M. A., B. D., Ph. D.; Emérito Acadêmico Universitário em Antigo Testamento e Hebraico, Oxford University, Oxford, Reino Unido MASSOUH, SAMIR B. A., M. A., M. Div.; Presidente, Professor Associado do Departamento de Estudos Bíblicos, College o f Arts and Sciences, Trinity International University, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América MATTIES, GORDON H. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Estudos Bíblicos, Concord College, Winnipeg, Manitoba, Canadá MCCANN, J. CLINTON, JR . A. B., D. Min., Th. M., Ph. D.; Professor Evangélico de Interpretação Bíblica, Eden Theological Seminary, St. Louis, Missouri, Estados Unidos da América M CCONVILLE, J. GORDON M. A., B. D., Ph. D.; Professor Acadêmico em Estudos Religiosos; Cheltenham ae Gloucester College de educação superior, The Park, Cheltenham, Reino Unido M EIER, SAMUEL A. B. A., Th. M., Ph. D.; Professor Associado de Hebraico e Línguas Semitas Relacionadas, Ohio State University, Columbus, Ohio, Estados Unidos da América M ERRILL. EUGENE H. B. A., M. A., M. Phil., Ph. D.; Professor de Estudos do Antigo Testamento, Dallas Theological Seminary, Dallas. Texas, Estados Unidos da América MILLARD, ALAN M. A., M. Phil.; Professor graduado de Hebraico e Línguas Semitas Antigas, The University of Liverpool, Reino Unido MOBERLY, WAI.TER M. A.. Ph. D., Acadêmico em Teologia, University o f Durham, Durham, Reino Unido
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Colaboradores
M OORE, M ICHAEL S. B. A., M. A., M. Div., Th. M., M. Ph., Ph. D.; Professor Assistente Adjunto de Antigo Testamento do Fuller Theological Seminary, Phoenix, Arizona e Ministro Pregador da Tatum Boulevard Church of Christ, Phoenix. Arizona, Estados Unidos da América MOULDER, W ILLIAM J. B. A., M. Div., Ph. D.; Professor de Estudos Biblicos, Trinity International University, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América NAUDÉ, JACOBUS (JACK1E) A. M. A., M.Th., M. A., D. Litt.; Professor Acadêmico, Departamento de Estudos do Oriente Médio, The University o f the Free State, Bloemfontein, República da África do Sul NEL, PH IL IP J. B. Th., D. Litt.; Professor de Línguas Semitas, University o f the O range Free State, Bloemfontein, República da África do Sul NEWMAN, ROBERT B. S., M. Div., S. T. M., Ph. D.; Professor de Novo Testamento do Biblical Theological Seminary, Hatfield, Pennsylvania, Estados Unidos da América NICOLE, EM ILE Doctorat d’Etat en théologie protestante; Professor de Antigo Testamento, Faculté Libre de Thélogie Evangélique, Vaux-sur-Seine, França NIEHAUS, JE FF R E Y J. B. A., M. A., Ph. D., M. Div.; Professor de Antigo Testamento, Gordon-Conwell Theological Seminary, South Hamilton, Massachusetts, Estados Unidos da América NIXON, ROSEMARY B. D., M. A„ M. Th.; Diretor, Theological Institute o f the Scottish Episcopal Church, Edimburgo, Escócia NOGALSKI, JIM Th. D.; Professor Assistente de Interpretação do Antigo Testamento, Southern Baptist Theological Seminary, Louisville, Kentucky, Estados Unidos da América NOLL, STEPHEN F. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Estudos Bíblicos, Reitor Acadêmico da Trinity Episcopal School for Ministry, Ambridge, Pennsylvania, Estados Unidos da América NUNNALLY, W. E. B. A., M. A. (Língua Hebraica); M. A. (Antigo Testamento); M. Phil., Ph. D.; Professor Associado de Judaísmo Primitivo e Origens Cristãs da Central Bible College, Springfield, Missouri, Estados Unidos da América 0 ’C 0N N E L L , ROBERT H. B. A., Th. M., Th. D., Ph. D.; editor autônomo e escritor; já foi Professor Associado de Antigo Testamento da Colorado Christian University, Denver, Colorado, Estados Unidos da América 0 ’KENNEDY, D. F. B. A., B. Th., M. Th., D. Th.; Ministro da Dutch Reformed Church, Helderberg, Somerset West, e acadêmico em tempo parcial na Universidade de Stellenbosch (Faculdade de Teologia, Departamento de Antigo Testamento) Stellenbosch, África do Sul O LIVER, ANTHONY B. Th., M. A., Ph. D.; Reitor da Caribbean Gratuate School o f Theology, Kingston, Jamaica OLIV IER, J. P. J. (HANNES) M.Th., D.Litt.; Professor de Antigo Testamento, University o f Stellenbosch, Stellenbosch, África do Sul OSBORNE, W ILLJAM M. A., M. Phil.; Chefe do Departamento de Antigo Testamento; Diretor de Estudos de Pós-graduação na Bible College o f New Zealand, Auckland, Nova Zelândia OSWALT, JO H N N. B. A., B. D., Th. M., M. A., Ph. D.; Professor “Ralph W. Beeson” de Estudos Bíblicos, Asbury Theological Seminary, Wilmore, Kentucky, Estados Unidos da América PAN, CHOU-W EE B. A., Ph. D.; Professor leitor de Antigo Testamento, Trinity Theological College, Singapura PARK, SANG HOON Th. M., Ph. D., Pastor graduado da Igreja Presbiteriana Seung Dong, Seul, Coréia do Sul
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Colaboradores
PATTERSON, RICHARD D. A. B., M. Div., Th. M„ M. A., Ph. D.; Ilustre Professor Emérito, Liberty University, Lynchburg, Virgínia, Estados Unidos da América PAUL, MAARTEN J. Th. D.; Professor de Antigo Testamento, Theologische Hogeschool “Calvijn”, Ede, e Pastor da Hervormde Kerk, Dirksland, Países Baixos PEELS, HENDRIK G. L. Th. D.; Professor de Antigo Testamento, Theologische Universiteit van de Christiijke Gereformeerde Kerken in Nederland, Apeldoom, Países Baixos PENNANT, DAVID F. M. A., B. D., Ph. D.; ex-pároco, St. Savior’s Church, Brookwood, Woking, Surrey, Reino Unido PHELPS, M ARK ANTHONY B. A., M. T. S., M. A.; Instrutor, Ozarks Technical/Community College, Springfíeld, Missouri, Estados Unidos da América PIENAAR, DANIEL N. B. A., B. A., M. A. Phil. licenciado, chefe do Departamento de Estudos Bíblicos, The University of the Orange Free State, Bloemfontein, África do Sul PO W ELL, TIM OTHY B. S., M. Div., Ph. D.; Professor Adjunto, Mennonite Brcthren Biblical Seminary; Pastor graduado, Christian Life Assembly, Fresno, Califórnia, Estados Unidos da América PRICE, JA M ES D. B. S., M. Div., Ph. D.; Professor de Hebraico e Antigo Testamento, Temple Baptist Seminary, Chattanooga, Tennessee, Estados Unidos da América PROVAN, IAIN W. M. A., B. A., Ph. D.; Professor Acadêmico de Hebraico e Estudos do Antigo Testamento, University o f Edinburgh, Edimburgo, Escócia PUTNAM, FREDERIC CLARKE B.S., M. Div., S. T. M., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Biblical Theological Seminary, Hatfield, Pennsylvania, Estados Unidos da América RASMUSSEN, C A R L G . B. D., Th. M., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Bethel College, St. Paul, Minnesota, Estados Unidos da América REED, STEPHEN A. M. Div., M. A., Ph. D.; Winthrop, lowa, Estados Unidos da América REID, DEBRA K. B. D., M. A., Ph. D.; Tutor de Hebraico, Antigo Testamento e História da Igreja do Spurgeon’s College, Londres, Reino Unido REIM ER, DAVID B. Th., B. A., M. A., D. Phil.; membro e tutor de Hebraico e Antigo Testamento da Regent’s Park College, University o f Oxford, Oxford, Reino Unido ROGERS, JR . CLEON L. B. A.,Th. B.,Th. M.,Th. D.; FundadoreAntigo Diretor do Oeiman Theological Seminary, Giessen, Alemanha ROOKER, MARK B. A., Th. M., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Southeastem Baptist Theological Seminary, Wake Forest, Carolina do Norte, Estados Unidos da América VAN ROOY, HARRY F. M. A., Th. B., D. Litt.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas da Portchefstroom University for Christian Higher Education, Potchefstroom, África do Sul ROSS, ALLEN P. Th. M., Th. D., Ph. D.; Professor de Estudos Bíblicos da Trinity Episcopal School for Ministry, Ambridge, Pennsylvania, Estados Unidos da América SATTERTHWAITE, PH IL IP E. B. A., M. A., Ph. D.; acadêmico afiliado da Faculdade de Estudos Orientais, University o f Cambridgc; Pesquisador no Tyndale House, Cambridge, Reino Unido SCH1BLER, DANIEL B. A., M. A., Docteur en Études Orientales; Professor Leitor Visitante no Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois; Pastor da Igreja Reformada da Suíça, Vevey, Suíça
xii
Colaboradores
SCHOVILLE, KEITH N. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Emérito de Hebraico e Estudos Semitas, University o f Wisconsin, Madison, Wisconsin, Estados Unidos da América SCHULTZ, R1CHARD B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Wheaton College, Wheaton, Illinois, Estados Unidos da América SEEVERS, BOYD B. A., Th. M., doutorando pela Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América SELMAN, MARTIN J. B. A„ M. A., Ph. D.; Diretor Adjunto, Spurgeon’s College, Londres, Reino Unido SHEPHERD, JERRY M. A. R., Ph. D. Associado; Professor Assistente de Antigo Testamento do Edmonton Baptist Seminary, Edmonton, Alberta, Canadá SKJOLDAL, N E IL O . B. A., S. T. M., Ph. D.; Professor Assistente de Estudos Bíblicos, Trinity International University, Miami. Flórida, Estados Unidos da América SM ICK, E LM ER B. t B. A., Th. B., S. T. M., Ph. D.; Ex-Professor de Antigo Testamento, Gordon-Conwell Theological Seminary, South Hamilton, Massachusetts, Estados Unidos da América SM ITH, GARY V. B. A., M. A., Ph. D., Professor de Antigo Testamento, Bethel Theological Seminary, Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos da América SONG, THOM AS B. Th., M. Div., doutorando na Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América SOUTHW ELL, PETER J. M. M. A.; tutor graduado, Wycliffe Hall; capelão e acadêmico de Teologia, The Queen’s College, Oxford, Reino Unido SPENDER, ROBERT D. B. A., M. A., Ph. D.; Professor de Estudos Bíblicos, The King’s College, BriarclifTManor, New York, Estados Unidos da América SPINA, FRANK ANTHONY B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Seattle Pacific University, Seattle, Washington. Estados Unidos da América STALLMAN, ROBERT C. B. A., M. Div., Doutorando; Westminster Theological Seminary; Professor Assistente de Bíblia e Teologia do Central Bible College, Springfield, Missouri, Estados Unidos da América STRONG, JO H N T. B. A., M. Div., M. A. R., Ph. D.; acadêmico da Southwest Missouri State University, Springfield, Missouri, Estados Unidos da América STRUTHERS, GALE B. B. A., M. A., doutorando na Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois; instrutor do Oak Hills Bible College, Bemidji. Minnesota, Estados Unidos da América SWART, IGNATIUS B. A., B. A. (Hons.), M. A., B. Th., D. Phil.; candidato ao Departamento de Estudos Religiosos, Universidade de Stellenbosch, Stellenbosch, África do Sul TALLEY, DAVID B. A., M. A., Th. M., Doutorando pela Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América TAYLOR, J. GLEN B. A., Th. M., Ph. D.; Professor Associado, Wycliffe College, Toronto, Ontario, Canadá TAYLOR, M ARION A. B. A., M. A., M. Div., S. T. M., Ph. D.; Professor Associado de Antigo Testamento, Wycliffe College, University o f Toronto, Toronto, Ontario, Canadá TAYLOR, RICHARD A. B. A., M. A., Ph. D., M. A., Ph. D.; Professor de Estudos do Antigo Testamento, Dallas Theological Seminary, Dallas, Texas, Estados Unidos da América
xiii
Colaboradores
THOM PSON, DAVID L. A. B., B. D., Th. M., Ph. D.; F. M. e Professor da cátedra Ada Thompson de Estudos Bíblicos, Asbury Theological Seminary, Wilmore, Kentucky, Estados Unidos da América THOM PSON, JO H N ARTHUR M. A., M. Se., B. Ed„ B. D., Ph. D.; Ex-leitor, University o f Melboume, Departamento de Estudos do Oriente Médio, Melboume, Austrália TOMASINO, ANTHONY B. A., M. Div., Ph. D.; acadêmico, University o f Chicago, Chicago, Illinois, Estados Unidos da América TREBILCO, PAUL R. B. Se., B. D., Ph. D.; Professor de Estudos do Novo Testamento, Knox College, e Sub-Reitor da Faculdade de Teologia, University o f Otago, Dunedin, Nova Zelândia TSUMURA, DAVID T. B. Se., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Japan Bible Seminary, Hamura, Tóquio, Japão TUELL, STEVE S. B. A., M. Div., Ph. D.; Professor Associado de Estudos Religiosos; Randolph-Macon College, Ashland, Virgínia, Estados Unidos da América VAN DAM, CORNELIS B. A., B. D., Th. M„ Th. D.; Professor de Antigo Testamento, Theological College o f the Canadian Reformed Churches, Hamilton, Ontario, Canadá VANGEMEREN, W ILLEM A. B. A., B. D., M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Trinity Evangelical Divinity School, Deerfield, Illinois, Estados Unidos da América VANHOOZER, KEVIN B. A., M. Div., Ph. D.; Professor Acadêmico em Teologia, New College, Edinburgh University, Edimburgo, Escócia VAN LEEUW EN, CORNELIS D. Th.; Professor Emérito de Antigo Testamento, Rijksuniversiteit Te Utrecht, Países Baixos VAN LEEUW EN, RAYMOND C. B. A.. B. D., M. A., Ph. D.; Professor de Bíblia e Teologia, Dept. de Bíblia e Teologia, Eastem College, St. Davids, Pennsylvania, Estados Unidos da América VAN NO Y, J. ROBERT B. A., M. Div., S. T. M., Th. D.; Professor de Antigo Testamento do Biblical Theological Seminary, Hatfield, Pennsylvania, Estados Unidos da América VAN PELT, M ILES V. B. A., M.A; Professor Leitor de Grego, Gordon College, Wenham, Massachusetts, Estados Unidos da América VAN ROOY, HARRY F. M. A., Th. B., D. Litt.; Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas no Portchefstroom University for Christian Higher Education, Potchefstroom, África do Sul VASHOLZ, ROBERT B. A.. M. A., B. D., M. A., Th. M., Th. D.; Presidente do Departamento de Antigo Testamento no Covenant Theological Seminary, St. Louis, Missouri, Estados Unidos da América VERHOEF, PIE T ER A. M. A., M. Th., D. Th.; Professor Emérito, University o f Stellenbosch, Stellenbosch, República da África do Sul VOS, HOWARD F. B. A., Th. M., Th. D., M. A., Ph. D.; Professor de História e Arqueologia, Chefe de departamento do The King’s College, BriarcliffManor, New York, Estados Unidos da América WAKELY, ROBIN B. A., Ph. D.; Professor Acadêmico em Hebraico e Estudos do Antigo Testamento, Rhodes University, Grahamstown, África do Sul WALKER, LARRY L. B. A., B. D., M. A., Ph. D.; Presidente do Departamento de Antigo Testamento, Professor de Antigo Testamento e Línguas Semitas, Mid-America Baptist Theological Seminary, Memphis, Tennessee, Estados Unidos da América
xiv
Colaboradores
WALTKE, BRUCE K. Th. D., Ph. D.; Professor da cátedra Marshall Sheppard de Estudos Bíblicos da Regent College, Vancouver, British Columbia, Canadá; Professor de Antigo Testamento, Reformed Theological Seminary, Orlando, Flórida, Estados Unidos da América WALTON, JO H N H. A. B., M. A., Ph. D.; Professor de Bíblia, Moody Bible Institute, Chicago, Illinois, Estados Unidos da América WAY, ROBERT J. M. A. (Univ. o f St. Andrews), M. A. (Univ. o f Cambridge); Ministro, Headingley St. Columba United Reformed Church. Leeds, Reino Unido W EGNER, PAUL B. A., M. Div., Th. M., Ph. D.; Professor Associado do Moody Bible Institute, Chicago, Illinois, Estados Unidos da América WENHA.M, GORDON J. M. A., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, The Cheltenham and Gloucester College o f Higher Education, Cheltenham, Reino Unido W ILLIAM S, TYLER F. B. A., M. Div., Doutorando do University o f St. Michaels College, Wycliffe College, University o f Toronto, Toronto, Ontário, Canadá W ILLIAM S, W ILLIAM C. B. A., M. A., M. A. Rei., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento, Southern Califórnia College, Costa Mesa, Califórnia, Estados Unidos da América W ILLIAM SON, HUGH G. M. M. A., Ph. D., D. D., F. B. A.; Professor Régio de Hebraico, The University o f Oxford, Oxford, Reino Unido W ILSON, GERALD H. B. A., M. Div., M. A., M. A., Ph. D.; Assistente do Reitor e Diretor de Programas Especiais do Western Evangelical Seminary, Portland, Oregon, Estados Unidos da América W ILSON, IAN B. Se., M. Phil., M. A., Ph. D.; Clare Hall, Cambridge, Reino Unido W ILSON, MARVIN R. B. A., M. Div., M. A., Ph. D.; Professor “Harold J. Ockenga” de Estudos Bíblicos e Teólogicos, Gordon College, Wenham, Massachusetts, Estados Unidos da América WISEMAN, D. J. M. A., D. Lit., F. B. A.; Professor Emérito de Assiríologia, The University o f London, Londres, Reino Unido WOLF, HERBERT M. B. A., Th. M., Ph. D.; Professor de Estudos Teológicos (Antigo Testamento) da Wheaton College Graduate School, Wheaton, Illinois, Estados Unidos da América W OLTERS, AL B. A., M. A., doutorando, Ph. D.; Professor de Estudos Bíblicos, Redeemer College, Ancaster, Ontario, Canadá W RIGHT, C H RISTO PH ER J . H. M. A., Ph. D.; Diretor, Acadêmico em Antigo Testamento, Ali Nations Christian College, Warc, Reino Unido YAMAUCHI, EDWIN M. B. A., M. A., Ph. D.; Professor de História, Miami University, Oxford, Ohio, Estados Unidos da América YARCHIN, W ILLIAM S. B. A., M. A., Ph. D.; Professor Associado de Religião da Azusa Pacific University, Azusa, Califórni Estados Unidos da América YOUNGBLOOD, RONALD F. B. D., Ph. D.; Professor de Antigo Testamento e Hebraico, Bethel Theological Seminary (West), Sa Diego, Califórnia, Estados Unidos da América YOUNGER, K. LAWSON, JR . B. A., Th. M„ Ph. D.; Professor Associado de Estudos Bíblicos, LeToumcau University, Longview, Texas, Estados Unidos da América XV
Abreviações: Geral
Abreviações Geral a. C. AAS abr. abs. ac. acad. adj. adv. AES af. AG apoc. Apr. Áq. ár. aram. aramA aramB aramE araml aramJ aramP aram PC aramPJ aramS aramT art. assír. ast. AT at. bab. BH bíbl. c. can. cap(s). cf. col(s). conj. const. copt. crist. CS D def. denom. deut. dial. disleg. diss. du. xvi
antes de Cristo antigo arábico do Sul abreviado, abreviatura absoluto acusativo acadiano adjetivo, adjetival advérbio, adverbial arábico epigráfico do Sul afel (Versão) Antiga Grega apocalíptico Livros apócrifos Versão grega de Aquila arábe, arábico aramaico aramaico antigo aramaico bíblico aramaico egípcio aramaico imperial aramaico judaico aramaico palestino aramaico palestino cristão aramaico palestino judaico aramaico samaritano aramaico tardio artigo assírio assunto Antigo Testamento ativo babilõnico Bíblia Hebraica bíblico circa (cerca de) cananita, cananeu, cananéia capítulo
E eA ed(s). egíp. Einl. ep(s). esp. et. etp. fem. fen. fig(s).
frg(s). FS G ha. hapleg. HB heb. hi. hisht. hit. hitp. hitpalp. hitpol. HM ho. HPB HR HT idem impf. impv. indcf. inf. ing. intrans. ipht. J jd. jud. juss.
K LA lat. lit. loc.cit. LQ LR Lpr. LXX mand.
Eloístico (fonte/estrato) (Tell) el-Amama (tabuleta) editado por, editor(es), edição(ões) egípcio Einleitung (introdução) epístola(s) especialmente etíope elpe'el/elpa'al feminino fenício figura(s) fragmento{s) Festschríft (conjunto de textos) grego haphel hapax legomenon (que ocorre uma vez) Hebraico Bíblico hebraico, hebreu, hebréia hiphil hishlaphel hitita hitpael hitpalpel hilpolel hebraico moderno hophal hebraico pós-bíblico hebraico rabínico hebraico tardio o mesmo imperfeito imperativo indefinido infinitivo inglês intransitivo iphta 'al javista (fonte/estrato) judaico da Judéia jussivo kethib, ketiv (“como é lido"; diferença entre o texto escrito e o lido) latim antigo (versão) latim literal(mente) loc cilato (no local citado) literatura de Qumran literatura rabínica Leitura proposta Septuaginla mandeano
Abreviações: Símbolos
masc. mg. Midr. Mix. Mix. Sin. MMM moab. MS(s) n. NA nab. NG ni. nom. NP NR NT nt. O. OA obj. OM OMA Onk. op. cit. P(P)pa. pal. palm. par. part(s). pass. P-B PC pe. Pent. Pex. Pf. pi. pilp. pl(s). pol. pred. PS PSa Pseud. pu. pún.
masculino margem Midraxe (midráxico) Mixná (mixnaico) Mixná do Sinédrio Manuscritos do Mar Morto moabita manuscríto(s) número(s) Neo-assírio nabaleano nome geográfico niphal nominativo nome próprio rodapé Novo Testamento nota(s) Oeste, Ocidente Oriente antigo objeto Oriente Médio Oriente Médio Antigo Onkelos (Targum) opere citato (na obra citada) página(s) pael palestino palmireno paralelo(s) / passagens paralelas particípio(s) passivo pós-bíblico palestino cristão peal Pentateuco Pexila perfeito piei pilpel plural(is) polel / polal predicado proto-sinaitico Pentateuco Samaritano pseudepígrafos pual púnico
Q qrab. ref(s). reimp. rev. RS S s.v. s/d SA sab. sam. séc. seg(s). sem. semO sim. Simc. sing. sir. SN subs. suf. sum. supl. Talm. TalmB TalmP Teod. Trg(s). TI tiph. TM Tosef. TR tr. trans. ugar. v(v). var(s). vb(s). Vg. Vl(s) viz. VL vrs. vs.
qere qal rabínico referência(s) reimpressão, reimpresso revisado (por) Ras Samra (ugarítico) Sacerdotal, clerical (fonte/estrato) sub verbo (na palavra relevante) sem data Séries Antigas sabcano (dialeto do AAS) samaritano século e seguintes semita, semitico semítico ocidental similar(mente) Versão grega de Símaco do AT singular siríaco (língua) Séries Novas substantivo(s) sufixo sumério suplemento, suplementar Talmude (talmúdico) Talmude babilônio Talmude Palestino (de Jerusalém) Versão grega de Teodócio do AT Targum / targumim (targúmico) Tradução em inglês tiphil texto massorético Tosefta Textrn Receptus (Texto Recebido) tradução, traduzido por transitivo ugarítico versículo(s) varianle(s) verbo(s) Vulgata versão(ões) em inglês videlicet (a saber) Yetus latina versões (antigas) versus
Símbolos II
< > * -> ft x: Teologia
paralelo com provém de origina forma hipotética referência-cruzada (dentro do NDITE AT) número hebraico (sistema Goodrick-Kohlenberger) ver artigo (x) no quarto volume
xvii
Abreviações: Publicações
Publicações 1819 AANLM AARSBLA AARSR AASOR AB ABD ABL ABRL AbrN ACF AcOr ADOG AEO AER ÀF AfO ÀgAbh AGJU AGM ACM N AHw AJBA AJBI AJSL ALUOS AnBib Anclsr ANEP ANESTP ANET Ang AnOr ANQ AnSl AO AOAT AOB AOS AOSTS AOT AOTS APFC APNM APOT ARA ARAB ArbT ARC ARE ARM
xviii
A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira d’Almeida. Texto original de 1819. Atti deH'Academia Nazionale dei Lincci: Memorie American Academy o f Religion/Society o f Biblical Literature Abstracts American Academy o f Religion Studies in Religion Annual o f the American Schools o f Oriental Research Anchor Bible Anchor Bible Dictionary, ed. D. N. Freedman, 6 vols., New York, 1992 R. F. Harper, Assyrian and Babylonian Lellers, 14 vols., Chicago, 1892-1914 Anchor Bible Reference Library Abr-Nahrain A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira d ’Almeida. Edição Corrigida Fiel. Acta orientalia Abhandlungen der Deutschen Orienl-Ge.iellschaft A. H. Gardiner, Ancient Egyptian Onomastica, 3 vols., London, 1947 American Ecclesiastical Review Âgyptologische Forschungen A rchivfiir Orientforschung Âgyptologische Abhandlungen Arbeiten zur Geschichte des antiken Judentums und des Urchristentums A /vh ivfu r Geschichte der Medizin. ed. K. Sudhoff, 20 vols., Leipzig, 1907-1928 Sudhoffs Archiv fu r Geschichte der Medizin (und Naturwissenschaften). vols. 21-, 1929W. von Soden, Akkadisches Handwòrterbuch. 3 vols., Wiesbaden, 1959-1981 Australian Journal o f Biblical Archaelogy Annual o f the Japanese Biblical Institute American Journal ofSem itic Languages and Literatures Annual o f Leeds University Oriental Society Analecta bíblica R. de Vaux, Ancient Israel: Its Life and Institutions, 2 vols., tr. J. McHugh, New York, 1961, 1965 The Ancient Near East in Pictures. ed. J. B. Pritchard. Princeton, 1954, 1969 Ancient Near East: Supplementary Texts and Pictures, ed. J. B. Pritchard, Princeton, 1969 Ancient Near Eastern Texts Relating to lhe Old Testament, ed. J. B. Pritchard, Princeton, 1950, 1955% 19695 Angelicum Analecta orientalia Andover Newton Quarteríy Anatolian Studies Der alte Orient Alter Orient und Altes Testament Altorientalische Bilder zum AT. ed. H. Gressmann, Berlin, 1927American Oriental Series American Oriental Society Translation Series Altorientalische Texte zum AT. ed. H. Gressmann, Berlin, 1926Archaeology and Old Testament Study, ed. D. W. Thomas, Oxford, 1967 A. E. Cowley, Aramaic Papyri o f the Fifth Century B. C., Oxford, 1923 11. B. Huffmon, Amorite Personal Names in the Mari Texts. Baltimore, 1965 Apocrypha and Pseudepigrapha o f the Old Testament, ed. R. H. Charles, 2 vols., Oxford, 1913; repr. 1978 A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira d ’Almeida. Edição Revista e atualizada. Ancient Records o f Assyria and Babylonia. ed. D. D. Luckenbill, 2 vols., Chicago, 1926-1927; reimpr. 1968 Arbeiten zur Theologie A Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira d ’Almeida. Edição Revista e corrigida. Ancient Records o f Egypt. ed. J. H. Breasted, 5 vols., Chicago, 1905-1907; repr. New York, 1962 Archives royales de Mari
Abreviações: Publicações
ArOr ARW AS ASG ASNU ASOR AST1 ASV ATAbh ATANT ATAT ATD ATDA ATDan ATR AusBR AuSP AUSS AUSSDS AV BA BAfO BAGD BARev BASOR BASS BAT BBB BBC BBET BBLAK. BBR BDB BDT BEATAJ BeO BethM BETL BETS BEUP BEvT BFT BGBE BHEAT BHH BHK BHS BHT Bib BibLeb BibOr BibRev
Archiv orientálni Archiv fiir Religionswissenschaft D. D. Luckenbill, The Annals o f Sertnacherib, OIP 2, Chicago, 1924 Archiv fiir Schweizerische Geschichle Acta scminarii neotestamentici upsaliensis American Schools o f Oriental Research Annual o f lhe Swedish Theological Inslitule American Standard Version Alttestamentliche Abhandlungen Abhandlungen zur Theologie des Alten und Neuen Testaments Arbeiten zu Text und Sprache im Alten Testament Das Alte Testament Deutsch Aramaic Texls from Deir ‘Alia, ed. J. Hoftijzer and G. van der Kooij, DMOA 19, Leiden, 1976 Acta theologica danica Anglican Theological Review Australian Biblical Review G. H. Dalman, Arbeit und Sitie in Palãstina, 7 vols., Gutersloh, 1928-1942; repr. 1964 Andrews University Seminary Studies Andrews University Seminary Studies: Dissertation Series Authorized (King James) Version Biblical Archaeologist Beihefle zur Archiv fiir Orientforschung W. Bauer, W. F. Amdt, F. W. Gingrich, F. W. Danker, Greek-English Lexicon o f lhe NT. Chicago, 1957, I9792 Biblical Archaeology Review Bulletin o f lhe American Schools o f Oriental Research Beitrage zur Assyriologie und semitischen Sprachwissenschaft Die Botschaft des Alten Testaments Bonner biblische Beitrãge Broadman Bible Commentary Beitrãge zur biblischen Exegese und Theologie Beitrãge zur biblischen Landes und Altertumskunde Bulletin fo r Biblical Research F. Brown, S. R. Driver, and C. A. Briggs, Hebrew and English Lexicon o f lhe OT, Oxford, 1907; reimpr. com correções, 1953 Baker s Dictionary ofTheology, ed. E. F. Harrison, Grand Rapids, 1960 Beitrãge zur Erforschung des Alten Testaments und des Antiken Judentums Bibbia e oriente Beth Miqra Bibliotheca ephemeridum theologicarum lovaniensium Bulletin o f lhe Evangelical Theological Sociely Babvlonian Expedition o flh e University o f Pennsylvania. ed. H. V. Hilprecht; Series A, Cuneiform Texts, Philadclphia 1893-1914 Beitrãge zur evangelischen Theologie Biblical Foundations in Theology Beitrãge zur Geschichte der biblischen Exegese Bulletin d ’histoire et d ’exégèse de 1’Ancien Testament Biblisch-historisches Handwõrterbuch, ed. B. Reicke and L. Rost, 3 vols., Gõttingen, 19621966 Biblia hebraica, ed. R. Kittel, Stuttgart, 1905-1906, 197316 Biblia hebraica stuttgartensia, ed. K. Elligerand W. Rudolf, Stuttgart, 1969-1975, 19843 Beitrãge zur historischen Theologie Biblica Bibel und Leben Biblica et orientalia Bible Review'
xix
Abreviações: Publicações
BibS Biella BIES B1FAO Bijdr BIN BIOSCS BJ BJPES BJRL BJS BKAT BJ BL BL BN BO BR BRL BRM BSac BSC BSAPF BT BTB BTGP BuA BurH BVC BVSAW BWANT BWL BZ BZAW CAD CAH CahRB CahThéol CAT CB CBC CBET CBQ CBQMS CBSC CC CGTC CHALOT ChiSl CII C1S c iw a
xx
Biblische Siudien (Freiburg, 1895-1930; Neukirchen, 1951-) J. C. Biella, Dictionary o f O ídSouth Arabic: Sabaean Dialect, HSS 25, Chico, Calit'., 1982 Bullelin o f lhe Israel Exploralion Society (= Yediol) Bulletin de 1'instituí français darchéologie orientale Bijdragen Babvlonian Inscríptions in the Collection o f James B. Nies, Yale University, New Haven, 19171954 Bulletin o f the International Organization fo r Septuagint and Cognate Studies Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2008. Bulletin o f the Jewish Palestine Exploration Society Bulletin o f the John Rylands University Library o f Manchester Brown Judaic Studies Biblischer Kommentar: Altes Testament Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2008. H. Bauer and P. Leander. Historische Grammatik der hebrãischen Sprache, Halle, 1918-1922; reimpr. 1962 Bibel-Lexikon, ed. H. Haag, Zurich, 1951; Einsiedcln, 1968Biblische Notizen Bibliotheca orientalis Biblical Research K. Galling, Biblisches Reallexikon. HAT l / l , Tübingen, 1937, 1977! Babvlonian Records in the Library ofJ. Pierpont Morgan, ed. A. T. Clay, New York, 1912-1923 Bibliotheca Sacra Bible Study Commentary Bíblia Sagrada. Trad. Pe. Antônio Pereira de Figueiredo. São Paulo, 1997. Bible Translator Biblical Theology Bulletin H.-J. Kraus, Die biblische Theologie: ihre Geschichle undProblematik, Neukirchen-VIuyn, 1979 B. Meissner, Babylonien und Assyrien. 2 vols., Heidelberg, 1920, 1925 Buried History Bible et vie chrétienne Berichte ilber die Verhandlungen der sãchsischen Akademíe der Wissenschaften zu Leipzig Beitrãge zur Wissenschaft vom Alten und Neuen Testament W. G. Lambert, Babylonian Wisdom Literature, Oxford, 1960 Biblische Zeitschrift Beihefte zur Zeitschrift filr die alttestamentliche Wissenschaft The Assyrian Dictionary o f the Orienta! Institute o f lhe University o f Chicago, Chicago, 1956Cambridge Ancient History, 12 vols., Cambridge, 1923-1939, 1961-19712, I970-3 Cahiers de Ia Revue biblique Cahiers théologiques Commentaire de 1’Ancien Testament Ccntury Bible Cambridge Bible Commentary Contributions to Biblical Exegesis and Theology Catholic Biblical Quarterly Catholic Biblical Quarterly Monograph Series Cambridge Bible for Schools and Colleges Communicator’s Commentary Cambridge Greek Testament Commentary A Concise Hebrew andAramaic Lexicon o f the Oíd Testament, ed. W. L. Holladay, Grand Rapids, 1971 Chicago Studies Corpus inscriptionum iudaicarum, Vatican City, 1936Corpus inscriptionum semiticarum. Paris, 1881 The Cuneiform Inscríptions o f Western Asia, ed. H. C. Rawlinson, 5 vols., London, 1861-1884, I8 9 l:; repr. 1909
Abreviações: Publicações
CJ CJT CML ConBNT ConBOT ConCom COT CPTOT CRAI CRINT CTA CTBT CTJ CTM CTM CurTM DB DBHE DBl DBSup DBT DCH DDD DHRP DISO DJD DLE DME DMOA DNWSI DÕAW DOTT DSB DTC DTT EAEHL EBC EBib ECT EDB EDNT ED T EHAT EMiqr EncBib EnchBib EncJud
Concordia Journal Canadian Journal o f Theology Canaanite Myths and Legends, ed. G. R. Driver, Edinburgh, 1956; ed. J. C. L. Gibson, 19782 Coniectanea bíblica, New Testament Series Coniectanea biblica, Old Testament Series Continental Commentaries Commentaar op het Oude Testament, ed. G. C. Aalders, Kampen, 1955-1957 J. BarT, Comparative Philology and the Texl o f the Old Testament. Oxford, 1968; Winona Lake, Ind., 1987= Comptes rendus des séances de PAcadémie des inscriptions et belles lettres Compendia rerum iudaicarum ad Novum Testamentum A. Herdner, Corpus des lablettes en cunéiformes alphabétiques découvertes à Ras Shamra-Ugarit, 2 vols. Paris, 1963 Cuneiform Texts from Babylonian Tablets... in the British Museum, London, 1896Calvin Theological Journal Calwer theologische Monographien Concordia Theological Monthly Currents in Theology and Mission Dictionnaire de Ia Bible, ed. F. Vigouroux, Paris, 5 vols., 1895-1912 Diccionaria Biblico-Hebreo-Espahol, ed. L. Alonso-Schõkel, V. Morla, and V. Collado, 12 vols., Valencia, 1990-1993 A Dictionary o f Biblical Interpretation, ed. R. J. Coggins and J. L. Houlden, Philadelphia, 1990 Dictionnaire de Ia Bible: Supplément, ed. L. Pirot et ai.. Paris, 1928X. Léon-Dufour, Dictionary o f Biblical Theology, tr. P. J. Cahill and E. M.Stewart, New York, 1973J (ET o f Vocabulaire de théologie biblique. Paris, 19682) Dictionary o f Classical Hebrew, ed. D. J. A. Clines, ShefField, 1993Dictionary o f Deities and Demons in the Bible, ed. K. van der Toom, B. Becking, and P. W. van der Horst, Leiden, 1995 Dissertationes ad historiam religionum pertinentes C.-F. Jean and J. Hoftijzer, Dictionnaire des inscriptions sémitiques deVouest, Leiden, 1965 Discoveries in the Judaean Desert, Oxford, 1955A Dictionary ofLate Egyptian, ed. L. H. Lesko and B. S. Lesko, 4 vols., Berkeley, Calif., 19821989 A Concise Dictionary o f Middle Egyptian, ed. R. O. Faulkner, Oxford, 1962 Documenta et monumenta orientis antiqui J. Hoftijzer and K. Jongeling, Dictionary o f the North-West Semitic Inscriptions. 2 vols., Leiden, 1995 Denkschri ften: Osterreichischer Akadcmie der Wissenschaften Documents from Old Testament Times, ed. D. W. Thomas, London, 1958 Daily Study Bible Dictionnaire de théologie catholique, 15 vols., Paris, 1903-1950 Dansk teologisk tidsskrift Encyclopedia ofArchaeological Excavations in the Holy Land. ed. M. Avi-Yona, 4 vols., Englewood Cliffs, N.J., 1975-1978 The Expositor's Bible Commentary, ed. F. E. Gaebelein, 12 vols., Grand Rapids, 1976-1995 Études bibliques The Egyptian Coffm Texts, ed. A. de Buck and A. H. Gardiner, Chicago, 1935-1947 Encyclopedic Dictionary o f the Bible, ed. and tr. L. F. Hartman, New York, 1963 Exegetical Dictionary o f the New Testament, ed. H. Balz and G. Schneider, 3 vols., Grand Ra pids, 1990- (ET o f Exegetisches Wõrterbuch wum NT, 3 vols. Stuttgart, 1980-1982) Evangelical Dictionary o f Theology, ed. W. A. Elwell, Grand Rapids, 1984 Exegetisches Handbuch zum Alten Testament Entsiqlopedia m iqra'it-Encyclopaedia biblica, 8 vols., Jerusalém, 1950-1982 Encyclopaedia Biblica. ed. T. K. Cheyne, 4 vols., London, 1899-1903, 1914:; repr., 1958 Enchiridion biblicum Encyclopaedia Judaica, Jerusalem, 1971-1972
xxi
Abreviações: Publicações
EOTT ER ERE
C. Westermann, Elemenls o f Old Testament Theology, tr. D. W. Stott, Atlanta, 1982 The Encyclopedia o f Religion, ed. Mircea Eliade, 16 vols., New York, 1987 Encyclopaedia o f Religion and Ethics, ed. J. Hastings, 13 vols., New York, 1908-1927; reimpr., 13 vols. in 7, 1951) ErfTS Erfurter theologische Studien Erlsr Eretz Israel ErJb Eranos Jahrbuch ESE M. Lidzbarski, Ephemeris fiir semitische Epigraphik, Giessen, 1900-1915 EstBib Estúdios biblicos ETL Ephemerides lheologicae lovanienses ETR Etudes thêologiques et religieuses Even-Shoshan A New Concordance o f lhe Bible, ed. A. Even-Shoshan, Jerusalem, 1977,1983'* EvK Evangelische Kommentare EvQ Evangelical Quarterly EvT Evangelische Theologie ExpTim Expository Times FOTL Forms o f Old Testament Literature FOTT The Flowering o f O ld Testament Theology, ed. B. C. Ollenburger, E. A. Martens and G. F. Hasel, Sources for Biblical and Theological Study 1, Winona Lake, Ind., 1992 FRLANT Forschungen zur Religion und Literatur des Alten und Neuen Testaments FuF Forschungen und Fortschritte FzB Forschung zur Bibel GAG W. von Soden, Grundriss der akkadischen Grammatik, AnOr 33, Rome, 1952 GKC Gesenius'HebrewGrammar, ed. E. Kautzsch, tr. anded. A. E. Cowley, Oxford, 19IO2 (E T of W. Gesenius, Hebrüische Grammatik, ed. E. Kautzsch, Halle, I9093*) GLECS Comptes rendus du Groupe linguistique d ’études chamito-sémitiques GPL Z. S. Harris, A Grammar o f lhe Phoenician Language, AOS 8, New Haven, 1936; repr. 1990 GSAT Gesammelte Studien zum Alten Testament GTJ Grace Theological Journal Guide Guide to Old Testament Theology and Exegesis (vol. 1 do nidotte) GVGSS C. Brockelmann, Grundriss der vergleichenden Grammatik der semitischen Sprachen, 2 vols., Berlin, 1908-1913; repr. 1961 HAD Hebrew and Aramaic Dictionary o f the OT, ed. G. Fohrer, tr. W. Johnston, London, 1973 (ET of Hebrâisches undaramâisches Wõrterbuch zum AT, Berlin, 1971) HAHAT W. Gesenius, Hebrâisches und aramâisches Handwõrterbuch über das Alte Testament, ed. F. Buhl, Berlin, 1915'7; ed. R. Meyerand H. Donner, 1987-18 HAIJ A History o f Ancient Israel and Judah, ed. J. M. Miller and J. H. Hayes, Philadelphia, 1986 HALAT Hebrâisches und aramâisches Lexicon zum Alten Testament, ed. L. Koehler, W. Baumgartner, and J. J. Stamm. 5 vols., Leiden, 1967-19955 HALOT The Hebrew and Aramaic Lexicon o f the O ld Testament, 1994- (ET o f HALAT) HAR Hebrew Annual Review HAT Handbuch zum Alten Testament HAW E. Kõnig, Hebrâisches und aramâisches Wõrterbuch zum Alten Testament, Leipzig, 1910 HBC H arpers Bible Commentary, ed. J. L. Mays et al., San Francisco, 1988 HBD Harper i Bible Dictionary, ed. P. J. Achtemeier, San Francisco, 1985 HBT Horizons in Biblical Theology HDB H astings’Dictionary o f the Bible. ed. J. Hastings, 5 vols., New York, 1898-1904; reimpr. Peabody, Mass., 1994 HDR Harvard Dissertations in Religion Herm Hermanthena HeyJ Heythrop Journal HG J. Fricdrich, Die hethitischen Gesetze, DMOA 7, Leiden, 1959 HKAT Handkommentar zum Alten Testament HL E. Neufeld, The Hittite Laws, London, 1951 HNE M. Lidzbarski, Handbuch der nordsemitischen Epigraphik, Weimar, 1898 HO Handbuch der Orientalistik
xxii
Abreviações: Publicações
HR
HS HSAT HSM HSS HSyn HTR HTS HUCA HUCM IB IBD IBHS IBS ICC ÍDB IDBSup 1EJ IH IJH ILC
IndES Int Interp IOS IOSOT IO T IOTS IPN IRT ISBE ITC ITQ JAAR J ANESCU JAOS JAOSSup JARG JASA Jastrow JB JBC JBL JBQ JBR JCS
E. Hatch and H. A. Rcdpath, Concordance to the Septuagint and Other Greek Versions o f the O ld Testament, 2 vols. and supp. vol., Oxford, 1897 (vols. 1-2), 1906 (supl.); reimpr., 3 vols. in 2, Grand Rapids, 1983 Hebrew Studies Die heilige Schrift des Alten Testaments, ed. E. KauUsch and A. Bertholet, Tübingen, 19221923J Harvard Semitic Monographs Harvard Semitic Studies C. Brockelmann, Hebrâische Syntax, Neukirchen. 1956 Harvard Theological Review Harvard Theological Studies Hebrew Union College Anmial Monographs o f the Hebrew Union College The Interpreter 's Bible. ed. G. A. Buttrick et al., 12 vols., New York, 1951-1957 The Illustrated Bible Dictionary, ed. J. D. Douglas and N. Hillyer, 3 vols., Leicester, 1980 B. K. Waltke and M. 0 ’Connor, An Introduction to Biblical Hebrew Syntax, Winona Lake, Ind., 1990 Irish Biblical Studies International Criticai Commentary The Interpreter s Dictionary o f the Bible, ed. G. A. Buttrick, 4 vols., New York, 1962 The Interpreter s D ictionary o f the Bible, Supplementary Volume, ed. K. Crim, Nashville, 1976 Israel Exploration Journal J. de Rougé, Inscríptions hiéroglyphiques copiées en Egypte, Etudes égyptologiques 9-11, 3 vols.. Paris, 1877-1879 Israelite and Judaean History, ed. J. H. Hayes and J. M. Millcr, Philadelphia, 1977 J. Pedersen, Israel: Its Life and Culture, tr. A. Moller (vols. I -2) and A.I. Fausball (vols. 3-4), 4 vols. in 2, London, 1926, 1940; repr. 1973 (ET o f Israel, vols. 1-2: Sjaeleliv og Samfundsliv, vols. 3-4: Hellighed o f Guddeomelighed, Copenhagen, 1920, 1934) Indiatt Ecclesiastical Studies Interpretation Interpretation Israel Orienta! Studies The International Organization for the Study o f the Old Testament R. K. Harrison, Introduction to the Old Testament. Grand Rapids, 1969 B. S. Childs, Introduction to the Old Testament as Scripture, Philadelphia, 1979 M. Noth. Die israelitischen Personennamen im Rahmen der gemeinsemitischen Namengebung, BWANT 3/10, Stuttgart, 1928; repr., Hildesheim, 1980 Issues in Religion and Theology International Standard Bible Encyclopedia, ed. G. W. Bromiley, 4 vols., Grand Rapids, 1979-19882 International Theological Commentary Irish Theological Quarterly Journal o f the American Academy o f Religion Journal o f the Ancient Near Eastern Society o f Columbia University Journal o f the American Oriental Society Supplement to the Journal o f the American Oriental Society Jahrbuch Rir Anthropoologie und Religionsgeschichte Journal o f the American Scientific Affiliation M. Jastrow, Dictionary o f the Targumim, the Talmud Babli and Yerushalmi, and the Midrashic Literature, 2 vols., New York, 1886-1903 Jerusalem Bible The Jerome Biblical Commentary, ed. R. E. Brown et al., 2 vols. in I, Englewood Cliffs, N.J., 1968 Journal o f Biblical Literature Jewish Bible Quarterly (1989-) (formerly Dor leDor [ 1972-1989]) Journal o f Bible and Religion Journal o f Cuneiform Studies
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Abreviações: Publicações
JEA JEOL JES JETS JewEnc JFSR JHNES JJS JM EOS JNES JNSL JPO S JPSV JQR JQRMS JR JSem JSJ JSN T JSO T JSOTSup JSP JSS JSSR JTC JTS JTVI Jud KA1 K AJl KARI KAT KAVI KB KB KBANT HBL2 HBL3' KBo KD
KD KEHAT KHAT KJV KISchr KP K.PG KQ T KSGVI KTU
xxiv
Journal o f Egyptian Archaeology Jaarbericht van het Vooraziatisch-Egyptisch Genootschap “Ex oriente lux " Journal o f Ecumenical Studies Journal o f the Evangelical Theological Society The Jewish Encyclopedia, ed. I. Singer, 12 vols., New York, 1901-1906 Journal o f Feminist Studies in Religion Johns Hopkins Near Eastem Studies Journal o f Jewish Studies Journal o f the Manchester Egyptian and OrientaI Society Journal o f Near Eastem Studies Journal o f Northwest Semitic Languages Journal o f the Palestine Oriental Society Jewish Publication Society Version Jewish Quarterly Review Jewish Quarterly Review Monograph Series Journal o f Religion Journalfo r Semitics Journalfo r the Study ofJudaism in lhe Persian, Hellenistic. and Roman Period Journalfo r the Study o f lhe New Testament Journalfo r the Study o f the O ld Testament Journal for the Study of the Oid Testament Supplement Series Journal fo r the Study o f the Pseudepigrapha Journal o f Semitic Studies Journal fo r the Scienlific Study o f Religion Journal fo r Theology and the Church Journal o f Theological Studies Journal o f Transactions o f the Victoria Institute Judaica: Beitrãge zum Verstõndnis... H. Donner and W. Rõllig, Kanaanãische undaram ãische Inschriften. 3 vols., Wiesbaden, 196719692 E. Ebeling, Keilschrifttexte aus Assur jurislischen Inhalts, WVDOG 50, Leipzig, 1927 E. Ebeling, Keilschrifttexte aus Assur religiõsen Inhalts, WVDOG 28, Leipzig, 1915Kommentar zum Alten Testament O. Schroeder, Keilschrifttexte aus Assur verschiedenen Inhalts, WVDOG 35, Leipzig, 1920 L. Koehler and W. Baumgartner, Lexicon in Veteris Testamenli libros, 2 vols., Leiden, 19582 Keilmschriftliche Bibliothek, ed. E. Schrader, 6 vols., Berlin, 1889-1915 Kommentare und Beitrãge zum Aiten und NeuenTestament ver KB ver HALAT Keilschrifttexte aus Boghazkõi, WVDOG 30,36,68-70,72,73,77-80,82-86,89-90, Leipzig,1916K. F. Keil and F. Delitzsch, Biblical Commentary on the Old Testament, tr. J.Martin et al., 25 vols., Edinburgh, 1857-1878; rcimpr. 10 vols., Grand Rapids, 1973 (ET o f Biblischer Kommen tar iiber das AT, 15 vols., Leipzig, 1861-1870, 1862-18752) Kerygma und Dogma Kurzgefasstes exegetisches Handbuch zum Alten Testament, ed. O. F. Fritzsche, 17 vols., Lei pzig, 1838-1862 Kur/er Hand-Commentar zum Alten Testament King James (Authorized) Version Kleine Schriflen (A. Alt, 3 vols., Munique, 1953-1959, 1964’; O. Eissfeldt, 6 vols., Tübingen, 1962-1979; K. Elliger, Munique, 1966) E. H. Merrill, Kingdom ofP riests: A History o f O ld Testament Israel, Grand Rapids, 1987 Knox Preaching Guides K. G. Kuhn, Konkordanz zu den Qumrantexten, Gõttingen, 1960 A. Alt, Kleine Schriflen zur Geschichte des Volkes Israel, 3 vols.,Munich, 1953-1959, 1964' Die keilalphabetischen Texte aus Ugarit, I, ed. M. Dietrich, O. Loretz, and J.Sanmartín, AOAT 24, Neukirchen-Vluyn, 1976
Abreviações: Publicações
KuAT Lange LB LBC LBI L ei LexÃg LexSyr LHA LU LLAVT LQ LR LS LSS LTK LTP LUA MAL MAOG McCQ MDB MdD MDP MedHab MEOL MGWJ Moscati MSL MTZ Mus MVÃG NAB NAC NASB NAWG NBC NBD NCBc. NEB NedTT NERTROT NFT NGTT NICNT NICOT NIDBA NIDNTT
NIDOTTE
Die Keilinschriften und das Alte Testament, ed. E. Schrader, Berlin, 19035 Lange Commentaries Lingüística biblica Layman’ s Bible Commentaries Library o f Biblical Interpretation Lesoménu W. Helck and E. Otto, Lexikon der Àgyptologie, Wiesbaden, 1972C. Brockelmann, Lexicon Svriaeitm. Berlin, 1895;Halle, 19682 F. Zorell, Lexicon hebraicum et aramaicum Veteris Testamenti, Rome, 1946-1954, I962J A. Dillmann, Lexicon tinguae aethiopicae. Leipzig, 1865 E. Vogt, Lexicon linguae aramaicae Veteris Testamenti documentis antiquis illustratum, Rome, 1971 Lutheran Quarterly Lutherische Rundschau Louvam Studies Leipziger semitistische Studien Lexicon fiir Theologie und Kirche, ed. J. G. Herder, second series, 10 vols., Freiburg, i.B., 19571965 Lavai théologique et philosophique Lunds universitets ârsskrift C. Saporetti, The Middle Assyrian Laws, Malibu, Calif., 1984 Mitteilungen der altorientalischen Gesellschaft McCormick Quarterly Le monde de Ia Bible E. S. Drowerand R. Macuch, A Mandaic Dictionary, Oxford, 1963 Mémoires de Ia délégation en Perse Medinet Habu, Epigraphic Expedition, OIP 8, Chicago, 1930; OIP 9, 1932 Mededelingen en Veitiandelingen van het Vooraziatisch-Egyptisch Genootschap “Ex oriente lux” Monatsschrift fiir Geschichte und Wissenschafi des Judentums S. Moscati, An Introduction to the Comparative Grammar o f Semitic Languages, Wiesbaden, 1969 Materialen zum sumeríschen Lexikon, Rome, 1937Münchener theologische Zeitschrift Muséon: Revue d ’ètudes orientales Mitteilungen der vorderasiatisch-âgyptischen Gesellschaft New American Bible New American Commentary New American Standard Bible Nachrichten der Akademie der Wissenschaften in Gõttingen The New Bible Commentary, ed. D. Guthrie and J. A. Motyer, London, I9703 The New Bible Dictionary, ed. J. D. Douglas, London. 19822 New Century Bible (Commentary) New English Bible Nederlands theologisch tijdschrift Near Eastern Religious Texts R elatingto the O ld Testament, ed. W. Beyerlin, Philadelphia, 1978 (ET o f Religiongeschichtliches Textbuch zum AT, Grundrisse zum AT 1, Gõttingen, 1975) New Frontiers in Theology Nederduits gereformeerde teologiese tydskrif New International Commentary on the New Testament New International Commentary on the Old Testament The New InternationalDictionary’ o f Biblical A rchaeology, ed. E. M. Blaiklockand R. K. Harrison, Grand Rapids, 1983 The New International Dictionary o f New Testament Theology, ed. C. Brown, 4 vols., Grand Rapids, 1975-1978 (ET o f Theologisches Begriffstexicon zum NT, ed. L. Coenen et al., 4 vols., Wuppertal, 1965-1971) The New International Dictionary o f Old Testament Theology and Exegesis (a presente obra)
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Abreviações: Publicações
N1V N1VEC NJBC NJPSV NKJV NKZ NorTT NovT NRSV NRT NTD NTOA NTS OBL OBO OBT OECT OED OIP OLP OLZ OMRM Or OrAnl OTE OTG OTL OTM OTS OTT o ttc t
OTTO OTWSA PAAJR Palachü Peake PEQ PJ Ph PNPI POT POTT POTW PPG PRU PSB PSTJ PTR PTS PTU Pyr xxvi
New International Version The NJV Exhauslive Concordance, ed. E. W. Goodrick and J. R. Kohlenberger III, Grand Rapids, 1990 The New Jerome Biblical Commentary, ed. R. E. Brown et al., Englewood ClifFs, N. J., 1990 New Jewish Publication Society Version New King James Version Neue kirchliche Zeitschrift Norsk teologisk tidsskrift Novum Testamentum New Revised Standard Version Nouvelle revue théologique Das Neue Testament Deutsch Novum Testamentum et orbis anliquus Neiv Testament Studies Orientalia et biblica lovaniensia Orbis biblicus et orientalis Overtures to Biblical Theology Oxford Editions o f Cuneiform Texts The Oxford English Dictionary Oriental Institute Publications Orientalia lovaniensia periódica Orientalistische Literaturzeitung Oudheidkundige Mededeelingen uit het Rijksmuseum van Oudheden te Leiden Orientalia Oriens anliquus Old Testament Essays Old Testament Guides Old Testament Library Old Testament Message: A Biblical-Theological Commentary Oudlestamentische Studiên G. von Rad, Old Testament Theology, tr. D. M. G. Stalker, 2 vols., New York, 1962, 1965 (ET of Theologie des ATs. Einfuhrung in die cvangelische Theologie l,2 v o ls., Munich, 1957, 1960) B. S. Childs, Old Testament Theology in a Canônica! Context, London, 1985 W. Zimmerli, Old Testament Theology inOutline, tr. D. E. Green, Atlanta, 1978 (ET o f Gnmdríss der aittestamentlichen Theologie, Theologische Wissenschaft 3, Stuttgart, 1972) Die Ou Testamentiese Werkgemecnskap in Suid Afrika Proceedings o f lhe American Academy o f Jewish Research J. L. Palache, Semantic Notes on the Hebrew Lexicon, tr. and ed. R. J. Z. Werblowsky, Leiden, 1959 Peake ‘s Commentary on the Bible, ed. M. Black and H. H. Rowley, New York, 1962Palestine Exploration Quarterly Palãstina-Jahrbuch Patrologia Latina, ed. J.-P. Migne, 221 vols.. Paris, 1841-1864 J. K. Stark, Personal Names in Palmyrene Inscríptions, Oxford, 1971 De Prediking van het Oude Testament Peoples o f O ld Testament Times, ed. D. J. Wiseman, Oxford, 1973 Peoples o f the Old Testament World, ed. A. E. Hoerth, G. L. Mattingley, and E. M. Yamauchi, Grand Rapids, 1994 J. Friedrich and W. Rõllig, Phõnizisch-punische Grammatik, AnOr 46, Rome, 1970: LeP alais royaldV garit, ed. C. F.-A. Schaeffer and J. Nougayrol, Paris, 1956Princeton Seminary Bulletin Perkins (School o f Theology) Journal Princeton Theological Review Pretória Theological Studies F. Grõndahl, Die Personennamen der Texte aus Ugarít, Rome, 1967 K. Sethe, Die oltãgyptischen Pyramidentexte, 4 vols., Leipzig, 1908-1922
Abreviações: Publicações
QD QDAP QJRM RA RAC RANE RÀR RArch RB RE REB RECA
RechBib REg REJ RelS RES ResQ RevExp RevistB RevQ RevScRel RevSém RGG RHLR RHPR RHR RLA RR RSO RSP RSR RSV RTL RTR RV RVV SAHG SANT SAOC SAT SBB SBLDS SBLMS SBM SBS SBT
Quaestiones disputatae, ed. K. Rahner and H. Schlier, Freiburg, i.B., 1958-; Eng. ed., New York, 1961Quarterlv o f the Department o f Antiquities in Palestine Quarterly Journalfo r Reflection on Ministry Revue d'assyriologie et d ’arehèologie orientale Reallexikon fu r Antike und Christentum, ed. T. Klauser, 10 vols., Stuttgart, 1950-1978 Records o f the Ancient Near East H. Bonnet, Reallexikon der õgyptischen Religionsgeschichte. Berlin, 1952 Revue archèologique Revue biblique Realeneyklopãdie Jurprotestantische Theologie und Kirche, ed. A. Hauck, Leipzig, 1896-1913 Revised English Bible Real-Encyclopãdie der classischen Altertumswissenschaft, ed.,A. Pauly, 6 vols., Stuttgart, 1839; ed. G. Wissowa et al.. first series, 24vo!s„ 1894-1963; second series, 10 vols., 1914-1972; supplements, 16 vols., 1903-1980 Rccherches bibliques Revue degyptologie Revue des études juives Religious Studies Rèpertoire d'épigraphie sémitique Restoration Quarterly Review and Expositor Revista biblica Revue de Qumran Revue de sciences religieuses Revue sémitique Die Religion in Geschichte und Gegenwart, H. Gunkel and L. Zschamack, 5 vols., Tíibingen, 1927-19312; ed. K. Galling, 7 vols., 1957-1965' Revue d'histoire et de littérature religieuses Revue d ’histoire et de philosophie religieuses Revue de l ‘histoire des religions Reallexikon der Assyriologie, ed. G. Ebeling and B. Meissner, Berlin. 1, 1932; 2, 1938; 3, 19571971; 4, 1972-1975; 5, 1976-1980; 6, 1980-1983; 7, 1987-1990 Review o f Religion Rivista degli studi orientali Ras Shamra Parallels: The Texts from Ugarit and the Hebrew Bible, ed. L. R. Fisher, vols. 1-2, AnOr 49-50, 1972, 1975; ed. S. Rummel, vol.3, AnOr 51, 1981 Recherches de Science religieuse Revised Standard Version Revue théologique de Louvain Reforned Theological Review Revised Version Religionsgeschichtlichc Versuche und Vorarbeiten A. Falkenstein and W. von Soden, Sumerische und akkadische Hymnen und Gebete, Zurich, 1953 Studien zum Alten und Neuen Testament Studies in Ancient Oriental Civilization Die Schriflen des Alten Testaments in Auswahl, tr. and ed. H. Gunkel et al., Gõttingen, 19091915, 1920-1925= Stuttgarter biblische Beitrãge Society o f Biblical Literature Dissertation Series Society o f Biblical Literature Monograph Series Stuttgarter biblische Monographien Stuttgarter Bibelstudien Studies in Biblical Theology
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Abreviações: Publicações
ScrHier Scrip SDIOAP SE SEÂ SEAJT Sem Seux SGL SGV SJ SJLA SJO T SJT SNovT SNumen SOTBT SPIB SR SSN SSS ST STÂ STDJ STK Str-B STT StudBib StudBT StudOr SUNT SVT SVTP SWBA SW JT Syria TAPA TArb TBT TBü TCL TDNT
TDOT TEH TEV TGI TGUOS THAT
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Scripta Hierosolymitana Scríptura Studia et documenta ad iura orientis antiqui pertinentia Studia Evangélica 1, 2, 3, etc. (= TU 73,1959; 87,1964; 88,1964; etc.) Svensk exegetisk ârsbok South East Asia Journal o f Theology Semitica J. M. Seux, Epithètes royales akkadiennes et sumériennes. Paris, 1967 A. Falkenstein, Sumerische Gõtterlieder, Heidelberg, 1959 Sammlung gemeinverstàndlicher Vortrâge und Schriften aus dem Gebiet der Theologie und Religionsgeschichte Studia judaica Studies in Judaism in Late Antiquity Scandinavian Journal o f the Old Testament Scottish Journal o f Theology Supplements to Novum Testamentum Supplements to Numen Studies in Old Testament Biblical Theology Scripta pontificii instituti biblici Studies in Religion/Sciences religieuses Studia semitica necrlandica Semitic Study Series Studia theologica Svensk teologisk ârsskrift Studies on the Texts o f the Desert o f Judah Svenskteologisk kvartalskrift H. L. Strack and P. Billerbeck, Kommentar zum N T aus Talmud und Midrasch, 6 vols., Munich, 1922-1961 The Sultantepe Tablets. vol. I, ed. O. R. Gumey and J. J. Finkelstein, London, 1957; vol. 2, ed. O. R. Gumey and P. Hulin, London, 1964 Studia biblica Studia biblica et theologica Studia orientalia Studien zur Umwelt des Neuen Testaments Supplements to Vetus Testamentum Studia in Veteris Testamenti pseudepigrapha Social World of Biblical Antiquity Southwestem Journal o f Theology Syria: Revue d 'art oriental et d'archéologie Transactions o f the American Philological Association Theologische Arbeiten The Bible Today Theologische BUcherei Textes cunéiformes du Musée du Louvre Theological D ictionary o f the New Testament, ed. G. Kittel and G. Friedrich, tr. and ed. G. W. Bromiley, 10 vols., Grand Rapids. 1964-1976 (ET o f Theologisches Wõrterbuch zum NT, 10 vols., Stuttgart, 1933-1979) Theological Dictionary o f the Old Testament, ed. G. J. Botterweck, H. Ringgren, and H.-J. Fabry, tr. J. T. Willis, Grand Rapids, 1974- (ET o f TWAT) Theologische Existenz Heute Today’s English Version K. Galling, Textbuch zur Geschichte Israels, Tübingen, 1950, 19685 Transactions o f the Glasgow University Oriental Society Theologisches Handbuch zum Alten Testament, ed. E. Jenni and C. Westermann, 2 vols., Munich, 1971, 1976
Abreviações: Publicações
Them ThStud TigrWb TLZ TNT Torch TOT TOTC TPQ TPs TQ TRE TREg TrinJ TRu TSSI TToday TTS 772 TU TV TViat TWAT TWBB TWOT TynBul TZ UAA UCPNES UE UF USQR UT UUÂ VAB VASKMB VDJ VE VF VT WbÃS WBC WbMyth WC WD WEC Wehr WF Whitaker WMANT WO WTJ
Themelios Theologische Studiên E. Littmann and M. Hõfner, Wõrterbuch der Tigre-Sprache, Wiesbaden, 1962 Theologische Literaturzeitung G. E. Ladd, A Theology o f the New Testament, Grand Rapids, 1974 Torch Bible Commentaries W. Eichrodt, Theology o f the Old Testament, tr. J. A. Baker, 2 vols., Philadelphia, 1961, 1967 (ET o f Theologie des AT, 3 vols., Leipzig, 1933-1939; 3 vols. in 2, Stuttgart, 1957-19612) Tyndale Old Testament Commentaries Theologisch-praktische Quartalschrift H.-J. Kraus, Theologie der Psalmen, BK.AT 15/3, Neukirchen-Vluyn, 1979 Theologische Quartalschrift Theologische Realenzyklopãdie, ed. G. Krause and G. Müller, Berlin, 1977P. Lacau, Textes religieux égyptiens, part I, Paris, 1910 Trinity Journal Theologische Rundschau Textbook o f Syrian Semitic Inscríptions, ed. J. C. L. Gibson, 3 vols., London,1971-1982 Theology Today Trierer theologische Studien Trierer theologische Zeitschrift Texte und Untersuchungen Theologische Versuche Theologia vialorum Theologisches Wõrterbuch zum Alten Testament, ed. G. J. Bolterweck, H. Ringgren, and H.-J. Fabry, 8 vols., Stuttgart, 1970-1995 A Theological Wordbook o f the Bible, ed. A. Richardson, London, 1950 Theological Wordbook o f the Old Testament, ed. R. L. Harris et al., 2 vols., Chicago, 1980 Tyndale Bulletin Theologische Zeitschrift Urkunden des ãgyptischen Altertums, ed. G. Steindorff, Leipzig, 1903University o f Califórnia Publications in Near Eastem Studies Ur Excavations, ed. C. L. Woolley, London, 1927Ugarit-Forschungen Union Seminary Quarterly Review C. Gordon, Ugaritic Textbook, AnOr 38, Rome. 1965 Uppsala universitetsârsskrift Vorderasiatische Bibliothek, 7 vols., Leipzig, 1907-1916 Vorderasiatische Schriftdenkmãler der kõniglichen Museen zu Berlin, ed. O. Schroeder, Leipzig, 1907Vestnik drevnej Istorii Vox evangelica Verkündigung und Forschung Vetus Testamentum A. Erman and H. Grapow, Wõrterbuch der ãgyptischen Sprache, 5 vols., Berlin, 1926-1931; repr. 1963 Word Biblical Commentary Wõrterbuch der Mythologie, ed. H. W. Haussig, Stuttgart, 1961-; Westminster Commentaries Wort und Dienst Wycliffe Exegetical Commentary H. Wehr, A Dictionary o f M odem Written Arabic, ed. J. M. Cowan, Ithaca, 1961, 19763 Wege der Forschung R. E. Whitaker, A Concordance o f the Ugaritic Literature. Cambridge, Mass., 1972 Wissenschaftliche Monographien zum Alten und Neuen Testament Die Welt des Orients Westminster Theological Journal
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Abreviaturas dos livros bíblicos
WTM WUNT WUS WVDOG W\V WZ YJS YOSBT ZA ZA H ZAS ZA W ZB ZDMG ZDPV ZEE ZK T ZNW Zorell ZPEB ZRGG ZTK
J. Levy, (Neuhebrãisches und chaldàisches) Wõrterbuch iiber die Talmudim und Midraschim, 4 vols., Leipzig, 1876-1889; Berlin, 1924a; repr. 1963 Wissenschaftliche Untersuchungen zum Neucn Testament J. Aistleitner, Wõrterbuch der ugaritischen Sprache, BVSAW 106/3, 1963J9744 Wissenschaftliche Verõffentlichungen der deutschen Orientgesellschaft Word and World Wissenschaftliche Zeitschrift (der Karl-Marx-Universitat. Leipzig/der Wilhelm-Pieck-Universitãt, Rostock) Yale Judaica Series Yale Oriental Series, Babylonian Texts Zeitschrift fu r Assyriologie Zeitschrift fiir A Ithebraistik Zeitschrift fu r âgyptische Sprache und Altertumskunde Zeitschrift fu r die alttestamentliche Wissenschaft Zürcher Bibelkommentare Zeitschrift der deutschen morgentãndischen Gesellschaft Zeitschrift des deutschen Palâstina-Vereins Zeitschrift fu r evange/ische Ethik Zeitschrift fiir katholische Theologie Zeitschrift fu r die neutestamentliche Wissenschaft F. Zorell, Lexicon hebraicum et aramaicum Veteris Testamenti, Rome, 1946-1954, 1962: The Zonderm n Pictorial Encyclopedia o f the Bible. ed. M. C. Tenney, 5 vols., Grand Rapids, 1975 Zeitschrift fur Religions und Geistesgeschichte Zeitschrift fiir Theologie und Kirche
Abreviaturas dos livros bíblicos A n tig o T e s ta m e n to Gn Ex Lv Nm Dt Js Jz Rt ISm 2Sm lRs 2Rs lCr
Gênesis Êxodo Levitico Números Deuteronômio Josué Juizes Rute 1 Samuel 2 Samuel 1 Reis 2 Reis 1 Crônicas
2C'r Ed Ne Et Jó SI Pv Ec Ct Is Jr Lm Ez
2 Crônicas Esdras Neemias Ester Jó Salmos Provérbios Eclesiastes Cântico dos Cânticos Isaias Jeremias Lamentações Ezequiel
Dn Os Jl Am Ob Jn Mq Na Hc Sf Ag Zc Ml
Daniel Oséias Joel Amós Obadias Jonas Miquéias Naum Habacuque Sofonias Ageu Zacarias Malaquias
Hb Tg lPe 2Pe IJo 2Jo 3Jo Jd Ap
Hebreus Tiago 1 Pedro 2 Pedro 1 João 2 João 3 João Judas Apocalipse
N ovo T e s ta m e n to Mt Mc Lc Jo At Rm ICo 2Co G1
xxx
Mateus Marcos Lucas João Atos Romanos 1 Coríntios 2 Coríntios Gálatas
Ef Fp Cl ITs 2Ts ITm 2Tm Tt Fm
Efésios Filipenses Colossenses 1 Tessalonicenses 2 Tessalonicenses 1 Timóteo 2 Timóteo Tito Filemom
Abreviaturas dos livros bíblicos
Apócrifos lEd 2Ed Tob Jdt Ad Est Sab Ecli Sir
Bar Ep Jer Três Sus Bel Man IMac 2Mac
1 Esdras 2 Esdras Tobias Judite Adições a Ester Sabedoria de Salomão Eclesiástico = Ecli (Siraque)
Baruque Epístola de Jeremias Canção dos Três Jovens Susana Bel e o Dragão Oração de Manassés 1 Macabeus 2 Macabeus
Pseudepígrafos Adão Ass Moi As h a 2Bar 3Bar lEn. 2En. 3En. Ari 4Ed. Jub 3Mac 4Mac M Isa SI Sal
Vida de Adão e Eva Assunção de Moisés Ascensão de lsaias 2 (Apocalipse Siriaco de) Baruque 3 (Apocalipse Grego de) Baruque 1 Enoque (Etiope) Enoque (Eslavão) Enoque (Hebreu) Aristéias 4 Esdras Jubileu 3 Macabeus 4 Macabeus Martírio de Isaias Salmos de Salomão
Sib Test XII Test Rub Test Sim Test Levi Test Judá Test Iss Test Zeb Test Dã Test N a f Test Gad Test Ase Test José Test Ben
Oráculos Sibilinos Testamentos dos Doze Patriarcas Testamento de Rubem Testamento de Simeão Testamento de Levi Testamento de Judá Testamento de Issacar Testamento de Zebulom Testamento de Dã Testamento de Naftali Testamento de Gade Testamento de Aser Testamento de José Testamento de Benjamim
Manuscritos do Mar Morto e Textos Relacionados O número arábico inicial indica o número da caverna em que o manuscrito fo i encontrado: Q=Qumran: p=pexer (comentário) CD Hev 8HevXII gr Mas MasShirShabb Mird Mur IQ34*"' lQapGen 1QDM (or 1Q22) 1QH lQIsa* lQIsab 1QM IQpHab IQpMic lQpPs IQS 3QInv (or 3Q 15) 4QFIor 4QPBless
O preceito de Damasco (no texto da Guenizá do Cairo) Textos de Nahal Hever Manuscritos gregos dos Profetas Menores de Nahal Hever Textos de Masada Cânticos do sacrifício do sábado ou Liturgia angelical de Masada Textos de Khirbet Mird Textos de Wadi Murabba’at Oração pelafesta das semanas (Fragmento do Manuscrito de orações litúrgicas = 10 Devotos) 0 Gênesis apócrifo As palavras de Moisés Hinos de ação de graças Primeira cópia de Isaías Segunda cópia de Isaías O preceito da guerra Comentário (Pexer) a Habacuque Comentário(Pexer) a Miquéias Comentário (Pexer) aos Salmos Manual de disciplina / O preceito da comunidade Manuscrito de cobre (Tesouro) Florilégio (Midraxim escatológico) Bênçãos patriarcais XXXÍ
Autoridades Antigas
4Qplsa’ bc d 4QpNah 4QpPs37 4QSam"-b* 4QTestim 6QD (or 6Q 15) 11QPs*DavComp 11 QtgJob 11QTemple*-b
Cópias de Comentário a Isaias Comentário (Pexer) a Naum Comentário (Pexer) ao SI 37 Cópias de Samuel Texto Testimonia Fragmentos do Documento de Damasco Salmos apócrifos (Suplemento em prosa) Targum de Jó Manuscrito do Templo
Para siglas adicionais, ver J. A. Fitzmeyer, The D eadSea Scrolls: Major Publications and Toolsfor Study, SBL Sources for Biblical Study 20, Atlanta, 1990.
Autoridades Antigas Ant. Hist. E d. Hist. Nat. Guerras
Antigüidades dos judeus, de Flávio Joscfo História eclesiástica, de Eusébio História Natural, de Plínio Guerras dos judeus, de Flávio Josefo
Transliterações Para Transliterações, veja Vol. I, p. xxxvii.
xxxii
NOVO DICIONÁRIO INTERNACIONAL DE TEOLOGIA e
E x e g e se d o A n t ig o T e st a m e n t o
Verbetes lexicais tt? a n
8612)
8612
3X0
2XW (s ’b), q. tirar (água) (19x; #8612; HALAT 1273a); subs. 3X ^0 (m as’ãb), lugar de tirar (água) (hapleg.,
somente no pl.; # 5393; HALAT606b). OMA No acad., possui o cognato sáb/pu(m) ( *sa'ãb/pu[?J), tirar (água) (CAD, S, 9b-10a; cf. s a ’ãb/pu, mastigar [?], Ia; AHw 2 :1000a [999a]). O radical ugar. s ’ib significa tirar (água) (fVUS # 2563; UT # 2366; p. ex., sib mqdst, aquele que tira água no santuário [PRU 5:19-21; UT, texto 2011 15; KTU, 4.609 15]; ver Heltzer, 6; de Tarragon, 143). Ugar. s ’ib || ugar. htb, cortar (madeira) em dois lugares (UT, Krt 112-13, 214-16; CTA 14 iii 112-13, iv-v 214-16; cf. RSP, 1, ii 175a-c [176]; 2, ii 8a-c, e [48]; 2, ii 37 [68]). O AAS atesta um vb, s ’b, e o ár. possui o vb. sa "aba, beber (o suficiente), saciar (sede), e o subs. mis ’ab, pote (grande / de tirar). Cf. o termo egíp. silábico su-wa-b-li, vasilha (de água / de tirar água) (Albright, 57). AT 1 .0 TM atesta apenas o vb. no q. (mas o Pent. sam. atesta um pi.; Dt 29.10). O signi ficado principal no AT, tirar (água), fica claro em frases em que mayim, água, é apresentado explicitamente como objeto direto do vb. (Gn 24.13; 1Sm 9.11; Na 3.14), ainda que em outras passagens seja usado sem um objeto definido (Gn 24.19-20,43-45; Rt 2.9). A água tirada de um poço era, por vezes, derramada diante de Javé como libação, simbolizando a necessidade de ab solvição da culpa (1 Sm 7.6) ou, como no retrato concêntrico de 2Sm 23.16-17 (= 1Cr 11.18-19), de exoneração da possibilidade futura de atrair sobre si a culpa de homicídio (trad. do autor): A. Os três valentes irromperam no acampamento dos fílisteus, tiraram água (wayyis ’abümayim) do poço próximo à porta de Belém e carregaram[-nos] e levaram[-nos] a Davi. 1
(# 8612)
B. E, no entanto, ele não quis beber deles [ou seja, dos odres com água], mas or denou que fossem derramados diante de Javé e disse: C. “Livra-me, O Javé, de fazer tal coisa, C ’ [de beber] o sangue dos homens que se foram com [perigo de] vida!” B’ Assim, ele não quis beber deles. A’ Essas coisas fizeram os três valentes. 2. O par de palavras, s ’b, tirar (água) || htb, cortar (madeira), aparece 4x no AT, sempre na forma do part. e sempre como um sínteta referindo-se à ocupação de estrangeiros escravi zados para servir Israel/o altar de Javé (Dt 29.11 [10]; Js 9.21, 23, 27; RSP, 1, ii 175d [176]; 2, ii 8d-e [49]). 3. O subst. heb. m as’abb'm, lugares de tirar (água), é encontrado apenas em Jz 5.(3, 10-)l 1: “Ouvi, reis, dai ouvidos (s ’hú-m [m enclítico]), príncipes... a música (mehasç'm < subs. *mhí$ [GKC §84£-m]); cf. vb. em acad. mahã$u, bater (CAD, M/l m 71b-84b;cf. 78b §3, b, tocar [um instrumento musical, p. ex. kiskilãte, badalos de metal; malil, flauta de junco]), ugar. mhs, bater, e aram. meha' (< *meh a ‘), bater (M. Held, “mh$/mhs in Ugaritic and Other Semitic Languages,” JAOS 79, 1959, [169-76] 171a); na tradução de R. G. Boling, “címbalos” (Judges, AB 6A, 1975, 110)]) / dos distribuidores(?) (pi. part.< hss [cf. acad. hasãçu 1, dividir, romper com estalo[?] [de juncos, de chifres de carneiros]) (AHw 1:331b; CAD, H, 130b-31a); no heb. pós-bíblico h$$, cunhar, abrir um buraco; rachar, interpor (Jastrow, 1:496a); et. separar, desunir os lugares de tirar (água); lá entre os canais dos rebanhos, falai (em antífonas) dos atos de justiça do Senhor.” 4. Uma associação semelhante entre as imagens de tirar água e alegrar-se com os fei tos redentores de Javé aparece em Is 12.3, em que o refrigério resultante da retirada de água é comparado (por hipocatástase) com a alegria que redundará da salvação de Javé: “Vós, com alegria, tirareis água (üse 'abtem-mayim) das fontes da salvação.” P-B O vb. é atestado no heb. pós-bíblico s ’b, tirar ([água [Mix. Miqwaot 2:6; 6:3; 7:6; Tosefta Miqwaot 2:9]; em “uma vida que embebe a alma” [Midr. Rabá a Gênesis, § 14]; em “pelegrinos que levam a inspiração sagrada até Sião” [Midr. Rabá a Gênesis, §70, referindo-se a Gn 29.2]) (Jastrow, 2:1505a; cf. CD 11:1; 1QH 3:29 [texto incerto]); e no aramJ & ’ê!êb, puxar (com referência à atração de um imã [Trg. 1Cr 20.2]; brasas vivas puxando o sangue das veias [TalmB Pesahim 74b]; grafita absorvendo o som [TalmB Sinédrio 64a]) (Jastrow, 2:1505a). Bebedouro, extração de água, alagamento: g m ' (engolir, beber, # 1686); gr ‘ II (puxar [gotas d’água], # 1758); -> dlh I (tirar água, # 1926); yrh II (dar de beber, # 3722); /" II (beber ruidosamente, # 4363); -> Iqq (lamber, sorver, # 4379); ms? (beber, tragar, # 5209); -> rwh (saciar a sede, embriagar, regar, encharcar, # 8115); -> s ’b (tirar [água], # 8612); sqh (dar de beber, refrescar, #9197); -> sth II (tirar água, dar de beber, # 9272) B ib l io g r a f ia
W. F. Albright, Vocalization o f the Egyptian Syllabic Orthography, 1934; J. M. de Tarragon, Le culte à Ugaril, CahRB 19; 1980; M. Heltzer, The International Organization o f the Kingdom ofUgarít, 1982; C. Rogers, TWOT 2:890a. Robert H. O 'Connell 8613 (s ’g , bramir, bramar, rugir [leão]), 2
# 787
n x tf(# 8 6 1 5 )
8614 (íe'ãgâ, uivo, gemido),
# 787
HNtt? (í ’h I), q. assolar; ni. ser assolado; deixar desolado; hi. transformar num monte de ruínas de pedra (# 8615); nXÍUN? (mesô a), subs. deserto, terra desolada (# 5409); PXU7 (sã on I), subs. cova (# 8622); rPXtt? (se ’iyyâ), desolação (# 8625); nxu? (sê ’/), subs. desolação (# 8643); nxilP (s ô a ), subs. cova (# 8739). OMA Os termos sir. sehã ’ e sehT significam extinguir (um fogo) ou esvaecer (perder as for ças); o mand. sha I significa definhar ou secar. O ár. sã ’a(w) significa mau, perverso, severo; o subs. sü ’ quer dizer mal, injustiça, problema. O et. say ’ significa crime ou ato perverso. E pos sível que a forma shh se encontre no texto II 14 do Deir ‘Alia (Hoftijzer e van der Kooy, 241, 307; Muller, 217, 236-37). A tentativa do KTU 1.1 v 26, de encontrar se ’iyyâ em b si ’ (HALA T 1276) deve ser considerada especulativa demais para ser proveitosa. De acordo com DeMoor, a tradução da coluna v é bastante incerta (27); sua tradução da linha 26 é; “Tu cobiças a mon tanha que me foi dada” (28).
AT I . A abrangência semântica de s 'h não fica completamente clara (TH AT2:838); não se sabe ao certo se a separação entre retinir (ou fazer barulho) e assolar em dois radicais diferentes (HALAT 1273-74) é justificável em termos semânticos. E possível que os dois aspectos daquilo que pode ser ouvido e visto sejam referentes à mesma palavra em usos gramaticais diversos, uma vez que ambos tratam do mesmo estado de desordem e confusão. O vb. s ’h I é encontrado no q. em Is 6.11, em que o profeta fica sabendo que o povo per sistirá em sua intransigência até que as cidades sejam arrasadas. O TM apresenta o ni. na última linha — os campos serão arrasados — mas o texto é incerto. O G parece sugerir a tradução “a terra será deixada desolada” para o vb. s >, numa versão mais fluente (Wildberger, 233). O hi. é encontrado em 2Rs 19.25 (cf. Is 37.26), em que os assírios transformam cidades fortificadas em montes de ruínas de pedra. O vb. também é viável em Naum 1.5; o TM apresenta wattissã ’ (foi erguido), cujo significado pode ser o de que a terra se levantou ou a terra clamou, ou seja, levantou a voz. Por outro lado, pode-se interpretar o texto como wattisã’ (BHS), que signifi caria, então, que a terra foi arrasada. 2. O subs. só 'â é encontrado 13x no TM, mas há outras passagens em que seu uso s ria, possivelmente, o mais apropriado; havendo ainda outras em que o termo aparece que de veriam ser emendadas. Ele pode ter o sentido de algo súbito ou inesperado, algo que irrompe, por vezes como a chegada de uma tempestade calamitosa (Scott, 24). Essa parece ser a ima gem retratada em Ezequiel 38.9, em que a vinda das hordas do norte é como uma tempesta de que avança (kassõa), como a chegada de uma nuvem que cobre a terra. Para Isaías 10.3, Wildberger prefere o sentido de uma tempestade, sugerindo que sô ’â pertence ao radical íw ’ (fazer o mal) e não a s'h (179). O Q de Provérbios 1.27 é de uma tempestade (K. ía ’awâ). As três ocorrências de mesô a são todas ligadas p o ríô a com o conceito de desolação e ruína; Sofonias 1.15 parece ser uma descrição que usa a imagem de uma tempestade, mas Jó 30.3, 14 e 38.27 são claramente retratos de um deserto improdutivo. É possível que a junção das palavras concentre-se mais na desolação resultante do que nas condições meteorológicas destrutivas. Jó 30.14 descreve a calamidade como uma brecha, uma ruína; Isaías 47.11 simplesmente indica a ruína num paralelo com o mal e a destruição. No Salmo 35.8, a ruína encontra-se na metáfora de uma cova com um laço que serve de armadilha. Apesar do sir., não há motivo algum para se 3
n x tf ( # 8616)
emendar a segunda ocorrência de só a neste v. para o termo cova, pois a repetição da palavra chama a atenção para a calamidade e o meio como ela sobrevem. O subs. no v. 17 também não deve ser emendado para uma palavra que signifique rugido, pois fica claro que se trata de uma referência à armadilha mencionada anteriormente. A cova com um laço (v. 8) era, sem dúvida alguma, um tipo de armadilha para leões; aqui, o salmista suplica para ser livrado de tal laço e, em vez disso, refere-se aos caçadores como leões. É provável que o Salmo 63.9 [10] deva ser emendado para como no G (HALAT 1325); os inimigos buscam a vida sem uma causa, por um motivo vão. 3. O subs. s ã ’ôn I é encontrado no Salmo 40.2 [3]. Dahood sugere que essa seja u das mais de trinta formas de se chamar o inferno encontradas na poesia bíblica (245); significa devastador ou destruidor (TH AT2:238). Resta pouca dúvida de que se trata de uma referência à morte, como em 30.3 [4], em que a cova é sinônimo de Seol. Como um lugar de destruição, poderia manter o sentido de ruído, como o estrondo de ondas ou de uma tempestade. A água é associada ao inferno, uma vez que é uma força que traz o caos e a destruição (Johnston, 416); dois dos diversos termos para água (í 7,yãwên) são encontrados em 40.2 [3]. O subs. s ê ’t é en contrado em Lamentações 3.47 como parte de um par de palavras em assonância que transmi tem a idéia de algo como pânico ou cova, destruição e ruína (Hillers, 132). A formação exata do hapleg. é desconhecida. O subs. se 'iyvâ é encontrado em Isaías 24.12; não ficam evidentes nem a derivação da palavra nem a construção gramatical do verso (Wildberger, 915). O subs. parece ser um casus pendem que introduz abruptamente a desolação — como destruição: a porta é reduzida a ruínas. P-B Pode-se encontrar a expressão s ’h wm sw’h nos hinos de Qumran (1QH 5:30). Nesse texto, ela parece ter o sentido de demolição e destruição dos inimigos, de maneira muito seme lhante às de Jó 30.3 e 38.27. A forma variante ms ’h 7 miw 'h, em 1QH 9:6, descreve a vida do salmista da ruína à destruição, da enfermidade à doença, das dores às torturas. A mesma com binação, em Eclesiástico 51.10, refere-se a um dia de devastação e desolação (cf. Sf 1.15). Deserto, ermo, terra assolada: -> bõhü (vazio, # 983); -> bqq 1 (assolar, ser agitado, # 1327); -> horbâ (ruína, desolação, # 2999); -> y^simôn (ermo, devastação, # 3810); -> midbãr 1(ermo, # 4497); -> ‘arãbâ (estepe, # 6858); -> !}ehihâ (terra ressecada, # 7461); -> fiyyâ (deserto, # 7480); s ’h I (destruir, desolar, # 8615); -> smm (ficar desolado, deserto, assolar, estremecer, ficar horrorizado, # 9037); Deserto: Teologia B i b l i o <; r a f i a
THAT 2:838-39, 882; M. Dahood, Psalms 1 1-50, AB 16, 1965, 245; D. R. Hillers, Lamentations, AB 7A, 1992, 132; J. Hoftijzer e G. van der Kooy, Aramaic Texts from DeirAlla, Docu menta et Monumenta Antiqua XIX, 1976,241,307; P. Johnston, “The Underworld o f the Dead in the Old Testament”, TynBul 45, 1994, 415-19; J. C. de Moor, An Anthology o f Religious Texts from the Ugarit, 1987, 27, 28; H. P. Muller, “Die aramãische Inschrift von Deir Ali un die ãlteren Bileamspruche”, ZAIV94, 1982, 217,236-37; R. B. Y. Scott, “Meteorological Phenomena and Terminology in the Old Testament”, ZA W 64, 1952, 24; H. Wildberger, Jesaja, BKAT, 1980, 179,233, 915. A. H. Konkel
nxiP ( s ’h II), apenas no ni. rugir(# 8616); pXW (sã'ôn II), subs. estrondo, fragor (# 8623). 4
n x t f ( # 8616)
OMA O HALAT não apresenta cognatos, descrevendo o radical como sendo problemático. THAT2:S39 c o m b in a i’/) I e II, tratando dos dois termos em Se o l (# 8619). AT 1. O vb. s ’h I significa tomar, ser desolado (p. ex. Is 6.11) e i 'h III (hapleg.) esperar desalentado (Gn 24.21). s'h II, o termo em questão aqui, e s ã ’ôn II formam parte do âmbito semântico dos ruidos, juntamente com qôl (# 7754), voz ou barulho (Dt 27.14), hmh (#2159) e hãmôn (# 2162), usado para ruídos naturais e expressões de emoção (Jr 31.20). 2. O vb. (apenas no ni.) ocorre duas vezes em Isaías 17.12-13, com o subs. s ã ’ôn II, casos em que tem o sentido de rugir ou estrondar, um retrato onomatopéico do som, tanto do mar quanto do inimigo de Israel, de modo que também faz lembrar as forças mitológi cas do caos (ver Cross, Canaanite Mylh, 112-44 e Day, G ods Conflict).Q subs. s ã ’ôn II é usado literalmente tanto para o rugir das ondas quanto para o ruído dos mares. Numa for ma de uso metafórico, o salmista louva a Deus por salvá-lo de uma cova de ruídos (s ã ’ôn II; ARA: cova de perdição), significando uma cova (um poço) terrível, um lugar de lama e lodo, e colocar seus pés sobre uma rocha (SI 40.2 [3]). O sentido negativo de S ã’ôn II serve para realçar a salvação. 3. Num julgamento contra Jerusalém, Isaías 5.14 fala da cova que abre a boca para engolir a elite da cidade (lit. glória), seu povo (hãmôn) e sua “gente ruidosa” (sã'ôn II). Uma versão mais apropriada para hãmôn pode ser “tumulto”, num paralelo com “ruído” (ou júbilo: “e quem nesse meio folgava”). Num oráculo contra a Babilônia, qôl sã on é paralelo a qôl hãmôn, transmitindo a idéia de um ruído tumultuoso que ocorre enquanto Deus reúne os exércitos das nações (13.4; cf. o ruído s ã ’ôn dos que exultam [24.8], o ímpeto dos estranhos [25.5] e a voz de grande tumulto daqueles que são castigados por Deus [66.6]). Semelhantemente, Jeremias (25.31) u sa íã ’ôn II para referir-se ao juízo de Deus (rib) e ao tumulto que este causa entre as nações. Porém, sua referência a Faraó, rei do Egito, como “Espalhafatoso” (Jr 46.17) é bas tante peculiar. Bright (Jeremiah, 306) sugere a possibilidade de que se pretendia fazer ali um trocadilho com o nome ou título de Faraó, enquanto Carroll (Jeremiah, 767) traduz, “Chamai Faraó pelo nome... Ruidoso o que deixa o tempo passar (implicando uma estratégia de batalha realizada num momento errado). Num ai contra Moabe, o profeta adverte que o fogo consumi rá “o alto da cabeça dos filhos do tumulto (t£nê s ã ’ôn)" (48.45; ARC: turbulentos). Por fim, em Amós 2.2, sã o n II é traduzido corretamente como estrondo, mas a oração “morrerá entre grande estrondo” é inadequada como referência à morte. Podemos concluir que sã on II referese a um tumulto destoante relacionado com folguedos ou a um exército, sendo qôl um tumulto ruidoso. Teologicamente, o termo serve como contraste para os sons agradáveis da teofania divina e da voz (qôl\ # 7754) de Deus. P-B A LXX faz uma tradução livre de sã on, resultando muitas vezes em interpretação di ferente (p. ex. Is 24.8; 25.5). Em duas ocasiões, usa krangê para referir-se a um grito (Is 66.6; Am 2.2). NT O termo kraugê é usado no NT como o clamor angelical ou com referência à promessa de que o pranto cessará (Ap 14.18; 21.4). Ruído, rugido, voz: g ‘r (rugir, gritar, berrar, bradar, repreender, censurar, # 1721); hmh (fazer um ruído, fazer barulho, tumultuar, ficar inquieto, # 2159); hmm (ribombar, despeda çar, #2169); nhm (rosnar, gemer, # 5637); -> qôl (voz, som, trovão, brado, # 7754); -> rgs (ficar inquieto, # 8093); í g (rugir, # 8613); -> í 'h II (rugir, #8616) 5
nXU7'(# 8617)
B ib l io g r a f ia
NIDNTT3:\ 11-14; TWOT2:890-91; J. Bright, Jeremiah, 1965; R. R Carroll, Jeremiah, 1986; F. M. Cross, Canaanite Mylh and Hebrew Epic, 1973, 112-44; J. Day, God's Conflict with the Dragou and the Sea, 1985; O. Kaiser, Isaiah 13-39, 1974. W. R. Domeris
8617
nxw
nxtt? ( s
7j
III), hitp. olhar atentamente (#
8 61 7 ).
AT O vb. refere-se a um olhar contínuo, firme e pensativo. O servo que foi buscar uma esposa para Isaque observou Rebeca com grande inquietação interior quando ela estava perto do poço, mas o fez silenciosamente, para descobrir se o sinal que havia pedido se cumpriria ou não (Gn 24.21). Olhar, observação, percepção, vista, visão, vigilância: -> hdh II (olhar fixamente, aparecer, # 2526); hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); hmh (ver, espreitar, tornar-se visível, # 2778); nbt (olhar em volta, aceitar como um ato de graça, # 5564); -> pis II (observar, # 7143); -> II (olhar para, #7438); r ’h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); -> r$d (vigiar, # 8353); -> s q d (notar, # 8567); S'h III (olhar atentamente, # 8617); sgh (olhar fixamente, fitar, # 8708); swr I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, # 8800); ízp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); -> s ‘h (olhar, cuidar, olhar em volta, § 9120); -> sqp (olhar para baixo, # 9207); -> st' (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283) Jackie A. Naudé
8619
VlKW'
17ÍXtp (se 'ôl), Seol, regiões infernais (# 8619).
OMA O sum./acad. atesta s u ’ãru ou o termo alternativo su'âlü (cf. AHw, 1255b), porém a maioria dos estudiosos rejeita qualquer relação entre eles e o termo heb. se ’ôl (Heidel, The Gilgamesh Epic, 173). Tendo em vista que o lexema não ocorre em nenhuma outra parte nos textos sem. antigos, parece claro até o momento que se trata de uma hisoglossa hebraica. AT Em referência ao lugar de habitação dos mortos, esse termo ocorre 65x no AT heb., sendo traduzido 61 x como hadês na LXX e 61x como infernum ou inferi na Vg. Todas as ten tativas de recuperar sua etimologia foram frustradas (cf. HALAT 1274). Sua colocação com ’bdh/ 'abaddôn (Pv 27.20; 15.11) e seu paralelismo com bôr (Is 14.15) e mãwet (SI 89.48[49]; Pv 5.5; 7.27; Ct 8.6) deixam claro que se ’ôl designa tanto o túmulo quanto o reino dos mor tos, particularmente este último. É um termo caro à poesia e à literatura de sabedoria (35x), e ocorre também várias vezes em Isaías (9x) e em Ezequiel (5x).
1. Em termos essenciais, sP’ôl é um lugar abaixo da superfície da terra para onde pessoas descem quando morrem (Gn 37.35; Jó 7.9; Ez 31.15, 17; 32.27), ou mesmo enquanto ainda estão vivas (Nm 16.33; SI 55.5 [16]). O uso comum de ^«/juntam ente com o hi. sugere que as pessoas também vão para o Se ’ôl contra a vontade; são levadas a tal lugar (Gn 42.38; 44.29,31; 1Sm 2.6; 1Rs 2.6,9; Ez 31.16). Em última análise, é Javé quem as faz descer até lá, mas ele também tem o poder de trazê-las de volta (1 Sm 2.6; cf. Is 26.19). Quer se tenha em vista 6
VíXtf (# 8619)
o túmulo ou o reino dos mortos, se 'ól refere-se ao mais profundo abismo, à antítese dos mais altos céus (Jó 11.8; cf. Pv 9.18). Assim como mwt, é um lugar de habitação, ao qual se chega passando-se por portas, um local completamente coberto de pó (Jó 17.16; Is 38.10). 2. Como personificação, SP’ô l é um inimigo medonho. Arrasta suas vítimas para baixo (Jó 24.19) com cadeias (2Sm 22.6 = SI 18.4[5]) até à boca (SI 141.7). É um déspota cruel (Ct 8.6), capaz de realizar seus desígnios perversos por meio de seu poder irresistível (SI 89.48 [49]). Apesar de encontrar-se na barriga de um peixe, metaforicamente, Jonas também se viu no Seol (Jn 2.2 [3]; ARA: abismo). 3. No entanto, Deus não pode ser frustrado pelo se ol; antes, pode fazer os sábios se desviarem desse lugar (Pv 15.24) e livrar os santos de suas investidas (SI 86.13). Pode ser ne cessário usar de disciplina para dirigir um filho obstinado para longe do se ’ôl (Pv 23.14), mas mesmo aqueles que chegam à beira da morte têm a esperança de ser remidos (pdh -> # 7009) de suas garras e trazidos de volta à vida (SI 49.15 [16]). 4. As descrições mais minuciosas do Seol no AT aparecem em Isaías e Ezequiel. Ao falar do rei da Babilônia, à guisa de Helel ben Sacer, Isaías profetiza-lhe a queda das alturas para as profundezas, para o Seol (Is 14.15 || bôr). Lá, seus habitantes ficarão admirados com essa inversão radical da sorte do rei (vv. 16-18). Ezequiel condena Faraó de maneira seme lhante, destinando-o ao Seol, o lugar da cova (bôr) e as partes mais inferiores da terra ( ’ere$ tahtit, Ez 31.16). E o reino dos incircuncisos (v. 18), uma forma de descrever especificamente os pecadores gentios (cf. 32.21). Os mortos desse lugar têm um certo tipo de existência, ainda que sua descrição como “sombras” (t^pã ‘im) (Is 14.9) deixe claro que se trata de um estilo de vida fraco e pouco gratificante (14.10). Não há esperança de livramento do túmulo ou do Seol, a menos que, em sua graça, o próprio Deus intervenha; uma possibilidade indicada de forma esparsa no registro do AT (SI 16.10; 49.15 [16]; 56.13 [14]; 86.13). A certeza plena da vitória sobre o Seol deve esperar até a revelação do testemunho do NT (ICo 15.50-58). P-B
MMM; Heb. mix., Jastrow 2:1505.
Morte: -> 'bd I (perecer, # 6); -> 'a dãmá (chão, pedaço de terra, solo, terra, reino dos mortos, # 141); asón (acidente fatal, # 656); -> gw ‘ (expirar, morrer, # 1588); hrg (matar, assas sinar, # 2222); -> zrm I (dar cabo da vida, # 2441); -> hedel (reino dos mortos, # 2535); hn( II (embalsamar, ser embalsamado [embalsamamento], # 2846); -> mwt (morrer, matar, execu tar, # 4637); -> qtl (assassinar, chacinar, # 7779); r*pã’im I (sombras, espíritos passados, # 8327); -> se 'ôl (Seol, inferno, # 8619); -> sahat (cova, túmulo, # 8846) B ib l io g r a f ia
ABD 2:101-5; NIDNTT 2:205-10; TDNT 1:146-49; THAT 2:837-41; TWOT 2:892-93; W. F. Albright, “The Etimology o f Se ol,” AJSL 34, 1917-18, 209-10; R. L. Harris, “The Meaning o f the Word Sheol as Shown by Parallels in Poetic Texts,” BETS 4, 1961, 129-35; A. Heidel, The Gilgamesh Epic and Old Testament Parallels, 173-91; S. Jellicoe, “Hebrew-Greek Equivalents for the Nether World, Its Milieu and Inhabitants in the Old Testament,” Textus 8, 1973, 1-19; W. G. T. Shedd, Dogmatic Theology, reimpresso [n.d.], 2:591-640; N. Tromp, Primitive Conceptions ofD eath and the Nether World in the Old Testament, 21-23. Eugene H. Merrill 8620 (s ã ’úl, Saul), -> Saul 8622 (sã ’ôn I, cova),
# 8615 7
Vxtf (# 8626)
8623 (Sãon II, estrondo, tumulto), -> # 8616 8624 ($e ’ã(, desdém),
# 8764
8625 (se>iyyâ, desolação), -> #8615
'7X.W(s 7), q. perguntar, inquirir, requisitar, desejar, men digar, cumprimentar; ni. (5x) pedir licença para ausen tar-se (ISm 20.6; Ne 13.6); pi. (2x) inquirir com grande cuidado (2Sm 20.18), mendigar (SI 109.10); hi. (2x) dar, emprestar (ISm 1.27 [28]; Ex. 12.36) (# 8626); (m is’ãlâ), subs. desejo, pedido ( -¥ # 5399); nVNtp (se elâ), subs. pedido, desejo (# 8629). OMA Esse lexema é atestado nos três principais ramos lingüísticos semitas. Cognatos do vb. são atestados no acad. Salu(m) e sa ’alu(m), perguntar, inquirir, interrogar (AHw, 1151 -52); no ugar. s 7, perguntar, requisitar, tomar emprestado (fVUS, 2566; í/7’2369); no aram. s 7, pergun tar, mendigar, tomar emprestado (Jastrow, 1507-8); no mand. s 7, perguntar, desejar, mendigar, orar (MdD, 441-42); e no ár. 57, pedir, reivindicar, mendigar (Biella, Dictionary, 321-22). AT Esse lexema ocorre 171 x no AT, sendo que, destas, 162 estão no q. com os seguintes sentidos: 1. Perguntar, inquirir. Esse vb. introduz tanto perguntas diretas quanto indiretas. Nesses casos, o objeto do vb. é uma oração. O objeto direto também pode ser uma pessoa (Dt 32.7) ou tanto uma pessoa quanto uma coisa (Jr 38.14). Em casos como esses, a preposição le, para, é usada muitas vezes para marcar o objeto direto (“perguntou-nos”, perguntou para nós, Gn 43.7). A preposição min, de, também é associada a esse lexema. E usada 35x para marcar a possível origem daquilo que é requisitado (Js 15.18). Em alguns casos, a força da indagação chega a um nível de arguição (SI 35.11). O termo § 7 faz parte do mesmo campo semântico que várias outras palavras, b 'h, in quirir ( -> # 1239), é encontrado apenas duas vezes; ambas as ocorrências estão em Isaías 21.12. São mais freqüentes os sinônimos: hqr, buscar ( # 2983), bqs, buscar ( -> # 1335) e drs, buscar ( # 2011). s 7 possui uma grande sobreposição semântica com essas palavras. As seguintes observações gerais podem ser usadas com cautela: Um pedido que envolve explo ração por tempo mais longo é, muitas vezes, representado por hqr, uma busca realizada com um objetivo claro é mais provavelmente apresentada como bqs, e uma busca mais cuidadosa e meticulosa é representada por drs. 2. Pedido. A indagação pode assumir a forma de um pedido específico. Esse pedido pode ser feito com humildade (1 Rs 2.16,20,22) ou num tom áspero e exigente (2Sm 3.13; Mq 7.3). O objeto do pedido pode ser um rei (ISm 8.10), um filho (1.20), uma cidade (Js 19.50), um sinal (Is 7.11) ou um campo (Js 15.18). O subs. í e elâ é usado 15x com o sentido de um pedido ou desejo. Esse pedido pode ser dirigido a um mortal (Es 5.6) ou a Deus (ISm 1.27). O contexto contém tanto um pedido que é feito (Jz 8.24) quando um pedido que é atendido (SI 106.15). 3. Desejar, mendigar, tomar emprestado. Em certos contextos, o resultado do pedido é tão sutil que o lexema enfraquece, tomando-se um desejo expressado em oração (1 Rs 19.4; Jn 4.8; Zc 10.1). Dentro do contexto correto, esse desejo pode ser mais bem compreendido como mendigar (SI 109.10), ou pode ser formulado num ato de tomar emprestado (2Rs 6.5). 8
'7Xti (# 8626 )
4. Cumprimentar, s 7, pode ocorrer juntamente com sãlóm, de modo a formar um cum primento comum, perguntando se o outro indivíduo e sua família estão bem (Gn 43.27; Êx 18.7). Quando a oferta desse cumprimento, ou a recusa em fazê-lo, é colocada no contexto das relações internacionais, pode ter implicações diplomáticas relevantes (Wiseman, 317-22). 5. Sentidos teológicos. Esse vb. é empregado repetidamente no sentido técnico de per guntar a um oráculo, esperando-se uma simples resposta afirmativa ou negativa. São as pala vras rituais usadas para descrever a consulta realizada por meio da estolá do sumo sacerdote (ver parágrafos seguintes). Essa forma de consulta também pode ser dirigida a um ídolo de madeira (Os 4.12) ou aos mortos (1 Cr 10.13). Em cada um desses casos, a origem da resposta esperada é marcada pela preposição be. O lexema é usado 3 Ix em 1 Samuel e 1Ix em 2 Samuel. Dentro da narrativa do profe ta Samuel e da narrativa que fala da queda de Saul e ascensão de Davi, essa palavra toma-se mais do que uma indagação. J. P. Fokkelman conclui que esse radical desempenha um papel importante na distinção entre Saul e Davi (Narrative Art, 2:430; opinião semelhante à de Peter D. Miscall, / Samuel, 14). Trata-se de um leitmotiv (tema recorrente) usado pelo escritor para marcar os segmentos do texto nos quais a relação de um personagem com Deus está para ser ilustrada. Em I Samuel 1, s 7 é usado 4x (1.17, 20, 27 e 28). Todos os casos referem-se a uma súplica humilde da fiel Ana por um filho. O pedido é atendido e Israel recebe um grande líder na pessoa de Samuel. A consagração de Samuel ao Senhor é relatada de maneira marcante por meio do uso do hi. de s 7 (v. 28). Pouco depois, esse filho tão esperado argumenta com um povo que “lhe pedia um rei” (8.10; 12.17, 19). Esse rei é chamado Saul (s ã u l, aquele que foi pedi do; ver Ronald F. Youngblood, “ 1, 2 Samuel”, 649; Miscall, 1). A associação do verbo com o nome próprio de Saul ressalta o sujeito da consulta. Porém, em 14.37, o leitor é surpreendido: Deus não responde ao pedido de instrução desse rei. Logo em seguida, Davi pede orientação e o Senhor responde (22.10). Saul percebeu rapidamente tal incongruência e deixou transparecer a ira que o assunto lhe causava (22.13). A situação se repete. Davi recebe uma resposta à sua indagação em 23.2, 4 enquanto o escritor observa que Saul não recebe nenhuma resposta de fonte alguma. “Consultou Saul ao Senhor, porém o Senhor não lhe respondeu, nem por sonhos, nem por Urim, nem por profetas” (28.6). Saul busca a orientação dos mortos, só para ouvir de Samuel (?) que tal “consulta” é inapropriada, vinda de alguém que foi rejeitado por Deus (28.16). Essa mensagem conclusiva e clara de rejeição é seguida imediatamente em 30.8 e em 2 Samuel 2.1; 5.19, 23 da consulta bem-sucedida de Davi. Saul, “aquele que foi pedido”, toma-se Saul, o rejeitado. Assim, em cada um dos casos observados acima (p. ex., Ana, Israel, Saul e Davi), ao usar o radical s 7, a narração define o relacionamento de um indivíduo com Deus. Outro uso teológico dos radicais é a oração (Zc 10.1). Nesse caso, s 7 pode ser distinguido do radical mais comum pll, orar (# 7137; -> Oração: Teologia). O radical pll é o mais genérico dos radicais nesse âmbito lexical, e era escolhido pelo escritor como a forma padrão. O radical í 7 é escolhido pelo escritor quando o objeto do pedido deve ser mencionado formal mente. O radical s 7 sempre tem um objeto direto, o que não acontece com pll. Quando Deus é o sujeito de s 7, muitas vezes o pedido intensifica-se de modo a tomarse uma exigência (Dt 10.12; SI 40.6 [7]). Javé é usado como o sujeito (implícito) desse vb. em apenas duas ocasiões (Jó 38.3 e 40.7). Por fim, a ocorrência desse vb. em conjunto com lõ ’ transmite um sentido teológico. Na minoria dos casos, esse par de palavras tem uma conotação positiva, como quando Salomão deixa de pedir uma vida longa, a riqueza ou a morte de seus inimigos quando teve a oportunida de de fazê-lo (p. ex., 1Rs 3.11). Porém, se é da vontade de Deus que certo pedido seja feito e a 9
]WD(# 8631)
pessoa deixa de fazê-lo, essa combinação de palavras tem uma conotação de apostasia (p. ex., Israel e a dissimulação dos gibeonitas [Js 9.14] e Acaz [Is 7.12]). P-B Na LXX, £ 7 é traduzido com mais freqüência como erõtaô e aiteõ, refletindo a dis tinção mencionada acima. O cumprimento comum é traduzido como aspazomai. Os Trgs. empregam o cognato aramaico com o sentido de pedir, indagar, mendigar, tomar emprestado e emprestar. Os escritores da LQ empregam o radical lOx, sendo que destas, 9 encontram-se no ni., ser perguntado/pedido. O heb. mix. apresenta um paralelo muito próximo desse radical no Hb ao longo de todos os seus modelos. O heb. moderno usa esse radical para pedir e tomar emprestado. Pergunta e Resposta: -> ‘nh (responder, replicar, testemunhar contra, # 6699); -> s 7 (pergun tar, inquirir, requisitar, desejar, implorar, cumprimentar, # 8626) Desejo, cobiça, anseio, anelo, deleite, felicidade, prazer: ’areset (desejo, pedido, # 830); -> hm d(desejar, almejar, ansiar por, cobiçar, estimar, # 2773); -> hps I (ansiar, desejar, querer, cuidar, # 2911); -> hsq (desejar, ansiar por, ambicionar, # 3137); -> y ’b (ansiar por, anelar, de sejar, # 3277); kãleh (anseio, # 3985); kmh (ansiar por, desejar ardentemente, # 4014); -> ksp II (desejar, almejar, # 4083); -> môrãs II (anelo, desejo, # 4626); -> 'rg (desejar com ânsia, suspirar por, # 6864); i 7 (pedir, requisitar, querer, # 8626); -> / I (desejar, ansiar por, # 9289); -> fisüqâ (desejo, enleio, apetite, # 9592) B ib l io g r a f ia
TD N T\:\92; 2:686-87; 77//47'2:841-44; rW W ’2:891-92; T. H. Gaster, “Short Notes”, VT4, 1954,73; J. Lindblom, “Lot-Casting in the Old Testament,” F7" 12,1962,164-78; H. Madl, “Die Gottesbefragung mit demonstrar Verb sã 'al,” in Bausteine Biblischer Theologie, 1977,37-70; D. J. Wiseman, “ ‘Is It Peace?’ Covenant and Diplomacy,” V T32, 1982, 317-22. John A. Beck 8629 (se 'êlá, pedido, desejo),
8631
# 8626
|RU7" (s'n) pilp. estar em paz, imperturbado (# 8631); (sã 'anãrí), subs. o sossegado, o tranqüilo (# 8633).
OMA Não se sabe de nenhum cognato inequívoco, apesar de tanto o et. quanto o AAS. con terem raízes de vocábulos dos mesmos radicais relacionados a paz. AT Esse radical aparece 5x como verbo e 1Ox como substantivo. Ambas as formas têm em comum a mesma abrangência de conotações, indo desde o sossego resultante da segurança até à complacência e arrogância. Várias ocorrências possuem uma conotação negativa, mas a idéia não é, inerentemente, negativa. Esse fato é demonstrado em referências como “Mas o que me der ouvidos habitará seguro (btfj), tranqüilo e sem temor do mal” (Pv 1.33) e “O meu povo habitará em moradas de paz. (menúhôt)” (Is 32.18). Um raciocínio semelhante a esse aparece em Isaías 33.20; Jeremias 30.10; 46.27. De maneira irônica, Jó 3.18 afirma que os cativos que estão mortos podem, finalmente, repousar, não tendo mais que obedecer seu capataz. Porém, uma vida que nunca sofreu ameaças (como aquela de que Moabe desfrutava, Jr 48.11) pode resultar numa complacência que não dá atenção aos sinais de advertência (Jó 12.5; Is 32.9,11; 10
(# 8634)
Am 6.1; Zc. 1.15). Além disso, a pressuposição de que a segurança individual é indiscutível pode redundar em orgulho que ridiculariza os menos favorecidos (SI 123.4) ou mesmo em insolência como a da Assíria, a qual acreditava que jamais poderia ser derrotada (2Rs 19.28 || Is 37.29). Descanso, quietude, repouso: -> dmh II (chegarao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); -> nwh I (descansar, # 5657); -> nwh I (sossegar, descansar, esperar, estacionar, depositar, # 5663); -> rg‘ (formar uma crosta sobre, endurecer, parar, ficar quieto, # 8088/89); s ’n (ficar em paz, imperturbado, # 8631); sbh II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); -> sebet (des canso, assento, # 8699, 8700); stq (acalmar-se, # 9284) Confiança: -> Atfi I (confiar, depositar confiança em, # 1053); -> S'n (apoiar-se em, depender de, #9128) John N. Oswalt 8633 (sã ’anãn, em paz, imperturbado),
8634
'1NW
# 8631
p)N\Cf (S ’p ) arquejar, ofegar (# 8634).
AT Jeremias descreve o arquejar (sorver) dos jumentos selvagens no cio (Jr 2.24) ou no último suspiro (14.6). Essas ilustrações referem-se tanto à paixão devassa com que Israel busca amantes idólatras, quanto à morte com a qual o povo irá deparar-se em função de tal perver sidade. Isaías retrata o próprio Deus ofegando como uma mulher em trabalho de parto. Ainda que seja doloroso, ele deve enviar julgamento sobre seu povo (Is 42.14; cf. Jr 4.31). O termo 5 'p é usado como metáfora para desejos intensos: desejo de que venha a noite para esconder a perfídia (Jó 36.20); desejo de ter a riqueza de outro e desfrutar de conforto (Jó 5.5); ou, o anseio louvável pelos mandamentos de Deus (SI 119.131). Até mesmo o sol arqueja de anseio por voltar para o lugar de onde veio (Ec 1.5). Fôlego, vida: -> hebel I (fôlego, # 2039); nepes (fôlego, vida, desejo, # 5883); nesãmâ (fôlego, # 5972); -> s ’p I (arquejar, ofegar, # 8364) Anseio, desejo, lascívia, querer: -> ’wh (desejar, querer, almejar, # 203); ’areset (dese jo, pedido, # 830); -> hmd (desejar, ansiar por, almejar, cobiçar, estimar, # 2773); hp<> I (querer, desejar, almejar, cuidar, # 2911); -> hsq (desejar, almejar, desejar ardentemente, # 3137); -> y ’b (ansiar por, anelar, desejar, # 3277); -> môrãs II (anelo, desejo, # 4626); -> S 'p (arquejar, ofegar, # 8634); - > / ’/> I (desejar, ansiar por, # 9289); -> fisúqã (desejo, enleio, apetite, # 9592) D. C. Fredericks
(s V), q. remanescer; ni. sobrar, ser deixado para trás; hi. deixar para o futuro (# 8636; THAT 2:844-55; HALAT 1280b-1282a); "iXttj (& ’ãr), subs. resto, resíduo, remanescente (# 8637; HALAT 1282a1283a); nHNip' (í6 ’êrit), subs. resto, restante, remanescente (# 8642; HALAT 1284a-1285b). OMA O radical é empregado em várias línguas sem. com o sentido de remanescente/restante: ugar. í V; araml uma quantidade de produtos agrícolas que resta de um todo maior que é jogado 11
W
(# 8636)
fora (cf. DISO, 287; cf. Cowley, 11.9; 30.11, 77, et al.); nab. s ’ryt (cf. Cooke, 73:5; 94:3); ár. sa ’ira (cf. THAT 2:844; de Vaux, 15, n. 1); aramB se 'ãr; sir. sey ã rã ' (TH AT2:844). AT 1 .0 valor semântico do radical s ’r. a. Freqüência. No heb. do AT, o radical s 'r aparece tanto como um vb. (uma vez no q.; 94x no ni; 38x no hi.) quanto em derivativos substantivais: masc. se ’ãr (27x) e fem. í e ’êrít (66x). No aramB, o subs. se 'ãr aparece 12x (Daniel, 4x, e Esdras, 8x). O radical í V aparece em grandes concentrações no Pentateuco (30x), nas partes históricas do AT (80x) e especialmente nos escritos proféticos (108x; Isaías [27x]; Jeremias [42x], Ezequiel [ 11x], Joel [ 1x], Amos [5x], Obadias [ 1x], Miquéias [5x], Sofonias [5x], Ageu [4x], Zacarias [6x], Malaquias [lx]). O radical é raro na literatura de sabedoria (uma vez em Jó; pode-se deduzir que os escritores são mais propensos a usar “reto/justo” em vez de “rema nescente”). b. Sinônimos conjuntos. O radical í V é combinado em vários casos ou aparece como um paralelo com ytr I, ser deixado (T iS \),p lt (80x) e srd (27x): p. ex., í ’r, srd, e pl( (Js 8.22); plU í V e ytr I (Is 4.2-3); ytr I e ótí/(1s 1.9); pl(, escapar, srd, sobreviver e i V, restar, (Jr 44.14). Todos esses radicais expressam a idéia de remanescente, de ser deixado ou de ter escapado. Em alguns casos, o subs. ’aharit, último, fim, é usado com o sentido de remanescente (Ez 23.25 [2x]; Am 4.2; 8.10; 9.1; cf. BDB, 31). Uma análise do campo semântico de remanes cente mostra que o radical s ’r é o ponto focal da expressão terminológica do tema do rema nescente hebreu. Os derivativos deytr,pl(, srd e 'hr agrupam-se em maior ou menor grau em tomo desse ponto focal. c. Significado lexical. O vb. s ’r ocorre uma vez no q. em 1 Samuel 16.11, significando restar. No ni., o vb. transmite o sentido do q.: ser deixado como resto, sobreviver. O ni. é usado muitas vezes no part. ( 14x, sing.; 28x, pl.) e, assim, ocasionalmente, tem o mesmo significa do que seus derivativos substantivais (cf. Is 4.3). O hi. é causativo: deixar um resto, poupar. O uso mais freqüente do hi. é associado à destruição de seres vivos e, nesse sentido, repete-se como um refrão na história do extermínio dos habitantes de Canaã por Josué (p. ex., Js 8.22; 10.28, 30, 33,39,40). d. Objetos de referência. O radical s ’r não se refere apenas a seres humanos: Noé e sua família(Gn 7.23),os sodomitas(Gn 14.10), um exército (Êx 14.28), dois homens (Nm 11.26), uma mãe com os filhos (Rt 1.3), o filho da mulher de Tecoa (2Sm 14.7), a última brasa viva (2Sm 14.7;) e uma tribo (2Rs 17.18); mas também àquilo que não é humano: dinheiro (Gn 47.18), as rãs que ficaram no rio (Êx 8.9, 11[5, 7]), moscas (8.31 [27]), gafanhotos (10.19), gado (10.26), sangue (Lv 5.9), a terra que ainda restava para ser tomada (Js 13.1), o tronco de uma imagem deixado depois de terem sido cortados fora a cabeça e os braços (ISm 5.4), ca valos (2Rs 7/13), respigas (Is 17.6) e cidades (Jr 34.7). e. Causas. As referências do radical a homens transmitem, ocasionalmente, o sentido de “sobreviver” a várias ameaças: p. ex., um dilúvio (Gn 7.23), uma desgraça (Gn 14.10), uma briga de família (Gn 32.8 [9]), terremotos (Is 24.6), morte natural (Rt 1.3, 5) e ira divina (Lv 26.36, 39; 2Cr, 34.21; Ez 6.12; 9.8; Zc 11.9). Outra série de ameaças provém das guerras. Nesse caso, o radical S'r é, muitas vezes, associado a vbs. que pertencem ao âmbito semântico da guerra; p. ex., nkh (hi.), ferir (Nm 21.35; ISm 11.11; lCr4.43); nkh (hi.) e mv/(hi.), matar (2Rs 25.2122); bzh, despojar (1 Sm 24.36); smd, destruir (2Sm 14.7); ou krt, exterminar (Is 14.22). f. Aspectos bipolares. O radical heb. S 'ré usado tanto de modo positivo quanto negati vo. Por vezes, a partícula negativa é usada com o radical para expressar a idéia de perda total e falta de sentido: “não ficou uma só mosca” (Ex 8.31 [27]), “nem um só homem ficou” (Js 8.17) ou “ninguém ficou” (2Rs 24.14). O radical com a(s) seguinte(s) palavra(s) também expressa o 12
1XW (# 8636)
aspecto negativo: “somente” ( 'ak, Gn 7.23; raq, 2Rs 17.18), “senão” (b ilt"im, Gn 47.18; k "m, 2Cr 21.17). O sentido positivo do radical expressa-se na combinação de sem e s V ou 'êrít (nome e sobreviventes, 2Sm 14.7; Is 14.22). O mesmo conceito é enfatizado no paralelismo entre se 'êrit e sôres (raiz e sobreviventes, Is 14.30). Enquanto houver uma “raiz”, existirá o pleno potencial de crescimento e vida. Assim, o radical s ’r apresenta uma bipolaridade de aspectos positivos e negativos. g. Uso com preposições. O radical s ’r é associado muitas vezes a uma preposição. Pode aparecer com min: i. partitivo: “de” (Dt 3.11; Js 13.12; Ez 1.4; Ne 1.2-3; Jr 8.3); ii. separativo: “depois de” (Êx 10.5; Rt 1.5; Jr 21.7). Também ocorre com be: i. locativo: “em” (Êx 8.9 [5], 11 [7]; Jr 38.22); ii. partitivo, “de” (Lv 26.36, 39; ISm 11.11; Is 17.6; Jr34.7; 37.10); iii. especificativo (Lv 5.9, “o restante do sangue”; 25.53, “anos restantes” ). O termo pode ser encontrado ainda associado a le: i. possessivo: “de” (2Rs 10.11, 17; Zc 9.7); ii. locativo, “de” (Êx 10.5). h. As formas verbais de i V podem indicar uma única pessoa (2Sm 14.7), dois homens (Nm 11.26), os pobres (2Rs 25.12), uma tribo (17.18) e um exército (13.7). Por outro lado, o subs. se ’ãr nunca é empregado para um indivíduo, mas sempre para um grupo (p. ex., lCr 16.41; Ez 3.8; 4.3, 7; Es. 9.16). O termo ’ã r é típico dos escritos de Isaías (13 das 27 ocor rências). Esse termo pode referir-se ao remanescente de Israel (Is 10.20), do seu povo (11.11, 16; 28.5); de Jacó (10.21), bem como de uma nação estrangeira, tal qual a Babilônia (14.22), Moabe (16.14), a Síria (17.3) e a Arábia (Quedar; 21.17). i. se erit. O subs. se ’êrit também é usado para designar o remanescente de uma nação estrangeira. Pode referir-se ao remanescente dos amalequitas(lCr4.43), dos filisteus (Am 1.8), de Edom (9.12), de Moabe (Is 15.9), Asdode (Jr 25.20) e da costa de Caftor (47.4). Quando aplicado ao remanescente de uma nação estrangeira, o subs. se 'êrít normalmente expressa a idéia de destruição absoluta ou dizimação dolorosa com ênfase na completa insignificância (Am 9.12 pode ser uma exceção). Por outro lado, quando associado ao remanescente de Is rael, o subs. se erit geralmente expressa o aspecto positivo da salvação do povo de Deus (as referências em Jeremias podem ser uma exceção). O termo aparece nas seguintes construções gramaticais genitivas: “resto de Israel” (2Cr 34.9; Ez 11.3), “restante de Israel” (Ez 9.8; Mq 2.12; Sf 3.13), “o restante da casa de Israel” (Is 46.3), “restante de José” (Am 5.15), “restante de Jacó” (Mq 5.7, 8 [6, 7]), “restante da tua herança” (Mq 7.18; cf. 2Rs 21.14) e “o restante do meu povo” (Sf 2.9). O termo também indica aqueles que voltaram do exílio, mas pode ser uma referência apenas a um pequeno remanescente (Ag 1.12, 14; 2.2; Zc 8.6, 11, 12). 2. Interpretação teológica do radical s V. Os derivativos verbais e substantivais do ra dical heb. í > contribuem para o tema do remanescente. O propósito desta seção é investigar o uso teológico de $ ’r, o termo mais importante de referência ao remanescente no AT. a. Pentateuco. O primeiro uso do termo na Bíblia encontra-se na história do dilúvio. N relato do dilúvio, segundo Gênesis 7.23b, Noé é considerado um remanescente: “ficou (.v >) somente Noé e os que com ele estavam na arca”. Ele foi escolhido para sobreviver ao dilúvio, pois era justo (6.9). Fica claro pela repetição quádrupla da oração “consoante (segundo) a tudo o que Deus (o Senhor) lhe ordenara” (6.22; 7.5; 9, 16) que a obediência à vontade do Senhor é esperada de um homem “justo” (6.8). A terminologia relacionada ao remanescente também pode ser encontrada no episódio da guerra entre os reis da região do mar Morto e os reis do Leste (Gn 14), em que o grupo res tante não é um remanescente fiel, mas apenas um remanescente histórico, os sobreviventes de uma catástrofe. A narrativa de Esaú e Jacó conta como Jacó dividiu seu grupo em dois acampamen tos, na esperança de que “o outro (S ’r) bando [escapasse]”, caso Esaú ferisse um dos bandos 13
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(Gn 32.8 [9]). O aspecto positivo do tema do remanescente é inegável nessa passagem, pelo fato de esperar-se que o remanescente previsto preserve a descendência. Também é digno de nota que, para Jacó, a esperança de sobrevivência encontrava-se, em última análise, em Deus (32.11-12 [12-13]). Na cena da história de José, em que ele é reconhecido, José confronta seus irmãos te merosos dizendo: “Deus me enviou adiante de vós, para conservar vossa sucessão na terra e para vos preservar a"vida por um grande livramento” (Gn 45.7). As palavras de José mostram que a preservação desse remanescente é um ato da graça de Deus, e que há uma relação pró xima entre o conceito de remanescente e a continuidade da vida. Tendo em vista, portanto, as passagens anteriores de Gênesis, o tema do remanescente mostra que diz respeito à questão fundamental da existência humana e sua continuidade, que muitas vezes está associada a di versas ameaças. O tema do remanescente também pode ser encontrado no relato do livramento de Israel por Javé no mar Vermelho (Êx 14.21-31). Javé cobriu o exército egípcio de água no meio do mar, de modo que “nem ainda um deles ficou” (14.28). E interessante observar que Javé não garante proteção a Israel de maneira incondicional: antes, age de acordo com a resposta de Israel aos princípios de vida dados por Javé, conforme foram revelados na aliança no Sinai. A obediência de Israel à aliança protegerá o povo e cumprirá a promessa de Javé de que ele destruirá até o remanescente dos inimigos de Israel (Dt 7.20). A rejeição da aliança por Israel suscitará o julgamento de Javé sobre o povo, dispersando a casa de Israel entre as nações de modo que apenas alguns restem como uma minoria insignificante (4.27; 28.62) ou destruindoos de todo (Lv 26.36, 39). b. Escritos históricos. Na história da conquista, Israel destruiu as cidades cananéias e seus habitantes sem deixar um remanescente (Js 10.28,37,39,40; 11.8,14,22). Deus ordenou a Israel que exterminasse toda a população cananéia para que, havendo um remanescente, este não se tomasse uma fonte de problemas constantes no futuro. No entanto, nem sempre os cananeus derrotados eram completamente destruídos. As vezes, alguns ainda ficavam para trás (Js 23.7, 12). O livro de Juizes relata que o fato de Israel não ter exterminado tanto os habitantes quanto os deuses deles foi a causa dos males que so brevieram à nação nas gerações seguintes. ( Josué/Juizes: Teologia) Na metade do século IX a. C., o culto cananeu a Baal ameaçou extinguir a adoração a Javé. Na cena do monte Carmelo, Elias considerou-se o único profeta de Javé a ter sobrevivi do (1 Rs 19.14). Porém, numa teofania majestosa, Javé garantiu-lhe: “Também conservarei em Israel sete mil”, sendo que estes continuariam fiéis à aliança (1 Rs 19.18). O remanescente fiel deve sua existência, antes de tudo, à graça de Javé. O cronista, escritor de Esdras / Neemias, emprega a terminologia do remanescente para referir-se aos exilados (Ed 6.16; 9.8, 14) e àqueles que não foram exilados mas permanceram na terra (Ne 1.2-3). Assim, o grupo correspondente pode ser classificado como um remanes cente histórico que sobreviveu à catástrofe nacional.' c. Profetas, i. Profetas anteriores ao exílio. O conceito de remanescente é mais articulado entre os profetas do século VIII a. C. O primeiro profeta a registrar suas mensagens por escrito e apresentar uma teologia do remanescente plenamente articulada foi Amós. Uma compreensão correta do uso do radical s 'r em Amós esclarece uma boa parte da teologia do remanescente, no AT como um todo. Em Amós, o radical $ V aparece 5x (1.8; 5.3, 2x; 5.15; 9.12). Também é importante levar-se em consideração seu desenvolvimento em Isaías e em Miquéias. a. Amós. O primeiro tema do remanescente em Amós aparece no ciclo de declaraç contra as nações (1.3— 2.16). O castigo que sobrevirá às cidades da Filístia será tão severo que 14
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até mesmo “o resto dos filisteus” (lit., “o remanescente dos filisteus”) perecerá (Am 1.8). Nesse caso, o tema do remanescente tem, de maneira clara, sentido negativo. Por vezes, os oráculos contra Israel também são concluídos com a observação de que qualquer remanescente que es capar ao primeiro golpe do castigo cairá, inevitavelmente, com o golpe seguinte (cf. 4.2; 8.10; 9.1; essas passagens definem o remanescente como 'aharít). Num lamento fúnebre (Am 5.1-3), Amós volta a proclamar a destruição de Israel, de pois da qual restará apenas um remanescente (5.3). A ênfase nesse caso não incide sobre o fato de que alguns escaparão da destruição militar, mas sim sobre quão poucos serão os poupados. Observa-se que dos primeiros mil, apenas dez sobreviveram — cem deles restaram depois do primeiro confronto militar e, desses cem, apenas dez depois do segundo confronto (cf. a in versão da promessa dada em Dt 1.11). Em Amós 6.9-10, lemos que dez homens que haviam sobrevivido às derrotas estarão reunidos numa casa e então morrerão (cf. 5.3). Amós 5.15 menciona o “restante de José”. A origem dessa expressão pode ser encon trada no ponto culminante do ciclo sobre José em Gênesis 45.7, que declara: “Deus me enviou adiante de vós, para conversar vossa sucessão na terra”. O tema do remanescente em Amós 5.15 expressa um valor semântico positivo com uma expectativa de livramento. O significado positivo da oração fica claro pelo contexto no qual Amós exorta as elites de Israel: “Assim diz o Senhor... Buscai-me e vivei” (5.4-6, 14-15). Nem sempre Amós profetiza o julgamento sem nenhum alívio. O propósito de sua proclamação é destruir as idéias falsas e amplamente difun didas da salvação dos israelitas e chamá-los ao arrependimento, a fim de conduzi-los de volta para Deus. O termo “talvez”, no v. 15, indica que o remanescente não tem origem na qualida de daqueles que forem salvos, mas sim na ação salvadora de Deus. Porém, a responsabilidade humana não é ignorada, uma vez que a vida é condicional, dependendo de buscarem Javé e de demonstrarem preocupação pelo próximo. No epílogo do livro de Amós (9.11-15), o profeta vislumbra um futuro promissor. Pro clama a mensagem escatológica da restauração do “tabemáculo caído de Davi” (9.11). O re manescente de Edom (9.12) foi acrescentado a essa passagem para deixar claro que, na restau ração, todo o território que pertencia ao reino de Davi será recuperado, especialmente Edom, que tem uma longa história de rivalidade com Israel. Em resumo, Amós aplicou o tema do remanescente a três tipos de grupos: um remanes cente histórico, o qual seria composto de sobreviventes da catástrofe (Am 1.8); um remanes cente fiel com uma espiritualidade autêntica e um verdadeiro relacionamento de fé com Deus (5.15), e um remanescente escatológico que receberá o reino eterno depois da restauração do reino de Davi (9.12). O tema do remanescente deixa implícito tanto o julgamento quanto a salvação. Referese ao julgamento precedente e contribui para o aspecto negativo da absoluta inexpressividade. No entanto, também pode expressar a potencialidade futura. Assim, o tema possui tanto um elemento positivo quanto um negativo. A existência de um remanescente baseia-se na misericórdia de Deus. Se o remanescente é preservado somente pela misericórdia de Deus, então o tema do remanescente não pode ser de caráter quantitativo. Desse modo, o remanescente pode expressar a imensa potencialidade futura inerente a um determinado grupo, qualquer que seja o seu tamanho. E cabível afirmarmos que o conceito de remanescente desempenha um papel impor tante na proclamação do profeta Amós, da seguinte maneira: a completa destruição do povo culpado de Israel; a salvação que Deus concederá ao remanescente fiel e a oportunidade do povo de salvar sua existência buscando a Deus ou demonstrando preocupação com o próximo. ( Amós: Teologia) 15
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b. Isaías. O conceito de remanescente tem um papel importante na teologia de Isaías. Como no caso de Amós, pertence ao contexto da expectativa de julgamento e salvação. Sem dúvida o tema contém uma referência à grandeza do julgamento (Is 10.19-22 [5x]). O desti no de Israel é descrito em termos metafóricos como os poucos frutos nos ramos mais altos da oliveira depois da colheita (17.6). No entanto, também traz uma referência à salvação. Apesar dos pecados de Israel, que o tomam merecedor da mais absoluta destruição, ainda há um re manescente poupado pelo zelo de Javé (37.32) e por sua misericórdia (46.3). Javé expurgará e purificará, de modo que o remanescente será santo (4.2-3). Javé resgatará o remanescente do seu povo (11.11), e ele próprio será uma coroa de glória para esse grupo (28.5). Um caminho plano será aberto para eles (11.16). O remanescente constituirá o núcleo de uma nova comu nidade de fé, a partir da qual se desenvolverá uma nova vida (37.31-32). Javé transmite uma mensagem de salvação a esse grupo (46.3). E preciso lembrar, porém, que a esperança do futuro encontra-se inteiramente ligada à fé em Javé. Isaías ressalta essa idéia com o nome simbólico de seu filho Sear-Jasube (Is 7.3; ARA:“Um-Resto-Volverá”). A posição enfática de Shear e a bipolaridade do uso do verbo Jashub ("volverá”), entre um significado religioso e um significado secular, pode contribuir para a ambivalência do significado do nome. Aliás, na perícope de 10.20-23, o nome é interpretado tanto de maneira positiva (v. 21) quanto negativa (v. 22). A verdadeira questão, porém, não é se o conceito de remanescente está associado à esperança ou ao pessimismo, mas sim quem irá pertencer ao remanescente. A intenção do confronto de Isaías e seu filho com o rei Acaz é exortar o rei e seu povo a voltar, pela fé, para Javé (7.9). Assim, Isaías mostra a idéia de que o remanescente continuará a existir como resultado de uma atitude de fé em Deus. Vale observar que o uso do remanescente é esparso em Isaías 40-66 (3x: Is 44.17; 46.3; 49.21). Podemos deduzir que o remanescente já é visto como um grupo que foi refinado pelo julgamento e que retomou fisicamente para a terra e espiritualmente para o Senhor. ( Isa ías: Teologia) c. Miquéias. O profeta fala de um pequeno remanescente histórico que se encontra dis perso e desamparado entre as nações (Mq 5. 7, 8 [6, 7]. No entanto, Javé cuida de seu povo como líder (2.12; 4.7) e o transformará numa nação forte (4.7). Assim, Miquéias determina uma demonstração de ações de graças a Javé, o qual perdoa as transgressões do remanescente de sua herança (7.18). ( -> Miquéias: Teologia) d. Sofonias proclama a promessa de Javé segundo a qual o remanescente de Judá se apossará do litoral pertencente aos filisteus (Sf 2.7) e tomará Moabe e Amom como despojo (2.9). Esse remanescente será humilde e submisso à Javé e viverá em justiça e paz (3.12-13). ( -> Sofonias: Teologia) ii. Durante o exílio. Jeremias, que faz o uso mais amplo do radical se ’ãr (42x), emprega muitas vezes o termo se 'êrít para se referir aos sobreviventes deixados para trás em Jerusalém por seus conquistadores. O remanescente histórico será insignificante ou acabará totalmente destruído (Jr 6.9; 8.3; 21.7; 24.8). O fato relevante é que, salvo raras exceções (p. ex., 23.3; 31.7; 50.20), Jeremias emprega o termo g//;, exilados, em vez de K 'êrít para os desterrados que são recipientes das esperanças do profeta (p. ex., 24.5; 28.4, 6; 29.4, 16, 20). Ezequiel roga a Javé que permita a alguns dos israelitas sobreviver (Ez 9.8; 11.13). E, de fato, um remanescente sobreviverá ao holocausto em Judá e será dispersado entre as nações (5.10; 17.21). A missão de Ezequiel era levar esse remanescente histórico a voltar-se para Javé e fazer desse remanescente um remanescente fiel (11.16-21). iii. Profetas posteriores ao exílio. Na profecia posterior ao exílio, o remanescente é identificado com uma pequena comunidade de judeus que regressaram do exílio (Ag 1.12, 14; 16
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2.2, 3; Zc 8.6). Apesar de várias dificuldades iniciais, eles obedecem a Deus e trabalham para reconstruir o templo. São os portadores das antigas bênçãos da aliança nas quais se baseia a mensagem de esperança de Zacarias. Conclusão: O tema do remanescente é um conceito teológico decisivo em pontos críticos da história, quando a vida e a existência humana são ameaçadas de extermínio. O remanescente significa um pequeno grupo de pessoas que escapará do perigo. O remanescente é uma ponte que liga a ameaça de castigo à promessa de restauração. O remanescente tem suas origens na obra salvadora de Deus. A humanidade moderna, que vive numa situação de ameaças cons tantes com a possibilidade da destruição total causada pela crise ambiental, a fome em grande escala, a superpopulação, a degeneração moral, a aniquilação nuclear, etc., é confrontada com a questão da realidade absoluta. Assim, devemos dar ouvidos ao chamado profético urgente e nos voltarmos para Deus, pela fé, a fim de pertencermos ao remanescente do Senhor no atual estádio crítico da História. P-B Na LR, os fariseus concluíram que eles eram o “remanescente” (SB II, 170,464,617). Posteriormente, o conceito de remanescente em geral transforma-se na idéia de que toda Israel terá uma participação no mundo futuro (Mix. Sinédrio X .I) (cf. ISBE, 4:134). Na LXX, os termos í ’r e s£ erít costumam ser traduzidos pela forma verbal de kataleipõ ou hyp "leipõ. NT No NT, o “remanescente” é expressado por kataloipoi (At 15.17; cf. Am 9.12), leimma (Rm 11.5), e hypoleimma (Rm 9.27, citando Is 10.22). Remanescente, lucro: ytr I (sobrar, sobejar, restar, # 3855); -> sãrid I (foragido, sobrevi vente da batalha, # 8586); -> s V (remanescer, # 8636) B ib l io g r a f ia
ISBE 5:130-34; A7DA7T3:257e segs.; TDNT4:144-214; THAT2:844-55; A. Cowley, Aramaic Papyri o f the Fifth Century B. C.; A. Cooke, A Textbook ofNorth-Semitic Inscríptions; E. W. Heaton, “The Root s 'r and the Doctrine o f the Remnant”, JTS 3, 1952, 27-39; G. F. Hasel, “Semantic Values o f Derivatives o f the Hebrew Root s V,” A USS 11, 1972, 152-69; idem, The Remnant: The History and Theology o f the Remnant Idea from Genesis to Isaiah; R. de Vaux, The Bible and the Ancient Near East; S. A. Irvine, “Isaiah’s She ’ar-Yashub and the Davidic House,” BZ 37, 1993,78-88. Sang Hoon Park 8637 (se 'âr, resto, resíduo, remanescente), -> # 8636
8638
IWp (se er), carne (alimento), comida, tecido (do corpo), corpo, parente consanguíneo, a própria pessoa (# 8638);
OM A Ugar. sir, acad. sTru(m), pu. s V. AT 1 .0 Salmo 78.20,27 usa a palavra para referir-se à carne de codomizes que Deus proveu para os israelitas enquanto vagavam pelo deserto (cf. Ex 16.13; Nm, 11.31). Numa acusação severa de injustiça socioeconômica, Miquéias (Mq 3.1-3) culpou os governantes de Israel de 17
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arrancarem a came de seu povo oprimido dos ossos e comerem-na. Essa imagem de canibalis mo ressalta de maneira vivida, ainda que hiperbólica, as medidas injustas e cruéis decretadas pelos ricos contra os pobres. Ver J. Mays, Micah, 1976, 79. 2. O Salmo 73.26 e Provérbios 5.11 consideram o se ’êr como o local da força físic da vitalidade. O salmista do Salmo 73 declara sua certeza de que, mesmo que sua força (came) se desfaleça, Deus é capaz de sustentá-lo. Apesar de alguns considerarem essa declaração, em conjunto com o v. 24, como a esperança do salmista na vida depois da morte (cf. M. Dahood, Psalms, 1968, 2:195-96), isso parece pouco provável no contexto do livro de Salmos. É bem possível que o versículo 24 trate da esperança nesta vida mesmo, e que o termo “desfaleçam” (v. 26) não precise ser considerado uma referência à morte em si, podendo descrever a fraque za física que é característica daqueles que estão à beira da morte (cf. Jó 33.21; SI 71.9; 143.7; Pv 5.11). Corpo: -> bãsãr (came [alimento], comida, tecido [do corpo], # 1414); -> gewiyyà (corpo, cadáver, # 1581); -> gid (nervo, tendão, # 1630); -> gap II (corpo, # 1727); -> hõb (peito, # 2460); -> hêq (colo, peito, # 2668); kãbêd II (fígado, # 3879); -> kilyá (rim, # 4000); -> lehúm (vísceras?, # 4302); -> m ê‘eh (corpo, entranhas, # 5055); m ipsã‘â (glúteos, #5156); -> 'e$em I (osso, pele, corpo, a própria pessoa, # 6795); qereb (órgãos internos, # 7931) Tecido (do corpo), comida, carne (alimento): -> bãsãr (came [alimento], comida, tecido [do corpo], # 1414; -> se 'êr (came [alimento], comida, # 8638) B ib l io g r a f ia
TWAT 7:931-33; A. Johnson, The Vitality o f the Individual in lhe Thought o f Ancient Israel, 1964, 37-38; W. Kirkpatrick, The Book o f Psalms, 436-38; M. Krieg e H. Weder, Leblichkeit, ThStud 128,1983; R. Martin-Achard, From Death to Life, 158-64; H. W. WolfF, Anthropology o f the Old Testament, 1981,26-31. Robert B. Chisholm 8639 (se ’ãryãsúb, Sear-Jasube, Um-Resto-Volverá), -> Sear-Jasube 8642 (f6 'êrít, resto, restante, remanescente),
# 8636
8643 (Sê't, desolação), -> # 8615
rn© (sbh), q. levar cativo; ni. ser levado cativo (# 8647); subs. 'Dl? (Sebí) cativeiro, cativos (# 8660); n ’3Ç? (sibyâ), cativeiro, cativos (# 8664); rraip (jPbiyyâ), um cativo (hapleg.; # 8665); n , 3Çf (sebit), cativeiro (hapleg.; Nm 21.29; # 8669). 8647
OMA Esse lexema é relativamente comum em línguas relacionadas ao hebraico É encontrado (em várias formas) no ugar., araml, aramJ, aramE, aram., sam., sir., mand., no ár. tamúdico, AAS e no ár. comum, apesar de o vb. não ser encontrado no fen. nem no acad. (HALAT 1286). Em todos os casos, o significado é essencialmente o mesmo do heb.: levar cativo. AT 1. Como vb., sbh ocorre 47x no heb.: q (39x), significando levar cativo, e ni. (8x), sig nificando ser levado cativo. Exemplos do uso do q. são: Gn 34.29, “levaram cativos [todos os 18
iatp' (# 8648)
espólios de Siquém]”, e 2 Crônicas 25.12, “também os filhos de Judá prenderam vivos dez mil”; e do uso do ni.: 1 Samuel 30.3,5: “E Davi e os seus homens chegaram à cidade e eis que estava queimada a fogo, e suas mulheres, seus filhos e suas filhas tinham sido levados cativos [pelos amalequitas].” O vb. é usado com mais freqüência nos livros narrativos históricos (33x), espe cialmente 2 Crônicas (12x). Deus é o sujeito do vb. em apenas uma ocasião, no Salmo 68.18 [19]: “[Tu, ó Deus] levaste cativo o cativeiro (sãb'tã seb cf. também a mesma expressão em Juizes 5.12 em que Baraque é o sujeito. 2. A abrangência semântica desse lexema é mais ampla do que a de glh. Enquanto glh de nota movimento de distanciamento de um local rumo ao exílio e, quase sempre, ao exílio assírio ou (especialmente) babilônio, Sbh denota o ato de tomar prisioneiro(s) ( -> Ikd, capturar, # 4334) e é praticado por uma grande variedade de indivíduos ou grupos ao longo de diversos séculos. Também pode ser associado ao exílio quando é modificado de modo a denotar tal lugar. O principal subs. cognato de Sbh é í ebi, significando cativeiro, cativos, ocorrendo c. 49x. Desses dois significados, o de uso ligeiramente mais comum é “(estado de) cativeiro”, como em Amós 9.4: “Se forem para o cativeiro diante de seus inimigos” ou no Salmo 78.61: “e passou a arca da sua força ao cativeiro”. Normalmente, nesse uso, Seb ' é acompanhado de um vb. de movimento, como b w ’ (hi.), enviar, ou (especialmente) hlk, ir. A palavra também significa (um grupo de) cativos, como em Êxodo 12.29: “até ao primogênito do cativo que es tava na enxovia” ou em Habacuque 1.9: “eles reúnem os cativos como areia”. 3. Outro subs. relacionado é Sibyâ, que ocorre 9x. Em duas ocasiões, significa (um estado de) cativeiro (Jr 48.47; Ne 4.4 [3.36]) e 7x quer dizer “(um grupo de) cativos” (p. ex., Ot 21.11; 2Cr 28.13, 14, 15). O terceiro subs. relacionado, Sebiyyâ, (aquele que foi levado) cativo, ocorre uma vez (Is 52.2). Parece não haver nenhuma diferença essencial entre esses três substantivos. 4. Sebit e Sebút são duas palavras associadas muitas vezes a sbh, sendo que ambas são traduzidas como cativeiro, refletindo uma avaliação de sua relação etimológica com Sbh (cf. BDB, 986). Essas duas palavras ocorrem c. 32x, em quase todos os casos com o vb. Swb, vol tar, restaurar; numa oração, restaurar o cativeiro (SI 85.1 [2]). No entanto, o consenso entre os estudiosos, no momento, tende a identificar as duas palavras etimologicamente com swb, voltar e, assim, traduzi-las como “restauração”, “sorte” ou “prosperidade”, como é o caso do Salmo 85.1 [2] (cf. Dahood, Psalms 111, 218; Soggin, 7 7 /^2 :8 8 6 -8 7 ; HALAT 1289-90). P-B Na LXX, o termo mais comum para as palavras relacionadas a Sbh é aichmalõtizõ, cap turar. A LXX em si nem sempre distingue claramente entre glh and Sbh. O radical Sbh também ocorre no heb. de Qumran (HALAT 1286). Cativeiro, expulsão, exílio, perseguição: brh II (fugir, afugentar, ferir, # 1369); -> glh (descobrir, revelar, estar longe / ir para longe, exilar, # 1655); -> dbr I (rejeitar, mandar em bora, # 1 8 1 8 );-^ rdp (estar atrás de, ir no encalço de, perseguir, # 8103); Sbh (levar cativo, ser levado cativo, # 8647); -> Exílio: Teologia B ibl . k x í r a u a
M. J. Dahood, Psalms, 1966-70 David M. Howard, Jr.
Í3ÇP1(^ b ô ), pedra preciosa? (# 8648), somente em Êxo do 28.19; 39.12. 19
yi31P'(# 8651)
OMA Ver o acad. Subü, pedra semipreciosa (AHw, 1258), do qual o termo heb sebô é em prestado. AT 1. A segunda pedra na terceira fileira do peitoral das vestes sacerdotais; essa palavra é traduzida tradicionalmente como “ágata”. 2. Para uma introdução teológica ao tema das pedras preciosas no AT, ver 'õdem (#138). Pedras preciosas: -> 'eben (pedra, rocha, # 74); 'õdem (pedra preciosa, # 138); -> 'ahlãmã (jaspe, # 334); -> 'eqdãh (berilo, # 734); bahaf (pedra preciosa, # 985); -> bãreqet (esmeralda, # 1403); -> yah®lõm (pedra preciosa; # 3402); -> yãsepêh (jaspe, # 3835); -> £acffi:õí/(rubi?, # 3905); -> leSem I (pedra preciosa, # 4385); nõpek (pedra semipreciosa, # 5876); sõheret (pedra mineral, # 6090); -> sappir (lápis-lazúli, # 6209); -> (crisólita, olivina, # 7077); 5eí»ô (pedra preciosa, # 8648); Sõham I (pedra preciosa, # 8732); -> Sãmir 11 (esmeril, diamante?, # 9032); -> íês 11 (alabastro, # 9253); -> tarçís II (pedra preciosa, # 9577) Jóia, adornos: ffali I (adorno, jóia, # 2717); -> harüzim (colar de conchas, # 3016); tabba'at (anel, #3192); -> kúmãz (adorno, # 3921); misbe$ôt (engastes, # 5401); -> nezem (anel, # 5690); -> ne(i(í)pá (brinco, # 5755); 'õgil (brinco?, # 6316); -> '/» II (adomar-se, # 6335); ‘As (retinir, # 6576); -> «ç (colocar um colar, # 6735); pemnim (corais, péro las, # 7165); sawwãrôn (colar, # 7454); -> sãmid I (bracelete, # 7543); -> <^‘ãdâ (cadeias dos artelhos, cadeiazinhas para os passos, # 7577); -> rã/wW (colar, # 8054); -> saharônim (crescentes [luetas], # 8448); -> (adorno, # 8667); sêr (bracelete, # 9217); -> /ôr (pendente, # 9366) B ib l io g r a f ia
/D 5 2:898-905; /5 f i£ 4:623-30; NID NTT3:295-98; T W O T2:63\;i. S. Harris, “An Introduction to the Study of Personal Omaments, of Precious, Semi-Precious and Imitation Stones Used Throughout Biblical History,” ALUOS 4, 1962, 49-83; L. Koehler, “Hebrâische Vokabeln II,” ZAW 55, 1937, 161-74; H. Quiring, “Die Edelsteine im Amstsschild des judischen Hohenpresters und die Herkunft ihrer Namen,” /4GA/38,1954, 193-213; W. Zimmerli, Ezekiel 25-48, 1983,82-84. Andrew E. Hill
8651
VI3 »
(sãbúa'), semana (# 8651).
OMA O subs. Sãbúa ‘ pertence ao grupo de palavras que contém o número sete (Seba'; Sib a). O número sete (Sb\ Sb‘t, s b ‘m) aparece muitas vezes no ugar. (UT, 7.15, 36; 2381), muitas vezes escolhido deliberadamente para indicar um número grande ou indefinido, ou o conceito de inteireza (Kapelrud, 499); de modo que a casa de Baal é construída em sete dias (KTU, 1.4 iv 20-35), Baal copula sete vezes setenta vezes (KTU, 1.5 v. 20) e Baal permanece morto du rante sete anos (KTU, 1.6 vv. 5-10). O número sete é encontrado em inscrições fen., púnicas, moabitas, bem como em aram. antigo e médio. Tanto sete quanto semana são subs. primários, com padrões de formação substantivai independentes, de modo que os significados não são interdependentes (Stamm, 1287). As tentativas de associá-los ao vb. sb ' (jurar, fazer um jura mento) parecem frustradas; o heb. não relaciona o número sete com juramentos, e outras línguas sem. não associam com sete nenhum vb. jurar, ainda que o número sagrado seja importante em alianças e rituais (THAT 3:856). O subs. sebütum, que significa sete meses, é encontrado 20
(# 8651)
no babilônio antigo (AHw, 1034); em et. e tigré, sabii' quer dizer sete dias ou sétimo dia, e, no ár., usbú‘ significa semana. AT 1. Em várias passagens, sãbúa' significa um período de sete dias: em Gênesis 29.2728, refere-se à semana da festa de casamento; em Levítico 12.5, o tempo de purificação depois do nascimento de um bebê do sexo feminino é duas semanas. Daniel ora durante um período de três semanas (Dn 10.2-3), uma expressão que provavelmente pode ser entendida como uma aposição de tempo (GK.C, 131 d), ainda que “três semanas inteiras” possa ser uma interpretação extrapolada; é possível que nesse caso a expressão distinga semanas literais das semanas refe rentes a anos na passagem anterior. Jeremias diz que Deus “conserva as semanas determinadas da sega” (Jr 5.24), ainda que, com base nas vrs., exista a possibilidade de o termo sebu'ôt ter sido acrescentado a essa passagem (BHS). Em Ezequiel 45.21, de acordo com um comentário na margem do texto, tudo indica que a Festa das Semanas foi incorporada, ficando no lugar no número sete que definia o tempo da Páscoa, conforme encontrado em alguns MSs e versões. Em Deuteronômio 16.9, a data da Festa das Semanas é determinada como sendo sete semanas depois do início da colheita. 2. O pl. sãbu ‘ôt é um dos termos usados para a Festa da Semanas (Êx 34.22; Dt 16.10, 16; 2Cr 8.13), que também é chamada de Festa da Sega (Êx 23.16) e dia das primícias (Nm 28.26). As primícias da colheita da cevada eram uma medida chamada de ômer (Lv 23.10); sete semanas depois, as primícias da colheita do trigo consistiam de dois pães (Lv 23.17). A festa devia ser acompanhada das ofertas e sacrifícios prescritos (Lv 23.18-19; Nm 28.27-31). Assim como o sábado, a festa era independente do calendário lunar e, no AT, não está relacionada a nenhum dos grandes acontecimentos redentores. Ezequiel não a inclui em seu calendário para as comemorações no templo da comunidade restaurada (Ez 45.21-25), possivelmente porque em Levítico 23.16-21 ela não é descrita como uma festa de peregrinação (Milgrom, 245). O tempo e as ofertas da festa indicam que era principalmente um festival para os agricultores. A exigência de que os pães fossem assados com fermento (Lv 23.17), ao serem oferecidos como primícias, indica uma relação com a Festa dos Pães Asmos, sete semanas antes (de Vaux, 494); ao que parece, as duas festas marcavam respectivamente o início e o fim da colheita, sendo que o pão com fermento no final da colheita do trigo indicava o recomeço da vida normal. 3. Daniel usa o termo sãbu"m para apresentar uma nova aplicação à profecia de Jere mias 25.8-14 ao período além dos tempos de exílio (Dn 9.24-27). As diversas ambigüidades dessa passagem levaram a várias interpretações, sendo que uma das mais importantes referese ao significado do próprio termo sãbúa'. O termo só é encontrado no pl. masc. nessa seção, não tendo relação com o pl. de sete, como por vezes é afirmado, pois sãbúa' é, por si mesmo, um subs. primário que significa semana (Hasel, 108-9). Essa característica de duas terminações pis. para esse subs. também é encontrada no Preceito da Comunidade de Qumran (1QS 10.7,8); Qimron (67) afirma que por vezes a constr. pl. masc. é encontrada no subs. fem. singular. É im portante distinguir entre o gênero em si e a terminação de gênero, pois as terminações podem ter finalidades relacionadas a significado ou função e não a gênero (GKC, 242-44). O típico é que em subs. com duas terminações pis., o pl. fem. (ôt) indique as partes individuais de um agrupamento, enquanto o pl. masc. (im) indica uma pluralidade dentro de uma quantidade total; p. ex., a palavra “campos”, no pl. fem., indicaria vários terrenos, mas no pl. masc. refere-se ao interior, que pode ter diversos campos. É provável que esse seja o caso de sãbúa' (Hasel, 113); o pl. masc. enfatiza o total de semanas, enquanto o pl. fem. poderia enfatizar as semanas indivi dualmente. Nesse sentido, vale observar que Daniel 9.2 emprega o sing. fem. quando se refere às setenta semanas de Jeremias, colocando a ênfase num período singular de tempo (ibid., 115). 21
? ia tf ( # 8651)
A unidade das setenta semanas é indicada ainda pelo vb. sg. cm Daniel 9.24, ou seja, determinase um único período de tempo. Isso serve de argumento contra a idéia de que a última semana seja separada das outras. Assim, sãbu 'im só pode ser traduzido como semanas, e o pl. deve ser entendido como um único período; “semanas” são um período cronológico ininterrupto que não pode ser transformado num período indefinido no tempo histórico. A melhor descrição de Daniel 9 encontra-se, possivelmente, no midraxe expositivo (Goldingay, 231); esse midraxe trata de questões textuais no contexto em que está sendo lido. Jeremias 25.11 (cf. 29.10) é considerado à luz de Levítico 26.18, 21, 24, 28, 31-35, 43; os se tenta sábados devidos são cobrados sete vezes. Porém, os anos de desolação não significam o fim da aliança; a confissão e o reconhecimento da causa do exílio farão com que Deus se lembre da antiga aliança (26.40-44). O uso de 70 e 490 na estruturação da história aparece em outros textos; do dilúvio até o fim, passam-se setenta gerações (lE n. 10.12) ou setenta semanas (4Q 181 2:3; cf. 4Q 180 1:4-9); 1lQMelq. considera um período de dez Jubileus, ou quatro centos e noventa anos até o julgamento final. Esse uso de números é um guia para o midraxe de Daniel, que não deve ser entendido como uma cronologia, mas sim como uma cronografia: um esquema estilizado da história usado para interpretar dados históricos e não originado de les (Goldingay, 257). Essa idéia apóia-se no fato de que as ambigüidades da passagem tomam impossível anexá-la a qualquer esquema cronológico, ao mesmo tempo em que fica evidente, por meio de outros escritos, que os antigos eram perfeitamente capazes de investigar as crono logias dos séculos; na história deut., a própria Bíblia contém uma grande quantidade de dados cronologicamente específicos, embora contenha outros que também são mais esquemáticos (quarenta anos, p. ex.). Restam dúvidas, ainda, quanto à unidade de Daniel 9.24-27; tomando por base uma aná lise literária crítica detalhada, Laato conclui que o v. 27 é uma aplicação posterior relacionada à história do período macabeu (220-21). Ele propõe que os vv. 24-26 sejam de uma tradição mais antiga que interpreta Zacarias 12-14 com relação ao exílio e ao período subseqüente (221 25). O período de sete semanas foi tirado da realidade histórica do exílio, enquanto o período de sessenta e duas semanas foi derivado da cronologia da história deut.; a guerra das nações contra o ungido terminaria mais uma vez com a destruição de Jerusalém, mas, na última sema na, Israel se mostraria vitoriosa. As teorias de desenvolvimento que tomam por base a análise literária são, necessariamente, especulativas, mas o midraxe pode muito bem ter incorporado idéias de Zacarias 12-14 e, como uma cronografia fica, obviamente, aberto a novas aplicações. ( -> Daniel: Teologia) P-B 1. A Festa das Semanas era importante para vários grupos do período pós-bíblico. En contrava-se particularmente associada a Êxodo 19.1, à entrega da lei no terceiro mês. O Trg. de Crônicas situa 2 Crônicas 15.8-15 — passagem em que o rei Asa reúne Israel e Judá para uma renovação da aliança no terceiro mês como parte de suas reformas cultuais — na Festa das Semanas. No Talmude (TalmB. Megilla 31a), Êxodo 19 toma-se a passagem oficial a ser lida durante várias semanas; no Livro de Jubileus, a aliança de Êxodo 19 cai no décimo quin to dia do terceiro mês, uma vez que Moisés sobe ao monte no décimo sexto dia (Jub 1.1). A aliança com Abraão também foi feita na data dessa festa (Jub 15.1; cf. 14.20); é possível que em Jubileus essa festa não fosse a das semanas (&ãbu‘ôt), mas a dos juramentos (sebu'ôt). O Documento de Damasco observa que Abraão foi circuncidado no dia em que adquiriu conhe cimento, referindo-se para maiores detalhes ao Livro de Jubileus (DD 16.1-5). O Manuscrito do Templo de Qumran considera a Festa das Semanas a primeira de uma série de quatro festas das primícias, cada uma separada da anterior por um período de quarenta e nove dias. Apesar 22
yiaw '(# 8651)
de não ficar explícito no Preceito da Comunidade sobre a admissão de novos membros (1QS 1:16—2:18), ao que parece estes eram recebidos no terceiro mês; se for esse o caso, o mais provável é que fosse a Festa das Semanas (VanderKam, 896). 2. Beckwith (1981) apresenta um resumo de várias interpretações cristãs e judaicas aplicadas à profecia das setenta semanas em Daniel: o contraste entre a imprecisão da profecia e a especificidade dos esquemas cronológicos é impressionante (541). “E como se a profecia e seus intérpretes pertencessem a duas eras ou ambientes distintos” (ibid.). As três principais interpretações judaicas são a essênia, a helenista e a farisaica/zelotc. a. A interpretação essênia encontra-se no Testamento de Levi e no Documento de Pseudo-Ezequiel (4Q 384-90). Os essênios eram extremamente messiânicos e calculavam que as setenta semanas terminariam entre 3 a. C. e 2 d. C. b. A tradução G original de Daniel nos proporciona a interpretação não messiânica mais antiga da qual se tem conhecimento, aplicando-a a Onias III, como o ungido que foi morto. c. A Assunção de Moisés é um escrito curioso no sentido de que espera uma intervenção de Deus de acordo com o tempo dos essênios, mas incorpora a cronologia farisaica representada no seder rab. Olam Rabá. Esta última cronologia baseia-se num texto heb. massorético e deter mina o fim das setenta semanas entre 63 e 70 d. C. E possível que tal datação tenha sido feita de modo a evitar a associação com as expectativas messiânicas anteriores dos zelotes. O próprio seder Olam Rabá é de caráter não messiânico em sua aplicação, que provavelmente apresenta data posterior à destruição provocada por Roma. Josefo parece concluir que as setenta semanas terminaram no ano 70 d. C. e considerar o sumo sacerdote Anano o ungido que foi morto. A revolta de Bar Cochbá pode ter sido resultado do messianismo zelote lançando mão da cronologia farisaica, porém começando depois do exílio e não antes, criando a expectativa de que o tempo da guerra deveria ser setenta anos depois de 63 d. C. Os patriarcas cristãos do século III (Tertuliano, Clemente de Alexandria, Júlio Africano e Hipólito) interpretam as setenta semanas como um período que conduz à vinda de Jesus e à destruição de Jerusalém que se seguiu. E interessante observar que Clemente e Hipólito são os primeiros escritores a afirmar que a profecia refere-se a dois ungidos, um depois das sete semanas e outros depois das setenta e duas semanas; a tradução G não fornece nenhum indí cio de uma interrupção entre as sete e as sessenta e duas semanas ou de um ungido anterior. Ao que parece, depois da revolta de Bar Cochbá, o judaísmo desiludido reagiu à interpretação messiânica e delineou a interpretação que aparece atualmente na marcação masorética de duas eras diferentes (Beckwith, 540-41). NT 1. O Pentecostes é mencionado 3x no NT. Em Atos 20.16, Paulo refere-se à ocasião de sua volta à Jerusalém e, em 1 Coríntios 16.8, faz referência à sua estada em Efeso. O longo relato da vinda do Espírito Santo, em Atos 2, faz lembrar a idéia de que foi nesse tempo que Deus concedeu sua revelação. De acordo com uma tradição, no Sinai todas as nações ouviram em suas setenta línguas a voz que vinha do monte (b. Shabb. 88b), mas nada disso fica claro em Atos. 2 .0 NT fala da abominável desolação, em Mateus 24.15 e Marcos 13.14, uma provável referência a Daniel 9.27. Não existe, porém, nenhum esquema cronológico, e é mais provável que os acontecimentos da destruição romana sejam um modelo, ou seja, acontecimentos que possuíam uma correspondência histórica com a destruição anterior no tempo dos macabeus, referida nas profecias de Daniel. Essa é uma forma comum de aplicação das profecias (p. ex., Mateus 2.15, 18). Uma abordagem semelhante pode ser apontada no relato de Lucas, em que o anjo Gabriel aparece na hora do sacrifício do final do dia e anuncia uma série de acontecimentos que terminam com a consagração de Jesus no templo 490 dias depois (Goldingay, xxix). 23
n ivauún (# 8651 a)
Dia: -> bõqer II (manhã, alvorada, # 1332); # 3427)
,vww I (luz do dia, dia, dia escatológico, hoje,
B ib l io g r a f ia
77/^72:856; R. Beckwith, “Daniel 9 and the Date of Messiah’s Corning in Essene, Hellenistic, Pharisaic, Zealot, and Early Christian Computation”, RevQ 40, 1981, 521-42; R. de Vaux, Anclsr. 1961,2:493-95; J. Goldingay, Daniel, WBC 30,1989, xxix, 231-68; G. F. Hasel, “The Hebrew Masculine Plural for ‘Weeks’ in the Expression ‘Seventy Weeks’ in Daniel 9.24,” A USS 2,1993,105-18; M. Kalafian. The Prophecy o f the Seventy Weeks o f the Book ofDaniel, 1991; A. S. Kapelrud, “The Number Seven in Ugaritic Texts”, V T 18,1968,494-99; A. Laato, “The Seventy Yearweeks in the Book o f Daniel,” Z A W 102, 1990, 212-25; T. E. McComiskey, “The Seventy ‘Weeks’ o f Daniel Against the Background o f Ancient Near Eastem Literature,” WThJ 47, 1985, 18-45; J. Milgrom, Numbers, JPS Torah Commentary, 1990, 244-45; E. Quimron, The Hebrew o f the D eadSea Scrolls, HSS 29, 1986, 67; J. J. Stamm, Hebrâisches andarmãisches Lexicon zum Alten Testament, 1990,1287; J. C. VanderKam, “Weeks, Festival of,” AB 6:895-97; J. C. Whitcomb, “Daniel’s Great Seventy-Week Prophecy: An Exegetical Insight,” GTJ2, 1981,259-63. A. H. Konkel
8651 a
niJDBfan
niJDBfan (hag sãbu ‘ôt). Festa das Semanas (# 8561 a).
OMA É pouco provável que o subst. tenha alguma relação com o vb. s b ', jurar, mas o subs. é devidamente atestado no OMA, p. ex: acad. sebütum, sétimo dia do mês; ár. usbü AT
1. Formas de uso. a. No Livro da Aliança, a segunda festa do ano é chamada de “festa de peregrinação da colheita” (hag haqqãsir, que provavelmente indica a colheita da safra de cevada; Ex 23.16). Arichea (419) sugere a tradução “Festa da Colheita”. Em outras passagens de Êxodo, ela é chamada de “Festa das Semanas” e está relacionada com “as primícias da sega do trigo” (bikkúrê qe$ír hiffím) (34.22). b. De acordo com Deuteronômio 16.9-12, a festa é chamada de “Festa das Semanas” (hag sãbu ‘ôt), o que indicava que um período de sete semanas devia ser contado depois da Festa dos Pães Asmos antes da oferta voluntária, proporcional à capacidade individual de con tribuição, ser apresentada. c. As instruções sacerdotais (Lv 23.9-22) não se referem a essa comemoração como uma festa de peregrinação, pois as primícias deviam simplesmente ser entregues ao Senhor. Dão, porém, informações mais específicas sobre o cálculo do tempo da festa. Os sacrifícios a serem oferecidos durante a festa encontram-se prescritos em Números 28.26-31. Nas profecias de influência sacerdotal durante o exílio (Ez 45.18-25), o caráter agrícola passa a ocupar um segundo plano e não se faz menção alguma à Festa das Semanas (TREg 11:99-100). 2. Interpretação teológica. Essa festa não era ligada ao passado de Israel de maneira próxima quanto outras festas de peregrinação. A primeira vista, pode-se suspeitar que a Festa das Semanas desempenhava um papel teológico secundário comparado à Páscoa e à Festa de Sucote. Apesar da falta evidente de um caráter histórico, há certos aspectos teológicos impor tantes que podem ser citados (ABD 6:895). a. O motivo mais aparente para a oferta das primícias é prestar tributo a Deus co aquele que provê a fertilidade, e resquícios dessa convicção ainda podem ser encontrados na 24
nisatfan (# 865 ia)
idéia que o AT tem da Festa das Semanas e das Primícias. É preciso considerar até que ponto a religião cananéia, com sua ênfase na fertilidade, representou uma ameaça constante à adoração de Javé em Israel, muito tempo depois da instituição da monarquia. A Festa das Primícias não era apenas uma comemoração da fertilidade em si, mas uma celebração de Deus como Senhor e provedor de todas as coisas (TWAT 7:1022). O êxodo era o motivo lógico da liberdade de Israel, liberdade esta que também era simbolizada e da qual o povo se apropriava novamente a cada ano ao realizar a oferta das primícias (Johnstone, 45-47). b. Deve-se dar atenção às ofertas específicas realizadas durante a Festa das Semanas (Lv 23.15-22; Nm 28.26-31). Dois pães feitos de flor de farinha e assados com fermento eram apresentados a Deus — a única exceção à exigência de que nenhum cereal oferecido devia conter fermento (Grabbe, 91). Cinqüenta dias antes, a Festa dos Pães Asmos lembrava Israel da pressa com que haviam se preparado para o êxodo. Durante a Festa das Semanas, o pão com fermento, habitual numa comunidade agrícola, era oferecido como sacrifício, indicando possivelmente um estilo de vida mais tranqüilo (de Vaux, 494). Assim como em outras festas, devia predominar um clima de alegria (Dt 16.11), sendo prescrita ainda a preocupação com os pobres (Lv 23.22). c. Deuteronômio 16.11-12 enfatiza que a comunidade toda era convidada a participar da Festa das Semanas e das Primícias. O fato de os menos favorecidos participarem dessa co memoração servia para lembrar a Israel como Deus havia libertado seu povo da escravidão do Egito. A oferta era proporcional à abundância da bênção de Deus (Merrill, 254), um bom exemplo de uma consciência social orientada pela teologia. P-B 1. Targum. O Targum de 2 Crônicas 15.8-15 situa as reformas cultuais de Asa e a assem bléia de Israel na Festa das Semanas. Isso representa uma associação entre sãbu ‘ôt e a aliança que é desenvolvida em mais detalhes na LR (ABD 6:896). 2. LXX. A tradução G enfatiza os cinqüenta (dias), pentêkostê (qüinquagésimo). 3. Qumran. O Manuscrito do Templo (18:10— 19:10) refere-se à Festa das Semanas como parte de uma série de quatro festas das primícias, cada uma delas separada da anterior por um período de quarenta e nove dias (ABD 6:896; Reeves, 350-61). De acordo com o Do cumento de Damasco, a cerimônia de renovação da aliança pode estar ligada à Festa das Se manas (Milik, 117). 4. LR. Os rabinos chamavam a atenção para Êxodo 19.1, que afirma claramente que Israel chegou ao Sinai no terceiro mês depois de sair do Egito. Assim, considera-se que a entre ga da Torá coincide com a última parte da Festa das Semanas (Gaster, 59-79; Zimmerli, 128). Esse acontecimento deve ser distinguido da festa de Simhat Torah, do século XI d. C., durante a qual também era comemorada a entrega da lei. NT No NT, a festa é chamada de Pentecostes, como aparece na LXX (At 2.1; 20.16). Pentecostes foi o dia em que o Espírito Santo derramou-se sobre os apóstolos (Atos 2). Posterior mente, Paulo quis voltar a Jerusalém para a observância dessa data (At 20.16). Cristo é des crito como “primícias” em 1 Coríntios 15.20,23 (TWOT2:%99). Tiago refere-se aos primeiros cristãos como “primícias” de uma igreja em crescimento (Tg 1.18). Festas e festivais: bikkúrim (primeiros frutos ou primícias,# 1137); hag (procissão, dança de roda, festival, festa, # 2504); -> hanukkâ (consagração, Festa da Consagração, # 2853); mò 'èd (tempo determinado, # 4595); -> massôt (Festa dos Pães Asmos, # 5174a); -> marzêah (banquete cultuai, refeição fúnebre, # 5301); -> sukkôt (Festa dos Tabemáculos, # 6109a); 25
ro to (# 8655)
‘aí)ãrâ (reunião festiva, # 6809); pürim (Festa do Purim, # 7052a); pesah (Festa ou sa crifício da Páscoa, # 7175 [Páscoa: Teologia]); r õ ’s hõdes (festival da lua nova, # 8031a); -> rõ ’5 hassãnâ (início do ano, # 8031 b); 5<5íh ‘óí (Festa das Semanas, # 8651 a); sabbãt (sábado, # 8701 [Sábado: Teologia]) B ib l io g r a f ia
ABD 6:895-97; TREg 6:96-106; TW/tt-6:974-1028; TW OT2:899; D. C. Arichea, “Translating Biblical Festivais,” BT 32, 1981, 413-23; U. Cassuto, yí Commentary on the Book o f Exodus, 1951; B, S. Childs, The Book o f Exodus, OTL, 1974; R. de Vaux, Ánclsr, 1961, 493-95; J. 1. Durham, Exodus, 1987; T. H. Gaster, Festivais o f the Jewish Year, 1978; L. L. Grabbe, Leviticus, 1993; W. Johnstone, Exodus, 1990; E. H. Merrill, Deuteronomy, NAC 4, 1994; J. T. Milik, Ten Years o f Discovery in the Wilderness ofJudaea, 1959; J. C. Reeves, “The Feast of the First Fruits o f Wine and the Ancient Canaanite Calendar,” VT 42, 1992, 350-61; W. Zimmerli, 0 7 7 0 , 1984. Hendrik L. Bosman 8652 (sebú ‘â, juramento), -> # 8678 8653 (sãbür, ferido), -> # 8689 8654 (sebút, fortunas),
8655
# 8740
nau?
roá* (sbh), pi. elogiar, louvar, glorificar, honrar; hitp. glória (# 8655); aram. pael, louvar (# 10693).
OMA aramB, aramJ, sir. sbh, louvar; ár. sabbalja, louvar; egíp. sbh, clamar. AT Esse vb., uma palavra estrangeira incorporada ao aram., é parte do vocabulário de lou vor. Ocorre principalmente nos Salmos. 1. Em Eclesiastes, o vb. expressa os elogios de um mestre da sabedoria — de os mortos serem mais felizes do que os vivos (Ec 4.2) e da alegria de viver (8.15). 2. Em outras passagens, o vb. denota o louvor religioso. Nos hinos, ele introduz uma seção de louvor no Salmo 147.2 e um chamado retórico às nações para louvar a Deus no Salmo 117.1. Num único hino, aparece como uma exortação para que o louvor a Deus seja transmitido de geração em geração, louvor este por sua obra na criação e sua história redentora (145.4). Num salmo de confiança, Deus é louvado por seu amor (na aliança), que é considerado uma bênção maior do que a própria vida (63.3 [4]). Num lamento público, uma súplica por livramento entrevê o louvor que será dado a Deus uma vez que a súplica for atendida (106.47 = lCr 16.35). 3. No texto aram. de Daniel, o termo aparece em orações de ação de graças, em Daniel 2.23; 4.31 [34], referindo-se ainda ao louvor prestado a deuses pagãos, em Daniel 5.4, 23. P-B No 1QM 4:8, um dos estandartes carregados pelo exército vitorioso trazia a inscrição tsbwht 7, louvores a Deus. Louvor, cântico, açâo de graças: hll II (louvar, ser digno de louvor, gloriar, exultar, # 2146); -> zmr I (fazer música, cantar louvor, # 2376); -> ydh II (reconhecer, dar graças, louvar, 26
nn® (# 8656)
# 3344); nwh II (louvar, # 5658); -> ‘m/» IV (cantar, # 6702); p-j/i I (irromper em cântico ou começar a cantar, # 7200); -> rômêm (exaltação, # 8123a); -> sM I (elogiar, louvar, honrar, # 8655); Syr (cantar, # 8876); -> tnh (recitar, comemorar, # 9480) Leslie C. Allen
8656
nnií?
naíP (Sbh), pi. silenciar, acalmar; hi. aquietar (# 8656).
AT Duas das ocorrências dessa palavra encontram-se relacionadas à capacidade de Deus de acalmar o mar tempestuoso (SI 65.7 [8]; 89.9 [10]. A terceira está relacionada à capacidade de um homem sábio conter-se, em contraste com um insensato impetuoso (Pv 29.11). Descanso, quietude, repouso: -> dmh II (chegar ao fim, repousar, ficar calado, em silêncio, # 1949); -> nwh I (descansar, # 5657); nwh I (assentar, descansar, esperar, estacionar, deposi tar, # 5663); rg ' (formar uma crosta sobre, endurecer, parar, ficar quieto, # 8088/89); -> S ’n (ficar em paz, imperturbado, # 8631); sbh II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); sebet (descanso, assento, # 8699, 8700); -> stq (acalmar-se, # 9284) John N. Oswalt
8657
oaW
u a i; (Sêbe(), vara, bastão, cetro, tribo (# 8657); (sarbíf), bastão, cetro (# 9222) (4x).
OMA O subs. sêòef é atestado no acad. Sabbitu, bastão, cetro; no aram., Seba(, tribo; e no AAS sb(, vara. O subs. derivativo Sarbit, bastão, cetro, é atestado apenas em Ester, com a aparição de resh, talvez devido à influência do aram. ou mesmo do persa.
AT Tanto sêbef ( 190x) como seu sinônimo ma((eh (# 4571) referiam-se, a principio, a par tes de uma árvore da qual se podia fazer um bastão ou uma arma (Brenner, 1980). Líderes que usavam essas armas com eficácia ficaram conhecidos como Sêbe( (como em Nm 24. 17-19), bem como seus seguidores. Assim, o significado de maior predominância atribuído a sêbe( no AT é tribo, mais especificamente, uma das tribos de Israel ( Tribos: Teologia). Por outro lado, a palavra possui grande significado teológico como um termo de autoridade, quando retrata a vara da disciplina ou o cetro do Messias. 1. Pentateuco. O termo Sêbef aparece pela primeira vez nas Escrituras em Gênesis 49.1 uma passagem amplamente aceita como sendo messiânica (ver, porém, Moenikes, 1988). Apesar de voltar a ocorrer em 49.16 e 49.28 com o significado de tribos, tem aqui o sentido de cetro, paralelo sinonímico de >nehõqêq, bastão do comandante; em última análise, alguém de Judá que terá autoridade para reinar. Apesar de a maioria das ocorrências de sêbe( no Pent. referir-se a tribos israelitas, sêbe( também designa uma vara com autoridade disciplinadora (Ex 21.20) e a uma vara ou bastão (bordão), usado para separar as ovelhas para o dízimo ao Senhor (Lv 27.32). Uma ocorrência de maior importância teológica encontra-se em Números 24.17, uma passagem messiânica dos oráculos de Balaão, a qual sugere que um cetro conquistador (Sêbef), ou um governante, virá de Israel (cf. 24.19). Alguns consideram que, nesse caso, sbt indique o termo Sbyf, cometa, num paralelo com kõkãb, estrela, na linha imediatamente anterior em função da ocorrência de kwkb ’ dsby( no TalmB. Berakhot 58b (Schwartz, 1981). De qualquer 27
(# 8657)
modo, é concebível que essa passagem possa ter levado os magos a associar uma estrela com o nascimento do Messias (cf. Mt 2.1 -2). 2. Livros históricos. Assim como no Pent., a glosa mais freqüente atribuída a sêbet na literatura histórica do AT é a de tribo. Há exceções, como em Juizes 5.14, em que é provável que a expressão sêbe( sõpêr (lit. vara de um escriba) refira-se ao bastão de um comandante (paralelo sinonímico de mehõqeq ’m, como em Gn 49.10). Apesar de o uso de sõpêr, escriba, depois de sêbet ser atípico, é possível que uma pessoa que trabalhasse como escriba no OMA também pudesse ter autoridade política (Baker, 1994). O termo sêbe( apresenta uma ocorrên cia mais marcante em outra passagem supostamente messiânica, 2 Samuel 7.14. Nesse caso, não significa o cetro de um governante, mas sim a vara de disciplina sobre a descendência de Davi, usada pelas autoridades sob a orientação de Deus. Por fim, essa disciplina recaiu sobre o Messias que levou sobre si o nosso pecado (2Co 5.21). Assim, seu uso, nesse caso, se apro xima da compreensão mais comum na literatura poética do AT (ver abaixo). E possível que as ocorrências de sêbet em 2 Samuel 18.14 e 23.21 (dardo, lança) não sejam teologicamente relevantes. O derivativo sarbit aparece apenas em Ester com o sentido de cetro, o símbolo de autoridade de Xerxes. 3. Livros poéticos. A idéia mais comum de sêbet na literatura poética do AT é a de uma vara de disciplina usada por alguém numa posição de autoridade, como no caso do castigo cor retivo de um pai (Pv 13.24; 22.15; 23.13, 14; 29.15), da aplicação de uma pena por uma auto ridade pública (10.13) ou de Deus (Jó 21.9; 37.13). Talvez essa também seja a idéia do Salmo 2.9, em que o Messias de Deus brande uma vara de ferro contra as nações inimigas, sugerindo tanto autoridade quanto disciplina. O conceito de um cetro de justiça vem do Salmo 45, um salmo real em que o salmista declara, no versículo 6 [7], que o cetro (sêbe() do reino de Deus será um cetro (sêbet) de eqüidade. Ele governará com justiça. O uso mais conhecido de sêbef no Salmo 23.4 (“o teu bordão [a tua vara] e o teu caj me consolam”) pode ser entendido como o conforto proporcionado às ovelhas pela presença do pastor. Também é possível que a autoridade de Deus sobre a morte, autoridade esta repre sentada pelo bordão (cetro), seja uma fonte de consolo para aqueles que estão atravessando o vale da sombra da morte. 4. Livros proféticos. A vara da disciplina de Deus é empregada por Emanuel em Isaí as 11.4. Esse aspecto da autoridade de Deus é repetido em outras passagens dos escritos dos profetas (Is 10.5; Lm 3.1; Ez 20.37). Outras ocorrências de sêbef, como uma vara nos livros proféticos, simbolizam o governo de outros reinos (da Assíria em Is 14.5; da Síria em Am 1.5; da Filístia em 1.8 e do Egito em Zc 10.11). LXX A LXX traduziu sêbef de diversas maneiras, sendo a mais numerosa, obviamente, phylê, tribo (Gn 49.16,28; Am 1.5,8). Outras palavras utilizadas são tentativas de interpretar as várias nuanças de sêbet como símbolo de autoridade: archõn, governante (Gn 49.10); anthrõpos, ho mem (Nm 24.17); rhabdos, vara (Jz 5.14 [texto vaticano]; 2Sm 7.14; SI 44.7 [45.7]); skêptron, cetro (Jz 5.14 [texto alexandrino]; Zc 10.11); zygon, jugo (de opressão; Is 14.5). P-B É possível que a comunidade de Qumran entendesse que sêbe( indicava a pessoa do Intérprete da Lei no Documento Zadoquita 7:18-19, no 4Qflir 1:11 e, talvez, também no 4QPBless (Schwartz, 1981). O conceito de um escriba tomar-se um intérprete revestido de autori dade pode ter contribuído para isso (cf. Jz 5.14; Baker, 1994). NT O NT afirma claramente o significado messiânico dos Salmos 2.9 e 45.7, aplicando-os a Cristo ao usar rhabdos em Apocalipse 2.27 (12.5; 19.15) e Hebreus 1.8, respectivamente. O 28
3’rnp' (# 8663)
conceito de disciplina pode ser observado no vb. rhabdizõ, bater com varas, e está relacionado com o subs. rhabdoukos, carcereiro. Vara, bordão, bastão: -¥ hõ(er (vara, rebento, # 2643); -> môtá (jugo, canzil, # 4574); -> ma((eh (bordão, vara, cetro, tribo, # 4751); -> mãnôr (vara, # 4962); maqqêl (vara, galho, bordão, # 5234); sêbet (tribo, bastão, vara, arma, cetro, # 8657) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:897; D. W. Baker, “Scribes as Transmitters o f Tradition,” in Faith, Tradition, and History, eds. A. R. Millard, J. Hoffmeier, D. W. Baker, 1994, 65-77; A. Brenner, “On Matteh and Sêbe( and Their Semantic Classification,” Les 44, 1980, 100-108 (Heb.); K. M. Craig Jr., “The Characterization o f God in 2 Samuel 7.1-17,” Sem 63, 1993, 159-76; A. Moenikes, “Messianismus im Alten Testament,” ZRGG 40, 1988, 289-306; D. Murray, “Once Again 't ’hdsb(y ysr 7 in II Samuel 7.7,” RB 94, 1987,389-96; D. R. Schwartz, “The Messianic Departure from Judah (4Q Patriarchical Blessings),” T Z 37,1981,257-66; D. T. Tsumura, “ ‘Inserted Bicolon’ the AXYB Pattem. in Amos i 5 and Psalm ix 7,” fT 3 8 , 1988,234-36. David M. Fouts 8660 (seb ’, cativeiro, cativos), -> # 8647
8663 AT
rra tf
TDtt? (sãbib), subs. chama (# 8663).
O subs. refere-se à chama de um fogo (Jó 18.5; Dn 3.22; 7.9).
Fogo, chama: -¥ ’úd (cepo, tição fumegante, # 202); -> es I (fogo, # 836); b ‘r I (chamus car, arder em chamas, ser consumido, # 1277); gahelet (carvão candente, # 1625); -> goprit (enxofre, # 1730); yst (acender um fogo, queimar, atear fogo, # 3675); y q d (incandescer, estar queimando, aceso [fogo], # 3678); -> kidôd (faísca, # 3958); /AA II (assar bolos, # 4221); lahab (chama, lâmina, # 4258); -> //jf I (arder, queimar, # 4265); lappid (tocha, relâmpago, # 4365); -> «/"íôí (faísca, # 5773); pehãm (carvão, # 7073); -> re$ep I (brasa, # 8363); resep I (chama, incandescência, flecha, praga, # 8404); -> írp (queimar, ser quei mado, # 8596); sãbib (chama, # 8663) Jackie A. Naudé 8664 (sibyâ, cativeiro, cativos),
# 8647
8665 (sebiyyâ, cativo), -> # 8647
8666
(sebil), vereda (# 8666).
AT 1. Esse lexema (sebül no K de Jr 18.15) ocorre apenas duas vezes no AT e, em ambos os casos, com um sentido não literal. No Salmo 77.19 [20] é paralelo sinonímico de derek, cami nho: “Pelo mar foi o teu caminho, as tuas veredas [K, os teus caminhos] pelas grandes águas”. Trata-se aqui de uma referência ao livramento miraculoso dos hebreus, do Egito, pela travessia do mar Vermelho, pelo qual Javé, o Guerreiro, conduziu seu povo, dividindo as águas. 29
W3Ü (# 8667)
2. A outra ocorrência desse termo, com o sentido de caminho (ou “vereda”, como HALAT), encontra-se em Jeremias 18.5, em que, conforme foi observado, o texto K. apresenta sebül em vez de sebil. Nessa passagem, o profeta emprega três sinônimos para caminho ou estrada, ao descrever a infidelidade de Israel para com Javé no passado. O povo se esqueceu de seu Deus e buscou deuses inúteis, o que fez com que tropeçasse em seus caminhos (bedarkêhem), as veredas antigas (sebilê 'ôlãm), e que trilhassem estradas (netíbôt), passassem por veredas (derek) não aterradas. A estrutura da passagem (ABBA) indica que sebil é paralelo a rfitibâ e deve, portanto, ser considerado um sinônimo bastante próximo. De qualquer forma, todos os termos dessa passagem referem-se a um modo de vida, nesse caso, pecaminoso por ser caracterizado ou motivado pela idolatria. Vereda, caminho: ’rh (estar a caminho, vagar, # 782); -> derek (caminho, distância, jorna da, maneira, # 2006); madrégâ (caminho íngrime, # 4533); nfisillá (estrada, # 5019); m a‘gãl II (trilha, # 5047); -> miS‘ôl (caminho fútil, # 5469); -> nãtib (vereda, # 5985); pis I (livrar o caminho, abrir caminho, #7142); -> ^ // ( v e r e d a , # 8666); -> sep l \ (trilha, #9155) Eugene Merrill
(sãbis), subs. tiara (ou pequenos adornos em for mato de sol; [hapleg.], [# 8667], [adomos em forma de lua; luetas]); possivelmente relacionado a T3U? (í&y), tecer em padrões decorativos ( -> # 8687); OMA Aram. sebisã ’; sir. Pex. sebfihên, adorno deles (HALAT 1295); ugar. sps (UT, 2468), sol = heb. semes, sol. AT O termo ocorre numa lista de adomos femininos (Is 3.18; LXX tous kosoumbous, as re des de cabelo; cf. HALAT 1295). Para um estudo sobre jóias, ver ‘dh (colocar adomos, # 6335). MalcolmJ. A. Horsnell 8668 (SebVi, sétimo),
# 8679
8669 (sPbít, cativeiro), -> # 8647
_________________________ Z _______
V3®1’ (Sõbel), saia esvoaçante (hapleg. Is 47.2) (# 8670).
AT O hapleg. sõbel representa o requinte da Babilônia, aquilo que ela estava prestes a per der como nação conquistada. Em vez de ser a senhora das nações, seria reduzida à condição de escrava. Nessas palavras de escárnio, o profeta incentiva os piedosos a buscarem a salvação de Deus. A remoção do véu significa o rebaixamento da condição social de senhora para serva (Beeston, 175-77; Watts, Isaiah 34-66, WBC, 169). Roupas — vestes, saia, manto: -> kãnãp (asa, saia, orla, # 4053); -> kfsüt (cobertura, ves timenta, capa, # 4064); -> n fi'il (manto, # 5077); -> sõbel (saia esvoaçante, # 8670); -> súl (saia, # 8767); -> takrik (manto, # 9423) 30
VtV^W(# 8671)
B ib l io g r a f ia
A. F. L. Beeston, “Hebrew sibbõlet and sobel (Is 47.2),” JSS 24, 1979, 175-77. Robert L. Alden
8671
7T7 5 Ç' (sabbelúl), prov. “lesma” no Salmo 58.8 [9]; foi sugerido, porém, “aborto” (HALAT 1296) (# 8671).
Esterilidade, atecnia, aborto: galmúd (estéril, # 1678); -> nêpel (natimorto, aborto, # 5878); -> 'ãqãr (estéril, sem filhos, # 6829); -> 'ariri (sem filhos, # 6884); -> skl (ser desfiIhado, privar, abortar, # 8897) Victor P. Hamilton
nVàlE1’(sibbõlet I), espiga de cereal (# 8672). OMA Essa palavra possui um número expressivo de cognatos nas línguas do OMA (ugar. sblt; acad. subultu(m), subiltu; ár. sabal, sunbui, AAS sblt), sendo que todos significam “es piga de cereal”. AT 1. Dez das quinze ocorrências no AT são encontradas no sonho de Faraó (Gênesis 41) e, de modo geral, referem-se à parte de cima das espigas (ver o v. 5, em que a palavra refere-se a sete espigas num talo); porém, Jó 24.24 emprega a palavra rõ cabeça, com sibbõlet para indicar a parte de cima do talo. 2. Em Juizes 12.6, a pronúncia da palavra sibbõlet possuía uma variação, sibbõlet, no dialeto de Efraim. Os efraimitas que não conseguiam pronunciar a palavra sibbõlet eram mor tos (ver também sibbõlet II, # 8673; Almeida: chibolete e sibolete). 3. Há certa dúvida quanto ao significado de sibbõlet em Zc 4.12, pois pode originarse de sibbõlet I, querendo dizer, “ponta de um ramo de oliveira” ou, mais possivelmente, de sibbõlet II, significando, “correntes de azeite de oliva” (D. L. Petersen, Haggai andZechariah 1-8, 1984, 235-36). P-B A LXX traduz o termo como stachus, espiga, e línguas posteriores, como o heb. da mix. (sibbõlet), o sir. (sebbelã) e o aram. (seba!tã sübaltã') continuaram a usar formas relaciona das, significando “espiga de cereal”. Cereal, cevada, painço, arroz, etc.: -> 'ãbib (espigas de cereal, # 26); biçqãlôn (talos fres cos [conj.], # 1303); -> bar III (grão, milho, # 1339); gãdis (meda de cereal, feixe de trigo, # 1538); geres (grão trilhado, esmagado; # 1762); -> dãgãn (grão, # 1841); -> dõhan (sorgo, painço, # 1893); -> hi(tâ (trigo, # 2636); -> kussemet (espelta [trigo vermelho], # 4081); karmel IV (espigas verdes, tenras, # 4152); -> melilá (cereal, grãos, # 4884); -> minnit (arroz, # 4976); -> mõ$ (moinha, pragana, palha, #5161); sõlet (farinha de trigo, # 6159); pannãg (grão tostado?, flor de farinha, # 7154); -> çebet (grão, feixe de cereais, # 7395); çãnum (duro, [espigas de cereal] improdutivas, # 7568); qãli (grão tostado, # 7833); -> qãmâ (seara, grão, cereal não ceifado, # 7850); -> sôrâ (painço, # 8463); -> se ora (cevada, # 8555); -> sibbõlet I (espiga de cereal, # 8672); -> Seber II (cereal, # 8692) Paul D. Wegner 31
rfTárç (# 8673)
nVálT' (sibbõlet II), subs. torrente, ondulação (# 8673). OMA A derivação de sibbõlet II é incerta, mas observem-se os termos ár. sabal (chuva, san gue correndo), sublat (chuva abundante) e sabbãlat (fonte); cf. ár. asbala (chover a cântaros); um radical proto-sem. não atestado *lbl (ver HALAT 1297 e artigos de Beeston, Rendsburg e Swiggers para um resumo da discussão). AT As dezenove ocorrências da forma sibbõlet encaixam-se claramente em duas categorias de significado (e derivação). Quatro passagens (Jz 12.6; SI 69.2 [3], 15 [16]; Is 27.12) costu mam ser consideradas como sibbõlet II, com o significado de um curso de água (Beeston, 1979, 175-76) ou correnteza (H ALAT942). O HALAT (\291) apresenta sibbõlet III (rio / vau — Jz 12.6; Is 27.12) em comparação com Sibbõlet II (inundação; cf. Beeston, 1988, 261 [inundação repentina] — SI 69.2 [3], 15 [6]). The NIVExhaustive Concordance classifica Juizes 12.6 com sibbõlet I, e as três outras passagens com sibbõlet II. No Salmo 69 (um lamento individual), sibbõlet II representa a experiência de calamidade do salmista, uma situação da qual ele pede que Javé o livre (69.15 [16]). Nas duas ocasiões do Salmo 69, o termo aparece com o vb. s(p, inundar (# 8851) para retratar a natureza incontrolável das águas dessa inundação (mayim apa rece com sibbõlet II em 69.5 [6]). No caso de Is 27.12, sibbõlet II descreve um curso de água que faz parte de uma expressão extensa (“daqui até lá”). Inundação, dilúvio, torrente: b z ' (dividir [por ação da água], # 1021); -> grp (arrastar com a água, # 1759); -> mabbül (oceano celestial, dilúvio, # 4429); -> niggeret (torrente, # 5600); -> .fwp (inundar, elevar, fazer flutuar, # 7429); sibbõlet II (torrente, ondulação, # 8673); -> sô( III (inundação [repentina], # 8766); s(p (arrastar com água, inundar, alagar, # 8851); íe.fep (enchente, # 9192) B ib l io g r a f ia
A. Beeston, “Hebrew Sibbõlet and Sobe/ (Is 47.2),” JSS 24, 1979, 175-77; idem, “Sibbõlet: A Further Comment,” JSS 33, 1988, 259-61; J. EIlington, “More on Shibboleth (Judges. 12.6),” BT 43, 1992, 244-45; A. Faber, “Second Harvest: Sibbõlet Revisited (Yet Again),” JSS 37 1992, 1-10; D. Marcus, “Ridiculing the Ephraimaites: The Shibboleth Incident (Judg. 12.6),’ Maarav 8, 1992, 95-105; G. Rendsburg, “More on Hebrew Sibbõlet," JSS 33, 1988, 255-58 P. Swiggers, “The Word Sibbõlet in Jud. XII.6,” 75S 26, 1981,205-7. Michael A. Grisanti
VXD (sb ') q. pass. ser levado a jurar (somente uma vez); ni. jurar, prestar juramento, comprometer-se por jura mento; hi. levar a jurar, adjurar (# 8678); HVTDip (seb ú ‘â), subs. juramento (# 8652). .OMA O radical consonantal é idêntico à palavra que significa “sete”. Nesse sentido, tem cognatos em várias línguas do OMA, inclusive no acad., ár., nab., et. e aramaico. AT 1. Derivação. Uma vez que as consoantes são equivalentes ao termo usado para sete, alguns autores apresentam a hipótese de uma relação antiga entre o número sete e a prática de jurar. Em Gênesis 21.22-34, Abraão sela um juramento sobre o uso de um poço dando a Abimeleque sete cordeiras. O poço é chamado então de Betesda, “Poço do Juramento”. Se houve 32
s a tf (# 8678)
um tempo que o número sete era parte integrante da prática de prestar juramento, essa relação se perdeu em grande parte do AT. 2. Forma eJunção. Na vida do AT, jurar era garantir que se cumpriria fielmente a palavra. Os juramentos do AT consistem numa promessa que é reforçada pelo acréscimo de uma maldi ção, com um apelo a uma divindade (ou mesmo a um rei humano) que garantiria a maldição. Na BH, os juramentos apresentam a forma básica, “Assim e mais, faça Deus comigo/contigo se eu/tu não fizer/fizeres isto e aquilo...” Quando Eli instou Samuel a contar-lhe a visão que tivera à noite, disse: “assim Deus te faça o que bem lhe aprouver se me encobrires alguma coisa de tudo o que te falou” (1 Sm 3.17). Quando o rei de Israel jurou matar Eliseu em 2 Reis 6.31, também usou a forma típica: “Assim me faça Deus o que bem lhe aprouver se a cabeça de Eliseu, filho de Safate, lhe ficar, hoje, sobre os ombros”. Observe que o juramento pode estar relacionado ao comportamento da própria pes soa ou de outrem. Superficialmente, declarações de juramento parecem condicionais, mas é a maldição — e não a promessa — que é condicional. Não há dúvidas da intenção do locutor de cumprir sua obrigação: o “se” é apenas uma lembrança de que a ira de Deus foi invocada caso isso não aconteça. No AT, qualquer promessa a Deus eqüivale a um juramento. As promessas de Javé de estabelecer a linhagem de Davi no trono (2Sm 7), por exemplo, encontram-se registradas como simples afirmações declarativas, porém mais tarde o salmista insiste que Javé “[jurou] a Davi [seu] servo” (SI 89.3 [4], cf. 132.11; At 2.30). As pessoas juravam pela divindade, mas Javé não tinha como invocar um poder superior: podia jurar por si mesmo (ls 45.23; Jr 49.13; 51.14), por sua santidade (SI 89.35 [36]), pela sua mão direita (Is 62.8) ou por seu grande nome (Jr 44.26). Quando Deus falava, era impensável que sua palavra não se cumpriria; ficava implícito que ele havia jurado por si mesmo em todas as promessas e alianças com seu povo. Esse não era o caso dos homens comuns, para os quais o acréscimo de uma maldição com um apelo à divindade era uma parte essencial do juramento. Porém, ao longo do tempo, o juramento tomou-se tão estereotipado na antiga Israel que a primeira oração (“Assim me/lhe faça Deus”) passou a ser deixada de fora por uma convenção, ficando subentendida (quando não se encontrava presente de fato) antes da oração condicional “se eu/tu...” Essa forma apocopada pode ser encontrada em Gênesis 14.23; Números 14.23; 1 Samuel 3.14; 19.6; 2 Reis 2.2; 3.14; Jó 6.28; Salmo 132.3-4; Isaías 22.14.0 caráter de juramento desses textos raramente é revelado nas traduções modernas, pois a preposição heb. 'im seguida de um juramento cla ro ou implícito costuma ser traduzida como uma negativa enfática (BDB, 50a; implícito em GKC, par. 149d-e). Enquanto Gênesis 14.23, por exemplo, diz literalmente, “se eu tomar...”, a tradução diz, “nada tomarei”, obsecurecendo a forma heb. subjacente. Problemas de tradução como esses podem levar à confusão entre votos e juramentos. O Salmo 132.2-5 contém um juramento composto de várias partes que, muitas vezes, é con fundido com um voto, especialmente porque o texto em si diz, sobre Davi, no v. 2: “jurou ao Senhor e fez votos ao Poderoso de Jacó”. A tentativa do poeta de apresentar um paralelismo sinonímico depara-se com o fato de que o heb. não possui um equivalente exato para s b ', de modo que ndr, voto, foi empregado como a melhor aproximação disponível. A asserção em si, nos vv. 3-4 contém nada menos que três orações do tipo “se eu...”, deixando claro que constitui um juramento e não um voto. No AT, um voto é uma promessa feita a Deus sob a condição de que Deus deve antes realizar um determinado desejo do adorador (cf. Gn 28.20-22; Nm 21.2; Jz 11.30-31; 1Sm 1.11; 2Sm 15.8) e não deve ser confundido com os juramentos bíblicos. 3. Regras para prestarjuramento. Prestar um juramento era um assunto sério. Números 30.2,9, 10-11, [3, 10, 11-12] é enfático em sua afirmação de que todos os juramentos e votos 33
IH tf (# 8679)
devem ser cumpridos, com uma única exceção: pais e maridos têm o poder de cancelar os votos e juramentos de suas filhas e esposas, desde que o façam no mesmo dia em que tomarem conhe cimento deles. Mulheres independentes, como viúvas e divorciadas não sofrem tais restrições. A importância de cumprir a palavra dada também fica implícita na própria forma do juramento, pois todo aquele que jura invoca sobre si uma maldição caso quebre tal juramento. 4. Relevância. O juramento como costume religioso estava amplamente difundido e de importância considerável em Israel, pois todos, desde o camponês mais humilde até o mais poderoso rei, podiam invocar o nome de Deus para validar a palavra empenhada. Os juramentos podiam ser feitos para asseverar a declaração de um fato (1 Sm 20.3), para atestar a inocência de um indivíduo (Êx 22.11 [10]), para afiançar determinado comportamento (Gn 24.37; 50.24), confirmar um tratado de paz (Js 9.15), expressar a lealdade ou amor de um indivíduo por outro (1 Sm 20.17; Ne 6.18), ou mesmo para demonstrar o compromisso de um indivíduo com Deus (2Cr 15.14). Israel acreditava que o próprio Deus havia feito juramentos com seu povo esco lhido a fim de ressaltar que a palavra de Deus era confiável (Gn 24.7; 26.3; Êx 13.11). P-B Os escritos rabínicos como a Mixná revelam que, com o tempo, a linha divisória entre os juramentos e os votos tomou-se cada vez menos clara. Até mesmo uma leitura cursiva dos tratados Nedarim e Sebu'ot deixa claro que os rabinos praticamente não faziam a distinção real entre os dois. O poder intenso por trás da prática de fazer juramentos também se dissipou em função das incontáveis circunstâncias casuístas introduzidas de modo a anular juramentos e suspender compromissos. Penhor, segurança: -> "issãr (ligação por obrigação, penhor, voto de abstinência, # 674); -> hbl II (tomar em penhor, requerer um penhor, # 2471); -> hôb (penhor, caução, # 2550); -> n s ' I (emprestar mediante penhor, # 5957); -> 'b( (tomar emprestado, tomar um penhor, # 6292); 'rb (garantir, prestar fiança, # 6842); -> piqqãdôn (bens depositados, armazém, suprimento, provisão, # 7214); -> tq ‘ (impelir, empurrar, bater palmas, tocar trombeta, empenhar, # 9546) Fala: -> ’!m (estar comprometido, perder a fala, calar-se, # 519); -> ’m r (dizer, falar, mencio nar, # 606); -> bl' II (transmitir, relatar, # 1181); -> dbr II (falar, ameaçar, prometer, ordenar, # 1819); hwh I (declarar, explicar, # 2555); -> Isn (caluniar, # 4837); -> mil III (falar, dizer, declarar, # 4910); -> ng d (tomar conhecido, revelar, declarar, # 5583); rãkil (mexeriqueiro, tagarela, enganador, caluniador, # 8215); snn II (repetir, recontar, # 9112) B ib l io g r a f ia
TWAT 5:261 -74; T. W. Cartledge, Vows in the Hebrew Bible and the Ancient Near East, 1992; I. Kottsieper, “Zur Etymologie von hebrãischen s b ' I,” U F 22, 1990, 144-68; J. Pedersen, Der Eid bei den Semiten, 1914. T. W. Cartledge
(seba' I), subs. sete (número cardinal) (# 8679); ______________________ l i ______ VTHU7’ (sãbü ‘a), subs. período de sete dias, semana ( -> # 8651); >V‘,312? (sebí'í), adj. sétimo (número ordinal) (# 8668). OMA A ocorrência do radical s b ' é comum nas línguas semitas. O sete é um número univer sal sagrado e importante, indicando muitas vezes inteireza, plenitude ou perfeição. Sua im portância talvez decorra do fato de as quatro fases da lua serem consideradas perídos de sete 34
y a f (# 8679)
dias. Essa relação é anterior à idéia de que havia sete planetas, ainda que este e outros fatores culturais possivelmente tivessem reforçado a relevância dessa relação. O termo, na Mesopotâmia e em Canaã, tinha uma ampla gama de sentidos, assim como em Israel; no entanto, os povos mesopotàmicos e cananeus não davam muita importância ao princípio sabático. O sete é empregado amplamente na literatura mesopotâmia, em listas associadas a uma divindade, em festas de sete dias e em atos rituais repetidos sete vezes. Na Epopéia de Gilgamés, o sete é um princípio essencial de organização, especialmente para os períodos de tempo. Enquidu fica com a meretriz seis dias e sete noites, a tempestade se acalma no sétimo dia e Gilgamés perde a imortalidade ao dormir durante sete dias (A N E T11,94,95). Na litaratura ugar., encontramos regularmente o par 77/88 (CTA 5 v 20-21; CML2 72), e Atirate tem setenta filhos varões (CTA 4 vi 46; CML2 63). AT 1 .0 número sete pode, por vezes, indicar um número aproximado, porém mais impor tante do que isso é o fato de deixar implícito inteireza ou plenitude. As jornadas muitas vezes levam sete dias (Gn 31.23; Pv 26.16; Jr 15.9). Sete filhos do sexo masculino constituem a fa mília perfeita e ideal, tanto no OMA (Keret CTA 15 ii 23), quando em Israel (2Sm 21.9). Com isso, a destruição da família de Jó é ainda mais trágica e a restauração dela, apropriada (Jó 1.2; 42.13). Também encontramos o número sete multiplicado por dois: 14 (Nm 29.13; Ez 43.17); e o algarismo sete repetido: 77 (Gn 4.24; Jz 8.14; Ez 8.35; cf. 777, Gn 5.31). Em algumas oca siões, o número catorze é importante por ser o dobro de sete. O número de ovelhas de Jó é do brado para quatorze mil quando Jó é renovado (Jó 42.12; cf. 1.3). Nas festas, normalmente são sacrificados sete cordeiros, enquanto quatorze são oferecidos ao longo dos sete dias da Festa dos Tabernáculos (Nm 29.13-34), enfatizando seu caráter de ponto culminante do ciclo anual. 2. A associação do sete com inteireza, totalidade e perfeitação toma a relação dele com a divindade e a santidade uma decorrência natural. Os atos rituais são realizados sete vezes e correspondem à invocação do poder de Deus, como na queda de uma cidade (Js 6), na ressur reição de um morto (2Rs 4.35) ou no pronunciamento “recitativo” de bênçãos e maldições (Gn 4.24; Dt 28). Jacó curva-se sete vezes diante de Esaú, prestando-lhe reverência quase como a uma divindade (Gn 33.3). 3. A importância subjacente do número sete como estrutura fundamental de tempo no mundo criado está declarada em Gênesis 1.1—2.3. As tradições sacerdotais desenvolvem esse fato a um grau extraordinário, a ponto de tornar-se um tema unificador entre a criação, a histó ria e o culto. A santificação do sétimo dia e a conclusão da criação refletem a santificação do tabemáculo que, de acordo com alguns, foi realizada em sete etapas (P. J. Keamey, “Creation and Liturgy: The P Redaction of Exodus 25-40”, ZAW 89, 1977, 375-87). É provável que as sete hastes do candelabro (Êx 25.31-37) também retratem a árvore da vida (C. L. Meyers, The Tabemacle Menorah, 1976). A criação e bênção de Deus manifestam-se no culto de Israel. Os sacerdotes são consagrados num ritual de ordenação que dura sete dias (Êx 29.35-37), que atinge seu auge teofãnico no sétimo dia (Lv 8— 9). Há sete festas (contadas de maneira di versa em Lv 23; Nm 28—29), sendo que as duas mais importantes duram sete dias (dos Pães Asmos e dos Tabernáculos, que também ocorrem no sétimo mês). A purificação das principais imundícias leva sete dias (Lv 12.2; 15.13; Nm 19.11; cf. 2Rs 5.10), bem como os rituais que realizam a transição de uma condição para outra (Lv 14.1-20). Esses rituais muitas vezes in cluem aspergir sete vezes sangue (Lv 4.6; Nm 19.4) ou óleo (Lv 8.11). O número de sacrifícios oferecidos, muitas vezes, é sete (Nm 28— 29), e no dia culminante da Festa dos Tabernáculos, são sacrificados sete novilhos, dois carneiros e quatorze cordeiros (Nm 29.32; cf. os 70 bois oferecidos em CTA 6 i 18, CML2 74). 35
(# 8679)
4 .0 padrão de seis mais um do sábado ( ) reflete-se nos sacrifícios oferecidos ne dia, que eram um acréscimo às ofertas diárias (Nm 28.9-10). Uma equivalência de dia e ano dá origem ao costume do ano sabático, a ser observado no sétimo ano (Dt 15.1), e do ano do jubileu, a ser celebrado depois de “sete semanas de anos... quarenta e nove anos” (Lv 25.8). Salomão levou sete anos para construir o templo (1 Rs 6.38), o qual foi consagrado no sétimo mês (1 Rs 8.2). Ezequiel fala de sete degraus para o átrio do templo (Ez 40.22), o que talvez seja resquício dos zigurates de sete degraus da Babilônia, que tinham por finalidade servir de ligação entre o céu e a terra. 5. E comum encontrar os números três e sete associados em termos estruturais e proces suais. Ao que parece, a família ideal era composta de sete filhos e três filhas (Jó 1.2). O ritual para imundícias mais graves tinha um estádio intermediário no terceiro dia, e a purificação absoluta só ocorria no sétimo dia (Nm 19.12; 31.19). Elias é associado ao número três (IRs 17.21; 18.1), enquanto Eliseu pode ser associado ao número sete (2Rs 4.35; 8.1). O relato dos sete dias da criação apresenta uma repetição tripla do sétimo dia e sua obra. . O número sete fica implícito em genealogias (p. ex., sete filhos, Gn 10.2-5), listas (ls 11.2) e na estrutura de várias passagens, especialmente na litaratura deut. (IRs 8.19-53). O livro de Amós emprega o número sete em várias construções (J. Limburg). Não é fácil decidir de que maneira se deve avaliar a detecção de números sete menos evidentes, como a presença de sete pala%'ras numa frase (Gn 1.1; catorze no v. 2) ou numa passagem. E possível que haja um motivo estético ou que a palavra repetida seja um termo-chave relevante para a história ou tema em questão. Porém, em outros casos é possível que se trate de uma coincidência, sem nenhuma importância evidente para o significado teológico e literário do texto. A argumentação em favor da “harmonia numérica” (U. Cassuto, From Adam to Noah, 1961, 12) ganha força com a ocorrência do número em outras formas. Assim, a detecção de vários tipos de sete em Gênesis 1 é confirmada pela importância evidente do sete em textos sacerdotais relacionados. A criação e estruturação do mundo reflete-se, desse modo, na teologia ritual de Israel, e a harmonia numérica afirma que o Deus que Israel adora é Criador, Salvador e Sustentador (Gorman). Os números setes mencionados também não se encontram tão pro fundamente escondidos de modo a não poderem ser percebidos por um leitor mais sensível. Por outro lado, seria muito mais difícil um leitor encontrar relevância no número de letras ou sílabas de um texto mais longo. 7. O subs. sãbúa' descreve um período de sete dias ou uma semana, um prazo comum para acertos de contas ou duração de uma comemoração como, por exemplo, um casamento (Gn 29.27-28). A terceira festa mais importante do ano é hag hassãbu ‘ôt, a Festa das Semanas, assim chamada pois é determinada pela contagem de sete semanas de colheita (Nm 28.26; Dt 16.10,16). Daniel 9.24 (cf. 4Q 180,181) decreta setenta vezes sete (anos), numa possível com binação da profecia de Jeremias de 70 anos de exílio (Jr 25.11) com o castigo sétuplo de Leví tico 26.18, 28. O insucesso de esquemas cronológicos que procuram integrar o número literal à história de Israel é uma forte indicação de que se trata de um número simbólico, semelhante àqueles encontrados em outros escritos apocalípticos mais recentes (em lEn. 10.11 -12, o jul gamento ocorre depois de setenta gerações). Trata-se de uma referência histórica a uma crise ocorrida no século II e que girou em torno da perseguição promovida por Antíoco Epifãnio, porém a natureza alusiva e simbólica dos escritos permitiu que estes fossem aplicados também a acontecimentos posteriores, especialmente à queda de Jerusalém em 70 d. C. (Mt 24.15; Josefo, Ant x 276; ver J. E. Goldingay, Daniel, 1989, 267-68). (Ver ainda # 8651.) . O número setenta é um valor alto arredondado, que deixa implícito inteireza e perfeição a partir da combinação das totalidades menores de sete e dez. Os setenta anciãos
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8
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jn t f (# 8679)
constituem uma representação completa de toda a nação de Israel (Êx 24.9; Nm 11.24; Ez 8.11). A expectativa de vida é de setenta anos (SI 90.10; 140 anos é uma bênção dupla em Jó 42.16) e setenta anos de exílio representam o castigo de uma geração inteira (Is 23.15; Jr 25.11; Dn 9.2). As famílias e dinastias de um grande homem ou rei podem ter setenta mem bros (Gn 46.27; Jz 8.30; 12.14) e para encerrar uma dinastia era preciso matar todos eles (2Rs 10.1-7). P-B O simbolismo do número sete e de outros números é amplamente desenvolvido em Filo (p. ex., Op. Mund.). As Palavras das Luzes Celestias de Qumram (4Q504) têm sete seções e o número sete é predominante nos Cânticos do Sacrifício do Sábado (4Q400-407). O exército da guerra escatológica tem uma perfeição séptupla (sete sacerdotes, levitas, tropas de cavaleiros; 700 cavaleiros) e realiza ataques sétuplos (1QM 6-8). Para os intérpretes judeus, o mundo é constituído de setenta nações (Gn 10), correspondendo ao número de membros da família de Jacó (Gn 46.27; Trgs. de Dt 32.8). NT No NT, o sete pode ser um número pequeno arredondado (Mt 15.34) ou um número relativament grande (18.21; contrastar com 77 no v. 22). O número sete domina a estrutura e o simbolismo do livro de Apocalipse, sugerindo totalidade, plenitude, perfeição divina e inteireza. Números: -> ’e/iãí/(um,#285); elep II (mil,contingente militar,# 547); -> arba' (quatro, # 752); hãmês (cinco, # 2822); m ê ’â I (cem, # 4395); 'eser (dez, # 6924); r^bãbá (dez mil, miríade, # 8047 / 8052); -> seba' I (sete, # 8679); -> sãlõs, selõsâ (três, um grupo de três, # 8993); íPmõneh (oito, # 9046); senayim (dois, # 9109); -> sês I (seis, # 9252); -> têSa' (nove, # 9596) Numeração, contagem: kss (calcular, repartir, # 4082); mnh (contar, # 4948); -> spr I (contar, numerar, calcular, repetir, # 6218); -> p q d (numerar, determinar, #7212) B ib l io g r a f ia
NIDNTT2:690-92; 7Z)AT2:627-35; 7^/1 T 7:1000-1027; TWOT 2:933-34; Jastrow 2:1515; C. F. Bumey, “For and Sevenas DivineTitles,’V 7S 12, 1911,118-120; E. Burrows, “TheNumber Seventy in Semitic”, O rN S 5, 1936, 389-92; F. C. Fensham, “The Numeral Seventy in the Old Testament and the Family of Jerubbaal, Ahab Panammuwa and Athirat,” PEQ 109, 1977, 11315; R. Gordis, “Heptad as an Element of Biblical and Rabbinical Sty\e," JBL 62, 1943, 17; F. H. Gorman, The Ideology o f Ritual: Space, Time and Status in the Priestly Theology, JSOTSup 91, 1990; J. Hehn, Sibenzahl undSabbat bei den Babylonien undim Alten Testament: EineReligionsgeschichtliche Studie, 1907; P. P. Jenson, Graded Holiness: A Key to Priestly Conception ofthe World, JSOTSup 106,1992; A. S. Kapelrud, “The Number Seven in Ugaritic Texts,” VT 18, 1968,494-99; E. C. Kingsbury, “A Seven Day Ritual in the Old Babylonian Cult at Larsa,” HUCA 34,1963,1-28; J. Limburg, “Sevenfold Structures in the Book o f Amos”, JBL 106,1987, 217-22; D. H. Lorie, “ New Interpretation o f Daniel’s ‘Sevens’ and the Chronology of the Se venty ‘Sevens’, JETS 33, 1990, 303-9. S. E. Loewenstamm, “The Seven Day-Unit in Ugaritic Epic Literature,” IEJ 15, 1965, 121-33; C. L. Meyers, The Tabernacle Menorah: A Syntehetic Study o f a Symbol from the Biblical Cult, ASORDS 2, 1976; S. B. Noegel, “The Significance of the Seventh Plague”, Bib 76, 1995, 532-39; M. Pope, “Seven, Seventh, Seventy”, IDB 4, 1962, 294-95; D. Varley, Seven: The Number o f Creation, 1976. P. P. Jenson 37
r a tf (# 8687)
'Ptt? (sb$), pi. pu. tecer, engastar (# 8687); (misbe$ôt), colocação (de filigrana) (-> # 5401); p ç 7?
8687 (tasbêí), subs. entretecido (# 9587).
OMA Acad. sabsinnütu, tecelagem; sir. sebas, misturado; ár. tasabbasa, emaranhado/entretecido.
AT 1 .0 único pi. ocorre em Êxodo 28.39 e é traduzido como “tecer”, sendo a túnica do sumo sacerdote o objeto do vb. O único pu. ocorre em 28.20 e é traduzido como “guarnecernos engastes”, sendo as jóias para o peitoral do sumo sacerdote o objeto do verbo. 2. A única ocorrência do subs. taibêí encontra-se no mesmo capítulo, em que descre a túnica tecida de Arão (Êx 28.4). O termo também é traduzido como “franjado” ou “bordado”, mas é bem provável que esses adomos fossem entremeados no tecido. Somente o pu. no v. 20 não se acomoda perfeitamente a esse significado. Ver também # 9587. Fiação, costura, tecelagem, bordado: -> ’rg (fiar, tecer, # 755); dallâ (cabelo, fio sol to, tear, # 1929); -> hôsêb (tecelão, # 3110); -> twh (fiar, # 3211); kisôr (fuso [de fiar], # 3969); mãnôr (haste, # 4962); skk II (tecer, entrelaçar, #6115); 'êreb I (tecido tricotado, # 6849); pelek I (fuso, # 7134); rqm (bordar [bordador], entretecer, # 8387); ser ã d (tecido [adj.], # 8573); -> sbç I (tecer, # 8687); í^ /í I (urdidura, # 9274); tpr (coser, # 9529) Robert Alden
13© (íft/-1), quebrar, fraturar, demolir, romper, despe daçar, estilhaçar, dar à luz (# 8689); la u to (masbêr), abrir (a madre) ( -> # 5402); (misbãr), arrebentação, onda (# 5403); (sãbür), ferido (# 8653); “QtP (seber I), destruição, ruína (# 8691); p ia iy (sibbãrôn), queda, colapso (# 8695). 8689
na®
OMA O vb. encontra-se presente em várias línguas sem., entre elas o ugar. [br (UT # 2642), o acad. sebêru\ o aram. sbr (K A I222 A 38) e o fen. (K A I26 A I 8).
AT 1 .0 vb. ocorre 147x: 53x no q., 56x no ni., 36x no pi., Ix no hi. (Is 66.9, “Acaso, fa rei eu abrir [ ’asbir] a madre e não farei nascer? — diz o Senhor”) e 1x no ho. (Jr 8.21, “Estou quebrantado [ ‘al seber] pela ferida [hosbãrtí] da filha do meu povo”). No grau q., Deus costuma ser o sujeito do vb. (33x) e a referência normalmente é a uma atividade de julgamento e castigo, especialmente contra aqueles que perseguem Israel. Os objetos da ação destruidora de Javé são o jugo do rei da Babilônia (Jr 28.2), o arco de Elão (Jr 49.35), o jugo de Nabucodonosor (Jr 28.11), os assírios (Is 14.25), o braço de Faraó (Ez 30.21) e a porta de Damasco (Am 1.5). Porém, a destruição divina também recai sobre seu povo da aliança como em Oséias 1.5: “quebrarei o arco de Israel”. Ou ainda, compara com a experiência de Jeremias que é instruído a quebrar/despedaçar um vaso de barro (Jr 19.10) como um retrato simbólico daquilo que está prestes a acontecer com Judá. 2. A expressão “sustento do pão” ou outra semelhante ocorre cinco vezes (Lv 26.26; 105.16; Ez4.16; 5.16; 14.13). Essa oração parece indicar que uma das manifestações da justiça equitativa de Deus é privar o povo de alguns dos elementos básicos de sua dieta. 38
-o tf (# 8689)
3. No pi., Sbr é usado em várias ocasiões com referência à destruição de ídolos. Ver Isaías 21.9 (Deus); 2 Reis 18.4 (Ezequias); 2 Reis 23.14; 2 Crônicas 14.3 [2] (Asa); 34.4 (Josias); Jeremias 43.13 (Nabucodonosor); 2 Reis 11.18 (o povo da terra). 4. Apesar de não ser usado para o ato em si de quebrar ídolos, esse vb. é empregado 4x para dizer que Moisés quebrou as tábuas da lei depois do pecado de idolatria com o bezer ro de ouro no Sinai (Ex 32.19; 34.1; Dt 9.17; 10.2). Deuteronômio 9.17 descreve que Moisés quebrou as tábuas “ante os vossos olhos”, indicando que a ação de Moisés foi refletida e não espontânea. No OMA, a oração “quebrar uma tábua” (cf. acad. a oração tuppam hepü) denota o cancelamento da validade de um documento. 5. A declaração feita em duas ocasiões (Ex 12.46; Nm 9.12) sobre não quebrar um osso sequer do sacrifício de Páscoa está de acordo com outros requisitos para esse sacrifício; ou seja, que ele não seja esquartejado, que seja assado inteiro sobre o fogo. Essa preocupação com a integridade estrutural será repetida posteriormente no Evangelho de João, o qual afirma que as pernas de Jesus — morto na véspera da Páscoa — não foram quebradas (Jo 19.30). Para outros versículos referentes à fratura de ossos, ver Lamentações 3.4 (atividade castigadora divina con tra a Israel desviada) e Provérbios 25.15, em que a persuação branda é uma arma devastadora o suficiente para esmagar os ossos (coluna) da resistência de uma pessoa. Ver também Ecle siástico 28.17-18, “Ela [a língua] destruiu as cidades fortes dos ricos, e arrasou as casas dos poderosos. Desbaratou os exércitos dos povos, e dispersou nações valentes”, ou mesmo a rima infantil conhecida, porém muitas vezes incorreta: “Paus e pedras podem meus ossos quebrar, mas nunca palavras me hão de abalar”. . O termo Sbr é usado em várias ocasiões associado ao coração. O coração de uma pessoa pode ser ferido pela injúria (SI 69.20 [21]), por falsos mestres/ensinamentos (Jr 23.9) ou pelo pecado (SI 51.17 [ 19]). Até mesmo o coração de Deus pode ser quebrantado (Ez 6.9). Porém, Deus também está perto “dos que têm o coração quebrantado” (SI 34.19-18), cura-os (SI 147.4) e os restaura (Is 61.1). O servo de Javé não esmagará a cana quebrada (42.3). 7. O termo Sbr é usado de algumas formas interessantes em Jeremias. A primeira de las é a referência à acusação de Jeremias de que o povo abandonou Javé, o manancial de água viva, preferindo cavar suas próprias “cisternas rotas” (bõ 'rõt niSbãrim, Jr 2.13). Que decepção! Deram as costas para uma fonte garantida de água (Javé, o manancial) e depositaram suas es peranças nas cisternas que eles próprios escavaram, cisternas sem revestimento, que não retêm água. Além disso, quebraram (Sãbarti, ainda que provavelmente tenha de ser lido como um fem. sing. arcaico) o jugo e se recusaram a servir Javé. Ver 2.20 e, também, 5.5. Deixaram de prestar serviço a Javé na aliança e passaram a fiar-se na própria corrupção. Não são capazes de entregar-se inteiramente àquele que promete que, um dia, quebrará o jugo da Babilônia (28.2, 4, 11; 30.8). Não é de se admirar que, ao refletir sobre a situação lamentável de seu povo, Jere mias disesse: “estou quebrantado” (hoSbãrti, 8.21). (Sobre a idéia de que é Jeremias — e não Deus — quem fala em 8.21, ver W. L. Holand, Jeremiah, Hermeneia, 1:289.) Na verdade, Sbr é usado mais vezes em Jeremias (28x) do que em qualquer outro livro do AT. Em ordem decrescente, os livros que mais empregam o termo são: Salmos (2 lx), Eze quiel (21 x) e Isaías (14x). . Das quarenta e quatro ocorrências de Seber, destruição ou ruína, vinte e oito referemse ao colapso ou devastação do reino do Norte ou do Sul. Sibbãrôn, quebra ou colapso, é um disleg., e aparece em Jeremias 17.18 e em Ezequiel 21.6 [11] (ARA e AV, p. ex., usam o vb. destruir). Sãbúré um hapleg. em Levítico 22.22: “mutilado”. E possível que misbãr, arreben tação, onda, possa ser usado de modo um tanto literal (Jn 2.3 [4]) ou metafórico (2Sm 22.5; SI 42.7 [8]; 88.7 [8]) para referir-se a ser sobrepujado e consumido por ondas enormes. No
6
8
39
- a tf (# 8690)
entanto, a majestade de Javé é maior até mesmo do que as arrebentações do mar (“bramido das grandes águas”, SI 93.4). R achadura, fenda, fatia: -> bq' (rachar, abrir, # 1324); -> hrtrt II (rachar, # 3050); -> htr (abrir caminho, # 3168); mispãh (violação da lei, # 5384); -> p//; (cortar em fatias, fender, # 7114); psm (fender, # 7204); I (abrir caminho, irromper, ser quebrado, # 7287); -> r “ II (despedaçar, # 8318); -> r.»- (triturar, esmagar, quebrar, # 8368); -> sòr I (quebrar, des truir, despedaçar, estilhaçar (# 8689) B ib l io g r a f ia
TWAT1:1027-40; 7H/07'2:901-2; M. J. Dahood, Psalms, AB, 1970,3:56; J. Hartley, Leviticus, WBC, 1992,466; B. Levine, Leviticus, JPS Torah Commentary, 1989, 187. Victor P. Hamilton
8690
nau?
(sbr II), vb. comprar, esp. cereais (cf. sbr Seber) (# 8690); "niP (seber II), subs. cereal (# 8692).
AT 1. A grande quantidade de palavras para cereal reflete o fato de que este era um alimen to básico na antiga Israel, uma sociedade agrária que dava grande importância às épocas de plantação e colheita durante o ano. No entanto, a estação das chuvas se estendiaa de outubro a abril e era comum haver secas, o que levou os israelitas a perceberem desde o começo que as colheitas dependiam de Javé (Dt 11.13-17). . O vb. é usado como símbolo de restauração; os exilados são convidados a comprar vinho e leite, mas não terão de pagar por esses produtos (Is 55.11). Aquele que está disposto a vender o trigo quando necessário para o bem da comunidade (cf. W. McKane, Proverbs, 1970, 434) é considerado abençoado (Pv 11.26 — berãkâ). 3. Em tempos de fome, os cereais eram comprados do Egito, como foi o caso na his tória de José (Gn 41.1-2; 43.2). No caminho para a terra prometida, o povo de Israel teve de comprar comida, mas houve quem se recusasse a vender (Dt 2.6,28). Os cananeus (= comer ciantes) vendem cereais, mas são desonestos, como se vê em Amós 8.5a, e vendiam até mesmo o refugo (Am 8.6; cf. Os 12.8 [7]);. 4. A palavra seber II, cereal, ocorre 9x no AT, como termo geral para cereais, e possui uma abrangência semântica semelhante à de dãgãn. Sua etimologia é incerta, mas estudiosos sugerem que o termo derive do verbo sbr, quebrar (G. HofFmann, “Verusche zu Amos,” ZAW 3, 1883, 122), ou de uma forma denominativa do vb. sbr, comprar ou vender cereais (S. M. Paulo, Amos, 1991,258). J. Klein afirma que a oração seber ra ‘abôn, em Gênesis 42.19, a qual ele traduz como “uma (ração) de cereal para a fome de alguém”, é um equivalente semântico da oração acad. sê nebrítim, que tem significado semelhante (1:237-44). O termo Seber II ocorre 7x na narrativa sobre José em Gênesis, referindo-se ao cereal que os irmãos de José desejavam comprar no Egito por causa da grande fome em Israel (Gn 42.1,2,19,26; 43.2; 44.2; 47.14). Seu significado geral como um termo usado para referir-se a cereais é sugerido por Neemias 10.31 [32], quando o povo afirma que não comprará seber, cereal, no sábado e em Gênesis 42, que descreve a comida consumida no tempo da fome, oca sião em que as pessoas são menos seletivas quanto ao alimento.
2
P-B A tradução mais comum de Seber na LXX é sitos, cereal, mas também são usados ter mos mais gerais: synkrisis, agregação e suntrimma, coleção. 40
nau? (# 8694)
Negócio, comércio, com pra, venda: k?na ‘an (comerciante, # 4047); krh (obter por meio de comércio, # 4126); -> I (preço, pagamento, # 4697); -> mkr I (comerciar, vender, # 4835); -> s/ir (viajar, comerciar, # 6086); -> çw/i (adquirir, comprar, # 7864); -> rW (comerciar, # 8217); -> íô r II (comprar, # 8690) Grão, cevada, painço, arroz, etc.: 'õbib (espigas de cereal, # 26); bisqãlôn (talos fres cos [cj.], # 1303); -> bar III (grão, milho, # 1339); gãdis (meda de cereal, feixe de trigo, # 1538); geres (grão trilhado, esmagado, # 1762); dãgãn (grão, # 1841); -> dõhan (sorgo, painço [ou milhete], # 1893); -> hittâ (trigo, # 2636); -> kussemet (espelta [trigo vermelho], # 4081); karmel IV (espigas verdes, tenras, # 4152); -> melilâ (cereal, grãos, # 4884); -> minnit (arroz, # 4976); m ãj (moinha, pragana, palha, #5161); sõ/e/ (farinha de trino, # 6159); pannãg (grão tostado?, farinha, # 7154); -> (grão, feixe de cereais, # 7395); -> çãnum (duro, [espigas de cereal] improdutivas, # 7568); qãlí (grão tostado, # 7833); ->
se ‘õrâ (cevada, # 8555); sibbõlet I (espiga de cereal, # 8672); Seber II (grão, # 8692) B ib l io g r a f ia
G. Dalman, /ímS, 3:161; J. Klein, “]135mau7 [Gn 42.19] in the Light o f an Old Babylonian Parallel,” The Proceedings o f the Sixth World Cortgress o f Jewish Studies, 1977, 1:237-44; S. M. Paul, Amos, 1991; M. Zohary , Plants o f the Bible, 1982 Paul D. Wegner / Izak Cornelius 8691 (seber I, destruição, ruína),
# 8689
8692 (seber II, cereal), -> # 8690)
8694
l a tf
"iatt> (Sêber), subs. interpretação; usado somente em Juizes 7.15, referindo-se à interpretação de um sonho
(# 8694). Para uma discussão sobre interpretação, ver ptr, interpretar (# 7354); para sonho, ver hlm, sonho, sonho revelador (# 2731). Sonho, revelação, visão: tomar-se visível, # 2731); perceber, # 8011)
hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); hlm (ver, espreitar, ptr (interpretar [sonho], # 7354); -> r ‘h (ver, ter visões, escolher, Philip E. Satterthwaite
8695 (sibbãrôn, queda, colapso), -> # 8689 8697 (Sbt, parar, parar de trabalhar, remover, descansar),
8699
nau?
Sábado
ro?? (sebet), subs. alguém sentado tranqüilamente, des canso (# 8699, # 8700).
AT A derivação de todas as ocorrências desse subst. nem sempre é clara. Em alguns casos, pode originar-se áeysb, sentar-se, daí o signifcado de “sentado tranqüilamente”. Outros casos 41
« t f (# 8704)
parecem estar relacionados a íbt, parar, cessar, daí “descanso, cessação”. Alguns exemplos do primeiro caso são: “serão totalmente queimados no seu lugar" (2Sm 23.7); “ Vivem no meio da falsidade” (Jr 9.6 [5]) e “fazeis chegar o trono [reino] da violência” (Am 6.3; ver também Is 30.7, “Gabarola que faz nada” [aquele que fica sentado]). Ao que parece, é necessário usar a outra derivação em Êxodo 21.19, “lhe pagará o tempo que perdeu" e em Provérbios 20.3: “Honroso é para o homem o desviar-se de contendas”. É concebível que Rute 2.7, “menos um pouco que esteve na choça”, possa ser compreendido com ambos os sentidos. Em todos os ca sos, tem-se uma impressão de inatividade. Descanso, quietude, repouso: -> dmh II (chegar ao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); nwh I (descansar, # 5657); -> nwh I (sossegar, descansar, esperar, estacionar, depositar, # 5663), -> rg‘ (formar uma crosta sobre, endurecer, parar, ficar quieto, # 8088/89); $ 'n (ficar em paz, imperturbado, # 8631); -> sbh II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); -> sebet (des canso, assento, # 8699, 8700); stq (acalmar-se, # 9284) John N. Oswalt 8701 (sabbãt, sábado),
sábado
8702 (sabbãtôn, dia de descanso; festa do sábado), -> sábado
8704
(igg), q. cometer um erro, pecar inadvertidamente (# 8704); subs. fUJ# (segãgâ), erro, descuido (# 8705).
AT 1. Duas das quatro ocorrências do vb. encontram-se na legislação do Pent. que trata da expiação sacerdotal pelo pecado involuntário (Lv 5.18; Nm 15.28). Esse pecado inconsciente não é decorrente da ignorância da lei mosaica. É mais a percepção ou conhecimento de uma transgressão da aliança como resultado da ação da consciência humana. O transgressor é “res ponsabilizado” no sentido de que se sente culpado por seu pecado e sofre em função dele (cf. G. J. Wenham, The Book ofLeviticus, NICOT, 107-8). O sacrifício de um carneiro como oferta pela culpa serve de expiação pela transgressão. 2. O vb. significa “errar” em Jó 12.16 e “andar errado” em SI 119.67. Nesses caso palavra tem como conotação a tendência humana de falhar moralmente, e sua propensão a de sobedecer os mandamentos de Deus. 3 .0 subs. (segãgâ) ocorre 19x e transmite dois significados básicos. Em primeiro lug pode significar um erro inadvertido ou um equivoco resultante de uma experiência quotidiana (p. ex., um deslize ao falar, Ec 5.6 [5]; um erro de um governante, Ec 10.5 [6] ou mesmo ho micídio culposo [acidental], Nm 35.11,15; Js 20.3,9). Em segundo lugar, quando em conjunto com o vb. h( ’, pecar ( # 2627), a palavra exerce a função de um termo legal e litúrgico nas descrições sacerdotais do sacrifício de culpa que expiava pelo pecado involuntário (Lv 4.2, 22, 27; 5.15, 18; Nm 15.24-29). Esses pecados não intencionais contrastam com os pecados cometidos em rebeldia à lei de Deus (Nm 15.30), pelos quais não há sacrifício de expiação. Em termos teológicos, o conceito de pecado involuntário apóia a distinção entre os as pectos objetivos e subjetivos do pecado humano. O primeiro compreende todo pecado em ter mos judiciais ou legais como uma transgressão da lei, quer tenha sido cometido intencional ou inadvertidamente. O segundo refere-se ao pecado sob a perspectiva ética, enfatizando o papel 42
mu; (# 8706)
da volição humana e da responsabilidade pessoal. De acordo com J. Milgrom, o termo segãgâ conota “consciência do ato”, quer esse pecado inadvertido tenha sido cometido como resultado de negligência ou ignorância (JQR 58,1967-68,118). Além disso, ele observou duas categorias de pecado acidental, sendo que segãgá identifica os atos dos quais o agente tem consciência, porém só mais tarde toma ciência do caráter pecaminoso deles, enquanto nistãrôt refere-se a atos pecaminosos dos quais o agente não tem consciência (cf. Sl, 19.12-13 [13-14]). O livro de Jó afirma tal responsabilidade humana diante de Deus pelo descuido consciente (ou seja, por segãgâ), mas indica que os justos não são culpáveis de pecados inconscientes (ou seja, nistãrôt; str, ocultar, # 6259). Na verdade, Jó aprendeu (ao contrário do conselho de seus amigos) que o castigo de Deus não é necessariamente uma conseqüência imediata do pecado, quer seja este acidental ou não. Para Milgrom, portanto, o uso ritual de segãgâ, em Levítico 4, adquire uma dimensão moral nos Salmos e uma dimensão teológica no livro de Jó. Ainda que as regras cultuais fizessem uma distinção entre os pecados intencionais e os inadvertidos (ver Nm 15.22-36), o aspecto objetivo da relação de aliança requeria a reconcilia ção entre o transgressor e Deus, quer o transgressor fosse um sacerdote ungido (Lv 4.3), toda a comunidade israelita (v. 13), um líder (v. 22) ou um membro da comunidade (v.27). Enquanto houvesse “culpa” ( ’ãsãm; -> # 8 7 1 ) resultante de pecados inadvertidos, a relação entre Deus e os homens não estaria absolutamente em ordem. Era necessário restabelecer a harmonia por meio do sacrifício de um animal como oferta pelo pecado (Lv 4) — sendo que o tipo de animal dependia da condição do transgressor individual — e pela declaração de perdão (Nm 15.25). Do contrário, restava apenas o julgamento. 4. A forma besaggam (Gn 6.3) é controversa (C. Westermann, Genesis 1-11, ConCom 1984,375-76). De acordo com V. Hamilton, “Sem dúvida os filhos de Deus não agem nem por negligência, nem por ignorância” (Genesis, 1-17, N1COT, 1990, 268). Erro, equívoco, mal: sgg (cometer um erro, pecar inadvertidamente, # 8704); -> sgh (perderse, desencaminhar-se, desviar-se, errar, enganar, # 8706); toh°lâ (erro, # 9334); -> ta'tu'im (enganos, escárnio, # 9511) Pecado, culpa, rebelião, transgressão, erro: -> 'ãwen (prejuízo, iniqüidade, desilusão, # 224); h t' (pecar, cometer um pecado, purificar, # 2627); -> ‘wh (prejudicar, perverter, # 6390); ‘wl I (agir incorretamente, # 6401); -> p S ‘ (rebelar-se, infringir, transgredir, # 7321); Queda: Teologia B ib l io g r a f ia
77/^72:869-72; D. J. A. Clines, “The Tree o f Knowledge and the Law ofYahweh (Psalm XIX),” VT 24, 1974, 8-14; R. P. Gordon, “Better Promises: Two Passagens in Hebrews Against the Background o f the Old Testament Cultus,” FS Bammel, 1991,434-49; K. Kinghom, “Biblical Concepts of Sin,” Wesley ThJ 1, 1966,21-26; J. Milgrom, “The Cultic segãgâ and Its Influence in Psalms and Job,” JQR N. S. 58, 1967-68, 115-25; P. Saydon, “Sin-Offering and Trespass Offering,” CBQ, 8, 1946, 393-98. Andrew E. Hill 8705 (sPgãgâ, erro, descuido),
8706
# 8704
rnu? (Sgh), q. desviar-se, perder-se, errar, cambalear, ser incapaz de andar em linha reta, equivocar-se, fazer o 43
ru tf (# 8706)
mal; hi. deixar desviar-se, desencaminhar, corromper (# 8706); subs. natpi? (misgeh), erro, des cuido, (hapleg., Gn 43.12; # 5405); níj’!® (seg i'á ), lapso, erro (hapleg., SI 19.12 [13]; # 8709); fra® (siggãyôn), um cabeçalho obscuro no Salmo 7.1; Habacuque 3.1 (# 8710).
AT 1 .0 principal significado do vb. é desviar-se ou vagar. É usado para descrever a perambulação das ovelhas sem pastor (Ez 34.6) e, causativamente, fazer um cego errar o cami nho (Dt 27.18). O ato de desviar-se não demorou a se desenvolver numa expressão não literal que designasse o desviar-se do Senhor: “Se deixas de ouvir a instrução, desviar-te-ás (sgh) das palavras do conhecimento” (Pv 19.27). O termo também é usado para o ato de desencaminhar alguém moralmente: “O que desvia os retos para o mau caminho, ele mesmo cairá na cova que fez, mas os íntegros herdarão o bem” (Pv 28.10); e para o homem que “anda como cego”, afastando-se de sua esposa para buscar o amor de uma adúltera (Pv 5.19-20, 23). . O vb. pode significar cambalear ou ser incapaz de andar em linha reta devido à em briaguez (Pv 20.1; Is 28.7). Isaías, por exemplo, acusa os líderes de desencaminhar o povo moralmente, “Mas também estes cambaleiam (sgh) por causa do vinho e não podem ter-se em pé por causa da bebida forte; o sacerdote e o profeta cambaleiam (Sgh) por causa da bebida forte, são vencidos pelo vinho, não podem ter-se em pé por causa da bebida forte; erram na visão, tropeçam no juízo” (Is 28.7). J. Oswalt comenta: “A linguagem repetitiva (cambaleiam — vinho; não podem ter-se em pé — bebida forte; cambaleiam — bebida forte; erram — tro peçam) parece imitar o cambaleio e o riso do bêbado” (Isaiah 1-39, 510). O vinho e a bebida forte distorciam as visões proféticas e pervertiam a justiça. 3. O radical também indica a realização involuntária de atos ofensivos (SI 119.21, 118) ou o pecado involuntário, cometido por um indivíduo (1 Sm 26.21) ou pela comunidade de Is rael (Lv 4.13). Ezequiel, o profeta do tempo do exílio, afirmou que a expiação é essencial para o perdão: “Assim também farás no sétimo dia do mês, por causa dos que pecam por ignorância e por causa dos símplices; assim, expiareis o templo” (Ez 45.20). 4. Não se sabe ao certo o significado de siggãyôn. Se a forma encontra-se relacionada ao radical sgh, o título pode indicar um determinado tipo de salmo com um ritmo esporádi co ou uma cadência frenética. Outros sugerem um tipo específico de lamento, caracterizado por pensamentos e linguagem “divagantes” (baseados no radical acad. segú\ cf. P. C. Craigie, Psalms 1-50, WBC, 1983, 97).
2
Erro, equívoco, mal: -¥ igg (cometer um erro, pecar inadvertidamente, # 8704); sgh (perderse, desencaminhar-se, desviar-se, errar, enganar, # 8706); toholâ (erro, # 9334); to ‘tu ‘im (enganos, escárnio, # 9511) Mal, erro, equívoco, transgressão, perversidade: -> 'wl I (agir incorretamente, # 6401); -> sgg (cometer um erro, pecar inadvertidamente, # 8704); sgh (perder-se, desencaminhar-se, desviar-se, errar, enganar, # 8706) B ib l io g r a f ia
D. J. A. Clines, “The Tree of Knowledge and the Law ofYahweh (Psalm XIX),” PT 24, 1974, 8-14; R. P. Gordon, “Better Promises: Two Passagens in Hebrews Against the Background of the Old Testament Cultus,” FS Bammel, 1991, 434-49; K. Kinghom, “Biblical Concepts of Sin,” Wesley ThJ 1, 1966, 21-26; J. Milgrom, “The Cultic segãgá and Its Influence in Psalms and Job,” JQR N. S. 58, 1967-68, 115-25; P. Saydon, “Sin-Offering and Trespass Offering,” CBQ, 8, 1946, 393-98. Andrew E. Hill 44
ma?' (# 8708)
8708
rotf
rUlP (sgh), hi, observar, fitar (# 8708).
AT 1 .0 verbo é usado para enfatizar a abrangência total divina. Do céu, o Senhor olha para a terra e observa todo ser vivo (SI 33.14). 2. O vb. denota o ato de observar. No Cântico dos cânticos 2.9, o amante, que tentou convidar a moça a desfrutar a beleza da natureza com ele, olhou pela janela, pois seria inso lência entrar na casa do pai dela. 3 .0 vb. refere-se a um olhar fixo, com os olhos arregalados, ao ato de fitar. Os transeu tes fitariam o tirano deposto diante do qual, outrora a terra havia tremido e os reinos haviam estremecido, que havia devastado a terra e suas cidades e cujos prisioneiros haviam definhado em suas masmorras até o fim da vida e cujo corpo profanado encontrava-se junto com o corpo da plebe na cova onde era jogado o lixo (ls 14.16). E inútil tentar identificar o tirano deposto com qualquer rei ou país conhecido (cf. Kaiser, 29-31). A idéia geral é de uma potência mundial hostil personificada nesse retrato imaginativo do rei apocalíptico o que, por sua vez, cumpre-se de modo intermediário no fim da dinastia imperial da Babilônia (Motyer, 142). Olhar, observação, percepção, vista, visão, vigilância: -> hdh II (olhar fixamente para, apa recer, # 2526); -> hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); -> hmh I (ver, espreitar, tomar-se visível, # 2778); -> nbf (olhar em volta, aceitar como favor, # 5564); -> pis II (observar, # 7143); íw í II (olhar para, # 7438); -> r'h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); -> r$d (vigiar, # 8353); -> sqd (notar, # 8567); S ’h III (olhar atentamente, # 8617); sgh (olhar fixamente, fitar, # 8708); -> Swr I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, # 8800); Szp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); s ‘h (olhar, preocupar-se com, olhar em volta, # 9120); sqp (olhar para baixo, # 9207); s t ' (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283) B ib l io g r a f ia
O. Kaiser, Isaiah 13-39, 1974; J. A. Motyer, The Prophecy o f Isaiah, 1993. Jackie A. Naudé 8709 (seg i a, lapso, erro),
# 8706
8710 (íiggãyôn, cabeçalho), -> # 8706
'iVD (sgl), q. dormir, ter relação sexual com, ni. ser vio lada, pu. ser violada (# 8711); (sêgal), subs. rainha, concubina? predileta do harém? consorte? (# 8712). 8711
OMA A etimologia é incerta, mas pode corresponder ao acad. sagãlu(m), apropriar-se ou expropriar-se. AT 1. Usado apenas 4x na Bíblia, o vb. aparece no q. (Dt 28.30), no ni. (Is 13.16; Zc 14.2) e no pu. (ou q. pass., Jr 3.2). Considerado obsceno pelos massoretas, o termo sgl costumava ser substituído por skb. Em decorrência disso, é difícil determinar exatamente qual nuança atribuir a expressões com Sgl. Os comentaristas tradicionais defendem os termos "profanado” e “vio lado”, porém Minkoff argumenta que esses termos não são capazes de apreender o horror e o 45
8713)
choque transmitido pela expressão. De qualquer modo, denotam claramente uma linguagem forte, senão vulgar, usada para atrair a atenção dos ouvintes. 2. Em Deuteronômio 28.30, sgl aparece em meio a frases de maldição: “Desposar-te-ás com uma mulher, porém outro homem dormirá com (sgl) ela”. As mulheres serão violadas (sgl) na Babilônia e em Jerusalém quando essas cidades forem saqueadas (Is 13.16; Zc 14.2). A Je rusalém infiel é comparada a uma mulher libertina: “Levanta os olhos aos altos desnudos e vê; onde não te prostituíste (sgl)?' Assim, Rashi entende que o subs. sêgal (SI 45.10; Ne 2.6; Dn 5.3 [aram.]) significa “concubina”, ainda que isso não possa ser provado de modo conclusivo. Coito, cópula, estupro: -> ‘ 1 (deitar-se, copular, # 8061); -> rb$ (deitar-se, # 8069); -> sgl (dormir, ser violada, # 8711); -> skb (deitar-se, ser violada, pousar, # 8886) Cama: -> y$ ‘ (arrumar a cama, # 3667); mittd (cama, # 4753); -> miskãb (cama, # 5435); -> 'eres (armação da cama, # 6911); -> p ê ’â II (luxo [de um sofá], # 6991); rb d (preparar uma cama, # 8048) Sono: dlp II (ficar insone, # 1941); ysn I (dormir, # 3822); nwm (dormir, # 5670); rc/m I (adormecer, #8101) B ib l io g r a f ia
J. A. Alexander, Commentary on theProphecies oflsaiah, 1976; J. Bright, Jeremiah, M i, 1965; M. L. Klein, “Not to be Translated in Public - i m a ^ a o n r i o í ò , ” JJS, 39, 1998, 80-91; H. Minkoff, “Coarse Language in the Bible? It’s Culture Shocking!” BR5, 1989, 22-27. William C. Williams 8712 (sêgal, rainha), -> # 8711
8713
VW
V W (s g ■), pu. alucinado, ensandecido; hip. comportarse como um louco (# 8713); 1ÍV3U?' (siggã‘ôn), subs.
loucura (# 8714). OMA O vb. tem relação com o acad. segü, fúria, bramido; et. zangé 'a, estar louco, adj. zengü louco, ár, saga‘a, arrulho (de pombo), recitar (prosa rimada).
AT 1 . 0 vb. sg' ocorrre 7x (pu. 5x, hip. 2x); o subs. siggã‘ôn ocorre 3x no AT. O subs. siggã‘ôn é usado juntamente com timmãhôn, loucura e ‘iwwãrôn, cegueira, em Deuteronômio 28.28 e Zacarias 12.4 — condições estas induzidas pelo Senhor como castigo sobre o povo. O subs. siggã 'ôn, assim como timmãhôn, é usado para denotar uma anomalia mental, da mesma forma que ‘iwwãrôn conota uma anomalia da visão. Em 2 Reis 9.20, o subs. siggã‘ôn é usado para descrever um cavaleiro conduzindo seu carro “furiosamente”, ou seja, de modo incomum, e, em Zacarias 12.4, é usado para descrever o cavaleiro ensandecido. 2. O vb. sg ' é usado com relação à loucura (ISm 21.14-15 [15-16]). O significa aproxima-se de hll III, comportar-se como um louco (ISm 21.13 [14]). O part. pu. de sg ' (mesuggã‘) refere-se a pessoas em tal estado de choque diante de uma catástrofe enviada pelo Senhor que se tomam ensandecidas (Dt 28.34; cf. 28.15-68). Por vezes, um profeta era acusa do com desprezo de ser um meíuggã \ um louco (2Rs 9.11; Jr 29.26; Os 9.7), de ser como um ’ewil, insensato (Os 9.7), por agir de modo “anormal” quando o Espírito de Deus vinha sobre ele. A palavra s g ‘ denota o sentido do murmúrio inarticulado do profeta que se encontrava 46
1W(# 8716)
sob grande pressão emocional ou preocupação espiritual. É possível que essa conotação tenha sido sugerida pelo ár. saga a, arrulhar (de um pombo). Mais do que isso, porém, sg ' denota o comportamento extático e extraordinário do profeta. E possível que essa conotação tenha sido sugerida pelo acad. segú, furia, bramido (Gray, 488; HALAT 1315; Parker, 282). Não se sabe ao certo se siggã ‘ôn (o nome de algum tipo de lamento; Kraus, Psalms 1-59, 1988, 26; Weiser, Psalms, 1962, 134), no Salmo 7.1, e sigyõnôt (talvez a forma pl. de siggãyôn), em Habacuque 3.1, têm alguma relação com siggã‘ôn (HALAT 1314; BDB, 993). Alguns sugerem que siggãyôn possa ser uma referência a algum tipo de “canção desvairada e intensa, com mudanças bruscas de ritmo” (BDB, 993). Insensatez, estultícia, loucura, despudor: -> ’ewil 1 (tolo, insensato, # 211); -> b ‘r IV (ser estúpido, # 1279); -> hll III (ficar confuso, tolo, comportar-se como louco, # 2147); -> ksl I (ser tolo, # 4071); -> Ihh (comportar-se como louco, # 4263); -> nbl II (agir com desdém, # 5571); skl (comportar-se com insensatez, agir como tolo, frustrar, #6118); -> pth I (ser inexperiente, ser ingênuo, enganar, persuadir, # 7331); -> sg ‘ (delirar, enlouquecer, # 8713); tpl I (dizer tolices, # 9520) B ib l io g r a f ia
1DB 3:220-21; 1SBE 4:211-12; TfVOT2:9Q5; Gray, 1 & 11 Kings, 1964; P. B. Parker, “Possession Trance and Prophecy in Pre-Exilic Israel,” VT2S. 1978, 282. Chou- Wee Pan 8714 (siggã‘ôn, loucura),
8716
# 8713
tlP
(sad), seio (# 8716); lú? (sõd I), seio (# 8718).
OMA Nos textos ugar. o seio é mencionado como uma fonte de alimento. O CTA 15 ii 27 refere-se ao filho de Querete, Iassibe, mamando no seio da deusa Anate, enquanto o CTA 23:24, 59, 61 descreve um grupo de deuses que mamam nos seios de Atirate e Anate (ver Gibsom, 124-26). Aram. taddã ’, sir. fidã, ár. tady, tadan. AT 1 .0 termo sad/sõdocorre muitas vezes referindo-se ao ato de a mãe amamentar o filho. No Salmo 22.9 [10], o salmista declara que, quando bebê, Deus permitiu que ele encontrasse segurança nos seios da mãe (o v. 9b [10b] pode ser parafraseado como: “Levaste-me a obter segurança nos seios de minha mãe”). Numa metáfora particularmente estranha, Isaías 60.16 descreve Sião personificada mamando nos seios de reis, uma referência ao tributo estrangeiro que fluirá para a cidade e a enriquecerá durante a era escatológica. Num texto relacionado, os habitantes da Jerusalém escatológica são retratados encontrando alimento nos seios da mãe, Sião (66.11). 2. Devido à associação com o parto e a alimentação, o seio (em conjunto com o ventre) simboliza fertilidade abundante e crescimento populacional na bênção patriarcal de Jacó sobre José (Gn 49.25). Por meio do recurso literário do trocadilho, Jacó enfatiza que o Todo-Poderoso (sadday) é a origem de tais bênçãos. Ironicamente, Oséias inverteu essa bênção antiga quando pediu ao Senhor que desse aos efraimitas (descendente de José) idólatras “um ventre estéril e seios secos” (Os 9.14). 3. No livro romântico do Cântico dos cânticos, os seios da noiva do rei são objeto do desejo sexual dele. A noiva compara seu amante a um “saquitel de mirra” entre os seios dela 47
1p(# 8717)
(Ct 1.13), e orgulha-se por seus seios o satisfazerem (Ct 8.10), enquanto o rei compara os seios de sua amada, que são macios e ainda estão desabrochando, a duas gazelas (4.5; 7.3 [4]) e a cachos de fruta prontos para serem colhidos (7.7-8 [8-9]). 4. Essa conotação sexual também fica aparente nas acusações mordazes e explícitas Oséias e Ezequiel ao falarem da idolatria de Israel e sua aliança com estrangeiros. Em Oséias 2.2 [4] o Senhor exorta a Israel idólatra a remover “seus adultérios (uma referência metonímica ao seu “amante”, o deus pagão Baal) de entre seus seios” (cf. Ct 1.13). Em Ezequiel 23, o Senhor condena as alianças de Israel e Judá com estrangeiros ao retratá-las como duas irmãs que recorrem à prostituição e, sem nenhum pudor, permitem que homens cheios de lascívia acariciem-lhe os seios (Ez 23.3,21). Seios: -> d a d (seio, # 1843); -> ziz II (seio, # 2329); # 8005); sad (seio, # 8716)
qissurim (faixa para envolver o peito,
B ib l io g r a f ia
N1DNTT1:240; TWAT1: 1069-71; TWOT 2:906-7; J. C. L. Gibson, Canaanite Myths andLegends, 1978,91, 124-26; P. N. Hunt, “Subtle Pronomasia in the Canticum Canticorum: Hiddcn Treasures of the Superlative Poet,” in Gelden Àpfel in silbern Schalen..., eds. Klaus-Dietrich Shunck e Matthias Augustine (Beitrage zur Erforschung des Alter Testaments und des antiken Judentums 20), 1992, 147-54. Robert B. Chisholm
8717
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(sêd), subs. demônio (# 8717).
AT O termo sêd ocorre no pl., e somente 2x (Dt 32.17; SI 106.37). A tradução típica é de mônios, mas existem outras variações nuançadas. Nos dois casos, sêd é um recebedor de um sacrifício proibido: “Sacrifícios ofereceram aos demônios, não a Deus; a deuses que não co nheceram, novos deuses que vieram há pouco, dos quais não se estremeceram seus pais” (Dt 32.17). De acordo com o registro, esses sacrifícios eram humanos ou infantis: “Imolaram seus filhos e suas filhas aos demônios” (SI 106.37). Tal idolatria pagã está relacionada ao sêdu ba bilônio, “um poder protetor sobrenatural, cuja presença era solicitada ao evocar-se os deuses” (TWOT2:906). Também sugere-se que tais demônios podiam ser representações de “vitalidade pessoal ou potência sexual” (TW OT2:906). Kaufmann observa que “é impossível não observar a escassez de referências à esfera demoníaca no AT e, mesmo quando esta ocorre, é desmitificada. O bem e o mal encontram-se na esfera moral e não metafísica” (65, n. 1). Prossegue dizendo: “Quando os deuses das nações são chamados de shedim, não significa que eram espí ritos maus, mas que eram sombras insubstanciais, ‘não-deuses’, sem nenhuma função divina ou demoníaca” (ibid.). Espírito, fantasma, demônio: -> ’ôb II (adivinho, espírita, necromante, fantasma, # 200); -> ’ittim I (fantasmas, fantasmas dos mortos, espíritos, # 356); -> lilit (monstro noturno, criatura noturna, # 4327); -> 'azã ’z êl (Azazel, demônio, bode expiatório, # 6439); -> sí II (habitante do deserto, aquele que clama, que uiva, besta selvagem, # 7470); rúah (vento, sopro, transitoriedade, volição, disposição, temperamento, espírito, Espírito, #8120); -> r^pã ’im I (sombras, espíritos mortos, # 8327); -> sã ‘ir III (sátiro, demônio em forma de bode, ídolo em forma de bode, # 8359); sêd (demônio, #8717) 48
77tf (# 8720)
B ib l io g r a f ia
TDNT2\\-2Q\ TW OT2:905-6; M. A. M. Juárez, “El diablo 1 João lod demoniOs Lefe dei antiguo Israel,” ByF 56, 1993, 36-54; Y. Kaufmann, The Religion o f Israel, 1960. M. V Van Pelt /W . C. Kaiser, Jr. 8718 (sõd I, selo),-> # 8 7 1 6 8719 (Sõd, II, violência), -» # 8720
"ni£> (Sdd), q. devastar, assolar, conquistar; ni. ser de vastado (somente em Mq 2.4); pi. maltratar, destruir (somente em Pv 19.26; 24.15); pu. (ou q. pass.?) ser devastado; po. devastar (somente em Os 10.2); ho. (ouq. pass.?), ser devastado (somente em Is 33.1; Os 10.14) (# 8720); subs. lá? (Sõd II), violência, destruição (# 8719). 8720
na?
OMA O termo sdd, devastar, é encontrado no ugar. (cf. ainda HALAT 1318a).
AT 1. Esse vb. aparece 43x, sendo que destas, 31 são no q. e 18 no pu., enquanto o subs. é encontrado 25x. O termo Sdd denota uma destruição violenta como a causada por um lobo (Jr 5.6; par. nkh) e, assim, descreve apropriadamente o julgamento de Javé sobre os filisteus (q., Jr 47.4), egípcios (q., Ez 32.12) e outros inimigos (p. ex., a Babilônia, part. pass. de q., SI 137.8). Conforme Provérbios 11.3b, “... aos pérfidos, a sua mesma falsidade os destrói (Sdd, q.)”. O part. ativo de q. ocorre 20x, praticamente ao longo de todo o livro de Isaías e no livro de Jeremias e refere-se a Javé (p. ex., Jr 25.36), à Babilônia como seu instrumento (p. ex., 12.12; cf. 51.55, em que Javé destrói a Babilônia) e outros (p. ex., ladrões, Ob 5). 2 .0 julgamento terrível associado a sdd também está relacionado com o Dia do Senh Essa destruição encontra-se intimamente ligada ao próprio Deus, com o emprego da paronomásia: “... e vem [o Dia do Senhor] como assolação do Todo-Poderoso [kPSõd misSadday yãbõ ] ” (J1 1.15; semelhantemente, Is 13.6). É impressionante o fato de Joel usar essa linguagem não contra nações estrangeiras, mas sim contra o povo que, mesmo sendo de Deus, permanece impenitente. Assim, o nome Sadday, que normalmente instilaria consolo ao povo de Deus, passa a ser associado com destruição e motivo de pavor (ver mais em Allen, 59-61). 3. Para o significado do pi., expulsar, ver Thomas, 1969, 289; c.f. Thomas 1962, 63. 4. O subs. Sõd é colocado juntamente com kãpãn, fome ( # 4102; Jó 5.22) e seber, destruição ( -> #8691; Is 51.19; 59.7; 60.18; Jr 48.3). Essas associações ressaltam a devastação relacionada a Sõd. Para o uso de Sõd com hãmãs, ver hms I ( -> # 2803). P-B Na interpretação rabínica, sdd adquire o significado de conquistar, roubar. Assim, ver Gn Rab. 75 sobre SI 12.6 (conforme observado por Jastrow, 2.1524a). Destruição, aniquilação, devastação, deformação, ruína: -> 'bd (perecer, # 6); -> ed (de sastre, # 369); -> blq (devastar, # 1191); -> dmh III (arruinar, # 1950); -> dmm III (perecer, # 1959); -> hrs (demolir, # 2238); -> hbl III (maltratar, # 2472); -> hlq III (destruir, # 2746); ht ’ (ser destruído, # 3148); -> klh (estar completo, perecer, acabar, destruir, # 3983); -> krl (cortar, remover, exterminar, fazer uma aliança, circuncidar, # 4162); -> mhh I (eliminar, ex terminar, destruir, # 4681); n$h II (decair, # 5898); -> nts (arruinar, estragar, # 5995); -> nt.$ (derrubar, demolir, # 5997); -> ntS (desarraigar, arrasar, destruir, # 6004); -> p ’h (despedaçar, 49
r n tf ( # 8721)
# 6990); pid (ruína, infortúnio, # 7085); -> prr (quebrar, invalidar, anular, frustrar, baldar, impedir, # 7296); -> .jüV? II (ser devastado, # 7400); -> rzh (destruir, definhar, # 8135); -> íc/rf (devastar, # 8720); -> íAí (corromper-se, arruinar, estragar, # 8845); -> .fwí/(ser exterminado, destruído, # 9012); -> taW/7 (aniquilação, #9318) B ib l io g r a f ia
jV/£W7T 1:462-71; L. C.Allen, TheBooksofJoel, Obadiah, JonahandMicah, NICOT, 1976; M. Dahood, “Hebrew-Ugaritic Lexicography X,” Bib 53, 1972, 386-403, esp. 403; D. Winton Thomas, “Textual and Philological Notes on Some Passages in the Book of Proverbs,” SVT 3, 1969, 280-92, esp. 289; idem, “A Pun on the Name Ashdod in Zephaniah ii.4,” ExpTim 74, 1962, 63. Cornelis Van Dam
8721
r n tf
r n ç 1 (Siddâ), dama, concubina (somente em Ec 2.8, sendo incerta a tradução para nossa língua) (# 8721).
Mulher: -> 'iSSâ (mulher, # 851); -> gebirã / geberet (dama, rainha, senhora, # 1485 / 1509); -> n a ‘arâ I (menina, # 5855); -> rfiqêbâ (fêmea, # 5922); pilegeS (concubina, # 7108); siddâ (dama, # 8721) B ib l io g r a f ia
R. E. Murphy, Ecclesiastes, WBC 23A, 17. Victor P. Hamilton 8724 (['êl\ sadday, [Deus] Todo-Poderoso),
8727
HQHp
# 446a
nOIV (Sedêmâ), subs. terraço (# 8727).
OMA Ugar. síAm/ campo, vinhedo.
AT 1. Terraço. O subs. sedêmâ ocorre 5x (como pl., sedêmôt, Dt 32.32; 2Rs 23.4; Is 16.8; Jr 31.40; Hc. 3.17) no AT (ver abaixo) e significa terraço ou, de modo mais geral, campo. Tanto em materiais heb. quanto ugar., Sedêmâ aparece em contextos horticulturais (Wyatt [149-53], o que sugere que sedêmâ refira-se à parte da planta em que cresce o fruto). Ocorre no par., com gepen, vinha, em duas passagens (Dt 32.32; Is 16.8). Em quatro das cinco ocorrências, o subs. é usado num const. relacionado ao nome de um lugar (Dt 32.32; 2Rs 23.4; Is 16.8), ou seguido de uma oração prep. indicando sua posição perto de um local (Jr 31.40). Stager afirma que, nesses casos, Sedêmôt refere-se a terraços usados na agricultura. A fim de aproveitar o espaço proporcionado pelas encostas relativamente íngrimes, construíam-se terraços na região mon tanhosa de Israel, região esta caracterizada por vales em forma de “V”. Os habitantes criavam os degraus nas encostas talhando os morros de modo a criar espaço para plantar vinhas ou ár vores. Colocava-se uma parede de pedra na borda externa de cada degrau para segurar a terra. Existem evidências arqueológicas de terraços agrícolas nas montanhas centrais da Palestina, datados desde c. 1220 a. C. (Stager, 116). O termo sedêmôt também significa terraços arquite tônicos de edifícios (Jr 31.40). 2. Campo. Apesar de sedêmâ aparecer muitas vezes em conjunto com gepen, es subs. pode significar mais do que vinhedos (ou os terraços onde estes eram colocados). Em 50
n ç n f (# 8727)
Habacuque 3.17, Sedêmâ ocorre na segunda de três linhas poéticas que descrevem quatro ri quezas da terra (figos, uvas, azeitonas, campos) e dois tipos de animais domésticos (ovelhas, gado). Uma vez que figos, uvas e azeitonas são mencionados especificamente, sedêmâ parece referir-se de maneira mais abrangente a diversos tipos de plantações nos campos (sem nenhu ma referência em especial a terraços agrícolas). 3. Isaías 37.27. Apesar de a última linha de Isaías 37.27 (TM) apresentar Sedêmâ lipnê qãmâ, um campo antes do cultivo, a passagem par. (2Rs 19.26; cf. 1Qlsa#, LXX, certos MSs heb.) traz Sedêmâ lipnê qãmâ, ressecado/empesteado, antes de crescer. Tendo em vista o con texto imediato, a versão de 2 Reis parece estar correta (em oposição a Motyer, 283, n. 1, que aparentemente prefere o TM tomando por base o fato de ser a versão mais difícil). Diante disso, a versão correta de Isaías 37.27 é Sedêpâ e não sedêmâ. 4. “Campo da morte”! Lehmann (3 6 1) interpreta Sedêmôt (pl. de sedêmâ) como uma palavra composta formada de Sdem t, a qual ele equipara com a expressão Sedê mãwet, campo da morte (Mote). Em seguida, selaciona essa oração ao Ciclo de Baal ugar., em que a deusa Anate mata o deus Mote (morte) e o enterra num campo (KTU1.6.11:30-37). Lehmann (363) argumenta que essa epopéia ugar. acabou anexada às cerimônias do culto, sendo uma delas um ritual de sepultamento (realizado num pedaço improdutivo de terra). Conseqüentemente, a expressão, “campo de Mote” tornou-se tecnicamente um sinônimo de solo improdutivo e ári do. A dificuldade mais evidente com a idéia de Lehmann diz respeito à ausência de prova que indicasse haver ali troca entre as consoantes S e s. De acordo com Gibson (CML, 42), “a inter pretação dessas palavras como um subs. composto (“campos da morte”; cf. heb. salmãwet) só pode ser respaldada caso se parta do pressuposto de que a tradição massorética com o S inicial seja incorreta”. Além disso, o cognato ugar. não apresenta nenhuma prova que corrobore essa interpretação. Observe-se uma passagem em que ocorre o ugar. smdt (KTU 1.23.11): “Que (o) lancem por terra no terraço [Smdth] como uma vinha” (Stager, 115; Stager considera o A do ugar. smdth como um suf. adv. de direção [“a”] e não como um suf. da terceira pessoa masc. sing. [“dele”]; cf. de Moor, 79, n. 30). Gibson (CML, 28) explica que, nessa passagem, Mote “é atacado por viticultores que o cortam, amarram e lançam para baixo do terraço como se não passasse de lenha”. A interpretação de Lehmann do termo Sedêmâ acrescenta significado mitológico que não é justificado pela gramática sem. comparativa e nem mesmo pelo uso do termo em ugarítico. 5. Conclusão. Tanto na literatura heb. quanto ugar., Sedêmâ ocorre para denotar terra ços agrícolas, especialmente aqueles onde eram plantados vinhedos (KTU 1.23:8-11; 2.1:43; Dt 32.32; Is 16.18), terraços arquitetônicos de edifícios (Jr 31.40) e também para referir-se a campos em geral (Hc 3.17). Campo, terreno, área rural: -> 'ãdãm IV (chão, # 135); -> bar IV (terreno descampado, in culto, # 1340); -> gãzêr (terra estéril, # 1620); -> hiujôt (campos abertos, # 2575a); -> yãgêb (campo, # 3321); -> rrfilêhâ (terra improdutiva, planície de sal, # 4877); -> mimSãq (terreno tomado por ervas daninhas, # 4940); me ‘ãrâ II (descampado, Meara, caverna, #5118); nír II (terreno recém-desbastado e roçado, # 5776); -> ‘ãqob (terreno [acidentado e esburaca do], coração enganoso, # 6815); perãzôn (campo fértil, # 7251); rekes (terreno acidenta do, # 8221); -> sãdeh (terreno descampado, campo aberto, campos, propriedade, # 8441); sedêmâ (terraço, # 8727); -> Sãmãn (campo fértil, # 9044) B ib l io g r a f ia
J. Croatto e J. Soggin, “Die Bedeutung von mmu?' im Alten Testament,” ZA W 74,1962,44-50; C. Labuschagne, The Incomparability ofYahweh in the Old Testament, 1966; M. Lehmann, “A 51
TTtf (# 8728)
New Interpretation o f the Term V T 3 ,1953,361 -71; J. de Moor, The Seasonal Pattern in the Ugaritic Myth ofB a'lu, 1971; J. Motyer, The Prophecy oflsaiah, 1993; L. Stager, “The Archeology o f the East Slope o f Jerusalem and the Terraces o f the Kidron,” JNES 41, 1982, 111-21; N. Wyatt, “A New Look at Ugaritic smdt," JSS 37, 1992, 149-53. Michael A. Grisanti
8728
TTtf
TKP (sdp), vb. ressecar, crestar (# 8728); ilDlip (sedêpâ), subs. ressecamento (hapleg., # 8729); 1ÍD7Ç; (siddãpôn),
subs. ressecamento (# 8730). OMA Há cognatos desse vb. no aram. sdp, queimar; ár. 'asdafa, ficar enegrecido (como se houvesse sido queimado?).
AT 1 .0 vb. aparece somente em Gênesis 41.6,23 e 27, no sonho de Faraó e na interpretação de José. Em cada um desses casos, descreve as sete espigas de milho mirradas que haviam sido “crestadas do vento oriental”. Tendo em vista que o vento oriental vem do deserto e é quente e seco, o vb. provavelemente refere-se ao ressecamento e crestamento das plantações. 2. O subs. sedêpâ, coisa ressecada, aparece apenas em 2 Reis 19.26: “Por isso, os se moradores (...) tomaram-se como a erva do campo, e a erva verde, e o capim dos telhados, e o cereal queimado antes de amadurecer.” E usado para para descrever os habitantes das cida des sitiadas por Senaqueribe, um simbolismo do desespero dessas cidades diante da aparente insensibilidade do conquistador. 3 .0 subs. siddãpôn, ressecamento, encontra-se apenas nas listas de pragas que o Senh lançará sobre Israel por desobediência (Dt 28.22; 1Rs 8.37 [ = 2Cr 6.28]; Am 4.9; Ag 2.17 [uma paráfrase de Am 4.9]). E usado sempre relacionado a yêrãqôn, normalmente traduzido como “míldio”. A relação com o míldio leva muitos tradutores e comentaristas a traduzirem o subs. como “ferrugem”, ou seja, doença que ataca as lavouras (Anderson e Freedman, 436). Tendo em vista a associação do vb. com o vento oriental, porém, parece mais provável que o subs. refira-se a um crestamento ou ressecamento. Uma vez que o míldio costuma estar associado à humidade, o par de substantivos “crestamento e ferrugem” pode ser melhor compreendido como um paralelismo antitético, ou mesmo como um exemplo de merisma, sendo que a oração representa uma grande variedade de doenças de plantações. P-B O vb. é usado na LR em estudos das leis agrícolas. Como em Gênesis, refere-se ao efeito do vento oriental sobre as plantações. Da mesma forma que na BH, o subs. siddãpôn é usado com relação ao “míldio”. Calor, ressecamento: -> hmm (ficar momo, quente, manter aquecido, # 2801), harisi (res secamento?, # 3046); hrr I (ficar quente, ressecado, áspero, # 3081); -> yst (acender, manter aceso, inflamar, queimar, ressecar, # 3675); -> çrb (estar ressecado, # 7646); -> srp (chamuscar, ressecar, cauterizar, # 8596); sdp (ressecar, 8728); sãrãb (calor escaldante, # 9220) B ib l io g r a f ia
IDB 2:4; F. Anderso e D. N. Freedman, Amos, AB, 1989,435-42; A. Brenner, Colour Terms in the Old Testament, 1982, 164; Phillips, Deuteronomy, 1973, 185; G. von Rad, Deuteronomy, 1966, 177. Anthony Tomasino 52
Dn®' (# 8732)
8729 (sedêpâ, ressecamento),
# 8728
8730 (siddâpôn, ressecamento), -> # 8728
8732
ontf
DnÚ!1(sõham I), ônix, comalina (# 8732).
OMA Ver o acad. sãmu e sãmtu, pedra preciosa vermelha (especialmente a comalina. ver CAD 15:121-24, 127); et. sõm, sárdio. AT 1. Várias versões da Bíblia (com exceção de Ez 28.13 em algumas delas) traduzem essa palavra como “ônix”. Outras traduzem sõham como “comalina”, a versão preferida por Zimmerli (83). Pope (Job, AB 15, 1980,204) reconhece que a identidade dessa pedra preciosa é conjectural. A LXX usa “ônix” para sõham (cf. sir. berilo). Tendo em vista o cognato acad. e aqueles encontrados nos textos do AT que mencionam sõham juntamente com lápis-lazúli (p. ex., Jó 28.16; Ez 28.13), parece mais provável que a pedra preciosa em questão seja a cornalina [Almeida: safira] (cf. Allen, Ezekiel 20-48, WBC 29, 1990, 90-91). 2. Na delimitação das fronteiras do jardim de Deus, há uma declaração parentética de que Havilá (sudoeste da Arábia?) era a principal origem da comalina (Gn 2.11-12; cf. Wenham, Genesis 1-15, WBC 1, 1987, 65). Essa pedra estava entre as doze pedras preciosas engastadas no peitoral do sumo sacerdote (Êx 28.20; 39.27). Além disso, a estola sacerdotal possuía duas pedras de sõham, cada uma contendo a inscrição de seis nomes de tribos, colocadas como om breiras na estola sacerdotal (Êx 28.9; 35.9). Essa pedra também é mencionada entre as pedras preciosas que o rei Davi ajuntou nos preparativos para a construção do templo de Javé (1 Cr 29.2). E, finalmente, assim como a pedra de sappir, a pedra de sõham não pode ser comparada em valor com o tesouro da sabedoria (Jó 28.16). 3. Para uma introdução teológica ao tema das pedras preciosas no AT, ver odem (# 138). Pedras preciosas: 'eben (pedra, rocha, # 74); -> ’õdem (pedra preciosa, # 138); 'ahlãmâ (jaspe, # 334); -> ’eqdõh (berilo, # 734); -> hahaf (pedra preciosa, # 985); bãreqet (esmeralda, # 1403); -> yahPlõm (pedra preciosa; # 3402); yãsepêh (jaspe, # 3835); kadkõd(rubi?, # 3905); lesem I (pedra preciosa, # 4385); nõpek (pedra semipreciosa, # 5876); sõheret (minério de pedra, # 6090); -> sappir (lápis-lazúli, # 6209); pifdâ (crisólita, olivina, #7077); sebô (pedra preciosa, # 8648); -> sõham I (pedra preciosa, # 8732); -> sãmír II (esmeril, diamante?, # 9032); sês II (alabastro, # 9253); -> larsis II (pedra preciosa, # 9577) Jóia, adornos: -> hali I (adomo, jóia, # 2717); harüzim (colar de conchas, # 3016); (abba‘at (anel, # 3192); -> kümãz (adomo, # 3921); -> misbe$ôt (engastes, # 5401); -> nezem (anel, # 5690); -> neti(i)pà (brinco, # 5755); -> V7g;7 (brinco?, # 6316); -> ‘dh II (adomar-se, # 6335); -> ‘is (retinir, # 6576); -> ‘nq (colocar um colar, # 6735); -> p eninim (corais, pérolas, # 7165); .yawwãrôn (colar, # 7454); çãmid I (bracelete, # 7543); se 'ãdâ (cadeias dos artelhos, cadeiazinhas para os passos, # 7577); -> rãbid (colar, # 8054); saharônim (cres centes [em forma de meia-lua], # 8448); -> íãAíi (adomo, # 8667); -> sêr (bracelete, # 9217); tór (pendente, # 9366) B ib l io g r a f ia
/Dfi 2:898-905; ISBE4:623-30; N/DNTT3:395-9S; J. S. Harris, “An Introduction to the Study of Personal Omaments, of Precious, Semi-Precious and Imitation Stones Used Throughout Biblical 53
XI# (# 8736)
History,” ALUO S4, 1962,49-83; L. Koehler, “Hebrâische Vokabeln II,"ZA fV 55, 1937, 16174; H. Quiring, “Die Edelsteine im Amtsschild desjudischen Hohenpriesters und die Herkunft ihrer Namen,” A G M 38, 1954, 193-213; W. Zimmerli, Ezekiel 25-48, 1983,82-84. Andrew E. Hill
XI# (iõ w ’), subs./adv. imprestável, ineficaz, engano, fraude (# 8736). Não está claro se a palavra é derivada daquele que parece ser seu radical, sw ’ I, maltratar (# 8736), que ocorre aparece no hi. nos Sal mos 55.15 [16] e 89.22 [23]; há controvérsias quanto ao radical exato em ambos os casos. É possível que também haja alguma relação com o radical sw ' II (outros optam por S ’h [# 8615] e seus derivativos), ficar ou deixar desolado ou inútil. Essa última possibilidade tem o apoio da proximidade, senão do paralelismo, entre Sãw’ e tôhü (# 9332) em Isaías 59.4. 8736
XI#
OMA Não há paralelos exatos em outras línguas do OMA. Os termos mais próximos são o ár. s a ’a, ruindade, perversidade; o et. s a j’, crime, delito, o sir. S ‘h ã \ ser extinto, S ‘hê, inútil, desolado. Também pode estar relacionado ao egíp. áw, vazio. AT 1. Essa palavra, que ocorre 53x no AT, parece ter dois sentidos básicos e inter-relacionados: ineficácia e falsidade; este último provavelmente deriva da idéia de que as esperanças e expectativas mostram-se falsas quando depositadas em pessoas ou coisas ineficazes e, portanto, indignas de confiança. Em alguns lugares, o termo parece denotar apenas ineficácia, sem ne cessariamente deixar implícito engano ou falsidade, como em Malaquias 3.14, em que o povo reclama que não lhes tem adiantado coisa alguma servir a Deus. Em Jeremias 2.30, Deus se queixa que castigou Judá iaSSãw' (em vão) (cf. 4.30; 6.29; 46.11). Esse é também o caso no Salmo 127.1-2, em que atividades como labutar, guardar, levantar-se cedo, ficar acordado até tarde e fatigar-se são consideradas inúteis se para elas não houver a assistência do Senhor. Jó se queixa de que recebeu por herança yarhê sã w ', “meses de desengano” (par. 'amai [# 6662]) (Jó 7.3). O salmista lamenta sobre a futilidade ( 'al-mah-Sãw") com que Deus criou a humani dade (SI 89.47 [48]). 2. Na maioria das passagens, porém, a idéia de falsidade ou engano encontra-se presen te, sendo, talvez até, fundamental. Isso fica especialmente claro em termos com os quais Sãw ’ ocorre em paralelo. Deuteronômio 5.20 [17] proíbe que se dê um 'êdSãw', falso testemunho; a passagem paralela em Êxodo 20.16 traz o termo Sãqer (# 9214) no lugar de s ã w Na litera tura profética e poética, vários termos que denotam falsidade são usados paralamente a sã w '. O termo utilizado com mais freqüência, principalmente em Ezequiel, para descrever visões falsas de profetas mentirosos (Ez 13.6-9; 21.29 [34]; 22.28) é kãzãb, mentira, engano (# 3942); cf. também Provérbios 30.8. No Salmo 26.4, a expressão “homens falsos” (metê-Sãw ’), tem como paralelo o termo na'alãmim (“dissimuladores”, 7/w, esconder [# 6623]). Em duas passagens, são usados os termos hãlãq, falsidade (# 2747) e o pl. halãqôt (SI 12.2 [3]; Ez 12.24). O termo correspondente em dois textos (Jó 31.5; SI 24.4) é mirmà, engano, traição (# 5327). Em vários casos, 'ãwen, injustiça, perversidade (# 224), serve de termo paralelo (Jó 11.11; SI 41.6 [7]); Zc 10.2). Ourtos termos usados em paralelo com sãw ' são hebel, vaidade (# 2039; Zc 10.2), mezimmá, plano perverso (# 4659; SI 139.20) e maddúhim, engodo (# 5615; Lm 2.14). 3. É especialmente interessante o uso dessa palavra no terceiro mandamento em Êxo do 20.7 (par. Dt 5.11): “Não tomarás o nome do Senhor, teu Deus, em vão” (mais lit., “não exaltarás... para falsidade” [lõ 'tissã' . . . laSSãw ]). De acordo com o conceito tradicional, esse 54
KW (# 8736)
mandamento é uma proibição de se usar o nome do Senhor levianamente, com raiva ou em juramentos. No entanto, a ordem para os israelitas é que façam seus juramentos em nome de Javé (Dt 6.13; 10.20). E, ainda que não haja outras proibições no Pent. que correspondam a um uso leviano ou impensado do nome do Senhor, há várias advertências sobre usar-se o nome do Senhor para dar falso (seqer) testemunho (Ex 23.1; Lv 19.12). Esses fatos, juntamente com a substituição de sãqer em Êxodo 20.16 por sã w ' em Deuteronômio 5.20 [17], tomam atraen te a idéia de considerar-se o mandamento uma proibição dc se usar o nome do Senhor ao dar falso testemunho. Apesar de haver provas convincentes de que esse é, provavelmente, o sentido prin cipal, vários estudiosos advertem, com razão, para que não se restrinja a abrangência desse mandamento uma vez que ', mesmo estando no mesmo âmbito semântico de seqer, não é simplesmente um sinônimo desse termo (Childs, Durham, Reiterer). A sugestão de Rad e Mowinckel de que o termo refere-se à magia perversa parece frágil e, de modo geral, não tem sido seguida como o sentido principal. Uma sugestão em particular mostra-se mais atraente. Em decorrência da localização dessa proibição dentro do Decálogo — justaposta com os dois primeiros mandamentos que tratam de falsos deuses e com o quarto mandamento que está re lacionado à adoração — é possível que a proibição refira-se à adoração sincrética, ou seja, o nome do Senhor sendo exaltado juntamente com o nome de ídolos ou mesmo sendo relacionado a esses falsos deuses de alguma forma. 4. Há várias passagens em que é provável o termo referir-se a ídolos, uma vez que estes são ineficazes e, portanto, falsos. A expressão, hablê-Sãw', ídolos imprestáveis (SL 31.6 [7]; Jn 2.8 [9]), junta dois termos quase sinônimos num único const. gramatical a fim de ressaltar o caráter absolutamente repulsivo da idolatria (VanGemeren). Também é provável que seja esse o caso em Jeremias 18.15, em que o Senhor condena aqueles que o esqueceram, mas queimam incenso “aos ídolos” (lassãw ’). Talvez seja apropriado ainda incluir-se o Salmo 24.4, “que não entrega sua alma à falsidade (a um ídolo [iáw ’]), nem jura dolosamente”. O paralelismo entre sãw ' e mirmá, engano, traição (# 5327), um termo que não é usado em contextos relaciona dos a ídolos, toma ainda mais provável que esse versículo seja simplesmente uma referência à questões de integridade básica. Sugeriu-se, em outras passagens, uma referência a ídolos (SI 26.4; 119.37; Is 1.13; Jó 31.5; ver Dahood), mas essa alusão é pouco provável. 5. Duas palavras do mesmo âmbito semântico, mas que ocorrem apenas raramente são ep a' e slh. a. O hapleg. ’epa‘ (subs. imprestável, # 703) ocorre apenas em Isaías 41.24: “menos do que nada (mê 'ãpa') é o que fazeis”. Trata-se de um texto controverso, e vários estudiosos consideram-no uma deturpação de m êepes (p. ex., BDB e BHS\ a palavra não se encontra em IQIsaa). Ocorre em paralelo com mê'ayin (menos do que nada) e, se no v. 24 awen (abominação) foi corrigido (como já foi sugerido) para 'ãyin, em que 'epes também aparece, então os dois termos aparecem em paralelo duas vezes, separados apenas por alguns versículos. Outros preferem deixar o texto inalterado e derivar a palavra de p ‘h (gemido). É provável que a me lhor opção seja considerá-lo simplesmente um sinônimo próximo de 'epes. Apesar de o termo não estar presente no lQIsaa de Isaías 41.24, ocorre, de fato, 4x no IQH; em 2.29, ocorre em paralelo com iõw’ ’. b. O vb. slh I ( -> # 6136), que pode ter relação com o acad. sali5, lançar fora, e com o ár. salã, desprezar, ocorre apeans duas vezes. No Salmo 119.118, o salmista declara ou pede (o vb. pode ser entendido como precatório [de acordo com Dahood]) que o Senhor rejeite (slh, q.) todos aqueles que se desviam dos decretos dele. Em Lamentações 1.15, o autor declara que todos os seus valentes foram rejeitados ou considerados imprestáveis (slh, pi.) pelo Senhor. 55
2VV (# 8740)
P-B A palavra sã w ’ ocorre no Eclesiástico para descrever os oponentes dissimulados da sabedoria (p. ex„ 15.8). É atestado na LQ em 1QH, lQpHab, 3QInv e 4QWiles, normalmente com referência à falsidade. Inutilidade, despropósito: hbl (tomar-se vão, # 2038); slh I (desprezar, # 6136); (esvaziar, derramar, tirar, # 8188); s w ' (maltratar, # 8735)
ryq
B ib l io g r a f ia
DCH 1:360; NIDNTT 1:546-53; TD N T4.519-24; TH AT2:U 2-M \ TWOT2:625, 730, 908; B. S. Childs, The Book ofExodus, OTL, 1974,386-88,409-12; M. Dahooh, Psalms 1-50, AB 16, 1965, 151;idem ,fW m s/fl/-750,A B 17a, 1970,186; J. I. Durham, £jco # 8615
(swb I), q. (683x) arepender-se, mudar; retornar, voltar; ir e voltar; reverter, voltar atrás, mudar de idéia; retirar; polel, trazer de volta, restaurar; hi. (350x) trazer de volta, conduzir de volta, transportar, restaurar; retirar (# 8740); subs. / adj. naW!? (mesübâ), (ato de) incredulidade, apostasia (# 5412); n i a ç (sebüt), sortes (# 8654); aaí® (sôbãb 1), incrédulo, rebelde (# 8743); aai® (sõbêb), apostatar, dar as costas (# 8745); H3W' (suba) regresso (# 8746); naiIPPI (fisübâ) regressar (# 9588). 8740
ai©
OMA O vb. é amplamente atestado; ugar. tb (cf. KBL 4:1326): regressar, voltar-se, responder; acad. sâbu(m), ocilar, balançar; ár. antigo twb, regressar; ár. tãba regressar, voltar. O radical não se encontra presente no etíope. AT O radical swb ocorre em várias formas verbais no AT com relativa freqüência (c. 1050x), com uma concentração em Jeremias (111 x). O subs. e o adj. relacionados ocorrem poucas ve zes. O vb., em suas diversas formas, é marcado por uma combinação de características — uma grande freqüência, uma rica variedade de significados, uma certa ambigüidade quanto à direção (p. e x ., “dar as costas para” ou “voltar-se para”). O vb. atua num sentido físico (uma pessoa vira-se em sentido oposto) e também num sentido religioso (pessoas dão as costas para Javé ou voltam-se para ele). Há dois sinônimos, swr (# 6073) e pnh (#7155), que também funcionam com os signi ficados de voltar-se fisicamente e querem dizer também dar as costas para Deus (apostasia) ou voltar-se para Deus (arrependimento). Com relação ao movimento físico, swb significa volver, swr significa desviar ou partir e pnh significa voltar-se ou olhar para uma entre várias direções (Êx 2.12; cf. rodear, Dt 2.3; sair de, Gn 18.22; voltar). Caminhadas ou jornadas são, muitas ve 56
mu?' (# 8740)
zes, o contexto de swb e swr, contrastando com pnh, que descreve pessoas (e coisas) mudando de posições ou atitudes (SI 86.16). Num sentido religioso, swb, é o termo mais comum tanto para voltar-se de modo decisivo para Deus (ou para ídolos), quanto para afastar-se dele (ou de les). O termo swr descreve deserção, uma mudança no objeto da lealdade e fidelidade, na maior parte das vezes, com um sentido de apostasia (Êx 32.8).pnh è usado com pouca freqüência para descrever uma mudança de posição espiritual (p. ex., Dt 31.18; Is 53.6; Jr 2.27). . swb é, basicamente, um vb. de movimento, significando regressar, voltar, voltar atrás, retomar, tomar; referindo-se muitas vezes à um movimento físico de voltar ao ponto de partida (p. ex., uma pessoa, Gn 15.16; Deus, 18.10; uma ave, 8.9; águas, Js 4 .18); mudança de direção (Gn 14.7; cf. o sinônimo pnh); movimento para trás, muitas vezes o recuo sob a pressão da ba talha (1 Rs 22.33; SI 6.10 [11]); movimento para frente e para trás, de ir e vir (p. ex.; corvo, Gn 8.7); ou movimento repetitivo (Gn 43.10). Às vezes, swb é usado com outro vb. com o sentido de fazer algo novamente (Gn 26.18; 2Rs 13.25) ou fazer algo maior ou cada vez mais (Ez 8.6, 17). O vb. aparece em discussões sobre a vida e a morte: tomar à terra (Gn 3.19); voltar da morte para a vida (2Sm 12.23) e voltar ao pó (Ec 12.7). 2. Outros contextos do radical swb, cm sua maioria sem cunho teológico, tratam de re lacionamentos e posições. É o caso da pergunta levantada sobre ser permitido ou não, a uma mulher divorciada, voltar para o marido, no sentido de restabelecer um relacionamento rom pido (Jr 3.1). No contexto da cidadania, um povo que se tomou desleal pode voltar (swb) a ter uma relação de lealdade para com o rei (lR s 12.27). Jefté declara que não pode voltar atrás (swb) do voto dado (Jz 11.35). Por vezes, o termo swb é usado para descrever uma mudança de idéia (Jó 6.29). 3. Um uso comum para swb ocorre no contexto dos lapsos morais e espirituais, afas tar-se de (dar as costas para) Javé ou voltar-se para Deus. Dar as costas para Deus é apostasia (mesübâ). Os subs. mesübâ ( -> # 5412) e sôbãb descrevem as condições de estar-se afastado de Deus em incredulidade e rebelião (Jr 2.19; 3.22; 5.6; 8.5; 14.7; Os 11.7; 14.4 [5]; sôbãb. Is 57.17; Jr 3.14, 22). Jeremias acusa o povo de Deus de ter dado as costas para Deus (Jr 34.16; 8.5). As pessoas voltam-se (swb) para a prática do mal (11.10). Israel recusa-se a deixar seus caminhos maus (15.7); “não quer voltar [para Deus]” (8.5). Parte da acusação de Amós é de que, apesar da disciplina de Deus, Israel não voltou para o Senhor (Am 4.6, 8, 9, 10, 11). 4. Por meio de seus profetas, Deus pede aos desviados que voltem para ele. Há um grande número de imperativos, às vezes advertindo e outras suplicando: “Voltai-vos dos vossos maus caminhos” (2Rs 17.13). Em tempos de reavivamento, reis proclamavam, “voltai-vos (swb) ao Senhor, Deus de Abraão, de Isaque e de Israel, para que ele se volte (swb) para o restante que escapou” (2Cr 30.6). Deus pede: “toma-te para mim, porque eu te remi” (Is 44.22). Oséias pede: “Volta, ó Israel, para o Senhor teu Deus” (14.1 [2]). Jeremias 3.11— 4.2 apresenta um longo apelo para que o povo retome (swb). Um trocadilho toma esse apelo memorável: “Volta (swb), ó pérfida (que dás as costas, mesübâ) Israel” (3.12); lit. “Volta (swb), povo que sem pre se revolta (que volta atrás, sõbãbím)" (3.14, 22). Ezequiel reitera o apelo: “Convertei-vos (5h'6)! e apartai-vos (hi. de swb) dos vossos ídolos” (14.6). O apelo para apartar-se dos ídolos é ampliado por meio do apelo de Joel para que o povo volte (swb) para “vosso Deus”, Javé (Jl 2.12-13; cf. Ml 3.7; Jr 4.1). Porém, nem todos os profetas (p. ex., Isaías, Amós), chamam ao arrependimento. Será por que passou do tempo de arrepender-se? 5. A palavra swb é essencial para o conceito de arrependimento. A imagem empregada é de uma pessoa dando meia volta. Nessa mudança completa de rumo — caso esta seja con siderada arrependimento — é crucial que a pessoa se volte para a direção certa, a saber, para Javé. Os passos nesse processo de mudança são delineados claramente em Jeremias 3.22— 4.2,
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3112? (# 8740)
uma verdadeira liturgia do arrependimento: reconhecer o senhorio de Deus (3.22); admitir o pecado (3.23), inclusive por meio de confissão verbal, “temos [tenho] pecado” (3.25); tratar da vergonha (3.25); afirmar e manter-se firme na nova conduta (4.1-2). Para uma descrição comparável dos elementos do arrependimento, cf. Oséias 14.1-3 [2-4], Em Jeremias 31.18-20 encontramos um retrato hipotético do arrependimento (swb) de Efraim (Israel), outra passagem na qual o profeta lança mão de um trocadilho. Aquele que está sendo disciplinado suplica que Deus o restaure (swb) para que possa voltar (swb). De acordo com Efraim, depois que se converteu (swb), ele se arrependeu (nhm) (3.19). O relacionamento pessoal entre Deus e os homens é ressaltado pelo uso de nhm, um sinônimo de swb. A forma ni. do vb., arrepender-se, mudar de idéia, apresenta nuanças da di mensão emocional do remorso no processo de transformação. O vb. nhm é usado com relação a Deus, p. ex., arrependendo-se e entristecendo-se por ter colocado Saul como rei (1 Sm 15.11). Deus interage com as mudanças de atitude de um povo, altera seu curso de ação e cede (nhm) de acordo com a situação (Jr 18.8, 10; cf. 26.3; 13. 19; Am 7.3; Jn 3.10). A mudança de planos da parte de Deus não representa inconstância, mas sim a integridade de uma pessoa e a coerência com um princípio determinado. O radical nhm ( # 5714), apesar de ser usado muitas vezes com Deus, aparece poucas vezes relacionado a pessoas (Êx 13.17; Jó 42.6; Jr 8.6; 31.19). . Não são apenas as pessoas que mudam de rumo (swb); Deus também altera seu curso (swb). O ato pelo qual Deus recebe de volta para si a pessoa arrependida também é descrito pelo termo swb. Nesse caso, Deus é o sujeito. Ele promete voltar-se (swb) para aquele que busca o perdão e a reconcilição. Sua resposta à súplica por restauração é afastar (swb) a sua ira (Os 14.4 [5]). No trecho sobre a “volta” de Efraim, Deus declara: “comove-se (hmh) por ele o meu coração, deveras me compadecerei (rhm) dele” (Jr 31.20). Por intermédio do profeta Oséias, Deus anuncia, a um povo, que pode arrepender-se: “Curarei a sua infidelidade (mesúbãtãm)" (Os 14.4 [5]). Holladay descreve como “uso pactuai de swb" as situações que envolvem o re lacionamento de Deus com os homens (ver seções 3-6). 7. Um uso freqüente e muitas vezes teológico de Swb, refere-se a Deus desistir ou não do seu furor (2Rs 23.26). Uma expressão crítica — lõ ' 'asibennii, não sustar — aparece em Amós (1 .3 ,6 ,9 ,1 1,1 3 ; 2.1,4,6). As traduções habituais consideram que o sujeito é o castigo, no sentido de revogar ou afastar o castigo. Outras versões lançam mão de pesquisas mais re centes e traduzem “não reciprocar o furor”. Uma série de passagens apresentam Javé enviando sua ira como uma flecha: Javé tanto pode revocar seu furor antes que atinja o alvo como pode permitir que acerte (Is 5.25; Jr 2.35; 4.8; Os 14.4 [5]; Jn 3.9). O motivo pelo qual Deus libera sua ira contra as nações surge do pecado e da injusti ça. Os seis discursos de acusação às nações em Amós identificam pecados que desrespeitam os direitos humanos: atrocidades (1.3); escravidão (1.5); rompimento de tratados (1.9); hosti lidade contínua (1.11); atrocidade, avareza (1.13) e ultraje (2.1). A ira de Deus contra Judá e Israel não será sustada, pois se rebelaram contra Javé, são idólatras (2.3), praticam a injustiça e o adultério e se recusam a ajudar o necessitado (2.6-8; cf. Is 5.21-25). Algumas passagens proféticas identificam outros males como motivos pelos quais a ira de Deus não será sustada nem se apartará: soberba (Is 9.8-12 [7-11]), maus caminhos e violên cia (Jn 3.7-9); abuso da função profética (Jr 23.16-22). Jeremias considera-se um mediador, suplicando a Deus para que desvie seu furor (Jr 18.20). Quando Roboão humilhou a si mesmo, apartou-se dele a ira de Deus (2Cr 12.12). ( Ira: Teologia) . É comum encontrar-se o termo swb sendo usado com terra, especialmente em Jere mias e Ezequiel. Esses profetas falam do regresso de Israel à terra, por vezes no mesmo orá culo em que anunciam seu exílio longe da terra (Jr 16.13, 15; cf. 12.11-15; 24.1-10). Também se pode encontar mais declarações independentes do regresso à terra (Jr 31.16; cf. Ez 11.17;
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rntf (# 8750)
20.34, 41-42; 34.13; 36.24; 37.21; 39.27-28). São apresentados diversos motivos para o re gresso à terra: a. Javé é compassivo e tratará favoravelmente com seu povo, restaurando-o à terra de Israel (cf. Jr 29.10-11; 31.16,20); b. Deus atua de modo a levar seu povo de volta pois é a reputação mesma de Javé que está em jogo (Ez 36.22-24; radical heb. bõ ”) e c. o regresso à terra representa a volta ao iugar de bênção (Jr 31.10-14). Outros escritores bíblicos além dos profetas do tempo do exílio referiram-se à pro messa do regresso. Deuteronômio ameaça com o exílio se o povo for desobediente; ao mesmo tempo, é prevista a resturação à terra (Dt 30.1-6). No século VIII, Isaías falou de um regresso à terra (Is 14.1-2). 9. Um uso cognato impressionante do termo swb se dá com o subs. Sebút, e, às veze com Sebit (25x). Pensava-se anteriormente que a parte subs. da expressão era derivada de sbh, cativeiro, de modo que as versões mais antigas a traduziam por “volta do cativeiro” (p. ex., Jr 32.44). Apesar de poder contemplar a idéia de libertação do cativeiro, o significado de swb e sebút é mais amplo, sebút é um cognato de swb e quer dizer, em termos idiomáticos, “res taurar a sorte” ou “realizar uma restauração” (cf. Jó 42.10 que, nas versões mais antigas era problemático por trazer a oração “o Senhor restaurou Jó do cativeiro”). Tendo-se em mente, portanto, essa interpretação da expressão, as declarações inicias do Livro da Consolação de Jeremias (Jr 30.1—33.26) deixam de ser redundantes. Deus irá “mudar a sorte” do seu povo — uma declaração geral (Jr 30.3) que pode referir-se a uma restauração espiritual completa do povo para junto dele (o que é explicado em Jr 31). Em termos específicos, porém, haverá uma restauração física do povo à terra de Israel (Jr 30.3). (Para o hapleg. Sebit, cativeiro, em Nm 21.29; ver #8669.) A oração cognata pode ser considerada uma “fórmula de restauração”. Não apenas Deus agirá para mudar a sorte do seu povo, como também ocorrerá a restauração de outros povos: Elão (Jr 49.39); Moabe (48.47); Sodoma (Ez 16.53) e Amom (Jr 49.6). Volta, apostasia, regresso, incredulidade, arrependim ento: zwr II (afastar, # 2319); hmq (desviar, # 2811); -> y q ' (desviar, # 3697); nq ‘ (alienar, # 5936); sbb (virar, rodear, cercar, # 6015); -> swr (desviar, # 6073); -> pnh (virar para o lado, # 7155); -> s(h (desviar, # 8474); -> swb (arrepender-se, mudar; retomar, reverter, retirar, # 8740); -> t^qúpâ (ponto crítico, # 9543) B ib l io g r a f ia
ABD5:67l-12; TDNT 1:357-59; 4:984-99; 7:23-26; 7 7 /^2 :8 8 4 -9 0 ; TWOT 2:909-10; W. L. Holladay, The Root Subh in the Old Testament, 1958; I. Willi-Plein, “SWB ÉBW T-eine Wiedererwãgung,” ZAH 4, 1991, 55-71; T. M. Raitt, A Theology o f Exile, 1977, 35-49. J. A. Thompson / Elmer A. Martens 8743 (Sôbãb I, incrédulo, rebelde),
# 8740
8745 (Sõbêb, apóstata, errante), -> # 8740 8746 (Sübâ, volta), -» # 8740
m ir (Swh I), q. ser/tornar-se semelhante, ser semelhan te, ser igual, ser adequado; pi. nivelar, suavizar; hi. equiparar/comparar (# 8750); n i # (Sãweh), subs. planície (# 8752). 59
m »' (# 8750)
OMA O vb. possui cognatos no ugar., twy igualar, ser semelhante (cf. Dietrich-Loretz, UF17, 1986, 126); ár, sawiya, ser igual/semelhante, nivelar, igualar, endireitar; e aram./ sir. sewã ’, ser semelhante. AT Labuschagne (29) afirma que, em termos etimológicos, o vb. remete a uma forma xafel do radical hyh / hwh. O significado original seria, entüo, “causar/iniciar”. A partir desse significado original, desenvolveu-se o valor semântico “ser semelhante/igual” . A forma q. do vb. com o significado “ser igual” é usada com as preposições ei (Is 40.25) e le (Pv 26.4) para comparar pessoas umas com as outras ou Javé com outros deuses. No caso de Isaías 40.25, o vb. possui uma função paralela ao pi. do radical dmh I (cf. também TDOT 3:252, 256). Em Provérbios 3.15 e 8.11, o vb. é usado com a preposição be para comparar o valor de um objeto (nesse caso, a sabedoria). Em Ester 3.8 e 5.13, o vb. é usado com a preposição le para indicar o que é adequado ou apropriado para uma pessoa. O vb. também ocorre no ni., com o signifi cado de “ser semelhante” (Pv 27.15), no pi. com o significado de “nivelar” ou “sossegar” (Is 28.25; 38.13 [esperar]; SI 131.2) ou de “tomar como” (2Sm 22.34; SI 18.33 [34] — em ambos os casos tendo Javé como sujeito) e no hi. com o sentido de “comparar” (Is 46.5 — mais uma vez, paralelo ao vb. dmh; Lm 2.13). O vb. swh aparece duas vezes no AB (cf. Dn 3.29; 5.21 Q). A primeira ocorrência mencionada (Dn 3.29) refere-se à destruição de algo inanimado: úbaytêh newãliyistawwêh, suas casas serão transformadas em monturo. Em 5.21 Q, porém, o vb. refere-se a um ser humano: welibbêh 'im-hêwetã'savnvíw, (lit.) e seu coração tornou-se como o de um animal selvagem. O uso do vb. swh para expressar o caráter imcomparável de Javé em Isaías (40.25; 46.5) é importante em termos teológicos. Em cada um dos casos, o vb. é usado paralelamente a dmh. O contexto no qual a combinação de swh com dmh é empregada mostra que Javé é co locado em constraste com outros deuses, enfatizando a singularidade dele. Jenni (THAT 1:454) acredita que essas declarações sobre o caráter incomparável de Javé têm a intenção de gerar polêmica com relação a declcarações comparáveis encontradas em textos babilônios (cf. um grande número de hinos assiro-babilônios a deuses como Samos, Enlil, Sim, Nergal, Adade, Ninibe, Marduque e Assur), que usam mahãru e sanãtiu (ser semelhante) para descrever seus deuses. Cf. também Labuschagne. O subs. Sãweh ocorre somente duas vezes no AT (Gn 14.5,17). No v. 5, o subs. constitui parte do nome de um lugar, a saber, a Planície de Quiriataim. Assim, o subs. refere-se a uma região onde não há montanhas e colinas. No v. 17, porém, não fica claro o sentido com que o subs. sãweh é usado. E empregado numa construção status constructus com ‘êmeq. O ‘emeq Sãweh é explicado, então, nesse v., como 'emeq hammelek. De acordo com 2 Samuel 18.18, 'emeq hammelek é o local onde Absalão levantou uma pedra memorial. Diversos estudiosos identificam a região relativamente plana ao norte de Jerusalém com essa referência geográfica (cf. entre outros, Stolz, Das erste undZweit Buch Samuel [ZB], 1981). Porém, a maioria dos estudiosos acredita que 'emeq hammelek refira-se ao vale a oeste da Cidade de Davi em Jeru salém. Tanto Von Rad (OTL, 179) quanto Westermann (BK / / 2 ,238) consideram a associação de ‘emeq sãweh com 'emeq hammelek uma conjectura deliberada para criar a impressão de que o encontro de Abraão com o rei de Sodoma ocorreu nas cercanias de Jerusalém. P-B 1. Gordon (395-97) afirma que os vbs. swh e swy no heb. e no aram. estão relacionados entre si. Houve um desenvolvimento no valor semântico de ambos os vbs. e, como resultado, muitos casos no Targum (p. ex., Trg. ISm 5.7; 6.4) podem ser considerados como “um verbo de movimento rápido ou hostil”. Jastrow (2:1532-33) parece concordar quando declara que, 60
mu? (# 8751)
em alguns casos, o vb. significa “fazer algo semelhante, retaliar”. Porém, de acordo com ele, o significado normal do vb. swy / s w ’ no Targum é “ser semelhante/nivelar, alisar, tomar se melhante”. O adj. sãweh / sãwewh significa “ligado, uniforme; adequado, igual; equivalente, condigno” (Jastrow 2; 1529). 2. De acordo com Juhn (KQT, 1960), o vb. Swh ocorre 4x nos textos de Qumran, o seja, no Livro dos Mistérios 1,2,2 e 1,2,8, no Papiro de Damasco 15:14 e nos Salmos de Ação de Graças 15:23. NT Todos os Evangelhos Sinópticos, bem como o Evangelho de João, identificam João Ba tista como aquele que os profetas (Is 40.3 e Ml 3.1) haviam afirmado que prepararia o caminho para o Senhor. O texto G usa euthys (subs., um caminho plano) ou euthynõ (vb., aplainar) em todos esses casos. O radical heb. representado por esses equivalentes G é pnh (pi.), desobstruir, preparar um caminho. Nivelamento, retidão: I (andarem linha reta, # 886); ->ysr (ser nivelado, plano, direito, # 3837); -> nãkõah (caminho reto, conduta correta, justiça, verdade, # 5791); -> pis I (livrar o caminho, nivelar o caminho, # 7142); -¥ swh I (ser/tomar-se semelhante, nivelar, # 8750); -> tqn (endireitar, colocar em ordem, # 9545) B ib l io g r a f ia
TDOT 3:250-57; THAT 1:790-94; M. Dietrich e O. Loretz, “Kerets Krankheit und Amtsunfôhigkeit,” UF 17, 1986, 123-28; R. P. Gordon, “The Meaning o f the Verb swy in the Targum to 1 Samuel v-vi,” VT42/3, 1992, 395-97; C. J. Labuschagne, The Incomparability ofJahweh in lhe Old Testament, 1966. Louis Jonker
8751
mu?
(swh II), pi. colocar, pôr (# 8751).
AT A forma e o significado desse radical encaixam-se perfeitamente no aram., no qual o pael costuma traduzir a BH como sym e Syt nos Trgs. (p. ex., Gn 21.14; Jz 6.19; SI 39.8 [9]). É provável que as quatro ocorrências excepcionais do vb. na poesia da BH (SI 16.8; 21.5 [6]; 89.19 [20]; 119.30; Os 10.1) devam-se a uma influência aramaica. Colocação, designação, posto, estação: -> ysg (colocar, apresentar, # 3657); -> kwn (perma necer firme, preparar, estabelecer, # 3922); nsb I (ficar em pé, estacionar, permanecer firme, # 5893); -> ntn (dar, apresentar, oferecer, # 5989); -> 'm d(ficar em pé, assumir uma posição, estacionar, designar, # 6641); -> 'rk (colocar, enfileirar, entrar na batalha, # 6885); qwm (levantar-se, permanecer em pé, erguer-se, realizar, # 7756); sym I (colocar, pôr, preparar, im por, # 8492); swh II (colocar, pôr, 8751); -> syt (pôr, colocar, assentar, designar, # 8883) Sam Meier 8752 (sãweh, planície),
8755
# 8750
mu?
JTIU> (swh I), q. afundar, inclinar-se para baixo (hapleg. em Pv 2.18; # 8755); nmu? (sühá), subs. cova (# 8757);
nmu? (sihâ), subs. cova (# 8664). 61
n m tf (# 8757)
OMA Cf. aram. súah dissolver, súhã \ cova; sir. Sihâ, fonte; ár. sãkhã, afundar. AT 1. Em Provérbios 2.18 o vb. é traduzido como “inclinar”. O sábio hebreu, em Provér bios, enaltece a prudência, pois ela livra o homem sábio tanto dos homens perversos (2.12) como da mulher adúltera (12.16). A casa da mulher adúltera se inclina para a morte, uma vez que aqueles que se juntam a ela na prática de sexo ilícito participam do rompimento da aliança de casamento dela (2.17). De acordo com Scott (Proverbs — Ecclesiastes [AB 18], 1965,43), nesse caso a morte significa “morte prematura, o castigo pela insensatez”. McKane (Proverbs, OTL, 1970, 287-88) rejeita as tentativas de relacionar a adúltera de 2.16-19 com as prostitutas do culto a lstar. Para McKane, a mulher devassa de 2.16 é uma metáfora para qualquer mulher que despreza as convenções sociais, morais e outras. Apesar de reconhecer que as alusões ao mundo dos mortos são importantes na mitologia can., McKane entende a associação com a adúltera como morte no sentido de alienação social. 2. O derivativo súhã ocorre 6x no AT. Em cinco casos, é traduzido como “cova(s)” (Jr 2.6; 18.20,22; Pv 22.14; 23.27) e, em um caso, no Salmo 35.8, “caia neles para a sua própria ruína” (ARA), fica subtendido que “neles” está no lugar de “poço”, de acordo com a NI V. Em apenas uma citação, a palavra cova é entendida de maneira bastante literal, como a paisagem irregular do deserto do Sinai (Jr 2.6). Nas outras passagens, a palavra é usada para simboli zar a trama diabólica dos perversos contra os justos (SI 35.8; Jr 18.20, 22) e as conseqüências mortais dos desejos sexuais pervertidos (Pv 22.14; 23.27) ( # 8757). 3. O termo sihâ, cova. é par. a súhâ, em Jeremias 18.22. No Salmo 57.6 [7], o salmista descreve a situação em que os perversos fizeram uma cova no caminho dele, mas eles próprios caíram nela. No Salmo 119.85, o salmista adverte aqueles (arrogantes) que fazem covas a fim de desviar os justos da fidelidade à lei de Deus. (Ver também JTItt’, sahat, que é usado como uma cova para capturar leões em Ez 19.4, 8 [ -> # 8846].) Afundamento, estabelecimento: -> (b ‘(afundar, # 3190); m kk(afundar, estabelecer, #4812); $11II (afundar, # 7510); -> swh (afundar, # 8755); s q ' (assentar, # 9205) Cova: mãgôr III (fosso de armazenagem; # 4473); madmêná (fosso de esterco, # 4523); mikreh (cova, # 4838); -> pahat (cova, # 7074); -> súhâ I (cova, # 8757); -> sahat (cova, sepultura, # 8846) B ib l io g r a f ia
J. A. Emerton, “A Note on Proverbs 2,18,” JTS 30, 1979, 153-58; A. Negev, Esdras., Archeological Encyclopedia o f the Holy Land, 1972, 149-50. Andrew E Hill / W. R. Domeris
nrTO' n n w (súhâ I), subs. cova (# 8757); HITU? (sihâ). subs. ______________________ I_______ cova (# 8864); os dois subs. podem ser derivados de rrnp (swh I), humilhar, afundar (de acordo com BDB, 1001; # 8755). AT 1 .0 termo súhâ é usado 2x no AT, com o significado de cova (Jr 2.6 e conj. SI 35.8), como aquela usada para capturar animais grandes. A cova é aberta e camuflada, de modo que o peso do animal o leve ao fundo, onde pode ser empalado por estacas ou deixado para morrer de fome. Representa um enorme perigo, especialmente para viajantes incautos. O uso metafórico vem desse sentido de perigo, de modo que o termo passa a significar um perigo oculto no cami 62
c -ltf (# 8763)
nho da jornada física ou espiritual de uma pessoa. Assim, Provérbios 22.14 compara a boca de uma adúltera com uma cova profunda. Provérbios 23.27 usa a mesma analogia para a prostituta. Jeremias 18.20,22 refere-se às tentativas de seus inimigos de capturar o profeta e é impossível não lembrar-se do tempo em que ele passou no fundo de uma cisterna seca (Jr 38.6). 2. Sfyâ, cova, é par. a súhà em Jeremias 18.22 e no Salmo 57.6 [7], em que o salmi descreve os perversos que fizeram uma cova no caminho dele, mas eles próprios caíram nela. No Salmo 119.85, o salmista adverte aqueles (arrogantes) que fazem covas a fim de desviar os justos da fidelidade à lei de Deus. (Ver também nrttt?, sahat, que é usado como uma cova para capturar leões em Ez 19.4, 8 [ -> # 8846].) Caça: -> yqs (armar um tropecilho, uma arapuca, um laço, enlaçar, # 3704); -> pah I (armadi lha, laço, # 7062); swd (caçar, # 7421); -> reset (rede, # 8407); -> Súhà I (cova, # 8757) Cova: -> mãgôrUl (fosso de armazenagem; # 4473); -> madmênâ I (fosso de esterco, # 4523); mikreh (cova, # 4838); -> pahat (cova, # 7074); -> Súhâ I (cova, # 8757); -> sahat (cova, sepultura, # 8846) B ib l io g r a f ia
A. Negev, ed. Archeological Encyclopedia o f Holy Land, 1972, 149-50. W. R. Domeris
01© (Sw( I), q. percorrer, perambular, passar por sobre (p. ex.; a água); pol. percorrer, hitpol. ir de um lado para o outro (# 8763); OittJQ (mãsô(), subs. remo (# 5414); 0 ’$ (sayi(), subs. remo (# 8868). 8763
OMA Um termo relacionado no acad. é sâ(u, puxar, arrastar; ár. sw(, realizar uma longa jornada. AT 1 .0 uso não teológico do vb. sw(, com o sentido de mover-se de um lado para o outro, é próprio para marinheiros que remam barcos (Is 33.21; cf. remo, Ez 27.6,29), mas é empregado com mais freqüência para pessoas numa missão de inspeção (Nm 11.8 [ARA: “espalhava-se o povo”]; 2Sm 24.2, 8; Am 8.12). 2. Tanto Satanás quanto Deus percorrem a terra para inspecioná-la. Satanás, o adversá rio, pode ter como missão avaliar a devoção do homem. Ou ainda, a causa de sua vigilância, reportada no livro de Jó (Jó 1.7; 2.2), não pode ser especificada por “motivos dramáticos”, uma vez que ele não tem o que relatar, mas se encontra alerta para o que está ocorrendo (cf. D. J. A. Clines, Job 1-20, 23). Alguns afirmam que as atividades de Satanás são semelhantes às de um espia real, segundo os costumes persas (M. Pope, Job, AB, 11). Os olhos de Deus também percorrem a terra e ele a inspeciona, pronto para “mostrar-se forte para com aqueles cujo co ração é totalmente dele” (2Cr 16.9). 3. Os subs. mâSôf, remo (Is 33.21) e sayíf, remo (Ez 27.6, 29), são incomuns. Para a terminologia náutica, ver ’onÍ, navio (# 639). Deambulação, errância, desabrigo: /?/’(desviar-se, ser levado para longe, #2133); -> ( ‘h (percorrer, fazer desviar, # 3246); ndd I (fugir, desviar-se, perambular, # 5610); nw d (os cilar, desabrigar-se, # 5653); nw$ (fugir, # 5680); rW (vagar, #8113); -> Sgh (perder-se, desencaminhar-se, desviar, corromper, # 8706); -> swf I (vagar, # 8763); t h (andar errante, desviado, # 9494) Elmer E. Martens 63
01® (# 8764)
8764
VVV
VW (sw( II), q. menosprezar, desprezar (# 8764). ÜX® (se ’ã(); subs. desdém (# 8624).
OMA Sir. Sãf, desprezar; mand. sut I, desprezar; acad. samlu, desconsiderar; eA sw(, despre zar, insultar, ár. st chicotear, açoitar (com scn\-(3nan [alma], estar oprimido, abatido). E provável que o subs. í e ’ãt consista numa variação de swt II, seguindo o padrão de outros vbs. intermediários fracos com um álef mediai em certas formas do part. (p. ex., Iwt nví; GKC, 198, §72p; BL, 403-5, §56u). AT As três formas nominais de se a( e as três formas de part. de sw( II ocorrem em Eze quiel e significam a atitude de desdém, desprezo e altivez (um desprezo verbal e insultuoso, Brownlee, 257). Todas as 6x, elas descrevem o desdém de naçoes pagãs por Israel. Os três part. proporcionam uma perspectiva passada e futura da relação de Israel com as nações ao seu redor. Ainda que no tempo de Ezequiel a nação escolhida de Deus tenha sido vítima do desprezo das nações em função da infidelidade de Israel a Javé (Ez 16.57), chegará o dia em que Israel não sofrerá mais esse desprezo (28.24). Javé destruirá todos os povos que demonstrarem desdém por sua nação e serva, Israel (28.26). Os três casos de subs. acusam Edom, a Filístia e Amom (como representantes de qualquer nação opressora), de procurar destruir Judá (Ez 25.15), de regozijarem-se com a destruição dela (25.6) e de saquear com menosprezo a terra prometida (Ez 36.5). Deus promete mais uma vez castigar com severidade todos aqueles que despreza rem o povo escolhido dele. Desprezo, desdém, repugnância, aversão: bwz (demonstrar desprezo por, # 996); bzh (ser desprezível, fazer pouco de, desprezar, # 1022); -> bhl (enfadar-se, desdenhar, # 1041); g 7 (abominar, aborrecer, desprezar, ser profanado, falhar, # 1718); zhm (abominar, # 2299); zwr III (tomar-se ofensivo, # 2320); zll II (ser leviano, tomar desprezível, # 2361); znh II (sentir aversão por, # 2389); zãrã’ (enjôo, náusea, # 2426); -> hnn II (estar fedendo, repugnante, # 2859); y q ' (desviar, # 3697); nq ‘ (alienar, # 5936); -> qw( (sentir aversão, # 7752); -> qll (ser insignificante, ligeiro, parecer leviano, tratar com desprezo, # 7387); swt II (menosprezar, desprezar, # 8764); sqs (tomar abominável, # 9210); t ‘b (ser detestável, ser detestado, detestar, abominar, # 9493) B ib l io g r a f ia
TWAT1:1182-87; W. Brownlee, Ezekiel 1-19, WBC, 1986; A. Rainey, The El-Amama Tablets, 1978,359-79. Michael A. Grisanti
8765
VW
üí® (sô(), chicote (# 8765).
OMA A forma pode estar relacionada ao heb. i/f, governar (BDB, 1020), e ao ugar. slt, gover nante (Aistleitner, §2612), sendo que a perda do lâmed central produziu um subs. derivativo (cf. s/sql nos SI 78.21; 139.8; Is 44.15; Ez 39.9 e GKC §66e). Essa sugestão pode ser respaldada pelo uso de sô( em 1 Reis 12.11, 14. AT Diferentemente de sebef ou ma((eh, que parecem ser uma vara ou bordão de madeira, sôt pode transmitir mais a idéia de um chicote ou açoite flexível. O sôt era usado para estimular o 64
ü ltf (# 8766)
trabalho na corvéia (lR s 12.11, 14; 2Cr 10.11, 14), para castigar (Jó 9.23; Is 10.26; 28.15, 18) e para pungir cavalos (Pv 26.3; Na 3.2). A expressão comum sôt lãsôn (Jó 5.21; “do açoite da língua”) pode ser entendida como uma explosão de hostilidade verbal (Bums, 1991). Vara, bordão, bastão: hõfer (vara, rebento, # 2643); -> mô(á (jugo, canzil, # 4574); -> mat(eh (bordão, vara, cetro, tribo, # 4751); -> mãnôr (vara, # 4962); maqqêl (vara, galho, bordão, # 5234); -> sêbet (tribo, bastão, vara, arma, cetro, # 8657) Chicote, látego: nk' (ser chicoteado, açoitado, # 5777); -> sô? (chicote, # 8765) B ib l io g r a f ia
J. Aistleiner, Wõrterbuch der ugaritischen Sprache, 1974; A. Brenner, “On Ma(teh and Sebet and Their Semantic Classification,” Les 44, 1980, 100-108 (Heb.); J. Bums, “The sw( Iswn in Job 5.21a as Metaphor and Irony,” BZ 35, 1991, 93-96. David M. Fouts 8766
OW'
ÜHP (sôt II), subs. inundação (repentina) (# 8766).
8868
AT
O K-Q em Isaías 28.15 dá ao leitor a possibilidade de escolher entre Sayif, remo ( # ), e sôt I, flagelo (-> # 8765). Vários estudiosos (Barth, 306-7; Fohrer, Jesaja, 2:56, 57, 60; Hoffman, 24-25; Wildberger, 1063, 1065) sugerem que o Q representa sôf II, inundação, pelas seguintes razões. Em primeiro lugar, a LXX e o sir. traduzem esse termo como furacão e planície fluvial (sujeita a inundações), respectivamente. Em segundo lugar, o part. sôfêp, que normalmente tem como conotação a inundação de uma enchente, ocorre com sôt em Isaías 2 8.15,18, juntamente com o vb. ‘br (que também é comum no contexto de inundações [ver s(p, # 8851 ]). Por fim, o termo mayim (águas) ocorre em Isaías 28.17, juntamente com s(p. O HALAT (1337) refere-se a Jó 9.23 como outra possível atestação de sôt II (cf. Fohrer, Hiob, 196, 199). No entanto, conforme indica o HALAT (1337), a identificação de sôf II em Jó 9.23 é desnecessária e apenas possível em Isaías 28. Motyer (233) e Oswalt (517) mantêm sôt I e consideram o subs. uma metáfora mista que significa açoite e afogamento. Oswalt (517, n. 17) chama a atenção para a mesma mistura metafórica no Alcorão (89:13), que diz: “Teu Senhor derrama sobre eles o flagelo do castigo”. Apesar de Sôf I, flagelo, normalmente referir-se a um chicote, sua justaposição com os elementos citados acima permitiria que o termo se referisse a qualquer tipo de castigo agonizante, inclusive à imagística da inundação, sem exigir a form conj. sôt II. Inundação, dilúvio, torrente: -> b z ' (dividir [por ação da água], # 1021); -> grp (arrastar com a água, # 1759); -> mabbid (oceano celestial, dilúvio, # 4429); -> niggeret (torrente, # 5600); !>wp (inundar, elevar, fazer flutuar, # 7429); -> Sibbõlet II (torrente, ondulação, # 8673); -> sôf II (inundarção [repentina], # 8766); stp (arrastar com água, inundar, alagar, # 8851); -> seçep (enchente, # 9192) B ib l io g r a f ia
J. Barth, “lUttróilP', ZAW 33, 1913, 306-7; G. Fohrer, Das Buch Jesaja, 1967; idem, Das Buch Hiob, 1963; H. Hoffman, Die Intention der Verkundigung Jesajas, 1974; J. Motyer, The Prophecy o f Isaiah, 1993; J. Oswalt, The Book o f Isaiah: Chapters 1-39, 1986; H. Wildberger, Jesaja 28-39, 1982. Michael A. Grisanti 65
Vltf (# 8767)
8767
VW
*7TO (Súl), subs. saia, orla (# 8767).
AT Cinco das onze ocorrências desse subs. encontram-se na descrição das vestes do sumo sacerdote (me 71) em Êxodo 28.33-34 e 39.24-26. Todas elas referem-se aos sinos e romãs pen durados na orla (súl) da sobrepeliz. Outras quatro referências estão relacionadas a um com portamento vergonhoso. Jeremias 13.26 é um exemplo típico: “Assim, também levantarei as tuas fraldas [saias] sobre o teu rosto; e aparecerão as tuas vergonhas” (cf. Jr 13.22; Lm 1.9; Na 3.5). A ocorrência remanescente de súl encontra-se na conhecida visão do templo em Isaías 6. No v. de abertura, o profeta relata que viu as abas (das vestes de Deus) enchendo o templo. Roupas — vestes, saia, manto: -> kãnãp (asa, saia, orla, # 4053); -> k?süt (cobertura, ves timenta, capa, # 4064); -> me 'il (manto, # 5077); -> sõbel (saia esvoaçante, # 8670); -> súl (saia, # 8767); -> takrík (manto, # 9423) Isaías: Teologia Robert L. Alden 8775 (Sw‘, clamar por socorro), -> Lamento
8777
VIU?
Si®1’(sôa ‘ I), nobre, de classe elevada (# 8777).
OMA Um cognato ugar. t ‘ é o título para KRT ou o nome do clã ao qual KRT pertence. Um possível cognato ár. é w asi‘a, magnânimo, nobre, senhor ou, como outros sugerem, w asi‘a no sentido de amplo, espaçoso. AT Trata-se de uma palavra pouco freqüente que ocorre apenas na poesia (2x), sendo de derivação incerta (ver HALAT 1340). É evidente que constitui um outro termo para a nobreza ( -> hôr, # 2985). Ocorre como sinônimo de nãdíb, nobre (Is 32.5), e tanto como sinônimo de sãrim, príncipes, quanto como antônimo de dal, pobre (Jó 34.19), sendo a tradução, respecti vamente, “magnânimo” e “rico”. 1. Isaías antevê o reinado de um soberano e de príncipes justos (Is 32.1 -8). Sob seu governo, Israel não será mais espiritualmente cega (v. 3; cf. 6.9-10) e os loucos (nãbãl || kilay) não serão mais chamados de nobres (32.5). Apesar de ser delineada na linguagem convencio nal dos escritos de sabedoria, a descrição dos loucos em 32.6-7 deixa implícita uma referência aos líderes de Israel. Ela reúne a perversão da justiça (v. 7; cf. p. ex., 3.14-15) pelos líderes e as políticas que eles implementaram durante a crise com a Assíria (32.6); Aqui, a expressão “obra o que é iníquo” (la ‘asôt hõnep) remete à aliança com o Egito (Ia 'asôt ‘êfâ) feita sem referência a Deus (30.1-2; cf. 31.1), enquanto “proferir mentiras (tô a) contra o Senhor” (32.6) faz lembrar os profetas embriagados que “erram (tã 'ú) na visão” (28.7) e que eram os preferidos pelo povo como porta-vozes das palavras proféticas (cf. 30.10). O fato de os loucos serem reconhecidos como tal deixa implícito que serão castigados (cf. 29.17-21). Assim, a passagem apresenta a perspectiva de que os líderes impiedosos e opressores serão erradicados do meio do povo de Deus. Então, a nobreza de caráter andará de mãos dadas com a nobreza de classe (32.8). 2. Em Jó 34.19, a palavra ocorre no contexto de uma declaração de Eliú — que do ponto de vista de Jó é simplista demais — sobre o governo justo e imparcial de Deus sobre o mundo. Todos os homens são obra da mão de Deus e serão julgados com eqüidade, qualquer que seja sua classe social. 66
HW (tf 8789)
Chefes: -> adôn (senhor, mestre, # 123); a/tá/? II (chefe da tribo, tf 477); ayí/ II (emi nente, nobre, # 722); -> zãçêw (ancião, tf 2418); -> hõr I (homem livre, nascido livre, tf 2985); -> maplêah (insígnia de um cargo, # 5158); -> nãgid (príncipe, governante, líder, tf 5592); nãsi' I (chefe, rei, # 5954); -> j ã r á (eunuco, oficial da corte, tf 6247); -> seren II (príncipe filisteu, tf 6249); ‘attüd (bode, líder, tf 6966); -> pe/W (governador, tf 7068); -> p ã q id (ofi cial; # 7224); qãçin (comandante, líder, ft 7903); -> ra/> II (capitão, chefe, tf 8042); rzn (reger, tf 8142); -> sô a ‘ I (nobre, tf 8777) B ib l io g r a f ia
V. Sasson, “Ugaritic ( ’ and gzr and Hebrew sôwa' and 'õzêr," UF 14, 1982, 201-8. Kenneth T. Aitken 8785 (sú'ãl I, raposa),
tf 9478
8788 (sô'êr, porteiro),
tf 9133
8789
'11U7
(.vvvp I), q. esmagar (tf 8789), (iwp II), q. tentar abo canhar, pegar (# 8790); uma forma secundária de s 'p,
arquejar, ofegar ( -> ft 8634). OMA O conjunto de significados acima, tirado de KB, relaciona swp I ao acad. sãpu, tripudiar sobre, e ao cognato sir. que significa ferir e considera swp II uma forma secundário do heb. s 'p, arquejar, ofegar, abocanhar, swp II está relacionado, então, ao termo cognato ár. que significa olhar para. Outros consideram que swp consiste em apenas um radical (de acordo com o HA LAT 1342, “atacar ferozmente” [“hart angreifen”]. É problemático determinar-se o significado exato desse vb., pois swp ocorre somente em três passagens difíceis: Gênesis 3.15; Jó 9.17 e Salmo 139.11. AT 1 .0 vb. swp ocorre duas vezes em Gênesis 3.15, o chamado Protoevangelho, a primeira vez em que o evangelho é proferido depois da queda em pecado. O Deus Javé diz à serpente: Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás (ou tentarás abocanhar?) o calcanhar. A natureza das evidências dos Targuns, da LXX e da Vg. é tal que proporciona pouca ajuda para traduzir-se swp. No que se refere ao contexto, podem-se fazer duas observações. Em favor de dois radicais diferentes traduzidos como “esmagar” e “tentar abocanhar”, respectiva mente, diz-se que “as duas ações são diferentes, correspondendo a formas corporais diferentes das partes em questão” (C. Westermann, Genesis 1-11, 1974 [ET 1984], 260). Por outro lado, é compreensível que a maioria dos estudiosos modernos prefira manter o mesmo sentido em ambos os casos (ver G. J. Wenham, Genesis 1-15, WBC, 1987, 80), em função da natureza recíproca da passagem. Além disso, o sentido de “esmagar” ou “bater” também se encaixa nas duas ocorrências desse vb. em Jó 9.17 e no Salmo 139.11. (Cf. G. R. Driver in JTS 30, 192829, 375-77 e A. Guillaume in JSS 9, 1964, 286-88.) 67
IDitf (# 8795)
2. A inimizade à qual Deus se referiu em Gênesis 3.15 era uma maldição para a serpente, mas uma grande bênção para Adão e Eva e os descendentes que acreditassem. A vitória plena implícita nessas palavras cumpriu-se inicialmente no sofrimento, morte e ressurreição de Cristo. O cumprimento final ainda está porvir. Cf. p. ex., Romanos 16.20; Colossenses 2.15; Hebreus 2.14; Apocalipse 12; 20.9-10. (Para uma compreensão histórico-redentora de Gn 3.15, usando o termo “golpear” para swp, ver Woudstra, 200-203; VanGemeren, Progress, 92-94.) Os Targuns constumavam entender Gênesis 3.15 com um sentido messiânico; porém, essa passagem mal é mencionada nos midraxes. (Ver Str-B, I, 958 n.l.) 3. Em Jó 9.17, swp denota ser esmagado por uma tesmpestade. No Salmo 139.11, a imagem de uma escuridão densa a ponto de esmagar e sobrepujar é retratada de maneira vi vida com o uso de swp. Não há necessidade de emendar-se esse texto. (Ver Glenn, Tradition, 174, 185.) P-B O uso posterior de swp encontra-se relacionado a esfregar com incenso (CD 11.4) e unguento, ou algo semelhante, mas também a esmagar e pisotear (cf. mais em Jastrow, s.v.). Golpe, esmagamento, trituraçâo: -> b ‘( (dar pontapés, coices, pisar, # 1246); -> dwk (es murrar, # 1870); dk ’ (esmagar, ser esmagado, # 1917); -> dkh (ser esmagado, # 1920); dqq (esmagar, # 1990); hlm (bater, # 2150); -> hbt (debulhar, bater, malhar, # 2468); thn (moer, triturar, # 3221); -> kts (triturar, # 4197); kit (pulverizar, moer, destroçar, # 4198); -> mh$ (despedaçar, # 4731); -> m 'k (pressionar, apertar, esmagar, # 5080); ngp (golpear, # 5597); -> nk ’ (ser chicoteado, açoiatado, flagelado, # 5777); nkh (ser atingido, golpeado, arruinado, destruído, # 5782); srr I (ligar, amarrar, # 7674); ->/•'$ (abater, # 8320); -> rss (esmagar, amassar, quebrar, # 8368); -> swp I (esmagar, # 8789); shq (triturar, # 8835) B ib l io g r a f ia
G. R. Driver, “Some Hebrew Verbs, Nouns, and Pronouns,” JTS 30, 1928-29, 371-78, esp., 375-77; A. Guillaume, “Paronomasia in Old Testament,” JSS 9,1964,282-90, esp. 286-88; W. A. VanGemeren, The Progress ofRedemption, 1988; M. H. Woudstra, “Recent Translations of Genesis 3:15,” CTJ 6, 1971, 194-203. Cornelis Van Dam 8790 (swp II, tentar abocanhar),
8795
"fDÍtP'
# 8789
IDitt’ (sôpãr), chifre de carneiro (confeccionado como instrumento de sopro) (72x; # 8795; HALAT 1343a).
OMA E possível que o acad. s/sappãru(m) signifique cameiro selvagem (palavra estrangeira do sum.; AHw 2:1027a); ugar. spr pode significar chifre na oração st [ilt hjm rspr: “Beba, ó deusa, o vinho do chifre” (KTU 1.108, 9-10; de acordo com Dietrich-Loretz-Sanmartín, 118). AT Deve-se fazer uma distinção entre sôpãr, chofar, e qeren, chifre (de animal); o primei ro termo descreve um instrumento sinalizador confecionado do segundo termo, chifre (cf. Js 6.5). Assim como o hasõsPrâ, o sôpãr não era um instrumento musical em si; em momento algum, é mencionado como parte de conjunto musical. No âmbito militar, o sôpãr era usado para soar o alarme quando um inimigo se aproximava (Ne 4.18 [12], 20 [14]; Is 18.3 [ || nês, estandarte, # 5812]; Jr 4.5-6 [ || nês], 19 [ || terú ‘al milhamâ\, 21 [ || nês]; 6.1 [ || mas ’êt], 17; 68
TSitf (# 8795)
Ez 33.3-6; Os 5.8 [ || ha$õs?râ]; 8.1; Am 2.2; 3.6, para convocar os exércitos de Israel a fim de se prepararem para o combate (Jz 3.27; 6.34; ISm 13.3; Jr 42.14; 51.27 [ || wês], para sinali zar (muitas vezes, juntamente com um som agudo [vb. rua'/subs. terú‘â\) um ataque (Js 6.16, 20; Jz 7.18-20, 22; Jó 39.24-25) ou para cancelar um ataque (2Sm 2.28; 18.16; 20.1, 22). Em eventos religiosos, o sôpãr era usado para anunciar o ano de jubileu (Lv 25.9) e as luas novas (SI 81.3 [4]), para proclamar jejuns e assembléias (J1 2.15) ou juramentos solenes (2Cr 15.14) e para anunciar os movimentos de Javé ou da arca (2Sm 6.15 = lCr 15.28; SI 47.5 [6]; 98.6). Esse uso ritual pode estar relacionado à importância religiosa do sôpãr como um instrumento que inspirava reverência, a ponto de dizer-se que seu som acompanhou a teofania de Javé no Sinai (Êx 19.16, 19; 20.18) e de as profecias afirmarem que o toque do instrumento anunciará grandes acontecimentos no Dia de Javé (J1 2.1; Sf 1.16; cf. Is 27.13; Zc 9.14). P-B No heb. pós-bíblico, o termo é atestado 6x em 1QM e muitas vezes no Talmude (p. ex., TalmB. Ros Hassana III, 2-3; IV, 5-6) e nos midraxes (p. ex., Leviticus Rabbah, §29) (Jastrow, 1540a). No aramJ, sôpãrã' aparece freqüentemente nos Trgs. (p. ex., Trg. Êx 19.13; em que o TM usa o heb. yõbêl). Instrum entos / termos musicais: gittit (instrumento musical?, # 1787); -> hemyâ (som, estrépito, # 2166); -> M (fazer tocar a flauta, # 2727); -> hssr (fazer soar a trombeta, # 2955); yõbêl (trombeta de chifre de cameiro, # 3413); -> kinnôr (lira, # 4036); -> mên (corda [de instrumento musical], # 4944); -> mena ‘an ‘ím (guizo, cascavel, chocalho, pandeiro, # 4983); nêbel II (instrumento sem cordas, # 5575); ngn (tocar a lira, # 5594); ‘íigãb (flauta?, # 6385); prt (improvisar, # 7260); ->.?//1(tinir, retinir, # 7509); -> sôpãr (chifre de carneiro,# 8795); -> sãlís II (instrumento musical, # 8956); -> sem a‘ I (som, # 9049); -> ipp (tocar, bater, # 9528); -> tq ' (impelir, empurrar, bater palmas, tocar a trombeta, empenhar, # 9546) B ib l io g r a f ia
H. J. Austel, TW OT2:951b-52a; B. Bayer, “The Finds That Could Not Be,” BARev 8/1, 1982, 25, 29; idem, The Material Relics o f Music in Ancient Palestine and Its Environs: An Archeological Inventor)’, 1963, Fig, 143; idem, “Music: History: Biblical Period, Second Temple Period,” Enc-Jud 12, col. 565, Figs. ld, 2 f and 2g; M. Dietrich, O. Loretz, J. Sannartín, “Der ‘Neujahrspsalm’ 1 Reis 24.252 (+UG. 5, s. 551-557 NR.2),” UF 7, 1975, 115-19; S. B. Finesinger, “Musical Instruments in OT”, HUCA 3, 1926, 56-61; idem, “The Shofar,” HUCA 8-9m 1931/32, 193-338; D. A. Foxgov e A. D. Kilmer, “Music,” ISBE 3:439; G. Friedrich, TDNT 7:76, 81; E. Gerson-Kiwi, “Musique (dans la Bible),” DBSup 5, 1957, cols. 1417-18; H. Gressmann, Musik und Musikinstrumente im AT, 1903, 29; O. Keel, The Symbolism o f the Biblical World, tr. T. J. Hallet, 1985, s.v. “Music and Song,” 340b-42b, 349b, Figs. 456,457 e 458; E. Kolari, Musikinstrumente und ihre Verwendung im AT, 1947, 42-49; N. J. McEleney, “Does the Trumpet Sound our Resound? An Interpretaiton of Matthew 6:2,” ZNW 76, 1985, 43-46; J. D. Prince, “Music,” EncBib 3, cols. 3230-31; G. von Rad, Der heilige Krieg im alten Israel, ATANT 20, 1951, 6; C. Sachs, History o f Musical Instruments, 1940, 110-12; H. Seidel, Horn und Trompete im alten Israel, WZ (der Karl Marx-Universitãt, Leipzig) 6, 1956/57, 589-99; O. R. Sellers, “Musical Instruments o f Israel,” BA 4, 1941, 42-43; D. G. Stradling e K. A. Kitchen, “Music and Musical Instruments,” IBD 2:1032, 1038-39; G. Wallis, “Musik, Musikinstrumente,” BHH 3, col.. 1258, Fig. 3; M. Wegner, Die Musikinstrumente des alten Orients, 1950,39; M. Weippert, “ 'Heiliger Krieg’ in Israel und Assyrien,” ZA W 84, 1972,486; “Musical Instruments,” E. Wemer, IDB 3 ,473a-74a, Fig. 88. Robert H. O 'Connell 69
pi® (# 8796)
pl® {swq I), hi. transbordar (somente em J1 2.24; 3.13 [4.13]); pol. conceder em abundância (somente no Sal mo 65.9 [10]) (# 8796). O vb. está relacionado com Hp® (sqh), beber ( -> #9197). 8796
pi®
AT O profeta Joel usou essa palavra incomum em sua mensagem a Judá primeiramente como parte de um cântico profético de encorajamento e depois em seu oráculo de julgamento contra as nações. Os tonéis transbordantes de vinho e a abundância de azeite são entendidos literalmente como promessas de Deus de abençoar a terra de Israel, que se encontrava destru ída pela praga de gafanhotos, quando Judá se arrependesse e voltasse para Javé (J1 2.12-17). 0 profeta relembra as bênçãos prometidas à nação e associadas à obediência à aliança (cf. Dt 28.1-14). O uso metafórico de “transbordar” em Joel 3.13 [4.13] encaixa-se perfeitamente com uma estrutura calculada composta de textos semelhantes encontrados em partes anteriores do livro (p. ex., os temas do dia do Senhor e da presença de Deus em Jerusalém). Em termos teo lógicos, o contraste entre as bênçãos abundantes de Javé sobre Judá e as maldições e julga mentos copiosos sobre as nações enfatiza a justiça de Deus como Senhor Soberano e confirma seu plano de restauração de Judá e Jerusalém de acordo com a aliança (3.17-21 [4.17-21]). A grave seca aliviada pela bênção das chuvas derramadas por Deus dá o contexto para a única outra ocorrência do radical swq no AT. O Salmo 65 costuma ser considerado um hino público de ação de graças por uma colheita abundante enquanto a comunidade israelita se reunia para cumprir os votos prometidos em oração, em tempos anteriores de angústia e privação. O “transbordamento” ou “abundância” da graça de Deus encontra-se relacionado aos “ribeiros de Deus” (65.9 [10]) ou ao canal através do qual Javé conduz, na forma de chuva, os oceanos de água doce dos céus até a terra seca. No entanto, ainda permanece uma controvérsia considerá vel quanto ao significado exato de tesõqeqehã\ Weiser (Psalms, 460-61) acompanha a LXX e traduz: “[tu] regas” (a partir de sqh). Dahood (Psalms 51-100, 114) equipara a forma com sôq, coxa, e traduz: “[tu] a fazes andar com jovialidade”. Abundância, multiplicação, suficiência: dgh (multiplicar, # 1835); -> day (suficiência, suprimento transbordante, # 1896); ysp (acrescentar, continuar, aumentar, # 3578); kbr 1 (fazer muitos, ter um suprimento abundante, # 3892); -> megammâ (totalidade, abundância, # 4480); rbb I (tomar-se numeroso, muito, grande, # 8045); -> rbh I (tomar-se numeroso, multiplicar, aumentar, # 8049); r ‘s II (ser abundante, # 8322); s g ’/sgh (tomar-se grande, aumentar, exaltar, # 8434 / 8436); sqp II (bastar, ser suficiente, # 8563); -> swq I (transbor dar, conceder em abundância, # 8796); -> sepa ‘ (superabundância, #9179) Andrew E. Hill
8797
pi®
pi® (sôq), coxa, perna (# 8797).
AT 1 .0 subs. refere-se tanto à coxa quanto à perna de uma pessoa (Dt 28.35; Jz 15.8) e, com mais freqüência, a essas partes de um animal oferecido como sacrifício. Quando é usado para animais, o termo sôq refere-se à coxa da perna traseira e não aos ombros das pernas dian teiras. A julgar pelo fato de que essa parte foi reservada para Samuel e Saul ( ISm 9.24), sôq devia ser considerada a came de mais excelente qualidade. 2. A expressão “a coxa da porção que foi movida (sôq hatterümâ)" — terümâ signif aquilo que foi separado ou consagrado — ocorre em Êxodo 29.27; Levítico 7.34; 10.14-15; Nm 6.20; 18.19. Nos sacrifícios pacíficos, a coxa direita, juntamente com o peito era as por 70
i? w (# 8798)
ções devidas ao sacerdote. A diferença entre o peito e a coxa é que o peito era dado a todos os sacerdotes (Lv 7.32), enquanto a coxa era dada somente ao sacerdote oficiante (Lv 7.32-33) em troca de seu trabalho (J. Milgrom, Leviticus 1-16, AB, 1991, 473-81). Perna, lombo, pé, coxa: -> behôn (polegar, dedão do pé, # 984); halãsayim (lombos, # 2743); -> yãrêk (coxa, perna, # 3751); -> kesel I (lombo, flanco / lado, # 4072); -> midrãk (pegada, # 4534); margelôt (lugar dos pés, # 5274); -> motnayim (lombos, quadris/ancas, # 5516); -> n a a / (sandália, # 5837); pahad II (coxa, # 7066); p a ‘am (pé, passo, tempo, # 7193); -> qarsõI (tomozelo, # 7972); -> rege/ (pé, # 8079); -> (coxa, perna, # 8797) Victor P. Hamilton
8798
pW
(süq), subs. rua (numa cidade pequena) (# 8798).
OMA O subs. é derivado de uma raiz verbal, swq, que nâo é usada no hebraico. Possivelmente atestado com relações semânticas incertas no ár. süq, mercado, acad. sãqu, tomar-se estreito, suqãqu, rua estreita, süqu, rua, e sir. sqq, viela estreita. Porém, o aram./sir. süqã’ significa rua, praça do mercado. AT O subs. ocorre 4x no AT e é usado apenas na poesia com referência a uma rua numa cidade pequena ou grande (Pv 7.8; Ec 12.4, 5). Sua forma pl. sewãqim é usada no Cântico dos cânticos 3.2 em par. com rehõb, praça da cidade (# 8148). P-B O subs. süq assumiu o significado de praça do mercado no heb. mixinaico. O heb. mo derno traz o vb. swq que, no grau pi., significa comercializar, colocar à venda. Cidade, vila, interior (região): /iii.j (área externa, rua, # 2575); hãsèr (recinto cercado, átrio, assentamento, aldeia, # 2958); kãpãr (aldeia, #4107); mãqôm (lugar, local, cidade pequena, lugar de habitação, lugar santo, # 5226); -> miqlãf (cidade de refugio, asilo, # 5236); -> 'ir I (cidade grande, cidade pequena, # 6551); -> p erãzôn (campo fértil, # 7251); -> qiryâ (cidade pequena, cidade grande, # 7953); -> r^hõb I (lugar amplo e aberto, praça pública, # 8148); süq (rua [numa cidade pequena], # 8798) B ib l io g r a f ia
M. H. Pope, Song ofSolomon, AB, 417. James D. Price
8800
Tlü
1VD (swr I), olhar fixamente, observar com atenção, ver (# 8800).
OMA Acad. surru(m), curvar-se. Não se sabe ao certo se a palavra é atestada no subs. ugar. drt, sonho, visão, ou sr (KTU 1. 191 II), olhar, cantar. AT 1 .0 vb. refere-se a um ato de perceber, de modo geral (Jó 33; 14) ou visualmente (Jó 7.8; 17.15; 24.15; 34.29; 35.14). Ao olhar de sua posição elevada, Balãao viu Israel (pelo me nos parcialmente) abaixo e percebeu que, como um grupo, Israel não podeia ser reputada entre 71
Tl®'(# 8801)
as nações (Nm 23.9). Em Números 24.17, Balaão viu uma figura indistinta, à qual o texto se refere misteriosamente na terceira pessoa apenas (aquele). 2. O vb. refere-se ao ato de fazer observações ao olhar atentamente. Eliú começa sua argumentação chamando Jó a atentar para os céus e as nuvens, símbolos da habitação sublime de Deus e da pessoa do próprio Deus (Jó 35.5). Nesse contexto, atentar é uma injunção pe dagógica; o estudante perceptivo da sabedoria diceme a verdade por meio da observação da natureza de modo a perceber qual é o significado teológico desses fenômenos. Os termos ttbl e r 'h, olhar, são usados como sinônimos paralelos nesse versículo (Habel, 491). 3. O vb. denota o ato de prestar atenção ou cuidar. Constitui parte da argumentação de Eliú que gira em tomo do desinteresse silencioso de Deus (Jó 35.13). De acordo com Eliú, os clamores dos oprimidos são apenas explosões fúteis de egoísmo; assim, usar Deus somente em momentos de dificuldade não passa de hipocrisia. Ainda que Jó afirme encontrar-se oprimido, não deve esperar resposta alguma para seus clamores inúteis. Deus fechou os olhos proposi tadamente para pessoas como Jó e não dará atenção ao seu caso. Jó entendeu mal a vigilância de Deus (Habel, 493). Oséias declara que o Senhor, que ouve a oração de Israel e, assim, salva essa nação, também se encontra sempre alerta, cuidando de seu povo (Os 14.8 [9]). 4. O vb. também é usado no sentido de ficar de tocaia. Em Jeremias 5.26, os homens perversos que ficam à espreita como aqueles que colocam armadilhas são um exemplo da classe constituída de indivíduos que não passam de parasitas da sociedade. O leopardo à espreita em Oséias 13.7 simboliza o Senhor, que aguarda atentamente (Wolff, 226). Olhar, observação, percepção, vista, visão, vigilância: hdh II (olhar fixamente para, apare cer, # 2526); -> hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); -> hmh (ver, espreitar, tomar-se visível, # 2778); -> nbf (olhar em volta, aceitar como favor, # 5564); -> pis II (observar, # 7143); -> íh ’í II (olhar para, # 7438); -> r 'h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); rsd (vigiar, # 8353); -> sq d (notar, # 8567); -> s ’h III (olhar atentamente, # 8617); sgh (olhar fixamente, fitar, # 8708); swr I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, # 8800); -> szp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); s'h (olhar, preocupar-se com, olhar em volta, # 9120); Sqp (olhar para baixo, # 9207); -> st' (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283) B ib l io g r a f ia
N. C. Habel, The Book ofJob, 1985; J. E. Hartley, The Book ofJoh, NICOT, 1988; D. Stuart, Hosea-Jonah, WBC, 1987; H. W. Wolff, Hosea, 1974. Jackie A. Naudé
8801
TI®
TI® (swr II), q. descer, caravana (part.) (# 8801).
AT Esse lexema é atestado 3x pelo HALAT (1346) tendo como significado “descer para” (Is 57.9; ARA: ir até), “descer de” (Ct 4.8; ARA: olhar para) ou (como part.) “caravana” (Ez 27.25). Em nenhum dos casos o termo possui um significado teológico, exceto, talvez, em Isaías 57.9, em que se faz referência a descer ao Seol, indicando a humilhação de Israel e não uma descida literal ( # 8619). Jornada, ida, m archa, caminhada, viagem: ’rh (estar a caminho, vagar, # 782); ’sr I (andar reto, # 886); -> drk (andar, marchar, # 2005); -> hlk (ir, caminhar, comportar-se, # 2143); zhl I (deslizar, # 2323); -> ’ (sair, apresentar-se, # 3655); -> yrd (abaixar, subir, descer, 72
Titf (# 8802)
# 3718); -> massa' (partida, U 5023); -> nht (descer marchando, descer, assentar, # 5737); -> s >i (andar com passos pesados, pisar, # 6008); -> ‘dh I (andar com passos largos, # 6334); ‘Ih (subir, ascender, erigir, # 6590); -> p.v' I (avançar, marchar, # 7314); -> .j ‘rf (pisar, marchar, # 7575); -> ívvr I (viajar, andar em caravana, # 8801) Eugene H. Merrill
li® 1(sôr), subs. boi, touro, vaca (# 8802). OMA O termo usado para boi existe em várias línguas sem.: srum no acad., tr no ugar. e taurã' no sir. (cf. ABD 6:1152). O mundo antigo reconhecia o valor do boi para o trabalho. De acordo com o registro de uma lei hit., um boi de arado valia doze siclos de prata, um touro valia dez siclos e uma vaca adulta, sete siclos (cf. ANET, 195, § 178; ABD 6:1130, em citação de material mais antigo). AT 1 .0 termo é uma subcategoria de bãqãr (gado, -> # 1330). Enquanto bãqãr é um termo coletivo, sôr refere-se a uma só cabeça de gado (cf. ABD 6:1152). Em alguns casos, porém, sôr é usado para um rebanho de gado (p. ex., Gn 32.5; Êx 22.30; Lv 7.23; ISm 14.34; 15.3; 22.19; Is 32.20). Empregado com esse sentido, sôr é sinônimo de bãqãr. O sentido genérico é mais ex plícito num par de palavras no qual sôr é contrastado com outros animais domésticos. Como no par de palavras $õ ’n übãqãr (ovelhas e gado), sôr por vezes aparece com rebanho (seh) ou com ovelhas como uma expressão de inclusão (p. ex., Êx 34.19, “de vacas e de ovelhas”; Lv 22.23; Dt 17.1, “novilhos”) e por vezes juntamente com jumentos (Ifimôr, p. ex., Gn 32.5; Dt 5.14); 2. sôr pode ser uma referência a bois ou a vacas (BDB 1004). Porém, o AT emprega o termo para referir-se, em primeiro lugar, a touros e novilhos, como se pode ver na referência a chifradas (Êx 21.28—36) e sacrifícios (p. ex., Lv 22.27; Nm 15.1; Dt 18.3; Jz 6.25; 2Sm 6.13; lRs 1.19, 25. Os 12.11). Somente algumas ocorrências referem-se obviamente à fêmea (p. ex., Êx 34.19; Lv 22.28). 3. O valor de sôr é considerado principalmente por seu uso para o trabalho (Dt 15.19; 22.10) e como alimento (p. ex.; Lv 14.4; 22.28). Ao contrário de par (touro), é relativamente raro sôr ser mencionado para sacrifícios. Trata-se, antes de tudo, de um animal de trabalho (Jz 6.25; cf. lRs 19.21). É fácil compreender a importância dos bois na agricultura antes da invenção das máquinas modernas. Eram essencias para arar e virar a terra a fim de obter-se uma boa colheita (Pv 14.4). P-B
Ver bãqãr (# 1330), P-B.
NT Um termo equivalente para sôr no NT é bons, usado para descrever um boi de tra balho (Lc 14.5, 19; ICo 9.9; ITm 5.18. No século I, o uso de bois na agricultura ainda era uma prática importante (cf. Lc 14.19) e continua sendo até hoje em muitos países menos desenvolvidos. Rebanho: bãqãr (gado, vacas, # 1330); -> 'egel ([touro] novilho, # 6319); 7228); -> sôr I (touro, boi, novilho, # 8802)
par (touro, #
B ib l io g r a f ia
ABD 5:870-86; 6:1129-30; IBD 1:254-55, 543-44, 724; 3:614; ISBE 1:623-25, 798; 3:624; NIDNTT 1:113-19; 2:410-14; TDNT 2:760-62; TDOT 2:6-20 (esp. 13-17), 209-16; TWOT 73
(# 8803)
1:121,124-25, 524; F. S. Bodenheimer, Animal and Man in Bible Lands, 1960; J. Feliks, Ani mal World o f the Bible, 1962; R. Pinney, Animais o f the Bible, 1964. Jejfrey S. Lu
8803
-nvr
71$ (sür I), parede (# 8803); ITJHP' (sürâ). muro de arrimo (# 8805).
OMA Existe um cognato no aram./sir., sür, muro. AT 1 .0 subs. sür ocorre 3x, todas elas em contextos poéticos. Em Gênesis 49.22, indica a parede de um terraço numa encosta. José é comparado a um potro selvagem numa colina com terraços. Em 2 Samuel 22.30 = Salmo 18.29 [30], Davi glorifica a Deus pela ajuda, que lhe permite escalar (ou saltar) uma muralha. As habilidades humanas extraordinárias são uma dádiva do Senhor. O aram. sür aparece em Esdras 4.12,13,16 na carta de Reum e Sinsai ao rei Artaxerxes, advertindo-o das sérias conseqüências que resultariam caso os judeus completassem a recons trução dos muros de Jerusalém. . sürâ, uma forma secundária de sür, tem como possível significado terraço e ocorre somente em Jó 24.11, na forma suf. plural. As montanhas estratificadas de calcário em Canaã criavam terraços naturais rústicos que, para um melhor aproveitamento, recebiam muros de arrimo de pedra ao longo das beiras de suas camadas expostas. Os israelitas expandiram con sideravelmente a prática dos cananeus de construir terraços para preservar a camada superior do solo e proporcionar terra adequada para a agricultura e horticultura simples nas encostas pedregosas.
2
M uro, amontoado de pedras: gdr (levantar um muro, # 1553); -> hômâ (muro, # 2570); -> hayü (muro frágil, # 2666); (irá (fileira de pedras, # 3227); kõtel (muro, # 4185); -> nêd (amontoado, muro, # 5603); -> qir (muro, # 7815); -> sür I (muro, # 8803) B ib l io g r a f ia
E. Klein, A Comprehensive Etymological Dictionary o f the Hebrew Language fo r Readers o f English, 1987; P. K. McCarter, Jr., 2 Samuel, AB 9,459,469; J. M. Myers, / a n d 2 Esdras, AB 14, 33; K. N. Schoville, “Fortification,” ISBE 2:346-54; E. A. Speiser, Genesis, AB 1,368; Y. Yadin, The Árt ofWarfare in Biblical Lands, 1963. Keith N. Schoville 8805 (sürâ, muro), -> # 8803
8806
T1W
■n íw (sôrèr), part. adversário, muitas vezes um adver sário pessoal ou um caluniador (# 8806).
OMA São sugeridos cognatos no acad. sãru, inimizade, e sâru, caluniador. AT O subs. é encontrado exclusivamente nos Salmos, em que ocorre 5x no sentido comum de inimigos humanos do indivíduo ( ‘y b; # 366). Assim, diante dos seus inimigos, o salmista 74
1TU? (# 8812)
ora, pedindo a misericórdia de Deus (SI 56.1 -2 [2-3]) e orientação para viver em retidão (27.11). O Salmo 54.5 [7] registra uma imprecação sobre os inimigos do salmista, enquanto o Salmo 59.10 [11] (cf. 92.11 [12]) apresenta a garantia de vitória final sobre eles. ( Animosidade: Teologia) Animosidade, inimizade, hostilidade: 'yb (ser um inimigo, # 366); -> $rr II (ser hostil, # 7675); s(m (odiar, # 8475); -> sãfãn (acusador, satanás, # 8477); -> in ’ (odiar, inimigo, # 8533); sôrêr (adversário, # 8806); -> Animosidade: Teologia Bruce Baloian
8812
IT®
*lW (szp), q. avistar, curtir, ressecar (# 8812).
AT 1.0 q. denota o ato de avistar. O falcão é louvado por sua visão, mas não pode equipararse à capacidade dos homens de penetrar as profundezas da terra; seus olhos não são capazes de avistá-las (Jó 28.7). Zofar retrata em pormenores a ruína do homem perverso: O olho que o vê não voltará a avistá-lo, ou seja, ele desocupará o lugar que lhe foi designado (Jó 20.9). 2. O q. também se encontra relacionado à aparência curtida/ressecada. No Cântico d cânticos 1.6, a amada descreve a cor de sua pele. Não havia conseguido cuidar da beleza como as mulheres do palácio, pois sua pele havia sido ressecada/avistada pelo sol (que poeticamente, é considerado como tendo olhos). P-B Na LR, o significado do vb., pretejar, é usado de modo figurado para denotar os efeitos contaminantes/poluentes da idolatria (Jastrow 2:1545). Olhar, observação, percepção, vista, visão, vigilância: hdh II (olhar fixamente para, apa recer, # 2526); -> hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); *> hmh I (ver, espreitar, tomar-se visível, # 2778); -> nbt (olhar em volta, aceitar como favor, # 5564); -> pis II (observar, # 7143); II (olhar para, # 7438); -> r 'h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); -> r$d (vigiar, # 8353); s q d (notar, # 8567); s ’h III (olhar atentamente, # 8617); -> sgh (olhar fixamente, fitar, # 8708); -> íw r I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, # 8800); -> szp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); -> s ‘h (olhar, preocupar-se com, olhar em volta, # 9120); sqp (olhar para baixo, # 9207); -> st ‘ (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283) B ib l io g r a f ia
G. Gerleman, Ruth: Das Hohelied, 1981; N. C. Habel, The Book o f Job, 1985. JackieA. Naudé 8814 {sah, olhos fitando o chão),
# 8820
in ® (shd), dar um presente (somente em Jó 6.22; Ez 16.33; # 8815); iniZ? (sõhad) subs. presente, suborno (# 8816). 7lró rtj??? (miqqah [de Iqh, receber] sõhad, aceitação de um suborno) é uma const. idiomática juntamente com sõhad. Essa expressão ocorre somente nas instruções de Josafá para os juizes recém-nomeados: “Agora, pois, seja o temor do Senhor convosco; tomai cuidado 8815
in ®
75
*lTtf (# 8815)
e fazei-o, porque não há no Senhor, nosso Deus, injustiça, nem parcialidade, nem aceita ele suborno (miqqah sõhad)'' (2Cr 19.7). OMA Ocorrem as seguintes formas cognatas: ugar. 'hd, apropriar-se; aca sahãdum, dar (palavra estrangeira can.; AHw, 1128); ár. sakada, dar; sir sehad, subornar, suhdã, suborno; aramE shd, suborno. No OMA, certas formas de suborno eram comuns em transações legais e comerciais (acad. sulmãnu/tãtu). Apesar de não haver nenhuma lei em escrita cuneiforme que proscreva o suborno, outros documentos do OMA indicam que se condenava o suborno de juizes para mudar um veredito (Finkelstein, 79-80). AT 1. A condenação do suborno pelo AT é fundamental para a exigência de Javé de que Israel praticasse a justiça/eqüidade. Em vinte e três ocorrências do subs. sõhad, Javé proíbe Israel de aceitar suborno uma vez que se trata de uma prática que corrompe a justiça (Êx 23.8; Dt 19; Pv 17.23), pois somente aqueles que recusam subornos entrarão na presença do Senhor (Is 33.15) e, sobretudo, porque o próprio Deus não aceita subornos (Dt 17.2; 2Cr 19.7; SI 15.5). O AT faz alusão a três casos específicos de suborno (ISm 8.3; lRs 15.19; 2Rs 16.8) e condena, em termos mais gerais, a prática de subornar alguém para assassinar outra pessoa (Dt 27.25; Sl, 26.10; Ez 22.12). 2. Duas das ocorrências no Deuteronômio são particularmente instrutivas. Um suborno cega os juizes de modo que os julgamentos das causas deixam de fazer justiça e ameaçam a vida e o futuro do povo de Deus (Dt 16.19). Talvez o uso mais impressionante e instrutivo de sõhad encontre-se em Deuteronômio 10.17-18, que descreve Javé como aquele que “não faz acepção de pessoas, nem aceita suborno; que faz justiça ao órfão e à viúva e ama o estrangeiro, dandolhe pão e vestes”. Esses vv. mostram claramente os alicerces da convicção de Israel de que os poderosos jamais devem permitir que o suborno influencie a execução da justiça. Aquele que pode ser manipulado pelo suborno confere ao lucro material a primazia sobre Deus; descon sidera, assim, as prioridades do próprio Deus — justiça, retidão, misericórdia e preocupação com os menos favorecidos e desamparados. Além disso, essa pessoa não deve jamais pensar que o Senhor pode ser subornado por meio dos presentes dela. 3. Nas duas primeiras ocorrências da forma verbal, Jó (6.22) declara aos seus amigos que não exigiu deles um presente para pagar uma dívida nem pediu que pagassem um suborno/ resgate (shd) para livrá-lo do domínio de um opressor. O profeta Ezequiel (Ez 16.33) condena Israel não apenas pela prostituição, mas por atrair amantes com subornos (em vez de receber pagamento como as outros prostitutas; ver 'etnan [# 924], nêdeh [# 5613] e nãdãn II [# 5621], todos termos que ocorrem em Ez 16.3334. A descrição da conduta de Israel que Ezequiel apresenta nessa passagem serve para enfati zar a severidade da traição do povo. Ao contrário de uma mulher adúltera, que pode dar como desculpa para a infidelidade o seu amor cego e, diferente da prostituta, que pode justificar seu estilo de vida com a necessidade econômica, a conduta de Israel não tem precedentes e qua se excede a compreensão. Em vez de buscar relações ilícitas por amor cego ou necessidade, Israel paga todos aqueles que vão para a cama consigo. O objeto evidente dessa repreensão profética é a propensão demonstrada por Israel de fazer alianças com nações estrangeiras em vez de confiar na força e proteção de Javé. Dentro do contexto da relação de aliança de Israel com Javé, a infidelidade daquele constituía uma traição ao pacto e era uma abominação diante de Javé (Ez 16.22, 36, 43). NT Aceitar suborno também significa negar a soberania de Deus em outro sentido: so mente a pessoa que não confia em Deus busca a segurança espiritual nos bens materiais. Os 76
nnu; (# 8820)
ensinamentos de Jesus apresentam os mesmos fundamentos acerca da soberania de Deus. Jesus diz: “Tende cuidado e guardai-vos de toda e qualquer avareza (pleonexia)\ porque a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui” (Lc 12.15). A palavra G pleonexia significa um desejo ávido por mais coisas — ganância, insaciabilidade ou cobiça. Mas Deus proverá diariamente àqueles que buscarem “em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça” (Mt 6.33; cf. 6.31-33 e i s 33.15-16). Suborno, presente: be$a"(pedaço de algo, lucro, suborno, # 1299); -> kõper IV (suborno, # 4411); skr III (barganhar, # 6128); shd (dar um presente, # 8815); salmõnim (pre sentes, # 8988) Presente: -> 'ahab (presentes de amor, talismã, # 172); zbd (conceder, # 2272); -> mgn I (entregar, # 4481); -> nãdãn II (presente, retribuições de amor, # 5621); -> ntn (dar, presentear, oferecer, # 5989); -> skr II (entregar, # 6127); .vty (dar, # 7381); -> i/ií/(dar um presente, # 8815): -> íay (dádiva, presente, # 8856); -> Salmõnim (presentes, # 8988) B ib l io g r a f ia
ISBE2:1166; NIDNTT 1:137-39; rD/Vr 6:266-74; 2:914; P. C. Craigie, The Book o f Deuteronomy, NICOT, 1976; J. finkelstein, “The Middle Assyrian Sulmânu-Texts” JAOS 72, 1952, 77-80; Y. Hochermann, “Does the Concept o f Bribery Have a Positive Side?” BethM 36, 1990-91,220-22. Michael A. Grisanti / J. Clinton McCann 8816 (sõhad, presente, suborno),# 8 8 15 8818 (Sehôr, fuligem, negrura, carvão), -> # 8837
nntí (íA/i), vb. q. encurvar, esconder-se, ser derrubado; ni. ser derrubado; hi. humilhar alguém, demolir; hitpol. ser desesperador (# 8820); nu> (sah) adj. humildes (olhos), ou seja, aquele que fita o chão (hapleg.; # 8814). 8820
nnu?'
OMA O HALAT cita os cognatos acad. sahãhu(m) debandar, minguar, declinar e *suhehunu (Amama e Nuzi), ser humilhado. Ver também o hwh II, adorar, curvar-se, fazer mesuras (# 2556). AT 1. No grau q. o vb. Shh refere-se a uma postura encurvada ou agachada. Essa postura é associada ao pranto do luto (SI 35.14; 38.6 [7]) e ao temor de Deus, daí o sentido de “esconderse” (Jó 9.13). O vb. refere-se á postura agachada de um leão (38.40). As vítimas dos perversos “caem” (SI 10.10). Como é o caso com spl, o termo shh no grau q. refere-se ao nivelamento de montes (“os outeiros etemos se abatem”, Hc. 3.6). O q. e o ni. (apesar de as formas poderem ser alomorfes de q.) referem-se a ser rebai xado, ou seja, humilhado: no julgamento, o povo será humilhado (Is 2.9 || 5.15), como também serão os arrogantes (Is 2.11, 17 )eo s perversos (Pv 14.19). A voz também pode ser rebaixada: Isaías diz que “do pó sairá tua fala” (Is 29.4). No hi., o vb. refere-se a Deus derrubando muros (Is 25.12) e humilhando pessoas (26.5). O vb. ocorre quatro vezes no hitpol. e, em cada caso, aparece com nepes, o próprio ser, a alma, como suj. (SI 42.5 [6], 6 [7], 11 [12]; 43.5), significando uma emoção de desespero. 77
VTW(# 8821)
2.0
adj. sah é atestado uma vez numa const. com 'ênayitn, olhos (um genitivo epexegé co). Elifaz refere-se a Deus salvando o “humilde” (lit., “olhar baixo” [respeitoso], Jó 22.29). P-B O vb. é atestado no q., tendo como significado principal arquear, curvar (Jastrow, 2:1546). Baixo, humilde, plano, nivelado: k r ‘ (agachar, acocorar-se, # 4156); -¥ 'n h ll (humilhar, oprimir, subjugar, # 6700); -> shh (encurvar, agachar, humilhar, # 8820); -> spl (ser baixo, nivelado, humilhar, rebaixar, # 9164) Humildade, aflição, miséria: k n ‘ (ser subjugado, ser humilhado, humilhar-se, # 4044); ‘nh II (aflito, humilde, afligir a alma, jejuar, oprimir, submeter, # 6700); -> $«' (ser modesto, humilde, # 7570); -> shh (curvar, agachar, humilhar, # 8820); -> íp / (ser baixo, ser nivelado, humilhar, rebaixar, # 9164) B ib l io g r a f ia
TWOT 2.9\4-\ 5. Gary Alan Long
unty (sht I), vb. q. abater (matar); ni. ser abatido (# 8821); nurttt? (saha(á), subs. ou const. q. inf. (o) abate (# 8823); n ü ’ni? (&hitâ), subst. abatido (# 8824). 8821
urra?
OMA I. O radical shté difícil de serdistinguido nas línguas semíticas. O BDB relaciona todas as ocorrências heb. sob um único radical (1006), mas o HALAT separa-os em dois radicais: Sht 1, abater, usado no q. e no ni. (ou seja, pass. do q.), e sh( II, martelar, bater, esmagar (HALAT 1352-54; Snaith, 244-46, explica que sh( I tem um “h suave” e que sht II tem um “h forte”; cf. sht em R. S. Tomback, A Comparative Semitic Lexicon o f the Phoenician and Punic Languages, SBLDS 32, 1978, 315). 2. O cognato acad. para o heb. sh( I é, sem dúvida, Sahãfu B, remover, esfolar, pelar, que por vezes é usado para o ato de esfolar um animal sacrificial (CAD §1, 92-95). No ugar., Sh(, na expressão km . s h t. Ihrkh (trad. “como um ‘matador’ ajoelhado” em CML 112,1. 24; cf. 113, 1. 35), parece ser o part. pass. do q. *sahút, significando abatido, descrevendo “um touro / novilho recém-abatido caindo de joelhos (cf. Ibrkh) como o primeiro passo num processo de expiração” (Margalit, 102; em oposição a Snaith, 245, que atribui isso a sht II e traduz essa fra se como “esmagar até fazer ajoelhar-se”. O ugar. msh{ parece confirmar um significado nessa linha para o radical: [w y‘uh]d. bvd .m sh (. bm .y m n . mhç, “ele (Baal) tomou um ‘matador’ na mão, um ‘golpeador’ na mão direita (para destruir Iam)” (CLA/42,1.39). Numa única inscrição neopúnica, íh t mw$l parece significar “uma faca (?) limpa” (R. S. Tomback, 315). 3. O ár. possui o vb. sahata, cortar a garganta, e um subs. correspondente, mashafu, garganta. Alguns estudiosos sugerem, portanto, que o heb. sh( significa cortar a garganta como o primeiro e principal passo no abate de animal de sacrifício (Snaith, 244-45; Milgrom, 1976, 14-15). Essa tem sido a interpretação rabínica há séculos (ver Mish. Hullin 1-3, Danby, 51318, esp. 513, n. 7). AT 1 .0 subs. í ehi(â, abatido, ocorre apenas uma vez: "Porque havia muitos na congregação que não se tinham santificado; pelo que os levitas estavam encarregados de imolar os cordei ros da Páscoa (lit., estavam sobre os abatidos)” (2Cr 30.17a). No AT, o animal costumava ser 78
VTW(# 8821)
abatido por aquele que levava a oferta. De acordo com o TM, por exemplo, Levítico 1.5 diz, “Ele (ou seja, o oferente) deve imolar o novilho perante o Senhor e, então, os filhos de Arão, os sacerdotes, devem levar o sangue e aspergi-lo no altar por todos os lados na entrada da tenda da congregação”. O oferente devia realizar o abate (cf. Mish. Huilin, 1.1; Danby, 513), mas os sacerdotes levavam o sangue e outras partes do animal até o altar (ou seja, somente os sacer dotes podiam ter contato direto com altar). Em 2 Crônicas 30.17, os adoradores não podiam realizar o abate em função de sua imundícia. Os levitas haviam se mostrado particularmente zelosos ao consagrarem-se em preparação para a Páscoa (cf. 29.34); assim, nessa ocasião as sumiram a tarefa de imolar os sacrifícios. A LXX traz, “eles” em vez de “ele” em Levítico 1.5, referindo-se, aparentemente, aos sacerdotes e/ou levitas. O shf ocorre 78x ou 79x na BH (BDB, 1006, diz 84x, mas inclui IRs 10.16, 17; lCr 9.15, 16; Jr 9.8 [7], que o HALAT coloca sob Shf II, martelar, bater, # 8822), dependendo da inclusão ou não de Oséias 5.2: v ^ s a ^ fâ sêtim he'míqú (“Na prática de excessos, vos aprofundastes”). Nesse caso, Sahatâ pode ser tanto um subs. fem. abstrato como um const. inf. do vb. q. Shf, abater (para este último, ver BDB, 1006, entre parênteses, e A. Even-Shoshan. A New Concordance o f the Old Testament, 2a. ed., 1989, 1130, porém com um ponto de interroga ção). De acordo com alguns estudiosos, Sahatá deve ser corrigido para v^sahat ha/bassiffim, “e a cova de Sitim (eles tomaram [ou ‘vós tomastes’] funda)” (ver p. ex. HALAT 1226 e nota textual no BHS). No entanto, essas emendas múltiplas da passagem não são aceitas por todos (ver Andersen e Freedman, 386). padrão geral de uso do vb. é esp. importante em contraste com o vb. zbh, abater (p um sacrifício de comunhão; # 2283). O contraste pode ser visto claramente ao se comparar o uso dos dois vbs. no livro de Levítico, no qual Shf é bastante usado com relação aos sacrifícios imolados (33x; ver, p. ex., Lv 1.5, o holocausto; 3.2, o sacrifício pacífico; 4.4, o sacrifício pelo pecado e 7.2, o sacrifício pela culpa; ver também o vb. ni. 2x em 6.25 [ 18]), enquanto o vb zbh ocorre apenas 8x (9.4; 17.5 [2x], 7; 19.5 [2x]; 22.29 [2x]), todas elas em relação ao sacrifício pacífico (o mesmo acontece com todas as ocorrências do subs. zebah em Levítico). Portanto, Shf é a palavra comum usada para o abate em si de um animal de sacrifício (ver OMA, seção 2, para uma proposta referente à forma de abate pretendida). Isso indica que o radical zbh refere-se não tanto ao abate, mas sim ao tipo de sacrifício sendo realizado — um animal abatido como mizbêah selãmim, sacrifício de oferta(s) pacífica(s) ( -> zbh # 2283). 3. O vb. shf também é usado quando se refere a um sacrifício ilícito. Ver, por exemplo, Isaías 66.3: “O que imola (sht) um boi é como o que comete homicídio; o que sacrifica (zbh) um cordeiro, como o que quebra o pescoço a um cão; o que oferece uma oblação, como o que oferece sangue de porco; o que queima incenso, como o que bendiz a um ídolo”. Em outros casos, o mesmo vb. é usado para referir-se à imolação de animais para alimento, o abate sim ples, sem cunho religioso: “e, lançando-se ao despojo, tomaram ovelhas, bois e bezerros, e os mataram no chão, e os comeram com sangue” (ISm 14.32; ver também v. 34; Is 22.13 e o vb. ni. em Nm 11.22; cf. Lv 17.3). Em Gênesis 37.31, os irmãos de José abateram um bode somente pelo sangue e não para usá-lo como alimento. 4. Em várias ocasiões, shf é usado para homicídio, quer como um ato de guerra (Jz 12.6), como sacrifício humano ao Senhor (Gn 22.10; ou seja, a expectativa do sacrifício de Isaque) ou como sacrifício de uma criança para falsos deuses (Ez 16.20-21; 23.39; cf. também Is 57.5).
2.0
P-B 1.0 vb. shf ocorre 4x nos MMM, todas elas no Papiro do Templo de Qumran, todas com referência ao abate de animais durante festas: a. o touro usado como sacrifício pelo pecado na ordenação dos sacerdotes (11QT 16:1; cf. Lv 8.14-17; ver Yadim 2:67 para o texto e 1:95-96 para as particularidades dos procedimentos de ordenação de acordo com o papiro); b. certos 79
üntf (# 8822)
animais nas festas anuais de azeite e madeira (11QT 22:4 e 23:11; ver Yadim 2:99 e 105 para o texto e 1:108-24 para comentários sobre essas festas peculiares) e c. o bode imolado para sacrifício pelo pecado no Dia da Expiação (11 QT 26:5, cf. Lv 16.15-19; ver Yadin 2:116). 2. Como foi observado acima, o Mix. Hullin 1-3 desenvolve as regras rabínicas par abate correto de um animal. Essas regras ainda são seguidas nos dias de hoje no abate coxer (limpo) de animais para judeus ortodoxos. NT A LXX usa principalmente sphaçõ, imolar, abater, como tradução para o heb. sht. Esse vb. ocorre 9x no NT. Refere-se a Caim ter assassinado o irmão (IJo 3.12), ao assassínio de multidões durante o período de tribulação (Ap 6.4), ao martírio de santos ao longo da história e no dia da vinda do Senhor (Ap 18.24 e 6.9, respectivamente). Mais importantes, porém, são as quatro referências a Jesus: “Digno é o Cordeiro, que foi morto” (5.12; ver também 5.6, 9; 13.8). Essas últimas passagens podem ter como contexto a imolação do cordeiro pascal do AT (ver Ex 12.6), apesar de ser igualmente possível tratar-se de uma referência a Isaías 53.7 ( -> asãm, sacrifício pela culpa. # 871). Oferta, sacrifício: azkârâ (oferta memorial, # 260); -> 'iíSeh (oferta queimada, # 852); 'ãsãm (oferta pela culpa, # 871); -> zbh (abater, sacrificar, # 2284); -> hattã'at (oferta pelo pecado, # 2633); (bh (matar, # 3180); -> minhei (presente, dádiva, oferta, sacrifício, # 4966); -> ma ‘asêr (dízimo, # 5130); -> ndr (fazer um voto, # 5623); nwp I (mover-se para frente e para trás, balançar, # 5677); -> nsk 1 (derramar, ser consagrado, libação, # 5818); ‘ô/á (holocausto, # 6592); ‘arísã (oferta de manjares, # 6881); qorbãn (oferta, presente, # 7933); sht 1 (imolar, # 8821); -> selem (oferta pacífica, # 8968); -> tãmid (oferta regular, # 9458); -> firiimâ (tributo, contribuição, # 9556); Arão: Teologia; O ferta: Teologia; Sacerdotes e Levitas: Teologia B ib l io g r a f ia
7'ífS47’7:1214-18; F. 1. Andersene D. N. Freedman, Hosea, AB, 1980; H. Danby, The Mishnah, 1933; J. E. Hartley, Leviticus, WBC, 1992; B. A. Levine, Leviticus, The JPS Torah Commen tary, 1989; B. Margalit, “Lexicographical Notes on lhe AQHTE$\c (Part I: KTU 1.17-18), UF 15, 1983, 65-103; J. Milgrom, Leviticus 1-16, AB, 1991; idem, “ Profane Slaughter and a Formulaic Key to the Composition o f Deuteronomy,” HUCA 47, 1976, 1-17; N. H. Snaith, “The Verbs zãbah and sãha(,” VT25, 1975, 242-46; J. -M. de Tarragon, Le Culte à Ugarit, 1980; Y. Yadin, The Temple Scroll, vols. 1-2, 1983. Richard E. Averbeck
8822
vm f
urra? (Sh( II), q. fundido (# 8822).
OMA O ni. de sh( é encontrado nos papiros aram. num contrato de casamento, referindo-se a manto de lã tecida finamente (AP 15.10). Outra sugestão é de um manto com franjas. Trata-se provavelmente de um termo comercial derivado da linguagem dos comerciantes fenícios. O ár. sahata significa diluir vinho em água. AT O vb. aparece como um q. pass. descrevendo o ouro dos escudos feitos por Salomão (1 Rs 10.16-17; 2Cr 9.15-16). O G o traduz com o termo elatos, batido ou martelado; Gray supõe que existe uma metátese e que o radical deve serí/if, que significa ouro espalhado numa camada fina. Os papiros aram., no entanto, indicam que o termo poderia ter o significado de uma cobertura 80
rrnpf (# 8825)
fina. Tomando-se por base o aram., o sentido poderia ser o de uma diluição do ouro, ou seja, al gum tipo de liga metálica, mas não fica claro de que modo isso valorizaria os tesouros. As vrs. parecem dar um sentido técnico ao termo, considerando-o como ouro batido de modo a formar uma lâmina fina. Em Jeremias 9.8 [7], o adj. para flecha pode ser lido como o K swht, mortífera, ou como o Q shw(, afiada, pois os dois fazem sentido; a LXX e a Vg. seguem o ketiv. P-B fino.
O Talm. explica 1 Reis 10.17 como ouro espalhado feito cera, ou seja, ouro batido muito
Metais: -> 'anãk(chumbo, # 643); -> bed il(escória, #974); -> barzel(ferro, # 1366); zãhãb (ouro, # 2298); hei ’á 1 (ferrugem, # 2689); -> hasmal (brilho?, eletro, metal brilhante, # 3133); -> kesep (prata, dinheiro, # 4084); -> masgêr II (ferreiro, # 4994); -> m a ‘abeh (fundi ção, # 5043); nehõset I (cobre, bronze, # 5733); j/g (óxido de chumbo, # 6092); -> jêper II (bronze, chapa, # 6220); -> 'õperet (chumbo, # 6769); -> pah II (lâmina fina, # 7063); p elãdõt (aço?, # 7110); -> $ h t III (fundir [metal], # 7445); -> $a‘a$u‘im (objetos formados por uma cobertura de metal, # 7589); í/j/i II (arrumar, revestir, folhear, esmaltar, # 7596); -> jrp (derreter, fundir, refinar, # 7671); -> qãlãt (metal polido, # 7838); sht II (misturar metais [formar uma liga], # 8822) B ib l io g r a f ia
J. Gray, / á II Kings, OTL, 1963, 246-47; G. H. Jones, I a n d 2 Kings, NCBC, 1984. A. H. Konkel 8823 (sahatâ, abate), -» # 8821 8824 (selfi(â, abate), -> # 8821
8825
1’n®
pn® (ãehín), úlcera (# 8825).
OMA Esse termo geralmente denotava uma infecção cutânea por estafilococo que produzia bolhas (furúnculos e carbúnculos). Caso não seja tratada, a área ao redor de um folículo de pele produz uma supuração e necrose do centro desse folículo, um problema que pode ser con trolado com o uso de cataplasmas (2Rs 20.7; Is 38.21). As úlceras foram o castigo da terceira praga do Egito (Êx 9.9-11) e estão incluídas nas leis de higiene do Pent. (Lv 13.18-20,23). As úlceras do Egito e a úlceras incuráveis (Dt 28.27, 35) podem muito bem ser uma referência à varíola, uma doença aguda que começa com uma febre alta, seguida de cerca de cinco dias de erupções inicialmente na forma de pápulas (elevação cutânea contendo pus). Há vários tipos de varíola, e geralmente são fatais. Outro diagnóstico de conseqüências igualmente graves é o antraz cutâneo (carbúnculo), contraído de animais infectados com o Bacillus anthracis. Tam bém existem diversos tipos de antraz, mas a forma cutânea segue o padrão geral da varíola. É difícil diagnosticar qual tenha sido a aflição imposta a Jó como parte da provação de sua fé (Jó 2.7) e não como um castigo. No entanto, as opiniões modernas parecem ser favoráveis a uma típica reação alérgica que desapareceu quando seus enormes conflitos emocionais e espirituais foram resolvidos. Enferm idade — bolha, úlcera, doença cutânea, ferida: -> ’a b a ‘bu'õt (bolhas, # 8 1 ); bõhaq (problema de pele, # 993); -> baheret (mancha branca na pele, # 994); gãrãb (erupção 81
r©nç?(# 8831)
supurada, # 1734); -> zrr 1 (comprimir [feridas], # 2452); -> Ziere.ç I (coceira, # 3063); yaòfte/eí (verruga?, # 3301); -> yallepet (doença cutânea, # 3539); -> y^raqraq (mancha, # 3768); ktwiyya (cicatriz, # 3918); -> rn ’r (ficar dolorido, # 4421); -> mãzôr I (úlcera, # 4649); makkà (pancada, # 4804); mispahat (erupção cutânea, # 5030); mrh (esfregar, polir, # 5302); -> neteq (infecção do couro cabeludo, # 599); -> sappahat (doença capilar, # 6204); -> ‘õpel I (abscesso, # 6754); as II (pus, # 6932); -> íã/;á (pus?, # 7597); -> çarebet (cicatriz, # 7648); -> ,yr‘ (sofrer de uma doença cutânea, # 7665); eí II (inchaço, # 8421); -> .v/r (irromper [tumor], # 8609); -> (úlcera, # 8825) Para verbetes relacionados hlh I (enfraquecer, cansar-se, adoecer, # 2703) B ib l io g r a f ia
/S 5£ 1:532, 953-60; 3:103-06; J. Milgrom, Leviticus 1-16, 787; G. J. Wenham, The Book o f Leviticus, NICOT, 1979, 189-214. R. K. Harrison 8827 {sehit, cova),
# 7074
8828 (sahal, filhote de leão),
# 787
8829 (siffêlet, ônix, ingredientes de incenso), -> # 7787 8830 (sahap, gaivota),
_____ _
# 7606
" nsn®’ (sahepet), subs. (indeterminado) enfermidade ___________ ! W _____ (# 8831).
AT Mencionada somente em Levítico 26.16 e Deuteronômio 28.22, era prometida como castigo para os israelitas se quebrassem o acordo da aliança. A natureza da enfermidade é des conhecida, daí a sugestão de palavras como “tísica” ser de caráter estritamente conjectural. Doença — febre, enfermidade, debilidade: 'ns I (não ter boa saúde, # 653); -> dwb (con sumir-se, # 1853); -> dalleqet (febre, # 1945); zôb (expelir, # 2308); W’ (cair doente, # 2688); -> W/í I (enfraquecer, cansar-se, adoecer, # 2703); -> harhur (calor da febre, # 3031); -> madeweh II (doença, # 4504); pí/» (contagiar, # 7313); qaddahat (febre, # 7707); sahepet (enfermidade, # 8831). Para verbetes relacionados -> .yr' (sofrer de doença cutânea, # 7665). B ib l io g r a f ia
/Sfl£ 1:532, 953-60; 3:103-06; G. J. Wenham, The Book o f Leviticus, NICOT, 1979, 189-214. R. K. Harrison
8832
rnrç
(sahaç), subs. orgulho (# 8832).
OMA No aram., esse radical significa orgulhoso, no et., ser insolente, e no ár., elevar-se, ser elevado, ser uma pessoa de classe elevada. 82
pTW' (# 8835)
AT Em Jó 28.8, esse radical refere-se às feras majestosas, como os leões. Em Jó 41.34 [26], o Senhor retrata a humanidade como sendo orgulhosa mas, por ironia, impotente diante do Leviatã (crocodilo) e portanto, impotente na presença do Criador. Arrogância, orgulho, presunção: g ’h (elevar-se, ser exaltado, # 1448); zyd (agir com presunção, preparar comida, # 2326); -> yãhir (altivo, # 3400); -> sll (levantar, exaltar, #6148); -> 'pl (inchar, levantar, # 6752); -> 'ãtãq (velho, arrogante, # 6981); phz (ser temerário, arro gante, # 7069); -> rwm (ser elevado, exaltado, orgulhoso, # 8123); ía/iay (orgulho, # 8832) Gary K Smith
8835
pn®
pn® (shq), q. moer, desgastar (# 8835); -> pO® (sahaq), poeira, nuvem ( # 8836).
OMA O termo acad. relacionado, Sêqu(m), é traduzido como “aplainar [cereal num recipiente de medida], alisar [o barro com as mãos]”, enquanto a versão do termo cognato em sir. é “pul verizar” e no ár. “esmagar, triturar” {HALAT 1357b; cf. KB 9616). AT O vb. shq é usado para a prática de moer incenso até formar um pó (Ex 30.36), para a água desgastando pedras (Jó 14.16) e para o desgaste da soleira da porta (Ecli 6.36). Em ter mos figurativos, esse vb. (com o subs. poeira) é usado para retratar a subjugação completa de inimigos, “Então, os moí (shq) como o pó da terra; esmaguei-os (dqq) e, como a lama das ruas, os amassei” (2Sm 22.43; par. SI 18.42 [43]). Golpe, esmagamento, trituração: -> /)'/ (dar pontapés, coices, pisar, # 1246); -> dwk (es murrar, # 1870); dk ’ (esmagar, ser esmagado, # 1917); dkh (ser esmagado, # 1920); -> dqq (esmagar, # 1990); -> hlm (bater, # 2150); -> hbt (debulhar, bater, malhar, # 2468); -> thn (moer, triturar, # 3221); fai (triturar. # 4197); -> Aí/ (pulverizar, moer, destroçar, # 4198); w/íí (despedaçar, # 4731); m ’k (pressionar, apertar, esmagar, # 5080); -> ngp (golpear, # 5597); nk'(ser chicoteado, açoiatado, flagelado, # 5777); -> nkh (ser atingido, golpeado, arruinado, destruído, # 5782); 1 (ligar, amarrar, # 7674); -> r ‘$ (abater, # 8320); r.yy (esmagar, amassar, quebrar, # 8368); íwp I (esmagar, # 8789); (triturar, # 8835) Cornelius Van Dam
8836
pn®
pn® (sahaq), subs., poeira, nuvens de poeira (# 8836).
OMA O heb. sahaq possui uma relação etimológica com o ár. sahq, usado para falar de um tecido puído ao qual as nuvens finas se assemelham.
AT 1. Essa palavra é usada 21 x no AT. Em mais de metade dos casos, sahaq denota nuvens no céu (Jó 35.5; 38.37; Pv 8.28) ou é um sinônimo para os céus (Jó 37. 18; SI 36.5 [6]). A chu va, o orvalho e até mesmo a justiça vêm das nuvens (Jó 36.28; Pv 3.20; Is 45.8). 2. Em três ocasiões, a aparição de Deus está relacionada com as nuvens. Ele cava sobre as nuvens (Dt 33.26), as nuvens escuras de chuva são um pavilhão ao redor dele (2Sm 22.12) e “Do resplendor da sua presença saíram, pelas suas espessas nuvens, saraiva e brasas de fogo” (SI 18.12). 83
i n tf (# 8837)
3. Em uma passagem, as nações são consideradas um grão de pó na balança (Is 40.15). Poeira, barro, terra, terra solta: 'ãbãq (poeira, # 85); -> 'êper (cinzas, terra solta, # 709); -> hõmer II (lama, barro, argamassa, # 2817); -> tit (lama, lodo, barro, # 3226); -> (np (sujar, # 3245); -> 'pr (empoeirar, # 6759); -> rõ è a ' II (poeira, lixo, # 8066); regei» (torrões de terra, # 8073); í^Aôr (fuligem, negridão, # 8818); -> íaAaiy (poeira, nuvens de poeira, # 8836) Nuvem: -> hãzíz (nuvem, vento forte, estampido de trovão, # 2613); miplãs (expansão [de uma nuvem], # 5146); Vò (nublar, # 6380); -> 'ãnãn (nuvens, # 6727); 'arãpel (escu ridão profunda, trevas espessas, nuvem carregada, # 6906); -> ía/iac/ (poeira, nuvens de po eira, # 8836) /fo>’ E. Hayden
■7ITO (.ç/ir I), q. ser preto (# 8837); TÍmp (sehôr), subs. fuligem/negridão/carvão (# 8818); "rnu? (íahõr), preto (# 8839); nnr]U?' (saharüt), pretidão ( -> # 8841); lÍTrnip' (Seharhõr), escuro (# 8842). Pela definição de Brenner, o preto é uma cor primária (49-105), com uma série de especificações que vai do escuro ao negro, corno a cor de um corvo (Ct 5.11). 8837
OMA São encontrados cognatos no acad., aram. e siríaco. AT
1 .0 vb. ocorre somente uma vez: “Enegrecida se me cai a pele” (Jó 30.30). 2. A palavra sahõr ocorre 6x: Levítico 13 (2x), descrevendo pêlos saudáveis que crescem numa região de pele suspeita de doença (vv. 31,37); Zacarias, descrevendo o segundo cavalo (6.2, 6), e Cântico dos cânticos (2x). No último caso, a donzela descreve a si mesma (1.5) e o cabelo de seu amado (5.11) como sendo escuros. 3. A cor secundária seharhõr (escuro) é um hapleg. no Cântico dos cânticos (1.6), em que a sulamita diz: “Não olheis para o eu estar morena”. A palavra não denota raça, mas sim a pele escura resultante de viver ao ar livre (Brenner, 121). 4. O subs. masc. (ieAôr) aparece somente em Lamentações 4.8, em que o escritor re trata o rosto dos príncipes de Jerusalém depois de terem sido capturados: “escureceu-se-lhes o aspecto mais do que a fuligem”. 5 .0 subs. saharüt aparece somente em Eclesiastes 11.10 (traduzido como “juventude e refere-se ao cabelo escuro dos jovens vis-à-vis com o cabelo grisalho dos anciãos. Cores — Preto / M arrom:
húm (marrom, # 2569); -> shr I (ser preto, # 8837)
B ib l io g r a f ia
A. Brenner, Colour Terms in lhe Old Testament, JSOT, 1982; R. Grandwohl, Die Farben im Alten Testament, BZAW 83, 1963; W. D. McHArdy, “The Horses in Zechariah,” BZAW 103, 1968, 174-79. Robert L. Alden
8838 84
irm>
in ^ ' (shr II), q., pi. procurar, perguntar por (# 8838).
i n t f (tf 8838)
OMA O lexema é atestado nas principais línguas semíticas. No acad. sahãru(m), procurar, voltar-se para, rodear (AHw 1005-6); no mand. shr, buscar, investigar (MdD, 451). Também há a ocorrência do subs. no AAS shr, proteção mágica (?) (Biella, Dictionary, 504), daí a idéia de encantar ou encantamento (BDB, 1007). AT O lexema ocorre 13x no AT: 12x no pi. e lx no q. Não ocorre nas partes de prosa do AT. Assim, shr, procurar, pode ser uma palavra poética. 1. Sintaxe com o ac. duplo. Na construção de Provérbios 13.24, ’õhahô siharô musãr, com o ac. duplo, a oração é traduzida de duas formas: (1) “aquele que o ama procura-o com repreensão ou repreende-o cedo/nas horas de dormir” (HALAT 4:1359; cf. Driver, 174); (2) “aquele que o ama procura (ou seja, prepara cuidadosamente, por assim dizer) repreensão para ele”. Na segunda tr., o suf. do vb. shr é considerado dativo (Gesenius’Hebrew and Chaldee Lexicon, 1950, 815). 2. Sinônimos co-locativos. No AT, há três verbos empregados de maneira sinônima e par. a shr: 'wh I, querer, almejar (#203), lx (Is 26.9); bqs (procurar, tf 1335), 2x (Pv 11.27. Os 5.15); drs (buscar, # 2011), 2x (SI 78.34; Pv 11.27). 3. Uso geral. O vb. shr é usado 3x com o sentido geral de procurar (shr) comida, como fazem os asnos no deserto; buscar a presença de alguém, como faz a prostituta ao seduzir um rapaz (Pv 7.15) e buscar diligentemente (shr) o bem, como no caso do sábio que alcança (drs, lit. procura) favor (Pv 11.27). Ou seja, aquele que se esforça por aquilo que é bom recebe apro vação pública (McKane, 434). 4. Uso teológico. Em termos teológicos, o radical shr é empregado no AT com relação a Deus. a. Deus como objeto da procura. Na maioria das vezes, o objeto da procura é Deus: Jó 8.5; SI 63.1 [2]; 78.34; Is 26.9; Os 5.15. Dessas passagens, quatro declaram que alguém busca ao Senhor com fervor, procurando sua misericórdia num momento de aflição (Jó 8.5; SI 63.1 [2]; 78.34; Os 5.15). Em Isaías 26.9, o adorador simplesmente declara que seu ser deseja (“pro cura”) diligentemente a comunhão com Deus. Nessa passagem, shr deve ser entendido como um desejo intenso, que é par. de modo sinônimo com o vb. 'wh, almejar. b. Deus como sujeito da procura. Tal situação ocorre apenas uma vez e com sentido não figurativo (Jó 7.21). Ao falar sobre sua morte, Jó diz a Deus: “e, se me buscas, já não se rei” (Jó 7.21). c. A sabedoria como objeto da procura. Buscar (shr) sabedoria é par. de modo sinôni mo com preferir (bhr II, tf 1048) o temor de Deus (Pv 1.28, 29). A sabedoria pode ser obtida ao ser buscada diligentemente (shr) (8.17). O resultado é uma vida justa de aptidão moral e ética (8.20). Procura: -> bqs (procurar, encontrar, buscar, requerer, desejar, # 1335); drs (preocupar-se com, perguntar, procurar, # 2011); hpr I (cavar, buscar, tf 2916), -> shr II (procurar, per guntar por, # 8838) B ib l io g r a f ia
G. R. Driver, "Hebrew Notes on Prophets and Proverbs,” JTS 41, 1940, 162-75; W. McKane, Proverbs: A NewApproach, 1970; J. A. Motyer, The Prophecy o f Isaiah: Introduction and Com mentary, 1993; G. von Rad, Wisdom in Israel, 1972; R. N. Whybray, Proverbs, NCB, 1994. Chitra Chhetri 8839 (sâhõr, preto),
tf 8837 85
W
(# 8840)
8840
in ®
10
® (sahar), subs. crepúsculo antes do amanhecer, pe ríodo imediatamente anterior ao nascer do sol, aurora
(# 8840). OMA O subs. é adequadamente atestado, sendo encontrado no ugar. shrí acad. sê/irtu(m), manhã, alvorada, amanhecer; ár. sahar, aurora, amanhecer, cedo pela manhã. AT O subs. ocorre 24x. E usado muitas vezes em conjunto com um vb.: b q ' no ni. (Is 58.8); dmh no ni. (Os 1 0 .1 5 ) ;^ ' no pi. (Jó 38.12), ’itr no hi. (SI 57.8 [9]; par. 108.2 [3]); ‘lh no q. (Gn 19.15; 32.24 [25], 26 [27]; Js 6.15; Jz 19.25; ISm 9.26; Ne 4.21 [15]; Jn 4.7); ‘sh no q. (Am 4.13); prs no q. (J1 2.2); sqp no ni. (Ct 6.10). 1. Em várias ocasiões, acontecimentos importantes ocorreram ao amanhecer, mais pre cisamente, durante o breve momento que antecede a aurora (ver Childs, 70, n. 1), ou seja, o crepúsculo antes do amanhecer (cf. Andersen e Freedman, 424). Era costume, tanto entre os hebreus quanto entre os árabes, atacar uma cidade durante a noite ou bem cedo pela manhã (Cooke, 46), e foi ao amanhecer do sétimo dia que o povo levantou-se para marchar ao redor de Jericó (Js 6.15). Diante da forte oposição dos adversários, aqueles que estavam reconstruindo os muros de Jerusalém durante o governo de Neemias estendiam o dia normal de trabalho (do nascer ao pôr-do-sol; cf. Dt 24.15), começando a tarefa de reconstrução a cada dia no período que antecedia o amanhecer e continuando até que aparecessem as estrelas (Ne 4.21 [15]; cf. Clines, 1984, 164). O breve crepúsculo antes do amanhecer era considerado um momento místico no qual Deus respondia às preces de um suplicante (Dahood, 1973, 54-55; Andersen e Freedman, 424). Também era associado à atuação de Deus, tanto do tipo que revigora as esperanças, traz cura e renovação (p. ex., Os 6.3, em que a intervenção de Deus é considerada tão previsível e certa quan to a chegada do amanhecer), quanto do tipo que traz julgamento, destruição e/ou morte (p. ex. Gn 19.15-29; Os 10.15; Jn 4.7). A destruição de Sodoma e Gomorra por Javé estava marcada para ocorrer ao nascer do sol. No crepúsculo antes do amanhecer daquele dia fatídico, Ló — um homem indeciso e fraco, que ao longo de Gênesis 19 é retratado como sendo um tanto fanfarrão (ver Coats, 143-46) — demorou-se demais, e os dois visitantes celestes tiveram que tomá-lo jun tamente com a esposa e as duas filhas e arrastá-los para fora da cidade condenada (vv. 15-16). O v. 15 parece indicar que havia sido determinado um momento exato (provavelmente o nascer do sol) para a destruição (Bennett, 220; Skinner, 1969,308; Speiser, 143; Westermann, 303). A efi cácia da narração se deve, em grande parte, à maneira como o leitor é transportado ao momento do dia em questão, o suspense do amanhecer iminente (von Rad, 219-20; cf. Westerman, 303). De acordo com Westermann (305-6), as histórias dos patriarcas não possuem um retrato da natureza. As referências ao amanhecer (Gn 19.15) e ao sol nascendo sobre a terra (Gn 19.23) são pura mente funcionais, dividindo o decurso dos acontecimentos de maneira a criar tensão dramática. 2. Ao amanhecer, os espíritos e demônios começam a perder o poder. Considerada por alguns (ver R. Davidson, 1979, 184) a mais estranha e desconcertante narrativa de todo o AT, Gênesis 32.22-32 [23-33] é uma passagem antiga complicada, misteriosa e enigmática com vá rios significados (Tucker, 41-54; cf. Murphy, 33-34). Um propósito importante que essa passa gem cumpre é mostrar como num (outro) estádio crítico de sua vida, Jacó recebeu a última lição que quebrou sua obstinação e convenceu-o de que a bênção de Deus não era algo a ser tomado, mas sim recebido como uma dádiva pela graça (Peake, 1920, 160). O combatente divino, que lutou com Jacó no vau de Jaboque, devia partir antes do nascer do sol (vv. 24 [25], 26 [27]). Diz-se que aqui, sahar ressalta o caráter de Jacó: a meia-luz e escuridão do sahar espelham a combinação de piedade e impiedade de Jacó (Geller, 55; Hamilton, 332). 86
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No entanto, essa característica de desaparecer antes do nascer do sol é um dos vários temas que a história possui em comum com mitos e folclore (ver von Rad, 321; Coats, 229; Kselman, 107; Westermann, 517-18), e provavelmente indica a antiguidade da narrativa ori ginal. Existe uma crença primitiva, e amplamente aceita, de que os deuses ou demônios da noite devem partir antes do sol nascer (ver Peake, 1920, 160; Tucker, 47). Essa história da luta heróica de um homem determinado e de força extraordinária contra um poder sobre-humano é paralela às sagas de heróis de outras culturas (ver Tucker, 47). Kiine (105; cf. Hamilton, 332) afirma que a ansiedade do anjo em partir antes do nascer do sol era motivada pela preocupa ção de que Jacó morreria se contemplasse a face de Deus quando esta não se encontrasse mais encoberta pela escuridão (cf. Êx 33.20; Jz 6.22-23; 13.22). Brueggemann (267, 272) acredita que o retrato do nêmesis noturno inescrutável de Jacó é intencionalmente obscuro, mas consi dera absolutamente plausível que essa figura oculta fosse Javé, tendo presentes ainda traços de Esaú. Essa identificação é apoiada por Gn 32.30 [31], que sugere que o adversário de Jacó era Deus (cf. Os 12.3-4 [4-5]), e por Êxodo 4.24-26, que descreve como Deus atacou e procurou destruir Moisés, mas foi detido pela execução de um ritual no momento oportuno. Westerman (519, 521), argumenta com firmeza que Gênesis 32.30 [31] não dá funda mento suficiente para entender-se a narrativa em sua totalidade como um encontro entre Deus e Jacó. Prossegue dizendo que o atacante não é Deus, mas sim um demônio hostil do rio que deseja impedir Jacó de atravessar. Vários estudiosos (ver Peake, 1920,160) afirmam que, pelo menos na forma original da história, o antagonista sobrenatural era uma divindade local, pos sivelmente o deus cananeu El (ver Herbert, 106; Marks, 24) ou o deus do rio Jaboque, tentanto evitar que Jacó entrasse na terra prometida (no v. 24 [25] wayyê’ãbêq, lutava com ele, é um termo incomum que possui assonància com Jaboque; cf. Peake, 1920, 160; Simpson, 722-23). Há exemplos de outras culturas de divindades que guardam rios e que procuram matar qual quer um que tente atravessá-los (ver Peake, 1920, 160; Skinner, 1969,411; R. Davidson, 1979, 185; Westermann, 515-16). A análise estrutural dessa perícope realizada por Barthes resultou na idéia de que a crença monoteísta de Israel exigia um rompimento com o padrão convencional dos contos folclóricos (cf. Barton, 116-19; Kselman, 107). A trama da história segue o esquema de contos folclóricos extrabíblicos: Jacó é o herói enviado numa missão; é Deus quem dá origem à busca; o com batente noturno é o oponente que detém o herói e procura impedi-lo de cumprir a missão. O elemento crucial que contraria as regras do esquema de contos folclóricos — nos quais aquele que dá origem à busca e o oponente são definidos pela oposição binária entre um e outro — é o fato de que, em Gênesis 32, aquele que dá origem à busca e o adversário são exatamente o mesmo ser. A fé monoteísta de Israel exigia que se evitasse a dualidade, de modo que as con venções dos contos folclóricos são desconsideradas. 3. A palavra é usada como metáfora de um futuro auspicioso (Is 8.20; cf. Motyer, 97 A tradução e interpretação de 8.20b, 'im-lõ ’y õ ’merü kaddãbãr hazzeh ’aser 'ên-Iô sahar, são controversas (ver Gray, 157-60), apesar de a maioria concordar que o cenário é a crise resul tante da coalizão entre a Síria e Efraim (ver, porém, Seitz, 66-71, que adverte sobre o método de colocar-se o relato bíblico dentro da estrutura histórica reconstituída). Alguns tradutores acreditam que se trata de uma referência à futilidade ou falta de força da palavra proferida; daí algumas traduções apresentarem, “Certamente para esta palavra que proferem não há alva” ou “Certamente dirão coisas como estas, mas suas palavras são vãs”. Outros acreditam que são as próprias pessoas que falam que não terão nenhuma alva de esperança (ver Bright, 496-97; Kidner, 597): “Se eles não falarem desta maneira, jamais verão a alva”. Caso a referência seja àqueles que falam, então o sentido pode ser tanto de que se não o fizerem de acordo com os 87
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ensinamentos de Isaías não terão futuro, quanto de que reconhecerão tarde demais os valores e princípios formulados pelo profeta (cf. Dummelow, 420). S. R. Driver (1893, 35-36) acredita que Isaías 8.19-20 significa que aqueles que ou ra se recusaram a ouvir as palavras do profeta e que, em seu desespero e ansiedade de saber o futuro, lançam mão da mágica e necromancia (v. 19; cf. 1Sm 28), irão desenvolver tarde de mais uma avidez por aprender e sujeitar-se aos ensinamentos de Isaías. Kaiser (1977, 122, n.b) afirma que a referência àqueles que não verão a alva abrange toda a população de Jerusalém e Judá. Alguns (ver Scott, 229) preferem seguir a LXX e o Pex., e emendam a palavra sãhar, alva, para sõhad, recompensa, apresentando como tradução: “Se eles [ou seja, aqueles cujas palavras são citadas em Is 8.19] não falarem desta maneira, jamais terão recompensa”, vale dizer, “não terão proveito algum”. Observando aquilo que ele considera ser o uso do subs. em Isaías 47.11 — parte de uma passagem anunciando a queda da Babilônia (Is 47.1-15) — G. R. Driver (162) sugere que sahar seja traduzido como mágica ou poder para superar (a catástro fe). Quanto a Isaías 47.11, nessa passagem, a Babilônia personificada é advertida de que o mal está a caminho, e que ela não verá sahrãh, sua alva. A Vg. e alguns comentaristas modernos (ver Motyer, 374; Watts, 168) seguem o TM e traduzem por “sua alva”. Porém, a LXX omite o termo e o Trg. (“como orar contra ela”) apresenta uma paráfrase. Vários comentaristas pre ferem traduzir a palavra como “conjurar/exorcizar por meio de um feitiço”, tomando por base o cognato acad. sahiru, que significa feiticeiro [ár. sahara, exorcizar] (ver Whitehouse, 140; Smith, 212; Skinner, 1960,85; McKenzie, 90-9l;North, 1967,172; 1971,100; Whybray, 123). Alguns (ver Sawyer, 108), consideram que resgatar, remir (lendo sahadãh, o const. q. inf. de shd com um su f; cf. BDB) são mais apropriados, mas apesar de essa versão apresentar um bom paralelismo, trata-se de uma correção desnecessária (cf. North, 1967, 172). 4. Como na literatura cananéia (ver OMA acima), no AT saltar também é, por ve personificada. Na literatura cananéia, Saar (Alva) e seu irmão Salim (Ocaso/Pôr-do-sol) eram associados a boas vindimas e colheitas, ao amor, à vida e à celebração do rejuvenescimento e da fertilidade (Gaster, 406-39; cf. Tate, 80). O nascimento de sahar é celebrado num poema ugarítico sobre “O Nascimento dos Belos e Graciosos Deuses" (shr [Alva] e sim [Ocaso]), de acordo com o qual os pais de Saar eram El e uma das esposas dele (KTU 1.23). Saar é incluído numa lista fen. de nomes de deuses (Watts, 210), nos nomes pessoais ugar. (Stolz, 182, n. 10) e no nome ’ahisãhar, meu irmão é Sahar em 1 Crônicas 7.10. Alguns vêem, em certos textos do AT em que o termo sahar é personificado, uma referência ao deus desse nome. sahar é dotado de asas, uma descrição poética dos primeiros raios de sol da alvorada, abrindo-se em forma de leque no horizonte distante (SI 139.9; Dummelow, 376). sahar dorme a noite toda e precisa ser despertado (SI 57.8 [9]; 108.2 [3]). Alguns (ver Watts, 210) acreditam que o gênero da divindade é masc., enquanto outros afirmam que apesar de o subs. em si ser masc., as características de sahar são, sem dúvida algu ma, fem. (verPeake, 1905,73; Strahan, 53;Franks, 349; McKay, 1969,211-12; 1970,456-64; Clines, 1989, 88). Possui um ventre (SI 110.3 [que para muitos traz mêrehem sahar, do ventre da aurora, no TM, mêrehem mishar]), uma descrição poética da alva como a mãe do orvalho refrescante. É a mãe de Vênus, a estrela da manhã (ls 14.12). Chama a atenção por seus cílios, outra descrição poética dos raios que se abrem durante o nascer do sol, enquanto suas pálpebras ainda se encontram escondidas pelo horizonte (Jó 3.9; 41.18 [10]; é interessante observar que, nos hieróglifos egípcios, a alva é representada por olhos de crocodilo) e é comparada a uma mulher radiante cujos olhos possuem uma atração estonteante considerada irresistível pelos homens (Ct 6.10; cf. R. Davidson, 1986,142). O fato de o nome ocorrer na forma fem. na Pedra Moabita (1. 15) é significativo. No entanto, é pouco provável que qualquer um dos textos acima seja uma referência direta ao deus / à deusa shr. Em cada um desses casos, a personificação é 88
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apenas poética (ver Rogerson e McKay, 1977a, 44; 1977b, 57; Andersen, 104, n. 4;Clines, 1989, 88). As evidências sugerem fortemente que Israel tomou emprestadas da mitologia cananéia certas metáforas e outras imagens sem aceitar a mitologia em si (ver Kraus, 350). O título hêlêl ben-Sahar, Estrela do Dia, filho da Alva (Is 14.12), que é usado para o rei da Babilônia num canto fúnebre de escárnio (vv. 4b-23), pode ser reflexo de um anteceden te mitológico cananeu. Muitos estudiosos consideram esse cântico de escárnio, em Isaías 14, sobre a queda de um déspota humano, uma versão desmitificada e reaplicada de uma história mitológica da religião can. sobre uma divindade inferior can. cuja tentativa de ascender aos céus e tomar-se semelhante ao deus principal do panteão foi frustrada quando ele foi lançado às profundezas do mundo dos mortos (ver p. ex., Gray, 255-56; Morgenstem [esp. 108-14]; Albright, 83-84; 86, 195; Childs, 69-72; Johnson, 94, n. 1; Wright, 55; Clements, 6-9; McKay, 1969,210-15. 1970; 1973,57-58; Maucheline, 140; Kelley, 239; Craigie; Motyer, 144). O título Helel / Helal ben Saar encontrado nos textos de Râs Shamra, em que Saar é o Deus da alvora da (ver Scott, 261-62; Bright, 500; Ackroyd, 341), é apropriado para o semideus cuja ambição fatal e presunção levaram-no a aspirações de ascender a montanha dos deuses e tomar-se igual à Elion, o “Altíssimo”, um título do deus supremo El. A Vg. traduz hêlêl como lucifer (porta dor da luz), e pelo fato de alguns escritores patrísticos (p. ex., Tertuliano; Gregório o Grande) entenderam essa perícope, à luz de Lucas 10.18 e Apocalipse 12.7-9, como uma descrição da queda de Satanás, Lúcifer tomou-se um nome para o diabo (ver, p. ex., Jensen, 239). Todo o cosmo é súdito da soberania majestosa de Javé. Como criador do universo in teiro, ele exerce controle absoluto sobre as forças da natureza e pode transformar o amanhecer em trevas (Am 4.13; pace Paul, 155, que afirma que o sentido dos dois subs. deve ser invertido de modo que sahar signifique trevas e 'êpâ refira-se à luminosa alvorada). Porém, Javé não criou a alvorada para ser simplesmente um fenômeno natural; ela também atua como um agente moral (A. B. Davidson, 302), expondo os perversos ao julgamento. Instruída e capacitada por Javé, o criador do tempo, a alva exerce um poder transformador sobre a terra: toma a colcha de trevas sob a qual a terra dorme, sacode-a para livrar-se dos perversos como se fossem inse tos e animais rastejantes, ilumina os belos contornos e cores sortidas das paisagens que foram toldadas pela noite e ofusca a luz dos perversos (Jó 38.12-15; cf. Straham, 318; Peake, 1905, 316-17; S. R. Driver, 1906, 114-15; Franks, 363; Harltey, 497). 5. No Salmo 22.1, a palavra ocorre como parte do título de uma composição music ayyelel hassahar (“A Corça/A Gama/O cervo da Alva”), uma melodia com a qual o salmo devia ser acompanhado ou cantado. Só se pode especular sobre o significado e a relevância do título. Alguns estudiosos (p. ex., Delitzsch, 308; JB) sugerem a possibilidade de que ayyelet haisahar fossem as palavras de abertura de uma canção conhecida. De acordo com Delitzsch (308), referem-se à luz da madrugada, que precede o amanhecer e cujos primeiros raios são comparados no Talmude com os chifres de uma corça. No entanto, Kirkpatrick (115) argumenta que o uso da expressão no Talmude para identificar os raios de sol da manhã dificilmente pode servir para determinar o significado do Salmo 22. Se o Salmo retrata uma corça que salta com vigor, é provável que sua melodia fosse alegre e, portanto, inapropriada para o tom melancólico desse salmo. Por outro lado, é possível que o texto retrate uma corça sendo caçada no começo da manhã, o que seria adequado para o tom do salmo (C. A. e E. G. Briggs, 190). Contudo, Kirkpatrick (115) considera inútil especular se o título do Salmo 22 referese literalmente à corça (quer saltando ou sendo caçada) no começo da manhã ou, figurativa mente, ao crepúsculo matinal. Deliztsch (308) acredita ser possível que a melodia desse nome tivesse evocado o modo com que a glória irrompe a noite de aflição. Eaton (72) sugere que, quando o salmo foi composto, talvez a corça fosse usada em sacrifícios, como era o caso com os povos vizinhos de Israel. Se essa sugestão estiver correta, então o título do salmo pode estar 89
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relacionado com um rito sacrificial que chegava ao ápice com os primeiros raios do amanhecer (cf. Trg.). Ao observar que em materiais arqueológicos da Anatólia existe uma relação entre o cervo e o deus-sol, Jirku acredita que o título do Salmo 22 estava originalmente associado ao deus-sol Saar. Em vez de “corça”, a LXX, Simc. e Trg. pressupõem ou empregam ’eyãlut, uma palavra de som semelhante que significa força (cf. ’eyãlüti, “força minha”, no v. 19 [20]), que indica exatamente o conteúdo do salmo. Outros argumentam que o título no TM já descreve o conteúdo do salmo (p. ex., a corça como uma representação da inocência perseguida; a alvo rada como símbolo do livramento), porém Kirkpatrick (115) rejeita essa abordagem tomando por base o fato de que é contrária à analogia de outros títulos. Não existe um consenso quanto a ’eyãlut ser uma correção do título heb. (conforme Dahood, 1966, 141, acredita ser provável) ou simplesmente uma tentativa desses tradutores de encontrar sentido para um termo que não compreendiam (ver Durham, 212-13). 6. A rapidez com que Javé voltará para o seu povo e o curará quando este se livrar das cadeias da injustiça, libertar os oprimidos e estabelecer a eqüidade social e o cuidado mise ricordioso e abnegado pelos pobres é comparada à maneira dramática com que o crepúsculo irrompe ou penetra subitamente a escuridão (Is 58.8; cf. 60.1-3). 7. O hapleg. mishãr no Salmo 110.3, que ocorre na expressão mêrehem mishãr é re lacionado pela N1VEC como um subs. separado, alva [# 5423], porém muitos corrigem o TM nessa passagem de modo a apresentar mêrehem sahar, do ventre da alva. Parece mais plausível considerar-se o mem pré-formativo de mishãr como uma reduplicação do tnem final de mêrehem, em vez de entender miihãr como uma alternativa poética para o termo mais freqüente, sahar (ver McKay, 1970,458; ver também seção 4 acima). P-B O vb. heb. shr (irromper, cavar; buscar, procurar) ocorre, bem como as formas subs. sahar (aram. saharã ’, saharã), crepúsculo matinal, início da manhã e saharit, manhã (Jastrow, 2:1551-52). Nascer do sol, aurora, ocaso: -> ’ôr (luz, luz do dia, aurora, relâmpago, # 240); -> zerah I (aurora, nascer do sol, # 2437); -> m ãhô' (poente, ocaso, Oeste, # 4427); -> ma'arãb II (o poente do sol, oeste, #5115); nesep (anoitecer, crepúsculo, aurora, escuridão, # 5974); -> sahar (crepúsculo antes do amanhecer, # 8840). B ib l io g r a f ia
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nnrjrç>(# 8841)
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8841
rvnorç
rmnU7 (saharút) cabelo escuro ou flor da idade (# 884 í). 91
nn® (# 8845)
AT Esse hapleg. ocorre somente em Eclesiastes 11.10. A LXX traduz o termo como anoia, ignorância, e é acompanhada pelo siríaco. O Targum apresenta a versão yômê 'ôkkámúl se ‘ôr, dias de cabelos negros. No Talmude, a expressão “cabeças de cabelos negros” (Ncdarim, 30b) denota masculinidade (C. D. Ginsburg, Coheleth 1861/1970,456). Nesse caso, a palavra é re lacionada ao radical verbal Shr I, ser escuro (Jó 30.30), que também se reflete no subs. sahôr, preto. Outros preferem relacionar Saharút com o subs. sahar, amanhecer, uma referência ao amanhecer da vida e, portanto, par. ao subs. anterior no contexto, yaledút, infância. A tradu ção do termo como “vigor” é interpretativa, porém não impossível. O mais provável seria uma versão como meia-idade ou flor da idade. Juventude: bãhúr I (rapaz, # 1033); -> betúlá (moça, # 1435); ne ‘úrim (juventude, # 5830); ‘alúmim (juventude, # 6596), s ã ‘ir I (pequeno, diminuto, jovem, insignificante, # 7852); qãfõn (pequeno, insignificante, jovem, # 7785); -> saharút (cabelos escuros, flor da idade, # 8841) John Walton 8842 (Seharhõr, escuro)
# 8837
nn® (sht), ni. corromper-se, estragar-se; pi. extinguir, estragar, arruinar, causar problemas; hi. estragar, arrui nar, destruir; ho. estragado, arruinado (# 8845); subs. n ’n®Q (maShit), destruidor, destruição, armadilha para passarinhos (# 5422); np®D (maShêt), aniquilação, destruição (arma; hapleg. em Ez 9.1; # 5424); nntpb (miShat), desfiguração do rosto (somente em Is 52.14; # 5425); nn^D (moshãt) subs. desfiguração, usado somente em Levítico 22.25 ( -> # 5426). 8845
nn®
OMA A raiz sht é amplamente distribuída, e encontrada no acad., ugar., fen. e ár., bem como em outras línguas (HALAT 1363a). AT 1 .0 vb. sht ocorre cerca de 140x e aparece com mais freqüência no hi. (96x), com me nos freqüência no pi. (39x), ni. (6x) e ho. (2x) e sem nenhuma ocorrência no q. O subs. mashit é encontrado 19x. E difícil distinguir-se entre o significado específico do pi. e do hi. (p. ex., pi., 2Rs 19.12; par. hi., Is 37.12; mas cf. Jenni, 259-63). 2. O vb. Sht pode descrever a deterioração e destruição de uma grande variedade de coisas, como a corrupção da moralidade (ni. e hi., Gn 6.11-12 [par. hms\, pi., Dt 32.5; ni., Ez 20.44), a perda ou desperdício de sêmen (pi., Gn 38.9), uma fonte turvada (ho., Pv 25.26); o apodrecimento de um cinto (ni., Jr 13.7), a transgressão de uma aliança (pi. Ml 2.8) e a destrui ção de um rei (hi., ISm 26.15), de uma cidade (hi., Gn 18.28) ou de nações (hi. Jr4.7). 3. A devastação completa, denotada por Sht, toma o termo apropriado para o pronun ciamento e descrição do julgamento divino. Esse vb. é usado para a destruição de toda a came e toda a terra (pi., Gn 6.17; pi., 9.11, 15), de Sodoma e Gomorra (pi., 13.10; 19.13, 29; hi., 19.13-14), da Babilônia (hi., Jr 51.11) e de Tiro (pi., Ez 26.4 [par. fcr.s]). Somente o sangue na verga e nas ombreiras das portas podia proteger Israel do destruidor (part. hi.) que matou todos os primogênitos do Egito (Êx 12.23). Deus também podia visitar Israel com seu furor; castigou-o, por exemplo, por meio de um anjo, mas poupou Jerusalém (hi., 2Sm 24.16; lCr 21.12, 15) e profetizou sua divina ira contra Israel (p. ex., hi., Jr 13.14; 15.3 [par. ’&/]; 36.29), o que resultou na devastação de Sião (hi., Lm 2.8). Deus jamais destruiu completamente o seu 92
raro (# 8846)
povo. Entre os motivos, pode-se citar a intercessão de Moisés (hi., Dt 10.10; SI 106.23 [par. smd]), a humilhação diante do Senhor (hi., 2Cr 12.7) e o fato de ele ser Deus e não homem e de seu amor durar para sempre (hi., Os 11.9; cf. vv. 1-4). 4. Aquele que fere (Sht) o olho do seu escravo deve libertá-lo (pi., Êx 21.26). Em sua graça. Deus proibiu a destruição (sht) de árvores frutíferas quando se sitiasse uma cidade (hi., Dt 20.19-20). Rapar (destruir, sht) a extremidade da barba era uma prática proibida (hi., Lv 19.27), pois fazia parte dos costumes de luto pagãos (cf. Lv 21.1-5; Dt 14.1). 5. Para o sht (pi.) problemático em Amós 1.11, seguido de rahamãyw, ver Barré, que traduz a oração como “e destruiu completamente seus aliados”. Ao ser compreendido como uma referência à desfiguração (miShat) do rosto de um ser vo, Isaías 52.14 é uma profecia do sofrimento de Cristo (cf. Is 53.2-3; Mc 9.12). (Ver Komlosh [217-220] para a sugestão de ler-se mishat como miShãtô, sua estatura, levando em conside ração evidências do lQIsa.) A presença de sht no título dos Salmos 57-59 e 74, “Segundo a melodia ‘Não destruas’”, ainda não foi plenamente compreendida. É provável que indique a melodia a ser usada. P-B É interessante observar-se o uso de Sht (hi.) com s fn , adversário, Satanás, em 1QH frgs. 4:6 e 45:3 (ver R. E. Murphy, 62). Destruição, aniquilação, devastação, deformação, ruína: 'hd I (perecer, # 6); 'e d (de sastre, # 369); blq (devastar, # 1191); dmh III (arruinar, # 1950); dmm III (perecer, # 1959); hrs (demolir, # 2238); hbl III (maltratar, # 2472); -> hlq III (destruir, # 2746); -> h t' (ser destruído, # 3148); -> klh (estar completo, perecer, acabar, destruir, # 3983); -> krt (cortar, cortar fora, exterminar, fazer uma aliança, circuncidar, # 4162); mhh I (eliminar, exterminar, destruir, # 4681); -> nsh II (decair, # 5898); -> nts (desintegrar, # 5995); -> nt$ (demolir, # 5997); nts (desarraigar, arrasar, destruir, # 6004); -> p 7» (despedaçar com golpes, # 6990); p td (ruína, infortúnio, # 7085); -> prr (quebrar, invalidar, anular, frustrar, baldar, impedir, # 7296); -> çdh II (ser devastado, # 7400); rzh (destruir, definhar, # 8135); -> Sdd (devastar, # 8720); -> íAí (corromper-se, arruinar, estragar, # 8845); -> Smd (ser exterminado, destruído, # 9012); -> íoè//7 (aniquilação, # 9318) B ib l io g r a f ia
NIDNTT 1:462-71; TDNT 9:9:96-100; 2:891-94; M. L. Barré, “Amos 1:11 Reconsidered,” CBQ 47, 1985, 420-27; E. Jenni, Das hebrâische P i‘el, 1968, 65-67; Y. Komlosh, “The Countenance o f the Servant o f the Lord, Was lt Marred?,” JQR 65, 1975, 217-20; R. E. Mur phy, “Sahat in the Qumran Literature,” Bib 39, 1958, 61-66; A. Rubinstein, “Isaiah LII 14 — nrnpra - and the DSIa Variant,” Bib 35, 1954, 475-79. Cornelis Van Dam
8846
nnip
110® (Sahat), subs. cova, túmulo (# 8846).
OMA Esse lexema possui um cognato no moabita, h swh, cisterna (Mesha 9, 23?), mas fora isso, não é atestado claramente no sem. do noroeste. Os equivalentes semânticos acad. haStu e suttatu não podem ser associados conclusivamente ao heb. sht em termos etimológicos. AT O subs. ocorre 21 x no AT em constr. idiomáticos como yrd laSsahat (descer à cova; Jó 33.24; SI 30.9 [10]; 55.23 [24]; Ez 28.8); qrb laSsahat (chegar à cova; Jó 33.22); ‘brb laSSahat 93
71WB (# 8847)
(ir para a cova; Jó 33.28); müt lassahat (descer à sepultura; Is 51.14); r ’h sahat (ver a corrup ção / cova; SI 16.10; 49.9 [10]); krh sahat (abrir a cova; SI 94.13). Seu significado fica claro pelo uso em par. sinônimos com se ol (SI 16.10); bôr (SI 7.15 [ 16]) e mmtym (morte; Jó 33.22). Sua etimologia, porém, não é tão evidente. Held apresenta evidências convincentes de que a derivação tradicional do vb. swh (afundar) deve ser rejeitada em favor de uma ligação com shh, curvar-se (Held, 176-81). A maior concentração de sahat encontra-se em Jó 33 (5x de 21), uma passagem que nos proporciona uma percepção mais profunda das idéias do AT sobre a vida depois da morte. Ao falar de Deus, Eliú diz (v. 18) que ele guarda a humanidade da cova (ou seja, da morte || Se/ah); Held, 174). Em sua graça, Deus também redime da morte, nesse caso, para que nem mesmo se desça à cova (v. 24; cf. v. 28). Por outro lado, caso se faça necessário, Deus restaura aqueles que já foram para a cova (v. 30), um ato que os faz voltar a viver. Juntamente com todos os seus sinônimos (ver as referência abaixo), sahat dá a idéia tanto de túmulo como de reino dos mortos, dois conceitos que se sobrepõem muitas vezes e que não são claramente distintos na maioria dos contextos do AT. P-B Em Qumran, o subs. ocorre como cova/corrupção, cf. 1QS 4:12; 9:16, 22; 11:13; CD 14:2/ 1QH 2:21; 3:12, 18, 19. Heb. mix., ver Jastrow 2:1552. Morte: 'bd I (perecer, # 6); -> ’adãmâ (chão, pedaço de terra, solo, terra, reino dos mortos, # 144); -> 'ãsôn (acidente fatal. # 656); -> gw ‘ (expirar, morrer, # 1588); -> hrg (matar, assas sinar, # 2222); -> zrm I (dar cabo da vida, # 2441); -> hedel (reino dos mortos, # 2535); -> hnt II (embalsamar, embalsamamento, # 2846); -> mwt (morrer, matar, executar, # 4637); -> qtl (assassinar, matar com violência, # 7779); -> r^pâ 'im I (sombras, espíritos que pereceram, # 8327); -> se ’ôl (Seol, reino dos mortos, # 8619); -> sahat (cova, túmulo, # 8846) B ib l io g r a f ia
NIDNTT 1:468; TDNT 9:93-106; TWOT 2:918; E. Dhorme, Job, 496-506; M. Held, “Pits and Pitfalls in Akkadian and Biblical Hebrew,” JANESCU 6, 1973, 173-90; R. Murphy, “Sahat on the Qumran Literature,” Bib 39, 1968, 61-66; N. Tromp, Primitive Conceptions ofD eath and the Nether World in the Old Testament, 69-71. Eugene H. Merrill
8847
nBtí
(i/ffâ), acácia (# 8847).
OMA É provável que o nome sem. seja derivado do egíp. sndt; cf. copt. sonte; acad. samtu\ aram. Sitfã, sit(ã, acácia; ár. sanf. AT A palavra ocorre 28x no AT, quase todas com referência ao material do qual deviam ser construídos vários itens do tabemáculo (p. ex., arca, varais, mesa, tábuas verticais, travessas, pilares, altar). Com exceção de uma referência, todos esses exemplos encontram-se em Êxodo (25.5,10,13,23,28; 26.15,26,32,37; 27.1,6; 30.1,5; 35.7,24; 36.20, 31; 37.1,4, 10, 15,25, 28; 38.1, 6). A única referência do AT à acácia como árvore (e não sua madeira) encontra-se em Isaías 41.19, em que o Senhor promete uma renovação ecológica do deserto, que se tomará evidente com a presença de árvores que normalmente não são apropriadas para regiões áridas. A menção à acácia nesse contexto causa certa perplexidade, uma vez que é comum encontrarse essa árvore no deserto. 94
no® (# 8848)
Zohary descreve cinco espécies de acácia que atualmente são nativas da Palestina; va riam em tamanho desde arbustos até árvores grandes (Flora Palestina 2:26-29). A acácia bí blica é, provavelmente, a Acacia raddiana, que chega a atingir cerca de cinco a sete metros de altura. A madeira dessa árvore que viceja em regiões secas possui cor alaranjada e é valorizada para trabalhos de marcenaria. A resina de certos tipos de acácia tem propriedades medicinais e a casca da árvore era usada no curtume de couro. O pl. sittím também ocorre 5x no AT como topônimo de diveros lugares (Nm 25.1 [cf. 33.49]; Js 2.1; 3.1; J1 3 [4], 18; Mq 6.5). P-B A palavra ocorre tanto no Talm. como nos Trgs. De acordo o Gen. Rab. 94.4, as pes soas se recusavam a usar a madeira de acácia em sinal de respeito pela arca da aliança, que era feita desse tipo de madeira. A solidez e durabilidade da madeira de acácia é uma propriedade confirmada pelo fato de que na LXX a palavra é muitas vezes traduzida como asêpos, algo que não é sujeito à decomposição. Vegetação: ’êzôb (hissopo, # 257); ds ’ (verdejar, brotar, # 2012); -> zr ' (semear, espa lhar sementes, formar sementes, # 2445); -> hãsir 1 (grama, # 2945); -> hasas (grama seca, # 3143); yereq (verde, verdor, # 3764); -> n (‘ (plantar, estabelecer, realizar, # 5749); ‘ãleh (folha, folhagem, # 6591); -> ‘êseb (erva, ervagem, erva daninha, # 6912); -> qiqãyôn (planta de identidade indeterminada, # 7813); -> r õ ’s II (erva amarga e venenosa, # 8032); -> siah I (moita, arbusto, # 8489); -> sitlâ (acácia, # 8847) B ib l io g r a f ia
ABD 2:804; HDB 4:507; IDB 2:292; ISBE 1:22; G. Dalman, Árbeit undSitte in Palàstina, 19281942,1:79,373,382-83,644; Fauna and Flora ofthe Bible, 1972,87-88; I. Lõw, Die Flora der Juden, 1924,2:379-91; H .N .e A. L. Moldenke, Plants o fthe Bible, 1977,125-26; M. de Waal, Medicinal Herbs in the Bible, 1980,31 -32; W. Walker, AH the Plants o f the Bible, 1957,192-93; M. Zohary, Flora Palaestina, 1966-1986, 2:26-69; idem, Plants o f the Bible, 1982, 116. Richard A. Taylor
8848
TO®'
nu® (sth), q., pi. estender, despejar (# 8848); ITÍD®Z? ( miSfôah), subs., enxugadouro de redes de pesca
(# 5427). OMA Cognatos: cf. sir. sth, atirar-se para baixo; mand. s(a II, maltratar, decapitar, estender, atirar-se para baixo; ár. sataha, estender; et. satha, estender, e acad. setú, rede que era estendida para caçar animais e pássaros (CAD S, Parte II, 340-41). AT 1. O vb. é usado 5x (Nm 11.32; Jr 8.2; Ez 26.5, 14; 47.10) e refere-se a estender algo para secar ao sol. Ocorre 4x no q. Em Jeremias 8.2, diz-se dos ossos dos mortos: “espalhá-los-ão ao sol” (lit. “Espalhá-los-ão amplamente ao sol”). Números 11.32 também se referem à secagem das codomizes estendendo-as ao sol (s(h com semes) para curá-las: “ Estenderam [as codomizes] para si ao redor do arraial”. Em 2 Samuel 17.19, a esposa de um homem “estendeu” uma co berta sobre a boca de um poço e espalhou grãos sobre a cobertura para camuflá-la. Jó declara, a respeito de Deus: “Multiplica (estende; s(h) as nações e as faz perecer; dispersa-as e de novo as congrega” (Jó 12.23). 95
• p t f (# 8851)
É usada somente uma vez no pi., no Salmo 88.9 [10], como uma postura de oração: “e te levanto [estendo] as minhas mãos”. 2 .0 subs. mistôah é um trislegomenon. Num oráculo de julgamento, o profeta Ezequ diz que Tiro se tomará um “enxugadouro de redes [de pesca]” (mistah harãmim, Ez 26.5; 14). Ver também a expressão mistôah laharãmim em Ezequiel 47.10 (“lugar para se estenderem redes”) — um oráculo de salvação referente à descrição feita por Ezequiel de um rio correndo do templo para En-Gedi e En-Eglaim. P-B
Ver Jastrow 2: 1553, 1554,851.
Extensão, dispersão, estiramento: -> h dl(estender as mãos, # 2063); zrh 1(estender, aspergir, espalhar, # 2430); -> (ph I (espalhar, # 3253); ->ys{ (mostrar, espalhar, # 3804); mth (estender, # 5501); -> nth (espalhar, # 5742); -> np$ II (estender, dispersar, ser dispersado, # 5880); pw$ (dispersar, dissipar, ser estendido, ser dispersado, # 7046); -> pzr (espargir, dispersar, estender, ser dispersado, # 7061); -> prs (estender, propagação # 7298); -> psh (contagiar, # 7313); rpd (estender, sustentar, revigorar, # 8831); -> sth (estender, despejar, # 8848) B ib l io g r a f ia
J. Milgrom, Numbers, JPS Torah Commentary, 1990, 92; W. Zimmerli, Ezekiel, Hermeneia, 1983, 2:27,35,513-14. Victor P. Hamilton
8851
HOB1'
rlUtt? (stp), q. arrastar com água, transbordar; ni. ser ar rastado pela água, pu. ser arrastado pela água (#8851);
lUU’ (setep), subs. inundação (# 8852). OMA O radical do vb. também é atestado no ár. sa(afa, lavar, enxaguar; sa(afa, transbordar; safafa, ir embora, partir; no egíp., s tf derramar cuidadosamente; Pent. sam., aramJ, Heb. mix., s(p enxaguar, arrastar com água. AT 1. S(p é um termo associado a água: “uma tempestade de impetuosas águas” (Is 28.2) ou “torrentes transbordantes” (Jr 47.2). Uma vez que também significa uma grande fluência de água, pode referir-se a “lavar”, quer sejam as mãos (Lv 15.11) ou utensílios domésticos (Lv 6.28 [21 ]; cf. 15.12). Em 22 de suas 31 ocorrências, aparece com vários termos para água, gesem, chuva (Ez 13.11, 13; 38.22); mayim, água (Lv 6.28 [21]; 15.11-12; SI 124.4; Is 28.2, 17); nahal, rio (2Cr 32.4; SI 78.20; ls 30.28; 66.12; Jr 47.2 [2x]); nãhãr, rio (Ct 8.7; Is 43.2); setep, inundação (Dn 11.22); sibbõlet/sibbõlet mayim, corrente das águas (SI 69.2 [3]; 15 [16]); sô(, dilúvio (Is 28.15, 18). 2. Em sentido mais ameno, stp significa lavar/enxaguar um objeto (Lv 6.28; 15.12; 1Rs 22.38), as mãos (Lv 15.11) ou uma pessoa (Ez 16.9, a lavagem figurativa de Israel por Javé) ou tem a conotação de água corrente em geral (2Cr 32.4; SI 78.20). O significado “arrastar com água” relata o poder normal da água corrente (Jó 14.19; Ct 8.7). 3. Em termos figurativos, s(p é usado muitas vezes juntamente com chuvas torrenciais, aguaceiros, cheias de rios ou “arrastar com água” (Isaías. 28.17; Ez 38.22) e que pode ser fa cilmente transposto de modo a significar forças sobrepujantes. Inimigos como os reis assírios “inundam” a terra (Is 8.8). Diversas calamidades submergem (s(p) as pessoas (SI 69.2 [3]; 96
(# 8856)
124.4). No entanto, Deus promete aos seus que as catástrofes torrenciais não os submergirão (sfp) (Is 43.2). Em três ocasiões, o salmista emprega o termo sfp para descrever sua experiêcia pessoal de profunda desventura (S. 69.2 [3]; 124.4) ou para orar pedindo a Javé que o livre de tal sorte (SI 69.15 [16]). Em quatorze casos, sfp dá uma descrição vivida do julgamento divino contra Israel ou alguma potência estrangeira (Jr 47.2), usando a imagística de chuvas inundantes (Ez 13.11,13; 38.22) ou de uma terrível inundação. As imagens de inundação representam as forças destrutivas desencadeadas pelas conquistas militares. O profeta Isaías emprega vários vbs. para retratar a natrueza sobrepujante da campanha da Assíria conta Judá (hip, sfp, ‘br). Isaías usa sfp muitas vezes (inundar, transbordar, sobrepujar, Is 8.8; 10.22; 28.2,15. 17. 18; 30.28; cf. Jr 47.2; Dn 11.10,22,40) como parte da imagística de uma tempestade na qual a inundação (que representa o julgamento divino) destrói tudo o que encontra em seu caminho. Os reis assírios também usavam imagens relacionadas à tempestade em suas inscrições para descrever cam panhas militares. Salmaneser III declarou: “Exterminei seus guerreiros, descendo sobre eles como Adade quando faz cair um temporal” (ANET, 277). Uma inscrição de Nabônido descreve o ataque de um aliado babilônio contra os assírios: “Varreu a terra como uma enchente, acima e abaixo, à direita e à esquerda... destruindo suas cidades sagradas mais do que uma inunda ção” (ANET, 309). Em três passagens, a combinação dos vbs. sãfap w6 'ãbar (lit. “sobrepujar e passar por cima”) parece formar uma hendíadis expressando uma inundação sobrelevante (ver ls 8.8; Dn 11.10,40). 4. Javé promete um dia vindouro no qual não permitirá que Israel seja submerso pelas águas da aflição (Is 43.2) e estenderá sobre seu povo a glória das nações como uma torrente que transborda (Is 66.12). 5. Jeremias 8.6 se destaca de todos os outros casos de sfp ao retratar um cavalo que arremete com ímpeto na batalha, sem cuidar com o que faz. . O subs. cognato sefep ocorre 6x. Em dois casos, lança mão de imagens ligadas a inundação/tempestade para descrever o julgamento vindouro (Dn 9.26; Na 1.8). Dois textos retratam a passagem veloz das águas da cheia que obedecem ao comando de Javé (Jó 38.25) e que não tem poder algum sobre o refúgio que Javé oferece àqueles que confiam nele (SI 32.6). A imagística de “inundação” que costuma estar associada a sefep também pode representar a intensidade da ira (Pv 27.4).
6
Inundação, dilúvio, torrente: bz ’(dividir [por ação da água], # 1021); grp (arrastar com a água, # 1759); -> mabbúl (oceano celestial, dilúvio, # 4429); niggeret (torrente, # 5600); swp (inundar, elevar, fazer flutuar, # 7429); sibbõlet II (torrente, ondulação, # 8673); -> íô t II (inundação [repentina], # 8766); sfp (arrastar com água, inundar, alagar, # 8851); -> sesep (enchente, # 9192) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:918; J. A. Motyer, The Prophecy o f Isaiah, 1993; J. N. Oswalt, The Book o f Isaiah Chapters 1-39, 1986; H. Wildberger, Isaiah 1-12, 1991. Michael A. Grisanti / Elmer A. Martens 8852 (sefep, inundação),
8856
# 8851
'W (say), subs. presente, dádiva (# 8856). 97
r r tf (# 8863)
OMA Ár. Sai’, coisa, objeto; ugar. [y, tributo, presente; aramA, Sy, tributo, presente. A deri vação heb. de Say é incerta. AT Os três casos em que say ocorre retratam presentes oferecidos (ybl) ao Deus de Israel (SI 69.29 [30]; 76.11 [12]; Is 18.7). Povos e reis fora de Israel demonstrarão que reconhecem a soberania de Javé ao prestar-lhe homenagem. Presente: -> 'ahab (presentes de amor, talismã, # 172); -> zbd (conceder, # 2272); -> mgn I (entregar, # 4481); nãdãn II (presente, retribuições de amor, ft 5621); -> ntn (dar, presentear, oferecer, # 5989); skr II (entregar, tf 6127); -> sb( (dar, ft 7381); -> s h d (dar um presente, # 8815); -> say (dádiva, presente, tf 8856); -> salmõmm (presente, # 8988) Michael A. Grisanti
. rr® (Svh), q. derreter-se; hitpol. encontrar-se em desesOOOJ Trw _______________________________ pero (# 8863); OMA O termo ár. sãha significa fluir, derreter-se. AT O q. ocorre somente no Salmo 44.25 [26], em que se refere àqueles que são abatidos até ao pó e estão prestes a morrer. O hitpol. ocorre 4x, todas na mesma expressão idiomática nos Salmos 42.5, 6, 11; 43.5. Em três ocasiões, o vb. aparece na pergunta, “Por que estás aba tida, ó minha alma?” Cada uma dessas vezes, o salmista expressa sua convicção de que Deus o livrará de sua dificuldade. P-B A LXX usaperilypos nos Salmos 42— 43 [41.6, 12; 42.5] com o significado de triste, profundamente aflito. NT Mateus 26.38 emprega o termo perilypos quando Jesus orou em agonia no Getsêmane: “A minha alma está profundamente triste até à morte”. Cf. Marcos 14.34. Desânimo: mss (definhar, derreter, dissolver, perder a coragem, ft 5022); -> sar (taciturno, desanimado, tf 6234); -> 'gm (estar atormentado, angustiado, aflito, ft 6327); -> $wq I (cons tranger, pressionar, afligir, ft 7439); qsr II (ser inadequado, ficar desanimado, desgastado, tf 7918); -> rph (tomar-se frouxo, esmorecer, desanimar, tf 8332); -> Syh (derreter-se, encontrarse em desespero, tf 8863) Derretimento, dissolução: -> dônag (cera [metáfora para derretimento], tf 1880); -> mwg (derreter, vacilar, oscilar, perder a coragem, ft 4570); -> mss (perder a coragem, derreter, en fraquecer-se, ft 5022); -> msh (derreter, encharcar, # 4998); -> Syh (derreter-se, encontrar-se em desespero, ft 8863) Herbert M. Wolf/ Robert Holmstedt 8864 (Sihâ, cova), -> # 8757 8865 (Sihôr, rio, canal [no Egito]), -> tf 5643
8868
(Sayit, remo),
98
ft 8763
1’®' (# 8874)
8874
l’U?
P® (syn) hiftil ou q. com um / reflexivo (HALAT 1371), urinar (# 8874); l’??' (Sayin), subs. urina (# 8875).
OMA O heb. é cognato do aram. Siãnu, Sánu, urinar, e Sinãtu, urina. No ugar. tyn, (yttn, deixe-o urinar, U T 55:8).
AT 1.0 AT usa esse vb. somente numa expressão idiomática para homens urinando. O heb. emprega o part. e também o subs. muro (qir), daí poder-se traduzir a expressão como “aquele que urina no muro”, tomando-a equivalente a uma referência a alguém do sexo masculino. O vb. é usado 6x nos livros históricos (ISm 25.22; lRs 14.10; 16.11; 21.21; 2Rs 9.8). 2. O subs. é encontrado apenas nas passagens par. de 2Rs 18.27 e Is 36.12, beber su própria urina. O K acrescenta a glosa eufemística: méme raglêhem (“água de suas pernas”). Esterco, excremento, refugo, urina: -> 'aSpõt (monte de cinzas, monte de refugo, monte de esterco, # 883); -> gll II (emporcalhar-se, sujar-se, # 1671); -> dõmen (esterco, estrume, # 1961); harã ’im (esterco, # 2989); -> yesah (imundícia, diarréia, # 3803); -> madmènâ I (vala de esterco, # 4523); súhâ (restos de animal abatido, # 6054); peres I (restos de animal abatido, conteúdo do estômago, # 7302); -> çê a (imundícia, excremento humano, # 7362); -> Sãpia' (esterco [de gado], # 7616); -> sig (excremento, # 8485), -> syn (urinar, # 8874) Roy E. Hayden 8875 (sayin, urina),
# 8874
TU? (iyr), q. cantar; pol. cantar, part. cantor, músico; ho. ser cantado (# 8876); TU? (sir), subs. um conjunto de canções, canção, música (# 8877); HTtt? (sirâ), subs. canção (# 8878). 8876
TU?'
OMA Ugar. sr, cantar; acad. sêru(m), cântico; aramJ syr, cantar. AT Em Ez 40.44 sãrim, cantores, normalmente é corrigido para selayim, dois, de acordo com a LXX. . O cântico secular tinha um papel expressivo na cultura israelita, conforme atestam dois provérbios (Pv 25.20; Ec 7.5; cf. 12.4). Há cantos de amor no Cântico dos cânticos 1.1; Isaías 5.1; Ezequiel 33.32 e o Salmo 45 é chamado de cântico de núpcias. Em Isaías 23.15, um cântico sobre uma velha prostituta é aplicado a Tiro. 2 Crônicas 35.25 menciona a realização dos memoriais costumeiros com cânticos fúnebres por ocasião da morte do rei Josias. Isaías 24.9 refere-se a cânticos entoados em meio à bebedeira, e 2 Samuel 19.35 [36]; Esdras 2.65; Eclesiastes 2.8 e Ezequiel 2 6.13 falam de cantar como forma de entretenimento. Em uma oca sião, o vb. é usado para o piar dos mochos (corujas) (“a voz das aves retinará”; Sf 2.14). 2. Na maioria das vezes, o vb. e os subs. denotam louvor religioso. O impv. introduz um cântico de vitória em Êxodo 15.21, seções de hinos no Salmo 68.4, 32 [5, 33], um hino histórico no Salmo 105.2 (= 1Cr 16.9) e hinos escatológicos no Salmo 96.1 e em Isaías 42.10. O coortativo “Cantarei” introduz um cântico de vitória em Êxodo 15.1; Juizes 5.3 e conclui um hino solo no Salmo 104.33. Em dois lamentos do rei, introduz um prólogo de hino (SI 89.1 [2]; 101.1). Em outros lamentos individuais, começa com um voto de louvor (13.6; 27.6; 57.7 [8] = 108.1 [2]; cf. 21.13 [ 14]; 59.16 [ 17]; Jr 20.13).
1
99
(# 8880)
3. Faz-se menção freqüente a cantar “um cântico novo”. O pressuposto fundamental dessa expressão é uma nova experiência com Deus colocada em prática e que se reflete em ações de graças (SI 40.3 [4]; 144.9). Geralmente é usada em hinos escatológicos, antevendo pela fé a obra salvadora final que Deus há de realizar (SI 96.1; 98.1; 149.1; IS 42.10; cf. SI 33.3, à luz dos w . 20-22; cf. Ap 5.9). 4. O subs. refere-se a cânticos religiosos em Amós 8.3. Denota um cântico de ação de graças em 2 Samuel 22.1 (= ao título do Salmo 18); Salmos 28.7; 69.30 [31], um cântico de vitória em Êxodo 15.1; Juizes 5.1; Salmo 106.12 e um hino escatológico em Isaías 26.1. Os “cânticos de Sião” e o “canto do Senhor” no Salmo 137.3-4 fazem alusão a uma categoria de hinos que louvam Javé, o Deus de Sião. São representados pelos Salmos 48, 76, 84,87 e 122. E bem provável que o título “cântico de romagem” nos Salmos 122— 134 indique uma coleção de cânticos processionais entoados por peregrinos em Jerusalém, quando subiam ao templo para os cultos durante as festas. Muitos outros salmos trazem o termo sir, cântico, em seu títu lo, normalmente em conjunto com mizmôr, salmo, que era um poema acompanhado de músi ca. Pode-se interpretar o primeiro termo como um cântico entoado a capela, mas, com isso, a combinação dos dois termos toma-se estranha, a menos que se refira a uma tradição dupla de cantar-se certos salmos com ou sem acompanhamento musical. 5. Crônicas, Esdras e Neemias demonstram grande interesse na música do templo. Os cânticos acompanhados de instrumentos de corda e percussão eram responsabilidade dos levitas (lC r 15.16,19; 2Cr 23.13; Ne 12.27), enquanto os sacerdotes se encarregavam dos toques das trombetas (lC r 13.8; 2Cr 5.13; 29.27). NT
-> A7DATr 3:668-76.
Louvor, cânticos, ação de graça: -> hll II (louvor, ser digno de louvor, gloriar, exultar, # 2146); -> zmr I (fazer música, cantar louvores, # 2376); -> ydh II (reconhecer, dar graças, lou var, # 3344); -> nwh II (louvar, # 5658); -> 'nh IV (cantar, # 6702); -> psh I (pôr-se a cantar, irromper em cântico, # 7200); -> rômêm (exaltar, # 8123a); -> sbh I (elogiar, louvar, honrar, # 8655); syr (cantar, # 8876); tnh (recitar, celebrar, # 9480) B ib l io g r a f ia
THAT2:895-98; TWAT 7:1259-95. Leslie C. Allen 8877 (sir, conjunto de cânticos, cântico, música), -> # 8876 8878 (sírâ, cântico),
8880
# 8876
(Sayis), alabastro (# 8800).
OMA O termo heb. é uma palavra estrangeira, do egíp. Ss (HALAT 1374, cf. BDB, 1010); AT Usado somente em 1 Crônicas 29.2, sayis é um dos materiais que Davi juntou para a construção do templo de Javé. Essa pedra calcária era importada do Egito para a Palestina (I. Ben-Dor, “Alabaster,” IDB, 1:76). 100
n ’tí (# 8883)
Cal, giz, gesso: -> gir (giz, # 1732); -> rw/i (gesso, cobertura, revestimento, tinta, # 3212); -> fp/ (lambuzar, rebocar [com gesso], # 3260); s y d (rebocar [com gesso], caiar, # 8486); -> íe re J (giz, # 8574); -> ioy/í (alabastro, # 8800); -> tápê/ (reboco [de barro], caiação, # 9521) William C. Williams
rPW' (iy/), q. pôr, colocar, assentar; ordenar, designar; dirigir, determinar; impor; ho. ser colocado, assentado (# 8883); rPU? (sir), vestuário ( -> # 8884). 8883
rvtf
AT syt é um sinônimo tão próximo do radical sym em seu significado que é bem possível que os dois fossem equivalentes semânticos em dialetos ou línguas diferentes em que houve empréstimo de termos. No aspecto lexical, Syt tomou-se o mais exótico (poético, formal) dos dois, pois das oitenta e cinco ocorrências do vb. na Bíblia, a tendência de Syt é aparecer com mais freqüência em passagens mais antigas (pré-exílio) ou que demonstram um estilo (poético) mais refinado. O fato de raramente aparecer em livros bíblicos mais recentes e em outros textos de literatura heb. durante ou após o período do Segundo Templo (p. ex., Ecli 15.14; 1QS 10.s; observe a ausência no Mix.) indica que perdeu seu favoritismo para sym como vb. preferido de modo geral para identificar a idéia de colocação. Colocação, designação, posto, estação: -> ysg (colocar, apresentar, # 3657); kwn (perma necer firme, preparar, estabelecer, # 3922); -> n. ntn (dar, apresentar, oferecer, # 5989); -> 'md (ficar em pé, assumir uma posição, estacionar, designar, # 6641); ‘rk (colocar, enfileirar, entrar na batalha, # 6885); qwm (levantar-se, permanecer em pé, erguer-se, realizar, # 7756); -> sym I (colocar, pôr, preparar, im por, # 8492); -> Swh II (colocar, pôr, 8751); -> syt (pôr, colocar, assentar, designar, # 8883) Sam Meier
8884
rr®
rP® (Sit), subs. vestes, traje (# 8884).
AT Esse termo geral para roupas aparece somente duas vezes na BH. O Salmo 73.6 fala da “violência que os envolve como manto”, e Provérbios 7.10 descreve a mulher “com vestes de prostituta”. Esse último caso encontra-se na maioria das versões modernas alterado para uma forma verbal, “vestida como prostituta”. Roupa, vestes: beged II (roupa, vestes, # 955); -> gelôm (vestes, # 1659); -> hob (dobra das vestes, # 2460); hõçen (dobra das vestes, # 2950); kPtonet (vestes, # 4189); IbS (colocar, vestir, usar, # 4552); mad (vestes, roupas, # 4496); -> madeweh I (vestes, # 4504); -> mahala$ot (vestes festivas, # 4711); -> meltãhâ (guarda-roupa, # 4921); -> mesi (vestes caras, # 5429); -> sãdín (vestes caras, # 6041); sut (vestes, # 6078); p^tígil (roupas finas, # 7345); íe ò a ' (vestes coloridas, # 7389); -> simlâ (vestes, tecido, # 8529); íõ ie / (saia esvoaçante, # 8670); -> f»7 (vestes, trajes, # 8884) Robert L. Alden
3DU7 (Skb), q. deitar-se; ni. e pu. (?) ser violada; hi. co locar, ho. ser colocado, ser colocado na cama (# 8886); 101
(# 8886)
23ip'0 (miskãb), lugar de deitar, cama, ato de deitar ( -> # 5435); 1733^’ subs. (sekãbâ; ou n3?®' sikbâ), camada, efusão de sêmen ( -> # 8887); nablP ( -> sekõbet), efusão de sêmen (# 8888). OMA Pode-se encontrar cognatos do radical skb em várias línguas e dialetos sem. (p. ex., acad. sakãpu(m), recolher-se para dormir; ver BDB, 1011-12), inclusive o ugar., e transmite significados semelhantes à maioria daqueles encontrados no hebraico. AT 1. Dentro do âmbito geral de “deitar-se”, esse vb. comum (usado 212x) pode expressar uma grande variedade de nuanças, inclusive os preparativos para ir dormir (Gn 19.4), hospedarse por uma noite (Js 2.1), falecer (jazer; Is 14.18) e ter relações sexuais (1 Sm 2.22). 2. Em 1 Reis 3.19 a prostituta deita-se sobre o filho, ocasionando-lhe a morte. Em 1 Samuel 3.2, 3, 5, 6, 9, o vb. faz alusão a Samuel e Eli no santuário de Siló e significa ir para a cama, retirar-se aos seus aposentos para dormir. Gênesis 28.11 conta como Jacó passou a noite em Betei e em Jonas 1.5, em que a palavra é seguida de rdm, sono; a expressão significa que Jonas deitou-se e caiu no sono. O salmista fala de fazer sua cama no meio de leões devoradores (SI 57.4). Em Levítico 26.6, a ênfase é sobre o descanso tranqüilo que Israel teria em Canaã. Quando o coração de uma pessoa descansa, sua mente também repousa (Ec 2.23); Jó procu ra descanso, mas não consegue encontrá-lo quando se deita (Skb, 7.4) em seu leito (miSkãb, 7.13), e só lhe resta ter esperança de achá-lo quando deitar-se, skb, no pó (7.21). Pode haver um trocadilho quando espias entram na casa de Raabe, a prostituta, e decidem pousar lá (ou seja, pernoitar, Js 2.1; ver abaixo a insinuação sexual). 3. Uma vez que se faz referência tão freqüente à morte como um sono, parece mais do que natural que um vb. usado para designar deitar-se e preparar-se para dormir passe a ser uma metáfora para a morte (cf. Jó 3.13; 7.21). O contexto deixa claro que Isaías 14.8 referese à morte do rei da Babilônia (14.4). Todos os outros reis se deitarão em suas casas (ou seja, sepulturas; 14.8), mas esse rei permanecerá insepulto (14.9). Jazer/descansar com os pais sig nifica ser sepultado no túmulo da família (geralmente uma caverna talhada em rochas calcá rias da Palestina), como em 1 Reis 1.21; 2.10; 11.21 (Davi). A expressão é usada muitas vezes ao longo dos livros de 1 e 2 Reis (p. ex., lRs 11.43; 14.20, 31; 15.8, 24; 16.6, 28; 22.40, 51; 2Rs 8,24; 10.35). Esse conceito também descreve a morte de um patriarca (Gn 47.30). O ter mo é usado somente uma vez para fazer referência a uma morte violenta (ou seja, Acabe; 1Rs 22.40). E possível que Salmo 41.8 [9], uma repetição de Amós 5.2, empregue a linguagem de uma maldição ou encantamento (Kraus, citado por Anderson, 325). 4. Quando usada para denotar relações sexuais, a expressão “deitar-se com”, e seus de rivativos, indica relações sexuais ilícitas (Gn 30.15-16; 2Sm 11.11 são exceções). O termo skb refere-se a relações sexuais proibidas por lei (ou seja, incesto, bestialidade, homossexualida de), tanto em Levítico 20.11, 12, 13, 18, 20 (com 'et), como em Deuteronômio 27.20, 21, 22, 23 (com ‘im). A expressão denota estupro em Gênesis 34.2 e Deuteronômio 22.25. Em Gêne sis 19.23, 33, o termo indica que as filhas de Ló seduziram o pai e em Gênesis 35.22 refere-se à sedução de Bila por Rúben. A relação sexual lícita normalmente é descrita pelo termo y d ‘, conhecer; nas passagens em que a relação sexual é indicada para fins procriativos, o termo es colhido costuma ser bw 'el, entrar (van der Westhuizen). 5. De acordo com Orlinsky, os subs. sekãbá (sik?bâ) e sekõbet não devem ser derivados de skb, deitar-se, mas do ár. sakaba, derramar, e, assim, não têm relação com o ato de deitar-se. Com exceção de Êxodo 16.13-14, em que sekãbâ descreve uma camada de orvalho, esse subs. indica a emissão de sêmen na relação sexual. ( -> Preceitos sobre o sexo: Teologia) 102
(# 8887)
Coito, cópula, estupro: -> rb ‘ I (deitar-se, copular, # 8601); -> rà? (deitar-se, # 8069); -> íg / (dormir, ser violada, # 8711); -> s/rò (deitar-se, ser violada, pousar, # 8886) Cama: y$‘ (arrumar a cama, # 3667); miffá (cama, # 4753); miskãb (cama, # 5435); -> ‘eres (armação da cama, # 6911); -> p ê ’â II (luxo [de um sofá], # 6991); -> rèd (preparar uma cama, # 8048) Sono: -> í//p II (ficar insone, # 1941); -> ysn I (dormir, # 3822); -> nwm (dormir, # 5670); -> rdm 1 (adormecer, #8101) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:921 -22; A. A. Anderson, The Book o f Psalms, NCB, 1972; P. A. Bird, “The Harlot as Heroine: Narrative Art and Social Presupposition in Three Old Testament Texts,” Semeia 46, 1989, 119-39; Peter W. Coxon, “A Note on ‘Bathssheba’ in 2 Samuel 12, 1-6,” Bib 62, 1981, 247-50; John Gray, I & II Kings, 1970; N. C. Habel, The Book o f Job: A Commentary, 1985; J. S. Kselman, “Psalm 3: A Structural and Literary Study,” CBQ 49, 1987, 572-80; H. M. Orlinsky, “The Hebrew Root skb,” JBL 63,1944,19-44; J. P. van der Westhuizen, “Three Nuances of Sexual Intercourse,” Dor le Dor 18,1989-90. 92-100; R. N. Whybray, Ecclesiastes, NCB, 1989; Y. Zakovitch, “Sisseras Tod,” Z A W 93, 1981, 364-74. William C. Williams
rnpíÇ1(sikbâ), subs. o que se deita, camada de orvalho, em issão/ejaculação de esperm a (# 8887); n n b ç ? (sekõbet); subs. ejaculação de esperma, copulação, deitar-se com uma mulher, relação sexual (de uma mulher com um animal) (# 8888); < 3DU? (skb), deitar-se ( # 8886). 8887
rnprç
AT
1. Em Êxodo 16.13, 14o subs. sikbâ refere-se à cobertura de orvalho no solo. 2 .0 subs. sikbâ também refere-se à emissão/ejaculação (seminal) (Lv 15.16,17,18,32 22.4; Nm 5.13). A emissão seminal era considerada contaminante. A impureza normalmente durava apenas até ao pôr-do-sol e era removida pela lavagem com água. 3. O subs. sekõbet, cama, ocorre 4x, sempre numa expressão com o vb. ntn, dar. E expressão — dar sua cama — refere-se a relações sexuais ilícitas (iniciadas pelo homem), a saber, adultério (Lv 18.20; Nm 5.20) e bestialidade (Lv 18.23; 20.15). Relações sexuais: ’esek (testículo, # 863); -> zirmâ (falo, emissão, # 2444); -> mebúsim (órgãos genitais, # 4434); nablút (órgãos genitais, # 5578); vfihõset II (menstruação, luxúria, # 5734); -> ‘gn (manter-se isolado; # 6238); -> ‘õnâ (coabitação, relação sexual, # 6703); skb (deitar-se, ser violada, ser colocado na cama, # 8886); -> skh (apresentar tesctículos fortes, ter forte desejo carnal, # 8889); sopkâ (canal de fluido do órgão masculino, órgão/ túbulo urinário, # 9163); Preceitos sobre o sexo: Teologia Jackie A. Naudé
8888
(sekõbet, efusão de sêmen),
# 8886
HDtt? (skh), hi. apresentar testículos fortes, ter forte de sejo carnal ( # 8889). 103
TO® (# 8894)
AT O vb. refere-se ao estado de apresentar fortes desejos carnais. Em Jeremias 5.8, o vb. é usado na figura dos garanhões. Depois de Deus tê-los alimentado com abundância, eles de sonraram a generosidade dele e, por causa da luxúria que apresentavam, tomaram-se como garanhões fartos (Jr 5.8). Com essa imagem, Jeremias retrata a iniqüidade, o egoísmo e a depravação da vida em Jerusalém. Relações sexuais: 'esek (testículo, # 863); -> zirmâ (falo, emissão, # 2444); -> mebúsim (órgãos genitais, # 4434); nablüt (órgãos genitais, # 5578); -> rfihõset II (menstruação, luxú ria, # 5734); -> ‘gn (manter-se isolado; # 6238); 'õnô (coabitação, relação sexual, # 6703); jàtò (deitar-se, ser violada, ser colocado na cama, # 8886); -> skh (apresentar tesctículos fortes, ter forte desejo carnal, # 8889); -> sopká (canal de fluido do órgão masculino, órgão/ túbulo urinário, #9163); -> Preceitos sobre o sexo: Teologia Jackie A. Naudé 8890 (j&kôl, privação pela morte, perda dos filhos),
# 8897
8891 (Sakkúl, desolado pela perda de um ente querido), -> # 8897 8892 ($ekülâ, desolado pela perda de um ente querido), -> # 8897 8893 (sikkôr, embriagado),
#8910
("D® (.sM I), q. esquecer; ni. ser esquecido; pi. causar o esquecimento; hi. levar a esquecer (# 8894); pD® (sãkêah) adj. alguém que se esquece com facilidade (# 8895). O hitp. em Eclesiastes 8.10 cos tuma ser corrigido para uma forma de sbh, louvor. 8894
rn®
OMA No ugar. e no aram., skh significa encontrar. AT As palavras para esquecer são os antônimos de lembrar ( -> zkr, # 2349) e ocorrem nos mesmos contextos cerca de 15x (p. ex., Gn 40.23; 1Sm 1.11; Pv 31.7). Em vez de simplesmente denotar um processo mental, muitas vezes implica uma ação apropriada que alguém é levado a realizar. E interessante observar-se que o vb. ‘zb, abandonar ( -> # 6440), apresenta grande proximidade semântica com 8894 em sete casos (p. ex., ISm 12.9-10; Is 65.11; Lm 5.20). 1. Em muitos dos casos em que o sujeito é um ser humano, mudanças na situação de vida levam ao esquecimento de experiências anteriores. Numa crise, a pessoa se esquece de experiências positivas ou normais. A fome leva a abundância de cereal a ser esquecida (Gn 41.30). O sofredor se esquece de comer (SI 102.4 [5]) ou toma-se vítima da alienação social (Jó 19.14), sendo o grau máximo de tal alienação a própria morte que faz a pessoa ser esquecida (Jó 24.20; Ec 2.16; 9.5; cf. SI 31.12 [13]). Depois que muda a maré, o sofrimento é esquecido (Gn 27.45; cf. Pv 31.7). Zofar prometeu a Jó que as experiências amargas seriam coisa do pas sado se Jó se arrependesse (Jó 11.16), e Deus fez uma promessa semelhante a Israel em Isaías 54.4; 65.16. As experiências passadas também podem constituir uma lição que não deve ser esquecida (Dt 9.7; 31.21; Jr 44.9). 2. Em Jeremias 20.11; 23.40; 50.5, experiências futuras, quer positivas ou negativas, são descritas como inesquecíveis a fim de intensificar o conceito de 'ôlãm, perpétuo, eterno ( -> # 6409). 104
(# 8894)
3. Com freqüência, trata-se da omissão diante de compromissos assumidos, como quan do o copeiro-chefe se esquece de José (Gn 40.23) ou da negligência do rei com seus deveres (Pv 31.5; cf. 2.17). Israel mostrava-se especialmente propensa a esquecer-se da importância de Deus e de seus atos de salvação no passado. Deuteronômio apresenta advertências constantes sobre tal ingratidão egoísta (Dt 4.9; 6.12; 8.14; cf. SI 103.2; 106.13, 21), que podia assumir a forma de desobediência aos mandamentos de Deus (Dt 4.23; 8.11; c. 26.13; SI 78.7, 11) e de modo particular, pela adoração a ídolos (Dt 8.19; 32.18). Juizes 3.7, 1 Samuel 12.9; 2 Reis 17.38 falam do descaso para com tais advertências. Também os profetas acusaram Israel de deixar Deus de lado ao ignorar o compromisso criado pela redenção ou o relacionamento de aliança com o Senhor (Is 17.10; 51.13; Jr 3.21; 23.27; Ez 23.35; Os 13.6). Essa negligência podia assumir a forma de idolatria (Jr 13.25; 18.15; Os 2.13 [15]), abandono da adoração no templo (Is 65.11; cf. SI 137.5; Lm 2.6), transgressão das estipulações sociais e religiosas da aliança (Ez 22.12), confiança nos bens materiais (Os 8.14) ou, no caso dos sacerdotes, desa tenção para com seu dever de ensinar a lei (Os 4.6). O caráter absolutamente antinatural desse comportamento é observado em Jeremias 2.32; 18.15; 50.6. Em seus lamentos, os sofredores falam de como não se esqueceram daquilo que professaram em seu compromisso na aliança, a fim de instar o Senhor a mostrar sua fidelidade livrando-os da angústia (SI 44.17; 20 [18. 21]; 119.61,83,109,141,153,176 [cf. v. 139]). Em algumas ocasiões, prometem um compromisso futuro (119.61,93). Os perversos são caracterizados como aqueles que se esqueceram de Deus (SI 9.17 [18]; 50.22 [cv. v. 16]; cf. Jó 8.13). 4. Em várias ocasiões, o vb. tem Deus como sujeito, referindo-se ao compromisso dele com as estipulações da aliança. Os lamentos dos Salmos apresentam três tipos de expressão padrão que empregam o conceito de Deus (não) se esquecer. O primeiro tipo é uma petição para que Deus não se esqueça do sofredor, mas intervenha com o livramento (SI 10.12; 74.19, 23; cf. ISm 1.11). O segundo tipo é uma pergunta angustiada feita para saber-se o motivo de Deus ter se esquecido, contendo também um elemento de protesto (SI 13.1 [2]; 42.9 [10]; 44.24 [25]; 77.9 [10]; cf. Lm 5.20). A declaração em forma de lamento em Isaías 49.14 está relacionada a esse tipo de expressão. O terceiro tipo de lamento é uma afirmação de que Deus não se esquece daqueles que pertencem a ele (SI 9.12, 18 [13, 19]; contrastar com 10.11; cf. Dt 4.31). 5. Na literatura profética, a recusa de Deus em esquecer-se aparece em declarações de julgamento (Os 2.13 [15]; 4.6; Am 8.7) e na proclamação da salvação para a Jerusalém arrui nada durante o exílio (Is 49.15), quando se diz que o amor zeloso de Deus transcende o amor de uma mãe pelo filho. P-B Na LQ, 1Q22 2:4 repete a advertência de Deuteronômio 8.14, enquanto 4QpOsa 2.3 comenta sobre Oséias 2.8 [10] em termos de esquecer-se de Deus, fazendo alusão a Oséias 13.6. NT As formas de uso do vb. epilanthanomai, esquecer, tendo como sujeito o ser humano, incluem: o descaso para com a importância da revelação divina (Mt 16.9,10); o esquecimento de experiência passadas (Filipenses. 3.13); e a negligência diante das responsabilidades cristãs (Hb 13.2, 16). O uso com o sujeito divino em Lucas 12.6-7; Hebreus 6.10 dá continuidade à declaração de confiança em Deus encontrada no AT. L em brança, proclam ação, m em orial: # 2349)
zkr 1 (lembrar, realizar uma oferta memorial,
105
13®' (# 8896)
B ib l io g r a f ia
THAT 2:898-904; S. Balentine, The Hidden God: The Hiding o f the Face o f God in the Old Testament, 1982, 136-43; W. Zimmerli, Ezekiel 2, 1983. Leslie C. Allen 8895 (sakêah, esquecer-se), -> # 8894
8896
13®'
13® (skk) q. descer, diminuir; acalmar (# 8896).
AT No q., esse vb. refere-se às águas do dilúvio (Gn 8.1) ou à ira, de um rei se aplacando (Et 2.1; 7.10); Jeremias 5.26 é uma passagem problemática (ver Emerton; W. McKane, Jere miah, ICC, 1986, 1:132-33; W. Holladay, Jeremiah 1, Hermeneia, 1988, 193). O hi. é atestado em Números 17.5 [20], Insignificância, pequenez, indignidade: es II (pequeno, pouco, # 837); -> dll I (ser peque no, sem importância,# 1937); -> 'êr (pequeno, #2402); -> hwr II (diminuirem quantidade, # 2579); -> hsr (reduzir, decrescer, privar, # 2893); hrh II (desaparecer, estar em número reduzi do, #3014); m 't (estar em pequeno número, reduzir, tomar-se pequeno, tomar-se reduzido em número, # 5070); (ser pouco, insignificante, tomar-se pouco, # 7592); -> qtn (ser pequeno, pouco, diminuir, # 7781); -> skk (descer, abater, atenuar, # 8896); sême.'j (pequeno, # 9066) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:923; J. A. Emerton, “Notes on Some Problems in Jeremiah ver 26,” FS Cazelles, AOAT 2 12, 1981, 125-33. M. Daniel Carroll R.
ggçy ^ • ^3® (íW),q. ser privado (de filhos, pela morte); pi. cau----------------------------------------------- sar privação, abortar, privar (de filhos); hi. abortar (# 8897); Vo® (Sekôt), subs. privação, perda dos filhos (Is 47.8,9; SI 35.12) (# 8890); Vl3®' (íafotó/), usado 3x na analogia de uma ursa “roubada” de seus filhotes, para expressar veemência (2Sm 17.8; Pv 17.12; Os 13.8), na maldição de Jeremias contra seus perseguidores (Jr 18.21) e com relação a uma bela fileira de dentes brancos, com todos os dentes presentes, sem que haja algum faltando (Ct 4.2; 6.6) (# 8891); ^ 3 ® (sãkúl), desolado (pela perda de um ente querido) (# 8892); □ ,<73® (sikkulím), subs. falta de filhos, privação, somente em Isaías 49.20 (# 8898). OMA O vb. tkl com o sentido de “ficar sem filhos” ocorre no ugar. (KTU 1.100, linha 61). AT 1. Em vários casos, skl descreve a forma do castigo de Deus sobre seu povo pela de sobediência. Deus não irá amaldiçoar o povo com esterilidade, mas sim, tomar dele com vio lência os filhos que já têm, usando de meios como a espada (Dt 32.25; ISm 15.33; Lm 1.20) e animais selvagens (Lv 26.22; Ez 5.17; 14.15). O que pode ser mais doloroso e grave do que a perda de uma vida em sua tenra idade? Porém, o fato de Jó ter perdido os filhos demonstra que nem todas as tragédias desse tipo devem ser explicadas como sendo decorrentes da degeneração moral dos pais. Jesus indica essa mesma interpretação ao responder a pergunta de seus discípulos sobre o motivo da cegueira congênita de uma pessoa (Jo 9.1-5). 106
□3® f (# 8899)
2. Jacó expressa dor antecipada pela possível perda do filho mais novo, Benjamim (Gn 43.14), e Rebeca faz o mesmo com relação a Jacó e Esaú (Gn 27.45). Nesse último caso, se Esaú matasse Jacó, estaria sujeito à pena de morte de acordo com a vingança de sangue. 3. Outra idéia transmitida por esse radical é a de aborto: no caso de uma mulher (Ex 23.26 [no contexto de uma promessa]; Os 9.14 [uma oração imprecatória]); no caso de animais (ovelhas e cabras; algo que não aconteceu enquanto Jacó cuidou dos rebanhos de Labão; cf. Gn 31.38; Jó 21.10); no caso da terra ao tornar-se improdutiva (2Rs 2.19,21; Ml 3.11). A expressão yãs6 ’ú y^lãdeyhã (lit. “seus filhos saírem”, Êx 21.22) recebe interpreta ções divergentes. A versão Revista e Atualizada traz: “Se homens brigarem, e ferirem mulher grávida, e forem causa de que aborte...” Essa lei específica ocorre dentro de uma subunidade do Código da Aliança (Êx 20.22— 23.33) que trata de várias leis sobre lesões físicas (21.1836). Se não há uma lesão mais séria (na mulher? no feto? em ambos?), o ofensor deve pagar uma multa. No caso de lesão permanente, é aplicada a lei de retaliação (ou seja, lex talionis, pena de talião), “vida por vida, olho por olho, dente por dente”. Essa lei em particular não era, de modo algum, brutal ou primitiva. Antes, defendia (1) o princípio de justiça imparcial para todos e (2) a idéia de que a pena devia ser proporcional ao crime, nem mais nem menos (Childs, Exodus, 472). O código de Hamurábi (leis 209-14) trata da questão desse tipo de aborto. As penas são decrescentes, dependendo da condição social da mulher que sofre o aborto: uma mulher de classe social elevada — 10 siclos de prata se ela perder a criança, morte ao ofensor se a mãe falecer; a filha de um homem do povo — 5 siclos se ela perder a criança, meia mina de prata se a mãe falecer; uma escrava — 2 siclos se a criança morrer, um terço de mina se a mulher falecer (A N E T 184-85). Em contraste com o Código de Hamurábi e a lei hit., a lei bíblica não faz distinção alguma com base na classe social da mulher ferida. NT
-> N ID N TT1:176-88.
Esterilidade, atecnia, aborto: -> galmúd (estéril, # 1678); -> nêpel (natimorto, aborto, # 5878); -> 'ãqãr (estéril, sem filhos, # 6829); -> ‘aríri (sem filhos, # 6884); -> skl (ser privado, ser destilhado, abortar, # 8897) B ib l io g r a f ia
R. K. Harrison, “Untimely Birth,” IDB 4:735; G. Lee, “Miscarriage,” ISBE 3:383. Victor P. Hamilton 8898 (sikkulím, ausência de filhos, tristeza pela morte de um ente querido),
# 8897
031P (skm), hi. chegar cedo, levantar-se cedo, estar an sioso (# 8899). OMA O termo skm é encontrado no ugar. (tkm) e em várias outras línguas sem. como subs., significando ombro, e como vb. derivado desse subs., com o sentido de levar sobre os ombros (HALAT 1383). AT 1. É provável que a relação original com ombro ( # 8900) tenha se perdido no he braico. O significado habitual “levantar-se ou fazer algo cedo” provavelmente é derivado, por 107
DD® (# 8900)
metonímia, da prática realizada bem cedo pela manhã, de colocar-se sobre os ombros de uma pessoa ou o lombo de um animal as provisões para a jornada (cf. Gn 21.14; 22.3). Pode haver ainda, por extensão, a idéia de ansiedade para a realização de uma tarefa (GKC, 113k). Com freqüência, a hora de levantar-se é caracterizada ainda como “de madrugada” (Gn 19.27; ISm 29.10) ou “ao subir da alva” (Js 6.15; 1Sm 9.26). 2. Partir logo pela manhã era uma questão prática, mas no caso de Abraão, também refletia sua obediência resoluta a Deus, ao realizar uma tarefa que lhe era desagradável (Gn 19.27; 21.14; 22.3; contrastar com a procrastinação em Jz 19.5, 8,9). A adoração (Êx 32.6; Js 6.12; ISm 1.19; 2Cr 29.20; Jó 1.5)eas batalhas (Nm 14.40; Js 8.14; 2Rs 3.22) eram realizadas de modo mais adequado logo cedo. Uma liderança corrupta é condenada por levantar-se cedo para beber (Is 5.11) em vez de trabalhar (2Sm 15.2; SI 127.2). Aqueles que se levantavam cedo costumavam descobrir o que Deus ou homens haviam feito, como por exemplo, um exército vivo (2Rs 6.15), um exército morto (2Rs 19.25), um deus tombado (ISm 5.3, 4) ou um altar destruído (Jz 6.28). O desaparecimento rápido do orvalho da manhã é uma metáfora vivida para a devoção superficial de Israel a Deus (Os 6.4) e reflete-se no desaparecimento igualmente súbito da própria nação de Israel (Os 13.3). 3. Em Jeremias, skm ocorre como o primeiro de dois infinitivos absolutos (1 lx; também 2Cr 36.15). Ao manter o significado habitual (começar de madrugada e enviar), pode-se ob ter uma metáfora nítida dos atos zelosos de Deus. Porém, é mais provável que se trate de uma expressão idiomática que significa “sempre e de novo”. Em oráculos de julgamento, a decisão persistente de Israel de rejeitar os profetas só toma ainda mais grave a culpa dela (Jr 7.25; 25.4; 29.19; 35.15, inclusive a rejeição sofrida pelo próprio Jeremias em 25.3; 26.5). Sofonias 3.7 descreve a determinação persistente de agir-se de modo corrupto. P-B
O significado principal na LQ e na LXX é levantar-se cedo (CD 10.19; 11QT 17.9).
Cedo, anterior, frente: qdm (estar diante de, encontrar-se com, confrontrar, # 7709); -> skm (chegar cedo, levantar-se cedo, estar ansioso, # 8899) B ib l io g r a f ia
S. J. P. K. Rieckert, “The Cordinated Structs [sic] o f the Infmitive Absolute in Jeremiah and Their Bearing on the Stylistics and Authenticity o f the Jeremianic Corpus,” JNSL 13, 1977, 97-107; H. Weippert, Die Prosareden des Jeremiabuchers, 1973, 123-27. P. P. Jenson
DD® (sekem I), subs. ombro, o ato de voltar as costas (# 89Ó0). Ver o comentário em TWOT 2:924 sobre a rela ção do termo com skm, levantar-se cedo ( -¥ # 8899). 8900
DD®
OMA Ugar. (km ombro (WUS, # 2866). AT 1. A palavra l&kem, ombro, refere-se mais precisamente, em termos anatômicos, à parte superior das costas e pescoço, e é usada exclusivamente para as pessoas. A única exceção é a bênção de José por Jacó, que contém a promessa de um ombro ou “declive” de terra tomada dos amoritas (Gn 48.22; cf. 34.25-29 e o relato do segundo sepultamento de José em Siquém, Js 24.32). Na maioria das vezes, í ekem denota o ato de carregar algo nos ombros como forma de transportarem-se materiais de construção (p. ex., Js 4.5; Jz 9.48) ou bens pessoais (Jó 31.36). 108
p t f (# 8905)
Ao que parece, insígnias decorativas eram exibidas publicamente sobre os ombros como símbolo de honra ou autoridade (cf. Is 22.22). Tamanha era a certeza de Jó de sua inocência diante de Deus que estava disposto a usar a acusação, imputada a ele, sobre os ombros, quase como uma insígnia de martírio (Jó 31.36). 2. Os ombros também são usados como símbolo de trabalho e servidão, especialmente da escravização de Israel por um opressor estrangeiro (o Egito no SI 81.6 [7] e a Assíria em Is 14.25). E claro que no fim dos tempos, o Messias de Javé quebrará o jugo da servidão (Is 9.4 [3]; 10;.27) e levará sobre seus ombros a responsabilidade de estabelecer um governo de retidão e justiça (Is 9.7 [5]) 3. A expressão “do ombro para cima” (ISm 9.2; 10.23) significa, literalmente, que Saul era mais alto que todo o povo “do ombro e continuando para cima” (cf. Klein, 1 Samuel, WBC 10, 1983, 80). Semelhantemente, o termo “todos”, em Sofonias 3.9, pode ser traduzido com a expressão “um só ombro”, simbolizando união entre aqueles que são fiéis a Deus. 4. Por fim, o ato de voltar {pnh) as costas (ombros) significa partir ou sair (ISm 10.9), ou mesmo recuar covardemente na batalha (syt sekem, SI 21.12 [ 13]). Ombro: -> kãtêp (ombro, lado, encosta, # 4190); -> sekem I (ombro, # 8900) B ib l io g r a f ia
ISBE 4:493; TWOT 1:459-60; 2:924; W. von Soden, "Hiskim < sokem ‘Morgen’ Nicht ‘Schulter’,” UF 13, 1981, 162. Andrew E. Hill 8901 (Kkem II, Siquém), -> Siquém
pu?’ (skn), q. assentar-se, ficar, parar, descansar; assen tar-se (para viver em algum lugar), viver em, residir, habitar; pi. permitir, fazer (alguém ou algo) habitar; hi. assentar (alguém), permitir, fazer (al guém ou algo) habitar; (miskãn), subs. lugar de habitação, tabemáculo ( # 5438); p t f (sãkên), subs. vizinho ( -> # 8907). 8905
p tf
OMA Tanto o vb. quanto o subs. são conhecidos no vb. assír. sakãnu, pôr, colocar, estabelecer (uma habitação); situar-se (numa cidade); subs. maskanu, lugar, lugar de habitação; AB vb. sekên, habitar; subs. miskãn, habitação (de Deus). AT 1 . 0 radical do vb. parece significar “viver, habitar”. Apesar de ser ocasionalmente combinado com sinônimos aproximados como ysb, habitar ( # 3782), e gwr I, permanecer de passagem ( -> # 1591; Jz 5.17; SI 15.1; 120.5; Is 18.3), o vb. reflete a habitação ou descanso sempre de caráter mais temporário do que ysb, porém mais permanente do que gwr. . O subs. miskãn refere-se sempre ao “tabemáculo” ou santuário móvel em forma de tenda que ocupa posição importante nas narrativas de Êxodo e da jornada pelo deserto. E o precursor do templo de Jerusalém (Êx 25.9; 26.6-35; 38.21-31; 40.5-38; Lv 3.7-38). 3. O vb. ocorre com a prep. be— indicando o lugar de habitação (Nm 14.30; SI 139.9; Jr 25.24). A prep. 'al também aparece, marcando o lugar de habitação (Êx 40.35; Ez 31.13; Jó 3.5), enquanto em outras ocasiões o termo sam, lá, é empregado, por vezes com o hê locale (Dt 12.11; 14.23; Is 65.9). Diz-se que pessoas habitam (skn) no deserto (Jr 25.24), na terra
2
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p t f (# 8905)
(Pv 2.21; Is 18.3), nas fendas das rochas (Jr 49.16; Ob 3), em tendas (Jz 8.11) e entre os ho mens (SI 78.60). 4. Esse é o vb. usado para dizer-se que as aves fazem seu ninho ou encontram abri go (skn) nos galhos de uma árvore (SI 104.12; Isaías 34.11; Ezek 17.23; Ez 31.13). Em ou tras passagens, pode-se encontrar a imagem da ave chegando ao fim do vôo e “pousando” ou “detendo-se” (SI 55.6; 139.9). A mesma imagem de deter-se ou parar é empregada em vários casos para nuvens (nas narrativas do deserto, constituem uma representação da presença glo riosa de Javé) que se assentam temporariamente sobre a terra (Nm 9.17; Jó 3.5), sobre o pico de montanhas (Ex 24.16) ou sobre o tabemáculo (Ex 40.35; Nm 9.18, 22). Fica evidente que se trata de um fenômeno temporário. 5. Um terço das ocorrências desse vb. tem Deus como sujeito. Diz-se que Deus habita no monte Sião (J1 3.17 [4.17]) e também no meio (betôk) do seu povo, Israel (Êx 25.8; 29.4546; Nm 5.3; 35-34; IRs 6.13; Ez 43.7,9; Zc 2.14-15). Deus não habita com seu povo em fun ção do caráter especial de Israel, mas simplesmente por amor, clemente e imerecido (cf. Dt 7.7-8; 9.1-6). Porém, uma vez estabelecida, a presença de Deus requer uma vida de santidade por parte dos israelitas (cf. Lv 11.44-45; 20.7-8,26) a fim de evitarem-se a contaminação e as conseqüências destrutivas do pecado (Nm 5.3; 35.33-34). . Num uso especial deut. do vb. pi., diz-se que Deus escolhe um lugar para “fazer habitar o seu nome” (Dt 12.11; 14.23; 16.2, 6,11; 26.2; Ne 1.9). Assim, a habitação de Deus é associada a um único santuário, num lugar escolhido por ele dentro da terra prometida (Dt 12.5,6). Apesar de nenhuma dessas referências afirmar expressamente que esse lugar deve ser Jerusalém e que o santuário deva ser o templo, a implicação clara do ensinamento deut. e da reforma posterior realizada pelos reis Ezequias (2Rs 18) e Josias (2Rs 22) é de que se tinha em mente esse templo/santuário central. O fato de o santuário de Siló ter cumprido esse pa pel fica implícito nas narrativas de 2 Samuel e nos comentários pejorativos posteriores com referência à perda de prestígio e destruição de Siló, associada à corrupção dos descendentes sacerdotais de Eli. A tendência de grande parte dos estudiosos é considerar essa preocupação com um santuário central como um movimento do final do período da monarquia ou mesmo do tempo do exílio. Seu objetivo era superar as influências debilitantes do culto sincrético praticado nos lugares altos por todo o país centralizando toda a adoração em Jerusalém, onde poderia ser con trolada com maior zelo. De acordo com essa concepção, as palavras de Moisés com referência ao estabelecimento de um santuário central (Dt 12.5-6) são uma retrojeção de idéias posterio res. Outros explicam que as limitações mosaicas aplicam-se somente a certas comemorações ou sacrifícios que deviam ser realizados onde quer que a Tenda da Congregação e a arca da aliança estivessem. Era possível oferecer outros sacrifícios de modo legítimo nos lugares al tos ou em altares criados de improviso para situações especiais. De fato, nas ocasiões em que a Tenda da Congregação e a arca da aliança ficaram separadas uma da outra (cf. ISm 4-7), as circunstâncias exigiram que se oferecesse sacrifícios em outros lugares. Apesar de essa última concepção defender a validade das declarações mosaicas e pro porcionar explicações plausíveis para o uso constante dos altos, não apresenta uma resposta convincente para as evidências arqueológicas de lugares que aparentemente eram santuários oficiais além do templo de Jerusalém, em fortalezas como Arade, durante o perído monárqui co. (Ver Niehaus, 3-30.) 7. O uso do vb. skn enfatiza descanso e estabilidade relativos depois de um período de movimento. Esse descanso é um tanto provisório, tendo sempre a memória de um tempo ante rior quando o repouso era algo elusivo. O vb. é apropriado para descrever o uso de tendas pelas
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pu? (# 8907)
nômades (Jz 8.11). Por vezes, há um sentido mais permanente de “assentamento” associado ao vb., especialmente quando se refere a povos que costumavam ser nômades, mas que passaram a viver de modo mais sedentário em vilarejos. Diz-se que os descendentes de Ismael “habita ram de Havilá até Sur” (Gn 25.18) e, de acordo com a descrição do Salmo 78.55, Deus — o sujeito do verbo — “fez habitar as tribos de Israel” em seus territórios devidamente repartidos. Juizes 5.17 fala de três tribos que “assentaram-se” em locais diferentes, e os vbs. emprega dos são Skn,ySb e gwr. A tradução, usando vbs. que deixam implícita uma permanência mais longa (ficar, assentar-se, repousar), pode ser apenas uma tentativa de introduzir-se variedade no contexto, mas tem o efeito indesejado de obscurecer a natureza provisória e impermanente dessas ocupações. . Com referência a Deus, o termo (skn) afirma a liberdade e transcendência de De dando espaço, simultaneamente, para sua presença imanente e bondosa no meio de seu povo (Ez 43.1-9). A presença de Deus com Israel é, ao mesmo tempo, próxima e real e, no entanto, em momento algum garantida como uma situação permanente. O chamado á santidade está associado à habitação de Javé, o Deus Santo, no meio de Israel. A grande importância desse chamado vem da lembrança de tempos passados, quando Deus não habitava com Israel daquela forma, e da probabilidade assustadora de um futuro árido sem Javé.
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Casa, habitação, tabernáculo: bayit I (casa, habitação, construção, família, dinastia, # 1074); ysb (habitar, # 3782); -> mã'ôn II (covil, habitação, # 5061); -> nwh I (descansar, # 5657); skn (assentar-se, # 8905) B ib l io g r a f ia
THAT 2:904-9; J. Niehaus, “The Central Sanctuary: Where and When,” TvnBul 43, 1992, 3-30. GeraldH. Wilson
pu? (Sãkên), adj. ou part. masc. estativo > subs., resi dente, habitante; o vizinho, o próximo (20x; # 8907; HALAT 1389b); npU?'* (*Sekênã) ou nJDÇ?* (sekenet), fem. residente, habitante; a vizinha (2x; HALAT 1389b). 8907
pu?
OMA Ao que parece, a forma sem. mais atinga *skn era uma combinação do causativo formativo Sa + o lexema kn, levantar, erguer (ou seja, sa-kin > Sa-ken; cf. GKC §44c na forma pausai do heb. sãkên, em Dt 33.12; Haupt, “Psalm,” 222, “Wurzeln,” 248; GVGSS 1:522, §257; Thierry, 3-5; Wãcher, 382-83; TWAT1:1340a). Porém, como resultado da obsolescência gradual do formativo s, a morfologia orignal de *skn, fazer levantar (?), estabelecer (?) pode ter-se tomardo indefinida de modo que a forma passou a ser tratada como um radical trilítero comum, Skn (trans.), pôr, estabelecer, depositar, (estativo/intrans.) assentar. Conseqüentemente, as línguas cognatas representam tanto os sentidos trans., pôr, designar, estabelecer, como os sentidos estativos/intrans., estar parado, estar presente, residir, habitar, morar. Podem-se encontrar cognatos do subs. heb. sakên entre os adj. e subs. do vb. acad. Sakãnu(m), (trans.) colocar, depositar, estabelecer, designar (alguém para um cargo); (estativo/ intrans.) estar presente, existir, estar situado (com referência a uma cidade) (CAD, § / 1, [116b57b] 130b-34a; cf. AHw, 3:1134b-39a). Entre alguns cognatos acad. importantes, encontram-se as formas subs. Sakittu, acúmulo (de água) e siknu C, sedimento (em canais) (CAD, S /l, 169a; 111
1?® (# 8907)
S/2, 439b), o adj. Saknu (fem. sakintu/Sakittu), depositado, amontoado, estabelecido (CAD, S/l, 178b-80a) e as formas subs. maSkanu, local (de construção, obra), residência e maSkãnu, depósito (CAD, M /l, 369a-73b, 374a). O subs. derivativo Skní, vizinhos(?) (de Thatmanatu, uma filha de Kirtu) está relacionado com o vb. ugar. skn, habitar, morar (WUS, n. 2606; UT, n. 2414; CML2 158b), o que é atestado em Kirtu (KTU 1.16:11.53; cf. de Moor-Spronk, 186; Jz 11.38). Entre outros derivativos cognatos, estão aqueles relacionados ao fen. skn, morar, as sentar, inclusive o subs, Skn, habitação (KAI 2:54; DISO 299; Tomback, 316); o vb. ár. sakana, ficar parado, quieto, inclusive as as formas subs. sakan, habitação; sakina, residência; sakina presença (divina) e especialmente as forma subs. sãkin, habitante, residente, morador; musãkin vizinho, concidadão; e o adj. tnaskün, habitado, populado (Wehr, 418a-19a); o vb. et. sakana (LLA 381); e o vb. tigrésakna, assentar, habitar (TigrWb 191-92). O subs. sam. SêkPn, vizinho, apresenta um outro cognato com uma relação muito próxima. AT O subs. heb. sãkên, juntamente com seu equivalente fem. *Sekênâ ou *Sekênet, repre senta um adj. estativo ou um part. relacionado ao vb. Skn, assentar, morar, residir (131 x; # 8905). A forma masc. ocorre cerca de 20x no AT (inclusive em Salmos, 6x; Jeremias 5x); o fem. ocorre 2x. Com o significado de morar/habitar, sãkên ocorre juntamente com yõsêb, habitação, em Is 33.24, o último v. de uma longa descrição da exaltação de Sião e seu rei depois do casti go (Is 31-1— 33.24: “Então, nenhum morador dirá, ‘Estou doente’; o povo habitando ali [em Sião] será perdoado por suas iniqüidades” (tr. do autor). A const. de Sãkên é usada de maneira semelhante em Oséias 10.5: “O(s) habitante(s) de Samaria — estremecerão por causa do be zerro (LXX, Pex.; bezerros, MT) de Bete-Áven” (tr. autor). No sentido de vizinho/próximo, sãkên ou seu equivalente fem. denota aquele que resi de em algum lugar geograficamente próximo e, assim, pode designar o vizinho da habitação ao lado ou um parente (o vizinho mais próximo da casa, Êx 12.4 [sing. masc.]); vizinhas (Rt 4.17 [pl. fem.]; 2Rs 4.3 [pl. masc.]), uma estrangeira na vizinhança (Ex. 3.22 [sing. fem.]) ou nações com as quais se faz fronteira, como nos Salmos 44.13 [14] e 79.4 (pl. masc.; cf. v. 12): “Tomamo-nos o opróbrio dos nossos vizinhos (liSkênênü), o [objetos do] escárnio e a zombaria dos que nos rodeiam (lisbibôtênú)” (cf. SI 80.6 [7]; o Egito como vizinho devasso de Judá em Ez 16.26; a destruição dos vizinhos de Edom em Jr 49.10; as nações como vizinhos escamecedores do reino de Davi no Salmo 89.41 [42] e as nações como vizinhos perversos para com o povo de Javé em Jr 12.14). É possível que haja certa relevância no fato de tantas dessas últimas passagens, nas quais sãkên refere-se a nações vizinhas, retratarem os vizinhos de Israel de modo pejorativo e no contexto retórico da queixa de Israel ou da ameaça de julgamento divino. No AT, às vezes Sãkên aparece juntamente com rêa', amigo. Num par. tricola (de três idéias), Provérbios 27.10 adverte sobre uma situação na qual a lealdade de um vizinho ami gável pode ser mais forte do que a de um membro da família: “Não abandones o teu amigo (rê ‘akã), nem o amigo (K: vfirê ‘eh, Q: w^rêa') de teu pai, nem entres na casa de teu irmão no dia da tua adversidade. Mais vale o vizinho (Sãkên) perto do que o irmão longe”. Em Jeremias .21, que descreve outra situação em que o parentesco e a amizade são testados, é possível que sãkên forme um par estereotípico juntamente com rê a ': “Eis que ponho tropeços a este povo; neles cairão pais e filhos juntamente; o vizinho e o seu companheiro perecerão”. No Salmo 31.11 [12], lisakênay, para os meus vizinhos (cf. GCK § lOg) é par. a limeyuddã'ãy, aos meus conhecidos (part. pu.). Deuteronômio 1.7a apresenta um exemplo de sãkên que denota não pessoas vizinhas, mas regiões contíguas: “Entrai na região montanhosa dos amorreus e todas as suas cercanias
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nstf (# 8910)
(Sekênãyw) — o Arabá, a região montanhosa, o Sefelá, o Neguebe e a costa marítima” (tr. do autor) (cf. cidades e cercanias de Sodoma e Gomorra, Jr 49.18; 50.40). P-B O heb. pós-bíblico atesta um subs. masc. Sãkên e um fem. Sekênâ, colono, vizinho (Jastrow, 1575b; G. Dalman, Aramaische-neuhebrãische Wõrterbuch, 3a. ed., 1938, 423b). Os MMM indicam um uso do termo no 4QTestim 24: wmhth Ikwl Sknyw, e um terror para to dos os seus vizinhos (KQT, 220). Outros cognatos pós-bíblicos são o aramJ Sekênã ', vizinho (Jastrow, 1573b) e derivativos do vb. sir. Seken, assentar, descansar, o adj. Sekinãyã, perpé tua, habitando constantemente; o subs. Seknã, um demônio (habitando em um ser humano) e o adj. Sekãnã' habitante, permanente (J. Paybe Smith, A Compendious Syriac Dicitonary, 1903, 576b-77b). B ib l io g r a f ia
THAT 2:904-9; TWAT 7:1337-48; TWOT 2:925a-26b; H. F. Beck, “Neighbor,” IDB, 3:534b35b; R. Cook, “The Neighbor Concept in the OT,” diss., Southern Baptist Theological Semi nary, 1980; M. Dietrich, O. Loretz e J. Sanmartin, “KÜN-S und §KN im Ugaritischen,” UF 6, 1974, 47-53; P. Haupt, “Der achtundsechzigste Psalm,” AJSL 23, 1907, (220-40) 226; idem, “Die semitischen Wurzeln QR, K.R, XR,” AJSL 23, 1907, (241-52) 248; J. J. Hughes e N. J. Opperwall, “Neighbor,” ISBE, 3:517b-18b; J. C. de Moor e K. Spronk, “Problematical Passages in the Legend of Keret i.,” UF 14, 1982, (153-90) 186; G. J. Thierry, “Notes on Hebrew Grammar and Etymology,” OTS 9, 1951, (1-17) 3-5; R. S. Tomback, A Comparative Semitic Lexicon o f the Phoenician and Punic Languages, SBLDS 32, 1978; L. Wâchter, “Reste von Safel-Bildungen im Hebrãischen,"ZA W 83, 1971, (380-89), 382-83, 388-89. Robert H. O 'Connell
"D1P' {Skr), q. estar ou ficar bêbado; pi., hi. embriagar alguém; hitp. agir como um bêbado (# 8910); TÍ31P {Sikkôr) embriagado (# 8893); "DU? (Sekãr) cerveja (# 8911); "DU7 (Sãkur), bêbado (# 8912); fra ç ? (sikkãrôn) embriaguez (# 8913). 8910
-DU>
OMA Há cognatos para o heb. Skr em várias línguas sem. (HALAT 1390). Assim como no heb., o acad. Sakõru refere-se a estar bêbado (CAD 17 i, 157) enquanto o subs. Sik(ã)ru é uma bebida alcoólica, normalmente cerveja (AHw, 1139). A cerveja era uma importante oferenda para os deuses que, de acordo com os mitos, bebiam excessivamente. Fazer cerveja e beber em excesso era uma atividade humana característica. Assim, a descoberta da embriaguez por Enkidu na Epopéia de Gilgamexe (ANET, 77) é parte do processo pelo qual ele se distancia da natureza e descobre sua humanidade. Num texto ugar., o banquete depois da vitória de Baal resulta na embriaguez dos deuses (Skr, KTU 1, 114). Em geral os textos do OMA consideram a embriaguez uma questão relativamente inofensiva e falta-lhes a mesma percepção do perigo moral e religioso daquela, presente em diversas passagens bíblicas. AT 1 .0 termo Sêkãr costuma ser encontrado em conjunto com vinho (Nm 28.7; SI 69.12 [13] são exceções). É difícil determinar se a palavra refere-se a um determinado tipo de uva para vinho, ao vinho feito de algum outro produto e não de uvas ou a algum algum tipo de cerveja feita das cascas da cevada. E bem possível que Sêkãr seja o termo original para todas as bebidas alcoólicas. Posteriormente, quando o vinho de uva tomou-se um artigo importante. 113
n31P'(# 8910)
passou a ser descrito com um termo estrangeiro tomado emprestado (yayin; -> # 3516) e sêkãr continuou abrangendo todos os outros tipos de bebida alcoólica, inclusive o vinho de tâmaras, figos ou romãs e a cerveja de cevada. De acordo com Jerônimo (Epistle adNepotianum ii, 11), o sicera hebrao podia ser feito de cereais, uvas ou mel (de tâmaras). A antiga Palestina não conhecia técnicas de destilação, mas a associação desse radical com a embriaguez sugere que sêkãr podia se referir a um determinado tipo de vinho forte (no 11QT 21:10 sêkãr é uma apo sição para “vinho novo”). Os dois termos em conjunção ou par. compreendiam todos os tipos de bebidas alcoólicas (Lv 10.9; Is 56.12). Tanto o sêkãr quanto o vinho eram misturados com especiarias (Is 5.22). 2. As grandes festas e os banquetes de famílias eram boas oportunidades para a compra e consumo de sêkãr(D t 14.26; cf. ISm 1.12-16). A libação ( nesek, # 5821) normalmente é constituída de vinho, mas, em Números 28.7-8, é possível que sêkãr seja um tipo de provisão especial para o santuário (J. Milgrom, Numbers, 1990, 240). Existe um tom de advertência na instrução para que os sacerdotes israelitas não tocassem em vinho ou cerveja enquanto esti vessem ministrando (Lv 10.9; cf. Ez 44.21). A mesma proibição aplicada aos nazireus (Nm 6.3; Jz.. 13.14) é uma das formas pelas quais sua condição de santidade os toma semelhantes aos sacerdotes. 3. A embriaguez — e não simplesmente beber — é indicada pelo vb. Skr e pelos subs. derivados sikkãrôn e Sikkôr. A maioria das referências à embriaguez está associada a reis e pessoas abastadas, que podiam pagar pelas grandes quantidades de bebida necessárias para chegar-se àquele estado. Era um sinal de corrupção (5.22-23), negligência do dever (5.11) e insensatez mortal (1 Sm 25.36; 1Rs 16.9; 20.16). Noé, o primeiro homem a plantar uma vinha, também é o objeto da primeira menção à embriaguez (Gn 9.21). Esse seu estado associa-se à vergonha da nudez (cf. Lm 4.21; Hc. 2.15) e, possivelmente, à conduta sexual imprópria (cf. Gn 19.32-35). Um texto ugar. enfatiza os deveres de um filho para com o pai embrigado. Deve “segurar a mão dele durante sua embriguez (Skrn) / carregá-lo [quando] estiver cheio de vi nho (yn)” (CML2 104). O comportamento reverente de Sem e Jafé contrasta claramente com a inércia de Cam. A bênção e a maldição proferidas por Noé antevêem ou refletem a idéia de diferentes características e destinos para as nações de Canaã, para os descendentes de Cam e Israel e para os descendentes de Sem (Gn 9.22-27). 4. Os profetas usam a embriaguez como metáfora para os efeitos da ira de Deus sobre Israel ou sobre as nações. Assim como um bêbado, uma nação julgada é um retrato do ridí culo (Jr 48.26), impotente para se defender (Is 51.39, 57) e sujeito a envolver-se em brigas irracionais (Is 13.12-14) e a perder o controle (Pv 20.1; Is 19.14; 29.9; cf. 23.9). Deus levará as nações a experimentarem a vergonha da embriaguez fazendo-as beber do cálice da sua ira (Jr 25.27-29). Em Jeremias 51.7, o cálice recebe uma identidade histórica e um caráter real e militar temível e, nesse v., a Babilônia é chamada de “copo de ouro na mão do Senhor”. A imagem de pássaros e setas embriagados pela grande quantidade de sangue também se refere ao castigo divino (Ez 39.19; Dt 32.42). 5. O ato de beber (sql, hi. Gn 19.32-35), o vinho (yayin || tírôs, Os 4.11) e o cálice (Ms, Is 51.17,22) também causam a embriaguez. A literatura de sabedoria tem consciência do cará ter ambíguo da bebida (Ecli 31.25-31). Provérbios descreve como ela traz alegria, satisfação e conforto antes da morte (Pv 31.6-7), mas a maioria dos textos aconselha a sobriedade ao des crever os efeitos debilitantes da bebida sobre a mente, o corpo e a alma (Pv 23.29-35). A ironia e o realismo advertem que a bebida pode causar dependência (Pv 20.1; 26.9; cf. 23.35). P-B 114
Nos Trgs. e na LXX, o subs. normalmente é apenas transliterado (cf. Lc 1.15).
2*70? (# 8917)
Bebedouro, extração de água, alagamento: -> gm ’ (engolir, beber, # 1686); g r ‘ II (puxar [gotas d’água], # 1758; -> dlh I (tirar água, # 1926); -> >r/i II (dar de beber, # 3722); -> / “ II (beber ruidosamente, # 4363); (lamber, sorver, # 4379); (beber, tragar, # 5209); -> nvA (saciar a sede, embriagar, regar, encharcar, # 8115); -> S ( t i r a r [água], # 8612); -> £/) (dar de beber, refrescar, # 9197); -> sf/i II (tirar água, dar de beber, # 9272) Uvas — suco, vinho: ga/1 (lagar, # 1780); ífe/wa ‘ (suco tirado do barril de vinho, # 1964); hõme$ (vinagre, vinho, cerveja, # 2810); -> hemer (vinho, vinho espumante, # 2815); -> yay/M (vinho, # 3516); -> (barril / tonel de vinho, lagar, # 3676); -> >rs II (pisar sobre o lagar / as uvas, # 3770); »;/;/ (adulterar o vinho, # 4543); -> mezeg (vinho com especiairias, vinho misturado / combinado com outra bebida, # 4641); m /ira (suco, # 5489); -> (suco de uva, # 6747); -> i/j; (espremer, prensar uvas, # 8469); -> semer I (borra, vinho enve lhecido, # 9069); -> //rói (vinho fresco, # 9408) B ib l io g r a f ia
TWAT 8:1-8. P. P. Jenson 8911 (sêkãr, cerveja), -> # 8910 8912 (Sãkur, embriagado), -> # 8910 8913 (ãikkãrôn I, embriaguez),
#8910
’2 < 7 0 (Jílb), pu. ser unido, encaixado (# 8917); subs. (sãlãb), travessa, viga; bordas, postes, estrutura (# 8918). Subs. relacionados ao termo, no Heb. mix., significam cunhas, tábuas entalhadas, degraus de uma escada. 8917
a to '
OMA Não se sabe de nenhum cognato.
AT 1. Uma forma do vb. ocorre somente em Êxodo 26.17 — uma parte das instruções para a construção do tabemáculo — e em seu correlato em Êxodo 36.22 — uma parte da descrição da execução das instruções anteriores. Nas duas passagens, refere-se às partes que criavam a estrutura do tabemáculo sendo unidas firmemente de alguma forma (por espigas de madeira, ressaltos ou cavilhas, dependendo da versão do texto). Numa possível tentativa de visualizar-se como o tabemáculo todo se encaixava, a LXX apresenta uma paráfrase de Hebreus 26.17 com o termo antipiptõ, colidir ou resistir, e não traz nada que represente a seção de Êxodo 36.22 referente à execução. 2 .0 subs., que aparece apenas no pl., ocorre somente em 1Rs 7.28 e 29. O termo pare ser usado para descrever um objeto, provavelmente uma travessa (ver A. R. S. Kennedy, HDB 4:660) que juntava (V g. juncturaé) as molduras das bases de dez pias de bronze. Infelizmente, nenhuma outra descrição da antiguidade dos utensílios do templo, como o Papiro do Templo (llQ T a), reproduz esse termo; a LXX apresenta uma paráfrase (3 Reis 7.15-16: “ressaltos”, exechotnena). Associação, adesão, companheirismo: -> dbq (grudar, agarrar, aderir, perseguir, # 1815); -> hõtfilim (união, # 2582); -> hbr II (unir, estar unido, encantar, fazer um aliado, # 2489); yhd 115
(# 8920)
(estar unido, # 3479); -> /w/i I (acompanharjuntar-se, apegar-se, # 4277); -> jpA I (apegar-se, associar-se, juntar-se, # 6202); -> ‘rb II (associar-se, misturar-se, ser misturado com, # 6843); -> rTi II (associar-se, ser padrinho de casamento, fazer amizade, # 8287); í/è (unido, en caixado, #8917) George J. Brooke 8918 (sãlãb, travessa),
#8917
8919 (slg, nevar), -» # 8920
8920
(íe/eg I), neve (# 8920); iVtP’ (i/g), vb. denom, hi. nevar (# 8919)
OMA Cf. acad. salgu (CAD, 17:24); aram. talgã’; ár. talg. AT 1. A neve é um fenômeno natural citado no AT. E mencionada com referência a con dições meteorológicas desfavoráveis em 2 Samuel 23.20 || 1 Crônicas 11.22, em que um dos valentes de Davi matou um leão dentro duma cova num dia em que nevava. Aparece também em Provérbios 31.21, em que a mulher prudente (“virtuosa”) não teme a neve pois providen ciou roupas adequadas para a família. a. A neve também é um objeto de comparação em Êxodo 4.6 e Números 12.10, a alvu ra da “lepra” é comparada à da neve. No Salmo 51.7 [9] e em Isaías 1.18, a pureza do pecado perdoado é comparada à alvura da neve. Assim como a neve que acabou de cair faz uma região triste e feia parecer limpa e fresca, também a feiúra do pecado é removida pela graça clemente de Deus. A diferença, obviamente, é que o pecado não é simplesmente encoberto, para voltar a ser revelado posteriormente (como no caso da neve que derrete), antes, o pecado é, de fato, removido. O pecador é limpo e purificado. b. Certas qualidades são equiparadas à neve. Em Isaías 55.10, a fecundidade e eficá cia da palavra de Deus é comparada aos efeitos da chuva e da neve sobre a terra. Assim como a chuva e a neve trazem fertilidade para a terra, a palavra de Deus é produtiva, realizando os propósitos dele. As promessas de Deus certamente se cumprirão; o Senhor levará a cabo tudo o que se dispôs a fazer. Assim, seu povo deve confiar nele e não nas promessas de homens ou falsos deuses. Em Provérbios 25.13, o efeito refrescante que a neve teria no calor da estação da colheita serve para ilustrar como um mensageiro fidedigno é agradável àqueles que o enviam (ver o contraste em Pv 26.6); Em Jó 24.19, a vulnerabilidade humana à morte é comparada com a vulnerabilidade da neve ao calor do sol. Assim como a neve derrete sob os raios quentes do sol, também o pecador é removido da terra pelo Seol. Em Lamentações 4.7, as condições do corpo bem cuidado dos nobres antes da queda de Jerusalém é comparada à neve e ao leite, contrastando com a aparência posterior deles, na qual sua pele enrugada e ressecada, que pas sou a ser continuamente exposta ao calor do sol, é comparada à fuligem. Em Jó 6.16, há uma comparação indireta. A neve e o gelo que derretem fazem as torrentes sazonais se encherem de água turva gerando um fluxo que não dura muito tempo. Os amigos de Jó são comparados à incerteza e instabiliade desses rios sazonais. Em Provérbios 26.1, a honra inapropriada con ferida a um insensato é tão inoportuna e tem o mesmo tipo de efeito nocivo e desastroso que a neve teria durante o tempo da colheita no verão. 116
(# 8921)
c. Certos padrões de comportamento são equiparados à neve que fica o ano todo n lugares mais elevados. Em Jeremias 18.14, o afastamento de Judá do Senhor é comparado de forma negativa com as neves perenes nas encostas do Líbano. 2. A neve é uma provisão especial de Deus, demosntrando o poder soberano e imcomparável dele. Trata-se de um poder que não pode ser imitado pelos homens, e ao qual o homem pode apenas submeter-se. Em Jó 37, Eliú discorre sobre o poder de Deus, observando-o em vários fenômenos meteorológicos, inclusive na neve, no v. 6, e no gelo (qerah), no v. 10. Os homens não têm poder de criar ou controlar tais fenômenos (ver também SI 147.16-17). a. Ninguém é capaz de sondar a atuação de Deus no âmbito natural dos fenômenos meteorológicos (inclusive a neve, o granizo e a geada). Em Jó 38.22 e 29, Deus declara que Jó não estava presente na criação e que não conhece os segredos do universo (entre eles, a neve). Como poderia ser capaz de compreender as complicações das questões orais e do modo como Deus trata com a humanidade? b. A neve, como parte da criação e provisão de Deus, é convocada para unir-se num grande coro de louvor exaltando o poder e a majestade de Deus (SI 148.8). 3. Há uma passagem — o Salmo 68.14 [15] — na qual se pode encontrar o vb. denom. (no hi.). A cena da vitória de Deus sobre os reis e exércitos no Monte Sião é descrita como uma nevada, na qual os homens caídos com suas guarnições encontram-se espalhados pela montanha feito flocos de neve. Neve, geada, gelo: -> 'elgãblS (granizo ou cristais de gelo, # 453); -> kfipôr 11 (geada, escarcha. # 4095); qippã ’ôn (geada, # 7885); -> qerah (gelo, # 7943); -> Seleg I (neve, 8920) B ib l io g r a f ia
D. Baly, The Geography o f the Bible, 50-52. Hermann J. Austel
8921
fy p (seleg II), cáustico (# 8921)
AT A passagem em questão é Jó 9.30, em que seleg encontra-se em paralelismo poético com bõr, o sabão feito de cinzas de madeira e plantas. Em função desse paralelismo, mui tos consideram Seleg nessa passagem como um segundo radical (seleg II, relacionado à Mix. 'eSlãg e ao Talm. Salgâ, sabão, cáustico [Clines, Job, WBC; Preuss, Biblisch-Talmudic Medizin, 451; Fohrer, Kommerttar zum Alten Testament, vol. 16; Pope, Job, AB, 15]). Essa concepção é adotada por várias versões da Bíblia que traduzem o termo como “sabão”. Por outro lado, é possível que, como um símbolo de pureza, a neve ( Seleg, # 8920) seja considerada, nessa passagem, um agente purificador metafórico. Essa idéia é especialmente válida pelo fato de Jó estar se referindo a um ato metafórico. O contexto expressa claramente o sentimento de frustração de Jó por não ter como purificar-se o suflcente para estar à altura dos padõres de Deus. Clines (220) cita Hõlscher em sua referência à oração de Maomé: “Senhor, lava-me dos meus pecados com água, neve e gelo até que eu fique alvo”. Talvez seja mais apropriado se guir a tradição nessa passagem e traduzir Seleg como “neve” (como fazem algumas versões da Bíblia, a LXX [chioni], o Trg.; Anderson, Job; Driver e Gray e o ICC). Existe um problema relativamente pequeno quanto à questão de seguir o K (bemô Sãleg, neve) ou o Q da tradição massorética (bemê saleg, “em água da neve”). Algumas versões seguem esta última, porém a 117
nVtf (# 8922)
maioria, inclusive a LXX, usam o ketiv. Assim, a neve, o grande símbolo de pureza, não pode purificar Jó nem pessoa alguma aos olhos de Deus. Somente Deus pode realizar essa obra. Lavagem, banho: bõr II (potassa, # 1342); dwh (enxaguar, # 1866); -> (bl l (imergir, # 3188); kbs (lavar, bater, # 3981); neter (salitre, # 6003); r/i.? (lavar, # 8175); -> se/eg II (cáustico, # 8921) Neve, geada, gelo: -> ’elgãbiS (granizo ou cristais de gelo, # 453); -> kPpôr II (geada, escarcha, # 4095); qippã ’ôn (geada, # 7885); qerah (gelo, # 7943); íe/eg I (neve, 8920) Hermann J. Austel
n ^ ' (Slh), estar sossegado, em paz, tranqüilo; hi. (mais a neg.) desencaminhar (# 8922); 1 ^ ' (Sãlèw), adj. des preocupado, em paz, imperturbado (# 8929); iVtt? (sã/w) subst. prosperidade, despreocupação (# 8930); mVtp' (salwâ) subs. despreocupação, segurança descuidada (# 8932); (Selí) subst. sossego, privacidade (# 8952). 8922
OMA O vb. Selú ocorre no acad. com um significado comparável àqueles indicados acima para a palavra hebraica. Refere-se a uma atitude de “desatenção” ou “descanso”. O significa do negativo, “ser negligente” também pode ser visto em ocasiões nas quais estão em jogo as responsabilidades e obrigações do povo (c f, CAD 17/2, 274 e AHw, 1211). O vb. ocorre no texto de Sfire 224:5 (K A I1, 44), tendo o significado de “ficar sossegado” ou “permanecer” num determinado lugar. O vb. Slh e seu derivativo Salú ocorrem no AB, com o significado de “estar em paz” (Dn 4.1), “tranqüilidade” (Dn 4.27 [24]) e “erro” (desatenção) (Dn 6.4 [5]).
AT 1 .0 vb. slh normalmente indica um modo de vida tranqüilo e próspero. No Salmo 122.6, aqueles que amam Sião são descritos como “prósperos” (slh). Na maioria dos casos, a ênfase é dada à vida próspera e despreocupada dos perversos (Jó 12.6; Jr 12.1; Lm 1.5). Em nível pessoal, o vb. slh pode significar “estar sossegado” e, em termos semânticos, está próximo de Sq(, estar sossegado ( # 9200) e nwh, estar tranqüilo ( # 5663), cf. Jó 3.26. Com a forma negativa, o vb. pode significar “(não) ser negligente” (2Cr 29.11) e “dar falsas esperanças” (enganar) no hi. (2Rs 4.28). 2. Derivativos de slh. a. O subs. seliocorre somente uma vez numa oração adverbial co a preposição be, significando “em particular” (em segredo), “sem interrupções” (2Sm 3.27). b. O subs. sãlü é considerado um derivativo separado de Slh (ocorre somente uma vez, no Salmo 30.6 [7]). No contexto, refere-se à estabilidade resultante de uma existência imperturbada ou próspera. c. O subs. Salwâ é usado para uma vida de paz, sem lutas e pode ser mais bem traduzi do como “segurança” (SI 122.7; Pv 17.1). Num sentido negativo, pode referir-se a uma atitude de despreparo e deve ser traduzido como “negligente”, “despreocupado” (Dn 8.25; 11.21,24). Também pode designar uma atitude de ócio e descuido (Pv 1.32; Jr 22.21; Ez 16.49). d. O adj. Sãlêw/selêw (Jr 49.31) tem significados comparáveis àqueles de Salwâ. Num sentido positivo, descreve a qualidade de vida de um indivíduo (Jó 16.12; 21.23) ou de um país/cidade (1 Cr 4.40; Zc 7.7) antes de sobrevir-lhe um desastre ou calamidade. Nesses casos, pode ser traduzido como “tranqüilo” ou “imperturbado”. Descreve um estado que não está ao alcance dos perversos (Jó 20.20). Num sentido negativo, determina um sentimento falso de 118
n to ' (# 8938)
segurança (Jr 49.31) e é usado ironicamente para descrever a prosperidade despreocupada dos perversos (SI 73.12). P-B No Heb. mix. e no aram. sãlêw e sPlê, estar tranqüilo, despreocupado, bem como seus derivativos selêw, selêwâ e silyâ, são termos que ocorrem com freqüência (cf. Jastrow 2:1578; 1582-83). Paz, retribuição, segurança, tranqüilidade: -> befah I (segurança, # 1055); -> ãlh (estar sos segado, tranqüilo, dar falsas esperanças, # 8922); sim (ter satisfação, restituir, recompensar, retribuir, fazer as pazes, # 8966); -> sqt (estar tranqüilo, # 9200); Retribuição: Teologia Descanso, quietude, repouso: -> dmh II (chegar ao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); -> nwh 1 (descansar, # 5657); -> nwh I (sossegar, descansar, esperar, estacionar, depositar, # 5663 ),-$ rg' (formar uma crosta sobre, endurecer, parar, ficar quieto, # 8088/89); £ 'n (ficar em paz, imperturbado, # 8631); sbfy II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); sebet (des canso, assento, # 8699, 8700); stq (acalmar-se, # 9284) Descanso, silêncio: í/wwá I (silêncio, # 1872); -> t/m/; II (chegar ao fim, descansar, emude cer, calado, # 1949); -> dmm I (ficar parado, imóvel, em silêncio, # 1957); -> //p ' (fazer algo em segredo, # 2901); -> hsh (manter o silêncio, ordenar que se faça silêncio, # 3120); -> /irí II (estar surdo, ficar quieto, permanecer inerte, silenciar, # 3087); -> smí (silêncio, # 7551) B ib l io g r a f ia
/D B 2:541-48; THAT 2:9\9-35; TWOT 2:921. Philip J. Nel 8927 (salhebet, chama),
# 4258
8929 (sãlêw, despreocupado, tranqüilo, imperturbado),
# 8922
8930 (í # 8922 8932 (salwâ, seguro, descuidado, desatenção), -> # 8922 8933 (sillúhim, despedida, presente de despedida), -> # 8938 8934 (sãlôm, paz, saúde, salvação), -> # 8996 8936 (sillúm, reembolso, retribuição),
# 8996
n t o (í/A I), q. enviar, estender, dar autonomia; ni. ser enviado; pi. enviar, estender, libertar, escoltar, despedir; pu. ser enviado, despedido; hi. enviar, soltar (# 8938); rri1?®!? (miSlôah), subs. envio, extensão (# 5447) e nVçto (mislãh), subs. envio, extensão (# 5448); n n to l? (mislahat, # 5449), subs. dispensa, companhia (de acordo com o HALAT, para BDB, delegaçãoé mais apropriado); DTOto’ (sillúhim, # 8933). subs. despedida, presente de despedida; ninV® (seluhôt, # 8943) e (selãh II, # 8945), subs. gavinhas, rebentos. O vb. AB nV® (selah, # 10714), usado no peal como o q. da BH, está incluído nesse caso. 8938
n to '
119
n to ' (# 8938)
OMA Há vbs. cognatos atestados no ugar. (ver WUS, 2610, 2 6 11), fen., dialetos aram., incrições heb. (ver DISO, 300-2), todos Slh, enviar. Também encontrado no acad. Salahu, despa char, remeter, e, ao que parece, uma palavra estrangeira cananéia no acad. de eA suluhtu, envio (AHw 3:1270b). O possível cognato ár. saraha, enviar, expedir (para bibliografia, ver HALAT e THAT), é fonologicamente problemático (/- no lugar de l). AT Em geral, essa família dc palavras envolve o ato de o suj. induzir o obj. a se afastar do suj., e, com freqüência, fica pelo menos implícito algum propósito por parte do sujeito. Assim, “enviar” parece representar o cerne de significado a partir do qual erradiam outros usos. 1. Q. e ni. A sintaxe básica do q. é trans., < A > slh ( et-) < B > “A enviou B”. Geral mente, A denota uma pessoa (humana ou divina), enquanto B pode ser: a. outra pessoa (p. ex., mensageiro, enviado, servo) ou b. um objeto inanimado (p. ex., presente, mensagem, ajuda). A sintaxe básica costuma ser complementada por uma oração adverbial denotando a pessoa, o lugar de origem ou (com mais freqüência) o destino, ou por uma oração infinitiva expressan do propósito. O ni. é o pass. desse uso (Et 3.13). Exemplos: 2 Samuel 12.1, “O Senhor enviou Natã a Davi”; 11.6, “Joabe enviou Urias a Davi”; Êxodo 9.14, “enviarei [Eu, o Senhor] todas as minhas pragas sobre o teu coração”; Jz 3.15, “os israelitas enviaram tributo por meio dele a Eglon” (trad. autor). Uma variação importante desse padrão sintático ocorre quando o elemento B não se encontra explicitamente declarado, como descreve Ellington: “Dois verbos são usados em con junto e unidos apenas pela conjunção ‘e’. O verbo ‘enviar’ [q. Slh] é sempre o primeiro dos dois vbs., e, no heb., pode haver uma ou mais palavras entre ‘enviar’ e o segundo vb., quase sempre o suj. do verbo. Porém, na maioria dos casos, fica bastante claro que o objeto do segundo vb. não pode ser considerado o objeto do vb. ‘enviar’.” (Isso correponde ao verbete q. l.c do BDB,; e no HALAT, q. 3.a.By.) O segundo vb. mais comum é Iqh, levar; outros verbos que aparecem muitas vezes em segundo lugar são qr ’, chamar, e vbs. relacionados a trazer, reunir, contar, investigar. O segundo vb. também pode ser expressado como um infinitivo (p. ex., 1Sm 22.11, wayyiSlah hammelek liqrõ ’ 'et- 'ahimelek, “o rei mandou chamar Aimeleque”), tendo basica mente o mesmo significado. Ellington sugere que na maioria dos casos esse padrão envolve certo grau de autoriade da pessoa denotada por A e a função intermediária de uma outra pes soa ou grupo de pessoas (o elemento B omitido). “Muitas vezes, a melhor tradução [para slh] é algo como ‘deu ordem’, ‘comandou’... Outra possível trad. poderia ser ‘providenciou para que tal coisa ocorresse’ ou ‘fez com que tal coisa ocorresse’ sendo que nesses casos ‘tal coisa’ representa a ação do segundo verbo.” Porém, em vez dc considerar a “autoridade” como algo inerente ao vb. Slh, é mais apropriado vê-la como parte da relação cultural entre aquele que en via a. e o destinatário, uma vez que esse padrão também ocorre quando estão envolvidas duas pessoas consideradas iguais (p. ex., Dt 19.12, em que os anciãos enviam uma pessoa para os anciãos de outra cidade). Esse sintagma não deve ser confundido com aqueles casos nos quais o elemento B fica implícito de acordo com o contexto, p. ex., wayyõçê ’ ’ãsã ’kesep wezãhãb ... wayyiSlah ’el-ben-hadad, “Asa tomou prata e ouro... e enviou servos a Ben-Hadade” (2Cr 16.2; cf. v. 3, sãlahtí lekã kesep wezãhãb, “eis que te mando prata e ouro” ou “estou-lhe enviando prata e ouro”). Ellington observa que essa expressão idiomática é repetida em algumas passa gens do NT que usam apostellõ e pempõ (ver, porém, BAGD, item apostellõ, 1.d e pempõ, 1 para exemplos de uso semelhante no G não judaico). Quando o elemento B é uma parte do corpo (normalmente uma das mãos, às vezes um dedo ou um dos pés; analogamente, um ramo, uma vara ou foice), as línguas do ocidente traduzem Slh como “estender” ou “alcançar” (G ekteinõ). Por exemplo: 'al-tislah yãd?kã ’el120
n t o (# 8938)
hanna ‘ar, “não estendas a mão sobre o rapaz” (Gn 22.12); wayyislah yhwh 'et-yãdô wayyagga ‘ ‘al-pi, “estendeu o Senhor a mão, tocou-me na boca” (Jr 1.9); wayyislah 'et-qe$êh hamma((eh, “estendeu a ponta da vara que tinha na mão” (1 Sm 14.27). Nesse contexto, slh tem significado semelhante a nã(â, estender (# 5742). Outras formas de uso secundárias do q. têm o sentido de “mandar para longe, deixar ir” (tendo pessoas como o elemento B, Gn 28.5; Jz 11.38) e “soltar” (SI 50.19, sendo “boca” o elemento B). 2. Pi. e pu. O pi. (do qual pu. é o pass.) tem a mesma sintaxe transitiva que q.: < A > Slh ( ’et-) < B > “A enviou (mandou embora) B ” (acompanhado de possíveis complementos). Também pode ter significado muito semelhante ao de q.: Neemias 8.12 (em que o povo enviou porções de comida [cf. v. 10 usando o q.]); Gênesis 19.13 (em que Deus enviou mensageiros para destruir Sodoma); Êxodo 23.27 (Deus enviará seu terror diante de Israel [cf. v. 28 usando o q.]); Gn 38.17 (Judá: “Enviar-te-ei [pi.] um cabrito...”; Tamar: “... até que o mandes [q.]”). Semelhantemente, pode-se dizer que uma planta estende seus ramos, etc. (SI 80.11 [12]; Jr 17.8; Ez 31.5) e que pessoas estendem as mãos (Pv 31.19) ou os cabelos (Ez 44.20, “deixarão crescer”). No entanto, ao que parece, na maioria dos casos o pi. tem mais uma nuança de “man dar embora, despedir”, p. ex., way^Sal^hêhú yhwh ’elõhim miggan- ‘éden, “O Senhor Deus, por isso, o lançou fora do jardim do Éden” (Gn 3.23); e em Êxodo 3— 20 constitui um termo temático para a ordem dada a Faraó: “Deixa ir o meu povo”. Assim, despedir pode ser mandar embora da presença de alguém ou libertar, dependendo da situação descrita no contexto. Há uma relação sinônima parcial com grS (pi.), expulsar (# 1763); como coloca Delitsch (em Gn 3.24), slh “tem o sentido de mandar embora, e isso, somente pela sua relação com uma remoção forçada [ou seja, o contexto, e não a palavra em si, apresenta a idéia de força],” enquanto grs é “o termo mais vigoroso e menos ambíguo expulit [“ele expulsou”] (de modo que a expressão “lançar fora” é forte demais). Em Êxodo 6.1; 11.1 encontramos “lançar fora” e “deixar sair”. Uma aplicação importante desse tema encontra-se no contexto do divórcio (p. ex., Dt 22.19, 29; 24.1, 3; Jr 3.1; Ml 2.16). slh e seu sinônimo grs, expulsar, são termos intercambiáveis para divórcio; outros termos para divórcio são hô.fí’, levar/mandar embora (Ed 10.3.19, “despedir”), o hi. de >>.?', sair (cf. Dt 24.2, em que uma mulher divorciada sai [ví ' (q.), -> # 3655]) e possivelmente 'zb, desamparar (Is 54.6; 62.4; -> # 6440). (Ver Hugenberger, esp. 72, n. 125, para mais bibliografia.) Entre outras formas de uso secundárias e idiomáticas, podem-se citar “meter fogo a al gum lugar” (Am 1.4, 7, 10, 12; 2.2, 5; Os 8.14; Ez 39.6) e “pôr fogo a algum lugar” (ou seja, incendiar: Jz 1.8; 20.48; 2Rs 8.12; SI 74.7); animais “lançam de si” as suas dores de parto ao dar à luz (Jó 39.3). 3. Hi. Os cinco exemplos de hi. apresentam a mesma sintaxe: < A > Slh ( 'et-) < B > “A enviou B”. Todos possuem também a mesma semântica: Deus é o sujeito, e o elemento B é al gum flagelo (enxames de insetos, Êx 8.21 [17]; feras do campo, Lv 26.22; Rezim, 2Rs 15.37; fome, Ez 14.13; Am 8.11). 4. Relação de temas. De acordo com a teoria de E. Jenni (ver IBHS, 352-59, 396-400, 433-36, para um resumo da discussão em inglês), o pi. resultante (“A fez B ser enviado”) e o hi. causativo (nesse caso, “A obrigou-se a enviar B,” cf. Jenni 253). Observe que na forma idiomá tica de nossa língua (e no G, de acordo com a LXX), todas essas expressões seriam afirmadas do mesmo modo. Este não é o lugar apropriado para avaliar-se a teoria em sua totalidade (cf. Claassen, para uma introdução a tal crítica); antes, o que se deve perguntar é se ela esclarece a semântica desse vb. em particular. A resposta pare essa pergunta parece ser negativa. Se o 121
rfTO (# 8938)
sentido básico do vb. envolve A levando B a se afastar, então a tendência era usar o q. quando se tinha em vista o propósito do movimento; usar o pi. quando o movimento de afastamento era o elemento mais importante e o hi. nos casos em que se visava claramente falar do julgamento de Deus sobre pessoas infiéis. Observe que essa descrição geral de tendências deixa bastante espaço para sobreposições, sendo isso justamente o que ocorre (como foi visto acima); no en tanto, ela também justifica algumas das nuanças encontradas num único grau, p. ex., o pi. de “divorciar” e “libertar”. 5. Subs. derivados. Os subs. derivados demonstram possuir relações claras com os usos diversos do vb. como pode ser visto por suas formas. Assim, sillühim, despedida, é um subs. de ação que corresponde ao pi. (Jouon §881e) e é usado para a ação de Moisés de man dar Zípora embora (ver seção 7, abaixo, para a discussão desse assunto), ou um presente as sociado à despedida de alguém (1 Rs 9.16 [dote?]; Mq 1.14). As formas infinitivas mislõah, mislãh, mislahat referem-se, de modo geral, a uma ação (que normalmente corresponde ao q. e às vezes ao pi.; Jouon §88Ld): mislõah yã d = mislah yãd, estender a mão (Is 11.14; em Dt 12.7, 18; 15.10; 23.21 [20]; 28.8, 20 denota um esforço); mislõah mãnôt (Et 9.19, 22) signi fica “enviar porções (sacrificiais?)”; mislah sôr (Is 7.25) quer dizer “(o lugar de) libertar um boi”; enquanto mislahat é usado de modo absoluto, significando “(ato de) mandar embora, dispensar” (Ec 8.8) ou “missão diplomática, delegação” (SI 78.49, “legião”; de acordo com BDB, Delitzsch, em oposição ao HALAT, “bando, comitiva”). A forma seluhôt é morfologicamente um part. pass. usado de modo substantivai: aquilo que é enviado ou estendido, a saber, brotos ou ramos (Is 16.8); e selãhim (pl. do HALATselah II) também denota brotos, rebentos (Ct 4.13). . Observações literárias. E interessante observar o uso de trocadilhos com esse vb., p. ex., em Êxodo 3.20, “Estenderei a mão [q., vfísãlahti 'et-yãdí] e ferirei o Egito... depois, vos deixará ir [pi^y^sallah 'etkem]”; como foi observado acima, trata-se de uma palavra temática nessa parte de Êxodo, e os trocadilhos servem para ressaltar esse fato. O mesmo jogo de pala vras aparece em Gênesis 3.22-23: “(22) que não estenda [q.,yislahyãdô] a mão, e tome... (23) O Senhor Deus, por isso, o lançou fora [pi., way^salfêhêhü] do jardim.” Cassuto observa o trocadilho nas duas passagens; daí ser supreendente que Westermann “considere incontestável que os vv. 22 e 24 devem ficar juntos e formar uma só conclusão independente do v. 23” (ing., 271; alemão, 368), eliminando, desse modo, o trocadilho sem fazer nenhum comentário sobre ele; certamente esse recurso defende a unidade dos vv.22-24. Também é interessante que um adepto da crítica à fonte, como S. R. Driver atribua Gênesis 3.22-23 a J, e, ao mesmo tempo. Êxodo 3.20 a E. As duas passagens envolvem o Senhor no mesmo jogo de palavras: talvez devam, de fato, ficar juntas. Observe também o trocadilho em Êxodo 8.21 [17], enfatizando a natureza da justiça retribuidora de Deus: “Se tu não deixares ir [pi. part., mesallêah} o meu povo, eis que eu en viarei [hi. part., masliah] enxames de moscas”. 7. Textos difíceis. O texto mais desafiador a conter esse radical é Malaquias 2.16, consi derado por unanimidade um dos versículos mais difíceis na BH. A oração de abertura, ki-sãnê ’ sallah, costuma tradicionalmente ser traduzida como “odeia o repúdio”, o que é impossível diante do TM. Esforços independentes de Hugenberger e Collin, ainda que diferentes, concor dam que se deva interpretar os dois vbs. sãnê, odiar, e Sallah, repudiar, divorciar, como tendo o mesmo suj. (um membro da comunidade pós-exílio) e como sendo elementos de uma ação composta combinados de modo assindético: “pois ele odiava [sua esposa], [e] divorciou-se [dela] e cubrirá sua veste [= seu caráter] de delito” (Collins) ou “se ele odeia [e] se divorcia...” (Hugenberger).
6
122
n t o (# 8938)
Pode-se encontrar outra dificuldade em Êxodo 18.2, em que se diz que Moisés “enviou” sua esposa Zípora (usando o subs. sillúhim; lit., “depois de mandá-la embora”). Isso significa que ele se divorciou dela e que, nessa passagem, Jetro está tentando uma reconciliação (cf. Zakovitch, 34,38 [com referências rab.; léxico de Holladay)? Tendo em vista que, tanto no v. 2 quanto no v. 6 Zípora é chamada de “mulher” ( ’iSSâ) de Moisés, é mais provável que ele a tenha mandado embora para a própria segurança dela e para que não precisasse se preocupar com ela (cf. Sarna ad loc.)\ Deuteronômio 24.4 não refuta essa idéia, uma vez que num con texto extremamente específico, “seu primeiro marido” é ba ‘lãh hãrí ’sôn. . Slh II? O HALAT apresenta mais um vb., slh II, que significa “foijar” (especialment com referência a metais), baseado no radical ugar. slh encontrado em contextos de metalurgia; essa idéia tem origem numa proposta de M. Dahood. Exemplos de q.: Salmo 18.14 [15] / 2 Samuel 22.15; Salmos 50.19 e 110.2 (e Ecli 43.4); e de pi.: Provérbios 6.14, 19; 16.28. Uma vez que todas essas passagens encaixam-se sem problemas no padrão atestado de slh I (de acordo com BDB), não há motivo algum para redescobrir um homônio que seria inútil por não mostrar-se suficientemente distinguível do radical mais comum (cf. CPTOT, 125-55; Collins, Homonymous Verbs), de modo que essa idéia deve ser rejeitada.
8
P-B No heb. do Eclesiástico e nos MMM, o vb. é usado várias vezes no q. e no pi./pu. nas mesmas linhas de uso da BH descritas acima. A LR apresenta usos do vb. (heb. q., pi., hitp.; aram. pe., pa., af., itpa.), do subs. mislahat, missão, visitação, e sillúah, mandar embora, todos eles dentro das mesmas linhas gerais que a da BH, com evoluções naturais. A LXX normalmente traduzia Slh com os termos apostellõ e pempõ (e compostos, esp. com ek-), qualquer que fosse o tema. O NT usa esses vbs. para falar do ato de enviar alguém para cumprir uma missão (p. ex., Jo 4.34, pempõ) e despedir (Lc 1.53, exapostellõ); porém, diferentemente da LXX, não emprega com a mesma nuança de divórcio, para o qual o termo usado é apoluõ (nos Evangelhos) e, em 1 Coríntios 7.10-16, aphiêmi e chõrizõ. (Observe-se que as passagens de “divórcio” no Eclesiástico [7.26; 25.26. 28.15; 42.9] usam outros termos heb. e gregos.) O termo G apostolos é de extrema importância teológica para o NT, sendo que corres ponde a sãliah ou sãlúah, “enviado” (dependendo do uso comum do q. para expressar o envio para cumprir-se uma missão; cf. IRs 14.6 [part. pass., LXX apostolos]', cf. Is 6.8). Não fica claro se esse termo tem alguma relação com a Mix. e com o termo posterior Saliah/Sâlüahi, agente (legal) (sobre essa questão, ver EncJud, 2:349-54, que mostra que o termo no con texto legal refere-se a algo semelhante a uma procuração); ver Str-B 3:2-4; TDNT 1:407-47; N ID N TT1:126-37; DJG 27-33. De qualquer modo, não parece ser necessário procurar-se além do próprio NT, em que o termo funciona como um subs. passivo de apostellõ, tendo o sentido de “enviado” (cf. Jo 17.18, que se aplica tanto aos apóstolos quanto a Jesus, o “Apóstolo... da nossa confissão,” Hb 3.1). Extensão: 8938)
hdh (estender as mãos, # 2063); -> Slh I (enviar, estender, soltar, despedir, #
B ib l io g r a f ia
EncJud 2:349-54; NIDNTT 1:126-37; TDNT 1:398-447; THAT2:909-16; TW OT2:927-28; U. Cassuto, Genesis, 1, (ing.) 1961; idem, Exodus (ing.) 1967; W. T. Claassen, “On a Recent Proposal as to a Distinction Between Pi‘el and Hiph‘il,” JNSL 1, 1971, 3-10; idem, “The Declarative-Estimative Hiph‘il,” JNSL 2, 1972, 5-16; C. J. Collins, Homonymous Verbs in Biblical 123
irfflp (# 8947)
Hebrew: An Investigation on the Role o f Comparative Philology, 1989; idem, “The (intelligible) Masoretic Text of Malachi 2:16 or, How Does God Feel About Divorce?” Presbyterian 20:1, 1994,36-40; M. Dahood, Ugaritic-HebrewPhilology, 1965,73 (n. 2420); F. Delitzsch, Genesis, (ing.) 1894; G. R. Driver, “Forgotten Hebrew Idioms,” ZA Wl%, 1966,1 -7; S. R. Driver, Gene sis, ICC, 1904; idem, Exodus, CBSC, 1911; J. Ellington, “Send!” B T 45:2, 1994,228-32; V. R Hamilton, Genesis 1-17, NICOT, 1990; G. P. Hugenberger, “Marriage as a Covenant: A Study of Biblical Law and Ethics Goveming Marriage Developed From the Perspective of Malachi,” S V T 52, 1994,48-83; E. Jenni, Das hebraischePi‘el, 1968,193-99,252-53; N. Sama, Exodus, JPS Torah, 1991; C. Westermann, Genesis 1-11, BKAT, 1983; ing., 1984; P. B. Wodecki, “slh dans le livre d’Isaíe,” V T 3 4 ,1984,482-88; Y. Zakovitch, “The Woman’s Rights in the Biblical Law of Divorce,” Jewish Law Annual 4, 1981,28-46. C. John Collins 8939 (selah I, arma, espada, defesas), -> # 2851 8940 (Selah III, canal, rego), -> Siloé 8943 (Selúhôt, gavinhas, brotos), -> # 8938 8945 (Selãh II, gavinha, broto),
8947
# 8938
lrfTW
(sulhãn), mesa (# 8947).
OMA Ugar. tlhn usado para presentes e víveres (KTU 1.4.1:38; 1.4:IV:36). Podem-se encon trar mesas cultuais (ver seção 1) retratadas em relevos assírios e no arco de Tito (O. Keel, The Symbolism o f the Biblical World, 1978, figs. 201, 373, 440,460). AT 1. Uma mesa de culto era usada para os pães da proposição no tabemáculo (Êx 25— 26; 30—31; 35; 37; 3 9 - ^ 0 ; Lv 24.6; Nm 3.31; 4.7), no templo (1 Rs 7.48; 1Cr 28.16; 2Cr 4.8, 19; 13.11; 29.18) e também aparece no novo templo (Ez 40.39-43); 41.22; cf. 44.16; Ml 1.7,12). 2. As provisões da mesa do rei vinham dos distritos do reino (lR s 4.27 [5.7]) e eram oferecidas a reis vassalos (Jz 1.7), servos(lSm 20.29; 1Rs 2.7), profetas de ídolos (1 Rs 18.19) e familiares (1 Sm 20.34), membros da realeza como Mefibosete (2Sm 9) e governantes estran geiros influentes como a rainha de Sabá ( lRs 10.5; 2Cr 9.4). 3. Nesse caso, um profeta, enquanto está comendo, recebe a palavra de Deus (IRs 13.20, “estando à mesa”), e os animais se fartarão à mesa de Javé (Ez 39.20); e também há uma mesa para a deusa Fortuna (Is 65.11). A mesa denota comunhão oficial (Ne 5.17) ou fe licidade no lar (SI 128.3) e pode ser posta pelo próprio Grande Anfitrião (SI 23.5), suprindo o alimento para seu povo no deserto (SI 78.19). Contudo, pode ser ainda de caráter perverso (SI 69.22 [23]; Is 28.8; Dn 11.27). 4. A sulhãn, mesa, é um móvel comum no quarto do profeta (2Rs 4.10) mas também pode ser um símbolo de abundância, repleta de iguarias (Jó 36.16); em Ezequiel 23.41, encon tra-se associada a um leito (miftâ, # 4753). Uma mesa abundante é posta, figurativamente, pela Sabedoria personificada (Pv 9.2). Mobília: # 4058); 124
hadõm (escabelo, # 2071); Sulhãn (mesa, # 8947)
kebeS (escabelo, # 3900);
kissê' (cadeira, trono,
üVtf (# 8948)
B ib l io g r a f ia
BRL2, 230. I. Cornelius
8948
Ubw
aquilo que tem poder (# 8950); nante, tirano (# 8954).
OV© (sl(), q. adquirir poder, ter poder, dominar, permitir; confiar poder/controle (# 8948); lÍDVtt? (sil(ôn), subs. (salle(el), adj. dominador (# 8951); trVu? (salli;), gover
OMA O cognato do vb. no acad. (salãlu) possui significado semelhante a ter poder ou contro le sobre algo ou alguém. O poder ou controle pode ser exercido sobre tropas, súditos e posses legais. No aram., o vb. (que com freqüência é acompanho da preposição be ou W) também ocorre com o sentido de ter poder (Dn 3.27; 6.25). AT Um significado negativo associado ao vb. sl( pode indicar o ato de govemar ou subju gar alguém (Ne 5.15; Ec 8.9; 12.19). Num sentido metafórico, o pecado também pode dominar uma pessoa (SI 119.133). Apesar de o vb. í/f ter uma conotação negativa no AT, o subs. sallif, governante, em si, não tem nenhuma conotação negativa específica. José alcançou a posição de salllf no Egito (Gn 42.6). Ao que parece, Eclesiastes (7.19; 10.5) usa a palavra de modo negativo quando o autor a contrasta com aqueles que possuem sabedoria. A forma fem. do adj. sallefet, descara da/selvagem, tem conotação absolutamente negativa em Ezequiel 16.30, como descrição de uma prostituta. Em Eclesiastes 8.8, o subs. sallif, domínio, é usado em conjunto com silfôn, dominador. Porém, siltôn é mais importante nos textos aram. na forma solfan (cf. K. Beyer, Die aramàischen Texte vom Toten Meer, 1984, 710). P-B
Um uso semelhante do vb. pode ser atestado na LR e no Targum.
Realeza, governo, supervisão, domínio: -> b 7 1(casar-se, govemar sobre, possuir, # 1249); -> gebirâ/çfberet (dama, rainha, senhora, # 1485/1509); -> ykh (discutir, arrazoar, provar, julgar, presidir, reprovar, # 3519);-^ kbs (tomar subserviente, conquistar, # 3899); -> mlk I (govemar, # 4887); msl II (presidir, govemar, # 5440); -> nsh (supervisionar, # 5904); -> rd d (repelir, conquistar, # 8096); -> rdh (presidir, govemar, # 8097). r'h I (alimentar, pastorear, cuidar, govemar, # 8286); -> srr I (govemar, digirir, superintender, # 8606); -> slt (adquirir poder, # 8948); sp( (obter justiça, agir como juiz, presidir, # 9149) B ib l io g r a f ia
N. Lohfink, “Melek, Sallít, und Môsêl bei Kohelet und die Abfassungszeit des Buchs,” Bib 62, 1981,535-43. Philip J. Nel
8949
uVs? (Sele(), escudo (# 8949).
OMA Trata-se de uma palavra de etimologia um tanto obscura, mas que provavelmente está relacionada com um radical verbal atestado no acad. (Salãtu) e no ár. (sala(á). Não é possível 125
7V$P (# 8953)
captarmos a nuança exata desse termo, de modo que o mais seguro é traduzi-lo genericamente como “escudo”. AT O termo ocorre apenas 7x no AT, 3x com mãgên I (2Cr 23.9; Ct 4.4; Ez 27.11). Em to dos os outros casos, selet refere-se a armamento militar e nunca é usado em sentido metafórico referindo-se à proteção de Deus (ver 2Sm 8.7 = lCr 18.7). Com freqüência, a palavra é empre gada em contextos nos quais os escudos são expostos de modo decorativo. Numa passagem como Cântico dos cânticos 4.4 é certo que a palavra signifique escudo, pois o paralelismo tem a intenção clara de ser um sinônimo próximo e de significado mais restrito de mgn, o termo mais comum usado para escudo. Porém Borger (1972) reuniu provas das versões e cognatos de que a palavra signifique “estremecer” em Jeremias 51.11. No entanto, alguns optam por traduzir o termo da mesma forma em outras passagens (cf. Ez 27.11). Para uma discussão completa sobre o assunto, ver Holladay (422-23). Escudo: -> mãgên 1 (escudo, proteção, # 4482); -> 'agilâ (escudo redondo, # 6317); -> sinnâ II (escudo longo, # 7558); selef (escudo, # 8949) B ib l io g r a f ia
TWAT4:646-59; Holladay, Jeremiah 2 ,422-23; O. Keel, The Symbolism o f the Biblical World, 1978, 222-25; Y. Yadin, The Art ofWarfare in Biblical Lands, 1963. Tremper Longman 8950 (sil(ôn, aquele que tem poder), -> # 8948 8951 (sallefet, dominador), -> # 8948 8952 (M f, confidencial, constância), -> # 8922
g n ,, n’1?® (•sí/j ;ô), secundinas (hapleg. em Dt 28.57; cf. acad. -------------------------------- !_U_______ sifítu(m) [AHw, 1043b]) (# 8953). Para uma discussão sobre nascimento no AT, ver yld, dar à luz, gerar, nascer (# 3528). Victor P. Hamilton 8954 (sallif, governante, tirano), -> # 8948 8955 (sãlís I, terça parte),
# 8993
w t o (sãlís II), incerto: instrumento musical (de três ----------------------------------- _______ partes?); címbalos (?); sistro (?) (com três hastes?); alaúde (?) (de três cordas?) (hapleg.; # 8956; HALAT 1412a). OMA Essa palavra pode estar relacionada ao ugar. tJl III, uma liga de metal (com três partes?): bronze (?) (WUS # 2097; U T# 2691), da qual é possível que o instrumento fosse confeccionado. AT O termo aparece apenas em 1 Samuel 18.6: “... as mulheres... foram ao encontro do rei Saul, cantando e dançando, com tambores, cânticos de júbilo e sãlisim" (tr. do autor). A Vg. 126
(# 8957)
traduz in sistris, em sistros, que com freqüência compreende três hastes horizontais; a LXX (en kymbalois), a Pex. (A^e.y^/é) e o Trg. (ú b ^ a l^ lin ) traduzem com um termo que signifi ca “címbalos”. Ainda que alguns autores modernos tenham proposto que o termo significasse alaúde (com três cordas), é mais provável que se trate de um instrumento de percussão. Instrum entos / termos musicais: gittil (instrumento musical?, # 1787); -> hemyã (som, estrépito, # 2166); -> hll (fazer tocar a flauta, # 2727); -> fosr (fazer soar a trombeta, # 2955); -> jyõòé/ (trombeta de chifre de carneiro, # 3413); -> kinnôr (lira, # 4036); -> mên (corda [de instrumento musical], # 4944); -> /we/?a 'aw 'im (guizo, cascavel, chocalho, pandeiro, # 4983); -> nêbel 11 (instrumento sem cordas, # 5575); -> «gw (tocar a lira, # 5594); ‘«gõ/í (flauta?, # 6385); -> prf (improvisar, # 7260); -> í// 1(tinir, retinir, # 7509); -> sôpãr (chifre de carneiro, # 8795); -> iã /íí II (instrumento musical, # 8956); -> sem a' I (som, # 9049); /pp (tocar, bater, # 9528); -> tq ' (impelir, empurrar, bater palmas, tocar a trombeta, empenhar, # 9546) B ib l io g r a f ia
B. Bayer, “Music: History: Biblical Period, Second Temple Period,” EncJud 12, col. 564; S. B. Finesinger, “Musical Instruments in OT,” HUCA 3, 1926,68-69; D. A. Foxgov e A. D. Kilmer, “Music,” ISBE 3:445b; H. Gressmann, Musik und Musikinsirumente im AT, 1903, 32; O. Keel, The Symbolism o f the Biblical World, tr. T. J. Hallet, 1985, s.v. “Music and Song,” 347b; E. Kolari, Musikinsirumente undihre Verwendung imAT, 1947, 74-76; J. D. Prince, “Music,” EncBib 3, cols. 3227-28; C. Sachs, History o f Musical Instruments, 1940, 123; O. R. Sellers, “Musical Instruments o f Israel,” BA 4, 1941,45; D. G. Stradling e K. A. Kitchen, “Music and Musical Instruments,” IBD 2:1040; M . Wegner, Die Musikinsirumente des alten Orients, 1950, 41-42; E. Wemer, “Musical Instruments,” IDB 3:475a. Robert H. 0 ’Connell
g W’,'7\D (sãliS III), subs. terceiro homem num carro de ------------------------------------—--------- guerra, ajudante (militar) (# 8957). AT Mastin (125-54) apresenta uma ampla discussão que visa elucidar a etimologia do subs. sã/is. Chega à conclusão de que o termo está relacionado ao radical sls, três, e de que o ajudante do rei (2Rs 7.2, “capitão”) recebia esse nome pois era “do terceiro escalão” (154). C arro, carroça, carroção, equitação: -> rkb (montar / cavalgar, # 8206); -> Sãlis III (terceiro homem num carro de guerra, ajudante [militar], # 8957); -> G uerra: Teologia B ib l io g r a f ia
B. A. Mastin, “Was the SALÍS the Third Man in the Chariot?” in J. A. Emerton (ed.), “Studies in the Historical Books of the Old Testament,” SVT 30, 1979, 125-54. Louis Jonker 8958 (se!isí, terceiro [número ordinal]), -> # 8993
8959
iVtf
(slk I), hi., ho. atirar, lançar, arremessar (# 8959); subs. rDVtf? (salleket I), derrubada (de uma árvore) (ha-
pleg.; # 8961). 127
nV©' (# 8959)
AT 1 . 0 tenno slk refere-se, muitas vezes, à disciplina e julgamento divinos. O autor do Salmo 102 lamentou-se de que Deus o rejeitou (102.10 [11]); cf. Jn 2.3 [4]), enquanto outros dois salmistas suplicaram ao Senhor que não os rejeitasse da presença dele (SI 51.11 [ 13]; 71.9). A palavra costuma descrever os julgamentos históricos de Deus sobre nações e indivíduos. O Senhor lançou os egípcios no mar (Ne 9.11) e o rei de Tiro, comparado a um querubim da guarda no monte de Deus, foi lançado por terra (Ez 28.17). Ele atirou grandes pedras de granizo sobre os amorreus (Js 10.11; cf. SI 147.17) e avisou que lançaria imundícias ao rosto da orgulhosa Nínive, comparada a uma meretriz (Na 3.6). Cumprindo as advertências que deu por intermédio de Moisés e Salomão (Dt 29.28 [27]; 2Cr 7.20), ele lançou seu povo de sua presença e atirou-o no exílio (2Rs 17.20; 24.20; Jr 7.15; Am 4.3), ainda que anteriormente não estivesse disposto a fazê-lo por causa da promessa de aliança a Abraão, Isaque e Jacó (2Rs 13.23). Lançou do céu à terra a glória de Israel (Lm 2 .1) e lançou o rei Jeconias ao exílio babilônio (Jr 22.28); lançou às ruas o corpo do rei Jeoaquim e de outros que rejeitaram a palavra profética verdadeira do Senhor (Jr 14.16; 22.19; 36.30). 2. Por vezes, o termo refere-se à rejeição da palavra ou da autoridade de Deus. O es critor do Salmo 2 retrata os reis rebeldes tramando uma revolta contra o Senhor e contra seu governante ungido. Incitam uns aos outros a sacudir de si as algemas (símbolos de autoridade divina e, no contexto histórico dos salmos, da suserania israelita) colocadas neles pelo Senhor (SI 2.3). No Salmo 50, o Senhor acusa os perversos de rejeitarem as palavras dele (50.17). Neemias descreveu como a geração pré-exílio jogou para trás de si a lei do Senhor (“viraram as costas”, Ne 9.26), enquanto 1 Reis 14.9 e Ezequiel 23.35 acusam o rei idólatra Jeroboão I e a nação adúltera de Judá, respectivamente, de fazer o mesmo com o Senhor. Em vez de rejeitar o Senhor, seu povo deveria ter lançado fora os próprios pecados, especialmente os ídolos (Ez 18.31; 20.7-8), seguindo o exemplo de Moisés, Josias, Manassés e outros (Dt 9.21; 2Rs 23.6; 2Cr 30.14; 33.15). Afinal, quando vier o dia do Senhor, todos lançarão fora seus ídolos im prestáveis (Is 2.20; cf. Ez 7.19). 3. Ezequiel 16 compara as origens pagãs humildes de Jerusalém com um bebê que foi “lançado” (ou seja, abandonado) num campo para morrer (cf. v. 5). (Para outras formas de uso desse vb. com o sentido de “abandonar, deixar desabrigado”, ver Gn 21.15; Ex 1.22; SI 71.9; Jr 38.6,9; ver Cogan.) O Senhor passa pelo campo, salva a criança e, mais tarde, casa-se com ela. A alegoria descreve como o Senhor escolheu Jerusalém para ser o lugar especial onde ele habitaria. 4. Em Deuteronômio 9, o radical slk parece ser uma palavra-chave, cujo uso ressalta a dimensão do pecado de Israel ao adorar o bezerro de ouro. Quando Moisés desceu do monte e viu os israelitas adorando o bezerro de ouro, lançou por terra (slk) as tábuas da lei, enfatizando que o povo havia rompido a aliança (v. 17) (ver P. Craigie, The Book o f Deuteronomy, 1976, 195). Em seguida, destruiu o bezerro, moeu-o até virar pó, lançou (slk) o pó num ribeiro ali perto (v. 21) e fez o povo beber a água (Ex 32.19). As ações de Moisés, inclusive o gesto dele de espalhar o pó, são planejadas de modo a remover completamente a maldição da idolatria do arraial (ver B. Childs, The Book o f Exodus, 1974, 569). 5. Em raras ocasiões, Slk é usado com o sentido positivo de confiar em Deus ou no perdão divino. O escritor do Salmo 55 exorta cada um de seus ouvintes a lançar seus cuidados sobre o Senhor (55.22 [23], “confia os teus cuidados ao Senhor”). Ao louvar ao Senhor por perdão e cura, Ezequias declarou: “... porque lançaste para trás de ti todos os meus pecados” (Is 38.17). Miquéias anteviu um dia de restauração e perdão, quando o Senhor lançaria os pe cados cometidos pela nação nas profundezas do mar, onde jamais poderiam voltar a ser uma barreira entre Deus e seu povo (Mq 7.19). 128
VW (tf 8963)
6
. O subs. salleket, derrubada (de árvores) é usado em Isaías 6.13, em que o julgame to de Deus sobre Judá é comparado ao corte de uma árvore de modo que sobre somente um toco no chão (um símbolo do remanescente deixado depois do julgamento divino). Para uma discussão dessa passagem, ver J. A. Emerton, “The Translation and Interpretation o f Isaiah vi. 13,” in FS Rosenthal, 1982, 85-118 e G. Hasel, The Remnant, 1980, 235-48. Tiro, lançamento: -> dhh (empurrar, derrubar, ser humilhado, tf 1890); -> twl (lançar, # 3214); -> ydh I (atirar, # 3343); -> yrh I (atirar, lançar, tt 3721); -> mgr (lançar, tf 4489); -> rhb II (atirar, ft 8046); rmh I (lançar, atirar, # 8227); slk I (atirar, arremessar, # 8959); smt (soltar, ceder, deixar cair, lançar por terra, tt 9023) B ib l io g r a f ia
THAT 2:916-19; TWOT 2:929-30; M. Cogan, “A Technical Term for Exposures,” JNES 27, 1968, 133-35; M. Malul, “Foundlings and Adoption in the Bible and Mesopotamian Sources,” Tarbiz 57, 1987-88,461-82 (Heb.). Robert B. Chisholm 8960 (sãlãk, cormorão, ave), -> # 7606 8961 (sallelet I, sentido), -> tf 8959
8963
Vw
V7V (sll II), tirar (# 8963).
OMA Ár. salla, tirar, p. ex., uma espada (desembainhar). AT A única ocorrência desse vb. encontra-se em Rute 2.16, em que, na época da colheita, Boaz instrui seus servos a certificar-se de que Rute, recém-chegada de Moabe, tivesse grãos para respigar. Os servos deviam até tirar algumas espigas dos molhos colhidos e deixá-las sol tas para Rute apanhar. Esse gesto ia além da prescrição humanitária da lei do Pentateuco, de acordo com a qual os segadores não deviam ceifar os cantos dos campos, mas deixá-los para os pobres e estrangeiros (Lv 19.9-10; 23.22; Dt 24.19-22). Em purrão, remoção: gll I (rolar, rolar para longe, derramar, arrastar, chafurdar, tf 1670); grr (arrancar, ruminar, serrado, # 1760); -> m.sh (puxar para fora [da água], # 5406); -> msk (agarrar, arrastar para fora, atrasar, ft 5432); shb (arrastar para fora, remover, ft 6079); -» sll I (tirar, tf 8963) Robert P. Gordon
8964
Vw
rTV (sll II), q. tomar despojos, agarrar; hitpol. saqueado (ft 8964); V w (sãlãí), subs. pilhagem, presa, despojo,
saque, (# 8965). OMA Foram sugeridos cognatos sem. nos dialetos et. e ár. do sul da Arábia e esp. no acad. salãlu, levar cativo / pilhagem, presa. 129
Y tó (# 8964)
AT 1. Existe uma ligação semântica próxima entre sll e bzz (# 1024). De acordo com H. Ringgren, que trata os dois termos em conjunto, o subs. baz concentra-se na ação de despojar, e sãlãl no despojo em si (TDOT 2:66). 2. A expressão “repartir o despojo” (sãlãl) pode ser encontrada na Bênção de Jacó (Gn 49.27) e no Cântico de Moisés (Êx 15.19b, contrastando a vangloria de Faraó com o poder de Deus). O Cântico de Débora (Jz 5.28-30) descreve como a mãe de Sísera e as damas de com panhia dela o imaginavam triunfante, repartindo os despojos da batalha. O termo sãlãl é usado quatro vezes (v. 30) para descrever o despojo de moças cativas e vestes coloridas. Sísera, porém, encontra-se morto pelas mãos de uma mulher. Os fracos fortaleceram-se pelo Deus de Israel (v. 31). Os profetas também falam de dividir os depojos. No Cântico do Servo (Isaías 53), o servo desfruta sua recompensa; divide o espólio com os poderosos (v. 12), com um sentimento de conquista e vitória (ver também Zc 14.1). 3. Nos profetas, sãlãl ocorre dentro de três contextos principais. O primeiro é dos orá culos de julgamento (contra Israel, Is 8.4, ou seus inimigos, Jr 50.10). O oráculo em Isaías 8.4 está relacionado com o filho que Isaías teria com uma profetiza e que receberia o nome terrível de Maer-Salal-Hás-Baz (->), uma advertência sombria sobre a invasão iminente dos assírios (v. 3). Quando a criança fosse capaz de dizer “meu pai” ou “minha mãe”, as riquezas de Damasco e de Samaria já teriam sido levadas embora (v. 4). Assim é prevista a queda do Reino do Norte. O segundo contexto é dos oráculos de salvação: aquele que toca (lit. despoja) Israel, toca na menina dos olhos do Senhor (Zc 2.8 [ 13]). Em terceiro lugar, num contexto de opressão, Isaías fala daqueles que criam leis injustas, privam os oprimidos da justiça e despojam as viú vas. Em termos teológicos, esses contextos compõem o campo semântico mais relevante para sll (como também para bzz), inclusive ainda a alegria e vitória concedida àqueles que confiam em Deus (SI 119.162; Is 53.12). 4. Outros termos pertencentes a esse mesmo âmbito semântico são: malqoah, com o sentido de pilhagem de guerra (# 4917) e ‘a d III, encontrado em Gênesis 49.27 com o sentido de despojo (# 6331).
10.2
P-B Os escritos de Qumran empregam sll em contextos semelhantes aos do AT, como a to mada de espólio no contexto da guerra escatológica e do castigo por Deus sobre os inimigos (p. ex.; 1QM 7:2; 10:1-2). Jastrow 2.1585 identifica duas formas, sll I (pilhagem ou lucro), encontrado em B. Kam 61a, e sll II (corrente, ponto de costura). Saque, despojo, roubo, furto: bzz (pilhar, saquear, # 1024); -> gzl (furtar, roubar, # 1608); -> gnb (furtar, roubar, # 1704); -> pãris II (assaltante, ladrão, # 7265); pereq (encruzilhada?, saque, # 7294); -> sll II (tomar despojos, agarrar, # 8964); -> ssh (saque, pilhagem, #9115) B ib l io g r a f ia
F. M. Cross, Jr., “The Divine Warrior in Israel’s Early Cult,” Biblical Motifs, 1966, 11-30; R. de Vaux, Anclsr 254-57; M. C. Lind, Yahweh Is a Warrior, 1980; T. Longman III, “Psalm 98: A Divine Warrior Song,” JETS, 27, 1984, 267-74; P. D. Miller, The Divine Warrior in Early Israel, 1973; H. J. Stoebe, “Raub und Beute,” SVT 16, 1968, 340-54. W. R. Domeris 8965 (sãlãl, pilhagem, saque), -¥ # 8964 130
a to ' (# 8966)
a to ' (sim), q. intrans. estar terminado, ter satisfação; pi. _______________________________ restituir, recompensar, cumprir um voto, compensar, retribuir, completar, terminar; hi. fazer as pazes, cumprir, render-se (# 8966); a ito ' (sãlôm), subs. paz, amizade, felicidade, bem-estar, prosperidade, saúde, sorte, bondade, salvação (# 8934); O ito’ (Sillüm, # 8936); a t o (selãm), subs. acordo (# 8967); Oto' (selem) subs. acordo (hapleg. em E s4.7; -> # 8968);a t o (Sãlêm I), subs. ileso, seguro, completo, pacífico (# 8969); n o to (Sillumâ), subs. verbal, reembolso, retribuição (# 8974). OMA O vb. Sim é plenamente atestado em todas as línguas cognatas. Em termos comparativos, possui uma grande abrangência de significados no acad. S/salãmu, tendo relação com o ato ou estado de bem-estar, de encontrar-se seguro ou completo, e com procedimentos de reembolso, recompensa ou retribuição (cf. CAD 206-23). O subs. Salamu refere-se normalmente à saúde e bem-estar físicos ou públicos, e o adj. salmu significa saudável, intato, seguro e em boas con dições. No ugar., o vb. sim e o subs. ocorrem com o significado de paz, saúde. No grau D, o vb. também pode significar restituir (cf. UT, 490-91).
AT O grupo sãlôm representa um dos conceitos teológicos mais importantes do AT. Costu ma-se buscar o significado subjacente no uso do vb. Sim. O mais comum é que um significado do vb., “estar completo, intato”, receba ênfase excessiva e, como conseqüência disso, Sim seja considerado um estado de inteireza ou preenchimento. Em oposição a isso, Gerleman (THAT 2:919-35) enfatiza o significado básico do vb. como “retribuir, recompensar” e o defende como constituinte semântico fundamental de sim. Um procedimento mais produtivo consiste em re conhecer-se os diversos significados tomando por base principalmente as formas contextuais de uso no AT. I. O vb. Sim. a. A forma q. intrans. do vb. ocorre apenas algumas vezes, sendo possív distinguir dois significados: “ter satisfação” (Jó 9.4, “paz”; cf. 22.21) e “acabar” (lR s 9.25; Ne 6.15). b. O vb. Sim no pi. é bastante usado em contextos legais com o sentido de “restitui compensar”. Esse uso fica particularmente claro no Código da Aliança (Êx 20.22— 23.19). Otto (Rechtsgeschichte der Redaktionen im Kodex ESnunna und Bundesbuch, 1989, 151, 177-79) mostra que as chamadas leisyfiSãllêm em Êxodo 21.33— 22-14 consistem de leis de compensa ção civil e pareceres legais criminais. Pode-se observar aí um padrão fixo de alternância. Essas leis compensatórias expressadas com o vb. Sim mostram afinidade com as leis casuísticas da Mesopotâmia. O vb. também é usado com o sentido mais geral de “pagar” ou “restituir”. Pode, portanto, referir-se ao pagamento de uma dívida (2Rs 4.7) e, figurativamente, ao pagamento de ofertas de ação de graças (SI 56.12 [13]) e de votos (SI 22.25 [26]; Os 14.3). Num sentido negativo, Sim tem pessoas como sujeitos, especialmente com relação à retribuição do bem com o mal (Gn 44.4; SI 35.12; 38.20 [21]). No Salmo 41.10 [11], o suplicante pede a Javé que o ajude a vingar-se dos inimigos. Essa situação já indica a idéia geral de que Javé se vinga dos inimigos de Israel (Dt 32.35, 41; Pv 20.22; Jr 51.56). Na maioria dos casos em que Sim é usado tendo Javé como sujeito, o vb. é empregado de modo negativo para designar a retribuição e vingança do Senhor pelos pecados de Israel (Is 65.6) e pela perversidade dos inimigos de Israel (Is 59.18; 66.6; Jr 16.18; 25.14). O uso freqüen te de Sim em Isaías e Jeremias, com referência ao castigo dos inimigos por Javé, é explicado pelo fato de que isso é visto como parte do plano de Javé para restaurar a ordem no mundo. O vb. Sim tendo Javé como sujeito também é usado com um sentido positivo quando se refere à recompensa/compensação pelas boas obras (ISm 24.20; Pv 13.21; 25.22). Um importante 131
tiTti (# 8966)
aplicação de Sim pode ser encontrada em Isaías 57.18; nessa visão escatológica, Javé voltará (sim) a consolar o arrependido, o que contrasta com as acusações de Javé contra os perversos (IS 56.9— 57.13). Nesse caso, o vb. é usado em par. com rp \ sarar, ( # 8324). O resultado desse ato de Sim por Javé será a paz (v. 19; ver Sãlôm) para a nação, mas os perversos não te rão paz alguma (v. 21). c. O vb. sim no hi. também denota algo que foi completado ou cumprido (p. ex 44.26, 28). E usado em sentido figurado no lamento de Ezequias para retratar sua enfermida de como se Deus tivesse “dado cabo” dele (Is 38.12). sim ocorre com mais freqüência com o sentido de “fazer as pazes” ou “viver em paz com” (p. ex„ Dt 20.12; Js 10.1, 4; 2Sm 10.19; IRs 22.44 [45]). 2 .0 subs. sãlôm. a. Em sentido material ou secular, Sãlôm refere-se a bem-estar, prospe ridade ou saúde física (p. ex., Gn 29.6; 43.27; SI 38.3; Is 57.18; Jr 6.14). Também expressa um estado de espírito ou condição interior de tranqüilidade, satisfação ou contentamento. Nesses casos é, por vezes, acompanhado dos vbs. “ir” ou “vir” (Gn 26.29; Ex 18.23); “deitar-se” (SI 4.8); “ser sepultado” (Gn 15.15; 2Rs 22.20); “falar” (Gn 37.4), etc. Sãlôm também é usado de maneira padronizada ao perguntar-se sobre o bem-estar de alguém ou como um cumprimento geral, “paz seja contigo” (Jz 6.23; 18.15; ISm 10.4; 25.6; 2Rs 10.13). Na literatura de sabe doria, espera-se que alguém que vive de acordo com as prescrições da sabedoria tenha uma vida longa e paz (Pv 3.2, 17). O iníquo, pelo contrário, não achará paz (Is 48.22; 57.21; 59.8). De acordo com H. H. Schmid (Frieden, 54-56), em tais contextos Sãlôm indica um estado de existência de acordo com a ordem criada por Javé. b. O subs. Sãlôm também é usado para expressar relacionamentos sociais ou públicos entre amigos, grupos e nações. Nesses contextos, expressa a ausência de lutas e guerras, repre sentando, em outras palavras, uma aliança propícia (p. ex., Gn 34.21; Jz 4.17; IRs 4.24 [5.4]; 12[26]; Zc 6.13). O estado ou condição predominante quando termina a guerra é Sãlôm (p. ex., 1 Rs 2.5; Si 120.6-7; Is 59.8). Em sentido técnico, também significa “tratado” ( "sh sãlôm) (p. ex. Is 27.5). Quando Javé abençoa Davi com paz, em 1 Crônicas 22.9-10, há um trocadilho com o nome de Salomão, que é derivado dc sãlôm. O estado de paz (Sãlôm) também é tipificado nesses casos como um estado de calma e tranqüilidade (ver Seqef, -> # 9201). c. A expressão berít sãlôm, aliança de paz, ( berít, # 1382), ocorre 4x e deve receber atenção especial devido à sua implicação teológica. Em Números 25.12, Finéias demonstra o zelo que tem pela honra de Deus e mata dois pecadores que profanaram Israel, e, ao fazê-lo, aplaca a ira divina contra seu povo. Assim, realiza-se a restituição e Deus promete fazer uma “aliança de paz” com o sacerdote Finéias. Essa história indica que a “aliança de paz” é uma aliança promissora (Weinfeld, 184-203) que expressa a bênção e a salvação de Deus para o seu povo. Gerleman (THAT 2:929-30) mostra que essa expressão refere-se à restituição ou com pensação como bênção de Deus pelo mal causado ao seu povo, o que acontece de modo mais acentuado na bênção escatológica de uma “aliança de paz” depois que Israel é castigada. Javé voltará com misericórdia eterna (Is 54.7-8) e não removerá sua “aliança de paz”. Em Ezequiel 34.5, diz-se que o Deus soberano fará uma “aliança de paz” e todo o povo prosperará e viverá em paz. Ezequiel 37.26 deixa claro que a “aliança de paz” significa a restauração da antiga si tuação ideal do povo na terra de sua herança, onde voltarão a ser recebedorcs das bênçãos do Senhor. A berít sãlôm é, portanto, a aliança promissória de Deus, dada ao seu povo restaurado, na forma de bênção e salvação eternas. d. Como conceito religioso, Sãlôm constitui uma parte essencial do plano de Javé para a salvação. Ele é a origem de toda paz e o fundamento dela ( I Rs 2.33; Jó 25.2; SI 35.27; 122.6; Mq 4.5). E impossível haver paz se o relacionamento com Javé encontra-se corrompido (Jr 132
□ t o ' (# 8966)
30.5). Pela bênção de Arão (Nm.6.24-26), fica evidente que a pessoa, à qual Deus proporciona paz (Sãlôm), é abençoada (brk, # 1385), protegida (Smr, # 9068) e tratada com bonda de (hnn, -> # 2858). Pelo fato de a paz indicar o estado ou a condição de um relacionamento renovado com Deus, como parte da salvação, a criança messiânica é chamada de sar sãlôm, “Príncipe da Paz” (Is 9.6 [5]). A vinda do rei da paz, em Zc 9.9-10, é retratada como o início de um estado abrangente de paz e domínio universal. De acordo com a pregação profética, a paz (sãlôm) é resultado da restauração da justi ça e não pode ser alcançada enquanto se persiste no pecado e no mal (Is 32.17; 48.18; 54.13; 60.17). Em outras palavras, não se trata de uma paz política da qual uma nação pode se be neficiar, como era proclamado pelos falsos profetas. Os profetas do Senhor protestaram com veemência contra tal convicção (Jr 6.14; 14.13,28; Ez 13.16; Mq 3.5). Os profetas do período anterior ao exílio advertiram contra a presunção dos falsos profetas, que identificavam o propó sito divino de salvação com estabilidade política em Israel, equiparando, desse modo, a “paz” de Deus com a paz política. Essa identificação era inaceitável para os profetas do pré-exílio, os quais argumentavam que a questão da salvação e paz divinas não podiam ser tratadas de modo isolado da culpa e dos pecados de sua nação. Assim, eles distanciaram-se da falsa pregação de sãlôm (cf. H. H. Schmid, Frieden, 62-70). e. A relação entre sãlôm e s^dãqâ, justiça ( -> # 7407), merece um comentário à par Isaías 48.18 deixa claro que a paz e a justiça têm como origem a obediência aos mandamentos de Javé e podem ser consideradas bênçãos do Senhor. Isaías 60.17 ressalta esse fato ao retratar a glória vindoura de Sião. Nessa passagem, a paz e a justiça são representadas como gover nantes (“inspetores” e “exatores”) de Sião. Não haverá mais violência e destruição e Sião será um exemplo da salvação por Javé (cf. 60.18-22; também SI 72.1-7). Em Isaías 32, é apresenta do um retrato semelhante do reavivamento futuro de Jerusalém por intermédio do Espírito do Senhor. Um rei justo reinará (32.1) e a justiça prevalecerá em sua nação (v. 16). Os frutos da justiça serão sãlôm (v. 17), repouso (ver Seqet) e segurança (betah, -> # 1055). Assim, sãlôm (paz) e Seqe( (repouso) são decritos como as expressões supremas de uma existência plena e satisfeita, de acordo com a ordem planejada por Javé, expressa como a manutenção de sedãqâ (cf. H. H. Schmid, Gerechtigkeit ais Weltordmmg, 1968). Esse conceito é também expressado nos cânticos rituais de Israel. Na oração pela res tauração de Israel, no Salmo 85, o caminho da salvação de Javé é preparado pela justiça (fedeq, -> # 7406; v. 13 [ 14]). Javé promete paz (sãlôm) ao seu povo (v. 8 [9]) e a justiça (çedeq) e sãlôm se beijarão. Essa metáfora revela a dimensão da vida que será experimentada quando a salvação do Senhor for concedida ao seu povo. Tomando-se por base esses exemplos, é evi dente que a previsão de sãlôm, quando a paz for concedida no futuro, encontra-se relacionada de maneira muito próxima à justiça como caráter ideal de existência de acordo com a vontade de Deus. Essa existência é abençoada com paz divina como um cumprimento do propósito supremo do ser. 3. Derivativos de sim. a. Sãlêm. O adj. verbal Sãlêm tem um âmbito bastante amplo significados, semelhantes àqueles do próprio verbo Sim. Pode referir-se aos pecados que ainda não foram pagos (Gn 15.16). A tendência de Gerleman (THAT 2:926) é traduzir gãlút Selêmâ (Am 1.6, 9) como “deportação retaliatória” e, ao fazê-lo, rejeita a idéia tradicional de que a expressão deva ser traduzida como “deportação total” (cf. Jr 13.19). Gerleman aplica seu conceito do significado básico do vb. Sim, em todas as ocorrências de Sãlêm com coração (lêb/lêbãb), e, portanto, as traduz como “coração retribuidor”, no sen tido de um coração submisso e solícito. Tomando-se por base os diversos contextos, pode-se deduzir o seguinte: a expressão lêb Sãlêm ocorre somente uma vez com o significado secular de 133
üV» (# 8966)
“empenhado” (lC r 12.38 [39], “comprometidos”). Em todos os outros casos, refere-se a uma atitude religiosa de devoção ao Senhor e pode ser traduzido de modo mais apropriado como “sincero” ou “fiel” (p. ex., 1Rs 8.61; 11.4; 15.14; lCr 16.9; 28.9; 29.9; Is 38.3). Pode-se deduzir esse sentido sobretudo a partir dos exemplos em que o termo ocorre juntamente com fidelida de ( ’emet, -> # 622; 2Cr 19.9; Is 38.3). O escritor de Crônicas demonstra preferência por essa expressão para descrever um grande empenho em fazer o que é certo (1 Cr 29.19; 2Cr 25.2). O adj. sãlêm também é usado para descrever as pedras “toscas” ou “não lavradas” ne cessárias para construir-se um altar (Dt 27.6; Js 8.31) e também o templo (lR s 6.7). O termo é usado, ainda, para medidas ou pesos comerciais “integrais” ou “justos” (Dt 25.15; Pv 11.1). Pode referir-se, ainda, a voltar “ileso/em segurança” de uma viagem (Gn 33.8) ou a demonstrar uma atitude “pacífica” (Gn 34.21). b. O subs. sillüm, relacionado ao pi. do vb. sim (ver sim) é usado para uma recompensa (suborno?) recebida por alguém (Mq 7.3) ou para o dia (ano) de retribuição do Senhor, tanto num sentido negativo quanto positivo. Em termos negativos, refere-se à retribuição pelos pe cados de Israel (Os 9.7). Caso considere-se o uso de sillüm em vez de Sillêm em Deuteronômio 32.35, tem-se mais um exemplo comparável. Em termos positivos, indica Javé recompensando Sião quando os inimigos dela são castigados (Is 34.8). A forma fem. sillumâ ocorre uma vez e, da mesma forma, diz respeito à vingança contra os perversos (SI 91.8). c. O subs. selem (quase sempre no pl. [selãmím] no AT) está relacionado com o ugar. sim e refere-se a um determinado tipo de oferta. No contexto cananeu, sim pode indicar uma oferta pacífica ou um presente de saudação que reflete um bom relacionamento entre as partes envolvidas (cf. Janowski, 231-59; M. Dietrich e O. Loretz, 65, 77-88; também UT, 490; KAI, Nr 37B:4; 51.5). Há divergências quanto ao número exato de ofertas designadas por selãmim no AT (cf. uma lista sumária em KBL iv, 1421-23). Para o propósito desta obra, é suficiente enfatizar a conotação de selãmim que está sendo discutida, não sendo necessário entrar em todos os de talhes referentes aos diversos sacrifícios. Apesar de ser possível argumentar que zebah ( -> # 2285) e selem eram, a princípio, ofertas separadas, a combinação zebah selãmím ocorre muitas vezes e refere-se a uma oferta específica (Êx 24.5; ISm 11.15; Am 5.22). Ver mais informa ções em # 8968. Êxodo 29.28 deixa claro que o principal objetivo desse sacrifício era a expiação, num procedimento relacionado à ordenação e consagração dos sacerdotes. De acordo com Levítico 6.5-7, o indivíduo tinha a obrigação de compensar um companheiro israelita por qualquer dano causado e levar uma “oferta de culpa” a fim de realizar expiação pelo pecado. A ocorrência (13x) de zebah selãmim juntamente com o holocausto ( o/á; # 6592; p. ex. Êx 20.24; 24.5; Dt 27.7; Js 8.31; ISm 13.9; 2Sm 6.18) demonstra a relação próxima entre os dois, mas também sublinha a necessidade de fazer-se distinção entre eles. O fato de o sangue ser aspergido sobre o altar e de realizar-se a leitura do Livro da Aliança para o povo (Êx 24.6-7) é interpretado por alguns estudiosos (p. ex., R. Schmid, 122) como uma indicação de que a oferta selãmím era, basicamente, uma oferta ligada à aliança. De acordo com Janowski (UF 12,1980,257), os tex tos não sacerdotais e não cristãos retratam essas ofertas como a conclusão de uma importante cerimônia de sacrifício. No entanto, os contextos diferem demais para que se possa confirmar que se tratasse exclusivamente de uma cerimônia de aliança. Queimar a gordura, aspergir o sangue e comer a carne da oferta de Selãmím são procedimentos que sugerem uma reconcilia ção entre as partes envolvidas, especialmente quando uma delas é Javé. A ingestão da carne é a apropriação ritual do relacionamento restaurado. 134
Dto' (# 8968)
P-B No Papiro de Elefantino, Sim também ocorre com o significado de “pagar/restituir”. No aram. (inclusive no aramB) e na LR, o vb. Sim e o subs. sãlôm ocorrem com significados relacionados ao seu uso no AT e em expressões padronizadas de saudação e bênção (cf. Beyer, 711-12 e Jastrow 2:1579, 1585-86). Na LR também se pode encontrar a idéia de que é neces sário os individuos “fazerem as pazes” entre si ( 'sh sãlôm), uma vez que as lutas e discórdias são contrárias à vontade de Deus e retardam a vinda do Messias (TD N T2:408-10). A LXX costuma traduzir sãlôm por eirênê, o que abrange grande parte dos significados sem. da palavra de origem, exceto por “recompensa/retribuição”. Pelo fato de a paz em seu sentido religioso ser vista exclusivamente como a bênção de Deus de um relacionamento restaurado, o NT pode proclamar o cumprimento do estado escatológico de paz (Zc 9.10) em Jesus (Mt 5.9; 21.1; Lc 2.14). Por intermédio da morte de Cristo, é possível haver reconciliação e paz com Deus (Rm 5.1; Efésios 2.14) e entre os homens (Efésios 4.3; Tg 3.18). Assim, o NT dá continuidade ao conceito religioso de sãlôm e considera o triunfo do Messias a concretização de sãlôm (Lc 10.18; Rm 8.6; 16.20). Paz, retribuição, segurança, tranqüilidade: -> betah I (segurança, # 1055); -> slh (estar sos segado, tranqüilo, dar falsas esperanças, # 8922); -> sim (ter satisfação, restituir, recompensar, retribuir, fazer as pazes, # 8966); -> sqt (estar tranqüilo, # 9200); -> Retribuição: Teologia B ib l io g r a f ia
/D ô 3:704-6; TDNT 11:402-6; THAT 2:9\9-3S\ TW O T2:930-32; K. Beyer, Die Aramaischen Texte vom Toten Meer, 1983; J. C. De Moor, “The Peace-offering in Ugarit and Israel,” in Schrift en U itleg(W. H. Gispen), 1970, 112-17; M. Dietrich & O. Loretz, “Neue Studien zu den Ritualtexten aus Ugarit (1),” U F 13,1981,63-100; W. Eisenbeis, Die Wurzel t í w im Alten Testament, BZAW 113,1969; H. Gross, Die Idee des ewigen und allgemeinen Weltfriedens im Orient und im Alten Testament, 1967; P. Hanson, “War and Peace in the Hebrew Bible,” Int 38, 1984,34162; R. B. Janowski, “Erwãgungen zur Vorgeschichte des israelitischen se/a/ww-Opfers. UF 12, 1980, 231-59; J. Jarrick, “Shalom Reaffirmed: A Response to Gerleman’s Theory,” Lutheran Theological Journal 20, 1986, 2-9; M. Mettner, “Frieden” in Neues Handbuch theologischer Grundbegriffe, 1991,2:96-123; S. Olyan, “Hashalom: Some Literary Considerationsof2 Kings 9,” CBQ 46, 1984, 652-68; E. Otto, Rechtsgeschichte der Redaktionen im Kodex ESnunna und im Bundesbuch, 1989; H. H. Schmid, Gerechtigkeit ais Weltordnung, 1968; idem, Frieden im alten Orient und im Alten Testament, 1971; R. Schmid, Das Bundesopfer in Israel: Wesen, Ursprung und Bedeutundder alttestamentlichen Schelamim, 1964; H. H. Schrey, “Friede,” in RGG 11, 1958, 1133-35; M. Weinfeld, "The Covenant o f Grant in the Old Testament and the Ancient Near East,” JAOS 90, 1970, 184-203; D. J. Wiseman, “Is It Peace: Covenant and Diplomacy,” VT 32, 1982,311-26. Philip J. Nel 8697 (Selâm, acordo),
# 8966
t í w (Selem), subs. sacrifício de resgate, sacrifício de comunhão, oferta pacífica, oferta de fraternidade (# 8968); < ü t o (Sim), pagamento, recompensa ( # 8966). A lista de possíveis traduções apresentadas aqui reflete o fato de que todas elas são “na melhor das hipóteses, conjecturas informadas” (Milgrom, 1991, 220). Foram propostas várias 8968
Dto'
135
Dto' (# 8968)
etimologias do próprio heb. e de línguas cognatas (ver os resumos proveitosos em ibid., 22021; Hartley , 38; e TWAT e na literatura ali citada): (1) oferta pacífica, relacionada ao subs. heb. Sãlôm, paz; (2) oferta de bem-estar, do heb. Sãlêm, inteiro, ileso, saudável (ver Milgrom e também Hartley), (3) oferta de comunhão ou fraternidade (na NIV, este último termo estava associado, originalmente, à concepção totêmica que W. R. Smith tinha dos sacrifícios, mas essa tradução já não adota mais tal concepção; Ofertas e Sacrifícios: Teologia, seção 4); (4) oferta de compensação ou oferta de conclusão, relacionada ao vb. pi. heb. Sillêm, com pensar; completar, terminar; e (5) tributo, presente de saudação, relacionado ao acad. Sulmãnu e ao ugar. Slmm (ver esp. Levine, 3-52). Optou-se aqui por manter aqui a tradução “oferta pacífica”, pois ela permite o maior nível de flexibilidade conceituai. O principal enfoque desse tipo específico de oferta parece ser o da celebração em comunidade provida pela carne da oferta. Tratava-se de uma oferta de fraternidade ou comunhão que indicava e representava o fato de que havia paz entre Deus e seu povo e que a pessoa, família ou comunidade encontrava-se, portanto, numa condição de bem-estar.
OMA 1.0 radical Sim (# 8966) ocorre, evidentemente, com grande freqüência em quase todas as línguas sem. (ver, p. ex., HALAT 1418-19; DISO, 303-5; AHw, 1143-45; 1268-69). Apesar de haver quem argumentasse em favor de uma relação próxima entre o acad. Sulmãnu, o ugar. Slmm e o termo heb. para oferta pacífica, Selãmím (ver esp. Levine, 3-52), o termo acad. em si nunca é usado para uma oferta ritual. E provável que seja melhor comparar-se o termo heb. com ocorrências em línguas que o usam em sentido ritual. Para um bom resumo das manifes tações de Selãmím ou ofertas correspondentes em sistemas cultuais sem. e não sem. do OMA, ver Weinfeld, 98-99, 107-8. Em textos ritualísticos heteus e hurrianos, o termo usado é keldi ou taleSulaS e, muitas vezes, encontra-se unido a ambaSSi, holocausto. 2 .0 ugar. é esp. importante (verTarragon, 59-62 para um bom resumo das ocorrênci bem como questões interpretativas). No AT, o termo usado para oferta pacífica ocorre somente uma vez (Am 5.22), mas também há ocorrências no sing. no ugar (p. ex. gdlt Sim, uma fêmea do rebanho como oferta de paz [UT 1:8]). A forma pl. ocorre tanto de modo independente como na combinação Srp w Slmm, que corresponde ao BH 'õlôl úselãmim, holocaustos e ofertas pa cíficas (Jz 20.26; 21.4; cf. também num sentido mais livre, Ex 24.5; 32.6; Js 8.31). Há uma ocorrência na epopéia de Querete, ocorrência essa que tem recebido bastante atenção. Querete sitiou o Rei Pabil, que responde: (130) qh . k r í. Slmm (131) Slm m . w ng . mlk . Ibty, “Toma, Querete, as ofertas pacíficas, (toma) as ofertas pacíficas e foge, ó Rei, de minha casa” (CML, 86; cf. também 89, linhas 255-56 e 274-75). Levine usou essa passagem ugar. para argumentar que, assim como no acad., o uso original do termo era político (ou seja, tributo, cf. acad. Sulmãnu). Comparou-a com 1 Samuel 11.14-15, “Disse Samuel ao povo: Vinde, vamos a Gilgal e renovemos ali o reino. E todo o povo partiu para Gilgal, onde proclamaram Saul seu rei, perante o Senhor, a cuja presença trouxeram ofertas pacíficas (Selãmim); e Saul muito se alegrou ali com todos os homens de Israel”. Tomando esse texto por base, Levine sugeriu que, a princípio, Selãmím estava relacionado a uma celebração real ou nacional e que somente mais tarde tomou-se associado ao culto normal (ver TWAT8-. 103 para objeções a essa análise). 3. Encontramos no tarifário púnico a expressão b ’lp kll ’m $w ‘t ’m Sim kll, que po provavelmente, ser traduzida como: “No caso de uma cabeça grande de gado, quer o boi seja oferecido inteiro como holocausto (um s w ‘t) ou como oferta pacífica (Sim) do (ou seja, que acompanhava) holocausto inteiro (kll)..." (Levine, 118-20; cf. R. S. Tomback, A Comparative Semitic Lexicon o f the Phoenician and Punic Languages, SBLDS 32, 1978, 318 para estes e outros exemplos). 136
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AT O termo selem/selãmim, oferta pacífica, ocorre lx no singular (Am 5.22b, por causa da rebelião de Israel, o Senhor diz: “E, ainda que me ofereçais holocaustos e vossas ofertas de manjares, não me agradarei deles, nem atentarei para as ofertas pacíficas de vossos ani mais cevados”) e 86x no plural na BH. Em termos canônicos, o primeiro exemplo aparece na lei referente ao altar em Êxodo 20.24a: “Um altar de terra me farás e sobre ele sacrificarás os teus holocaustos, as tuas ofertas pacíficas, as tuas ovelhas e os teus bois”. A última ocorrência encontra-se em Amós 5.22 (ver acima). Êxodo 20.24 e 24.5 referem-se a tais ofertas sendo apresentadas em altares isolados antes da construção do tabemáculo ou do templo (ver também Êx 32.6, diante do bezerro de ouro). As ofertas pacíficas (e holocaustos) também continuaram sendo apresentadas em altares isolados mesmo depois que o tabemáculo — e, posteriormente, o templo — havia sido construído (ver Dt 27.7; Js 8.31 sobre o altar de ratificação da aliança em Siquém; Jz 20.26; 21.4 sobre o altar construído em Betei; 2Sm 24.25; lCr 21.26— 22.1 sobre a eira que mais tarde se tornaria o monte do templo; cf. ISm 10.8; 11.15; 13.9). As ofertas pacíficas foram parte importante da inauguração do tabemáculo (Lv 9.4, 18, 22). Salomão ofereceu uma infinidade de ofertas pacíficas na consagração do templo em Jerusalém (lR s 8.63-64, 2Cr 7.7; cf. lRs 9.25), tanto Ezequias quanto Manassés ofereceramnas ao renovarem a consagração do templo (2Cr 30.22; 31.2; 33.16) e o mesmo foi antevisto para a consagração do templo de Ezequiel e na adoração contínua em seu santuário (Ez 43.27; cf. Nm 29.39 com Ez 45.15, 17). Acaz chegou a usá-las na inauguração de seu altar pagão no templo de Jerusalém (2Rs 16.13). O maior agrupamento de ocorrências do termo selãmim encontra-se, de longe, nas seções sacerdotais do Pent. (ver seções 2-7). 2. O fato de que Deus habitava, verdadeiramente, no meio de seu povo no tabemáculo (e posteriormente no templo) e desejava ter um relacionamento com ele é fundamental para o sistema de ofertas e sacrifícios prescrito no Sinai. É o (zebah) selãmim, (sacrifício de) oferta de paz (ou oferta de fraternidade) que chama a atenção para o aspecto da comunhão no sistema sacrificial do AT (ver esp. Lv 3. 1-17; 7.11-21; -> Ofertas e Sacrifícios: Teologia). Por certo, as partes de gordura da oferta pacífica constituem uma dádiva de alimento para o Senhor, de modo semelhante ao holocausto e à porção memorial da oferta de manjares (ver acima e “oferta queimada, de aroma agradável ao Senhor,” Lv 3.5; cf. 3.11, 16; 7.25 e 'isseh, oferta queimada; presente, dádiva [# 852]). No entanto, o aspecto característico da oferta pacífica era o fato de que os ofertantes costumavam comer quase toda a came como parte de uma refeição comunal diante do Senhor. Somente a gordura e o sangue iam diretamente para o Senhor no altar (Lv 7.22-27) e apenas certas porções da came eram entregues aos sacerdotes como sua prebenda (ou seja, o pagamento que lhes era de direito pelos serviços prestados, Lv 7.28-34; cf. finúpâ, oferta movida, # 9485; firím â , tributo, contribuição, # 9556). 3. A oferta pacífica enfatiza o fato de que todas as pessoas da antiga Israel tinham a oportunidade de estar em comunhão íntima com o Senhor. Podiam comer a came de um animal que havia sido apresentado, identificado e consagrado como uma oferta ao Senhor (Lv 3.1-2; 7.11-21). Assim, a oferta pacífica significava que tudo estava bem (ou seja, em paz) no relacio namento entre o Senhor e seu povo e, portanto, sempre era realizada por último em qualquer série de ofertas da qual fazia parte (ver Lv 9.8 ,1 2 ,15 -17 e, finalmente, w . 18-21). A oferta não devia ter defeito algum, mas, diferentemente do holocausto, podia ser de um animal macho ou fêmea (v. 1), uma vez que costumava constituir, por natureza, uma expressão relativamente livre de adoração e louvor e, portanto, menos normatizada do que as outras ofertas. 4. Como no caso do holocausto, o ofertante imolava o animal, mas era o sacerdote que manipulava o sangue (Lv 3.2). Essa manipulação para a oferta pacífica normalmente era seme lhante àquela do holocausto: “E os filhos de Arão, os sacerdotes, aspergirão (lit. salpicar, zãraq, 137
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# 2450) o sangue sobre o altar, ao redor” (Lv 3.2b; cf. vv. 8, 13). Assim como nos holocaustos, essa era a maneira de tomar o sangue parte da oferta ao Senhor. Partindo desse ponto de vista, a manipulação do sangue não era, de fato, “o elemento mais fundamental dessa oferta” (em oposição a Milgrom, 1991,222), mas podia tomar-se importante em certas ocasiões. Apesar de alguns estudiosos argumentarem que a oferta de ordenação não era um tipo de oferta pacífica (ibid., 222), ainda assim, algumas características dessa oferta e de seu procedimento indicam uma conclusão contrária. Um fato especialmente relevante é que, de acordo com Êxodo 29.33, dizia-se que a oferta pacífica da ordenação e seus aparatos realizavam expiação ( kpr, # 4105). Isso modifica a afirmação habitual de que a oferta pacífica não realizava expiação. Essa expiação não se en contrava limitada ao sangue e sua manipulação, mas sim, como no caso do holocausto, incluía todas as coisas associadas à oferta pacífica de ordenação, da qual certas partes eram oferecidas para produzir “agradável aroma, oferta queimada ao Senhor” (Êx 29.25; cf. Lv 8.28, seção 5 abaixo, e os comentários sobre 'õlã, holocausto, # 6592). De qualquer modo, a manipulação do sangue era, claramente, uma parte importante do ritual, uma vez que era o centro da atenção nos procedimentos de consagração (Êx 29.12-21) e, daí, sua eficácia expiatória. Nesse caso, como oferta de ordenação, a oferta pacífica transformava-se essencialmente, numa oferta de expiação, ainda que não costumasse ser associada à expiação. É preciso lembrar-se de que a oferta pacífica era parte do sistema antigo da realização de ofertas em altares isolados (ver a discussão de Êx 24.6-8 na seção 7). Porém, tendo sido in corporada ao sistema do santuário, essa oferta e o seu sangue puderam assumir características expiatórias apropriadas para o propósito dela em meio às outras ofertas. Portanto, a coxa direi ta, que normalmente era prebenda do sacerdote (ver Prítmâ, tributo, contribuição [# 9556]), costumava ser queimada em vez de ser usada como alimento, para significar que o sangue do animal havia sido levado ao altar para fazer expiação pelos ofertantes (Êx 29.22; cf., da mesma forma, a oferta pelo pecado para o sacerdote em Levítico 6.30 [23]). Assim, a cria interpretum de Levítico 17.11 refere-se à base lógica para a expiação por sangue especificamente no contexto da oferta de paz. Em seu contexto, esse v. explica por que ninguém em Israel devia comer o sangue de nenhum animal sacrificado como oferta pa cífica: “Porque a vida da came está no sangue. Eu vo-lo tenho dado sobre o altar, para fazer expiação pela vossa alma, porquanto é o sangue que fará expiação em virtude da vida” (cf. v. 14; Gn 9.4-5). Para uma discussão completa de Levítico 17.11 em seu contexto, ver kpr, fazer expiação, #4105. 5 .0 povo de modo geral podia comer a came somente de um tipo de sacrifício, da ofe pacífica (cf. Lv 3; 7.11 -36) e esse era o único motivo para a proibição de se ingerir o sangue, conforme Levítico 17 que se refere às ofertas pacíficas. Essa proibição também ocorre junta mente com a proibição de se comer a gordura nos estatutos para a oferta pacífica em Levítico 3.16-17 e 7.22-27. Tanto a gordura quanto o sangue pertenciam somente ao Senhor: a gordura pois era reservada como um manjar ao Senhor (ver Lv 3.11 e 'isseh, oferta queimada; presente, dádiva [# 852]; cf. também 1.9, 13, 17; 3.5, 16) e o sangue, pois era reservado exclusivamente com o propósito de realizar expiação (Lv 17.11). As partes com gordura tomavam-se como toda a carcaça do holocausto e cumpriam o mesmo propósito, transformando-se em “oferta queimada, de aroma agradável ao Senhor” (Lv 3.5; cf. vv. 11, 14, 16, a carcaça toda de holo causto em 1.9, 13, 17 e a discussão em ‘õlá 1, # 6592). A principal perícope de oferta de paz em Levítico 3 conclui com as seguintes palavras: “Toda a gordura será do Senhor. Estatuto perpétuo será durante as vossas gerações, em todas as vossas moradas; gordura nenhuma nem sangue jamais comereis” (3 .16b-17). Essa mesma 138
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proibição dupla de se ingerir sangue ou gordura é apresentada de forma expandida em Levítico 7.22-27. Uma vez que a oferta pacífica era o único dos sacrifícios habituais do qual o povo em geral podia comer, era necessário enfatizar as leis daquilo que não podia ser ingerido. É bem provável que a gordura não devesse ser comida, pois era considerada uma iguaria. De acordo com Deuteronômio 32.13-14, por exemplo, o Senhor alimentava o povo com o que havia de melhor na terra, inclusive, entre outras coisas, a gordura de cordeiros, carneiros, bodes e até mesmo do trigo, bem como o “sangue” das uvas (v. 14; cf. Gn 45.18; Nm 18.12, 29-30, 32; SI 63.5). A “gordura e os rins do trigo” (lit. Dt 32.14) é, claramente, um trocadilho que significa o que há de melhor do trigo (cf. SI 81.16; 147.14). Além disso, o paralelo adicional indicado pelo “sangue das uvas” parece transformar essa passagem num jogo de palavras com a proibição dupla da oferta pacífica. Na oferta pacífica, era o Senhor que recebia a “gordura da terra” (Gn 45.18, “o melhor da terra”), não o povo e nem mesmo os sacerdotes (1 Sm 2.12-17). . Levítico 7.11-34 é importante para uma compreensão mais plena da oferta pacífi Afora a proibição de se ingerir sangue ou gordura nos vv. 22-27, essa passagem possui duas seções principais. A primeira trata de diversas explicações associados à oferta pacífica e esta tutos para comer-se a came que ia para os ofertantes (vv. 11-21), enquanto a segunda refere-se às porções de todas as ofertas pacíficas que iam para os sacerdotes (vv. 23-34). Esta última será tratada em outra ocasião ( -> finúpâ, oferta movida. # 9485; firúmá, tributo, contribuição, # 9556). Com referência à primeira seção, havia três tipos específicos de oferta pacífica: a oferta de ações de graças (vv. 12-15), as ofertas voluntárias e as votivas (vv. 16-18). As ofertas pací ficas de ações de graças deviam ser comidas no primeiro dia e as ofertas pacíficas votivas ou voluntárias, no primeiro e no segundo dia do sacrifício. Não fica claro qual era o motivo para tal distinção. Porém, por ocupar o primeiro lugar nos estatutos para as ofertas pacíficas, tudo indica que as ofertas pacíficas de ações de graças eram o tipo principal e, portanto, eram trata das com um grau mais elevado de prioridade. Também é possível que o fato de comer-se toda a oferta num só dia desse ocasião para uma celebração mais intensa de adoração, incentivando que o banquete fosse repartido com mais pessoas de fora da família ou clã numa espécie de comemoração comunitária. A oferta votiva encontra-se relacionada à pratica comum de fazer um voto promissó rio ao Senhor, a fim de obter seu auxílio numa situação difícil ou perturbadora (ver Gn 28.20; 31.13; Lv 22.18, 21-23; Nm 15.8; 21.2; 30.2-15; Dt 23.18; Jz 11.30; ver a análise completa realizada por Cartledge). O cumprimento de votos era uma questão importante aos olhos do Senhor (Lv 27.2-13; Dt 23.21-23; Pv 7.14) e costumava estar associado a uma oferta pacífica votiva ao Senhor (SI 22.25-26 [26-27]; 50.14; ver Anderson, “The Praise of God As a Cultic Event”). Uma pessoa podia fazer o voto de realizar uma oferta ao Senhor, quer fosse um holocausto ou uma oferta pacífica (Lv 22.18-23). As ofertas voluntárias eram, muitas vezes, realizadas juntamente com as votivas (22.18-25; 23.38); isso indica que as ofertas voluntárias eram apropriadas para praticamente qualquer ocasião e atitude de adoração diante do Senhor (ver Ez 46.12). Em um caso, o termo é usado para uma oferta verbal, de louvor ou oração, feita pelo adorador (SI 119.108). Também há ocasiões em que não fica claro se o termo para ações de graças refere-se a uma oferta pacífica de ações de graças ou simplesmente ao louvor expressado ao Senhor com gratidão (p. ex., SI 50.14, 23; cf. 26.7; 42.4). 7 .0 resumo apresentado em Levítico 7.37 refere-se aos cinco tipos principais de ofer e acrescenta mais uma, a oferta de consagração (ou seja, a oferta de). Não há orientações especí ficas para essa oferta em Levítico 1— 7, pois era basicamente, em todos os sentidos, uma oferta pacífica. Até mesmo a oferta de cereal associada a essa prática é mencionada (Ex 29.23, 32; Lv 8.26, 31). No entanto, constituía um tipo especial de oferta pacífica, uma oferta realizada
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somente no tabemáculo para a ordenação dos sacerdotes aos seus ofícios (ver Êxodo 29.19-34; Lv 7.37; com 8.22-23). Além disso, o animal prescrito era um carneiro, apesar de as ofertas pacíficas poderem ser de um macho ou uma têmea do rebanho de bovino, ovino ou caprino (Lv 3.1, 6). A questão é que se trata de uma oferta pacífica modificada. Uma vez que se concentravam especificamente no sistema do santuário, as ofertas pelo pecado e pela culpa eram as principais ofertas de expiação com sangue. Porém, tendo-se em vista que as ofertas pacíficas e holocaustos foram levados do sistema de altares isolados para o santuário (ver acima), era, portanto, natural que a eficácia delas dentro desse sistema também estivesse associada, até certo ponto, com as questões de expiação, porém de um modo dife rente. Na verdade, a aliança inicial realizada no Sinai entre o povo e o Senhor foi firmada em Êxodo 24.3-8, por meio de ofertas pacíficas e holocaustos apresentados num altar isolado. A expiação não é mencionada em Êxodo 24, mas o par. com o sangue da oferta pacífica de orde nação em Êxodo 29.19-21, 33 (cf. Lv 8.22-24, 30) e com a oferta de culpa para a purificação da lepra em Lv 14.12-18 (cf. vv. 25-29) indica que essa também era a intenção em Êxodo 24 (ver abaixo). A manipulação do sangue é semelhante àquela apresentada em Levítico 1 e 3 (ou seja, aspersão), mas em Êxodo 24, primeiro Moisés aspergiu metade do sangue sobre o altar isolado e, então, depois de o povo haver realizado seu juramento de aliança (v. 7), Moisés as pergiu o sangue sobre eles. “Eis aqui o sangue da aliança que o Senhor fez convosco a respeito de todas estas palavras” (v. 8b). Isso correspondeu à consagração de Israel como “reino de sacerdotes” (Êx 19.6). No entanto, a fim de que o Senhor estivesse, de fato, presente no meio deles, os israelitas precisa riam de “sacerdotes do reino” e era justamente esse o objetivo da cerimônia de consagração do sacerdócio arônico (Êx 29, Lv 8). Primeiro, Moisés ungiu Arão e seus filhos a fim de ordenálos para o sacerdócio (Êx 29.7-9; 40.12-15; Lv 8.12-13). Então, purificou e consagrou o altar com uma oferta pelo pecado (Êx 29.10-14; Lv 8.14-17). A manipulação do sangue nessa oca sião é característica (Êx 29.12; Lv 8.15, ver abaixo). Em seguida, ofereceu um holocausto com um aroma agradável ao Senhor e aspergiu o sangue em volta do altar, uma prática normal nos rituais do holocausto e das ofertas pacíficas (Êx 29.15-18; Lv 8.18-21; Êx 24.6; Lv 1.5; 3.2). Por fim, Moisés realizou a oferta pacífica de ordenação (é preciso lembrar-se de que a oferta pacífica era sempre a última de uma série). A manipulação do sangue nessa determinada oferta pacífica foi diferente. Como em Êxodo 24.6-8, o sangue foi aspergido sobre o altar e os sacerdotes arônicos (cf. o povo como “reino de sacerdotes” em Êx 24.8). Porém, na ordenação dos sacerdotes, foi aplicado de modo mais direto. Primeiro, Moisés mergulhou o dedo indicador direito no sangue e colocou-o na orelha direita, no polegar da mão direita e no polegar do pé direito de Arão e de seus filhos, e aspergiu o resto do sangue em volta do altar (Êx 29.20; Lv 8.23-24). Em seguida, tomou um pouco do sangue do altar e um pouco do óleo da unção e aspergiu-os sobre Arão e seus filhos e também sobre as vestes deles (Êx 29.21; Lv 8.30). A mesma aplicação prévia do sangue da oferta pela pecado sobre os chifres do altar (Êx 29.12; Lv 8.15), indica que os chifres do altar eram considerados correspondentes à ore lha, polegar da mão e do pé direitos dos sacerdotes. O sangue da oferta pelo pecado realizou a expiação a fim de purificar e consagrar o altar (Lv 8.15). O sangue da oferta pacífica de or denação realizou a expiação a fim de consagrar os sacerdotes (Êx 29.33; Lv 8.30). É preciso lembrar-se de que, em Êxodo 24.6-8, a aspersão do sangue sobre o altar equiparou-se à asper são do sangue sobre o povo, como no cap. 29. No cap. 24, o povo foi consagrado como reino de sacerdotes. Em Levítico 8 (cf. Êx 29), Arão e os filhos foram consagrados como sacerdotes do reino de sacerdotes. Em ambos os casos, isso indicou que as pessoas em questão estavam 140
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comprometidas com o Senhor (representado pelo altar) de maneira especial em seus respecti vos graus de envolvimento. P-B 1. Nos MMM, somente o Papiro do Templo usa o termo sclãmim, oferta pacífica (11 QT 37:5, 11, 12; 52:15; 63:15). As três primeiras ocorrências referem-se a não se misturar as por ções das ofertas pacíficas pertencentes aos sacerdotes com as porções do povo em geral (cf. Lv 22.10-16). 11QT 52:13b-16a diz: “Não imolarás um boi, ovelha ou bode limpo em todas as tuas cidades, próximo ao meu templo, (a uma) distância de três dias de viagem; não o farás. Antes, no meu templo o imolarás, fazendo dele um holocausto ou oferta pacífica e comerás e te regozijarás diante de mim no local em que eu escolher colocar meu nome” (Yadin 2:234-35). Fica clara a correspondência com Levítico 17.1 -7 e Deuteronômio 12.5-14(ver Yadin 1:315-17 e 2:231-32, para uma discussão das questões que aparecem no Papiro do Templo e em Lv 17 e Dt 12). 11 QT 63.15 trata dos direitos de uma esposa escrava estrangeira com relação à carne das ofertas pacíficas: “Ela não comerá um sacrifício de oferta pacífica até que se tenham pas sado sete anos (ou seja, sete anos depois de sua captura e casamento); só então poderá comer” (Yadin 2:286). 2. A LXX usa sõtêrion para o termo heb. selãmím na maioria dos contextos, esp. na literatura sacerdotal do AT. A expressão zebah Selãmim, sacrifício de oferta(s) pacífica(s), por exemplo, é traduzida como thysia sõtêriou em Levítico 3.1, devendo provavelmente ser inter pretada como “oferta de salvação” ou algo do gênero. Nos livros históricos anteriores ao exílio (ou seja, dos primeiros profetas, 1Sm—2Rs; ver, p. ex., 1Sm 11.15), porém, usa-se eirênikos, indicando a tradução oferta pacífica (TDNT 7:1022). Acredita-se que a expressão “oferta de salvação” signifique “um sacrifício que traz salvação” (ibid.), mas poderia muito bem ser tra duzida como “um sacrifício que celebra a salvação” . 3. E evidente que as ofertas pacíficas são um assunto relevante na Mix. e na LR (ver esp. Mish. Zebahim, Danby, 468-90; cf. NT seção 1). NT De acordo com Lucas 22.1-23, a última ceia de Jesus foi uma refeição pascal. E im portante reconhecer aqui que, uma vez que a carne dessa ocasião era consumida pelos ado radores, a oferta de Páscoa pertencia à categoria geral de ofertas pacíficas no AT e na LR (Mish. Pesai 5:2, 10; Danby, 141 e 143 n. 3). Perto do final da refeição, Jesus criou um novo ritual sobre os alicerces dos ritos de Páscoa já existentes. O novo ritual é a base da prática que passamos a chamar de Santa Ceia, Eucaristia ou Ceia do Senhor. Como é de conhecimento geral, contém as palavras de Jesus sobre o pão (“Isto é o meu corpo oferecido por vós; fazei isto em memória de mim”, Lc 22.19) e sobre o cálice (“Este é o cálice da nova aliança no meu sangue derramado em favor de vós”, Lc 22.20; ICo 11.25 acrescenta as palavras, fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim”). Esses dois elementos faziam parte do ritual básico da Páscoa, mas Jesus referiu-se ao pão como o próprio corpo e ao cálice como o próprio sangue. Além disso, Jesus falou do cálice como “o cálice da nova aliança no meu sangue” (Lc 22.20b; ICo 11.25). Sem dúvida é verdade que o ato de Jesus oferecer a si mesmo é, por ve zes, comparado a uma oferta pelo pecado no NT (ver Rm 8.3; 2Co 5.21; cf. IClauck, 888-89), mas a semelhança com a declaração de Moisés em Êxodo 24.8, “Eis aqui o sangue da aliança”, toma inconcebível a idéia de que os apóstolos não tenham associado as palavras de Jesus com o ritual de ratificação da aliança em Êxodo 24 (ver AT seção 7). Além disso, é possível que os fundamentos lógicos da oferta pacífica se misturem, por vezes, com os da oferta pelo pecado (e com outros tipos de ofertas). Nesse caso, porém, o sangue tinha por finalidade a ratificação 141
chw? (# 8968)
da nova aliança, que, obviamente, faz lembrar Jeremias 31.31-37 (ver esp. v. 31; cf. a discussão abaixo sobre Hb 9.15-24). As ofertas usadas em Êxodo 24.5-8 foram os holocaustos e as ofer tas pacíficas. A colocação de Êxodo 24 indica que uma combinação do sangue dos dois tipos de oferta foi usada para o ritual de juramento de sangue nos vv. 6-8. Porém, a came de um holocausto era, por definição, inteiramente consumida no altar, de modo que a came ingerida naquela ocasião foi somente a das ofertas pacíficas. Pelo menos de acordo com as regras levíticas, era um procedimento padrão incluíremse ofertas de cereal (manjares) juntamente com os holocaustos e ofertas pacíficas (ver Nm 15.1-16). Talvez isso tenha sido feito na ocasião de Êxodo 24. É possível que Jesus estivesse se referindo a seu corpo como o pão que acompanhava as ofertas de animais, mas é mais pro vável que sua intenção fosse a de criar um par. com a came das ofertas pacíficas. O corpo de Jesus era came e não pão. O pão foi apenas um símbolo usado naquela ocasião, assim como o vinho foi apenas um símbolo do sangue dele. A prática literal de comer came humana e be ber sangue era algo impensável para os costumes jud. (é importante lembrar-se de Gn 9.4; Lv 17.10-12; cf. Jo 6.52-65). De qualquer modo, fica claro que Jesus transformou a refeição de Páscoa numa refei ção de nova ratificação da aliança (Lc 22.20), o que foi perpetuado na igreja primitiva como a refeição memorial da nova aliança (ICo 11.25). Jesus realizou esse ritual antevendo sua morte iminente na cruz. Em breve, ele estaria literalmente derramando seu sangue por nós. O enfoque na aliança é importante para a maneira como a Ceia do Senhor deve ser ensinada e praticada na igreja. Deve fazer-nos relembrar, com um sentimento profundo de gratidão, da morte de Cristo por nós. Mas deve também levar a nos considerarmos espiritualmente vivos por causa da morte dele e unidos como uma comunidade da aliança com o compromisso de amarmos uns aos outros (Jo 13.34-35) e vivermos a vida juntos com o propósito de servir a nosso Senhor (Jo 17.11-23). Além disso, com referência à ratificação da aliança, tendo em vista que o sacrifício de Cristo foi superior aos sacrifícios que ratificaram a aliança no Sinai (ver Hb 9.18-20; cf. Êx 24.5-8), a aliança ratificada por esse sacrifício é uma aliança superior (ou seja, a nova aliança, Hb 9.15; cf. Hb 8; 10.16-18). 2. Por fim, a palavra do NT, eidõlothytos, refere-se à came sacrificada a ídolos (At 15.29; 21.25; 1Co 8.1, 4, 7, 10; 10.19; Ap 2.14, 20) e à questão de comer-se esse tipo de came (ver a discussão em Brown, 432-33, e o contexto intertestamental em zbh, # 2283, P-B, seção 3). É evidente que há uma relação próxima com a oferta pacífica do AT, uma vez que era o único tipo de sacrifício do AT do qual o povo em geral podia comer. O mais natural quanto a isso era pensar-se no consumo dessa came como a participação da adoração do deus (ou dos deuses) para o qual o animal havia sido oferecido. Em Romanos 14, comer ou não a carne parece ser uma questão de preferência, mas o termo eidõlothytos não ocorre nessa passagem. É verdade que, de acordo com Paulo, “o ídolo, de si mesmo, nada é no mundo e que não há senão um só Deus” (1 Co 8.4), mas também é verdade que “as coisas que eles sacrificam, é a demônios que as sacrificam e não a Deus; e eu não quero que vos tomeis associados aos demônios” (ICo 10.20). A igreja primitiva gentia foi instada a abster-se de came oferecida a ídolos (At 15.29; 21.25) e o livro de Apocalipse traz à memória a influência corrupta de tais práticas no mundo do AT por intermédio de Balaão e Jezabel (Ap 2.14, 20). O ferta, sacrifício: -> 'azkãrâ (oferta memorial, # 260); -> isseh (oferta queimada, # 852); asãm (oferta pela culpa, # 871); zbh (abater, sacrificar, # 2284); -> hat(ã’at (oferta pelo pecado, # 2633); tbh (matar, # 3180); -> minhã (presente, dádiva, oferta, sacrifício, # 4966); 142
(# 8988)
-> m a‘asêr (dízimo, #5130); -> «í/r (fazer um voto, # 5623); wwp I (mover-se para frente e para trás, balançar, # 5677); -> 1 (derramar, ser consagrado, libação, # 5818); -> 'õ/ 1 (holocausto, # 6592); -> (oferta de manjares, # 6881); -> qorbãn (oferta, presente, # 7933); -> Sh( I (imolar, # 8821); -> selem (oferta pacífica, # 8968); -> támíc/(oferta regular, # 9458); firúmâ (tributo, contribuição, # 9556); -> Arão: Teologia; -> O ferta: Teologia; Sacerdotes e Levitas: Teologia B ib l io g r a f ia
TDNT 7:1022-23; 7W # 8966 8974 (Sillumâ, reembolso, retribuição), 8976 (selõmõh, Salomão),
8988
# 8966
Salomão
m o to '
(Salmõním), subs. presente (hapleg. Is 1.23, # 8988).
OMA Ugar. si mm, ofertas pacíficas; acad. sulmânu, saudação. Vários estudiosos comparam salmõním ao acad. sulmânu e derivam Salmõním do heb. Sim, recompensar. Cohen (41) afir ma que, diante do fato de sulmânu ser um subs. primário no acad. e por não haver nenhuma palavra acad. que seja equivalente ao heb. Sim em termos etimológicos ou semânticos, o heb. Salmõním não pode ser derivado do heb. Sim. No mínimo, salmõním possuiu uma ligação morfológica com o acad. Sulmânu que, nos textos de adoração, descreve um presente para um rei ou divindade e que, nas relações diplomá ticas, significa um presente oficial (o que também é atestado em correspondências de el-Amama, textos a Alalá, textos acad. de Ugarite e documentos heteus; cf. Janowski, 242; Levine, 16). De acordo com Finkelstein (79-80), em textos do assír. médio, a provisão ou sulmânu para um juiz não constituía um suborno visando corromper a justiça, mas sim um pagamento cujo propósito era levar uma causa a ser julgada com mais rapidez. O abuso dessa prática acar retou na recusa do juiz de cumprir seus deveres legais até ter recebido um Sulmânu. 143
V 'to' / n # 't o (# 8993)
AT Em sua única ocorrência (Is 1.23), Salmõnim (par. a sõhad, suborno) descreve os presen tes que os líderes de Israel buscavam (em oposição a Êx 23.8; Dt 16.19). Esses líderes traíam a aliança pois, uma vez que os necessitados (viúvas e órfãos) não podiam oferecer presente algum, também não recebiam justiça alguma (cf. Dt 10.17-18; 27.19). Presente: -> 'ahab (presentes de amor, talismã, # 172); -> zbd (conceder, # 2272); -> mgn I (entregar, # 4481); nãdãn 11 (presente, retribuições de amor, # 5621); nln (dar, presentear, oferecer, # 5989); skr II (entregar, # 6127); -> .jè/ (dar, # 7381); -> í/ií/(dar um presente, # 8815); -> ,sV;v (dádiva, presente, # 8856); Salmõnim (presente, # 8988) Suborno, presente: -> fteja ‘ (pedaço de algo, lucro, suborno, # 1299); kõper IV (suborno, # 4411); -> III (barganhar, # 6128); -> í/jí/ (dar um presente, # 8815); -> Salmõnim (pre sente, # 8988) B ib l io g r a f ia
H. Cohen, Biblical Hapax Legomena in the Lighl o f Akkadian and Ugaritic, 1978; J. Finkelstein, “The Middle Assyrian Sulmãnu-Texts," JAOS 72,1952,77-80; B. Janowski, “Erwãgungen zur Vorgeschichte des israelitischen Selamim-Opfers," UF 12,1980, 231 -59; B. Levine, In the Presence o f the Lord, 1974. Michael A. Grisanti 8990 (Slp, desembainhar uma espada), 8992 (SIS, fazer pela terceira vez),
# 2995
# 8993
B? to ' / n # t o (SãlõS, SelõSâ), subs. três, um número três (# 8993); W t o (SãliS I), subs. terça parte (# 8995); ’tf(’)to' (SeliSí). adj. terceiro (número ordinal) (# 8958); ttfto’ (SIS), vb. (denom.) pi., pu. fazer pela terceira vez, dividir em três partes (# 8992). 8993
W 'to ' / n # to '
OMA Pode-se encontrar tríades de deuses na Babilônia (Anu, Bel, Ea), no Egito (Isis, Osíris, Hórus) e na Grécia (Zeus, Posseidon, Hades) que correspondem aos reinos do céu, da terra e do mundo dos mortos. O AT também usa essa classificação do mundo, mas seu monoteísmo certifica-se de que o Deus de Israel seja representado como soberanos sobre os três. Numa ampla gama de contextos retóricos e religiosos, “três vezes” é uma repetição que possui intensidade enfática.
AT 1 .0 três é, com freqüência, um número específico na Bíblia, mas também pode ser o menor número plural e, portanto, representa a unidade mínima com pluralidade. Assim, pode re presentar plenitude ou adequação (em contraste com o dois, Ec 4.12). Os três filhos de Noé são os ancestrais de toda a humanidade (Gn 6.10). Muitas vezes é difícil decidir-se se o três tem um significado exato ou se é um número redondo mínimo (Gn 30.36). O três é um ponto interme diário rumo a números maiores, especialmente o sete (Nm 19.12), como quando Eliseu critica o rei Jeoás por ferir a terra somente três vezes (2Rs 13.18). O três proporciona um nível interme diário comum de liderança entre o rei e um grupo maior (2Sm 23.8, 23; Dn 2.49; 1 Esdr. 3.9). 2. Três dias é o limite de tempo que se pode sobreviver sem água (Êx 15.22) e Es pede um jejum com essa duração antes de ela apresentar-se diante do rei (Es. 4.16). É pouco 144
0 yo
/ n® "7W (# 8993)
provável que a passagem enigmática de Os 6.2 esteja relacionada aos mitos de deuses que mor rem e ressurgem, ou a rituais de fertilidade que chegam ao auge no terceiro dia. É provável que esse padrão de dois dias/terceiro dia simplesmente designe um tempo determinado, depois do qual Deus, em sua misericórdia, irá reavivar seu povo. O período de três anos pode ter uma conotação jurídica (2Sm 13.38; 1Rs 2.39). 3. O três é um princípio de estruturação para atos rituais e litúrgicos. Os homens deviam participar de uma festa de peregrinação três vezes por ano (Êx 23.14), Elias estende-se três vezes sobre o corpo do menino morto (1 Rs 17.21) e Daniel ora três vezes por dia (Dn 6.11). Deus aparece aos israelitas no terceiro dia depois da purificação (Êx 19.15). Três dias (Gn 42.17) ou três anos (2Sm 21.1; 1Rs 18.1) são, com freqüência, a duração de um castigo real ou divino, talvez numa expressão tanto de justiça em sua pluralidade como de misericórdia em seu encerramento. Davi recebe três opções terríveis de castigos, com intensidade ascendente e duração descendente de três anos, três meses ou três dias (2Sm 24.12). 4. Noé (Gn 6.10), Saul (ISm 31.6) e Zeruia (2Sm 2.18) têm três filhos, sendo que o destino diferente de cada um deles é um elemento importante da trama em suas respectivas his tórias (cf. Os 1). A terceira ocorrência costuma ser o ponto crítico de uma narrativa. Um novo estádio da história é desencadeado pela menção do terceiro dia (Gn 22.4; 40.20; Êx 19.15) ou da terceira vez (ISm 3.8; 2Rs 1.13-14). Por vezes, é o prelúdio de uma ação decisiva no quarto dia (Ed 8.32-33; JDt 12.7, 10). 5. A forma fem. do número ordinal também é usada para expressar frações (GKC, 98b). Um perito em tática pode dividir um exército em três partes (1 Sm 18.2). Ezequiel corta o cabe lo e então queima um terço, fere um terço com uma espada e espalha o último terço ao vento (Ez 5.1-4). Assim, ele representa de modo dramático o julgamento variado e inescapável de Deus sobre o povo. . Podem-se encontrar unidades triplas implícitas na disposição de direita-meio-esquerda (Êx 14.29; Nm 20.27), começo-meio-fim (Sab 7.17-20) e céu-terra-mar (SI 96.11; Am 9.6; Ag 2.6; cf. Lv 11). Repetições triplas exatas são raras e extremamente enfáticas (Jr 7.4; 22.29), ou, então, uma forma de superlativo (Is 6.3). O uso de três termos pertencentes ao mesmo âmbito semântico é uma característica da retórica heb. (Lv 26.15; Dt 5.31; 6.17). A bênção arônica possui uma estrutura tripla e uma ocorrência tripla do nome de Deus (Nm 6.24-27), e uma liga ção tripla de palavras, orações ou seqüências gramaticais é comum tanto na prosa retórica (Dt 6.5; 30.11-14) como na poesia (Mq 6.8; Na 1.2), sendo que o terceiro elemento normalmente é o clímax. A maneira mais sucinta de contar-se uma história ou descrever um ciclo possui três partes (começo-meio-fim; cf. Sab 7.17-20). O universo pode ser descrito por meio de conjuntos de termos temários e binários (p. ex., céus-terra-água, SI 96.11; Am 9.6; Ag 2.6; cf. Lv 11). O tabemáculo/templo tem três áreas principais (o Santo dos Santos, o Santo Lugar e o átrio, Êx 25-27; 1Rs 6), correspondendo em intensidade decrescente à presença divina e numa crescente liberdade de acesso das pessoas de dentro para fora. 7. Trinta anos é uma idade importante, especialmente para aqueles que estão prestes a assumir um papel ativo ou levítico (Nm 4.23). Foi a idade em que José (Gn 41.46) e Davi (2Sm 5.4) começaram seu trabalho mais maduro. Trinta dias é um número arredondado para um mês e pode ser encontrado como período de luto (Dt 34.8) e adoração (Dn 6.7). O preço de trinta siclos por um escravo (Êx 2 1.32) é usado em Zacarias 11.12-13.
6
P-B O simbolismo do três é bem desenvolvido por Filo (Quest. in Gen, Op. MuncJ.). A LQ faz distinção entre três classes (sacerdotes, anciãos, povo [1QS 6:7-8]; Levitas no lugar de anciãos em 1 QS 2:19-21), apesar de os prosélitos encaixarem-se numa quarta classe em CD 14:3-4. 145
(# 9000)
NT O NT faz uso freqüente do três e das estruturas triplas em parábolas, narrativas e parêneses(Lc 10.36; At 10.16; ICo 13.13), e Jesus falou de sua ressurreição ao terceiro dia (Mc 8.31). Em 1 Coríntios 15.4, encontramos a declaração “ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras”, sendo que Oséias 6.2 é o candidato mais claro a uma referência específica do AT, especialmente tendo-se em vista que esse v. está relacionado à ressurreição e vindicação em fontes jud. (McArthur). No entanto, também é possível que Paulo estivesse fazendo uma referência mais geral às Escrituras que afirmavam que Deus iria vindicar seus servos depois de um breve período (p. ex., 2Rs 20.5; Jn 1.17 [2.1]; cf. o sinal dos “três dias e três noites” de Jonas, em Mt 12.40) Para a relação entre três e quatro, ver 'arba', quatro (# 752); para três e sete, ver seba \ sete (# 8679). Números; ehãd (um, # 285); -> 'elep II (milhar, contingente militar, # 547); -> 'arba' (quatro, # 752); hãmês (cinco, # 2822); mê ’â I (cem, # 4395); -> ‘eser (dez, # 6924); -> r^bãbâ (dez mil, miríade, # 8047 / 8052); seba' I (sete, # 8679); sãlõs, selõ$â (três, um grupo de três, # 8993); -> semõneh (oito, # 9046); -> senayim (dois, # 9109); -> sês I (seis, # 9252); tê$a' (nove, # 9596) Numeração, contagem: -> £ss (calcular, repartir, # 4082); mn/j (contar, # 4948); spr I (contar, numerar, calcular, repetir, # 6218); p q d (numerar, determinar, # 7212) B ib l k k ; r a fia
NIDNTT 2:686-88; rDAT 8:216-25; 8:114-22; r í f O r 2:933-34; J. B. Bauer, “Drei Tage,” Bib 39, 1958, 354-58; Jastrow 2:1584; H. K. McArthur, “On the Third Day,” NTS 18, 1971/72,81-86. P. P. Jenson 8997 (silsôm, anteontem), -> # 621
9000
(sillês), membro da terceira geração (5x, sempre pl.; # 9000; HALAT 1430a).
AT Assim como a solidariedade coletiva da família heb. ficou evidente no modo como o pecado de Acã estendeu-se até seus descendentes imediatos (Js 7.24-25), a culpa do pecado podia estender-se a membros da terceira e quarta geração (Êx 20.5 [=Dt 5.9]; 34.7; Nm 14.18), que era considerada a maior abrangência de gerações vivas numa família (cf. Gn 50.23, em que o uso de bertê na expressão t^nê sillêsim pode ser pleonástico, “filhos = membros da terceira geração,” ou equivalente a “membros da quarta geração” [lit., “filhos da terceira geração”], Jó 42.16; cf. Nm 16.31-33). Talvez o provérbio popular citado em Jeremias 31.29 e Ezequiel 18.2, “Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram” tenha-se ori ginado da indignação com o preceito de que os pecados de uma pessoa podem afetar de modo negativo até seus descendentes indiretos (Êx 20.5 [=Dt 5.9]; Nm 14.18). De qualquer modo, essas últimas passagens também servem de exemplo para o par numérico de palavras 3 || 3+1 (cf. W. G. E. Watson, Classical Hebrew Poetry, JSOTSup 26, 1984, 135, 144-49). Descendência, prole, semente: -> dôr II (geração, # 1887); -> zr' (semear, espalhar semen tes, formar sementes, # 2445); y ld (dar à luz, gerar, nascer, # 3528); -> nin (prole, # 5769); 146
DU? (# 9005)
-> neked (progème, # 5781); -> 'êqer (descendente, # 6830); -> $e'eíjã’im (prole, # 7368); -> ribbêa' (membro da quarta geração, # 8067); í/7/ã? (membro da sexta geração, # 9000); -> tarbút (linhagem, # 9551) Família, parente, cidadão: -> aô (pai, # 3); -> II (irmão, parente [homem da mesma fa mília], parente, compatriota, # 278), em (mãe, # 562); bên I (filho, neto, membro de um grupo, # 1201); bat I (filha, neta, # 1426); dôc/(tio, # 1856); Aã/w I (sogro, # 2767); /i/n (tomar-se parente em razão de casamento, tomar-se genro, #3161); -> mõdã ‘ (parente [homem da mesma família], parente, # 4530); -> mispãhâ (clã, classe, # 5476); am I (ci dadão, parente [homem da mesma família], parente, # 6638); -> ribbêa' (membro da quarta geração, # 8067); -> sillês (membro da sexta geração, # 9000). Números: -> ’ehãd (um, # 285); -> 'elep II (milhar, contingente militar, # 547); arba' (quatro, # 752); -> hãmês (cinco, # 2822); -> m ê ’â I (cem, # 4395); -> eié?r (dez, # 6924); -> r^bãbâ (dez mil, miríade, # 8047 / 8052); -> s e è a ' I (sete, # 8679); sãlõs, selõsâ (três, um grupo de três, # 8993); semõneh (oito, # 9046); senayim (dois, # 9109); Sês I (seis, # 9252); (nove, # 9596) Robert H. O 'Connell 9004 (íõ /m, lá),
Partículas
□U? (sêm), subs. nome, reputação, fama e apelido pejo rativo (# 9005); designação de Deus, especialmente o tetragrama que, posteriormente, foi substituído por hasSêm. Não há nenhuma conexão indis cutível com uma forma verbal. O subs. foi associado a um radical I Waw como no ár. wasãma, marca, símbolo (Smith, Kinship andM arriage in Anciet Arabia, 213; e LaGarde, Bildungder Nomina, 160). O termo smh, ser elevado, também foi apresentado, indicando a excelência de um nome ou reputação (Redslob, ZDMG, 1872,751-56). O mais provável é que sêm seja uma forma de subs. biconsonantal, uma vez que nenhuma língua sem. possui uma forma com três radicais respectivos. 9005
DU?
OMA O subs. é amplamente atestado nas diversas línguas. O acad. sumu tem algumas varia ções interessantes de significado mas, basicamente, com a mesma conotação que o hebraico. O aram. sêm ou Súm também tem os mesmos significados. Os termos pós-bíblicos sêm e súm significam nome, marca, título, natureza, denominação (Jastrow, 2:1590). A idéia geral é de uma “marca de distinção” (Bietenhard, TWNT, 242-83, esp. 252). AT 1. A palavra sêm ocorre aproximadamente 770x no sing. e 84x no pi. Na maioria dos casos, a palavra significa simplesmente nome, como em Rute 1.2, “Este homem se chamava Elimeleque, e sua mulher, Noemi; os filhos se chamavam Malom e Quiliom” [O nome desse homem era Elimeleque, o nome de sua mulher era Noemi e os nomes dos filhos eram Malom e Quiliom]. No mundo sem. da antigüidade, o nome de uma pessoa costumava ter um significado que ia além de uma forma de identificação; era considerado uma descrição de caráter ou de con dições. Ter um nome ou dar um nome a alguém era algo relacionado à — senão determinante da — existência de uma pessoa (Gevirtz, “O f Patriarchs and Puns”, HUCA 46, 1975, 33). A grande importância de dar-se nomes pode ser vista nos diversos relatos da criação. Em Gênesis o vb. qr ’, chamar, liga-se a sêm, para formar a expressão “dar nome”, ou seja “chamar alguém 147
üp (# 9005)
por um nome”. Nesse sentido, os nomes eram descrições naturais e adequadas das coisas que os recebiam (ver Gn 25,26). Pelo fato de o nome de uma pessoa, lugar ou coisa ser considerado profundamente 1igado ao caráter e talvez ao destino dela, a prática de dar nomes desempenhava um papel importante nas narrativas. Numa epopéia extrabíblica sobre a criação, o nome não é apenas uma descrição ade quada, mas um fator determinante da existência. Enuma Eliche simplesmente equipara o dar nomes com o existir: “Quando no alto céu ainda não havia recebido um nome” (Enuma Eliche 1,1-2,7-8). O ato de dar nomes conferia às coisas uma existência descritível. Semelhantemen te, na Bíblia o objeto e seu nome eram identificados de maneira tão próxima que não ter um nome ou perder o nome era o mesmo que deixar de existir. 2. A prática de dar nomes também era um ato de domínio, especialmente se aquele que dava o nome e a designação dada eram poderosos o suficiente para moldar o destino (Cashdan, “Names and the Interpretation o f Names,” Essays Presenteei to ChiefRabbi Israel Brodie, 1967, 32). Os primeiros atos de dar nomes são atribuídos à soberania de Deus sobre a criação (ver também Is 43.1). Outras formas de uso refletem o domínio da humanidade sobre a criação (Gn 2.20), nomes dados pelos pais aos filhos (4.25, a menos que Deus interviesse, como em 16.11), ou quando reis ou ancestrais famosos tomavam posse de territórios (28.19; ver também von Rad, OTT, 2:81; e Eissfeldt, 70-83). 3. “Nome” significa, muitas vezes, reputação. Esse é o sentido da promessa de engran decer o nome de Abrão (Gn 12.2), bem como o dc Davi (2Sm 7.9). A literatura de sabedoria também exalta a virtude de um bom nome (Pv 22.1, em que é par. a ser estimado). Essa idéia também continua sendo usada no heb. pós-bíblico; Berakot 17a fala de alguém que cresceu com um bom nome, ou seja, uma boa reputação. 4. A idéia de fama encontra-se relacionada a essa nuança. “Varões de renome” (Gn 6.4) são, lit. “homens de nome”, ou seja, pessoas famosas. Fazer um nome para si é o mesmo que buscar fama (como os construtores de Babel e, Gn 11.4; ironicamente, o nome do local, babTli, “portal de Deus”, recebeu o significado de “confusão” [uma etimologia popular usando balai] em hebraico). A idéia de fama explica a relação próxima de sêm com algumas formas de uso de zêker, memória ou memorial, que ocorre muitas vezes em constr. par. com sêm. No acad., zikru é “nome” e zakãru pode significar “citar um nome” ou “mencionar”. No heb., o vb. zkr ( # 2349) aparece em expressões fixas tendo sêm como o objeto direto e em 4x com o acrésci mo de uma preposição. O uso dc zêker/zkr com sêm pode indicar a lembrança de um nome, como em Êxodo 3.15: “Este é o meu nome eternamente, e assim serei lembrado de geração em geração”. No entanto, também pode indicar o ato de ponderar, mencionar ou meditar so bre um nome (como no SI 20.7 [8 ], em que besêmyhwh ... nazkir, “nós guardaremos o nome do Senhor... na memória” é traduzido como “nos gloriaremos em o nome do Senhor”, ou seja, lembrar-nos-emos do nome do Senhor como fonte de glória (ver B. Childs, Memory and Tra dition in Israel, 1962, 1-8). A semelhança de idéias expressadas com zkr e sêm também pode ser vista em várias passagens. A determinação do Senhor de apagar o nome da rebelde Israel debaixo dos céus, por exemplo, teria resultado na extinção da memória da nação (Dt 9.14). Ou, nas palavras de Sofonias, “Certamente farei de vós um nome (sem) e um louvor entre todos os povos da terra” (Sf 3.20). E, para um outro exemplo, pessoas desconhecidas ou infames que eram banidas da terra eram filhos sem nomes (Jó 30.8, “filhos de doidos”). A lembrança é determinada pelo nome (Is 56.5). 148
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5. sem também pode significar a natureza ou os atributos da pessoa que recebeu o nome. Esse é o caso especialmente com referência a Deus. Em Êxodo 34.5-7, a proclamação divina do “nome do Senhor” é seguida de uma lista de atributos de Deus. Posteriormente, hassêm passou a ser usado para denotar o nome santo e tudo o que ele representava. Portanto, o uso mais antigo da expressão wayyiqrã' besêm yhwh pode muito bem significar fazendo proclamação do Senhor pelo nome — proclamando os atributos do Senhor (Gn 4.26 e 12.8 [que Lutero traduziu como “pregou”]). O “nome do Senhor (yhwh) é uma metonímia para a natureza do Senhor. Seme lhantemente, os nomes dados ao Rei Magnífico, o Messias, em Isaías 9.6 são mais do que uma descrição de sua natureza e nomes ou títulos de realeza a serem usados: “E seu nome será: Ma ravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz”. Assim, orar “em nome do Senhor” pode significar orar com confiança na natureza e na capacidade de Deus. O mesmo também pode ser dito do nome “Emanuel” (ou seja, Deus conosco; Is 7.14; 8 .8 , 10). Pelo fato de sêm muitas vezes transmitir uma descrição de caráter em vez de uma simples identificação ou classificação, os estudiosos têm-se mostrado ansiosos para estudar as implica ções do uso dessa palavra. No entanto, é necessário observar algumas restrições. Lê-se com freqüência que no heb. o nome era a expressão real da essência de uma pes soa. J. Pedersen chegou a dizer que Sêm representa a alma em sua totalidade com toda a sua personalidade, bênçãos e honra (Israel, Life and Culture, 245). Porém, o fato de ser possível que um nome descreva uma personalidade não significa que ele é a alma da pessoa. Faltam evidências para se fazer uma associação abrangente. Semelhantemente, alguns sugerem que, de modo subconsciente, uma pessoa faz juz ao significado do seu nome (ver a discussão em Zimmermann, 311). Há pouquíssimos exemplos que podem ser explicados dessa forma e, se levada a extremos, essa idéia poderia ser absurda (especialmente tendo em vista o uso comum de nomes de animais e plantas; ver Barr, 11-29). Casos como o de Jacó podem envolver uma distorção do significado do nome (Gn 27.36) de pois de terem sido demonstradas certas peculiaridades do caráter — dificilmente os pais dariam aos filhos nomes como “trapaceiro” ou “enganador”. É provável que Jacó significasse “que ele proteja” (como alguém na retaguarda — numa associação com o termo “calcanhar”); mas depois que ele fez o irmão “tropeçar”, seu nome passou a ter um novo significado. No entanto, os nomes eram considerados parte fundamental da essência de uma pessoa. Um nome podia vir a representar tudo o que essa pessoa era, podendo até ser considerado o retrato dela. Desse modo, um texto podia dizer que o nome seria destruído, exterminado, apa gado, coberto ou estabelecido — tudo isso em conjunção com o que estava ocorrendo com a pessoa. Além disso, era possível agir em nome de outra pessoa (1 Sm 25.9). Conseqüentemente, era importante evitar que um nome caísse em esquecimento. Perder o nome era sinônimo de aniquilação (SI 41.5), e morrer sem ter filhos significava o fim do nome (2Sm 18.11). Assim, o objetivo das leis de casamento de levirato era preservar o nome de uma pessoa (Dt 25.5, 6 ). Apesar de haver fundamentos para concluir-se que, de fato, muitas vezes o nome sig nificava a essência da pessoa, o estudo dos nomes é bem mais complexo do que indicam algu mas generalizações. Os escritores bíblicos tinham imenso prazer em explicar os significados de nomes e lugares desde o início da história de sua nação. E foi o que fizeram com cerca de 200 nomes importantes. Porém, grande parte dessas explicações (ou, como são chamadas, “eti mologias populares”) não passavam de trocadilhos fonéticos para expressar os sentimentos do povo ou a relevância de uma pessoa ou acontecimento. Por vezes, nomes estrangeiros como Babel ou Moisés eram explicados com palavras heb. que tinham um som parecido com o desses nomes a fim de enfatizar a argumentação do relato. De modo geral, os nomes eram apresen tados e explicados para expressar a fé dos pais (Judá, “que ele seja louvado”, explicado como 149
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“eu louvarei”), para registrar circunstâncias importantes por ocasião do nascimento (O fato de Jacó agarrar o calcanhar, e de Esaú/Edom ter nascido peludo [Seir] e ruivo) ou para preservar a memória de acontecimentos sobrenaturais (Betei, a casa de Deus). As vezes, os nomes eram mudados para refletir uma nova condição ou percepção da realidade (Abrão foi mudado para uma variante em dialeto, Abraão, a fim de lembrar de modo homófono o termo para “pai de uma multidão”; ou no NT, o nome Simão que foi mudado para Pedro). Ao contar as histórias da antigüidade, os narradores consideravam de grande valor analisar o significado dos nomes de maneira a revelar o significado do acontecimento em si. As pessoas já não existiam mais, porém sua reputação e contribuições eram preservadas na memória de seu nome explicado. Os lugares permaneciam intactos, mas era o nome deles que trazia de volta à vida os acontecimen tos que haviam ocorrido ali. E interessante observar que, posteriormente, no período clássico, exatamente quando os nomes passaram a ser mais claros e de mais fácil análise etimológica, os escritores deixaram de lado essa prática. Mostraram-se mais interessados nos nomes durante os períodos fundacionais de sua nação. Os nomes heb. eram escolhidos livremente ou mesmo inventados. Podiam ser de conteúdo religioso, expressando experiências de salvação, confiança no Senhor, fé, gratidão e vários tipos de oração ou podiam, ainda, ser idéias seculares, como nomes de animais, de plantas, de cores e outros. 6 . Os nomes compostos parecem seguir modelos básicos, de modo que mesmo as ino vações possivelmente não passavam de variações desses modelos. Os elementos mais comuns usados nas composições eram de caráter divino, como ’el (Israel, Deus luta) ou yãh (Isaías, o Senhor salva), termos relacionados a parentesco, como ’ãb (Abrão, pai exaltado) ou ‘am (Ben Ami, filho de meu parente), elementos de domínio, como melek (Elimeleque, Deus é meu rei) e subs. comuns (Sara, rainha). Juntava-se uma grande variedade de verbos aos elementos das três primeiras categorias de modo a completar o significado; p. ex., Ismael, Deus ouve; Zaca rias, o Senhor se lembra. Muitas vezes, os nomes pessoais servem de epônimos para tribos, países e cidades em função da crença geral de que a origem do nome de um povo, uma tribo ou uma família era um indivíduo — o fundador ou alguma outra pessoa. E, no entanto, em certas ocasiões, os no mes ancestrais eram considerados nomes de clã, assim como as cidades recebiam o nome de seus fundadores. 7. Os nomes também eram usados em encantamentos, bênçãos e expressões de maldi ção. Um nome dc conotações negativas prestava-se naturalmente a isso e era motivo de preo cupação religiosa (lC r 4.9-10). Ao que parece, a feitiçaria e as adivinhações baseavam-se no uso imperioso de nomes — fato que pode estar contido na proibição de se tomar o nome de Deus em vão (Êx 20.7). Os profetas heb. costumavam apresentar oráculos com trocadilhos e jogos de palavras usando nomes (ver Is 8.1; Mq 1.10-16). Apesar de essa prática ter um certo efeito sobre os ou vintes, o cumprimento do oráculo dependia do poder de Deus por trás das declarações deles. Se o poder de um nome tem relação direta com o poder daquele a quem o nome per tence, então o sêmyhwh, o nome do Senhor é, compreensivelmente, a força predominante do AT. O nome do Senhor é Javé, em toda a plenitude de poder, santidade, ira e graça divinos que ele revelava em sua natureza. O nome do Senhor faz o mesmo que o Senhor — habita em um santuário (Dt 12.5,21), protege seu povo (SI 20.2) e guarda com zelo sua reputação (Ez 36.22, 23). Quando alguém luta em nome do Senhor, luta com o poder de Deus. Quando profetas eram enviados em nome de Deus (Dt 19.20), levavam consigo a autoridade pessoal de Deus quase como se o próprio Deus estivesse ali. O nome do Senhor é essencial para a adoração, uma vez que representa o Senhor. Pode ser louvado (J1 2.26), amado (SI 5.11), declarado (SI 22.22), 150
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temido (Ml 4.2), pode-se esperar nele (SI 52.9), pode ser proclamado (Is 12.4) ou pode-se an dar nele (Mq 4.5). Contudo, também pode ser blasfemado (Is 52.5) ou profanado (Jr 34.16; Ez 36.21 -23) quando o povo se rebela contra Deus. Assim, o nome do Senhor representa a natureza essencial de Deus revelada ao povo como uma força atuante em sua vida. P-B Na literatura pós-bíblica, o termo Sêm também significa nome, marca, título, denomi nação e natureza. É especialmente interessante a forma como a expressão “o nome de Deus” é usada para representar Deus e o fato de a palavra haSSêm, o nome, ser usada como subs tituto para o tetragrama Javé (Ecclus 23:10). Isso levou a disposições estatutárias como no Sinédrio 7.5, de acordo com o qual o blasfemador não é castigado a menos que use o nome especificamente. Nos centros de ensino, quando alguém falava “em nome” de outra pessoa, significava que estava dando o devido crédito pela idéia (ver Meg. 15a). Porém, quando alguém falava “em seu próprio nome”, estava apresentando sua própria interpretação (ver Peah 2:4). NT No NT, a palavra é usada de várias formas semelhantes às do AT. No entanto, o que mais chama a atenção é o modo como o nome de Deus é substituído pelo nome de Jesus. No NT, a pessoa pode invocar (ou seja, adorar) o nome de Jesus (At 9.14), crer no nome de Jesus (Jo 1.12), ser batizada no nome de Jesus (At 8.16) ou falar em nome dele (At 9.29). Como o nome do Senhor no AT, o nome de Jesus representa a natureza de Jesus. Assim, pedir algo em nome de Jesus, por exemplo, é o mesmo que orar tendo a plena confiança na capacidade dele e fazê-lo com a autoridade dele. A autoridade de Cristo é demonstrada de modo mais marcante no poder salvífico do seu nome (At; 2.21; 4.12). Em função da grandeza da obra redentora de Cristo, sua natureza gloriosa deve ser reconhecida por todos, pois ele recebeu um nome acima de todos os outros nomes e, diante do nome dele, todo joelho se dobrará e todos confessarão que ele é Senhor (Fp 2.9-11). Fama, nome, renome: -> hll II (louvar, ser digno de louvor, gloriar, exultar, #2146; hilülim, oferta de louvor, festival, # 2136; mahalãl, louvor, reputação, # 4545; t?hillá, louvor, renome, # 9335); sêm I (nome, reputação, fama, # 9005); -> Sm 4(ouvir, escutar, entender, dar atenção, obedecer, # 9048; hasmã 'üt, comunicação, # 2245; miSmã41, boato, rumor, # 5461; miSma at, guarda-costas, súditos, # 5463; Sem ú ‘â, notícia, relato, mensagem, # 9019; Sema' I, som, # 9049; S ê m a notícia, relato, boato, rumor, # 9051; S õ m a relato, fama, # 9053) B ib m o c r a fia
NIDNTT2:648-56; TDNT5:242-81; THAT2:935-63; TW OT2:97,4-2,5-, l. Barr, “The Symbolism of Names in the Old Testament,” BJRL 52, 1969, 11-29; H. A. Brongers, “Die Wendung besêm yhwh im AT,” ZAW 11, 1965, 1-20; N. G. Cohen, “Jewish Names as Cultural Indicators in Antiquity,” JSJ 7, 1976, 97-128; G. Contenav, Everyday Life in Babylon andAssyria, 1966, 16-62; O. Eissfeldt, “Renaming in the Old Testament.” in Words and Meanings, ed. por P. R. Ackroyd e B. Lindars, 1968, 70-83; G. B. Gray, Studies in Hebrew Proper Names, 1896; Th. NOldeke, “Personal Names,” in EncBib, 3:3271-307; M. Noth, Die israelitischen Personennamen im Rahmen der Gemeinsemitischen Namengebung, 1928; A. Strus, Nomen-Omen, 1978; F. Zimmermann, “Folk Etymology o f Biblical Names,” VTSupp 15, 1966, 311-26. Allen P. Ross 9006 (Sêm II, Sem),
Sem 151
na® (#9012)
(smd), ni. ser exterminado, aniquilado, destruído; hi. exterminar, aniquilar, destruir, matar (# 9012). smd costuma ser traduzido como “destruir". 9012
1 »®
10®
AT 1 .0 vb. ocorre 90x, sendo a maior parte delas no hi. (69x) com um sentido ativo. Mais de um terço dessas ocorrências no hi. é de inf. (27x), expressando propósito. O significado básico indica a destruição indiscriminada de um grupo de pessoas. 2. Em textos não teológicos, smd refere-se à destruição de uma família (Gn 34.30), de um grupo dentro de uma nação (2Sm 21.5; Et 3.6, 13) ou de várias nações (Is 10.7). Em raras ocasiões, refere-se ao assassínio de uma só pessoa (2Sm 14.7, 11, 16). 3. Quase quatro quintos das ocorrências de sm d possuem uma forte conotação teoló gica, uma vez que se encontram em contextos em que Deus é o sujeito imediato ou implícito. O extermínio sobrevem a uma nação ou grupo de pessoas por terem sido submetidos ao jul gamento de Deus. Dois terços das formas de uso teológico ocorrem no livro de Deuteronômio ou em textos deut. (Josué a 2 Reis). Os escritores do AT lançam mão desse termo para indicar o que Deus fará ou fez às nações que habitavam a terra de Canaã. Deuteronômio 7.23-24 é um exemplo típico: “Mas o Senhor, teu Deus, tas entregará e lhes infligirá grande confusão, até que sejam destruídas. Entregar-te-á também nas mãos os seus reis, para que apagues o nome deles de debaixo dos céus; nenhum homem poderá resistir-te, até que os destruas”. Isso fazia parte da teologia de concessão da terra. Era preciso que seus habitantes fosse aniquilados por causa de suas abominações, a fim de que Israel não aprendesse a seguir os caminhos deles e viesse a voltar as costas para Deus. 4. A seção de maldições da aliança em Deuteronômio (28.15-68) também se valeu do termo smd. Se Israel desobedecesse a aliança, estaria destinado à extinção, “O Senhor mandará sobre ti a maldição, a confusão e a ameaça em tudo quanto empreenderes, até que sejas destruí do e repentinamente pereças, por causa da maldade das tuas obras, com que me abandonaste”. A destruição posterior de Israel é, portanto, um acontecimento justificável (Is 48.19), como também o é a destruição de certas famílias reais (IRs 15.29; 2Rs 10.17) ou grupos de chefes em Israel (Ez 14.9 — falsos profetas; 34.16 — pastores = reis). 5. O julgamento futuro de Deus pode ser apresentado da mesma forma, quer seja sobre outras nações (Jr 48.8; Zc 12.9, etc.), sobre os lugares altos em Israel (Os 10.8) ou sobre os perversos em geral (SI 37.38. Is 26.14). 6 . 0 sinônimo mais próximo de sm dé 'bd, ser arruinado, perecer, destruir ( # 6 ), com o qual ele ocorre várias vezes, smd também possui quase o sentido técnico de hnn, entregar à expalriação ( # 3051) em função de seu uso nos contextos da conquista. LXX A LXX emprega várias palavras para traduzirsmd, sendo as mais freqüentes exolelhreuõ e apollymi. NT O termo exolethreuõ ocorre somente em Atos 3.23 num resumo de Deuteronômio 18.1519. Formas de apõleia, apollymi ocorrem com freqüência no NT com o sentido literal de “des truir, perecer ou morrer” (Mt 2.13; 27.20; ICo 1.19; lPe 1.7). Em contextos teológicos, esse conjunto de palavras refere-se a estar perdido (Lc 19.10) e à destruição final pela morte (1 Co 1.18; 2Pe 3.9) ( -> NIDNTT 1:462-67; TDNT 1:394-96) Extinção: d ‘k (apagar [uma vela], extinguir, desaparecer, # 1980); -> z 'k (ser extinto, # 2403); kbh (ser extinto, apagar, # 3882) 152
T\m(# 9014)
Destruição, aniquilação, devastação, deformação, ruína: -> 'b d (perecer, # 6 ); -> '^ ( d e sastre, # 369); -> 6 /í/ (devastar, # 1191); -> fifrn/i III (arruinar, # 1950); -> d/wm III (perecer, # 1959); -> hrs (demolir, # 2238); -> hbl III (maltratar, # 2472); -> hlq III (destruir, # 2746); A/' (ser destruído, # 3148); -> W/j (estar completo, perecer, acabar, destruir, # 3983); krt (cortar, cortar fora, exterminar, fazer aliança, circuncidar, #4162); /n/i/i I (eliminar, extermi nar, destruir, # 4681); «.?/? II (decair, # 5898); nte (desintegrar, # 5995); -> w/í (demolir, # 5997); -> h/s (desarraigar, arrasar, destruir, # 6004); p ’h (despedaçar com golpes, # 6990); -> p id (ruína, infortúnio, # 7085); -> prr (quebrar, invalidar, anular, frustrar, baldar, impedir, # 7296); .fdh II (ser devastado, # 7400); rz/; (destruir, definhar, # 8135); íúW(devastar, # 8720); s/i/ (corromper-se, arruinar, estragar, # 8845); sm d (ser exterminado, destruído, # 9012); -> tablit (aniquilação, # 9318). B ib l io g r a f ia
77/yir 2:963-64; TWOT 2:915. Gary H. Hall
_n . nQU? (Sammâ 1), horror, devastação, terra devastada (# _____________________ 1 * ~______ 9014); (mesammâ) horror, devastação (# 5457); nÇDtt? (semãmâ) horror, devastação, terra devastada (# 9039); ]ÍQQÇ7 (simmãmôn), subs. es panto, estremecimento (# 9041); < 0 Q1P (smm), demolir, destruir ( # 9037); AT O subs. sammâ ocorre somente 40x no AT. E um derivativo do vb. smm, que significa estar desolado ou aterrorizado. Em 33 ocasiões, esse subs. é usado com a preposição lamed. A distribuição desse subs. por todo o cânon é irregular; aparece uma só vez no Pent. (Dt 28.37), uma vez nos profetas antigos (2Rs 22.19), 4x nos escritos (2Cr 29.8; 30.7; SI 46.8 [9]; 73.19) e, por fim, 33x nos profetas posteriores (Jr 18.16). O termo sammâ é um subs. fem. que tem como significado básico horror ou aquilo que causa horror. E traduzido de modo variado como “pasmo” (Dt 28.37), “coisa espantosa e horrenda” (Jr 5.30), “maldição” (2Rs 22.19), “assolação” (Is 13.9), “desolação” ou causar desolação (Is 24.12; Jr 2.15; 4.7), etc. Esse subs. não representa o horror ou desolação em si, mas a exibição propositada de tal atrocidade (TWOT 2:927). “Para fazerem da sua terra um espanto (sammâ) e objeto de perpétuo assobio; todo aquele que passar por ela se espantará e meneará a cabeça” (Jr 18.16). Certos grupos de pessoas podem ser objeto de desolação. “Por isso eu farei de ti uma desolação (sammâ) e dos habitantes da tua cidade, um alvo de vaias; assim, trareis sobre vós o opróbrio dos povos” (Mq 6 .16b; cf. 2Cr 30.7). Nações como Edom (Jr 49.17), Babilônia (Jr 50.3,23; 5 1.29) e até mesmo Judá e Jerusalém (2Cr 30.7) também são consideradas objetos de opróbrio. Porém, é principalmente a terra ( 'ere$) que recebe a caracterização de sammâ. Essas duas palavras ocorrem juntas 16x. O termo sammâ retrata em particular a terra prometida de Israel submetida às maldições da aliança causadas pela desobediência a ela, especialmente pela idolatria (Dt.28.37). “O Senhor já não podia por mais tempo sofrer a maldade das vossas obras, as abominações que cometestes; pelo que a vossa terra se tomou deserta, um objeto de espanto e de desprezo e desabitada, como hoje se vê” (Jr 44.22; cf. SI 46.8 [9]; Is 13.9; Jr 2.15; 4.7; 5.30; 18.16; 25.9, 11,38. 50.3, 23; 51.29,41,43; Zc 7.14). Uma terra desolada que se toma objeto de horror é retratada principalmente como uma terra onde ninguém habita (mê'ên yôsêb) (Jr 4.7; 44.22; 51.29; cf. 2.15; 50.3). Esse lugar é caracterizado ainda por mansões ou casas desertas 153
n s » '(# 9014)
(Is 5.9), cidades queimadas e com seus portões em ruínas (Is 24.12; Jr 2.15; 4.7), improdutividade agrícola (Jr 29.18; 44.12; J1 1.7) e uma terra onde nem os animais vivem (Jr 32.43 ; 50.3). Assim, uma terra desolada ou horrenda é um lugar condenado a sucumbir ao julgamento de Deus e que, depois disso, não é capaz de suster a vida, seja ela humana, animal ou vegetal. O termo sammâ é usado com a preposição lamed 33x, restando apenas seis ocasiões em que a preposição não é empregada. Uma possível classificação para tal const. é “lamed de produto” (Waltke & 0 ’Connor, 209). Essa classificação denota um objetivo, compreendendo a transformação da “terra prometida” em "terra desolada”. Um opção mais apropriada, porém, é a classificação lamed de resultado. Essa classificação denota “quando uma ação resulta num estado” (Williams, 50). Faz parte dessa categoria o const. gramatical hyh mais a preposição lamed, com o significado de “tomar-se”. Esse const. em particular ocorre em dezoito ocasiões., Iesammâ ... hãy^tà (Dt 28.37; 2Rs 22.19; Is 5.9; Jr 25.11; Os 5.9; Sf 2.15, etc.). Esse mesmo tipo de const. ocorre mais 13x com outros três vbs.: sym, pôr, colocar (Is 13.9; Jr 4.7; 18.16; 19.8; 25.9; 51.29; J1 1.7; Zc 7.14), nm, dar, pôr, fixar, fazer (2Cr 29.8; 30.7; Jr 25.18; 29.18; Mq 6.16) e syt, fixar, apontar, determinar ou fazer (Jr 2.15; 50.3). Em cada caso, esse const. específico denota a maneira como se chegou ao estado de horror e desolação. Por fim, é importante reconhecer a importância de Deuteronômio 28.37 e o uso que essa passagem faz de sammâ. Deuteronômio 28 registra as possíveis bênçãos pela obediência e maldições pela desobediência à aliança mosaica. A seção extensa que registra as maldições começa com a seguinte frase: “ Será, porém, que, se não deres ouvidos à voz do Senhor, teu Deus, não cuidando em cumprir todos os seus mandamentos e os seus estatutos que, hoje, te ordeno, então, virão todas estas maldições sobre ti e te alcançarão” (Dt 28.15; cf. 28.15-68). Deuteronômio 28.37, consiste, portanto de uma das maldições a serem impostas como resultado de desobediência à aliança: “Virás a ser pasmo (w^hãyilã Iesammâ), provérbio e motejo entre todos os povos a que o Senhor te levará”. Ademais, Deuteronômio 28.36 descreve a condição que levará a tal estado de horror: “O Senhor te levará e o teu rei que tiveres constituído sobre ti a uma gente que não conheceste, nem tu, nem teus pais; e ali servirás a outros deuses, feitos de madeira e de pedra”. E a advertência ou sanção dessa determinada maldição que leva ao uso de sammâ na maioria das ocasiões subseqüentes. Assim, as 24x em que a palavra é usada em Jeremias tomam-se compreensíveis à luz da ênfase dada pelo profeta sobre o exílio iminente (cf. Jr 4.7; 25.9, 11; 29.18; 50.3). 2. Esse sinônimo de midbãr ( -> # 4497) e os termos relacionados não ficam claros quanto a uma distinção semântica mais precisa. Para a etimologia c representação em línguas cognatas, ver THAT2.970, 973-74; TWAT 4:668', BDB 1030-31; HALAT2:6\3; 4.1437, 144649. Para sua relevância teológica, ver a discussão de midbãr (# 4497) em Deserto (Teologia). 3. Os subs. mesammâ, devastação, terra devastada e $emãmâ, devastação, terra devas tada, ocorrem no mesmo contexto, aparecendo 7x e são empregados como uma designação de julgamento sobre Moabe (Is 15.6; Jr 48.34), Edom (Ez 35.3) e, com mais freqüência, sobre Israel (Ez 5.15; 6.14; 33.28, 29). Em cada caso, o que mais chama a atenção é a assolação ou devastação aparente do objeto indicado. As condições descritas são bastante comuns no caso de guerra, fome ou exílio. Esse termo caracteriza especificamente a situação séria da agricul tura em função do julgamento divino. Em pelo menos um caso, encontra-se o registro de que tal horror ou devastação deve servir de aviso para as outras nações (Ez 5.15). O subs. e sinônimo relacionado semãmâ ocorre 56x. Tanto meSammâ quanto semã são usados 4x como um subs. composto na descrição visual da desolação agrícola causada pelo julgamento divino (Ez 6.14; 33.28,29; 35.3). O tipo de desolação e destruição característicos de semãmâ é descrito de várias formas: uma terra desabitada ( Is 6 .11; Jr 6 .8 ; 10.22; 32.43; 34.22; 154
o a t í í # 9023)
50.13; 51.62), um deserto (Is 64.10 [9]; E z6.I4), montões de ruínas (Jr 9.11 [ 10]) e morada de chacais (Jr 9.11 [10]; 49.33). A causa desse julgamento severo é a série de graves transgressões (Ez 15.8), os atos abomináveis cometidos (Ez 33.26) e a violência (J13.19 [4.19]). Pelo menos 1Ox Ezequiel registra que o motivo de tal julgamento é servir de revelação para Javé: “e saberão que eu sou o Senhor” (Ez 6.14; 7.27; 12.20; 15.8; 29.9; 32.15; 33.29; 35.2, 9, 14). 4 .0 subs. heb. simmãmôn, espanto, estremecimento, aparece apenas 2x, ambas em Ez quiel (4.16; 12.9). Ezequiel recebe a ordem de profetizar sobre a condenação e destruição de Jerusalém e seus habitantes. O simbolismo profético de Ezequiel retrata que essa condenação será caracterizada pelo racionamento de água e alimento típico da devastação da agricultura e do exílio iminente: “comerão o pão por peso e, com ansiedade, beberào a água por medida e com espanto” (Ez 4.16). 5. Outras expressões relacionadas a sammâ são sa arúr e sa ‘arúri, algo horrível (#913 9137), e dèrã’ôn, aversão (# 1994). Os termos sa arúr e Sa‘arüri ocorrem apenas 4x no AT. Em cada uma dessas vezes o termo é empregado de modo descritivo para os pecados de Israel: injustiça (Jr 4.5), idolatria (18.13), adultério ou imoralidade sexual (23.14) e prostituição (Os 6 .10). Essas designações são principalmente simbólicas, representando de várias maneiras a infidelidade de Israel a Javé. Tais pecados justificam a aplicação das maldições da aliança e a remoção do povo da terra que está se tomando um sammâ ou coisa horrenda. Semelhantemen te, dêrã’ôn aparece somente no contexto de julgamento e maldição (Is 66.24; Dn 12.2). Nos dois casos, esse termo retrata aversão relacionada a um cadáver. Deserto, ermo, terra assolada: bõhü (vazio, # 983); bqq I (assolar, ser agitado, # 1327); -> horbá (ruína, devastação, # 2999); -> yPsimôn (ermo, devastação, # 3810); midbãr I (ermo, # 4497); -> ‘arãbâ III (estepe, # 6858); $ehihá (terra ressecada, # 7461); -> fiyyà (deserto, # 7480); -> s ’h (destruir, desolar, # 8615); smm (ficar desolado, deserto, assolar, estremecer, ficar horrorizado, # 9037); -> Deserto: Teologia B ib l io g r a f ia
THAT 2:970-73; TWOT 2:936-37; E. F. Deward, “Mouming Customs in I, II Samuel,” JJS 23, 1972, 145-66; B. K. Waltke & M. 0 ’Connor, IBHS, 209; Williams, Hebrew Syntax: An Outline2>1976. M. V. Van Pelt / W. C. Kaiser, Jr /A . R. Pele Diamond 9019 (ãem ú‘â, notícia, relato, mensagem), -> # 9048
UD1C (smf), q. soltar; ceder; mitigar; afrouxar; desistir; deixar cair; precipitar; tropeçar; ni. ser arremessado por terra, ser precipitado; hi. liberar, deixar cair (# 9023); rtüD® (semi((â), subs. remissão de dívi das (# 9024). 9023
am
OMA O vb. é adequadamente atestado, ocorrendo no acad. samãtu(m), puxar ou trazer para baixo, rasgar, quebrar, puxar ou arrancar; sir., sema(, extrair, puxar para fora; puxar para baixo; tigré sámtâtá, puxar para baixo e ár. sama(a remover, colocar de lado, tirar. O subs. sêmifta remissão anula de dívidas, pode ser encontrado no samaritano. AT 1. O q. é usado em 2 Reis 9.33, que descreve como, ao receberem ordem de Jeú, dois ou três eunucos jogaram Jezabel, a rainha mãe, de uma janela no alto e como o corpo dela 155
v m (# 9023)
esmagado foi pisoteado por cavalos. A dinastia de Onri, que se havia estabelecido por meio de uma revolução, com o assassinato da esposa de Acabe e de outros membros da família dele (lR s 16.15-20), caracterizou-se pela apostasia (1 Rs 16.29-33) e cobiça (lR s 21) e foi encerra da em cumprimento às profecias de julgamento dirigidas contra uma série de reis infiéis (lR s 14.11; 16.4; 21.19-24). Em Jeremias 17.4, o povo incrédulo de Judá foi advertido de que, como resultado de seu pecado inextirpável e compulsivo, seriam forçados a entregar a terra que haviam recebido de Javé. Parece provável que o termo úbekã e em ti/contra ti, que vem depois do vb. (q.), seja um equívoco, sendo que o termo correto deveria seryãtPkã, tua mão (ver Driver, 1906,99; Pe ake, 221; Robinson, 484; Bright, 118; BHS; Carrolt, 349; McKAne, 1986, 384, 386-87; ver Dt 15.3). Se for esse mesmo o caso, então o sentido será: “Afrouxarás a tua mão da tua herança”, ou seja, “terás que abrir mão da tua herança”. O castigo por desobedeceres as estipulaçôes da aliança será a privação de teus direitos sobre a herança (sobre nahalâ, ver, p. ex., Janzen, 14445) e a perda de tua existência como nação. O ni. pf. (precatório; ver Dahood, 308,312) é usado no primeiro verso do Salmo 141.6, em que é quase certo que tenha o sentido de ser arremessado por terra (ver C. A. e E. G. Briggs, 509-10). O texto heb. dos vv. 5-7 é cercado de dificuldades e foram propostas diferentes traduções. As seguintes estão entre as mais convincentes, sendo que todas elas preservam o sentido de ser permitido cair, ser jogado ou atirado para no ni.: “Eles estão entregues ao poder da Rocha, seu juiz” (ver BJ); “quando seus governadores foram precipitados sobre a rocha” (Eaton, 304); “seus juizes serão precipitados das laterais da rocha” (Anderson, 1972, 921). O salmista está orando não apenas por proteção divina contra os inimigos e livramento do mal e da tentação, mas também pelo castigo dos perversos. Se as traduções acima transmi tem com precisão a essência do v. 6 a., então, nessa passagem, o salmista pode ter em mente o castigo mencionado em 2 Crônicas 25.12 e Lucas 4.29 (ver Delitzsch, 365-66; Kirkpatrick, 1957, 799; Anderson, 1972, 921). A ocorrência do q. em 2 Samuel 6 .6 é motivo de grande controvérsia, e o significado do vb. nessa passagem não pode ser determinado com nenhum grau de certeza (ver Driver, 1966, 267). Ansioso para transferir a legitimidade e o poder da casa de Saul para si mesmo e sua cidade, Davi resolveu providenciar para que o símbolo antigo mais precioso de Israel, a arca, fosse transportada num carro de boi de Baalá de Judá (identificada em Js 15.9 e lCr 13.6 com Quiriate-Jearim, onde a arca foi deixada em ISm 7.1) para Jerusalém. A transferência é registrada em 2Sm 6.1-15. De acordo com 6 .6 (par. lCr 13.9), a uma certa altura da viagem, os bois que puxavam o carro tropeçaram (q. sãmetú). Estendendo a mão instintivamente (uma comparação com ICr 13.9; o 4Qsama , a LXX, a Pex., o Trg. e a Vg. indicam que as palavras 'et yãdô, sua mão, foram omitidas por acidente do TM) para segurar o objeto sagrado, Uzá profanou acidentalmente a santidade da arca, atraindo sobre si, desse modo, a ira divina. Muitos leitores consideram ofensivo o fato de o relato informar que Uzá foi ferido por Javé e morreu (v. 7). Foram propostas diversas explicações para a morte de Uzá (ver Ander son, 1989, 103-4), inclusive estas: sua arrogância ou desdém; sua frustração (supostamente involuntária) da vontade divina causada por ele não reconhecer que a queda da arca era um sinal indicando o desejo de Javé de parar a procissão; seu ato de sacrilégio ao entrar em con tato com a santa arca não sendo um sacerdote. Caird (1078-79) usa uma abordagem incomum. Seguindo a idéia de Amold, ele afirma que, nessa passagem, Sm( não significa tropeçar, mas sim deixar cair, verbo que ele considera um eufemismo para defecar. Uzá escorregou (essa versão requer uma alteração pequena do TM) no excremento, caiu de encontro à arca e mor reu por bater a cabeça na pedra do chão da eira. Apesar de engenhosa, essa versão dos vv. 6-7 156
üOtf (# 9023)
não recebe muito apoio. Se, como argumentam alguns, o vb. é trans., então a tradução deve ser “pois os bois quase a haviam tombado” (Anderson, 1989, 103), “a estavam fazendo incli nar” (cf. Ackroyd, 6 6 ) ou “porque os bois a faziam tombar” (BJ). Não existe, porém nenhum acusativo explícito. A LXX acrescenta um sufixo, apresentando o termo $emãtô, sacudiu-a (cf. Trg. que usa, porém, um vb. diferente). Apesar das interpretações conflitantes, no entanto, a maioria dos comentaristas concor da que um dos pontos principais ressaltados pelo escritor é de cunho teológico. E quase certo que havia um elemento calculista e de manipulação política envolvido na transferência da arca para Jerusalém. Noth (134), por exemplo, refere-se a isso como “uma ardilosa manobra real de legitimidade bastante questionável”. Impondo submissão e devoção, a presença da arca teria conferido legitimidade a Davi e à sua cidade. O incidente relatado em 2 Samuel 6.1-11 teria sido uma lembrança tanto para o rei quanto para o povo em geral de que o poder extraordiná rio — e potencialmente mortal — do Deus santo, representado ali pela arca, não pode ser con trolado por homem algum (ver Kirkpatrick, 1899, 92; McKane, 1963, 211; Anderson, 1989, 107-8; Brueggeman. 249-50). 2. O tema da terra é ubíquo no AT (Janzen, 146). O q. ocorre em Êxodo 23.11, que ins trui os israelitas a deixarem a terra alqueivada (sm() e em repouso todo sétimo ano. A mesma ordem é encontrada em Levítico 25.2-7 que, no entanto, usa o vb. sbt, descansar, ter um sábado. Uma comparação de Êxodo 23.10-11 com Levítico 25.2-7 sugere fortemente que a passagem de Levítico depende do texto de Êxodo, do qual é uma expansão (C. J. H. Wright, 1992, 857). O costume de deixar a terra alqueivada é relativamente comum entre os povos chamados de primitivos, que desejam apaziguar os poderes espirituais, os quais, para eles, controlam a terra e sua fertilidade (cf., p. ex., Rylaarsdam, 1011-12). Não é de surpreender que o AT apresente uma explicação teológica da lei referente à terra (cf. von Rad). Em Levítico 25.4, a motivação é mais explicitamente religiosa do que em Êxodo 23.10-11: A cada sétimo ano, Israel deve abrir mão do uso da terra em sinal de reconhecimento do fato de que Deus é proprietário dela e cede-a ao seu povo para que eles a administrem (cf. Lv 25.33). Porém, em Êxodo 23.11, o motivo possui uma dimensão predominantemente humanitária: os campos (plantações, vinhas, olivais) devem permanecer alqueivados de modo a prover alimento para os pobres (mais es pecificamente, para aqueles que não possuíam terras). A lavoura e outras atividades agrícolas relacionadas deviam cessar e tudo aquilo que crescesse por conta própria devia ser colocado à disposição dos pobres. É evidente que a exposição de Levítico 25.4 visa a um único ano universal de alqueive, mas não fica claro se era a intenção de Êxodo 23.11 que todas as partes do país observas sem o ano sabático simultaneamente. Tomando por base em grande medida o fato de que um ano de alqueive a cada sete não serviria para sustentar os pobres por muitos tempo durante um período de sete anos, alguns estudiosos argumentam que Êxodo 23.10-11 imaginava os agricultores realizando individualmente seu próprio ano de alqueive em suas terras, de modo a haver uma rotação de sete anos para as lavouras individuais. Porém, C. J. H. Wright (1992, 857) argumenta que, quando o ano sabático é colocado no contexto de outras leis referentes aos benefícios que eram de direito dos pobres sem terra (especialmente o direito anual de respigar, conforme Lv 19.9-10; 23.22; Dt 24.19-22 e o dízimo trienal de Dt 14.28-29), a questão de como os pobres sobreviviam nos seis anos que precediam o ano sabático deixa de existir. Não se sabe ao certo se essa instrução para o ano de alqueive foi, de fato, colocada em prática em Israel antes do período macabeu. O mesmo estilo lingüístico empregado na lei sobre o ano de alqueive em Êxodo 23.10-11 pode ser encontrado em Deuteronômio 15.1-3. Em Deuteronômio 15.2, é provável que a frase 157
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interessante, sãmô{ kol-ba 'ai massêh yãdô ’aseryasseh berê'èhú, signifique: “Todo credor de posse de um penhor de dívida deve liberar aquilo que lhe foi penhorado por aquele que lhe deve” (cf. C. J. H. Wright. 1992, 858; Phillips, 103). Conforme Horst, North e C. J. H. Wright (1984, 1992, 854), entre outros, argumentam de modo convincente, Deuteronômio 15.1-3 pede a remissão setenial de penhores de dívidas e não simplesmente da dívida em si. Era co mum tomar propriedades como penhor, mas por vezes, os devedores propunham colocar seus dependentes à disposição do credor. Um credor podia, por direito, resgatar uma dívida de um devedor inadimplente ao usar dos serviços da esposa e dos filhos dele (cf. Êx 21.7). Há fun damento para se crer que a lei de Deuteronômio 15.1-3 seja posterior tanto a Êxodo 23.10-11 quanto a Levítico 25.2-7 e que o objetivo era expandir a lei de alqueive do sétimo ano de modo que a compaixão se estendesse não apenas aos pobres sem terra, mas também aos proprietários de terra que houvessem sido atingidos pela pobreza e o endividamento (C. J. H. Wright, 1992, 858-89). Em Deuteronômio 15.1, o significado de conceder remissão é transmitido pelo vb. ‘sb (fazer, realizar), seguido do subs. semi(lâ. No v. 2, são usados o subs. e o q. inf. abs. smt e, no v. 3, o hi. ocorre na seqüência de yãdekã (lit., tua mão soltará, ou seja, “deverás remitir” ou, no caso de um direito de posse, “deverás renunciar”). O fato de o estilo lingüístico dessa lei em Deuteronômio 15.1 -3 ser tão semelhante ao de Êxodo 23.11 sugere para alguns estudiosos que se tratava principalmente de uma dívida agrária relacionada ao uso da terra. Como em Levítico 25, Deuteronômio 15.1-3 considera que o séti mo ano é de relevância universal. A devolução de todos os penhores (propriedades e pessoas) representava um alívio considerável para os devedores, mas será que estes continuavam sob o peso da dívida propriamente dita? Alguns (p. ex., C. J. H. Wright, 1992, 858) acreditam que o penhor não apenas servisse para dar a garantia necessária até que a divida fosse paga, mas que também era usado para pagar a dívida em si. Nesse tipo de acordo “anticrético”, o produto da terra penhorada ou o serviço do dependente colocado à disposição do credor pertencia a esse credor e constituía o pagamento da dívida (C. J. H. Wright, 1992, 858; 1990, 171-72). Trata-se de uma idéia que tem seus atrativos no caso de Deuteronômio 15.1-3. Não fica claro se essa lei prescrevia um cancelamento completo e permanente da dívida ou uma suspensão do pagamento dessa dívida por um ano. Porém, uma prorrogação temporária é indi cada tanto pelas palavras usadas no v. 2 (“[o credor] não o exigirá [«gi] do seu próximo ou do seu irmão”) quanto pelo fato de que não seria necessário haver um ano especial de jubileu se a intenção do ano sabático fosse cancelar total e definitivamente todas as dívidas e restaurar em caráter permanente as propriedades hipotecadas (C. J. H. Wright, 1992, 859; cf., p. ex. Craigie, 236; pace, p. ex. Smith, 198-99; G. E. Wright, 428; Mayes, 247; Payne, 93; Nelson, 223). Ao que parece, portanto, Deuteronômio 15.1-3 instrui os credores a devolver os penhores aos devedores e não exigir o pagamento de nenhuma dívida durante o ano de remissão. A motivação teológica da lei de senii!(â em Deuteronômio 15.1-3 tem como fundamento o reconhecimento da generosidade de Deus ao livrar seu povo da escravidão e conceder-lhe a dádiva da terra. Nos vv. 7-11, os israelitas são advertidos que seria pecado endurecer o coração e não usar de compaixão e generosidade para com os pobres. No v. 9, aqueles que têm condições de emprestar são exortados a não demonstrar má vontade e relutância ao tratar da pobreza e das dificuldades, mas sim dar com alegria e generosidade, mesmo quando o sétimo ano, o ano de remissão (Senai has.^mittã) estiver próximo. Deuteronômio 31.10-11 diz a Israel que, no final de cada sétimo ano, no tempo determinado do ano de remissão (bemõ êdsenat hassemi!(â [v. 10]), a lei deut. deve ser lida no santuário central durante a Festa dos Tabemáculos. P-B Formas verbais e nominais ocorrem tanto no heb. quanto no aramaico. O vb. no heb. é sãmaf, escorregar; afrouxar, separar; levar embora, roubar; ni. ser separado, esgueirar-se; pi. 158
üDtf (# 9023)
e hi. afrouxar, arrancar; arrastar para frente; liberar de uma dívida; fazer cessar o trabalho no campo; enquadrar-se na lei de limitações do ano sabático; descansar (para o solo); remitir uma dívida; abandonar, mandar embora; hitp. escorregar, cair de um lugar. No aram., o vb. é semat, semêt, afrouxar, separar, libertar-se, levar embora; escapar, deslizar; ser liberado, descansar, alqueivar; deixar descansar, deixar alqueivado; af. liberar, remitir uma dívida; descansar, alqueivar; abandonar; deixar alqueivado; pa. causar a remissão de uma dívida; soltar, deixar cair, descartar; arrancar; itp. escapar, ser deslocado; libertar-se; aliviar-se; escapar, desembaraçar-se. As formas subs. heb. semittâ, semíttâ e as formas subs. aram. semif[etã semi((etá, semittã semítlã'. semi!(á, semi((etã', significam liberação, descanso, especialmente o cancelamento de dívidas e o repouso do solo no ano sabático. O subs. samfüfin, significa rebento, renovo. As formas adj. heb. sãmút e aram. sem ú(ã‘, semitã \ semitâ, significam ágil, longo, fino. No aram., as palavras sãmôfã ’, s ã m ú fã significam gafanhotos longos e esticados (nome de uma espécie) (Jastrow, 2 :1592, 1594-95). Empréstimos: Iwh II (tomar emprestado, emprestar, # 4278); ns ’ I (emprestar mediante um penhor, # 5957); -> nsk II (pagar / cobrar juros, # 5967); -> 'bt (tomar emprestado, tomar um penhor de, # 6292); -> smt (liberar, remitir, deixar cair, precipitar, # 9023) Queda, cambaleio, tropeço: -> bth II (cair ao cão, # 1054); -> hwh I (cair, # 2092); ksl (tropeçar, cambalear, ser arruinado, # 4173); nss I (vacilar, # 5823); npl (cair, ficar pros trado, # 5877); -> ntr I (cair, # 6000); -> smt (soltar, ceder, deixar cair, precipitar, tropeçar, # 9023) B ib l io g r a f ia
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D’» tf (# 9028)
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# 9023
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(sãmayim), céu, céus, firmamento, ar (# 9028)
OMA smy é o radical para o heb. sãmayim (pl. masc.), sendo que seus cognatos são atestados no aram., fen., ugar. e acadiano. No pl. acad., samú pode significar céu como reino dos deuses e também céu como espaço acima da terra (CAD S /l, 339-48). Os assírios analisavam-no como sa mê, o lugar das águas (HALAT 1442; ver Livingstone, 32). No OMA, o céu é, muitas vezes, personificado e até mesmo deificado como o deus mesopotâmio Anú. O ugar. smm (Gordon, OT, § 19.2427), que é escrito silabicamente como uma forma pl. de sa-mu-ma, é deificado como o deus ar$ wsmm, Terra-e-Céus (KTU 1.118 :11), e smm wthm, Céus-e-Profundezas ( 1. 100:1); é provável que esses nomes refiram-se ao horizonte da terra e do mar.
AT 1. Significado e formas de uso. O céu no AT não é deificado, é apenas uma criação de Deus. E o lugar, tanto visível quanto invisível, muito acima da superfície da terra, o ponto de vista restrito dos homens. O heb. sãmayim significa céu, ar ou firmamento. Também refere-se aos “céus como esfera divina”, como é o caso em Ezequiel 1.1 e Eclesiastes 5.2. O termo sãmayim é juntado com outros termos sinônimos além de rãqía' (SI 19.1 [2]). O par mais freqüente é sãmayim-sehãqtm ( -> # 8836), céus (SI 36.5 [6 ], etc.) ou nuvens (Dt 33.26, etc.). A ordem inversa aparece no Salmo 78.23 (céus) e em Jó 38.37 (nuvens). 2. Cosmologia. a. Céus e terra. Na antiga Babilônia, havia duas cosmologias diferent Uma considerava o universo inteiro de modo bipartido como “céus e terra” e a outra de modo tripartido como “céus-terra-Apsu”. Semelhantemente, no AT, a criação toda é descrita de ambas as formas (ver Tsumura, The Earih and the Waters, 67-77; também Lambert, RLA 4:411 -12). A visão bipartida é expressada pelo par merismático de palavras “céus e terra”, que se refere a tudo ou a todos os lugares. Esse é o modo como o universo em sua totalidade foi cria do (Gn 1.1 [br ]; Êx 20.11 [ ‘sh], Gn 14.19 [qnh]), é pertencente ao Senhor (1 Cr 29.11) e será abalado por Deus (Ag 2.6, 21). Javé é “Deus do céu e da terra” (Gn 24.3). A expressão “nos céus ou na terra” é usada para descrever Deus como o único Deus (Dt 3.24), onipresente (Dt 4.39; Jr 23.24; etc.) e onisciente (J1 2.30 [3.3]). b. Céus e águas. A expressão tripartida “céus-terra-mar(es)”, aparece em Êxodo 20.1 Neemias9.6; Salmos 69.34 [35]; 96.11; 135.6; 146.6; Ageu 2.6, referindo-se ao universo como um todo. Tanto na visão bipartida quanto na tripartida, os céus são uma referência ao local acima da terra. Nesse último caso, porém, os céus também são contrastados com os mares e referem-se a um lugar acima dos mares. No AT, sãmayim aparece por vezes em conjunto com yãm(im), mar(es) (Jó 9.8), hôm(ôt), abismo/profundezas (Gn 7.11; 8.2; 49.25; Dt 33.13; SI 107.26 [pl.]; ver acima, o ugar. smm wthm) e se 'ôl (Jó 11.8; SI 139.8; Am 9.2). Esses pares, que enfatizam a elevação do céus num contraste nítido com as águas e Seol, também são merismáticos e referem-se à totalidade, com o par “céus e terra”. 160
D’QU7 (# 9028)
Deve-se observar que em Gênesis 1.1-2, o universo é descrito de modo bipartido como “céus e terra”, uma vez que “mar(es)” {yãm[im}), o terceiro elemento do sistema tripartido, só aparece em 1 . 10 . c. De acordo com o conceito babilônio, havia três céus, ou seja, o céu superior, q pertencia ao deus-céu Anú; o céu médio, que pertencia a Igigi (os deuses do céu) e o céu infe rior, que pertencia às estrelas (RLA 4:412). No conceito do AT, até mesmo semê hassãmayim, o mais alto dos céus (lit., “os céus dos céus”) não é capaz de conter Deus (1 Rs 8.27), pois sendo apenas sua criação (Ne 9.6) ele lhe pertence (Dt 10.14). Os céus são convocados para louvar a Deus juntamente com outras de suas criações (SI 148.4). 3. A estrutura dos céus. No AT, os céus são descritos metaforicamente como cobertos de uma abóbada (hüg sãmayim; Jó 22.14). Na Babilônia, porém, de acordo com Lambert “não há nenhuma evidência de uma concepção de abóbada acima da terra” (RLA 4:412). No conceito babilônio, havia portas com trancas nos dois lados dos céus, onde estes se encontravam com a terra, nas “fundações dos céus” (an.úr = isidsamê). No Enuma Eliche, a epopéia babilônia da criação, considerava-se também que os céus eram ligados à terra tanto por um cordão cósmico quanto pela rede de Marduque (RLA 4.412). No entanto, no AT não há menção alguma de como a terra e os céus encontram-se ligados. Além disso, Gênesis não apresenta nenhuma descrição detalhada da criação dos céus. Em outras passagens, porém, há metáforas arquitetônicas com referência à sua construção: a. “porta” (sa ‘ar, Gn 28.17; cf. ugar. tgr [KTU 1.78:3]); b. “portas dos céus” (daltê hassãmayim-, Sl, 78.23); c. “comportas” que li beram a chuva ( 'arubbôt Gn 7.11; 8.2); “janelas” que liberam comida (2Rs 7.2, 19), “maná” (Sl 78.23-34) e “bênçãos” (Ml 3.10); d. “represas” que se abrem (em Is 24.18, o termo 'arubbôt é contrastado com “fundamentos da terra” [ver também Jr 31.37]; d. “fundamentos dos céus” (môsedôt hassãmayim 2Sm 22.8), cujo cognato no acad. é isid samê; e. “colunas do céu” ( ‘ammüdê sãmayim’, Jó 26.11). 4. Criação dos céus. Ao longo de todo o AT, o leitor depara-se com o fato de que os céus são uma criação de Deus. Ele criou (br ’; Gn 1.1; Is 42.5; 45.18) e fez ( ‘sh; lCr 16.26; Ne 9.6; Sl 96.5) os céus. Foi “por sua palavra” (Sl 33.6) e “com [seu] entendimento” (Sl 136.5; Pv 3.19; Jr 10.12; 51.15) que ele fez, estabeleceu (kwn) e estendeu (n(h) os céus. Deus fez os céus e a terra, ou seja, todo o universo (Gn 2.4; Êx 20.11; 31.17; 2Rs 19.15; 2Cr 2.11; Sl 115.15; Is 37.16; Jr 32.17). A criação dos céus, propriamente dita, é descrita em Gênesis 1.6-8, em que Deus fez um firmamento (rãqía') entre as águas para separá-las e o chamou de “Céus”. Em Provérbios 8.27, o estabelecimento dos céus é explicado como resultado de Deus traçar “o horizonte (hüg) sobre a face do abismo (fihômj". A separação dos “céus” do abismo também se reflete no nome ugar. composto smm wthm “Céus-e-Profundezas” (ver acima). Os céus são obra das mãos (ou dedos) de Deus, assim como a lua e as estrelas (Sl 8.3 [4]; 102.25 [26]). Deus estendeu os céus com as mãos (Is 45.12), sua destra estendeu (fph) os céus (Is 48.13) e ele tomou a medida dos céus (tkn) a palmos (Is 40.12). A maneira como Deus criou os céus é caracterizada por “estendê-los” (n(h || mth) como uma cortina ou tenda (Jó 9.8; Sl 104.2; Is 40.22; Jr 10.12; 51.15; Zc 12.1; etc.). 5. Os habitantes dos céus. a. Aves. O termo heb. sãmayim pode ser traduzido como céus (Pv 30.19; Jr 8.7) ou, em algumas versões, como ar (Dt 4.17), quando aparece relacionado a aves. A expressão “aves dos céus” (Gn 1.26, etc.) aparece 38x. b. Águas. As águas nos céus assumem várias formas: chuva, orvalho, neve, etc., q Deus pode enviar dos céus como bênção ou reter como castigo. i. Chuva dos céus (me(ar hassãmayim-, Dt 11. 11). A chuva é a forma mais comum água (2Sm 21.10) do “seu bom tesouro, o céu” ( 'õ^rôt), manifestação da generosidade de Deus 161
□ ’DU> (# 9028)
(tôb) (Dt 28.12). É despejada dos niblê sãmayim, odres dos céus (Jó 38.37). Quando Deus troveja, “há tumulto de águas no céu” (Jr 10.13; 51.16). Por causa do pecado, Deus fecha ( ’sr) os céus para que não chova (Dt 11.17; 1Rs 8.35; 2Cr 6.26; 7.13). ii. O orvalho do céu (tal hassãmayim) || exuberância da terra (semannê h ã ’ãres\ Gn 27.28; 27.39 [em ordem inversa]); cf. ugar. tl smm || smm ar$, o óleo da terra (KTU 1.3:11:3940; 1V:43; ver RSP 1:190-91). O orvalho consiste no “que é mais excelente dos céus” (Dt 33.13; também 33.28; Ag 1.10; Zc 8.12), mas os céus podem reter (kl') o orvalho como forma de julgamento (Ag 1.10). iii. A neve (seleg), assim como a chuva, desce dos céus (Is 55.10). Deus faz chover gra nizo (bãrãd; Êx 9.23) e “dá à luz a geada do céu” (kPpôr sãmayim) (Jó 38.29). c. Vento. Deus também faz sair o vento dos seus depósitos ( o^rô t; Jr 10.13), ou seja, dos céus (Dt 28.12). d. Estrelas, etc. No conceito bipartido do universo, que se reflete no Salmo 148 (ver Tsumura. The Earth and the Waters, 74-77), as “estrelas luzentes” (v.3) e “as águas que estão acima do firmamento” (m ê‘al hassãmayim', v. 4) pertencem aos céus, enquanto as aves (“vo láteis”; v. 10 ) e “fogo e saraiva, neve e vapor e ventos procelosos” (v. 8 ) pertencem à terra. Assim, as estrelas encontram-se mais elevadas que as aves nos céus. A expressão “estrelas dos céus” aparece lOx (Gn 22.17; 26.4; etc.). As estrelas são “os brilhantes luminares do céu” (Ez 32.8) e também “o fulgor do firmamento”, rãqia' (Dn 12.3). (No acad. a expressão “escritos do firmamento” [sitir burümè] refere-se à estrelas ou constelações [CAD B:345].) As estrelas são convocadas juntamente com o sol, a lua e os anjos para louvar a Deus (SI 148.3) e elas o adoram (Ne 9.6). Apesar de Deus ter advertido os israelitas para não serem seduzidos a adorar o sol, a lua e as estrelas (Dt 4.19; 17.3), eles adoraram todo o exército do(s) céu(s) (kol çfhã 'hassãmayim', 2Rs 17.16; 21.3; 23.4; 2Cr 33.3; Jr 8.2) e lhes queimaram incenso (2Rs 23.5/ Jr 19.13; também Sf 1.5). Manassés chegou a construir-lhes altares nos dois átrios da casa do Senhor (2Rs 21.5; 2Cr 33.5) ( kôkãb, estrela, # 3919). e. Anjos. Diferentemente dos habitantes naturais dos céus inferiores, visíveis à huma nidade, os anjos encontram-se no céu onde Deus habita (p. ex., SI 103.20-21). Apesar de a pa lavra “céu” não aparecer, as cenas da corte celestial, como em IRs 22.19-22 e Jó 1 e 2 (onde Satanás chega depois “de rodear a terra e passear por ela”) fica claro que é lá que se passam as cenas retratadas. Além disso, os anjos de Deus chamaram/bradaram (qr ’) do céu (Gn 21.17; 22.11, 15). O “exército do céu” pode ser uma referência tanto às estrelas (Jr 8.2, etc.) como aos anjos (1 Rs 22.19). 6. Sinais e outros fenômenos nos céus. a. Sinais. Deus fez os luzeiros, ou seja, o so a lua e as estrelas no firmamento como sinais ( otôt) para marcar as estações e os dias e anos (Gn 1.14). Servem, portanto, de sinais para o calendário sagrado. Deus advertiu Israel para não assimilar as práticas pagãs e “[espantar-se] com os sinais ( otôt) dos céus” (Jr 10.2), pois “os que dissecam (hbr) os céus”, ou seja, os astrólogos, e “fitam os astros” (Is 47.13) serão queimados como restolho. b. Prodígios. Deus julga cobrindo (pi. ksh) os céus, fazendo enegrecer (qdr) suas estre (Ez 32.7) e luminares (Ez 32.8), vestindo-os (Ibs) de negridão (qadrüt) (Is 50.3). Deus também destrói os desobedientes transformando os céus em ferro || bronze” (Lv 26.19b; Dt 28.23), fa zendo chover (m(r) “enxofre e fogo, da parte do Senhor” (Gn 19.24) e fazendo cair (slk) do céu grandes pedras de granizo (Js 10.11). Os céus se abalam (r s) como a terra (J1 2.10), desapare cerão (ni. mlh) como fumaça (Is 51.6) e se enrolam (ni. gll) como um pergaminho (Is 34.4). 162
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A escuridão do céu muitas vezes anda lado a lado com a desolação ( 'bl, tõhíi wãbõhü) da terra (Jr 4.23, 28) (ver Tsumura, The Earth and lhe Waters, 36-40). Para povos dos OMA, a escuridão causada por um eclipse solar ou lunar era um mau agouro (cf. o texto ugar. KTU 1.78, o registro mais antigo conhecido de um eclipse solar). O AT, pelo contrário, fala do julgamento de Deus vindo dos céus sobre a humanidade por sua omissão moral (p. ex., Jr 4.23, 28). Nos últimos dias, Deus mostrará môpe tim nos céus: “Mostrarei prodígios no céu e na terra: sangue, fogo e colunas de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que venha o grande e terrível Dia do Senhor” (J1 2.30-31 [3.3-4]). No fim dos tempos, Deus substituirá este universo por outro, pois criará “novos céus e nova terra” (Is 65.17; 66.22). 7. Metáforas. Em momento algum o céu é deificado no AT; trata-se simplesmente de uma criação de Deus. Até os mais altos céus (semê hassãmayim) não podem conter (kwl) Deus (1 Rs 8.27). No entanto, os céus são, muitas vezes, personificados e/ou usados como metonímia para seus habitantes. Os céus declaram (pi. spr) a glória de Deus (SI 19.1 [2]), proclamam (hi. ngd) sua justiça (SI 50.6; 97.6), inclinam os ouvidos/dão ouvidos (Dt 32.1; Is 1.2) e se regozijam (rnn; Is 44.23; 49.13; Jr 51.48) e louvam (hli, SI 69.34 [35], hi.ydh; 89.5 [6 ]). Fazem chover (r'p) justiça (Is 45.8) ou manifestam (glh) a iniqüidade humana (Jó 20.27). 8 . Deus no céu. a. O Deus dos céus. Os céus têm uma relação especial com Deus e re ferem-se à esfera divina. A expressão “Deus do(s) céu(s)” ( ’elõhê hassãmayim) aparece 9x no AT e apresenta Javé como uma divindade universal. Abraão queria que seu servo jurasse pelo “Senhor, Deus do céu” (Gn 24.3, também v. 7). Jonas usou o mesmo título quando apresentouse como um hebreu que adorava ao Senhor (Jn 1.9). Ciro, o rei da Pérsia disse que “o Senhor, Deus dos céus” lhe deu todos os reinos da terra (2Cr 36.23; Ed 1.2). Neemias orou perante o Deus dos céus (Ne 1.4, também 1.5; 2.4, 20). O Salmo 136.26 convoca para dar graças a 'el hassãmayim, o Deus dos céus. Esse tí tulo não possui nenhuma relação direta com o nome divino fen. Baalsamen, b ‘Ismm (TSSI 3, 6:3, 15:A:iii: 18; também Ba-al-sa-me-ma [aca ] \b ‘lsmyn [aram.]; ver Gibson, TSSI 3:19). Essa divindade, cujo nome significa “Baal-do-céu” é mencionada lado a lado com “El-criador-daterra” Iqn ars (15:A:iii; 18), de modo que é distinta dele. Javé é o “Deus Altíssimo que possui os céus e a terra” (qõnêh sãmayim wã 'ãre.y, Gn 14.19,22); como “Deus dos céus”, ele é a única divindade que criou e controla os céus e a terra, ou seja, todo o universo. b. O céu de Deus. No AT os céus são chamados com freqüência de “céus do Senhor” (SI 115.16; Lm 3.66); são exaltados por sua antigüidade (qedem; SI 68.33 [34], santidade (qõdes; SI 20.6 [7]; 102.19 [20] com mãrôm) e poder (SI 150.1 com rãqia'). Os céus são, por excelência, a esfera divina. Diz-se que os céus são a “santa habitação” de Deus (m ã‘ôn; Dt 26.15; 2Cr 30.27), lu gar da sua habitação (meqôm sibfikã, 1Rs 8.30; mekôn sibtekã, 1Rs 8.39) e seu “santo templo” (hêkãl; SI 11.4). Diz-se também que “Deus é o que edifica as suas câmaras no céu” (Am 9.6). O céu é tanto o lugar do trono de Deus (SI 2.4; 11.4; 103.19; 123.1) quanto o trono (kissê') em si (Is 66.1); cf. “tua santa e gloriosa habitação [“trono elevado (z?bu[)"] ” (Is 63.15). Deus é descrito assentado sobre/acima daquilo que se assemelhava à safira, a cor do céu (Ex 24.10; Ez 1.26). E significativo o fato de dizer-se que os três céus babilônios são feitos de três pedras preciosas (ver RLA 4:412). c. Glória e palavra. Deus não se encontra apenas no céu (2Cr 20.6; SI 73.25; 115.3; Ec 5.2 [1]; Lm 3.41), mas nas alturas do céu (Jó 22.12) e é aquele que deve ser exaltado acima dos céus (SI 57.6 [7], 11 [12]; 108.5 [6 ]). A glória de Deus (kãbôd) está acima dos céus (SI 113.4); sua majestade, glória (hôd) encontra-se acima dos céus e da terra (SI 148.3), cobre os céus (Hc. 3.3) e é entoada (ou exposta) nos céus (SI 8.2). 163
trQUr' (# 9028)
A palavra de Deus (dãbãr) é etema e está firmada no céu (Sl 119.89). No AT, as leis fi xas (huqqôt) dos céus e da terra (Jr 33.25; também Jó 38.33) são a aliança etema de Deus. Essa aliança é caracterizada pelo amor (hesed) e fidelidade ( ’emet) de Deus, que chega até aos céus (sãmayim) ou até às nuvens (sehãqim) (Sl 57.11; 108.4 [5]; também 36.5 [6 ]). Deus confirma (hi. kwri) sua fidelidade 'emúnâ, nos céus (Sl 89.2 [3]). d. Deus desde o céu. Apesar de estar elevado em seu santo e glorioso trono (Is 63. Deus tem um interesse íntimo por seu povo. Ele olha dos céus (hi. nbt\ Sl 33.13, etc.) e desde o céu (sqp, Dt 26.15, etc.), fala (dbr) dos céus (Êx 20.22; Ne 9.13), ouve (sm ■) no céu (1 Rs 8.30; 2Cr 6.21, etc.) e responde ( 'nh) do céu (Sl 20.6 [7]). Responde a Davi com fogo do céu sobre o altar do holocausto (1 Cr 21.26). Deus desce dos céus baixando-os (n(h\ 2Sm 22.10; Sl 18.9 [10]; 144.5) ou fendendo-os (q r‘\ ls 64.1 [63.19] ou cavalga (rkb) sobre os céus para ajudar seu povo (Dt 33.26; também Sl 68.33 [34]; cf. v.5; 2Sm 22.11; Sl 18.10 [11]). 9. Os homens em relação ao céu. a. Ascensão ao céu. No AT, as tentativas humanas de ascender ao céu são tratadas de modo negativo, exceto no caso de Elias, em que o próprio Senhor o fez subir (2Rs 2.1, 11). Além disso, apesar de o texto em Gênesis 5.24 não mencio nar os céus, é possível, levando-se em consideração o texto sum., que Enoque tenha ascendido ao céu; ver R. Borger, “The Incantation Series Bit Mêseri and Enoch’s Ascension to Heaven”, in SBTS 4, 1994, 224-33. Ninguém subiu aos céus ( ‘Ih) e voltou (Pv 30.4). A destruição será o destino daqueles que tentarem subir aos céus: para Israel (Am 9.2), para os perversos (Jó 20.6-7), para a Babilônia (Jr 51.53) e para o rei da Babilônia que diz: “Eu subirei ao céu; aci ma das estrelas de Deus exaltarei o meu trono” (Is 14.13). No conceito do AT, o céu é a esfera de Deus e não dos homens. b. Oração. No entanto, os homens podem aproximar-se de Deus no céu por meio da oração e ao levantarem as mãos aos céus em juramentos. Assim, Ezequias e Isaías oraram (hitp. pll) e clamaram (z ‘q) ao céu (2Cr 32.20) e diz-se que a oração do povo “chegou até à santa habitação de Deus, até aos céus (2Cr 30.27). Salomão “estendeu (prs) as mãos para os céus” (lR s 8.22; também 8.54; 2Cr 6.13). Orar é levantar (n s’) o coração e as mãos para Deus nos céus (Lm 3.41). Levantar as mãos (para o acad., nis qãti, ato de levantar as mãos, oração, ver CA D N/2, 295) é um gesto usado não apenas na oração mas também em juramentos. Uma vez que levan tar (n s') as mãos aos céus era um ato formal de juramento, até mesmo Deus usa esses termos ao expressar uma declaração solene, como é o caso de Deuteronômio 32.40: “Levanto a mão aos céus e afirmo por minha vida etema”. c. Minha testemunha no céu. Em Jó 9.33, Jó expressa o desejo de ter um mediador entre ele e Deus. Posteriormente, em 16.19, confessa: “Já agora sabei que a minha testemunha ( ‘êdi) está no céu, e, nas alturas, quem advoga (sãhadt) a minha causa” e deposita esperança no seu intercessor celestial. No NT, Paulo diz a Timóteo em sua primeira carta: “Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem” (lTm . 2.5). 10. Expressões idiomáticas. A expressão “entre o céu e a terra” significa “no ar” (2Sm 18.9, etc.; ver E. Levine, ZAW 8 8 , 1976,97-99). A expressão “debaixo de todo o céu” referese à toda a terra (Dn 9.12; também Dt 2.25; 4.19; Jó 28.24; 41.3). Assim, destruir “tudo o que há debaixo dos céus” (Gn 6.17, etc.) significa aniquilação total. Já a expressão “assim como os céus são mais altos do que a terra” indica um contraste nítido(Is 55.9), grandeza (Sl 103.11) ou inescrutabilidade (Pv 25.3). Observe-se que Eclesiastes emprega os termos “debaixo do céu” (Ec 1.13; 2.3; 3.1) 3x no lugar da expressão habitual “debaixo do sol” (29x; todas em Ec). 164
D’0® (# 9028)
A expressão “chega até ao céu” é usada, por vezes, com os vbs. q./hi. n g \ q. gdl, alcan çar e expressa um caráter extremo. Alguns exemplos são o julgamento da Babilônia (Jr 51.9), o orgulho do perverso (Jó 20.6), a culpa (Ed 9.6) ou a ira (2Cr 28.9) que chega aos céus. No caso de “até aos céus”, trata-se de uma hipérbole para exagerar a altura extrema de algumas construções. E usado, por exemplo, para os muros de uma cidade (Dt 1.28; 9.1) que, suposta mente, chegam até aos céus. P-B Na LQ, tanto as formas heb. quanto aram. são devidamente atestadas. A LXX quase sempre traduz sãmayim como ouranos. Em 51 das 667x o termo é traduzido como um subs. pl. refletindo a forma pl. do heb. sãmayim. Nas pseudepígrafes e em algumas tradições rabínicas, favorecia-se uma concepção mística do céu e alguns místicos chegavam a dizer que haviam viajado para lá. Existem também diversas tradições sobre a Jerusalém celestial, e na LR a angelologia desenvolveu-se muito além dos limites do próprio AT. NT No NT o termo ouranos ocorre 273x; aparece 82x em Mateus e 52x em Apocalipse. Mateus emprega a palavra “céus” como um sinônimo para Deus na expressão “reino dos céus” (32x, todas elas em Mateus), em vez de “reino de Deus” . A expressão “vosso / meu Pai celeste” (1 Ox) também pode ser encontrada em Mateus. Foi sugerido que a forma aram. encontrar-se-ia por trás dessas expressões, mas não há equivalente algum no AT. As concepções de céu no NT são praticamente as mesmas do AT. O NT afirma que Deus criou os céus e a terra. Deus é Senhor dos céus e da terra; diz-se que ele habita no céu e de lá se revela. Porém, o NT é singular nos seguintes aspectos: o Espírito Santo desceu do céu sobre Jesus (Mt 3.16; Mc 1.10; Lc 3.22; Jo 1.32). Depois de sua ressurreição, Jesus Cristo recebeu toda autoridade no céu e na terra (Mt 28.18) e subiu aos céus (At 1.11; cf. Jo 3.13; E f 4.10); entrou no céu, que é o verdadeiro santuário (Hb 9.24; também 8.5); foi exaltado ao trono de Deus e voltará do céu. Para um manifesto cristológico, -> NIDNTT, 194-95. O NT também faz referência à pátria celestial (Hb 11.16) bem como à Jerusalém celestial (Hb 12.22; também Ap 3.12; 21.2, 10). Céu: -> ’aguddá (firmamento, aspersor, # 99); -> rãqia' (firmamento, prato, # 8385); -> sahaq (nuvens de poeira, # 8836); -> sãmayim (céu, céus, ar, # 9028) B ib l io g r a f ia
ABD 3:90-91; NIDNTT 184-96; THAT2:965-70: R. Borger, “The Incantation Series Bit Mêseri and Enoch’s Ascension to Heaven,” in R. S. Hess & D. T. Tsumura (eds.), / SludiedInscriptions from Before the Flood, SBTS 4, 1994, 224-33; P. Collini, “Studi sul lessico delia metallurgia nell 'Ebraico Biblico e nelle lingue Siro-Palestinesi dei II e I millennio A. C.,” Studi Epigrafici e Linguistici 4, 1987,9-43; C. Houtman, Der Himmel im Alten Testament: Israels Weltbild und Weltanschauung, OTS 30, 1993; M. C. A. Korpel, “Soldering in Isaiah 40:19-20 and 1 Kings 6:21,” UF 23, 1991, 219-22; W. G. Lambert, “Himmel,” RLA 4:411-12; E. Levine, “Distinguishing ‘Air’ from ‘Heaven’ in the Bible,” Z A W S S ,1976,97-99; A. Livingstone, Mysticaland Mythological Explanatory Works o f Assyrian and Babylonian Scholars, 1986; D. T. Tsumura, The Earth and the Waters in Genesis I and 2, JSOTSup 83, 1989; idem, “A ‘Hyponymous’ Word Pair, and thm(t), in Hebrew and Ugaritic,” Bib 69, 1988, 258-69. David Toshio Tsumura 9029 (semtní, oitavo),
# 9046 165
T O # (# 9031)
9031
TOtf
T O # (sãmir I), espinho-de-cristo (# 9031)
OMA Existe apenas um cognato ár. para essa palavra. AT Esse termo é usado somente em Isaías (espinheiro; 8 x): Isaías 5.6; 7.23-25; 9.17; 10.17; 27.4; 32.13. Aparece quase sempre com sãyil, abrolhos, como hendíadis denotando o caráter de algo espinhoso. Em Isaías 32.13, é usado juntamente com qôç. O contexto de todos esses casos é o julgamento de Deus sobre seu povo. P-B
Ocorre um cognato em t. Sofa 15.1: sãmir, espinho
Espinheiro, urtiga, espigão, cardo, espinho: ’ã(ãd (espinheiro, # 353); barqõn (espi nho, arbusto espinhoso, # 1402); -> deber II (espigão espinhoso, # 1823); -> dardar (cardo, # 1998); -> hêdeq (arbusto espinhoso, # 2537); -> hôah I (espinho, # 2560); -> mesukâ (sebe de espinhos, # 5004); na'a$ú$ (espinheiro, # 5848); -> sirá (moita espinhosa, # 6106); s/7/ôm (espinho, #6141); -> seneh (toiça espinhosa, # 6174); -> sirpãd (urtiga, # 6552); $e’elim (lótus espinhoso, # 7365); $eniním (espinhos, # 7564); qô$ I (espinheiro, # 7764); -> qimmôs (ervas daninhas, urtigas, # 7853); -> sêfc (espinho, lasca, # 8493); -> Sãmir I (espinho-de-cristo, # 9031) /C. Lawson Younger, Jr.
9032
TO#
T O # (sãmir II), esmeril, diamante ? (# 9032), somente em Jeremias 17.1; Ezequiel 3.9; Zacarias 7.12.
OMA O HALAT cita cognatos no aram. e no sir.; em última análise, talvez se trate de deriva dos do egípcio. AT 1. Algumas versões da Bíblia traduzem o termo como pedra ou pederneira, enquanto outras como magnetita ou diamante. A maioria dos comentaristas concorda que a melhor tra dução para sãmir é diamante, uma substância adamantina (de acordo com Greenberg, Ezekiel 1-20, AB 22,1983,69; cf. Bright. Jeremiah, AB 21, 1965,114; e Smith, Micah-Malachi, WBC 32, 1984, 224). Em Jeremias 17.1, o termo sãmir é usado para retratar a natureza “arraigada e impossível de erradicar” da rebelião de Judá (de acordo com Thompson, Jeremiah, NICOT, 1980,417), enquanto em Ezequeiel 3.9 e Zacarias 7.12 o termo é uma metáfora para a extensão e o grau da obstinação de Israel diante do Senhor. 2. Para uma introdução teológica ao tema das pedras preciosas no AT, ver 'õdem (# 138) Pedras preciosas: -> ’eben (pedra, rocha, # 74); 'õdem (pedra preciosa, # 138); -> 'ahlãmã (jaspe, # 334); ’eqdãh (berilo, # 734); baha( (pedra preciosa, # 985); bãreqet (esme ralda, # 1403); yaffilõm (pedra preciosa; # 3402); -> yã&pêh (jaspe, # 3835); kadkõd (rubi?, # 3905); lesem I (pedra preciosa, # 4385); nõpek (pedra semipreciosa, # 5876); sõheret (minério de pedra, # 6090); sappir (lápis-lazúli, # 6209); -> pi(dâ (crisólito, # 7077); i ebô (pedra preciosa, # 8648); sõham I (pedra preciosa, # 8732); sãmir II (esmeril, diamante?, # 9032); -> sêí II (alabastro, # 9253); tars/í II (pedra preciosa, # 9577) 166
D&tf (# 9037)
Jóias, adornos: hali I (adomo, jóia, # 2717); -> harúzim (colar de conchas, # 3016); tabba 'a! (anel, #3192); -> kúmãz (adomo, # 3921); -> misbesôt (engastes, # 5401); nezem (anel, # 5690); ne(i(i)pâ (brinco, # 5755); -> 'ãgil (brinco?, # 6316); ‘dh II (adomar-se, # 6335); -> ‘As (retinir, # 6576); ‘«<7 (colocar um colar, # 6735); pCnintm (corais, pérolas, # 7165); sawwãrón (colar, # 7454); -> sãmíd I (pulseira, # 7543); $e ‘ãdâ (tomozeleiras, # 7577); rãbid(colar, # 8054); saharôntm (crescentes [em forma de meia-lua], # 8448); sãò/í (adomo, # 8667); -> sêr (pulseira, # 9217); rôr (pendente, # 9366) B ib l io g r a f ia
7£>5 2:898-905; AS'fi£ 4:623-30; M£W7T3:395-98; J. S. Harris, “An Introduction to the Study of Personal Omamments, o f Precious, Semi-Precious and Imitation Stones Used Throughout Biblical History,” ALUOS 4, 1962, 49-83; L. Koehler, “Hebrãische Vokabeln II,” ZAW 55, 1937, 161-74; H. Quiring, “Die Edelsteine im Amtsschilddesjudischen Hohenpriesters und die Herkunft ihrer Namen,” AGM 38, 1954, 193-213; W. Zimmerli, Ezekiel 25-48, 1983, 82-84. Andrew E. Hill
Onw (Smm), q. estar desolado, deserto, devastar, estre mecer, ficar horrorizado; ni. ser desolado, ser transfor mado em deserto, ser levado a estremecer, ficar horrorizado; pol. amedrontado, desolador = destruidor; hi. que foi transformado em deserto, que foi desolado; ho. desolação; hitp. conster nação, torpor (# 9037); (meSammâ) subs. terror, horror, devastação, desolação ( # 5457); rtSU)1(Sammá I), subs. lugar desolado, deserto, horror, ruína ( # 9014); DÇ3U7 (sãmêm), subs. lugar desolado, lugar desabitado (# 9038); nnOtt? (semãmâ), subs. lugar desolado, deser to ( -^ # 9039); p o a i? (Simmãmôri), horror, estremecimento, desespero ( # 9041). 9037
OMA O verbo smm é atestado esparsamente em outras línguas sem. O acad. Samãmu, para lisar, entorpecer, aleijar, é encontrado em vários textos médicos acad. (CAD, S / 17:295; AHw, 1154). Ocorre lx no ugar. (KTU, 1.3.1.13); enquanto alguns consideram o termo como sen do o vb. smm, maravilhar-se ( WUS, 2631; cf. tremer, estremecer em F. Stolz, Funktionen und Leistungen des Mythos, 1982, 92), outros consideram-no um subs., céu (CML, 46: mt.smm, lit. homens do céu = homens poderosos). As evidências pún. não são claras quanto a smm, es tar perturbado, transtornado (?), que ocorre lx (DNWSI, 1163; porém, cf. J. J. Gluck & M. G. Maurach, “Ounisch in plautinischer Metrik”, Semitics 2, 1971-72, 125). AT 1 .0 vb. smm é encontrado c. 91x no AT (c. 36x. no q. [considerando sõmêm em Dn 8.13; 9.27b; 12.11 como um part. q.], 25x no ni., 17x no hi., 5x no hitp., 4x no po., e 4x no ho.), predominantemente nos textos proféticos (62x; sendo 25x em Ez.; 1lx em Jr.; lOx em Is.; 9x em Dn.; 2x em Am.; lx em cada um dos seguintes: Os., JI., Mc.; Sf., Zc e 6 x em Lm.). Algu mas dessas ocorrências foram contestadas (p. ex., Nm 21.30; Sl 40.15 [16]; Jó 16.7) e várias outras foram propostas (p. ex., 2Rs 8.11; Is 62.4; Na 1.14; cf. HALAT). No entanto, nenhuma dessas sugestões é particularmente convincente. 2. Tomando por base evidências das versões e da linguagem sem. histórica, alguns tudiosos sugerem que em certos casos, ysm e sm ( # 870) são formas secundárias de smm e que as três formas são derivadas de um radical com duas consoantes — Sm (ver G. R. Driver, “Confused Hebrew Roots,” 1936, 75-78; idem, Problems, 1936,3-8). É bem possível que este seja o caso em Ezequiel 6 .6 : “as cidades serão destruídas [tiSân^nâ; < vi/w], e os altos ficarão 167
DOT (# 9037)
desolados, para que os vossos altares sejam destruídos e arruinados [wey e ’semú\ < ’i»w]” (no caso deste último, pode se tratar de um erro textual; cf. W. Zimmerli, Ezekiel /, 1979, 179 n. 6 b); Joel 1.18; “também os rebanhos de ovelhas estão perecendo [ne 'sãmir, < ’.v/w]” (ver D. Stuart, Hosea-Jonah, 1987, 239; cf., porém, TDOT 1:435); e talvez ainda o Salmo 34.21-22 [22-23J (ver P. Craigie, Psalms 1-50, 1983, 277). Essa mesma interpretação de 'sm também foi proposta para Isaías 24.6; Oséias 5.15; 10.2 e 13.16 [14.1], apesar de esses casos não fica rem tão claros (ver F. I. Andersen e D. N. Freedman, Hosea, 1980; sobre Os 13.16 [14.1], cf. Stuart, 199, 208). 3. O vb. smm ocorre diversas vezes (c. 55x) com o sentido de sofrer destruição, tendo como implicação, ficar desabitado e abandonado, em várias ocasiões, como conseqüência do julgamento e/ou da ação de inimigos. Em termos semânticos, fica mais próximo do vb. hrb I, secar, estar em ruínas, ser devastado (HALAT, # 2990; # 2992) junto do qual é encontrado com freqüência (Is 61.4; Jr 33.10; E z29.12; 30.7; 36.35; Am 7.9; Sf3.6). Quando smm refere-se à ação do inimigo, costuma ser traduzido como assolar, devastar (Nm 2 1.30; SI 79.7; Jr 10.25; Os 2.12 [14]). No entanto, é usado com mais freqüência para descrever o estado resultante de ruína ou destruição e, nesse caso, é traduzido como estar deserto, estar desolado, estar em ruí nas. Desse modo, é empregado para descrever o julgamento de Deus sobre Israel e o estado subseqüente de desolação do povo (Jr 12.11; Ez 6.4; 25.3; 33.28; 35.12, 15; Am 7.9; Mq 6.13); as portas de Jerusalém e do Monte Sião estão desoladas por causa do julgamento de Deus (Lm 1.4; 5.18). Depois que Javé dispersou Israel, “a terra foi assolada atrás deles, de sorte que nin guém passava por ela, nem voltava” (Zc 7.14). O julgamento de Israel se deveu ao fato de o povo haver rompido a aliança e, desse modo, ter sofrido as maldições da alianças registradas em Levítico 26 (cf. Lv 26.22, 31, 34, 35,43; ver Stuart, xxxvi). Pode-se encontrar um uso se melhante na referência à assolação de nações estrangeiras (Sf 3.6), esp. nos oráculos contra as nações estrangeiras em Jeremias e Ezequiel (Jr 49.20; 50.45; Ez 29.12; 30.12, 14; 32.15). 4. O vb. smm também ocorre nos livros proféticos em contextos de esperança: as cida des arruinadas de Israel serão reconstruídas (Am 9.14); sons de júbilo e alegria voltarão a ecoar nas cidades abandonadas de Judá e nas ruas de Jerusalém (Jr 33.10-11; cf. Is 61.4); o Servo do Senhor restaurará a terra de Israel e repartirá suas heranças assoladas (Is 49.8). Ezequiel apre senta uma imagem particularmente bela da restauração de Israel: no dia em que Javé purificar Israel dos pecados, a terra desolada se transformará num lugar como o jardim do Éden a fim de que as nações ao redor saibam que Javé reconstruiu aquilo que havia destruído e replantou aquilo que estava abandonado (Ez 36.34-36). Isso ressalta que fazia parte das prerrogativas de Javé, na aliança, castigar e restaurar seu povo desviado e que, em última análise, Javé foi o responsável pelo castigo e restauração de Israel, mesmo que tivesse realizado isso usando como instrumentos nações como a Babilônia ou Pérsia. 5 .0 termo smm ocorre 8 x com um referente humano, como uma extensão figurativa sentido concreto de estar desabitada e abandonada (ver seção 3). O autor de Lamentações des creve a si mesmo como uma pessoa que representa a cidade e que foi feita “assolada e enferma todo o dia” (Lm 1.13; cf. 3.11) e seus filhos como “desolados, porque prevaleceu o inimigo” (Lm 1.16; cf. 4.5). Semelhantemente, Jó lamenta-se dizendo: “tu, ó Deus, destruíste a minha família toda” (Jó 16.7; cf., porém, D. Clines, Joh 1-20, 1989,367, 370). Em dois casos, faz-se referência a mulheres desoladas. Depois de ser estuprada pelo irmão Amnom, Tamar é descri ta vivendo na casa de Absalão, outro irmão dela, como uma mulher desolada (Sõmêmâ; 2Sm 13.20). Isso significa, evidentemente, que ela continuou solteira e sem filhos (cf. Is 54.1, em que smm é par. a lõ 'yãlãdâ, mulher estéril e pishi rinnâ, aquela que nunca esteve em trabalho de parto e contrasta com be 'íilâ, mulher casada; cf. também Is 62.4). 168
□Dtp (# 9037)
6 . Em Daniel, Smm ocorre 4x com referência à happesa ‘ Sõmêm, transgressão assoladora (Dn 8.13) ou à Siqqús sõmêm, abominação desoladora (Dn 12.11; meSõmêm em Dn 9.21; 11.31). Tais referências sâo denúncias veladas — porém mordazes — contra Antíoco IV Epífanes, que interrompeu os sacrifícios sistemáticos no templo de Jerusalém e, em seu lugar, colocou uma “abominação desoladora”, normalmente interpretada como sendo um ídolo, um altar ou sacrifício pagão (cf. 1 Mac 1.54; 4.23; 2 Mac 6.5; ver J. Lust, “Cult and Sacrifíce in Daniel: The Tamid and the Abomination o f Desolation,” in Ritual and Sacrifíce in theAncient Near Easl, 1993, 238-99). A expressão em si é um trocadilho depreciativo do epíteto ba 'al Sõmêm, Senhor dos céus (G: Zeus Olympios), ao qual Antíoco IV consagrou o templo de Je rusalém (2 Mac. 6.2). A substituição de b a a l, Senhor, por Siqqüs, abominação (ou happeSa, transgressão), apresenta uma avaliação negativa dessas inovações religiosas, enquanto a troca de Sãmêm, céus, por Sõmêm, assoladora, indica o efeito da inovação sobre o templo, ou seja, da presença que transforma o templo num lugar desolado, impróprio para a adoração (J. Goldingay, Daniel, 1987, 212). Em Daniel 9.27, diz-se que “sobre a asa das abominações virá o assolador,” ‘al kÇnap. E bem provável que se trate de uma alusão aos chifres em forma de asa nos cantos no altar. Esse uso de kãnãp pode indicar ainda outra paródia, dessa vez com o título de Baal, ba ‘al kãnãp, Senho da asa (Goldingay, Daniel, 263). 7. O vb. Smm ocorre c. 28x denotando o sentido de repugnância ou espanto diante dos resultados do julgamento e / ou desolação divinos (a origem da sensação de repugnância ou as sombro é marcada com freqüência pela preposição 7; cf. Lv 26.32; Jó 17.8; Is 52.14; Jr 50.13; Ez 26.16; 27.35; 28.19; 32.10; Dn 8.27). Essa relação fica clara em Levítico 26.32: “Assolarei [wahaSimmõtí] a terra, e se espantarão 'ãlêhã] disso os vossos inimigos que nela morarem”. Assim, dependendo da natureza da reação à desolação, o termo pode ser traduzido como assustado, pasmo, assombrado, estupefato ou mesmo horrorizado. O vb. é encontrado em par. com assobiar (lR s 9.8; Jr 18.16; 19.8; 49.17; 50.13; # 9239); s ‘r, estremecer (Jr 2.12; Ez 32.10; -> # 8547); hrd, estremecer (Ez 26.16; # 3006); tmh, ficar pasmado (Jr 4.9; -> # 9449); nwd, balançar, ou seja, a cabeça (Jr 18.16; -> # 5653) e ’ãhazíi s ã ‘ar, ser tomado de horror (Jó 18.20). Na maioria das vezes, esse horror é resultante da infelicidade de outros; p. ex., aqueles que passarem pela cidade desolada de Jerusalém ficarão espantados e assobiarão por causa de todas as suas pragas (Jr 19.8; cf. lRs 9.8 || 2Cr 7.21 [com referência ao templo]; Jr 49.17 [com referência a Edom]; 50.13 [com referência à Babilônia]) e muitos ficarão pasmos com a aparência do servo de Javé (Is 52.14). No entanto, em certas ocasiões o termo é usado para expressar aversão a si mesmo (SI 40.15 [16]; 143.4). Por vezes, fica implícita uma certa sur presa: os céus devem espantar-se diante do fato de Israel haver trocado seus deuses (Jr 2.1112; cf. Is 59.16; 63.5), bem como um certo grau de confusão (Dn 4.19 [16]; 8.27, || ’ên mêbin, não entender). O termo também faz parte de um ritual de lamento, como aquele descrito em Esdras 9.3-4, em que, ao receber a notícia de que os israelitas estavam se casando com pessoas das nações vizinhas, Esdras rasgou as vestes, arrancou alguns cabelos e assentou-se atônito (cf. Ez 26.16; ver Williamson, Ezra, Nehemiah, 1985, 132-33). Nem sempre é fácil diferen ciar esse uso daquele na seção 3 acima; p. ex., em I Samuel 5.6, não fica claro se os filisteus estão aterrorizados ou desolados por causa do que ocorreu depois que capturaram a arca (cf. Jr 49.20; 50.45; Ez 20.26).
P-B O vb. Smm e seus derivados são encontrados c. 20x em MSs não bíblicos de Qumran. O verbo ocorre um total de 10x(4xem lQHa; 3x em CD-A; lx em cada um — 4QFlor; 6 QD; e 4QapocrJoséè). Todas essas ocorrências são concordes com o uso bíblico; p. ex., a ira de 169
IDtf (# 9042)
Deus inflamou-se contra a congregação do Enganador [ 'ys hlçwn] de modo que Deus devastou [lhsm\ toda a multidão pela apostasia dela (CD-A 2.1; cf. 3.10; 5.21). Em ÍQH *7 15[7]:3 ocorre entre os “Cânticos do Mestre” para descrever o horror [Ihsm] do mestre diante das conspirações perversas, uma vez que Belial se manifesta nelas. NT A “abominação desoladora” (to bdelygma tês erêmõseõs\ Dn 12.11 [LXX], com varia ções em 9.27; 11.31) pode ser encontrada em Mateus 24.15 e Marcos 13.14 com referência ao anticristo (porém -> NIDNTT 1:74-75). Lucas 21.20, por outro lado, relaciona a abominação à destruição de Jerusalém pelos romanos em 70 d. C. (ver T N T 197-99). Deserto, ermo, terra assolada: -> bõhü (vazio, # 983); -¥ bqq I (assolar, ser agitado, # 1327); horbâ (ruína, devastação, # 2999); -> y^simôn (ermo, devastação, # 3810); -> midbãr I (ermo, # 4497); -> 'arãbâ III (estepe, # 6858); -> ^ h íh á (terra ressecada, # 7461); -> fiyyâ (deserto, # 7480); -> s ’h I (destruir, desolar, # 8615); smm (ficar desolado, deserto, assolar, estremecer, ficar horrorizado, # 9037); -> Deserto: Teologia. Desolação: hrb I (ser seco ou desolado, arruinado, # 2990); s 'h I (devastar, transformar algo em deserto, # 8615); smm (ser desolado, despovoado, devastar, estremecer, ficar hor rorizado, # 9037) Horror, estremecimento, terror: b 't (ser tomado de terror súbito, estupefato, ficar aterrori zado, atacar, # 1286); -> gwr II (temer algo, ter grande receiro, ficar amedrontado, # 1593); -> htt (ser abalado, aterrorizado, assustar, aterrorizar, # 3169); smr (estremecer, ficar arrepiado, eriçar, # 6169); -> plf> (estremecer, agitar, tremer, # 7145); -> í ‘r I (temer, ficar aterrorizado, eriçado de horror, # 8547); -> sammâ I (horror, estremecimento, deserto, #9014) B ib l io g r a f ia
TDNTX :598-600; THAT 2:970-74; 7W4F 8:241-51; TWOT 2:92,6-7,1 \ G. R. Driver, “Confused Hebrew Roots,” Occident and Orient, 1936, 75-78; idem, Problems fo the Hebrew Ver bal System, 1936, 3-8; J. V. K. Wilson, “Hebrew and Akkadian Philological Notes,” JSS 6-7, 1961-62, 173-83. Tyler F. Williams 9038 (sãmêm, desolado, desabitado), -> # 9037 9039 (semãmâ, ermo, deserto),
#9014
9041 (simmãmôn, horror, estremecimento),
# 9014
■p® (s/wh I), vb. denom. q. ser obeso; hi. tomar[-se] (# 9042); subs. IÇtpD (mismãn) obesidade, pessoas emi nente, terras ricas (# 5458); D,3DÇ,0 (masmannim) comida seleta (# 5460); (semen) óleo (# 9043); TP®' (sãmên), gordura (# 9045). 9042
IDtf
OMA Ar. samn; acad. samnu; fen. smn; ugar. smn. AT 1. Derivado da oliveira (zayit, # 2339), Semen era um alimento básico e um produto importante nos tempos do AT. a. Dentre três subs. para óleo no AT (yiçhãr, -> # 3658; mishâ. 170
lo tf (# 9042)
# 5418), Semen é o mais usado e é parte da dieta básica ao longo de todo o período do AT (Dt 8 .8 ; Ez 16.19; Os 2.5 [7], cf. vv. 8 [10], 22 [24], em que é usado yishãr, Ag 2.12). No Sl 109.24 (“De tanto jejuar, os joelhos me vacilam, e de magreza vai mirrando a minha came”), mi.tfôm (de tanto jejuar) é par. a miSSemen (lit., de gordura/óleo; magreza). No primeiro caso, o elemento mi- (de tanto) significa “por causa de”, no segundo caso, “por falta de” (de acordo com Jerônimo, corretamente, absque oleo, apesar de a Vg. apresentar propter oleoum e a LXX di elaiorí). Assim, no heb. o texto diz, “Minha came emagrece pela falta de gordura corporal ou óleo”. Não se sabe ao certo qual dos dois é considerado em falta. O primeiro (gordura corporal) é um tanto pleonástico e forma um par. menos satisfatório com fome do que o segundo (óleo). Por outro lado, J. Milgrom (Leviticus AB 3,1991,205) vê nesse caso uma possível ligação com o termo rab. Sümãn, a gordura entretecida com os músculos. O significado preferido — óleo/ alimento — apresenta Semen em seu sentido ampliado referindo-se à plenitude física (Sl 45.7 [8 ]) ou mental (Is 61.3), à prosperidade (Jó 29.6) e ao recebimento de honra (Dt 33.24; cf. Lc 7.36-38). b. Semen podia constituir parte do tributo político de uma nação (Os 12.1 [2], L. K. D ler) e era comercializado no mercado internacional (Ez 27.17). Era usado para fins medicinais (p. ex., Is 1.6; cf. Lc 10.34), como ungüento (p. ex., Pv 27.9; Ct 1.3; Ez 16.9; Am 6 .6 ) e para manter o couro macio e maleável (2Sm 1.21). Derramar óleo era um sinal de hospitalidade e honra (p. ex. Sl 23.5; 133.2; cf. Lc 7.46). 2. O adj. Sãmên (# 9045) é usado para comidas substanciosas (Gn 49.20. Is 25.6) ou para solo rico ou fértil (Nm 13.20; lCr4.40; Nm 9.25,35; Is 5.1; 28.1,4; Ez 34.14) e para ho mens robustos (Jz 3.29). Em Ezequiel 34.16, adquire um sentido pejorativo (pimâ, # 7089) pois Deus diz que destruirá as ovelhas gordas e fortes de seu rebanho. Trata-se de uma alu são aos guardiões opressores de seu povo. São lembrados de que também encontram-se sob a autoridade de Deus e que sua busca passada pelo próprio prazer será confrontada pela futura repreensão divina. Em Habacuque 1.16 um julgamento semelhante é o que espera aqueles que se orgulham de tomar para si a mais rica comida por meio da opressão. 3. Os subs. miSmãn (# 5458); (Gn 27.28, 39; Sl 78.31; Is 10.16; 17.4; Dn 11.24) e maSmannim (Nm 8 .10) são empregados como adj. para denotar perfeição naquilo que está sendo levado em consideração na ocasião. Daí seu uso em Is 10.16 (guerreiros seletos) e Daniel 11.24 (terras mais férteis da província). Todos esses contextos, exceto Gênesis 27.28 e Neemias 8 .10, referem-se à desesperança vindoura para aqueles aos quais as palavras são dirigidas. 4. No q., smn (# 9042) tem um sentido desfavorável, denotando torpeza moral resultante do excesso de riqueza (Dt 32.15 [bis, engordou-se, engrossou-se]; Jr 5.28). M. Weinfeld (281, 2) encontra a origem desse tema no OMA em geral. No hi. o termo transmite um sentido desfavorável em Isaías 6 .10, mas é empregado de modo positivo em Neemias 9.25. Em Isaías 6.9-13 Deus instrui seu profeta: “toma insensível [lit. “engorda] o coração deste povo”. Ao dizer-lhes verdades que não estavam dispostos a ou vir, Isaías tomaria o coração do povo insensível e assim o prepararia para o julgamento que era a única esperança de salvação para a nação. O Trg. usa PpaS, ser recoberto de gordura, ser obstinado. Jesus condenou alguns de seus ouvintes por meio de suas parábolas (de acordo com Mc 4.12 e par. nos sinópticos) e de seus sinais (de acordo com Jo 12.39-41), como também o fez Paulo (At 28.23,28) por meio de sua pregação sobre o reino (Cranfield, 154-58; Bruce, 6 6 67; Tumer, 47-60). Neemias (Ne 9.25) recorda como os primeiros israelitas a tomarem posse da terra engordaram e mostraram-se gratos pela prosperidade que encontraram em Canaã. O vb. e seus cognatos têm como antônimos palavras do grupo rzh, definhar ( # 8135). Há uma sobreposição semântica entre Semen e desen ( -> # 2016). O significado de 171
19# (# 9044)
íemen está incluso no significado de biryâ, seleto, gordo (Ez 34.20; cf. vv. 16) e é par. a beri ’â, Habacuque 1.16 ( -> bãri ’, # 1374). semen é usado juntamente com vários vbs., inclusive bll, dsn, msh,y$q, ryq. 5. Sacerdotes (Êx 29.4-9; Lv 8.12-13) e reis (ISm 10.1; lRs 1.38, 39; 2Rs 9.1-3; SI 89.20 [21]) eram ungidos com óleo. Também era possível ungir objetos (Gn 28.18-22; 35.1315; Êx 30.22-29; Lv 8 .10-11), sendo que tal unção dependia do propósito dado a esses objetos (Js 4.1-9; 24.26; ISm 7.12; cf. Graesser, 34-63). Os reis e sumo sacerdotes usavam uma coroa como sinal da unção que haviam rece bido. O termo usado para coroa é nêzer ( -> # 5694), relacionado ao vb. nzr, consagrar ( # 5692). A unção separava a pessoa ou objeto para o serviço de Deus e perfazia seu ingresso no serviço para o qual havia sido designada. Essa unção dava ao sacerdote a autoridade para realizar o serviço sagrado e liberdade de manusear objetos sagrados sem entrar indevidamente na esfera divina. É possível que o sumo sacerdote só fosse ungido no período posterior ao exílio (de acordo com Vaux, 347, 399-400; no entanto, uma possível data anterior ao exílio para S volta a deixar essa questão em aberto [Milgrom, 13-35]). Os reis eram ungidos para governar Israel estando, porém, sob a autoridade maior de Deus. Por vezes, a presença do Espírito é associada à unção com óleo (ISm 10.1-7; 16.13; Is 61.1-3; Anclsr. 102-7, 397-403). No caso dos profetas, o termo unção é usado de modo meta fórico (Is 61.1), provavelmente devido à ênfase sobre o fato dos profetas serem possuídos pelo Espírito de Deus. O caso de Eliseu é sui generis no AT (1 Rs 19.16). Diz-se que, em seu papel profético, a nação toda é ungida ( lCr 16.19.22). A palavra heb. (mãsiah Messias, O Ungido) passou a ser uma referência ao Aquele que seria o maior de todos os ungidos, cuja vinda traria uma nova era para o povo de Deus (Is 40— 55). G ordura, comida gordurosa, óleo: -> ’bs (engordar, # 80); b r ’ II (engordar-se, # 1344); -> dsn I (tomar-se obeso, # 2014); hêleb I (gordura, # 2693); -> mhh III (cevado, # 4683); -> merV (cevado # 5309); -> peder (gordura, # 7022); -> pimâ (gordura, # 7089); -> smn I (ser obeso, # 9042). B ib l io g r a f ia
F. F. Bruce, The Books and the Parchments, 19713; C. E. B. Cranfield, Mark, CGTC, 1963; K. Deller, "Smm bll (Hosea 12, 2). Additional Evidence,” Bib 46, 1965, 349-52; C. F. Graesser, “Standing Stones in Ancient Palestine,” BA 35, 1972, 34-63; J. Milgrom, Leviticus 1-16, AB 3, 1991; N. Tumer, Grammatical Insights into the New Testament, 1965; R. de Vaux, Anclsr, 1961; M. Weinfeld, Deuteronomy and the Deuteronomic School, 1992; H. J. Zobel, “Der Bildliche Gebrauch von smn im Ugaritischen und Hebrãischen,” ZAW 82, 1970, 209-15. Robert J. Way 9043 (semen, óleo), -> # 9042
9044
1» #
]!?# (saman), subs. campo fértil (# 9044).
OMA Ugar. smn, óleo AT As duas ocorrências do subs. sãmãn encontram-se no pronunciamento de bênçãos abundantes de Isaque sobre Jacó e em suas palavras de agonia sobre Esaú. Apesar de sãmãn 172
ngbxp (# 9046)
ser derivado de semen ( # 9043), óleo, a maioria dos comentaristas considera o termo uma referência à fertilidade da terra (ver abaixo). A palavra de bênção proferida por Isaque sobre Jacó e sua descrição do futuro infeliz de Esaú são semelhantes. Os dois elementos em comum encontrados em cada uma das declarações são relacionados a uma bênção do cultivo da terra (Gn 27.28, 39) e ao exercício de domínio (Gn 27.29,40). A primeira parte da declaração de Isaque a Jacó e Esaú traz as expressões mitíal hassãmayim, do orvalho do céu e mismannê hã ares, da sãmãn da terra. No entanto, há duas diferenças-chave entre essas duas declarações. Em primeiro lugar, a preposição min, de[do], que parece na introdução do v. 28 é partitiva (“Deus te dê do...” ) enquanto o min correspondente no v. 39 exprime privação (“longe dos...”; ver exemplos de min privativo em ISm 15.23; Is 7.8; 17.1; Jr 48.2,42). Enquanto Jacó se servirá da riqueza das bênçãos, Esaú será mantido afastado dessas mesmas bênçãos. Com um coração pesaroso, Isaías condena Esaú a uma existência er rante. Em segundo lugar, a inversão na ordem dessas duas expressões se intensifica em termos retóricos como a sorte de Esaú será oposta à de Jacó. A que tipo de bênçãos essas orações se referem? A maioria dos comentaristas cita uma bênção dupla de chuva em abundância e colheita farta que tal chuva proveria (p. ex., Wenham, 209; Westermann, 441; Sarna, 193). O mesmo par de expressões ocorre na literatura ugar. (KTU 1.3.11:38-39), em que a deusa Anat “pegou água na concha de sua mão e banhou[-se], o orvalho do céu [e] o óleo da terra” (smn 'rs\ CMl, 48; cf. Gevirtz, 36). No contexto ugar., as duas expressões significam água. Em outra passagem ugar. (KTU 1.6.111:6-7) em que smn está relacionado com os céus, a expressão também significa água: “Os céus farão chover óleo (smn), mel correrá das ravinas” (CML, 77). Conseqüentemente, as duas expressões em Gênesis 27.28,39 parecem significar chuva no sentido imediato (cf. Zobel, 212-15), um fenômeno que produz colheitas abundantes (Gn 27.28c, “fartura de trigo e de mosto”; cf. Dt 7.13; 28.51; 33.28; 2Rs 18.32; Os 7.14; J1 1.10). Campo, terreno, área rural: -> adãm IV (terreno, # 135); -> bar IV (terreno descampado, não cultivado, # 1340); -> gãzêr (terra estéril, # 1620); -> húsôt (campos abertos, # 2575a); yãgêb (campo, # 3321); melêhâ (terra improdutiva, planície de sal, # 4877); -> mimsãq (terreno tomado de ervas daninhas, # 4940); me ‘ãrâ II (campo descoberto, #5118); -> nír II (terreno recém-desbastado e limpo, # 5776); -> ‘ãqob (terreno [acidentado e esburacado], coração astucioso, # 6815); -> f^rãzôn (campo fértil, # 7251 );-> rekes (terreno acidentado, # 8221); sãdeh (terreno descampado, campo aberto, campos, propriedade, # 8441); sedêmâ (terraço, # 8727); -> Sãmãn (campo fértil, # 9044) B ib l io g r a f ia
TUA T 8:251-55; S. Gevirtz, Patterns in the Early Poetry o f Israel, 1963; N. Sarna, Genesis, 1989; G. Wenham, Genesis 16-50, WBC, 1994; C. Westermann, Genesis 12-36,1985;H. Zobel, “Der bildliche Gebrauch von smn im Ugaritischen and Hebrãischen,” Z A W 82, 1970, 209-16. MichaelA. Grisanti 9045 (sãmên, gordura), -> # 9042
rubip (semõneh), subs. oito (número cardinal) (# 9046); 'r o í p (seminí), adj. oitavo (número ordinal) (# 9029). AT 1. Em várias ocasiões, atos rituais ocorrem no oitavo dia, mas isso se dá em relação a um período antecedente de sete dias (Lv 9.1; Ez 43.27). É possível que outros rituais do oitavo 173
y&tf (# 9048)
dia tenham como intenção deixar passar o período de maior impureza correspondente a sete dias (circuncisão, Gn 17.12; Lv 12.3; os sacrifícios de um nazireu contaminado, Nm 6.10). O oitavo dia da Festa de Tabemáculos constitui um festival solene de encerramento ( -> 'açeret, # 6809) (Lv 23.36); Nm 29.35), no qual não se deve realizar trabalho algum. Em 1 Reis 8 .6 6 , Salomão manda o povo para casa no oitavo dia, ainda que 2 Crônicas 7.9-10 registre que Sa lomão tenha dado continuidade ao festival no oitavo dia. Um animal primogênito podia ser sacrificado a partir do oitavo dia (Lv 22.27). Os oito degraus para o átrio interior do templo de Ezequiel (Ez 40.31) são parte de uma ascensão gradativa até o santuário mais interno (sete degraus, 40.22; dez degraus, ao emendar-se 40.49; cf. W. Zimmerli, Ezekiel II, 344). 2. Oitenta é mais do que a boa expectativa média de vida — setenta anos — e, portan é também uma idade madura particularmente avançada (2Sm 19.32 [33]; 35 [36]; SI 90.10). A vida de Moisés é dividida em segmentos de quarenta anos, sendo que Moisés apresentou-se diante de Faraó aos oitenta anos (Êx 7.7). P-B São raras as ocorrências do número oito na LQ e o mesmo possui pouco significado teológico independente. NT
No NT observa-se que Jesus é circuncidado no oitavo dia (Lc 1.59).
Números: 'ehãd (um, # 285); -> ’elep II (milhar, contingente militar, # 547); ‘arba‘ (quatro, # 752); -> hãmês (cinco, # 2822); -> mê'à I (cem, # 4395); ‘eser (dez, # 6924); -> r^bãbâ (dez mil, miríade, # 8047 / 8052); -> seba' I (sete, # 8679); -> sãlõs, seIõsá (três, um grupo de três, # 8993); á®mõneh (oito, # 9046); -> senayim (dois, # 9109); -> sês I (seis, # 9252); têsa4(nove, # 9596) Numeração, contagem: -> kss (calcular, repartir, # 4082); -> mnh (contar, # 4948); -> spr I (contar, numerar, calcular, repetir, # 6218); pqd (numerar, determinar, #7212) B ib l io g r a f ia
NIDNTT2.692-, Jastrow 2:1548. P. P. Jenson
27nw (sm ‘), q. escutar, ouvir, dar ouvidos a, prestar aten_______________________________ ção, perceber, compreender, atender, obedecer, conceder, examinar (legal); ni. ser escutado, obediente, concedido; pi. convocar; hi. fazer alguém escutar, proclamar, anunciar, convocar, soar alto (música) (# 9048); ni Vípufrl (haSmã ‘üt), comunicação (hapleg.; # 2245); (mismã ‘ I), boato, rumor (hapleg.; # 5461); n (misma at), guarda-costas, súditos (# 5463); nyiQtÇ1’(SPmú‘á), notícia, relato, mensagem (# 9019); subs. Vtpp (sem a' I), som (hapleg. cf. HALAT 1455; -> # 9049); VúXÓ (sêma % notícia, relato, boato, rumor (# 9051); VD® (sõm a'), relato, fama (# 9053). OMA O vb. com seus diversos sentidos é comum nas línguas sem. (ver HALAT 1452). AT 1 .0 significado principal de sm ' é escutar sons com o ouvido. Nos casos em que são ouvidas palavras, deixa implícito o envolvimento da mente, passando a ter o sentido de escutar (Gn 18.10). 174
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a. Nos livros proféticos (esp. Jeremias), escutar sons é um tema que se repete nas descri ções de julgamento por meio de desastres militares. O resfolegar de cavalos (Jr 8.16), o som de trombetas e o alarido da batalha (Jr 4.19, 21) sinalizam a chegada do inimigo e causam terror. O caráter extremo do julgamento é retratado em termos de escutar os clamores de angústia, medo e lamento (Jr 3.21; 4.31; 30.5), juntamente com uma ausência dos sons da vida diária (Jr 9.10 [9]; cf. 7.34; 25.10; Ez 26.13; Na 2.13 [14]). Com a restauração de Israel ocorre uma inversão no que se ouve: não há mais ruídos de violência, desolação e destruição (Is 60.18) nem de choro (Is 65.19), mas volta a se ouvir os sons da vida diária e as ações de graças (Jr 33.10-11; cf. Ne 12.43). b. No contexto das teofanias, ouvir trovões corresponde a ouvir a voz majestosa de Deus (Is 30.30). A revelação de Deus na tempestade é explicada com talento didático por Eliú: “dai ouvidos ao trovão de Deus” (Jó 37.2), pois se trata de uma das maravilhas de Deus (v. 14) que vai além da compreensão humana (v. 5) e que deve conduzir o homem ao reconhecimento da obra divina (v. 7) e ao temor do Senhor (v. 24). Por outro lado, a revelação de Deus nos céus por meio da sucessão dos dias e noites é inaudível: “deles não se ouve nenhum som” (SI 19.3 [4]; ver HALAT 1454-55; Craigie, 177-81). ( Teofania: Teologia) c. O ato físico de ouvir Deus falar a Israel é assunto para a reflexão teológica encontrada em Deuteronômio 4— 5. Israel ouviu Deus proferir as palavras dos dez mandamentos do meio do fogo (Dt 4 .10-13, 36; 5.22), causando espanto por ainda estarem vivos e temor de que mor reriam se Deus continuasse a lhes falar (Dt 5.24-26; cf. 4.33). Essa idéia forma um par. com a concepção mais comum de que não se pode ver Deus e sobreviver (Gn 32.30 [31 ]; Ex 33.20. Assim, o povo pediu a Moisés que ouvisse por ele (Dt 5.27). Em Deuteronômio 4.33-39, essa experiência é colocada no mesmo nível do êxodo e diz-se que o objetivo dela é ensinar Israel que Javé é o único Deus (v. 35; cf. v. 39), que dirigiu-se diretamente apenas a Israel como um sinal de sua eleição (v. 37). O fato de haver-se ouvido uma voz sem se ver uma forma reforça o segundo mandamento (Dt 4.15-19). d. O relato acima também propõe uma base teológica para a revelação da palavra de Deus a Israel por meio de seus porta-vozes escolhidos, esp. os profetas. A promessa em Deu teronômio 18.15-16 de que Deus suscitaria um profeta semelhante a Moisés remete ao pedi do de Israel por um mediador em Deuteronômio 5.27. Semelhantemente, os profetas ocupam uma posição privilegiada como ouvintes e mediadores da palavra de Deus: Ezequiel recebe a ordem, “ouvirás a palavra e os avisarás da minha parte” (Ez 3.17; 33.7; cf. Is 21.10; Jr 18.2). Porém, em Números 12.6-8, apresenta-se um contraste entre Deus falando com Moisés “face a face” (cf. Êx 33.11) e com os profetas por meio de sonhos e visões. Isso se reflete na relação próxima existente entre ouvir e ver nas revelações proféticas (Nm 24.4; Is 6 .1, 8 ; Jr 23.18; Ez 1.28). A freqüência com que a expressão do mensageiro é usada no discurso profético (“Diz o Senhor”) indica uma importância maior associada à maneira como os profetas compreendiam as palavras de Deus. 2. Além de ouvir uma comunicação direta, sm ' também é usado com o sentido de fi sabendo, ser informado de algo (Gn 21.26; 42.2). Nessa acepção, pode ser colocado num const. juntamente com os objs. substantivais sêm a' (Gn 29.13), sõm a' (Js 9.9) e sem ú‘â (1 Sm 4.19). Há várias referências a nações estrangeiras que ouviram sobre os feitos de Deus em favor de Israel. A informação de que Deus havia livrado seu povo do mar Vermelho toma as nações impotentes diante de Israel (Êx 15.14; cf. 2Cr 20.29) e leva a mulher de Jericó a confessar o Deus de Israel e esconder os espias (Js 2.10-11). Em Números 14.13-16, Moisés rogou a Deus que poupasse Israel, uma vez que as nações ouviriam o relato (sêm ar) do julgamento de Deus e seu poder seria impugnado. Esse tema se repete nos oráculos proféticos de salvação, quando 175
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mais uma vez as nações ouvirão o que Deus fez por Israel (Jr 33.9) e saberão da presença dele no meio do seu povo (Zc 8.23). Sua glória será proclamada entre as nações “que jamais ouvi ram falar de mim (sêma), nem viram a minha glória” (Is 66.19). 3. Em várias passagens, sm ' significa ouvir com atentamente, prestar atenção. Nesse sentido, o termo encontra-se disposto muitas vezes de modo par. a 'zn [hi.] (ver 'zn AT), qsb [hi.] (ver qsb AT) ou a nãfâ [hi.] 'õzen, inclinar o ouvido (Sl 45.10 [11]; Pv 22.17). Em Eze quiel 40.4, o termo é reforçado por sym lêb, pôr no coração, ou seja, a mente, em algo (ouvir com os ouvidos e notar bem, cf. 44.5). Para prestar atençã, é necessário que o ouvinte faça silêncio (Dt 27.9; Jó 29.21). a. Esse significado pode ser encontrado esp. nas convocações imperativas para escutar ou ouvir, na introdução de discursos diretos. Ocorre quando alguém dirige-se a um grupo de pessoas, casos em que serve como um pedido de atenção (Jz 9.7; lCr 28.2). No contexto do pleito divino (rib) Israel pode ser convocada a ouvir como parte acusada (Sl 50.7; cf. 81.8 [9]; Os 4.1) ou ainda, os céus e a terra podem ser convocados para ouvir como testemunhas das acusações de Deus (Is 1.2 [|| zn]; cf. Dt 32.1 [|| ’zn]; Jr 6.19; Mq 6.2). Uma vez que os céus e a terra foram testemunhas da ratificação da aliança (Dt 4.26; 30.19), podem ser chamados a testemunhar acerca da transgressão pactuai de Israel. Esse uso possui par. em tratados heteus e aram. (ver ANET, 205, 659). No âmbito profético, a convocação é. muitas vezes, apresen tada como uma proclamação formal (“Ouvi, pois, a palavra do Senhor,” Is 28.14; Jr 7.2; Ez 6.3), que também serve para definir o discurso como uma declaração oficial de Deus ou sua mensagem para Israel. b. Também pode-se encontrar uma convocação para ouvir atentamente no contexto dos ensinamentos de sabedoria (“Escuta [], pois, ... ouve-me; ... e ensinar-te-ei a sabedoria,” Jó 33.31-33), esp. nas palavras de um pai (mestre) ao filho (aluno) em Provérbios 1.8; 4.1; etc.). Serve de convocação para receber instruções — a ordem para o filho é: “ouve... e acei ta” (Pv 4.10; 19.20) — com referência ao que o pai lhe diz. Esse tipo de convocação costuma ser expressada de modo característico pelo termo sm ' par. a 'zn [hi.] (Sl 49.1 [2]; 78.1) ou qsb [hi.] (Pv 4.1; 7.24) e constitui um elemento típico na literatura de sabedoria do OMA, p. ex., o Amenemope egíp.: “Dai teus ouvidos, escutai o que é dito. Dai teu coração para compreendêlos. E proveitoso colocá-los em teu coração” (ANET, 421). Como uma introdução a oráculos proféticos, essa forma de convocação pode indicar o profeta ou o próprio Deus como mestre de Israel, instruindo o povo de várias maneiras sobre os preceitos divinos (Is 1.10 [|| ’zn], o julgamento iminente (Is 32.9 [|| ’zn); Os 5.1 [|| qsb || z«]), a necessidade de arrependimento (Jr 13.15 [|| ’z n\) e a salvação de Deus (Is 49.1 [|| qsb]; cf. 51.4 [qsb || ’zn]). c. A associação de sm ‘ com ensinamentos e aprendizado também pode ser encontrada no livro de Deuteronômio. Israel reuniu-se no monte Horebe para ouvir as palavras de Deus a fim de “aprender” a temê-lo (Dt 4.10), enquanto dessa mesma experiência nasceu o papel confiado a Moisés de “ensinar” os mandamentos de Deus a Israel (Dt 5.31). Assim, em 4.1, Moisés convoca Israel: “Ouve os estatutos e os juízos que eu vos ensino” e em 5.1, “Ouvi... os estatutos e juízos que hoje vos falo aos ouvidos” (cf. Dt 6.1-3). Também são tomadas provi dências para que a lei seja lida periodicamente na Festa dos Tabemáculos de modo que todos “ouçam e aprendam...” (Dt 31.12-13). A função instrutiva que essa passagem atribui ao culto de Israel reflete-se ainda na convocação do Salmo 34.11 [12] (cf. 49.1-4 [2-5]). 4. Tendo origem na idéia de atentar para algo, s m ' presta-se facilmente a ser usado com o sentido de entender compreender. Pode, portanto, ser associado a termos para conhe cer (do radical y d ‘) e compreender (do radical byn): p. ex., a declaração de Jó: “Meus ouvidos ouviram e entenderam Como vós o sabeis, também eu o sei” (Jó 13.1-2); ou com referência a 176
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Israel: “Acaso não sabeis? Porventura não ouvis? ... Não atentastes... ? (Is 40.21, 28; cf. 64.4 [3]). Em lRs 3.9, a expressão “um coração compreensivo [lit., que ouve]” significa uma mente perceptiva ou discemente. a. Assim, pode-se expressar o fato de Israel não entender a revelação de Deus como sua incapacidade de ouvir. Numa retrospectiva do êxodo, Deuteronômio 29.4 [3] apresenta o seguinte comentário: “porém o Senhor não vos deu coração para entender, nem olhos para ver, nem ouvidos para ouvir”. Em Isaías 6.9, é ordenado ao profeta que diga ao povo: “Ouvi, ouvi e não entedais; vede, vede, mas não percebais”. A tarefa de Isaías era entorpecer os órgãos do sentido de Israel, tomado o povo cego, surdo e ignorante, de modo que não pudessem se arre pender e ser curados (v. 10). Nessas passagens, a causa maior da inaptidão humana para ouvir sua revelação é Deus: o entendimento espiritual é uma dádiva de Deus negada a Israel, enquanto a cegueira e a surdez constituem um ato de julgamento divino. Tais julgamento, porém, con firmam a situação de cegueira e surdez de Israel em função de sua própria negação perversa a ouvir a palavra de Deus e ver suas obras (cf. Is 1.2-3; 5.12-13; 30.9). Em Jeremias 5.21, o tema aplica-se ao fato das pessoas insensatas não serem capazes de entender que Deus deve ser temi do. Em Isaías 42.20, aplica-se à inaptidão de uma Israel cega e surda de compreender o motivo do exílio. Na era da salvação, porém, Israel receberá a dádiva do entendimento espiritual: os surdos ouvirão e os cegos verão (Is 29.18; cf. 30.20-21 (29.18; cf. 30.20-21; 32.3-4). b. O termo sm ' também é usado para a compreensão de uma língua. A confusão das línguas em Babel significou que o povo não poderia mais “[entender] a linguagem de outro” (Gn 11.7; cf. Is 36.11). Uma das maldições da aliança era Deus permitir que Israel fosse ataca da por uma nação cuja língua os israelitas não compreendiam (Dt 28.49), uma ocorrência que aplica-se também à pregação profética (IS 28.11; 33.19 [|] binâ]; Jr 5.15 [|| yd']). 5. Em diversos contextos, s m ' denota dar ouvidos a, atentar ao agir em função de al ou colocar em prática aquilo que foi dito. Assim, pode ocorrer como sinônimo de 'sh, fazer (“Moisés atendeu às palavras de seu sogro e fez tudo quanto este lhe dissera,” Êx 18.24). Na neg., o termo significa ignorar, desconsiderar (1 Sm 2.25; Jr 36.25). Nos casos em que o ouvinte encontra-se sujeito à autoridade de quem fala, o termo passa a significar facilmente obedecer (os recabitas “obedecem às ordens de seus pais,” Jr 35.14). A obediência a uma pessoa costuma ser expressada pelo termo s m ' beqôl (lit., dar ouvidos à voz de alguém; Dt 21.18 [dos pais]; ISm 28.21 [do rei]; Gn 26.5 [de Deus]). Porém, os constrs. heb. com sm ' ( 'et, le, '/, beqôl, leqôí) não fazem uma distinção clara entre ouvir e fazer. Portanto, muitas vezes é difícil decidir se o termo denota, em primeiro lugar, um ouvir atento e disposto que se manifesta na obediência ou se o texto refere-se à obediência em si. a. No livro de Provérbios há vários ditados que refletem sobre a sabedoria de dar-se ou vidos ao conselho, repreensão, correção e instrução (Pv 12.15; 13.1; 15.31-32; 19.27; 25.12). O chamado do mestre para que a instrução seja recebida também pode ser reforçado por termos que enfatizam que atentar para suas palavras e aceitá-las (ver acima, 3[b]) implica praticá-las. O aprendiz deve ouvir e apegar-se (Pv 1.8; 4.1-2) a essas instruções. Na realidade, as palavras do mestre são mandamentos que o filho deve guardar (smr, Pv 4.4; 7.1 -2). Assim, a Sabedoria personificada declara sua bênção sobre aqueles que ouvem-na e guardam seus caminhos (Pv 8.32-34; cf. 1.33) em contraste com o destino daqueles que rejeitaram-na, ignoraram seu con selho e recusaram sua repreensão (Pv 1.24-25, 30; cf. 5.12-13). b. Israel deve dar ouvidos a Moisés (“o ouviremos, e o cumpriremos [ sh]," Dt 5.27), Jo sué (Js 1.16-18), aos seus juizes (Jz 2.17), profetas (Dt 18.15,19)e ao servo de Deus (Is 50.10), pois são seus líderes escolhidos por Deus e mediadores das palavras e mandamentos de Javé. A aquiescência à palavra profética é um tema importante na comissão de Ezequiel. O profeta deve 177
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declarar a palavra de Deus “quer ouçam quer deixem de ouvir” (Ez 2.5, 7; 3.11,27; cf. 33.4-5). Como era previsto (Ez 3.6-7), o povo se recusa a ouvir como deve: escutam suas palavras, “mas não as pôem por obra” ( 'sh, Ez 33.30-32). Essa omissão é resultante da recusa em ouvir a Deus (3.7) e, assim, é relacionada à rebeldia e à dureza de coração (Ez 2.5; 3.7; 12.2; 20.8). 6. Acima de tudo, Israel devia ouvir e obedecer a Deus. Em 1 Samuel 15.22, o princí bíblico da obediência é declarado de maneira categórica: “O obedecer é melhor do que o sacri ficar”. Em várias passagens, esse princípio refere-se à obediência de Israel ou de indivíduos a ordens específicas (Gn 22.18; Dt9.23; IRs 12.24). Em Isaías 1.10, 19, o ouvir e ser obediente diz respeito à resposta de Israel ao ensinamento (tôrâ) de Deus transmitido por intermédio do profeta (cf. Ag 1.12), inclusive o ensinamento durante a crise com a Assíria quanto à verdadeira fonte de segurança e descanso de Sião (Is 28.12; 30.9). A maioria das referência à obediência, porém, ocorre no contexto da aliança: obedecer a Deus é guardar (smr) sua aliança (Êx 19.5). Esse uso do termo é particularmente característico de Deuteronômio e da literatura relacionada de modo mais próximo a esse livro (esp. de Josué a Reis e em Jeremias). Assim, a obediência a Deus é muitas vezes par. à observar seus mandamentos (Dt 27.10 [ ‘íA]; 28.45 [i/m-]) e guardar sua lei (Jr 32.23 [hlk, lit. caminhar]; cf. 11.2; Dt 29.9 [8 ]. A desobediência a Deus é um ato de rebeldia e arrogância (Dt 1.43; ISm 15.23; Ne 9.29; Is 1.19-20; Jr 3.13). a. Em Deuteronômio, a obediência a Deus e aos seus mandamentos recebe um caráter programático para a história de Israel por meio da apresentação das bênçãos e maldições da aliança: “a bênção, quando cumprirdes os mandamentos ... a maldição, se não cumprirdes os mandamentos” (Dt 11.27-28; c f 28.1-2, 15; 30.17, 20). Esse princípio é empregado nos livros de Josué a Reis e aplicado de modo esquemático com o objetivo de apresentar uma explicação teológica para o exílio. Depois da morte de Josué, Israel desviou-se do caminho da obediência aos mandamentos de Deus e transgrediu sua aliança (Jz 2.17,20). Apesar dos momentos de ar rependimento e das renovações temporárias da aliança (p. ex., 1Sm 12.14-15; 2Rs 22.13; 23.3) e das pregações dos profetas, esse padrão mostrou-se predominante até que os dois reinos foram removidos por Deus em sua ira (2Rs 17.13-14, 18-20; 18.12). ( -> Teologia Deuteronômica) b. Essa teologia de desobediência e julgamento é explicada em detalhes no Livro de Jeremias. A obediência a Deus é o requisito fundamental da aliança do Sinai (“andai em todo caminho que eu vos ordeno,” Jr 7.23; “fazei tudo segundo o que vos mando,” 11.4). Disso de pendia a relação entre Deus e Israel, conforme expressado pela declaração formal da aliança (“vosso Deus... meu povo”) e, portanto, o bem-estar de Israel (Jr 7.23) e a posse da terra (Jr 11.5). A obediência dos recabitas aos seus antepassados (“e, assim, obedecemos, e tudo fizemos segundo nos ordenou,” Jr 35.10) serve de lição sobre aquilo que Deus requer e o que faltava a Israel (vv. 13-14). Deus enviou profetas repetidamente para advertir Israel para que o obe decessem, mas desde o princípio, os pais de Israel não “[deram] ouvidos" (Jr 7.25-26; 11.7-8; 17.23; 34.14). Essa atitude transforma-se em padrão para a geração do tempo do profeta (cf. Jr 9.14 [13]; 11.10). Assim como os profetas que o antecederam, Jeremias foi enviado a fim de chamar Israel para arrepender-se de seus caminhos maus e para advertir o povo das conseqüên cias “se não me derdes ouvidos [diz o Senhor]” (Jr 26.4; cf. 17.24,27; 22.4-5). Tendo em vista o julgamento que sobreveio seus pais pela desobediência (Jr 7.12-15; 26.6; cf. 11.7-8), “pode ser que ouçam e se convertam, cada um do seu mau caminho” (Jr 26.3, 13). No entanto, Israel mostrou-se capaz somente de realizar gestos calculados de obediência (Jr 34.15-17). O povo recusou-se a dar ouvidos a Jeremias (Jr 7.27; cf. 6 .10) e obedecer a Deus. Em 7.28, é apresen tada uma avaliação de sua situação: “Esta é a nação que não atende à voz do Senhor, seu Deus, e não aceita a disciplina.” Eis, portanto, sua iniqüidade e culpa (3.13,25) e a justificativa para seu castigo (Jr 9.12-13 [11-12]; 16.10-12; 40.2-3). ( -> Jeremias: Teologia) 178
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c. Depois do exílio, o tema da desobediência de Israel e sua rejeição dos profetas é tomado em novos apelos proféticos para que Israel aprenda as lições do passado e obedeça a Deus (Zc 1.4; 6.15; 7.11-13) e nas orações de confissão e súplica pela restauração de Israel (Ne 9.16-17, 29-30; Dn 9.6, 10-11, 14). 7. a. A capacidade que Deus possui de ouvir e, portanto, de agir (cf. Dn 9.19 [|| j o distingue de “deuses que são obra de mãos de homens, madeira e pedra, que não vêem nem ouvem” (Dt 4.28; SI 115.6). Em várias ocasiões, Deus responde ao que ouve castigando, p. ex., quando ouve a murmuração de seu povo no deserto (Nm 11.1; 14.27; SI 78.21) ou a satisfação maligna dos vizinhos de Israel (Ez 35.12-13; Sf 2.8; cf. 2Rs 19.4). A declaração dos perver sos de que Deus não dá atenção (byn) aos seus caminhos maus é particularmente insensata: “O que fez o ouvido, acaso, não ouvirá?... Porventura, quem repreende as nações não há de punir?” (SI 94.9-10). b. Com mais freqüência. Deus responde àquilo que ouve socorrendo e salvando. Nas narrativas sobre os patriarcas, o fato de Deus ouvir (em diferentes sentidos) é associado a dar à luz (Gn 30.6, 17,22), inclusive o nascimento de Ismael (Gn 16.11) e Simeão (Gn 29.33; ver HALAT 1457-58). O êxodo baseia-se em Deus ter ouvido os clamores dos escravos hebreus e têlos livrado (Êx 2.24; 3.7; 6.5; Dt 26.7). Assim, o ouvir toma-se um paradigma da compaixão de Deus, sen'indo como advertência para que não se oprima o pobre e desamparado pois, segundo o próprio Deus, “eu lhes ouvirei o clamor” (Êx 22.23, 27 [22, 26]; cf. SI 10.17; Jó 34.28). c. Portanto, Deus é aquele “que [escuta] a oração” (SI 65.2 [3]). Nesse contexto, sm ‘ significa conceder e é sinônimo de ‘nh, responder, conceder. Assim, nos salmos de lamento, aparecem apelos freqüentes a Deus dizendo, “ouve, Senhor, a minha oração... escuta-me ( ’zn) quando grito por socorro” (SI 39.12 [13]; 61.1 [2] [|| qib]) e, por vezes, relacionados a uma súplica por misericórdia (SI 4.1 [2]; 27.7) e com freqüência, a um apelo para Deus conceder ('nh, SI 4.1 [2]; 17.6; 27.7; 102.1-2 [2-3]) o pedido ou desejo, dando alívio da angústia (SI 4.1 [2]), auxílio (SI 30.10 [11]), protegendo (SI 64.1 [2]), vivificando (SI 119.149), perdoan do (1 Rs 8.30; Dn 9.19), etc. Muitas vezes, esses apelos são acompanhados de declarações de confiança de que Deus já ouviu ou que ele ouvirá (SI 4.3 [4]; 6.8-9 [9-10]). Assim, o suplicante “[fica] esperando” (5.3 [4]; cf. Mq 7.7) e dará louvores e graças a Deus (SI 28.6-7; 31.21-22 [22-23]). A oração respondida não apenas é motivo de louvor e ação de graças, mas também um exemplo por meio do qual outros podem aprender a temer a Deus e confiar nele (34.6-18 [7-19]; 40.1-3 [2-4]; 66.16-20); d. Por outro lado, nas passagens proféticas há várias referências às súplicas inúteis de Israel a Deus: “Ainda que me gritem aos ouvidos em alta voz, nem assim os ouvirei” (Ez 8.18; cf. Is 1.15; Jr 11.11); Jeremias não devia interceder pelo povo, pois Deus também não o ouvi ria (Jr 7.16; 11.14). As orações de Israel eram em vão pois o povo não dava ouvidos a Deus (Jr 11.10). Deus não é surdo, mas as iniqüidades do povo o separaram do Senhor, de modo a “não poder ouvir" (Is 59.1-2; cf. 58.4; Pv 15.29). P-B O uso teológico de sm ‘ nos escritos de Qumran corresponde ao seu uso no AT, p. ex., obediência a Deus ( 6 QD 3.7), percepção espiritual (IQH 18.19) e Deus ouvindo um clamor de angústia (IQH 5.12). Na LXX, normalmente é trad. como akouõ e seus compostos, especial mente hypakouõ, quando significa dar atenção, obedecer e epakouõ, quando significa ouvir, conceder ([pedido de] oração). Atenção, escuta, obediência, rum or: -> ’z n I (ouvir, # 263); qsb (ser atencioso, # 7992); í m ' (escutar, ouvir, compreender, atender, obedecer, # 9048) 179
VftW (# 9049)
B ib l io g r a f ia
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OA/to • SOU?" (sem a ' I), um som (hapleg.; # 9049; HALAT _____ _ ___________ _________ 1455b). OMA No Pent. sam., o termo sãma ‘ pode ser um cognato. AT O subs. é usado somente no Sl 150.5; sil$elê sãma ‘, címbalos (de dedo/de mão?) sonoros (|| çilselê terú 'â, címbalos [de dedo/de mão?] retumbantes). O radical sm ' não deixa implícita coisa alguma acerca da natureza do som (se este é musical ou não), apesar de o part. no hi. ter sido empregado para descrever sons musicais, como em lC r 15.16, masmi'im lehãrím-beqôl lesimhâ, “se fizessem ouvir e levantassem a voz com alegria” e 15.28, masmVim binbãlim wekinnõrôt “fazendo ressoar alaúdes e harpas;” como o inf. no hi. em 15.19, bim$iltayim nehõset lehasmia', “faziam ouvir com címbalos de bronze”. P-B O subs. aparece duas vezes no heb. pós-bíblico com o sentido de som, ressoar: sm ‘ h ’mt, “o ressoar da verdade” (DJD 1,# 27, 1 I 9, 103-4) e kwl swm 'y sm ‘kh, “todos que ouvem vosso som” (DJD 1, n. 28b, 3 V 19, 127-28). instrum entos / termos musicais: -¥ gittit (instrumento musical?, # 1787); -> hemyâ (som, estrépíto, # 2166); -> hll (fazer tocar a flauta, # 2727); -> h$$r (fazer soar a trombeta, # 2955); yõbêl (trombeta de chifre de carneiro, # 3413); kinnôr (lira, # 4036); mên (corda [de instrumento musical], # 4944); mena ‘an 'im (guizo, cascavel, chocalho, pandeiro, # 4983); -> nêbel II (instrumento sem cordas, # 5575); ngn (tocar a lira, # 5594); -> 'úgãb (flauta?, # 180
Y 0 (# 9066)
6385); ->pr( (improvisar, # 7260); -> $111(tinir, retinir, # 7509); -> s ô /w (chifre de cameiro, # 8795); -> sã/ís II (instrumento musical, # 8956); -> .íéwa' I (som, # 9049); tpp (tocar, bater, # 9528); tq ‘ (impelir, empurrar, bater palmas, tocar a trombeta, empenhar, # 9546) Som: -> hmh (fazer um ruído, fazer barulho, tumultuar, ficar inquieto, #2159); -> kf$r (fazer soar a trombeta, # 2995); gô/ (voz, som, trovão, clamor, # 7754); senta' 1 (som, # 9049) Robert O ’Connell 9051 (sem a', notícia, relato, boato, rumor), -> # 9048 9053 ( s õ m a relato, fama), -> # 9048
1777
• rp® (sêmeç), adj. pequeno (# 9066); nsp® (sim fâ), adj. ___________ pequeno (# 9067).
AT O adj. sêmes ocorre apenas duas vezes (“sussuro”, Jó 4 .12; 26.14) e Simjâ aparece uma vez (“vergonha”, Êx 32.25). Tomando por base o heb. mais recente (Ecli 10.10; 18.32) e o Trg., D. J. A. Clines traduz Jó 4.12 como “fragmento” (ver seus comentários sobre as três passagens, Job 1-20, WBC 17, 1989, 111). Insignificância, pequenez, indignidade: es II (pequeno, pouco, # 837); -> dll I (ser peque no, sem importância,# 1937); z e ‘êr(pequeno, # 2402); -> hwr II (diminuíremquantidade, # 2579); -> /j.sr (reduzir, decrescer, privar, # 2893); -> hrh II (desaparecer, estar em número reduzido, # 3014); m ‘( (estar em pequeno número, reduzir, tomar-se pequeno, tomar-se reduzido em número, # 5070); í V (ser pouco, insignificante, tomar-se pouco, # 7592); -> q(n (ser pequeno, pouco, diminuir, # 7781); -> íM (descer, abater, atenuar, # 8896); sême$ (pequeno, # 9066) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:939; E. Dhorme, /) Commentarv on the Book ofJob, 1984, 49. A/. Daniel Carroll R. 9067 (simsa, pequeno),
# 9066
173® (í/w I), q. vigiar, guardar; ni. cuidar-se, ter cuida do; pi. respeitar; hitp. ser guarda de alguém, ter cuidado (# 9068); rniDttW / rnb®K ( "aSmürá / ‘asmõret) vigília noturna (# 874); Iptpp (mismâr), pri são, guarda (# 5464); rnptpto (mismeret), uma guarda, responsabilidade (# 5466); rnp® (somrâ), guardar, vigiar (# 9072);(simmurim) vigília notuma, vigília (# 9081). 9068
in tf
OMA Há cognatos no acad., aram., fen., pún., ugar. e ár. AT O vb. é usado 370x no q., 37x no ni., Ix no pi e 3x no hitp. Como acontece com os equivalentes em nossa língua, smr reflete várias nuanças de significado. O radical fundamental significa “prestar muita atenção em”. Essa atenção pode estar voltada para a própria pessoa, para outros pelos quais ela é responsável ou para a vontade expressa ou implícita de seu(s) superior(es), seja este um rei ou uma divindade. 181
l a t f (# 9068)
Uma das primeiras incumbências de Adão foi ser responsável (sm r) pelo jardim no qual o Criador o havia colocado (Gn 2.15). A segunda ocorrência do vb., depois do fracasso no jardim, refere-se ao querubim e à espada flamejante que Deus colocou no Éden para im pedir o acesso dos homens à árvore da vida (Gn 3.24). Entre outros exemplos do uso desse termo pode-se citar: 1. O ni. é usado com o propósito de alertar pessoas de modo a terem cuidado para seu próprio bem, o equivalente a “cuide-se!” devido às possíveis conseqüências de não se fazê-lo. Em Êxodo 23.13, Moisés adverte seus ouvintes: “Em tudo o que vos tenho dito, andai aperce bidos”. Os israelitas são advertidos a ter o cuidado de não fazer tratados com os moradores da terra de Canaã, “para que te não sejam por cilada” (Êx 34.12). Eliseu advertiu o rei de Israel dizendo: “Guarda-te de passares por tal lugar, porque os siros estão descendo para ali” (2Rs 6.9). Enquanto os habitantes de Jerusalém em sua época passavam diante dele pelas portas da cidade. Jeremias os lembrou da palavra do Senhor: “Guardai-vos... não carregueis cargas no dia de sábado” (Jr 17.21-27). A preocupação consigo mesmo também fica evidente na ordem para guardar a boca e a língua e pode ser expressada no q. (Pv 21.23). Esse interesse no au tocontrole é expressado da seguinte forma pelo salmista: “Guardarei os meus caminhos, para não pecar com a língua” (SI 39.1 [2]), também no q. 2. O vb. pode concentrar-se na responsabilidade de uma pessoa por outros A intenção pode ser de cuidar ou vigiar o outro visando ao bem daquele/daquilo que está sendo guardado. Em Gênesis 30.31, o objeto é um rebanho. Davi acusou Abner e seus homens de negligência pois deixaram de cuidar do bem-estar de Saul. Estavam dormindo quando Davi foi furtivamen te ao seu acampamento (1 Sm 26.16). Apesar de Davi haver incumbido Joabe, Abisai e Itai de “[guardar] o jovem Absalão”, Joabe matou Absalão (2Sm 18.12). O vigia de uma cidade tinha a responsabilidade específica de cuidar do bem-estar dos habitantes (Is 21.11), como também era o caso dos guardas na entrada no palácio do rei (1 Rs 14.27). 3. A ênfase pode ainda encontrar-se sobre o conflito de interesses entre aquele que está de guarda e o que está sendo vigiado. Joabe estava vigiando a cidade dos amonitas, ou seja, esta encontrava-se cercada tendo como objetivo final sua conquista (2Sm 11.16). Um touro feroz devia ser mantido preso (Êx 2 1.29), mesmo que o animal desejasse a liberdade. Saul en viou seus comparsas para vigiar a casa de Davi com a intenção de matá-lo quando ele saísse de lá na manhã seguinte (ISm 19.11). Até mesmo Jó sentiu-se sob o olhar julgador do TodoPoderoso que estava esperando para castigá-lo por uma ofensa que acabaria inevitavelmente cometendo (Jó 10.14). 4. Uma das formas de uso mais freqüentes do vb. é a admoestação a ser cuidadoso e diligente com relação às responsabilidades religiosas e espirituais. A nação justa é aquele que se mantém firme na fé (Is 26.2) e o indivíduo que atenta para a (auto)discipIina encontra o ca minho para a vida (Pv 10.17). De Abraão em diante, os fiéis a Deus deviam ordenar os filhos a guardar o caminho do Senhor (Gn 18.19; Êx 20.26; Lv 18.26; Dt 26.16; Ez 11.20) e Davi pôde declarar que havia guardado os caminhos do Senhor (2Sm 22.22). O Pent. repete várias vezes a admoestação para guardar (atentar cuidadosamente) os estatutos e mandamentos do Senhor (Lv 22.31; Dt 4.40; 6.2; 26.17). Esse refrão pode ser ouvido ao longo de todos os escritos dos profetas mais antigos (Js 22.5; ISm 13.14; lRs 2.3; 11.34; 2Rs 17.37) e dos posteriores (Jr 35.18; Ez 18.19) bem como nos escritos poéticos e de sabedoria (SI 119.8; Pv 4.4). 5. A BH emprega várias expressões para transmitir o significado de guardar e vigiar. Estas incluem expressões como postar uma sentinela (swm pequddôt), colocar um guarda (syi Somrâ), colocar os olhos sobre (sym 'ayin) e ver com o sentido de vigiar (r ’h). Além de expres sões com a conotação de guardar e vigiar, há diversos vbs. que são usados para transmitir esses 182
ID tí (# 9069)
significados A mais comum dessas expressões é, de longe, smr, enquanto outros dois vbs., n$r e sqd aparecem com menor freqüência. 6 . O part. ativo q. pode ser empregado como um subs., um guarda, como em Isaías 2 1 . 11 - 12 , mas formas derivadas também podem ter uma conotação semelhante. O salmista clama, “Põe guarda, (somrâ) Senhor, à minha boca” (SI 141.3), enquanto Jó (Jó 7.12) se queixa com a pergunta, “Acaso, sou eu o mar ou algum monstro marinho, para que me ponhas guarda (mismãr)?” O termo mismãr pode representar a pessoa guardando ou o lugar sob sua guarda, uma prisão, como a experiência de Simeão em Gênesis 42.19. A forma relacionada, mismeret, ocorre 78x com uma ampla variedade de significados correlatos: deveres, requisitos, cuidado, responsabilidades, etc. O termo simmurim, outro cognato substantivai, ocorre 2x em Êxodo 12.42 com refe rência à vigília notuma especial que os israelitas deviam realizar anualmente para lembrar o êxodo. Em contraste com essa prática, a vigília notuma normal é 'asmúrâ / ‘asmõret (# 874). O salmista lançou mão da imagística da vigília para expressar os sentimentos mais profundos do coração. Graças e louvores transbordantes a Deus enchem o coração do escritor em seu leito enquanto ele medita durante a vigília da noite (SI 63.6). No Salmo 119.148 vê-se o escritor des perto novamente antes de cada vigília da noite, meditando nas promessas do Senhor. O Salmo 90.4 concentra-se na brevidade da vida humana em contraste com a visão que o Senhor tem do tempo, pois para ele mil anos são como o dia de ontem quando passa ou como a vigília da noite, uma idéia usada e expandida no NT, antevendo o dia do Senhor (2Pe 3.8). G uarda, vigia: ntr (cuidar, #5757); n$r I (vigiar, guardar, cuidar, # 5915); -> sph I (mon tar guarda, vigiar atentamente, postar sentinela, # 7995); -> smr I (vigiar, guardar, respeitar, # 9068); sqd (vigiar, despertar, # 9193) B ib l io g r a f ia
ANEP, 39, fig. 131; DISO 185, 310; NIDNTT 2:132-37; TDNT 8:140-51; 9:236-44; THAT 2:982-87; TWOT 2:576-77, 594-95, 773, 939-40, 952, 954; E. Klein, A Comprehensive Etymological Dictionary o f the Hebrew Langiiage fo r Readers o f English, 1987, 413, 424, 554, 6 6 8 , 677, 679; R. S. Tombeck, A Comparative Semitic Lexicon o f the Phoenician and Punic Languages, 1978, 221, 279, 325, 330. Keith N. Schoville
10#
_______ ______________ T í _____
(semer I), borra ou sedimentos de vinho; vinho velho (# 9069).
OMA A etimologia do termo é incerta. Ver o comentário em HALAT4:1464-65. AT 1. semer era o vinho que havia sido deixado sobre a borra ou sedimentos para ganhar qualidade. Quanto mais próximo ao fundo do jarro estavam os sedimento, melhor era o vinho envelhecido. Esse tipo de vinho era usado pelos profetas em suas mensagens de modo figura tivo. É possível que apareça 5x no AT (Ez 23.34 é conj. e Is 25.6 é questionável; nem todas as versões aceitam a conj.). Em Isaías 25.6, o termo é par. a semãnim, coisas gordurosas e é razo ável traduzi-lo como vinho velho ou vinho sobre seus sedimentos (semãrim), a ser servido no banquete do Senhor para todas as nações (IS 25.6-8) quando a morte será tragada. Nesse caso, o termo refere-se a uma preferência, o vinho de alta qualidade. 183
v m (tt 9087)
Em outras duas referências (Jr 48.11; Sf 1.12) o retrato do vinho deixado sobre seus se dimento para ganhar qualidade durante um longo tempo é usado para descrever Moabe e Judá respectivamente. Apesar de terem sido permitidas permanecer imperturbadas em suas terras durante algum tempo, seriam julgadas e levadas embora. No Salmo 75.8 [9], a ira de Deus é descrita como vinho espumante (yayin hãmar) que será bebido até às escórias (smr), ou seja, será consumido de todo, pois o Senhor os obrigará a bebê-Io. 2. O subs. é usado com os seguintes vbs. que, até certo ponto, servem para defini-l zqq, coar, clarificar ( -> # 2423; Is 25.6); msh, escoar (#5172; SI 75.8); qp ’, engrossar ( -> tt 7884; Sf 1.12); sq(, ser tranqüilo ( -> tt 9200; Jr 48.11). NT A LXX traduz a palavra como oinos, vinho (Is 25.6). O termo não é traduzido em Jr 48.11. Em Sofonias 1.12, é traduzido como derivado do radical smr, guardar, cuidar. No Salmo 75.8 [9] (LXX 74.9), não fica claro de que modo a tradução trata da palavra, sendo possível que empregue tr\>gias = smr, frutos, produtos da terra, numa divergência do termo hebraico. Uvas — suco, vinho: (lagar,# 1780); dem a' (suco tirado do barril de vinho, # 1964); -> hõmeij (vinagre, vinho, cerveja, # 2810); fjemer (vinho, vinho espumante, # 2815); -> yayin (vinho, # 3516); -> yeqeb (barril / tonel de vinho, lagar, # 3676); yrs II (pisar sobre o lagar / as uvas, # 3770); -> mhl (adulterar o vinho, # 4543); -> mezeg (vinho com especiarias, vinho misturado / combinado com outra bebida, # 4641); misrâ (suco, # 5489); -> ‘âsis (suco de uva, # 6747); -> sht (espremer, prensar uvas, tt 8469); -> semer I (borra, vinho enve lhecido, tt 9069); -> tirôs (vinho fresco, tt 9408) Eugene Carpenter 9072 (somrâ, guarda, vigia),
# 9068
9076 (sõmrôn, Samaria), -> Samaria 9081 (simmurim, vigília noturna, vigília), -> tt 9068
9087
wm
(semes), sol (# 9087)
OMA O cognato acad. samsu (masc., porém cm algumas ocasiões fem., como no sem. ociden tal) pode significar sol, luz do sol, dia, disco solar (CAD § / 1, 335-39). O nome divino Sarnas (Utu no sum.) refere-se ao deus sol que era “a divindade mais popular na Mesopotâmia do tempo dos acádios em diante” (Collon, 167) e é retratado com freqüência em selos cilíndricos com raios sobre seus ombros (cf. “as caudas do Sol”, em eblaíta, ver C. H. Gordon, “The Ebla Exorcisms,” 130) e sua faca serrilhada na mão direita. Num selo de Nipur ele é mostrado sob “um dossel sustentado por colunas torcidas” (Collon, # 765). De acordo com textos literários, Sarnas entra e sai das portas do céu em sua trajetória diária de perambulaçôes e sua ascensão pela porta leste na aurora é retratada com freqüência em selos cilíndricos acad. antigos (Lambert, RLA 4:412). Ele é o deus da justiça e, conseqüentemente, guardião da lei e juiz da Meso potâmia. Concede aos reis a autoridade de criar leis (Paul, 6 - 8 ). E o senhor do céu e da terra, senhor ou rei dos espíritos dos mortos (e(emmu) e tem autoridade de trazê-los de volta (sülú) do mundo dos mortos. Em termos iconográficos, o deus sol costumava ser representado como um disco alado (cf. samsatu, disco solar, CAD § / 1, 332-35). 184
(# 9087)
Assim como o ugar. sapsu (<- sappsu <- Sampsu <- samsu), a forma eblaíta Sipis traz p em vez de m como segundo radical; é resultado da “segolização” [uso da vogal aram. segol] de sapsu. Em textos alfabéticos ugar., sps (subs. fem.) refere-se ao sol (p. ex., spsm, ao nas cer do sol), bem como à deusa Sapsu, que é chamada muitas vezes de “luminária dos deuses” (UT, §19.1644) ou “dama” (UT, §19.2297). Ela é invocada num encantamento contra picadas dc cobra (KTU, 1.100) e diz-se que assumia o papel de psicompompa, que acompanhava o recém-falecido rei Niqmaddu até o mundo dos mortos (KTU, 1.161). No mito de Baal ela ajuda Anate a enterrar Baal depois que este morre, a procurá-lo no mundo dos mortos e restaurá-lo ao trono, resgatando-o do reino de Mote, o deus da morte (KTU 1.6 ). Quando ouve a terrível confissão de que Mote matou Baal, toma-se incandescente de indignação e detém o movimen to dos corpos celestes (C. H. Gordon, “Poetic Legends and Myths from Ugarit,” Berytus 25, 1977,113). As palavras “o Sol” são usadas como título para o rei heteu, bem como para Faraó (Gordon, UT, § 19.2468). AT O termo semes normalmente é masc. como no acad., mas pode aparecer, por vezes, na forma fem. (p. ex., Gn 15.17; Êx 22.2; Dt 24.15; 2Sm 12.11; Sl 104.22; Ec 12.2; Is 38.8; Jr 15.9; Jn 4.8; Ml 4.2 [3.20]) como no ugar. É possível que o uso no fem. seja um reflexo de sua origem cananéia. É um elemento de NP como simsôn, Sansão (HALAT 1471 -72) e simsay, Sinsai (HALAT 1472), bem como do NG bêt-semes, Bete-Semes (HALAT 124). Tais nomes, especialmente o último, podem refletir o culto ao sol em Canaã nos tempos pré-israelitas. 1. Cosmologia. a. A criação do sol. No AT o sol é um dos dois grandes luminares (me orõt) que Deus fez por sua palavra (Gn 1.14, 16). Deus formou “a luz (mã'ôr) e o sol (semes)" (Sl 74.16) e “pôs uma tenda para o sol” (Sl 19.4 [5]). Observe-se que, ocasionalmente, o céu é referido em termos metafóricos como uma tenda (p. ex., Is 40.22; Sl 104.2; “cortina”). Deus possui controle absoluto sobre seu movimento. Assim, Jó 9.7 diz: “quem fala ao sol, e este não sai, e sela as estrelas” . b. Sol e lua. O par sol-lua aparece com freqüência na forma de hendíadis, ou seja, sol e a lua” (Gn 37.9; Ha 3.11; Sl 148.3; J1 2.10; 3.15 [4.15]) ou de par., ou seja, sol || lua (Sl 104.19), transmitindo a idéia de totalidade da luz celestial. O último par também é expressado por lebãnâ || hammâ (Ct 6.10; Is 24.23; 30.26). A ele são acrescentadas estrelas, constelações e o exército dos céus em Deuteronômio 4.19, 2 Reis 23.5; Jeremias 8.2; 31.35. Em Jó 9.7, o sol (heres) é par. a estrelas, enquanto em Jó 31.26 or, luz || lua, refere-se ao sol (cf. Samas, como luz [nür\, verTallqvist, 456). 2. Fenômenos naturais, a. Govemar o dia. A principal função do sol é separar o dia da noite, governando (msl) o dia (Gn 1.16, Sl 136.8). Serve para luz do dia (Is 60.19; Jr 31.35) e também como um sinal “para as estações, para dias e anos” (Gn 1.14). b. O nascer do sol. Tal fenômeno possui significado tanto temporal quanto espacial (cf. ugar. $ai sps, nascer do sol, leste [UT, §19.1138], acad. samsi, nascer do sol, Leste [CAD, $, 154; também A/2, 367]). O sol nasce, sai ou vem (zrh, brilhar, Gn 32.31; 2Sm 23.4; Sl 104.22; Na 3.17; e t c . i j í ’, sair [-^ # 3655], em Gn 19.23; Jz 5.31; Is 13.10 e no acad. açu [CAD,AJ2, 367]) no/do Leste. Assim, no heb., o Leste é explicado como mizrah hassemes (o lugar ou di reção do) nascente (Nm 21.11; Js 1.15; 13.5; 19.12). A forma substantivai zerah refere-se à aurora em Isaías 60.3. No Salmo 19.5 [6 ], diz-se que o sol sai (y.ç ’) de seus aposentos. Na Mesopotâmia tam bém diz-se que na alvorada ele surge de seus aposentos, que encontram-se abaixo do horizonte (ver Heimpel, JCS, 1986, 128-30). c. O pôr-do-sol. Tal fenômeno possui, igualmente, significado tanto temporal quanto espacial. Assim, em Gênesis 15.12,17; Êxodo 17.12; 1 Reis 22.36. etc., refere-se ao poente e no 185
tf&tf (# 9087)
Salmo 104.19 diz-se que o sol sabe a hora do ocaso (mebô ’). Por outro lado, em Deuteronômio 11.30; Josué 1.4; 23.4; Zacarias 8.7, refere-se ao local do ocaso, ou seja, o Oeste. d. O calor do sol. E normal o sol ficar quente durante o dia (hmm em Ex 16.21; ISm 11.9; Ne 7.3), mas passa a ser destrutivo ao tomar-se quente demais Assim, em Jonas 4.8, “o sol bateu (nkh) na cabeça de Jonas, de maneira que desfalecia”. Há promessas de proteção do calor do sol no Salmo 121.6 e em Isaías 49.10. Cântico dos cânticos 1.6 também fala de ser-se queimado (szp) pelo sol. 3. Fenômenos incomuns. a. O escurecimento do sol. O escurecimento (hsk ou qdr; cf. acad. adãru [CAD A /l, 107; § / l, 335]) do sol é, por vezes, um prelúdio para ou efeito secun dário do julgamento divino. Joel o menciona com relação ao dia do Senhor (J12.10; 2.31 [3.4]; 3.15 [4.15]). Isaías 13.10 diz que no temível dia do Senhor o sol se escurecerá logo ao nascer (ver Koch, UF, 25, 201-17). Como julgamento sobre o Egito, Deus encobrirá (ksh) o sol com uma nuvem (Ez 32.7). Assim, o escurecimento do sol também é sinal do fim dos tempos (Ec 12.2). No acad. as calamidades são, muitas vezes, descritas pelo obscurecimento do sol (Heimpel, 138). Para um eclipse solar na antiga Canaâ, ver KTU 1.78 (Dietrich-Loretz, Man/ik in Ugarit, 39-86, 281-86). b. O pôr do sol durante o dia. Tal fenômeno também é sinal do julgamento de Deus. Assim, diz-se que como julgamento dos falsos profetas, “pôr-se-á o sol sobre os profetas, e sobre eles se enegrecerá o dia” (Mq 3.6). Até mesmo para a mãe de sete filhos, “pôs-se-lhe o sol quando ainda era dia” (Jr 15.9); no dia do Senhor, “farei que o sol se ponha ao meio-dia e entenebrecerei a terra em dia claro” (Am 8.9). Em oposição, diz-se que o sol nunca mais irá se pôr no tempo final da salvação (Is 60.20). c. O deter do sol. De acordo com Josué 10.12-13, o sol parou (dmm, # 1957) sobre Gibeão e “se deteve ( ‘md # 6641) no meio do céu e não se apressou a pôr-se, quase um dia inteiro”, por causa de Israel. Habacuque 3.11 também menciona que o sol e a lua se detiveram ( ‘md) “nas suas moradas”, ou seja, nos céus como resultado da temível marcha do Senhor. No primeiro caso, o movimento do sol foi um meio de Deus efetuar sua salvação, enquanto neste último, foi resultado de seu ato salvador. Esse fato já foi interpretado por alguns estudiosos como tendo relação com agouros celestiais. (Observe-se que a aparição do sol e da lua juntos no décimo quarto dia é considerada pelos assírios da antigüidade como um sinal favorável, ver Younger, 212-20.) d. O retroceder do sol. Quando o Senhor respondeu à oração de Ezequias e acrescen tou quinze anos à vida do rei, deu-lhe um sinal, dizendo: “Eis que farei retroceder dez graus a sombra lançada pelo sol declinante no relógio de Acaz” (Is 38.8). Assim, a luz do sol retroce deu (swb, # 8740) os dez graus que esta já havia declinado (ver também 2Rs 20.11). Esse fenômeno incomum foi um ato salvífico de Deus em sua misericórdia. 4. Sol salvador. Em Malaquias 4.2 [3.20], o Senhor diz: “Mas para vós outros que temeis o meu nome nascerá o sol da justiça, trazendo salvação (m arpê’ [ -> # 5340]) nas suas asas” . Trata-se de uma expressão extremamente metafórica dentro do contexto do OMA. A divindade solar é simbolizada muitas vezes por um disco alado no OMA e considera-se que a mesma possui um poder salvador ou curativo, conforme ilustrado pelo encantamento contra picada de cobra em Ugarite (KTU 1.100). Na expressão “o sol da justiça”, o gênero do sol é fem., refletindo o uso can. do termo. Porém, nesse caso, apesar de o sol ser personificado, não é divinizado. 5. Adoração ao sol. O AT adverte e proíbe constantemente a adoração de corpos celestes como o sol (Dt 4.19; 17.3). No entanto, pelo menos popularmente, tais práticas nunca se extinguiram ao longo da história de Israel (p. ex., Jr 8.2). Apesar de não ficar clara qual é a origem da 186
VfGti (# 9087)
adoração ao sol em Israel e sua relação com o javeísmo, é provável que NP como Bete-Semes, bem como o emprego ocasional do gênero fem. do sol no heb. reflitam a adoração pré-israelita ao sol em Canaã. Ver acima para as funções da deusa sol Sapsu em Ugarite. Essa adoração prosperou de modo particular no tempo de Manassés. De acordo com 2 Reis 23.5, antes da época de Josias, haviam aqueles que “incensavam a Baal, ao sol, e à lua, e aos mais planetas, e a todo o exército dos céus”. 2 Reis 23.11 fala dos “cavalos que os reis de Judá tinham dedicado ao sol”. É interessante observar que o deus mesopotâmio Sarnas era chamado de “aquele que anda de carruagem” (Tallqvist, 455). Não é preciso considerar que o culto ao sol foi uma inovação do século VII, pois já se encontrava tradicionalmente consoli dado em Canaã. Outra referência à prática do culto ao sol pode ser vista em Ezequiel 8.16, em que se diz que havia vinte e cinco homens adorando o sol e tinham as costas voltadas para o leste do templo, em direção ao sol, ou seja, ao nascente. 6 . Adoração aos mortos Apesar de o AT não apresentar nenhuma evidência clara do papel do sol na adoração aos mortos, não seria de surpreender se houvesse, popularmente, uma crença na divindade solar como um psicopompo, aquele que leva/traz os mortos para/do mundo dos mortos, como o acad. Samas que é chamado de “senhor dos espíritos dos mortos” (bêl efemmi; CAD, E, 398) e a deus sol ugar. Sapsu. É possível que um resquício da tradição popular can. encontre-se refletido na expressão ba'alat ’ôb (ISm 28.7), “a Senhora dos espí ritos dos mortos” (Tsumura, 54-55). 7. Expressões idiomáticas, a. Debaixo do sol. Essa expressão aparece 29x em Eclesiastes (p. ex., Ec 1.3,9, 14; 2.11; 10.5) e significa “a vida no mundo real” (NIDNTT) sendo, por vezes, substituída por “debaixo dos céus”. Aparece também no fen. (p. ex., KAI, 13:7; 14:12). b. Ao ar livre, em público (lit., “perante o sol”). A expressão é usada em Números 25.4 é contrasta com “em oculto” em 2 Samuel 12.12; cf. SI 72.17; Jó 8.16. c. Ver o sol. A expressão significa ter vida ou existência na terra (SI 58.8 [9], “como o aborto”; Ec 7.11) ou ter conhecimento (Ec 6.5). Cf. HALAT 1081. 8 . Metáforas, a. Comparação. O sol é usado para expressar pureza, como no Cântico dos cânticos 6.10 (“pura como o sol”) e permanência, como no Salmo 89.36 (“a sua posterida de durará para sempre, e o seu trono, como o sol perante mim”) e também esplendor, como em Juizes 5.31 (“Porém os que te amam brilham como o sol que se levanta no seu esplendor”). b. Personificação. O sol “conhece a hora do seu ocaso” (SI 104.9) e “se regozija como herói, a percorrer o seu caminho” (SI 19.5 [6 ]). c. Deus como sol. No Salmo 84.11 [12], Deus é descrito em termos metafóricos como “sol e escudo”; observe que os dois são objetos redondos. Não há, porém, nenhuma evidência de que o templo de Jerusalém fosse o centro de culto ao sol, ainda que a expressão reflita alguns elementos solares. O fato de Deus ser chamado de “sol” nessa passagem pode ser comparado com o fato de o rei heteu e de Faraó serem chamados de “o Sol” em ugarítico. Também no acad. “sol” é usado como um nome carinhoso: “és meu senhor, és meu sol” (CAD, § /l, 337). d. Deus e a justiça. Assim como o acad. Samas era o deus da justiça e, conseqüente mente, guardião da lei, o sol no AT é associado à idéia de justiça bem como ao próprio Deus justo. No Salmo 19, a tõrá, a lei ou instrução, de Deus é comparada com a influência do sol sobre o mundo. Em Malaquias 4.2 [3.20], diz-se que “o sol da justiça” nascerá para aqueles que temem a Deus. Essa expressão já foi explicada como: i. o sol que consiste de justiça; ii. o sol que produz justiça e iii. o sol que é justiça. Em 2 Samuel 23.3-4, faz-se menção novamente ao governo justo “no temor de Deus” relacionado ao esplendor do sol. 187
WÜV (# 9087)
P-B Na LXX, hêlios, sol, é usado com mais freqüência para marcar o tempo, quer seja a hora do dia, fazendo referência ao nascente, poente e ao calor do meio-dia ou a estação do ano. Em Apocalipse, o sol aparece em par. com “a luz da justiça” (Sab 5.6; cf. Ml 4.2) e em termos de seu esplendor (Ecli 23.19) e magnificência (Sab 7.29). Eclesiástico 26.16 diz que “a graça de uma mulher cuidadosa rejubila o seu marido (lit. “é como o sol nascente”). Nas Pseud., o escurecimento do sol descreve o dia escatológico do Senhor (p. e x ., Ass Mois 10.5; Sib 3.801 f. Escritores romanos relacionam o sol escurecido à tragédias como a morte de César ou a guerra entre Otaviano e Marco Antônio. Além disso, pode-se encontrar especulações astronômicas ou quase religiosas sobre o sol e a lua em lEn. 72— 74; 2En. 11— 16; 3Bar 6 —9. NT E comum o uso de hêlios para marcar o tempo, como o poente (Mc 1.32, etc.) e o nas cente (Mc 16.2), bem como para denotar a direção leste (Ap 16.12, etc.). As formas de uso descritivas aparecem em expressões como: “o seu rosto resplandecia como sol”, referindo-se a Jesus (Mt 17.2; bem como o rosto do anjo em Ap 10.1) e também “os justos resplandecerão como o sol” (Mt 13.43). Diz-se que Paulo viu uma luz “mais resplandecente que o sol” (At 26.13). O resplendor é expressado em orações como “um anjo posto em pé no so!” (Ap 19.17) e “uma mulher vestida do sol” (Ap 12.1). No contexto escatológico fala-se do escurecimento do sol (Ap 6 .12; 8.12; 9.2; também Mt 24.29). Diz-se que “haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas” (Lc 21.25). Para comentários sobre Atos 2.17-21, que cita Joel 2.28-32, ver NIDNTT, 732. Diz-se que a nova Jerusalém não precisará de sol nem lua para brilhar sobre ela, “pois a glória de Deus a iluminou, e o Cordeiro é a sua lâmpada” (Ap 21.23; cf. 22.5). Trata-se, basicamente, da mesma ocorrência citada na profecia de Isaías, de que o sol não servirá mais para luz do dia, “mas o Senhor será tua luz perpétua, e o teu Deus, a tua glória” (Is 60.19). Sol: -> hammâ (brilho, # 2780); heres (sol, # 3064); -> semes (sol, # 9087) Nascer do sol, aurora, ocaso: or (luz, luz do dia, aurora, relâmpago, # 240); zerah I (aurora, nascer do sol, # 2437); -> mãbô ’ (poente, ocaso, Oeste, # 4427); -> ma ‘arãb II (poen te, Oeste, #5115); -> nesep (anoitecer, crepúsculo, aurora, escuridão, # 5974); -> sahar (cre púsculo antes do amanhecer, # 8840) Lua, mês: -> hõdes I (mês, lua nova, # 2544); -> yerah I (mês, # 3732); -> Ae.se ’ (lua cheia, # 4057); lebãnâ (lua, # 4244) Céu: -> 'aguddâ (firmamento, aspersor # 99); -> râqta‘ (firmamento, prato, # 8385); sahaq (nuvens de poeira, # 8836); sãmayim (céu, céus, ar, # 9028) Luz, esplendor, claridade: -> ’wr (ser claro, esplendoroso, brilhar, # 239); bãhir (esplen doroso, brilhante, # 986); zrh I (nascer [do sol], brilhar, # 2436); y p ' I (reluzir, # 3649); ngh (brilhar, fazer brilhar, # 5585); -> nhr II (ser radiante, # 5642); qrn (irradiar, ser radiante, # 7966) B ib l io g r a f ia
ABD 6:237-39; CAD § / 1:332-35, 335-39; HALAT 1468-72. NIDNTT 730-33; THAT2:9%199; D. Collon, First Impressions: Cylinder Seals in the Ancient Near East, 1987; M. Dietrich e O. Loretz, Mantik in Ugarit, 1990. C. H. Gordon, “Poetic Legends and Myths from Ugarit,” Berytus 25, 1977, 5-133; idem. “The Ebla Exorcism,” Eblaitica 3, 1992, 127-37; W. Heimpel, “The Sun at Night and the Doors o f Heaven in Babylonian Texts,” JCS 38, 1986, 121-51; J. Koch, “Der Finstemisbericht Jesaja 13,10,” UF 25, 1993, 201-17; W. G. Lambert, "Himmel,” RLA 4:411 -12; T. J. Lewis, Cults o f the Dead in Ancient Israel and Ugarit, HSM 39, 1989; S. 188
1# (# 9094)
M. Paul, Studies in the Book o f the Covenant in the Light o f Cuneiform and Biblical Law, SVT 18, 1970; J. J. M. Roberts, The Earliest Semitic Pantheon, 1972; M. S. Smith, “The Near Eastem Background o f Solar Language and Yahweh,” J5Z, 109, 1990,29-39; J. G. Taylor, Yahweh and the Sun, JSOTSup 111, 1993; K. Tallqvist, Akkadische Gõtterepitheta, StudOr 7, 1938; “The Interpretation o f the Ugaritic Funerary Text KTU 1.161,” Official Cult and Popular Religon in the Ancient Near East, 1993, 40-55; K. L. Younger, Jr., Ancient Conquest Accounts, JSOTSup 98, 1990. David Toshiro Tsumura 9088 (simsôn, Sansão), -> Sansão
9094
(sen I) dente, marfim (# 9094); G, 2 n ? # (senhabbim), marfim (# 9105); < p©' (snn), afiar (-> # 9 1 1 1 ).
OMA O radical snn é devidamente atestado em outras línguas sem., cf. acad. sinmr, ugar. sn; ár. sinn. AT 1 . 0 subs. é usado para os dentes de animais ou homens, como na pena de talião em Êxodo 21.24 e Levítico 24.20. 2. Tanto sên quanto senhabbim podem significar marfim, isto é, o material extraído de presas de elefante. O marfim era usado esp. em construções. Salomão “fez... um grande trono de marfim” (lR s 10.18 = 2Cr 9.17) e o palácio de Acabe era de marfim (lR s 22.39). Amós repreendeu os ricos insensíveis “que [dormem] em camas de marfim” (Am 6.4) e predisse a destruição de suas “casas de marfim” (Am 3.15). O marfim fazia parte da carga que os navios de Társis levaram a Salomão (1 Rs 10.22 = 2Cr 9.21). 3. O termo sên é usado em várias expressões metafóricas, a. Com referência ao poder para fazer mal a outros. Os dentes dos inimigos dos salmista são lanças e flechas (SI 57.4 [5]; cf. Pv 30.14; J1 1.6). No entanto, o Senhor tem poder de quebrar os dentes dos ímpios (SI 3.7 [8 ]; f. 58.6 [7]; cf. Jó 29.17). b. O ranger dos dentes contra uma pessoa é um sinal de ira e agressão (SI 35.16; 37.12; 112.10; cf. Lm 2.16). Não existe, porém, no AT nenhum par. à expressão do NT para pranto e ranger de dentes no julgamento de Deus. c. Em Jeremias 31.29-30 e Ezequiel 18.2, a expressão popular “Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram” é contestada, uma vez que “cada um, po rém, será morto pela sua iniqüidade; de todo homem que comer uvas verdes os dentes se em botarão”. Assim, nessas duas passagens o que se ressalta é a responsabilidade moral de cada indivíduo em contraste com o envolvimento conjunto de toda a nação com o pecado ou o fato de uma geração sofrer pelos pecados de seus antepassados. d. Amós 4.6 fala da disciplina do julgamento divino por meio da fome como o Senhor dar a Israel “dentes limpos” em todas as suas cidades, “falta de pão” em todos os lugares. Dente, marfim: -> hrq (ranger os dentes, # 3080);
sên (dente, marfim, # 9094)
B ib l io g r a f ia
IBD 2:722-24. Francis Foulkes 189
naicf (# 9101)
9101
nw
(snh I), q. mudar, ser diferente, repetir; ni. ser re petido; pi. mudar, alterar; pu. ser mudado; hitp. disfarçar-
se (#9101). OMA No aramJ sn ’, no ugar. snw, sny, no acad. sanü, fazer novamente, tornar-se diferente, mudar (considerado como dois radicais em CAD 17:398-408), no Deir ‘Alia, sn ’ (?). O acad. sanü ii., mudar, é usado para a alteração de contratos, acordos, palavras e textos (CAD 17:406-8). Cf. o uso do heb. snh no Salmo 89 (abaixo). AT Em três ocasiões, esse vb. tem Deus como sujeito. Jó acusou Deus de prevalecer con tra o homem desamparado, transformando sua esperança em desespero e mandando-o para a morte (Jó 14.20). Ao lamentar a aparente rejeição do rei davídico pelo Senhor, o autor do Salmo 89 lembra Deus sua promessa de não modificar seu juramento pactuai (SI 89.34 [35]). Deus declarou à geração de Malaquias, “eu, o Senhor, não mudo”, lembrando-os que ele havia demonstrando sua fidelidade pactuai imutável poupando a nação pecaminosa (Ml 3.6). Em Jeremias 2.36, a palavra descreve as políticas e alianças externas indecisas de Judá, sendo que todas atestavam sua falta de fé na capacidade do Senhor de proteger a nação. Mudança: -> hpk (virar, destruir, mudar, # 2200); -> hlp I (preterir, desaparecer, transgredir, mudar, renovar, #2736); mwr I (ser mudando, trocar, #4614); -> snh 1(mudar, repetir, #9101) B ib l io g r a f ia
R. L. Bergey, “Post-Exilic Hebrew, Linguistic Developments in Ester: A Diachronic Approach,” JETS 31, 1988, 163-64. Robert B. Chisholm
9102
rtlB' (sõná), subs. ano (# 9102).
OMA Snh é um radical comum atestado em várias línguas sem., inclusive o sam. sêna; o ugar snt; o acad. Sattu[m]; o aram./sir. senã ’ e o ár. sanat. AT 1. Das 874 ocorrências de sãnâ, a maioria pode ser mais facilmente compreendida de acordo com as convenções do uso moderno do termo. São comuns as referências aos anos de vida de uma pessoa (p. ex., Gn 7.11; apesar de os anos de Deus não terem fim, SI 102.24, 27 [25, 28]), os anos de reinado de um monarca (p. ex., 2Rs 13.1 e ao longo dos livros de Reis e Crônicas) e à regularidade de práticas religiosas (p. ex., Ex 12.2 e em outras passagens ao lon go de Êxodo e Levítico) entre outros. 2. Existem, porém, outras passagens nas quais o termo “ano” não deve ser entend com um sentido calendárico, mas sim como uma descrição da operação divina, assumindo as sim, inequivocamente, um caráter teológico. Refere-se, por exemplo, a um período de castigo de Deus em Isaías 34.8 e Jeremias 11.23. Nessa última passagem, Jeremias condena os homens de Anatote (seus adversários em sua cidade natal) e diz que as tragédias lhes sobrevirão “no ano da sua punição” (senatpequddãtãm [-> # 7213]; cf. 23.12). Na primeira passagem, o Senhor castigará Edom, no “ano de retribuições” (senat sillúmim [-> # 8936]) pela forma como tratou os israelitas (cf. Ez 25.12-14). Por outro lado, o termo refere-se também ao cuidado de Deus com seu povo. Isaías 61.2 fala do “ano aceitável do Senhor” (senat rãçôn [-> # 8356] layhwh) e 63.4, do “ano dos meus 190
na # (#9102)
redimidos” (-senat ge 'iilay [# 1453]). As duas expressões dizem respeito aos israelitas em sua espera pela libertação do cativeiro na Babilônia. A primeira é uma aplicação explícita do ano de jubileu (Lv 25) que fala da desobrigação dos israelitas de todas as dívidas e da devolução da terra a qualquer um que a tenha vendido anteriormente por necessidade financeira. As esti pulações do ano de jubileu são perfeitamente adequadas para a volta dos israelitas à sua terra natal depois do cativeiro na Babilônia. Nesses quatro exemplos, o termo “ano” tem um sentido mais indefinido de um período geral durante o qual se efetua o castigo ou a redenção de Deus. E compreendido, portanto, com relação às várias (e mais freqüentes) passagens ao longo do AT que se referem a dias, p. ex., “dia do Senhor” (J1 2.31 [3.4]; Am 5.20), “dia da salvação” (Is 49.8) e outras (ver>wn [-> # 3427]). P-B Nos MMM, a maioria das formas de uso de sãnã é comum, tratando particularmente dos diversos requisitos referentes aos membros da comunidade (p. ex., 1QS cols. 6-9; 1QM cols. 2, 6:14— 7:3; lQSa col. 1), apesar de CD 2:9-10 e 4:9-12 darem a impressão de falar dos anos que cabem aos perversos (inimigos da comunidade). O mesmo uso geral e comum também se aplica às Pseud. e ao Apocalipse. No entanto, 1lQMelq constitui uma passagem de importân cia teológica expressiva. O contexto de Melquisedeque é o julgamento escatológico, no qual ele pronunciará a sentença contra Satanás. Dentre as passagens bíblicas aduzidas nesse texto encontra-se Isaías 61.1-2. Trata-se de um fato que diz respeito não apenas à Melquisedeque em Hebreus 7, mas — o que é ainda mais relevante — à identificação de Jesus com essa passagem em Lucas 4.19. NT Além das formas comuns de uso esperadas para o termo “ano” no NT, Lucas 4.19 toma explícita a relação tipológica entre a libertação iminente dos israelitas da Babilônia em Isaías 61.2 e o ministério redentor de Cristo: Jesus afirma que seu ministério cumpre “o ano aceitável do Senhor”. Apesar de o interesse imediato de Isaías ser a libertação dos israelitas da época, em sua abrangência total, as palavras do profeta só se cumpriram com a vinda daquele que iria redimir todo o povo de Deus do cativeiro do pecado e da morte. Assim como Israel antes dela, a Igreja tomou-se o objeto do favor de Deus. Contudo, esse “ano aceitável do Senhor” não se limita a um acontecimento histórico isolado, como foi a libertação dos israelitas da Babilônia, mas teve início com a primeira vinda de Cristo, é característico da era messiânica como um todo (o livramento de Deus em Cristo é tão real agora quanto o era há dois mil anos) e tem implicações eternas. Nesse sentido, o uso de Isaías 61.1-2 em Lucas 4.19 encontra um par. impressionante em 1lQMelq. A diferença entre os dois é que o primeiro abrange somente o futuro escatológico enquanto, em Lucas a referência é, em primeiro lugar e acima de tudo, ao ministério de Jesus como início da era escatológica. Em Cristo, o “ano aceitável do Senhor” é experimentado de modo proléptico pela igreja, ainda que o cumprimento pleno dessa pro messa esteja aguardando sua segunda vinda. A caminhada dos israelitas pelo deserto durante quarenta anos (SI 95.10) também está relacionada à Igreja em seus “quarenta anos” de jornada no deserto (a era da igreja), apesar de o primeiro caso ser caracterizado pela ira de Deus e este último, pela sua bênção. Além disso, a expressão “mil anos”, descreve o aprisionamento de Satanás em Apocalipse 20.1 -6 , ainda que a natureza exata desse período continue sendo motivo de controvérsia. Dia: -> bõqer II (manhã, alvorada, # 1332); yôm I (luz do dia, dia, dia escatológico, hoje, # 3427) Tempo: "õbêd (desde então, # 7); 'ôpen (o tempo certo, # 698); g/7 I (um estádio da vida, # 1636); zmn (ser nomeado, # 2374); -> ‘ôlãm (um longo tempo ou duração, # 6409); 191
(# 9106)
'êt (tempo, # 6961); p a a m (pé, passo, tempo, # 7193); -> peta ‘ (instante, # 7353); tãmid (prosseguimento, continuidade, oferta regular, # 9458) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:941-42; M. P. Miller, “The Function o f Isaías 61 1-2 in 11 QMelchizedek” JBL 8 8 , 1969, 467-69; W. Zimmerli, “Das ‘Gnadenjahr des Hem,’” Archãologie und Altes Testament, 1990, 321-22; D. E. Gowan, “ Isaiah 61.1-3, 10-11,” Int 35, 1981, 404-9; I. H. Marshall, Com mentary on Luke, NIGTC, 1978, 177-90; J. A. Sanders, “From Isaiah 61 to Luke 4,” Christianity, Judaism, andO ther Greco-Roman Cults 1, 1975, 75-106; B. Chilton, “Announcement in Nazara: An Analysis of Luke 4:16-21,” Gospel Perspectives: Studies o f History and Tradition in the Four G ospels,2,1981,147-72; M. Rogers, “Luke 4:16-30— ACall for a Jubilee Year?” RTR 40, 1981,72-82. Peter Enns 9104 (sênâ, sono),
# 3822
9105 (senhabbim, marfim),
777” 9 1 0 6 ____________R
# 9094
'J©' (sãni I), fio escarlate (carmesim), escarlate (# ______ 9106)
OMA Acad. siriitu, sanu, tecido tingido; ugar. tn, escarlate (UT, 2702).
AT 1. A palavra é combinada com tôla 'at (# 9357) em Êxodo, Levítico e Números. Esses textos respondem pela maior parte das ocorrências do termo. Apesar de a cor ser derivada de um verme, a tradução de sãni nunca é “verme” quando o termo encontra-se isolado. Denota a cor (Is 1.18) e, com mais freqüência, a cor de um fio: o fio que Tamar amarrou no pulso de seu gêmeo primogênito (Gn 38.28, 30); o cordão do lado de fora da casa de Raabe em Jericó (Js 2.18, 21). Para a gama de cores, ver // ‘ (# 9433). 2 .0 termo sãni também denota a peça de roupa feita do fio. Representa luxo (Pv 31.2 cf. 2Sm. 1.24; Jr 4.30). 3. Em Isaías 1.18, aparece com outras duas palavras que identificam a cor vermelh tôlã ‘ e ’dm para denotar pecado. Cores — Vermelho: -> ’dm (ser vermelho, # 131); ’argãmãn (púrpura, # 763); -> karmil (carmesim, # 4147); Sãrõq (vermelho acastanhado, # 8601); sãni I (escarlate, # 9106); sãsar (cinabre/vermelho, # 9266); -> //' II (vestido(a) de tecido escarlate, # 9433) B ib l io g r a f ia
A. Brenner, Colour Terms in the Old Testament, JSOT, 1982; J. Doumet, A Study o f the An cient Purple Color, 1980; P. L. Garber, “Color,” ISBE, 1:729-32; R. Gradwohl, Die Farben im Alten Testament, BZAW 83, 1963; L. B. Jensen, “Royal Purple ofTyre,’VAr£ 5 22, 1963, 104-18. Robert Alden 9108 (sêni, segundo), -> # 9109 192
D’5# (# 9109)
9109
0’3ip'
D’3# (senayim), D'!)# (setayim), subs. dois (número cardinal), mais, outro, alguns (#9109); ’3U?' (sêní), adj.
segundo (número ordinal) (# 9108). AT 1. Um par de itens (p. ex., os órgãos simétricos do corpo) pode ser indicado pela forma dual — ayim bem como pelas palavras heb. para dois (senayim [masc.] e Setayim [fem.]) que também são duais. E possível que a forma gramatical dual conferisse à percepção de duplici dade um caráter distinto, enquanto que no mundo moderno supõe-se de modo geral que todos os números na linha de numerais possui igual peso e valor. Segai (3) sugere que o número dois é considerado uma extensão do número um e que a pluralidade começa com o três. E necessá rio, porém, tratar com cautela os argumentos da morfologia à psicologia. 2. A variedade de ocorrências do número dois na Bíblia atesta a importância das po laridades binárias na natureza e na cultura. Permeiam o mundo físico (os dois luminares, ou seja, o sol e a lua, Gn 1.16) e a narrativa do dilúvio dá ênfase aos casais de machos e fêmeas no mundo animal (Gn 7.9). Os homens possuem diversos relacionamentos bipolares, inclusive amigos chegados (Ec 4.11), pai e filho (Gn 22.6), mãe e filha (Rt 1.19) e, acima de tudo, ma rido e mulher (Gn 2.25). A simetria arquitetônica proporciona vários exemplos de organização dual (Êx 25—40; I Rs 6 — 8 ). Dois tipos principais de sacrifícios eram oferecidos muitas ve zes nos ritos sacerdotais (Lv 12.8; cf. Êx 29.38). A sociedade do pós-exílio buscou a liderança nas instituições afins da monarquia e sacerdócio (Zc 4). Os dois reis amoritas derrotados são exemplos do auxílio poderoso de Deus no deserto (Js 24.12) e com a bênção de Deus, dois guerreiros bastam na batalha (Dt 32.30). 3. “Dois” é suficiente para descrever um número pequeno (1 Rs 17.12; cf. o alemão, “ein Paar”), apesar de as aproximações serem expressadas pelo acréscimo do número adjacente, como por exemplo, “um dia ou dois” (Ed 10.13) ou “dois ou três” (2Rs 9.32). Os membros de um par podem ser considerados em conjunto ou separadamente, em relação complementar ou oposta. A narrativa heb. joga, por vezes, com a ambigüidade relacionai (Gn 22.6, 8 ; Rt 1.8 ). Os contextos de companheirismo enfatizam um desejo comum de duas pessoas ou grupos (1 Sm 14.11; Am 3.3), mas também basta haver dois para existir conflito, opressão e dominação (Gn 25.23). As narrativas patriarcais descrevem conflitos entre duas esposas (Gn 30.1) e entre dois irmãos (Gn 25.23). No entanto, a harmonia entre indivíduos não aparentados pode ser expres sada e preservada por meio de uma aliança (Gn 21.27; ISm 23.18). A resolução de conflitos entre duas partes é tarefa para um tribunal (Dt 21.15; 25.1) e a sabedoria judicial de um rei discerne o íntegro do perverso ( I Rs 3.16). As leis de poligamia proíbem o tratamento prefe rencial de uma das esposas (Dt 21.15-17) e ambas as partes envolvidas no adultério devem ser condenadas à morte (Dt 22.22). A base para a igualdade e imparcialidade é a justiça de Deus (cf. Dt 10.17) e sua posição de Criador (cf. Pv 20.12). 4. No que se refere à analogia com os tratados do OMA, não se deve considerar os dez mandamentos divididos em duas tábuas (Êx 34.1, 4; Dt 4.13). Antes, trata-se de registros em duas vias que normalmente ficariam nos templos das duas nações envolvidas (Kline, 13-26). Em Israel, foram colocadas na arca (lR s 8.9), servindo de testemunhas para o compromisso mútuo com a Torá tanto da parte de Deus quanto de Israel. 5. A tendência de Israel para a apostasia e iniqüidade levaram ao chamado deut. e pro fético para escolher entre dois caminhos ( lRs 18.21; mas cf. Jr 2.13). A divisão de Israel em duas partes — Norte e Sul — é o foco da crítica profética e das esperanças de, um dia, voltar a haver união (Jr 33.24; Ez 37.22).
193
P® (#9111)
v. O número ordinal “segundo” descreve com mais freqüência um segundo dia, mês ou ano. Pode identificar o segundo de uma série de três (2Sm 14.29) ou de uma seqüência mais longa numa lista (Gn 1.8 ). Numa seqüência de dois, descreve o outro (Êx 1.15; 25.12) ou uma açào repetida, novamente ou pela segunda vez (Lv 13.5-7). Segundas aparições, revelações e sonhos da parte de Deus (Gn 22.15; 41.5; Ag 2.20) ressaltam a importância da revelação e a certeza de seu cumprimento. 7. A duplicidade implícita é indicada por uma estrutura dupla de uma frase ou discurs A retórica deut. coloca diante do povo a escolha entre dois caminhos pela justaposição de dois termos opostos ligados por “e” (wãw, Dt 30.15) ou pela descrição de conseqüências contrastan tes em frases subseqüentes (Dt 30.16-18). A duplicação do efeito é uma característica comum do par. antitético (SI 1.1; Pv 10.1), como também o é a ênfase contrastiva da mesma palavra (SI 1.6 ; Pv 11.25). A ênfase é expressada ainda por meio da repetição da mesma palavra (1 Rs 13.2; “Eu, eu mesmo”, em Is 43.25). A figura retórica de merisma é usada para indicar o todo por meio da descrição dos dois extremos (SI 95.4-5). P-B Nos textos de Qumran, os termos “dois” e “segundo” aparecem em instruções milita res e referentes a sacrifícios A segunda das três redes de Belial para apanhar Israel é a riqueza (CD 4; 17). Em harmonia com o dualismo de Qumran, 1QS 3:18 refere-se a dois espíritos, um de verdade e outro de dissimulação, colocados por Deus nos homens. NT A perspectiva escatológica do NT intensifica a exigência de se escolher entre o caminho de Jesus e o caminho de oposição a Deus (Mt 6.24; Lc 16.13; cf. Mt 7.13-14). Números: 'ehãd (um, # 285); -> 'elep II (milhar, contingente militar, # 547); -> 'arba' (quatro, # 752); hãmêS (cinco, # 2822); mê a I (cem, # 4395); ‘eser (dez, # 6924); -> r^bãbâ (dez mil, miríade, # 8047 / 8052); seba ' I (sete, # 8679); -> SãlõS, SelõSâ (três, um grupo de três, # 8993); -> Semõneh (oito, # 9046); -> Senayim (dois, # 9109); -> sês I (seis, # 9252); -> tèsa' (nove, # 9596) Numeração, contagem: -> kss (calcular, repartir, # 4082); -> mnh (contar, # 4948); -> spr I (contar, numerar, calcular, repetir, # 6218); pqd (numerar, determinar, #7212) B ib l io g r a f ia
EDNT 1:360; NIDNTT 2:686; TWOT 2:942; M. G. Kline, Treaty o fth e Great King, 1963; J. B. Segai, “Numerais in the Old Testament,” JSS 10, 1965, 2-20; W. G. E. Watson, Classical Hebrew Poetry: A Guide To Its Techniques, 1984. P. P. Jenson 9110 (senínâ, zombaria), ->#9111
9111 (Sên I), dente, marfim (
(snn I), q. afiar; hitpol. ser perfurado (#9111); ru’3® (Senínâ), zombaria, comentário mordaz (# 9110); # 9094); OOrnU? (sênhabbim), marfim ( -> # 9105).
OMA O radical Snn, afiar é atestado de diversas formar no aram., afiado, no sir., ponta, e no ugar., dente. 194
ptC (# 9112)
AT 1 .0 vb. no q. é usado para a afiação de espadas ou flechas (Dt 32.41; Is 5.28) e de modo metafórico para palavras maldosas (SI 120.4; Pv 25.18). O Salmo 73.21 (hitpol.) refere-se às pontadas de dor resultantes da angústia. 2. A palavra seninâ é usada com mãSãl, provérbio, na linguagem de ameaças. As ma dições da aliança ameaçavam Israel com a possibilidade de exílio em meio às nações. Se per sistissem em sua desobediência, passariam pela desgraça do exílio e nesse tempo as nações tratariam o povo da aliança de Deus como se fosse “pasmo (sammâ), provérbio (mãsãl) e motejo (seninâ)" (Dt 28.37). Semelhantemente, na consagração do templo de Salomão, o Senhor preveniu Israel que, apesar de sua presença com eles, poderiam ser abandonados e passar pela desgraça do exílio, quando se tomariam “provérbio (mãsãl) e motejo (Seninâ) entre todos os povos” (1 Rs 9.7 || 2Cr 7.20). Jeremias, o profeta do exílio, aplicou as maldições da aliança a uma nação apóstata, quando construiu seu discurso de modo a impressionar o povo com o caráter inevitável e certo do julgamento. A herança do Senhor passaria a ser conhecida entre as nações como “objeto de espanto (zewã ’â), calamidade (za awâ) para todos os reinos da terra; opróbrio (herpâ [-> # 3075]) e provérbio (mãSãl [-> # 5442]), escárnio (Seninâ) e maldição (qelãlâ [-> # 7837])” (Jr 24.9). NT A Bíblia como um todo (cf. Tg 3.1-12) adverte do estrago cruel que palavras maldosas podem causar, incitando o julgamento impetuoso do próprio Deus (Mt 5.21-22). Afiação: -> brr II (afiar, # 1406); -> h d d (ser afiado, aguçado, # 2523); -> l(S (afiar, # 4323); -> qillesôn (objeto afiado?, # 7849); Snn I (afiar, perfurar, #9111); Embotamento: pe?irâ (embotado?, # 7201); -> qhh (ser embotado, # 7733) Motejo: -> ly$ (desdenhar, contar vantagem, ridicularizar, # 4329); -> mwq (escarnecer, zom bar, motejar, # 4610); -> shq (rir, escarnecer, regozijar-se, celebrar, dançar, # 8471) P. J. M. Southwell / W. A. VanGemeren
pu?’ (Snn II [?]), pi. fazer ser repetido, recontado, reci tado (hapleg. [?] em Dt 6.7; #9112; HALAT 1484a; a menos que snn em Dt 6.7
pu?
OMA É possível que haja um radical proto-sem. *tny ou *trm (iterativo geminado) por trás de todos os termos sem. glosados t / t / Sny / h / n que possuem sentidos semelhantes ou deriva dos do sentido de repetir, sendo que alguns começam com um Itl fonético (como no ugar. tny, repetir, recontar [ WUS, n. 2898; CML2 160a; cf. Donner, 324-27]; ár. tanay ou tanã', vergar, dobrar, curvar [E. W. Lane, An Arabic-English Lexicon, 8 vols., 1863-93,1/1,356-61; Wehr, 107 a-b]; cf. Moscati, §§8.11-14, 16, 19, 59-60), outros com a redução d e/f/p ara/t/ (como no heb. tnh, repetir, recontar [Jz 5.11; 11.40] e *tnn [?], repetir, copiar [subs. t’nn, semelhança, efígie; valor, preço (de acordo com Halper; observar o trocadilho polissêmico em Mq 1.7; de acordo com REB); cf. Barr, 145 n. 17, 322 n. 45; BDB, 1072b (sugerindo que *tnn seja uma forma secundária de n/w); e HALAT99 (sugerindo que o subs. 'tnn represente uma forma enérgica de ntn]); aram. tn \ repetir, ensinar; ár. tinn ou tanTn, igualar [Lane, 318]; cf. Moscati, §§8.11-14, 18, 59), ou a redução HJ para /SI (como no acad. Sanü, repetir, recontar [AHw 3:1165b-66a; 195
T3127 (# 9 1 1 2 )
CAD, §/l, 389b-403a]; heb. Snh II, repetir [subs. Senltayim, dois; miSneh, duplo, cópia] e Snn, repetir, recontar; cf. Moscatti, §§8.11-15, 17, 59). Cf. egíp. sn (WbÀS 4:148). Portanto, é possível que os vbs. heb. Snh II, repetir (HALAT 1477a), Snn II, repetir, tnh, repetir, recontar (HALAT 1619b-21a) e *tnn (?) sejam formas secundárias de um só ter mo glosado. Essa proliferação de termos glosados dentro um único âmbito semântico pode ter ocorrido como resultado de uma difusão dialetal (ainda que provavelmente não seja o caso, pelo menos em Jz 5.11 e 11.40, como resultado de um empréstimo; ver 0 ’Connell, 345 n. I; em oposição a Wagner, 119 n. 327). De fato, a diferenciação no proto-sem. entre *tny / *tnn, repetir e *Sny, ser/tomar-se diferente (como no ugar, entre tny, repetir e Sny [D], diferir; mudar [WUS, n. 2649]; no acad. entre Sanú III, repetir e Sanú IV, mudar [AHw 3:1166a-67a; CAD § /l, 403a-8b]; no aram. entre tn ', repetir e Sny [pael], mudar [DISO, 313; KAI, n. 266:9 (?); cf. o aramJ SnyI mudar (Jastrow, 1606a-b) e o sir. Sn ’, mudar (J. Payne Smith, A Compendious Syriac Dictionaty, 1903,586b-87a)]; e no heb. entre Snh U/Snn U/tnh/*tnn, repetir e Snh I, mu dar [HALAT 1476a-77a; cf. o heb. pós-bíblico Sny/h (pi./hitp.), mudar (Jastrow, 1605a-6a)]) pode ser resultado de um processo semelhante de difusão dialetal, mas de uma difusão desse tipo que tenha ocorrido há tanto tempo que é justificável os lexicógrafos considerarem esse padrão como uma forma de distinção entre dois cursos etimológicos AT O vb. heb. Snn II pode ser atestado no AT em Deuteronômio 6.7: “Tu as recitarás (weSinnantãm) [ou seja, as palavras de Javé do v. 6 ] a teus filhos, e delas falarás (wedibbartã) enquanto estiveres descansando em tua casa e enquanto estiveres andando pelo caminho, ao deitar-te, e ao levantar-te” (tr. do autor). O contexto de Deuteronômio 4— 11 deixa claro que ensinar os mandamentos de Javé a cada geração sucessiva era uma responsabilidade que Javé e seu servo Moisés haviam colocado sobre a nação. Nesse v., ao que parece, o significado propos to de Snn II, repetir, recitar, é corroborado pelos merismas “enquanto estiveres descansando... enquanto estiveres andando” e “ao deitar-te... ao levantar-te”, deixando implícito que ensinar os mandamentos de Javé acarretaria numa recitação e discussão contínua e pelo paralelismo verbal Snn, recitar || dhr, falar. No entanto, caso se reconhecesse aqui o heb. Snn I = ár. sanna, afiar; prescrever, decretar, estabelecer [uma lei/um costume] (Wehr, 433a) em vez do heb. Snn = Snh = ugar. tnn, repetir, recitar (cf. Driver, in FS Nütscher, 48), o v. também faria sentido, mas o enfoque da injunção seria mais sobre o objetivo de estabelecer como lei/costume as palavras de Javé citadas no v. 6 do que sobre a natureza repetitiva da tarefa. P-B Cognatos posteriores ocorrem no heb. pós-bíblico, Sny/h, repetir; estudar, ensinar (Jas trow, 1605a-6a) e tny/h (pi.), repetir, recontar, contar; (hi.), estipular (Jastrow, 1681 a-b); no aramJ tnyl ’, repetir, recontar, contar; (pael), fazer ser relatado, ensinado; (aphel), estipular (Jas trow, 1681b-82a) e no sir. tn \ repetir, recitar (Payne Smith, 616a). B ib l io g r a f ia
TWAT 8:318-24 (sobre Snh), 342-45 (sobre Snn); TWOT 2:942a-43b (sobre Snh), 2422 (sobre Snn); J. Barr, CPTOT, 1968,145 n. 17,322 n. 45; J. Blau, “Über homonyme und angelblich homonyme Wurzeln II,” VT1, 1957 (98-102) 101-2; J. L. Crenshaw, “The Expression míyôdêa'’ in the Hebrew Bible,” P T 36, 1986 (274-88) 279 n. 13; H. Donner, “Ugaritismen in der Psalmenforschung,” ZA W 79, 1967, (322-50) 324-27 (sobre Ugar. tny); G. R. Driver, “Problems of the Hebrew Text and Language,” in Alttestamentliche Studien, FS F. Nõtscher, BBB 1, 1950, (46-61) 48 (re Deut 6:7); idem, “Hebrew Poetic Diction,” in Congress Volume, Copenhagen 1953, SVT 1, 1953, (26-39) 27 (sobre thn em Jz 5:11; 11:40); idem, “Problems and Solutions,” 196
no® (#9115)
VT4, 1954, (225-45) 242 (sobre 'tnn); J. A. Emerton, “The M eaningofiê«ã’in Psalm cxxvii,” VT24, 1974, (15-31) 25-26; idem, “The Works o f D. Winton Thomas as a Hebrew Scholar,” VT 41, 1991, (287-303) 300-301; B. Halper, “The Root p n ,” 24, 1907-1908, (366-69) 366-68; B. Halpem,“YHWH’s Summary Justice in Job xiv 20,” VT2%, 1978,472-74; L. Kopf, “Arabische Etymologien und Parallelen zum Biblewõrterbuch,” VT9, 1959, (247-87) 280-83; B. Margalit, “Lexicographical Notes on the Aqht Epic (Part 1; KTU 1.17-18)”, UF 15, 1983, (65-103) 90-91; S. Moscati, ed., An Introduction to the Comparative Grammar o fth e Semitic Languages, 1969; R. H. 0 ’Connel, The Rhetoric o f the Book ofJudges, SVT 63, 1996, 345 n. 1; S. Paul, “Unrecognized Biblical Legal Idioms in the Light ofthe Comparative and Akkadian Expressions,” RB 86,1979, (231 -39) 233-35; J. Sanmartin, “Glossen zum ugaritischen Lexikon II,” UF 10, 1978, (349-56) 354, idem, “Glossen zum ugaritischen Lexikon III,” UF 11, 1979, (723-28) 727-28; D. Winton Thomas, “The Root n3® = sny in Hebrew,” ZAW 52, 1934, 23638; M. Wagner, Die lexicalischen undgrammatikalischen Aramaismen in alttemtamentlichen Hebràisch, BZAW 96, 1966, 119 n. 327 (sobre tnh). Robert O 'Connell
no® (ssh), q. saquear, pilhar; poel saquear, pilhar (# 9115); 0 0 ® (.?.«); saquear; ni. ser saqueado (# 9116); H0®p (meSissã), subs. pilhagem (# 5468). 9115
no®
OMA Os termos ugar. tsj ou tss e o egíp. s3s, são possíveis cognatos com o mesmo sentido de saquear. AT 1. ssh e Sss ocorrem juntos em Jz 2.14, em que o part. q. ssh é traduzido como “espoliadores” e o vb. Sss como “pilhar”. No entanto, exceto pela tendência de se usar Ssh na forma participial, não fica evidente a existência de nenhuma distinção de sentido entre os dois radicais O HALAT considera ambos como formas paralelas. 2 . O termo ssh é encontrado nos livros históricos, em que tem o sentido literal de sa quear, como no caso em que Saul saqueou os amalequitas (ISm 14.48) e em que os filisteus saquearam Queila (ISm 23.1). Em Jz 2.14, ssh refere-se àqueles que saqueiam Israel como castigo de Deus pela nação haver adorado Baal e Astarote. Assim como outros termos dessa esfera (ver bzz e Sll), a palavra saquear encontra-se diretamente associada ao julgamento de Deus em função de pecados específicos, neste caso em particular, da adoração a deuses estran geiros Observamos o padrão quádruplo do período dos juizes aparecendo nos vv. 14-16, à me dida que o povo passa da perversidade e adoração de deuses estrangeiros (pecado, vv. 11-14), para a experiência da vergonha e violência de ser saqueado (v. 14), até um estado de angústia profunda (v. 15) e finalmente à salvação (v. 16). 3. O termo Ssh ocorre com mais freqüência nos escritos proféticos ( 6 x). Tanto Isaías quanto Jeremias usam o termo em oráculos que denunciam nações estrangeiras. A Babilônia saqueia Israel (Jr 50.11) numa previsão do que será o exílio. A Assíria será saqueada por Deus (Is 10.13). Nos oráculos dirigidos a Israel, Isaías 17.14 promete que os saqueadores que trou xeram consigo o terror na noite terão desaparecido pela manhã. Prontos para saquear (Ssh) Israel, eles próprios serão saqueados (bzz; # 1024; cf. Jr 30.16). Em outros oráculos dirigidos a Israel, Isaías 42.22 é particularmente importante. O profeta fala de Israel, o servo de Deus, dizendo que este é cego e surdo (v. 18), um povo roubado (bãzüz, # 1024) e saqueado (ssh). E, no entanto, esse servo está destinado a tomar-se testemunha de Deus às nações (Is 43.10). 197
SDIP (#9117)
O uso metafórico do termo saquear enfatiza a extensão do julgamento de Deus e a ignomínia de Israel (v. 24b). Na verdade, Isaías 40.2c refere-se ao castigo duplo do exílio na Babilônia, de modo que o salmista é levado a clamar, “Por que... Senhor?" (SI 44.23-24 [24-25], uma vez que o castigo de Deus (despojo, Ssh, v. 10 [11] parece tão severo. 4. O termo Sss no Salmo 89.41 [42] descreve as emoções daquele que fala (suposta mente o rei) e que sofreu o despojo (v. 41 [42]) e a vergonha (v. 45 [46]) diante dos inimigos de Israel (v. 50 [51]). Numa referência à aliança com Davi (v. 36 [37]), o salmista clama, “Até quando, Senhor?” (v. 45 [46]). Nesse caso, o ato de despojar serve para ressaltar a humilhação sofrida pelo salmista. Assim, é um daqueles termos vividos que, se forem considerados com seu significado pleno de horror, violência e vergonha, nos permite compreender mais profun damente a ira de Deus e, por outro lado, a extensão de sua misericórdia. 5. Assim como Ssh, Sss é usado pelos livros históricos em relatos de batalhas, como na derrota de Golias (ISm 17.53) e, contrastando com isso, num oráculo contra o remanescente de Israel que em breve será enviado para o exílio, despojado por seu inimigo (2Rs 21.14). Nos profetas literários, pode-se encontrar oráculos de julgamento sobre Jerusalém (Sf 1.13), sobre seus inimigos (Is 13.16, Babilônia) e, por fim, com referência à batalha escatológica entre as forças do mal e do bem (Zc 14.2). Como tema teológico, o saquear e despojar dão corpo à ira terrível de Deus e, ao mesmo tempo, sustentam a esperança escatológica de que as fortunas deste mundo não são o fim e de que chegará um dia em que os saqueadores serão saqueados, os poderosos serão derrotados e os últimos serão os primeiros 6 . O subs. meSissá derivado do radical Ssh é encontrado 6 x com o sentido de espólio ou despojo. 2 Reis 21.11-16 apresenta o julgamento de Deus contra Manassés por idolatria (v. 11) e pelo derramamento de sangue inocente (v. 16). Assim, o remanescente de Israel será entregue nas mãos de seus inimigos, que tomarão sua presa (baz) e despojo (meSissâ; v. 14). Desse modo, o escritor conduz sua história até sua conseqüência inevitável — o exílio na Ba bilônia, mas ao mesmo tempo, apresenta a idéia de um remanescente, conceito que tomou-se essencial no pensamento do judaísmo do pós-exílio e no cristianismo. Aqui, o remanescente é usado juntamente com a herança para enfatizar a extensão da ira de Deus. Posteriormente, se tomará símbolo da misericórdia de Deus (Zc 8.6-11; cf. Rm 9.27). O restante das referências a meSissâ encontra-se na seção profética, tendo o mesmo sentido de julgamento refletido em outras palavras para saque (p. ex. Ha 2.7). Saque, despojo, roubo, furto: -> bzz (pilhar, saquear, # 1024); -> gzl (furtar, roubar, # 1608); -> gnb (furtar, roubar, # 1704); -> pãris II (assaltante, ladrão, # 7265); -> pereq (encruzilhada?, saque, # 7294); Sll II (tomar despojos, agarrar, # 8964); -> Ssh (saque, pilhagem, #9115) B ib l io g r a f ia
G. Hasel, The Remnant, 1972; H. J. Stoebe, “Raub und Beuten,” SVT 16, 1968, 340-54. W. R. Domeris 9116 (Sss, saquear), ->#9115
yotf («''), rasgar, dividir (# 9117); V0p (Sesa') parte fendida (#9118). 198
W
(#9119)
AT 1. í í ‘ aparece 5x no q., sempre com referência ao casco fendido de um animal. Ocorre com mais freqüência como um part. seguido de um cognato acusativo, “o casco se divide em dois” (Lv 11.3,7 [part. masc.], 26; Dt 14.6). Em uma ocasião, a forma aparece como q. pass. no part. (Dt 14.7). Três ocorrências do pi. referem-se a uma pessoa separar as partes de um animal. O termo também descreve a ação do sacerdote de rasgar as asas de uma ave (Lv 1.17) e de como Sansão rasgou um leão como rasgaria um cabrito (2x, Jz 14.6). Por fim, há ainda a ocorrência pouco clara em 1 Samuel 24.7[8], em que Davi rasga seus homens com palavras, recusando-se a dar-lhes permissão de atacar Saul. As versões não proporcionam nenhum consenso e já foram propostas diversas emendas, inclusive wym n', conteve; w y s q acalmou e wysm ', ouviu (ver McCarter, 381; Stoebe, 435). Apesar de seus problemas (Stoebe), a sugestão de Driver que relacio na o acad. Sasú, clamar, bradar, gritar, ler em voz alta (AHw, 1195) a um homônimo de ss ‘ que não é atestado de nenhuma outra forma, rasgar, dividir, continua sendo a opção mais plausível. Driver (1927, 286) traduz, “e Davi convocou seus homens com palavras”. Gordon mantém o sentido de “fender” seus homens com palavras e sua ação de cortar a veste de Saul (v. 4 [5]). 2 . O termo sesa \ parte fendida, um a forma substantivai do radical s s ", aparecem como o cognato acad. do radical verbal em quatro passagens que descrevem o casco fendido de um animal. NT
-> NIDNTT3:543-44
Divisão, medida, porção: -> hlq II (dividir, obter uma parte. # 2745); -> h$h (dividir, ser divi dido, # 2936); -> hss (dividir, ordenar, # 2951); -> mnh (contar, # 4948); -> plg (ser dividido, # 7103); -> prd (espalhar-se, ser divido, manter separado, # 7233); -> prs (medir, dividir, # 7271); -> ss ‘ (rasgar, dividir, #9117) B ib l io g r a f ia
G. R. Driver, “Two Forgotten Words in the Hebrew Language,” JTS 28, 1927, 285-87; idem, “Birds in the Old Testament: I. Birds in Law,” PEQ 87, 1955, 5-20; R. P. Gordon, “Word-Play and Verse-Order in 1 Samuel XXIV 5-8,” V T40, 1990, 139-44; P. K. McCarter, Jr, / Samuel: A New Translation with Inlroduction, Notes and Commentary, AB 8 , 1980; H. J. Stoebe, Das erste Buch Samuelis, KAT8/1, 1973. Richard Hess 9118 (s e s a parte fendida), -> #9117
9119
HO®'
HD® (Ssp), pi. despedaçar (?), cortar em duas partes (?) (#9119).
AT Esse hapleg. pode ser um shafel de swp, terminar, completar ( -> # 6066); daí, a tradu ção, “dar cabo / executar”. O heb. mix. emprega sçp, separar, dividir. 1 Samuel 15.33 descreve o que Samuel fez a Agague, o rei amalequita diante do Senhor, ou seja, num contexto/processo ritual informal. Pode significar (tomando por base Gn 15.10; Jr 34.18-19) que ele cortou o rei em duas partes, como foi feito com os sacrifícios nesses vv. P-B A LXX traduz com sphazõ, executar cortando a garganta; abater; cf. lat. jugulãre, cortar a garganta. A Vg. traduz como frusta concidit, cortar em pedaços. Assim, ainda não se sabe ao certo o significado exato do termo. 199
n y tf (# 9120)
Corte, destruição, extermínio, tosquia, poda: bs ‘(decepar, beneficiar-se, eliminar, separar, # 1298); -> br ’ III (podar árvores, cortar, destruir, # 1345); btr (despedaçar, # 1439); -> gc/‘ (cortar curto, # 1548); ghz (produzir, # 1602); -> gzz (cortar, tosquiar, # 1605); gzr I (cortar, remover,# 1615); grz(serelim inado,# 1746); -> g r ' I (cortarfora, cortar,# 1757); -> hip II (trespassar, perfurar, # 2737); -> /«/i (cortar, derrubar [mato / árvores], # 4065); Ar.vm (deixar aparado, removido, #4155); -> krt (cortar, eliminar, exterminar, realizar aliança, circuncidar, # 4162); melqãhãyim (espevitadeiras para aparar / limpar lâmpadas / lamparinas, # 4920); nqp I (cortar, derrubar [mato / árvores], destruir, # 5937); -> nth (despedaçar, # 5983); -> gsò (eliminar, tosquiar, # 7892); -> ís/? (despedaçar, #9119); -> /zz (decepar, # 9372) Eugene Carpenter
9120 OMA Acad. se
nm
( s '/?), q. olhar, preocupar-se com; hi. desviar o olhar; hitp. olhar em volta (# 9120).
procurar; ugar, t ‘y , olhar (rapidamente) por.
AT 1. O q. denota a ação de perceber com os olhos, ver (Is 32.3) e de considerar. O Senhor considerou favoravelmente (se agradou de) Abel e seu sacrifício, mas não Caim e seu sacri fício (Gn 4.4-5). No dia da destruição de Damasco, os olhos das pessoas atentarão para o seu Criador e não mais para seus ídolos (Is 17.7-8). O salmista confessa que sempre atentará para os decretos de Deus (Sl 119.117). 2. O q. e o hi. expressam a ação de desviar um olhar de fúria (Jó 7.19; 14.6; Is 22.4) salmista implora ao Senhor para suprir sua necessidade e, no entanto, pede para ser poupado de nenhum escrutínio da visão crítica de Deus e para que Deus desvie seu olhar de fúria (Sl 39.13 [14]). 3 .0 hitp. expressa a sensação de perda de forças e coragem. O vb. é usado para pro a acusação de que os deuses são incompetentes: não podem sequer prever e interpretar acon tecimentos. Em decorrência disso, não exercem nenhuma influência verdadeira sobre o povo, podendo levá-lo assustar-se ou encher-se de medo (Is 41.23). Em Isaías 41.10, o vb. é usado para enfatizar a relação de compromisso entre Deus e seu servo Israel: não há necessidade de medo ou assombro. Olhar, observação, percepção, vista, visão, vigilância: -¥ hdh II (olhar fixamente para, apare cer, # 2526); -> hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); hmh (ver, espreitar, tomar-se visível, # 2778); -> nb( (olhar em volta, aceitar como favor, # 5564); -> pis II (observar, #7143); -> .m? II (olhar para, # 7438); -¥ r ’h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); -> rsd (vigiar, # 8353); s q d (notar, # 8567); -> s "h III (olhar atentamente, # 8617); -> sgh (olhar fixamente, fitar, # 8708); -> Swr I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, # 8800); szp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); -> í ‘h (olhar, preocupar-se com, olhar em volta, # 9120); sqp (olhar para baixo, # 9207); -> st ‘ (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283) B ib l io g r a f ia
O. Kaiser, Isaiah 13-39, 1974; A. van Selms, Genesis, 1979; A. Weiser, The Psalms: A Com mentary, 1962; C. Westermann, Isaiah 40-66: A Commentary, 1976. Jackie A. Naudé 200
n o s # (#9121)
9121
nt?y#
TOS?# (se 'afã), pisadela (de cascos) (halpleg. em Jr47.3; #9121).
AT O termo aparece apenas na descrição que Jeremias faz da invasão da Filístia pelos egíp cios. O som dos cavalos egípcios galopando cada vez mais perto causaria pânico nos filisteus, mas o exército egípcio era um simples instrumento do julgamento de Deus (v. 4). Cavalo: -> dhr (galopar, # 1851); -> sm I (cavalo, # 6061); -> pãrãs (cavaleiro, cavalariano, cavalo, # 7304); rekeS (parelha de cavalos, # 8224); -> ra ‘mâ 11 (crina, # 8310); Se‘ãtâ (pisadela [de cascos], #9121) Robert B. Chisholm
9122
T3DVU7
T3t?2?# (Sa ‘a(nêz), subs. estofo, poss. linho (# 9122).
OMA A palavra pode ter sido emprestada do egíp. (Craigie, Deuteronomy, NICOT, 290). AT O termo Sa ‘atnêz ocorre apenas na legislação contra as misturas. Levítico 19.19 diz: “Nem usarás roupa de dois estofos misturados”. Deuteronômio 22.11 diz, “Não te vestirás de estofos (Sa 'atnêz) de lã e linho misturados” . O termo estrangeiro incerto pode referir-se a um tecido usado em cerimônias de magia. A fé em Javé distanciava-se da magia e da manipulação. Ou ainda, a proibição pode ter por base a pureza das espécies. Algumas combinações de tecido violariam essa pureza. Tecidos, estofos: berõmim (tecido de duas cores, # 1394); -> ha(ubôt (tecido colorido, # 2635); ‘êz (tecido feito de pêlo de cabra, # 6436); $eha ‘ (tecido colorido, tingido, # 7389); Sa ‘afnêz (estofo, linho ?, # 9122); -> //' II (vestido(a) de tecido escarlate, # 9433) Linho: sãdin (veste de linho, # 6041); -> pêSet (fibra de linho, # 7324) Magia, feitiçaria, artes secretas: -> hereS I (magia, feitiçaria, # 3088); keset (banda [para fins de mágicos], # 4086); -> kSp (praticar magia, feitiçaria, # 4175); -> Ihs (conjurar, sussur rar, # 4317); -> lãf (segredo, ocultismo, # 4319); -> ‘nn (conjurar, # 6726); -> qsm (praticar adivinhação, # 7876) Robert L. Alden 9123 (So‘al, punhado),
# 3338
Q]_„ . (S‘n), ni, apoiar-se em, depender de (# 9218); subs. _____________________ I________ (miS'ãn), sustento, provisão (# 5472); (mas ‘ên) e n33?#D (maS ‘ênâ), sustento, (# 5473 e 5474); (mis ‘enet), apoio, bastão, vara (#5475). OMA Não se sabe ao certo a etimologia do radical. AT 1 .0 vb. ocorre 22x no AT, sempre no ni. Tem o significado geral de apoiar-se em algo ou alguém, mas em contextos que referem-se a pessoas, entra no âmbito semântico de confiar ou crer em alguém. 201
IV® (#9128)
2. Quando tem o sentido geral de apoiar-se em algo ou alg, s'n é sempre seguido da preposição ‘al. Assim, Sansão pede para ser colocado junto aos pilares do templo de Dagom para que possa encostar-se neles ( Jz 16.26), enquanto Saul apóia-se sobre sua espada (2Sm 1.6 ). Três das referências nessa categoria aparecem em 2 Reis, todas elas com relação a um superior se apoiando na mão de um servo. Naamã pede perdão quando entra no templo de Rimom com seu senhor se apoiando em sua mão (2Rs 5.18). Mais adiante, no relato do cerco de Samaria, faz-se referência em duas ocasiões a um oficial na mão do qual o rei de Israel se apoiou (2Rs 7.2, 17). Em ambos os casos, o oficial subordinado era uma pessoa importante da corte do rei. Não se faz menção alguma de doença ou fraqueza da parte dos respectivos reis e, portanto, é melhor supor que se tratava de uma expressão idiomática para descrever um servo de alto escalão e de confiança, um braço direito. 3. Em duas ocasiões, s 'n é usado com um sentido mais próximo daquele que o vb. pos sui em nossa língua, deitar-se ou, possivelmente, ser revigorado. Quando os três mensageiros angelicais visitam Abraão em Manre, ele quer buscar água para eles se lavarem e depois re pousarem (s'm) debaixo de uma árvore (Gn 18.4). Na citação do Livro das Guerras do Senhor em Números 21.15, diz-se que o declive dos vales leva até Ar e se encosta (ou se apoia) nos limites de Moabe. 4. Mais da metade das ocorrências de s 'n é em passagens que se referem a confiar em alguém, esp. no Senhor. Com apenas duas exceções, em que uma preposição vêm depois do vb., emprega-se ‘al. O contexto no qual ocorrem essas duas exceções mostra que provavelmente são assimilações ao uso idiomático de um vb. anterior. Em Provérbios 3.5, s ‘n 'el segue o uso de b(h 'el ( # 1053), enquanto em Isaías 50.10, confiar no nome do Senhor (yibtah besêm yhwh) é seguido da menção de se firmar sobre seu Deus (weyissã‘ên bêlõhãyw). 5. E interessante observar que há cinco situações nas quais o radical bth ( -> # 1053) ocorre no mesmo v. quesV; ou no v. imediatamente anterior (Jó 8.15; 24.23; Pv 3.5; Is 30.12; 50.10). Não é possível fazer uma distinção clara entre bth be e í ‘n 'al ou s 'n 'el. 6 . Vários subs. derivativos são usados no AT; a. mis'ãn. No cântico de livramento de Davi ele se alegra com o modo como Deus o livrou e foi seu amparo (SI 18.18 [19] || 2Sm 22.19). O contexto sugere não apenas amparo ou apoio, mas também um provedor. As outras duas ocorrências encontram-se em Isaías 3.1 em orações idênticas, kõl m is‘an-lehem wekõl mis 'an-mayim, “todo sustento de pão e todo sustento de água”. O único paralelo próximo é a expressão ma((êh-lehem em Levítico 26.26, “sustento do pão”. b. m as‘ên, m as‘êná. Essas duas palavras ocorrem juntas em Isaías 3.1 em que, em um só v., encontra-se um agrupamento de três palavras diferentes derivadas do mesmo radical. Ao que parece, possuem significado idêntico e, juntas, transmitem a idéia de que o apoio de todo tipo está sendo removido de Jerusalém e Judá. c. m is‘enet As onze ocorrências desse subs. são divididas entre uso literal e figurativo. Elias tinha um bordão que foi usado por seu servo Geazi no episódio com o filho da mulher sunamita (2Rs 4.29 [2x], 31). Do mesmo modo, o anjo do Senhor tinha um cajado em sua mão (Jz 6.21), enquanto os nobres são retratados segurando cetros e bordões (Nm 21.18). Esses bordões também eram usados pelos cegos (Ex 21.19) e pelos idosos (Zc 8.4). A palavra é empregada ainda de modo figurativo para retratar confiança em algo, especialmente no Egito, um bordão quebrado. Aparece no discurso de Rabsaqué, comandante de Senaqueribe, para Ezequias (2Rs 18.21 || Is 36.6), no qual Rabsaqué retrata Ezequias confiando num bordão que cede e causa ferimentos quando alguém se apóia nele. A combinações dos dois radicais smk e s ‘n nesse v. é importante, bem como a ocorrência de bth no mesmo contexto. O único uso positivo de m is‘enet com sentido figurativo encontra-se no Salmo 23 em que o bordão e o cajado do Senhor consolam seu povo. 202
yy tf (#9129)
Ajuda, apoio, sustento: -> zqp (levantar, erguer, # 2422); -> smk (sustentar, apoiar-se, revi gorar, # 6164); s ‘d (suprir, sustentar, # 6184); ‘zr (ajudar, sustentar, encontrar ajuda, # 6468); rpq (apoiar-se, # 8345); -> i '« (apoiar-se em, depender de, # 9128) Allart M. Harman
9129
yytf
yytf (s" I) q. lambuzar, alisar; hi. grudar juntos, cerrar; hitpalp. cegar-se (# 9129).
AT 1. As três ocorrências indiscutíveis desse radical encontram-se em Isaías. Em sua co missão, o profeta recebe a ordem de entorpecer os sentidos de seu público (coração, ouvidos e olhos) para receber e aceitar a mensagem de Deus (Is 6.10, hi. impv. “fecha-lhe os olhos”). 0 âmago dessa ordem era um chamado à proclamação fiel (ainda que não bem-sucedida) da verdade de Javé, que teria efeitos destrutivos sobre o público imediato de Isaías, mas ação salvífica sobre gerações futuras (von Rad, O TT2A 2, 155). 2. Posteriormente, durante seu ministério, Isaías mostra-se aflitivamente cônscio da devastadora conseqüência da verdade de Deus. Em Isaías 29.9, esse radical verbal é usado tanto nos derivativos do q. quanto do hitpalp.: “cegai-vos e permanecei cegos”. Quanto mais ele prega fielmente, mais sua mensagem parece tolice para os governantes de Judá (v. 10; ICo 2.14). Então o profeta clama, cheio de frustração: “Tudo bem, então continuem cegos!” (J. N. Oswalt, Isaiah 1-39, NICOT, 1986, 531). 3. E possível encontrar outras ocorrências de s “ em Isaías 32.2 caso se aceite a Vg. e em Ezequiel 16.4, caso G. R. Driver esteja certo ao fizer que o TM lemiS 7 é, na realidade um inf. aram. de s 'h que não aparece em nenhuma outra parte do AT, mas que corresponde a um s " II heb.-aram. (“Difficult Words in the Hebrew Prophets”, in Studies in Old Testament Pro phecy, 1950, 64). Fecham ento,encerram ento: -> 'tm (bloqueado,# 357); '/''(fechar [a boca],# 358); gwp 1 (cerrar, fechar, # 1589); -> (hh (lambuzado, enroscado, fechado, # 3220); -> (mh (bloqueado, # 3241); -> n 7 1 (amarrar, trancar, # 5835); -> sgr I (cerrar, fechar, abandonar, # 6037); stm (bloquear, # 6258); -> ‘sh I (cerrar, # 6781); -> ‘sm III (fechar os olhos, # 6794); -> ,?rr I (jun tar, tapar, ser estreito, estar em dificuldades, aperto, # 7674); qp$ I (unir, cerrar, # 7890); í " (lambuzar, alisar, cerrar, # 9129) B ib l io g r a f ia
C.A. Evans, “TheTexts os Isaiah 6.9-W ,'' ZAW 94, 1982,415; J. M. Schmidt, “Gedanken zum Verstockungsauftrag Jesajas (ls VI),” V T 2 \, 1971, 68-90. Bill T. Arnold
9130 se/divertir-se (# 9130);
yytf
VV0 (s " II), pilp. divertir, deleitar, desfrutar, brincar, folgar; pulp. ser acariciado, embalado; hitpalp. deleitar(sa ‘aSü'im), alegria, êxtase, desejo, deleite (#9141).
OMA No aram., s 's', deleitar, divertir, deleitar-se; sa ‘asü 'im, desejo; no sir. se ‘y ã e se ‘ãtã, di versão, passatempo, zombar; escárnio, desprezo, motejo, ridículo. Duas formas mand. são ates tadas: saa I, falar, relatar, recitar, discutir (MdD, 438) e saiata, espetáculo, jogo, esporte (MdD, 441a). Um possível uso et./aram. pode ser encontrado na forma s à ‘s â ‘e, dançar (Leslau, 54). 203
V1NP (# 9130)
AT 1. M orfologiaesintaxe. O radical s " II ocorre em várias configurações: pilp. com o sen tido de alegria intensa, levar a exultar, deleitar, desfrutar (3x: SI 94.19; 119.70; Is 11.8; HALAT 4 :1489b-90a; Buhl, 854a); polp. com o sentido de ser embalado, mimado, tratado com carinho, acalentado (Is 66.12); hitpalp. com o sentido de deleitar-se/divertir-se (SI 119.16,47). Consi derar também nesse caso o Salmo 29.9. O subs. sa 'a sú ‘im ocorre somente no pl. (SI 119.24; 77, 92, 143, 174; Pv 8.30, 31; Is 5.7; Jr 31.20). a. No grau pilp. o vb. significa brincar [com referência a uma criança], como no caso de “a criança de peito brincará sobre a toca da áspide” (Is 11.8). Também significa deleitar-se em algo, como nas palavras do salmista, "Tomou-se-lhes o coração insensível, como se fosse de sebo; mas eu me comprazo na tua lei” (SI 119.70); ou causar prazer, trazer alegria, como no Salmo 94.19: “Nos muitos cuidados que dentro de mim se multiplicam, as tuas consolações me alegram a alma”. b. No grau polp. o vb. ocorre apenas uma vez no AT e significa embalar uma criança sobre os joelhos: Referindo-se à bênção futura que seria concedida a Israel, o Senhor declarou: “Eis que estenderei sobre ela a paz como um rio, e a glória das nações, como uma torrente que transborda; então, mamareis, nos braços vos trarão e sobre os joelhos vos acalentarão” (Is 66.12). c. No grau hitpalp. o vb. ocorre uma vez no AT e significa deleitar-se em algo: “Terei prazer nos teus decretos; não me esquecerei da tua palavra” (SI 119.16; também no v. 47). d. O uso das duas formas em Isaías 29.9 é problemático. A oração hista ‘as ‘ü wãsõ ‘ii é par. à oração anterior, hitmahnehú útemãhü, estatelai-vos e ficai estatelados. Além disso, as duas orações são uma combinação de impv. duplos, hitp. e q. Assim, em ambos os casos, a mesma forma verbal é usada duas vezes. Os termos hista ‘as ‘ú e wãsõ ‘ú permitem ser compre endidos com um dentre três sentidos possíveis: i. Tomando por base a ocorrência do radical em Isaías 32.3, o HALAT 1489 considera que a raiz é s “ I (# 9129; ver BDB, 1044) e portanto, traduz como “cego”. Oswalt (529) e Motyer (239) também optam por esse sentido, bem como diversas versões e Tanakh. ii. Watts (383,384. n.9) traduz fitar atentamente, tomando por base s ‘h (# 9120), fitar. iii. A expressão também pode ser derivada do radical s “ II e, portanto, tra duzida como deleitar. O sentido dessa linha poderia ser, então, comprazer-se e deleitar, com ironia zombeteira. e. sa ‘asü ‘im ou sa ‘asü ‘im, subs. deleite (#9141). Esse subs. ocorre 9x no AT, sempre nos escritos poéticos. Normalmente, menciona-se o objeto do deleite: No Cântico da Vinha, Isaías explica, “Porque a vinha do Senhor dos Exércitos é a casa de Israel, e os homens de Judá são a planta dileta (sa'asú‘im) do Senhor; este desejou que exercessem juízo, e eis aí quebrantamento da lei; justiça, e eis aí clamor” (Is 5.7). O Senhor se deleitava em seu filho, Efraim: “Não é Efraim meu precioso filho, filho das minhas delícias [filho no qual me deleito]?” (Jr 31.20). A sabedoria fala de seu deleite na humanidade na criação, “Então, eu estava com ele e era seu arquiteto, dia após dia, eu era as suas delícias, folgando perante ele em todo o tempo; regozijando-me no seu mundo habitável e achando as minhas delícias com os filhos dos homens” (Pv 8.30-31). No Salmo 119, o salmista deleita-se em vários aspectos da Palavra de Deus: em seus estatutos (119.24), em sua lei (119.77, 97, 174) e em seus mandamentos (119.143). 2. Distribuição. O lexema s " II ocorre 17x no AT (supondo que as duas formas em Is 29.9 são derivadas de s ‘‘ II): 9x em Salmos (94.19; 119.16, 24, 47, 70, 77, 92, 143, 174); 5x nos profetas: Is 5.7; 11.8; 29.9 [2x]; 66.12; Jr 31.20 e 2x em Provérbios (8.30, 31). O uso predominante, portanto, encontra-se nos livros poéticos e de sabedoria, talve numa indicação do significado da palavra para o salmista. É o caso especialmente para o escri tor do Salmo 119, uma passagem na qual pode-se encontrar todas as formas de uso do termo nos Salmos com apenas uma exceção. Do ponto de vista do gênero, as ocorrências são todas. 204
y y t f (#9130)
sem exceção, nos escritos poéticos. Esse fato em si indica um uso e compreensão figurativa dos respectivos termos. O lexema s a “ ocorre 8x. Essas formas ocorrem apenas em Salmos (4x) e Isaías (4x). O subs. sa'asú'im ocorre 9x no AT; 5x em Salmos, 2x em Provérbios e 2x nos profetas. Com exceção de Isaías 11.8, traduzido como brincar, o subs. é traduzido de modo uniforme como deleitar/comprazer. Como veremos mais adiante, o sentido é uniforme ao longo de todo o AT. 3. Sinônimos e antônimos. Kidner (1975, 420, n .l) sugere que, comparado a sãmêah, feliz ( -> # %524)/simhâ, alegria (# 8525), o subs. sa 'a sü ‘im possui “um tom mais tranqüilo e simples”. No entanto, sa ‘asú Im descreve uma emoção intensa. A diferença encontra-se na di reção/maneira de expressão e não na intensidade da experiência, sa 'asú ‘im possui um enfoque interior e o radical smh, uma exuberância exterior. Entre outros sinônimos, pode-se citar ’ng (# 6995) pi, viver em prazer; s b ' ( -> # 8425), estar satisfeito; I ’b desejar, almejar ( -> # 9298) e lips, deleitar, aprazer ( -> # 2911). Os antônimos incluem skh, esquecer ( # 8894) e (ps, empedernido, insensível ( -> # 3263). Em comparação com smh e hps, s “é usado apenas algumas vezes. Contudo, essa com paração, baseada numa contagem literal das formas, é enganosa, hps é traduzido como deleite apenas 16x, o mesmo número de vezes que s “. O termo ‘ng é usado 15x em todas as suas for mas. Na realidade, portanto, apesar dessa aparente escassez, s " é um dos principais radicais traduzidos como deleite no AT. Esse fato, em si, dá ao termo grande relevância e levanta a se guinte pergunta: O que leva o escritor a usar esse radical em determinados pontos? 4. Uso teológico. No que se refere à esfera do uso, e difícil fazer uma distinção entre as formas de uso seculares e religiosas. Quase sem exceção, existem aspectos humanos e divinos fortemente entretecidos Até mesmo em Provérbios 8.31-32, a admiração da sabedoria diante da criação está relacionada a Deus — uma vez que a sabedoria personificada é o Criador. As duas principais esferas de uso coincidem com as tradições da literatura de sabedoria e dos es critos proféticos. a. A tradição da literatura de sabedoria, i. Nos Salmos as associações de palavras ta do subs. quanto do vb. ressaltam a importância da lei de Deus como um instrumento de jus tiça. A Torá é de grande valor para se viver com sabedoria e tomar as atitudes corretas e está relacionada às preocupações existenciais diárias da vida do crente/adorador. Assim, existe uma conotação de valor/benefícios pragmáticos: livramento da angústia pessoal, Salmo 119.70; orientação/conselho, 119.24; sustento, 119.77, 92 e salvação do perigo imediato, 119.174. As situações sociais nas quais o salmista encontra prazer na palavra de Javé são as mais variadas. No Salmo 119.70 trata-se de uma situação de adversidade pessoal. Por meio das aflições que sofreu, o salmista aprendeu a comprazer-se na palavra. Em 119.47, o contexto é definido pela presença de uma autoridade política; o poder político humano não sacia a sede do salmista pela palavra de Javé. A situação muda ainda mais em 119.24, 47, dois casos de opressão. É interes sante que todas as formas de uso substantivai aparecem numa situação de opressão/angústia: 119.24, 77, 92, 143, 174. Em cada uma dessas ocorrências no Salmo 119, s “é ligado à palavra de Javé. Os Salmos empregam oito termos para lei ou palavra (Kraus 2.411). Só no Salmo 119.9-16 são usados sete radicais diferentes relacionados à palavra de Javé. s " é diretamente relacionado com três desses radicais nos Salmos: tôrâ, hõq e miçwâ. É ligado indiretamente a dãbãr no Salmo 119.16 por um quiasmo (Dahood 2.175) sendo esta também a situação de behuqqôteykã e debãre(y)kã. Os dois principais sentido dos lexemas verbais encontram-se nos Salmos. O primei ro possui um sentido de esgotar-se de prazer (119.16, 47). O uso no v. 16 é par. aos vbs. para alegrar-se (íwí / sys, v. 14) e para meditar (siah, v. 15). A progressão se desenvolve do seguinte 205
1?1W(#9130)
modo: alegrar-se, meditar, deleitar-se em; o objeto de cada vb. é a palavra de Javé. Uma com binação parecida com sihà e s " ocorre em 119.47-48 (cf. vv. 23-24). Essa combinação pode indicar que a meditação diligente é o meio pelo qual a pessoa chega a deleitar-se na palavra de Javé. s “ é contrastado com a disposição negativa do esquecimento — um ato deliberado da vontade própria (Anderson 2:813) no v. 16; assim, deleitar-se nos estatutos de Javé envolve e requer o mesmo exercício consciente da vontade própria. No v. 47, o vb. implica uma dis posição positiva, caso em que é par. ao amor. Nesses dois w ., o deleite transmite, portanto, o sentido de esgotar-se de prazer por meio de um interesse refletido e consciente por um objeto, a saber, a palavra de Javé. O significado contém um elemento emotivo. Outra nuança do verbo é a alegria intensa, levar a exultar (SI 94.19; 119.70). Os dois vv. têm em comum a situação de angústia pessoal do salmista. Apresenta-se um contraste entre as atitudes negativas de rebelião, arrogância e insensibilidade e o prazer (119.70). No Salmo 94.19, o termo é associado a consolações, contrastando com ansiedade e preocupação. O vb. s “ transmite a idéia de uma receptividade humilde e sensibilidade à revelação de Javé, bem como confiança e fé nessa palavra. As duas formas de uso estão relacionados à lei / revelação de Javé como o objeto ou fonte do prazer. ii. Provérbios. As duas formas de uso nominais (Pv 8.30-31) são relacionadas à sab doria personificada na atividade da criação, Sa "asü ‘im aparece numa relação de quiasmo com shq, regozijo “Dia após dia, eu era as suas delícias, folgando perante ele em todo o tempo; re gozijando-me no seu mundo habitável e achando as minhas delícias com os filhos dos homens”. Esse arranjo em forma de quiasmo serve para enfatizar a alegria exuberante da sabedoria. Kidner (81) sugere que o significado no v. 30 é, “Eu era a própria felicidade”. Nessa declaração, encontram-se ecos da aprovação de Deus depois de avaliar sua criação em Gênesis 1: “E viu Deus que ... era bom”. Como instrumento e testemunha da criação, a sabedoria personificada exulta na criação de Deus. Essa nuança de exuberância está de acordo com a intensificação do sentido da raiz básica. b. Tradição profética. Todas as formas de uso de S ‘‘ nos profetas ocorrem dentro da relação de aliança. Israel é identificada como deleite do Senhor tanto em Isaías 5.7 como em Jeremias 31.20.0 contexto das ocorrências em Isaías 11.8 e 66.12 e escatológico, descrevendo como serão as coisas na Jerusalém restaurada. No entanto, os sentidos são diferentes. Em 11.8 vê-se uma brincadeira alegre, enquanto em 66.12 o lexema tem o sentido de ser embalado, mi mado, acariciado. Em Isaías 29.9, o contexto é o julgamento e a indiferença do povo diante de sua iminência. Com sarcasmo poético mordaz, o profeta insta o povo a continuar em sua indi ferença estúpida (“Estatelai-vos e ficai estatelados”) até que caia sobre eles o julgamento. Isaías 5.7 e Jeremias 31.20 são as duas únicas passagens em que o subs. ocorre fora dos Salmos. Javé é o objeto do deleite em ambos os casos, estendendo sua afeição a Israel. Nos dois exemplos, tem-se em vista a relação de aliança. Em cada uma das situações, a tensão é entre as expectativas de Javé, seu deleite e uma realidade decepcionante. O termo sa ‘asü 'im é usado no famoso Cântico da Vinha relacionado de maneira muito próxima com os troca dilhos juízo e quebrantamento (miSpãi, mispãh) e justiça e clamor ($edãqâ\ $e‘ãqâ) (Is 5.7). Javé deseja que haja juízo e justiça em Israel, mas encontra o oposto. A questão é que o delei te de Javé é qualquer coisa menos fonte de prazer para ele. Em Jeremias 31.20, supõe-se que Israel tenha chegado ao arrependimento por sua iniqüidade. Então, em decorrência de afeição de Javé para com seus filhos, o Senhor restaurará Efraim à sua posição dentro da aliança com ele. A conotação de um forte laço filial pode ser encontrada nos dois contextos. O sentido é o mesmo: tema afeição. 206
"Wí? (#9132)
P-B O vb. é encontrado várias vezes na LQ. Os textos do Mix. e do Talm. usam o vb. e o subs. basicamente com o mesmo sentido; sa 'asü ‘im adquiriu a nuança adicional de filho ama do. No heb. moderno, o subs. assumiu o sentido de “jogo, brinquedo”. Deleite, prazer, mimo: -> ‘dn (deleitar, viver em luxo, festejar, # 6357); -> ‘ng (deleitar-se, # 6695); *> pnq (mimar-se, mimar, # 7167); -> $hq (rir, brincar, insultar, # 7464); -> í “ II (brin car, comprazer-se em algo, # 9130) B ib l io g r a f ia
ISBE, 914; A. A. Anderson, Psalms, 2, NCB, 1972; L. C. Allen, Psalms 101-150, 1983; M. Dahood, Psalms 2 ,3,1968,1970; O. Kaiser, Isaiah 13-39, OTL, 1974; C. F. Keil e F. Delitzsch, Proverbs, 1964; idem, Psalms 73-150, 1975; H. -J. Kraus, Psalms, 2, 1989; J. L. McKenzie, Second Isaiah, 1968; J. Alec Motyer, The Prophecy o f Isaiah, 1993; J. N. Oswalt, Isaiah 1-39, NICOT, 1986; W. A. VanGemeren, “Psalms,” EBC, 5, 1991; J. D. w. Watts, Isaiah 1-33, 1985; C. Westermann, Isaiah 40-66, OTL, 1969; E. J. Young, Isaiah I, 2, NICOT, 1965, 1969. Douglas Carew / James D. Price
“ÍVIP (S‘r), q. calcular (hapleg. # 9132); 1 VÍ? (sa ‘ar II), subs. cálculo, medida (hapleg. # 9134). OMA O radical s ‘r ocorre no ugar. IV e no ár. s ‘r.
AT 1 .0 vb. hapleg. s 'r ocorre em Provérbios 23.7, que descreve o homem preocupado com todos os seus bens e na companhia do qual ninguém deve andar. Isso porque ele é um homem que está sempre calculando {s V) cada iguaria que alguém come e cada cálice que alguém bebe. Seu desejo extremo pelo seu pão e vinho fará o outro vomitar a comida, a bebida e a hospita lidade. Nessa parte, a LXX apresenta outra tradução: “Pois como um pêlo na garganta, assim é esse homem”. Para versões diversas e emendas propostas, ver W. McCane, Proverbs, 38384. 2 .0 subs. hapleg. sa ‘ar aparece em Gênesis 26.12, em que Deus abençoa as plantaç de Isaque para que ele colha uma medida (ou cálculo) cem vezes maior do que plantou. Medida, padrão, regra: zrh II (medir, # 2431); -> mdd (estender, medir, # 4499); -> s ‘r (calcular. # 9132); -> tkn (regular por meio de pesos ou medidas, # 9419). P ara medidas de peso / volume: -> ’êpâ (um efa, # 406), para medidas de comprimento: -> ’ammâ I (côvado, vara, braça, # 564) Russel Fuller
. ly t f (sa ‘ar I), porta (# 9133); IVÍtC (sô ‘êr), sentinela, ______________________ II ______ porteiro (# 8788). OMA A palavra sa ‘ar aparece numa carta do século XIV a. C. de Amama para Birídia de Megido, na qual o termo can. sahri é glosado com o acad. abullu, porta da cidade (eA 244, linha 16). Cf. fen., pún. s'r, porta; sir, ta r‘ã \ No fen. (DISO, 315) a inscrição de Caretepe (Aiii 14, 15, 16, 18) registra uma maldição colocada pelo o rei sobre qualquer um que derrubar a porta 207
W (# 9 1 3 3 )
ou apagar o nome do monarca que encontra-se escrito nela. Dentre os exemplos pún. pode-se citar uma inscrição de Malta; “porta de PN” (Honeyman). Trata-se de um exemplo de alguém que colocou seu nome numa porta (cf. também Rt 4.10). Também serve de exemplo de um nome numa porta em alguns casos da Bíblia em que sa 'ar aparece numa constr. com um subs. comum (p. ex., Ne 3.1, 3, 6, 13). A linha 22 da inscrição de Mesa contém a expressão de van gloria de Mesa sobre a cidade de Qarhoh, “Eu reconstrui as portas” . A essa declaração é acres centada outra sobre a reconstrução de suas torres (mgdlth, cf. 2Cr 14.7 [6]). (Para mais sobre a arqueologia das portas antigas de cidades, ver Wright, 191 -204 e Herzog). Os cognatos do semO descrevem portas de cidades, apesar de ser possível que a inscrição de Malta indique a entrada de uma habitação particular. AT I. A porta da cidade. Era o centro estratégico de uma cidade antiga. Tomar posse da por ta significava conquistar a cidade (Gn 22.17; 24.60). Era fechada durante a noite para garantir a segurança (Js 2.5). Era aberta para receber tributos (Is 60.11; cf. Ap 21.25; 1QM XI 1.13-14) e para dar as boas vindas ao seu rei (SI 24.7, 9). Quando a cidade era capturada, reis e oficiais colocavam seus tronos e cadeiras à por ta a fim de julgar a cidade subjugada (Jr 1.15; 39.3). Também há exemplos do exercício da justiça em tempos de paz (Dt 16.18; 17.5). Nomeavam-se juizes para cada porta. Os anciãos e sábios sentavam-se à porta para arbitrar casos e lá eram levados a efeito os castigos e execu ções (Dt 21.19; 22.15, 24; Pv 24.7; Jr 20.2). À porta da cidade, podia-se fazer negócio diante de testemunhas (Gn 23.10, 18). Também podia servir de local para o julgamento de Deus e morte (Ex 32.26-27; observe a referência às portas mesmo na residência temporária do arraial no deserto). A porta da cidade abrangia áreas privadas como aquela onde Joabe matou Abner (2Sm 3.27) e onde Davi aguardou o mensageiro que trazia notícias de Absalão (2Sm 18.24). Davi pranteou a morte de Absalão numa sala que ficava por cima da porta ( ‘aliyat hassa'ar, 2Sm 18.33 [19.1]). Havia lugares altos (hãmôt) nas portas das cidades, especialmente do lado es querdo de quem entrava (2Rs 23.8; cf. Cogan e Tadmor, 286-87 e a possibilidade de lugares de culto nas portas da cidade). Estar dentro da cidade era estar dentro de suas portas. Isso significava proteção, mesmo para o estrangeiro (Êx 20.10; Dt 5.14). Assim, o termo passou a simbolizar a cidade toda onde moravam os levitas (Dr. 12.12), onde os animais podiam ser abatidos e consumidos (Dt 12.15, 21) e onde eram guardados os dízimos (Dt 14.28). 2. A porta do santuário. A primeira referência a tal porta é uma alusão ao santuário ce lestial: “É a casa de Deus, a porta dos céus” (Gn 28.17). A entrada do átrio do tabemáculo no deserto era coberta com uma cortina feita especialmente para esse fim (Êx 27.16; 38.18). Cf. também a seção 5 abaixo. 3. A questão da entrada para uma habitação privada. A ordem para escrever a lei “nos umbrais (mezüzâ) de tua casa e nas tuas portas (sa 'ar)” pode ser uma referência aos batentes que formavam parte da “porta” que dava para o interior da casa, a menos que os batentes sejam relativos à habitação privada e as portas, à cidade (ou santuário). A ausência de outras referên cias que relacionem sa ‘ar, porta, com uma habitação privada argumenta em favor da porta da cidade como o local das inscrições mencionadas em Deuteronômio. 4. Uso simbólico. O uso simbólico das portas para descrever “ritos de passagem” ao longo da vida pode ficar evidente na queixa de Ezequias de que devia passar pelas portas da morte (sa ‘arêse 'ôl, Is 38.10; cf. Ecli 51.9; 1QH 111.17; -> # 8619). Uma expressão semelhante, 208
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(#9133)
portas da morte (sa'arê mãwet), ocorre em Jó 38.17; Salmo 107.18; IQH VI.24; 4Q184 1.10 ( mawet, morte, # 4926). 5. Os profetas. As promessas proféticas de uma nova Jerusalém e de um novo templo também mencionam as portas. Isaías 60.18 registra que as portas da futura cidade serão cha madas Louvor. Na visão de Ezequiel do novo templo de Jerusalém aparecem descrições deta lhadas das portas (Ez 40.6-48). 6. Porteiros. O subs. sõ ‘êr, sentinela, pode ser usado de várias maneiras: a. Os portei ros ou sentinelas da cidade atuam como mensageiros que relatam o que viram (2Sm 18.26) ou ouviram (2Rs 7.10). b. Os porteiros do santuário eram um grupo á parte no meio dos funcionários do temp (Ed 2.42, 70; 7.7; Ne 7.1, 45, 73 [72], etc.). Podiam ser separados em divisões (mahleqôt). O cronista indica que havia milhares deles durante o reinado de Salomão (lC r 23.5). 7. Concluindo, a porta representa duas áreas de temas teológicos. Em primeiro lugar, como entrada física de vilas, cidades e templos, a porta representa o centro estratégico e social. Ter a posse da porta é possuir a cidade. Obter acesso à porta do santuário é ter acesso a Deus. A segunda área temática é a da porta como metáfora. No AT é usada principalmente para a passagem da vida para a morte. Na literatura posterior, o significado é expandido de modo a referir-se ao acesso humano a diversas experiências. P-B 1. A expressão “as portas da salvação” (s ‘ryysw 'wt) aparece numa bênção a Deus com referência ao seu poder de livrar seu podo em tempos de crise (1QM XVIII.7). Cf. a expressão incomum “portas da eternidade” (s ‘ry 'wlm, 1QH VI.31), das quais são trazidas armas. A porta mencionada em CD X. 16 parece referir-se ao portal através do qual o sol entra no mundo para trazer o dia. 2. Em 1QM III. 1, 7; VII.9, 16; VIII.4; IX. 14; XVI.4 ocorre a expressão “portas da guerra” (s 'ry mlhmh). São identificadas por Yadin, 267, como intervalos na linha de combate usados por escaramuçadores e outros indivíduos para avançar. 3. Em 4Q492, a expressão “portas de luz” (i 'ry ’wr) aparece dentro de contextos frag mentários (III.14; IV.2; VIII.10; XI.12; XII.20; XIX.2). 4. Pode-se encontrar uma grande quantidade de material sobre a construção e colocação das portas no novo templo em 11QT, especialmente nos capítulos 39-44. NT NIDNTT 2:29-31. Porta, portão, limiar: -> 'ayil (batente, # 382); 'õmnâ (pilar?, batente?, # 595); bPriah (barra, # 1378); delet (porta, # 1946); -> lúl (alçapão, # 4294); -> mezftzâ (batente, # 4647); miptãn (limiar, #5159); masqôp (verga, # 5485); -> spp (estar no limiar, # 6214); -> $ir I (moente da porta, # 7494); s a ‘ar I (porta, # 9133) B ib l io g r a f ia
M. Cogan e H. Tadmor, II Kings: A New Translation with Introduction and Commentary, AB, 1988; Z. Herzog, “Fortification (levant),” /ÍSD 2:844-52; A. M. Honeyman, “Two Semitic Inscriptions from Malta,” PEQ, 1961, 151-53; G. R. H. Wright, Ancient Buildings in South Syria and Palestine, 2 vols., 1985; Y. Yadin, The Scroll o f the War o f the Sons o f Light Against the Sons ofDarkness, 1962. Richard S. Hess 9134 (s a ‘ar II, cálculo, medida),
#9132 209
(# 9135)
“ISÍC' (sõ ‘ãr), estragados (figos) (# 9135). AT Em Jr 29.11, sõ'ãr, um adj. que significa estragado, podre, modifica te 'ênâ. O povo de Judá que ainda encontrava-se em Jerusalém e sobre o qual viria a calamidade por sua desobe diência contumaz a Javé, foi comparado a figos estragados do pior tipo. Figo: -> bikkúrâ (primeiro figo, # 1136); -> bis (arranhar até abrir, # 1179); -> siqmá (sicômoro [figueira], # 9204); -> ^ 'ê n â (figo, # 9300) EcJwin C. Hostetter 9141 (Sa‘aSú‘im, alegria, êxtase, desejo, deleite), -> # 9130 9142 (í/>/z, desnudar),
#9155
9144 (sepô(, julgamento),
9147
# 9149
niDtf
níDtp (Sepôt), hapleg. subs. coalho, talvez iogurte (2Sm 17.29) (#9147).
OMA De acordo com o HALAT, não há nenhum cognato sem. atestado. E traduzido como gubbenê’ / gübnin, queijo no sir. e no Targum.. AT Apesar de seu significado exato continuar incerto, sepôt é descrito como um produto do leite de vaca (bãqãr), distinto do coalho de ovelhas ou cabras ( fõ ’n). E considerado parte importante do cardápio de uma refeição suntuosa para um rei, que consiste de “trigo, ceva da, farinha, grãos torrados, favas e lentilhas; também mel, coalhada, ovelhas e queijo de gado (Sepôt)” (2Sm 17.28-29). Caquot (TD O T4:390) não o considera um laticínio. Leite, laticínios: -> çfbinâ (queijo, # 1482). -> hãlãb (leite, principalmente de cabra, # 2692); -> hem ’â (leite coagulado, manteiga, # 2772); -> hãriç 1 (fatia, pedaço de queijo, # 3043); -> Sepôt (coalho, # 9147) B ib l io g r a f ia
TDOT 4:386-91. J. P. J. Olivier
9148
nTOE?
n nçtf (Siphâ), subs, escrava, serva (# 9148).
OMA A derivação apresentada polo BDB do heb. Siphâ de um vb. atestado no ár., safaha, derramar, que designa o escravo mais humilde que derrama água sobre as mãos é improvável. A atestação de Sph = serva no fen. e pún. é questionável (cf. DNWSI, 1181). AT 1. Serva. O termo Siphâ, serva, que ocorre 63x no AT, bem como seu sinônimo próximo 'ãmâ, escrava, é o equivalente fem. do termo mais freqüente ‘ebed. De acordo com I. Riesener (83) Siphâ é usado quando uma escrava é considerada uma propriedade e uma trabalhadora. 210
nra® (#9148)
ao passo que 'ãmà designa a escrava quando enfatiza suas qualidade femininas (necessidade de proteção, fraqueza, atratividade sexual). (Para uma discussão mais minuciosa das sugestões de diferenças semânticas entre os dois termos, ver 'ãmâ # 563). Enquanto 'ãmâ é a palavra preferida para uma escrava em textos legais, Siphâ aparece principalmente em Gênesis (28x) e nos livros históricos (20x). Esse termo é empregado muitas vezes em conjunto com 'ebed (21 x; 6x sing., 15x pl.) e costuma ser mencionado juntamente com animais domésticos como indicação da riqueza de uma pessoa (p. ex., Gn 12.16; 20.14; 24.35; 30.43). A serva normalmente atendia a mulher da casa de maneira mais direta, de modo que o termo é usado com mais freqüência com senhora (bebirâ, Gn 16.4,8,9; SL 123.2; Pv 30.23; Is 24.2) do que com senhor. Trata-se de um relacionamento fundamental; assim, Hagar continua sendo serva de Sara mesmo depois de ter sido entregue a Abraão como parceira sexual (Gn 16.5). No entanto, pode-se falar da(s) serva(s) de um homem empregando-se o sufixo pronomi nal “dele” quando não se é mencionada esposa alguma (Gn 29.24, 29), numa série (Gn 32.22 [23] — suas duas mulheres, suas duas servas e seus onze filhos) e com o pronome indefinido “todos” (Jr 34.9, 10, 16). Jepsen (293-97,425) sugere que siphâ designa principalmente uma mulher solteira. Assim, o “primogênito” da serva em Êxodo 11.5 seria uma referência a um fi lho ilegítimo e a única ocorrência de siphâ num contexto legal (Lv 19.20) poderia ser explicada pelo fato de que a escrava em questão estava noiva, porém ainda não havia se casado. Contudo, não se pode supor que quando o termo é empregado juntamente com 'ebed, refere-se exclusi vamente a escravas solteiras. Antes, o que está sendo enfatizada é sua condição subordinada de propriedade. Semelhantemente, em Êxodo 11.5, é a condição humilde da escrava que está sendo contrastada com Faraó; em Levítico 19.20, o mais importante não é o fato da escrava ser noiva, mas sim de que não havia sido libertada (kí lõ ’huppãiã; # 2926). 2. Serva como designação própria. Quando usado como designação própria em sinal de reverência (por Rute em Rt 2.13; Ana em ISm 1.18; Abigail em ISm 25.27, 41; a médium de En-Dor, ISm 28.21-22; a mulher sábia de Tecoa em 2Sm 14.6, 7, 12, 15, 17, 19; a viúva de um dos filhos dos profetas, em 2Rs 4.2, 16) ao dirigir-se a um homem — nunca a uma mulher — de condição social mais elevada e do qual a mulher depende para que este lhe conceda um pedido, siphâ indica a subserviência da mulher e sua disposição em servir ou seguir instruções. Assim também, o homem às vezes é chamado de senhor ('adõni, Rt 2.13; ISm 25.27; 2Sm 14.9, 12, 15, 17, 18, 19, 20; 2Rs 4.16). Nos casos da médium de En-Dor e da mulher sábia de Tecoa, em que estas estavam se dirigindo ao monarca no poder, o emprego do termo também pode refletir o uso da terminologia de servo para expressar a relação rei/súdito. O fato de Siphâ denotar uma condição mais humilde como trabalhadora, enquanto 'âmâ indica uma condição mais elevada e um relacionamento mais pessoal, é indicado pelo uso que Rute faz do primeiro termo para descrever a si mesma em Rute 2.13, quando ela se compara às escravas de Boaz, mas do segundo termo em Rute 3.9, quando existe a possibilidade de casar-se com ele e pelo uso que Abigail faz de ambos os termos em 1 Samuel 25.41: “ Eis que a tua serva ( ’âmâ) é criada (siphâ) para lavar os pés aos criados de meu senhor”. Em termos teológicos, o contexto mais relevante no qual siphâ é usado encontra-se em Joel 2.28-29 [3.1 -2], em que é anunciado o futuro derramamento do Espírito sobre todo o povo, mesmo sobre escravos e escravas. Distinções anteriores de idade, sexo e condição social serão “eliminadas nessa concessão espiritual a todos” (L. C. Allen, The Books ofJoel, Obadiah, Jonah and Micah, NICOT, 1976, 99; ver VanGemeren). Outra passagem de importância teológica é o Salmo 123.2, no qual a dependência de uma serva da sua senhora é usada para retratar a dependência do salmista de Deus para con ceder misericórdia a Israel. 211
üDtf (#9149)
P-B
A LXX normalmente traduz siphâ com paidiskê (41 x) ou doulê (16x).
Servo, escravo: 'ãmâ (escrava, # 563); -> rfitinim (escravos do templo, # 5987); -> ‘ebed (servo, # 6269); -> (escrava, serva, # 9148) B ib l io g r a f ia
7Y/^Í7’2 :187-88; 7'fF07’2:946-47; C. Cohen, “Studies in Hxtrabiblical Hebrew Inscríptions: The Semantic Range and Usage of the Terms HDK and TTíSW,"Shnaton 5-6,1978/79, xxv-liii; A. Jepsen, “Amah und Schphchah,” V T8, 1958, 293-97,425; I. Riesener, Der Stamm "iny im Alten Testament, BZAW 149, 1979; A. W. VanGemeren, “The Spirit of Restoration,” WTJ 50, 1988, 81-102; G. W. Wenham, Genesis 16-50, WBC, 1994. Richard Schultz
9149 ~ üDtf (sp(), q„ ni., po. julgar, realizar julgamento, gover----------------------------------------------- nar (# 9149); UDU? (spt), vb. aram., julgar (# 10735); UDtpD (mispãt) subs. julgamento (causa, processo, veredito, sentença), justiça, direitos, lei, re quisito, prática ( -> # 5477); DÍD# (sepô() subs. julgamento (# 9144); UD# (sepet); subs. ato de julgamento (# 9150). OMA 1. As formas cognatas de spt são amplamente atestadas nas línguas sem., dando evi dências claras tanto de usos forenses quanto não forenses. No ugar. é documentado tanto o uso verbal (tpt I, WUS, 2921, arrumar, acertar, atuar como procurador; UT, 2727, julgar, go vernar) quanto o titular (tpt 111, WUS, 2921, governante, juiz, soberano) de spt. O clamor por justiça social conforme expressado no texto Krt ugar. apresenta um par. bastante próximo ao que se encontra no AT: “Não julgaste a causa da viúva, não adjudicaste o caso do pobre”, Itdn dn 'Im nt/lttpt tp( q$r nps (UT 127:45-47). No acad., o vb. sapã(/tu(m) significa julgar (AHw, 1172) enquanto sãpHu(m) e sãpitútum são traduzidos, respectivamente, como juiz e oficio de juiz (AHw, 1173). Mafico (ABD 3:1104) sugere que sãpifum era originalmente um título semO introduzido na língua acad. pelos amoritas, uma vez que só é atestado depois da Idade Antiga do Bronze (c. 2000 — 1600 a. C.). De acordo com os documentos de Mari, o sãpitum era nomeado pelo rei (sarrum) para atuar como governador territorial e suas atividades eram administração, rea lização de campanhas militares e arbitragem de contendas domésticas (cf. Marzal). No aram. oficial, são atestados os significados iniciar um processo, litigar; julgar. (sp( 1 DNSWI, 118182). No fen. e no pún. o significado magistrado, que corresponde ao heb. sõpêt governante, é amplamente atestado (spt 2, DNWSI, 1182-83); no norte da África, os sufetes eram os funcio nários de posição mais elevada. (Para uma discussão mais completa sobre as evidências sem., ver Richter, 59-70; e Niehr, cap. 3.) As tentativas etimológicas de explicar a derivação de spt não contribuíram de modo significativo para a compreensão de seu uso no AT. As tentativas de atribuir os dois significados heb. básicos (governar, julgar) tomando por base uma derivação de dois radicais diferentes (cf. acad. sapãfu I, governar; sapãfu II, ameaçar) não são convin centes (cf. Niehr, 19-24). 2. É atestado um cognato ugar., tpt II (WUS, 2921, julgamento, lei; UT, 2727, uma cau sa). O acad. siptu(m) designa um julgamento (punitivo) (AHw, 1247). AT 1 .0 vb. spt (heb. 202x; sepaf, aram. 1x) descreve uma série de ações que restauram ou preservam a ordem na sociedade, de modo a garantir a justiça, especialmente no âmbito social. 212
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Quer seja realizada por Deus (c. 40 por cento das ocorrências) ou por um agente humano (c. dos 60 por cento restantes), na forma de uma atividade contínua, o termo pode ser traduzido como reger, governar; na forma de uma atividade específica, pode ser traduzido como livrar, resgatar ou julgar. Tanto o uso no AT quanto as evidências sem. comparativas tomam sem fun damento a tradução do vb. exclusivamente como julgar (cf. Liedke, 73). A distribuição estatística de spt reflete as principais categorias de uso; 13 por cento no Pent., na maioria das vezes com referência a atividades judiciais humanas; 34 por cento nos livros históricos, na maioria das vezes designando líderes humanos; 22 por cento nos Salmos e livros de sabedoria, na maioria das vezes referindo à atividade divina; 31 por cento nos profe tas, na maioria das vezes com referência ao julgamento divino, inclusive a acusação de juizes humanos. Entre os sujeitos indicados por esse vb. pode-se citar Moisés, o rei, o juiz, o profeta Ezequiel, a assembléia israelita como um todo e também seus oficiais, e Javé; os objetos in cluem Israel em sua totalidade (também descrita de modo figurado como ovelhas), bem como as nações estrangeiras, partes em conflito e especialmente os necessitados. Essas passagens relativas aos necessitados reflete uma correlação bastante próxima en tre o vb. spt e o estabelecimento e manutenção da justiça num contexto mais amplo do que o do tribunal. O vb. ocorre muitas vezes juntamente com outros termos judiciais como dinldyn (subs./vb., julgamento, julgar [-> # 1906]: SI 7.8 [9]; 9.4, 8 [5,9]; 72.2,4; Pv 31.9; Jr 5.28), rtb / ryb (subs. / vb. disputa, ação judicial / contender [-> # 8189]; Dt 19.17; 25.1, 2; ISm 24.15 [16]; 2Sm 15.4; SI 35.24; 43.1; ls 1.17, 23; Jr 11.20; 25.31; Ez 44.24) e mispãt (julgamento, justiça [-> # 5834; Justiça: Teologia]; mais de 20x). O julgamento deve ser realizado com justiça (com çedeq / çedãqá [-> # 7405]: Lv 19.15; Dt 1.16; 16.18; SI 7.11 [12]; 9.4, 8 [5, 9]; 50.6; 51.4 [6]; 72.4 [cf. vv. 1, 2 ,3 , 7]; 96.13; 98.9; Pv 31.9; ls 11.4; 16.5; Jr 11.20), verdade (com 'emet [# 622] / ‘emúnâ [575]: SI 96.13; Pv 29.14; Is 59.4; Zc 7.9; 8.16) e eqüidade (com mêsarim [# 4797], SI 58.1 [2]; 67.4 [5]; 75.2 [3]; 98.9). A expectativa de que se faça justiça também é indicada pelo uso do vb. com bên (... bêri) (entre duas coisas/pessoas), exigindo a condenação e o castigo de uma das partes e absolvição/vindicação da outra (Gn 16.5; 31.43; Êx 18.16; Nm 35.24; Dt 1.16; especialmente Jz 11.27; ISm 24.12, 15 [13, 16]; Is 2.4 || Mq 4.3; Ez 34.20, 22). 2. Com referência à atividade humana, a. Estabelecer e manter a justiça. Um dos p cipais deveres do rei e de outros líderes é manter a justiça na terra, garantindo-a especialmente aos necessitados (ver acima; Lv 19.15; SI 72.4; Pv 29.14; 31.8-9; Is 1.17; Zc 7.9-10). Aque les que não o fazem, são repreendidos ou julgados por Deus (SI 58.1-2 [2-3]; 82.2; Is 1.23; Jr 5.28). Essa atividade caracterizará o futuro rei messiânico (ls 11.3-4; 16.5), conforme anun ciado por Isaías. b. Julgar ou castigar (como agentes divinos, principalmente em Ezequiel). Os babilô nios e os caldeus castigarão Jerusalém (Oolibá: Ez 23.24; cf. 24.14). Homens justos condena rão mulheres adúlteras e violentas (Ez 23.45). Depois que Deus pergunta ao profeta sobre suas intenções de julgar Israel (20.4; 22.2; 23.36), ele lhe diz quais pecados deve citar ao acusar o povo (vd ‘, hi.). c. Julgar, resolver disputas legais no meio do povo. Esse uso, mais comumente asso ciado a spt, está relacionado principalmente às atividades de líderes específicos, como Moisés (Êx 18.13, 16, 22), juizes nomeados para o cargo (Êx 18.22, 26; Dt 1.16; 16.18; 25.1 — “Em havendo contenda entre alguns, e vierem a juízo, os juizes os julgarão, justificando ao justo e condenando ao culpado”; 2Cr 19.6), os líderes do povo (Mq 3.11; ra sim), toda a assembléia (Nm 35.24), o rei (IR s 3.28, possivelmente também v. 9, mas ver 1 [d]; cf. ainda IRs 7.7: “Também fez a sala do trono, onde julgava, a saber, a Sala do Julgamento”) ou os sacerdotes 213
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(Ez 44.24, um contexto escatológico). 2 Crônicas 19.6-7 afirma a responsabilidade relacio nada a essa autoridade judicial delegada: “Vede o que fazeis, porque não julgais da parte do homem, e sim da parte do Senhor, e, no julgardes, ele está convosco. Agora, pois, seja o temor do Senhor convosco; tomai cuidado e fazei-o, porque não há no Senhor, nosso Deus, injustiça, nem parcialidade, nem aceita ele suborno.” No uso não literal, o populacho de Jerusalém e Judá é chamado a resolver o conflito entre Deus e sua “vinha” (ou seja, seu povo, Is 5.3). d. Reger, govemar. Tomando por base evidências lingüísticas do OMA, fica claro q spt pode ser usado para descrever a autoridade ou atividades de um regente/governante. Den tre as passagens incontestáveis, pode-se citar Daniel 9.12 na oração de confissão de Daniel. A co-regência de Jotão durante o tempo em que Azarias sofreu de lepra é assim descrita: “Jotão, filho do rei, tinha o cargo da casa e governava o povo da terra” (2Rs 15.5 || 2Cr 26.21). Se melhantemente, Salomão ora pedindo discernimento de Deus para julgar devidamente o povo (lR s 3.9 || 2Cr 1.10-11). Pode-se encontrar um uso sarcástico de spt em Gênesis 19.9, em que os cidadãos de Sodoma escarnecem de Ló, um estrangeiro que vive naquela cidade e que age como se fosse seu juiz! A profecia de Obadias se encerra (v. 21a) evocando a linguagem de Juizes, falando de salvadores, m õsilm , que julgarão o monte de Esaú (Edom) demonstrando que “o reino será do Senhor” (v. 21 b). (Diante dessa alusão, a revocalização do B H K como um par. de ni; e a revocalização de Stuart como um part. do ho., Hosea-Jonah, WBC 31, 1987, 413, não têm fundamento.) E comum os juizes do Livro de Juizes serem considerados oficiais do poder judiciário como resultado da expressão conclusiva: “x julgou a Israel y anos” (Jz 10.2, 3; 12.7, 8-9, 11, 13-14; 15.20; 16.31; também com referência a Eli, ISm 4.18; cf. Rt 1.1; 2Rs 23.22). Porém, o fato de Rute 1.1 referir-se de modo geral ao tempo (lit.) “em que julgavam os juizes”, de Juizes 3.10 descrever Otoniel julgando quando “veio sobre ele o Espírito do Senhor” antes de ir à bata lha. desse livro não relacionar nenhuma atividade judicial específica aos juizes (com referência a Débora, ver 2.e. abaixo; na verdade, o povo não lhes deu ouvidos, Jz 2.17) e do vb. não se aplicar a Eúde, Baraque e Gideão, indica que é preferível optar por uma outra interpretação do termo nesses casos. Webb (62, seguindo Boling, 81) entende julgar Israel em Juizes 3.10 como “mobilizar Israel para uma guerra santa,” implicando aspectos tanto religiosos quanto milita res. No entanto, não há evidências textuais de que tal interpretação seja apropriada para Juizes 12 ou de que Sansão (ou qualquer um dos juizes no Livro de juizes — 6.25-27 descreve uma ação particular de Gideão e não um ato público de reforma religiosa) tenha exercido liderança religiosa sobre Israel. Portanto, uma tradução mais apropriada de spt no livro de Juizes seria “x conduziu, ou seja, serviu como sõpêf designado por Deus para Israel,” o que é esclarecido em Juizes 3.10 com a frase seguinte, “saiu à peleja”. O vb. spt é aplicado 4x às atividades de Samuel (ISm 7.6, 15, 16, 17), comparando-o, deste modo, a Eli, ISm 4.18, que é apresentado como um sucessor do oficio de sõpêt. O fato de o povo exigir um rei “que nos governe” ( I Sm 8.5-6) e para “sair adiante de nós e fazer as nossas guerras” (v. 20) acarreta numa exigência para que o ofício hereditário de rei, melek, substitu ísse o ofício teocrático e carismático de sõpê(. Apesar de spt em 1 Samuel 7.6 dar a impressão de reterir-se à restauração da ordem (religiosa) de acordo com a lei da aliança (a oração “E Samuel julgou o povo de Israel em Mispa” não se encaixa no contexto) e de I Samuel 7.16-17 deixar implícitas as obrigações de um juiz de tribunal itinerante, isso não justifica a inclusão dessas atividades no uso de sp( no livro de Juizes, especialmente tendo-se em vista as incum bências sacerdotais e proféticas de Samuel, o que possivelmente explica seu conjunto singular de atividades de liderança designadas pelo termo sp{ (ver A. Weiser, 15; e Eslinger, 245-49; 214
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os filhos de Samuel, ISm 8.1-2 exercem apenas uma autoridade judicial limitada em Berseba; não são indicados como seus sucessores para um cargo nacional). e. Juizes 4.4, uma forma singular de uso de Spt no Livro de Juizes (como part. verb ocorre em 4.4 com referência a Débora, que é descrita claramente como uma profetisa ( ’iSSâ nebí'â, cf. profeta, 'is n ã b i\ em Jz 6.8) e que não assume nenhum papel de liderança na ba talha a não ser garantir a Baraque que seria vitorioso (Jz 4.14) ou, depois da vitória, liderar o cântico de louvor (Jz 5.1, 12). A descrição dela como “mãe em Israel” (Jz 5.7; análoga ao uso de “pai” para dirigir-se a um profeta, 2Rs 2.12; 6.21) e a expressões par. usadas para descrevêla e a Jabim, rei de Hazor (part. deySb, Jz 4.2, 5), indicam que nos caps. 4— 5 Débora não está sendo retratada como uma juíza (como Baraque), mas sim como uma porta-voz de Deus. O mispat que Israel busca ao dirigir-se a ela sob uma palmeira (Jz 4.5, w ayya‘alü, um ato que ocorre uma só vez) não se refere a resolver suas disputas, mas sim a inquirir sobre a resposta de Deus (mispãf = declaração ou decisão divina, semelhante ao uso desse subs. em Jz 13.12) ao clamor do povo pedindo socorro (Jz 4.3). A resposta de Deus é indicada pela medida toma da por Débora ao chamar Baraque para conduzir Israel à batalha (Jz 4.6), nomeando-o, desse modo, para ser o próximo indivíduo a liderar Israel (cf. D. Block). 3. Com referência à atividade divina (ver também 4.e. abaixo). A mesma série de us de spj descrevendo atividades humanas também pode ser aplicada a atividades divinas. a. Govemar a terra. A soberania universal de Javé é afirmada, declarando-se que ele vem para julgar, spt, a terra (hã are.?, têbêí) com justiça (1 Cr 16.33; SI 96.13; 98.9, cf. também 9.8 [9]; 67.4 [5]; 75.2 [3]). Se “vir” for entendido como um vb. no part. e não no tempo perf., pode-se visualizar uma certa manifestação escatológica mais plena desse governo (de acordo com Tate, seguindo Gunkel e Kraus, Psalms 51-100, 511-12). O salmista conclui o Salmo 82 pedindo para que Deus estabeleça seu julgamento, distinguindo-o assim de todos os outros governantes, sãrím (Sl 82.2, cf. v. 7). b. Julgar. O fato desse governo de Deus implicar atividades judiciais num sentido mais restrito fica implícito no primeiro v. do Salmo 82, em que diz-se que Javé julga “no meio dos deuses” (beqereb 'elõhim), numa referência mais provável a divindades (pagãs) na assembléia divina e que são acusadas no v. 2 (cf. Tate, 334-39). A idéia de julgamento divino é expressa da por meio do uso da preposição bên ... bên, quando Deus é chamado a adjudicar entre duas partes em litígio, vindicando uma e condenando a outra (Gn 16.5: Sarai e Abrão, indicando que Abrão falhou em sua responsabilidade de defender os direitos da esposa diante de Hagar; 31.53: Labão e Jacó, caso um deles ultrapasse os marcos de delimitação; Jz 11.27: Israel e Amom; ISm 24.12, 15 [13, 16]: Davi e Saul; cf. também Sl 9.4 [5] e Jr 11.20). Essa ativida de divina continuará no contexto escatológico, no qual o Senhor julga entre ovelhas e entre carneiros e bodes (Ez 34.17, 20, 22) e decide conflitos entre nações (Is 4.2 || Mq 4.3). Em sua oração de consagração, Salomão pede a Deus que julgue entre indivíduos que apresentam suas causas no templo para adjudicação (lR s 8.32 || 2Cr 6.23). Jó também afirma os atos judiciais divinos, que pessoa nem coisa alguma podem frustrar (Jó 21.22; 22.13); enquanto o Pregador está certo do julgamento futuro de Deus dos justos e perversos (Ec 3.17) ainda que não fique clara uma referência ao tempo exato. c. Estabelecer justiça por livramento ou vindicação. Especialmente quando ocorre o sintagma Spt miyyad, a idéia principal é de livramento (das mãos de alguém) (1 Sm 24.15 [ 16]; 2Sm 18. 19, 31). Essa idéia também fica subentendida no clamor imperativo do salmista para que Deus lhe faça justiça (Sl 7.8 [9]; 26.1 — ambos se referem à justiça do salmista; 35.24; 43.1 — no original, os dois se referem à causa [rib\ do salmista; cf. Lm 3.59). Num contexto 215
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escatológico, as ilhas são descritas aguardando o braço divino que trará justiça aos povos (ls 51.5; par. minha justiça, siciqi e minha salvação, yis ‘í). d. Estabelecer julgamento por meio do castigo. As ações específicas de Deus com rel ção a indivíduos e nações no estabelecimento e manutenção da justiça (usando ãp() envolvem com maior freqüência o castigo. É o que fica implícito quando o salmista reconhece a mão disciplinadora de Deus em sua própria vida (SI 51.4 [6]) e o que é esperado quando o povo clama a Deus para que julgue seu líder (Êx 5.21, com referência a Moisés) ou seu inimigo (2Cr 20.12, na batalha que se segue) e quando Deus anuncia que julgará de acordo com os atos do transgressor (ISm 3.13; com referência a Eli; Ez7.3, 8,27; 16.38; 18.30; 24.14, provavelmen te uma forma pass. impessoal, ainda que Zimmerli, Ezekiel I, Hermeneia, 1979,496, emende o TM com os MMs para a Ia pessoa do sing.; 33.20; 35.11; 36.19, referindo-se ao exílio, cf. 21.30 [35]), sendo que tal castigo tem como propósito levar ao reconhecimento da soberania de Javé (Ez 11.10,11). Nesse item, também pode-se acrescentar o anúncio de Deus do julgamento escatológico das nações no vale de Josafá (= Decisão Judicial, Jl 3.12 [4.12]). 4. Como um subs. verbal, governante ou juiz. Uma das formas importantes de uso d vb. é um part. substantivai (58x) que designa aquele que ocupa o cargo de juiz ou governante (usos verbais do part.: Jz4.4; ISm 3.13; 2Rs 15.5 || 2Cr 26.21; SI 9.4 [5]; 58.11 [12]; Pv 29.14; Is 16.5; Jr 11.20; Ez 34.17). Os deveres ou atividades exatos que ficam subentendidos com o uso do termo sõpê( são motivo de grande controvérsia, em especial no que se refere ao livro de Juizes, mas correspondem basicamente à série de usos de spt discutida acima. a. Um cargo em Israel. De acordo com Números 25.5, os juizes deviam executar aque les que se envolveram com o culto a Baal de Peor, talvez numa referência àqueles que são indicados em Êxodo 18.24-26 (de acordo com Ashley, Numbers, NICOT, 1993, 518; cf. Dt 1.16), apesar de essa última passagem descrever uma abrangência mais restrita da autoridade. De acordo com 16.18-20, devia-se nomear juizes e oficiais das tribos (sâ(erim) em cada cidade para exercer justiça imparcial (cf. Dt 21.2; 25.2). Ao que parece, Deuteronômio 17.8-13 (esp. vv. 9, 12) refere-se a juizes de um “tribunal central” (de acordo com Craigie, Deuteronomy, NICOT, 1976, 251) que, juntamente com os sacerdotes e levitas, deviam decidir os casos di fíceis “perante o Senhor” (cf. Dt 19.16-19). Faz-se referência a juizes juntamente com outros oficiais israelitas em Josué 8.33; 23.2 e 24.1; É bem provável que os juizes empossados por Davi em 1 Crônicas 23.4 e 26.29 (levitas), aqueles aos quais Salomão se dirige em 2 Crônicas 1.2 e que são nomeados por Josafá em 2 Crônicas 19.5-6, representem uma continuidade do cargo de acordo com a legislação do Pent. (cf. Is 3.2). Esses oficiais são acusados pelos profetas de perverter a justiça (Mq 7.3; Sf 3.3; cf. ISm 8.1-2). No período posterior ao exílio, Esdras recebe ordem de Artaxerxes para nomear oficiais como esses para os habitantes da região do Trans-Eufrates (Ed 7.25, aram.; 10.14). b. Os juizes do livro de Juizes. No Livro de Juizes, aqueles que são levantados pelo Senhor para livrar Israel da opressão estrangeira são chamados de sõpefím na seção de sumário teológico, 2.6— 3.6 (Jz 2.16, 17, 18 [3x], cf. discussão acima em 2 [d]; também Rt 1.1; 2Sm 7.11; 2Rs 23.22; lCr 17.6, 10), ainda que a designação mais precisa para eles seja libertado res ou salvadores (mõsVím, Jz 3.9, 15). Isaías 1.26 fala de uma restauração escatológica desse tipo de liderança (“como eram antigamente,” kebãrVsõnâ). Desde A. Alt e M. Noth (“Das Amt des ‘Richters Israels” ; Das System der zw õlf Starnme Israels; The History o f Israel, 99-103, 106-7), os estudiosos têm procurado distinguir entre os juizes maiores com responsabilidades militares e os juizes menores, com incumbências de liderança judicial na “anfictionia”. Não existe nenhuma evidência textual clara de que esses indivíduos chegaram a exercer alguma autoridade judicial. No entanto, é provável que suas conquistas militares granjeassem para eles 216
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um papel contínuo de liderança, ainda que esta fosse, talvez, limitada a um certa região (cf. Jz 11.8 com 12.1). Além disso, vários dos “juizes menores” de Noth também envolveram-se em atividades militares (Jefté em Jz 12; Tola também “se levantou, para livrar Israel” y s ' [hi.; # 3828] em 10.1 [cf. Sangar em 3.31]; Jair em 10.3; cf. Nm 32.41; Dt 3.14). Assim, é mais cor reto entender sõpêt em Juizes e Rute como uma designação somente para um cargo de lideran ça que incluía o estabelecimento e manutenção da ordem política e da justiça social em Israel. (Para uma apresentação mais detalhada e uma crítica das idéias de Noth, ver Mayes, Bãchli e Hauser, “The ‘Minor Judges’”; idem, “Unity and Diversity in Early Israel.”) c. Governantes, p. ex., reis e generais em Israel. O termo Sõpêf também é usado para descrever governantes sem enfatizar necessariamente nenhuma incumbência judicial (cf. porém o desejo de Absalão em 2Sm 15.4; Niehr, 131 -34 interpreta as palavras de Absalão como indi cação de interesse no cargo de governador. Contudo, é mais provável que simplesmente deseje ser rei no lugar de Davi, o que levou posteriormente ao seu golpe). Refere-se em termos mais gerais aos governantes da terra (SI 2.10 || melek, rei; SI 141.6; 148.11, com melek e sar, prínci pe; Pv 8.15-16, com reis, príncipes e nobres; Is 40.23 || rõzenim, príncipes) e ao governante de Moabe (Am 2.3, com sar), bem como aos governantes de Israel (Dn 9.12; Os 7.7; 13.10, ambos com rei; Mq 5.1 [4.14]). A soberania de Deus sobre todas as autoridades humanas é enfatizada especialmente nas passagens que se referem a governantes estrangeiros. d. Outras formas de uso. Moisés é acusado pelos israelitas de assumir o papel de juiz (Êx 2.14). Jó usa o termo para referir-se de modo geral aos juizes humanos (Jó 9.24; 12.17 — controlados por Deus). O Salmo 109.31 aplica o termo aos opressores dos necessitados (ver discussão em 2 [a] acima). e. Deus como governante. Deus é chamado de Governante/Juiz ou descrito como tal 9x. Esse ofício divino é invocado por Abraão ao interceder em favor de Sodoma e Gomorra (Gn 18.25) e por Jefté ao rogar a Deus (em termos temáticos, um aspecto significativo no livro de Juizes: Deus é o verdadeiro Juiz) para adjudicar a disputa territorial entre Israel e Amom na batalha que se seguiria (Jz 11.27). O salmista apresenta Deus e o louva como o justo afiançador da justiça na terra (SI 7.11 [12]; 50.6; 75.7 [8]; 94.2). Jó também está certo de que o juiz divino o absolverá ou vindicará se ele tiver uma chance de defender sua causa (Jó 9.15, poel; 23.7). Isaías 33.22 descreve Deus como juiz, legislador e rei, no qual se pode confiar para nos salvar (_y.v', hi.). Apesar do uso de terminologia legal nessas passagens, fica claro que as atividades de Deus para estabelecer a justiça são decorrentes de sua autoridade e soberania universais, da qual toda autoridade humana também é derivada. 5. Uso no niphal. O vb. sp( também ocorre 17x no niphal, sendo que quase todas e se referem a uma atividade de Deus ou divinamente sancionada. As ocorrências no grau ni. são semelhantes em significado às formas de uso no qal, muitas vezes no contexto de castigo, com o acréscimo da nuança de alguém pleiteando sua causa ou entrando em litígio, conforme indicado pelo uso freqüente com as preposições e te ‘im (com, cf. esp. Pv 29.9; J1 3.2 [4.2]; cf. tambémyahad, Is 43.26; cf. o uso pass. no SI 37.33). Aplicado aos homens, o vb. descreve Jeú executando julgamento sobre a casa de Acabe (2Cr 2.28) e as acusações de Samuel contra Israel por sua rejeição de Deus e por sua liderança exigir um rei (ISm 12.7, uma ação judicial dentro da aliança). Em Provérbios 29.9, sp( ni. refere-se literalmente a processar na justiça, enquanto Isaías 59.4 lamenta a falta de justiça num sentido mais amplo (cf. vv. 8-9, 14-15). Deus defenderá a causa do justo diante dos perversos (SI 37.32-33) e condenará estes últimos (SI 109.7, uma imprecação). Nos escritos dos profetas, o vb. é usado para descrever o futuro castigo de Israel e das nações por Deus. De acordo com Ezequiel, Deus castigará o rei perverso de Jerusalém (Ez 17.20, o exílio na Babilônia), purificando os israelitas como fez 217
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no deserto depois do êxodo (Ez 20.35-26 [2x], cf. vv. 37-38) e destruindo Gogue (Ez 38.22). Deus desafia Israel a apresentar sua causa contra ele, defendendo sua inocência, ou seja, seu caráter irrepreensível (Is 43.26; cf. v. 27; cf. Jr 2.35), mas o fogo e a espada do guerreiro di vino executarão seu veredito contra seus inimigos (Is 66.16). Deus também entrará em juízo com todas as nações (J1 3.2 [4.2] — no “Vale do Julgamento” em conjunto com a restauração de Judá), castigando toda a humanidade depois de pleitear contra as nações (rib; Jr 25.31; cf. Sl 9.19 [20]). A metáfora legal é predominante nessas passagens, enfatizando a justiça das (ou seja, justificativa para) medidas punitivas de Deus. 6. Formas substantivais, a. O subs. sepôt, julgamento, é usado 2x para descrever ju gamento divino: na oração de Josafá em 2 Crônicas 20.9, como uma maldição da aliança, lit., “espada” de julgamento e em Ezequiel 23.10, com referência ao castigo de Oolá (= Samaria, v. 4) pelos assírios em função da sua infidelidade para com Deus. b. O subs. sepet, juízo, ocorre 16x no AT, sempre no pl. e, com exceção de Provérbi 19.29, descreve exclusivamente atos que Deus realiza (em várias ocasiões com ‘sh + be), como, por exemplo, contra o Egito (Êx 6.6; 7.4) e seus deuses (Êx 12.12; Nm 33.4) ou contra Judá por intermédio dos sírios (1 Cr 24.24). O termo Sepet ocorre lOx em Ezequiel (5.10, 15; 11.9; 14.21; 16.41; 25.11; 28.22, 26; 30.14, 19). Esses julgamentos sobre Judá ou seus vizinhos, que assume várias formas, têm dois propósitos: castigar as transgressões e ensinar o povo que “eu sou o Senhor”. Em Provérbios 19.29, um jogo de palavras junta esse v. com o anterior (v. 28): As testemunhas inúteis que escarnecem da justiça (rniSpãt) estão fadadas ao julgamento (Sepã(ím). P-B A LXX costuma traduzir Spt como krinõ (102x) e diakrinõ (1 Ox) e sõpet como kritês (41x). O termo Spt ocorre muitas vezes na LQ mas, de acordo com Niehr, 336, aparece no qal quase que exclusivamente em contextos judiciais e principalmente com um sentido negativo (ou seja, condenar); sõpê( é usado como título 1lx nos MMM (em lQSa, CD e 4Q 511). De acordo com CD 10:4-10, a comunidade de Qumran deveria ter dez juizes. NT Atos 13.20 menciona os juizes do AT, enquanto Hebreus 11.32-34 faz referência às re alizações desses juizes. De acordo com W. Schneider, (NIDNTT 2:365), a influência da LXX (refletindo o heb. Sp() aparece quando krima significa govemar (julgar, Ap 20.4; cf. Mt 19.28; Lc 22.30). O NT desenvolve mais detalhadamente o tema de Deus como juiz justo e universal, enfatizando o papel de Jesus no julgamento final: Atos 10.42; 2 Timóteo 4.8; Hebreus 12.23; Tiago 4.12; 5.9; 1 Pedro 1.17; 2.23; Apocalipse 18.8; 19.11. Apocalipse 20.12-13 enfatiza o mesmo princípio de julgamento de acordo com as obras que se destacam nos profetas do AT. Justiça, julgamento: -> dyn (julgar, contender, govemar, administrar, # 1906); mispãh (infração da lei, # 5834); -> p ll I (assentar-se para julgar, arbitrar, esperar, # 7136); $dq (ser justo, reto, justificado, # 7405); -> Spt (julgar, realizar julgamento, governo, # 9149) B ib l io g r a f ia
ABD 3:1104-6; NIDNTT 2:361-71; THA T 2:999-1009/ TWA T 8:408-28; TWOT2:947-49; A. Alt, “The Origins of Israelite Law,” Essays on Old Testament History and Religion, 1966,79-132; O. Bãchli, Amphiktyone im Alten Testament: Forschungsgeschichtliche Studie zur Hypothese von Martin Noth, 1977; D. I. Block, “Deborah Among the Judges: The Perspective o f the Hebrew Historian,” in Faith, Tradition & History: Old Testament Historiography in Its Near Eastern Context, 1994,229-53; R. G. Boling, Judges, A B 6A, 1975; L. M. Eslinger, Kingship o f God in 218
’ S tf (#9155)
Crisis: A Close Reading o f I Samuel 1-12,1985; I. H. Eybers, “The Stem S-P-T in the Psalm,” OTWSA 1963,58-63; F. C. Fensham, “The Judges and Ancient Israelita Jurisprudence,” OTWSA 1959,15-22; A. J. Hauser,“The ‘Minor Judges’ — A Re-Evaluation,” JBL 94, 1975, 190-200; idem, “Unity and Diversity in Early Israel Before Samuel,” JE T S2 2 ,1979,2890303; T. Ishida, “The Leaders of the Tribal Leagues ‘Israel’ in the Pre-Monarchic Period.” RB 80, 1973, 51430; G. Liedke, Gestalt und Bezeichung alttestamentlicher Rechtssàtze, WMANT 29, 1971; A. Marzal, “The Provincial Govemor at Mari: His Title and Appointment,” JNES 30, 1971, 186217; A. D. H. Mayes, Israel in the Period o f the Judges, SBT 29, 1974; H. Niehr, Herrschen und Richten: Die Wurzel sp( im alten Orient und im Alten Testament, FzB 54, 1986; M. Noth, “Das Amt des ‘Richters Israels’, Gesammelte Studien zum Alten Testament, 1969,2:71 -85; idem, Das System der zwõlfStàm m e Israels, BWANT 4, 1930; idem, The History o f Israel, 1958; J. van der Ploeg, “sãpat et mispõt,” OTS 2, 1943, 144-55; idem, “Studies in Hebrew Law,” CBQ 12, 1950, 248-59; W. Richter, “Zu den ‘Richtem Israel’,” ZAW 11, 1965, 40-71; H. N. Rõsel, “Dir ‘Richter Israels’: Ruckblick und neuer Ansatz,” B Z 2 5 ,1981,180-203; M. S. Rozenberg, “The Sõfefim in the Bible,” Erlsr 12, 1975, 77*-86*; K..-D. Schunck, “Die Richter Israels und ihr Amt,” Congress Volume: Genève 1965, SVT 15, 1966, 252-62; I.L. Seeligmann, “ZurTerminologie fur das Gerichtsverfahren im Wortschatz des biblischen Hebrãisch,” SVT 16, 1967, 251-78; A. van Selms, “The Title ‘Judge’,” OTWSA 1959, 41-50; M. E. Tate, Psalms 51-100, WBC 20, 1990; H. C. Thomson, “Schophef and Mishpat in the Book o f Judges,” TGUOS 19, 1963, 74-85; B. G. Webb, The Book o f the Judges: An Integrated Reading, JSOTS 46, 1987; A. Weiser, Samuel: Seine geschichtliche Aufgabe und religiõse Bedeutung. Traditions-geschichtliche Untersuchungen zu 1. Samuel 7-12, FRLANT 81, 1962; H. Wildberger, “Samuel und die Entstehung des israelitischen Kõnigtums,” 7Z 13, 1957,442-69. Richard Schultz 9150 (sepef, ato de julgamento), -> # 9149
9155
( ^ p í I), subs. alto desnudo (# 9155); < HD® (sph), ni. desnudar (# 9142).
OMA O termo sepi é atestado no ugar. spm, deserto, morro descoberto (HALAT 1502-3); no aram., ipy, alto desnudo, trilha (HAD 1:292), e no sam. sepi, suavizar (HALAT 1503b). sph possui cognatos no aram., sph, desnudar (part. do ni.), estar emaciado (pu.) (HAD, 292) e swp, esmagar (q. HAD 1:280); no mand. spa, estar quieto, calmo (MdD 471 I); no heb. mix„ spy, esmagar, estar quieto (Jastow 2:1614-15). AT O subs. sepi ocorre 9x no AT (Nm [ 1x]; Jr [6x], outros profetas [2x]). É usado em uma ocasião com um sentido neutro, 2x em imagens de bênçãos e 6x em imagens de julgamento. sph aparece 2x e Isaías e lx em Jó. 1. Morro desnudo. A única ocorrência em Números refere-se ao “morro desnudo” qual Balaão subiu a fim de encontrar-se com Deus ao reunir-se com Balaque (Nm 23.3). Je remias é quem usa o termo com mais freqüência, sempre para descrever algum aspecto do julgamento de Deus sobre Israel. A nação trouxe sobre si o julgamento ao cometer adultério (infidelidade pactuai) em toda a parte, até mesmo nos “altos desnudos” (à vista de todos, Jr 3.2) e agora que veio o julgamento, ela chora e se lamenta nesses lugares (Jr 3.21; 7.29). O julgamento de Javé vem como “vento abrasador dos altos desnudos do ermo” (Jr 4.11) e traz 219
1DU?'(#9161)
incontáveis destruidores fervilhando sobre os altos desnudos (Jr 12.12) chegando para dizi mar Israel. A seca que acompanha o julgamento (Harrison, 101) é tão grave que “os jumentos selvagens se põem nos desnudos altos e, ofegantes, sorvem o ar como chacais” (por causa da falta de água, Jr 14.6). Isaías usa o termo 2x para retratar as bênçãos que Israel desfrutará depois do julgamento. Em Isaías 41.18, Javé restaurará a terra de tal modo que fará rios fluírem “nos altos desnudos” (proverá em abundância). Em Isaías 49.9, o favor de Javé permitirá que os outrora cativos le vem seus rebanhos para pastar em todos os morros desnudos. 2. Desnudar. O vb. sph aparece 2x. Isaías usa o ni. para descrever um monte desc vado (Is 13.2), onde será erguido um estandarte como sinal para as tropas se reunirem (Young 1:416) para a destruição da Babilônia, a nação que destruiria Judá. Jó (33.21) usa o pass. pu. para falar de ossos protuberantes num homem emaciado. Concluindo, sepi e sph são termos básicos para altos desnudos e desnudar, sendo usados com mais freqüência de modo figurativo pelos profetas para retratar o julgamento de Deus e, no caso de Israel, a restauração subseqüente. Nudez, necessidade, privação: -> hsp 1 (descobrir, desnudar, # 3106); -> ‘rh (descalvar, ser desejado, # 6867); ‘ãróm (nu, # 6873); -> 'rr (despir, ser demolido, # 6910); -> p fl (descobrir, # 7202); pst (tirar [as roupas], atacar, descobrir, # 7320); -> sep i (alto desnu do, #9155) B ib l io g r a f ia
K. Elliger, “Ser Sinn der hebraischen Wortes ZAW 8 3 ,1971,317-29; R. K. Harrison, Jere miah and Lamentai ions: An Introduction and Commentary, 1973; Wm. McKane, “spy(m) with Special Reference to the Book of Jeremiah,” Mélanges bibliques et orienteaux en Vhonneur de M. Henri Cazelles, 1981, 319-25; E. J. Young, The Book o f Isaiah, NICOT, 1, 1969. Boyd V. Seevers 9159pipõn, víbora),
# 5729
1DU? (spk), q. despejar, verter, derramar; ni., pu., ser despejado, ser vertido; hitp., esvair, escorrer (# 9161); subs. -|DU? (sepek), área de despejo (# 9162); 9161
OMA O vb. é usado com sentido semelhante no ugar. (3 Aqht: 23, 24), acad. (sapãku), e ár. (safaka).
AT O radical spk é o termo mais comum para despejar. Sobrepõe-se com yçq mas não é usado para unção com óleo ou para fundição de metal. O termo ysq, por outro lado, nunca se refere a derramar sangue. 1. Em várias ocasiões, Spk aparece em contextos em que é proibido consumir sang Os israelitas eram ordenados a drenar todo o sangue da carne antes de comê-la (Lv 17.13; Dt 12.16; 15.23). Por ironia, quando Moisés derramou a água do Nilo ela transformou-se em san gue, ficando imprópria para beber (Êx 4.9). O vb. é usado duas vezes para referir-se às rela ções imorais dos israelitas com estrangeiros, que derramavam sobre Israel a sua lascívia (Ez 16.15; 23.8). 220
IDtf (#9161)
2. É comum spk fazer referencia ao derramamento de sangue nos contextos de homi cídio ou guerra. Mas em Gênesis 9.6 o homicídio é condenado com base no fato de que os homens são criados à imagem de Deus. Tomar a vida de alguém é demonstrar desdém para com Deus e profanar a terra, sendo que a expiação só pode ser feita “com o sangue daquele que o derramou” (Nm 35.33). Rúben instou seus irmãos a não derramar o sangue de José (Gn 37.22) e Abigail advertiu Davi de não tirar a vida de Nabal desnecessariamente (ISm 25.31). As Escrituras fazem distinção entre homicídio e derramamento de sangue na batalha (cf. 2Sm 3.27-29; 20.10), mas como conseqüência de sua participação em guerras, Davi não pode cons truir o templo (1 Cr 22.8; 28.3). 3. Assim como y$q, o termo spk pode ser usado para descrever o derramamento de san gue na base do altar associado à oferta pelo pecado (Ex. 29.12; Lv 7.4,18). Derramava-se água fresca sobre “cinza da queima da oferta pelo pecado” e aspergia-se essa água para purificar uma pessoa imunda (Nm 19.17). Numa cerimônia incomum, Samuel derramou água diante do Senhor, talvez para simbolizar profundo arrependimento e humildade (ISm 7.6; 2Sm 23.16 é semelhante, mas usa o vb. nsk; cf. Youngblood, EBC 3:608). Em Juizes 6.20, Gideão derramou caldo como um tipo de oferta para o anjo que lhe apareceu. Ofertas de libação foram derramadas para idolos em Isaías 57.6. No monte Carmelo, os profetas de Baal se cortaram com espadas e lanças “até derramarem sangue” (1 Rs 18.28). 4 .0 hitp. refere-se ao esvaecimento da vida das crianças no final do cerco de Jerusalém (Lm 2 .12). O povo escolhido estava sendo “espalhado” pelas ruas como as pedras do santuário (Lm 4.1; cf. Jó 30.16). 5. Em termos metafóricos, o vb. é usado para o ato de derramar o coração ou a alma para o Senhor em orações fervorosas, normalmente em meio à lágrimas e profundo desânimo. Ana orou do mais profundo de sua alma pedindo um filho (1 Sm 1.15) e o povo de Jerusalém clamou em agonia pela destruição de sua cidade (Lm 2.11, 19). O clamor do salmista, “Derramei-me como água,” representa uma perda absoluta de força física e coragem diante de intensa oposi ção e até mesmo da possibilidade de morte (Sl 22.14 [15]; cf. 42.4 [5]; 142.2 [3]). 6. O AT fala mais de lOx de Deus derramando sua ira e furor em julgamento. A ira ar dente de Deus veio como fogo contra Israel e seus líderes quando a guerra chegou às portas de Jerusalém (Is 42.25; Lm 2.4). O derramamento da ira de Deus é associado ao derramamento de sangue (Ez 21.31-32 [36-37], Em Oséias 5.10, o furor do Senhor é comparado com uma inun dação. Jeremias declara que, a seu tempo, as nações pagãs experimentarão, da mesma forma, a indignação de Deus (Jr 10.25). 7. Os profetas também antevêem o dia quando o Senhor derramará seu Espírito sobre Israel, restaurando seu povo do exílio e regando-o com suas bênçãos (Ez 39.29). Tem-se em vista ainda a era messiânica quando o Senhor derramará “o espírito (ou o Espírito) da graça e de súplicas” sobre seu povo e eles “olharão para aquele a quem traspassaram” (Zc 12.10). Joel olha adiante até o dia em que Deus derramará seu Espírito “sobre toda a came”, sem distinção de sexo, idade ou condição social (J1 2.28-29 [3.1-2]). 8 .0 subs. sepek ocorre somente em Levítico 4.12, em que as partes do touro apresentadas como uma oferta pela culpa são queimadas fora do acampamento sobre o montão de cinzas. P-B A LXX usa ekcheõ (ou ekchynnõ) tanto para ritos de purificação (Nm 19.17) como para o derramamento de sangue (Gn 9.6). NT Os mesmos vbs. G aparecem no NT e tanto a purificação quanto o derramamento de sangue estão incluídos na morte de Cristo, cujo sangue foi “derramado (ekchynnomenon) em 221
npç® (#9163)
favor de muitos” (Mt 26.28; Mc 14.24). Pedro cita Joel ao explicar o significado da vinda do Espírito em Pentecostes (At 2.17-21). De acordo com Paulo, o amor de Deus foi derramado no coração dos crentes pelo Espírito Santo (Rm 5.5; cf. Tt 3.5-6). Em Apocalipse 16, os anjos derramam sobre a terra sete taças cheias da cólera de Deus. Derramamento, fundição, aguaceiro: -> y$q (despejar, lançar, # 3668); -> ngr (correr, fluir, ser despejado, # 5599); -> ntk (derramar, derreter, # 5988); spk (derramar, despejar, esvair, escorrer, #9161) Herbert Wolf / Robert Holmstedt 9161 (sepek, área de despejo),
9163
#9161
HpD® (sopkâ), subs. canal de fluido do órgão masculino, órgão / túbulo urinário (#9163).
AT O subs. refere-se ao canal de fluido do órgão sexual masculino. Uma das classes so ciais que não deviam ser admitidas na comunidade religiosa era a dos eunucos, que haviam sido emasculados por meio do corte do túbulo urinário (Dt 23.1 [2]). A exclusão de homens mutilados era um protesto contra as práticas cultuais e rituais pagãos e não uma discriminação social ou política. Relações sexuais: -> 'eiek (testículo, # 863); -> zirmâ (falo, emissão, # 2444); -> wfibúsim (ór gãos genitais, # 4434); nablút (órgãos genitais, # 5578); -> nehõset II (menstruação, luxúria, # 5734); -> 'gn (manter-se isolado; # 6238); -> 'õnâ (coabitação, relação sexual, # 6703); -> skb (deitar-se, ser violada, ser colocado na cama, # 8886); skh (apresentar testículos fortes, ter forte desejo camal, # 8889); -> sopkâ (canal de fluido do órgão masculino, órgão/túbulo urinário, # 9163); Preceitos sobre o sexo: Teologia Jackie A. Naudé
9164 '701V (spl), 30x, vb. q. ser (tomar-se) humilde, ser arra_______________________________ sado, ser humilhado; hi. ser rebaixado, humilhado, aba ter, descer (#9164); Vs® (sêpel), 2x, subs. humilde (em condição social), ignóbil (# 9165); '70W (sãpãl), 18x, adj. baixo, profundo, desprezível, humilhado, em condição humilde (# 9166); (siplâ), lx, subs. destruição, nivelamento (#9168); n'73® (sepêlâ), 20x, NG Sefelá (->), (1) a região leste dos montes da Judéia e leste das planícies costeiras e (2) uma região fisiográfica semelhante no norte de Israel ou subs. contrafortes (# 9169); (siplút), lx, subs. ócio, inatividade (# 9170). OMA O radical é devidamente atestado nas línguas sem. cognatas: no acad. sapãlu ser baixo, profundo; no ár. safala, saftla, sajula, ser baixo, estar abaixo de algo; o AI spl ocorre no grau haphel, humilhar, sepêl no AB, ser humilde; no sir. sepal, estar cansado, fraco, pael e aphel, abater; no ugar. spl, ser baixo (KTU 1.23:32). AT 1 .0 vb., que ocorre nas raízes q. e hi., é usado para se referir à redução de estruturas naturais e construídas por homens: o nivelamento de um monte/outeiro (Is 40.4), cidade (Is 222
'TSU? (# 9164)
32.19; 26.5) e fortaleza (Is 25.12); a derrubada de árvores (Is 10.33, em que spl é um par. se mântico de g d ‘, abater; Ez 17.24) e ao esmorecimento do som (Ec 12.4). Os radicais spl, abater e shh, humilhar ( -> # 8820) são usados oito vezes na HB em paralelismos semânticos, todas elas em Isaías. O vb. refere-se à ação de “curvar-se” e “descer.” a. No Salmo 113.6, o salmista decla ra a natureza exaltada de Javé, aquele que está entronizado no alto e, no entanto, “se inclina” (part. do hi.) para ver o que se passa nos céus e na terra. Duas das primeiras versões mais im portantes traduzem esse v. de outro modo. Na Pex., alguns usam o subs. ‘üm qã’, a profundeza, para o hi. part. do TM, lendo-se que o Senhor é aquele que “vê o que se passa na profundeza, nos céus e na terra.” Cf. com a LXX (Sl 112.6) em que se lê que Deus toma conhecimento do tapeinos, o humilde, abatido. De acordo com o TM, Javé age curvando-se para olhar, enquanto na Pex. e na LXX, Deus olha para algo abaixo, b. Ao descrever o povo de Israel, o escritor de Isaías 57.9 afirma que o povo “desceu” (hi.) ao próprio Seol (“até à profundidade do sepul cro”), uma provável alusão à prática da necromancia (Whybray, 206). Esse sentido de descer também é usado em Jeremias 13.18. O uso predominante do vb. refere-se à ameaça ou promessa de Javé de que o arrogante e o altivo serão abatidos, humilhados ou rebaixados (2Sm 22.8; Sl 75.8; 147.6; Pv 25.7; Is 2.9 || 5.15; 2.12, 17; 13.11; 25.11; Ez 21.26 [31]), sendo que em algumas ocasiões os olhos são o ponto focal da pessoa arrogante (Sl 18.27 [28]; Is 2.11; 5.15). O vb. é mais usado no livro de Isaías do que em qualquer outro livro. Seu papel é es pecialmente importante no cap. 2, em que ocorre várias vezes no dia do Senhor/profecia do oráculo de calamidade (Is 2.6-21). Com grande habilidade, Isaías faz alusão a um terremoto recente (mencionado em Am 1.1) e ao seu poder destrutivo e desenfreado como o julgamento de Javé sobre os arrogantes da terra. O ambiente textual indica que a altivez do povo tem como origem a riqueza e afluência. E provável que Isaías use essa catástrofe natural para indicar a humilhação futura dos arrogantes da terra. Virá um dia em que os bens materiais serão despo jados e o povo fugirá para cavernas e fendas nas rochas (Is 2.21), uma imagem provavelmente inspirada no comportamento das pessoas durante o terremoto recente. O povo de Israel conti nuará arrogante e precisando ser humilhado. 2. O NP sepêlâ é mencionado 20x na BH. Com exceção de duas ocasiões, essa palavras refere-se a uma região geográfica imediatamente a oeste dos montes da Judéia, sendo difícil determinar suas fronteiras exatas. Nas traduções, talvez o melhor a se fazer seja simplesmente transliterar a palavra: o “Sefelá (de Judá)”. A idéia de uma característica mais baixa baseia-se na perspectiva do povo de Judá de acordo com a qual essa região é mais baixa do que os mon tes de Judá e a cidade de Jerusalém. O Sefelá (->) servia como uma região de defesa, sendo que seus vales dispostos no sentido leste-oeste permitiam acesso a terrenos mais elevados e ofereciam terrenos naturalmente adequados para fortificações (p. ex., Gezer, Laquis e BeteSemes). Em Josué 11.2 e 11.16, o termo refere-se ao Sefelá em Israel, ou seja, a região Norte, talvez os contrafortes do oeste da Galiléia que estendiam-se para o alto em direção à planície de Tiro, uma vez que aqui a fisiografia se assemelha mais àquela do Sefelá do sul (Finkelstein, 84-94). Deve-se ter o cuidado de não confundir a “região montanhosa” em Josué 11.2 com o Sefelá do Sul. 3. O sentido do adj. sãpãl, não é figurativo de algo fisicamente baixo ou profundo. Na alegoria/enigma de Ezequiel sobre as duas águias e a vinha, o adj. refere-se a uma vinha de pou ca altura (Ez 17.6) e a uma árvore baixa (Ez 17.24). Em Levítico o termo é usado no contexto de uma doença de pele, se esta encontra-se abaixo da superfície da pele (Lv 13.20,21,16) e se o míldio (“praga”) penetrou a superfície de uma parede (Lv 14.37). Ver ainda, #9166. 223
Vd# (# 9166)
Quando Ezequiel usa o adj. para se referir ao reino de Zedequias (Ez 17.14) e ao Egito (29.14, 15) tem-se em mente a idéia de uma condição desprezível e impotente. Jó 5.11 e Pro vérbios 16.19 tratam de pessoas que foram humilhadas por dificuldades. Pode-se encontrar um sentido teológico negativo para “humilhação” em Ml 2.9. Javé disciplina os sacerdotes por realizarem suas incumbências de modo indevido e afirma que os fez “desprezíveis (nibzim) e indignos diante do povo”. O adj. também se refere à humilhação positiva, ou seja, a um comportamento piedo so de colocar-se em segundo plano. Em 2 Samuel 6.22, enquanto a arca entra em Jerusalém, Davi salta e dança diante de Javé, um comportamento que Milcal considera indigno para um rei. Ela repreende seu marido por essa conduta, mas Davi responde dizendo que continuará a se alegrar diante de Javé e se fará ainda mais desprezível. O heb. wehãyiti sãpãl, “me humi lharei”, refere-se a um comportamento piedoso e de supressão própria e não a uma desgraça (McCarter, 187). Nessa mesma linha de raciocínio, Deus promete habitar com aquele que é contrito e “abatido de espírito” (Is 57.15), uma característica que contrasta com o orgulho dos soberbos (SI 138.6; Pv 29.23). 4. Em Eclesiastes 10.6, a palavra sêpel refere-se à posição inferior que por vezes os ricos ocupam enquanto o tolo é colocado “em grandes alturas”. O salmista usa o termo “abatimento” para se referir à Israel com o sentido de “condição ignóbil” (SI 136.23). 5. O subs. siplâ é usado por Isaías para se referir à destruição ou abatimento de uma cidade (Is 32.19). 6. O Pregador observa que ter mãos inativas ou ociosas (siplút) tem suas conseqüên cias (Ec 10.18). P-B O uso pós-bíblico é semelhante ao do AT. A posição inferior no sentido de humildade é um tema importante no NT (ver NID NTT2:259-64). Baixo, humilde, plano, nivelado: -> Ar‘(agachar-se, acocorar-se, #4156); -> ‘nh II (humilhar, oprimir, subjugar, # 6700); -> Shh (encurvar, agachar, humilhar, # 8820); -> spl (ser baixo, ser nivelado, humilhar, rebaixar, # 9164) Humildade, aflição, miséria: k n ' (ser subjugado, ser humilhado, humilhar-se, # 4044); -> ‘nh II (aflito, humilde, afligir a alma, jejuar, oprimir, submeter, # 6700); -> ‘ (ser modesto, humilde, # 7570); -> shh (curvar, agachar, humilhar, # 8820); Spl (ser baixo, ser nivelado, humilhar, rebaixar, # 9164) B ib l io g r a f ia
TfVOT2:950-51; H. Brodsky, “S h e p h e l a h , 1992,5:1204; I. Finkelstein, “The Shephelah o f Israel,” Tel Aviv 8, 1981, 84-94; P. K. McCarter, II Samuel, AB, 1984; A. F. “Shephelah,” ISBE 4:473-74; R. N. Whybray, Isaiah 40-66, NCBC, 1975. Gary Alan Long 9165 {sêpel, baixo),
9166 (
# 9164
'7VW
'PBp (sãpãl), adj. profundo, baixo (# 9166); < (spl), q. tomar-se humilde, ser rebaixado; hi. abater
#9164).
OMA O radical ocorre no acad., ugar., aram. e árabe. 224
'TStf (#9166)
AT 1 .0 uso mais freqüente do termo é em passagens que tratam da ameaça ou promessa de Deus de abater e humilhar a altivez e orgulho humanos e ao mesmo tempo exaltar aqueles que caminham diante dele com humildade. O contexto de Isaías 2.6-22, em que o orgulho cen surado é a falta de humildade diante de Javé é típico dessas referência em termos de conteúdo. Para Isaías, o pecado principal é o orgulho e contém dentro de si todos os outros pecados. Assim como o pecado, a idolatria é condenada pois não observa a devida ordem dentro da sociedade como um todo. Isso implica que a humildade, por sua vez, vê o universo conforme este foi or denado, tendo como origem de sua lógica e sentido a posição suprema de Deus dentro desse universo como seu Criador e Sustentador. Se o orgulho como raiz de todo o mal é o excesso de confiança que remove os homens de seu devido lugar na criação, então a humildade é a acei tação da distância que existe entre a humanidade e Deus e a consciência do lugar designado para o homem e de sua devida proporção sob a providência de Deus. 2. O vb. no hi. pode significar derrubar fisicamente (p. ex., o muro de uma cidade [Is 25.12]). Esse sentido toma-se menos expressivo com o sentido metafórico “abater e humi lhar” os arrogantes (ISm 2.7; 2Sm 22.28; Is 13.13). Em todos os vinte e nove casos em que o vb. aparece, com exceção do hi. interno no Salmo 113.6 e possivelmente de Jó 22.29, possui uma conotação negativa; a saber, algo ou alguém é humilhado em decorrência de sua exalta ção indevida. 3. O adj. Sãpãl também pode ter um sentido físico, p. ex., uma vinha “de pouca altu ra” (Ez 17.6), uma árvore “baixa (Ez 17.24) e um reino “humilhado” (Ez 17.14), ou pode ser usado como comparativo para uma infecção “mais funda do que a pele” (Lv 13.20,21,26) ou para uma praga de míldio “mais funda que a parede” (Lv 14.37). Pode ainda ter um sentido pejorativo de “humilhado(s)” (2Sm 6.22; Ez 21.31; 29.14,15; Ml 2.9), mas muitas vezes tem o sentido favorável de alguém que, por meio da aflição, teve seu orgulho derrubado e tomouse devidamente humilde de espírito diante de Deus. 4 .0 adj. sãpãl é usado para definir humildade: “Habito no alto e santo lugar, mas hab também com o contrito e abatido (Sepal-rüah) de espírito, para vivifícar o espírito dos abatidos e vivificar o coração dos contritos (rüah-sepãlim)” (Is 57.15). O comportamento de Davi quando fez subir a arca para sua cidade foi sãpãl (2Sm 6.22). Provérbios 16.19 usa a forma para referir-se à humildade concomitante com a pobreza e desprovida de orgulho, enquanto Provérbios 29.23 a contrasta com o orgulho. Ezequiel 17.14 refere-se à humildade que deve caracterizar o reino de Judá a fim de que este não seja levado para o exílio, especialmente diante da deportação de Jeoaquim e sua comitiva em 597 a. C. Ezequiel 21.26 [31 ] é uma declaração geral sobre o Deus que exalta o humilde e abate o soberbo (como Jó 5.11; Salmo 138.6). Em Ezequiel 24.14, 15, o termo é usado também com referência ao Egito humilhado como reino. 5. O subs. Sêpel, lugar baixo, é empregado com relação à história política de Israe ao caráter enganoso das riquezas em Eclesiastes 10.6. Outro subs., Siplã, humilhação, ocorre como um reforço para o vb. em Isaías 32.19. Humildade, aflição, miséria: -> An' (ser subjugado, ser humilhado, humilhar-se, # 4044); -> ‘nh II (aflito, humilde, afligir a alma, jejuar, oprimir, submeter, # 6700); -> $n' (ser modesto, humilde, # 7570); Shh (curvar, agachar, humilhar, # 8820); spl (ser baixo, ser nivelado, humilhar, rebaixar, # 9164) W. J. Dumbrell 9168 (Siplã, destruição, nivelamento), -> # 9164 9169 (Sepêlâ, Sefelá), -> Sefelá 225
y ? # ( # 9179)
9170 (Siplút, ócio), -> # 9164 9176 (Sãpãn, coelho), -> # 2651
9179
VS#
y ç # (se/?a “), subs. superabundância (hapleg. em Deu teronômio 33.19; # 9179); nyjj# (Sip ‘ã), subs., multidão,
inundação (# 9180).
AT 1. Como vários dos termos para abundância, o subs. Sepa ‘ é poético e ocorre no AT so mente na bênção de Moisés para Zebulom e Issacar em Deuteronômio 33.19. A prosperidade das duas tribos é associada ao mar (cf. a ligação de Zebulom com o mar na bênção de Jacó, Gn 49.13). A “abundância dos mares” (ou seja, pesca, comércio marítimo e atividades econômicas costeiras como produção de corantes à base de moluscos e produção de vidro usando areia) proporcionará grande riqueza para os povos de Zebulom e Issacar. 2. Em duas ocasiões no livro de Jó, o subs. relacionado Sip‘â descreve uma inundaçã Elifaz adverte Jó que as águas transbordantes do julgamento divino estão prestes a cobri-lo por causa de pecados ocultos os quais Jó supõe que Deus não possa ver (Jó 22.11). Hartley observa que “águas escuras e transbordantes muitas vezes simbolizam a pressão emocional inexorável do desespero (Jó 2.5 [6]; SI 69.1-2 [2-3])” (Job, 327). Em outra passagem, a pala vra se refere a chuvas fortes, enfatizando a impotência da humanidade diante dos fenômenos da natureza (Jó 38.34). Há dois casos em que o termo retrata um grande número de animais invadindo uma cidade. Em Ezequiel 26.10, o julgamento de Tiro é acompanhado de uma profusão de cavalos e em Isaías 60.6, a riqueza das nações cobre Jerusalém com multidões de camelos como sinal da bênção renovada de Javé na aliança. Abundância, multiplicação, suficiência: -> dgh (multiplicar, # 1835); -> day (suficiência, suprimento transbordante, # 1896); -> ysp (acrescentar, continuar, aumentar, # 3578); -> kbr I (fazer muitos, ter um suprimento abundante, # 3892); megammâ (totalidade, abundância, # 4480); rbb I (tomar-se numeroso, muito, grande, # 8045); -> rbh I (tomar-se numeroso, multiplicar, aumentar, # 8049); -> r'S II (ser abundante, # 8322); -> s g ’/ sgh (tomar-se grande, aumentar, exaltar, # 8434 / 8436); spq II (bastar, ser suficiente, # 8563); -> Swq I (transbor dar, conceder em abundância, # 8796); -> sepa ‘ (superabundância, # 9179) Inundação, dilúvio, torrente: t e ’ (dividir [por ação da água], # 1021); grp (arrastar com a água, # 1759); -> mabbül (oceano celestial, dilúvio, # 4429); -> niggeret (torrente, # 5600); -> $wp (inundar, elevar, fazer flutuar, # 7429); -> Sibbõlet II (torrente, ondulação, # 8673); Sôf III (inundação [repentina], # 8766); -> S(p (arrastar com água, inundar, alagar, # 8851); Se$ep (enchente, # 9192) Andrew E. Hill 9180 (Sip'â, multidão, inundação),
# 9179
9 j g2 13®1(.spr), q. ser belo (# 9182); 1DU? (Seper I), beleza, ----------------------------------------------- graça, belo (# 9138); r n ç # (Siprâ I), subs. formosura, formoso, pureza (# 9185).
226
no® (#9182)
OMA Nos grupos sem. da região Noroeste, ugar. spr, beleza, chifre (do qual se bebe); amor. spr, spr, formoso (Huffmon, 252; Albright, 229); siprum, formosura, beleza (Buccellati, 180). No sem. do sul, et. sâmrü, estar contente, satisfeito, saciado (Leslau, 55); ár. safara, resplande cer, brilhar, radiar ou emitir; resplandecer, cintilar, reluzir ou ser distinto; radiar, resplandecer, reluzir ou fulgurar, do radical SFR, resplandecer (Albright, 229). Alguns estudiosos sugerem o acad. suparraru, estender (um dossel) (Habel, 365) e o ár., zufra bolsa d’água (HALAT 1509). AT 1. Distribuição. O radical spr ocorre apenas 6x no AT, aparecendo 4x como um vb. (1 x no heb. e 3x no p e'a l aram.) e 2x como adjetivo. As três formas de uso no aram. encontramse em Daniel; as outras estão em Gênesis, Jó e Salmos. Para cada uso no heb., os estudiosos postularam traduções alternativas. 2. Verbo. Em cada contexto, a ação verbal é qualificada pelo uso do dativo: Daniel 4.2 [3.32], para comigo; 4.27 [24], para Nabucodonosor; 6.1 [2], para Dario e Salmo 16.6, para comigo. O dativo distingue um indivíduo que faz uma avaliação depois de refletir como resul tado de (1) um acontecimento que acabou de ocorrer; depois que Nabucodonosor viu os amigos de Daniel sobreviverem a fornalha ardente (Dn 4.2 [3.23]); depois que Daniel interpretou uma visão de Nabucodonosor (Dn 4.27 [24]) e depois que Belsazar morreu e Dario subiu ao trono (Dn 6.1 [2]); ou (2) um reconhecimento reflexivo de sua situação; o salmista reflete sobre sua herança (SI 16.6). Seguindo essa contemplação: 1. inicia uma reação deliberada (ou indica que tal resposta é necessária): uso do infinitivo, “fazer conhecidos” (Dn 4.2 [3.32]); uso do impe rativo, “põe termo” (4.27 [24]) e uso do perfeito com waw consecutivo, “pareceu bem a Dario constituir” (6.1 [2]) ou 2. é um ato completo em si (quando tem um sentido reflexivo, como é o caso acima): simplesmente “é mui linda” (SI 16.6). 3. Adjetivos. O âmbito semântico da palavra parece deixar implícito o sentido de que essa é forma como algo deve ser quando está correto ou em sua condição ideal, de fato, a perso nificação da beleza. Assim, pode-se traduzir Gênesis 49.21 (seper) como “encantador, belo ou formoso”, dependendo da maneira como o v. é interpretado (cf. Sarna, 342) e Jó 26.13 (siprâ) pode ser traduzido como “claro”. Alguns estudiosos consideram os vv. 11-13 à luz da mitolo gia do OMA (ver Hartley, 367). Cada referência indica que algo está como Deus pretendia que fosse para que a humanidade desfrutasse tal coisa. P-B O Apócrifo de Gênesis dedica uma grande parte do texto a esse termo, usando-o numa descrição da beleza física (Fitzmeyer, 55). 3En. 22.12 usa-o para descrever seres angelicais em seu esplendor e maravilha (Odeberg). No heb. mix., é encontrado no q. com o sentido de liso, arredondado e agradável, bom e alegre; no pi. limpar, tomar agradável, conciliar ou har monizar; e no ni. fazer com que algo pareça asseado, ser adornado. Sentidos semelhantes são atestados nos Trgs. (Jastrow 2.1614). Beleza, belo, desejo, desejável, formosura: ’wh (desejar, considerar belo, desejável, # 203); hemed (graça, encanto, beleza, # 2774); -> yph (tomar-se formoso, belo, adornar, # 3636); n ’h (ser belo, # 5533); p V (embelezar, glorificar, # 6995); -> spr (ser belo, # 9182) B ib l io g r a f ia
W. F. Albright, “Northwest Semitic Names in a List o f Egyptian Slaves from the 18th Century B.C.,” JAOS 74, 1954, 222-23; G. Buccelati, The Amorites o f the Ur III Period, 1966; J. Fitz meyer, The Genesis Apocryphon o f Qumran Cave I: A Commentary, 1966; N. C. Habel, The Book ofJob, OTL, 1985; J. Hartley. The Book ofJob, NICOT, 1988; H. B. Huffmon, APNM, 227
T I!?# (#9188)
1965; W. Leslau, Ethiopic and South Arabic Contributions to the Hebrew Lexicon, 1958; H. Odeberg, ed., III Enoch, 1973 (1928); N. Sama, Genesis, JPS Torah Commentary, 1989. David Talley 9183 (ãeper I, beleza, graça, belo),
# 9182
9185 (siprá, formosura, formoso, pureza), -> # 9 1 8 2
TIÇU? (saprír), subs. tenda real? (# 9188) AT O hapleg. saprír pode ser relacionado ao acad. sãpiru, governante, rei, soberano (CAD § 1 453-58). Apesar de Moscati § 12.12 afirmar que a palavras com um terceiro raidcal normal mente são acompanhadas de um sentido diminutivo ou pejorativo, na realidade esse termo pode indicar em Jeremias 43.10, um pequeno dossel colocado acima do trono de Nabucodonosor, como mostra a corretamente a tradução “baldaquino”. Tenda, cortina: ohel (tenda, aquele que habita em tendas, # 185); -> 'ãzên (equipamento, # 266); -> yPrVâ (cortina, tecido usado para tendas, # 3749); yãtêd (estaca, cravilha, prego, # 3845); -> qubbã (tenda abaulada, aposentos das mulheres, # 7688); semiká (cortina, co bertura, # 8526); -> saprír (tenda real?, # 9188) David M. Fouts
'IXtP (sesep), subs. inundação (# 9192) OMA No heb. mix., s$p (= ssp) significa cortar, golpear. AT Tendo em vista a tradução da LXX (mikrõ, curto, breve; cf. Áquila, num átomo de tempo) e do heb. mix., cortar, golpear, alguns estudiosos sugerem a tradução “um ataque momentâneo [de raiva]/por um instante” para sefep (North, 247; Whybray, 186). O Targum de Isaías 54.8 traz “numa breve hora, por um tempo...” Porém, a presença de um elemento temporal nesse caso, parece reduntante, à luz de rega', por um momento, no final da oração. É mais provável que o autor tenha mudado sefep (# 8852) para seçep a fim de fazer assonância com a palavra subseqüente (qeçep, furor, ira). Conseqüentemente, como a expressão sefep 'ap em Provérbios 27.4, seçep qeçep em Isaías 54.8 significa a natureza esmagadora dessa ira, “numa torrente/ num ímpeto de ira”. Inundação, dilúvio, torrente: b z’ (dividir [por ação da água], # 1021); grp (arrastar com a água, # 1759); -> mabbül (oceano celestial, dilúvio, # 4429); -> niggeret (torrente, # 5600); -> çwp (inundar, elevar, fazer flutuar, # 7429); -> sibbõlet II (torrente, ondulação, # 8673); -> Sôf II (inundação [repentina], # 8766); -> sfp (arrastar com água, inundar, alagar, # 8851); se$ep (enchente, # 9192) B ib l io g r a f ia
D.North, The Second Isaiah, 1964; R. Whybray, Isaiah 40-66, 1981. Michael A. Grisanti 228
W (# 9 1 9 3 )
IpE’ (sqd), q. vigiar, despertar (# 9193); ~lpU? (Sãqêd), amêndoa (-> # 9196). OMA Existem cognatos no pún. e no aramaico. AT O radical sqd está relacionado com o subs. Sãqêd, amêndoa, amendoeira. Isso porque o vb. tem o sentido básico de vigilância e, em Israel, a flor da amendoeira aparece logo no come ço da primavera, constituindo um sinal esperado que anuncia a mudança de estação. A relação entre o vb. e o subs. é a base para o trocadilho no chamado de Jeremias (Jr 1.11-12). A flor de Sãqêd é uma confirmação visual a Jeremias de que o Senhor está esperando (sõqêd, vigiando) para cumprir seus propósitos desde o princípio. A maioria das ocorrências desse vb. encontra-se em livros mais recentes: Jeremias o emprega 4x. O profeta usa o vb. de forma negativa para expressar o julgamento de Deus, como o leopardo à espreita, esperando para despedaçar o povo que ousasse sair da cidade (Jr 5.6). O Senhor está velando sobre os israelitas no Egito, para fazer-lhes mal, e não bem (Jr 44.27), mas para outros, assim como ele velou sobre eles para destruir, ele também velará para edificar e plantar (Jr 31.28). O termo sqd pode ter várias conotações negativas. Jó se queixa que o homem rico des prezível recebe um enterro requintado e que se faz vigilância sobre seu túmulo (Jó 21.32). A oração de Daniel diz que o Senhor estava observando seu povo para lhes trazer o mal (Dn 9.14) e o salmista sente-se desconsolado, vigiando como um passarinho solitário num telhado (SI 102.7 [8]). Porém, a Sabedoria considera feliz o homem que vela dia a dia às suas portas (Pv 8.34). O Salmo 127.1 assevera o olhar benevolente do Senhor. A menos que ele vigie (smr), o sentinela vigia (sqd) em vão. P-B Nos MMM, é possível que sqd ocorra em 1QS 6, 7, numa reconstituição baseada em 4QS MS D (4Q258), na conhecida passagem, “Os Muitos passarão um terço de toda a noite do ano em união, lendo o Livro...” Na literatura posterior dos Trgs., o vb. significa vigiar, estar ansioso, ser cuidadoso, enquanto o subs. Saqdãn significa vigilante, laborioso, escrupuloso. G uarda, vigia: rtír (cuidar, # 5757); -> n^r I (vigiar, guardar, cuidar, # 5915); -> sph I (mon tar guarda, vigiar atentamente, postar sentinela, # 7995); -> smr 1 (vigiar, guardar, respeitar, # 9068); -> Sqd (vigiar, despertar, # 9193) B ib l io g r a f ia
ANEP, 39, fig. 131; DISO, 185, 310; P. C. Craigie, P. H. Kelley e J. F. Drinkard, Jr, Jeremiah 1-25, 1991; Fauna and Flora o f the Bible, United Bible Societies, 1972, 89-90; E. Klein, A Comprehensive Etymological Dictionary o f the Hebrew Languagefo r Readers o f English, 1987, 413,424,554,668,677,679; R. S. Tombeck, A Comparative Semitic Lexicon o f the Phoenician and Punic Languages, 1978, 221, 279, 325, 330. Keith N. Schoville
9196
li?#
(Sãqêd), amêndoa (# 9196).
AT 1. A amendoeira é uma árvore comum que se cresce em Israel e é conhecida por flo rescer cedo em janeiro/fevereiro (antes de dar folhas!) enquanto outras árvores ainda estão 229
ni?® (#9197)
desfolhadas. Essa característica é usada num trocadilho em Jeremias 1.11-12 com relação ao cumprimento iminente e rápido das profecias de julgamento. A vara de Arão que floresceu (Nm 17) era um ramo de amendoeira e o candelabro des crito em Êxodo devia ter “cálices com formato de amêndoa, com suas maçanetas e com suas flores” (Êx 25.33-36; cf. 37.19). Hoje em dia, há pelo menos duas variedades comuns de amendoeiras em Israel: a Amygtlalus commutiis var. dulcis que produz flores rosas e frutos doces e a Amygtlalus cornmunis var. amara que produz flores brancas e frutos amargos. Suas flores brancas também são usadas na imagística da velhice com seus cabelos brancos (Ec 12.5). Seus frutos amadurecem no final do verão. Quando Jacó estava enviando presentes dos melhores produtos de Canaã que poderiam impressionar o governante egípcio, ele mandou amêndoas (Gn 43.11). 2. A amendoeira também é chama de lüz II (# 4280). Essa palavra corresponde ao mo ár. comum para amêndoa. O local que Jacó chamou de Betei era conhecido antes como Luz (Gn 28.18), possivelmente um nome comum para lugares derivado de um determinado arvoredo de amendoeiras. Vários lugares mencionados no AT têm nomes derivados de árvores (p. ex., Tamar, Tapua, Sitim). Em Gênesis 30.37, esse termo aplica-se a um de três tipos de varas (“aveleira”) descas cadas por Jacó para aumentar a fertilidade e identidade de seu rebanho; as outras duas varas eram de álamo e plátano. Á rvores:-> ê/â I (árvore vigorosa,#461 ),-> 'erez(cedro,# 780); 'õren I (pinheiro, #815); -> ’êsel (tamargueira, # 869); -> berôs (zimbro, # 1360); -> lüz I (amendoeira, # 4280); -> 'êy (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); -> ar'ãr (zimbro, # 6899); çammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); -> sãqêd(amêndoa, # 9196); siqmâ (sicômoro [figueira], # 9204); tP ‘assür (cipreste, # 9309); -> tâmãr I (tamareira, # 9469); -> tirzâ (ár vore desconhecida, # 9560); ( Árvore do Conhecimento / Vida: Teologia) Larry Walker
np® (sqh), pu. que foi saturado/embebedado(?) (hapleg., Jó 21.24); hi. (de sth, por suplência) regar/dar de beber; aguar, irrigar (62x; # 9197; HALAT 1512a-13a); subs. nptpi? (masqeh I), aquele/aquilo que dá de beber, copeiro (19x; # 5482; H ALAT616b, 1513a[5]); 'Ip® (siqqúy), beber (GCK §846/; < *saqqüy [?], cf. GCK §§84am, 846g), bebida, poção (3x, # 9198; HALAT 1513b). OMA Formas desse lexema são atestadas em todos os principais grupos lingüísticos sem. (Bergstrãsser, 189; ET: 218-19). O lexema à atestado no vb. acad. saqü(m), dar de beber, aguar, irrigar (AHw, 3:118a-b, saqü(m) III; CAD, S/2, 24b-28b, saqú B), subs. (part. subs.) saqú(m)/ Saqitu(m) masc./fem. copeiro; irrigador (AHw, 3:1182a, 1179a; CAD 5/2, 28b-32b, sãqü A) e as formas subs. saqltu(m), terra irrigada (AHw, 3:1179a; CAD S/2, 15a), masqTtu(m) a., lugar de beber; recipiente para beber (?)/regar (?) (AHw, 3:629a; CAD M /l, 384a-b) e masqútu, va silha de beber (?), poção (AHw, 3:629a; CAD M /l, 385a). O termo também é atestado no vb. ugar. íqy, beber ( WUS, # 2677; UT, # 2471; cf. CML2 159a) e as formas subs. msq, poncheira (WUS, # 1695, 2677; UT, # 1565) e talvez Sqym (P R U 2, 1957, 116; UT, texto 1092, 8; KTU 1.115.11), ainda havendo dúvidas se a tradução deve ser “libações, ofertas de bebida” (L. R. Fisher, “An Ugaritic Ritual and Genesis I, 1-5,” Ugaritica 6, 1969, [197-205] 198) ou (o dual) 230
n p tf (# 9197)
“par de coxas” (B. Janowski, “Erwãgungen zur Vorgeschichte des israelitischen selamímOpfers,” UF 12, 1980, [231-59] 247); subs. do aramA, sqy \ copeiro (cf. B. Mazar Et ai., “ ‘Eing Gev, Excavation in 1961,” IEJ 14, 1964,27-29; Yamauchi, 132-33). O termo também é ligado ao AE hsqy', dar de beber; sam. aphel. sq ’, dar de beber, aguar, irrigar; AAS sqy, regar, irrigar (Conti-Rossini, 199; Biella, 343-45); o vb. ár. saqã (*sqy), dar de beber e o subs. sãqin copeiro; estalagem, taberna e ao et. sâqàyã, irrigar (LLA, 354b). O vb. ugar. sqy, beber, costu ma aparecer juntamente com Ihm, comer (RSP 1, ii 334a-i [251]). AT 1 .0 pu. ocorre apenas em Jó 21.24, “baldes cheios de leite e fresca/bêbada (?) a medula dos seus ossos”, uma sinédoque (de uma parte para o todo) simbolizando a boa saúde daquele que tem o favor de Deus. O sentido básico do hi. “regar/dar de beber” é amplamente atestado no AT e usado com referência à terrenos cobertos de vegetação (Gn 2.6,10; Dt 11.0; SI 104.13; Is 27.3; J1 3.18 [4.18]), a animais (Gn 29.2-3, 7-8; Êx 2.16-17, 19; SI 104.11) e homens (Gn 21.19; 2Sm 23.15 = 1Cr 11.17). Dar de beber era considerado um sinal de bom caráter, quer a água fosse provida por homens (Gn 24.14, 18-10, 43, 45-46; 29.10; mas cf. Jó 22.7; Jr 16.7) ou por Javé (SI 36.8b [9b]; 78.15; 104.11, 13; Is 43.20; porém, cf. Jr 8.14; 9 .15 [ 14]; 23.15). A maldade humana, pelo contrário, é retratada no ato de fazer o inimigo beber vinagre (SI 69.21 [22], em oposição a Pv 25.21 -22) ou de fazer o companheiro beber vinho só para se aproveitar dele quando estiver bêbado (Ha 2.15). Por vezes, o f profetas retratam Javé de modo figurativo fazendo seus inimigos beberem do cálice do seu furor (Jr 25.15,17), sendo esse “beber do cá lice” uma metonímia de causa para o efeito estonteante induzido pela retribuição de Javé (cf. SI 60.5 [3]). 2. Uma representação poderosa de lamentação encontra-se na imagem de ser obrigado a beber as próprias lágrimas: p. ex., Jeremias 8.14, “nos deu de beber água da cabeça (hadimmãnú)" (tr. do autor) (cf. RSP 3, i 89e [57] SL 80.5 [6], “[Tu, Javé] Dá-lhes [a Israel] a comer pão de lágrimas (he 'ekaltãm lehem dim a) e a beber copioso pranto (watasqêmô bidmã ‘ôt)” (cf. SI 42.3 [4]; 102.9 [10]). O subs. Siqqúy pode ser usado de maneira semelhante no Salmo 102.9 [10], “Por pão tenho comido cinza e misturado com lágrimas a minha bebida (Siqqúyay)”. Os derivativos do heb. Sqy/Sqh, beber, muitas vezes formam pares com o subs. Ihm, comida/pão (cf. RSP 1, ii 334j-k, m-n [251]; porém, em oposição a 1, Ihm não || Siqqúy em Os 2.5b [7b]). 3. Em dois contextos do AT, o subs. siqqúy parece designar bebida/refrigério. Em Oséias 2.5 [7b], siqqúy é usado em conjunto com semert (unção de) óleo: “Porque [ela] diz: Irei atrás de meus amantes, que me dão o meu pão e a minha água, a minha lã e o meu linho, o meu óleo [de unção] e as minhas bebidas (Samni weSiqqúyãy)". Provérbios 3.8 siqqúy de maneira se melhante: “Isso trará saúde (rip ’út) para o teu corpo e bebida (weSiqqúy) [metonímia de causa para efeito, ‘refrigério’], para os teus ossos” (tr. do autor). 4. A subs. maSqeh, aquele/aquilo que dá de beber; copeiro, pode ser usado para designar terras irrigadas (Gn 13.10), uma vasilha de beber, na expressão keli masqeh (1 Rs 10.21 = 2Cr 9.20), um copeiro (do rei) (Gn 40.1-23, Ixpassim ; 41.9; lRs 10.5 = 2Cr9.4; Ne 1.11) ou para o cargo de copeiro (Gn 40.21). No TM, mimmaSqèhyisrã'êl, dos pastos ricos (irrigados) de Israel, em Ezequiel 45.15 pode ser correto, apesar de muitos emendarem para m iqnêhyisrã ’êl, dos rebanhos de Israel ou para mimmiSpehôtyisrã’êl, dos clãs de Israel (< LXX, ek pasõn tõn patriõn tou israêl [cf. Brockington, 239], REB). 5. A transliteração bíblica do título oficial assírio rab-Sãqêh, Rabsaqué (ao longo de 2Rs 18.17— 19.13 = Is 36.2— 37.8) é derivada do título honorário acad. rab-Sãqú copeiro chefe (const. rab, chefe [AHw, 2:933a, 938am 938D 1] + subs. Saqú/Sãqê, copeiro [AHw, 3:1182a A 7; CAD S/2, 28b-32b, Sãqú A; de acordo com Yamauchi, 133], daí, não tratar-se de um título 231
O jW (# 9200)
militar como “comandante (de campo)” ou “comandante-chefe”, mas sim de um título civil que denota as responsabilidades de um governador ou primeiro-ministro [cf. Tadmor, 279-80]). P-B Pode-se encontrar traduções posteriores no heb. pós-bíblico, vb. no hi. sqy/sqh, dar de beber; aguar, irrigar (Jastrow, 2:1622a) e subs. soqi, irrigação (Jastrow, 2:1622a); o aphel aramJ 'asqi, dar de beber, regar, irrigar, saturar (Jastrow, 2:1622a), bem como nas formas subs tantivas siqqüyãy’, bebida, poção (Jastrow, 2:1567b), ãaqyã’, irrigação (Jastrow, 2:1622a) e soqyõ', copeiro (Jastrow, 2:1622a-b); no sir. etpeel ’e&teqV, ser aguado e aphel 'asqi, dar de beber, regar, irrigar (J. Payne Smith, A Compendious Syriac Dictionary, 1903, 592b) e diver sas formas substantivais, inclusive sãqyã’, copeiro; sãqütã’, irrigação, canal, o ato de beber, poção; saqãyã irrigador, carregador de água, copeiro; seqyã ’, irrigação, canal, vala, o ato de beber, uma bebida; saqãyütã ’, irrigação, seqitã ’, seca, poção, remédio (Payne Smith, 593a-b); e no aphel mand. sqa (MdD 473a). Bebedouro, extração de água, alagamento: gm ’ (engolir, beber, # 1686); -> g r ’ II (puxar [gotas d’água], # 1758; dlh I (tirar água, # 1926); -> yrh II (dar de beber, # 3722); l" II (beber ruidosamente, # 4363); -> Iqq (lamber, sorver, # 4379); -> mss (beber, tragar, # 5209); rwh (saciar a sede, embriagar, regar, encharcar, # 8115); s ’b (tirar [água], # 8612); sqh (dar de beber, refrescar, # 9197); sth II (tirar água, dar de beber, # 9272) B ib l io g r a f ia
H. J. Austel, 7TF07'2:952b-53a; G. Bergstrãsser, Eifuhrung in diesemitischen Sprachen, 1928; ET: Introduction to the Semitic Languages, tr. P. T. Daniels, 1983; L. H. Brockington, Hebrew Text o f the OT, 1973; C. Conti-Rossini, Chrestomathia arabica meridionalis epigraphica, 1931; G. Gerleman, THAT, 2: 1022-26; A. W. Jenks, “Eating and Drinking in the OT, ABD 2:250b54b; J. F. Ross, “Drink,” /D S l:871b-72a; D. E. Smith, “Drink,” ISBE l:992b-93a; H. Tadmor, “Rab-sãris or Rab-shakeh in 2 Kings 18.” in C. L. Meyers e M. 0 ’Connor, eds., The Word o f the LordShall Go Forth, FS D. N. Freedman, 1983,279-85; E. M. Yamauchi, “Was Nehemiah the Cupbearer a Eunuch?” W^92, 1980, 132-42. Robert H. O 'Connell 9198 (siqqúy, beber?),
# 9197
9199 (siqqúç, abominável, detestável),
9200 e paz (# 9200);
# 9210
típtC' (sqi), q. ter paz, ficar quieto, estar ocioso, ter des canso, estar tranqüilo: hi. demonstrar, causar quietude (Seqef), tranqüilidade (hapleg. lCr 22.9; # 9201). uptf
OMA O cognato acad. saqãtu ocorre somente algumas vezes com o significado de fazer cair (AHw, 1179). No óstraco heb. de Laquis (K A I196, linhas 6/7), ocorre no hi. com o significado de deixar cair ou descansar as mãos (KAI II, 196-97). Nos Trgs, ocorre esparsamente e com um significado comparável ao usado no AT (cf. Targ. Zac. 1:11). AT Apesar de cada ocorrência no AT acrescentar uma nuança particular ao significado do vb. sqí, o campo semântico tem como idéia central estar tranqüilo ou ter descanso. A qualidade 232
O ptf (# 9200)
de vida de um indivíduo ou nação indicada por sq(, é considerada a satisfação de uma exis tência correta e saudável, em harmonia com a ordem social e religiosa. Viver em paz (sãlôm, -> # 8996) e descansar das lutas e sofrimento é uma condição ideal que se concretiza com a redenção do Senhor e pode ser fruto da justiça (Is 30.15; 32.17). A guerra e as tragédias são as contradições máximas da forma desejável de existência. O vb. sq( é usado para descrever uma situação de paz e descanso da guerra. Em Juizes, Josué e Crônicas, a paz na terra costuma ser descrita com o termo sq( (Js 11.22; 14.15; Jz 3.11, 30; 5.31; 8.28; 2Cr 14.1; 20.30). Período de tranqüilidade e ausência de guerra e opressão são considerados bênçãos de Javé. O vb. sqt é associado muitas vezes a sãlôm (lC r 22.9-10; Is 32.17) e ao vb. b(h, sentir-se seguro ( # 1055); p. ex., Juizes 18.7,27; Is 18.4. A restauração de Israel e seu livramento dos inimigos são retratados como um período de descanso (nwh, -> # 5663) e quietude (ls 14.7; Jr 30.10; 46.27). Essa existência pacífica não sofre perturbação (sa anãn, -> # 8633, Jr 30.10). Isaías 62.1 e Jeremias 47.6-7 apresentam uma outra nuança do vb. sq(. A espada de Javé não pode se aquietar enquanto Jerusalém é oprimida e não se cumpre seu propósito reden tor. Enquanto os inimigos de Israel conspirarem e tramarem contra Israel, Javé não se calará (hrs, -> # SI 83.1 [2]), pois o Altíssimo cobre-lhes o rosto de vergonha (SI 83.16-18). Somente quando cessar o seu furor e se completar o seu julgamento é que ele se apartará da sua ira e se aquietará (Ez 16.42). No exemplo anterior, sqt expressa o oposto de estar irado (k ‘s, -> # 4087). Esse uso sobrepõe-se com o uso do vb. sqt para descrever o apaziguamento de uma briga (Pv 15.18). A conotação positiva de sqt também fica evidente nos casos em que o Senhor é retratado como alguém que dá sossego e descanso para os que estão ansiosos e amedrontados (Jó 34.29; Is 7.4). Não há o que temer. Aqueles que obedecem a disciplina de Deus experimentarão alívio (descanso) de seus dias atribulados (SI 94.13). Os perversos, por outro lado, são privados da bênção de ter uma existência calma e pacífica. Não encontram descanso (Is 57.20) e não terão paz (sãlôm; Is 57.21). O mesmo se aplica aos inimigos de Israel, que não terão descanso e se rão continuamente atribulados (Jr 49.23). O vb. sqt também pode significar repousar imóvel (Jó 37.17), um significado que se aplica de modo negativo aos moabitas que repousam nas borras do seu vinho (Jr 48.11). Assim, podemos concluir que sqt significa a qualidade de vida antes ou depois da ocor rência de lutas, opressão ou guerra. Uma existência calma e tranqüila sem medo é considerada uma bênção do Senhor e, portanto, faz parte do retrato da salvação de Deus e da restauração de Israel. Deste modo, juntamente com sim, constitui parte da fraseologia que descreve uma existência expressiva de acordo com os desígnios de Deus para uma vida religiosa e comuni tária ideal. Paz, retribuição, segurança, tranqüilidade: -> be/ah I (segurança,# 1055); slh (estar sos segado, tranqüilo, dar falsas esperanças, # 8922); -> sim (ter satisfação, restituir, recompensar, retribuir, fazer as pazes, # 8966); -> sqt (estar tranqüilo, # 9200); -> Retribuição: Teologia Descanso, quietude, repouso: dmh II (chegar ao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); -> nwh I (descansar, # 5657); -> nwh I (sossegar, descansar, esperar, estacionar, depositar, # 5663), -> rg' (formar uma crosta sobre, endurecer, parar, ficar quieto, # 8088/89); s 'n (ficar em paz, imperturbado, # 8631); sbh II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); -> sebet (des canso, assento, # 8699, 8700); -> stq (acalmar-se, # 9284) Descanso, silêncio: -> dümã I (silêncio, # 1872); -> dmh II (chegar ao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); -> dmm I (ficar parado, imóvel, em silêncio, # 1957), -> hp' (fazer algo 233
V ptf (# 9202)
em segredo, # 2901); -> hsh (manter o silêncio, ordenar que se faça silêncio, #3120); hrs 11 (estar surdo, ficar quieto, permanecer inerte, silenciar, # 3087); smt (silêncio, # 7551). B ib l io g r a f ia
/Dfi 2:541-48; TWOT 2:953; K. Heilung Beth, M G , 1958, 3:194-98. Philip J. Nel 9201 (seqef, tranqüilidade), -> # 9200
VpW (í
AT 1 .0 sentido básico do vb., que é usado 22x, parece ser de pesar. De modo que, p. ex., Absalão pesava os cabelos de sua cabeça (2Sm 14.26). 2 .0 vb. é usado com maior freqüência para se referir ao ato de pesar ouro ou prata p realizar um pagamento. Abraão comprou um lugar para sepultar sua esposa Sara ao pesar para Efrom 400 siclos de prata, “moeda corrente entre os mercadores” ( 'õbêr lassõhêr, Gn 23.16). Jeremias comprou um campo pesando “numa balança” (bemõ ’znãyim) dezessete siclos de prata (Jr 32.10). Esdras pesou cuidadosamente a prata, o ouro e o bronze que haviam sido entregues como oferta para a casa do Senhor em Jerusalém (Ed 8.24-34). Isaías refere-se àqueles que pesam a prata “nas balanças” (baqqãneh) e depois contratam ourives para transforma o metal em ídolos (Is 46.6). 3. Tendo em vista, porém, que os pesos de ouro e prata tomaram-se, essencialmente, a moeda do OMA (e o dinheiro do período posterior ao exílio), em diversas ocasiões, sql é apenas um termo que significa pagar ou comprar, sem envolver, necessariamente, o ato de pesar (Ex 22.17 [16]; 2Sm 18.12; 1Rs 20.39; Jó 28.15; Et 3.9; 4.7; Is 33.18; 55.2; Zc 11.12). 4. Em várias ocasiões, o vb. é usado de maneira metafórica. Jó exclama: “Se a minha queixa, de fato, se pesasse” (/« sãqôl yisSãqêl, inf. do q. abs. seguido do ni. impf.; Jó 6.2). Posteriormente, ele expressa o desejo de ser pesado por Deus em balanças fiéis (Jó 31.6). Em seu discurso magnífico sobre a grandeza e o caráter incomparável do Senhor, Isaías pergunta quem “pesou os montes em romanas e os outeiros em balança de precisão” (Is 40.12). Quanto a esta última passagem, há uma certa dúvida se Isaías está simplesmente perguntando se al guém poderia fazer isso ou se, ao mesmo tempo, está descrevendo o Senhor que realizou esse feito (ver J. D. Smart, History and Theology in Second Isaiah, 1965, 56-57; E. J. Young, The Book o f Isaiah, 1972, 3:43). 234
'Tptf (# 9202)
5. Existem outros dois termos que também significam pesar, mas que são usados ape nas raramente no AT. O vb. zwl (q. pesar, derramar, esbanjar; #2313 [LXX symballõ}) ocorre com certeza tendo esse significado somente em Isaías 46.6, em que se encontra na forma participial (hazzãlim) e par. a sql. O subs, nâtíl (# 5744), que ocorre somente em Sofonias 1.11 na frase constr. kol-ne(ílê kãsep (“todos os que pesam prata”), é provavelmente derivado do radi cal ntl (impor algo sobre alguém; pesar; # 5747). O TM considera a forma como sendo ativa, apesar de a maioria das vrs. tê-la considerado pass. (cf. LXX epêrmenoi, os que são erguidos pela prata). O termo par. no v., porém (kena an [# 4047], não se referindo à região, mas aos “mercadores” em Is 23.8; Ez 16.29; 17.4; Os 12.7 [8]) e talvez Zc 14.21) toma mais provável que seja um termo para aqueles que pesam, ou seja, negociam, com prata (ver J. J. M. Roberts, Nahum, Habakkuk, and Zephaniah, OTL, 1992, 175-76). 6. Ao que parece, o subs. misqelet/misqõlet é um tanto remoto dos outros derivativos do radical, sendo que todos são relacionados a medidas de peso. Esse subs. é usado apenas duas vezes para referir-se a um instrumento de nível ou fio de prumo. Existe, porém, um peso envolvido uma vez que o fio de prumo é uma pedra pendurada de uma corda para determinar a precisão horizontal de muros, etc. (Is 34.11 e Zc 4.10 referem-se ao peso ou pedra [ 'eben] usado no fio de prumo). Em 2 Reis 21.13, o Senhor declara que estenderá o prumo sobre a casa de Acabe e que o julgará de acordo com seus próprios critérios de justiça. Em Isaías 28.17 o Senhor declara que fará da justiça um fio de prumo, ou seja, o critério que usará para medir Sião. Nas duas passagens, o termo ocorre na linha B de uma parelha de versos poéticos e tem como par. na linha A qãw (cordel, régua). 7. O subs. misqôl, peso, ocorre apenas duas vezes no AT. Em Ezequiel 4.10, o Senhor diz ao profeta para racionar seus alimentos pelo peso (bemisqôl). A sugestão de que o uso da preposição be com o termo significa “exatamente” ou “cuidadosamente” pesado é duvidosa; é possível que signifique apenas “com respeito a pesar”. 8. O subs. miiqãl, que ocorre 49x, é usado na maioria dos casos com referência a ob jetos físicos literais. Assim como acontece com misqôl, a sugestão de que o uso da preposição be significa “peso exato” é incerta. Apesar de ter-se a impressão de que esse seja o caso em Gênesis 43.21, é menos provável que se aplique às outras ocorrências (Lv 19.35; 26.26; lCr 28.14, 15,17,18; Ed 8.34; Ez 4.16). O único uso que parece ser metafórico encontra-se em Jó 28.25, em que Jó pergunta quem “regulou o peso do vento” (la ‘asôi lãrüah). Em Levítico 19.35, o Senhor diz aos israelitas que não deve haver injustiça ( 'ãwel) ao se medir o peso (bammisqãl). Em Levítico 26.26, o Senhor adverte os israelitas que se abando narem seus caminho, ele enviará contra o povo cercos inimigos, pragas e fome, de modo que será preciso distribuir o pão “por peso” (bammisqãl), ou seja, terão que racionar seu pão. Essa mesma idéia se repete em Ezequiel 4.16, em que o Senhor explica ao profeta o significado da ilustração que pediu para Ezequiel realizar em 4.10 (ver acima, sobre misqôl)'. o suprimento de comida para o povo de Jerusalém seria cortado, de modo que se teria de racionar o pão. 9. O subs. seqel, que ocorre 88x, dá a impressão de que era a unidade básica de peso na antiga Israel (como fica evidente pela omissão da palavra em passagens nas quais se faz referência clara ao siclo [Gn 20.16; 37.28; Jz 17.2-4, 10; ver ABD 6:906]). Apesar de o termo normalmente ser usado com relação a metais preciosos, também se media o peso de outras substâncias em siclos (p. ex., Ex 30.23-24). E no mínimo possível que, em alguns casos em que se apresenta um peso em siclo para uma determinada substância, o termo siclo seja usado não para o peso do objeto em si, mas para seu valor correspondente em ouro ou prata. Há pelo menos três fatores que tomam complicado determinar o peso exato do siclo e de outras medidas: 1. Havia diversos sistemas metrológicos para peso no OMA; p. ex., na 235
V ® (# 9202)
Mesopotâmia, havia as medidas “pesadas” e “leves” de peso, sendo que as pesadas eqüiva liam a aproximadamente o dobro das leves. Além disso, essas medidas não eram constantes; p. ex., o talento por vezes era considerado como 60 minas, mas em outras ocasiões, como 50 minas. Ademais, tanto para as medidas pesadas quanto leves, há evidências de que a medida determinada pelo rei para ambas talvez fosse cerca de cinco por cento mais pesada do que as medidas comuns. 2. Usavam-se diferentes sistemas de contagem; os assírios, sumérios e babi lônios empregavam um sistema sexagesimal, enquanto os israelitas usavam um sistema deci mal. Isso afeta principalmente a determinação dos valores do mãneh e do kikkãr (ver abaixo). 3. Dentre as milhares de pedras de medida encontradas, há uma grande variação no peso de pedras com a mesma designação. 10. Ao que parece, em Israel o siclo pesava cerca de 10 a 13 gramas. É possível que se usassem três diferentes medidas de siclo. 1. O “siclo do santuário” (seqel haqqõdes) aparece c. de 25x. em Êxodo, Levítico e Números, sendo que pesava por volta de 10 gramas e prova velmente era uma medida padrão que ficava guardada no santuário. De acordo com Levítico 27.25, todos os valores a serem estabelecidos deviam corresponder a esse siclo. 2. Tomando-se por base uma possível interpretação de Gênesis 23.16, talvez houvesse uma “moeda corrente entre os mercadores” ( 'õbêr lassõhêr), mas também é possível que essa expressão simples mente significasse que Abraão providenciara para que um mercador pesasse a prata em questão (ABD 6:907). 3. 2 Samuel 14.26 também deixa subentendida a existência de uma medida de peso determinada pelo rei. O texto diz que os cabelos de Absalão pesavam 200 siclos “segundo o peso real” (be ’eben hammelek, pela pedra do rei); por outro lado, ver ABD 6:907 para uma opinião contrária. 11. Em várias passagens dignas de nota, os pesos são apresentados em siclos. Se um escravo era chifrado por um touro, o dono do touro devia pagar 30 siclos de prata para o pro prietário do escravo (Êx 21.32). Se, em Zacarias 11.12, as trinta moedas de prata (Selõsim kãsep) pagas ao profeta são de fato siclos, então é possível que a intenção desse pagamento, tendo em mente Êxodo 21.32, fosse de insultar Zacarias. A armadura de bronze que Golias usava pesa va cinco mil siclos, ou aproximadamente cinqüenta e cinco quilos, enquanto sua lança pesava 600 siclos, ou cerca de sete quilos (ISm 17.5-7; cf. 2Sm 21.16, em que um dos valentes de Davi tinha uma ponta de lança com metade desse peso). 2 Samuel 14.26 indica que o peso dos cabelos de Absalão era de 200 siclos (pouco mais de dois quilos). Os pregos de ouro usados na construção do templo de Salomão pesavam 50 siclos ou aproximadamente meio quilo (2Cr 3.9). 2 Reis 7.1, 16-18 registra os preços exorbitantes pagos por quantias parcas de farinha e cevada durante o cerco arameu a Israel. Em sua ilustração profética, na qual ele prenuncia o cerco e a fome em Jerusalém, Ezequiel é ordenado por Deus a racionar seus alimentos de modo a consumir 20 siclos por dia, pouco mais de 200 gramas (Ez 4.10). 12. Apesar da existência de diferentes sistemas metrológicos e da imprecisão na con fecção desses pesos, ainda assim o Senhor ordena que os israelitas usem pesos honestos. Em Amós 8.5, o profeta se queixa daqueles que “aumentam o siclo” (hagdil seqel), numa aparente referência à prática de usar um siclo com peso maior do que o comum para enganar o cliente, vendendo-lhe uma quantidade menor de mercadoria pelo mesmo valor. 13. Termos relacionados: a. O beqa ‘ ou meio siclo (LXX drachmê) parece ser derivado de bq ‘ (fender, partir). É usado somente em Gênesis 24.22 e Êxodo 38.26. b. O termo gêrâ (acad. girú; LXX obolos) ocorre apenas 5x: Êxodo 30.13; Levítico 27.25; Números 3.47; 18.16; Ezequiel 45.12. É usado somente para definir o siclo (nas quatro primeiras passagens, o siclo do santuário; ver acima) como sendo constituído de 20 geras. O correspondente acad. girú eqüivalia a 1/24 siclo. 236
'tyW (#
9202)
c. Ao que parece, o kikkãr (talento; acad. kakkaru [também hiltu]; aram. kakkerã ’; ugar. kkr; LXX normalmente talanton) referia-se, a princípio, a qualquer objeto redondo em forma de disco. Era usado, por extensão, para uma única porção de metal moldada em forma de dis co e depois, como um subs. coletivo para pesos menores que, quando colocados juntos, cons tituíam o equivalente (p. ex. Êx 38.25). O kikkãr consistia de 3.000 siclos (aproximadamente trinta e quatro quilos), apesar de haver algumas evidências de que, por vezes, era calculado como 3.600 siclos. Há diversas passagens dignas de nota que apresentam pesos ou quantidades usando kikkãr. 2 Samuel 12.30 (|| 2Cr 20.3) relata que o rei de Rabá usava uma coroa que pesava um talento (cerca de trinta e quatro quilos). De acordo com 1 Reis 9.13-14, além dos materiais de construção para o templo que havia enviado para Salomão, o rei Hirão também mandou 120 talentos de ouro (cerca de 4.050 quilos). O tributo anual de ouro recebido por Salomão de diversas regiões era de 666 talentos (cerca de 22.500 quilons; IRs 10.14). Além dos 6.000 siclos de ouro (aproximadamente sessenta e oito quilos), Naamã estava preparado para pagar 10 talentos de prata (cerca de trezentos e trinta e oito quilos) para Eliseu a fim de ser curado de sua doença de pele (2Rs 5.5). De acordo com 1 Crônicas 22.14, Davi ofereceu para o templo 100.000 talentos de ouro (cerca de 337.500 quilos) e 1 milhão de talentos de prata (aproxima damente 3.375.000 quilos). Para mais informações sobre a etimologia e outras formas de uso, ver kikkãr (# 3971). d. O mãneh (mina, cerca de meio quilo; acad. maná; ugar. mn; aram. manyã 'Imenè ’; LXX = mna) ocorre apenas 5x: 1 Reis 10.17; Esdras 2.69; Neemias 7.71-71 [70-71]; Ezequiel 45.12. É possível que o termo seja derivado do radical mnh, contar (# 4948). A passagem em Ezequiel parece determinar que o valor de uma mina é de 60 siclos, em conformidade com a prática babilônia, uma possível mudança com relação à mina de 50 ciclos, para a qual há evi dências na Assíria e Ugarit. No entanto, tomando por base evidências de determinadas versões, muitos comentaristas consideram o texto adulterado e entendem que Ezequiel prescreve uma mina de 50 siclos (ver L. Allen, Ezekiel 20-48, WBC 29, 1990, 240, 247, 265; W. Simmerli, Ezekiel 2, Hermeneia, 1983, 474, 477). É possível que o aram. tekel (# 10770) e menê' (# 10428) em Daniel 5.25-27 sejam equivalentes de seqel e mãneh. e. O hapleg. pim em 1 Samuel 13.21 foi considerado indevidamente durante muito tempo como uma “lima com bocas”, tomando por base uma suposta derivação de peh (boca). No entanto, a descoberta de vários pesos com a inscrição pim, todos eles pesando cerca de 7 a 8 gramas, mudaram drasticamente a compreensão dessa passagem, sendo que a maioria das traduções modernas interpreta o termo como 2/3 de siclo. f. Ao que parece, o qesitâè um peso cuja medida desconhecemos. Ocorre somente em três textos: Gênesis 33.19; Josué 24.32; Jó 42.11. Nas duas primeiras passagens, é traduzido como “peças” e na última como “dinheiro”. Existe a possibilidade de que a interpretação da LXX, amnas/amnos, cordeiro, seja correta; os rebanhos eram um bem de comércio no OMA. No en tanto, o contexto de Jó, em que “cada um lhe deu qesifâ e um anel de ouro” serve de argumento contra essa idéia'. Uma sugestão é de que o termo amnas na LXX seja uma forma expandida de mna, que é traduzido no G como mãneh (mina, ver abaixo). Outra possibilidade é que o peso tivesse o formato de um cordeiro (era comum os pesos terem formatos de animais como patos, tartarugas e leões). Também pode ser que o termo significasse o valor de um cordeiro. P-B A LXX apresenta várias traduções para sql e seus derivativos O vb. costuma ser traduzido como histêmi, colocar (sobre balanças), pesar, pagar; mas outras palavras usadas apenas uma ou duas vezes são diagraphõ (escrever, ou seja, escrever uma nota promissória), apokathistêmi 237
rrapu? (# 9204)
(restaurar), apotinõ (pagar de volta),paristêmi (restituir); symbouleuõ (aconselhar, [entenden do sql em Is 33.18 como sendo metafórico]) e limaõ (honrar, valorizar [entendo sql em Is 55.2 como sendo metafórico]). O subs. misqelet é traduzido uma vez como síathmos (medida) e outra vez como stathmion (peso). O subs. misqãl é traduzido duas vezes como síathmos, mas a maioria das ocorrência encontra-se dividida igualmente entre stathmion e kolkê (peso). Na LXX, o subs. seqel é traduzido em quase todos os casos como siklos, em duas oca siões, porém, é traduzido como drachmê e stathmos Na época dos Apoc. e dos MMM, o siclo havia se tomado uma designação monetária referente mais a uma moeda do que a um peso. O vb. sql, na maioria das vezes, tem o mesmo sentido literal nos PB que no AT, mas também possui sentido figurativo. Uma caracterização de um determinado inimigo da comu nidade de Qumran afirma que ele “pesa o vento e prega mentiras (CD 8.13). Diz-se que o ‘Ins trutor’ (maskil) da comunidade deve separar e ‘pesar’ os filhos da justiça de acordo com seu espirito” (1QS 9.12-14). Negócio, comércio, com pra, venda: -> k?na 'an (comerciante, # 4047); -> krh (obter por meio de comércio, # 4126); -> nfihir I (preço, pagamento, # 4697); mkr I (negociar, vender, # 4835); -> shr (viajar, negociar, # 6086); -> qnh (adquirir, comprar, # 7864); -> rkl (negociar, # 8217); sbr II (comprar, # 8690). Peso: 'eben (pedra, rocha, # 74); -> kbd (ser pesado, indiferente, honrado, # 3877); kikkãr (região, cercanias, # 3971); -> mõ 'znayim (balança, # 4404); qaw I (cordel de medir, # 7742); qãneh (cana, junco, cana de medir, haste, balança, # 7866); -> sql (pesar, pesar na balança, pagar, # 9202) B ib l io g r a f ia
ABD 1:1076-89; 6:897-99, 905-8; IBD 2:1018-23; 3:423-35, 1634-35; 4:828-33; ISBE 3:295; TWAT 8:454-58; TWOT 1:123-24, 173, 238, 456, 513-14; 2:575, 722-23, 817, 953-54. ZPEB 1:902-11; 4:813; 5:918-22. A. Ben-David, “The Standard of the S h e q e l PEQ 98,1966,168-69; idem, “The Talmud Was Right! The Weight of the Biblical Sheqel,” PEQ 100, 1968, 145-47; idem, “The Philistine Talent from Ashdod, the Ugarit Talent from Ras Shamra, the ‘PYM’ and the ‘N - S - P UF 11,1979,29-45; K. Deller e K. Watanabe, “sukkulufm), sakkulu, ‘abwischen, auswichen’,” ZA 70,1980-81, 198-226; W. G. Dever, “Iron Age Epigraphical Material from the Area of el-K.om,” HUCA 40-41,1969-70, 182; D. Diringer, “The Early Hebrew Weight Found at Lachish,” PEQ 74,1942, 82-103; J. C. Greenfield, “The Root sql in Akkadian, Ugaritic, and Aramaic,” UF 11,1979,325-27; R. Kletter, “The Inscribed Weights o f the Kingdom o f Judah,” Tel Aviv Journal 18, 1991, 121-63; W. R. Lane, “Newly Recognized Occurrences ofthe Root PYM,"BASOR 164, 1961,21-23; N. Mundhenk, “The Translation ofShekel,” B T 37/2, 1986, 237-38; M. A. Powell, “Ancient Mesopotamiam Weight Metrology: Methods, Problems, and Perspectives,” A O A T 203,1979,71-109; R. B. Y. Scott, “Weights and Measures o f the Bible,”, BA 22, 1959, 22-40; E. A. Speiser, “Os Shoes and Shekels,” in Oriental and Biblical Studies, 1967, 156-59; R. de Vaux, Anclsr, 1965, 1:203-9. Jerry E. Shepherd 9203 (seqel, peso de siclo),
9204 238
na,?#
# 9202
n n p # (Siqmâ), sicômoro (# 9204).
yj7tí (# 9205)
AT Árvore do mesmo gênero da figueira. O HALAT a chama de amoreira (Ficus sycomorus). No AT, a LXX sempre traduz como sykomoms (cf. sykamorea em Lc 17.6), um nome provalvemente derivado do fato de que a folha era semelhanta à da amoreira (moron) e seu fruto como o figo (sykon). Trata-se de uma típica árvore perene com um tronco alto e galhos superiores longos e pesados. Seus frutos são semelhantes a figos, porém não tão doces. Ao que parece, era uma árvore comum (Is 9.9)que crescia nos contrafortes (1 Rs 10.27; l C r 27.28; 2Cr 1.15; 9.27). Davi nomeou um supervisor para os “olivais e sicômoros” (lC r 27.28). A madeira era usada para construção, especialmente nas estruturas mais simples. Para as construções mais caras, dava-se preferência ao cedro (lR s 10.27; Is 9.9 [10]). Comparada com o cedro, a ma deira do sicômoro é leve e porosa. Além disso, o sicômoro não absorve umidade e é resistente à deterioração. Prova disso é que sarcófagos normalmente feitos dessa madeira para guardar múmias egípcias encontram-se preservados até hoje. O fruto do sicômoro é menos valorizado que sua madeira. E preciso cuidado especial para apreciar plenamente seu fruto, que deve ser perfurado alguns dias antes de ser colhido (cf. Am 7.14; LXX perfurou). O fruto que não passa por esse procedimento cai antes da hora e é considerado imprestável. Árvores: -> 'êlâ I (árvore vigorosa, #461), -> 'erez{cedro, # 780) ; ’õren (pinheiro, #815); -> 'êsel (tamargueira, # 869); -> berô$ (zimbro, # 1360); -> lúz I (amendoeira, # 4280); ey (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); 'ar ‘ãr (zimbro, # 6899); $ammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); -> sãqêd (amêndoa, #9196); -> siqmâ (sicômoro [figueira], # 9204); -> 'assúr (cipreste, # 9309); -> tãmãr (tamareira, # 9469); -> tirzâ (árvore desconhecida, # 9560); ( Ár vor e do Conhecimento / Vida: Teologia) Larry Walker
SpB’ (sq '), q. afundar, desmoronar (# 9205); ni. abaixar (somente em Am 8.8); hi. manter afundado, fazer afun dar, assentar (somente em Ez 32.14); yj7tp’!D(m isqã'), subs. águas claras, ou seja, sedimentadas (hapleg. em Ez 34.18, # 5488). 9205
Spti
OMA Comparar com o ár. çaqafa, desmoronamento (de um muro); aram. seqa \ afundar.
AT 1. Em dois casos, o radical Sq ‘ significa “assentar”, de modo bastante literal, como na praga de fogo sobre Israel que se apagou com a intercessão de Moisés (Nm 11.2) e as águas do Nilo que se assentaram simbolizando a desolação do Egito causada pelo julgamento divino — tanto que nenhum animal ou homem perturbará o Nilo (Ez 32.14). Em três ocasiões, a tradução “afundar” tem o sentido de tragédia sobre uma nação. Em Jeremias 51.64, a Babilônia se afun dará no esquecimento como um livro amarrado com uma pedra mergulha no Eufrates, ao passo que o julgamento de Javé sobre Israel na forma de um terremoto fará com que a terra se levan te e abaixe como um rio (Am 8.8; 9.5; cf. Andersen & Freedman, Amos, AB 24A, 1989, 694). 2. O subs. misqã ‘ ocorre apenas em Ezequiel 34.18, em que diz “águas claras”. A i gística indica águas plácidas nas quais os sedimentos se assentaram, tomando-as puras, em contraste com um bebedouro de águas turvadas pela movimentação de animais que nelas bus cam refrigério. No contexto, trata-se de uma questão de exploração social entre os próprios exilados hebreus, realizada por um cartel de corretores de poder e mercadores de influência 239
r n n y p ® (# 9206)
dentro da comunidade do exílio, uma injustiça que Ezequiel procura tratar com a ameaça de julgamento e a promessa de livramento (Ez 34.17-24). Afundamento, estabelecimento: -> (b' (afundar, # 3190); 4812); $// II (afundar, # 7510); íwA (afundar, # 8755);
mkk (afundar, estabelecer, # ‘ (assentar, # 9205)
B ib l io g r a f ia
1:342, 787. Andrew E. Hill
9206
nnnvp®
rnnyiptp (í^ga ’arürâ), depressões (# 9206).
AT O termo i&qa ‘arúrâ ocorre apenas em Levítico 14.37. Trata-se de uma forma shaphel rara derivada de q ‘r, ser fundo, côncavo e que não é atestada na BH., mas que tem qe 'ãrâ, prato (# 7883) como termo relacionado. Nossa forma também apresenta um radical final reduplicado. Há várias interpretações e explicações para essa expressão, mas o contexto indica manchas aparentes verdes ou vermelhas numa parede, que formam uma depressão ou uma erupção na superfície (rebocada?). B ib l io g r a f ia
D. Klein, A Comprehensive Etymological Dictionary o f the Hebrew Language fo r Readers o f English, 1987; J. Milgrom, Leviticus 1-16, AB 3, 1991, 870-71. Keith N. Schoville
HP® {sqp), ni./hi. olhar do alto, vigiar (# 9207); tpptp'D (masqõp), verga da porta (-> # 5485); der.? Ip® / D’Dpip (seqep / Sequpim), subs. madeiramento, vigamento ( # 9208, 9209). 9207
ip tf
OMA No aram. / sir. seqipã \ cume rochoso, rocha; no ár. s a a f teto, telhado, céu.
AT 1.0 termo sqp ocorre 2 2 x , sendo lO xnoni.e 12 no hi. A idéia básica inerente a ambos é de olhar do alto. Abimelque olhou do alto (“da janela”) e viu Isaque acariciando Rebeca (Gn 26.8). Jezabel (2Rs 9.30) e seus eunucos (v. 32) olharam para baixo pela janela e viram Jeú, assim como Mical estava olhando pela janela, vendo seu marido, o rei Davi (2Sm 6.16 = lCr 15.29) e como a mãe de Sísera olhava pela janela (Jz 5.28). Essa imagem é ilustrada claramente pelo tema da mulher, talvez uma deusa, observando algo ou alguém atentamente por uma balaustrada, encontrado em vários entalhes de marfim recuperados em excavações arqueológicas.) Mas o mestre da sabedoria também observava pelas grades de sua janela os movimentos de um jovem rebelde sendo seduzido até a porta da casa de uma adúltera (Pv 7.6). O vb. é usado para mostrar Araúna olhando do alto enquanto Davi e seus homens s biam da Cidade de Davi para o local que hoje é o monte do Templo, quando o rei foi comprar a eira do jebuseu (2Sm 24.20). Nos altos de onde se podia ver Hebrom, Abraão e seus vistantes incomuns contemplaram Sodoma e Gomorra (Gn 18.16), como também o fez Abraão depois da destruição das cidades (Gn 19.28). Por intermédio de Jeremias, o Senhor advertiu o povo de que Jerusalém a fugir pois uma tragédia estava prestes a sobrevir-lhes. Vinda do norte, a personifi240
ri7u?(# 9210)
cação da calamidade contempla a cidade do alto (Jr 6.1), talvez do monte Escopo. Tanto Pisga (Nm 21.20) quanto Peor (23.28) permitiam uma visão panorâmica do deserto logo abaixo. 2. Outras passagens empregam Sqp tendo como sujeito o Senhor. O vb. enfatiza que nada do que acontece na terra permanece oculto dos olhos atentos de Deus (SI 14.2; 53.3; 102.19 [20]; Lm 3.50). O Senhor perscrutou o exército egípcio do alto da coluna de fogo e nuvem antes de mover-se para destruí-lo (Êx 14.24). Ele olha para os homens para saber se há quem o busque (SI 53.2 [3]), mas de seu santuário celestial também lança um olhar redentor para os desamparados e para os condenados á morte (SI 102.19 [20]). Assim, o poeta temente a Deus irá chorar até que o Senhor veja lá do céu as condições do seu povo exilado (Lm 3.50) e Moisés ora pedindo que o Senhor, em sua benevolência, olhe dos céus para os israelitas (Dt 26.15). 3. A justiça (ou seja, a vontade salvadora de Deus em todos os seus aspectos) baixa o seu olhar dos céus (ou seja, despertando a fidelidade e a fé do povo, SI 85.11 [12]). A calami dade olhou do norte, ou seja, a devastação inevitável e iminente de uma nação impenitente e incorrigível por um agente destruidor escolhido por Deus (Jr 6.1). Nessas passagens, o olhar do Senhor que vê todas as coisas de seu ponto do observação elevado atenta para o que ocorre lá embaixo. Em seguida, age de modo a cumprir seus propósitos e abençoar aqueles que buscam ao Senhor. É com esse fim que oram os fiéis. G uarda, vigia: -> n(r (cuidar, # 5757); -> n$r I (vigiar, guardar, cuidar, # 5915); sph I (mon tar guarda, vigiar atentamente, postar sentinela, # 7995); -> Smr I (vigiar, guardar, respeitar, # 9068); -> sqd (vigiar, despertar, # 9193) Olhar, observação, percepção, vista, visão, vigilância: -> hdh II (olhar fixamente para, apa recer, # 2526); hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); -> hmh I (ver, espreitar, tomar-se visível, # 2778); -> nb( (olhar em volta, aceitar como favor, # 5564); pis II (observar, # 7143); -> II (olhar para, #7438); -> r 'h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); -> r$d (vigiar, # 8353); -> sqd (notar, # 8567); -> í 7i III (olhar atentamente, # 8617); -> Sgh (olhar fixamente, fitar, # 8708); -> iw r I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, # 8800); -> Szp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); -> S ‘h (olhar, preocupar-se com, olhar em volta, # 9120); Sqp (olhar para baixo, # 9207); -> St ‘ (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283 Keith N. Schoville / Jackie A. Naudé 9208 (Seqep, madeiramento, vigamento), -> # 5485 9209 (S?qup\m, madeiramento, vigamento), -> # 5485
TÍ7U? (Sq$), tomar alguém detestável (# 9210); PjPtP' (Siqqus), subs. algo abominável, detestável (# 9199); (Seqeç) subs. algo abominável, detestável (# 9211). 9210
rpu?
OMA O vb. cognato acad. Sãkã$u significa olhar para algo com desprezo (AHw, 1139) ou ameaçar (com mau-olhado, Milgrom, 1992, 107; TWOT 2:955 sugere que seu significado é estar maculado, impuro) e o subs. cognato Siqçu denota uma úlcera (Milgrom, 107). AT North (155) sugere que o heb. Siqqüs era provavelmente um derivativo shaphel (causativo) de qwç, que significa repugnância (p. ex. Gn 27.46; Nm 21.5). Dos três elementos desse 241
ri7®'(# 9210)
conjunto constituído de 2 subs. e um vb., o que ocorre com mais freqüência (28x) é o subs. Siqquç. Já o subs. seqe$ ocorre 1lx (9x em Levítico) e o vb. (um denom.) é encontrado 7x (4x em Levítico). 1. Alimentos impuros e a atitude do indivíduo com relação a eles. As onze ocasiões em que subs. seqeç é atestado conotam animais e outras criaturas detestáveis, que Javé declarou imundas e proibiu os israelitas de comê-las. Os quatro casos em que o vb. sq.f aparece em Le vítico (11.11,13,43; 20.25) denotam aversão ou ser motivo de aversão em função de alimentos impuros O subs seqe$ apresenta uma nuança mais nítida de repugnância do que o termo habitual para alimentos impuros ((âmê # 3238). Uma vez que é usado em justaposição com (ãmê \ vários estudiosos discutiram os significados particulares desses dois termos. Milgrom (1191, 656-85; 1992, 107-16) defende a idéia de que animais considerados (ãmê' não podiam ser consumidos nem tocados, enquanto animais seqe$ não podiam ser con sumidos mas não transmitiam impureza pelo toque. Os sete casos de seqeç que tratam de tipos específicos de animais (Lv 11.10-13,20, 23,41) parecem encaixar-se nessa sugestão. Porém, Levítico 7.21 refere-se a um íeqeç (ã m ê’, que Milgrom (1992, 109) considera “estranho” e “contraditório”. A justaposição desses dois termos descreve algo impuro que não concorda com a distinção que Milgrom sugere haver entre eles. Conseqüentemente, Milgrom aceita a versão variante de Seqeç, que é seres, criaturas que voam em enxames (apoiada por alguns MMM em heb., pelo Pent. sam., Pex. e Trgs.). Milgrom também encontra dificuldade em lidar com o uso aparentemente sinônimo do vb. (m ’ e de sq$ em Levítico 11.43.44. Conclui que esses dois vv. são derivados do Livro da Santidade, diferentemente dos vv. anteriores em Levítico 11. Se seqe$ e (ãmê ’ demonstram uma distinção sutil entre comer e comer e/ou tocar, respectivamente, essa distinção não é respeitada de maneira constante ao longo do contexto em questão (a menos que se lance mão da análise da fonte). A inclusão de íeqkç nesse contexto apresenta variedade e maior intensidade com relação à natureza detestável dos animais designados impuros por Javé. Infelizmente, nem todos os israelitas procuraram viver de acordo com essas estipulações divinas. Isaías (66.17) descreve israelitas perversos reunindo-se num local de adoração pagã (jardins; cf. Is 1.29; 65.3) e comendo came de porco, coisas abomináveis (seqe$) e ratos (Lv 11.29 — tudo isso proibido por Javé) como parte de um ritual pagão. Ezequiel (8.10) re trata outro caso de traição abominável da aliança quando testemunha setenta anciãos de Israel adorando deuses pagãos numa sala com paredes cheias de entalhes de animais que deveriam ser abominados pelos israelitas. 2. Tudo o que é abominável do ponto de vista da adoração a Javé. O subs. mais co mum siqqúç (28x) concentra-se exclusivamente em certos aspectos da adoração idólatra, quer seja o ídolo em si ou parte de um ritual idólatra. Exerce uma função semelhante a tô 'êbâ ( # 9539) ao proporcionar diretrizes tangíveis necessárias para que Israel cumprisse a missão de ser um “reino de sacerdotes e nação santa” (Ex 19.6). O termo siqqúf ocorre 6x como si nônimo exato ou próximo de tô'êbâ (2Rs 23.13; Jr 16.18; Ez 5.11; 7.20; 11.18, 21). Em lRs 11.5, Milcom é chamado de Siqqü.'; dos amonitas, enquanto em 2 Reis 23.13 ele é chamado de tô ‘êbá dos amonitas. A escolha dos filhos de Israel de abominar ou não siqqúçím, ou seja, as práticas pagãs proibidas, demonstrava claramente sua condição espiritual e servia de indicador do seu desti no. Mesmo depois que o rei Salomão ergueu vários templos a siqqúçím (ídolos pagãos — cf. 1 Rs 11.5,7), Israel teve diversas oportunidades de voltar obedecer a aliança. Josias (2Rs 23.13, 24) e Asa (2Cr 15.8) procuraram lutar contra a maré de práticas idólatras dentro das fronteiras de Israel. Os israelitas, no entanto, se deleitavam em suas abominações, $iqqú$im (Is 66.3) e se recusavam a dar ouvidos aos apelos de Deus para que as abandonassem (Jr 4.1; Ez 20.7-8) 242
f p t f (# 9210)
e suas ofertas de restauração (Ez 11.18; 37.23). Sua reverência por Javé era tão pouca que co locaram Siqqüçim dentro do recinto do templo que levava o nome do Senhor (Jr 7.30; 32.34; Ez 5.11). Em função de seu compromisso com suas íiqqüsim, Javé prometeu julgá-los sem piedade (E z5.U ; 11.21; 20.8). A recusa de Israel em manter sua pureza tinha implicações extremamente abrangentes, sendo uma das mais importantes sua incapacidade de atuar, de fato, como uma nação que ser via a Deus, espelhando o caráter divino para as nações pagãs ao seu redor. Em vez disso, como julgamento, o povo sendo dispersado no meio dessas nações pagãs. O profeta Oséias (Os 9.10) descreve como Israel passou de nação amada a ãiqqúç, uma nação abominável. A descoberta improvável de uvas no deserto e a iguaria dos primeiros fi gos produzidos por uma figueira retratam a intensidade do prazer de Javé com sua nação da aliança. Porém, depois que Israel encontrou o povo de Moabe, “começou o povo a prostituirse com as filhas dos moabitas” (Mm 25.1), uma possível alusão aos ritos sexuais pagãos que costumavam ser associados a cultos de fertilidade. Em decorrência disso, o prazer que Javé sentia em sua nação transformou-se em repugnância uma vez que ela passou a participar de atos de adoração repreensíveis diante do Senhor. Como se vê na ordem de exterminar os cananeus, o adorador que participava dos rituais pagãos enfrentava o mesmo furor divino que os insensatos idólatras. Os filhos de Deus tomaram-se tão detestáveis diante de Javé quanto a imoralidade abominável da adoração a Baal. Naum 3.6 mostra que apesar de Siqqü^im costumar ser associado explicitamente à ido latria, o termo pode significar qualquer coisa que Javé considera detestável. Como parte da afirmação de Javé da sua oposição pessoal a Nínive (e ao império assírio) (Na 3.5-7), o Senhor promete lançar sobre eles imundícies ($iqqú$ím). A conotação idólatra habitual de siqqüçim apóia o argumento de que o termo transmite uma idéia subjacente do destino reservado àqueles que depositam sua confiança em outros deuses (Cogigns, 50). Como parte da transformação de Javé dos filisteus num remanescente do seu povo esco lhido, o Senhor afirma que removerá o sangue (dãm) de sua boca e as abominações (siqqüçim) dentre os seus dentes (Zc 9.7). O sangue refere-se a algum aspecto de seus sacrifícios idólatras ou ao fato dos filisteus não escoarem todo o sangue da came antes de consumi-la. As coisas abomináveis que Javé removerá dos filisteus provavelmente referem-se à came impura para um israelita e que era consumida pelos filisteus no contexto de um ritual religioso pagão. Tendo em vista que siqqúftm normalmente refere-se a algum aspecto de práticas idólatras, não pode ser limitado à idéia do consumo de alimentos impuros pelos filisteus. O sangue e as coisas abominá veis referem-se, por sinédoque, às diversas perversões religiosas dos filisteus (Merrill, 245). A expressão traduzida muitas vezes como “abominação desoladora”, Siqqüçtm + a for ma par. de smm (com pequenas variações), ocorre três vezes em Daniel (9.27; 11.31; 12.11). Essa abominação desoladora será colocada no templo e causará a interrupção dos sacrifícios apropriados. A relação genitiva entre esses dois elementos pode ser melhor traduzida como “a abominação que desola”. A palavra kenap, que inicia a cadeia do const., é problemática porém não essencial para a compreensão da expressão em questão. Tendo em vista o significado habi tual de Siqqüs, a estrutura sendo estudada nessas passagens tem sentido de “desolar” por causa de sua relação com a idolatria pagã. Quem cumpriu/cumprirá essa profecia? De acordo com 2 Macabeus 6.1-2, “um velho ateniense foi enviado pelo rei [Antíoco] para ... macular o templo de Jerusalém, dedicá-lo a Júpiter [Zeus] Olímpico”. 1 Macabeus 1.54 diz; “No dia quinze do mês de Casleu, do ano cento e quarenta e cinco, edificaram a abominação da desolação por sobre o altar”. No entanto, Cristo aplica essas palavras à queda de Jerusalém: “Quando, pois, virdes o abominável da desolação de que falou o profeta Daniel no lugar santo... nesse tempo 243
9212)
haverá grande tribulação” (Mt 24.15, 21). Diante da ambigüidade de 1 Macabeus, Daniel e Mateus com relação à natureza exata dessa abominação desoladora, foram apresentadas diver sas sugestões: um altar pagão, pedras sagradas, uma estátua de Júpiter, etc. (para informações detalhadas, ver Collins, 357-58). Nestle (248; cf. Collins, 357) sugere que a expressão siqqüfim mesõmêm, abomina ção desoladora, era um trocadilho derrogatório com o título ba ‘al sãmêm/sãmayim, Senhor do céu, dado a Zeus como principal dos deuses. Conseqüentemente, quando os judeus foram ordenados a confessar Zeus com esse título (“Senhor do céu”), podiam dizer, “uma abomina ção que desola”. 3. Desprezo. O salmista assegura seu público que Javé não detesta (bzh, -> # 1022 nem abomina (sqs) a dor dos aflitos (SL 22.24 [25]). Não se esquiva de sua aflição, antes ouve seu clamor. Tendo em vista a intensidade habitual desse conjunto de palavras, essa declaração negativa proporciona grande consolo para aqueles que passam por aflições. P-B Os três elementos desse conjunto de palavras ocorre no heb. da Mix. com o mesmo sen tido básico que o da BH. (Jastrow, 2:1557, 1625). A LXX traduz 35 das 44 ocorrências desse conjunto de palavras como bdelygmos/bdelussõ. NT
NIDNTT 1:74-75
Desolação: hrb I (ser seco ou desolado, arruinado, # 2990); s ’h 1 (devastar, transformar algo em deserto, # 8615); smm (ficar desolado, deserto, assolar, estremecer, ficar horrori zado, # 9037) Impureza, profanação, contaminação: -> g ’l II (ser contaminado, profanado, macular, # 1458); -> hnp I (ser ímpio, contaminado, # 2866); -> tm ’ (ser/tomar-se cerimonialmente im puro, contaminar-se, profanar, # 3237); -> piggúl (carne impura, # 7002) B ib l io g r a f ia
R. Coggins e S. Re’emi, IsraelAm ong theNations, 1985; J. Collins, Daniel, 1993; J. Hartley, Leviticus, 1992; B. Levine, Leviticus, 1989; E. Merril, Haggai, Zechariah, Malachi, 1994; J. Milgrom, “Two Biblical Hebrew Priestly Terms: seqeç and fãmê," M AARAV8, 1992, 10716; idem, Leviticus 1-16, 1991; E. Nestle, “Zu Daniel,” ZAW 4, 1884, 247-48; C. North, “The Essence o f Idolatry,” Von Ugarit nach Qumran, F.S. O. Eissfeldt, ed. W. Albright, et al., 1958, 151-60. Michael A. Grisanti 9211 (seqeç, abominável, detestável), -> #9210
j?j?U? (Sqq I), q. correr de um lado para o outro, saltar, atacar; hitpalp. ir e vir com pressa (# 9212); i?j?D (maSSãq), pular, lançar-se sobre algo (hapleg.; # 5480). 9212
ppvf
OMA O ugar. íqq é incerto (HALAT 1579) (M. Dietrich eG . Loretz [“Die Banung von Schlangengift(KTU 1.100 und KTU 1.107:7b-13a.l9b-20),” { /F 1 2 ,1980,160] e i. Kottsieper [“KTU 1.100 — Versuch einer Deutung (eine weitere Eule nach Athen getragen),” UF 16,1984, 106] identificam esse termo heb. com o ugar. tqy = acad. saqü, q. ser elevado; pi. erguer; mas cf. M. 244
V ® (#9213)
Tsevat [UF 11, 1979, 762-63], acad. sakãku, rastelar, enfiar, encordoar ou Saqãqu, precipitarse sobre, mergulhar.
AT 1 .0 vb. descreve pessoas lançando-se sobre despojos como gafanhotos (Is 33.4) e um urso atacando, sendo que este último serve de metáfora para um governante perverso que rouba dos pobres (Pv 28.15). 2. O vb. no hitpalp. retrata carros correndo de um lado para o outro nas praças de nive, na esperança de reunir guerreiros para defender-se de um poderoso exército invasor (Na 2.4 [5]). 3 .0 subs. ocorre numa descrição da multidão lançando-se sobre os despojos depoi uma grande batalha; seu ataque é comparado ao movimento de uma nuvem de gafanhotos (Is 33.4). Alguns estudiosos (H ALAT616) propõe o significado “ataque” para o subs., mas Wil dberger (Jesaja, BKAT, 1982, 1284) não encontra muito apoio para essa idéia. A emenda a maqqas apresentada por Ginsberg é ainda menos atraente, alguém que escolhe. Pulo, salto, sobressalto: -> gls (saltitar, pular, # 1683); -> dw$ (dançar, # 1881); ^ dlg (saltar, # 1925); -> znq I (pular perante, # 2397); -> ntr II (sobressaltar-se, saltitar, #6001); -> s ld (pu lar, saltitar, # 6134); -> pws (saltitar, saltar, # 7055); -> pzz II (ser rápido, ágil, dar pulinhos, # 7060); rqd (saltitar, saltar, # 8376); -> sqq (correr de um lado para o outro, saltar, #9212) B ib l io g r a f ia
H. L. Ginsberg, “Some Emendations in Isaiah,” ./BZ, 69, 1950, 57-58. John E. Hartley
IjW" (sqr) m q. tratar/usar de falsidade; pi. usar de fal sidade com, trair (# 9213); 1j?tP' (seqer), subs. dissimu lação, falsidade, pretexto, dolo, fraude (# 9214); (saqqãr), var. não usada (# 9215). OMA Acad. suqq/gguru(m), enganar; Mari sikarum, dolo, transgressão da fé; ugar. sqr, enganar (KTU 2.36:9, ver Dijkstra, 141, 143); no aramA, sqr agir de modo traiçoeiro (com referência a uma pessoa ou aliança); ár. (palavra estrangeira) suqarísugar, mentira; aramJ siqrã', mentira, falsidade; sir. sqr, mentir, enganar; suqrã ’, mentira; heb. Mix. sqr, mentir, ser um mentiroso comprovado. AT 1 .0 vb. ocorre apenas 6x, sendo lx no q. (Gn 21.23) e 5x no pi. (Lv 19.11; ISm 15.29; SI 44.17 [18]; 89.33 [34]; Is 63.8). Nos fundamentos da verdade bíblica, encontra-se o caráter de Javé, que não pode ser falso; uma vez que não é homem, mas sim Deus, não pode mentir (ISm 15.29; cf. Nm 23.19, em que kzb é usado para fazer a mesma asserção). Ele não é ho mem ( 'ãdãm) que pode praticar e pratica a dissimulação. Em sua fidelidade à aliança ( ‘emúná, # 575), ele jamais desmentirá suas palavras a Davi (SI 89.33 [34]; os vv. par. 34-35 [35-36] empregam lõ ’snh, não mudar e kzb como sinônimos próximos) e não trairá sua aliança com Davi. Semelhantemente, quando ocorre no tratado de Sefire, em aram., sqr +be significa trai ção (Fitsmeyer, 455-56; cf. Klopfenstein, 8). Portanto, Javé jura não apenas que se recusará a desviar-se de suas palavras, como também que não romperá sua fidelidade à aliança. O radical ’mn ( # 586), ser fiel, verdadeiro, certo e seus derivativos são os antônimos mais apropriados para o radical Sqr e seus derivativos O Senhor diz a verdade ( ’emet # 622) 245
n p tí(# 9213)
tomando por base a sinceridade e honestidade. Assim também, o povo de Deus é categori camente proibido de usar de falsidade (Lv 19.11; par. khS [pi.], enganar, trair; gnb, furtar, no mesmo v.). Os pagãos Abimeleque e Ficol pedem a Abraão que não use de falsidade para com eles (Gn 21.23; Sqr + le), ou será impossível viverem juntos na terra. Deus esperava que seu povo de Deus não mentisse para ele (IS 63.8). Não foi o que aconteceu, tendo-se em vista que pelo menos uma vez Israel parece declarar sua inocência na transgressão da aliança (cf. Êx 19—24) mesmo tendo sido castigada (Sl 44.17 [18]; Skr + be + berít). Esse uso verbal deter mina a abrangência do campo semântico do radical. Quando há um objeto, o vb. é seguido de b + aliança, um atributo da fidelidade de Deus ou por le + pessoa. 2. Mesmo sendo empregado muito mais vezes do que o vb. (113x), o subs. segol seqer, dissimulação, é usado de maneira semelhante. Não é de surpreender que o termo seja encon trado 37x em Jeremias, pois o profeta trata da aliança rompida e do abuso e dissimulação de Israel com relação a ela (esp. Jr 8.8). Descreve os sonhos falsos dos profetas que não foram chamados por Javé e cuja falsidade/mentiras (Seqer) podem desviar de Javé o povo (Jr 23.32). As formas de uso da palavra podem, de modo geral, ser categorizadas da seguinte maneira: a. É usada no âmbito legal/de jurisprudência com relação a uma falsa testemunha (Êx 20.16; Dt 19.18), inclusive fazer um juramento falso (Lv 6.5 [5.24]). b. Naturalmente, o culto de Israel era uma área em que a falsidade podia tomar-se abundante e ninguém que falasse ou adorasse com falsidade (mentiras, l eqãr'm , Sl 27.12; 101.7) habitaria na casa do Senhor. Os preceitos de Deus é que devem dirigir a vida e não os caminhos da falsidade (Seqer, Sl 119.104). c. O mal é aquilo que gera seqer, dissimulação, dolo, iniqüidade (Sl 7.14 [15]). Todo tipo de pes soa ou influência perversa pode ser considerado semelhante aos mentirosos (Seqer, Is 57.3-4). d. O termo descreve os atos e o regozijo desonestos e infundados dos inimigos de um homem justo (Sl 35.19), pois eles mesmos baseiam-se na falsidade, e. Uma mentira, ou a própria lín gua mentirosa podem ser descritas por esse subs. e ambas são detestadas pelo justo (Pv 13.5) e também por Deus (Pv 6.17; 12.22). A verdade é contrária a Seqer. f. A palvavra usada para designar um mentiroso (Pv 17.4) e é colocada juntamente com um homem perverso (ra ‘; # 8273) que dá ouvidos à língua maligna. Em última análise, um mentiroso é culpado de apre sentar dissimulação/falsidade, em vez da verdade. 3. Em resumo, pode-se dizer que esse radical é ligado ao mundo das palavras e com portamentos falsos, da dissimulação, do dolo ao tratar das coisas conforme são definidas pelo caráter, palavras e atos de Deus. A justiça, a fé e as estipulações da aliança/tratado foram trans gredidas/desconsideradas. O termo encontra-se intimamente relaiconado à traição da confiança do outro ao usar-se de dissimulação/falsidade e não da verdade. LXX De modo geral, a LXX emprega termos com a formação adik- (injusto, iníquo) para traduzir seqer. Também são usados termos com anom-, irregular e pseud-, falso. P-B A palavra é usada muitas vezes no heb. posterior (p. ex. Gen R 5.85). No pi,, significa mentir, defraudar, mostrar-se falso, contradizer; o hitp., que não é usado no AT, desenvolveu o significado de ser provado que alguém é mentiroso, ser refutado (para referências, cf. Jastrow 2:1626). MMS O vb. é encontrado lx (no pi.) e o subs. 8x. O vb. adquire um significado específico relevante para os participantes da aliança de Qumran: “realizar declarações falsas” para entrar na comunidade (1QS 6:24). O uso do subs. é semelhante àquele do AT; é empregado de ma neira próxima a kzb (lQpHab 10:10, 12). 246
ngfc'(# 9216)
NT É evidente que o NT se preocupa com a área da vida à qual esse radical se refere. Apre sentar provas falsas, dar falso testemunho e jurar em falso são questões de interesse dos es critores do NT e a forma como usam o radical é semelhante àquela do AT (p. ex., Mt 5.33-37; 26.59-60; Mc 14.56; Jo 8.44; At 6.13; ICo 15.15). Dissimulação, falsidade, dolo, fraude, iniqüidade, mentira: -> 'ãwen (injúria, iniqüidade, dissimulação, # 224); -> b d ’ (inventar, tramar, mentir, # 968); kzb I (mentir, ser um menti roso, enganar, # 3941); -> khs (trair, enganar, tomar-se escasso, # 3950); nkl (ser ardiloso, enganador, trapaceiro, # 5792); ns ’ II (ser enganado, enganar, causar engano, # 5958); sãrá II (rebelião, crime, revolta, falsidade, # 6240); ’ qb I (agarrar o calcanhar, embair, en ganar, # 6810); -> rmh I (trair, usar de traição com, # 8228); -> íw í (voltar-se para a falsidade, emaranhar-se em mentiras, # 8454); í^rr (usar de/ agir com falsidade, trair, # 9213); -> /// (enganar, escarnecer, gracejar, # 9438) 1 B ib l io g r a f ia
NID NTT2:457-63, 470-74; 77/^7"2:1010-19; TWAT ZA66-12; TW O T2:955-56; M. Dijkstra, “Marginalia to the Ugaritic Letters in KTU ii.,” U F 2 \ , 1989, 141-52; J. Fitzmyer, “The Ara maic Suzerainty Treaty From Sefire in the Museum o f Beirut,” CBQ 20, 1958, 444-76; M. Klopfenstein, Die Luge nach demonstrar Alten Testament, 1964, 6-8. Eugene Carpenter / Michael A. Grisanti 9214 (seqer, mentira, dissimulação, falsidade, dolo), -> # 9213
9216
njró'
njró (sõqet), subs. cocho de água (# 9216); < nj71P (sqh), regar, dar de beber ( # 9197).
OMA O radical é conhecido em outras línguas sem., cf. ár. sãqiyat, canal. AT A palavra é usada em Gênesis 24.20 e 30.38, mas sem relevância teológica. Apesar de Sõqet e rahat serem usados para bebedouros de ovelhas ou gado, por derivação, sõqet referese ao processo de prover água para animais sedentos, enquanto raha; é o lugar onde a água é coletada para os animais. Cocho: -> ’êbús (cocho de comida; # 17); -> yeqeb (tina/tonel de vinho, lagar, # 3676); -> m iã’eret (amassadeira, # 5400); púrâ (tonel [lagar], # 7053); -> rahat (cocho de água, # 8110); -> sõqet (cocho de água, # 9216) Francis Foulkes
9217
"W (Sêr I), subs. pulseira, bracelete, somente no pl. rri“W" (Sêrôt), usado (hapleg.) (# 9217).
OMA Acad. sawilarum, anel (HALAT 1522; AHw, 1205-6); aram. sêrã pulseira; ár. si/uwar, anel (HALAT 1522); sem/weru, pulseira; conf. aramA, cognatos sir., ser firme (BDB, 1057; HALAT 1528). 247
nti7(# 9219)
AT O termo ocorre em Isaías 3.19. Para uma discussão sobre jóias, ver ‘ dh (colocar ador nos, # 6335). MalcolmJ. A. Horsnell
9219
nu?
1127 (sõr), umbigo, cordão umbilical (# 9219; cf. HALAT 1522-23).
AT 1. Cordão umbilical. Em Ezequiel 16.4, a palavra é usada para falar da situação de Is rael em seus primórdios. O retrato mostra uma menina ainda bebê que não recebeu cuidados depois de nascer e foi abandonada; mas Javé tem compaixão da criança. 2. Umbigo ou força. Em Provérbios 3.8, não fica claro qual é o significado exato da palavra, que pode ser corpo (LXX), umbigo (KD, Proverbs, 1:87-88) ou força (McKane, Pro verbs, 1970, 293). No Cântico dos cânticos 7.2 [3] foi sugerido o significado “vulva” (BDB, 1057), mas isso com base numa etimologia incorreta (R. E. Murphy, The Song o f Songs, Hermeneia, 182, n. 3). Abdômen, ventre: 'úl (ventre, corpo, #214); beten I (ventre, # 1061); gãhôn (ventre [de um réptil], # 1623); -> hõmes II (ventre, # 2824); -> kãrês (ventre [de um animal], # 4160); -> mê'eh (corpo, entranhas, # 5055); -> qêbâ (ventre, abomaso [estômago de ruminantes], # 7687; -> sõr (umbigo, cordão umbilical, # 9219) B ib l io g r a f ia
A. Murtonen, Hebrew in Its West Semitic Setting. Part One: A Comparative Lexicon, Section Ba: Root System: Hebrew Material, 1988. Cleon L. Rogers, Jr
7777
. ___________ 1 ” _____
aiw' (sarab), subs. calor escaldante, vento do deserto (# 9220).
OMA O subs. é atestado no acad. sarrabu, o nome de um demônio; no vb. aram. (srb), estar ressecado e subs. (serab), seca; no ár. sarãb designa uma miragem.
AT 1 .0 subs. aparece duas vezes no livro de Isaías, ambas como uma condição ambiental desagradável que será removida quando o Senhor vier para livrar Judá. Em Isaías 35.7 o ter mo parece designar o chão ressecado que será transformado em lago no fim dos tempos (um exemplo do tema “água no deserto”, que aparece com freqüência em Isaías). 2. Em Isaías 49.10, o profeta promete que a volta dos israelitas num novo êxodo n seria afligida pelo sol nem porsãrãb, em função da proteção e provisão do Senhor. Nesse caso o subs. provavelmente se refere a um vento escaldante, um flagelo comum para os viajantes do deserto (Torrey, 385). P-B O texto heb. do Eclesiástico 43.22 afirma que o orvalho traz refrigério depois de um sãrãb. A LXX traduz o subs. como kausõn, calor abrasador. Calor, ressecamento: -> hmm (estar momo, quente, manter aquecido, # 2801), -> f^ risí (ressecamento?, # 3046); -> ftrr I (estar quente, ressecado, estar áspero, # 3081); y$t (acender. 248
n n u? (# 9223)
manter aceso, inflamar, queimar, ressecar, # 3675); -> srb (estar ressecado, # 7646); srp (cha muscar, ressecar, cauterizar, # 8596); sdp (ressecar, 8728); íãraA (calor escaldante, # 9220) B ib l io g r a f ia
IDB 2:551; C. C. Torrey, SecondIsaiah, 1928. Anthony Tomasino 9222 (sarbif, vara, cetro), -> # 8657 9227 (sãrôn, Sarom),
9223
Sarom
rt’"!®' (Siryã), significado incerto; talvez lança, azagaia ou ponta de flecha (# 9223).
OMA Ár. sirwat/siryat, ponta de flecha. AT O termo siryâ é um hapax que ocorre somente em Jó 41.26 [ 18]. Não se sabe ao certo o seu significado. A impressão é de que se tem em mente uma lança, um chuço ou azagaia. Po rém a LXX traz thõrax, peitoral. Tomando por base o cognato ár., sugeriu-se “ponta de flecha” (HALAT 1011). Arco, flecha, arco-e-flecha: -> 'aspâ (aljava, # 880); -> ziqôt (flecha inflamada, # 2338); -> hê$ (flecha, # 2932); -> (hh (ficar ao alcance de um tiro de arco, # 3217); -> yôreh I (arqueiro, # 3452); -> yeter II (corda do arco, # 3857); -> qeset (arco, # 8008); -> rbb II (atirar, # 8046); rbh II (ficar ao alcance de um tiro de arco, # 8050); fi l í (aljava, # 9437); -> G uerra: Teologia Lança: -> tp m t (lança, # 2851) B ib l io g r a f ia
2:956. /v. Lawson Younger, Jr 9234 (Siryôn, escudo de armas, armadura),
# 5796
P ® (irí), q. enxamear, fervilhar, ser incontável (# 9237); subs. (Seres), seres que enxameiam (# 9238). OMA O radical heb. srç tem cognatos no sir. (rastejar) e no et. (brotar). AT 1 .0 radical ocorre 14x, somente no q., com o significado básico de enxamear ou fervi lhar com uma quantidade incontável. A palavra é usada para descrever a vida abundante sobre a terra no relato da criação (Gn 1.20-21). A aliança com Noé continha a instrução para a huma nidade se multiplicar ou fervilhar sobre a terra da mesma forma (Gn 9.7). Depois do dilúvio, todas as criaturas preservadas na arca deveriam se multiplicarem abundância (Gn 8.17). Pos teriormente, o termo sr$ é usado para enfatizar o rápido crescimento populacional dos hebreus no Egito, representando uma ameaça numérica e política para os egípcios (Êx 1.7). O mesmo 249
p t f (# 9237)
termo retrata o fervilhar de incontáveis sapos, um fenômeno relacionado à segunda praga (Êx 8.3 [7.28]; cf. Sl 105.30). Há duas passagens importantes para determinar distinções entre rms, enxamear, fervilhar e Sr$, enxamear, fervilhar. Em Gênesis 7.21, Sr$, enxames de criaturas, é entendido como um subconjunto de rms, toda came que se movia. O significado fervilhar ou multiplicar-se abun dantemente para o termo srs é mostrado de modo mais específico em Gênesis 8.17, em que os animais na arca são libertados para se multiplicarem (cf. Gn 1.26). Nesse caso, Sr$ tem a co notação clara de uma abundância enxameante ou fervilhante de seres, enquanto rms indica um grande número de seres (ver rms) se movendo (especialmente se arrastando e fervilhando). Em termos teológicos, Levítico classifica “enxames de criaturas que povoam a terra” como sendo cerimonialmente imundos para os hebreus (Lv 11.29,41,42,43,46). Ezequiel em prega essa imagem para enxames de criaturas vivas, peixes no rio de Javé que corre do templo no fim dos tempos como símbolo da bênção divina (Ez 47.9), lembrando sem dúvida alguma a abundância da primeira criação de Deus (Gn 1.20-21). 2. O subs. seres ocorre 14x no TM, com dez citações em Levítico 10. Assim como forma verbal, Seres mantém o significado característico de seres enxameando ou fervilhando em contraste com remes, répteis pequenos (-> # 8524). Em termos genéricos, seres refere-se à abundância de criaturas no mar que Deus fez existir na criação (Gn 1.20). A mesma palavra é usada para descrever todas as criaturas que se moviam sobre a terra e que foram destruídas pelo dilúvio (Gn 7.21). Em outras passagens, Seres é usado de maneira teológica com um sentido pejorativo, para categorizar tipos de criaturas viventes que profanam a pureza cerimonial dos israelitas, quer por tocá-las (Lv 22.25), tocar sua carcaça (Lv 5.2) ou comê-las (Dt 14.19). De acordo com Wenham, o termo heb. Sere.y tem como melhor tradução “seres que enxameiam”. Trata-se de pequenas criaturas que se ajuntam em grandes números, movendo-se de um lado para o outro de modo aleatório e que podem ser encontradas no ar, no mar ou em terra (Leviticus, NICOT, 175). A relação sacerdotal de alimentos puros e impuros contém vá rios tipos de Seres, como todo inseto que voa (Lv 11.20), enxames de criaturas terrestres como roedores e répteis (vv. 29,31) e enxame de criaturas que povoam a terra e se arrastam sobre ela (vv. 41,44). Douglas sugere que esses enxames de criaturas eram imundos para os hebreus pois não apresentavam um padrão claro de movimento em seu âmbito de vida (Purity and Danger, 1966, 56). Para demonstrar esse fato, Douglas cita o exemplo dos gafanhotos que saltam em vez de se arrastar, tomando-os comestíveis para os israelitas (cf. Lv 11.21-22). Abundância, multiplicação, suficiência: dgh (multiplicar, # 1835); day (suficiência, suprimento transbordante, # 1896); -> ysp (acrescentar, continuar, aumentar, # 3578); -> kbr I (fazer muitos, ter um suprimento abundante, # 3892); megammâ (totalidade, abundância, # 4480); -> rbb I (tomar-se numeroso, muito, grande, # 8045); rbh I (tomar-se numeroso, multiplicar, aumentar,#8049); -¥ r 'S II (serabundante,# 8322); -> s g ’/s g h (tomar-segrande, aumentar, exaltar, # 8434 / 8436); spq II (bastar, ser suficiente, # 8563); Swq I (transbor dar, conceder em abundância, # 8796); -> Sepa ‘ (superabundância, # 9179) B ib l io g r a f ia
NIDNTT 1:728-44; 2:128-31; 3:136-38; TWOT2:956-51; M. Gilbert, “Soyes feconds et multipliez (Gen 1:28),” NRT 96. 1974,729-42; I. Nowell, “The Narrative Context o f Blessing in the Old Testament,” in Blessing and Power, M. Collings & D. Powers, (Eds.), 1988, 3-12. Andrew E. Hill 250
jritt? (# 9239)
9238 (seres, seres que enxameiam), -> # 9237
p n# (Srq), q. sibilar (9x); assobiar (como sinal para cha mar, 2x) (# 9239; HALAT 1527b); subs. (Serêqâ), sibilo (8x [inclusive Jr 18.16, *Serêqat]; # 9240; HALAT 1528a); njTHP1'(seriqâ), assobio (?) silvo (?) (hapleg.; # 9241; HALAT 1528a). 9239
p i#
OMA Talvez o termo G syrinx, flauta, flauta de Pã, seja derivado (como palavra estrangeira) do radical sem. Srq (HALAT 1528a). AT No AT, o vb. srq significa sibilar, sempre como uma inteijeição derrisória ou apotropéica feita quando alguém passa pelas ruínas de uma cidade destruída (1 Rs 9.8; Jr 19.8; Lm 2.15-16; Sf 2.15) ou assobiar, não num sentido musical, mas como um sinal para chamar, como quan do Javé convoca as nações contra Sião (Is 5.26; 7.18). O derivativo serêqâ é usado somente com o sentido de sibilar, sempre como uma interjeição derrisória ou apotropéica feita quando alguém passa pelas ruínas de uma cidade destruída (2Cr 29.8; Jr 19.8; 25.9; Mq 6.16). Apesar de em Juizes 5.16o termo Seriqâ referir-se claramente ao som feito pelos pastores, não se sabe ao certo se se trata do som de um assobio para chamar as ovelhas ou do uso de um instrumento de sopro. O subs. do aramB maSrôqitã' (# 10446) usado em Daniel 3.5, 7 provavelmente se refere a algum tipo de flauta. P-B O vb. heb. pós-bíblico pode ser usado para se referir ao coaxar de um sapo, como no Midraxe Rabá de Êxodo, § 10 (Jastrow, 2:1633b); o vb. no aramJ Seraq, sibilar, assobiar, pode referir-se, como no TalmB Hullin 63a, ao canto de um pássaro (Jastrow, 2 :1634a). O aphel sir. de srq pode significar assobiar, sibilar e é usado para o sibilo da serpente para Eva (J. Payne Smith, A Compendious Syriac Dictionary, 1903, 599b). Zom baria, ridículo, escárnio, gagueira: -> gdp (insultar, blasfemar, # 1552); -> h tl(enganar, zombar, # 2552); -> hrp II (afrontar, zombar, insultar, provocar, # 3070); -> lys (desdenhar, con tar vantagem, ridicularizar, # 4329); -> / ‘b (gracejar, brincar, #4351); l'g (gaguejar, zombar, motejar, # 4352); -> /«■ (rebelar, escarnecer, # 4372); -> mwq (escarnecer, zombar, motejar, # 4610); -> qls (desdenhar, escarnecer, mofar, # 7840); -> shq (rir, escarnecer, regozijar-se, cele brar, dançar, # 8471); tll (enganar, escarnecer, gracejar, # 9438); -> /" (enganar, escarnecer, # 9506); ta ‘tu ‘im (erros, escárnio, # 9511) B ib l io g r a f ia
H. J. Austel, TWOT2:957; B. Bayer, “Music: History: Biblical Period, Second Temple Period,” EncJud 12 cols. 564, 565; S. B. Finesinger, “Musical Instruments in OT,” HUCA 3, 1926, 5354; D. A. Foxgrov e A. D. Kilmer, “Music,” ISBE 3:444a, 445b; P. Grelot, “L’orchestre de Da niel iii, 5, 7, 10, 15,” VT29, 1979, 26-28; H. Gressmann, Musik und Musikinsirumente imAT, 1903, 29; E. Kolari, Musikinsirumente und ihre Verwendung im AT, 1947, 35-36; O. R. Sellers, “Musical Instruments o f Israel,” BA 4, 1941, 40-41, 46; D. G. Stradling e K. A. Kitchen, “Music and Musical Instruments,” IBD 2:1032, 1038; E. Wemer, “Musical Instruments,” IDB 2:1032,1038; E. Wemer, “Musical Instruments,” IDB 3:472a. RobertH. 0'C onnell 9240 (Serêqâ, sibilo), -> # 9239 251
niT-rç; (# 9244)
9241 (seriqâ, assobio, silvo?),
9244
n iT I Ç
# 9239
niV l® ' (serirút), obstinação (# 9244).
OMA Aram. serírútã’, força, verdade; sir. Sarrirütã, firmeza. AT O subs. serirút ocorre lOx, sendo 8x em Jeremias (3.17; 7.24; 9.14 [13]; 11.8; 13.10; 16.12; 18.12; 23.17), uma vez em Deuteronômio (29.19 [18]) e outra em Salmos (81.12 [13]). Em cada caso, o substantivo é ligado a lêb, coração (5x, um coração [ r a ‘] perverso, Jr 3.17; 7.24; 11.8; 16.12; 18.12), numa relação de constructo. Aqueles que são culpados de abrigar tal atitude em seu coração trilham o caminho da teimosia (o vb. hlk exerce a função de vb. regente 8x e encontra-se bastante próximo nas outras 2x [SI 81.12 (13); Jr 18.12]). Os acontecimentos que cercaram o êxodo de Israel do Egito fornecem grande parte do cenário contextual para esse termo. Os pais (seus antepassados que saíram do Egito) e o Egito são citados no contexto mais amplo de seis ocorrências (SI 81.12 [13]; Jr 7.24; 9.14 [13]; 11.8; 16.12; 23.17). Spencer (247) sugere que & rirút apresenta três dimensões de significado; confiança em si mesmo, fazer a própria vontade em vez da vontade de Deus, e idolatria. No contexto da cerimônia de renovação da aliança (Dt 29), Moisés adverte os israelitas da natureza abominável da idolatria (Dt 29.16-18 [ 15-17]). Ele prossegue avisando-os para não confiar que a lealdade de Israel como um todo à aliança cobrirá atos individuais de traição (idolatria) (Dt 29.19 [18]). A nação vassala de Deus é constituída de indivíduos que fazem escolhas, que por sua vez de terminam o destino de sua nação inteira. Essa pertinácia arrogante trará as maldições pactuais sobre a nação desobediente (Dt 29.20-21 [ 19-20]; Jr 11.8). O significado sugerido por Spencer, confiança em si mesmo, não parece encaixar-se ao Deuteronômio 29.19 [18]. Moisés adverte de seguir presunçosamente os próprios desejos obstinados na esperança de que a obediência de sua nação contará mais do que a traição pessoal. Assim como várias passagens de Jeremias (9.14 [ 13]; 13.10), serirút retrata a atitude de qualquer israelita que teima em se apegar a ten dências idólatras em vez de adorar fielmente a Javé. O par. de conselhos para si próprio (mõ "êjâ/mahsãbà) e teimosia (serirüt, SI 81.12 [ 13]; Jr 7.24; 18.12) enfatiza o contraste entre a vontade da própria pessoa e as expectativas de Javé. P-B A justaposição de sPrirüt e lêb aparece repetidamente nos MMM como indicação de um indivíduo rebelde (CD 2.17; 3.5, 11; 8.8, 19; 19.20, 33; 20.9; 1QS 1.6; 2.14, 26; 3.3; 5.4; 7.19, 24; 9.10; 1QH 4.15). Na maioria dos casos, o vb. regente para essa estrutura é hlk (caminhar). Rebelião, conspiração, obstinação, teimosia; -> y sd II (conspirar conjuntamente, # 3570); ksh (tomar-se obstinado, teimoso, # 4170); -> lãçôn (vangloria, palavras insensatas, # 4371); /$.? (rebelar, escarnecer, # 4372); -> mrd (revoltar, rebelar, # 5277); mrh (ser insubmis so, teimoso, # 5286); -> srr I (ser obstinado, rebelde, # 6253); 'bt (conspirar juntamente, # 6309); ‘ê jã II (desobediência?, rebeldia?, # 6784); -> 'ãtãq (velho, duro, obstinado, arro gante, # 6981); p s ' (revoltar, rebelar, # 7321); qes i (obstinação, # 8001); -> q ir (aliar-se em conjunto, conspirar, juntar, # 8003); -> í erirút (obstinação, # 9244) B ib l io g r a f ia
A. Spencer, “mVHP as Self-Reliance,” JBL 100, 1981, 247-48.
MichaelA. Grisanti 252
U h tf (# 9245)
ttHtf (srs), pi. desarraigar, erradicar; pu. ser erradicado; poel. arraigar; poal e hi. arraigar; vb. denom. (# 9245); tthtf (sõres), raiz, origem, base (# 9247). OMA O subs. é comum nas línguas cognatas, cf. acad. sursir, ár. Sirs; ugar. srs. AT 1 .0 subs. sores é usado para a raiz de uma planta (Jó 8 .17; 14.8; 18.16; 30.4 e a mes ma palavra no aram., para a raiz de uma árvore em Dn 4.15,23, 26 [12,20,23]); para as solas dos pés ou calcanhares de uma pessoa como raízes (Jó 13.27); para o sopé de uma montanha (Jó 28.9); para o fundo do mar (Jó 36.30). 2. Empregado para referir-se à raiz ou origem de uma questão (Jó 19.28). Deuteronômio 29.18 [ 17] fala do perigo de haver em Israel uma raiz que produza “erva venenosa e amarga” levando o povo a deixar o Senhor e voltar-se para ídolos Em termos gerais, Provérbios 12.12 diz: “Ojusto não pode ser desarraigado” (cf. Pv 12.3; Ez31.7). Isaías 11.1 apresenta a promessa messiânica: “Do tronco de Jessé sairá um rebento, e das suas raízes, um renovo” e Isaías 11.10 fala mais sobre a “raiz de Jessé”. Então, referindo-se ao servo do Senhor, o profeta diz em Isaías 53.2: “Porque foi subindo como renovo perante ele e como raiz de uma terra seca”. 3. O vb. é usado no sentido positivo do Senhor fazer com Israel, como uma vinha ti rada do Egito, crie raízes na terra que lhes foi dada (Sl 80.9 [10]). Depois do julgamento de erradicação, para o qual é usada uma outra parte do mesmo vb. (ver abaixo), há esperança e promessas, como em Isaías 27.6: “Dias virão em que Jacó lançará raízes, florescerá e brotará Israel, e encherão de fruto o mundo.” Cf. também 2 Reis 19.30 = Isaías 37.31; Ezequiel 17.6-9; Oséias 14.5 [6], 4. Os poderosos que não temem ao Senhor são desarraigados (Sl 52.5 [7]; Is 5.24). Ao falar do grande poder do Criador e da fragilidade até dos maiores governantes da terra, em Isaías 40.24, o profeta diz: “Mal foram plantados e semeados, mal se arraigou na terra o seu tronco, já se secam, quando um sopro passa por eles, e uma tempestade os leva como palha”. As vezes, tem-se a impressão de que os ímpios lançam raízes (Jr 12.2) e não são perturbados, mas no final, o que acontece com eles é aquilo que Amós (2.9) descreve ocorrendo com os amorreus: “destruí o seu fruto por cima e as suas raízes por baixo”. Raiz, poda: nts (desarraigar, arrasar, destruir, # 6004); -> 'qr (desarraigar, # 6827); -> srs (desarraigar, # 9245) B ib l io g r a f ia
J. Becker, “Wurzel und Wurzelspross,” BZ 20, 1976, 22-44. Francis Foulkes 9247 (sõres, raiz), -> # 9245
9249
rntflU? (sarserâ), subs, cadeia, cordões retorcidos ou trançados firmemente (# 9249).
AT 1. Os cordões eram para enfeitar a estola sacerdotal e o peitoral do juízo. O sumo sa cerdote de Arão usava um peitoral do juízo (Êx, 28.15-21) e uma estola com duas pedras em cada ombreira nas quais estavam escritos os nomes das tribos de Israel. Cada pedra ficava num engaste ao qual eram ligados cordões retorcidos de ouro (Êx 28.14; cf. v. 22; 39.15). 253
r n t f (# 9250)
2 .0 templo de Salomão era magnificamente decorado com festões em forma de SarSerâ. S. J. DeVries discute rapidamente esse subs. como um termo técnico e o define como “uma grinalda ou guirlanda feita de festões em fileiras” ( / Kings, 110). Cada capitel das duas colu nas de bronze no pórtico do templo tinha preso a si sete cadeias como essas com romãs (lR s 7.17; cf. 2Cr 3.5; 16 [2x]). 3. O uso figurativo do termo “cadeia” chama a atenção para o sofrimento que pode brevir indivíduos ou nações. Quando o sofrimento é originado de Deus, é considerado disciplina pelo pecado. Ser liberto de tais cadeias é um ato de compaixão divina. Cadeia, grilhão: -> ’s r (prender, aprisionar, agrilhoar, engatar, # 673); -> zêq (cadeia, grilhão, # 2414); -> harçõb (cadeia, grilhão, # 3078); kebel (algema, # 3890); -> migbãlôt (cadeias, # 4456); -> mahpekel (tronco [para prender condenados], # 4551); rnõsêr (grilhões, cadeias, # 4591); -> sad (tronco [para prender condenados], algemas, # 6040); -> phh (ser capturado, acorrentado, # 7072); ríq (ser preso, # 8415); -> S ar^râ (cadeia, # 9249) Sacerdotes e levitas: -> ’abnê( (cinto, esp. de sacerdotes, # 77); 'êpôd 1 (estola, veste sa cerdotal, objeto de veneração, # 680); -> hõSen (peitoral do sumo sacerdote, # 3136); Wiw (cumprir os deveres de um sacerdote, # 3912); -> kômer (sacerdote pagão, # 4024); -> lèwi (levita, # 4290); -> migbã a (tiara, # 4457); -> miknãsayim (calças, # 4829); -> pa ‘amôn (cam painha [na sobrepeliz do sacerdote], # 7194); tasbêç (quadriculado [túnica do sacerdote], # 9587); -> Arão: Teologia; -> Sacerdotes e levitas: Teologia T. Desmond Alexander
mu? (Srt), pi. atender, ser um criado, servir, ministrar (# 9250); subs. rnç? (Sãrêt), serviço religioso (# 9251). OMA O radical Srt ocorre no heb. e no aram.; uma forma substantivai, serviço, ocorre no fenício. É usada para práticas religiosas em Qumran. (Ver 77W7’2:1019 e a discussão no HALAT 1532.) AT 1 . 0 vb. Srt (pi.) ocorre 97x, sendo que mais da metade delas em textos cultuais em Êxodo (lOx), Números (lOx) e 1 e 2 Crônicas (18x) e Ezequiel (17x). As formas predominan tes são aquelas relativas ao participio (45x) e ao infinitivo (32x). O part. mesãrêt é traduzido com freqüência como “servo” o “assistente” (p. ex., Êx 24.13). O vb. possui um significado bastante próximo de 'bd, servir, mas enquanto este último pode ser usado para trabalhar ou trabalhar/servir em geral (cf. Gn 29.15-20), srt significado basicamente ministrar ou atender o outro, seja ele humano ou divino. Aqueles que ministram normalmente são seres humanos, mas podem ser as hostes celestiais (SI 103.21) ou mesmo os anjos (SI 104.4) O subs. sãrêt, utensílios para o serviço no santuário, ocorre 2x (Nm 4.12; 2Cr 24.14). 2. Serviço ou assistência a outros homens. Nesses casos, trata-se de uma referência serviço pessoal: José ajudando os funcionários de Faraó na prisão (Gn 39.4; 40.4); Josué com relação a Moisés (Êx 24.13; Js 1.1); Eliseu com relação a Elias (1 Rs 19.21; 2Rs 4.43; 6.15); os levitas com relação a Arão (Nm 3.6; 13.2) e à congregação de Israel (16.9). No contexto referente a um rei, Srt diz respeito aos criados pessoais (2Sm 13.17-18; lRs 1.4; 10.5; 2Cr 22.8; Xerxes em Et 1.10; 2.2; 6.3; cf. SI 101.6). Por vezes, o termo é usado para funcionários em cargos políticos e oficiais militares (lC r 27.1; 28.1; 2Cr 17.19; cf. Pv 29.12). Assim, o vb. é associado ao serviço prestado a um superior por alguém, de um escalão inferior. O serviço é contínuo, porém de duração limitada e prestado por homens livres e não escravos. 254
PP (# 9252)
3. Ministério associado à adoração a Javé. Esses textos tratam das responsabilidades específicas dos sacerdotes (1 Rs 8.11), levitas (1 Cr 6.32 [ 17]) e outros (Samuel, 1Sm 2.11, 18) no contexto da adoração em Israel. A idéia de servir a Deus com todo o ser e toda a vida não fica implícita nesse vb. como é o caso com ‘bd (observe-se, porém, o paralelo com “servo” em Is 56.6 [cf. 61.6], em que é possível que algo semelhante ao “sacerdócio de todos os fiéis” esteja envolvido nessa visão do futuro). Em alguns casos, é especificado em mais detalhes em que esse ministério acarreta. Os levitas deviam “ministrar diante da arca do Senhor, e celebrar, e louvar, e exaltar o Senhor” (lC r 16.4; cf. 2Cr 5.13-14; 8.14); os filhos de Arão deviam “acender a oferta queimada ao Senhor” (Ex 30.20; cf. 28.35, 43), um ministério para o qual havia uma série de apetrechos específicos (p. ex., vestes, Êx 39.1; Ez 42.14; cf. Nm 4.9; utensílios, Nm. 4.12, 14; Jr 52.18). As atividades dos sacerdotes num culto de lamento comunitário são especificadas em Joel (1.9, 13; 2.17). De um modo mais geral, envolviam cuidar do local de adoração (Nm 1.50) e de seus equipamentos (3.31; cf. ISm 3.1; 2Rs 25.14). Existe também a possibilidade do exercício de um ministério falso (Ez 20.32; 44.12). 4. Uma oração usada (com várias formulações) é “servir ao Senhor” (Dt 10.8; 17.12; 18.5, 7; 21.5; lCr 15.2; 23.13; 2Cr 13.10; 29.11). Esses textos mostram um tom pessoal em seu conceito de serviço; trata-se de um ministério voltado para e em favor do próprio Deus e não apenas com relação aos lugares e objetos associados à adoração divina. Esse ministério também representa um serviço para a congregação (Nm 16.3; Ez 44.11). Num certo sentido, Deus escolheu ser dependente dessas pessoas para sua atividade; daí esses indivíduos poderem ser considerados assistentes divinos, sendo que tanto Deus quanto o povo são beneficiados por suas atividades à medida que colaboram para intensificar o relacionamento entre os dois. Na visão do templo restaurado, Ezequiel 44— 55 faz uma distinção entre o ministério dos levitas (superintendência mais geral do templo, 44.11-14; cf. Nm 8.26; Jr 33.21-22) e os descendentes de Zadoque (ministério no altar, Ez 44.15-27). Na visão de Isaías 56— 66, os estrangeiros irão ministrar a Deus (56.6, par. a “servo”) e, no entanto, num contraste com os estrangeiros, os israelitas serão chamados “ministros de nosso Deus” (61.6; cf. 60.7, 10) em par. com “sacerdote do Senhor”. Adoração, prostração, reverência: -> ghr (curvar-se, dobrar-se, # 1566); -> hwh II (adorar, curvar, fazer mesura, # 2556); kpp (curvar-se, inclinar-se em reverência, # 4104); -> k r ‘ (dobrar-se, # 4156); -> sgd (curvar-se, # 6032); -> 'bd (trabalhar, servir, adorar, # 6268); -> qdd (curvar-se, ajoelhar-se; # 7702); -> srt (atender, ser um criado, servir, ministrar, # 9250) B ib l io g r a f ia
THAT 2:\0\9-22\ TWOT 2:958; J. van der Ploeg, “Slavery in the Old Testament,” SVT 22, 1972, 86-87. Terence E. Fretheim 9251 (sãrêt, serviço cultuai), -> # 9250
^ (sês 1), subs. seis (número cardeal) (# 9252); nu?® ----------Ü------------------------ :---------- (í í /j), vb. denom. pi. dar uma sexta parte (porém apenas em Ez 45.13; considerar provavelmente o ordinal) (# 9257); ' p p (sissí), adj. sexto (número ordinal) (# 9261). 255
(# 9253)
AT Diferentemente da maioria dos outros números, o seis parece ser neutro ou inerte em termos de qualquer sentido simbólico ou retórico, de modo que há poucas ocorrências inte ressantes, exceto com relação ao número sete. Assim, seis dias (Êx 16.26; 20.9) ou seis anos (Êx 21.2; 23.10) conduzem ao sétimo ou são distinguidos dele. As seis hásteas do menorá são implicitamente distintas da sétima hástea central (Êx 25.32). Sessenta é um número alto inter mediário para cidades (Dt 3.4) e guerreiros (Ct 3.7). 2. Em certos livros bíblicos de contexto mesopotâmio (p. ex., Gn 7.11; Dn 3.1) há indí cios de um sistema sexagesimal (que tem o seis como unidade básica) usado juntamente com o sistema decimal em textos sumérios e babilônios. Há termos distintos para 6, 60, 600, 3.600 no acad. e os reinos da Lista do Rei Sumério (ANET 264-65) são múltiplos de 6 e 36 (p. ex., 600, 24.000). Em Daniel 6.2 há 120 sátrapas, mas U. Cassuto (From Adam to Noah: A Com mentary on the Book o f Genesis 1-6, 1961,259) sugere que havia uma tendência a acrescentar o sete, que era o número preferido (cf. os 127 sátrapas em Et 1.1; 8.9; 9.30). As dimensões do templo do pós-exílio são de sessenta côvados (Ed 6.3; cf. 1Rs 6.2). 3. É provável que números mais elevados envolvendo um múltiplo de seis sejam simbóli cos e não exatos, uma vez que se trata de uma técnica literária comum usar números hiperbólicos para indicar importância. Dentre os prováveis exemplos estão o êxodo de 600 mil israelitas (Êx 12.37), a morte de 600 adversários pelas mãos de um só homem (Jz 3.31) e o sacrifício de 600 bois (2Cr 29.33). Como um número arredondado realista, uma força militar de 600 homens é considerada modesta (1 Sm 13.15; 23.13), como aquele que poderia haver numa tribo (Jz 18.11). No entanto, 600 carros é um número assustador para um povo refugiado (Êx 14.7). P-B No Preceito da Guerra, a disposição de um com seis totalizando sete é uma caracterís tica da organização militar, de modo que um batalhão luta e há outros seis (1QM 9:4) e seis sacerdotes com trombetas acompanham o sumo sacerdote (1QM 7:12). Os sacerdotes servem no templo dos 30 aos 60 anos de idade (CD 14:7)e os juizes dos 25 aos 60 (CD 10:7). Castigos podiam durar seis meses (1QS 7:3-5) ou sessenta dias (1QS 7.8). NT No NT pode-se encontrar a seqüência 30-60-100 (Mt 13.8), sendo que o sexto item numa série é um preparo para o sétimo e culminante item no livro de Apocalipse (6.12; 9.13; 16.12) e o fato de ficar aquém da perfeição do sete pode ser parte do significado do número da besta, 666 (Ap 13.18). Números: -> 'ehãd (um, # 285); -> elep II (milhar, contingente militar, # 547); -> 'arba‘ (quatro, # 752); -> hãmês (cinco, # 2822);. mê a I (cem, # 4395); ‘eser (dez, # 6924); -> r^bãbâ (dez mil, miríade, # 8047 / 8052); -> seba ’ I (sete, # 8679); -> sãlõS, SelõSâ (três, um grupo de três, # 8993); Semõneh (oito, # 9046); senayim (dois, # 9109); sês I (seis, # 9252); tèsa ‘ (nove, # 9596) Numeração, contagem: -> kss (calcular, repartir, # 4082); mnh (contar, # 4948); -> spr I (contar, numerar, calcular, repetir, # 6218); -> pqd (numerar, determinar, # 7212) P. P. Jenson
9253 OMA Ver o armênio sis, giz. 256
Vjp (sês II), alabastro ou mármore branco (# 9253), so mente em Estér 1.6; Cântico dos cânticos 5.15.
XttW (# 9255)
AT 1 .0 termo é traduzido como alabrastro em Ester 1.6 e mármore no Cântico dos cânticos 5 .1 5 .0 uso de sês no Cântico dos cânticos é uma figura de linguagem para a força e a beleza das pemas do amado, semelhantes a pilares de mármore (apesar de Pope [Song ofSongs, AB 7C, 1977, 546] sugerir que o contraste desse material com a cor da pele pode ser problemático). 2. Para uma introdução teológica ao tópico das pedras preciosas no AT, ver 'õdem (# 138). Pedras preciosas: ‘eben (pedra, rocha, # 74); -> ‘õdem (pedra preciosa, # 138); ahlãmâ (jaspe, # 334); 'eqdãh (berilo, # 734); -> bahat (pedra preciosa, # 985); -> bãreqet (esme ralda, # 1403); -> yahalõm (pedra preciosa; # 3402); -> yãsepêh (jaspe, # 3835); kadkõd (rubi?, # 3905); -> /esew I (pedra preciosa, # 4385); -> nõpek (pedra semipreciosa, # 5876); -> sõheret (minério de pedra, # 6090); -> sappir (lápis-lazúli, # 6209); pz/dâ (crisólito, # 7077); -> K tó (pedra preciosa, # 8648); -> sõham 1 (pedra preciosa, # 8732); sãmir II (esmeril, diamante?, # 9032); -> iê f II (alabastro, # 9253); -> /arízí II (pedra preciosa, # 9577) Jóia, adornos: -> Aa /í I (adorno, jóia, # 2717); -> harúzim (colar de conchas, # 3016); tabba'at (anel, #3192); -> kúmãz (adorno, # 3921); -> misbe$ôt (engastes, # 5401); nezem (anel, # 5690); neti(í)pâ (brinco, # 5755); -> ‘ãgil (brinco?, # 6316); ‘dh II (adomar-se, # 6335); -> ‘As (retinir, # 6576); ‘/?ç (colocar um colar, # 6735); -> p eninim (corais, pérolas, # 7165); !>awwãrôn (colar, # 7454); -> sãmid I (pulseira, # 7543); $e 'ãdâ (tomozeleiras, # 7577); rãftW (colar, # 8054); -> sah^rônim (crescentes [luetas], # 8448); -> sõiw (adorno, # 8667); -> sêr I (pulseira, # 9217); -> rôr (pendente, # 9366) B ib l io g r a f ia
/DS 2:898-905; ISBE4:623-30; MD/V7T3:395-98; J. S. Harris, “An Introduction to the Study of Personal Omaments, of Precious, Semi-Precious and Imitation Stones Used Throughout Biblical History,” A LU O S4, 1962, 49-83; L. Koehler, “Hebrãische Vokabeln II,” Z A W 55, 1937, 16174; H. Quiring, “Die Edelsteine im Amtsschild des judischen Hohenpriesters und die Herkunft ihrer Namen,” AGM3S, 1954, 193-213; W. Zimmerli, Ezekiel 25-48, 1983, 82-84. Andrew E. Hill 9254 (sês III, linho egípcio),
9255
# 7324
STO (ss'), pi. conduzir uma criança (# 9255).
OMA O et. atesta sosawa, caminhar juntamente. AT O vb. é um hapleg. (Ez 39.2), cujo significado é, em grande parte, determinado por sua disposição juntamente com swb, voltar ( # 8740), ‘lh, educar ( -> # 6590) e bw \ ir ( - > # 995). Pode-se encontrar assistência também na LXX kathodêgeõ, carregar e na Vg. educare, levar junto. Orientação, direção: -> nhg I (guiar, orientar, # 5627); -> nhl (conduzir, orientar, # 5633); h/i/i (conduzir, # 5697); -> is ’ (conduzir uma criança. # 9255) B ib l io g r a f ia
W. E. Zimmerli, Ezekiel 2, Hermeneia, 1983,290. E. H. Merrill 257
■V pw (# 9266)
9257 (ssh, dar uma sexta parte), 9261 (sissi, sexto),
# 9252
# 9252
(Sãsar), subs. cinabre/vermelho (# 9266). Brenner relaciona-o a um pigmento vermelho produzido no Egi-
9266 to a partir do ocre (153).
OMA Não se sabe ao certo a etimologia dessa palavra rara. AT Jeremias usou SãSar para descrever a cor do palácio que Zedequias construiu para si (Jr 22.14). Ezequiel empregou o termo para descrever a cor das roupas dos soldados caldeus pelos quais Oolibá (Judá) sentia-se atraída em sua volúpia (Ez 23.14). Cores — Vermelho: -> 'dm (ser vermelho, # 131); 'argãmãn (púpura. # 763); -> karmll (carmesim, # 4147); -> sãrõq (vermelho acastanhado, # 8601); -> sãní I (escarlate, # 9106); iõ ío r (cinabre/vermelho, # 9266); -> //'I I (vestido(a) de tecido escarlate, # 9443) B ib l io g r a f ia
A. Brenner, Colour Terms in the Old Testament, JSOTSup, 1982. R. Gradwohl, Die Farben im Alten Testament, BZAW 83, 1963. Robert Alden
9268
ntf
n® (sêt I), nádegas (somente em 2Sm 10.4; Is 20.); fun damentos (?) no Salmo 11.3 (hassãtôt) é raro e proble-
mático (ver comentários) (# 9268). Dorso: -> gab I (dorso, # 1461); -> gibbên (corcunda, # 1492); -> gaw (dorso, # 1567); mipsã 'â (nádegas, # 5156) Cleon L. Rogers, Jr 9269 (sêt II, Sete), -> Caim
í lW (sth II), q. beber (217x; # 9272; HALAT 1537-39a) (hi. formado em sqh por suplência); sub. nrupç (mi&teh), festa (festejar), banquete (banquetear); bebida (beber) (46x; # 5492; H A L A T adj./subs. 'n® (seti II), ato de beber (até a repleção?), saciedade (?), bebedeira (?) (hapleg., Ec 10.17; # 9275; HALAT 1539b); subs. n-TlU? (setiyyâ), (maneira/hora de) beber (hapleg. Et 1.8; # 9276; HALAT 1539b). 9272
nm?
OMA Há cognatos do lexema sty/sth atestados em todas os principais grupos lingüísticos sem. com exceção do ár. clássico (no qual seu lugar foi tomado por sariba, beber, e seus congêneres lexicais [Wehr, 462a-63a; cf. Gerleman, col. 1022]). Pode-se encontrar cognatos verbais no acad. satú(m), beber (AHw, 3:1202b-3a, satü(m) II; CAD §/2; 207a-217b, satü A); ugar. sty i., beber 258
nn tf (# 9272)
(W UStt 2705; UTtt250\;CML2 159a; cf. RS 24.258, Obv. 3 [2x], 16); eblaítas i-ti(Pettinato, 92); num texto aram. de Deir ‘Allas/ywfimpv.), beber (combinação I, linha 12; Hoftijzer— van der Kooij, 174,179,207-8); no aramB setâ, beber (Dn 5.1 -4); AAS. sty (Conti-Rossini, 200b); et. satya (LLA, 365); e tigré satã ( TigrWb 186). Cognatos substantivais, seguindo a forma do heb. misteh são o acad. mastitu, bebida (vasilha de tamanho padrão) (CAD, M /l, 393b-94b) e mastü (vasilha de beber); ração (porção) de bebida; bebida (CAD, M /l, 395a-b); ugar. mslt, bebida (W U S# 2705; U T # 1568; 2501); e aramB misteyã', banquete (banquetear) (Dn 5.10). Dentre os cognatos que seguem a forma do subs. heb. seti II encontram-se o et. sétê e sétay (LLA, 365) e o tigré sTtõ (TigrWb 186a). O vb. ugar. sty, beber, aparece com freqüência juntamente com iiim, comer (RSP I, ii 335a-g [251-52]), e às vezes com sb', estar satisfeito (RSP 3, i 296a-g [154-55]; cf. 3. i 327a-d [ 170]). Por vezes, o subs. ugar. mastitu, bebida || 'akãlu, comida (RSP 2, ix 38a-c [395]). Num texto aram. de Deir ‘Alia ütyw.hmr, beber vinho (por metalepse, uma metonímia de causa para o efeito, cambaleante que, por sua vez, é uma metonímia de efeito para a causa, furor) (Com binação 1, linha 12) || ’klw (p)hd comer temor (Combinação 1, linhas 11-12; Hoftijzer-van der Kooij, 174, 179,207-8).
AT 1 .0 sentido verbal comum de sth, beber, é ilustrado de diversas maneiras no AT tendo como sujeito pessoas ou animais, significando ou proibindo, de modo alternativo, que se beba água (Nm 20.11, 19; Jz 15.19), vinho fermentado (Jz 13.4, 7, 14), leite (Ez 25.4) ou sangue ( lCr 11.19). E raro um objeto inanimado ser personificado bebendo algo, como quando a terra de Israel, diferente da terra irrigada do Egito, bebe água “da chuva dos céus” (Dt 11.11). A ex pressão estereotípica do AT “comer e beber” aparece no ditado temático de Eclesiastes: “Nada há melhor para o homem do que comer ( kl), beber (sth) e fazer que a sua alma goze o bem do seu trabalho” (Ec 2.24; cf. 3.13; 5.18 [ 17]; 8.15). Em outras passagens, essa expressão significa consumir uma refeição inteira, quer seja compartilhada com outros (Gn 24.54) ou feita sozinho (Gn 25.34) ou participar de festanças exageradas (Êx 32.6; 1Sm 30.16; 1Rs 1.25). O paralelis mo poético padrão ’kl || sth é exemplificado com freqüência (p. ex.. Is 29.8; Ez 12.18-19) e em Ezequiel 39.17-20, sua repetição tripla intensifica a descrição sanguinolenta de aves de rapina e feras convidadas a comer da came e beber do sangue daqueles que foram mortos na batalha escatológica de Javé. Numa pergunta retórica (Sl 50.13), em meio à rejeição de Deus da com pensação ritual (Sl 50.8-13), Deus é o sujeito dos vbs. 'kl || sth ainda que estes não passem de sinédoques para o ato de ele receber ofertas (cf. Dt 32.37-38, em que Javé repreende os deuses que comiam e bebiam do seu povo). O vb. heb. sth, beber, por vezes forma um par com sb \ estar saciado (normalmente de alimentos sólidos, Hc 2.16; Ag 1.6; porém cf. Am 4.8) ou com o subs. sob'â, saciedade (Ez 39.19) (RSP 3, i 296h-l [155]; cf. 3, i 327e-f [ 170]) e às vezes com sth || Ihm, comer (p. ex., Pv 4.17; 9.5; RSP 1, ii 335g-h [252]). 2. O subs. heb. misteh denota uma festa, um banquete, sempre que seu uso deixa im plícito receber convidados de modo suntuoso com comida e bebida, quer os convidados sejam membros da família (Jó 1.4-5) ou conhecidos (2Sm 3.20), poucos (Gn 19.3; 26.30; Et 5.4, 8, 12; 6.14) ou muitos (Gn 21.8; 29.22; IRs 3.15; Et 1.3, 5, 9), ou sempre que o uso se refere a comemorações em geral que incluem comida e bebida (Et 8.17; 9.22). Ainda que em qualquer desses sentidos, misteh possa se referir a um banquete de casamento (Jz 14.10; Et 2.18; Jr 16.8-9), no AT nunca denota especificamente a refeição do casamento. É possível que o dita do de Eclesiastes 7.2, “Melhor é ir à casa onde há luto do que ir à casa onde há banquete (bêt misteh)" encontre um par. literário num texto assírio médio de RS: [e] te-e[r-d]i DUMUru ina É qe-re-ti = [é] te[rd]i mãru ina bit qerêti, “Filho [não vá à] uma casa em que há banquetes” 259
n rw ' (# 9272)
(cf. RSP 2, ix 4 [376-77]; AHw, 2:917b-18a). Jeremias 51.39 usa misteh de modo figurativo e mostra Javé preparando para os cidadão da Babilônia um banquete no qual ele os embriagará com a destruição. Em livros posteriores do AT, o subs. heb. misteh pode ser usado como senti do de bebida (Ed 3.7; Dn 1.5, 8, 10, 16); o subs. ocorre duas vezes em conjunto com m a ’akãl, comida (Ed 3.7; Dn 1.10; cf. RSP 2, ix 38d [395]), ou como o gerúndio de um/o ato de beber (vinho) (Et 5.6; 7.2, 7-8; cf. Ecli 49.1). 3. Comprovando o único uso no AT de setí II, Eclesiastes 10.17 elogia o rei que c para refazer suas forças e não para “saciedade/bebedice”. Ao apresentar o único uso no AT de setiyyá, Ester 1.8, pelo contrário, ilustra os excessos dos membros da corte persa que “por de creto do rei, bebiam sem constrangimento (de hora/modos)” (tr. do autor). P-B O vb. heb. pós-bíblico Sty/sth significa beber, apesar de o part. pass. denotar estar bê bado/sob influência da bebida (Jastrow, 2:1637a-b). O aramJ setã ’, beber, pode significar, no etpeel, estar bêbado (Trg Onk. Lv 11.34) (Jastrow, 2:1637). Em outros textos, o vb. é atestado no sir, st ’, beber, embeber; etpeel, estar bêbado (Payne Smith, 600a). O subs. heb. pós-biblico setiyâ denota o ato de beber, como um estado metonímico de haver bebido, pode ter a conotação de saciedade ou gratificação (Cf. Jastrow, 2:1638a). O ter mo heb. pós-bíblico misteh, que significa bebida (beber), banquete (banquetear), festa (feste jar) (Jastrow, 2:859a), refere-se com tanta freqüência ao banquete de casamento que chega a denotar essa refeição, como no Sinédrio de Tosefta 12.10 (e no Sinédrio do TalmB. 101a), que diz “a voz estremece no Cântico dos Cânticos e, portanto, conduz à residência do casamento [bêt hammisteh]” (de acordo com Rudolph, 189-90 n.4, comparando a tradução da LXX do Hb misteh em Gênesis 29.22, Ester 2.18; 9.22 com o G gamos, comemoração/banquete de ca samento — ainda que com base num calque do significado do termo heb. pós-bíblico misteh). O subs. aramJ mist^yã ’ significa bebida (ato de beber), festa (ato de festejar) ou, com freqüên cia, festa de casamento (Midr. Rabá de Gênesis, §3) (Jastrow, 2:859a). O sir. atesta as formas substantivais m a s fiy ã bebida (ato de beber), seca, poção, festa, banquete (Payne Smith, 310b), sãtüyã’ e satãyã ’, dois termos que significam aquele que bebe, um bebedor; setyã ’ e setãyã’, uma bebida, o ato de beber (Payne Smith, 600b); e o subs. mand. myst(y)ty significa uma be bida, o ato de beber (MdD 476b). Bebedouro, extração de água, alagamento: g m ' (engolir, beber, # 1686); g r' II (puxar [gotas d’água], # 1758; dlh I (tirar água, # 1926); yrh II (dar de beber, # 3722); /" II (beber ruidosamente, # 4363); Iqq (lamber, sorver, # 4379); -> (beber, tragar, # 5209); rwh (saciar a sede, embriagar, regar, encharcar, # 8115); s'b (tirar [água], # 8612); -> sqh (dar de beber, refrescar, # 9197); -> sth II (tirar água, dar de beber, # 9272) B ib l io g r a f ia
H. J. Austel, 7’H/0 7 ’2:959b-6Oa; C. Conti-Rossini, Chrestomathia arabica meridionalis epigraphica, 1931; D. M. Edwards, “Drunkenness,” ISBE, 1979, l:994b-95a; G. Gerleman, THAT, 2:1022-26; J. Hoftijzer eG . van der Kooij, eás.,ATDA, 1976; A. W. Jenks, “Eating and Drinking in the OT,” ABD 2>250b-54b; D. J. Pardee, “The Prcposition in Ugaritic,” UF 7, 1975, (32978) 373 (sty + preposições b. Ibl, ‘d, '/«); J. Payne Smith, A Compendious Syriac Dictionary, 1903; G. Pettinato, Old Canaanite Cuneiform Texts o f the Third Millenium, 1979; M. H. Pope, “A Divine Banquet at Ugarit,” in The Use o f the OT in the New and Other Essays, FS W. S. Stinespring, ed. J. M. Efird 1972, 170-203 (RS 24.258); J. F. Ross, “rink,” IDB l:871b-72a; 260
(# 9274)
W. Rudolph, “Das Hobe Lied im Kanon,” ZAW 59, 1942-43, 189-99; D. E. Smith, “Drink,” ISBE, 1979, 1:992b-93a. Robert H. O 'Connell
9274
’nw'
’n # (seti I), subs. material tecido (# 9274).
OMA Acad. satú, trama, sutü urdidura; ugar. stt tecido; aram. setã ’ trama, sityã ’ urdidura. AT Esse termo e ‘êreh 1( -> # 6849) ocorrem nos mesmos nove lugares em Levítico 13.4859. Em diversas versões, o par é traduzido como “urdidura e trama”. A perícope refere-se a roupas contaminadas com uma praga. Essa tradução habitual “urdidura e trama” é problemática pois dá a impressão de que o fungo se desenvolve em fios que correm em ambos os sentidos. No entanto, Milgrom argumenta em favor da interpretação tradicional (Leviticus 1-16, AB, 809). A expressão pode ser entendida como um tecido feito de dois tipos diferentes de linha (de acordo com Wenham, Leviticus, 202) ou diferentes estilos de manufatura, “tecido e tricotado”, como aparece em algumas traduções. Fiação, costura, tecelagem, bordado: ’rg (fiar, tecer, # 755); dallâ I cabelo, fio solto, tear, # 1929); hõsêb (tecelão, # 3110); twh (fiar, # 3211); -> kisôr (fuso [de fiar], # 3969); -> mãnôr (haste, # 4962); -> skk 11 (tecer, entrelaçar, #6115); 'êreb 1 (tecido tricotado, # 6849); pelek I (fuso, # 7134); rqm (bordar [bordador], entretecer, # 8387); serãd (tecido [adj.], # 8573); -> sb$ 1 (tecer, # 8687); -> Setí 1(urdidura, # 9274); tpr (coser, # 9529) Robert Alden 9275 (seti II, o ato de beber, embriaguez?), -> # 9272 9276 (setiyyâ, o ato de beber), -> # 9272 9277 (sãtíl II, o ato de cortar),
9278
brw
# 9278
^ntC (stl), q. plantar, transplantar (# 9278); V,n # (sãtil), o ato de cortar (hapleg.; # 9277).
OMA Ocorre no ár. e no aram. com o mesmo significado. No acad., a forma substantivai sig nifica broto ou talho. AT 1 .0 vb., que ocorre um total de 1Ox no grau q. aparece sempre em passagens poéticas com um sentido metafórico. Ezequiel 17.8 fala de Israel como a vinha que, apesar de estar plan tada em solo fértil, próxima à água em abundância e perto da grande águia (Babilônia, v. 12), seca quando estende seus ramos para outra águia (Egito, v. 15). Ainda que a vinha seja trans plantada (v. 10), ela secará quando for atingida pelo vento do Leste, o julgamento de Deus pelas mãos da Babilônia (v. 20). No epílogo de Ezequiel 17, Deus anuncia que ele mesmo plantará um broto tenro da ponta do cedro (v. 22) no alto monte de Israel (v. 23) e esse broto crescerá e se transformará numa árvore nobre, oferecendo abrigo para todos os pássaros. Ezequiel 19.10, 13 é estruturado em cima dessas mesmas imagens. Plantada junto a águas em abundância na 261
yntf (# 9283)
terra de Canaâ (v. 10), Israel tomou-se grande e floresceu, mas foi destruída pelo fogo (julga mento) depois de ter sido transplantada (exílio na Babilônia) para um deserto. 2. Jeremias 17.8 e Salmo 1.3 descrevem as bênçãos concedidas àquele que confia no Senhor: “Ele é como a árvore plantada junto às águas”. Mesmo durante a seca, ele continuará verdejante. Semelhantemente, o Salmo 92.13 [14] revela que os justos “plantados na Casa do Senhor” florescerão e continuarão a dar frutos mesmo na velhice (v. 14 [15]). 3. A transmissão textual de Oséias 9.13 reflete a possibilidade de dois textos heb. clara mente semelhantes. O TM, representado pela maioria das traduções modernas, diz “Vi Efraim como Tiro (le$ôr), plantado (stf) num lugar agradável (benãweh)." A LXX sugere, “Como vi, seus filhos [de Efraim] (bãneyhá) são designados (Sãtú lãhem) para serem presa (lesayid)." O mais provável é que a tradução contextualmente difícil do TM tenha dado origem à tradução apresentada pela LXX. 4. Estruturado de acordo com a disposição qãtil, comum com outras atividades agríco las (p. ex. zãmir, a poda de vinhas), é possível que Sãtil tenha um sentido pass., aquilo que é plantado ou enxertado. O único exemplo da palavra em hb. é metafórico e refere-se aos filhos daquele que teme ao Senhor como rebentos de oliveira (Sl 128.3). P-B Apesar de uma das designações próprias dos membros da seita de Qumran ser Plantação Etema, ma((a‘at 'olam (1QS 8.5, 11.8), não há derivativos do radical Stl nos textos existentes. Dá-se preferência aos radicais n( ‘ e $mh. Aram. com o mesmo significado, Trg. do Salmo 128.3 para sãtil. Eclesiástico 50.12 glorifica os servos do sumo sacerdote Simeão II (219-196 a. C.): “São como rebentos de cedro (Sãtilé) no Líbano”. Rebento: yônêq (criança pequena, bebê, criança de peito, # 3437); -> n t‘ (plantar, estabe lecer, guiar, # 5749); -> stl (plantar, transplantar, # 9278) M. G. Abbeg, Jr
9283
yntf
ynu? (s t'), q. olhar fixamente, olhar, fitar; hi. desviar o olhar; hitp. olhar ao redor com ansiedade (# 9283).
AT O vb. heb. st ‘ aparece somente 2x no AT (Is 41.10, 23). Na verdade, essa forma é deri vada de S ’h, olhar fixamente, olhar, fitar (# 9120), que aparece mais 12x no AT. O radical S'h sofre uma metátese na forma hitp. resultando no que parece ser um novo radical St \ No q. e no hi. esse vb. denota o movimento do olho, significando olhar ou ver (2Sm 22.42; Jó 7.19; 14.6; Sl 39.13 [14]; Is 22.4; 31.1). Em termos simbólicos, pode referir-se a prestar atenção ou ter consideração por algo ou alguém (Gn 4.4, 5; Ex. 5.9; SL 119.17; Is 17.7, 8). No contexto do medo, porém, esse vb. aparece 2x na forma hitp. mencionada acima, significando olhar ao redor com ansiedade e aparecendo em algumas versões como assombrar-se (Is 41.10, 23). Nos dois casos y r '( # 3707) o termo heb. mais comum para medo aparece juntamente com essa forma de s ‘h. No primeiro caso é usado como uma exortação de consolo, semelhante à oração par. ‘a! t i r ã não temas, seguida da oração subordinada causai apropriada ("porque eu sou o teu Deus”). No segundo exemplo, aparece no contexto de um insulto idólatra: “Fazei bem ou fazei mal, para que nos assombremos, e juntamente o veremos”. Em ambos os casos, a idéia por trás da expressão desse medo é análoga à ansiedade de sempre ter que olhar por sobre o ombro à espera de uma ameaça desconhecida. 262
pn® (# 9284)
Olhar, observação, percepção, vista, visão, assistir: -> hdh II (olhar fixamente para, aparecer, # 2526); -> hzh (ver, perceber, contemplar, # 2600); -> hmh I (ver, espreitar, tomar-se visível, # 2778); nbt (olhar em volta, aceitar como favor, # 5564); -> pis II (observar, # 7143); -> II (olhar para, # 7438); -> r ’h (ver, ter visões, escolher, perceber, # 8011); r.vc/ (vigiar, # 8353); -> (notar, # 8567); -> $ 'h III (olhar atentamente, # 8617); -> ig/i (olhar fixamente, fitar, # 8708); swr I (olhar fixamente, observar com atenção, ver, tt 8800); ízp (avistar, curtir [ao sol], ressecar, # 8812); -> í 7? (olhar, preocupar-se com, olhar em volta, # 9120); -> sqp (olhar para baixo, # 9207); -> s / ‘ (olhar fixamente, olhar, observar com atenção, olhar ao redor com ansiedade, # 9283) M K ta/j Pelt /W . C. Kaiser, Jr
9284
pnu?
pn® (s/g), q. acalmar-se (# 9284).
AT Esse radical ocorre 4x como verbo. Em três ocasiões, refere-se ao mar se acalmando (SI 107.30; Jn 1.11, 12) como resultado da ação de Deus e uma vez, ao fim de uma contenda quando não há intriga (Pv 26.20). Descanso, quietude, repouso: dmh II (chegar ao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); -> nwh I (descansar, # 5657); nwh I (sossegar, descansar, esperar, estacionar, depositar, # 5663), -> /g'(form ar uma crosta sobre, endurecer, parar, ficar quieto, # 8088/89); -> s ’n (ficar em paz, imperturbado, # 8631); sbh II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); seèe/ (des canso, assento, # 8699, 8700); -> (acalmar-se, # 9284) ./oAw jV. Oswalt
263
3Xn (# 9289)
DXn (/ ’b I), desejar, desejar com ânsia (# 9289); subs. rn x n (ta ’abâ), anseio, desejo ( # 9291). AT 1 .0 vb. pode ser uma raiz secundária baseada em ’bh, desejar, querer ( # 14). O vb. é usado duas vezes no Salmo 119 para descrever o anseio pela palavra de Deus (preceitos, piqqudim) e pela salvação que vem dele (vv. 40, 174). Esse vb. enfatiza o fato de que os homens, feitos à imagem de Deus, encontram seu significado mais essencial nos atos e palavras de seu Criador/Redentor. 2. O subs. é encontrado no Salmo 119.20 para indicar o anseio do salmista pela pala vra do Senhor. P-B O vb. é atestado na LR tanto com referência ao apetite físico (por alimento) como moral (pendor para o mal) e também para aqueles que anseiam por filhos. Desejo, cobiça, anseio, aneio, deieite, felicidade, prazer: -> ’areset (desejo, pedido, # 830); -> hmd (desejar, almejar, ansiar por, cobiçar, estimar, # 2773); -> hps 1 (ansiar, desejar, querer, cuidar, # 2911); -> hsq (desejar, ansiar por, ambicionar, # 3137); y 'b (ansiar por, anelar, de sejar, # 3277); -> kãleh (anseio, # 3985); -> kmh (ansiar por, desejar ardentemente, # 4014); ksp II (desejar, almejar, # 4083); môrãs II (anelo, desejo, # 4626); -> ‘rg (desejar com ânsia, suspirar por, # 6864); -> s 7 (pedir, requisitar, querer, # 8626); t ’b (desejar, ansiar por, # 9289); fisítqâ (desejo, enleio, apetite, # 9592) 9290 (t 'b II, detestar, abominar), 264
# 9493
rraxn (# 9291)
9291
rn xri
r n x n (ia ’abâ), subs. anseio, desejo, apetite, desejo ardente, lascívia (# 9291); < 3Nn (t ’b) ansiar por (
# 9289); AT O subs. é halpleg. usado somente no Salmo 119.20. O contexto expressa a intensidade com o uso de grs, consumir, definhar ( -> # 1756). O objeto do desejo ardente (consumidor) do salmista são os decretos do Senhor que, no final, lhe dão prazer (v. 24, í " , #9141). Desejo, cobiça, anseio, anelo, deleite, felicidade, prazer: -> ’areset (desejo, pedido, # 830); -> hmd (desejar, almejar, ansiar por, cobiçar, estimar, # 2773); hps I (ansiar, desejar, querer, cuidar, # 2911); -> hsq (desejar, ansiar por, ambicionar, # 3137); y ’b (ansiar por, anelar, de sejar, # 3277); -> kãleh (anseio, # 3985); -> Avh/i (ansiar por, desejar ardentemente, # 4014); H (desejar, almejar, # 4083); -> môrãs II (anelo, desejo, # 4626); -> 'rg (desejar com ânsia, suspirar por, # 6864); í 7 (pedir, requisitar, querer, # 8626); - > / ’£> I (desejar, ansiar por, # 9289); -> fisüqâ (desejo, enleio, apetite, # 9592) David Talley
9292
nxn
nxn (/7i), pi. demarcar (um limite) (# 9292).
AT Enquanto twh é usado quando há pessoas envolvidas, í ’h refere-se à demarcação de limites ou divisas. No OMA, na maiora dos casos as divisas eram vagamente definidas pelas cidades que se encontravam ao longo do caminho (cf. item “Grenzle,” RLA 1957-71, 3:639). Em Números 34, os marcos de delimiatação fixos são o mar e uma montanha: “Este vos será o limite (t ’h) do norte: desde o mar Grande marcareis até o monte Hor” (v. 7; ver também v. 8; no v. 10 observar o pi. perf. de t ’h [cf. BHS]). Marco: çiyyún (lápide, baliza, # 7483); -> / 7» (demarcar, # 9292); -> twh I (marcar, # 9344); tamrürím II (balizas, postes itinerários, # 9477) 9293 (í® o, antílope),
# 2651
9294 (ta ’awá, desejo), -> # 203 9297 (ta ’alâ, maldição),
9298
# 457
QSn
DXn (t ’m), vb. denom. dar à luz gêmeos (# 9298); □'TpSiD (tô ’amim), gêmeos (# 9339).
AT 1. vb. aparece em Êxodo 26.24 e 36.29 com o sentido de duplicado. No Cântico dos cânticos, o vb. refere-se aos dentes enfileirados da donzela, perfeitamente alinhados e sem fa lhas ou intervalos (Ct 4.2; 6.6). 2. Para o subs., ver a referência a Jacó e Esaú em Gênesis 25.24 e a Perez e Zera em Gênesis 38.27. Ver também Cântico dos cânticos 4.5 e 7.3 [4], em que os seios da donzela são comparados a gêmeas de uma gazela, um animal conhecido por sua perfeição de forma e beleza. 265
n:!w (# 9300)
NT Em João 11.16 e 20.24, Jesus chama Tomé de “Dídimo”, refletindo o termo G para “gê meo” (didymos). Em aram., seu nome seria Te’oma. É possível que “Tomé” seja uma forma helenizada do nome sem., enquanto Dídimo era seu nome em G. C riança: -> gõlem (embrião, # 1677); -> tap I (crianças, # 3251); yônêq (criança pequena, # 3437); y ld ( dar à luz, gerar, ser nascido, # 3528); yãtôm (órfão, # 3846); -> mamzêr (bastardo, # 4927); -> « a ‘a r (menino, # 5853); ‘ô/ê/ (criança, # 6402); -> t ’m (dar à luz gêmeos, # 6402); -> Adoção: Teologia Victor Hamilton 9299 (ta ’anâ, período do cio),
9300
# 628
niKljl (fi enâ), subs. figo (# 9300).
OMA Acad. tittu(m), figo; aram. tênetã ',
entã ’, figo; fen. tyn, figo.
AT 1. A palavra usada com mais freqüência na BH para figo é ^'ê n â . Mais de um terço de suas quase quarenta ocorrências aparece em combinação com gepen, vinha. Juntos, esses termos muitas vezes simbolizam paz e prosperidade. No tempo de Salomão, todos os israelitas “habitavam confiados, cada um debaixo da sua videira e debaixo da sua figueira” (IRs 4.25 [5.5]). No tempo de Ezequias, o comandante assírio apelou ao povo de Judá para “fazer as pazes”, prometendo que cada um poderia comer “da sua própria vide e da sua própria figuei ra” (2Rs 18.31 = Is 36.16). E daquele mesma época (e também depois) que vêm dois oráculos proféticos: no dia do Senhor, “cada um... convidará ao seu próximo” para assentar-se debaixo da vide e da figueira e “não haverá quem os espante” (Mq 4.4; Zc 3.10). 2. Um uso surpreendente da palavra enâ aparece em Jeremias 24. Nessa passage Javé retrata os habitantes exilados de Judá “para a terra dos caldeus [Babilônia]” como figos bons e diz, “Porei sobre eles favoravelmente os olhos” (vv. 5-6). Numa situação contrastan te, o “restante de Jerusalém, tanto os que ficaram nesta terra, como [os] que habitam na terra do Egito” são descritos como figos ruins que serão destruídos (vv. 8, 10; comparar com Jr 29.17). Seria de esperar que os ímpios fossem aqueles levados para o cativeiro — e, portan to, os “ruins”— enquanto os que ficaram para trás fossem os justos e, portanto, “bons”. Javé, porém, afirma o contrário. Mas em que exatamente consiste essa declaração do Senhor? A mensagem sobre os figos possui vários aspectos. Em primeiro lugar, não se trata de uma questão de geografia e política, mas sim de moralidade e espiritualidade. O que está em jogo é o relacionamento do povo com Javé; eles serão renovados pois se voltarão para ele “de todo o seu coração” (Jr 24.7). Javé exi ge que sejam castigados pelas suas transgressões, mas também dá início a atos de misericórdia (ver Wessels, 406). Em segundo lugar, seria equivocado concluir a partir de Jeremias 24 que o “Deus da Bíblia” automaticamente toma partido daqueles que são rejeitados ou destituídos e que eles são os “favorecidos nas mãos dos quais está o futuro. Wessels observa acerbamente que fazer tal generalização com base nesse capítulo na verdade insere no texto uma idéia pre concebida. (-> Jeremias: Teologia) O figo é uma metáfora apropriada nessa passagem, pois de todos os frutos, é aquele cujas melhores e piores características apresentam um contraste gritante. Um figo maduro era considerado uma iguaria, mas se apodrecia, fazia virar o estômago e tomava-se repugnante e 266
(# 9309)
imprestável, servindo apenas para ser jogado fora. Assim, de forma irônica, Javé encontra va lor redentor na comunidade exilada, enquanto o remanescente deixado na terra seria lançado fora como refugo. 3. Três outros termos empregados juntamente com ’ênâ, tanto dentro quanto fora d sas passagens de Jeremias são bikkürâ/bakkürâ, sõ'ãr e pag. Figo: bikkúrâ (primeiro figo, # 1136). -> bis (arranhar até abrir, # 1179); moro [figueira], # 9204); -> ^ 'ê n â (figo, # 9300)
siqmâ (sicô
B ib l io g r a f ia
TWOT2:963\T. Giles, “A Note on the Vocation of Amos in 7.14”, JBL 111,1992,690-92; J. W. Wenham, “Fig Tree in the Old Testament”, JTS 5/6, 1954/55, 206-7; W. J. Wessels, “Jeremiah 24:1-10 as a Pronouncement o f Hope?” Old Testament Essays 4, 1991, 393-407. Edwin C. Hostetter 9301 (tõ ’anâ, ocasião), -> # 628 9302 (ta ’aniyyâ, tristeza),
9309
# 627
Tltfxn
"IHtfNFi
'assúr), cipreste (# 9309).
AT Usado somente 3x (Is 41.19; 60.13; Ez 27.6). O BDB identifica essa árvore como buxo e o Talmude parece entender a palavra como cipreste (Rosh Hashana 23a; Baba Batra 80b). Esse termo foi encontrado no ugar. (UT, #2512; WUS # 2729), em que é escrita t 'ishr. Também já foi comparado a um termo hit. semelhante (tieshshar) para madeira. E comum verem-se ciprestes em cemitérios e jardins em Israel. Trata-se de uma árvore alta, de tom verde escuro e madeira muito valorizada. De acordo com Isaías, era uma árvore seleta que Deus plantaria no deserto (Is 41.19). Alguns acreditam que Noé usou madeira de cipreste na construção da arca (Gn 6.14). Cf. # 9560 tirzâ, uma palavra encontrada somente uma vez (Is 44.14) e traduzida como cipreste. Árvores: -> 'êlâ I (árvore vigorosa, # 461), 'erez (cedro, # 780); -> ‘õren (pinheiro, #815); esel (tamargueira, # 869); -> berós (zimbro, # 1360); -> lüz I (amendoeira, # 4280); -> ‘êy (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); -> ‘ar ‘ãr (zimbro, # 6899); -> çammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); -> (amêndoa, #9196); -> siqmâ (sicômoro [figueira], # 9204); 'assúr (cipreste, # 9309); -> tãmãr I (tamareira, # 9469); -> tirzâ (ár vore desconhecida, # 9560); ( Ár vore do Conhecimento / Vida: Teologia) B ib l io g r a f ia
N. Hareuveni, Tree and Shrub in Our Biblical Heritage, 1984. Larry L. Walker
9310
rn n
r n n (têbâ), subs. arca, cesta (# 9310) 267
n ? n (# 9310)
OMA 1. Normalmente supõe-se que têbâ tenha origens egíp. no radical tbt, apesar de não se tratar de uma idéia unânime e de alguns proporem origens babilônias ou um termo estrangeiro acad. (elippu tebita). Vários estudiosos observaram analogias do OMA com o relato da em barcação de Noé e do dilúvio na décima primeira tábua da epopéia de Gilgamés (acad., início do 2M), no Gênesis de Eridu (Babilônia Antiga, c. 1600) e na história do dilúvio de Atrahasis (c. 1600). (Alguns também afirmam a existência de uma analogia entre o cesto de junco de Moisés e a Lenda Babilônia de Sargom de Acade.) Os três primeiros textos são relacionados em termos literários e, de modo geral, con cordam entre si, mas as semelhanças formais e descritivas desses relatos extrabíblicos não se estendem ao significado teológico encontrado em Gênesis. Apesar da impressão de que existe uma fonte comum antiga ou um conhecimento dos acontecimentos, ainda não se precisou sua relação com o texto bíblico. 2. A arca de Noé era feita de um tipo indeterminado de madeira chamada gõper, qu alguns entendem como cipreste (G kyparíssos); supõe-se que era resinosa e que tenha recebido um revestimento de betume (hêmãr, # 2819). A pequena embarcação de Moisés também rece beu uma calafetação de hêmãr (Êx 2.3), mas foi feita de gõm e' de papiro (Jó 8.11; Is 35.7), de modo bastante parecido com os barcos egípcios (Is 18.2). (hêmãr também foi usado na cons trução da torre de Babel em Gn 11.3 e refere-se ainda aos poços traiçoeiros de piche no vale de Sidim [Gn 14.10].)
AT 1 .0 subs. têbâ, arca (que não deve ser confundido com ’arôn [# 778], arca do Testemu nho) desempenha um papel vital na história bíblica e tem instigado a imaginação das pessoas ao longo da história, levando a diversas tentativas contínuas de encontrar o local em que a arca finalmente foi parar depois do dilúvio. Representa o primeiro marco verdadeiro da história an tiga da humanidade, possuindo um significado extraordinário na história da redenção. Tal im portância não se encontra na arca propriamente dita, mas nos acontecimentos dentro dos quais ela teve um papel crítico: o primeiro grande julgamento de Deus e o livramento da humanidade, dentro de um contexto cosmológico incomparável na história humana (com exceção da criação em si) e a realização de uma nova aliança com essa criação. Dúvidas sobre a existência da arca ou sobre a veracidade de um dilúvio de tais proporções têm ocupado estudiosos, cientistas e leigos, havendo, porém, muito pouco em termos de resoluções e consenso. É fácil deixar pas sar, em meio às controvérsias, o que o texto bíblico revela e, independentemente de qualquer futura descoberta sobre a arca e de um consenso entre os cientistas sobre o dilúvio, devemos considerar o texto pela fé, compreendendo que o significado teológico não pode ser separado do histórico, pois tal cisão reduz os dois a exercícios de abstração e especulação. Nem uma teo logia reducionista que nega a unidade histórica e teológica da narrativa das obras redentoras de Deus e nem um materialismo reducionista que nega a relevância real e espiritual das maravilhas e obras de Javé na natureza e na história dá o devido valor ao registro da narrativa do AT. 2. Com exceção de dois casos, no AT têbâ refere-se à embarcação de Noé (28x). O outros dois casos referem-se à pequena embarcação que a mãe de Moisés confeccionou para que ele navegasse pelo Nilo na esperança de salvá-lo da ordem de Faraó para que todo menino recém nascido fosse afogado nas águas desse rio (Êx 2.3, 5). Nos dois exemplos dessa palavra, o objeto em questão tem como propósito transportar algo pela água, sendo basicamente, um barco. Infelizmente, esse termo sempre foi traduzido da mesma forma que ’arôn. Em decor rência disso, a palavra “arca” é ambígua, pois têbâ é um meio de transporte aquático, enquanto 'arôn é uma caixa. O termo em nosso língua vem do latim arca (baú ou caixa). Levando-se em consideração o tamanho da arca de Noé, a interpretação menos ambígua é chamá-la de navio 268
n ; n (# 9310)
ou barco grande e de aparência semelhante a uma caixa. Talvez se trate apenas de uma coin cidência — ainda assim, digna de ser comentada — que os par. entre as arcas de Noé e Moi sés abrangem um tempo que antecede um julgamento, seguido de um livramento miraculoso ocorrido em função do sucesso das arcas propriamente ditas. 3. Em Gênesis 6— 9, a arca é associada de modo inseparável a Noé (->), o mencio nado 54x na Bíblia. O nome Noé (nôah) é parecido com o heb. nhm (# 5714), consolar ou se arrepender, sendo usado de maneira apropriada em Gênesis 6.6, em que se diz que o Senhor se arrependeu (wayyinnãhem yhwh) de ter feito a humanidade. Nesse contexto de perversidade extrema, o Senhor decide trazer julgamento ao dar cabo de todas as pessoas, com exceção de uns poucos da família de Noé que seriam salvos por causa da sua retidão. Apesar de a terra estar “corrompida à vista de Deus e cheia de violência” (Gn 6.11-13), Noé foi chamado de íntegro. Só no cap. 6 há mais de oito referências à extensão da corrupção humana, em contraste com o reconhecimento repetido da justiça de Noé. A embarcação que ele recebe ordem de construir seria seu livramento. Devia ter 150 metros de comprimento, 25 metros de largura e 15 metros de altura, contando possivelmente com três andares completos, ser calafetada com betume e toda coberta com um telhado, tendo um vão de cerca de 46 centímetros acima das laterais para permitir a entrada de ar e luz. A segunda tarefa de Noé era providenciar dois pares de todos os tipos de criatura na terra (sete pares de animais limpos) que ficariam na arca durante o dilúvio ( mabbúl, oceano celeste, inundação universal, # 4429). Essa enorme tarefa só foi cumprida quando, de acordo com o texto, os animais “entraram para Noé, na arca” (7.9) de forma evidentemente miraculosa. Quando a chuva começou a cair, Noé e sete pessoas de sua família foram fechados dentro da arca e, apesar de a chuva durar cerca de quarenta dias, as águas do dilúvio só baixaram depois de mais de um ano. Depois disso, Noé e seus familiares saíram da arca e ofereceram holocaustos ao Senhor (8.20). A narrativa antevê e culmina com a primeira grande aliança entre o Senhor e a humanidade, apresentando as primeiras ocorrências do termo aliança (beríi, # 1382) no AT e compreendendo uma renovação das promessas feitas pelo Senhor no Éden bem como uma promessa de nunca mais voltar a destruir a terra com um dilúvio. Essa última promessa foi re presentada pela aliança do arco-íris (Gn 9.13-16; Is 54.9-10). 4. O propósito redentor de Deus nesse primeiro julgamento devastador sobre o pecado foi de estabelecer uma nova aliança incondicional com sua criação (Gn 6.18. 9.9-10). A em barcação que Noé construiu cumpriu sua função nessa redenção ao conduzir em segurança os poucos representantes justos de um mundo de perversidade indescritível a uma nova esperança como resultado da luz da misericórdia do Senhor. A narrativa de tal destruição cataclísmica é, com freqüência, alvo das objeções daqueles que não aceitam a realidade do pecado humano. Porém, a perversidade e crueldade humanas extensas no século XX servem de testemunho em favor de Noé e contra esse ponto de vista. A narrativa da arca e do dilúvio transmite de modo arquetípico o constante tema bíblico do julgamento pela desobediência e da bênção pela obe diência. Sua eterna mensagem é de esperança na graça e misericórdia do Senhor num mundo de males aparentemente monolíticos ( Gênesis: Teologia) P-B A LXX não faz distinção alguma entre têbâ e 'arôn e traduz os dois termos como kibõtos (# 3066). Isso indica que a LXX considera qualquer estrutura em formato de caixa como um kibõtos, mostrando que não há nenhum significado teológico especial associado às arcas em si, mas sim aos seus contextos A LXX tende a enfatizar determinados significados (p. ex., a arca da aliança é sempre considerada kibõtos martyriou, mesmo no contexto em que não se pode encontrar o heb. êdut). Com referência à arca de Noé, a LXX é direta ao traduzir o ter 269
r n n ( # 9310)
mo como um barco em forma de caixa, o que pode explicar que o motivo de o termo enfatizar com tanta freqüência a idéia de aliança da arca do Testemunho nas passagens em Êxodo é a intenção de fazer uma distinção clara. O fato da LXX apresentar uma outra palavra, thibin em Êxodo 2.2, 5, 6 para o barco de junco de Moisés também pode indicar uma distinção da arca do Testemunho. É possível, ainda, que deixe implícito que a embarcação de Moisés era uma simples cesta de junco que a mãe dele cobriu de betume para impermeabilizar, diferenciando-a não apenas da arca do Testemunho, mas também da própria arca de Noé.
AT 1. Pode-se encontrar referências à arca dc Noé nas advertências proféticas de Jesus de que o fim dos tempos será como os dias de Noé: as pessoas estarão vivendo em pecado e in diferença, a ponto de encontrarem-se absolutamente cegas para a manifestação do julgamento final de Deus com a volta de Cristo (Mt 24.37-38; Lc 17.26-27). Desse modo, Jesus não apenas retrata o significado histórico e teológico da narrativa do AT sobre o barco de Noé e o dilúvio como sendo inseparáveis, mas também refere-se, de maneira análoga, ao que ocorreu com o mundo no dilúvio e sua própria volta iminente na história espaço-temporal. 2. Num retrato vivido do evangelho do NT, Hebreus 11.7 completa a descrição da ret dão de Noé elogiando sua fé e “temor santo” ao construir a arca pela qual “condenou o mundo e se tomou herdeiro da justiça que vem pela fé”. 1 Pedro 3.20 apresenta uma concepção da arca de Noé e do dilúvio que considera dois aspectos. Por um lado, aqueles que desobedeceram continuaram sob julgamento enquanto, por outro lado, o livramento de oito pessoas na arca simbolizou (antitypon) o batismo cristão que é a promessa de que Deus salvaria os crentes pela ressurreição de Cristo. Pedro também aplica as narrativas acerca de Noé de outra forma dupla ao usá-las tanto como advertência para pecadores arrogantes que acreditam, equivocadamente, que o julgamento não virá, como também para o encorajamento dos cristãos que se vêem passando por grandes provações ao mostrar que dúvida alguma, o Senhor os livrará. Como acontece em todas as passagens do NT, pode-se encontrar aqui o pressuposto da veracidade histórica e teológica dos relatos sobre Noé, bem como o caráter inseparável inerente ao signi ficado histórico e teológico. Arca: -> 'arôn (arca, baú, esquife, # 778); -> têbâ (arca, cesta, # 9310) B ib l io g r a f ia
ANET, 72-99, 104-6, 503-7, 512-14; HAHAT 869; EncJud 3:466-68; TWAT 8:541-42; L. R. Bailey, “Noah’s Ark,” ABD 4:1131; idem, Where Is Noah s Ark: Mystery on Mt Ararat, 1978; idem. Noah, 1989; S. Dalley, Myths From Mesopotamia, 1989; A. Heidel, The Gilgamesh Epic and Old Testament Parallels 2 , 1949; W. G. Lambert and A. Millard, Atrahasis: The Babylonian Story o f the Flood, 1969; A. Millard, “A New Babylonian ‘Genesis Story’,” TynBul 18, 1967, 3-18; J. A. Montgomery, The Quest fo r Noah s’ Ark, 1972; Pritchard, C. Siegfried e S. Stade, Hebrãische Wõrtenbuch zum Alten Testament, 1893, 837; W. von Soden, The Ancient Orient: An Introduction to the Study o f the Ancient Near East, 1994; R. C. Thompson, The Gilgamesh Epic, 1930; E. Ullendorff, “The Construction o f Noah’s Ark,” VT 4, 1954, 95; J. H. Walton, Ancient Israelita Literature in Its Cultural Context: A Survey o f Parallels Between Biblical and Ancient Near Eastern Texts, 1990. Stephen T. Hague 9311 (fibú ’â, produção, renda), -> # 3292 9312 (fibim â, inteligência, aptidão), 270
# 1067
Van (#9315)
9313 (tebúsâ, opressão), -> # 1008 9314 (lãbôr, Tabor), -> Tabor
9315
Van
Van (têbêl), subs. fem., mundo (# 9315).
OMA Acad. tabalu. AT Encontrada 36x exclusivamente em textos poéticos, essa palavra transmite o sentido cósmico ou global com o qual 'ere$ por vezes é usado; ou seja, a terra ou mundo todo consi derado como uma única entidade. Ocorre, de quando em quando, em par. com 'ere$ (Jr 10.12; Lm 4.12). E usada em duas ocasiões juntamente com 'ere.y para expressar a “redondeza da terra” (Jó 37.12) ou talvez com o sentido da terra habitada (Pv 8.31). O termo é empregado com freqüência em contextos que o associam à obra criadora de Javé e que, como resultado, expressam a estabilidade ou durabilidade da terra (ISm 2.8; Sl 89.11 [12]; 93.1; 96.10). Usado também quando se faz referência a toda a população da terra (Sl 24.1; 33.8; 98.7; Is 18.3; 26.9; Na 1.5). Isaias usa têbêl mais do que qualquer outro profeta, em grande parte no contexto do julgamento universal (Is 13.11; 24.4; 34.1; cf. Sl 96.13; 98.9). Terra: -> ’adãmâ (chão, pedaço de terra, solo, terra, reino dos mortos, # 141); -> 'ereç (planeta terra, terra, # 824); -> têbêl (mundo, # 9315) Christopher J. H. Wright 9316 (tebel, contaminação), -> # 1176
9318
n’Van
n’Van (tablit), aniquilação (# 9318).
AT Aparece somente em Isaías 10.25, com referência à destruição da Assíria por Javé (HA LAT 1552). Para sugestões de forma e significado, ver H. Wildberger, Isaiah 1-12, 443. Destruição, aniquilação, devastação, deformação, ruína: -> ’bd I (perecer, # 6); -> ed (de sastre, # 369); -> blq (devastar, # 1191); -> dmh III (arruinar, # 1950); dmm III (perecer, # 1959); hrs (demolir, # 2238); -» hbl III (maltratar, # 2472); hlq III (destruir, # 2746); -> ht ’ (ser destruído, # 3148); -> klh (estar completo, perecer, acabar, destruir, # 3983); -> krt (cortar, cortar fora, exterminar, fazer uma aliança, circuncidar, # 4162); -> mhh 1 (eliminar, exterminar, destruir, # 4681); nfh II (decair, # 5898); -> nts (desintegrar, # 5995); -> nts (demolir, # 5997); -> nts (desarraigar, arrasar, destruir, # 6004); -> p 'h (despedaçar com golpes, # 6990); -> p id (ruína, infortúnio, # 7085); -> prr (quebrar, invalidar, anular, frustrar, baldar, impedir, # 7296).; -> $dh II (ser devastado, # 7400); -> rzh (destruir, definhar, # 8135); sdd (devastar, # 8720); -> sht (corromper-se, arruinar, estragar, # 8845); - ) $md (ser exterminado, destruído, # 9012); -> tablit (aniquilação, # 9318). B ib l io g r a f ia
NIDNTT 1:462-71. Cornelis Van Dam 271
^ 3 í i (# 9319)
'7^51!' (Fballul), mancha branca no olho [belida] ou de feito da visão (# 9319).
9319
AT Um termo raro que descreve a presença de uma mancha branca no olho, implicando talvez uma perda concomitante e parcial da visão (Lv 21.20). A LXX traduz como plilos, in flamação do olho. Esse defeito da vista excluía um homem do sacerdócio hebreu, uma vez que era incompatível com a integridade e perfeição do Senhor. Não se sabe ao certo a natureza dessa enfermidade. Deficiências físicas, deformidades, cegueira, coxeadura, gagueira, mudez: 'illêm (mu dez, # 522; gibbên (corcunda, # 1492); -> hãrúç IV (mutilação [animal], # 3024); -> hêrês (mudo, # 3094); -> ksh (ser coxo, aleijado, #4171); -> múm (nódoa, # 4583); -> mishãt (des figurado, # 5425); -> nãkeh (aleijado, prostrado, # 5783); V r I (ser cego, # 6422); -> ‘illêg (gagueira, tartamudez, # 6589); -> psA (ser coxo, aleijado, # 7174); ' 1 (mancar, # 7519); -> g/f I ([animal] defeituoso, # 7832); í r ' (deformado, mutilado, # 8594); -> ^ballul (man cha branca no olho, # 9319) Olho, piscadela: -> 'isôn (pupila do olho, #413); bãbâ (pupila do olho, # 949); -> y« (olhar com suspeita, # 6253); a/J ‘appayim (olhadela, # 6757); -> (piscar, beliscar, # 7975); -> rzm (lampejar, # 8141); -> ^ballul (mancha branca no olho, #9319) /?. K. Harrison / E. H. Merril
9320
ia n
]nn (teben), talos cortados, palha (# 9320); subs. der. ja n o (matbên), monte de palha (# 5495).
OMA Há cognatos no araml, tibtiã ’ (Ahiq. 112); sir. tebnã’; cf. palm. tb n ’, palha cortada; acad. tibun(m), ár. tibn. AT Da colheita dos cereais faziam parte ceifar, debulhar e joeirar (limpar). O objetivo desse processo era separar o grão da palha e do restolho. O cereal em si era de grande valor, a palha era menos valiosa e o restolho possuía o menor valor. Borowski afirma que qas é palha, teben são pequenos pedaços de palha e mõs refere-se às partículas menores e mais leves daquilo que era debulhado (Agriculture in Iron Age Israel, 69). Supõe-se que teben era usado não apenas como alimento (para bois em Is 11.7), mas também para servir de cama. A ração dos camelos (Gn 24.25) e burros (Jz 19.19) consistia de mispô ’ e teben e os cavalos do rei eram alimentados com teben e cevada ( 1Rs 4.28 [5.8]). Tam bém era usado juntamente como barro para confeccionar tijolos (Ex 5.7). Depois que Faraó pa rou de fomecer palha aos hebreus, eles tiveram que recolher qas em vez de teben (Êx 5.12). Os diversos termos para palha, palhiço e restolho são usados muitas vezes de manei ra metafórica e por vezes aparecem juntos em textos do AT. O qas queima rapidamente e era usado para alimentar o fogo. E usado como metáfora para algo que se consome num instante (Is 5.24; 47.14). Quando o julgamento divino é retratado como fogo consumidor, o objeto des se julgamento arde tão rapidamente quanto qas (MI 4.1 [3.19]) e também como haSaí, erva / folhas secas (Is 33.11). teben e mõ$ são usados metaforicamente para algo insubstancial em Jó 41.27-29 [41.1921]. Leviatã (o crocodilo) considera armas como se fossem palha. Uma vez que a palha e o restolho não valem quase nada, por vezes são usados de modo metafórico para algo desprezível 272
Dinp (# 9333)
{qas, Jó 13.25). teben é como o sonho de um profeta comparado ao trigo, que é como a palavra de Deus (Jr 23.28). Assim como o trigo é mais valioso que a palha, também a palavra de Deus tem maior valor que o sonho de um profeta. Restolho e palha são leves e o vento os leva embora. O termo mõ? é usado muitas ve zes em metáforas para algo que é transitório, insubstancial. Como pessoas cheias de pecado e merecedoras do julgamento (Os 13.3). Os perversos são como palha e restolho (pragana; Jó 21.18). De acordo com Isaías, os homens têm uma existência breve e logo morrem e para ilus trar esse fato, usa a imagem de ser levado embora como qas (Is 40.24) Forragem, restolho, palha: -> belil (forragem mista, # 1173); -> hãmis (forragem, # 2796); -> mispô ’ (forragem para animais, # 5028); -> mõ$ (restolho, #5161); -> qas (restolho, # 7990); -> teben (talos cortados, palha, # 9320) B ib l io g r a f ia
C. Nims, “Bricks Without Straw”, BA, 13, 1950, 24-28; K. A. Kitchen, “From the Brickfields ofEgypt,” TynBul 21, 1976, 127-47. Stephen A. Reed 9322 (tabnit, padrão, imagem, modelo),
Forma
9325 (üglat-piVeser, Tiglate-Pileser), -> Tiglate-Pileser 9326 {tagmúl, recompensas, benefícios),
# 1694
9327 (tigrâ, contenda?), -> # 1741, # 2101 9329 (tidhãr, árvore não identificada), 9332 (tõhú, deserto, nada),
9333
DinJ?
# 6770
# 983
Dinn (tehôm), oceano primitivo, profundezas do mar, água subterrânea, profundezas (# 9333).
OMA Diversos estudiosos (ver Hasel, 93, para uma lista de vários desses proponentes) afirmam que tehôm, juntamente com os cognatos ár. (tihãmat), ugar. {thm [tahãmu]/thmt [tahãmatu], o acad. (tiãmtum, tãmtum) e o eblaíta (ti-'a-ma-tumltihãm[a]tum) {HALAT, 1557-58) são deri vados de um radical sem. comum, *tihãm- (Tsumura, Earth and fVaters, 52). Em termos morfológicos, o heb. tehôm corresponde ao ugar. thm e não ao nome da divindade acad. Tiamate (que possui uma terminação feminina). No ugar., acad. e eblaíta, os cognatos para o heb. tehôm ocorrem de maneira não perso nificada e significam oceanos, mares (Tsumura, Earth and Waters, 53-56). No ugar. e acad. os cognatos são, por vezes, personificados como nomes de divindades (Tsumura, 56). AT Apesar de esse termo ocorrer apenas 36x (22x no sing., 14x no pl.; 12x em Salmos, 4x em Gênesis, Jó e Provérbios e l-3x em outros sete livros do AT), tem sido motivo de extensas discussões com referência ao seu significado e relação com a mitologia do OMA (para um su mário breve, ver o apanhado geral em yãm, # 3542). 273
DiDip (# 9333)
I. Possíveis antecedentes mitológicos. Como acontece com um dos sinônimos (vã desse termo, vários estudiosos defendem a idéia de que tehôm é um derivativo direto de Tiamate, a deusa acad. do oceano primitivo no Enuma Elis (Childs, 36; B. Anderson, 39-40; M. Wakeman, 86-90), dos deuses do caos de Hermópolis, no Egito (Gourg, 11-15; tehôm é as sociado ao deus Num [água parada] enquanto mayim está relacionado com o deus Hu [água corrente]) ou de um mito can. de Chaoskampf (“batalha do caos”). (Day, 7, 50). Argumentam que, em várias passagens, a Bíblia desmitifica ou despersonaliza a idéia da batalha de Tiamate ou Baal contra Iam. O material a seguir examina uma seleção de possíveis ocorrências mitológicas de t*hôm. A discussão toda sobre os antecedentes de tehôm no OMA começa com Gênesis 1.2. Apesar de estudiosos mais antigos se concentrarem nos antecedentes mesopotâmios do relato bíblico da criação (o mito de Enuma Elis), estudiosos mais recentes propõem antecedentes cananeus (o conflito entre Baal e Iam; ver o resumo no item yãm # 3542) para a forma como Javé trata fé hôm em Gênesis 1.2. Tsumura (Earth, 62-65) apresenta vários motivos pelos quais um con flito cananeu do caos não serve de contexto para 1.2. O fihôm heb. em 1.2 não dá nenhuma indicação de que constitui o nome despersoni ficado (ou demitologizado) de uma divindade. Antes, serve claramente de substantivo comum para o mar. Além disso, o dragão marinho é Iam e não Taam, Baal não é um deus criador e Iam sequer aparece em 1.2. Assim, “Não existe relação alguma entre o relato de Gênesis e a chamada mitologia de Chaoskampf' (Tsumura, Earth, 65). Isso não significa, porém, que o relato da criação em Gênesis não possui nenhuma relação com a mitologia do OMA. A ocorrência de tehôm e mayim pode ter trazido à memória dos leitores as descrições pagãs da criação e servido de alusão polêmica aos mitos do OMA acerca da criação. O subs. tehôm aparece de modo predominante em Gênesis 1.2 para retratar o estado da terra no começo da atividade criadora de Deus (“havia trevas sobre a face do abismo”). O termo é precedido de eres (“A terra, porém, estava sem forma e vazia [tõhú wãbõhü])” e seguido de mayim (“o Espírito de Deus pairava por sobre as águas”). De acordo com a argumentação de Tsumura (Earth and Waters, 78), em momento algum tehôm descreve a terceira divisão do uni verso tripartido (como faz yãm). Como parte de um par hipônimo de termos (hã 'ãreç / tehôm), tehôm proporciona um subconjunto semântico de hã 'ãreíj. Apresenta informações sobre a terra que Deus fez existir. As trevas que permeavam tehôm não são uma indicação de caos ou mal, denotando simplesmente uma característica da terra ainda não formada. Demonstram que a terra ainda não estava pronta para ser habitada. A oração anterior, “A terra, porém, estava sem forma e vazia,” enfatiza esse aspecto de hã aref. Essas duas orações constituem uma unidade que retrata a terra como “um lugar improdutivo e desabitado” (Tsumura, 43) (observar o quiasmo em Gn 1.2a-b; A hã 'ãre$ ... B tõhú wãbohü ... B’ hõsek ... A’ tehôm). Amós 7.4 faz parte da segunda visão que Javé dá a Amós com referência ao possível julgamento vindouro diante da transgressão da aliança por Israel. Nessa visão, o Senhor con voca um fogo que consome tanto o grande abismo (fihôm rabbã) como a terra de Israel. No mínimo, a associação de terra (hêleq) e grande abismo demonstra a devastação absoluta que seria provocada por esse possível julgamento. Javé destruiria a terra que havia concedido à sua nação da aliança e as águas subterrâneas que abasteciam suas fontes e rios (Gn 7.11; 49.25) e que eram tão essenciais para sua existência. Vários estudiosos identificam nesse uso de tehôm uma alusão às águas primitivas mitológicas (Hillers, 221-25. Miller, 256-61; Niehaus, 454; Wolff, 298-99), mostrando que o julgamento divino pelo fogo é comum tanto na literatura bíblica quanto cananéia. Qualquer alusão à mitologia do OMA coloca ênfase no controle absoluto de Javé sobre toda a terra e mares. 274
ainçi (# 9333)
Diversos estudiosos afirmam que Habacuque 3.10 descreve a campanha de Javé contra os inimigos de Israel em termos que fazem lembrar o conflito do caos na mitologia da Mesopotâmia(Marduque contra Tiamate)e de Canaã (Baal contra Iam)(Bruce, 886-88; Cassuto, 3-15; Day 1,106-46; May 10; Hiebert, 97-109). No máximo, essa passagem simplesmente faz alusão ao conflito do caos para servir de polêmica contra a mitologia do OMA usando isso como uma forma de enfatizar o caráter incomparável de Javé (Tsumura, “Hab 3”, 28-48). Habacuque 3.10 é parte de uma visão de teofania que retrata Javé como um guerreiro que destrói seus inimi gos e livra seu povo (Hc 3.3-15). Nessa perícope, (Hc 3.3-15), o profeta reconhece Javé como o único que pode oferecer o que é melhor para sua nação eleita. Habacuque faz referência ao passado, citando o êxodo de Israel do Egito pela intervenção de Javé (Hc 3.3-7) e a entrada do povo na terra prometida (Hc 3.8-15) como provas do poder de Javé (Patterson, 225-26, 23354). A imagística de Habacuque 3.9-11 contém diversas alusões à travessia do mar Vermelho e do rio Jordão, bem como à vitória de Javé sobre os amorreus em Gibeão. Só restava ao fihôm submeter-se à vontade de Javé (Hc 3.10). ( Habacuque: Teologia) 2. Massa aquática. Como subs. comum, fihôm refere-se muitas vezes a massas aquáti Pode tratar-se das profundezas fluidas que envolviam a terra no início da semana da criação (Gn 1.2; Jó 38.16; SI 33.7; 104.6; Pv 3.20; 8.24, 27-28) ou das água subterrâneas que jorraram no dilúvio (Gn 7.11) e que continuam a alimentar as fontes e rios. A separação das águas quando o povo de Israel atravessou o mar Vermelho mostra o controle de Javé sobre fíhôm (Ex 15.5, 8; SI 106.9; Is 51.10; 63; 13; cf. Ha 3.10). Por fim, fihôm serve de metáfora para a imensidão incomensurável da justiça de Javé; pertence a uma expressão hiperbólica para enfatizar a ex tensão da adversidade de uma pessoa (SI 36.6 [7]) ou para intensificar os transtornos sofridos por um navio lançado de um lado para o outro numa tempestade (SI 107.26). P-B Nos MMM, fihôm ocorre com maior freqüência em 1QH e refere-se principalmente à criação e a mares tempestuosos ou serve de metáfora para descrever a abrangência da atuação de Deus. A LXX costuma traduzir o termo como abyssos. No heb. da Mix., fihôm significa, “profundezas, profundidade, o interior da terra” e tem a conotação de uma qualidade imensu rável de algo ou explica sua profundidade (p. ex., uma cova) (Jastrow 2:1648). M ar e grandes massas aquáticas: -> gal II (onda, # 1644); -> hôl I (lama, areia, # 2567); haripôt (conj. grãos de areia, # 3041); -> yãm (mar, mares, # 3542); me^ôlâ/me^ãlâ (pro fundeza, profundidade, # 5185); -> qarqa' I (piso, fundo do mar, # 7977); -> tPhôm (oceano primitivo, profundezas do mar, profundezas, # 9333) B ib l io g r a f ia
THAT 2:1026-31; TWOT 2:966; B. Anderson, Creation Versus Chaos: The Reinterpretation o f Mythical Symbolism in the Bible, 1987; F. Bruce, “ Habakkuk,” in The Minor Prophets, ed. T. McComiskey, 1993, 2:831-96; U. Cassuto, “Chapter III o f Habakkuk and the Ras Shamra Texts,” in Biblical and Oriental Studies, 1975, 2:3-15; B. Childs, Myth and Reality in the Old Testament, 1973; M. Gourg, “Zur Struktur von Gen 1,2,” BN 62, 1992, 11-15; G. Hasel, “The Polemic Nature o f the Genesis Cosmology,” EvQ 46, 1974, 81-102; A. Heidel, The Babylo nian Genesis, 1963; T. Hiebert, God o f My Victory: The Ancient Hvmn in Habakkuk 3, 1986; D. Hillers, “Amos 7,4 and Ancient Parallels,” CBQ 26, 1964, 221-25; O. Kaiser, Die Mystiche Bedeutung des Meeres in Ágypten, Ugarit, und Israel, 1959; H. May, “Some Cosmic Connotations o f Mayim Rabbim, ‘Many Waters’,” JBL 74, 1955, 9-21; P. Miller, “Fire in the Mythology o f Canaan and Israel,” CBQ 21, 1965,256-61; J. Niehaus, “Amos,” in The Minor 275
nVnn (# 9334)
Prophets, ed. T. McComiskey, 1992,1:315-494; R. D. Patterson, Nahum, Habakkuk, Zephaniah, 1991; P. Reymond, L 'eau, sa v/e et sa Signification dasn l 'Ancien Testament, SVT 6, 1958; G. Smith, Amos, 1989; L. Stadelmann, The Hebrew Conception o f the World, 1970; N. Tromp, Primitive Conceptions o f Death and the Nether World in the Old Testament, 1969; D. Tsumu ra, The Earth and the Waters in Genesis I and 2, 1989; idem, “Ugaritic Poetry and Habakkuk 3,” TynBul 40, 1989, 24-48; M. Wakeman, Gods Battle with the Monster: A Study in Biblical Imagery, 1973; H. Wolff, Joel and Amos, 1977; A. Yahuda, The Language o f the Pentateuch in Its Relation to Egyptian, 1933. Michael A. Grisanti
9334
n^nn
nVnn (toh°lâ), erro (hapleg., # 9334).
AT A tradução desse termo é difícil, pois o subs. ocorre somente em Jó 4.18 e sua deriva ção é incerta (HALAT 1559). E de duvidar-se de que a palavra esteja relacionada ao radical hll 111, que significa insensatez ou loucura (cf. J. E. Hartley, Job, N1COT, 1988, 114). A tradução “imperfeição” é a que melhor capta o significado da expressão no contexto. Ninguém pode alegar inocência diante de Deus, nem mesmo a mais alta ordem de sua criação. O v. indica que as hostes angelicais do céu servem a um Senhor onisciente e santo que examina seus atos e mostra os erros ou imperfeições inadvertidos sempre que necessário. Erro, equívoco, mal: sgg (cometer um erro, pecar inadvertidamente, # 8704); -> sgh (perderse, desencaminhar-se, desviar-se, errar, enganar, # 8706); -> tobPlâ (erro, # 9334); -> ta ‘tu ‘im (enganos, escárnio, # 9511) Andrew E. Hill 9335 (fihillâ, louvor, renome), -> # 2146 9336 (tah°lukâ, procissão festiva), -> # 2143 9337 (tahpukâ, perversidade),
# 2201
9338 (tãw, marca), -> # 9344 9339 (tô 'amím, gêmeos), -> # 9298 9342 (túgâ, tristeza, aflição), -> # 3324 9343 (tôdâ, ação de graças, oferta de gratidão, louvor), -> # 3344
0244 -p_ m n (twh I), hi. marcar (# 9344); W (tãw), subs. marca, --------------------------------- _________ assinatura (?) (3 9338).
AT O mais provável é que o vb. twh i. remeta à última letra do alfabeto do heb. antigo (tãw) que tinha a forma de cruz (Zimmerli, Ezekiel, 1:247, n. 61). Esse sinal servia de sím bolo ou marca de identificação. Em Ezequiel 9.4,6, um ser angelical recebe a ordem: “marca 276
m n (# 9345)
com um sinal (tãw) a testa dos homens que suspiram e gemem”. A finalidade dessa marca era distinguir tais pessoas daqueles que não se preocupavam com a apostasia da cidade e protegêlas no dia do julgamento. (Ver também o Preceito de Damasco IX: 10-12 e Sl Sal 15.6-9; -> NIDNTT 2:572-73.) O mesmo sinal também aparece em objetos descobertos na Siria-Palestina e ainda num molde (1000 a. C.) encontrado em Taanaque que mostra uma mulher segurando na mão um bolo sagrado. O bolo traz o símbolo da cruz. De acordo com Keel, é possível que fosse um símbolo divino que indicava uma consagração especial (205ss.). Em Jó 31.35, a im pressão é de que tãw poderia até denotar uma certa marca de confirmação. Nessa passagem, em seu clamor por justiça Jó lança um desafio: “Eis aqui a minha tãwi (assinatura?)! Que o Todo-Poderoso me responda!” (ver Dhorme, Job, 468). A única outra ocorrência do radical em 1 Samuel 21.13 [14] não é considerada, uma vez que o texto é incerto (ver McCarter, / Samuel, 355). Marco: siyyún (lápide, baliza, # 7483); -> t 'h (demarcar, # 9292); -> twh I (marcar, # 9344); -> tamrürím II (balizas, postes itinerários, # 9477). B ib l io g r a f ia
E. Dhorme, A Commentary on the Book ofJob, 1967; O. Keel, “Zeichen der Verbundenheit”, Mélanges Dominique Barthelémy, 1981, 160-240. Paul A. Kruger
9345
m n (twh II), hi. perturbar, provocar (# 9345)
mn
OMA A etimologia dessa palavra ainda é incerta. AT Par. a nsh, testar, provar, a única atestação desse radical no AT parece descrever o que Israel fez no deserto ao provocar/tentar o Santo de Israel (Sl 78.41; LXX paroxynõ, provocar). P-B
Cf. NT paroxynõ, provocar, p. ex., 1 Coríntios 13.5 (“exasperar”).
Prova, provação, disciplina: -> bhn (prova, # 1043); nsh (provar, treinar, exercitar, # 5814); -> çrp (refinar, purificar, testar, # 7671); -> twh II (perturbar, provocar, # 9345) David Thompson 9347 (tôhelet, esperança),
9348
# 3498
-pn
■pn (tãwek), subs./adj. meio, centro; normalmente ten do b6 como prep. e indicando “no meio de” (# 9348);
lÍD’n (tikôn), adj. meio (# 9399). OMA twk está relacionado com o ugar. tk (prep. para, depois; KTU 1.2 I 20; 1.5 II 15) e btk (prep. no meio de; KTU 1.4 III 13, V 117). AT 1 .0 termo tãwek aparece como subs. ou adj. significando meio ou centro (13x): com referência a Abraão cortando os animais para o sacrifício “pelo meio” (Gn 15.10); com relação 277
■pjFi (# 9348)
às cidades dos levitas “no meio” dos pastos ao seu redor (Nm 35.5); aos homens de Ai que fi caram “no meio” da emboscada israelita (Js 8.22); ao meio de um vale que serve de marco de delimitação em Deuteronômio 3.16 e Josué 12.2; às duas colunas “do meio” na sala de ban quetes dos filisteus e que Sansão derrubou em Juizes 16.29; para a parte central do átrio do templo em 1 Reis 8.64 = 2 Crônicas 7.7; à “deusa que está no meio” em rituais idólatras (Is 66.17); à “Porta do Meio” em Jeremias 39.3; ao “meio da cidade” em Ezekiel 11.23; ao “meio... queimado” do sarmento de videira na parábola de Ezequiel acerca do caráter desprezível de Jerusalém (Ez 15.4); ao interior do palanquim real de Salomão no Cântico dos cânticos 3.10. Na maioria de suas 418 ocorrências, tãxvek é combinado com outra prep. de modo a formar uma prep. composta (como acontece também no uso do termo no ugarítico). Em conjunto com min (67x), tem o significado de “fora” (ou seja, de dentro para fora), transmitindo um sentido de separação (como em Gn 19.29, em que Deus tira Ló “do meio” da destruição das cidades da planície) ou origem (como na expressão deut. característica na qual o Senhor fala do meio do fogo ; cf. Dt 4.12, 15, 33,36; 5.4, 22,23, 26; 9.10; 10.4). Em conjunto com 'el (prep. para, # 448; 21x), tãwek é usado para de fora para dentro (p. ex., Êx 14.23, em que os egípcios perseguem os israelitas até ao meio do mar) ou dentro (p. ex. Ne 6.10, em que Neemias insta Semaías a esconder-se no “meio do templo”), tãwek aparece lx em conjunto com ‘ad (prep. até; -> # 6330) em 2 Samuel 4.6. 2. O uso mais comum de tãwek é combinado com a prep. b, dentro, com (cf. ugar.). Essa combinação pode significar em ou dentro (usada, p. ex., sobre Noé deitado sem roupas e embriagado “dentro de sua tenda”, Gn 9.21), ou no meio/centro (p. ex. a localização da árvore da vida no jardim do Éden em Gn 2.9). Com vbs. de movimento tfilôk pode ter o sentido de “para dentro” (ISm 9.14, com relação a Saul c seu companheiro ao “entrarem” na cidade em que Samuel morava) ou mesmo “por meio” (como em Nm 33.8, sobre os israelitas passando “pelo meio” do mar). Usado com dois sujeitos, t^tô k pode significar entre (com referência à orla “no meio das romãs” na sobrepeliz das vestes sacerdotais em Êx 39.25); com mais de dois sujeitos, também significa entre (p. ex., o Senhor habitando “no meio” do povo de Israel). 3. tíkôn, meio, aparece I lx, normalmente como um termo arquitetônico ou estrutural. Em Êxodo 26.28 e 36.33, refere-se à “travessa do meio” na estrutura do tabemáculo. Com mais freqüência, o termo indica o andar do meio quando há três andares (cf. IRs 6.6, 8; Ez 41.7; 42.5-6). Em 2 Reis 20.4 refere-se ao átrio central do palácio (de acordo com Q; mas de acordo com K, à “parte central da cidade”). O termo é usado apenas uma vez sem fazer referência a uma construção ou estrutura em Juizes 7.19, em que Gideão e seus cem homens chegam à beira do acampamento medianita, “ao princípio da vigília média”. Cf. também o NG HazerHaticom (Ez 47.16; -» # 2962). Centro, meio; -> (abbúr (centro, umbigo, #3179); -> tãwek (meio, # 9348) B ib l io g r a f ia
UT, 497; WUS, 325. Steven S. Tuell 9349 (tôkêhâ, repreensão, correção, castigo), -> #3519 9350 (tôkahat, repreensão, correção, castigo), -> #3519 9352 (tôlêdôt, descendentes, gerações), 278
# 3528
Vrin (# 9354)
9354
VTin
W n (íôlãl), subs. opressor (# 9354).
OMA O mais provável é que o hapleg. não tenha cognatos no mundo semita. Dahood procura igualar esse termo com o vb. ugar. hll, mas sua argumentação é fraca. Não se tem conhecimen to de evidências no heb. para a pronúncia muda do hê inicial (exceto por hlk) e a única outra palavra sem. que apresenta esse fenômeno é hll. Guilleaume defende um cognato ár. duvido so, talla, que significa levar à escravidão, mas há pouco apoio substancial para essa idéia. O radical y ll (# 3536), uivar, lamentar, é preferido por vários estudiosos. Esse radical aparece no fen., pún., araml, ár., targ., et., mand., Mix. e no aramE
AT O hapleg. tôlãl ocorre somente no Salmo 137.3. Dahood o qualifica como “um dos hapax legomena mais recalcitrantes do Saltério” (270). Houve tentativas de transformar esse subs. num derivativo de hlk (numa emenda a môlikênü, aqueles que nos fazem ir), hll (Dahood, 271 ),yll (BDB, 1062; Kraus, 501; TWOT 1:380-81) e tll (Guillaume, 143). Seria de se esperar uma raiz verbal começando com um waw original (cf. tôrâ, tôsãb), uma vez que o ditongo re sultante transforma-se numa vogal longa marcada pelo waw que anteriormente era consonantal. Exceto pela emenda de hlk a môlikênü, nenhuma dessas raízes apresenta um waw holem inicial em outras pré-formações, nem estas seriam esperadas no contexto em questão. O significado do subs. é contextualmente claro, uma vez que ocorre par. a sôbênú Salmo 137:3; “Aqueles que nos levaram cativos pediam canções, e os nossos opressores, que fossemos alegres”. Não fica evidente uma preferência desse subs. em detrimento de seus sinô nimos e a nuança exata do subs. é impossível de ser recuperada a partir de um só contexto. O subs. forma um trocadilho com “pendurávamos” no v. 2 (tãlinu, ver W. VanGemeren, “Psal ms”, EBC 5:828-29). Aflição, opressão: -> dhq (oprimir, # 1895); -> hms 1 (prejudicar, # 2803); -> hm.i II (opri mir, # 2807); ynh (oprimir, # 3561);-} Ihs (pressionar, # 4315); -> mã$ôr I (aflição, cerco, U 5189); -> mrr I (estar amargurado, perturbado, aflito, # 5352); -> nega' (praga, aflição, # 5596); ngs (extorquir, # 5601); ‘nh II (afligir, humilhar, afligir a alma de alguém, jeju ar, oprimir, sujeitar-se, # 6700); ‘wq I (esmagar?, # 6421); -> ‘mr II (tratar com tirania, # 6683); ‘sq I (tratar com injustiça, # 6943); -> çwq I (constranger, impor, oprimir, atormentar, molestar, # 7439); -> çwr II (tratar com tirania, # 7444); rhb (atacar, pressionar, importu nar, assustar, confundir, # 8104); -> rss (esmagar, # 8368); -> tôlãl (opressor, # 9354); -> tõk (opressão, #9412) B ib l io g r a f ia
IBHS, 90-91; TD O T6.82-87; TWOT 1:380-81; M. Dahood, Psalms, AB, 1968, 268-82; H.-J. Kraus, Psalms, 1978, tr. 1989, 500-504; U. Kellerman, “ Psalm 137”, £ 4 ^ 9 0 , 1978,43-58; A. Guillaume, “The Meaning o f y n n in Psalms M l.h ,” JBL 75, 1956, 143-44. Mark Anthony Phelps 9355 (tôlõ' I, verme, tecido tingido de carmesim),
9357
nsVin
# 9443
nV7in (tôlè‘â), subs. verme (# 9357); V7Ín (tólã % subs. tecido tingido de vemelho ( # 9355); r?73T (rimmâ),
subs. verme, larva (# 8321). 279
nyVin (# 9357)
OMA Os subs. lôlê'á (tôla ‘at) e tôla‘ correspondem ao acad. tültu\ ao aramJ tôla ‘tã ’e ao sir. taula'tã, sendo que todos significam verme, inclusive insetos em sua fase larvária. Sua deri vação é desconhecida. O termo rimmâ está relacionado com o vb. rmm, apodrecer, decompor; cf. o ugar. mrm e o acad. rimmatum, verme, bem como o ár. ramma, estar decomposto. AT 1. Cor. Em 33 de suas 39 ocorrências, tôlè 'â é associado a sãni, escarlate (-> # 9 1 0 6 ), para indicar fio escarlate, logo depois das cores azul e púrpura em todos os casos exceto 7x. O termo tôla ‘ aparece duas vezes e significa carmesim ou púrpura. Essa cor escarlate é produzida com os ovos e o corpo de um tipo de piolho e, juntamente com os corantes azul e púrpura fei tos de moluscos, coloria várias cortinas e coberturas do tabemáculo e de seu pátio, bem como as vestes sacerdotais e a estola e peitoral do sumo sacerdote (Ex 25.4; 26.1, 31, 36; 27.16; 28.5-6, 8, 15, 33; 35; 36.8, 35, 37; 38.18,23; 39.1-3, 5, 8, 24,29; Nm 4.8). O sinônimo karmil refere-se a essa mesma cor que Hirão-Abi usou nos tecidos do templo de Salomão (2Cr 2.7 [6], 14 [13]; 3.14), semelhante ao que Bezalel e Aoliabe fizeram com o tabemáculo mosaico (Ex 35.35; 38.23). Junto com o cedro e o hissopo, o fio escarlate fazia parte de vários rituais: puri ficação de doenças de pele infecciosas e fungos, bem como preparação da água da purificação (Lv 14.4,6,49, 51-52; Nm 19.6). Isaías compara a natureza indelével do pecado ao escarlate e carmesim (sãnim e tô la '), que Javé pode deixar brancos como a neve (Is 1.18). A escarlata, t ô l a também é associada a um estilo de vida abastado que teve fim com o exílio (Lm 4.5). 2. Animais. Os outros seis exemplos de tôlê‘â referem-se a vermes e larvas, na sua maioria, às larvas de moscas e besouros. Com exceção do sábado, todos os dias o maná jun tado pelos israelitas no deserto era infestado por vermes (Êx 16.20, 24 [rimmà]. Os vermes que ameaçavam as uvas (Dt 28.39) talvez fossem larva de um tipo de mariposa (Polychrosis botrana ou Chaerocampa celerio). Os estudiosos não têm uma identificação precisa da vinha que fez sombra para Jonas nem do verme que a fez secar (Jn 4.7). 3. Humilhação. Em todas as suas sete ocorrências, o subs. coletivo rimmâ significa verme ou larva. A palavra tôlê‘â aparece duas vezes, sempre par. a rimmâ, indicando a indignidade da natureza humana e o destino mórbido que aguardava o rei da Babilônia (Bildade em Jó 25.6; Is 14.11). O salmista desprezado e queixoso chama a si mesmo de “verme (tôlê a) e não homem” (Sl 22.6 [7], uma idéia que pode encontrar-se repetida com tons messiânicos em Is 41.14, em que Javé dirige suas promessas de redenção ao “vermezinho (tôlê'â) de Jacó”. A oração par. “povozinho de Israel” pode ser traduzida como metêyisrã ’êl (lit. “os homens de Israel"), trans mitindo a idéia de desamparo; não há necessidade de emendar metê a rimmat, verme. 4. Morte ejulgamento. Os vermes são especialmente repugnantes quando se alimentam de came humana e, portanto, constituem símbolos apropriados para a morte e a sepultura (Jó 17.14; 21.26; 24.20 [rimmâ]). Jó descreve sua aflição física dizendo: “A minha came está vestida de vermes [rimmâ] e de crostas terrosas” (Jó 7.5). Caso não se trate de linguagem hiperbólica, é possível que seja uma referência a uma infestação de larvas de mosca, apesar de pensamentos relacionados ao túmulo e seus efeitos também não estarem distantes. Essa imagem repleta de vermes que retrata o túmulo serve para descrever a perdição escatológica e etema. Isaías referese a essa situação declarando “o seu verme (tôlê'â) nunca morrerá” (Is 66.24). Dificilmente se trata de uma referência a um estoque inesgotável de cadáveres de apóstatas do lado de fora de Jerusalém (Duhm). Apesar de essa oração transmitir a idéia de destruição total, é mais provável tenha como conotação o sofrimento etemo. A literatura apocalíptica (->) sem dúvida entendia dessa forma e muitas vezes reforçava essa cena com a menção de fogo. Isaías usa o hapleg. sãs I (bicho, verme, # 6182) par. a as I (traça, # 6931) para fazer um contraste entre a justiça etema de Javé e a ruína inevitável dos perversos, que serão comidos como uma veste de lã (Is 51.8). 280
m n (tt 9365)
P-B A LXX traduz tôlê a como skõlêx e rimmâ como sapria, skõlêx e sêpsis. A seqüência azul, púrpura e escarlate pode ser encontrada na LQ, descrevendo sacerdotes numa batalha (1QM 7:11). Os vermes significam humildade (1QS 11:9) e são o oposto de riqueza. (IMac 2.62). Estão à espera do homem no túmulo (Ab. 3, 1; 4, 4). Os hinos de Qumran usam vermes para descrever a cova de onde Deus ressuscitará o justo e destruirá o perverso (1QH 6:34; 11:12). A literatura apocalíptica, os pseudepígrafos e a LR continuaram a usar a imagem do verme para expressar conceitos escatológicos de perdição etema. (Jdt 16.17; Ecli 7.17; lEn. 46.6; Sin 100b). Os vermes são instrumentos de julgamento contra Antíoco IV, Heródes o Grande e Heródes Agripa (2Mac 9.9; Josefo, Ant. 17.6; At 12.23, cf. Josefo, Ant. 19,8). NT Jesus cita Isaías 66.24 em Marcos 9.48 para descrever os tormentos do inferno. O NT também usa roupas comidas pela traça para ilustrar a natureza transitória da riqueza terrena (Mt 6.19|| Lc 12.33; Tg 5.2). Animais: behêmâ (quadrúpedes, tt 989); zõnãb (rabo, tf 2387); -> hazír (porco, # 2614); hayyâ I (animal, ft 2651); -> keleb (cão, ft 3978); -> 'akbãr (rato, ft 6572); -> $epardêa ‘ (sapo, ft 7630); -> qippod (ouriço/coruja?, ft 7887); -> rms (rastejar, enxamear, tt 8253); srç (enxamear, fervilhar, ft 9237); -> tan (chacal, tf 9478); -> Répteis: Teologia; procurar no índice de Pássaros; Camelo; Cervo; Jumento; Pomba; Rebanho/Bando; Gazela; Insetos; Leão; Larva; Cobra, etc. B ib l io g r a f ia
IDB 4:878; ISBE 1:729-32; NIDNTT 1:119; TDNT 7:453-55; TWOT 91 \-72\ F. S. Bodenheimer, Animal and Man in Bible Lands, 1960, 78. Robert C. Stallman 9359 (tô 'êbâ, abominável, detestável, desagradável), ft 9493 9360 (tô'â, perturbação),
#2101
9361 (tô ‘ãpôt, chifres, picos [de montanhas]), -> # 2215 9362 (tô$ã'ôt, passagens, extremidades, saídas),
tt 3655
n n (twr), q. ir em busca (dos próprio desejos), explorar; hi. providenciar para que se faça um reconhecimento (# 9365); H n , i n (tôr, tõr I), mudança, oportunidade; pl. TIFI (tôr), cordel, pendentes, talvez ador nos com aparência franzida ou retorcida (cf. BDB, 1064) (# 9366). 9365
Tin
OMA O vb. é conhecido no acad. târu(m), virar-se, voltar (AHw, 1332-34); ár. tãra I, empre ender. AT 1 .0 vb. aparece em narrativas, esp. no episódio em que os doze espias são enviados de Cades para uma missão de reconhecimento da terra (Nm 13.2, 16, 17, 21, 25, 32; 14.6, 7, 34, 36, 38. cf. Ez 20.6). Durante a jornada de Israel, o próprio Deus estava numa missão para explorar (twr) lugares apropriados para o povo acampar (Dt 1.33). 281
nunn (# 9369)
2 .0 vb. é usado de modo teológico 3x em contextos que narram o êxodo e as experiên cias no deserto. Em Números 10.33, o narrador retrata a arca da aliança representando Deus como o explorador, que prepara o caminho para o seu povo. No entanto, as histórias subse qüentes de julgamento em Números 11— 12 e dos espias em Números 13— 14, demonstram que o discernimento humano da orientação divina é prejudicado por sua perspectiva limitada (cf. Dt 1.33). Por outro lado, nas histórias dos espias em Números 13— 14, Deus tem a inten ção de dar a terra a Israel (Nm 13.2). Na única referência desse tipo no AT, Ezequiel ressalta o papel divino ao declarar que foi o Senhor e mais ninguém quem procurou a terra para Israel (Ez 20.6). Essas referências escassas porém importantes indicam que o Deus de Israel é, de fato, tanto aquele que toma a iniciativa quanto aquele que vai adiante do seu povo na jornada rumo à terra prometida. 3. Eclesiastes usa o vb. para descrever a investigação ou exploração realizada pela sabedoria de “tudo quanto sucede debaixo do céu” (Ec 1.13; com drs). Essa busca intelec tual pela sabedoria e entendimento de tudo se repete em Eclesiastes 7.25 (com y d ' e bqs) e de modo mais indireto em Eclesiastes 2.3. O termo hqr é usado somente no epílogo (Ec 12.9) para se referir à atividade de pesquisa do pregador. O livro de Jó, pelo contrário, usa hqr exclusivamente para falar de uma busca semelhante (Jó 5.27; 13.9; 28.3, 27). Os dois livros apresentam uma concepção mais profunda da busca do homem por saber qual é sua participação e compreender a ordem cósmica e moral. Além disso, ambos concluem que a investigação humana permite apenas uma percepção limitada. O mistério e o enigma perma necem ocultos em Deus. 4. O subs. no singular é encontrado em Et 2.12, 15. Para o uso do pl. significando “pen dentes,” ver ’dh (colocar adornos, # 6335). Investigação, exploração, busca, descoberta: bqs (procurar, encontrar, buscar, requerer, desejar, # 1335); -> drs (inquirir, procurar, # 2011); -> hpr I (cavar, explorar, # 2916); -> hps (buscar, examinar, disfarçar-se, esconder-se, # 2924); hqr (buscar, explorar, espiar, investi gar, imaginar, # 2983); rgl (difamar, espiar, # 8078); -> í 7 (investigar, inquirir, requisitar, desejar, # 8626); twr (espiar, explorar, investigar, enviar espias, # 9365) B ib l io g r a f ia
S. Wagner, “Die Kundschaftergeschichten im Alten Testament,” Z A W lb , 1964,225-69. Gordon H. Matties / J. A. Thompson 9366 (tôr, cordão, pendente), -> # 9365 9367 (tôr II, rola),
# 3433
9368 (tôrâ, direção, instrução, a lei), -> Lei
9369
açfin
(tôsãb), subs. forasteiro, colono (# 9369) < 3 # ’ (ysb), assentar-se, habitar ( -> # 3782).
OMA O subs, é encontrado no araml com o sentido de estrangeiro ou residente estrangeiro na narrativa de Ahiqar (AP, 216; DISO, 325). O acad. atesta o vb. (w)asãbu, morar, habitar e o subs. müsabu e subtu, habitação; porém nenhuma das línguas indica uma natureza estrangeira. 282
TTn (# 9372)
AT 1 .0 subs. é encontrado 14x no TM, em várias ocasiões como sinônimo de gêr. Ocorre 7x em Levítico 25 com referência aos direitos no ano de jubileu. Uma referência semelhante é feita às cidades de refúgio em Números 35.15. Em Levítico 22.10, o colono é descrito como um estrangeiro (zãr) proibido de participar da refeição sagrada. Em Êxodo 12.45, o estrangeiro e o assalariado são proibidos de participar da Páscoa, enquanto o hóspede (gêr) circuncidado é tratado como um israelita nativo (v. 48). A inclusão do estrangeiro (tôsãb) com o assalariado (sãkir) e o forasteiro (ben-nêkãr), deliberadamente contrastados com um residente que não é nativo (gêr) indica que, possivelmente, ele era menos assimilado em termos sociais e religiosos do que o gêr (de Vaux, 75-76), alguém que dependia de outros (Lv 22.10; 25.6). 2. A referência a Elias em 1 Reis 17.1 é textualmente incerta; tsb pode ser um erro de escrita para estrangeiro ou uma referência a um grupo de pessoas pertencentes a um povo (con forme é indicado na LXX). 3. No Salmo 39.12 [ 13], tôsãb é poeticamente par. a gêr ao descrever o peregrino diante de Deus. Em 1 Crônicas 29.15, é sinônimo de gêr com o mesmo sentido. P-B A LXX usa parepidemos (# 4215) para tôsãb em Gênesis 23.4 e para a analogia do Sal mo 39.12 [13]). Esse sentido de peregrino é, sem dúvida, importante para o uso do termo em 1 Pedro 1.1; 2.11; Hb 11.13. Em 1 Pedro 1.1 há também um duplo sentido em ser forasteiro em sua habitação terrena; sua condição aqui na terra representa a condição espiritual de todos os cristãos. No heb. da Mix. e no aram., tôíãb é usado com o sentido de imigrante ou colono. Como termo técnico, gêr tôsãb refere-se àquele que renuncia a idolatria e aceita os sete mandamentos de Moisés, diferentemente do gêr $edeq, que é o verdadeiro prosélito. Estrangeiro, forasteiro, estranho: gwr 1 (habitar como estranho, # 1591); zãr (foras teiro, surpreendente, # 2424); nêkãr (de fora, estrangeiro, # 5797); tôsãb (forasteiro, colono, # 9369) B ib l io g r a f ia
Jastrow 1:263; 2:1659; R. de Vaux, Ânclsr 1, 1965, 74-76. A. H. Konkel
9372
TTn
TTn (tzz), hi. decepar (# 9372)
AT Esse hapleg. é traduzido como cortar em Isaías 18.5. Refere-se à terra da Etiópia (o Egito e a Assíria também já foram sugeridos), cujos ramos serão removidos (ívvr, -> # 6073) e decepados (tzz) com podadeiras; ou seja, em termos figurativos, ela será removida/cortada no auge do seu esplendor e rapidamente. Corte, destruição, extermínio, tosquia, poda: -> bs' (decepar, beneficiar-se, eliminar, sepa rar, # 1298); -> b r ' III (podar árvores, cortar, destruir, # 1345); btr (despedaçar, # 1439); -> g d ' (cortar curto, # 1548); -> ghz (produzir, # 1602); -> gzz (cortar, tosquiar, # 1605); -> gzr I (cortar, remover, # 1615); -> grz (ser eliminado, # 1746); -¥ gr ‘ I (cortar fora, cortar, # 1757); -> hip II (trespassar, perfurar, # 2737); -> ksh (cortar, derrubar [mato / árvores], # 4065); krsm (deixar aparado, removido, # 4155); -> krt (cortar, eliminar, exterminar, realizar aliança, circuncidar, # 4162); melqãhãyim (espevitadeiras para aparar/limpar lâmpadas/lamparinas, # 283
rn^ann (# 9374)
4920); -> nqp I (cortar, derrubar [mato/árvores], destruir, # 5937); «/A (despedaçar, # 5983); (eliminar, tosquiar, # 7892); -> ssp (despedaçar, # 9119); -> tzz (decepar, # 9372) B ib l io g r a f ia
K. Marti, Das Buch Jesaja, 1900, 150; J. Oswalt, Isaiah, 1, 1986, 358. Eugene Carpenter 9373 (taznút, fomicação), -> # 2388
9374
niVann
DiVann (tahbulôt) conselho, orientação (# 9374).
AT Essa palavra é encontrada somente na literatura de sabedoria, uma vez em Jó (37.12) e 5x em Provérbios (1.5; 11.14; 12.5; 20.18; 24.6). É relacionada a hebel II, corda ( # 2475), sendo possível que se referisse, a princípio, a pilotar um navio. Os fenômenos da natureza são guiados pelo tahbulôt de Deus, “para fazerem tudo o que [ele] lhes ordena” (Jó 37.12). Recomendação, conselho, plano, propósito: ~ ^ y 's(planejar, recomendar,aconselhar,# 3619); -> mekêrâ (plano, conselho?, # 4839); -> mlk II (deliberar, # 4888); -> m a'aneh II (propósito, # 5102); -> tahbulôt (conselho, orientação, # 9374) 9377 (tahalu 'im, enfermidades), -> # 2688
- 0 . nVnn (fihillâ), subs. começo (# 9378); V?n (A//1), hi. VJ/o n/nFi T , , I______________________ — _____ I começar, tomar invalido; ho. ser começado (somente em Gn 4.26; para o sentido de “profano” no pi., ni., hi., ver # 2725). OMA O radical ocorre em todo o âmbito das línguas sem., mesmo tendo sido incorporado ao acad. como uma palavra estrangeira do aram. (AHw, 309). AT 1. Apesar de não se saber ao certo como o hi. desse radical passou a significar “come çar”, ele ocorre 54x com esse sentido (inclusive uma vez no ho.) sendo que setenta e quatro por cento desses casos usam o infinitivo para completar seu significado. Seu antônimo é klh I, terminar ( -> # 3983; Gn 41.53-54; 44.12; I Cr 27.24). Assim, Deus cumpre sua palavra intei ramente, do começo ao fim (ISm 3.12). Esse radical marca o início de um novo esforço para realizar um propósito. Depois da derrota de Seom e Ogue, Moisés animou-se a entrar na terra da promessa pois ele o povo começaram a ver o poder da mão de Deus (Dt 3.24). O oitavo ano de Josias marcou a época em que ele começou a buscar a Deus (2Cr 34.3) e houve um momento determinado em que o Espírito de Deus começou a operar na vida de Sansão (Jz 13.25). Esses acontecimentos marcaram um ponto crítico na vida de pessoas e nações e testemunharam a conclusão gradual da vontade de Deus na vida daqueles que se entregaram a ele. 2. fihillâ (22x) costuma representar o primeiro de uma série de acontecimentos ou idéias, apesar de poder significar em algumas ocasiões um tempo anterior ou antigo. O come ço da colheita das palavras de Deus ou de algum acontecimento é repleto de possibilidades e, com freqüência, é lembrado com carinho. Daí, as promessas de Deus de restaurar os juizes 284
ín n n (# 9389)
rebeldes de Jerusalém “como eram antigamente” (ri 'sõná) e seus conselheiros “como no prin cípio” ^ 1.26). Começo: hnk (treinar, iniciar, # 2852); -> rõ 's I (cabeça, chefe, começo, # 8031); -> fihillâ (começo, # 9378) B ib l io g r a f ia
TDNT 6:871-81; TWOT 1:108-10; J. Becker, Gottesfurcht im Alten Testament, AnBib, 1965; H. Bloecher, “The Fear of the Lord as the Principie o f Wisdom,” TynBul 28, 1977, 3-28; A. Brongers, "La crainte du Seigneur (Jir’at Jhwh, Jir’at ‘Elohim),” OTS V, 1948, 158-63; C. R. North, “The ‘Former Things’ and the 'New Things’ in Isaiah 40-48,” in Studies in Old Testa ment Prophecy: FS fo r T. H. Robinson, ed. H. H. Rowley, 1950, 111-26; D. H. Odendaal, “The ‘Former’ and the ‘Latter Things’ in the Prophecies of Deutero-lsaiah,” Tarbiz 14, 1942, 19-25; A. Schoors, “Les choses antérieures et les choses nouvelle dans les oracles detéro-iraíens,” Ephemenides Theologicae Lovanienses 40, 1964, 19-47. Bill T. Arnold 9379 (tahmãs, mocho), # 7606 9382 (tehinnâ, súplica), -> # 2858 9384 (tahanün, súplica),
9389
# 2858
xnnn
ín n n (tahrã'), 2x, subs. gola de couro [?] (# 9389).
OMA O termo egíp. dhr, couro, é incerto. AT Não se tem certeza alguma do sentido de tahrã Em Êxodo 28.32 e 39.23 a palavra refere-se a uma parte da estola sacerdotal, a abertura pela qual o sacerdote passaria a cabeça. Ao que parece, essa abertura era reforçada por uma gola de couro ou, como sugerem alguns, de linho. Pele, couro: -> 'ãdãm II (couro, # 133); ’ahabâ II (couro, # 174); -> 'ôb I (odre de vinho, # 199); -> gêled (pele, # 1654); -> hêmet (odre de água, # 2827); -> nõ ’d (frasco, rolo [perga minho], # 5532); -> ‘ôr (pele, couro cru, # 6425); shl II (apresentar brilho [pele saudável], # 7413); -> tahrã’(gola de couro:, # 9389); -> tahas I (couro?, # 9391) B ib l io g r a f ia
J. I. Durham, Exodus, WBC 3, 1987, 384,494. Gary Alan Long
9391 AT
Bfrin
ttTin (tahas I), couro tingido como uma pedra dusu! (# 9391).
O subs. é usado em dois contextos separados. 285
p n n n (# 9396)
1. Ocorre com relação à cobertura do tabemáculo (Êx 25.5; Nm 4.6). Apesar de ter sido associado ao golfinho ou dugongo tomando por base o termo ár. tuhas, é preferível relacioná-lo ao cognato acad. dusii, o couro tingido como uma pedra dusú. Além disso, partindo do pressu posto de que o golfinho era um animal imundo (uma vez que não tem escamas), R. K. Harrison contesta o cognato ár. dizendo que a pele de um animal imundo como esse dificilmente seria usada para o tabemáculo e sugere uma origem egíp. para o termo. O propósito do couro era cobrir os materiais do tabemáculo durante o transporte. os lexemas relacionados ao subs. nos seguintes contextos: ksh, cobrir ( - > # 4059; Êx 26.14; 36.19; 39.34; Nm 4.6, 10-12, 14, 25), n s \ carregar (-> # 5951; Nm 4.25). 2. Em Ezequiel 16.10, o subs. refere-se ao material do qual são feitas as sandálias de mulheres. P-B A LXX traduz o termo como hyakinthinos (da cor de jacinto) e esse termo G ocorre no Eclesiástico 6.30; 40.4. Argumentações rabínicas com relação à identificação de tahas (TalmB Shab. 28b) demonstram que, caso se trate, de fato, de um animal, este não era co nhecido por eles. Pele, couro: -> adãm II (couro, # 133); 'ah^bâ II (couro, # 174); -> ’ôb I (odre de vinho, # 199); -> gêled(pele, # 1654); -> hêmet (odre de água, # 2827); -> nõ ’d (frasco, rolo [pergami nho], # 5532); 'ôr (pele, couro cru, # 6425); $hl II (apresentar brilho [da pele saudável], #7413); tahrã’(gola de couro:, # 9389); -> tahas I (couro?, # 9391) B ib l io g k a fia
EMiqr 8:520-21; M. Greenberg, Ezekiel 1-20, 1990; R. K. Harrison, Numbers, 1990; Fauna and Flora o f the Bible, 1972, 22-23. N. Kiuchi 9393 (tahat I, abaixo, embaixo, em vez de),
# 9396
lin n n Tinrtn (tahtôn), adj. inferior, o mais baixo (# 9396); nnn ------------------------------------ —_____ (tahat I), abaixo, embaixo, em vez de (# 9393); ’PinFl (tahtí), adj. inferior, o mais baixo (# 9397). AT 1 .0 adj. tahtôn indica que um objeto encontra-se em posição inferior à outro. Em cin co das treze ocorrências no AT, tahtôn é usado para distinguir o povoado inferior (de baixo) de Bete-Horom do povoado superior (de cima; ICr 7.24; 2Cr 8.5; cf. Js 16.3; 18.13; lRs 9.17). Em Isaías 22.9 refere-se ao açude inferior da Cidade de Davi. Em outras passagens, tahtôn é usado para distinguir entre itens na parte inferior ou superior do templo (1 Rs 6.6; Ez 40.18-19; 41.7; 42.5-6; 43.14). 2. Assim como tahtôn, o termo tahtí por vezes diferencia algo em posição inferior de outra coisa em posição superior: o pavimento mais baixo da arca (Gn 6.16); as fontes inferio res (Js 15.19; Jz 1.15); a mó de baixo (Jó 41.24 [16]). tahtí também pode indicar a parte infe rior de algo: do monte Sinai (Êx 19.17); da terra (SL 63.9 [10]; 139.15; Is 44.23); do muro de Jerusalém (Ne 4.13 [7]). Quando é usado com Se 'õl, o reino dos mortos ( -> # 8619; Dt 32.22; SI 86.13) ou bôr, cova, reino dos mortos ( -> # 1014), tahtí indica que estes encontram-se abaixo, em posição 286
l ir n (# 9402)
inferior. O pl. tahtiyyôt é uma expressão variante: da mais profunda cova (Lm 3.55; cf. Js 15.19; Jz 1.15). Em Ezequiel 26.20; 31.14, 16, 18; 32.18, 24 as expressões ’ere$ tahtit e 'ereç tahtiyyôt designam as “profundezas da terra” ou “reino dos mortos”, em contraste com ’ere$ hayyim, “terra dos viventes” (Ez 26.20; 32.23-27, 32). A variedade de palavras no Salmo 88.6 [7] — “Puseste-me na mais profunda cova (bôr tahtiyyôt), nos lugares tenebrosos (maha$akkím), nos abismos (me$õlôt)” — leva Kraus a co mentar: “Um após o outro, os novos termos denotam a profundeza insondável da condição do que é abandonado por Deus e da experiência da morte” (Psalms 60-150,2:193-94). No entanto, de modo predominante, a idéia de “profundeza ocorre associada ao caráter insondável de Deus e de suas obras e, ao mesmo tempo de sua revelação. A profundidade da dissimulação humana e da atração do pecado também é um tema forte. Profundeza: -> me^ôlâ/me^úlá (profundo, profundezas, # 5185); -> ‘mq I (ser profundo, miste rioso, aprofundar, # 6676); -> fihôm (oceano primitivo, profundezas do mar, água subterrânea, profundezas, # 9333); tahtôn (inferior, o mais baixo, # 9396) Escuridão: ’õpel (escuridão, trevas # 694); "esún (aproximação da escuridão, # 854); hsk (estar/ficar escuro, tomar-se sombrio, escurecer, esconder, confundir, # 3124); -> (uhôt (es curidão, obscuridade, partes internas, # 3219); -> kamrír (negridão, trevas profundas, # 4025); laylâ (noite, # 4326); neSep (crepúsculo, escuridão, # 5974); -> ‘wp II (ser/estar escuro, # 6415); -> 'alãtâ (escuridão, anoitecer, # 6602); ‘mm II (escurecer, obscurecer, # 6670); -> 'arãpel (escuridão profunda, trevas espessas, nuvem carregada, # 6906); sll III (estar/ ficar escuro, lançar uma sombra, # 7511); -> çalmãwet (escuridão, sombra da morte, # 7516); qdr (ser/estar escuro, prantear, # 7722) Morte: ’bd I (perecer, # 6); -> ‘adãmâ (chão, pedaço de terra, solo, terra, reino dos mortos, # 144); -> ’õsôw (acidente fatal, # 656); -> gw ‘ (expirar, morrer, # 1588); hrg (matar, assas sinar, # 2222); -> zr/M I (dar cabo da vida, # 2441); -> hedel (reino dos mortos, # 2535); hn( II (embalsamar, embalsamamento, # 2846); -> /mv/ (morrer, matar, executar, # 4637); g?/ (assassinar, matar com violência, # 7779); r^pã 'im I (sombras, espíritos que pereceram, # 8327); í e ’ô/ (Seol, reino dos mortos, # 8619); -> íaAa/ (cova, túmulo, # 8846). M ar e grandes massas aquáticas: ga/ II (onda, # 1644); -> hôl I (lama, areia, # 2567); -> haripôt (conj. grãos de areia, # 3041); -> yã/M (mar, mares, # 3542); me$ôlâ/me$úlâ (pro fundeza, profundidade, # 5185); qarqa ‘ I (piso, fundo do mar, # 7977); -> t^hôm (oceano primitivo, pro fu n d eis do mar, profundezas, # 9333) T. DesmondAlexander 9397 (tahtí, inferior, o mais baixo), -> # 9396 9399 (/fltów, meio), -» # 9348
9402
f jr n
]0’n (têmãn I), sul, regiões do sul, vento do Sul (# 9402); < ID’ (virar para a direita, -> # 3554).
AT 1 .0 sul pode indicar a fronteira meridional de Judá, onde se localiza o deserto de Zim (Js 15.1). De acordo com Isaías 43.6, Deus trará seu povo de volta do sul. 2. O termo também pode se referir ao vento do Sul, sendo Deus quem “pelo seu po conduziu o vento do Sul” (SI 78.26; Ct 4 .16; Zc 9.14). 287
rn i^ n (# 9406)
3. Habacuque 3.3 é uma referência geográfica ao “Deus que vem de Temã”, dispo em par. às palavras “do monte Parã vem o Santo”. Trata-se de uma referência ao que Deus fez por seu povo no passado, indicando que ele o livrará das dificuldades. Pode ser uma referência à sua revelação no Sinai ou talvez, melhor ainda, fale de sua presença no meio do povo durante ajomada pelo deserto (ver. R. D. Patter, Nahum, Habakkuk, Zephaniah, WEC, 1991, 230-32). Para os textos amplamente discutidos de “Kuntillet ‘Ajrud” e possíveis referências a “Javé de Temã”, ver J. Renz e W. Rõllig, Handbuch althebrãischen Epigraphik, 1995, 1:62-64. Direções: -> dãrôm (sul, # 1999); yãm (oeste, mar, # 3542); -> yãmim 1 (direita. Sul, # 3545); mizrãl} (nascer do sol. Leste, # 4667); -> m a ‘arãb II (Oeste, # 5115); -> negeb (Sul, Neguebe, # 5582); -> sãpôn I (Norte, # 7600); -> qãdim (lado leste, vento leste, # 7708); -> semõ 7 (lado esquerdo, mão esquerda, desafortunado, em direção ao norte, # 8520). têmãn I (Sul, # 9402) Cleon L. Rogers, Jr.
....
______
-
■
i"nO, n (timãrâ), colunas [de fumaça] comformato de ___ paYmeira(# 9406).
OMA No ár., o subs. tamr significa tamareira, como também tamrãh no aramaico. O cognato tmr aparece numa inscrição fen. no templo de Osíris em Abidos (século III a. C.) com o signi ficado de plantador/cultivador de tamareiras ou um termo semelhante (KAI II, 65-66; cf. ugar. tmr, UT, 498).
AT 1 .0 subs. é usado uma vez numa profecia para retratar os fenômenos tumultuados do fim dos tempos: quando Javé derramar seu Espírito sobre toda a came, haverá sangue, fogo e, ao que parece, colunas de fumaça com formato de folha de palmeira (Jl 2.30 [3.3]). 2 .0 subs. também é usado numa descrição figurativa das colunas de poeira levantad pelos carros e escoltas de Salomão (Ct 3.6). Fumaça: -> 'sn (estar envolto em fumaça, estar irado, # 6939); -> qtr (deixar subir como fu maça, # 7787); timãrâ (coluna de fumaça com formato de palmeira, # 9406) Jeffrey J. Niehaus
9408
ttHTn (tirôs), subs. vinho fresco, vinho novo (# 9408)
OMA O termo ocorre no ugar. tr[ (UT 19:2613) com o mesmo significado que aquele encon trado no AT e talvez seja de origem não sem. (cf. W. F. Albright); hit. twarsa. AT 1. As trinta e duas ocorrências dessa palavra encaixam-se nas mesmas categorias que yayin, vinho ( -> # 3516) e com freqüência o termo é traduzido com a mesma palavra na LXX. Designa um vinho novo e não fermentado, especialmente desejado e agradável. Fazse um contrastado com as borras do vinho velho (semãrim) que sedimentaram por um longo tempo (Sl 75.8 [9]; Sf 1.12). É usado 20x juntamente com as primícias de Israel, com óleo ou cereais. O vinho novo, bem como esses produtos, devia ser fornecido regularmente aos levitas e sacerdotes, que recebiam essas ofertas como pagamento por seus serviços no altar 288
t f ) (#9412)
(Nm 18.4). A palavra normalmente difere em significado deyayin, vinho e Skr, bebida forte ( -> # 8910) e, portanto, não costuma ser considerada uma bebida nociva. Em Oséias 4.1, porém, o termo é usado com yayín, como uma bebida que tira o entendimento (lêb), o que de fato um excesso de vinho novo podia fazer. O povo de Deus é responsável pelo uso/abuso dos dois tipos de bebida. 2. Quando Israel preferiu vinho/vinho fresco em detrimento a Javé, Oséias viu que prioridades do povo estavam distorcidas (cf. SI 4.7 [8]). No entanto, ao que parece, não há nenhuma diferença constante que se possa discernir quanto ao uso dos termosyayin e tirôS no AT. tirôs em si nunca é condenado, enquanto yayín é a bebida perigosa. Porém, uma vez que tirôs alegrava o coração tanto de homens quanto de Deus (Jz 9.13), possuía as qualidades inebriantes de yayin (cf. Os 4.11). Assim como yayin, o vinho novo também era usado no culto a Javé. Honrar ao Senhor levava a uma abundância de vinho novo (Pv 3.10). O julgamento de Deus sobre seu povo rebelde removerá o “vinho novo” (tirôs) de modo que não beberão vinho (yayin-, Mq 6.15). Assim como yayín, o vinho novo é uma expressão da benção da abundân cia das mãos de Deus (Gn 27.28, 37). O Senhor prometeu que quando Israel o obedecesse, ele iria abençoá-los com tirôs (Dt 7.14), mas em tempos de apostasia ocorreria o oposto (Dt 28.51). Num tempo de restauração para o povo de Deus, o Senhor não permitirá que seus ini migos bebam seu vinho novo (Is 62.8). Além disso, é Javé — e não o rei da Assíria — quem determina quando seu povo desfrutará essa bênção da aliança (cf. Is 36.16-17). Por fim, se Zacarias 9.17 é uma passagem escatológica, é indicada a presença de tirôs nesse tempo de res tauração final, tomando-o um tempo em que o povo de Deus terá de volta a alegria. Se Isaías 65.8 pode ser compreendido de modo um tanto literal, a presença de tirôs num cacho de uvas ( ’eSkôl) indica um suco não fermentado. Trata-se, evidentemente, de uma questão controversa (cf. Gn 40.11). Em Isaías 65.8 representa, sem dúvida alguma, o remanescente de Israel que Javé está preservando. P-B A LXX traduz essa palavra heb. de maneira bastante uniforme como oinos, como tam bém o faz no caso de yayin, deixando claro que não discerne nenhuma distinção importante. No heb. da Mix., a palavra passou a designar suco, mosto, vinho (cf. esp. Tosef Ned 10, 3; Jastrow 2:1666), mas que podia ser usado de modo inebriante. Uvas — suco, vinho: gal I (lagar, # 1780); dem a' (suco tirado do barril de vinho, # 1964); -> hõmes (vinagre, vinho, cerveja, # 2810); -> hemer (vinho, vinho espumante, # 2815); -> yayin (vinho, # 3516); -> yeqeb (barril/tonel de vinho, lagar, # 3676); -> yrs II (pisar sobre o lagar/as uvas, # 3770); -> mhl (adulterar o vinho, # 4543); mezeg (vinho com especiarias, vinho misturado/combinado com outra bebida, # 4641); -> misrâ (suco. # 5489); -> ‘ãsis (suco de uva, # 6747); -> sht (espremer, prensar uvas, # 8469); -> Semer I (borra, vinho envelhecido, # 9069); -> tirôs (vinho fresco, # 9408) B ib l io g r a f ia
HDB 1112-13; IDB 4:785-86; W. F. Albright, Yahweh and the Gods o f Cannan, 1968, 186. Eugene Carpenter
9412
tf
t f (tõk), opressão (# 9412).
OMA Acad. takãku, pressionar; fen. tk, subjugação (DISO, 327). ár. takka, reprimir. 289
nVDijí (# 9418)
AT Essa palavra ocorre 4x no AT (Sl 10.7; 55.11 [12]; 72.14; Pv 29.13) e mostra alguma forma de opressão social. No Salmo 55, é descrita uma sociedade dissimulada e socialmente corrupta. A vítima passa por essa situação numa cidade violenta e cheia de conflitos (v. 9 [10]). Dentro dos limites de seus muros há malícia e perversidade (v. 10 [11]) e a opressão (tõk) e o engano nunca deixam suas ruas (v. 11 [12]). A vítima corre perigo nessa cidade (vv. 4-5 [5-6]) e os opressores são descritos como “homens sanguinários” (v. 23 [24]). Em três referências, os pobres ( ’ebyôn, dal, rãs) são mencionados no contexto imediato da opressão (tõk; cf. Sl 10.7; 72.12,13; Pv 29.13-14). tõk pode, portanto, indicar a exploração tirânica e econômica daqueles que são socialmente frágeis na sociedade israelita. Aflição, opressão: -> dhq (oprimir, # 1895); -> hms I (prejudicar, # 2803); hm$ II (opri mir, # 2807); -> ynh (oprimir, # 3561); -> lh$ (pressionar, #4315); -> mã.fôr I (aflição, cerco, # 5189); tm r I (estar amargurado, perturbado, aflito, # 5352); -> nega' (praga, aflição, # 5596); -> ngs (extorquir, # 5601); -> ‘rth II (afligir, humilhar, afligir a alma de alguém, jeju ar, oprimir, sujeitar-se, # 6700); -> ‘wq I (esmagar?, # 6421); -> ‘mr II (tratar com tirania, # 6683); -> ‘sq I (tratar com injustiça, # 6943); -> swq I (constranger, impor, oprimir, atormentar, molestar, # 7439); -> swr II (tratar com tirania, # 7444); -> rhb (atacar, pressionar, importu nar, assustar, confundir, # 8104); rss (esmagar, # 8368); tôlãl (opressor, # 9354); -> /õ& (opressão, #9412) Pobreza, opressão, necessidade: -> 'ebyôn (pobre, necessitado, # 36); -> dfr ’ (oprimir, ser oprimido, # 1917); -> Ja/II (escasso, desamparado, impotente, insignificante, abatido, # 1924); dqq (oprimir, # 1990); -> mwÂ: (deprimido, empobrecer, # 4575); -> miskên (homem pobre, # 5014); 'ãnãw (pobre, humilde, # 6705); -> ‘ãn/ (humilde, # 6714); -> ’ (ser modesto, humilde, # 7570); -> ru-í (empobrecer, oprimido, # 8133) B ib l io g r a f ia
T. D. Hanks, Gos So Loved the Third World: The Biblical Vocabulary o f Oppression, 1983, 3-39; Y. I. Kim, “The Vocabulary o f Oppression in the Old Testament,” diss. de Ph.D. Drew Universty, 1981; C. F. Marriottini, “The Problem o f Social Oppression in the Eighth Century Prophets,” diss. de Ph.D. Southern Baptist Theological Seminary, 1983; J. Miranda, Communism in the Bible, 1982,37-39; J. Pons, L 'oppression dans l ‘Ancien Testament, 1981; E.Tamez, Bible o f the Oppressed, 1982, 1-30. /. Swart 9414 (fikúnâ, local, arranjo, mobília), 9415 (tukkiyyim, babuínos),
# 3922
# 989
9416 (tiklâ, perfeição), -> # 3983 9417 (taklit, fim, perfeição),
# 3983
r t o n {fikêlet), subs. lã púrpura, violeta (# 9418). Brenner define t?kêlet como uma cor sintética de grande abrangência: heliotrópio, azul profundo, violeta ou mesmo verde (145-48). 9418
290
rfoljl
p n (# 9419)
AT 1. Esse termo ocorre 48x, sendo que somente seis delas fora de capítulos que descre vem o templo, o tabemáculo e as vestes sacerdotais (ou seja, Êx 25— 28, 3 5 ,3 6 ,3 8 —39; Nm 4, 15; 2Cr 2 e 3). 2. A palavra fikêlet modifica tecidos — “um pano azul” (Nm 4.7) — e ocorre jun tamente com outros tecidos coloridos como ’argãmãn. Tendo em vista que fikêlet antecede 'argãmãn com regularidade, é possível que indique a importância de fikêlet (Brenner, 146). Por exemplo, “Farás também um véu de estofo azul (tfikêlet), e púrpura ( 'argãmãn), e carme sim (tôla 'at sãní), e linho fino retorcido; com querubins o farás de obra de artista” (Êx 26.31). O termo também é encontrado com húr, branco, em Ester 1.6 e 8.15 ( hwr l, ficar pálido, ft 2578; húr 1, branco, # 2580). 3. Jeremias usa o termo para descrever as vestimentas dos ídolos (Jr 10.9); Ezequiel o emprega 3x, duas para descrever bens comercializados por Tiro (Ez 27.7,24) e um para des crever as vestes usadas pelos soldados assírios, que eram objeto da lascívia de Israel (compa rada a uma prostituta) (Ez 23.6). Cores — Vermelho: -> 'dm (ser vermelho, # 131); -> 'argãmãn (púrpura. # 763); karmil (carmesim, tf 4147); sãrõq (vermelho acastanhado, # 8601); -> Sãní I (escarlate, # 9106); sãsar (cinabre/vermelho, ft 9266); -> / / ‘ II (vestido(a) de tecido escarlate, # 9433) B ib l io g r a f ia
A. Brenner, Colour Terms in the Old Testament, JSOTSup, 1982; J. Doumet, A Study o f the An cient Purple Color, 1980; P. L. Garber, “Color,” ISBE 1:729-32; R. Grawohl, Die Farhen im Al ten Testament, BZAE 83, 1963; L. B. Jensen, “Royal Purple of Tyre,” JNES 22, 1963, 104-18. Robert Alden
~ p n (tkri), q. controlar pesando ou medindo; avaliar ou ----------------------------------------------- julgar com precisão, saber exatamente; ni. ser julgados, medido; pi. colocar num estado regulado (ou correto), determinar a medida; pu. ser colocado num estado controlado, ser medido (# 9419); H33riD (matkõnet), subs. critério, proporção, es pecificação (# 5504); p n (tõken I); subs. critério, regra (# 9420); (toknít), subs. propor ção, plano, padrão (# 9422). OMA O radical tkn ocorre somente no heb. da Mixná. AT 1 .0 vb. descreve Deus em seu julgamento preciso das motivações e ações da humani dade. Todos crêem que seu coração e motivações são puros, mas é Deus quem verdadeiramente pesa (e, portanto, conhece com exatidão) o espírito e o coração (Pv 16.2; 24.12). 2. Além disso. Deus julga com precisão todas as ações dos homens de acordo com os critérios dele (ISm 2.3). 3. Em Ezequiel 18.25,29; 33.17,20, Israel acusa Deus de ter critérios injustos (ou seja, critérios que não estão à altura de uma norma justa). Deus responde que são os critérios de Israel que deixam a desejar. O padrão justo de Deus é o mesmo para todos: a pessoa à altura desse padrão divino viverá, mas o que dele se desviar, morrerá. 4. O vb. também descreve Deus em sua obra de criação. Em sua onipotência, Deus de termina a medida das águas (Jó 28.25). Isaías repete essa idéia, mas acrescenta que ele as mede “na concha de sua mão” (IS 40.12). 291
V P ? (# 9423)
5. Ao meditar sobre a majestade e a glória de Deus reveladas na criação, Isaías (Is 40.13) é impelido a exclamar: “Quem guiou (lit. controlou) o espírito do Senhor (em seu pla no de criação)?” 6. Semelhantemente, o salmista (SI 75.3 [4]) diz que a terra e seus habitantes vacilam, mas foi o Senhor, o grande empreiteiro quem ergueu os alicerces da terra. 7. O vb. é usado uma vez para descrever o dinheiro a ser pesado para os carpinteiros e edificadores que fizeram reparos no templo (2Rs 12.11 [12]). 8. O subs. tõken ocorre duas vezes: em Ezequiel 45.11 determina-se que o efa e o bato tenham a mesma medida de capacidade e, em Êxodo 5.18, apesar de não fornecerem mais pa lha para os israelitas, os egípcios ainda exigiam que Israel mantivesse seu padrão de produção de tijolos. 9. O subs. matkõnet ocorre em Êxodo 30.32, 37, em que Deus proíbe Israel de repro duzir o óleo santo da unção e o incenso santo. Ao fazer outros tipos de óleos e incensos, não se podia misturar seus ingredientes nas mesmas proporções (matkõnet) do óleo de unção e do incenso santo. 10. Quando Israel realizou reparos no templo de Salomão (2Cr 24.13), ele foi restaurado às suas especificações (matkõnet) originais. 11. Um subs. parecido (toknit) ocorre duas vezes. Ezequiel faz uma descrição sarcástica do rei de Tiro como alguém que sela a proporção, ou seja, aquele que determina os padrões da perfeição: “Tu és o sinete da perfeição, cheio de sabedoria e formosura” (Ez 28.12). Um dos propósitos do templo de Ezequiel é lembrar Israel de seus pecados. Quando se envergonharem de seus pecados, devem medir o templo de acordo com seu modelo (Ez 43.10). P-B Na LQ, o radical tkn também descreve Deus criando o mundo e sua soberania sobre seus habitantes. O subs. verbal tkwn significa medida, porção ou comportamento fixo ou adequado (Kaddari, 219-24). Medida, padrão, regra: -> zrh II (medir, # 2431); -> mdd (estender, medir, # 4499); s'r (calcular, # 9132); -> tkn (regular por meio de pesos ou medidas, # 9419). Para medidas de peso/volume: -> 'êpâ (um efa, # 406); para medidas de comprimento: -> ’ammâ 1 (côvado, vara, braça, # 564) B ib l io g r a f ia
THAT 2:1043-45; M. Z. Kaddari, “The Root TKN in the Qumran Texts,” RevQ 18, 1965,21924; K. Elliger, Bibliseher Kommentar, 11, 1978, 48, n 1. Russel Fuller 9420 (tõken I, critério, regra),
# 9419
9422 (toknit, proporção, plano, critério), -> # 9419
9423
(takrik), subs. manto (# 9423).
OMA Construído com base no radical krk que em outras línguas sem. significa envolver, esse subs. que ocorre apenas uma vez deve se referir a um manto. Ester 8.15 diz que Mordecai ves tiu um manto de linho fino e púrpura. 292
nbn (# 9434)
Roupas — veste, saia, manto: kãnãp (asa, saia, orla, # 4053); -> k?süt (cobertura, ves timenta, capa, # 4064); -> m e‘/7 (manto, # 5077); -> sõbel (saia esvoaçante, # 8670); -> sm/ (saia, # 8767); íakrík (manto, # 9423) Robert L. Alden 9430 (filã 'â, sofrimento, dificuldade), -> # 4206 9432 (tilbõset, peça de vestuário), -> # 4252
9434
nVn
nVn (///?), pendurar (# 9434).
OMA Acad. /«//« II, drapear (AHw, 1369a); talãlu, estender, esticar (AHw, 1309b), subs. tãlilum, arqueiro (AHw, 1310a); aram. //y, no araml e nab. (DISO, 328); ár. talã, seguir; talla, derrubar, jogar ao chão; sir. telã ’, pendurar; aes. tlw, seguir, continuar, pagar tributo; et. tãlãwã, seguir, acompanhar.
AT O termo tlh ocorre em várias formas de literatura do AT, apesar de ser mais freqüente nas narrativas. No Pent., nos livros históricos, Lamentações e Ester, aparece no q. (uma vez no ni. em Lamentações) com referência a pessoas que são mortas por enforcamento ou cujo corpo é pendurado como forma de humilhação depois da morte. Essas formas de uso na nar rativa bíblica e nas leis são estudadas nas seções 1-3 abaixo. As ocorrências de tlh em Isaías, Ezequiel, Salmos, Jó e Cântico dos cânticos não se referem a pendurar o corpo de uma pessoa, mas sim a pendurar objetos. Nesses últimos exemplos, tlh ocorre nas raízes q. e pi. As seções 4 e 5 examinam o ato de pendurar objetos conforme encontra-se na poesia e profecia bíblica. O item 6 descreve um sentido abstrato de tlh. As palavras que descrevem o ato de pendurar constituem dois horizontes nos quais seu uso pode ser traçado. O primeiro é um conjunto contínuo definido de acordo com o grau de propósito por trás do ato. O segundo é a capacidade de resistência do objeto que esta sendo pendurado, hnq, estrangular, descreve um forte senso de propósito da parte do agente e um alto grau de resistência daquele que está sofrendo tal ação. Nos exemplos do AT, o objeto desse verbo normalmente é um ser vivo. No extremo oposto, dlh II e dll II, dependurar, descrevem um senso mínimo de propósito da parte do agente e um objeto que não oferece resistência al guma. Assim, as pernas de um homem coxo ficam dependuradas. O uso de srh I, dependurar ou estender indica um alto grau de propósito da parte do agente, sem resistência alguma da parte do objeto que sofre a ação (p. ex., tecido de cortinas que ficam dependuradas e que servem para cobrir). Também pode indicar uma ausência quase total de propósito da parte daquilo que é esticado, como é o caso dos convidados de um banquete que se “estendem” sobre sofás, tlh, pendurar, reflete um grau mais elevado de propósito em todos os exemplos. No entanto, não há resistência alguma da parte daquilo que é pendurado, ou pelo menos, nada que fique aparente no AT. Conforme será visto, isso muda nas formas de uso P-B. 1. Pena de morte. De acordo com Deuteronômio 21.22, um crime capital resulta na morte seguida do procedimento de se pendurar o corpo numa árvore ou poste de madeira ( ‘êy). A vítima já estava morta antes de o corpo ser pendurado. A lei assíria permitia a execu ção por empalação em estacas como pena para crimes. E possível que a lei deut. tivesse ser vido para melhorar as condições da execução em Israel. O propósito da prática de pendurar o corpo talvez fosse de mostrar publicamente o criminoso de modo a servir de aviso para outros 293
(# 9434)
transgressores (Craigie, 285). Deuteronômio 21.23 especifica que não se deve permitir que o corpo fique pendurado da árvore de um dia para o outro, mas que deve ser sepultado. O mo tivo para isso é apresentado, com a declaração: “porquanto o que for pendurado no madeiro é maldito de Deus; assim, não contaminarás a terra que o Senhor, teu Deus, te dá em herança”. O criminoso havia atraído sobre si a maldição de Deus. Permitir que o corpo permanecesse insepulto por muito tempo contaminaria a terra que Deus havia dado a Israel (Driver, 248-49; Davies, 32, 34; von Rad, 138). 2. Guerra. Ao ilustrar o relato da derrota dos cinco reis em Josué 10 à luz das práticas do OMA (especialmente da Assíria), Younger (222-23) demonstrou que esse relato, com seu registro de como foi pendurado o corpo dos reis mortos (v. 26) é a linguagem dos relatos de conquistas do OMA e não um etiologia (Noth, “Die flinf Kõnige”) ou uma forma rescrita do relato a fim de provar que Josué cumpriu as leis deut. (Fishbane, 148). Senaqueribe registra como executou os governantes derrotados de Ecrom e “pendurou o corpo deles em postes pela cidade” (Prism, col. III 8-10, Younger, 223). Partindo desse ponto de vista, os outros relatos narrativos de inimigos derrotados cujo corpo foi pendurado para exibição pública e humilha ção, também podem ser entendidos como uma prática de guerra e propaganda política e não relacionadas a Deuteronômio 21, que se refere à legislação criminal. Disso faz parte o relato sobre o rei de Ai (Js 8.29), sobre o assassinato de Isbosete (2Sm 4.12) e de Saul e Jônatas (2Sm 21.12), bem como sobre a humilhação dos príncipes de Sião (Lm 5.12). Para uma opinião con trária, que entende que o D pretendia associar com a legislação deut. os ato de Josué e de outros de pendurar as vítimas, ver Carmichael, 153-55. O relato de como Absalão fica preso numa árvore e de como ficou “pendurado num carvalho” (2Sm 18.10) é diferente dos contextos de guerra. Absalão não está morto e o fato de ficar pendurado não é subseqüente à sua morte. No entanto, o uso do radical tlh em outras passagens narrativas como “Leitwort” (ver abaixo) e seu uso ao longo de todo o livro de 2 Samuel apresentam coerência com a associação de morte e de pendurar o corpo. A aparição do radical em 2 Samuel 18 serve para prenunciar a morte iminente de Absalão pelas mãos de Joabe. 3. Leitwort em narrativas, a. Conforme Martin Buber e Franz Rosenzweig identificam o termo, Leitwort consiste numa repetição e trocadilho de um determinado radical na BH. (cf. Alter, 92-95). O termo tlh pode aparecer como Leitwort. Esse radicai ocorre, por exemplo, 3x no relato da interpretação de José para o sonho do padeiro-chefe na prisão (Gn 40.19, 22; 41.13). A primeira vez em que aparece, José acabou de dar uma interpretação cheia de espe rança para o copeiro-chefe. Quando se dirige ao padeiro, José profere palavras de perdição: “Faraó te tirará fora a cabeça e te pendurará num madeiro”. Nas outras duas vezes em que aparece, tlh é a palavra que identifica o contraste entre as atitudes de Faraó com o copeiro e depois com o padeiro. Primeiro, o narrador conta o que aconteceu e depois o próprio copeiro apresenta seu relato, tlh caracteriza o destino do padeiro e enfatiza a maneira literal como se cumpre a profecia de José. b. tlh aparece com Leitwort em Ester. O radical ocorre 9x. Caracteriza a conspiração de Hamã, a maneira como foi frustrada e a ironia de como a trama de Hamã recaiu sobre ele e sua família. Ao longo do livro de Ester, tlh é usado para descrever a morte por enforcamen to, diferentemente de outras formas de uso em narrativas nas quais ocorre a morte e depois o corpo é pendurado. Esse fato pode indicar uma origem culturalmente distinta dessa narrativa, p. ex., a Pérsia. O primeiro uso de tlh ocorre como castigo dos traidores que são identificados por Mordecai (Et 2.23). Esse acontecimento serve de prova da lealdade de Mordecai e consti tui a base para a resistência bem-sucedida à conspiração de Hamã. Essa trama é descrita, por fim, em Ester 5.14, em que Hamã recebe o conselho de preparar uma forca e nela tlh, pendurar 294
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(enforcar) Mordecai. Essa intenção de Hamã é repetida em 6.4, em que forma um pano de fun do contrastante com a exaltação de Mordecai pelo rei. A inversão irônica da sorte de Hamã é descrita no cap. 7, culminando com a ordem do rei para tlh, pendurar (enforcar) Hamã em sua própria forca (7.9-10). Esse fato é relatado oficialmente pelo rei a Ester e Mordecai (8.7). Como parte da vitória dos judeus sobre seus inimigos, Ester pede ao rei para tlh, pendurar (enforcar) os dez filhos de Hamã (9.13) o que, de fato, acontece (9.14). A ocorrência final ressalta a ironia da trama de Hamã contra os judeus ter recaído sobre ele e os filhos (9.25). 4. Pendurar escudos. Há três referências a essa prática na Bíblia: duas delas (pi.) na descrição de Tiro em Ezequiel 27.10-11 e uma na metáfora do amado no Cântico dos cânticos 4.4. A cópia de Layard de um relevo assírio mostra Tiro como uma cidade com escudos pen durados entre torres (Katzenstein, 255). Ezequiel 27 usa a imagem de uma grande embarcação para descrever a cidade de Tiro. Tanto navios como cidades decoravam suas laterais/muralhas com os escudos de seus defensores (Zimmerli, 60). No caso de Tiro, os escudos pertenciam a mercenários africanos e aliados fenícios. A imagem da beleza ornamental é transposta para a descrição do pescoço do amado, adornado com mil escudos (Ct 4.4.), apesar de os comentaris tas considerarem que se trata de um retrato de força. A imagem pode, ainda, ser uma referência a um colar com várias camadas (Pope, 467-68, com desenhos de vários colares em estatuetas mesopotâmias, 454). 5. Pendurar ou suspender outros objetos. Dentre estes, pode-se identificar harpas que são penduradas em salgueiros por exilados desconsolados (Sl 137.2), vários objetos que podem ser pendurados numa estaca de madeira (yãtêd -> # 3845; Ez 15.3) e a terra, que fica suspensa sobre o nada pela mão de Deus (Jó 26.7). 6. Uso abstrato de tlh. Em Isaías 22.24 Eliaquim é comparado a uma estaca de madei ra, na qual “pendurarão toda a responsabilidade da casa de seu pai, a prole e os descendentes, todos os utensílios menores, desde as taças até as garrafas”. Essa imagem retrata a convicção e confiança que todos podem ter na liderança de Eliaquim (Oswalt, 423). Assim como a asso ciação com yãtêd em Ezequiel 15.3, pendurar-se todo tipo de coisa nessa estaca. P-B
tlh ocorre em dois textos de Qumran. 1. No pexer de Naum (4QpNah [DJD V 169 fragmentos 3-4]), linhas 7-8. As linhas par cialmente restauradas descrevem o Leão da Fúria, identificado como Alexandre Janeu (103-76 a. C.) e sua ação contra Aqueles que Buscam as Coisas Serenas, provavelmente os fariseus, “os quais ele penduraria ainda vivos no madeiro”. Trata-se de uma descrição da crucificação, o que fica claro no relato de Josefo dos atos de Janeu (Ant. 13.14.2 par. 380; Guerras 1.4.6 par.97). A linha 8 prossegue: “Pois assim foi feito anteriormente em Israel, com relação aos que eram pendurados vivos no madeiro”. Como já foi observado, não era um costume bíblico pendurar pessoas vivas. Em momento algum as narrativas mencionam tal prática (exceto no caso do aci dente de Absalão). Alguns estudiosos encontraram um indício de Deuteronômio 21.22-23 na linha 7, esp. com a restauração de “[que encontrou um crime punível com] a morte” (cf. Yadin, Fitzmyer, 499-502), apesar de Horgan, 178, argumentar que essa restauração ainda deixa uma lacuna de 15 a 20 espaços. 2. tlh também aparece 4x no Manuscrito do Templo (11QT LXVI 8, 9, 10, 12). Numa discussão sobre crimes capitais, parece haver várias referências a tlh. Em dois casos, porém, a ordem é de que se pendure o condenado antes da execução. “E [também] o pendurarás no madeiro e ele morrerá” (linhas 8 e 10-11). Entre essas referências, encontra-se aquilo que pa rece ser uma seqüência diferente para o castigo. “Ele será executado e eles o pendurarão no madeiro”. A intenção parece ser de apresentar um par. com Deuteronômio 21.22b, "... e tiver 295
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sido morto, e o pendurares num madeiro”. Em Qumran, esse texto é seguido de uma passagem idêntica à de Deuteronômio 21.22a, “E se um homem tiver cometido crime, passível da pena de morte”. Esses par. indicam uma preocupação em basear a legislação de 11QT em Deuteronômio 21, enquanto a diferença na seqüência apresentada nas linhas 8 e 10-11 deixa implícito que o castigo de ser pendurado deveria preceder a execução. Juntamente com a ocorrência no pexer de Naum, o uso de tlh é mais bem compreendido como uma alusão à crucificação (de acordo com Fitzmyer, 504-5; em oposição a Baumgartem “Does TLH," e Martinez, “4QpNah”). A ci tação de Deuteronômio 21.22 tem a intenção de indicar que a legislação original permitia essa ordem e não exigia que a execução ocorresse antes do castigo de ser pendurado (Yadin, The Temple Scroll, 1 373-4,11 289-90). Outro par. pode ser encontrado na linha 12: “Amaldiçoado por Deus e pelos homens é aquele que está pendurado no madeiro”. Deuteronômio 21.23 diz: “porquanto o que for pendurado no madeiro é maldito de Deus”. 11 QT acrescenta “pelos ho mens”. Variações da citação dessa passagem deut. também podem ser encontradas na LXX e em Gálatas 3.13 (em que é omitido “de Deus”). De fato, os textos de Qumran dão mais evidências para diferentes tradições dos vv. 22 e 23 de Deuteronômio 21 (Wilcox, 88-90), indicando que a fonte da citação do NT pode ser outra que não a tradição preservada no TM ou na LXX. NT A relação das duas passagens com a LQ sugere que o judaísmo pré-cristão considerava o tlh, “pendurar”, de Deuteronômio 21 como crucificação (Fitzmyer 509-13). O Manuscrito do Templo também indica que se tinha em mente a crucificação como uma forma válida de castigo pelo menos em alguns segmentos do judaísmo (Wilcox, 90). Assim, tem fundamento histórico o testemunho conjunto dos Evangelhos e Atos de que os judeus tomaram a iniciativa de pedir a crucificação como pena pela suposta blasfêmia de Jesus (Ford, 275-76). Textos posteriores rab. e dos Trgs. desenvolvem e diversificam as implicações de Deuteronômio 21.22-23 (cf. Diez Merino, “La crucifixion,”), mas não afetam a relação desse texto e tlh com a prática da crucificação conforme esta é compreendida e aplicada a Jesus Cristo pelos escritores do NT. Enforcamento, suspensão, espreguiçamento, estrangulamento. -> dlh 11 (dependurar, # 1927); dll II (dependurar, # 1938); hnq (estrangular, # 2871); -> hps II (deixar pendura do?, # 2912); srh I (pendurar sobre [cobrir], it 6243); -> tlh / tl ’ (pendurar, # 9394) Morte: ’bd I (perecer, # 6); -> ’adãmâ (chão, pedaço de terra, solo, terra, reino dos mortos, # 141); 'ãsôn (acidente fatal, # 656); -> gw ' (expirar, morrer, # 1588); -> hrg (matar, assas sinar, # 2222); zrm I (dar cabo da vida, # 2441); -> hedel (reino dos mortos, # 2535); hn( II (embalsamar, embalsamamento, # 2846); -> mwt (morrer, matar, executar, # 4637); -> qtl (assassinar, matar com violência, # 7779); -> t^pã 'im I (sombras, espíritos que pereceram, # 8327); -> se ’ôl (Seol, reino dos mortos, # 8619); sahat (cova, túmulo, # 8846) B ib l io g r a f ia
R. Alter, The Art o f Biblical Narrative, 1981; J. M. Baumgarten, “Does TLH in the Temple Scroll Refer to Crucifixion?” JBL 91, 1972, 472-81; C. M. Carmichael, Law and Narrative in the Bible: The Evidence o f Deuteronomic Laws in the Decalogue, 1985; P. C. Craigie, The Book o f Deuteronomy, NICOT, 1976; W. D. Davies, The Gospel and the Land: Early Christianity and Jewish Territorial Doctrine, 1974; L. Diez Merino, “La crucifixion en la antigua literatura judia (periodo intertestamental),” Studi biblici franciscani liber annuus 26, 1976, 31-20; S. R. Driver, A Criticai and Exegetical Commentary on Deuteronomy, ICC, 1916; M. Fishbane, Biblical Interpretation in Ancient Israel, 1985; J. A. Fitzmyer, “Crucifixion in An cient Palestine, Qumran Literature, and the New Testament,” CBQ 40, 1978, 493-513; J. M. 296
(# 9437)
Ford, ‘“ Crucify Him, Crucify Him’ and the Temple Scroll,” ExpTim 87/9, 1976, 275-78; M. P. Horgan, Pesharim: Qumran Interpretations o f the Biblical Books, CBQMS 8, CBA, 1979; H. J. Katzenstein, The History ofTyre from the Beginning o f the Second Millennium B.C.E. Until the Fali o f the Neo-Babylonian Empire in 538 B.C.E., 1973; F. G. Martinez, “4QpNah y la Crucifixion: Nueva hipotesis de reconstruccion de 4Q 169 3-4 i, 4-8,” EstBib 38, 1979-80, 221-35; M. Noth, “Die fiinf Kõnige in der Hõhle von Makkeda,” P J 33, 1937, 22-36; J. N. Oswalt, The Book o f Isaiah (1 -39), NICOT, 1986; M. H. Pope, Song ofSongs: A New Tranlation with Introduction and Commentary, AB 7C, 1977; G. von Rad, Deuteronomy: A Commentary, OTL, 1966; M. Wilcox, ‘“ Upon the Tree’ — Deut 21:22-23 in the New Testament,” JBL 96, 1977, 8599; Y. yadin, “PesherNahum (4Qnahum) Reconsidered,” IEJ 21, 1971, 1-12; idem, The Temple Scroll, Vols. I and 11,1983; K. L. Younger, Jr., Ancient Conquest Accounts: A Study on the Ancient Near Eastem and Biblical History Writing, JSOTSup 98, 1990; W. Zimmerli, Ezekiel 2, Hermeneia, 1983. Richard S. Hess
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9437 AT
(m i), aljava (# 9437).
teli ocorre apenas em Gênesis 27.3 com o sentido de “aljava” (HALAT 1029).
Arco, flecha, arco-e-ílecha: 'aspâ (aljava, # 880); ziqôt (flecha inflamada, # 2338); hê$ (flecha, # 2932); -> (hh (ficar ao alcance de um tiro de arco, # 3217); -> yôreh I (arqueiro, # 3452); yeter II (corda do arco, # 3857); -> qeset (arco, # 8008); rbb II (atirar, # 8046); -> rbh II (ficar ao alcance de um tiro de arco, # 8050); tPli(aljava, # 9437); -> Guerra: Teologia B ib i. k k ;r a f ia
TWOT 2:970. K. Lawson Younger, Jr.
9438
V?n
V?n (tll), hi. enganar, zombar, gracejar; ho. enganado (# 9438); nVnnD (malfitallâ), ilusões, delírios (hapleg., ls
30.10, #4562). OMA Ár. dalla, brincar, zombar, flertar; dalãlat pessoa intriguista. AT Há uma discussão entre os estudiosos quanto ao significado dos vbs. tll e htl e também quanto à derivação correta dos vbs. e subs. que poderiam ser derivados de um desses verbos. Fensham (311) sugere que tanto tll quanto htl derivaram de uma forma original com duas con soantes, tl. Em decorrência disso, tll e htl representam formas par. e não uma forma primária e outra secundária, respectivamente. No entanto, o consenso acadêmico sugere que htl é um de senvolvimento secundário de tll (HALAT247; ver TWAT 8:664-66, para uma argumentação ex tensa em favor desse consenso). A única atestação de htl no AT ocorre em 1 Reis 18.27 (cf. Ecli 11.4; 13.7). A derivação da forma em Isaías 30.10 (matfitallâ) também é contestada (ver abaixo). I. tll é encontrado 8x no AT e mahPtallâ lx. O vb. + be é usado muitas vezes para dicar a pessoa enganada (Gn 31.17; Jz 16.10, 13, 15; Jó 13.9; Jr 9.5 [4]). O significado fun damental é dissimulação, apresentar algo que não é verdadeiro/real. Em todos os casos, a 297
tiin (# 9439)
dissimulação é intencional por parte daquele que fala/age, com exceção do uso do subs. em Isaías 30.10 (ver abaixo). Labão enganou Jacó dez vezes com relação ao seu salário (Gn 31.7). Faraó enganou/ zombou de Javé/Moisés sobre deixar o povo de Israel ir (Êx 8.29 [25]). Esp. nesse caso, a pa lavra indica a aparência de que se fará algo que, na realidade, não é levado à cabo, apesar de circunstâncias externas terem levado Faraó a mudar de idéia. O significado da palavra se sobrepõe como de vários outros termos em seu campo s mântico. De acordo com Juizes 16.10,13,15, Sansão enganou/zombou de Dalila ao contar-lhe mentiras (k^zãbim). A palavra parece enfatizar a mentira ou dissimulação em si como um ato deliberado e responsável da pessoa envolvida. Jeremias 9.5 [4] apresenta o seguinte arranjo com lll: cada um zomba = não falam a verdade ( ’emet, -> # 622) || ensinam a sua língua a pro ferir mentiras {seqer, -> # 9214) = cansam-se de praticar a iniqüidade (h a ‘awêh, -> # 6390). No contexto imediato, também pode-se encontrar os radicais do vb. ‘qb ( -> # 6811), rmh ( -> # 8228) e o subs. rãkil ( - > # 8215). No entanto, não se pode enganar/zombar/escamecer de Deus como se faz com um homem (Jó 13.9); ele repreende aqueles que tentam proceder desse modo. O idólatra presunçoso, que faz seu ídolo inútil, é conduzido à sua insensatez por um coração enganado (Is 44.20; ho. hútal; cf. Jr 17.9-10). 2. A forma única mahatallã (Is 30.10) pode ser um part. do hi. (Wildberger, 1172) ou um subs. (HALAT 1602; TfVAT 8:662-63), de lll ou de htl. Qualquer que seja o caso, essa for ma significa as ilusões que os filhos de Deus queriam ouvir ao invés da verdade judiciosa do Santo de Israel. Dissimulação, falsidade, dolo, fraude, iniqüidade, mentira: -> 'ãwen (injúria, iniqüidade, dissimulação, # 224); -> bd' (inventar, tramar, mentir, # 968); -> kzb I (mentir, ser um menti roso, enganar, # 3941); -> khs (trair, enganar, tomar-se escasso, # 3950); -> nkl (ser ardiloso, enganador, trapaceiro, # 5792); -> n s' II (ser enganado, enganar, causar engano, # 5958); -> sãrâ II (rebelião, crime, revolta, falsidade, # 6240); -> ‘qb I (agarrar o calcanhar, embair, en ganar, # 6810); rmh II (trair, usar de traição com, # 8228); sw( (voltar-se para a falsidade, emaranhar-se em mentiras, # 8454); -> sqr (usar de/ agir com falsidade, trair, # 9213); -> tll (enganar, escarnecer, gracejar, # 9438) B ib l io g r a f ia
TWAT 8:662-71; F. Fensham, “The Stem HTL in Biblical Hebrew,” VT 9, 1959, 310-11; H. Wildberger, Jesaja, 1982. Eugene Carpenter / Michael A. Grisanti
9439
nVn
□Vn (telem), sulco (# 9439).
OMA O termo telem está relacionado com o ár. talam, sulco e ao et. telm, sulco; não se tem certeza da relação com o ugar. tlm; ver HALAT 1602. AT 1. telem refere-se à vala que um arado faz no solo. O Senhor perguntou a Jó se era ca paz de fazer o boi arar um sulco reto (Jó 39.10). Numa ocasião anterior, Jó havia alegado que os sulcos de seu campo não estavam molhados de lágrimas (31.38), significando molhados das lágrimas de inquilinos oprimidos (ver v. 39). Deus encharca de chuva sulcos que acabaram de ser semeados para abençoar os tenros brotos (Sl 65.11; ver Futato, 179). 298
vVn (# 9443)
2. telem é usado de modo figurativo em Oséias 10.4. Em função da dissimulação de senfreada (vv. 2-3), “brota o juízo como erva venenosa nos sulcos dos campos”. O termo pode ser traduzido também como “ação judicial” ( # 5477), porém o sentido mais provável é “justiça”. A justiça que brota como erva venenosa pode ser um oximoro para uma justiça per vertida, como é o caso em Amós 6.12, em que mispãf é transformado em veneno (ver também Dt 29.17; 32.32-33; Am 5.7; Stuart, Hosea-Jonah, 161; e Wolff, Hosea, 175). Aragem: -> ’êt 111 (relha do arado?, machado, # 908); g fdü d 1 (rego, # 1521); hrs I (arar, lavrar, preparar, planejar, # 3086); ma 'anâ (comprimento do sulco, # 5103); -> nyr II (rom per [solo não arado], # 5774; -> telem (sulco, # 9439) B ib l io g r a f ia
F. Anderson e D. Freedman, Hosea, 1980; M. Futato, “A Meteorological Analysis of Psalms 104, 65, and 29,” diss. The Catholic University o f America, Washington D.C., 1984. Mark D. Futato 9441 (talmíd, aluno),
# 4340
9442 (filunnôt, murmuração, queixa), -> # 4296
yVn (tl' II), pu. vestir-se de tecido escarlate (# 9443); yVín (tôlã' I), subs. verme, tecido tingido de carmesim (# 9355); subs. fem. nsVin (tôlê‘ã) e n?Vín (tôla'at), subs. verme, tecido carmesim (# 9357). Brenner define tôlã ‘/tôla 'atlsãnl como uma cor sintética dentro dos tons de vermelho: “escar late, carmesim” (143-45). 9443
vVn
AT 1. A tintura escarlate ou carmesim era extraída de um verme chamado quermes (Coccus ilicis). O termo descreve a extensão do pecado (Is 1.18) como escarlata, possivelmente uma alusão a mãos ensangüentadas (1.15). Significa pecado que, pelo sangue do sacrifício, pode ser branqueado. Em Lamentações 4.5, indica luxo ao descrever aqueles que foram criados vestindo escarlate, mas que logo serão exilados. 2. Ao longo de Êxodo, Levítico e Números, tôlê‘â ocorre com sãni formando no subs. compostos: tôla ‘at sãni (Êx 28.5-6; 35.25; 39.3; Nm 4.8) e seni tôla ‘at (Lv 14.4, 6, 49, 51-52; Nm 19.6). Essas expressões descrevem as cortinas e tapeçarias do tabemáculo e as vestes do sumo sacerdote. O estudo das cores é um assunto complexo. As palavras heb. são relativamente escassas, a definição não pode ser direta e o termo em questão pode ter passa do por transformações semânticas ao longo do tempo. Brenner apresentou um estudo valioso sobre a terminologia das cores. Ela define as cores como primárias, secundárias, terciárias e artificiais. As cores primárias são 'ãdôm, vermelho; lãbãn, branco; sãhôr, preto; yrq II, tomarse verde e çãhõb, amarelo. É interessante observar que os materiais têxteis usados na construção do tabemáculo, bem como as vestes do sumo sacerdote, eram extremamente coloridos. A organização do tabernáculo, suas cortinas e utensílios coloridos, bem como as vestes dos sacerdotes trabalhavam em conjunto para comunicar de modo simbólico mensagens teológicas sobre a presença e a gló ria de Deus naquele lugar. Haran ( 158-65) mostrou que o tipo, preço e cores dos tecidos eram diretamente proporcionais à sua proximidade com o Santo dos Santos. As vestes coloridas e 299
n r? > n (# 9444)
exclusivas do sumo sacerdote deviam separá-lo do resto pois somente ele podia entrar na pre sença de Deus (Êx 28.3, 35). Ver Childs, 537-47. 3. Em sete ocasiões, a tradução correta de tôlâ é “verme”, quer o sentido seja literal (Êx 16.20; Dt 28.39; Is 14.11; Jn 4.7) ou metafórico (Jó 25.6; Sl 22.6 [7]; Is 41.14). Em contraste com o poder e a justiça de Deus, a humanidade não passa de um verme (Jó 25.6). Em meios às aflições, às vezes as pessoas sentem-se tratadas como vermes (Sl 22.6 [7]). No entanto, Deus as ajudará em sua aflição (Is 41.14). O verme em Isaías 66.24 é um termo figurativo para a morte e angústia etema reservadas aos perversos (cf. Mc 9.43-48) ( # 9357). 4. A única vez que esse íl ' aparece como vb. é em Naum 2.3 [4], em que, de acordo com a descrição, os homens de Nínive “vestem escarlate”. Cores Preto/M arrom : -> húm (marrom, # 2569); -> shr (ser preto, # 8837) B ib l io g r a f ia
A. Brenner, Colour Terms in the Old Testament, JSOTSup, 1982; J. Doumet, A Study o f the Ancient Purple Color, 1980; P. L. Garber, “Color,” ISBE 1:729-32; R. Gradwohl, Die Farben im Alten Testament, BZAW 83,1963; M. Haran, Temples and Temple-Service in Ancient Israel, 1978; L. B. Jensen, “Royal Purple o fly x ç ," JN ES22, 1963,104-18. Robert Alden
9444
nvoVn
nvpVn (talpiyyôt), fileiras de pedras (# 9444).
AT O subs. ocorre somente no Cântico dos cânticos 4.4, em que é traduzido como “edificada para arsenal”. Seguindo Honeyman (“Two Contributions to Canaanite Toponymy,” JTS 50,1949,50-52), Pope (Song o f Songs, AB 7C, 1977,465-67) traduz mais corretamente como “edificada em fileiras”. Rocha, pedra: -> 'eben (pedra, rocha, # 74); -> gãbis (cristal de rocha, # 1486); -> hallãmis (sílex, # 2734); hãsãs (cascalho, # 2953); -> kêp (rocha, # 4091); -> sõheret (pedra, # 6090); *> sela ‘ (rocha, # 6152); -> sql (atirar pedras, # 6232); -> r I (rocha, matacão, # 7446); sur II (seixo, sílex, # 7447); sôr I (faca de sílex, # 7644); rgm (pedra, # 8083); -> tal piyyôt (fileiras de pedras, # 9444) B ib l io g r a f ia
ISBE 3:205-6; 4:622-30; MZW7T2:731-34; 3:381-99. Andrew E. Hill
9446
D',t?n'?n
D^nVn (taltãlim), cachos de tâmaras (# 9446).
AT Esse termo encontrado no Cântico dos cânticos 5.11 é um hapleg. de significado incerto (R. O. Murphy, The Song o f Songs, 166, n. 11). Murphy traduz a frase como, “os cabelos dele, folhagens de palmeira” (164). Robert L. Alden 9447 (tãm, irrepreensível, inocente, puro, saudável), -> # 9462 300
n an (# 9449)
9448 (tõm, perfeição, inteireza),
9449
# 9462
n on (tmh), q. ficar espantado, olhar com espanto; hitp. entreolhar-se (# 9449); linDPl (timmãhôn), confusão
non
(#9451). AT 1 .0 vb. tmh aparece lOx no AT, 8x no q., lx no hitp. e lx no hitpalp. Em Eclesiastes 5.8 [7] significa ficar espantado ou supreso com coisas que acontecem e em Gênesis 43.33, quer dizer entreolhar-se com espanto (“maravilharam-se entre si”; cf. também Is 13.8). Em Isaías 29.9, o vb. tmh aparece no q. e no hitpalp. com o sentido de ficar atordoado ou admira do. Em Habacuque 1.5, o q. e o hitp. aparecem com o mesmo significado. Em Jeremias 4.9, o julgamento do Senhor causa estupefação (cf. também Jó 26.11; SI 48.5 [6]). 2. O subs. relacionado timmãhôn aparece em Deuteronômio 28.28 e Zacarias 12.4. Deuteronômio 28.28, é seguido do subs. lêbãb e refere-se à confusão mental que fará parte do julgamento do Senhor pela transgressão da aliança. Em Zacarias 12.4 os cavalos são o objeto do vb. e, mais uma vez o Senhor é o sujeito e o contexto é de guerra. 9450 (tummâ, retidão, honestidade, lealdade), -> # 9462 9451 (timmãhôn, confusão),
# 9449
9454 (fimúnâ, imagem, forma, modelo, representação), -> Forma. 9455 (fimürâ, transferência, negócio),
# 4614
9456 (fim utâ, morte), -> # 4637
T!?n (tãmid), subs. prosseguimento, continuidade; adv. perpetuamente (# 9458). Radical incerto, talvez 110 (mwd) ou TO (myd), sendo que nenhum dos dois é atestado na BH. 9458
Tpn
OMA O Pent. sam. traduz como tãmed, com a variação ocasional tãmida. Cf. ár. madda, es tender, expandir ou mãda, crescer, aumentar.
AT 1 .0 subs. é usado com mais freqüência — e, provavelmente, nos textos mais antigos do AT — como um adv. significando continuamente ou perpetuamente. E empregado em vá rias situações nas quais se tem em vista uma atividade interminável, contínua ou repetida. Não existe nenhuma distinção sintática entre uma atividade que ocorre de modo repetido numa ro tina regular (p. ex., uma atividade diária, como por em ordem o pão da proposição; Lv 24.8) e uma que, supõe-se, continuará sem interrupção (p. ex., um fogo ardendo no altar; Lv 6.13 [6]). O significado pretendido do adv. deve ser inferido pelo contexto. Assim, o aspecto mais importante do adv. não é a duração da atividade descrita, mas sim o seu caráter incessante ao longo de um certo período. 2. Apesar de nem sempre ser possível distinguir entre uma atividade contínua e u repetida com regularidade, há diversas passagens bíblica nas quais fica claro que se trata de 301
TOFI (# 9458)
uma atividade ininterrupta. Isaías 60.11 prediz que na era de restauração escatológica, as porta de Jerusalém estarão sempre abertas para que as nações do mundo possam trazer suas rique zas para a cidade (cf. Ap 21.25-26). A imagem de uma cidade cujas portas nunca são fechadas também sintetiza a paz e segurança que caracterizarão a era escatológica (cf. Whybray, 234). Em Ezequiel 38.8, os montes de Israel são descritos como estando sempre desolados, signi ficando mais uma vez um estado contínuo. O subs. também é usado de forma adverbial para descrever ações freqüentativas, como no Salmo 119.44, em que o salmista promete observar continuamente a lei do Senhor (cf. também SI 119.117; Pv 6.21). É comum descreverem-se estados mentais ou emocionais como sendo contínuos: p. ex., o medo que Israel tem de seus inimigos quando se esquece de confiar no Senhor (ls 51.13) ou a esperança de uma pessoa que confia no Senhor (SI 71.74). Provérbios 28.14 declara que a pessoa que teme ao Senhor constantemente será abençoada. Ter algo “sempre diante” de si quer dizer estar a todo tempo consciente disso. Assim, no salmo penitencial de Davi, o pecado de Davi está sempre diante dele (SI 51.3 [5]; cf. também 38.17 [18]), ao passo que as “enfermidades e feridas” de Israel (ou seja, sua perversidade) estão continuamente perante o Senhor, provocando sua ira (Jr 6.7). Por outro lado, os muros de Jerusalém estão continuamente perante o Senhor — ou seja, ele providencia para que sua cidade santa esteja sempre protegida (Is 49.16). A proteção contínua do Senhor sobre seu povo também é declarada nos Salmos 71.3 e 40.11 [12], em que a “graça e... verdade” de Deus guardam sempre o salmista. Semelhantemente, a presença contínua do Senhor pode servir para guiar o justo pelo caminho certo (SI 73.23; Is 58.11). 3. Ações que ocorrem repetidamente, porém não dentro de uma rotina defendida, tam bém podem ser descritas usando-se o subs. Vários dos salmos prescrevem que os justos louvem ao Senhor continuamente por suas obras de salvação (SI 34.1 [2]; 35.27; 40.16 [ 17] = 70.4 [5]; 71.6). A perversidade também pode ser contínua, como se vê no Salmo 74.23 (o tumulto dos adversários do Senhor), Isaías 52.5 (blasfêmia), 65.3 (os perversos de Israel que de contínuo irritam o Senhor), Naum 3.19 (a opressão das nações por Nínive) e Habacuque 1.7 (os caldeus que saqueiam as nações). O julgamento dos perversos é descrito usando-se o mesmo termo. Em Obadias 16 o julgamento das nações é descrito com imagens vividas: assim como elas haviam bebido do santo monte do Senhor (depois da destruição de Jerusalém), também as nações beberiam continuamente do julgamento no dia do Senhor. Numa expressão mais metafórica, no Salmo 119.109 o salmista declara que está “de contínuo” em perigo de vida. 4. Em algumas passagens, a idéia de continuidade é combinada com a idéia de repetição: uma atividade persiste ao longo de um ciclo ininterrupto. E o caso em Deuteronômio 11.12, em que os olhos do Senhor estão continuamente sobre a terra de Canaã, desde o começo até o final do ano. Assim sendo, obviamente é ele quem faz as estações do ano seguirem seu devido curso. Números 9.16 também declara que havia sempre uma nuvem sobre o tabemáculo du rante o dia e fogo durante a noite. 5. No entanto, em diversas passagens o adv. tãmid refere-se a uma ação que deveria ser repetida constantemente em intervalos regulares. Assim, Mefibosete recebeu permissão de co mer sempre à mesa de Davi, ou seja, fazer suas refeições diariamente com Davi (2Sm 9.7, 10, 13; cf. também 2Rs 25.29 = Jr 52.33). Com mais freqüência, porém, essas referências aparecem no contexto de procedimentos cultuais. Diz-se que Arão e os filhos ministravam continuamen te perante a Arca da Aliança de Deus (1 Cr 16.6;), deixando claro que eram responsáveis pelos sacrifícios rituais que deviam ser realizados regularmente em determinados horários. Êxodo 27.20 ordena que a lâmpada fique acesa no templo de modo contínuo, durante toda a noite. Nesse caso, tãmid é, em sua essência, equivalente à palavra “diariamente”. Assim também, a mesa com o pão da proposição devia ser posta diante do Senhor “perpetuamente” (ou seja, 302
T!?n (# 9458)
diariamente, Êx 25.30; cf. ainda Haram sobre esses rituais). Arão devia usar o peitoral e a mitra continuamente, ou seja, sempre que realizasse os rituais sacrificiais (Ex. 28.30, 38). O termo é empregado com mais freqüência desse modo para descrever a realização dos sacrifícios em horários determinados: pela manhã e ao pôr-do-sol (Ex. 29.38; SI 50.8; lC r 16.40; 23.31; 2Cr 24.14 ou ainda para as ofertas diárias de manjares (minhâ; -> # 4966). 6. Quando é usado como subs., tãmíd tem o significado básico de perpetuidade. Ezequiel 39.14 fala de “homens que, sem cessar, percorrerão a terra” (lit., “homens de perpetuidade”) a fim de purificá-la depois da batalha de Gogue (->) e Magogue. Ao que parece, trata-se de indivíduos que estarão sempre trabalhando com esse único propósito. O subs. também apa rece em 2 Reis 25.30 = Jeremias 52.34, em que Joaquim recebe uma “subsistência vitalícia,” ou seja, uma provisão recebida periodicamente do rei babilônio Evil-Merodaque. Contudo, o mais comum é que o termo seja usado com relação ao culto: as ofertas queimadas da manhã e da tarde são chamadas de “ofertas queimadas da perpetuidade” [Almeida: “holocausto con tínuo”] em Êxodo 29.42, os sacrifícios realizados pela manhã e no final do dia são chamados de “holocausto contínuo” ( ‘ôlat tãmíd), sendo chamados pelo mesmo nome várias vezes em Números 28 —29 (28.3,6,10, 15,23,24, etc.). Ocasionalmente, a oferta diária de manjares é chamada de “contínua oferta dos manjares” (minhat hattãmid', Nm 4.16; Ne 10.33 [34]), como também acontece com a oferta diária de incenso (Ex. 30.8) e o pão da propiciação (lehem hattãmid\ Nm 4.7; 2Cr 2.4 [3]). 7. No livro de Daniel, o subs. é usado com o artigo como um termo técnico para os sacrifícios realizados pela manhã e ao pôr-do-sol (Goldingay, 211). O monarca perverso do livro de Daniel desafia a autoridade do Senhor ao acabar com o sacrifício diário (hattãmid; Dn 8.11, 12, 13; 11.31). A interrupção do holocausto contínuo é um acontecimento de grande importância escatológica, uma vez que, por definição, tal sacrifício deveria ser incessante. Em função disso, Daniel começa a calcular a extensão do período final da história humana a partir desse acontecimento (Dn 12.11). P-B O subs. é amplamente atestado no heb. P-B, sendo usado tanto de modo adverbial quan to como subs. É empregado somente como adv. nas versões heb. de Ben Siraque. Eclesiástico 6.37 chama os leitores a meditar perpetuamente sobre os mandamentos; 37.12 aconselha que se confie na pessoa que teme ao Senhor perpetuamente; em 51.11, Ben Siraque afirma que louvará ao Senhor constantemente. Em 45.14, o subs. é usado de modo adverbial com uma conotação cultuai para descrever os sacrifício diários pela manhã e ao pôr-do-sol. O subs. aparece com freqüência, nos MMM. Em 1QS 6.7 encontra-se a prescrição segundo a qual, sempre que dez homens da comunidade se reunirem, deve estar presente um homem que busca as Escrituras perpetuamente. Nos Preceitos da Guerra, o subs. é usado para descrever os deveres dos sacer dotes com relação aos sacrifícios diários ( 1QM 2.2,3,5). Em várias ocasiões, o termo é usado para o louvor perpétuo a Deus (1QS 10.23, IQH 11.6, 12.4). Na LR, o subs. é empregado de maneira semelhante à da BH. O uso do subs. como termo técnico para os sacrifícios diários pela manhã e ao pôr-do-sol, encontrado na Bíblia somente no livro de Daniel, é freqüente na LR e o termo tãmíd é título de um tratado da Mixná. Tempo: -> obêd (desde então, # 7); 'õpen (o tempo certo, # 698); -> gil I (um estádio da vida, # 1636); zmn (ser nomeado, # 2374); -> ‘ôlãm (um longo tempo ou duração, # 6409); 'et (tempo, # 6961); -> pa'am (pé, passo, tempo, # 7193); -> p eta ' (instante, # 7353); -> tãmíd (prosseguimento, continuidade, oferta regular, # 9458) 303
IDn (# 9461)
B ib l io g r a f ia
S. DeVries, Yesterday, Today and Tomorrow: Time and History in the Old Testament, 1975; J. Goldingay, Daniel, WBC, 1989; M. Haran, “The Complex Ritual Acts Perfonned Inside the Tabemacle,” ScrHier 8, 1961, 272-302; R. RendtorfF, Studien zur Geschichte des Opfers im alten Israel, 1967, 74-76; R. N. Whybray, Isaiah 40-66, NCBC, 1981. Anthonv Tomasino 9459 (tãmim, inteiro, perfeito, inculpável, honesto), 9460 (tummím, Tumim),
9461
# 9462
# 242
pn
■p n (tmk), pegar, agarrar (# 9461)
OMA O vb. tmk encontra-se na inscrição fen. Kilamuwa de Zinjirli, na qual o rei diz que se gura nas mãos uma certa classe de pessoas (possivelmente lavradores e colonos) que, aparen temente, haviam sido desfavorecidas no passado (KAI, 24.13; cf. 2.33). O NP amonita tm k’l / ’ltmk também é atestado (HALAT 1612). O acad. tamãhu(m) apanhar ou segurar é comum, usado com vários objetos; sendo encontrado também uma vez como tamãku (AHw, 1312). AT O vb. tmk ocorre 20x no q. e uma vez no ni., porém vários textos são difíceis e há pro postas de diversas emendas. Pode referir-se a segurar um objeto como um fuso (Pv 31.19) ou tomar a mão de uma outra pessoa (Gn 48.17; Êx 17.12). No entanto, é usado com mais fre qüência e com maiores variações na forma metafórica. O mestre instrui a pessoa a agarrar-se à sabedoria (reter, Pv 3.18), a mente do filho deve apoderar-se dela (reter, Pv 4.4). O Salmo 17.5 fala dos passos que se mantém nas veredas de Deus, mas outros propõe uma divisão diferente do v. (cf. BHS) que pode implicar uma emenda (cf. Kraus, 244). Deus sustém aqueles que pos suem integridade e coloca-os diante de si para sempre (Sl 41.12 [13]; cf. 63.8 [9]. Is 41.10). O Senhor mantém a herança do justo (Sl 16.5). O ato de segurar o cetro (Am 1.5, 8) descreve a função da realeza. A mão do justo se recusa a reter o suborno (Is 33.15). Já o perverso é detido (ni.) pelas cordas do seu pecado (Pv 5.22). Ao que parece, Jó 36.17 afirma que Jó está sendo retido por um processo judicial e por litígio (Habel, 498); o objeto não é expressado, sendo que o texto é considerado, muitas vezes, ininteligível, mas tem-se a impressão de que significa que Jó ficou obcecado com o fracasso da justiça. Há dois textos incertos. Em Provérbios 5.5, tmk é paralelo a descer (yrd), numa refe rência a descer à cova. Uma interpretação dessa linha é que os passos da prostituta conduzem ao Seol. Dahood propôs um possível radical ugar., ymk, que significa descer, uma forma se cundária de mkk, afundar, cair (89). De acordo com Provérbios 28.17, ninguém deve deter uma pessoa culpada de homicídio. De acordo com alguns, isso quer dizer que ninguém deve ajudar essa pessoa enquanto ela foge até o fim de seus dias. “Fugir para a cova” parece ser um eufe mismo para ser um fugitivo para o resto da vida (descer, cf. Pv 1.12), mas o restante da frase não fica claro. Apesar de as vrs. apresentarem um sentido que dá a impressão de que ninguém deve abrigar essa pessoa, tal observação seria um tanto redundante (HALAT 1613). É possível que se trate de uma declaração da pena de talião, de acordo com a qual ninguém irá intervir em favor dessa pessoa nem protegê-la na cidade de refúgio. O sentido mais provável é de que a pessoa culpada de homicídio foge até a morte, sem ser detida nem presa. 304
DDH (# 9462)
P-B No Talm., o vb. tmk significa repousar sobre, colocar sobre ou pressionar. Um par. in teressante com Provérbios 5.5 pode ser observado num poema de sabedoria de Qumran sobre as artimanhas de uma mulher perversa, no qual diz-se que “seus pés se afundam (tmkw) para agir com perversidade” (1Q 184 1.3). Apanha, captura, posse: ‘hz I (apanhar, assentado, # 296); -> hfp (apanhar e levar embora, # 2642); -> hth (levar, buscar, # 3149); kwl (apoderar-se de, apanhar, conter, # 3920); -> Ikd (prender, capturar, # 4334); -> Ipt (pegar, agarrar, segurar na mão, virar, # 4369); msk (apanhar, arrastar, atrasar, # 5432); -> qm( (apanhar, # 7855); -> ím/c (pegar, agarrar, # 9461); -> /pi (capturar, ocupar, # 9530) B ib l io g r a f ia
M. Dahood, f ta /m j /: 7-50, AB 16, 1974, 89;. Habel, The Book ofJob, OTL, 1985,498; H.-J. Kraus, Psalms 1-59, 1988, 244. A. H. Konkel
onn (imm) q. estar completo, hi. terminar, hitp. comple tar (# 9462); DhQ (metõm), subs. um corpo ileso e sau dável (# 5507); Dn (tãm) adj. irrepreensível, inocente, sincero, quieto, pacífico, piedoso, puro, saudável (# 9447); üh (lõm) perfeição, inteireza (# 9448); HSn (tummã), subs. (fem.) retidão, honestidade, lealdade (# 9450); 0’0ri (tãmim), adj./subs. inteiro, perfeito, intato, imaculado, irrepreensível, honesto, sincero (# 9459). 9462
DDn
OMA tmm é um radical do sem. ocidental, ocorrendo no ugar, (UT, # 2563; WUS, # 2770), no fen. / pún. (DISO, 329), no aram. (P-B, cf. THAT 2:\045) e no ár. (Wehr, 86). No ugar., o uso da forma verbal continua sendo questionável (Van Zijl, 193-94) como também o emprego do subs. O adj., porém, é atestado na expressão s b ‘ snt tmt, sete anos inteiros (cf. KTU 1:23, 66; THAT2:1045-46). Num texto fen. (KAI 27.16), o adj. na oração s tm py designa verdadei ra (palavra) e no pún. (KAI 152; 3), quer dizer sincero (DISO, 329). Sua ocorrência em NP é evidente (Benz, 429). Koch chamou a atenção para o uso excepcional em termos de freqüên cia e importância do emprego do radical tmm, (esp. com derek e hlk) na LQ (TH AT2:1050). E particularmente interessante sua combinação com qds, que caracteriza sua comunidade como sendo de “perfeição santa” em relação aos outros.
AT 1. No heb., o conceito de integridade é, em grande parte, expressado pelo radical tmm e seus derivativos. Ocorre de diversas formas e com várias funções mais de 200x no AT, trans mitindo um significado de algo completo, irrepreensível, justo, honesto, perfeito, pacífico, etc.; daí ser um atributo ou atitude que reflete autenticidade e confiabilidade. 2 .0 vb. tmm ocorre 54x no q., sendo quase metade delas em Jeremias, Josué e Deute nômio; 8x no hi. e 2x na forma hitp. (THAT2A046). Abrange diferentes nuanças de significado que vão desde “acabar/estar acabado”, no sentido de “completar/estar completo” ou “esgotar/ estar esgotado” até “ser/tomar irrepreensível” (HALAT 1613-15). A obra das colunas “se acabou” quando foram concluídas e levantadas no pórtico do templo (1 Rs 7.22). Semelhantemente, tmm refere-se ao fim (cessão) de um discurso (Jó 31.40), a uma flor caída (Is 18.5) ou à conclusão de uma ação (Js 3.17). Jeremias recebeu pão todos os dias até “acabar-se” de todo (a farinha para assar) o pão da cidade (Jr 37.21). Em Números 14.35 a aposição (mwt, # 4637) define 305
DOn (# 9462)
seu sentido como “morrer” (cf. Dt 2.14; Js 5.6; SI 9.6 [7]), principalmente pela espada ou pela fome (Jr 14.15; 44.12). Seu par. no Salmo 19.13 [14] indica que o termo possui o significa do de ser irrepreensível, coerente, portanto, com ser inocente de uma grande transgressão. O hi. refere-se a concluir uma ação, ou seja, pedir para que deixe pronto (2Rs 22.4) ou cozinhar bem (Ez 24.10). Seu significado ético é definido pelo seu par. $dq em Jó 22.3, descrevendo os caminhos do justo como sendo irrepreensíveis. 3. De acordo com Koch (THAT 2:1048), o adj./subs. tâmim, inteiro, perfeito ou irr preensível é usado quase sempre em relação a regras cultuais referentes a levar as ofertas. Ex pressões sacerdotais estereotipadas (cf. Lv 22.21) especificam que todo sacrifício “deve ser sem defeito para ser aceitável” (ao Senhor). Assim tãmim é uma designação para as condições perfeitas de um animal a ser oferecido: deve ser saudável, sem defeito e livre de mácula (Lv 9.2; cf. Ex 12.5; Nm 6.14; 28.19). O termo é usado ainda para indicar a serenidade do relacio namento tranqüilo entre Deus e os justos (Gn 6.9; 17.1; Dt 18.13; Js 24.14), bem como a con fiança dentro de um relacionamento sincero e leal entre os homens (Jz 9.16; Am 5.10; cf. Ez 28.15). Seus sinônimos (vãsãr, justo [-> # 3837]; çaddiq, reto [-> # 7804]) também indicam que o termo resume o etos correto no meio daqueles que são retos e sábios, p. ex., “Porque os retos habitarão na terra, e os íntegros permanecerão nela” (Pv 2.21). Ser tãmim também significa ser piedoso e reto diante do Senhor, p. ex., “Também fui íntegro para com ele e me guardei da iniqüidade” (SI 18.23 [24]; cf. 101.2). Por fim, tãmim descreve o caminho de Javé como sendo perfeito (2Sm 22.31 = SI 18.31; cf. Dt 32.4), como também o é seu conhecimento (Jó 37.16) e sua lei (SI 19.8). A oração de Saul (ISm 14.41) contém um uso um tanto singular da palavra, ou seja, verdade, ou seja, clareza completa (Stoebe, KAT, V II/1,266-70). 4 .0 adj. tãm ocorre raramente fora do livro de Jó, transmitindo diferentes significado irrepreensível, inocente, sincero, quieto, pacífico, piedoso, puro, saudável, etc. Em Gênesis 25.27, Jacó é contrastado com Esaú e caracterizado como 'is tãm “homem pacato (e culto)”, enquanto seu irmão é um homem do campo (Westermann, BKAT, 1/2, 502). O texto compli cado do Salmo 73.4 refere-se ao corpo saudável (tãm) e forte/gordo dos perversos (cf. Kraus, BKAT XV/2, 664). O termo tãm designa (esp. na literatura de sabedoria), um grupo discernível de pessoas para as quais é de suma importância a lealdade ao etos e aos valores sociais que distinguem claramente aqueles que são tementes a Deus dos que são perversos ( 'iqqês). São chamados de íntegros (Jó 8.20; 9.20-22; SI 64.4 [5]), íntegros e retos (com yãsãr, Jó 1.1, 8; 2.3; em par, com 'is sãlôm SI 37.37; cf. Pv 29.10). O termo não aparece na literatura pro fética, nem em contexto cultuai algum e nem como um atribulo de Deus (TH AT2:1050). No Cântico dos cânticos 5.2 e 6.9 é usado como um tratamento carinhoso, a saber, imaculada/ perfeita (HALAT 1604). 5. O subs. tõm, perfeição, ocorre com mais freqüência em conjunto com a preposi ção prefixada be, caracterizando a natureza e o modo de uma ação ou a atitude daquele que a está realizando, significando, por um lado, em cheio (cf. Is 47.9) ou aleatoriamente, de modo insuspeitado (lR s 22.34 = 2Cr 18.33) e, por outro lado, integridade de coração (lR s 9.4; cf. consciência limpa, “sinceridade de coração” em Gn 20.5-6). Costuma ser usado em associa ção com o vb. hlk, caminhar ( -> #2143) para indicar uma conduta inocente ou irrepreensível (2Sm 15.11; SI 26.1, II; 101.2; Pv 2.7; 28.6). Como um complemento d e yõser (SI 25.21), descreve o desejo mais profundo de viver em harmonia com Deus e com os homens. Na lite ratura de sabedoria (cf. Pv 10.9; 13.6; 19.11), adquiriu o sentido mais abstrato de integridade e perfeição (TH AT2:1049). 6. O subs. tummâ é usado exclusivamente no livro de Jó (com exceção de Pv 11.3) e descreve o caráter e a qualidade de uma vida guiada pelo temor do Senhor e pelos princípios 306
10PI (# 9469)
éticos de retidão, honestidade e lealdade, a saber, pela integridade (Jó 2.3, 9; 27.5), sendo que 0 resultado é perfeição, paz e felicidade suprema (Pedersen, 531). 7. O subs. metõm denota um corpo ileso e saudável que não demonstra nenhuma e dência de ferimentos ou enfermidades (Sl 38.3 [4], 7 [8]; Is 1.6). Integridade, eqüidade, honestidade, lealdade, retidão: -> hsd 11 (mostrar-se bondoso, # 2874); ysr (ser nivelado, plano, direito, # 3837); -> kên I (certo, perfeito, honesto, habilmente, # 4026); imm (ser/estar ileso, inteiro, # 9462) Final, resultado: ’aharit (final, efeito, # 344) Fim, cessação, resultado: 'aharit (final, efeito, # 344); -> 'ps (cessar, chegar ao fim, # 699); -> A;/ (cessar o trabalho, # 1060); -> gmr (estar no fim, cessar, fracassar, # 1698); -> hdl 1 (finalizar, parar, # 2532); -> j n p (chegar ao fim, # 6066); sãrâ I (retenção, # 6239); <7ás (fim, limite, fronteira, # 7891); -> I (concluir, encurtar, # 7894) B ib l io g r a f ia
TH AT 2; 1045-51; F. L. Benz, Personal Names in the Phoenician and Punic Inscriptions, 1972; J. Pedersen, Israel I & II, 1920; P. J. van Zijl, Baal, 1972. J. P. J. Olivier 9468 (temes, dissolução, derretimento), -> # 5022
9469
iDn
in n (tãmãr I), tamareira (# 9469); rn b n (timõrâ), ador no em forma de palmeira (# 9373).
AT 1. É provável que o termo seja derivado do conceito radical de ser alto, majestoso, uma característica que possivelmente levou-o a ser empregado como NP fem. em Gênesis 38.6-30 (a nora de Judá) e em 2 Samuel 13.1-22 (a filha de Davi). Alguns estudiosos acreditam que, de longe, a forma da árvore é semelhante à de uma mulher em pé: “Teu porte é semelhante à palmeira” (Ct 7.7). A palmeira não tem galhos e sua copa é constituída de um grande circulo de frondes ou palmas (folhas características da palmeira). Em algumas versões o termo é traduzido como “palmas”, enquanto a maioria traz “ramos” (cf. Jo 12.13). No Salmo 92.12 [13], o caráter reto do justo é comparado com uma palmeira e apare ce em par. com o cedro do Líbano. Sua natureza saudável — folhas muito verdes e cheias de seiva — proporciona uma imagem de prosperidade (Sl 92.13 [14]). Em Isaías 9.14 e 19.15, a palma (kippâ, # 4093) representa os líderes ou maiorais do povo, enquanto o junco simboliza os mais humildes. Jericó era conhecida como Cidade das Palmeiras (Dt 34.3; Jz 1.16; 3.13; 2Cr 28.15), um nome que provavelmente é anterior à conquista de Canaã pelos israelitas. O córrego pe rene no local contribuía para a fertilidade desse oásis famoso. O termo também é usado como NG em Ezequiel 47.18-19; 49.28. De acordo com Juizes 4.5, Débora “atendia debaixo da pal meira de Débora”. Desde os tempos mais remotos, essa árvore era considerada sagrada na Arábia e na Assíria; em Canaã. a folha aparece retratada como elemento decorativo em cerâmicas de no mínimo 1800 a. C. Foi um elemento decorativo no templo de Salomão (1 Rs 6.29,32,35; 7.36; 307
-IQh (# 9473)
cf. 2Cr 3.5; Ez 40.16). Amplamente usada em tempos subseqüentes, apareceu nas moedas dos judeus e tem especial destaque nas famosas moedas “Judaea Capta” de Vespasiano. A disponibilidade de ramos de palmeira para serem usados em manifestações públicas de regozijo no primeiro dia da Festa dos Tabemáculos é observada em Levítico 23.40, uma prática que ainda persistia no tempo de Neemias (Ne 8.15) e que estendeu-se até o período dos macabeus (2Mac 10.7). Simão Macabeu entrou em Jerusalém com ações de graças e “ramos de palmeiras” (cf. IMac 13.51). 2. O subs. timõrâ, adomo em forma de palmeira, é encontrado cerca de 17x, todas elas em 1 Reis, 2 Crônicas e Ezequiel. Como derivativo evidente da palavra para palmeira (tãmãr), de acordo como contexto, o termo é usado para descrever alguns adomos ou decorações. Entende-se que a passagem de 1 Reis 6.29 fala de representações entalhadas de palmeiras. Apesar de não ser explícita, é possível que a passagem em Ezequiel 40.22 refira-se a algum tipo de representação de palmeiras na arquitetura. Arvores: ’êlâ I (árvore vigorosa. # 4 6 1 ),-^ 'erez (cedro, # 780); 'õren I (pinheiro, # 815); esel (tamargueira, # 869); -> berôs (zimbro, # 1360); lüz 1 (amendoeira, # 4280); -> ‘êy (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); -> 'ar'ãr (zimbro, # 6899); -> sammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); -> sãqêd(amêndoa, #9196); -> siqmã (sicômoro [figueira], # 9204); 'assúr (cipreste, # 9309); tãmãr I (tamareira, # 9469); -> tirzá (ár vore desconhecida, # 9560); ( Árvore do Conhecimento / Vida: Teologia) B ib l io g r a f ia
Y. Shiloh, “The Proto-aeolitic Capital — The Israelite ‘Timorah’ [Palmette] Capital,” PEQ 109, 1977, 39-52. LarryL. Walker 9472 (tõmer I, Palmeira), -> # 6770
7717 l o h (tõmer II), subs. espantalho (hapleg. Jr 10.5; _____ _________________ i l ______ #9073). OMA tõmer II não possui nenhum cognato claro. AT Há controvérsias entre os estudiosos quanto a tõmer II, se este significa palmeira ou espantalho. A Vg., o sir. e o Trg. entendem tãmãr como palmeira (enquanto a LXX omite in teiramente a forma) (cf. Deist, 225-26). A maioria dos estudiosos (p. ex., Bright, 76; Craigie, Kelley, Drinkard, 155-56; McKane, 222-23; TWOT 2:975; et al) prefere o significado espan talho, esp. levando-se em consideração Baruque 6.70 (6.69 G = Epístola de Jeremias v. 70). A Vg., que apóia o significado palmeira em Jeremias 10.5, traz o termo espantalho na Epístola de Jeremias. O profeta Jeremias (Jr 10.5) empregou o termo tõmer II em sua polêmica sarcástica contra a idolatria (Jr 10.1-5). Apesar de os adoradores pagãos voltarem-se para fenômenos cosmológicos extraordinários (p. ex., eclipses, cometas, meteoros) com a finalidade de prog nosticarem acontecimentos, Jeremias mostra a absurdidade de toda a idolatria. Esses deusesídolos venerados não passam de criações humanas. Os adoradores começam com uma árvore, cortam-na do tamanho certo, revestem-na de metais preciosos e, por fim, fixam-na num local 308
□n n ip r i (# 9477)
para que não venha a tombar. Os ídolos são como espantalhos (tõmer), uma vez que não podem falar. Além disso, os adoradores devem carregar consigo o objeto de sua adoração, pois estes não são capazes de andar. Conseqüentemente, os filhos de Deus não têm o que temer da parte desses deuses inúteis. Não podem fazer nem o mal e nem o bem. Idolatria: -> 'elil (nada, # 496); -> ’asêrâ (objeto de adoração feito de madeira, poste, deusa, # 895); -> gillulim (imagens, ídolos, # 1658); dãgôn (Dagom, # 1837); -> k?môs (Quemos [deus dos moabitas], # 4019); -> mõlek (Moloque, # 4891); massêkâ I (estatueta fundida, # 5011); -> mipleçet (coisa terrível, objeto abominável, # 5145); semel (imagem, # 6166); -> 'ãçãb (imagem de um deus, # 6773); ‘astõret (Astarote, # 6956); pese/ (imagem cultuai, estátua de um deus, #7181); tõmer II (espantalho, # 9473) -> firãpim (estatuetas, máscara, # 9572); Idolatria: Teologia B ib l io g r a f ia
TWOT 2:975; J. Bright, Jeremiah, AB, 1965; P. Craigie, P. Kelley, J. Drinkard, Jr, Jeremiah 1-25, WBC, 1991;F.Deist,“Z u n » ‘j7Dnoh? in Jeremias \0:5,"Z A W S5,1973,225-26; B. Duhm, Das Buch Jeremia, 1907; W. Holladay, Jeremiah 1, Hermeneia, 1986; W. McKane,/! Criticai and Exegetical Commentary on Jeremiah, ICC, 1986. Michael A. Grisanti 9474 (timõrâ, adorno em forma de palmeira), -> # 6770, # 9469 9475 (tamruq, massagem e unguento),
# 8379
9476 (tamrürim 1, amargurado, enfurecido),
9477
annon
# 5352
D m iQ n (tamrürim II), subs. balizas, marcos (hapleg.; # 9477).
AT O termo tamrürim é usado em par. com çiyyün ( -> # 7483) em Jeremias 31.21. Isso explica as traduções “marco”, “poste indicador” ou “poste itinerário” (W. L. Holladay, Jere miah, 1989,2:194). A palavra tamrürim é derivada do radical tmr (HALAT 1619), que também é a origem de tmr, uma coluna/pilar (de fumaça) (Ct 3.6; ver também J1 2.30 [3.3]). Marco: çiyyün (lápide, baliza, # 7483); -> t ’h (demarcar, # 9292); -> twh I (marcar, # 9344); -> tamrürim II (balizas, postes itinerários, # 9477) Paul A. Kruger
9478
in
|n (tan), chacal (# 9478).
AT 1. Essa palavra é esparsamente atestada no AT. Aparece no AT 14x, sempre no pi. e com freqüência numa declaração do julgamento do Senhor. Uma vez que estes e outros ani mais vivendo num lugar desabitado como um deserto ( ’õah, hiena ou coruja, # 280; chacais; 'il, chacal, # 363; hiena) são referidos na descrição da ira de Deus (SI 44.19 [20]; Is 13.22), podem simbolizar tal ira. 309
m n (# 9480)
Assim como as panteras (nãmêr, # 5807), os lobos (ze eb, # 2269), hienas ? (sãbu 'a , # 7380) e raposas (Sü‘ãl, # 8785, ver HALAT), os chacais aparecem em descrições do castigo de Deus (Jr 9.11 [10]). Em Miquéias 1.8, os chacais uivam tristemente nos lugares ermos (Jó 30.29; Is 13.22), desertos (Is 43.20) e assolados (Jr 9.10 [11]; 10.22; 49.33). Apesar de não se dizer que esses e outros animais carnívoros são ritualmente impu ros (presume-se que não sejam considerados entre os alimentos comuns) para os israelitas, é evidente que são relacionados à morte. E interessante observar que no castigo do Senhor ele conjura os animais que tem contato com a impureza da morte e nunca animais puros. Trata-se de algo que, na verdade, é declarado resumidamente em Jeremias 15.3, em que diz-se que o castigo do Senhor virá pela espada, cães (ver keleb, -> # 3978), aves e feras do campo. Essa é uma prova clara de que apesar de os israelitas deverem manter-se afastados da morte e de seus presságios, é Deus quem controla a impureza e o poder da morte. 2. O subs. tanním não devem ser confundido com tannln, criaturas marinhas ( # 9490). Animais: tfihêmâ (quadrúpedes, # 989); zãnãb (rabo, # 2387); hazír (porco, # 2614); -> hayyâ I (animal, # 2651); -> keleb (cão, # 3978); -> ‘akbãr (rato, # 6572); -> $epardêa' (sapo, # 7630); -> qippod (ouriço/coruja?, # 7887); -> rms (rastejar, enxamear, # 8253); -> Srs (enxamear, fervilhar, # 9237); tem (chacal, # 9478); Répteis: Teologia; procurar no índice Pássaros; Camelo; Cervo; Jumento; Pomba; Rebanho/Bando; Gazela; Insetos; Leão; Larva; Cobra, etc. Impureza, profanação, contaminação: -> g 'l II (ser contaminado, profanado, macular, # 1458); hnp 1 (ser ímpio, contaminado, # 2866); -> tm ’ (ser/tomar-se cerimonialmente im puro, contaminar-se, profanar, # 3237); -> piggúl (came impura, # 7002) B ib l io g r a f ia
EMiqr 8:617-18; Fauna and Flora o f the Bible, 1972, 31 -32. N. Kiuchi
9480
mn
m n (tnh), pi. recitar, comemorar (# 9480).
OMA No ugar. tny, repetir, relatar; aramJ e sir. tn ’, repetir, narrar; ár. (anã, ser duplicado. AT Esse vb. ocorre somente no pi. e parece ser um termo estrangeiro do aram. usado na BH., cognato do heb. snh II, repetir. Pode denotar repetição numa recitação de antífona. 1. Juizes 5.11, refere-se à narração dos atos salvadores de Deus, em louvor a ele, en quanto em Juizes 11.40 é relacionado à comemoração anual da morte da filha de Jefté. 2. No Salmo 8.1 [2] o impv. incomum tenâ, dar, costuma ser emendado para natattâ, expor, seguindo diversas versões antigas. Outra possibilidade é revocalizar o termo como um pu., tunnâ, (sua glória) é louvada, tendo para isso um certo apoio da LXX. Louvor, cântico, ação de graças: hll II (louvar, ser digno de louvor, gloriar, exultar, # 2146); zmr 1 (fazer música, cantar louvor, # 2376); ydh II (reconhecer, dar graças, louvar, # 3344); -> nwh II (louvar, # 5658); -> ‘nh IV (cantar, # 6702); psh I (irromper em cântico ou começar a cantar, # 7200); rômêm (exaltar, # 8123a); -> Sbh I (elogiar, louvar, honrar, # 8655); Syr (cantar, # 8876); tnh (recitar, comemorar, # 9480) Les lie C. Allen 310
(#9481)
9481
nxiíljl (t£nü a), subs. desagrado (# 9481); < NU (nw ’), estorvar, impedir, frustrar ( # 5648).
nsup
OMA Esse subs., que aparentemente vem do radical nw 7 (BDB, 626; H ALAT640) não é en contrado em outras línguas sem., apesar de o mesmo radical existir no acad. com o significado de voltar/desviar (CAD N2: 198-200 sub nê ’u) e no ár. com o significado de oprimir, opor-se; lutar (Wehr, 1006). AT A forma ocorre duas vezes no AT, uma vez como sing. (Nm 14.34) e uma como pl. (Jó 33.10). A primeira é no contexto da resposta de Javé ao seu povo quando os israelitas se rebelam contra ele no deserto. Não apenas são responsáveis por seus pecados, como também sentirão o “desagrado” de Deus. O contexto parece envolver o castigo sobre aquela geração pelo pecado e não uma oposição mais geral (cf. NIDNTT2:144), tratando-se de uma situação temporária e não mais permanente. Eliú reflete sobre as alegações de inocência de Jó (Jó 33.8-11), suas declarações de que Deus o está tratando injustamente. Esse tratamento da parte do Senhor envolve não apenas maus tratos físicos e maior vigilância (v. 11) como também ser considerado por Deus como um inimigo (v. 10). Esse último termo ocorre em paralelo com o termo que está sendo trata do. Jó afirma que Deus jamais encontrou nele “transgressão” ou “iniqüidade”, mas que ainda assim agiu contra ele como se tivesse se desagradado de seu servo, de modo que um conceito de “desagrado” sugerido acima se encaixa também neste contexto. P-B De acordo com o Manuscrito do Templo, uma mulher pode fazer um voto de abstinência sexual, mas o parecer final sobre a decisão é de seu pai. Ele pode “demonstrar desagrado” ou “apresentar objeção” (Maier, 47, 1.20; é usado um vb. do mesmo radical, nw 1) e, nesse caso, o voto é anulado. Animosidade, inimizade, hostilidade: -> ’y b (ser um inimigo, # 366); $rr II (ser hostil, # 7675); sim (odiar, # 8475); sãtãn (acusador, satanás, # 8477); s n ' (odiar, inimigo, # 8533); -> sôrêr (adversário, # 8806); Animosidade: Teologia B ib l io g r a f ia
NID NTT2:143-45; J. Maier, The Temple Scroll, 1985. Dcrvid W. Baker 9482 ijPnúbâ, frutos, produtos da terra), -> # 3292 9483 (tPnuk, lóbulo [da orelha]),
# 265
9484 (finíimâ, dormir), -> # 5670 9485 (tPnüpâ, oferta movida),
9486
"Y!3ri
# 5677
■fljri (tannúr), forno, fogareiro, fornalha (# 9486). 311
m n (# 9486)
OMA Aca, linüru (AHw, 1360); aram. tnwr (inscrição de Tell Kekherye do século IX, linha 22 [D. M. Gropp & T. J. Lewis, “Notes on Some Problems in the Aramaic Text o f the HaddYkth’ Bilingual,” BASOR 259, 1985, 46], assar pão). AT 1. Na tecnologia da antiguidade, as fornalhas eram usadas como fomos para cerâmica e crisóis metalúrgicos. No AT, a fornalha é empregada de modo figurativo para a provação do homem (ou seja, purificação espiritual), para a aparição de Deus no Sinai e para o julgamento divino. 2. Os fomos são usados para assar pão (Lv 26.26) e tostar grãos para a oferta de man jares (Lv 2.14; 7.9). Gênesis 15.17 faz referência a um tannúr fiimegante que passou entre os animais do sacrifício. Em Êxodo 8.3 [7.28], a praga de sapos também atinge os fomos. 3. O termo é usado de modo figurativo. O coração dos conspiradores políticos pode arder (b ' r) como um forno (Os 7.4, 6, 7) e depois da destruição de Jerusalém, a pele ficou quente como um fomo (Lm 5.10). 4. O julgamento divino: a fornalha de Javé está em Jerusalém (par. ao fogo em Sião) para consumir a Assíria (Is 31.9); quando ele aparecer, transformará os inimigos em fornalha ardente [fê tannúr ’ês) (Sl 21.9 [10]), par. à ira de Javé ( 'ap; # 678) como um fogo consu midor ([ ’êf; ff 836] ’kl). O dia do Senhor arde (b ’r) como fornalha (Ml 4.1 [3.19]); cf. fogo do ourives ( $rp, tf 7671) em Malaquias 3.2-3. 5. Havia uma Torre dos Fomos na região noroeste de Jerusalém (Ne 3.11; 12.38). P-B Elias era um profeta como o fogo e suas palavras queimavam como uma fornalha (Ecli 48.1). NT
-» NIDNTT 1:654-56
Fornalha, lareira, forja, forno, fogSo: 'ah (braseiro, fogareiro, tt 279); kibsãn (for nalha, forja, ft 3901); -> kúr (forja, # 3929); -> kir (fomo pequeno, ff 3968); -> mebasselôt (lareiras, ft 4453); móqêd (lareira, tf 4611); -> ‘alil (fornalha de barro, ft 6612); tannúr (fomo, fomalha, tf 9486) Queima, ardência, ressecamento, chamuscamento: òV 1 (queimar, arder em chamas, ser consumido, tf 1277); gahelet (carvão candente, ft 1625); dlq (atear fogo, queimar, perseguir ansiosamente, tf 1944); hmr III (estar em fermentação, estar aquecido, vermelho, incandescente, em brasa, arder, ff 2813); hrr I (estar em brasa, arder, ft 3081); -> y$t (acen der um fogo, queimar, atear fogo, tf 3675); yqd (queimar, acender [fogo], # 3678); -> kwh (queimar, arder, chamuscar, tf 3917); -> Iht I (arder, estar em brasa, queimar, tf 4265); nsq (pegar fogo, ser aceso, queimar, tf 5956); $wt (acender, começar um fogo, inflamar, fazer queimar em chamas, ft 7455); -> qdh (atear fogo, acender, inflamar, fazer arder, pôr fogo, tf 7706); srp (chamuscar, ressecar, cauterizar, ft 8596) Fogo, chama: ’ü d (cepo, tição fumegante, ft 202); -> 'ês I (fogo, # 836); b V l (queimar, arder em chamas, ser consumido, tf 1277); gahelet (carvão candente, tf 1625); -> goprít (enxofre, ff 1730); (acender um fogo, queimar, atear fogo, tf 3675); _v kidôd (faísca, tf 3958); -> Ibb II (assar bolos, ft 4221); lahab (chama, lâmina, # 4258); -> lh( I (arder, queimar, # 4265); -> lappid (tocha, relâmpago, # 4365); -> (faísca, ff 5773); pehãm (carvão, tf 7073); -> reçep I (brasa, # 8363); -> resep I (chama, incandescência, flecha, praga, tf 8404); -> srp (queimar, ser quei mado, ft 8596); sõbíb (chama, tt 8663) 312
pan (# 9490)
B ib l io g r a f ia
BRL2 40-41; IBD 531 \ZPEB 2:614; J. Kelso, The Ceramic Vocabuary o f the OT, 1948; A. Salonen, “Die Ôfen der alten Mesopotamier,” Baghdader Mitteilungen 3, 1964, 100-124. I. Cornelius 9487 (tanhúmôt, conforto), -> # 5714 9488 (tanhúmim, consolação), -> # 5714
9490
P3Ç1 (tarmin), criaturas marinhas (# 9490).
pari
AT Esse termo genérico refere-se às grandes criaturas marinhas em Gênesis 1.21 e no Sal mo 148.7. Em Êxodo 7 e no Salmo 91.13 refere-se a um tipo de serpente, provavelmente mui to menor e talvez semelhante a uma víbora (cf. também Dt 32.33). Esses textos não contêm nenhuma conotação mitológica. Pelo Salmo 74.13-14 e Isaías 27.1, tem-se a impressão de que o Leviatã (monstro marinho) pertence à categoria de tannin ou de que os tarmin são ajudantes do monstro marinho. Esse nome também é usado de modo simbólico para o poder do inimigo/ mal (Is 51.9 e Jr 51.34; cf. Raabe [# 8105], Tomando por base Ezequiel 29.3 e 32.2, podemos deduzir que o texto pretende fazer referência ao crocodilo ou hipopótamo. Porém, é mais pro vável que trate-se de uma criatura marinha maior e mais poderosa. Leviatã: -> liwyãtãn (Leviatã, # 4293); -> tannin (criaturas marinhas, # 9490) Maarten J. Paul 9491 (tinsemet I, camaleão),
Répteis
9492 (tinsemet II, coruja branca),
# 7606
( t‘b II), ni. ser detestável, ser detestado; pi. detestar, abominar, tomar uma abominação; pu. ser abominado; hi. agir de modo abominável (# 9493); rn ih n (tô ‘êbâ). subs. algo abominável, detestável, ofensivo (# 9359); UND ( t ’b II), detestar, abominar (hapleg. Am 6.8, # 9290). 9493
nvn
OMA Apesar de a maioria dos estudiosos concordar que o vb. t ’b (que ocorre 15 das 22x no pi. [em várias ocasiões com uma raiz denom.]) é derivado do subs. tõ ‘êbâ (que ocorre 117x; em oposição a LHA [892, 904-5], que deriva o vb. e o subs. de diferentes radicais ár.), esses mesmos estudiosos não apresentam um consenso quanto à derivação exata de tõ ‘êbâ. Além da sugestão mais provável de que é derivado de y ‘b (ár. ‘ãba, ser afligido com uma fraqueza), Humbert (1961, 157-60, ver Kopf [188-89; cf. LHA, 892]) chama a atenção para o ár. ‘ãfa, humilhar) e Albright (176. n. 45) argumentam em favor do ár. w ‘b, purificar. Fora da BH, esse conjunto de palavras é atestado somente no heb. da Mix. (Jastrow, 1655, 1683), sam., aram. e numa inscrição de um túmulo fen. (ANET, 662; Cooke, 26-30), que adverte todos os ladrões de túmulos a não abrir o sarcófago, uma vez que isso seria “uma abominação a Astarote” ( t‘bt ‘strt). 313
31?n (# 9493)
AT 1. Significado geral. Basicamente, tô 'êbâ denota as pessoas, coisas ou práticas que ofendem a ordem ritual ou moral de algo, enquanto / ‘b descreve a abominação dessa pessoa, coisa ou prática ofensiva. A natureza abominável ou repugnante é determinada pelo caráter, valores ou cultura de uma pessoa. De acordo com seus costumes, o pastoreio de rebanhos (Gn 46.34) e comer com estrangeiros (Gn 43.32) eram repugnantes para um egípcio. Como parte de seu pedido para que Faraó permitisse que os israelitas oferecessem sacrifício a Javé no deserto (longe dos egípcios), Moisés mencionou sua preocupação quanto a profanar as práticas cultuais egípcias. Apesar de o motivo exato de sua preocupação não ser declarado no texto, pode-se imaginar a seguinte situação. Se o povo do Egito visse os israelitas sacrificando touros (cf. Trg Onkelos), animais que consideravam sagrados (Ápis era um deus touro), poderia acontecer dos egípcios apedrejarem os adoradores israelitas (Êx 8.26 [22]). Cassuto (109) sugere que tô'êbâ pode ser um termo mosaico derrogatório para os ídolos egípcios e não uma descrição da pos sível reação do povo do Egito aos sacrifícios dos israelitas. Por fim, o salmista se queixa que em sua situação desesperadora ele tornou-se um objeto de abominação para seus amigos (SI 88.8 [9]). 2. Transgressões diversas da aliança (Levítico e Deuteronômio). A ocorrência de tô ‘êb nos livros do Pent. e nos escritos históricos e proféticos têm como contexto o relacionamen to de aliança entre Israel e Javé. A exigência de Javé de que Israel obedeça de todo o coração em diversas áreas dava a Israel um meio tangível de cumprir sua comissão divina a fim de ser uma "propriedade peculiar... reino de sacerdotes e nação santa” (Êx 19.5-6). Parte dessas ex pectativas divinas implicava evitar e detestar certas coisas e práticas proibidas. Essas questões proibidas foram determinadas pelo próprio Javé e, por isso, são incompatíveis com o caráter dele e devem ser rejeitadas e abominadas por todo adorador do Deus de Israel. Todas essas abominações constituem ameaças à harmonia e existência de Israel, a comunidade da aliança de Javé. Ao que parece, a questão fundamental é o desejo de Javé de preservar a pureza de seu povo escolhido de modo a permitir que reflitam claramente o caráter divino às nações pagãs ao seu redor. As práticas de adoração pagã, a falsidade e a insubordinação em meio à nação da alian ça, bem como a adoração superficial a Javé constituem as três principais esferas de atividades abomináveis. a. Práticas de adoração pagã. A oração “abominação(ões) das nações” (tõ 'abati tõ ab gôyim, Dt 18.9; IRs 14.24; 2Rs 16.3; 21.2; 2Cr33.2; 36.14; cf. Ed 9.1, 11, 14) serve de ex pressão genérica em passagens que advertem os israelitas a não imitar as práticas iníquas dos povos vizinhos. Em várias ocasiões, o termo tõ 'êbâ encontra-se sozinho, como uma condena ção abrangente das práticas cananéias, sem nenhuma menção explícita de uma conduta pagã (Lv 18.26,27,29,30; Dt 18.12; 20.18). Em termos mais específicos, a prostituição cultuai, que constituía uma parte fundamental da adoração a Baal (Albright, 158-59; Finegan, 133; Ringgren, 165-67; a prostituição cultuai também existia nos impérios da Babilônia [CH, §178-84] e da Pérsia [Heródoto 1:199-200]), era considerada detestável para um israelita (Dt 23.18-19 [17-18]; IRs 14.23-24). Os prostitutos e prostitutas cultuais eram chamados respectivamente de qãdês e qedêsâ (Gruber, 133-48). Como funcionários do templo, eram consagrados à fun ção de participar de atos sexuais abomináveis com adoradores a fim de persuadir o panteão de divindades a conceder fertilidade a fiéis, aos seus campos e animais. Para um israelita, praticar a prostituição cultuai era o mesmo que negar a capacidade de Javé de cumprir sua promessa de abençoar seu povo com fertilidade. A participação israelita em qualquer elemento de idolatria também era considerada tõ'êbâ. Javé ordenou aos seus filhos que destruíssem todos os ídolos. A pessoa que desconside314
3Sm (# 9493)
rasse tal advertência e mantivesse um ídolo (qualquer que fosse seu propósito) provocaria a ira de Javé (Dt 32.16) e colocaria sua casa sob maldição (Dt 7.25-26; # 3051). Moisés ordenou que os levitas pronunciassem uma maldição sobre qualquer um que confeccionasse um ídolo para adoração pessoal, maldição esta que fez parte da assembléia nacional em Siquém durante a conquista de Canaã por Israel (Js 8.30-33). Qualquer cidade que seguisse a liderança de ho mens tentando voltar seus compatriotas israelitas para a idolatria deveria ser completamente destruída (hmr, R. 13.12-18 [13-19]). Como parte de sua reforma, Josias acabou com vários locais de idolatria edi ficados pelo rei Salomão (2Rs 23.13; 2Cr 34.33). 2 Reis 23.13 menciona especificamente os locais de ido latria em Sidom. Moabe e Amom, mas usa siqqu.j (ver # 9199) para os dois primeiros e tõ 'êbâ para o último. Esses dois termos ocorrem juntos em outras cinco passagens (Jr 16.18; Ez 5.11; 7.20; 11.18, 21). Não fica claro se os dois termos possuem ou não nuanças diferentes nessas últimas passagens. De modo geral, tõ'êbâ é um termo mais amplo, que indica algo ofensivo aos valores, cultura ou religião de uma pessoa, enquanto o radical sqç é um termo mais técnico significando coisas que profanam a adoração a Javé. O termo tõ ‘êbâ é usado para se referir ao sacrifício humano, uma prática abominável atestada em várias religiões do OMA, porém de modo mais predominante, com referência ao culto a Moloque (Heder, Day) (Dt 12.31; cf. Lv 18.21-22; 20.2-5). Infelizmente, houve casos de sacrifício de crianças durante os anos posteriores de apostasia da história de Israel (2Rs 16.3; 17.17-18; 21.6; 2Cr28.3). Javé também abominava a homossexualidade (Lv 18.22; 20.13) e o travestismo (Dt 22.5). Tendo em vista que as outras cinco ocorrências de tõ'êbâ em Levítico referem-se a práticas cananéias em geral (Lv 18.26, 27, 29, 30) ou à homossexualidade em particular (Lv 20.13), ao que parece, a homossexualidade constitui uma parte importante das práticas do povo de Canaã, mais provavelmente como um elemento de sua adoração (prostituição cultuai). Essa prática de um homem deitar-se com outro “da mesma forma como deita-se com uma mulher” (Levine, 123) era abominável a Javé pois pervertia a relação heterossexual determinada por ele (Gn 2.24; 4.1). Aquele que cometesse tal abominação devia ser executado (Lv 20.13). Az onze tribos de Israel procuraram fazer cumprir essa ordem quando os homens da cidade de Gibeá entregaram-se às práticas detestáveis dos seus vizinhos cananeus (Juizes 19). Hofírier (333-34) sugere a possibilidade de que a condenação quanto a usar roupas do sexo oposto em Deuteronômio 22.5 seja uma referência a símbolos externos que faziam parte algum ritual de fertilidade pagão e que podiam constituir claramente uma transgressão no re lacionamento de aliança de Israel com Javé. Uma vez que k?ligeber significa “qualquer coisa referente a um homem,” o travestismo não é a única ou principal conduta em questão. Apesar de o texto não deixar clara essa correlação, é bem provável que esse tipo de conduta fosse as sociado à homossexualidade e/ou fosse parte de um rito cultuai pagão. b. Falsidade e insubordinação. A condenação dos falsos pesos e medidas como abom nação a Javé (Dt 25.16; a expressão tõ ‘abatyhw h, ocorre somente em Deuteronômio e Pro vérbios) possui um par. egíp. (Sabedoria de Amenemope 18:15— 19:3; cf. 17:18, 21; 18:1-5; Washington, 92), em que o alqueire de capacidade é comparado ao olho de Rá e subtrair de tal medida constitui uma abominação a Rá (Washington, 88). Em Deuteronômio, a oração tõ ‘abat yhwh é sempre relacionada a uma exigência de devoção exclusiva na adoração a Javé, enquan to em provérbios refere-se principalmente aos desvios morais e relacionamentos interpessoais sem um contexto claramente ligado à aliança (McKane, 301). De acordo com seus próprios desígnios eletivos (e não necessariamente em função de seu valor intrínseco), Javé determinou que certos animais seriam aceitáveis, enquanto outros 315
3»n (# 9493)
não poderiam fazer parte da dieta dos israelitas. Esses animais inaceitáveis são chamados de tõ 'êbâ (Dt 14.3). A obediência a essas regulamentações da alimentação contribuía para a santi dade e distinção de Israel diante das nações pagãs ao seu redor. Conseqüentemente, transgredir tais regulamentações era um ato de traição da aliança. O segundo casamento de um homem e uma mulher depois dos dois haverem se divor ciado um do outro e da mulher haver se casado com outro homem (que morre ou se divorcia dela) é considerado tõ ‘êbâ (Dt 24.4). Há controvérsia entre os estudiosos sobre o significado exato de “não for agradável a seus olhos” em Deuteronômio 24.1 e sobre o motivo pelo qual é permitido um segundo casamento, desde que este não seja com o cônjuge do qual se divor ciou. Vários estudiosos afirmam que essa proibição procura prevenir uma forma legalizada de adultério (Merril, 318; Craigie, 305). c. A adoração superficial a Javé. Javé havia determinado o sistema sacrificial para p porcionar ao seu povo escolhido um modo tangível pelo qual poderiam colocar em prática as várias facetas de seu relacionamento com Deus. Ele exigia que seu povo lhe oferecesse so mente animais sem defeito ou mácula (Dt 15.19-23). Oferecer um animal inferior a Javé era tõ'êbâ e demonstrava falta de reverência para com Deus (cf. Ml 1.6-8) e hipocrisia por parte do adorador (Dt 17.1). A passagem que descreve a prostituição cultuai como abominação (Dt 23.18-19 [1718] também proíbe qualquer israelita de usar salários recebidos por prostituição cultuai como parte de alguma oferta a Javé. Uma vez que o dinheiro adquirido desse modo não podia ser dado como demonstração da gratidão do adorador a Deus pela provisão bondosa divina, tal dinheiro era detestável. 3. Condenação profética de Israel (Isaías, Jeremias, Ezequiel e Malaquias). Javé enviou os profetas para confrontar sua nação vassala por esta haver transgredido as estipulações da aliança. Os profetas advertiram sobre o julgamento vindouro por Israel haver traído a aliança e, por vezes, proporcionaram esperança para a nação caso esta voltasse a obedecer a aliança. No contexto de seu ministério, vários profetas condenaram Israel por diversas práticas abomi náveis, repreendendo a nação especialmente por suas práticas difundidas de idolatria. Javé havia dado ao seu povo escolhido a terra de Canaã como sua herança, uma conces são da aliança. Israel retribuiu contaminando essa herança com sua idolatria (Jr 2.7). Jeremias assemelha a multiplicação dos ídolos inanimados em Israel a encher a terra de cadáveres (Jr 16.18). Além disso, os líderes espirituais de Israel não contiveram o crescimento da idolatria. Antes, apesar de existir uma fenda cada vez maior entre Israel e seu Senhor da aliança, a lide rança sacerdotal conduziu seu ministério como se o relacionamento de Israel com Javé fosse harmonioso (Jr 6.15). Além da sua falsidade, os sacerdotes estavam envolvidos em práticas idólatras ao mesmo tempo em que conduziam a adoração do povo a Javé (Jr 7.10; 8.12). Assim como os sacerdotes, o povo de Israel estava realizando suas obrigações sacrificiais, como por exemplo os rituais, sem nenhum entusiasmo. No tempo de Isaías, Javé considerou as ofertas de incenso de Israel tõ ‘êbâ (Is 1.13). A maioria das ocorrências proféticas de tõ 'êbâ condena a ignomínia do envolvimento de Israel com a idolatria (Jr41.24). Algumas passagens repreendem Israel por participar do sacrifício de crianças (Is 44.19; Jr 32.35; 44.4, 22). O termo tõ 'êbâ ocorre com mais freqüência nas profecias de Ezequiel (43x, com ex ceção de 4x [Ez 16.50; 18.12; 22.11; 33.26] no pl). tô 'êbâ serve de termo abrangente para os diversos aspectos da impureza cultuai, práticas abomináveis abundantes tanto dentro do templo como por todas as regiões adjacentes em Israel (Zimmerli, 190). 4. Provérbios As 2 lx em que tõ ‘êbâ ocorre em Provérbios descrevem o que é abominá vel à humanidade ou à Javé mas não possuem um contexto explícito da aliança como acontece 316
3Vn (# 9493)
nas ocorrências no Pent. e nos textos deut. Vários casos de tõ 'êbâ simplesmente expressam a aversão que uma pessoa sente a algo ofensivo. Um homem justo abomina a falsidade (im piedade; Pv 8.7), o escamecedor (Pv 24.9) e o iníquo (Pv 29.27). Os insensatos abominam o justo (Pv 29.27) e a idéia de apartar-se do mal (Pv 13.19) e guardam tõ ‘êbâ no seu coração (Pv 26.25). A expressão tõ'abat yhwh (12x) descreve práticas repugnantes a Javé (Pv 3.32; 11.1, 20; 12.22; 15.8, 9, 26; 16.5; 17.15; 20.10, 23): iniqüidade, pesos e medidas enganosos, falsidade, hipocrisia, maldade e arrogância. Essa expressão é bastante parecida com uma ora ção encontrada várias vezes no texto egípcio “Sabedoria de Amenemope” (Simpson, 242-65). Palavras enganosas e falsificação de documentos por um escriba (Sabedoria de Amenemope 15:20-21; cf. Pv 17.15; Washington, 93) são considerados “a abominação do deus” (Sabedoria de Amenemope 13.16; cf. Pv 6.16-17; 12.22). Weinfeld (1972,268) argumenta que a natureza geral das ofensas definidas pela expressão Iõ ‘abatyhwh ressalta a atitude hipócrita do malfei tor, quer nos relacionamentos humanos (Pv 11.1; cf. 6.16-19) ou na adoração (21.27; 28.9), que constitui uma abominação diante de Deus. 5. Amos 6.8 e t'b. Quer a mudança de t'b para t ’b tenha sido intencional ou não ( Wolff, 282), diante do par. anterior de sn ’e t'b (Am 5.10), a forma ímpar que aparece em Amós 6.8 (m etã’êb) deve ser lida como m etã’êb. P-B O desenvolvimento do judaísmo exerceu um forte efeito esp. sobre a história mais am pla do conjunto de palavras t ‘b. O judaísmo ortodoxo colocou limites ainda mais rígidos para evitar a contaminação, tomando por base principalmente Deuteronômio — p. ex., Ab Zar. 1:9; 3:6 (THAT2:1055). Nos M M M ovb. ocorre 15x e o subs. l i x e apresenta um uso singular des se conjunto de palavras. A LXX traduz iõ'êbâ principalmente com bdelugma, mas usa anomia em Ezequiel. Desprezo, desdém, repugnância, aversão: -> bwz (demonstrar desprezo por, # 996); bzh (ser desprezível, fazer pouco de, desprezar, # 1022); -> bhl (cansar-se, desdenhar, # 1041); g 'l (abominar, ser profanado, falhar, # 1718); -> zhm (tomar alguém repugnante, # 2299); -> zwr III (ser afrontoso, # 2320); -> zll II (ser frívolo, ser desprezado, # 2361); -> znh II (sentir desagrado por, # 2389); -> zãrã ’(enjôo, náusea, # 2426); hnn II (estar fedendo, repugnante, # 2689); -> v q ' (desviar, # 3697); -> n q ' (desprender-se, # 5936); qw( (sentir nojo, # 7752); qll (ser insignificante, rápido, parecer leviano, tratar com desprezo, # 7387); -> sw( II (me nosprezar, desprezar, # 8764); -> Sq$ (tomar-se detestável, # 9210); t'b (ser detestável, ser detestado, detestar, abominar, # 9493) B ib l io g r a f ia
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n»n (# 9494)
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nyn (/ 7»), q. perder-se, vagar; ni. cambalear, ser desvia do do caminho; hi. desviar alguém do caminho, deixar ou fazer alguém se perder, fazer alguém cambalear (# 9494); ni?ü (/ ‘h), q. vagar; hi. desviar alguém do caminho ( # 3246). 9494
Hi?n
OMA Ar. (agã ultrapassar limites; cf. acad. tã 'tu, sair do caminho certo. AT 1. Numa forma de uso não religiosa, t ‘h é associado a: a. estar perdido ou deslocando-se sem direção num campo ou deserto (p. ex. Hagar, Gn 21.14; José 37.15; viajantes, SI 107.4) e b. estar cambaleando como resultado de haver ingerido bebida forte (p. ex. profetas/sacerdotes. Is 28.7). A linguagem sobre a perda de direção física ou uma direção equivocada era útil para se falar sobre um modo de vida, esp. aquele afastado de Deus. As dimensões morais e religio sas são, portanto, importantes em t ‘h. 2. Em termos religiosos, desviar-se do caminho ( t‘h) significa abandonar um ponto de referência. Ficar perdido é deixar de ter um ponto de referência como aquele que pode ser proporcionado: a. pela sabedoria, b. pelos ensinamentos da lei ou c. por Deus. O conselho em Provérbios 7.25 é para que o jovem não se desvie para os caminhos da mulher insensata. Quan to aos ensinamentos da Torá, o salmista declara que não se desviou dos preceitos de Deus, a lei (SI 119.110). Diz-se de Israel que “andava errado... desviados ( t ‘h) de mim [Deus]” (Ez 44.10). Quando a pessoa se desvia do bem, quer este seja representado pela sabedoria, pela lei ou por Deus, fica desorientada. 3. Esse desvio pode ser um desencaminhamento daquilo que é conhecido e verdadeiro por falta de atenção ou pode ser um afastamento deliberado do bem em busca de alguma outra coisa, como ídolos (Ez 44.10; cf. Os 4.12). O desvio acontece quando a pessoa é guiada por realidades além de Deus e seus ensinamentos. O indivíduo desvia-se quando deixa o bom ca minho. E necessário então, voltar ao rumo certo ( swb, voltar, arrepender-se, # 8740). 4. Quase metade das ocorrências de t'h são no hi., desviar algo do caminho certo. Nes ses casos, os sujeitos são líderes como reis, profetas e sacerdotes. São eles que levam outros a errar espiritualmente (Is 9.15 [16]; cf. Mt 15.14). Os pastores, ou seja, líderes civis de Israel, inclusive os reis, são acusados de fazer o povo se desviar do caminho (Jr 50.6). Manassés, o rei mais perverso de Judá, seduziu Israel edificando altares a Baal, colocando um poste de Aserá no templo e, como resultado, “fizeram pior do que as nações que o Senhor tinha destruído” (2Rs 21.9; cf. 2Cr 33.9). Os falsos profetas são acusados de fazer o povo errar por meio de visões e esperanças falsas (Mq 3.5; cf. o longo discurso contra os falsos profetas em Jr 23.9-40, esp. a obra de falsos profetas sob os auspícios de Baal, v. 13). Ezequiel prevê um dia em que Deus 318
yyn (# 9506)
exigirá que os falsos líderes prestem contas e Israel não se desviará mais dele (Ez 14.11). Fora de Israel, os oficiais egípcios são culpados de terem conduzido o Egito pelo caminho errado, fazendo sua nação se desviar (Is 19.13-14). Um apóstata faz os outros se desviarem do cami nho da vida (Pv 10.17). O caminho dos perversos os faz errar (Pv 12.26). 5. Por vezes, Deus é o sujeito de t 'h, perambular, cambalear, como quando fez Abra andar errante no tempo da fome (Gn 20.13). Como parte de seu julgamento contra o Egito, o Senhor fez a nação cambalear (hi. de t ‘h). O profeta pergunta a Deus porque fez o povo se desviar dos seus caminhos (Is 63.17; t ‘h [hi.]; cf. 30.28; SI 107.40). 6 .0 termo t ‘h é apropriado para os perversos que se desencaminham desde o nascime to (SI 58.3 [4]). Porém, na metáfora vivida de Isaías, “todos nós andávamos desgarrados como ovelhas” (Is 53.6), o profeta apreende o dilema humano de uma propensão para a desobediên cia que implica desorientação e desencaminhamento. A metáfora é importante como forma de esclarecer a natureza do pecado e da condição humana sem a salvação (Is 47.15; Jr 42.20; cf. E.J. Young, The Book o f Isaiah, III, 349). 7. O vb. t 'h, uma forma de t ‘h que sofreu influências aramaicas e significa perder-se, ocorre uma vez (Ez 13.10), com o sentido de “enganar” (W. Zimmerli, Ezekiel I, 287, 295). O KBL observa a hipótese de que no Cântico dos cânticos 1.7 a intenção seja de fazer uso da forma q. P-B A comunidade de Qumran preocupava-se esp. com aqueles que haviam se desviado e que estavam desencaminhando outros. O vb. ( ‘h e o subs. (ã ‘út, erro, ocorrem com freqüência na LQ. Deambulação, errância, desabrigo: h l’ (desviar-se, ser levado para longe, # 2133); t'h (percorrer, fazer desviar, # 3246); -> ndd I (fugir, desviar-se, perambular, # 5610); nwd (oscilar, não ter lar, # 5653); -> nwç (fugir, # 5680); -> rwd (andar errante, #8113); sgh (equivocar-se, desencaminhar-se, fazer o mal, corromper, # 8706); -> sw( I (andar errante, # 8763); t'h (perder-se, # 9494) B ib l io g r a f ia
NIDNTT2:457-61, esp. 458; TD NT6:228-53; THAT2:1055-57; TWOT2:977. ElmerA. Martens 9496 (fi 'údâ, testemunho, atestação), 9498 (jfi'ãlá I, trincheira, vala),
# 6386
# 5643
9500 (ta ‘alúlim, capricho, devassidão, delito),
# 6618
9502 (ía ‘alumâ, algo oculto, secreto), -> # 6623 9503 (to 'artüg, conforto, deleite, prazer), -> # 6695 9504 (ta 'anit, jejum), -> # 6700, # 6705
yyn (/" ), pilpel zombar, enganar; hitp. zombar, abusar (# 9506). 319
nyn
(# 9509)
OMA O radical é atestado no ár. ta ‘ta a, gaguejar, estremecer violentamente.
AT 1 .0 vb. aparece no part. do pilp. em Gênesis 27.12. Jacó se debate com a sugestão de sua mãe de que ele finja ser seu irmão Esaú e engane seu pai Isaque para que este o abençoe. Jacó lembra a mãe de sua pele lisa e de como Esaú é coberto de pelos, “Dar-se à o caso de meu pai me apalpar, e passarei a seus olhos como zombador, assim, trarei sobre mim maldição e não bênção” (Gn 27.12). A avaliação final das ações de Jacó em Gênesis 27.35-36 esclarece o significado do radical t" em 27.12. Os termos mirmã (BDB, 941; # 5327) e 'qb (BDB, 784; TWOT 2\\616-11 \ # 6810) — ambos indicando dissimulação ou fingimento — são usados para descrever suas táticas. Jacó conclui corretamente que tal comportamento merece maldição e não bênção. 2. O part. do hitp. em 2 Crônicas 36.16 transmite um sentido semelhante. A queda Jerusalém é justificada pela repetida desconsideração de Israel para com as advertências de Deus. 2 Crônicas 36.11-14 registra o comportamento vergonhoso do povo. e o v. 15 descreve as tentativas misericordiosas de Deus de restaurá-los. A resposta dos israelitas foi zombar dos seus mensageiros, desprezar suas palavras e debochar de seus profetas. Seu comportamento enganoso obstruiu o caminho para a bênção e conduziu à destruição: “Eles, porém, zomba vam dos mensageiros, desprezavam as palavras de Deus e mofavam dos seus profetas, até que subiu a ira do Senhor contra o seu povo, e não houve remédio algum” (2Cr 36.16). A ação transmitida por /" tem fortes nuanças negativas, redundando em culpa, causando a ira divina e resultando em julgamento. P-B O radical t “ é traduzido de várias maneiras pelas versões G do AT. A linguagem do es cárnio é transportada para a literatura do período intertestamentário (ver TDNT 5:630-36). Zom baria, ridículo, escárnio, gagueira: gdp (ultrajar, blasfemar, # 1552); -> htl (enganar, zombar, # 2552); -> hrp 11 (afrontar, zombar, insultar, provocar, # 3070); ly$ (desdenhar, con tar vantagem, ridicularizar, # 4329); -> l'b (gracejar, brincar, # 4351); -> / ‘g (gaguejar, zombar, motejar, # 4352); /$$ (rebelar, escarnecer, # 4372); -> mwq (escarnecer, zombar, motejar, # 4610); -> qls (desdenhar, escarnecer, mofar, # 7840); -> shq (rir, escarnecer, regozijar-se, cele brar, dançar, # 8471); -> tll (enganar, escarnecer, gracejar, # 9438); -> t " (enganar, escarnecer, # 9506); -> ta ‘tu ‘im (erros, escárnio, # 9511) 9507 (fi'upâ [cj.], escuridão), -> # 6415 9508 (ta asumôt, vigor), -> # 6793
9509
n sn
1VPI (ta ‘ar), subs. navalha, canivete (# 9509); < m v ( ’rh), estar descalvado ( # 6867).
OMA O radical é atestado no acad., ugar., aram., ár. e outras línguas (com o mesmo significado que no heb.), mas a forma substantivai que significa navalha é atestada somente no hebraico. AT 1 .0 subs. normalmente refere-se a uma navalha usada para raspar a cabeça ou o copo, como os levitas que foram raspados como preparação para o serviço sacerdotal (Nm 8.7) ou na proibição de se cortar o cabelo dos nazireus (Nm 6.5). (Este último caso mostra que o cabelo 320
t r y n y n (# 9 5 1 1 )
em si não é tabu. Antes, a raspagem dos sacerdotes foi parte do ritual de purificação geral.) Ezequiel recebeu ordem de usar uma espada afiada como navalha (Ez 5.1), cortando seu cabelo como um símbolo da desolação vindoura de Judá. O uso da espada para raspar provavelmente foi significativo, prefigurando a devastação de Judá pela espada (cf. Ez 5.2; ver Cooke, 57). 2. Da mesma forma, o subs. é usado de modo figurativo na comparação do rei da As síria com uma navalha que raspará o cabelo e a barba de Judá (Is 7.20). Assim como em Eze quiel 5.1, nesse caso o ato de raspar também simboliza a vergonha de Judá (cf. 2Sm 10.4) e sua devastação. 3. Em Jeremias 36.23, o subs. ta ‘ar designa “um canivete de escrivão”, aparentemente parecido em tamanho e forma com uma navalha. E provável que costumasse ser usado para partir juncos e cortá-los de modo a poderem ser empregados como instrumentos de escrita. Faca, navalha, cinzel: garzen (machado, cinzel, # 1749); -> m a ’akelet (faca de açouguei ro, # 4408); ma ‘a$ãd(podadeira, cinzel, # 5108); maqçu 'â (faca de entalhar, # 5244); sakkin (faca, # 8501); -> to 'a r (navalha, canivete, # 9509) B ib l io g r a f ia
IDB 3:42, 711; N1DBA, 281; J. Blekinsopp, Ezekiel, lnterp, 1990, 38-39; C. Corswant, A Dicitionary ofL ife in Bible Times, 1956, 164; Cooke, The Book o f Ezekiel, 1936; W. Zimmerli, Ezekiel l, Hermeneia, 1979, 172-73. Anthony Tomasino 9510 (ta ’arübôt, reféns),
9511
# 6842
D^ynyn
D’Vnyri (ta ‘tu ‘im), subs. ilusões (# 9511).
OMA Se é correto entender que o subs. é um derivativo do vb. t ", então o radical é atestado no ár. ta 'ta ‘a. gaguejar, estremecer violentamente. Faltam evidências do subs. fora do AT. AT O subs. ocorre 2x no AT, em passagens idênticas em Jeremias. As duas perícopes trans mitem repreensões vigorosas contra a idolatria. O subs. ta ‘tu 'im é associado a hebel ( -> # 2039) para descrever o caráter absolutamente imprestável e enganoso dos ídolos: “Vaidade são, obra ridícula; no tempo do seu castigo virão a perecer” (Jr 10.15; 51.18). Algumas versões apresentam “objetos de zombaria” no lugar de “obra ridícula”, numa tradução do TM ma ‘asé ta ‘tu ‘im, que descreve o ídolo imprestável como “fazedor/criador de zombarias”. Essa expressão consiste num contraste direto entre os ídolos e Deus, descrito anteriormente (Jr 10.12; 51.15) como aquele que “fez a terra”. A ilusão dos ídolos e da idolatria leva o povo a rejeitar o Cria dor perfeito e eterno em troca de imagens patéticas e perecíveis feitas por mãos humanas. Esse comportamento zomba de Deus e ameaça a relação de aliança que o povo desfruta com ele. P-B A LXX usa uma forma do vb. empaizõ em Jeremias 10.15. Esse vb., juntamente com seus derivativos, forma um importante conjunto de palavras para o conceito dc zombaria na LXX. nos Pseud., na literatura apocalíptica, bem como no NT (ver TDNT 5:630-36). Inutilidade, despropósito: hbl(ser imprestável, #2038); -> slh I (tratar como sendo impres tável, # 6136); -> ryq (esvaziar, derramar para fora, tirar, # 8188); sw ‘ (maltratar, # 8735) Tm Powell 321
n is n (# 9515)
9512 (tõp, tambor [instrumento musical]), -> # 9528 9514 (tip eret, beleza, glória, jactância), -> # 6995
9515
m srt
Hisn (tappúah), maçã, macieira (# 9515).
AT O termo é mencionado mais vezes no Cântico dos cânticos (2.3, 5; 7.8 [9]; 8.5). Ape sar de terem sido sugeridas outras frutas (p. ex., pêssego, damasco), chegou-se a um consenso quanto à maçã. O damasco foi trazido mais tarde da China e não parece apropriado. O uso e contextos posteriores dessa palavra com molho, cidra, etc., também sugerem fortemente que seu significado é maçã. As maçãs eram muito apreciadas na antiguidade e diz-se que os enfer mos gostavam de seu cheiro. No Cântico dos cânticos, talvez o odor do amado faça lembrar o cheiro bom da maçã, “o aroma da tua respiração, como o das maçãs” (Ct 7.8 [9]). A perfeição das formas da maçã aparecia na ornamentação (Pv 25.11). Em Joel 1.12, a macieira foi uma das vítimas da praga de gafanhotos. Talvez a ampla aceitação dessa fruta tenha se refletido em nomes de lugares em Canaã (Js 12.17; 15.34; 16.8; 17.8). O termo também é usado como nome próprio em 1 Crônicas 2.43. Hoje em dia, a mação é um produto de exportação de Israel. Na arte e literatura relacionadas à Bíblia, a maçã era usada com freqüência em conjunto com a Árvore do Conhecimento (-^) no jardim do Éden (->). Árvores: ’ê lá I (árvore vigorosa,#461), 'erez(cedro,#780); ’õren 1(pinheiro, #815); -> 'êsel (tamargueira, # 869); -> berós (zimbro, # 1360); -> liiz I (amendoeira, # 4280); ‘áy (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); 'ar "ãr (zimbro, # 6899); -> çammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); sãqêd (amêndoa, # 9196); -> siqmâ (sicômoro [figueira], # 9204); -> t* 'assür (cipreste, # 9309); -> tãmãr 1 (tamareira, # 9469); -> tirzâ (ár vore desconhecida, # 9560); ( Árvore do Conhecimento / Vida: Teologia) Larry L. Walker 9518 (fipüsâ, dispersão), -> # 7046
Vsn (tpl 1), q. dizer tolices (# 9520); hitp. comportar-se de maneira tola; 'TOR (tãpêl 1), ser insípido (# 9522); (tiplà), mau procedimento (# 9524). 9520
OMA O radical tpl 1 pode ser associado ao ár. tafala, cuspir, subs. tufl, cuspe; et. ta fa , cuspir, subs. té/a ’, cuspe. AT 1. Foi sugerida uma ocorrência de tpl (pf. tãpaltí) no Salmo 141.5, mas esta é ques tionável (HALAT 1634). O hitp. impf. tittappãl ocorre apenas uma vez em 2 Samuel 22.27. É usado para descrever Deus fazendo chacota do perverso ao “comportar-se de modo tolo” ou “mostrar-se inflexível”. Muitos tradutores preferem o uso do termo tipattãl (hitp. ptí), tortuo so, perverso, no Salmo 18.26 [27] (Anderson, 2 Samuel, 1989, 258; cf. McCarter, II Samuel, 1984,453), enquanto outros traduzem com um sentido mais indireto, “perspicaz”, “astucioso” ou “astuto”. 322
2. Em Jó 6.6, o adj. tãpêl é usado para descrever o alimento “insípido”, ingerido “sem sal” (mibbeli-melah). Os estudiosos mostram-se divididos quanto ao sentido exato de tãpêl em Lamentações 2.14. Alguns acreditam tratar-se de tãpêl 1, absurdo, por causa de sua relação próxima com sãw ’, dissimulação. A maioria prefere o sentido de tãpêl II, caiar, como este é usado em Ezequiel 13.10-11, 14-15; 22.28 (Hillers, Lamentations, ed. rev., 1962, 11). Aqui o termo é usado para descrever as palavras enganosas dos falsos profetas, que desencaminharam 0 povo de Deus, levando-os a uma falsa segurança. 3. Em Jeremias 23.13, o subs. tiplâ é usado para descrever a “loucura”(cf. Vg.; McKane) encontrada no meio dos profetas de Samaria que profetizavam em nome de Baal. Nesse caso, tiplâ desenvolveu um significado derivado de “insipidez,” que pode ser entendido como “moral ou religiosamente ofensivo” (McKane, Jeremiah, I, 1986, 573). Esse significado se reflete em algumas traduções (LXX, Pex., Trg.; cf. Bright, Thompson). Em seu sofrimento, Jó não pecou nem atribuiu a Deus tiplâ, loucura (Dhorme) ou falta (Jó 1.22). A palavra tiplâ conota a idéia de “expressar desdém” por Deus (Habel, Job, 94; cf. Clines, Job 1-20, 1989, 40, “dirigir-se a Deus com irreverência”). A ocorrência de tiplâ em Jó 24.12 é contestada por alguns estudio sos. Vários adotam o termo, tepillâ, oração (diversas versões; Dhorme). Caso seja mantido o TM, de Jó 24.12, pode-se comparar tiplâ em termos de significado com 1.22, em que o termo é usado para descrever a idéia de Jó de que Deus não vê “falta alguma” nem coisa alguma que seja desdenhosa em um mundo no qual os necessitados são explorados continuamente por opressores implacáveis (Habel, 360). Insensatez, estultícia, loucura, despudor: -> 'ewil I (tolo, insensato, #211); AV IV (ser estúpido, # 1279); -> hll III (ficar confuso, tolo, comportar-se como louco, # 2147); -> ksl 1 (ser tolo, # 4071); -> Ihh (comportar-se como louco, # 4263); nbl II (agir com desdém, # 5571); -> skl (comportar-se com insensatez, agir como tolo, frustrar, #6118); -> pth I (ser inexperiente, ser ingênuo, enganar, persuadir, # 7331); -> sg ' (delirar, enlouquecer, # 8713); -> tpl I (falar coisas sem nexo, # 9520) Maldade, crueldade, perversidade: zmm (planejar, planear, planejar o mal, # 2372); kilay (salafrário, # 3964); -> ‘wl I (agir incorretamente, # 6401); -> $dh I (agir intencional mente, # 7399); -> r " I (ser mau, ferir, # 8317); -> rs ‘ (agir perversamente, iniquamente, ser culpado, declarar culpado, # 8399) B ib l io g r a f ia
HALAT 1634; TWOT 2:978; E. Dhorme, A Commentary on the Book ofJob, 1967; N. Habel, Job, OTL, 1985; W. McKane, Jeremiah, I, 1986, 573-74; R. Gordis, The Book o f Job, 1978. Chou-Wee Pan
ç^ 2 i
'jpn
(tãpêl II), subs. reboco de barro ou caiação (#
AT Derivada de um radical incerto, essa palavra é encontrada somente em Ezequiel 13.1011, 14-15; 22.28, sem dúvida em função de suas qualidades aliterativas com yippõl e tippõlnâ (v. 11, a escrita foi mudada intencionalmente para (pl a fim de apresentar um trocadilho?) e é sempre usada com o vb. (wh, rebocar. Ao derivar o termo de um radical que significa “não temperado” (relacionado a tpl 1 em Jó 6.6, “sem sal”, “insípido”) alguns estudiosos acreditam que se trate da argamassa de baixa qualidade que não consegue dar coesão a uma parede frágil 323
non (# 9528)
(Ez 13.10; p. ex., Calvin, 19). Greenberg (237-38) refere-se a Lamentações 2.14, em que se diz que os profetas “anunciaram visões falsas e absurdas (tãpêl)". Outros, ao observarem a se melhança de tãpêl II com (wh, rebocar (-> # 3 2 1 2 ), acreditam tratar-se de reboco ou caiação aplicado com a finalidade de dar uma boa aparência a uma parede mal construída (Craigie, 91; Taylor, 122; Eichrodt, 167-68; Wevers, 108-9). Diante de sua aparente permutabilidade com (iah (Ez 13.12), o significado preferido é reboco ou caiação espessa. Cal, giz, gesso: -> gir (giz, # 1732); -> (wh (estucar, revestir, pintar, # 3212); -> (pl (lambu zar, rebocar [com gesso], # 3260); syd (rebocar [com gesso], caiar, # 8486); -> sered (giz, # 8574); -> sayiS (alabastro, # 8800); -> tãpêl II (reboco [de barro], caiação, # 9521) B ib l io g r a f ia
TWOT 2:978; J. Calvin, Commentaries on the First Twenty Chapters o f the Book o f the Prophet Ezekiel, reimpr. 1948; Peter C. Craigie, Ezekiel, 1983; M. Greenberg, Ezekiel 1-20, AB, 1983; J. B. Taylor, Ezekiel: An Introduction and Commentary, 1969; J. W. Wevers, Ezekiel, CB, 1969; W. Zimmerli, Ezekiel 1, 1979. William C. Williams 9522 (tãpêl I, insípido),
# 9520
9524 (tiplâ, mau procedimento), -> # 9520 9525 (t?pillâ, oração),
Oração: Teologia
9526 (tiple.fet, horror, terror), -> # 7415
HDri (tpp), denom.; q. tocar tambor, bater (TM hapleg. + ISm 21.14 *wayyãtãp [LXX, Vg.]); poel, fazer com que seja batido (hapleg.) (# 9528; HALAT 1637a); subs. (tõp), tambor, tamborim (14x [emen dar TM de Ez 28.13 de tuppeykã para *petúheykã, seus engastes]; # 9512; HALAT 1630b). 9528
HDn
OMA O aramA atesta o vb. peal tpp (KAI # 224, 13; D ISO 332), porém não o subs., indican do que nesse caso, é possível que o sentido principal fosse verbal “golpear, bater”. Porém, no heb. e no fen. (R. S. Tomback, A Comparative Semitic Lexicon o f the Phoenician and Punic Languages, 1978, SBLDS 32, 344) é o subs. tõp, tambor, que parece ser o principal, de modo que o vb. é denom. O subs. também possui cognatos no ugar. tp ( WUS # 2794), no sam. (/,d/tph (estado determinado), no ár. ditff, no Pent. sam tà f e no egíp. tln; cf. o G (tympanon / typanon (vb. typtõ, bater, golpear). AT O tõp, tamborim, costumava ser tocado por mulheres ao celebrar a volta de guerreiros vitoriosos (Êx 15.20; Jz 11.34; ISm 18.6; cf. Jr 31.4 sobre a personificação de Israel como uma virgem). Isaías 30.32 descreve de modo figurativo como todos os golpes de Javé sobre os assírios seriam desferidos ao som de tõp e (pequenas) harpas. No entanto, para acompanhar a adoração cultuai e procissões, o tõp podia ser tocado por qualquer pessoa (vbs. pl. masc. impv. nos Sl 81.2 [3]; 149.3; 150.4; cf. vbs. no terceiro pl. comum em 2Sm 6.5 = ICr 13.8). O tõp também podia acompanhar músicas festivas em ocasiões de natureza não cultuai ou religiosa 324
nsn (# 9529)
(Gn 31.27; Jó 21.12 [emendar ketõp (hapleg. # 4119; H ALAT481b) para betõp (como fazem vários MSs. heb., Vg., Pex., Trg.)]; Is 5.12; 24.8). O uso musical do vb. ocorre somente no Salmo 68.25 [26] em que uma procissão so lene do templo é constituída de cantores que vão adiante, músicos com instrumentos de cor das por último e, entre eles, donzelas com adufes (tôpêpôt, part. de q.). O TM de 1 Samuel 21.13 [14] waytãw (pretérito pi. < twh, fazer com que seja marcado) e “[Davi] esgravatava (ou seja; fazia marcas?) nos postigos das portas” deve ser emendado para *wayyãtãp (pre térito q.) “e ele golpeava” (de acordo com a LXX, Vg.), o que se encaixa no contexto como algo apropriado para alguém fazer nas ( 'al) portas ao fingir loucura. O poel é usado somente em Naum 2.7 [8], que descreve as escravas de Nínive sendo levadas cativas enquanto batiam (metõpepõt) no peito. P-B O heb. pós-bíblico atesta o subs. tõp, tambor no Midr. Rabá de Gênesis §23 e em outras passagens (Jastrow, 1655a) e o polel (denom.) de tpp, juntar, golpear, bater (Jastrow 1689a). O aramJ também traz tanto o subs. luppã’, tambor (cf. Trg. Êx 15.20, Trg. SI 150.4 [pl.] e outras passagens) (Jastrow, 1655a) quanto o vb. polel (denom.) tepap I, juntar, golpear, bater (Trg. SI 68.26) (Jastrow, 1689a). Instrum entos / term os musicais: gittit (instrumento musical?, # 1787); -> hemyâ (som, estrépito, #2166); -> h!l( fazer tocara flauta, # 2727); t e r (fazer soar a trombeta, #2955); -> yôbêl (trombeta de chifre de carneiro, # 3413); kinnôr (lira, # 4036); -> mên (corda [de instrumento musical], # 4944); m ena’a n ‘lm (guizo, cascavel, chocalho, pandeiro, # 4983); -> nêbel II (instrumento sem cordas, # 5575); -> ngn (tocar a lira, # 5594); -> 'úgãb (flauta?, # 6385); -> prt (improvisar, # 7260); sll I (tinir, retinir, # 7509); sôpãr (chifre de carneiro, # 8795); sãlis II (instrumento musical, # 8956); -> sema ‘ I (som, # 9049); -> tpp (tocar, bater, # 9528); tq ‘ (impelir, empurrar, bater palmas, tocar a trombeta, empenhar, # 9546) B ib l io g r a f ia
B. Bayer, “The Finds That Could Not Be,” BARev 8/1, 1982, 24, 26, 29, 31-32; idem, The Material Relics o f Music in Ancient Palestine and Its Environs: An Archeological Inventory, 1963, Fig. 132; idem, “Music: History: Biblical Period, Second Temple Period,” EncJud 12, col. 565, Figs. Ia, 2 ae2 d ; S. B. Finesinger, “Musical Instruments in Old Testament.” HUCA 3, 1926, 63-66; D. A. Foxvog e A. D. Kilmer, “Music,” ISBE 3:444a; E. Gerson-Kiwi, “Musique (dans la Bible),” DBSup 5, 1957, col. 1435; H. Gressmann, Musik und Musikinsirumente im AT, 1903, 32; O. Keel, The Symbolism o f the Biblical World, tr. T. J. Hallet, 1985, s. v. “Music and Song,” 339a-40a, 349b, Figs. 450, 451,452,453,454 e 456; E. Kolari, Musikinsrtumente und ihre Verwendung im AT, 1947, 16-20; J. D. Prince, “Music,” EncBib 3, cols. 3226-27. C. Sachs, History o f Musical Instruments, 1940, 108-9; O. R. Sellers, “Musical Instruments of Israel,” BA 4, 1941, 35-36, Figs. 2, 7a; D. G. Stradling e K. A. Kitchen, “Music and Musical Instruments,” IBD 2:1032, 1039, 1040; G. Wallis, “Musik, Musikinstrumente,” BHH 3, col. 1258, Fig. 7; M. Wegner, Die Musikinstrumente des alten Orients, 1950,41; E. Wemer, “Mu sical Instruments,” IDB 3:47a-75a, Fig. 88. R. F. Youngblood, TW OT2:978. Robert H. O 'Connell
9529
nsn
-isn (tpr), q., pi. costurar, remendar (# 9529). 325
»'sn (# 9530)
AT Adâo e Eva costuraram folhas de figueira (Gn 3.7). Jó costurou panos de saco sobre sua pele (Jó 16.15). O pregador nos diz que há um tempo de rasgar e tempo de coser (Ec 3.7). Ezequiel empregou o part. do pi. ao condenar as mulheres “que cosem invólucros feiticeiros para todas as articulações das mãos” (Ez 13.18). Robert Alden
. Uten (tps), q. apoderar-se de, capturar, ocupar; ni. ser _______________________________ pego; pi. pegar (# 9530). OMA O significado do acad. tapãsum é incerto; pode ter o sentido de colocar algo sob guarda; o ár. bafasa significa agarrar com grande força. AT O vb. tps é encontrado 49x no q. e 15x no ni. É usado com freqüência para descrever o ato de agarrar ou manejar um objeto, como uma foice (Jr 50.16) ou um arco (Am 2.15). Jeremias repete o vb. para descrever aqueles que manejam o escudo e entesam o arco (Jr 46.9). Quan do é usado com a preposição be, o termo indica um certo vigor na ação, como quando Moisés tomou as tábuas e quebrou-as (Dt 9.17), quando o profeta Aías tomou sua capa e rasgou-a em dez pedaços (1 Rs 11.30) ou com referência ao braço forte de Faraó empunhar uma espada (Ez 30.21). Pode referir-se à força usada para agarrar uma pessoa, como os pais pegando um filho desobediente para levá-lo à justiça (Dt 21.19), ou os desesperados por um líder, tentando re crutar alguém para o cargo (Is 3.6). Ezequiel descreve como Israel tomou o Egito pela mão (Ez 29.7 Q; K traz tua mão, o que dá a impressão de ser secundário) só para descobrir depois que este desabou como um junco quebrado deslocando-lhe o ombro. A esposa de Potifar agarrou José (ac.) pelas (be) vestes quando tentou seduzi-lo (Gn 39.12); por ela estar segurando com força, José foi forçado a deixar as vestes na mão dela. Como um part. num const., o vb. é usado para indicar o manejo ou uso de um instru mento. Jubal foi o pai de todos que tocam harpa e flauta (Gn 4.21). Todos que pegam no remo descerão de suas embarcações quando os pilotos dos navios de Társis gritarem (Ez 27.29); Deus levará para o cativeiro todos aqueles de Gogue que empunharem a espada (Ez 38.4). Essa expressão se estende metaforicamente de modo a descrever todos os que saem para a batalha (Nm 31.27)). Jeremias aplica a metáfora aos sacerdotes para descrever todos aqueles que lidam com a lei (Jr 2.8). E comum o vb. ser usado com relação à guerra. Descreve aqueles que são tomados vivos durante a batalha, como o rei de Ai (Js 8.23) ou Agague, o rei dos amalequitas (1 Sm 15.8). Também descreve a captura de uma cidade para ser destruída (Dt 20.19; Js 8.8; 2Rs 14.7; etc.) ou para ser habitada (Jr 40.10; cf. 49.16, em que Edom ocupa a parte mais alta de um monte). O ni. é usado para descrever aqueles que são levados para o cativeiro (Jr 34.3; Ez 12.13; 17.20) ou aqueles que são apreendidos em sua falsa esperança e pecado (Ez 21.23, 24 [28, 29]; cf. SI 10.2, aqueles que são presos nas tramas que eles próprias urdiram). A cidade da Babilônia será capturada (Jr 50.46; 51.41), bem como os vaus que poderiam servir de rota de fuga (Jr 51.32). Um uso incomum do part. pass. de q. (tãpüs) é para descrever uma imagem coberta de ouro ou prata (Hc 2.19). Parece mais provável que a intenção seja fazer referência a um reves timento de metal sobre o ídolo e não um estojo protetor para ele (HALAT). Em várias ocasiões, tps é empregado para uma ação mental. O próprio Deus respon derá aos idólatras que forem ao profeta a fim de poder “apanhar” o coração da casa de Israel 326
n sh (# 9531)
(Ez 14.5). Provérbios adverte que tanto as riquezas quanto a pobreza são um perigo. As rique zas podem resultar na negação de Deus, mas a pobreza pode redundar em necessidade e furto, levando à profanação do nome santo do Senhor quando este é usado (tomado) (Pv 30.9; cf. THAT 2:953). O pi. é encontrado novamente no TM em Provérbios 30.28, que descreve o lagarto (geco) que pode ser apanhado com as mãos e que, no entanto, está nos palácios dos reis. O G, porém, traz o pass., tomando a ocorrência do pi. textualmente duvidosa (cf. BHS). P-B Nos Trgs., tps significa agarrar, pegar ou prender; no Talm, o aphel pode significar de positar (fazer confiscar). Apanha, captura, posse: -> 7iz I (apanhar, assentado, # 296); -> h(p (apanhar e levar embora, # 2642); -> hth (levar, buscar, # 3149); -> b \’l (apoderar-se de, apanhar, conter, # 3920); -> Ikd (prender, capturar, # 4334); -> Ipt (pegar, agarrar, segurar na mão, virar, # 4369); msk (apanhar, arrastar, atrasar, # 5432); -> qm( (apanhar, # 7855); -> tmk (pegar, agarrar, # 9461); tps (capturar, ocupar, # 9530) A. H. Konkel
9531
n sh
n s h (tõpet), subs. cuspe (# 9531).
OMA Ár. taffa, cuspe; amárico tafa, cuspe. AT O subs. é onomatopéico. Aparece somente em Jó 17.6. Cuspir em alguém é um sinal de desprezo. Uma transliteração possível é o homônimo tofete, o lugar fora de Jerusalém onde acredita-se que foi praticado o sacrifício de crianças (2Rs 23.10; Jr 19). Caso tal relação este ja correta, trata-se de um contexto teológico de contaminação e não simplesmente de abomi nação. Ver Números 12.14 em que, num caso hipotético, fica claro que cospe-se “no” rosto, bepãneyhã. No exemplo dado, o ato de cuspir é seguido de exclusão do arraial por sete dias a fim do transgressor ser envergonhado (cf. Lv 15.8). Também é possível que esteja presente a idéia de contaminação. Em Jó 17.6, porém, a expressão é “em cujo rosto”, lepãnim. Cuspe, saliva: -> yrq I (cuspe, vômito, # 3762a); -> rir (cuspe, suco, muco, # 8202); -> rqq (cuspir em, cuspir, # 8394); tõpet I (cuspe, # 9531) B ib l io g r a f ia
R. Alden, Job, 1993, 190; M. Pope, Job, 1965, 129. fVilma Ann Bailey 9536 (tiqwâ, esperança, paciência, expectativa), -> # 7747 9538 (fiqümâ, poder para enfrentar inimigos),
9543
nsipip
# 7756
HDlpn (tPqüpã), subs. ponto crítico, ciclo, percurso (# 9543); < (nqp II), fazer uma volta ( -> # 5938). 327
1i?n (# 9545)
OMA O subs. tequpâ possui um cognato ugar. nqtp (cf. heb. nqp II, v. rodear, entrar num circulo; daí, a virada do ano). Ver HALAT 1641 -42 para um resumo dos pontos de vista aca dêmicos. AT O termo teqi4pâ é associado ao movimento dos corpos celeste e, portanto, ao registro do calendário. O percurso do sol contribui para louvar a Deus na criação (SI 19.6 [7]). Êxodo 34.22; 1 Samuel 1.20 e 2 Crônicas 24.23 referem-se a um solstício ou mudança de estações (anos). A observância dos festivais é relacionada aos pontos críticos do ano (Êx 34.22). P-B Vê-se um tom escatológico em 1 QS 10:1, 2, 3, 6 bem como em 1 QH 12:5, 6, 8, que dão a impressão de falar de períodos ordenados de tempo (teqüpâ) caracterizados por “luz” (retidão) e “trevas” (perversidade). A nuança específica de qúpâ, ou seja, a virada de um ano para outro, fica evidente nessas passagens que falam de um período minguante e outro cres cente. O uso rabínico diz respeito ao calendário anual, ou seja, aos solstícios e equinócios. Estações: -> hrp I (passar o inverno, # 3069); -> qayis (verão, frutos de verão, #7811); -> qúpâ (ponto crítico, mudança das estações, # 9543) J. A. Thompson / Peter Enns 9544 (taqqip, forte),
# 9548
|i?n (tqn), q. endireitar; pi. colocar em ordem (#
OMA Tanto o ugar. (tqn é usado no NP Deus da Ordem) quanto o aca (taqãnu, ser ordenado/ garantido) têm o valor semântico de “ordem.” Cf. também o sir. teqên, estar em boa ordem, pael — organizar. O ár. atqana temo sentido de tomar completo. Não se sabe ao certo a origem do vb. heb. tqn. De acordo com o KLB1, HALATe Delcor (THAT2:1043), tqn exerce a função de par. de tkn. O KLB1 menciona que tqn e tkn desenvol veram-se a partir do vb. aram. tqn. Cf. também Delcor. Apesar de o HALAT ainda ser da opinião de que esse desenvolvimento pode ter ocorrido, esse léxico afirma agora que a ocorrência do radical tqn no acad. e no ár. toma essa teoria questionável. AT Esse vb. ocorre somente no livro de Eclesiastes (1.15; 7.13; 12.9). O HALAT sugere que litqõn (inf. de q.) em 1.15 deve ser conjecturado como lehittãqên (inf. do ni.). Em 1.15 e 7.13, tqn é usado em contraste com ‘wt (torto, torcido). O BHS observa que tiqqên em 12.9 provavelmente é um acréscimo ao texto original. No entanto, o HALAT sugere (como Zimmerli, ATD 16/1, 1980, 244) que deve ser emendado para tiqqên. O significado, “colocar em ordem (mesãUm)” pode encontrar-se indicado em 12.9. Cf. o uso. par. deysr, ser reto ( # 3837; de acordo com HALAT 1:791). Nivelamento, retidão: sr I (andarem linha reta, #886); ->ysr (ser nivelado, plano, direito, # 3837); nãkõah (caminho reto, conduta correta, justiça, verdade, # 5791); -> pis I (livrar o caminho, fazer um caminho, #7142); -> swh I (ser / tomar-se semelhante, nivelar, # 8750); tqn (endireitar, colocar em ordem, # 9545) 328
ypn (# 9546)
B ib l io g r a f ia
THAT 2:1043-45 Louis Jonker
ypn (tq ‘ ), q. impelir, empurrar, bater palmas, tocar (trombeta); ni. dar fiança de algo, comprometer-se (# 9546); D, V|7Ín (tôqe 'im), o bater de palmas (# 9364); i?j?n (íêqa '), toque de instrumento de so pro ( - » # 9547). 9546
»i?n
OMA A origem da palavra dá a impressão de ser onomatopéica, ou seja, formado pela imita ção do som que ela descreve (Blau, 344). Nas línguas cognatas, refere-se a tocar uma trombeta, O ugar. tq ‘ em tq 't (KTU 24:49) diz respeito a um nome divino, ou seja, uma das deusas Ktrt (van Selms, 743-44), que, de acordo com a mitologia, são associadas ao bater de palmas. AT O termo tq ‘ é atestado 71 x no AT, sendo que destas, 68x encontram-se no q. e somente 3x no ni. Apesar de o verbo ser encontrado com conotações aparentemente distintas, os dife rentes significados podem ser relacionados por meio de seu caráter alusivo. 1. tq ' serve para descrever um movimento linear forçado, p. ex., bater em um objeto ou empurrar um objeto para dentro de algo. Em Gênesis 31.25, descreve o ato de armar a tenda de Jacó (cf. Jr 6.3), sendo que o som do martelo cravando as estacas no solo foi o que moti vou a escolha do vb. Cf. também Isaías 22.23,25, em que a imagística de fincar uma estaca na parede é aplicada de modo figurativo ao rei, denotando que seu cargo era garantido por Deus. No contexto de guerra, tq ' é usado para o ato de fazer penetrar uma arma de ataque no corpo do inimigo (Jz 3.21; 4.21; 2Sm 18.14). Essa conotação de t q 'é encontrada principalmente no Pent. e nos escritos históricos. 2. Na literatura poética, tq' é empregado sobretudo para denotar o som de palmas ba tendo, uma ação que pode, no entanto, ter várias intenções. O salmista incentiva o povo a bater palmas como expressão de alegria (SI 47.1 [2]). A mesma ação num contexto diferente, pode adquirir uma nuança derrisória, ou seja, como expressão de alegria pela queda da Assíria (Na 3.19). Além disso, o bater de palmas significa uma ação legal de comprometer-se com a outra parte de um acordo, como é ilustrado em Jó 17.3 (a segunda parte do v. pode ser mais bem traduzida como “quem mais haverá que possa fazer um tratado comigo batendo na palma de minha mão?” ). Cf. também Provérbios 6.1 e 17.18.0 part. pl. de tôqe ‘im pode ser encontrado somente em Provérbios 11.15 (em escrita defeituosa) e em Provérbios 22.26 (em maiúsculas e também em escrita defeituosa), em que também denota o ato legal de comprometer-se com outra pessoa ao bater palmas, ainda que nesse caso, trate-se de um contexto negativo. 3. No entanto, a maioria das ocorrências de tq ' no AT denotam o som do toque da trom beta. Uma relação semelhante entre um vb. denotando um movimento linear e o ato de tocar um instrumento de sopro pode ser observado em hll, q. furar, pi. poluir, profanar, tocar a flauta ( - ¥ # 2727; cf. também hâlil, flauta). Num contexto cultuai, as trombetas de prata confeccio nadas por Moisés (uma passagem de Josefo [Ant 3 §291] mostra que, de fato haçõserõt eram trombetas [-> # 2956]) soavam para reunir o povo de Israel, a saber, para sinalizar que era hora de levantar acampamento e partir. Usavam-se vários sinais para indicar a respectiva ação (Nm 10.1-10) e o toque da trombeta era associado ao favor de Deus (ABD 4:936). Essa idéia também toma-se aparente no toque da trombeta para a guerra, esp. durante a batalha de Jericó em Josué 6. Nesse caso, o toque das trombetas em combinação com os gritos do povo serve como arma 329
ypn (# 9547)
no ataque surpresa no sétimo dia e encontra-se diretamente ligado à queda das muralhas da cidade (Js 6.20). O toque das trombetas tem um efeito semelhante em Juizes 7.18-22, criando um pânico induzido por Deus entre os inimigos e a conotação cultuai das trombetas transforma a batalha de Gideão contra os midianitas numa guerra de caráter divino (Kang, 177). Assim, o toque das trombetas mostra a relação próxima existente entre as várias esferas da vida (p. ex., a adoração e a guerra) no AT sem fazer distinção entre o religioso e o secular. Esse tipo de uso recebe um significado escatológico na literatura profética, em que o toque das trombetas encontra-se intimamente ligado ao dia do Senhor (J1 2.1; Zc 9.14). P-B As mesmas conotações do AT são encontradas na literatura doTrg. (Jastrow, 2:1693). O vb. é atestado nos escritos de Qumran, referindo-se ao toque cultuai do chofar (4QCata 1:13). Heródoto usa o equivalente G tq ' ao descrever o som de clangor de um escudo de metal durante o combate (NIDNTT 3:112). E m purrão, escorjamento, impulsão: -> dhh (empurrar, derrubar, ser humilhado, # 1890); -> dpq (empurrar, impulsionar com força, bater, # 1985); -> hdp (empurrar, impelir, # 2074); -> yrt (dar um empurrão, empurrar, ser temerário, # 3740); -> ngh (escomar, empurrar, impelir, # 5590); 7/ II (enfiar, # 6619); -> tq ‘(impulsionar, impelir, bater palmas, comprometer-se, # 9546) Instrumentos/termos musicais: -> gittit (instrumento musical?, # 1787); -> hemyâ (som, estrépito, #2166); -> hll (fazer tocar a flauta, # 2727); -> hçsr (fazer soar a trombeta, # 2955); -> yôbêl (trombeta de chifre de carneiro, # 3413); -> kinnôr (lira, # 4036); -> mên (corda [de instrumento musical], # 4944); -> men a 'a n ‘im (guizo, cascavel, chocalho, pandeiro, # 4983); -> nêbel II (instrumento sem cordas, # 5575); -> ngn (tocar a lira, # 5594); -> ‘ügãb (flauta?, # 6385); -> pr( (improvisar, #7260); -> $ //1(tinir, retinir, # 7509); -> sôpãr (chifre de carneiro, # 8795); -> sãlis II (instrumento musical, # 8956); -> setna' I (som, # 9049); -> tpp (tocar, bater, # 9528); -> tq ‘ (impelir, empurrar, bater palmas, tocar a trombeta, empenhar, # 9546) B ib l io g r a f ia
ABD 4:934-39; NIDNTT 3:112; TW O T2:979; J. Blau, “Etymologische Untersuchungen aufgrund des palaestinischen Arabisch,” VT 5, 1955,337-44; M. Jastrow, A Dictionary o f the Targumim, the Talmud Babli and Yerushalmi, and the Midrashic Literature, 1903; S.-M. Kang, Divine War in the Old Testament and in the Ancient Near East, BZAW 177, 1989, 174-77; H. Seidel, Musik in Altisrael, Beitrãge zur Erforschung des Alten Testaments und dse Antiken Judentums, 1989; A. van Selms, “The Root k-t-r and its Derivatives in Ugaritic Literature,” UF 11, 1979, 739-44. Martin G. Klingbeil
9547
ypn
Spri (têqa‘), toque, clangor (p. ex. de um chifre de carneiro/trombeta) (hapleg.; # 9547; HALAT 1644a); < S?pn
(tq ■), tocar (-> # 9 5 4 6 ) AT O Salmo 150.3, halelúhú betêga‘ sôpãr, “louvai-o com o toque de um chifre de car neiro,” (tr. do autor), apresenta o único exemplo no AT do uso da forma substantivai do vb. tq ‘ (dar um) toque, clangor (num chifre/trombeta), bater (palmas) e pode deixar implícito o toque de um chifre de cameiro ou de uma trombeta mesmo quando o instrumento não é especificado (Ez 7.14). 330
Hi?n (# 9548)
P-B Uma inscrição heb. pós-bíblica numa pedra que caiu do canto sudoeste do segundo tem plo de Jerusalém diz, Ibyt htqy 'h Ihq “para o lugar de toque, para a observância (costumeira),” supostamente referindo-se ao local onde o sacerdote tocava o chifre de carneiro ou trombeta para indicar o começo ou o final do sábado e outras ocasiões religiosas. Instrumentos/term os musicais: gitíit (instrumento musical?, # 1787); hemyâ (som, estrépito, # 2166); hll (fazer tocar a flauta, # 2727); hssr (fazer soar a trombeta, # 2955); -> >'óòé/ (trombeta de chifre de carneiro, # 3413); -> kinnôr (lira, # 4036); -> mêw (corda [de instrumento musical], # 4944); -> men a 'a n ‘im (guizo, cascavel, chocalho, pandeiro, # 4983); nêbel II (instrumento sem cordas, # 5575); -> (tocar a lira, # 5594); -> 'ügãb (flauta?, # 6385); -> (improvisar, # 7260); -> .>7/1(tinir retinir, # 7509); -> iô p ãr (chifre de carneiro, # 8795); sã/zí II (instrumento musical, # 8956); -> sema ‘ I (som, # 9049); tpp (tocar, bater, # 9528); -> tq ‘ (impelir, empurrar, bater palmas, tocar a trombeta, em penhar, # 9546) B ib l io g r a f ia
B. Bayer, “Music: History: Biblical Period, Second Temple Period,” EncJud 12, cols. 573-74, Fig. 3c; G. Friedrich, TDNT7:7&, 81; E. Wemer, “Musical Instruments,” IDB 3:474a; R. F. Youngblood, TW OT2:979b. Robert H. O ’Connell
1)711 (tqp), dominar, prevalecer (# 9548); TjJri (taqqip), adj. forte (hapleg.; # 9544); (tõqep), subs. poder, força, autoridade (# 9549); 'pjpÇI (taqqip), adj. forte (# 10768); T p n (fiqip) vb. forte (# 10772); ^pn (fiqõp), subs. força (# 10773). 9548
npn
OMAO radical ocorre no aram. como um vb., subs (Pqõp) e adj. (taqqip), guardar, enquanto no ár. taqafa ocorre com o significado de alcançar/atingir/conseguir/obter com empenho/es forço/luta. O vb. tq f alcançar/atingir/obter/granjear/conseguir é encontrado no AAS. AT O vb., que é usado em passagens mais recente, ocorre 3x. Numa elegia magnífica la mentando a condição humana (Jó 14.1-22), Deus é descrito prevalecendo sobre os mortais (titqepêhú, “tu prevaleces... contra ele”) de uma vez por todas ou completamente (lãnesah; ver esp. Thomas, 107) (v. 20; Harley, 239, entende lãnesah como “poderosamente”). Alguns estu diosos (p. ex., Dhorme, 205; Blommerde, 72) seguem a Vg. ao ligar lãnesah com wayyahalõk “e para sempre ele [o homem] passa,” em vez de titqepêhú, mas não se trata de uma opção recomendável (Clines, 1989,285). Qualquer que seja, porém, a versão preferida, o significado é claro. Ao longo de sua vida fugaz tão repleta de aflição, tristeza, dor e perplexidade, os ho mens atraem constantemente sobre si o desprazer do antagonista divino, que acaba com suas frágeis esperanças e aspirações e então joga o seu trunfo, a morte (Heavenor, 430). Imperioso e destruidor, (cf. Jó 12.13-24), Deus é implacavelmente hostil para com os homens desde o mo mento de sua concepção (cf. Jó 10.8-14) e a morte — invocada pelo poder fatal de Deus — é apenas o último golpe contra eles (Clines, 1989, 335-36). Não há homem que possua recursos para resistir ao ataque furioso de Deus (Hartley, 240). Em seu segundo discurso (Jó 15.1-35), Elifaz assevera com toda confiança que o ho mem perverso é atacado pela reunião de forças do destino com as circunstâncias e a insegurança mental (vv. 17-35) (Watts, 73). Aquele que se revolta contra Deus é perpetuamente atormenta331
npn (# 9548)
do pela aflição e a angústia (seus próprios medos e ansiedades) que prevalecem contra ele ou que o sobrepujam (Pope, 113) (tiíqepêhú, v. 24). A angústia mental (“terrores da consciência e pressentimentos do mal” [A. B. Davidson, 134]) aflige o perverso ao longo de toda a sua vida e, por fim, o leva à morte (Clines, 1989, 358). Uma das quatro (ou três?) ilustrações que o pregador usa para mostrar que a companhia de outros é a única coisa que ameniza a miséria da existência humana (Ec 4.9-12) diz respei to a um assaltante que pode prevalecer sobre (yitqepô), subjugar ou dominar (Plumptre, 142; Whybray, 87; Delitzch, 277-78 prefere a tradução “assaltar com violência”; cf. Gordis, 150,232 que entende o termo como “atacar”) uma vítima solitária, mas que é repelido por duas pessoas (v. 12). A cooperação com outros supre calor, conforto, segurança e proteção (Rankin, 55; cf. Kidner, 50 [lucro, resiliência, conforto e força]). 2. O adj. heb taqqip ocorre uma vez (cf. Crenshaw, 131; Whybray, 110) 'im setaqqip [Q] mimmemm, com alguém mais forte que ele. De acordo com a argumentação do pregador (Ec 6.10), os homens não podem transformar sua natureza e seu destino imutavelmente deter minados nem contender (lit. pleitear [usado para a disputa de uma causa judicial]) com aquele que possui força superior (numa provável referência a Deus [Jones, 314-5; Gordis, 253; Hendry, 574; Kidner, 62; R. Davidson, 43; Whybray, 110; Wright, 493] e não à morte [Plumptre, 158; Martin, 251]). E mais apropriado considerar-se Q (setaqqip, que é forte [ou seja, entendendo taqqip como um adj. predicativo]) do que K sehtaqqip (que poderia ser tanto um adj. com o art. definido como a forma hi. do vb.). Seria inútil os homens insignificantes tentarem contender com o Deus Todo-Poderoso (Whybray, 110). 3. O subs. tõqep ocorre 3x. Depois que Mordecai, em seu cargo de vizir, publicou uma carta convocando todos os judeus que viviam nas províncias do rei Xerxes a comemorar a fes ta de Purim anualmente no décimo quarto e décimo quinto dia do mês de adar (Et 9.20-28), a rainha Ester confirmou essas providências fornecendo-lhe “toda autoridade” (wattiktõb ... ’et-kol-tõqep, v. 29, lit., e ela escreveu com plena autoridade). Ao acrescentar sua autoridade escrita à carta do grão-vizir, Ester tomou obrigatória a observância da festa (Patton, 300; Cli nes, 1984, 329-30). Aqueles leitores do Livro de Ester que se interessam em saber sobre os atos de poder e valor do rei Xerxes (yfikol-ma 'asêh toqpô üg^bürãtõ) são encaminhados aos anais dos reis da Média e da Pérsia (Et 10.2; a expressão usada nessa passagem lembra muito e, provavelmente é uma imitação das palavras que aparecem com freqüência nos livros de Reis [p. ex., lRs 11.41; 14.19, 29; 15.7,23, 31; 2Rs 1.18] e Crônicas [p. ex., ICr 29.29-30; 2Cr 25.26; 28.26; 32.32] para fazer referência a fontes contendo informações sobre os governantes reais). Ao interpretar para Daniel a visão da história se desdobrando, o anjo refere-se a alguém (quase certamente Antíoco 111o Grande [223-187 a. C.]) que avançará com a força de seu reino inteiro (betõqep kol-malekütô, Dn 11.17 [para o significado mais provável do texto heb. ambí guo, ver Bevan, 183; Collis, 365]) e trará um acordo de paz (para o Egito [v. 17b é entendido de modo geral como uma referência ao casamento que ocorre em Rafia em 193, entre Cleópatra, filha de Antíoco 111 e Ptolomeu V Epifãnio]). 4 .0 uso do radical no aramB reflete o sentido subjacente de força. O vb. fiqip (5x) ocor re em contextos que se referem a coisas que se tomaram fortes/foram fortalecidas, quer seja a árvore da visão de Nabucodonosor que simbolizava o próprio rei (Dn 4.11,20,22 [8, 17,19]), a arrogância confirmada de Nabucodonosor (ou seja, seu coração endurecido pela soberba [Dn 5.20]) ou a necessidade do monarca persa de executar seu decreto (Dn 6.7 [8]). O subs. t?qõp refere-se ao poder do reino de Nabucodonosor (Dn 2.37; cf. teqap [4.3 [27], bitqap hisni, com meu grandioso poder]). O adj. taqqip é usado para se referir ao quarto 332
V n (# 9548)
reino de Daniel (2.40,42; 7.7), bem como ao testemunho de Nabucodonosor acerca do poder do Deus de Daniel (4.3 [3.33]). P-B O vb. tqp ocorre no heb. com o sentido de agarrar, dominar; apoiar-se pesadamente em, ser duro. No aram., o vb. teqap, fiqêp, significa agarrar, segurar firmemente; ser forte, tomar-se poderoso; ser pesado, apoiar-se pesadamente em, ser duro; ser veemente, ardente, empolgado; esquentar, fermentar, azedar; pa. fortalecer, tomar forte, pesado; endurecer; agarrar, apoderarse de, fazer agarrar; (termo escolástico) [tomar, deter] levantar um objeção; itpa., itpe., e ittof. fortalecer-se, ser forte; fazer um esforço; ser endurecido; azedar. As formas substantivais heb. tôqep e tõqep significam força, poder e o subs. aram. 1úqepã ’ significa força, poder; onipotên cia, Todo-Poderoso; fortaleza; rigidez, ira. O adj. heb. taqqip é encontrado com o significado de forte, poderoso e as formas aram. equivalentes taqqip, taqqipã’ ocorrem com o sentido de forte, poderoso; protetor; duro, austero, severo (Jastrow, 2:1655-56, 1690, 1693-94). Poder, força: -> 'ãbir (forte, poderoso, #5 1 ); -> ’ôn I (poder generativo, força, # 226); -> 'ayil I (homem de poder, # 380); -> el IV (força, poder, # 445); -> Vn.y (ser forte, fortalecer, ser superior a, # 599); -> ’ãpiq II (forte, # 693) 'ss (tomar coragem, # 899); -> gbr (realizar, sobressair-se, avolumar-se, elevar-se, ser forte, # 1504); -> dõbe' (força, # 1801); -> zimrâ II (força, # 2380); -> hzq (ser forte, dominar, sustentar, agarrar, # 2616); -> hayil (capacidade, poder, propriedade, # 2657); -> hãsõn (forte, # 2891); -> ykl (ser capaz, suportar, ser vitorioso, conquistar, # 3523); ysr II (fortalecer, # 3580); -> kabbir (forte, # 3888); kõah I (força, poder, posse, recursos, # 3946); -> kellah 1(maturidade, pleno vigor, # 3995); me oc/(poder, força, # 4394); -> ma 'amãy (esforço, #4410); -> nig (apossar-se de, ser capaz de, ter recursos para. aparecer, # 5952); -> zz (ser forte, desafiar, mostrar-se desavergonhado, # 6451); -> I (ser forte, vasto, numeroso, tomar forte, # 6793); -> tqp (dominar, # 9548) B ib l io g r a f ia
A. A. Bevan, /I Short Commentary on the Book o f Danielfo r the Use o f Students, 1892; A. C. M. Blommerde, Northwest Semitic Grammar and Job, 1969; D. J. A. Clines, Ezra, Nehemiah. Esther, NCBC, 1984; idem, Job 1-20, WBC, 1989; J. J. Collins, Daniel, Hermeneia, 1993; J. L. Crenshaw, Ecclesiastes: A Commentary, OTL, 1987; A. B. Davidson, The Book ofJob With Notes, Introduction and Appendix, CBSC, 1962; R. Davidson, Ecclesiastes and the Song o f Solomon, DSB, 1986; F. Delitzsch, Commentary on the Song o f Songs and Ecclesiastes, K.D, 1877; E. Dhorme, A Commentary on the Book ofJob, 1967; R. Gordis, Koheleth — The Man and His World, 1955; J. E. Hartley, “Ecclesiastes,” in NBC, 1972, 570-78; E. Jones, Proverbs and Ecclesiastes: Introduction and Commentary, Torch, 1961; D. Kidner, A Time to Mourn and a Time to Dance: Ecclesiastes and the Way o f the World, The Bible Speaks Today, 1981; G. C. Martin, Proverbs, Ecclesiastes and Song o f Songs, CB, 1908; L. B. Paton, A Criticai andExegetical Commentary on the Book os Esther, ICC, 1951; E. H. Plumptre, Ecclesiastes: or, The Preacher, With Notes and Introduction, CBSC, 1898; M. H. Pope, Job: Introduction, Translation, and Notes, AB, 3a ed., 1979; O. S. Rankin, “The Book o f Ecclesiastes: Introduction and Exegesis,” in IB, 1956, 5:1-88; D. W. Thomas, “The Use o f ne$ah as a Superlative in Hebrew,” JSS 1, 1956, 106-9; J. D. W. Watts (com J. J. Owens e M. E. Tate), “Job,” in BBC, 1972,4:22-151; R. N. Whybray, Ecclesiastes, NCBC, 1989; A. G. Wright, “Ecclesiastes (Qoheleth),” in NJBC, 1990, 489-95. Robin Wakely 333
rva-in (# 9551)
9549 (tõqep, poder, força, autoridade), -> # 9548
9551
rv a^n
m a iri (tarbüt), prole, linhagem (# 9551); < HDT (rbh, prole, -> # 8049).
AT O subs. é um hapleg. em Números 32.14, “raça de homens pecadores”, um termo pe jorativo usado para as tribos além do Jordão que se recusavam a cooperar. Descendência, prole, semente: dôr II (geração, # 1887); -> z r ' (semear, espalhar sementes, formar sementes, # 2445); -> yld (dar à luz, gerar, ser nascido, # 3528); -> n/n (prole, # 5769); nefa?d (progênie, # 5781); (descendente, # 6830); -> !>e’e$ã'im (prole, # 7368); ribbêa' (membro da quarta geração, # 8067); -> i/Y/ãs (membro da sexta geração, # 9000); tarbüt (linhagem, # 9551) BIBLIOGRAFIA
J. Milgrom, Numbers, 1990, 329. Vietar P. Hamilton 9552 (tarbit, juros, acréscimo), -> # 8049 9554 (tardêmâ, sono profundo),
9556
nçnp
# 8101
n ç n r i (jPrümá), subs. tributo, contribuição (# 9556); n*Dl“1R (firüm iyyâ), subs. tributo, contribuição (#
9557).
OMA 1. A primeira vista, a etimologia de tPrümâ parece clara. Tudo indica que vem do radical rwm, provavelmente do grau hi., elevar, levantar. Assim, ao longo da história o termo tem sido traduzido como oferta elevada (cf. erguer, levantar). Na verdade, há diversos argumentos em favor dessa tradução, mesmo que o sentido “oferta elevada” não se encaixe em sua derivação de rwm, conforme é usada nos textos rituais (ver HALAT 1645-46 e AT seção 1). No entanto, nos últimos anos foi proposta uma outra derivação. No acad. existe um vb. râmu III, dar, e no acad. periférico há um subs. tarimtu, presente (ver AHw, 952b; Anderson, 1992,137-44; Milgrom, 1991,475). De acordo com essa idéia, o radical acad. em questão e seus derivativos são supostamente de origem amorita sem. ocidental e servem de base tanto para o subs. firüm â quanto para as formas de uso do vb. hi. no heb. quando o significado parece ser de apresentar, oferecer algo dentro de contextos rituais Esse radical subjacente proposto poderia, em última análise, ser relacionado ao heb. rhm, demonstrar misericórdia, bondade (# 8163). 2. A questão da etimologia (ver acima) ainda não está resolvida, mas há ocorrênci interessantes de trmmt com o significado de contribuição (oferta) nos contextos rituais ugar. (ver HALAT 1645; Tarragon, 103). Um exemplo aparece no hino final ao deus sol (Sapás), próximo à conclusão da epopéia ugar. de Baal, quando o menestrel insta Sapás a participar da refeição de ofertas que lhe foram apresentadas, sendo que uma delas é Ihm , trmmt, o pão da contribuição (CML 81, linha 43). E interessante que, nesse caso, o próprio Deus consome a firüm â e não o(s) sacerdote(s), como no AT. 334
n a n n (# 9556)
AT 1 . 0 termo firím â ocorre 76x no AT, mas rümiyyâ aparece apenas lx, este último, no contexto de t?rümâ, referindo-se a porções de terras concedidas aos sacerdotes zadoquitas fiéis imediatamente ao redor do templo de Ezequiel: “Será região (/*rümiyâ) especial (para os zadoqueus) dentro da região sagrada, lugar santíssimo, fazendo limites com a porção dos le vitas” (Ez 48.12). Em outras passagens, o termo terúmâ refere-se a ofertas santas, porém não santíssimas (contrastar Lv 10.12-13 com 10.14-15; cf. Nm 18.8-19, esp. w . 8 e 19, com 18.910). Ao que parece, em Ezequiel 48.12, terümiyyâ tem o efeito de transformar a terra santa firüm à em terra santíssima. Do ponto de vista das ofertas levíticas, há duas partes principais da oferta pacífica de um animal que eram entregues aos sacerdotes: o peito era entregue como uma “oferta movida” para todos os sacerdotes ( -> finúpâ [# 9485] sob rtwp I [# 5677] e esp. LV 7.29-31,34) e a coxa direita era entregue como contribuição para o sacerdote específico que havia oficiado aquele determinado sacrifício pacífico (^rüm â; observar esp. Lv 7.32-33, o termo ocorre um total de 76x no AT). Como foi mencionado anteriormente, é comum acreditar-se que esse último termo é derivado do vb. heb. levantar, e por esse motivo, em algumas versões essa oferta é chamada de “oferta elevada”. No entanto, no contexto ritual esse vb. na verdade significa remover algo a fim de apresentar ao Senhor (ou seja, separar como uma contribuição especial; ver Lv 22.15, “[os sacerdotes] não profanarão as coisas sagradas que os filhos de Israel oferecem [yãrímü] ao Senhor”; cf. Lv 4.8-10, 31, 35; esp. Nm 15.19-21, especificamente com relação à oferta de contribuição; ver Milgrom, 1991,461 e 473-475). núpá e firum ã eram, portanto, as prebendas habituais para os sacerdotes, tiradas das ofertas sacrificiais pacíficas (Lv 7.34). Podiam ser comidas em qualquer local limpo (Lv 10.14; ou seja, eram santas, não santíssimas; contrastar com a prebenda da oferta de manjares nos vv. 12-13). Assim, não apenas os próprios sacerdotes, mas também todos aqueles que faziam parte de sua casa e encontravam-se puros podiam comer essas partes das ofertas pacíficas (Lv 22.10-16). É evidente que o consumo dessas porções por uma pessoa comum seria uma profa nação das coisas santas do Senhor. 2. A palavra “contribuição” também é usada para todo tipo de oferta sagrada entregue aos sacerdotes (Nm 5.9; 15.19-21; 18.8, 19; Dt 12.6,11, 17; 2Cr 31.10, 12,14; Ne 12.44; 13.5; Ez 20.40), inclusive todas as ofertas de manjares que acompanhavam as ofertas pacíficas de ações de graças (Lv 7.14); as ofertas movidas (Nm 18.11-19; p. ex., as primícias de azeite fresco, vinho e cereais; o primogênito de todos os animais, etc., todas descritas em detalhes na Mix., ver P-B, seção 4); o dízimo para os levitas (Nm 18.24; Ne 10.37) e para os sacerdotes (Nm 18.26-29; Nel0.39); a porção de despojos dada aos sacerdotes (Nm 31.29,41,52); a me tade de um siclo para a manutenção do serviço do tabemáculo (Ex. 30.13-15); a terra para o templo, sacerdotes e levitas em Ezequiel (Ez 45.1, 6-7; 48.8-21) e as partes dadas ao príncipe para suprir o culto regular no templo de Ezequiel (Ez 45.13-17). Para uma discussão completa da relação entre nüpâ e firüm â, ver nwp 1 (# 5677). 3. A relação próxima entre os dízimos e ofertas firúm â fica evidente em Números 18.24, “Porque os dízimos dos filhos de Israel, que apresentam ao Senhor em oferta (terúmâ), dei-os por herança aos levitas; porquanto eu lhes disse: No meio dos filhos de Israel, nenhuma herança tereis.” A relação entre os dois é explicada em todos os seus detalhes na Mix. (ver abaixo). 4. É provável que a expressão sedê terümot em 2 Samuel 1.21 signifique campos eleva dos. Refere-se aos campos do monte Gilboa, onde Saul e Jônatas morreram (Fokkelman). P-B 1. O Manuscrito do Templo de Qumran relata as regulamentações para as ofertas mo vidas e elevadas (11 QT 20:14-21:5; 22:8-14; ver Yadin 2:90-93 e 100-101) e explica t?mipâ e 335
n a n p (# 9556)
teriimâ e outras regulamentações subjacentes em Deuteronômio 18.1-8 em certo detalhe que vai além das descrições na BH (11 QT 50:1-10; Yadin 1:163-68 e 2:271-73). Desenvolve es pecificamente rúmá em sua aplicação a Deuteronômio 18.5 a fim de conter provisões para todos os levitas e não apenas para os sacerdotes de Arão e suas famílias (Yadin 1:159-68). De acordo com Milgrom, isso envolve a parte superior (ou seja, o quarto dianteiro) dos sacrifícios pacíficos, sendo que a parte inferior (ou seja a coxa) pertencia somente aos sacerdotes e suas famílias (cf. Lv 7.32-34 e os comentários em Milgrom, “The Shoulder for the Levites”). 2. Os Preceitos da Guerra de Qumran referem-se a um estandarte militar da tribo levítica de Merari no qual está escrito “A Oferta Votiva de Deus” (trw m t’l; 1QM 4:1, Vermes, 108). O hino de adoração no encerramento do Manual de Disciplina de Qumran faz referência pelo menos duas vezes à rúmá dos lábios: “no dia santo, determinado para memorial, em suas estações eu os abençoarei com ofertas (firúm á) dos lábios” ( IQS 10:6; Vermes, 76) e “Eu os abençoarei com ofertas daquilo que procede de meus lábios” (IQS 10:14; Vermes, 77). 3. A LXX usa dois termos principais para traduzir firúmâ. a. aparchê, primeiros filho tes, primícias (39x) e b. aphairema, aquilo que é tirado como parte seleta (28x). O primeiro termo ocorre no NT, mas o segundo não (ver NT, seção 2). 4. A Mix. possui um tratado inteiro dedica a Terumote e, ao todo, o termo é usado mais de 600x na Mix. (ver Danby, 52-66 e seus comentários no Apêndice 1, 797, # 48). Os pontos prin cipais são: a. a quantia de produtos da terra de uma pessoa que deve ser oferecida ao sacerdote nessa categoria (ou seja, um sessenta avos a um quarenta avos; Danby, 52 n. 2); b. a santidade das ofertas, o que significa que nenhuma pessoa comum podia comer dessas porções e c. a re lação entre o dízimo e firúmá, no sentido de que os dízimos iam para os levitas e o dízimo do dízimo dos levitas entregue aos sacerdotes era o “/^rúmá do Senhor” (Nm 18.26). Este último é ainda mais interessante, considerando que o Manuscrito do Templo de Qumran estende partes do firúmâ para além dos sacerdotes, de modo a incluir os levitas (ver P-B seção 1).
NT 1. Passagens do Manual de Disciplina de Qumran citadas em P-B 2 acima podem, de fato, apresentar pelo menos um contexto literário e metafórico inerente a passagens como Hebreus 13.15, “Por meio de Jesus, pois, ofereçamos a Deus, sempre, sacrifício de louvor, que é o fruto de lábios que confessam o seu nome”. 2. A palavra G aparchê, primeiros filhotes, primícias, usada com mais freqüência n LXX para traduzir o heb. firúm â ocorre 9x no NT, referindo-se: a. aos cristãos como primícias do ministério do evangelho em certos locais ou em geral (Rm 16.5; ICo 16.15; 2Ts 2.13; Tg 1.18; Ap 14.4); b. aos cristãos como aqueles que têm “as primícias do Espírito” (Rm 8.23); c. em termos metafóricos, às “primícias da massa” (ou seja, os judeus) como sendo “santas”, de modo que os “ramos” (ou seja, os gentios enxertados) também são santos caso estejam ligados à mesma árvore do reino (Rm 11.16; cf. Nm 15.19-21 para a terúmâ das primícias da massa) e d. ao próprio Cristo, como “primícias dos que dormem” (ICo 15.20, 23). Oferta, sacrifício: -> 'azkãrâ (oferta memorial, # 260); -> m á (oferta queimada, # 852); asãm (oferta pela culpa, # 871); zbh (abater, sacrificar, # 2284); -> haftã ’at (oferta pelo pecado, # 2633); tbh (matar, # 3180); minhã (presente, dádiva, oferta, sacrifício, # 4966); ma'asêr (dízimo, # 5130); -> ndr (fazer um voto, # 5623); nwp I (mover-se para frente e para trás, balançar, # 5677); -> nsk I (derramar, ser consagrado, libação, # 5818); ‘õlá 1 (holocausto, # 6592); 'arisâ (oferta de manjares, # 6881); qorbãn (oferta, presente, # 7933); sht 1 (imolar, # 8821); selem (oferta pacífica, # 8968); tãmid (oferta regular, # 9458); firúmâ (tributo, contribuição, # 9556); Arão: Teologia; -> O ferta: Teologia; -> Sacerdotes e Levitas: Teologia 336
n n n (# 9560)
B ib l io g r a f ia
TWAT7:425-34; G. A. Anderson, “Sacrifice and Sacrificial Offerings (OT ),”ABD, 1992,5:87086; idem, Sacrifices and Offerings in Ancient Israel, HSM, 41,1987; H. Danby, The Mishnah, 1933; J. P. Fokkelman, “sdy trwmt in II Sam 1:21a — a non-existent crux,” ZAW 91, 1979, 290-92. T. H. Gaster, “The Service o f the Sanctuary: A Study in Hebrew Survivals,” Melanges syriens offerts á Monsieur Rene Dussaus, vol. 2, 1939, 577-82. J. E. Harley, Leviticus, WBC, 1992; D. R. Hillers, “Ugaritic snpt, ‘wave-offerings’,” BASOR 198, abril 1970, 42; B. A. Levine, Leviticus, The JPS Torah Commentary, 1989; J. Milgrom, “The Alleged Wave-OfTering inlsrael and the Ancient near East,” IEJ22, 1972,33-38 e reimp. em sua obra Studies in Cultic Terminology, S JL A 36,1983,133-38; idem, Leviticus 1-16, AB, 1991; idem, Numbers, The JPS Torah Commentary, 1990; idem, “The Shoulder for the Levites,” in Yadin, The Temple Scroll, 1983, 1:169-76; R. Rendtorff, Leviticus 1-16, BKATIII3, 1992; J.-M. de Tarragon, Le culte ò Ugarit, 1980; G. Vermes, The DeadSea Scrolls in English, 3a ed., 1987; M. Weinfeld, “Social and Cultic Institutions in the Priestly Source Against Their Ancient Near Easter Background,” Proceedings o f the Eight World Congress ofJewish Studies, 1983,95-129; G. J. Wenham, The Book o f Leviticus, NICOT, 1979; Y. Yadin, The Temple Scroll, vols. 1-2, 1983. Richard E. Averbeck 9557 (^rüm iyyâ, tributo, contribuição), -> # 9556 9558 (firiVâ, sinal [de alarme], grito [de alegria]), 9559 (firüpâ, remédio, medicamento),
9560
nnn
#8131
# 8324
n n n (tirzâ), árvore desconhecida (# 9560).
AT Trata-se de uma palavra de origem incerta. A tradução latina sugere o azevinho ou azinheira. O subs., encontrado somente em Isaías 44.14 no contexto da confecção de ídolos, é tra duzido em diversas versões como cipreste. Nesse texto, o profeta descreve aquele que faz o ído lo usando a madeira dessa árvore bem como de 'erez, cedro (# 780) e ’élôn, carvalho (# 471). Árvores: -> 'êlâ I (árvore vigorosa, # 461), ‘erez (cedro, # 780); ’õren I (pinheiro, #815); -> "êsel (tamargueira, # 869); berôs (zimbro, # 1360); lüz I (amendoeira, # 4280); ‘ãy (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); -> ‘ar 'ãr (zimbro, # 6899); -> sammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); sãqêd (amêndoa, # 9196); siqmâ (sicômoro [figueira], # 9204); -> t6 assúr (cipreste, # 9309); tãmãr I (tamareira, # 9469); -> tirzâ (ár vore desconhecida, # 9560); ( -> Árvore do Conhecimento / Vida: Teologia) LarryL. Walker 9564 (tormâ, de modo furtivo, traiçoeiro), -> # 8228 9567 (tarmit, falsidade, dissimulação),
# 8228
9568 (tõren, haste de bandeira, mastro), -> # 639
9569
n ^n
n^Vin (ta r‘ít), subs. pesamento (conj.; # 9569). 337
CT?™ (# 9572)
OMA Sir. tar'itã, subs. inteligência, opinião, razão. AT No Salmo 119.118, o TM, “sua falsidade é dissimulação,” costuma ser considerado uma tautologia. Assim, muitos emendam o TM de tarmitãm, seu tratamento falso, para tar ‘itãm, seu pensamento, tomando por base a LXX, Eclesiástico e Jerônimo. Allen (Psalms 101-150, WBC, 1983,138), porém, argumenta que o TM faz sentido, afirmando que a LXX traduz tarmit como enthymêna, pensamento, estratégia, em Jeremias 8.5 e 14.14. Diante disso, o melhor é seguir o TM. Plano, pensamento, meditação, intriga: -> ’zn II (pesar, ponderar cuidadosamente, # 264; b d ’ (inventar, imaginar, # 968); higgãyôn (melodia, pensamento, # 2053); zmm (pla nejar, planear, planejar o mal, # 2372); hms II (pensar, inventar, # 2804); -> hsb (contar, computar, calcular, pensar, planejar, # 3108); -> yêçer I (mentalidade, disposição, # 3671); -> st I (pensar, ponderar, # 6951); -> sihâ (meditação, estudo, # 8491); -> éfi 'ippim (pensamentos inquietantes, preocupações, # 8546); -> tar ‘ít (pensamento, # 9569) John E. Hartley 9570 (ta r‘êlâ, vacilante, cambaleante), -> # 8302
D’?™ (terãpim), a. estatuetas; b. máscara (assim como “estola”, parece significados distintos em diferentes passagens — deuses do lar / ídolo / ídolos / idolatria, # 9572). O termo pode ser sing. (cf. 1Sm 19.13, 16) com terminação— m. 9572
D’?np
OMA Apesar de incertas, as etimologias sugeridas são rph, ser fraco ( -> # 8332) ou o hit. tarpis, espírito, demônio. AT 1 . 0 termo aparece no contexto da adoração. Em Oséias 3.4-5, como castigo, Israel ficará sem governante (Davi, seu rei, v. 5) e sem os objetos de adoração a Javé: sacrifício (= altar), coluna, estola sacerdotal ou ídolos do lar (firãpim). Na história deut., com exceção de ídolos do lar, essas palavras são os itens comuns que compõem um santuário, ainda que tal fato seja condenado pelo escritor, o qual defende a adoração centralizada em Jerusalém. O mesmo se aplica ao santuário de Mica em Juizes 17.5; 18.17, 18 (prováveis acréscimos) e o v. 20 fala de estola, ídolos do lar e pesei úmassêkâ. 2. Em Gênesis 31.19,34,35, os terãpim parecem ser os emblemas do clã, talvez conce dendo direitos legais de liderança àquele que estivesse em poder dos terãpim. São pequenos o suficiente para serem facilmente escondidos debaixo de uma pessoa. O fato de a mulher estar menstruando mostra o desprezo do escritor por esses objetos. 3. Por outro lado, em 1 Samuel 19.13, 16, o objeto é grande o suficiente para imitar o corpo de um homem debaixo das cobertas de uma cama. Sugeriu-se a tradução “um embrulho de trapos (gastos?)”. Essa história também zomba dos objetos pois, afinal, para que mais eles servem? Nos casos 2 e 3, o significado de firãpim não é associado a um santuário. 4. Assim como a estola, porém num sentido negativo, o objeto é associado à adivinha ção: 1 Samuel 15.23; 2 Reis 23.24 (ou será que, nesse caso, a associação é com gillulim?); Ezequiel 21.21 [26]; Zacarias 10.2. P-B A palavra continua sendo empregada, ainda que com pouca freqüência, na literatura mais recente. 338
tí’í n n (# 9577)
Idolatria: -> 'eIU (nada, # 496); ’aserâ (objeto de adoração feito de madeira, poste, deusa, # 895); -> gillülim (imagens, ídolos, # 1658); -> dãgôn (Dagom, # 1837); -> k?môs (Quemos [deus dos moabitas], # 4019); mõlek (Moloque, # 4891); -> massêkâ 1 (estatueta fundida, # 5011); -> mipl&jet (coisa terrível, objeto abominável, # 5145); -> semel (imagem, # 6166); -> ‘õjã/) (imagem de um deus, # 6773); -> ‘astõret (Astarote, # 6956); -> pesei (imagem cultuai, estátua de um deus, # 7181); -> tõmer II (espantalho, # 9473) firãpim (estatuetas, máscara, # 9572); -> Idolatria: Teologia B ib l io g r a f ia
C. F. Bumey, The Book ofJudges, 2a ed., 1920; J. L. Mays, Hosea, OTL, 1969; J. A. Motyer, “Teraphim,” NBD, 1253. Judith M. Hadley
W’Çnr) (tarsis II), crisólito ? (# 9577). AT 1. De acordo com Zimmerli (83), a associação dessa pedra preciosa com sua procedên cia (ou seja, Tartessos, na Espanha) é de grande ajudar para determinar o tipo exato de pedra à qual o escritor bíblico se refere. A Espanha era conhecida por fomecer duas pedras em parti cular, o azeviche e o topázio dourado. Seguindo Quiring, Zimmerli prefere a tradução “topázio dourado”. O termo ocorre em Êxodo 28.20; 39.13; Cântico dos cânticos 5.14; Ezequiel 1.16; 10.9; 28.13; Daniel 10.6. Com exceção do Cântico dos cânticos, em que aparece “ouro”, nas outras referências o termo é traduzido como "berilo”. 2. Para uma introdução teológica ao tópico das pedras preciosas no AT, ver 'õdem, pe dras preciosas (# 138). Pedras preciosas:-> 'ehen (pedra, rocha, # 74); -> 'õdem (pedra preciosa, # 138); 'ahlãmâ (jaspe, # 334); -> 'eqdãh (berilo, # 734); -> bahat (pedra preciosa, # 985); -> bãreqet (esme ralda, # 1403); yalfilõm (pedra preciosa; # 3402); -> yãsPpêh (jaspe, # 3835); kadkõd (rubi?, # 3905); -> lesem 1 (pedra preciosa, #4385); nõpek (pedra semipreciosa, # 5876); sõheret (minério de pedra, # 6090); -> sappir (lápis-lazúli, # 6209); -> (crisólito, # 7077); í e£><5 (pedra preciosa, # 8648); -> sõham I (pedra preciosa, # 8732);-> sãmir II (esmeril, diamante?, # 9032); -> ies II (alabastro, # 9253); tarí/s II (pedra preciosa, # 9577) Jóias, adornos: -> hali I (adorno, jóia, # 2717); -> harúzim (colar de conchas, # 3016); -> toòiíi aí (anel, # 3192); kümãz (adorno, # 3921); -> m ist^çôt (engastes, # 5401); -> nezem (anel, # 5690); -> neti(i)pâ (brinco, # 5755); -> 'ãgil (brinco?, # 6316); ‘dh II (adomar-se, # 6335); ‘ks (retinir, # 6576); -> /; (colocar um colar, # 6735); pPninim (corais, pérolas, # 7165); sawwãrôn (colar, # 7454); -> sãmid I (pulseira, # 7543); ‘ãdâ (tomozeleiras, # 7577); -> rãbíd (colar, # 8054); -> saharônim (crescentes [em forma de meia-lua], # 8448); -> íõftw (adorno, # 8667); -> .fêr I (pulseira, # 9 2 17); -> rôr (pendente, # 9366) B ib l io g r a f ia
IDB 2:898-905; ISBE 4:623-30; NIDNTT3:395-98; J. S. Harris, “An Introduction to the Study of Personal Omaments, of Precious, Semi-Precious and Imitation Stones Used Throughout Biblical History,” ALUOS, 1962,49-83; L. Koehler, “Hebraische Vokabeln II,” ZAW S5, 1937, 161-74; H.Quiring, “Die Edelsteine im Amtsschild desjüdischen Hohenpriesters und die Herkunfl ihrer Namen,” y4GA/38, 1954, 193-213; W. Zimmerli, Ezekiel 25-48, 1983,82-84. Andrew E. Hill 339
raip'n (# 9587)
9582 (fisüm â, colocado sob os cuidados de alguém),
# 5238
rayjt) {tasbês), subs. trabalho quadriculado, xadrez (# 9587); (misbe$ôt), subs. fem. pl. trabalho qua driculado, xadrez (# 5401); FD'? (sãbãs) vertigem (# 8688); < FDU?’ (sbs), pi. tecer um trabalho quadriculado, xadrez (-> # 8687). 9587
ratffri
AT 1. Não se sabe ao certo o significado desse radical. Além disso, o subs. sãbãç é de pouca ajuda. O HALAT(1303) considera sãbãf um hapleg. (de sb$ II). Esse subs. descreve o que se apoderou de Saul e o motivo pelo qual ele desejava ser morto (2Sm 1.9). Seria possível fazer uma ligação com as outras palavras estudadas nesse caso se o radical transmitisse uma idéia de misturar, fazendo com isso que o problema de Saul fosse confusão ou vertigem (cf. sir., Trg. e provavelmente a LXX). Porém, o contexto favorece um significado como fraqueza (cf. Josefo, Ant 7, 3) ou convulsões. 2. O termo tasbê.? ocorre somente lx, na descrição da túnica do sumo sacerdote com kPtõnet tasbês (Ex 28.4). O H ALAT(1656) sugere três possibilidades: a. uma túnica com orlas (cf. LXX; debruada); b. uma túnica com bordas decoradas; c. uma túnica com alternância de fios fortes e fracos (cf. BDB, 990, trabalho quadriculado (ou plissado); seguido pela maioria das vi. O vb. no pi. relacionado é usado para ordenar a confecção de uma túnica desse tipo usando-se linho fino (sês, Ex 28.39), enquanto em Êxodo 28.20, as pedras preciosas do peito ral são engastadas em ouro (part. pu.).0 termo mistfisôt ocorre 9x, todas elas em Êxodo (com exceção do Salmo 45.13 [14]); seis dessas ocasições encontram-se em forma de const. com ouro (misbe$ôt zãhãb). Os misbe$ôt de ouro são traduzidos de várias maneiras como engastes de filigrana de ouro, rosetas de ouro ou suportes de ouro. Ouro; -> 'ôpir (ouro de Ofir, # 234); beser I (minério de ouro, # 1309); -> zãhãb (ouro, # 2298); -> hãrús I (ouro, # 3021); -> ketem (ouro, # 4188). -> sãgúr (ouro puro, # 6034); -> paz (ouro puro, # 7058); -> $rp (derreter, fundir, refinar, # 7671) Sacerdotes e levitas: -> ’abnê( (cinto, esp. de sacerdotes, # 77); -> 'êpôd I (estola, veste sa cerdotal, objeto de veneração, # 680); -> hõsen (peitoral do sumo sacerdote, # 3136); -> khn (cumprir os deveres de um sacerdote, # 3912); -> kõmer (sacerdote pagão, # 4024); -> lêwi (levita, # 4290); -> migbã a (tiara, # 4457); miknãsayim (calças, # 4829); pa 'amôn (cam painha [na sobrepeliz do sacerdote], #7194); -> tasbês (quadriculado [túnica do sacerdote], # 9587); Arão: Teologia; Sacerdotes e levitas: Teologia Philip Jenson 9588 (tPsübâ, volta), -» # 8740 9591 {fisú a, salvação),
7771 _____ ______________ ^
# 3828
. •____
nj?1U?n ( ^ súqá), subs. desejo, pedido, anseio, apetite (# 9592) (HALAT 1658).
OMA A palavra é atestada no sam. e no heb. da Mix. com o sentido de ímpeto, desejo ardente, impulso. 340
r n itfp (# 9593)
AT Esse subs. é usado 3x no AT, sendo 2x em Gênesis e 1x no Cântico dos cânticos. O termo é motivo de bastante controvérsia (cf. Foh, 376-77), porém a maioria dos estudiosos concorda que a palavra enfatiza um desejo ardente, anseio ou ímpeto. No Cântico dos cânticos 7.10 [11], o termo “possui sem sombra de dúvida uma nuança romântica e positiva, descre vendo o sentimento de atração mútua entre dois amantes” (Hamilton, 201). Em Gênesis 4.7, o termo apresenta inequivocamente uma nuança negativa, descrevendo o desejo de pecar que se encontra à espreita, pronto para lançar-se sobre Caim e dominá-lo. Trata-se de uma referência à conquista, ao desejo de derrotar um inimigo. Não há grandes desacordos com relação a essas passagens. No entanto, surgem diver gências quanto ao termo em Gênesis 3.16 — se este deve ser interpretado de forma positiva ou negativa. O desejo (tesúqâ) de uma mulher por seu marido deve ser enaltecido como uma virtude ou lamentado como um sentimento manipulador? Alguns comentaristas consideram o termo dessa passagem de modo mais positivo (cf. von Rad, 93; Holder, 40; Aalders, 108) en quanto outros o vêem de modo mais negativo (cf. Hamilton, 202; Cassuto, 165-66; Wenham, 81-82; Foh, 383). Wenham observa que “tendo em vista a raridade do termo, ‘ímpeto’ certa mente não é uma possibilidade” (82). Susan Foh apresenta uma boa fundamentação para mais estudos. Sua conclusão de que o desejo é uma disputa pela liderança — portanto um uso ne gativo — parece provável no caso de Gênesis 3.16. P-B A LXX emprega hê apostrophê, voltar ou uma forma desse termo nos três casos. Ao que parece, considera fisúbâ (# 9588) em vez de tesúqâ (Hamilton, 201; cf. R. Bergmeier). Desejo, cobiça, anseio, aneio, deleite, felicidade, prazer: -> 'areset (desejo, pedido, # 830); hrnd (desejar, almejar, ansiar por, cobiçar, estimar, # 2773); -> hp$ 1 (ansiar, desejar, querer, cuidar, # 2911); hsq (desejar, ansiar por, ambicionar, # 3137); y ’b (ansiar por, anelar, de sejar, # 3277); -> kãleh (anseio, # 3985); -> kmh (ansiar por, desejar ardentemente, # 4014); -> ksp II (desejar, almejar, # 4083); -> môrãs II (anelo, desejo, # 4626); -> 'rg (desejar com ânsia, suspirar por, # 6864); s 7 (pedir, requisitar, querer, # 8626); / ’b I (desejar, ansiar por, # 9289); tesúqâ (desejo, enleio, apetite, # 9592) B ib l io g r a f ia
G. Ch. Aalders, Genesis, 2, 1981; R. Bermeier, “Zur Septuagintaubasetszung von Gen 3.16,” ZAW 79, 1967, 77-79; U. Cassuto, A Commentary on the Book o f Genesis, Part 1, 1944. S. Foh, “What is the Woman’s Desire?” WTJ 37, 1974/75, 376-83; V. P. Hamilton, The Book o f Genesis, Chapters 1-17, 1990; M. Hoder, T z‘enah, the Classic Anthology o f Torah Lore and Midrashic Commentary, tr. do Yiddish por Miriam Stark Zakin, 1983; G. von Rad, Genesis, OTL, 1972; G. Wenham, Genesis 1-15, WBC, 1987. David Talley
. __________
*
=
r n i t r á (fisúrâ), subs. presente (hapleg., ISm 9.7, # 9593).
OMA Cohen (24) argumenta que tesúrà é derivado do heb. swr tomando por base a analogia com o acad. tãmartu, presente de saudação, um derivativo comum de amãru. AT Paul (442-44) refere-se a t?súrâ como um “taxa de entrevista” (cf. 1Rs 14.3; 2Rs 4.42; 8.8-9). Em 1 Samuel 9.7, Saul expressa sua preocupação por não ter presente alguma para dar 341
yrçn (# 9596)
ao profeta Samuel no encontro vindouro, indicando que era uma cortesia habitual oferecer um presente a um profeta. Ao longo de toda a história de Israel, profetas e sacerdotes abusaram dessa cortesia (Jr 6.13; 8.10; Mq 3.5, 11). Presente: -> 'ahab (presentes de amor, talismã, # 172); -> zbd (conceder, # 2272); mgn I (entregar, # 4481); -> nadem II (presente, retribuições de amor, # 5621); -> ntn (dar, presentear, oferecer, # 5989); -> íAr II (entregar, # 6127); .yò/ (dar, # 7381); i/W (dar um presente, # 8815); -> íery (dádiva, presente, # 8856); salmõmm (presente, # 8988) B ib l io g r a f ia
H. Cohen, Biblical Hapax Legomena in the Light ofAkkadian and Ugaritic, 1978; S. Paul, “ 1 Samuel 9:7: An Interview Fee,” Bib 59,1978, 542-44. Michael A. Grisanti 9595 (t^sVi, nono), -> # 9596
9596
ytffl
Sttfrl (têsa") subs. nove (número cardinal), um nono (# 9596); , y, ©’p (fiã fí), adj; nono (número ordinal)
(# 9595). OMA Há poucas evidências de que o nove seja um número significativo no mundo semita. A teologia da criação procedente de Heliópolis, no Egito (ANET, 3-4) retratava a origem dos nove deuses da enéade, que era liderada por Atom-Rá, o Deus Sol. Posteriormente, a enéade passou a ser considerada uma só divindade. AT O nove aparece raramente, ainda que, por ser um número menor que dez, é significativo nos nove décimos de Neemias 11.1. Os noventa anos de Sara (Gn 17.17) podem ser dez a mais do que a idade extremamente avançada de oitenta anos, enfatizando assim a impossibilidade de ela dar à luz. P-B
O nove ocorre esparsamente na LQ e possui pouca relevância teológica independente.
NT No NT, um pode ser distinto de nove num grupo de dez (Lc 17.17) ou um em contraste com 99 num grupo de 100 (Mt 18.12-13). Números: -> 'ehãd (um, # 285); 'elep II (milhar, contingente militar, # 547); -> 'arba' (quatro, # 752); -> hãmês (cinco, # 2822); -> mê ’â I (cem, # 4395); 'eser (dez, # 6924); -> t^bãbà (dez mil, miriade, # 8047 / 8052); ■ ) Seba' I (sete, # 8679); sãlõs, selõsâ (três, um grupo de três, # 8993); semôneh (oito, # 9046); ■ ) senayim (dois, # 9109); sês I (seis, # 9252); -> têsa' (nove, # 9596) Numeração, contagem: -> fcss (calcular, repartir, # 4082); mnh (contar, # 4948); -> spr I (contar, numerar, calcular, repetir, # 6218); -> pqd (numerar, determinar, #7212) B ib l io g r a f ia
Jastrow 2:1704-5 P. P. Jenson 342
D i c io n á r io T e m á t ic o
Abiatar
Abadom -> # 11 ( ’abaddôn, destruição) Abandono
# 6440 ( z i I, abandonar)
Abate -> # 3 1 8 0 (tbh, abater) Abatimento -> #9168 (siplâ, destruição, nivelamento) Abdome -> # 1061 (befen I, ventre)
Abiatar
Abiatar (HVDN ['ebyãlar], # 59).
AT Abiatar (“pai da excelência” ou “aquele que é excelente [abundante] é pai”), filho do sacerdote Aimeleque, foi o único sobrevivente do massacre dos sacerdotes descendentes de Eli, realizado pelo rei Saul (lR s 2.27) em Nobe (ISm 22.20-22). 1. Aimeleque ( ’ahimelek, “meu irmão é rei” ou “meu irmão é [o deus] Moloque/Milcom”; # 316) era o líder de uma família de sacerdotes, supostamente descendentes de Eli (1 Sm 14.3) que, depois da destruição de Siló, continuaram a servir a Javé na cidade benjaminita de Nobe durante o reinado de Saul (1 Sm 22.11). Seus deveres sacerdotais eram, entre outras coi sas, consultar a Deus (por meio de uma estola de linho), providenciar o pão da propiciação (lehem pãnim) para a mesa sagrada do santuário (Êx 25.30; 40.23; Lv 24.5-9; cf. Hb 9.2) e guardar a lei (1 Sm 21.4). Aimeleque foi acusado e condenado (1 Sm 22.13) por deslealdade e conspiração contra o rei Saul por ajudar Davi e tomar seu partido ao dar-lhe do pão sagrado e entregar-lhe a espada de Golias (ISm 21.1-9). Aimeleque e toda a sua família foram mortos por Doegue, o edomita, um oficial e informante de Saul (SI 52.1; ISm 22.19). O único sobre vivente do massacre de Nobe foi Abiatar, filho de Aimeleque (ISm 22.20). De acordo com a tradição, Abiatar era um servo justo e leal de Javé, que agiu com sabedoria ao distribuir o pão sagrado para os companheiros famintos e necessitados de Davi (Mt 12.3-4; Mc 2.25-26; Lc 6.3-4). Em 2 Samuel 8.17 e 1 Crônicas 18.16 (cf. 1Cr 24.3, 6, 31), é possível que os nomes de Aimeleque e Abiatar tenham sido trocados um pelo outro. 1 Samuel 26.6 menciona um outro Aimeleque, um oficial heteu a serviço do rei Davi. 2. Abiatar juntou-se a Davi (->) e seus companheiros em Queila e serviu-o como sacer dote transmitindo-lhe oráculos por meio da estola (1 Sm 23.6-9; 30.7), contribuindo assim ainda mais para o isolamento de Saul. O sacerdote e seu filho Jônatas (2Sm 15.27), juntamente com Zadoque, cumpriram os principais deveres religiosos de seu ofício (2Sm 20.25) levando a arca para Jerusalém (1 Cr 15.11 -12; 27.34) e guardando-a durante a revolta de Absalão (2Sm 15.29). Conselheiro sábio, ele negociou a restauração de Davi ao trono em Jerusalém (2Sm 19.11 -12). Sua lealdade a Davi (1 Rs 2.26) salvou-lhe a vida quando ele e Joabe deram apoio a Adonias para suceder Davi (1 Rs 1.7, 19, 25) em vez de Salomão. Em decorrência disso, Abiatar foi banido para a propriedade da família em Anatote (lR s 2.27, 35), de onde veio o profeta Jeremias (Jr 1.1). Ao que parece, ocupou um cargo superior ao de Zadoque durante o reinado de Davi (1 Rs 2.35; Mc 2.26). Até hoje não se sabe ao certo se ele teve um filho chamado Aimeleque ou se esses nomes eram usados de maneira intercambiável (2Sm 8.17; lCr 18.16; 24.6). 3. Nobe (nõb, “prosperar”, “fruto”?), um santuário secundário a Javé em território ben jaminita, é descrito como “cidade destes sacerdotes” (1 Sm 22.19), onde se estabeleceram os sa cerdotes descendentes de Eli depois da destruição de Siló e da captura da arca (1 Samuel 4). 344
Abimeleque
O “pão da proposição” (Êx 25.30), consagrado a Javé (ISm 21.6), a consulta a Javé por meio da estola (ISm 22.10) e a responsabilidade de guardar objetos de importância reli giosa como a espada de Golias ( ISm 21.9) dão testemunho da existência da adoração javeísta devidamente organizada nesse local, sendo realizada sem nenhuma ligação expressiva com a corte real de Saul em Gibeá. Enquanto fugia de Saul, Davi conseguiu (usando de falsos pretextos) obter de Aimeleque o pão sagrado bem como a espada de Golias (1 Sm 21.1 -9). Esse fato foi interpretado e relatado por Doegue, um oficial de Saul, como um ato de conspiração contra o rei, motivo pelo qual 85 sacerdotes, suas famílias e seus rebanhos e criações foram mortos a fio de espada (ISm 22.18-23). Abiatar, o único que escapou, juntou-se posteriormente a Davi e confirmou sua rebelião pública contra Saul, que na verdade havia começado em Nobe. De acordo com Isaías 10.32 (cf. Ne 11.32), Nobe ficava perto do monte Escopo ou em algum lugar entre Gibeá, Jerusalém eAnatote. A cidade foi identificada com Ras Umm et-Tala' perto do hospital Augusta-Victoria, cerca de dois quilômetros ao norte de Jerusalém. Alguns estudiosos preferem situá-la em Nebi Samwnl. NT O episódio em Nobe ocupa posição de destaque no NT para ilustrar o senhorio superior de Cristo ao suprir as necessidades da humanidade (Mt 12.3-4; Mc 2.25-28; Lc 6.1 -5). Os sím bolos de santidade e os recursos dos rituais religiosos devem servir e não intimidar os homens, e Abiatar representa essa tradição. Eli B i b l k x ;k a fia
A. Cody, A History o f Old Testament Priesthood, 1969; B. A. Levine, “Priests,” IDBSup, 68790; J. Kegler, Politisches Geschehen und theologisches Verstehen, 1977,246-48; H. J. Stoebe, Das erste Buch Samuelis, KAT, 1973; R. de Vaux, Anclsr, 372-74. J. P. J. Olivier
Abimeleque
Abimeleque
\'abimelek], # 43).
AT O nome Abimeleque (fen. abimTlki\ AAS ’bmlk) aparece c. 60x no AT e refere-se a três indivíduos diferentes. Abimeleque é um rei filisteu em Gerar, contemporâneo de Abraão (Gn 20.2; cf. 2 1.22-34); o segundo Abimeleque, idêntico ao primeiro ou, possivelmente, um des cendente do mesmo, é contemporâneo de Isaque (Gn 26.1-33). A terceira pessoa com o nome de Abimeleque é um israelita que faz parte da casa de Gideão (Jz 9.1-57). O nome significa “o rei divino (melek) é meu pai ( 'abi)". 1. A importância teológica de Abimeleque em Gênesis 20—21 encontra-se principalm te em três áreas. a. Abimeleque é retratado como um rei pagão/filisteu piedoso em Gerar, cujo comportamento moral e ético supera até mesmo o de Abraão — que mentiu ao dizer que Sara era sua irmã (Gn 20.2-18). O comportamento louvável de Abimeleque é caracterizado por sua integridade de caráter (v.6), uma resposta afirmativa à palavra de Deus a ele em um sonho (vv. 8-9) e disposição de permitir que Abraão (->) vivesse onde quisesse na terra. Naquele tempo, ainda não havia se enchido a medida de pecado do povo de Canaã (Gn 15.16). Para surpresa de Abraão, ainda havia algum “temor de Deus” no meio desses filisteus em Gerar (Gn 20.8, 11). Assim, Abimeleque faz parte de uma série de não-israelitas tementes a Deus como Melquisedeque (Gn. 14.10-20) e Jetro (Êx 18.1-27). 345
Abimeleque
b. Apesar disso, Abimeleque foi afligido por Deus (Gn 20.17) e teve que fazer repara ção a Abraão por aquilo que havia intentado com relação ao casal escolhido de Deus (v. 2; cf. Gn 12.3) e que Deus havia protegido (v. 6). Foi Abraão quem orou pela cura de Abimeleque, pois era profeta do Deus verdadeiro (vv. 7, 17-18). Fica claro que o favor de Deus repousava sobre Abraão e Sara, com os quais havia feito aliança. c. Como rei fllisteu de Gerar e pai ou avô do rei Abimeleque em Gênesis 26, ele prefigura o modelo/estilo de reinado assumido por ainda outro Abimeleque no tempo dos juizes (Jz 9, ver abaixo), que cobiçou tal realeza. Posteriormente, no tempo de Samuel, toda Israel foi seduzida por esse modelo de poder (1 Sm 8.12). 2. Abimeleque e Abraão fizeram uma aliança — um tratado que, depois, foi proibido para Israel — pois Abimeleque e seu povo sentiam-se ameaçados pela prosperidade com a qual Deus havia abençoado Abraão em todas as coisas (Gn 21.22-24,31). É possível que o medo de Abimeleque seja um prenuncio da reação parecida, porém violenta, de Faraó (Êx 1.9). Isaque (->), o filho de Abraão, deparou-se com o filho/neto desse Abimeleque, cujo nome é o mesmo de seu antecessor. Isaque pede ajuda a esse rei dos filisteus em Gerar. Boa parte da história anterior se repete, dessa vez com ênfase na multiplicação dos descendentes de Abraão e Isaque (Gn 26.3-6, 24). Mais uma vez, as atitudes de Abimeleque são retratadas como exemplares (vv. 8-9, 11) e é ressaltado o receio dele quanto à multiplicação de Israel (v. 16). Até mesmo Abimeleque reconhece a bênção da aliança (vv. 28-29) e, novamente, obtémse a coabitação pacífica na terra. 3. Abimeleque, filho de Gideão (->) com uma concubina fllistéia de Siquém (Jz 8.31) contrasta nitidamente com seu pai/avô e agrava em muito a tensão entre os filisteus (->) e os israelitas. Ao contrário do pai Gideão, que se recusou a ser coroado rei de Israel, Abimele que buscou ativamente a posição de monarca. Dentro desse contexto, fica evidente que seu nome é irônico uma vez que, na realidade, o pai se recusou a ser rei! Sem dúvida o escritor antevê com isso os possíveis males decorrentes da monarquia e do desejo de Israel de ser como as outras nações ao redor (1 Samuel 8 — 12). Abimeleque desejava ser rei por causa de suas relações com os cananeus. Ao declarar-se rei, também representa uma antítese dos juizes escolhidos por Deus. O próprio Deus acabou com esse reinado obtido por usurpação (Jz 9.22) e vingou o sangue dos setenta filhos de Gideão (v. 24, 56). Por meio de uma mor te ignominiosa (cf. 2Sm 11.21), o Senhor deu a Abimeleque a paga por seus atos perversos e aspirações, como Jotão, claramente inspirado por Deus, havia predito em sua fábula (Jz 9.24). Essa fábula tinha por objetivo censurar o caráter de Abimeleque (um espinheiro, v. 14, ’ã(ãd) e mostra a natureza injusta dos atos dos homens de Siquém (vv. 7-20). Deus estabele ceria sua própria monarquia no tempo apropriado. Não seria aquele o caráter da monarquia de Israel (Jz 17.6; 21.25). B ib l io g r a f ia
ABD 1:20-21 Eugene Carpenter / Michael A. Grisanti Abominação -> # 9493 (t'b , ser detestável, repugnar, abominar) Aborto
# 8897 (Skl, ser privado de, abortar)
Aborto
# 8897 (skl, ficar desolado com uma perda, perder, abortar)
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Abraão / Abrão
Abraão / Abrão
Abraão (QTrUK [ 'abrâhãm], # 90; D“)5N [ abram], Abrão, # 92).
AT 1. Nome. O AT apresenta duas formas do nome do patriarca: Abrão e Abraão. A primeira ocorre 61 x, exclusivamente em Gênesis 11.26— 17.5 e também em 1 Crônicas 1.27eNeemias 9.7 (# 92). A forma Abraão ( 'abrâhãm) aparece 129x em Gênesis, 42x no resto do AT e 83x no NT (# 90). Uma característica extraordinária desse nome é que não foi usado por mais nin guém até o século VI d. C. (ver D. J. Wiseman, “Abraham Reassessed,” in Essays, 154). Não existe nenhum paralelo extrabíblico incontestável para Abraão. Em textos cuneiformes acad. do século XIX a. C., ocorrem as formas A-ba-am-ra-ma, A-ba-ra-ma e A-ba-am-ra-am. O nome Abrão aparece no ugar. (Gordon, UT, 286,348, texto 2095, linha 4), mas provavelmente, lê-se A-bira-mi (ver Sarna, EncJud 2:112). As opiniões divergem quanto a Abrão ser considerado uma forma abreviada de Abirão. Sarna nega essa idéia de modo enfático, enquanto L. Hicks (IDB 1:15) a considera possível, assim como “Abner” vem de “Abiner” . A forma Abrão é com posta de dois elementos: ’ãb (pai) e rãm (do vb. rwm, ser elevado, exaltado). Portanto, o nome significa “ele é exaltado com respeito ao pai”, isto é, ele é de uma linhagem eminente (Sarna) ou “pai exaltado”. Enfatiza a eminência ou superioridade da pessoa envolvida (Hicks). A pala vra rãm não deve ser entendida como um nome divino, mas sim como um adj. descritivo que ressalta a exaltação de Javé (SI 138.6; Is 6.1; 57.15). Não se sabe ao certo qual seja a etimologia e tradução de Abraão. A etimologia tradi cional ou popular é apresentada em Gênesis 17.4-5 em que, ao firmar sua aliança com Abrão, Deus mudou o nome do patriarca para Abraão como testemunho da promessa divina de que ele seria “pai de numerosas nações” (ver Hicks, 15; Wiseman, 153-54). O nome Abraão costuma ser considerado uma expansão aram. de Abrão e fundamentalmente idêntico a este último em forma e significado (ver A. E. Speiser, Genesis, 1964, 124). 2. A narrativa de Gênesis. Os principais detalhes da vida de Abraão encontram-se gistrados cm Gênesis 11.26— 25.10. Constituída de uma série de episódios separados, a nar rativa sobre Abraão é prefaciada em Gênesis 11.10-26 por uma história resumida na forma de genealogia da família de Noé (-> ; o segundo personagem em importância a aparecer em Gê nesis depois de Adão [-> ]) até a família de Terá, que inclui Abrão, o terceiro personagem em importância a aparecer em Gênesis (ver Goldingay, 12). Trata-se de um fato teologicamente significativo. A terceira fase principal das relações de Deus com a humanidade tem início com Abraão. Estudiosos holandeses e alguns americanos vêem-se propensos a chamar essa fase de “particularista”, em contraste com a fase “universalista” que a antecede e que a seguirá mais uma vez na dispensação do NT (ver W. H. Gispen, Genesis 2, 1979, 23; G. Vos, 89-90; VanGemeren, 102-21; ver também SI 147,19-20; At 14.16; Rm 9.4-5). A narrativa de Gênesis é introduzida ainda em 11.27-32 por um relato sobre Terá e sua família. Na BH, o chamado de Deus a Abrão (Gn 12.1) dá início a uma nova passagem, o verdadeiro começo da narrativa de Abraão (ver Goldingay, 12). Abraão é retratado como membro de uma família relacionada à vida urbana no sul da Babilônia, que se muda para Harã na alta Mesopotâmia em sua jornada rumo a Canaã (Gn 11.31; ver Millard, ABD 1:35). De acordo com a análise crítica da fonte, para J o local da origem de Abraão é somente Harã, diferentemente de S que, quanto a essa questão, se refere a “Ur dos caldeus”. Esse último ponto de vista recebe o apoio de Gênesis 15.7; Neemias 9.7 e Atos 7.2-4. De acordo com Atos 7.2, “O Deus da glória apareceu a Abraão, nosso pai, quando estava na Mesopotâmia, antes de habitar em Harã”. É provável que o deslocamento inicial da família de Terá, de Ur para Harã, tenha sido provocado pela aparição de Deus a Abraão (At 7.3-4). 347
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Podemos supor que esse chamado repetiu-se em Harã (ver Wiseman, in Millard e Wiseman, 140). Depois da morte de Terá (Gn 11.32), Abrão partiu junto com o sobrinho Ló para a terra que Deus lhe mostraria (Gn 12.4-5). A narrativa da jornada de Abraão até Canaã, e dentro dessa terra, é marcada pela inter venção divina por meio de ordens, promessas, bênçãos e alianças, e pela resposta dc Abraão demonstrando obediência, fé e devoção. Seu itinerário o levou a Siquém, no centro de Canaã. Em seguida, levantou sua tenda entre Betei e Ai, onde construiu um altar ao Senhor (Gn 12.8). Depois disso, rumou para o Neguebe, na região sul de Canaã (Gn 12.9). Uma grande fome na terra o levou a descer para o Egito, onde usou de dissimulação e apresentou a esposa Sarai como irmã (Gn 12.10-20; verT. D. Alexander, 145-53; -> Sara). Ao voltarem para seu lugar anterior entre Betei e Ai, Abrão e Ló resolveram separarse, em decorrência de disputas por pastagens (Gn 13.1-13). Esse episódio foi seguido de uma reiteração das promessas de Deus de conceder-lhe uma nação e terras (Gn 13.14-17). Em se guida, Abrão mudou suas tendas de lugar e foi habitar próximo às grandes árvores de Manre e Hebrom onde, novamente (pela terceira vez) construiu um altar ao Senhor (Gn 13.18). O tema-chave dos dois capítulos introdutórios (Gênesis 12 e 13) é que o Senhor assumiu determinados compromissos com Abrão, promessas que foram parcialmente cumpridas, mas que sofreram ameaças constantes de fatores circunstanciais e humanos. Todos os elementos principais do restante da narrativa de Abrão estão relacionados a esse tema (Goldingay, 13). Invasores estrangeiros capturaram Ló, de modo que Abrão e mais 318 homens derrota ram-nos, resgataram Ló e tomaram de volta os espólios. Isso trouxe a bênção de Melquisede que, o rei-sacerdote de Salém, para o qual Abrão entregou o dízimo (Gênesis 14; ver Millard, ABD, 35). Abrão voltou a receber uma confirmação da promessa divina, dessa vez, selada por meio de uma elaborada cerimônia de aliança (Gênesis 15; ver Sarna, 112). A aparente disparidade entre as promessas de Deus e o cumprimento delas chega ao auge: De acordo com um costume em voga, llagar, uma serva egípcia é usada como substitu ta para Sara, a esposa estéril (Gn 11.30; 16.1), a fim de ajudar Deus a cumprir a promessa de uma descendência numerosa (Gn 16.1-15). Dessa união nasceu Ismael, quando Abrão estava com 86 anos de idade. A narrativa de Gênesis não fala dos treze anos seguintes. Deus apareceu a Abrão, que estava então com 99 anos (Gn 17.1; cf. 12.1; 15.1), anunciando a si mesmo e apresentando um desafio (Gn 17.1; cf. 15.1) que reafirmava e fortalecia a promessa de uma posteridade abundante (Gn 17.2-8). A palavra-chave “bênção” (Gn 12.2-3) é substituída pela palavra-chave “alian ça”, que na realidade significa uma promessa de abençoar (ver Goldingay, 14). Deus promete expressamente dar uma descendência que será “bênção” tanto para Sara, por intermédio do nascimento de um filho (Gn 17.16), como para Ismael, o filho de Hagar(Gn 17.20). É nesse ponto que os nomes de Abrão e Sarai são mudados para Abraão e Sara, respec tivamente (Gn 17.5, 15). Além disso, é ordenada a instituição da circuncisão (->) como sinal da firmeza da aliança de Deus com Abraão e sua descendência (Gn 17.9-14; ver Sarna, 113). Sara recebe a promessa clara de que terá um filho que se chamará Isaque, por meio do qual seria mantida a aliança (Gn 17.16-19, 2 1). Numa terceira teofania (Gn 18.1; ver 12.7; 17.1), o Senhor apareceu a Abraão próxi mo às grandes árvores de Manre como um dos três visitantes que foram devidamente acolhi dos pelo patriarca. Foi declarado que em breve Sara teria um filho (Gn 18.10-15). O Senhor revelou também a intenção de destruir Sodoma e Gomorra. Abraão rogou pela revogação dessa ameaça por amor a um pequeno grupo de fiéis que talvez existisse nessas cidades (Gn 18.16-33). Ao que parece, não foi possível encontrar o número mínimo de dez fiéis, ainda 348
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que, pela intercessão de Abraão, Ló e suas filhas tenham sido salvos da destruição que se seguiu (Gn 18.16— 19.29). A única viagem de Abraão mencionada depois disso é sua estada temporária como es trangeiro residente (gêr) no território de Gerar, entre Cades e Sur e que na época era governado por Abimeleque (Gn 20.1). O capítulo 20 também revela que a capacidade de Abraão de colocar em perigo a promessa ainda não havia se esgotado sendo que, dessa vez, o patriarca fez Sara passar-se por irmã diante de Abimeleque. Cumpre-se finalmente, a promessa de um filho (Gn 21.1 -7). Aos noventa anos de idade (Gn 17.17) Sara deu a Abraão, agora com cem anos, um filho que foi chamado de Isaque. Com isso, surge a questão do relacionamento entre os dois filhos de Abraão. Gênesis 21.8-21 reafir ma que os dois se tomarão nações (Gn 21.13; cf. 17.20), mas Isaque terá importância especial (Gn 21.12; cf. 17.21). O tratado entre Abraão e Abimeleque em Berseba (Gn 21.22-34) ilustra o cumprimento de outro aspecto da promessa de Deus a Abraão: o patriarca foi engrandecido (Gn 12.2; ver Goldingay, 15). O ponto crítico da vida de Abraão foi a ordem de Deus para que sacrificasse Isaque na terra de Moriá (Gn 22.1 -12). Abraão obedeceu sem nenhuma restrição e sua mão foi detida no último instante, quando um carneiro foi providenciado para tomar o lugar do menino (Gn 22.13-14; ver Sarna, col 113). A esse episódio, seguiu-se uma renovação da promessa da aliança com referência a descendentes e bênçãos (Gn 22.15-19; cf. 12.2). Depois de um retrospecto que se passa em Harã (Gn 22.20-24) e que oferece um pano de fundo para Gênesis 24, o cap. 23 fala da morte de Sara e de como Abraão comprou um lu gar para ela ser sepultada em Hebrom (ver Goldingay, 16). A fim de garantir que a promessa permaneceria dentro da família, Abraão enviou aos seus parentes na região de Hebrom seu principal servo com a missão de encontrar uma esposa para Isaque (Gn 24.1 -67). Uma vez re solvida a questão sucessória, Abraão distribuiu presentes entre seus outros filhos e, ao falecer com 175 anos de idade, foi sepultado por Isaque e Ismael ao lado da esposa Sara (Gn 25.1-10; ver Millard, ABD, 35). Goldingay conclui corretamente que o tema da narrativa de Abraão é o compromisso de Javé em abençoar o patriarca com descendentes e terras e fazer dele uma bênção para outros povos; os obstáculos para o cumprimento dessa promessa surgiram de várias partes, mas Javé continuou a reafirmar seu compromisso e providenciou para que este se cumprisse parcialmente durante a vida do próprio Abraão (op.cit., 16). 3. Abraão no restante do AT. Além de Gênesis, Abraão é mencionado em quinze livr do AT: Êxodo (2.24; 3.6, 15, 16; 4.5; 6.3, 8; 32.13; 33.1); Levítico (26.42); Números (32.11); Deuteronômio (1.8; 6.10; 9.5, 27; 29.13; 30.20; 34.4); Josué (24.2-3); 1 Reis (18.36); 2 reis (13.23); I Crônicas (1.27, 28, 32, 34; 16.16; 29.18); 2 Crônicas (20.7; 30.6); Neemias (9.7); Salmos (47.9 [10]; 105.6, 9, 42); Isaías (29.22; 41.8; 51.2; 63.16); Jeremias (33.26); Ezequiel (33.24) e Miquéias (7.20). Essas referências estão, em sua maioria, relacionadas aos dois temas principais da narrativa de Abraão: a promessa de Deus de uma posteridade numerosa e terras e a resposta fiel de Abraão às promessas de Deus. Essa promessa é repetida a Isaque (Gn 26.3) e Jacó (Gn 28.13-14; 35.11-12). José esperava que essas bênçãos fossem compartilhadas por seus irmãos (Gn 50.24) e Moisés devia exortar toda a Israel a essa fé (Êx 6.3-8). O Deus que chamou Abraão e fez aliança com ele era o “Deus de Abraão” (Gn 26.24). Israel era o “povo do Deus de Abraão” (Sl 47.9 [10]), a “posteridade de Abraão” (2Cr 20.7; Sl 105.6; Is 41.8; cf. Jr 33.26) e Abraão era o pai de Israel (Is 51.2). Em função de sua obediência fiel, Abraão ficou conhecido não apenas como “servo” de Deus (Gn 26.24; Sl 105.6,42), mas também como seu “amigo” (2Cr 20.7; Is 41.8). 349
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Tomando por base a força da fé de Abraão (Gn 15.6) e sua relação de aliança com Deus, Israel podia apelar a Deus para que se lembrasse de suas promessas (Ex 32.13) e também es tar certa de que ele confirmaria sua aliança com Abraão (Lv 26.42; Dt 9.27; 29.13; 2Rs 13.23; ICr 16.16; SI 105.9-11). Foi por causa de Abraão que Deus livrou Ló (Gn 19.29), abençoou Isaque (Gn 26.24), redimiu Israel da escravidão (Êx 2.24) e continuou a usar de misericórdia para com Abraão (Mq 7.20; ver Hicks, 20; Sarna, 113-14). 4. Abraão e a revelação especial. Deve-se fazer uma distinção entre a form a e o conte údo da revelação feita a Abraão. Com referência à forma, esta adquiriu gradativamente maior importância e abrangência. No passado, costumava-se afirmar que Deus falava à humanidade, sem entrar em detalhes sobre a forma do discurso nem se esse discurso vinha acompanhado de uma aparição. Então, é apresentada pela primeira vez uma descrição mais ou menos circuns tancial da forma (ver G. Vos 82-89). A forma da revelação a Abraão também é de caráter direto, sem a mediação de profetas (ver Wenham, in Millard e Wiseman, 185). Resumindo as diferentes maneiras como Abraão recebeu a revelação divina, temos: em grande parte, por intermédio da palavra falada (Gn 12.1 -3; 13.14-17; 21.12-13; 22.1-2), depois, por meio de visões (Gn 15.1-6; cf. 46.2-4), sonhos (cf. Gn 20.3-7; cf. 28.12-15. 31.10-13, 24; etc.), aparições ou teofanias (Gn 12.7; 16.7-14; 17.1; 18.1; cf. 26.2, 24; 35.1, 9; 48.3; etc.) e pelo Anjo do Senhor (Gn 16.7-13; 21.17-19; 22.11 -12, 15-18; cf. 31.11). Quanto ao conteúdo da revelação, a principal característica que se destaca é o fato significativo de que Deus havia chamado, eleito Abraão, para levar adiante a obra divina de redenção e revelação. De acordo com Vos, essa é a relevância extraordinária do chamado de Abraão. Assim, todo o curso da grande obra de Deus se restringe ao canal limitado de um só povo (89-90). A segunda característica marcante da revelação de Deus a Abraão se refere à objetivida de das dádivas que ela concede. De acordo com Vos, trata-se do início de uma religião factual, associada a intervenções divinas objetivas em favor da humanidade (93). Deus começa dando suas promessas a Abraão. O princípio fundamental não é o que Abraão precisa fazer para Deus, mas o que Deus fará por Abraão. Não há um consenso entre os estudiosos com referência à efetividade e extensão das promessas, mas de acordo com a própria narrativa sobre Abraão, há três promessas interliga das: O povo escolhido seria transformado numa grande nação (Gn 12.2; 13.16; 15.5; 17.2-6), a terra de Canaã seria deles (Gn 12.7; 13.14-17; 15.7; 17.8) e se tomariam uma bênção para todos os povos (Gn 12.3). Essas três promessas foram combinadas nas estipulações da aliança, por meio da qual Deus ingressou numa relação pessoal com Abraão (Gn 17.7). A resposta de Abraão à revelação divina foi expressada pelas atitudes tradicionais de devoção, sacrifícios, votos, dízimos, purificação ritual e oração. Abraão foi um homem de fé (Gn 15.6) que obede ceu às ordens de Deus e creu em suas promessas. Em suma: O que distingue a fé de Abraão não é o ritual externo, mas sim a concepção de Deus como aquele que escolhe, promete e conduz a um relacionamento próximo com ele aqueles que ele chamou (ver V. R Hamilton, 71). 5. Abraão no estudo do AT. Esta breve discussão concentra-se em duas matérias prin cipais: a historicidade e a religião de Abraão. a. A historicidade de Abraão. Uma das principais tendências da abordagem modern historicidade de Abraão pode ser destacada com duas citações, uma de Wellhausen e outra de T. L. Thompson. De acordo com Julius Wellhausen, “não há conhecimento histórico a ser ob tido sobre os patriarcas, mas somente sobre o período em que as histórias acerca dos mesmos surgiram no meio do povo de Israel. Esse período posterior só precisou ser projetado para o 350
Abraão / Abrão
passado, para uma antigüidade venerável, a partir da qual se refletiu como uma gloriosa mi ragem” (Prolegomenon to the History o f Israel, 318). Para Wellhausen, o Abraão histórico perdeu-se irreparavelmente e é inútil tentar procurá-lo. Essa proposição tomou-se a forma de avaliação mais comum do caráter histórico de Abraão, especialmente no meio dos estudiosos europeus do AT. O conhecido estudioso holandês Th. C. Vriezen, por exemplo, “considera que a narrativa histórica começa com Moisés, não porque nega a possibilidade de uma revelação pré-mosaica a Abraão, mas porque, em sua opinião, é possível até certo ponto usar de uma abordagem histórica acadêmica com respeito a Moisés, porém não com respeito a Abraão” (An Outline o f OT Theology, 1958, nota 1; 30). Também para T. L. Thompson, “a busca pelo Abraão histórico é, fundamentalmente, uma ocupação improdutiva” (315). O autor encerra seu livro sugerindo que não é preciso que os patriarcas tenham nenhum valor histórico a fim de serem verdadeiros. Antes, a fé de Israel é uma resposta à esperança em Deus dentro de uma situação presente. Nesse sentido, a histó ria da salvação não constitui algo que, de fato, aconteceu, mas sim uma forma literária surgida de um determinado contexto histórico (328). O presente é afirmado criando-se um passado do qual ele é o cumprimento. Assim, os fiéis não têm interesse algum na realidade histórica de uma narrativa do AT (326-30; ver Goldingay, 35). Para uma avaliação essencialmente negativa da historicidade de Abraão, especialmente à luz das evidências arqueológicas, ver Hayes e Miller, IJH, 1977; J. Van Seters, Abraham e W. G. Dever, in Hayes e Miller, 99-102. É verdade que o problema da historicidade de Abraão e a investigação do seu tempo dentro do contexto da história antiga constitui, de fato, uma questão complexa, mas não há necessidade alguma de partir para um ceticismo excessivo como o que se encontra demons trado acima (ver J. Bright, 67-103; J. J. Bimson, in Millard e Wiseman, 59-92. M. J. Selman, in Millard e Wiseman, 93-138). A maneira como os testemunhos bíblicos da fé se referem a acontecimentos históricos passados, como forma de explicação e justificação, toma difícil crer que não partem do pressuposto de que suas histórias são verídicas. Se, por exemplo, as narrativas patriarcais não são, em sua essência, verdadeiras, podem fazer sentido, ainda que estejam desprovidas de referência (Goldingay, 37). De acordo com Hamilton, o ponto de vista de Thompson é exatamente o oposto da idéia dos escritores bíblicos, ou seja, de que é Abraão quem estimula a fé da comunidade religiosa. Como justificar o fato de que os acontecimen tos tanto do êxodo sob a liderança de Moisés, quanto da conquista sob o comando de Josué são fundamentados nos episódios patriarcais de Gênesis? Se tais episódios são fictícios, então também não há base para a fé no êxodo ou na conquista — a menos que ocorrências fictícias encontrem-se fundamentadas em outros acontecimentos fictícios. “Não estamos dizendo que as tradições patriarcais precisem ser verdadeiras para ter valor. Caso não sejam verídicas, abre-se mão do testemunho canônico de Gênesis, afirmando-se que a história bíblica não começa com o êxodo do Egito ao qual foi acrescentado uma tradição patriarcal, mas sim com uma tradição patriarcal que serviu de ponto de partida para o êxodo e a conquista”. Hamilton conclui que “devemos considerar ainda aquilo que se perde da mensagem bíblica de redenção, inclusive o Novo Testamento, caso os patriarcas não existissem. De acordo com a revelação bíblica, Abraão é a primeira etapa de um plano e Jesus Cristo, o filho de Abraão, representa o apogeu da provisão de Deus para a redenção da humanidade” (66-67). Wiseman também enfatiza esse ponto de vista: “A tradição bíblica em si é unânime em situar os patriarcas antes do êxodo do Egito. O texto mostra-se coerente ao levar cada geração sucessiva a remeter de volta a ‘nosso pai Abraão’” (in Millard e Wiseman, 148-53). Depois de estudar as três principais objeções a um contexto do segundo milênio para a narrativa de Abraão — anacronismo, ausência de provas e narrativas repetidas— A. R. Millard 351
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concluiu: “É, portanto, admissível situar Abraão no início do segundo milênio a. C. Apesar de as informações extrabíblicas não se limitarem de modo algum a essa era... sem dúvida permitem chegar a tal conclusão em conformidade com os dados bíblicos” (ABD, 40; Bimson, 59-92; M. J. Selman, in Millard e Wiseman, 93-138; Wiseman, in Millard e Wiseman, 139-56). b. A religião de Abraão. Para um levantamento detalhado das diferentes abordagens esse problema controverso, ver H. Weisman, Die Patriarchen und ihre Religion im Licht der Forschun seit Julius Wellhausen, 1968; G. J. Wenham, 157-88; Bright, 96-103. De modo geral, podem-se distinguir duas posições acadêmicas com referência à religião patriarcal. A primeira é aquela de A. Alt, com sua concepção de que os três patriarcas de Gê nesis na realidade representam três tribos ou grupos de tribos, sendo que cada uma delas ado rava um deus diferente — daí a ênfase desse autor sobre a expressão “O(s) Deus(es) de nossos pais” ( 1929, Essays on OT History’ and Religion, tr. R. A. Wilson, 1968,3-86). A segunda linha de investigação é a abordagem comparativa da religião, tendo F. M. Cross como seu principal proponente. Cross rejeita a idéia de Alt de que os vários deuses, que recebem a denominação de “El” em Gênesis, são divindades locais e sugere, em vez disso, que esses nomes de EI referem-se à divindade cósmica de Canaã, El, o pai dos deuses, presente nos textos ugaríticos. Era a esse deus principal cananeu que os patriarcas adoravam (F. M. Cross, “Yahweh and the God of the Patriarchs,” HTR 55,1962,225-59; Canaanite Myth and Hebrew Epic, 1973). Para uma avaliação sucinta das idéias de Alt e Cross, ver Wenham, 166-67, 170-72. Ao analisarem-se as diferentes abordagens ao problema da religião de Abraão, é im portante atentar para os argumentos significativos contrários à origem cananéia dos Elim de Gênesis (ver M. Haran, “The Religion o f the Patriarchs,” A ST I4, 1965, 34-5). Ainda que mui tos desses Elim fossem associados a determinados locais (Gn 21.33; 31.13), vários deles não eram. O nome mais evidente sem uma associação local é El Shadai (Gn 17.1; 28.3; 35.11; 48.3). De acordo com Haran, “o caráter fundamentalmente hebraico de El Shadai é, talvez, a característica que mais chama a atenção nas tradições patriarcais” (34; ver também Wenham, 159-60). Uma evidência de peso contra a origem cananéia é a ausência de nomes relativos a Baal em Gênesis (ver Hamilton, 69 e Wenham, 184-85). A explicação mais simples para isso é que “as denominações Elim eram aceitas em Israel como nomes para Javé... justamente porque constituíam uma herança hebraica e pré-mosaica, o que não era o caso com relação a Baal” (Haran, 49, n. 1). Uma pergunta intrigante é se Abraão conhecia Deus como Javé. O nome Javé ocorre 65x em Gênesis, mas Êxodo 6.2-3 afirma que o Senhor “[apareceu] a Abraão, a Isaque e a Jacó como Deus Todo-Poderoso (El Shadai); mas pelo [seu] nome, O Senhor (Javé), não lhes [foi] conhecido”. A explicação que atribui Êxodo 6.2-3 a S não leva em consideração que várias referências a Javé atribuídas a S (Gn 17.1; 21.1) indicam que Javé era conhecido dos patriar cas por esse nome (Hamilton, 70), enquanto em J havia 59x menções a Javé. Assim, nem S nem J discordam abertamente um do outro com relação ao conhecimento de Javé no período pré-mosaico; ou então, Êxodo 6.2-3 requer outra interpretação. Hamilton sugere que Êxodo 6.2-3 mostra uma revelação mais profunda de Javé à era pós-mosaica do que aquela apresen tada na era pré-mosaica (70). De acordo com Wenham, o editor javeísta de Gênesis estava tão convencido da identidade de Javé e do Deus que se revelou aos patriarcas que não usou Javé apenas na narrativa, mas também, com mais moderação, ao relatar as falas de homens e anjos (183, ver 177-83; ver R. W. L. Moberly, The OT o f the OT: Patriarchal Narratives and Mosaic Yahwism, OBT, 1992; também J. C. de Moor, The Rise o f Yahwism: The Roots o f ísraelitic Monotheism, B E T L 91,1990; Jean-Marc Heimerdinger, “The God of Abraham,” VE22, 1992, 352
Abraão / Abrão
41-55; “O Deus de Abraão é facilmente reconhecível como o tipo de Deus pessoal atestado nos textos mesopotâmicos”). Hamilton diz que “por certo, a concepção de Deus, que seu povo, indivíduos ou grupos possuíam, foi evoluindo com o tempo. Abraão teve uma visão um tanto turva desse Deus. Foi ao mesmo tempo produto de seu tempo e aquele que transcendeu sua era. E pouco provável que tenha desenvolvido, ou que fosse capaz de desenvolver um tratado teológico acerca do monoteísmo. No entanto, o relacionamento do patriarca com seu Deus era dinâmico, confiante, maduro e comprovado (70; ver também Bright, 96-103). (-> Javé)
P-B 1. Abraão na tradição judaica. Para uma discussão profunda sobre Abraão na Agadá e na filosofia judaica, ver as contribuições de Israel Ta-Shma e David Kadosh in EncJud 2:115-120. A posição elevada de Abraão dentro do AT atingiu o auge de sua expressão no judaísmo. Pelo fato de o patriarca ter sido escolhido por Deus, todos aqueles que confessarem pertencer a ele compartilharão com ele do reino de Deus (cf. Mt 3.9). Para o judaísmo rabínico, a vida de Abraão foi uma série de atos de obediência. Ele guardou todos os mandamentos (Yome 28b; QidduSin 4.14; etc.), mesmo aqueles que ainda não tinham sido revelados. Agiu dentro da mais estrita submissão à lei oral: “Ninguém se ocupou tanto dos mandamentos divinos como Abraão” (Nedarin 32a). A principal virtude de Abraão era o fato de ele ter sido o primeiro a reconhecer Deus. Há várias estimativas quanto ao momento exato desse acontecimento: quando ele estava com um, três, dez ou quarenta e oito anos de idade (Rabá de Gênesis 95.2; 64.4; ver EncJud, 115). As lendas judaicas relatam que Abraão foi o primeiro a reconhecer o monoteísmo e, como pri meiro prosélito, também se dedicou ao trabalho missionário (TDNT 1:8). O judaísmo helenista, principalmente com Filo, ressaltava a confiança de Abraão nas promessas de Deus, especialmente naquelas que se referiam ao juízo final e ao reino de Deus. Também atribuía a Abraão o início da crença num mundo vindouro (cf. Ecli Bar 57.2). Para Filo, Abraão personificava o arquétipo de um homem verdadeiramente livre, pois era “amigo de Deus” e emancipado de toda "opinião fútil” (H. A. Wolfson, Philo I, 76; ver EncJud, 117). 2. Abraão na tradição islâmica. Como progenitor das tribos árabes posteriores, Abra também foi essencial à tradição muçulmana. Foi um dos profetas enviados por Deus e, além de Moisés, é mencionado com mais freqüência no Alcorão do que qualquer outro indivíduo, sen do tanto para o islamismo quanto para o judaísmo o recebedor da aliança divina (ver Harrison, ISBE 1:17). Para uma discussão mais profunda, ver S. D. Goitein in EncJud, 2:119-21. NT Abraão no NT. Há oitenta referências a Abraão em onze livros do NT: Mateus (1.1,2, 17; 3.9; 8.11; 22.32); Marcos (12.26); Lucas (1.55, 73; 3.8, 34; 13.16, 28; 16.22, 23, 24, 25, 29, 30; 19.9; 20.37); João (8.33, 37, 39, 40, 52, 53, 56, 57, 58); Atos (3.13, 25; 7.2, 5, 8, 16, 17,32; 13.26); Romanos (4.1,2, 3, 9, 12, 13, 16, 18; 9.7, 8; 11.1); 2 Coríntios (11.22); Gálatas (3.6, 7, 8, 9, 14, 16, 18, 29; 4.22); Hebreus (2.16; 6.13, 15; 7.1,2, 4, 5, 6, 9, 10; 11.8, 11, 17, 19); Tiago (2.21, 23) e 1 Pedro (3.6). Em alguns w ., o nome aparece duas vezes. Os temas relevantes do AT estendem-se para o NT, sendo porém expandidos e reinterpretados de modo significativo. Abraão é ainda considerado o pai dos israelitas “segundo a carne” e eles são filhos dele (Mt 3.9; Lc 13.16; 16.24; At 13.26; Rm 11.1). No entanto, também se toma pai de todos aqueles que partilham de sua fé (Lc 19.9; Rm 4.16; G1 3.29), ao passo que seus descendentes naturais podem ser deserdados (Mt 8.11-12. Jo 8.39-40). O juramento que Deus fez a “Abraão, o nosso pai” (Lc 1.73), selado com suas promessas (At 7.5-6), estende-se agora a todos aqueles que, como Isaque, são “filhos da promessa” (Gl 4.28) e “herdeiros 353
Acã
segundo a promessa” (G13.29). Deus é o Deus vivo “de Abraão” (Mc 12.26; At 7.32) e, como no AT, Abraão é chamado de “amigo de Deus” (Tg 2.23). Esse mesmo Deus, “glorificou o seu Servo Jesus” (At 3.13) e, portanto, também opera em favor dos cristãos. Abraão é chamado enfaticamente de “pai de todos nós”, isto é, de todo aquele “que é da mesma fé que Abraão” (Rm 4.16; G1 3.7-9, 14). (Ver Hicks, 20; NIDNTT 1:77-80). Sara; -> Gênesis: Teologia B ib l io g r a f ia
NIDNTT 1:76-80; T. D. Alexander, “Are the Wife/Sister Incidents o f Genesis (12,20,26) Literary Compositional Variants?” VT4 2 ,1992m 145-53; D. W. Baker, “Diversity and Unity in the Literary Structure o f Genesis,” Essays, 189-205; J. J. Bimson, “Archaeological Data and the Dating o f the Patriarchs,” Essays, 59-92; J. Bright, A History o f Israel, 3a ed., 1981, 67-103; J. Goldingay, “The Patriarchs in Scripture History,” Essays, 11-42; B. Gemser, “God in Gene sis,” OTS 12, 1958, 1-21. idem, Vragen rondon, de Patriarchenreligie, 1958. V. P. Hamilton, The Book o f Genesis, NICOT, 1990; L. Hicks, IDB, 1962, 1:14-21; A. R. Millard, “Methods o f Studying the Patriarchal Narratives as Ancient Texts,” Essays, 43-58; idem, ABD, 1993, 1:35-41; A. R. Millard e D. J. Wiseman (eds.), Essays on the Patriarchal Narratives, 1980 (1983 [abrev. aqui como Esscrys]); A. Parrot, Abraham en zijn Tijd, 1964 (original em francês: Abraham etson temps)\ N. M. Sarna, EncJud, 1971,2:112; M. J. Selman, “Comparative Customs and the Patriarchal Age,” Essays, 93-138; T. L. Thompson, The Historicity o f the Patriar chal Narratives, BZAW 133, 1974; W. A. VanGemeren, The Progress ofRedemption, 1988; J. Van Seters, Abraham in History and Tradition, 1975; idem, Prologue to History: The Yahwist as Historian in Genesis, 1992; G. Vos, Biblical Theology: Old and New Testaments, 1948; G. J. Wenham, “The Religion o f the Patriarchs,” Essays, 157-88; D. J. Wiseman, “Abraham Reassessed,” Essays, 139-56. P. A. Verhoef Abrigo# 5039 (mistôr, abrigo) Absolvição Absorção
# 6142 (slh, praticar clemência, absolver, perdoar) # 1180 (b l‘ I, engolir, tragar, sorver)
Abundância -> # 8045 (rbb I, tornar-se numeroso, muito, grande)
Acã
Acã ( p v [ 'ãkãn], # 6575).
AT Acã ( ‘ãkãn, também Acar, 'ãkãr) é mencionado 6x no AT. Era originário da tribo de Judá e do clã de Zera. Era filho de Carmim, filho de Zinri (lC r 2.6-7). No ataque a Jericó, transgrediu a aliança com o Senhor ao tomar para si ouro, prata e uma boa capa babilônica (Js 7.15). O efeito foi devastador, pois a maldição do Senhor recaiu sobre Israel e seus inimigos os derrotaram facilmente em Ai. A narrativa ressalta que a observância da aliança é sine qua non para Israel, sendo responsável pela criação de sua solidariedade social. Somente ao remover o que era herem, coisa condenada (-> # 3051), é que Israel poderia novamente conquistar seus inimigos (Js 7.13). Acã arrependeu-se do que havia feito, mas somente depois de ser descoberto 354
Acabe
por Josué (Js 7.19). Sua insensatez foi exposta diante de Israel (Js 7.22-23) e ele, sua família e todos os seus bens transformaram-se em herein para Javé e foram destruídos por apedrejamento no vale de Acor ( akôr, perturbação). O propósito dessa história era ensinar que a obediência à aliança/Livro da Lei era ab solutamente essencial para que Israel tomasse (mantivesse sob seu poder) a terra de Canaã (Js 7.1 -26) e que o pecado de um indivíduo podia destruir a nação toda (Js 22.20) e trazer a ela “perturbação” (cf. 'kn, conturbar, Js 7.25). O escritor de 1 Crônicas 2.7 repete o trocadilho de Josué indicando que Acar ( ‘ãkãr) era o perturbador ( 'kr [-> # 6579]) de Israel (alguns MSs apresentam 'kn nesse caso). E possível que, originalmente, a palavra usada tenha sido Acar, tendo Acã como um termo convenientemente alterado para formar um trocadilho, pois a LXX usa achar ao longo de todo o texto. No entanto, pode ser também que a LXX estivesse tentando simplificar esse jogo de palavras da narrativa (a Vg. segue o texto hebraico). É interessante observar que o escritor de Oséias consola o povo de Deus com a esperan ça de que o Senhor transformará o vale de Acor ( ‘ãkôr), um lugar de julgamento, numa porta de esperança (tiqwâ) (Os 2.15). B ib l io g r a f ia
ABD 1:54; IDB 1:26; NDB 2:10. Eugene Carpenter / Michael A. Grisanti
Acabe
Acabe (3XnX [ 'ahãb], rei de Israel, #281).
Acabe significa “irmão do pai” e, de acordo com Noth (230), esse rei não era de ori gem israelita. Essa designação pode ser um nome monárquico indicando que ele era príncipe co-regente com seu pai (Gray, 367). Acabe sucedeu ao pai Onri no trono de Israel (1 Rs 16.28—22.40; 2Cr 18.1 -34; Mq 6.16) em 874 a. C. (Comey, 78) e reinou (1 Rs 16.29) em Samaria durante vinte e dois anos. 1. Relações exteriores. Acabe herdou um reino estabelecido e seu trabalho foi princi palmente dar continuidade e expandir o que seu pai havia iniciado. Manteve as alianças com Sidom e Judá e talvez também com o Egito. O casamento de Acabe como Jezabel, filha de Etbaal (lR s 16.31), selou o pacto entre Israel e Sidom. Essa aliança vantajosa iniciada pelo pai de Acabe, Onri, permitia que Israel tivesse acesso ao comércio fenício no Mediterrâneo. Outro casamento diplomático, o da filha Atalia (2Rs 8.18,26) com Jeorão de Judá, selou as relações de paz com Judá. Quanto às relações com o Egito, estas são confirmadas por um vaso de alabastro contendo traços de uma cártula de Osorcom II (Kitchen, 324). Depois de sua ascensão ao trono, Acabe foi vitorioso no conflito com Ben-Hadade e suas forças araméias nas batalhas travadas em Samaria e Afeca (1 Rs 20). Conseguiu inverter a situação e acabou fazendo um tratado com Ben-Hadade (1 Rs 20.34). Ao que parece, o principal motivo para esse tratado foi a crescente ameaça da Assíria, uma vez que, posteriormente, BenHadade e Acabe uniram forças contra Salmaneser III em 853 a. C. (Oppenheim, 278-79). De acordo com a inscrição de Mesa (linha 6), Acabe deu continuidade à dominação is raelita sobre Moabe, mas foi posteriormente desafiado pelos moabitas (linhas 5-10; cf. Ullendorff, 196). Essa insurreição ocorreu durante o reinado de Jorão, filho de Acabe (2Rs 3.1-27; cf. Smelik, 90-91 e Dearman, 169-70). Outras batalhas de Acabe: Em seus anais no Obelisco Negro, Salmaneser III menciona que lutou contra uma coalizão de reis cananeus em Qarqar no Orontes em 853/2 a. C. Acabe, o 355
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israelita, e Hadadezer de Damasco encontravam-se entre os membros da coalizão (Oppenheim, 278-79). Apesar do sucesso relativo da coalizão em deter o avanço assírio, a aliança durou ape nas enquanto os assírios representavam uma ameaça a seus participantes (Soggin, 220). 2. Política religiosa. De acordo com costumes em voga desde o tempo de Salomão, a rainha possuía o próprio santuário dela (1 Rs 11.1 -8; cf. 16.31 -33). Não foram encontrados ves tígios de um santuário ou templo em Samaria. Portanto, Yadin (1978, 129) sugere que este se encontrava no monte Carmelo, na terra de Samaria. O casamento de Acabe com Jczabel teve influência negativa sobre a vida religiosa de Israel, uma vez que Jezabel promoveu a adoração a Baal em Israel. Apesar de a política religiosa dos simpatizantes de Onri favorecer a adoração a Baal, os nomes teofóricos que Acabe deu aos filhos indicam que o rei ainda era javeísta (Jagersma, 199; Parzen, 78-79; Ahlstrõm, 588). E interessante observar que à medida que foi cres cendo a influência de Jezabel, o relacionamento de Acabe com os profetas de Javé sofreu uma deterioração progressiva. Esse fato levou a repetidas confrontações com Elias, que atingiram o ápice no conflito com os sacerdotes de Baal no monte Carmelo (1 Reis 17— 19). Apesar de Elias haver saído vitorioso em nome de Javé, teve que fugir da fúria de Jezabel (1 Rs 19.2). 3. Programas de construção. A prosperidade gerada pelas políticas dos governantes na dinastia dc Onri ofereceu a Acabe os meios para continuar a desenvolver os programas de construção iniciados pelo pai (Pienar, 153-55), como uma casa de marfim em Samaria (Kenyon, 7 1-89) e cidades fortificadas (1 Rs 22.39) e com sistemas de distribuição de água eficientes em Megido e Hazor (Yadin, 1975, 227-47). Vários incidentes mostram o afastamento gradual de Acabe da aliança e do culto a Javé. Um exemplo é o episódio com Nabote. Acabe queria a vinha de Nabote para fazer uma horta. Quando Nabote se recusou a ceder-lhe a vinha. Acabe reconheceu, ainda que relutantemente, esse direito do proprietário. Jezabel, por outro lado, não foi capaz de aceitar o fato, pois em seu país de origem, os direitos dos indivíduos estavam sujeitos ao desejo do rei. Assim, a rai nha providenciou por meios legais para que Nabote fosse assassinado a fim de obter a vinha para Acabe (Pfeiffer, 23). Quando o rei estava prestes a tomar posse da vinha, Elias fez uma aparição dramática (Gray, 442) e pronunciou o julgamento de Deus sobre ele (lR s 21.17-25). A maldição proferida pelo profeta é claramente associada à transgressão das estipulações da aliança, pois os termos empregados (lR s 21.23-24) fazem lembrar as maldições de tratados desse mesmo período (Hillers, 69; cf. Dt 28.26). Uma vez que o arrependimento de Acabe pa receu ser verdadeiro (Gray, 443), o julgamento de Deus sobre a dinastia de Acabe foi adiado até os “dias de seu filho” (ou seja, “do filho de Acabe”; I Rs 21.29; cf. 2Rs 9.14-28). Tendo Josafá como aliado, Acabe empreendeu sua última campanha militar contra a Sí ria em Ramote-Gileade ( I Reis 22). A devoção pessoal dc Josafá e sua obediência a Javé ficam claras quando ele pede o conselho de um profeta do Senhor (1 Rs 22.7). Acabe, pelo contrário, não se impressionou com Micaías e consultou outros profetas cujo porta-voz era Zedequias, e este profetizou o sucesso da campanha (1 Rs 22.11-12). Em sua oposição a Micaías, que foi contra essa expedição (lR s 22.17), Acabe personificou uma convicção obstinada acerca da predominância política sobre a profecia (de Vries, 45; cf. lRs 22.13-16). Apesar da opinião negativa transmitida pelo profeta de Javé, Acabe provou ser um guerreiro valente na batalha, lutando até a morte (1 Rs 22.35). 4. Conclusão. Acabe foi um estadista e estrategista competente que promoveu a inde pendência e proeminência de Israel (Kittel, 239) ao expandir as políticas iniciadas por seu pai. Escavações em diferentes cidades importantes testemunham tanto em favor da elegância quanto do planejamento estratégico da era de Onri. Infelizmente, como também aconteceu com seu pai, em função da atitude leniente de Acabe (1 Rs 16.31 -34) com relação ao culto a Baal (Pienaar, 356
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157), essas políticas criaram uma resistência aos profetas. É interessante observar que o Talmude apresenta uma atitude mais positiva com relação a Acabe. Os rabinos admitiram os pecados do rei, mas também reconheceram a bravura dele como militarista e rei (Waldman, 47). B ib l io g r a f ia
G. W. Ahlstrõm, The History o f Ancient Palestine from the Palaeolithic Period to A lexander s Conquest, 1993; J. Bright, A History o f Israel, 1984; idem, The Kingdom o f God, 1953; R. W. Comey, The Reigns o f Omri and Ahad, 1970; J. A. Dearman, “Historical Reconstruction and the Mesha Inscription”, in A. Dearman (ed.), Studies in the Mesha Inscription and Moab, 1989; S. J. De Vries, Prophet Against Prophet, 1978; J. Gray, / cê II Kings, 1970; D. R. Hil lers, Treaty Curses and the O. T. Prophets, 1964; H. Jagersma, A History o f Israel in the Old Testament Period, 1978; K. Kenyon, Royal Cities o f the Old Testament, 1971; K. A. Kitchen, The Third Intermediate Period in Egvpt, 1973; R. Kittel, Geschichte des Volkes Israel, zweiter Band, 1925; E. H. Merrill, Kingdom ofPriests, 1987: J. M. Miller & J. H. Hayes, HAIJ, 1986; M. Noth, The History o f Israel, 1960; L. Oppenheim. “Babylonian and Assyrian Historical Texts”, in J. B. Pritchard (ed.), ANET, 1969; H. Parz.en. “The Prophets and Omri and Dynasty”, HTR 33, 2:69-96, 1940; C. Pfeiffer, The Divided Kingdom, 1967; D. N. Pienaar, “The Roll of Fortified Cities in the Northern Kingdom During the Reign o f the Omride Dynasty”, JNSL 9, 1981, 151 -58; K. A. D. Smelik, Converting the Past: Studies in Ancient Israelite and Moabite Historiography, 1992; A. Soggin, An Introduction to the History o f Israel and Judah, 1993; E. Ullendorff, “The Moabite Stone”, in D. W. Thomas. DOTT, 1958, 195-98; N. M. Waldman, “Ahab in Bible and Talmud", Ji/í/a/s/w 37:41-47,1988; Y. Yadin, "The ‘H ouseofB a’al’ofAhab and Jezebel in Samaria, and That o f Athalia in Judah”, in Archaeology in the Levant: Essays fo r Kathleen Kenyon, P. R. S. Moorey & P. J. Parr, eds., 1978, 127-63; idem. Hazor, The Rediscovery o f a Great Citadel o f the Bible, 1975. D. N. Pienaar Acampamento -> # 4328 (lyn, posar, acampar, permanecer, residir) Ação de graças -> # 9343 (tôdá, ação de graças, louvor)
Acaz
Acaz (Tnx [ ahãz], # 298).
AT As lutas políticas e os insucessos morais de Acaz, rei de Judá (->) entre 735 e 715 a. C., servem de testemunho da dificuldade das circunstâncias em que ele se encontrava e da incapacidade que tinha de confiar em Deus em meio à adversidade. Apesar do reinado de Acaz ser descrito em três livros (2Rs 16.1-20; 2Cr 28.1-27; Is 7-8), vários problemas históricos re lacionados à duração de seu governo giram em tomo das diferentes maneiras de calcular os acontecimentos inter-relacionados que ocorreram durante esse período (cf. Hobbs, 2 Kings, 1985, 212). Pouco depois de subir ao poder, Acaz recusou-se a ingressar na coalizão contra a Assíria composta por Rezi, rei de Damasco (->), e Pecá, rei de Israel (-> Guerra Siro-Efraimita: Teologia). Em decorrência disso, Judá foi atacada pelos exércitos dessas nações, bem como pelos filisteus (2Cr 28.18) e edomitas (2Cr 28.17) por volta de 734-732 a. C. Mais de 120 mil soldados foram mortos em combate e 200 mil pessoas levadas para o cativeiro. Todas as ci dades, com exceção de Jerusalém, foram dominadas pelos exércitos invasores (2Cr 28.6-8). O escritor de Crônicas e o profeta Odede (2Cr 28.1-5,9) interpretaram essa derrota militar de 357
Acaz
modo teológico, afirmando tratar-se de um castigo de Deus, uma repreensão divina por Acaz ter feito o que era mal aos olhos de Deus. Crônicas fazem uma comparação clara entre Acaz e as práticas perversas dos reis de Israel. Seguindo o exemplo deles, Acaz confeccionou ído los de Baal, ofereceu sacrifícios e incenso em lugares altos de adoração a esse deus, queimou os filhos no fogo do vale dos filhos de Hinom (provavelmente em adoração a Moloque, cf. 2Rs 23.10) e construiu altares para um deus estrangeiro no terraço de sua casa (2Rs 23.12). Os atos de Acaz causaram uma inversão nas relações entre a nação do norte, Israel, e a nação do sul, Judá, que haviam sido firmadas no tempo de Abias (2 Crônicas 13). Nesse caso, Judá — e não Israel — é condenada por idolatria: sofre uma derrota militar e é parcialmente exilada (Williamson, 343-44). (-> Crônicas: Teologia) Isaías não se concentra na pecaminosidade de Acaz antes da guerra siro-efraimita nem na terrível derrota do exército de Judá, mas sim na promessa surpreendente de Deus de prote ger Judá dos inimigos que planejavam depor Acaz e declarar Tabeal como novo rei (Is 7.4-8). Isaías encorajou Acaz a crer na promessa de Deus e confiar no livramento do Senhor a fim de que não fosse derrotado (Is 7.9). Acaz foi confrontado com as questões fundamentais da fé: Deus, o Guerreiro Divino (->), é mais poderoso do que os exércitos dessas nações? Suas pro messas de proteção são verdadeiras? Deus irá, de fato, intervir nos acontecimentos históricos ou permitirá que as coisas tomem rumo de acordo com os planos dos homens? O medo que Acaz sentia dos inimigos era maior que seu temor a Deus. Não estava firmemente convicto de que Deus seria fiel. Chegou até a recusar a oferta de um sinal miraculoso para autenticar a palavra de Deus por intermédio de Isaías (Is 7.10-12). Em sua fraqueza, Acaz deixou de con fiar no Senhor, dependendo, em vez disso, da força do rei assírio Tiglate-Pileser III (->) para livrá-lo dos exércitos da Assíria e de Israel (2Rs 16.7-9). Em decorrência disso, Isaías procla mou uma palavra negativa de julgamento (Is 7.17; os assírios devastariam Judá) e uma palavra positiva de esperança futura (Is 7.14; o nascimento daquele que se chamaria Emanuel, “Deus conosco”). Em sua narrativa sobre o rei Ezequias (Is 36), Isaías faz um contraste entre a falta de fé de Acaz e a resposta positiva da liderança piedosa de Ezequias (->). Acaz não confiou em Deus (Is 7), enquanto Ezequias mostrou-se concorde e confiou plenamente no Senhor numa situação de crise internacional e militar semelhante (Oswalt, Isaiah I—3 9 ,1986, 55,630). (-> Isaías: Teologia) Depois que os assírios chegaram e salvaram Acaz da Síria e Israel (2Rs 16.9), Judá tomou-se reino vassalo da Assíria e foi forçado a pagar pesados tributos, sendo que parte des tes era proveniente do templo (2Cr 28.20-21). Posteriormente, Acaz foi a Damasco a fim de submeter-se a Tiglate-Pileser; enquanto estava lá, fez sacrifício a um dos deuses assírios num belo e elaborado altar pois, esses deuses estrangeiros haviam dado a vitória aos inimigos de Acaz(2Rs 16.10-18; 2Cr 28.22-25). Quer tenha sido de vontade própria ou sob pressão (cf. W. J. McKay, Religion inJudah under the Assyrians, 1973, 5-12), Acaz ordenou que o sacerdote Urias construísse uma réplica desse altar no templo de Jerusalém. Em seguida, mudou a dis posição de alguns dos altares existentes e demoliu outros, fechou o templo propriamente dito e construiu altares para deuses estrangeiros em todas as cidades de Judá. Isso levou a nação a uma grande apostasia e provocou a ira de Deus. Apesar de toda a perversidade de Acaz, seu fi lho Ezequias foi um rei piedoso que destruiu os altares pagãos em Jerusalém, reabriu o templo e conduziu a nação a um grande reavivamento (2Cr 29). (-> Assíria; Crônicas: Teologia) B ib l io g r a f ia
P. R. Ackroyd, “Historians and Prophets”, SEA 33, 1968, 18-54; idem, “The Biblical Interpretation o f the Reigns of Ahaz and Hezekiah”, Studies in the Religious Traditions o f the Old Tes358
Adão e Eva
íament, 1987, 181 -92; M. Cogan, “The Ahaz Altar”, Proceedings o f the Sixth World Congress o f Jewish Studies, 1977; M. E. W. Thompson, Situation and Theology: Old Testament Interpretation o f the Syro-Ephraimite War, 1982; H. G. M. Williamson, / and 2 Chronicles, 1982. Gary V. Smith Aceitação -> # 8354 (r$h I, agradar-se de, ser aceito) Acontecimento
# 7936 (qrh I, acontecer, construir, ordenar, dirigir, selecionar)
Açougueiro ^ # 3184 (tabbãh, açougueiro) Adaga
# 2995 (hereb, pederneira, adaga, espada)
Adão e Eva
Adão (D1X [ ’ãdãm III], # 134) e Eva (TTin [hawwá II], # 2558).TT
OMA A estrutura geral do material encontrado em Gênesis 1-11 tem seus paralelos mais pró ximos na história suméria do dilúvio e na lista de reis sumérios, bem como na epopéia de Atraase, todos eles de 1600 a. C. ou antes. Nesses textos, praticamente não existe uma avaliação ética e a humanidade é, antes de tudo, escrava dos deuses. Dentre a ampla literatura disponível, recomendamos: Bertrand, Hess, Jacobsen, Lambert e Millard, Van Seters.
AT 1. Adão. A palavra 'ãdãm pode significar homem/humanidade (-> # 132) num sentido geral ou pode referir-se ao primeiro homem. Na BH, em grande parte dos casos em Gênesis I—3, o termo é precedido do artigo. Assim, pode-se preferir a tradução “o homem”, no sentido de “o ser humano”, mesmo ao fazer referência a uma só pessoa. Isso porque Adão, o primeiro homem a ser criado representa a humanidade. Em outras passagens do AT, ’ãdãm ou hã 'ãdãm significam sempre “ser humano” (SI 32.2; Pv 28.17; Ec 5.18). Esse conceito não se limita so mente aos israelitas. Normalmente, envolve a condição da humanidade como criatura que de pende de Deus e deve prestar contas a ele (Salmo 8; em Ezequiel, ben ’ãdãm). Não se sabe ao certo a etimologia do termo 'ãdãm. Em Gênesis 2.7 e 3.19 fica implícita uma ligação com ’adãmâ (solo; # 141). Ao que parece, refere-se ao solo do campo, com sua cor predominantemente marrom avermelhada (cf. o vb. 'dm, ser vermelho, -> # 131). 2. Situação inicial. Deus criou (br ’) o primeiro homem à sua imagem (selem) e sem lhança (cPmút) no sexto dia. Criou-o do solo ( ’adãmâ) e soprou nele o fôlego da vida (nismat havyim) que o transformou num ser vivente (nepes hayyâ) (cf. Gn 6.3, 17; 7.15). A humani dade não é distinguida dos animais por possuir nepes (-> # 5883) e rúah (-> # 8120), pois os animais também os possuem. Antes, a distinção encontra-se na idéia de que os homens são criados à imagem de Deus (Gn 1.26-28). Esse conceito é ilustrado pelo fato de que os homens foram designados para exercer domínio sobre os animais da terra. O contexto de Gênesis 2.15-19 mostra a inclusão do trabalho de cuidar ( ’bd) do Éden e guardá-lo (smr), dar nomes aos animais e obedecer voluntariamente a Deus. A julgar por esses aspectos, a humanidade pode ser considerada uma espécie de vice-regente colocada entre Deus e a criação (cf. Salmo 8; também Wenham, 30-32 para outros pontos de vista). Como representantes de Deus, os ho mens não tinham a permissão de ser destruidores nessa incumbência. Tinham que trabalhar (Gn 1.28; 2.15) e consumir alimentos de origem vegetal (Gn 1.29). Somente depois da aliança 359
Adão e Eva
de Deus com Noé, os homens receberam permissão de comer a came de animais — permissão esta que será revogada no futuro caso se leve em consideração certas profecias (Is 11.7, etc.). Mesmo tendo sido expulsa do jardim do Éden, a humanidade não foi abandonada como um ser independente. Antes, os homens continuam tendo um valor singular e ocupando uma posição especial diante de Deus (Jónsson). 3. Eva. Deus criou a mulher para o homem. Ela era apropriada para ele e podia ser sua auxiliadora. Deus a criou a partir de uma costela (.yê/<5‘) [mais precisamente, “ilharga”] do homem, simbolizando a intimidade. O homem ( 'is) a chama de mulher ( 'issã). Em Gênesis 2.24, essa relação é considerada o alicerce para o casamento (monógamo). Em Gênesis 3.20, a mulher recebe o nome de Eva (hawwà), termo relacionado a hyh (viver). Apesar de a vida do indivíduo chegar ao fim, seus descendentes viverão (ela é a “mãe de todos os homens”). A bênção de Deus é experimentada no nascimento do primeiro filho (Gn 1.28; 4.1). O livro de Gênesis mostra que Adão e Eva são os progenitores de toda a humanidade. 4. A queda. Instigados pela serpente, os primeiros homens comem do fruto proibido. Homens dedicados exclusivamente a Deus, voltam-se agora para si mesmos. O desejo de co nhecimento e de igualdade com Deus prevaleceu sobre a obediência. As conseqüências diretas foram o temor ao Senhor e a consciência (literal e espiritual) da nudez. A serpente foi amaldi çoada, e haverá sempre inimizade entre a descendência da serpente e a descendência da mulher (Gn 3.15). Dentro do uso profundo da linguagem nesse capítulo, a serpente representa o poder do mal, a saber, o pecado. Assim, essa inimizade indica um futuro de contínuo antagonismo entre o bem e o mal (cf. Gn 4.7) e conflito entre os crentes e os incrédulos — um dos temas principais do AT. Muitos consideram a promessa dada em Gênesis 3.15 o proto-evangelho. De qualquer modo, as exegeses judaicas e cristãs mais antigas indicam, nesse ponto, a batalha en tre Satanás e o Messias vindouro, na qual este último vencerá. Além disso, é declarado que, desse momento em diante, a humanidade trabalhará com dor e sofrimento e a mulher terá filhos e dará à luz em meio a dores. Para o homem tirado do solo, diz-se, “porque tu és pó e ao pó tomarás” (Gn 3.19). Deus substitui as folhas de fi gueira, usadas pelos homens, por peles de animais (Gn 3.21). Em parte, essa história pode ser interpretada como um paradigma em que a batalha entre o bem e o mal é repetida várias vezes. No entanto, contém elementos que ocorrem somente uma vez, como a expulsão do jardim e a introdução da morte. Ademais, as conseqüências de uma única transgressão dos primeiros homens afetam seus descendentes (Nm 16.29; lRs 8.46; Jó 14.1-12; Sl 90.3). De acordo com a concepção de “individualidade corporativa” em Israel, cada homem é respon sável pelos outros; as bênçãos e maldições afetam gerações sucessivas (Gn 12.2; Ex 20.5-6). Em Gênesis, prevalece a consciência de culpa da humanidade. Trata-se de uma característi cas contrária ao tom otimista dos escritos mesopotâmios sobre a origem da humanidade. (-> A Queda da Humanidade) 5. Caim eAbel. O primeiro filho de Adão e Eva recebeu o nome de Caim. Não se sabe ao certo a etimologia do termo, que Eva associou a qnh, adquirir, gerar (-> # 7864). O segundo filho foi chamado de Abel, no heb., fôlego, vaidade (hebel; cf. Ec 1.2; # 2039). O primeiro filho tomou-se agricultor e o segundo, pastor. Cada um apresentou seus sacrifícios (Abel: das primícias = do que havia de melhor?). O sacrifício de Abel agradou a Deus, mas o de Caim não. Caim matou Abel apesar de uma advertência severa de Deus. Sua atitude depois da morte do irmão demonstrou uma consciência menor de culpa do que a atitude de Adão depois da que da — talvez um sinal de que a humanidade estava se endurecendo no pecado. Como castigo, Caim teria que vagar pela terra sem nenhum sossego. Longe da proteção da família, teve que levar uma vida pior que a de um beduíno e recebeu um sinal para que não fosse morto sem que 360
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houvesse conseqüências. Posteriormente, ele (ou seu filho Enoque?) construiu uma cidade que recebeu o nome de Enoque (Gn 4.17). 6. Sele. Depois de perder os dois filhos, Adão e Eva tiveram outro filho à imagem e semelhança deles, quando Adão estava com 130 anos de idade, e deram-lhe o nome de Sete (< syt (?) = colocar > substituir; -> # 8883; Gn 5.3). No tempo de Enos, as pessoas começaram a invocar o nome de Javé. Ao que parece, essa expressão indica a adoração pública (Gn 4.2526; cf. 12.8; 13.4; 21.33 e 26.25). 7. Genealogias. Na genealogia de Caim, estão relacionadas invenções de todo tipo, como tendas, instrumentos musicais e metalurgia. A genealogia de Gênesis 4 chega ao ápice num descendente cruel chamado Lameque, aquele que se vingou excessivamente (Caim seria castigado sete vezes, enquanto Lameque seria castigado setenta vezes). Fica evidente que o mal se mostrou cada vez mais presente nas gerações subseqüentes. Tendo em vista que o escri tor incluiu as invenções na linhagem de Caim, a impressão é de que, com isso, ele indica que todos os aspectos da cultura humana foram, de uma forma ou de outra, afetados pelo pecado de Caim. (-> Genealogia no AT). Gênesis 5 apresenta a genealogia de Adão a Noé, incluindo Sete, Enos, Enoque (que andou com Deus; Gn 5.22-24) e Noé (“consolo”). Em função de sua organização, as duas ge nealogias apresentam contrastes: arte e ciências na posteridade de Caim e devoção na de Sete. Westermann se opõe energicamente a essa exegese (1:343 na tr. em inglês) e, no entanto, essa tem sido a explicação mais aceitável ao longo da história da exegese (Augustine, Gabriel, Paul; cf. Bryan, Wilson). P-B Diversas histórias foram reunidas por L. Ginsberg, TheLegendoftheJew s, 1909-1938; M. M. Kasher, Encyclopedia o f Biblical Interpretation: A Millenial Anthology, 1953ss.; J. H. Charlesworth, The Old Testament Pseudepigrapha /-//, 1983-85. Ver também S. E. Porter,“The Pauline Concept of Original Sin, in Light o f Rabbinic Background,” TynBul 41, 1990, 3-30. NT Adão é considerado, com freqüência, o representante da humanidade, aquele por meio do qual o pecado entrou no mundo. Cristo veio para trazer salvação dessa condição (Mc 1.13; Rm 5.12-21; ICo 15) e restaurou a situação do Paraíso. O relacionamento entre Adão e Eva é determinado como exemplo para o matrimônio, no sentido de que não pode ser anulado, e para a relação entre marido e mulher (Mc 10.2-9; lTm 2.13-14). Abel é o primeiro mártir; era justo e vivia pela fé (Mt 23.35; Hb. 11.4; 12.24). Caim é considerado um exemplo negativo (1 Jo 3.11-15; Jd 11). B ib l io g r a f ia
D. A. Bertrand, La vie grècque d ’Adam et Eve, Paris, 1987; D. T. Bryan, “ A Reevaluation of Gen 4 and 5 in the Light of Recent Studies in Genealogical Fluidity,” ZAW99, 1987, 180-88; J. Gabriel, “De Kainitengenealogie: Gen 4:17-24,” Bib 40, 1959,409-27; R. S. Hess “The Genealogies o f Genesis 1-11 and Comparative Literature,” Bib 70, 1989, 241-54; idem, “Splitting the Adam: The Usage o f 'ãdãm in Gen 1-V,” SVT 41, 1990, 1-15; T. Jacobsen, “The Eridu Genesis,” JBL 100, 1981, 513-29; G. A. Jónsoon, The Image o f God: Genesis 1, 26-28 in a Century o f Old Testament Research, Stockholm, 1988; W. G. Lambert and A. R. Millard, Atra-hsís, 1969; W. G. Lambert, “Babylonien und Israel,” TREg, 1979, 5:67-79; M. J. Paul, “Genesis 4:17-24: A Case-Study in Eisegesis,” TyBul 47, 1996, 143-62; A. P. Ross, Creation and Blessing: A Guide to the Study and Exposition o f the Book o f Genesis, 1988; W. A. VanGEmeren, The Progress ofRedemption, 1988,40-97; J. Van Seters, “The Primeval Histories of 361
Adoção
Greece and Israel Compared,” ZA W 100, 1988, 1-22; B. K. Waltke, “Cain and His Offering,” WTJ48, 1986, 363-72; G. J. Wenham, Genesis /, WBC, 1987; R. R. Wilson, Genealogy and History in the Biblical World. Maarteen J. Paul Adesão -> # 1815 (dbg, grudar, agarrar, aderir, perseguir) Adivinhação Adivinho
# 7876 (qsm, praticar adivinhação) # 200 ( 'ôb II, adivinho, espírita, fantasma)
O AT não emprega em parte alguma o vb. adotar ou o subs. adoção. Também não contém nenhuma lei refe rente à adoção e há poucas evidências da presença de cerimônias de adoção. Portanto, a idéia de adoção é expressada em orações como “Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho” (2Sm 7.14) ou “Tomar-vos-ei por meu povo” (Êx 6.7). 1. O AT não apresenta casos claros de adoção. Cinco exemplos em Gênesis são possí veis ilustrações de adoção: 1. Por não ter filhos, Abrão deseja que seu servo Eliezer se tome seu herdeiro, ainda que, de modo geral, somente os filhos tivessem direito a herança (Gn 15.2); 2. Sara (Gn 16.2) e Raquel (Gn 30.3) quiseram adotar os filhos nascidos de suas servas quando estas foram usadas como mães substitutas; 3. fazendo uma analogia com um contrato Nuzu, argumenta-se que Labão adotou Jacó (Gn 29— 31), apesar de o AT não falar em momento algum de adoção nesse caso; 4. e, ao que parece, um avô adota seus netos como filhos (Jacó: Gn 48.5, José: Gn 50.23). E possível que essas ilustrações refiram-se apenas a questões de herança e não representem a adoção em seu sentido mais pleno. Exemplos como Êxodo 2.10 (a filha de Faraó e Moisés) ou Ester 2.7, 15 (quando Mordecai “adota” sua prima que ficou órfã), podem retratar muito mais a situação de um “filho de criação” do que de adoção. Semelhantemente, a expressão usada para Noemi sobre o filho de Rute, “A Noemi nasceu um filho” (Rt 4.17) deve significar que Noemi, a avó da criança, tomou-se ama-seca da criança. De outro modo esse procedimento teria solapado o propósito do casamento de Rute com Boaz (do ponto de vista legal, para ter um filho que pudesse dar continuidade ao nome do marido falecido de Rute). (-> Rute: Teologia) A escassez da adoção no AT pode ser atribuída 1. ao fato de laços familiares artificiais serem criados por uma consciência tribal muito unida que criava laços familiares artificiais e 2. à prática bastante difundida da poligamia, que tomava a adoção praticamente desnecessária. 2. A adoção é usada como metáfora para descrever o relacionamento familiar de Deus com seu povo. Ele é seu Pai e ele são seus filhos (Êx 4.22; Dt 8.5; 14.1; Jr 3.19; 31.9; Os 11.1) (VanGemeren). Observe-se porém como é raro os israelitas se chamarem de “filhos de Deus”, talvez para evitar a insinuação de alguma sexualidade de Javé (VanGemeren). 3 .0 AT também usa a adoção como metáfora para descrever o relacionamento de D com o rei, que é o filho de Deus (2Sm 7.14; lCr 17.13; 22.10; 28.6; SI 2.7; 89.27). O conceito de adoção divina dos reis pode ter como origem as alianças de concessão, nas quais um doa dor adota um donatário e a concessão assume a forma de uma herança (Winfeid, 192). Assim, a adoção de Davi por Deus serve de base legal para a concessão da dinastia real e a adoção de Israel por ele é o conceito subjacente a essa concessão (Weinfeld, 192). No entanto, P. C. Craigie considera a expressão “Tu és meu filho” (SI 2.7) um sinal de uma “renovação do relacionamento entre Deus e a casa de Davi na pessoa de um rei recémAdoçâo
362
Adoção
coroado” e “deixa implícito que um ‘novo nascimento’ de natureza divina ocorreu durante a coroação” (Psalms 1—50, 67). P-B Somente Paulo e mais ninguém, usa o termo adoção no NT (Rm 8.15, 23; 9.4; G1 4.5; Ef 1.5). E deveras interessante a forma como Paulo aplica esse termo a Israel em Romanos 9.4, um termo que o próprio povo de Israel nunca usou para si. Ao retratar o relacionamento de Israel com Deus como uma adoção, Paulo deixou claro que Israel devia sua existência e relacionamento com Deus não a qualquer coisa boa que tivesse em si mesma, mas somente à livre e bondosa escolha de Deus. NT -> NIDNTT 1:280-91 Nascimento, concepção, gravidez: -> ghh (puxar para fora [do ventre], # 1622); -> hrh (estar grávida, conceber, # 2225); hbl IV (estar grávida, em trabalho de parto, # 2473); -> hyl I (estar em trabalho de parto, estremecer, # 2655); -> hsp II (dar à luz prematuramente, # 3107); -> (ph II (dar à luz crianças saudáveis, # 3254); -> yhm (conceber, # 3501); y ld (dar à luz, gerar, ser nascido, # 3528); -> t ’m (dar à luz gêmeos, # 9298); Adoção: Teologia; -> Ge nealogia: Teologia Criança: -> gõlem (embrião, # 1677); -> (ap I (crianças, # 3251); -> yôrtêq (criança pequena, # 3437); -> yld (dar à luz, gerar, ser nascido, # 3528); -> yãtôm (órfão, # 3846); -> mamzêr (bastardo, # 4927); -> «a ‘a r (menino, # 5853); -> ‘ó/ê/ (criança, # 6402); -> / 'm (dar à luz gêmeos, # 9298); -> Adoção: Teologia B ib l io g r a f ia
ABD 1:76-79;/5fl£ 1:53-55; S. Feigin, “Some Cases o f Adoption in Israel”, JBL 50,1931,186200; C. H. Gordon, “Biblical Customs and the Nuzu Tablets”, BA 3, 1940,2-7; H. Hoffner, Jr., “Birth and Name-Giving in Hittite Texts”, JN E S27,1968,198-203; S. Kardimon, “Adoption as a Remedy for Infertility in the Period ofthe Patriarchs”, JSS 3,1958,123-26; F. Lyall, “Roman Law in the Writings of Paul”, 7SL 88,1969,458-66; M. Malul, “Adoption of Foundlings in the Bible and Mesopotamian Documents: A Study of Some Legal Metaphors in Ezekiel 16:1-7”, JS O T 46, 1990, 97-126; I. Mendelsohn, “A Ugaritic Parallel to the Adoption o f Ephraim and Manasseh”, / £ / 9 , 1959, 180-83; C. F. D. Moule, IDB 1:48-49; H. H. Rowley,“The Marriageof Ruth”, HTR 40,1947,77-99; J. H. Tigay, EncJud, 2:298-301; W. A. VanGermeren, “Abba’ in the Old Testament?” JETS 31,1988,385-98; J. Van Seters, “The Problem o f Childlessness in Near Eastem Law and The Patriarchs of Israel”, JBL 87, 1968,401 -8; M. Weinfield, “The Covenant of Grant in the Old Testament and in the Ancient Near East”, JAOS 90, 1970, 184-203. Victor P. Hamilton Adoração
# 2556 (hwh II, adorar, curvar-se)
Adomo -> # 2075 (hdr, aumentar, honrar, adornar) Adultério
# 5537 (n ’p , cometer adultério, idolatria)
Advertência -> # 2302 (zhr II, ser advertido, advertir) Afabilidade
# 6844 ( 'rb III, ser agradável) 363
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Afiação -> # 1406 (brr II, afiar) Aflição -> # 3324 (ygh I, afligir, magoar) Afortunado -> # 887 ( 'ír II, ser, fazer ou declarar feliz, abençoado)
Ageu: Teologia de A. Contexto histórico Não se sabe coisa alguma sobre o profeta Ageu. Assim como vários profetas do AT, é evidente que aqueles que coletaram, transmitiram e pregaram as palavras de Ageu consideravam a mensagem mais importante do que o mensageiro. O nome de Ageu está ligado ao termo heb. para “festival” (hag), de modo que talvez ele tenha nascido durante algum dos importantes dias religiosos de Israel. O cabeçalho do livro situa o começo do ministério de Ageu no primeiro dia de Elul (agosto/setembro), no segundo ano do governo do rei persa Dario I (520 a. C.). A data do último oráculo de Ageu é o 24e dia de quisleve (dezembro) do mesmo ano, indicando um período bastante curto de atividade. Devido à preocupação de Ageu com o templo, alguns estudiosos consideraram-no um dos “profetas cultuais” ou “profetas do templo”. Sem dúvida, ele encontra-se dentro da tradição profética do AT no que diz respeito ao uso que faz da conhe cida fórmula do mensageiro: “diz o Senhor”, apesar de apresentar uma nova forma de oráculo com o uso que faz da “Torá sacerdotal” (Ag 2.10-14). Ageu viveu numa época de tremenda inquietação política por todo o império persa. O grande Ciro, que havia derrotado a Babilônia, fora sucedido por seu filho Cambises em 529 a. C. Quando Cambises cometeu suicídio em 522, Dario I (Histaspes) tomou o trono, um acon tecimento que desencadeou uma eclosão de revoltas por todo o império. Alguns estudiosos acreditam que essas revoltas serviram de indicação para Ageu e Zacarias do colapso iminente do império e do início da nova era do reino de Deus. No entanto, é mais provável que tenham sido as palavras e esperanças de grandes profetas como Jeremias e Ezequiel, bem como a tradi ção antiga da escolha de Sião por Deus e da dinastia davídica que estimularam as expectativas mais intensas desses profetas. As palavras de Ageu revelam um estado de pobreza e desânimo entre os judeus que per maneceram em Judá e os que se juntaram a eles vindos da Babilônia. Ele fala de fome e secas freqüentes (Ag 1.6, 9-11; 2.17) que trouxeram consigo dificuldades econômicas, resultando em inflação, para a qual Ageu apresenta uma das definições clássicas (1,6d). Não é de admirar que, numa época como essa, era só o que povo podia fazer para conseguir sobreviver (Ag 1.4; o heb. [sepünim] indica algo muito mais improvisado do que o termo “apaineladas” empregado em várias versões). Trata-se de uma situação estranha, uma vez que o decreto de Ciro concedeu não apenas permissão, mas também recursos para a reconstrução do templo (Ed 3.7; 5.13-15), e tendo em vista o início anterior das obras de reconstrução por Sesbazar (5.16) ou por Josué e Zorobabel (3.8-13). E evidente que essa iniciativa passada havia perdido a força.
B. Temas teológicos 1. O templo e a era messiânica. Ageu, porém, acaba com as desculpas de seus contem porâneos de que são pobres demais para reconstruir o templo. Explica que a pobreza deles é resultante do fato de não terem se dedicado a essa reconstrução e, para ressaltar seu argumento, o profeta faz um trocadilho. Uma vez que “esta casa permanece em ruínas” (hãrêb, Ag 1.4), 364
Ageu: Teologia de
Deus faz “vir a seca sobre a terra” (hõreb, 1.11). Se reconstruíssem o templo, a sorte deles mu daria, a benção da fertilidade substituiria o julgamento de fome (1.7-11; 2.15-19). Assim, com essas promessas, Ageu consegue animar o líder civil, Zorobabel, o sumo sacerdote Josué e toda a comunidade para que se empenhem na construção. Diante da desilusão com o resultado de seus esforços (2.4), Ageu os encoraja com a promessa de que o templo restaurado veria a pre sença de Javé habitando ali novamente e governando sobre todas as nações. As nações virão para reconhecer seu reino universal ao trazerem seus tributos (2.6-9). A promessa de Ezequiel da volta da glória de Deus a Jerusalém e ao templo (Ez 43.1-5) se cumprirá. Além disso, o governo de Deus será exercido novamente por uma figura messiânica: Zorobabel (Ag 2.23). De acordo com 1 Crônicas 3.19, Zorobabel era neto de Joaquim, de linha gem davídica. Assim, é extremamente significativo que Ageu o descreva como “servo” e “anel de selar” de Deus, dois termos que são empregados em outras passagens para o rei da linhagem de Davi (SI 89.3 [4]; Jr 22.24). Ao que parece, Ageu acreditava que a dinastia davídica seria restabelecida na nova era do governo de Deus, que seguiria à conclusão do templo. Os temas de pobreza e riqueza são intimamente entretecidos na pregação de Ageu. Vá rios estudiosos acreditam que essa relação tem origem na teologia da aliança no Sinai, com suas bênçãos e maldições pela obediência ou desobediência (p. ex., Deuteronômio 28). Sem dúvida tal ligação existe, mas a mesma relação também pode ser encontrada na tradição de Sião, a qual reconhecia que o reinado de Javé como rei de Sião, exercido pelos descendentes de Davi, resultaria em prosperidade e paz universais (p. ex., 2Sm 23.2-5; SI 96.10-13; 132.11-18, esp. v. 15; 29; etc.). Tudo indica que Ageu se encontra dentro da antiga tradição de Sião. O profeta crê firmemente que todas as expectativas expressadas na liturgia antiga, tão proeminentes nos salmos, estão prestes a ser preenchidas. 2. Santidade e obediência. O ministério de Ageu foi eficaz. Os líderes e o povo r ponderam e o templo foi concluído em 515 a. C. (Ed 6.15). Ageu é acusado com freqüência de ser um profeta inferior aos seus antecessores do pré-exílio por causa da ligação tão próxima que tinha com o templo e o culto, enquanto os profetas anteriores ao exílio haviam enfatizado a necessidade de uma resposta ética e espiritual a Deus como o elemento essencial da religião (p. ex., Jr 7.1-7). O caráter verdadeiro ou falso dessas acusações depende em parte da interpre tação do oráculo em Ageu 2.10-14. A “Torá” (ou seja, regulamento ou orientação) sacerdotal, sobre o qual Ageu é ordenado a perguntar, mostra que, apesar de a imundícia ritual ser trans missível pelo contato, o mesmo não acontece com a santidade. Isso leva a uma advertência para o povo de que, aos olhos de Deus, “toda obra de suas mãos” e “o que ali oferecem” (ou seja, os sacrifícios) são imundos. Pode-se atribuir isso ao fato de o templo não ter sido recons truído, apesar de a data desse oráculo (v. 10) ser posterior ao início das obras de reconstrução (Ag 1.12-15). E possível que se tratasse de uma advertência de que o templo em si e o simples ato externo de construí-lo não podiam ser a fonte de pureza. O povo deve ouvir os chamados dos profetas anteriores ao exílio e voltar-se para Deus, tanto em seu coração como em suas ações externas. Num aspecto mais amplo e canônico, pode-se dizer que Ageu e os profetas do préexílio oferecem, na somatória de seus esforços, uma atitude mais completa com relação às instituições e estruturas de sua religião do que cada um deles considerado isoladamente. Os profetas mais antigos mostram como é fácil as coisas externas tomarem-se substitutas para a verdadeira resposta que Deus quer. No entanto, Ageu nos faz lembrar de que, quando em pregadas de modo apropriado, essas instituições e estruturas podem ser um meio de nutrir e expressar uma consciência da presença de Deus e a resposta correta a ele. A fim de que o ju daísmo pudesse sobreviver depois do exílio, era importante que tivesse sua instituição central, 365
Ai
com o intuito de dar forma à sua vida e fé. Toda religião precisa de estruturas. Estas podem ser “instrumentos da graça”, mas devem estar constantemente sob o julgamento de Deus para que se tomem autônomas. A relação próxima que Ageu estabelece entre a obediência a Deus e a prosperidade da terra não pode ser dispensada de modo condescendente como um exemplo de pensamen to primitivo e simplista. Hoje em dia, é fato comprovado que todos os principais problemas ecológicos da terra são de caráter moral e ético. Acredita-se que a solução deles requeira uma preocupação fervorosa com os direitos dos pobres, dos famintos e dos menos privilegiados, e uma determinação de usarem-se os recursos da terra no mesmo tipo de parceria com Deus, e em obediência a ele, que é antevisto nos primeiros capítulos de Gênesis. A relação que Ageu estabelece entre a casa deserta de Deus e a terra assolada pela seca continua sendo muito mais do que um trocadilho em heb. antigo. B ib l io g r a f ia
Ver comentários sobre Ageu; e também P. R. Ackroyd, Exile and Restoration, 1968; S. Amsler, Aggée, Commentaire de PAncien Testament, 19882; J. G. Baldwin, Haggai, Zechariah, Malachi, TOTC, 172; W. M. Beuken, Haggai-Sacharja 1-8, 1967; Th. Chary, Aggée-Zacharie 1-8, Malachie, Sources bibliques, 1969; R. J. Coggins, Haggai, Zechariah, Malachi, OTG, 1987; P. D. Hanson, The Dawn o f Apocalyptic, 1975; R. A. Mason, 'T he Prophets o f the Restoration”, in R. J. Coggins, et. al. (eds.), Israels Prophetic Tradition, 1982, 137-54; idem, Preaching the Tradition: Homily and Hermeneutics After the Exile, 1990; C. L. & E. M. Meyers, Haggai, Zechariah 1-8, AB, 1987; D. L. Petersen, Haggai & Zechariah 1-8, OTL, 1985; W. Rudolph, Haggai, Sacharja 1-8, Sacharja 9-14, Maleachi, KAT, 1976, W. A. VanGemeren, Interpreting the Prophetic Word, 1990, 187-93; P. A. Verhoef, The Books o f Haggai and Malachi, NICOT, 1987,32-39; A. S. van der Woude, Haggai, Maleachi, POT, 1982. Rex Mason Agitação -> # 8074 (rgz, agitar, estremecer, agitar) Agricultor -> # 438 ( 'ikkãr, agricultor) Água #4784 (mayim, água)
Ai
AiCV V<*y], #6504).
Escrito na BH com o artigo (ha ‘ay, a ruína), o nome da cidade de Ai é mencionado em vários textos do AT, mas a única ocorrência de relevância teológica é a presença do nome na narrativa da conquista em Josué 7— 8. Nesse caso, é bastante acentuada a dificuldade de conciliar o relato bíblico com a reconstituição da história da cidade tomando-se por base as descobertas arqueológicas. 2. O local atual mais comumente identificado como Ai é Et-Tel, a leste de Beitin (Be bíblica). Começando em 1928, foram realizadas três séries de escavações nesse local (para um resumo bastante útil das expedições e suas descobertas, ver J. A. Callaway, EAEHL 1, 36-52; ABD 1,125-30). Os resultados desses estratos em camadas de solo e rocha que possuem alguma relevância com relação à conquista de Israel, demonstram que de c. 2400 a 1200 a. C., o local foi deixado em ruínas. De c. 1200 até 1050 a. C., foi fundada uma vila na região da acrópole 366
Ai
do morro, ocupando cerca de 2 /i acres dos 27'/í que se encontravam originalmente cercados pelos muros mais antigos. Estes ainda estavam em pé nessa época posterior, mas não serviam mais de proteção. A dificuldade em relacionar o relato bíblico com as descobertas de El-Tel é evidente: não havia cidade alguma habitada nesse local durante os séculos X1II-XV a. C. Foram apresentadas diversas soluções para esse problema. Tomando por base as desco bertas de El-Tel, J. Marquet-Krause, coordenador de uma das escavações em 1933-35 concluiu que Josué 1— 8 não possuía nenhuma base histórica (Syria 16, 1935, 341). M. Noth afirmou que o relato de Josué era puramente etiológico. Tinha como propósito explicar a existência de um conjunto proeminente de ruínas ao criar a história de uma destruição imaginária realizada por Josué (Das Buch Josua, 23; cf. B. O. Long, The Problem o f Etiological Narrative in the Old Testament, 25-6). W. F. Albright sugeriu que o relato de Josué na verdade está associado à destruição de Betei, uma outra cidade próxima, relacionada de maneira muito próxima a Ai dentro da narrativa bíblica. Ele supõe que a tradição posterior confundiu os dois acontecimentos e associou o relato da destruição de Betei à narrativa da devastação de Ai (BASOR 56, 1939, 11-23). De acordo com a interpretação de Callaway, a escavação significa que a “conquista” deve ter ocorrido durante a Idade do Ferro, c. 1125 a. C. Ele descarta a idéia de uma ação mi litar coordenada como a que aparece em Josué 1 — 11, preferindo, em vez disso, ver o assen tamento de Ai como parte de um deslocamento de pessoas das montanhas para as planícies, do oeste para o norte. Para ele, essa gente que fundou várias vilas nas montanhas, acabou se transformando naquilo que veio a ser a nação de Israel, um processo que é descrito de maneira mais precisa no livro de Juizes. P. Vincent propôs que as ruínas de Ai foram usadas pelos con tingentes militares de Betei para formar uma defesa contra o avanço israelita (em Js 8.17, não se faz uma distinção clara entre os homens de Betei e os de Ai). Defesas construídas às pressas não teriam deixado vestígios permanentes (RB 46, 1937, 258-66). Outro conjunto de propostas implica a rejeição da identificação de El-Tel com Ai. As sim, D. Livingston argumentou contra a identificação de Betei com Beitin rejeitando, em de corrência disso, El-Tel como a localização de Ai ( WTJ 33, 1970-71,22-40; ver a réplica de A. Rainey, ibid. 175-88). J. M .Grintz apresentou uma série de motivos para se supor que El-Tel não seja o local de Ai, mas sim de Bete-Aven que, de acordo com Josué 7.2, “está junto” ( ‘ im) a Ai (Bib 42, 1961, 201-16). Ele cita textos que indicam a existência de uma cidade cha mada Ai no período da monarquia e no tempo de Esdras-Neemias (p. ex., Is 10.28; Ne 7.32) e insiste que esta se encontra no mesmo lugar da cidade tomada por Josué. No entanto, as esca vações de El-Tel não mostram evidência alguma de um assentamento no local depois de 1050 a. C. Um assentamento desse tipo, contudo, é compatível com a história de Bete-A ven. Aliás, Grintz argumenta que durante o tempo em que, segundo os pesquisadores, El-Tel foi habitada, os textos parecem indicar que também havia habitantes em Bete-Áven. Esse fato, juntamente com observações topográficas e onomásticas, o convence de que El-Tel é, de fato, Bete-Áven. Grintz não tem como sugerir um local definitivo para Ai. 3. E justo afirmar que a maioria dos estudiosos não está convencida de que foi enc trada uma solução para o problema. O texto de Josué 7—8 parece fazer uma distinção clara entre os três locais: Betei, Bete-Áven e Ai, apesar de estarem eles estreitamente relacionados. O fato é que, no tempo de Amós e Oséias, o nome Bete-Áven era usado de maneira depreciati va para se referir a Betei e sua forma corrompida de adoração (Os 4.15; 5.8; 10.5; cf. Am 5.5). Nesse contexto, a expressão significa “casa de nada” (cf. S. Paul, Amos, 164). De acordo com a narrativa de Josué, Bete-Áven e Ai são consideradas extremamente próximas (Js 7.2) e as duas têm nomes que indicam fraqueza ou mesmo ruína. Essa fraqueza observada se reflete no relato dos espias a Josué sobre as condições de Ai, “Subam uns dois ou três mil homens a ferir 367
A ijalom
Ai; não fatigueis ali todo o povo, porque são poucos os inimigos” (Js 7.3). É uma idéia atraente considerar o uso dos nomes Ai — que significa montão de entulho, ruína — e Bete-Aven — que quer dizer “casa de nada” — uma escolha deliberada para reforçar o caráter teológico da passagem de Josué. A confiança em Javé e aquiescência aos requisitos para a participação na “Guerra de Javé” eram essenciais para o sucesso, mesmo numa região conhecida pela fraqueza. Se essa sugestão for, de algum modo, válida, então os nomes Ai e Bete-Áven empregados para os locais da narrativa podem ter sido criados mais para exercer maior influência teológica, da mesma forma como Oséias usa o nome Bete-Áven para Betei, do que para servir de orientação geográfica. (-> Josué: Teologia) B ib l io g r a f ia
W. F. Albright, “The Israelite Conquest o f Canaan in the Light o f Archaeology”, BASOR 74, 1943,11 -23; J. J. BimsoneD. Livingston, “Redating the Exodus”, BARev 13,1987,40-53,6668; J. M. Grintz, “Ai Which Is Beside BethAven”, Bib 42, 1961, 201-6; J. A. Callaway, “Ai”, EAEHL, 1:35-52; idem; “Ai”, ABD, 1:125-30; B. Halpem, “Radical Exodus Redating Fatally Flawed”, BARev 36, 1987, 56-61. W. Osborne
Aijalom
Aijalom Cpl7'’N [ 'ayyãlôn], # 389);
AT O vale de Aijalom é o vale mais importante que corta o Sefelá e proporciona passa gens da planície costeira para a região montanhosa da Judéia. Esse vale difere dos outros que cruzam o Sefelá por ser uma bacia ampla e profunda e não o vale estreito de um rio. A estrada natural principal saindo de Jope levava a esse vale, passando por Lode e Bete-Horom de cima e de baixo, prosseguindo até Gibeão e Jerusalém. No AT, o vale de Aijalom aparece de maneira mais expressiva na grande batalha de Josué contra os amoritas, quando Josué ordenou que o sol se detivesse (Js 10.10-15). Foi através desse caminho que, mais tarde, os filisteus fugiram depois de serem derrotados em Micmás (ISm 14.31), e foi por lá que Faraó Sisaque subiu até Quiriate-Jearim e Gibeão e ameaçou Jerusalém pelo lado noroeste no quinto ano do reinado de Roboão de Judá (926-5 a. C). O rei de Judá evitou que sua capital fosse sitiada ao pagar uma pesada indenização (1 Rs 14.26). Em 1948, os israelitas lutaram encamiçadamente para reter essa rota de acesso a Jerusalém. Um dos milagres mais discutidos do AT é o “longo dia” de Josué, concedido em sua grande batalha para defender os gibeonitas que haviam feito um pacto com Israel. O relato de Josué 10 descreve a marcha notuma das tropas de Josué de Gilgal para Gibeão, a vitória sobre os amorreus naquele local e depois uma perseguição aos amorreus para noroeste, descendo o vale de Aijalom e passando pelas duas cidades de Bete-Horom. Foi nesse ponto que Josué or denou que o sol se detivesse, o que ocorreu com o consentimento de Deus que, então, atirou contra os inimigos pedras enormes de granizo matando um grande número de combatentes. O relato contém uma citação do livro de Jachar, evidentemente uma antiga coletânea de canções de guerra e outras baladas. (-> Josué: Teologia) Há várias interpretações para o que ocorreu em resposta à ordem de Josué. Uma escola considera a passagem de maneira poética, como um clamor por socorro e forças. Em resposta à súplica de Josué, Deus deu aos homens do líder israelita forças renovadas, de modo que fi zeram o trabalho de um dia na metade do tempo, parecendo-lhes que o dia havia sido prolon368
A ija lo m
gado. O entremeio não literal de um vocabulário associado à astronomia pode ser observado em Juizes 5.20 e Joel 2.10,30-31. Outra escola considera o milagre um prolongamento da claridade. Deus literalmente fez a terra parar em seu eixo. Aqueles que se opõe a essa idéia observam que se a terra parasse de girar em seu eixo, isso teria efeitos drásticos sobre o planeta e a lua e sua relação com seu sistema solar. Uma variação interessante da teoria do dia prolongado aparece em Patter, et al., The Long Day o f Joshtia. Os autores relacionam o dia longo de Josué com uma aproximação de Marte, a qual eles datam entre 24 e 25 de outubro de 1404 a. C. Naquele momento, Marte teria chegado a cerca de 112 mil quilômetros da terra, causando um imenso holocausto, com o impacto de material meteórico e meteorítico contra a terra e talvez até oscilações na rotação do eixo (172-98). Um terceiro ponto de vista também opta por um prolongamento da claridade, mas con sidera tratar-se de um milagre de refração, uma miragem sobrenatural de mudança de direção dos raios luminosos. Na realidade, o sol costuma ser visto alguns segundos depois de se pôr devido à refração da luz. De acordo com essa concepção, tal ocorrência natural foi prolongada de modo sobrenatural. Uma quarta linha de raciocínio afirma que Josué na realidade desejava um prolonga mento da noite para oferecer proteção aos seus homens do calor causticante do dia (depois de encontrarem-se à beira da exaustão tendo marchado durante toda a noite) e para facilitar as movimentações estratégicas no campo de batalha. Essa interpretação traduz o radical heb. dmm (-> # 1957) como “calar-se” ou “emudecer-se” (ou seja, abster-se de brilhar), em vez de “deter-se” e imagina o sol sendo obscurecido por uma cobertura de nuvens. Ao que parece, o céu escureceu durante a terrível tempestade de granizo pela manhã e essa escuridão persistiu por um longo tempo. É evidente que tal fenômeno local não afetaria o movimento da terra em sua órbita, podendo satisfazer assim os defensores do uniformitarianismo. Nesse caso, devemos nos referir à “longa noite” e não ao “longo dia” de Josué. B ib l io g r a f ia
G. Archer, Encyclopedia o f Bible Difficulties, 1982, 161-62; B. Alfrink, “Het ‘still staan’ van Zon en Maan in Jos 10:12-15”, Studia Catholica 24, 1949, 238-68; M. Balaban, “Kosmische Dimension des Wunders von Gibeon”, Commumio Viatorum 12,1269,51-60; R. Eisler, “Joshua and the Sun”, AJSL 42, 1926, 73-85; R. C. Fuller, “Sun, Stand Thou Still”, Scripture 4, 1951, 305-13; M. J. Gruenthanes, “Two Sun Miracles in the Old Testament”, CBQ 10,1948,271-90; J. S. Holladay, “The Day(s)the Moon Stood Still”, JBL 87,1968, 166-78; E. W. Maunder, “BethHoron, Battle o ? \IS B E 1:469-71; E. W. Patten, et al., The Long Day o f Joshua and Six Other Catastrophes, 1973; B. Ramm, The Christian View o f Science and Scripture, 1954, 107-10; J. Reid, “Did the Sun and Moon Stand Still?” ExpTim 9,1898, 151-54; J. F. A. Sawyer, “Joshua 10:12-14 and the Solar Eclipse ofSeptember 30, 1131 B. C.”, PEQ 104, 1972, 139-46. Howard F. Vos Ajuda -> # 3829 iyêsa', ajuda, libertação, salvação) Ajuntamento -> # 7695 (qb$, ajuntar) Alarme -> # 6907 ( V$, ser, ficar alarmado, ser horrível, estar aterrorizado) Algibeira
# 7655 ($erôr I, algibeira, saco) 369
Aliança siro-efraimita
1. História. As fontes primárias para esse episódio são 2 Reis 15.37; 16.5-9; e os anais assírios (ANET, 284). Pecá, rei de Israel, estava disposto a criar uma coalizão contra a Assíria, a potência que dominava a região. Ele e Rezim, o rei da Síria, tentaram convencer Jotão, rei de Judá, a juntar-se à causa deles, mas tudo indica que Jotão não tenha aceitado. As sim, os aliados atacaram Judá, mas coube ao novo rei, Acaz, reagir à agressão (735 a. C.). Acaz sofreu uma derrota grave no Norte (ver esp. o relato em 2 Crônicas), sendo que seu próprio filho e alguns dos principais comandantes morreram na batalha. Ao que parece, o objetivo dos aliados era colocar um sírio que simpatizasse com a causa deles (um certo “filho de Tabeal”, Is 7.6) no trono de Davi em Jerusalém. Essa também não foi a única derrota sofrida por Acaz. Ao mesmo tempo, a guarnição de Elate, no Sul, foi atacada e destruída pela Síria (TM, 2Rs 16.6) ou por Edom, da qual ela havia sido tomada no reinado de Azarias( 14.22). Sem dúvida, Edom uniu-se aos agressores de Judá, como se vê em 2 Crônicasl. 17. Os filisteus também consideraram essa uma oportunidade para tomar territórios de Judá (1.18) e se apoderaram de algumas cidades e vilas importantes. Em termos políticos, o mais natural seria Acaz buscar o socorro da Assíria, com seus recursos militares gigantescos e a suscrania sobre aquela região. Acaz enviou mensageiros ao imperador Tiglate-Pileser III (chamado por seu nome babilônio “Pul” em 2Rs 15.19), que não precisou de estímulo para ir até lá e restabelecer a ordem em seus domínios ocidentais. Em 734, Tiglate-Pileser veio do Norte pelo litoral e subjugou os filisteus até a fronteira com o Egito, e, alguns meses depois, investiu contra Israel, tomando uma parte considerável de seu território. Todas as terras de Israel do outro lado do Jordão, bem como a Galiléia foram conquistadas, e as grandes cidades fortificadas de Hazor e Megido foram destruídas. Multidões foram depor tadas (15.29) e o próprio Pecá acabou morto numa conspiração, tendo como sucessor o próprio assassino, Oséias, filho de Elá, o qual, mais que depressa, implorou pela paz. Tiglate-Pileser afirma ter exercido sua influência sobre essa situação (“Depuseram seu rei Pecá e eu coloquei Oséias como rei sobre eles”). Foi pago um tributo e, no ano seguinte. Damasco foi atacada e conquistada e Rezim foi morto. Seguindo o costume assírio, a população foi deportada e le vada para Quir, de onde alguns de seus antepassados haviam emigrado (Am 9.7). Judá estava segura, apesar de ter pago um alto preço por isso, tanto com recursos do templo (2Rs 16.8) como com a liberdade política. 2. Teologia. Esse último ponto foi um grande peso para o profeta Isaías, que havia oposto à decisão de Acaz de apelar para a ajuda da Assíria (Is 7.1— 8.8), crendo que tal medida representasse uma falta de confiança na promessa de Deus à casa de Davi e que levaria a um domínio assírio excessivo tanto sobre a vida política quanto religiosa. Os acontecimentos mos traram que Isaías estava com a razão, uma vez que “por causa do rei da Assíria” (2Rs 16.18), Acaz foi obrigado a alterar o culto e os utensílios cultuais do templo em Jerusalém de modo que contivesse um altar assírio — que se tomou o principal lugar de oferta de holocaustos. Acaz teve também que abolir vários aspectos tradicionais da adoração em Jerusalém, inclusi ve a entrada particular no templo, simbolizando, desse modo, a supremacia da Assíria sobre o culto a Javé (vv. 10-18). Além disso, o novo regime foi um período de imoralidade pagã crescente em Judá, da qual os profetas Isaías e Miquéias deram amplo testemunho. O prognóstico de pobreza pronun ciado por Isaías sem dúvida cumpriu-se parcialmente na grave queda nos rendimentos que a perda de extensos territórios para a Filístia, Edom, Israel e Síria (Is 7.23-25) deve ter acarretado, apesar de os ricos continuarem ricos, em grande medida por meio da opressão aos pobres e da devoção hipócrita à religião de Javé (1.4-17). Tanto o historiador deut. (2Rs 15.37) quanto o Aliança siro-efraimita
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Amaleque
cronista (2Cr 28.19) vêem em tudo isso as marcas do julgamento divino sobre um povo infiel, que praticava os sacrifícios humanos e a idolatria lado a lado com a fé de seus ancestrais. (■> Teologia Deuteronômica) Foi nesse contexto que Isaías pronunciou um dos oráculos mais conhecidos da Bíblia, dizendo ao rei Acaz que Deus iria intervir para salvar Judá apesar da fraqueza do rei e que o sinal seria o nascimento de um menino chamado Emanuel (= Deus está conosco) a uma jovem que talvez não fosse casada (pois é ela quem dá o nome à criança, Is 7.14). Isso aconteceria em breve, pois essa mulher já estava grávida, de modo que não tardaria para o rei saber que Deus estava prestes a agir em favor de Judá. A Síria e Israel não seriam mais uma ameaça; no entanto, a Assíria, aliada de Acaz, deixaria atrás de si um rastro de problemas. Apesar de não sabermos a qual dos líderes mais novos de Judá esse oráculo se refere (Ezequias, o filho de Acaz havia nascido c. 738), essa profecia é usada no NT (Mt 1.23) para ilustrar como Deus traria um libertador nascido de modo miraculoso na linhagem de Davi a um mundo oprimido pelo pecado. Em vez de abandonar a fé em troca de uma ligação perigosa, a reação teológica apropriada diante da aliança siro-efraimita era; “acautela-te e aquieta-te; não temas” pois “se não o crerdes, certamente não permanecereis” (Is 7.4, 9). ( -> Isaías: Teologia). B ib l io g r a f ia
J. Bright, A History o f Israelh, 1981; J. H. Hayes e J. M. Miller, Israelite and Judaean His tory, 1977, 421-34; S. Herrmann, A History o f Israel in Old Testament Times, 1975, 246-49; B. Oded, “The Historical Background of the Syro-Ephraimite War Reconsidered”, CBQ 34, 1972, 153-65. P. J. M. Southwell Alimento -> # 4312 (lehem, alimento, pão) Altar -> # 4640 (mizbêah, altar) Altura -> # 8 1 2 3 (rwm, ser elevado, exaltado, orgulhoso) Aluguel -> # 8509 (skr, alugar) Amadurecimento -> # 1694 (gml, realizar, perfazer, conseguir, amadurecer)
Amaleque
Amaleque (pVny [ 'amãlêq], # 6667).
AT Amaleque, filho de Elifaz e Timna, é chamado de um dos “príncipes que nasceram a Elifaz [o primogênito de Esaú]” (Gn 36.15-16). Os descendentes de Amaleque formaram uma tribo seminômade que vivia em grande parte no Neguebe (Nm 13.29), apesar de ser possí vel que houvesse um grupo que habitava nos montes da região oeste de Samaria (Edelman). Os amalequitas são constantemente apresentados como um inimigo de Israel e, portanto, do próprio Javé. A única atitude apropriada para com uma gente determinada a frustrar os propósitos de Deus para o seu povo — desde o tempo em que Israel vagou pelo deserto até o início da monarquia — era riscar (mhh, -> # 4681) totalmente a sua memória de debaixo do céu (Êx 17.14; Dt 25.19). 371
Amom
Os conflitos de Moisés/Josué (Êx 17.8-13), Saul (ISm 15.1-35) e Davi (ISm 27.8-11; 30.1 -20) com os amalequitas são particularmente significativos, uma vez que cada um deles sofreu um ataque injustificado aproveitando-se da fraqueza israelita (Dt 25.17-18). O texto de Êxodo 17 traz certos pontos teológicos essenciais que comprovam a idéia de que os amalequi tas representam qualquer grupo ou nação que resiste aos propósitos de Deus. 1. As tentativas de Israel de apagar a memória dos amalequitas têm sua origem na ini mizade do próprio Javé (Êx 17.14, 16; Dt 25.19; cf. ISm 15.3, “destrói totalmente a tudo o que tiver”). O crédito das vitórias obtidas nas batalhas pertence a Deus e não a Israel (cf. 1Sm 30.23). Até mesmo Moisés age em nome de Javé, por meio da autoridade representada em seu bordão (Êx 17.9; cf. 4.1-5) e ao levantar as mãos (Êx 17.11-12). Esse último gesto pode sim bolizar a oração de Moisés ou um gesto que imita um estandarte, mostrando sua total confiança (Robinson, 18. cf. a sugestão de Coats, 34-35, de que em Êxodo 14, a mão estendida e o bordão indicam um acontecimento miraculoso). 2. Moisés, o líder escolhido de Javé, é fiel, porém não é auto-suficiente. O fato de suas mãos ficarem “firmes” (Êx 17.12b, 'emúná — um termo que indica fidelidade a uma determinada tarefa [-> # 575]) é relacionado à necessidade que Moisés teve de ajudantes (v. 12a). Davi também demonstrou sua fidelidade ao consultar Javé antes de lançar um ataque contra os amalequitas (ISm 30.7). Apesar de derrotar os amalequitas, Saul, pelo contrário, não se mostra fiel em realizar a missão de Deus e é rejeitado como rei de Israel (1 Sm 15.24, 35; 28.17-18). A relevância das narrativas sobre os amalequitas é, portanto, de que o povo de Deus não precisa temer ninguém que se oponha a Deus. O cumprimento das promessas e planos divinos não depende da força humana, mas sim do próprio Javé. B ib l io g r a f ia
G. W. Coats, “Moses Versus Amalek”, SVT2S, 1974,29-41; D. Edelman, “Saul ’s Battle Against Amalek”, JSO T 35,1986, 71 -84; B. P. Robinson, “Israel and Amalek. The Context o f Exodus 17:8-16”, ./SO r 32, 1985,15-22. Debra Reid Amamentação -> # 3567 (ynq, sugar, mamar) Amanhã -> # 4737 (mãhãr, amanhã) Amarelo -> # 7410 (shb, ser amarelo, da cor do cobre) Amargura Amigo
# 5352 (mrr I, ser amargo, perturbado; aflito) # 8287 ( r ‘h II, associar-se a; rêa', amigo, próximo)
Amom
Amom CpaV [ ‘ammôri], # 6684).
AT 1. Ao longo de toda a era do AT, a relação entre Amom e Israel foi de discórdia. Esse conflito teve origem nos antepassados Abraão e Ló. Eles haviam contendido por causa de pastagens para seus rebanhos, de modo que se separaram a fim de evitar maiores desavenças 372
Amom
(Gn 13.8-13). Apesar dc Abraão ter salvado Ló dos quatro reis invasores em duas ocasiões (Gn 14), tê-lo livrado por meio de suas orações por Sodoma (Gn 18.20-33) não houve reconciliação entre eles, ainda que Ló perdesse tudo. Ben-Ami, pai dos amonitas, foi concebido por um artifício envolvendo o estupor da embriaguez e um ato de incesto a fim de preservar a linhagem de Ló (Gn 19.30-38). Deus deu terras aos descendentes de Ben-Ami e Israel não deveria provocar os amonitas ao passar por lá (Dt 2.19). No entanto, eles atormentaram Israel recusando-se a ajudar o povo no deserto e contratando Balaão para amaldiçoar os israelitas (Dt 23.3-6). 2. Posteriormente, Amom uniu forças com Eglom para atacar Israel (Jz 3.13). Depois disso, atacaram o povo de Deus em decorrência de uma disputa de fronteiras. Jefté negou a acusação de que Israel havia tomado a terra dos amonitas, citando como prova 300 anos de coexistência pacífica (Jz 11.26-27). No entanto, Josué 13.25-28 levanta dúvidas quanto à ve racidade das afirmações de Jefté. No tempo de Saul, Naás sitiou Jabes-Gileade e foi uma campanha bem-sucedida para reverter essa situação que ajudou a estabelecer a monarquia (1 Samuel 11; 12.12). Amom provocou Israel novamente ao rejeitar o gesto cordial de Davi ao rei Hanum (2 Samuel 10). Foi enquanto Joabe estava derrotando os amonitas que Davi cometeu adultério com a esposa de Urias (2 Samuel 11). Nessa ocasião, um filho foi concebido e Davi tentou en cobrir a verdade embriagando Urias antes de mandá-lo de volta para casa, a fim de que Urias se deitasse com a esposa para imaginar que o filho fosse dele. Esse estratagema faz lembrar alguns aspectos da concepção do próprio Ben-Ami. Mas o ardil não funcionou e a criança aca bou morrendo pelas mãos de Deus (2Sm 12.14). 3. Salomão amou muitas mulheres estrangeiras, entre elas, amonitas (1 Rs 11.1), e Roboão, que viu Israel dividir-se em dois durante seu reinado, era filho de Salomão com uma mulher amonita (lRs 14.21). Uma vez que Rute, antepassada de Davi, era moabita (Rt 1.22), os dois filhos de Ló passaram a ter descendentes na linhagem de Davi. Com o tempo, não hou ve mais reconciliação com Amom e nem com Moabe. Josafá derrotou esses dois povos (2Cr 20.1-23); Jotão derrotou os amonitas e recebeu tributo deles por três anos (2Cr 27.5); Josias purificou os lugares altos de adoração amonita (2Rs 23.13) e, posteriormente, Amom tentou matar o rei Gedalias (Jr 40.14). Mesmo depois do exílio, foi um amonita, Tobias, que se opôs à reconstrução do templo (Ne 2.10). E justo dizer, portanto, que assim como ocorreu com Amaleque (Ex 17.16), houve guerra contra Amom de geração em geração. B ib l io g r a f ia
Arqueologia: A. J. ‘Amr, “An Ammonite Votive Dolomite Stative”, PEQ 119, 1987, 33-38. História: G. Krause & G. Müller, eds., Theologische Realensyklopüdie 2, 1978, 455-63; IDB 1:40-43, 108-14; in Judaism, EncJud 2: 856-59. Linguagem: G. A. Rensburg, “The Ammonite Phonema T”, BASOR 269, 1988, 73-79. Cerâmica: S. Helms, “An EB IV Pottery Repertoire at Amman. Jordan”, BASOR 273, 1989, 33-36; with illustrations, ZPEB 1:134-40. David E Pennant Amor
# 170 ( ’hb, amar, gostar)
Amorreus -> Cananeus 373
Amós: A teologia de
Amós: A teologia de A. Contexto histórico Apesar de o profeta Amós ser um pastor no vilarejo de Tecoa (Am 1.1; 7.14), cerca de vinte quilômetros ao sul de Jerusalém, a proclamação de sua mensagem teológica ocorreu na cidade israelita de Samaria (Am 7.1-7), possivelmente entre 765 e 760 a. C. Nessa época, a Síria e a Assíria eram relativamente fracas, e o rei israelita Jeroboão II (793-753 a. C.) pôde expandir consideravelmente as fronteiras de Israel, estendendo-as ao norte até Hamate (2Rs 14.25). Suas campanhas militares extremamente bem-sucedidas trouxeram uma nova prosperi dade e uma falsa sensação de segurança aos poderosos e abastados de Israel (Am 6.1). A classe alta emergente podia viver em meio ao luxo em seus enormes palácios fortificados (Am 3 .15; 5.11; 6.1 -11), mas os pobres e fracos eram explorados financeiramente e sofriam abusos nos tribunais (Am 2.4-6; 5.10-12; 8.4-6). B. Estrutura literária A análise literária das mensagens do profeta indica que o livro pode ser dividido em três seções: I. Oráculos de Guerra Contra as Nações II. A Confirmação do Julgamento de Deus sobre Israel II. Visões e Exortações Sobre o Fim A primeira seção (Am 1.3—2.16) é extremamente estruturada, usando uma termino logia semelhante tanto nas passagens de acusação (“por três transgressões... e por quatro...”) quanto nas de julgamento (“por isso, meterei fogo...”) dos oráculos contra oito nações. A se gunda parte (Am 3.1— 6.14) é dividida de maneira mais livre em oráculos que confirmam a intenção de Deus de trazer destruição sobre Israel (Am 3.1— 4.13) e uma série de ais e lamentos pela falsa esperança de Israel (Am 5.1—6.14). A seção final (Am 7.1—9.15) é estruturada em tomo de cinco visões (e também exortações) sobre o fim de Israel como nação e um oráculo de salvação a respeito de sua restauração final depois da destruição (Am 9.11-15). Apesar de Wolff (Joel and Amos, 106-13) delinear o desenvolvimento redacional da teologia do livro em cinco estádios (as palavras do próprio Amós; acréscimos feitos por uma escola de seguidores, acréscimos do tempo de Josias; uma redação deut. e um acréscimo escatológico realizado após o exílio), outros estudiosos argumentam que a grande maioria das mensagens desse livro são provenientes do breve ministério de Amós em Israel. A estrutura retórica desses oráculos e o uso repetido das mesmas características de estilo (arranjo das partes em pares em Am 1.3— 2.16; 3.4-8; 7.1—8.4; arranjo em grupos de cinco em Am 4.6-11; 7.1-9.4; 9.2-4; a inversão sarcástica de tradições sagradas em Am 2.5-16; 3.1-2; 4.4-5; 5.18-20) argumentam em favor da unidade dessas mensagens (cf. Smith, Amos, 6-7, 39-40). C. Temas teológicos Os temas teológicos contidos nesses oráculos possibilitam uma compreensão mais pro funda das dificuldades enfrentadas pela nação do Norte, Israel. Os “Oráculos de Guerra Contra as Nações” (Am 1.3—2.16) revelam que Deus possui o controle soberano do futuro do próprio povo e também do destino das nações. Ele exigirá que todas as nações prestem contas pelo tra tamento opressivo e desumano aos fracos e impotentes. Amós acusou os vizinhos estrangeiros de Israel de diversos atos de rebelião. Entre eles, atrocidades militares contra mulheres grávidas 374
Amós: A teologia de
e os filhos ainda não nascidos (Am 1.13) e deportação de pessoas inocentes com o intuito de vendê-las como escravas (Am 1.6, 9). Esses atos não foram condenados por representarem o tratamento desumano de um membro do império de Davi, transgredindo desse modo a aliança davídica (c f. Wright, 236); antes, foram condenados por desobedeceram as normas internacionais estipuladas em tratados entre diferentes nações, leis escritas determinando os comportamentos sociais aceitáveis no Oriente Médio antigo (cf. Barton), bem como as leis da consciência que tomam cada pessoa responsável por suas ações (cf. Rm 1.18-20; 2.12-15). Deus estava responsa bilizando os líderes e o povo dessas nações e ameaçando destruí-los. Amós também proclamou que Judá, e especialmente Israel, mereciam o mesmo castigo, pois estavam se rebelando contra a vontade manifesta de Deus (Am 2.4,6-8). Esqueceram-se de que Deus já havia libertado seu povo oprimido dos poderosos egípcios e que havia colocado nas mãos dele a terra dos amoritas (Am 2.9-10). Certamente Deus lutaria contra os poderosos opressores. Muitos dos ouvintes de Amós rejeitaram a idéia de que a nação escolhida de Deus, e redimida por ele do Egito, poderia ser destruída (Am 3.1-2). Isso porque a condição de eleita era considerada uma garantia absoluta das bênçãos divinas e não uma demonstração da graça de Deus num relacionamento dinâmico de confiança em Javé. Em seus oráculos de “Confir mação do Julgamento de Deus sobre Israel” (Am 3.1— 6.14), Amós afirma que os privilégios de Israel implicavam grandes responsabilidades. Assim, o profeta procurou influenciar o povo de modo para que temesse a Deus (Am 3.8). Até mesmo os pagãos chegariam à conclusão de que o estilo de vida dos ricos que desfrutavam do conforto de palácios fortificados era cheio de opressão e violência (Am 3.9-11, 15; 4.1). Portanto, a destruição do país, de seus templos e palácios era certa. O julgamento de Deus também era justificado pela falsa adoração do seu povo. Seu cul to não passava de um simples ritual, desprovido de justiça e abominado por Deus (Am 4.4-5; 5.21 -26). Apesar de as formas exteriores de ortodoxia e piedade ficarem evidentes no templo, nos sacerdotes, nos sacrifícios e nas comemorações no sábado e em dias festivos (ainda que houvesse também alguns indícios de adoração a deuses estrangeiros: Am 5.26; 8.14), essa observância era fútil pois não havia um verdadeiro encontro com Deus. O povo não estava disposto a voltar-se para Deus mesmo depois de Javé levar maldições sobre o povo por causa da desobediência (Am 4.6-11). Assim, o povo devia preparar-se para um encontro face a face com Deus (Am 4.12). A nação seria tomada de morte e lamento (Am 5.1-3. 16-17), pois não buscava Deus nem estabelecia justiça na terra (Am 5.4,6,14-15). A falsa confiança na salvação no dia do Senhor (Am 5.18-20) e a falsa esperança baseada nas riquezas e no poderio militar (Am 6.1-14) não seriam capazes de salvar o povo, que obtivera essas riquezas pela opressão dos pobres e Deus é quem haviam concedido as vitórias militares, como afirma o escritor de Reis (2Rs 14.25). O futuro não traria mais prosperidade e bênçãos ilimitadas no dia do Senhor. Antes, Israel, a arrogante nação do Norte, seria destruída e enviada para o exílio (Am 5.27; 6.8, 14) quando Deus passasse no meio dela em julgamento (Am 5.17). As mensagens de Amós são reforçadas pela inclusão de doxologias semelhantes a hinos que celebram o poder e autoridade de Deus. O povo foi lembrado da verdadeira natureza do seu Deus. O Deus de Israel é o Criador das grandes montanhas que se erguem da terra (Am 4.13), das estrelas nos céus (Am 5.8) e das esplendorosas câmaras no céu (Am 9.6). Por ser o Criador do mundo, a ele pertence todo o poder nos céus e na terra. Ele controla as forças da natureza causando a seca (Am 1.2), enviando luz ou trevas (Am 4.13) e desencadeando inundações e terremotos (Am 5.8; 9.5-6). Deus usa esse poder sobre a natureza para conceder bênçãos a seu povo (Am 9.11-15) ou como maldição de destruição para aqueles que o rejeitam (Am 5.9). No entanto, antes de Javé despejar sua ira, ele revela seus planos a seu profeta, de modo que o 375
Amós: A teologia de
profeta possa advertir os culpados (Am 1.2; 3.6-8) e chamá-los de volta a fim de que busquem a face de Deus. Se o fizerem, o Senhor pode usar de sua graça para com eles, permitindo que vivam (Am 5.4, 6, 14-15). A seção final, “Visões e Exortações Sobre o Fim” (Am 7.1 —9.14), mostra outro aspecto do caráter de Deus, a saber, a disposição em ser misericordioso quando alguém busca a com paixão dele (Am 7.1-6). Em resposta à oração intercessora de Amós, Deus, cm sua bondade, adiou os dois primeiros julgamentos à nação, mas outras visões de destruição mostram que havia passado o momento do perdão. O rei morreria e o templo e a nação chegariam ao fim (Am 7.6— 8.4). Ninguém poderia se esconder da ira de Deus (Am 9.1-4). Ainda que muitos pensassem, por motivos teológicos, que era impossível Deus destruir seu próprio povo (Am 9.10) — aqueles que ele havia libertado do Egito — , o profeta mostra que o fato de Deus ha ver livrado Israel ou qualquer outra nação gentia no passado não é o princípio fundamental para se entender o relacionamento dele com o povo no futuro. A nação que pecar será destru ída por Deus (Am 9.7-10). Em sua liberdade soberana, Javé pode escolher usar da graça para um pequeno remanescente que abandonar os caminhos perversos (Am 5.14-15), mas isso não proporciona esperança para a nação como um todo. Essa mensagem difícil levou Amós a entrar em conflito com o sacerdote encarregado do templo em Betei (Am 7.10-17). O sacerdote rejeitou a palavra de Deus, dada por intermédio de Amós, e impeliu Amós a voltar para Judá e ganhar a vida ali. Amós manteve-se firme em sua convicção da palavra do Senhor. Não era a intenção dele viver à custa de suas profecias, pois a vida dele se baseava num chamado para proclamar fielmente a palavra de Deus com toda a autoridade dela (Am 7.14-15). As mensagens de Amós se encerram com um oráculo escatológico sobre a futura restau ração da fertilidade da terra, a volta do povo às cidades de Israel e a certeza de que não serão destruídas (Am 9.11-15). As bênçãos de Deus transformarão o povo pecador e derrotado e a terra devastada de Israel num futuro reino glorioso, que abarcará israelitas e gentios (Am 9.12). Ao desenvolver seus temas teológicos, Amós demonstra grande coerência com tradi ções bíblicas e literárias anteriores. Emprega oráculos de guerra, discursos de julgamento, ais e lamentos, hinos, visões e um oráculo de salvação. Usa de formas literárias correntes de discurso, mas sempre mostrando independência ao adaptar essas formas aos seus propósitos (p. ex., é surpreendente como seu oráculo de guerra não anuncia a vitória de Israel, mas sim a derrota). Suas mensagens lançam mão de seu próprio conhecimento das tradições sobre Sodoma e Gomorra (Am 4.11), as prescrições para os sacrifícios (Am 4.4-5; 5.21 -23), o êxodo e a conquista (Am 2.9-10; 3.1 -2; 4.10; 5.17; 9.7-8), as maldições e bênçãos da aliança (Am 4.6-11; Am 9.11 15), a teologia do dia do Senhor (Am 5 .18-20), estatutos legais (Am 2.6-8; 8.4-6) e hinologia (Am 4.13; 5.8-9; 9.5-6). A maioria das referências de Amós a essas tradições é coerente com suas formas originais de uso. Porém, ao ampliar o dia do julgamento do Senhor a toda Israel em vez de limitá-lo aos gentios, Amós negou as bênçãos esperadas pela nação e sua condição especial como povo eleito de Deus. Nesses casos, demonstrou um rompimento dramático da sua visão das experiências históricas e tradições de Israel e da visão que o público dele possuía dessas mesmas experiências e tradições. D. Contexto Canônico O livro de Amós é um dos registros mais antigos das pregações de um profeta, mas sua preocupação em condenar a opressão dos pobres, rejeitar a adoração fútil de Israel, lamentar as esperanças ilusórias do povo e lembrá-lo de um dia futuro de restauração é comum a vários outros profetas (p. ex.. Is 1.10-17,21-13,26-27). Esses temas não são excepcionais nos escritos 376
Ana, Cântico de
canônicos do Antigo e Novo Testamentos. Pouco antes da queda de Judá, Jeremias advertiu o reino do Sul de suas esperanças ilusórias e da falsa confiança na presença do templo (Jr 7.5-6, 9), condenou a opressão exercida pelos poderosos (Jr 7.1-15) e mostrou um panorama do reino messiânico de Deus quando Judá e Israel seriam restauradas às suas terras (Jr 3.15-18; 30-31). No NT, Tiago advertiu sobre a discriminação contra os pobres, afirmando que a verdadeira reli gião demanda o cuidado com os des validos (Tg 1.27—2.10), e Jesus condenou os fariseus pelas demonstrações exteriores de adoração desprovidas de um coração reto (Mt 5.20; 6.1-18). No NT, Estevão cita passagens de Amós no resumo histórico que faz das rebeliões pas sadas de Israel contra Deus, em Atos 7.42-43 (usando a tradução da LXX de Am 5.25-27, que é um tanto diferente do TM). Tiago também cita o profeta em um discurso diante do conselho de Jerusalém (usando a LXX de Am 9.12), comprovando assim que era da vontade de Deus que os gentios fossem recebidos na igreja primitiva (At 15.15-18). B ib l io g r a f ia
H. M. Barstad, The Religious Polemics o f Amos, 1984; J. Barton, Am os Oracles Against the Nations, 1980; A. Benson, “From the ‘M outhofthe Lion’. The Messianism ofAmos”. CBQ 19, 1957,199-212; D. N. FreedmaneF. I. Andersen, Amos, 1989; J. P. Hyatt, “The Book ofAmos”, int 3, 1949, 338-48; C. G. Howie, “Expressly for Our Time: The Theology o f Amos”, int 13, 1959,273-85; W. C. Kaiser, Jr., “The Davidic Promise and the Inclusion o f the Gentiles”,./£TS 20, 1977, 97-111; A. S. Kapelrud, "God as Destroyer in the Preaching o f Amos and the An cient Near East”, JBL 71,1985,33-38; idem, Central ldeas in Amos, 1956; C. J. Labuschagne, “Amos’Conceptionof God and the Popular Theology ofhis Time”, OTWSA 7-8,1965,122-33; C. van Leeuwen, “The Prophecy o f the Yôm YHWH in Amos 5:18-20”, OTS 19,1974,113-34; J. L. Mays, Amos: A Commentary, 1969; S. Paul, Amos, 1991; W. Rudolph, Joel-Amos-ObadjaJona, 1971; F. H. Sailhammer, “The Role o f the Covenant in the Mission and the Message of Amos”, in A Light unto My Path: Studies in Honour o f J. B. Meyers, ed. H. N. Bream, et al., 1974,435-51; G. V. Smith, Amos: A Commentary, 1989; D. Stuart, Hosea-Jonah, 1987; W. A. VanGemeren, Interpreting the Prophetic Word, 1989, 127-37; D. L. Williams, “The Theology of Amos”, RevExp 63, 1966, 393-403; H. W. Wolff, Joel and Amos, 1977, 100-113; G. E. Wri ght, “The Nations in Hebrew Prophecy”, Encounter 26, 1965, 236. Gary V. Smith Amparo -> #9128 (s'n, apoiar-se em, depender de)
AT O cântico de Ana encontra-se registrado em 1 Samuel 2.1-10. Seu tema é a vitória soberana de Deus. O Senhor é santo (v. 2) e conhece todas as coisas (v. 3). Ele exalta os humildes e rebaixa os orgulhosos (vv. 3, 7), concede alimento e vida, fome e morte (vv. 5, 6), toma as pessoas ricas ou pobres (vv. 7, 8), favorece os seus santos, mas emudece os perversos (v. 9) e julga com justiça (v. 10). Alguns estudiosos observaram que essas opiniões são temas gerais do AT e não parecem estar relacionadas especificamente à situação de Ana. Além disso, a referência ao rei ungido de Deus (v. 10) foi considerada prematura, uma vez que, no tempo em que Samuel nasceu, havia poucas perspectivas de uma monarquia. Até mesmo a ruína dos perversos foi descri ta como sendo anacrônica (v. 9), tendo em vista que isso não aconteceu na época dos Juizes (Miscall, 16). Assim, esse poema foi tido como um salmo que não se encontra relacionado ao Ana, Cântico de
377
Ana, Cântico de
seu contexto (Hertzberg, 29). Seu gênero é mais próximo daquilo que Gunkel descreve como o hino do indivíduo (Bartelmus). E possível que, em seu contexto original, o poema tivesse celebrado uma vitória militar (Gordon, 79). A referência ao rei ungido dificilmente se encaixa nessa visão conservadora (v. 10). Em contraste com essas opiniões críticas, é possível relacionar adequadamente o cântico com a situação de vida de Ana. Ao dar à luz Samuel, Ana (# 2839) havia desconcertado sua rival, Penina, que costumava atormentá-la (1 Sm 2.1; cf. 1.6). O cântico de Ana refere-se à superação da esterilidade (v. 5). Sua esterilidade lhe havia causado tristeza (1.10), e o tom de alegre vitória pela capacidade de Deus de reverter situações que pareciam impossíveis de mudar se reflete na experiência da própria Ana. (v. 10). Ainda que o conceito de monarquia não fosse novo para Ana (Dt 17.14-20; Baldwin [58] cita Gn 17.6; Jz 8.22; 9.6), não havia um governo desse tipo no tempo em que ela proferiu essas palavras. Nesse discurso sobre a monarquia, pode-se detec tar um elemento profético, que talvez tenha origem na intensidade das emoções de Ana, e que surge no auge do cântico (ISm 2.10). Com essa declaração profética, ela prenunciou Samuel, que em breve teria um ministério inequivocamente profético (3.19-20). No contexto literário mais amplo, existe uma semelhança entre a mãe de Samuel e a de Sansão. As duas eram estéreis e ainda assim tiverem filhos especiais para Deus, e as duas se abstiveram de vinho e bebida forte durante a gestação (Jz 13.7; ISm 1.15). Diante disso, o cântico de Ana pode ser considerado um resumo de que o povo talvez tivesse aprendido, ao refletir sobre o período dos Juizes, que é Deus quem governa sobre os assuntos da humanidade e que, no final, é o arrependimento humilde e não a força bruta que traz a vitória. Mais do que em qualquer outra passagem, isso fica evidente na história da humilhação de Sansão na prisão e no poder que ele recebeu posteriormente em resposta à sua oração (Jz 16.28). Olhando adiante, pode-se comparar o cântico de Ana perto do começo dos livros de Samuel com o cântico de Davi, perto do fim de um desses livros (2 Samuel 22; cf. Salmo 18; Baldwin, 58-59). Assim como Ana, Davi entoa um salmo e os dois apresentam temas parecidos. Deus é retratado como soberano no livramento que concede aos fracos (2Sm 22.18-19) e na humilhação dos poderosos (22.28). Deus é uma rocha (22.2-3), que responde os clamores sin ceros de aflição (22.7), vence os inimigos (22.4) e troveja do céu (22.14). Ele exalta o humilde e abate o altivo (22.28). Considerando esses dois poemas em conjunto, é possível vê-los como um comentário sobre os acontecimentos dos livros de Samuel. (-> Samuel: Teologia) NT Num contexto ainda mais amplo, foi observado que o cântico de Ana prefígura intensa mente o cântico de Maria antes do nascimento de Jesus (Lc 1.46-55). Essa semelhança ressalta a natureza profética do cântico de Ana. Esterilidade, atecnia, aborto: galmúd (estéril, # 1678); -> nêpet (natimorto, aborto, # 5878); -> ‘ãqãr (estéril, sem filhos, # 6829); -> 'arJrí (sem filhos, # 6884); -> Skl (ser priva do, desfilhado, abortar, # 8897) B ib l io g r a f ia
J. Baldwin, 1 & 2Sam uel, 1988; R. Bartelmus, “TempusaisStrukturprinzip: Anmerkungenzur stilistischen und theologischen Relevanz des Tempusgebrauchs im ‘Lied der Hanna’ (1 Sam 2,1-10)”, B Z 31, 1987, 15-35; D. N. Freedman, Poetry and Prophecy, 1980, 243-61 (=Erlsr 14, 1975, 56-70)”, R. P. Gordon, 1 & 2 Samuel, 1986; H. W. Hertzberg, I & 2 Samuel, 1964; R. W. Klein, 1 Samuel, 1983; P. D. Miscall, 1 Samuel: A Literary Reading, 1986. David F. Pennant 378
Animosidade
Ancião -> # 2418 (zãqên, ancião) Angústia -> # 3873 (k? 'êb, dor, angústia) Animal
# 2651 (hayyâ I, animal)
~ ! ., , AT 1. Inimigos humanos de Israel. Os textos bíblicos Animosidade . , . . . . , . . ______________________________ talam tanto de inimigos coletivos quanto pessoais. Nos Salmos, é especialmente difícil distinguir entre esses dois tipos de adversários. Os termos em pregados com mais freqüência são ’y b, ser um inimigo (-> # 366), çrr, ser hostil (-> # 7675) e s n ', odiar (-> # 8533) e encontram-se em construções par. entre si ou não demonstram esses termos nuanças teológicas distintas. Como outros povos, Israel era tentada a ver a vida em termos simplistas, dividindo as pessoas em dois partidos: aqueles que eram a favor deles e os que eram contra. Assim, quando Josué, em meio a uma crise militar, viu, do lado de fora de sua tenda próxima a Jericó, um desconhecido, perguntou-lhe: “És tu dos nossos ou dos nossos adversários?” A resposta do homem é um excelente exemplo da teologia deut. e profética (e do AT como um todo) com re lação aos inimigos nacionais: “Não; sou príncipe do exército do Senhor e acabo de chegar” (Js 5.13-15). Assim como a reação correta de Josué foi prostrar-se com o rosto em terra e adorar, a postura correta para Israel diante dos conflitos com seus inimigos era se prostrar e adorar Javé. Os problemas de Israel com seus inimigos nacionais eram secundários em relação ao relacio namento com Deus. Israel não podia reduzir o mundo a “eles” e “nós”; parte de sua educação religiosa ao longo da história foi conscientizar-se de uma terceira parte: “ele”. Ao tratar em primeiro lugar da crise de relacionamento com Javé, os problemas subseqüentes de Israel em seus relacionamentos humanos acabariam se resolvendo. A teologia por trás das passagens que falam dos inimigos de Israel ressalta que era o próprio Javé quem determinava a derrota ou a vitória de Israel diante dos inimigos. O papel de Israel se limitava a duas atitudes principais: obedecer a Javé e suplicar a ele. Com referência ao primeiro tema, a obediência resultava em bênçãos na batalha (Êx 23.22; Dt 28.7), mas a deso bediência acarretava a derrota (Lv 26.17; Js 7.12). Apesar de ser possível encontrar esse tema ao longo de todos os textos do AT, ele se sobressai de modo particular no Pent. e nos escritos proféticos. Pode-se dizer que o relacionamento de Israel com seus inimigos servia de indicador do relacionamento com Javé. A vitória não era apenas um sinal de bênção, mas também da pre sença de Deus (Dt 23.9 [10]; ISm 4.3). Se Israel encontrava-se numa posição de obediência ao sair para a batalha, então a presença do Senhor estava com Israel e Javé dizia para o seu povo não temer, “pois o Senhor, teu Deus... está contigo” (Dl 20.1, 3-4). Esse primeiro tema cardeal apresenta corolários. O ato de obediência podia acarretar mais do que a vitória, conferindo também “descanso” em relação aos inimigos naturais (Js 21.44 [42]; 2Sm 7.1). Além disso, a vitória vinha, sem dúvida alguma, das mãos do Senhor e, assim, até mesmo na distribuição dos espólios havia procedimentos específicos determinados por Javé sobre como tratar dessas riquezas (ou seja, Dt 20.14, mas comparar com Et 9.16, em que não foi tomado despojo algum). Nos profetas mais recentes, apesar de esse tema ainda estar presente, ele é colocado em segundo plano. A grande desobediência de Israel havia trazido a derrota nacional, mas Javé também trataria com os inimigos de seu povo que já eram culpados, de modo que o destino lógico desses adversários era a destruição completa. Mensagens de esperança e a promessa de 379
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que Israel ver-se-ia livre de seus inimigos também eram proclamadas, tomando-se por base não a obediência de Israel, mas sim, e somente, a opção de Deus de conceder misericórdia (Is 62.8; Mq 4.10; Sf 3.15). O segundo tema com referência aos inimigos nacionais de Israel gira em tomo da outra atitude necessária da parte de Israel: suplicar pela ajuda de Javé. O assunto que mais se destaca nos Salmos é o pedido de Israel por socorro diante de seus inimigos opressores (cf. 1 Reis 8), por intermédio de orações de súplica e confiança (SI 74.10; 80.6 [7]). Esse tema normalmente recorre à situação miserável, indefesa, porém comparativamente reta. Além disso, vários textos falam especificamente da profanação do templo (SI 74; Is 63.18; Ez 39.27) e procuram levar Javé a honrar seu nome. Ao pedir alívio dos ataques inimigos, esses textos não apelam para a justiça de Israel, mas sim para a honra e misericórdia de Deus. Por fim, assim como Israel devia confiar que Javé a livraria dos inimigos opressores, também devia terminar suas súplicas com expressões de gratidão pelo livramento das mãos de seus adversários (SI 107.2; Is 108.12-13 [13-14]; 136.24; 138.7). Por meio do louvor, devia reconhecer que Deus, o terceiro elemento da equação, era o fator decisivo do relacionamento do povo com seus inimigos. O tema da vitória não pertence à categoria de nacionalismo cego. A fim de manter sua posição privilegiada, Israel devia ser obediente à lei e fiel à pessoa de Javé (1 Rs 8.33; Ne 9.2627). Em segundo lugar, muitos dos salmos deixam claro que Israel não era a agressora. Neles o inimigo é retratado como o iniciadordo conflito (SI 60.11-12 [13-14]; 69.4 [5], 19 [20]; 78.42, 53). A descrição dos inimigos de Israel mostra que eles são insolentes em suas palavras (SI 80.6 [7]; 102.8 [9]), arrogantes (SI 44.16 [17]), odiosos (Êx 35.11; SI 25.19) e dissimulados (Nm 25.17,18). J.-J. Kraus aponta para a confiança dos adversários de Israel no poderio militar, en quanto Israel deveria confiar somente em Javé (Salmo 20) (The Theology o f Psalms, 126). Vários textos são dirigidos às nações estrangeiras ou se referem às respostas delas. Ape sar de muitos dos textos considerarem os inimigos de Israel como instrumentos de julgamen to de Javé sobre o povo, diversos deles referem-se ao castigo de Deus sobre os inimigos pelo comportamento opressor deles (Ez 25.15; Jr 30.16; Na 3.11, 13). Nesses casos, os inimigos passaram dos limites como agentes de Javé. Além disso, se Israel fosse obediente, aqueles que odiassem o povo de Deus sofreriam castigos ou pragas. Assim, era perigoso atacar os eleitos quando eles estavam fiéis ao seu Senhor (Dt 7.15; 30.7). Uma última questão é o entendimento que Javé podia incutir nos inimigos estrangei ros. Israel devia mostrar-se virtuosa a fim de não ser repreendida por seus inimigos (Ne 5.9). Por causa de sua condição de povo eleito, Israel devia estar atenta para a forma como era vista por seus adversários (2Sm 12.14). Israel também foi poupada do julgamento completo e um remanescente foi livrado para que seus inimigos não pensassem que eles, e não Javé, haviam sido os responsáveis pela vitória (Dt 32.27). 2. Inimigos humanos do indivíduo. Assim como a nação, os indivíduos eram incentiva a suplicar por ajuda para vencer seus inimigos. Deviam permanecer fiéis a Deus e perseverar na tarefa que lhes havia sido designada, na esperança de que Deus iria intervirem favor deles (Is 66.5; Am 5.10). Essa esperança aplicava-se não apenas aos profetas (Jr 15.11), mas também às donas de casa (ISm 2.1); todos deviam saber que ele “[prepara] uma mesa na presença dos meus adversários” (SI 23.5). Esse livramento podia servir como uma forma de consolo. Ao ver o sucesso daquele que confiava em Deus, o inimigo seria envergonhado (SI 86.17). Em outras ocasiões, a garantia da derrota dos seus inimigos também servia de esperança para o indivíduo justo (Nm 23.11; 1Sm 25.22, 26, 27; 2Sm 4.8). O consolo resultante da humilhação de um inimigo é apenas parte de um quadro mais amplo (SI 6.10 [ 11]; 27.6; 109.6). Muitos textos do AT pedem uma atitude de benevolência para 380
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com os inimigos (p. ex., Jr 29.7). Êxodo 23.4-5 é um excelente exemplo da atitude humanitá ria do AT com relação aos inimigos: “Se encontrares desgarrado o boi do teu inimigo ou o seu jumento, lho reconduzirás. Se vires prostrado debaixo da sua carga o jumento daquele que te aborrece, não o abandonarás, mas ajudá-lo-ás a erguê-lo”. O indivíduo não apenas devia evitar medidas punitivas com relação ao inimigo, como a lei também exigia que o israelita realizasse gestos explícitos de beneficência. Deve-se, por exemplo, dar de comer e beber ao inimigo (Pv 25.21-22), um gesto que redunda tanto em resultados construtivos para o inimigo quanto na bênção de Javé (2Rs 6. 18-23). A crueldade excessiva para com os inimigos não é aprovada (Jó 31.29), mesmo quando alguém se encontra em posição de vantagem sobre os adversários ou nos casos em que eles não são os agressores (cf. Sl 7.4-6 [5-7], em que a súplica é precedida de um testemunho de inocência). Essa benevolência prescrita nos textos legais e de sabedoria é demonstrada de maneira práticas nas seções narrativas do AT. Assim, Davi é considerado piedoso na maneira de tratar certos inimigos e, em várias ocasiões, surpreendeu seus adversários ou conhecidos (o próprio Saul, em ISm 24.19 [20]; aqueles que mentiram sobre terem assassinado Saul, em 2Sm 4.8; o etíope, com referência a Absalão, em 2Sm 18.32; Abisai em duas ocasiões, com referência a Saul, em ISm 26.8, e com relação a Simei, em 2Sm 19.22-23 [23-24]). É possível que na maioria dos casos, Davi tivesse outros motivos por trás de seus atos, mas seguiu o ensinamento: “Não aborrecerás teu irmão no teu íntimo; mas repreenderás o teu próximo e, por causa dele, não levarás sobre ti pecado. Não te vingarás, nem guardarás ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou o Senhor” (Lv 19.17-18). Atitudes como essas em relação aos inimigos não atingem o nível do NT, mas são per meadas por um forte conceito de justiça. Tudo o que resta ao indivíduo é esperar pelo alívio e só reagir aos inimigos quando estes são opressores e mais fortes. Não é aceitável, porém, alegrar-se com a queda de um inimigo só por causa da posição antagônica dele. “Quando cair o teu inimigo, não te alegres, e não se regozije o teu coração quando ele tropeçar; para que o SENHOR não veja isso, e lhe desagrade, e desvie dele a sua ira” (Pv 24.17-18). Essa proibição parece contradizer a atitude que transparece nos salmos imprecatórios mais severos (Salmos 55; 109), a menos que se considerem duas questões destacadas nos pró prios textos. Uma delas é que tudo se encontra sob a providência de Javé. Seu papel de reden ção dos fracos e julgamento dos opressores é essencial tanto nos salmos de maldição como em Provérbios. Não é permitido fazer justiça com as próprias mãos. O perseguido deve entregar sua situação nas mãos de Javé, pois, do contrário, coloca-se fora da esfera de proteção de Javé. Em segundo lugar, o inimigo deve ser perverso e opressor a fim de incitar a ira vinga dora de Javé. Nos salmos, os adversários são chamados de malfeitores (mer ê ‘im, [-> # 8317] o upõ 'alê awen [-> # 224] — Sl 27.2; 59.2 [3]; 92.7 [8]), perseguidores (rdp [-> # 8103]; Sl 31.15 [16]; 35.3) ou ímpios (t^sã^m [-> # 8400] — Sl 3.7; cf. 6.10; 41.5). Além disso, Kraus (130-131) apresenta em detalhes as três metáforas mais importantes que se referem aos ata ques cruéis e terríveis desses adversários: um exército hostil que ataque os indefesos (Sl 27.3; 62.3), caçadores ou pescadores (Sl 7.5 [6]; 59.6 [7]) e feras selvagens (Sl 7.2). Alguns chegam a considerar que esses inimigos se valem de poderes mágicos ou ocultos (Kraus, Mowinckel. ver Sl 59.12 [13]). A grande importância da necessidade de justiça no tratamento com os inimigos também pode ser encontrada nos textos que falam sobre ser a parte odiada, ou um adversário, numa relação conjugal. Havia certos dispositivos de proteção para a mulher (normalmente a parte mais fraca e, portanto, mais sujeita a ser oprimida) caso ela não obtivesse o afeto do marido (Dt 22.13-16; 24.1-4). Ela recebia proteção legal caso se tratasse simplesmente de o marido 381
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aborrecê-la. Era preciso provar que ela era legalmente culpada ou que havia se entregado a práticas indecentes; do contrário, haveria repercussões legais contra o marido. Nos casamen tos polígamos, a possibilidade de uma mulher perder o favor do marido ou ser preterida (Gn 29.31, 33; ISm 1.6) era comum o suficiente para ser tratada no conjunto das leis de Israel (Dt 21.15-17). Nesse caso, o tema da dominação concentra-se em mostrar como a rejeição não de via ser seguida de injustiça. Da mesma forma, Levítico 18.18 proibia um homem de casar-se com a irmã da atual esposa, talvez para que nenhuma rivalidade entre elas não se perpetuas se dentro do casamento. Em todos esses casos de relacionamento conjugal, o que estava em questão era a justiça. O sentimento de ódio que podia transformar um cônjuge num inimigo devia ser controlado e refreado para que se fizesse justiça. Assim, em alguns casos, essas leis previam sanções sociais. A preocupação com a injustiça orientava as estipulações para julgar os casos de homi cídio culposo. Essa situação muitas vezes levantava à questão de o homicida ter sido inimigo daquele que havia sido morto (Dt 4.42; 19.4, 6) e se o ódio o havia levado a premeditar o ho micídio (Nm 35.20-23; Js 20.5). Desse modo, o juiz podia realizar um julgamento justo. Por fim, assim como a nação de Israel devia ver o mundo além da própria segurança, também o indivíduo devia ver a pessoa e, portanto, os valores de Javé como fatores determinan tes em qualquer relacionamento com os adversários. Essa dimensão aparece em vários textos nos quais líderes, homens numa posição de vantagem, são retratados como vendo o mundo de maneira falsa, com simplismo e dualismo. Ao entrar em decadência, Saul começou a consi derar todos como se estivessem contra ele ou a favor dele. Até mesmo os inimigos nacionais tomaram-se inimigos pessoais dele, a ponto de ele esquecer que o papel dele como líder do povo era o de servir e, portanto, o de ter consciência das necessidades de sua gente (ISm 14.24, 30; 18.25; cf. Gn 27.41; 2Sm 19.6 [7]). Pelo fato de Davi ameaçar-lhe a sobrevivência, Saul passou a vê-lo exclusivamente como inimigo. Se Saul tivesse levado Deus em consideração como o terceiro elemento da equação, teria enxergado a vida sob uma ótica diferente. Em vez disso, foi impelido pelo medo e pelo fato de Deus tê-lo abandonado à morte (comparar com Ana, em 1Sm 2.1). Saul não foi destruído por seus inimigos, mas pelo próprio Deus. (Ver tam bém Acabe, em 1Rs 21.20; 22.8.) 3. A animosidade e o ódio humanos. O sentimento mais associado aos inimigos é ódio ou a animosidade. A conexão teológica entre esse sentimento e as relações com os ini migos aparece na própria estrutura da língua. Na língua hebraica, todas as principais formas substantivais para inimigo são derivadas de uma forma verbal que indica algum tipo de hos tilidade ou ódio. Em vários textos, a questão predominante não é o sentimento de ódio em si, mas o caráter próprio daquilo que é odiado. O objeto do ódio era um elemento decisivo para o julgamento. Odiar o lucro desonesto, por exemplo, era um pré-requisito para uma liderança piedosa (Ex 18.21; cf. Pv 15.27; 28.16), enquanto odiar a disciplina era atrair julgamento sobre si (SI 50.17; cf. Pv 5.12; 12.1). Algumas vezes, o ódio era um sentimento necessário: “Aborrecei o mal, e amai o bem, e estabelecei na porta o juízo; talvez o Senhor, o Deus dos Exércitos, se compadeça do res tante de José” (Am 5.15). Era louvável detestar a falsidade e os seus caminhos (SI 119.104, 128, 163; Pv 13.5), como também o era detestar o mal ou a perversidade (SI 45.7 [8]; 97.10). A graça de Deus era prometida àqueles que odiassem a congregação de malfeitores (SI 26.5), os idólatras (SI 31.6 [7]) e aqueles que rejeitassem a Deus (SI 139.21 -22). As bênçãos de Deus eram prometidas àqueles que detestassem o proceder dos apóstatas (SI 101.3) ou a hipocrisia para com a lei (SI 119.113). 382
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Havia certas coisas, porém, que se implorava para que o indivíduo não odiasse, como o conhecimento (Pv 1.22, 29), a honestidade (Pv 29.24), a sabedoria (Pv 8.36) e, como foi mencionado acima, a repreensão (Pv 9.8; 12.1; 13.24). Aqueles que eram propensos a odiar o bem, também odiavam o justo (SI 34.21 [22]; Pv 29,10), a bondade (Mq 3.2) e, portanto, Deus (Dt 5.9; Sl 83.3). Esses textos são caracterizados por dois elementos: um apelo para a escolha e um ato de rejeição. Com referência ao primeiro, o objetivo desses textos é criar ou estimular um esta do de comprometimento naqueles aos quais as palavras são dirigidas. A fim de ser justo e fiel a Javé, era preciso que o indivíduo assumisse uma posição radical contra o mal. Esse compro metimento não era separado do sentimento de ódio. O incentivo a opor-se ao mal era carregado de emoção, enquanto, ao mesmo tempo, também consistia numa decisão racional. Aborrecer implica rejeitar. A história de Tamar e Amom ilustra vividamente esse con ceito. O amor de Amom por Tamar transformou-se rapidamente em ódio e o resultado imediato desse sentimento foi a rejeição, como mostram claramente as palavras de Amom a Tamar: “Levanta-te, vai-te embora” (2Sm 13.15). Tamar apelou para que ele voltasse atrás em sua decisão (v. 16). Ele, porém, se recusou a ouvir e, portanto rejeitou (aborreceu) a disciplina ou repreen são. A morte dele, logo depois, pelas mãos do irmão, serviu para provar a máxima: “Disciplina rigorosa há para o que deixa a vereda, e o que odeia a repreensão morrerá” (Pv 15.10). Apesar de esse aborrecimento ser considerado positivo ou mesmo necessário para o israelita justo, o sentimento de ódio muitas vezes é contrastado negativamente com o amor. O ódio não é era o sentimento natural do justo. Em Provérbios, ser odiado (e rejeitado) pelos retos era algo a ser evitado sempre que possível. Assim, várias admoestações falam sobre evi tar a hostilidade para com amigos e parentes. Se alguém conspira a fim de fazer o mal, será odiado (Pv 14.17). As pessoas também não devem demorar-se na casa dos vizinhos para não criar hostilidade (Pv 25.17). O hóspede que não era bem-vindo provavelmente estava consu mindo toda a comida, abusando das acomodações ou tomando o tempo do vizinho. Este, por sua vez, não podia mandá-lo embora educadamente, mas devia sofrer esses incômodos em silêncio. Talvez seja esse o contexto da declaração de que o pobre é odiado pelos vizinhos (Pv 14.20) ou pelos irmãos (por causa da obrigação familiar [19.7]). Por outro lado, a pobre za ou escassez de recursos financeiros deve ser considerada preferível à riqueza quando esta traz consigo o ódio (Pv 15.17). O elemento sempre presente nesse tema é o conselho para evitar-se a animosidade. Juntamente com outros sentimentos tratados no AT, o ódio devia ser controlado e de monstrado dentro dos devidos limites, mas não devia ser negado. Compare-se o uso do ódio em Eclesiastes 3.8; 9.1,6, em que o aborrecimento, o zelo e o amor são relacionados em paralelo e como metonímias para a vitalidade ou vida de um indivíduo. Fazem parte da vida amar e odiar (ou rejeitar) intensamente. A atitude claramente incorreta era odiar as coisas erradas. Também era considerado inapropriado esconder o ódio. Aqueles que escondiam o aborrecimento eram sempre descritos como dissimulados ou mentirosos (Pv 10.18; 26.24, 26, 28; 27.6). 4. Os inimigos de Deus. A descrição do aborrecimento divino emprega os principais t mos heb. para animosidade, com exceção de s(n, acusar (# 8476). Outros termos substantivais parecem ser usados de forma intercambiável (Dt 32.41-43; Sl 68.1 [2]); e, de maneira seme lhante aos textos que se referem aos inimigos humanos, Javé possui tanto adversários coletivos quanto pessoais. Israel não apenas é auxiliado por Javé na luta contra os inimigos nacionais, como também os adversários de Israel tomam-se adversários de Javé. No entanto, o envolvi mento pessoal de Javé com os inimigos de Israel também não se baseia em um nacionalismo cego. A fim de que Deus abominasse os inimigos de Israel, era necessário que Israel estivesse 383
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em harmonia com a vontade dele (Êx 23.22; Jz 5.31). Os inimigos de Deus são os perversos (SI 37.20; 97.10) e os opressores (Is 42.13; 59.18; Na 1.2). De modo semelhante aos exemplos acima, Deus com freqüência livrava seu povo, não porque o povo fosse extremamente puro, mas para fazer justiça (Jr4 6 .10), glorificar seu nome divino (Dt 32.34; Is 64.2 [1]) ou propor cionar a misericórdia da qual Israel necessitava (Is 26.11). A importância atribuída à justiça é tanta que, quando Israel mostrava-se perversa, ela própria tomava-se inimiga de Deus (Jr 12.8; Lm 2.4-5; Os 13.7; Mq 2.8). “Portanto, diz o Senhor, o Senhor dos Exércitos, o Poderoso de Israel: Ah! Tomarei satisfações aos meus ad versários e vingar-me-ei dos meus inimigos” (Is 1.24). Tal severidade era motivada pela injus tiça (vv.22-23). Os textos acima referem-se ao castigo coletivo de Israel, mas outras passagens falam de relacionamentos antagônicos entre Javé e indivíduos perversos específicos dentro da nação (Is 59.18; 66.6). Javé não era simplesmente o Deus nacional de Israel, mas também inimigo se os is raelitas não o aceitassem como protetor. Quando rejeitavam a justiça ou Deus, ele tomava-se inimigo veemente deles. Esses textos estão entremeados de palavras referentes a ira, zelo ou ódio. A decisão de Javé de ser inimigo de Israel era justificada por motivos claros e objetivos e, muitas vezes, estava associada a alguma finalidade positiva que Javé tinha em mente para seu povo, depois que este havia sido disciplinado (Is 1.24-26). 5. O ódio divino. Alguns textos falam daquilo que o próprio Javé aborrece. Todos e usam o termo s n ' e são provenientes de diversas formas literárias: jurídicas, proféticas ou de sabedoria. O objeto desse ódio encaixa-se em diversas categorias, sendo uma delas a idolatria. Deuteronômio traz mandamentos proibindo certas práticas idólatras estrangeiras (Dt 12.31; 16.22). Parte da motivação para esses estatutos é o fato de conterem eles práticas que Javé aborrece (especialmente Dt 12.31) e de tais práticas serem infiéis à vontade dele e, portanto, à sua pessoa (ver também Jr 44.4). Contudo, o que Deus aborrece não é o comportamento cerimonialmente impuro. O ódio de Deus estende-se à prática da falsa religião mesmo dentro do próprio culto a Javé (Os 9.15; Am 5.21). O aborrecimento dessa falsidade não é simplesmente uma reação emocional, pois tem conseqüências sérias. Impede que as orações do povo sejam ouvidas (Is 1.14) ou leva ao julgamento e exílio (Os 9.15; Am 5.21). O principal objeto do ódio de Javé é o comportamento inapropriado para com outros homens. Em três dos seis textos relacionados acima sobre os impropérios religiosos (Dt 12.31; Is 1.14; Am 5.21), a injustiça ou opressão faz parte da causa do aborrecimento de Deus. Ou tras passagens descrevem o ódio de Javé contra o mal, a dissimulação e o perjúrio (SI 5.5 [6|; Pv 6.17, 18, 19; 8.13; Zc 8.17), violência e homicídio (SI 11.5; Pv 6.17), divórcio (Ml 2.16) e arrogância (Pv 6 .17; 8.13; Am 6.8). Nos casos acima, os principais objetos do aborrecimento de Deus são os israelitas e não os estrangeiros. No entanto, Malaquias 1.2-3 diz que Javé aborreceu Esaú e amou Jacó. Fica evidente que se trata de um texto nacionalista. Porém, considerando-se o contexto, tratase de uma palavra de consolo para os israelitas que se perguntavam sobre a prosperidade dos edomitas e o próprio fim apesar da lealdade a Javé. A linguagem enérgica reafirma que Deus elegeu Israel, mas não mostra um favoritismo cego. Palavras relacionadas ao aborrecimento ou desprazer de Deus aparecem nas seis contestações no livro de Malaquias, sendo que cinco delas são dirigidas aos próprios israelitas. Sem dúvida Javé rejeita a deslealdade, a falsa religião e o comportamento nocivo, opressivo ou dissimulado. No entanto, é mais do que mera linguagem antropomórfica prove niente de uma cultura simples que ainda não conhecia formas de abstrair a comunicação. A escolha dessas antropopatias específicas relaciona-se à intenção clara dos textos, em todas as 384
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passagens, de mostrar Javé como um indivíduo que rejeita explícita e energicamente compor tamentos desleais ou opressivos. Se alguém considera ofensivo que o Deus do universo possa odiar, então também deve ofender-se com o fato de ele amar (Is 61.8). Animosidade, inimizade, hostilidade: -> ’y b (ser um inimigo, # 366); -> $rr II (ser hostil, # 7675); -> stm (odiar, # 8475); sãfãn (acusador, Satanás, # 8477); sn ’ (odiar, inimigo, # 8533); -> sôrêr (adversário, # 8806); -> Animosidade: Teologia B ib l io g r a f ia
NIDNTT 1:533-37; TD N T2:S\1-15; TDOT 1:212-18; H. Birkeland, The Evildoers in the Book o f Psalms, 1955; W. Eichrodt, TOT 2:205-9; H. —J. Kraus, Theology o f the Psalms, 1986, 125-36; S. Mowinckel, The Psalms in Israel s Worship, 1962,1:195-218; H. Ringgren, “Einige Bemerkungen zum LXXIII. Psalm”, V T3,1953,265-72; K. Stendahl, “Hate, Non-Retaliation, and Love: 1QS X, 17-20”, HTR 55, 1962, 343-55; E. F. SutclifFe, “Hatred at Qumran”, RevQ, June 1960, 345-55. Bruce Baloian Anjo Ano
# 4855 (mal ’ãk, anjo, mensageiro) #9102 (sãnâ, ano)
Anseio -> # 2773 (hmd, desejar, almejar, ansiar, estimar) Ânsia
# 2773
desejar, ansiar, almejar por, estimar)
Anterior -> # 8037 (ri'sôn, primeiro, situação anterior, anterior) Antipatia -> #9210 (sq$, tomar-se detestável)
O AT está repleto de antropomorfismos, ou seja, atri buições de características humanas a Deus. Empregamse não apenas ações humanas para falar das atividades de Deus — ele fala (Sl 50.12), anda (Gn 3.8), vê (Dt 26.7), move-se (2Cr 16.9), arrepende-se (ISm 15.11), etc., mas também caracte rísticas físicas de seres humanos para descrevê-lo. Diz-se que Deus tem mãos (Dt 26.8), cora ção (Os 11.8), pés (Êx 24.10), ouvidos (Is 59.1), olhos (Ne 1.6), etc. Javé também é definido nas ocupações e nos papéis inter-relacionais dos homens, como guerreiro (Jr 20.11), pastor (Sl 23.1), rei (Sl 24.8), juiz (Gn 18.25), pai (Is 63.16), etc. Por fim, ele possui emoções (descritas nos mesmos termos usados para tratar-se de sentimentos humanos), como ciúmes (zelo; Êx 20.5), ira (2Sm 6.7), amor (Pv 3.12), graça (Sl 103.8), misericórdia (2Sm 24.14), etc. Os elementos mencionados acima são apenas uma amostra da grande variedade de usos dos antropomorfismos. O mais interessante é que não há nenhum desenvolvimento significativo em textos posteriores no sentido de uma terminologia mais abstrata. Os antropomorfismos são empregados em todos os períodos da literatura de Israel e em todos os seus diversos gêneros literários (Baloian, Anger in the OT, 269-72). Além disso, não há uma terminologia especial ou um conjunto de designações reservadas exclusivamente para referir-se às ações, natureza ou caráter de Deus. Antropomorfismos
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Antropomorfismos
Os antropomorfismos não foram aceitos com facilidade pelas culturas de influência grega. O fato é que a igreja tem se mostrado, com freqüência, conflitante quanto ao uso de tal linguagem, especialmente no que diz respeito aos antropopatismos (atribuição de sentimentos a Deus, inclusive a ira). Tendo em vista a alta consideração de Israel pela majestade e santi dade de Javé, vale a pena considerar o motivo dos escritores bíblicos terem corrido o risco de apresentar equivocadamente o caráter de Deus com essas qualificações humanas. As caracterizações antropomórficas podem parecer contraditórias com a proibição de imagens de Javé no AT. No entanto, ao longo do AT, há um desejo intenso de compreenderse a santidade de Javé sem comprometer a mensagem de que ele deseja relacionar-se com os homens. L. Koehler (24) faz uma excelente colocação: “O propósito dos antropomorfismos é tomar Deus acessível ao homem. Esse recurso abre a porta para encontros e controvérsias entre a vontade de Deus e a vontade do homem. Representa Deus como uma pessoa.” Sob essa ótica, formou-se um conceito de Deus para que seus encontros com os ho mens pudessem ser compreendidos além dos limites da piedade individual. O Deus de Israel era um Deus nacional (c, em alguns textos, um Senhor internacional). Não devia ser conhecido somente na devoção pessoal (apesar de essa prática ser incentivada e não proibida), mas tam bém devia ser conhecido e encontrado como base para a justiça social na vivência de Israel. O objetivo dos antropomorfismos era evitar-se o uso de uma linguagem particularmente religio sa e especializada da elite intelectual (os meios sacerdotais ou as escolas de sabedoria). Uma vez que Deus é a fundação da ética social, precisava ser compreensível dentro de um contexto social. Javé devia ser conhecido por todos e exercer influência na vida diária de todos. As sim, as descrições do caráter de Javé eram feitas de maneira tal que todos pudessem usá-las e compreendê-las, tanto na comunhão com Deus como na função de base para o relacionamento dele com os homens. Além disso, a decisão de Israel de falar sobre Javé por meio de analogias em termos in terpessoais não foi uma concessão às mentes menos eruditas, mas sim uma necessidade gerada por dois motivos. Em primeiro lugar, Dorothy Sayers nos lembra que quase toda a linguagem é analógica e que todo o pensamento é feito, principalmente, na forma de metáforas: Não podemos explicar coisa alguma em termos dessa coisa em si, mas somente em termos de outras coisas. Até mesmo a matemática só é capaz de expressar-se em termos próprios dela mesma ao lidar com um sistema ideal de números puros; no momento em que começa a tratar de números como “coisas”, é forçada a voltar-se para a linguagem da analogia. (Sayers, 24) Quando os homens falam ou pensam sobre algo que vai além de sua experiência dire ta, fazem-no por analogia. Sayers prossegue explicando que este também é, necessariamente, o caso ao se falar de Deus: Pode ser perigoso, assim como deve ser inadequado, interpretar Deus por analogias conosco mesmos, mas somos compelidos a fazê-lo. Não temos outro meio de inter pretar nada. Os céticos queixam-se com freqüência de que o homem fez Deus à sua própria imagem; na verdade, deveriam ir mais longe (como muitos deles o fazem) e reconhecer que o homem fez toda a existência à sua imagem. Se a tendência do antropomorfismo é um bom motivo para que se evite pensar sobre Deus, então é um motivo igualmente válido para que se evite a pensar sobre a luz, as ostras ou os navios de guerra. (Ibid., 23) 386
Antropomorfismos
Em outras palavras, a fim de formarmos uma idéia de Deus e comunicarmos esse co nhecimento de alguma forma pública e racional, isso deve ser feito pelo uso do pensamento metafórico ou analógico. O segundo motivo pelo qual as metáforas antropomórficas podem ser empregadas aber tamente para Javé é o fato de corresponderem à experiência israelita. As metáforas só morrem quando a metáfora é substituída pela experiência e o argumento prossegue numa esfera “de abstração sem ser relacionada à vida em todos os seus pontos” (Sayers, 45; ver M. Buber, The Eclipse o f God, 13). A forma como os israelitas se referiam a Deus e às emoções dele não era uma projeção freudiana dos sentimentos deles no espaço. Eram as tentativas deles (da única maneira que compreendiam) de descrever seu encontro autêntico com Deus. No entanto, essa linguagem metafórica não tem sentido algum, exceto como uma representação de uma reali dade verdadeira. Assim, as metáforas que falavam da natureza de Javé eram controladas pela realidade daquilo que Israel havia experimentado de uma divindade pessoal. Israel havia sempre experimentado uma Pessoa, o que se reflete na escolha da linguagem analógica. Em resumo, qualquer outra metáfora teria causado problemas. A relevância daquilo que os profetas, sacerdotes e sábios de Israel tinham a dizer sobre Javé à comunidade de crentes sempre tomou por base três elementos essenciais. Em primeiro lugar, era preciso corresponder à sua experiência verdadeira. Em segundo lugar, os israelitas que viessem depois só poderiam compreender de fato a linguagem analógica ao sentirem Javé da mesma forma. Cada era de veria comprovar por si mesma as referências do cânon de Israel às emoções de Javé. Por fim, o uso que Israel fazia do antropomorfismo e da analogia poética permitia que lançasse mão da imaginação em vez de afirmar uma compreensão plena da natureza divina. O grande empreendimento filosófico dos gregos também utilizava metáforas. No en tanto, esses pensadores optaram por representar a realidade suprema por meio de referência à parte lógica da experiência humana. Utilizando-se de metáforas, Platão e Aristóteles resol veram a dificuldade de se compreender a mudança e a permanência ao postularem a presença de “formas” impessoais. Essa conceituação promoveu a justificativa dos valores metafísicos, exaltou as virtudes da justiça, da verdade e da beleza, as quais se tornaram fundamentais para a compreensão dos elementos mais básicos do politeísmo; possibilitou também uma negação racional do animismo, e, portanto, promoveu um estudo crítico da natureza. Por mais proveitoso que isso tenha sido, as opções gregas pelo pensamento analógico tiveram alguns efeitos cola terais negativos, ao passo que o pensamento heb. apresenta algumas vantagens. O pensamento grego levou a uma dicotomização da mente e da matéria (especialmente no caso de Platão), algo que não é saliente na concepção hebraica. Esse dualismo radical também continha uma intensa depreciação da natureza material do universo, o que é menos corrente no AT. Em vez das “formas” de Platão, os israelitas escolheram o caráter pessoal como metáfora predominante para ajudá-los a lidar com o problema da mudança. No pensamento heb., tanto a permanência (transcendência) como a mudança podiam ser encontradas na personalidade de Deus — personalidade esta que pode existir e manter sua integridade mesmo quando se revela. Assim, a relação entre mudança e permanência era compreendida analogicamente a partir da experiência com a personalidade humana. Pode-se afirmar que existe certa continuidade num indivíduo, ainda que envolvida nos caprichos e mudanças da história. Assim, detectava-se a permanência suprema (transcendência) na personalidade de Deus e, no entanto, os homens podiam experimentar a imanência de Deus na esfera da história. Essa escolha de conceitos permitia conferir a Deus “uma identidade contínua, não em termos de ações invariáveis, mas de adaptações infinitamente delicadas por meio das quais um propósito constante pode ser cumprido em meio a circunstâncias variáveis” (Temple, 23: 227-300). Em outras palavras, a 387
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opção de usar-se a analogia do caráter pessoal tomou como base o propósito e a intencionalidade presentes na realidade, uma vez que é somente nas pessoas que os homens encontram e compreendem o conceito de propósito. A opção de Israel pela metáfora, que a princípio não foi ditada pelo conceito que se ti nha de Deus, mas sim pela experiência que se tinha dele, tem implicações para aquilo que era fundamental no sistema de valores do povo. O aspecto predominante da religião era um rela cionamento — e não um conhecimento — adequado. A concepção israelita da revelação es pecial não era tanto a divulgação do conhecimento, mas sim a manifestação da pessoa de Javé. Aquilo que os israelitas receberam, não foi “a verdade sobre Deus, mas o próprio Deus vivo” (Temple, 322). Para eles, ser religioso implicava a plena participação deles como pessoas: sua vontade, emoções, comportamento com respeito ao mundo físico e aptidões racionais. A atribuição de emoções ou características humanas a Deus permitiu que Israel auten ticasse a existência humana. Os textos que descrevem as ações ou emoções de Deus mostram o envolvimento intenso dele com o mundo dos homens (ISm 25.29) e, portanto, a validade da experiência humana ao longo do história. Também preenchem a pessoa humana com sen tido. Indicam esses textos que Israel percebia a presença de significado e intencionalidade na existência pessoal pois a realidade de Israel fundamentava-se em alguém sensível, desejoso, intenso e acessível com quem relacionar-se. B ib l io g r a f ia
W. F. Albright, From the Stone Age to Christianity, 1946; B. Baloian. The Aspect o f Anger in the O.T., 1988; D. M. Beegle, “Anthropomorphism”, BD T,45-46; G. W. Bromiley,“Anthropomorphism”, ISBE 1:136-39; A. Hesche, The Prophets, 2:36-62; L. Koehler, O. T. Theology, 1957; G. von Rad, OTT 2:18-45; B. P. Robinson, A Dictionary o f Biblical Interpretation, 1990, 28-29; D. Sayers, The Mind o fth e Maker, 1941, 23-45; W. Temple, Nature, Man and God, 23:277300; S. Terrien, The Elusive Presence, 1978, 267-68, 289. Bruce E. Baloian Aparo -> # 7894 (qsh II, aparar, mutilar, encurtar, raspar)
O termo é originário do gr. apokryphos, um adj. que significa coisas ocultas ou talvez, livros ocultos (Davies, 161) — daí, livros que revelam segredos divinos de outro modo inacessíveis à mente humana. É possível que os Apr. também se referissem a verdades esotéricas incompreensíveis para os não-espirituais; cf. 2 Esdras 14.45-47, em que se diz que esses livros devem ser lidos somente pelos sábios. Os Apr. são uma coleção de quinze livros incluídos no AT da Vg. (sendo que a maioria deles chegou ao latim por meio da LXX), mas que não fazem parte do AT hebraico. Em termos de conteúdo, esses livros podem ser classificados como históricos (1 Esdras; 1,2 Macabeus; Adições a Ester; Epístola de Jeremias), histórias de edificação (Tobias, Judite, Susana, Bel e o dragão), litúrgicos (Oração de Azarias, o Canção dos Três Jovens e a Oração de Manassés), apocalíptico (2 Esdras) e didáticos/de sabedoria (Sabedoria de Salomão, Eclesiástico e Baruque). Apócrifos: Teologia dos
A. Os livros apócrifos 1. 1 Esdras. Esse livro também é conhecido como Esdras grego, e seus nove capítulos são par. a 2 Crônicas 35.1—36.23; Esdras; Neemias 7.73— 8.12, ou à história de Judá, desde 388
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a Páscoa de Josias em 621 a. C., até a reforma de Esdras, em 444 a. C. Apesar de 1 Esdras apresentar problemas históricos, não traz algumas das mesmas dificuldades cronológicas en contradas nos canônicos Esdras-Neemias, e sua seqüência foi seguida por Josefo. Escrito por um autor desconhecido em c. 300 a. C., 1 Esdras explica como Deus providenciou para que o templo fosse reconstruído. O decreto de Dario, que permitiu aos judeus voltarem para sua terra, é ocasionado por um debate oratório (caps. 3— 4) no qual o autor atinge a verdadeira excelência literária (-> Esdras). 2 .2 Esdras. Não se encontra em nenhum MS da LXX, mas chegou até nós pela Vg., em que é chamado de 4 Esdras e colocado num apêndice ao final da Bíblia. Foi originalmente es crito em heb. por volta de 100 d. C., sendo que os caps. 1—2 e 15— 16 são acréscimos cristãos posteriores, de c. 150 e 250, respectivamente. 2 Esdras é uma tentativa pessimista, criteriosa e criativa de um teólogo judeu compreender o problema do mal no mundo. Por intermédio do anjo Urias, Deus responde que seus caminhos excedem o entendimento e desafia aquele teó logo, como fez com Jó, a compreender as obras de Deus na natureza. Tobias. Essa história de edificação, redigida no Egito, originalmente em heb. ou aram., em c. 200 a. C., possui boa qualidade literária e desfrutou grande popularidade na antigüidade. O argumento principal do autor é que Deus abençoará e protegerá aqueles que honrarem sua lei por meio de obras piedosas dando esmolas, orando, etc. Judite. A história relata a queda de Holofemes, principal general de Nabucodonosor, pelos ardis de uma bela mulher. Escrito com grande destreza em heb. por um antigo fariseu em c. 150 a. C., o livro contém vários erros históricos, mas Moore (79) acredita que sejam intencio nais. O objetivo do autor era “apresentar uma ficção escrita com determinado sabor histórico, de modo a acentuar o efeito dramático” (Metzger, 51). Assim como Tobias. Judite ensina que Deus livrará até os mais fracos do seu povo se confiarem nele e obedecerem sua lei. Adições a Ester. Esses 106 vv. não são, de fato, um livro, mas seis passagens acrescenta das a Ester quando o livro foi traduzido para o grego. Escritos c. 125 a. C., conferem a Ester um tom de reverência ao exaltar o Deus justo que escolheu Israel para ser sua herança (-> Ester). Sabedoria de Salomão. A influência inconfundível da filosofia grega indica que esse ser mão sobre a sabedoria foi escrito em Alexandria entre 50 a. C. e 50 d. C. A seção I (1.1— 5.23) apresenta um contraste entre a vida do perverso e a do justo; a seção II (6.1—9.18) exorta os reis a viverem pela sabedoria como faz o autor (supostamente Salomão); a seção III descreve como a sabedoria guiou a humanidade desde Adão até o Êxodo. Em resumo, o autor exorta seus compatriotas judeus a perseverarem na fé, uma vez que esta representa a verdadeira sabedoria de Deus e, portanto, é incomparavelmente mais elevada do que as idolatrias e filosofias pagãs. A Sabedoria de Jesus, o filho de Siraque (Eclesiástico). O livro mais longo (51 caps.) e um dos mais respeitados dos Apr., o Eclesiástico foi escrito c. 180 a. C. em heb. por Jesus, filho de Siraque, um judeu palestino que registrou suas percepções mais profundas sobre a vida de pois de anos viajando, estudando e ensinando as Escrituras hebraicas. Cerca de cinqüenta anos depois, seu neto levou o livro para Alexandria, onde o traduziu para o gr., visando aos judeus da diáspora que ali viviam. A ampla variedade de assuntos discutidos por Ben-Siraque indica que ele desejava proporcionar instruções adequadas para todas as circunstâncias da vida. Baruque. Escrito no estilo da literatura profética do AT, e atribuído ao secretário de Je remias, Baruque, relata o cativeiro babilônio fazendo uso de orações penitenciais (1.1— 3.8), ensina por meio de materiais de sabedoria em forma profética (3.9— 4.4) e conclui com exor tações proféticas e encorajamento pela esperança da restauração certa (4.5— 5.9). É provável que as seções II e III tenham sido escritas logo depois de 70 d. C.; sendo que a seção II pode ser até de 100 a. C. 389
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Epístola de Jeremias. Essa epístola não é de fato uma carta, mas sim um sermão sobre a insensatez da idolatria, que requer grande dedicação, mas não oferece coisa alguma em troca. Bali (in APOT, 596) afirma que a Epístola de Jeremias foi escrita em heb., c. 305 a. C., como uma advertência contra a assimilação da cultura babilônia, enquanto Davies (991) acredita que foi escrita em gr., em Alexandria, c. 25 a. C. Canção dos três jovens. Esse acréscimo ao livro de Daniel (68 w ., inseridos entre Dn 3.23 e 24) contém a oração de Azarias (1-22), uma descrição narrativa da fornalha e do anjo do Senhor (23-27) e o cântico que Azarias, Ananias e Misael entoaram enquanto estavam na fornalha. É provável que esse relato inspirativo tenha sido escrito originalmente em heb., c. 165 a. C., durante a perseguição de Antíoco IV aos judeus. Susana. Esse livro apresenta a história do resgate diligente de Susana, uma mulher virtuosa, por Daniel, por meio da averiguação hábil do falso testemunho contra ela dado por dois anciãos lascivos. O relato consiste de 74 vv. redigidos originalmente em heb. ou aram. e colocados no final de Daniel. Além da mensagem óbvia de que Deus livra os inocentes que confiam nele, também é possível que a história reflita a insistência dos fariseus na averiguação cuidadosa, durante a controvérsia deles com os saduceus no reinado de Alexandre Janeu, c. 95 — 80 a. C. (de acordo com Kay, in APOT, 638; Oesterley, 283-84). Bel e o dragão. Esse terceiro acréscimo a Daniel (42 w .) provavelmente foi escrito em heb. para advertir os compatriotas judeus dos perigos de aceitar-se a idolatria pagã. Nesses dois relatos, talvez as histórias de detetive mais antigas das quais se tem conhecimento, Daniel prova a Ciro que os sacerdotes de Bel, e não o próprio deus, é que estão comendo os alimentos ofe recidos a Bel. Além disso, Daniel mata uma enorme serpente adorada pelos babilônios por ser considerada imortal, cumprindo assim as palavras de Jeremias 51.34,44 (Moore, 1977, 26). Oração de Manassés. Livro mais curto entre os Apr. (15 w .), esse texto possui “elegân cia em sua construção, precisão em sua forma litúrgica, as mais excelentes tradições da devo ção judaica histórica” (Harrison, 235). Uma vez que o livro não é encontrado em texto algum da LXX, talvez não fizesse parte dos Apr. originais. Aparece pela primeira vez na Didascalia Apostolorum (d. C. 200 — 250), mas é provável que tenha sido escrito em gr. ou heb. durante o período macabeu. A oração magnífica Deus por sua grandeza e disposição em perdoar aque les que verdadeiramente se arrependem. 1 Macabeus. Trata-se dc um relato histórico sóbrio, relativamente preciso e extrema mente valioso de acontecimentos ocorridos entre 175 — 135 a. C. Escrevendo em heb., c. 100 a. C., de um ponto de vista saduceu, o livro registra a perseguição dos judeus por Antíoco IV e a resistência bem-sucedida liderada por Matatias e seus filhos, posteriormente auxiliada pelos chassides, e que resultou numa nova consagração do templo e na instituição do chanuca [Con sagração das luzes], uma festa que comemora anualmente essa grande vitória. 2 Macabeus. Outro relato da luta contra Antíoco, mas neste caso, do ponto de vista teo lógico farisaico, uma vez que seres sobrenaturais costumam cooperar nessa luta (2Mac 3.2426; 5.2-3; 10.29-31; 11.8). Grande parte do livro (cap. 3) é uma condensação de uma história de cinco volumes escrita por volta de 100 a. C. por Jason de Cirene. 2 Macabeus apareceu em heb. cerca de vinte anos depois. B. Teologia dos Apócrifos A grande contribuição dos Apr. encontra-se no fato de que apresentam um contexto no qual os escritos do NT podem ser mais bem compreendidos. Essas obras refletem o judaísmo com suas práticas e crenças no tempo de Jesus e dos apóstolos. Juntamente com o desenvol 390
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vimento do judaísmo rabínico (que se reflete na Mix.), do judaísmo helenista e com materiais de Qumran, formam uma pônte entre o AT e o século I d. C. Os Apr. mostram como o judaísmo começou a abrir-se para um contexto mais amplo à medida que os judeus passaram a refletir mais sobre Deus, o mundo e suas responsabilidades num âmbito gentio. Como tal, prepararam o caminho para que a revelação de Deus no AT fosse ouvida por um universo gentio. 1. Seres sobrenaturais, a. Deus. A maior parte dos Apr. reflete a teologia do AT, o q não surpreende, uma vez que, para os escritores dos Apr., o AT é a palavra oficial de Deus. Acima de tudo, a pessoa de Deus é magnificada em contraste com um cenário de perigos da idolatria pagã e das influências filosóficas helenistas. Em reação a estes primeiros, ele é apre sentado como o único e verdadeiro Deus (Ecli 36.5), Criador de tudo (Jdt 9.12), onipotente e onisciente (Ad Est 13.9-12), santo, justo e reto (Tob 3.2, 11; Sab 12.15), misericordioso e clemente (Ecli 18.11-14; Man 7). Vários Apr. concentram-se nesses atributos, especialmente as histórias de edificação. Tobias, Judite, Cânticos dos três jovens, Susana, Bel e o dragão, 1 e 2 Macabeus demonstram o poder de Deus para salvar aqueles que o reconhecem exclusiva mente como Deus, ao escolherem morrer em vez de salvar-se pela transigência religiosa; ao passo que Baruque e 2 Macabeus celebram a misericórdia de Deus ao perdoar o contrito. A fidelidade de Deus ao conceder livramento é enfatizada em Hebreus 11 (ver esp. vv. 32-38; o v. 35 provavelmente se refere aos mártires de 2Mac 7). A reação do judaísmo ao pensamento grego não foi simplesmente uma rejeição, como no caso da idolatria, mas sim uma aceitação parcial e uma adaptação. Enquanto os estóicos atribuíam a existência do cosmo e seu planejamento ordenando ao logos ou Idéia Divina, era mais do que natural para os judeus, ver nessa idéia o atributo da sabedoria de Deus personifi cada em Provérbios ( ->); sabedoria esta que é a companheira de Deus durante a criação e instrutora da humanidade em todos os aspectos da vida (Provérbios 8—9). O AT é reinterpretado lançando-se mão desses conceitos; a sabedoria deu a Adão a força para dominar a terra, livrou Ló de Sodoma, guiou Jacó, preservou José e livrou Israel do Egito (Sab 10.1-21). Na verdade, a lei de Moisés é a sabedoria de Deus (Ecli 15.1; 19.20; 24.23; Bar 3.9; 4.1-2). A defesa firme do Deus de Israel como único Deus verdadeiro e o uso perspicaz do conceito de sabedoria/fogos em favor da causa da apologia judaica exerceu ram profunda in fluência sobre os escritores do NT. A sabedoria é um das características dos ensinamentos de Jesus (Mt 13.54), mesmo durante sua infância (Lc 2.40, 52). Jesus fala como personificação da sabedoria (Mt 23.24; cf. Lc 11.49) e a preexistência dele é descrita por João como o logos/ sabedoria de Deus (Dentan, 106). Paulo também se mostra familiarizado com os livros de sabedoria apócrifos. Para o cristão, Jesus representa a sabedoria de Deus — uma sabedoria que, paradoxalmente, os filó sofos gregos (“amantes da sabedoria”!) não são capazes de compreender (ICo 1.17-31). No contexto da idolatria, a contribuição dos Apr. é ainda mais evidente. Paulo segue o estudo de três partes da idolatria encontrado em Sabedoria de Salomão quando afirma, em Romanos 1, que a humanidade não tem justificativa para não reconhecer Deus, uma vez que ele é revelado na natureza (Rm 1.20; cf. Sab 13.1,5, 8-9). Em seguida, ao rejeitar o testemunho da natureza, a humanidade voltou-se para os ídolos (Rm 1.22-23; Sab 12.24; 13.10). Por fim, Deus res pondeu permitindo que a humanidade se entregasse a toda sorte de pecado e depravação (Rm 1.26-31; Sab 12.25; 14.10-11,22-26). Mais adiante, em Romanos 9, Paulo usa novamente o livro de Sabedoria ao descrever o oleiro que, da mesma porção de argila, faz vasos de barro, para usos puros e impuros (idóla tras; ver Jr 18.2-6). Paulo transfere a ilustração para Deus, que de uma só humanidade forma 391
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aqueles que o servem e aqueles que se opõem a ele (Rm 9.21; Sab 15.7). Os dois textos des crevem ainda a paciência e soberania de Deus, que adia o julgamento dos pecadores ao mesmo tempo em que cumpre seus propósitos por meio deles próprios, mesmo enquanto resistem a ele (Rm 9.20-23; Sab 12.12-21). Tiago também tinha conhecimento dos textos de sabedoria dos apócrifos. Como mes tre de sabedoria na tradição de Provérbios, Sabedoria de Salomão e Eclesiástico, ele segue o modelo de instrução e exortação desses livros em vários assuntos, a fim de retratar o modo de vida ideal. O conhecimento profundo que ele tinha de Eclesiástico fica evidente nos oito temas seguintes. Primeiro, uma vez que os indivíduos que decidem servir a Deus devem enfrentar a tentação, Tiago recomenda paciência e perseverança em meio às provações de fogo. Deus aju dará os fortes na fé (Tg 1.2-8; Ecli 1.28; 2.1-6). Em segundo lugar, Deus não repreende quan do concede sabedoria (Tg 1.5; cf. Ecli 18.15). Em terceiro lugar, Deus não pode ser culpado pela tentação (Tg 1.13-15; cf. Ecli 15.11-14). Em quarto lugar, a língua deve ser controlada. Compare-se “pronto para ouvir, tardio para falar” (Tg 1.19; 3.2-12) com “rápido para ouvir, ponderado para falar” (Ecli 5.11; ver 4.23-24, 29; 5.10-14). Em quinto lugar, a verdadeira fé mostra-se na misericórdia para com os pobres e, no caso das reuniões dos crentes, ao não se privilegiar os ricos (cf. Tg 1.27—2.4; Ecli 4.1-10,22). Em sexto lugar, ele enfatiza a importân cia da humildade (Tg 3.15-17; Ecli 10.26-28). Em sétimo, contrasta a sabedoria terrena com a divina (Tg 3.15-17; cf. Ecli 19.20-25). E em oitavo lugar, Deus ouve os clamores dos pobres e julga os ricos corruptos que os oprimem (Tg 5.1-6; Ecli 21.4-5). b. Anjos, Satanás, demônios. A angelologia (inclusive Satanás e a demonologia) ganh força no judaísmo mais recente, como provável resultado, pelo menos em parte, da influên cia persa (Russell, 258). Os anjos passaram a ter nomes, escalões, números e uma porção de responsabilidades. Os textos Apr. e, mais ainda, o NT incorporam esse desenvolvimento em suas teologias, ainda que a atenção dada pelos Apr. aos anjos e demônios seja notadamente superficial, em comparação com outros livros intertestamentais, como 1 Enoque. O anjo Uriel é identificado em 2 Esdras 4.1; Rafael é identificado em Tobias 3.17 e descrito posteriormen te em 12.15 como um dos sete santos anjos, que apresentam as orações dos crentes a Deus. Semelhantemente, João descreve um anjo que mistura as orações dos santos com incenso e oferece-os a Deus (Ap 8.34). 2. Humanidade: Pecado, lei, expiação. As tradições do AT com relação à queda, à mosaica e aos ensinamentos dos profetas são as fontes das extensas reflexões sobre o caráter pecaminoso da humanidade que caracterizam 2 Esdras, Sabedoria e Eclesiástico. Todos con cordam que o pecado começou no Éden, quer seja atribuído a Eva (Ecli 25.24), Adão (2Ed 3.21-22) ou Satanás (Sab 2.23-24). No entanto, surgem nos Apr. duas atitudes diferentes com relação à humanidade pecaminosa. Como mestre da sabedoria, Siraque pinta o retrato mais otimista, pois do contrário não haveria motivo para seus conselhos. Ao mesmo tempo em que admite a propensão da humanidade para o mal (yêçer hãrã ‘), prefere impelir o leitor no sentido da responsabilidade moral como uma opção verdadeira: “Se guardares os mandamentos” (Ecli 15.14-17). Contrastando com isso, o autor de 2 Esdras vê toda a humanidade sob uma ótica pessimista. A “semente perversa” do pecado no coração de Adão encheu o mundo de maldade e continuará a fazê-lo até o fim (2Ed 3.20-22; 4.30-32). O autor mostra-se disposto a admitir a existência de uns poucos justos, mas só com grande esforço (2Ed 7.89, 92). Na verdade, a salvação desses poucos representa grande trabalho da parte do próprio Deus (2Ed 9.21-22)! Em sentido mais popular, as histórias de edificação dos Apr. funcionam como uma re flexão fiel sobre a centralidade da lei para o judaísmo farisaico no final do período do AT. Para eles, pode-se dizer que uma vida de piedade (ou seja, de fidelidade à lei) é a melhor solução para 392
Apócrifos: Teologia dos
o problema do pecado pessoal. Tobias resiste à apostasia de seus parentes ao continuar dando esmolas, fazendo sacrifícios, etc. (Tob 1.3-18). Judite recusa a comida impura de Holofemes (Jdt 12.2), e Susana, instruída na lei pelos pais (Sus 3), escolhe morrer em vez de desonrar o que havia aprendido (v. 23). No entanto, a sagacidade dos profetas não foi deixada de lado, pois a verdadeira pie dade se revela em atos de bondade e não nos sacrifícios de animais. Tais obras chegam a fazer expiação pelos pecados, pois “aquele que observa a lei [dá esmolas] faz numerosas oferendas [ofertas de ação de graças]... Afastar-se da injustiça é oferecer um sacrificio de propiciação” (Ecli 35.1-3; ver 3.3, 14-15, 30). E também “perdoa ao teu próximo o mal que te fez, e teus pecados serão perdoados quando o pedires” (Ecli 28.2; cf. Tob 12.9; Três 15-17). A importância dessa teologia encontra-se no fato de que o judaísmo pode adaptar-se à vida em outras terras onde não era mais possível fazer sacrifícios no templo. O cristianismo também reconhecia o propósito interior e espiritual da observância exterior da lei, mas encon trou um meio maior e mais perfeito de expiação na morte de Cristo. E, no entanto, a exaltação Apr. das obras de piedade permanecem registradas no livro de Tiago. As obras são retidão (jus tificação), pois consistem em prova exterior da fé salvadora interior (Tg 2.20-26). 3. Escatologia. a. A vida depois da morte. Mesmo no período dos Apr., o Seol ( # 861 gr. Hades) era o lugar tenebroso de todas as almas que partiram ou, ainda, o lugar das sombras (Jó 10.21 -22) que têm apenas uma certa medida de personalidade humana (Ecli 14.16; 17.2728; Russell, 358-59). No entanto, vários desenvolvimentos significativos surgem durante esse tempo, em função da influência da literatura apocalíptica. Os mortos são descritos como “almas” ou “espíritos” dotados de plena consciência humana (2Ed 7.78-79). Além disso, aqueles que partiram são separados de acordo com seu caráter moral, pois a essa altura, o Seol possui várias divisões onde já se experimenta suplício ou êxtase (2Ed 7.95; cf. 4.41; lEn. 22.9-13). Por fim, o Seol é visto agora como uma morada temporária; no dia do julgamento, deixará ir todos os seus habitantes (2Ed 7.32). E possível que Jesus tenha lançado mão desse conceito conhecido de Seol em sua história sobre Lázaro e o homem rico. Esses dois encontram-se em divisões diferentes e são retratados como tendo plena consciência em meio ao tormento ou ao prazer. b. O fim dos tempos. Mais uma vez, o desenvolvimento da visão apoc. do mundo e sua história, transforma de modo dramático as esperanças do judaísmo. Nas partes mais anti gas do AT, esperava-se que Deus cumprisse seu plano para a história segundo os meios con vencionais dela. Afirmava-se especificamente que ele levantaria um rei da tribo de Judá para assentar-se no trono de Davi para sempre, restaurando Israel à sua posição passada de glória (Is 9.6-7; 11.1-10; Jr 23.5; Mq 5.2 [1], etc.). Contudo, na teologia apoc., que afirma que anjos caídos influenciam o destino das nações, os processos bíblicos habituais não bastam. Somente a intervenção divina no fim desta era presente de perversidade pode salvar a terra e trazer uma nova era de justiça (2Ed 4.26; 6.7, 18-28; 9.2-8; cf. Lc 21.25-28). E compreensível que essas previsões sobre o fim da era presente, seguido de uma nova era de bênção e paz, tenham produzido interesse considerável nos sinais indicadores da apro ximação desse acontecimento extraordinário. Em geral, trata-se de acontecimentos destruido res, pois marcam a luta da terra em decomposição para dar à luz um novo período da história. Essas “dores de parto” (Mc 13.8; cf. 2Ed 5.51-55) encaixam-se em três categorias: decadência natural — terremotos, fome, etc. (2Ed 5.4-9; Mc 13.8, 24-25); decadência social — guerras, etc. (2Ed 5.9; 6.24; Mc 13.7-8, 12) e decadência espiritual — falsos profetas, etc. (2Ed 5.912; Mc 13.6,21-22). Deve-se ressaltar que essas passagens de Marcos 13 (e as passagens paralelas em Mateus e Lucas) demonstram que as previsões de Jesus sobre o fim desta era se valem grandemente 393
Apócrifos: Teologia dos
das imagens apocalípticas, como aquelas registradas em 2 Esdras, e não podem ser compre endidas por inteiro caso não se leve em consideração tal imagistica. Essas três categorias de decadência também constituem boa parte do livro de Apocalipse. No NT, a volta de Cristo é o meio específico de intervenção divina no final dos tempos. c. O Messias. Ao conceito tradicional de Messias davídico, os teólogos apoc. acrescen taram uma figura celeste que teve como origem aquele “como o Filho do Homem”, em Daniel 7.13-14. Em 1 Enoque, “Filho do Homem” toma-se um título e, apesar de 2 Esdras não em pregar essa expressão, pode-se distinguir nela conceitos messiânicos tanto nacionalistas mais antigos quanto mundiais mais recentes. Em 2 Esdras 7, o Messias é um homem que morre depois de reinar durante 400 anos (v. 28); e nos caps. II e 12, é o leão que destruirá a águia (que representa Roma). Mas também é descrito como uma “figura de homem” preexistente e sobrenatural, que voa com as nuvens do céu (2Ed 13.3,26) e consome seus inimigos com um jato de fogo da boca (2Ed 13.9-11). Nos Evangelhos, o “Filho do Homem” é o termo preferido de Jesus para si mesmo, e tem o mesmo significado escatológico encontrado em Daniel e 2 Esdras: uma figura que dei xa a presença de Deus e vem nas nuvens para julgar e governar a terra (Mc 13.26; 14.62; Mt 25.31-46). d. A ressurreição. A crença na ressurreição do corpo é o que sustenta os mártires de 2 Macabeus (7.10-11, 14, 23, 29). A ressurreição será universal (2Ed 7.32), apesar de outras fontes dizerem que somente os justos serão ressurretos (lE n. 46.6). No NT, a ressurreição de todos é afirmada de modo congruente por Jesus (Mt 22.23-32), Paulo (ICo 15.12-23) e João (Ap 20.4-5). e. O juízo final. Na descrição extraordinariamente explícita de 2 Esdras, esse aconteci mento durará uma “semana de anos” e trará o início da nova era. O mundo todo é ressuscitado e aparece diante de Deus, que decidirá entre o inferno e o paraíso (2Ed 7.31-44). Os justos resplandecerão na glória e verão a face de Deus (2Ed 7.97-98; cf. Ap 22.4). O juízo final era um tema conhecido no AT (ls 51.5-6; 63.1-6; Jr 25.29-33; Ez 38— 39; Ag 2.6-7; Zc 14), e várias obras apoc,. fazem uma descrição mais detalhada e completa do juí zo final do que a encontrada no AT. O juízo final em 2 Esdras 7.31-44, por exemplo, é parte de uma descrição bem mais longa que contém os sinais do fim, a revelação do Messias, a abertura dos livros celestiais e a ressurreição dos mortos (caps. 5—6). A grande contribuição da literatura apoc. (p. ex., 2Ed) encontra-se na doutrina do juízo universal e não só dos vizinhos geográficos de Israel. Na literatura desse período, tudo fica claro — em detalhes e numa unidade integrada. Os escritos apostólicos desenvolvem mais esse enfoque com relação a Jesus Cristo. O Dia do Senhor passa a ser a volta de Jesus (lTs 5.2) e as nações serão julgadas pela ira do Cordeiro que foi morto (Ap 6.16-17). -> Literatura Apocalíptica; -> Período Intertestamentário B ib l io g r a f ia
L. H. Brockington, A Criticai Introduction to the Apocrypha, 1961; J. H. Charlesworth, ed., The Old Testament Pseudepigrapha, 1983; T. W. Davies, “Apocrypha”, ISBE 1:161-65; idem, “Jeremiah, Letherof", 2:991; idem, “Book ofTobit”, 4:866-68; R. C. Dentan, The Apocrypha, Bridge o f lhe Testaments, 1954; J. A. Goldstein, II Maccabees, AB, 1983; R. K. Harrison, “Manasseh, Prayerof’,/Sfi£'3:235-36; B. M. Metzger, An Introduction to the Apocryipha, 1957;C. A. Moore, Judith, AB, 1985; idem, Daniel, Esther and Jeremiah: The Additions, AB, 1977; D. F. Morgan, “Wisdom of Solomon”, ISBE 4:1082-84; J. M. Myers, I andIIE sdras, AB, 1974; 394
Arã
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Arã (CHK [ ’arãm], # 806; [#812]).
[ ‘arammí], arameu
AT 1. Os termos Arã e arameus (Síria e sírios no gr. e em nossa língua), referem-se a indi víduos, ao povo antigo conhecido como arameus e ao país onde viveram. Em Gênesis 10.22 e 1 Crônicas 1.17, Arã é mencionado juntamente com Elão, Assur, Arfaxade e Lude, como os filhos de Sem. É importante o fato de Arão ser associado nessas passagens com as regiões fronteiriças do norte e nordeste do Crescente Fértil. Isso reflete a descendência em comum de Israel e Arã e a relevância cada vez maior do povo arameu na po lítica e economia dessa região. 2. Arã também é o NP de um dos netos de Naor, um irmão de Abraão (Gn 22.21), e é mencionado entre os descendentes de Aser (1 Cr 7.34). Esses dois casos podem ser referências a tribos e não a indivíduos. De acordo com o AT, os patriarcas possuíam laços estreitos com os arameus, o que é ilustrado pelo fato de Abraão não aprovar um casamento entre Isaque e uma cananéia, de modo que enviou seu servo a Arã a fim de encontrar uma esposa para Isaque (Gn 24.2-4). Fica claro que Abraão não queria correr o risco de misturar sua religião com a dos cananeus (von Rad, 255; cf. Êx 34.15, 16; Dt 7.3,4). Também é possível que, pelo raciocínio de Abraão, se Isaque se casasse com uma moça cananéia, receberia a terra da família cananéia e não das mãos de Deus (van Selms, 38). Abraão ainda sentia-se parte da comunidade religiosa araméia de onde tinha vindo. Esse também foi o motivo por trás da viagem arriscada de Jacó até Harã/Padã-Arã seguindo o conselho de seus pais (Gn 27.43—28.5; 29.1-30). Como resultado de sua associação com Labão, Jacó foi chamado de “arameu” (Dt 26.5). (-> Gênesis: Teologia) 3. A escassez de informações toma impossível visualizar um retrato nítido dos primórdios da história de Arã. A primeira referência extrabíblica aos arameus que não apresenta am bigüidade (Pitard, 82) encontra-se nas inscrições de Tiglate-Pileser 1 (1115-1077 a. C.), rei da Assíria. Ele revela que se lançou numa campanha contra grupos étnicos hostis chamados de arameus (Dupont-Sommer, 40) e que conquistou vilas araméias nos arredores do monte Bisri (Malamat, 136-37). E possível que tenham se infiltrado nas regiões norte e central da Síria antes 395
Arã
do extermínio das potências hititas e amoritas. Os Povos do Mar, que causaram o colapso final dessas duas nações deixaram o país devastado e aberto para os novos nômades semitas (Unger, 38). Durante esse período, o declínio das potências mundiais coincidiu com a ascensão de três nações semitas, os arameus, os israelitas e os fenícios (Mazar, 155). A princípio, os arameus formaram uma série de Estados separados, como Damasco, Zoba, Hama, Bite Aguse e Samal. O aparecimento da monarquia israelita perturbou o equilí brio do poder na região e, por fim, levou à unificação dos Estados arameus (cf. 1Rs 20.24). A impotência dos grandes impérios criou condições favoráveis para as nações menores se desen volverem, enquanto a revitalização do expansionismo deles, mais perto do final do século X, deteve o avanço delas (Moscati, 214). As variações na eficiência dos impérios deram início a uma relação instável entre as nações menores. Por vezes, Israel e Arã disputaram a influência sobre a região (1 Reis 20), mas também formaram uma aliança para impedir o avanço das for ças assírias para o Oeste (p. ex., a batalha de Qarqar, em 853 a. C.) (Unger, 62). 4. Saul foi o primeiro rei israelita a defrontar-se com os arameus de Zobá em combat (ISm 14.47). Posteriormente, Davi venceu Hadadezer, rei de Zobá e conquistou território arameu (2Sm 8.3-12; 10.6-19). Ao que parece, Zobá possuía os territórios de maior influência, e foi a força motriz por trás da unificação dos arameus. A nação estabeleceu domínio sobre um território que ia da Transjordânia até a curva do Eufrates. Ao que parece, a soberania de Salomão sobre essa região foi contestada e ele teve que tratar de rebeliões em Hamate-Zoba (2Cr 8.3-4) e Damasco (1 Rs 11.23-25). Esses movimen tos foram precursores do estabelecimento de uma dinastia araméia forte em Damasco, sob o governo de Rezom (lR s 11.23-25; 15.18). No início do século IX, o crescimento comercial, político e militar constante que se manifestou sob Ben-Hadade I, de Arã-Damasco, tomou-se uma ameaça constante para a casa de Onri de Israel. Com a aquisição de poder e a luta subse qüente para consolidar seu reinado, Onri viu-se obrigado a fazer certas concessões aos arameus (1 Rs 20.34). Depois que Acabe subiu ao trono, Israel e Arã guerrearam entre si com freqüência (lR s 20, 22; 2Rs 6.8, 24; 8.28; 13.22-25; 14.25-28). Por volta de 843 a. C., Hazael realizou uma mudança dinástica em Damasco ao assassinar Ben-Hadade e declarar-se o novo rei (2Rs 8.15), trazendo conseqüências opressivas para Israel (2Rs 13.22). Depois da morte de Hazael, Jeroboão II acabou predominando sobre Arã (2Rs 14.2528). Sob a liderança de seu último rei, Rezim, Arã teve um momento final de glória quando marchou com Israel contra Judá. Acaz, rei de Judá, apelou para os assírios, e Tiglate-Pileser ajudou atacando Damasco (2Rs 16.9). E assim o reino arameu foi extinto em 732 a. C. O fato de Israel ser mencionada em Amós 9.7, juntamente com seus arquiinimigos, os arameus e filisteus, reflete uma relação com Arã diferente daquela existente no tempo dos patriarcas. Assim como Israel, essas nações também tiveram um “êxodo” e sua história também foi dirigida por Javé como ilustra a unção de Hazael por Eliseu (1 Rs 19.15; cf. 2Rs 8.7-15) e o fato de esse rei ser usado como instrumento para castigar a nação infiel de Israel (2Rs 13.3,4, 22). Apesar de textos religiosos inadequados impedirem que se tire alguma conclusão de finitiva com referência à religião araméia, pode-se supor que as divindades apresentadas nas inscrições araméias são, de modo geral, apropriadas dos arredores onde os arameus escolheram viver (S. Moscati, 217-22; cf. 2Rs 5; 8.8). Ben/Bar-Hadade, o nome dinástico usado em Da masco é testemunho do fato de que a principal divindade adorada na Síria era o deus sem. da tempestade, Hadade (Malamat, 148; Pitard, 4; 2Rs 5.18). Pela infiltração e deportação subseqüentes à captura de Damasco, com o tempo, os arameus foram dispersados por todo o Crescente Fértil. Deixaram para trás um legado cultural 396
Arabá
extraordinário, pois a língua e escrita deles acabaram sendo empregados na literatura, comércio e diplomacia (Malamat, 147). -> Damasco;
Israel;
Aliança siro-efraimita
B ib l io g r a f ia
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Arabá (H211Í [ ‘arãbá\, Arabá, planície, deserto, terra devastada, ermo [# 6858]). 1. Em 25 das suas 28 ocorrências no AT, 'arãbâ, Arabá, é um NG que se refere à parte do vale da Fenda, que se estende do mar da Galiléia até a extremidade sul do mar Morto. Essa parte do vale da Fenda possui pouco mais de cem quilômetros de extensão, variando em largu ra de 5,5 a 22,5 quilômetros. A sul de Bete-Seã, o clima muda de mediterrânico para desértico/ de estepe, com a precipitação reduzida a apenas dez centímetros no ponto em que o rio Jordão desemboca no mar Salgado. Podem-se encontrar provas de que o termo “Arabá” se refere a essa região em passa gens como 2 Samuel 2.29, em que Abner e seus homens passaram pelo Arabá e cruzaram o Jordão ao viajarem de Hebrom. na Cisjordânia, para Maanaim, a Transjordânia. Com exceção de duas ocasiões, o termo Arabá refere-se a essa região, ou seja, ao vale do Jordão, do mar da Galiléia até o mar Morto. 2. Para os escritores bíblicos, o Arabá e, mais especificamente, o rio Jordão (->), era parte da divisa oeste da terra de Canaã. Quando Israel cruzou o Jordão sob a liderança de Josué, estava entrando na terra prometida aos descendentes de Abraão e Sara. Estava sendo conduzido para aquela terra de modo que pudesse ser plantado no monte da herança de Deus, o lugar de Arabá
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Arabá
sua habitação e santuário (Êx 15.17). Esse acontecimento podia ser visto como uma reentrada no Éden, onde o povo de Deus poderia viver, obedecer e adorar na presença do Senhor. Foi no vale da Fenda, do lado oeste do Jordão, que as tribos transjordânicas construíram um altar (Js 22.10-11) para lembrá-las de que, mesmo não vivendo de fato dentro da terra de Canaã, tam bém eram parte do povo de Deus. Em 1 Samuel 23.24, o termo ‘arãbâ refere-se evidentemente à área do vale da Fenda ao sul do mar Morto, que nos mapas modernos de Israel é chamada de “Aravá”. Esse uso também pode encontrar-se refletido em Deuteronômio 1.1. É possível que nos tempos bíblicos, o termo 'arãbá se referisse a todo o vale da Fenda desde o mar da Galiiéia até o mar Vermelho; mas, em função da escassez de acontecimentos relevantes na região entre a extremidade sul do mar Morto e o mar Vermelho, apenas duas das 28 ocorrências referem-se a essa região. Apesar de haver uma falta de referências textuais específicas a essa região, sabe-se que rotas importantes no sentido norte-sul cruzavam o valem. As estradas que ligavam a Arábia, fonte de ouro, incenso e outras especiarias, ao Egito, Mediterrâneo e Israel eram particularmente importantes. Não se sabe ao certo se a oração “desde a entrada de Hamate até o ribeiro (vale; nahaí) de Arabá” refere-se ao rio Jordão, ao “vale” em geral ou a um dos afluentes do Jordão (Am 6.14). O termo ’arãbâ também é usado na expressão “mar de Arabá”, com referência ao m Morto (Dt 3.17; 4.49; Js 3.16; 12.3; 2Rs 14.25). Em três desses casos, o mar de Arabá é tradu zido como “mar Salgado” (Dt 3.17; Js 3.16; 12.3; usado 9x no AT). Essas águas também são chamadas no AT de “mar do oriente” (Ez 47.18; J1 2.20; Zc 14.8). O rio Jordão desemboca no mar de Arabá, mas não tem vazão (Js 3.16). O tamanho do mar varia, dependendo da dis ponibilidade das águas que correm para dentro dele, mas suas dimensões aproximadas são de 75 quilômetros de comprimento por 14,5 de largura. Sua superfície fica cerca de 400 metros abaixo do nível do mar e sua maior profundidade é aproximadamente 400 metros. Em todas as ocasiões que o termo é usado no AT, o mar de Arabá serve de marco geográfico. A forma const. pl. ‘arbôl ou ‘arbot pode ser encontrada apenas em dois contextos: um deles descrevendo a parte da região bíblica de Arabá próxima a Jericó, referindo-se a ela como “campinas (= ‘arbôt) de Jericó” (Js 4.13; 5.10; 2Rs 25.5; Jr 39.5), e outro referindo-se à parte da região bíblica de Arabá a oeste do rio Jordão e logo abaixo e a leste dos montes de Moabe como “as campinas (= ‘arbôt) de Moabe” (Dt 34.1, 8; Js 13.32). Todas as ocorrências de “cam pinas de Moabe” referem-se a Israel sob a liderança de Moisés, acampando antes de cruzar o Jordão e entrar na terra de Canaã. 3. Várias partes do vale da Fenda também recebem outros nomes. A expressão “campin (kikkãr, # 3971) (do Jordão)”, por exemplo, é usada 13x num contexto geográfico, e dez des sas ocorrências referem-se a diferentes partes do vale da Fenda (= Arabá da Bíblia). O termo “campina” é usado 7x nas histórias sobre Sodoma e Gomorra (Gn 13, 19) e são feitas duas re ferências específicas à “campina do Jordão” (Gn 13.10, 11). Essa expressão também descreve outra região do vale do Jordão, próxima ao local em que o rio Jaboque se une ao Jordão — O lugar onde Salomão mandou fundir os objetos/utensílios de bronze usados em seu templo (1 Rs 7.46; 2C r4 .17). Em um dos casos (Dt 34.3), kikkãr, “a região toda”, refere-se à região do vale do Jordão próxima a Jericó, sendo traduzida como “vale de Jericò"(biq'atyerêhô; # 1326). Outro termo, gã ’ôn (49x no AT; # 1454), é traduzido como “floresta” em variações da expressão “floresta do Jordão”, referindo-se a uma subdivisão bem definida do Arabá (Jr 12.5; 49.19; 50.55; Zc 11.3). Nesses casos, a “floresta” é uma área verdejante nas vizinhanças ime diatas do rio Jordão. Era conhecido como um lugar de flora viçosa e muita fauna, sendo, por isso, chamado às vezes de “orgulho do Jordão” (para gã on usado comumente como “orgulho” [23x], # 1454). 398
Arábia
A última sub-região do Arabá a ser observada é o “vale do Sal”. Trata-se de uma refe rência á região da bacia do rio, localizada na extremidade sul do mar Salgado (= Mar de Ara bá). Lá os israelitas lutaram em várias ocasiões contra os edomitas (2Sm 8.13; 2Rs 14.7; lCr 18.12; 2Cr 25.11). O nome vale do Sal vem, evidentemente, da composição salina do solo e de outras formações minerais dessa região. Em Gênesis 14.3, 8, 10, a região é chamada de “vale de Sidim” ( 'emeq hassiddim, # 8443). Quando não é usado como um termo geográfico referente a uma região específica do vale da Fenda, ‘arãbâ é traduzido de diferentes maneiras: deserto (5x), terra devastada (5x) ou ermo (2x). O termo é empregado com freqüência em conjunto com midbãr (# 4497) e/ou ?ivyâ (# 7480). Em todos esses casos, é enfatizada a aridez e esterilidade do 'arãbâ. E no 'arãbâ que vivem os asnos monteses (Jó 24.5; 39.6) e o lobo (Jr 5.6). Sua desolação é símbolo do castigo/ destruição que os perversos (Jr 17.6) e a Babilônia, inimiga de Judá (Jr 50.12; 51.43), sofrerão. No entanto, Deus passará pela região do ‘arãbâ com facilidade (Is 40.3); e, durante o tempo de restauração do povo de Deus, a esterilidade da região se transformará em fertilidade semelhante à do Éden (Is 51.3), caracterizada pela abundância de água (Is 35.6) e árvores (Is 41.19). Deserto, ermo, terra assolada: bõhü (devastação, # 983); -> bqq I (assolar, ser agitado, # 1327); horbâ (ruína, devastação, # 2999); -> y^simôn (ermo, devastação, # 3810); midbãr I (ermo, # 4497); -> 'arãbâ (estepe, # 6858); -> ^ h ih â (terra ressecada, # 7461); çiyyâ (de serto, # 7480); -> s ’h (destruir, desolar, # 8615); smm (ficar desolado, ficar deserto, assolar, estremecer, ficar horrorizado, # 9037); Deserto: Teologia. B ib l io g r a f ia
ABD 1:321-24; D. Baly, The Geography o f the Bible, 1974; H. Brodsky, “The Jordan: Symbol ofSpiritual Transition”, BibRev 8/3,1992,34-43,52; M. Har-El, “The Pride of the Jordan: The Jungle of the Jordan”, BA 41/12, 1978, 65-75; idem, “The ‘Aravah”, HS 26/2, 1985, 219-23; C. Rasmussen, The Zondervan N IV Atlas o f the Bible, 1989; I. Schattner, The Lower Jordan Valley, ScrHier 11, 1962. Carl Rasmussen
A rábia
Arábia p lj? [ 'arab\, Arábia, # 6851/ [ '<*rãb], [ ‘arbi], árabe(s), arábico, nômade [# 6861]).
AT 1. A grande porção de terra da Península Arábica (cerca de um terço do tamanho dos Estados Unidos ou do Brasil) situa-se a leste e sudeste de Israel. Começando a sudoeste e indo em sentido horário, suas fronteiras são: a sudoeste, o mar Vermelho; a noroeste, o golfo de Aqba/Elate, o vale da Fenda e a cadeia de montanhas dos contrafortes do Líbano; a nordeste, o rio Eufrates, o golfo Pérsico e o golfo de Omã e, a su-sudeste, o mar da Arábia e o golfo de Adem. Cadeias de montanhas limitam a península de Omã ao longo das costas su-sudoeste e oeste — chegando, em algumas regiões a elevações acima de três mil metros de altitude. Em termos esquemáticos, a plataforma da Arábia apresenta um declive do sudoeste para o nor deste. As chuvas são mais abundantes nas extremidades su-sudoeste e sudeste da península — chegando a passar dos quinhentos milímetros anuais em alguns lugares. No entanto, a maior parte da península é coberta por grandes desertos, nos quais a precipitação anual é menor que dez centímetros. Do Sul para o Norte, os grandes desertos da Arábia são o Ruba’el-Khali, Nefude e Sírio. 399
Arão
2. Além do termo “arábio”, deve-se observar que nas Escrituras várias tribos são associadas á península Arábica e/ou seus arredores: a saber, os descendentes de Quetura; de Agar (Gn 25); de Esaú (-> Edom; Gn 36); de Ismael; de Midiã (->) (Gn 37.25-26), além dos povos de Dedã, Temã. Quedar, Buz, Efa e (durante a era do NT) dos nabateus. No final, os povos da Arábia se juntarão regozijantes a outros povos que trarão suas riquezas para adorar ao Senhor (Isaías 60). 3. No momento, não há uma derivação etimológica satisfatória para o termo “arábio”. No AT, o termo se refere a um habitante do deserto (Jr 3.2), aquele que vive numa tenda (Is 13.20) e aquele que se assenta à espera de outros no deserto (Jr 3.2). Os arábios e quedaritas eram conhecidos comerciantes de cordeiros, carneiros e bodes (Ez 27.21). Na verdade, alguns desses habitantes do deserto não viviam na península Arábica, conforme descrito acima, mas sim na região norte do Sinai e em partes do Neguebe (->). Isso fica claro, pois eram associados aos filisteus (-> ; 2Cr 17.11; 21.16; 26.7) e meunitas (2Cr. 26.7), dois povos que habitavam territórios a su-sudoeste de Israel. É provável que o opositor de Neemias — Gesém, o arábio — também devia estar associado a essa região (Ne 2.19; 4.7; 6.1). 4. Em certas ocasiões, Israel parece ter controlado os arábios ou exercido influência favorável sobre esse povo; observe a visita da rainha de Sabá (1 Rs 10; 2Cr 9) e o tributo que ia dos reis da Arábia para os cofres de Salomão, Josafá e Uzias (lR s 10.15; 2Cr 9.14; 17.11; 26.7). No tempo do rei Acabe, Gindibu, o árabe, era aliado dele e de outros numa coalizão que lutou contra e resistiu ao violento ataque assírio de Salmaneser III em Qarqar (853 a. C.; ANET. 279). Diz-se que Gindibu ofereceu mil cameleiros à coalizão. No entanto, em outras ocasiões, os árabes uniram forças com os filisteus, amonitas e/ou samaritanos para atacar Judá, p. ex., nos dias de Jorão (2Cr 21.16), Acazias (2Cr 22.1) e Neemias. Parece ter havido uma ligação econômica importante entre Israel e os povos da Ará bia do tempo de Salomão em diante. Bens de luxo, como incenso e ouro provenientes da Ará bia, eram transportados por terra em caravanas que passavam dentro de território israelita até os portos do Mediterrâneo ou pontos ao norte, como Damasco. Além disso, outros bens que haviam sido descarregados na Arábia, vindos de lugares como África e índia, também eram transportados pelo território de Israel. O comércio pode explicar o encontro entre Salomão e a rainha de Sabá. Os reis de Jerusalém eram conhecidos por cobrar pedágios e tarifas (Ed 4.20) das caravanas que atravessavam o território deles. B ib l io g r a f ia
ABD 1:324-27; A. K. Irvine, “The Arabs and Ethiopians”, POTT, 1973,287-311; J. A. Montgomery, Arabia and the Bible, 1934; I. Eph 'al, The Ancient Arabs: Nomads on the Borders o f the Fertile Crescent, 9th-5th Centuries B. C., 1982; G. W. Van Beek, “Frankincense and Myrrh”, in The Biblical Archaeologist Reader, 2, 1964, 99-126. Carl Rasmussen
Arão
Arão (Thnx [ 'alfirôn], # 195).
AT O primeiro sumo sacerdote de Israel teve como sucessor no cargo o filho Eleazar que, por sua vez, provavelmente foi seguido pelo filho Finéias. Dois nomes são de origem egíp.: Arão (egíp. ’rn, o nome [de Deus] é grande) e Finéias (egíp. p3-nhsy, o núbio). Eleazar é um nome heb. que significa “(o deus) El tem ajudado”. Há poucos detalhes biográficos sobre Arão e seus descendentes. Fica claro que o AT tem mais interesse no cargo e na importância de Arão do que em sua vida e personalidade. 400
Arão
Arão era filho de Anrão e Joquebede, da tribo de Levi. Seu irmão mais novo, Moisés, nasceu três anos depois dele. Arão aparece pela primeira vez na história oitenta anos depois, como porta-voz de Moisés ou profeta (Ex 7.7), falecendo precisamente quarenta anos depois, aos cento e vinte e três anos de idade (Nm 33.39). Tendo em vista o fato de dizer-se que Moisés morreu depois de Arão aos cento e vinte anos de idade (Dt 34.7), essas idades podem repre sentar tradições diferentes ou ser consideradas de modo simbólico, a menos que Moisés tenha morrido em seguida ao irmão, no mesmo ano. 2. Conforme retratado no Pent., o ministério público de Arão divide-se em duas par tes. A primeira, descrita em Êxodo, mostra-o basicamente como companheiro e assistente de Moisés. A segunda, que se encontra em Levítico e Números, trata do ministério de Arão como primeiro sumo sacerdote ungido de Israel. No entanto, essas duas fases do ministério não são independentes, pois a primeira é uma prefiguração da segunda. Como sumo sacerdote, sua fun ção era ser o mediador supremo entre Deus e Israel: por um lado, ele representava Deus diante de Israel, por ter recebido a lei de Deus (p. ex., Lv 11.1) para, então, proclamá-la ao povo (Lv 10.10-11) abençoando-o (Nm 6.23-27). Por outro lado, representava Israel diante de Deus ao oferecer-lhe orações, incenso e sacrifícios em favor do povo, esp. nas grandes festas, como o dia da expiação (Lv 16). No entanto, Arão já atuava como mediador entre Deus e a humanidade antes de ser consagrado sumo sacerdote. Sua primeira tarefa foi servir de porta-voz para o tímido Moisés diante do povo e, depois, diante de Faraó. “Então, disse o Senhor a Moisés: Vê que te consti tuí como Deus sobre Faraó, e Arão, teu irmão, será teu profeta” (Êx 7.1; cf. 4.14-16; 7.2). Foi a mão ou o bordão de Arão estendido por ordem de Moisés que desencadeou as pragas (Êx 7.19; 8.5 [1]). Posteriormente, Arão e seus filhos Nadabe e Abiú foram convidados a subir ao monte Sinai para o momento supremo em que a lei foi entregue (Êx 19.24; 24.1, 9). Nessas atividades, Arão está, antes de mais nada, representando e revelando ao povo a vontade e o caráter de Deus, mas, ao sustentar as mãos de Moisés enquanto este orava, é retratado o outro lado da função mediadora de Arão — interceder pela nação — colocando diante do Senhor as aflições do povo (Êx 17.12). 3. Êxodo 28— 29 descreve, de modo relativamente detalhado, o uniforme do sumo sa cerdote (-¥ kõhên,# 3913) e os procedimentos pelos quais Arão foi consagrado. Há comentários que explicam a natureza das vestes e do simbolismo delas. Nesse caso, é apropriado observar somente o significado delas para o ministério de Arão. Suas belas vestimentas, feitas de linho fino, bordadas com ouro, escarlata e estofo azul e enfeitadas com pedras preciosas, manifestava a dignidade suprema do cargo de Arão como grande mediador entre Deus e Israel. O esplendor do uniforme refletia a majestade e santidade de Deus, do qual o sacerdote era representante na terra. A mitra era azul, da cor da morada divina, e a ela encontrava-se presa uma lâmina de ouro com as seguintes palavras gravadas: “Santidade ao Senhor” (Êx 39.30). Outros itens dos paramentos sacerdotais eram referências fortes ao papel de Arão como representante de Israel diante de Deus. O peitoral trazia doze pedras preciosas que represen tavam as doze tribos de Israel, enquanto as ombreiras da estola tinham mais duas pedras, com o nome de seis tribos gravado em cada uma delas. Usando essas vestimentas sagradas, Arão colocava-se diante do Senhor como representante espiritual de toda a nação: toda vez que en trava no tabemáculo vestindo os paramentos de sumo sacerdote, estava confirmando simbo licamente que Deus havia escolhido as tribos e suplicando pela graça divina em favor delas. (-> Êxodo: Teologia) 4. Apesar de Arão ser mencionado com freqüência no Pent., há poucos vislumbres de seu caráter. A prontidão de Moisés em aceitar Arão como porta-voz indica que Arão tinha mais 401
Arão
coragem que o irmão. Porém, episódios posteriores parecem deixar implícito que lhe faltavam os princípios e a força interior de Moisés. Foi Arão quem cedeu ao pedido do povo de fazer um bezerro de ouro; e, depois, incentivou-o a adorá-lo, quebrando desse modo os dois primeiros mandamentos. Quando Moisés o censurou, Arão deu uma resposta esfarrapada: “Deram-mo [o ouro]; e eu o lancei no fogo, e saiu este bezerro” (Êx 32.24). Um retrato parecido é apresenta do em Levítico 10, em que os dois filhos de Arão morreram por haver profanado o santuário, estando Arão envolvido no pecado deles. Ele e os outros filhos que sobreviveram não comple taram corretamente a oferta pelo pecado e foram repreendidos por Moisés pela negligência (N. Kiuchi, Purification Ojfering, 67-85). Por fim, tanto Arão quanto Moisés pecaram em Meribá, ferindo a rocha em vez de falar com ela e, em decorrência desse pecado, foram excluídos de Canaã (Nm 20.2-12). O fato de um homem que cometeu pecados tão graves ter sido escolhido sumo sacerdote mostra o triunfo da graça, indicando que Deus usa instrumentos aqui da terra para mostrar a glória dele. 5. Eleazar, o filho de Arão, é mencionado com freqüência muito menor que seu pai. Nos capítulos finais de Números, ele assume gradativamente as funções de Arão. Foi Eleazar quem juntou os incensários daqueles que morreram na rebelião de Corá (->) e Datã e os transformou numa cobertura para o altar (Nm 16.36-39). Eleazar foi o responsável por preparar as cinzas purificadoras da novilha vermelha (Nm 19.1-8) e por purificar os guerreiros que se contami naram na batalha devido ao contato com cadáveres (Nm 31). Depois da morte do pai, Eleazar assumiu-lhe inteiramente o lugar e, assim como Arão, exerceu a função de líder conjunto do povo, primeiro com Moisés e depois com Josué (Nm 20.25-28; 26.1, 3, 63; Js 14.1; 21.1). No entanto, nada sabemos sobre o caráter pessoal de Eleazar. . Finéias, filho de Eleazar, alcançou a fama ao matar Zinri, um chefe de tribo envol vido em relações ilícitas com uma mulher midianita. Esse ato de vingança fez cessar a praga que estava destruindo a nação, uma vez que muitos do povo haviam sido seduzidos por mu lheres moabitas e midianitas. O zelo de Finéias mostrou que ele era digno da posição de sumo sacerdote e, de acordo com o Salmo 106.31, “Isso lhe foi imputado por justiça, de geração em geração, para sempre”. Sua coragem e determinação ficam evidentes em outros dois episódios: ele foi o sacerdote que acompanhou as tribos na guerra contra os midianitas (Nm 31.6) e foi o principal negociador com as tribos da Transjordânia suspeitas de secessão (Js 22.13, 30-32). Juizes 20.28 menciona o trabalho de Finéias como sumo sacerdote.
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Sacerdotes e levitas: -> 'abnêt (cinto, esp. de sacerdotes, # 77); -> ’êpôd I (estola, veste sa cerdotal, objeto de veneração, # 680); hõsen (peitoral do sumo sacerdote, # 3136); -> khn (cumprir os deveres de um sacerdote, # 3912); kõmer (sacerdote pagão, # 4024); -> lêwí (levita, # 4290); -> migbã ‘â (tiara, # 4457); -> miknãsayim (calças, # 4829); pa 'amôn (cam painha [na sobrepeliz do sacerdote], #7194); -> tasbêç (quadriculado [túnica do sacerdote], # 9587); Arão: Teologia; Sacerdotes e levitas: Teologia B ib l io g r a f ia
U. Cassuto, Exodus, 1967; B. S. Childs, Exodus, OTL, 1974; A. Cody, A History o f Old Testa ment Priesthood, 1969; J. L. Durham, Exodus, WBC, 1987. N. Kiuchi, The Purification Offe ring in the Priestly Literature, 1987; J. Milgrom, Numbers, The JPS Commentary, 1990; G. J. Wenham, Leviticus, NICOT, 1979. G. J. Wenham Arca -> # 778 ( 'arôn, arca, baú, esquife) 402
Árvore da vida
Arco -> # 8008 (qeset, arco) Arco-e-flecha -> # 3452 (yôreh I, arqueiro) Ardência -> #2813 (hmr 111, estar em fermentação, estar aquecido, arder, queimar) Areia -> # 2567 (Ao/1, lama, areia) Argila -> # 2817 (hõmer II, barro, argila, argamassa) Armação -> # 9208 (seqep, armação, estrutura) Armadilha -> # 7062 (pah I, armadilha, cilada) Armagedom Arraial
Megido
# 4722 (mahaneh, arraial, acampamento, guerra)
Arranjo -> # 6885 ( >/c, marcar, colocar em fileiras, entrar na batalha) Arrasto
# 6079 (sAò, arrastar embora, arrancar)
Arremesso -> # 8959 ( i/i I, atirar, arremessar) Arremetimento -> # 5590 («gA, escomear, empurrar, enfiar) Arrogância -> # 1467
ser elevado, exaltar, ser arrogante)
Arroz -> # 4976 (minnit I, arroz)
A árvore que concedia vida e que ficava “no meio do jardim” do Éden (Gn 2.9; 3.24). Antes de Adão e Eva pecarem, tinham livre acesso a ela, mas depois do ato de desobediência deles, dois querubins passaram a guardar a passagem para a árvore e o casal não pode mais comer dos frutos dela. Todas as outras passagens do AT, na qual a expressão “árvore da vida” aparece, podem ser encontradas no livro de Provérbios. Ao falar da sabedoria, Provérbios 3.18 diz que ela “É árvore de vida para todos os que a alcançam”. Em 11.30, “O fruto do justo é árvore de vida” e 13.12 promete, “A esperança que se adia faz adoecer o coração, mas o desejo cumprido é árvore de vida”. E, por fim, 15.4 adverte, “A língua serena é árvore de vida, mas a perversa quebranta o espírito”. Em todos esses casos, o conceito de “árvore da/de vida” está associado ao bem-estar, saúde e plenitude de vida. Esse conceito é bastante atestado no OMA e pode-se encontrar uma árvore desse tipo retratada em selos, cerâmicas, relevos e na literatura. No entanto, o OMA possuía idéias diver sas sobre as árvores da vida e, em alguns casos, as árvores eram, de fato, adoradas por serem consideradas capazes de dar vida ao adorador. Ao consumir a sua seiva ou o fruto da árvore, podia-se experimentar uma vida renovada ou preservada. Esses paralelos do relato bíblico são Árvore da vida
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Árvore do conhecimento do bem e do mal
um tanto gerais e não dão maiores esclarecimentos para a história de Gênesis que é contada de maneira tão simples. Escritos judaicos posteriores parecem associar três idéias à árvore da vida. Ela encontrase no Paraíso; o justo terá acesso aos frutos dela; só voltará a estar inteiramente à disposição depois do julgamento (3En. 24.1-6; 25.4-6; 31.1-3). Outras referências apócrifas falam de uma época em que “a árvore da vida está plantada, a era vindoura está preparada, a abundância é provida, uma cidade é construída, o descanso é determinado, a bondade é estabelecida e a sa bedoria aperfeiçoada de antemão” (2Ed 8.52). O último livro da Bíblia volta a fazer referência à árvore da vida. Apocalipse 2.7 pro mete àquele que prevalecer: “dar-lhe-ei que se alimente da árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus”. O último capítulo da Bíblia apresenta a árvore da vida “de uma e outra mar gem do rio [da água da vida]” (22.2). E a última referência profere uma bênção para “aqueles que lavam suas vestiduras no sangue do Cordeiro, para que lhes assista o direito à árvore da vida” (22.14). Tudo aquilo com que a mitologia pagã sonhava, o que o judaísmo havia perdido ou aquilo pelo que a alma faminta ansiava será restaurado e cumprido no mundo do porvir. Árvores: Árvores: -> elá I (árvore vigorosa, # 4 6 1 ), 'erez (cedro, # 780); -> 'õren 1 (pinheiro, #815); 'êsel (tamargueira, # 869); berôS (zimbro, # 1360); -> lüz I (amen doeira, # 4280); -> ‘ê? (ávore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); -> ‘a r ‘ãr (zimbro, # 6899); -> sammerel (acácia, topo [da árvore], # 7550); -> sãqêd (amêndoa, # 9196); siqmá (sicômoro [figueira], # 9204); -> te 'assur (cipreste, # 9309); tãmãr I (tamareira, # 9469); -> tirzâ (árvore desconhecida, # 9560); (-> Á rvore do Conhecimento / Y'ida: Teologia) B ib l io g r a f ia
R. Marcus, ‘“Tree o f Life’ in Proverbs”, JBL 62, 1943, 117-20. LartyL. Walker
Uma das duas árvores mencionadas es pecificamente no Jardim do Éden e a mais enigmática — especialmente pela falta de paralelos significativos no OMA. A outra ár vore era a árvore da vida (Gn 2.9) (-> ‘ás, árvores, # 6770). A expressão heb. exata de Gênesis (usada apenas 2x: Gn 2.9,17) é incomum e não apa rece em outras passagens do AT. O nome da árvore apresenta certa dificuldade sintática. No heb., a expressão é literalmente “a árvore de saber o bem e o mal”. O problema concentra-se no termo d a ’at. A palavra é um subs. (“conhecimento”) ou um infinitivo (“saber”). Essa ex pressão pode ser compreendida como “a árvore do conhecimento do bem e do mal”, mas não é comum uma palavra num constr. ter um art. def. com um prefixo. A árvore do conhecimento do bem e do mal também é chamada de “árvore que está no meio do jardim” (Gn 3.3) e simplesmente de “árvore” (3.6, 12), ou “árvore de que te ordenei que não comesses” (3.11) ou, ainda, “árvore que eu te ordenara não comesses” (3.17). Apesar de os frutos da árvore serem proibidos para o primeiro casal (2.17), o Tentador insinuou que ex perimentar os frutos dela aumentaria o conhecimento de Adão e Eva e os tomaria “como Deus” (3.5). O resultado foi inesperado. Em vez de obterem conhecimento superior que os igualaria a Deus, adquiriram a consciência ou conhecimento do mal, da culpa e do julgamento. Árvore do conhecimento do bem e do mal
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Asa
Os detalhes dessa narrativa simples já foram tema de especulações intermináveis. A questào principal parece ser apenas a prova — o primeiro casal humano foi testado para deter minar se obedeceriam ou desobedeceriam ao Criador. Apesar das inúmeras tentativas modernas de ver nessa história o tema da imoralidade sexual, não parece ser isso que está em questão nesse teste. Como criaturas recém-formadas pelo Criador e feitas à imagem dele, não eram pe caminosas e nem tinham consciência do pecado. A desobediência e a transgressão cometidas nessa prova trouxe ou conhecimento ou consciência do que era ser um pecador desobediente. Num ato de desobediência, comeram do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal e passaram a ter consciência do que é ser mau. Outras referências na Bíblia descrevem a inocência das crianças que ainda “nem sabem distinguir entre bem e mal” (Dt 1.39). Ao referir-se a uma criança prometida, o profeta diz: “antes que este menino saiba desprezar o mal e escolher o bem” (Is 7.16). É evidente, porém, que tais casos dizem respeito a descendentes do primeiro casal que pecou. Algumas tradições apresentam essa árvore como uma macieira, mas as Escrituras não dão nenhuma identificação botânica. A história exerceu influência significativa sobre a litera tura do ocidente; um excelente exemplo é o Paraíso perdido de Milton. Arvores: -> elâ I (árvore vigorosa, #461); 'erez (cedro, # 780); -> ’õren I (pinheiro, #815); -> ’êsel (tamargueira, # 869); berôs (zimbro, # 1360); lúz 1 (amendoeira, # 4280); -> ‘ês (árvore, madeira da árvore, madeira de lei, gravetos, # 6770); -> 'ar'ãr (zimbro, # 6899); -> sammeret (acácia, topo [da árvore], # 7550); -> sãqêd (amêndoa, #9196); -> siqmâ (sicômoro [figueira], # 9204); -> ’assür (cipreste, # 9309); tãmãr I (tamareira, # 9469); -> tirzâ (ár vore desconhecida, # 9560); (-> Árvore do Conhecimento / Vida: Teologia) B ib l io g r a f ia
R. Gordis, “The Knowledge of Good and Evil in the Old Testament and the Qumran Srolls”, JBL 76, 1957, 123-38; V. P. Hamilton, The Book o f Genesis, Chapters 18-50, NICOT, 1995; G. Vos, Biblical Theology, 1954. Larry L. Walker
Asa
Asa (XDK [ ’ã sã "], rei de Judá, # 654).
AT Asa foi rei de Judá (->) de 911-870 a. C. (cf. lRs 15.9-10,33; 16.15,23, 29; 2Cr 16.1, considerando-se as soluções comuns para os problemas de sincronia/cálculo das co-regências; Thiele, 81-96). Se ‘ã sã ’ é, de fato, um cognato do aram. s ’, curar (ver Jastrow, 1:88, 92-93), então seu nome pode ser um presságio, como acontecia muitas vezes com os nomes hebraicos (ver Shinan e Zakowitch). Os capítulos que precedem o relato sobre Asa em Reis e Crônicas mostra a necessidade de restabelecimento político. Asa demonstrou um zelo religioso inquestionável, a ponto de depor a própria mãe (avó) (cf. lRs 15.2, 10) do cargo de rainha-mãe (1 Rs 15.3) — por certo uma proeza das mais difíceis, tendo em vista as tendências idólatras do pai dele (lR s 15.3). De modo geral, “Asa fez o que era reto perante o Senhor” e “o coração de Asa foi, todos os seus dias, totalmente do Senhor” (lR s 15.11, 14; 2Cr 14.3, 5; 15.8.b) apesar de os lugares altos não terem sido ex tintos (lR s 15.14). Ao ler sobre Asa no livro de Crônicas, surgem dificuldades. O livro de Reis afirma, por exemplo, que Asa não removeu “os altos” (1 Rs 15.14), enquanto o cronista especifica que 405
Asa
ele o fez em Judá (2Cr 14.5), mas não em Israel (2Cr 15.17; cf. v. 9). Reis relata que a guerra entre Asa e Baasa de Israel durou “todos os seus dias” (1 Rs 15.16), enquanto o cronista indica que a nação de Asa “esteve em paz dez anos” (2Cr 14.1,6; cf. 15.15c, 19; 16.9c). Assim, uma escola de estudiosos vê esses casos como uma invenção do cronista, enquanto outros insistem que ele dispunha de informações adicionais (ver Williamson, 255s). O cronista desenvolve a relevância de Asa ao longo de três capítulos (2Cr 14.4— 15.1 provavelmente ficaria entre 1Rs 15.12 e 13). Citando, por vezes, o livro de Reis quase textual mente (p. ex., lRs 15.15 em 2Cr 15.18), o cronista apresenta uma quantidade considerável de informações novas (48 vv. comparados com 15 vv. em Reis). Este estudo se limitará aos dados religiosos. (-> Crônicas; Teologia) 1. Asa removeu os “prostitutos-cultuais” (1 Rs 15.12), um detalhe que, curiosamente, o cronista deixa de fora. Somente Josafá teve que repetir essa expurgação (1 Rs 22.46). 2. Asa colocou no templo os objetos consagrados, porém não identificados (qedãsim, coisas, lRs 15.15; 2Cr 15.18). 3. A reforma de Asa (que não é mencionada em Reis) estendeu-se até os indivídu os das tribos de Israel (Efraim; Manassés e, mais impressionante ainda, até Simeão; ver 2Cr 15.9). O cronista elabora, de maneira extremamente completa, um “detalhe” do reinado de Asa (2Cr 15.1-15). 4. A princípio, Asa demonstrou confiança em Javé em meio ao perigo (2Cr 14.11; cf. v. 4), o que infelizmente acabou transformando-se numa confiança em Ben-Hadade, o arameu, em vez de fé em Javé (2Cr 16.7-9), durante a guerra de Asa com Baasa, rei de Israel. Essas observações (baseadas em grande parte no relato do Cronista) indicam que Asa se preocupava com a adoração correta (como testemunha a sua reforma). Percebeu que bên çãos como a posse contínua da terra são, de fato, decorrentes da fidelidade passada e presente (2Cr 14.7; 15.2), concordou com o profeta Azarias que Deus está sempre aberto para receber de volta seus filhos desobedientes (2Cr 15.3-6, que lembra o livro de Juizes) e, apesar de Asa ter incentivado uma cerimônia solene de renovação da aliança em Jerusalém (2Cr 15.10-15), pelo menos aos olhos do cronista, seus últimos dias foram tristes. Com a rejeição da adver tência severa de Hanani para que não confiasse nas alianças políticas (2Cr 16.7-9), um tema importante do movimento profético (cf. Isaías 7), o fim da vida de Asa é um exemplo da or dem bíblica conhecida por meio de outras passagens (Hb 6.1-8; 10.36; Ap 21.7), a saber, que o povo de Deus deve “buscá-lo” a todo tempo. Resta pouca dúvida entre os estudiosos quanto ao fato de que a “teologia da retribuição” (basicamente quidpro quo à Ia Deuteronômio 27—28; p. ex., em 2Cr 15.2, 13) era um dos principais interesses do cronista. No entanto, assim como foi o caso com outros reis, nem todo o reinado de Asa é colocado sob esse prisma, mas sim apenas determinados episódios sobre os quais o escritor discorre a fim de ilustrar tal doutrina (cf. também Am 2.3). (-> Retribuição: Teologia) B ib l io g r a f ia
W. W. Davies e D. F. Payne, “Asa”, ISBE, 1979, 1:308-9; R. B. Dillard, “The Reign o f Asa (2 Chr 14-16): An Example o f the Chronicler’s Theological Method”, JETS 23, 1980, 207-18; idem, 2 Chronicles, WBC, 1987, 112-28; J. G. McConville, Chronicles, DSB, 1984;A. Shinan e Y. Zalowitch, “Midrash on Scripture and Midrash Within Scripture”, ScrHier 31,1986,272; H. G. M. Williamson, I and 2 Chronicles, NCB, 1982. Daniel Schibler Asa -> # 4053 (kãnãp, asa, saia, borda mais externa) 406
Asafe
Asafe
Asafe (HOS [ 'âsãp], # 666).
AT 1. Asafe, filho de Berequias, é um nome que passou a ser associado a uma longa li nhagem de cantores do templo e músicos de Jerusalém (lC r 6.39 [24]; 25.1-2; cf. 15.19). Asafe ministrou na cerimônia quando a arca voltou a Jerusalém (lC r 16.5, 7, 37). Recebeu de Davi a nomeação proeminente de chefe dos cantores levíticos (lC r 16.5). O rei também lhe deu um salmo de ação de graças (1 Cr 16.8-36). O salmo é uma combinação derivada dos Salmos 96.1-13; 105.1-15; 106.1, 47-48. Além disso, Davi nomeou os filhos de Asafe para ministérios na área da música, sob as ordens do pai (lC r 25.1-2,6). Pai e filhos participaram da cerimônia de consagração do templo de Salomão (2Cr 5.12). Os descendentes de Asa fe ainda cantavam e tocavam instrumentos no tempo de Esdras e Neemias (Ed 2.41; 3.10; Ne 7.44; 11.17, 22; 12.35). 2. O nome de Asafe encontra-se no cabeçalho de doze Salmos (50; 73— 83), especial mente no Livro 111, que vem depois da principal seção davídica (Livros 1 e 11; observe-se o SI 72.20). Nota-se uma preponderância de lamentos nesses salmos. Pode ser um fato relevante que o primeiro deles (SI 73) apresenta questionamentos profundos sobre a bondade de Deus (que são respondidas no próprio salmo). Outros refletem a experiência no exílio (SI 74.4-8; 79.7) e dois colocam seus questionamentos no contexto de retrocessos na história da salvação (SI 78; 80). Salmos: Teologia B ib l io g r a f ia
ABD 1:471; M. J. Buss, “The Psalms o f Asaph and Korah,” JBL 82, 1963, 382-92; H. G. M. Williamson, / and II Chronicles, NCB, 1982, 128-30; G. H. Wilson, The Editing o f the He brew Psalter, 1985. Robert L. Alden
Asdode
Asdode (TÍW'X [ ’asdôd], # 846).
AT Asdode (a cidade modema de Isdude e Azoto em At 8.40) situa-se na parte central da extremidade oeste da fértil planície da Fiiístia, cerca de 4 quilômetros do mar, sendo separada deste por uma série de dunas. A colina tem uma acrópole com cerca de 20 acres e uma cidade baixa de proporções bem maiores. Um importante elo político e comercial na chamada Via Maris, a cidade obteve seu papel de destaque muito antes de ser colonizada pelos filisteus (->), como atestam descobertas da Idade do Bronze. 1. Referências literárias. Textos ugar. do século XIV indicam claramente que Asdode era um importante centro de manufatura de vestes de púrpura e que alguns de seus merca dores negociavam e até viviam em Ugarite (NEAEHL, 93). De acordo com o AT, Asdode era uma das cinco cidades pertencentes aos governantes filisteus (Js 13.3). O templo de Dagom em Asdode é mencionado na narrativa sobre a arca (ISm 5.2-3), e os muros da cidade são citados no relatório do reino de Uzias (2Cr 26.6). Os oráculos proféticos fazem referência à destruição de Asdode como adversária de Javé e seu povo (Jr 25.20; Am 1.8; S f 2.4; Zc 9.6). Isaías 20.1 refere-se ao comandante de Sargom que atacou e conquistou Asdode. De pois de várias revoltas nos anos de 713-705, Asdode perdeu a independência e tomou-se uma província assíria (ANET, 288, 291, 294). Leais aos seus senhores assírios Senaqueribe 407
Asdode
e Esaradon, os governantes de Asdode, Mitinti e Aimilco, trouxeram-lhe considerável pros peridade durante algumas décadas. Antes de Asdode ser completamente destruída pelos ba bilônios, foi governada pelos egípcios (Heródoto II, 157) e, muito provavelmente, por Josias de Judá (Dothan, 94). 2. Escavações arqueológicas. As escavações arqueológicas realizadas por Moshe Do than (1962-72) revelaram que a cidade foi ocupada da Idade Média do Bronze até o período bizantino. Os restos da ocupação íilistéia começam a aparecer a partir do estrato XIIIA. A substituição das construções e fortalezas destruídas, bem como o aparecimento de utensílios micênios 1IIC1 são indicações suficientes de que os filisteus haviam ocupado Asdode um sé culo ou mais antes da grande invasão dos “Povos do Mar”. De acordo com Dothan, a cidade desfrutou grande prosperidade durante o final da Idade do Bronze. Uma abundância de con chas do molusco Murex sertegalensis sugere a grande importância da indústria da púrpura em Asdode e seu ancoradouro em Tel Mor, na colina de Laquis ao norte (ABD 1:478). Uma cama da de destruição com um metro de espessura mostra o fim do domínio egípcio sobre Asdode no final desse período. Os estratos subseqüentes, XII — VI, representam a ocupação filistéia durante a Idade do Ferro. O forte filisteu do século XII e o muro ao seu redor (Área A), ca sas, locais de culto, oficinas, vasos decorados importados do tipo micênio IIIC (Área G), a estatueta de Asdoda e dois selos gravados (Área H), bem como as portas da cidade com suas torres maciças e vários fomos (Área M) indicam que Asdode passou por um intenso desen volvimento durante a Idade do Ferro I, estratos XII e XI (NEAEHL, 96; cf. a ilustração oposta à pg. 65). Os restos descobertos na Área M, da Idade do Ferro II (estratos X — VI) mostram que as principais atividades de Asdode concentravam-se na cidade baixa. De acordo com Do than (NEAHEL, 98, refutado por Ussishkin, 82), a grande porta (20,5 x 18.25 m) que consistia de duas torres com três câmaras cada uma, semelhante às portas de Megido, Gezer e Hazor, pode ser relacionada às construções de Salomão. Os objetos característicos da cerâmica que leva o nome da cidade (vasos vermelhos polidos com faixas pretas), um pequeno templo no estrato VII com uma grande quantidade de objetos rituais (estatuetas de animais domésticos, kernoi, estatuetas masculinas e femininas [do tipo semelhante às placas ornamentais de Astarote], entre elas “A Plataforma dos Músicos”), o bairro dos oleiros com suas casas, oficinas e fornos refletem a prosperidade de Asdode, que chegou subitamente ao fim perto do final do século VIII como resultado da conquista assíria. Dois fragmentos de uma esteia de basalto de Sargom II são uma triste lembrança dessa invasão. A descoberta de algumas inscrições em heb. (a maioria sobre medidas de peso) indica sólidas relações comerciais com Judá durante o século VII. Os restos dos períodos subseqüentes não oferecem dados novos sobre a história e cultura filistéia. Filisteus: 'asdôd (Asdode, # 846); ’asqelôn (Asquelom, # 884); gat (Gate, # 1781); -> ‘azzâ (Gaza, # 6445); -> 'eqrôn (Ecrom, # 6833); -4 pelisti (Filístia, # 7149) B i b l h x ;ra f ia
M. Dothan, “Ashdod: A City of the Philistine Pentapolis”, Archaeological Discoveries in the HolyLand, 1967,129-37; idem, “Ashdod”, NEAEHL, 1,93-102; idem, “Ashdod”, ABD 1:47782; D. Ussishkin, “Notes on Megiddo, Gezer, Ashdod and Tel Batash in the Tenth to Ninth Centuries B. C.”, BASOR, 277/278, 1990, 71-91. J. P. J. Olivier Aspersão 408
# 2450 (zrq I, aspergir, espalhar)
Asquelom
Asquelom
Asquelom
[ ’asqelôn], # 884).
AT Asquelom (hoje, Ascalã) localiza-se no litoral leste do Mediterrâneo, cerca de 16 qui lômetros ao norte de Gaza. Em função de sua posição estratégica na Via Maris, constituiu um importante centro de comércio marítimo e terrestre. Solo fértil e lençóis de água doce sempre permitiram que seus habitantes praticassem a agricultura e horticultura irrigadas. Tel Asque lom é extremamente ampla (150 acres) e constitui diferentes estratos de ocupação, que vão do período calcolitico ao período mameluco. 1. Referências literárias. Asquelom é considerada uma inimiga nos textos egíp. de exe cração (ANET, 329), da Idade Média do Bronze II, durante a qual a cidade foi um importante centro de poder e riqueza até sua destruição pelos egípcios depois da expulsão dos hicsos. Em várias das cartas de Amama (EA nos 320-326, 370; cf. 287), Yidya, governante de Asquelom prometia suprimentos de “bebida forte, óleo, cereais, bois, ovelhas e bodes” às tropas egípcias e até mesmo enviar “trinta peças de vidro” para o rei (Moran, 352). Chamada de “cidade des prezível” por Ramsés II (ANET, 256), foi conquistada por mais de um faraó no Novo Império. Na parede do templo de Camaque encontra-se um retrato vivido do ataque de Memepta a As quelom (para a esteia de Memepta, cf. Kaiser, 1:551). Os habitantes dentro da cidade murada suplicaram por clemência (Keel & Küchler, 52). De acordo com o AT, Asquelom era uma das cinco cidades pertencentes aos governan tes filisteus (->) (seren, cf. Js 13.3) e uma importante fortaleza filistéia no tempo dos Juizes (Jz 14.19). Na elegia de Davi (2Sm 1.20), as ruas (ou melhor, o mercado) de Asquelom são uma referência ao papel comercial dela como porto marítimo (NEAHEL, 104). A destruição de Asquelom, como adversária de Javé e do povo dele, é citada em diversos oráculos proféticos (Jr 25.20; Am 1.8; Sf 2.4; Zc 9.6). Os registros assírios contêm várias referências a governantes de Asquelom. a saber: Mitinti, Ruquibtu, Sidquia, Xarruludari, Mitinti II (ANET, 282-83; 287; 291; 293-94). Seu rei Sidquias apoiou a rebelião de Ezequias (cf. Mittmann, 96). No século VII, continuava sendo uma cidade vassala dos assírios, mas foi destruída por Nabucodonosor em 604 a. C. (ABD 1:489). No período helenista-romano-bizantino, a cidade manteve sua autonomia e posição de importante centro comercial. 2. Escavações arqueológicas. Há evidências convincentes do papel comercial de As quelom já no início da Idade do Bronze; mas foi na Idade Média do Bronze II que a cidade consolidou-se como porto marítimo rico e poderoso, a julgar pelo conjunto maciço de muralhas fortificadas a seu redor (15 m de altura e 30 m de espessura na base). O chamado Santuário do Bezerro de Prata foi origem de belas cerâmicas do IMB I1C, bem como de uma estatueta de um bezerro de prata (10, 5 x 11 cm.) confeccionada com perfeição impressionante, provavelmente usada como símbolo ritual na adoração do deus cananeu Baal. A estatueta foi encontrada num vaso em forma de colméia representando uma espécie de relicário (Stager, 1991 a, 29). A desco berta dc um valioso selo cilíndrico também menciona a prosperidade da IMB II. Com exceção de algumas informações novas sobre os costumes de sepultamento, o final da Idade do Bronze não tem sido o alvo de estudos mais detalhados em escavações recentes. Durante a Idade do Ferro I, Asquelom foi governada pelos filisteus. Expandiu-se de modo a constituir um porto marítimo amplo e bem fortificado. Ao que parece, a produção de materiais têxteis era uma indústria importante, tendo em vista o grande número de pesos para teares encontrados nas escavações. As cerâmicas de duas cores da segunda e terceira geração de habitantes filisteus se parecem com uma combinação de obras micênias IIIC e estilos regio nais. Também é interessante observar nela o consumo de carne de suínos, conforme indicado 409
Assadura, fervura, cozimento, tostadura
por análises osteológicas (NEAHEL, 107). O papel contínuo de Asquelom como importante centro comercial na Idade do Ferro II é comprovado pela abundância de cerâmicas fenícias. A partir de uma rica coleção de ossos de peixes, foram identificados doze tipos de peixes de água salgada e doce (NEAHEL, 107). A importância comercial de Asquelom durante o período persa é devidamente representada pelas construções monumentais e algumas peças artesanais de alta qualidade, como a estatueta de um homem orando (NEAHEL, 109). Depois de uma destruição em grande escala no período helenista, Asquelom readquiriu sua posição de centro comercial e intelectual (Stager, 1991b, 36) como mostram escavações de imensos depósitos contendo ânforas fenícias e áticas e a descoberta de inúmeras moedas. Um achado extraordinário desse período é um cemitério de cães, de onde foram escavados mais de 800 sepulturas caninas. Na cultura predominantemente fenícia, é bem provável que os cães fossem venerados como ani mais sagrados. Os restos dos períodos subseqüentes não apresentam contribuições relevantes à história e cultura filistéias. Filisteus: ' a s d ô d (Asdode, # 846); 'asqelôn (Asquelom, # 884); -> gal (Gate, # 1781); ‘azzâ (Gaza, # 6445); -> 'eqròn (Ecrom, # 6833); p3 lis ti (Filístia, # 7149) B ib l io g r a f ia
D. L. Esse, “Ashkelon”, ABD 1:487-90; O. Kaiser, (ed.), Texte aus der Umwelt des Alten Testaments, 1985, 1:544-52; O. Keel & M. Küchler, Orte und Landschaten der Bibel, 2, 1982; S. Mittmann, “Hiskia und die Philister”, JNSL, 16, 1990, 91-106; W. L. Moran, The Amarna Letters, 1992; L. E. Stager, Ashkelon Discovered. From Canaanites and Philistines to Romans and Moslems, 1991; idem, “When Canaanites and Philistines Ruled Ashkelon”, BARev 17/2, 1991a, 24-43; idem, “Eroticism & Infanticide at ‘Ashkelon’”, BARev 17/4,1991b, 35-53; idem, NEAEHL 1:103-12. J. P. J. Olivier Assadeira -> # 5306 (marheset, assadeira) Assadura -> # 684 ( 'ph, assar)
1. apresentar tantas formas diferentes nos tem pos bíblicos, várias expressões são usadas para transmitir as idéias. O vb. ‘vvg significa assar bolos de pão numa grelha ou sobre brasas (# 6383). O supos to radical ‘wg parece dar a idéia de um círculo ou de tracejar-se um círculo. O heb. posterior usa a palavra ‘ugâ para algo circular, como uma vala. Já os cognatos ár. descrevem algo torto, curvado ou arqueado. O subs. ‘ugâ (# 6314) pode ser um disco ou bolo de pão, obviamente de forma redonda. Existe ainda um vb. denom. derivado que significa assar ou fazer um bolo. O subs. é usado em Oséias 7.8 para descrever o Reino do Norte como um pão que não foi virado, cru de um lado mas queimado do outro. O heb. também apresenta o subs. m ã‘ôg, bolo ou pão (# 5056; IRs 17.12). O vb. ‘wg significa assar um bolo de pão. Esse bolo podia ser feito de flor de farinha (Gn 18.6), de cevada (Ez 4.12), de massa não fermentada (Ex 12.39) ou mesmo de maná do céu (Nm 11.8). Assadura, fervura, cozimento, tostadura
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Assadura, fervura, cozimento, tostadura
Outro termo é o vb. 'ph, assar num forno ou no chão de uma lareira (# 684). O objeto desse vb. costuma ser pão (Lv 26.26), quer fermentado ou asmo. Existe ainda um subs. cog nato, ma ’apeh, algo assado (# 4418), que aparece, por exemplo, nas instruções para as ofertas de manjares em Levítico 2.4. A forma participial opeh é sempre um subs., padeiro (# 685; 7x em Gn 40). Em parte alguma do AT a ocupação de padeiro é considerada um trabalho inferior, nem mesmo em 1 Samuel 8.13, que diz que o rei tomaria as filhas para serem cozinheiras e padeiras (única passagem em que encontramos a forma feminina). Algumas formas de um radical Ihb II (# 4221) aparecem em 2 Samuel 13. O vb. no pi. é uma forma denom. que significa fazer bolos (vv. 6, 8); seu subs. cognato é lebibâ, bolos assados em panela (# 4223; vv. 6, 8, 10). Encontramos um vb. rbk (-> # 8057) relacionado à atividade de assar. Significa mistu rar, mexer a massa. É usado com o sentido técnico de misturar óleo com o bolo nos sacrifícios (Lv 6.14; 7.12; lCr 23.29). O procedimento a ser seguido podia apresentar diversas formas. Um padeiro podia pe neirar e limpar o cereal e então transformá-lo em farinha moendo entre duas pedras ou com pilões. A farinha era misturada com água e sovada numa gamela (que podia ser portátil). Caso se desejasse fazer pão asmo, a massa era imediatamente transformada em bolos e assada. Do contrário, um pedaço de massa levedada, reservado num dia anterior para esse uso era quebra do em pedaços e acrescentado a essa massa. O bolo ou pão era então colocado de lado para fermentar. Num dos métodos mais antigos e simples, o pão era assado sobre pedras quentes (1 Rs 19.6 fala de “pão cozido sobre pedras em brasa”). As pedras eram bem aquecidas, removiam-se as cinzas, colocava-se o pão sobre as pedras e depois se cobria a massa com mais cinzas. Poste riormente, as cinzas eram removidas e o bolo era virado (Os 7.8) para que assasse por igual. Esse processo também podia ser realizado num prato de ferro convexo ou chapa (Lv 2.5; 1Cr 9.31). Depois que Israel assentou-se na terra, o método mais comum era assar os bo los de pão num forno (tannúr, -> # 9486). Havia um “forno de tigela”, uma grande tigela de barro com uma tampa removível. O pão era assado nas pedras quentes e a tigela era invertida sobre elas. O “forno de jarro” era um forno com formato de jarro aquecido com grama que era colocada para queimar dentro dele. Para assar os bolos estes eram grudados às paredes internas do jarro. O “forno de buraco” era feito de barro rebocado e parcialmente enterrado no chão. Os bolos eram assados na parte externa do forno. Os fomos públicos eram convenientes e úteis em termos econômicos para os pobres. Podiam ficar em uma só parte da cidade, como na Rua dos Padeiros citada em Jeremias 37.21, de onde o profeta devia receber seu pão. Sempre que os israelitas fossem a um santuário oferecer um sacrifício, deviam levar uma oferta de manjares como parte habitual de sua adoração (Levítico 2). Podiam levar qualquer coisa assada num forno de pedra, metal ou cerâmica, mas os regulamentos sobre o que devia ser incluído eram bastante precisos. Essa oferta devia ser considerada uma oferta de consagração, entregue como memorial ao Senhor. Com isso, os adoradores estavam dizendo que tudo o que possuíam havia sido recebido do Senhor, e aquela oferta (minhâ) era um sinal de sua gratidão e devoção ao serviço do Senhor. 2. Ferver. O termo mais comum para esse processo de cozimento é o vb. bs/, ferv ebulir, cozinhar (# 1418) (cf. também o sir. e o acad. basalu). O subs. mebasselôt significa lugares para ferver (-> # 4453). O adj. bãiêl quer dizer cozido ou fervido (#4119). Israel não devia, por exemplo, comer o cordeiro pascal “cozido” em água (Êx 12.9). 411
Assadura, fervura, cozimento, tostadura
No aram., bsl é usado para amadurecer, como também o é, por vezes, no heb. (p. ex., J1 3.13). Ocorre com esse sentido no q. em Joel 3.13 e no hi. com referência a cachos de uvas (Gn 40.10). No restante dos casos (em sua maioria no pi./pu.), tem o sentido de ferver. E empregado com freqüência para coisas fervidas relacionadas ao ritual religioso, como a oferta pela culpa (Ez 46.20), o sacrifício pacífico (Ez 46.24), a came de um dos sacrifícios (1 Sm 2.13 — que os filhos de Eli tomavam impacientemente para si) ou para coisas sagradas em geral (2Cr 35.13). A palavra também pode ter o sentido de cozinhar em geral. Vários outros termos ocorrem com o sentido de cozinhar. O vb. zyd significa ferver, transbordar durante a fervura, ebulir (-> # 2326). Esse termo é usado em Gênesis 25.29 para descrever como Jacó preparou o guisado de lentilhas (é bem provável que essa determinada palavra para ferver tenha sido usada a fim de insinuar a maquinação do patriarca). O vb. po dia ser usado naturalmente com sentido metafórico para indicar algo que transborda durante a fervura, ou seja, agir de modo presunçoso — no aram., significa ser arrogante, e no ár., exce der, exagerar (no falar). No heb., a idéia de passar dos limites, agir com orgulho ou arrogância aparece em Êxodo 21.14 e Deuteronômio 1.43, tendo a conotação de uma atitude insolente. Em Deuteronômio 18.20, descreve o falso profeta que supõe estar proferindo uma palavra que não é em nome do Senhor. O Adj. zêd significa insolente, arrogante (-> # 2294; Pv 21.24). E o termo zãdôn quer dizer insolência, impiedade arrogante demonstrada na forma de desobe diência (-> # 2295). Outra palavra, rth, significa estar quente, fazer ferver (# 8409; Ez 24.5) e é relacionada ao subs. retah. fervura (# 8410). Esse termo também é usado de maneira metafórica para des crever a ebulição de emoções intensas (Jó 30.37). Descreve ainda o crocodilo que faz ferver as profundezas (Jó 41.31). O termo b'h II também significa ferver, mas transmite a idéia de inchar(# 1240), como uma parede formando uma barriga (Is 30.13) ou uma panela de ferver (ls 64.2 [1]). O concei to de inchar ou ferver presta-se facilmente para o aumento do desejo ou a idéia de buscar-se algo de todo o coração. No ár., significa buscar ou inchar, e no aram., buscar. Assim, em Isaías .12, refere-se a procurar-se o profeta. 3. Cozinhar. O subs. tabbãh refere-se a um abatedor, um cozinheiro (-> # 3184). Sig nifica aquele que abate e prepara animais para servirem de alimento (ver Gn 18.7). Gideão era cozinheiro e também padeiro (Jz 6.19). As profissões de cozinheiro e padeiro, eram conside radas ocupações honradas, como indica 1 Samuel 8.13. O termo hrk I significa queimar, chamuscar, tostar (# 3047) — também no aramaico. É usado em Provérbios 12.27 com referência ao preparo de uma came de caça. 4. Crestar. A palavra í / / i é usada algumas vezes para referir-se a assar came (# 7499), como em Isaías 44.16 e 1 Samuel 2.15, e esse também é seu significado em árabe. O adj. heb. íã /í descreve aquilo que é assado ao fogo (# 7507; Êx 12.8-9). O vb. qhl I significa assar, queimar ou crestar (# 7828). O cognato assírio é queimar ou consumir e o ár. significa fritar ou tostar trigo. O cereal tostado ao fogo era uma das ofertas que deviam ser levadas ao Senhor (Lv 2.14); representava um dos alimentos comuns do povo qõli, cereal tostado [-> # 7833]). (Js 5.11; O termo também pode descrever o corpo queimando de febre ou de aflição (Sl 38.8).
21
Pão: lehem (alimento, pão, # 4312); -> massâ I (pão asmo, # 5174); -> pãrãq (pão esmigalhado, # 7295); Pão: Teologia Tecido (do corpo), comida, carne (alimento): -> bãsãr (came [alimento], comida, tecido [do corpo], #1414); -> & ’êr (came [alimento], comida, #8638) 412
Assíria
Alimento: caldo, sopa: mãrãq (caldo, sopa, # 5348); -> nãzid (prato, cozido, sopa grossa, # 5686) Fornalha, lareira, forja, forno, fogão: -> 'ah (braseiro, fogareiro, # 279); kibsãn (forna lha, forja, # 3901); -> £wr (forja, # 3929); -> Wr (forno pequeno, # 3968); irfihasselôt (la reiras, # 4453); m ôqèd(lareira, # 4611); -> 'aHl (fornalha de barro, # 6612); tannúr (forno, fornalha, # 9486) B ib l io g r a f ia
V. H. Matthews, Manners and Customs in lhe Bible, 1991; F. H. Wight, Manners and Customs o f Bible Lands, 1953. Allen P. Ross Assembléia
# 7735 (///, reunir, convocar)
Assentamento -> # 8905 (siw, assentar) Assento
# 3782 (y íi, sentar, habitar)
Assíria
Assíria ("WN [ aí.vwr], # 855).
AT 1. Resumo da história assíria. Durante o segundo milênio a. C., a Assíria desenvolveuse a partir de uma cidade-Estado com amplas relações comerciais, especialmente com a Anatólia (as “colônias capadócias” como Cultepe-Canes) e transformou-se numa grande potência correspondente ao Egito e aos hititas no século XIV a. C. Aproveitando-se do enfraquecimento do reino de Mitani na Alta Mesopotâmia, a Assíra estendeu seu domínio até o Eufrates, c. 1300 a. C. O enérgico rei Tuculti-Ninurta 1 (c. 1244-1208 a. C.) realizou campanhas tanto no Oeste quanto no Sul, conquistando a Babilônia e reinando sobre ela por sete anos. Por meio de ações militares freqüentes, vários reis sucessivos mantiveram o controle sobre grande parte dessa região, com exceção da Babilônia, mas tiveram que enfrentar um novo inimigo: os arameus. A ameaça cada vez maior desse povo levou Tiglate-Pileser I (c. 1115-1077 a. C.) a marchar várias vezes para o Oeste, chegando a Palmira, Líbano e Arvade. Os arameus foram apenas temporariamente repelidos, avançaram rumo ao Leste durante o século XI a. C. e por pouco não dominaram a Assíria. A partir de 1050 a. C., os assírios viveram uma “idade das trevas” que só terminou com o reinado de Asur-dã (c. 934-912 a. C.), cujas inscrições falam de ataques contra os arameus que vinham ocupando as terras assírias. Seus dois sucessores continuaram a restabelecer a hegemonia assíria no Norte e Oeste e sob o comando de Asurbanipal II (c. 889858 a. C.) seu domínio voltou a alcançar o Eufrates. Os Estados mais a oeste relutaram em sujeitar-se, levando esse rei e seu filho, Salmaneser III (c. 858-824 a. C.) a empreender campanhas no Mediterrâneo e em Damasco. Ao mes mo tempo, esses reis estavam consolidando o domínio assírio nas montanhas a leste. Depois de um período de calmaria, a Assíria chegou ao apogeu sob o governo de Tiglate-Pileser III (c. 745-727 a. C.), Sargom II e seus descendentes Senaqueribe (->), Esaradom e Asurbanipal, estendendo seu controle até o Irã, Anatólia e Egito e assimilando em sua organização provin cial vários reinos antes independentes. As riquezas fluíam para a Assíria na forma de tributos, despojos e comércio, permitindo a construção dos famosos palácios de Nínive e Ninrode, cujos cômodos eram apainelados com lajes de pedra lavrada e mobiliados com peças esculpidas em 413
Assíria
marfim. Asurbanipal tentou colecionar cópias de toda a literatura babilônia em sua biblioteca e a recuperação de grande parte de sua coleção serviu de base para o conhecimento moderno sobre a Assíria. Não há registros sobre os anos mais avançados desse monarca (640 a. C. em diante), mas surgiram fraquezas que abriram caminho para os medos e babilônios acabarem com a Assíria em 621 a. C. 2. Contatos da Assíria com Israel e Judá. Em 853 a. C., Salmaneser III lutou contra forças do Levante em Qarqar, na Síria, citando o nome de Acabe, o israelita, entre seus opo nentes. Alguns anos depois, Salmaneser relatou ter recebido tributo de “Jeú filho de Onri” (c. 841 a. C.), o qual foi retratado pelos artistas do rei no famoso “Obelisco Negro” (ANET 279231; ANEP, 351-55). Os textos assírios apresentam datas precisas para cada acontecimento, uma contribuição de valor inestimável para a cronologia bíblica. Joás de Israel pagou tributos a Adadnirari III por volta dc 796 a. C. Os registros assírios não trazem informação alguma sobre Israel até Menaém começar a pagar tributos por volta de 738 a. C., quando Tiglate-Pileser es tava começando a consolidar seu controle sobre o sul da Síria (ver 2Rs 15.19-20; ANET, 283). Peca, que assassinou o filho de Menaém, não recebeu a aprovação assíria e foi substituído por Oséias que teve o apoio de Tiglate-Pileser (ver 2Rs 15.29-30; ANET, 283). A conhecida rebe lião de Oséias —■ sua aliança com o Egito e a suspensão do pagamento de tributos — levou o exército assírio, então sob o comando de Salmaneser V, a Samaria. Depois da conquista final de Samaria por Sargom II em 720 a. C., a cidade tomou-se um centro provincial assírio, e Is rael desapareceu como Estado nacional. Em Judá, Acaz trocou a independência pela intervenção da assíria contra as ameaças de Samaria (Peca) e Damasco (c. 732 a. C.; ver 2Rs 16.5-20; ANET, 282). Incentivado por Merodaque-Baladã, o nacionalista caldeu da Babilônia, Ezequias, filho de Acaz, tentou livrar-se do jugo assírio fazendo alianças com outros governantes locais e com o Egito. A campanha punitiva de Senaqueribe é descrita em detalhes, tanto do ponto de vista heb. quanto assírio. Senaqueribe devastou todo o reino de Judá, com exceção de Jerusalém e a capital só foi salva pela retirada apressada dos assírios diante de uma calamidade (2 Reis 18— 19; ANET, 287-88). Enquanto ain da ocupava o trono, Ezequias sujeitou-se aos assírios renovando o tributo que o filho Manassés continuou a pagar, de acordo com os registros de Esaradom e Assurbanipal (ANET, 291,294). O controle assírio em Samaria foi marcado por uma esteia inscrita erguida por Sarg e pela presença de oficiais assírios residindo na região. Foram encontradas em Israel evidên cias arqueológicas de estilos assírios na construção de palácios e em cerâmicas. Não se sabe ao certo até onde sua influência se espalhou. Hoje em dia, rejeita-se a idéia de que os assírios impunham rigorosamente sua religião sobre os Estados vassalos, pois, ao que parece, havia pouca interferência nos assuntos locais. Quando os assírios criavam assentamentos numa re gião conquistada, é evidente que levavam consigo suas próprias crenças e costumes. O mesmo também acontecia quando outros povos colonizavam Estados conquistados (ver 2Rs 17.24-34). A repressão de rebeliões às vezes era seguida de outros conflitos. A deportação era um meio usado para quebrar-se o patriotismo, o que era uma política habitual. Assim, depois da queda de Samaria, israelitas foram levados para a Assíria e esculturas de Senaqueribe mostram judeus de Laquis também sendo deportados. 3. A atitude bíblica com relação à Assíria. Os escritores bíblicos só dão atenção às re lações da Assíria com Israel quando estas passam a ter um envolvimento mútuo permanente a partir da ocasião em que Menaém se sujeitou a Tiglate-Pileser III. O rei Acaz de Judá viu a Assíria como uma grande potência capaz de trazer-lhe alívio, enquanto Isaías o advertiu que, com isso, estaria escrevendo a sentença de morte de sua nação (Isaías 7). A atitude de Acaz foi natural e constituiu um par. muito próximo com o que ocorreu no Estado de Samal, no norte 414
Ataiia
da Síria, um século antes e provavelmente com vários outros reinos menores. Isaías descreve claramente como os Assírios de fato viriam, não para salvar, mas para conquistar Judá, como a “navalha alugada do Senhor”, como uma inundação (Is 7.17-25; 8.4-8; cf. Os 10.6; 11.5). Em várias ocasiões, o profeta caracteriza a Assíria politicamente como um falso refúgio, cuja pro messa inicial se mostraria falsa, exatamente como as promessas do Egito (Jr 2.18,36; Lm 5.6; Os 5.13; 7.11; 12.1 [2]; 14.3 [4]), e moralmente como uma parceira impura e contaminadora (Ez 16.28; 23; Os 8.9; 9.3). O controle de Deus sobre a Assíria também é ressaltado repetida mente. O historiador afirma claramente que a conquista de Samaria foi o castigo de Deus pela apostasia de Israel (2Rs 17.7-23). Enquanto Israel foi completamente eliminada, um castigo um pouco mais brando, po rém ainda severo, aguardava Judá. Talvez Isaías tenha proclamado seu famoso oráculo “Ai da Assíria, cetro da minha ira!” (Is 10.5-34) enquanto Senaqueribe avançava, condenando as ações da Assíria como desmedidas ao “destruir e desarraigar não poucas nações” (v. 7) — entre elas a Babilônia (Is 23.13) — e por exaltar-se com arrogância. (Outros povos foram condenados anteriormente devido às mesmas atitudes; ver Am 1.6,9, 11,13.) Em decorrência disso, o po deroso carvalho seria derrubado (Is 14.24-27; 30.27-33; 31.8, 9; Sf2.13; Zc 10.11; Naum). Os judeus exilados na Assíria voltariam daquele lugar de opressão (Is 11.11, 16; 27.13; Os 11.11; Zc 10.10), assim como haviam escapado do Egito (ls 52.4). Os historiadores e profetas consi deraram a queda da Assíria como cumprimento da palavra de Deus, castigo para o algoz (Jr 50.18; Ez 31.2-17; 32.22). Por outro lado, os profetas predizem a vinda do Egito e da Assíria juntamente com Israel para receber a bênção de Deus e reconhecê-lo como Senhor (Is 19.23-25; Mq 7.12). Em vários desses aspectos, a Assíria é semelhante à Babilônia (Jr 50.17), que pensava ter poder, mas era um simples instrumento nas mãos de Deus. As duas nações representavam, portanto, todos os poderes contrários ao domínio de Deus (ver Is 14.12; Lc 10.18). B ib l io g r a f ia
M. Cogan, Imperialism and Religion: Assyria, Judah and Israel in the Eighth and Seventh Centuries B.C.E., 1.974; A. R. Millard, “Sennacherib’s Attack on Hezekiah”, TynBul 36, 1985, 6 1-77; idem, “Israelite and Aramean History in the Light of Inscriptions”, TynBul, 41,1990,261 75 (Appendix 1 lists Assyrian inscriptions naming kings o f Israel and Judah); B. Oded, Mass Deportations and Deportees in the Neo-Assyrian Empire, 1979; H. W. F. Saggs, The Might That Was Assyria, 1984. A. R. Millard Assolação
# 8615 ( í 'h I, ser devastado, tomar-se desolado)
Assunto -> # 6721 ( ‘inyãn, assunto, negócio, ocupação) Astarote Astúcia
# 6956 ( ‘astõret, Astarote) # 6891 ( 'rm II, ser astuto, astucioso, tomar astuto)
Atação -> # 2502 (Itbs, amarrar, pôr sela [em animal], atar)
Atalia
Atalia (rrVni? {'atalyâ], Javé é exaltado [Noth, 191], #6975). " 415
Atai ia
De acordo com 2 Reis 8.18, Atai ia era filha de Jezabel e Acabe, mas, conforme 2 Reis 8.26 e 2 Crônicas 22.2 (BHS), ela era filha de Onri. Katzenstein (78) acredita que Atalia ficou órfã quando Onri morreu e foi criada por Acaz e Jezabel. Por isso, também foi chamada de fi lha de Acabe (2Rs 8.18; 2Cr 21.6). Seu casamento com Jorão, rei de Judá, selou uma aliança com o reino vizinho do Sul (Bright, 238). Infelizmente, esse fato acabou levando à introdução do culto a Baal em Jerusalém. A forte influência que ela exerceu sobre o marido pode ser vista de maneira clara na eliminação de todos os possíveis rivais quando Jorão sucedeu o pai, Jeorão (2Cr 21.2-4; cf. Bright, 249; Lockyer, 240). Depois que Acazias, filho de Atalia, foi morto durante o golpe de Estado de Jeú (2Rs 9.27), em 841/40 a. C., ela assumiu o trono e exterminou todos os possíveis pretendentes ao trono, ainda que isso tenha significado matar os próprios filhos (2Rs 11.1). Vários motivos levaram seu reinado a ser um período de crise em Judá. Foi a primeira e única vez entre o reinado de Davi e a queda de Judá que uma rainha — aliás, não pertencente à linhagem de Davi — ocupou o trono. Uma vez que ela era devota do culto a Baal, incentivou sua prática juntamente com a adoração a Javé (2Rs 11.18). Jeoseba, irmã de Acazias e esposa do sacerdote Joiada, tomou Joás, filho de Acazias, quando ainda era bebê e escondeu-o numa câmara interior. Posteriormente, o menino foi le vado ao templo, onde permaneceu durante seis anos (2Rs 11.2-3; 2Cr 22.11-12). Quando Joás estava com sete anos de idade, Joiada promoveu uma contra-revolução bem-sucedida que deu cabo do reinado e da vida dessa rainha perversa (2Rs 11.18-21; 2Cr 23.1-21). -> Judá (Reino de): Teologia B ib l io g r a f ia
J. Bright, A History o f Israel, 1972; H. J. Katzenstein, “Who Were the Parents of Athaliah?”, IEJ 5:194-97, 1955; H. Lockyer, Ali the Kings and Queens o f the Bible, 1961; E. H. Merrill, Kingdom ofPriests, 1987; J. M. Millere J. H. Hayes, A History o f Ancient Israel andJudah, 1986; M. Noth, Die Israelitischen Personennamen in Rahmen der gemeinsemitischen Namengebung, 1928. D. N. Pienaar Ataque
# 7003 (p g \ encontrar, atacar)
Atenção -¥ # 9048 (sm ', escutar, ouvir, compreender, dar ouvidos, obedecer) Atencioso -¥ # 7992 (qSb, ser atencioso) Atração
# 6077 (swt, atrair, seduzir, incitar)
Atraso -> # 336 ( 'hr, demorar, deter) Aumento Aurora
# 3578 (ysp, acrescentar, continuar, aumentar) # 8840 (Sahar, crepúsculo da manhã)
Avanço -> # 7314 (p s' 1, dar um passo à frente, marchar) Azarias -> Uzias 416
Azazel
Azazel
Azazel (*?TKTV [ 'azã zêí], # 6439).
OMA A crença do OMA em demônios era intensa, extremamente difundida e praticamen te universal (Canaã). Apesar das descobertas recentes de inscrições (p. ex., os textos de Deir ‘Allã), sabe-se relativamente pouco sobre a postura dos israelitas com relação ao mundo ctônico. A devoção ímpar de Israel a Javé como o único Deus verdadeiro ainda serve de principal contexto para que se possa reconstituir um retrato da demonologia israelita (Milgrom, 1021).
10
AT O termo Azazel é encontrado 3x no AT, todas no ritual do Dia da Expiação (Lv 16.8, , 26) e os estudiosos traduziram-no basicamente de três formas: 1. uma combinação de ‘z + ’z l, lit. o bode que se vai embora, ou seja, o bode expiatório; 2. um termo que significa um lugar acidentado e difícil (baseado principalmente na tradução ár. de Saasia,y«M 'azãz, um despenhadeiro escarpado) e 3. um NP, ou seja, o nome de um determinado demônio. Apesar de algumas versões da Bíblia adotarem sempre a primeira possibilidade rela cionada acima, traduzindo ‘azã ’z êl como bode expiatório, a maioria dos estudiosos de hoje opta pela terceira possibilidade, traduzindo o termo como um NP para uma determinada en tidade demoníaca. Citam-se os seguintes motivos para apoiar essa idéia: 1. A sintaxe paralela em Levítico 16.8: “para o Senhor” || “para Azazel”; 2. o fato de que o deserto costuma ser de signado nas Escrituras como lugar freqüentado por demônios (Is 13.21; 34.14; Mt 12.34; Ap 18.2); 3. o fato de que Azazel é mencionado pelo nome em 1 Enoque 10.4, uma passagem que evidentemente faz referência a Levítico 16 e 4. a possibilidade de que 'z ’z l seja uma metátese intencional de 'zz 7, deus feroz (11QT 26:13). Ver ainda # 6439. P-B A LXX traz tõ apopompaiõ, a coisa que leva (o pecado) embora em Levítico 16.8, 10 e ton chimaron ton diestalmenon, o bode mandado embora, em Levítico 16.26. A Vg. traz caper emissarius, provavelmente uma tradução direta da LXX para Levítico 16.26. Em / Enoque 10.4, “Diz o Senhor ao anjo Rafael: Ata Azazel pelas mãos e pés e lança-o nas trevas! E fez um buraco no deserto que ficava em Dudael e ali o lançou”. Os comentaristas do Midr. não apresentam um consenso. Alguns (como Saadia) procuram subestimar o caráter “pessoal” de Azazel como uma entidade específica. Outros não vêem problema algum em relação a esse caráter (3 En 4.6; Ibn Ezra, Ramban).
Espírito, fantasm a, demônio: -> ’ôb II (adivinho, espírita, necromante, fantasma, # 200); I (fantasmas, fantasmas dos mortos, espíritos, # 356); -> lílít (monstro noturno, criatur da noite, # 4327); ‘azã ’zêl (Azazel, demônio, bode expiatório, # 6439); -> II (habitante do deserto, aquele que clama, que uiva, besta selvagem, # 7470); -> rüah (vento, sopro, transitoriedade, volição, disposição, temperamento, espírito, Espírito, # 8120); -> r^pã ’im I (sombras, espíritos mortos, # 8327); -> s ã ‘ir III (sátiro, demônio em forma de bode, ídolo em forma de bode, # 8359); -> s ê d (demônio, #8717) B ib l io g r a f ia
T. Canaan, Dãmonenglaube in Lande der Bibel, 28; J. Kapach, (ed.), Comments ofR . Saadiah Gaon on the Torah, 1963; H. M. Kümmel, “Ersatzkõnig und Sündenbock”, ZA W 80,1968,289318; J. Milgrom, Leviticus, AB 3, 1991, 1020-23; M. S. Moore, “Job’sTexts of Terror”,CBQ 55, 1993, 662-75; H. Tawil, “Azazel the Prince of the Steppe: A Comparative Study”, ZAW 92, 1980, 43-59. M S. Moore 417
Baal
Baal
Baal (Vya [ba ‘aí), nome ou título de um deus, o Mestre, Baal, # 1251); < b'l, q. possuir, controlar, casar (->
# 1249). OMA 1. No pensamento mesopotâmico, os deuses eram vistos como os “verdadeiros” donos das cidades onde ficavam seus principais templos. Assim, o deus-lua Sin era conhecido como Mestre/Senhor de Harã (b 'Ibrn [KAI, 218]). Era comum um Estado dar esse título ao seu deus mais importante. No AT, o equivalente é “o deus [ ’elõhê] de X”. Em certos casos, o deus tam bém podia ser chamado de “Senhor” como um nome próprio (Bel). Do século XVI a. C. em diante, Bel tomou-se o outro nome de Marduque na Babilônia. Istar, a principal deusa podia ser chamada em acad. de bêltu, Senhora, ou, em G, Mylitta (Heródoto I§ 131, 199). J. C. de Moor (TDOT2:183) sugere que, de maneira semelhante, Javé passou a ser chamado de 'adõnãy “(meu) Senhor” quando seu nome era sagrado demais para ser pronunciado. Não se sabe ao certo quando o nome Baal foi dado ao deus da tempestade no Levante. Uma carta El Amama de Tiro descreve o trovão de Baal (eA 147, 13-15, ANET, 484). “Assim, não mais do que a partir da metade do segundo milênio a. C., quando os povos semitas do Oes te usavam b 7 ou b ‘lm com um sentido absoluto, tinham em mente um único deus Baal” (de Moor, TDOT 2:184). O Baal (sozinho) é usado em ugar. de maneira intercambiável com b ‘l $pn e hd (Hadade ou Hade: que corresponde ao acad. Adade, filho de Dagom/Dagã). E mais difícil tomar uma posição quanto a exemplos como o de KAI 47.1: a expressão Imlqrt b 7 ,fr deve ser entendida como “Melcarte, senhor de Tiro” ou “Melcarte, Baal de Tiro” (de Moor, TDOT 2:185)? 2. Referências egípcias a Baal retratam-no como o deus da tempestade/guerra. 3. No ugar., b 7 /Ac/habitava (assim como os deuses gregos no Olimpo ou Javé no monte Sião) no monte Cássio, 40 quilômetros ao norte de Ugarite (b 7 bsrrt spn; KTU 1.3.1:21). Era o deus mais importante de Ugarite, apesar de El continuar sendo o deus mais elevado, o touro, o procriador. As consortes de Baal eram Anate e Astarte. Num certo sentido, Aserá (mãe dos deuses) era a mãe de Baal, mas ele estava sempre em conflito com os filhos de El e Aserá, esp. Iam (Príncipe Mar), Astar (estrela da manhã/noite) e Mote (morte). Anate e Astarte não são mães de deuses (daí serem chamadas de “virgens”). Uma das festas mais importantes era o Ano Novo/Vindima Nova (ver abaixo, Baal-Berite). Baal é um deus da fertilidade apenas no sentido de que controla a chuva. E possível, ainda que isso não seja incontestável, que ele fosse um deus que morria e ressuscitava (ou seja, morria todo ano durante o inverno seco e não apenas nos períodos de seca). No entanto, sabe-se com certeza que nos mitos e lendas não há nenhum ritual orgíaco relacionado a ele (cf. Hermann, DDD, cols. 254-55, 262). Na verdade, Baal abomina “um sacrifício em que servas se entregam à devassidão” (KTU 1.4.111:21, tr. de Gibson; ANET, 132 diz “banquete de lascívia das servas”). Não há sequer evidência de prostituição cultuai, apesar de ser possível que esta existisse. Somente seus inimigos acusam os cidadãos siro-fenícios de hábitos depravados. Sabe-se do nome Hadade pela inscrição em aram. encontrada em Dã. No meio dos ara meus, Hadade também era chamado de Ramã. Em 2 Reis 5.18 esse deus é chamado de Rimom e em Zacarias 12.11, de Hadade-Rimom (sendo que nessa passagem o pranto pode indicar um deus que morria e ressuscitava; cf. Tamuz em Ez 8.14). AT 1. Distribuição. Com exceção de nome de lugares ou elementos teofóricos no nome de indivíduos, é surpreende como são escassas as referências a Baal no AT, podendo ser encon tradas apenas em certas seções. Limitam-se, basicamente, à história deut. (apesar de, no livro 418
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de Deuteronômio em si, serem encontradas apenas em Dt 4.3, caso não se trate de um NG; ver abaixo). O plural, baalins, ocorre na estrutura formal de Juizes — 1 Samuel 12 (antes do rei Saul). A forma sing. é encontrada na história de Gideâo (Jz 6); nas narrativas de Elias/Eliseu/ Acabe, a saber, Acabe e Elias; do filho de Acabe, Azarias; de Elias (lR s 16.29— 19.18; 22.5153; 2Rs 1); da família de Jeú e Acabe (2Rs 10.1-28); da filha/irmã de Acabe, Atalia (2Rs 11.18) e nas passagens paralelas dos atos de Manassés (cap. 21) revogados por Josias (cap. 23). Há duas referências a Baal colocadas em lugares estratégicos (2Rs 3.2 [filho de Acabe] e 2Rs 17.16). E 2 Reis 3.2 é parte do resumo deut. dos reinos apresentando um dos conjuntos “proféticos” de narrativas, uma “história de Eliseu”. Jorão remove a coluna (mas.^êbá) de Baal que Jeú destrói novamente em 2 Reis 10.27 (mas o texto é um tanto incerto; cf. LXX). 2 Reis 17.16 faz parte da condenação de Israel — o motivo pelo qual mereciam ser destruídos. Para esse fim, tomam-se emprestadas proibições e vocabulário de todas as partes do AT (inclusive o termo gillülim, encontrado apenas em raras ocasiões fora do livro de Ezequiel e, nesses casos, em colocações como essa [p. ex., 2Rs 21 e 23]; -> # 1658). Sofonias 1.4 acusa sacerdotes ile gítimos (kõmer, # 4024) de adoração a Javé e Baal/hostes celestiais/Milcom (cf. 2Rs 23.5). Além disso, há algumas passagens em Crônicas que se referem a Baal. Nos profetas, além de Sofonias 1.4, somente Jeremias e Oséias falam de Baal. No Pent. e em Josué, Baal é mencionado somente na história de Baal-Peor (Nm 25.3 [= Sl 106.28]. Dt 4.3). O AT não usa o termo ba ‘alat com o sentido de deusa; antes, emprega o pl. masc. “deus” ( ’elõhim) também para um deus do sexo feminino. 2. Relevância de Baal nas passagens básicas da história deuteronômica. 2. Em Ju zes, a forma pl. é usada para indicar os muitos “outros deuses” das nações que Israel encontra na terra. Deuteronômio 6.14, “Não seguirás outros deuses, nenhum dos deuses dos povos que houver ao redor de ti”, é citado em Juizes 2.12 depois de uma referência aos baalins (be 'ãlim) e tem um par. em 1 Reis 18.18: “e seguistes os baalins”. Os baalins e Astarote (Juizes 10.6 [conj. 2.13; 3.7]; ISm 12.10) podem ser par. ao acad. ilãni u istarãti e referir-se a qualquer deus ou deusa ou a todas as divindades (de acordo com H.-P. Müller, TWAT 6:453). O CAD (istaru, 272) apresenta um par. interessante de Juizes 10.6: ili mãtim is-ta-ra-at mãtim ^Sarnas d$ín dAdadu d ista r, “os deuses e deusas da terra, [a saber] Samos, Sim, Adade e Istar”. O texto da Bíblia diz, “serviram aos baalins, e a Astarote, e (a saber; waw explicativum) aos deuses (ou deus, ’elõhê) da Síria, e aos de Sidom, de Moabe, dos filhos de Amom e dos filisteus” (HadadeRamã, Astarote, Semos, Milcom e Dagom) (Js 10.6). Podemos rejeitar com firmeza a idéia de que esses “baalins” eram “divindades sem nome” que representavam algum tipo de crença animista. Apesar de ser argumentada com grande erudição por Robert Smith, essa idéia apóia-se excessivamente nas analogias com os welís árabes e os daimorn clássicos e muito pouco na natureza literária das narrativas (cf. Wolff, 1974, 38, “É incorreta a suposição de que a religião cananéia possuía um número enorme de Baalins situados em diversos lugares”; cf. também Day). b. A forma sing. como nome ocorre em Juizes 6, em que o pai de Gideão tem um al a Baal e o costumeiro poste-ídolo. Não se faz nenhuma menção de uma coluna. Gideão destrói o altar, constrói outro “correto” e usa a madeira do poste-ídolo para queimar um sacrifício. Assim como Gamaliel em Atos, o pai de Gideão dá um bom conselho. De fato, “se é deus, que por si mesmo contenda” (comparar com 1 Reis 18). O filho de Gideão, Abimeleque (filho de Jerubaal) é identificado desse modo, pois o pai de Gideão deu a Gideão um novo nome: Jerubaal, que provavelmente significa “que Baal lhe dê descendência” (possivelmente, “luta por mim”), mas que foi reinterpretado como “Baal contenda contra ele” (Jz 6.32). O título Baal aplica-se, então, somente a um deus estrangeiro e não a Javé. 419
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c. De acordo com a história deut., havia uma forma de culto a Baal que teve fim com a consolidação da monarquia. (Os escribas chegaram até a alterar alguns dos nomes dos filhos de Saul e Davi para deixar isso mais claro; p. ex., Isbosete de 2Sm 2.8 = Esbaal em lCr 9.39). Os dias em que “não havia rei em Israel; cada um fazia o que achava mais reto” (Jz 21.25) haviam chegado ao fim. Antes disso, Mica havia feito imagens para Javé e não outros deuses (Jz 17.3; cf.psl, # 7180). “Então, os filhos de Israel tiraram dentre si os baalins e os astarotes e serviram só ao Senhor” (ISm 7.4). Salomão perdeu o controle de Israel pois “seguiu” Astarote, Semos e Milcom (IRs 11.5, 10), mas esse fato constitui uma anomalia individual. Jeroboão, primeiro monarca do Reino do Norte, é acusado de fazer “altos”, nomear sacerdotes que não eram levitas, mudar as datas das festas e até fazer imagens de bezerros (ao que parece, associadas a Javé, uma vez que ele “vos tirou da terra do Egito”). Em momento algum ele é acusado de adorar a Baal. Aliás, a adoração ao bezerro é distinguida especifica mente do culto a Baal em 2 Reis 10.28-29 e presume-se que esses bezerros sejam os “seus idolos” em 1 Reis 6.26. Semelhantemente, Roboão é acusado de “todas as coisas abomináveis das nações que o Senhor expulsara de diante dos filhos de Israel”, mas não de adorar seus deuses (1 Rs 14.24). Sua transgressão é o ato de adorar a Javé de maneira incorreta (esp. em santuários locais e não no altar em Jerusalém) e não de prestar culto a outros deuses. d. Somente ao casar-se com Jezabel (uma princesa de Tiro) é que Acabe não apenas começou a considerar “como se fora coisa de somenos andar ele nos pecados de Joroboão (ir regularidades cultuais, festas celebradas em datas incorretas), como também “foi, e serviu a Baal, e o adorou” (IRs 16.31). Ao contrário do que afirma Mulder(7Z)07), pode-se dizer que de Vaux está correto: essa passagem não faz sentido algum, a menos que Baal seja estrangeiro (a narrativa contém uma polêmica nacionalista), possivelmente o Baal-Melcarte de Tiro. Não se trata de uma afirmação inquestionável, uma vez que os escritos clássicos fazem uma distin ção entre Zeus (Baal fenício?) e Héracles (Melcarte), mas esse pode ser o erro deles. Baal era adorado em Tiro como deus da tempestade (aquele que dava a chuva) (ver OMA, evidências de el Amama). Apesar das vitórias de Javé sobre esse Baal, foi somente no reinado de Jeú que “Jeú exterminou de Israel a Baal” (2Rs 10.28). Essa declaração deve ser levada a sério dentro da narrativa. e. Em 2 Crônicas, a forma pl. baalins ocorre em passagens que possuem par. em Reis, mas no caso de Reis, não há nenhum indício de envolvimento com baalins ou qualquer outro deus estrangeiro: 2 Crônicas 17.3 (Josafá não procurou os baalins); 24.7 (os filhos de Atalia usaram as coisas sagradas do templo para os baalins); 28.2 (Acaz fez imagens a baalins [sam. altares: provavelmente uma referência ao altar que fez em Reis, mas aquele foi um altar a Javé]); 33.3 (cf. 34.4) (Manassés é acusado de fazer altares para baalins [a passagem em Reis menciona altares a Baal, sing.; 2Rs 21.3]). Crônicas usa “baalins” num sentido geral, mas, ao contrário da história deut. (e de Oséias), considera que a adoração desses deuses “estrangeiros” estendeuse por toda a história de Judá. Infelizmente esse último conceito tomou-se predominante na interpretação bíblica, e as outras evidências foram interpretadas sob essa ótica. f. Em 2 Reis 21 e 23 (que, tomando por base outros motivos, parece ser um acréscimo a um esboço original que pode ter-se encerrado com Ezequias), encontramos o mesmo ponto de vista que o de Oséias e Jeremias. Há uma ênfase em imagens e na adoração de outros deu ses (inclusive Baal) nos “altos”, em parte por causa da necessidade de retratar Manassés como sendo tão perverso que nem mesmo o piedoso rei Josias pôde salvar Jerusalém da destruição. Assim, atribui-se a Manassés todo pecado possível encontrado em Deuteronômio (sendo de pois removidos por Josias). As reformas de Ezequias são limitadas a um versículo (2Rs 18.4): 420
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a remoção dos altos, destruição das colunas e postes-ídolos e destruição da serpente confec cionada por Moisés. 3. "Baal" nos profetas, a. Oséias apresenta o termo tanto no pl. quanto no singular difícil detectar alguma diferença entre as passagens que usam um ou outro. Oséias 2.16 [18] emprega ba 'li, meu mestre ou marido (metáfora) como título para Javé — título este que deve ser deixado de lado em função de sua semelhança literal com o nome Baal. Seria de esperar-se o sing. e não o plural no v. 17 [19]. Não se pode pressupor que nomes como b#‘alyâ, Bealias, em 1 Crônicas 12.5 [6], ou os dez nomes com — baal, juntamente com onze nomes contendo — yau (Javé) no óstraco de Samaria (ANET, 321) representem a adoração de outro deus impor tante. Tigay mostra que pelo menos no meio das classes mais altas do século VIII em diante, os NP raramente eram formados com nomes de outros deuses ou deusas. Ao que parece, no meio dos Estados nacionais (Israel, Judá, Moabe, Edom, Amom), o nacionalismo era forte demais para permitir a adoração de deuses de outros povos. Foi somente com o colapso do Estado e a dispersão dos povos que essa opção tomou-se viável. Oséias apresenta uma polêmica intensa contra Israel. Assim Oséias 1.4 reavalia o jul gamento de Jeú, colocando no lugar da avaliação predominantemente positiva do D — com exceção dos bezerros de ouro — uma avaliação negativa (por causa da matança dos judeus?). Contrastando com isso, é possível que Oséias considere não apenas o uso de imagens, mas também a adoração a Baal, uma prática corrente em Israel. “Ainda que tu, ó Israel, queres pros tituir-te (TM zõneh), não se faça culpado Judá... Efraim está entregue aos ídolos ( 'asabbim); é deixá-lo” (Os 4.15, 17); “eu não mais tomarei a favorecer a casa de Israel... Porém da casa de Judá me compadecerei” (Os 1.6-7) e Os 11.12 [12.1] diz: “Efraim me cercou por meio de men tiras, e a casa de Israel, com engano; mas Judá ainda domina com Deus e é fiel com o Santo”. (Há poucas passagens que criticam Judá. E possível que todas as passagens que se referem a Judá sejam interpolações, mas isso não afeta a polêmica anti-Israel; ver, p. ex., G. Emmerson). Uma boa parte do texto de Oséias fala de “ídolos” ( ‘a.?abbím). Com freqüência, não significa outra coisa senão a iconografia cultuai de Israel (bezerros de ouro, possivelmente colunas, es tola sacerdotal e ídolos do lar, cf. Os 3.4) de modo que é difícil determinar-se se Oséias queria dizer que Israel havia, de fato, adorado a algum Baal, ou que a seu ver, esse tipo de adoração era tão horrível quanto adorar a Baal. b. O plural ocorre apenas duas vezes em Jeremias. Ao adorar nos “altos”, Israel (q nesse caso significa Judá) estava, na realidade, adorando baalins (Jr 2.23). (Essa afirmação contrasta com a história deut. que, ao mesmo tempo em que condena a adoração nesses luga res, normalmente não vê essa prática como um pecado mortal. Até mesmo reis piedosos antes de Ezequias permitiram a adoração em lugares altos. Tratava-se de um culto a Javé, mas era imperfeito por não ser realizado em Jerusalém. No entanto, o uso de utensílios cultuais em separado de um altar era pecado.) Jeremias 9.13 é semelhante a 2.23. Nas duas passagens, a expressão é exatamente par. à expressão deut. “seguir outros deuses” (Dt 6.14; 8.19; 11.28; 13.2; 28.14; Jz 2.12; etc.; Jr 7.6, 9; 11.10; 13.10 e com freqüência). Ao usar o sing. “o Baal”, Jeremias acusa o povo de adorar Baal em vez de Javé (Jr 2.8; 7.9; etc.). “Cuidam em fazer que o meu povo se esqueça do meu nome pelos seus sonhos que cada um conta ao seu companhei ro, assim como seus pais se esqueceram do meu nome, por causa de Baal” (Jr 23.27). Aqui, os sonhos — que em outras passagens da Bíblia são um meio para a revelação de Deus — são visto de maneira negativa. Em par. a isso, Jeremias parece dizer (assim como Oséias) que em outros tempos o povo usou o termo (título) “Baal” em vez do nome de Deus, Javé. Para ele, isso é o mesmo que esquecer-se do próprio Deus. Nos altos de Baal, crianças eram sacrifica das a Moloque (-> #4891; Jr 32.35). (Em Jr 19.5, diz-se que queimaram os filhos no fogo em 421
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holocausto a Baal, apesar de o nome de Baal não estar presente na LXX e em Jr 7.31, em que são citados os “altos de Tofete”.) Para Jeremias, o comportamento de Judá era comparável à adoração de outro(s) deus(es). c. Em alguma dessas passagens não há nada que corresponda ao conceito moderno “religião cananéia” — trata-se do fruto da imaginação dos estudiosos (cf. Lemche, 199). Oséias e Ezequiel usam imagística sexual como metáfora para o comportamento de Israel (o mesmo acontece em Jeremias 3). A partir disso, os estudiosos deduziram a existência de um “culto ao sexo” (Wolff), mas não há evidência alguma de orgias lascivas ou casamentos sagrados. As histórias de Heródoto sobre a Babilônia (I§ 199) não têm o apoio de evidências contemporâneas. Grande parte da linguagem (com freqüência exagerada) de Oséias e Ezequiel trata de associações políticas às quais é atribuída relevância teológica. Ezequiel traz imagens sexuais explícitas das relações de Israel com o Egito, a Assíria e a Babilônia (Ez 16.23-43; 23.1-49). Esses “flertes” são considerados uma rejeição de Javé e, portanto, adultério (especialmente de acordo com a imagística de Oséias). Porém, somente em Jeremias e Ezequiel diz-se que o povo cometeu adultério com “pedras e árvores” (Jr 3.9, supostamente colunas e postes-idolos cultuais) ou com “seus ídolos” (Ez 23.37, -> gillülim, # 1658). Essas expressões dificilmente representam orgias nos altos dos montes ou mesmo adoração a deuses estrangeiros. Ainda as sim, as metáforas empregadas são motivo de polêmica. No contexto sacerdotal, “prostituir-se com X” é o mesmo que “seguir”, num contexto deut. (a preposição “com” é usada com o vb. znh). A imagem de prostituição também é empregada para descrever o ato de seguir outros deuses em Êxodo 34.14, 15, 16; Levítico 17.7; 20.5, 6; Números 15.39; Deuteronômio 31.16; Juizes 2.17; 8.27, 33; 1 Crônicas 5.25. Ezequiel 20.30 substituiu o termo “deuses” nessa ex pressão por siqqúífím, abominações (#9199) e, em 6.9, pelo termo de sua preferência, gillülim (lit., imundícia; # 1658). (Em Os 2.5, os “amantes” podem muito bem ser considerados outros deuses.) Pode-se observar que o conceito de prostituição não pertence a práticas rituais, mas ao vocabulário dos escritores. Existem algumas referências a prostitutos e prostitutas cultuais (qedêsim e qedêsôt, san tos). Faziam parte da adoração a Javé reprovada pelo D, e aparecem em críticas à prostituição cultuai. Oséias também ataca a hipocrisia do povo: “Não castigarei vossas filhas (que ainda não estão noivas), que se prostituem, nem vossas noras (ou filhas casadas, noivas), quando adul teram, porque os homens mesmos se retiram com as meretrizes e com as prostitutas cultuais sacrificam, pois o povo que não tem entendimento corre para a sua perdição” (Os 4.14). Oséias vê esse comportamento sexual devasso como conseqüência de adorar nos altos (Os 4.13), mas criar um importante culto ao sexo tomando por base essas passagens é uma extrapolação do que mostram as evidências. 4. Expressões compostas. O termo h a ‘al ocorre com freqüência em combinação co algum outro subs., muitas vezes com um NG. Não devemos deduzir a existência de diferentes deuses, apesar de ser possível que, a princípio esse fosse o caso. O significado do nome em si, não necessariamente a reinterpretação do AT, pode ser “Baal de X” ou “Mestre de X”. No primeiro caso, significa “o Baal (Hadade) conforme este é adorado em X”. Trata-se de algo semelhante ao “Javé de Samaria” ou “Javé de Temã” nas inscrições de Kuntillet ‘Ajrud (ver Hadley, Frevel e referências nos mesmos) e ao “Javé do Sinai” (Jz 5.5 em algumas versões), ou ainda a exemplos como íttrt hr, “Astarote do povo de Hur”. Caso a tradução seja “Mestre de X”, então pode tratar-se de algum outro deus, reconhecido como principal deus de um local, como Aserá era a “Elate” (deusa) de Sidom. Muitas das expressões compostas são NG, com freqüência nome de lugares em, ou perto de, montes: Baalá (Quiriate-Jearim, em Js 15.9); Baal-Gade(Js 11.17; 12.7; 13.5); Baal-Hazor 422
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(2Sm 13.23); Baal-Hermom (Jz 3.3; lCr 5.23); conj. Baalá de Judá (2Sm 6.2); Baal-Meom (Nm 32.38; Ez 25.9); Baal-Zefom (Baal do monte Cássio; cf. o ugar. “assento dos deuses”, ou monte Zefom mencionado no Pent. [Êx 14.2, 9; Nm 33.7]) e Baal-Perazim (2Sm 5.20). São atribuídas a Baal Perazim — provavelmente, a princípio, Baal do monte Perazim — duas etimologias populares (2Sm 5.20, 21). A primeira identifica Javé e Baal: “Rompeu o Senhor as fileiras inimigas diante de mim” (v. 20); a segunda identifica Baal com ‘asabbim, imagens: “Os filisteus deixaram lá os seus ídolos" (v. 21). 5. Deuses, a. O Baal de Peor (ou Bete-Peor). Números 25.1 indica que os acontec mentos se passam em Moabe, de modo que o deus deve ser considerado Semos, conforme este era adorado em Peor. Pode-se identificar o tema típico deut. da atração sexual seduzindo homens a adorar outros deuses (Dt 7.1-5; Jz 3.6; IRs 11.1-8). Esse episódio é lembrado em Josué 22.17 e em Oséias 9.10. Em Oséias 9.10, Baal foi substituído por bõset, vergonha (cf. Jr 11.13; possivelmente 3.24). Os ancestrais haviam se tomado siqqü$tm, abominações. Assim como a adoração sacrificial de Israel / Judá, nesse culto havia uma refeição em comum (para comensalidade: ver Robertson Smith, 269-90). Interpreta-se com freqüência que no culto havia prostituição cultuai, mas essa conclusão não tem fundamento. b. Baal-zebube. Na história de Elias e Acazias (2Rs 1), Acazias envia mensageiros a “Baal-Zebube, deus de Ecrom” (vv. 2, 3, 6, 16). Costuma-se considerar que o nome significa, aparentemente, “deus das moscas” — uma derivação por meio de uma corruptela intencional: de ba ‘al z?búb < ba ‘al 2? búl, Exaltado Baal, Príncipe Baal. Não se sabe qual divindade pos sa ser. (1 Sm 6 menciona apenas Dagom como deus de Asdode; não se fala de deus algum de outras cidades.) c. b a ‘al berít, a aliança de Baal? Mestre da aliança? (Jz 8.33; 9.4). Podemos supor com segurança que essa designação é uma variação de El-Berite, mencionado em Juizes 9.46 (é evidente que pode haver dois deuses em Siquém, um chamado El-Berite e outro Baal-Berite: Mulder, TDOT2:194; mas essa é, de longe, a hipótese menos provável). Observe que (em opo sição a Mulder), o v. 33 não diz que “esse Baal era um deus cananeu”. Antes, ba ‘al berít é um dos baalins, ou seja, “outros deuses”. A história indica que ele é o deus de Siquém, pois é lá que se encontra o seu templo. O v. 33 é uma oração de ligação que introduz o tema da apostaria aos balaains (e Asterote) depois da morte de um juiz e, ao mesmo tempo, cria uma associação específica com o deus da narrativa seguinte. Essa história é relacionada a Gênesis 34 (Jz 9.28), em que Israel vive no campo e Hamor na cidade. Assim, Juizes 8.33 considera que o pecado de Israel é a adoção do deus de Siquém em vez de Javé. É equivocado considerar a festa uma peculiaridade “cananéia”: Essa festa é a mesma de Sucote, a Festa dos Tabernáculos (na qual também havia o consumo de muito vinho; ver Jz 21.16-22; ISm 1.3, 13-14). Observe que um dos personagens da história chama-se Zebul. B ib l io g r a f ia
R SP 2:335-500; TDOT2:181-92, 192-200; TH AT\ :321-34\ TWAT6:453-63; TWOT 1:119-21; W. F. Albright, Yahweh and the Gods o f Canaan, 1968; M. D. Coogan, “Canaanite Origins and Lineage: Reflections on the Religion of Ancient Israel”, Ancient Israelite Religion, 1987, 11524; P. C. Craigie, Ugrarít and the Old Testament, 1983; F. M. Cross, Canaanite Myth and He brew Epic, 1973; J. Day, “Baal (Deity)”, ABD 1:545-49; G. 1. Emmerson, Hosea: An Israelite Prophet inJudean Perspective, 1984; C. Frevel, Aschera und der Ausschliesslichkeitsanspruch YHWHs, 1995; J. C. L. Gibson, Canaanite Myths and Legends2, 1978; J. Gray, Legacy o f Canaan2, 1965; J. M. Hadley, “Some Drawings and Inscríptions on Two Pithoi From Kumtillet cAjrud”, VT 37, 1987, 50-62; Herodotus, Histories, tr. A. D. Godley, 1920-25; W. Herrmann, 423
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AT 1. Em Gênesis 11.1 -9, a humanidade em migração assenta-se na terra de Sinar (= Babilônia), emprega suas aptidões para fazer tijolos e, usando betume como argamassa, começa a construir uma cidade e uma torre, “para que não sejamos espalhados por toda a terra” (v.4). A torre que chega até os céus é mais do que uma sugestão do zigurate babilônio ou uma torre-templar escalonada, que era considerada o local por onde os deuses desciam, o ponto de contato entre a esfera humana e a divina. De acordo com a narrativa, Deus de fato desce, mas antes da cidade e (supostamen te) da torre estarem completas, e entra em ação usando uma repetição zombadora dos gritos de encorajamento dos construtores de Babel (“vinde... façamos, edifiquemos, desçamos...”, vv. 3, 4, 7). Além disso, diz-se que essas tentativas de construir são idéia dos “filhos dos homens” (lit., v. 5), uma expressão que chama a atenção para a fragilidade humana dos construtores. Para marcar a interrupção desse empreendimento malogrado de solidariedade humana, a cida de recebe o nome de “Babel”, que o texto explica citando o vb. heb. bll, confundir (-> # 1176), com referência à confusão de línguas criada pelo julgamento sobre os construtores e não se referindo à etimologia babilônia tradicional (“Porta de Deus”). A torre da história pode aludir a E-temen-an-ki (“Casa da Fundação do Céu e da Ter ra”) na Babilônia. Se, como sugere W. von Soden, E-temen-an-ki foi iniciada por Nabucodonosor I no século XII, porém completada somente vários séculos depois, a existência de um “elefante branco” de Nabucodonosor na Babilônia durante vários séculos pode ter influencia do a narrativa bíblica. E provável que também seja relevante o fato de Gênesis apresentar a Babilônia como uma cidade pós-diluviana (cf. também Gn 10.10), uma vez que, de acordo com o Enuma Elis 6:57-58, a babilônia foi fundada na criação do mundo, enquanto o relato de Berosso do dilúvio (século III a. C.) deixa implícito que a Babilônia foi fundada na criação, mas reconstruída depois do dilúvio (cf. Josefo, Contra Apionem 1:19). Assim, de uma forma ou de outra, a grande cidadc imperial e inimiga de Israel no primeiro milênio é situada em seu devido lugar em Gênesis 11. 2. No cenário mais amplo da proto-história de Gênesis, a iniciativa dos construtores Babel pode ser vista ao mesmo tempo como um exemplo de extrapolação dos limites e rejeição do mandamento inicial: “enchei a terra” (Gn 1.28). A extrapolação dos limites já aparece repre sentada no ato pelo qual Adão e Eva desconsideram a interdição divina e buscam a sabedoria proibida (Gn 3.5-7 [“como Deus, sereis...”, v. 5]) e também na coabitação dos “filhos de Deus” com as “filhas dos homens” em Gênesis 6.1-2, 4. “Agora não haverá restrição para tudo que intentam fazer” (Gn 11.6). A construção da cidade vai contra o mandamento inicial de Gênesis 1.28 (“enchei a terra e sujeitai-a”; cf. 9.1) e é tratado de maneira coerente com outras tendências antiurbanas que se destacam em Gênesis. A primeira pessoa a ser associada com a construção de uma cidade é Caim, aquele que foi expulso da presença do Senhor e condenado a vagar como Babel: Torre de
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Babilônia
um fiigitivo, e a impressão é de que, com isso, Caim tentou desafiar a sua sentença (Gn 4.12-14, 17). Também, a dependência infeliz de Ló da vida urbana aparece em vários capítulos posterio res como uma contraposição ao tema do chamado de Abraão para ser um peregrino. O caso é que o “nome” que os construtores buscavam para si mesmos na verdade esta va reservado para o novo personagem da narrativa; é Abraão quem recebe a promessa de um “grande nome” na ocasião em que foi chamado a deixar sua cidade natal e rumar para uma vida incerta na terra de Canaã. Assim, Gênesis 11.1-9 prepara o caminho para a dissociação e para um recomeço com Abraão, o ancestral do povo judeu (Gn 12.1). Ao mesmo tempo, a localização da narrativa de Babel depois da Lista das Nações em Gênesis 10, na qual a Ba bilônia / Babel já é mencionada (Gn 10.10), tem o efeito de tomar a divisão da humanidade em povos e línguas diferentes um acontecimento natural depois do dilúvio (“e destes foram disseminadas as nações na terra”, Gn 10.32). Ao organizar seus textos dessa forma, o escritor de Gênesis toma, portanto, a divisão étnica e lingüística do mundo algo mais primordial e não apenas uma conseqüência do julgamento divino, o que poderia, do contrário, ser o caso. (-> Gênesis: Teologia) 3. Alguns escritores encontram em Sofonias 3.9 — em que o profeta fala sobre De purificar os lábios das nações para que possam servi-lo — uma inversão do tema de Babel, mas os termos da referência não são suficientes para corroborar tal explicação. P-B Josefo (Ant. 1.109-10) faz uma associação muito próxima da história de Babel com a tra dição do dilúvio, o que explica seu comentário sobre a falta de disposição de alguns descendentes de Noé de descer das regiões montanhosas depois do dilúvio. O uso de betume na construção da torre visava tomá-la impermeável, como se os construtores estivessem desafiando o julgamento anterior. Assim, a interpretação que Josefo apresenta para Gênesis 11 é um exemplo interessante de “interpretação holística” dentro da história primitiva de Gênesis e é sugestiva tanto para a temática quanto para a teologia desses capítulos, quando estes são lidos como um todo. B ib l io g r a f ia
H. Bost, Babel. Du Text au symbole, 1985; J. P. Fokkelman, Narrative Art in Genesis, 1975, 11 -45; A. Garcia Santos, “Gn 11,1-9: crítica literaria y de la redacción”, EstBib 47, 1989,289318; F. E. Greenspahn, “A Mesopotamian Proverb and Its Biblical Reverberations”, JA OS 114, 1994, 33-38; R. B. Laurin, “The Tower o f Babel Revisited”, in G. A. Tutlle (ed.), Biblical and Near Eastem Studies (Fs W. S. LaSor), 1978, 142-45; J. M. Sasson, “The ‘Tower o f Babel’ as a Clue to the Redactional Structuring o f the Primeval History (Gen 1-11:9)”, in G. Rendsburg et al. (eds.), The Bible World(Fs C. H. Gordon), 1980, 211-19; K. Seybold, “Der Turmbau zu Babel: Zur Entstehung von Genesis XI 1-9”, V T 2 6 ,1976,453-79; W. von Soden, “Etemenanki vor Asarhaddon nach der Erzãhlung vom Turmbau zu Babel und dem Erra-Mythos”, UF 3, 1971,253-63 (= idem, Bibel und Alter Orient, 1985, 134-47); J. A. Soggin, “Der Turmbau zu Babel”, in R. Liwak and S. Wagner (eds.), Prophetie undgeschichtliche Wirklichkeit im alten Israel (Fs S. Herrmann), 1991, 371-75. Robert P. Gordon
Babilônia
Babilônia (Vaa [bãbel], Babel, Babilônia, #951).
Babilônia é o nome da antiga capital, nação e povo no rio Eufrates (a 50 quilômetros de Bagdá, no Iraque) que confrontaram Jerusalém e deram fim ao Estado de Judá. 425
Babilônia
1. A cidade de BabeI (->), Babilônia (262x; no acad. babil, possivelmente do sumério babilla, “porta [residência] dos deuses”, bãb-ilT). A tradição mais antiga do AT indica que esse foi um dos primeiros lugares de onde saíram imigrantes para o Norte a fim de fundar a Assíria (Gn 10.10-11). O nome aparece pela primeira vez em textos de c. 2400 a. C. 2. A nação. A Babilônia era cortada pelo rio Eufrates e localizada na Mesopotâmia, ao sul de onde os rios Eufrates e Tigre se aproximam um do outro. A região ao redor, conhecida como Babilônia, desenvolveu-se principalmente na Idade Antiga Babilônica, tempo dos pa triarcas bíblicos e na Idade Neobabilônica, tempo de Jeremias, Daniel e Ezequiel. Na Idade Antiga Babilônica, a nação desenvolveu-se com governantes fortes e inde pendentes que controlaram e assimilaram os seminômades amorreus e impediram o avanço de inimigos fortes do Norte (Assíria) e Leste (elamitas e cassitas). O rei mais conhecido dessa época foi Hamurábi (1792-1750 a. C.), que reconstruiu várias cidades e templos. Quando seu reinado chegou ao fim, haviam conquistado todos os seus antigos aliados, inclusive Larsa ao sul e Mari a noroeste. Hamurábi é mais conhecido por seu Código, a coleção mais ampla de leis da Mesopotâmia. Na verdade, não se trata de um código, mas sim de uma coleção de mais de 250 casos relatados ao deus Xamache. Na Idade Média Babilônica, Nabucodonosor I (1125-1104 a. C.) promoveu o deus babilônio Marduque (na Bíblia, Merodaque) à posição mais elevada do panteão. Recuperou a estátua do deus que se encontrava em Susã, para onde havia sido levada pelos elamitas em 1160. Posteriormente, a Babilônia passou a ser controlada por reis assírios. Tiglate-Pileser III (745-727a. C.) declarou-se rei da Babilônia e reinou como Pul I em 738 a. C. (lC r 5.26). Seu sucessor, Senaqueribe, saqueou a Babilônia em 648 a. C. e incitou o ódio dos cidadãos que seu sucessor, Esaradom, não foi bem-sucedido em acalmar a população. Conforme a indicação de textos assírios, provavelmente foi nessa época que Manassés, rei de Judá, foi deportado para a Babilônia (2Cr 33.11). No primeiro milênio a. C., os caldeus (bab. kaldu) adquiriram proeminência na “Ter ra do Mar” na região sul de Mesopotâmia, no alto do golfo Pérsico. A dinastia neobabilônia (caldéia) foi fundada em 626 a. C. por Nabopolasar, pai de Nabucodonosor II. Depois que os caldeus e medos saquearam Nínive, a capital assíria em 612 a. C., Nabucodonosor II (605-562) tomou à força toda a região siro-palestina, o que levou a um confronto direto da Babilônia com Judá. E bem provável que tenha sido nas primeiras campanhas de Nabucodonosor, talvez em 603, que Daniel e outros jovens reféns judeus foram levados para a Babilônia (Dn 1.1-4). O conflito entre babilônios e egípcios em 601 pode ter influenciado Jeoaquim a se rebelar contra os babilônios (2Rs 24.1), indo contra o conselho de Jeremias. Seguiu-se o primeiro ataque a Jerusalém e a cidade foi tomada em 16 de março de 597 e saqueada dez anos mais tarde, de pois de outra rebelião dos judeus. A maioria das referências à Babilônia no AT é relativa a esses acontecimentos históricos e ao exílio subseqüente nessa terra estrangeira. Em outubro de 539, os persas comandados por Ciro tomaram a Babilônia e permitiram que os judeus voltassem a Judá para reconstruir Jerusalém. E possível que o enigmático “Dario, o meda” (Dn 6.28 [29]) seja um título de Ciro (ver Wiseman, 1965). 3. Observações teológicas. a. A Babilônia no Pentateuco. A introdução ao AT heb. contém o episódio da Torre Babel. A construção da cidade com sua torre escalonada (zigurate, uma forma arquitetônica exclusiva da Babilônia) foi interrompida pela intervenção divina (Gn 11.1-9). Essa medida foi considerada um sinal do desprazer de Deus com a arrogância do povo como um todo. Seu orgulho e preocupação com a perpetuação de seu nome (que levaram à rebelião contra Deus), foi seguido de julgamento, dispersão e confusão. A história é usada para explicar o nome Ba 426
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bel por um trocadilho ou paronomásia, não como uma etimologia, mas como uma referência à forma secundária bll, confundir, misturar, embaralhar, perturbar (Gn 11.9). Também é interessante observar que esse mesmo episódio serve para introduzir a linha gem de Sem (“o nome”), chegando até Abrão (Gn 11.1-31), sob o qual os males da Babilônia começam a ser frustrados e o nome de Deus passa a ser cada vez mais revelado. A história de Babel não apresenta datas precisas, mas elementos semelhantes foram encontrados na literatu ra acad. antiga do segundo milênio a. C. — daí a confusão das línguas (Enmerkar) e a recusa da humanidade em adorar os deuses (Atraase). Essa história, juntamente com a cosmologia, a forma literária e as referências culturais, significa que esse conceito não pode ser facilmente descartado como uma criação pós-exílio. A reversão do estrago causado pelo povo de Babel toma-se. ainda, um tema do NT em Pentecostes (At 2.5-13). b. A Babilônia nos escritos dos profetas. Além das diversas alusões a acontecimen históricos contemporâneos, o AT traz várias previsões sobre o destino da Babilônia. Apesar de muitos estudiosos interpretarem essas profecias como tendo sido escritas na era posterior ao exílio ou mesmo depois da queda da Babilônia para Xerxes, em 482 a. C., não há bases para uma data tão avançada. Dentre as referências à Babilônia nos profetas, pode-se citar a repreensão de Ezequias por Isaías (Is 39.1 -8) por ter recebido com todas as honras a delegação enviada da Babilônia por Merodaque-Baladã no final do século VIII. Os tesouros de Judá revelados nessa ocasião seriam levados para a Babilônia juntamente com alguns dos descendentes de Ezequias (Is 39.7-8). Um contemporâneo de Isaías, o profeta Miquéias (Mq 4.10) garantiu aos judeus que apesar de serem levados para a Babilônia, certamente também seriam resgatados (cf. Is 47— 49). A Babilônia, jóia dos reinos (Is 13.19) e, no entanto, vara dos perversos usada por Deus para castigar seu próprio povo (Is 14.5; cf. Assíria, 10.4), apesar de constituir um instru mento do Deus de Judá, se transformaria em ruínas desabitadas (Is 13.20) e a reputação dela (posteridade) seria exterminada (Is 14.22-23). Os agentes dessa destruição seriam os medos, inimigos vindos do Norte, assim como os assírios haviam sido suscitados contra Jerusalém (Is 13.17). Os medos eram uma potência em ascensão no tempo de Isaías e o exílio era um con ceito e prática em voga há muito tempo. E preciso estudar o contexto cultural da profecia e seu cumprimento antes de descartá-la, taxando-a de gênero literário, como fazem muitos estudiosos ao considerá-la simplesmente uma projeção de acontecimentos na forma de profecia. Jeremias também profetizou que Jerusalém e Judá seriam destruídas e que seus ha bitantes seriam levados para a Babilônia (Jr 20.4-6; 32.28), como o fez Ezequiel (Ez 12.13). Jeremias afirmou que o exílio iria durar setenta anos (Jr 25.11-12) e que, por fim, os judeus teriam permissão de regressar, o que de fato ocorreu depois de 538 a. C. Em 595, Jeremias (Jr 27.19—28.17) havia atacado energicamente o profeta Hananias por este haver prenunciado falsamente que os utensílios do templo não tardariam em ser trazidos de volta da Babilônia. O próprio Jeremias enviou uma carta (cap. 29) incentivando os exilados a se assentarem na Ba bilônia, mas prometeu que seriam restaurados a Judá (cap. 30). Apesar de a Babilônia ter sido usada por Deus para disciplinar Judá, essa mesma nação, bem como seus deuses, seria julgada com severidade (caps. 50— 51; cf. Is 13— 14). Pouco antes de sua humilhação com um surto temporário de loucura, Nabucodonosor se vangloriou dizendo: “Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a casa real, com o meu grandioso poder e para glória da minha majestade?” (Dn 4.30). De fato, Nabucodonosor transformou a Babilônia na maior cidade da antigüidade, compreendendo uma região de mais de 2000 acres. Seus muros, portas, fossos e construções magníficas foram descritos por Heródoto no século V a. C. e escavados pelo arquiteto alemão Robert Koldewey (1899-1913). Por causa do nível do lençol freático, os pesquisadores nor malmente não conseguem ir além dos níveis neobabilônicos. 427
Babilônia
4. A Babilônia mais recente. Em 331 a. C., Alexandre, o Grande, foi recebido de bra ços abertos na Babilônia, como aquele que a libertou dos persas; e foi ali que ele faleceu em 323. Durante o reinado de seu sucessor, Seleuco, a prosperidade da Babilônia foi afetada negativamente pela fundação de uma nova capital na Selêucia, às margens do rio Tigre. Um pequeno povoado permaneceu na Babilônia e o documento cuneiforme mais recente desse local é do d. C. 110. E possível que a referência em 1 Pedro 5.13, “Aquela que se encontra em Babilônia”, seja à igreja nesse local, mas não há provas suficientes disso. Para Manley, trata-se de uma referência a um assentamento militar no Egito conhecido como Babilônia. A maioria dos estudiosos considera que todas as referências do NT à Babilônia são alusões simbólicas a Roma. Incentivados pelo renascimento que o presidente iraquiano Saddam Husseim promo veu da Babilônia como local turístico, alguns estudiosos (Dyer, 1987, 1991) afirmam que a Babilônia voltará a levantar-se como inimiga do povo de Deus. No entanto, não há indicação alguma no AT, NT ou em nenhum acontecimento histórico presente de que a Babilônia será ou pode ser restaurada. No livro de Apocalipse, faz-se referência à cidade de modo simbólico, e esta é interpretada como Roma ou qualquer potência que demonstre uma atitude contrária a Deus (Ap 18.10). A ênfase é dada sempre ao modo pelo qual a Babilônia será condenada, e cairá de súbito (Ap 14.18; 17.5; 18.2, 10, 21). Em 200 d. C., o local onde ficava a Babilônia não passava de ruínas, conforme as profecias do AT haviam predito (ls 13.19-22; Jr 50.13, 2326, 39; 51.24-26). Apesar de Benjamim de Tudela, um judeu da Espanha, ter identificado cor retamente no século XII os escombros próximos a Hilá como o local onde ficava a Babilônia, seu diário só foi publicado em 1543. B ib l io g r a f ia
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# 5272 (marbêq, baia de gado)
Balaão, Oráculos de
Balaâo, Oráculos de
Balaão (□V'?3 [hilam], 3 1189); Oráculos de.
A história de Balaque e Balaão em Números 22—24 apresenta sete oráculos de Ba laão: (1) 23.7-10; (2) 23.18-24; (3) 24.3-9; (4) 24.15-19; (5) 24.20; (6) 24.21 -22; (7) 24.23-24. Apesar de a erudição crítica atribuir diferentes partes tanto da história quanto dos oráculos de Balaão a fontes e datas díspares, (p. ex., de Vaux, Rouillard), nas últimas décadas a idéia da unidade literária da perícope como um todo (Alter) e à aceitação tanto da antigüidade dos orá culos (Albright e sua escola) quanto da historicidade de Balaão como um adivinhador arameu antigo voltou a ganhar força (Wolters, Lemaire). (-> Números: Teologia) Apesar de a série de oráculos encerrar-se com três proclamações espontâneas de jul gamento a nações estrangeiras, começa com três profecias mais longas, oficialmente comis sionadas e encenadas de modo formal, não anunciando maldições, mas sim bênçãos cada vez maiores para o povo de Israel e enfatizando especialmente seu sucesso militar. Então, depois de Balaque zangar-se e mandar Balaão embora, as bênçãos chegam ao apogeu com o quarto oráculo que ocupa a posição central: “uma estrela procederá de Jacó, de Israel subirá um cetro que ferirá as têmporas de Moabe e destruirá todos os filhos de Sete” (Nm 24.17). Nas palavras de Moisés: “Porém o Senhor, teu Deus, não quis ouvir a Balaâo; antes, trocou em bênção a maldição, porquanto o Senhor, teu Deus, te amava” (Dt 23.5 [6]; cf. Ne 13.2). Nas tramas hostis de Balaque, e por meio delas, Deus abençoa seu povo e a bênção é o sinal do relacionamento de amor entre Deus e aqueles que são abençoados (Mitchell). Essa é a principal implicação teológica desses oráculos. A fim de dar o devido valor a esse significado, devemos considerar os oráculos dentro de uma série de contextos concêntricos. Dentro do contexto de Números 22—24, os oráculos demonstram a proteção soberana de Deus sobre seu povo contra um ataque espiritual plane jado, sendo que o próprio povo nem sequer tem consciência desse ataque e nada pode fazer para impedi-lo. No contexto do livro de Números como um todo, os oráculos indicam a volta dramáti ca do favor de Deus depois de castigar a geração infiel com os quarenta anos de marcha pelo deserto (cf. Olson). Dentro do contexto de todo o Pent., os oráculos reafirmam e ampliam as promessas patriarcais quando Israel está prestes a entrar em Canaã. Como um prelúdio de trombetas antes de levantaram-se as cortinas, são proclamadas novas promessas exatamente quando o “tema do Pentateuco” se aproxima de seu cumprimento (cf. Clines). Dentro do AT em sua totalidade, os oráculos representam a promessa não apenas de prosperidade nacional e supremacia militar, mas, especificamente, de um grande e poderoso rei, uma promessa que, a princípio cumpriu-se em Davi e sua conquista das nações vizinhas (2Sm 8.1-14), mas que apontava para o futuro, para o rei messiânico vindouro que seria fi lho de Davi. Essa visão messiânica da “estrela” prometida já se reflete nos três Trgs. jud. do quarto oráculo. No contexto de toda a história da revelação, os oráculos são especialmente significa tivos por proclamarem Jesus Cristo e sua soberania universal sobre todas as nações. Essa in terpretação está de acordo tanto com a visão tradicional dos oráculos quanto com a exegese unânime da igreja primitiva, e é possível que se faça referência à mesma no próprio NT (cf. Ap 22.16). As bênçãos prometidas nos oráculos passam a aplicar-se à igreja de Cristo, a nova Israel, principalmente quando esta se encontra em meio a batalhas espirituais (Ef 6). Porém, a mensagem dos oráculos de Balaão também se aplica de modo direto e literal a declarações como esta: “Pois contra Jacó não vale encantamento, nem adivinhação contra Israel” (Nm 429
Baruque
23.23). Os poderes demoníacos não podem prevalecer contra a proteção soberana de Deus sobre seu povo escolhido. B ib l io g r a f ia
W. Albright, “The Oracles of Balaam”, JBL 63, 1944, 207-33; R. Alter, The Art o f Biblical Narrative, 1981, 104-7; D. J. A. Clines, The Theme o f the Pentateuch, 1979; J. de Vaux, Les nombres, 1972, 255-98; A. Lemaire, “Bala’am/Bela’ fils de Be’or”, ZAW 102, 1990, 180-87; C. W. Mitchell, The Meaning o f BRK "To Bless " in the Old Testament, 1987; D. T. Olson, The Death o f the Old and the Birth o f the New, 1985, 153-64; H. Rouillard, La péricope de Balaam (Nombres 22-24): La prose et les "oracles”, 1985; G. J. Wenham, Numbers, 1981, 164-84; A. Wolters, ‘T he Balaamites o f Deir ‘Alia as Aramean Deportees”, HUCA 59, 1988, 101-13. Al Wolters Balanço
# 5653 (mvd, sacudir, vagar, fugir)
Bálsamo -> # 7661 ($°ri / $eri, bálsamo, resina) Baluarte
# 1307 (bçr III, ser inacessível)
Banimento -> # 5615 (ndh I, banir, ser dispersado, ser expulso) Barba -> #2417 (zãqãn, barba)
Baruque
Baruque (^ 1 3 \barük\, # 1358).
Baruque, filho de Nerias era um escriba, companheiro de longa data e amanuense de Jeremias (->), que menciona Baruque em seu livro (Jr 32, 36, 43 e 45). Josefo sugere que Baruque era de uma família nobre (Ant X.9.1) e que foi para o Egito com Jeremias (Ant. X.9.6). As tradições quanto à morte de Baruque são contraditórias (p. ex., Jerônimo, referindo-se a Is 30.6, diz que Baruque morreu no Egito; outros dizem que ele foi à Babilônia). O fato de o irmão de Baruque, Seraías, ter sido “camareiro-mor” do rei Zedequias (Jr 51.59) indica que o próprio Baruque era um homem de certa importância, o que é ressaltado pelo fato de vários apocalipses posteriores terem sido escritos no nome dele (p. ex. O Apocalipse de Baruque [2 Baruque]; ver Charlesworth, 1:615-79). A estampa de um selo descoberta num arquivo real diz: “Pertencente a Berequias (o nome mais longo de “Baruque”), filho de Nerias o escriba” (Avigad). Outras pessoas com o mesmo nome (que significa “ser abençoado”) estão relacionadas em Neemias 3.20; 10.6; 11.5. Baruque — provavelmente um escriba profissional num “tempo de muitos escribas” (Muilenberg, 217) — registrou em rolos as palavras ditadas por Jeremias (Jr 36.4,17,18; 45.1). Seguindo uma ordem de Jeremias, Baruque leu essas palavras no átrio do templo durante a observância de um jejum (dezembro de 605 a. C.; 601 a. C., de acordo com a interpretação da LXX de Jr 43.9 do TM 36.9) e novamente na “câmara” de Gemarias. Este era da família de Satã e, como os filhos de Nerias, também possuía a vocação de escriba, o qual podia ser tanto a escrita quanto a interpretação (Deraman). É possível que o rolo de Baruque tivesse o colofão habitual dos escribas (que agora se encontra no cap. 45, de acordo com Lundbom, 100). Jeoaquim, para o qual as palavras do profeta foram lidas, ateou fogo ao rolo e ordenou que 430
Belém
Jeremias e Baruque fossem presos. Jeremias ditou sua mensagem outra vez e esta foi registrada num segundo rolo juntamente com textos adicionais (Jr 36.32). As tentativas de determinar-se o conteúdo do primeiro rolo não foram conclusivas; é possível que o rolo contivesse parte do texto atual de Jeremias 1.1—25.12. Baruque testemunhou e registrou a compra que Jeremias fez de um pedaço de terra a seus antepassados (Jr 32). Ao que parece, exerceu alguma influência sobre Jeremias (Jr 43.3). Num raro oráculo pessoal de salvação (cf., porém, Jr 39.16-18) e Schulte), Jeremias exortou Baruque a refrear as ambições pessoais (ou, de acordo com Schulte, deixar de pedir um “gran de” livramento para Jerusalém) e garantiu-lhe que havia dores mais profundas que a dele e que sua vida seria poupada (Jr 45). Baruque sobreviveu à queda de Jerusalém (587 a. C.) e acom panhou Jeremias até o Egito, assentando-se em Tafnes (Jr 43.1-7). Assim como Jeremias, Baruque é considerado por alguns como uma figura histórica e, por outros, como um personagem fictício, “uma criação deuteronômica” (Carrol, 151). W. Bruggemann propôs que Baruque seja visto não apenas como uma pessoa histórica, mas tam bém como representante de certos interesses ideológicos (p. ex., a coerência dos desígnios de Javé e da política babilônia); desse modo seria possível que os partidários de Baruque tivessem influenciado de forma considerável a redação e edição do livro de Jeremias. B ib l io g r a f ia
N. Avigad, “Baruch the Scribe and Jerahmeel the King’s Son”, IEJ 28, 1978, 52-56 (Repr. BA 42, 1979, 114-18); W. Brueggemann, “The ‘Baruche Connection’: Refiection on Jer 43:1-7”, JBL 113/3, 1994, 405-20; R. P. Carroll, From Chaos to Covenant: Prophecy in the Book o f Jeremiah, 1981, 5-30, 150-53; J. H. Charlesworth, ed., The Old Testament Pseudepigrapha, 1983; J. A. Dearman, “My Servants the Scribes: Composition and Context in Jeremiah 36”, JBL 109,1990, 403-21; W. Holladay, Jeremiah 2, Hermenéia, 1989; J. R. Lundbom, “Baruch, Seraiah, and Expanded Colophons in the Book o f Jeremiah”, JSO T 36, 1986, 89-114; J. Muilenberg, “Baruch the Scribe”, in Proclamation and Presence, FS for G. H. Davies, ed. by J. I Durham and J. R. Porter, 1970, 215-38; H. Schulte, “Baruch und Ebedmelech— Persõnliche Heilsorakel im Jeremiabuche”, BZ 32/2, 1988, 257-65. Elmer A. Martens Baruque, (Livro de) -> Apócrifos Bebedeira -> # 8910 (skr, estar bêbado) Bebida -> # 9272 (sth II, beber) Beijo -¥ # 5975 (nsq I, beijar) Bel e o dragão
Apócrifos
Belém
Belém (0nVn, 3 [bêt lehem], # 1107).
AT 1. Esse topônimo, que provavelmente significa casa do pão (ou do alimento), refere-se à cidade que fica cerca de nove quilômetros de Jerusalém, no território de Judá (Js 15.59 LXX). Lá moraram Noemi e Rute (Rt 1.19, etc.), e foi o local onde nasceu e foi ungido por Samuel o 431
Berseba
descendente de Rute, o rei Davi (c. 1000-961 a. C., ISm 16.4-13; 17.12). Também é chamada de Efrata, e seus habitantes, efrateus (ver Rt 1.2; 4.11; ISm 17.12; Mq 5.2 [1]). É possível que, em parte, esse outro nome seja para distingui-la de Belém em Zebulom (Js 19.15; ver também bêt lehem y^hudâ [“Belém de Judá]” em Rt 1.1-2) e talvez seja vestígio de um nome mais an tigo do lugar (ver Gn 35.16, 19; porém, ver também ISm 10.2, para outro possível local do sepultamento de Raquel — e Gn 48.7) ou de suas cercanias (SI 132.6). Diz-se, por vezes, que o nome aparece nas cartas de Amarna do príncipe Abdi-Heba de Jerusalém, contando a Faraó da deserção de Bit-lahmi para os 'apiru. No entanto, talvez a escrita cuneiforme possa ser mais bem interpretada como Bit (ilu) NINURTA. Em Juizes 12.8, 10, Belém é a cidade natal do juiz Ibsã. Mais adiante no livro de Juizes, ela aparece como ci dade natal de um levita sem terras e da concubina de outro levita (Jz 17.7-9; 19.1), sendo que a morte dessa concubina foi a causa de uma guerra civil e do massacre em Gibeá. De acordo com 1 Crônicas 2.51, 54; 4.4, os belemitas eram parentes de Calebe. 2. Havia uma guarnição filistéia em Belém (2Sm 23.14-16) na época em que a cidade também era relacionada a alguns dos trinta valentes de Davi (2Sm 23.24; cf. 2.32). É possível que Elanã, identificado como filho de Jaaré-Oregim, o belemita de 2 Samuel 21.19 e como aquele que matou Golias, seja o nome original heb. de Davi (um título amorreu que significa “líder”), uma vez que Jessé e Jaaré podem ser facilmente confundidos na escrita heb. (ver R. R Gordon, 1 & II Samuel, 302-3). A cidade foi fortificada por Roboão (2Cr 11.6 ) e, posterior mente, seus habitantes fugiram dos babilônios (Jr 41.17) e foram para o exílio, de onde de 120 a 130 deles voltaram (Ed 2.21; Ne 7.26). 3. O profeta Miquéias (Mq 5.2 [1]) viu Belém como o lugar de nascimento de um fu turo libertador real (como era apropriado para a cidade de Davi). Em João 7.40-42, encontra mos evidência de uma crença jud. contemporânea de que o Messias viria de Belém (de acordo também com o Trg. de Mq 5.2 [1]). Mateus (2.6) junta as palavras de Miquéias com 2 Samuel 5.2 (“O Guia [Davi] que há de apascentar o meu povo, Israel”) empregando-as num contexto especialmente adequado, pois Miquéias prossegue dizendo, “até ao tempo em que a que está em dores tiver dado à luz” (Mq 5.3 [2]). Ainda que nessa ocasião Mateus não o tenha dito, as Escrituras haviam-se cumprido. B ib l io g r a f ia
F. M. Abel, Géographie de la Palestine, 1933-38; Y. Aharoni, The Land o f the Bible, 1966; 1. Finkelstein, The Archaeology o f the Israelite Settlement, 1988; G. A. Smith, The Historical Geography o f the Holy Land, 1904. P. J. M. Southwell Beleza
# 3636 (yph, tomar-se formoso, belo, adornar)
Beliscada -> #4916 (mlq, beliscar) Bem-aventurança
# 897 ( 'asré, verdadeiramente feliz/abençoado, abençoado)
Berseba
Berseba (y3tfhN3 [be er seb a'], # 937).
1. Berseba, uma cidade que fica aproximadamente em meio do caminho entre o m Mediterrâneo e a extremidade sul do mar Morto, ocupou uma posição de destaque na vida dos 432
Berseba
três grandes patriarcas. Abraão, Isaque e Jacó viveram lá por longos períodos. Abraão fundou um centro de adoração em Berseba (Gn 21.33). Foi lá que Esaú vendeu a Jacó seus direitos de primogenitura e foi de lá que Jacó partiu para sua jornada rumo à Mesopotâmia, onde nasce ram quase todos os progenitores das tribos de Israel. Jacó parou em Berseba para oferecer um sacrifício “ao Deus de Isaque, seu pai” (Gn 46.1), quando passou por lá a caminho do Egito, e foi nesse local que Deus apareceu a Jacó numa revelação direta para prometer-lhe cuidado providencial para sua família como um todo enquanto estivessem no Egito e predizer o futuro êxodo da terra do Egito. O nome do lugar vem de uma aliança feita entre Abraão e Abimeleque de Gerar, ao re solverem uma disputa sobre poços da região. O nome “Berseba” significa “poço dos sete” (dos sete animais — cordeiras — que Abraão deu a Abimeleque como sinal de que os poços perten ciam a Abraão) ou “poço do juramento” (Gn 21.28-31). Posteriormente, Isaque e Abimeleque entraram numa contenda semelhante, que também foi resolvida em favor dos hebreus, tendo como resultado que “Berseba é o nome daquela cidade até ao dia de hoje” (Gn 26.33). 2. Desde o início, Berseba ficou conhecida como a extremidade sul do território de Is rael, assim como Dã situava-se ao norte (Jz 2.1), e foi de maneira semelhante que se calcularam as fronteiras do reino de Saul e Davi (2Sm 3.10). A cidade manteve a importância ao longo de toda história hebraica. Os filhos de Samuel julgaram lá, no tempo dos juizes (ISm 8.2). E Davi (2Sm 24.7) e Salomão ( I Rs 4.24) mantiveram-na como centro administrativo. O rei Ezequias, no século VIII (2Cr 30.5), e Josias, no século VII (2Rs 23.8), deram-lhe particular atenção, e, no período após o exílio, uma população de judeus voltou a residir na cidade (Ne 11.27-30). 3. Tel-Berseba (Tell es-Saba), cerca de oito quilômetros da cidade moderna de Berseba, foi identificada por muitos como o local da Berseba bíblica. Lá, Yohan Aharoni, da Universi dade de Telavive, realizou escavações de 1969 a 1976. A cidade parece ter sido colonizada no século XII ou XI, e é provável que tenha sido nessa vila sem muros que os filhos de Samuel julgaram (ISm 8.2). A cidade foi fortificada no século X, evidentemente no tempo de Salo mão. Posteriormente, ainda no século X, a vila sofreu uma grande destruição, o que pode ter acontecido por ordem de Faraó Sisaque, a qual se repetiu depois, durante a invasão assíria sob o comando de Senaqueribe, por volta de 700 a. C. Nos últimos anos, o fato de Tel Berseba não ter sido habitada antes do século XII levou alguns críticos a duvidarem da veracidade das referências de Gênesis a esse local e, até mes mo, da existência de um período patriarcal. No entanto, tais conclusões radicais não parecem ter fundamento. O próprio Aharoni acreditava que a Berseba do tempo dos patriarcas ficava em Bir es-Saba‘, na região da Berseba modema e que a maioria dos habitantes havia sempre vivido próximo aos vales e poços (EAEHL, 1:168). N. Na’aman tem essa mesma convicção (New Encyclopedia o f Archeological Excavalions in the Holy Land, 1:168). Do ponto de vista teológico, é particularmente interessante que, além de Deus revelar-se em Berseba, conforme comentado acima, descobriu-se lá um altar com chifres na área aberta da porta de Tel Berseba. Os habitantes de Judá instituíram “altos” para competir com o santuário central de Jerusalém no tempo do reino dividido. Ao que parece, houve um santuário assim em Berseba nos dias de Amós, durante o século VIII a. C. (Am 5.5; 8.14), sendo que, durante sua reforma, Josias deu fim a esses lugares altos, inclusive ao que ficava em Berseba (2Rs 23.8). B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, EAEHL 1, 153-68; Z. Herzog, NEAEHL 1:167-73; ISBE 1:448-51; K. Schovelle, Biblical Archaeology in Focus, 1978, 315-21. Howard F. Vos 433
Betei
Betei
Betei
fàrn’3 [bêt-êí], #
1078)
AT 1. Betei significa “casa de Deus” ou “casa de El”. Identificada com a cidade de Luz (Gn 28.19; 35.6; ver também Js 16.2), também era um santuário, o que possivelmente é suge rido pelo termo mãqôm, lugar, em Gênesis 28.19. Foi onde Jacó teve sua visão quando estava a caminho de Padã-Arã (Gn 28.11 -22), o que deu origem não apenas ao nome do lugar em si, mas também ao nome divino ’êl b êt-’êl, o Deus de Betei (Gn 31.12; 35.7). Oséias (Os 12.5) tinha conhecimento desse episódio e na opinião de Amós, o santuário de lá rivalizava com o de Jerusalém (Am 5.4-5). Situava-se em Efraim, provavelmente na moderna Beitin, cerca de dezoito quilômetros ao norte de Jerusalém, na fronteira com Benjamim (ver Kelso, 1:190-93). A arqueologia con firma que Betei foi parcialmente destruída e reocupada duas vezes no século XII a. C., sendo a primeira vez uma possível recaptura pelos cananeus da cidade que, antes disso, havia sido tomada por Josué (ver Js 8 , em que a relativa passividade de Betei, com exceção do v. 17, du rante o ataque sobre Ai (->), pode indicar uma rendição anterior sem nenhum conflito, apesar de uma tradição diferente relatar a execução do rei de Betei: Js 12.16). A segunda ocupação deve ser aquela a que se refere Juizes 1.22-26, em que lemos que Betei foi tomada pelos he breus (“a casa de José”), durante a conquista de Canaã. Alguns comentaristas acreditam que a narrativa de Josué 8 faça confusão entre Ai e Betei, mas isso é pouco provável. 2. Entre outros lugares, a arca da aliança foi colocada em Betei depois da conquista (Jz 20.18-28) e, durante o tempo de Samuel, o santuário da cidade prosperou, sendo visitado pelo profeta num circuito que ele percorria todos os anos julgando o povo, e que incluía ainda Gilgal e Mispa (1 Sm 7.16; 10.3). Betei perdeu parte do prestígio quando Davi declarou Jerusalém capital e santuário, mas foi reavivada sob Jeroboão I (c. 931-910), que colocou lá (e em Dã) um bezerro de ouro (lR s 12.28-30) como objeto de adoração, supostamente com a intenção de que Betei rivalizasse com o templo de Salomão em Jerusalém, ao dar ao culto de Javé, em Betei, um ar sincrético. Ao que parece, por esse motivo, Oséias (esp. 10.5) chama o santuário de bêl 'ãwen, casa de iniqüidade. 3. Tomada de Jeroboão por Abias, rei de Judá (915-913,2Cr 13.19), a cidade tomou-se um centro de “discípulos dos profetas” (2Rs 2.3), provocando talvez a oposição local a Eliseu (v. 23). Durante o governo assírio em Israel, Betei foi o centro de instrução religiosa dos colo nos assírios na terra (2Rs 17.28); porém, posteriormente, o santuário foi destruído por Josias (c. 621 a. C.), aparentemente cumprindo uma profecia (2Rs 23.15-18), apesar de a cidade em si não ter sido destruída nem por Josias nem por Nabucodonosor. 4. No tempo de Esdras, depois de um possível incêndio ao final da era babilônia ou da era persa, Betei não passava de um vilarejo (Ed 2.28; Ne 11.31), mas foi fortificada por Báquides no século 11(1 Mac 9.50), com construções que ainda podem ser vistas. Os romanos capturaram-na durante a guerra com os judeus (69 d. C.) e, depois disso, a cidade foi reconstruída e prosperou até que a invasão muçulmana da Palestina acabasse com o domínio bizantino. 5. O nome Betei também é conhecido como um NG em Judá, próximo a Berseba e Ziclague (1 Sm 30.27; ver também Js 15.30 [LXX], 19.4; 1Cr 4.30). B i b l k x ;r a f i a
F. M. Abel, Géographie de la Palestine, 1933-38; I. Finkelstein, The Archaeology o f the Is raelite Settlement, 1988; J. L. Kelso, “Bethe”, EAEHL, 190-93; G. A. Smith, The Historical Geography o f the Holy Land, 1904; Y. Aharoni, The L a n d o f the Bible, 1966. P. J. M. Southwell 434
Bete-Seâ
Bete-Seã
Bete-Seã (TNÇftT’3 [bêt se an], # 1126).
AT 1. Bete-Seã pode significar casa de descanso ou, o que é preferível, templo de Seã, pois naquele local foi construído um templo para o deus-serpente sumério, Sahan. A importância dessa cidade antiga, situada na extremidade leste do vale de Jezreel, devia-se à proximidade do rio Jordão e do sistema de estradas do vale de Jezreel. A cidade guardava o tráfego no sentido leste-oeste, abrangendo os vaus do outro lado do Jordão e a estrada de Damasco que cortava a região no sentido norte-sul. A primeira ligava Gileade ao Egito e ao litoral fenício e a segunda, à Damasco. Depois delas, encontravam-se as principais vias que ligavam a Ásia à África. A ocupação desse local é praticamente contínua, desde o quarto milênio a. C. até os dias de hoje. No AT, Bete-Seã encontrava-se na grande colina de Tell el-huçn e nos tempos helenísticos (a partir do século III a. C.), a cidade espalhou-se para uma ampla área adjacente e passou a chamar-se Sitópolis. De 1921 a 1933, foram realizadas escavações em Tell el-huçn patrocinadas pelo Museu da Universidade da Pensilvânia. A cidade adjacente do tempo do Novo Testamento e da época bizantina vem sendo escavada desde 1986 sob a direção da Uni versidade Hebraica e do Departamento de Antigüidades de Israel. As evidências revelaram que Bete-Seã era uma típica cidade cananéia. Como tantas cidades em locais estratégicos, sofreu a conquista e o controle do Egito durante a Baixa Idade do Bronze (níveis IX-VI). A crescen te presença e o crescente poder dos filisteus em Canaã são atestados no nível V. Escavações do nível V (1200-1050 a. C.) revelaram templos identificados com os de Astarote e Dagom. Os templos do nível V e o grande número de objetos cultuais associados à adoração da deusa da fertilidade (bem como objetos cultuais de fertilidade de períodos anteriores) ajudam a do cumentar os cultos cananeus absolutamente imorais e justificar a ordem divina de destruir os devotos deles (Dt 20.17). 2. Ainda que ficasse no território de Issacar, Bete-Seã foi dada a Manassés (Js 17.11). Manassés não conseguiu tomar Bete-Seã, Ibleã e outras cidades estratégicas no vale de Jezreel (->) por causa da força militar superior destas cidades: “todos os cananeus que habitam na terra do vale têm carros de ferro, tanto os que estão em Bete-Seã e suas vilas como os que estão no vale de Jezreel” (v. 16; cf. Jz 1.27-28). A cidade também tem uma participação dramática na batalha travada perto dela, em Gilboa (1 Sm 28.4), onde Saul e Jônatas perderam a vida. Depois da batalha, os filisteus pendu raram os dois corpos no muro de Bete-Seã (1 Sm 31.10-13; 2Sm 21.12-14), colocaram a arma dura de Saul no templo de Astarote naquela cidade (1 Sm 31.10) e colocaram a cabeça de Saul no templo de Dagom (1 Cr 10.10). Lembrando-se da bondade de Saul (1 Cr 11.1 -11), os homens de Jabes-Gileade cruzaram o rio Jordão e tiraram os corpos de Saul e seus filhos para além dos muros da cidade, removendo desse modo a desgraça da casa de Saul (1 Sm 31.11-12). 3. No tempo do NT, era uma cidade helenística importante chamada Sitópolis e que pertencia a Decápolis. Era a única cidade de Decapólis a oeste do Jordão. Como cidade hele nística, enfraqueceu a fé supranaturalista do judaísmo tradicional. B ib l io g r a f ia
Excavations and Surveys in Israel 1987/88, 6:7-45; G. M. Fitzgerald, “Beth-shean”, Archaeology and OTStudy, 1967, 185-96; F. James, A. Kempinski, N. Tzori, “Beth-shean”, EAEHL 1:207-29; R. North, “Beth-Shan and Megiddo”, CBQ 12, 1950, 84-89; A. Rowe, The History and Topography o f Beth Shan, 1, 1930. Howard F. Vos 435
Bildade
Betume -> # 4109 (koper II, betume, asfalto)
Bildade
Bildade
[bildcid], # 1161).
OMA O nome Bildade é originário da tribo suíta (Gn 25.2; Jó 2.11). Documentos legais an tigos em acad. mencionam um certo Su-Dada, uma combinação do nome de sua tribo e parte do nome dele (ANET, 217). Ao que parece, trata-se de um nome aram., uma justaposição de Bil (Baal, Senhor) e Adade (Hadade, Dada). Tanto reis arameus quanto edomitas usavam essa designação (cf. Hadade, filho de Bedade [Gn 36.35] e Baal-Hanã [Gn 36.38]). Assim como seus outros dois amigos (Elifaz [->] e Zofar [->]) e Jó, Bildade era do Oriente. Ao falar dos horrores da morte aos quais estavam destinados os perversos, Bildade advertiu Jó sobre o que o esperava caso não se arrependesse e deixasse de se rebelar contra Deus. A referência feita por Bildade ao primogênito da morte é interpretada basicamente de duas maneiras. Em primeiro lugar, alguns acreditam que ele se utilize da mitologia cananéia, que possuía um deus inferior, o qual era vizir de Mote (o deus do reino dos mortos). Uma vez que no AT o termo “primogênito” refere-se muitas vezes a uma posição simplesmente, é pos sível que Jó 18.13 seja uma alusão a esse vizir que devora o homem perverso. Em segundo lugar, outros vêem aqui o próprio Mote (a Morte) que, em ugar. é chamado de filho de El e que possui um apetite voraz (cf. “cova” em Is 5.14; Ha. 2.5). De qualquer modo, sem dúvida o “rei dos terrores” (Jó 18.14) mencionado por Bildade é Mote (a Morte) que, com sua garganta engole todos os seres vivos ao colocar “Um dos lábios na terra e outro no céu” (ANET, 138; ver abaixo em NT).
AT 1. Como os outros supostos amigos de Jó, Bildade acreditava que o sofrimento de Jó era um castigo de Deus pelo pecado. Partindo desse pressuposto, cada um abordou Jó por um ângulo ligeiramente distinto. Bildade estava convencido de que Jó era iníquo desde o começo. Ofereceu-lhe alguma esperança caso Jó mudasse seus caminhos, mas nada sabia sobre a mise ricórdia e a graça (Jó 8 , 18). Bildade considerou Jó absolutamente irracional e ressentiu-se da atitude de Jó para com seus consoladores (Jó 18.3). Afinal, o mundo não girava em tomo de Jó (18.4). Para Bildade, Jó não compreendia a retribuição pelo pecado. Em termos teológicos, trata-se de uma doutrina importante da Bíblia, pois sem ela, não há necessidade de redenção. Mas Bildade equivocouse ao aplicar esse princípio a Jó. Mostrou arrogância com suposição de que sabia o motivo do sofrimento de Jó. Tomou seu erro teológico ainda maior ao não deixar espaço para o amor de Deus, seu poder redentor e sua graça para com os pecadores. O caráter de Bildade revela-se no breve discurso em Jó 25, em que procurou exaltar Deus ao responder a pergunta proposta por Jó em 9.2: “Como pode o homem ser justo para com Deus?” (cf. outra possível tradução de Jó 4.17 em EBC 4:895, 897). Bildade respondeu dizendo que o homem não passava de um gusano, de um verme! (Jó 25.6). Isso, porém, entrava em contradição com o fato de que Deus criou a humanidade à imagem dele e, apesar de essa imagem ter sido distorcida pelo pecado, todos ainda carregam consigo vestígios dela. Chamar o homem de verme é o mesmo que infamar o próprio Deus. Bildade não é mencionado em nenhuma outra passagem da Bíblia. 2. Os três amigos de Jó não falam do julgamento dos pecadores depois da morte, ma sim da sina desses pecadores nesta vida. A visão é simplista: o pecado causa sofrimento. Pode-se concluir ainda que o sofrimento de uma pessoa é diretamente proporcional ao pecado dela. Jesus 436
Bildade
contestou essa idéia em João 9, quando respondeu a pergunta sobre o cego de nascença: “Nem ele pecou, nem seus pais; mas foi para que se manifestem nele as obras de Deus” (Jo 9.3). Esse tema aparece em vários documentos extrabíblicos do período bíblico (cf. ANET, 405-7,434-38), mas somente o livro de Jó trata de modo profundo da questão do sofrimento do inocente. Cada um dos três conselheiros apelou a uma autoridade superior para apoiá-lo em con denar Jó. Elifaz valeu-se de uma revelação na forma de um sonho tão assustador que lhe fez arrepiar os cabelos do corpo (Jó 4.12-17). Em tal sonho, recebeu um oráculo que apresentava a pergunta penetrante: “Seria, porventura, o mortal justo diante de Deus?” (Jó 4.17). Bildade apelou para a tradição antiga (Jó 8 .8 ) e sua autoridade e Zofar fez o mesmo, firmando-se ainda na autoridade da “sabedoria”. Insinuaram que a sabedoria era um elemento que, infelizmente, faltava a Jó, pois havia se mostrado um homem estulto (Jó 11.5, 6 , 12). De acordo com esses conselheiros, a sabedoria tem como pré-requisito a obediência aos mandamentos de Deus. Este, por sua vez, recompensa aqueles que são tementes a ele com bênçãos materiais e saúde. Assim, os conselheiros mostraram-se defensores típicos da teologia da salvação material pelas boas obras. Ainda que cada um deles tivesse sua própria forma retórica de enfatizar tal ensinamento, os três concordaram com essa conclusão (ver D. J. A. Clines). Em seguida, somos confrontados com a questão importante da relação entre a sabe doria normal definida como “temer a Deus e guardar seus mandamentos” — conforme esta é apresentada nos salmos de sabedoria (cf. Sl 1, 37, 49, 111— 1 12, 127, 128, 133) e no livro de Provérbios, Jó 28.28 e nas palavras dos conselheiros de Jó — e uma anti-sabedoria, expressa da por Jó em sua ira e também pelo escritor do livro de Eclesiastes em meio à perplexidade. O segundo aspecto consiste na questão teológica de mais difícil compreensão na literatura bí blica de sabedoria, pois, é nele que a humanidade defronta-se com o mistério dos caminhos de Deus. Somente como sofredor inocente é que Jó — e qualquer outro servo do Senhor — foi capaz de começar a compreender o mistério da vontade de Deus. A obra do mais inocente dos sofredores, o Filho unigênito de Deus, oferece a única solução para o problema do mal, do so frimento e da morte. Por isso Paulo cita Isaías 25.8 em 1 Coríntios 15.54, 55. A morte, grande devoradora, é devorada pela vitória de Cristo na ressurreição. NT Há uma referência a Jó no NT (Tg 5.11), e Paulo cita a declaração de uma verdade gené rica do primeiro discurso de Elifaz: “Ele apanha os sábios na própria astúcia deles” (ICo 3.19; cf. Jó 5.13). A alusão em Romanos 11.35 vem do segundo discurso divino (Jó 41.11 [41.3]) e não proporciona nenhuma indicação sobre os conselheiros. P-B O Testamento deJó faz referência aos três conselheiros e Eliú; este último é conhecido na LR. Eliú;
Elifaz;
Zofar; -> Jó: Teologia
B ib l io g r a f ia
D. J. A. Clines, “The Arguments o f Job’s Three Friends”, Art and Rhetoríc in Biblical Litera ture, J. G. Davies, et al., eds., JSOT, 1982, 199-214; Y. Freund, “Were Job’s Friends Gentiles?” Jewish Bible Quarterly [Formerly Dor 1 e Dor] 18, 1989-1990, 107-10; W. Hulme, “Pastoral Counseling in the Book ofJob”, C J 15,1989,121-38; W. A. Irwin, “The First SpeechofBildad”, ZAW 51, 1953, 205-16; J. E. Miller, “The Vision of Eliphaz as Foreshadowing in the Book of Job”, Proceedings: Eastem Great Lakes & Midwest Biblical Societies 9, 1989, 98-112; H. M. Sarna, “The Mythological Background of Job 18",JB L 82, 1963, 315-18; E. B. Smick, “Old 437
Bildade
Testament Cross-Culturalism: Paradigmatic or Enigmatic?”, JETS 32/1,1989,3-16; J. Tsmudi, “A Study o f the Second Dialog Cycle in the Book of Job”, BethM 33, 1987-88,63-68. Elmer B. Smick Blasfêmia Boca Bolha
# 1552 (gdp, ultrajar, blasfemar)
# 7023 (peh, boca) # 81 ( 'aba'bu'õt, bolhas)
Bolha, ferida -> # 4649 (mãzôr I, bolha) Bolsa -> # 3967 (/r/.v, saco) Bondade
# 3201 (fwA, ser bom, ser bem-sucedido, agir corretamente)
Borda -> # 4136 (karkõb, borda, beirada) Bordado
# 8387 (rqm, bordar, entretecido)
Bordão -> # 8657 (sêbef, tribo, bastão, vara, arma, cetro) Botão -> # 7255 (pWi 1, brotar, germinar, fazer florescer) Braço
# 2432 (7?rôa', braço)
Bramido -> # 5637 (nhm, rugir, gemer) Branco -> # 4235 (Ibn I, tomar branco) Brecha -> # 8691 (seber, brecha, ruína) Brincadeira -> # 7464 Çj/ig, rir, brincar, insultar) Bronze -> # 5733 (rfihõsel I, cobre, bronze) Buraco -> # 4704 (nfihillâ, buraco) Busca -> # 5162 (m.y buscar, encontrar, alcançar, ser) Cabeça -> # 8031 ( rõ ’í I, cabeça, cabelo da cabeça, chefe, líder, começo) Caça -> # 7421 (fW , caçar) Cadáver
# 1581 (g^vWyyá, corpo, cadáver)
Cadeira
# 4058 (kissê’, cadeira, trono)
438
Caim e Sete
Caim e Sete
Caim e Sete (Pj? [qayin II], #7803; TVp [iê/], # 9269).
AT 1. Os homens que viveram antes do dilúvio, ou seja, os descendentes de Adão e Eva pela linhagem de Caim (Gn 4) e Sete (Gn 5), são chamados de patriarcas antediluvianos. Es tritamente falando, Adão, Caim, Abel e Noé são antediluvianos, mas tendo-se em vista que sua relevância teológica é discutida em outro texto, este estudo se concentrará nos descendentes de Caim (Gn 4.17-24) e Sete (Gn 5.6-31). 2. Assim como Gênesis, a tradição mesopotâmica dividia a história do mundo numa era antediluviana e noutra pós-diluviana. De acordo com essa tradição, sete apkallus, sábios que surgiram do oceano, ensinaram á humanidade as artes da civilização. Diz-se que um desses sábios, Utuabzu (cf. Enoque), ascendeu aos céus. A Lista dos Reis Sumérios cita oito, nove ou dez reis (o número varia de um texto para outro) que reinaram — cada um deles mil anos — antes do dilúvio. A história suméria do dilúvio menciona uma série de acontecimentos an tes dessa grande chuva (nomadismo, construção de cidades, instituição de cultos) que possui algumas semelhanças com Gênesis 4. Esses pontos em comum mostram que o livro de Gênesis está a par das idéias do OMA com referência ao passado distante, mas a ênfase que dá a esses acontecimentos é bem dife rente. Enquanto, por exemplo, a história suméria do dilúvio é otimista e crê no progresso da civilização, “no relato bíblico é justamente o contrário. Por terem origem nas mãos de Deus, as coisas começaram perfeitas e, com o tempo, foram ficando cada vez piores com a pecaminosidade do homem” (T. Jacobsen, JBL 100, 1981, 529). Além dessa observação ampla, o propósito das listas de antediluvianos em Gênesis só pode ser determinado por meio de uma leitura atenciosa do texto bíblico. 3. As duas listas de antediluvianos. Gênesis 4 relaciona sete gerações de descendentes de Adão pela linhagem de Caim, enquanto Gênesis 5 apresenta nove gerações. Gênesis 4
Gênesis 5
Adão
Adão Sete Enos
Caim
Cainã
Enoque
Maalael
Irade
Jarede
Meujael
Enoque
Metusael
Matusalém
Lameque
Lameque
Jabal, Jubal, Tubalcaim
Noé
A presença de dois nomes idênticos nessa lista (Enoque, Lameque) e a semelhança de outros (Caim/Cainã, Irade/Jaede, Metusael/Matusalém) levou à sugestão de que essas listas são duas versões de uma única genealogia original. No entanto, isso é pouco provável, pois a tradi ção mesopotâmia fala de dois grupos de heróis antediluvianos, os apkallus, que correspondem aproximadamente a Gênesis 4, e os reis com seus longos reinados que possibilitam comparálos com Gênesis 5. O mais provável é que a semelhança entre as duas listas seja resultado da 439
Caim e Sete
assimilação de listas que, originalmente eram independentes, e não que seja uma divergência de uma só lista. Com certeza, o editor de Gênesis não considerava as duas listas como se fossem a mesma, pois, em Gênesis 5.21-24, 29-30, há certas particularidades sobre Enoque e Lameque (os únicos nomes em comum nas duas listas) a fim de deixar claro que esse Enoque e esse Lameque não são os mesmos citados em Gênesis 4.17-24 (Wilson, Genealogy and History in the Biblical World, 137-66; Bryan, Z W 9 9 , 1987, 180-88). 4. Os descendentes de Caim. Gênesis 4 trata em detalhes de Caim (vv. 1-16) e Lame que (vv. 19-24), passando rapidamente pelos outros antediluvianos; o propósito de se mencio nar suas realizações na genealogia permanece obscuro. Enoque (e não Caim) foi o primeiro a construir uma cidade, Jabal o primeiro criador de rebanhos beduíno, Jubal o primeiro músico e Tubalcaim o primeiro a trabalhar com metais. Era comum no mundo antigo traçar-se a origem das artes e ofícios até os tempos antediluvianos, e vê-se a repetição dessa idéia em Gênesis. No entanto, é provável que essa lista tenha outras duas finalidades. Em primeiro lugar, a tec nologia e a arte são realizações humanas e não dádivas dos deuses. Em segundo lugar, essas aptidões humanas são invenções de homens pecaminosos, filhos de Caim e de Lameque, cuja descrição não é nada lisonjeira. O assassinato de Abel pelas mãos de Caim e o julgamento e a sentença de Deus que se seguem são contados em termos muito parecidos com os de Gênesis 3, mostrando que a transgressão de Caim é uma repetição da queda do homem. Contudo, Caim já partiu de um ponto mais baixo e terminou ainda mais impenitente e amaldiçoado que seu pai. A história mostra que os efeitos do pecado são acumulativos, que sem a intervenção divina a situação humana se deteriora a cada geração. A descrição de Lameque intensifica ainda mais a impressão de que cada uma das gerações da família de Caim é pior do que a anterior. Lame que é o primeiro bígamo, deixando, desse modo, o padrão divinamente instituído de monogamia demonstrado no fato de Deus haver criado somente uma esposa para Adão. Além disso, Lameque é descrito como um homem maldoso, cuja vingança contra aqueles que o atacam é setenta vezes maior (Gn 4.24). Esse retrato de depravação embrutecida que conclui a linhagem de Caim indica que o julgamento do dilúvio é inevitável. 5. Os descendentes de Sete. Depois da genealogia de Caim, a linhagem não predestinada, Gênesis apresenta a linhagem de Sete, a família eleita. Trata-se de um procedimento típico de Gênesis que apresenta sempre a árvore genealógica da família que não foi eleita antes da que foi (Jafé e Cão, antes de Sem [cap. 10]; Ismael antes de Isaque [cap. 25]; e Esaú antes de Jacó [cap. 36]). Assim, a lista dos descendentes de Adão pela linhagem de Sete é importante para se traçar as origens de Israel até o primeiro homem, Adão. Como convém à linhagem eleita, ela apresenta várias figuras que se destacam pela piedade. Enoque andou com Deus e Deus o tomou para si. Lameque, o pai de Noé, profetizou que Noé salvaria o mundo dos efeitos do pecado humano. Por fim, veio o honrado Noé, um homem “justo e íntegro entre os seus con temporâneos” (Gn 6.9) que também “andava com Deus”. Mas todos eles guardaram o manda mento divino que declarava: “sede fecundos, multiplicai-vos” (Gn 1.28), e diz-se de todos eles que tiveram outros “filhos e filhas”. Os antediluvianos da linhagem de Sete são conhecidos por sua longevidade — até 969 anos. A vida deles é curta quando comparada aos dez mil anos durante os quais os reis da Lista de Reis Sumérios governaram. Porém, é difícil entender essas idades do ponto de vista histó rico ou teológico. Elas indicam que o homem vivia mais tempo antes do dilúvio, talvez pelo fato de a maldição da morte pelo pecado humano ter sido atenuada por algum tempo? Gênesis 6.3 indica que essa idéia pode ser parte da explicação. Foram propostas várias justificações criativas para a longevidade dos antediluvianos, mas, caso haja um valor simbólico, nenhuma dessas razões o explica de modo convincente. O 440
Calebe
máximo que se pode dizer no momento é que, ao citar a idade de um patriarca por ocasião do nascimento do primeiro filho dele e do falecimento desse patriarca, o escritor de Gênesis esta va afirmando que esses homens eram mais do que nomes: eram figuras históricas reais, como aqueles que vêm depois deles na narrativa, p. ex., Abraão e Isaque. Contudo, a idade extre mamente avançada deles pode refletir o distanciamento desses patriarcas do tempo do próprio autor. (-> Gênesis: Teologia) B ib l io g r a f ia
V. P. Hamilton, Genesis 1-17,236-61; G. F. Hasel, “The Genealogies of Gen 5 and 11 andTheir Alleged Babylonian Background”, AUSS 16,1978,361-74; H. H. Gowen, “The Canaanite Ge nealogies o f Gen. 4 and 5",AThR 2, 1924, 326-27; G. J. Wenham, Genesis 1-15,92-134; J. M. Miller, 'T he Descendants of Cain: Notes on Gen. 4”, Z A W 8 6 , 1974, 164-74; C. Westermann, Genesis 1-11, 321-62. On ages o f antediluvians see also C. J. Labuschagne, “On the Applica tion of Numbers from Babylonian Mathematics to Biblical Lifespans and Epochs”, OTS 25, 1989,121-27; D. W. Young, “On the Application of Numbers from Babylonian Mathematics to Biblical Life Spans and Epochs”, ZAW 100,1988,331-61; idem, “The Influence o f Babylonian Álgebra on Longevity Among the Antediluvians”, ZAW 102, 1990, 321-35. G. J. Wenham Cal -> # 8486 (syd, gesso, caiação) Calçamento -> # 8367 (riçpâ, calçamento, calçamento de pedra/mosaico) Cálculo -> #3108 (hsb, contar, computar, calcular, pensar, planejar)
Calebe
Calebe (3^3 [kãlêh], Calebe, # 3979).
AT É possível que o nome Calebe (kãlêb, cão) refira-se a quatro pessoas diferentes no AT, sendo que ocorre 35x. O mais importante deles foi Calebe filho de Jefoné, um quenezeu (Nm 14.6) que, juntamente com Josué, tomou-se um líder excepcional em Israel e um exemplo de fé em Javé (Nm 14.24). (Para mais detalhes sobre sua genealogia, ver lCr 4.14-16.) Calebe era da tribo de Judá (Nm 13.6) e um dos dois espias fiéis que voltaram de Canaã com um re latório favorável, dizendo “subamos e possuamos a terra, porque, certamente, prevaleceremos contra ela” (Nm 13.30; 14.6). Tanto ele quanto Josué entraram na terra prometida e receberam Hebrom como sinal de reconhecimento por sua fidelidade a Javé (cf. Js 14.13-15; lCr 6.5556). Calebe também ajudou a dividir a terra entre as tribos (Nm 34.19). Expulsou os filhos de Anaque de Hebrom e deu a filha em casamento a Otoniel, irmão mais novo dele e o primeiro juiz (sõpêf) de Israel (Jz 1.12-13; 3.7-11). Foi um homem enérgico, porém bondoso (Js 15.1619; cf. Jz 1.12-20). O território ao sul de Hebrom ficou conhecido como Neguebe de Calebe (ISm 30.14). B ib l io g r a f ia
ABD 1:808-10;/DB 1:482-83; NBD 2:157. Eugene Carpenter/Michael A. Grisanti Cálice
# 3926 (kôs 1, cálice, taça) 441
Cam
Calor -> # 2801 (hmm, estar momo, quente, manter aquecido) Calvície -> # 7942 (qrh, rapar até deixar calvo)
Cam
Cam (On[hãm 111], #2769).
OMA Em termos etimológicos, o nome Cam poderia ser associado ao egíp. Kmt, a terra ne gra (= copta Keme), que descreve o Egito (ver o uso de Cam em Sl 78.51; 105.23,27; 106.22). Porém, uma vez que as equiparações entre can./egíp. são diretas, h= h, k=k (p. ex., can. rahab = egíp. rahabu; can. Kamá= egíp. Kama), essa etimologia é bastante improvável. As passa gens em Salmos podem simplesmente indicar que, tradicionalmente, o Egito é descendente de Cam (Gn 10.6). Uma alternativa seria considerar Cam como uma forma derivada do radical sem. hmm, ser quente. Porém, a identificação de Cam com a divindade hammu, apresentada por Lewy, é improvável. A etimologia não tem nenhuma relevância para a exegese bíblica. AT 1. De acordo com Gênesis, Cam era o filho mais moço de Noé (Gn 9.24) e, juntamente com a esposa, foi poupado dentro da arca no julgamento do dilúvio (-> Dilúvio: Teologia). No novo mundo, viu a nudez do pai e contou para seus dois irmãos (9.22), mas foi a Canaã, filho de Cam, que Noé (-> Teologia) amaldiçoou (9.25). Cam foi o pai de várias nações, inclusive do Egito (Mizraim) e Canaã (10.6-20). Ninrode era seu neto (10.8). 2. Cam aparece nas genealogias de Crônicas como filho de Noé, de maneira semelhan à Tabela das Nações (1 Cr 1.4, 8-13). P-B Uma linha de exegese da antigüidade considera a expressão benô haqqãtãn (Gn 9.24) como sendo de desdém, ou seja, qãtãn, pequeno, com o significado de “sem valor, desprezí vel” em vez de “jovem”. A literatura pós-bíblica não dá muita atenção a Cam, que só aparece na repetição da narrativa de Gênesis no livro de Jubileu. Cam não aparece no NT. B ib l io g r a f ia
J. Lewy, “The Old West Semitic Sun-God hammu”, HUCA 18, 1943-44,473-74. Jerome A. Lund Cama -> # 4753 (mi((â, cama) Cambaleio Camelo
# 5675 (nw ‘, sacudir, tremer, cambalear, bambolear, oscilar) # 1695 (gãmãl, camelo)
Caminho -> #2143 (hlk, caminhar, comportar; comportar-se, partir) Campo -> # 8441 (sãdeh, campo aberto, campos, domínio) Canal
# 5643 (nãhãr, rio)
Cananeus, amorreus e Israel 442
A história de Israel está inextricavelmente ligada à his tória da região de Canaã, com sua combinação de dife
Cananeus, amorreus e Israel
rentes povos, os cananeus (ainda que esse título refira-se a um grupo mais restrito, conforme será explicado abaixo) e amorreus. Do ponto de vista bíblico, o patriarca Abraão imigrou para Canaã, terra que foi prometida para os descendentes dele. Ainda do ponto de vista bíblico, o cumprimento dessa promessa implicava a conquista dos amorreus, cananeus e outros povos, e de uma apropriação à força dos territórios deles. Em termos teológicos, esses habitantes de Canaã representavam, em parte, uma ameaça ao modo de vida consagrado a Javé. A. Uma visão histórica dos amurru / amorreus e dos cananeus 1. Amurru / amorreus. Há várias distinções bastante úteis que devem ser preservad ao se estudar os amurru/amorreus: a. Os antigos amorreus ou amurru; b. o povo amurru como uma entidade política na Baixa Idade do Bronze (BIB) e c. os amorreus, designação encon trada na BH. a. A princípio, tem-se a impressão de que os antigos amorreus ou amurru eram ruralistas cuja terra natal situava-se ao longo do Alto Eufrates e dos canais fluviais Cabur e Balique. Em vez de serem vistos como ameaças externas para o norte da Síria, talvez seja mais correto considerá-los um subgrupo ímpar da população rural dessa região (Buccellati, 90). Não se sabe ao certo se eram um grupo étnico homogêneo ou uma porção de grupos heterogêneos reunidos pelos escritos sumérios e acádios sob a designação MAR.TU e amarru, respectivamente, uma vez que os sumérios e acádios possuíam a mesma visão dos amurru — um povo cultural e lingüisticamente não sumério e não acádio (Mendenhall, “Amorite Migrations,” 235). Mendelhall afirma ser possível detectar a cultura amurru no nordeste da Síria já nos períodos Neolítico e Calcolítico, e que essa cultura prosseguiu até o final da Idade Média do Bronze (IMB), quando a cultura mitani e a população de Ur e da região indo-européia ocuparam a região (Mendenhall, ABD 1:200). Quer uma atestação tão antiga seja ou não verdadeira, o fato é que os amurru imigraram para o Leste e, por volta de 2000 a. C., encontravam-se assentados em grandes números em cidades mesopotâmicas como Uma e Lagas. Durante a dinastia de Ur III, o monarca §uSin construiu muralhas para conter a invasão amurru, uma empreitada que se mostrou inútil. A primeira dinastia da Babilônia, fundada no século XIX a. C. (que teve Hamurábi entre seus monarcas) foi uma dinastia amurru. Um fenômeno semelhante ocorreu em direção às regiões ocidentais do Crescente Fér til, ainda que a documentação seja escassa em comparação com os registros do Oriente. Esse movimento para Oeste exerceu grande influência sobre a região costeira oriental do Mediter râneo ou Levante. Em Ugarite, um selo dinástico que ainda era usado pelos reis ugaríticos nos séculos XIV e XIII a. C. mostra que Ugarite teve uma dinastia amurru na mesma época que a primeira dinastia da Babilônia. Na Palestina, a 1MB IIA (c. 2000-1800 a. C.) testemunhou a chegada e estabelecimento da cultura amurru, um movimento que continuou até a IMB IIC (c. 1600 a. C.) (Mazar, 189). A transição da Idade Média para a Baixa Idade do Bronze (século XVI a. C.) foi tumultuada e, ao que parece, a cultura amurru no norte da Síria foi afetada de maneira adversa pela cultura mitani que se encontrava em franco desenvolvimento. b. Na BIB, havia uma entidade política conhecida como Amurru na região central do vale do rio Orontes, sendo Abdi-ASirti e seu filho, Aziru, seus governantes de renome. A pri meira atestação é do século XV a. C., encontrada nas tábuas de Alalah e é provável que sua população fosse composta de pastores ou refugiados resultantes de tempos turbulentos e dos hãbint, uma designação para vários grupos e classes sociais, usada por vezes de modo pejo rativo (Ahlstrõm, 14). Nesse tempo, o nome Amurru possuía pouca ou nenhuma importância lingüística e étnica. O mesmo se aplica ao título “Seom, rei dos amorreus” (Nm 21.21,26,29), que governou tendo como sede Hesbom, na Transjordânia. E bem possível que o título Seom fosse tradicional para qualquer governante capaz de estabelecer um regime dentro das tradições 443
Cananeus, amorreus e Israel
políticas dos amurru em outra região, o mesmo que o Estado neo-hitita de Carquemis conseguiu fazer depois da destruição do império hitita em c. 1200 a. C. (Mendenhall, ABD 1:201). c. A designação “amorreu”, empregada na BH, refere-se àqueles que se encontravam em regiões geográficas as quais, assim como o reino de Seom, eram de algum modo relacionadas à entidade política de Amurru — quer por meio de ligações históricas diretas ou por meio de um reavivamento das tradições políticas amurru — ou que eram remanescentes de invasões amurru durante a IMB, ou ainda, a ambos os casos. Pode-se encontrar uma associação no fato de que o nome de Jerusalém antes do tempo de Davi, conforme preservado no registro em HB, eray^bús — Jebus, uma denominação de forte afinidade com a antiga onomástica do amorreu yabusum. Além disso, ao condenar Jerusalém, Ezequiel diz que o pai da cidade era amorreu e a mãe, hetéia, considerando claramente a relação de Jerusalém com o norte da Síria. Estas são as principais referências aos amorreus que podem ser encontradas nas páginas da BH: um reino cujo centro situava-se a leste do rio Jordão, na região central da Transjordânia (Números 21); vários grupos de pessoas a oeste do rio Jordão, governados por reis, prin cipalmente nas regiões montanhosas (os reis de Jerusalém, Hebrom, Jarmute, Laquis e Eglom são chamados de “reis dos amorreus que habitam nas montanhas” [Js 10.6]); uma localidade geográfica da entidade política Amurru na BIB (Js 13.4); uma designação para algo não mais explícito do que habitantes da região sul do Levante, provavelmente apresentando mais cono tações políticas do que éticas (Gn 15.16; 48.22; Êx 3.8, 17; 23.23). 2. Cananeus. A designação “cananeu” pode referir-se à população (nativa?) da região sul do Levante, a oeste do rio Jordão, estendendo-se ao Norte só até o sul da Síria. Durante a Idade Média do Bronze na Palestina, o termo “cananeu” ocorre pela primeira vez num texto Mari do reinado de Iasmá-Adade (século XVIII a. C.) (Sasson, 90). Um texto ugar. da cidade de Ugarite, na região norte de Levante, fala de y 7 kn ‘ny, Iael, um cananeu (KTU 4.96:7), no contexto de mercadores estrangeiros. Essa denominação étnica indica que, como levantinos do Norte, os ugaritas não se consideravam cananeus (Rainey, 45). Depois de uma transição tempestuosa da Baixa Idade do Bronze para a Idade do Ferro, durante a qual ocorreu a invasão dos Povos do Mar, “Canaã” começou a ser um termo empregado de modo mais restrito para referir-se à região sul da Palestina. 3. Cananeus e amorreus na Palestina. Quando há um contraste entre os termos “cana neus” e “amorreus” na BH, os primeiros referem-se a centros populacionais mais antigos (mais nativos?) localizados principalmente nas planícies costeiras e nos vales de Jezreel e do Jordão. “Amorreu” refere-se a áreas populacionais situadas nas regiões montanhosas, na Transjordânia e na localidade histórica Amurru da BIB. É provável que Amós empregue o termo “amor reu” como uma designação geral para todos os habitantes da Palestina (Am 2.9-10), mas a denominação refere-se com mais freqüência a uma população da região montanhosa. Muitos estudiosos sugerem que a designação “amorreu” era preferida pela tradição eloísta, enquanto a tradição javeísta preferia “cananeus” para referir-se essencialmente aos mesmos grupos de pessoas. Qualquer que seja a visão considerada sobre o processo de escritura do Pent., não se pode ignorar que as escolhas feitas pelos escritores com relação a denominações possa ser orientada pelo estilo, impacto emocional, tradição e outros fatores do gênero. Tais elementos não podem ser completamente descartados no caso da escolha autoral de “cananeus” em vez de “amorreus” e vice-versa na BH.
B. Considerações teológicas sobre os cananeus e Israel 1. Do ponto de vista bíblico, a Palestina, ou terra de Canaã, foi prometida a Abra (Gn 12), confirmada a ele (Gn 15.8), anunciada aos seus descendentes (Gn 26.3-4; 28.13-15; 444
Cananeus, amorreus e Israel
35.9-12) e considerada uma dádiva ou possessão na era Mosaica da BH (Êx 6.4, 8 ; Dt 5.31). O relato bíblico da conquista de Josué e a vitória dele sobre os cananeus (um termo genérico empregado aqui para referir-se a todos os povos não israelitas que viviam na Palestina naquele tempo) representa um cumprimento da promessa feita aos patriarcas. Antes de prosseguirmos, devemos observar que diversos estudiosos consideram a idéia da conquista israelita, conforme esta se encontra retratada na BH, uma questão complicada. A interpretação dos dados arqueológicos e históricos extrabíblicos existentes em conjunto com os relatos bíblicos contribui para o surgimento de várias idéias. Alguns acreditam que o nome “Israel” a princípio era um NG para a região montanhosa. Assim, os israelitas não foram conquistadores estrangeiros, mas sim grupos nativos de pessoas dessas regiões montanhosas. Esses grupos atingiram uma proeminência inicial com os reinados de Saul, Davi e Salomão (Ahlstrõm). De acordo com essa concepção, as descrições bíblicas da conquista são criações literárias — que não possuem fundamento histórico ou que constituem relatos romantizados de conflitos regionais — entretecidas com relatos de coabitação que, por sua vez, são consi derados mais precisos em termos históricos. Diz-se que as criações literárias sobre a conquis ta foram elaboradas numa era posterior, a fim de reforçar o direito de posse das terras que os israelitas afirmavam pertencer-lhes. Os vv. que retratam a coabitação (Js 13.1-7; Jz 1.21, 27, 29-33) foram reunidos para contrabalançar a tradição de uma conquista rápida e completa (Js 21.43-44, mas também 10.40; 11.16, 19) de modo a indicar que os israelitas, ou povos que depois viriam a ser israelitas, viviam na Palestina durante a BIB e não no Egito como retrata a BH. A questão da conquista está longe de ser insignificante e é preciso preparo para lidar-se com todos os dados disponíveis. No entanto, também é possível concentrar-se na perspectiva bíblica e teológica, encontrada nas páginas da Escritura, que retrata uma conquista seguida de coabitação entre israelitas e povos da região. 2. Apesar de a terra ser uma dádiva a eles, foi preciso ser conquistada pelos israelitas: a terra dos cananeus devia ser tomada à força, e seus habitantes, exterminados. Para muitos que lêem a Bíblia em nossos dias, essa brutalidade representa um dos aspectos mais repulsivos do texto bíblico. A natureza delicada do processo de criação de uma nação consagrada exclusiva mente a Javé lado a lado com povos cujas práticas Javé considerava abomináveis pode ajudar, em parte, a compreender essas diretrizes tão severas. Na despedida de Josué dos seus líderes, ele afirmou que todas as promessas de Javé para eles haviam se cumprido (Js 23.14). Um cum primento mais pleno dessas promessas ocorreu durante os reinados de Davi e Salomão, quando o território governado por eles mostrou-se mais semelhante àquele descrito na confirmação dada a Abraão (Gn 15.18). A terra tomada dos cananeus devia ser um lugar de fartura e descanso para Israel. Era uma terra que vertia leite e mel, uma referência à fertilidade dela. A terra representava descan so depois de anos vagando de um lado para o outro e devia oferecer tranqüilidade, o fim do tormento causado pelos inimigos de Israel (Dt 12.9-10). 3. A terra era uma dádiva de Javé aos israelitas, mas estava bem claro que ele continuava sendo o dono dela (Lv 25.23, “porque a terra é minha; pois vós sois para mim estrangeiros e peregrinos”). Esse fato implica algo importante: o direito de posse da terra exigia um modo de vida continuamente apropriado. A terra era inalienável no sentido de que ninguém a tomaria à força dos israelitas, mas a própria nação podia perder esse direito. De fato, dentro da concepção bíblica, ao deixarem de viver em obediência, os israelitas perderam a terra, primeiro em 722/1 a. C. e, depois, em 587/6 a. C. Ao relembrarem o conceito do caráter inalienável da terra, os profetas do exílio pregaram a volta do cativeiro para a terra (Jr 12.14-16; Ez 11.17; 36.24-32) e o reavivamento do modo de vida correto. Existe grande controvérsia quanto à existência e 445
Cânon, cânone
natureza da relevância dessas declarações proféticas. Ao justapor o AT ao NT, o cristão deve levar em consideração o reino de Deus, que transcende um conceito meramente terreno de pro priedade. No entanto, continua sendo motivo de discussão determinar-se se o reino de Deus anula ou inclui o interesse territorial neste mundo. B ib l io g r a f ia
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1. O termo cânon, q de livros aceitos como Sagradas Escrituras, não se en contra no AT. A palavra heb. qãneh, que muitos afirmam ser o subs. do qual “cânon” é deriva do, significa cana. Apesar de a associação entre cana e materiais escritos ter surgido original mente da prática antiga de se embalar tábuas para escrever em esteiras de cana, nos dias de hoje, o termo heb. está associado a um padrão de medida (Ez 40.5). Daí a idéia de que cânon representa um critério para avaliar aquilo que pertence ao conjunto de textos das Escrituras. 2. O cânon do AT é composto de trinta e nove livros da antiga BH. Para o judaísm há vinte e quatro livros, que na verdade são os mesmos, porém contados de outra maneira. A igreja católica romana inclui quatorze documentos que constituem livros ou partes de livros e que são conhecidos como Apócrifos do AT. Os Apócrifos (->) não fazem parte da Bíblia pro testante pois nunca foram considerados no antigo cânon do judaísmo e nem receberam aprova ção dos apóstolos do NT (cf. R. L. Harris, 178-89). Essa idéia é questionada ao considerar-se passagens como Judas 14-16, que apresenta uma citação direta do livro de Enoque. No entanto, Enoque nunca foi incluído nos Apr., e nenhuma igreja cristã ortodoxa — e nem mesmo a Igre ja Católica Romana — aceita a canonicidade dele. E provável que Judas tenha citado Enoque pelo fato de esses escritos serem aprovados pelos falsos mestres que Judas estava refutando. O Livro de Enoque incriminava os próprios mestres que o promoviam! O apóstolo Paulo usa um método semelhante, em Tito 1.12.
Cânon,cânone
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Cânon, cânone
No Talmude, há cinco livros do AT, Cântico dos cânticos, Eclesiastes, Ester, Provérbios e Ezequiel — livros Antilegomena — cuja presença no cânon do AT é questionada. As objeções giram principalmente em tomo dos problemas que esses livros representavam para o judaísmo. Cântico dos cânticos beirava o erotismo? Eclesiastes possuía uma tendência excessivamente pessimista? Por que os detalhes do templo de Ezequiel são diferentes do templo de Salomão? etc. No entanto, foi justamente o fato de esses livros já serem canônicos que levou a tais dis cussões. Não se tratava de determinar se deveriam o não pertencer ao cânon. A autenticidade e autoridade deles nunca foram o alvo dos questionamentos. Talvez o único livro bíblico a sofrer contestação mais séria quanto às evidências his tóricas seja Ester. Foi o único livro do AT a não ser incluído numa lista de livros do AT com pilada por Melito, bispo dc Sardes, por volta de 170 d. C. Também é o único livro do AT que não se encontra atestado nos escritos de Qumran, e um dos poucos que não é citado no NT. No entanto, esses problemas não são insolúveis. O rolo do livro de Ester pode ter sido anexa do a outro escrito bíblico e classificado sob o nome de outro livro do AT (cf. Mt 27.9-10, em que o evangelista menciona uma profecia de Jeremias que não se encontra no livro canônico de Jeremias, mas no de Zacarias; é possível que Mateus se referisse a um livro apócrifo de Jeremias). A ausência de Ester nos escritos de Qumran não é um fator decisivo, mas significa apenas que não sabemos se o livro de Ester estava ou não presente em Qumran. Alguns his toriadores afirmam que, de qualquer modo, a comunidade de Qumran relutaria em usar essa obra em função de certos preconceitos por parte da comunidade. Por fim, sabe-se que a festa de Purim, que tem sua origem no livro de Ester, era celebrada no período intertestamentário (com o acréscimo de Et 10.10-13; 2Mac 15.36). Josefo, um contemporâneo de alguns escritores do NT, afirma que em seu tempo, todos os judeus do mundo celebravam a festa de Purim (Ant. Xl.6.13). Essa prática demonstra que, muito antes do NT ser escrito, o Livro de Ester era tido em alta consideração. Seu enfoque singular pode ter sido um empecilho para que os escritores do NT fizessem uso dele. 3. Num prólogo ao Livro de Eclesiástico, 132 a. C., o cânon do AT era descrito co tendo três seções. Essas seções eram chamadas de Lei, Profetas e outros livros. Ao longo do século XIX, esse fato levou a maior parte dos críticos bíblicos a concluir que tal descrição indica três estádios históricos que marcaram o fim da inclusão dos livros bíblicos: a Lei, canonizada finalmente no século V a. C.; os Profetas, no século III a. C.; e os outros livros (chamados pos teriormente de Escritos), no século I d. C. Em outras palavras, de acordo com essa concepção, o AT foi composto a partir de três cânones separados. A datação tardia atribuída a vários livros por esses críticos indica que a canonização do AT não estava concluída antes da era do NT. Para apoiar essa idéia, usa-se o fato de que, em 90 d. C., ainda estavam sendo tomadas decisões canônicas no chamado Concilio de Jânia. No entanto, R. Beckwith demonstrou, de modo persuasivo, ser pouco provável que essa divisão do cânon representasse um processo tripartido de canonização (R. Beckwith, The Old Testament Canon o f the New Testament Church, 110-80). Ao tomar por base a baraíta, Beckwi th atribui essa organização a um aspecto artístico. A divisão em três partes é apenas descritiva e representa uma separação e classificação de escritos que já eram considerados canônicos. A prática de agrupar-se livros bíblicos de acordo com a cronologia e o tamanho, colocando-os em algum tipo de ordem lógica, já existia entre os antigos escribas judeus, chamados de soferins (400-200 a. C.). Além disso, Sid Leiman desabonou a idéia de que se possa falar de algum tipo de determinação de um texto padrão em Jânia como resultado da definição e encerramen to do cânon (S. Z. Leiman, 120-24). Uma análise mais atenciosa mostra que não há nenhuma 447
Cânon, cânone
evidência de uma canonização consciente das Escrituras dentro das próprias Escrituras. É no AT e no mundo do AT que se deve buscar as conclusões referentes à canonização do AT. 4. A idéia de um cânon, o registro e preservação de escritos atribuídos a uma divindade como regra divina de fé para a comunidade é um conceito muito mais antigo do que os próprios escritos do AT. Apesar de o termo cânon não haver entrado em voga com relação às Escrituras até o tempo dos patriarcas eclesiásticos gregos e latinos, documentos antigos do Egito e da Mesopotâmia deixam claro que os elementos de um conceito de cânon — uma palavra inves tida de autoridade e proveniente de um deus — já se encontravam devidamente consolidados antes do período mosaico. E amplamente atestado, por exemplo, que os egípcios possuíam vários registros de todas as palavras de suas divindades num “livro do deus” e que os escribas babilônios trabalhavam dentro de uma tradição meticulosa que evitava qualquer alteração de seus escritos sagrados (ver AN ET, 368-69, 373, 447-48; R. O. Faulkner, The Ancient Pyramid Texts, 189, 218, 220, 228, 231-32, 238, 241; L. Oppenheim, 14. 18; e B. K. Waltke, “The Textual Criticism of the Old Testament,” in EBC 1:212). Essas obras eram colocadas em santuários, guardadas e trans mitidas por sacerdotes e escribas devotos. Foi nesse mundo que o AT se inseriu. Porém, apesar de as palavras dos antigos ficarem aquém de qualquer teologia coerente no contexto de uma progressão histórica, e mesmo Israel sendo a única a empregar uma estrutura peremptória do modelo de tratado/aliança (-> # 1382) para expressar a vontade do Deus deles para seu povo, esse meio deixou vestígios suficientes para nos garantir que não há motivos para que o conceito de um conjunto de textos investidos de autoridade divina — que deveria ser cuidadosamente preservado e transmitido — não tenha acompanhado a formação do AT desde o princípio. 5. Apesar de os elementos que constituem o conceito de cânon serem contemporâneos dos autores do AT, o cânon do AT possui diferenças significativas com relação a materiais par. da antigüidade em termos de autoridade. Enquanto as origens dos escritos sagrados das nações vizinhas de Israel eram atribuídas a visões, oráculos, sonhos, adivinhações, etc., o cânon do AT atribuía suas origens teológicas a uma aparição magnífica (porém digna de temor) do próprio Deus no Sinai (“Eis que virei a ti”, Ex 19.9). Esse acontecimento foi acompanhado de uma teofania (->) que contemplava relâmpagos, uma nuvem densa, trovões, o som de trombetas tocando cada vez mais alto, fogo e fumaça (Êx 19; 20.1-19; Dt 4.10-14; 5.1-27). A aparição inquestionável de Deus serviu como endosso para seu porta-voz (“para que o povo ouça quan do eu falar contigo [Moisés] e para que também creiam sempre em ti”; Êx 19.9). O significado não podia ser mais claro: Deus havia falado. Uma nação inteira viu e ouviu a manifestação da presença de Deus da maneira mais impressionante possível, um acontecimento que não podia ser esquecido com facilidade. Esse acontecimento digno de temor e reverência foi acompanhado da entrega da pa lavra de Deus a Moisés (Êx 20.1-17; 21—23.33), sendo essa palavra chamada de Livro da Aliança (Êx 24.7). Em seguida, ocorreu a aceitação formal e ratificação da autoridade desse livro por meio de um juramento nacional realizado por milhares de testemunhas. “Tudo o que falou o Senhor faremos”(Êx 24.3). Essa proclamação pública significava que as palavras eram definitivas, de modo que, de acordo com o registro, o texto dó Livro da Aliança foi escrito imediatamente (Êx 24.3). A aceitação pública dessas palavras como sendo canônicas, ou seja, investidas de autoridade, foi ratificada por uma cerimônia solene de aliança realizada pelos anciãos como representantes da nação (Êx 24.9-11). A primeira descrição da apresentação de escritos canônicos serviu de paradigma para escritos canônicos posteriores do AT. Os escritos do cânon exigiam uma demonstração visível e mensurável da aprovação divina e, conseqüen temente, registravam a palavra de Deus. 448
Cânon, cânone
Tendo em vista, porém, que os acontecimentos do Sinai não se repetiriam depois do período mosaico, foram aprovadas alterações teológicas de modo a adequar-se a situações futuras. Moisés, aquele que recebeu mais aprovação como escritor canônico do que qualquer outro escritor do AT, conferiu às profecias a mesma autoridade que Deus lhe havia outor gado (cf. Dt 18.16-18 com 5.22-31). Em Deuteronômio 18.21-22, Moisés levanta a questão de “Como saber quando uma mensagem foi proferida pelo Senhor?” E responde declarando que as palavras de um profeta devem se cumprir. O cumprimento de prenunciações exatas sempre foi reconhecido universalmente como algo que se encontra além da competência dos homens. Esse cumprimento deveria servir de prova tangível da aprovação divina. O AT contém vários casos de profetas aos quais foram atribuídos textos das Escrituras como os que apresentaram exemplos de prenunciação/cumprimento a seus contemporâneos. Não há praticamente escrito algum do AT que não conte com o testemunho das Escrituras em favor desse dom profético. A autoridade canônica podia ser demonstrada e encontrada no profeta, qualquer que fosse a forma literária (narrativa, poética, de sabedoria, etc.) que ele se visse inspirado a compor. Para apoiar o reconhecimento da autoridade canônica do profeta, os escritores do AT costumavam ser citados por autores subseqüentes do AT que reconheciam os escritos daqueles como palavras revestidas de autoridade. Isso porque os profetas cumpriam sua missão divina não apenas pregando, mas também escrevendo. Citações e alusões dentro do AT mostram que a Israel da antigüidade considerava as palavras escritas de seus antecessores como dadas por Deus. O AT está repleto de referências à autoridade da lei escrita de Moisés, além do detalhe de que a própria lei de Moisés presume a canonicidade de outras partes do Pentateuco (Êx 34.27; Nm 9.14; Dt 2.37; etc.; cf. Js 1.7-8; 8.31; 23.6-8; 1Rs 2.3;2R s 14.6; 17.37; 1Cr 16.40; 2Cr 17.9; 23.18; 30.5, 18; 31.3; 35.26; Ed 3.2, 4; Os 8.12; Dn 9.11, 13). As palavras escritas do profeta também eram tratadas como mensagens divinas. Josué 6.26 é reconhecido em 1 Reis 16.34 como estando de acordo com “a palavra do Senhor”, e Daniel 9.2 faz referência à profecia dos setenta anos de cativeiro proferida por Jeremias como sendo “pelos livros... de que falara o Senhor ao profeta Jeremias” (cf. Is 30.8; Jr 25.13; 29.1; 30.2; Ha. 2.2-3; Dn 7.1; lCr 29.29; 2Cr9.29; 12.15; 13.22; 20.34; 21.12; 26.22). O modo autocrático de o AT de usar o próprio AT mostra que as palavras escritas de Moisés e dos profetas eram consideradas Sagradas Escrituras quando o AT ainda encontrava-se em processo de formação. Por isso, a igreja de hoje pode afirmar suas crenças teológicas tomando por base um cânon de Escrituras fundamentado na história da atuação poderosa de Deus no meio de seu povo desde a antigüi dade. O AT é singular com relação a seus concorrentes, pois declara e cumpre seus próprios critérios de canonicidade. Apócrifos B i b l k x ;r a f i a
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Cântico do Mar
Cansaço
# 2703 (hlh I, ficar fraco, doente, cansado)
Cansado -> # 6545 ( ‘y p, estar fatigado) Cântaro
# 655 ( asúk, jarro, cântaro, frasco)
Cântico
# 8877 (.?/>, cântico, música)
Cântico do M ar
Cântico do Mar (nVÇ? [í/Vâ], cântico, # 8878).
AT 1 .0 “cântico (Sirâ) do mar”, como é conhecido na tradição hebraica, refere-se a Êxodo 15.1 b-18 e é uma composição em forma poética entoada por Moisés e os israelitas para Javé. O cântico celebra mais especificamente o livramento divino e miraculoso de Israel das mãos dos perseguidores egípcios. Encurralados entre os perseguidores e o intransponível mar Vermelho/ de Juncos, pela intervenção de Javé, os israelitas passaram pelas águas divididas a pés enxu tos. Para os pretensos agressores, os egípcios, o mar Vermelho/de Juncos se fecha sepultando o exército do Egito sob suas águas. Aqueles que pensaram estar prestes a morrer, sobrevivem. Aqueles que pensaram que iriam viver, morrem. 2. No início, o povo canta sobre Deus (vv. 1-5), mas, em seguida, passa a cantar pa Deus (vv. 6-17). Na poesia bíblica, o fenômeno de mudar a forma de se dirigir a Deus, da ter ceira pessoa para segunda pessoa, ocorre muitas vezes. Um exemplo bastante conhecido é o Salmo 23: “Ele me faz repousar...[ele] refrigera-me... [ele] guia-me... Não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo; o teu bordão e o teu cajado...” 3 .0 cântico dirige todo o louvor a Javé. Apesar de o papel de Moisés no êxodo de Isra do Egito ser importante, é ignorado. A ausência de Moisés no hino é ainda mais crítica ao se levarem consideração o último versículo do capítulo anterior (Êx 14.31) que termina dizendo: “... e o povo temeu ao Senhor e confiou no Senhor e em Moisés, seu servo” . A preocupação exclusiva de Êxodo 15.1b-18 com os feitos poderosos de Javé indica que essa composição é mais um hino do que um cântico de vitória. Na acepção mais correta dos termos, esse hino é um cântico que dá louvores a Deus por conceder a alguém a capaci dade de vencer outros, como é o caso em Juizes 5, o cântico da vitória de Débora e Baraque sobre Sísera. 4. A data da composição do cântico ainda é motivo de controvérsia. Trata-se de u exemplo de poesia heb. mais antiga ou mais recente? Alguns estudiosos (p. ex., Bender) argu mentam que o poema é uma composição mais recente, que pode ter sido escrita no tempo do exílio, mas não antes do período do reino dividido. Hoje em dia, o ponto de vista mais aceito (p. ex., Cross & Freedman) é de que o poema foi composto oralmente desde o período dos Jui zes e que sua forma presente já estava em circulação no século XII a. C. O principal motivo para situar-se a data num período mais recente é o uso amiúde que o poema faz de elementos normalmente encontrados na poesia cananéia antiga, como, por exem plo, o emprego de formas vb. com prefixo (yq(l) equivalentes a formas vb. com sufixo (q(f) e o uso de termos relativos zü nos w . 13, 16 (que ocorrem apenas como arcaísmos na poesia mais recente). Pode-se chamar a atenção ainda para os nove exemplos dos 3 sufixos pl. masc. -mw (vv.5, 7, 9 [2x], 10, 12, 15, 17 [2x]) que não são característicos de subs. e vbs., em contraste com os exemplos de -m (uma forma incomum na poesia hebraica). 450
Cântico do Mar
5. Apesar de grande parte do cântico celebrar os feitos de Javé no passado recente, al gumas partes descrevem aquilo que Javé costuma fazer. Um exemplo mais evidente pode ser encontrado no v. 11, em que, em vez de usar as formas vb. no finito, o escritor passa a usar o particípio: “... glorificado (ne ’dãr) em santidade, terrível (nórã ’) em feitos gloriosos, que ope ras ( 'õsêh) maravilhas?” Assim o escritor se desloca de verdades específicas sobre seu Deus para verdades gerais sobre seu Deus, do louvor descritivo para o louvor declarativo. Outros elementos do cântico também mostram que “aquilo que Deus fez se aplicaria de modo geral à operação divina em outras esferas. Ele é um Deus Criador, atuante, dessa maneira, em todo o mundo. Não é de admirar que as nações estejam estremecendo” (Fretheim, 166). 6 . O autor também descreve nitidamente acontecimentos que não estão relacionados ao êxodo e que vão muito além do tempo de Moisés. Isso fica especialmente claro na última parte do cântico (w . 13-17). Os vv. 13-15b, por exemplo, parecem referir-se aos quarenta anos vagando pelo deserto, e o v. 15c (“esmorecem todos os habitantes de Canaã”) diz respeito à conquista sob a liderança de Josué. E, por fim, no v. 17, as orações “no monte da tua herança” e “no lugar que aparelhaste, ó Senhor, para a tua habitação, no santuário” dão a impressão de ser referências à captura de Jerusalém por Davi e à construção do templo por Salomão. Na ver dade, o êxodo e a construção do templo estão ligados por 1 Reis 6 .1 como dois focos críticos da história de Israel: “No ano quatrocentos e oitenta, depois de saírem os filhos de Israel do Egito... [Salomão] começou a edificar a Casa do Senhor”. Ao se deslocar numa só linha contínua do êxodo para a construção do templo, do agora para o ainda não, o escritor do cântico afirma que o “Deus que atuou na história de Israel é o mesmo que está atuando e continuará a fazê-lo” (Childs, 1974, 249). Assim, o autor consegue “projetar, a partir da experiência extraordinária do mar Vermelho/de Juncos, um modelo mais amplo dos atos poderosos — e até heróicos — de Deus na história” (Alter, 53). 7. Há pontos em comum naquilo que é ressaltado nos vv. 1b-12 e nos 13-18: na primeira seção, os inimigos de Israel são Faraó e os soldados egípcios com seus carros; na segunda seção, são os povos de Edom, Moabe e Canaã; nos dois casos, os inimigos são aqueles que desejam impedir Israel de concretizar o destino que Deus reservou para o seu povo. Mas nenhum deles tem sucesso. Javé afoga o primeiro grupo e enche de terror paralisante o coração daqueles que pertencem ao segundo grupo. Em decorrência disso, os primeiros inimigos afundam “como pedra” (v. 5) e os outros “emudecem como pedra” (v. 16). 8 . Pode-se fazer referência ainda a Apocalipse 15, em que no meio de um outro corpo de água (“um mar de vidro” [v. 2]) os fiéis redimidos entoam o “cântico de Moisés” (v. 3; uma referência a Ex 15.1b-18 ou a Deuteronômio 32?) com o acompanhamento de instrumentos musicais (harpas — Ap 15.2; tamborins — Ex 15.20). E assim como Êxodo 15, Apocalipse 15 oferece a Deus tanto louvor descritivo (vitória sobre a besta) quando declarativo (p. ex., “só tu és santo”). 9. Existem alguns casos de correspondência entre as primeiras pragas e a travessia do mar, tanto no aspecto da linguagem quanto das imagens. É o caso do bordão de Arão que “de vorou” (b lr) os bordões dos encantadores e sábios egípcios (Êx 7.12), prefigurando a terra/ mundo dos mortos que devorou os egípcios (“tragou”; 15.12). Estas são as duas únicas vezes em que bãla' aparece em Êxodo. Na segunda praga, a referência aos sapos que “cobriram” a terra (Êx 8 .6 [2]) pode ser um presságio do futuro ominoso, no qual as águas “cobriram” os egípcios (Êx 15.5, 10; cf. 14.28). Cf. também o uso do vb. para se referir aos gafanhotos, na oitava praga, que “cobrirão” a face da terra (Êx 10.5). 451
Cântico dos cânticos: Teologia de
E, apesar de o relato em prosa não fazer parte do cântico, pode-se comparar sua oração “nem ainda um deles ficou” {lõ’-niS’ar bãhem ‘a d -‘ehãd), em Êxodo 14.28, com a praga das moscas (Êx 8.31 [27]), “não ficou uma só mosca” (lõ ' n is’ar 'ehãd) (cf. também Êx 10.19, “nem ainda um só gafanhoto restou” [lõ 'nis 'ar 'arbeh 'ehãd]). As moscas, os gafanhotos e os egípcios tiveram todos um fim parecido — lõ ’n is’ar 'ehãd. 10. O cântico não termina ressaltando algo que Javé tenha feito por seu povo. Antes ênfase ao reino eterno de Javé: “O Senhor reinará por todo o sempre”. Assim, o poema “não termina com uma definição do papel de Israel na terra, mas sim com uma reflexão sobre Israel em sua condição de comunidade adoradora” (Childs, 1974, 52). -> Moisés B ib l io g r a f ia
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Cântico dos cânticos é uma coleção de poemas de amor emocionantes, cada um deles contribuindo para produzir um cântico de amor intenso e apaixonado (daí o título “Cântico dos cânticos”). Trata-se do amor humano, do amor entre um homem e uma mulher. A imagem do jardim re mete a imaginação teológica de volta ao jardim do Éden e interpreta essa cantiga como um terceiro movimento numa teologia bíblica da sexualidade humana. O uso disseminado da ima gem do casamento ao longo de todo o cânon também exige que o leitor reflita sobre as impli cações do livro para a relação entre Deus e a humanidade e, ainda mais especificamente, entre Jesus Cristo e a igreja. É possível que nenhum outro livro tenha passado por uma mudança tão radical em ter mos de compreensão teológica nos últimos cem anos como aquela que ocorreu como livro de Cântico dos cânticos. Sua forma é poética, alusiva, repleta de imagens e combina uma mensa gem teológica com um tema explicitamente erótico. Para uma forma de cristianismo com ten dências ascéticas, essa era uma questão embaraçosa e levou a uma repressão da leitura natural do livro durante grande parte do período inicial do cristianismo, repressão esta que ainda pode ser encontrada em algumas partes da igreja. A coleção de imagens do livro possui um caráter sexual tão claro que os primeiros intérpretes foram buscar na exegese alegórica o “verdadeiCântico dos cânticos: Teologia de
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Cântico dos cânticos: Teologia de
ro” significado da obra. Interpretado em termos alegóricos, o livro é uma descrição da relação amorosa entre Jesus Cristo e a igreja, assim como nos meios judaicos mais antigos o relaciona mento entre o amante e sua amada representava o amor de Deus por Israel. Cirilo de Alexandria (375-444 d. C.) interpretou os “seios” em Cântico dos cânticos 1.13 como sendo o AT e o NT, enquanto o saquitel de mirra é Jesus Cristo, que abarca tanto um quanto outro. Numa carta à sua discípula Paula, Jerônimo (347-420 d. C.) aconselhou-a a manter a filha longe do livro de Cântico dos cânticos até que ela tivesse um conhecimento mais profundo de todo o resto da Bíblia, pois, de outro modo, ela não “compreenderia que apesar de ser escrito em termos car nais, é o cântico de casamento de uma noiva espiritual” (Pope, 119). A. Estrutura Literária A descoberta de cânticos de amor extrabíblicos no OMA exerceu grande influência so bre a concepção contemporânea da relevância do livro. Cânticos de casamento árabes (wa.sj) e também egípcios (White; Fox) e poemas de amor acádios apresentam várias semelhanças po éticas e genéricas com o livro bíblico. Esses textos levaram os intérpretes a apoiar o que pode ser chamado de leitura “natural” das imagens do livro, uma leitura que reconhece a natureza sexual do conteúdo do livro. De acordo com um consenso surpreendente nos dias de hoje, o livro é um cântico de amor no qual o amante e a amada expressam profunda afeição e desejo sexual um pelo outro. O livro de Cântico dos cânticos é uma celebração do amor físico. No momento, um dos pontos de controvérsia entre os estudiosos é a estrutura literária e unidade do livro. Carr (45) afirma que a obra é constituída de um só poema de amor com uma unidade temática informal e abran gente, baseada no amor entre o homem e a mulher: 1.2— 2.7
Expectativa
2.8—3.5
Encontrado, perdido e encontrado
3.6—5.1
Consumação
5.2— 8.4
Perdido e encontrado
8.5-14
Confirmação
Melhor argumentação, porém, pode ser apresentada em favor da análise que Falk faz do livro, dividindo-o em trinta poemas separados, relacionados pelos uso de um tema semelhante. De qualquer modo, o livro emana uma sexualidade intensa, contendo alguns termos com duplo sentido que normalmente sofrem glosas na tradução (5.2-8). B. Temas Teológicos Quando lidos de modo canônico, esses cânticos de amor encaixam-se numa “teologia da sexualidade” que começa no jardim do Éden. Aliás, é o uso extenso da metáfora do jardim no livro de Cântico dos cânticos que desencadeia essa associação bíblico-teológíca (Trible). A relação amorosa no jardim de Cântico dos cânticos faz o leitor lembrar a relação que existia entre Adão e Eva antes da queda. No jardim, os dois eram “uma só came” (Gn 2.24); estavam nus um diante do outro e não se envergonhavam (vs. 25) disso. Em outras palavras, a harmonia que existia entre o homem e a mulher no jardim era expressada em termos sexuais. Assim, não é de surpreender que o resultado do pecado de Adão e Eva fosse enuncia do em termos sexuais também. A alienação de Deus resultou numa alienação de um para com 453
Cântico dos cânticos: Teologia de
o outro de modo que um não podia mais aparecer nu na presença do outro. A primeira coisa que fizeram foi procurar cobrir-se com folhas de figueira (Gn 3.7) e, mais tarde. Deus, em sua graça, deu-lhes vestimentas mais duráveis (3.21). Quanto Cântico dos cânticos é lido à luz de Gênesis 1— 3, é impressionante como o amante e a amada podem ficar nus um diante do outro no jardim sem sentirem pudor e desfrutar plenamente o corpo um do outro. Sem dúvida, é correto ler o livro como a história da “sexuali dade redimida” (Trible). Não se deve entender com isso que o povo de Deus experimenta o amor conjugal perfeito, enquanto os incrédulos não possuem nenhuma compatibilidade sexual. No entanto, a mensagem implícita do livro em seu retrato de relacionamentos humanos harmoniosos no jardim depois da queda é de que a cura e o prazer são possíveis pela graça de Deus. O livro pode ser visto ainda sob a ótica da metáfora biblica que se estende pela obra e que assemelha o relacionamento entre Deus e os homens àquele entre um homem e uma mulher. Ao longo de grande parte do AT, a relação de Deus com Israel é descrita como um casamento. Ezequiel 16 desenvolve bastante essa metáfora, relatando como Deus salvou Israel quando a nação era um bebê abandonado. Quando Israel cresceu e transformou-se numa bela mulher, Deus a tomou para si como esposa. Ele a amou e cuidou dela com carinho. Israel, porém, res pondeu a esse amor prostituindo-se com outros amantes (os deuses de outras nações). Oséias também desenvolve esse tema do relacionamento conjugal entre Deus e Israel, sendo que dessa vez o próprio Oséias toma para si uma esposa que se mostra infiel (Oséias 1 e 3). Assim, tudo indica que o AT usava o relacionamento conjugal como uma metáfora dentre outras para des crever a relação entre o Senhor e Israel. A intimidade do relacionamento conjugal ressalta tanto a intimidade entre Deus e seu povo quanto a exclusividade da relação. A associação estreita de adultério e idolatria baseiase no fato de que existem apenas dois tipos de relações legitimamente exclusivas nas quais o ciúme zeloso é apropriado: o relacionamento com Deus e o casamento. Em certo sentido, a interpretação do livro fecha o círculo voltando à leitura de Cântico dos cânticos como uma reflexão sobre a intimidade nas relações entre Deus e os homens. Em primeiro lugar, a leitura “natural” do livro não é deixada de fora; trata-se de uma obra que ce lebra a sexualidade humana. Em segundo lugar, a associação de Cântico dos cânticos com o relacionamento divino não é arbitrária, mas está profundamente arraigada no cânon. O cristão que lê Cântico dos cânticos é conduzido à continuação da metáfora do casa mento quando Paulo a desenvolve em Efésios 5.22-33. Da mesma forma que Paulo descreve o relacionamento entre maridos e esposas, vê essa relação como um reflexo do amor de Cristo pela igreja. B ib l io g r a f ia
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#7157 (pinnâ, canto [ângulo])
Canto -> # 8876 (syr, cantar) Cão 454
# 3978 (keleb, cão)
Carmelo
Captura -> # 296 ( 'hz I, capturar, assentado) Cardo
# 1998 (dardar, cardo)
Carência -> # 4728 (mahsôr, carência, falta)
Carmelo
Carmelo (^Dl? [karmel III], # 4151).
Carmelo (kerem, vinha + / [GK § 85s]): uma cadeia de montanhas que se estende de oeste para leste a partir do sul da baía de Aco, também conhecida como har hakkarmel, cordi lheira do Carmelo, e rõ ’$ hakkarmel, cabo ou promontório do Carmelo. Normalmente aparece como “o Carmelo”, mas o art. pode ser omitido em textos poéticos (Is 33.9; Jr 46.18). OMA Fontes egípcias antigas que possivelmente fazem referência ao Carmelo: Museu do Cairo 1435 (c. século XXIV a. C.), “o Focinho da Cabeça da Gazela” (Aharoni, 1979,237; in ANET, 228b, “Antelope-Nosé”)-, lista de cidades de Tutmés III (século XV a. C.), r-S q-d-s (Ca beça Sagrada = Promontório do Carmelo, Aharoni, Land, 161, no. 48); Papiro Anastasi I (final do século XIII a. C.), o monte wsr ( User = forte, poderoso) (ANET, 477b; cf. Aharoni, 1947). A segunda referência pode indicar que o monte já era sagrado. A passagem pela cordilheira do Carmelo é mencionada na primeira campanha de Tutmés II: “Sua Majestade entrou na estrada que se toma deveras estreita” (ANET, 234b); a passagem ao longo da costa ao redor do pro montório era considerada perigosa demais para ser usada. Salmaneser III referiu-se a Ba 'li-ra 'si (ANET, 280; Aharoni, 1979, 341): Senhor do Cabo ou Baal do Cabo? (-> Baal). Lá, em 841 a. C. ele recebeu tributo de Ia-u-a mâr hu-um-ri-i (Jeú, “filho” [do clã] de [“Bit”] Onri), rei de Samaria. É possível tratar-se de uma indicação de que o Carmelo marcava a fronteira entre Tiro e Israel no litoral. No entanto, Lipinski afirma que o acad. sa p üt tam-di sapu-ut kur$urri, nos anais de Salmaneser III, “de frente para o mar e de frente para (a terra de) Tiro”, indica que r-í q-d-s e Ba 'li-ra 'si são na verdade Rãs en-Nãqüra ou a Escada de Tiro em geral. AT O Carmelo é importante como a. símbolo de fertilidade, b. símbolo de altitude e c. lu gar sagrado. Tanto a. quanto c. estão relacionados à localização do promontório, que se eleva a noroeste saindo da costa como parte mais ocidental no norte; encontra-se voltado para o mar de onde vêm os ciclones que trazem consigo as chuvas e, por ser elevado, recebe mais preci pitação do que qualquer outra parte ao sul da Galiléia. 1. As árvores do Carmelo e de Basã perderam as folhas; isso, juntamente com o fato de Sarom haver secado e se transformado em deserto, simboliza a desintegração social de Israel, em Isaías 33.9 e Naum 1.4, e o castigo do Senhor, em Amós 1.2. Por outro lado, na volta do exílio, o deserto receberá “o esplendor do Carmelo e de Sarom” (Is 35.2; cf. Jr 50.19). 2. A cabeça do amado “é como o monte Carmelo” (Ct 7.5 [6 ]); o invasor será tão alto quanto o Tabor ou o Carmelo (Jr 46.18). Ainda assim, o monte não é alto o suficiente para os fugitivos escaparem do castigo do Senhor (Am 9.3). 3. Essa cadeia de montanhas ocupa uma posição de destaque nas histórias de Elias e Eliseu. Elias recebe a ordem de levar “toda Israel” à cordilheira do Carmelo. Lá, ele restaura o mizbah yhwh, altar de Javé (ao contrário da teologia deuteronômica). Assim, o Carmelo é considerado um antigo santuário de Javé, sendo usurpado por um invasor, Baal — e não, como alguns estudiosos sugerem, uma competição no “próprio território” de Baal. 455
Casamento de levirato
Nos acontecimentos subseqüentes. Javé mostra que é o único verdadeiro deus da tem pestade: controla os raios (1 Rs 18.38) e a chuva (1 Rs 18.45). O local tradicional do conflito (elMuhraqa) fica bastante afastado do mar (ver de Vaux, 238 n.4), mas é de se pensar se esse local sagrado situava-se ou não no promontório voltado para o mar. Isso porque, a fim de determinar a aproximação da tempestade, Elias sobe ao promontório (que aparece como rõ ’s hakkarmel) e diz ao seu servo para olhar para o mar, onde acaba vendo a primeira nuvem (1 Rs 18.42-44). Eliseu é associado ao Carmelo de modo um tanto periférico. Em 2 Reis 2.25, ele volta de Jericó para Samaria pelo “monte Carmelo” — um caminho incomum. Em 2 Reis 4.25, ele é procurado e encontrado no monte. Fora isso, tem-se a impressão de que ele vagava de um lado para o outro ou que vivia em Samaria. B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land the Biblel, 1979; idem, “Settlement of the Israelite Tribes ...” (Hebrew), 1947; D. Baly, The Geography o fth e Bible, 1974, 172-73; O. Borowski, “The Carmel Ridge Is a Wedge Dividing IsraePs Northern and Southern Coasts”, BR 6 , 1990, 46-52; E. Lipinski, “Ba'li-Ra si et Ra'su Qudsu”, RB 78, 1971, 84-92; H. O. Thompson, “Carmel Mount”, ABD 1:874-75; R. de Vaux, “The Prophets of Baal on Mount Carmel”, in The Bible and the Ancient Near East, 1971,238-51. Judith M. Hadley Carmesim
# 9357 (tôlêa, verme, tecido carmesim)
Came -> # 1414 (bãsãr, came [alimento], comida, tecido [do corpo]) Carro
# 5324 (merkãbâ, carro de guerra, carro)
Casa -> # 1074 (bayit I, casa, habitação, construção, família, dinastia) Casamento -> # 1249 (b 7 I, casar-se, governar sobre)
O casamento de levirato é a união matrimonial de uma viúva com o irmão do marido falecido dela (lat. levir, cunhado; heb. yãbãm; -> # 3303). Estudos antropológicos mostram que grande parte dos gru pos sociais praticava o casamento de levirato (Murdock, 441) e, no OMA, os códigos legais atestam costumes análogos no meio dos vizinhos de Israel (MAL n°s. 30, 33, 43; cf. ANET, 190-91; Hittite HL § 193; cf. ANET, 196; ver também Ugar. RS 16.144; Leggett, 9-27).OAT faz referência ao casamento de levirato em Gênesis 38.1-30; Deuteronômio 25.5-10; Rute 1.1113; 4.1-17 e Salmo 133.1-3, e retrata o costume como uma obrigação conhecida e nobre na Israel antiga. I. Deuteronômio 25.5-10 prescreve o casamento de levirato quando irmãos vivem jun e um deles morre sem deixar um herdeiro do sexo masculino (v. 5). Em tais circunstâncias, a vi úva não deve se casar com ninguém de fora da família (vv. 5-6). Se o cunhado se recusar, a viúva deve remover uma das sandálias dele na presença dos anciãos, cuspir no rosto dele e proferir uma explicação padrão (vv. 7-10). Não se sabe ao certo o significado dessa cerimônia chamada de hali$â no judaísmo (do vb. heb. hl$, remover ou tirar [-> # 3741], v. 9). No divórcio dentro da cultura beduína, o marido às vezes lança fora sua sandália e declara que faz o mesmo com Casamento de levirato
456
Casamento de levirato
sua esposa (Smith, 105). Em textos de origem Nuzi, uma sandália é entregue como pagamento simbólico (Speiser, 15-18) e um dos pés é levantado de um pedaço de terra para renunciar o direito de posse e colocado sobre ela para reivindicar esse direito (Lacheman, 53-56). Da mes ma forma, Javé se apropria de Edom ao atirar sua sandália sobre ela (Sl 60.8 [10]). De acordo com Rute 4.7, remover uma sandália legaliza a transferência de uma propriedade, conferindo à transação um caráter irrevogável. Em Deuteronômio 25.5-10, a declaração “Assim se fará ao homem que não quer edificar a casa de seu irmão” (v. 9) indica que o ritual combina metáfora legal e erótica (cf. o significado eufemístico dos pés em Ex 4.25; Dt 28.57; Carmichael, 32930). Ao recusar a consumação do casamento e produção de um herdeiro, o cunhado abre mão de todo direito em relação à viúva e às propriedades do marido falecido dela, colocando em risco, desse modo, uma parte dos bens da família (para herdeiras do sexo feminino e alienação de propriedades, ver Nm 27.1-11; Jó 42.15; Josefo, Ant 4.8.23; Weingreen, 518-20; Davies, 141-42; Thompson e Thompson, 96-99). Afinidades estruturais e temáticas ligam os vv. 5-10 com os w . 11- 12 , os quais, juntos, advertem que nem o homem nem a mulher devem colocar em risco a geração de um herdeiro (Eslinger, 221-26). A disposição paralela de Deuteronômio 5.6-21 e 12.1-25; 16 indica que a lei do levirato é uma aplicação específica do décimo manda mento: não cobiçarás (cf. 5.21 e 25.5-16; ver Kaufman, 105-58; Merril, 326-31). 2. As histórias sobre Judá e Tamar (Gênesis 38) e Rute e Boaz (Rute 4) fazem do ca samento de levirato uma questão de responsabilidade social e providência divina. Em Gênesis 38, Judá tem dois filhos perversos que são mortos por Javé: Er, por motivos não especificados, e Onã, por não cumprir a obrigação de levirato para com Tamar, viúva de Er, temendo a perda de outro filho, Judá se recusa a dar Tamar — viúva pela segunda vez — a Selá (vv. 1-11). As sim, Tamar se disfarça de prostituta e engana seu sogro de modo que ele cumpra, sem saber, o dever de Selá (vv. 12-23). Três meses depois, quando Judá toma conhecimento da gravidez de Tamar, ordena que seja morta por prostituição, mas retira essa ordem quando ela prova que ele é o pai (vv. 24-25). Sem ter saída, ele confessa: “Mais justa é ela do que eu, porquanto não a dei a Selá, meu filho” (v. 26). Apesar de não reconhecer a prostituta coberta com um véu “à entrada de Enaim” (v. 14; petah ‘ênayim, lit., o abrir dos olhos), reconhece o próprio erro e a justiça do casamento de levirato (Bos, 40-49). Em Rute 4, Boaz usa o casamento de levirato como uma manobra engenhosa para ga rantir a posse de propriedades para as viúvas desamparadas, Noemi e sua nora Rute. Num tri bunal na porta da cidade, Boaz anuncia que Noemi está vendendo as propriedades dela (ou o direito de redimi-las) e sugere que o parente resgatador que tem o direito preferencial compre as tais terras (vv. 1-4). O parente concorda até que Boaz anuncia: “No dia em que tomares a terra da mão de Noemi, também eu tomarei da mão de Rute, a moabita, já viúva, para suscitar o nome do esposo falecido, sobre a herança dele” (v. 5 — segundo a versão K qãniti, eu ad quiro, ao contrário de Q qãnitâ, tu adquires; Beattie, 1971,490-94; Sasson, 119-36). Sabendo que perderá o direito à propriedade, uma vez que Boaz e Rute gerarem um herdeiro, o parente resgatador diz: “Para mim não a poderei resgatar, para que não prejudique a minha [herança]” (v. 6 ). Em Gênesis 38 e Rute 4, os justos aceitam a responsabilidade do levirato e, pela provi dência (um tema recorrente em Gênesis e Rute), cuidam de viúvas desamparadas e preservam a linhagem de Davi (Gn 38.27-30; Rt 4.18-22). 3. As interpretações tradicionais não reconhecem uma provável menção ao casamen to de levirato no Salmo 133. Esse cântico de sabedoria celebra a bênção que Javé concede ao “viverem unidos os irmãos” (cf. Sl 133.1 e Dt 25.5). A oração refere-se ao inquilinato conjun to numa propriedade da família e não à harmonia social ou religiosa (Oesterley, 534-36). O termo “unidos” (v. 1) não é necessário na tradução e a frase “E como o óleo precioso sobre a 457
Casamento de levirato
cabeça, o qual desce para a barba, a barba de Arão, e desce para a gola de suas vestes” (v. 2) constitui quase certamente um acréscimo feito por um escriba (cf. N IV e BHS, n. I33:2b-b; H.-J. Kraus, 484-86). Essa emenda pode ter sido feita por um escriba que acreditava que o casamento de levirato transgredia as proibições relacionadas ao incesto (Lv 18.15-16; 20.21; 21.14; Westbrook, 8 6 ). De acordo com o salmo, esse inquilinato conjunto é bom e agradável (v. 1), pois perpetua a vida (v. 3). Assim como o óleo e o orvalho (vv. 2-3), que pressagiam prosperidade e fertilidade, o inquilinato conjunto garante que haverá descendentes para herdar, manter e desfrutar a terra. 4. Diferenças entre os quatro textos indicam que a prática sofreu variações ao longo tempo (ver Rt 4.7). A recusa em honrar essa obrigação resultava em morte para o recalcitrante no tempo dos patriarcas (Gn 38.10), em humilhação pública para o homem e sua família depois que foi dada a lei (Dt 25.9-10) e ligeiro desconforto no tempo dos juizes (Rt 4.6-8). O escritor de Rute concede anonimidade ao resgatador relutante (4.1) e a emenda do Salmo 133 desvia a atenção da questão do levirato (v. 2). No NT, a pergunta que os saduceus fizeram a Jesus sobre o casamento e a ressurreição pressupõe o conhecimento da prática do levirato (Mt 22.23-33; Mc 12.18-27; Lc 20.27-40) e isenções do casamento de levirato são assunto de debates rabínicos no século II (ver Mix. Yab. 1:1-16:7). A tendência histórica parece deslocar-se da obediência estrita para a evasão sob pretextos técnicos (Manor, 138-42). Casamento, noivado: -> 'rs (ficar noivo, # 829); -> b ‘l I (casar-se, govemar sobre, pos suir, # 1249); hrp IV (comprometido/noivo, # 3072); -> hatunnâ (casamento, # 3164); ybm (consumar o casamento, # 3302); -> kallá (noiva, nora, # 3987); -> mõhar (dote da noiva, # 4558) B ib l io g r a f ia
ABD 4:296-97; Anclsr, 24-38; EncJud 11:122-31; IDE 3:282-83; JewEnc 8:45-46; NIDNTT 2:577-78; RGG3 4:338-39; TDOT5:367-73; TWAT 3:393-400; TWOT 1:359-60; D. R. Beattie, “Kethibh and Qere in Ruth IV 5”, VT 21, 1971,490-94; idem, “The Book o f Ruth As Evidence for Israelite Legal Practive”, K7~24,1974,251-67; S. Belkin, “Levirate and Agnate Marriage in Rabbinic and Cognate Literature”, JQR 60,1969,275-329; J. W. H. Bos, “Out of the Shadows: Genesis 38, Judges 4:17-22, Ruth 3”, Semeia 42, 1988, 37-67; H. C. Brichto, “Kin, Cult, Land and Afterlife—A Biblical Complex”, HUCA 44, 1973, 1-54; M. Burrows, “Levirate Marriage in Israel”, JBL 59, 1940,23-33; idem, “The Ancient Oriental Background o f Hebrew Levirate Marriage”, BASOR 77, 1940, 2-15; idem, “The Marriage of Boaz and Ruth”, JBL 69, 1940, 445-54; E. F. Campbell, Ruth, AB, 1979; G. Cardascia, “Adoption matrimoniale et levirat dans le droit d’Ugarit”, ARA 64, 1970, 119-21; C. M. Carmichael, “ACeremonial Crux: Removing a Man’s Sandal as a Female Gesture of Contempt”, JBL 96, 1977, 321-36; P. Cruveilhier, “Le levirat chez les hebreux et chez les assyriens”, RB 34,1925,524-46; D. Daube, “Consortium in Roman and Hebrew Law”, Juridical Review 62,1950,71-91; E. W. Davies, “Inheritance Rights and Hebrew Levirate Marriage”, V T3\, 1981,138-44,257-68; L. Epstein, MarriageLaws in the Bible and the Talmud, 1942,77-144; L. Eslinger, “More Drafting Techniques in Deuteronomic Laws”, VT 34, 1984, 221-26; F. E. Greenspahn, When Brothers Dwell Together, 1994, 48-59; S. A. Kaufman, “The Structure o f the Deuteronomic Law”, MAARAV ‘A , 1978-79, 105-58; P. Koschaker, “Zum Levirat nach hethitischen Recht”, Revue hittite et asianique 10,1933,77-89; J. —J. Kraus, Psalms 60-150, 1989, 484-86; E. R. Lacheman, “Note on Ruth 4:7,8”, JBL 56, 1937, 53-56; D. Leggett, The Levirate and Goel Institutions in the Old Testament, 1974; D. W. Manor, “A History of Levirate Marriage As It Relates to the Bible”, ResQ 27, 1984, 129-42; 458
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# 5969 (niskã, depósito(s), cela, cômodo)
Celeiro -> # 4473 (mãgôr III, poço de armazenagem) Censura -> # 1721 (g ‘r, rugir, berrar, gritar, repreender, censurar) Centena -> # 4395 (m ê'â I, cem) Centro -> # 9348 (tãwek, meio) Cercania -> # 6015 (sbb, virar, dar a volta, cercar) Cerco -> # 7443
(s h t
I, sitiar)
Cereal -> # 26 ( 'ãbib, espigas de cereal) 459
Cheiro
Cerradura
# 6781 ( ‘.yh 1, cerrar)
Cervo -> # 385 ( 'ayyãl, cervo) Cetro -> # 8657 (sêbet, tribo, bastão, vara, arma, cetro) Céu -> # 9028 (sãmayim, céu, firmamento, ar) Cevada Chacal
# 8555 (.íe ora, cevada) # 9478 (/an, chacal)
Chacina -> # 1947 (dãm, sangue, chacina, assassínio) Chama -> # 4528 (lahab, chama, lâmina) Chamado -> # 7294 (<7/- ’ I, chamar, invocar, convocar, proclamar) Chamuscamento
# 8596 (ir/?, queimar, chamuscar, cauterizar)
Chefe -> # 5954 (n ã ií' 1, chefe, rei) Chegada
# 995 (6 w ir, vir, chegar, entrar)
O sentido do olfato não tem a mesma precisão que a visão ou a audição, mas o efeito físico direto de um odor confere aos cheiros fortes uma influência emocional peculiar. No mundo antigo, havia aromas e fragrâncias agradáveis (perfumes, óleos, árvores aromáticas) e cheiros e fedores desagradáveis (feridas supuradas, cadáveres). A distinção clara entre os cheiros bons e ruins significa que a linguagem dos cheiros é uma forma eficaz de expressar conceitos éticos, sociais e religiosos opostos. Por vezes, é difícil saber até que ponto o significado derivado tomou-se convencional e o quanto do simbolismo físico do cheiro se perdeu. O cheiro que marca a conclusão de um sacrifício ou oferta possuía nuanças particular mente relevantes. Assim como Noé (Gn 8.20-21), Utnapistim, o herói do dilúvio mesopotâmio oferece um sacrifício depois dessa ocorrência e “os deuses sentiram seu aroma, os deuses sentiram seu doce aroma, os deuses se aglomeraram feito moscas ao redor do sacrificador” (Gilgamés XI, 159-61; ANET, 95). Apesar de ser provável que haja um certo elemento de sátira nessas palavras, a ausência de sentimentos semelhantes na Bíblia reflete os limites e ênfases da maneira como esse conceito opera em seu simbolismo. No caso de Gilgamés, o aroma das ofertas atrai os deuses que se encontram famintos devido à ausência de sacrifícios durante o dilúvio. Na Bíblia, não há nenhuma indicação de que Deus precisava de sustento proveniente do culto a ele (cf. S150.8-15). Outro aroma universal é o do incenso (qe(õret) que era usado para controlar os cheiros tanto em ambientes domésticos quanto religiosos. Cheiro
Incenso: lebõnâ I (incenso, resina branca, # 4247); -> qtr (deixar-se transformar em fu maça, # 7787) 460
Cidades levíticas
Oferta, sacrifício: -> 'azkãrâ (oferta simbólica, # 260); 'isseh (sacrifício por fogo, # 852); -> 'ãsãm (sacrifício pela culpa, #871); -> zbh (abater, sacrificar, # 2284); -> haftã 'at (sacrifí cio pelo pecado, # 2633); (6 /) (abater, # 3180); -> wm/iâ (presente, dádiva, oferta, sacrifício, # 4966); ma ‘asêr (dízimo, # 5 130); -> nc/r (fazer um voto, # 5623); «wp I (mover para frente e para trás, balançar, # 5677); -> I (derramar, ser consagrado, libação, # 5818); -> ô/ô (holocausto, # 6592); -> ‘flr á â (oferta de manjares, # 6881); -> qorbãn (oferta, presente, # 7933); shf I (abater, # 8821); -> selem (sacrifício de compensação, # 8968); tãmid (ofer ta regular, # 9458); -> firúm â (tributo, contribuição, # 9556); -> Arão: Teologia; -> Oferta: Teologia; Sacerdotes e Levitas: Teologia Cheiro, fedor: b s (feder, tomar-se odioso, # 944); z m t III (feder, ser ofensivo, # 2320); -> zn/i I (tomar-se mal-cheiroso, # 2395); /i«n II (estar fedendo, ser repugnante, # 2859); -> sr/í II (feder, estragar, # 6244); -> $ahanâ (fedor, # 7462); -> rwh B (cheiro, # 8193); -> Cheiro: Teologia Chicote
# 5777 («A- ’, ser açoitado, fustigado)
Chofar -> # 8795 (sôpãr, chifre de carneiro) Choro -> # 7590 (.y^, clamar, erguer um clamor de lamentação, convocar, chamar) Chumbo
# 6769 ( 'õperet, chumbo)
Chuva -> # 1772 (gim, fazer chover) Chuvas -> # 8053 (i^bib im , chuvas) Cidadão -> # 275 ( 'ezrãh, cidadão natural) Cidade
# 6551 ( 7> I, cidade grande, cidade)
Cidadela -> # 1072 ( 6 /rá, cidadela, acrópole)
1.0 rateio de 48 cid conferiu-as aos levitas no lugar das concessões de ter ritórios como no caso das outras tribos de Israel. De acordo com Josué 21.1-42, as cidades levíticas foram determinadas e entregues aos clãs levitas lançando-se sortes. Além disso, seis das 48 cidades levíticas foram separadas como cidades de refugio. Essas cidades especiais eram lugares de asilo para aqueles que haviam cometido homicídio culposo (acidental), de acordo com a lei heb. (cf. Nm 18.20-32; Dt 19.1-13; Js 20.1-9; -¥ miqlãf, refugio, asilo, # 5236). Em outras passagens, a lei sacerdotal indica que os levitas tinham o direito de res gate sobre propriedades familiares nas cidades levíticas e as leis que regiam a restituição de propriedades ao dono original no Ano de Jubileu também se aplicavam às propriedades dessas cidades levíticas (Lv 25.25-34). Essas 48 cidades levíticas foram divididas de forma a haver uma média aproximada de quatro cidades de cada tribo de Israel. Em termos geográficos, foram distribuídas de Aim, no sul de Judá, a Quedes, no norte da Galiléia e de Gate-Rimom, na planície costeira até a Cidades levíticas
461
Cidades levíticas
Transjordânia. Os levitas que eram descendentes de Arão receberam treze cidades (de Judá, Benjamim e Simeão; Js 21.4), os descendentes de Gérson, o primeiro filho de Levi, também receberam treze cidades (de Aser, Naftali e Manassés; Js 21.6 ), os descendentes de Coate, o segundo filho de Levi, receberam dez cidades (de Efraim, Dã e Manassés; Js 21.5) e os de Merari, terceiro filho de Levi, receberam doze cidades (de Rúben, Gade e Zebulom; Js 21.7). 2. A concessão de cidades aos levitas foi uma providência pragmática social e econô mica. Ao contrário das outras tribos de Israel, os levitas não tinham direitos territoriais, uma vez que a herança deles era o Senhor Deus e o serviço a Israel em nome dele (Nm 18.20; Dt 10.9-10). E, no entanto, eles também precisavam de um lugar para viver e de auxílio econômico. Assim, as terras de pastagem ao redor das cidades levíticas foram concedidas a eles (Js 21.8, 11, etc.). 3. A dispersão das cidades levíticas pelos territórios tribais israelitas também tinha funções religiosas e políticas. E bem provável que, além de seu rodízio habitual nas funções sacerdotais no tabemáculo (ou, posteriormente, no templo), os levitas servissem ainda como mestres e executores da lei da aliança no meio do povo (cf. lCr 26.20-32; 2Cr 17.7-9). Tam bém é possível que tivessem exercido uma importante função política durante os dias da união das tribos e no período monárquico, servindo de “cidadãos exemplares” e “lobistas” no meio da população geral, apoiando fielmente o juiz ou rei ungido por Javé. As variações nas listas paralelas de cidades levíticas Josué 21 e 1 Crônicas 6 conti nuam sendo motivo de controvérsia nos meios acadêmicos com referência a vários assuntos relacionados a isso. A questão da primazia entre fontes bíblicas tem como melhor solução o reconhecimento do caráter original de Josué ou a pressuposição de uma tradição comum que deu origem a relatos divergentes. O estudo minucioso da versão G, em comparação com o TM, confirma a validade histórica da lista de cidades, uma vez que apenas algumas delas ainda não foram identificadas com locais conhecidos da antigüidade. Um assunto mais sério é a acusação de que as passagens que descrevem a distribuição das cidades levíticas caem em contradição com os ensinamentos do Pent. sobre o lugar dos levitas na sociedade heb. (p. ex., que não receberam herança alguma e viviam dos dízimos dos sacrifícios, Nm 18.20,24; Dt 18.6-8; e os levitas são contados entre os despossuídos de Israel, ou seja, o estrangeiro, o órfao e a viúva, Dt 14.29; 16.11). Estudiosos têm afirmado subseqüen temente ao longo dos anos que, de fato, essas cidades nunca existiram, mas eram interpretações posteriores idealizadas da existência de Levi como uma tribo dispersada em Israel (de acordo com Auld). Outros consideram a lista de cidades como parte da organização dos levitas rea lizada por Davi, uma vez que muitas das cidades mencionadas só passaram a fazer parte de Israel depois da conquista de Davi (de acordo com Butler, Mazar). Alguns chegaram a sugerir que a lista de cidades levíticas não passa de uma apologia para a inclusão de locais sagrados cananeus no sistema religioso de Israel (de acordo com IDB 3:116). Entre os contra-argumentos pode-se citar a necessidade de reconhecer-se a distinção entre as cidades como herança e as áreas de terra unificadas concedidas a outras tribos. Além disso, em lugar algum os levitas recebem posse exclusiva dessas cidades. Antes, lhes é concedido o direito de assentar-se e habitar nesses locais (cf. Nm 35.7). Por fim, a conquista gradativa de Canaã pelos hebreus não exclui a possibilidade de que certas cidades levíticas já funcionassem como tal antes do reinado de Davi. A lista de Josué 21 simplesmente antevê uma realidade es perada, enquanto o cronista reflete em termos teológicos sobre a realidade histórica posterior das cidades levíticas. 4. Como “centros da Torá”, as cidades levíticas eram de enorme importância teológi ca para o estilo de vida nacional. Serviam de lembrança tangível de que a terra de Israel era 462
Circuncisão
diferente de todas as outras. A ordem da aliança mosaica para que Israel fosse uma nação de sacerdotes só podia ser cumprida se os levitas instruíssem o povo nos estatutos de Javé. Esse ministério sacerdotal de educação englobava tanto a transmissão do conhecimento de Deus quando o incentivo da obediência à lei divina. De fato, a própria sobrevivência de Israel na ter ra prometida dependia da sujeição às estipulações da aliança de Javé (cf. Lv 18.24-30), como reconheceu o profeta Oséias (Os 4.6; 6.3). Além disso, somente à medida que os israelitas atentavam para Deus e sua revelação da aliança, obedecendo-a com amor, é que os israelitas podiam ser a luz de Javé para as nações (p. ex., Is 42.6; sobre esse assunto, ver E. J. Hamlin, Joshua, ITC, 1983, 152-53). 5. Em termos escatológicos, as cidades levíticas do AT podem simbolizar o legado servados para todos aqueles que são fiéis a Javé. Assim como o Senhor era a porção dos levitas, também o próprio Deus será a herança daqueles que têm seu nome inscrito no Livro da Vida (Ap 21.6-7, 27). Então, o conhecimento de Deus estará por toda a parte na cidade celestial e as nações da terra andarão na luz dela (21.21-27) Refúgio, escape: -> hsh (buscar refúgio, # 2879); -> mãlôn (alojamento, # 4869); -> mãnôs (lugar de escape, # 4960); -> miqlãt (refúgio, asilo, # 5236); -> ‘wz (refugiar-se, # 6395); p lf (salvar, colocar em segurança, # 7117); -> srd (fugir, escapar, # 8572) B ib l io g r a f ia
ISBE 3:109-10; W. F. Albright, “The List o f Levitic Cities”, in S. Lieberman, et. al., eds., Louis GinzbergJubilee Volume 1, 1945,49-73; A. G. Auld, “The Levitical Cities: Texts and History”, Z A W 91, 1979, 194-206; idem, “Joshua: The Hebrew and Greek Texts”, in J. A. Emerton, ed., Studies in the Historical Books o f the Old Testament (S VT 30), 1979, 1-14; R. G. Boling e G. E. Wright, Joshua, AB 7, 1982,478-97; R. Braun. 1 Chronicles, WBC 14, 1986,95-102; T. C. Butler, Joshua, WBC 7, 1983, 218-33; A. Cody, A History o f the Old Testament Priesthood, AnBib 35, 1969, 159-65; S. J. DeVries, I & 2 Chronicles, FOTL 11, 1989, 62-72; M. Haran, “Studies in the Account o f the Levitical Cities”, JBL 80, 1961, 45-54, 156-65; idem, Temples and Temple-Service in Ancient Israel, 1978,84-87, 112-31; B. Mazar, “The Cities o f the Priests and Levites”, SV T1, 1960, 193-205; H. G. M. Williamson, I & 2 Chronicles, NCB, 1982, 6 8 76; M. H. Wousdtra, Joshua, NICOT, 1981, 303-313. Andrew E. Hill Cinco
# 2822 (hãmês, cinco)
Cinto -> # 2512 (hagôr, cinto, cinta) Cinzel -> #5108 (ma ‘asãd, podadeira, cinzel) Círculo -> # 2552 (hwg, traçar um círculo)
OMA A circuncisão era uma prática sem. realizada na puberdade (cf. Gn 17.25), como um rito de iniciação para a idade adulta do homem e para o casamento (cf. Gn 34.15-16; Êx 4.25; de Vaux, 46-47). No Egito, era praticada nas classes sociais mais altas, com uma ligeira variação na técnica cirúrgica (cf. Sasson, 474). Não era praticada na Mesopotâmia e nem pelos filisteus (-> W, # 6887). Circuncisão
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Circuncisão
AT 1. A aliança promissiva feita com Abraão em Gênesis 17 serve, em termos canônicos, para reafirmar a aliança de Gênesis 15 (-> beríi, # 1382). A circuncisão, que constitui a ampu tação do prepúcio de modo a expor a glande do pênis, deveria servir de confirmação da aliança para Abraão e seus descendentes do sexo masculino. A relação entre aliança e circuncisão é enfatizada na estrutura dos vv. 9-14 (cf. Westermann, 263-64). A circuncisão pressupõe uma apropriação da aliança (v. 10). Também serve de sinal (v. 11 ’ôt, # 253) de que, de acordo com uma comparação com Êxodo 31.12, é uma lembrança dada por Deus e um reconhecimento do caráter de distinção daqueles que receberam a aliança (cf. 1lermisson, 69). Assim, uma práti ca cultural comum (ver acima, OMA) foi investida de um novo significado religioso. Também passou a ser realizada no oitavo dia depois do nascimento (v. 12; cf. 21.4; Lv 12.3). Funcionava como marca indispensável de Deus em seu povo, sendo que a ausência dessa marca acarretava excomunhão (Gn 15.14). O papel da circuncisão como critério para a participação efetiva na comunidade religiosa é ressaltado em Êxodo 12.44, 48, em que a circuncisão é requisito para que se tome parte na celebração da Páscoa. 2. Em Gênesis 34, a exigência de que os homens de Siquém fossem circuncidados an tes de se casarem com membros da família de Jacó foi um engodo (v. 13) para incapacitá-los e facilitar o extermínio deles como vingança pela morte de Diná (vv. 25, 31). Essa passagem não apenas expressa o papel da circuncisão como condição essencial para a participação na comunidade (v. 16), como também serve de contestação aos casamentos mistos com os vizi nhos pagãos (cf. Dt 7.2-3; Kessler, 3-8). 3. Em Josué 5.2-18, Deus ordena que a geração de israelitas nascidos no deserto e que não haviam sido circuncidados passe por esse ritual. Assim como em Êxodo 12.44, 48, a cir cuncisão é uma precondição para a Páscoa (v. 10). Ao que parece, a declaração de que se tratou de uma segunda circuncisão (“de novo”, Js 5.2) é uma referência à passagem de Êxodo. O rito também marca a consagração do povo de Deus antes de ocupar a terra prometida na aliança (vv. 6 , 11-12; cap. 6 ). (-> Páscoa, # 7175) 4. A narrativa enigmática de Êxodo 4.24-26a é explicada no v. 26b cm termos da midõt (circuncisão) de Moisés (cf. Childs, 100). Essa passagem serve para mostrar a necessidade da circuncisão antes que Moisés pudesse dedicar-se à missão da qual Deus havia lhe incumbido. No original, os pronomes indefinidos da passagem tomam o texto ambíguo; mas, ao que pare ce, o ataque divino do v. 24 foi desencadeado pela condição incircuncisa de Moisés, que seria reparada por sua esposa ao circuncidar o filho como um ato vicário, completado quando ela tocou os pés ou o pênis de Moisés (cf. Is 6.2; 7.20) com o prepúcio removido da criança. Em termos contextuais, Moisés também parece atuar como representante do primogênito de Deus, Israel, cuja vida foi poupada pela aplicação de sangue a suas casas (cf. v.22; 12.12-13; 13.1-2, 15-16 e Kosmala, 22-23). 5. O vb. mwl, circuncidar (# 4576) é usado com sentido metafórico. Em Deuteronômio 10.16, como conseqüência de sua eleição, os israelitas são chamados a circuncidar o coração, num gesto oposto a “[endurecer] a cerviz” (v. 16) e equiparado a uma atitude espiritual de temor, serviço e apego ao Senhor (v. 20). A menos que seja uma referência ao prepúcio que cobre a glande do pênis, trata-se de uma alusão à relevância da circuncisão como sinal de compromisso com a aliança, como em Gênesis 17. O texto insta o povo a um compromisso semelhante de “coração” (-> lêb, # 4213), órgão que representa a vontade e a disposição mental do homem (cf. Hemiisson, 71,74). Da mesma forma, Deuteronômio 30.6 promete que, quando Israel fosse restaurada à terra depois de se arrepender no exílio. Deus daria início a uma nova era marcada pela circuncisão que ele próprio realizaria no coração do povo a fim de que o amasse “de todo o coração” (contrastar com Dt 29.4). Jeremias repete a idéia de Deuteronômio 10.16 em Jeremias 464
Circuncisão
4.4, que constitui a conclusão da liturgia de arrependimento em Jeremias 3.21— 4.2 e conclama a um equivalente espiritual do rito físico. A exortação himmõlú layhwh (“circuncidai-vos para o Senhor” ) assemelha-se a uma expressão ritualística (cf. 2Rs 23.21). Se for esse o caso, a ora ção seguinte, “circuncidai o vosso coração”, explicaria a anterior em termos de se colocar em prática o significado do rito: um compromisso com Deus (cf. Weinfeld, 33). Jeremias 9.25-26 [24-25], que pode ser uma referência a uma coalizão militar de nações que usaram a circuncisão como um elemento em comum para unirem-se contra os babilônios incircuncisos, deprecia o valor da circuncisão física (mwl, circuncidado) como um fim em si. Todos eles, inclusive Judá eram, na realidade “incircuncisos”, ou seja, “incircuncisos de coração”. P-B A importância da circuncisão para o judaísmo no período helenista é demonstrada pela proibição a essa prática por Antíoco IV, com o propósito de profanar a santa aliança ( / Mac 1.48, 60-61, 63), e pela circuncisão forçada dos idumeus imposta por João Hircano I (Josefo, Ant. XIII.257). A seita de Qumran enfatizava a interpretação espiritual da circuncisão. IQS 5:5 declara a necessidade de se circuncidar o prepúcio das disposições perversas e da dureza de cerviz, enquanto lQpHab 11:13 refere-se à circuncisão do coração e 1QH 2:18 menciona os lábios incircuncisos e 18:20 fala do ouvido incircunciso (-> W, # 6887). NT A circuncisão foi um ponto importante de controvérsia entre os cristãos judeus e gen tios. Tomando partido destes últimos, Paulo enfatizou ainda mais o caráter espiritual desse rito conforme o AT (e Qumran) e argumentou que a prática literal do mesmo já não era mais ne cessária (p. ex., Rm 2.28-29; Colossenses. 2.11-12; cf. At 7.51; NIDNTT 1:307-312). Circuncisão: -> mwl I (circuncidar, # 4576); mil II (circuncidar, # 4909); W (tratar como incircunciso, # 6887) Corte, destruição, extermínio, tosquia, poda: -> b.f ‘ (decepar, beneficiar-se, eliminar, sepa rar, # 1298); -> b r' III (podar árvores, cortar, destruir, # 1345); -> btr (despedaçar, # 1439); g d ‘ (cortar curto, # 1548); -> ghz (produzir, # 1602); gzz (cortar, tosquiar, # 1605); -> gzr I (cortar, remover, # 1615); -> grz (ser eliminado, # 1746); -> g r' I (cortar fora, cortar, # 1757); hlp II (trespassar, perfurar, # 2737); -> ksh (cortar, derrubar [mato / árvores], # 4065); -> krsm (deixar aparado, removido, #4155); -> krt (cortar, eliminar, exterminar, rea lizar aliança, circuncidar, # 4162); melqãhãyim (espevitadeiras para aparar / limpar lâm padas / lamparinas, # 4920); nqp I (cortar, derrubar [mato / árvores], destruir, # 5937); nth (despedaçar, # 5983); qsb (eliminar, tosquear, # 7892); ssp (despedaçar, #9119); -> tzz (decepar, # 9372). B ib l io g r a f ia
TD NT6:72-81; 7’^ 7 '4 :7 3 4 -3 8 ; 6:385-87; J. Barr, “Some Semantic Notes on the Covenant”, in FS Zimmerli, 1977, 23-38; B. S. Chids, Exodus, OTL, 1974; R. le Deaut, “Le thème de la circoncision du coeur (Deut 30:6; Jer 4:4) dans les versions anciennes (LXX et Targum) et à Qumran”, SVT 32, 1982, 178-205; M. V. Fox, “The Sign of the Covenant: Circumcision in the Light of the Priestly 'ôt Etiologies”, RB 81, 1974, 557-96; J. de Groot, “The Story of the Bloody Husband: Exodus 4:24-26”, OTS 2, 1943, 10-17; H.-J. Hermisson, Sprache und Ritus im altisraelitischen Kult, 1965,64-76; S. B. Hoenig, “Circumcision: The Covenant of Abraham”, JQR 53,1926/63,322-34; M. Kessler, “Genesis 34— An Interpretation”, Reformede Review 19, 1965, 3-8; H. Kosmala, “The ‘Bloody Husband’”, VT 12, 1962, 14-28; A. Lods, “La mort des incirconcis”, Comptes rendus de l 'A cadémie des Inscriptions et Belles-Lettres, 1943, 271 -83; 465
Ciro
S. E. Loewenstamm, “Zur Traditionsgeschichte des Bundes zwischen den Stücken”, VT 18, 1968,500-506; J. Reider, “The Etymology of Hebrew mui and mol and Its Bearing on tmol and 'etmoF', HUCA 12/13, 1937/38, 89-96; J. Sasson, “Circumcision in the Ancient Near East”, JBL 85, 1966, 473-76; H. Schmid, “Mose, der Blutbrautigam”, Jud 22, 1966, 113-18; J. A. Soggin, “Akkadisch TAR BERIT1 und Hebràisch”, VT 18, 1968, 210-15; R. de Vaux, Anclsr (Eng.) 1961,46-48; M. Weinfeld, “Jeremiah and the Spiritual Metamorphosis o f Israel”, ZAW 8 8 , 1976, 17-56; C. Westermann, Genesis 12-36, ConCon. 1985. Leslie C. Allen
Ciro
Ciro (IZhiS [kôreS], # 3931).
Ciro II, conhecido como Ciro o Grande, fundou o império persa durante seu reinado de 559 a 530 a. C. Era filho do persa Cambises I e de Mandane, uma princesa persa. Esta beleceu o domínio persa sobre os medas em 550, conquistou a Lídia e a Jônia em 547-546 e capturou a Babilônia em 539, derrotando Nabônido e seu filho, Belsazar, a última dinastia neo-babilônia. Quer por motivos religiosos ou pragmáticos, Ciro e outros reis persas aboliram a política seguida pelos impérios anteriores, restaurando os cativos — inclusive os judeus — às suas terras natais. OMA Na língua persa antiga, o nome de Ciro era kürus, em elamita kuras, no acad. kuras(u) e em gr. Kyros. No AT, seu nome aparece, tanto em heb. quanto em aram., 23x como kôres. Na capital de Ciro, Pasárgada (ver Kent, 166; E. Yamauchi, Persia and the Bible, 74-76), há somente três inscrições em persa antigo atribuídas a Ciro. Podem-se considerar mais importan tes quatro documentos acad.: 1. O Sonho de Nabônido (Oppenheim, 202-5,250), que garantiu ao rei da Babilônia que Marduque estava usando Ciro como servo para derrotar os medos; 2. A Crônica de Nabônido (ANET, 305-7), um relato valioso de como Ciro subiu ao poder; 3. O Relato em verso (ANET 312-15), que acusava Nabônido de mostrar favoritismo pelo deus-lua Sin e 4. O cilindro de Ciro (ANET, 315-16; Berger; Kuhrt; Harmatta; Walker), que declarava que Marduque havia chamado Ciro pelo nome para capturar a Babilônia, a cidade de Mardu que. Foram observados vários paralelos entre esse texto e as passagens sobre Ciro no livro de Isaías (Laato). Vários estudiosos (especialmente Boyce) afirmam que Ciro era zoroastrista, mas outros dizem que ele era adorador do deus Mitras. Apesar das escavações realizadas em sua capital, Pasárgada (Stronach, Pasargadae), não há nenhuma evidência direta das convicções religiosas de Ciro (Yamauchi, 419-24).
AT 1. Daniel, que serviu na corte babilônia, continuou a prestar seus serviços sob o domínio persa depois que a Babilônia foi capturada por Ciro (Dn 1.21; 10.1). Com relação ao problema controverso de “Dario”, o meda (Dn 6.28), Wisemann sugere a possibilidade de que esse fosse um título de Ciro. 2. Esdras 1.1-4 (|| 2Cr 36.22-23) registra o decreto generoso de Ciro publicado depois d ele haver tomado a Babilônia e que não apenas incentivou os exilados judeus a voltarem para Judá como também autorizou recursos e ofertas para a reconstrução do templo. Ciro também devolveu os utensílios que haviam sido tirados do templo (Ed 1.7-8). Estudiosos mais antigos haviam questionado a autenticidade do decreto de Ciro em função de sua fraseologia judaica, mas as evidências de documentos daquela mesma época mostram que seus termos estavam 466
Ciro
de acordo com a política real da Pérsia (Bickerman, De Vaux). Posteriormente, no reinado de Dario I (522-486), quando surgiu a oposição à reconstrução do templo pelos judeus, o rei de cidiu em favor dos judeus, quando um memorando aram. do decreto de Ciro foi encontrado em Acmetá (Ed 6 .1 -5). 3. As referências mais significativas e controversas a Ciro são aquelas que aparecem em Isaías 44.28 e 45.1. Somente alguns estudiosos (p. ex., Harrison, 794) argumentam que es sas referências ao nome de Ciro são glosas inseridas por um copista. Outras passagens que se referem a Ciro: Isaías 41.1-5,25; 45.2-13; 46.11-13 e 48.14-15. a. Os estudiosos que defendem a unidade do livro Isaías (Allis, Archer, Manahan, Magalioth, Motyer, Oswalt, Whitcomb, Young) afirmam que se trata de previsões extraordinárias feitas por Isaías, o profeta do século VIII. Citam como caso paralelo a profecia do nascimento de um indivíduo mencionado pelo nome (lR s 13.2), a saber, Josias. Nas palavras de Josefo (Ant. XI.5-6): “Ciro sabia de tais coisas por ter lido os livros de profecia que haviam sido dei xados por Isaías duzentos e dez anos antes”. b. Outros estudiosos (MacKenzie, Radday, Simcock, M. Smith, Watts, Westermann, Whybray) atribuem essas passagens a um Deutero-Isaías anônimo que escreveu no século VI. S. Smith sugere que Isaías 40— 55 foi um panfleto escrito para incentivar os exilados judeus a se rebelarem contra Nabônido e apoiarem Ciro. Krantz sugere que se deve considerar que Isaías 40—48 foi escrito em 539 e Isaías 49— 54, no final do reinado de Ciro. Smart (115) comenta que “2 Isaías foi interpretado tão extensivamente sob a ótica da carreira de Ciro que não foi permitido a essa obra transmitir para uma era moderna a mensagem que lhe foi confiada por Deus e proferida fielmente pelo profeta em seu próprio tempo” . c. As referências de Isaías a Ciro ressaltam a soberania de Javé: O Deus que criou os céus e a terra é o único que pode prever o futuro. Foi ele quem chamou Ciro de seu pastor (Is 44.28) e mesmo de seu mãsiah, “seu ungido” (Is 45.1). Foi ele quem deu a Ciro as vitórias e quem despertou nele o desejo de libertar os cativos judeus para que pudessem retomar e re construir o templo do Senhor em Jerusalém. 4. A fonte gr. mais importante da história de Ciro é a obra de Heródoto, História das Guerras Médicas, redigida no século V a. C. E a Ciropédia (século IV a. C.) de Xenofonte, que supostamente relata a educação e a juventude de Ciro, mas que, na realidade, é um romance encomiástico que tem por finalidade exaltar Ciro, o Moço (c. 400 a. C.). B ib l k k jr a fia
O. T. Allis, The Unity ofIsaiah, 1950; G. Archer, A Survey o f Old Testament Introduction, 1974; P.-A. Beaulieu, TheReignofNabonidus KingofBabylon, 1989; P.-R. Berger, “Der Kyros-Zylinder ZA 64, 1975, 192-234; E. Bickerman, “The Edict of Cyrus in Ezra 1”, JBL 65, 1946, 249-75; M. Boyce, “The Religion o f Cyrus the Great”, in A. Kuhrt e H. Sancisi-Weerdenburg, eds., Achaemenid History III: Method and Theory, 1988, 15-31; Commémoration Cyrus, 3 vols., 1974; R. Dillard & T. Longman III, An Introduction to the Old Testament, 1994; J. Harmatta, “The Literary Pattems o f the Babylonian Edict o f Cyrus”, Acta Antiqua, 1971,217-31; R. K. Harrison, Introduction to the Old Testament, 1970; R. G. Kent, Old Persian, 1953; R. G. Kratz, Kvros im Deuterojesaja Buch, 1991; A. Kuhrt, “The Cyrus Cylinder and Achaeme nid Imperial Policy”, JSOT, 25, 1988; A. Laato, The Servant ofYH W H and Cyrus, 1992; J. MacKenzie, Second Isaiah, 1968; M. Mallowan, “Cyrus the Great”, Iran 10, 1972, 1-17; R. Manahan, “The Cyrus Notations o f Deutero-Isaiah”, GTJ 11, 1970,22-33; R. Margalioth, The Indivisible Isaiah, 1964; J. A. Motyer, The Prophecy o f Isaiah, 1993; A. L. Oppenheim, The Interpretation ofDreams in the Ancient Near East, 1956; J. Oswalt, The Book o f Isaiah, 1986; 467
Coate
Y. Radday, The Unity o f Isaiah in the Light o f Statistical Linguistics, 1973; C. Simcox, “The Role o f Cyrus Deutero-lsaiah”, JAOS, 57, 1937, 158-71; J. Smart, History and Theology in Second Isaiah, 1965; M. Smith, “II Isaiah and the Persians”, .7,405 83, 1963,415-40; D. Stronach, “Cyrus the Great”, Iran 10, 1972, 1-17; idem, Pasargadae, 1978; R. de Vaux, The Bi ble and the Ancient Near East, 1971, ch. 4; J. Walker, “A Recently Identified Fragment o f the Cyrus Cylinder”, Iran 10, 1972, 158-59; J. Watts, Isaiah 34-66 1987; C. Westermann, Isaiah 40-66, 1969; J. Whitcomb, “Cyrus in the Prophecies o f Isaiah”, in J. Skilton, ed., The Law and the Prophets, 1974, 388-401; R. Whybray, Isaiah 40-66, 1975; D. J. Wiseman, et al., Notes on Some Problem in the Book o f Daniel, 1965; E. Yamauchi, Persia and the Bible, 1990; idem, “Cyrus ii. the Great”, inA. Commire, ed., Historie World Leaders, 1994,1:132-35; E. J. Young, The Book o f Isaiah III: Chapters 40-66, 1972. E. Yamauchi Cismático -> # 6189 (sê'êp, desunido, dividido [de coração e mente], conflitante) Cisterna Ciúme
# 1014 (bôr, cisterna) # 7861 (qn ’, ser ciumento, invejoso, zeloso, furioso, enraivecido)
Claridade -> # 239 ( 'wr, ser/estar claro, brilhante, brilhar)
Coate (nnp, nnj? [qehãt, q°hãt], patrônimo [# 7740], refere-se ao fundador de uma guilda sacerdotal influen te, conhecida como 'nnp , 'nnj? [qehãti, q°hãti, pl., -m, ou benê qehãtr, # 7741]). Coate
O OMA não atesta nenhum cognato, com exceção, possivelmente, do nome pessoa de Aqht, herói legendário da literatura ugar. (Grõndahl, # 125; UT, # 322). AT 1. Coate foi o segundo dos três filhos de Levi (Gn 46.11; Ex 6.16) e antepassado do clã coatita (Nm 26.57), aparentemente a divisão mais importante da tribo de Levi (sendo as outras os gersonitas e meraítas). O clã era constituído de quatro famílias: os descendentes de Anrão, Isar, Hebrom e Uziel. De acordo com as listas genealógicas em Êxodo 6.16-20 (cf. Nm 3.17, 19; 26.59; ICr 6.1-2; 5.27-28; 23.12-13) e em 1 Crônicas 6.22-28 [7-13], Moisés e Arão eram netos de Coate, e Samuel era seu descendente distante. 2. Durante o tempo em que o povo vagou pelo deserto, foram conferidas incumbências cultuais específicas aos coatitas, a saber, guardar e cuidar das coisas santíssimas (Nm 3.27-32), transportar sob a orientação de Arão a mobília sagrada (coberta) que ficava na Tenda da Con gregação (4.4-20; 7.9; 10.21) e, provavelmente, preparar os pães da proposição e tocar música na casa do Senhor. Devido ao seu contato próximo com a santidade, os coatitas receberam ad vertências claras para não tocar diretamente nem olhar para os utensílios sagrados que deveriam transportar, sendo que a desobediência poderia causar a morte (4.19). 3. Um importante clã levítico, os coatitas receberam 23 cidades depois da conquista, sendo que a maioria delas situava-se nos territórios do Norte (Js 21.4-5,10,20-26). Faz-se uma distinção clara entre as cidades herdadas dos descendentes de Arão que eram sacerdotes e aque las do restante dos coatitas, indicando a existência de uma tensão entre a minoria dominante (os aronitas) e os outros grupos levíticos muito mais numerosos (Nm 3.39; ver Haran, 128). 468
Coluna de nuvem e fogo
4. Na organização do serviço do templo realizada por Davi (e Salomão), acredita-se que os coatitas executavam diversos serviços nos arredores do templo: eram porteiros (lC r 9.17; 26.23-31), padeiros (9.32), cantores e músicos (6.31-38 [16-23], cf. Sabourin, 117). Os coatitas também são mencionados com relação à guerra de Josafá (2Cr 20.19 cf. Gese, 231) e à purificação e restauração do templo por Ezequias e Josias, respectivamente (29.12,14; 34.12). Juntamente com os coreítas, no período depois do exílio, constituíam um grupo secundário e subserviente de servos do templo, na sua maioria cantores ( lCr 9.19; cf. Anclsr, 392). 5. Ao que parece, quase todos os textos que tratam dos coatitas refletem a situação do pós-exílio com sua supremacia incontestada do sacerdócio. Os diferentes grupos sacerdotais desejavam criar uma tradição autoritária e unificada que legitimaria sua posição como admi nistradores oficiais de determinadas leis e regulamentações (TOT, 404). Assim, tudo indica que o serviço do templo era dominado por uma preocupação teológica central, a saber, a soberania incondicional de Deus. Os coatitas eram extremamente úteis no processo de afirmação dessa concepção por meio de seu papel litúrgico no serviço do templo. P-B Em tempos recentes, foi publicado o Testamento de Coate, um texto em aram. dos pa piros do mar Morto contendo instruções para o sacerdócio. O texto revela a teologia e ética predominantes em meio ao estilo de sacerdócio supostamente macabeu (ou seja, nativo, ao contrário de outros estilos impostos por estrangeiros) (Eisenman, 64). O texto sublinha um estilo de vida de acordo com a justiça e a retidão. B ib l io g r a f ia
Anclsr, 382-97; HAIJ, 112-15; 1BD 2:864; ISBE 3:50; TOT 1:392-436; R. H. Eisenman, “The Testament ofKohath”, BARev XVII/6 , 1991,64; H. Gese, “Zur Geschichte der Kultsãnger am zweiten Tempel”, FS Otto Michel, 1963,222-34; M. Haran, Temple and Temple Service in An cient Israel, 1985; L. Sabourin, Priesthood, 1973, 116-30. J. P. J. Olivier Cobre -> # 5733 (nehõset 1, cobre) Cocho
# 17 ( 'êbús, cocho)
Coleção -> # 7748 (qwh II, juntar) Colheita -> # 7917 (qçr, colher) Colina
# 1911 (dõyêq, baluarte)
Colocação -> # 8492 (sym I, pôr, assentar, colocar, arranjar, impor) Coluna
# 5167 (ma$$êbâ, pilar de pedra, coluna)
Coluna de nuvem e fogo
Coluna de nuvem e fogo ( ‘ammüd he ‘ãnãn hã es).
‘ammúd
OMA O conceito de seres divinos irem adiante de exércitos é atestado na literatura mesopotâ mia, mas ocorre principalmente no contexto de batalhas e não com o intento de conduzir o povo 469
Coluna de nuvem e fogo
(Mann, 1977, 30-58, 129). Ugar. ‘rm, criado, lacaio (CML, 1978, 154), “aparece geralmente em contextos referentes a divindades” (UT, 458) e Mendenhall (56-66) e Mann (1971, 20-24) consideram que o termo esteja relacionado ao heb. ânãrr, da mesma forma o acad. melammü, “uma auréola de brilho ofuscante que envolve a divindade” (A. L. Oppenheim, “Akkadianpul(u) j (t)ue melammu", JAOS 63, 1943, 31) e pulujtu, “vestimentas feitas de chamas com a qual se diz que os deuses se cobrem” (ibid., 33) são considerados relacionados por Mendenhall (59). Porém, apesar dessas possíveis correspondências, não foram observados nos textos históricos paralelos próximos à idéia do AT de Javé guiando e protegendo seu povo numa coluna de nu vem e fogo. A designação freqüente de Baal no ugar. como “cavaleiro das nuvens” (rkb 'rpt, ver RSP III, AnOr 5 1 ,4 ,40a) parece representar um fenômeno diferente daqueles que estamos considerando.
AT Dados lexicais: 'ammúd, coluna (-> # 6647); 'ãnõn, nuvem (-> # 6727); es I, fogo (-> # 836). 1. A coluna de nuvem e a coluna de fogo aparecem pela primeira vez depois da fug de Israel do Egito (Ex 13.21-22) e, de acordo com a representação, acompanham o povo per manentemente (13.22; Nm 14.14; Ne 9.12, 19; cf. Dt 1.33) em sua jornada pelo deserto até a fronteira com Canaã. Não há registro algum indicando se as colunas entraram na terra prome tida (ver, porém, Sl 99.6-7, que parece inicar que a nuvem ainda existia pelo menos no tempo de Samuel). A expressão completa “coluna de fogo e de nuvem” aparece somente uma vez (Ex 14.24). Todos os outros casos referem-se a elas em separado como coluna de fogo ou co luna de nuvem. Foram meios visíveis usados por Javé para guiar seu povo pelo deserto, e há diversas explicações naturalísticas para esses fenômenos físicos. As mais comuns são resumidas por G. H. Davies: “Talvez essa imagem seja proveniente das colunas do templo de Salomão, ou da fumaça que subia do altar do holocausto... [ou] foi sugerido que houvesse um braseiro com lenha queimando, o que indicava o caminho... [ou] algum fenômeno natural... como o cume nebuloso de um vulcão em erupção” (“Pillar of Fire and Cloud”, IDB 3:817); e por J. Plastaras: “O mais provável é que... tenha por base uma recordação de um fenômeno meteorológi co, possivelmente um furacão ou uma nuvem de tempestade” (The God o f the Exodus, 1966, 186). Os escritores bíblicos, porém, vêem nas colunas a provisão, pelas mão de Deus, tanto de orientação permanente como de iluminação suficiente para permitir que o povo viajasse du rante a noite (Ex 13.21; Ne 9.12, 19). Essa direção é considerada prova do cuidado divino (Ne 9.12, 19; Sl 78.14; 105.39). Normalmente, em sua função de guias, as colunas iam à frente do povo, mas numa ocasião a coluna de nuvem deslocou-se para a retaguarda do povo israelita a fim de colocar-se entre eles e seus perseguidores egípcios (Êx 14.19-20). Desse modo, pro tegeu o povo ao evitar que os perseguidores se aproximassem ainda mais. No entanto, a fuga subseqüente, da perseguição dos egípcios, não é atribuída à coluna em si, mas à intervenção de Javé na manhã seguinte (v. 25). Por fim, é possível que a coluna fosse um instrumento para a manifestação da glória divina (16.10), além de ser associada, por vezes, à revelação verbal de Deus (cf. 14.24-26; 16.10-12). (-> Êxodo: Teologia) Apesar de alguns estudiosos considerarem esses fenômenos físicos simplesmente como símbolos da Presença divina, os escritores bíblicos os representam envolvendo essa Presen ça, uma vez que se diz que Javé estava “numa” (be) coluna de nuvem ou de fogo (Êx 13.21; 14.24; Nm 14.14; Ne 9.12; cf. Dt 1.33; Sl 78.14) (tomando por base a interpretação como a bêt essentiae, Morgenstem considera a identificação das colunas com Javé possível, porém me nos provável [154 n. 1]). As colunas são distintas da Presença divina, mas, ao mesmo tempo, 470
Coluna de nuvem e fogo
constituem veículos dessa Presença; revelam a Deus no sentido de que indicam onde ele se encontra, mas ao mesmo tempo ocultam-no da visão. Elas chamam a atenção para a Presença divina ou e intensificam (Fretheim, 89). Duas características distinguem essa manifestação da Presença divina daquelas que a precedem na narrativa bíblica. Em ocasiões anteriores, a aparição de Javé foi angelical, huma na ou não especificada e somente a eventual surpresa expressada por aqueles que sobrevive ram a esses encontros dá alguma indicação da diferença qualitativa existente entre o humano e o divino. No caso do êxodo e dos acontecimentos ocorridos imediatamente antes dele, onde é especificado, a Presença de Javé toma-se envolta por um manto completamente impessoal, cuja própria natureza dá testemunho da distinção. A imanência de Javé é demonstrada pelo fato de ele estar dentro da coluna, enquanto, ao mesmo tempo, a transcendência dele fica tanto implícita quanto protegida pelo velamento do fenômeno físico associado a ela (fogo/nuvem, cf. Lv 16.13). Cada um desses aspectos da Presença divina é, então, comunicado de maneira mais vivida quando a glória divina aparece dentro da nuvem (Ex 16.10; cf. Nm 16.42[ 17.7]). Em segundo lugar, antes do êxodo, todas as aparições observadas de Javé eram para indivíduos e, de modo geral, implicavam uma comunicação verbal com eles. A introdução da coluna, porém, coincide com o surgimento de Israel como nação e é a primeira manifestação da Presença divina ao povo em massa. Além disso, o efeito combinado na ocultação de Javé e, em relação aos israelitas, de sua função restringir-se a dar-lhes direção e proteção (enquanto um indivíduo [Moisés] permanece como único recebedor da comunicação verbal divina) tem como objetivo retratar uma Divindade envolvida com seu povo, porém de maneira menos ínti ma dali em diante do que em Gênesis. Tal representação da Presença localizada de Javé acom panhando os israelitas em sua jornada a Canaã deve ser contrastada com aquela em Gênesis 12, na qual o narrador não fornece nenhum detalhe sobre como Javé dirigiu Abraão até Canaã, “a terra que te mostrarei” (v. 1; cf. v. 5). Ainda assim, a coluna de nuvem pode ser vista tanto preparando os israelitas para ver Deus vindo a eles “numa nuvem escura” (Ex 19.9) e descen do sobre a montanha em fogo (cf. 19.18) como para lembrá-los, depois que tivessem partido do Sinai, das leis recebidas de Deus. 2. Com relação aos fenômenos acima, tem-se ainda a “coluna de nuvem” (por vezes chamada de “nuvem”) que descia (yrd — > # 3718) normalmente na porta da Tenda da Con gregação. Diferentemente da visibilidade mais pública das colunas de nuvem e fogo, porém, essa nuvem podia descer para o benefício de apenas um indivíduo, como no caso da teofania particular a Moisés no monte Sinai (Êx 34.5; [-> Teofania: Teologia]). Sua descida não tinha o propósito de guiar nem de dar proteção, mas era acompanhada de uma comunicação verbal da Divindade, relacionada em várias ocasiões à legitimação (Mann) de líderes como Moisés (Êx 19.9; Nm 12.5-8), os setenta anciãos (Nm 11.25) ou Josué (Dt 31.14-15, 23), à comunhão íntima (Êx 33.9-11) ou à revelação (34.5-7). De modo geral, essas visitas eram intermitentes e temporárias e costumavam ocorrer por iniciativa de Deus. Em 33.7-11, porém, a descida da nuvem é representada como uma resposta freqüente ao procedimento de Moisés de sair e dirigir-se à Tenda da Congregação. Também nesse caso Javé é descrito como estando presente “na” (34.5; Nm 11.25; 12.5) nuvem. 3. A partir do momento em que o tabemáculo foi completado (Êx 40.34-38), é associa da a ele uma nuvem com a mesma função orientadora que as colunas de nuvem e fogo. Essa nuvem tinha a aparência de uma nuvem durante o dia, mas de fogo durante a noite (40.38; Nm 9.15-16); a presença dela sobre o tabemáculo era um sinal de que os israelitas deviam manterse onde estavam, enquanto o movimento ascendente dela indicava que eles deveriam levantar acampamento (Êx 40.36-37; Nm 9.17-22; ilustrado por 10.11-12). Além disso, a nuvem dirigia 471
Coluna de nuvem e fogo
os israelitas nas viagens, uma vez que acampavam onde a nuvem parava (9.17). Considerava-se ainda que os movimentos da nuvem indicavam a vontade de Deus (“o mandado do Senhor” 9.17, 22 [cf. vv. 18, 23]). Essa nuvem podia, igualmente, manifestar a glória divina (16.42[17.7]). (-> Números: Teologia) 4. Isaías 4.5 faz referência a Javé criando sobre o monte Sião “uma nuvem de dia e fu maça e resplendor de fogo chamejante de noite” para indicar a Presença continua de Deus na Nova Jerusalém. (-> Isaías: Teologia) P-B I. A LXX traduz 'ammúd pelo termo stylos, ‘ãnãn por nephelê e ’ês por pyr e é seme lhante ao heb. sem nenhuma redução óbvia da Presença em relação às duas colunas, stylos foi acrescentado a Êxodo 19.9 e nephelê a diversas passagens, particularmente a 19.13; Nm 14.10; Js 24.7. 2. Os Apócrifos referem-se às funções de direção e iluminação das colunas (Sab 18.3; 2Ed 1.14) enquanto identificam-nas também com a sabedoria (Sab 10.17; cf. Ecli 24.4). 3. As Pseudepígrafes mencionam as colunas nos Sih 3.250-51 e associam o lugar onde a arca e seu conteúdo se encontravam no momento (“engolidos numa rocha”) a “uma nuvem como fogo [que aparece todas as noites], idêntica àquela da antigüidade” pois “a glória de Deus jamais declinará da Lei de Deus” (Lives o f the Prophets 2:11-19). 4. Na LR, a coluna de nuvem é retratada como “sete colunas de glória”, sendo que seis delas envolveram Israel durante o tempo em que o povo vagou pelo deserto (Mek Beshallah 1; NumR 1.2; SifreNum 83). Essas nuvens aplainavam o terreno adiante e davam proteção, p. ex., de cobras e ataques, especialmente dos amalequitas (Mek Amalek 1; SifreDeut 296.3; RH 3a; Taan 9a), porém não, p. ex., para os pecadores (NumR 20.23) ou os ritualmente imundos (PRE, 44). Numa referência clara à idéia da Presença divina, Nabucodonosor é representado preparando uma pequena nuvem para viver dentro dela e, assim, habitar longe da presença dos homens (NumR 9.24; cf. Mek Shirata 6 ). NT As únicas menções diretas ocorrem em 1 Coríntios 10.1-5, que declara “nossos pais estiveram todos sob a nuvem... tendo sido todos batizados, assim na nuvem como no mar, com respeito a Moisés” (vv. 1-2). Em outra passagem, a nuvem é associada ao próprio Deus na Transfiguração (Mt 17.5 par.), a Jesus em sua Ascensão (At 1.9) e à vinda do Filho do Homem (Mt 24.30 [ver Mc 13.26; Lc 21.27]; Mt 26.64 [ver Mc 14.62]; Ap 1.7; 14.14-16). B ib l io g r a f ia
T. E. Fretheim, The Suffering ofG od, OBT 14, 1984,60-106; J. Luzarraga, Las tradiciones de Ia nube en Ia Bíbliay en el Judaismo primitivo, AnBib 54, 1973; T. W. Mann. Divine Presence and Guidance in Israelite Traditions: The Typology o f Exaltation, JHNES, 1977, 123-52, 164-75; idem, “The Pillar o f Cloud in the Reed Sea Narrative”, JBL, 90, 1971, 15-30; G. E. Mendenhall, “The Mask ofYahweh”, in The Tenth Generation, 1973, 56-66; J. Morgenstem, “Biblical Theophanies”, TA 25, 1911, 139-93. Ian Wilson Comandante -> # 7903 (qãsin, comandante, líder) Comando, ordem -> # 7422 ($wh, dar ordens, comandar) Combate -> # 4309 (Ihm I. combater, lutar) 472
Conquista
Começo -> # 8040 (rê'sit, começo, ponto de partida, primeiro) Comércio -> # 8217 (rkl, comércio) Comida -> # 430 ( 'kl, comer, consumir; devorar) Cômodo -> # 2540 (heder, cômodo escuro, câmara do Seol) Compaixão -> # 8163 (r/wj, amar, ter compaixão) Companhia -> # 2492 (hãbêr, sócio, companheiro) Comparação
# 8750 (iw/» I, ser/tomar-se igual, ser semelhante, nivelar)
Completitude -> # 4005 (kll, terminar, completar) Compra -> # 7864 (qnh, adquirir, comprar, criar) Comprimento
# 799 ( 'r/c 1, alongar-se)
Cômputo -> # 3108 (//ii, contar, computar, calcular, pensar, planejar) Comunidade -> # 6337 ('õ /á I, comunidade, ajuntamento, bando) Conclusão -> # 3983 (W/i I, concluir, estar completo, terminar, destruir) Concubina -> #7108 (pileges, concubina) Condução -> # 3297 (vò/1, levar, conduzir) Confiança -> # 1053 (òf/i I, confiar, depositar a confiança em) Conflagração -> # 8599 (serêpâ, fogo, conflagração, incêndio) Confusão -> # 2101 (Ahti, desconcertar) Congregação -> # 6637 ( ‘êt/á I, congregação) Conhecimento -> # 3359 (vd ‘ I, observar, preocupar-se com)
1. A conquista de C tecimentos de relevo da história do AT. A conquista foi o meio pelo qual, depois de ter sido libertada da escravidão no Egito, a nação de Israel tomou posse da terra que havia sido prometida a seus ancestrais. Na realidade, o objetivo do êxodo era a conquista e o assentamento subseqüente em Canaã. Há muito, os estudiosos críticos se opõem à descrição bíblica da conquista, argumentando principalmente que as evidências arqueológicas não confirmam uma destruição em massa de Conquista
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Conquista
cidades israelitas entre os séculos XV e XIII a. C. (W. G. Dever, “Archaeology and the Conquest,” ABD 3:533). Diversos críticos acreditam que, na verdade, os israelitas não existiam como nação até o tempo da monarquia e, portanto, consideram os acontecimentos descritos em Josué 1— 11 como relatos sobre tribos individuais que foram entretecidos por um redator que desejava dar à narrativa um ponto de vista nacionalista (M. Noth, The History o f Israel, 1958). Outros negam inteiramente uma invasão exterior, afirmando que a conquista na verdade foi um movimento interno ou “revolta camponesa” (N. K. Gottwald, The Tribes ofYahweh, 1979). O estudioso israelita Yehezel Kaufmann apresenta uma argumentação convincente em favor da idéia de que é impossível ter ocorrido uma conquista gradual ou interna por diversas tribos. Se tal conquista que os estudiosos críticos têm em mente houvesse ocorrido, poder-se-ia esperar que fossem encontradas evidências de batalhas e tratados entre as tribos israelitas. Tais evidências não existem. Além disso, se a conquista foi um “movimento interno” envolvendo povos nativos, como explicar o caráter étnico característico dos israelitas? A identidade étnica dos israelitas fica evidente desde os primórdios do registro bíblico. A falta de evidências pro venientes de dados arqueológicos com relação à destruição em massa das cidades israelitas também não é convincente. O próprio registro bíblico não sugere que a conquista de Canaã por Josué foi abrangente. Esse fato é particularmente óbvio em passagens como Juizes 1.1—2.5 e 2 .6 — 3.6, em que fica claro que seria responsabilidade das tribos individuais completar a con quista ao expulsar dos territórios cananeus os habitantes que a nação não tivesse conseguido desalojar. Além disso, Merril demonstrou que a narrativa bíblica não indica que grandes cen tros populacionais foram destruídos por Josué durante a conquista (ver “Palestinian Archaelogy”). O termo usado para se referir a essa atividade militar é Ikd, que significa tomar (-> # 4334) e não destruir. Os israelitas foram instruídos a demolir objetos pagãos de culto, expulsar ou executar os habitantes e ocupar a terra; o texto não diz nada sobre demolir cidades (ver Ex 23.24; Nm 33.50-56; Dt 20). 2. A conquista (Js 1— 11), a continuação das vitórias sobre os reis da Transjordânia (Nm 21.21-35; Dt 2.26— 3.17), foi iniciada por Javé quando ele abriu o rio Jordão, permitindo que os israelitas atravessassem para Canaã. Depois de erguer um memorial com doze pedras para comemorar a travessia do rio Jordão, os israelitas acamparam em Gilgal e, logo em seguida, conquistaram Jericó (Josué 6 ). Então, Josué conquistou Ai (Js 7.2— 8.28), que dividia a ter ra de Canaã em duas e assim tomou impossível às cidades do Norte formarem uma coalizão com essas cidades no sul de Canaã. Numa reação a essas vitórias, os gibeonitas enganaram os israelitas para que fizessem uma aliança com eles (cap. 9), e os reis de Hebrom, Jarmute, Laquis e Eglom formaram uma coalizão militar (Js 10.1-4). Essa aliança dos reis cananeus do Sul atacou Gibeão e com isso forçou os israelitas a entrarem em guerra (Js 10.5). Josué surpreen deu a coalizão cananéia em Gibeão e conseguiu derrotar completamente os inimigos quando Deus atirou pedras do céu e fez o sol se deter (Js 10.12-13). Em resposta ao sucesso israelita, Jabim, rei de Hazor, fez uma aliança com os reis da região norte de Canaã para lutar contra os israelitas (Js 11.1-5). No entanto, Josué tomou a ofensiva e realizou um ataque surpresa. Os exércitos da coalizão fugiram até a Fenícia, e Hazor, a principal cidade-Estado do Norte, foi incendiada (Js 11.1-15). Josué conquistou uma boa parte do território de Canaã, mas nem toda a terra estava sob domínio israelita. Os filisteus (->) mantiveram o controle da terra ao longo da costa do mar Mediterrâneo e as cidades de Tiro, Sidom e Gebal permaneceram nas mãos dos nativos. Assim, o relato bíblico descreve a conquista como resultado de uma invasão das tribos de Israel unidas, vindas de fora de Canaã. Vários fatores possibilitaram essa vitória. Em pri meiro lugar, os cananeus não tinham como apresentar uma resistência unificada aos atacantes 474
Conquista
israelitas. Os cananeus eram divididos geograficamente em 31 cidades-Estados (ver Js 12.924), o que tomava impossível uma unidade política ou militar. Essa situação de fragmentação política e social de Canaã é reforçada pela descrição bíblica freqüente dessa terra como sendo constituída por sete povos (p. ex., Js 3 .10). Uma descrição idêntica de Canaã aparece nas cartas de Amama do Egito durante a metade do século XIV a. C. Em segundo lugar, o exército israelita empregou táticas militares apropriadas. A estra tégia de Josué foi planejada de modo a dividir as forças cananéias. Conforme foi observado anteriormente, as primeiras vitórias em Jericó e Ai, na planície central, criaram uma separação das forças cananéias. Além disso, pode-se observar que durante as batalhas foram usadas técnicas como cha marizes, ciladas, ardis e ataques-surpresa (Js 8 .6 , 16; 10.9-10; 11.7-8), organização de equi pamentos e suprimentos de comida (Js 1.10-11; 20.10), e a realização de operações para obter informações secretas (Josué 2). Estas últimas resultaram em dados de grande valor sobre a topografia, constituição demográfica, estruturas políticas e militares, etc. Por fim, o fato de os israelitas não ocuparem imediatamente o território conquistado, mas voltarem sempre para o acampamento deles ao longo de toda a campanha, permitiu que a conquista fosse realizada num ritmo acelerado. Durante todo o tempo de conflitos, os israeli tas não ocuparam nem reconstruíram uma cidade grande sequer. (A inferioridade numérica do exército israelita não constitui um obstáculo para a credibilidade do relato. A conquista árabe da Palestina sob o controle dos bizantinos e a destruição de Roma pelas tribos germânicas são dois exemplos mais recentes de impérios que foram conquistados por povos tribais que poderiam ser considerados inferiores.) A narrativa da conquista de Canaã é coerente com os registros de conquistas dos povos do OMA tanto em termos estruturais quanto temáticos (cf. Younger). Apesar de Israel ter empregado várias técnicas militares na conquista de Canaã, o relato bíblico deixa claro que a conquista deve ser considerada um acontecimento de caráter absolu tamente teológico. A terra pela qual a nação lutou era a terra que Deus havia prometido dar a Abraão, o patriarca de Israel (ver Gn 15.18-21; 17.8; 26.3; 28.4, 13; 35.12; 48.6,16,21-22; Êx 3.8, 17; 6 .8 ; 13.5; 23.23, 28-33; 33.1-3; 34.11; Nm 34.29; Dt 1.17-18; 3.21; 7.16, 19; 9.1-3; 11.23-25; 31.3-8; Js 1.2-5). 3. Tendo em vista que a terra havia sido prometida à nação por Javé, a guerra pe territórios assumiu um caráter religioso. Além disso, é impossível entender-se a conquista sem levar em consideração a intervenção de Javé (-> Guerreiro Divino). Essa intervenção foi de monstrada no começo da conquista, quando o Senhor conduziu os israelitas à terra prometida atravessando o rio Jordão (Josué 3). A nação reconheceu que esse havia sido um ato de Deus ao erguer um memorial em Gilgal para comemorar o acontecimento (Js 4.1-9) e, então, recor dou-se das promessas anteriores da aliança e dos feitos passados do Senhor ao observar a cir cuncisão e a Páscoa em Gilgal (Js 5.2-12). Antes do início da expedição militar, Josué, o líder das forças israelitas, encontrou-se com o comandante do exército de Javé, mostrando desde o começo que as batalhas eram do Senhor e que era dele que Josué recebia ordens (Js 5.13-15; ver Êx 3.5 e W. VanGemeren, 142-43). Também se deve observar que o resultado de cada con flito militar era definido pela vontade de Javé (ver Js 6.2; 8 .1; 10.8; 11.6 ). O Senhor havia até mesmo determinado as estratégias militares dos cananeus para assegurar-se da derrota deles (Js 11.20). O fato de o resultado das campanhas ser definido por Javé também fica evidente na única derrota militar de Israel, em Ai. Os israelitas perderam a batalha por causa da transgres são contra Javé (Js 7.11-12). Antes de ocorrerem outras vitórias militares, não era preciso que os israelitas melhorassem suas estratégias no campo de batalha, mas sim que se tratassem do pecado (Js 7.24-26; também 8.30-35). A batalha pertencia ao Senhor, e os combates eram uma confirmação da palavra dele (ver Js 11.20). (-> Josué: Teologia) 475
Conquista
4. A conquista de Canaã não é tratada em detalhes em outros livros do AT além de sué. E verdade que encontramos menção de vitórias no Salmo 135.10-11, mas trata-se de uma passagem que reflete sobre as obras de Deus em favor de Israel. O Salmo 135, assim como o livro de Josué, concentra-se no fato de que foi Javé quem derrotou as nações cananéias. A mesma verdade também é ressaltada por Paulo em Atos 13.19, quando ele falou aos judeus na sinagoga de Antioquia da Pisídia. NT Fora do livro de Josué, a conquista de Canaã é tratada mais demoradamente apenas em Hebreus 3.7— 4.11. Nessa passagem o escritor de Hebreus fala do descanso que o povo teria de seus inimigos como resultado da conquista de Canaã como um retrato do descanso que os crentes experimentam quando depositam sua fé na pessoa e na obra de Jesus Cristo. Assim, a entrada temporária no descanso do Senhor que foi obtida sob o comando de Josué constituiu um tipo do descanso espiritual e eterno. A citação do Salmo 95.7-8 em Hebreus 4.7 apóia a idéia de que existe uma aplicação prática para os crentes daquilo que é mostrado da conquista comandada por Josué. Por outro lado, apesar de ser verdade que o povo de Deus continua en volvido em conflitos com seus adversários, os inimigos agora são espirituais e não de came e osso (Ef 6.12). Apanha, captura, posse: -> 'hz I (apanhar, assentado, # 296); -> hfp (apanhar e levar embora, # 2642); -> hth (levar, buscar, # 3149); -> kwl (apoderar-se de, apanhar, conter, # 3920); Ikd (prender, capturar, # 4334); -> Ipt (pegar, agarrar, segurar na mão, virar, # 4369); -> msk (apanhar, arrastar, atrasar, # 5432); -> qm( (apanhar, # 7855); -> tmk (pegar, agarrar, # 9461); -> tps (capturar, ocupar, # 9530) G uerra, exército, batalha, luta: -> gdd II (coligar-se, # 1518); -> hms (organizado para a guerra, # 2821); Ihm I (realizar batalhas, lutar, # 4309); -> mahaneh (arraial, acampamen to, guerra, # 4722); -> ma ‘arâká (linha de batalha, # 5120); -> $b ’ (ir à guerra, servir, revistar tropas, alistar, # 7371); -> .?? (navio de guerra, # 7469); -> ,$rh (chamar, gritar com estridência, erguer o grito de guerra, # 7658); -> qerãb (batalha, # 7930); -> rkb (montar, andar [em lom bo de animal], # 8206); -> rw ' (gritar, dar o grito de guerra, #8131); -> sãlís (terceiro homem num carro de guerra, ajudante, # 8957) B i b l k x ;k a f ia
ABD 3: 545-58; 5:1120-43; ISBE 2:908-24; M. Barth, “The Old Testament in Hebrews: An Essay in Biblical Hermeneutics”, in Current Issues in New Testament Interpreiation: Essays in Honor o f O. A. Piper, 1962, 53-78; J. J. Bimson, Redating the Conquest, 1978; C. B. Caird, “The Exegetical Method of the Epistle to the Hebrew”, CTJ 5, 1959,44-51; P. C. Craigie, The Problem o f War in the Old Testament, 1978; D. Garland, “The Renewal o f the Promise of Rest: ACanonical Reading of Hebrew 3:7-4:13”, in Reclaiming the Prophetic Mantle, 1992,203-21; R. S. Hess, “Early Israel in Canaan: A Survey of Recent Evidence and Interpretations”, IEJ 125, 1993, 125-42; Y. Kaufmann, History o f the Religion o f Israel, 1956, 2:302-28 (in Heb.); idem, “Traditions Conceming Early Israelite History in Canaan”, in ScrHier, 1961, 8:303-34; idem, The Biblical Account o f the Conquest o f Canaan, 2 ed., 1985; A. Malamat, “Israelite Conduct of War in the Conquest o f Canaan According to the Biblical Tradition”, in Symposia Celebrating the 75th Anniversary o f ASOR, 35-55; E. Merrill, “Palestinian Archaeology and the Date o f the Conquest: Do Tell Tales?”, GTJ 3, 1982, 107-21; idem, Kingdom o f Priests. A History o f Old Testament Israel, 1987; G. von Rad, Holy War in Ancient Israel, 1991; W. VanGemeren, The Progress o f Redemption, 1988; B. G. Wood, “ Did the Israelites Conquer Jericho? A New Look at the Archaeological Evidence”, BARev 16.2, 1990,44-59; idem, “Da476
Corá (Coré)
ting Jericho’s Destruction: Bienkowski Is Wrong On Ali Counts”, BARev 16.5, 1990, 45-49, S. Yeivin, “The Conquest o f the Land”, Emiqr 4:79-102 (in Heb.); K. L. Younger, Ancient Conquest Accounts, 1990. Mark E Rooker
68;
Consagração
# 7727 (qds, ser santo, consagrado)
Conselho -> # 3619 (y's, planejar, aconselhar, recomendar) Consolação -> #5719 (nihitmim, consolação, conforto) Consolo -> # 5714 (nhm, consolar, ter compaixão, arrepender-se) Conspiração -> # 8003 (^.ír, juntar, conspirar, atar) Constância
# 622 ( 'ewe/, confiável, duradouro, fidelidade, verdade)
Constrangimento -> # 7439 ($w<7 I, constranger, colocar em situação difícil, atormentar) Construção -> # 1215 (£>«/;, construir, fortificar, reconstruir, trabalharem) Contagem
# 6218 (vpr I, contar, numerar, calcular, relatar)
Contenção -> # 3920 (A-u7, apoderar-se de, apanhar, conter, suportar) Contenda -> # 8 1 8 9 (ryb, contender) Contenda -> # 8190 (rib, contenda) Contentamento, saciedade
# 8425 ( í è ', estar saciado)
Contestação
# 6699 (
Continuação
# 9458 (tãmid, continuação)
Contratação
# 8509 (ifcr, contratar)
Controle
# 706 ( ’p q II, controlar-se)
Convocação Copulação
I, responder, replicar, testemunhar contra)
# 7924 ( g r ' I, chamar, invocar,convocar, proclamar) # 8061 (r£>', deitar-se, copular)
Corá (mj7 [çõra/i]; G Kore), nome próprio de vários indivíduos e de um grupo de levitas de segundo escalão no serviço do templo após o exílio (# 7946). Corá (Coré)
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Corá (Coré)
OMA O nome pessoal qrh é atestado no assír. (Tallqvist, 183b), ugar. (PTU, 177), fen., ár. (HALAT, 1064), bem como em uma inscrição heb. descoberta no átrio do templo em Tel Arad (Aharoni, 82). De acordo com IPN, 227, é derivado do radical qrh, rapar (cf. Lv 21.5), e, pro vavelmente, quer dizer calvo. AT 1 .0 nome Corá aparece em todas as três listas que explicam a genealogia de Esaú como antepassado dos edomitas que viviam na região montanhosa de Seir (Gn 36.1-8,9-14, 15-19). Corá aparece na lista como filho de Esaú com sua esposa Hevéia Oolibama, daí ser Corá um chefe de clã edomita (cf. ICr 1.35; Gn 36.5, 14,18); mas aparece também como neto de Esaú em Gn 36.16 (TM, omitido em samaritano). 2. De acordo com a genealogia dos clãs de Calebe, Coré era o nome de um dos filhos de Hebrom ( ICr 2.43). 3. Coré aparece como um adj. designando os cinco guerreiros especialmente hábeis com o arco e a funda dentre os parentes de Saul da tribo de Benjamim, que se aliaram a Davi em Ziclague(lCr 12.6 [7]). De acordo com Rudolph (104), nessa passagem o nome Coré refere-se a um topônimo desconhecido e não ao Coré do clã de Calebe mencionado acima. 4. Corá, filho de Isar, é o nome de um levita do clã de Coate, que conspirou com Datã, seu irmão Abirão e um benjaminita chamado Om, e que, juntamente com 250 seguidores, rebelou-se contra Moisés e Arão (Nm 16.1 -50[ 16.1-17.15]). A narrativa apresenta diferentes motivos para o sentimento de insatisfação (IBD, 864); ou seja, Moisés e Arão consideravamse superiores ao restante da congregação (vv. 3, 13); Moisés não os havia levado a uma terra que “manava leite e mel” (v. 14), Moisés e Arão usurparam o sacerdócio para si mesmos (vv. 7-11) e chamaram Corá e os seguidores dele de levitas, os quais, ao que parece, restringiam-se apenas a realizar certos rituais sacrificiais (uso de incenso). De acordo com Sabourin (129), o que estava de fato em jogo era uma controvérsia sobre o caráter absolutamente separado do sacerdócio na comunidade do pós exílio, ou seja, Números 16 registra o conflito dramático entre sacerdotes e levitas. Os estudiosos afirmam que essa narrativa é constituída de diferentes versões do mes mo episódio (ou pelo menos uma tentativa de unificar diferentes histórias), sendo que cada uma delas reflete um ponto de vista diferente sobre a luta pela liderança entre os vários grupos sacerdotais concorrentes da comunidade do templo (após o exílio), ou seja, entre os aronitas e o coraítas (RGG 4, 15; Coats, 156-57; TREg, 608; Haran, 89-90). Comparando as outras passagens que tratam do mesmo acontecimento (Nm 26.9-11; Dt 11.6; Sl 106.16-18), podese dizer que o relato de Números 16 foi combinado com outro relato (original?) sobre uma revolta de origem política sob a liderança de Datã e Abirão contra a autoridade exercida por Moisés e Arão. De acordo com outro ponto de vista, Corá não era um levita, mas um líder comunitário importante do sul de Judá com uma profunda consciência de destino que reagiu contra o monopólio de Moisés nas questões religiosas (Miller, 67; Schmid, 8 8 ; TREg, 608). Depois desse conflito fatídico, alguns de seus descendentes (dentre os quais havia edomitas, levitas e calebitas, cf. Gn 36; Nm 26.57-58; ICr 2.42-43) serviram no templo real cm Arade (cf. a inscrição 49 de Arade). De acordo com Miller (67) “é possível que, em associação com a reforma de Josias, os coraítas tenham chegado até Jerusalém e começado a servir no templo como porteiros e padeiros”. 5. Como patrônimo, Corá refere-se a antepassado dos coraítas, uma família de levitas do clã de Corá (-> # 7740) que serviam em alguns cargos religiosos desde o tempo de Davi (Ex 6.21, 24 (S); ICr 6.22[6.7]). Três listas genealógicas apresentam gerações sucessivas de Corá, inclusive Samuel e seu filho Joel (IC r 6.22-30 [7— 15], 33-38 [18— 23]; ISm 1.1, 20). 478
Corá (Coré)
I Crônicas 9.19-31 traz uma lista que relaciona a linhagem com as quatro gerações depois de Joel e com duas gérações posteriores (ISBE 3.51). a. Os oficiais coraítas do templo. Diz-se que os diferentes termos usados para os coraítas, i.e, qõrah (Êx 6.21; Nm 16.1, 5, etc; lCr 6.22 [7]), Ifinê qõrah (Êx 6.24; Nm 26.11 e os títulos dos Salmos 42—49, 84, 85, 87, 8 8 ) e qorhi refletem, de algum modo, diferentes grupos de coraítas que devem ser distinguidos entre si (Mõhlenbrink, 230). Tanto Wanke (1966, 25) quanto Gese (230-34) apresentam sérias objeções a essa hipótese e preferem interpretar os no mes diversos como um reflexo de diferentes tradições de âmbitos e épocas distintas. Também é possível que o termo “filhos de” não denote necessariamente uma descendência direta, mas, em alguns casos, refira-se a guildas ou sociedades que compartilhavam interesses em comum, como um grupo de músicos ou cantores. O cronista nos informa que, a certa altura, acabaram por tomar-se uma associação ou guilda (juntamente com os asafitas) encarregados da música e do canto sacro no templo de Jerusalém (2Cr 20.14, 19; cf. Rudolph, 173). Ao que parece, nem mesmo no tempo de Esdras eram considerados levitas (Ed 2.42), mas chegaram a essa posição, mais influente e prestigiosa em termos religiosos, depois de começarem em cargos mais humildes como porteiros e padei ros do templo (1 Cr 9.19; 26.1, 19). Um certo Matitias, filho de Salum (1 Cr 9.31; cf. 17-21), filho de Coré (qôré') e neto de Corá, foi incumbido de assar os pães para as ofertas, enquanto “outros dos irmãos, dos filhos dos coatitas, tinham o encargo de preparar os pães da proposi ção para todos os sábados” (v. 32). As diferentes descrições de suas várias tarefas podem ser reflexo de diferentes estádios de sua ascensão a cargos mais altos no tempo posterior ao exílio. Ao que parece, também, diversas tradições acentuam os aspectos distintos da posição, papel e função dos coraítas. Assim, De Vaux conclui corretamente que “os coraítas sempre foram os mesmos, cheios de intrigas, batalhando para ganhar espaço, primeiro como porteiros, depois cantores e, por fim, chegando até a usurpar funções sacerdotais” (Anclsr, 393). b. Os salmos de Corá. Os onze salmos (Salmos 42— 49, 84, 85, 87, 8 8 ) atribuídos aos “filhos de Corá” já foram objeto de estudos profundos, sendo excelentes exemplos disso os textos de Wanke e Goulder. Ao mesmo tempo em que esses estudiosos discordam quanto à data e lugar de origem desses salmos (Goulder, p. ex., acredita que tiveram origem no santuário de Dã no tempo que antecedeu o exílio e que foram levados a Jerusalém pelos coraítas depois da destruição do reino de Israel), os dois afirmam que esses salmos contêm a essência da teologia de Sião (-> # 7482), ou seja, temas como a presença constante de Javé em seu santo monte Sião e sua proteção sobre a cidade santa de todo o tipo de ameaça ou inimigo. Wanke (1989, 609) descreve alguns temas mitológicos presentes nesses salmos (p. ex., a batalha cósmica e a descrição do lugar de habitação dos deuses em correntes [paradisíacas]) e afirma que os co raítas os tomaram emprestados de mitos e cantos litúrgicos cananeus. Os salmos constituem uma coleção singular no sentido de que têm em comum algumas expressões exclusivas, entre elas, “Deus Todo-Poderoso”, “Deus de Jacó”, “o Deus vivo”, “apresentar-se diante de Deus”, “cidade de Deus”, que parecem refletir a tradição teológica específica dos coraítas. Duas se qüências identificadas por Goulder, cada uma delas representando seu próprio vocabulário e função para o uso público, indicam que os salmos coraítas já se encontravam completos quando foram incluídos no livro de Salmos. (-> Salmos: Teologia) Dentro do que foi mencionado acima, fica evidente que os coraítas ou “filhos de Corá” são associados, muitas vezes, ao serviço de cântico no templo (Rudolph, 173). Em todo es tádio decisivo da história de Israel, eles parecem cumprir uma importante função litúrgica como cantores (2Cr 20.19; 29.12). O fato de uma coleção de salmos ser atribuída aos coraítas, 479
Corá, Datã e Abirão
coleção esta que ainda constitui parte dos cânon judaico e cristão, talvez seja a melhor indi cação da influência dos coraítas no serv iço do templo (Wanke, 1989, 609). Sua contribuição para a formação do livro de Salmos, o desenvolvimento da teologia de Sião com ênfase na presença de Javé em Jerusalém (e, conseqüentemente, à posição elevada de Jerusalém) e seu avanço no serviço do templo ao identificarem-se com o canto e a oração litúrgica não podem ser facilmente superestimados. Sacerdotes e levitas: -¥ 'abnê( (cinto, esp. de sacerdotes, # 77); 'êpôd 1 (estola, veste sa cerdotal, objeto de veneração, # 680); -> hõsen (peitoral do sumo sacerdote, # 3136); -> khn (cumprir os deveres de um sacerdote, # 3912); -> kõmer (sacerdote pagão, # 4024); -> lêwt (levita, # 4290); mighã'â (tiara, # 4457); miknãsayim (calças, # 4829); -> pa ’amôn (cam painha [na sobrepeliz do sacerdote], # 7194); tasbê$ (quadriculado [túnica do sacerdote], # 9587); Arão: Teologia; -> Sacerdotes e levitas: Teologia B ib l k k v k a f ia
Anclsr, 382-97; HAIJ, 112-15; IPN, 227; ISBE 3:51 -52; R üG 4:15; Y. Aharoni, Arad Inscriptions, 1975, 82-84; idem, TREg 3, 1978, 587-90; G. W. Coats, Rebellion in lhe Wilderness, 1968, 156-84; H. Gese, “Zur Geschichte der Kultsãnger am zweiten Tempel”, FS Otto Michel, 1963, 222-34 (=Von Sinai zum Zion, 1974, 147-58); M. D. Gouder, The Psalms ofth e Sons o f Korah, 1982; M. Haran, Temple and Temple Service in Ancient Israel, 1985; J. M. Miller, “The Korahites o f Southern Judah”, CBQ 32, 1970, 58-68; K. Mõhlenbrink, “Die levitische Überlieferungen des AT”, ZA W 52, 1934, 184-231; W. Rudolph, Chronikbücher, HAT 21, 1955; L. Sabourin, Priesthood, 1973; H. Schmid, Die Gestalt des Mose, 1986; G. Wanke, Die Zionstheologie der Korachiten, BZAW 97, 1966; idem, TREg 19, 1989, 608-9. J. P. J. Olivier
Corá (rnj? [qõrah], # 7946), Datã (IJTJ [dãtãn], # 2018) e Abirão (DT3S [ ’abírãm] # 53): A Rebelião de. No livro de Números, a rebelião de Corá, Datã e Abirão (Nm 16) ressalta, por um lado, o papel subordinado dos levitas não arônicos ao sacerdócio arônico e, por outro, a divisão en tre a tribo sacerdotal e as tribos seculares. Em passagens anteriores de Números, havia-se feito uma distinção clara entre os sacerdotes arônicos e os levitas não arônicos, sendo que os coatitas (->) haviam sido colocados sob a direção do sacerdote Eleazar, filho de Arão (3.32; 4.16) e os gersonitas e meraritas sob a direção do sacerdote Itamar, filho de Arão (4.28, 33). Apesar de todos os sacerdotes deverem ser levitas, nem todos os levitas deviam ser sacerdotes (3.6), uma distinção que passou a ser questionada. Além disso, enquanto os levitas não arônicos ocupa vam uma posição subordinada vis-à-vis com os sacerdotes arônicos, formavam uma separação entre as tribos seculares e o tabemáculo, de modo a evitar que as tribos seculares penetrassem nas áreas sagradas (1.49-53). Pelas queixas gerais (16.3), tudo indica que alguns não-levitas também queriam exercer funções sacerdotais. (-> Números: Teologia) Do ponto de vista temático, a rebelião liga a seção anterior, que se concentrava na terra e na liderança de Moisés (esp. Nm 13— 14) à seção que trata do sacerdócio e da liderança de Arão (caps. 16— 19; Arão). Na história subseqüente de Israel, o sacerdócio e a terra tomamse, obviamente, inseparáveis. O episódio também dá continuidade ao tema de dissensão e re belião da primeira geração daqueles que participaram do êxodo. Em sua insolência, os rebeldes — Corá, um levita da família de Coate, primo em pri meiro grau de Moisés e Arão; Datã e Abirão, dois irmãos rubenitas e 250 príncipes da congreCorá, Datã e Abirão
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Corá, Datã e Abirâo
gação — desafiam a autoridade de Moisés e Arão como lideres designados por Deus sobre a congregação no deserto. Todos os rebeldes eram líderes comunitários respeitáveis (Nm 16.2; 26.9). Pronunciando-se a uma só voz, perguntam de modo provocador a Moisés e Arão: “Por que, pois, vos exaltais sobre a congregação do Senhor?” (v. 3). Arrazoavam que, tendo em vista a congregação e seus membros serem santos (cf. 15.40) e uma vez que o Senhor habitava no meio deles, então todos se encontravam em pé de igualdade com Moisés e Arão. De acordo com o contexto mais amplo, era Moisés quem havia sido escolhido pelo Senhor para tirar o povo do Egito e levá-lo a uma terra que manava leite e mel (Êx 3.8-10), e Arão e seus filhos haviam sido ordenados pelo Senhor como sacerdotes (Êx 28.1; Levítico 8 ). Além disso, ao aceitar a aliança no Sinai, a congregação como um todo havia se tomado um “reino de sacer dotes e nação santa” (Êx 19.6). O que passa a ocupar o primeiro plano é a questão da santidade, especialmente com relação ao sacerdócio. Ao observar essa rebelião com mais atenção, vê-se duas facções principais, um grupo de 250 aspirantes a sacerdotes liderados por Corá (esp. Nm 16.4-11) e Datã e Abirão (esp. vv. 1215). O grupo de 250 príncipes, por sua vez, era constituído de levitas (vv.7 e 10) e não-levitas (v. 2; cf. 27.3). Corá é o personagem central, sendo mencionado 1lx no capítulo e aparecendo em primeiro lugar na seqüência Corá, Datã e Abirão (vv. 1, 24, 27); Datã e Abirão aparecem num papel secundário, sendo mencionados 6 x no capítulo. Uma vez que uma extensa porção do texto trata do sacerdócio (caps. 16— 19) e que Corá foi aparentemente o instigador de todo esse incidente (cf. 26.9), é ele quem recebe mais atenção. A rebelião, cujo núcleo ficava na parte sul do acampamento, começou com os coatitas e espalhou-se para os rubenitas. Dentre os levitas, a responsabilidade dos coatitas era carregar a mobília do santuário quando o povo se deslocava (3.31; 4.15). Das três principais famílias levíticas, os coatitas eram os que se en contravam mais próximos do culto. Rúben era o primogênito (Gn 49.3) e ocupava a posição mais importante das três tribos do Sul (Nm 2.10, 16). As queixas dos rebeldes são apresentadas em detalhes em duas seções separadas, a. Corá e seu grupo, composto de levitas e não-levitas, buscam o reconhecimento sacerdotal (vv. 5 e 10). Em resposta a isso, Moisés chama a atenção dos levitas em particular por não se con tentarem com o papel especial que exerciam no trabalho manual e ministério no tabemáculo (v. 10). A queixa desse grupo é dirigida, portanto, contra Arão (v. 11). b. A queixa expressada por Datã e Abirão é de outra natureza. Eles rejeitam a liderança de Moisés que, de acordo com eles, enganou a comunidade com a falsa promessa de uma terra abundante em árvores frutíferas e capaz de sustentar grandes rebanhos de ovelhas e cabras (vv. 13-14). De acordo com eles, o Egito era a terra que manava leite e mel (v. 13). O uso do vb. ‘Ih, subir (-> # 6590) faz lem brar o episódio recente com os espias (caps. 13— 14), mas nesse caso, serve para expressar a recusa em colocar-se diante de alguém maior do que eles (cf. Dt 25.7; Jz 4.5). Por essa recusa, desceriam (yrd, -> #3718) vivos ao abismo, às suas sepulturas (Nm 16.33). Dois julgamentos diferentes são dispensados aos dois grupos distintos. Os 250 as pirantes a sacerdotes deviam sujeitar-se a um teste, oferecendo incenso em seus próprios incensários (Nm 16.17). Como julgamento, o fogo do Senhor foi até eles e os consumiu (v. 35), de modo semelhante a Nadabe e Abiú (Lv 10.1-2). O Senhor julgou Datã e Abirão ao fazer com que a terra os tragasse vivos numa morte inatural (Nm 16.32). Quando a cena se desloca do tabemáculo para as tendas, Moisés e Corá movem-se junto com ela. Ao que parece, Corá morre no julgamento em que a terra o “traga” juntamente com Datã e Abirão (v. 32; cf. 26.10). A relação indefinida entre os envolvidos na rebelião c a aparente fragmentação da nar rativa levou estudiosos a proporem pelo menos três modelos diferentes para se compreender o 481
Corá, Datâ e Abirão
texto. De acordo com o primeiro modelo, trata-se de duas rebeliões historicamente relacionadas que refletem uma experiência verdadeira no deserto (Ashley, 302). De acordo com o segundo modelo (a hipótese documentária), há três histórias de rebelião, tiradas de documentos literá rios anteriores, reunidos por um redator (Noth, 121). A primeira história narra a rebelião de Datã e Abirão contra a autoridade civil de Moisés em função de seu insucesso (a história JE); a segunda relata como Corá, um não-levita lidera os não-levitas contra Moisés e Arão (que simbolizam o sacerdócio de Jerusalém) por estes colocarem-se acima de toda a congregação (a história S básica); a terceira relata de que modo Corá, como um levita, lidera a rebelião dos levitas contra a autoridade religiosa do levita Arão sobre a questão do sacerdócio (a história S complementar). As histórias da rebelião de Corá refletem a luta histórica pelo sacerdócio ob servada depois da volta do cativeiro na Babilônia. De acordo com o terceiro modelo, o texto contém relatos de duas rebeliões históricas distintas, unidas em função de seu tema comum, a rebelião contra a autoridade religiosa (Liver). A primeira história, de Datã e Abirão, constituiu uma tradição do deserto que reflete o período mais antigo da existência de Israel como nação. A segunda rebelião, de Corá, reflete a luta pelo sacerdócio no período de sua consolidação e organização no templo de Jerusalém no início da monarquia. O modelo da hipótese documentária requer alterações do texto que seus críticos consid ram arbitrárias (p. ex., Liver, 194). Nesse caso, não é possível aceitar que Corá, Datã e Abirão encontravam-se no mesmo local nos vv. 24 e 27, uma vez que isso vai contra a teoria. A oração “do redor da habitação (miskãn) de Corá, Datã e Abirão” deve ser mudada para “da habitação do Senhor” nos dois vv. (Gray, 191, 204), ou então a oração “da habitação de Corá” deve ser removida do v. 24 e as palavras “da habitação de” e “Datã e Abirão devem ser removidas do v. 27 (Noth, 119). Da mesma forma, a oração “todos os homens que pertenciam a Corá e todos os seus bens” (v. 32) deve ser considerada uma tentativa de harmonização por um redator, uma vez que une Corá a Datã e Abirão em morte. A concepção documentária alega a existência de dois Corás diferentes, um não-levita, que supostamente aparece nos caps. 2— 7, e outro levita que aparece nos vv. 8-11. Assim, uma vez que a oração “basta-vos, filho de Levi” no v. 7 con tradiz a tese de dois Corás diferentes, deve ser considerada secundária. Fora do livro de Números, a rebelião é mencionada em outras duas passagens do AT. Deuteronômio 11.6 cita o julgamento do Senhor contra Datã e Abirão, mas não fala de Corá. Alguns estudiosos propuseram que o motivo para essa omissão é que a história de Datã e Abi rão era, a princípio, separada da história de Corá. No entanto, é possível que o motivo para a menção somente do julgamento contra Datã e Abirão seja seu caráter absolutamente singular, também observado em Números (16.30). O Salmo 106 cita especificamente Datã e Abirão, mas é possível que faça alusão ainda a Corá (v. 18). P-B Corá aparece em Judas 11 como exemplo de um líder ostensivamente perverso, junta mente com Caim e Balaão, a quem Deus destruiu. Num hino exaltando Arão, Ben Sira relata como os seguidores de Datã e Abirão e o bando de Coré, os quais chamou de “forasteiros” (zãr, # 2424), foram tomados de inveja de Arão (Ecli 45.18). 4 Macabeus 2.17 ilustra como a razão deve govemar sobre as emoções, mesmo aquelas violentas como a ira, usando o exemplo de Moisés quando este irou-se contra Datã e Abirão (Nm 16.15). De acordo com a Mix. do Sinédrio 10.3, aqueles que pertenciam ao grupo de Coré não teriam parte na ressurreição. B ib l io g r a f ia
T. R. Ashley, Numbers, NICOT, 1993; P. J. Budd, Numbers, WBC, 1984; G. W. Coats, Rebellion in the fVilderness, 1968, 156-84; J. de Vaux, Les Nombres, 1972; G. B. Gray, Numbers, ICC, 482
Corá, Datã e Abirão
1906; J. Licht, A Commentary on the Book o f Numbers [XI-XXJ] (Heb.), 1991; J. Liver, “Korah, Dathan and Abiram”, ScrHier 8 , 1961, 189-217; J. Milgrom, Numbers, 1990; M. Noth, Numbers (Engl), 1968; G. J. Wenham, Numbers, TOTC, 1981. JeromeA. Lund Coração -> # 4213 (lêb, coração) Corda -> # 2475 (hebel II, cordão, corda, terra, região) Cores (ver cada uma das cores) Coroa -> # 4195 (keter, coroa) Correção
# 3837 (ysr, ser reto, nivelado, aprumado)
Corredeira -> # 5641 (nhr I, fluir) Corrente -> # 2414 (zêq, corrente, grilhão) Corrida -> # 8132 (rw$, correr, ser/estar ocupado) Corrupção -> # 8845 (í/i/, corromper-se, arruinar, estragar) Corte -> # 4162 (krt, cortar, extirpar, exterminar) Cortina -> # 3749 (y^rfâ, cortina, tecido de tenda) Costura -> # 9529 (/pr, costurar, remendar) Couro -> # 133 ( actá/w II, couro) Couro cru/pele -> # 6425 ( 'ôr, pele, couro cru) Cova -> # 8846 (sahat, cova, túmulo) Covil -> # 5061 (mã'ôn II, covil) Coxa -> # 3751 (yãrêk, coxa, quadril) Coxo -> # 7 1 7 4 (pj/i, ser coxo, aleijado) Crescimento
# 1540 (gí///1, crescer, criar, engrandecer, gabar-se)
Criação -> # 1343 (Ar ’ I, criar, separar) Criança -> # 3529 (yeled, menino, criança, jovem) Criaturas voadoras -> # 6416 ( ‘ôp, criaturas voadoras) 483
Crônicas 1,2: Teologia de
Crônicas 1,2: Teologia de A.
Contexto histórico Os livros de Crônicas, que são incluídos junto com os livros históricos na LXX e, por tanto, nas traduções para a nossa língua, encontram-se no final da BH. Em sua presente forma, apresentam um esboço da história de Israel com diferentes graus de detalhes, desde Adão até 0 decreto de Ciro autorizando os judeus a deixarem o exílio na Babilônia e voltarem para Je rusalém. Esse decreto, porém, é interrompido no meio (cf. Ed 1.2-4), de modo que a obra toda conclui com um tom animador e exortativo: “Quem dentre vós é, de todo o seu povo... suba a Jerusalém”. E possível afirmar corretamente que essa conclusão (que pode ter sido tirada de Esdras e acrescentada a esse texto para fins litúrgicos) determina o modo como a obra deve ser interpretada em sua totalidade. 1. O principal enfoque da história é o reino de Israel, primeiro sob a monarquia unifi cada desde a morte de Saul, passando pelos reinados de Davi e Salomão e, depois da divisão do reino, em sua parte do sul (Judá) até o exílio. O cronista tinha acesso aos livros de Samuel (->) e Reis (->) e fica claro que lançou mão de ambos como sua principal fonte. (Em alguns detalhes importantes, o texto de suas fontes diferem ligeiramente do TM, de modo que é pre ciso usar de cautela ao realizar uma comparação sinóptica; cf. W. E. Lemke; S. L. McKenzie.) Pode-se descobrir muita coisa sobre os métodos, pressupostos e interesses do cronista ao es tudar o modo como lidou com essas fontes (cf. as sinopses de Bendavid, Kegler-Augustin e T. Willi; cf. M. Fishbane). Além disso, o cronista empregou outras fontes de vários tipos. Exceto por suas alusões a várias partes anteriores do AT, não se sabe mais quais foram essas fontes e os estudiosos apre sentam grande divergência quanto à sua extensão e precisão histórica (cf. P. Welten; S. Japhet. “The Historical Reliability of Chronicles”; M. Noth; D. G. Deboys). No entanto, em termos de avaliação teológica, essa questão não é tão séria quanto poderia parecer à primeira vista se estivermos preparados para conceder ao cronista algumas liberdades como fazemos a prega dores modernos quando relatam uma história bíblica visando à edificação, ao encorajamento e à admoestação. Pode ocorrer de o material ser reagrupado e das prioridades serem definidas em função dos atuais interesses da congregação, os discursos podem ser narrados de forma imaginativa a fim de ressaltar temas religiosos importantes e assim por diante (cf. L. C. Allen; R. Mason, Preaching the Tradition). Se, como parece ser o caso em algumas ocasiões (p. ex., 1Cr 10.13-14; 2Cr 10.15), o cronista parte do pressuposto de que seus leitores conhecem a his tória mais antiga, então devemos ser capazes de aceitar que ele não estava apenas apresentando um relato alternativo da história, mas sim, procurando vários meios de extrair sua mensagem perene para uma geração posterior. 2. Não é fácil determinar uma data para a obra do cronista, e a questão apresenta com plicações maiores em função da controvérsia ainda em andamento sobre Esdras (->) e Neemias (->) serem ou não partes integrantes da obra do cronista. (No texto a seguir, Crônicas é considerado separadamente; cf. S. Japhet, “The Supposed Common Authorship”; H. G. M. Williamson, Israel in the Books o f Chronicles. 5-70; R. L. Braun, “Chronicles, Ezra and Neemiah”; comparar com D. Talshir; P. R. Ackroyd, “Chronicles-Ezra-Neemiah”; J. Blekinsopp.) No entanto, o período mais provável parece ser a última parte do domínio persa (metade do século IV a. C.). A ausência de qualquer sinal de influência helenista toma improvável uma data mais recente. Nos últimos tempos, procurou-se atribuir uma data muito mais antiga para Crô nicas, situando-as na época da construção do segundo templo (520-515 a. C.; cf. F. M. Cross; J. D. Newsome; M. A. Throntveit, 97-107). Essa idéia fora proposta anteriormente por A. C. 484
Crônicas 1, 2: Teologia de
Welch e D. N. Freedman. No entanto, ela não leva em consideração a referência aos daricos que aparece em 1 Crônicas 29.7 (uma moeda cunhada inicialmente por Dario I) e a aparente citação de Zacarias 4.10, em 2 Crônicas 16.9 — algo que, pela crítica da forma, corresponde à citação que o cronista faz de profetas canônicos, em outros discursos chamados de “sermões levíticos”. (R. Mason, Preaching the Tradition, 49-51, afirma, do mesmo modo, que 2Cr 15.5-7 é uma exegese de Zc 8.9-10, 13.) E pouco provável que alguém citasse o livro de Zacarias no período em que o profeta ainda era vivo. Além disso, para que essa teoria funcione, é preciso considerar as genealogias de 1 Crônicas 1—9 como um acréscimo posterior à obra (ver esp. o final de 1 Crônicas 3), enquanto estudos recentes mostram que elas são partes integrantes do todo (M. D. Johnson e M. Oeming). O século IV a. C. foi uma espécie de idade das trevas na história de Judá. Em função disso, só nos resta lamentar da impossibilidade de se relacionar a redação de Crônicas com qualquer acontecimento importante específico, mas esse fato em si pode nos oferecer uma outra pista para a interpretação. Não se trata de livros escritos para uma época de crise, mas sim para tempos comuns quando a vida parece normal, com pouca expectativa de mudanças de vulto. Qual é, então, a relevância dos inspiradores heróis da fé do passado? Como é possível evitar os conflitos dentro da comunidade, um elemento tão característico de tempos assim? E, acima de tudo, como é possível manter a fé, e como esta deve ser expressada quando valores religio sos e morais parecem fazer pouca diferença para o que acontece no quotidiano? São questões desse tipo que despertam o interesse do cronista. B.
Estrutura literária e temas teológicos 1. Os livros são constituídos de quatro seções principais: a. a introdução genealógica de 1 Crônicas 1—9; b. a monarquia unida de Davi e Salomão, que tem como introdução um relato da morte de Saul ( ICr 10—2Cr 9); c. a história de Judá durante o período do reino dividido (2Cr 10—28); d. a história do reino de Ezequias até o exílio (2Cr 29— 36). Esse último período tem início aproximadamente no tempo da queda do império do norte (um acontecimento que não é mencionado explicitamente no texto). Assim, fica evidente que o cronista não trata da história mais antiga de seu povo — os patriarcas, o êxodo, a colonização da terra, o período dos juizes e a fundação da monarquia. Além disso, por vezes ele passa por cima de referências a esses acontecimentos presentes em suas fontes (p. ex., o êxodo é omitido em 2Cr 6.39-40, embora apareça em lRs 8.50-53, fonte daqueles versículos). Esse fato é, algumas vezes, interpretado de forma polêmica, como se o cro nista desejasse negar que Israel nem sempre estivera presente na terra (S. Japhet, “Conquest and Settlement in Chronicles”; K. W. Witelam). No entanto, alusões feitas em outras partes (p. ex., 1 Cr 17.21 -22) devem nos levar a refletir sobre essa idéia. Tendo escrito no final do período do AT, o cronista podia tomar vários dos acontecimentos do passado como sendo conhecidos de todos. É melhor aceitar-se que ele selecionou seu material para determinados propósitos (observe-se, por exemplo, o novo final que ele apresenta para a oração de Salomão em 2Cr 6.41-42, a fim de substituir o tema do êxodo) e voltar a atenção para a avaliação desses propósitos. Portanto, no texto a seguir será apresentado um esboço dos temas principais e mais características de cada seção, e não uma descrição teológica geral (para isso, ver S. Japhet, The Ideology o f the Book o f Chronicles), uma vez que isso necessariamente acabaria levando a uma repetição de grande parte daquilo que já se sabe por outras passagens do AT. Além do mais, deve-se observar que vários desses temas caracterizam mais do que uma seção da obra do cronista. Os temas serão tratados nas seções em que são mais relevantes, ainda que a expo sição remeta a outras passagens do livro quando necessário for. 485
Crônicas 1,2: Teologia de
2. Genealogia<>.Apesar de uma aparência inicial de confusão, as genealogias possuem uma estrutura geral clara e simples. O cap. 1 apresenta uma passagem sucinta de Adão para Is rael (como Jacó é quase sempre chamado nesses livros). Grande parte do material é resumo de Gênesis. Os caps. 2— 8 relacionam as tribos de Israel numa estrutura proporcionada pelas três tribos predominantes na comunidade do cronista: primeiro, Judá (2—4); por último, Benjamim (8 ); e no meio, Levi (6 ). Depois, o cap. 9 apresenta um sumário dos membros da comunidade restaurada dedicando atenção especial àqueles que se ocupavam das atividades cultuais. (-> Restauração [no pós-exílio]: História) Tais observações levam a várias conclusões, a. O lugar central ocupado por Israel na família das nações está claro no capítulo de abertura. Ao resumir uma lista simples de nomes de uma fonte mais variegada, o cronista mostra que almejava uma simplificação. Os detalhes das linhagens secundárias de uma família são apresentados sempre no início, de modo que cada seção termina ressaltando a linhagem que levaria a Israel. Essa apresentação da eleição e graça dá aos leitores do cronista uma idéia do valor da situação deles no sistema divino (cf. Ef 1.3-6 para um paralelo no NT). b. No entanto, a estrutura da seção central (caps. 2— 8 ) indica que esse tema da eleição não deve ser interpretado num sentido único. A linhagem que vai até a comunidade do pósexílio não percorre um traçado reto, passando isoladamente pelas três tribos que a constituí ram, pois estas compreendem as tribos do Norte cujas listas mais incompletas são um indício do estado de pobreza em que viviam. c. Tudo o que ocorreu antes converge para a comunidade do cap. 9. São herdeiras da graça de Deus pela eleição, e também das responsabilidades decorrentes dela como nação. d. Há vários outros temas secundários dignos de menção, i. A família de Davi recebe destaque, tanto pela posição surpreendente de Judá como primeira dentre as tribos (explicada em lCr 5.1-2) quanto pela posição central ocupada pela família real na genealogia (cap. 3; cf. H. G. M. Williams, "Sources and Redaction in the Chronicler’s Genealogy of Judah”). Além disso, a família de Davi é a única que tem sua linhagem traçada até o dia do próprio cronista (1 Cr 3.17-24). ii. Da mesma forma, dá-se ênfase considerável ao papel da família levítica no culto, tanto em sua genealogia (cap. 6 , em termos esquemáticos, situada no cerne de sua nação) como na descrição da comunidade do pós-exílio (cap. 9). iii. Aspectos geográficos repetem-se com freqüência ao longo das genealogias das tribos, provando a importância teológica da terra como um todo, mesmo quando a comunidade havia sido reduzida em termos territoriais a apenas um remanescente (cf. M. Kartveit). iv. Existem ainda várias alusões históricas espalhadas por esses capítulos. É comprovado que essas alusões também servem para ilustrar muitos dos principais pontos de destaque do cronista (cf. M. Oeming), como, por exemplo, a eficácia da oração (1 Cr 4.10), a importância da fé em Deus em tempos de aflição (1 Cr 5.20) e as tragédias políticas e militares decorrentes da infidelidade religiosa (1 Cr 5.25-26; 9.1; ver ainda a seção 4 abaixo). 3. A monarquia unida. O período da monarquia unida começa em 1 Crônicas 10, em que Israel encontra-se numa situação de derrota, descrita especialmente nos vv. 13-14 numa linguagem que, em outras passagens, é usada para explicar o exílio na Babilônia (-> Exílio: Teologia). Isso nos mostra o uso que o cronista faz da tipologia como meio de extrair verda des teológicas permanentes de acontecimentos históricos específicos. Comportamentos como o de Saul, incluindo-se a “infidelidade” (ma ‘al, -> # 5085; sobre isso, ver esp. W. Johnstone) e a recusa em ouvir a palavra do Senhor ou em consultá-lo, resultam numa situação de exílio e morte (ressaltados em ICr 10.6 [cf. ISm 31.6] e 13). Então, Davi (->) é apresentado como uma espécie de figura de salvador, aquele que começa a reverter a situação imediatamente. No decorrer do tempo, recebe o apoio de todo o 486
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povo de Israel (caps. 11— 12; 13.1-5) e “[tomou] a trazer (heb. buscou)... a arca do nosso Deus” que fora esquecida nos tempos de Saul (lC r 13.3). Apesar dos insucessos ( lCr 13.9-14), suas intenções louváveis foram recompensadas com bênçãos que também caracterizam o governo de outros reis avaliados de forma positiva — uma grande família, o sucesso na batalha e o res peito perante as nações (v. 14). Um elemento predominante de todo o reinado de Davi é a preocupação com a adoração correta a Deus. A história da arca prossegue até uma conclusão feliz nos caps. 15— 16; as vi tórias de Davi proporcionam riquezas para o templo (caps. 18—20; cf. esp. 18.8, 11; 2Cr 5.1); o fracasso do censo leva à aquisição de um local para o futuro templo (1 Cr 21.28— 22.1), e os preparativos de materiais, projetos e trabalhadores para construção são completados nos caps. 22 e 28— 29. Ao mesmo tempo, tem-se o cuidado de ressaltar que Davi tomou todas as pro vidências necessárias para que os oficiais religiosos ocupassem seus devidos cargos uma vez que as circunstâncias mudaram e a arca havia chegado ao destino (1 Cr 16.1-4, 37-43; 23—27; ver S. J. DeVries; há controvérsias com referência a se ou o quanto dos capítulos 23— 27 de vem ser considerados obra do próprio cronista; cf. H. G. M. Williamson, “The Origins o f the Twenty-Four Priestly Courses” ). Ao mesmo tempo, o conteúdo de Samuel que não se mostra relevante para esse tema é simplesmente omitido. Assim, é difícil evitar-se a impressão de que o cronista apresenta o reinado de Davi como um paradigma para os leitores, uma demonstração de como sair da situação de exílio. Foi sugerido (R. Mosis) que o reinado de Salomão é retratado como um terceiro estado tipológico, uma situação de bênção escatológica. Na verdade, porém, é preferível observar-se que, por meio de vários recursos, o cronista apresenta o reinado de Salomão como idêntico ao de Davi, semelhante em termos de qualidade fundamental e complementar no que se refere a colocar-se em prática os planos de Davi para o templo e para o culto (observe-se especialmente como estão relacionados em 2Cr 3.1; 5.1; 7.10; etc.; cf. R. L. Braun, “Solomonic Apologetic in Chronicles” e “Solomon, The Chosen Temple Builder”; H. G. M. Williamson, “ The Accession of Solomon”). Assim, seus reinados devem ser considerados em conjunto, tanto em termos históricos como tipológicos. Isso nos leva a perguntar qual era, possivelmente, a esperança do cronista com referência ao futuro da linhagem de Davi. As opiniões dividem-se entre aqueles que acreditam que o cro nista não tinha esperanças desse tipo, uma vez que tudo o que Davi e Salomão representavam concretizou-se no templo e, conseqüentemente, em seus sucessores depois do exílio (p. ex., Rudolph, xxiii-xxiv; A. Caquot; O. Plõger; R. Mason, Preaching the Tradition), e aqueles que, por outro lado, consideram o retrato entusiasmado que o cronista apresenta do rei Davi como sendo plenamente messiânico (p. ex., ainda que com ênfases distintas, G. von Rad, Das Gershichtsbild des chronistischen Werkes, 119-32; A. Noordtzij; A. M. Brunet, “Le chroniste et ses sources” e “La théologie du chroniste”; G. J. Botterweck; W. F. Stinespring). Ao que parece, a verdade encontra-se entre esses dois extremos. A maneira como o cronista trata do oráculo de Natã ( lCr 17; cf. 2Sm 7) e suas repercussões posteriores (p. ex., lCr 22.9-10; 28.4-10) indica que ele con siderava a promessa de uma dinastia eterna de Davi como algo que dependia da condição de o filho de Davi ser obediente, especialmente em levar a cabo a construção do templo. E precisa mente esse o tema que caracteriza a seleção de material pelo cronista para descrever o reinado de Salomão, de modo que, por ocasião da morte do rei, fica claro que se deva considerar a dinastia de Davi eternamente estabelecida. Apesar de não haver muitas referências a esse fato na narrativa posterior, as que existem bastam para reforçar essa conclusão (2Cr 13.5; 21.7; 23.3). Dificilmente, poderíamos chamar essas considerações de messiânicas no sentido cos tumeiro da palavra; mas elas não excluem a promessa de todas as esperanças. Antes, podemos 487
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nos contentar com o termo monarquista, afirmando que o cronista procurava a restauração da monarquia davídica dentro de um contexto histórico e não escatológico (cf. H. G. M. Williamson, “escathology in Chronicles” e “The Dynastic Oracle”). E possível que, naqueles dias, tal esperança tivesse parecido remota. Ainda assim, o cronista consegue mantê-la viva ao ressaltar que o reino não é apenas uma instituição humana, sujeita aos caprichos da conveniência política, mas também, num sentido verdadeiro, o rei no de Deus, confiado por um decreto divino à família de Davi. Essa idéia mostra-se tanto em passagens em que o cronista parece estar redigindo livremente (IC r 28.5; 29.23; 2Cr 13.8), quanto em várias alterações pequenas, porém significativas, na escolha de palavras de suas fontes (comparar ICr 17.14 com 2Sm 7.16; 2Cr 9.8 com lRs 10.9). Assim, o reino de Israel era garantido e eterno, pois se encontrava nas mãos de Deus. Da mesma forma como ele havia especificamente “[transferido] o reino a Davi” (IC r 10.14) a fim de resgatar Israel depois da tragédia (semelhante ao exílio) da morte de Saul, também podia intervir novamente para resta belecer seu reino quando desejasse fazê-lo (cf. M. Saebo, “Messianism in Chronicles?”). 4. Judá durante o reino dividido. O problema apresentado pela divisão do reino depo da morte de Salomão pode ser tratado de modo mais conveniente quando estudarmos o reinado de Ezequias (->). Enquanto isso, a descrição que o cronista faz do período do reino dividido nos será instrutiva para outro de seus principais temas teológicos, chamado muitas vezes de “doutrina da retribuição imediata”. (-> Retribuição: Teologia) E fato bem conhecido que o cronista vai além do historiador deut. na correlação que faz entre bênção e fidelidade e julgamento e desobediência dentro de cada uma das gerações (os exemplos mais importantes já foram reunidos por J. Wellhausen, 203-10). Em termos ge rais, os reis que demonstram fidelidade são recompensados com sucesso em seus planos de construção e na guerra e também com famílias grandes, riquezas e o respeito de outras nações; enquanto aqueles que “deixam" o Senhor sofrem derrotas, enfermidades, conspirações e assim por diante. Esse fato é ilustrado em quase todos os capítulos de 2 Crônicas 10—28, bem como em outras passagens (cf. R. B. Dillard). A premissa fundamental dessa doutrina é expressada, em seu aspecto negativo, em 1 Crônicas 10.13-14 e, em seu aspecto positivo, em 28.9; passagens estas que apresentam parte do vocabulário-chave do cronista. No entanto, também é importante ressaltar que essa doutrina não é colocada em prática de maneira automática apenas. Em primeiro lugar, considera-se a possibilidade de arrependimento como uma forma de evitar-se, ou pelo menos atenuar o julgamento anunciado. A base para isso é colocada no acrés cimo do próprio cronista à resposta de Deus à oração de Salomão na consagração do templo (2Cr 7.14). As quatro respostas a calamidades, que ele apresenta nessa passagem, repetem-se ocasionalmente em narrativas subseqüentes (p. ex., humilhar-se, cf. 2Cr 12.6,7,12; 30.11; 33.12, 19, 23; 34.27; 36.12; orar, cf. 1Cr 4.10; 5.20; 21.26; 2Cr 13.14; 14.11; 18.31; 20.9; 30.18, 27; 32.20, 24; 33.13, 18-19, etc.); geralmente esses atos são seguidos de intervenções miraculo sas que, sem dúvida, em certos casos, geram dificuldades históricas, mas que também servem para sublinhar a convicção predominante do cronista de que o desejo de Deus de abençoar é maior do que o desejo de condenar, e de que Deus busca apenas uma mudança de opinião, um arrependimento, que o faça reter seu julgamento. Em segundo lugar, quase sempre há advertências proféticas feitas antes da chegada do julgamento. Trata-se normalmente de “sermões levíticos” curtos que resumem vários dos temas prediletos do cronista (cf. G. von Rad, “The Levitical Sermon in 1 and II Chronicles” ). Há controvérsias quanto a ser ou não apropriado dividir-se esses sermões em categorias de acordo com a crítica da forma (cf. D. Mathias; R. Mason, “Some Echoes o f the Preaching in 488
Crônicas 1,2: Teologia de
the Second Temple?” e Preaching and Tradition, 133-44). Quando atendidas, essas adver tências podem evitar o julgamento (p. ex., 2Cr 12.5; 15.1-7; 28.9-13), mesmo na última hora (2Cr 33.10-13); mas quando rejeitadas, são inevitavelmente seguidas de julgamento (p. ex., 2Cr 16.7-10; 24.19-22; 25.15-16; 26.16-21). Assim, como último recurso, o julgamento é re sultado de não se dar ouvidos à Palavra de Deus, de modo que a retribuição não fica apenas na esfera do automático. Apesar de muito criticada (e, obviamente, precisar do contrapeso de outras passagens das Escrituras), essa doutrina deve ser vista, antes de mais nada, como mais uma expressão da abertura do cronista para o futuro. Os ideais do passado não são produto do desejável, mas sim, incentivos á fidelidade no presente, estimulando a convicção de que Deus não está preso à história, mas atua em cada geração usando de liberdade e graça (OTT 1, 349). 5. De Ezequias ao exílio. Pode-se dizer que, com o reinado de Ezequias (2Cr 29— 32 o cronista sugere uma solução para o problema histórico que a divisão do reino representa para seus ideais. Nas genealogias e nos reinos de Davi e Salomão, esses ideais concentraram-se no povo como um todo, plenamente unido sob um rei da linhagem davídica em tomo do templo em Jerusalém. A separação das tribos do Norte representou um risco enorme de desintegra ção desse ideal, a ponto de não poder mais haver nenhuma esperança realista de restauração no presente. Isso deu origem à idéia muito difundida no passado de que o cronista era “antisamaritano” (p. ex., G. von Rad, Das Gershichtsbilddes chronistischen Werkes; Rudolph, ix; M. Noth; para uma tentativa recente de recuperar essa idéia, ver M. Oeming). Em 2 Crônicas 13, porém, o cronista deixou claro que a população do Norte ainda fa zia parte de Israel, mesmo que houvesse (temporariamente) abandonado o Senhor, fato que foi salientado pela derrota que ela sofreu para o exército de Judá. No entanto, como vimos, depois disso o próprio reino de Judá deu as costas para Deus sem que tal atitude os separasse definitivamente da possibilidade de restauração. O melhor exemplo pode ser visto nos dias de Acaz (2 Crônicas 28), quando uma situação militar no cap. 13 foi completamente invertida. A descrição que o cap. 28 apresenta da situação religiosa de Judá sob o governo de Acaz é tão negativa quanto qualquer coisa dita em outras passagens sobre o Reino do Norte (aliás, Acaz “andou nos caminhos dos reis de Israel”, v.2) e de acordo com o v. 6 , “Judá... [abandonou] o Senhor, Deus de seus pais”. Portanto, não é de surpreender que Judá tivesse sido derrotada por Israel (vv. 5-6). Por outro lado, Israel é apresentada pela primeira vez sob uma ótica mais po sitiva, com seus líderes mais destacados confessando tanto seus pecados presentes quanto pas sados (v. 13), o que indica que começaram a trilhar o caminho para a restauração. A essa altura, com Judá em seu ponto mais baixo (ver a descrição referente ao “exílio” em 2Cr 29.8-9) e o Reino do Norte aparentemente ntmando para a recuperação, o cronista faz uma caracterização singular de Ezequias como um segundo Salomão (ou talvez, melhor ainda, como uma combi nação de Davi e Salomão). Diversos elementos contribuem para isso, mas devemos observar, especialmente neste contexto, que se dá ênfase ao convite realizado por Ezequias ao povo do Norte para participar da primeira Páscoa de seu reinado (2Cr 30.1-5), ao fato de um número significativo ter aceito o convite (2Cr 30.11) e a que, em decorrência disso, houvesse uma co memoração, como não acontecia “desde os dias de Salomão” (2Cr 30.26). Pode-se sugerir, portanto, que sob a ótica do cronista, Ezequias restaurou o que se havia perdido depois da morte de Salomão (cf. H. G. M. Williamson, Israel in lhe Book o f Chronicles, 87-131). E evidente que ainda havia mais o que fazer para transformar-se essa idéia retórica numa realidade prática (p. ex., 2Cr 34.9; 35.18); e, sem dúvida, o cronista teria argumentado que essa era uma necessidade ainda mais premente em seu próprio tempo, muito depois disso, quando, passadas as reformas de Esdras e Neemias, a atitude predominante em certos meios 489
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mais influentes da população era a de exclusão. Porém, para os propósitos deste estudo, é su ficiente concluir-se que o cronista apresentou uma interpretação da história da monarquia que mostrava como não havia necessariamente barreiras que impedissem a realização dos ideais davídicos e salomônicos. Assim, podemos concluir que o cronista usou o instrumento da redação histórico-interpretativa para apresentar aos seus leitores uma visão de como deveriam ordenar sua vida comu nitária, religiosa e individual dentro das circunstâncias bastante diversas de seu próprio tempo. Não deviam desanimar pensando que suas mãos estavam atadas por aquilo que havia acontecido no passado e nem se deixarem levar pela idéia equivocada de que Deus não estava disposto ou não era capaz de reverter as situações das quais eles mesmos não tinham nenhum controle. Desse modo, num certo sentido, seus escritos tomam-se um tipo de “sermão levítico” em grande escala. Assim como os exemplos menores desse gênero que aparecem entremea dos em sua narrativa, também os livros em sua totalidade lançam mão de Escrituras canônicas anteriores como “texto”, aplicando-as aos leitores em estilo exortativo. O querigma geral que aparece pode ser resumido como uma conclamação à fé resoluta (“Crede no Senhor, vosso Deus, e estareis seguros; crede nos profetas e prosperareis”. 2Cr 20.20) e à ação (“que suba”, 2Cr 36.23), uma mensagem dupla que repercute ao longo de grande parte tanto do Antigo Tes tamento e também do Novo. B ib l io g r a f ia
Principais comentários: R. L. Braun, 1 Chonicles, 1986; E. L. Curtis e A. A. Madsen, The Books o f Chronicles, 1910; S. J. De Vries, 1 and 2 Chronicles, 1989; R. B. Dillard, 2 Chroni cles, 1987; J. Goettsberger, Die Bücher der Chronik oder Paralipomenon, 1939; S. Japhet, I andII Chronicles, 1993; F. Michaeli, Les livres des Chroniques, d 'Esdras et de Néhémie, 1967; J. M. Myers, / Chronicles and 2 Chronicles, 1965; W. Rudolph, Chronikhiicher, 1955; H. G. M. Williamson, / and 2 Chronicles, 1982. Outros: P. R. Ackroyd, “Chronicles-Ezra-Nehemiah: The Concept of Unity”, Suppl. to ZA W 100, 1988,189-201; idem, The Chronicler in His Age, 1990; L. C. Allen, “Kerygmatic Units 1 and 2 Chronicles”, JSO T 41,1988,21-36; A. Bendavid, Parallels in the Bible, 1972; J. Blenkinsopp, Ezra-Nehemiah, 1988; G. J. Botterweck, “Zur Eigenart der chronistischen Davidgeschichte”, TQ 136,1956,402-35; R. L. Braun, “Solomonic Apologetic in Chronicles”, JBL 92,1973,503-16; Idem, “Solomon, the Chosen Temple Builder: The Significance of 1 Chronicles 22, 28 and 29 for the Theology of Chronicles”, JBL 95,1976,581 -90; idem, “Chronicles, Ezra and Nehemiah: Theology and Literary History”, SV T 30, 1979,52-64; A.-M. Brunet, “Le chroniste et ses sources”, RB 60, 1953,481-508; 61, 1954, 349-86; idem, “La théologie du chroniste. Théocratie et messianisme”, in J. Coppens et al. (eds.), Sacra Pagina, 1, 1959, 384-97; A. Caquot, “Peut-on parler de messianisme dans 1'oeuvre du Chroniste?” R TP 99/2, 1966,110-20; F. M. Cross, “A Reconstruction o f the Judean Restoration”, JBL 94, 1975, 4-18; D. G. Deboys, “History and Theology in the Chronicler’s Portrayal o f Abijah”, BIB 71,1990,48-62; S. J. De Vries, “Moses and David as Cult in Chronicles”, JBL 107, 1988,619-39; R. B. Dillard, “Reward and Punishment in Chronicles”, WTJ 46, 1984, 164-72; M. Fishbane, Biblical Interpretation in Ancient Israel, 1985; D. N. Freedman, “The Chronicler’s Purpose”, CBQ 23, 1961,436-42; S. Japhet, “The Supposed Common Authorship o f Chronicles and Ezra-Nehemiah Investigated Anew”, VT 18, 1968, 330-71; idem, “Conquest and Settlement in Chronicles”, JBL 98, 1979, 205-18; idem, “The Historical Reliability o f Chronicles”, JSO T 33, 1985, 83-107; idem, The Ideology o f the Book o f Chronicles and Its Place in Biblical Thought, 1989; M. D. Johnson, The Pur pose o f the Biblical Genealogies, 1969; W. Johnstone, “Guilt and Atonement: The Theme o f 1 490
Dã
and 2 Chronicles”, in J. D. Martin e P. R. Davies (eds.), A Word in Season: Essays in Honour ofW illiam McKane, 1986, 113-38; M. Kartveit, Motive und Schichten der Landtheologie in 1 Chronik 1-9, 1989; J. Kegler e M. Augustin, Synopse zum chronistischen Geschichtswerk, 1984; W. E. Lemke, “The Synoptic Problem in the Chronicler’s History”, HTR 58, 1965, 34963; S. L. McKenzie, The Chronicler’s Use o f the Deuteronomistic History, 1985; R. Mason, “Some Echoes o f the Preaching in the Second Temple? Tradition Elements in Zechariah 1- 8 ”, ZAW 96, 1984, 221-35; idem, Preaching the Tradition: Homily and Hermeneutics After the Exile, 1990; D. Mathias, “Levitische Predigt’ und Deuteronomismus”, Z A W 96, 1984, 23-49; R. Mosis, Untersuchungen zur Theologie des chronistischen Geschichtswerkes, 1973; J. D. Newsome, “Toward a New Understanding of the Chronicler and His Purposes”, JBL 94,1975, 201-17;A.Noordtzij,“Les intentions du chroniste”, RB 49,1940,161-68; R. North,‘Theology o f the Chronicler”, JBL 82, 1963, 369-81; M. Noth, The Chronicler s History, 1987 (German original, 1943); M. Oeming, Das Wahre Israel: Die "genealogische Vorhalle" 1 Chronik 1-9, 1990; D. L. Petersen, Late Israelite Prophecy, 1977; O. Plõger, Theocracy and Eschatology, 1968; G. von Rad, Das Geschichtsbild des chronistischen werkes, 1930; idem, “The Levitical Sermon in 1and II Chronicles”, in The Problem o f the Hexateuch and Other Essays, 1966,26780; idem, O T T 1:347-54; M. Saebo, “Messianism in Chronicles?” H BT2, 1980, 85-109; idem, “Chronistische Theologie/chronistisches Geschichtswerk”, in G. Krause e G. Müller (eds.), Theologische Realenzyklopàdie, 8,1981,74-87; W. F. Stinespring, “Eschatology in Chronicles”, JBL 80, 1961, 209-19; D. Talshir, “A Reinvestigation of the Linguistic Relationship Between Chronicles and Ezra-Nehemiah”, F 7 3 8 ,1988,165-93; M. Throntveit, When Kings Speak: Royal Speech and Royal Prayer in Chronicles, 1987; A. C. Welch, The Work o f the Chronicler, 1939; J. Wellhausen, Prolegomena to the History o f Israel, 1885; P. Welten, Geschichte und Geschichtsdarstellung in den Chronikbiichern, 1973; K. W. Whitelam, “IsraePs Traditions o f Origin: Reclaiming the Land”,J 5 0 7 '4 4 ,1989,19-42;T. Willi, Die Chronik ais Auslegung, 1972; H. G. M. Williamson, “The Accession o f Solomon in the Bools o f Chronicles”, VT 26,1976,351-61; idem, Israel in the Books o f Chronicles, 1977; idem, “Eschatology in Chronicles”, TynBul 28, 1977, 115-54; Idem, “The Dynastic Oracle in the Books o f Chronicles”, in A. Rofé (ed.), Isaac Leo Seeligmann Volume, 3, 1983, 305-18; idem, “The Origins of the Twenty-Four Priestly Courses: A Study o f I Chronicles XXIII-XXVII", S V T W , 1979, 251-68; idem, “Sources and Redaction in the Chronicler’s Genealogy of Judah”, JBL 98,1979, 351-59. H. G. M. Williamson Cúbito Cuidado Culpa
# 564 ( 'ammâ I, cúbito, vara, braça) # 9068 (Smr I, vigiar, guardar; ter cuidado) # 870 ( 'sm, tomar-se culpado, levar a culpa, declarar culpado)
Cura -> # 8324 (rp ’, curar, tomar saudável, fazer com que alguém seja curado)
Dã
Dã (|T [dãn II], cidade na região norte de Israel; Dã = [o Senhor] julga/é juiz [# 1969]). Também a tribo de Dã
e o antepassado epônimo. OMA O nome mais antigo, Laís (Jz 18.29) já foi considerado o mesmo que r-w-s na lista de cidades de Tutmés III (#31 em Aharoni, 160) e nas cartas acad. de Mari (Aharoni, 149). 491
Dã
AT As referências do AT a Dã dizem respeito à cidade e à tribo (bem como ao antepassado epônimo) e como as duas tomaram-se ligadas. Trata-se do único exemplo no qual o nome de uma cidade também é o nome de uma tribo. 1. A cidade é usada muitas vezes para representar o ponto mais ao norte no território conquistado pelos reis de Jerusalém. Assim, aparece diversas vezes nas histórias do reinado de Davi: “desde Dãaté Berseba” (2Sm 3.10; 17.11; 24.2 [1 Cr 21.2, desde Bersebaaté Dã], 15) e num resumo do reinado de Salomão (1 Rs 4.25 [5.5]). Em 2 Crônicas 30.5 a expressão “de Berseba até Dã” também é usada, mas não há nenhuma passagem paralela em Reis. Em Deute ronômio 34.1, é considerada a fronteira de Gileade ao norte e, portanto, supostamente parte da Transjordânia, uma vez que ficava numa das nascentes do rio Jordão. Em Juizes 20.1, “desde Dã até Berseba” designa todas as tribos da Cisjordânia. Como ponto mais ao norte, também era vulnerável a invasões (que no AT geralmente eram esperadas do Norte). Em 1 Reis 15.20 [= 2Cr 16.4], é uma das cidades do Norte conquistadas pelos arameus, e o mesmo acontece em Jeremias 4.15; 8.16 — em Dã são ouvidos os primeiros sons da invasão. 2. No reino de Israel, apesar de a fronteira ao sul variar, a fronteira ao norte sempre foi delimitada por Dã. No relato do pecado terrível de Jeroboão, Dã e Betei são as cidades que representam os extremos. Jeroboão fez duas imagens de bezerros revestidas de ouro e colo cou-as em Dã e Betei. (lR s 12.29-30; 2Rs 10.29 e provavelmente Am 8.14, ainda que nessa passagem a descrição seja “os que agora juram pelo ídolo de Samaria, e dizem: Como é certo viver o teu deus, ó Dã! E: Como é certo viver o culto de Berseba! Esses mesmos cairão e não se levantarão jamais”. Ao que parece, Dã e Berseba também são consideradas os extremos da terra nesse caso.) 3. No livro de Juizes, o herói Sansão é da tribo de Dã (Jz 13.2) e vive “em Maané-Dã, entre Zorá e Estaol” (13.25). Estas duas últimas cidades foram entregues a Dã em Josué 19.4048, mas a Judá em Josué 15.33-36. A existência de dois NG — Maané-Dã e Dã — parece tomar necessária uma explica ção: Maané-Dã ficava em Judá e Dã no Norte de Israel. Qual delas é a região (tribo) de Dã? Josué 19.47 trata desse problema numa declaração parentética. A primeira parte desse ver sículo normalmente é traduzida de modo a encaixar-se no contexto da segunda parte, algo como “foi perdida para eles” (“Saiu, porém, pequeno o limite aos filhos de Dã”). As palavras no original são semelhantes àquelas usadas nas descrições das fronteiras em Josué 15.9, 11; 16.6; 18.15; 19.34, traduzidas como “vai mais este limite” ou “segue até”. Assim, é possível que esse versículo seja uma parte de uma descrição de fronteiras que é interrompida. O versí culo prossegue: “pelo que subiram os filhos de Dã, e pelejaram contra Lésem, e a tomaram, e a feriram a fio de espada; e tendo-a possuído, habitaram nela e lhe chamaram Dã, segundo o nome de Dã, seu pai”. Essa declaração, bem como outras em Josué, é retomada em Juizes 1.34-36, em que os amorreus (o termo alternativo, cf. Liverani, 125; em outros casos, o termo usado no cap. 1 é sempre cananeus) empurram os danitas para as regiões montanhosas. Depois disso, os amor reus (->) habitaram em Aijalom e Saalabim, (duas cidades danitas em Josué 19) mas pagaram tributos a José. A versão dos LXX de Josué também apresenta essa declaração. 4. A narrativa em Juizes 18 trata de um mundo diferente. Toda a narrativa de Juizes 18— 19 é uma miniatura da narrativa de conquista e assentamento na terra prometida (Whitelam, 11, citando Malamat). Cinco espias foram enviados para espreitar a terra (cf. Nm 13). Seu relatório é mais parecido com o de Josué e Calebe (Nm 14.7-9) do que com o dos outros espias israelitas na história de Números. A terra é boa e o povo é pacífico e isolado. Os danitas sobem a Laís, incendeiam-na depois de matar todos os seus habitantes e fundam sua própria cidade. 492
Damasco
Isso porque a tribo/clã "buscava para si herança em que habitar; porquanto, até aquele dia, entre as tribos de Israel, não lhe havia caído por sorte a herança”. Fica claro que não tinham território algum e haviam chegado até Zorá e Estaol quando enviaram os espias. Então, para explicar o nome do lugar, prosseguem até Maané-Dã (apenas um acampamento temporário, e não o lar de Sansão) e de lá, vão para Efraim. A essa altura, um segundo elemento da narrativa se entrepõe. O narrador deseja mostrar que aquela havia sido uma cidade de idólatras desde a fundação. Os espias haviam encontra do um levita numa parte não identificada de Efraim. Esse levita estava exercendo a função de sacerdote de Javé num santuário na casa de Mica. Os objetos cultuais continham uma ima gem folhada de prata, uma estola sacerdotal e um ídolo do lar (supostamente para consultar o Senhor; comparar Jz 18.5 com ISm 23.6, 9-12; 30.7-8). O partido mais forte de guerreiros danitas fez uma proposta irrecusável ao sacerdote levita, ameaçou Mica e depois rumou para o norte. Uma vez assentados na cidade de Dã, levantaram uma imagem de escultura (pesei # 7181) e colocaram Jônatas, filho de Gérson, filho de Moisés como sacerdote e fundador da linhagem sacerdotal que durou até a queda do Reino do Norte. Na narrativa, presume-se que ele seja o levita contratado (Moisés era da tribo de Levi) cujo nome não é revelado. Diz-se que a imagem permaneceu em Dã no mesmo tempo em que o tabemáculo (com a arca?) ficou em Silo. Isso dá espaço para que Jeroboão erija outra imagem (de ouro), mas não há registro do que foi feito do ídolo de prata. No entanto, o texto mostra que Dã era um santuário com ídolos já nos tempos do assentamento dos israelitas na terra, antes dos dias de Jeroboão. Para estudos do sítio arqueológico de Dã, contendo a inscrição importante que parece mencionar a “casa de Davi”, ver p. ex., Biran; Biran e Naveh; Cryer e Sasson. B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land o f the B ible2,1979; A. Biran, Biblical Dan, 1994; idem, “Dan”, NEAEHL, 1:323-32; A. Biran e J. Naveh, “An Aramaic Fragment from Tel Dan”, IE J 43, 1993, 81-96; F. H. Cryer, “O f Epistemology, Northwest-Semitic Epigraphy an Irony: The 'bytchvd House of David Inscription Revisited”, JSO T 69,1996,3-17; H. L. Ellison, “Tribes: Location o f ’, ZPEB, 815-20; M. Liverani, “The Amorites”, POTT, 100-133; G. F. Moort, Judges, ICC, 1898; J. M. Sasson, “The Old Aramaic Inscription from Tel Dan: Philological Literary and Historical Aspects”, JSS 40, 1995, 11-30; K.. W. Whitelam, “Dan (Person)”, ABD 2:10-12. Judith M. Hadley Dádiva
# 5989 (ntn, dar, apresentar, oferecer)
Dagom -> # 1837 (dãgân, Dagom)
Damasco
Damasco (pÚ>En [dammeseq], # 1966).
OMA A referência mais antiga ao país onde ficava Damasco encontra-se no grupo de Textos de execração egípcios de Posener. O nome usado para essa terra é ’Apum. Na lista de cidades que Tutmés III (c. 1504-1450 a. C.) conquistou, ele chama Damasco de ta-ms-qu; a denomi nação aparece também nas cartas de Amama, nos Textos Assírios Novos e na inscrição de BirRakib. Não se sabe ao certo o significado e a origem da palavra (Pitard, 7-11, 36). 493
Damasco
AT O nome Damasco é mencionado diversas vezes tanto no AT quanto no NT. Aparece como dammeseq (IRs 11.24), dúmmeseq (2Rs 16.10) e darmeseq (2Cr 16.2; 28.5) em heb. e aram.; em G é Damaskos (At 9.2). Damasco, uma das cidades mais antigas do mundo, entre as que ainda existem, era co nhecida como capital de Arã/Síria (-> ; Is 7.8). A cidade fica a leste do monte Hermom, na beira do deserto sírio e deve sua longa existência ao rio perene Barada (Abana), à fértil planície de Guta ao redor e às rotas de caravanas que passavam por ali rumo a países da Ásia Menor, Me sopotâmia, Palestina, Arábia e Egito (Noth, 92; Miller e Hayes, 43). Essa região onde Damasco se encontra é famosa por seus pomares e jardins, sendo irrigada pelos rios Farfar e Abana. Damasco é mencionada com relação a seus patriarcas e, ao que parece, era uma cidade bastante conhecida nesse período. Nas cercanias de Damasco, Abraão derrotou uma coalizão de reis que haviam raptado Ló (Gn 14.15). Depois de derrotar os arameus, Davi criou para eles uma província cuja sede governamental ficava em Damasco (Noth, 96; cf. 2Sm 8.5, 6 ). Durante o reinado de Salomão, Rezom conseguiu estabelecer um reino arameu poderoso tendo como centro a cidade de Damasco (1 Rs 11.23-25; cf. 15.18). Ao que parece, o rei de Damasco conseguiu finalmente unir os vários Estados arameus (cf. 2Sm 10.8) e formar um único reino arameu que controlava as regiões habitadas entre o Líbano e os contrafortes do Líbano, bem como a região leste desses contrafortes. No período que se seguiu, Damasco alcançou uma posição de tamanha influência na Síria-Palestina que, quando Ben-Hadade I subiu ao trono (c. 900 a. C.), Damasco foi capaz de interferir nas relações entre Israel e Judá (2Cr 16.2) (Pittard, 144). E bem provável que esse tenha sido o mesmo rei que conseguiu conquistar cidades is raelitas e estabelecer regiões de comércio em Samaria. E evidente que Damasco encontrou grandes oponentes na dinastia de Onri, o que pode ser visto quando Acabe conseguiu triunfar sobre o sucessor de Ben-Hadade (1 Rs 20.34). Apesar de Acabe ter conseguido derrotar Ben-Hadade em Afeca (20.29-30), para desalento do profeta do Senhor Acabe não matou o rei, mas fez um tratado com ele (20.35-42). O tratado visava a coalizão que se opôs aos assírios. De acordo com os anais de Salmaneser III, ele lutou contra essa coalizão em Qarqar em 853 a. C. Em decorrência da ameaça constante que os assírios representavam, os Estados aliados não podiam dar-se ao luxo de acabar uns com os outros. O grande contingente de carros, cavalaria e soldados, com os quais o rei de Damasco contribuiu na coalizão, mostra o poder que se encontrava acumulado nessa cidade. A instrução do Senhor a Elias para que ungisse Hazael como rei da Síria provavelmente foi seguida por Eliseu (IRs 19.15; cf. 2Rs 8.7-15). Enquanto isso, a coalizão contra os assí rios se dissolveu e em 841 a. C. Hazael teve de enfrentar sozinho os novos ataques da Assíria. Apesar de Damasco ter sido cercada, Hazael conseguiu defender a cidade. Salmaneser não a capturou, mas incendiou os pomares e campos cultivados ao redor dela. Mais para o final do século IX a. C., as novas incursões assírias sob o comando de Adade-Nirari III enfraqueceram Damasco a tal ponto que Joás conseguiu retomar as cidades que haviam sido perdidas anteriormente para os arameus (2Rs 10.32; cf. 13.25). Depois da morte de Hazael, Jeroboão II acabou triunfando sobre Arã (14.25-28). Sob o governo de Rezim, Arão readquiriu parte do poder que havia possuído em outros tempos. Rezim e Peca de Israel procuraram envolver Acaz (->) numa coalizão anti-Assíria, mas não tiveram sucesso. Quando Acaz insistiu em manter uma política independente, o cerco siro-israelita de Jerusalém (->) que se seguiu tinha por finalidade levar Judá a aliar-se a eles (Bright, 273) ao depor o rei Acaz que se recusava a cooperar e colocar em seu lugar o filho de Tabeal (Is 7.6). Diante da invasão iminente de Judá, Isaías exortou Acaz a confiar nas promessas de Javé a Davi (7.4-9). Incapaz de exercer a fé que lhe foi requerida, Acaz conseguiu pedir ajuda dos assírios e, em 732 a. C., 494
Daniel: Teologia de
Tiglate-Pileser III da Assíria reagiu atacando Damasco, matando Rezim e deportando os habi tantes para Quir (2Rs 16.9), dando fim, desse modo, à história gloriosa da cidade exatamente onde essa história havia começado (Am 1.5; 9.7). O julgamento profético sobre Damasco (Is 17.1,3; Jr 49.23-27) cumpriu-se em 732 a. C., quando a cidade foi capturada e incorporada ao império assírio como província. Durante quase dois séculos, do reinado de Salomão à rendição da cidade em 732 a. C., Da masco foi uma cidade de grande influência na Síria-Palestina e uma inimiga perigosa de Israel. B i b l k k ;r a r a
S. Ahituv e B. A. Levine (eds.), The Early Biblical Period, 1986, 151-72; J. Bright, A History o f Israel, 1980; C. G. Davis, “The Aramaean Influence Upon Ancient Israel to 732 B.C.”, dis sertação de Ph. D. inédita, Ann Arbor, 1979; H. Donner, “The Separate o f Israel and Judah”, in IJH, 1977; A. Dupont-Sommer, “Sur les débuts de 1'histoire araméenne”, SVT 1, 1953,40-49; A. Jepsen, “Israel and Damascus”, AfO 14, 1942, 154-58; E. G. H. Kraeling, Aram and Israel, 1918; A. Malamat, “The Aramaeans”, in D. J. Wiseman, POTT, 1973, 134-55; A. Mazar, Archeology o f the Land o f the Bible 10,000-586 B.C.E. 1990; B. Mazar, “The Aramean Empire and Its Relations With Israel”, in The Early Biblical Period, S. Ahituv and B. A. Levine (eds.), 1986, 151-72; J. M. Miller & J. H. Hayes, HAIJ, 1986; S. Moscati, The Face o f the Ancient Orient, 1962; M. Noth, The Old Testament World, 1966; W. T. Pitard, Ancient Damascus, 1987; J. A. Soggin, An introduction to the History ofIsrael and Judah, 1993; M. F. Unger, Israel and the Aramaeans o f Damascus, 1975. D. N. Pienaar
Daniel: Teologia de A. Contexto histórico A data mais antiga citada no texto é o terceiro ano de Jeoaquim, rei de Judá (Dn 1.1.), 605 a. C., quando Nabucodonosor (->) levou suas expedições militares pela primeira vez até a Síria-Palestina (cf. 2Rs 24.1). A última data é o terceiro ano de Ciro (Dn 10.1), 537 a. C., cujo império persa substituiu o da Babilônia. Essas datas servem de moldura para o livro, mas o escritor não faz referência alguma à destruição de Jerusalém em 587 nem à volta dos exilados para Judá em 538 (Esdras 1). Seu livro trata do plano mais amplo de Deus com relação a sobe ranos e reinos. O escritor cita o império grego (Dn 8.21) e antevê o fim dessa potência (8.25). O quarto império de Daniel 2.40 e 7.7, com o qual a história chega ao seu auge pela interven ção de Deus, estende-se além do império grego e provavelmente até o romano. Para a Síria e o Egito, esse tempo iniciou-se em 168 a. C., quando o cônsul romano declarou sua autoridade sobre o Egito e expulsou o rei sírio. Porém, a visão refere-se ao fiituro distante (8.26) e é bem possível que essa referência estenda-se além dos impérios históricos da Grécia e de Roma. Os estudiosos divergem entre si no tocante à perspectiva histórica do escritor. Alguns consideram mais provável uma data entre os séculos VI e V, logo depois do tempo de Daniel, e acreditam que os sonhos e visões são predições de acontecimentos que, naquele período, ainda eram futuros (Baldwin, Young). Outros preferem uma data no século II, de modo que se deva considerar que os “prenúncios” foram escritos depois dos acontecimentos, como as supostas “profecias” de alguns tipos de literatura do OMA, conhecidas em termos técnicos como vaticina ex eventu (Davies, 56-80; Porteous, 17-18). O fato de o ponto de vista do autor não poder ser determinado com certeza não afeta profundamente a interpretação. 495
Daniel: Teologia de
B. Estrutura literária O livro de Daniel apresenta mais de um arranjo literário. O mais simples e óbvio é a divisão da obra em histórias (caps. 1— 6 ) e visões (caps. 7— 12). Há dois aspectos que unem essas partes. O primeiro é uma semelhança entre os caps. 2 e 7, sendo que cada um, a seu pró prio modo,aponta para a instituição do reino de Deus. O segundo é distribuição das línguas originais: háuma seção em aram. (2.4b— 7.28) que liga as duas metades do livro, enquanto o começo (1.1—2.4a) e os últimos cinco caps. estão escritos em hebraico. A seção em aram. apresenta um padrão literário concêntrico, formado em tomo dos caps. 4 e 5, em que a autoridade do Altíssimo é desafiada e o desafio é respondido. Esse padrão pode ser demonstrado mais adequadamente na forma diagramática: A. Os quatro impérios c o reino vindouro de Deus (cap. 2) B. A provação por fogo e o livramento concedido por Deus (cap. 3) C. Um rei advertido, disciplinado e livrado (cap. 4) C \ Um rei advertido, hostil e deposto (cap. 5) B’. A provação na cova dos leões e o livramento concedido por Deus (cap. 6 ) A’. Os quatro impérios e o reino eterno de Deus (cap. 7) A presença de um padrão quiasmático nos caps. 2— 7 fortalece as ligações existentes entre as duas metades do livro e facilita a identificação de onde se encontra a ênfase do livro. Há moti vos válidos para crer-se que o cap. 7 é a chave de todo o livro, constituindo seu ponto focal. As outras visões tratam de ataques políticos e militares à terra de Deus e ao santuário em Jerusalém, e da vindicação final de todos os fiéis que sofrem na luta. Alguns estudiosos procuraram estruturar o livro todo num padrão quiasmático em tomo dos caps. 5 e 6 , mas a correspondência de temas entre os caps. de um lado e de outro é menos convincente (cf. Gol dingay, 325). Na falta de uma análise que defina as seções a partir de temas distintos, a divisão de capítulos proporciona uma base para a investigação da teologia das seis histórias e quatro vi sões (os caps. 10— 12 constituem a quarta visão). Daniel 1.1-21. Desde o momento em que o rei babilônio passou a controlar o rei Jeoaquim e levou judeus cativos para a Babilônia (-> Exílio), essa tragédia é considerada obra do Senhor Soberano (Dn 1.2, ’adõnãv). O fato de Daniel ter vivido para ver o fim do império ba bilônio (1.21) confirmou a soberania do Deus ao qual ele servia, pois a Babilônia representava o orgulho e as realizações humanas (2.36-38). A mão de Deus sobre os acontecimentos deu sentido e esperança para aqueles que estavam sofrendo como estrangeiros. Eles decidiram ser fiéis a Deus e o Senhor demonstrou fidelidade a eles ao providenciar-lhes um amigo na corte, dar-lhes uma saúde extraordinária apesar da dieta restrita que tinham e um domínio impressio nante da sabedoria oriental. A santidade e o sucesso não são incompatíveis. Daniel 2.1-49. Deus revelou seus segredos ao rei da Babilônia, mas Daniel foi o intér prete. O texto volta-se então para a história mundial. Nabucodonosor é o governante mundial de sua época por decreto divino (Dn 2.37-38). É a cabeça de ouro da estátua, enquanto seus sucessores são inferiores a ele. Quando uma pedra atinge os pés de barro, a estrutura toda se estilhaça e a rocha que representa o reino de Deus enche a terra. O rei humano prostra-se dian te de Deus que, por ter controle absoluto sobre a história, dá sentido a cada era da história e a revela a Daniel (2.44). Daniel 3.1-30. A cerimônia para reunir os cortesãos de todas as nações diante da ima gem de ouro do rei deu ocasião para acusações contra três judeus que se recusaram a adorar a 496
Daniel: Teologia de
imagem. Furioso por suas ordens terem sido desprezadas, o rei cumpre a ameaça de condenálos às chamas. Essa provação extremamente severa é uma oportunidade para se experimentar o poder salvador de Deus: uma quarta figura os acompanha dentro da fornalha e os livra da morte. A lealdade a Deus deve ter precedência sobre a segurança pessoal, quer o livramento seja concedido ou não(vv. 17-18). Fica implícita a possibilidade de vida e vindicação depois da morte. Foi concedido a esses confessos o direito de adorar seu Deus na Babilônia sem nenhum impedimento. Deus demonstrou seu poder de vindicar aqueles que fossem fiéis. Daniel 4.1-37. O sonho de Nabucodonosor foi um presságio, advertindo-o de que sua prosperidade seria efêmera a menos que ele reconhecesse a soberania do Deus altíssimo e desse prioridade à retidão e justiça para os oprimidos (vv. 25-27). No entanto, nada mudou até que o rei foi acometido de uma enfermidade grave que o levou a ser banido da sociedade e a viver como um animal. Sua experiência de cura e restauração ao trono foi atribuída à operação de Deus, conforme o rei dá testemunho no final de sua narrativa (v. 22). O fato de Nabucodonosor ser restaurado mostra que a monarquia tem seu devido lugar nas questões humanas, desde que esteja sujeita à autoridade do Rei dos reis, que reina para sempre com justiça. Daniel 5.1-31. Ao contrário de Nabucodonosor, Belsazar não voltou nenhum de seus pensamentos para Deus. Sua rebeldia contra Deus e sua arrogância impetuosa apresentaram um contraste com a submissão de Nabucodonosor, e a morte não tardou para Belsazar, vinda pelas mãos dos invasores persas que exterminaram o império da Babilônia (-> Ciro). Assim, mais cedo ou mais tarde, governantes e nações colhem aquilo que semeiam e a história mostra os sinais da retribuição divina em ação, mesmo por meio de movimentos revolucionários como golpes de Estado. (-> Retribuição) Daniel 6 .1 -28.0 sábio e piedoso Daniel toma-se alvo de uma oposição organizada. Uma vez que não há meio de salvá-lo da morte, ele é atirado aos leões. A impotência do rei Dario contrasta com a supremacia do Deus vivo, que livra Daniel da boca dos leões. A retribuição (->) recai sobre os acusadores de Daniel, mostrando que, no final, é impossível o êxito dos poderes que se opõem ao domínio de Deus. Pela manhã, o homem que deveria ter morrido é encontra do vivo, pronto para voltar ao seu cargo no governo, sendo, desse modo, vitorioso sobre seus inimigos. Os temas do Salmo 2 encontram paralelos na experiência de Daniel, uma vez que, posteriormente, foram recapitulados na vida de Jesus (At 4.25-26) (Goldingay, Daniel, 136). Daniel 7.1 -28. Assim como no cap. 2, essa visão abrange um intervalo entre o tempo de Daniel e a intervenção do Altíssimo para instituir o seu reino. Apesar de haver quatro bestas na visão, as forças que se opõem a Deus são mais destrutivas na quarta besta, cuja autoridade chega ao fim de modo repentino com sua morte e julgamento. Os céus se abrem e o “Ancião de Dias” entrega o domínio de todo o mundo àquele que é “como o Filho do Homem” (v. 13). Uma vez que a oposição foi derrotada, a soberania e o poder são concedidos ao “povo dos santos do Altíssimo” (v. 27). Apesar da interpretação, muita coisa no texto continua sendo um mistério e, assim como Daniel, nos vemos perplexos. No entanto, podemos afirmar que Jesus se identificou com o papel daquele que havia de vir — humano, porém exercendo autoridade divina como governante e juiz. Daniel 8.1-27. Duas potências mundiais dominantes, identificadas como a Média-Pérsia e a Grécia, chegarão, cada uma à sua vez, a um fim predeterminado. Um governante grego atacará o povo de Deus e, desse modo, se levantará contra o próprio Deus (v. 25). A queda de tais pessoas é certa. Essa é a última representação simbólica do futuro. Daniel 9.1-27. Daniel entra na presença do Deus da aliança de Israel, confessando o pecado que causou a tragédia em Jerusalém e invocando as promessas de Deus. O livramento de seu povo será vindicação para o caráter de Deus. A resposta de Gabriel (-> Anjo) emprega 497
Daniel: Teologia de
números simbólicos baseados em “setenta” (Jr 25.11; 29.10) para confirmar que Jerusalém será reconstruída mas não escapará de futuras devastações. Os propósitos de Deus são decla rados no v. 24, e os estádios de seu cumprimento nos vv. 25-27. Os escritores do NT estavam convencidos de que o ministério de Jesus deu início à vinda do reino de Deus (Mc 1.15) e de que a sua morte lançou fora o pecado (Hb 9.24-28). Apesar de o fim do perseguidor ser certo, Daniel não viveu para ver o fim das “setenta semanas”. Ainda era preciso que a história se guisse seu curso. Dn 10.1-12— 12.13. A revelação final foi trazida pela figura radiante de um homem com poder para fortalecer Daniel e possibilitar que ele recebesse a longa e detalhada narrativa do Livro da Verdade. A história é apresentada na forma de uma sucessão de reinos. Os reis dis putam o poder e exercem a autoridade, e, então, seus reinos são desfeitos e caem. O desenrolar dos acontecimentos não é revelado, mas um dos governantes que se exalta acima de todos, e diz coisas que sequer podem ser mencionadas contra o Deus dos deuses (11.36), recebe atenção detalhada (11.21 -45). Sua arma é a perseguição religiosa e ele consegue dividir o povo de Deus profanando o templo e causando a morte de crentes. As referências, que se aplicam a Antíoco IV (175-164 a. C.; -> Período Intertestamentário: Teologia), também se estendem além dele a outros perseguidores do povo de Deus. Apesar do sucesso político e militar, todos têm o mes mo fim. A aflição sem precedentes sofrida pelos crentes é seguida de uma promessa, também sem precedentes, de ressurreição (Dn 12.2-3). A morte não é o fim. O significado da história encontra-se além da história, guardado em segurança dentro do propósito insondável de Deus. Enquanto isso, apesar do sofrimento e perseguição, os fiéis devem permanecer firmes. Assim como Daniel, ressurgirão para receber a herança que lhes é devida. C. Temas teológicos Esses temas surgem de determinados problemas decorrentes do exílio, do conseqüente envolvimento com potências mundiais e seu totalitarismo e da demora para a obtenção da liber dade política depois da volta a Jerusalém. Durante o período em que a Judéia foi subjugada por uma série de impérios, a oposição ao domínio deles só fez aumentar a perseguição sem trazer nenhuma libertação. Surgiu então a pergunta: Em meio a tudo isso, onde estava Deus? 1. O Deus dos deuses governa sobre a humanidade. Além de ser o Senhor soberano ( ’adõnãy) que determina o resultado do cerco de Nabucodonosor a Jerusalém (Dn 1.2), o Deus de Israel é aquele que realizará a restauração do templo segundo sua grande misericórdia e por amor do seu nome (9.17-19). Governantes pagãos referiram-se ao Senhor como “Deus dos deuses”, “Senhor [mãrê'] dos reis”, “revelador de mistérios” (2.47); “Altíssimo” (4.2) ou fa laram do Deus de Daniel e seus compatriotas (3.28-30; 6.26-27). Daniel orou ao Deus do céu (2.19; cf. vv. 28, 37, 44) e declarou os atributos de Deus (2.20-23), como também o fizeram reis de outras nações cujas orações foram respondidas por Deus (4.3, 34-35; 6.26-27). Deus revelou seu futuro intento ao rei babilônio (2.45b), bem como a Daniel, por meio de visões, demonstrando desse modo sua preocupação para com toda a humanidade, seu controle sobre a história humana como um todo e seu propósito de instituir o reino eterno do Deus do céu (2.44; 7.27). Ao orar, Daniel usa o nome divino Javé (“o Senhor” em várias VSS.; -> Javé: Teologia), que é associado à relação de aliança do Senhor com Israel (Êx 3.14; 6.3). Javé res pondia a seu povo (9.4, 8 , 10, 13, 14, 19), o EU SOU revelava a si mesmo e sua mensagem àqueles que rogavam a ele. 2. O sofrimento deve ser esperado pelos crentes. Os movimentos políticos causaram so frimento (Dn 1.2) e a lealdade a Deus gerou perseguição num ambiente hostil (3.8-23; 6.3-12). A oposição organizada à causa do Senhor viria de inimigos bem preparados que dariam a im 498
Daniel: Teologia de
pressão de haver triunfado (7.21 -25; 8.23-25; 9.26; 11.36-45). O povo de Deus sofrerá derrotas políticas e morte (12.7b), mas no final, será vindicado (12.12). Seu sofrimento não é sem sentido (12.10). Os crentes devem permanecer firmes na sabedoria que lhes foi dada e transmiti-la a outros. A morte não é o fim (12.1), pois haverá uma ressurreição e um julgamento (12.2-3). 3. Há mais coisas na história do que os olhos dos homens podem ver. A revelação de que as nações têm seus correspondentes no céu (Dn 10.13) que podem retardar, mas não frustar os planos de Deus, reforça a mensagem de Daniel de que a história não é uma série de aconte cimentos aleatórios. Deus é soberano sobre a história do mundo e das nações; quer reconheçam elas o Senhor ou não, são parte do plano de Deus para estabelecer seu reino no mundo. Há uma guerra espiritual ocorrendo tanto no céu quanto na terra (Ef 6.12). 4. O objetivo da história é o reino de Deus. Enquanto a queda de Jerusalém foi o fim das esperanças de Israel (Lm 1.20), Deus usou o cenário político mundial para mostrar a ex tensão de sua soberania. Nas histórias de Daniel 1— 6 , os governantes do mundo seguiram seus próprios programas políticos e, no entanto, Deus claramente vindicou seus servos. O Senhor alcançou seus propósitos tanto quando os governantes agiram com responsabilidade (Dn 4.3435) como quando reagiram com insensatez (5.22-24). Nas visões, a história é brutal, repleta de batalhas e destrutiva; o povo de Deus é oprimido e seu santuário é profanado. Quando tudo parece estar perdido, Deus intervém e estabelece seu reino para sempre (7.27). Números mis teriosos não revelam quanto tempo levará para que isso aconteça. Daniel não viveria para ver esse fato, mas o povo de Deus como um todo seria testemunha da instituição de seu reino num ato final de ressurreição e julgamento. D. Contexto canônico Na BH, Daniel encontra-se entre os Escritos; a LXX coloca esse livro entre os Profetas, depois de Ezequiel — a mesma ordem seguida por nossas versões. Apesar de estar entre os profetas, Daniel vai mais longe do que qualquer um deles na revelação dos propósitos futuros de Deus para o mundo. E, portanto, classificado como “apocalíptico” (ver Collins, Apocalyptic Vision; -> Literatura Apocalíptica), mostrando aquilo que Deus determinou para a histó ria e a intervenção sobrenatural como fundamentos para a esperança (Dn 7.9-14). Dentro do AT como um todo, Daniel é, em vários sentidos, o ápice. No princípio, a rebelião do homem contra Deus resultou na morte e na expulsão do jardim, onde ficava a árvore da vida (Gênesis 3). Daniel começa com a expulsão da terra causada por uma nação poderosa que adora outros deuses. A ameaça de potências militares e culturais sobrepujantes é contínua e chega ao auge na quarta besta (Dn 7.7-11, 25) que se coloca contra Deus. A rebelião humana se completa. A esperança deve girar em tomo da intervenção divina, pois para os crentes, não há o que fazer. O mais importante é “dar fim aos pecados” e “trazer a justiça etema” (9.24). É previsto um período de perseguição contínua até mesmo para o Ungido de Deus (9.26), mas a revelação dos céus abertos e as boas-vindas daquele que é como o Filho do Homem (7.9-14) retratam a eficácia do poder salvador de Deus. Seu reino é celestial, indestrutível e eterno. Aqueles que o contemplarem serão completamente purificados (12.10). Devem também permanecer firmes e esperar pelo tempo de Deus (12.11-13). Os Evangelhos são permeados por temas das visões, especialmente de Daniel 7 (France, 259-63). Jesus viu sua própria missão na figura do Filho do Homem em Daniel 7.13, e citou Daniel pelo nome (Mt 24.15) quando falou da profanação e destruição do templo de Herodes nos termos de Daniel 11.31. Esse acontecimento, juntamente com a vindicação e exaltação de Jesus (Mt 24.30), demonstrou sua autoridade universal e etema. Apocalipse 1.14 emprega a teofania de Daniel 7.9-10 para descrever Jesus exaltado que, desse modo, é identificado com 499
Daniel: Teologia de
Deus, enquanto “aquele como o Filho do Homem” é o juiz no juízo final (Ap 14.14; cf. Dn 7.13, 22). Na exaltação de Jesus, a história alcança seu objetivo e o livro de Daniel, seu cum primento. O cânon das Escrituras estava completo. A mensagem de julgamento transmitida pelos profetas que antecederam o exílio cum priu-se na queda de Jerusalém; os pecados de toda Israel fizeram recair sobre o povo o julga mento de Deus (Dn 9.7-14). A idéia de continuidade encontra-se na expectativa de que Deus, em sua misericórdia, perdoará o pecado de seu povo e restaurará o santuário em Jerusalém (Dn 9.15-19; cf. Ed 1.1-4; 6.17-18). Ao longo do livro, Deus concede vindicação a indivíduos que confiam nele, livrando-os da morte e revelando a eles a verdade de Deus. A idéia de interrupção encontra-se no fato de que o futuro não gira mais em tomo de Je rusalém e sua restauração sob um rei da linhagem de Davi. Em vez disso, a “terra gloriosa” será ameaçada (Dn 11.41) e a cidade e o santuário serão destruídos novamente (9.26). O propósito de Deus para o mundo contém o sofrimento num contexto mundial. Seu reino compreende todos os poderes dos céus e da terra (4.35) e, no entanto, o domínio eterno é entregue a uma figura humana, a qual todas as nações devem adorar (7.13-14). O socorro para o povo de Deus em meio a essa grandiosa luta com seus vários aspectos assustadores, virá da liderança do homem celestial de Deus (7.14, 27), cujo reino transcende a morte. Fica inferido que um longo tempo se passará até que a luta chegue ao fim e que se possa ver o triunfo do reino de Deus. B ib l io g r a f ia
Comentários: R. A. Anderson, Signs and Wonciers, ITC, 1984; J. G. Baldwin, 1978, TOTC, 636 8 ; J. J. Collins, Daniel, With an Introduction to the Apocalyptic Literature, 1984; P. R. Davies, Daniel, OTG, 1985, 81-120; M. Delcor, La livre de Daniel, Sources Bibliques, 1971, 36-50; F. Dexinger, Das Buch Daniel und seine Probleme, SBS, 1969, 39-76; J. E. Goldingay, Daniel, WBC, 1978; R. Gumey, God in Control, 1980, 157-96; L. F. Hartman & A. A. Di Lella, The Book o f Daniel, AB, 1978; E. W. Heaton, The Book o f Daniel: Introduction and Commentary, Torch, 1956; A. Jeffery, “Daniel”, IB, 1956; A. Lacocque, The Book o f Daniel, CAT, 1976 (ET 1979), 251 -52; W. Luthi, The Church to Come, 1939; S. Olyott, Dare to StandAlone, 1982; N. W. Porteous, OTL, 1965,18-21; D. S. Russell, Daniel. An Active Volcano, 1989; H. Veldkamp, Dreams and Dictators, ET 1978; R. S. Wallace, The Lord Is King: The Message o f Daniel, 1979; E. J. Young, The Prophecy o f Daniel, 1949. Monografias e artigos: J. G. Baldwin, “Some Literary AfTinities ofthe Book of Daniel”, TynBul 30, 1979, 77-99; R. J. Bauckham, “The Rise of Apocalyptic”, Themelios 3:2, 1977-78, 10-23; idem, “Theology after Hiroshima”, SJT 38, 1985, 503-601; G. K. Beule, The Use o f Daniel in Jewish Apocalyptic Literature and in the Revelation ofSt. John, 1984; B. S. Childs, Introduction to the OT as Scripture, 1979, 608-23; idem, OT Theology in a Canonical Context, 1985, 36-37,222-47; J. J. Collins, “The Court Tales in Daniel and the Development o f Apocalyptic”, JBL 94, 1975, 218-34; idem, The Apocalyptic Vision o f the Book o f Daniel, 1977, 191-218; P. R. Davies, “Eschatology in the Book of Daniel”, JSO T 17, 1980, 33-53; W. Eichrodt, TOT 1960, 1:467-501; R. T. France, Jesus and the Old Testament, 1971; R. A. Hall, “Post-Exilic Theological Streams and the Book o f Daniel”, diss. Yale, 1974; D. W. Gooding, “The Literary Structure o f the Book of Daniel and Its Implications”, TynBul 32, 1981, 43-79; W. L. Humphreys, “A Life-Style for Diaspora: A Study o f the Tales o f Esther and Daniel”, JBL 92, 1973, 211-23; W. H. Joubert, “Power and Responsibility in the Book o f Daniel”, diss. Univ. of S. Africa, 1980; Ad. Lenglet, “La structure litteraire de Daniel 2-7”, Bib 53, 1972, 169-70; A. R. Millard, “Daniel 1-6 and History”, EvQ 49:69-73; M. Noth, “The Understanding o f History in OT Apocalyptic” and “The Holy Ones o f the Most High”, in The Laws in the Pentateuch and 500
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Davi (TH [dãwid], # 1858).
Davi, o filho mais moço de Jessé, da cidade de Belém, tomou-se o segundo rei de Is rael e foi o fundador de um império fugaz e de uma dinastia muito mais duradoura que reinou em Judá até o exílio na Babilônia. Seu governo foi lembrado como um período especialmente próspero para o reino unido de Israel e estimado como um ideal a ser alcançado novamente quando a monarquia davídica chegasse à plenitude potencial As principais fontes do AT para a apresentação de Davi e do ideal monárquico de sua dinastia são os livros de 1—2 Samuel (->), 1 Crônicas (->) e o livro de Salmos (->) bem como certas passagens dos Profetas. Também há referências a Davi como fundador dinástico e exemplo de governo monárquico em Judá espa lhadas pelos livros de 1—2 Reis. 1. Davi e Samuel. O relato sobre Davi em 1—2 Samuel costuma ser dividido em dois principais segmentos narrativos, a “História da Ascensão de Davi” (ISm 16— 2Sm 5 [7]) e a “Narrativa da sucessão” ou “História da corte de Davi” (2Sm 7 [9]—20; [ 1Rs 1—2]), que pode ou não representar fontes literárias separadas que tratam respectivamente do início da carreira de Davi e de seu reinado em Jerusalém. A primeira narrativa exerce a função de uma espécie de Bildungsroman [romance de formação] que nos conta como o jovem herói ergue-se de suas origens humildes para tomar-se um guerreiro de renome, membro da corte de Saul e, posterior mente, vítima da inveja exacerbada desse rei. Enquanto Saul impressionava por sua aparência física (ISm 9.2; 10.23-24), Davi foi escolhido por meio de uma avaliação mais profunda (16.7). E, enquanto a eleição de Saul foi uma resposta à exigência do povo expressada pelos anciãos de suas tribos (8.4-5), Davi é descrito como um homem segundo o coração do Senhor (“um homem que lhe agrada”; ISm 13.14), sendo que “coração” significa “vontade” ou “escolha” (ver McCarter [1980], Gordon [1986]). A narrativa de Davi e Golias em 1 Samuel 17, normal mente considerada uma história de bravura, apresenta o jovem Davi como um exemplo de fé em Deus: “Tu vens contra mim com espada, e com lança, e com escudo; eu, porém, vou contra ti em nome do Senhor dos Exércitos, o Deus dos exércitos de Israel, a quem tens afrontado” (v. 45). A derrota conseguinte de Golias no vale de Elá levou Davi a um relacionamento ínti mo com Saul e sua família por meio da amizade de Jônatas (1 Sm 18.1 -4), com quem Davi fez uma aliança de lealdade (20.16-17), e também ao tomar-se genro de Saul (18.20-27). A reação inicial de Jônatas, depois da vitória de Davi sobre Golias, foi presentear Davi com os símbolos de sua posição de príncipe (18.4) num ato que pode muito bem ser considerado praticamente 501
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uma “abdicação” em favor de Davi (cf. Jobling). O compromisso tanto de Jônatas como de Mical com a causa de Davi (cf. 1Sm 19.11-17) contribuiu de modo significativo para a função apologética da chamada “História da Ascensão de Davi” pois, a partir da própria família de Saul, mostra como a desconfiança do rei em seu rival era infundada. Mas, enquanto Saul não demonstra escrúpulo algum em suas tentativas de matar Davi (ISm 18.10-11, 17, 20-21, 25), a narrativa ressalta como Davi não desejava fazer mal a Saul, visto que este era o “ungido do Senhor” (p. ex., 1Sm 24.6; 26.9). E evidente que certos desafetos na monarquia de Davi consideravam o rei um usurpa dor que havia alcançado a sua posição à custa da vida de alguns que se encontraram entre ele e o trono. Essa idéia vem à tona nas palavras de insulto do benjaminita Simei, quando o rei foi forçado a deixar a capital no início da rebelião de Absalão. Simei afirmou que os infortúnios de Davi nas mãos de Absalão eram o castigo de Deus por Davi ter assassinado membros da família de Saul, “cujo reino usurpaste” (2Sm 16.7-8). Assim, um dos principais objetivos da “História da Ascensão de Davi” é defender Davi de acusações como essas. Em vários momentos, vê-se Davi evitando quase que ostensivamente até a aparência de inimizade para com Saul e sua casa, talvez de modo mais conspícuo quando, por duas vezes, ele poupa a vida do rei quando teve oportunidade de matá-lo (ISm 24; 26). Uma certa teologização explícita desse tema é apre sentada no discurso de Abigaíl em 1 Samuel 25: “ E há de ser que, usando o Senhor contigo segundo todo o bem que tem dito a teu respeito e te houver estabelecido príncipe sobre Israel, então, meu senhor, não le será por tropeço, nem por pesar ao coração o sangue que, sem causa, vieres a derramar e o te haveres vingado com as tuas próprias mãos” (vv. 30-31). As circunstâncias em que Davi se encontrava, de não estar nem a serviço dos filisteus, nem à disposição de seu próprio povo no dia da derrota e da morte de Saul no monte de Gilboa, são descritas em detalhes em 1 Samuel 29— 31. A reação de Davi à notícia da morte de Saul (2Sm 1.15-16), bem como ao assassinato de Abner e Isbosete (2Sm 3.28-39; 4.9-12), também serve para o mesmo argumento: para chegar ao trono de Israel, Davi não derramou sangue da família de Saul nem esteve envolvido nisso quando outros o fizeram. Talvez seja mais uma opinião acadêmica moderna a de que o tema do “ungido do Senhor” nesses capítulos trans mita uma mensagem sobre como o povo deve ver o reinado de Davi: Se ele agiu de modo tão honrado para com Saul que foi rejeitado, Davi (e mesmo seus sucessores) como “ungido do Senhor” era ainda muito mais merecedor de respeito, para não dizer de um caráter sacrossanto! Por outro lado, uma vez que os capítulos correspondentes à “História da Ascensão de Davi” tratam do “messianismo real”, pelo qual a condição de ungido do rei é um indício da posição especial de Davi em relação a Deus e à nação, a dignifícação de Saul pelo título de “ungido do Senhor” é um detalhe a ser considerado em qualquer reflexão que se faça sobre o messia nismo davídico no AT. O relato do tempo em que Davi ocupou o trono em Jerusalém começa em 2 Samuel com a captura de Jerusalém das mãos de seus habitantes jebuseus. A transferência da arca da aliança para lá foi o primeiro passo para que a cidade se tomasse o centro religioso e a capital política de Israel (cap. 6 ). Numa digressão da narrativa que descreve esse acontecimento, a pos sibilidade de Israel ser governada pelos descendentes de uma união das casas de Davi e Saul é excluída depois de um desentendimento entre Davi e Mical sobre a comemoração efusiva do rei quando a arca chegou à capital (2Sm 6.20-23). O relato da altercação doméstica é seguido do comentário de que Mical, filha de Saul, “não teve filhos, até ao dia da sua morte” (v. 23). As expedições militares de Davi como rei são resumidas rapidamente em 2 Samuel 8 , sendo suas vitórias atribuídas diretamente à operação de Deus em seu favor (vv. 6 , 14). Depois do relato de como Davi cumpriu seu juramento a Jônatas (cf. 1Sm 20.14-17), ao conceder fa 502
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vores especiais ao filho dele, Mefibosete (2 Samuel 9), há um relato mais longo dos conflitos militares com os amonitas e seus aliados, os arameus, mas essa apresentação mais extensa se deve, em parte, ao fato de as guerras com os amonitas servirem de contexto para o adultério de Davi com Bate-Seba, a ordem para matar Urias, marido de Bate-Seba, e uma série de tra gédias domésticas nos caps. 13— 19, nos quais é executado o julgamento anunciado por Natã (“Agora, pois, não se apartará a espada jamais da tua casa, porquanto me desprezaste e tomaste a mulher de Urias, o heteu, para ser tua mulher”, 2Sm 12.10). O acontecimento mais sério, por representar o maior perigo para Davi e seu reino, a rebelião de seu filho Absalão, que se aproveitou de certas fraquezas administrativas do pai e tão bem logrou persuadir os indivíduos descontentes do reino que acabou obrigando Davi a fugir de Jerusalém e retirar-se para a Transjordânia. O Davi desses capítulos é um personagem lastimável e contrito (cf. 2Sm 16.11-12), levando sobre si o peso do castigo e, em certo senti do, mais parecido com o fugitivo descrito na segunda metade de 1 Samuel. Quando Davi volta para sua capital, depois do colapso da rebelião, é magnânimo para com aqueles que haviam abusado dele de maneira oportunista ou cuja lealdade havia se mostrado questionável (2Sm 19.15-30) — um contraste vivido com o conselho vingativo que dá a Salomão em seu leito de morte em 1 Reis 2.1-12, no chamado “Testamento de Davi”, e que parece ser contestado no discurso divino em 1 Reis 3.11, no relato do sonho de Salomão em Gibeão. Outras modificações no retrato de Davi como um homem de poder e conquistas milita res são apresentadas no “Apêndice a Samuel” em 2 Samuel 21—24. Duas narrativas referentes à fome e à praga nos caps. 21 e 24, respectivamente, mostram Davi sendo obrigado a tomar algumas atitudes para o bem do reino, ainda que no primeiro caso a culpa estivesse ligada ao nome de Saul, por este haver matado injustamente os gibeonitas quando era rei (2Sm 21.1,5). A atenção também se volta para a vulnerabilidade de Davi e sua dependência do auxílio divino, inclusive em combate, quando a narrativa nos mostra a vida de Davi em perigo e sendo salva apenas pela intervenção de um de seus homens (“Porém Abisai, filho de Zeruia, socorreu-o [Davi]”, 2Sm 21.17); da mesma forma, o salmista, no cap. 22 (= Salmo 18), mostra-nos que as vitórias de Davi contra os inimigos são atribuídas aos atos de livramento de Deus em favor de Davi. (-> Samuel: Teologia) 2. A aliança davidica. Dentro das tradições davídicas de 1—2 Samuel, a passagem de 2 Samuel 7 ocupa um lugar especial, pois é nesse capítulo que Deus anuncia por intermédio do profeta Natã que o filho e sucessor de Davi construirá um templo para o Senhor e, mais impor tante ainda. Deus diz: “estabelecerei para sempre o trono do seu reino [de Salomão]” (v. 13). Apesar de a palavra aliança (heb. t^rít, # 1382), em si, não aparecer nesse capítulo, ainda assim o conteúdo mostra que essa promessa é a mesma coisa que a “aliança etema” menciona da nas “últimas palavras” de Davi em 2 Samuel 23.5. Além disso, a aliança é representada no texto principal de 2 Samuel 7 como um compromisso incondicional de Deus em favor de Davi e sua dinastia. No caso inevitável de o(s) sucessor(es) de Davi não cumprir(em) a parte dele(s) no pacto — o v. 14 refere-se especificamente a Salomão — , essa transgressão resultaria em disciplina mas não representaria o fim da relação estabelecida a partir de então (vv. 15-16). E possível fazer comparações com a aliança abraâmica em Gênesis 15, que também é expressada em termos de uma promessa incondicional de Deus aos descendentes de Abraão, bem como com a tradição abraâmica em geral, encontrada em Gênesis (comparar Gn 12.2 com 2Sm 7.9). E evidente que a aliança com Davi ocupava um lugar central na teologia oficial e no culto no templo em Jerusalém antes do exílio (cf. Sl 2.7-12; 89.19-37 [20-38]; 132.11-18). O problema do caráter condicional, experimentado ao longo da história da aliança davidica teoricamente incondicional é tratado de maneira direta e em meio à dor do exílio no Salmo 89.38-51 [39-52], 503
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A friabilidade do conceito de aliança incondicional já fica evidente em 1 Reis 9.6-9, em que manter a fé em Javé toma-se um pré-requisito para a continuação da aliança (com referência a essa questão, cf. também ISm 2.30). A aliança davídica, conforme esta é expressada no oráculo de Natã, em 2 Samuel 7, representa uma visão de Davi que é determinante para a avaliação de seus sucessores em 1—2 Reis. Davi é o modelo de governante nessa parte da (assim chamada) história deuteronômica (->) e de tempos em tempos, seus sucessores são comparados com ele, quer de modo positi vo ou (com freqüência) negativo. Para exemplos do primeiro caso, ver 1 Reis 15.11 (Asa) e 2 Reis 18.3 (Ezequias). Por outro lado, o coração de Salomão “não era de todo fiel para com o Senhor, seu Deus, como fora o de Davi, seu pai” (1 Rs 11.4) e críticas semelhantes são feitas a Abias (IRs 15.3), Amazias (2Rs 14.3) e Acaz (2Rs 16.2) (cf. G. von Rad, Studies in Deu teronomy, 1953, 86 - 8 8 ). No entanto, apesar do desprazer de Deus com Salomão, não houve nenhuma retribuição imediata por causa de Davi: “Contudo, não o farei nos teus dias, por amor de Davi, teu pai; da mão de teu filho o tirarei. Todavia, não tirarei o reino todo; darei uma tribo a teu filho, por amor de Davi, meu servo, e por amor de Jerusalém, que escolhi” (IRs 11.12-13). Essa mesma atitude é mostrada com relação ao fracasso de Jeroboão que “andou nos caminhos dos reis de Israel” (2Rs 8.18-19). A avaliação positiva de Davi é muito bem resumida na descrição que von Rad faz dele como “o rei segundo o coração do Deuteronomista” ( 8 8 ). Fica claro que esse Davi não é o mesmo personagem de 2 Samuel 9—20, fraco e vacilante em casa, ainda que vitorioso nas batalhas. Ele adquire proporções protomessiânicas e seu reinado passa a ser o critério de comparação para todos os seus sucessores. No entanto, o que possibilita esse enaltecimento da parte do historiador bíblico é o fato de o escritor deut. prezar a lealdade cultuai a Javé e, nesse aspecto, o Davi da tradição foi ainda mais exemplar que Salomão. 3. Davi em Crônicas. A idealização de Davi, assim como de Salomão, é ainda ma pronunciada em I— 2 Crônicas (->). Nesses livros, porções extensas da história de Davi, con forme relatada em Samuel e, provavelmente, conhecida do cronista (cf. as implicações de ICr 20.1-3), são omitidas, especialmente quando relacionadas a pontos “negativos” da vida de Davi, quer sejam as circunstâncias complicadas nas quais ele sucedeu Saul como rei ou o relacionamento ilícito com Bate-Seba e tudo o que 2 Samuel associa a Davi em termos de jul gamento sobre ele e sua família. Enquanto a tradição bíblica testemunha de modo inequívoco que Salomão construiu o templo de Deus em Jerusalém, e com relação a isso o cronista não é exceção, em Crônicas é Davi quem faz todos os preparativos para a construção, apesar de não poder participar da edificação em si. O motivo de sua desqualificação é apresentado em 1 Crônicas 22.8 e repetido em 28.3: “Porém a mim me veio a palavra do Senhor, dizendo: Tu derramaste sangue em abundância e fizeste grandes guerras; não edificarás casa ao meu nome, porquanto muito sangue tens derramado na terra, na minha presença” (1 Cr 22.8). Assim, nesse discurso de Davi para Salomão, o oráculo de 2 Samuel 7 é ampliado além da simples decla ração de que o filho de Davi é que iria construir o templo. Não obstante essa declaração, em Crônicas Davi desempenha um papel decisivo na edificação do templo de Israel, ajuntando o material de construção e organizando os funcionários levitas antes da edificação. Com relação a isso, a história do censo, da peste e da compra da eira de Araúna adquire uma relevância que não apresenta claramente em 2 Samuel 24. Em Samuel, a eira é simplesmente o local onde Davi ergue um altar e oferece sacrifícios a fim de fazer cessar a peste que ocorreu depois de seu censo imprudente. 1 Crônicas 21—22 relata esses fatos, mas acrescenta ainda que, ao ver a eficácia de seus sacrifícios, “Disse Davi: Aqui, se levantará a casa do Senhor Deus e o altar do holocausto para Israel” (1 Cr 22.1). 504
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1 Crônicas 22.2—26.32 registra as providências tomadas por Davi a partir de en uma vez que “Salomão, meu filho, ainda é moço e tenro” (1 Cr 22.5). “Estrangeiros” são usados para preparar as pedras e são armazenadas grandes quantidades de metal e madeira. Talvez as listas dos oficiais do templo, que ocupam boa parte de 1 Crônicas 23—26, sejam ainda mais relevantes para o retrato de Davi como planejador do templo. Tanto o louvor quanto a organi zação geral do templo são obra de Davi, que implementa as principais leis e estatutos do código mosaico. De acordo com uma interpretação, é bem provável que essa concentração em tomo de Davi como planejador e organizador do templo represente a “esperança davídica” do cronista e de sua geração: "Quaisquer que sejam suas esperanças para o futuro, ele não as expressa. Isso porque o cumprimento da história não é considerado um acontecimento do futuro que suplan taria ou mesmo anularia a história passada, sendo antes reconhecido na ordem presente” (P. D. Hanson, The Dawn o f Apocalyptic, 1975, 276-77). Os dados apresentados para a redação de Crônicas vão de c. 516 a c. 350 a. C. e, apesar de se tratar de “uma questão extremamente de licada” (Williamson. 121), as evidências favorecem uma data mais recente em detrimento de outra mais antiga. Se esse é o caso, significa que no tempo do cronista, o Estado reconstituído de Judá/Israel já havia voltado a existir, talvez há várias gerações, sem a restauração da monarquia. Em tais circunstâncias, a relevância e validade da promessa davídica teria sido questionado. Se mesmo depois da restauração da terra não havia nenhum sinal de um descendente de Davi para assentar-se no trono de Davi, seria possível que as tradições da antigüidade estivessem se cumprindo, não num descendente de Davi, mas nas instituições davídicas que ainda existiam? A questão, porém, não é tão simples, uma vez que, logo no principio, a genealogia da linhagem de Davi em 1 Crônicas 3 chega até ao século IV e, quer seja original ou suplementar, serve de evidência do interesse que ainda existia na casa de Davi, como se ainda não tivessem sido abandonadas todas as esperanças de cumprimento do oráculo dinástico. Vários outros aspectos de Crônicas sugerem que, no tocante ao cronista, a esperança davídica ainda mantinha o vigor. Pode-se perceber, por exemplo, que a versão do oráculo de Natã apresentada em 1 Crônicas 17.14 associa-o diretamente a Salomão (“Mas o confirma rei na minha casa e no meu reino para sempre, e o seu trono será estabelecido para sempre”; comparar com ICr 22.9-10 e contrastar com 2Sm 7.16). 1 Crônicas 28.7 (“ Estabelecerei o seu reino para sempre, se perseverar ele em cumprir os meus mandamentos e os meus juízos, como até ao dia de hoje”) atribui tudo à obediência de Salomão aos mandamentos e ordenanças de Deus, e a avaliação indubitável do cronista é que Salomão obedeceu ao Senhor. Uma vez que considera que Salomão cumpriu suas obrigações contratuais, sendo a mais visível delas a construção do templo, por certo a promessa davídica jamais foi revogada. Assim, em 2 Crô nicas 13.5, Abias de Judá pode declarar que Deus deu o reino de Israel à casa de Davi “para sempre... por uma aliança de sal” e o próprio cronista pode acrescentar o seguinte comentário com referência à perversidade de Jeroboão: “Porém o Senhor não quis destruir a casa de Davi por causa da aliança que com ele fizera, segundo a promessa que lhe havia feito de dar a ele, sempre” (2Cr 21.7). A comparação com o Vorlage do cronista em 2 Reis 8.19 mostra que ele realizou algumas mudanças importantes, pois, Reis fala da destruição de Judá, ao passo que Crônicas concentra-se na casa de Davi, e Reis explica que a retenção do julgamento é “por amor de Davi, seu servo”, enquanto Crônicas de refere à aliança feita com Davi. a partir dessa leitura dos textos citados, tem-se a impressão de que, talvez mesmo no final do século IV, o cronista e outros da mesma opinião ainda alimentavam esperanças na restauração da monar quia davídica. (-> Crônicas: Teologia) 4. Davi nos Salmos e nos Profetas. A tradição de Davi como músico e salmista (cf. 1 16.18, 23; 18.10; 2Sm 23.1 [?]; Am 6.5) encontra-se profundamente arraigada no AT e, mais 505
Davi
do que em qualquer outro lugar, no livro de Salmos, em que 72 salmos estão associados ao seu nome, sendo que um subgrupo se refere, especificamente em seus cabeçalhos, às experiências da vida de Davi. Uma vez que a expressão ledãwid não implica necessariamente autoria (ver, porém, Waltke, 586), o grau de relação entre Davi e esses salmos continuará sendo motivo de controvérsia. No entanto, é possível fazer-se algumas observações incontestáveis sobre o Davi do livro de Salmos. Em primeiro lugar, a associação de Davi com um grande número de salmos por meio dos cabeçalhos, que provavelmente constituem acréscimos posteriores, são paralelos ao destaque dado à relação de Davi com o templo em 1 Crônicas, sendo possível que sejam até originários do mesmo período. Em segundo lugar, a maioria dos cabeçalhos históricos se referem às dificuldades da vida de Davi, quer em seus tempos de fugitivo durante o reinado de Saul ou quando ele próprio era rei. Em terceiro lugar, e como conseqüência da questão ante rior, Davi torna-se um “tipo” do sofredor justo que, nos salmos de lamento busca o socorro de Deus em meio às injustiças que sofre nas mãos de inimigos pessoais ou de desafetos em geral. Apesar de haver outros cabeçalhos que, com seus respectivos salmos, celebram as realizações e a posição privilegiada de Davi, essa identificação dele com o sofrimento e as lamentações vai contra a imagem de Davi como governante aclamado e conquistador exaltado em suas diversas campanhas no Oriente Médio. Porém, está de acordo com a tradição sobre Davi encontrada em 1- 2 Samuel, a qual, conforme observamos, concentra-se menos nos triunfos dele e mais nas provações por que passou. A importância messiânica (no sentido que esse adjetivo tem no AT) fica evidente em especial nos livros proféticos, em que o futuro mais distante de Judá / Israel é retratado em termos de um governo restaurado e aprimorado de um rebento da linhagem de Davi. Os pro fetas do século VIII, Isaías e Miquéias, expressam essa esperança tendo como pano de fundo o fracasso contemporâneo dos descendentes de Davi que subiram ao poder, ficando aquém das expectativas incentivadas, por exemplo, pela ideologia real davidica promovida dentro do contexto cultuai do templo de Jerusalém e provavelmente expressada na ascensão ao trono de cada novo rei em linguagem semelhante àquela de Isaías 9.1-7. Nesse caso, toma-se neces sário um tipo davídico diferente daquele que já foi apresentado: o governante esperado será um rebento “do tronco de Jessé” (Is 1l.l); é preciso voltar a “Belém-Efrata” para recomeçar a história davidica e para encontrar um novo governante da linhagem de Davi (Mq 5.2). A “esperança davidica” é articulada em outros livros proféticos do AT (p. ex., Jr 33.15, 21-22, 25-26; Ez 34.23-24; 37.24-25; Os 1.11; 3.5; Am 9.11-15; Ag 2.23). Apesar de Ezequiel, do ponto de vista privilegiado do exílio da Babilônia, ter motivos para questionar o valor da mo narquia como instituição numa comunidade devidamente organizada — testemunho disso é a preferência dele pelo termo “príncipe” ao referir-se ao futuro governante (p. ex., Ez 44.3; 46.8) — ele deixa espaço para um Davi redivivus que alimentará seu povo como seu rei-pastor (Ez 34.23). Porém, juntamente com essa expectativa persistente de um governante davídico, ape sar da tragédia do exílio, também se pode encontrar num texto importante desse período uma “democratização” da aliança davidica, quando, em Isaías 55.3, as “misericórdias prometidas de Davi” são estendidas a todos aqueles que responderem à misericórdia divina, desfrutando assim dos privilégios outrora concedidos à extremamente privilegiada, porém historicamente decaída linhagem dinástica de Davi. 5. Além do Antigo Testamento. A tradição posterior adornou a reputação de Davi d várias maneiras. Um texto de Qumran registra que o rei foi autor de 4050 salmos e outras com posições (11Q5, col.27 [DJD IV 48 (texto), 91-93 (trad. e discussão)]). A LXX atribui salmos adicionais a ele (p. ex., Sl 95; cf. Hb 4.7), enquanto o Talmude Babilônico refere-se a Davi como editor geral do livro de Salmos (ver Baba Bathra 14b-15a). Esse tratamento de celebri 506
Davi
dade se estende para outros aspectos da carreira de Davi: “Brincava com leões como se fossem pequenos bodes e com ursos como se fossem cordeirinhos do rebanho” (Ecli 47.3). No entanto, na mesma seção Ben-Sira também homenageia a dedicação de Davi a Deus, a quem louvava de todo o coração (v. 8 ). Também era lembrado como um homem misericordioso (IMac 2.57) e um intercessor (2Ed 7.108) — sendo a oração de 2 Samuel 24 (ver vv. 10, 17, 25) citada como exemplo de oração virtuosa em favor dos iníquos (v. 111). A vitória sobre Golias no vale de Elá continuou servindo de inspiração para gerações posteriores que enfrentaram invasões militares (1 Mac 4.30). No NT, Davi é chamado de profeta (At 2.30), de acordo com a tendência pós-bíblica de ampliar o uso do termo (ver, porém, 2Sm 23.2). Aparece, porém, de maneira mais preeminente no NT como antepassado de Jesus, o Messias cristão. Mateus (1.1 -16) e Lucas (3.23-28) forne cem genealogias davídicas de Cristo e sua origem davídica é apresentada como um elemento importante da proclamação cristã do evangelho (Rm 1.3; 2Tm 2.8). E evidente que a desig nação “Filho de Davi” possui fortes laços messiânicos e foi usada em várias ocasiões para se referir a Cristo (p. ex., Mt 12.23; Lc 18.38-39), mas as limitações dela, do ponto de vista cristológico do NT, são indicadas em Mateus 22.41-45, enquanto no capítulo anterior, faz-se um contraste nítido entre o Davi guerreiro, cuja conquista de Jerusalém é associada, em 2 Samuel 5.8, à exclusão dos cegos e coxos da “casa” (= templo?), e o “Filho de Davi” conciliador, que, ao entrar na cidade no Domingo de Ramos, fez questão de receber os cegos e coxos no templo e curá-los (Mateus 21.14). B i b l k x ;k a f ia
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# 8332 (rph, relaxar, desanimar, desalentar, desamparar) 507
Débora
Dcbora
(nnl37 [debôrâ II], # 1806).
AT 1 .0 nome Débora significa abelha (-> # 1805), uma criatura associada com freqüên cia às práticas cultuais de Creta e da Fenícia. Esse fato levou à sugestão de que Lapidote (fogo ou tocha; Jz 4.4), marido de Débora, tenha sido posto no livro a fim de enfatizar que Débora é contida dentro dos limites por uma figura masculina (cf. Klein, 41-42, 216-17, n.). No entan to, é provável que se possa traduzir a descrição de Débora como eSet lappidôt (Jz 4.4) como “mulher de fogo” (“mulher determinada”). Essa tradução parece apropriada diante do que se sabe sobre o caráter de Débora e do fato de que Lapidote não volta a ser mencionado (ver F. Gottlieb, “Three Mothers,” Judaica 30, 1981, 195). 2. A história de Débora é relatada primeiramente na forma narrativa (Juizes 4) e depois em forma poética (Juizes 5). A relação exata entre os dois capítulos é bastante discutida (ver Neef) apesar de hoje em dia haver praticamente um consenso — tomando por base compa rações estilísticas com textos cananeus — de que o cap. 5 (o chamado “Cântico de Débora”) é anterior ao século X (ver NIDBA, 158). As abordagens mais recentes procuraram produzir leituras integradas desses dois capítulos, usando para isso as afinidades estruturais e temáticas, bem como o conteúdo metafórico e simbólico (ver Brenner, 129-38). Nesses dois capítulos, Débora julga e liberta Israel e proclama a palavra de Javé. Nenhuma parte do texto declara ex plicitamente que Débora foi levantada por Deus ou que recebeu o espírito divino, apesar de sua atuação demonstrar que essas duas coisas de fato ocorreram. Seu papel como juíza é singular, pois combina elementos legais, proféticos e político-militares. Ela julga sob uma palmeira e resolve casos litigiosos (Jz 4.5; cf. Moisés em Êx 18.13-16); é uma profetiza que transmite a palavra de ordem de Deus (4.6) e a relevância militar dessa mulher encontra-se no fato de ha ver promovido, inspirado e sido responsável por uma guerra que resultou na liberdade nacional da opressão e levou Israel a quarenta anos de paz. Nessas tarefas, ela age de modo compará vel a Moisés e, assim como ele, atua como mediadora de Javé. No entanto, Débora é retratada principalmente como uma líder nata e persuasiva que eleva essa batalha específica e a vitória subseqüente a um plano teológico. 3. O chamado “Cântico de Débora” apresenta conceitos teológicos importantes. a. Pressupõe-se que exista uma consciência nacional, bem como a identificação própria do povo como povo de Deus. Trata-se de um elemento importante, tendo-se em vista a data muito antiga desse capítulo (ver J. C. de Moor, The Rise o f Yahwism: The Roots o f Israelita Monotheism, 1990). b. Dois temas se justapõem: o poder humano e o divino. Por um lado, foi conquistada uma vitória humana sobre Sísera, mas, por outro, essa vitória pertence a Javé. Esse formato não é, de maneira alguma, incomum no AT e mostra-se especialmente claro no texto relacio nado ao “Cântico” no Salmo 6 8 . c. Débora é descrita como “mãe em Israel” (Jz 5.7). Não há um consenso sobre o sig nificado teológico desse título. De acordo com a sugestão de Sawyer (73), ele indica que Dé bora exercia autoridade religiosa comparável à dos sacerdotes. Outros estudiosos ressaltam que Débora é apresentada como alguém que cuida de Israel e que num certo sentido é como uma “boa” mãe humana (Brenner. 133). Contudo, talvez o título também possa ser entendido de uma forma que confirma valores patriarcais tradicionais. Apesar de Débora romper com as convenções tradicionais, ainda pode ser louvada como uma mulher que é capaz da tarefa ex tremamente valorizada dc procriar. Pelo fato de o texto não indicar se Débora tinha filhos ou não, Rasmussen sugere que a maternidade de Débora possui “uma nova relevância política” (92) que envolve a lealdade a outras mulheres e confirma a liberdade e individualidade dela. 508
Decálogo (Os Dez Mandamentos)
Desse modo, é criado um contraste especialmente entre Débora e a mãe de Sísera (Jz 5.28). Nas palavras de Klein, “As preocupações pessoais e egoístas dessa mãe contrastam com a ima gem de Débora como mãe em Israel” (45). Mas Jael, esposa de Héber também representa um contraste em relação a Débora (Jz 4.17-22; 5.24-27). Ela é “mulher de Héber” (“mulher” tem, aqui, conotação sexual), um homem associado ao inimigo de Israel (4.17). Débora não é alvo de associações depreciativas como essas (Klein, 47). B ib l io g r a f ia
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Os dez mandamentos constituem uma parte es sencial da aliança entre Deus e seu povo no Si nai. Em heb., são chamados de “dez palavras” (Êx 34.28; Dt 4.13; 10.4), o que se reflete no uso posterior do termo “Decálogo” (resultante do G) para descrevê-los. Em duas dessas pas sagens (Êx 34.38; Dt 4.13), a expressão “as dez palavras” é ligada à aliança de modo a deixar implícito que as duas coisas podem ser praticamente equiparadas. Apesar de constituírem um sumário amplo da lei de Deus, faltam-lhes os detalhes e penalidades associados aos códigos legais modernos. Na realidade, pertencem ao âmbito do conceito mais amplo de aliança. Quan do a aliança do Sinai foi renovada nas campinas de Moabe, diz-se explicitamente que as estipulaçôes são “as palavras da aliança que o Senhor ordenou a Moisés fizesse com os filhos de Israel na terra de Moabe, além da aliança que fizera com eles em Horebe” (Dt 29.1 [28.69]). 1. O Decálogo encontra-se dentro da estrutura da aliança realizada no Sinai e expr sões que destacam esse aspecto são empregadas repetidamente. O Decálogo é chamado de “Testemunho” (Êx 25.16,21; 40.20; cf. 2Rs 17.15), lembrando que a aliança foi imposta sobre Israel e reconhecida solenemente por meio de um juramento. As tábuas nas quais o Decálogo foi escrito são chamadas de “tábuas da aliança” (Dt 9.9, II, 15), “tábuas do Testemunho” (Êx 31.18; 32.15; 34.29), ou mesmo, “aliança” (1 Rs 8.21). A arca onde eram guardados é chamada de “arca da aliança” ( ’arôn habberít) ou “arca do Testemunho” ( ’arôn hã'êdút). O Decálogo deve ser considerado dentro dos moldes dos tratados extrabíblicos do OMA (para uma relação dos tratados disponíveis, ver Walton, Ancient Israelite Literature in Its Cultu ral Context, 95-107). Ainda que esses tratados englobem um período de pelo menos dezessete séculos e apresentem quatro padrões distintos, o padrão em Êxodo, Deuteronômio e Josué 24 se assemelha mais claramente aos tratados da metade do segundo milênio (cf. Kitchen, The Bible in Its World, 80-95). Diversos aspectos desses tratados extrabíblicos se refletem nos detalhes da formulação da aliança em geral e, mais especificamente, em relação ao Decálogo. Havia Decálogo (Os Dez Mandamentos)
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listas análogas de proibições no OMA (especialmente no Egito e na Babilônia), ainda que es sas listas não se apresentassem como proibições na segunda pessoa do singular. A comparação com os tratados extrabíblicos também ajuda a explicar várias características da apresentação bíblica do Decálogo. Maldições e bênçãos eram parte integrante desses tratados e encontram-se embutidas também no Decálogo (cf. segundo, terceiro, quarto e quinto mandamentos), sendo expandidas em Levítico 26 e Deuteronômio 27—28. As palavras de Êxodo 34.10-26 costumam ser consideradas um relato repetido da alian ça original. No entanto, o contexto deixa claro que aquela aliança foi rompida pelo pecado do povo e refeita nas bases da original (Êx 34.1,28). Portanto, é mais apropriado considerar-se as palavras de 34.10-26 como um sumário do Decálogo e do Livro da Aliança. Quando um tratado era renovado numa ocasião posterior, naturalmente incorporavam pequenas alterações. Isso explicaria as variações encontradas no Decálogo em Deuteronômio 5 em comparação com Êxodo 20 (para detalhes completos, ver IDBSsup, 876 e Nielsen, 3444, em que há uma comparação textual e literária das duas formas do Decálogo, ainda que essa discussão contenha falhas decorrentes de suas idéias críticas). Além das pequenas mudanças verbais, há três alterações de maior importância: a. O motivo para se guardar o sábado, em Êxodo 20.7-8, é o exemplo de Deus ao criar e depois descansar; em Deuteronômio 5.15, é a redenção do povo do Egito por Deus. Tanto a idéia de criação como de redenção são impor tantes (cf. Catecismo Maior de Westminster, pergunta 121, para “manter uma grata recordação dos dois grandes benefícios da criação e da redenção”). O exemplo de trabalho e descanso apresentado por Deus devia ser imitado por seu povo, porém a entrada no descanso supremo de Deus ocorreria somente pela redenção (ver Hb 3.12— 4.11 para o desenvolvimento da idéia no NT). b. O quarto mandamento é expandido com o acréscimo das palavras “como te ordenou o Senhor, teu Deus” depois da instrução inicial. Assim também, o quinto mandamento traz o mesmo acréscimojuntamente com as palavras “para que te vá bem”, c. No último mandamento, ocorre uma inversão na seqüência de “mulher” e “casa”, e o acréscimo da palavra “campo”. A necessidade de acrescentar-se o termo “campo” surgiu do fato de Israel estar prestes a entrar na terra prometida e tomar-se um povo sedentário. 2. Em Êxodo 20, o Decálogo é apresentando no contexto da redenção do Egito. Come ça com a declaração crucial: “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão” . Na realidade, trata-se de um sumário da atividade redentora de Deus narrada nos capítulos anteriores de Êxodo. Essa redenção foi uma expressão do amor de Deus por Israel (Dt 7.7), e a resposta adequada para isso era amar a Deus de todo o coração (Dt 6.5). O Decá logo proporciona a estrutura dentro da qual esse amor deveria expressar-se a fim de manter-se um relacionamento verdadeiro com Deus e com o próximo. As estipulações que o constituem foram dadas a um povo redimido que fora livrado da escravidão do Egito pelo Senhor, que demonstrara grande favor e graça para com eles em seu momento de necessidade. Não havia espaço para pensar-se que a salvação teria como base a obediência à lei. O povo de Israel não fora e não era capaz de merecer o favor de Deus (Dt 7.7; 9.4-6). 3. As Dez Palavras já foram divididas de várias maneiras ao longo dos séculos. O texto bíblico nos dá o número, porém não a divisão exata, e o sistema de acentos do TM apresenta duas (possivelmente três) divisões diferentes (GKC# 316,63; KD, Pentaleuch, 2 : 111- 112). Fo ram empregadas três formas principais de divisão (para detalhes completos, ver Nielsen, The Ten Commandments in New Perspective, 10-13, e esp. o quadro sobre as diversas posições na p. 10). a. Josefo foi o primeiro a dar testemunho da ordem que é atualmente seguida pelos pro testantes e católicos ortodoxos. Filo usou a mesma ordem antes de Josefo, mas seguiu a LXX ao colocar adultério antes de homicídio, b. Agostinho combinou deuses estrangeiros e imagens 510
Decálogo (Os Dez Mandamentos)
(Êx 20.2-6) em um só mandamento e seguiu Deuteronômio 5.21 ao colocar “mulher” antes de “casa” (cf. Êx 20.17), determinou como nono mandamento a proibição de cobiçar-se a mulher do próximo, e combinou no décimo mandamento a casa e outras propriedades. Os católicos romanos e os luteranos aceitam a contagem de Agostinho, mas seguem a seqüência de Êxodo 20.17, de modo que o nono mandamento proíbe que se cobice a casa do próximo enquanto o décimo contempla a mulher e outras propriedades, c. Os judeus dos primeiros séculos cris tãos e posteriormente, da Idade Média até hoje, colocaram o chamado Prólogo como primeiro mandamento (Êx 20.2), de modo que o segundo mandamento passou a ser 20.3-6 (uma com binação de deuses estrangeiros e imagens). Os oito últimos mandamentos concordam com a seqüência protestante. De acordo com a argumentação de M. G. Kline, os tratados extrabíblicos mostram que Êxodo 20.2 e Deuteronômio 5.6 constituem o preâmbulo histórico e não devem ser considera dos um mandamento. Ele afirma que a variação entre Êxodo 20.17 e Deuteronômio 5.21 “con tradiz a divisão do mesmo em dois mandamentos, o que evita o erro associado de combinar-se em um só o que a maioria dos protestantes, seguindo as tradições mais antigas, considera o primeiro e segundo mandamentos (NDB2, 1175). Apesar de Kline estar correto com relação ao segundo ponto, sua primeira afirmação dá espaço para dúvidas. É verdade que os tratados extrabíblicos possuem um preâmbulo, mas no caso da aliança feita no Sinai, o preâmbulo é toda a história precedente em Êxodo, não apenas 2 0 .2 . É absolutamente lógico considerar-se 20.2-3 como primeiro mandamento. Desse modo, as palavras introdutórias com referência ao redentor da aliança — Deus — explicam exatamente o pecado de se ter qualquer outro deus diante dele. Nesse sentido, a abordagem judaica estava correta, mas deixou de associar a isso a primeira proibição de modo a formar a primeira palavra. 4. Na teologia pós-Reforma, costuma-se dividir o Decálogo em duas tábuas. Considera-se que a primeira tábua da lei abrange os mandamentos 1— 4, que tratam do relacionamento com Deus, enquanto os mandamentos 5— 10 constituem a segunda tábua, tratando dos relaciona mentos com os outros homens. O texto bíblico em si não faz essa divisão em momento algum. De acordo com o registro, havia duas tábuas de pedra (Êx 31.18; 32.15; Dt 5.22; 9.10) e elas eram “escritas de ambos os lados” (Êx 32.15). Não há nenhuma explicação sobre a segunda cópia, mas a comparação com tratados extra-bíblicos indica que esse procedimento fazia parte das práticas comuns. Normalmente, uma cópia era colocada no santuário do Grande Rei que estava fazendo o tratado, enquanto outra era levada pelo partido menos poderoso e colocada em seu santuário. Essa explicação poderia se encaixar no caso da Bíblia, apesar de a natureza da situação ter levado as duas cópias a serem colocadas num único santuário (Êx 40.20). 5. Uma análise do Decálogo mostra que as dez palavras se encaixam de modo a formar um todo coerente, acentuando os principais deveres que o povo precisava cumprir com relação ao seu Senhor soberano. a. A introdução (normalmente chamada de Prefácio ou Prólogo) identifica o Deus aliança, e desde o início apresenta os motivos fundamentais para se obedecê-lo. Deus assevera sua autoridade sobre Israel ao lembrar o povo de que ele é Senhor autônomo e , no entanto, ao mesmo tempo é o Deus bondoso que fez uma aliança com Israel, de modo que se tomara seu Deus. Segue-se a lembrança daquilo que Deus havia feito, em sua graça soberana e poder absoluto, ao libertar o povo da escravidão no Egito. Eles haviam sido libertos para servir ao Senhor, e a recapitulação da graça passada que o Senhor teve para com eles devia impeli-los a submeter-se em obediência aos requisitos da aliança. Logo em seguida, vem a declaração de que Israel não deveria ter nenhum outro deus senão o Senhor. Dependendo da forma como a preposição heb. ‘al é colocada na frase, isso pode significar além de Deus (como em Gn 48.22; 511
Decálogo (Os Dez Mandamentos)
Sl 16.2, “senão”) ou em acréscimo a ele (como em Gn 31.50; Dt 19.9). Ao proibir outros deuses além do Senhor, o primeiro mandamento requer fidelidade à aliança e exclui uma relação com quaisquer outros supostos deuses. O Deus redentor exigia de seu povo fidelidade absoluta. b. O segundo mandamento está intimamente ligado ao que o antecede no sentido de que prossegue definindo um aspecto importante da adoração. Não se trata de uma questão de todas as pinturas e esculturas serem proibidas, mas de se construírem imagens de Deus. Não se deveria fazer nenhuma tentativa de representar Deus por meio de uma imagem. Se existis sem imagens desse tipo, Israel não deveria prostrar-se diante delas nem servir a elas (cf. o em prego do mesmo radical heb. para descrever a escravidão no Egito [Ex 20.2] sendo que nesse caso seu uso denota o serviço a um falso deus/ídolo). Os motivos dados para fazer cumprir essa proibição são basicamente o caráter de Deus e as ameaças e promessas que ele apresenta. Seu caráter é reafirmado com a repetição das palavras introdutórias do Decálogo (“Eu sou o Senhor teu Deus”), com a aposição da idéia de que ele é um Deus zeloso. Se o povo se rebelasse contra ele, Javé castigaria essa iniqüidade por várias gerações. Por outro lado, a constância do amor de Deus na aliança é prometida àqueles que o amarem e guardarem seus mandamentos. No TM, a palavra “geração” não ocorre nem na oração anterior (“visito a iniqüidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração”) nem nesta (“e faço misericórdia até mil gerações”). No entanto, o paralelismo requer a inserção do termo nas duas orações, o que fica ainda mais plausível com o uso da expressão “até mil gerações” num contexto parecido em Deuteronô mio 7.9. A idéia do amor de Deus toma-se um tema predominante na expansão do Decálogo em Deuteronômio (6.5; 7.9; 10; 12; 11.1, 13, 22; 13.3 [4]; 19.9; 30.6, 16,20). c. O terceiro mandamento proíbe tomar-se o nome de Deus em vão. Quando o vb. heb. (ns ’, # 5951) aparece sozinho, nunca se refere à fala, ao passo que o objeto do vb. (“o nome do Senhor”) significa muito mais do que um vocábulo denotando Deus. Tomar o nome de Deus significava assumir o caráter de Deus, ao viver-se como povo de Deus. As ações deviam mos trar que eles eram, de fato, o povo escolhido do Senhor. Tomar o nome dele era algo que não devia ser realizado dc modo fútil, feito com hipocrisia. O perigo da hipocrisia no serviço do Senhor é deixado claro pela aplicação da maldição da aliança sobre os transgressores. O man damento adverte que todo aquele que infringir essa proibição será culpado diante do Senhor, e esse infração não ficará impune. d. Também era requerido de Israel que o povo estruturasse o tempo. Antes do Decálogo, a única referência específica ao sábado encontra-se em Gênesis 2.3 (em que está expresso que o sábado é o descanso de Deus e, portanto, esse dia é abençoado) e no relato da provisão de maná no deserto (Êxodo 16). Agora, o documento básico da aliança do Sinai tem o princípio do descanso no sábado gravado entre suas cláusulas. A expressão introdutória “ lembra-te” não significa “recorda-te”, mas sim “lembra-te de fazer”. Antes de proibir o trabalho no sábado, o quarto mandamento fala em termos positivos sobre a natureza das atividades nos seis dias da semana. Seguindo o próprio exemplo de Deus, seu povo é chamado a uma vida de atividade na qual o trabalho é necessário e tem o seu devido lugar. O dia de descanso tem sentido ape nas quando considerado em relação ao trabalho que o precede. A importância do sétimo dia deve-se ao fato de que ele pertencia ao Senhor como um dia de descanso, pois era dele e não de Israel (sabbãt layhwh). Como Senhor do sábado, ele possuía direitos exclusivos sobre esse dia e, portanto, podia exigir a abstinência do trabalho tanto de seres humanos quanto de ani mais. O objetivo maior do sábado era dar descanso às pessoas e animais, seguindo o exemplo de descanso que o próprio Deus proporcionou (“ao sétimo dia, descansou,” Êx 20.11). O sá bado expressa o princípio de consumação demonstrado na obra redentora de Deus. Tendo sido redimido do Egito “com mão poderosa e braço estendido” (Dt 5.15) de Deus, o povo deveria 512
Decálogo (Os Dez Mandamentos)
manifestar seu reconhecimento do poder redentor de Deus por meio de uma vida estruturada de acordo com os mandamentos de Deus. (-> Sábado: Teologia) e. O quinto mandamento é uma ordem explícita para se honrarem pai e mãe. O vb. honrar (kbd, tt 3877) tem um vasto âmbito semântico. É usado com referência à resposta de adoração dada a Deus (ISm 2.30; SI 86.9; Pv 3.9; ls 24.15), mas também para a honra e esti ma de outros homens. O fato de esse mandamento ser dirigido a adultos indica que visa algo mais do que à simples obediência aos pais. Isso é confirmado pela última parte do mandamen to. Uma vida longa na terra prometida dependeria da obediência aos mandamentos de Deus e respeito para com os representantes escolhidos por eles que iriam exercer seu governo. Apesar de expressado em termos positivos, esse mandamento traz outra advertência para Israel, pois deixar de mostrar respeito pelos pais seria o mesmo que rebelar-se contra Deus, o que resulta ria numa interrupção repentina da ocupação da terra. Um dos pecados mencionados a Ezequiel como causa do exílio era o desrespeito pelos pais (Ez 22.7). f. O sexto mandamento é um dos três consecutivos que têm em comum a formulação curta com uma partícula negativa acrescida de um verbo. Trata da segurança da vida no caso de um ataque. O vb. empregado não é o mais comum para o ato de se tirar a vida, no AT, pois matar (hrg, -> ft 2222) ou executar (mwt, -> ff 4637) aparecem com freqüência muito maior. O vb. usado (rsh, -> # 8357) pode denotar o ato de matar em geral, homicídio doloso ou cul poso. A falta de um objeto deixa a expressão em aberto, de modo que poderia referir-se tanto ao homicídio quanto ao suicídio. Por trás dessa proibição, encontra-se o conceito fundamental da santidade da vida humana, pois a humanidade era portadora da imagem de Deus (Gn 9.6). E evidente que várias exceções eram aplicáveis a essa cláusula: refere-se somente a homens e não se refere a defesa do lar (Êx 22.2), mortes acidentais (Dt 19.5) nem vidas tiradas em tempos de guerra. g. No OMA, o adultério era considerado um pecado gravíssimo (cf. Gn 39.9), e o sé timo mandamento trata da ofensa à santidade do casamento causada por esse pecado. O vb. utilizado (n ’p , -> ft 5537) é empregado no AT tanto para homens quanto para mulheres, apesar de ser usado com mais freqüência para homens. É usado com referência à relação sexual de um homem com a esposa de outro (Lv 20.10) e para a relação da esposa com um homem, suposta mente também casado (Ez 16.32; Os 4.13). A proibição geral é contra as relações sexuais entre duas pessoas, sendo que pelo menos uma delas é tida como casada com uma terceira pessoa. No tocante a esse mandamento, as mulheres noivas são julgadas como se fossem casadas (Dt 22.22-24). A infração dessa proibição era considerada, antes de tudo, um pecado contra Deus (cf. as palavras de José: “Como, pois, cometeria eu tamanha maldade e pecaria contra Deus?” Gn 39.9). Os profetas relacionam cometer adultério com a adoração daqueles que “não são deuses” (Jr 5.7; Os 4.2), mostrando o quanto essa proibição era levada a sério. O uso da analo gia do casamento para descrever a relação de Israel com Deus permitiu que o mesmo vb. desse mandamento fosse usado para falar da falta de fidelidade pactuai da parte de Israel quando a idolatria foi introduzida no meio do povo (Is 57.1-3; Jr 3.6-9; Ez 23.36-49). h. O oitavo mandamento é dirigido à preservação dos relacionamentos rompidos em decorrência de roubos, um desrespeito para com a santidade da propriedade e os direitos de indivíduos e da sociedade como um todo. Mais uma vez, o vb. é usado sem um objeto, colocan do a proibição no contexto mais abrangente possível. No AT tudo pertencia a Deus (SI 24.1), mas ele confiou suas dádivas aos homens e o uso da propriedade devia ser respeitado. Mesmo aqueles que estivessem endividados e fossem forçados a vender sua propriedade, recebiam-na de volta no ano sabático ou no ano de jubileu (Êx 21.1-3; Lv 25.23-34; Dt 15.1-11). 513
Decálogo (Os Dez Mandamentos)
i. Outra santidade que devia ser mantida era a da verdade, e é disso que trata o no mandamento. A referência a dar-se falso testemunho indica uma situação legal em que um companheiro (rê a ') da comunidade da aliança estivesse sendo julgado. No entanto, o conceito é muito mais abrangente do que apenas o contexto de um tribunal, como também é demons trado pela alteração na forma deut. do mandamento de “falso, fraudulento” (seqer, #9214) para “nada, vazio” (.çáw’). Isso é apoiado pelo fato de que tanto Êxodo quanto Deuteronômio desenvolvem ainda mais a idéia de que é proibido mentir de modo geral (Êx 23.1-3; Dt 17.6; 19.15-21; 22.13-21). j. O último mandamento é diferente dos outros, pois trata de motivos internos e não de ações externas. O mesmo vb. (hmd, # 2773) ocorre duas vezes em Êxodo 20.17, enquanto em Deuteronômio 5.21 a segunda ocorrência é alterada para outro vb. ( ’wh, hitp.; -> # 203). É bem possível que esse último verbo tenha um caráter sumariante, voltando a atenção para o fato de que o desejo é a raiz de todos os outros pecados, uma vez que toda cobiça vem do co ração (Pv 6.25). Apesar de a lista nesse mandamento ser típica de listas semelhantes do OMA, ao que parece, é direcionada para objetos do desejo e não para uma lista daquilo que um ho mem possui. 6. O Decálogo representa parte da constituição dada por Deus a Israel como nação. maioria de seus preceitos básicos — senão todos — pode ser deduzida da criação e das narra tivas sobre os patriarcas, e reforça energicamente a moralidade da criação. No entanto, também contém o documento fundamental que dá origem à constituição de Israel como nação. Era uma imposição do Rei que redimiu Israel, transmitindo seus requisitos para seus vassalos e citando os casos de transgressão. Tratava-se de algo extremamente sério, pois as transgressões corres pondiam à rejeição do próprio vínculo da aliança. Posteriormente, os profetas confrontaram o povo com os abusos proibidos no Decálogo (cf. Os 4.1 -5) e acusaram os sacerdotes de não preservarem as prescrições da lei (Os 4.6-9; Ml 2.1-19). A última palavra profética do AT foi uma conclamação ao povo para lembrar-se da lei dada em Horebe (Ml 4.4. [3.22]). NT Para um estudo sobre o lugar da Lei à luz da vinda de Cristo, ver os cinco pontos de vista apresentados em The Law, the Gospel, and the Modem Christian: Five Views, Ed Wayne Strickland, 1993. Ética; -> Lei de Deus B ib l io g r a f ia
B. S. Childs, Exodus, 385-439; P. C. Craigie, Deuteronomy, 1976, 146-64; A. M. Harman. “The Interpretation o f the Third Commandment”, RTR 47, 1988, 1-7; C. Hodge, Systematic Theology, 1873, 3:271-465; W. C. Kaiser, Introducing Old Testament Ethics, 1983, 81-95; M. G. Kline, Treaty o f the Great King, 1963, 13-44; E. Nielsen, The Ten Commandments in New Perspective, 1968; A. Philips, Ancient Jsraels Criminal Law, 1970; J. J. Stamm e M. E. Andrew, The Ten Commandments in Recent Research, 1967; W. VanGemeren, “The Law Is the Perfection o f Righteousness in Jesus Christ”, in The Law, the Gospel and the M odem Chris tian, 1993, 13-58; G. Vos, Biblical Theology, 1975, 124-43; G. J. Wenham, “Law and Legal System in the Old Testament”, in Law, Morality and Bible, 1978,24-52; C. J. H. Wright, Living as the People o f God, 1983. Allan M. Harman Decisão 514
# 8606 (srr I, decidir, dirigir)
Descanso
Declaração -> # 5583 (ngd, tomar público, revelar, declarar) Decomposição
# 5245 (mqq, putrefazer, apodrecer, definhar)
Decreto -> # 3076 (/ir.j 1, determinar) Dedicação -> # 2852 (/)«£, treinar, consagrar) Dedo
# 720 (
Deformação Deleite
dedo)
# 6430 ( 'vv/, entortar, perverter, curvado)
# 6696 ( ‘ng, deleitar-se)
Delicadeza -> # 6695 ( ‘wg, ser criado com delicadeza; deleitar-se) Demônio -> # 8717 (sêd, demônio) Dente -> # 9094 (sên, dente, marfim) Dependurado -> # 1927 (dlh II, estar dependurado) Depressão -> # 3908 (AM 1, estar desalentado) Derramamento
# 9161 (ípA, entornar, verter, derramar)
Derretimento -> # 5022 (m s , dissolver, derreter, perder a coragem/o ânimo) Desabrigo -> # 5653 ( mvm/, oscilar, estar/ficar sem lar) Desalento -> # 2917 (hpr II, ficar desalentado, sentir-se envergonhado) Desaparecimento# 7080 (p/r, desaparecer, escapar, deixar escapar) Desarraigamento Desbravamento
# 9245 (irí, erradicar) #3168 (A/r, abrir caminho)
Conforme von Rad mostrou em seu ensaio, divulgado pela primeira vez em 1933, o conceito de descanso no AT encontra-se inextrincaveimente entretecido com a promessa da terra. No entanto, a experiên cia israelita de perder a terra durante o exílio e readquiri-la apenas como um feudo ao regressar criou um campo fértil para a reflexão sobre os propósitos maiores de Deus. As implicações finais dessas observações só são desenvolvidas até o fim no NT, especialmente no livro de Hebreus. Nessa reflexão, tomou-se claro que as promessas de Deus devem, em última análise, ter uma relação com o caráter e o destino humanos e não apenas com questões geográficas e políticas. Descanso
515
Descanso
1. O descanso é composto de diversos elementos. Uma idéia fundamental é a de lugar de repouso. Assim como os pássaros, os homens precisam de um lugar onde podem en contrar descanso de suas atividades e no qual podem sentir-se protegidos e seguros (Is 32.18). O reconhecimento dessa necessidade encontra-se no cerne das promessas a Abraão em Gêne sis 12.1-3. De maneira um tanto inexplicável, tendo em vista o restante das Escrituras, essas promessas não apresentam nenhuma relação com o que pode ser considerado uma promessa espiritual típica. Não se faz nenhuma menção a perdão, restauração, favor divino ou retidão de caráter. Antes, Deus promete coisas aparentemente desinteressantes, como descendentes, terras e uma reputação duradoura. À primeira vista, conhecendo o problema da pecaminosidade humana, conforme este é explicado ao longo do restante da Bíblia, essas promessas dão a impressão de ser um tanto insignificantes, talvez até mesmo um pouco grosseiras. No entanto, o caráter dessas promessas encontra-se inteiramente de acordo com uma compreensão mais profunda da origem e caráter do pecado, que é revelada em Gênesis 3, um capítulo que apenas parece simples. Nessa passagem, é demonstrado que a causa da desobediência humana às or dens de Deus e, portanto, do afastamento de Deus, é um ceticismo fundamental com relação à autenticidade de Deus. E, por trás dessa incredulidade, encontra-se uma desconfiança profunda das motivações de Deus. As pessoas duvidam seriamente que Deus visa o bem delas. Assim, para que Deus possa tratar dos problemas da desobediência humana e suas conseqüências, deve começar num nível mais fundamental do que o arrependimento, a retidão e a santidade. Deve convencer a humanidade de que ele se preocupa de fato com as necessidades dela e suas questões mais básicas. E a isso que se referem as promessas feitas a Abraão. Acima de tudo, as promessas tratam da permanência. Desde que a morte entrou no mundo pela queda, não há como escapar de seus dedos gélidos. Toda a alegria foi obscurecida por sua sombra, toda ação perdeu o sentido diante de seu andar impassível. A vida passou, de súbito, a ser extremamente curta e frágil. Deus se importava? Ou será que seu único interesse era manter suas prerrogativas divinas? Por certo, Deus se importava; ele sabia como era cruciai ter filhos para preservar a sensação de continuidade no mundo; compreendia a importância de ter um lugar seguro e tranqüilo para si na corrida que leva à morte e sabia como era importante desenvolver um tipo de caráter que deixa para trás um perfume duradouro depois que partimos. Foram essas as coisas que Deus prometeu a Abraão para mostrar ao patriarca e a outros que se podia confiar nele e que suas motivações em relação aos homens eram altruístas. A promessa de uma terra encontra-se no centro das promessas de Deus a Abraão e descendentes (cf. Js 1.13, para uma relação clara entre descanso e terra). Essa promessa de uma terra (e, portanto, de des canso) é uma promessa de permanência. Enquanto o povo de Deus durar, terá a terra (cf. lCr 23.25; Is 32.18; Ez 37.14). Uma geração pode dar lugar a outra, mas a terra permanecerá (Lv 25.23). Trata-se de um lugar de continuidade em meio às infindáveis mudanças que caracteri zam um mundo governado pela morte. A cultura e os costumes podem mudar mas, de algum modo, a geografia permanece a mesma. Eis um lugar para onde o coração pode voltar repleto de alívio sempre e de novo (Gn 49.15), como a pomba que volta sempre ao pombal (8.9). Eis o sussurro de uma esperança de que, de algum modo, a morte possa ser transcendida. O povo de Deus pode sempre encontrar descanso. A promessa da terra é uma promessa de segurança. A morte parece nos afetar de muitas maneiras. Não é apenas a morte física que nos põe em perigo, mas também a morte econômi ca e social. Há inimigos de todo tipo que ameaçam rasgar o tecido frágil que constitui a nossa vida. Tais ameaças multiplicam-se enormemente quando um povo não tem controle algum so bre sua habitação, fonte de renda ou ambiente. No entanto, Deus prometeu a Abraão e filhos, e aos escravos no Egito, que teriam descanso de seus inimigos numa terra que lhes pertenceria 516
Descanso
(Dt 12.10; 25.19; Js 23.1; etc.); os inimigos ficariam além das fronteiras dessa terra; o fruto do trabalho do povo seria só dele; seus filhos cresceriam até a idade adulta no próprio lar e vive riam para abençoar os pais por meio do trabalho. A promessa de terra é a promessa de libertação da escravidão. Os escravos não perten cem a lugar algum, não têm raízes e são completamente vulneráveis. O solo no qual trabalham pertence a outros, os filhos que geram pertencem a outros, os frutos que produzem pertencem a outros — podem perder tudo num momento, de acordo com a determinação dos outros. A promessa de uma terra para Israel era uma promessa de autodeterminação. Os israelitas não precisariam mais trabalhar para outros, sob o açoite de exigências insaciáveis. A realidade diante deles era de descanso das demandas do capataz (Sl 105.14; Is 14.3). Pelo fato de aquela terra pertencer a eles, podiam ter a liberdade abençoada de escolher suas próprias condições de trabalho e tinham liberdade de trabalhar ou parar de trabalhar, conforme decidissem, sob a proteção do relacionamento com Deus. E interessante observar que os mandamentos de Deus não se concentravam em levar as pessoas a trabalharem mais, mas sim, em garantir que não trabalhassem demais, uma vez que estavam livres para fazê-lo como lhes parecesse melhor (Êx 23.12; Dt 5.14). Deus mostrou-se particularmente preocupado que elas próprias não se tomassem opressores daqueles que estavam sob as ordens delas: os animais e os servos. (Para um estudo mais completo sobre o descanso aplicado ao sábado, -> # 8701.) A promessa da terra era uma promessa de serenidade e tranqüilidade. Essas qualidades eram a soma total da consciência de todos os significados do descanso (Sl 23.2; 35.20; 116.7; Ec 4.6; Jr 6.16; Is 63.14). Quando o espírito humano desfruta o senso de permanência, é liber tado da pressa frenética de fazer tudo de uma só vez antes que venha a noite (Pv 1.33; Jr 30.20). Quando o espírito desfruta segurança, não vive sempre olhando para todos os lados ou sendo consumido por uma ansiedade diante do desconhecido (Is 14.7; Lm 1.3). Quando o espírito sabe que é responsável pelo próprio destino, fica livre da furia que é companheira inescapável do escravo (Sl 131.2). Esse é o descanso que fica implícito na promessa da terra para Abraão e que se tomou explícito no cumprimento dessa promessa no livro de Êxodo. 2. O Deus revelado em Êxodo é um Deus que não apenas se lembra da promessa outrora, mas que também é capaz de cumprir essa promessa apesar de adversidades aparente mente insuperáveis. Assim, Moisés pode proclamar com certeza que Deus irá, de fato, conduzir o povo à terra e dar-lhe descanso (Dt 12.10), e Josué pode afirmar que Deus fez exatamente aquilo que havia prometido (Js 21.44). Quando Deus deu a promessa da terra, ele o fez para mostrar que era digno de confiança, pois se preocupava, antes de mais nada, não com suas próprias necessidades, mas com aquelas dos homens. E quando ele cumpriu essa promessa, apesar da passagem dos anos e da oposição de um mundo caído, demonstrou sua veracidade. Ele podia e devia ser obedecido. Sua palavra é confiável e verdadeira. Porém, ao longo do caminho rumo ao cumprimento da promessa, foi preciso que algo estranho acontecesse — o episódio de Cades-Barnéia, no qual os israelitas se recusaram a con fiar e crer em Deus. Por certo, Deus não estava preocupado com o bem de seu povo se que ria que os pobres israelitas se lançassem contra uma terra cheia de gigantes! Além disso, era impossível crer em Deus quando ele disse aos israelitas que eles conquistariam aquela terra. Assim como em Gênesis 3, o resultado foi a desobediência, seguida do anúncio terrível de que aquela geração não entraria no descanso prometido (Sl 95.11). Em outras palavras, a tragédia havia deixado claro que a oferta divina de permanência, segurança, liberdade e tranqüilidade só podia ser recebida pelos que confiavam, criam e obedeciam àquele que havia feito a pro messa (37.7). Pode-se dizer, no mínimo, que foi dessa calamidade que começaram a surgir os princípios para que o povo pudesse ingressar no descanso. 517
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3. Mas será que Deus desejava dar apenas a terra ao seu povo? Uma vez que os filhos da geração do deserto, ao contrário dos pais, haviam confiado, crido, obedecido e entrado no descanso prometido, esgotaram o que Deus havia pretendido dar a eles? De maneira alguma. Pois, se o significado da terra podia ser colocado dentro da categoria de descanso, o sentido do descanso não podia ser abrangido pela terra. Os primeiros vislumbres desse fato podem ser encontrados logo em Êxodo 33.14, em que o descanso prometido é associado inseparavelmente à presença de Deus. Em última análise, o descanso deve ser encontrado em Deus e não pode ser achado em terra distante de Deus. Outra separação entre descanso e posse da terra aparece na aplicação das promessas de descanso a Davi e Salomão (2Sm 7.1, 11; 1Rs 5.4 [18]; 8.56; lCr 22.9). Por um lado, eles haviam recebido o descanso quando a terra foi conquistada sob a liderança de Josué. Mas, por outro, esse descanso só se concretizou no reinado dos monarcas davídicos e quando arca entrou no lugar do seu “repouso” em Jerusalém (Sl 132.8, 14). Assim, apesar de o descanso estar intimamente ligado à posse da terra pelo povo, não era inseparável dessa posse. Esse descanso possuía uma qualidade individual que era, enfim, uma expressão do relacionamento com Deus. Esse começo de uma separação entre a metáfora e a realidade é de importância crucial. Isso porque, na verdade, como a experiência de Israel deixou claro, a terra não podia prover de todo nenhuma das qualidades tão desesperadoramente necessárias aos homens. No final das contas, o senso de permanência, segurança, liberdade e tranqüilidade não pode ser encontrado nas coisas da terra. Tudo isso só pode vir do Criador santo da terra e ser obtido ao se confiar e crer nele e ao obedecê-lo. 4. Esse significado mais amplo dc dcscanso ficou ainda mais evidente na experiência do exílio. Por certo, Deus não podia permitir o exílio, pois isso significaria a anulação de to das as promessas, inclusive a de descanso. Mas o fato é que ele o permitiu e, de acordo com os profetas, na verdade foi ele quem o provocou. Como poderia uma terra profanada pela perversidade e idolatria ser uma terra de descanso (Mq 2.10)? A posse de uma terra profanada não eqüivalia a descanso. O descanso devia ser encontrado ao depositar a confiança em Deus, como Isaías expressou com tanta eloqüência: “Em vos converterdes e em sossegardes, está a vossa salvação; na tranqüilidade e na confiança, a vossa força, mas não o quisestes” (Is 30.15). Na realidade, foi apenas por meio do exílio que Israel despertou para suas idéias equivocadas de que a adoração consistia em um templo e o descanso, na posse da terra. E isso que as Escrituras deixam cada vez mais claro ao separarem as qualidades do descanso da posse da terra. Não é por um simples rei terreno que “a glória lhe será a morada” (Is 11.10), nem a terra desse reino será uma simples terra deste mundo (65.17-25). A seguran ça da criança brincando sobre a toca da áspide é um tipo de segurança absolutamente distinto daquela que este mundo pode oferecer (11.8 ). A imagem da terra continua sendo empregada. O descanso continua sendo expressado dentro desse conjunto de termos (cf. Jr 31.2-6; 50.34), mas estes termos são cada vez mais claramente metafóricos. O descanso não pode ser encontrado numa escritura de propriedade. Antes, está nos braços do Deus da promessa (Is 28.12; 30.15). Porém, nunca é fácil para os filhos de Adão e Eva se entregarem a esse abraço. Diferentemente de Abraão, que compreendeu que o próprio Deus era a dádiva e a promessa e, assim, mostrouse disposto a devolver ao Senhor o filho prometido, nossa tendência é nos concentrarmos na metáfora e deixar de lado a realidade. Queremos o filho e, de bom grado, abrimos mão daquele que deu o filho, sem jamais percebermos que, separada de seu Doador, a criança morre. Foi o que aconteceu para muitos em Israel. A medida que a terra da promessa tomava-se cada vez menos capaz de dar aos israelitas as qualidades do descanso, por causa da pecaminosidade deles (Ne 9.28), passaram a culpar a Deus (Is 64.12[11]). E quando, no exílio, eles per deram de todo essa terra, não conseguiam imaginar como as qualidades do descanso poderiam 518
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ser restituídas (Dt 28.65) — a menos que Deus repetisse o que havia feito no passado, dando a eles uma nação independente protegida por uma força militar. O que se dizer da fidelidade di vina às promessas quando essas expectativas não são preenchidas? Felizmente, alguns tiveram a visão de entender o que o povo em geral não conseguia enxergar: a terra era uma metáfora, Deus era a realidade (SI 61.1 [2]; Jr 6.16). 5. Qual é a concepção bíblica de descanso? E o descanso da fé, uma vida de confianç convicção e obediência a Deus. Nele que é eterno há permanência; nele que não tem êmulo algum, há segurança; nele que nos fez à sua própria imagem, há liberdade; nele, que é a com binação de poder absoluto, santidade absoluta e amor absoluto, há tranqüilidade. Aqueles que sabem disso podem calar seus medos e ansiedades diante dele (SI 131.2), assim como ele si lencia o rugir dos mares e o ruído das ondas (65.7 [8 ]). No final da era do AT, pelo menos alguns assimilaram essas verdades. Assim, lemos no Salmo 62.1 [2]: “Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosa” ou em Isaías 63.14, “O Espírito do Senhor lhes deu descanso”; ou ainda, em Jeremias 31.2, “Eu irei e darei descanso a Israel”. Enquanto outrora o descanso era inseparável da posse soberana da terra, nesse momento alguns compreendiam que o descanso encontrava-se naquele que havia dado a terra. Mas como era possível para homens, cuja condição já havia sido revelada pela história de Israel, receber algum dia esse descanso? O episódio de Cades-Baméia repetiu-se um semnúmero de vezes na história de Israel. O auto-retrato que Israel deixou para nós é de uma fran queza implacável. E, para o horror das pessoas, é também um espelho no qual se reconhecem. Assim como Israel, são impedidas de entrar no descanso prometido de Deus em função do longo histórico de incredulidade que testemunha contra elas. Mesmo que esse histórico pudesse, de algum modo, ser apagado, indo contra todas as leis de causa e efeito, como tais pessoas pode riam começar a confiar, crer e obedecer de modo coerente se jamais o haviam feito antes? É com essas duas perguntas não respondidas que se encerra o AT. E é Jesus Cristo quem as responde, conforme o escritor do livro de Hebreus captou de maneira tão brilhante. Esse es critor, fosse ele Paulo ou outra pessoa, começou declarando categoricamente aquilo que vinha surgindo da reflexão do AT: as promessas de descanso feitas por Deus ainda não haviam se cumprido de todo na concessão da terra e Deus continuava chamando seu povo para entrar no descanso de Deus muito tempo depois que a terra fora dada. Além disso, foi Cristo quem fez o sacrifício perfeito exigido pela lei do AT; sacrifício necessário em função da condição huma na. Por fim, sofrendo como sofrem os homens e sendo tentado como os homens são tentados, Cristo é capaz de ajudá-los a triunfar sobre a própria condição humana por meio do poder do Espírito Santo que ele lhes dá (Hb 2.10-18; 4.14-16; 6.4-6, 17-19). O que as pessoas devem fazer? Não devem repetir o episódio de Cades-Baméia! Cada um deve deixar de lado os esfor ços para justificar a si mesmo; deve descansar inteiramente na provisão que Deus oferece em Cristo e entrar na vida eterna com toda a permanência, segurança, liberdade e tranqüilidade dela. Ainda há descanso para o povo de Deus. As palavras escolhidas para serem incluídas neste verbete tratam de duas idéias bási cas: o repouso e o silêncio. A ponte entre essas duas idéias pode ser encontrada em radicas como rg ‘ e dmh 11, que contêm tanto o conceito de estar em repouso como de estar quieto. Vários verbetes aqui listados estão relacionados ao descanso (principalmente nwh, rg ' e seus derivativos, mas também s 'n, rgs, sbt e stq) e outros, ao silêncio ( ’lm I, dmh II, ditmâ I, hsh, hsh, hrs II, sbh e sqt). Descanso, quietude, repouso: dmh II (chegar ao fim, descansar, ficar mudo, calado, # 1949); -> nwh 1 (descansar, # 5657); -> nwh I (sossegar, descansar, esperar, estacionar, depositar. 519
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# 5663), -> rg' (formar uma crosta sobre, parar, ficar quieto, # 8088/89); S ’n (estar em paz, imperturbado, # 8631); -> sbh II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); -> Sebet (sentar-se quie to, descansar, # 8699, 8700); -> Stq (acalmar-se, # 9284) Descanso, silêncio: dí/mâ I (silêncio, # 1872); í/otA II (chegar ao fim, descansar, ficar, mudo,calado,# 1949); dmn I (ficarparado, imóvel, em silêncio,# 1957); -> Ap’(fazeralgo em segredo, # 2901); -> (manter o silêncio, ordenar que se faça silêncio, # 3120); -> /irí II (estar surdo, ficar quieto, permanecer inerte, silenciar, # 3087); -> (silêncio, # 7551) B ib l io g r a f ia
TDNT3:627; TDOT3.260-65; rWOT 1:185-86, 192-93, 328-29; 2:562-63, 832-33; H. Attridge, “Let Us Strive to Enter That Rest: The Logic of Heb. 4:1-11”, HTR 73,1980,279-88; G. R. Driver, “AConfused Hebrew Root (DTT HD7 Q D 1)” , SepherN H Tur Sinai, 1960; J. Hausman, Israel s Rest: Studien zum Selbstverstãndnis der nachexilischen Gemeinde, 1987; W. Kaiser, Toward an Old Testament Theology, 1978, 127-30; G. von Rad, “There Still Remains a Rest for the People of God”, The Problem o f the Hexateuch and Other Essays, 1966, 94-102; G. Robinson, “The Idea of Rest in the OT and the Search for the Basic Character of the Sabbath”, Z A W 92, 1980, 32-42; W. Roth, “Deuteronomic Rest Theology: A Redaction Criticai Study”, BiblRes 21, 1976, 5-14. John N. Oswalt Descendência -> # 7368 ($e ’e$ã 'im, descendência) Descuido
# 8932 (Salwâ, seguro, descuidado, descuido)
Desdém -> # 7840 (qls, desdenhar, zombar, motejar) Desejo
# 203 ( ’wh, desejar, considerar belo, desejável)
Desenvolvimento -> # 1540 (gdl I, crescer, criar, engrandecer, gabar-se)
Deserto
Deserto 0 3 1 0 [midbãr I], estepe [27lx]; # 4497).
OMA Como termo geográfico midbãr (e sinônimos relacionados, ver abaixo) representa o opos to de um território populado urbano e semi-urbano. Refere-se ao verdadeiro deserto árido (sul da Palestina e península do Sinai) bem como aos territórios semi-áridos adequados para pastagem. Para etimologia e representação nas línguas cognatas, ver HALAT 518, BDB, 184, THAT 1:433; TWAT 4:663-64 (para detalhes geográficos, ver TWAT 4:670-79); para antôni mos, ver THAT 1:58. AT O fato de o AT conter referências ao deserto em seu vocabulário geográfico não é sur presa alguma, tendo-se em vista a localização geográfica que serviu de contexto para a Israel antiga (ver Schwarzenbach; Simons). Os principais termos não contêm nenhuma dificuldade léxica significativa: midbãr I, deserto, estepe (27lx) e principais sinônimos, ‘arãbâ II, estepe (60x; # 6858), horbâ, ruína, ermo (42x; # 2999), Sammâ, meSammâ, Semãmâ, ermo, deserto (39x, 7x, 56; # 9014; 5457; 9039),y^Simôn, deserto/ermo (13x; # 3810) e fiyyâ, deserto (16x; # 7480); ver Talmon, “Wildemess”, 946-49. 520
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1. Pesquisa contemporânea. O tema do deserto adquire valor teológico principalmente por suas relações mais abrangentes com modelos narrativos ou imagens poéticas importantes e não pelas mudanças semânticas de termos individuais, como se estes constituíssem um vo cabulário teológico técnico. O estudo do tema do deserto no século XX procurou discernir a relevância religiosa e teológica, em termos gerais, de quatro maneiras, a. A primeira abordagem surgiu de uma determinada teoria sobre a origem da religião israelita. A teoria do “ideal nômade” foi bas tante influente. Comentários das profecias pré-exílio eram interpretados como indicações de movimentos de revitalização que idealizavam as origens nômades de Israel como um tempo antigo de pureza religiosa absoluta, a qual rejeitava as influências sincréticas das religiões cananéias, exercidas sobre o povo por meio da vida agrícola; defendia-se, dessa maneira uma volta ao “ideal nômade” como meio de purificação e restabelecimento de um relacionamento idílico com Javé. Depois de passar pelo escrutínio do criticismo (ver especialmente Talmon, “The ‘Desert M otiP”; e TWAT 4:683-85) e ser considerada sociologicamente obsoleta (ver J. H. Hayes e J. M. Miller, IJH, 104-20; N. Gottwald, The Tribes ofYahweh, 1979, 453-63; R. B. Coote e K. W. Whitelam, The Emergence o f Early Israel, 1987, 81-116), essa abordagem mostra-se como um beco sem saída. b. A escola do “mito e ritual” procurou situar o significado do tema do deserto num festival de Ano Novo/Entronização, celebrado no culto régio em Jerusalém. Em termos simbó licos, o deserto é associado aos poderes hostis do caos e integrado ao culto de uma divindade que morre e renasce, relacionada aos ciclos de seca e chuvas das estações (Haldar). No entanto, as reconstituições de um festival de entronização mais completo com todos os seus detalhes não se mostraram sólidas e nem levaram a um consenso em estudos subseqüentes da religião israelita (R. E. Clements, A Century o f Old Testament Study, 1983, 104-8). c. Em contraste com essas abordagens baseadas em grande parte na “história das reli giões”, o terceiro caminho principal para uma avaliação teológica firmou-se mais numa abor dagem da “história das tradições”. Quer seja avaliada em termos diacrônicos (von Rad, OTT 1:280-89; Talmon, “The ‘Desert MotiP,” 31-63) ou sincrônicos (Clines; Brueggeman), a im portância teológica do tema do deserto é descoberta dentro da estrutura narrativa das tradições do Pentateuco. De acordo com essa idéia, o deserto não é, antes de mais nada, um símbolo teológico por si mesmo, mas somente quando associado à história da origem de Israel como nação. Tendo em vista ser o tratamento teológico mais profícuo, essa terceira abordagem será discutida abaixo em pormenores. d. Em tempos mais recentes, surgiu uma quarta alternativa, empregando metodologias estruturalistas e antropológicas (Cohn, 7-23; Leach, 579-99). Nessa concepção, o deserto (ou ermo) pode representar simbolicamente “o outro mundo das coisas sagradas” deixando implí cita uma “situação anormal / mítica / sagrada” em contraste com uma “situação normal / do mundo real / profana” (Leach, 587). O significado desse modelo é discernido ao lançar-se mão da estrutura de ritos de iniciação (A. van Gennep, The Rites o f Passage, 1960; V. Tumer, The Ritual Process, 1969; Leach, 584). O deserto tomou-se um lugar simbólico de poder divino transformador, uma condição marginal necessária (cf. os comentários esclarecedores de Cohn sobre a função de “liminaridade” e a produção de "communitas ”, 9-12) para capacitar aqueles que são destinados a uma vocação divina especial para uma tarefa sagrada (cf. a discussão de Leach sobre o chamado de Moisés [585] e sobre as narrativas de Elias/Eliseu [587-88]). À primeira vista, esses empreendimentos interpretativos podem parecer extravagantes. No entanto, é preciso usar-se de cautela tendo em vista as tentativas claras do narrador de Reis de delinear suas histórias sobre Elias/Eliseu de acordo com as tipologias narrativas do êxodo, 521
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da passagem pelo deserto e da conquista (cf. a jornada de Elias ao Sinai; a travessia do Jordão por Elias/Eliseu). No mínimo, essa interpretação indica motivos para o poder psicológico e social do modelo canônico escolhido por Israel para narrar sua história. 2. O simbolismo teológico do tema do deserto e da tribulação pelo ermo. A abordage da história da salvação (ver terceira abordagem acima) detectou corretamente que um aspecto do tema do deserto no AT é derivado de seu contexto dentro da história das origens de Israel como nação. Como teologia narrada, essa história das origens nacionais foi contada e recontada com diferentes ênfases e pontos de vista. Em suas circunstâncias, os escritores israelitas não sentiam necessidade de dar uma versão fixa de suas origens nacionais aos leitores. Para o intérprete moderno, isso toma necessária uma sensibilidade para com a distinção entre uma história (em sua abstração) e uma determinada narrativa dela. O Pent. representa claramente a narrativa mais elaborada da história das origens israelitas no AT. Começaremos, porém, com as versões fora do Pentateuco. a. A passagem pelo deserto na profecia clássica. Os profetas do pré-exílio não dedica muito espaço a esse modelo de história. Quando o fazem, porém, é a serviço de suas mensagens de julgamento. E provável que o público do profeta empregasse as tradições de nação eleita como um argumento retórico de direito, que garantisse a esse público a existência nacional. A alusão do profeta a essas suposições afeta a maneira do povo pensar a fim de discernir quais são as bases para o julgamento da geração atual. O que surpreende não é apenas o fato de esses profetas fazerem uma “releitura” da história tradicional das origens de sua nação, de maneira incrivelmente distinta dos seus contemporâneos, mas também de mostrarem diferenças signi ficativas dessa interpretação entre si e com relação ao(s) narrador(es) do Pentateuco. i. Oséias. Dentro do contexto da imagem de Israel como esposa infiel de Javé, o dis curso de julgamento de Oséias lança mão da história mais antiga de Israel, considerando-a um período idílico caracterizado pelo amor nupcial e fidelidade por parte de Israel e pelo cuidado divino e provisão de Javé (Os 2.15 [17]; 13.4-5). É só a partir do assentamento na terra prome tida que surgem as dificuldades “conjugais” (Os 13.6; H. W. Wolff, Hosea, 43; contrastar com Fox, 448-49, que procura diminuir a importância do elemento da fidelidade de Israel). Tendo em vista o atual contexto de redação (Os 2.1-23 [3-25]), essa alusão à passagem pelo deserto interpreta o julgamento de Israel como sendo de função catártica, visando recobrar o amor do período inicial de noivado. O julgamento presente desencadeia uma recapitulação da antiga história da eleição. A volta ao “deserto” (um símbolo da invasão, conquista e exílio históricos de sua nação pelos assírios) oferece mais uma vez um contexto em que Javé pode atrair Israel para si e recuperar-lhe o amor. (-> Oséias; Teologia) ii. Amós. Ao contrário de Oséias, ao referir-se pela primeira vez à passagem pelo deserto, Amós não faz nenhuma menção de um período idílico de fidelidade israelita (Am 2 .10). Antes, sua ênfase é na orientação divina e no cuidado para com a nação. A história serve de base para as acusações do profeta de crimes nacionais cometidos no presente. A outra alusão à passagem pelo deserto em Amós 5.25 apresenta diversos problemas interpretativos (ver W. R. Harper, Amos and Hosea, 136-38; J. L. Mays, Amos, 111; H. W. Wolff, Joel and Amos, 258-68; G. V. Smith, Amos, 188-191 para levantamentos dos problemas). O contexto de oráculo reflete uma condenação do culto em Israel (Am 5.21-27). Qualquer que seja o modo como a corrupção do culto é compreendida, continua sendo válido que a pergunta retórica do profeta (v. 25) apela para a passagem pelo deserto como um acontecimento constitutivo da identidade comunitária de Israel. O v. 25 apresenta as condições daquele tempo em contraste com as práticas do pre sente, que representam inovações intoleráveis. Quer essa negação do culto sacrificial seja vista como relativa ou absoluta (R. de Vaux, Anclsr, 2:454-56), não parece possível-se encaixar a 522
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perspectiva de Amós junto com a das narrativas do Pentateuco. O ponto de vista do profeta com relação às tradições de eleição desempenha a função simbólica de enfraquecer (ao contrário da expectativa do povo) a legitimidade da existência e das práticas atuais de Israel como nação. Ao mesmo tempo, essa concepção sugere que a passagem pelo deserto seja vista como um período idílico e normativo quando a adoração a Javé era correta. Por ficar aquém do exigido, o culto em sua manifestação presente toma necessária e justificada a destruição vindoura da nação (vv. 26-27). A história das origens nacionais, inclusive a passagem pelo deserto, não traziam implicações apenas para um determinado modo de vida que a nação deveria ter seguido (Am 2.6-16), mas também proporcionavam um paradigma de orientação quanto aos detalhes desse modo de vida (5.21-27). (-> Amós: Teologia) iii. Jeremias. Dentro das tradições proféticas anteriores, o apelo de Jeremias idealiza a passagem pelo deserto, enfatizando a orientação, cuidado e proteção divinos (Jr 2.2-8). Assim como Oséias, Jeremias emprega essa metáfora juntamente com a imagem de marido/mulher. Ao ressaltar a ingratidão de Judá diante da fidelidade divina, vê-se que a apostasia de Judá é completamente injustificada, legitimando, assim, a proclamação do julgamento. Na interpre tação de Jeremias da história nacional, a infidelidade teve origem no assentamento na terra prometida (Jr 2.7; Os 13.6). As expressões em Jeremias 2.2, “tua afeição (bondade) quando eras jovem” / “teu amor quando eras noiva, e de como me seguias no deserto”, costumam ser entendidas como referências à fidelidade no período que antecedeu o assentamento na terra, tomando-se por base uma analogia com o ponto de vista de Oséias (ver comentários). Essa interpretação sofreu sérios questionamentos (Fox, 441-50). Em vez disso, as construções gra maticais genitivas são consideradas como genitivos objetivos — a referência é vista como uma alusão à bondade/amor de Deus para com a nação durante a juventude dela, nos seus dias de noivado. O ponto forte dessa concepção é o fato de se usar o termo “bondade” (hesed, afeição). Fox afirma que, no AT, esse termo nunca é usado para descrever as atitudes ou ações de uma pessoa com relação a Deus (443). No entanto, não há argumentos para se defender a tese com hesed apresentada por Fox (ver Os 4.1; 6.4; ver também W. L. Holladay, Jeremiah 1, 1986, 82-3). (-> Jeremias: Teologia) iv. Ezequiel. É surpreendente como a interpretação da história por Ezequiel apresenta um enfoque bastante distinto daquele mostrado por seus antecessores (Ez 20.1-44). Enquanto eles fazem referência à história das origens nacionais a fim de revelar um ponto evidente de contraste (fidelidade/apostasia, norma/desvio, o profeta Ezequiel reconta essa história com o intuito de revelar um ponto de semelhança. A história de sua nação consistia de um único pa drão cíclico permanente (observe-se o modelo estrutural da passagem). Em vez de determinar a origem dos problemas de lealdade de Israel no período do assentamento da terra, Ezequiel vê essas dificuldades presentes desde o início na geração do êxodo, antes mesmo da libertação do cativeiro no Egito e continuando sem nenhuma interrupção até o presente. Para Ezequiel, não houve uma geração fiel sequer em toda a história nacional! Os julgamentos do passado, durante o tempo no deserto, são prenúncios do julgamento do exílio no presente (cf. Ez 20.23). E assim como aqueles castigos do passado, a disciplina do presente também não conseguiu acabar com a infidelidade e rebeldia nacionais. Assim, o profeta espera o julgamento ainda maior da “Diáspora” no futuro (v. 34). A passagem pelo deserto será recapitulada em maior escala (v. 35, “deserto dos povos”) e, como no passado, servirá de contexto para o julgamento (vv. 35-36), exercendo uma função catártica (v. 38). Isso porque nessa “segunda” passagem pelo deserto Javé finalmente conseguirá produzir um povo de Israel digno de herdara terra (vv. 39-44). A história de Israel passa a ser um paradigma simbólico mais amplo para conceituar a vida de Israel no presente e no futuro. Dentro desse contexto simbólico, o tema do deserto 523
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assume a função de um mecanismo repetido e necessário e uma fase do ciclo de vida nacional para executar julgamento e purificar a nação de sua deslealdade perversa para com Javé (-> Ezequiel: Teologia) v. Isaías 40—55. Nos oráculos de Isaías, a futura restauração dos exilados na Babilôn à terra prometida por Deus e por meio da ação humana de Ciro, o governante persa, constitui uma recapitulação das tradições da eleição: êxodo, passagem pelo deserto, conquista (Is 40.3-5, 9-11; 41.17-20; 43.14-21; 48.20-22; 49.8-13; 51.9-11; 52.11-12; 55.12-13). Ao mesmo tempo em que o uso dessa história pelos profetas do pré-exílio era moldado de acordo com os inte resses da mensagem de julgamento, para Deutero-Isaías tais interesses foram substituídos por um enfoque exclusivo no consolo, cuidado e orientação de Deus para com seu povo sofredor. A história não é usada para desenvolver os temas de castigo, julgamento, catarse ou provação (Is 40.1-2; contrastar com Oséias e Ezequiel 20). A descrição desse recomeço para a comunidade transcende de longe a história antiga que tal descrição recapitula. São excluídas todas as dificuldades encontradas na primeira tribulação e todos os milagres testemunhados nela devem se repetir numa escala muito maior. O deserto será completamente transfigurado e se tomará um paraíso para o cuidado e sustento dos exilados em seu retomo (Is 40.3-5; 41.18-19; 43.19-20). A passagem pelo deserto toma-se uma procissão triunfante e miraculosa. A história das origens nacionais de Israel passam a ser essencial para o significado da salvação ao mesmo tempo em que as circunstâncias contem porâneas e expectativas futuras fazem surgir transformações e intensificações dessa história. (-> Isaías: Teologia) b. A passagem pelo deserto no Livro de Salmos. Ao contrário das profecias, os salmos da história da salvação (SI 6 8 ; 78; 95; 105; 106; 107; 136) mostram maior concordância e co nhecimento dos detalhes da história conforme esta é narrada pelas tradições do Pentateuco. As referências à passagem pelo deserto tomam dois rumos. Documentam os feitos de Deus em termos de cuidado, socorro e proteção nas condições inóspitas do deserto, inclusive a paciência misericordiosa dele com os pecados do povo (SI 68.7 [8 ]; 78.15, 52; 105.37-43; 106; 136.16); ou então, registram como o povo não respondeu ao seu Senhor salvador em obe diência e fidelidade (SI 78.17-19, 40; 95.8-11). Esses temas podem ser mantidos separados (105; 136) ou combinados (78; 95; 106). Em ambas as formas, esses salmos fazem lembrar a retórica moral profética. O relato da história proporciona uma base para a exortação moral, confissão e arrependimento ou para a súplica e a esperança da repetição de tais atos salvíficos para as provações do presente. A função clara da história no contexto da adoração e louvor a Javé é característica do uso que o livro de Salmos faz das tradições do Pentateuco. O relato da história é uma forma de adoração e cria um contexto apropriado para a ativação de diversas funções retóricas dessa his tória mencionadas acima (cf. C. Westermann, Praise and Lament in the Psalms, 214-42). Esse recurso mostra a preocupação em Israel de se fundamentar a adoração e a vida nesse manancial histórico lembrado e continuamente evocado e, de fato, de viver como povo de Deus a partir dessa história (ver também H.-J. Kraus, Theology o f the Psalms, 59-67, 175-76). O Salmo 107 dá testemunho do quanto o povo de Israel estava disposto a ressaltar o caráter paradigmático desses acontecimentos salvíficos ao generalizar e universalizar o modelo de história do Pent. como sendo simplesmente o padrão costumeiro da operação de Javé na vida humana (cf. A. Weiser, Psalms, 686-87; A. A. Anderson, Psalms 73-150, 750-51). (-> Salmos: Teologia) c. A passagem pelo deserto no Pentateuco. Sem dúvida alguma, as abordagens à teologia da narrativa que se baseiam na história da salvação discerniram corretamente que a relevância fundamental da passagem pelo deserto encontra-se em seu carátar de tribulação para a terra 524
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da herança em cumprimento à promessa aos patriarcas. A estrutura geral do Pent. e as alusões repetidas às promessas feitas aos patriarcas corroboram amplamente essa interpretação teoló gica do texto (Clines, 53-57). No entanto, essa observação não apresenta uma resposta para a função retórica dentro da história dessa passagem pelo deserto. Por que o narrador representa a história da tribulação dessa maneira? Mais especificamente, qual é. afinal, a necessidade de uma tribulação pelo deserto? Essa pergunta pode parecer um tanto estranha. De que outra maneira teria sido possível viajar do Egito para Canaã senão atravessando o deserto? Mas é só aqui que o narrador revela suas intenções e indica que certas coisas nessa tribulação de transição vão muito além das aparências. Desde a partida de Israel do Egito, ele indica a existência de um caminho alternativo (o “caminho da terra dos filisteus”). Em Êxodo 13.17, o narrador mostra Deus excluindo esse caminho possível e mais fácil em favor de outro mais longo por ver que os israelitas ainda não estavam prontos para combater nas guerras de conquista. Esse comentário narrativo mostra uma dimensão mais intencional da passagem pelo deserto e deve ser considerado juntamente com outros comentários. Dentro da narrativa do êxo do em si, o propósito da libertação dos escravos é expressado em termos de uma peregrinação para o Sinai a fim de guardar um festival religioso para oferecer sacrifícios e adorar a Deus no deserto (Ex. 3.12, 18; 5.1, 3; 7.16; 8.27, 28 [23,24]; 12.31). Outros comentários referem-se a Deus provando os israelitas ou aos israelitas testando o Senhor com respeito às dificuldades da tribulação pelo deserto ou os sinais e maravilhas realizados por Javé (Ex. 15.25; 16.4; 17.2, 7; 20.20; Nm 14.22). Nesses contextos, o povo angustiado imagina que Deus (ou Moisés) tem a intenção de matá-los durante a passagem pelo deserto (Êx 14.11, 12; 16.3; 17.3; Nm 16.13; 20.4-5; 21.5). Por fim, depois que o povo se recusa a iniciar as guerras de conquista, a estadia no deserto é prolongada especificamente a fim de castigar a comunidade ao dar cabo de toda a geração do êxodo no deserto (Números 14). Essas características oferecem os indícios ne cessários para se descobrir qual é, para o narrador do Pent., a importância multifacetada, e até mesmo a necessidade, da tribulação pelo deserto. A tribulação pelo deserto é um mecanismo necessário para a constituição de Israel como povo de Javé. Duas imagens mostram-se predominantes — uma cultuai e outra conju gal. O êxodo possibilita uma peregrinação religiosa que chega ao ápice na revelação no Sinai. Israel não apenas encontra-se com Deus em seu santuário no deserto, como também toma-se uma comunidade cultuai dentro da qual o santuário de Deus deve permanecer (cf. os planos para o tabemáculo). Esse santuário deve fazer parte da tribulação para a terra da promessa. A outra metáfora importante é conjugal, conforme é sugerido em Êxodo 13.17 e proclamado abertamente no Cântico do Mar (Êxodo 15). Como Números 1— 10 deixa claro, no restante da tribulação pelo deserto ocorre a organização e formação de Israel como uma força invasora sob o comando do guerreiro divino, Javé (observar também a terminologia marcial empregada para a comunidade: $ãbã', exército, hoste [-> # 7372], repetidamente em Nm 1— 10 ou como hamusim, em formação de batalha [-> # 2821 ], em Êx 13.18). A tribulação pelo deserto é uma preparação e treinamento para a guerra. A formação de Israel também é uma provação. As dificuldades da tribulação são co locadas repetidamente no contexto de uma prova divina da fé e fidelidade dos israelitas. O interesse narrativo trata desse assunto no tema da murmuração no deserto. Nenhuma parte da tribulação é isenta desse tema e a história da passagem pelo deserto é entremeada de fracassos humanos repetidos. Assim, a tribulação toma-se um mecanismo para castigar a incredulidade e expurgar os perversos e a perversidade de Israel. A história descreve em detalhes uma busca em resposta à pergunta de Javé “Até quando me provocará este povo e até quando não crerá em mim, a despeito de todos os sinais que fiz no meio dele?” (Nm 14.11). 525
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A passagem pelo deserto também pode ser caracterizada como uma prova do caráter de Javé, como é mostrado na revelação inicial de seu nome e em explicações subseqüentes (Êx 3.13-15; 6.2-7; 33.18-23; 34.6-7; Nm 14.17-19). Nessa provação de Deus, são pesadas a integridade de seu caráter revelado e a capacidade de ele cumprir seus propósitos. Isso é re presentado claramente no conhecimento dos personagens humanos, oscilando entre interpre tações sinistras das motivações divinas (Êx 16.3, etc.) e o reconhecimento de que o fracasso desse empreendimento ameaçaria a honra divina (Êx 32.11-13; Nm 14.13-16). A ousadia do narrador pode ser vista no retrato que faz dessa provação divina também como uma luta inte rior na pessoa do próprio Javé, o que se expressa mais claramente em crises importantes como a apostasia comunitária, o episódio do bezerro de ouro (Êx 32— 34) e a recusa em lutar pela conquista da terra (Nm 13— 14). A ameaça que a presença de Javé representa no meio da co munidade rebelde (Êx 33.3, 5) é evitada, por pouco, pelo trabalho intercessor de Moisés que toma por base os atributos do caráter divino. O próprio Javé deve resistir à tentação de uma explosão de fúria beirando o niilismo, que teria representado o fim tanto para Israel como para a honra divina e o fracasso da graça e da fidelidade declaradas por Deus. Assim, a passagem pelo deserto toma-se um testemunho da realidade do caráter e do poder de Javé. Ele sai triun fante dessa provação e mostra-se capaz de superar toda e qualquer possível ameaça ao intento de conquistar um povo com o qual possa habitar por amor ao seu nome e à promessa feita aos patriarcas, mesmo quando — por ironia — essa ameaça vem do próprio caráter de Deus. (-> Êxodo: Teologia; -> Números: Teologia) O objetivo moral e religioso desse material fica claro pela organização editorial que colo ca os discursos de despedida de Moisés (ou seja, o livro de Deuteronômio) depois da conclusão de Números. A passagem pelo deserto é considerada um período paradigmático de disciplina (Dt 11.2; müsaryhwh, a disciplina [-> # 4592] de Javé), uma provação e teste com o objetivo de educar Israel nos caminhos da obediência à revelação no Sinai (Dt 8.2-5, 15-16), que continua a representar uma obrigação e ameaça para Israel tendo em vista a fidelidade divina. 3. O simbolismo teológico do tema do deserto: O tema do deserto-desolação. Em Jer mias 4.23 o profeta declara: “Olhei para a terra, e ei-la sem forma e vazia" (tõhú wãbõhü, cf. Gn 1.2). Os profetas clássicos proclamam a ruína de Israel. Uma das maneiras que os profetas usam para descrever a natureza do julgamento nacional é introduzir em seus discursos aquilo que pode ser chamado de “tema do deserto-desolação”. O julgamento divino iminente transformará Israel num deserto (Jr 4.26; cf. 22.6). Essa retórica concentra-se em Jeremias e Ezequiel. a. O retorno ao caos. E importante observar-se que o tema do deserto-desolação articulado no contexto de uma determinada visão política e moral atuante no pensamento profético. Em primeiro lugar, a história das nações — sua ascensão e queda, seus interesses nacionais e culturais, seus conflitos em busca de império e poder — é interpretada pelos pro fetas (de modo geral) como manifestação da intervenção de Javé na humanidade e em sua guerra contra ela, uma vez que esta se opõe à vontade e ao domínio de Deus. Em segundo lugar, essa intervenção e essa guerra pressupõem uma determinada ordem moral e religiosa apropriada para a vida e a sociedade, articuladas de diversas maneiras ao longo de toda a literatura profética. A transgressão dessa ordem expõe qualquer sociedade à destruição di vina prevista, por vezes, como uma forma de teofania capaz de abalar o mundo todo (cf. Jr 25.30-38) ou como a obra imanente do guerreiro divino nos processos políticos, conduzindo as nações à ruína (cf. Jr 25.8-29). É dentro dessa estrutura conceituai que o tema do deserto-desolação encontra seu valor. Este pode ser discernido, em um primeiro nível, pelo simbolismo geral das condições e asso ciações referentes ao deserto (registradas com freqüência, ver Talmon, “Wildemess,” 946), e 526
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num segundo nível, na tendência de se incorporar temas mitológicos na poesia e imagística de guerra (R. Alter, TheArl o f Biblical Poetry, 146-57). Em primeiro lugar, o deserto representa tudo aquilo que é hostil à vida normal na terra. Destituído de vida humana e impróprio para a habitação (Nm 20.5; SI 107.4-5; Jr 2.6), o deserto é onde se escondem animais selvagens, ho mens violentos (Dt 8.15) e demônios (ls 13.21; 34.14). O deserto não apenas é um ambiente ameaçador, mas também é o lugar de onde vêm as ameaças que invadem a vida já assentada da comunidade (Jr 4.11; 5.6; 12.12; 13.24). Em resumo, o deserto é hostil à sociedade e en contra-se associado aos poderes da morte (existem, porém, raras exceções a esse simbolismo; ver Cântico dos cânticos, 8.5; Jr 9.2 [1]). A última questão remete diretamente à segunda tendência, que é a de desenvolver o tema do deserto-desolação com relação a temas mitopoéticos. Tem-se em vista, aqui, especialmente a associação do deserto-desolação com o mundo dos mortos ou a sepultura, a tempestade e o mar ou as águas (Jr 4.11 -13; 5.16; 9.21 [20]; 23.19; Ez 19.12-13; 26.3, 19-20; 27.26-27, 34; 28.8; 29.5; 31.1-18; 32.14-15, 18). Nesse conjunto de imagens, o deserto encontra-se entre os poderes do caos. Originadas nas mitologias de culturas cognatas (não israelitas), essas ima gens são reutilizadas pelos profetas (ver ainda J. Day, G ods Conflict with the Dragon and the Sea, 1985) para entremostrar a guerra de Javé com Israel e as nações em termos provenientes de mitos antigos da criação (e/ou de fertilidade) (Is 27.1; ver também B. W. Anderson [Ed], Creation in the Old Testament, 1984; -> liwyãtãn, Leviatã, # 4293; tannin, criaturas marinhas, # 9490). O impressionante é que Javé, Criador de Israel, não apenas combate o caos (como se ria de se esperar pelas narrativas e imagens míticas), ou seja, as nações em sua rebelião contra o domínio divino (Is 24.10; Jr 46.7-8; 50.2-3, 38-40; 51.13, 15-16, 36, 53; cf. Is 14.4-21; Ez 28.1-20), mas também, Javé toma-se o poder do caos ou o emprega o contra Israel (Jr 4.11-13; 5.20-24; 6.22-26; cf.25.31-38; Ez 26.19-20). Na retórica de julgamento dos profetas, o tema do deserto-desolação anuncia, de modo assustador, que Javé está enviando sua criação de volta ao caos (como Jr 4.23 deixa claro). Não se trata da criação num sentido abstrato, mas da criação do ponto de vista da vida de Israel na terra. b. Deserto transformado em jardim. Uma discussão sobre o tema do deserto-desola nos profetas não pode ser considerada completa sem que se faça menção ao modo como esse tema é tratado nos oráculos de restauração. Na lógica da restauração, a imagem-chave é inversa às condições do julgamento. Assim, ao invés do deserto-desolação — a condição atual da ter ra, das cidades e do povo — ocorre uma volta à fertilidade agrícola, social e política (p. ex., ls 32.15-16; Jr 31.5-6, 10-14; 32.43; 33.10; Ez 34.25-31). Ou, em termos de alegoria, “sua alma será como um jardim regado” (Jr 31.12). Um desenvolvimento extraordinário dessa imagem de volta ao jardim ilustrando a tendência constante do tema do deserto-desolação transformar-se em mitopoese ocorre em Ezequiel e em Isaías. Nesses casos, a imagem da reversão dá espaço à lógica da transfiguração. Em vez de um simples retomo, a terra será transformada num ver dadeiro jardim do Éden (Is 51.3; Ez 36.34; comparar o rio em Ez 47.1-12 com o rio no Éden, Gn 2). (-> gan ‘êden, jardim do Éden, # 6359) 4. Conclusão. Em termos teológicos, o tema do deserto no AT demonstra flexib dade simbólica e aplicabilidade a todo tipo de situação histórica nova e acontecimentos nas circunstâncias do povo de Deus que, aparentemente, não têm nenhuma semelhança imediata ou clara com seus referentes originais. Assim sendo, pode-se considerar o tema do deserto como um símbolo arquetípico que permitiu a Israel interpretar e delinear sua identidade por meio das ambigüidades de sua existência histórica. Essas transformações simbólicas prepa raram o caminho para aplicações escatológicas e apocalípticas posteriores do tema no judaís mo do Segundo Templo e no cristianismo primitivo (ver mais detalhes em Ar/DAT7'3:1004; 527
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TDNT 2:657-60). O tema da tribulação pelo deserto, juntamente com o tema da conquista é utilizado nas seções centrais dos Sinópticos, especialmente por Lucas e Marcos (de acordo com W. M. Swartley, 94-153). Deserto, ermo, terra assolada: -> bõhú (devastação, # 983); bqq I (assolar, ser agitado, # 1327); horbà (ruína, devastação, # 2999); y^Símôn (ermo, devastação, # 3810); -> midbãr I (ermo, # 4497); -> arãbâ III (estepe, # 6858); -> ?ehihâ (terra ressecada, # 7461); -> fiyyâ (deserto, # 7480); -> í 7» I (destruir, desolar, # 8615); -> smm (ficar desolado, deserto [adj.], assolar, estremecer, ficar horrorizado, # 9037); -> Deserto: Teologia. B ib l io g r a f ia
ABD 6:912-14; TWAT 4:660-95, 991-94; C. Barth, “Zur Bedeutung der Wüstentradition”, SVT 15, 1966, 14-23; W. Brueggemann, The Land, 1977; D. J. A. Clines, The Theme o f the Pentateuch, 1978; G. W. Coats, Rebellion in the Wilderness, 1968; idem, “The Wildemess Itinerary”, CBQ 34, 1972, 135-52; R. L. Cohn, The Shape o f Sacred Space, 1981; G. I. Davies, The Way o f the Wilderness, 1979; idem, “The Wildemess Itineraries and Recent Archaelogical Research” S V T 41, 1990, 161-75; M. V. Fox, “Jeremiah 2:2 and the ‘Desert Ideal’”, CBQ 35, 1973,441-50; A. Haldar, The Notion o f the Desert in Sumero-Accadian and West Semitic Religions, 1950; E. Leach, “Fishing for Men on the Edge o f the Wildemess”, The Literary Guide to the Bible, 1987, 579-99; R. W. L. Moberly, At the Mountain o f God: Stoty and The ology in Exodus 32-34, 1983; W. M. Swartley, Israel 's Scripture Traditions and the Synoptic Gospels: Story Shaping Story, 1994; A. Schwarzenbach. Die geographische Terminotogie im Hebr. Des AT, 1954; J. Simons, The Geographical and Topographical Texts o f the Old Testa ment, 1959; S. Talmon, “The ‘Desert M otif in the Bible and in Qumran Literature”, in Biblical Motifs, 1966, 31-63; idem, s.v. “Wildemess”, in IDBSup, 946-49; idem, “The ‘Comparative Method’ in Biblical Interpretation— Principies and Problems”, S V T 29, 1978, 329-32; G. von Rad, OTT, 1:280-89; J. A. Wilcoxen, “Some Anthropocentric Aspects o f Israel’s Sacred His tory”, JR 48, 1968,333-50. A. R. Pete Diamond Deserto Desespero
# 9014 (sammâ I, devastação, deserto) # 3286 (y ’.v, desesperar, desanimar)
Desfiguração -> # 5425 (mishãt, desfigurado) Desgraça
# 1425 (bõset, vergonha, ignomínia, desgraça)
Desimportância
# 2103 (hwn, considerar fácil, arriscar)
Deslize -> # 8706 (sgh, desencaminhar-se, errar, ser injusto, sair errado, corromper) Desmaio -> # 6494 ( ‘tp II, ficar fraco, desmaiar, estar sem forças) Desolação -> # 9037 (smm, ficar desolado, deserto, ficar horrorizado) Despedaçamento 528
# 8689 (sbr I, quebrar, despedaçar)
Deuteronômio: Teologia do
Despejo -> # 2911 (hp$ I, querer, desejar, almejar, cuidar) Despertar
# 3699 (yq$, despertar)
Despir -> # 7320 (pst, tirar [roupas], atacar; despir) Desprezo
# 1022 (fe/f, ser desprezível)
Desvio -> # 6073 (svvr, desviar) Determinação -> # 3585 (y W, determinar, designar, reunir) Deus -> # 446a ( e/ V, Deus, deus)
A teologia do Deuteronômio depende de quatro fatos fundamentais. 1. Deuteronômio é uma série de discursos proféticos. Como tal, estabelece padrões para profecias e revelações que são seguidos até o final do NT (Dt 4.2; 12.32; cf. Ap 22.18-19). 2. Deuteronômio assemelha-se a tratados ou alian ças internacionais do OMA entre suseranos e vassalos. Em decorrência disso, o livro revela conceitos teológicos que aparecem em tratados da antigüidade. 3. O livro também faz parte de um código legal e, como tal, reflete a teodicidade e os conceitos jurídicos encontrados também em outros códigos do OMA. No entanto, como documento profético, Deuteronômio apresenta a antiga aliança e os conceitos legais dentro dos moldes monoteístas. Em outras palavras, ape sar de empregar formas e idéias legais da antigüidade, em última análise o conteúdo de Deu teronômio não é derivativo, mas sim revelador. Mostra os verdadeiros padrões de Deus que os tratados e leis do OMA apenas refletem vagamente. 4. O estilo próprio do livro ajuda a articu lar sua teologia e consiste na utilização e reutilização de um conjunto determinado de orações. A repetição cria certas ênfases teológicas chamadas de deuteronômicas. Essas orações são re petidas entâo em Jeremias e nos livros históricos e conferem a esses livros também um caráter deut. (-> Teologia Deuteronômica/Deuteronomista) 1. Discursos proféticos. Deuteronômio representa um registro dos três últimos discur de Moisés aos israelitas antes de entrarem na terra prometida. Esses três discursos encontram-se em Deuteronômio 1.4— 4.40; 5.1—28.68 e 29.1—30.20 (ver J. A. Thompson, Deuteronomy, 15-16). Contêm material variado, inclusive uma recapitulação histórica (caps. 1— 4), exorta ção (caps. 6 — 11; 29— 30) e leis (caps 5; 12—26). São, acima de tudo, as últimas palavras do maior profeta de Javé no AT (Dt 34.10-12). Assim, o livro exalta a profecia no seu nível mais elevado antes de Cristo. Também determina a definição israelita de um verdadeiro profeta e sua função, definição esta que deveria ajudar Israel a avaliar profetas posteriores (Dt 13.1-5; 18.9-22). Conseqüentemente, a idéia de que Javé havia se revelado a Israel por intermédio de um profeta e continua a revelar-se a Javé por meio dos profetas é o alicerce — aliás, sine qua non — da teologia deuteronômica. Um conceito teológico relacionado a isso é aquele do profeta como ministro da aliança de Deus. Havia dois tipos de ministério profético: o profeta como mediador da aliança (somente Moisés) e o profeta como mensageiro do pleito judicial da aliança (os profetas subseqüentes). Deus chamou o profeta Moisés para mediar a aliança de Deus com Israel e chamaria outros profetas para apresentar os pleitos da aliança — para chamar o povo de volta à obediência Deuteronômio: Teologia do
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Deuteronômio: Teologia do
ou anunciar os castigos da aliança incididos por sua desobediência. Como observou Noth, o conceito de castigos da aliança orienta a avaliação teológica da história subseqüente de Israel e lhe confere um tom deuteronômico. 2. A form a pactuai. A aliança é uma idéia central em Deuteronômio. O termo heb. pa tratado, aliança (berit) é usado 26x em Deuteronômio para referir-se a aliança de Javé com Israel (a aliança mosaica) — mais vezes do que em qualquer outro livro do AT (comparar 16x em Josué e 12x em Jeremias). Na realidade, Deuteronômio é uma renovação da aliança ou uma segunda aliança que ocorre nas campinas de Moabe (cf. Dt 29— 30). O procedimento de revisão e suplemento das leis associado a esse acontecimento explica algumas das diferenças observadas entre as leis de Deuteronômio e as de Êxodo (ver abaixo). Além disso, o livro em si possui uma estrutura característica de aliança. A semelhança de Deuteronômio com tratados/alianças hititas entre suserano e vassalos do segundo milênio a. C. foi identificada pela primeira vez por George Mendenhall (49-76). M. G. Kline e K. A. Kitchen (1973, 1978) combinaram os resultados do estudo de Mendenhall com Deuteronômio como parte de uma argumentação em favor de uma data mais antiga (mosaica) para o livro. Deuteronômio segue um padrão literário/legal que é facilmente identificável em tratados inter nacionais do segundo milênio (apesar de essa distinção ter sido contestada, cf. McCarthy). O contraste apresentado por Kitchen (1978, 79-85) e estabelecido também por ele de modo deta lhado (Kitche, 1995,48-49, 88-95) é reproduzido no quadro abaixo (são observadas as partes de Deuteronômio que correspondem a tratados hititas): Segundo milênio
Deuteronômio
Primeiro milênio
Título / Preâmbulo
1.1-5
Título/Preâmbulo
Prólogo histórico
1.6— 3.29
Estipulações
4—26
Depósito do texto
31.9, 24-26
Leitura pública
31.10-13
Testemunhas
31.16-30; 32.1-47
Bênçãos
28.1-14
Maldições
28.15-68
Estipulações
Testemunhas Maldições
A relação de aliança entre Javé e Israel traz consigo vários conceitos teológicos impor tantes. Um deles é de que Javé é o “Suserano”, ou de Israel ou de seu “Grande Rei” (Kline): Suserano e Deus (Dt 33.1-5). Como tal, ele espera “amor” dentro da aliança, o que eqüivale a obediência (cf. Jo 14.21,23-24; 15.9-10; W. Moran, 77-87). De sua parte, Deus conferirá fiel mente as bênçãos da aliança (Dt 28.1-14) e também as maldições (Dt 28.15-18) à medida que o povo for obediente ou desobediente. O pleito judicial observado acima é um resultado inevitável da aliança. Ao longo de toda a história de Israel, Deus chama seu povo repetidamente à obediência quando o povo rompe a aliança. Deus faz o chamamento a fim de evitar ou, quando isso não é possível, a fim de anunciar a ocorrência das maldições da aliança. Deuteronômio 32 (um poema profé tico que Moisés entoa como testemunho contra a apostasia futura de Israel) é o documento fundamental do pleito judicial da aliança e reflete claramente os elementos essenciais dos modelos de aliança: 530
Deuteronômio: Teologia do
Aliança
Aliança
Pleito judicial
Testemunhas
Convocação das testemunhas
32.1-2
Título
Atributos de Deus
32.3-4
Prólogo histórico
Retrospectiva histórica
32.5-14
Estipulações
Acusação
32.15-18
Maldições
Julgamento
32.19-29
Bênçãos
Garantia da salvação
32.30-38
Juramento
Juramento
32.39-42
Oráculos subseqüentes contra Israel participam, em maior ou menor grau, desse modelo básico e encontram-se radicados nele (cf. G. Emest Wright, 26-67; HufTmin. 285-95). Dois dos principais temas teológicos de Deuteronômio surgem da discussão acima acerca da estrutura, a. Javé é um Deus que se revela aos profetas e, por intermédio deles, ao povo, Israel, b. Javé entra em aliança com Israel, arcando com todas as implicações desse acor do, inclusive as leis para a sociedade teocrática e as bênçãos e maldições que acompanham a obediência ou desobediência. Na conjunção desses dois conceitos, duas outras idéias ficam claras: c. Moisés é o mediador da aliança, aquele que a recebe de Javé e a medeia para o povo; d. São esperadas mais revelações de Javé para os profetas subseqüentes e por meio deles, que se levantarão para levar adiante o trabalho de orientação divina para a comunidade depois que Moisés tiver falecido. Além desse agrupamento de temas principais, a fraseologia de Deutero nômio indica outras idéias teológicas relevantes. 3. Leis. Além de seu aspecto pactuai, Deuteronômio também contém leis. Caso se c sidere a estrutura pactuai do livro, a porção legal corresponde às estipulações de um tratado da antigüidade (ver acima). Contudo, é igualmente justo caracterizar o livro como sendo, pelo menos em parte, um código legal. Como tal, reflete a teodicidade e os conceitos judiciais tam bém encontrados em outros códigos do OMA. O mais conhecido é o Codex Hammurapi ou Código de Hamurábi, rei da Babilônia c. 1792-1750 a. C. Uma gravura acima das leis mostra Hamurábi recebendo-as de Samas, o deussol mesopotâmio e supervisor das leis e alianças (comparar com Moisés recebendo as leis de Javé, supervisor da lei e da aliança com Israel). O Código de Hamurábi contém 282 seções que tratam de uma ampla gama de assuntos, desde roubo e assalto até casamento e adoção, taxas e salários, bem como escravidão. Alguns dos casos e decisões assemelham-se a códigos legais anteriores (Ur-Namu, Lipite-lstar, Esnuna; cf. ANET, 159-80). Alguns são parecidos com leis deut., p. ex., as leis com referência ao falso testemunho (CH 1, 3-4; cf. Dt 19.16-20), rapto (CH 14; cf. Dt 24.7), roubo (CH 23-24), escravidão (CH 117; cf. Dt 15.12-18), adultério (CH 129; cf. Dt 22.22) e estupro (CH 130; cf. Dt 22.23-27). As leis de ambos os códigos tratam de uma gama parecida de questões, simplesmente porque ambos são códigos legais, ou seja, têm por objetivo regulamentar o comportamento humano em sociedade. Também compartilham a idéia comum no OMA, de que os deuses davam as leis, sabedoria e autoridade para escolher líderes para o governo do povo (cf. Niehaus, 1995, caps. 3-4). De modo geral, as leis deut. são mais humanitárias do que as do Código de Hamurábi e do que outras leis do OMA — uma ca racterísticas certamente resultante da origem divina das leis deuteronômicas (ver ainda G. R. Driver e J. C. Miles, 1935; R C. Craigie, 408). A revisão das leis decorrente do aspecto de renovação da aliança do livro leva a algu mas diferenças entre a legislação de Êxodo e a de Deuteronômio. Uma revisão não implica 531
Deuteronômio: Teologia do
necessariamente, por exemplo, uma repetição de todos os detalhes da legislação anterior. Além disso, como observa Craigie (238-39; cf. 41-42), em sua revisão final Moisés se esforça para evidenciar as implicações do amor pactuai. Assim, na lei paralela a Êxodo e freqüentemente citada sobre a alforria de escravos (Êx 21.2-11 || Dt 15.12-18) a parte casuística mais antiga (Êx 21.3-4, 7-11) é considerada um pressuposto em Deuteronômio e suplementada por instruções de caráter mais humanitário (Dt 15.13-15). O escravo liberto não deve ser mandado embora “de mãos vazias”, mas generosamente suprido de cereais e vinhos. Israel deve lembrar-se de que, quando era escravo no Egito, Deus o libertou — “pelo que, hoje, isto te ordeno” (Dt 15.15). Para uma discussão das leis que fazem uso da ética social, cf. C. J. H. Wright (1990). 4. Fraseologia e teologia deuteronômica. Há muito tempo se reconhece que Deuter nômio emprega um estilo único, caracterizado por um conjunto distinto de orações repetidas ao longo do livro. Sua repetição coloca em primeiro plano vários temas que compreendem questões teológicas importantes do livro. Algumas dessas orações voltam a aparecer em partes de Jere mias e nos livros históricos (Josué — 2 Reis) e dão uma forma deut. também a esses livros. W. M. L. de Wette foi o primeiro a isolar algumas das orações deut. e explorar suas implicações estilísticas (Dissertatio Critica). Produziu uma relação de “orações, palavras [e] expressões retóricas prediletas” (Lehrbuch, 2 0 1 -2 ) que considerava evidência de uma teologia distinta e de uma data mais recente (século VII a. C.) para Deuteronômio. Entre essas evidên cias encontrava-se a declaração de Deuteronômio 12.5: “Buscareis o lugar que o Senhor, vosso Deus, escolher de todas as vossas tribos, para ali pôr o seu nome e sua habitação”, entendida como uma referência velada ao templo de Jerusalém. Fazia parte dos objetivos deut. de refor ma centralizar o culto em Jerusalém e assim, confirmar o controle do sacerdócio de Jerusalém e intensificar o combate à idolatria. Essa idéia tomou-se a interpretação padrão entre diversos estudiosos, apesar de ir contra a maneira como essa passagem era compreendida de longa data, a saber; que “o lugar que Senhor, vosso Deus, escolher de todas as vossas tribos, para ali pôr o seu nome e sua habitação” significa simplesmente —■ “o lugar que o Senhor lhes ordenasse co locar o tabemáculo” — quer fosse Siló (Jr 7.12) ou, posteriormente, Jerusalém (cf. Thompson, 35-42; Craigie, 217). A identificação do “lugar” de Deuteronômio 12.5 com Jerusalém depende da existência de uma fraseologia semelhante no livro de 2 Reis (p. ex., 2Rs 21.7). Porém, hoje em dia fica claro que uma fraseologia comum era empregada no OMA para diferentes locais, à medida que as circunstâncias se alterava, de modo que o “lugar” em Deuteronômio 12.5 também pode se referir simplesmente a qualquer lugar onde o Senhor escolhesse colocar seu “Nome”. Para uma discussão detalhada da questão da história do santuário central e da respectiva frase ologia, com evidências importantes do OMA, ver Niehaus (1992, 3-30). A data do século VII também foi proposta em função da semelhança estilística com os sermões em prosa de Jeremias (e diferença de Gênesis — Números) e acredita-se que o “Livro da Lei” descoberto por Hilquias durante a reforma do templo no governo do rei Josias (621 a. C.; 2 Reis 22) era o livro de Deuteronômio. Partindo-se desse ponto de vista, Deuteronômio vinha depois de J e E e era um documento mais avançado em termos teológicos. Muitos estudiosos têm seguido a abordagem de Wette desde seu trabalho memorável. Na virada do século, S. R. Driver havia produzido uma listagem bem mais longa e completa de palavras e orações deut. (1978, lxxxvi-lxxxviii). Para ele, as diferenças de estilo entre Deuteronômio e outros livros do Pent. indicavam uma diferença de autor (Ixxvii-lxxviii), e as semelhanças de estilo entre Deu teronômio e Jeremias indicavam uma data mais recente (xcii-xciv). Seguindo a mesma concepção, Moshe Weinfeld produziu uma listagem ainda mais com pleta de orações. Além disso, agrupou a fraseologia deut. em tomo de nove questões teológi cas mais importantes: a. a luta contra a idolatria; b. a centralização do culto; c. êxodo, aliança 532
Deuteronômio: Teologia do
e eleição; d. o credo monoteísta; e. a observação da lei e a lealdade à aliança; f. a herança da terra; g. retribuição e motivação material; h. cumprimento da profecia e i. eleição da dinastia davidica (1:320-65). De acordo com Weinfeld, Deuteronômio apresenta uma teologia original que contém um monoteísmo mais elevado e um humanitarismo mais avançado do que os ou tros livros do Pentateuco. Ele identifica três ramificações da literatura deut.: o livro de Deu teronômio, a estrutura editorial de Josué-Reis (= o suposto deuteronomista) e os sermões em prosa no livro de Jeremias (Weinfeld, 4). Construindo sobre a base da hipótese de Martin Noth, Weinfeld acredita que o deuteronomista era um escritor/editor do tempo do exílio que adotava a teologia deuteronômica e que redigiu os livros históricos de um ponto de vista deuteronômico. Por causa de sua obra, o fim trágico de Israel podia ser compreendido em termos teológicos como um resultado das maldições da aliança apresentadas em Deuteronômio: em fidelidade à sua aliança, era obrigação de Javé executar essas maldições quando Israel entregou-se à idola tria (cf. 2Rs 17.7-20). Apesar de Javé ter enviado seus servos, os profetas, para chamar Israel e Judá de volta à obediência à aliança, os dois reinos continuaram merecendo ser castigados (2Rs 22.15-20; 24.1-4, 18.20). (-> Teologia Deuteronômica/Deuteronomista) A história de Israel, conforme seu registro nos livros históricos do AT, certamente apre senta uma forma deuteronômica. Em termos teológicos, é considerada como a relação entre a obediência (ou desobediência) de Israel à aliança, e as conseqüentes bênçãos (ou maldições) conferidas por Javé e essa relação costuma ser expressa numa fraseologia que nos remete de volta a Deuteronômio. Ao que parece, isso pode ser atribuído ao fato de Deuteronômio ser o “Livro da Lei”, descoberto pelo sacerdote Hilquias e apresentado ao rei Josias durante a reforma do templo (2Rs 22.8-10). A exposição que Deuteronômio faz da relação de aliança entre Javé e Israel e suas leis rigorosas e polêmicas contra a idolatria não apenas entristeceu Josias como também o levou a renovar a aliança (2Rs 23.1-3) e purificar o templo e a terra ao remover os ídolos (2Rs 23.4-27). Serviram, ainda, de motivo teológico e de meio fraseológico pelo qual Jeremias pôde profetizar e os historiadores israelitas interpretar a história e o fim de Israel. Compreendido desse ponto de vista, o livro de Deuteronômio serviu de base teológica tanto para a constituição quanto para a dissolução de Israel. A fraseologia de Deuteronômio é original e marca o início de uma tradição literária em Israel. Há pelo menos dois motivos pelos quais isso ocorre. Deuteronômio não é simples mente uma aliança, apesar de ser moldado na forma de uma aliança. Ao que parece, o formato de aliança foi utilizado para mostrar a Israel que Javé era seu Suserano legal e que Israel se encontrava sob obrigações legais para com Javé. Em decorrência disso, várias das orações ca racterísticas do livro têm origem nessa natureza pactuai do texto. No entanto, Deuteronômio também é uma série de discursos finais de Moisés. A fraseologia repetida que tantos observa ram em Deuteronômio pode ser atribuída à sua dimensão parenética, sendo que Moisés usou de repetição para enfatizar os pontos principais. Os alicerces pactuais da fraseologia do livro ficam evidentes desde o começo. Os tratados hititas entre suseranos e vassalos começavam com uma seção histórica, na qual o suserano recapitulava seus atos em favor do vassalo (ver acima). O propósito dessa seção era criar no vassalo um senso de obrigação de obedecer a aliança. Deuteronômio também começa dessa maneira, com uma seção histórica que contém orações repetidas posteriormente ao longo do livro. Algumas das orações trazem à memória a aliança de Javé com os patriarcas: “o Senhor, Deus de vossos pais” (1.11, 21; 4.1; 6.3; 12.1; 26.7; 27.3); “com juramento” (de Javé para os patriarcas, Dt 1.8, 35 [jurei]; 4.31 [jurou] e passim); “amou/teve afeição pelos pais/Israel” (Dt 4.37; 7.7, 8 , 13; 10.15; 23.6). Outras lembram os feitos magníficos de Deus contra o Egito: “sinais e maravilhas” (4.34; 6.22; 7.3, 19; 26.8; 29.2; 34.11); “com grandes espantos” (4.34; 533
Deuteronômio: Teologia do
26.8; 34.12); “com mão poderosa, e com braço estendido” (4.34; 5.15; 7.19; 11.2; 26.8); ou sobre os anos vagando pelo deserto: “grande e terrível deserto” (1.19; 2.7; 8.15); “que tu não conhecias” (com referência ao maná, 8.3, 16; e depois disso, sobre deuses estrangeiros, 11.28; 13.3; 28.64; 32.17; ou pessoas, 28.33, 36). Javé se revelou a Israel e deu-lhe suas leis: “os estatutos e os juízos” (4.1, 5, 8 , 14; 5.1; 11.32; 12.1; 26.16); “que te ordeno hoje” (4.40; 6 .6 ; 7.11 e passim), de modo que Israel devia ter o cuidado de obedecer esses mandamentos (“Guardai-os, pois, e cumpri-os,” 4.6; 7.12; 16.12, etc.) e de dar ouvidos ao que Deus havia dito (“atenderes a voz [de Deus],” 4.30; 8.20; 9.23 e passim). Devia, especialmente, evitar a idolatria (“seguir outros deuses,” 6.14; 7.4; 11.16, 28 e passim) e seguir a Javé, assumindo com ele um compromisso total (“de todo o teu coração e de toda a tua alma,” 4.29; 6.5; 10.12 e passim). Javé não apenas livrou Israel do Egito (“resgatou,” 7.8; 9.26; “da casa da servidão,” ou seja, do Egito, 13.5; 15.15; etc.), mas também a escolheu (4.37; 7.6, 7; 10.15, etc.) e lhe deu a terra prometida (“boa terra,” 1.35; 3.25; 4.21-22; etc; “que o Senhor, vosso Deus, lhes dá,” 1.20, 25; 2.29; 3.20 e passim). A fim de manter seu povo puro, Deus ordena que os israelitas desapossem (4.38; 9.4-5; 11.23, etc.) e exterminem impiedosamente os cananeus idólatras ("os teus olhos não terão piedade deles,” 7.16; 13.9 [8 ], etc.). Porém Javé ordenou que o povo fosse misericordioso para com os pobres e fracos em Israel, p. ex., “ao órfiío e à viúva... os estrangeiros” (10.18; 24.17, 19, 20, 21; 27.19, etc.), e também para com os escravos, lembrando-lhe que os próprios israelitas haviam sido “servos na terra do Egito” (5.15; 15.15; 16.12, etc.). O propósito redentor de Deus é preeminente. Ele escolheu Israel para ser “[seu] povo e [sua] herança / povo próprio” (4.20; 7.6; 9.26, 29; 14.2; 26.18; 27.9). Deus deseja abençoálo (“para que o Senhor, teu Deus, te abençoe,” 14.29; 23.21 [20]; 24.19, etc.; cf. “para que se prolonguem os teus dias,” 4.40; 5.16,26 [29]; 6.3, 18, etc.), mas sabe que, para isso ser possí vel, Israel deve amar seu Deus (6.5; 7.9; 10.12 e passim) e apegar-se a ele (10.20; 11.22; 13.5, etc.) como um homem deve unir-se à sua esposa (cf. Gn 2.24). O comentário deut. sobre a história subseqüente de Israel mostra claramente como Is rael abandonou os preceitos da aliança, algo que a ênfase parenética procurou inculcar. Em última análise, o fracasso de Israel demonstrou a necessidade de que a lei fosse cumprida em favor do povo pela figura de Cristo (cf. G1 3.24). E o próprio livro de Deuteronômio continha material que prenunciava a natureza desse Cristo. 5. A teologia deuteronômica e o NT. Duas idéias deut. fundamentais aparecem com ênfases significativas no NT. Uma delas é a concepção de que Deus levantará outro profeta como Moisés — outro mediador da aliança — que, implicitamente, receberá outra aliança de Deus e a mediará ao povo, como Moisés o fez (Dt 18.15-19). A outra concepção é o relaciona mento de amor que deve ser mantido entre Deus e seu povo. A profecia mosaica de Deuteronômio 18.15 aponta, acima de tudo, para Cristo, “O Senhor, teu Deus, te suscitará um profeta do meio de ti, de teus irmãos, semelhante a mim”. O NT considera essa passagem messiânica, pois tal profecia cumpriu-se na pessoa de Jesus. De pois de curar um mendigo coxo na porta do templo, chamada de porta Formosa, Pedro explica para a multidão maravilhada que tal milagre foi realizado pela fé no nome de Jesus e identifica Jesus como o profeta prenunciado por Moisés (At 3.22-23). Uma vez que não houve profeta igual a Moisés no regime da antiga aliança, Jesus é, de fato, um novo Moisés. Moisés foi o mediador da aliança de Deus com Israel e todos os outros profetas do AT foram subservientes a essa aliança — isto é, foram mensageiros do pleito judicial da aliança (ver acima). Se, portan to, Jesus é o novo Moisés, segue-se que, para ser verdadeiramente igual a Moisés, Jesus deve 534
Deuteronômio: Teologia do
trazer consigo uma nova aliança. Assim, a profecia mosaica de um outro profeta como Moisés também implica uma nova aliança (cf. Jr 31.31). Também nessa aliança pode-se ver o etos pactuai de Deuteronômio. De acordo com Deuteronômio, a aliança mosaica foi uma revelação de Deus que não devia ser alterada pela corrupção humana: “Nada acrescentareis à palavra que vos mando” (Dr. 4.2). O Apocalipse, escrito por João, demonstra a mesma atitude com relação à santidade da revelação divina na nova aliança: “Eu, a todo aquele que ouve as palavras da profecia deste livro, testifico: Se al guém lhes fizer qualquer acréscimo, Deus lhe acrescentará os flagelos escritos neste livro; e, se alguém tirar qualquer coisa das palavras do livro desta profecia, Deus tirará a sua parte da árvore da vida, da cidade santa e das coisas que se acham escritas neste livro” (Ap 22.18-19). Na soma geral, porém, o amor de Deus em Deuteronômio obscurece todas as outras considerações. Não apenas entra em aliança com Israel por amor, como também promete ou tro profeta como Moisés (e, implicitamente, outra aliança), prevendo o dia em que a aliança mosaica fracassará. O amor de Deus em Deuteronômio apresenta dois aspectos: o amor da hu manidade por Deus e o amor de Deus pela humanidade. O mandamento deut. de amar a Deus aparece não só no maior dos mandamentos (Dt 6.5; cf. Mt 22.37), mas também nas últimas palavras de Jesus aos seus discípulos antes de sua paixão: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos” (Jo 14.15). Conforme observamos acima, essa relação entre amor e obediência possui uma origem antiga, uma vez que não aparece somente em Deuteronômio, mas também nos tratados do OMA. Porém, ainda maior e, em última análise, mais importante do que o amor de Israel por Deus é o amor de Deus por Israel: “mas porque o Senhor vos amava e, para guar dar o juramento que fizera a vossos pais, o Senhor vos tirou com mão poderosa e vos resgatou da casa da servidão, do poder de Faraó, rei do Egito” (Dt 7.8). Esse amor imutável de Deus resplandece com muito mais poder numa aliança nova e superior à primeira: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). B ib l io g r a f ia
P. C. Craigie, The Book o f Deuteronomy, 1976; W. M. L. de Wette, Dissertatio Critica Qua Deuteronomium a prioribus Pentateuchi libris diversum alius cuiusdam recentioris opus esse monstratur, 180; idem, Lehrbuch der historisch-kritischen Einleitung in die kananischen und apokryphischen Bücher des Altern Testaments, 1833; G. R. Driver e J. C. Miles, The Assvrian Laws, 1935; S. R. Driver, Deuteronomy, ICC, 1978; H. B. Huffmon. “The Covenant Lawsuit in the Prophets”, JBL 78, 1959, 285-95; K. A. Kitchen, Ancient Orient and Old Testament, 1973; idem, The Bible in Its World, 1978; idem, “The Patriarchal Age: Myth or History?”, BA Rev 2\ 122, 1995, 48-57, 88-95; M. G. Kline, Treaty ofthe Great King, 1963; D. J. McCarthy, Treaty and Covenant, AnBib 21 A, 1978; J. G. McConville, Grace in the End: A Study in Deuteronomic Theology, SOTBT, 1993; G. Mendenhall, “Covenant Forms in Israelite Tradition”, BA 17, 1954,49-76; W. Moran, “The Ancient Near Eastem Background of the Love o f God in Deuteronomy”, CBQ 25, 1963, 77-87; J. J. Niehaus, God at Sinai: Covenant and Theophany in the Bible and Ancient Near East, SOTBT, 1995; idem, “The Central Sanctuary: Where and When”, TynBul 42/\, 1992; M. Noth, Überlieferungsgeschichtliche Studien, 1943,19572 (Eng. tr., E. W. Nicholson, The Deuteronomistic History, JSOT 15,1981); J. A. Thompson, Deutero nomy, 1974; M. Weinfeld, Deuteronomy and the Deuteronomic School, 1972; C. J. H. Wright, Godis People in G ods Land, 1990; G. Emest Wright, “The Lawsuit of God: A Form-Critical Study of Deuteronomy 32”, in Israels Prophetic Heritage, 1962, 26-67. J. J, Niehaus 535
Dilúvio
Devastação
# 8720 (Sdd, devastar)
Dia -> # 3427 (yôm I. luz do dia, dia, dia escatológico, hoje) Diadema -> # 5694 (nêzer, diadema) Dificuldade
# 6662 Çãmãl, aflição, dificuldade, labuta, esforço)
Diligência -> # 3026 (hãrii$, laborioso, diligente) Dilúvio
# 4429 (mabbül, oceano celeste, dilúvio)
Dilúvio
Dilúvio (Vl30 [mabbül], # 4429).
A palavra mabbül indica a fase destrutiva do dilúvio, os quarenta dias em que choveu e as fontes subterrâneas se romperam. Para o restante do tempo em que a terra ficou submer sa, Gênesis usa a expressão “as águas”, p. ex., 7.24. No entanto, neste artigo não voltaremos a atenção somente para a fase destrutiva da inundação, mas também para a relevância teológica desse episódio como um todo, conforme descrito em Gênesis 6 — 9.
1. Contexto do OMA. Histórias de inundações universais são conhecidas pelo mundo todo (B. Lang, Anthropos 80, 1985, 605-16), mas como seria de se esperar, os par. mais pró ximos ao relato bíblico do dilúvio são os que se encontram na História suméria do Dilúvio, no Épico de Atraasis e no Épico de Gilgamés, tábua 11 (para traduções modernas, ver S. Daley, Myths from Mesopotamia, 1989). Esses textos em suas principais versões são de c. 1600 a. C. e todos eles descrevem uma inundação que destruiu a vida na terra. Em linhas gerais, a versão bíblica é suficientemente semelhante às versões mesopotâmias para mostrar que foi escrita por alguém que conhecia a essência destas últimas e as estava comentando. Tanto Gênesis quanto Gilgamés, por exemplo, falam de uma decisão divina de destruir a humanidade, uma adver tência dada ao herói do dilúvio, a construção de uma arca, o dilúvio em si, o encalhe numa montanha, o envio de pássaros e a oferta de sacrifícios. Porém, as diferenças teológicas entre as histórias são mais significativas do que as semelhanças de sua trama. 2. Teologia. A teologia da história do dilúvio em Gênesis pode ser discernida de três ma neiras. Em primeiro lugar, uma comparação entre Gênesis e os par. mesopotâmios mostra uma visão muito diferente de Deus e sua relação com o mundo. Em segundo lugar, dentro do livro de Gênesis, o dilúvio marca uma grande interrupção na história mundial — o mundo antigo é destruído e uma nova terra restaurada é novamente criada. Em terceiro lugar, Noé é retratado tanto como o segundo Adão quanto como um israelita justo arquetípico. a. A rejeição de Gênesis à mitologia mesopotâmia. Ao longo de Gênesis 1— 11, podeobservar uma polêmica contra as idéias do antigo Oriente sobre deuses e religião. Gênesis 11 escarnece das pretensões religiosas da cidade da Babilônia. Gênesis 1 mostra que a humani dade é o auge da criação de Deus e não uma idéia que ocorreu só mais tarde ao Criador (como dá a entender o Épico de Atraasis). Esses contrastes entre as atitudes bíblicas e aquelas do OMA são mais gritantes nos re latos do dilúvio. Em Gênesis há somente um Deus que planeja e executa o dilúvio e livra Noé. No Épico de Gilgamés, a decisão de inundar o mundo é conjunta e um dos deuses dissidentes 536
Dilúvio
planeja a fuga de seu devoto Utnapistim. Em Gilgamés, os deuses se assustam com o dilúvio que desencadearam, “encolhendo-se contra a parede como cães”, uma característica absoluta mente estranha ao Deus de Gênesis. De fato, o mais impressionante é que quando Enlil chega ao local do sacrifício, fica surpreso ao descobrir que Utnapistim sobreviveu ao dilúvio. Ape sar de ser um dos deuses supremos do panteão, ele não controlava nem sabia o que se passava no mundo. O Senhor de Gênesis, porém, foi o Deus que enviou o dilúvio, encerrou Noé e os animais na arca, lembrou-se de Noé, levou-o à terra seca e garantiu-lhe que nunca mais a terra seria destruída por um dilúvio. As divindades mesopotâmias não fazem tal juramento e, por sua própria natureza, parecem incapazes de cumpri-lo. O Deus de Gênesis não é apenas onisciente e onipotente, atributos que claramente não podem ser encontrados nos deuses mesopotâmios. como também ele próprio é moral e justo ao lidar com sua criação. A humanidade não é destruída por ser tumultuada ou excessivamente fértil, mas sim por sua corrupção (Gn 6.5, 12). Enquanto o modo das divindades babilônias tra tarem a humanidade era ditado por malevolência ou predileção, o Deus de Gênesis é retratado como um ser leal que recompensa o justo e que confirmou sua aliança com Noé preservando-o durante o dilúvio. O próprio Noé é descrito como sendo irrepreensível. Sua sobreviência não se deveu à sorte de escolher o Senhor como divindade padroeira. Noé andou com o único e verdadeiro Deus e guardou fielmente a sua lei. b. O dilúvio como uma “descriação ” e recriação. O dilúvio destruiu a criação original de Deus, o velho mundo do qual nasceu outro novo. Gênesis apresenta nitidamente as seme lhanças e contrastes entre a criação e o dilúvio. A longa lista de criaturas que pereceram no dilúvio (Gn 6.7; 7.21) repete a classificação das criaturas em Gênesis 1.20-26. O dilúvio pro priamente dito implicou um rompimento das fontes do grande abismo e a abertura das janelas do céu (Gn 7.11), revertendo desse modo o processo de separação das águas acima e abaixo do firmamento e da terra seca do mar. O paralelo entre o processo original de criação e a recriação do mundo descrita em Gênesis 8 — 9 é igualmente óbvio. O ponto crítico da história é Gênesis 8.1: “Lembrou-se Deus de Noé... fez soprar um vento sobre a terra, e baixaram as águas”. Aqui, um vento en viado do céu lembra o vento (“Espírito” ) de Deus que pairava sobre as águas antes do pri meiro ato criador. E, assim como em Gênesis 1, segue-se uma separação progressiva entre as águas e a terra: primeiro aparece o topo das montanhas, depois as novas árvores e, por fim, a terra seca. Uma vez que Deus criou os animais para crescerem e se multiplicar na ter ra, Noé é orientado a mandá-los para fora a fim de que possam fazer o mesmo novamente (Gn 1.20-22; 8.17). c. Noé como o segundo Adão ou israelita arquetípico. Os par. entre a primeira criação e a recriação depois do dilúvio indicam que Noé (->) deve ser considerado um segundo Adão. Ambos foram os primeiros ancestrais de toda a humanidade. Ambos receberam a ordem: “Sede fecundos, multiplicai-vos” (Gn 1.28; 8.17; 9.1), em contraste com o Épico de Atraasis, em que os deuses tomam providências para limitar o crescimento populacional. E, assim como Adão, Noé caiu da graça (9.18-27). No entanto, a queda de Noé é apenas uma repetição da história e de conseqüências menos graves que o pecado de Adão. O aspecto mais importante que move a história é o comportamento justo de Noé. Até esse último episódio, ele dá a impressão de ser um homem perfeito, descrito como “justo e íntegro” (Gn 6.9). Em várias ocasiões, a narra ção insiste, “Assim fez Noé, consoante a tudo o que Deus lhe ordenara”. Ao que parece, Noé guardava o sábado (Gn 8.10, 12), fazia distinção entre animais limpos e imundos e encontra va-se num relacionamento de aliança com Deus (Gn 6.18). De todas essas maneiras, ele age como um modelo de israelita. Por fim, ao sair da arca, Noé ofereceu um sacrifício cujo aroma 537
Dinheiro/lingote
agradável levou o Senhor a declarar que jamais destruiria a terra outra vez com um dilúvio. Nessa passagem, Noé é retratado exercendo o ministério sacerdotal em favor do resto da hu manidade, da mesma forma como Israel seria chamado a fazer mais tarde, atuando como reino de sacerdotes em favor de todas as nações do mundo (cf. Êx 19.6). -> Gênesis: Teologia B ib l io g r a f ia
B. W. Anderson, “From Analysis to Synthesis: The Interpretation ofGen 1-11”, JBL 9 7 ,1978, 23-39; D. J. A. Clines, “Noah’s Flood: The Theology o f the Flood Narrative”, Faith and Thought, 100, 1972-73, 128-42; G. J. Wenham, Genesis 1-15, 1987, 148-208. G. J. Wenham Dinastia -> # 1074 (bayit I, casa, habitação, família, dinastia)
Djnheiro/li te Dinheiro/lingote (*1M [kikkãr], sub., talento [# 3971a]; ------------------------------------ Sj?3 [beqa “], subs. meio siclo [# 1325];]ÍQ^T/D’}3T!í): t ’adarkõnim, dark?môri], subs. dárico, moeda persa de ouro ou prata com aproximadamente oito gramas e meio ou talvez, dracma, moeda grega [# 2007, # 163]). OMA O termo kikkãr também ocorre no ugar. (kkr), acad. (kakkaru), aram., sir.; beqa ' aparece no aram. e no sir.; dark^môna ’ ocorre ainda no aram. e no siríaco. AT Essas unidades monetárias, ou melhor, esses lingotes, a princípio eram pesos (cf. a “libra” da Grã-Bretanha) e, na Israel bíblica, talvez apenas o dárico fosse uma moeda. Êxodo 38.25-27 dá a proporção entre esses pesos — o beqa' eqüivalia a meio siclo (de acordo com pesos descobertos juntamente com a inscrição beqa'-, ver G. I. Davies, 258) e um talento era igual a três mil siclos. O consenso dos estudiosos é de que o siclo pesava cerca de 11-13 gra mas, o que resultou na seguinte tabela: talento
33-39 kg
siclo
11-13 g
beqa'
5.5-6.5 g
É comum os escritores bíblicos registrarem o preço de certos itens em unidades mone tárias de modo a transmitir o valor relativo e a importância de tais itens. Durante o reinado de Hamurábi, a renda média anual era de dez siclos de prata. Trata-se de um dado relevante em termos teológicos, com referência ao tabemáculo e às diversas construções do templo, indicando o valor que o Senhor, os líderes e o povo davam aos seus lugares de adoração: 1. Talento a. Os utensílios do tabemáculo foram feitos de um talento de ouro puro batido (Êx 37.24). b. Na construção do santuário, foram usados pouco mais de 29 talentos de ouro (Êx 38.24). 538
Dinheiro/lingote
c. Davi usou uma coroa tomada dos amonitas que pesava um talento de ouro (2Sm 12.30). d. Geazi, o servo de Eliseu, aceitou dois talentos de prata de Naamã, depois do que a lepra de Naamã passou para Geazi (2Rs 5.26-27). e. O rei Menaém de Israel pagou mil talentos de prata a Pul, rei da Assíria como uma espécie de tributo (2Rs 15.19). 2. Meio siclo a. Quando o servo de Abraão encontrou Rebeca junto ao poço, deu-lhe de presente um anel de ouro que pesava meio siclo (Gn 24.22). b. De acordo com o censo dos israelitas, havia 603.550 homens, sendo que cada um deles pagou meio siclo de ouro para a construção do santuário (Ex 38.26). 3. Dàrico a. Para construir o primeiro templo, os líderes das famílias contribuíram com 10.000 dáricos de ouro (IC r 29.7). b. Para a construção do segundo templo, os líderes das famílias contribuíram com 61.000 dáricos de ouro (Ed 2.69). c. As vinte taças de ouro do segundo templo valiam mil dáricos de ouro (Ed 8.27). d. Na reconstrução de Jerusalém, o governador deu mil dáricos de ouro, os líderes das famílias deram vinte mil e o resto do povo, mais vinte mil (Ne 7.70-72). P-B
Todos esses pesos são usados nos textos pós-bíblicos judaicos.
Ouro: -> 'ôpir (ouro de Ofir, # 234); -> bexer I (minério de ouro, # 1309); -> zãhãb (ouro, # 2298); -> jã rü f 1 (ouro. # 3021); ketem (ouro, # 4188). -> sãgür (ouro puro, # 6034); paz (ouro puro, # 7058); ■> $rp (derreter, fundir, refinar, # 7671) Dinheiro: -> kikkãr (talento, # 3971a); -> Dinheiro/lingote: Teologia B i b l k x ;k a f ia
Y. Aharoni, “The Use of Hieratic Numerais in Hebrew Ostraca and the Shekel Weights”, BASOR 184, 1966, 13-19; E. M. Cook, “Weights and Measures”, ISBE 1988 4:1046-55; G. I. Davies, Ancient Hebrew Inscríptions, 1991; R. de Vaux, “Weights and Measures”, Anclsr 1961, 195206; M. A. Powell, “Weights and Measures”, ABD 6 , 1992, 897-908; R. B. Y. Scott, “Weights and Measures o f the Bible”, BA 22, 1959, 22-40; E. Shany, “A New Unpublished ‘Beq a ’ Wight in the Pontif. Bibl. Institute, Jerusalem”, PEQ 99, 1967, 54-55; E. Stem, “Weights and Measures”, EncJud 16, 1971, 376-92. Russel Fulter Dinheiro -> # 4084 (kesep, prata, dinheiro) Direções -> # 3545 (yãmin I, direita, sul) Discernimento -> # 1067 (byn, compreender, discernir) Disciplina -> # 3579 {ysr 1, admoestar, corrigir, disciplinar) Discriminação
# 5951 (ns'pãnim , discriminar) 539
Ebal e Gerizim
Discurso -> # 1819 (dbr II, falar, ameaçar, prometer, ordenar) Disparo -> # 3721 (yrh I, atirar) Dispendiosidade -> # 2776 (hamudôt, dispendiosidade, caro, preciosidade) Dispersão -> # 7046 (pwy, espalhar, dispersar) Disputa -> # 3519 (y£/j, contender, julgar, decretar, reprovar) Distorção -> # 6835 ('<75, ser perverso, entortar) Distrito -> # 3971 (kikkãr, região, cercanias) Dito -> # 606 ( ’mr I, dizer, ordenar, pensar) Divisa -> # 1487 (gW I, limitar, delimitar; demarcar limites ao redor) Divisão -> # 2745 (A/^ II, dividir, obter a própria parte) Divórcio -> # 4135 (kPritút, divórcio) Dízimo -> # 5 1 3 0 (ma ‘asêr, dízimo) Doce -> # 5 5 1 7 (mtq, ser/tomar-se doce; adoçar) Doença -> # 2716 (h°lí, doença) Doença (de pele) -> # 7665 ($r', sofrer de doença de pele) Doença (peste) -> # 1822 (deber I, peste bubônica) Domínio -> # 4895 (malkül, poder real, domínio) Dor -> # 3872 (fc’6 , estar com dor, causar dor, arruinar) Dorso -> # 1461 (gaè I, dorso) Dromedário -> # 4140 (kirkãrâ, dromedário) Duplicação -> # 4100 (kpl, repetir, dobrar, duplicar) Duração -> # 6409 ( ‘ôlãm, longo tempo, duração)
Ebal e Gerizim 540
t ‘áôã/], # 6507) e Gerizim # 1748).
[gerizim],
Ebal e Gerizim
AT 1. Ebal e Gerizim são duas montanhas situadas na região central da Palestina, ao norte e ao sul da antiga Siquém (Tell Balata). Ebal (atual Jebel Eslãmiyeh) encontra-se a cerca de 2 quilômetros a noroeste de Siquém e sua elevação é de aproximadamente 940 metros acima do nível do mar. Gerizim (atual Jebel ev-vôr ou Tell er-Ras) encontra-se a cerca de 2 quilômetros a sudoeste de Siquém e tem uma altitude de aproximadamente 8 6 8 metros. Os dois picos ele vam-se sobre o vale Nablus e guardam a única passagem no sentido leste-oeste para Samaria e para a região montanhosa de Efraim. 2. Seguindo as ordens de Moisés, foi nesse lugar que Israel realizou a cerimônia de renovação da aliança com yhwh, depois da conquista inicial de Canaã (Dt 27.1-26). O ritual continha a inscrição da lei de Deus em placas de pedra caiadas, a construção de um altar e oferta de sacrifícios, bem como a recitação das maldições e bênçãos da aliança pela congre gação de Israel divida em tribos, seis delas sobre o monte Gerizim e seis sobre o monte Ebal. Josué efetuou a cerimônia com os israelitas depois de capturar Ai (Js 8.30-35). Posteriormente, foi do alto do monte Gerizim que Jotão contou a fábula da “árvore” para o povo de Siquém, opondo-se ao reinado de Abimeleque. O estudo de Deuteronômio 11.26-32 e 27.1 -26 realizado por N. Lohfink confirma a in tegridade literária do ritual de Ebal em Deuteronômio 27 como uma declaração de renovação da aliança realizada numa ocasião anterior à cerimônia em si (Das Hauptgebot, 1963, 234). Isso faz da cerimônia de Gerizim-Ebal parte de uma imagem literária espelhada que constitui um envoltório para as estipulações da aliança registradas nos caps. 12—26 (cf. P. C. Craigie, The Book o f Deuteronomy, NICOT, 1976, 212; cf. 211-13; 326-34). Outros estudiosos consi deraram essa estrutura espelhada (ABCC’B’A’) uma técnica literária heb. típica, tomando o cap. 27 um elemento indispensável dentro do plano mais amplo do livro (p. ex. G. J. Wenham, “The Date of Deuteronomy”, Them 10, 1985, 20). 3. Os paralelos literários entre Deuteronômio 27 e a estrutura de tratados e documentos legais do OMA já foram, há muito, identificados (p. ex., K. A. Kitchen, Ancient Orient and Old Testament, 1964, 90-102). Tendo em vista essas semelhanças com expressões de tratados antigos, o propósito e a natureza do ritual de Ebal podem ser mais bem compreendidos quan do são conciliados com o tema da renovação da aliança no livro de Deuteronômio. Porém, o ritual de Ebal representa um equivalente heb. do tratado de concessão real do OMA, distinto da experiência de Israel de renovação da aliança depois do êxodo e, no entanto, integralmente relacionado a ela. Como tal, constitui uma cerimônia (p. ex., uma concessão divina de terras) dentro de outra cerimônia (ou seja, a renovação da aliança de Israel) e deve ser considerada a seção de conclusão das estipulações para a renovação da aliança em Deuteronômio 12—26 (verHill). (berít, 1382) A identificação do ritual de Ebal como uma adaptação israelita do tratado de conces são de terras do OMA tem implicações teológicas importantes tanto para Deuteronômio 27 como para Josué 4 e 8 . D. J. McCarthy observou corretamente que o propósito da renovação da aliança em Deuteronômio era unir o povo, a terra e a lei sob a tutela de Javé. Assim, como um tipo hebraico de concessão de terras, a cerimônia de Ebal formalizou a posse israelita de Canaã em conjunto com o pacto de renovação da aliança. Os monumentos de pedra e o rito de circuncisão em Gilgal (Josué 4— 5) serviram como juramento de adoção para Israel, selando seu relacionamento com Javé como povo de sua aliança. Em Josué 8 , a execução da cerimô nia de concessão da terra (Ebal) como parte do pacto de renovação da aliança constituiu uma união do povo com a terra sob o senhorio supremo de Javé. Por fim, considerar o ritual de Ebal como uma concessão real hebraica também oferece a melhor explicação para a presen ça do Dodecálogo de maldições em Deuteronômio 27.15-26, uma vez que as expressões de 541
Eclesiastes: Teologia de
maldição de tratados de concessão desse tipo costumavam ser individuais e incondicionais em contraste com a natureza corporativa e condicional das maldições e bênçãos dos tratados entre suserano e vassalos. B ib l io g r a f ia
NID NTT3:449-67; R. G. Boling, “Bronze Age Buiidings at the Shechem High Place”, BA 32, 1969, 82-103; R. J. Buli, “Er-Ras, Tell (Mt. Gerizim)”, EAEHL 4:1015-22; A. E. HilI, “The Ebal Ceremony as Hebrew Land Grant?”, JETS 31,1988,399-406; D. J. McCarthy, Treaty and Covenant, 19812; G. E. Wright, Shechem: The Biography o f a Biblical City, 1965. Ândrew E. Hill
Ainda há controvérsias quanto à questão do contexto histórico de Eclesiastes, uma situação que deve conti nuar enquanto existirem diferentes pressuposições teológicas quanto à autoria e divergências na argumentação lingüística com relação ao desenvolvimento da língua hebraica. Aqueles que defendem a autoria de Salomão precisam lidar com algumas palavras em araml (hús min , k? 'ehãd, taqqip/tãqêp). Aqueles que defendem datas posteriores ao exílio precisam reavaliar o heb. encontrado no livro, considerando seu gênero em vez de simplesmente repetir as com parações imprecisas com o heb. da Mix., com o heb. mais recente e com o aramaico. É comum considerar-se que uma influência filosófica ou lingüística G exige que o livro seja datado como pertencente ao século III ou II (a. C.), ou então se acredita que os contextos políticos retratem situações que podem auxiliar na adatação do livro, p. ex., Eclesiastes 4 .9 - 12. Contudo, as ob servações filosóficas e políticas do pregador são universais e não exclusivas a uma só época, sendo igualmente válidas tanto na cultura literária do OMA quanto nas observações da vida e da política de hoje. A declaração “nada há, pois, novo debaixo do sol” é uma fato que o pregador teria aplicado até mesmo às suas próprias idéias (Ec 1.9 ). Qualquer datação de Eclesiastes deve levar em consideração também os intervalos de tempo entre a redação original e a edição final do epilogador ou narrador (Fox, 1977). Eclesiastes: Teologia de
A. Estrutura literária Apesar dos vários esboços estruturais de todo o livro, nenhum deles recebeu apoio sig nificativo dos críticos. Foram propostos sucessivos esboços convencionais e esquemas para lelos e quiasmáticos. O estudo da estrutura literária das subseções do livro é um esforço mais promissor do que qualquer tentativa de se descobrir uma estrutura principal. E provável que um esquema geral como esse possa ser construído ao dar-se atenção às diferenciações de ex tensão e de assuntos tratados nessas estruturas retóricas menores. Um resumo informal como o que se segue pode ser de ajuda para o leitor: I.
A investigação específica do pregador (caps. 1— 6 ) A. Dificuldades do trabalho e da sabedoria (caps. 1— 3) B. Vantagens do trabalho e da sabedoria (caps. 4— 6 ) II. Observações subseqüentes e conclusões (caps. 7— 12.8 ) A. Ditados convencionais de sabedoria (caps. 7— 10) B. A necessidade de sabedoria e trabalho (caps. 11— 12.8 ) III. Epílogo ( 12.9 - 14) 542
Eclesiastes: Teologia de
B. Temas teológicos 1. Um tema bastante evidente em Eclesiastes é a conclusão de que tudo é “fôlego” (hebel). Essa é a frase enfática de abertura e encerramento do discurso do pregador (Ec 1.2; 12.8) e aparece cerca de trinta vezes ao longo do texto. Nenhuma tradução se contenta somen te com a metáfora, sendo que cada uma se vê compelida a interpretar a metáfora para o leitor por meio de uma palavra supostamente mais inteligível. Essa tradução/interpretação atém-se predominantemente ao âmbito de termos como “vaidade, futilidade, inexpressividade”, em outras palavras, o valor da vida, seu conteúdo e sua interpretação. Uma tendência em unir-se a fraseologia existencialista contemporânea com o raciocínio antigo do pregador resulta no termo preferido por Fox — “absurdo”. Essas interpretações de hebel são acompanhadas de justificativas diversas para a canonicidade do livro. Se, por exemplo, a vaidade de toda a realidade é, de fato, a conclusão do próprio pregador, isso se deve somente a uma observação limitada da parte dele de uma rea lidade sem o Deus do resto do AT. Então, quando Deus é introduzido, essa visão de mundo pessimista se dissipa e é superada por uma atitude mais ortodoxa expressada no epílogo (Ec 12.13-14). De acordo com outra justificativa, uma vez que as alusões às origens salomônicas em Eclesiastes 1.1 e outras passagens são as principais razões para a canonicidade, o cinismo explícito do livro foi aceito apesar de seu caráter heterodoxo. A interpretação mais coerente de Eclesiastes, fiel ao próprio livro e ao cânon como um todo, é considerar-se o termo hebel como “temporário”: “Tudo é temporário”, um significado viável para a metáfora de acordo com o heb., especialmente na literatura poética e de sabe doria. Tudo o que a humanidade faz é temporário, e são justamente a vida e as atividades do indivíduo o que mais interessa ao pregador, ainda que ele reconheça o caráter eterno de Deus e de seus feitos. 2. A soberania de Deus é um tema tão importante quanto a transitoriedade de suas cria turas. Ele é criador (Ec 11.5; 12.1, 7), juiz (3.17, 18; 11.9), benfeitor (2.24-26; 3.13; 5.18-20) e aquele que deve ser temido (3.14; 5.1-7; 7.18) e também obedecido (5.4; 7.26; 8.2). Ele pre destina o que há de bom e de trágico (3.11; 5.18— 6.2; 7.13-14), suas obras encontram-se muito além do conhecimento, que é limitado, (3.11; 8.16— 9.1) e, no entanto, ele é justo (8.12, 13). A vontade incompreensível, porém inquestionável, de Deus permeia esse discurso do pregador de tal modo que as interpretações mais radicais acreditam que o pregador considera Deus injusto em seu domínio incansável e determinante sobre todos os acontecimentos da vida. Na realidade, essa idéia, juntamente com a de estudiosos menos cínicos, considera esse discurso do pregador como uma sedição catártica contra uma crença irreal e, ainda assim, ortodoxa num Deus justo e reto, encontrada no restante da literatura de sabedoria. Para os críticos, Eclesiastes marca uma “crise” na teologia heb., o que os leva a interpretar o livro de maneira totalmente pessimista — a sabedoria convencional encontrada em Provérbios, Jó e em alguns Salmos é, sob o ponto de vista do pregador, uma concepção ingênua e, se está repetida em Eclesiastes, é somente para ser negada ou mais bem descrita. Contudo, uma interpretação cínica como essas não explica adequadamente as várias semelhanças injustificadas com passagens proverbiais e de retribuição no conjunto total da li teratura de sabedoria. Também não explica as prescrições freqüentes de alegria na vida que se encontram espalhadas pelo texto de Eclesiastes. Cinismo e alegria profundos não são caracte rísticas comensuradas de um homem sábio como o pregador. 3. Além da transitoriedade e da soberania divina, três outros aspectos da vida são des tacados pelo pregador para ajudar a se viver num mundo amaldiçoado: o trabalho sábio, o pra zer sensato e guardar a lei de Deus. Dois deles encontram-se juntos em contextos ligeiramente 543
Eclesiastes: Teologia de
distintos: a. ter prazer na comida, na bebida e no trabalho (2.24; 3.12-13, 22; 5.18; 8.15) e b. desfrutar a vida agora enquanto se pode, mas sem que tal prazer leve a evitar o trabalho sábio (9.7-10; 11.6-10). Achegar-se ao templo para ouvir também redunda em menos tragédias na vida (5.1-7). E claro que esses temas também são encontrados separados uns dos outros. A impor tância da sabedoria para o trabalho diário é crítica apesar das tragédias que se podem encontrar pela frente e apesar dos resultados serem, por vezes, devastadores (2.13). Evitar os perigos decorrentes da ocupação ( 10 .8 - 10 ), considerar os benefícios de se entrar em sociedade nos ne gócios (4.7-12) e vencer um agressor temível (9.14-15) são coisas que só podem ser realizadas por meio da sabedoria. O poema do pregador, em 3.2-8, é constituído de declarações sucin tas aconselhando a escolha do tempo mais sábio para as atividades diárias e seus opostos. De acordo com 3.7b e com o resto do livro há, por exemplo, um tempo certo para falar e para o silêncio sábio (5.5; 6.11; 7.10, 21; 9.17; 10.12-15, 20). Assim como Provérbios, Eclesiastes exalta a diligência (9.10; 10.18; 11.6), a disposição de aprender (4.13; 7.5; 9.17), a moderação (10.16-17) e a submissão às autoridades (8.2-4; 10.4). Apesar de se dever trabalhar com afinco e sabedoria, não se pode deixar de apreciar os prazeres que Deus concede àqueles que escolhe (2.24-26; 5.18-20). A sabedoria necessária para o uso do tempo nas atividades diárias, recapitulada em 3.2-8, contém riso, dança, abra ço, amor e paz, especialmente tendo em vista que o pregador identifica repetidamente que o próprio Deus é a fonte desses prazeres (2.24, 25; 3.12-13, 22; 4.8; 5.18; 6 .6 ; 8.15; 9.7; 11.7; 12.1). Outras alegrias são o descanso (4.6; 5.12), o cônjuge (9.9), a juventude (11.9-10) e as realizações (2.4-8) do indivíduo. 4. Por fim, enquanto Provérbios procura descrever a justiça por meio de um paradigm simples de retidão/recompensa — perversidade/castigo, o pregador está disposto a falar das aparentes injustiças que devem ser suportadas até que chegue finalmente o julgamento de Deus (3.17; 8.12,13; 11.9). Assim como Jó, o pregador se agonia com o homem sofredor de uma forma que não podia ser feita por meio dos provérbios curtos e enigmáticos de Israel. Apesar de esses provérbios serem verdadeiros, sua intenção como um todo não é sondar mais profundamente as exceções mais graves à regra e nem os hiatos permitidos por Deus. O pregador apresenta uma relação das terríveis realidades da vida, mas o faz a fim de enfatizar a necessidade premente de sabedoria e alegria nessa mesma vida. Ele não se esquiva de enfatizar os vitimados, mas vai além disso e aconselha o governo responsável da vida. Esperando ou reagindo às ameaças, decepções e tragédias inevitáveis da vida, seu conselho sugere aplicar táticas sábias de evasão e encontrar consolo em alegrias que atenuam o sofrimento. B ib l io g r a f ia
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Ecrom
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Ecrom
Ecrom (pipV [ ‘eqrôn], # 6833).
AT 1. Ecrom (atual Kh. el-Muqanna ou T. Miqne) fica estrategicamente situada na fron teira entre a planície filistéia e o Sefelá e próxima a uma rede antiga de estradas, inclusive a Via Maris bem como outras rotas de acesso da planície filistéia às montanhas de Judá. Um dos maiores sítios arqueológicos da Idade do Ferro, esse outeiro abrange a cidade alta, com c. dez acres e a cidade baixa com quarenta acres. 2. Referências literárias. Ao que parece, a concessão de Ecrom ao território de Judá (Js 15.11,45-46) não chegou a se concretizar (Js 13.2-3), pois o local continuou sendo um dos importantes baluartes militares e culturais dos filisteus durante grande parte da Idade do Ferro. Esse fato é comprovado pelas narrativas sobre a arca e sobre Elias (ISm 5.10; 7.14; 2Rs 1.2-3). A destruição de Ecrom como adversária de Javé e seu povo é mencionada em vários oráculos proféticos (Jr 25.20; Am 1.8 ; Sf 2.4; Zc 9.6). Chamada de Amqarruna em fontes assírias, a cidade foi subjugada por Tiglate-Pileser III e cercada em 712 a. C. por Sargão II, acontecimento retratado vividamente nos relevos de seu palácio em Corsabade (Tadmor, 90; cf. Keel e Küchler, 831). A resistência de seu rei Padi em tomar-se parte de uma coalizão contra os assírios liderada por Ezequias foi recompensada em 701 a. C. quando ele foi restituído ao trono de Ecrom por Senaqueribe (ANET, 287-88; Mittmann, 94). O rei Icausi de Ecrom permaneceu um vassalo leal que apoiou tanto Esar-Hadom quanto Assurbanípal nas campanhas egípcias deles (ANET, 291, 294). A chamada carta de Ado, um papiro em aram. de Sacara no Egito, refere-se a um rei de uma das cidades filistéias que apelou para o Egito pedindo auxílio militar contra as forças da Babilônia pouco antes de essa cidade ser destruída em 603 a. C. por Nabucodonosor. Ao que parece, há motivos para crer-se que Adom era rei de Ecrom (NEAEHL, 1052). Não se sabe muita coisa sobre a história subseqüente de Ecrom, exceto que constituiu parte do território de Asdode nos tempos helenistas e romanos, a não ser por um breve interlúdio durante o qual esteve sob o domínio dos hasmoneus. De acordo com Eusébio, a cidade possuía uma grande população de judeus nos tempos bizantinos. 3. Escavações arqueológicas. Escavações em Tel Miqne tiveram início em 1981, sob a direção de Dothan e Gitin. As cerâmicas descobertas no local mostram que a cidade foi habi tada do período calcolítico até a Idade do Ferro II. O estrato da Baixa Idade do Bronze contém evidências de um amplo comércio marítimo no Mediterrâneo oriental e contatos culturais com cidades cananéias e também de indústrias locais (ABD, 2:417). Num conjunto de construções na acrópole, foram descobertas em bom estado de preservação grandes quantidades de trigo, lentilhas e caroços de azeitonas carbonizados em vasilhas de cerâmica seladas por paredes de tijolos de barro desmoronadas e chamuscadas, bem como vigas dc madeira queimadas. No 545
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entanto, foi durante a Idade do Ferro que Ecrom tomou-se um centro influente de comércio e indústria, especialmente sob a supremacia assíria no século VII a. C. As evidências arqueológicas do período correspondente à Idade do Ferro I mostram a introdução de uma nova cultura semelhante às da ocupação filistéia em outros lugares. A muralha de fortificação feita de tijolos de barro e com uma espessura de 3,25 metros, os tipos diferentes de fomos, instalações industriais e cerâmica micena IIIC de produção local, inclusive vasilhas monocromáticas em formato de sino, jarras redondas, canecas, etc., atestam a presença filistéia na cidade (NEAEHL, 1053). No Campo I (estrato VI) foi descoberta uma construção que pode ter sido um dos santuários dos filisteus. No estrato V, correspondente ao século XI, foram acha das estatuetas de Asdode, vasilhas votivas, kernoi e escápulas bovinas gravadas, que mostram claramente uma ligação entre Chipre e o culto filisteu. A última fase da Idade do Ferro I (estra to IV) marca a construção de torres de pedra com a finalidade de reforçar as fortificações. Ao que parece, o trabalho local com metais também atraiu excelentes artesãos, como indica uma faca de ferro com cabo de marfim. Aliás, a maior concentração de objetos de ferro encontrada na Palestina foi descoberta em Ecrom. A construção monumental de número 351 localizada na área da Elite (Campo IV) contém um santuário circular (semelhante ao de Tel Qasile), sendo que foram encontrados outros 28 santuários na acrópole e mais sete na cidade baixa. Apesar de a construção ter passado por reformas radicais nos estratos seguintes, o santuário continuou a ser usado (cf. Dothan e Gitin, 1990a, 35, para uma representação artística). Outros objetos de culto, como bamah de tijolos de barro e utensílios como plataformas com rodas, refletem as práticas religiosas filistéias. Uma cidade grande e bem planejada, com edifícios, indústrias e recintos religiosos impressionantes, bem como um comércio e relações culturais consolidados, Ecrom foi destruída no século X, mas continuou sendo habitada por mais quatro séculos. Durante o século VII, Ecrom tomou-se um importante centro comercial do império neo-assírio, atingindo seu auge como maior centro produtor de azeite de oliva no OMA (Do than e Gitin, 1990b, 37). Com 102 instalações para a produção de azeite de oliva, Ecrom podia produzir mais de mil toneladas de azeite por ano. A cidade passou por um pico de crescimento, chegando a ocupar cerca de 85 acres. Era dividida em quatro regiões — uma para fortificações, duas para habitação comum e das elites e uma para as indústrias. As fortificações representa vam um sistema de muralhas duplas de pedra, com saliências e reentrâncias ligadas ao muro superior e quatro entradas na forma de portas, protegidas por uma grande portaria (NEAEHL, 1057). Num cinturão industrial ao redor da cidade foram construídos edifícios com salas para a produção de azeite, armazenagem e uma ante-sala que dava acesso à rua. As instalações para a produção de azeite eram constituídas de uma grande bacia retangular, tonéis de prensagem, uma viga de madeira, pesos de pedra perfurados e jarros de cerâmica, sendo que mais de seiscentos desses jarros foram restaurados. Uma grande quantidade de pesos para teares indicam a existência de uma indústria têxtil. Foram descobertos quinze altares de incenso com quatro chifres (um dos principais elementos do culto israelita), bem como esconderijos com lingotes de prata. Uma cidade cosmopolita e industrial, Ecrom passou um breve período sob o domínio de Judá. Uma inscrição lamelekh em heb., que significa “pertencente ao rei de Hebrom”, pode ser uma alusão ao controle de Ezequias sobre Ecrom. Filisteus: -> 'asdôd (Asdode, # 846); ’asqelôn (Asquelom, # 884); -> gat (Gate, # 1781); 'azzâ (Gaza, # 6445); -> ‘eqrôn (Ecrom, # 6833); -> ffiVãti (Filístia, # 7149) B ib l io g r a f ia
T. Dothan & S. Gitin, “Ekron”, ABD 2:415-422; idem, “Miqne,Tel (Ekron)”, NEAEHL, 3:1051-59; idem, “Ekron ofthe Philistines”, I, BAR, 16/1, 1991,21-36; II, BAR, 16/2, 1990,33-42; O. Keel & 546
Éden
M. Küchler, Orte und Landschaften der Bibel, II, 1982; S. Mittmann, “Hiskia und die Philister”, JNSL, 16, 1990, 91-106; H. Tadmor, “Philistia Under Assyrian Rule”, BA, 29/3, 1966, 86-102. J. P. J. Olivier
Éden
Éden (111? [ ‘êden II], jardim do Éden [# 6361]).
[gan ‘êden], subst. Éden,
OMA Uma derivação do termo sum. / acad. EDEN / edinu, estepe (KBL) é menos provável (HALAT). A etimologia mais próxima (e mais antiga) é o aram. 'dn, que ocorre no século IX a. C., na inscrição de Tel Fekheriye (m ‘dn) e significa abundância (F. C. Fensham, JNSL 15, 1989, 89). Esse termo é relacionado ao vb. heb. 'dn I e ao subst. ‘êden I (viver com luxo, de leitar-se). No ugar., ocorre o NG 'dn (RSP 2:307). AT 1. gan 'êden, jardim do Éden, especifica o jardim em Gênesis 2— 3. Em Gênesis 2.8, o jardim é situado dentro do Éden (be 'êden); também em Ezequiel 28.13, em que é especifica do ainda como jardim de Deus (-> gan; # 1703), mas no v. 10, o rio do jardim corre do Éden (m ê‘êden). A diferença no uso das preposições (be = dentro de e min = a partir de) pode indi car que o nome Éden refere-se à localização geral ou região em que o jardim se situava. Não faltam especulações sobre a localização do jardim do Éden (ISBE 2.16-17), mas o significado (qualidade) é mais importante. O Éden pode estar relacionado ao vb. heb. ‘dn I e ao subst. ‘êden I (viver com luxo, deleitar-se), como na LXX. Os homens foram colocados por Deus no jar dim para o cultivar (Gn 2.15). Depois do episódio descrito em Gênesis 3, o homem é expulso e precisa cultivar a terra (3.23). O Paraíso é perdido (Milton), e é guardado pelos querubins ao oriente do jardim do Éden (v. 24). O termo também é usado de modo metafórico em Ezequiel 36.35 e Joel 2.3. Ezequiel promete que a terra arruinada será como o jardim do Éden. Joel usa o termo com significado inverso ao descrever o dia do Senhor. 2. Ezequiel 31.9 (cf. “no jardim de Deus”, -> gan), 16 , 18 são todos versículos que empregam a expressão “as árvores do Éden ( ‘a$ê- 'êden) no cap. que compara o Egito a um jardim (-> gan). 3. O termo Éden é usado na maioria das vezes com relação ao jardim, mas aparece iso lado em Gênesis 2.8, 10 (-> gan). Cain foi até a terra ao oriente do Éden (Gn 4.16). 4. O Éden é identificado com o jardim de Deus (Ez 28.13) ou em paralelismo com o jardim de Javé (Is 51.3), sendo que este último descreve a futura restauração de Sião, quando os desertos serão como o Éden. P-B A LXX traduz o heb. ‘êden como edem e gan 'êden como paradeisos tryphês, jardim do prazer. Em Eclesiástico 40.27, o temor do Senhor é como um ‘êden (G paradeisos eulogias, jardim frutífero, cf. v. 17) abençoado. O texto 1QH 6:16 de Qumran compara o justo com uma árvore regada pelos rios do Éden (fazendo lembrar o SI 1.3). Jardim , pomar: -> gan/gannâ (jardim, pomar, # 1703/1708); -> karmel I (pomar, # 4149); [gan] 'êden II ([jardim do] Éden, # 6359); -> ‘arúgâ (canteiro de jardim, terraço, # 6870); -> pardês (parque, floresta, # 7236) B ib l io g r a f ia
ISBE 2:16-17, 399-400; TDOT3.34-39; TWAT 4:343-45, 6:1093-1103; TWOT 1:168-69,455, 2:646-47; ZPEB 2:199-201, 652-53; W. Berg, “Israels Land, der Garten Gottes: Der Gasten 547
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Edom
Edom (□ití? ['edôm\, Edom, # 1 2 1 ; 'DÍTN ['adômí], edomita, # 122; VVÍP [sê ‘ir I], Seir, # 8541; 1 ’ [sê ‘ir
II], monte Seir, # 8542). OMA O termo Edom ocorre em registros egíp. no mínimo do século XIII a. C. (ANET2 ,259); Seir aparece nas cartas de Amama (ANET 3, 488) e em textos do século XII, do reinado de Ramsés III (ANET 3, 262). Ambos referem-se a uma região habitada por um povo nômade chamado pelos egípcios de shasu. Os dois termos não aparecem juntos e podem representar regiões ligeiramente diferentes. Edom ocorre muitas vezes em documentos assírios do tempo de Adade-Nirari III até Assurbanípal II (ANET3, 281,282, 287,291,294, 298). Dois óstracos de Arade mencionam esse Edom.
AT 1. Uso de Edom e Seir no AT. a. Edom é usado como um topônimo para se referir à região montanhosa em geral a leste de Arabá e a sul de Wadi al-Hesa. A palavra é relacionada a ’ãdõm, vermelho (-> # 137), uma referência ao arenito vermelho núbio do qual grande par te dessa região é formada. Vários textos do AT indicam que o território edomita se estendia a oeste do Arabá (1 Rs 9.26; 2Cr 8.17). Seir refere-se à terra a sudeste (e/ou sudoeste? ver abai xo, ns 2) do mar Morto. É, muitas vezes, equiparada à terra de Edom (Gn 32.3 [4]; Nm 24.18) e empresta seu nome a uma montanha ou cadeia de montanhas sinônimas de Seir (2Cr 20.10; Ez 35.2). Referc-se ainda a uma montanha em Judá (Js 15.10). b. Edom refere-se ao povo habitante da terra de Edom (Nm 20.14-21), descendent de Esaú (Gn 36.9). O nome é usado como sinônimo de Esaú (Gn 25.30). Seir é o antepassado epônimo dos horeus (Gn 36.20), daí serem chamados de filhos de Seir (36.21; ICr 1.38). 2. A relação entre Edom e Seir. Seir e o monte Seir aparecem em vários textos com sinônimo de Edom (Gn 32.2 [4]; Nm 24.18; Ez 35.7). Esaú, que é identificado como o ante passado epônimo dos edomitas, costuma ser associado a Seir. Em termos etimológicos, s ê ‘ir I é relacionado a sã'ir, peludo (-> # 8538). Os trocadilhos com o nome de Esaú em Gênesis 25.25 indicam uma ligação entre Edom e Seir, apesar de a relação com o nome Esaú ser, na melhor das hipóteses, vaga e tênue. Seir era a terra dos horeus, desapossados pelos edomitas (Dt 2.12). E tradicional identificar-se o monte Seir com Jebel-es-Será, a leste de Arabá. Foram apresentadas várias propostas que visam explicar o uso de dois nomes para a mesma região. Alguns acreditam que ambos os termos se refiram a regiões a leste dc Arabá, sendo que talvez Seir seja usado para as encostas leste cobertas de vegetação, enquanto Edom identifica a região núbia de afloramento de cor vermelha. No entanto, certos textos sugerem fortemente que Seir ficava a oeste do Arabá (ver Bartlett, “Brotherhood”, para uma relação de textos e discussão). Vários textos referem-se a Javé saindo de Seir (Dt 33.2; Jz 5.4; cf. Hc 3.3, em que Temã é par. 548
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ao monte Parã). Pode-se considerar que essas declarações corroboram a localização de Seir ao sul de Judá, mas deve-se usar de cautela ao tratar de linguagem poética e detalhes geográfi cos. Bartlett propôs que Esaú e Seir estavam, a princípio, associados às terras ao sul de Judá e que suas ligações com Edom e as terras a leste do Arabá são secundárias. O que parece claro é que os profetas empregam o termo Seir de maneira limitada, pois na literatura profética, Seir e Edom são sinônimos. 3. Edom e o cânon do AT. a. A Torá. De modo geral, a Torá retrata Edom/Esaú de m neira positiva. A história de Edom/Esaú e Israel/Jacó prenuncia o relacionamento futuro des sas duas nações aparentadas (Gn 25.19— 36.43). Na realidade, Israel/Jacó é o “enganador” e “suplantador” que obtém falsamente a bênção do primogênito (cap. 27), enquanto Edom/ Esaú resolve esse rompimento ao oferecer a Jacó (->) o perdão (cap. 33). O clã edomita e as listas de reis oferecem ligações entre Israel e povos que habitavam as regiões ao sul e sudes te de Judá (cap. 36; cf. 1 Crônicas 2). Dicou encontrou uma ótica universal nessas narrativas, o que indica que Israel pode encontrar paz com seus vizinhos, tendo em vista que todos eles descendem de Abraão. Além disso, numa declaração excepcional, o D adverte Israel para não abominar Edom “pois é teu irmão”, que poderia ser aceito na assembléia do Senhor na terceira geração (Dt 23.7-9). E, no entanto, na Torá também aparecem tensões entre os dois irmãos/ nações. Pode-se dizer que a confrontação do caçador (Esaú) com o criador dc animais (Jacó) encontra-se por trás de todo o ciclo Jacó-Esaú. A bênção de Isaque coloca Esaú numa posição de subserviência a Jacó e destina Esaú/Edom a uma vida de privação e conflito (“viverás da tua espada,” Gn 27.40). O incidente no qual Esaú recusa dar passagem para Israel quando o povo encontrava-se vagando pelo deserto também ressalta as crescentes tensões (Números 20). (-¥ Gênesis; -> Números) b. Oi livros históricos. As referências a Edom que se encontram espalhadas pelos li vros históricos indicam tensões que vão surgindo entre Israel e Edom. Davi conquistou Edom e pôs guarnições nesse território (2Sm 8.14). Ao que parece, Josafá manteve algum controle sobre Edom (1 Rs 22.47). Logo depois, Edom se revoltou e instituiu uma monarquia durante o reinado de Jeorão (2Rs 8.20). Os 150 anos subseqüentes foram testemunha de repetidos con flitos entre Edom e Judá, principalmente pelo controle de rotas comerciais e um aumento da pressão dos edomitas nas regiões ao sul de Judá. Evidências arqueológicas indicam que Edom ganhou força a partir do século VIII — mais um motivo para Judá haver perdido o controle das lucrativas rotas comerciais, enquanto Edom conseguiu colocar-se na posição de infiltrar-se gradualmente nas terras do Sul, a oeste do Arabá. c. Literatura profética. A presença de Edom na literatura profética é evidente e possui um tom inequivocamente negativo. Nenhuma outra nação recebe mais condenações morda zes do que Edom. Essa nação ocupa uma posição de destaque numa série de oráculos contra as nações (Is 25.12-14; Jr49.7-22; Am 1.11-12) e recebe atenção exclusiva em Obadias (->) e outros oráculos de julgamento (Is 34; Ez 35; Ml 1.2-5). Há referências esparsas nos Salmos (esp. no Sl 137, mas também em 60.8-9; 108.9-10), em Lamentações (Lm 4.21-22) e em ou tros profetas (p. ex.; J1 3.19) que dão continuidade à condenação de Edom. As datas de cada um dos oráculos são motivo de controvérsia. Será apresentado, abaixo, um resumo de algumas indicações das causas da hostilidade e de certas nuanças teológicas dos oráculos. A hostilidade há muito latente entre Edom e Israel/Judá. e subentendida nos livros his tóricos, manifestou-se com toda a força no final do período anterior ao exílio e durante o exílio. Ao que parece, havia duas causas: de algum modo não especificado, os edomitas participaram ou se beneficiaram do saque de Jerusalém por Nabucodonosor em 587-86 a. C. Os detalhes dessa atividade não são descritos em parte alguma, mas inúmeros textos partem do pressuposto 549
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de uma grave cumplicidade (Sl 137.7; Ez 35.15; Lm 4.22; Ob 10-14). 1 Esdras 4.45 em espe cial relaciona o incêndio do templo de Jerusalém a Edom. Outro fator foi a crescente pressão dos edomitas no leste do Neguebe a partir do final do século VII a. C. (cf. Baith-Arieh, que sugere uma certa ocupação edomita no Neguebe em território de Judá). Os edomitas estavam invadindo a “terra da aliança" concedida a Israel pela promessa divina (Ez 35.10). A junção desses dois fatores desencadeou uma profunda hostilidade expressada em termos de intenso nacionalismo e particularismo da parte dos judeus. Apesar de ser descrito biblicamente como nação “irmã” (uma designação empregada pelos escritores bíblicos somente para Edom e para nenhuma outra nação vizinha de Israel), os atos de Edom traíram o conceito de fraternidade. Além disso, Edom/Esaú não era “escolhido”; essa condição pertencia exclusi vamente a Jacó/Israel/Judá. Malaquias usou a linguagem da eleição (“amei a Jacó, porém abor reci a Esaú”) para ressaltar essa questão (Ml 1.2-3). Atos como a traição dos “irmãos” contra o povo “escolhido” exigiam o castigo divino. A restauração da sorte de Judá e o julgamento de seus inimigos foram uma caracterís tica marcante do judaísmo no período do exílio e depois dele. Há uma relação evidente entre o julgamento de Edom e a restauração de Judá/Israel (Lm 4.22). Isaías 34 e 35 apresentam um contraste particularmente forte entre o julgamento das nações e as bênçãos que estão à espera da comunidade redimida de Sião. Em certos oráculos, Edom transforma-se num símbolo de tudo o que é iníquo e antiético, p. ex., ao se aproveitar do infortúnio de outros e mostrar-se arrogante (Is 34.5; Ez 36.5; Ob 15). Alguns comentaristas encontram um uso escatológico ou apocalíptico do tema do julgamento de Edom relacionado à restauração de Judá / Israel (cf. Westermann sobre Is 63.1-6). Na LR posterior, Edom passou a ser um símbolo de inimigo, uma posição conquistada depois de séculos anteriores de inimizade com Jacó / Israel/ Judá. d. Período da literatura de sabedoria. Israel reconhecia e honrava uma tradição anti de sabedoria relacionada a Edom (Jr49.7; Ob 8 ). Já se propôs um contexto edomita para o livro de Jó, mas essa questão está longe de ser esclarecida. Elifaz, um dos amigos de Jó, é descrito como sendo temanita (Jó 2.11; 4.1). Temã, uma região ou distrito de Edom, possivelmente si tuada junto a Bozra, é usada para designar Edom ou o monte Esaú em oráculos proféticos (Ez 25.13; Ob 9). O nome Elifaz aparece na lista de descendentes de Esaú, aparentemente como um primogênito (Gn 36.4, 10-11), e Temã era o filho mais velho de Elifaz (Gn 36.11). Tanto Elifaz como Temã aparecem entre os descendentes de Esaú como chefes de clãs (Gn 36.15-17). Lamentações (4.21) apresenta uma relação entre a terra de Uz — onde Jó vivia — e os edomi tas, sendo impossível, porém, determinar-se a localização exata de Uz. O que impressiona é a relação feita nos oráculos proféticos entre os edomitas e a sabedoria. Pode tratar-se de uma tradição antiga e anterior às circunstâncias históricas que causaram a inimizade entre Israel e Edom, ou a perspectiva universal característica da literatura de sabedoria é o que predomina no livro de Jó. P-B A LXX translitera Edom com Edõm e usa a forma grecizada ídoumaia. O termo Iduméia acabou sendo usado para a região ao sul da Judéia, habitada por povos descendentes dos edomitas que migraram da Transjordânia por causa da crescente pressão árabe. Diodoro refere-se à Iduméia como uma eparquia. João Hircano conquistou a Iduméia no século II a. C. e forçou os habitantes a se sujeitarem aos costumes religiosos judeus. A dinastia herodiana, fundada por Herodes, o Grande, era iduméia. O NT cita a Iduméia apenas uma vez no contexto das multidões que seguiram Jesus na Galiléia (Mc 3.8). A Iduméia manteve uma identidade separada como um distrito até a primeira revolta dos judeus, depois da qual foi assimilada pela Judéia. 550
Educação no AT
B ib i.k m ír a fia
ABD 2:287-95; L. E. Axelsson, The LordRose Up From Seir, ConBOT 25,1987; J. R. Bartlett, Edom and the Edomites, JSOTSup 77, 1989; idem, “The Land of Seir and the Brotherhood of Edom”, JTS n.s. 20, 1969, 1-20; 1. Beit-Arieh, “New Light on the Edomites”, BARev 14, 1988, 29-41; B. Cresson, “The Condemnation o f Edom in Postexilic Judaism”, in The Use o f the Old Testament in the New andOther Essays, ed. J. M. Efird, 1972; B. Dicou, Edom, Israels Brother and Antagonist, JSOTSup, 1994, 169; C. Westermann, Isaiah 40-66, OTL, 356-64; T. Finley, Joel, Amos, Obadiah, 1990; J. D. W. Watts, Obadiah, 1969. Thomas V. Brisco
Continua sendo difícil reconstituir um retrato preciso do processo educacional na Israel da antigüidade, prin cipalmente devido à falta de qualquer discussão deliberada desse tema no AT. Em decorrência disso, tal retrato deve ser construído por uma analogia com a situação geral do OMA, bem como a partir de inferências dos textos bíblicos que se referem direta ou indiretamente ao en sino. Essa reconstituição ainda é fundamentada em grande parte em suposições e, portanto, tênue e sujeita a constantes revisões e correções. Educação no AT
OMA 1. Mesopotâmia. A educação formal em escolas encontrava-se plenamente consol idada na Mesopotâmia por volta da metade do terceiro milênio a. C. (2500 a. C.). A fim de dominar a difícil escrita cuneiforme com suas centenas de sinais era necessário um longo período de de dicação e instrução num ambiente educacional formal. Os filhos das famílias mais ricas eram enviados para escolas anexas a templos e palácios, onde eram instruídos na escrita e treinados em outras áreas de aptidão necessárias para a administração dessas instituições sociais. As escolas eram dirigidas pelo ummia ou “pai da escola”, assistido por “irmãos mais ve lhos”. Arqueólogos recuperaram tábuas contendo trabalhos dos alunos bem como descrições da vida escolar de c. 2500 a. C. Os alunos eram chamados de “filhos da casa da tábua” [E.DUBBA] e estavam sujeitos a disciplina rigorosa com chibatadas e surras. Além da lista básica de sinais, os alunos copiavam listas de palavras e termos, bem como documentos que serviam de amostra e que estavam relacionados à carreira que os jovens seguiriam depois dos estudos. Dava-se uma certa atenção a textos literários clássicos e religiosos bem como à música e à arte. O salário de professores e funcionários vinha das taxas que eram pagas pelos pais dos alunos, de modo que a matrícula nessas escolas (e a ascensão social) restringia-se aos abastados. Ainda que a maioria dos alunos sem dúvida fosse do sexo masculino, há algumas evi dências de mulheres letradas (quase todas da realeza) que ocuparam posições importantes na sociedade. Talvez a mais conhecida seja Enheduana, filha de Sargão I de Acade (2334-2279 a. C.), nomeada pelo pai sacerdotisa do deus lua Nana de Ur. Enheduana foi uma princesa, sa cerdotisa e poetisa de grande mérito, responsável por pelo menos dois conjuntos importantes de obras literárias: uma coleção de quarenta e dois hinos cultuais em homenagem ao pai e uma série de textos sobre a deusa Inana. 2. Egito. Assim como na Mesopotâmia, em 2500 a. C. as escolas egípcias já eram i tituições plenamente consolidadas. Apesar de o ensino enfatizar a escrita, também havia au las de música e dança. As escolas, chamadas de “casa de vida”, eram anexas aos templos e educavam meninos e rapazes nas aptidões profissionais necessárias para formá-los soldados, sacerdotes, engenheiros e nobres. O currículo escolar enfatizava a escrita e a caligrafia e tinha amostras de cartas e documentos, textos enaltecendo a profissão de escriba e pequenos ditados 551
Educação no AT
instrutivos de sabedoria. A disciplina era rígida e o incentivo à diligência se dava por meio de surras e muita exortação. 3. Canaã. Em diversos momentos de sua história, a Canaã pré-israelita viu-se sob a fluência ou o controle de grandes potências das duas extremidades do crescente fértil. Foram descobertos documentos com escrita cunei forme nas línguas da Mesopotâmia em vários locais em Canaã, ao passo que diversos artefatos egípcios também comprovam a presença do Egito nessa região. O desenvolvimento de uma escrita cuneiforme alfabética (chamada de ugarítico, em função do nome da antiga cidade onde a maioria desses textos foi descoberta) facilitou a escrita a partir da metade do segundo milênio (c. 1730 a. C.). A importância da função do escriba é mostrada pela cidade cananéia chamada QuiriateSefer (“Cidade do Escriba/Livro,” cf. Js 15.15-16; Jz 1.11-12). A existência de escolas para a instrução de escribas e administradores é confirmada por uma carta em escrita cuneiforme de um professor que exige dos pais o pagamento de salários atrasados por serviços educacionais prestados a um aluno (c. 1400 a. C.).
AT 1. A educação dentro do clã. Apesar de o desenvolvimento de escolas formais para o treinamento de escribas e administradores em Israel continuar sendo uma questão obscura em função da falta de comentários explícitos, é bem provável que a educação geral para a vida tivesse início dentro do contexto da família/clã e continuasse como uma atividade constante mesmo depois do desenvolvimento das escolas. As crianças aprendiam a realizar tarefas do mésticas como preparar alimentos no fomo (ISm 1.8) e fiar (Êx 35.25) e participavam do tra balho no campo, pastoreando ovelhas (e cuidando de outros animais) e ajudando na lavoura. É possível que formas mais específicas de artesanato (cerâmica, trabalhos em couro, carpintaria, etc.) fossem transmitidos diretamente do artesão ou artífice da família para os aprendizes, sen do que algumas das aptidões eram passadas de pai para filho como ofícios familiares. A transmissão das tradições religiosas também era uma função da família e um dever de todo pai e mãe (Dt 11.19). A submissão absoluta a Javé, caracterizada pela recitação freqüente do Sema (->) moldava a identidade religiosa da criança desde a mais tenra infância (Dt 6.4-9). A vida de integridade era incentivada pelo ensino dos mandamentos (Dt 6.9-10) enquanto a identidade nacional e social eram consolidadas pelos pais por meio das narrativas da história israelita com Javé na forma de credo (Dt 6.20-25). A comemoração das principais festas reli giosas na comunidade reforçava essa instrução oferecida pelos pais e, juntamente com certos marcos e monumentos históricos, oferecia a oportunidade de experiências educativas na forma de perguntas e respostas (Èx 12.26-27; 13.8, 14; Lv 23.42-43). 2. O avanço do ensinoformal. Com o desenvolvimento de uma vida agrária e sedentár na terra, a necessidade de uma classe de escribas letrados (para registrar transações financeiras, rituais religiosos e tradições num crescente sistema em tomo do templo, bem como os assun tos de Estado) levou gradualmente ao crescimento do ensino formal em escolas. A data desse avanço educacional em Israel é motivo de grande controvérsia, sendo que alguns (A. Lemaire) acreditam na existência de um sistema complexo de escolas antes do período monárquico e outros (F. Golka) negam a existência desse sistema até o século II a. C. Talvez a estimativa mais cautelosa diante da falta de dados explícitos seja de que grande parte do ensino ocorria no contexto familiar, enquanto alguns alunos seletos possivelmente recebiam um ensino “superior’ no contexto de associações de artífices ou escolas palacianas (J. Crenshaw). Ao que parece, o ensino profissional desenvolveu-se aos poucos a partir do período monárquico. E impossível determinar até que ponto o povo de Israel era alfabetizado apesar de a relativa simplicidade do sistema alfabético adotado para a escrita do hebraico indicar que era 552
Educação no AT
relativamente acessível. Numa certa ocasião, trinta e seis homens (três de cada tribo) foram es colhidos para viajar até a terra prometida e descrevê-la por escrito (Josué 18). Posteriormente, quando Gideão atacou Sucote, um jovem da cidade capturado à revelia conseguiu escrever os nomes de 77 príncipes e anciãos (Juizes 8 ). Estes e outros incidentes dão a entender que pelo menos a alfabetização mais rudimentar era amplamente difundida desde tempos muito anti gos. A descoberta do Calendário de Gezer (c. 950-918 a. C.) — um exercício escolar alfabé tico que descrevia as divisões das estações na agricultura — confirma a existência de escolas no século X a. C. Com o avanço da monarquia, cresceu a necessidade e aumentaram as referências feitas a escribas educados. No entanto, não há evidências diretas de escolas para esses profissionais. Além dos escribas empregados em assuntos do Estado israelita, há outros três grupos de mem bros dessa ocupação que costumam aparecer nos vários materiais que compõem o AT: mestres da sabedoria e seus alunos, profetas e seus discípulos e sacerdotes. 3. Os efeitos do Exílio. A volta ao enfoque na identidade em tomo da Torá — de modo que a nação judaica no exílio ficou conhecida como “povo do livro” — representou o desenvol vimento formativo durante o período do exílio (-> ; normalmente associado à obra do escriba Esdras [->]). A estruturação da vida dependia da aptidão de escribas letrados e estudantes da Torá que tinham liberdade de explorar as Escrituras com a profundidade necessária para obter o pleno entendimento das mesmas. Centros locais testemunharam o desenvolvimento de sina gogas visando à preservação, transmissão e interpretação da Torá para a vida diária. As esco las anexas às sinagogas ensinavam os meninos e rapazes judeus a escrita (inclusive as regras minuciosas para a transmissão de textos sagrados) bem como um conjunto cada vez maior de interpretações conhecidas como “lei oral”. Ao que tudo indica, os ensinamentos dos escribas eram transmitidos oralmente ao público em geral, tanto por meio da leitura e exposição da Torá nos ciclos lecionários semanais na sinagoga quanto pela instrução contínua dos rabinos. Com a crescente perda de conhecimento do heb. entre os judeus da diáspora, cresceu também o trabalho e a influência da classe de escribas letrados. A. Lemaire chegou a sugerir que nosso cânon do AT foi desenvolvido como um livro didático para o ensino e leitura nas escolas. Essa teoria ignora os fundamentos religiosos do desenvolvimento canônico bem como a função dos profissionais proféticos, sacerdotais e sapienciais nesse processo. Em momento algum Lemaire explica de maneira clara o motivo pelo qual textos religiosos canônicos eram os únicos a serem empregados quando se acredita (e ele mesmo supõe) que o currículo das escolas era muito mais variado. Em última análise, as con clusões de Lemaire não conquistaram o apoio geral dos meios acadêmicos. 4. A influência do helenismo. Os gregos enfatizavam a educação como a transmissora da sua cultura. O sucesso do gimnaiyum (com seu currículo composto da língua G, história, cultura e competições atléticas) em atrair rapazes judeus e afastá-los das tradições de seus an ciãos representava uma ameaça séria à identidade distinta do judaísmo. Como reação deu-se o avanço da seita ultra-ortodoxa do hassidismo, bem como o crescimento das oportunidades para a educação judaica dos jovens dentro da comunidade hassídica (Jub 11.16; 19.14). A pri meira referência a uma escola (bêt hammidrãs) em Eclesiástico 51.23 é desse período (c. 180 a. C.). A consciência da ameaça representada pela helenização fortaleceu o sistema de sinago gas com sua ênfase na Torá, nos costumes judaicos e na interpretação oral como árbitros da verdadeira identidade judaica. 5. Grande parte do vocabulário da aprendizagem judaica gira em tomo de uma série de radicais verbais e construções gramaticais nominativas estruturadas sobre eles. Segue-se uma discussão dos termos mais relevantes. Outros termos associados ao processo de aprendizagem 553
Educação no AT
estào relacionados de maneira mais próxima à tradição de sabedoria e são tratados em mais detalhes neste tópico: (p. ex.; byn, adquirir maior discernimento, aprender [-> # 1067; müsãr, disciplina, instrução -> # 4592]). a. yrh 111, hi. indicar, mostrar; orientar, ensinar ( # 3723); subst. tôrâ, orientação, ins trução, lei (-> # 9368); subst. môreh III, mestre (-> # 4621). O vb. possui cognatos no aram. 'ôri e no assírio ârú, conduzir, guiar, enquanto o subst. tôrâ é par. ao assírio têrtu, lei. Por vezes, o vb. hi. assume o significado de indicar, mostrar, especialmente ao apontar para uma direção com o dedo (Gn 46.28; Pv 6.13). Talvez a ligação com o ensino seja derivada do uso que o mestre faz da instrução para “apontar o caminho” para o aluno. Além disso, apontar o dedo para dirigir a atenção do aluno para algo é uma prática usada há muito tempo no ensino. O uso mais comum de yrh III é com o sentido de instruir, ensinar, sendo que o vb. possui vários objetos relacionados: tôrâ (-> # 9368; Dt 17.11); mispâtím, mandamentos (-> # 5477; Dt 33.10) e até mesmo seqer, mentiras (-> # 9214; Is 9.14; Hc 2.18). O subst. tôrâ é derivado do vb. e tem como significado básico aquilo que guia, instrui. Como tal, é devidamente empre gado para descrever os cinco primeiros livros do AT, a Torá, que guia e instrui Israel quanto à sua identidade e seu relacionamento correto com Javé. Ainda que seja apropriada, a restrição do termo para “lei” (uma vez que a lei, de fato, instrui e guia) tende a obscurecer a abrangência mais ampla da palavra, especialmente em sua referência ao Pentateuco. O subst. relacionado môreh, mestre, é derivado do particípio hi., tendo significado bá sico de aquele que guia, instrui (Jó 36.22; Pv 5.13; Is 30.20). b. Imd, q. aprender; ni. ser domado, dócil; pi. ensinar; pu; ser instruído, versado (-> # 4340); adj. limmud, letrado, experiente; discípulo (-> # 4341). O vb. é conhecido tanto no ugar. (Imd) quanto no acad. (lamadu) com o mesmo sentido, aprender, ensinar. Quando usado como um vb. no q., diz-se que as pessoas aprendem a guerra (Is 2.4), o entendimento (Is 29.24), a justiça (ls 26.9, 10) e os mandamentos e preceitos (Dt 5.1). O vb. pi. é usado em várias ocasiões nas quais são descritas pessoas ensinando: Moisés (Dt 4.1,5,14; 5.31); pais israelitas (Dt 4.10; 11.19), as nações estrangeiras (Dt 20.18), Deus (Is 48.17; Jr 32.33); Israel (Jr 2.33), mulheres pranteando (Is 9.19) e o sábio pregador (Ec 12.9). A forma pu. pode denotar ações costumeiras: mandamentos humanos aprendidos sem grande reflexão (Is 24.13) ou comportamentos arraigados, resultantes de longo treinamento, gado treinado (Jr 31.18; Os 10.11) e guerreiros treinados para a batalha (Ct 3.8). 6. Reflexões teológicas. No pensamento heb. do AT, quase não se faz distinção ent aptidões e conhecimento adquiridos por meio da educação formal e sabedoria aprendida pe las experiências da vida. Os termos sabedoria (hokmá, -> # 2638) e conhecimento (da ‘at, -> # 1981) são par. freqüentes e por vezes empregados de maneira intercambiável (Pv 1.7; 2.6, 10; 9.10; 14.6; 21.11; Ec 1.8; 7.12). A palavra “sabedoria” pode ser empregada para descrever bom senso (cf. a famosa decisão de Salomão em IRs 3.16-28), entendimento derivado de re velação divina (Pv 21.1-12), aptidão para realizar bem um tipo de trabalho manual (Êx 28.3; 36.1; IRs 7.14) ou mesmo a habilidade excepcional de trapacear (2Sm 13.3-19). Para o AT, Deus é o autor da sabedoria e do conhecimento (Pv 2.6-8; 8.22-31; Jó 38.36) e sua sabedoria excede a compreensão humana. Por ser incompleto, o verdadeiro conhecimento humano deve começar (Pv 1.7) e termi nar (Ec 12.13) no “temor do Senhor” — uma consciência apropriada de dependência absoluta de Deus e de seu amor e misericórdia imutáveis. Em decorrência dessa falta de distinção entre conhecimento secular e religioso, entre o que é aprendido e o que é revelado, a apropriação e aplicação de todo conhecimento encontra-se dentro dos limites impostos pela relação espera da entre a humanidade e seu Criador e Senhor. A verdadeira sabedoria consiste em reconhecer 554
Efraim
a soberania de Deus e responder corretamente à sua criação (Gn 1.26). É disso que vem uma dimensão ética necessária para todo o aprendizado e a ciência. Também não é possível haver ciência ou conhecimentos neutros, pois os homens (sob os efeitos do pecado) aprendem, bus cam e empregam os resultados do processo educacional de maneira obstinada e independente e, um dia, serão chamados a prestar contas diante de Deus (Ec 12.14). Assim, o conhecimento e a ciência humana são oferecidos num contexto que define seu significado e propósito dentro da vontade cósmica e etema de Deus. Ética; -> Lei de Deus;
Escrever
Aprendizagem, ensino: -> 'lp I (aprender, ensinar, # 544); -> 'omnâ II (tratamento, proteção, # 594); ysr I (admoestar, corrigir, disciplinar, # 3579); yhr III (ensinar, instruir, # 3723); -> Ihg I (estudar, # 4261); -> Imd (aprender, ensinar, # 4340); leqah (ensinamento, dom de persuasão, # 4375); -> Educação: Teologia Conhecimento, discernimento, astúcia, sabedoria: -> byn (entender, discernir, # 1067); -> hkm (tomar-se sábio, agir com sabedoria, # 2681); Çm (provar, testar, sentir, discernir, # 3247); y d '\ (observar, preocupar-se com, # 3359); -> «Ar (fingir, ser reconhecido, # 5795); 'rm II (ser astuto, ser esperto, tomar esperto, # 6891); -> íM I (ter sucesso, entender, tomar sábio, agir com discernimento, # 8505) Sabedoria, conhecimento, aptidão: -> òyn (entender, discernir, # 1067); -> Ijkm (ser sábio, tomar-se sábio, agir com sabedoria, # 2681); yc/‘ (entender, saber, # 3359); -> ysr I (admoes tar, corrigir, disciplinar, # 3579); /ega/i (ensinamento, dom de persuasão, # 4375); mezimmâ (consideração, plano perverso, trama, # 4659); -> 'oqbâ (astúcia, esperteza, # 6817); 'rm II (ser astuto, ser esperto, tomar esperto, # 6891); -> iA/1 (ter sucesso, entender, tomar sábio, agir com discernimento, # 8505); tahbulôt (conselho, orientação, # 9374) B ib l io g r a f ia
/1SD 2:301-12; J. L. Grenshaw, “Review o f A. Lemaire, Les écoles et la formation de la Bible darts 1'ancien israêl”, JBL 103, 1984, 630-32; R. de Vaux, Anclsr 1:82, 127-32; G. R. Driver, Semitic Writing, 1954, 88-89; L. Dürr, Das Erziehungswesen im Alten Testament und im antiken Oríent, 1932, 107; H. —J. Hermisson, Studien zur israelitischen Sprudhweisheit, 1968, 98-103; A. Klostermann, “Schulwesen im Alten Israel”, FS th. Zahn, 1908, 193-232, esp. 201; J. Laessoe, “Literacy and Oral Tradition in Ancient Mesopotamia”, Studa Orientalia Ioanni Pedersen, 1953; A. Lemaire, Les écoles et la formation de la Bible dans 1’ancien Israel, 1981; J. A. Maynard, A Survey o f Hebrew Education, 1924; W. McKane, Prophets and Wise Men, SBT 144, 1965; N. Morris, The Jewish School: An Introduction to the History o f Jewish Edu cation, 1937; S. Safrai, “Education and the Study of Torah”, S. Safrai e M. Stem eds., Jewish o f the First Century, 1976, 2:945-70; F. H. Swift, Education in Ancient Israel from Earliest Times Until A.D. 70, 1919; R. N. Whybray, The Intellectual Tradition in the Old Testament, 1974, esp. 3 IfF. Gerald H. Wilson
Efraim
Efraim (ü’19X [ ’eprayim], a região de Efraim, #713).
AT 1 .0 nome Efraim significa fertilidade e é derivado deprh, ser frutífero # 7238) com uma terminação locativa. A área descrita na realidade é a mais frutífera e fértil da Palestina. O 555
Efraim
termo aparece na expressão har 'eprayin, monte Efraim (Js 20.7) que. aparentemente, preten de referir-se ao maciço central da terra de Israel, em contraste com as regiões altas ao norte, na Galiléia ou ao sul, em Judá. Aliás, dois profetas do século VIII usam o termo Efraim como sinônimo para o próprio reino do Norte, Israel (cf. is. 7.9, 17; Os 5.3 et passim), cuja riqueza, abundância e fertilidade os afastou dos preceitos de Javé, levando seu povo a buscar somente o próprio prazer, a idolatria e a embriaguez (cf. Isaías 28). Os montes mais elevados dessa re gião central são Ebal (->) e Gerizim (->), de um e outro lado de Siquém (->) e, ao que parece, Deuteronômio visualiza a realização da aliança de Israel com Deus nesse local, exatamente no coração da parte mais alta da terra (Deuteronômio 27, em que o “monte Ebal” fv.4] pode ser uma alteração judia e anti-samaritana do original “Gerizim”, ainda encontrado em samaritano e nas versões em LA.; cf. também o v. 10). No entanto, o termo Efraim é empregado com mais freqüência para indicar o território alocado para o assentamento dos descendentes de Efraim, o filho mais moço, porém favoreci do, de José. Nesse uso, a palavra refere-se somente à parte sul da região montanhosa, uma vez que a parte norte foi dada à tribo do filho mais velho, Manassés. A região em questão é delimitada em Josué 16.5-10 e 17.7-12, fazendo fronteira ao sul com Benjamim (que significa “proveniente do Sul”). Trata-se de um planalto elevado, com cerca de mil metros de altitude e cortado por leitos profundos de rios vindos tanto do lado oriental como ocidental, dificultando a aproximação com intenções hostis de qualquer um dos lados. A rota principal atravessava a região de norte a sul, mais próxima da margem oriental da bacia. Há certas variações nos relatos do território que essa região abrangia, como no caso de Siquém, apresentada como sendo pertencente a Manassés (Josué 17) e Efraim (1 Cr 7.28-29 — uma alteração no período monárquico?). Gezer (Js 16.3, 10) passou a receber um controle mais rigoroso a partir do século X (lR s9 .1 6 -1 7 )e 2 Samuel 18.6 parece sugerir territórios outrora controlados a leste do rio Jordão (cf. v. 23 e Jz 12.4). 2. A importância de Efraim devia-se, em parte, ao número tanto de cidades importantes quanto de líderes de Israel que surgiram dentro de suas fronteiras. As cidades importantes de Jericó, Siló, Gilgal e Betei (considerada benjaminita em Js 18.22) encontravam-se todas dentro do território de Efraim e dentre as pessoas que se destacaram nessa tribo, Josué foi sepultado em Timnate-Sera (Js 24.30), Samuel era de Ramá (1 Sm 1.19-20) e Jeroboão I de Zereda (1 Rs 11.26). E interessante observar-se que os santuários e homens distintos dessa região rica cos tumam ser julgados pelos escritores bíblicos como tendo desagradado ao Deus de Israel, cujo favor passou cada vez mais a repousar sobre a cidade e dinastia de Davi nas montanhas menos férteis do Sul. No entanto, Efraim encontra-se no alto da lista das regiões administrativas de Salomão (lR s 4.8-19) e, na expressão usada com freqüência “Efraim e Manassés”, precede o irmão mais velho. Da “confederação siro-efraimita” contra Judá de 735-732 a. C. (cf. Is 7.1— 8.15) fazia parte Manassés (Is 9.21) mas, enfraquecida por dissensões internas, não constitui uma força importante. (-> Aliança Siro-Efraimita: Teologia) 3. Apesar da fertilidade da terra de Efraim e da dificuldade de atacá-la do leste ou do oeste (as encostas a oeste não ofereciam muito cobertura para os invasores e nem locais que pudessem ser fortificados), foi atacada mais facilmente pelo norte (a planície de Esdraelon) e, uma vez invadida, proporcionou terreno ideal para os carros de guerra, ao contrário dos mon tes íngremes e desfiladeiros estreitos de Judá. Zacarias 9.10 reflete essa distinção e, em várias ocasiões, o reino do Norte mostrou-se mais vulnerável do que Judá aos ataques de invasores bem equipados. Oséias 5.3-14 declara como era inútil buscar proteção, até mesmo da Assíria, pois aquela terra era tão aberta às influências sincréticas (prostituição, Os 6 .10) quando à aten ção indesejada dos exércitos inimigos. 556
Egito
4. É possível que a cidade de Efraim (Jo 11.54) seja mencionada pela primeira vez em Samuel 13.23 e provavelmente é a cidade de Afairema (1 Mac 11.34) do território de Samaria, entregue por Demétrio 11 da Síria ao sumo sacerdote Jonatã em 145 a. C. Fica nas cercanias de Betei, próxima a uma estrada que cortava a região no sentido leste-oeste e mencionada como “pelo caminho do deserto” (Js 8.15) ou “na direção do deserto” (1 Sm 13.18) que levava da re gião de Afeca, via Betei, até o vale do Jordão, acompanhando a extremidade sul da região mon tanhosa de Efraim. Outra estrada importante era a que atravessava essa região e levava de Socó a Samaria e Siquém. seguindo até Tirza e descendo ao Jordão, próximo à cidade de Adã. B ib l io g r a f ia
F. M. Abel, Gèographie de la Palesline, 1933-38; Y. Aharoni, The Land o f The Bible, 1966; I. Finkelstein, The Archaeology o f lhe Israelite Settlement, 1988; G. A. Smith, The Historical Geography o f the Holy Land, 190411. P. J. M. Southwell
Egito
Egito
[mi$rayim\, #5213).
AT Em seu relacionamento com Israel, o Egito recebe mais atenção nas páginas do AT do que qualquer outra nação. O nascimento de Israel como nação ocorreu no Egito, com o Êxodo, naquele que foi incontestavelmente o acontecimento central da história da salvação no AT. O Egito aparece pela primeira vez em Gênesis 10.6 entre os filhos de Cão. 1. Gênesis — Juizes. A história das relações entre esses dois povos vem desde os tem pos dos patriarcas, quando Abraão fez sua fatídica visita ao Egito (Gn 12.10-20). Seguindo os dados cronológicos apresentados no AT e usando a versão da LXX para Êxodo 12.40, é pro vável que Israel tenha se mudado para o Egito 215 anos antes do êxodo. (De acordo com o TM, essa mudança ocorreu 430 anos antes do êxodo.) Pela data mais recente, Abraão passou pelo Egito durante a Décima Segunda Dinastia, no século XIX a. C., quando a capital egípcia era Liste, na região de Mênfis (ao sul da cidade moderna do Cairo). O motivo alegado para a visita de Abraão foi a fome na Palestina. É possível que condições semelhantes tenham força do Isaque a fazer essa mesma viagem, que, no entanto, foi impedida pela intervenção divina (Gn 26.2-3). Deus reitera a Isaque o compromisso com a aliança realizada com Abraão de dar aos descendentes do patriarca a terra de Canaã. Conseqüentemente, a ida de Isaque ao Egito poderia ameaçar o cumprimento dessa promessa. Apesar de tal preocupação, Deus incentivou Jacó a emigrar para o Egito com a família a fim de ficar com José durante um outro período de penúria. Lá, Deus transformou os descendentes de Israel numa grande nação e, a seu tempo, os levou à terra prometida (Gn 46.2-4). Apesar da opressão sofrida pelos israelitas no Egito e descrita em Êxodo I—2 e 5, fica claro que Deus tinha um propósito com a estada temporária de Israel naquele país. Em pri meiro lugar, a iniqüidade dos amorreus (um termo usado para todos os povos de Canaã) ainda não havia chegado a um ponto em que fosse necessário executar o julgamento de Deus que resultaria na perda da posse da terra por ocasião da conquista israelita (Gn 15.16; V. P. Hamil ton, The Book o f Genesis Chapters I—17, NICOT, 1990, 436). Como a história demonstrou posteriormente, Israel não demorou para ser seduzida pela religião sincrética dos cananeus. Se a nação de Israel teve dificuldades em permanecer fiel a Javé, como seria possível a iden tidade religiosa original do clã de Abraão sobreviver? No Egito, a família de Jacó pôde viver com alguma autonomia religiosa que não teria encontrado em Canaã, e lá os filhos de Israel 557
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sobreviveram à terrível fome que assolava Canaã, graças à revelação de Deus a José sobre os sete anos vindouros de escassez. Em segundo lugar, Deus usou a impotência total de Israel diante da força de Faraó para redimir Israel e deixar claro que todo o crédito pela salvação do povo pertencia ao Senhor. Argumentações mais recentes afirmam que as pragas (->) representaram um confronto final entre Deus e Faraó, o deus do Estado egípcio (Hoffmeier, “Plagues o f Egypt,” ABD 2:374-77). Javé triunfou sobre Faraó e sobre o Egito (Êx 14.4). Depois do êxodo, Deus deu a seguinte instrução a Israel com referência ao Egito: “[não] fará voltar o povo ao Egito” (Dt 17.16). No contexto desse versículo, o futuro rei de Israel é ordenado a não buscar o auxílio militar do Egito, especialmente para comprar cavalos. E comum dizer-se que essa declaração é uma “polêmica deut.” contra a prática de Sa lomão descrita em 1 Reis 10.26-29. Diante da ausência de qualquer condenação do historiador deut. à conduta de Salomão, trata-se de uma sugestão improvável. Uma idéia mais plausível é que Deus procurava mostrar a Israel que o Egito e seu poder militar, exemplificado por car ros e cavalos, mostrou-se impotente diante de Javé quando ele estendeu seu braço poderoso sobre o mar Vermelho (cf. Êx 15.1 - 6 ). Por que, então, Israel iria querer buscar a ajuda militar do Egito? (cf. Hoffmeier, “Egypt As an Arm o f Flesh,” 83-84). Esse tema é repetido nos pro fetas (ver abaixo). Houve mais sofrimento nas mãos de Faraó Memepta (1213-1204), que invadiu a Pa lestina c. 1208 a. C. e que menciona ter feito contato com Israel. Em sua famosa “Esteia de Israel”, Memepta se gaba de que “Israel está destruída, desprovida de semente” (M. Lichtheim, Ancient Egyptian Literature, 1976,2:73-77). Esse acontecimento que, surpreendentemente não aparece no AT, deve ter ocorrido durante o período dos Juizes. 2. De 1000-586 a. C. Enquanto Israel ainda era um reino unificado, suas relações co o Egito eram amistosas, culminando com um tratado entre Salomão e Faraó — que, na época, provavelmente era Siamum — pelo qual Salomão casou-se com a filha de Faraó (K. A. Ki tchen, The Third Intermediate Period in Egypt (1100-650 BC), 1986, §§ 235-36). Além disso, A. R. Green acredita que existiu algum tipo de tratado entre Davi e o antecessor de Siamum, Psusenes 1 (“Solomon and Siamun: A Synchronism Between Early Dynastic Israel and the Twenty-First Dynasty o f Egypt,” JBL 97, 1978,362, n. 48). A era de Davi e Salomão marcou um ponto baixo do Egito em termos políticos e militares. Com dinastias rivais governando em Tànis e Tebas, o Egito era um país dividido que jamais voltaria a ser uma potência imperial. Conseqüentemente, nesse momento da história, Salomão desfrutava uma posição de superio ridade, o que se reflete no fato de ele haver recebido uma princesa egípcia. Quando, em 931 a. C., o reino foi divido entre Roboão, o sucessor de Salomão e Jeroboão I (->) que assumiu o controle das tribos do Norte, o Egito voltou a ter mais poder que Israel/Judá. A XXI Dinastia, com a qual havia se mantido relações cordiais, foi usurpada por um chefe tribal líbio, chamado na Bíblia de Sisaque. 1 Reis 14.25 e 2 Crônicas 12.2-9 relatam que Sisaque humilhou Judá e Jerusalém. A invasão continuou rumo ao Norte, subjugando vá rias cidades de Jeroboão, de acordo com a lista de cidades do templo de Camaque, em Tebas (ANET, 242-43, 263-64). Ironicamente, quando Jeroboão fugira para o Egito para refugiar-se de Salomão alguns anos antes, foi acolhido por esse mesmo Sisaque (1 Rs 11.40). A conduta de Sisaque deveria servir de lição para Israel e Judá, mostrando como não se podia confiar no Egito como aliado. A hostilidade egípcia voltou a ser sentida durante o reinado do piedoso rei Asa (->) (911-870 a. C.). O cronista relata a invasão de Zerá, o etíope, com um exército enorme (2Cr 14.9). Apesar de alguns estudiosos questionarem a historicidade desse aconteci mento (ABD 6:1081), afirmando que se tratava de uma memória do período depois do exílio, 558
Egito
outros sugerem que Zerá era um chefe tribal beduíno (IDB, 4, 953-54; S. Hidal, “The Land of Cush in the Old Testament,” SEÂ 41-42, 1976-77, 100-101), uma vez que Cusã é identifica da com os midianitas (cf. Hc 3.7). Uma solução ainda melhor é considerar esse exército uma força mercenária liderada por Zerá (J. Bright, A History o f Israel, 1983, 234-35), trabalhando para Osorcão I, sucessor de Sisaque. Essa idéia tem o apoio da descrição bíblica do exército, o qual continha líbios que estavam no poder no Egito (2Cr 16.8), e do fato de esse exército usar carros (2Cr 14.9). É improvável que os beduínos tivessem carros e, muito menos que os empregassem em combates (Hoffmeier, “Egypt As an Arm o f Flesh,” 8 6 ). Pode-se concluir, portanto, que uma invasão real forçou Asa a clamar pelo socorro de Deus, resultando numa vitória de Judá (2Cr 14.12-15). No crepúsculo da história de Israel, Oséias de Samaria buscou a ajuda do Egito para enfrentar a Assíria (2Rs 17.4). Ao que parece, essa ajuda não veio e as tribos do Norte foram exiladas (2Rs 17.5-6). A identidade de Sô, em 2 Reis 17.4, é motivo de amplas discussões (cf. recentemente ABD 6:76-77). As sugestões são variadas: alguns acreditam que fosse a cidade de Sais, no Delta (siw egípcio) do Egito; outros, que era o nome de um rei saíta; e outros ainda, que se tratava de uma abreviação do nome de Osorcão IV, rei de Tânis (730-715 a. C.). E bem prová vel que o pedido de ajuda de Israel para o Egito, um inimigo de longa data, tenha sido o motivo da condenação enérgica de Isaías por Israel confiar nos cavalos e carros do Egito (Is 31.1). 2 Reis 19.9 e Isaías 37.9 mencionam rapidamente que quando Ezequias (->) entrou confronto com Senaqueribe (->) da Assíria (->) em 701 a. C., Tiraca, rei da Etiópia ajudou Judá. Etíopes de Napata (Sudão) controlaram o Egito de c. 715 a 664 a. C., a XV Dinastia do Egito. No tempo da invasão, não era Tiraca quem estava reinando, mas sim seu irmão mais velho Sebitco, e Tiraca era seu representante. Na época mais provável em que esse capítulo foi registrado, c. 681/680 a. C. (a julgar pela menção feita ao assassinato de Senaqueribe no final do capítulo), Tiraca já havia se tomado rei, daí o texto referir-se a ele como melek (Kitchen, Ancient Orient and Old Testament, 1966, 82-84). Mais uma vez, o Egito mostrou-se incapaz de apoiar Judá. Nesse caso, não há nenhuma evidência no texto bíblico de que Ezequias tenha pedido os reforços, apesar de os anais de Senaqueribe dizerem que tal pedido foi feito (ANET, 287-88). Isaías, que trabalhou junto com Ezequias durante essa crise, certamente não teria permanecido calado se o rei de Judá tivesse pedido a ajuda do Egito. Antes, ao que parece, os etíopes agiram por interesse próprio, tomando uma atitude preventiva. A fé resoluta de Eze quias está refletida em sua exortação às tropas: “Sede fortes e corajosos, não temais, nem vos assusteis por causa do rei da Assíria, nem por causa de toda a multidão que está com ele; porque um há conosco maior do que o que está com ele. Com ele está o braço de came, mas conosco, o Senhor, nosso Deus, para nos ajudar e para guerrear nossas guerras. O povo cobrou ânimo com as palavras de Ezequias, rei de Judá” (2Cr 32.7-8). A referência ao braço de came visa apresentar um contraste com o braço poderoso de Deus que triunfou sobre Faraó e os egípcios no êxodo do Egito (cf. Êx 6 .6 ; 15.6,12, 16; Dt 9.29; 26.8; Hoffmeier, “The Arm o f God,” 37887). Assim como Javé havia dado a Israel a vitória sobre os egípcios naquela ocasião, também o faria no combate contra a Assíria. Uma mudança na XVI Dinastia transformou Sais (na região noroeste do delta) na ca pital egípcia. Esses reis almejavam um maior controle do Levante enquanto o império assírio sucumbia. Neco II mudou-se para a Palestina, numa tentativa aparente de apoiar o remanes cente assírio contra o poder em ascensão dos caldeus. O rei Josias entendeu as motivações de Neco e tentou impedi-lo, resultando na morte prematura desse extraordinário rei de Judá (2Rs 23.29). Depois disso, Neco depôs Joás II (Salum), levando-o cativo para o Egito, colocando no trono Jeoaquim e exigindo que este lhe pagasse tributo (2Rs 23.33-35). Durante esse breve 559
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período, Judá sofreu humilhação nas mãos do Egito, um fato que pode encontrar-se refletido em Jeremias 2.16. Sob o comando de Nabucodonosor, não tardou para que os caldeus tomassem dos egípcios o controle sobre Judá em 605 a. C. (2Rs 24.1; Dn 1.1 -2). Depois de várias rebeliões mal sucedidas, quando Judá estava à beira da aniquilação, Zedequias voltou-se de novo para o Egito em busca de reforços militares (Ez 17.15). Faraó Apries ou Hofra de Jeremias 44.30 respondeu a esse pedido, mais foi completamente derrotado pelos caldeus e Jerusalém foi des truída. Mais uma vez, a ajuda do Egito mostrou-se inútil. Apesar da longa história do Egito com um inimigo ou um aliado incerto, muitos judeus fugiram para o Egito depois da queda de Jerusalém (Jeremias 42— 43). 3. A literatura profética. Tendo em vista a relação entre Israel e o Egito ao longo d séculos, não é de se surpreender que o Egito seja o alvo de vários oráculos de Jerusalém. Todos os profetas maiores têm algo a dizer sobre o Egito e Israel (Is 19; Jr 46; Ez 29—32). Em termos históricos, o Egito havia sido uma nação poderosa, controlando um império que, no século XV, se estendia além do rio Eufrates. Até o século XII, os egípcios dominaram os acontecimentos políticos da Palestina e da Síria com seu poderio militar. No primeiro milê nio, porém, o Egito já não era mais a “superpotência” de outrora. Ao se dirigirem a Ezequias, os oficiais assírios de Senaqueribe ridicularizaram o Egito: “Confias no Egito, esse bordão de cana esmagada, o qual, se alguém nele apoiar-se, lhe entrará pela mão e a traspassará; assim é Faraó, rei do Egito, para com todos os que nele confiam” (Is 36.6). Conforme indicado na revisão histó rica acima, os reinos de Israel e Judá buscaram a ajuda militar do Egito em várias ocasiões para conter as invasões da Assíria e da Babilônia. Os profetas se deram conta de como era inútil con fiar no Egito, pois se tratava de uma nação fraca. Isaías refere-se ao Egito da seguinte maneira: “Pois, quanto ao Egito, vão e inútil é o seu auxílio; por isso, lhe chamei Gabarola que nada faz” (Is 30.7). O termo usado para Garabarola também pode ser Raabe, numa referência ao monstro marinho cananeu, que simbolizava o caos primitivo. Assim como Raabe, quando comparado ao poder de Javé, o Egito era insignificante. Ezequiel usa essa mesma imagística no século VI, comparando Faraó ao “grande monstro (marinho)” (hattanním haggãdôl), outra criatura mito lógica dos cananeus associada a Raabe (->) e Leviatã (“crocodilo enorme”; Ez 29.3). Essas declarações são inequívocas: o Egito não tinha poder algum para ajudar pois encontrava-se enfraquecido. Ainda que tivesse sido uma superpotência, Deus já havia triun fado sobre o Egito no êxodo e, portanto, era impensável para Israel buscar a ajuda do Egito quando Javé era o Deus dos israelitas. Os oráculos de Jeremias e Ezequiel também advertem quanto ao dia de julgamento do Egito, que pode ser associado à invasão de Nabucodonosor em 568 a. C. Porém, nem tudo o que os profetas tinham a dizer sobre a relação entre o Egito e Israel era negativo. Numa seção que costuma ser como de natureza escatológica (H. M. Wolf, Interpreting Isaiah, 1985, 125), Deus afirma: “Naquele dia, Israel será o terceiro com os egípcios e os assírios, uma bênção no meio da terra; porque o Senhor dos Exércitos os abençoará, dizendo: Bendito seja o Egito, meu povo, e a Assíria, obra de minhas mãos, e Israel, minha herança” (Is 19.24-25). “Meu povo” é uma denominação geralmente reservada para Israel como povo da aliança de Deus. Aqui, vislumbra-se uma liga entre o Egito e Israel na qual ambos são parte da mesma relação de aliança com Deus. B ib l io g r a f ia
ABD 2:374-77; C. F. Aling, Egypt and Bible History: From Earliest Times to 1000 B.C., 1981; J. K. Hoffmeier, “The Arm o f God Versus The Arm o f Pharaoh in the Exodus Narratives”, Bib 560
Eli
67, 1986, 378-87; idem, “Egypt As an Arm of Flesh: A Prophetic Response”, in FS Harrison, 1988, 83-84; K. A. Kitchen, “Israel Seen From Egypt: Understanding the Biblical Text from Visuais and Methodology”, TynBul 42, 1991, 113-26; A. F. Rainey, ed., Egypt, Israel, Sinai: Archaeological and Historical Relationships in the Biblical Period, 1987; D. B. Redford, Egypt, Canaan and Israel in Ancient Times, 1992. James K. Hoffmeier
Eli
Eli (''JV [ elí], # 6603).
1. Em 1 Samuel Eli é apresentado como sacerdote e juiz. Aparece como principal sa cerdote na cidade de Siló, enquanto sua magistratura (cf. ISm 4.18) pode ser comparada aos papéis atribuídos a certos juizes “menores” no Livro de Juizes (->). A maneira como os filhos de Eli, Hofni e Finéias, são apresentados em 1 Samuel 1.3 indica que a administração dos as suntos de rotina de Siló havia sido passada do pai ancião para eles (cf. 1Sm 2.12-17). São des critos como homens perversos (“filhos de Belial”; 1Sm 2.12), que por cobiça se aproveitavam dos adoradores em Siló quando estes iam oferecer sacrifícios. Tendo como pano de fundo a passividade de Eli e a falta de caráter de seus filhos, Ana, esposa de Elcana toma uma atitude em Ramataim. E notável que no contexto da sociedade e religião do AT, algo tão crítico para os acontecimentos subseqüentes do livro de Samuel (->) tenha sido iniciado por uma mulher. A princípio, Eli não compreende o motivo da aflição de Ana quando a observa orando em Siló, mas profere uma bênção — um caso raro de narrativa de uma bênção sacerdotal no AT — em resposta à explicação que ela lhe dá. Sua oração é para que tenha um filho que, num gesto de gratidão, ela consagrará a Deus, possivelmente como nazireu (ISm 1.11; cf. Nm 6.5). (A declaração no v. de que sobre a cabeça do menino não passaria navalha pode ser uma alusão intertextual a Sansão, especialmente no que se refere ao seu papel de libertador de Israel das mãos dos filisteus.) 2. A história da ascensão de Samuel (->) e da rejeição dos filhos de Eli é contada numa série de seções contrastantes que chegam ao auge com o reconhecimento de Samuel como um profeta “desde Dã até Berseba” e com a morte de Hofni e Finéias numa batalha contra os filis teus (1 Sm 2.11,12-17,18-21,22-25,26,27-36; 3.1 —4.1 a; 4.1 b-22). A importância da relação com Eli encontra-se intimamente associada ao papel de Siló nesse período e ao fato de que o relato de 1 Samuel 1— 4 da destruição do antigo lugar central do santuário prepara o caminho para que, a seu tempo, Jerusalém se tome a cidade a abrigar a arca da aliança e o ponto focal do culto nacional israelita durante o período monárquico. No discurso a Deus do homem anônimo em 1 Samuel 2.27-36, a história desse ramo da linhagem sacerdotal de Arão é resumida desde o começo (v. 27) até a desgraça de Abiatar e seu banimento para o campo (v. 36; cf. 1Rs 2.2627). Esse relato trata da anulação de uma aliança com a família sacerdotal que deveria ter sido um pacto eterno (1 Sm 2.30). Eli não é poupado da condenação, mas considerado pessoalmente responsável pelos atos de seus filhos, os quais ele é acusado de honrar mais do que a Deus (v. 29). No v. 35 parece haver uma referência a Zadoque (->), como o “sacerdote fiel” cujos des cendentes oficiaram no tempo da monarquia davídica (cf. 2. Sm. 8.17; 20.25; lRs 1.38-39). 3. Em 1 Samuel 3, a ameaça de julgamento é comunicada ao menino Samuel num en contro noturno com o Senhor e toda a questão da rejeição de Eli, da família dele, e do santuário em Siló é colocada novamente no âmbito profético. A primeira fase do julgamento é executada quando ocorre a segunda derrota do exército israelita pelos filisteus, acarretando na perda da arca da aliança e na morte de Hofni e Finéias (1 Sm 4.11; cf. 2.34). A tragédia continua com o 561
Elias e Eliseu
assassinato dos sacerdotes de Nobe (1 Sm 22.9-20) que, evidentemente, dariam continuidade à tradição de Siló (1 Rs 2.26-27). Contudo, apesar de Eli ser censurado por não corrigir o abuso de autoridade dos filhos, ele é retratado demonstrando uma piedosa preocupação com o bemestar da arca da aliança, a ponto de a notícia da captura dela deixá-lo mais arrasado que o re lato da morte dos dois filhos (cf. 1Sm 4.13 [“porque o seu coração estava tremendo pela arca de Deus”], 18 [“ao fazer menção da arca de Deus”]). A mesma atitude fica evidente no comportamento da cunhada de Eli, antes de morrer ao dar à luz (ISm 4.21). Seu filho Icabô (“não há glória” ou possivelmente, “Onde está a gló ria?”) recebe esse nome em decorrência da captura da arca e da morte do sogro e do marido (ISm 4.21). Essa associação do conceito de glória com a arca da aliança é consoante com a preferência do uso do termo “glória” (kãbôd, # 3883) em trechos de caráter sacerdotal do AT, como o termo apropriado para expressar a idéia da presença divina, ao contrário do uso deut. de “nome” (sêm, -> # 9005), para transmitir uma imagem mais matizada dessa mesma presença. Trata-se de um termo que apresenta uma ressonância especial com a descrição feita por Ezequiel da partida da presença divina (“glória”) de Jerusalém no tempo do exílio (cf. Ez 9.3; 10.18-19; 11.22-23), e, de fato, a oração em 1 Samuel 4.21 pode ser devidamente traduzida como “A glória foi exilada de Israel”. O fim trágico da casa de Eli, conforme o relato de 1 Samuel, é, por vezes, considerad um prenuncio da rejeição da casa de Saul em favor de Davi. Porém, se I Samuel 14.3 é inter pretado como uma indicação de culpa por associação (“Aías, filho de Aitube, irmão de Icabô, filho de Finéias, filho de Eli, sacerdote do Senhor em Siló”), também é preciso lembrar-se de que Abiatar, dessa mesma família sacerdotal, tomou-se um defensor de Davi depois do massa cre dos sacerdotes em Nobe (1 Sm 22.20-23). Abiatar foi consagrado sacerdote juntamente com Zadoque no reinado de Davi (2Sm 20.25) mas, no final desse reinado passou a apoiar Adonias (lR s 1.7), e assim foi deposto por Salomão (1 Rs 2.26-27). O fim do sacerdócio e do santuário em Siló é lamentando no Salmo 78.60-64, numa recapitulação da história de desobediência de Israel e do julgamento de Deus sobre o povo (“os seus sacerdotes caíram à espada, e as suas viúvas não fizeram lamentações”). B ib l io g r a f ia
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Elias e Eliseu
Elias OIT’1?!* [ 'êliyyãhü], Javé é Deus [ou El] # 489) e Eliseu [ 'elisã'], # 515).
A. As histórias No texto atual dos livros de Reis — de 1 Reis 17.1, em que Elias entra em cena e con fronta Acabe, até 2 Reis 13.21, quando os ossos de Eliseu realizam seu último milagre de cura — temos uma coleção singular de tradições ligadas aos dois homens. Essas histórias são algu562
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mas das mais conhecidas da Bíblia: são inesquecíveis, fascinantes e profundamente enigmáti cas. Os dois “profetas” (apesar de raramente serem assim chamados) parecem tomar conta da narrativa. Essa predominância é intencional. As histórias habituais que narravam a recompensa (se era “bom”) ou castigo (se era “mau”) do rei, em que o rei é a figura central, foram sobre pujadas por esses curiosos relatos proféticos. Nessas história, “o poder do rei é caracterizado repetidamente como fraco e inútil, enquanto o profeta pode dar a vitória, a cura e até mesmo a vida” (Wesley J. Berger em Coote, 131). É possível que esses relatos nem se encaixem na es trutura histórica. Em 2 Reis 2.1-5, por exemplo, a transferência de cargo de Elias para Eliseu vem depois da frase padrão final sobre o reinado de Acazias em Israel (2Rs 1.17-18) e antes da observação inicial sobre a ascensão de Jorão ao trono de Israel (2Rs 3.1-3). Walsh considera esse fato “incomum”, enquanto McKenzie mostra como essas histórias também desarranjam a cronologia (97). Normalmente, as histórias encontram-se associadas ao reinado dos monarcas de Israel, mas a idéia de que o D incorporou uma história profética mais antiga à sua obra não é provável (ver Campbell e McKenzie, 11-14 sobre Campbell e McCarter). 1. Há dois conjuntos de histórias relativas ao reinado de Acabe. a. 1 Reis 17— 18 apre senta uma narrativa extremamente estruturada sobre Elias, à qual se encontra ligado o cap. 19 (ver McKenzie, 82). b. 1 Reis 20.1—22.38 é uma coleção de histórias sobre o profeta/homem de Deus/discípulos dos profetas, voltadas principalmente para as guerras contra Arã e assim, relacionadas de modo mais próximo aos relatos sobre Eliseu. Dentro desse grupo, encontra mos a história da vida de Nabote, ligada pela expressão sar v^zã 'êp, desgostoso e indignado (1 Rs 21.4; sendo que o único outro exemplo dessa expressão pode ser visto em IRs 20.43) à narrativa anterior (1 Rs 20.35-43). Elias aparece depois de concluído esse episódio, como Natã no caso de Davi em 2 Samuel 12.7-15, para acusar o rei, profetizar o castigo, observar o arre pendimento e transferir o castigo para o filho do rei. 2. Elias volta a aparecer no reinado de Acazias em Israel e é levado embora deste mun do depois da morte de Acazias (2 Reis 1— 2). 3. Eliseu é apresentado no reinado de Acabe (IRs 19.16-17, 19-21), mas suas histó rias mais importantes começam sem data em 2 Reis 2 e a maioria delas ocorre no reinado de Jeorão de Israel. 4. Eliseu é ligado marginalmente às histórias de Jeú (que, de outro modo, são histórias “normais” sobre o rei), sendo mencionado apenas em 2 Reis 9.1 como aquele que enviou “um dos discípulos dos profetas”. Em várias histórias essa comunidade profética encontra-se rela cionada a Eliseu de modo mais.próximo. Já nas histórias do tempo de Acabe, Elias não está associado a nenhuma comunidade desse tipo. 5. Depois disso, Eliseu sai de cena e só volta à narrativa no reinado de Joás de Israel. Em outra narrativa fora da estrutura básica do texto (depois da frase padrão sobre a vida de Joás, 2Rs 13.10-13, e antes de Amazias de Judá subir ao trono, 2Rs 14.1-4), é apresentada a última profecia de Eliseu em vida e um ato simbólico, além da ressurreição de corpo depois da morte do profeta (2Rs 13.1 -25). Muitas das narrativas descrevem pessoas semelhantes em certos aspectos aos encan tadores de outras culturas. Ainda que o termo “xamanismo” não seja uma comparação muito apropriada (Overholt, apesar de possivelmente haver evidências de tipos xamãs no AT), foram citados par. africanos (Wendland). As histórias que chamam o personagem principal de “homem de Deus” (p. ex., IRs 17.18, 24) parecem, de fato, enfatizar os atos poderosos, além das habi lidades de pessoas comuns. No livro de Reis, Elias raramente é chamado de profeta; a expres são “o profeta Elias” ocorre somente em 1 Reis 18.36, mas é encontrada em 2 Crônicas 21.12 563
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(sem par. em Reis) e em Malaquias 4.5. As únicas outras referências a ele como profeta são as frases que descrevem seu caráter singular: 1 Reis 18.22; 19.10, 14. Quando é identificado em outras seções, é chamado de “o tesbita” (lR s 17.1; 21.17, 28; 2Rs 1.3, 8 ; 9.36). 1 Reis 17.1 parece explicar essa denominação pois esta é seguida de “um dos colonos (tõsãbê) de Gileade” (sentido aproximado no TM), sendo que nesse caso, a explicação parece usar um trocadilho. Porém, a LXX traduz a frase como “de Tisbe, em Gileade” e acrescenta a palavra profeta, que provavelmente não se encontrava no original. A expressão “homem de Deus” é relativamente comum em Crônicas (em particular com referência a Moisés e Davi; cf. Sl 90: título[ 1]), em Neemias e uma vez em Jeremias. Em D, é usada para Moisés, Samuel, um anjo (Juizes 13) e um homem de Judá (1 Reis 13). 0 retrato geral apresentado de Elias é uma composição de diferentes perspectivas. Em 1 Reis 17— 18 ele é um segundo Moisés, realizando maravilhas, desafiando o rei e proclaman do a primazia de Deus (ver p. ex., Gray, 376, citando Fohrer, Elia, 1957, 48; McKenzie, 83; Walsh, 464). No capítulo 19, é uma figura extremamente humana pronta para renunciar sua comissão. Em 1 Reis 21.17-29, ele é mostrado como o profeta arquetípico ao confrontar o rei com questões éticas. Em outras passagens, o cumprimento de suas profecias, juntamente com aquelas de outros profetas, constituiu um dos temas de Reis. A principal passagem sobre Elias (1 Reis 17— 19) contém a maior parte das narrativas de relevância teológica. As história de Eliseu, pelo contrário, tem relativamente pouca rele vância em termos teológicos. Por vezes a história apresenta a profecia e seu cumprimento (ver 2Rs 4.43,44; também 7.1, 16, “palavra do Senhor”; 7.2, 17-20, “homem de Deus”). A história horrível da morte dos meninos que riram de Eliseu (2Rs 2.23-25) é relatada sem nenhum co mentário editorial e, nos tempos modernos, tem causado reações como “trata-se, em todos os sentidos, de um conto pueril... sendo derrogatório para essa grande figura pública e beirando a blasfêmia” (Gray, 479-80). E importante observar que Eliseu não exerceu o mesmo fascínio que Elias na literatura pós-bíblica e subseqüente. B. O conteúdo das histórias 1. a. O relato de 1 Reis 16.34 provavelmente corresponde à avaliação de Acabe no 30. A segunda avaliação prossegue dizendo: “tomou por mulher a Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios; e foi, e serviu a Baal, e o adorou. Levantou um altar a Baal, na casa de Baal que edificara em Samaria. Também Acabe fez um poste-ídolo” ( lRs 16.31-33). 1 Reis 17.1 dá início ao castigo por esses atos: a seca. Esse é o tema que une os caps. 17— 19. Contudo, as tentativas de se interpretar todos os detalhes em termos do tema de seca/ chuva e/ou oposição a Baal mostram-se forçadas (verTromp). O isolamento de Elias junto à torrente de Querite (1 Rs 17.3-6) prefigura o tema da perseguição. As histórias sobre a viúva de Sarepta são ligadas a essa narrativa pelo tema do esgo tamento da torrente e de Elias pedindo água (lR s 17.10), naquilo que transformar-se também numa súplica por alimento. O Senhor também deu ordens (v. 9) à viúva mas, ao contrário dos corvos (ver v. 4), ela não sabe disso. Nessa passagem vê-se o tema da “prova do recebedor dig no”. O milagre da alimentação é seguido de um milagre de ressurreição — ambos derrotando a morte (f. Hauser, 12, apesar de haver dúvidas quanto a esta ser “a verdadeira luta”). É difícil compreender-se a importância de Sarepta como lugar. Apesar de estar indicado “que pertence a Sidom”, a viúva não é retratada explicitamente como uma estrangeira (para “teu Deus” no v. 12, cf. 2Sm 14.11). Ottoson pode estar correto ao detectar uma crença de que a cidade, apesar de pertencer “a Sidom”, deveria estar dentro das fronteiras de Israel (ver Obadias 20, a única outra referência) e ao dizer que “a tribulação de Elias para lá é uma confirmação ideológica 564
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da autoridade de Javé sobre a terra prometida” (Ottoson, 193). Contudo, o tema principal das histórias em si é a confirmação da autoridade do “homem de Deus” bem como a confirmação da “palavra do Senhor” (cf. Levin). Essas duas histórias têm par. nas narrativas sobre Eliseu (2Rs 4.1-7; 18— 37). A narrativa da seca, propriamente dita, é retomada em 1 Reis 18.1. Nessa ocasião, Deus promete incondicionalmente enviara chuva. O rei é apresentado de maneira trivial: ele próprio está procurando pastagem para seus animais com apenas um servo, seu mordomo Obadias, que “temia muito ao Senhor”. A história termina com 1 Reis 18.41-46, em que Elias transmi te a mensagem de 1 Reis 18.1: “Então, disse Elias a Acabe: Sobe, come e bebe, porque já se ouve ruído de abundante chuva” (v. 4 1). A verdadeira condenação de Acabe encontra-se em 18.18, em que , usando da melhor linguagem deut., Elias acusa o rei de abandonar o Senhor e seguir baalins. Entre uma passagem e outra, em 1 Reis 18.21-40, vê-se uma competição entre Javé e Baal. Nos vv. de transição 19-20, Acabe convoca o povo, juntamente com os profetas de Baal, para irem ao monte Carmelo. Então Acabe desaparece da narrativa, cujo enfoque passa a ser o povo. Eles “ [coxeiam] entre dois pensamentos” (18.21). A competição é simples: “o deus que responder por fogo esse é que é Deus” (18.24). Será Javé ou Baal? De acordo com 2 Reis 1.10, 12, a capacidade de fazer descer fogo do céu é própria do “homem de Deus”. Nessa passagem, o fogo destrói todo o local do sacrifício. Devemos considerar Elias um feiticeiro? Tromp afirma que se o ato de derramar água tinha a intenção de ser um tipo de “magia empática”, “então é um tanto surpreendente ler que Elias escarneceu dos profetas de Baal sobre práticas de magia que ele próprio estava prestes a realizar" (485). Contudo, para o escritor, nem Elias nem os profetas de Baal estão praticando magia. Isso contrasta com Êxodo 7 .11 (citado com freqüência nesse contexto), em que os ad versários de Moisés de fato usam de magia, uma vez que não têm um deus para invocar. Não se trata tanto da distinção entre curandeiro e feiticeiro (ver Wendland), mas sim entre encantador e sacerdote. Os atos de Elias, assim como os dos profetas de Baal, são rituais. Tromp argumenta que o julgamento pelo fogo é um episódio separado da vinda da chuva, mas que se encontra relacionado pela associação de fogo (relâmpago) com tempestade. Tanto Elias quanto os profetas de Baal invocam seu deus, mas Baal toma-se motivo de zombaria. Se ele existe — e sua inexistência não é declarada especificamente — não é capaz de responder e, portanto, não é o Deus ’elõhim. Os profetas não são páreo para Elias e os prodígios provam que ele é um “homem de Deus”. O povo se volta para Deus (IRs 18.37, 39) e os elementos estranhos — os profetas de Baal — são destruídos. Nesse conjunto de histórias Jezabel não desempenha papel algum. Ela é introduzida no texto de modo parentético, como aquela que exterminava os profetas de Javé (v. 4) e alimentava os profetas de Baal (v. 19). No entanto, Jezabel é a ligação entre os caps. 17— 18 e 19. Essa ligação dá uma ênfase diferente à história que, de outro modo seria mais uma “história de Moisés” : uma jornada até o monte santo para encontrar-se com Deus, uma versão alternativa dos caps. 17— 18. Nessa história, Elias aparece como um homem vulnerável, carente de fortalecimento e convicção. O relato já foi interpretado como a renúncia de Elias (Walsh, 465, citando Coote) ou como a histó ria de um profeta jactancioso sendo repreendido (Gregory, “Irony in the Unmasking of Elijah,” in Hauser e Gregory). Porém, o objetivo principal da narrativa é ligar Elias a Eliseu e mostrar por que, mesmo depois do cap. 18, a adoração a Baal se estende até o tempo de Jeú. A “ressunção repetitiva” (IRs 19.10, 14) pode ser uma indicação do caráter composto da narrativa. O significado exato da teofania nos w . 11-13 é obscuro e controverso, mas se considerarmos a ênfase na palavra e não nos prodígios, então é possível que não estejamos 565
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muito longe da verdade. O discurso em Horebe transmite a palavra divina que se cumprirá nas narrativas de 2 Reis. Os adversários de Elias morrerão pela espada e o testemunho do Senhor permanecerá, não apenas por meio de Jeú e Eliseu, mas também por meio daqueles sobre os quais Deus diz: “conservei em Israel sete mil, todos os joelhos que não se dobraram a Baal” (lR s 19.17-18). Nas narrativas subseqüentes, Elias não realiza a unção de reis (vv. 15-16), mas somente o chamamento de Eliseu. b. A história do reinado de Acabe poderia terminar aí, com ele morrendo aparentemen de causas naturais (1 Rs 22.40), mas um novo tema é apresentado: a morte violenta de Acabe e a ruína de sua dinastia. O cap. 20 introduz o tema da guerra com Arã e a morte de Acabe (v. 42). Trata-se de um conjunto de narrativas sobre o profeta e o homem de Deus, sendo que destas, somente uma (o apêndice à história da vinha de Nabote) se refere a Elias. De modo geral, o cap. 20 mostra-se fa vorável a Acabe, relatando suas vitórias e boas relações com os profetas e homens de Deus. O relato sobre a vinha de Nabote é singular dentro da HDt: mostra todas as preocupações dos profetas com os oprimidos, com o abuso de poder, a justiça e a ética — temas notavelmente ausentes da HDt (e em grande parte de Ezequiel, -> gillúlim, # 1658). Para encaixar a história dentro da narrativa deut., encontramos comentários parentéticos como “Ninguém houve, pois, como Acabe, que se vendeu para fazer o que era mau perante o Senhor, porque Jezabel, sua mulher, o instigava; que fez grandes abominações, seguindo os ídolos [gillúlim, lit. imundícia] segundo tudo o que fizeram os amorreus, os quais o Senhor lançou de diante dos filhos de Is rael” (1 Rs 21.25-26). Trata-se de temas conhecidos na história em questão: os crimes cultuais são piores do que os morais e os homens são instigados pelas esposas a se desviar de Javé e adorar deuses estrangeiros (cf. Baal-Peor, Nm 25; Jz 3.6; e as esposas de Salomão). A conde nação cultuai não tem nenhuma relação com a história da vinha de Nabote! Os acontecimentos relatados nessa passagem são incompatíveis em termos de detalhes com a versão de 2 Reis 9.21-26 e ao aceitar 2 Reis 9 como sendo histórico, Williamson consi dera 1 Reis 21 como um “romance ou conto” ( 8 6 , cf. “ficção histórica” in Miller, 255). A his tória em 1 Reis 21.1-16 pertence ao mesmo gênero que as histórias de 2 Samuel 9.20 e 1 Reis 1 —2. Quando Acabe é frustrado em seu intento de conseguir a vinha próxima ao seu palácio por meio de compra ou troca (a idéia de que Nabote não podia vender suas terras por causa de costumes israelitas não parece correta; cf. Würthwein, 383-84), o rei fica angustiado como o “filho de Davi” em 2 Samuel 13. Então a esposa de Acabe faz as vezes de “sábia conselheira” que pode conseguir para o marido o que ele deseja; as considerações éticas tomam-se irrele vantes. Fica claro que essas histórias cumprem vários propósitos: Os ouvintes/narradores tiram suas próprias conclusões ou usam-nas para indicar sua própria conduta moral. Nesse contexto, a história é usada para retratar Elias (que só aparece em 1 Reis 21.17-29) como um profeta clássico e também para mostrá-lo profetizando os acontecimentos do tempo de Jeú (2Rs 10.10). Além disso, Acabe é julgado, mas (assim como Davi) o rei se arrepende e Deus altera-lhe o castigo (2Rs 21.29; cf. 2Sm 12.13). Isso parece significar que o próprio Aca be não será morto, mas sim o filho. A ligação dupla com Acabe e com o filho dele (Jorão) traz uma certa confusão para a narrativa. Não fica claro se a cena se passa em Jezreel (onde Jorão morre) ou em Samaria (onde o sangue de Acabe é lambido pelos cães) (ver esp. Williamson). A morte de Jezabel também é prenunciada nessa passagem. Apesar de Jezabel mostrarse amoral ao longo do relato, simplesmente atendendo os desejos do rei, semelhante a todos os “sábios conselheiros”, em virtude de sua associação com Tiro, ela se toma um exemplo não israelita de realeza. Assim, cria-se a ligação com 1 Reis 16.32; 19.1-2 e apresenta-se um tema comum com 2 Reis 11, a oposição às mulheres. 566
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2. Acazias de Israel chega ao trono em 1 Reis 22.51 e também é um adorador de Baal. Ele é castigado primeiro ao perder Moabe (2Rs 1.1 corresponde em gênero a lRs 16.34). Na seqüência, é relatada a morte de Acazias. Entre sua queda do telhado e o momen to de sua morte, ele mostra sua lealdade a Baal enviando mensageiros para o deus de Ecrom, Baal-Zebube. Elias é apresentado novamente como o tesbita e sua roupa característica é descrita. Trata-se, aparentemente, de sua identificação, como também era o caso com o falecido Samuel (ISm 28.14; cf. Zc 13.4). É possível que esses símbolos identificassem qual deus o devoto representava. Mais uma vez, Elias prova que é um “homem de Deus” ao fazer descer fogo do céu. Profetiza a morte de Acazias e o rei morre. Nessa passagem, Elias é descrito muito mais dentro dos padrões de Eliseu, mas ainda com a presença clara do tema de oposição a Baal. 3. As histórias de Eliseu não possuem uma estrutura geral semelhante à de 1 Reis 17— 19. São basicamente coleções de histórias que comprovam que Eliseu era homem de Deus tão po deroso quanto Elias. Eliseu é retratado como o defensor de Israel contra as nações estrangeiras, esp. Arã. A oração “Meu pai, meu pai, carros de Israel e seus cavaleiros!” (2Rs 2.12) é proferida na partida de Elias (2Rs 13.14) e novamente por Eliseu no leito de morte (13.14). Em 2 Reis 2.1-25 a autoridade profética é transferida de Elias para Eliseu. Esta con siste de uma série de prodígios para autenticar tanto Elias quanto Eliseu. Pertence claramente ao conjunto de histórias referentes a Eliseu (McKenzie, 79). Elias atravessa o Jordão usando sua capa como foco de poder. Decidido a segui-lo, Eliseu pede a porção dupla do primogênito. Elias é assunto aos céus num redemoinho (e não numa carruagem, como diz a lenda popular). Eliseu toma a capa, realiza o mesmo prodígio partindo as águas do Jordão e volta para Jericó. As histórias subseqüentes têm por objetivo mostrar que Eliseu é um sucessor digno de Elias. Jorão é perverso, porém não tão perverso quanto o pai ou o irmão (2Rs 3.2-3), de modo que Eliseu o ajuda ou, como o profeta prefere considerar, ajuda Josafá, rei de Judá (2Rs 3.14). 2 Reis 3.11 repete 1 Reis 22.7 referindo-se a Eliseu em vez de Micaías. Os reis são vitoriosos sobre os moabitas, mas o resultado final é o fracasso (2Rs 3.26). A história de Naamã, o leproso (2 Reis 5), é a que possui relevância teológica mais evidente. Mais uma vez, Eliseu encontra-se entre o furor de Arã e a ira do rei (2 Reis 5.7), a qual ele evita realizando uma cura. Na primeira metade da história, essa cura prova que “há profeta em Israel” (v. 8 , autenticação), mas na segunda metade encontramos a declaração “não há Deus, senão em Israel” (v. 15). Os sacrifícios realizados sobre o solo exportado de Israel (v. 16), assim como o altar no monte Carmelo, não cumpre os requisitos deuteronômicos! Geazi aparece em 2 Reis 4.12 como servo de Eliseu. O papel de Geazi é semelhante ao de Baruque em Jeremias. Na história em questão, Naamã contrasta com Eliseu, mostrando-se ganancioso e sendo acometido de lepra. Outro tema encontrado nessa passagem é a vidência do profeta (ver também 2Rs 6.12; cf. ISm 9.6, 20). Em 2 Reis 8.4, Geazi autentica essa tradição (mas a maldição de “lepra” não é levada em conta pelo autor). 4. Observamos como é tênue a ligação entre Eliseu e Jeú. 5. Em seu último ato (2Rs 13.14-20), Eliseu ainda é o baluarte contra Arã, usando de procedimentos rituais (que, em outro contexto, seriam magia). A fraqueza do rei (Jeoás) impede que as vitórias sejam definitivas. Cumpre-se a profecia de três derrotas dos arameus. P-B / NT Elias é mencionado com freqüência na literatura pós-bíblica, especialmente como precursor do Messias no fim dos tempos. No NT, tanto Jesus quanto João Batista são consi derados por alguns como o Elias ressurrecto. No relato de Lucas, subseqüente à transfigura ção, faz-se um contraste entre Jesus — que, como Elias, “devia ele ser assunto aos céus” (Lc 9.51; cf. 2Rs 2.1) — e Elias com referência à sua reação aos seus adversários (2Rs 1.10, 12; 567
Elifaz
cf. Lc 9.54-56). A partida misteriosa de Elias cativava a imaginação e foram atribuídos a ele alguns apocalipses. Eliseu, por outro lado, é mencionado uma só vez no NT (Lc 4.27), e a primeira referência pós-bíblica a ele encontra-se em Eclesiástico 48.12-14, numa paráfrase de textos de Reis. B ib l io g r a f ia
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Elifaz
Elifaz (TD’^ [ 'eiipaz], # 502).
AT Elifaz era, sem dúvida, o mais velho dos consoladores de Jó (Jó 2.11), uma vez que foi o primeiro a falar. Ele se mostra um poeta competente e em seu primeiro discurso (caps. 4— 5) começa num tom conciliatório, dando crédito a Jó por ser uma pessoa reta suportando o sofrimento com o propósito da disciplina (5.17). No entanto, ele menciona esse tema somente nesse versículo e depois não volta a tocar no assunto. Quando Jó não reage á sua abordagem diplomática, em mais dois discursos (caps. 15; 22) Elifaz finalmente concorda com os outros que Jó está recebendo aquilo que merece: “Porventura, não é grande tua malícia, e sem termo, as tuas iniqüidades?” (Jó 22.5). Bildade; -> Eliú;
Zofar; -> Jó: Teologia
B ib l io g r a f ia
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Eliú 568
Eliú On’’?» [ >elihü], # 490).
Eliú
AT O personagem Eliú (Jó 32— 37), apesar de prolixo e fastidioso de um ponto de vista moderno, apresenta uma abordagem diferente ao problema do sofrimento de Jó. A teologia de Eliú é mais equilibrada do que a dos três outros conselheiros, e ele responde às palavras de Jó, citando-as muitas vezes. Ao contrário dos outros, ele não acusa Jó de levar a vida de perversidade pela qual estava sendo castigado e, por esse motivo, Eliú não é condenado por Deus no Epílogo. Apesar de Eliú dar ares de santarrão ao falar da própria inspiração, o nível de seu discernimento espiritual é mais elevado do que o dos outros. No entanto, ele também não foi capaz de com preender o que, de fato, estava acontecendo do ponto de vista divino apresentado no Prólogo — que Jó estava sofrendo como servo escolhido para a glória suprema de Deus e para desmas carar o verdadeiro caráter de Satanás como o falso Acusador que mostrava ser. (-> Jó: Teologia) Bildade; -> Elifaz; -> Zofar B ib l io g r a f ia
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# 741 ( 'rb, ficar de tocaia, ficar à espreita)
Embotamento -> # 7733 (qhh, estar embotado) Embriaguez -> # 8910 (skr, estar embriagado) Empilhamento Empréstimo Empurrão
# 6148 (sll, amontoar, empilhar; ter em alta estima; resistir) # 4278 (Ihw II, tomar emprestado, emprestar)
# 1890 (dhh, empurrar, derrubar, ser humilhado)
Empuxo -> # 9546 (tq ', impelir, empurrar, bater palmas, tocar trombeta, penhorar) Encharcamento -> #8115 (rwh, beber sua porção, encharcar) Encontro Enfeite
# 7008 (pgs, encontrar-se com) # 6335 ( ’dh II, colocar adomos)
Enfermidade
# 5710 (nahalâ II, enfermidade, saúde precária)
Engano -> # 6814 ( ‘ãqõb I, enganoso) 569
Enoque
Engodo# 5396 (massã on, fraude, falsidade, dissimulação) Enigma# 2648 (hidâ, enigma, linguagem difícil, pergunta difícil)
Enoque
Enoque 0|ÍJrj [hanôk I], # 2840).
OMA Um par. importante pode ser encontrado num texto publicado por R. Borger (“Die Beschwõrungsserie Bit Mêsseri und die Himmelfahrt Henochs,” JNES 33, 1974, 183-96), que descreve o sétimo dos sábios da antigüidade como Utuabzu, “que ascendeu ao céu”. Utuabzu era conselheiro de Emeduranque, o sétimo rei antediluviano. AT O filho de Jarede é o mais conhecido dos quatro homens com o nome de Enoque (< hnk, consagrar [-> # 2852]; Gn 5.18-24). Os outros são filhos de Caim (Gn 4.17), Midiã (Gn 25.4) e Rúben (Gn 46.9). Na presente disposição do texto de Gênesis há uma distinção clara entre a posteridade de Caim, na qual o pecado toma-se cada vez maior (cap. 4) e na de Sete, na qual Deus é servido (cap. 5). Cada uma dessas genealogias apresenta um Enoque. O Enoque de Gênesis 5 é a sétima geração — um sinal de importância nas genealo gias do OMA (J. M. Sasson, “A Genealogical ‘Convention’ in Biblical Chronography.” ZAW 90, 1978, 175-76) — contando a partir de Adão. Viveu 365 anos e “andou Enoque com Deus” (Gn 5.24; hitp. hlk.; -> #2143), uma expressão que também é usada para Noé (Gn 6.9; cf. Mq 6 .8 ; Ml 2.6) a fim de indicar sua piedade fora do comum. Conforme Victor Hamilton observa: ‘“ Andar com’ compreende uma ênfase à comunhão e ao companheirismo” (The Book o f Ge nesis, NICOT, 1990, 258). “E já não era, porque Deus o tomou para si”. O vb. Iqh (-> # 4374) também é usado para se referir à ascensão de Elias (2Rs 2.10). E justificável concluir-se que, assim como o profeta, Enoque foi recebido na presença de Deus sem morrer. A repetição de “e morreu”, uma conseqü ência de Gênesis 3.19b é interrompida. É possível que a linguagem dos Salmos 49.15 [ 16] e 73.24 reflita a história de Enoque. Nesse caso, o exemplo da assunção de Enoque pode ter exercido uma certa influência sobre a esperança da vida com Deus além da morte. Ademais, ao mesmo tempo que uma vida longa é uma honra, uma vida com Deus é uma honra ainda maior (L. Zachmann, “Beobachtungen zur Theologie in Gen 5," ZAW 88,1976,272-74), (-> Gênesis: Teologia) NT Enoque é mencionado em Lucas 3.37 e Hebreus 11.5-6 (Gn 5.22 LXX) e Judas 14-15 cita 1 Enoque 1.9. P-B Ver Eclesiástico 44.16; 49.16; Sabedoria 4.10-14. Nos meios apocalípticos, uma grande quantidade de literatura foi dedica a Enoque como escritor, mestre da sabedoria e estudioso do apocalipse. Ver J. H. Charlesworth, The OTPseudepigrapha, 2 vols., 1983-85. (-> Apócrifos: Teologia) B ib l io g r a f ia
M. J. Paul, “Genesis 4:17-24: A Case-Study in Eisegesis”, TynBul 47, 1996, 143-62; A. Schmitt, “Die Angaben über Henoch: Gen. 5:21-24 in der LXX”, FzB, 1, 1972, 161-69; idem, “Entrückung-Aufnahme-Himmelfahrt: Untersuchung zu einem Vorstellumgsbereich im AT”, FzB, 10, 1973, 152-93; idem, “Zum Thema Entrückung im A T’, BZ 26, 1982, 34-49. Maarten J. Paul 570
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Ensino -> # 3723 (yrh III, ensinar, instruir) Entalhe -> # 3100 (h rt , entalhar) Entrada -> # 995 (6 w ’, ir, vir, chegar, entrar) Envio -> # 8938 (í/A I, enviar, estender-se, libertar, mandar embora) Envoltura -> # 2520 (hgr, atar, cingir) Enxame -> # 9237 («-$, enxamear, fervilhar) Eqüidade -> # 4797 (mêsãrím, aplainar, eqüidade, integridade) Equívoco -> # 5405 (misgeh, equívoco, engano) Erro -> # 8704 (ígg, cometer um erro, pecar inadvertidamente) Ervas / especiarias -> # 8380 (reqah, especiarias) Escabelo
# 2071 (bfldõm, escabelo)
Escapada -> # 4880 (m/í I, chegar a um lugar seguro, escapar, livrar) Escape
# 1368 (òr/i I, fugir, escapar, desaparecer)
Escarlate -> # 9443 (// Escamecimento
vestido[a] de tecido escarlate)
# 4372 (fe , rebeldes, escamecedores)
Escárnio -> # 3070 (Arp II, zombar, escarnecer, insultar, insulto de provocação) Escatologia -> # 344 ( 'aharit, fim, extremidade, o mais distante) Escavação -> # 4125
I, cavar, ser cavado)
Escolha -> # 1047 (Wir II, escolher, eleger, testar) Escória -> # 974 (bedil, escória, estanho, prumo) Escorregadio -> # 2744 (A/qr I, ser liso, tomar escorregadio, lisonjear)
1. A escrita no Antigo a necessidade de administrar grandes assentamentos urbanos de sumérios no sul da Babilônia tenha estimulado a invenção da escrita no quarto mi lênio a. C. Um sistema a princípio pictográfico, desenvolveu-se rapidamente para a escrita Escrita
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cuneiforme babilônia, com um total de quinhentos sinais, sendo que nem todos eram usados juntos. Os acádios que viviam ao norte adaptaram esse sistema de modo a escreverem sua lín gua semita e continuaram a usá-lo pelo menos até o século I d. C. A escrita cuneiforme repre sentava diversos conceitos básicos com sinais equivalentes a palavras, mas se tomou basica mente uma escrita silábica e foi adotada para o registro de várias outras línguas por todo o OMA (p. ex., elamita, huriana e hitita). O conceito de escrita passou rapidamente da Babilônia para o Egito, onde os famosos hieróglifos surgiram por volta de 3000 a. C. e foram logo segui dos pela forma cursiva, a escrita hierática. A escrita hieroglífica também constitui um sistema pictográfico e continuou como tal até o fim do século V d. C. Além de sinais equivalentes a palavras, os textos muitas vezes eram escritos de modo silábico e, no meio desses sinais silá bico, pode-se perceber a existência de um alfabeto hieroglífico no qual cada um de 25 sinais denota uma única consoante. Foi só depois do surgimento do alfabeto em Canaã que os escri bas egípcios perceberam como isso lhes proporcionava o potencial de um sistema de escrita bastante simples. As escritas cuneiforme e hieroglífica eram comuns no Levante durante o terceiro milê nio a. C. Depois de 2000 a. C., surgiram várias outras formas dc escrita. Além de usarem o tipo cuneiforme, os hititas da Anatólia possuíam um sistema hieroglífico com cerca de 150 sinais para palavras e um silabário de aproximadamente sessenta sinais, que se espalhou com o im pério hitita até a Síria (ver D. Hawkins, “Writing in Anatolia: Imported and Indigenous Syste ms”, WorldArchaeology 17, 1986, 363-76). Em Creta, os hieróglifos minóicos deram origem à escrita Linear A (ainda não decifrada) e Linear B; esta última era usada para escrever o grego micênico por meio de sinais equivalentes a palavras e sílabas. Em Chipre, uma forma derivada da escrita de Creta continuou a ser usada até os tempos helenísticos, sendo que exemplos des sa escrita chegaram às cidades costeiras da Síria-Palestina. Em Biblos, na metade do segundo milênio, surgiu um sistema de 114 sinais, que ainda não foi decifrado. Três tábuas de argila de Tell Deir ‘Alia no vale do Jordão apresentam uma outra escrita, aparentemente silábica. Apesar de serem, a princípio, administrativas, tanto a escrita babilônia quanto a egípcia não tardaram a ser aplicadas para o registro de textos de conteúdo mágico, religioso, lendário e filosófico. Esses textos podem ser vistos em monumentos, particularmente em inscrições reais com informações históricas, em túmulos (encantamentos mágicos, os Textos da Pirâmide no Egito) ou em salas de aula, nas quais textos de todo tipo eram copiados. Fica claro que, uma vez estabelecida a escrita, seu valor como meio de registrar o pensamento humano, transmitir informações com precisão por longas distâncias e preservá-la para gerações futuras ganhou amplo reconhecimento. Desde que houvesse um escriba por perto para fazer seu trabalho, qualquer coisa podia ser escrita. A maioria das pessoas não sabia ler nem escrever, mas muitas delas sabiam da existência da escrita pelas atividades de pesquisadores, coletores de impostos e militares. A escrita cuneiforme em tábuas de argila proporciona um conjunto de textos muito mais amplos do que os escritos egípcios, que eram feitos com pena e tinta em rolos ou folhas de papiro facilmente perecível ou, por vezes, também em couro. Tábuas para escrita feitas de madeira, muitas vezes cobertas de cera, eram outro material comum de escrita tanto para os sinais cuneiformes como para os hieróglifos e provavelmente também para a escrita hitita e outras formas mencionadas, mas raramente estas são recuperadas. Para anotações temporárias, registros de entregas e remessas e para exercícios escolares, pedaços de cerâmica ou lascas de pedra eram superfícies fáceis de serem usadas por escribas trabalhando com pena e tinta ou com uma ponta afiada. Foi dentro desse contexto no Levante, quando várias escritas já estavam em uso du rante o segundo milênio, que surgiu o alfabeto. A insatisfação com os sistemas complexos e 572
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inadequados para o registros dos fonemas do semO, juntamente com uma análise lingüísti ca mais precisa permitiram que um escriba desconhecido criasse um silabário limitado com um sinal para cada som consonantal principal seguido de qualquer vogal, em vez de sinais separados para cada consoante com uma vogal específica, como nas escritas mais antigas. Os sinais equivalentes a palavras foram abolidos. As línguas semO eram particularmente apropriadas para tal esquema pois nenhuma palavra começava nem era constituída apenas de sons vogais. Os exemplos de um alfabeto antigo são escassos pois, influenciados pelo treinamento egípcio, os escribas costumavam escrever com pena e tinta em papiros perecíveis. Os regis tros mais antigos são aqueles gravados em pedras ou objetos de pedra nas minas de turquesa controladas pelos egípcios em el-Cadem, no Sinai, por volta de 1600 a. C. Anotações curtas de direito de propriedade ou consagração podem ser encontradas gravadas ou pintadas em vasos de cerâmica, metal e obras de cantaria dos séculos seguintes em cananeus. A simpli cidade do primeiro alfabeto atraiu os escribas em Ugarite, instruídos dentro das tradições babilônias, que produziram uma imitação usando caracteres cuneiformes, provavelmente no século XIV a. C. Depois das conturbações no final da Baixa Idade do Bronze, as escritas egípcias no Levante foram substituídas pelo alfabeto, exceto quando a região encontrou-se sob o domínio da Assíria, Babilônia ou Egito. Em 1200 a. C., o alfabeto já estava adquirindo uma forma pa dronizada, como se pode ver pela primeira vez num texto contínuo no ataúde do rei Airão de Biblos, por volta de 1000 a. C. Alguns exemplos mostram o alfabeto em uso no século X a. C. e há várias amostras do século IX, distribuídas por todo o Levante, indicando o desenvolvimento de características locais que levaram à distinção do aramaico, hebraico e fenício e de outros estilos regionais. Os contatos comerciais difundiram o alfabeto dos gregos, que pegaram sinais para consoantes semíticas que não eram necessários para eles e usaram-nos no lugar de vogais (de modo que y tomou-se i), produzindo o primeiro alfabeto verdadeiro. O alfabeto aramaico foi bastante adotado como um instrumento administrativo do império persa, transformandose na “escrita quadrada” hebraica nas mãos dos escribas judeus e, pelos escribas nabateus, desenvolvendo-se de modo a formar o alfabeto árabe. 2. A escrita na Israel antiga. Quando Israel estabeleceu-se em Canaã, o alfabeto já ex tia como parte da herança cultural dos cananeus. Apesar de não terem sido descobertos textos caracteristicamente hebraicos mais antigos do que aqueles do século IX a. C., não há motivos para se supor que as gerações anteriores de escribas israelitas não usassem esse sistema. O que sobreviveu do século IX ao século VI foram algumas inscrições formais gravadas em túmulos hebreus, lajes (todas incompletas) e marfim, com milhares de exemplos gravados em pedras usadas como selos, outros entalhados em pesos e alguns arranhados na superfície de pedras ou em vasos. Há mais de duzentos óstracos, anotações e mensagens curtas inscritas com tinta em pedaços de cerâmica que não tinham o propósito de servir como registros a longo prazo, sendo produto de escreventes comuns. Um pedaço de papiro encontrado numa caverna próxima ao mar Morto representa o material escrito habitual que, com exceção desse exemplo, pode ser visto apenas nas inscrições no verso de selos de argila que costumavam ser anexados a docu mentos. Não foram recuperados nenhum livro, mas o relato do profeta Balaão — escrito num dialeto local na parede de um santuário em Tel Deir‘Ala, a leste do Jordão, por volta de 800 a. C. — imita as colunas de um rolo; e os dois amuletos de prata de um túmulo de c. 600 a. C. na extremidade do vale de Hinom em Jerusalém, contendo uma forma de Bênção Sacerdotal (Nm 6.24-26), dão testemunho do uso da escrita para obras literárias durante a monarquia. Para uma ampla coleção de inscrições hebraicas antigas, ver Rens e Rõllig. 573
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3. Terminologia a. Escrita i. 3rD (ktb), q. escrever; ni. ser/estar escrito; pi. escrever constantemente (# 4180); subs. 3H? (ketãb), um escrito (#4181); r o ? (kPtõbet), uma marca (# 4182); DrO?p (miktãb), algo escrito (# 4844). OMA Esse é o termo comum no semO para escrever, em ugar., fen., aram. e heb. (DNWSI, 540-46), continuando até o árabe. AT O termo ktb, escrever, ocorre 223 vezes. Depois de sua introdução, quando Moisés escre veu um relato da derrota de Amaleque (Ex 17.14), o vb. é usado para se referir ao registro escri to das palavras de Deus por Moisés (24.4) e pelo próprio Deus (Êx 34.1; Dt 4.13, etc.). Moisés também escreveu um relato das jornadas dos israelitas (Nm 33.2) e as palavras do “Cântico de Moisés” (Dt 31.19), os espias escreveram uma descrição de Canaã (Js 18.8-9) e Samuel escreveu os estatutos da monarquia (1 Sm 10.25). O rei era ordenado a escrever para si uma cópia da Lei (Dt 17.18); costumavam-se escrever cartas (2Sm 11.14, etc.), bem como registros (Nm 11.26), escrituras legais (Jr 32.10), crônicas (1 Rs 14.19, etc.), profecias (Jeremias 36) e conselhos (Pv 22.20). Escrever dava poder às palavras de uma forma que as tomava diferentes das palavras faladas. Assim, a fim de atestar sua inocência, uma mulher suspeita de adultério devia beber água que fora usada para lavar um rolo contendo uma maldição (Nm 5.23), e Ezequiel foi ordenado a engolir o rolo a fim de conhecer por inteiro a sua mensagem (Ezequiel 3). Em termos metafóricos, ensinamentos podiam ser escritos no coração (Pv 3.3; Jr 31.33) para que pudessem ser lembrados, da mesma forma como mandamentos de Deus deviam ser colocados no coração do povo (Dt 11.18). Escrever um relato de um acontecimento era uma forma de preservá-lo para a posteridade; daí o registro de Êxodo 17.14 ser “para memória” {zikkãrãn # 2355). O caráter perecível do papiro ou do couro era um motivo para escrever em superfícies mais duráveis: pedras no monte Ebal para a Lei (Deuteronômio 27; Js 8.32); um testemunho escrito com uma pena de ferro esculpida com chumbo numa rocha (Jó 19.24 — a pequena inscrição cuneiforme acima da capela de Dário, o Grande, em Beistum era incrusta da com chumbo, ver AfO 15, 1945-51, 147); metaforicamente, “O pecado de Judá está escrito com um ponteiro de ferro e com diamante pontiagudo, gravado na tábua do seu coração e nas pontas dos seus altares” (Jr 17.1). O único registro escrito duradouro já concebido era o registro celeste, o livro de contas de Deus, no qual nomes eram colocados ou removidos por Deus (Êx 32.32; S169.28[29]; 87.6; 139.16; Dn 12.1; Ml 3.16), e o nome daqueles que deixassem o Senhor seriam, pelo contrário, escritos no pó, onde poderiam ser facilmente apagados (Jr 17.13). O conceito de “Livro da Vida” teve continuidade nos tempos do NT (p. ex., Lc 10.20; Ap 3.5). ii. rrhbp (sepõrôt), a arte de escrever (# 6228). AT A única ocorrência desse termo encontra-se no Salmo 71.15, “A minha boca relatará a tua justiça... ainda que eu não saiba o número”, em que que “número” exprime esse termo, sendo que o texto poderia facilmente significar que o salmista pode apenas falar e não escrever seu louvor a Deus. iii.üUh(rsOT), q. part. pass., escrito (# 8398); aram. pe. escrever;pe 11, ser / estar escrito (# 10673). 574
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AT A base rãm ocorre somente em Daniel, em que a única ocorrência heb. é uma palavra estrangeira tomada emprestada e, depois, o termo volta a aparecer no aram. pós-bíblico. O heb. em Daniel 10.21 significa o que está escrito. No texto aram. de Daniel, é usada sempre com uma palavra para um texto escrito, kPtõbõ ’, quer na parede do palácio (5.24-25) ou no caso do decreto de Dário (6 .8 , 9 [9, 10]), e com 'esãr, indicando o mesmo decreto (6.12-13 [13-14]). b. Escritores i. T3JD (mazkir), escrevente, secretário (# 4654), hi. part. de zkr, lembrar; aquele que faz lem brar, daí os termos cronista e memorial. OMA O título mazkir ocorre uma vez num selo de origem provavelmente moabita (DNWSI, 609). AT Esse título foi dado a Josafá, filho de Aiúde, no tempo de Davi (2Sm 8.16= lC r 18.15), que continuou a exercer a função de mazkir até o reinado de Salomão (lR s 4.3). No reinado de Ezequias, Joá, filho de Asafe, é chamado cronista (2Rs 18.18, 37 = Is 36.3,22), e, no rei nado de Josias, o cronista é Joá, filho de Joacaz (2Cr 34.8). Esse cargo já foi comparado ao de whmw, mensageiro, repórter, no Egito, e nãgiru, em acad. (T. N. D. Mettinger, Solomonic State Officials, 1971, 52-62), mas não há nenhum motivo válido para supor-se que tal profissão não existisse nas cortes cananéias, tendo continuidade com os israelitas (ver K. A. Kitchen, “Egypt and Israel During the First Millennium B.C.”, S V T 40, 1986, 107-23). ii. "lOb (sõpêr), escriba (# 6221), talvez part. de spr, contar (-> # 6218), ou denominativo de sêper, documento escrito (-> # 6219); aram. sãpar (# 10516). OMA O termo era comum durante a Baixa Idade do Bronze no ugar. (spr) e no cananeu, do qual foi passado para um texto egípcio da XIII Dinastia (como sopira), sendo que nesse caso seu significado é mostrado claramente pelo equipamento de escrivão colocado como um sinal determinati vo antes do termo (J. E. Hoch, Semitic Worlds in Egyptian Texts o f the New Kingdom and Third Intermediate Period, 1994, no. 540). Comum no fen. e no aram. (DNWSI, 798-99), passou para o babilônio como sepiru (CAD S, 225). AT O termo sõpêr pode denotar qualquer tipo de escriba (Jz 5.14; Is 33.18), mas designava, com mais freqüência, um homem, como o secretário de Jeremias, Baruque (Jeremias36), ou um escriba ou secretário real (2Sm 20.25; 1Rs 4.3; 2Rs 18.37, etc.; aram., Ed 4.8, etc.). Tratava-se de um cargo necessário nas cortes da antigüidade e é bem provável que Israel tenha dado con tinuidade ao costume dos cananeus. Não há muitos argumentos em favor da sugestão de que essa função teve origem num modelo egípcio (como argumenta T. N. D. Mettinger, Solomonic State Officials, 1971). O trabalho do escriba exigia vários anos de dedicação e treinamento; uma criança, por exemplo, só conseguia anotar um número pequeno de árvores (Is 10.19), de modo que há referências a um “habilidoso escritor”, sõpêr mãhir (Sl 45.1 [2]; cf. Ed 7.6 e spr hkym wmhyr Ahiqar 1). Tal responsabilidade podia não ser levada a sério, de modo que Jere mias criticou os escribas pela falta de dedicação deles ou por adulterarem deliberadamente a lei de Deus, que estava ao encargo deles como leitores e escritores profissionais (Jr 8 .8 ); seu papel na apresentação da Lei para o povo aparece resumido em Esdras (7.6, 11; 7.12, 21 [am bos em aram.]; Neemias 8 ) e é mais desenvolvido posteriormente. A tradição judaica de copiar 575
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de modo confiável, codificada nos tratados Torá, Soferim e Massequete, anexados ao Talmude Babilônio, deu continuidade às práticas das escolas da Babilônia antiga bem como de outras escolas. Esse cuidado fica evidente em vários textos cuneiforme e na exatidão geral dos ma nuscritos bíblicos (ver A. R. Millard, “ In Praise of Ancient Scribes”, BA 45, 1982, 143-53). iii. rnDÒ (sõperet), escritor (?) (# 6230) AT Na lista dos exilados que retomaram, podem-se encontrar os descendentes dos servos de Salomão, “os filhos de Soferete (sõperet)" (Ed 2.55) = “filhos de Soferete (sõperet)’' (Ne 7.57) e, uma vez que os nomes adjacentes na lista são NP, é bem provável que essa palavra também seja um NP, talvez derivado de um título profissional, comparável às “famílias dos escribas” em 1 Crônicas 2.55. c. Materiais para a escrita. i. nVlÇ (megillâ, pl. megillôt), rolo, rolo de papiro/pergaminho (# 4479), da raiz (gll), rolo (-> # 167Ò). AT Essa é a forma normal de um documento com mais de uma folha de extensão, como o registro legal (Ed 6.2) ou as profecias de Jeremias (Jeremias 36, passim). Os oráculos de lamen to, proferidos por Ezequiel, eram tão longos que cobriam os dois lados do rolo — um processo incomum, pois os escribas costumavam acrescentar páginas para estender o rolo, escrevendo no verso somente quando reutilizavam o papiro ou pergaminho (Ez 2.9; 3.1-3). Zacarias (cap. 5) viu um rolo voante de proporções extraordinárias, 20 cúbitos por 10 cúbitos (cerca de 10 metros por 5 metros); o rolo comum normalmente media 3 metros de comprimento por menos de 30 centímetros de largura. li'’’?} (gillãyôn, pl. gilyômm), rolo de papiro / pergaminho (# 1663), da raiz glh, ser/estar descoberto (-> # 1655). AT O termo ocorre duas vezes, uma delas qualificado como grande (gãdôí) e usado por Isaías para anotar o nome de seu filho ainda não nascido (Is 8.1) e uma vez entre os adomos das mulheres de Sião (3.23). O significado mais provável é de uma folha em branco, como traduzem a LXXa e a Mix., possivelmente de madeira ou metal (ver abaixo); daí, alguns estu diosos suporem que se tratava de uma folha lisa de metal e, portanto, de um espelho. iii.
(lúah, pl. lúhôt), tábua, tábua de escrever (# 4283)
OMA No acad., lê ’um era uma tábua e, muitas vezes, de 2000 a. C. em diante, uma tábua de escrever, normalmente de madeira. O termo é encontrado em Ugarite, c. 1300 a. C., e, poste riormente, em aram. (ver DNWSI, 569). AT Com exceção de algumas ocasiões em que o termo é usado para indicar uma tábua (Ex 27.8; Ez 27.5, etc.), lúah refere-se a tábuas de escrever, muitas vezes dispostas em pares, pre sas por dobradiças, convenientes para serem carregadas, e nas quais o escriba podia escrever diretamente com tinta. Era comum as tábuas serem revestidas com cera, de modo que os textos podiam ser riscados sobre ela e, depois do uso, serem facilmente apagados (ver Driver, figuras 23.2-6). Em Isaías 30.8, lúah é paralelo a sêper, enquanto, em Habacuque 2.2, tudo indica que 576
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se trate de uma tábua grande que pode ser lida por alguém que passa correndo por ela. Assim, em termos metafóricos, aplica-se também à memória, “na tábua do teu coração” (Pv 3.3; 7.3; Jr 17.1). As lúhôt mais conhecidas são as que Moisés trouxe do alto do monte Sinai, inscri tas com a Lei (33x). Eram tábuas de pedra (lúhôt h ã ’eben, Êx 24.12), provavelmente lascas, como os óstracos egípcios, sobre as quais a escrita era riscada (ver A. R. Millard, “Recreating the Tablets of the Law”, Bible Review 10, 1994,48-53). Devido ao conteúdo, foram chamadas de “tábuas do Testemunho” (lúhôt hã 'êdút, Êx 31.18) e guardadas em segurança na arca (Dt 10.5), da mesma forma como outros documentos de tratados da antigüidade eram colocados diante dos deuses no templo (p. ex., ANET, 205). iv. nVl (delet, pl. dPlãlôi), porta, painel semelhante a uma porta (# 1946). OMA O acad. daltu refere-se a uma folha de uma tábua de escrever ou a uma coluna de escrita no século VII a. C. (S. Parpola, “Assyrian Library Reports”, JN E S42, 1983,1-29), e o termo pode ter-se tomado o G deltos. AT A única ocorrência dessa palavra é em Jeremias 36.23 em que se refere às seções (“fo lhas”) que o rei cortou do rolo quando as profecias de Jeremias foram lidas a ele. A mesma palavra pode ser encontrada no Ostraco 4 de Laquis, do mesmo período (K A I, no. 194). Para o significado porta, # 1946. d. Implementos para a escrita. i. U")H (heret), instrumento de gravação, buril (?) (# 3032). AT O instrumento que Isaías usou para gravar o nome de Rápido-Despojo-Presa-Segura numagillãyôn (Is 8 .1; ver acima) é descrito como um here( ’enôs, buril de um homem, supos tamente significando um buril comum. Arão usou esse instrumento para dar forma ao bezerro de ouro (Êx 32.4). ii. 01 ? ( ’ê() pena, buril (# 6485). OMA É provável que a pena fosse normalmente um pedaço de junco afiado na ponta (Sl 45.1 [2]; Jr 8 .8 ) e mantido afiado com um “canivete de escrivão” (ta 'ar hassõpêr, Jr 36.23). Para escrever-se em superfícies mais duras, era necessário usar um buril forjado em ferro (Jr 17.1; Jó 19.24). iii.
(cPyô), tinta (# 1902).
OMA O termo heb. é de derivação incerta; alguns sugerem que seja emprestado do egíp. ryt, tinta (WbÃS 2.399), sendo que d foi copiado incorretamente no lugar de r, ou talvez tenha ocorrido uma mudança fonética da letra inicial (T. O. Lambdin, “Egyptian Loan Words in the O T ',JA O S 1 3 , 1953,149). AT A tinta é mencionada apenas no relato de Baruque sobre o registro das palavras de Je remias num rolo (Jr 36.18). Na antigüidade, a tinta era feita de fuligem misturada com resina ou óleo. 577
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iv. noj? (qeset), paleta de escriba (# 7879). OMA A palavra heb. é emprestada do egip. gsty (do Alto Império em diante; WbÂS 5.207). Exemplos dessas placas de madeira estreitas com cavidades para guardar penas e tinta foram encontrados no Egito e são retratados em monumentos do Levante (Driver, figuras 32, 33.1; ANEP, # 234). AT Ezequiel teve uma visão de um homem com uma qeset e, portanto, um escriba, que marcou os fiéis de Jerusalém para que escapassem do julgamento que estava prestes a ocorrer sobre a cidade (Ezequiel 9). e. Documentos escritos. i. "IDO (séper), documento escrito (# 6219); aram. separ (# 10515). OMA O termo semO comum para um documento escrito de qualquer tipo, encontrado em textos dc Ugarite da Baixa Idade do Bronze em diante (ver DNWSI, 799-801). AT O termo sêper (185x) refere-se a um texto escrito, quer seja uma escritura legal (Dt 24.1; Jó 31.35; Jr 32.10-14), uma carta (2Sm 11.14, 15; lRs 21.8-11, etc.) ou um livro de papiro ou pergaminho, por vezes especificado como estando na forma de rolo (megil!at sêper Sl 40.7 [8 ]; Jr 36.2; Ez 2.9). A expressão “os céus se enrolarão como pergaminho (sêper)" (Is 34.4) parte do pressuposto de que essa era uma forma normal. Descobertas arqueológicas mostram que, depois que um rolo era escrito, recebia um selo que consistia de uma pequena porção de argila (uma bula) e somente pessoas autorizadas podiam abri-lo (29.11-12). Documentos e livros eram definidos como sêper hattôra, livro da Lei (Dt 28.61), sêper zikkõrôn, memorial escrito (Ml 3.16), sêper hammiqnâ, escritura da compra (Jr 32.11, etc.), sêper kÇritut, termo de divórcio (Dt 24.1). No tempo dos persas, a corte imperial possuía um edifício que abrigava o arquivo real (bêt sirayyã', Ed 6.1) onde eram guardados os documentos (separ-dokrãnayyâ’, Ed 4.15). ii. rn?D (siprâ), livro (# 6225). AT A única ocorrência desse termo no fem. refere-se ao registro celestial de Deus (Sl 56.8 [9]) (para registro, ver acima, ktb). iii.
(hfitãb), um escrito (# 4181), da raiz ktn, escrever; aram., idem (# 10375).
OMA Conhecido no aram. oficial posterior (um caso em heb. em Quirbete-el-Qom, DNWSI, 546, é interpretado mais corretamente como uma forma verbal, Renz e Rõlling,207-8). AT O termo aparece mais tarde na BH para indicar algo escrito: projetos para o templo (1 Cr 28.19), cartas e decretos (2Cr 2.11 [10]; Ed 4.7; Et 3.14), registros (Ed 2.62; Ez 13.9) e um livro (Dn 10.21). Em Ester, a palavra refere-se especificamente à forma de escrita, sendo que a frase seguinte indica a língua (Et 1.22; 3.12; 8.9). O uso em aram. é semelhante ao do heb. comum, referindo-se ao texto da Lei (Ed 6.18), ao texto na parede do palácio (Dn 5.7, etc.), ao decreto de Dario (6 .8 [9], etc.) e à ausência de uma quantia por escrito (Ed 7.22). 578
Escrita
iv. roíp (kõtebet), marca (# 4182), do radical ktb, escrever. AT Em sua única ocorrência (Lv 19.28), essa palavra parece indicar uma tatuagem ou escarificação. Em Isaías 44.5, pode referir-se a escrever na mão de um escravo o nome de seu proprietário, que podia ser uma prática semelhante, bastante conhecida na Mesopotâmia (M. A. Dandamayev, Slavery in Babylonia, 1984, 229-34). v. 3 r ç p (miktãb), algo escrito (# 4844), da raiz ktb, escrever. AT A palavra descreve Deus escrevendo as primeiras tábuas da Lei (Êx 32.16; Dt 10.4) e a gravação na lâmina da coroa sagrada do sumo sacerdote, semelhante à gravuras de sinete (Êx 39.30). Em 2 Crônicas 21.12, denota uma carta, em 35.4, os estatutos cultuais de Salomão, e, em 36.22 (= Ed 1.1), o texto do decreto de Ciro. O hino de Ezequias depois de sua enfermida de é designado por esse termo (Is 38.9), mas muitos estudiosos preferem a versão miktãm (ver abaixo). vi. QFDO (miktãm) um termo técnico de significado incerto (#4846). AT Essa palavra aparece no título dos Salmos 16 e 56— 60 e o mais provável é que tivesse uma conotação musical cujo significado se perdeu. Caso se trate de uma variação de miktãb (ver acima), é estranho que essa forma ocorra em títulos de Salmos, em que também podem ser encontrados outros termos de difícil compreensão. vii. rnJK (7ggeret), documento, carta (# 115); aram. JOiiX ( 'igger ã "), (# 10007). OMA No acad., egirtu é um documento e a palavra foi passada para o aram. (DNWSI,\2). AT O termo ocorre apenas em textos do pós-exílio (heb. 1Ox, aram. 2x), com o significado específico de carta (2Cr 30.1; Ne 2.7; 6.5; Et 9.26). viii. 111W3 (nisfiwãrí), carta (# 5981); aram., idem (# 10496). OMA Essa palavra persa (nistãvan) aparece num documento em aram. do Egito datado do século V a. C. (APFC, 17.3; DNWSI, 766). AT Todos os exemplos bíblicos encontram-se no livro de Esdras, do século V a. C., no contexto da comunicação com a corte persa (4.7; 7.11 [heb.]; 4.18,23; 5.54 [aram.]). ix. lltPr© (patsegen), cópia (# 7358); aram.
(parsegen), (# 10598).
AT Todos os exemplos aram. encontram-se no livro de Esdras, do século V a. C. e estão relacionados a correspondências oficiais (4.11,23; 5.6; 7.11), e todos os casos em heb. referemse a cópias de éditos reais (Et 3.14; 4.8; 8.13). x. HUT© (pãrãsâ), declaração exata (# 7308); < UHD (prs), esclarecer (-^ # 7300). AT Somente em Ester 4.7, com relação a uma soma em dinheiro, e, em 10.2, sobre atos realizados. 579
Escrita
xi. U31"1S (pitgãm), decreto, assunto (# 7330); aram., idem (# 10601). OMA Esse termo persa (*pati-gãma) aparece em documentos aramaicos do Egito (DNWSI, 948). AT No heb., denota um decreto real (Et 1.20) e um veredito (Ec 8.11), e no aram., uma pa lavra ou mensagem (Ed 4.17, etc.; Dn 3.16; 4.17 [14]). E interessante observar-se que nos tempos anteriores ao exílio, sêper e megillà, junta mente com termos de qualificação, eram suficientes para definir textos escritos, mas a varie dade de palavras para documentos cresce sob a administração persa, sendo vários dos termos não semíticos. A ausência dessas palavras em Samuel — Reis pode indicar que as fontes desses livros eram de data anterior ao exílio. 4. Jogos de palavras usados pelos escribas. As línguas sem. prestam-se a trocadilhos, como fica absolutamente claro em várias composições, e a escrita expande o universo de possibilidades. As escritas da Babilônia e do Egito, com seus sinais polivalentes, davam a escribas astutos ou bem-humorados uma ampla esfera de significados dentro da qual pode riam mostrar sua engenhosidade ou esconder significados daqueles que não eram iniciados (ver E. F. Weidner, “Geheimschrift”, RLA 3:185-88; H. G. Fischer, “Hieroglyphen, G, H,” LexÀg 2, 1977, 1189-99 e W.Guglielmi, LexÂg 6 , 1986,27). No caso de um código simples encontrado na Bíblia, ao inverter as letras do alfabeto (em nossa língua, z = a, x = b, etc., no heb., / = ’, s = b, etc, método conhecido, portanto como 'atbãs), bbl (Babilônia) toma-se ssk em Jeremias 25.26; 51.41, apesar de o texto não explicar o motivo do código ser usado nesses versículos. Os acrósticos são mais comuns e baseiam-se na letra inicial de cada linha ou verso. Também podem ser encontrados em babilônio, em que a sílaba inicial de cada linha introduz 0 texto (ver W. G. Lambert, Babylonian Wisdom Literature, 1960,63, 67 e R. F. G. Sweet, “ A Pair of Double Acrostics in Akkadian”, Or 38, 1969, 459-60). Os casos aceitos na Bíblia são: Salmo 25 (exceto o v. 18, no qual não ocorre o q), 34 (omite vv), 37, 111, 112, 119,145 (omitem n); Provérbios 31.10-31; Lamentações 1—4, cada um contendo o alfabeto inteiro. O Salmo 119 e Lamentações 3 são mais extensos, sendo que a primeira letra de cada linha de cada estrofe é a mesma. Ao que parece, o Salmo 9 começa e o Salmo 10.7-18 termina com um acróstico alfabético, mas há interrupções, indicando que o poeta não conseguiu completá-lo ou que o texto foi alterado (ver Driver, 200-206, para uma sugestão de reconstituição). Pode-se ver, da mesma forma, um acróstico em Naum 1.2-14, mas o grande número de emendas necessárias para completá-lo toma pouco provável que abrangesse todo o alfabeto (ver D. L. Christensen, “TheAcrostic ofNahum Reconsidered”, ZA W 87, 1975,17-30). Esses acrósticos são reprodu zidos em inglês na tradução da Bíblia por Ronald Knox (1955). 5. O lugar da escrita no AT. As referências freqüentes à escrita e seu lugar como par te normal da vida, considerados juntamente com as evidências materiais marcantes de docu mentos escritos durante a monarquia israelita, destacam a relevância da escrita no AT. Desde 0 tempo em que Israel tomou-se uma nação no Sinai, como uma comunidade de grandes pro porções, era necessário que tivesse fontes autoritárias de lei civil e religiosa. Assim, a escrita é um elemento importante para a entrega da Lei. A palavra de Deus — a Lei — estava além do controle humano; uma vez escrita, podia permanecer inalterada durante séculos. Esse tra balho fundamental de preservar as palavras realizado pela escrita é explorado ao máximo na legislação do Pentateuco. Os textos originais ficavam guardados em segurança na arca dentro 580
Escrita
do santuário, havendo cópias disponíveis para a consulta no dia-a-dia (p. ex., 2 Crônicas 19) e para reprodução (cf. a lei referente ao rei em Dt 17.18). Mesmo que o um livro se perdesse, podia ser redescoberto e suas palavras serem eficazes (2 Reis 22). Apesar de o uso geral do alfabeto não ter promovido uma alfabetização universal na antiga Israel, significou que qualquer pessoa com determinação podia aprender a ler e talvez escrever sem esforço exagerado, ao contrário do que os sistemas de escrita da Babilônia e do Egito exigiam. Os estatutos segundo os quais a lei devia ser escrita nos umbrais (Dt 6.9; 11 .2 0 ), deixa implícito que era fácil encontrar quem soubesse escrever e que todos reconhe ceriam o que era a escrita. Apesar de muita coisa ser transmitida oralmente e passada dessa forma de geração em geração (p. ex., Êx 13.14-15), a existência da escrita proporcionava uma forma de confirmação; os inquisitivos, céticos ou esquecidos podiam ler as palavras originais num livro. É importante perceber que a lsraei da antigüidade não vivia em um mundo que de pendia somente da tradição oral. Tanto na Mesopotâmia quanto no Egito, a palavra escrita era investida de autoridade e não há nenhum motivo que leve a crer que fosse diferente em Israel. A idéia de que profecias e outras composições eram preservadas na memória somente até um momento de crise •— como um ataque inimigo — levá-las a serem escritas de súbito (de acordo com E. Nielsen, Oral Tradition, 1954, seguido por vários outros autores) não encontra nenhum apoio nas evidências de textos antigos e nas circunstâncias em que foram escritas. As palavras do profeta podiam ser escritas no dia em que eram proferidas e depois guardadas para consulta ou verificação (ver Dt 18.22; A. R. Millard, “La prophetie et 1’écriture”, RHR 202, 1985, 125-45). Semelhantemente, os registros de acontecimentos extraordinários e in formações sobre reis e suas políticas podiam ser mantidos num ritmo freqüente e de modo cumulativo, produzindo crônicas que os historiadores bíblicos citam como sendo suas fontes (p. ex., lRs 11.41; 2Rs 23.28), da mesma forma como era feito em outros reinos. Trata-se de um fato conhecido tanto pelas referências bíblicas (para a corte persa, ver Et 2.23; 6 .1) e por textos como a Crônica Babilônia (ver A. K. Grayson, Assyrian and Babylonian Chronicles, textos das fontes cuneiformes V, com uma revisão de A. R. Millard, JAOS 100, 1980, 3646 8 ). Uma vez que o alfabeto foi estabelecido quando o povo de Deus tomou-se uma nação, Israel passou a ter um meio simples de registrar e preservar as revelações divinas que lhe eram concedidas e tomá-las acessíveis ao povo fora dos círculos de escribas profissionais, viabilizando desse modo as suas Escrituras. B ib l io g r a f ia
G. R. Driver, Semitic Writing, from Pictograph to Alphabet, 3rd ed., 1976; A. R. Millard, “The Infancy o f the Alphapet”, World Archaeology 17, 1986, 390-98; idem, “An Assessment of the Evidence for Writing in Ancient Israel”, in J. Aviram, ed., Biblical Archaeology Today, 1984, 301-12; J. Renz e W. Rõllig, Handbuch der althebrãischen Epigraphik, 1995; B. Sass, The Genesis o f the Alphabet and Its Development in the Second Millennium B.C., Agypten und A Ites Testament 13,1988. Alan Millard Escudo -> # 4482 (mãgên I, escudo, proteção) Escuridão -> # 3 1 2 4 (hsk, estar/ficar escuro, escurecer, confundir) Escuta -> # 9048 (sm \ ouvir, escutar, compreender, dar atenção, obedecer) 581
Esdras
Esdras
Esdras (ÍClTy [ 'ezrã ], # 6474).
AT Esdras e Neemias foram dois dos líderes mais importantes de Israel depois do exílio. A destruição de Jerusalém e do templo, em 587 a. C., juntamente com a experiência do exílio na Babilônia, forçaram o povo de Israel a reavaliar todos os aspectos de sua existência, especial mente seu relacionamento com Deus. Antes do exílio, Judá havia sido uma monarquia semiautônoma, mas depois do cativeiro, tomou-se uma pequena província do vasto império persa. Pelo fato de sua monarquia e nacionalidade não existirem mais, sob a liderança de Esdras e Neemias, os judeus buscaram uma nova visão de si mesmos em sua religião e tradição. A Bíblia apresenta Esdras como um sacerdote e escriba. Sua longa genealogia (Ed 7.1-5) acompanha seus antepassados até Arão, pela linhagem de Zadoque. Em momento algum as Escrituras aplicam a Esdras o título de sumo sacerdote, mas ele atuou como tal em Judá e foi assim chamado na tradição extrabíblica. Esdras também é identificado como escriba (sôpêr, ou “mestre”) “versado na Lei de Moisés” (Ed 7.6) e, como tal, é considerado o arquétipo da tradição judaica dos escribas. Apesar de Esdras haver cumprido seu papel sacerdotal em parte pela atenção dada às observâncias cultuais (Ed 8.21; 9.5; 10.6), deu atenção principalmente à instituição e preser vação da pureza e santidade em Israel. Essa preocupação foi demonstrada pela primeira vez na intervenção de Esdras no problema dos homens judeus, inclusive sacerdotes, que haviam se casado com mulheres estrangeiras (cap. 9), uma questão que envolvia mais do a obediência à lei mosaica que proibia os casamentos mistos (Êx 34.11-16; Dt 7.1-4). Esdras reconheceu que esse tipo de casamento ameaçava o relacionamento de aliança entre Israel e Deus. Percebeu que a miscigenação da “raça santa” com gente de outros povos era um ato de infidelidade e que não tardaria a transformar os judeus num povo igual aos pagãos (Ed 9.2). Na tradição, Esdras é mais conhecido pelo papel de escriba. A Bíblia o descreve como aquele que “tinha disposto o coração para buscar a lei do Senhor, e para a cumprir, e para en sinar em Israel os seus estatutos e os seus juízos” (Ed 7.10). Essa preocupação com a Torá chegou ao seu auge numa cerimônia na Porta das Águas (Neemias 8 ), durante a qual Esdras fez a leitura da lei para a comunidade reunida. Nessa assembléia, Esdras cumpriu a ordem que havia recebido de Artaxerxes, o rei persa, para ensinar a lei como palavra de autoridade para os judeus (Ed 7.12-26). O resultado foi uma atenção maior ao culto (Ne 8.13-18), a confissão de pecados (Ed 9.1-37) e a renovação da aliança (v. 38). A relação de Esdras com a lei é tâo forte que a tradição judaica atribuiu a ele um lugar abaixo somente de Moisés. O Talmude e outras fontes preservam diversas tradições sobre o papel de Esdras na instituição do texto e da auto ridade da Torá. Devido à importância que ele dava à Torá e ao papel dela em Israel no período após o exílio, Esdras é considerado o pai do judaísmo. (-> Esdras; Teologia) Neemias;
Restauração
B ib l io g r a f ia
A. Bentzen, “Ezras Persõnlichkeit”, S T 2, 1949, 95-98; W. J. Dumbrell, “The Theological Intention of Ezra-Nehemiah”, RTR 45, 1986, 65-72; H. L. Ellison, “The Importance o f Ezra”, EvQ 53, 1981, 48-53; K. Koch, “Ezra and the Origins o f Judaism”, JSS 19, 1974, 173-97; H. G. M. Williamson, Ezra, Nehemiah, 1985. Owen Dickens Esdras (1,2) -> Apócrifos 582
Esdras: Teologia de
Esdras: Teologia de A. Contexto histórico Em 586 a. C., o reino de Judá foi para o exílio ( 4 ) e o templo de Jerusalém foi destruído. A ascensão do império persa sob o comando de Ciro e a captura da Babilônia por ele em 538 a. C. marcam o início do período pós-exílio. Fazia parte da política persa permitir que povos exilados sob o domínio babilônio voltassem para suas terras e reconstruíssem seus locais de culto. Esse é o contexto de Esdras e do livro que o acompanha: Neemias (->). B. Estrutura literária O livro de Esdras apresenta duas seções: caps. 1— 6 e 7— 10. Os caps. 1— 6 descrevem como o primeiro grupo de judeus exilados voltou para casa e reconstruiu o templo de Jerusa lém (concluído em 515 a. C.). Tudo nessa seção encontra-se relacionado aos temas de regres so e reconstrução: o edito de Ciro (Ed 1.1-4), a lista dos utensílios do templo (1.7-11), a lista daqueles que regressaram (cap. 2), o lançamento dos alicerces (cap. 3), a oposição ao trabalho (Ed 4.1-5; vv. 6-23 estão relacionados a um período posterior), o recomeço, a autorização re novada e a conclusão do trabalho (caps. 5— 6 ). Os caps. 7— 10 descrevem a missão de Esdras (a data é controversa: tradicionalmente, estabelece-se 458 a. C.) que consiste em ensinar a lei de Deus àqueles que regressaram (Ed 7.10), regulamentando a vida dessa comunidade (vv. 25-26). Os caps. 9— 10 não concluem o relato do ministério de Esdras (ver Ne 8 —9). C. Temas teológicos O tema da restauração encontra-se presente nos caps. 1— 6 . É Deus quem realiza a res tauração: ele enviou Israel ao exílio (Ed 5.11 -12) e agora reverte essa decisão (1.1). A atuação de Deus é percebida ao longo de toda essa seção (1.5; 5.5; 6.14,22) e, em certos pontos, reco nhecida pelo louvor e adoração de toda a comunidade (Ed 3.10-11; 6.16-22). Fez parte da restauração o processo de reatamento dos laços rompidos pelo exílio. Os caps. 1— 6 mostram várias ligações entre a comunidade e as gerações anteriores de Israel. Assim, certos aspectos do novo templo fazem lembrar o templo de Salomão: os utensílios (Ed 1.7-11), os materiais (Ed 3.7; cf. 1Rs 5.6) e o estilo de construção (Ed 6.4; ver lRs 6.36). Todos os membros da comunidade são de origem israelita (Ed 2.2-58) e voltam para os terri tórios de seus antepassados (2.21-35, 70). Os estrangeiros são excluídos (4.1-5). A adoração que os filhos de Israel prestariam estava regulamentada pela lei de Moisés (3.2; 6.18), e faz-se referência à história de Israel: Deus é descrito como “o Deus de Israel” (1.3; 3.2; 4.3; 6.22) e o regresso é apresentado como um segundo êxodo (Ed 1.11; ver Êx 3.8, 17; Ed 1.6; cf. Êx 12.35-36; comparar também Ed 4.1-3 e Êx 23.23-33). Setenta anos depois, nos caps. 7— 10, Deus continua a operar em favor de Israel, cha mando seu povo à adoração e à fé (Ed 7.27-28; 8.21-23). Ele viabiliza a missão de Esdras e conduz o grupo de Esdras em segurança para Jerusalém (Ed 7.6, 27-28; 8.31). A preocupação em guardar as leis, que aparece anteriormente (Ed 3.2; 6.18), é predominante nos caps. 7— 10. Os casamentos mistos dos caps 9— 10 são tratados especificamente como uma transgressão à lei (Ed 9.1-2, 10-12; 10.3). Os vínculos da comunidade com as gerações anteriores de Israel continuam a ser ressaltados (7.27; 8.35), bem como o fato de que a comunidade está repetindo os pecados das gerações passadas (9.10-15). O exílio havia dado cabo da condição de Judá como nação independente e levantado diversas questões. O que definia Israel no momento em que tantas de suas instituições nacionais haviam deixado de existir? Que forma(s) Israel assumiria no futuro? E de que maneira elas 583
Esdras: Teologia de
estariam relacionadas à história de Israel? Tais preocupações explicam a ênfase teológica original do livro de Esdras: a insistência em que o regresso havia sido uma iniciativa de Deus, à qual os israelitas que possuíam discernimento espiritual haviam respondido (Ed 1.5; 8.18), e também o cuidado de se estabelecerem vínculos com a história de Israel. Com isso, o autor procura legiti mar a comunidade (Clines, 25). Da mesma forma, a presença do templo (“a casa do Senhor/de Deus”; Ed 3.11; 6.22) no meio da comunidade e o desejo dela de viver de acordo com a lei são fatos que dão a ela o direito de se chamar “Israel” (7.10; 10.25). Contudo, também se encontra envolvida aqui a questão daquilo que define Israel: a adoração e a obediência à lei devem fazer parte de sua vida depois do exílio. Não se trata de legalismo (a alegria da adoração da comuni dade evita essa sugestão; ver Ed 3.10-13; 6.22), mas sim do reflexo de uma preocupação com sua identidade e do desejo de que essa identidade possa ser expressa de maneiras concretas na vida diária. O caráter exclusivo da comunidade (porém não absolutamente, como mostra Ed 6 .2 1 ) e a severidade dos divórcios no cap. 10 podem ser explicados no contexto da necessidade premente da comunidade de manter essa identidade em meio a um ambiente hostil. A restauração é apenas parcial. Judá continua sendo uma província persa, dependente do favor do rei (Ed 1.1-4; 6 .1-12). Pode ser melhor do que o exílio, e Deus certamente não é limitado por governantes estrangeiros, mas a comunidade ainda se encontra em “cativeiro” (9.7-9), um frágil remanescente (9.15) enfrentando forte oposição (4.1-5; vv. 6-23 deixam cla ro que essa situação perdurou por várias gerações). O modo como o livro termina, com o tom negativo dos casamentos mistos, também indica o caráter incompleto da restauração. Os livros de Esdras e Neemias são interligados, sendo que a leitura da lei e a oração de Esdras (Neemias 8 —9) constituem o ponto culminante dos dois livros juntos (cf. B. S. Childs, IOTS, 634-37). Assim, considera-se que as atividades dos dois reformadores têm um objetivo em comum dentro de uma comunidade de adoradores estabelecida na terra e obediente à lei. Os temas da operação de Deus para restaurar seu povo, do caráter incompleto da restauração e da oposição externa encontram-se presentes ao longo dos dois livros e mostram-se cada vez mais profundos, uma vez que são tratados de maneira mais extensa. Assim como 1 e 2 Crônicas (->), de acordo com o ideal de Esdras, o povo de Deus é composto pelas doze tribos de Israel (Ed 6.17; 8.35), o que é uma qualificação importante para o exclusivismo que se manifesta em outras partes do livro. Ao contrário de 1 e 2 Crônicas, porém, Esdras não tem uma doutrina de “retribuição imediata”. Em Esdras, a piedade pode provocar oposição em vez de trazer bênçãos (cap. 4) e a confissão dos pecados também não é garantia de bênção (cap. 9; Williamson, Israel in lhe Book o f Chronicles, 67-68). Em momento algum Esdras indica que um descendente de Davi (->) voltará a governar Judá como um reino independente. Ao contrário das expectativas messiânicas de Ageu (->) e Zacarias (->), Esdras parece ser politicamente “quietista” (S. Japhet, Z A W 94, 1982, 71-80): por um lado, Deus usa os reis persas para abençoar Israel; por outro, a comunidade cuida de vários dos assuntos que costumavam ser administrados anteriormente pela monarquia, como a construção do templo, o culto e o governo (Clines, 28-29). Na verdade, apesar de Esdras olhar para o passado com freqüência, em momento al gum olha explicitamente para o futuro. Podem-se encontrar alusões a partes de Isaías 40—66, cujo cumprimento o escritor havia testemunhado (Ed 1.1,6; cf. Is 41.2, 25; 45.13), mas não às partes (Isaías 54; 60-62) que prometem um futuro glorioso para uma Jerusalém restaurada (McConville, 9). Apesar de o escritor ver a mão de Deus no regresso do exílio, era realista o suficiente para reconhecer que as conquistas da comunidade restaurada desde 538 a. C. ainda ficavam aquém dessas promessas. Além disso, também não atenuou os problemas que a comu nidade já havia confrontado e possivelmente continuaria a confrontar a comunidade vinda do exílio em sua terra natal. Não fazia parte da fé nas promessas de Deus fingir que elas haviam se cumprido, quando esse ainda não era o caso. 584
Esdras: Teologia de
B ib l io g r a f ia
A. Bentzen, “Ezras Persõnlichkeit”, ST 2, 1949, 95-98; D. J. A. Clines, Ezra. Nehemiah, Esther, NCB, 1984; J. Goldingay, “The Theology o f the Chronicler”, BTB 5, 1975,99-126; E D. Kidner, Ezra and Nehemiah, TOTOC, 1979; J. G. McConville, Ezra, Nehemiah and Esther, 1985; W. Rudolph, Ezra undNehemia, HAT, 1949; H. G. Williamson, Ezra. Nehemiah, WBC, 1985; idem, Ezra and Nehemiah, OTG, 1987. P. E. Satterthwaite Esmagamento -> # 1917 (d k \ esmagar, ser esmagado) Esmagamento -> # 1920 (dkh, ser esmagado) Esmorecimento
# 7918 (q.fr II, ser inadequado, estar desanimado)
Espaçoso -> # 81 1 8 (rwh A, tomar-se espaçoso, ser espaçoso) Espada
# 2995 (hereb, pederneira, adaga, espada)
Especiarias -> # 8380 (reqah, especiaria) Espera -> # 7595 (sph I, guardar, vigiar atentamente) Esperança -> # 7747 (qwh I, demorar, aguardar, esperar; ficar à espera de) Esperteza -> # 7349 (ptl, torcer, lutar, ser esperto, astuto) Espessura -> # 6286 ( ‘bh, ser espesso) Espia -> # 2983 (hqr, procurar, espiar, investigar, pesquisar) Espinho -> # 7764
I, espinheiro)
Espírito -> # 8 1 2 0 (rüah, vento, sopro, transitoriedade, espírito, Espírito) Espirro
# 2453 (zrr II, espirrar)
Esplendor -> # 2086 (hôd I, esplendor, majestade) Esquecimento
# 8894
Esquerda -> # 8521 (im
I, esquecer) ir para a esquerda)
Estabelecimento -> # 3922 (Awn , manter-se firme, preparar, estabelecer) Estandarte -> #5812 (wêí, estandarte, pendão) Estanho -> # 974 (bedil, escória, estanho, fio de prumo) 585
Ester: Teologia de
Estátua -> # 7181 (pesei, imagem cultuai, estátua de um deus)
Os acontecimentos do livro de Ester ocorrem na Pérsia (-> Pérsia e Israel) durante o reinado de Xerxes I (486465 a. C.), conhecido no livro de Ester como “Assuero” (o G antigo identifica Assuero incor retamente como Artaxerxes). De acordo com Heródoto (Histórias, Livros 7-9), Xerxes era um governante ambicioso, impiedoso e intolerante, administrador de um vasto império, guerreiro brilhante (apesar de ter sido derrotado pelos gregos em 479 a. C.) e amante ciumento. A história de Ester refere-se a judeus que não voltaram para sua terra natal depois do exílio. A historicidade do livro já foi colocada em dúvida (Paton, 64-77; Moore, xxxiv-xlvii), mas foi igualmente defendida de modo competente (Wright; Shea; Gordis, 382-88). Ester: Teologia de
A. Estrutura literária A história literária da narrativa de Ester é complexa (ver Clines, Scroll, 39-68, 93174). E, no entanto, a narrativa simples no TM é uma história bastante conhecida. Refere-se à sorte dos judeus sob o domínio persa, personificada particularmente na sorte e nas ações de dois judeus. A história começa com Ester, uma bela moça judia, chegando à posição de rainha, e Mordecai, seu primo e pai adotivo, informando o rei por intermédio de Ester so bre uma conspiração contra a vida dele (caps. 1—2). Entretanto, Mordecai se indispõe com Hamã, um oficial de alto escalão e como vingança, Hamã ordena o extermínio de todos os judeus (cap. 3). Quando Mordecai apela para Ester a fim de que ela intervenha em favor dos judeus, ela cumpre a missão com sucesso: a conspiração de Hamã contra os judeus é desmascarada e o rei se mostra benigno para com os judeus por causa do amor que tinha por Ester e da consideração por Mordecai, que o salvara no passado. Hamã é executado na forca que havia preparado para Mordecai (caps. 4— 7). Mordecai, por sua vez, é elevado à posição antes ocupada por Hamã; é publicado um decreto para neutralizar o de Hamã e os judeus conseguem se defender de seus agressores (caps. 8 —9). O livro termina com instru ções para a festa de Purim (->), que comemora o livramento do povo, e com a exaltação de Mordecai (caps. 9— 10). Esboço estrutural: I. Introdução: a ascensão de Ester (1.1—2.23) II. Uma ameaça aos judeus: a ascensão de Hamã (3.1— 5.14) III. A ameaça é invertida: a queda de Hamã (6.1— 9.16) IV. A inversão é comemorada: Purim (9.17-31) V. Conclusão: A exaltação de Mordecai (10.1 -3) A história de Ester é estruturada predominantemente na ação e não no desenvolvimento dos personagens ou na reflexão teológica. Uma característica importante da história é o tema da inversão da sorte (Berg, 103-13; Fox, “Structure”). Quando o livro chega ao fim, Mordecai, Ester e os judeus foram todos exaltados e livrados de seus inimigos por meio de reviravoltas marcantes. B. Temas teológicos Estritamente falando, Ester não possui uma “teologia” (ou seja, “estudo de Deus”), uma vez que Deus não é mencionado no livro. Além disso, não há referências a instituições ou práticas religiosas, (exceto pelo jejum), tomando duplamente difícil a tarefa de aduzir-se uma teologia do livro. 586
Ester: Teologia de
Um tema importante que surge do texto é a natureza e significado da festa de Purim (“sor tes”) (Berg, 31 -57). As sortes em si não são um componente principal do livro, mas parte do tema da inversão (cf. Et 3.7; 9.26), e um dos apêndices da obra (9.32) apresenta instruções formais para a comemoração da festa (Childs, Introduction to the Old Testament as Scripture, 603-5). Outro tema importante é o da realeza (Berg, 59-72). A história se desenrola num con texto real sendo que Ester e até mesmo Mordecai (cf. Et 6.7-11; 8.2, 15; 10.1-3) são figuras da nobreza. Uma das mensagens era que os judeus podiam prosperar mesmo numa terra estrangeira e, de modo sutil, que a esperança de terem sua própria monarquia não deviam ser inteiramente abandonada (ver esp. Et 10.1-3). A ausência de qualquer referência direta a Deus no livro é crucial para a compreensão de sua mensagem geral ou propósito. Fica claro que Deus foi deliberadamente deixado de fora do livro, uma vez que em inúmeras ocasiões, teria sido muito fácil o escritor mencionar a intervenção divina, mas não o faz, como no episódio do jejum (Et 4.3, 16), na certeza que tinham a esposa e os amigos de Hamã de que seria impossível para Hamã prevalecer sobre um judeu (6.13), ou mesmo na declaração de Mordecai sobre o livramento concedido aos judeus (4.13-14). O escritor também poderia facilmente ter mencionado Deus como aquele que estava por trás das inúmeras “coincidências” do livro, como o fato de uma moça judia estar no lugar certo na hora certa para ajudar seu povo (4.14b), na insônia do rei na noite antes do pedido de ajuda de Ester (6.1-3) ou na presença de Hamã na corte do rei quando este último quis honrar Mordecai (6.4-6). Dizer que o escritor deliberadamente suprimiu as referências a Deus não é o mesmo que afirmar que o escritor não cria em Deus ou em seu controle sobre os assuntos do mundo. Na verdade, o cuidado providencial de Deus para com seu povo é um dos principais temas da obra. O livro não foi escrito num vácuo, mas sim para e sobre um povo a favor de quem Deus tem constante e ativamente intercedido ao longo dos séculos. Qual era, por exemplo, o propósito do jejum, senão comover Deus a agir (Et 4.3, 16)? O que a esposa e os amigos de Hamã expressaram (6.13) senão um conhecimento da história passada de Israel e do triunfo final da causa dos judeus por intermédio de Deus? E o que signi ficou a declaração de Mordecai (4.13-14) senão que ele cria na certeza do livramento para os judeus, um livramento que, em última análise, vem de Deus, quaisquer que sejam suas fontes mais imediatas? (A referência de 4.14 a “outra parte” é a um agente humano e não a Deus [Fox, “Structure,” 298, n. 15; Gordis, 360-61, n. 6 ], mas ainda assim demonstra uma forte crença na determinação dos acontecimentos em favor dos judeus.) Os leitores do livro de Ester podem, sem dúvida, detectar a presença de Deus por trás das várias “coincidências” oportunas e dramá ticas da obra. Elas refletem uma determinação dos acontecimentos por Deus que já havia feito o mesmo tantas vezes antes. Até mesmo o tema da inversão da sorte demonstra a crença numa determinação da história, uma vez que em Ester, a inversão sempre é em favor dos judeus. A própria estrutura do livro demonstra esse fato (Fox, “Structure”). Afirmar que um dos temas principais do livro é o cuidado providencial de Deus para com seu povo é apresentar apenas uma visão parcial da teologia do livro. A ocultação de Deus é um componente de grande importância no restante dessa visão. Outros livros do AT mencionam a providência divina, de modo que a supressão intencional de referências a Deus deve ser parte integrante da teologia de Ester. Uma dedução lógica a ser feita sobre a ausência de Deus é que a ação humana é im portante. Em repetidas ocasiões, são as iniciativas de Ester e Mordecai que fazem a diferença para os judeus; não vemos os dois aguardando passivamente para receber sinais de Deus ou que Deus realize um milagre dramático de algum tipo. Em segundo lugar, apesar das muitas explicações possíveis sobre a ocultação de Deus em Ester (ver Fox, “Religion,” 135-38 e a 587
Ester: Teologia de
bibliografia abaixo), devemos admitir que o escritor é intencionalmente indefinido sobre a pre sença de Deus nos acontecimentos. Por um lado, ele afirma que Deus está envolvido com seu povo, mas, por outro, admite que por vezes é difícil perceber o envolvimento de Deus. Apesar de o escritor e seus leitores saberem (racionalmente) que Deus está presente e no controle, sua presença nem sempre fica tão clara nas experiências da vida. Assim, uma “indefinição cuida dosamente planejada” é parte importante da mensagem: “A indefinição da história transmite a mensagem de que os judeus não devem perder a fé se também encontrarem-se em dúvida sobre onde Deus se encontra durante uma crise” (Fox, “Religion,” 146). E, no entanto, essa indefinição não é sinal de incredulidade: “Se há algo que é deixado de fora, é a incredulidade. O escritor de Ester nos faz confiar mesmo quando não há certeza nem compreensão dos deta lhes... Ao investigarmos o texto de Ester em busca de indícios da atividade de Deus, estamos fazendo aquilo que o escritor nos levou a fazer” (Fox, “Religion,” 146-47). C. Contexto canônico O livro de Ester não é citado em parte alguma do NT (nem em outras partes do AT) e é o único livro do AT que não se encontra entre os rolos de Qumran. Esses fatos levaram a dúvi das consideráveis sobre sua canonicidade (Moore, Esther, xxi-xxx; Beckwith, 288-97,312-17, 322-23; Clines, Ezra, Nehemiah, Esther, 254-56) e inspiraram reações enérgicas, tanto positivas quanto negativas (Anderson; Moore, Ester, xxx-xxxi). A localização de Ester nos muitos textos e listas da Bíblia apresenta grandes variações (Moore, xxx; Beckwith, 452-64). Na maioria das versões do cânon heb., aparece como o úl timo dos cinco megillôt (rolos) que passaram a ser lidos liturgicamente nas principais festas. Sua presença depois de Lamentações oferece esperança, uma vez que enfatiza a comemora ção e a transformação do pranto em alegria, um contraste nítido com a situação melancólica retratada em Lamentações. Vem imediatamente antes de Daniel, outro livro sobre judeus que prosperam numa terra estrangeira. Nas versões em G. antigo, o livro de Ester é suplementado por seis acréscimos mais im portantes que servem para dar um tom religioso que, de outro modo, não haveria. Deus é men cionado com freqüência e está explicitamente envolvido nos acontecimentos do livro. A oração também é um componente importante desses acréscimos. Dentre as obras deuterocanônicas, o livro de Judite é o que apresenta uma relação mais próxima com Ester, contando a história da resistência dos judeus a um exército pagão, mas com uma visão claramente mais religiosa. B ib l io g r a f ia
B. W. Anderson, “The Place ofthe Book of Esther in the Christian Bible”, JR 30, 1950,32-43; R. Beckwith, The Old Testament Canon ofT he New Testament Church, 1985; S. B. Berg, The Book o f Esther, SBLDS 44,1979; D. J. A. Clines, The Esther Scroll, JSOTSup 30,1984; idem, Ezra, Nehemiah. Esther, NCB, 1984; W. Dommershausen, Die Estherrolle: Stil und Ziel einer alttestamentliche Schrift, 1968; M. V. Fox, “The Structure o f the Book of Esther”, in Isac Leo Seeligman Volume, ed. A. Rofé e Y. Zakovitch, 3, 1983, 291-303; idem, “The Religion of the Book o f Esther”, Judaism, 39, 1990, 135-47; G. Gerleman, Esther, BKAT, 1973; R. Gordis, “Religion, Wisdom and History in the Book o f Esther — A New Solution to an Old Crux”, JBL 100, 1981, 359-88; E. L. Greenstein, “A Jewish Reading of Esther”, in Judaic Perspecti ves on Ancient Israel, ed. J. Neusner, B. A. Levine e E. S. Frerichs, 1987, 225-43; F. B. Huey, Jr., “Esther”, in EBC, 4:775-839; idem, “Irony as the Key to Understanding the Book o f Es ther”, Southwestem Journal o f Theology, 32, 1990, 36-39; J. A. Loader, “Esther as a Novel with Different Leveis o f Meaning”, ZAW, 90, 1978, 417-21; C. H. Miller, “Esther’s Leveis of 588
Ética
Meaning", ZAW, 92, 1980, 145-48; C. A. Moore, Esther, AB 7B, 1971; idem, ed., Studies in the Book o f Esther, 1982; L. B. Paton, The Book o f Esther, ICC, 1908; W. H. Shea, “Esther and History”, AUSS, 14, 1976,227-46; S. H. Talmon, “Wisdom in the Book o f Esther”, VT 13, 1963, 419-55; J. S. Wright, “The Historicity o f the Book of Esther”, in New Perspectives on the Old Testament, ed. J. B. Payne, 1970, 37-47. David M Howard, Jr. Ester (Acréscimos a) -> Apócrifos Esterco -> # 1671 (gll 11, tomar imundo, sujar-se) Esterilidade -> # 6829 ( ‘ãqãr, estéril, atecnia) Estiramento -> # 5742 (n(h, estender, esticar) Estiramento -> # 5742 (n/h, estender, esticar) Estola -> # 680 ( ’êpôd I, estola, vestimenta sacerdotal, objeto de culto) Estrada -> # 2006 (derek, caminho, distância, jornada, maneira) Estrangeiro -> # 5797 (nêkãr, estrangeiro, forasteiro) Estrangulamento -> # 2871 (hnp, estrangular) Estrebaria -> # 774 ( 'urwâ, estrebaria) Estreiteza -> # 7674 (srr 1, atar, calar, ser estreito, estar em aflição) Estrela -> #3919 (kôkãb, estrela) Estremecimento -> # 3006 (An/, tremer, estremecer, assustar) Estultícia -> #211 ( ’ewil 1, tolo, insensato) Estupidez -> # 1279 (6 > IV, ser estúpido) Esvaziamento -> # 6867 ( ‘rh, deixar descalvado, ser derramado)
Ética A. A ética do Antigo Testamento como uma disciplina No que se refere à sua identidade e escopo, no atual século, a disciplina da ética no AT encontra-se num estado semelhante ao da teologia do AT como um todo. Foram apresentados comentários críticos sérios sobre tentativas anteriores (Eichrodt, Hempel, Van Oyen) de siste matizar ou unificar em termos diacrônicos os ensinamentos éticos do AT (Barton, McKeating). 589
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Assim como é problemático relacionar-se a história inconstante da religião de Israel com uma teologia unificada do AT, também é necessário fazer uma distinção entre as convenções do credo e do comportamento israelita em diferentes momentos, os valores éticos e critérios interpretativos de diferentes escritores do AT e aquilo que se pode entender que o AT como um todo apresenta como conjunto coerente de valores éticos. Além dessa discussão metodológica, também há a questão de como os ensinamentos éticos da BH se aplicam aos dias de hoje. Em que sentido se pode dizer que o AT possui auto ridade moral sobre os cristãos? Em termos históricos, a tendência dessa questão foi concentrarse na validade da lei (Bloesch, 1067-1125). No tempo da Reforma, Lutero enfatizou a função da lei como uma “cerca”, refreando o pecado na sociedade civil israelita e como “espelho”, mostrando para nós mesmos nosso pecado e, assim, nos impelindo em direção ao Evangelho. Ao que parece, Lutero rejeitou teoricamente um “terceiro uso” da lei, ou seja, como guia para a moralidade cristã investido de autoridade. E, no entanto, Lutero usou a lei extensivamente de modo prático em seus catecismos, em que, em essência, o reformador “cristianizou” o Decálogo. Em termos teológicos, porém, a lei precedeu e contrastou com o Evangelho. Calvino detectou uma coesão maior entre o AT e o NT, de modo que ressaltou o “terceiro uso” da lei, tomando a sério a declaração de Cristo de que a lei continuava sendo válida. Para Calvino, o evangelho não substituiu a lei, mas mostrou a verdadeira integridade dela e permitiu aos cristãos cumpri-la de fato. Os anabatistas, uma ala radical da Reforma, discordavam dos principais reformadores quanto ao uso que faziam do AT, principalmente por causa de seu ponto de partida eclesiológico diferente. Confrontados com o uso do AT para defender o batismo de bebês e o uso da espada, os anabatistas tendiam a atenuar a autoridade do AT para os cristãos, empenhados que estavam em favor do batismo de crentes adultos e do pacifismo. Estudos recentes, porém, exoneraram os anabatistas da acusação de marcionismo (Swartley, Essays). No século XX, os extremos da interpretação foram, de um lado a posição teonomista, argumentando que a lei do AT tem validade permanente e deve ser aplicada não apenas na igreja mas também por magistrados civis (Bahsen) e do outro, a posição do dispensacionalismo extremo, argumentando que a lei do AT restringia-se inteiramente à dispensação de Israel e não tem autoridade obrigatória alguma em nenhum respeito sobre os cristãos da era da igreja (Geisler). Os críticos das duas concepções tentaram preservar a distinção antiga (iniciada por Orígenes, Agostinho e Calvino) entre leis morais, civis e cerimoniais no AT (Kaiser, “God’s Promise”). Ao mesmo tempo em que reconhecem que não se trata de uma distinção explícita no próprio texto nem que foi planejada para servir de guia exegético, consideram que essa idéia tenha certo respaldo no NT e valor hermenêutico, desde que não resulte em limitar o interesse cristão no AT somente aos Dez Mandamentos. Não se trata tanto de uma categoria separada de lei moral, mas sim de uma dimensão moral presente em todas as leis em termos de princí pios, que incentiva a investigação ética mesmo de leis que os cristãos não consideram mais obrigatórias (Wright). Nos últimos anos, estudiosos críticos têm argumentado em favor de uma grande varie dade de idéias sobre qual deve ser a função ética do AT para os cristãos. O AT pode refletir a moralidade natural e o consenso moral de Israel dentro do contexto mais amplo da moralidade no OMA e, assim, podemos compará-lo criticamente com nossa própria ética (Rogerson). Os textos do AT são um manancial rico de critérios e recursos éticos, mas não devemos reduzi-lo a princípios eternos e, desse modo, ignorar a natureza historicamente condicionada das leis e convenções do AT (Clements). Antes, é justamente o caráter concreto e objetivamente especifico que serve de corretivo saudável para a tendência da ética cristã de tratar de generalidades inde finidas (Davidson. Goldingay). Ainda que o AT não seja mais normativo em suas prescrições, 590
Ética
continua exercendo uma forte influência no processo de moldar a identidade cristã e o caráter moral (Birch e Rasmussen). Esse é, especificamente, o papel das narrativas do AT, revestidas do poder moral de revelar a realidade, abalando e transformando visões de mundo e exigindo uma resposta (Birch, “Moral Address”). Nos muitos escritos de Bruggeman, o poder moral dos textos do AT é aplicado às questões sociais, políticas e econômicas contemporâneas por meio de uma espécie de neotipologia (esp. The Land e Prophetic Imaginatiori). As abordagens sociológicas ao AT também trouxeram uma nova dimensão para a re levância ética do AT. Pode-se observar uma motivação claramente ideológica, como na inter pretação manifestamente marxista dos aspectos socioeconômicos da religião israelita. No en tanto, tem como mérito apontar de maneira enérgica para a relevância ética de Israel como um organismo social completo e não apenas para a importância de textos isolados provenientes de sua tradição (Wright, “Ethical Relevance”). Essa variedade de abordagens à ética do AT mostra-se esclarecedora ao retratar as res postas verdadeiras de Israel a questões éticas no próprio contexto de Israel, ao nos ajudar a relacionar esse contexto com o nosso e ao nos mostrar como textos literários de vários gêneros diferentes funcionam, de fato, no processo de moldar ou oferecer recursos para a ética do leitor. No entanto, alguns estudiosos lamentam a perda de um senso de coerência ou de um princí pio unificador central e também a falta de um conceito de autoridade, ou seja, de que para os cristãos, o AT tem um papel ético normativo permanente. Kaiser relaciona esses pontos fracos também com as abordagens literárias mais recentes ao AT, que mudaram seu enfoque herme nêutico da intenção do escritor para a resposta do leitor e assim, solaparam qualquer autoridade do texto para a ética normativa (“New Approaches”). O próprio Kaiser procura restabelecer a autoridade da lei moral do AT, mas ao mesmo tempo, evita o extremo teonômico ao trabalhar com princípios aplicados. Goldingay (38-65) também valoriza a autoridade normativa do AT em termos éticos advertindo, porém, que não são nossos princípios derivados que têm a auto ridade, mas sim o texto em si. Devemos levar em consideração a especificidade, diversidade e as limitações dos mandamentos do AT e colocá-las inteiramente dentro de seu contexto histó rico. Wright propôs uma abordagem paradigmática que considera Israel na íntegra, colocada no meio das nações como modelo de Deus, com todo o caráter concreto de sua particularidade histórica e contextual, mas também com uma função paradigmática que libera os ensinamentos do AT para serem aplicados na sociedade humana em geral em diferentes culturas. Assim, a re levância ética da lei deve ser colocada no contexto mais amplo do propósito da existência e da missão de Israel em favor da humanidade como um todo. Schluter e Clements desenvolveram essa abordagem nas propostas práticas para a reforma social na Inglaterra. Outros exploraram aplicações semelhantes nos Estados Unidos (Mason). O campo da ética do AT tem atraído cada vez mais a atenção dos estudiosos e a ar da metade do século XX parece ter dado lugar a um quadro mais promissor e fecundo (Janzen, Knight, Birch). Dentro das limitações deste artigo, seria excessivamente ambicioso apresentar um rela to descritivo ou analítico da ética no AT. Seguiremos, portanto, uma seqüência de modo geral canônica, observando os principais temas de importância ética em relação às maiores articula ções da fé de Israel. O AT pressupõe a existência de um Deus vivo e pessoal que determina a vida humana como um todo em resposta a ele. Logo, a ética do AT é, antes de tudo, uma res posta a Deus, a quem ele é e àquilo que fez. Essa resposta é colocada primeiramente no con texto de Deus como Criador e, portanto, ela possui força universal. Em segundo lugar, a ética do AT é colocada no contexto do Deus com seus desígnios da aliança, cujo compromisso de abençoar a raça humana o levou a iniciar uma relação especial com Israel, o que, por sua vez, 591
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exigiu uma resposta ética desse povo. Em terceiro lugar, a resposta ética de Israel foi moldada pelo Deus dos atos redentores, que livrou seu povo e lhe deu uma terra onde morar e uma lei de acordo com a qual viver. B. Criação 1. Simplicidade ética, O monoteísmo dos capítulos iniciais da Bíblia é tão claro que podemos deixar passar facilmente seu caráter revolucionário em termos éticos. A narrativa da criação exclui o politeísmo e o dualismo, bem como todas as suas implicações étnico-culturais universais. Somente um Deus criou os céus e a terra e os homens devem prestar contas a esse único Deus. Desse modo, é introduzida de imediato uma simplicidade fundamental na ética bíblica. Um compromisso de amar e obedecer ao único Deus vivo nos salva do medo de ofen der um deus ao tentar agradar a outro, o que resulta em um conflito de exigências morais. O Salmo 33 apresenta conclusões universais ao deslocar-se diretamente da palavra criativa única de Javé para o desafio universal que todos os homens enfrentam de temer a esse Deus (vv. 6 - 8 ), uma vez que ele é o adjudicador moral de todo comportamento humano (vv. 13-15; cf. também Sl 96.4-5. lOff). Essa simplicidade essencial serve de incentivo para se agir de acordo com a palavra revelada de Deus (Dt 30.11-14; Mq 6 .8 ). 2. Ordem moral. Gênesis 1 apresenta a criação como um lugar de ordem, sistema e es trutura. Vivemos num cosmo e não no caos (cf. Is 45.18ss). Isso oferece uma base e autoridade objetiva para o exercício da liberdade moral e impõe limites para o relativismo moral. Qualquer que seja o contexto cultural ou histórico, precisamos todos viver dentro do mundo criado por Deus como suas criaturas humanas. Esse mundo possui uma forma básica que não foi inven tada por nós e, portanto, há também uma forma correspondente para a resposta moral exigida de nós a fim de vivermos dentro da liberdade que é autorizada pela determinação de Deus. Em termos bíblicos a moralidade é, portanto, precondicionada pela forma da criação, subjacente à relatividade cultural de respostas a essa moralidade dentro da história. A ordem estabelecida da criação também resulta em fé na segurança e previsibilidade da vida neste mundo. É evidente que isso não exclui os aparentes infortúnios inesperados da vida (cf. Eclesiastes) e nem o seu fatalismo. A BH simplesmente parte da observação da regu laridade, coerência e permanência encontradas na própria criação (p. ex., em Jr 31,35ss) para então declarar a existência dessas mesmas características em Deus e, assim, supor que certas conseqüências sempre seguem certas ações. Assim como no mundo físico, na esfera da mo ralidade há causas e efeitos e faz parte de uma vida de sabedoria neste mundo observar essas causas e efeitos e agir de acordo com elas. Esse conseqüencialismo pode ser encontrado na literatura de sabedoria, que tende a basear-se na teologia da criação e não da redenção. Grande parte dos conselhos e orientações dados em Provérbios é prudencial: “Pensa no que acontecerá se...”. Causa e efeito comportamentais são associados repetidamente. A ética sexual da tradição de sabedoria ilustra esse princípio. Enquanto a lei simplesmente proíbe o adultério, sob pena de morte, a sabedoria ad verte quanto a isso ao descrever as conseqüências assustadoras às quais o adúltero se expõe pessoal e socialmente. Na verdade, dentro desse raciocínio, as regras e conseqüências morais reforçam umas às outras (p. ex.; Pv 5; 6.24-35; 7). No entanto, o conseqüencialismo da sabe doria é absolutamente pessoal e teísta. Por trás de todos os conselhos prudenciais dos sábios encontra-se seu próprio axioma fundamental: “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria”. Quaisquer que sejam os resultados de nossas ações, não consistem num processo mecânico de causa e efeito, mas são produto da própria ordem de Deus em seu mundo. Assim, o conse592
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qüencialismo da sabedoria baseia-se naquilo que chamaríamos teologicamente de providência e justiça soberanas de Deus. 3. A imagem de Deus. Dentre as implicações mais importantes dos textos de criação p a ética bíblica, temos a afirmação de que Deus criou os homens à imagem dele. Tal declaração apresenta duas grandes implicações éticas. a. A santidade da vida humana. Já na aliança com Noé foi declarado o princípio de que a vida humana deveria ser considerada inviolável, pois os homens foram feitos à imagem de Deus (Gn 9.6). Até mesmo animais seriam responsabilizados diante de Deus por matarem se res humanos. A influência desse princípio pode ser vista na lei de Israel. As leis sobre animais domésticos que ferissem ou matassem pessoas, por exemplo, eram parte comum dos códigos legais do OMA. Todos eles prescrevem diferentes graus de compensação e castigos para o dono do animal. Somente a lei heb. determina que o boi “culpado” também seja apedrejado até a morte (Êx 21.28ss). É bem provável que esse elemento tenha sido incluído aí em função do princípio religioso da santidade da vida, condensado em Gênesis 9.5-6 (cf. Wright, G ods People in G ods Land, 156-60). Em termos empíricos, esse alto valor atribuído à vida aparece nas narrativas em vários lugares onde o derramamento de sangue é considerado abominação (p. ex., ISm 19.4-6; 25.26; 2Sm 2.22; 3.28, 37). b. A igualdade dos homens. O AT não eliminou todas as distinções sociais, como por exemplo a condição social e economicamente subordinada do escravo. No entanto, fez grande progresso no sentido de amenizar os piores efeitos por meio de uma teologia da igualdade hu mana essencial baseada no caráter comum de todos como criaturas. A lei do AT não apresenta distinção de penas para crimes cometidos contra pessoas de diferentes níveis, como era normal ocorrer nas leis do OMA. Deus ordenou que tanto o nativo quanto o estrangeiro fossem trata dos com igualdade (Lv 24.22). O escravo recebeu direitos humanos e legais sem precedentes nas sociedades daquela época (Êx 21.20-21, 26-27). Isso se refletiu na magnífica autodefesa ética de Jó, na qual ele baseia suas alegações no fato de haver tratado seus escravos com jus tiça em qualquer causa que apresentavam contra ele, fazendo uma declaração inequívoca da igualdade humana na criação aplicada a mestre e escravo: “Aquele que me formou no ventre materno não os fez também a eles?” (Jó 31.15). Mais uma vez, é na literatura de sabedoria que encontramos a prática mais ampla dessa teologia da criação no etos social de Israel. Vá rios textos em Provérbios declaram a igualdade entre ricos e pobres diante de Deus (p. ex., Pv 22.2; 29.13) e outros identificam Deus de tal modo com todos os homens, qualquer que seja a condição deles, que deveríamos fazer a eles o que fazemos ao próprio Deus (Pv 14.31; 17.5; 19.17). Essa é uma área na qual podemos encontrar reflexos bastante claros da tradição de sa bedoria nos ensinamentos éticos de Jesus. C. Promessa pactuai 1. Preocupação universal. Gênesis 3— 11 descreve a corrupção e frustração do propósito de Deus para a vida humana na terra como resultado do pecado e da rebelião do homem, que crescem a cada um desses capítulos de proporções individuais para proporções familiares, sociais e globais. Portanto, o início de uma aliança de promessas com Abraão, em Gênesis 12, possui uma abrangência igualmente global. Essa aliança é o alicerce do projeto redentor de Deus para toda a criação, ao longo do restante da Bíblia. Trata-se de uma aliança de graça, que se encontra por trás de todos os atos subseqüentes de Deus na história, pois representa o compromisso dele com o bem maior da humanidade: “Em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gn 12.3). A abrangência universal dessa promessa ecoa por todas as narrativas dos patriarcas (Gn 18.18; 22.18; 26.4-5; 28.14) e depois, ao longo do resto da BH. Esse compromisso com um propósito 593
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pactuai de redenção da parte de Deus introduz um elemento de esperança escatológica e intento “missionário” à ética bíblica. De outro modo, as incertezas da história poderiam nos reduzir a uma condição de cinismo com relação ao valor das escolhas morais, conforme é observado em Eclesiastes. Porém, a pela ótica maior da redenção e da nova criação, o comportamento ético possui uma base sólida e não é apenas uma conveniência imediata. 2. O povo de Deus. Deus prometeu fazer de Abraão uma grande nação (Gn 12.2-3). Es é uma característica importante da ética bíblica, arraigada aqui no AT. A resposta de Deus para um mundo de nações dispersadas em arrogância e discórdia (conforme o retrato de Gênesis 11) foi criar uma nova comunidade. Seria um povo descendente de Abraão, abençoado como ele, mas em última análise, seria o meio de trazer bênção para o mundo inteiro de nações, e a con tribuição desses descendentes para tal propósito se daria pela distinção ética deles. O simples fato de aquela nação ser Israel constituía uma prioridade e missão ética no meio do mundo. Isso porque um israelita era chamado a responder ao propósito pactuai de Javé para as nações ao viver como povo de Deus em meio a elas. A expressão mais clara dessa verdade encontra-se em Gênesis 18.19: “Porque eu o es colhi para que ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do Senhor e pratiquem a justiça e o juízo; para que o Senhor faça vir sobre Abraão o que tem falado a seu respeito”. O contexto desse v. é o julgamento iminente de Deus sobre Sodoma e Gomorra. No meio de um mundo caracterizado por Sodoma (->), cuja perversidade estava levando a clamores de protesto, Deus queria uma comunidade caracterizada pelos valores e prioridades dele, ou seja, retidão (observe-se o trocadilho entre $edãqá e ‘ãqâ\ cf. Is 5.7) e justiça (mispãf). A presença dessas duas orações, “o caminho do Senhor” e “pratiquem a jus tiça e o juízo”, aqui nessas narrativas ancestrais, mostra que a identidade de Israel como uma comunidade ética distinta tem suas origens antes da aliança no Sinai e da lei mosaica. Era algo escrito no código genético de Israel, por assim dizer, quando esse povo ainda nem fora gerado por Abraão. De fato, tal distinção ética é apresentada nessa passagem pelo próprio Deus, exata mente como o motivo para a eleição de Abraão: “Porque eu o escolhi para que...” Esse v. apre senta um forte conceito de propósito. Eleição significa ser eleito para manter prioridades éticas em meio ao mundo corrupto das Sodomas. Esse conjunto de prioridades em si é apenas parte de um propósito ainda mais amplo: “para que o Senhor faça vir sobre Abraão o que tem falado a seu respeito”. Diante do que é dito no v. anterior, trata-se de uma referência clara à intenção maior de Deus de abençoar todas as nações por intermédio dos descendentes de Abraão. O que é mais relevante nesse v., em termos sintáticos e também teológicos, é a forma como a ética é o meio termo entre a eleição e a missão. Por um lado, a qualidade de vida distinta do povo de Deus, comprometida com a retidão e justiça divinas, constitui o propósito da eleição e, por outro lado, é o meio de missionar— trata-se do fundamento do versículo. Essa seqüência de eleição, ética e missão sustenta todo o esquema bíblico de prioridades para a vida do povo de Deus. Dessa forma, a ética do AT é colocada dentro de uma estrutura universal e escatológica. Jeremias 4.1-2 apresenta uma ilustração do mesmo princípio nos textos proféticos. Em primeiro lugar, Jeremias insta o povo a renunciar a idolatria e tomar o culto e a vida social, em geral, compatíveis “em verdade, em juízo e em justiça”. Prossegue descrevendo os resultados que virão de tal arrependimento ético radical. O profeta parte do pressuposto de que o julga mento de Deus sobre Israel seria evitado e assume uma perspectiva mais universal, fazendo outra alusão clara à aliança com Abraão: “nele serão benditas as nações e nele se glorificarão” (Jr 4.2b). E evidente que Jeremias acreditava que a qualidade da vida ética de Israel não era apenas um fim em si, mas que devia ter amplas conseqüências para as outras nações também. Havia muito mais em jogo do que só salvar a pele de Israel do julgamento. Isaías 48.1, 17-19 594
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apresenta a mesma argumentação em termos retóricos e hipotéticos, mas ao mesmo tempo in tensifica a relação entre o propósito redentor de Deus para a humanidade, conforme indicado na aliança com Abraão, e seus requisitos éticos para com Israel como povo de Deus. A ética do AT possuía um propósito missionário.
D. Um povo redimido O livramento histórico de Israel da escravidão do Egito foi declarado explicitamente como tendo sido motivado pela fidelidade de Deus à sua aliança com Abraão. O Livro de Êxo do parte do livramento em si e avança para o encontro entre Javé e Israel no monte Sinai. Lá, Israel foi confrontado com as implicações éticas profundas do que havia acontecido com ele. 1. Sacerdotal e santo. Êxodo 19.4-6 é uma passagem crucial, pois gira em tomo da história redentora do êxodo e da lei e textos da aliança que se seguem. Nesses w ., Deus dá a Israel uma identidade e uma missão, que servem de base para os requisitos éticos da lei, e, por trás desses dois elementos, encontra-se a atuação redentora do próprio Deus. Assim, como uma forma de prefácio para toda a legislação detalhada a ser apresentada na seqüência, o princípio ético fundamental é o de que os requisitos de Deus dependem, em primeiro lugar, daquilo que o próprio Deus fez e, em segundo lugar, de quem Israel é. a. A iniciativa de Deus e seu interesse universal. “Tendes visto o que fiz” (Êx 19.4). Assim como no Decálogo, o texto começa com uma lembrança histórica da atuação de Deus. Israel era um povo livre por causa da iniciativa de Deus de graça redentora e cumprimento de suas promessas. Quaisquer exigências morais que o povo tivesse diante de si jamais passariam de uma reciprocação daquilo que Deus já havia feito por eles. A prioridade da graça sobre a lei não foi uma descoberta ou revolução do NT, mas sim uma realidade embutida na natureza do encontro entre Deus e os homens desde o começo. Era uma parte clara da aliança de Israel e continua sendo um princípio fundamental da ética bíblica como um todo. Apesar de, a essa altura da história canônica, o enfoque ser principalmente sobre Israel e a relação redentora e pactuai singular entre ele e Deus, o escopo universal da aliança com Abraão não se perdeu. A visão de Deus ainda é tão ampla quanto “todas as nações” de “toda a terra”. Mesmo no Egito ele havia demonstrado esse fato para a Faraó (Êx 9.14, 16,29). Quais quer exigências éticas que se seguissem deveriam ser determinadas não apenas à luz do ato histórico recente de redenção, mas também no contexto do objetivo universal de Deus. b. A identidade e obrigação moral de Israel. Tendo lançado esses dois alicerces, Êxodo 19.6 prossegue descrevendo o papel e a missão de Israel em duas orações, que se repetem em outras partes do AT e também são aplicadas à igreja em 1 Pedro 2.9: “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa”. i. Sacerdotal. Na Israel da antigüidade, um sacerdote era alguém que se interpu entre Deus e o resto do povo, atuando como mediador nas duas direções. Por um lado, repre sentava Deus para o povo de Deus pela vida e pelo exemplo, mas especialmente por meio de sua responsabilidade de ensinar a lei (Lv 10.9-11; Dt 33.8-10; Jr 18.18; Os 4.6; Ml 2.1-9). Assim, por intermédio do sacerdote o povo podia conhecer a Deus. Por outro lado, represen tava o povo diante de Deus, uma vez que era incumbência dele, sacerdote, levar os sacrifícios e fazer expiação pelo povo no altar. Desse modo, por intermédio do sacerdote o povo podia aproximar-se de Deus. Portanto, é com esse significado duplo do sacerdócio que Israel como uma comunidade inteira é comissionada para ser o sacerdócio de Javé entre as nações. Por um lado, Israel repre sentaria o verdadeiro Deus para as nações — revelando sua vontade, suas exigências morais, seu propósito salvador, etc. Por intermédio de Israel, outras nações conheceriam Javé. Porém, 595
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também seria por meio de Israel que Deus, a seu tempo, traria as outras nações para junto de si numa relação pactuai de redenção e expiação. Por intermédio de Israel, outras nações se aproximariam de Javé. Profetas posteriores usam as duas idéias: a lei de Deus emanando de Israel para outras nações e as outras nações achegando-se a Deus. Assim, a identidade de Is rael como sacerdócio confere à ética do AT mais uma dimensão de relevância “missionária”. Logo no inicio de sua tribulação histórica, Deus determina suas prioridades éticas no contexto da missão do povo no meio das nações (essa mesma motivação é vista na aplicação que Pedro faz do caráter sacerdotal do povo de Deus, 1Pe 2.9-12). ii. Santo. Essa palavra tem o sentido de distinção e diferença. Israel seria uma naç como outras nações, mas seria santa — diferente do resto das nações (Lv 18.3). Essa é a impli cação prática da doutrina sacerdotal da eleição de Israel dentre as nações (Lv 20.26). Até mesmo Balaão, um estrangeiro, reconheceu essa consciência de distinção em Israel (Nm 23.9). As implicações dessa característica afetavam todas as dimensões dos israelitas como nação, quer no âmbito religioso, social, econômico, político ou pessoal. Uma das demonstrações mais claras desse fato pode ser encontrada em Levítico 19, um capítulo repleto de leis práticas para a vida diária, todas elas sob o título “Santo sereis, porque eu, o Senhor, vosso Deus, sou santo” (Lv 19.2). A santidade afetava mais do que apenas a área ritual da vida. Determinava a generosidade com os produtos agrícolas (vv. 9-10; cf. Dt 24.19), o tratamento justo e o paga mento dos empregados (v. 13; cf. Dt 24.14), a compaixão prática pelos inválidos e o respeito para com os idosos (vv. 14, 32; cf. Dt 27.18), a integridade do processo judicial (v. 15; cf. Dt 16.18-20), medidas de segurança (v. 16b; cf. Dt 22.8), consciência ecológica (vv. 23ss; cf. Dt 20.19-20), igualdade diante da lei para as minorias étnicas (vv. 35-26; cf. Dt. 24.17) e honesti dade no comércio e nos negócios em geral (vv. 35-36; cf. Dt 25.13ss). Em resumo, amar o pró ximo (e até mesmo ao forasteiro) como a si mesmo (Lv 19.18,34) não é um princípio arraigado numa ética de amor revolucionária introduzida por Jesus (cf. Mc 12.31), mas uma exigência ética fundamental da santidade no Antigo Testamento (Gammie, 33-34). 2. Guardar a lei. Colocar a lei do AT sob essa ótica (a atuação redentora de Deus e seu objetivo universal) ajuda a suavizar o tom de outro modo completamente deontológico da lei — ou seja, a predominância do mandamento divino como base para o comportamento. A relação de aliança entre Israel e Deus implicava obediência às leis, estatutos e ordenanças de Javé. Sem dúvida a ética continha regras baseadas na autoridade divina, mas a deontologia do AT era tão teísta quanto seu conseqüencialismo. A autoridade da lei não é uma autoridade de absolutos éticos abstratos, mas sim do Deus pessoal que o povo conhecia como Criador e Redentor. Assim, a obediência à lei não consistia apenas em conformidade com as regras, mas em lealdade pessoal ao Deus que havia dado ao povo essas regras. 3. Obediência motivada. Por esse motivo, a lei em si contém um grande número de “orações causais”, apresentando motivos pelos quais determinadas leis deviam ser obedecidas. Tais orações encaixam-se em diversas categorias (cf. Wright, Living, 21-32). 4. Gratidão. O próprio Decálogo começa com uma declaração de redenção a fim de ressaltar que a obediência às leis que se seguiam era uma questão de responder com gratidão (Êx 20.2). A forma de sermão de Deuteronômio 4— 11 reforça esse ponto. O Deus que amou os antepassados de Israel o suficiente para resgatar seus descendentes da escravidão é um Deus que deve ser amado em reciprocidade, com uma aliança expressada em termos de obediência. É significativo que a área da lei que mais insiste nesse motivo de gratidão pelo livramento his tórico é aquela que se refere ao pobre, ao estrangeiro, ao devedor e ao escravo — justamente as condições das quais Deus resgatou Israel (p. ex., Êx 22.21; 23.9; Lv 19.33-36; 25.38,42-43; 596
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54-55; Dt 15.15). Há exemplos narrativos desse mesmo princípio sendo colocado em prática (p. ex., ISm 11.12-13; 30.22-25). 5. Imitação de Javé. Os atos de Deus em favor de Israel não eram apenas motivo para obediência, mas também um modelo de obediência. Obedecer era “andar nos caminhos do Senhor’’. Em Deuteronômio 10.12-19, esse motivo — a imitação (vv. 17b-19) — é acrescentado a outro — a gratidão (v. 15). Dentro da narrativa, encontramos uma referência a Davi imitando a “bondade de Deus” (2Sm 9.3). Nos Salmos, a imitação das características éticas de Deus é inculcada pela celebração metódica das mesmas e, ocasionalmente, por uma comparação direta entre as qualidades éticas de Javé e aquelas de uma pessoa justa (como nos Salmos par. 11 e 112; ver vv. 3,4, 5 e 9 de cada capítulo.). . O bem do homem. Além de constituir um dever, a obediência também é apoiada cons tantemente pela consideração “utilitária” que produzirá a felicidade mais profunda do maior número de pessoas. Essa é a motivação das exortações em Deuteronômio (p. ex., 4.40; 5.33; 6.24-25; 30.15-20, etc.). A justiça social do rei trará bênçãos e prosperidade para a nação toda (Salmo 72). Por outro lado, a perversidade social endêmica levará a um desastre econômico, ecológico e político (Oséias 4 e os profetas,passim). Os salmos que louvam a lei não apresen tam, de modo algum, uma moralidade legalista. Antes, regozijam-se na obediência como meio de manter e desfrutar o relacionamento reto com Deus que leva à maior liberdade pessoal e bem-estar social (Sl 1; 19; 119). Os escritos de sabedoria revelam um ponto dc vista semelhante (Pv 3.5-10; 11.17; 14.34). 7. A escala de valores da lei. Dentro do Decálogo (Êx 20.1 -17), encontramos uma escala de prioridades na seqüência dos mandamentos. Deus vem em primeiro lugar (primeiro ao tercei ro). O mandamento do sábado é para o bem de toda a sociedade (quarto). Depois, a autoridade e integridade da família (quinto), seguidas da vida individual (sexto), do sexo e integridade do casamento (sétimo), da propriedade (oitavo e décimo) e da integridade judicial (nono). Mais do que isso, o resto das leis apresenta algumas prioridades definidas em sua escala de valores, i. A vida é mais importante do que os bens. Assim, nenhuma ofensa que envolvesse propriedades (roubo, fraude, etc.) acarretava em pena de morte no procedimento judicial israelita comum. Também não se podia atribuir a uma vida tirada por homicídio um valor em dinheiro, liberando o homicida depois do pagamento de uma multa (Nm 35.31-34). ii. As pessoas são mais importantes do que os castigos. Ao contrário da crença popular, a lex talionis foi criada para limitar a vingança e proteger os criminosos de castigos excessivos. É provável que constituísse um princípio declarado em termos enérgicos que não eram destina dos a ser aplicados literalmente. O castigo físico (açoitamento) era controlado rigorosamente a fim de preservar a dignidade do transgressor (Dt 25.1-3). Em nenhum caso, era prescrito o encarceramento. A mutilação física também estava quase completamente ausente (sendo Dt 25.11 a única e remota exceção). iii. As necessidades são mais importantes do que os direitos e reivindicações. Havia um etos na lei israelita, que fica mais claro em Deuteronômio, segundo o qual mesmo nas questões em que alguém tinha um direito ou reivindicação legal, devia agir levando em consideração as necessidades e sentimento da outra parte. Por vezes isso ia contra todos os costumes do mundo antigo, como no caso de dar asilo a escravos fugidos (Dt 23.15-16). Em certas ocasiões, pro tegia a dignidade dos mais fracos e vulneráveis como os devedores (24.10-13) ou as mulheres cativas (21.10-14). Colocava as necessidades físicas do homem acima dos direitos estritos de propriedade (23.24-25; 24.19-22). Estendia-se até a animais (22.1-4, 6-7; 25.4). Em resumo, dentro do sistema social e econômico geral de Israel dava-se grande valor à defesa dos direitos e suprimento das necessidades das partes mais fracas da sociedade, não apenas pela exortação
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à caridade, mas também por mecanismos estruturais, como a quitação de dívidas e libertação de escravos no ano sabático e a observação do ano de jubileu (cf. Wright, “Israel as a Society”). . Uma ética comunitária. Com exceção dos períodos de paganismo e decadência m ral desenfreados (como o reinado de Manassés), os israelitas de modo geral compartilhavam um etos comum que era, em grande parte, orientado pelas principais distinções da lei mosaica. Pode-se ver evidências disso nas “tipologias” éticas encontradas aqui e ali — ou seja, retratos de comportamentos tipicamente justos ou iníquos. Essas tipologias são esclarecedoras pois não se encontram no contexto legal, mas sim refletem até que ponto os valores da lei penetra ram os valores comumente aceitos da sociedade. Exemplos de relações desse tipo podem ser encontrados nas narrativas (p. ex., ISm 12.1-5), nos Salmos (15; 24), na tradição de sabedoria (p. ex., Jó 31) e nos profetas (p. ex., Ezequiel 18) (Wright, Living, 203-8). A característica que mais se destaca em todas essas relações é o alto grau de combinação daquilo que chamamos de moralidade particular com a moralidade pública — abrangendo tudo, desde pensamentos íntimos até deveres civis. Elas proporcionam um entendimento mais esclarecedor e gratificante do que qualquer outro estudo sobre a ética do AT.
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Decálogo; Palavra de Deus B ib lk x ;ra fia
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Exaltação (orgulho) -> # 1467 (gbh, ser elevado, exaltado, arrogante) Exaustão -> # 3333 ( y g \ estar cansado) Excremento
# 7362 (fjê ’â, imundície, excremento humano)
Execução -> # 4637 (mwt, morrer, matar, executar) Exercício -> # 5814 (nsh, testar, treinar, exercitar) Exército Exigüidade
# 7371 ($b ’, ir à guerra, servir, passar tropas em revista, alistar) # 5070 ( m serem poucos, reduzir, diminuir, poucos)
Não há nada tão devastador na história de Israel quanto o exílio. Destruiu a cidade santa, o templo e o ritual histórico de adoração; removeu a monarquia e o sacerdócio de seu lugar na sociedade; tirou a maior parte do povo da terra e deu cabo da existência de Israel como nação autônoma. Tal de vastação causou uma crise de grandes proporções na fé do povo de Deus. Se não fosse pelos oráculos dos profetas, é possível que a fé desse povo não tivesse resistido ao cativeiro. 1. O vocabulário empregado pelas Escrituras para se referir ao exílio é direto, a. dos principais termos para exílio, glh (-> # 1655) significa simplesmente “descobrir”. Pode referir-se à divulgação de um segredo (Pv 20.19), à publicação de um decreto (Et 3.14) ou à Exílio
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revelação de uma mensagem (Nm 24.42). O vb. também é usado na oração para que Deus “abra” (glh) os olhos e dê entendimento (Sl 119.18). Da mesma forma, o cognato aram. é usado em Daniel 2.22 para declarar que Deus “revela o profundo e o escondido”. O termo também pode ser empregado de modo idiomático para atos vergonhosos, como descobrir a nudez, um eufemismo para o contato sexual ilícito (Lv 18.6-19) ou descobrir-se embaraçosamente (Gn 9.21; 2Sm 6.20). No entanto, glh também significa partir, remover ou ir embora, como em 1 Samuel 4.21-22, em que a expressão “Foi-se a glória” descreve a captura da arca da aliança. É nessa linha que se encontra o sentido claro de ir para o exílio (2Rs 17.23 [glh]). A relação entre os significados é de que num exílio a terra é descoberta quando as pessoas são removidas. E pos sível ainda que a idéia de descobrir, ou seja, expor, fosse associada às condições de uma terra arruinada ou dos exilados que estavam sendo levados para o cativeiro (cf. Mq 1.16). Assim, o radical hi. significa levar para o exílio (2Rs 17.6). Há dois derivativos heb. atestados para esse vb.: gôlâ significa exílio (Et 2.6; Zc 6.10; # 1583) egãlút tem a mesma acepção — exílio, exilados (ver Is 45.13; Jr 24.5; -> # 1661). b. O outro termo importante que descreve exílio ésbh, levar cativo (-> # 8647). Gênes 14.14, por exemplo, relata que Ló “estava preso” (sbh), que havia sido levado cativo pelos reis invasores. Um subst. relacionado seb isignifica (estado dc) cativeiro (-> # 8660). Deuteronômio 28.41 adverte que a nação desobediente verá seus filhos irem para o cativeiro. sebi também pode significar cativos. É esse o sentido em Êxodo 12.29, que inclui “o primogênito do cativo” entre aqueles que são ameaçados de morte. Também os subst. sibyâ (-> # 8664), sebüt (# 8654) e sebit ( # 8669), que podem referir-se a um cativeiro ou aos cativos em si (Sl 126.1). 2. Ir para o exílio ou ser levado para o cativeiro por um exército invasor significav a perda de sua pátria e a deportação para uma terra estrangeira. Era um tempo de destruição, morte e desespero. Para Israel e outros grupos politicamente pequenos do OMA esse era um temor constante. Kenneth Kitchen coletou dados suficientes da história do OMA para mostrar como o exílio era comum. Ele começa observando evidências de uma deportação e reassentamento já em Mari, c. 1800 a. C. Um oficial escreve, por exemplo, sobre um “presente” de 1 030 homens para o palácio e posteriormente, Simri Lim fala de trinta mil deportados. Outras cartas regis tram censos e listas de trabalhos dos exilados. Em seguida, Kitchen observa que no século XVI, Ahtusil I, um rei hitita, “libertou” a população servil das cidades e reassentou-a na terra dele para servir à deusa Sol. No século seguinte, Tutmés III do Egito capturou 2 500 prisioneiros em sua primeira campanha e Amenófis II transplantou cem mil sírios para o Egito. No século XIV, o hitita Mursil II afirma ter transferido grupos populacionais inteiros nas campanhas mi litares, sendo que só para o palácio foram designados 15 500 servos. No século XIII, a inscri ção de Ramsés II em Abul Simbel o descreve como aquele que removeu a Núbia para a Terra do Norte e os sírios para a Núbia. Os assírios também eram conhecidos por suas deportações. Tukulti-Ninurta I levou cativos 28 800 guerreiros hititas. Em dez anos, Salmaneser III levou 44 mil pessoas para a Assíria. Tomando-se por base essas e outras evidências, fica claro que a prática do exílio ou deportação era bastante conhecida desde a antigüidade. Não é de surpreender, portanto, que nas primeiras tradições da Bíblia haja um teste munho claro desse perigo. Em um caso. Gênesis 14.14 registra uma agressão internacional dos reis do Oriente. É bem provável que o escritor considerasse esse acontecimento como o cumprimento de um oráculo de maldição que prenunciava a escravidão terrível para um povo vivendo em devassidão (Gn 9.25). Também prefigurou as invasões posteriores dos reis da Assíria e Babilônia quando o povo da terra passou a andar nos caminhos dos cananeus. Num 600
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caso diferente, os descendentes de Abraão foram escravizados enquanto estavam no Egito e forçados a trabalhar junto com outros cativos (Gn 15.13; Êx 12.29). Assim, quando o povo foi livrado da escravidão do Egito e recebeu a lei, entendeu perfeitamente bem a advertência sobre o exílio em caso de rebelião pertinaz (Dt 28.41). A aliança tinha estipulação e as violações da aliança acarretavam penalidades. Ao tornar-se uma nação, o povo de Israel envolveu-se em todos os aspectos da guerra, inclusive a prática de fazer prisioneiros (Nm 31.12). Apesar de grande parte da escravidão em Israel ser resultante de endividamento, também havia cativos de guerra. Em muitos casos, era uma questão de fazer prisioneiros aqueles que, de outro modo, iriam capturá-los (“leva presos [sebí\ os que te prenderam [.y/>/;]”, Jz 5.12). A lei determinava como os israelitas deviam tratar os prisioneiros (Êx 21.20), especialmente no caso das mulheres que eram levadas cativas (Dt 21.10). Além disso, todos os escravos deviam ser libertados no ano sabático (Êx 21.2). 3. Quando a nação voltou-se para os falsos deuses e entregou-se à iniqüidade, desc briu que as ameaças de julgamento não deviam ser consideradas levianamente. Deus usaria outras nações para levar Israel à submissão e até mesmo exilaria Israel em outra terra se ele persistisse na infidelidade. No tempo dos Juizes, a nação provou um pouco dessa disciplina divina. Talvez o momento mais sombrio tenha sido do período em que os filisteus derrotaram Israel e capturaram a arca. Nessa ocasião, os israelitas proferiram o lamento: “Foi-se a glória” ([ghl kãbôd], ISm 4.21-22). Então, no período monárquico Israel descobriria como essa terrível ironia do mundo antigo seria usada por Deus para julgar seu povo. Quando a nação afastou-se do Senhor para adorar falsos deuses e seguir suas práticas depravadas, os profetas começaram a proclamar orá culos de julgamento que ameaçavam o povo com a advertência pactuai do exílio. Esses orácu los eram, com freqüência, precedidos de discursos de acusação, os pleitos da aliança (ríb) que apresentavam o motivo para a mensagem de destruição (ls 1.1-25; Am 3.1-10). Desse modo, a culpa era colocada claramente sobre o povo infiel de Israel por romper a aliança e o Senhor era vindicado ao executar o julgamento por tal rebelião (Os 13.1-16). Afinal, a relação de aliança que Deus havia estabelecido com Israel, um pacto baseado na eleição e redenção, não dava a Israel a liberdade de seguir outros deuses. As tradições pactuais sempre fizeram da lealdade à aliança de Deus a condição para a bênção divina — ele prote geria o povo e o proveria desde que o povo lhe permanecesse fiel; mas se o povo o deixasse. Deus faria sobrevir a calamidade. A conjunção “se” constituía o eixo teológico das promessas da aliança (Dt 28.1-2, 15; Js 24.20). A aliança do Senhor podia ser descrita como uma aliança incondicional ou eterna, mas a participação individual nessa aliança exigia fé e obediência. Tendo-se em vista que os profetas encontravam-se profundamente envolvidos nas tradições da aliança, as advertências deles devem ser consideradas tentativas de preservação dessa aliança. As mensagens deles eram repletas de clamores insistentes para que a nação voltasse para Deus (p. ex., Jr 3.14, 15; 4.1-2; 18.7-11; 25.4-7; 26.3-6; Os 14.1-9; Am 5.4-15). Pelo fato de o povo haver rompido a aliança, o único recurso era arrepender-se antes que fosse tarde demais. Havia, portanto, uma possibilidade de escapar-se ao julgamento. Porém, ao negar-se arrepender, Israel selou a condenação e causou a recusa de Deus em absolvê-lo dos pecados. Israel não quis atentar para as advertências sobre a destruição (Ez 3.7) e nem mudar de cami nhos (Jr 25.7-11). Em vez disso, os israelitas deram ouvidos aos profetas que mentiam para eles, convencendo-os de que, pelo fato de serem o povo da aliança, teriam paz (Jr 5.31). Para o povo de Israel, os oráculos de julgamento eram impensáveis e a instrução para que se sujei tassem ao julgamento do exílio era antipatriótica (Ez 24.13, 14). 601
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Assim, a nação deu uma volta completa. Os profetas lembraram ao povo de como o Senhor o havia tomado para si e cuidado dele quando ninguém mais se importava (Ez 16.5-14). Deus fez deles o seu povo. Porém, pelo fato de infidelidade contumaz de Israel e de sua recu sa em mudar de caminhos (Jr 11.1-17) não podia mais ser o povo de Deus (Os 1-10). Aqueles que rejeitavam o Senhor perdiam esse direito; Deus não teria compaixão (Ez 16.35-42; 24.14; Os 1.6). O raciocínio era impecável: Por que Deus devia perdoar aqueles que se voltavam para outros deuses (Jr 5.7)? Em vez disso, o Senhor o mandaria Israel para o exílio para servir aos estrangeiros e aos deuses deles, pois Israel havia deixado o Senhor para servir a outros deuses (Jr 5.18-19). Tendo-se em vista que a maioria do povo havia desprezado as estipulações da aliança (-> # 1382), Deus declarou que removeria da terra dele o povo. E assim, Amós começou a anunciar que Israel certamente iria para o exílio (glh, Am 7.11-17) e que os israelitas seriam mortos no cativeiro (sebi, Am 9.4). Anunciou especificamente que Betei e Gilgal seriam exi ladas (haggilgãl gãlõh yigleh, Am 5.5) e que até mesmo as nações vizinhas como Arã seriam levadas embora {glh, Am 1.5). Oséias condenou a religião falsa de Israel ao prenunciar que a glória dos bezerros de Bete-Áven (Betei) partiria (glh, OslO.5, numa alusão a ISm 4.21-22). Posteriormente, nos oráculos para Judá, Jeremias lembrou o povo da infidelidade para com a aliança perguntando a ele: “Deixaria eu de castigar estas coisas, diz o Senhor, ou não me vingaria de nação como esta?” (Jr 5.9, 29; 9.9). A violência e a corrupção haviam conta minado a terra, mas agora, ela teria descanso (Jr 25.12; 29.10). Com o simbolismo de setenta anos de descanso, o profeta revelou a certeza do exílio, sua duração e seu fim, bem como um dos principais objetivos de Deus ao executar esse julgamento. Ezequiel explicou que o impacto seria tal que todas as nações saberiam que Judá havia ido para o exílio (glh) por sua iniqüidade e que, em decorrência dos pecados do povo, o Senhor entregara o povo nas mãos dos inimigos (Ez 39.23). Pelo fato de uma grande parte da culpa por essa deserção ser dos líderes de Israel, Jeremias concentrou neles parte considerável de sua atenção. Advertiu corajosamente Pasur, seu opressor, de que Pasur e sua casa seriam levados para o cativeiro (bassebi, Jr 20.6) e deu-lhe um novo nome: “terror por todos os lados” (v. 10). Uma vez que a aliança havia sido violada, não havia ensinamento falso ou tentativa de se faze rem alianças políticas que pudessem impedir o cumprimento dos oráculos de destruição. 4. As previsões dos profetas cumpriram-se nos cativeiros de 734 e 722 para Israel 597 e 586 para Judá. Tiglate-Pileser (->) levou o povo do Norte para o exílio (glh) (2Rs 15.29) e tomou (glh) Samaria (17.6). O relato se encerra com a noticia da deportação (glh) de Israel para a terra da Assíria (17.23). 2 Reis 24.14 relata como, depois disso, a Babilônia exilou (glh) o povo de Jerusalém, deixando para trás apenas os mais pobres, e 25.11 conta como foi exilado (glh) o restante de Judá. Sem dúvida o exílio causou uma crise na fé de Israel. Uma coisa era sobreviver à inva são e devastação, mas outra bem diferente era tentar compreender o que Deus estava fazendo. Deus havia abandonado seu povo? Ele os havia rejeitado para sempre? A terra da promessa foi arrasada (Jr 7.34) e a cidade santa de Jerusalém estava em ruínas (2Rs 25.10; cf. Lamenta ções); o templo havia sido incendiado e saqueado; o rei levado escravo; o povo deportado; e aqueles que escaparam haviam fugido. Em resumo, o que estava em jogo era a sobrevivência — a própria identidade — de Israel. Por certo Israel havia pecado antes e não havia recebido esse tipo de julgamento. Con tudo, o castigo foi tão severo que muitos questionaram a natureza de Deus. Afinal, esse era o seu Deus, que havia feito aliança com ele; era o Deus de justiça que o estava destruindo jun tamente com as nações perversas (Jr 27.6; Hc 1.12-17); era o Deus de misericórdia que estava 602
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se recusando a ter piedade de Israel. Seria preciso que os justos, que tiveram que suportar o mesmo destino de sua nação como um todo, vivessem pela fé (Hc 2.4). E seria necessária uma fé viva para se olhar além do desespero e enxergar o futuro. Mas, conforme anunciaram os oráculos de salvação, haveria um futuro. Enquanto isso, a devastação e deportação foram quase insuportáveis. Calcula-se que cerca de quarenta mil pessoas foram deportadas para o exílio na Babilônia e muitos outros que fugiram também acabaram se dirigindo para aquela região por motivos familiares ou econô micos. De repente, pela primeira vez em sua experiência como nação, Israel viu-se sem o culto — não havia templo, nem sacrifício e nem festas. O povo não podia entoar os cânticos de Siâo no exílio, pois seus captores escarneciam dele; só o que lhe restava era chorar por Jerusalém (Salmo 137). A nação experimentou morte e destruição num grau sem precedentes — foi, de fato, um cálice de atordoamento recebido das mãos de Deus (Is 51.17-20). Aqueles que foram deixados para trás, para habitar nas ruínas, tentaram manter as práticas religiosas, mas a per versa opressão os impediu e colocou-lhes a vida em perigo (Jr 41.5-8). Pode-se perceber em alguns oráculos de consolo e salvação como o povo via a terrível situação. O fato de os profetas terem que convencer os exilados de que havia esperança indica qual era a condição de sua fé. Devido aos oráculos de julgamento, muitos daqueles que tenta ram entender o que estava acontecendo convenceram-se de que, em sua ira contra os pecados do povo, o Senhor os havia abandonado (Is 54.7-8), vendido ou se divorciado deles (50.1-3). Pensaram que Deus não podia ver os caminhos deles (40.27) e entraram em desespero. Deus havia se escondido deles e eles tinham sido consumidos (64.6-7). Era chegada a hora do luto e da tristeza (60.20) pois estavam profundamente aflitos e desconsolados (54.11). 5. Porém, aos poucos, os oráculos proféticos de salvação trouxeram a esperança. Log o povo poderia dizer com o salmista que o Senhor disciplinara o povo com severidade, mas não o havia entregue à morte (SI 118.18). O povo não morreria, mas viveria. Na verdade, um dos sinais de maior esperança foi que no 378 ano de exílio, Joaquim, o rei de Judá, foi ele vado à condição de monarca, passou a receber uma pensão e foi convidado a comer à mesa do novo rei da Babilônia, Evil-Merodaque (2Rs 25.27-30). Assim, o livro de Reis, que havia documentado a queda quase instantânea de sua nação, termina com essa observação otimista. (-> Reis: Teologia) Além disso, na Babilônia os “judeus” (como passaram a ser chamados; -> # 3374) fixa ram residência e viram-se numa situação muito diferente da escravidão no Egito. Não demora ram a adaptar-se a uma vida relativamente normal nessa nova terra — com a diferença de que eram súditos de outro rei. Mantiveram a identidade, tinham liberdade de se deslocar, podiam adorar seu Deus e adquiriram suas próprias casas e negócios como o profeta os instruiu a fa zer (Jr 29.4-9). Alguns deles ocuparam imediatamente cargos privilegiados na corte real (Dn 1.3-7). Uma vez que, de modo algum estavam lutando pela sobrevivência, o importante para os judeus era cuidar de seu legado e não tomar-se parte de um mundo pagão (Dn 1.8-16). E claro que alguns se esqueceram de sua herança e acomodaram-se na terra do exílio, mas houve um remanescente que preservou a fé. Das cinzas da destruição surgiu um povo fervorosamente consagrado a Deus. O milagre do exílio foi o fato de a nação ter sido purificada da idolatria. Houve, ocasionalmente, práticas idólatras isoladas, mas Israel nunca mais seguiu outros deuses. Pelo contrário, no exílio come çou a desenvolver uma nova forma de culto não sacrifical, provavelmente sob a liderança de homens como Ezequiel. Foram as raízes daquilo que posteriormente tomou-se o culto na sina goga, com sua ênfase na oração, na leitura da Escritura e na instrução (p. ex.; Ez 33.30-33). 603
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O que causou essa mudança? O mais provável é que o povo de Deus tenha percebido que os oráculos de julgamento pela transgressão da aliança haviam se cumprido. E se esse era o caso, então também podiam crer nos oráculos de salvação e ter esperança. Deus havia se irado com eles e os havia rejeitado — mas apenas por um momento (Is 54.7-8). Quando Deus julgou a geração infiel com o exílio, não os abandonou para sempre. Prometeu uma gloriosa restauração para o remanescente. Aliás, o chamado profético era para “proclamar libertação aos cativos” (lisbúyim
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mento dos caminhos do Senhor para a preservação de uma nação santa na terra e receberam a promessa de uma aliança ainda melhor. Jeremias: Teologia; Lamentações: Teologia Cativeiro, expulsão, exílio, perseguição: brh II (mandar embora, ferir, # 1369); -> glh (descobrir, revelar, estar / ir para longe, exilar, # 1655); dbr I (rejeitar, mandar embora, # 1818); -> rdp (estar atrás, ir ao encalço de, perseguir, # 8103); -> sbh (levar cativo, ser levado cativo, # 8647); Exílio: Teologia B ib l io g r a f ia
J. Goldingay, Gods Prophet, Gods Servant: A Study in Jeremiah and Isaiah 40-55, 1984; Y. Kaufmann. The Babylonian Captivity and Deutero-Isaiah, 1970; K. Kitchen, “Ancient Orient, 'DeuteronisirTand the Old Testament”, in New Perspectives on the Old Testament, 1970,1-24; J. G. McConville, Judgment and Promise: An Interpretation o f the Book o f Jeremiah, 1993; T. M. Raitt, A Theolohv o f Exile: Judgment/Deliverance in Jeremiah and Ezekiel, 1977; E. Yamauchi, “Slaves of God”, BETS 9 , 1966, 31-49. Allen P. Ross
AT 1. A tradição do êxodo encontra-se no cerne da fé do AT. É o exemplo máximo da atuação salvadora de Javé em favor de seu povo e, como tal, toma-se um paradigma para todos os atos de salvação. O acontecimento em si é, estritamente, o livramento das tribos de Israel do Egito. A palavra “êxodo” que significa “saída” é o nome em latim para o livro que contém a narrativa (sendo o termo originado, por sua vez, do G exodos, o nome do livro na LXX). No entanto, esse acon tecimento é muito mais do que uma simples partida, abarcando também considerações acerca do propósito, destino e relacionamento entre Javé e Israel (ver abaixo). É impossível compreender-se a religião israelita separadamente de sua crença de que Javé atua na história para salvar seu povo dos inimigos (ainda que Albrektson mostre que isso não se restrinja exclusivamente a Israel). Os estudiosos discutem até que ponto as narrativas são baseadas em acontecimentos históricos. Von Rad (1962) fez da “história da salvação” o princípio organizador decisivo na teologia do AT, sendo que a teologia do êxodo desempenha um papel fundamental (ver também Pannenberg). Porém, a dicotomia entre a história crítica e as declarações de fé de Israel apresentada por ele e baseadas nas experiências históricas de Israel dificilmente é satisfatória. Se a pesquisa histórica é limitada cm termos daquilo que pode demonstrar com certeza, o caso continua sendo que o AT deposita muita de sua confiança em Deus e em seu poder de atuar na história (Gondingay, TynBul, 1972). Uma possível abordagem ao tema do êxodo e sua teologia é o estudo do vocabulário. Esse estudo revela que os verbos mais comuns usados para “sair (subir)” são y$ ’ (q. e hi.; -> # 3655 ) e 'lh ([q.; hi.]; -> # 6590 ), com uma predominância de vb. no hi. cujo sujeito é Javé, uma vez que o êxodo é, acima de tudo, a história do livramento concedido por ele a Israel. Outros termos são bw ' ([q.; hi.]; -> # 995 ), njl (ni.) e imagens poéticas como w ã ’essâ ’ etkem 'al-kanpê nesãrím (Êx 19.4 ). Por vários motivos, porém, essa abordagem baseada no estudo do vocabulário apresenta suas limitações. Em primeiro lugar, os verbos mais comuns nâo ocor rem em alguns dos textos de maior importância (como Êx 15. 1- 18; 19.4 ). Em segundo lugar, pelo menos nesse caso, a escolha de vocabulário não indica a direção tomada pelas nuanças do Êxodo
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pensamento (Wijngaards), nem é congruente com trechos mais extensos de material literário. Em terceiro lugar, muitas vezes o sentido de nossos textos surge da maneira como alguns dos termos característicos são usados uns em relação aos outros. Precisamos, portanto, de um método que permita que os próprios textos falem. Come çaremos com material do Pent., continuaremos com os Salmos e os Profetas e, por fim, obser varemos algumas alusões do NT. 1. Pentateuco. a. A teologia do êxodo do Egito no Livro de Êxodo (-> Êxodo: Teolo do) em si pode ser melhor compreendida pela referência a várias passagens-chave. Nenhuma delas é mais importante que Êxodo 3, o relato do encontro de Moisés com Javé na sarça ardente. Javé anuncia a intenção de salvar seu povo, e Êxodo 3.8 é revelador no que se refere à nature za dessa salvação. Em primeiro lugar, a remoção física de Israel do Egito geográfico ( ‘lh [hi]) também é um resgate ou livramento (/iy/ [hi.]; -> # 5928) do poder do opressor egípcio. Em segundo lugar, ela ocorre pois o povo clamou a Javé em meio à sua aflição. O êxodo do Egi to é, portanto, baseado na relação de aliança (berít, tratado, -> # 1382) entre Javé e seu povo. Não é coincidência que esse texto seja o mesmo no qual Javé revela o seu nome (vv. 13-14). O êxodo não só é baseado nesse relacionamento, como também tem o propósito de consolidá-lo: o povo será liberto do Egito para adorar a Deus (v. 12) — um tema que se tomará importante no desenrolar da história (cf. Êx 8.1). Outra questão que surge em Êxodo 3 é que a saída do Egito tem por intenção a entrada numa terra boa (v. 8). Na verdade, o êxodo de Israel não faz sentido sem o aspecto que lhe dá equilíbrio: ser conduzido ao lugar de bênção — e os dois encontram-se intimamente ligados no v. 8 .0 contraste é um elemento essencial na história do êxodo: entre a escravidão e a liberdade, a fé e a rebeldia, a soberania de Javé e a tirania de Faraó. Em decorrência disso, onde quer que o tema do êxodo apareça, traz consigo esse sentido de um destino radicalmente diverso daquilo que foi deixado para trás, pois simboliza o propósito de Javé para o seu povo. Por fim, Êxodo 3 introduz a idéia de guerra santa (von Rad, 1951; Miller; -> Guerrei ro Divino: Teologia). O livramento de Israel do Egito não se concretizará sem a oposição de Faraó e suas forças (cf. Brueggemann). Javé sabe que “o rei do Egito não vos deixará ir se não for obrigado por mão forte” (v. 19), uma idéia que serve de preparo para o longo conflito de vontades cujo resultado final é a morte do exército egípcio sob as águas do mar Vermelho (->). Javé também exercerá seu poder sobre os habitantes da nova terra que decidiu dar a Israel — a menção das seis nações nos w . 8 e 17 é ominosa para esses povos. O êxodo só é possível pois os planos de Javé são afiançados por seu poder incomparável sobre um mundo que se encontra inteiramente sob o domínio dele. A teologia do êxodo, conforme esta é desenvolvida no resto do livro de Êxodo, consiste em grande parte de uma variação desses temas. Êxodo 6.1 -12 tem suas próprias considerações sobre a revelação do nome divino. De certo modo, também dá mais ênfase ao tema da guerra santa (-> Guerreiro Divino) e desenvolve a questão do livramento de modo que o “resgate” (n$l [hi.], cf. Êx 3) passa a ser também uma “redenção” ( # ’/;- > # 1457). Essa figura de lingua gem toma-se uma expressão comum da teologia do êxodo à medida que esta se desenvolve no AT(cf. SI 74.2; 77.15). Outras passagens importantes de Êxodo são os caps. 15 e 19. O cap. 15 é o Cântico do Mar (->), que os estudiosos em geral reconhecem como uma composição poética heb. bastante antiga e que celebra num ato de adoração um livramento experimentado num passado recen te. Êxodo 19 é de relevância fundamental por diversos motivos. Em primeiro lugar, serve de ponte entre a história do êxodo e a perícope do Sinai, criando, desse modo, um elo que liga o livramento à aliança estabelecida por Javé entre ele próprio e ísrael (observe-se a conexão 606
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entre o êxodo e a aliança em Êx 19.4-5 e 20.2). Em segundo lugar, expressa nitidamente a re lação próxima entre o ato físico-geográfico de “trazer” o povo de Israel para fora do Egito e o gesto relacionai de “trazer” o povo para junto dele, Deus (bw ' [hi.], v. 4; cf. bw' [q.], vv. 1-2). Em terceiro lugar, articula de uma forma inédita a ligação entre o êxodo e o relacionamento entre Javé e Israel — sua segullâ, propriedade peculiar (v. 5; -> # 6035). Desse modo, também coloca a escolha de Israel no contexto do senhorio de Deus sobre toda a terra. Relembra, com isso, que o objetivo final do livramento de Israel é ter um papel “sacerdotal” diante das outras nações. Ao mesmo tempo em que a história do êxodo, com sua linguagem de guerra santa, tende a opor as nações aos propósitos de Javé, o relato não deixa de fora o objetivo maior de Javé para todo o mundo. Assim, a história do êxodo é apenas parte de um movimento dentro do AT. Não pode se tomar o paradigma exclusivo da relação da comunidade religiosa com o poder governante (Goldingay, TynBul, 1976). O resto da história do êxodo no Pent. encontra-se relacionado de forma muito próxima com o fracasso do relacionamento entre Javé e Israel. O tema da murmuração de Israel ocupa uma posição de destaque em Êxodo e Números. O clamor de Israel no deserto (Êx 17.2-3) foi decorrente de uma falta de fé, sendo que sem fé, teria sido impossível concretizar o êxodo e a entrada na bênção prometida. Em sua falta de fé, o povo distorce o propósito com o qual Javé o tirou do Egito (v. 3, “para nos matares de sede, a nós, a nossos filhos e aos nossos rebanhos?”) e o incidente toma-se uma ilustração comum para a dureza de coração no AT (v. 7; SI 95.8). Mais uma vez, o êxodo e a nova terra encontram-se inteiramente entretecidos; a relutância do povo em entrar na terra é, ao mesmo tempo, um desejo de ter a “segurança” do Egito (Nm; 14.2-3; cf. 21.5). No AT, a volta para o Egito toma-se símbolo não apenas do castigo mais apropriado, mas também da pior manifestação de falta de fé. É expressamente proibida para o rei e para o povo em Deuteronômio 17.16 e, na teologia de Jeremias (Jr 24.8-10), representa uma recusa em submeter-se aos propósitos de Javé. b. O aspecto predominante do livro de Deuteronômio é a teologia do êxodo e da nova terra e contém todos os elementos principais observados acima bem como dois elementos no vos. Em primeiro lugar, a motivação de Javé para livrar seu povo é definida como amor (Dt 7.8). E, em segundo lugar, a demonstração do poder de Javé no êxodo toma-se uma motivação para Israel crer que Javé é capaz de conduzir o povo à terra; é uma motivação também para o povo não temer (Dt 7.19). Isso fica implícito em Números 14, mas nesse caso é afirmado com nova intensidade, à luz da incredulidade do passado e suas conseqüências trágicas para aquela geração (Nm 14.22-23). 2. Salmos. Pode-se observar vários desenvolvimentos do tema do êxodo fora do P Os Salmos mostram que o êxodo tomou-se um tema central na adoração de Javé em Israel. Os Salmos 105, 106 e 136 celebram o êxodo como fundamento para as ações de graça, apesar de o Salmo 106 fazê-lo por meio da ênfase no elemento da desobediência no passado. O Salmo 78 também se concentra nesse tema, visando ensinar às gerações futuras a lição da obediência. Os Salmos 74 e 80 colocam o êxodo no contexto do lamento e súplica. Assim, os atos passados de Javé tomam-se motivo de esperança, como determina a teologia de Números e Deuteronô mio. Os Salmos 77 e 81 incentivam a fé e a obediência pelo mesmo motivo. É notável a ana logia imaginativa dos salmos entre o êxodo e a própria criação, sendo um bom exemplo disso o Salmo 77. Enquanto o v. 19 fala claramente do livramento do êxodo em si (“pelo mar”), os “abismos” do v. 16 são fihõm ôt (-> # 9333), o termo usado para as águas do caos em Gênesis 1.2.0 “mundo” e a “terra” (SI 77.18) também colocam o livramento num contexto mais amplo do que o do êxodo do Egito como acontecimento isolado e limitado em termos geográficos. Assim, os salmos reúnem a criação e a redenção como dois aspectos da mesma obra de Javé: o 607
Êxodo
Salmo 74.13, com seus ecos tanto do mar Vermelho quanto de retratos mitológicos da criação, e o Salmo 136, com sua justaposição mais evidente da criação com o êxodo. Não apresentamos aqui uma relação completa das referências ao êxodo em Salmos. No livro de Salmos, o êxodo é o típico ato divino de salvação (cf. 66.1 -7) e pode, por vezes, estar por trás de referências mais gerais aos atos de Javé, como no caso em que o salmista se refere aos “prodígios” (pele ’ [-> # 7099]; p. ex., 88.10, 12) de Javé. 3. Os profetas. Os profetas levam o conceito de êxodo a uma culminância de outro tipo. Tomam esse acontecimento como base para repreender Israel por sua ingratidão e incredulida de (Am 2.10; 3.1; Mq 6.4). Oséias, por outro lado, lembra-se do período no deserto como um tempo de devoção pura entre Javé e Israel e visualiza uma volta a essa condição, tendo como resultado uma renovação das bênçãos de Deus na terra (Os 2.14-15, 22-23). É seguido por Je remias em sua visão idealizada do período no deserto (Jr 2.2-3), mas Ezequiel lembra-se da infidelidade da geração do deserto (Ezequiel 20; cf. caps. 16; 23). O aspecto mais interessante dos profetas, porém, é o modo como o êxodo do Egito tomase a base para a esperança de um novo “êxodo”, desta vez, da Babilônia. Esse par. é traçado claramente em Jeremias 16.14-15; 23.7-8, mas é Isaías quem desenvolve o conceito de manei ra mais complexa, especialmente em Isaías 40— 55, em que o tema do deserto e da orientação divina trazem à memória o êxodo em geral (Is 40.3; 42.16-17). No entanto, o melhor exemplo de uma meditação mais extensa do “novo êxodo” é o cap. 43. A ligação se dá de maneira mais clara com referência ao destino dos carros de Faraó (vv. 16-17). Depois disso, vem a orienta ção e provisão para o povo no deserto, pois os israelitas são caracterizados como escolhidos de Javé (vv. 19-21). A lógica da história do êxodo também é imitada, pois o livramento deve levar à adoração, mas não é o que acontece (vv. 22-24). O novo acontecimento não é simplesmente uma repetição do passado. Ou seja, o pro feta quer ter a certeza de que se perceberá a novidade desse livramento (Is 43.18-19). Trata-se de salvação não somente pela água, mas também pelo fogo (v. 2); não apenas o Egito, mas também a Etiópia e Sebá são dados como resgate por Israel (v. 3), e esse êxodo acarretará num regresso de gente dos quatro cantos da terra (v. 6). Esse raciocínio chega ao auge numa decla ração de perdão que vai além daquela proclamada em Números 14.20. Em outras alusões im portantes ao primeiro êxodo, há declarações sobre a superioridade do último. Quando o povo deixa a Babilônia, Javé diz “Porquanto não saireis apressadamente, nem vos ireis fugindo” (Is 52.12), um contraste direto (usando o mesmo termo) com Êxodo 12.11. Além disso, há uma impressão de que o novo ato de Deus traz consigo uma nova era que é eterna (Is 55.13) e que leva a própria criação a exultar (Is 43.20; 55.12-13). 4. Os escritos. Uma das últimas reflexões do AT sobre o êxodo vem do livro de Esdras, em que a volta dos exilados da Babilônia faz lembrar, mais uma vez, o primeiro êxodo. Ape sar de o tema aparecer de modo mais sutil, pode-se perceber em Esdras 1.4 uma lembrança inequívoca desse acontecimento no fato de que “todo aquele que restar em alguns lugares em que habita” deve fornecer ouro e prata para os exilados que estão voltando, como os egípcios haviam feito com os antepassados dos judeus (cf. Êx 12.35-36). Assim como o primeiro êxodo, o propósito do retomo dos exilados da Babilônia para a terra é no mínimo um cumprimento incipiente das expectativas proféticas anteriores de um novo êxodo com todas as suas respec tivas bênçãos. NT No NT, o êxodo normalmente é lembrado como um ato histórico de salvação, ainda que muitas vezes também apareçam elementos tipológicos nas alusões. O mártir Estêvão re vela um conhecimento do êxodo (At 7.35-43) dentro das tradições proféticas quando relata os 608
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pontos altos da história de Israel a fim de mostrar a ingratidão do povo pelos feitos de Deus em favor do povo. Contudo, a interpretação do êxodo vai além disso, pois Estêvão também usa o termo ekklêsia (v. 38), com sua conotação neotestamentária de “igreja” para referir-se à “congregação” daqueles que foram tirados do Egito — com o objetivo de fazer uma longa analogia entre Moisés e Jesus. Em Atos 13.17-18, Paulo menciona o êxodo ao lembrar-se da fidelidade de Deus. Refere-se ao mesmo acontecimento em 1 Coríntios 10.1-13, em que mais uma vez, o significado tipológico dessa ocorrência está por trás de uma interpretação do texto como advertência para a geração de Paulo. Hebreus 3.16-18 apresenta uma combinação pareci da de elementos históricos e tipológicos. E em Hebreus 11.26ss a conduta de Moisés no tempo do êxodo é apresentada como inspiração para os escritores contemporâneos que, assim como os crentes, também devem se sentir justificados por ficarem “amedrontado[s] com a cólera do rei” (= imperador; Hb 11.27; cf. 1Pe 2.17). O tema do êxodo ocorre de maneira menos direta nos Evangelhos. Mateus usa as palavras de Oséias, “Do Egito chamei o meu Filho” (Mt 2.15; cf. Os 11.1), para mostrar uma analogia entre o êxodo e Deus trazendo o menino Jesus do Egito. A analogia retrata Jesus entrando na terra prometida, o palco dos atos de salvação e, ele próprio, cumprindo a missão de Israel (o “Filho” na metáfora de Oséias). Marcos lança mão do tema do deserto de forma um tanto mais alusiva quando Jesus é enviado para o deserto durante quarenta dias (cf. os quarenta anos de Israel) antes de aparecer publicamente para começar sua missão na Galiléia (Mc 1.12-15). NT
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Uma teologia do livro de Êxodo também é uma teologia do Pentateuco. Êxodo apresenta o registro do cumpri 609
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mento das atividades de Deus na história e na criação registradas em Gênesis e oferece os temas que terão continuidade em Levítico-Deuteronômio: a intenção de Deus de tomar Israel para si como seu povo e instilar nele, por meio do próprio ato de livramento, a capacidade de reco nhecer o Senhor como Deus (Êx 6.7); a definição de Deus da identidade de seu povo como “reino de sacerdotes e nação santa” em virtude da obediência à aliança (9.5-6), da intenção de Deus de habitar em meio ao povo (Êx 25.8; cf. Gn 2—3) e ser o Deus dele (Êx 19.45-46), bem como o cumprimento desse propósito (40.34) ao conduzir o povo até a terra prometida de Ca naã (12.13; 40.36-38). O livro de Êxodo registra nada mais que o nascimento do povo de Deus e a habitação de Deus novamente em meio à humanidade. O objetivo e propósito de Deus em Gênesis 1—2 era criar um povo que o escolhesse livremente e se consagrasse a ele •— como Paulo diria em Atos 17.29, sua “geração”. O pro cesso pelo qual Deus criou seu povo e o caráter e natureza desse povo são registrados deta lhadamente nesses capítulos. Trata-se de passagens repletas de teologia, arte literária, história, narrativa, antropologia, sociologia e tudo o mais necessário para revelar os planos e propósitos do Criador. No entanto, o objetivo do Criador dc ter um povo que continuasse a se relacionar com ele, uns com os outros e com o resto da criação foi tragicamente interrompido. Nasceu um povo escolhido que, no entanto, não permaneceu nesse relacionamento dinâmico de retidão dentro do qual havia sido criado. Ao se recusarem a obedecer às palavras explícitas do Cria dor, que tinha por intenção beneficiá-los e dar-lhes vida eterna, os homens escolheram trilhar outro caminho a fim de encontrar a realização absoluta. A recusa em obedecerem efetivamen te as palavras do Criador removeu a soberania/senhorio divino da vida deles tanto individual como coletivamente. O livro de Êxodo trata do tema importante da preservação e criação do povo de Deus por Deus, no Egito. Os descendentes de Abraão, Isaque e Jacó eram o povo por intermédio do qual Deus renovaria sua “comunidade da criação”. A recriação desta como uma comu nidade dinâmica, santa, justa, devotada e instruída ocupa o centro da teologia de Êxodo. As referências a Israel, ao povo, a Moisés e as referências sufixais a Israel são mais numerosas do que as referências a Javé e Deus juntas. A entronização de Javé no meio de seu povo, ou seja, a restituição de seu senhorio/soberania é o outro lado da moeda, conforme Gênesis 1—3, em que seu senhorio/soberania foi rejeitado. Deus é a figura principal de Êxodo. Tanto em Gênesis quanto em Êxodo, períodos da atividade criadora de Deus, os maiores recursos usados por Deus para realizar sua obra maravilhosa foram seus feitos, palavras e presença. Nesses dois livros, a palavra divina atuou com poder de modo a constituir o povo de Deus. A rejeição do mundo antediluviano (Gênesis 6—9) e pós-diluviano (11.1 -9), juntamente com sua arrogância em Babel, foi seguida do chamado de Deus a Abraão para ser o pai de um povo/nação que, mais uma vez, pertenceria exclusivamente ao Criador/Redentor. A aliança e as promessas a Abraão e aos descendentes dele proporcionaram a estrutura dentro da qual Deus realizou seu plano criativo-redentor ( 12. 1- 3 ; 15; 17; 26 . 3 - 4 ; 35 . 11- 13). Essas alianças e promessas asseveram novas e grandes esperanças para Abraão e seus descendentes, mas também reafirmam e contemplam os planos de Deus, para sua criação original, por meio desses homens. Se a humanidade pode ser visualizada no cume de uma pirâmide em Gênesis 1, entâo pode ser retratada no centro de um círculo em Gênesis 2, com todas as coisas criadas para a alegria e o usufruto do vice-regente de Deus, e tudo isso, por sua vez, subordinado ao reflexo da glória do Criador, por ser a humanidade imagem dele. Gênesis 3 registra o acontecimento trágico de rebelião na origem da raça humana, quando a humanidade ( ’dm) desprezou a palavra de vida de Deus e escolheu trilhar um cami 610
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nho próprio, destruindo a relação comunitária da criação com o Criador. A harmonia, beleza, santidade, perfeição e cuidado de Gênesis 1—2, tudo isso é destruído por uma decisão tomada pela humanidade. Êxodo registra uma época crucial para a renovação de Deus desse relacio namento com seu povo. A. Estrutura Conforme Childs observa, não existe uma forma óbvia de separar-se Êxodo em partes. Ele sugere (IOTS, 170-71) que é plausível seguir a estrutura abaixo: I. O êxodo do Egito (1.1— 15.21) II. As tribulações pelo deserto (15.22— 18.27) III. A aliança no Sinai e suas ordenanças (caps. 19— 40). J. Durham sugere: I. Israel no Egito (1.1— 13.16) II. Israel no deserto (13.17— 18.27) III. Israel no Sinai (caps. 19— 40). Pelo menos, Durham mantém o tema do livro — Israel, o povo de Deus — em cada uma das seções sugeridas. N. Sarna observa a seguinte possibilidade de esboço para o livro: 1. Opressão e libertação (1.1— 15.21) 2. Do mar de Juncos ao Sinai (15.22-18) 3. Acontecimentos no Sinai (caps. 19— 40), abrangendo a aliança no Sinai (caps. 1924) e o tabemáculo e sua implementação (caps. 25— 40). Num desdobramento das sugestões de Childs, W. VanGemeren prefere a seguinte dis posição: A. A revelação do poder real de Javé (caps. 1— 13) B. As prescrições reais e a complacência de Israel (caps. 14— 18) C. Aliança: a consagração de Israel como povo da aliança (19.1— 24.18) C’. Aliança: planos para o tabemáculo (caps. 25—31) B’. Idolatria, perdão, renovação da aliança, presença de Deus (caps. 32— 34) A’. A construção do tabemáculo e a revelação da glória real de Javé (caps. 35— 40) No entanto, o livro de Êxodo é maior do que a soma de suas partes. Mas as partes são essenciais para se conhecer a história e a variedade e riqueza das narrativas individuais não devem ser obscurecidas. A meu ver, tendo em mente os esboços estruturais apresentados acima, o seguinte esboço tópico ajudará o leitor a conhecer as partes principais da história e experi mentar um pouco do todo. A adoração no monte de Deus (Êx 19.1— 40.38) contém a chegada ao Sinai e os preparativos para o recebimento das palavras da aliança (19), a entrega dos Dez Mandamentos (20.1-20), o Livro da Aliança (20.21—24.18), as instruções para a adoração e a construção do tabemáculo (25.1— 31.18; 35— 40.33), o rompimento da aliança, a confecção do bezerro de ouro e a renovação da aliança (32— 34); a descensão de Deus sobre o tabemá culo (40.34-38). 611
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B. Temas Eis um breve relato dos principais passos seguidos em Êxodo enquanto Deus cria seu povo, juntamente como uma comparação e contraste desse processo com Gênesis sempre que for apropriado. Os temas expressados em Êxodo são desenvolvidos de maneira mais completa em Levítico e Números. 1. A multiplicação dos israelitas a fim de tornarem-se um "povo em potencial” multiplicação dos israelitas no Egito é obra de Deus, como o texto mostra em várias ocasiões. A bênção divina do Senhor encontra-se sobre esse povo, demonstrando assim que são o seu povo. A multiplicação dos israelitas escravizados no Egito não é, em primeiro lugar, de cunho biológico ou ambiental, mas sim, essencialmente, uma questão teológica que conta com o en volvimento pessoal do Senhor. Trata-se da lembrança de Deus das suas promessas e aliança com os descendentes de Abraão, Isaque e Jacó (Êx 2.24). A multiplicação que ocorre é resul tado da bênção original de Deus sobre a criação, bênção esta que havia sido colocada sobre a “comunidade da criação” e que agora é concedida a esse povo (ver Êx 1.7 que emprega as palavras-chave de Gn 1.28): E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo ani mal que rasteja pela terra. (Gn 1.28) Mas os filhos de Israel foram fecundos, e aumentaram muito, e se multiplicaram, e grandemente se fortaleceram, de maneira que a terra se encheu deles. (Ex 1.7) A ordem de Deus à humanidade para ser fecunda (prh), multiplicar-se (rbh) e encher (m l') a terra foi colocada sobre os israelitas e tomou-se uma realidade para os descendentes de Abraão, Isaque e Jacó no Egito, pois foram fecundos (prh), aumentaram muito (rbh) e enche ram (m l’) a terra. Além disso, o texto nos diz que “grandemente se fortaleceram”. Essa última expressão liga o desenvolvimento dos “israelitas” (assim chamados pela primeira vez no v. 7; cf. v. 1, que se refere somente aos doze filhos de Jacó) numa nação — uma promessa cumpri da para Abraão, feita em Gênesis 18.18, juntamente com as bênçãos originais concedidas à humanidade. De acor do com Gênesis 18.18, Israel herdou essas bênçãos e elas foram o meio pelo qual Deus fez de Abraão uma grande e poderosa nação: “Abraão certamente virá a ser uma grande e poderosa nação, e nele serão benditas todas as nações da terra” (18.18). Em decorrência disso, Israel enche a terra do Egito. Êxodo 1.7 usa de uma prolepse e refere-se ao povo cada vez mais numeroso como “nação”, em reconhecimento a Gênesis 18.18. As alusões ricas e multifacetadas dos vv. de transição de Êxodo 1.1-7 são suficientes para pro var esse primeiro ponto. Apesar de os primeiros recipientes das bênçãos de Deus, inclusive Jacó e José, terem morrido, as bênçãos permanecem, pois o Deus dos patriarcas continua fiel, e o Deus criador se lembra de seu planos para a humanidade. E a morte não é vitoriosa sobre as promessas e alianças de Deus. Porém, o povo escravizado não é, de modo algum a imagem de Deus. Trata-se de uma inversão do modelo de Gênesis, em que o povo de Deus é criado à imagem de Deus e então recebe a ordem para se multiplicar. Nesse caso o que se vê em ação é a graça de Deus. Seu povo escolhido é levado a multiplicar-se antes mesmo dc seu nascimento e transformação pelo conhecimento de que, possivelmente, Deus o transformaria na “comunidade recriada”, a qual refletiria Deus em caráter, ação e conhecimento. 612
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2. Javé fa z nascer seu povo e o dirige. O tema de Êxodo, no qual Deus cria seu povo ao redimi-lo, é declarado explicitamente em Êxodo 6.7, e os detalhes desse plano são revelados ao longo do livro em diversas passagens: "Tomar-vos-ei por meu povo e serei vosso Deus; e sabereis que eu sou o Senhor, vosso Deus, que vos tiro de debaixo das cargas do Egito”. O senhorio de Deus sobre todos fica evidente em Gênesis 1— 11, mas aqui, temos uma indicação do quanto as nações se afastaram de Deus (Gn 11.1 -9). Deus não tem seu próprio povo singular que o reflita. Todos os povos abandonaram os caminhos do Criador. Nenhum povo ou naçâo o conhece verdadeiramente. Por meio de Israel, porém, o Senhor está tomando para si um povo que irá servi-lo e imitá-lo. A questão aqui é o*senhorio. Deus possui um povo e esse seu povo o reconhece. O conhe cimento é a ligação essencial que conduz ao senhorio — o povo que verdadeiramente conhece a Deus. Deus está tirando um povo do cativeiro para dar a ele, por meio de atos e palavras, um conhecimento de Deus e um nome, um povo chamado pelo nome de Deus. O conhecimen to de Deus que a “comunidade criada” possuía será restaurado, e o verdadeiro conhecimento de Deus será colocado no meio do seu povo. Porém a forma como isso acontecerá ainda nâo é revelada. E o processo continuará até que todos os aspectos fundamentais para Deus e seu povo — como o relacionamento íntimo entre os membros do povo, o lugar onde habitarão e a presença de Deus — sejam restaurados e concretizados. O êxodo como um acontecimento em si mostra que Javé se preocupa com seu povo e age em favor dele. O Senhor gerou o seu povo, como nos faz lembrar um antigo título para o êxodo, 'aíyisrã ’él (lit.), a saída de Israel, um termo usado para descrever o nascimento de uma criança. A origem do povo de Deus é devidamente explicada somente como um milagre. Deus cria seu povo a partir daqueles que não eram povo algum. O par. com Gênesis também fica evidente aqui. Um povo que estava perecendo é transformado numa multidão florescente que prospera debaixo das condições políticas, ambientais, religiosas, militares, econômicas e sociológicas mais severas que se pode imaginar. O livramento de Deus a seu povo não é uma simples ocorrência natural, mas sim resultado da intervenção de Deus para cumprir seus ob jetivos por meio de seus sinais, maravilhas, prodígios e vigorosas demonstrações tanto do seu amor quanto da sua capacidade de executar julgamento sobre todos aqueles que se opõem à criação do povo dele. A resposta de Israel é de entendimento, por meio do reconhecimento demonstrado pela adoração (Êx 12.27; 14.31). E, assim que Israel começou a sair do Egito, a presença do Senhor — mesmo que Javé ainda não estivesse entronizado no meio do povo — já estava se concretizando. A presença de Deus em Gênesis 2-—3 não era muito diferente. Êxodo 25.8 nos lembra que o plano de Deus é habitar em meio a seu povo novamente. O caminho de volta para o “jardim” foi árduo e demorado, mas apresenta muitos pontos e elementos vitais. (-> Êxodo [do Egito]) 3. A promessa de uma terra que mana leite e mel. A perda do “jardim” em Gênesis 3 foi uma tragédia, mas Deus pretendia restaurar inteiramente para seu povo um lugar de habi tação igual ou superior às condições perfeitas do primeiro lugar onde a humanidade habitou. Êxodo 6.8 menciona a terra que Deus dará a seu povo, uma terra que se tomou lendária pela abundância e beleza — uma terra que podia ser considerada um jardim, manando leite e mel, e uma terra de importância teológica. 4. A formação e o caráter do povo de Deus. a. O caráter do povo de Deus. Êxodo 19.5-6 nos dá uma definição-chave do povo de Deus, pois, para que esse povo seja de Deus deve ser um povo peculiar, de um Deus peculiar com um propósito peculiar. Esse propósito era o de for mar um “reino de sacerdotes” para levar o conhecimento de Deus a todas as nações, e tomar-se 613
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“uma nação santa”, dando uma idéia de quem era o seu Deus a todas as outras nações, o que seria demonstrado por meio de uma obediência e dedicação total a ele, ao refleti-lo. No centro do plano de Deus para a criação de seu povo encontrava-se, mais uma vez, a palavra de instrução e de vida, a Torá, apresentada na forma de uma aliança (Êx 19.5). As dez palavras de Javé dirigiam os caminhos do povo para que o povo vivesse de um modo que cer tamente agradaria a Deus. Suas palavras eram vida; a desobediência e elas significava morte, como o Deuteronômio expressa com tanta beleza e poder: Aplicai o coração a todas as palavras que, hoje, testifico entre vós, para que orde neis a vossos filhos que cuidem de cumprir todas as palavras desta lei. Porque esta palavra não é para vós outros coisa vã; antes, é a vossa vida; e, por esta mesma pa lavra, prolongareis os dias na terra à qual, passando o Jordão, ides para a possuir. (Dt 32.46-47)
A comunidade original da aliança da criação nâo tinha essa responsabilidade; antes, era portadora das más notícias de separação e fracasso. Essa “comunidade renovada” deve ser portadora das boas novas de reconciliação e restauração como uma experiência ao alcance de todos aqueles que conhecem o Deus de Israel. b. Um remanescente restaurado da humanidade. No Sinai e na aliança ali realiza onde Deus revelou sua vontade e caráter ao povo escolhido, ocorreu um dos acontecimentos mais extraordinários do AT, com exceção da criação da primeira “comunidade da criação”. Lá, finalmente uma parte restaurada do mundo caído de Deus foi elevada a uma experiência religiosa, moral, ética, civil e cultuai superior e a um conhecimento de Deus que proporcionou a essa comunidade vislumbrar mais uma vez o que significava os homens refletirem e conhe cerem a Deus. Os Dez Mandamentos ou as “dez palavras” propriamente ditas, juntamente com as ins truções religiosas, morais, éticas, civis e cultuais dadas por Javé à sua comunidade escolhida elevou-os potencialmente a uma condição de refletir a Deus, de ser novamente a imago dei. As “palavras” do Senhor encontram-se agrupadas em Êxodo 18 e 20, pois é nessa passagem que a renovação moral e ética do povo regenerado de Deus ocupa a posição central. Por meio das palavras de Javé, o caráter essencial de seu povo voltou a ser proclamado. As palavras de Deus tinham uma função pactuai, desde a criação, passando por Noé até Abraão e chegando ao Sinai. E, assim como a Torá espelhava o próprio Javé, também seu povo devia espelhar a Torá, a palavra de Javé, dada ao povo, para o bem do povo e para conceder-lhe vida em abun dância. (-> Decálogo: Teologia) A Torá definia a esfera religiosa e ético-moral em que a humanidade devia operar — como Deus havia feito no jardim pronunciando sua palavra de autoridade. Aliás, era a mesma esfera que ele havia definido para sua comunidade da criação. E assim como a palavra de Deus produziu o mundo físico onde a humanidade viria a existir, aqui também, sua palavra definiu a esfera onde a essência religiosa, ética e moral da vida devia ser vivida. Viver significava cum prir as palavras de Javé, tanto na teologia da criação quanto na teologia da redenção. Suas pa lavras eram fonte de vida para eles. A humanidade podia aprender novamente que as criaturas de Deus, que são imagem dele, vivem “não só de pão... mas de tudo o que procede da boca do Senhor” (Dt 8.3; cf. Gn 2.16-17; 3.3). Fica claro que Deus não havia desistido de suas exigências morais, religiosas e éticas desde a primeira “comunidade da criação”. A comunidade renovada tinha a responsabilidade de cumprir as palavras de Javé a fim de viver e não morrer. Havia um verdadeiro ponto em comum entre a moralidade e ética esperadas no passado e aquelas que 614
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eram esperadas dessa comunidade desde então. Essa moralidade e ética novas restauravam e renovavam as antigas. As primeiras serviram de esboço para as últimas. O “caminho do Senhor” (derekyhwh) devia ser o caminho em que Israel permaneceria como povo de Deus, pois nesse caminho se encontra um verdadeiro conhecimento do Senhor. As palavras de Javé foram fun damentais para a criação de seu povo. As palavras de Deus, em Gênesis, não apenas criaram, mas também conduziram seu povo. As palavras de Deus eram o poder/aspecto dinâmico e, ao mesmo tempo, relacionai do Deus que realizou todas as suas vontades e propósitos, tanto na criação quanto em Êxodo. (-> Ética; Lei: Teologia) 5. A restauração da presença de Deus. Para que Israel fosse o povo de Deus, era abso lutamente essencial que a presença de Deus estivesse no meio desse povo. Era a condição in dispensável: sem a presença de Deus não podia haver um povo de Deus. Apesar de a presença do Senhor ter sido restaurada na coluna de fogo (->), durante a noite, e na nuvem, durante o dia, e, apesar de ter-se mostrado no Sinai, ainda não consistia na presença de Deus habitando com seu povo da mesma forma como a “comunidade da criação” havia desfrutado dela (Gêne sis 2— 3). No entanto, foram tomadas providências para que isso mudasse, uma vez que essa presença era, de fato, necessária, como Moisés asseverou tão energicamente em Êx 33.15-16: “Se a tua presença não vai comigo, não nos faças subir deste lugar. Pois como se há de saber que achamos graça aos teus olhos, eu e o teu povo? Não é, porventura, em andares conosco, de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da terra?” Assim, Deus deu o projeto para que fosse construído um tabemáculo e estabelecida uma Tenda da Congregação (25.8; 29.45-46; 33.7-11). A presença dele reforçaria o reconhe cimento de Israel de que Javé era o Deus que havia resgatado seu povo do Egito (29.45-46; cf. Lv 26.11). Quando o tabemáculo foi concluído, o Senhor prontamente o encheu com sua presença maravilhosa (40.34-35). Javé encontrava-se novamente no meio de seu povo, tanto durante a jomado quanto durante o descanso (40.36-38) — o único povo da terra que possuía a Torá como guia e a presença de Deus como identidade. Esse povo havia chegado potencial mente a uma posição em que poderia voltar a crescer no conhecimento de Deus, pois Deus se declarara para seu povo por meio de acontecimentos, da Torá e do culto — e, de fato, por sua presença, mais uma voz, no meio do povo. E a fim de promover esse relacionamento e dar ao povo acesso à sua presença santa, foi estabelecido com a aprovação divina um sacerdócio para servir de mediação humana entre Javé e o povo e para espelhar o modo como a nação toda deveria proceder diante de todas as nações (19.5-6; 29). Dos lares individuais em Êxodo 1.1, em que Deus havia operado nos bastidores, Israel havia se transformado em “toda a casa de Israel” (Êx 40.34-35, 38). . Outros temas. Há muito mais o que dizer sobre temas teológicos específicos do Livro de Êxodo. Outros temas podem ser observados brevemente abaixo, e costituem parte do tema geral da obra (Êx 6.6-7), ou seja, a redenção/criação do povo pelo Senhor. a. Deus mostrou ser o Deus da aliança com os patriarcas Abraão, Isaque e Jacó. Lem brou de sua aliança com eles e sofreu com seu povo (2.23-25). Apesar de ser o Deus de todas as nações, tomou Israel para ser a jóia de sua coroa, seu povo peculiar (segullâ [-> # 6035], 19.5-6) por intermédio da sua aliança. Porém, mesmo antes de estabelecer uma relação pactu ai com Israel no Sinai, declarou Israel seu primogênito (4.22-23), firmando com o povo uma relação familiar. Ele era um Deus de ações, que operou em favor do seu povo; era para eles um homem de guerra (pragas: Êx 15.3, esp.), mas também um Deus comunicativo, tomando sua vontade conhecida em palavras, c^bãrim, bem como em ações, cPbãriml As palavras de Deus ao longo do livro permitiram compreender os atos de Deus.
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Além de revelar seu caráter por meio de palavras e atos, comunicou-se também ao re velar seu nome, yhwh (Êx 3.14-15). Esse nome transmitia outro aspecto de sua identidade: o Deus que estava presente. Seu nome mais completo, ’ehyeh ’aser 'ehyeh, entendido de várias formas, entre elas, “EU SOU O QUE SOU” (Êx 3.14), “serei quem serei” ou “faria ser tudo o que vem a ser”, cria a oportunidade para que Deus mostre quem ele é por meio de tudo o que ele disse e fez no livro de Êxodo e posteriormente. Sua simples presença tomava o lugar (mãqóm) onde ele se manifestava (cf. Êx 3.5) um lugar santo (qds). Acima de tudo, ele é um Deus santo. Êxodo 3.5 é a primeira vez que o radical qds é usado desde Gênesis 2.3, quando Deus santificou, tomou santo (qds) o sétimo dia. Em Êxodo, um novo nível de compreensão da santidade de Deus o leva a revelar ainda mais de si mesmo do que havia revelado aos pa triarcas (Moberly, Old Testament o f the Old Testament, 5-35, 79-146). Êxodo 34.5-7 contém o auge da revelação do caráter moral e ético de Deus, a única coisa que, em função de sua graça, toma possível a renovação de uma aliança rompida. O Senhor é um Deus que prometeu habitar com seu povo, como fez no princípio (Êx 25.8), pois desejava relacionar-se com seu povo pessoalmente. Também estaria com seu povo e seria um guia para ajudar esse povo a saber quando e para onde ir, à medida que Deus o con duzia para a herança prometida (3.7-10; 23.23-33). Deus era soberano sobre todas as forças da natureza, sobre a história (10.1-23; 14.21, 27) e sobre as supostas divindades (18.11), no Egito e em toda parte. b. Moisés, o líder escolhido por Deus, tomou-se não apenas o grande legislador de Javé, como também o agente humano de libertação (mõseh, aquele que retira, que livra) e um profeta por excelência (Dt 4.1-17; 18.15-18; 34.10-12). O livramento dc Moisés das águas do Nilo num cesto (têbâ, pequena arca) prefigurou o livramento de Israel. Sua vida foi dirigida por Deus quando era um tôb, especial, criança (“formoso”, Êx 2.2). Não houve no AT quem se comparasse àquele que institui a aliança do Sinai. Moisés tomou-se um modelo de intercessor pelo povo diante de Deus (32.11-34) e um exemplo do AT de bom pastor, disposto a dar a vida por suas ovelhas (32.30-32). E o Senhor, por sua vez, mostrou-se disposto a dar ouvidos ao seu servo. c. A opressão e a multiplicação resultante dos israelitas no Egito é um fato histórico, mas que também foi dirigido pela palavra de Javé por meio de sua aliança com os patriarcas (Gn 1.26-28; 9.1-2; 15.12-16; 18.17). d. As pragas no livro de Êxodo mostram a capacidade de Javé de livrar seu povo, derro tar todos os inimigos do povo, fossem eles homens ou deuses, e controlar os reis da terra para a glória dele e para o bem de seu povo. Para realizar seus desígnios, Deus é soberano sobre o mundo natural. e. O significado do êxodo como acontecimento é fundamental. Deus deixa claro que o objetivo do livramento de seu povo é este: para que o povo possa servi-lo, como a um verda deiro Mestre, e não a Faraó ou aos elementos do mundo (Êx 3.12; 4.23; 5.1; 7.16, etc.). Sem dúvida benefícios econômicos, materiais, políticos, sociais e psicológicos resultam desse li vramento e convergem para a verdadeira liberdade espiritual. Neste mundo, nem sempre esses benefícios virão, mas a liberdade espiritual e religiosa é concedida. O êxodo tomou-se um episódio inigualável de salvação no AT. Conceitos posteriores sobre as atividades de salvação e/ou restauração realizadas por Deus usavam o êxodo como o exemplo de futura libertação (p. ex., Is 43.18-21). No NT Pedro deixa claro que o propósito do novo êxodo da escravidão do pecado tem, antes de tudo, um objetivo religioso: glorificar a Deus (lPe 2.9-10). 616
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f. As ordenanças referentes a festas e festivais de Israel orientavam os israelitas para que celebrassem com alegria as obras e palavras de seu Deus Criador/Redentor que os havia resgatado, feito existir como um povo e que continuaria a preservá-los enquanto andassem pela Torá. Essas comemorações não estavam associadas à natureza em si, mas reconheciam a mão de Deus como a fonte provedora absoluta para seu povo, tanto na história como na economia e na agricultura. i. A Páscoa (pesah) ou Pães Asmos (hag hammassôt) (Êx 10.2; 12.3-20; 23.15) era um dos três festivais anuais. Lembrava especificamente o livramento histórico de Israel. Era co memorada do décimo quarto dia de aviv (chamado posteriormente de nisã), o primeiro mês, até o vigésimo primeiro dia do mês. O primeiro e o último dia eram convocações santas (m iqrãT) para Israel. ii. A Festa das Semanas (hag sãbu ‘õt), também chamada de Festa da Sega ou Festa das Primícias (Êx 23.16; 34.22), apresentava uma convocação santa (miqrã') e sacrifícios. Poste riormente, passou a ser conhecida como Pentecostes, uma vez que começava no quinquagésimo dia depois do sábado em que se iniciava a Páscoa (cf. Nm 28.26; Lv 23.16). Era comemorada no final da colheita no mês de sivã (maio — junho). iii. A Festa dos Tabemáculos (sukkôt) era comemorada no final de cada ano em Tisri (setembro — outubro). Também é chamada de Festa da Colheita ou Tendas. Vários dos prin cipais produtos agrícolas de Israel como frutas em geral, uvas e azeitonas eram colhidos nessa ocasião (Êx 23.16). Êxodo 23.10-16 constitui um pequeno calendário cultuai no qual é apresentado o ano sabático e a importância do sábado. O sábado havia sido formalizado em Êxodo 20.11, sen do justificado pelo descanso de Deus depois da criação. Em 23.12, é apresentada uma base humanitária para a observação do sábado (cf. Dt 5.12-15): Israel não havia recebido nenhum descanso de seu trabalho no período final da opressão no Egito, onde possivelmente foram submetidos a semanas de trabalho de dez dias. Javé proveria descanso para o seu povo, ainda que Faraó não tivesse feito (Êx 5.6-9). g. Javé provou (nsh, # 5814) Israel no deserto para determinar se Israel seguiria as leis e decretos de Deus (Êx 15.25b-26; 16.4). O período no deserto (->) tomou-se um tempo durante o qual o Senhor mostrou a capacidade de prover para o seu povo sob as condições mais adversas. O suprimento miraculoso de alimento por meio do maná foi usado por Jesus para descrever quem ele era (Êx 16.13-36; João 6). Israel aprendeu que a humanidade não vive só de pão e que o Senhor é a fonte do sustento, e supre as necessidades diárias de alimento. h. As Dez Palavras (Êxodo 20.1-17) de Javé elevaram Israel a uma nova posição entre as nações, de modo que Israel pudesse ser propriedade peculiar (segullâ) de Deus e para que o próprio Deus pudesse habitar no meio dela (25.8; 33.15-16). Essas palavras extraordinárias de orientação moral, ética e espiritual para governar o relacionamento entre Deus e os homens foram uma dádiva para toda a humanidade concedida por intermédio de Israel como a nação santa do Senhor, um reino de sacerdotes que serviriam de mediadores entre Javé e as nações (Gn 12.1-3). Essa lei é o elemento central, gravado no coração e na mente daqueles que fazem parte da nova aliança instituída por Cristo (Jr 31.31-34; Hb 8.8-13). i. A fim de que Israel fosse um reino sacerdotal santo, Deus instituiu tanto o sacerdócio liderado pelos filhos de Arão (Êx 28— 29.1-37) como o sistema sacrificial (20.24-26; 29.3846) para seu povo, com o intuito de que o povo expiasse os próprios pecados e estabelecesse um relacionamento com seu Deus. j. O Livro da Aliança (Êx 20.21— 24.8) apresenta as regras, exemplos e princípios que deveriam orientar a vida econômica e civil do povo de Deus. Não se pode, contudo, separar 617
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esse aspecto da vida de Israel das leis religiosas e teológicas, pois tanto umas quanto as outras fazem parte de um todo. Sua futura vida agrária na terra de Canaã está contida nessa apresen tação prévia (23.1-33). k. A rebelião de Israel no Sinai (Êxodo 32— 34) deu ao escritor a oportunidade de des crever no livro tanto o ponto mais alto como o ponto mais baixo do povo. Essa rebelião e a confecção de um bezerro de ouro determinaram como Israel era aos olhos do Senhor: um povo rebelde e obstinado que merecia ser destruído — que havia rompido a aliança antes mesmo de os documentos do pacto lhe serem entregues (32.9). No entanto, por causa da intercessão fiel de Moisés pelo povo, Deus, pela graça do seu caráter divino (Êx 34.5-7), perdoou o povo e renovou a aliança (Êx 34.10-25, 27-28). Se não fosse um Deus bondoso e gentil, esse teria sido o fim da história desse grupo de israelitas. tabemáculo (miskãn; Êxodo 25—31) tinha por objetivo ser o lugar de habitação presença de Deus (tenda) no meio do seu povo (25.8-9), a condição indispensável para que Is rael fosse o povo de Deus (33.15-16). A conclusão do tabemáculo faz-nos lembrar a conclusão do universo em Gênesis (cf. Gn 2.1-3; Êx 39.32,42-43). A presença de Deus é a essência desse elemento característico de Êxodo. Um dia, o tabemáculo/templo será permanentemente extinto na comunidade final de Deus e seu povo (Ap 21.2-4,22), pois, em última análise, é a presença de Deus que santifica seu povo (cf. Êx 3.5). Tal presença define e cria a santidade. Posterior mente, o templo de Salomão foi construído dentro do mesmo projeto básico do tabemáculo. m. A presença de Deus em Êxodo também é ressaltada nas colunas de nuvem e fogo. Ele conduziu seu povo para fora do Egito (Êx 13.21-22) e pelo deserto até o Sinai (16.10). De pois que o tabemáculo foi concluído, a nuvem o cobriu e ele “habitou” no Santo dos Santos. O Senhor guiou Israel em todas as suas jornadas pela coluna de nuvem e mostrou sua presença com grande poder como uma coluna de fogo (40.34-38). Esses dois fatos sublinham a orienta ção fiel de seu povo depois do Sinai.
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Festas e festivais: -> bikkürím (primeiros frutos ou primícias, # 1137); -> hag (procissão, dança em círculo, festival, festa, # 2504); -> hanukkâ (consagração, Festa da Consagração, # 2853); mô 'êd (tempo determinado, # 4595); masçôt (Festa dos Pães Asmos, # 5174a); marzêah (banquete cultuai, refeição fúnebre, # 5301); -> sukkôl (Festa dos Tabemáculos, # 6109a); -> 'a$ãrá (assembléia festiva, # 6809); pürím (festival de Purim, # 7052a); pe sah (Festa ou Sacrifício da Páscoa, #7175) [-> Páscoa: Teologia]); r õ s hõdeS (festival da lua nova, #8031 a); -> rõ ’S haSSãnâ (começo do ano, # 8031 b); Sãbu ’ôt (Festa das Semanas, #865 la); -> Sabbãt (sábado, # 8701 [-> Sábado: Teologia]) B ib l io g r a f ia
HBD 288-91; IDB 2:188-97; NBD2, 374-76; 77*4 T 1:755-62; U. Cassuto, A Commentary on the Book o f Exodus, 1967; B. S. Childs, The Book o f Exodus, OTL, 1974; idem, Introduction to the Old Testament As Scripture, 1979, 161-79; G. Coats, “Theology of the Hebrew Bible”, in The Hebrew Bible and Its M odem Interpreters, 1985, 239-56; D. Daube, The Exodus Pattern in the Bible, Ali Souls Studies 11, 1963; W. J. Dumbrell, Covenant and Creation, 1984; J. I. Durham, Exodus, WBC, 1987; M. Har-El, The Sinai Journeys, 1983; W. Kaiser, Toward an Old Testament Theology, 1978, 100-121; W. Johnstone, Exodus, 1990; E. Martens, Gods Design, 1981; E. H. Merril, “A Theology o f the Pentateuch”, in A Biblical Theology o f the Old Testament, eds. Zuck, Merril, Bock, 1991, 7-87; N. M. Sama, Exodus, The JPS Torah Com mentary, XII-XIII; idem, Exploring Exodus, 1986, 6-7; S. D. Steinberg, The Mishkan and the 618
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Holy Garments, trans. M. Miller, 1922; J. Strong, The Tabemacle o f Israel, 1987; W. A. VanGemeren, The Progress o f Redemption, 1988, 132-79. Eugene Carpenter Expansão -> # 7337 (pth, abrir, conquistar) Expiação -> # 4105 (kpr, expiar, apaziguar, indenizar) Explicação -> # 930 (b VI, esclarecer, explicar) Expulsão
# 1764 (grs II, lançar para o alto, lançar fora, expulsar)
Extermínio -> # 9012 (smd, ser exterminado, destruído) Extinção -> # 3882 (kbh, ser extinto, extinguir) Extorsão -> # 6943 ( ‘sq I, extorquir) Extorsão
# 6945 ( 'õseq, opressão, extorsão)
Extração
# 768 ( VA II, arrancar)
Extração de água -> # 8612 (í ’b, tirar água)
Ezequias
Ezequias (rP|?Tn [hizqiyyâ], in y rn [hizqiyyãhü], # 2624, # 2625).
AT Ezequias foi rei de Judá no final do século VIII a. C. (ver Dillard, 226 e 233-34, para uma breve introdução e uma bibliografia referente à discussão sobre as datas exatas; ver tam bém J. B. Pritchard, A N E T3, 287-88 para referências extrabíblicas a esse rei). Ezequias é uma figura de grande importância para os livros de Reis, Crônicas e Isaías. Três capítulos em Reis (2 Reis 18— 20) e quatro em Crônicas (2 Crônicas 29— 32) são dedicados à descrição do reinado de Ezequias, mais espaço do que recebe qualquer outro rei depois de Salomão. Além disso, a maneira como o governo de Ezequias é descrito nos dois livros confirma que seu reinado foi considerado um ponto alto da história de Israel dentro da terra prometida. Em Isaías 36—39 a história de Ezequias ocupa uma posição crítica no livro, ligando suas duas partes principais (caps. 1—39 e 40— 66). De acordo com qualquer definição, Ezequias é um personagem-chave do AT e de grande relevância teológica. Dentro da narrativa dos livros de Reis, a importância de Ezequias toma-se aparente pela primeira vez em 2 Reis 18.3-4, pela “fórmula de julgamento”, que declara o veredicto do es critor com relação a Ezequias no contexto dos reinados de outros reis de Judá. Essas fórmulas mostram uma busca por um rei como Davi que vem se desenrolando desde 1 Reis 15.11 (con trastar com 15.3; 2 Reis 14.3; 16.2). O escritor encontra esse homem em Ezequias, que é, por excelência, o segundo Davi, antevisto em toda a estrutura dos livros de Reis. A declaração de que Ezequias removeu os altos também é prenunciada nos livros e constitui o auge daquilo que pode ser chamado de “tema dos lugares altos”. As palavras em 2 Reis 18.4 “removeu os altos” 619
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(algumas versões apresentam o fato de modo mais enfático: “Foi ele quem removeu os altos” [hú 'hêsír 'et-hab-bãmôl]) mostram mais uma vez que Ezequias é o rei para o qual as fórmulas anteriores de julgamento apontam (ver Provan, 1988, 57-131 para uma discussão detalhada dos altos e dos temas davídicos em Reis; para mais comentários sobre o lugar de Ezequias nos livros como um todo, -> Reis, Teologia de). Assim, Ezequias é figura de importância crucial nos livros de Reis. A idéia predominan te com referência ao caráter dele é que ele “confiou (b(h) no Senhor” (1 Rs 18.5a). Pelo menos com respeito a isso (existe uma certa ambigüidade em 2Rs 18.5 e não fica claro se a intenção de 18.5b é fazer uma declaração geral sobre Ezequias ou somente uma afirmação específica sobre sua confiança), nem antes e nem depois dele há outro semelhante dentre todos os reis de Judá. O sucesso desse rei, especialmente contra a Assíria (2Rs 18.7) se deve ao fato de ele confiar no Senhor. A história apresentada na seqüência, sobre a invasão de Judá por Senaqueribe (2Rs 18.13— 19.37) tem, na verdade, a intenção de desenvolver essas idéias. Quando o comandante faz seu discurso do lado de fora dos muros de Jerusalém (2Rs 18.19-25), fica claro que é justa mente a confiança de Ezequias no Senhor que está em jogo. O radical bth (-> # 1053) aparece nessa passagem (com tradução diferente em algumas versões) nada menos que seis vezes, de modo mais alusivo com referência à remoção dos altos (2Rs 18.22). Esse procedimento signi fica, de fato, confiança no Senhor ou rejeição dele? Acontecimentos posteriores comprovam que Ezequias estava mesmo com a razão, uma vez que o Senhor interveio miraculosamente para derrotar o exército assírio (19.35-36). O retrato de Ezequias apresentado nessas passagens de 2 Reis 18 e 19 é tão repleto de entusiasmo que estudiosos chegaram a afirmar que, originalmente, os livros de Reis termina vam com o relato do reinado dele. O virtuoso “segundo Davi” chegou e trouxe salvação para o povo! Seja como for, essa descrição de Ezequias e seu reinado em 2 Reis 18—20 não é assim tão inequívoca. Quanto ao seu caráter, 18.13-16 no mínimo leva o leitor a perguntar exatamente quando Ezequias começou a confiar no Senhor (foi apenas depois de outras alternativas terem fracassado?), enquanto 20.12-19 talvez levante ainda mais perguntas sobre a profundidade de sua devoção. Quanto ao seu reinado, por meio de sua cronologia e escolha de palavras (cf. Cle ments, 65), 2 Reis 20.1-11 dá a impressão de fazer uma ligação clara entre a fidelidade desse rei em particular e o livramento de Jerusalém, sugerindo, portanto, que a proteção da cidade não estava garantida se os reis subseqüentes não tivessem um caráter semelhante (contrastar com as implicações de passagens anteriores como IRs 15.3-5; 2Rs 8.18-19). 2 Reis 20.12-19 prossegue falando sobre o exílio iminente na Babilônia. Desse modo, o reinado de Ezequias é colocado no contexto da estrutura mais ampla dos livros de Reis como um todo, inclusive seu final. Apesar de o segundo Davi ter vindo e trazido uma espécie de salvação para seu povo, o reinado dele nâo tem conseqüências mais permanentes no que se refere ao destino do povo. Ainda assim, o povo de Judá recebe o fim que merece, sendo que nem Ezequias nem Josias (o segundo Moisés; cf. Provan, 1988, 114-17) são capazes de salvar o povo de sua sorte. Sem dúvida Ezequias é um rei paradigmático, mas seu reinado, assim como o de todos os reis da vídicos do AT (cf. Childs, 1985, 108-21), no final, aponta para alguém além dele (por mais incerta que seja a forma como ele o faça; cf. 25.27-30), prenunciando um futuro rei no qual a promessa se cumprirá plenamente. O retrato de Ezequias nos livros de Crônicas é, como um todo, ainda mais adulatório do que em Reis, ainda que também não se mostre isento de aspectos negativos. A maior atenção dedicada à sua reforma religiosa (2 Crônicas 29— 31) faz com que o tema do “segundo Davi” seja muito mais trabalhado em Crônicas do que nos livros de Reis, sendo descrito no contexto de Crônicas, e talvez de modo mais preciso, como “tema do segundo Davi/Salomão”. O cro 620
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nista deseja mostrar que toda Israel estava reunida durante o governo de Ezequias sob um só rei e ao redor de um só templo pela primeira vez desde a era dourada de Davi e Salomão, e reforça as ligações entre Ezequias e esses reis pelo uso perspicaz tanto da linguagem quanto das idéias. Ele emprega a expressão ’ere$yisrã e/ apenas em quatro ocasiões (Davi, ICr 22.2; Salomão, 2Cr 2.17 [16]; Ezequias, 30.25; Josias 34.7), cada uma delas no contexto de um rei nado durante o qual a terra ocupou todo o território que lhe era devido, desde Berseba até Dã. As comemorações religiosas conjuntas no reinado de Ezequias têm como antecedente o rei nado de Salomão (2Cr 30.26); a grande riqueza de Ezequias faz lembrar a de Salomão (9.1314; 32.27-29) e a oração de Ezequias na comemoração da Páscoa traz à memória a oração de Salomão na consagração do templo (cap. 6; 30.18-20). Tudo isso serve para enfatizar e intensificar o caráter central de Ezequias para a his tória de Israel, indicado também em Reis. Ezequias é um dos reis de suprema bondade que governaram Israel, e os benefícios do reinado dele estendem-se não apenas a Judá, mas a toda Israel. Assim como Reis, porém, Crônicas também não se mostra absolutamente inequívoco em relação ao caráter de Ezequias (cf. 2Cr 32.24-31, ainda que se possa argumentar que a pas sagem um tanto ambígua de 32.31 tenha a intenção de livrar Ezequias de qualquer suspeita levantada por 2Rs 20.12-19, a saber, de que ele era arrogante; ele é aprovado no teste do arre pendimento ou não?). No entanto. Crônicas enfatiza de maneira ainda mais clara do que Reis a natureza contingente das realizações de Ezequias. De um modo geral, o cronista tem uma visão das obras de Deus no mundo de acordo com a qual a fidelidade humana e a bênção de Deus, bem como a desobediência humana e o julgamento divino, encontram-se intimamente relacionados. Cada geração separada eleva-se ou cai com seu rei ungido, e os feitos de uma geração têm pouco efeito ou são inócuos para a geração seguinte. Assim, a prosperidade de Ezequias (cf. 2Cr 31.20-21) está diretamente ligada às suas circunstâncias imediatas e não tem conseqüências mais marcantes para o povo. A importância dele como rei exemplar, porém, é, em certa medida, maior em Crônicas do que em Reis, considerando-se especialmente a equi paração direta, na concepção do Cronista, da monarquia em Israel com o reino de Deus (cf. Williamson, 26-28) e o tom esperançoso muito mais explícito com que 2 Crônicas termina (contrastar com a passagem ambígua de 2Rs 25.27-30). O reino de Deus deve, inevitavelmen te, ser restabelecido quando isso lhe aprouver. Não pode haver nada no passado do povo que sirva de empecilho para sua tão esperada restauração: um povo, unido sob um rei, ao redor de um templo. Cada geração deve prestar contas de si mesma diante de Deus e, assim, para o cronista, Ezequias é um paradigma real para o futuro, a figura para a qual convergem as ex pectativas. (-> Crônicas: Teologia) E em Isaías (especialmente quando se leva em consideração o contexto canônico mais amplo do livro) que fica mais claro o movimento do passado para o presente com referência à relevância de Ezequias e seu reinado. Foi argumentado de modo bastante persuasivo (Ackroyd, 105-20, num desenvolvimento do trabalho de Melugin) que Isaías 36— 39 é correspondente a Isaías 6.1—9.6 e, de fato, há pontos em comum interessantes entre essas duas seções do li vro. Na primeira, uma avaliação da dinastia davídica e do reino de Acaz (Isaías 7) é seguida da promessa de uma criança da linhagem de Davi (8.23—9.6), na qual as promessas feitas a Davi se cumprirão; essa criança, à qual está ligada tamanha expectativa, é considerada mais naturalmente nesse contexto, como sendo o filho de Acaz, Ezequias(cf. Is 11.1-10. 14.28-32); e, nos caps. 36— 39, seu reinado é descrito em detalhes, de uma forma que parece ressaltar sua devoção em relação tanto a Reis quanto a Crônicas (cf. a oração em Is 38.9-20, que não é en contrada em nenhum outro livro, e também a omissão, como no caso de Crônicas, de qualquer menção ao pagamento de tributo para os assírios [ver 2Rs 18.13-16]). 621
Ezequias
A localização desses capítulos dentro do Livro de Isaías é crucial. Aparecem imediata mente antes dos oráculos do livramento glorioso e da restauração que começam em Isaías 40, de modo que o oráculo de Isaías sobre o exílio e a resposta de Ezequias (39.5-8) conduzem diretamente para a súplica “Consolai, consolai o meu povo” (IS 40.1). Childs (1979, 325-38) observou o modo como os caps. 40— 55 de Isaías ficam isolados de qualquer situação histó rica e tomam-se inteiramente escatológicos, declarando o futuro de Israel com Deus. Childs argumenta que, nesse contexto, os caps. 36—39 adquirem um papel metafórico de comentário sobre a morte e o renascimento de Israel como nação. Além disso, porém, a figura do próprio Ezequias é levada para dentro dessa visão do futuro nacional, graças a uma estruturação do livro que toma o reinado de Ezequias tão es sencial. Isaías 6.1—9.6 (juntamente com as passagens associadas mencionadas acima) sugere que Ezequias é o segundo Davi, aquele que deve cumprir plenamente as promessas de Deus. É durante a vida de Ezequias que terá início a era tão esperada de paz e segurança universais. Isaías 36— 39 também faz essa ligação entre Ezequias e as promessas de Deus. Não se trata apenas da atuação de Isaías no tempo de Ezequias estar sendo apresentada como uma ocasião histórica para se proferir as palavras de consolo nos caps. 40— 55 (Ackroyd). Antes, essa im pressão é dada pela justaposição imediata de Isaías 39.8 (“Haverá paz e segurança em meus dias”) com o começo dessas palavras de consolo (e, de fato, a ausência de qualquer observação sobre a morte e o sepultamento de Ezequias, que se encontram nessa parte do texto em Reis), afirmando que, verdadeiramente, as promessas se cumprirão de algum modo no reinado de Ezequias. Em outras palavras, tudo indica que a figura de Ezequias em si toma-se independente de qualquer vínculo histórico e, dentro do contexto literário do livro de Isaías, passa a ser tão plenamente escatológica quanto nos caps. 40— 55. E evidente que Isaías 8.23—9.6 incentiva esse passo teológico, em função do retrato do futuro rei como portador de atributos divinos, que traz consigo o reinado de Deus. O efeito total do conjunto desses textos dentro do contexto do livro de Isaías como um todo é, portanto, identificar Ezequias mais uma vez como um rei paradigmático em cujo reinado as promessas não se cumpriram e que aponta para além de si, para outro monarca davídico por vir. (-> Isaías: Teologia) Intérpretes judeus posteriores desenvolveram ainda mais o conceito de Ezequias como uma figura messiânica e pode-se encontrar no NT uma quantidade impressionante de para lelos entre a vida de Ezequias e a vida de Jesus (para detalhes, cf. Daube). Uma purificação do templo, por exemplo, é colocada próximo ao início oficial das atividades públicas de cada um (2Cr 29.3, 17; Jo 2.14-25). A atitude de Ezequias com relação aos israelitas impuros du rante a comemoração da Páscoa em seu reinado traz à memória dos leitores dos Evangelhos a atitude de Jesus para com os ritualmente impuros (2 Crônicas 30; Mc 7.1-23), e a cura do povo em decorrência da garantia de Ezequias do perdão divino (2Cr 30.18-20) faz lembrar a história em Marcos 2.1-12. O restabelecimento de Ezequias depois de uma enfermidade (2Rs 20.1-7) era considerado pelos rabinos quase como uma ressurreição dentre os mortos, ressurreição esta que, deve-se observar, ocorreu no terceiro dia (2Rs 20.5, 8). Tais paralelos indicam, no mínimo, que a história de Jesus foi escrita tendo em mente a figura de Ezequias, uma figura tirada tanto dos textos do AT como de interpretações rabínicas posteriores desses mesmos textos. Dessa forma, o papel teológico de Ezequias dentro do AT é dc um dos agentes mais im portantes da soberania de Deus no mundo, concretizando e prenunciando o reino de Deus que, nos últimos dias, será trazido em sua plenitude pelo Ungido do Senhor. No contexto canônico da Bíblia como um todo, o segundo Davi, para o qual Ezequias serve de tipo, é Jesus de Nazaré, a Raiz e a Geração de Davi (Ap 22.16), no qual todas as coisas se fazem novas. 622
Ezequiel: Teologia de
B ib l io g r a f ia
P. R. Ackroyd, Studies in the Religious Tradition o f the Old Testament, 1987; B. S. Childs, Introduction to the Old Testament as Scripture, 1979; idem, Old Testament Theology in a Canonical Context, 1985; R. E. Clements, Isaiah and Deliverance o f Jerusalem, 1980; D. Daube, He That Cometh, 1966; R. B. Dillard, 2 Chronicles, 1987; R. F. Melugin, The Formation o f Isaiah 4 0-55,1976; 1. W. Provan, Hezekiah and the Books o f Kings, 1988; idem, 1 and 2 Kings, 1995; H. G. M. Williamson, I and 2 Chronicles, 1982. I. W. Provan
Ezequiel: Teologia de A. Contexto no Antigo Testamento Ezequiel ministrou em um mundo turbulento. No cenário internacional, as principais potências do OMA estavam mudando de papéis e nações menores estavam desaparecendo de todo. Ao longo de sua vida, ele testemunhou o fim do império neo-assírio e a ascensão dos babilônios. Aliás, sentiu pessoalmente o impacto do poder destes últimos quando, em 597 a. C., foi levado para o exílio na Babilônia, juntamente com o rei Joaquim e muitos da elite de Jerusalém (Ez 1.1-3; cf. 2Rs 24.8-17). Durante seu mandato como profeta, o povo de Judá encontrava-se espalhado por três regiões principais: Judá, Egito e Babilônia. De acordo com a Bíblia, os babilônios deportaram praticamente toda a população de Judá depois de um dos pri meiros ataques deles a Judá (597 a. C.) e das devastações no período de 588-586 a. C., sendo que somente alguns dos “mais pobres da terra” (middallôt hã ’ãre$) foram deixados para trás para cuidar das vinhas e dos olivais (Jr 52.16). Desses poucos que ficaram, vários fugiram para o Egito depois da morte de Gedalias, o governador nomeado pelos babilônios (2Rs 25.25-26; Jr 41.1-2). O profeta Jeremias, colega de Ezequiel estava entre esses fiigitivos juntamente com seu escriba Baruque. De modo geral, o povo que permaneceu em Jerusalém sofreu uma gra ve depressão expressada em termos de pobreza econômica, letargia política e entorpecimento espiritual. Uma nova classe surgiu com relativa rapidez, mas não tinha nenhum conhecimento de sua rica herança religiosa e nem sensibilidade ou piedade para com seus compatriotas de portados (Ez 11.14-16). O público principal de Ezequiel era a comunidade de judeus na Babilônia. Ainda há muito a ser esclarecido sobre o ambiente social do exílio, mas podem-se compor certas carac terísticas desse contexto (2Rs 25.27-30; ANET, 308). Ezequiel insulta Zedequias — que na época ocupava o trono — datando seus oráculos a partir do tempo da deportação e não pela data da ascensão do monarca (Ez 1.2; 33.21; 40.1; cf. 8.1; 20.1). Ezequiel ministrou aos seus companheiros exilados em Tel Abibe, junto ao rio Quebar (1.1; 3.15). Apesar de humilhados pela experiência da deportação, os exilados não parecem ter sofrido dificuldades econômicas. Daniel 1 indica que alguns judeus logo se distinguiram e alcançaram postos elevados na corte babilônia. Documentos dos Arquivos de Murasu, da segunda metade do século V a. C. mostram que os judeus não tardaram a envolver-se com empreendimentos mercantis e bancários. Dentro de duas gerações, é possível que a família Murasu tenha se tomado, no mínimo, abastada. De acordo com Jeremias 29.5-7, alguns exilados dedicaram-se à agricultura. Na verdade, a pros peridade dos judeus na Babilônia foi tanta que, quando Ciro publicou seu decreto de 539 a. C., permitindo que exilados voltassem para Jerusalém, tudo indica que muitos preferiram ficar. Ainda que os judeus exilados tenham se integrado rapidamente à economia babilônia, con seguiram, de modo geral, permanecer uma comunidade étnica e social distinta. Essa consciência 623
Ezequiel: Teologia de
de coesão étnica foi promovida por e/ou refletiu-se na preservação cuidadosa de registros fami liares (Esdras 2; Neemias 1) e na comunicação constante com Jerusalém, especialmente antes da queda da cidade (Jeremias 29). Em contraste com o contexto egípcio, nâo há registro algum de um templo para Javé na Babilônia. Ainda assim, ao que parece, pelos menos exteriormente, as tradições religiosas israelitas como a circuncisão e o sábado foram mantidas (cf. Is 56.2-4; 58.13; Ez 44—46). Porém, pelas profecias de Ezequiel descobrimos que a condição espiritual subjacente era bem outra. O povo parecia ter trazido consigo toda a sua bagagem de apostasia, inclusive suas tendências à idolatria e toda sorte de males sociais (Ezequiel 18). Na verdade, os exilados sofreram um grave choque teológico. Apesar de os profetas te rem, justificadamente, condenado o povo de Judá por sua idolatria e seus crimes sociais, ao longo de toda a crise babilônia, o povo continuou confiando que Javé tinha a obrigação de salvá-lo. Dentro das perspectivas comuns da época no OMA, essa sensação de segurança baseava-se na convicção de um vínculo indestrutível que unia a divindade protetora da nação (Javé), o territó rio (a terra de Canaã) e o povo (a nação de Israel). Em termos mais específicos, a confiança do povo em Javé baseava-se numa ortodoxia oficial, sustentada por quatro proposições imutáveis, quatro pilares de promessa divina: o caráter irrevogável da aliança de Javé com Israel (Sinai), o senhorio de Javé sobre a terra de Canaã. a aliança eterna de Javé com Davi e a residência de Javé em Jerusalém, o lugar que escolheu para seu nome habitar. Quanto mais os exércitos de Nabucodonosor se aproximavam, mais o povo se apegava às promessas de Deus. No entanto, Jerusalém caiu, a casa de Davi foi exterminada, o templo foi saqueado e a nação foi enviada para o exílio. Era mais difícil lidar com as conseqüências espirituais do que com os efeitos físicos desses acontecimentos. A vitória de Nabucodonosor deixou os judeus emocionalmente arrasados, levantando diversas dúvidas sobre Javé — dúvidas relacionadas à impotência divina, sua traição e abandono. Tudo indicava que Marduque, o deus dos babilô nios, havia prevalecido. Ezequiel defrontou-se com um público desiludido, cínico, amargurado e cheio de raiva. A casa de rebelião (bêt mert) havia desmoronado sem haver quem a socorresse. Essa era a crise para a qual o profeta fora enviado. O atual Livro de Ezequiel, que representa uma coleção de mensagens recebidas Deus e transmitidas no nome dele, é um testemunho da fidelidade do profeta e do poder re tórico de sua comunicação. Porém, é ainda um testemunho de uma teologia da qual seu povo do século VI a. C. carecia desesperadamente, uma teologia que também precisa ser resgatada em nossos dias. B. Estrutura literária Parte um: mensagens de destruição e trevas para Judá/Israel (1.1— 24.27) I. O chamado de Ezequiel para o ministério profético (1.1—3.27) A. O cabeçalho (1.1-3) B. A primeira visão de Ezequiel (1.4-28a) C. A comissão de Ezequiel (1.28b—3.11) D. A preparação de Ezequiel (3.12-15) E. O discurso do Senhor para a indução de Ezequiel: quatro estudos de caso (3.16-21) F. A iniciação do profeta (3.22-27) II. Sinais e visões de aflição para Israel/Judá (4.1— 11.25) A. O drama da queda de Jerusalém (4.1— 5.17) B. A proclamação do julgamento contra os montes de Israel (6.1-14) 624
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C. O alarme para a terra de Israel (7.1 -27) D. O anúncio da profanação do templo (8.1— 11.25) III. Uma coleção de oráculos de julgamento contra Israel (12.1— 24.27) A. Sinais dos tempos (12.1-20) B. Profecia — verdadeira e falsa (12.21— 14.11) C. O alto preço da traição (14.12— 15.8) D. A esposa adúltera: tripúdio à graça de Deus (16.1-63) E. Mensagens de pecado e retribuição (17.1— 22.31) 1. A águia e a vinha: uma fábula (17.1 -24) 2. O questionamento à justiça de Deus (18.1-32) 3. Um lamento para a dinastia davídica (19.1-14) 4. A reelaboração da história sagrada (20.1-44) 5. A espada vingadora do Senhor (21.1 -37 [20.45—21.32]) . Ai da cidade sanguinária! (22.1-31) F. Oolá e Oolibá (23.1 -49) G. A panela de fervura (24.1-14) H. O fim de uma era (24.15-27)
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Parte dois: mensagens de esperança e restauração para Judá / Israel (25.1— 48.35) I. Mensagens negativas de esperança: os oráculos contra as nações estrangeiras (25.1— 32.32) A. Oráculos de julgamento sobre as seis nações (25.1— 28.23) 1. Oráculos breves contra os vizinhos de Israel (25.1-17) 2. Os oráculos de Ezequiel contra Tiro (26.1—28.19) B. Os planos do Senhor para as nações (28.20-26) C. Oráculos de julgamento sobre o Egito (29.1—32.32) II. O fim de uma era (33.1-33) A. Convocação final (33.1-20) B. Palavra final (33.21-22) C. Questionamento final: a imposição de nossos direitos (33.23-29) D. Vindicação final (33.30-33) III. Mensagens positivas de esperança para Israel: o evangelho segundo Ezequiel (34.1—48.35) A. Proclamação das boas novas: “Aquietai-vos e vede o livramento do Senhor!” (34.1— 39.29) 1. A salvação do rebanho do Senhor (34.1-31) 2. A restauração da terra do Senhor (35.1— 36.15) 3. A restauração da honra do Senhor (36.16-38) 4. A ressurreição do povo do Senhor (37.1-14) 5. A renovação da aliança do Senhor com Israel (37.15-28) . A garantia da proteção do Senhor sobre Israel (38.1—39.29) a. Preâmbulo (38.1) b. A derrota de Gogue (38.2-23) Conclusão interpretativa (38.23) c. O fim de Gogue (39.1-29) Conclusão interpretativa (39.21 -29)
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B. Entrevendo as boas novas: “A quietai-vos e vede a volta do Senhor!” (40.1—48.35) 1. O novo templo (40.1 —43.11) a. Preâmbulo da visâo do templo (40.1 -4) b. A disposição do espaço sagrado (40.5—42.20) c. A volta do Senhor ao seu templo (43.1 -9) d. Epílogo da excursão pelo templo (43.10-11) 2. A nova Torá (43.12— 46.24) 3. A nova terra (47.1— 48.29) 4. A nova cidade (48.30-35)
C. Ênfases teológicas Pode-se agrupar a mensagem de Ezequiel de modo conveniente sob estes três títulos: 1. Ezequiel e sua visão de Deus; 2. Ezequiel e sua visão do povo de Deus; 3. Ezequiel e sua visão do Messias 1. Ezequiel e sua visão de Deus. a. O provincianismo de Ezequiel contrasta nitidamen te com o universalismo e o plano cósmico de Isaías. Em nenhum outro profeta, a grandeza de Deus é expressada de modo tão eloqüente e sublime quanto em Isaías (cf. Oswalt, Isaiah Chaplers 1-29, 132-36, em que Javé, o Santo de Israel, não é apenas o único Deus; ele é o Criador onisciente, o Sustentador onipotente, o Diretor superintendente e Juiz onisciente do universo). Porém, do início ao fim, o Deus que confronta o leitor em Ezequiel é antes de tudo o Deus de Israel, não apenas impetuoso em seu relacionamento com seu povo, mas disposto a colocar sua reputação em risco pelo destino e a sorte do povo. Sem dúvida, ele se mostra um rei cós mico em seu trono nos céus e, de seu carro celestial seu domínio se estende até os cantos mais remotos da terra (Ez 1.1-28), mas escolheu habitar em Jerusalém (comparar a partida de Javé do templo de Jerusalém conforme a descrição dos caps. 8— 11 com a volta dele ao templo nos caps. 40— 43), na terra de Canaã/Israel (caps. 4— 48), em meio ao seu povo (Ez 48.35). Mesmo no exercício de sua soberania sobre as nações, os planos de Javé concentram-se em Israel. No que se refere a Ezequiel, o lugar de Nabucodonosor da história é definido pelo papel daquele que empunha a espada divina contra Judá e Jerusalém (Ez 21.5-37 [1.32]). Os oráculos contra as nações (caps. 25— 32) não deixam dúvidas quanto à soberania absoluta de Javé, mas a ascensão e queda das potências estrangeiras têm relevância histórica, à medida que esses acontecimentos afetam o destino do povo de Javé (Ez 28.24-26). Gogue (->) e suas hordas, os inimigos arquetípicos de Israel reunidos dos quatro cantos da terra (caps. 38— 39), são marionetes que entram em cena pelas mãos divinas para provar o compromisso eterno de Javé com a segurança de seu povo. Ao eliminá-los, ele se engrandece (gdl, [hitp.], 1514; Ez 38.23), dá-se a conhecer (y d ‘, -> # 3359; Ez 38.23) e manifesta a sua glória (nln kãbôd, # 3883; Ez 39.21) entre as nações. Por certo preocupa-se que todo o mundo reconheça sua pessoa e presença em todos os assuntos, mas os planos dele concentram-se sempre em Israel. A visão que Ezequiel tem de uma Israel restaurada deixa espaço para não-israelitas, mas a in corporação deles na nova ordem, em Ezequiel 47.21-23, pressupõe adaptação e integração a uma sociedade e cultura que são claramente israelitas. b. Apesar de Ezequiel não usar o título “Santo de Israel” (qedô$yisrã el), comum e Isaías (Is 1.4; 5.19; etc.; ser Oswalt, Isaiah, 33), o atributo da santidade divina ocupa uma posição de destaque no pensamento dele. Desde a forma e radiância da primeira visão, espe cialmente o trono de Javé separado das criaturas semelhantes a querubins que o sustentam por uma plataforma como que de cristal (rãqia', -> # 8385; Ez 1.22-26), até as gradações 626
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concêntricas de santidade embutidas no plano do templo na visão final (caps. 40— 43), tudo sobre o caráter e as ações de Javé proclama “Santo! Santo! Santo!”. E particularmente a atitude dele para com seu povo é motivada por zelo à reputação do santo nome. Deus deve vir sobre seu povo com julgamento, pois a idolatria e outras práticas abomináveis profana ram (ím V hll, -> # 3237, # 2725) o templo (Ez 5.11; 8.5-18; 23.38-39), a terra (36.16-18), o povo (20.7, 31, 43), os sábados (20.13, 21, 24) e o nome de Deus (sêm qodsô, 20.39). Foi em função do zelo por seu santo nome que ele não destruiu completamente seu povo no pas sado (20.9, 14, 22, 44) e, por esse motivo, deve restaurar seu povo para si e na sua terra, no futuro (20.44; 36.20-32). Uma Israel perversa, que se comporta como Sodoma e Gomorra, desonra a reputação de Deus, como também o faz sua nação no exílio e sua terra arruinada. Deixando de lado as causas humanas, os observadores internacionais dessa calamidade concluem que Javé não é capaz de cuidar do povo dele ou que deliberadamente o abandonou. Qualquer que seja o caso, seu nome sagrado foi desonrado. Assim, depois do julgamento, quando Javé trata com os ini migos de Israel, ajunta seu povo, restaura-o à pátria e revigora-o com a infusão de seu Espíri to, não age de acordo com aquilo que o povo merece, mas em defesa de seu santo nome, para que ele seja santificado entre as nações por intermédio de seu povo (Ez 20.41-42; 28.22, 25; 36.16-32; 38.16,23; 39.7, 27). c. Javé é o Deus bondoso que fez e manteve sua aliança com Israel. A base pactuai seu relacionamento com a nação fica evidente nâo apenas no nome que o profeta usa para Is rael, 'ammu meu povo (mais de 25x), mas também nas inúmeras citações e alusões à expres são pactuai, “eles serão o meu povo, e eu serei o seu Deus” (p. ex., Ez 11.20; 14.11; 34.24, 30-21; 36.28; 37.23). Referências explícitas a aliança em si ( berít, -> # 1382) ocorre 17x no Livro de Ezequiel, apesar de seis delas, no cap. 17, aplicarem-se mais estritamente à aliança de Nabucodonosor com Zedequias (17.13, 14, 15, 16, 18), também chamada de aliança de Javé (v. 19). Pelo fato de os seus contemporâneos considerarem as promessas de Javé a Israel na aliança como garantias incondicionais de segurança, o profeta passa os caps. 1—24 procurando desenganá-los dessa convicção ilusória. Sem a fé no Senhor da aliança e obediência aos termos da aliança, não estão protegidos nem dos inimigos humanos e nem do próprio Javé. Israel é uma família rebelde (bet merí) cuja perversidade excede as práticas abomináveis das nações pagãs (5.5-7; 16.44-53). Pelo fato de Israel haver rejeitado os preceitos (mispã(ím, -> # 5477) e decretos (huqqôt, -> # 2978) da aliança, Javé executará as maldições da aliança descritas em Levítico 26 e Deuteronômio 28. A rebelião do povo tomou-se tão profunda que nenhum clamor por socorro fará com que Deus se compadeça (Ez 8.18; 9 .10; 24.14). No entanto, a expansão furiosa das maldições da aliança, que Ezequiel prediz em seus oráculos de julgamento, não deve cegar o leitor para a atitude fundamentalmente positiva do profeta com relação à aliança. Na extensa alegoria de Ezequiel 16, Javé é apresentado como um Deus bondoso e compassivo que nâo apenas salva da morte certa a cidade de Jerusalém (uma referência metonímica a Israel), que não passa de uma criança abandonada. Quando ela cresce, ele a salva outra vez, casa-se com ela e com expressões incontidas de amor, a eleva à posição de rainha (16.1-14). Tudo o que Israel tem e tudo o que é, deve à generosidade de Deus. De acordo com Ezequiel, o julgamento presente e iminente de Javé sobre a nação não deve ser interpretado como uma desistência da aliança, mas sim como o cumprimento rigoroso de todos os detalhes dessa aliança. Israel atraiu as maldições sobre si ao tripudiar a graça do pacto de Javé (16.15-43). Mas Javé não pode e não irá abandonar seu compromisso essencial com seu povo. As profecias de esperança e restauração proferidas por Ezequiel baseiam-se no caráter eterno da aliança (observe-se berít ‘ôlãm, aliança eterna, em Ez 16.60 e 37.26) e no 627
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zelo infinito de Javé pelo bem-estar de seu povo (Ez 34.25-31 sobre a berít Sãlôni, aliança de paz, que ele faz com Israel). d. Em afinidade com o que foi dito acima, de acordo com uma das formas específicas de apresentação usada por Deus para si mesmo, ‘aniyhw h dibbarti \ve'ãsiti, “eu, o Senhor, o disse e o fiz” (Ez 17.24; 22.14; 24.14; 36.36; 37.14), Javé é, por definição, um Deus que age. Ezequiel não apresenta nenhuma poesia sublime sobre os atributos de Deus nem discursos gran diosos sobre a personalidade de Deus. Assim como nos acontecimentos relacionados ao êxodo de Israel do Egito (Êxodo 1— 15), o conhecimento da pessoa e do caráter de Deus é adquirido principalmente ao observar-se a atuação dele. De fato, essa coleção de profecias dá a impressão de que quando Javé age em julgamento contra seu povo, não é primeiramente para castigar, mas para que o povo e o mundo o conheçam. O mesmo se aplica aos atos de restauração em favor de Israel (cf. a expressão de reconhecimento vfiyãdÇ ‘ú ki- ’aniyhw h, “então saberão que eu sou o Senhor”, ao longo de todo o livro). O principal objetivo de Javé ao derrubar as potên cias estrangeiras não é destruir os inimigos de Israel, mas manifestar a própria grandeza, glória e santidade (p. ex., os oráculos contra Gogue e suas hordas [Ez 38.23; 39.21-23]). Da mesma forma, o intento de Deus ao restaurar Israel é demonstrar a santidade divina (Ez 36.16-32). e. Mais do que qualquer outro, Ezequiel é um profeta do Espírito (ver a discussão com pleta em meu ensaio “The Prophet o f the Spirit,” 27-49). Explorando ao máximo a palavra rúah, espírito, vento, sopro, Ezequiel apresenta o Espírito de Javé como a marca da presença divina em vários contextos diferentes: i. como agente de condução (Ezequiel é levantado e transpor tado pelo Espirito [Ez 3.12, 14; 8.3; 11.24; 37.1; 43.5; cf a expressão mais física, “a mão do Senhor Deus caiu sobre mim,” relacionada ao movimento do profeta em 8.1; 37.1; 40.1]); ii. como agente de animação (os “seres viventes” carregando o trono divino, 1.19,21; 1.28—2.2; 3.23-24; 10.17; a Israel falecida 36.26-27; 37.1-14; cf. o comentário de Jesus para Nicodemos em Jo 3.1-8); iii. como agente de inspiração profética (Ez 11.24; cf. 2.2; 3.24; cap. 13; cf. 2Pe 1.21); iv. como sinal de senhorio divino (39.29). Mas Ezequiel não apenas falou do poder do Espírito; ele também o personificou em si mesmo. f. Em decorrência disso, apesar do tom mórbido de grande parte da pregação de Eze quiel, Deus está do lado da vida e não da morte. Ezequiel não só possui um extenso vocabulário relacionado à morte (ver Block, “Ezekiel ’s Vision,” 115-16), como também o Deus que fala por intermédio dele tem à disposição uma ampla gama de agentes letais: fome, feras, peste, carni ficina, espada, fogo (Ez 5.17; 6.11; 7.15; 12.16; 14.21; 28.23; 39.6). Por vezes, é Deus mesmo quem executa a sentença de morte: empunha a espada em sua mão, extermina o povo, destrói, faz perecer, consome com seu furor, faz o povo cair e o envia para a cova (Block, “Ezekiel’s Vision,” 117-19). Esse tom fúnebre é, obviamente, derivado da natureza sentenciosa de mui tas das profecias. Contudo, a presença constante do tema não significa que Javé se compraz com a morte. Pelo contrário, o povo trouxe essa sorte sobre si ao rejeitar Aquele que os havia chamado para a vida (Ez 16.6), atraindo assim as maldições das quais havia sido avisado de antemão. A atitude fundamental de Javé é em favor da vida, mesmo para os rebeldes entre os exilados, se eles se arrependerem de seu pecado e voltarem-se para Deus (Ez 18.30-32). Esse é o desejo de Deus para toda a humanidade. 2. Ezequiel e sua visão do povo de Deus. Dentro de sua visão provinciana de caráte um tanto restrito, Ezequiel associa a identidade do “povo de Deus” de modo inextricável à na ção de Israel, que consiste principalmente dos descendentes de seu antepassado epônimo Jacó/ Israel, o que se reflete nas referências freqüentes que o profeta faz a bêt yisrã ’êl, casa/família de Israel e, por vezes, a ^ n ê yisrã ’êl, filhos de Israel. Apesar de sua nação ter-se dividido em dois reinos no século X e de dez das doze tribos terem sido assimiladas pelo império neo-assírio 628
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no século VIII, assim como os outros profetas, Ezequiel usa a designação “Israel” para todos aqueles que restaram dessa nação, representada, então, principalmente pelo que restou de Judá e pela comunidade no exílio da Babilônia. a. A percepção de Ezequiel do passado de Israel. Apesar de partir do pressuposto d as origens étnicas de Israel encontram-se nos patriarcas — Abraão, Isaque e Jacó — , Ezequiel dá pouca atenção à sua história nacional antes do Egito. Os patriarcas são citados apenas 4x no livro: Abraão somente uma vez (33.24), Isaque nâo é mencionado e Jacó apenas 3x (28.25; 37.25; 39.25). Em 39.25, o papel de Jacó é simplesmente de correlato de Israel, e em cada um dos textos os nomes estão associados às promessas de Javé e seu livramento da terra de Canaã em favor dos israelitas. Quando Ezequiel cita os “pais” ( ’ãhôt), refere-se de modo mais geral aos antepassados da atual geração (2.3; 18.2; 20.27; 37.25). Ezequiel apresenta dois levantamentos da história de Israel, ambos no contexto dos longos pleitos judiciais iniciados por Javé contra a nação. Os dois relatos são radicalmente revisionistas, reconstituindo o passado de Israel do ponto de vista de Deus e não sob a ótica idealista dos contemporâneos do profeta. No cap. 16, o levantamento histórico de Ezequiel é apresentado na forma de uma extensa alegoria. Os quinze primeiros vv. destacam o papel de Javé na história de Israel, que começa na terra de Canaã. Jerusalém (que serve de metonímia para a nação) era uma criança desampa rada, abandonada à morte pelos pais quando Javé passou por ela e salvou-a, concedendo-lhe vida. Quando ela havia crescido e se tomado mulher, Javé deparou-se com ela novamente e desposou-a. Ele não apenas entrou num relacionamento de aliança com Israel, mas também cobriu-a de afeto com sua generosidade incontida. elevando-a à condição de rainha. O argu mento é claro: tudo o que Israel é e tudo o que possui é atribuído à graça de Deus. No cap. 20, a história de Israel é dividida em sete eras, cada uma delas caracterizada pelos atos da graça de Javé em favor de seu povo e pela rejeição de Israel da sua aliança. Do ponto de vista de Ezequiel, o passado é representado pelas três primeiras fases. Na primeira fase (vv. 5-9), Ezequiel localiza as origens de Israel no Egito, onde Javé escolheu (bhr, # 1047) seu povo, fez-se conhecer (y d ‘ [ni.], # 3359), comprometeu-se sobjuramento (wã 'essã ’ yãdi, levantei minha mão) em ser o Deus de sua naçâo e prometeu sobjuramento que a tiraria do Egito e levaria para a mais gloriosa de todas as terras [Canaã] que ele havia pessoalmente “previsto” [examinado com antecedência] (twr) para ela. Em resposta aos atos de bondade de Deus, a exigência dele de que o povo abandonasse os comportamentos abomináveis e deixas se os deuses egípcios era razoável (vv. 5-7). Porém, o povo se recusou a fazer as duas coisas, instigando o furor de Javé. Apesar disso, Javé se conteve e, num ato bondoso de livramento do Egito, revelou-se às nações. Na segunda fase (Ez 20.10-17), Javé levou Israel para o deserto, onde lhe revelou sua vontade específica, prometendo-lhe vida em troca de obediência e dando-lhe o sábado como sinal desse compromisso pactuai. Mas Israel desonrou o nome de Deus ao rejeitar a aliança, de modo que Javé se recusou a levá-lo à terra prometida. Ainda assim, o zelo de Javé por seu santo nome impediu-o de destruir Israel no deserto. Em vez disso, na terceira fase (vv. 18-26), ele decidiu recomeçar com a geração seguinte, à qual ele revelou novos decretos com a intenção de dar vida a ela. Mais uma vez ela se recusou a obedecer, incitando a ira de Deus. Contudo, agindo novamente por amor à sua reputação, em vez de destruir a naçâo, ele resolveu espalhála entre as nações e substituir suas leis que davam vida por regulamentos que levariam à morte. Agindo mais uma vez por amor ao seu nome, na quarta fase (vv. 27-29) Javé finalmente levou Israel para a terra que havia prometido a ela. Mesmo assim, Israel rejeitou a graça, e continuou infiel (m # 5058) a Javé ao praticar toda sorte de abominação idólatra. Esse retrato da res posta de Israel a Javé na terra é compativel com a descrição que Javé faz de sua nação como 629
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uma casa em rebelião desde o princípio, em seu primeiro discurso de comissão para o profeta (Ez 2.3), seguido da primeira série de atos simbólicos do profeta, de acordo com os quais Israel vinha cometendo atos de iniqüidade ao longo de 390 anos (para essa interpretação de Ez 4.5, ver D. I. Block, The Book o f Ezekiel, 1996). Em suma, o relacionamento de Javé com Israel começou como um ato da mais pura graça. Pela graça, Deus escolheu Israel como povo. Pela graça, estabeleceu sua aliança com Israel. Pela graça, revelou-se a ele em sua Torá. Pela graça, deu-lhe a terra de Canaã. Ainda que a manutenção do relacionamento divindade-nação-terra fosse claramente motivada pelo zelo de Javé com seu santo nome, Ezequiel oferece poucas informações sobre a motivação inicial de Javé para a eleição de Israel. Ao contrário de Isaías, que via Israel como uma “luz para os gentios” (Is 42.6; 49.6; 51.4; 60.1, 3), o ponto de vista de caráter estritamente provinciano de Ezequiel se reflete em Ezequiel 5.5, em que ele diz que Javé havia colocado a nação “no meio das nações e terras que estão ao redor dela”. Não se trata de uma referência a uma localização central cósmica, mas à posição de Jerusalém no contexto de seus vizinhos (em oposição à in terpretação que propõe “umbigo da terra” para Ez 38.12; cf. Block, Ezekiel). Sob as vistas das nações ao redor, a incumbência de Israel era honrar o nome de Javé aceitando seu senhorio divino e guardando fielmente sua aliança, uma resposta que seria recompensada com a bênção e proteção divinas. Por meio da prosperidade e da felicidade do povo de Deus, a boa reputa ção de seu benfeitor divino seria reconhecida entre as nações. Por outro lado, quando o povo se rebelou contra Deus e as bênçãos da aliança foram retidas e substituídas pelas maldições, o nome de Javé foi desonrado. Nisto, pode-se reconhecer vários princípios perenes com referência ao relacionamento entre Deus e seu povo. Em primeiro lugar, o povo de Deus adquire essa condição pela escolha soberana e redenção da graça divina. O chamado para o povo de Deus não se baseia em qualifi cações prévias ou em algum mérito e, muitas vezes, é contrário à disposição natural do homem. Em segundo lugar, o chamado de Deus em sua graça para entrar em aliança com ele deve ser respondido com uma devoção agradecida e irrestrita ao Senhor da aliança e obediência total à sua vontade. O povo de Deus é caracterizado por uma vida disciplinada de santidade e pela adoração fiel, não para alcançar o favor de Deus (o que seria legalismo), mas como expressão de gratidão e louvor pelo favor já recebido. Em terceiro lugar, Deus atrela sua reputação entre as nações à saúde e felicidade de seu povo. Ao mesmo tempo em que devemos cuidar para não transformar as promessas divinas de saúde, felicidade e sucesso para Israel em promessas idênticas para os cristãos de hoje, continua sendo fato que a reputação de Deus na sociedade é determinada pela saúde da igreja e por seu grau de sucesso em alcançar os objetivos espirituais que o Senhor definiu para ela. b. A percepção de Ezequiel do tempo presente de Israel. Apesar de afirmarem o contrá rio (Ez 18.1-2), de acordo com a avaliação de Ezequiel, os israelitas são uma casa rebelde (bêt merí, 2.3; 5.6; etc.). Assim como seus antepassados, a nação colocou em risco sua condição de povo de Javé ao adorar outros deuses (6.1-14; 8.5-17; 14.3-5; 16.15-22; 20.30-31, etc.), imi tar os costumes dos pagãos (sua perversidade é maior do que a dos pagãos, 5.6-7; 16.44-52) e confiar em potências estrangeiras para satisfação e segurança dela própria (16.23-29; 23.5-21). E ao mesmo tempo, ela exige o direito de proteção divina, fiando-se nas promessas imutáveis de Deus. De qualquer modo, Ezequiel mostra-se inflexível ao condenar a hipocrisia do povo. As promessas de bênção da aliança não são garantias incondicionais do favor divino; a segu rança e a felicidade dependem de aceitar-se a exigência de lealdade exclusiva para com Javé e de obediência total à vontade dele. Uma vez que Israel não fez nem uma coisa nem outra, os membros da presente geração encontram-se sob a ameaça das maldições da aliança. Na verdade, 630
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a sorte de Judá e Jerusalém já foi irrevogavelmente determinada. Javé convocou Nabucodono sor, seu agente de destruição, e colocou a espada na mão do rei babilônio. A partida de Javé do templo e a queda subseqüente da cidade são apenas uma questão de tempo. As exigências do povo pelo favor de Javé, especialmente daqueles que vivem em Jerusalém, são vazias diante da falta de verdadeira devoção a Deus. Ao mesmo tempo, Javé não abandonou completamente suas promessas e nem o seu povo. Por ironia, o futuro encontra-se nos exilados, aqueles que foram removidos da terra e privados de acesso ao templo. Assim como a arca no tempo do dilúvio (Gênesis 6—9), é na região ao redor do rio Quebar que se encontra a chave para a continuação da existência de Israel. Como no dilúvio, o tempo de exílio representa um período de incubação, do qual surgirá uma nova comunidade da fé. Porém, os exilados não devem deduzir com isso que, automaticamente, têm o direito de participar da nova obra de Deus. Assim como seus compatriotas em Jerusalém, os exilados também se encontram sob a condenação divina, visto que não mudaram de conduta desde que foram deportados (Ez 14.1-11). A mesma sentença de morte que pesava sobre seus pais e que pesa sobre os compatriotas em Judá também pesa sobre os exilados a menos que se arrependam de seus caminhos e voltem sua devoção para Javé (18.1 -32). A participação na esperança vindoura depende de sua transformação espiritual. A partir dessas observações, o leitor pode tirar algumas conclusões teológicas com respeito ao relacionamento entre Deus e seu povo. Em primeiro lugar, o cristão não tem direi to algum de apropriar-se das promessas de Deus se essa reivindicação não for acompanhada de uma devoção exclusiva a ele e obediência fiel à sua vontade. Deus é absolvido de todas as obrigações para com aqueles que se voltam para qualquer outro deus, que se recusam a levar a sério todas as exigências éticas e morais de Deus ou que buscam segurança em qualquer outro poder. Não temos direito algum de cantar que estamos “firmes nas promessas”, quando continuamos “firmes em nossas próprias decisões éticas”. Em segundo lugar, desfrutar do fa vor divino não depende do acesso físico direto à casa ou à terra de Deus. Antes, depende da adoração a Deus em espírito e em verdade (cf. Jo 4.23-24) e no cumprimento grato de suas exigências morais e éticas. c. A percepção de Ezequiel do futuro de Israel. Tendo em vista as palavras cheias esperança no final das maldições da aliança em Levítico 26.40-46 e Deuteronômio (Dt 4.3031; 30.1-20. Para esse assunto, ver McConville, Grace in the End, 134-39), não é de admirar que o levantamento de Ezequiel da história de Israel possa ver além do julgamento iminente e/ou presente até um novo dia no qual a nação será restaurada a Javé e prosperará na terra de Canaã. De acordo com o esquema de sete partes em Ezequiel 20, o atual [quinto] período de exílio (vv. 30-31) será seguido de um período no qual a nação se encontrará no “deserto dos povos”, onde Javé a purifica dos pecados e a leva de volta à “disciplina da aliança” (vv. 32-38). Mas essa história ante-eventum de Israel chega ao ápice na sétima era, quando a sorte de Israel será plenamente restaurada. Ainda que o profeta tenha apresentado um esboço das principais características desse novo dia em vários oráculos anteriores (cf. declarações de esperança se melhantes em oráculos de julgamento anteriores; Ez 6.8-10; 11.16-20; 16.60-63), é depois da queda de Jerusalém em 586 a. C., que o tema da restauração nacional passa a desempenhar um papel de grande importância nas pregações de Ezequiel (ver caps. 34— 48). Apesar de serem acrescentados vários detalhes, de modo geral, Ezequiel apresenta um quadro de Israel no qual todos os erros do passado são reparados e a nação finalmente começa a viver à altura do po tencial prometido na primeira aliança de Javé. Como foi observado anteriormente, nesse pro cesso, são restaurados os pilares nos quais a nação havia apoiado equivocadamente sua segu rança no passado (mas que Ezequiel derrubou sistematicamente nos oráculos de julgamento). 631
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Vê-se que as promessas de Javé são, de fato, eternas: i. Israel é o povo da aliança de Javé para sempre; ii. a terra de Canaã lhe foi dada como território nacional para sempre; iii. Javé habi tará no meio do seu povo para sempre; iv. o compromisso de Javé com seu servo Davi dura para sempre. Javé não voltará atrás em sua palavra. Afinal, como ele mesmo declara: "eu, o Senhor, o disse e o fiz”. Pode-se reconhecer prontamente as principais características das atividades futuras de Javé em favor de Israel: i. em um novo êxodo, Javé ajuntará o povo dispersado pelos países por onde foram espalhados (t 1.16-17a; 20.41; 34.11-13a-16; 36.24b; 37.12b); ii. Javé os levará de volta à sua pátria hereditária, que foi purificada de sua profanação (11.17b-18; 20.42; 34.13b15; 37.21b); iii. Javé revitalizará seu povo espiritualmente, renovando sua aliança com eles, dando-lhes um novo coração e infundindo-os com seu Espírito para que o povo possa andar nos caminhos do Espírito (11.19-20; 16.62; 34.30-31; 36.25-28; 37.23-24); iv. Javé restaurará a dinastia de seu servo Davi como um agente que visa ao bem do povo e como um símbolo de unidade para a nação (34.23-24; 37.22-25); v. Javé abençoará Israel com uma prosperidade sem precedentes e garantirá a segurança da nação na própria terra dela (34.25-29; 36.29-30; 37.26; 38.1 —39.29); vi. Javé fixará sua residência permanente no meio deles e organizará novamente o culto em Israel (37.26b-28; 40.1—48.35). Os estudiosos conservadores apresentam grandes divergências no que se refere às im plicações das declarações de restauração feitos por Ezequiel para o futuro de Israel e da igreja. Por um lado, à luz de uma nova definição do reino de Deus em termos espirituais e suprana cionais no NT, a tendência dos amilenialistas é considerar essas e outras previsões do AT sobre Israel como parte das bênçãos estendidas à igreja e herdadas por ela. Assim, Ezequiel oferece um retrato de uma nova Israel espiritual, ajuntada de todas as nações, transformada pela obra do Espírito de Deus e desfrutando de bênçãos espirituais de felicidade e paz sob o reinado de Cristo, o Messias (cf. o estudo geral dessa abordagem realizado por A. Hoekema, “Amillennialism,” 155-87). As concepções milenialistas do futuro, por outro lado, firmam-se em grande medida nos escritos de Ezequiel. De acordo com esse ponto de vista, a era presente terminará com a volta de Cristo, que governará sobre uma Israel reunida e uma terra redimida. Durante esse período, Satanás estará preso e o mundo desfrutará mil anos de paz sem precedentes. Eze quiel oferece boa parte das evidências para o tom judaico pronunciado desse milênio e para a seqüência de acontecimentos escatológicos aceitos especialmente pelos premilenialistas dispensacionalistas (cf. Cooper, Ezekiel, 45-52). A nosso ver, ao mesmo tempo em que o NT admite muitas vezes novas significações em sua leitura dos textos do AT (a igreja é herdeira das promessas espirituais de Deus a Israel), nossa interpretação deve ser determinada pela própria concepção de Ezequiel dos seus oráculos (cf. W. W. Klein, etc. Introduction to Biblical lnterpretation, 144). Se fosse possível perguntara Ezequiel se ele esperava ou não um ajuntamento literal de seu povo, a volta desse povo à terra de Israel, sua revigoramento espiritual e a restauração de um rei da linhagem de Davi ao trono de Israel, poder-se-ia esperar, sem dúvida alguma, uma resposta afirmativa. Afinal, Javé deu sua palavra e não voltará atrás nas promessas eternas que fez a Abraão, Moisés e Davi. Porém, apesar de os oráculos de restauração de Ezequiel preverem acontecimentos literais, nem todas as suas descrições retratam os acontecimentos ao pé da letra (cf. Klein, 369). Na verdade, de Ezequiel 34 a 48, as profecias de esperança tomam-se cada vez mais abstratas e conceptuais. Não é difícil visualizar o ajuntamento e revitalização de Israel conforme descritos nos caps. 34 e 36.16-38 e os principais elementos devem ser levados a sério (da mesma forma, em Ez 37.15-28). No entanto, 37.1 -14 é apresentado como uma visão, sendo que os ossos secos atuam simbolicamente no papel de Israel. O oráculo de Gogue de Magogue (caps. 38— 39) é como 632
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uma caricatura literária, com várias características irreais e grotescas e a visão final do templo é bastante ideológica, com diversos elementos idealistas e fantásticos difíceis de conciliar com as realidades geográficas e culturais. Apesar de Ezequiel sem dúvida alguma antever uma volta verdadeira de Israel para a terra da Palestina, a designação de um Messias davídico e um longo período de paz e prosperidade para a nação, sua visão continua sendo estritamente naciona lista. Com exceção da garantia de Javé de oferecer proteção, mesmo diante de conspirações universais contra Israel (caps. 38— 39), Ezequiel fala muito pouco das implicações cósmicas da nova ordem. Uma vez que ele não apresenta uma cronologia ciara para esses acontecimen tos dos últimos dias, os detalhes de suas descrições não devem ser usados para estruturar um calendário seqüencial de acontecimentos escatológicos. 3. Ezequiel e sua visão do Messias. Apesar de mais de um quarto das profecias de E quiel que foram preservadas esperar o futuro glorioso de Israel, são incrivelmente poucas as referências claras ao Messias nesse livro. Exceto pelas vagas alusões à ponta do cedro, identi ficada como rak, renovo, broto em Ezequiel 17.22 e ao chifre, poder (qeren) em 29.21, decla rações explicitamente messiânicas ocorrem somente em dois contextos: 34.22-23 e 37.22-25 (ver uma discussão mais completa em nosso “Bringing Back David,” in The Messiah in the Old Testament). Somente por inferência é que o nãsi ’ dos caps. 40—48 pode ser identificado como alguém da linhagem de Davi e seu papel não é descrito em termos de realeza. Fica evidente a partir de 34.22-23 e 37.22-25 que a esperança messiânica de Ezequiel envolve o oposto de suas declarações de julgamento sobre a casa de Davi na primeira metade do livro. Porém, a visão messiânica de Ezequiel encaixa-se perfeitamente no ambiente ideológico e cultural da Mesopotâmia antiga. Em vários textos da antigüidade, depois de relatos de abandono divino e julgamento sobre a terra, a nomeação de um rei humano é um elemento fundamental, senão o ápice da normalização do relacionamento entre uma divindade e sua terra/povo (para textos e discussão, ver Block, The Gods o f the Nations, 134-48). Assim a expectativa de Ezequiel com relação a um novo rei (messiânico) para governar seu povo era igualmente compreensível tanto para um israelita da antigüidade como para um estrangeiro. Enquanto as visões messiânicas de outros profetas tinham a tendência de apresentar um caráter de inclusão, abrangendo povos de outras terras além de Israel, o Messias de Ezequiel é um governante nacional, cujas principais características se refletem em seus títulos e atribuições. Assim como Davi, ele é herdeiro das promessas dinásticas eternas feitas por Javé ao maior de todos os reis de Israel por intermédio do profeta Samuel (2 Samuel 7; cf. Is 9.1-7 [8.23—9.6]; 11.1-5; Jr 5— 6; Os 3.5; Am 9.11; Mq 5.1-4 [4.14— 5.5]). Como 'ahdi, meu servo, ele desfruta um relacionamento especial com Javé. Nesse papel fundamentalmente religioso, ele recebe sua autoridade por indicação divina e não por mérito pessoal ou eleição democrática. Como nãsi", príncipe, líder tribal, ele está à frente do seu povo, não como um monarca tirano, mas como aquele que foi chamado do meio do povo para representá-lo. Como melek, ele é a figura real, simbolizando a nova unidade nacional (góy 'ehãd) sob um rei (melek 'ehãd), ocupando a terra de Israel. Como rô 'eh 'ehãd, um pastor, ele buscará o bem-estar do rebanho, protegendo-o e cuidando dele de acordo com o exemplo do próprio Javé (cap. 34) segundo a antiga provisão mosaica de realeza (Dt 17.14-20). Em todos esses papéis, o messias de Ezequiel simboliza as realidades da nova era. E notável que ele não tenha nenhuma participação na restauração de Israel. Não ajunta seu povo nem os conduz de volta à sua pátria. Além disso, ao contrário de outros profetas, Ezequiel não faz nenhuma menção do Messias como um agente de paz (Is 9.6-7 [9.5-6]; 11.6-9; Jr 23.6; Mq 5.5; Zc 9.9-10) ou de justiça (Is 9.5-6; 11.2-5; Jr 23.5-6; cf. A. Moenikes, 289-306). Ezequiel atribui estas à atuação direta de Deus. Porém, a presença pessoal do Messias simboliza o reinado de Javé nessa nova e gloriosa era. 633
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O nãsi', na última visão de Ezequiel (caps. 40— 48) é uma figura enigmática (para o privilégios e responsabilidades do n ã si’ na nova ordem de Ezequiel, ver 44.3; 45.7-8; 45.21 — 46.12; 48.21). Trata-se claramente de uma figura em posição elevada, muito mais importante do que os “príncipes” do período anterior à monarquia. Contudo, o relato da visão não apenas omite qualquer relação com Davi, como também Sião/Jerusalém parecem não fazer parte do cenário. Aliás, o príncipe e sua terra encontram-se deliberadamente separados da cidade cha mada de “O Senhor Está Ali” (Ez 48.35) e do templo, a verdadeira habitação de Javé. Além disso, não apenas a autoridade do n ã si’ é vinculada à terra de Israel (não constituindo um go verno cósmico), mas também seus direitos são rigorosamente limitados. Javé pode autorizá-lo a comer perante ele na porta oriental, mas, como mortal, ele deve entrar por outro caminho pois a entrada oriental é reservada a Javé. A questão mais problemática é que o realismo da descrição do príncipe contrasta nitidamente com o retrato gloriosamente idealista do Messias em 34.23-24 e 37.21-25. Não apenas deve-se oferecer sacrifícios por ele, como também há normas específicas advertindo-o a não explorar nem abusar de seus súditos como os reis de Israel haviam feito no passado (Ez 46.18). Ao que parece, uma das chaves para compreender-se o significado de nãsi' em Eze quiel 40— 48 é reconhecer a mudança de gênero que ocorre entre os oráculos de restauração anteriores (o cap. 34 é um verdadeiro oráculo de salvação, enquanto 37.15-28 é um ato simbó lico interpretado) e a visão final idealista. Enquanto os primeiros encontram-se intimamente ligados à história, antevendo uma inversão completa dos acontecimentos relacionados à que da de Jerusalém em 586 a. C., o último é imaginário, conceituai e simbólico e várias de suas características são impensáveis (cf. os comentários introdutórios aos caps. 40— 48 em Block, Ezekiel). Ao contrário da opinião popular, a descrição do templo não é apresentada como uma planta para uma futura construção feita por mãos humanas. Essa visão trata do tema da presença divina anunciada em 37.26-27 e descreve a realidade espiritual em termos concretos, empre gando as expressões culturais conhecidas: templo, altar, sacrifícios, n ãsi’e terra. Ao apresentar essa constituição teológica para a nova Israel, Javé anuncia a reparação de todas as injustiças e o estabelecimento de relacionamentos saudáveis entre divindade, nação e terra. A visão final de Ezequiel apresenta um ideal elevado: Onde Deus está, ali é Sião. Onde Deus está, também há ordem e cumprimento de todas as suas promessas. Além disso, a principal preocupação dessa visão não é de cunho político, mas sim cultuai. A questão central não é a volta de Davi, mas a presença de Javé. Desse modo, o n ã si’desempe nha uma função facilitadora e não regiamente simbólica. Ao contrário dos reis do passado, que perverteram a adoração a Javé por interesses egoístas ou ao apoiar a adoração de outros deuses, a incumbência desse n ãsi'é promover a adoração a Javé em espírito e em verdade. Nessa visão (e somente nela), com seu retrato radicalmente teocêntrico do futuro de Israel, o nãsi' aparece como um funcionário religioso, servindo a comunidade santa da fé que, por sua vez concentrase na adoração do Deus que habita no meio dela. O nãsi’ não é responsável pela administra ção do culto. Não apenas ele não participa ativamente do ritual, como também não constrói o templo, não planeja o culto nem nomeia sacerdotes pois essas prerrogativas pertencem a Javé. Isso encontra-se de acordo com a imagem de n ã si’ em Ezequiel 34.23-24, que é investido do cargo de pastor adjunto de Javé somente depois que este último resgatou Israel pessoalmente (cf. Duguid, 50-55). Nessa apresentação ideológica, o nãsi’ atua como benfeitor e patrono do culto, aquele cuja atividade garante a continuidade de Sãlôm entre a divindade e os súditos. O Deus de Israel cumpriu as promessas da aliança, reunindo seu povo e restaurando-o à terra. Mais importante do que isso, porém, é ter chamado seu povo novamente para junto de si e fixado residência em meio a esse povo. Que o povo, então, comemore e que o nã si’ o conduza! 634
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B ib l io g r a f ia
L. Allen, Ezekiel 1-19, 1994; idem, Ezekiel 20-48, 1990; D. 1. Block, The Gods o f the Nations: Studies in Ancient Near Eastem National Theology, 1988; idem, ‘T he Prophet o f the Spirit: The Use of RWH in the Book o f Ezekiel”, JETS 32, 1989,27-49; idem, “Ezekiefs Vision o f Death and Afterlife”, BBR 2, 1992, 113-42; idem, The Book o f Ezekiel, 1996; idem, “Bringing Back David: EzekiePs Messianic Hope”, The Lords Anointed, 1995, 167-88; K. W. Carley, Ezekiel Among the Prophets, 1974; L. E. Cooper, Ezekiel, 1994; I. M. Duguid, Ezekiel and the Leaders o f Israel, 1994,50-55; W. Eichrodt, Ezekiel: A Commentary, 1970; M. Greenberg, Ezekiel 1-20, 1983; A. Hoekema, “Amillennialism”, in The Meaning o f the Millennium: Four Views, ed. R. G. Clouse, 1977; P. Joyce, Divine Initiative and Human Response in Ezekiel, 1989; R. Klein, Ezekiel, 1988; W. W. Klein, C. L. Blomberg, R. L. Hubbard, Introduction to Biblical Interpretation, 1993; J. D. Levenson. Theology o f the Program o f Restoration o f Ezekiel 40-48, 1976; J. G. McConville, Grace in the End: A Study in Deuteronomic Theology, 1993; A. Moenikes, “Messianismus im Alten Testament (vorapokalyptische Zeit)”, ZRGG 40, 1988, 289-306; J. N. Oswalt, The Book o f Isaiah Chapters 1-29, NICOT, 1986; W. Zimmerli, Ezekiel 1, 1979; idem, Ezekiel 2, 1983. Daniel I. Block D. Temas teológicos Em 1913, G. B. Gray (Criticai Introduction to the OT, 198) declarou, “Nenhum outro livro do AT é caracterizado por sinais tão claros de integridade e unidade em sua autoria”. Em 1924, porém, G. Hõlscher (Hesekiel) apresentou o livro como uma pseudepígrafe da qual so mente 14 por cento consistia de palavras do próprio profeta. Desde então, há uma grande varie dade de opiniões da parte dos estudiosos, apesar de estas terem sido influenciadas em tempos mais recentes pelo excelente comentário de W. Zimmerli (1955,1968, ET) e sua conclusão de que, apesar de haver alguns acréscimos ao longo de toda a obra, cada uma das seções do livro possui um núcleo original constituído pelos ensinamentos do próprio Ezequiel. Além disso, mesmo quando tais acréscimos são perceptíveis, é possível que, em alguns casos, o material tenha sido acrescentado pelo próprio profeta, apesar de Zimmerli propor a existência de uma “escola de Ezequiel” para explicar partes posteriores do processo. Em termos gerais, esses acréscimos podem ser considerados aplicações do profeta a épocas subseqüentes e, particular mente, ao período imediatamente anterior à volta do exílio. Porém, Zimmerli detecta diferenças significativas de perspectiva teológica, especialmente com referência à importância conferida aos sacerdotes da linhagem de Zadoque, os quais são apresentados de maneira que não pode ser facilmente conciliada com o conceito de pecado e graça do profeta. Somente em 1989 uma obra de proporções comparáveis ao comentário de Zimmerli desafiou, de fato, a posição dele (T. Krüger, Geschichtskonzepte im Ezechielbuch), fazendo-o, em particular, com a sugestão de que a apresentação histórica no cap. 20 (apontando para uma futura restauração) difere pronun ciadamente da apresentação nos caps. 5, 16 e 23. Mas é discutível se R. J. Coggins (“Recent Continent OT Literature,” ExpTim, 101, n. 12, 1990, 364) está certo ao considerar Krüger o precursor de uma fase pós-Zimmerli de estudos sobre Ezequiel. Outra área importante da discussão crítica é a afirmação de que Ezequiel nunca esteve na Babilônia (ou que esteve lá somente durante uma parte de sua carreira como profeta). W. H. Brownlee, por exemplo, argumenta em favor de Gilgal como o local onde Ezequiel reali zou grande parte de suas atividades. Além de não ser plausível que o livro bíblico tenha rea lizado tamanha distorção dos fatos básicos, Zimmerli é capaz de mostrar por meio de evidên cias detalhadas que o esboço do livro é proveniente do exílio, fato este que tem implicações 635
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importantes para a perspectiva teológica do livro. Aquilo que se segue, portanto, está baseado na compreensão de que a motivação teológica central do livro de Ezequiel vem de um profeta com esse nome que foi levado para a Babilônia em 597 a. C. e que qualquer acréscimo tem a função de aplicar a mensagem de Ezequiel à experiência corporativa de Israel à medida que esta se desenvolveu, contribuindo deste modo para sua configuração canônica final. 1. Ezequiel esua concepção cie Deus. O livro é sustentado por três pilares que consistem de três visões em datas definidas, conferindo à obra uma coerência geral (Ez 1.1; 8.1; 40.1). Essas visões encontram-se claramente relacionadas: a segunda à primeira (8.4) e a terceira à primeira e à segunda. Esta última relação é confirmada por uma declaração explícita (43.3) e pela correspondência entre o (rápido) regresso da glória de Deus à Jerusalém (43.2) e a maneira (relutante) como ela partiu (11.23). O conceito de glória, proveniente das idéias cultuais da presença de Deus no templo, re flete a experiência anterior de Ezequiel como sacerdote, o que também pode ser visto na ênfase que ele dá aos pecados cultuais (em vez de ressaltar questões éticas mais gerais), no estilo de seus ensinamentos (semelhantes à lei sagrada) (cf. Ez 14.4 com Lv 17.5 e ver Zimmerli 1:302) e em expressões como “levarão sobre si a sua iniqüidade” (Ez 14.10). As circunstâncias do exílio que, para os exilados representou não apenas serem banidos de sua pátria mas também exclu ídos da presença de Deus, constituem um pano de fundo sombrio para o brilho intenso dessa visão e enfatiza a iniciativa que Deus toma de revelar-se a si mesmo. Quer seja pelo julgamento ou pela misericórdia, Deus está determinado a se fazer conhecido. Observe-se a expressão de reconhecimento repetida muitas vezes (“saberão que eu sou o Senhor”, 7.4,27, etc.). O formato da primeira visão corresponde, em parte, à visão anterior recebida por Isaías (Is 6 .1). Mas enquanto aquela estava intimamente ligada ao templo de Jerusalém, um elemento importante do retrato de Deus apresentando por Ezequiel é a onipresença e onisciência de Deus, simbolizadas por rodas e olhos (Ez 1.15) (ver O. Procksh, “Die Berufungvision Hesekiels,” in FS Budde, 1920, 141). Deus não cra inacessível e nem indiferente para com seu povo na Babilônia. O leão, o urso e o leopardo representam o Sul, o Norte e o Leste na geografia as tral babilônia (cf. E. Bickermann, Four S/range Books, 1967, 102). Também é possível que os animais tenham sido introduzidos para indicar a soberania de Deus sobre as nações, enquanto a forma geral da visão em si talvez tivesse a intenção de se opor à representação extravagante das divindades babilônias, especialmente Nabu, cuja função era escrever nas tábuas do destino (Is 46.1; C. R. North, The Second Isaiah, 1964, 163). Qualquer que seja a psicologia das visões de Ezequiel, elas significam que Deus se revela no processo da história, especialmente no julgamento (expressado na destruição de Jerusalém, predominante na primeira parte do livro) seguido da esperança de reconstrução (predominante na segunda parte). Isso ajuda a explicar a importância da palavra de Deus, con siderada quase uma entidade objetiva com seus próprios poderes (O. Grether, Name und Wort Gottes im Alten Testament, 1934, 150), que permite ao mensageiro de Deus interpretar-lhe a atividade (Ez 3.16). 2. Pecado. Dois problemas são destacados nessa área da mensagem de Ezequiel: a. por que Jerusalém, objeto do favor de Deus, teve de sofrer as humilhações que lhe sobrevieram naqueles anos? e b. por que não havia esperança algumas para aqueles que tinham sido dei xados na cidade depois do primeiro exílio em 597 a. C. A condenação dos pecados nacionais pelo profeta não tinha como objetivo apenas explicar o que já havia acontecido, mas também desencorajar qualquer idéia de que uma futura reconstituição poderia ocorrer sem que houves sem mudanças radicais. A apresentação dessas acusações encontra-se principalmente nos dois capítulos (Eze quiel 16; 23) que retratam o pecado de Israel como a infidelidade de uma mulher para com o 636
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marido. Nessa abordagem, Ezequiel segue as mesmas linhas empregadas por Oséias e Jeremias. O caráter hediondo dessa prostituição encontra-se na ingratidão de Israel diante do tratamento bondoso que recebeu de Deus e expressava-se tanto no âmbito religioso quanto nas alianças políticas. Práticas pagãs eram aceitas no templo de Jerusalém, adornos sagrados eram trans formados em objetos de adoração de falsos deuses aos quais eram oferecidas crianças como sacrifícios (16.17-21). Mas aos olhos de Ezequiel, as alianças estrangeiras também eram consi deradas prostituição, em parte porque refletiam uma confiança inadequada no Deus verdadeiro e em parte, porque juramentos idólatras costumavam fazer parte dos tratados que selavam tais alianças. O rompimento da aliança feita em nome de Javé também é levado a sério ( 17.16). O cap. 23 trata particularmente do fato de que Jerusalém não deu atenção ao destino de Samaria, que já havia sofrido o julgamento de Deus pelas mãos da Assíria (722 a. C.). A gravidade desse pecado é acrescida de uma revelação terrível: os atos mais repugnantes de idolatria eram realizados no coração do templo por aqueles que eram líderes da comunidade (Ez 8.9). Um elemento característico de Ezequiel é a ênfase no fato de que esse problema não era nada recente, pois ao contrário de Jeremias (Jr 2.1-3), Ezequiel não deixou espaço algum para a idéia de Oséias de um período idílico no deserto (Os 2.15). A idolatria de Israel teve origem no Egito e o que ocorreu naquela terra serviu de modelo para os “flertes” com o Egito nos dias de Ezequiel (W. Eichrodt, Ezekiel, ET 1970, 323). Nenhuma comparação chocante poderia ser mais violenta do que a acusação de que o pecado de Jerusalém fez a iniqüidade de Sodoma parecer branda (Ez 16.44-52). Apesar de tudo, Ezequiel teve de combater o otimismo complacente daqueles que foram deixados em Jerusalém depois de 597 a. C. “Esta cidade é a panela, e nós, a carne” (Ez 11.3) é uma expressão que provavelmente significa “Não importa o que fizermos, tudo dará certo” . Uma teologia judaica desse tipo é repudiada em 33.23-26, em que aqueles que ficaram para trás tiveram a audácia de se comparar com Abraão, imaginando que eram herdeiros da promessa e da terra. Em resposta a eles, o profeta apresenta uma profecia de devastação (vv. 27-29). 3. Julgamento. O julgamento divino era um tema comum entre os profetas de Israel. Ma no tocante à Jerusalém, tanto Isaías quanto Ezequiel desenvolveram seus ministérios durante o cumprimento dessa ameaça. A iminência do julgamento é ressaltada, desmentindo aqueles que imaginavam que, se de fato o julgamento ocorresse, não seria logo (Ez 12.22-27). Vê-se uma série de características recorrentes que acompanham a tragédia militar: fome e peste, fogo e es pada, a dispersão dos sobreviventes, quer pela fuga ou pelo exílio e o reaparecimento das feras do campo. O fato de que tudo isso constitui um julgamento divino fica claro na visão dos sete anjos (9.2) e na forma como o relato sobre a complacência da cidade encontra-se interposto a dois estádios da partida da gloria de Deus (10.19; 11.23). Ezequiel inverteu a guerra santa ao retratar Deus agindo contra o próprio povo (Eichrodt, TOT, 2.329). Esse julgamento foi con siderado um amadurecimento (7.10) que não podia ser impedido pela intervenção de homens justos. O próprio Ezequiel intercedeu, mas de nada adiantou (9.8-11). Nem mesmo a presença dos modelos de perfeição do passado — Noé, Daniel e Jó — poderia ter poupado Jerusalém (14.14). É possível que nessa passagem se encontre um reflexo do erro do rei Zedequias que considerou a presença de Jeremias uma espécie de apólice de seguro. O papel do profeta tam bém não é pedagógico (contrastar J. Hempel, Ethos des AT, 110 com L. Kõhler, Theologie des AT, 1936, 212-13) e não havia a possibilidade de dar ouvidos às advertências dele. Antes, a função do profeta era diagnostica. É preciso tratar com cuidado a questão da presença (ou ausência) de uma teologia do remanescente em Ezequiel. Por um lado, o profeta pode ter dito que o remanescente seria dis persado (Ez 5.9-10; cf. 9.8; 11.13). Também pode ter rejeitado completamente a idéia de um 637
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remanescente (15.7). Por outro lado, ele deixou espaço para a possibilidade de salvação indi vidual, pois sabia da existência de pessoas fiéis na cidade: sua visão fala de um sinal (a letra tãw) a ser colocado na testa daqueles que lamentavam o pecado (9.4); a idéia de que, em última análise, alguém sofreria injustamente é anátema (18.1-32). A solução estava em reconhecer que não seria um remanescente justo que receberia a salvação, mas sim, um remanescente que reconhecia a própria iniqüidade. Também não se tratava simplesmente da continuidade de Is rael, como havia se pensado (sem nenhum realismo) no reino do Sul depois da destruição de Samaria (M. Greenberg, 140-41, 177). Apesar de Ezequiel pregar o julgamento com rigor inigualável, essa severidade era contrabalançada pela exposição das garantias divinas de restauração feita por ele. O papel do profeta como atalaia e a expressão de reconhecimento estavam relacionados tanto à ameaça quanto à promessa. Por vezes, o julgamento era visto como uma espécie de “preparação” (Ez 20.35-36), porém era mais característico ser considerado um preâmbulo para a nova obra de Deus: não podia haver ressurreição sem morte. A extensa seção sobre as nações (caps. 25— 32) não é apenas um interlúdio ou um acréscimo irrelevante. Antes, cumpre dois propósitos. Um deles é deixar claro que não poderia haver paz verdadeira para a nova Israel, a não ser que ocorresse um acerto de contas com as nações vizinhas. O mais importante, porém, é que as sete nações simbolizavam todas as nações do mundo e, portanto, essa seção proclama a mensagem de que toda atividade política está su jeita à justiça perfeita e final das mãos do Deus soberano. Foi observado que a Babilônia não é uma das sete nações mencionadas. E evidente que ela não escaparia (cf. Is 46), mas naquele momento, a Babilônia era considerada a vara e não a vítima da ira de Deus. 4. Esperança para ofaturo. Para os ouvintes de Ezequiel, a notícia da queda de Jerusa em 586 a. C. foi a gota d’água e, para o profeta, foi o chamado para dar início a uma nova fase de seu ministério, concluindo assim um período de silêncio. Suas profecias de esperança, que começam no cap. 34, são separadas da seção seguinte pela passagem de Gogue e Magogue (caps. 38—39) e a seção final é dedicada inteiramente à visão do novo templo (caps. 40— 48). Tendo como objetivo a vindicação do nome de Deus tanto no meio do seu próprio povo (observe-se o uso freqüente da expressão “para que saibais que eu sou o Senhor vosso Deus” [Ez 20.20; etc.]) como entre os vizinhos desdenhosos (36.37-38), a restauração antevista não é uma resposta a uma mudança do coração dos israelitas, ainda que isso seja o resultado dela. A necessidade de um novo coração é fundamental para a esperança de Ezequiel. Ele havia ob tido esse conceito de Jeremias (Jr 31.33), juntamente com a idéia de uma nova aliança, que também tem um papel relevante na concepção de Ezequiel acerca do futuro (Ez 34.25; 37.26). Outro tema importante é o de um novo rei. Há muito tempo, a liderança era um problema sé rio em Israel, resultante da insistência de vários monarcas de usar sua posição de responsa bilidade em beneficio próprio. O governante davídico esperado, pelo contrário, apascentaria seu rebanho e não a si mesmo (34.23). O termo comum para rei (melek) aparece apenas duas vezes (37.22, 24) e isso, num contexto em que ficam claros os seus indícios de opressão. O termo usado normalmente é nãsi' (príncipe; p. ex., 34.24). Von Rad (204) mostrou que o go vernante davídico tem uma presença discreta em Ezequiel e que se pode encontrar a mesma fusão do cumprimento da aliança com Davi e da aliança com Israel que também aparece em Isaías 55.3. Um povo renovado surgirá, purificado dos pecados e da idolatria do passado (Ez 36.25) e multiplicando-se como um rebanho produtivo (36.37-38). A ênfase não recai apenas no reavivamento (37.6), mas também na união de Judá e Israel (vv. 15-23). Apropria terra será renovada: protegida dos animais selvagens (34.25), fértil (v. 27) e livre dos ataques de vizinhos hostis, especialmente de Edom (Ez 35.1-15). 638
Ezequiel: Teologia de
O ataque de Gogue (38.1— 39.29) é um exemplo de escrito apocalíptico, com uma ba talha envolvendo a intervenção sobrenatural no fim dos tempos e, expressivamente, depois da vinda do governante davídico. É impossível determinar a procedência geográfica de Gogue e Magogue, apesar de a identificação de Gômer (38.6) com os cimerianos indicar que Ezequiel transpôs para o fim dos tempos a ameaça do Norte — com suas constantes erupções na história do Oriente Médio — de modo a representar os poderes do mal em geral. A derrota de Gogue e Magogue anuncia o estabelecimento final da paz e harmonia simbolizadas pela visão do tem plo nos capítulos de encerramento (40— 48). Suspeita-se de que é nessa conclusão do livro que tenham sido feitos os acréscimos mais extensos aos escritos do profeta, refletindo uma situação que se seguiu imediatamente ao retomo do exílio, quando questões sobre o sacerdócio na comunidade recém-constituída adquiriram uma relevância bastante prática. Aliás, é um fato histórico que os zadoquitas se estabeleceram como casta sacerdotal governante depois do exílio. Ezequiel lhes atribui uma posição superior à dos levitas (44.6-31). Isso pode indicar que foram os zadoquitas que criaram um ambiente favorável no qual o livro foi transmitido e, até certo ponto, editado. Por outro lado, é provável que a visão do templo, cuja concepção é muito mais coerente com a versão salomônica do que com aquela que foi construída depois da restauração, tenha se consolida do em sua forma literária num estádio relativamente inicial e que não tenha sofrido alterações posteriores significativas. O tema que mais impressiona nessa passagem é a presença permanente de Deus (assim como sua partida havia sido o aspecto mais trágico do julgamento apresentado anteriormen te). A função do guia angelical com sua vara de medir é mostrar uma simetria que simboliza a perfeição do plano final de Deus. Correspondendo a isso, vê-se uma completa harmonia na atividade humana associada ao novo templo, na distribuição ordenada de privilégios e deveres do povo de Deus. O fato de ser um templo que proporciona esse epítome de perfeição é algo que sublinha a importância da adoração, e vale a pena observar-se que Ezequiel não exclui nenhum estrangeiro (47.22-23). É significativo que, ao transmudar o retrato de um rio fluindo do templo (cap. 47), o escritor de Apocalipse fala de árvores nas margens produzindo folhas para a cura dos povos (Ap 22.1 -2). E. Contexto canônico Uma pesquisa cuidadosa das fontes usadas por Ezequiel revela duas principais áreas de tradição representadas em outras partes do AT. Em primeiro lugar existe, sem dúvida, uma relação com as profecias anteriores. Nesse caso, é importante observar-se as ligações não apenas com Oséias e Jeremias, mencionadas acima, mas também com o material bíblico rela cionado a Elias e Eliseu. Sem dúvida, a oposição à idolatria é uma questão importante nessa área, porém mais notáveis ainda são os reflexos dos retratos bíblicos desses profetas, com seus discípulos assentados diante deles (2Rs 2.3; cf. Is 8.16), seus poderes de clarividência e o uso da expressão “a mão do Senhor”. Zimmerli (1:248) sugere que aqueles que lamentaram e cho raram pelas abominações em Jerusalém, quer fossem zadoquitas fiéis que ficaram na cidade, quer fossem aqueles que se reuniram ao redor de Jeremias, foram considerados um reflexo do remanescente em 1 Reis 19.15-17. A segunda ligação importante com outros materiais bíblicos envolve o Código de San tidade (Levítico 17—26). Apesar de haver diversos paralelos próximos, não se sabe ao certo como funcionava essa relação. Uma vez que não há provas convincentes de dependência nem de uma parte, nem de outra, a conclusão pode ser que tanto Ezequiel quanto o escritor do material sacerdotal no Pent. lançaram mão de fontes em comum ou interrelacionadas (ver Zimmerli). 639
Ezequiel: Teologia de
Num trabalho de pesquisa inédito (1990), H. McKeating chama a atenção para os fortes parale los entre a apresentação de Moisés no Pent. e no Livro de Ezequiel, particularmente nos caps. 40— 48, levando-nos a pensar se aqueles que foram responsáveis pela forma final do livro não viam Ezequiel como o profeta semelhante a Moisés (Dt 18.15). Levenson (38) comenta sobre a rivalidade peculiar entre Moisés e Ezequiel 40— 48, em que Ezequiel aparece quase como um “novo Moisés” (cf. Blekinsopp, 194-207). Até agora, deu-se pouca atenção ao papel importante desempenhado por Ezequiel na formação da visão de mundo do escritor de Daniel. A intimidade que este último possuía com aquilo que representava uma parte substancial do cânon das Escrituras do AT, então em seu processo de consolidação, fica clara em várias reminiscências verbais de pouca relevância teológica. A des crição das experiências visionárias de Daniel segue fielmente o modelo das teofanias no livro de Ezequiel. Mais importante ainda é a forma como a situação pressuposta em Daniel espelha o cenário dos exilados oprimidos, permitindo desse modo que o escritor veja que a mesma esperança na soberania de Deus, que Ezequiel pregou para os seus companheiros de exílio, encontra-se à disposição de seus leitores também. Esse tema é ilustrado pela representação das potências mundiais como animais enfurecidos, porém ainda assim sob o controle de Deus (Dn 7.3; cf. Ez 29.3). Os comentários de A. Lacocque sobre a mensagem integral dos escritos apocalípticos judaicos, a qual indica que quando o homem tem de escolher a morte, somente Deus pode transformá-la em vida (The Book o f Daniel, ET, 1979, 118). Ele vê os homens na fornalha crematória de Nabucodonosor como um retrato dos mártires que sofreram sob Antíoco Epifãnio e relaciona essa história a Ezequiel 37 (70). A luz do parágrafo anterior, não é de se surpreender que as referências mais extensas a Ezequiel no NT encontram-se no livro de Apocalipse no qual surgiu, com o início da perseguição de Nero aos cristãos (entre outras coisas, ele os queimou para usá-los como postes de iluminação numa festa em seu jardim), uma situação semelhante em princípio àquela dos judeus no tempo de Antíoco Epitânio. Muitas das alusões a Ezequiel em Apocalipse têm uma ponte em Daniel. Mas isso nem sempre acontece. Aliás, a própria estrutura de Apocalipse pode estar diretamen te ligada a Ezequiel, uma vez que começa com uma visão de Cristo baseada em conceitos de Ezequiel (Ap 1.13) e termina com a descrição contrastante da Babilônia de Roma (Ap 16.19) com a nova Jerusalém, na mesma linha da inspeção que Ezequiel fez do templo reconstruído, enquanto era guiado pelo anjo (A. Farrer, A Rebiríh oflm ages, 1949, 130). O Evangelho de João também mostra uma dependência considerável de conceitos arrai gados em Ezequiel. Alguns desses casos, como o Verbo (Jo 1.1; cf. Ez 6.1), a videira (Jo 15.1-8; cf. Ez 15.1-5); a noiva (Jo 3.29; cf. Ez 16.8) e a paz (Jo 14.27; cf. Ez 37.26) também podem ser identificados com outras fontes do AT. Mas o uso que João faz do termo sinal (contrastar Jo 4.48, 54) possui claramente raízes em Ezequiel (4.3). A justaposição de água e espírito (Jo 3.5) também é esclarecida por Ezequiel 36.25-27, como também são as passagens de João 6.63 e 20.22 pelos ensinamentos de Ezequiel em 37.11-14 sobre o Espírito como a fonte de Vida. E, apesar de a idéia de Bom Pastor (Jo 10.11) ter mais de uma fonte dentro das Escrituras, o uso crítico da palavra um (Jo 10.16) liga essa referência especificamente a Ezequiel 37.24. E raro encontrarem-se reminiscências verbais de Ezequiel em outras passagens do NT. Nas passagens em que elas existem, tendem a ser usadas de tal modo que representam a herança de termos comuns a toda a linguagem profética. Por outro lado, enquanto Ezequiel 37 emprega a idéia de ressurreição de maneira explicitamente metafórica (v. 12), esse capítulo proporciona um modelo de importância vital para a doutrina desenvolvida do NT e é bem possível que o conceito missionário resumido em Atos 1.8 deva muito ao rio de água vivificadora que nasce no templo restaurado (Ez 47.1). Também é provável que a idéia de Anticristo, conforme este 640
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é retratado em 2 Tessalonicenses 2, bem como a descrição da morte como “o último inimigo” (ICo 15.26) sejam conceitos formados com base em Ezequiel 38— 39 (J. B. Job, God's Watchman in Babylon, 78-80). Concluindo: apesar de os ensinamentos de Ezequiel terem como público original uma comunidade e de terem sido, igualmente, apreciados e conservados por uma comunidade, os últimos estádios do processo editorial que moldou o cânon do AT revelam uma preocupação com a influência sobre o leitor como indivíduo. Ezequiel é visto muitas vezes como aquele que introduziu uma tendência individualista na teologia do AT, particularmente à luz do cap. 18. Na verdade, essa evolução já se encontra presente na concepção de Jeremias da nova aliança (Jr 31.29-30). Ainda assim, é importante perceber que o diagnóstico arrasador do pecado, o caráter inevitável do julgamento de Deus sobre ele e a esperança que se encontra além do desespero das soluções humanas são realidades que podem ser aplicadas à situação de todo leitor, bem como à dos primeiros ouvintes da mensagem e às diferentes comunidades de Deus ao longo das eras. Sob essa ótica, a destruição de Jerusalém, o eixo em tomo do qual gira o livro de Ezequiel, corresponde à agonia antes da morte do velho homem (Rm 7.4, 9, 13). A volta dos exilados é considerada por Ezequiel como uma ressurreição dos mortos, como também o é o conceito de regeneração de Paulo (Ef 2.5). O templo reconstruído pode ser visto não apenas como um modelo para os novos céus e a nova terra, mas também para a nova criatura em Cristo, cujos sacrifícios não são mais as ofertas literais de animais em altares, mas a consagração do próprio corpo vivo de Cristo durante sua existência aqui na terra (Rm 12.1) e, por fim, os louvores a ações de graça diante do trono na cidade celestial (Ap 22.3). B i b l k k ;k a h a
P. R. Ackroyd, Exile and Restoration, 1968, 103-17; J. Blenkinsopp, A History o f Prophecy in Israel, 1984, 193-207; W. H. Brownlee, Ezekiel 1-19, 1986; K. W. Carley, Ezekiel Among the Prophets, 1975; R. E. Clements, “The Ezekiel Tradition”, in Israel 's Prophetic Tradition, ed. Coggins, 1982, 119-36; G. A. Cooke, The Book o f Ezekiel, 1936; E. F. Davis, Swallonwing the Scroll: Textuality and the Dynamics o f Discourse in Ezekiel s Prophecy, 1989; W. Eichrodt, Ezekiel: A Commentary; 1970; M. Grenberg, Ezekiel 1-20, 1983; J. B. Job, God's Watchman in Babylon, 1983; P. Joyce, Divine Initiative and Human Response in Ezekiel, 1989; J. D. Levenson, Theology o f the Program o f Restoration o f Ezekiel 40-48, 1976; B. Lindars, “ Ezekiel and Individual Responsibility”, VT 15, 1965, 452-67; T. M. Raitt, A Theology o f Exile, 1977; H. H. Rowley, “The Book of Ezekiel in Modem Study”, in Meno f God,1963, 169-210; G. von Rad, The Message, ET, 1968, 189-205; J. Wevers, Ezekiel, 1969; W. Zimmerli, Ezekiel 1, ET, 1979; idem, “The Special Form and Tradition-Historical Character o f EzekiePs Prophecy”, VT 15, 1965,515-27. J. B. Job Faca -> # 4408 (ma ’akelet, faca de açougueiro) Faixa -> # 4457 (migbã ‘â, tiara) Fala -> # 1819 (dbr 11, falar, ameaçar, prometer, ordenar) Falsidade -> # 3942 (kãzãb, falsidade, engano) Falta
# 2893 (hsr, diminuir, decrescer, faltar, privar) 641
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Família -> # 5476 (mispãhâ, [subjdivisão, espécie) Fantasma -> # 356 (
fantasma, fantasmas dos mortos, espíritos)
Fardo -> # 6022 (sò/, carregar, levar um fardo) Fatigado
# 4206 (/ 'A 1, ficar cansado)
Favorecimento -> # 2858 (Ann I, favorecer, ser bondoso com) Febre -> # 7707 (qaddahaí, febre) Fechamento
# 6037 (srg I, cerrar, fechar, abandonar)
Fedor -> # 944 (6 s, feder, tomar-se repulsivo) Feitiçaria -> # 3088 (heres I, magia, feitiçaria) Feiticeiro
# 200 ( ’ôb II, feiticeiro, necromante, adivinho)
Feito -> # 7188 (p7, fazer, produzir, praticar, desempenhar) Felicidade -> # 887 ( ’í r II, ser/tomar feliz, abençoado) Fenda -> # 2511 (hãgú, refúgio, fenda) Ferida
# 4421 (m ’r, estar dolorido)
Ferimento -> # 2467 (habbúrâ, ferimento) Fermentação -> # 2813 (/j/nr III, estar em fermentação, estar aquecido, incandescer) Ferro -> # 1366 (barzel, ferro) Fervura, cozimento
# 1418 (tá/, ferver, cozinhar)
Festa -> # 2504 (Aag, procissão, dança em círculo, festival, festa) Festival -> # 2504 (Ziag, procissão, dança de roda, festival, festa) Fiação -> # 755 ( Vg, fiar, tecer) Fiação -> # 755 ( Vy, fiar, tecer) Fidelidade -> # 586 ( ’m/j I, apoiar; ser fiel, crer, depositar confiança em) Fígado -> # 3879 (kãbêd, fígado) 642
Filisteus
Figo -> # 9300 (^'ê n á , figo) Filha -¥ # 1426 (bat I, filha, neta) Filho -> # 1201 (bên I, filho, neto, membro de um grupo)
AT Os filisteus foram os principais adversários de Israel durante o período dos Juizes e no início da mo narquia. Em Juizes, aparecem juntamente com os amonitas (Jz 10.6-7), como povos cuja reli gião tomou-se uma armadilha para os israelitas e nas mãos dos quais Javé entregou seu povo a fim de castigá-lo. Nos séculos seguintes, a história de Israel foi dominada pelos conflitos com os filisteus. 1. Origens. O nome filisteus (pPlistim) ocorre 288x no AT e o termo Filístia, 8x. E desses termos que vem a designação moderna “Palestina”, apesar de sua derivação original ou signifi cado ser desconhecido. Em nossa língua moderna, “filisteu” adquiriu o significado figurativo de alguém de espírito vulgar e estreito. Ao que parece, os filisteus originaram-se das ilhas e litoral do mar Egeu, como, p. ex., a ilha de Creta. Em Ezequiel 25.15-16 e Sofonias 2.4-5, a palavra “queretita” (ou seja, cretense) ocorre em paralelismo poético com filisteus. Em Jeremias 47.4 e Amós 9.7, os filisteus são associados especificamente com “Caftor”, uma palavra que ocorre em documentos de escri ta cuneiforme de várias línguas como Captara e em textos egípcios como Qeftiu e que pode ser identificada com Creta e suas redondezas. Uma comparação entre Deuteronômio 2.23 e 1 Samuel 30.14 mostra que os habitantes de Caflor devem ser identificados de modo bastante próximo com os queretitas. Amós 9.7 afirma que Javé tirou os filisteus de Caftor da mesma forma como tirou os israelitas do Egito. Isso indica que Caftor talvez não fosse o primeiro lugar de origem dos fi listeus, uma vez que o Egito também não era o primeiro lugar de origem dos israelitas. Essa idéia confere com as informações em Gênesis 10.13-14, com referência aos filisteus serem descendentes dos egípcios pelos filhos de Casluim. E possível que estes tenham sido os ante passados dos filisteus antes de estes últimos irem para Caftor, e que a referencia à origem do Egito seja um reflexo do fato de que os descendentes dos filisteus foram assentados posterior mente em Canaã pelos egípcios sob o domínio de Ramsés III, ou então que saíram do Egito e foram para Caftor. Gênesis 10 associa os filisteus a vários povos da linhagem de Cam, inclusive os ca naneus (Gn 10.6-20) e não aos filhos indo-europeus de Jafé, das ilhas ou regiões litorâneas (10.2-5). Isso indica que os filisteus não eram um só grupo com uma única origem vivendo num único período no Sudoeste de Canaã. Antes, ao que parece, eles eram uma mistura de vá rios povos diferentes, sendo que os filisteus descendentes dos filhos de Casluim eram distintos daqueles que vieram de Caftor. Essa idéia combina com o retrato dos filisteus revelado pelas descobertas arqueológicas. 2. Fontes literárias. Fora da Bíblia, os filisteus aparecem em várias referências impor tantes na literatura egípcia do final da Idade Baixa do Bronze, no período dos juizes bíblicos. Foram mencionados pela primeira vez pelo Faraó egípcio Ramsés 111(1184-1153 a. C.), que em seu oitavo ano de reinado (1176 a. C.) realizou grandes batalhas por terra e mar entre os egíp cios e gente que chamavam de “povos do mar”. Dentre estes, havia um povo conhecido como os pelesetes, os quais os estudiosos identificam com os filisteus da Bíblia. Foi um tempo de Filisteus
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Filisteus
caos extremo por todo o litoral oriental do Mediterrâneo e os filisteus e outros Povos dos Mares tiveram parte em toda essa enorme conturbação. Ramsés conquistou grandes vitórias sobre os Povos do Mar e, por fim, permitiu que os pelesetes, juntamente com outros grupos, se assentas sem na região sudoeste de Canaã, que era justamente a região onde se encontravam os filisteus dos livros de Juizes e Samuel nos anos subseqüentes (Gn 20.1- 18; 21.22-34; 26.1-33). Os únicos registros escritos de contatos entre os filisteus e Israel são aqueles encontrados na Bíblia. Nenhum outro escrito claramente filisteu sobreviveu e outras referências extrabíblicas aos filisteus não os associam a Israel de nenhuma maneira significativa. 3. Os patriarcas e os filisteus. Os primeiros contatos ocorreram quando Abraão e seu filho Isaque tiveram vários encontros com os filisteus (Gn 20.1-18; 21.22-34; 26.1-33). Em diferentes ocasiões no território filisteu de Gerar, tanto o pai quanto o filho tentaram fazer a esposa se passar por irmã, temendo que o rei filisteu a tomasse para si. Em vez disso, nos dois casos, o rei filisteu agiu de maneira honrada e os episódios terminaram amigavelmente. Mais tarde, surgiram conflitos entre os dois patriarcas e os filisteus com relação a direitos sobre fon tes de água, impasses estes que também foram resolvidos. Vários estudiosos encontraram uma discordância entre os registros arqueológicos que datam a entrada dos filisteus em Canaã em algum momento depois de 1200 a. C. e os registos em Gênesis que mostram o contato deles com os patriarcas israelitas. Porém, diante do que vimos acima com referência às origens dos filisteus. ou seja, que eram um grupo miscigenado, proveniente de diversas regiões em épocas diferentes, não teremos dificuldade em imaginar que os primeiros filisteus nâo tinham nenhuma relação genética com os filisteus posteriores, e que estes, ao entrarem na Palestina, foram assimilados por aqueles (ver Howard, “Philistines”, 237-38). A referência ao “caminho da terra dos filisteus” em Êxodo 13.17 diz respeito aos gru pos de “filisteus” que já se encontravam em Canaã antes do afluxo de outros filisteus para a região depois de 1200 a. C., ou então representa uma “atualização” editorial posterior, usando o nome recente da região, de maneira um tanto análoga ao tipo de atualização feita nos nomes que encontramos em Gênesis 23.2 (o nome mais antigo de Hebrom era Quiriate-Arba) ou em 28.19; 35.6 (o nome mais antigo de Betei era Luz). 4. Os filisteus e a monarquia. Posteriormente, durante o período dos Juizes, os filisteus foram os principais adversários de Israel, e Deus usou-os como instrumentos para provar Israel (Jz 2.6— 3.6). Os filisteus estavam entre as nações pagãs a cujos deuses os israelitas adoraram, às quais Javé entregou seu povo e das quais ele libertou os israelitas (10.6, 7, 11). O maior conflito dos filisteus com Israel ocorreu no tempo em que Sansão era juiz (Jz 14— 16), apesar de o juiz Sangar ter morto 600 filisteus com uma aguilhada de boi (3.31). Ape sar do caráter menos exemplar de Sansão, Deus usou-o para seus propósitos contra os filisteus que, na época, dominavam sobre Israel (13.5; 14.4). Depois de Sansão, não tardou para que os filisteus voltassem a oprimir Israel. Em pou cos anos. já eram, sem dúvida alguma, militarmente superiores aos israelitas, uma hegemonia que durou várias décadas. Entre outras coisas, mantinham o controle da metalurgia e das ar mas (ISm 13.19-21). A primeira luta registrada entre os filisteus e Israel depois de Sansão foi fatídica. Ocor reu na parte Nordeste do território filisteu, entre Afeque e Ebenézer, onde os israelitas foram derrotados e a arca foi capturada (1 Samuel 4). A presença da arca no meio dos filisteus teve um efeito mortal sobre esse povo, e, em reação a isso, a arca foi devolvida aos israelitas de acordo com o conselho de sacerdotes e adivinhadores (caps. 5—6). Ao que parece, os filisteus conheciam a reputação do Deus de Israel, uma vez que referiram-se à sua vitória sobre o Egito no êxodo (6.6) e aos “deuses” que haviam ferido os egípcios com as pragas (4.8). 644
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Samuel, o último juiz israelita, liderou a nação na resistência à outra invasão dos fi listeus em Mispa (ISm 7.7-11). Depois de uma vitória impressionante, a situação na terra foi tranqüilizada e Israel recuperou as cidades e territórios que haviam sido tomados pelos filis teus. Depois disso, o próximo conflito do qual se tem registro entre filisteus e israelitas ocorreu depois que Israel havia pedido e recebido um rei (1 Samuel 13— 14). Jônatas, o filho de Saul, derrotou uma guarnição de filisteus em Geba, perto de sua cidade natal de Gibeá (13.2-4). Em seguida, os filisteus reuniram um exército numeroso, bem equipado e organizado para enfren tar Israel, mas foram derrotados na batalha subseqüente na passagem em Micmás (14.13-23). Na seqüência, Saul teve conflitos constantes com os filisteus em todos os dias restantes de seu reinado (14.52). Israel só ficaria livre deles com o aparecimento de Davi como libertador es colhido por Deus. O primeiro confronto de Davi com os filisteus foi contra Golias, o campeão que safiou Israel a um duelo homem-a-homem no vale de Elá, a oeste de Belém (1 Samuel 17). Davi matou Golias e os filisteus foram derrotados, batendo em retirada para suas cidades de Gate e Ecrom. Como resultado, Davi tomou-se herói em Israel e continuou a ter sucesso contra os fi listeus (ISm 18.20-30; 19.8) em ocasiões posteriores. Durante vários anos, porém esse povo representou uma ameaça para Israel. Davi salvou a cidade de Queila de um ataque filisteu (23.1-5) e, mais tarde, Saul lutou contra os filisteus quando estes atacaram o território israe lita (23.27-28). Em duas ocasiões, Davi fugiu para território filisteu a fim de escapar de Saul (21.10-15; caps. 27, 29). Saul morreu nas mãos dos filisteus (cap. 31) que lhe profanaram o corpo: cortaram-lhe a cabeça, expuseram o corpo na muralha de Bete-Seã e penduraram a ar madura dele no templo da deusa Astarote (31.8-10). Depois disso, Davi continuou a lutar contra os filisteus. Após ter consolidado seu poder e tomado Jerusalém dos jebuseus, Davi sofreu a oposição dos filisteus que o consideraram uma ameaça. Derrotou-os em dois confrontos separados no vale dos Refains (2Sm 5 .17-25). Poste riormente, conseguiu subjugá-los quase de todo, tomando grande parte do território deles (8.1, 12). Na seqüência, os valentes de Davi voltaram a derrotar os filisteus — incluisive quatro de seus gigantes — em vários confrontos (21.15, 18-22). Davi usou mercenários quenitas e peletitas (ou seja, filisteus ou grupos intimamente aliados a eles) e homens de Gate, uma cidade filistéia (2Sm 15.18). Até mesmo um dos fiéis comandantes de Davi era de Gate (15.19-22). A lista dos valentes de Davi comprova as lutas contínuas com os filisteus durante toda a vida desse rei (23.9-16). Com efeito, Davi conseguiu eliminar a ameaça filistéia. A coalizão de cinco cidades — Asdode, Asquelom, Ecrom, Gaza e Gate — foi rompida: menções posteriores de cidades filistéias mostram-nas isoladas e cada uma por conta própria. Os filisteus aparecem como adversários de Ezequias (2Rs 18.8), Josafá (2Cr 17.11), Jeorão (21.16-17), Uzias (26.6-7) e Acaz (28.18), e voltam a ser mencionados ocasionalmente nos registros de reis mesopotâmios e egípcios que invadiram Canaã; no entanto, nunca mais representaram uma força política ou militar importante. 5. Cultura filistéia. Os costumes religiosos dos filisteus podem ser observados ao examinar tanto a Bíblia quanto os registros arqueológicos. Os filisteus possuíam seus próprios deuses, liderados por Dagom, que é mencionado várias vezes na Bíblia: Juizes 16.23-25; 1 Samuel5.1-5; 1 Crônicas 10.10; havia um templo dedicado a ele, no qual a imagem do deus havia sido colocada (ISm 5.2). No entanto, os filisteus não eram os únicos a adorar Dagom; o nome do deus aparece em toda parte e ao longo de todos os períodos no OMA. Astarote era a principal deusa e também tinha seu próprio templo (31.10); era adorada igualmente em outras culturas 645
Filisteus
do OMA. O terceiro principal deus filisteu era Baal-Zebube, o deus de Ecrom (2Rs 1.2, 3, 6, 16), cujo nome significa “senhor das moscas” e não aparece em outras partes do OMA. Porém, é possível que na verdade Baal-Zebube fosse “Baal-Zebul”, uma designação mais honrosa que significa “senhor Baal” ou “senhor da habitação (celestial)” e que “Baal-Zebube” fosse um nome derrisório usado pelos escritores da Bíblia. O NT mantém a forma “Baal-Zebul” (cf. Mt 10.25; 12.24,27; Mc 3.22; Lc 11.15, 18, 19). Foram escavados alguns templos filisteus que apresentam várias características dis tintas que os separam dos templos cananeus. Como a maioria dos povos ao redor deles, os filisteus possuíam adivinhadores e vaticinadores (Is 2.6; cf. Re 1.2). Também foram feitas várias descobertas sobre os utensílios rituais dos filisteus, que permitem entrever um pouco de suas práticas religiosas. Entre esses objetos, encontram-se diversos tipos de cálices de cerâmica, anéis e estatuetas. Até mesmo os ataúdes dos filisteus revelam algum tipo de cons ciência religiosa. Vários filisteus foram sepultados em “ataúdes antropomórficos de barro”, semelhantes a grandes vasilhas de mantimentos e nos quais era colocado o corpo. A terça parte ou metade superior dessa vasilha era removida para que o corpo pudesse ser inserido no recipiente e então encerrado ali quando a parte superior era recolocada. Sobre a região do rosto, uma imagem um tanto tosca e grotesca do rosto do falecido era moldada no barro (ver Howard, 246-49 “Philistines” e referências para mais informações sobre os costumes religiosos dos filisteus). A relevância dos filisteus para Israel se deveu ao poder e influência dos filisteus duran te um período critico da história de Israel: a segunda parte do período dos Juizes e o início da monarquia. Os filisteus foram os principais adversários de Israel, e figuras como Samuel, Saul, Jônatas e Davi tomaram-se célebres por suas vitórias sobre os filisteus. Nos Profetas, os filisteus são um símbolo de perversidade. Normalmente, constituem os objetos da ira de Deus, muitas vezes em contextos escatológicos (p. ex., Is 11.14; Ex 25.15-16; Am 1.6-8; Sf 2.4-5; Zc 9.5-6), mas também aparecem como instrumentos do castigo de Deus sobre Israel (Is 9.12). O profeta Ezequiel chegou a afirmar que o comportamento de Jerusalém era tão abominável que envergonhava até os filisteus (Ez 16.27,57). B ib l io g r a f ia
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# 2932 (hê.y, flecha) # 7255 (prh I, brotar; fazer florescer) # 3623 (ya ‘ar I, floresta, madeira)
Forma, Imagem
Fluidez -» # 3297 (ybl II, fluir) Fluxo -> # 2307 (zu’6, fluxo) Focinheira
# 2888 (Asm, focinheira)
Fogão -> # 3968 (kirayim, fogareiro) Fogo -> # 836 ( ei I, fogo) Fôlego
# 5883 (nepeh, fôlego, vida, desejo)
Folha -> # 6591 ( ‘ã/e/i, folha, folhagem) Fome -> # 8279 ( r ‘6, estar faminto) Fonte
# 5078 (ma ‘y ãn, fonte)
Forasteiro -> # 9369 (tôsãb, forasteiro, colono) Força -> # 2616 (feg, ser forte, agarrar) Foija
# 3901 (kibsãn, fomalha, foija)
Forma, Imagem A. Os homens à imagem de Deus 1. Vocabulário. DVx (selem), imagem (# 7512); niETJ (cfêmút), semelhança (# 1952). 2. OMA. Uma referência antiga ao homem como “imagem” do deus aparece no texto da X Dinastia “Instruções dirigidas ao Rei Meriquare” (c. 2050 a. C.): A humanidade é bem cuidada — o rebanho de deus Ele fez o céu e a terra para ela... Deu fôlego ao nariz dela para que ela vivesse. São imagem dele aqueles que vieram do corpo de deus... Fez para eles plantas e rebanhos, Aves e peixes para alimentá-los... Quando choram, ele ouve... Pois deus conhece todo nome (Lichtheim, AEL 1:106). Essa aplicação de “imagem” a todos os homens é isolada em termos de Egito antigo, onde normalmente é usada para o rei. A idéia relacionada de que os homens são progênie dos deuses também se aplica aos reis como “filhos” da divindade. Em Israel, há vários termos que podem ser usados para imagem e semelhança (ver Dion, 1985, para uma discussão e bibliogra fia). O deus Amon-Rá se dirige a Amenófis III da seguinte forma: “És meu filho amado, que surgiu de meus membros, minha imagem, que coloquei na terra. Dei-te para govemar a tena 647
Forma, Imagem
em paz” (Clines, 85). Deve-se ter sempre em mente a semelhança não física entre imagem e objeto representado. As formas de representação do OMA eram extremamente metafóricas e simbólicas. Assim, o mesmo deus egípcio pode aparecer como uma figura humana, na forma de um hieróglifo ou como um animal, e a rainha Hatsepsute pode ser a imagem de uma divindade (cf. Clines, 72-73). A imagem de um deus não é, portanto, uma questão de semelhança física, mas de poder e prerrogativa, associados com freqüência à expressão “sob os pés” (Lichtheim, AEL, 2:36-37; cf. SI 8.6b). Também na Mesopotâmia, ainda que de modo menos freqüente, o rei pode ser cha mado de imagem (salmu) de uma divindade. Como no Egito, a semelhança pode ser expressa em termos de filiação: um pai gera um filho à sua semelhança (cf. Enuma Elis 1:15-16; Gn 5.1-3; Lc 3.38). Tanto no Egito quanto na Mesopotâmia, as designações “imagem de deus” ou “imagem de [nome da divindade]” podem ser consideradas um título real, indicando o poder e a soberania do rei. 3. Há uma longa história de tentativas de se entender a “imagem de Deus” como u função ou aspecto nos homens que os diferencia das outras criaturas e em termos do qual são chamados “como Deus”. Dependendo das predisposições filosóficas ou teológicas, a imagem já foi vista em elementos como a “razão” humana ou, no caso dos Reformadores, na “verdadeira retidão e santidade” (cf. Barth, 192-206; Berkouwer). No século XX, aos poucos foi surgindo um consenso entre os estudiosos do AT a respeito da imagem (Jonsson, Scharbert). No começo do século, alguns estudiosos consideravam que a imagem se referia ao corpo humano como sendo fisicamente semelhante a Deus (cf. Isaías. 6.1, 5; Ez 1.26; Dn 7.9-10), uma forma de “teomorfismo” (von Rad, 145-46). Trata-se de uma idéia excessivamente simples (ver acima). Uma compreensão correta da imagem refere-se ao ser humano como um todo, nâo a uma par te ou propriedade dele mesmo. Numa pesquisa mais recente, Stendebach discerne duas linhas principais de interpretação da imagem. Primeiro, a humanidade é representante de Deus na terra, incumbida da tarefa de domínio sobre toda criação não humana. O segundo modelo con sidera a humanidade correlativa a Deus (Gengeniiber Gottes) de modo que existe uma relação dialógica entre Deus e a humanidade (Stedenbach, 1051-52). Os dois modelos são válidos no sentido de que expressam aspectos de ser “a imagem de Deus”. Em termos teológicos, o uso mais importante e controverso de selem encontra-se ligado à declaração de Deus na criação da humanidade (-> Adão): “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (be.falmênü kidmútênü, Gn 1.26; cf. 1.27). Essa expressão dupla acrescenta o termo dPmút, que tem o mesmo âmbito semântico de selem, mas que se concentra no aspecto da parecença. Assim, Isaías 40.18 contrasta o caráter incomparável de Deus com a confecção humana de um ídolo (pesei): “Com quem comparareis (dmk, # 1948) a Deus? Ou que coisa semelhante (que imagem, ífêmút) confrontareis com ele?” A resposta implícita é que ne nhuma criatura ou criação humana é capaz de representar o Criador (40.12-17). Diferentemente de interpretações anteriores, a distinção semântica entre imagem (.yelem) e semelhança (d?múi) não tem uma importância teológica relativa. O paralelismo desses termos em Gênesis também pode ser encontrado na estátua com inscrições bilíngües em Tel Fekheriye. Os termos cognatos aram. são usados simplesmente para a estátua do rei (Millard and Bordreuil: Dion, 1982). Na concepção de Dion, em Gênesis 1.26 Deus cria Adão de acordo com um modelo celeste, assim como Moisés faz o tabemáculo de acordo com um modelo vindo do céu (tabnit; Êx 25.40. cf. 25.9). Um tabnit é “algo construído” (bnh; # 1215), como um modelo ou planta para um construtor (2Rs 16.10; lCr 28.19), o produto final de uma construção (Js 22.28, com referência a um altar) ou algo construído à semelhança de outra coisa (Dt 4.16-18, com referência a ídolos feitos à semelhança de criaturas). Assim, Gênesis 1.26 e Êxodo 25.40 648
Forma, Imagem
empregam a mesma expressão: “fazer A em conformidade com B” ( 'sh [+ objeto direto] + preposição b). Essa expressão (à qual se pode acrescentar como uma variante a preposição k) evita uma invocação da "bet essentiae " em Gênesis 1.26. Deus não fez os homens para serem a imagem dele, nem para serem semelhança de uma imagem celeste (talvez um anjo) além dele. A expressão significa simplesmente que Deus criou os homens como imitação de si mesmo (de acordo com Dion, 388-89). De acordo com Clines, porém, uma vez que Deus nâo tem forma, a humanidade não foi feita à imagem de Deus, mas sim como imagem dele e, desse modo, a humanidade é sua representante e agente aqui na terra. O termo “semelhança” garante que os homens serão re presentantes fiéis e adequados de Deus na terra. Assim, os homens personificam “o senhorio de Deus sobre as ordens inferiores da criação” (Clines 101). Mas em qualquer uma dessas interpretações, Gênesis 1.26b expressa o propósito ou objetivo de criar os homens à imagem de Deus. Ao contrário dos mitos mesopotâmios, nos quais os homens são criados para servir os deuses (p. ex., Atraasis I: Enuma Elis 6:8), em Gê nesis o objetivo é o domínio. O vocabulário, os paralelos no OMA e a linguagem real do Sal mo 8 (que não usa o termo “imagem de Deus” mas o pressupõe claramente) confirmam que esse domínio deve ser entendido em termos de monarquia, que foi “democratizada” de modo a referir-se a todos os homens. Portanto, o significado de “imagem” não se encontra apenas nos termos empregados, mas na compreensão da tradição de Israel ou, mais precisamente, da tradição sacerdotal, daquilo que vem a ser monarquia representativa. Neste estudo rápido, só nos é possível observar os elementos fundamentais. Para Is rael, a monarquia (com sua autoridade e poder) deve ser usada para o bem dos súditos, de acordo com os padrões de juízo e justiça (Salmo 72). O poder monárquico existe para “servir” ao bem-estar do povo (lR s 12.7). Além disso, o poder monárquico não é absoluto, mas sim limitado a cumprir os propósitos de Deus para a monarquia e suas respectivas incumbências. Portanto, quando Saul ou Uzias ultrapassam os limites e propósitos de seu cargo, ambos são julgados (1 Samuel 13,15; 2Cr 16-21). Sendo assim, devemos supor que os homens à imagem de Deus existem para cumprir os propósitos de Deus na terra como seus representantes reais. E seu domínio (como homem e mulher; cf. Bird) sobre a terra encontra-se relacionado à sua fecundidade e bem-estar e não à exploração destrutiva (Kaiser). 4. Gênesis 5.1-3 deixa claro que a condição de ser imagem de Deus não é exclusivida dos primeiros homens; antes, é passada adiante para todos os seus descendentes. Essa imagem não se perde com o pecado (cf. Salmo 8). A inversão dos termos “imagem” e “semelhança” em Gênesis 5.3 pode ser uma característica de estilo do escritor. Gênesis 9.6 indica que os ho mens, feitos à imagem de Deus, possuem um valor intrínseco relacionado à própria glória de Deus. Desse modo, ferir ou matar seres humanos é o mesmo que ofender a majestade de Deus (cf. Pv 14.31; Tg 2.9). Apesar de o conceito de imagem de Deus aparecer explicitamente em três passagens do tipo S (Gn 1.26-27; 5.1-3; 9.6; cf. Salmo 8), sua mensagem essencial pode ser pressuposta ao longo de todos os textos S e outros relacionados, como o Código de Santidade em Levítico. Assim, podemos supor que a visão sacerdotal da humanidade como imagem de Deus é atuan te mesmo em textos em que a imagem não é mencionada especificamente. Ou seja, textos S e relacionados devem ser lidos à luz da imagem enquanto, por outro lado, a imagem deve ser considerada à luz de S. Se esse princípio interpretativo está correto, uma outra implicação ca nônica é a de que o conceito de homem à imagem de Deus esclarece todos os textos bíblicos que retratam a humanidade. Isso é indicado pelo fato de o conceito ter sido colocado no início do cânon e por ter sido aplicado a Jesus Cristo (Cl 1.15). 649
Forma, Imagem
B. Imagem ou ídolo. 1. O AT tem um vocabulário amplo para imagem e termos relacionados. Entre os ter mos associados, encontram-se HS1D (mar ’eh), aparência (# 5260); n ’33n (tabnlt), modelo ou plano para algo construído (# 9322); (temünâ), forma (# 9454). O uso comum de $elem, imagem (e de vários termos relacionados) indica uma figura tridimensional ou um relevo (Ez 23.14), geralmente como semelhança ou modelo de algo: de um deus (2Rs 11.18; Am 5.26), de seres humanos (Ez 16.17; 23.14), ou mesmo de ratos (ISm 6.5). Quando usado para seres humanos ou deuses, o termo refere-se com freqüência a uma estátua, como também é o caso de seus cognatos em acad. $almu e aram. ^ lê m (Dn 3.1, 5). No entanto, os Salmos 39.6 [7] e 73.20 indicam uma evolução do termo de “imagem” como estátua para “imagem”, como sim ples semelhança ou parecença de algo. Ainda que o termo nesses textos possua uma etimologia diferente, o âmbito semântico de selem é ampliado (de acordo com Barr, 21). Há outras palavras heb. usadas para designar ídolos, imagens, semelhança ou formas. E comum tratar-se de uma referência a deuses pagãos. Alguns desses termos são transparentes, ou seja, seu sentido fica evidente em sua formação (uma vez que estamos considerando aqui a semântica e não a etimologia). Barr usa o exemplo do alemão Handschuh (sapato para a mão) em contraste com nosso termo “luva”, que é “opaco” pois “aquele que fala sabe o que é, mas não sabe porquê” (Barr, 17). Os termos massêkâ (-> # 5011; Êx 34.3, 8; 34.17) e nesek I (-> # 5822; Is 48.5) são subs. que se referem a “imagens fundidas”, feitas de metal derramado num molde, mar eh é uma forma ou aparência de algo visto (vb. r ’h). tabnit pode se referir a ídolos como algo construído para servir de modelo de várias criaturas (Dt 4.16-18), mas também para uma forma ou plano usado de modelo para construir alguma coisa (bnh; -> # 1215) — como por exemplo o tabemáculo (Êx 25.9). d?mút, semelhança, tem a conotação de similaridade entre uma imagem e aquilo que ela representa (vb. dmh). O subs. yêser (algo formado, quer seja uma vasilha, uma imagem, um ser humano ou um plano mental), cujo part. yôsêr (-> # 3450) pode se referir a um oleiro (Is 29.16). O vb. é usado muitas vezes de maneira metafórica para a criação divina (br', criar; -> # 1343). Um termo relacionado é y^surim, um pl. hapleg. abstrato (-> # 3675), que denota os membros de uma pessoa (Jó 17.7). pesei é uma imagem esculpida (ídolo; •> #7181) pois é feita pelo processo de esculpir ou cortar (psl; -> #7180) pedra (Is 44.9). selem, a palavra mais relevante em termos teológicos, não é transparente quanto aos sentidos acima, mas denota uma estátua ou pedra redonda contendo uma imagem. Possui cogna tos aram., enquanto seu par. can. é sml, outro termo um tanto opaco. Na BH, esse último termo aparece (5x) sempre com sentido negativo, com referência a ídolos. Barr acredita que seu uso comum nas linguagens de Canaã (fen., pún., heb.) pode ter influenciado o escritor S a usar o termo mais neutro $elem, para se referir aos homens como imagem de Deus. Ainda assim, Barr reconhece que alguns dos termos desse campo semântico, inclusive selem (p. ex., Nm 33.52; Am 5.26), são ambivalentes no que diz respeito ao seu caráter religioso (Barr, 22-24). 'ã.)ãb I (-> # 6773) é outro subs. que significa ídolo ou imagem e que, para nós, não é transpa rente. fimi/nâ, forma, é outro termo opaco. É usado de modo negativo para dizer que nenhuma forma de Deus foi vista no monte Horebe (Dt 4.12, 15). Assim, Israel não pode fazer imagem de coisa alguma para representar Deus (Êx 20.4; Dt 4.16, 23, 25; 5.8). Por fim, tõ ’ar pX h, forma, figura, # 9307) pode ser um subs. denom. cujo vb. ("ixn, / V II, # 9306) significa vergar. O subs. refere-se à figura ou aparência de seres humanos (Gn 29.17; 39.6), animais (41.18-19) e, em uma ocasião (Jr 11.16), de plantas. Esse termo é usado especialmente associado com as qualidades estéticas (normalmente positivas) do referente. 2. Os homens são proibidos de fazer representações sólidas ou gráficas {pesei, ^m ím â, semel [-> # 6166], tabnit) de Deus (Êx 20.4; Dt 5.8) ou de deuses pagãos (-> Idolatria: Teo 650
Forma, Imagem
logia). Tal representação inevitavelmente tomaria por base alguma criatura (Êx 20.4; Dt 4.1519, 23, 25; cf. Rm 1.23) e, assim, seria uma distorção do Criador invisível. No monte Sinai, Israel ouviu Deus falar, mas não viu forma alguma múrtâ; Dt 4.12). Outras passagens do AT referem-se de modo antropomórfico à presença ou face (pãnim) de Deus, que não pode ser vista sem conseqüências fatais (para r ’h, ver Êx 33.20, 23; cf. Is 6.5). É possível encontraremse exceções raras a essa regra (Gn 16.3, que é problemático; 32.30; Êx 24.9-11, 17; 33.11), mas em tais passagens, a aparição de Deus normalmente é distanciada ou mediada por uma coluna de nuvem ou algum outro meio. Na visão de Ezequiel do trono, por exemplo, há várias camadas mediadoras entre o profeta e a “aparência da glória do Senhor” (mar 'êh (Pmüt k^bod yhwh, Ez 1.28; cf. 1.4-28; 8.2-3; 10.1). Em outra passagem, quando Moisés vê Deus “face a face”, a qualificação usada é “a forma (tÇmünâ) do Senhor” (Nm 12.8; cf. Dt 34.10, sem qua lificação). Mas, de modo geral, quando os homens contemplam a face ou alguma outra ma nifestação visível da presença divina como o “o anjo do Senhor” (mal'ak yhwh), enchem-se de temor (Êx 3.2-6; Jz 6.22-23; 13.21-22; cf. Gn 3.8-9, em que a interação divina e humana ocorre sem mediação). 3. Em termos teológicos, quando o AT proíbe a confecção de imagens de Deus, fala aparência dele ou ausência de forma, ou, então, declara que os homens não podem ver Deus e viver; a linguagem do AT transmite a transcendência e o caráter incomparável de Deus. Ele vai além da compreensão e representação humana. É conhecido apenas à medida que se revela, e isso ocorre, necessariamente, de maneira mediada. Por outro lado, a linguagem antropomórfica de ver face a face ou alguma outra manifestação visível de Deus transmite a imanência e a pre sença de Deus em sua graça no meio dos homens (cf. Êx 29.43-45; 33.16; Is 7.14 e a declaração freqüente “estarei convosco”). Na teologia cristã, essas aparições prenunciam a Encarnação (cf. Mt 1.23; 28.20; Jo 1.18; Fp 2.6-11; Cl 1.15; Hb 1.3). Os escritos paulinos em particular desenvolvem a idéia de Cristo como o segundo ou último (->) Adão, que é a perfeita imagem ou semelhança de Deus, à imagem de quem a nova humanidade é renovada ou recriada (Rm 8.29; ICo 15.49; 2Co 3.16—4.6; Kim, 137-268). Forma, molde: dmh I (sersemelhante, tornar-se semelhante, ponderar, imaginar,# 1948); -> y$r (formar, moldar, confeccionar, criar, # 3670); ayãb I (forma, # 6773); qeçeb (medida, talho, # 7893); -> tõ ar (forma, figura, # 9307); -> tabmt (padrão, imagem, modelo, # 9322); -> fimünâ (imagem, forma, formato, representação, # 9454); Forma, Imagem: Teologia Idolatria: -> ’elil (nada. # 496); ’asêrã (objeto de adoração feito de madeira, poste, deusa, # 895); -> gillúlim (imagens, ídolos, # 1658); -> dãgôn (Dagom, # 1837); k^môs (Quemos [deus dos moabitas], # 4 0 19); -> mõlek (Moloque, # 4891); -> massêká I (estatueta fundida, # 5011); mipleçe! (coisa terrível, objeto abominável, # 5145); semel (imagem, # 6166); 'ã$ãb (imagem de um deus, # 6773); 'astõret (Astarote, # 6956); pesei (imagem cultuai, estátua de um deus, #7181); -> tõmer II (espantalho, # 9473) -> rãpim (estatuetas, máscara, # 9572); -> Idolatria: Teologia B ib l io g r a f ia
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Fortaleza
# 5171 (me.sãd, fortaleza)
1. A necessidade de fortificações. As fortificações mais antigas das quais se tem conhecimento foram escavadas em Jericó e consistem de três muralhas sem suportes construídas de pedras não polidas e com uma torre circular anexa, cercando uma área de aproximadamente quarenta mil metros quadra dos. Acredita-se que essas estruturas sejam de c. 8000 a. C. No entanto, a construção das pri meiras cidades muradas da Palestina ocorreu na Alta Idade do Bronze, c. 2900 a. C. e as forti ficações se desenvolveram de modo a enfrentar o desafio das mudanças nas táticas e tecnologias de guerra. O desenvolvimento de fortificações ainda na Jericó neolítica indica a condição básica decaída da natureza humana retratada na história de Adão e Eva, Caim e Abel. O povo de Jericó, os construtores das primeiras cidades muradas de Canaã e os cananeus e israelitas depois deles procuraram proteger-se de outros homens que lhes ameaçavam a existência e/ou o sustento ou, ainda, intimidar possíveis invasores. As cidades cananéias fortificadas com muralhas de dez a quinze metros de altura e sete metros ou mais de espessura, por exemplo, fizeram esmorecer o coração dos israelitas, pois tais cidades pareciam impenetráveis (Nm 13.28). A possibilidade ou a inevitabilidade de conflitos entre os homens é a triste história da raça humana desde os primórdios até o presente e as referências bíblicas a fortificações bem como as ruínas arqueológicas dessas estruturas são testemunhas inequívocas do problema do pecado. A resposta do homem para a pergunta feita a Caim, “Acaso, sou eu tutor de meu ir mão?” (Gn 4.9), sempre foi negativa. A doutrina de que os homens são feitos à imagem de Deus encaixa-se com o desen volvimento das fortificações, pois Deus é Criador, e a concepção e construção de fortificações exigia dos homens criatividade e engenhosidade. Quando povos itinerantes ou nômades viam exércitos inimigos se aproximando, podiam buscar segurança pela evasão ou fuga, mas se a proteção do território tribal era mais importante do que a segurança, o resultado era um con flito. Uma vez assentados em vilas, porém, era impossível esquivar-se do inimigo. Ainda que fosse possível fugir, essa nâo era mais uma alternativa atraente. Assim, foram desenvolvidas fortificações para reagir a um ambiente humano hostil e tirar proveito das características favo Fortificação
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Fortificação
ráveis do ambiente natural. Assentamentos fortificados costumavam localizar-se em elevações que davam aos defensores a vantagem da altura sobre seus atacantes. 2. A sociologia das fortificações. A construção de fortificações foi um trabalho desco munal que exigiu o desenvolvimento e aplicação criativos da organização social e também do uso de materiais. A construção de muralhas, portas, torres e baluartes requeria um ou mais lí deres para organizar e dirigir o projeto de construção. E provável que a resolução de construir fortificações fosse mais uma imposição autoritária do que uma decisão democrática. No entanto, tais construções não podiam ser concluídas sem a cooperação dos habitantes, trabalhando eles livremente ou sob coerção. Samuel advertiu a naçâo de Israel de que o rei tentaria escravizá-la (1 Sm 8.17). Normalmente, os reis eram os indivíduos responsáveis pela liderança na construção de fortificações. Salomão foi lembrado como um grande construtor e, pelo menos em parte, usou de coerção (mas, # 4989) para realizar seus projetos (lR s 4.6; 5.13-14; 9.15). Entre os conselheiros dos reis israelitas, porém, havia representantes dos lavradores, sacerdotes, profetas e autônomos — escribas e sábios. E bem possível que servissem para moderar e informar das decisões do rei e atuassem como uma ponte entre a casa real e o povo em geral. A construção de fortificações era o esforço conjunto dos líderes e do povo em função da necessidade comum de segurança e proteção. Essas empreitadas promoviam uma idéia de participa ção num propósito em comum e forneciam um meio de fortalecer os vínculos da comunidade. 3. A cidade como uma fortificação. O principal termo empregado no AT para referir-se a uma cidade é ‘ ir (-> # 1651). Um sinônimo de ‘ ir é qiryâ (-> # 7953), derivado do heb. qir (casa), parede, e, secundariamente, muro da cidade (p. ex., Nm 35.4); há cognatos no fen. qr, no ugar. qrt (o equivalente heb. aparece em Jó 29.7; Pv 8.3; 9.3, 14; 11.11) e no moabita, qr, cidade. As fortificações eram compostas de muralhas, portas, torres, baluartes, fossos secos (hãrüs II; hapleg. em Dn 9.5 [# 3022]) e até mesmo lagos artificiais ( 'agãm [# 107], ver W. L. Holladay, Jeremiah, Hermenéia, 1989, 2:427 em oposição a HALAT, 10). Dentro das cidades, a área da cidadela, onde normalmente ficavam palácios, templos e prédios do governo, muitas vezes era cercada por um conjunto secundário de muralhas. Os fortes israelitas situados em locais estratégicos, surgiram somente depois da funda ção da monarquia. Antes disso, os israelitas, de modo geral, viviam em vilas não fortificadas dentro dos territórios de suas tribos e clãs. A monarquia trouxe consigo uma consciência mais intensa de nacionalismo e o controle de territórios mais extensos. Saul construiu um pequeno forte para seu quartel general na colina em Gibeá (atual Tel el-Fül, c. 6 quilômetros ao norte de Jerusalém) e, no período do reino dividido, vários fortes judeus foram construídos para proteger rotas comerciais e áreas fronteiriças (p. ex., Uzias, 2Cr 26.10). Foram descobertas ruínas de mais de vinte fortificações só no Neguebe, inclusive fortes retangulares com c. 50x65 metros com torres proeminentes, outros fortes de tamanho parecido, mas de formato oval e sem torres e também fortes menores sem torres com c. 25 metros quadrados. Essas estruturas costumavam ser chamadas de migdãlim, torres (-> # 4463). 4. Fortificações elevadas. Além de se aproveitarem de terrenos naturalmente defen sáveis, os construtores de fortificações usavam materiais de construção naturais. Em lugares montanhosos, as partes eram feitas inteiramente de pedras da região; nas planícies, estruturas de tijolos de barro eram construídas sobre alicerces naturais de pedra. O radical da maioria dos termos bíblicos para fortificação tem significados associados a elevações. ’armôn, palácio (-> #810), por exemplo, é derivado de um radical biliteral rwm. O mesmo acontece com A.jr III, ser inacessível (-> # 1307). Fortificação, cidadela, cerco, fortaleza: 'armõn (cidadela, # 810); -> hirá (cidadela, acrópole,# 1072); -> b$r III (serinacessível,# 1307); -> dãvêq(baluarte,# 1911); h ê l(proteção, 653
Fortificação
# 2658); m illô' (terraço, # 4864); -> misgeret (baluarte, masmorra, borda, mesa, # 4995); me$ãd (baluarte, # 5171); mã$ôr II (fortificação, cidade fortificada, # 5190); -> sõhêrâ (proteção, # 6089); -> (mantelete, #6116); $eriah (porão, catacumba, cova, baluarte, # 7663); sgò (ser elevado, fortificado, proteger, # 8435); -> Fortificação: Teologia Cidade, vila, interior (região): -> //âí (área externa, rua, # 2575); Aõyêr (recinto cercado, pátio, assentamento, vila, # 2958); kãpãr (vila, # 4107). mãqôm (lugar, local, cidade pe quena, lugar de habitação, lugar santo, # 5226); -> miqlãt (cidade de refúgio, asilo, # 5236); -> ‘ir (cidade grande, cidade pequena, # 6551); -> p erãzôn (campo fértil, # 7251); -> qiryà (cidade pequena, cidade grande, # 7953); -> ^ h õ b I (lugar amplo e aberto, praça pública, # 8148); -> iúç (rua [numa cidade pequena], #8798) B ib l io g r a f ia
E. Klein, /í Comprehensive Etymological Dictionary o f the Hebrew Language fo r Readers o f English,1987, 543-44, 555-58; K. N. Schoville, “Fortification”, ISBE 2:346-54; Y. Yadin, The Art o f Warfare in Biblical Lands, 1963. Keith N. Schoville Fortificações -> # 1911 (dãyêq, fortificações) Fraqueza Fraude
# 5570 ( nbl I, murchar, enfraquecer, desfalecer, definhar, desonrar) # 5327 (m im â I, traição, fraude, engano)
Freio -> # 5496 (meteg, freio, rédea) Frescor
# 7557 ($innâ I, frescor)
Frio -> # 7981 (^rr II, estar frio) Frivolidade -> # 2361 (z//1, ser frívolo, ser desprezado) Fronteira -> # 1487 (gí>/1, limitar, delimitar; demarcar limites ao redor) Frustração -> # 7296 (p/r, quebrar, anular, frustrar) Frutificação -> # 7238 (prh, dar fruto; tomar frutífero) Fuga
# 5674 (/ws, fugir, escapar, escapulir)
Fumaça Funda
# 6939 ( ‘in, estar envolto em fumaça, estar irado) # 7843 (q l‘ I, funda, arremesso)
Fundação -> # 3569 (ysc/ I, fundar, estabelecer) Fundição 654
# 3668 (ys<7, despejar, fundir)
Gate
Fúria -> # 7911 (q$p I, enfurecer-se) Furto -> # 1704 (gwi, furtar, roubar) Futilidade -> # 8 1 9 9 (rêq, vazio, fútil) Gado -> # 5238 (miqneh, rebanho/criação, propriedade) Gafanhoto -> # 746 ( 'arbeh, gafanhoto) Garoa
# 3228 (/«/, orvalho, chuvisco, garoa)
Gate
Gate (H3 [gal], # 1781).
AT 1. Gate (atual Tel es Safi; Tel Zafit) é um local estratégico natural (100 m. acima do leito do vale) no Sefelá, beirando a borda oriental da planície filistéia. Situada na Via Maris bem como na rota de acesso ao longo do vale do Elá até as montanhas de Judá, Gate servia de importante forte militar filisteu contra invasões. A identificação de Gate com Tel es Safi/Zafit é questionada por Wright (84), que considera Tel Shari’ah mais provável. 2. Referências literárias. O termo heb. gat, é associado a vários lugares, inclusive ao mais importante deles, Gate dos filisteus (Am 6.2). De acordo com Josué 13.3; 1 Samuel 5.8; 6 .17; 7.14 e 2 Samuel 1.20, Gate foi uma das cinco cidades filistéias que continuou como ba luarte militar e cultural filisteu durante grande parte da Idade do Ferro. Era a cidade de Golias (ISm 17.4,23; cf. 2Sm 21.19) e do rei Aquis, que a princípio recusou (ISm 21.11-15; cf. SI 56.1) mas depois deu refúgio a Davi e seus 600 homens que se tomaram vassalos em Ziclague (ISm 27.2-12). Entre os soldados mais leais de Davi, numa contagem posterior, havia 600 geteus, liderados por ltai (2Sm 15.18). É interessante observar-se que Gate é omitida dos oráculos proféticos que anunciam a destruição das cidades filistéias (Jr 25.20; Am 1.6; Sf 2.4; Zc 9.6), pois é bem provável que já tivesse sido destruída por Hazael (2Rs 12.17). Chamada degi-im-tu em fontes assírias, a cidade foi conquistada por Sargão II em 712 a. C. por ter apoiado a rebelião de Asdode contra as autoridades assírias (ANET, 286). De acor do com uma carta de Abdi-Heba a Faraó, Gate fez exatamente a mesma coisa 600 anos antes, a saber, fornecendo tropas para forças rebeldes (EA n. 290; cf. ANET, 489). Com exceção das informações extraídas de materiais arqueológicos, sabe-se muito pouco sobre a história sub seqüente de Gate. 3. Escavações arqueológicas. Tel es Safi/Zafit (= Gate) foi um dos primeiros sítios da Palestina a serem escavados, o que ocorreu em 1899 sob a direção de Bliss e seu assistente, Macalister. Mais tarde, foi estudado por Amiran e Aharoni (1955). As cerâmicas encontradas mostram que a cidade foi habitada desde a Idade Média do Bronze até o período selêucida, mas a maior parte dos fragmentos mostra que se trata principalmente de um sítio da Idade do Ferro. Vários escaravelhos com temas típicos do Egito e outros de origem hitita e mitaniana indicam os vastos contatos de Gate com outras culturas na Baixa Idade do Bronze, apesar de ter permanecido uma cidade cananéia onde Qudshu era adorado (Keel e Küchler, 840). Foi encontrada uma grande quantidade de cerâmica filistéia, confirmando a presen ça dos filisteus na Idade do Ferro. Uma construção na Área D considerada anteriormente um templo é, na verdade, uma casa de quatro cômodos sustentada por pilares (NEAHEL, 1523). 655
Gaza
O muro da cidade da Idade do Ferro II provavelmente foi erguido por Roboão (2Cr 11.8). Em sua construção foram empregadas pedras de formato mais ou menos quadrado e torres (10 a 11,3 m. de comprimento). Selos de lammelek, selos com NP heb., pesos de siclos, fragmen tos de uma esteia assíria, cerâmica grega, estatuetas do período persa, etc., confirmam que era uma importante cidade comercial. É pouco provável que sejam realizadas outras escavações no local, devido à existência de um maqãm sagrado na acrópole e de um vilarejo árabe cujo cemitério fica na parte inferior da cidade. Filisteus: -> 'asclôd (Asdode, # 846); 'asqelôn (Asquelom, # 884); -> gat (Gate, # 1781); -> 'azzá (Gaza, # 6445); ‘eqrôn (Ecrom, # 6833); -> p e//ífí(Filístia, # 7149) B ib l io g r a f ia
ABD 2:908-9; BRL, 170; O. Keel & M. Küchler, Orle und Landschaften der Bibel, 2, 1982, 836-44; E. Stcm, “Zafit, Tel", NEAEHL, 1522-24; G. E. Wright, “Fresh Evidence for the Philistine Story”, BA 29, 1966, 70-85. J. P. J. Olivier
Gaza
Gaza (H7y [‘azzd], # 6445).
AT 1. Gaza (atual el Ghuzza, Ghazza; T Harube, T ‘Azzah) localiza-se na borda ocidental da fértil planície do sul da Palestina, cinco quilômetros para o interior em relação à costa do Mediterrâneo. Como importante cidade marítima no sul da Palestina e local mais estratégico da Via Maris, Gaza serve de passagem entre o Egito e a Síria, bem como entre as regiões me diterrâneas e árabes. Não é possível superestimar sua influência política e econômica ao longo de quatro milênios. Uma das maiores cidades na região sudoeste da Palestina (55 hectares) foi escavada apenas cm escala limitada. 2. Referências literárias. Num relevo de Seti I no templo de Camaque, Gaza é chama de “(a cidade de) Canaã”. Uma cidade devidamente fortificada é representada mostrando uma acrópole, torres e sua muralha e porta. Uma fortaleza egíp. no tempo de Seti I (1293-1279), Gaza serviu para proteger o controle egíp. da rota para a Síria dos ataques de nômades (ANEP, 329; cf. Keel e Küchler, 79, 108, 114). E mencionada como a primeira cidade na Palestina na lista de Tutmé III (c. 1457). Foi a capital da província egíp. de Canaã (ANET, 235) durante quase qua trocentos anos. Continuou sendo, juntamente com Jafa (Yapu), uma base militar egíp. (“guarda a porta da cidade de Azzatu”) contra invasões inimigas (dos hapiru), conforme a referência nas correspondências de Amama (eA, 296, cf. 289; Moran, 339) e numa carta de Taanaque (Albright, 24). O diário de um oficial da fronteira menciona o nome de dois guardas de Gaza: Túti filho de Tiecrem e Baal-Rói, filho de Zipoer, que estavam a serviço de Memeptá (ANET 25%). Como antiga capital do Egito, Gaza assumiu um papel de liderança entre as cidades filistéias. Teoricamente, pertencia ao território de Judá (Js 10.41; 11.22; 13.3; 15.47), mas con tinuou sendo um importante baluarte militar e cultural filisteu durante grande parte da Idade do Ferro I, como o comprovam as narrativas sobre Sansão. De acordo com Juizes 16.1-3; 2330, Gaza era bem fortificada e possuía uma prisão e o templo de Dagom. A lista de cidades conquistadas por Sisaque, do templo de Camaque, menciona Gaza como o ponto de partida para a campanha destruidora empreendida por Sisaque (Kitchen, 435). Para o Egito, a cida de continuou sendo uma importante passagem conduzindo ao Levante, até a entrada na As síria na região costeira mediterrânea. A conquista de Gaza tomou-se o principal objetivo de 656
Gedalias
Tiglate-Pileser III (Tadmor, 91). Hanno — o rei da cidade — fugiu; suas propriedades foram confiscadas e foram impostos tributos sobre a cidade (ANET, 282). As muralhas e defesas de Gaza são representadas num relevo em Nínive no tempo de Sargão II, que a conquistou (Keel e Küchler, 81). Gaza passou a ser, então, um local crítico para o ataque militar dos assírios contra o Egito (Mittmann. 103). Hanno voltou ao poder e começou a se rebelar contra os senhores assírios, mas logo em seguida foi subjugado por eles (ANET, 285). Assim, Gaza não participou da rebelião de Ezequias (cf. 2Rs 18.8) e, em decorrência disso, foi recompensada com parte do território de Judá (ANET, 288). Gaza continuou leal à Assíria durante os noventa anos seguintes. Neco II tentou reconquistá-la (Jr 47.1) como fortaleza egíp., mas não foi páreo para o poder de Nabu codonosor da Babilônia. Vários oráculos proféticos referem-se à destruição de Gaza (Jr 25.20; Am 1.6-7; Sf 2.4; 47.5; Zc 9.6). Nos impérios persa, helenístico e romano, Gaza era famosa por seu comércio com a Arábia, especialmente de incenso e especiarias. Foi a única cidade da costa do Mediterrâneo a opor-se a Alexandre, o Grande, que a cercou e vendeu o povo dali como escravo. Foi restaurada por Pompeu e readquiriu posição como um dos mais importantes centros comerciais e culturais do mundo mediterrâneo (NEAEHL, 464). 3. Escavações arqueológicas. Em função da extensa reconstrução ocorrida durant período romano, o material arqueológico encontrado é bastante escasso (NEAEHL, 465). W. J. Phythian-Adams realizou escavações em 1922. Descobriu restos das muralhas da cidade, bem como de objetos de cerâmica, que atribuiu ao período filisteu (ABD 2:914). Um complexo in dustrial bem preservado foi descoberto debaixo da sinagoga antiga, indicando a existência de uma indústria de tingimento. As fortificações impressionantes dos tempos romanos e bizanti nos podem ser vistas numa construção enorme de cantaria, feita de pedras bem polidas numa configuração típica de encaixes. Ovadiah realizou escavações na sinagoga antiga (que difere consideravelmente das sinagogas palestinas), cujo piso de mosaico apresenta o repertório nor mal de figuras de animais. Filisteus: 'asdôd (Asdode, # 846); -> 'asqelôn (Asquelom, # 884); -> gat (Gate, # 1781); -> 'azzá (Gaza, # 6445); -> 'eqrôn (Ecrom, # 6833); pPlisti (Filístia, # 7149) B ib l io g r a f ia
RGG 2 :1207; W. F. Albright, “A Prince of Taanach in the Fifteenth Century BC”, BASOR 94, 1944,24-25; H. J. Katzenstein, “Gaza(Prehellenistic)”,^SD2:912-15; O. Keel & M. Küchler, Orte un Landschaften der Bibel, 2, 1982, 76-96; K. A. Kitchen, The Third Intermediate Pe riod in Egypt (1100-650 BC), 1973; S. Mittmann, “Hiskia und die Philister”, JNSL, 16, 1990, 91-106; W. L. Moran, The Amarna Letters, 1992; A. Ovadiah, “Gaza”, NEAEHL 2:464-67, cf. EAEHL 2:408-17; H. Tadmor, “Philistia Under Assyrian Rule”, BA 29/3, 1966, 86-102; G. E. Wright, “Fresh Evidence for the Philistine Story”, BA 29, 1966, 70-85. J. P. J. Olivier Gazela
# 7383 (febí II, gazela)
Geada -> # 7943 (qerah, geada, gelo)
Gedalias
Gedalias(rrVll [gedalyâ,# 1545] ouirPVlJ \g?dalyãhú, #1546]). 657
Genealogias no Antigo Testamento
Gedalias, um hebreu, foi nomeado pelos babilônios para ser governador do povo que permaneceu em Judá depois que a Babilônia tomou Jerusalém (586 a. C.) e levou os líderes de Judá para o exílio (2Rs 25.22-26; Jr 40.5— 41.18). Gedalias era filho de Aicã e neto de Safã, o escriba, uma família amiga de Jeremias. Quando Gedalias foi nomeado governador em Mispa, Jeremias foi visitá-lo e ficou naquela re gião (Jr 40.5-6). Com seu comportamento pacífico, Gedalias conquistou a confiança dos judeus que viviam em Moabe, Edom e no meio dos amonitas e que voltaram para a terra de Judá (Jr 40.11-12). Apesar de Gedalias ter sido advertido por Joanã e outros comandantes do exército de que Ismael, um príncipe e também comandante do exército, estava a serviço de Baalis, rei dos amonitas, e que planejava atentar contra a vida dele, Gedalias os ignorou ingenuamente (Jr 40.13-16). Aproveitando-se de uma ocasião num banquete, Ismael assassinou sem nenhuma piedade o governador Gedalias e outros líderes judeus, juntamente com soldados babilônios que ali se encontravam (Jr 41.1 -3). Apesar de Joanã ter subjugado as forças terroristas, a insur reição desencadeou a partida de um grupo, inclusive a de Jeremias, para o Egito (Jr 41.16-18), por medo de uma represália dos babilônios. De acordo com a tradição judaica, esse episódio é comemorado com o “jejum de Gedalias” no terceiro dia de tishrei (cd. Zc 7.5; 8.19). O nome Gedalias aparece num selo encontrado em Laquis. Também é o nome de o tras pessoas no AT (p. ex., um político de alto escalão no reinado de Zedequias, Jr 38.1-6; um músico levita, Ed 10.18 e o avô do profeta Sofonias, Sf 1.1). -> Jeremias: Teologia Elmer A. Martens Gelo
# 7943 (qerah, gelo)
Gemido -> # 634 ( 'nh, suspirar, gemer)
De acordo com a definição de R. R. Wilson ci tada com freqüência, uma genealogia é “uma expressão escrita ou oral da descendência de uma ou mais pessoas a partir de um ou mais an tepassados” (Genealogy and History, 9). Podem-se distinguir dois tipos principais de genea logia: as lineares, que traçam apenas uma linhagem de descendentes a partir de um antepassa do e as segmentadas, nas quais é traçada mais de uma linhagem a partir de um antepassado e que, portanto, ramificam-se em algum ponto em duas ou mais linhagens distintas. Genealogias no Antigo Testamento
1. Dados genealógicos do AT. Os principais textos genealógicos do AT são: Gênesis 4.17-22: a linhagem de Caim, por sete gerações; Gênesis 5.1-32; 4.25-26: a linhagem de Adão por meio de Sete, chegando até os filhos de Noé: Sem, Cam e Jafé; Gênesis 10.1-32: os descendentes dos filhos de Noé; também chamada de Tabela das Nações; Gênesis 11.10-26: a linhagem de Sem até Abraão; Gênesis 11.27 estende a lista até Ló, sobrinho de Abraão; Gênesis 19.37-38: os filhos de Ló, Moabe e Ben-Ami, dos quais os moabitas e amoni tas são descendentes; 658
Genealogias no Antigo Testamento
Gênesis 22.20-24: os filhos de Naor; Gênesis 25.1-4: os filhos de Abrão, ora chamado Abraão (cf. Gn 17.5) com Quetura; Gênesis 25.12-18: os filhos de Ismael; Gênesis 35.23-26: os filhos de Jacó com Lia, Raquel, Bila e Zilpa; Gênesis 36.1-43: os descendentes de Esaú, inclusive uma lista de chefes tribais des cendentes dele (w . 15-30), uma lista dos reis de Edom (vv. 31-39) e uma lista dos chefes descendentes de Esaú “segundo as suas famílias, os seus lugares e os seus nomes” (vv. 40-43); Gênesis 46.8-25: os filhos e netos de Israel (= Jacó); Êxodo 6.14-25: descendente de Rúben e Simeão, aparentemente relacionados apenas como um preâmbulo para a relação mais completa dos filhos de Levi que apresen ta todos os descendentes dele até a segunda geração, concentrando-se em seguida nos descendentes de Coate, neto de Levi, especialmente nos descendentes de Arão e Corá; Números 3.17-20: descendentes de Levi até a segunda geração, divididos nos clãs dos gersonitas, coatitas e meraritas, formando a base para a distribuição dos encargos relacionados ao tabemáculo e ao santuário nos vv. 21-38; Números 26.41-60: relação dos homens capazes de sair à guerra das doze tribos de Is rael (vv. 5-51); segue-lhe uma lista dos levitas (vv. 57-60); essa lista também serve de base para a divisão da terra de Canaã entre as tribos; Rute 4.18-22: a genealogia de Davi, desde Perez, passando por sete gerações; 2 Samuel 3.2-5: os filhos nascidos a Davi em Hebrom; 1 Crônicas 1—9: uma extensa coleção de material genealógico que vai de Adão até o período depois do exílio. Parte desse texto parece ser um resumo de outras passa gens do AT (comparar ICr 1.5-23 com Gênesis 10. ICr 1.29-31 e 32-33 com Gn 25.12-18 e 25.1-4), enquanto outros materiais são encontrados somente aqui (ICr 4.39-43; 5.19-22; 7.20-27). Apresenta uma divisão em três seções: 1 Crônicas 1 compreende o período de Adão até Israel; 1 Crônicas 2— 8 fala dos filhos de Israel e seus descendentes no período anterior ao exílio e I Crônicas 9 relata o período depois do exílio. O material do AT contém genealogias lineares (p. ex., Gn 5.1-32; Rt 4.18-22) e seg mentadas (Gênesis 10; Nm 3.17-20). As genealogias que descrevem as origens de nações ou grupos étnicos menores incluem tanto os nomes pessoais — que em outras partes do AT apare cem como nomes de lugares — como nomes gentílicos (p. ex., Gn 10.4... filho de Javã “Elisá, Társis, Quitim e Dodanim”). As genealogias aparecem principalmente em textos relacionados aos períodos mais antigos e mais recentes da história de Israel. Pode ser o caso de um fenô meno semelhante àquele encontrado nos textos da Babilônia antiga, nos quais as genealogias segmentadas são importantes no período pré-monárquico (pois refletem realidades políticas/ tribais), mas depois são substituídas por genealogias lineares, descrevendo a linhagem dos reis (ver abaixo as expressões monárquicas em 1 e 2 Reis). Vários outros textos do AT também são relevantes para este assunto, pois assim como muitas das genealogias do AT, também tratam de questões relacionadas à composição ou organização interna do povo israelita: censos dos israelitas (p. ex., Nm 1.19-43; 4.34-49); a disposição das doze tribos (cada uma com seu ancião tribal) ao redor do tabemáculo (Nm 2.134); a lista de ofertas das tribos para o tabemáculo (Nm 7 .12-38); listas de territórios das tribos (Js 15.1-21; 42); listas de sacerdotes e funcionários do templo (IC r 15.5-24; 23-26); listas de 659
Genealogias no Antigo Testamento
homens escolhidos pelas tribos para propósitos diversos: a tim de ajudar Moisés no censo (Nm 1.5-15), espiar Canaã (Nm 13.4-15), ajudar na distribuição da terra prometida (Nm 34.19-28), fornecer as provisões para a casa de Salomão (lR s 4.8-19); listas dos soldados de Davi (2Sm 23.8-29) e de seus oficiais ( lCr 27.25-34); listas de indivíduos e famílias da comunidade do pós-exílio no tempo de Zorobabel (Ed 2.3-63; Ne 7.7-63); aqueles que acompanharam Esdras em sua jornada a Jerusalém (Ed 8.2-14); aqueles que reconstruíram os muros de Jerusalém (Ne 3.1-32) e aqueles que se casaram com mulheres estrangeiras (Ed 10.18-43). Em Esdras e Neemias o que está em questão é, com freqüência, a pureza da comunidade após o exílio. As expressões monárquicas nos livros de Reis (1 Rs 2.10-12; 11.41 -43; 14.19-20, etc.) constituem uma categoria distinta. Esses textos curtos observam a sucessão de reis tanto no reino do Sul quanto no do Norte, onde houve mais de uma dinastia real. 2. As funções das genealogias no AT. As genealogias do AT desempenham papéis im portantes nos livros de Gênesis a Neemias. Dão uma idéia de continuidade entre as gerações e oferecem uma estrutura (pelo menos parcial) para uma série de narrativas que se estendem da criação até o período depois do exílio. Por mais impressionantes que pareçam ser algumas narrativas individuais, a constante presença das genealogias nos lembra que as narrativas são parte de uma história mais ampla. Outros aspectos da interação de narrativas e genealogias são observados na discussão de Gênesis e Crônicas (abaixo). Em termos gerais, as genealogias cumprem dois propósitos: descrever a descendência das nações do mundo conhecido desde Adão, passando por Noé (ver esp. Gn 10.1-32 e par tes de I Crônicas 1), e apresentar uma “linhagem da promessa” que vai de Sete, passando por Abraão, até Jacó/Israel, cujos descendentes tomam-se a naçâo de Israel, o povo escolhido de Deus. Assim, as genealogias expressam de forma concisa o desdobramento dos propósitos de Deus ao criar o povo de Israel; definem os limites desse povo escolhido e, desse modo, estão intimamente ligadas aos temas de eleição e promessa e da herança de Israel, a terra de Canaã. São expressões claras da identidade de Israel. As genealogias de Israel dos descendentes de Levi marcam os levitas como um grupo distinto dentro de Israel, cuja esfera de ministério deve ser o tabemáculo de Deus; diferentes grupos de levitas desempenham diferentes papéis. Conforme foi observado na seção anterior, uma das funções das genealogias, tanto no AT como em outras localidades do OMA, parece ter sido a legitimação de pessoas que ocupavam determinados cargos. Mesmo algumas das genealogias que não descrevem a linhagem da promessa ou que nem sequer se referem a israelitas, parecem ser organizadas visando à linhagem prometida ou à nação de Israel. A. P. Ross observou como a organização dos povos cm Gênesis 10 dá a im pressão de centrar-se na futura terra de Israel (“A Tabela das Nações,” 22— 34): os descenden tes de Jafé espalham-se de Leste a Oeste na fronteira norte; os descendentes de Cam cercam a terra de Sul a Oeste e os filhos de Sem seguem a linha de Leste a Sul ao redor da terra. A menção das nações canancias (Gn 10.15-18) em particular indica que o escritor concentra-se na terra que Deus pretende dar a Israel. Semelhantemente, ainda que numa outra escala, a relação dos descendentes de Naor (Gn 22.20-24) apresenta Rebeca, aquela que se tomará esposa de Isaque. Por vezes, linhagens genealógicas divergentes parecem ser apresentadas em detalhe para marcar um contraste com a linhagem da promessa. As linhagens tanto de Ismael, filho de Abraão com Hagar, como de Esaú, o irmão gêmeo de Jacó, dão a impressão de ser “paralelas” àquela da promessa: diz-se claramente que Ismael foi o pai de doze “príncipes de seus povos” (25.16), indicando que ele é, por assim dizer, uma “Israel paralela”; e, entre os descendentes de Esaú, há uma linhagem de reis (36.1-39), assim descrita: “são estes os reis que reinaram... antes que houvesse rei sobre os filhos de Israel” (v. 31), o que mais uma vez sugere um contraste com os descendentes de 660
Genealogias no Antigo Testamento
Jacó. O narrador traça, propositadamente, paralelos entre o irmão rejeitado e aquele que leva adiante a linhagem da promessa, como que para ressaltar o tema da escolha soberana de Deus ao indicar a idéia de “tão perto, porém tão distante”.3. Comparação entre materiais genealó gicos do A T e do OMA. O OMA apresenta vários materiais comparativos (discutidos de modo proveitoso por R. R. Wilson que dedica especial atenção aos materiais sumérios, acádianos, assírios e babilônios [Genealogy and History, 56-136]; ver também M. Chavalas [“Genealogical History as ‘Charter’,” 103-28]). As listas de reis são predominantes nesses textos, mas também há genealogias de sacerdotes e escribas. Esses textos contêm algumas características possivelmente relevantes para as genealo gias do AT. As genealogias podem, por exemplo, combinar materiais de diferentes datas (p. ex., a Lista de Reis Assírios, ANET, 564-66), e genealogias que apresentam mais de uma versão podem, por vezes, divergir em alguns pontos, talvez por defenderem reivindicações rivais de herança (Chavalas, “Genealogical History as ‘Charter’,” 114-23, compara a Lista de Reis As sírios com a Genealogia da Dinastia de Hamurábi nesse aspecto) e certas genealogias podem condensar várias gerações. Além disso, as genealogias do OMA referem-se quase sempre à le gitimação, confirmando a apropriação de um indivíduo dos seus direitos de governar ou ocupar um determinado cargo oficial em função da origem desse indivíduo. Um exemplo da função legitimadora de uma genealogia é a Lista de Reis Sumérios (ver ANET, 265-66) que apresenta algumas semelhanças com as genealogias de Gênesis 1— 11. Há várias versões dessa lista (datadas entre 2100 e 1950 a. C.), sendo que uma delas relaciona-se à dinastia da cidade Suméria de Isin (c. 1950 a. C. em diante). Trata-se de uma lista de reis que governaram na Suméria e das cidades de onde reinaram. A lista faz distinção de reinos antes e depois do dilúvio. Os números apresentados com relação aos reinos são exorbitantes: antes do dilúvio, diz-se que oito reis governaram por 241 mil anos, seguidos de vinte e três reis que supostamente governaram durante 25510 anos (a longevidade que fica implícita nesses núme ros é um dos pontos de comparação com Gênesis 1—-11). Chavalas (“Genealogical History as ‘Charter’,” 110-13) argumenta que, pelo menos na versão de Isin, a lista tinha como propósito apoiar a reivindicação da dinastia de Isin do seu direito de governar Sumer; ela encobre o fato de que a dinastia de Isin não podia afirmar ser descendente de reis anteriores, mas indica que, como várias cidades haviam governado Sumer em diferentes ocasiões, não havia nada que im pedisse Isin de tornar-se o centro do governo. A legitimação também parece ser a questão nas genealogias do AT que apresentam a linhagem levítica, nas fórmulas da monarquia e também nas listas de membros da comunidade depois do exílio em Esdras e Neemias. Esses materiais tratam de questões como: Quem pode servir como sacerdote? Quem é o verdadeiro descendente monárquico? Quem pertence, de fato, a Israel? Poderia dizer-se o mesmo das genealogias dos descendentes de Israel no Pent. e em 1 Crônicas 2—8. Uma vez que procuramos ir além da regra geral de legitimação, porém, apesar de ter valor na sugestão de possíveis abordagens às genealogias do AT, os materiais do OMA são menos proveitosos na interpretação de seus detalhes. Costuma-se comparar Gênesis 1— II com vários materiais do OMA. No entanto, R. S. Hess (“The Genealogies of Genesis 1— 11,” 241-54, esp. 247-50) observa as seguintes dife renças importantes entre genealogias do OMA e Gênesis 1— 11: a. os materiais do OMA não contêm nada que seja tão abrangente quanto a Tabela das Nações em Gênesis 10. b. De modo geral, o que está em questão nas genealogias de Gênesis 1— 11 não é a legitimidade, c. Os nú meros na Lista de Reis Sumérios (com a qual Gênesis 1— 11 já foi comparado em várias oca siões) parecem ter uma função diferente dos números apresentados em Gênesis 4— 5 e 11. Em Gênesis, a questão é o tempo de vida de cada indivíduo, enquanto na Lista de Reis Sumérios, 661
Genealogias no Antigo Testamento
os números descrevem exclusivamente os anos de reinado de cada governante, d. Em Gênesis 4— 5 e 11, as genealogias olham para o futuro, indo de pai para filho, enquanto nas listas de reis do OMA, o movimento normalmente é para trás, partindo do último descendente, em direção aos seus antepassados. As comparações detalhadas das genealogias do OMA e do AT têm seu valor. No entanto, as genealogias do AT parecem ter propósitos distintos, o que o material do OMA pode esclarecer apenas de maneira limitada. 4. Genealogias do A T e reconstituição histórica. Alguns dos problemas resultantes d se usar genealogias do AT para fazer reconstituições históricas já foram observados anterior mente. Podemos citar duas questões importantes (cf. Wilson, Genealogv and History, 137-98 e “The Old Testament Genealogies,” 169-89). a. Há casos em que os dados da genealogia parecem conflitantes. Diz-se que os filhos de Elifaz foram Temã, Omar, Zefô, Gaetã e Quenaz (Gn 36.11), enquanto em outras passagens o nome Corá é inserido entre Gaetã e Quenaz (Gn 36.16). O material relacionado a Calebe (ou seriam dois Calebes?), em 1 Crônicas 2.18-24, 42-50, parece contraditório (cf. as abordagens diferentes de R. Braun [/ Chronicles, 1986, ad. loc.] e M. J. Selman [1 Chronicles, 1994, ad. loc.]). A genealogia de Samuel o situa a uma distância impossível de dezenove gerações de Levi em 1 Crônicas 6.33-38 [ 18-23] e também apresenta dificuldades no fato de ele ser de ori gem efraimita (1 Sm 1.1). E muito fácil ocorrerem erros de transmissão nesse tipo de material e sem dúvida alguns desses conflitos (e outros semelhantes) podem ser explicados como tendo surgido de deslizes cometidos por escribas. O fato de os nomes terem a tendência de se repetir em linhagens é fonte específica de dificuldades. Um exemplo disso (e da possível confusão resultante) pode ser encontrado ao se compararem as listas de sumos sacerdotes apresentada em Esdras 7.1-5; I Crônicas 6.1-15 [5.29-41]; 6.50-53 [35-38]. E claro que não devemos concentrar toda a atenção nas incongruências. Em tempos recentes, G. A. Rendsburg apresentou uma argumentação em favor da exatidão e coerência gerais das genealogias em Êxodo-Josué (“The Internai Consistency,” 185-206). Juntando as informações genealógicas desses dois livros e também o material relevante em 1 Crônicas e Rute 4, ele conclui que, para cada indivíduo de Êxodo-Josué cuja genealogia pode ser traçada, há uma distância de três a seis gerações entre esses indivíduos e um dos filhos de Jacó (esse tipo de variação não é problemático, como Rendsburg mostra por meio de uma comparação com a família real inglesa). A única exceção a esse padrão é que a genealogia de Josué, em 1 Crônicas 7.20-27, o coloca há dez gerações dc distância de José (Rendsburg também comenta a genealogia de Samuel em 1Cr 6.33-38 [18-23], 195-86). Trata-se de um retrato de coerência impressionante, especialmente tendo-se em vista que os dados genealógicos do AT podem ser originários de mais de uma fonte. b. Com relação a isso, há várias maneiras de se compreender algumas das genealogias do AT: pode ser que funcionem de acordo com certas convenções das quais não temos conhe cimento. Alguns dos principais termos genealógicos (“pai”, “filho”, “irmão”), por exemplo, são por vezes usados de maneira bastante flexível no AT. Acã é descrito como sendo “filho de Carmi, filho de Zabdi, filho de Zera” em Josué 7.1 e 18, mas como “filho de Zera” em Josué 7.24; Abraão descreve a si mesmo e a Ló como “parentes chegados” (ou seja, ligados, relacio nados por laços de parentesco) em Gênesis 13.8, quando na verdade Ló é, mais precisamente, sobrinho de Abraão (Gn 14.12). Pode-se extrapolar disso que, por vezes, o vocabulário refe rente à família seria usado para expressar associações políticas? Rendsburg, por exemplo, sugeriu que a descrição do nascimento dos filhos de Jacó em Gênesis 29—30 é uma representação em termos familiares da história primitiva das tribos is raelitas (“The Internai Inconsistencies,” 201-4). De acordo com ele, os seis filhos que nascem 662
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inicialmente de Léia ou Raquel, ou seja, Rúben, Simeão, Levi, Judá, José e Benjamim (que são os únicos filhos a apresentar algum papel individual em Gn 30— 50) foram, de fato, filhos de Jacó que se tomaram antepassados epônimos das seis tribos. Os seis filhos restantes, Dã, Naftali, Gade, Aser, Issacar e Zebulom, são filhos que nasceram mais tarde de Léia ou então, das servas Bila e Zilpa. Rensburg sugere que essas tribos não possuíam laços de família com Jacó, mas que aos poucos, juntaram-se às suas primeiras tribos de modo que, quando chegou o período dos Juizes, havia doze tribos. De acordo com essa concepção, a descrição de todas as doze tribos como descendentes de Jacó expressa, em parte, a realidade, mas, em parte tam bém, a linguagem dos laços de parentesco para descrever alianças tribais nas quais não havia nenhum vínculo familiar envolvido, sendo essa distinção marcada pela descrição do segundo grupo de seis filhos, o qual teria nascido mais tarde ou de servas. Podem-se levantar diversas objeções a essa idéia, que o próprio Rendsburg reconhece ser especulativa. Meu propósito aqui é simplesmente mostrar que a linguagem das genealogias pode ser interpretada de mais de uma forma. Tanto a concepção de Rendsburg quanto a visão tradicional de que os cabeças das doze tribos eram todos filhos naturais de Jacó aceitam que Gênesis 29—30 (e as genealogias que relacionam os filhos de Jacó, p. ex., Gn 35.23-26; 46.8-25) expressa uma realidade histórica. O ponto de discórdia refere-se à realidade expressada e à forma como a linguagem genealó gica é usada para expressá-la (cf. a forma como, na Lista de Reis Sumérios, a linguagem da descendência física é usada para expressar um determinado ponto de vista da realidade polí tica). Podemos discordar de Rendsburg, mas sua interpretação da linguagem genealógica em Gênesis 29-—50 tem, no mínimo, um grau superficial de plausibilidade. Trata-se, em essência, de uma questão de gênero. Podemos mencionar outro exemplo relacionado à questão das convenções literárias genealógicas. As idades apresentadas em Gênesis 5 para aqueles que viveram antes do dilúvio varia entre 365 anos (Enoque, 5.23) e 969 anos (Matusalêm, 5.27). (Daí em diante, os núme ros vão diminuindo gradualmente, de modo que, Abraão, por exemplo, morre com 175 anos de idade, 25.7, e Jacó com 147 anos, 47.28). As idades de Gênesis 5 (que são apresentadas de forma bastante distinta na LXX. e em sam.), além de parecerem extraordinariamente elevadas, quando consideradas juntamente com outros dados, indicam que a criação do mundo se deu em 4004 a. C., uma data que diverge seriamente das descobertas da geologia. Foram sugeri das diversas explicações para esses números (ver G. J. Wenham, Genesis 1—75,1987,130-34 para um levantamento). Essas idades avançadas podem ser, por exemplo, uma polêmica contra idades como aquelas encontradas na Lista de Reis Sumérios, desafiando a idéia de que homens semidivinos que viveram mais de mil anos chegaram mesmo a caminhar sobre a terra. Ou ain da, indicam uma história humana que vem de um passado inconcebivelmente distante e, de acordo com essa idéia, o fato de cada ser humano receber uma idade exata enfatiza que essas pessoas tão remotas foram, ainda assim, homens reais e mortais. J. Hughes considera as idades de Gênesis 5 parte de uma cronologia sacerdotal muito mais ampla, abrangendo o período da criação até o exílio e depois dele (Secrets, 4-54). Nenhuma das sugestões apresentadas, porém, obteve uma aceitação mais geral. Ao que parece, estamos lidando com uma convenção literária que não somos mais capazes de interpretar com certeza. 5. Genalogias do AT em seu contexto: Gênesis e Crônicas. Apesar de as genealogias AT se destacarem de seu contexto narrativo, é errado estudá-las isoladas desse contexto, uma vez que muitas vezes contribuem para o desenvolvimento da narrativa. Assim, a breve lista dos filhos de Davi, em 2 Samuel 3.2-5, por exemplo, ressalta a argumentação do v. 1 segundo a qual “Davi ia se fortalecendo, porém os da casa de Saul se iam enfraquecendo”. Semelhantemente, a genealogia levita em Êxodo 6.14-25 concentra-se em Arão e Corá e seus filhos (vv. 20-25), 663
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como se o escritor estivesse preparando os leitores para as narrativas subseqüentes, nas quais estas figuras terão um papel importante (p. ex., Levítico 9— 10; Números 16). Podem-se ob servar relações mais complexas entre genealogia e narrativa em Gênesis e no caso (de certa forma diferente) da relação entre 1 Crônicas 1—9 e o resto de 1 e 2 Crônicas. a. Gênesis. Conforme observamos anteriormente, as genealogias em Gênesis traça as origens das nações do mundo e também ressaltam a linhagem da promessa em meio a es sas nações. As genealogias que ressaltam a linhagem da promessa costumam ser apresenta das pelas fórmulas “Este é o livro da genealogia (tôlêdôt, -> # 9352) de...” (Gn 5.1), “Esta é a história de...” (Gn 6.9; 37.2), “São estas as gerações de...” (Gn 11.10, 27; 25.19). Essas fórmulas repetidas conferem uma estrutura clara às narrativas de Abraão, Isaque, Jacó e José (ver B. Renaud, “Les génealogies,” 5-30). É evidente que essas narrativas também têm como principal tema o surgimento da linhagem da promessa dentre as nações do mundo. Porém, como observou R. R. Robinson (“Literary Functions,” 595-608), os estilos bastante distintos de genealogia e narrativa criam uma tensão considerável em Gênesis. As genealogias são, por natureza, sumários impassíveis e áridos que se concentram num só fato crucial, o progresso de uma linhagem geração por geração. Não indicam os problemas ao longo do caminho. Por outro lado, nas narrativas sobre a linhagem de Abraão, de acordo com Robinson, “Gênesis vai atrás de praticamente toda ameaça imaginável a uma genealogia linear” — a esterilidade de Sara; a possibilidade de Faraó ou Abimeleque tomarem Sara de Abraão (Gênesis 12 e 20); a ordem para sacrificar Isaque (Gênesis 22) e a rivalidade entre os irmãos Esaú e Jacó (Gênesis 25), que se toma ainda mais acirrada entre os filhos de Jacó na geração seguinte (Gênesis 37) — e descreve tudo em detalhes vividos. As duas maneiras de se traçar a linhagem da promessa parecem indicar dois pontos de vista: o de Deus, sendo que diante do seu olhar uma geração segue outra irresistivelmente (não foi o que ele prometeu?), e o dos membros da linhagem, confrontados com ameaças à promessa a cada geração e para os quais de modo algum parece certo que a promessa se cumprirá (e, no entanto, se cumpre). Podem-se observar outras ligações em menor escala entre genealogia e narrativa. Gê nesis 5.1-2 apresenta a genealogia de Adão com referência à criação da humanidade à imagem de Deus (cf. Gn 1.26-27). A implicação clara é de que as gerações sucessivas continuam sendo portadoras da imagem de Deus. Nessa passagem, uma breve inserção narrativa afeta de modo significativo nossa interpretação da genealogia. O fenômeno oposto pode ser observado na ora ção repetida “e morreu”, em Gênesis 5: apesar de ser formalmente desnecessária, tem o efeito de ressaltar que, com exceção de Enoque (Gn 5.24), ninguém da linhagem de Adão escapou da morte. Nesse caso, a genealogia desenvolve um tema narrativo apresentado inicialmente em Gênesis 2.17 (cf. 3.19). Num estudo etimológico de Gênesis 1— 11, R. S. Hess argumentou que os nomes nas genealogias têm sua própria história para contar por meio de trocadilhos (Studies in the Personal Names o f Genesis 1—11, 1993, esp. 111- 62 ): proporcionam um “ ‘comentário onomásti co’ paralelo aos acontecimentos dentro das narrativas” ( 158). Os nomes na linhagem de Caim (Gn 4 . 17- 24 ), por exemplo, dão a impressão de serem relacionados a palavras que indicam a cultura urbana (Irade), a religião (Meujael, Metusael), a arte e a música (Ada e Zilá) e proce dências religiosas (Jabal, Jubal, Tubalcaim). No entanto, nada dessa cultura e religião é capaz de evitar que o ímpeto homicida de Caim se repita de forma ainda mais letal sete gerações depois, em Lameque (Gn 4 .23- 24 ). A linhagem de Adão por Sete (Gn 5 . 1- 32), pelo contrário, contém nomes que indicam idéias de substituição (Sete; cf. Gn 4 .25 ), renovação e restabele cimento da humanidade (Enoque, Cainã), louvor (Maalael), oração para que Deus desça e so corra (Jarede) e descanso do trabalho (Noé). Observe-se como em ambas essas genealogias o 664
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“comentário” dado pelos nomes é reforçado por breves inserções narrativas que apresentam os mesmos argumentos: Gênesis 4.17, 20-22; 5.24, 29 (sobre essas genealogias, ver também D. J. A. Clines, Themes o f the Pentateuch, 66-68). E, por fim, depois do relato da torre de Ba bel (Gn 11.1 -9), cujos construtores tentam tomar “célebre o [seu] nome” (v. 4), a genealogia de Sem (= “nome”) nos w . 10-26, parte da continuação da linhagem da promessa, sugere um comentário irônico: os homens podem, em seu orgulho, se opor a Deus, mas somente Deus pode dar significado à vida deles. b. I Crônicas 1—9. Em 1 e 2 Crônicas as genealogias não se encontram entretecid com a narrativa como em Gênesis, mas sim num único bloco nos nove primeiros caps. de 1 Crônicas. Pode não parecer que uma lista tão densa de nomes seja capaz de articular algo de relevância teológica, mas num estudo mais cuidadoso, esses caps. prenunciam vários dos temas que aparecem ao longo do restante de 1 e 2 Crônicas; daí estarem eles integralmente ligados ao resto dos dois livros (para uma boa parte daquilo que se segue, ver H. G. M. Williamson, / and 2 Chronicles, 38-92 e M. Oeming, Das wahre Israel, 1990, esp. 206-18). Em primeiro lugar, a tripartição de 1 Crônicas 1—9 em períodos (de Adão aos filhos de Israel [ICr 1.1—2.2], os filhos de Israel no período pré-exílio [ICr 2.3—9.1] e o perío do pós-exílio [ICr 9.2-34]), situa o relato sobre Israel no contexto de uma história mundial mais ampla. Na primeira seção, a linhagem da promessa é destacada pelo fato de ser sempre apresentada por último (1 Cr 1.17-27, 34; 2.2). Essa primeira seção é, com efeito, uma versão drasticamente simplificada do livro de Gênesis, que de maneira semelhante, situa o relato da linhagem de Abraão (Gênesis 12— 50) no contexto de uma narrativa sobre as origens da hu manidade (Gênesis 1— 11). Em segundo lugar, na seção central, as três tribos estudadas em detalhes são Judá (1 Cr 2.3—4.23), Levi (6.1-81) e Benjamim (8.1-40), que também são posicionadas de modo a for mar o começo, o meio e o fim das genealogias israelitas. Com isso, as três tribos que o cronista considerou como tendo sido fiéis à monarquia davídica e ao templo antes do exílio, tomam-se a estrutura na qual são encaixadas todas as outras tribos. Tudo indica que essa estrutura de fende, implicitamente, um “ideal de abrangência” de Israel (todos podem pertencer a Israel se “estiverem em conformidade com” Judá, Levi e Benjamim), o que se mostra coerente com a atitude positiva expressada posteriormente com relação às tribos israelitas do Norte (cf. 2Cr 13.4-12; 30.1-12; esses dois textos expressam a idéia de que as tribos do Norte podem voltar para Deus se reconhecerem a linhagem real de Davi e aceitarem Jerusalém como o local legí timo de adoração). Uma argumentação semelhante pode ser encontrada na observação breve de 1 Crônicas 5.1-2, que apresenta a genealogia de Rúben. E verdade que “Judá, na verdade, foi poderoso en tre seus irmãos, e dele veio o príncipe” (v. 1), mas essa declaração é seguida de outra segundo a qual o direito de primogenitura de Rúben não foi passado para Judá, mas sim para os filhos de José (v. 2, uma tradição que não é encontrada em outras passagens do AT). Nas palavras de Williamson: “Nessa passagem, o cronista se deu o trabalho de salvaguardar o lugar extrema mente honrado dos ‘filhos de José’ — o núcleo do antigo reino do Norte — dentro da família de Israel em sua totalidade” (/ and 2 Chronicles, 63). Em terceiro lugar, grande parte do material relacionado a Judá se refere aos descen dentes de Davi (1 Cr 3.1-24 indo até além do exílio), os quais ocupam uma posição central nas genealogias dessa tribo (H. G. M. Williamson, “Sources and Redaction,” 351-59). Tudo isso está inteiramente de acordo com a ênfase de 1 e 2 Crônicas sobre a linhagem de Davi como a dinastia real escolhida por Deus. Semelhantemente, as genealogias levitas visam particular mente ao serviço no templo (IC r 6.31-32 [16-17], 48-49), refletindo o interesse constante do 665
Genealogias no Antigo Testamento
cronista pelo papel dos levitas no culto (1 Crônicas 15; 2 Crônicas 5,35). A referência a Davi e Salomão, em lCr 6.31-32 [16-17]), prenuncia a descrição do cronista do trabalho de Davi e Salomão na organização dos levitas (1 Crônicas 23—26) e nas providências para a construção do templo em Jerusalém (1 Crônicas 28— 2 Crônicas 7). Em quarto lugar, a relação em 1 Crônicas 9.2-34 das pessoas que voltaram para Jeru salém do exílio na Babilônia, especialmente os sacerdotes, Levitas e outros funcionários do templo (vv. 2,13-34), indica que apesar de a comunidade do pós-exílio ser apenas uma sombra de sua antiga identidade, ainda assim, em sua organização interna e principalmente no fato de ter como centro “a casa do Senhor” (vv. 13,26-27), encontra-se, ligada de modo reconhecível às gerações israelitas anteriores e pode voltar a mostrar a glória passada de Israel. A mesma ar gumentação sobre essa coesão (e possíveis esperanças para o futuro) é apresentada ao estender a lista dos descendentes de Davi até o período após o exílio (lC r 3.17-24) Inserções narrativas ocasionais em 1 Crônicas 1—9 também parecem ter um propósito semelhante. Tratam elas de dois assuntos: da conquista de território pelas tribos (4.39-43; 5.10; 7.21 -24; como foi observado acima, esse material é característico do cronista); e do exílio (5.6, 25-26 com referência às tribos do Norte; 6.15 [5.41] com referência a Judá; cf. 9.1). Por um lado, o cronista atribui o exílio diretamente aos dois reinos e à infidelidade deles (5.25; 9.1) e ao julgamento de Deus sobre essa infidelidade (5.26; 6.15 [5.41]), introduzindo desse modo o tema da retribuição, que aparece ao longo de todo o texto de 1 e 2 Crônicas (1 Cr 10.13-14; 2Cr 7.1, etc.). Por outro lado, a menção dos territórios das tribos num momento em que a co munidade ocupava uma região minúscula, mostra o interesse permanente do cronista na terra que havia sido prometida a Abraão e pertencido ao reino de Davi. Ele parece, no mínimo, in sinuar a possibilidade de que essa terra voltará a pertencer a Israel (mesmo que por iniciativas em pequena escala como as que são descritas nessas duas inserções) e podemos observar que a teologia de retribuição do cronista é contrabalançada por uma ênfase igualmente forte no fato de que o arrependimento e a restauração são possíveis em todas as gerações (2Cr 7.14). Assim, as genealogias do AT possuem diversos temas em comum com as narrativas dentro das quais se encontram. Se a maioria das genealogias do AT ressalta a condição de Is rael como povo escolhido, então o fato de todas as nações do mundo traçarem sua linhagem de volta até Adão, passando por Noé, também nos lembra daquilo que Israel tem em comum com essas nações: todas elas são portadoras da imagem de Deus (cf. Gn 1.26-27) e dependem da misericórdia e bênção divinas para continuar a existir (cf. 8.21—9.1). Além disso, aquelas genealogias que apresentam as linhagens das nações do mundo também deixam claro que o papel de Israel é definido com relação aos propósitos de Deus para todas as nações (cf. 12.1 -3). Pode-se dizer que as genealogias do AT encontram conclusão lógica nas genealogias de Jesus em Mateus 1 e Lucas 3, que nos apresentam um salvador de origem israelita que traz a salva ção para toda a humanidade. (-> Crônicas: Teologia) História do Antigo Testamento: Uma Perspectiva Teológica (Guia) História do Antigo Testamento: Uma Perspectiva Hermenêutica (Guia) B ib l io g r a f ia
M. Chavalas, “Genealogical History as ‘Charter’”, in A. R. Millard et al., Faith, Tradition and History, 1994, 103-28, esp. 114-23; D. J. A. Clines, The Theme o f the Pentateuch, 1978; R. S. Hess, “The Genealogies of Genesis 1-11 and Comparative Literature”, Bib 70, 1989,241-54; J. Hughes, Secrets o f the Times, 1990; M. D. Johnson, The Purpose o f the Biblical Genealo666
Gênesis: Teologia de
gies, 19882; B. Renaud, “Les génealogies et la structure de 1’histoire sacerdotale dans le livre de la Génèse”, RB 97, 1990, 5-30; G. A. Rendsburg, “The Intemal Consistency and Historical Reliability of the Biblical Genealogies”, VT 40, 1990, 185-206; R. R. Robinson, “Literary Functions of the Genealogies o f Genesis”, CBQ 48, 1986, 595-608; A. R Ross, “The Table of Nations in Genesis 10— Its Contents”, Bsac 1 3 8 ,1981,22-34; H. G. M. Williamson, “Sources and Redaction in the Chronicler’s Genealogy o f Judah”, JBL 98, 1979, 351-59; R. R. Wilson, Genealogy and History in the Biblical World, 1977; idem, “The Old Testament Genealogies in Recent Research”, JBL 94, 1975, 169-89. Philip E. Satterthwaite Generosidade -> # 5618 (nâdib, homem disposto, generoso, nobre)
Gênesis: Teologia de A. A estrutura de Gênesis I. Gênesis 1— 11. O ponto divisor tradicional usado pelos comentaristas de Gên fica entre os caps. 11 e 12. O primeiro e mais curto desses segmentos (caps. 1— 11) é chamado de “história primitiva”. Ao segundo segmento, que é bem mais longo (caps. 12—50), dá-se o nome de “história patriarcal”. A primeira seção é voltada principalmente para o início da his tória universal, enquanto a segunda concentra-se mais no começo da história israelita. É natural que a segunda seção, aquela que trata dos fundadores e fundadoras de Israel, ocupe uma porcentagem bem maior do texto bíblico do que a primeira. Assim, enquanto um quinto de Gênesis (caps. 1— 11) descreve a história de vinte gerações (de Adão a Abraão), os quatro quintos restantes descrevem a história de apenas quatro gerações (de Abraão a José). Desse modo, partindo-se do pressuposto de que, proporcionalmente, um escritor dedica mais material àquilo que ele considera de maior relevância e proveito para a transmissão de sua mensagem, fica aparente que o escritor de Gênesis desejava dar destaque à história de Israel como nação e à história de seus progenitores. Portanto, aquilo que é narrado nos caps. 12—50 é mais relevante para cumprir esse propósito do que o conteúdo narrativo dos caps. 1— 11. Isso indica, então, que os caps. 12— 50 explicarão os caps. 1— 11, e não o contrário, e que a principal área a ser explorada a fim de determinar a teologia de Gênesis é essa segunda e mais extensa seção. Dito isso, porém, é igualmente verdadeiro que a mensagem e a teologia de Gênesis 12—50 por si só não pode ser compreendida sem os caps. 1— 11. Assim os caps. 1— 11 têm um papel mais importante do que apenas o de serem introdutórios ou tangenciais aos caps. 12—50. Pelo contrário, são o berço dentro do qual e por causa do qual a teologia dos caps. 12— 50 se manifesta de maneira característica. Ou seja, a idéia de desenvolvimento da história da salvação tem como fundamento o conceito de desenvolvimento da história universal. Na seção sobre a história universal (Gênesis 1— II) vê-se um movimento geral da “cria ção em harmonia” (caps. 1-2) rumo à “criação em alienação” (caps. 3— 11) (VanGemeren, 39, 67). Dentro desses parâmetros amplos, já ocorreram várias tentativas da parte dos estudiosos de decifrar o enfoque teológico dessa seção. Tanto von Rad (1972) quanto Westerman (1984), por exemplo, apresentam algum tipo de seqüência do tipo pecado-discurso-castigo como mo delo básico para Gênesis 1— 11. Assim, ao examinar cinco episódios dessa unidade (a queda — Gênesis 3; Caim e Abel — cap. 4; filhos de Deus — 6.1-4; o dilúvio — caps. 6.5— 7.24; a torre e a cidade — 11.1 -9), vê-se em primeiro lugar uma referência à transgressão propriamente 667
Gênesis: Teologia de
dita, seguida de um discurso de Deus anunciando o castigo vindouro e, por fim, a aplicação desse castigo. No episódio da queda, por exemplo, o pecado de Adão (->) e Eva é mencionado em 3.6. Segue-se um discurso de Deus (3.14-19) que, por sua vez, é seguido de um relato do castigo (3.22-24). Clines (1978, 63) amplia esse padrão observável expandindo para quatro o número de temas teológicos: pecado, discurso, mitigação e castigo. Ou seja, depois do discurso sobre o castigo, mas antes da sua aplicação, há um ato de Deus que ressalta a capacidade dele de de monstrar graça, equilibrando sua capacidade de julgar. Usando novamente Gênesis 3 como exemplo, entre o discurso de julgamento (3.14-19) e o castigo (3.22-24), encontra-se um ato da graça de Deus na provisão de vestimentas para o casal agora vulnerável (3.21), antes de os dois serem expulsos do jardim. Apesar de essa observação mostrar-se perceptiva e criativa, é provável que não seja ade quada para descrever o enfoque teológico geral de Gênesis I— 1 1 .0 motivo dessa deficiência é o fato de que não se inclui e não se pode incluir em seu esquema nem a história da criação, nem as diversas genealogias espalhadas por toda essa unidade. Uma variação do esboço acima para Gênesis 1— 11 é considerar-se a seção como o desenvolvimento do tema da propagação do pecado e da graça, uma idéia que também foi pro posta por von Rad (OTT 1:154). Dentro da linha das palavras de Paulo, “mas onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5.20), essa sugestão entende que para cada incidente des ses capítulos, que se concentra na mais inimaginável e irrestrita capacidade da raça humana de se revoltar contra Deus e assim, distanciar-se dele e provocar sua disciplina, há um episódio correspondente que mostra a graça de Deus em ação. Desse modo, Adão (->) e Eva são expul sos, porém vestidos. Caim é um refugiado errante, porém protegido. A humanidade é afogada, porém Noé (->) e sua família são poupados. As críticas contra o primeiro modelo são neutrali zadas nessa proposta pela inclusão da história da criação e das genealogias como atos da graça de Deus. Por exemplo: ao mesmo tempo em que as genealogias têm uma função cronológica evidente e uma função social não tão evidente, também dão uma contribuição teológica. Pode mos concordar com Westerman (1984, 66) quando ele diz que “são a concretização da bênção dada na criação e é essa mesma bênção que se encontra atuante na sucessão de gerações, levan do até Abraão e acompanhando a linhagem que nele se inicia”. Semelhantemente, a narrativa da criação em Gênesis 1—2 descreve uma série de atos da graça divina que contrabalançam a série de julgamentos divinos encontrados em outras passagens. Relacionada à idéia acima, encontra-se a proposta de Cline (1978, 73-76) de uma cria ção — “descriação” — recriação em Gênesis 1— 11. Se os caps. 1—2 representam o aspecto de criação desse modelo, então os caps. 3— 6 trazem a história da destruição da criação, ten do como resultado o fato de Deus remover os limites determinados no cap. 1 para permitir que a água inundasse a terra. O dilúvio só pode ser contido com a reimposição desses limites. (-> Dilúvio) Mais um passo rumo à “descriação” pode ser observado no conflito na família de Noé e nos construtores da cidade. O dilúvio adiou, porém não eliminou a capacidade da raça humana de “descriar” aquilo que Deus recriou. Agora, Deus deve responder a esse ato de “descriação” com sua ira e misericórdia. Assim, Clines (76) conclui: “Não importa quão extremo o pecado do homem se toma, destruindo tudo o que há de bom e que foi criado por Deus e levando o mundo à beira da ‘descriação’. A graça de Deus nunca deixa de livrar o homem das conse qüências de seu pecado. Mesmo quando o homem responde a um recomeço com seus velhos padrões pecaminosos, o compromisso de Deus com seu mundo continua firme e o homem pe cador experimenta o favor de Deus, bem como seu julgamento justo”. 668
Gênesis: Teologia de
Em resumo, Gênesis 1— 11 apresenta exemplos da humanidade em comunhão com Deus e longe dele, vivendo de acordo com os preceitos divinos ou tentando ignorá-los — exemplos de equilíbrio e desequilíbrio. Apresenta também várias ilustrações de um Deus de graça e um Deus de julgamento. Quanto ao seu julgamento, vemos como Deus expulsa os iníquos da pre sença dele (Adão, Eva, Caim), diminui a longevidade (6.3), afoga os degenerados (6.5ss) e confunde e dispersa construtores de cidades e torres (11.1-9). Com referência à graça, vemos um Deus que dá esperança aos homens desesperados, com a promessa da descendência da mulher que derrotará a serpente (3.15), com as roupas que dá ao primeiro casal (3.21), o sinal protetor que coloca em Caim (->) para impedir os vingadores (4.15), a renovação e restauração da ordem e do caráter previsível da natureza que há pouco havia sido tomada pelo caos (8.22) e uma promessa pactuai de jamais destruir a humanidade com outro dilúvio — uma promessa selada com um arco que Deus coloca no céu para lembrar a si mesmo e aos homens da pala vra que deu (9.8ss). Porém, por mais graça e bondade que haja nesses atos, são eles suficientes para resol ver completamente o dilema da humanidade? Existe mais alguma coisa que precisa ser feita além de roupas, sinais na testa e dos juramentos divinos de nâo se enviarem mais dilúvios? A meu ver, todos esses atos redentores de Deus movem-se no sentido de um grande ato divino contra o pecado e a corrupção e consistem em precursores desse mesmo pecado. Tal ato é, evi dentemente, o chamado de Abraão (->), o cabeça de uma família por intermédio da qual todas as outras famílias da terra seriam abençoadas. Gênesis 12— 50 não apresenta novamente nem recria para nós o mundo puro dos caps. 1—2. Essa é uma tarefa que será cumprida por Apoca lipse 21—22. Ainda assim, esses capítulos da segunda seção resolvem, ou pelo menos têm o propósito de resolver o problema da transgressão cada vez maior, que precisa encarecidamente de uma solução legítima. 2. Gênesis 12—50. Há pelos menos um indício dessa ligação entre Gênesis 11 e 12 fato de que, ao contrário das narrativas anteriores nos caps. 1— II, não é proferida nenhuma palavra de graça depois do incidente de Babel, tratando da situação caótica ali criada. Essa au sência faz com que, de acordo com von Rad, a história primitiva “se interrompa na mais agu da dissonância". Será que Deus rompeu permanentemente todos os relacionamentos com as famílias na terra? Será que Deus ainda proporcionará alguma salvação? E na seqüência dessa situação que ocorre o relato da eleição e bênção de Abraão. Nas palavras de von Rad (1973, 154), “A questão da salvação de Deus para todas as nações continua em aberto e sem resposta na história primitiva. Mas, na verdade, o narrador dá uma resposta, a saber, no ponto em que começa a história sagrada... De repente e de uma só vez, o campo de visão universal se estreita e o mundo e a humanidade, toda a plenitude ecumênica, são submergidos, e todo o interesse se concentra num único homem”. A genealogia de Sem (Gn 11.10-26) e depois a de Tera ( 11.27-32) servem de ponte en tre a história primitiva e a patriarcal, sendo que a primeira é um cabeçalho genealógico da se gunda, assim como a genealogia de Ismael (25.12-18) é um cabeçalho da genealogia de Isaque (25.19-26) e a genealogia dos descendentes de Esaú (36.1— 37.1) é o cabeçalho da genealo gia de Jacó (37.2) (Steinberg, 43). No caso desses três cabeçalhos genealógicos (Sem, Ismael, Esaú), cada um deles refere-se a um indivíduo “colocado fora dos holofotes que se encontram voltados para os personagens citados nas narrativas genealógicas ligadas à herança escolhida de Israel” (Steinberg, 45). A segunda dessas genealogias, a de Tera, vai além da apresentação dos membros de duas gerações de uma família. Implicitamente, ela prepara o caminho para um dos enfoques teológicos mais importantes do resto de Gênesis — o direito de herança. Uma vez que um dos 669
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filhos de Tera morreu e outro, Naor, ficou para traz com sua família em Ur, Abraão é o único elo restante pelo qual a família de Tera pode ter continuidade. No entanto, há um obstáculo para que isso aconteça, pois Sara é estéril (v. 30). Os únicos netos de Tera, além de Ló, são mulheres (Milca e Iscá). Assim, Ló é o único neto do sexo masculino, e o fato de um texto mais adiante (Gn 12.4) relatar que Ló acompanhou Abraão quando este último partiu para Harã é, em termos de trama literária, “o tema instigante de quem será o herdeiro” (Silberman, 19). Há um consenso entre os estudiosos bíblicos (p. ex., von Rad, Westermann, Clines, Kaiser, VanGemeren) de que o tema teológico que une pelo menos Gênesis 12— 36 é o da pro messa divina aos indivíduos Abraão, Isaque e Jacó. (Discorrerei abaixo sobre como a história de José [caps. 37— 50] perpetua esse mesmo tema, ainda que de modo um tanto distinto). As sim, pode-se citar uma declaração sobre Gênesis 12ss, feita von Rad, o qual considera Gênesis uma colcha de retalhos de diferentes tradições literárias e diz: “O todo possui, ainda assim, um sustentáculo que o apóia e dá coesão, a chamada promessa aos patriarcas” (1962-65; 1:167). Semelhantemente, Brevard Childs afirma que a promessa aos patriarcas em Gênesis oferece “o elemento constante em meio a todas as situações de mudança dessa história bastante diver sificada” (1979, 151). Pode-se observar, por exemplo, como a vida de Abraão e de Jacó, que são, claramen te, a preocupação do narrador (que dedica apenas um capítulo [26] exclusivamente a questões envolvendo Isaque) é repleta de visitações divinas. Num aspecto em particular, vê-se que em ambos os casos, o primeiro e o último discurso de Deus ao patriarca é de promessa. Assim, as primeiras palavras que Deus profere a Abraão são uma série de declarações, “farei... abençoa rei... engrandecerei...” (Gn 12.1-3) passando do imperativo (v. 1) para o futuro do indicativo (vv. 2-3). A última palavra de Deus a Abraão também começa com um imperativo (22.1) e ter mina com o futuro do indicativo (vv. 15-18). Da mesma forma, a primeira palavra de Deus a Jacó (->) é uma palavra de promessa (28.13-15, mas por motivos óbvios não traz um imperativo introdutório como 12.1) e sua úl tima palavra também é uma promessa (Gn 46.3-4). Assim como em Gênesis 22.1 ss., o padrão é um imperativo (46.3b), seguido de um futuro do indicativo (46.3c, 4ab). Abraão recebe sua revelação inicial fora da terra da promessa (em Harã ou em Ur, dependendo de como se traduz o vb. heb. em 12.1 a — no pretérito perfeito [“disse”] ou pretérito mais que perfeito [“dissera”]; cf. At 7.2]), mas quando está a caminho dela. Jacó, por outro lado, recebe sua primeira revela ção quando está a caminho dc Harã (28.10), tendo saído da terra prometida. Pode-se observar que, no caso de Abraão, a revelação ocorre exatamente no início do relato escriturístico de sua vida, apesar de Abraão já ser um septuagenário. No caso de Jacó, porém, a revelação ocorre depois da narrativa das Escrituras sobre vários acontecimentos na família envolvendo Jacó e seu irmão Esaú (25.26,27-34; 27.1 ss). Assim, no caso de Abraão, o leitor não tem como saber que tipo de pessoa é Abraão, ou como é o caráter dele, quando o cap. 12 começa. No caso de Jacó, é possível julgar-se alguns aspectos do caráter de Jacó, mesmo antes de Deus lhe dirigir, pela primeira vez, a palavra. E preciso, desde o início, mencionar três questões sobre essas promessas. Em primeiro lugar, o que discutirei sucintamente, é se todas essas promessas são, de fato, originais dentro das narrativas em que aparecem ou se, por algum motivo, foram inseridas posteriormente de maneira editorial. Grande parte dos estudiosos do AT tende a apoiar essa segunda opção. No entanto, um exame dos casos em que uma promessa aparece toma possível, aliás provável, que a perícope das promessas não seja um adendo. Se, por exemplo, elimina-se as promessas a Abraão em Gênesis 22.15-18, considerando-as secundárias em relação à narrativa original, uma posição adotada por vários exegetas, prejudica-se a narrativa em 22.1-14. Ou seja, o re 670
Gênesis: Teologia de
sultado seria uma narrativa truncada na qual a obediência fiel de Abraão ao levar Isaque para Moriá não tem nenhum resultado positivo, ou seja, que Abraão terá então muitos descendentes que possuirão as cidades de seus inimigos. A segunda questão a ser mencionada é o número e o conteúdo dessas promessas. Os estudiosos apresentam uma divergência quanto ao número de promessas distintas existentes no texto. Westermann (1980) distingue sete promessas origi nalmente independentes e identifica-as como promessas de: 1. um filho; 2. um novo território; 3. auxílio; 4. terras; 5. crescimento da descendência; 6. bênçãos e 7. uma aliança; sendo que as três primeiras, na opinião dele, encontram-se arraigadas no período patriarcal e, dessas três, a primeira — a promessa de um filho/herdeiro — é o principal aspecto da tradição da promessa. VanGemeren (104-8) relaciona quatro promessas distintas feitas aos patriarcas, identificando-as como: 1. descendência; 2. terra; 3. bênção pessoal e 4. bênção nacional. Clines (31-37) men ciona apenas três dessas promessas: 1. descendentes; 2. relacionamento e 3. terras. Os três concordam quanto à promessa de 1. descendência (Westerman: um filho e cres cimento da descendência; VanGemeren: descendência; e Clines: descendentes), 2. terras e 3. bênção, tanto pessoal quanto mediada. Gostaria de argumentar que esta última, a promessa de bênção mediada, é fundamental para as outras, constituindo, talvez sua pedra angular. Em quatro ocasiões um patriarca (Gn 12.3), um patriarca e sua descendência (28.14) ou a descen dência de um patriarca (22.18; 26.4) recebe a promessa de que será um canal de bênçãos para as famílias da terra. A primeira dessas quatro passagens. Gênesis 12.3, mostra por meio da sintaxe do ver sículo o enfoque dessa frase que, aliás, constitui seu clímax: “em ti serão benditas todas as famílias da terra”. Essa unidade (12.1-3) começa com um imperativo (“Sai”), continua nos vv. 2, 3a com vários conotativos na primeira pessoa do singular (“farei... abençoarei... engrande cerei...amaldiçoarei”) e um imperativo com um waw conjuntivo (v. 2d, lit., “para que tu sejas uma bênção”) — sendo que todas essas formas indicam propósito ou intenção. O ápice de uni dade é um futuro perfeito (“será abençoado,” nibr^kü). A força impressionante desse futuro perfeito eqüivale a fazer com que essa última oração como uma oração que expressa resulta do, “de modo que todas as famílias da terra sejam benditas por seu intermédio” (IBHS, 530; Miller, “Syntax,” 474). Essa promessa remete a capítulos anteriores de Gênesis e, ao mesmo tempo, refere-se a capítulos e episódios posteriores. A expressão “famílias da terra” sem dúvida contempla as nações posteriores a Noé mencionadas no cap. 10. Estas devem experimentara bênção de Deus por intermédio dessa família abençoada. Assim, Deus deixa claro para Abraão e seus descen dentes que são eleitos por amor e para o bem dos que não foram eleitos. A mesma promessa também encontra um cumprimento parcial em alguns dos episódios posteriores de Gênesis. Assim, Labão de Padã-Arã pode dizer ao genro Jacó: “Tenho experimen tado que o Senhor me abençoou por amor de ti” (30.27). A casa do egípcio Potifar é abençoada por causa de José (39.5; -> José). A presença de José no Egito salvou da fome não apenas a família de Jacó, mas todo o país do Egito. Por certo esses acontecimentos isolados não esgotam o cumprimento dessa promessa aos patriarcas. No entanto, são indícios, ou cumprimentos ini ciais de uma promessa divina, declarados por alguém de fora (30.27) ou pelo narrador (39.5), apontando de modo escatológico para um cumprimento ainda maior em eras vindouras. A terceira área a ser mencionada é a natureza fundamental dessas promessas. Pode-se observar que, predominantemente, essas promessas são feitas por Deus em caráter incondicional. A ausência da conjunção “se” em Gênesis é tão notável quanto sua presença em Êxodo, pelo menos do cap. 19 em diante (“Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a minha voz e guardardes a minha aliança...”, Êx 19.5). Esse elemento de incondicionalidade é anunciado de forma 671
Gênesis: Teologia de
clara tanto nas promessas em si quanto na aliança que Deus faz com Abraão e, por extensão, com seus descendentes (instituída em Gn 15.1-21 e confirmada em Gn 17.1-27). Em nenhuma outra parte, Deus acrescenta uma oração condicional com “se” à qualquer promessa feita a Abraão ou Jacó, sugerindo que a obediência ou fidelidade são uma condição essencial para o cumprimento de tal promessa. Observe-se que a primeira palavra de Deus para Abraão é uma ordem e não uma oração condicional, e esse padrão se repete ao longo do resto de Gênesis. Entre outras coisas, isso significa que as narrativas de Gênesis não sâo, em primeiro lugar, sobre a fé do patriarca, mas sim sobre a fidelidade de Deus. Isso não significa que em Gênesis a obediência ou fidelidade não tenham conseqüência alguma. Pelo contrário, são importantes e agradáveis a Deus. Afinal, o texto registra que Abraão creu nas promessas de Deus (15.6), ainda que a pergunta de Abrão fosse decorrente de decep ção e desencantamento (15.2, 8). Eis a resposta apropriada para uma palavra de Deus. Mais uma vez, na conclusão do episódio de Moriá, o Senhor diz a Abraão não uma, mas duas vezes, que “porquanto fizeste isso... porquanto obedeceste à minha voz” (22.16,18). Deus abençoará seus descendentes. Assim, uma vida de obediência fiel é uma das duas formas em Gênesis de exercer influência espiritual. A outra é a oração intercessora (18.16-33). E fato conhecido que as figuras patriarcais de Gênesis envolvem-se em atividades de caráter moral duvidoso para os leitores modernos do texto. Em duas ocasiões, Abraão incenti va a esposa a ser desonesta sobre a verdadeira natureza do relacionamento com ele (12.10-20; 20.1-18), colocando-a, assim numa posição vulnerável de possivelmente tomar-se uma adúl tera. E não é verdade que se alguém possuísse Sara sexualmente ela seria excluída do papel de esposa escolhida, mãe do herdeiro legítimo de Abraão? Seguindo a sugestão de Sara, Abraão coabita com outra mulher e tem um filho com ela (cap. 16). Isaque (->) imita a falsidade do pai quando também se vê numa situação vulnerável em terra estrangeira (cap. 26). Jacó (->) explora o irmão (25.29-34), engana o pai idoso e en fraquecido para obter uma bênção usando de falsos pretextos (cap. 27) e, mesmo depois de encontrar-se com Deus em Peniel e do que acontece ali em seguida, Jacó ainda mente para Esaú (33.12-18). Judá é pai de gêmeos com a nora que se disfarça de prostituta (cap. 38), e José acusa os irmãos falsamente (“Sois espiões,” 42.14), e depois age de modo clandestino (colocando dinheiro no meio dos sacos de cereais deles, 42.25) para dar a impressão de que são ladrões ou estão se esquivando de pagar os cereais distribuídos a eles. O que separa esses atos de transgressões semelhantes perpetradas, por exemplo, por Davi ou Salomão? No caso desses dois últimos indivíduos, cada um deles paga um alto preço pelo modo licencioso de viver. O que não acontece, porém, com os patriarcas. Em momento algum são censurados por qualquer atitude imoral. Trata-se do extremo oposto de Gênesis 3— 11, em que Adão, Eva, Caim, os contemporâneos de Noé e os construtores da cidade sofrem terríveis conseqüências por seus atos aberrantes. A única exceção a isso na história patriarcal encontrase nas palavras do Senhor a Abraão, “Porque se riu Sara e lhe disse...?” (Gn 18.13). (A atitude de Sara é influenciada pelo fato de que o marido é o único crente que ela conhece e de ela ser testemunha das incongruências dele? Se o único crente que alguém conhece age como Abraão fez em 12.10-20, então o que se deve pensar de seu Deus?) Pode-se acrescentar ainda a morte de Onã (38.8) depois de não cumprir suas responsabilidades de levirato para com o irmão fa lecido e a cunhada. Assim, encontramos a pergunta “Por que se riu Sara?”, mas não “Por que Abraão mentiu?” ou “Por que Jacó enganou?” ou ainda “Por que José tramou?” Além disso, há passagens em Gênesis 12— 50 nas quais pessoas de fora são castigadas por Deus em função do pecado. O gesto inadvertido de Faraó de tomar Sara para si provoca 672
Gênesis: Teologia de
grandes pragas (12.17). Os quatro reis poderosos do Oriente são humilhados e derrotados por Abraão e seu pequeno exército de 318 homens, tudo porque raptaram Ló (cap. 14). Sodoma e Gomorra são destruídas por causa de sua depravação (cap. 19). O Senhor cerrou a madre das mulheres do reino de Abimeleque por este haver tomado Sara para si (20.18). No entanto, não há episódios correspondentes nos quais os patriarcas são afligidos. Sara também era estéril, mas não em função de pecado ou do pecado do marido. Tomando como exemplo as histórias de “esposa passando-se por irmã” em Gênesis, certamente essas narrativas levantam questões éticas — p. ex., por que Deus castiga um ho mem inocente e permite que Abraão seja coberto de presentes, dando quase a impressão de uma recompensa ou lucro resultante de sua dissimulação? Em termos teológicos, porém, esses episódios funcionam em outro nível. A promessa feita recentemente de uma nação por meio de Abraão ainda valerá quando o recebedor dessa promessa der a impressão de a estar colo cando em perigo com seu comportamento? As nações da terra serão, de fato, abençoadas por um homem como esse? Deus tem um plano de emergência? O plano de Deus para a redenção está prestes a ser frustrado? O que será do povo de Deus quando a maior ameaça à promessa dele são os próprios recebedores dessa mesma promessa? A resposta teológica para essas per guntas é que “mesmo a insensatez de um homem crente, em última análise, nâo colocará em risco a promessa de Deus” (Marden, 32). Apesar dessas impropriedades morais, Deus não tem interesse em se livrar da família da promessa como objeto da bênção dele e luz e sal para as nações da terra, assim como não se sente tentado a descartar o equivalente da família escolhida de Abraão na nova aliança, ou seja, a ekklêsia, apesar de sua longa lista de torpezas. G. Coats (1980) chamou a atenção sugestivamente para o alto número de episódios em Gênesis nos quais o tema constante é 1. intimidade 2. rompida por conflito, 3. que por sua vez pode ou não acabar em reconciliação. Esse modelo aparece pela primeira vez nos três capítulos de abertura de Gênesis e prossegue até as narrativas de José (->), em que a discórdia entre José e seus irmãos é bastante parecida com as rupturas familiares sobre as quais se lê em Gênesis 3—4. Em todas essas narrativas, o tema da intimidade — conflito — reconciliação é funda mental e, em muitas delas, o tema da promessa é secundário, isso quando está presente. Esse padrão é bem evidente na narrativa sobre Jacó, a qual Coats explora detalhadamen te a fim de apoiar sua idéia. Vê-se irmão contra irmão, irmão e pai contra mãe e irmão, irmão contra pai, esposa contra esposa, genro contra sogro e vice-versa. Encontram-se presentes temas repetidos como exploração, dissimulação, ira e ressentimento profundos, adultério, poligamia, belas mulheres, ciúmes, manipulação, roubo, mentiras, estupro e violência. Na maioria desses incidentes, o comportamento de Jacó ocupa uma posição central. Somente em alguns dos casos seu envolvimento mostra-se periférico. No entanto, isso não torna menos interessante o fato de que nas quatro teofanias que Jacó experimenta (28.10-22; 32.22-31; 35.9-13; 46.2-4), Deus em momento algum questiona o comportamento de Jacó. O que o patriarca ouve é uma série de promessas incondicionais de Deus de abençoá-lo, dar-lhe uma multidão de descendentes, dar terras a esses descendentes e abençoar as famílias da terra por intermédio deles. A ausência de um comentário negativo sobre os patriarcas persiste nos livros históricos (p. ex., Josué 24), nos profetas (p. ex., Ml 1.2-3), nos Salmos (p. ex. SI 105, 106) e no Novo Testamento (At 7; Rm 9; Hb 11; Tg 2). (Os 12.2-4 é uma das poucas ocasiões em que um profeta condena o comportamento de um patriarca.) O que encontramos no restante do cânon do AT e do NT é uma interpretação teocêntrica de Gênesis 12— 50. Atos de impiedade nâo tiram a santa e diretiva vontade de Deus do curso. Gênesis ensina, e outras formulações bíbli cas posteriores repetem, que os patriarcas são os escolhidos de Deus, escolhidos para serem 673
Gênesis: Teologia de
abençoados e serem uma bênção e também para serem recipientes de uma promessa de alian ça feita primeiramente a Abraão e depois confirmada a Isaque e Jacó. Nas palavras de Childs (1985,215), “É impressionante ver até que ponto as dificuldades éticas da história de Gênesis são completamente desconsideradas. A narrativa tem por objetivo ilustrar algo inteiramente distinto, a saber, a fidelidade de Deus”. A história de José (Gênesis 37— 50; José) concentra-se na íntegra no destino de José, filho de Jacó, excelo pelo caps. 38 e 49.1-28. O elemento comum a essas duas exceções é a presença de Judá, o irmão de José. A primeira passagem retrata Judá de modo pouco atraente, tendo em vista seu relacionamento com Tamar, sua Nora e, como tal, é contrastado no cap. 39 com José, que se mostra fiel e virtuoso. E, no entanto, nas palavras de Jacó sobre Judá, em 49.812, Judá deve liderar seus irmãos que “se inclinarão” a ele. Judá terá “o cetro” e “o bastão” de governante. Assim como seu pai antes dele, suas fraquezas e loucuras no relacionamento com outros parecem não impedir que ele seja escolhido para servir de canal por meio do qual Deus abençoará todos os povos da terra. Não há discursos divinos, teofanias ou epifanias em Gênesis 37— 50, de modo que, nessa parte de Gênesis, não se pode encontrar promessas a pessoa alguma semelhantes àquelas feitas a Abraão, Isaque e Jacó. Ainda assim, a seu próprio modo, a narrativa de José contribui para a motivação teológica de Gênesis 12— 36. De modo semelhante às narrativas patriarcais, certamente afirma a fidelidade de Deus. O próprio José declara esse fato em suas famosas pa lavras de Gênesis 45.8 e 50.19-21. Gênesis 37—50 também dá destaque para o povo de Deus em circunstâncias que podem dar cabo da vida desse povo. Ao contrário de Abraão, que conseguiu ir ao Egito para escapar da fome em sua terra, e de Isaque que pôde fugir para a nação vizinha da Filístia, logo depois que é raptado e levado para o Egito, José descobre que aquela terra também está sujeita à fome. No caso de Abraão, a seu ver, era sua própria segurança que estava em jogo (12.10-20). Sara é incapaz de conceber e, mais tarde, Abraão recebe a ordem de colocar o verdadeiro e tão espe rado herdeiro, o filho da promessa, aquele que ri, sobre o altar de sacrifício (cap. 22). Poderão as promessas de Deus vencer essas ameaças ou circunstâncias desanimadoras? Sem dúvida as promessas de Deus são mantidas. Na história de José, perguntamo-nos se o povo de Deus so breviverá àquela fome devastadora. Acontecerá de os descendentes de Abraão, agora no estádio embrionário de se tomarem como a areia da praia e as estrelas do céu, serem exterminados? Ou um Deus fiel manterá viva sua promessa e assim, de algum modo, salvará seu povo da morte pela fome? A história de José dá uma resposta afirmativa a essas perguntas. Também deixa claro que, mesmo em circunstâncias excruciantes, o Deus de Abraão, Isaque e Jacó pode usar seu povo para trazer bênçãos a uma família da terra — os egípcios, em cujo território o povo de Deus reside temporariamente. Mas o Egito jamais deve tomar-se o lar do povo de Deus. Assim, as últimas palavras de Jacó a seus filhos, na forma de uma bênção profética, indicam o que acontecerá a eles “nos dias vindouros” (49.1), e as últimas palavras de José à família são um testemunho da fidelida de de Deus (50.24-25). Nos caps. 1— 11, lemos sobre indivíduos que tinham terras mas que as estão perdendo ou sendo expulsos delas. Nos caps. 12— 50, a ênfase é sobre indivíduos que não têm terras, mas estão em vias de obtê-las. Um grupo está perdendo seus direitos enquanto outro está esperando por eles (Brueggemann, 15).
B. Temas teológicos 1. Criação. Tanto o AT como outras obras da literatura do OMA apresentam somen quatro métodos de criação: pela palavra, pela ação, por atos sexuais ou combate contra forças 674
Gênesis: Teologia de
do mal. Gênesis 1 ressalta o primeiro desses métodos, enquanto 2.4-25 concentra-se no se gundo. Assim, a criação é resultado daquilo que Deus diz e faz. Por motivos óbvios, o terceiro método não aparece de modo algum nas Escrituras. Aliás, a ausência de um cônjuge para Deus, aquele que transcende toda a sexualidade (a qual é uma estrutura da criação), é um fenôme no que distingue o AT dos modelos do OMA. Há referências posteriores esparsas, todas elas nos textos poéticos, que associam a criação com Deus subjugando o monstro (SI 74.13-15; Is 51.9-10), mas nada desse tipo encontra-se presente nos capítulos de criação em Gênesis (-> br', criar, # 1343). Dizer que o mundo é criação de Deus eqüivale a fazer certas declarações teológicas, a. Chamar Deus de “Criador” e todo o resto de “criatura” é afirmar o caráter completamente se parado e transcendente de Deus. A linha de demarcação entre Criador e criatura não pode ser apagada nem obscurecida, assim como os dois também não podem jamais se misturar numa forma de panteísmo ou misticismo. b. Por outro lado, chamar Deus de Criador também é o mesmo que afirmar sua natu reza generosa, receptiva e carinhosa. Deus não cria com o propósito de preencher alguma ne cessidade não suprida em sua existência. Antes, a criação é necessária pois Deus é um Deus de amor, que se deleita em compartilhar vida com outros. Assim as Escrituras ensinam tanto a criação quanto a salvação pela graça. c. Ao dizer que tudo, exceto Deus, é criatura, estamos afirmando que a criatura é ra dicalmente dependente do Criador para a vida e para o sustento e que o preenchimento dessa circunstância determinada por Deus só ocorre quando a criatura admite prontamente a própria finitude e dependência. A serpente no jardim do paraíso (Gênesis 3) consegue convencer o pri meiro casal de que tal dependência não é liberdade, mas sim, escravidão. d. Apesar de sua dependência e finitude, a criação é boa (porém não perfeita). Ao pensar em termos de Gênesis, “dependente” e “finito" não são sinônimos de “pecaminoso”. Antes, de finir a criação dessa forma indica possibilidades de risco e crescimento. E interessante observarse que a criação de Deus move-se em direção ao seu auge não na criação da humanidade, mas no descanso e na celebração (Gn 2.1-3). Os dias de trabalho são chamados de “bons”, mas o dia de descanso e reflexão sobre o que é bom, é chamado de “santo” (2.3). e. Afirmar que toda a criação de Deus é boa eqüivale a dizer que nada é inerentemen te mau. O mal, o pecado e Satanás não são fenômenos cuja origem Gênesis explica. Antes, o que faz é afirmar que essas realidades são intrusas na criação de Deus e, em momento algum, originais. f. Interpretar fielmente Gênesis 1—2 é o mesmo que fazer certas afirmações sobre a humanidade que a distinguem do resto da criação. Somente o ser humano é criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1.26-27). Assim, a diferença ente a humanidade e o resto da cria ção é qualitativa e nâo apenas quantitativa. Mas o que significa essa imago Dei? Refere-se à postura, à imaginação/criatividade ou é, como se supõe com freqüência, a capacidade de ra ciocinar? E este último conceito que tem predominado no cristianismo ocidental. Seu ponto fraco é que se concentra exclusivamente na capacidade intelectual da humanidade, desvalori zando, desse modo, outros aspectos da existência humana como as emoções. Outra sugestão é compreender a imago Dei de modo relacionai. Gênesis 1 e 2 parecem apoiar essa idéia. Ser portador da imagem de Deus é ser capaz de viver num relacionamento correto com Deus, com as outras criaturas, com o resto da criação e consigo próprio. Essa imagem é deslustrada pela corrupção desses relacionamentos. 2. Eleição. O vb. heb. para eleição ou escolha, bhr (-> # 1047), ocorre somente u vez em Gênesis, quando descreve um ato humano: “os filhos de Deus... tomaram para si 675
Gênesis: Teologia de
mulheres, as que, entre todas, mais lhes agradaram [que eles escolheram]” (Gn 6.2). O uso pouco freqüente desse vb. ou de seus derivativos em Gênesis é oposto ao que ocorre em Deu teronômio e nos livros deut. relacionados do AT, em que o vb. é muito mais usado. Apesar de o vocabulário referente à eleição praticamente não aparecer em Gênesis, não faltam episódios envolvendo Deus na sua eleição de povos e indivíduos. Começam na história primitiva, com o nascimento de Sete (Gn 4.25) como sucessor de Abel e com Noé, cujo propósito de vida foi anunciado logo depois do nascimento dele (5.29); prosseguem com o chamado de Abrão para que deixe sua terra natal e família (12.1); chegam ao auge na escolha de Isaque em vez de Is mael (21.12) e de Jacó em vez de Esaú (25.23); e deslocam-se rumo à conclusão na história de José que foi “enviado” por Deus para o Egito (45.5, 7-8) para “conservar [a] sucessão na terra” da família eleita (45.7). Diante dessas histórias, considerando-se também reflexões do NT sobre elas (p. ex., Romanos 9— 11), que afirmações teológicas podemos fazer acerca da eleição? a. a eleição su blinha o elemento da soberania divina. Deus é soberano tanto como Criador quanto como Re dentor. A humanidade não pode ditar-lhe as condições para sua criação ou redenção, pois estas são determinadas exclusivamente por Deus. Uma das coisas que Deus determinou de modo soberano é que os homens tomam-se aquilo que são. E impossível seguir um certo tipo de vida e escolher um destino sem levar-se em consideração esse estilo de vida. Assim, em última aná lise, Deus determina o destino da humanidade. b. Deus é soberano com referência à decisão de redimir pela graça. A humanidade não poderia iniciar esse processo. Além disso, Deus é soberano para determinar a condição para a graça, e essa condição, que Deus determinou de modo soberano, é a fé (Gn 15.6). c. Deus é soberano com referência à determinação de quem satisfaz essa condição. Os homens não podem determinar isso por si mesmos. Além disso, tal determinação é feita de antemão, desde a eternidade. Por que Deus não apenas determina tais coisas, mas também as revela de antemão (Gn 25.23)? Isso se dá simplesmente para ressaltar que todas essas coisas se baseiam na misericórdia e nâo em obras de justiça. Remove-se, assim, qualquer idéia de eleição do ponto de vista de retribuição ou mérito e coloca-se a eleição inteiramente na esfera da misericórdia. d. Em Gênesis (e em outras partes do AT), a eleição é relacionada a uma função e não primeiramente à salvação e ao relacionamento de um indivíduo com Deus. Os eleitos são es colhidos por amor aos que não são eleitos “para ser uma bênção aos povos da terra” (usando a linguagem de Gênesis) e "para ser luz às nações” (usando-se da linguagem de Isaías). Assim, a eleição tem por objetivo “ser um meio particularista com um fim universal” (Vos, 77). 3. Revelação. Três vbs. heb. são especialmente proeminentes na linguagem da revelaç no AT: a. glh (-> # 1655), usado com mais freqüência no ni. ou hitp. tendo Deus como sujei to; b. r 'h (-> # 8011), no q. tendo um ser humano como sujeito ou no ni. tendo Deus como o agente da revelação e c. y d ' (-> # 3359), no ni. como um reflexivo. a. glh (ni.) ocorre somente uma vez, em Gênesis 35.7: “Porque ali Deus se lhe revelou [a Jacó], quando fugia da presença de seu irmão” . b. r ’h (ni.) tendo Javé/Elohim como sujeito é usado com mais freqüência (“Apareceu o Senhor a X”). Ver Gênesis 12.7; 17.1; 18.1 [a Abraão]; 26.2,24 [a Isaque]; 35.9; 48.3 [a Jacó], (Gn 46.29 mostra que o ni. de r ’h também pode descrever um encontro de pessoas: “Então, José ... Apresentou-se, lançou-se-lhe ao pescoço [de Jacó] e chorou assim longo tempo”.) c. vd' (ni.) não aparece em Gênesis dentro de um contexto de revelação, mas cf. Êxodo 6.3: “Apareci (/• 7», ni. + ’et) a Abraão, a Isaque e a Jacó como Deus Todo-Poderoso; mas pelo meu nome, o Senhor, não lhes fui conhecido”. 676
Gênesis: Teologia de
Tendo em vista o fato de que esses três vbs. são usados no AT no contexto secular, e, especificamente, que cada um deles pode-se referir à relação sexual, pode-se sugerir que os termos empregados pelo AT para descrever a revelação dc Deus de si mesmo ao seu povo são tomadas emprestadas de um relacionamento erótico e matrimonial entre cônjuges. Quer seja Deus falando a Abraão ou um homem relacionando-se sexualmente com a esposa, cada um está se revelando a outro. Seria difícil, porém, concluir a partir de Gênesis que, a revelação divina significa “automanifestação”. Afinal, o grande Moisés teve o privilégio de ver as costas de Deus, mas não a face (Êx 33.18-23). Quando lemos que “Falava o Senhora Moisés face a face” (33.11), mas poucos vv. depois que “Não me poderás ver a face” (33.20), não se trata de uma contradição. A primeira referência indica que havia uma troca verbal direta entre Deus e Moisés, enquanto a segunda referência indica que a identidade de Javé permaneceu oculta a Moisés. Se observarmos alguns relatos de revelação em Gênesis, encontramos essencialmente a mesma coisa que em Êxodo, ou seja, que Deus se revela aos homens não para seu próprio benefício, mas para o benefício da humanidade. Quando, por exemplo, Adão e Eva (Gn 3.913, 16-19) ou Noé (7.1-4; 9.1-7) experimentaram a revelação divina como representantes da humanidade, o propósito não foi apenas a comunhão intima e pessoal entre Deus e Adão / Noé, mas também que cada um recebesse instruções de Deus sobre o futuro da comunidade huma na. Semelhantemente, a revelação de Deus a Abraão (Gn 12.1-13,7; 15.1-5, 7,9-21; 17.1-22, etc.) e a Jacó (28.10-22; 32.22-32; 35.9, 10) não é um desvelamento divino particular para o beneficio dos patriarcas. Bem no centro dessas revelações, encontra-se um Deus que age e que irá agir. Com Abraão e Jacó, ele está iniciando uma obra redentora que nenhum dos dois vive ria para ver. Assim, a revelação original a Abraão e Jacó é, por fim, uma palavra de revelação para a comunidade formada por seus descendentes. B ib l io g r a f ia
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Gesém
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# 1384 (brk I, ajoelhar-se)
Gerizim -> Ebal
ç es£m
Gesém (Dtt?3 [gesem II], # 1774;
[gasmú], #
AT 1. A oposição de Gesém, Sambalate e Tobias deve ser considerada no contexto da teo logia de Esdras e Neemias (estruturada a partir de Jeremias 24) de que o futuro dos judeus encontrava-se naqueles que haviam sido exilados na Babilônia e não nos que haviam se res sentido com esse propósito de Deus em particular. 2. Mencionado pela primeira vez em Neemias 2.19, Gesém aparece como o último membro de um triunvirato (juntamente com Sambalate e Tobias) cujo objeto era desacreditar Neemias (->) em sua tentativa de guardar as defesas de Jerusalém no reinado de Artaxerxes (provavelmente o primeiro com esse nome, chamado Longanimus) em 445-444 a. C. Gesém é chamado de “o arábio” e tanto a forma arabizada de seu nome em Neemias 6.6 (Gasmu) como a estima especial conferida a ele na Arábia podem indicar que ele era o Gasmu/Gesém citado como pai de Qaynu (Caim), rei de Quedar numa inscrição em aram. numa tigela de prata de Sucote consagrada à deusa árabe Han-ilate (a al-Lat de Qumran), do final do século V a. C. Os árabes haviam chegado à região ao final da Idade do Ferro II e Quedar abrangia o norte da Arábia, Edom (o inimigo recente de Israel), o Neguebe judeu e o território que ia até a frontei ra leste do Egito. Portanto, a conspiração de Gesém com Sambalate para fazer mal a Neemias em Ono (Ne 6.1-2) teria levado Neemias para mais perto do território de Gesém (e de Samaria, a região de Sambalate) ao mesmo tempo em que estaria longe de sua própria cidade e de sua esfera de influência. Um Gesém (o mesmo?) também é citado juntamente com o governador persa de Dedã, possivelmente no mesmo período, numa inscrição em aram. de Bete-Searim. O nome significa “o gordo” ou “homem robusto”. 3. Ao que parece, Sambalate (# 6172), chamado de “o horonita” em Neemias 2.10 era Sambalate I, mencionado como governador de Samaria no reinado de Dario II em 408-407 678
Gesém
а. C. nos papiros de Elefantino (cf. n. 30, linha 29, grafado sn "bit). Tanto seu cargo quanto os nomes teofóricos dos filhos Delaias e Selemias indicam que Sambalate era javeísta e, portan to, mais provavelmente originário das vilas judias de Bete-Horom do que da cidade moabita de Horonaim (cf. Jr 48.3). Seu próprio nome, porém, é babilônio (significa “o pecado deu vida”), talvez indicando que ele fosse de linhagem judia não exilada e sincrética. De acordo com o relato, ele é o líder das tentativas por parte da população nativa da Palestina de impedir a reconstrução de Jerusalém pelos exilados que haviam voltado da Babilônia tendo Neemias como governador, de 444 a. C. em diante (Ne 4.1-9; 6.1-19); para isso, ele usava da intimi dação, da ridicularização e da dissimulação como armas principais e planejava um ataque militar aos construtores e até mesmo o assassinato do governador. Uma filha de Sambalate era casada com o filho (ou neto) do sumo sacerdote judeu (Ne 13.28), o que levou Neemias — depois de ter voltado de um período de licença (Ne 13.6-7) — a expulsar o marido dela da comunidade dos judeus — ou pelo fato de a filha de Sambalate não ser judia (cf. Lv 21.14) ou porque Sambalate era inimigo dos judeus. Uma versão imprecisa dessa história é relatada por Josefo (Ant. XI:vii.2). 4. Juntamente com Sambalate e Gesém, Tobias se opôs ao plano de reconstrução de rusalém encabeçado por Neemias, completando desse modo, o quadrilátero de inimigos ao redor de Judá (Samaria ao norte, Asdode a oeste, os árabes ao sul e Amom a leste, cf. Ne 4.7). Um dos quatro Tobias do AT, esse é chamado de “o servo amonita” em Neemias 2.10, significando que era um escravo ou oficial de uma província e distinguindo-o como membro de uma raça cujo acesso ao templo de Jerusalém era negado (Dt 23.3). Não fica claro se Tobias (seu nome é javeísta e significa “Javé é [meu] bem”) era o governador persa de Amom ou simplesmente um subordinado palestino de Neemias (cf. também Ed 2.59-60 — os filhos de Tobias que nâo puderam provar a linhagem). Por vezes o nome desse Tobias aparece antes do de Sambalate (p. ex., Ne 6.12, 14), e Tobias age por conta em própria Neemias 6.17-19 (contrastar com Ne б.1, em que a ausência de uma preposição antes do nome pode indicar que este é secundário). Tinha uma rede de espias, aliados e uma esposa e uma cunhada, ambas judias (Ne 6.18), bem como uma câmara na área do templo (Ne 13.1 -9), da qual Neemias providenciou para que To bias fosse expulso como um estrangeiro indesejado, apesar da proteção de Eliasibe, o camerarius (e que, portanto, provavelmente não era Eliasibe o sumo sacerdote, cf. Ne 3.1). Na era helenista, a família de Tobias exerceu grande influência na Transjordânia (p. ex., 2Mac 3.11; Josefo, Ant. XH:iv.2). -> Neemias: Teologia B ib l io g r a f ia
W. F. Albright, The Archaeology ofPalestine, 19604, 145; F. M. Cross, “The Discovery ofthe Samaria Papyri”, BA 2 6 ,1963,110-21 (=E. F. Campbell and D. N. Freedman, eds., The Biblical Archaeologist Reader 3, 1970, 237); idem, “Geshem the Arabian, Enemy o f Nehemiah”, BA 18, 1955,46-47; C. C. McCown, “The Araq el-Emir and the Tobiads”, BA 20, 1957,63-76; B. Mazar, “TheTobiads”, IEJ 7,1957, 137-45,229-38; I. Rabinowitz, “Aramaic Inscriptions ofthe Fiflh Century B.C.E. from aNorth-Arab Shrine in Egypt”, JNES, 15, 1956, 1-9; H. H. Rowley, “Sanballat and the Samaritan Temple”, BJRL, 38, 1955-56, 166-98; F. Vattioni, “L’inscription 177 de Beth She-arim et le livre de Néhémie”, RB 80, 1973, 261-63. P. J. M. Southwell Gesso -> # 8486 (syd, caiar, estucar, engessar) 679
Gibeá
Gibeá
Gibeá (HM? [gib a II], [# 1497]).
AT 1 .0 termo heb. gib ‘â é usado no AT como uma designação, significando colina (gib ‘à I; -> # 1496), e também como um topônimo para vários lugares diferentes (gib'â II). Este ar tigo trata apenas do uso toponímico, ainda que, por vezes, seja difícil determinar-se o signifi cado pretendido num determinado contexto bíblico. A compreensão de algumas passagens é complicada ainda mais por uma relação indefinida entre gebci ‘ e o termo próximo gib ‘â, que também é usado no AT tanto como subs. comum, colina quanto como NG, traduzido por Geba. A discussão seguinte considerará o uso toponímico de gib ' á e a relação entre gib ‘â e geba bem como as principais passagens bíblicas que mencionam Gibeá de Benjamim, o local mais proeminente com esse nome na Bíblia. 2. É possível que pelos menos três locais do AT se chamassem Gibeá: a. uma Gibeá que fazia parte das cidades entregues a Judá na região montanhosa (Js 15.57; cf. vv. 21,48); b. uma Gibeá na região montanhosa de Efraim, onde Eleazar, o filho de Arão, foi sepultado (Js 24.33; apesar de não se ter certeza se gib 'al pirfihãs deve ser lido como Gibeá de Finéias ou como uma designação simples, colina de Finéias) e c. uma Gibeá no território de Benjamim, que ocupa uma posição de destaque em várias passagens a serem consideradas logo a seguir. Uma outra gib 'â benjaminita mencionada em Josué 18.28 provavelmente deve ser considerada um subs. comum; sendo que a oração gib 'al qiryat 'ãrím no v. 28 seria então traduzida como “monte de Quiriate, Jearim, cidades...” pressupondo uma perda por haplografia de u m / W w no original antes de ‘ãrím (ver Amold, 21-24). Sem dúvida alguma, a Gibeá mais proeminente no AT é a Gibeá de Benjamim, e nela se concentrará nossa discussão. Duas perguntas importantes continuam a gerar controvérsias sobre a Gibeá de Benjamim: Onde se localiza? e qual é sua relação com a Geba [Gaba] de Ben jamim? Um relato interessante do estudo dessas perguntas ao longo último século e meio foi feito por Amold (39-54). Num breve sumário, estes são os pontos mais relevantes. Em 1841, E. Robinson deu início à busca por Gibeá de Benjamim ao sugerir que Gibeá e Geba deviam ser considerados topônimos diferentes para o mesmo local ou, pelo menos, para locais bas tante próximos a serem associados com a cidade moderna de Jeba‘ c. 10 quilômetros ao nor te de Jerusalém, ao sul do rio VVadi es-Suweinit e do outro lado da atual Mucmas (a Micmás bíblica). Posteriormente, Robinson mudou de idéia em função de Juizes 19.10-14 e associou Gibeá à Tell el-Fúl (c. 5 quilômetros ao norte de Jerusalém) enquanto continuava a associar a cidade bíblica de Geba à Jeba‘. As escavações de A. W. Albright em Tel el-Fúl nas décadas de 1920 e 30 reforçaram um conceito acadêmico emergente de que a capital do rei Saul em Gibeá de Benjamim devia, de fato, ser associada a Tel el-Fúl. No entanto, a publicação por L. Sinclair (1960) dos resultados detalhados da expedição de Albright em 1933, juntamente com um estudo arqueológico subseqüente do local por P. Lapp (1965), levou alguns estudiosos a questionar essa identificação. Hoje em dia, a maioria dos estudiosos está voltando à idéia mais antiga de que tanto Gibeá quanto Geba devem ser associadas a Jeba‘ (p. ex., Wentz; Miller; Arnold). Para uma solução da aparente distinção entre Geba e a Gibeá de Saul em Isaías 10.29, ver Amold, 57-58. 3. Ainda restam incertezas e, por vezes, essas incerteza dificultam a determinação dos detalhes topográficos de episódios bíblicos nos quais Gibeá de Benjamim é mencionada (Ar nold, Demski, Lombardi, Miller), mas o conteúdo teológico desses episódios não é afetado de forma relevante. a. O primeiro trecho narrativo no qual Gibeá de Benjamim se destaca encontra-se n epílogo do livro de Juizes. Referente a um tempo em que “não havia rei em Israel; cada qual 680
Gibeá
fazia o que achava mais reto” (Jz 17.6; 21.25; cf. 18.1; 19.1), Juizes 19 relata a jornada a Belém de Judá de um levita que vivia em Efraim para recuperar sua concubina que havia fugido para a casa do pai. Depois de abusar por mais de quatro dias da hospitalidade do pai da concubina, o levita finalmente começa a viagem de volta para casa ao fim do quinto dia (Jz 19.4-10). Quando cai a noite, o grupo do levita só conseguiu chegar até Jebus (Jerusalém); o levita se recusa a pro curar hospedagem em Jebus e insiste que o grupo todo deve passar a noite numa cidade israelita (19.11 -13). Ao chegarem em Gibeá de Benjamim, a princípio não encontram nenhuma acolhida mais; por fim, são hospedados na casa de um efraimita que morava na cidade (19.14-21). Na quela noite, “homens daquela cidade, filhos de Belial” cercaram a casa e exigiram que o levita lhes fosse entregue para que abusassem sexualmente dele (19.22). (-> Juizes: Teologia) Bastante parecido com um episódio ocorrido na casa de Ló em Sodoma (Gênesis 19), o incidente do Levita, porém, tem um fim muito mais trágico. O hóspede levita de Juizes 19 não cega os homens perversos de modo que não possam encontrar a porta, como haviam feito os hóspedes de Ló (Gn 19.10-11). Em vez disso, lança sua concubina para o meio daqueles homens que então abusam dela até o amanhecer. A morte dela, que ocorre em seguida, o des membramento realizado pelo levita e o envio dos restos mortais da mulher para todas as partes de Israel desencadeiam um conflito entre as tribos que resulta em grande número de mortos (Juizes 20) e quase extermina a tribo de Benjamim (Juizes 21) — uma tragédia que só foi evi tada por um outro abuso de mulheres (Jz 21.15-23). Assim, a primeira menção importante à Gibeá de Benjamim no texto das Escrituras não é nada auspiciosa, pois, apesar de ser israelita, a cidade não é nem um pouco melhor do que Sodoma, tão famosa por sua perversidade. E em Gibeá, não há nenhuma intervenção divina de salvação. b. A segunda aparição importante de Gibeá ocorre nas narrativas que descrevem o reina do de Saul, filho de Quis (1 Samuel 9—31), o primeiro rei de Israel. Gibeá de Deus (gib 'at hã ’elõhim), que possivelmente deve ser identificada com Gibeá de Benjamim, é o local do terceiro sinal confirmando a unção de Saul para liderar o povo de Deus (1 Sm 10.5) e o lugar onde seu primeiro ato de rebelião contra os filisteus — “faze o que a ocasião te pedir” (10.7) — deveria ter ocorrido, mas nada aconteceu (cf. ISm 13.3; -> Saul; para um estudo completo, ver Long). Gibeá também é o lugar para onde Saul voltou depois de ter sido escolhido pelo lançamento de sortes em 1 Samuel 10.17-27, a ocasião em que Saul foi encontrado “escondido entre a ba gagem” . E o local para onde foram enviados mensageiros em busca de um libertador quando Jabes-Gileade encontrava-se sitiada, e também o lugar de onde Saul, fazendo lembrar o levita de Juizes 19, enviou partes (dessa vez de bois) para toda a terra de Israel a fim de reunir o povo para a guerra (1 Samuel 11). Em Gibeá, pela primeira vez Saul foi repreendido abertamente por Samuel (cap. 13) e foi para lá que Saul voltou depois de ter sido rejeitado definitivamente por Samuel (cap. 15). É o lugar de onde Saul coordenou as tentativas de destruir Davi que lhe parecia um rival perigoso (22.6; 23.19; 26.1). E ainda o local onde sete dos descendentes de Saul foram executados pelos gibeonitas para se vingarem de uma injustiça cometida por Saul contra eles (2Sm 21.1-14). Em resumo, a associação de Gibeá com Saul não contribui para melhorar a imagem nem dele, nem da cidade. (-> Samuel: Teologia) c. A terceira menção de importância de Gibeá encontra-se no livro de Oséias. A cidade é usada especificamente como um ponto negativo de comparação ao qual a Israel dos tempos de Oséias é assemelhada em termos de perversidade e corrupção. A oração “nos dias de Gibeá”, que ocorre em Oséias 9.9 e 10.9 é quase certamente uma alusão aos acontecimentos funestos de Juizes 19—21, em que Gibeá de Benjamim apareceu pela primeira vez com maior destaque. Assim, nos três contextos teologicamente significativos em que Gibeá de Benjamim aparece, ela traz consigo associações negativas. 681
Gideão
B ib l io g r a f ia
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Gideão
Gideão (tilHJ [gid‘ôn], # 1549).
AT A colocação literária e a estrutura dessa história são inteiramente de natureza teológica. Como resultado da perversidade de Israel, o Senhor havia colocado os israelitas sob a opressão intensa dos midianitas (Jz 6.1-3). Essa situação levou Israel a clamar ao Senhor (6.6). Deus respondeu, mas não sem que antes relatasse pelos lábios de um profeta a recusa de Israel em obedecer ao Senhor (Jz 6.7-9). Gideão, juntamente com Moisés (Êxodo 15) e Débora (Juizes 5), ilustra o modelo divino de “guerra santa” na qual Javé é o guerreiro (-> Guerreiro Divi no: Teologia). O Senhor livrou Israel do clã dos abiezritas da tribo de Manassés pela mão de Gideão, chamando-o para essa incumbência por meio de um mensageiro (m al'akyhwh) que apareceu a Gideão (Jz 6.11-12). Gideão é chamado de “homem valente” {gibbôr hehãyil, Jz 6.12) e com ele a vitória é certa (Jz 6.14, 16). O mensageiro do Senhor concedeu a Gideão três sinais para assegurá-lo de que dev cumprir a missão do Senhor (Jz 6.20-22, 36-40) que era livrar (yi') Israel (Jz 6.36, 39). Gi deão humilhou Baal destruindo-lhe o altar (6.25,26) e usando a madeira do bosque de Aserá para oferecer holocausto para Javé (vv. 26, 28). Depois disso, o nome de Gideão foi mudado para Jerubaal (y^rubba ‘al, que Baal contenda), pois desafiou Baal para que, se fosse um deus, tratasse ele próprio de Jerubaal. A orientação e o livramento de Deus são temas desenvolvidos com cuidado ao longo dos capítulos restantes. O Senhor livrou Israel (Jz 7.2, 7), mas não pelo poder do próprio povo ou pela força de Gideão (7.2, 7, 9). O Espírito do Senhor conduziu Gideão a entrar em ação, e o Senhor colocou seu temor sobre os midianitas, amalequitas e outros povos, derrotando-os (7.12-15). Deus fez uso de um sonho para desmoralizar o inimigo; o ardilde Gideão deixou o inimigo em pânico. Gideão mostrou seu lado impiedoso ao exterminar os adversários (8.10-21), mas a de dicação extrema dele em seguir ao Senhor fica clara quando se recusa tomar-se rei a pedido dos israelitas, afirmando: “o Senhor vos dominará (msl)” (8.23). No entanto, evidenciou-se a propensão de Israel a ser seduzida pelos padrões monárquicos dos cananeus (8.22). A estola que Gideão criou com os espólios dos ismaelitas foi uma idéia insensata que acabou servindo de cilada (môqês), mas foi o povo que “se prostituiu (znh, # 2388) ali após ela” (8.27). Gideão foi abençoado com setenta filhos (cf. Êx 1.1-7), dentre os quais um com uma concubina cananéia que deu à luz Abimeleque (->), aquele que tentaria estabelecer o reinado 682
Gigantes, Heróis, Valentes
cananeu que Gideão havia rejeitado. Todo o bem que Gideão e sua família fizeram não tardou a ser esquecido. Gideão constitui um exemplo por excelência de juiz e libertador, levantado por Javé para libertar seu povo (cf. Hb 11.32). B ib l io g r a f ia
ABD 2:1013-15; IDB 1:9-10, 2:393-94; NDB 2:4, 420. Eugene Carpenter/Michael A. Grisanti
1. A palavra “gigante(s)” é atestada no AT como a tra dução de três subs. diferentes: a. gibbôr(im) (Jó 16.14 [LXX dynamenoi; guerreiro]). Em outras passagens (p. ex. 2Sm 10.7; 2Sm 23.8), é traduzido como “valentes” ou termos semelhantes. A LXX, porém, usa gi gas/gigantes para gibbôr(ím) em Gênesis 6.4; 10.8-9; 1 Crônicas 1.10; Salmos 19.5 (6; LXX 18.6); 33.16 (LXX 32.16); Is 3.2; 13.3; 49.24-25; Ez 32.12, 21, 27; 39.18, 20 (# 1475). b. nepílim (Gn 6.4; Nm 13.33 [2x]; # 5872). A LXX traduz o termo como gigantes nos dois versículos. c. hãrãpâ (2Sm 21.16, 18,20 [LXX Rapha], 22 [LXX “descendentes dos tõn gigantõn em Gate, a casa/família de Rapha"]-, # 8335). d. [h]rp'\ym] II (Dt 2.11, 20; 3.11, 13; Js 12.4; 13.12; 15.8; 17.15; 18.16; lC r2 0 .4 ,6 [LXX gigantes], 8 [LXX Rapha e gigantes; # 8325; sg.]; # 8328; pl.). A LXX também apre senta a tradução gigantes em Gênesis 14.5, Josué 12.4; 13.12; 1 Crônicas 11.15; 14.9. Apesar do uso geral da LXX, pode-se dizer que “a verdadeira palavra heb. para gigante é... raphah... e... a variação rapha ’”(Beecher, 166). Evidências cognatas para compreender o significado do radical rp' em vários contextos do AT são especialmente fortes no ugaríticas. Observe-se o seguinte texto de encantamento classificado como RS 24.252 {= KTU 1.108): Gigantes, Heróis, Valentes
1 [hl]n . y s t. rpu . mlk . 'Im . wyst 2 [ iljg tr . wyqr. i l . w[b . b ‘ttrt 3 i l . tp t. bhdr‘y . dysr. wy4mr Vêde! Deixai que o Herói-Guerreiro, o rei eterno, bebei! E deixai que beba o Deus que habita em ‘Athtartu, [o deus] Gathru-e-Yaqaru, o deus que governa em Haddura‘iyu, que canta e toca! Assim, o ugar. rpum, uma guilda (semi)divina de reis guerreiros, aparentemente tinha como quartel general Astarote e Edrei, os mesmos dois centros controlados pelos refains na Bíblia (Js 12.4; 13.12) (de Moor, 187, n. 3; Youngblood, EBC 3:865, n. 18). Os refains eram os habitantes pré-israelitas da região da Transjordânia, famosos por terem grande estatura (Gn 14.5; 15.20; Dt 2.10-11,20; 3.11,13; Js 17.15). A região toda de Argobe em Basã costumava ser conhecida como a terra dos refains (Dt 3.13). Rafa era o antepassado epônimo de um gru po distinto de refains (2Sm 21.16, 18, 20, 22; 1Cr 20.4 [“descendentes dos gigantes”], 6, 8) (Youngblood, EBC 3:863; Waltke, 64-66). É possível que o gigante filisteu Golias (1 Sm 17.4) fosse um deles (2Sm 21.19; lCr20.5). O povo de Moabe chamava os refains de “emins” (Dt 2.11), enquanto “os amonitas lhes chamavam zanzumins” (Dt 2.20). E possível que os refains 683
Gigantes, Heróis, Valentes
fossem o equivalente transjordaniano dos anaquins na Cisjordânia (Dt 2.10-11, 20-21; McCarter, 137). Além de Golias, o refaim mais conhecido foi, sem dúvida, o rei Ogue. Aliás, ele foi um dos últimos do grupo pré-israelita de refains. Reinou sobre Astarote e Edrei no território de Basã (Dt 3.11; Js 12.4; 13.12). Tudo indica que era um homem gigante, pois tinha uma cama de ferro que media “nove côvados ... [de] comprimento, e ... quatro,... [de] largura” (aproxi madamente quatro metros de comprimento por dois de largura; Dt 3.11). As estatísticas sobre outros refains e vários gigantes também são impressionantes. A ponta de bronze da lança de Isbi-Benobe pesava quase quatro quilos (2Sm 21.16). Um refaim cujo nome não é mencionado era “um homem de grande estatura, que tinha em cada mão e em cada pé seis dedos” (2Sm 21.20). Lami, o irmão de Golias, era tão grande que tinha uma lança com uma haste “como eixo de tecelão” ( ICr 20.5). Benaia filho de Joiada matou um egípcio com quase dois metros e meio de altura (ICr 11.22-23). O próprio Golias tinha “seis côvados e um palmo” de altura (cerca de três metros; 1Sm 17.4). 2. As descrições da estatura incomum dos refains e outros gigantes devem ser entendidas de modo literal ou figurativo? É preciso partir-se do pressuposto de que a atribuição dc uma grande estatura a eles “provavelmente consistia numa forma narrativa de expressar sua aptidão militar” (Clifford, 345)? Dificilmente seria esse o caso. Mesmo o relato da altura de Golias tem paralelo nos tempos modernos nas descrições de R. P. Wadlow que tinha dois metros e noven ta e cinco centímetros de altura quando faleceu em 15 de julho de 1940, aos 22 anos de idade (Insight 18, 1985, 51). Também não é verdade que “não existem restos mortais [esqueletos e afins] de quaisquer aborígenes de tamanho anormal” (Wright, 307). Há relatos de esqueletos com 3,2 metros de altura, “escavados na Palestina” (Wiseman, 23; cf. 244, n. 58). Apesar de as causas do gigantismo na antigüidade serem desconhecidas, foi sugerido que os gigantes sofriam de “uma condição resultante da hipertrofia dos ossos longos do esque leto” (Van Broekhoven, 519). De qualquer modo, no caso de um dos gigantes, são descritas mutações genéticas em 2 Samuel 21.20; 1 Crônicas 20.6. 3. Um último assunto a ser investigado é a identidade e o fim que levaram os enigmá ticos nefilins (Gn 6.4; Nm 13.33). E quase certo que o termo em si queira dizer “caídos”, quer moralmente num sentido geral ou caídos (ou seja, expulsos) do céu num sentido mais específi co. Uma proposta plausível é a de que os nefilins eram príncipes das casas reais dos “filhos de Deus” (Gn 6.4) e que eram “poderosos tiranos que... consideravam que a força que tinham era direito deles” (Kline, 196). Certos exegetas judeus apresentaram a proposta criativa de que a descendência de nefilim de Números 13.33 foi preservada durante o dilúvio nas noras de Noé (cf. Kline, 197, n. 30). Outros, pressupondo um dilúvio local ou regional, sugeriram que os nefilins sobreviveram ao migrarem para outros lugares (Van Broekhoven, 519). A literatura do período intertestamental, por sua vez, lança mão de outra abordagem. De acordo com Eclesiástico 16.7, os “gigantes antigos” eram rebeldes e mereciam o castigo divino. Sabedoria 14.6 e Baruque 3.26-28 são ainda mais específicos: os gigantes foram des truídos pelo dilúvio. Se esse é o caso, os nefilins que aparecem depois têm apenas a mesma designação, porém não são descendentes dos antediluvianos. A seu modo, porém, não eram menos assustadores. Conforme a confissão dos espias israelitas, “éramos, aos nossos próprios olhos, como gafanhotos e assim também o éramos aos seus olhos” (Nm 13.33). B ib l io g r a f ia
W. J. Beecher, “Giant”, HDB 2:166-67; R. J. Clifford, “Giant”, HBD 345; J. C. de Moor, An Anthology o f Religious Textsfrom Ugarit, 1987; C. L’Heureux, “The Ugaritic and Biblical Re684
Gilboa
phaim”, HTR 67, 1974, 265-74; A. Kilmer, “The Mesopotamian Counterparts of the Biblical Nephilim”, Francis Andersen Festschrift: Perspectives on Language and Text, 1987, 39-43; M. G. Kline, “Divine Kingship and Genesis 6:1-4”, WTJ 24, 1962, 187-204; P. K. McCarter, Jr., “Rephaim”, ISBE 4:137; M. Pope, “Notes on the Rephaim Texts from Ugarit”, Essays on the Ancient Near in Memory o f J. J. Finkelstein, 1977, 163-82; H. Van Broekhoven, Jr., “Ne philim” ISBE 3:518-19; W. A. VanGemeren, “The Sons of God in Genesis 6:1-4”, WTJ 43, 1981,320-48; B. K. Waltke, “Rephaim”, ZPEB 5:64-66; D. J. Wiseman, “Medicine in the Old Testament World”, Medicine and the Bible, 1986; G. E. Wright, “Troglodytes and Giants in Palestine”, JBL 5 7 /3 , 1938, 305-9; R. F. Youngblood, “ 1,2 Samuel”, EBC 3:695-96, 862-65, 1058-61; idem, (ed.), The Genesis Debate, 1990, 184-209. Ronald F. Youngblood
Gilboa
Gilboa (Vá*?? [gilboa'], # 1648).
Essa palavra é usada 8x no AT, referindo-se sempre ao monte Gilboa, localizado do lado sudeste do vale de Jezreel (->). Não se sabe ao certo o que essa palavra significa e nem como foi derivada, mas L. Koehler acredita que ela esteja relacionada ao termo geba‘, monte (“Hebraische Etymologien,” JBL 59, 1940, 35). Não há dúvida de que o acontecimento mais importante a ocorrer no monte Gilboa foi a morte violenta do rei Saul e de seus filhos pelas mãos dos filisteus, uma vez que as oito ocorrências do nome tratam desse incidente. No la mento de Davi pela morte de Saul e Jônatas (2Sm 1.21), Davi amaldiçoa o monte Gilboa por ser o local da tragédia. Jezreel B ib l io g k a fia
ABD 2:1019. Paul Wegner
Gileade
Gileade (IV^ii [gH'õd], # 1680).
AT 1 .0 referente exato da palavra Gileade nem sempre fica claro, pois esse termo indica uma pessoa (Jz 11.1-2), uma tribo (Nm 26.29-30; Jz 5.17) ou um território (JS 22.9; Jz 10.17). É aplicado com mais freqüência à região central da Transjordânia que fica mais próxima ao rio Jordão, entre os rios Amom e larmuque, especialmente a parte ao redor do rio Jaboque. Apesar de alguns estudiosos terem associado o uso que Oséias faz de Gileade ao nome de uma determinada cidade (Os 6.8), o emprego desse termo pelo profeta é muito provavelmente me tafórico. Gileade ocupou uma posição de proeminência na história do povo de Deus, desde os dias em que Israel vagava pela terra até os tempos do NT (Mc 5.20). 2. Em termos teológicos, Gileade está relacionada a vários incidentes bíblicos de de que. Foi lá que Jacó se encontrou com os anjos de Deus (Gn 32.1 -2) e lutou com o próprio Deus junto ao rio Jaboque (Gn 32.22-32; cf. Os 12.4-5). Ao fazê-lo, Jacó descobriu que uma pessoa obtém a vitória na vida somente quando se esforça para receber a bênção divina, uma verdade representada na mudança do nome de Jacó para Israel (->). No tempo dos Juizes, Gileade foi o lugar onde Jefté livrou os israelitas da opressão amonita por meio de um voto que, por fim, 685
Gilgal
custou-lhe todas as esperanças de ter um herdeiro pessoal (Jz 11.29-40). Apesar de a natureza do voto e a maneira como ele foi cumprido serem motivo de controvérsia, a passagem ensina, no mínimo, que o crente deve estar disposto a realizar a obra de Deus sem alimentar a idéia de reter para si nem mesmo o que lhe é mais caro, recusando-se a entregá-lo a Deus. (-> Jefté) 3. Os recursos naturais e a localização de Gileade também contribuíram para seu re nome como um lugar de abundância e beleza (Ct 4.1; 6.5; Jr 22.6) e como refúgio do inimigo (2Sm 17.26). Jeremias referiu-se a uma resina aromática enviada de lá para simbolizar o fato de que somente Deus pode curar os males de qualquer nação (Jr 8.22; 46.11). A riqueza de Gileade também aparece nas promessas de Deus sobre as bênçãos futuras de Israel (Jr 50.19; cf. Ez 47.18; Zc 10.6-10); assim, é um instrumento adequado para a súplica de Miquéias pela provisão misericordiosa de Deus ao seu povo (Mq 7.14). A relação de Gileade com a terra prometida de Israel (cf. Gn 15.18; Êx 23.31; Nm 34.1-10; Js 1-4) também é importante. Enquanto Deuteronômio 34.1-4 parece incluir Gile ade nas dimensões mais amplas da promessa de Deus, o ponto focal era Canaã (Gn 17.7-8). Portanto, a seleção de Gileade como uma herança pelas tribos de Rúben, Gade e parte de Manassés criou uma tensão que poderia eclodir na forma de um conflito interno (Números 32; Js 22.10-34). Aliás, é bem provável que, até certo ponto, o povo de Gileade tenha sido considerado sempre estrangeiro. Além disso, Gileade passou por vários períodos de guerra nas mãos de diversos povos como os midianitas, amalequitas, amorreus, arameus e assírios (Juizes 6, 7; 11.1— 12.7; ISm 11.1-11; 31.8-13; 2Sm 2.1-9; 10.1-9; IRs 20.23-43; 22.1-4; 2Rs 10.32-33; 15.27-31). 4. Assim, apesar dos atrativos naturais dessa terra, aqueles que viviam lá enfrentaram repetidamente tempos de perigo e dificuldade. Além disso, o povo também não estava livre de problemas espirituais. Ainda que os primeiros colonizadores tivessem sido elogiados pela fé que tinham (Js 22.1-9), seus habitantes posteriores ficaram conhecidos pela iniqüidade (Os 12.11). Desse modo, a escolha em favor daquilo que, do ponto de vista humano, parecia tão adequado e conveniente, acabou levando a problemas sérios e pôde servir de lição para todos os que se acomodam antes de alcançar o alvo pretendido por Deus. B ib l io g r a f ia
D. Baly, The Geography o f the Bible, 1974, 219-25; M. Ottoson, Gilead: Tradition and His tory’, 1969 (ET). Richard D. Patterson
Gilgal
Gilgal (VJ>J [gilgal II], # 1652).
AT 1. É possível que o nome Gilgal, do radical gll, rolar, revolver (-> # 1670) fosse uma designação comum referente a várias cidades israelitas no período bíblico. Um dos lugares na região montanhosa ao sul de Samaria foi o lugar onde Elias e Eliseu começaram sua missão final antes de Elias ser transportado para o céu (2Rs 2.1). Ao que parece, outro lugar com o nome Gilgal fica na parte norte da tribo de Judá, ao norte do vale de Acor (Js 15.7). De acordo com Josué 12.23, Gilgal indica a localização de uma cidade cananéia derrotada por Josué (a LXX sugere que essa cidade ficava na Galiléia; essa possibilidade refere-se a uma glosa interpretativa da parte do tradutor da LXX, indicando que a localização dessa determinada Gilgal era na Galiléia). Alguns estudiosos sugerem que a ocorrência do nome Gilgal em Deuteronô mio 11.30 pode se referir a mais um lugar com esse nome. 686
Gilgal
2. Porém, não há dúvida alguma de que Gilgal é identificada com mais freqüência com o local do primeiro acampamento de Israel na terra prometida de Canaã no início da conquista (Js 4.19). Foi lá, a alguns quilômetros a leste de Jericó, que os israelitas levantaram um memo rial feito de doze pedras para comemorar a travessia do rio Jordão. Também foi em Gilgal que a geração mais jovem de israelitas foi circuncidada (5.2-7) e onde ocorreu a primeira observân cia nacional da Páscoa (5.10). No dia seguinte à celebração da Páscoa, os israelitas comeram dos frutos da terra e o maná cessou (5.11-12). Durante a conquista, Gilgal tomou-se uma base militar centralizada de operações para onde os israelitas voltavam depois de suas missões mi litares (10.15,43). O papel central de Gilgal pode ser entendido tanto em termos de logística e estratégia como de um lugar que era, ao mesmo tempo, um entroncamento de diversas ligações em Canaã e um trampolim para seu interior montanhoso (A. Malamat, 43-44). No tempo de Samuel, Gilgal tomou-se um importante centro religioso. Gilgal, Betei e Mispa eram as cidades que Samuel visitava anualmente no circuito que percorria como juiz (1 Sm 7.16). A cidade é mencionada nesse período como o lugar sagrado onde eram oferecidos os sacrifícios (11.15; 15.15). A importância de Gilgal é indicada ainda pelo fato de ser o local da coroação de Saul (11.14-15) e também onde ele foi rejeitado como rei de Israel (15.22-23; cf. V. P. Long). 3. Depois que a monarquia se consolidou e Jerusalém tomou-se o centro das ativida des religiosas, Gilgal costuma ser citada de maneira negativa. Isso fica especialmente claro em Oséias e Amós. Oséias adverte os habitantes do reino do Norte para que não cometam adul tério, que é associado a entrar em Gilgal ou subir à Bete-Aven (= “casa de perversidade,” um trocadilho sarcástico com Betei, “casa de Deus”; ver Os 4.15). Posteriormente, Oséias diz aos seus ouvintes que Deus rejeitou o povo por causa dos atos de perversidade deste. Suas práticas perversas começaram em Gilgal (Os 9.15). E, apesar de ter-se a impressão em Oséias 12.12 [11] de que Gilgal havia continuado a ser um lugar sagrado para o sacrifício de animais no tempo de Oséias, o contexto indica que as ofertas em Gilgal não eram sancionadas por Deus (no heb., baggilgãl, em Gilgal, e k?gallim representam um trocadilho insinuando o castigo de Gilgal pelo som do NG Gilgal, “como montões”). Amós, o contemporâneo de Oséias, também tece comentários negativos sobre a rele vância religiosa de Gilgal. Indica que eram realizados sacrifícios ilícitos em Betei e Gilgal (Am 4.4) e exorta os israelitas a buscarem Javé e não Betei ou Gilgal (5.5a). Amós apresenta o mo tivo de sua admoestação: “porque Gilgal, certamente, será levada cativa, e Betei será desfeita em nada” (observe-se mais uma vez o trocadilho pela repetição dos sons de g e 1 na expres são haggilgãl gõlõh yigleh, “Gilgal, certamente, será levada cativa”, em 5.5b). E irônico que Gilgal, o lugar naturalmente associado com a entrada dos israelitas na terra de Canaã e com a conquista, passe a ser retratada como a cidade que levará a nação ao exílio, que significa a saída da terra prometida. 4. A única outra ocorrência do nome Gilgal no AT é em Miquéias 6.5, em que Javé lembra os israelitas daquilo que fez pela nação ao longo da história. Entre os atos salvadores de Deus está a abertura da passagem para que os israelitas pudessem partir de Sitim, o último acampamento na Transjordânia, e chegarem até Gilgal, o primeiro lugar de acampamento em Canaã. Gilgal não aparece no NT. B ib l io g r a f ia
ABD 2:1022-24; ASSE 2:470-72; B. M. Bennet, Jr., “The Search for Israelite Gilgal”, P E Q 104, 1972, 111-22; D. W. Gooding, “Traditions o f lnterpretation of the Circumcision at Gilgal”, in Proceedings o f the 6th Congress ofJewish Studies 1:149-64; V. P. Long, The Reign and Rejec687
Gogue e Magogue
tion ofSaul, 1987; A. Malamat, “Israelile Conduct of War in the Conquest o f Canaan According to the Biblical Tradition”, in Symposia Celehrating the 75th Anniversary o f ASOR, 1979, 35-55; J. Muilenburg,‘T he Site of Ancient Gilgal”, BASOR 140, 1955, 11-27. Mark F. Rooker Giz -> # 1732 (g/>, giz)
Gogue e Magogue
Gogue e Magogue (JB [góg], # 1573; JÍJD [mãgâg], # 4470).
AT 1. Identificação. Em Gênesis 10.2 (= ICr 1.5), Magogue é relacionado como um filho de Jafé, juntamente com Gomer, Madai, Javã, Tubal, Mesequc e Tiras, todos eles localizáveis em alguma parte na região da Anatólia. As referências dc Ezequiel estão de acordo, associando “Gogue da terra de Magogue” com MesequeeTubal (Ez38.2, etc.), G ôm ereacasa deTogarma (Ez 38.6) e com o litoral (Ez 39.6). Meseque e Tubal são conhecidos de textos assírios e outros mais recentes, como os reinos na região central da Anatólia (Maseque = Frigia); há um consenso de que Gomer eqüivale aos cimerianos, uma tribo que ocupou grande parte da região no século VII a. C., e Bete-Togarma é, provavelmente, a Til-garimmu das inscrições assírias, situada em Tubal (AR II parágrafos 26, 290). As terras costeiras seriam, então, a costa oeste e as ilhas da Turquia. A menção a outros lugares como aliados (Pérsia, Etiópia, Pute: Ez 38.5) não contradiz, necessariamente, uma localização na Anatólia. Não há motivo para se duvidar, portanto, de que Gogue e Magogue em Ezequiel 38— 39 sejam o rei Giges da Lídia e seu reino. Gogue pode facilmente ser identificado com o nome conhecido em G como Giges, traduzido como Gugu em assírio e possivelmente grafado Gugu nas letras lidianas na parede de pedra de um enorme monte que servia de cemitério em Sardis, a capital da Lídia (G. M. A. Hanfmann, “The Seventh Campaign at Sardis” [1964], BASOR 177, 1965, 34). Giges buscou e recebeu ajuda de Assurbamípal da Assíria contra o ataque cimeriano por volta de 665 a. C., mas depois se aliou ao Egito, um inimigo da Assíria, e foi morto no segundo ataque cimeriano, cerca de vinte anos depois, como relatou Assurbanípal com todo o prazer (AR parágrafos 784, 785). O título de Gogue em Ezequiel 38.2, “príncipe de Rôs, de Meseque e Tubal” pode indicar uma coalizão de governantes da Anatólia formada para combater os cimerianos. (A proposta de se relacionar Gogue com a terra de Gaga, na Carta de El-Amama 1:36-40, deve ser descon siderada com a correção do texto para Kaska, ver W. K. Moran, The Amarna Letters, 1992, ad loc.) Não há muita base para a tradução “príncipe de Rôs” nessa passagem, pois rõ s, chefe, encontra-se em aposição a nes í \ príncipe (de), e somente em concepções fantásticas pode-se aplicar essa tradução, juntamente com Meseque e Tubal à Rússia, Moscou e Tobolk (como fi zeram C. I. Scofield, The Scofteld Reference Bible, 1917 e autores posteriores). Assim, Magogue, a terra de Gogue é a Lídia, o que levanta a questão: Por que foi usado esse nome em vez de Lude, o nome da terra de Giges em assírio e em outros textos? Apesar de as respostas se encontrarem parcialmente na distinção bíblica de Lude como um descendente de Sem (Gn 10.22 = 1Cr 1.17) e não de Jafé, como era o caso de Magogue, é possível que Eze quiel tivesse outros motivos (ver abaixo). Apesar de Magogue ser um termo exclusivo do texto bíblico, uma explicação da expressão assíria mãtgugi, terra de Gogue, é atraente e tem o apoio de outras evidências desse tipo de assimilação (Millard, “Review o f W. Schramm,” 82). 2. Papel. Ezequiel apresenta Gogue como líder das forças mundiais que atacariam Israel restaurada quando ela estivesse prosperando pacificamente. Numa série de vinhetas, 688
Gòmer
o profeta mostra Gogue tanto sendo impelido por Deus como agindo por iniciativa própria, rumando apressadamente para a destruição. A chave para se entender os oráculos é Ezequiel 38.17: “Não és tu aquele de quem eu disse nos dias antigos, por intermédio dos meus servos, os profetas de Israel, os quais, então, profetizaram, durante anos, que te faria vir contra eles?” A maioria dos estudiosos interpreta esse v. como uma pergunta a ser respondida afirmativamente, mas isso cria várias dificuldades que os comentaristas resolveram ao proporem diversas fontes, glosas ou corrupções textuais. Outros transformam as palavras numa declaração afirmativa: “Tu és aquele” (como a LXX e a Vg.). Acredita-se então que Ezequiel estivesse se referindo a profecias anteriores de acordo com as quais “do Norte se derramará o mal” (p. ex., Jr 1.1315; 4.6), cumpridas por outros invasores e aplicada novamente a Gogue. Se o v. é interpretado como uma pergunta a ser respondida negativamente, como considerou D. Block, o problema é bem menor. Gogue não atacaria Israel como agente de Deus para aplicar um castigo mere cido, como fez Senaqueribe ou Nabucodonosor. Seu terrível ataque seria inteiramente com o propósito de auto-engrandecimento, um ato arrogante e cruel. Ele seria o exemplo mais ex tremo do grupo que Amós condenou por agressão impiedosa e não provocada (Am 1.3—2.3). Cheios de cobiça, outros povos se reuniriam para dividir os espólios (Ez 38.13). No entanto, a vitória aparente de Gogue seria totalmente invertida; a incitação divina levaria a ambição natural ao seu fim lógico: aniquilação total. Deus julgaria àqueles criminosos e os destruiria devidamente, mostrando que, apesar de castigar Israel com severidade pelo pecado, a nação continuava sendo o povo de Deus, o qual Deus iria restaurar e restabelecer como comprovação de sua santidade para o mundo. Por que Gogue foi escolhido para essa representação escatológica (cf. Ap 20.7-9)? Provavelmente por estar entre os mais remotos dos governantes passados que o público de Ezequiel seria capaz de reconhecer e por não ter contato algum com Israel, de modo que não possuía nenhuma reivindicação ou direito por intermédio de tratados ou outras obrigações, como o tiveram a Assíria, o Egito e a Babilônia quando foram suseranos de Judá e Israel, vas salos que se mostraram infiéis. Além disso, a própria mudança de lado de Giges, bem como o seu destino, podem tê-lo marcado como aquele que recebeu o merecido castigo por deslealda de. É impossível saber-se ao certo quanto conhecimento do passado o profeta e seus ouvintes possuíam, mas é pouco provável que esses nomes não tivessem significado algum para eles, mesmo que não fossem providos de nenhuma relevância histórica. O fato de Ezequiel usar os nomes Gogue e Magogue em vez de Lídia (conhecida no tempo dele e citada como Lude em Ez 30.5; cf. “lídios”, 27.10) pode ser uma indicação do propósito simbólico desses oráculos, descrevendo a revolta final da humanidade e a vindicação suprema de Deus. B ib l io g r a f ia
D. Block, “Gog in Prophetic Tradition: A New Look at Ezekiel XXXVIII 17”, VT 42, 1992, 154-72; idem, Ezekiel, 1997; A. R. Millard, “Review o f W. Schramm: Einleitung in die Assyrischen Kõnigsinchriften. Zweiter Teil", JAOS 97,1977, 80-82; E. M. Yamauchi, Foes From the Northern Frontier, 1982. Alan Millard Golpe -> # 5782 (nkh, ser atingido, golpeado, arruinado, destruído)
Gômer
Gômer (7DÍ \gõm er],# 1700). 689
Gômer
AT Esse era o nome de um dos filhos de Jafé (“Gomer”, Gn 10.2, 3), de um dos aliados no norte de Gogue (Ez 38.6) e da esposa do profeta Oséias (Os 1.3). O significado do nome é obscuro. O HALAT traz o sentido “perfeição” ou “carvão em brasa” (190). Também pode ser uma forma abrev. de gfm aiyãhü (Gemarias, “Javé realizou”, Jr 36.10). Ver também gmryhw, no óstraco de Laquis 1,1 (Gibson, T S S I1:36). A esposa de Oséias é descrita ainda como “filha de Diblaim” (Os 1.3), o que pode ser explicado como o nome do pai dela ou seu lugar de ori gem. A Bíblia fala de uma cidade moabita, Almom-Diblataim, na qual os israelitas acamparam durante sua jornada pelo deserto (Nm 33.46-47). Ficava próxima à famosa Baal-Peor, onde, na opinião de Oséias, começou a apostasia de Israel à religião de Baal (Os 9.10; ver Andersen e Freedman, 172). Gômer foi um símbolo da prostituição de Israel como nação. Ela escolheu outros amantes e Israel amou outros deuses e, apesar da natureza destrutiva de seu pecado, Gômer foi amada novamente (Os 3.1) e o relacionamento matrimonial foi restabelecido. Assim também. Deus amará seu povo outra vez e renovará seu relacionamento de aliança com eles (3.4-5). Gômer e Israel não mereciam amor e não fizeram coisa alguma dele. Apesar de o pecado ser grande e devastador, o amor foi além daquilo que qualquer um poderia pedir ou conceber. Oséias: Teologia -> Oséias; Jezreel; -> Lo-Ami; -> Lo-Ruama B ib l io g r a f ia
F. I. Andersen, D. N. Freedman, Hosea, AB, 1980; H. Balz-Cochois, “Gomer oder die Macht der Ashtarte: Versuch einer feministischen lnterpretation von Hos 1-4" ,I v T 42, 1982, 37-65; P. A. Forseth, “Hosea, Gomer and Elective Grace: Reflection of an Armchair Theologian”, Reformed Journal 35, 1985, 15-18; B. D. Napier, “The Omrides o f Jezreel”, VT 9, 1959, 366-78; K. G. 0 ’Connell, “Those Lively Prophets: Hosea, a Prophet o f Passion”, CurTM 4, 1977, 104-8; G. G. Swain, “Hosea the Statesman”, in Biblical and Near Eastern Sudies, 1978, 177-83; A. S. van der Woude, “Three Classical Prophets: Amos, Hosea and Micha”, in Israel ’s Porphetic Tradition, 1982,32-57; W. Vogels, “Hosea Gift to Gomer (Hosea 3:2)”, Bib 69, 1988, 412-21; R. J. Weems, “Gomer: Victim ofViolence or Victim of Metaphor”, Semeia, 1989, 87-104. Paul A. Kruger Gordura
# 9042 (smm I, ser gordo)
Gotejamento Governo
# 5688 (nzl, fluir, escorrer lentamente)
# 4887 (mlk I, ser rei, governar)
Graça -> # 2858 (hnn I, favorecer, ser benevolente para com) Grama
# 2012 (d s', verdejar; [‘êseb, plantas verdes, grama])
Grandeza -> # 7098 {pl', ser maravilhoso, difícil) Granizo -> # 1352 (bãrãd, granizo) 690
Guerreiro Divino
Gravetos -> # 3675 (yV, acender, pôr fogo, inflamar, queimar, chamuscar) Gravidez -> # 2225 (hrh, estar grávida, conceber) Grilhões -> # 2414 (zê # 8264 (m n , bradar, gritar [com alegria], gemer) Grito (de guerra) ->#8131 (n v ', gritar, soltar um grito de guerra)
No decorrer do período do AT, Deus se revela a seu povo de várias formas diferentes. Ele é rei, pastor, pai, mãe, esposa e marido. Cada uma dessas imagens proporciona um vislumbre da natureza de Deus, aquele que não pode ser inteira nem demasiadamente conhecido. Ao longo das páginas do AT (Frederiksson, von Rad, Cross, Miller) e também no NT (Longman e Reid), Deus se revela e aparece na história como um guerreiro poderoso. (-> Antropomorfismo) 1. O guerreiro divino e a guerra santa. Há uma relação muito próxima entre o retrato de Deus como guerreiro e a prática da guerra em Israel. A lei de Deus (particularmente em Deuteronômio 7 e 20) instrui Israel a guerrear e, no cerne de sua mensagem, encontra-se a crença de que Deus é aquele que luta no meio de Israel. Assim, é justificável que os estudiosos modernos chamem esse fenômeno de “guerra santa”, uma vez que a presença de Deus santifica tanto o acampamento militar quanto o campo de batalha (Dt 23.14). Outros comentaristas (Smend) aproximam ainda mais essa relação ao rejeitar a expressão guerra santa e substituí-la por “guerra de Javé”. De qualquer modo, Israel experimentou tanto o amor de Deus quanto a ira de Deus no campo de batalha, e Deus se revelou a Israel como um guerreiro (Js 5.13-15). Javé, o guerreiro divino, ocupa a posição central na guerra santa (Js 5.13-15). 2. A relação entre o guerreiro divino e o exército humano. E impressionante observar a relação entre Deus e seu povo na guerra. Uma vez que Deus luta por Israel, a nação não pre cisa se preocupar com o número de soldados nem com a tecnologia de suas armas. Antes, no etos do AT, um exército maior e armas de tecnologia superior são elementos negativos. Israel não pode se vangloriar da própria força, mas apenas do poder de seu grande Senhor, que dá a vitória ao seu povo apesar de todas as desvantagens. E melhor entrar no campo de batalha com um exército menor e menos equipado do que um exército maior e mais bem treinado. Tais questões encontram-se por trás das histórias de Gideão, que reduziu seu exército de 32 mil para trezentos homens (Js 7.1-9), ou de Davi, que lutou sem armadura contra Golias, um guerreiro profissional (1 Samuel 17), e talvez também do caso em que Davi jarreteou os ca valos dos carros (2Sm 8.4). Ainda, assim, Israel precisa lutar. E evidente que Javé poderia ter optado por aniquilar os inimigos de Israel sem nenhuma ajuda humana (Ex 15.3), mas ele ordena que Israel comba ta em seu nome e na sua presença (Dt 7.2). É possível que as muralhas de Jericó desmoronem sem um estratagema militar, mas, para que isso aconteça, Israel deve marchar ao redor da ci dade (Js 6.2-5). Davi pode não carregar uma lança para combater Golias, mas deve ter pedras para sua funda e atirá-las (1 Sm 17.40). Ao guerrear contra seus inimigos, a atitude do povo de Deus é, ao mesmo tempo, ativa e passiva. 3. A presença de Deus e a guerra. O ceme da teologia de guerra santa é a presença de Deus durante o combate. E preciso ter-se em mente que, em função da queda, para Israel Guerreiro Divino
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a experiência da presença de Deus não é uma ocorrência diária comum. A queda (Gênesis 3) provocou uma separação no relacionamento entre Deus e a humanidade, de modo que esta nâo podia entrar com facilidade na presença dele. Foi preciso separar lugares especiais para que o povo pecaminoso pudesse encontrar-se com Deus. Durante grande parte da história de Israel, esse lugar especial foi o santuário (tabemáculo/templo) no qual a presença de Deus era sim bolizada pela arca da aliança (Nm 10.35). O simbolismo do templo, bem como dos sacrifícios e direitos de entrada no Lugar Santo apontam todos para o fato de que a presença de Deus é santa e de que é difícil aproximar-se dele durante o período do AT. 4. A arca. Assim, a presença de Deus com o exército durante a batalha é algo especial mente relevante. O fato de o Deus santo de Israel estar junto com o exército ajuda a explicar o papel da arca durante a batalha. A arca costumava ficar no Santo dos Santos (para possíveis exceções, ver Jones, 310-11), uma vez que era o objeto identificado de maneira mais próxima com a presença de Deus no meio do povo. Também era um objeto móvel que podia ser car regado com o exército para mostrar a Israel que Deus estava presente. Desse modo, durante o tempo em que o vasto exército de israelitas vagou pelo deserto, a arca ia adiante dele, du rante o dia. O fato de a arca estar intimamente ligada a Deus, o guerreiro divino, fica claro no clamor de Moisés quando a arca é colocada diante do povo de Deus: “Levanta-te, Senhor, e dissipados sejam os teus inimigos, e fujam diante de ti os que te odeiam” (Nm 10.35). A arca ia adiante dos israelitas quando marchavam durante o dia, mas era colocada no tabemáculo, situado no meio do acampamento, durante os períodos de descanso (Números 2). Assim, a po sição do tabemáculo pode ser comparada àquela da tenda do líder militar, cercada pelas tendas de seus exércitos. Ao que parece, era costume dos israelitas carregarem a arca para a batalha junto com o exército deles, representando, desse modo, a presença de Deus no conflito. A arca encontra-se, por exemplo, no centro dos fatos decisivos relacionados à queda de Jericó durante a conquista. As instruções de combate vieram do próprio guerreiro divino (Js 5.13-15, ver abaixo). O exér cito israelita devia marchar ao redor da cidade uma vez por dia durante seis dias e, então, no sexto dia, fazer o mesmo circuito sete vezes. O foco da atenção, porém, não devia ser o exér cito, mas sim a arca no meio dele. Dessa forma, os muros ruíram pela mão de Deus. Por meio do ritual complicado durante os dias que antecederam a conquista da cidade, era esperado que o povo demonstrasse fé. A arca era, portanto, uma representação palpável de uma realidade espiritual — a presen ça de Deus como guerreiro divino junto ao povo dele. Porém, a arca em si não era um talismã que garantia a vitória. E verdade que, pelo menos temporariamente, esse conceito equivocado do poder da arca existiu em meio aos israelitas, como o provam as ações dos filhos de Eli (1 Sm 4 . 1— 5. 12). No final do período dos Juizes, os filisteus estavam pressionando Israel ao extremo. Junto com o exército israelita estavam Hofni e Finéias, os filhos de Eli. Quando encontraram os filisteus em Afeca, os israelitas sofreram baixas terríveis. Então, Hofni e Finéias chegaram com a arca (1 Sm 4.4). Tomando por base aquilo que já foi revelado pela narrativa sobre esses dois filhos rebeldes de Eli (ISm 2 . 12-26), o leitor sabe que os atos deles não são motivados por amor e fé, mas sim pela intenção de manipular o poder divino em benefício próprio. O re sultado era previsível: os israelitas sofrem uma derrota vergonhosa. 5. O comparecimento de Deus à batalha. Ao mesmo tempo em que o comparecimento de Deus à batalha era representado muitas vezes pela presença da arca junto ao exército, as histórias do AT mostram que Deus também se revelava de outras maneiras. Na maioria das vezes, ele era visto pelos efeitos de seu combate. Na travessia do mar Vermelho, por exemplo (Êxodo 14; 15), os israelitas não perceberam uma forma visível de Deus, mas presenciaram 692
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tanto a separação das águas do mar para que pudessem passar, quanto a reunião dessas águas que resultou na morte de seus inimigos. A natureza miraculosa do livramento não deixou ne nhuma dúvida na mente deles quanto a quem lhes havia concedido a vitória sobre os egípcios (ver abaixo as dimensões cósmicas dessa vitória). Por vezes, o guerreiro divino dava indicações mais plausíveis de sua presença. Depois de sua coroação, por exemplo, Davi lutou contra os filisteus nas cercanias de Jerusalém (2Sm 5.17-25). Deus deu a Davi uma indicação de sua presença por “um estrondo de marcha pelas copas das amoreiras” (v.24), cujo significado era o dc que “o Senhor... saiu diante de ti, a ferir o arraial dos filisteus” (v. 24). Em outra ocasião, Eliseu e seu grupo de profetas foram encur ralados em Dotã pelo exército arameu. O servo de Eliseu estava extremamente amedrontado até que Deus abriu-lhe os olhos para que visse a realidade da situação: o exército de Deus cer cando o exército arameu (2Rs 6.8-23). 6. O papel da criação de Deus no combate divino. A criação desempenha um papel du plo no combate divino. Por um lado, Deus emprega sua criação para lutar e vencer as guerras. Por outro lado, a criação se perturba violentamente com a aparição do guerreiro divino. Há diversos relatos de guerra santa no AT que narram como Deus usa aspectos da na tureza na batalha. O relato da travessia do mar Vermelho contém uma descrição de como Deus empregou “um forte vento oriental” (Ex 14.21) para separar as águas do mar e permitir que os israelitas atravessassem, e como, depois também usa o mar para destruir o exército egípcio. Durante a conquista da terra, destruiu a coalizão das cidades cananéias do Sul ao fazer cair so bre elas pedras enormes (Js 10.9-11). No contexto dessa mesma batalha, Deus deteve o sol e a lua a fim de permitir que os israelitas tivessem um dia mais longo para completar sua vitória (10.1- 15). Por fim, no cântico de louvor entoado por Débora ao Senhor pela vitória sobre os midianitas, ela cita o papel da criação na batalha: Vieram reis e pelejaram; pelejaram os reis de Canaã em Taanaque, junto às águas de Megido; porém não levaram nenhum despojo de prata. Desde os céus pelejaram as estrelas contra Sísera, desde a sua órbita o fizeram. O ribeiro Quisom os arrastou, Quisom, o ribeiro das batalhas. (Jz 5.19-21) Por outro lado, várias passagens do AT descrevem a violenta perturbação da natureza com a aparição do guerreiro divino. Seu poder e força são tão grandes que a criação definha diante de sua presença temível. Exemplos específicos são a ausência absoluta de fertilidade sobre a terra (Is 24.1-13; Mq 1.3,4; Hc 3.6) e de água nos mares (Na 1.2-6; Hc 3.8). A pertur bação da natureza pela presença de Deus como guerreiro divino pode ser explicada em parte pelo contexto desse tema no OM (ver abaixo). 7. O contexto do OM no tema do guerreiro divino. Muitas vezes Deus se revelava de forma comum no meio mais amplo do OMA em que Israel encontrava-se inserida. Por todo o OMA, por exemplo, acreditava-se que os deuses habitavam em montes. Assim, Deus revelou sua presença relacionando-a a montes (Sinai e Sião). Portanto, não é de surpreender que a maioria dos povos do OMA tivesse sua própria concepção do guerreiro divino (Kang). 693
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Na Babilônia, o principal guerreiro divino era Marduque. Ele lutava contra Tiamate, cujo nome significa Mar, a fim de preservar a existência dos deuses mais jovens e do corpo dela (Tiamate) é que foi criado o universo (Enuma Elise). Em Canaã, os textos ugar. mencionam a luta entre Baal, o guerreiro divino, e lam, cujo nome também significa Mar. Baal derrotou Iam e foi proclamado rei do panteão (ANET, 130-131). Diante dessas concepções de guerreiro divino do OMA, é impressionante ver no AT o domínio que Deus exerce sobre as águas e os monstros que surgem do mar. A Bíblia emprega a linguagem dos mitos do OMA para retratar Deus como o guerreiro divino por excelência. Nos Salmos, Deus é vitorioso sobre o mar (SI 74.12-17), é entronizado sobre o mar (29.10) e fundou a terra sobre o mar (24.1-2). Também nos Salmos, as águas do mar Vermelho são per sonificadas de maneira tal a mostrar a travessia como resultado de uma luta entre Deus e as águas (77.16-20; 114). Deus é aquele que subjuga as águas com repreensão (Na 1.4). O poder de Deus sobre as forças históricas do caos é representado pela vitória dele sobre as bestas que surgem do mar (Daniel 7). Esse conceito de Deus combatendo o mar usa um tema mitológico original com propósitos polêmicos. Ou seja, o poder e a superioridade de Deus em relação às forças do caos são retratados como uma batalha entre o Mar personificado e o próprio Deus. O tema é polêmico, pois apropria-se de ações, papéis e títulos atribuídos a divindades pagãs como Marduque e Baal. Os escritores bíblicos também exploraram um padrão literário comum encontrado em alguns textos do OMA, nos quais a vitória do deus é seguida de uma proclamação do próprio deus como rei e a construção de um palácio-templo. Esse padrão pode ser observado de modo mais nítido nos textos ugar. sobre Baal, mas também no Enuma Elise mesopotâmio. Obviamen te, na concepção bíblica, Javé é o rei eterno e único Deus do universo (SI 93.2), mas a vitória divina, a soberania dele e o santuário são temas que aparecem associados freqüentemente na Bíblia (Êx 15.1-18). 8. Salvador, Juize Rei. A atividade bélica de Deus encontra-se intimamente relacionada ao papel de Salvador e Juiz (Miller, 173-75). Ao operar em favor de seu povo, ele o salva da aflição e do perigo. No AT, a salvação é vista muitas vezes em termos físicos e não espirituais (como, por exemplo, em Êxodo). Além disso, no processo de salvar Israel da opressão política e do perigo, ele lhe julga os inimigos, que são a origem das dificuldades do povo (Na 1.2-8). Essa relação entre guerreiro divino e julgamento explica a predileção desse tema pelos profe tas. Tal favoritismo é comprovado pela freqüência da imagem do dia do Senhor nos escritos proféticos (Am 5.18-20) — o dia da batalha de Deus contra aqueles que são seus inimigos e contra os inimigos do seu povo (Zacarias 14). Por fim, o tema do guerreiro divino encontra-se intimamente relacionado com o conceito de Deus como rei (SI 98; ver Miller, 174-75). Suas vitórias mostram que é ele quem está no controle das nações e que também é soberano sobre o desenrolar da história. 9. Jesus Cristo, o guerreiro divino. Vários dos temas associados ao guerreiro divino no AT continuam sendo desenvolvidos no NT e, como era de esperar, com relação a Jesus Cristo. Jesus vem sobre as nuvens como se estas fossem um carro de guerra (Mt 24.30 e par.; Ap 1.7). Mostra domínio sobre as águas do mar (Mt 14.22-36), subjugando-as com repreensão (Mc 4.35-41). Dessas e de outras maneiras, descobrimos que Jesus Cristo é o guerreiro divino que luta por seu povo contra os verdadeiros inimigos no reino espiritual. A guerra se intensifica e o objetivo dela não é mais os rebeldes humanos, mas sim as forças espirituais por trás deles (Ef 6.10-20). Jesus alcançou uma grande vitória quando morreu na cruz (Cl 2.13-15), mas o cum primento dessa vitória espera pelo dia em que Jesus voltará em toda sua glória militar a fim de executar o juízo final sobre todos aqueles que lhe resistem ao domínio (Ap 19.1-21). 694
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F. M. Cross, “The Divine Warrior in Israel’s Early Cult”, in Biblical Motifs, 1966, 11-30; H. Fredriksson, Jahwe ais Krieger, 1945; G. H. Jones, “The Concept o f Holy War”, in The World o f the Old Testament, 1989, 299-322; Sa-Moon Kang, Divine War in the Old Testament and in the Ancient Near East, 1989; M. C. Lind, Yalmeh Is a Warrior, 1980; T. Longman, III, “The Divine Warrior: The New Testament Use o f an Old Testament M otif’, WTJ 44,1982,290-307; idem e D. G. Reid, God Is a Warrior, 1995; P. D. Miller, Jr., The Divine Warrior in Early Israel, HSM 5, 1973; G. von Rad, Der heilige Krieg im alten Israel, 1965 (1951); D. G. Reid, “The Christus Victor Motif in PauFs Theology”, Ph.D. diss. Fuller Theological Seminary, 1982; R. Smend, Yahweh War and Tribal Confederation, 1970. Tremper Longman III
Habacuque: Teologia de A. Contexto histórico O livro de Habacuque não contém informações biográficas nem autobiográficas sobre seu escritor (comparar, porém, Bel 33-39). Fica claro que ele viveu no período do ressurgimento da Babilônia no final do século VI a. C. (Hc 1.6), quando o domínio assírio sobre a Palestina estava chegando ao fim. Tudo o que sabemos sobre ele como pessoa é seu nome, que pode ser relacionado ao nome de uma planta em assírio (habbaququ, CAD 6:13 s.v.), o que indi ca, possivelmente, que a infância dele foi vivida durante o governo do rei Manassés, vassalo da Assíria, quando os nomes teofóricos caíram de moda, sendo substituídos por nomes como Acbor (aranha), Ulda (toupeira) e Safà (texugo). O lamento em Habacuque 1.2-4 pode ser um reflexo da apostasia e injustiça da época, antes das reformas de Josias. A proposta de se datar Habacuque na era Alexandre, o Grande, implica uma emenda injustificada de “caldeus” em 1.6 para “Quitim” (Kittim) e de “vinho” em 2.5 para “Grécia”. Assim, o livro pertence à literatura que testemunhou a invasão babilônia rumo ao Oeste quando Deus julgou a perversidade do reinado de Manassés, apesar das reformas de Josias (p. ex., 2Rs 21.14; 23.26; 24.4 e observar o tom nitidamente deut. de Hc 1.4). B. Estrutura literária Normalmente, o livro começa com um debate entre Deus e o profeta. Não há nenhum pronunciamento público, experiência vocacional, sinal miraculoso ou mesmo o reconhecimento público da condição do escritor como profeta. Nesse sentido, estamos mais próximos do gênero de Isaías 40—55 (e posteriormente também de Malaquias) do que do contemporâneo de Ha bacuque, Jeremias (apesar das “confissões” deste último). Habacuque lamenta os pecados de sua época (Hc 1.2-4) e recebe (o texto não nos diz como) uma garantia divina (1.5-11) de que o advento dos exércitos da Babilônia é obra de Deus, supostamente (ainda que não seja dito em lugar algum) como julgamento sobre Judá (cf. Is 10.5-11). Logo em seguida, o profeta lamenta que os babilônios sejam cruéis e injustos (Hc 1.12-17) e que Deus não deve encorajar-lhes a perversidade. Em 2.2-4 Deus responde que os justos serão preservados pela fidelidade deles. Seguem-se (2.6-19) cinco oráculos de calamidade (como os sete ais de Is 5.8-23; cf. 10.1 -4) di rigidos contra a cobiça, violência e idolatria da Babilônia, numa linguagem derivada, em parte, de outros textos heb. (ver abaixo), concluindo com uma convocação cultuai ao silêncio diante de Javé e seu templo, lembrando o Salmo 11.4; Sofonias 1.7 e Zacarias 2.13 (ou sendo lembrado por essas passagens). Segue-se um salmo (Hc 3.2-19) apresentado (como nos caps. 1—2) por 695
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uma glosa editorial, em que o poder e a glória de Javé são celebrados com referência particular ao êxodo e à conquista de Canaã num estilo que traz à memória Deuteronômio 32; Juizes 5 e Salmo 68. Pelo fato de lQpHab não ter esse cap., ele foi considerado como não sendo autênti co, o que é pouco provável. Para o comentarista de Qumran, Habacuque 3 não servia nenhum propósito, uma vez que seu verdadeiro interesse era a aplicação das alusões históricas dos caps. 1—2 ao próprio tempo dele. Além disso, Habacuque 3, juntamente com os caps. 1—2, apre senta características de estilo como citações de textos mais antigos, imagens militares e uma perspectiva comum de assuntos internacionais. A idéia editorial que o associou aos caps. 1—2 foi perspicaz, ao contrário da atribuição pela LXX dos Salmos 145— 148 (= TM 146— 148) a Ageu e Zacarias. No entanto, a introdução editorial aos caps. 1—2 não conhece ou não se preocupa com as estruturas contemporâneas de Jeremias (Jr 23.33) referentes a profetas que declaravam ter um fardo de Javé. Nâo é provável que Habacuque fosse um oficial do culto a Javé no templo de Jerusalém. Mas em favor dessa idéia, pode-se citar a descrição de I labacuque como levita (Bei 1, LXX — um texto muito mais recente), a admoestaçâo cultuai em Habacuque 2.20 (que ocorrc, porém, em outros textos), o salmo do cap. 3 (que tem paralelos em textos não cultuais; p. ex.. Juizes 5) e a suposição sem provas de que a torre de vigia em 2.1 podia ser o posto de um sacerdote do templo. Habacuque foi um homem piedoso que expressou em particular, e depois por escrito (Hc 2.2), suas dúvidas e esperanças teológicas. C. Temas teológicos O livro de Habacuque contém vários temas teológicos importantes. 1. Assim como Isaías (-> ; cf. Is 41.2, 25), Habacuque passa a ter certeza dc que Deus está operando no cenário da história internacional, mesmo que os acontecimentos não sejam obviamente desejáveis (ver também Am 3.6b). Habacuque 3 alimenta essa certeza referindo-se aos grandes feitos de Deus no passado, como acontece em alguns Salmos (p. ex., 74, 78, 80). Nisso, ele é herdeiro de uma grande tradição teológica que ele refina e aprimora. 2. Habacuque também aprendeu a transformar as dúvidas e tristezas em orações (Hc 1.2-4, 12-17; 3.2-19; comparar com o SI 73.16-17), talvez feitas no templo (2.20). A adoração leva Habacuque a uma fé regozijante no poder e na bondade de Deus e 3.16-19 é uma das ex pressões mais sublimes dessa confiança no AT 3. Em Habacuque, Deus condena o mal. No cap. 2, ele condena a bebedeira, a cobiça, o roubo, a violência, a opressão, a libertinagem, o abuso da natureza (2.17) e a idolatria (esp. o terceiro “Ai”, 2.12-14; cf. Is 11.9; Jr 51.58; Mq 8.10; e o quarto “Ai”, Hc 2.15-17; cf. SI 75.8; IS 51.17, 22-23; Jr 25.15-19; Ez 23.32-34). Na concepção de Habacuque acerca de um tempo determinado para o julgamento (2.3), encontramos uma antevisão da literatura apoca líptica posterior. 4. Habacuque 2.4 (esp. “o justo viverá pela fé”) é um texto justificadamente famoso, citado no NT (Rm 1.17; G1 3.11; Hb 10.38-39) e objeto de uma interpretação quase cristã em lQpHab (“isso se refere a todos aqueles que guardam a lei na casa de Judá, aos quais Deus li vrará da Casa de Julgamento, por causa de seu sofrimento e sua fé no Mestre da Justiça”). Em 2.4, o próprio Habacuque não se refere a “crença”, mas sim a “fidelidade”. Apesar de ser uma época violenta e de homens maus estarem triunfando, um dia os perversos cairão, e os justos, por causa da fidelidade de Deus, sobreviverão aos acontecimentos trágicos de seus dias (cf. Mt 10.2). Assim, o julgamento de Deus não é indiscriminado; antes, concede salvação àqueles que não vacilam em sua lealdade para com ele. Esse é o conceito que Paulo usa para ilustrar sua doutrina da justificação pela fé, pois se refere à salvação daqueles que esperam quando não 696
Hananias
há mais esperança, apesar das aparências. Essa conclusão (que pode ser, em parte, atribuído ao Salmo 37) é o legado mais duradouro de Habacuque para a Teologia. No cânon, o livro encontra-se entre os Profetas Menores, uma seleção variada de tex tos atribuídos a diversos santos e sábios heb., organizada (no TM) em parte pela suposta data e em parte pela extensão dos escritos. Só voltamos a encontrar Habacuque em Bel e o Dragão, apesar de 1QpHab e o NT revelarem que seu discernimento histórico e teológico era valorizado dentro da comunidade judaica e muito depois de sua época. B ib l io g r a f ia
K. Budde, Encycolpaedia Bíblica, ed. T. K. Cheyne, 1899-1903, 19852 (s.v.)”, M. Delcor, La sainte Bible, VIII Les pelils prophètes, 1964, 389-433; J. A. Emerton “Textual and Linguistic Problems of Habakkuk II, 4-5”, JTS n.s. 28, 1977, 1-18; P. Humbert, Problèmes du livre d ’Habacuc, 1944; W. A. Irwin, “The Psalm of Habakkuk”, J N E S I, 1942,10-40; D. M. LloydJones, From Fear to Faith; Studies in the Book o f Habakkuk, 1953; H. H. Rowley, The Zadokite Fragments and the Dead Dea Scrolls, 1952; G. A. Smith, The Book o f the Twelve Prophets, 1928, 2:115-60; P. J. M. Southwell, “A Note on Habakkuk II 4 “, JTS n.s. 19, 1968, 614-17; C. C. Torrey, Alexander the Great in the Old Testament Prophecies, ZAW 41, 1925, 281-86; W. A. VanGemeren, Interpreting the Prophetic Word, 1990, 168-73; G. Vermes, The Dead Sea Scrolls in English, 1962. P. J. M. Southewell Habilidade -> # 4 1 7 9 (kisrôn, sucesso, habilidade) Habitação -> # 3782 (ysb, estar assentado, habitar)
Hananias
Hananias (H’350 [l^nanyâ], # 2863).
Apesar de quase uma dúzia de pessoas ter o nome Hananias (“Javé foi bondoso,” p. ex., ICr 25.4; 2Cr 26.11; Ne 7.2), a de maior interesse é Hananias, filho de Azur, profeta de Gibeão. Ele entrou em conflito com o também profeta Jeremias c. 594/593 a. C. quanto à duração do exílio (Jeremias, 70 anos, Jr 25.11; Hananias, 2 anos, Jr 28.3). Hananias, chamado repetida mente de “profeta”, profetizou que dentro de dois anos o domínio babilônio chegaria ao fim e o rei Joaquim, que havia sido levado cativo para a Babilônia (597 a. C.) seria mandando de volta para casa juntamente com os utensílios tirados do templo (Jr 28.3-4). A confrontação pública no templo, dramatizada pelo gesto de Hananias ao quebrar o jugo simbólico de madeira que Jeremias usava, trouxe à tona a questão da autenticidade profética. Jeremias lançou mão da tra dição profética, a saber, que a mensagem de julgamento e não de salvação era mais apropriada para um povo que havia rompido a aliança (28.8). Apelando também para o cumprimento de predições como um critério para a verdadeira profecia (28.9; cf. Dt 18.22), Jeremias anunciou que Hananias morreria dentro de um ano. A morte de Hananias dois meses depois desmascarou esse homem de Gibeão como falso profeta. -> Jeremias: Teologia B ib l io g r a f ia
T. W. Overholt, The Threat o f Falsehood: A Study in the Theology' o f the Book o f Jeremiah, SBT, 2nd ser. 16, 1970; J. L. Crenshaw, Prophetic Conflict: Its Effect Upon Israelite Religion, 697
Hazor
BZAW, 124, 1971; H. Mottu, “Jeremiah vs. Hananiah: Ideology and Truth in Old Testament Prophecy", The Bible and Liberation: Political and Social Hermeneutics, ed. N. K. Gottwald, 1983, 235-51. Elmer A. Martens
Hazor
Hazor (Tixn [hãjôr II], # 29 3 7 ).
1. Identificação e localização. Tell el-Qedah (Tel Waqqas), identificada como Hazor (hãfôr), tanto por J. L. Porter (1875) quanto por J. Garstang (Joshua-Judges 1931, 184), loca liza-se cerca de 23 quilômetros ao norte do mar da Galiléia e cinco quilômetros a sudoeste do lago Huleh (Yadin, Hazor I, 1958, 1-3). 2. Descrição. O local é composto de dois elementos principais: o cume da cidade em si, em forma de garrafa e estendendo-se por uma área de 61 600 m2 e, ao lado deste, um planalto de 740 000 m2 ao norte da cidade (Yadin, Hazor I, 1958, 1). 3. História. Fica evidente que a grande quantidade de referências a Hazor na literatu ra antiga é uma indicação da importância dessa cidade na antigüidade. A primeira referência a esse local encontra-se nos Textos egípcios de execração (Conjunto Posner) do século XIX a. C. Hazor também é mencionada em vários outros documentos egípcios, p. ex., nos Anais dos Faraós do Novo Império (1400-1300 a. C.), nas cartas de El-Amama (século XIV), nos Textos de Mari (c. 1700 a. C.) (Yadin, Hazor, 1975, 11-17) e no Livro babilônio de sonhos (Yadin, AOTS, 1967,245). Ao que parece, Hazor estava à altura de outras importantes cidades comerciais e centros administrativos do Crescente Fértil, como Mari e Qatna. A importância de Hazor é ainda mais acentuada pelo fato de que se encontrava numa importante rota comercial do Egito para os países do Norte e do Leste. As referências mais relevantes a Hazor no AT estão em Josué, Juizes e Reis. O rei Ja bim de Hazor liderou uma coalizão de reis do Norte contra os israelitas na batalha nas águas de Merom, onde o exército de Josué os derrotou (Js 11.1-5). De acordo com os vv. 10-13, “Josué, tomou a Hazor e feriu à espada o seu rei... A todos os que nela estavam feriram à espada... e a Hazor queimou”. A importância de Hazor para o Norte da Palestina no tempo da conquista é ressaltada pelo comentário de que “Hazor, dantes, era a capital de todos esses reinos” (Js 11.10). Algumas décadas depois de sua derrota inicial, o reino de Hazor foi restabelecido como principal potência da região. Ocorreu outra batalha entre as forças israelitas sob o comando de Débora e Baraque e as forças de “Jabim, rei de Canaã, que reinava em Hazor” (Js 4.2; cf. vv. 4-5), sendo lideradas por Sísera. As forças inimigas confrontaram-se no vale de Jezreel, nos arredores do rio Quisom, onde os cananeus foram derrotados e Sísera foi morto por Jael (Jz 4.16). A reconstrução de Hazor, bem como de Megido e Gezer por iniciativa de Salomão, é relatada em 1 Reis 9.15, e a queda de Hazor na mão dos assírios é mostrada em 2 Reis 15.29. A cidade também é mencionada em 1 Macabeus 11.67 ligada, nesse caso, a Jônatas, que mar chou com seu exército de Quinerete para o Norte, até a planície de Hazor. 4. Escavações. Infelizmente, os resultados das investigações de Garstang em Hazor em 1928 nunca foram publicados, exceto por algumas observações em seu comentário JoshuaJudges (1931). A partir de 1955, Yagel Yadin passou a dirigir a Expedição James A. de Rothschild da Universidade Hebraica. Os resultados dessa iniciativa foram amplamente publicados desde sua conclusão e abrangem um período que vai da Baixa Idade do Bronze II (2850-2650 a. C.) até o Período Helenista I (332-142 a. C.). As escavações foram retomadas sob a direção de Amnon Ben-Tor da Universidade Hebraica. 698
Hebrom
5. A cidade cercada ou Cidade Baixa. Evidências escavadas provaram que esse planalto era, de fato, uma cidade constituída de extensas fortificações, edifícios públicos, casas parti culares e templos. As edificações mais antigas encontradas nesse local são da Idade Média do Bronze 1IB (metade do século XVII a. C). O baluarte de terra construído no tempo dos hiesos criou uma cidade que poderia acomodar uma população estimada em tomo de 50 mil pessoas. Entre outras descobertas importantes, há pelo menos cinco portas da cidade e vários templos cananeus sobrepostos, inclusive um semelhante aos templos de Salomão e Alacá, bem como os respectivos implementos cultuais como altares, incensórios e recipientes rituais. Evidências claras de um incêndio criminoso comprovam a violência considerável com a qual a ocupação de Hazor foi concluída na segunda metade do século XIII a. C. Depois dessa destruição, não foi encontrada nenhuma evidência de reocupação da Cidade Baixa. Yadin acredita que essa devastação foi causada pelos invasores israelitas (Js 11.13; Yadin, Hazor, 1975, 145). 6. A Cidade Alta. Apesar de os pesquisadores terem desenterrado estratos da Idade do Bronze que correspondem àquele encontrado na Cidade Baixa, os resultados mais significati vos podem ser datados da ocupação israelita da cidade em si. Foram encontradas em diferentes partes evidências de um assentamento israelita na Cidade Alta da Idade do Ferro. No entanto, foi durante o reinado de Salomão, quando ele a reconstruiu como uma cidade fortificada, que Hazor readquiriu parte da glória passada. O rei colocou em Hazor muralhas de casamata, uma grande porta com seis câmaras, duas torres laterais e uma espécie de cidadela na extremidade oeste (Yadin, Hazor, 1972, 135-46). Também foram encontradas evidências de várias constru ções ocorridas durante a dinastia de Onri. O chamado edifício dos pilares que servia de depó sito, outros armazéns construídos num muro de casamata mais antigo, uma grande cidadela e um sistema de água subterrâneo adequado comprovam a prosperidade e o poder de Hazor sob o governo da dinastia de Onri, durante o século IX a. C. (Yadin, Hazor, 1972, 147-48; Hazor, 1975, 146-85). Apesar de a cidade propriamente dita ter sido ocupada antes da Cidade Baixa, os resultados das escavações esclarecem aspectos da sociedade israelita até a destruição da cidade pelas mãos de Tiglate-Pileser III em 732 a. C. (2Rs 15.29). Um assentamento não for tificado foi estabelecido em seguida, provavelmente por israelitas que voltavam para o local, mais para o fim do século VIII. Uma grande cidadela do período de dominação assíria conti nuou a ser usada no período persa. Os restos de uma cidadela helenística marcam o fim da fase bíblica da história de Hazor. B ib l io g r a f ia
A. Ben-Tor, (ed.), The Archaeology o f Ancient Israel, 1992; J. Garstang, Joshua-Judges, a reprint o f the 1931 edition in 1978; J. L. Porter, Handbook fo r Travellers in Syria and Palestine, 1875; J. A. Wilson, Egyptian Rituais and Incantations, ANET, 1969; Y. Yadin, “Hazor”, in D. W. Thomas (ed.), Archaeology and Old Testament Study, 1967,236-45; idem, Hazor, the H eadofA ll Those Kingdoms, Schweich lectures 1970,1972; idem, “Hazor”, in EAEHL, 1976, 2:464-95; idem, The Rediscovery o f a Great Citadel o f the Bible, 1975; Y. Yadin, Y. Aharoni, R. Amiran, T. Dothan, I. Dunayevsky e J. Perrot, Hazor 1-11 andIII-IV, 1959-64. D. N. Pienaar
( p ig n [hebrôri], é o nome de uma cidade [63x] locali zada na parte sul da região montanhosa de Judá, # 2496); NP (lOx; Êx 6.18; Nm 3.19; lCr2.42, 43; 6.2 [5.28], 18 [3]; 15.9; 23.12, 19; #2497); sobre nome [5x] (Nm 3.27; 26.58; lCr 26.23, 30, 31; # 2498). Hebrom
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Hebrom
1. Etimologia. O nome Hebrom está relacionado ao radical heb. hbr, que em sua for ma verbal costuma ser traduzido no q., juntar, unir, associar; no pi., unir, juntar e, no pu., estar aliado a, juntado. O nome geográfico pode refletir a suposição de alguns de que, em Hebrom, vários clãs/famílias, uniram-se numa espécie de aliança (ver Quiriate-Arba, “cidade dos qua tro”; # 7957). 2. História. Hebrom é mencionada especificamente 4x nas narrativas patriarcais. Lá, Abrão/Abraão construiu um altar (Gn 13.18) e comprou uma cavema no campo de Macpela (makpêlà; # 4834,6x) para sepultar a esposa Sara. Essa transação ocorreu na porta da cidade de Hebrom (cap. 23). O texto indica que, em ocasiões subseqüentes, Abraão, Isaque, Rebeca, Jacó e Lia foram sepultados naquela cavema. Diz-se que o campo de Macpela e, portanto, a cavema, ficam a leste de Manre (Gn 23.19 [mamrê'], 8x como NG [# 4934], 2x como NP [# 4935]). Os carvalhais de Manre ficavam próximos a Hebrom (13.18), e foi lá que Abrão/Abraão adorou a Deus, sendo, aliás, nesse local que o Senhor apareceu a ele (18.1). A grande proximidade de Manre com Hebrom é sublinhada em Gênesis 23.19 e 35.27, em que Manre é identificada como “Hebrom”. Começando nas narrativas patriarcais e continuando ao longo das Escrituras , deve-se observar que o nome mais antigo de Hebrom era Quiriate-Arba (Js 14.15; Jz 1.10; [qiryat 'arba “] # 7957 e # 7959, 9x; ver, por exemplo, Gn 23.2; 35.7; etc.). Depois do êxodo do Egito, os espias que Moisés enviou à terra prometida voltaram para Hebrom (Nm 13.22), trazendo consigo frutos saborosos do vale de Escol (Nm 13.23,24; 32.9; Dt 1.24; [ eskôl] # 865,4x como NG), não muito longe dali. No tempo da conquista sob o comando de Josué, Hoão, o rei de Hebrom, juntou-se à co alizão de amorreus que foi derrotada por Josué (Js 10.3,5,23,36,39; 11.21; 12.10). Hebrom foi separada para a tribo de Judá (15.24) e serviu, não apenas como cidade levítica (21.11,13; ICr 6.55 [40]), mas também como uma das três cidades de refúgio a oeste do rio Jordão (20.7; ICr 6.57 [42]). Hebrom foi entregue a Calebe e seus descendentes (Js 14.13-15; 15.13; Jz 1.20). Posteriormente, na história israelita, quando Davi era um fugitivo dc Saul, galanteou o povo de Hebrom enviando-lhe presentes (1 Sm 30.31). Depois da morte de Saul, Davi governou sobre a tribo de Judá em Hebrom (2Sm 2.1,2, 11; etc.) durante sete anos. Esse era o lugar “na tural” de onde reinar, pois Hebrom era a maior cidade de Judá na região montanhosa, servindo como centro comercial, uma vez que era cortada pela importante “estrada da Cordilheira” que ia para o norte de Hebrom, passando por Belém, Jerusalém, Gibeá, Ramá, Betei, etc. Hebrom também era a porta para o sul — para o Neguebe, pois havia uma estrada que ia para sudoeste até Berseba e outra para sudeste até Arade. Quando Davi foi proclamado rei sobre toda Israel, mudou a capital para Jerusalém. Porém, é evidente que Hebrom continuou sendo um importante centro religioso (Absalão foi para lá para cumprir um voto feito ao Senhor [2Sm 15.7]) e também político (onde Absalão foi coroado rei [2Sm 15.10]). Hebrom só é mencionada uma vez no período do reino dividido — foi fortificada por Roboão, sucessor de Salomão (2Cr 11.10). Não aparece em momento algum no período de exílio e nem depois dele, apesar de haver um relato de uma Quiriate-Arba, onde exilados que voltaram para a terra se assentaram (Ne 11.25). A idéia de que essa Quiriate-Arba é a mesma cidade mencionada em narrativas anteriores deixa dúvidas, pois as vilas associadas a ela ficam todas localizadas nas regiões ao sul e a oeste de Hebrom, no Neguebe e no Sefelá. Além disso, deve-se observar que esse é o único lugar das Escrituras em que a menção de Quiriate-Arba não está associada a Hebrom. E possível que Hebrom já tivesse começado a ser assentada por grupos étnicos não israelitas (edomitas?), e que o nome Quiriate-Arba tivesse sido dado a um outro assentamento judeu. 700
Hesbom
3. O local. A Hebrom bíblica é identificada a um local numa ponta de Jebel Rumeida (Grade pal.: 160103). Esse local já foi escavado (ver Ofer) e, apesar de a cidade variar de ta manho, cobria (no máximo) c. dezessete acres. Foram encontrados restos arqueológicos da Alta Idade do Bronze, Idade Média do Bronze, Idade do Ferro, períodos Helenístico, Romano, Bi zantino e Árabe. A “caverna de Macpel”, associada à cidade, normalmente é identificada com Harã-el Kalil — uma estrutura herodiana — situada no vale abaixo de Jebel Rumeida. Dentro de Harã, encontram-se os supostos túmulos dos patriarcas e suas esposas. Manre costuma ser identificada com a cidade cercada de Harã Ramete el-Kalil (Grade pal.: 160108). Foram en contrados nesse local, restos arqueológicos dos Períodos Romano e Bizantino. 4. Importância teológica. De modo geral, lugares mencionados na Bíblia não possuem nenhum significado teológico intrínseco, e Hebrom não é exceção. No entanto, com freqüên cia, os locais adquirem importância em função dos acontecimentos ali ocorridos. E o caso da relevante promessa feita a Abrão/Abraão de que sua descendência ocuparia a terra de Canaã (Gn 15.18; 17.8; et al). Mas assim como aconteceu com outros aspectos da promessa — se haveria uma descendência e, quem diria, numerosa — Abraão creu na palavra de Deus (15.6). A posse completa da terra de Canaã pelos descendentes de Abraão só ocorreria muito tempo depois, no tempo de Davi-Salomão e, no entanto, ao comprar a caverna de Macpela próxima a Hebrom, Abraão começou a tomar posse da terra. Apesar de ser apenas um pequeno pedaço de terra, sua compra foi o início do cumprimento da promessa de Deus a Abraão. Além disso, é possível que Hebrom tenha servido de centro religioso durante pelo menos um milênio, pois Abrão/Abraão construiu um altar naquele local; a cidade foi entregue aos levitas e designada cidade de refúgio e, mesmo no tempo de Davi, seu filho Absalão foi até lá para adorar. B ib l io g r a f ia
TDOT4:193-97; TWOT 1:259-611; A. Ofer, “Hebron”, NEAEHL, 2:606-9. Carl Rasmussen
Hesbom
Hesbom [hesbón II], dispositivo?; possivelmen te = fortificações; Hesbom, cidade na Transjordânia [ár.
hasbãn]; #3114).
AT Hesbom localiza-se a leste do mar Morto, na extremidade norte do misõr (planalto, Dt 3.10; 4.43; etc.), próximo ao córrego Hesban. O reino de Seom é descrito como se estendendo “desde o Amom até ao Jaboque” e a leste, até a fronteira do território amonita (Nm 21.24). (Para comentários sobre os territórios disputados, ver Transjordânia.) A história da conquista de Hesbom por Israel é contada 3x no AT — Números 21.2131; Deuteronômio 2.14-37; Juizes 11.12-28 — e recebe referências freqüentes na história deut. (e em Ne 9.22). O poema de escárnio associado à cidade aparece duas vezes (Nm 21.27-30 e Jr 48.45-47). A repetição do relato da história e a reutilização da poesia demonstram a técnica de historiadores antigos, que empregavam a obra de seus antecessores, adaptando-a, porém, a pro pósitos pessoais. A versão mais simples é a de Deuteronômio. Hesbom ocupa uma posição de destaque numa história sobre o rei Seom, história esta que possui diversos tons. 1. Deuteronômio 1— 4 apresenta um resumo histórico que faz a transição para o liv da lei nos caps. 5—8. Moisés recapitula os acontecimentos que conduziram Israel a um lugar descrito de diversas maneiras: “terra de Moabe” (Dt 1.5); “campinas de Moabe” (Dt 34.1) 701
Hesbom
(provavelmente a designação mais conhecida para o escritor); “Sitim” (=defronte de Bete-Peor, Nm 25.1; Js 2 .1); “na terra de Seom, rei dos amorreus” (Dt 4.46). Em Deuteronômio, é descrita uma mudança completa da ocupação da terra. Todos os estados da Idade do Ferro mencionados, como Israel, Judá, Amom (amonitas), Moabe e até mesmo os filisteus são ocupantes recentes de cidades antigas que tomaram por meio de suas conquistas (cf. Dt 2.10-12, 21-23, “caftorins” = filisteus que “destruíram os primeiros habi tantes”). Era raro fundar-se uma nova cidade. Esse conceito de mudança de ocupação é basi camente o mesmo encontrado em Heródoto. Os fenícios vêm do Golfo Pérsico (Heródoto, 7 §89); na Grécia, os dórios colonizam o Peloponeso (8 §56). Em Deuteronômio, Israel realiza uma substituição completa, “não [deixando] sobrevivente algum” (Dt 2.34; cf. 3.3; Js 8.22; 10.28,30,33,37,39,40; 11.8; etc.; “a todos os homens feriram à espada,” Js 11.14; “homens, mulheres e crianças,” Dt 2.34). Essa linguagem contribui para a idéia da terra ser assentada por um povo “puro”. Como parte dessa ideologia, é preciso que sejam mantidos os direitos dos novos Es tados. Os povos da Transjordânia são aparentados entre si (o que fica evidente pela língua e a cultura) e, portanto, parte da família da Abraão (Dt 2.5, 9. 19, 22). Sua terra também vem de Deus. Assim, para que Israel possa apropriar-se de qualquer território a leste do Jordão (que não fazia parte da terra prometida a Abraão), devem ser terras colonizadas por habitantes mais antigos (descendentes de Cam, cf. Gênesis 10.6, 16) e não por semitas. Em Deuteronômio, os edomitas e moabitas deixam Israel passar (Dt 2.29). Portanto, é bem provável que a terra ao norte do Amom não pertencesse a nenhuma uma das nações semitas, mas sim aos povos mais antigos. Estes são chamados de “amorreus”, mas apenas como um termo geral (ver Liverani; cf. Gn 10.16). Todos os escritores chamam os povos mais antigos da Transjordânia de amorreus; mas enquanto o D fala de amorreus na Cisjordânia, em outras passagens são chamados de cananeus. O texto não diz qual era o nome específico do povo de Seom: o nome geral para o povo original (autóctone?) era “refains” (Dt 2.11, 20); Basã era uma terra dos refains (3.13) e o rei Ogue também era de lá (3.11). Logo, supõe-se que Hesbom (e Seom) também fosse dos refains. Josué 12.2-4 faz uma distinção entre os amorreus e os refains, mas os amonitas haviam expulso os refains (Dt 2.20), mais especifi camente, os zuzins (Gn 14.4). Na narrativa deut., Israel oferece passar direto pelo território de Hesbom e atravessar o Jordão, mas Seom (como Ogue numa ocasião posterior) não lhes dá passagem e, assim, perde sua terra, seu povo e a vida. Apesar disso, os guerreiros devem cruzar o rio para manter todos “os filhos de Israel” (Dt 3.18-20) reunidos. Somente Moisés é deixado para trás. 2. A história de Jefté (->) se passa em Gileade, a norte de Hesbom. Os amonitas es lutando contra os habitantes da região ao sul do Jaboque. Na digressão de Juizes 11.12-28, Jefté imita o comportamento de Moisés e também envia mensageiros até os amonitas, pedindo para arrazoarem sobre o conflito. A resposta é uma reivindicação por todas as terras “desde o Amom até ao Jaboque”. Porém, no resumo sobre Jefté, os reis de Edom e Moabe não lhes dão passagem, de modo que precisam contornar esses Estados, viajando pelo deserto a leste, cruzando o Amom. Não entraram “no território dos moabitas, porque Amom é o limite deles” (Jz 11.18, gêbül é traduzido como fronteira e como território). Seom rejeita o apelo dos men sageiros pedindo passagem em segurança, mas Israel toma toda terra, apossando-se dela por direito de conquista. Assim, os amonitas não têm direito algum sobre a terra que costumava ser dos amorreus. (E supõe-se, aqui, que não sobraram amorreus para contestar o fato.) Ao di reito de conquista, é acrescentado ainda o direito de ocupação, pois Israel encontra-se assen tada na região há trezentos anos (Jz 11.26). Num contraste nítido com Deuteronômio, porém, 702
Hesbom
Juizes 11.24 apresenta um Jefté diplomático que atribui aos amonitas o direito de ocupação de seu próprio território a Semos, o deus de Moabe, e não a Javé. 3. Números possui elementos das duas versões da história. Moisés enviou mensageiros de Cades até o rei de Edom, declarando serem irmãos e pedindo o direito de viajar pela estrada do rei, sem usar comida ou bebida da terra dele (Nm 20.17) e pagando pela água de que pre cisassem (v. 19). Os israelitas são recusados e confrontados por uma grande força (contrastar com Deuteronômio. 2.4-5: “eles terão medo de vós... nâo vos entremetais com eles”. Em Nú meros, o Senhor não dá direitos sobre a terra a Edom). Assim como em Juizes, Israel primeiro oferece não beber coisa alguma e depois oferece pagar pela água. Desviam de Edom, entrando no deserto e viajando a leste de Moabe rumo ao Amom, que é a fronteira entre Moabe e os amorreus. Seom partiu para o ataque contra Israel e foi derrotado. Ao contrário de Deuteronômio (e do resto de Números), Moisés não é mencionado pelo nome nessa passagem. E Israel quem envia mensageiros (como acontece em Juizes), e não Moi sés. Contrastando com os dois relatos deut., não há menção alguma de intervenção divina na ba talha. Para o D, a intervenção divina é necessária para ressaltar que era Javé quem estava dando a terra mas, ao que parece, essa não é questão mais relevante para o relato de Números. 4. O Livro de Números é conhecido por sua documentação, sua inserção de trechos de antigos poemas para servirem de prova/ilustração para a narrativa. Na história de Seom, é citado um cântico de escárnio (hammõíelim, em Nm 21.27, provavelmente significa “escarnecedores” e não poetas ou cantores de baladas; ou pode-se ainda traduzir bimesãlim como versos de escárnio). Esse poema aparece (com algumas variações) em Jeremias 48.45-47. Faz parte de uma coleção de insultos contra Moabe dentro da série de oráculos contra as nações (Jeremias 46— 51). A cidade de Hesbom (como cidade de Moabe) também é citada em Jeremias 48.2, 34. Em 49.3 dá a impressão de ser parte de Amom. Poemas semelhantes podem ser encontrados em Isaías 15.1— 16.13 (o nome de Hesbom aparece em 15.4 e 16.8-9). No poema em Jeremias, que tem como contexto a invasão babilônia, o fogo começou em Hesbom (ou seja, a invasão veio do Norte) e está se espalhando para o sul. Não fica claro o que forma o paralelo com Hesbom. Em vez de “do meio de Seom” (Jr 48.45 [TM]) alguns MS trazem “da casa de” (ou ainda, palácio — mas se “casa” é um termo correto, então prova velmente seria uma indicação de que Seom era um deus e essa casa um templo, como BeteHorom, etc.). O poema em Números é ainda mais difícil de ser interpretado, como mostram as dife rentes versões. A estrofe “Vinde a Hesbom! Edifique-se, estabeleça-se a cidade de Seom ( ‘ir sihôn)\" não se encontra em Jeremias. No v. 29, há três linhas para as duas que aparecem em Jeremias. Essa linha adicional define como contexto do poema a época da invasão israelita. Nesse caso, os cativos são capturados por Seom e não pela Babilônia. O fogo vem de Hesbom, mas não é lá que começa a destruição. A realidade destoa raciocínio do Deuteronômio. Para ele, toda terra que pertencia a Moabe era tabu para os israe litas. Conforme foi observado, Números não demonstra nenhuma piedade por Edom (e não é apresentado motivo algum para que os israelitas se desviassem de Moabe). O povo dá a volta ao redor de Edom devido à força desse povo e não por ordem de Deus (o mesmo acontece em relação a Amom, Nm 21.24). Assim, não há nenhum escrúpulo sobre Israel tomar a terra que havia pertencido a Moabe, caso fosse capaz de fazê-lo. Na narrativa deut., o território de Seom é dado por Josué aos rubenitas (Js 13.21), mas nos vv. 16-17, o território de Rúben limita-se à região do Amom até Hesbom, enquanto os 703
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gaditas herdam a parte de Hesbom até o Jaboque (Js 13.26) apesar de que em Josué 21.39 (= 1 Cr 6.81), Hesbom pertence a Gade. B ib l io g r a f ia
S. R. Driver, Deuteronomy, 1895; L. T. Geraty, “Heshbon: First casualty in the Israelite Quest for the Kingdom of God”, The Questfor the Kingdom o f God, 1983,239-48; idem, “Heshbon”, NEAEHL, 1993, 2:626-30; E. A. Knauf, “Hesbon, Sihons Stadt,Z D P V 106, 1990, 135-44; M. Liverani, “The Amorites”, POTT, 1973, 100-133; H. C. Schmitt,“DasHesbonlied Num 21 27apb-30 und die Geschichte der Stadt Hesbon”, ZDPV 104, 1988, 26-43; J. van Seters, “The Conquest o f Sihon’s Kingdom: A Literary Examination”, JBL 91, 1972, 182-97. Judith M. Hadley Hoje
# 3427 {yôm, luz do dia, dia, dia escatológico, hoje)
Holocausto -> # 6592 ( ‘õlâ I, holocausto) Homem -> # 132 ( 'ãdãm I, homem) Homicídio
# 7779 (qtl, matar, assassinar de modo violento)
Honestidade -> # 3841 (yõser, retidão, honestidade, integridade) Honra -> # 3877 (kbd, ser pesado, honrado) Honra
# 3877 (kbd, ser pesado, honrado)
Humanidade -> # 132 ( 'ãdãm I, homem) Humildade Humilhação
# 6708 ( ‘anãwâ, humildade) # 4009 (k?limmâ, desgraça, humilhação, desdém)
1. Definição. No NT 10.14; G1 5.20; Cl 3.5; lPe 4.3) descreve a adoração dos objetos materiais em si. Eles “mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis” (Rm 1.23). Esse conceito foi extraído do judaísmo antigo, que pode ser visto claramente em Sabedoria 13— 14, passagem da qual essa parte de Romanos constitui um paralelo próximo. “Mas são desgraçados e esperam em mortos, aqueles que chamaram de deuses a obras de mãos huma nas... porque o culto de inomináveis ídolos é o começo, a causa e o fim de todo o mal” (Sab 13.10; 14.27). Em G comum, a palavra eidõlon era neutra, significando fantasma (Odisséia 11.601), imagem refletida na água e cópia em forma de figura. Nos meios judeus de fala grega, porém, adquiriu o sentido negativo que possui na tradução da LXX, em que traduz termos heb. como pesei, maskit, gillülim, íiqqú$, to ‘êbâ, tabnit, fimúnâ. Muitas dessas palavras são, por vezes (mas não sempre), traduzidas em nossas versões como “ídolo”. Há diferentes opiniões sobre Idolatria: Teologia
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Idolatria: Teologia
quando o termo é apropriado, pois ao mesmo tempo em que essas palavras são usadas de modo negativo no AT, nem sempre têm o sentido restrito somente a imagens. Ao contrário de diversas asserções, o AT não considera as imagens como sendo diabó licas ou representações ou aspectos de maus espíritos. As duas passagens usadas para sugerir esse significado são Deuteronômio 32.17 e especialmente o Salmo 106.37. Apesar de a tradução apresentar o termo “demônios”, trata-se mais de daemom no sentido do G do que do uso feito dessa palavra no NT [ver, porém, Gelin, col. 186]. O resto do AT rejeita a idéia de que ídolos representem maus espíritos. Para o monoteísmo do AT, existe somente um Deus [Dt 32.39; Is 45.5-7,18] e não há conceito algum de maus espíritos (seres moralmente perversos). E possível que haja um resquício da crença popular em “monstros imaginários” (Eichrodt 2:223). Tratase de um tema secundário no NT “as coisas que eles sacrificam, é a demônios que sacrificam” ( ICo 10.20), mas não tem sua origem no AT. Mais no começo do século XX, os antropólogos falam de fetichismo, aceitando a idéia de que as pessoas muitas vezes confundiam o sinal com aquilo que tal objeto representava. Tal interpretação não é mais tão aceita e a teoria mais corrente afirma que o deus pode encontrarse manifestado na imagem, mas ele é sempre mais do que uma imagem. Os objetos usados no culto são sempre “consagrados”. No mundo antigo, eram realiza das cerimônias elaboradas (p. ex., “a abertura da boca”; ver Jacobsen. cf. Faur) aos ídolos. As “paródias de ídolos” são válidas somente ao negar-se que essas cerimônias realizam alguma coisa. E significativo que a parte mais importante da imagem é o símbolo de divindade que ela usava ou portava. As pessoas não acreditavam que aquela era a aparência de seus deuses e até mesmo as imagens de reis eram mais a imagem da monarquia do que retratos de reis indivi duais. Assim também a cabeça de animal em um deus egípcio não era a aparência exata desse deus, mas sim um símbolo que expressava algo da natureza do deus. Portanto, os “bezerros de ouro” (Êxodo 32; 1 Reis 12) não representavam a imagem de Deus, mas um aspecto seu, a sua força. O AT abstinha-se sempre de representações humanas ou animais de Deus, mas reconhe cia símbolos. Foi somente num período posterior que os símbolos, mesmo quando não estavam ligados a uma forma (heb. temúnà, Êx 20.4; Dt 4.15), tomaram-se repreensíveis. Nem mesmo seu nome podia ser usado! (-> Sinal e Símbolo: Teologia) Duas linhas de pensamento do AT levaram ao conceito de idolatria (a saber, “a imagem é tudo o que há”): a proibição de se confeccionarem imagens (de qualquer deus) para o uso no culto e o monoteísmo. Isso resultou nas sátiras das “paródias dos deuses” (-> psl, #7181). Fica claro que em alguns meios, especialmente na ordem sacerdotal, não se faz objeção alguma a certos símbolos. Os utensílios do templo e do tabemáculo eram elaborados e icono gráficos. Não havia objeção alguma quanto a se fazerem representações de coisas no céu ou na terra que não fossem imagens de deuses. Para Êxodo 20.4-6, ver psl (#7181). Até mesmo os querubins (k^rúbim) sobre a arca eram considerados representações de criaturas “reais” e nâo fantasia (cf. SI 18.10 [ 11 ] — apesar de ser provável que o poeta tivesse em mente uma nuvem de tempestade). Ao escrever sobre tradições posteriores, Josefo afirmou que eram “diferentes de qualquer coisa que os olhos dos homens tivessem visto” (Ant. 3, §137). A adoração a Javé era associada a vários objetos materiais, alguns deles prescritos por profetas e outros não. Em uma ocasião ou outra, eram usados objetos como a estola sacerdotal, a arca, as colunas, o templo e seus utensílios e também a serpente de bronze. Diz-se ainda que o ’asêrâ (poste, Aserá) era usado no culto a Javé, mas não há prova alguma dessa colocação (cf. ’ílsêrâ # 895). É possível que seja simplesmente obra do acaso o fato de não haver his tórias sobre os postes, como há sobre a arca e a estola sacerdotal. 705
Idolatria: Teologia
2. Israel e os deuses babilônios, a. Os deuses da Babilônia, i. Bel, Marduque (TM merõdãk\ cf. nomes; acad. Marduk-apla-idinna, Marduque deu um filho; no AT, MerodaqueBaladã, 2Rs 20.12; Mordecai, Et 2.5 [= acad. mardukà]). Marduque era o principal deus da Babilônia, cujo símbolo era o planeta Júpiter. Adquiriu o título honorário de “Bel” ou Mestre (ver Baal). ii. Nabu (cf. TM nebô, Nebo), filho de Bel Marduque, deus do aprendizado. Nomes ba bilônios que contêm a designação desse deus: Nabucodonosor (acad. nabü-kudurri-u$ur, Nabu protege o filho), Nebuzaradã (cf. 2Rs 25.8; Jr 39.11). iii. Sambalate (Ne 2.10, etc) é o acad. Sin-uballi(, Sin dá vida. Sin era o deus ocidental da lua. Apesar de seu nome, Nabunaide, último rei da Babilônia antes de Ciro, o persa, ofen deu os sacerdotes de Marduque com sua devoção a Sin e a reconstrução do templo desse deus em Harã (ANET, 312-15). iv. Nergal, deus do mundo dos mortos; cf. Nergal-Sarezer (Jr 39.3, 13). v. Nisroque (2Rs 19.37 = Is 37.38) é desconhecido: seria de se esperar Assur, principal deus da Assíria. vi. Quium (TM kiyyün\ cf. aca Kay[a]m/wõnu, firme, Saturno) aparece em Amós 5.26, vo calizado com as vogais de siqqúç, abominação (ver At 7.43 “Renfà” [de acordo com a LXX]). b. A humilhação de Bel Marduque é usada como um símbolo para a destruição da B bilônia. Os sacerdotes da Babilônia afirmavam que Ciro era o escolhido de Marduque (ANET, 315; como Is 44.28-45.3 afirma sobre Javé) e honrado por ele. Bel e Marduque são usados em paralelo em Jeremias 50.2, porém Bel aparece com Nebo em Isaías 46.1 (-> '.?/>, # 6773). Em 2 Reis 17.29-33, o escritor acusa os habitantes de Samaria de serem politcístas — adorando Javé, mas também os deuses babilônios. Explica esse fenômeno como resultado de um intercâmbio forçado entre os diferentes povos. Os mesopotâmios “fizeram” (esse vb. normalmente deixa implícita a origem humana dos deuses, mas não é empregada nenhuma palavra para imagem) os deuses de suas cidades natais: os da Babilônia fizeram Sucote-Benote (sendo sugerido nesse caso Marduque e/ou Sarpanitu, mas provavelmente significa Sacute); os de Cuta fizeram Nergal, os de Hamate fizeram Asima (cf. Am 8.14), os aveus fizeram Nibaz (altar?) e Tartaque (?). Os sefarvitas queimavam os filhos a Adrameleque (Hadade é meleque?) e Anameleque (‘An-meleque ou ‘Anate Meleque, cf. Millard, DDD, cols. 58-60). Para esse sacrifício, ver mõlek (-> # 4891). 3. Israel e os deuses egípcios. A referência a animais em Ezequiel 8.10 foi considera da uma alusão aos elementos teriomórficos da iconografia egípcia de seus deuses, um assunto freqüente, objeto do humor/aversão de escritores judeus posteriores (cf. Sab 15.18-19). Uma possível referência direta a um deus é a interpretação conj. de hap (= Apis) em Jeremias 46.15 (cf. LXX). Apis era a encarnação de um deus na forma de um touro (Heródoto 3 §28). Heródoto apresenta um relato fictício do rei persa Cambises zombando dessa encarnação (Heródoto 3 §29), matando-a e morrendo como castigo por isso. A história é semelhante às polêmicas judaicas posteriores, exceto pelo fato de que a devoção de Heródoto não permite que se zombe da divin dade de nenhum povo. Os Papiros de Elefantino mostram que os judeus consideravam Cambises um simpatizante. O contraste entre e atitude de Heródoto e a de polemistas judeus ulteriores é, ao mesmo tempo, extremo e instrutivo. (Com a expansão da influência grega, Heródoto não se sentia ameaçado.) Os epitáfios em sarcófagos de touros mostram que nenhum touro daquela época morria prematuramente e que Cambises respeitava a religião egípcia (Posener). Idolatria: -> 'elil (nada, # 496); -> ’asêrâ (objeto de adoração feito de madeira, poste, deusa, # 895); -> gillülim (imagens, ídolos, # 1658); -> dãgôn (Dagom, # 1837); -> kPmôS (Quemos 706
Idolatria: Teologia
[deus dos moabitas], # 4019); -> mõlek (Moloque, # 4891); massêkâ 1 (estatueta fundida, # 5011); -> mipleset (coisa terrível, objeto abominável, # 5145); -> semel (imagem, # 6166); -> ‘õyãô (imagem de um deus, # 6773); 'astõret (Astarote, # 6956); -> pe.ve/ (imagem cultuai, estátua de um deus, #7181); tõmer II (espantalho, # 9473) -> ^rãpim (estatuetas, máscara, # 9572); -> Idolatria: Teologia B ib l io g r a f ia
/S fl£2:746-800; NIDNTT2:2S4-93; TDNT 1:438-44,2:375-80; TDOT 1:285-87,438-44,3:1-5; 77T/<7'4:1009-15, 5:488-93, 6:301-5, 688-97; R. Borger, “Amos 5,26 Apostelgeschichte 7,43 und Surpu II, 180”, ZAW 100, 1980, 70-81; M. Cogan e H. Tadmor, II Kings, AB, 1988; E. M. Curtis, “Idol, Idolatry”, ABD 3:376-81; E. Eichrodt, “The Demons”, Theology o f the Old Testament, 1967,2:223-28; J. Faur, “Biblical Idea o f Idolatry”, JQR 69, 1978, 1-15; C. Frevel, Aschera und der Ausschlieslichkeitsanspruch YHWHs, 1995; A. Gelin, “Idoles, Idolatrie”, in DBSup, 6, 1949, cols. 169-87; J. Gray, Legacy o f Canaan, 2d ed., 1965; idem, “Idolatry”, ÍDB 2:675-78; idem, “Sakkuth and Kaiwan”, IDB 4:165; J. M. Hadley, “Yahweh and ‘His Asherah”\ Ein Gott allein?, 1994,235-68; T. Jacobsen, “The Graven Image”, Ancient Israelite Re ligion, 1987, 15-32; A. Lemaire, “Who or What Was Yahweh’s?” BARev 10, 1984,42-51; A. R. Millard, “Anammelech”, DDD, cols 58-60; D. Pardee, Les Textes para-mytologique de la 24e campagnes (Ras Shamra-Ougarit 4), 1988; G. Posener, La première domination perse en Égypte, 1936; G. von Rad, “The Polemic Agaisnt Idols”, Wisdom in Israel, 1972, 177-85; W. M. W. Roth, “For Life, He Appeals to Death (Wis 13:18)”, CBQ 37, 1975,20-47; S.Schroer, In Israel gab es Bilder, 1987; R. Stadelmann, Syrisch-Palãstinenische Gottheiten in Àgypten, 1967; M. Stol, “Kaiwan”, DDD, cols 899-900; H. W. Wolff, Joel and Amos, 1977; W. Zim merli, Ezekiel, 1979. Judith M. Hadley Imagem ->#7181 (pesei, imagem cultuai, estátua de um deus) Impedimento -> # 5648 (nw ’, impedir, evitar, frustrar) Impiedade -> # 2866 (hnp I, ser ímpio, ser corrompido) Imposto -¥ # 4989 (mas, tributo, imposto) Imprecaçâo
# 457 ( ’lh I, jurar, amaldiçoar, colocar sob juramento)
Impureza -> # 3237 (fm ’, tomar-se impuro, poluir, profanar) Incêndio -> # 7706 (qdh, atear fogo, acender, pôr fogo, incendiar) Inchaço -> # 2075 (hdr, inchar, honrar, adornar) Incircunciso Incisão
# 6887 ( 'rl, tratar como incircunciso)
# 1517 (gdd I, fazer cortes, incisões)
Incitação -> # 6424 ( ‘wr III, mexer-se) 707
Idolatria: Teologia
Incitamento -> # 6424 (‘wr III, mexer-se) Inclinação -> # 2129 (hakkãrâ, inclinação) Incorreção -> # 6401 ( ‘ u71, agir incorretamente) Indagação -> # 2011 (í/ri, preocupar-se com, indagar, buscar) Indiferença
# 7069 (pAz, ser indiferente, arrogante)
Infortúnio -> # 7085 (pW, ruína, infortúnio) Ingenuidade
# 4074 (kislâ, confiança)
Inimigo -> # 366 ( [yft, ser um inimigo) Iniqüidade -> # 6404 ( awe/, injustiça) Iniqüidade Injúria
# 6411 ( ‘ãwõn, iniqüidade, transgressão)
# 1552 (g
Inocência -> # 5927 (nqh, ser livre, isento de culpa, permanecer) Inscrição -> # 2980
gravar, inscrever)
Insensatez -> # 5571 (wW II, agir com desdém) Insignificância -> # 7592 ($ V, ser de pouco valor, insignificante) Inspeção -> # 1329 (fop- I, examinar, inspecionar, cuidar de) Instrução -> # 4341 (limmud, instruído, experiente, discípulo) Insuficiência Insulto
# 1924 (dn/ II, insuficiente, impotente, insignificante, abatido)
# 3070 (hrp II, insultar, escarnecer, ultrajar, zombar)
Integridade
# 7045 (.yc/c/, ser justo, reto, justificado)
Interpretação -> # 7354 (p/r, interpretar [sonho]) Intrepidez -> # 6451 (zz, ser forte, desafiar, tornar firme) Inundação -> # 8851 (ífp, arrastar com água, inundar, transbordar) Inveja -> # 7861 (
Ira
Inverno -> # 3069 (hrp I, passar o inverno)
Ira
A. A ira humana Os termos empregados para designar a ira humana no AT (196x) são os mesmos usa dos para descrever a ira de Deus (com a restrição de que certas formas gramaticais dos termos que aparecem com menos freqüência são limitadas somente à ira humana ou divina). Essas palavras raramente se referem à ira de um grupo. Antes, costumam indicar a ira de um indiví duo, normalmente voltada contra outros homens (a mula de Balaão é exceção), mas em alguns casos esparsos, volta-se também contra Deus. Assim, uma característica da ira humana no AT é a dimensão interpessoal dela. 1. O controle da ira humana. Um dos temas mais amplos de discussão gira em to das reações rápidas dos homens encolerizados. Espera-se que uma pessoa sinta raiva na vida quotidiana (p. ex., SI 37.8; Pv 12.16; 17.27; 19.11). Os textos partem do pressuposto de que os homens têm liberdade de expressar ou refrear a ira e usar de persuasão. Na literatura de sabe doria, as orações causativas tanto prometem quanto ameaçam de várias maneiras. Por um lado, controlar a ira promove a saúde (Pv 12.18), pode apaziguar conflitos (Pv 15.18), é sinônimo de grandeza (Pv 16.32) e sabedoria (Pv 29.11), etc. Por outro lado, o indivíduo irascível é um insensato (Pv 12.16; Ec 7.9), suscita contendas (Pv 15.18) e sua vida fica exposta ao fracasso e à destruição (Pv 25.28). As motivações presentes nas narrativas do AT não apenas defendem a admoestação fun damental contra uma resposta precipitada, como também apresentam um argumento a mais para apoiá-la: o indivíduo nem sempre tem todas as informações necessárias para tomar uma decisão justa e sábia. Não se pode tomar decisões corretas no calor da ira (Gn 39.7-16; Ex 32.22; Nm 31.14; Jr 37.15). A natureza das limitações humanas adverte do perigo de liberar a violência impetuosa da ira. Agir sem ter conhecimento pleno pode levar a conseqüências desastrosas. O AT não incentiva a eliminação das paixões humanas; antes, ressalta métodos para colocá-las a serviço de relacionamentos adequados. Um método que se destaca é o apelo a uma resposta refletida e racional. É possível irar-se sem pecar (SI 4.4 [5]), mas se nos recusamos a pensar, então normalmente perdemos as respostas construtivas que poderíamos encontrar para as situações que desencadearam a ira (Gn 4.3-8; 1 Samuel 25). O chamado à reflexão no momento da ira está associado a várias sugestões para ati tudes alternativas. A primeira delas é a exortação a verbalizar a ira em vez de agir de modo incorreto (Gn 31.36; Jó 3. 9, 10). As perícopes que incentivam essa verbalização especificam certas disciplinas que contribuem para o seu sucesso. Ao demonstrar ira, é necessário ater-se ao assunto e não depreciar, repreender ou atacar pessoalmente aquele a quem se está dirigindo (Gn 30.2; Lv 10.16-20). A verbalização é voltada não apenas para outros, mas em certos casos, também para Deus. Quando aqueles que estão causando a ira do justo encontram-se inacessíveis por algum motivo, o justo pode apresentar sua frustração a Deus e realizar uma reflexão racional sobre a situação. O segundo método é evitar certas situações que poderiam causar a ira ou que colocariam a pessoa numa posição em que ela sofreria as conseqüências da ira de outros. Assim, aconse lha-se evitar os escamecedores (Pv 29.8), ter consciência da honradez de evitar-se contendas (Pv 20.3), dos resultados inevitáveis da fofoca e da difamação (Pv 25.23) e dos perigos de se intrometer nos assuntos dos outros (Pv 25.17). 709
Ira
Também há certos tipos de indivíduos e certas circunstâncias que os acompanham e que se deve, por princípio, evitar. Nunca se envolva numa discussão com um insensato (Pv 27.3; 29.9). Evite provocar a ira daqueles que têm poder na sociedade (Pv 16.14; 19.12), instigar o ciúme de um homem (Pv 6.34; 27.4), casar-se com uma mulher rixosa (e iracunda) (Pv 21.19) e andar com indivíduos conhecidos pelo comportamento irritável. O AT também fala de como se deve lidar com a ira de outros. Pode-se desviar a ira com uma resposta branda (Pv 15.1; cf. Jz 8.3; 2Rs 5.11-12), abatê-la com um suborno (Pv 21.14), refletir sobre a brevidade da vida e perceber que é inútil exigir demais de si mesmo (Ec 11.10) ou que exigir demais dos outros quando estão irados é perigoso (Pv 30.33). Por fim, não se deve permanecer em estado de inveja ou irritação por causa do sucesso dos perversos (Pv 3.31; 24.19-20). Essas instruções, quando consideradas como um todo ou individualmente em seus res pectivos contextos, não são sustentadas por uma filosofia de resignação ou passividade. Tais ensinamentos também não consistem em mero pragmatismo, especialmente do tipo sofista ou narcisista. Essas diretrizes são fundamentadas em uma preocupação ativa com a formação de relacionamentos bem-sucedidos e justos entre as pessoas. Essa preocupação estende-se à co munidade (Pv 29.8), aos pais (Pv 17.25) e refere-se àquilo que é sábio e reto diante de Deus (SI 37.8; Pv 19.3). 2. As causas da ira. a. Frustração. Uma das maiores questões é a frustração dos desejos indivíduo (Gn 4.3-8). Outras subcategorias são: tera vontade contrariada (2Sm 3.8; 2Cr 16.10; Et 1.12; etc.) ou esperar uma perda (ISm 18.8; Ne 4.7 [1]). Nesse último caso, a pessoa irada sente-se ameaçada por algo que está por vir e não por um fato ou ação presente. Em algumas ocasiões, observa-se um misto de ansiedade e ira (Jz 9.30; 2Sm 6.8; Ne 3.33; Et 1.18). E interessante como, do ponto de vista psicológico, em quase todas as situações acima, as pessoas envolvidas são lideres que sem dúvida possuem muita confiança e são seguros de si. E comum uma pessoa que espera algum tipo de ameaça ao seu bem-estar sentir apreensão, temor ou aflição; esses homens, porém, reagem com ira (p. ex., Ezequias em Is 37.1). Até certo ponto, o AT apresenta a ira como um luxo — está presente quando é permitida. Tomás de Aquino (Summa, 1a2ae.46-48) observa que uma reação de ira (entre outras coisas) sempre nasce de algo que é visto como injustiça. Esses textos não parecem comprovar essa idéia, a menos que se suponha a presença de um enorme delírio de falsa igualdade em diversos líderes investidos de poder. De acordo com essa argumentação, aqueles que possuem autoridade se apegariam à crença equivocada de que ninguém tem o direito de ameaçar-lhes o poder, pelo simples fato de que o poder lhes pertence. Tal irracionalidade pode ser encontrada muitas vezes juntamente com a ira, mas não é inerente a ela. Podem-se fazer algumas outras observações sobre a ira causada pela frustração. A pie dade, atividade religiosa ou profissão de uma religião serve de garantia contra a ira. O AT apre senta figuras variadas como Moisés e Davi de um lado e Caim e Saul de outro. Também são pessoas das mais diversas ocupações: uma autoridade poderosa, uma dona de casa (1 Samuel 1) ou um funcionário subalterno (Ester 2). Todos eles são retratados como susceptíveis à ira. Além disso, indivíduos ou grupos podem reagir de várias maneiras. As mesmas motivações combinadas com diferentes reações, mesmo dentro da mesma pessoa, indicam que os homens têm a capacidade de fazer escolhas mesmo quando estão irados. b. Orgulho. A segunda causa principal da ira no AT é o orgulho. Há diversos temas em comum com referência à combinação de ira e orgulho, i. O orgulho humano manifestado di retamente contra Javé traz conseqüências desastrosas (cf. Is 37.28, 29; Ez 35.11; Os 7.16). ii. O sistema de valores do homem ou grupo que fica irado se mostra abaixo dos padrões. Vários 710
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exemplos de Daniel (Dn 8.4, 8; 11.20) e dos profetas mostram a fúria da batalha e o orgulho juntos (Is 7.4; Jr 25.38; Ez 19.12), resultando em crueldade excessiva e opressão por aqueles que são tomados de tal arrebatamento. É extremamente interessante observar que, pelo ponto de vista das orações causativas desses textos, aquilo que estimula o orgulho daqueles indivíduos é a irritação, a inveja, a cobiça por terras e o desejo de guerrear. Não apenas a intensidade do ímpeto em si, mas sua motivação e direção fazem com esse comportamento seja condenado devido à perversidade dele. iii. A ira humana e o orgulho que levam a atitudes como aquelas descritas nos textos são impotentes diante do furor divino. Uzias (2Cr 26), Asa (2Cr 16.10), Saul, Amazias (2Cr 25.19), Hamã (Ester) e, indire tamente, Acabe (1 Rs 21.4), não dominaram sua ira arrogante (Gn 4.7) e servem de exemplos negativos dos efeitos devastadores que a ira pode ter. Do lado positivo, tem-se os episódios de Davi (1 Samuel 25) e do estrangeiro Naamã (2 Reis 5), que lograram dominar a ira e o orgulho com a ajuda de outras pessoas. Esses dois homens foram aconselhados a demonstrar controle e ambos encontravam-se numa posição de autoridade acima daqueles que os aconselharam. A cura para os indivíduos irascíveis e arrogantes requer o reconhecimento dos limites do próprio poder e autoridade deles. E necessário que o indivíduo aceite a capacidade de avaliação dos outros como sendo mais precisa que a dele. c. Injustiça. A última e mais abrangente causa para a ira é a percepção da injustiça. Tod os textos mencionados tratam dessa motivação. Há dois critérios fundamentais para decidir-se se a injustiça está presente: i. um discernimento geral do que vem a ser certo e errado e que supostamente pode ser encontrado em todos os homens e ii. revelações da vontade de Javé. Com referência ao primeiro critério, o AT apresenta a ira ou irritação como uma reação natural e, portanto, uma resposta apropriada e justificada à injustiça (Gn 27.44,45; Nm 24.10; 2Rs 13.19; Ne 5.6; Pv 17.25). No entanto, a forma como essa ira é canalizada e o quanto o indivíduo foi “justo” ao reagir àqueles cuja injustiça lhe incitou a ira parece ser um elemento essencial para a avaliação dos textos bíblicos. A injustiça clara toma legítima a ira dos opri midos, mas os próprios indivíduos irados devem, antes de mais nada, submeter-se à justiça e permanecer dentro daquilo que é aprovado por Javé. O segundo critério justifica a ira quando esta se manifesta em resposta não apenas à injustiça, mas também à orientação divina (Êx 16.20; ISm 1.16). Os exércitos assírios são confrontados de forma semelhante pelo discurso profético que caracteriza a agressão arrogante deles contra Judá, como uma demonstração de fúria contra o próprio Javé, e, portanto, um ato digno de julgamento (2Rs 19.27-28). Ao que parece, atacar a fonte de toda a justiça (Javé) é, em si, um ato de injustiça. Nos textos acima, a vontade de Javé é coerente com o discernimento humano. Po rém, se os dois conceitos do que vem a ser uma ira justificada entram em conflito um com o outro, o conceito de Javé prevalece sobre o sentimento de injustiça dos homens, mesmo dos crentes (Jonas 4). Por fim, fica implícita na discussão bíblica da ira a intenção de desenvolver a co munhão não apenas com Deus, mas também com os outros. A possibilidade de comunhão baseia-se na consideração que os homens devem ter uns pelos outros. Daí, a condenação do narcisismo. Trata-se, talvez, de algo pressuposto e que não precisa ser mencionado em de talhes, restando salientar, porém, como é essa questão que com freqüência determina o que é ou não apropriado em tal avaliação da ira humana. A ira mostra-se mais justa e benéfica quando irrompe em favor do outro (quer este “outro” seja Deus ou uma pessoa). Os homens conseguem reagir mais adequadamente à própria ira se a injustiça percebida é contra outros e não contra eles próprios. 711
Ira
B. A ira divina Termos para ira que têm Javé como sujeito ocorrem 518x no AT. Isso nâo inclui os diversos textos em que a fúria de Javé fica claramente subentendida, em que outras palavras próximas ao conceito de ira (como zelo) são empregadas e nem as várias metáforas como fogo, guerra, etc. que, muitas vezes, são associadas à idéia de ira. A Bíblia fala abertamente da paixão de Javé, apresentando-o como um ser enérgico e impetuoso, fervorosamente interessado no mundo dos homens. Não apenas o AT mostra, sem nenhuma restrição, que Javé tem emoções como também as exalta (ver, por exemplo, 2Sm 22.8, 9, 16; SI 145.8). Na verdade, além de garantir um profundo interesse pelo mundo, a paixão de Javé também mostra que ele é um indivíduo. Isso, por sua vez, cria a possibilidade de comu nhão no cerne do universo. Assim, a paixão dele era considerada sempre associada à execução de sua vontade e, nisso, relacionada à interação dele com o mundo. O Deus do AT desejava ter comunhão e relacionar-se com as pessoas no mundo e o furor dele era considerado parte da concretização desse desejo. A ira divina refere-se, de fato, à emoção de Javé, mas não é apresentada simplesmente com um sentimento. Dentre as quase 300 perícopes que falam da ira divina, somente Êxodo 4.14 trata a ira exclusivamente como uma emoção. De modo geral, a ira de Javé é sinônimo da execução de seu terrível julgamento. Esse julgamento não é apresentado como um conjunto de reações indignadas de uma divindade poderosa, mas sim como julgamento procedente de um contexto justo e legítimo. I. As causas da ira divina. O estudo das causas da ira de Javé leva a dois temas: justiç racionalidade, a. Justiça: a ira divina e a aliança. Das 281 perícopes estudadas que contêm refe rências à ira de Javé, 157 delas dizem respeito à aliança. A ira de Javé era vista com freqüência como uma resposta legítima à transgressão da aliança por Israel (-> berit, # 1382). b. A natureza das orações causativas. Quase todas as perícopes contendo ira divin possuem algum tipo de justificativa associada à expressão de ira, e essas causas podem ser dividas em duas categorias básicas. A primeira categoria, que compreende aproximadamente 51 por cento dessas perícopes, envolve a perversidade dos homens, no comportamento de uns para com os outros, ou pelo menos menciona a quebra dos estatutos e ordenanças de Javé que governam os relacionamentos humanos. Na segunda categoria, quase 75 por cento das vezes, a causa apresentada é a rebelião direta contra a pessoa de Javé na forma de orgulho, sincretismo e idolatria ostensiva. Além disso, em 33 por cento das ocasiões, pode-se encontrar tanto a opressão de outros homens como a deslealdade ou desrespeito por Javé nas mesmas orações causativas (ver Baloian, 290-304). Várias idéias podem ser tiradas dessas estatísticas. Em primeiro lugar, apesar de ser possível as duas categorias básicas aparecerem juntas, Javé é capaz de irar-se exclusivamente pela crueldade humana (Êx 15.1-18; Mq 6.10-16). O fato de Javé ser capaz de irar-se com o desrespeito dos homens ao senso natural de justiça dele demonstra que ele se importa com a forma como as pessoas tratam umas às outras. Ele se preocupa profundamente com a vida dos homens e se a justiça está sendo praticada no meio deles (ver Heschel, 2.6). Esses textos tes temunham uma relação intrínseca da ética com a teologia. Tendo cm vista que muitas vezes o que causa o furor de Javé é a rebelião, fica evidente que Deus leva sua própria pessoa a sério e que é perigoso os homens não fazerem o mesmo (ver p. ex., Êx 32.7-14; Nm 22.21 -30; Is 63.1 -6). O fato de essas duas motivações fundamentais serem mencionadas com tanta freqüênc mostra que é difícil separar a preocupação de Javé consigo mesmo da sua preocupação com a humanidade (ou seja, 2Rs 21.1 -9; Is 42.18-25; Jr 2.33-37). Esse é o traço comum de uma porção 712
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considerável do conteúdo do AT, que consiste numa combinação daquilo que seria chamado hoje de material secular e religioso (ou seja, o conjunto de leis da aliança: Êxodo 20.22—23.32). Esses dois aspectos estão unidos pela realidade de que a ira é procedente do desrespeito à von tade de Deus. É desejo dele que os homens tratem uns aos outros sem crueldade e que também tenham uma atitude de reverência e lealdade para com Deus. Além disso, as perícopes sobre a ira de Javé contra as nações estrangeiras, nas quais a motivação que mais se destaca é a crueldade humana, demonstram que os não-israelitas são jul gados com base naquilo que sabem e, pelo que podem, portanto, ser com justiça imputados. c. A legitimidade da ira divina. A preocupação desses textos com a legitimidade pode ser considerada de diversas maneiras. Os textos de sabedoria do AT têm grande cuidado em certificar-se de que os indivíduos que pedem justiça a Deus estejam, eles próprios, vivendo em retidão (p. ex., SI 7.9, 10, 12). No livro de Jó, a justiça furiosa de Javé no mundo é exaltada como sendo uma resposta justa e racional aos atos perversos dos homens (ver Jó 4.9; 21.17,30; 35.15; etc). A experiência de Jó é uma exceção à regra e é esse fato que causa tanta angústia e lamento. Jó acreditava que o julgamento de Deus era, verdadeiramente, racional e justo. Má muito tempo, os críticos à forma têm observado nos textos profético que os mo tivos para o julgamento são sempre acompanhados de uma ameaça profética (especialmente no estádio do registro escrito da história da tradição; cf. Gunkel). Além disso, apesar dc haver uma heterogeneidade nos gêneros literários em que a ira de Javé é mencionada, existe uma constância no lugar ocupado pela ira divina. Sua ira sempre aparece no final de um processo legal explícito que faz desse furor a execução do julgamento. É comum haver uma convoca ção, a apresentação de provas (usando vários meios: acusação, lamento, contestação, etc.), um veredicto (ou pronunciamento do julgamento) e, por fim, a ira que sempre implica a ação de Javé (para exemplos, ver Is 42.18-25; Jr 6.9-15; Os 11.1-11; Zc 7.8-14). (A literatura narrativa segue esse mesmo procedimento. A ira de Javé é sempre justificada com orações causativas. Há controvérsias, porém, quanto à possibilidade de justificar todas as perícopes. Comparar A. T. Hanson, 1957 com B. Baloian, 1988, sendo que o primeiro vê mais a forma de desenvolvi mento tradicional e histórico da compreensão da racionalidade da ira de Javé.) d. Além da justificação da ira de Javé, as orações causativas têm outro objetivo funda mental: comprovam a racionalidade. Sua função é ajudar o leitor a entender o motivo de Javé estar encolerizado. É necessário saber por que ele está furioso para que se saiba como evitar as conseqüências. Esse caráter previsível era essencial para o incentivo da ordem moral e para uma filosofia prática de vida que evitava o desespero e a desilusão. Esse aspecto da ira divina libertava os homens da ansiedade e, ao mesmo tempo, motivava-os a ter um comportamento adequado. A ordem era considerada um alicerce da existência, em parte pelo fato de o julga mento de Javé não ser imprevisível e nem resultante de um capricho divino. Se havia algo de imprevisível em Javé, era a extensão de sua graça e nâo o seu julgamento. 2. Resultados da ira divina. A füria de Javé possui um aspecto distinto da fúria hum na. Para Deus, a ira é sempre mais do que uma emoção: ela é eficaz. Nos casos em que a ira de Javé é proclamada, somente quatro textos (2 por cento) deixam de mencionar alguma ação específica dentro do contexto imediato. (Com exceção das declarações antecipatórias [p. ex., Gn 18.16-30, 32; Jz 6.39. 2Rs 22.13; Ed 8.22; 9.14], etc., e das declarações repetitivas sobre como Javé tarda em irar-se [p. ex., êx. 34.6; Nm 14.18; SI 86.15; 103.8].) A ira de Javé tem conseqüências na vida dos homens. Deus não é retratado como uma divindade frustrada que acaba perdendo a paciência, mas sim como alguém que demora em irar-se. Porém, quando isso acontece, sua ira é sentida de forma concreta no mundo. A maioria dos textos cita manifesta ções específicas de seu furor: derrota militar, morte, pragas ou doenças, fome, destruição das 713
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lavouras e cidades da terra, cativeiro, terremotos, profanação de rituais religiosos e perda de líderes ou cargos de poder. Ao ser considerada em conjunto com a afirmação acima de que a ira de Javé funciona como execução da justiça, essa ira não se relaciona ao aspecto da sentença, mas sim ao cumpri mento do veredicto. Nessa observação do raciocínio hebraico, fica implícita a relação entre as facetas espirituais (mentais) e físicas da realidade. Javé irava-se com a infidelidade espiritual ou relacionai da comunidade de crentes e o pecado de Israel tinha como efeito os danos causados ao bem-estar físico do povo e também o rompimento dc sua relação espiritual com Javé. 3. Os desígnios da ira de Javé. Ao estudar o propósito da ira de Javé no mundo, observam se duas categorias básicas: justiça e amor. a. Justiça, i. Julgamento. Ao associar o julgamento de Javé com uma acepção antropopática de ira, Israel corria o risco de associar a justiça de Javé com o que, na experiência humana, muitas vezes, é o oposto. Sem dúvida a idéia de uma divindade colérica poderia ter reforçado a eficácia emocional das advertências proféticas, mas seria exagero dizer-se que a atribuição de furor a Javé visava somente a um efeito retórico. E mais provável que o principal objetivo fosse levar os próprios profetas a ver Deus de forma extremamente pessoal. Assim a “ira” de Javé contra Israel correspondia à “compaixão” ou ao “amor” por Israel e, de fato, pelo mundo. Se a justiça encontrava-se no cerne do universo e era garantida por um Deus pessoal, então os alicerces da realidade continham penalidades e recompensas reais. Com isso, atribuía-se relevância não apenas às ações dos homens no rela cionamento de uns com os outros, mas também à atitude de adoração. ii. Demonstração de poder. Diversos textos falam da ira divina em termos de demons trações aterradoras de energia e força (Is 30.30; Jr 10.10; Ha. 3.12). A ira funciona como um meio de informar ou mostrar que Javé agia de modo a sancionar a retidão. Essa demonstração de poder voltava-se, em alguns casos, contra os que estavam oprimindo outros ou insultando Javé, mas também podia servir de estímulo para o crente. Podia ser um auxílio à fé, uma vez que as demonstrações do poder de Javé em sua ira costumavam ser precedidas de um clamor pelo livramento do povo (p. ex., SI 18.7-15 [8-16]). Textos assim atuam como convites à fé e meios de demonstrá-la na capacidade que Javé tem de livrar os que o servem (ver também SI 21.9 [10]; 59.12-13 [13-14]; 76.7 [8]; etc.). iii. A eleição e o amor de Javé. Os textos também retratam a ira divina como sendo es pecialmente ativa em defesa de determinados indivíduos escolhidos (p. ex., Moisés, Nm 12.9 ou 16), bem como de certos grupos (Nm 23.8). Com referência a Israel, a ira de Deus era ativa tanto contra a nação por esta haver ofendido a aliança como também em defesa dela contra aqueles que a ofendiam. O primeiro conjunto de textos (p. ex., Is 28.21; 51.17,20,22; Jr 30.2324; Ez 16.42-43) ressalta as obrigações do povo eleito. O segundo grupo trata do julgamento como fonte de bênção, um ato em favor dos eleitos (ou seja, Ez 25.14; Ha. 3.12; Na 1.2, 6; etc.). Nos versículos adjacentes que falam do julgamento colérico de Javé, pode-se encontrar uma abundância de justificativas para esse julgamento como legítima retribuição pela perver sidade; mas também há uma nuança adicional que mostra a atuação veemente de Javé para recompensar o povo em função do afeto privilegiado que vota a Israel. b. Amor. i. Advertências sobre a ira iminente. A ira divina é retratada muitas vezes com uma provação prevista, porém ainda não ocorrida (Jr 2.35; Jn 3.9). Os textos indicam que o futuro pode ser mudado e que a alteração do curso de ação anunciado depende da resposta do homem, uma vez que as transgressões humanas são responsáveis por provocar a ira. Vê-se uma revelação clara da pessoa de Javé. Ele não apenas impõe uma sanção contra a injustiça como também deseja ter comunhão com os homens e, uma vez que o pecado impede esse relacio 714
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namento, Javé chama ao arrependimento para que sua ira possa ser evitada. Deus informa aos homens como viver em comunhão íntima com ele. ii. Provação da ira divina. Há diversos textos que falam da reação à ira divina. Uma vez que o julgamento colérico de Deus não era concebido como uma resposta automática para 0 mal e nem apresentado de maneira irrevogável, podia não apenas ser evitado, como também detido ou revertido. E impressionante como o AT retrata a reversão da ira de Javé como uma cessação, não resultante do arrependimento, mas sim da misericórdia de Javé. A ira deve ser levada até certo ponto, pois é necessário que a justiça seja feita (Ne 13.18; Jr 30.24; 32.27; Ez 5.13-17, etc.), mas, inteiramente pela graça de Javé, surge um remanescente (“restante de Israel e os da casa de Jacó”; ou seja, alguns serão poupados; Is 10.20-25). Essa reversão da ira mos tra a coexistência da compaixão e na natureza justa de Deus. Esses textos não davam a Israel a esperança de que o povo pudesse pecar e depois se arrepender para escapar ao castigo, mas mostravam que a justiça divina seria abrandada por compaixão. Em meio à experiência da ira de Deus retratada nesses textos, há vários exemplos de lamentos ou súplicas por clemência. O povo de Deus estava certo da compaixão de Javé e a prova implícita dessa certeza era a prática de relatar a Deus a provação pela qual se estava pas sando (Jó 10.17; SI 6, 38, 88, 102, etc.). Também há evidências claras da compaixão de Deus em algumas das proclamações, p. ex., Salmo 103.9: “nem conservas para sempre a sua ira”. iii. Entendimento da ira depois do julgamento. Várias manifestações do amor de Javé em sua ira apresentam-se depois que o furor foi experimentado. Há textos sobre a ira que fa lam de esperança para o futuro, uma vez que o furor de Javé estava passando (SI 27; Is 12.1; 54.8; Zc 8.14, 15). Israel compreendeu que seu julgamento nas mãos de Javé era justo, mas também apren deu que não precisava permanecer para sempre no estado de julgamento. Essa compreensão levou, entre outras coisas, à intercessão, não com base na pureza do povo, mas sim na com paixão de Deus (Is 64.9; Jr 18.20,23; Lm 1.12; 3.1; Dn 9.16-19; etc.). Na concepção daqueles que oravam desse modo, Javé podia ser profundamente provocado pelas transgressões do povo, mas também podia ser levado à compaixão diante do sofrimento deles. Outro tema que aparece nesses textos de experiência da ira é o fato de que esta ensi nou a Israel a justiça por meio do julgamento. O propósito de Deus sempre foi o de restaurar e abençoar. Uma vez que a restauração da comunhão com Deus só pode ser realizada no contexto da justiça, a ira significa o cumprimento desse objetivo de abençoar. A última expressão do amor de Javé em sua ira é observada na maneira como as futuras gerações podem evitar os erros do passado. Apesar da ênfase intensa sobre o fator de julgamen to inerente a essa ira e da advertência clara de que mesmo a condição de eleitos não confere imunidade aos requisitos da justiça, a ira é acompanhada de um forte elemento de amor. Deus expressa amor em cada uma das experiências de julgamento. A maior ameaça a Israel também é uma expressão secreta desse amor. Fúria, raiva, ira: -> ’np (estar irado, # 647); -> z'm (amaldiçoar, estar irado, # 2406); z'p 1 (irritar-se, perturbar-se, # 2406); -> hémâ (raiva, # 2779); -> hrh I (estar furioso, ficar irado, # 3013); k's (estar irritado, irado, # 4087); 'br II (mostrar ira, # 6297); q$p I (irar-se, # 7911); -> rgz (sacudir, agitar, # 8074); -> Ira: Teologia B ib l k m ;ra f ia
IDB 4:903-8; N1DNTT 1:105-13; TDNT 5:382-418; Sister M. Aloysia, “The God of Wrath”, CBQ 8, 1946, 407-15; B. Baloian. The Aspect o f Anger in the Old Testament, 1988; H. 715
Isaías: Teologia de
Conzelmann. Et al., “Zom Gottes”, Die Religion in Geschichte und Gegenwart, 1962,6:193033; W. Eichrodt, TOT, 1967, 1:258-69; H. M. Haney, The Wrath o f God in the Former Prophets, 1960; A. T. Hanson, The Wrath o f the Lamb, 1959; A. Heschel, The Prophets, vol. 2, chs. 1-6; T. B. Kilpatrick, “Anger”, Encyclopedia o f Religion and Ethics, 1908, 1:475-82; L. Koehler, Old Testament Theology, 1957, 22-25; H. von Ringgren, “Einige Schilderungen des gõttlichen Zoms”, Tradition undSituation, 1963, 107-13; W. H. Simpson, Divine Wrath in Eighth Century Prophets, 1968. Bruce Baloian Ira Irmã Irmão
# 3013 (hrh I, estar furioso, irar-se) # 295 ( 'ãhôt, irmã, amada) # 278 ( ah II, irmão, parente, membro da família)
Irrigação -> # 9197 (Sqh, beber, umedecer)
A teologia do livro de Isaías é mais abrangente do que aquela encontrada na maioria dos escritos proféticos hebraicos. Esse caráter mais pleno é visto na investigação completa e detalhada que o livro apresenta da relação entre julgamento e salvação. Nenhum outro livro do AT apresenta uma visão tão abrangente. Além dos fatos literários mais específicos, esse é um dos motivos pelos quais diversos estudiosos acreditam que o livro, em sua presente forma, seja resultado de um longo período de formulações e reformulações. Seja como for, nenhum outro livro explora com tanta profundidade as formas pelas quais a tragédia da desintegração de dois reinos e o exílio subseqüente pode ser compreendida — como parte dos propósitos mais amplos de Deus e não como tentativa de destruição desses mesmos propósitos. De um ponto de vista simplista. Deus deve manter sua aliança com o povo ao livrá-lo dos inimigos, ou então deve negar essa aliança e entregar o povo nas mãos desses inimigos. Porém, Isaías mostra que não se trata de uma questão de julgamento ou salvação, mas sim de julgamento como um instrumento de salvação ou a salvação possibilitada pelo julgamento. Ao explorar esse tema, Isaías mostra o caráter de Deus com uma profundidade e amplidão maiores do que quase qualquer outro livro bíblico. O livro de Isaías, em sua forma atual, abrange o período todo daquela que foi a maior crise porque Israel passou: o exílio. De acordo com o texto do próprio livro, foi escrito durante a vida do profeta Isaías, de c. 740 a. C. até c. 695 a. C. Nesse tempo, a Assíria capturou o rei no do Norte, Israel, e chegou muito perto de capturar Judá também. Nesse contexto, Isaías viu claramente que o privilégio de Israel de estar em aliança com Deus não era garantia de ver-se livre dos inimigos, qualquer que fosse a situação moral de Israel. No entanto, de acordo com a representação do livro, Isaías também foi capacitado para que pudesse ver além do seu próprio tempo, até a captura de Judá pela sucessora da Assíria, a Babilônia, em 586 a. C. Assim, foi capaz de tratar de antemão as questões que surgiriam com esse acontecimento. Pôde mostrar que o exílio não indicaria nem a derrota de Deus pelos deuses babilônios, nem a insolubilidade do problema do pecado de Israel. (-^ Exílio: História) Porém, a crise do exílio não terminou com o retomo dos judeus a Judá em 536 a. C. O simples fato de o povo estar de volta à terra prometida não era garantia de que compreendera o que significava estar em aliança com Deus. Na verdade, o povo podia muito bem crer que seu Isaías: Teologia de
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direito inato era mais importante do que a obediência. Assim, o livro tambcm se refere a esse período. (-> Restauração Pós-Exílio: História) A. Estrutura Hoje em dia, existe certo consenso de que o livro é composto de três segmentos princi pais: caps. 1— 39,40— 55 e 56— 66. Uma vez que esses segmentos correspondem aproxima damente aos três contextos históricos mencionados acima, muitos estudiosos afirmaram que pelo menos três escritores diferentes participaram da redação do livro. A tendência dessa idéia era trabalhar contra a unidade do livro, uma vez que os estudiosos procuraram identificar as contribuições de cada escritor. Mais recentemente, essa abordagem ao livro caiu em desuso, uma vez que a unidade temática da obra tomou-se mais clara. Isso não indica um abandono da teoria da autoria múltipla por parte dos críticos, mas mostra uma consideração renovada pelo livro como unidade literária. Os cinco primeiros caps. servem de introdução, contrastando a situação nacional trá gica do presente com o futuro glorioso que se encontra adiante. O cap. 6 serve de transição, mostrando de que maneira a experiência do profeta pode ser um modelo para o povo como um todo. Nos caps. 7—39, a ameaça assíria é usada como base para uma exploração da insensatez de se confiar em nações humanas em vez de em Deus. A divisão começa e termina com seg mentos nos quais um rei de Judá é confrontado com um incidente histórico que exige que esse rei confie em Deus (caps. 7— 12; 36— 39). No primeiro episódio, Acaz permanece cético; mas no segundo, Ezequias dobra-se diante da verdade. Entre estes, encontram-se segmentos sobre o julgamento das nações (caps. 13—23), o senhorio de Deus sobre as nações (caps. 24— 27) e a insensatez da recusa em se confiar em Deus (caps. 28— 35). Uma vez que a lição sobre o caráter leal de Deus já foi ensinada nos caps. 7— 39, os caps. 40— 55 tratam de como Deus está determinado a redimir. Na concepção de Isaías, o exí lio levantaria questionamentos sobre tudo o que Isaías havia dito nos caps. anteriores. Será que Deus continuaria digno de confiança se um dia não livrasse seu povo das mãos do conquistador? Os caps. 40— 48 mostram que o Senhor pode livrar dos deuses babilônios, e os caps. 49— 55 mostram que ele pode livrar da alienação resultante do pecado. Ao que parece, a última parte do livro (caps. 56— 66) trata da situação em Judá depois do exílio. Quando os judeus voltassem, seriam tentados a depender de seu direito inato e dos ri tuais para se relacionarem com Deus. Essa divisão, que é estruturada num princípio quiasmático tendo como centro, nos caps. 60—62, o reino messiânico, ressalta que estrangeiros obedientes que contam apenas com a graça de Deus são mais verdadeiramente servos de Deus do que os judeus como raça pura que contam apenas com o direito inato e os rituais deles. Como foi mencionado acima, a questão teológica crítica do livro de Isaías é o aparen te conflito entre os papéis de Deus como Juiz e Libertador, entre sua justiça e sua fidelidade. A incapacidade evidente de Israel de cumprir as obrigações da aliança trouxe essa questão à baila com força total. Aqueles que guardassem a aliança desfrutariam as bênçãos divinas, e aqueles que a rompessem trariam sobre si as maldições que eles próprios haviam invocado (ver Dt 28.1-68). Uma vez que Israel havia rompido a aliança, isso não significava que não era mais possível ter algum relacionamento com Deus? Javé deveria destruir seu povo por causa do pecado, ou então, se desejava manter-se em aliança com ele, ignorar o pecado em função do compromisso estabelecido. Todos os profetas sabiam que essa tensão teria que ser resolvida de alguma forma. Assim, até mesmo alguém como Amós, cujas visões eram cheias de imagens do julgamento vindouro, é capaz de vislumbrar além deles a tenda de Davi, firme e protegida. Cabe a Isaías 717
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elaborar as relações exatas desse processo. É ele quem nos mostra que o fogo destruidor será o instrumento da salvação e, a menos que venham essas chamas, não haverá meio de as promessas de Deus se cumprirem (cf. Is 1.21-28; 4.2-6). Na verdade, é por meio do fogo que uma Israel purificada poderá levar a palavra da soberania de Deus às nações, como Deus havia prometi do a Abraão há tanto tempo (Gn 12.2-3; 17.4-8, etc.). Sem dúvida, essa concepção nasceu de Isaías por experiência própria. Como poderia uma nação de lábios impuros ser o instrumento usado para chamar as nações ao monte da Casa do Senhor (Is 2.1-5)? Da mesma forma que um homem de lábios impuros pode tomar-se a voz da santidade de Deus para um povo corrupto: pelo fogo (6.5-7; 66.17-19). Esse tema é elaborado na estrutura geral do livro bem como dentro das divisões. Em termos mais gerais, os caps. 6— 39 descrevem em detalhes a destruição que está prestes a so brevir a uma nação que não se coloca nas mãos de Deus. Apesar do caráter absolutamente confiável de Deus ensinado nesses caps. e, por fim, demonstrado de maneira indiscutível na destruição do exército de Senaqueribe, Isaías sabe que Judá seguirá os passos de Israel e, as sim como Ezequias com seus convidados babilônios, confiará em sua própria força e em suas realizações. O resultado inevitável será a destruição (Is 39.5-7). Dessa destruição, Deus fará surgir um povo purificado, por meio do qual terá a opor tunidade de revelar, como nunca antes, que somente ele é Deus. Ao livrar seu povo por meio de um imperador pagão, mostrará ao mundo todo que os maiores deuses pagãos, os deuses babilônios, são impotentes diante dele. Esse é o tema dos caps. 40— 55 e, especialmente, dos caps. 40— 48. Que forma terá o braço poderoso e libertador de Deus? Já em Isaías 7— 12, havia sido apresentada uma imagem impressionante desse libertador: uma criança. Ela seria meiga e pacífica, daria fim às guerras, não por meio de um poder arrogante, mas de uma capacidade ilimitada de absorver o mal. Essa imagem torna-se um retrato completo nos caps. 49— 55. Neles, fica claro que Ciro, um servo de Deus (ainda que alheio a esse fato), não será aquele que resolverá o problema mais profundo de Israel — a separação de Deus. Isso será obra do Servo que personificará tudo o que Israel deixou de fazer, Aquele que tomará sobre si todo o mal do mundo e o retribuirá com bondade (52.13—53.12). Assim, é no contexto do desampa ro do exílio que a verdadeira Esperança do mundo pode ser revelada. E justamente por meio do julgamento de Israel que se manifesta a soberania mundial de Deus e sua fidelidade que destrói todo pecado. A terceira seção de Isaías, caps. 56— 66 integra de forma significativa as idéias das duas primeiras seções. Considerados isoladamente, os caps. 40— 55 podem indicar que a experiên cia de salvação anula a necessidade de uma vida de piedade. Afinal, o livramento da Babilônia não viria porque o povo de Judá havia se arrependido e prometido mudar de comportamento. Seria simplesmente uma expressão da graça e soberania de Deus. Porém, os caps. 56— 66 aca bam imediatamente com essa falácia, pois o chamado de Deus para uma vida de piedade não foi alterado pela fidelidade dele às suas promessas. É esperado daqueles que serão libertos do cativeiro que levem uma vida consagrada ao Senhor. Mas corno isso seria possível? Antes do exílio, haviam fracassado completamente nesse modo de proceder; o que seria diferente depois? A resposta é o poder que Deus concede em sua graça. Assim como, quando não encontrou quem o ajudasse, ele se levantou sozinho para livrar seu povo do cativeiro, também se levantará so zinho para capacitá-lo a fim de que o povo cumpra seus justos preceitos (Is 59.14-21). Em sua justiça, Deus exige uma vida justa e reta e em sua fidelidade; ele dá o poder necessário para que isso se concretize. Aqueles que se fiam na própria retidão não passam de pagãos, mas isso 718
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não desobriga o crente de uma vida justa, pois deve andar nos caminhos da retidão por meio da dependência contínua da graça capacitadora de Deus.
B. Temas 1. O caráter incomparável de Deus. O tema do caráter incomparável de Deus é fun mental para a teologia do livro de Isaías. Mais do que em qualquer outro livro bíblico, Isaías deixa claro que o Senhor não é apenas o maior de todos os deuses: ele é o único Deus. Não há outro que possa sequer ter alguma pretensão à divindade. Sem dúvida, pode-se determinar que essa idéia tem suas origens na primeira visão do profeta. Fica claro que a revelação Daquele que não é apenas santo, mas três vezes santo, cuja glória é o que enche toda a terra, ficou gra vada na mente de Isaías para o resto de seus dias. Em 25 ocasiões, Isaías chama Deus de “o Santo de Israel” (e em uma ocasião, “o Santo de Jacó”), uma designação que só ocorre cinco vezes no resto da Bíblia. a. Criador e Senhor da história. Entre outras coisas, é evidente que o termo “san transmite o caráter absolutamente separado de Deus em relação ao sistema cósmico. Deus não é parte desse sistema e não é limitado por ele. Essa verdade é expressada especialmente na visão do livro acerca de Deus como Criador e Senhor da história. A imensa crise histórica do tempo de Isaías sem dúvida levantou sérias questões sobre Deus. Como era possível o Deus de Israel ser o maior Deus de todos se Israel não era a maior de todas as nações? Se a Assíria (e depois a Babilônia seguida da Pérsia) eram capazes de passar por cima de Israel a seu belprazer, isso não indicava que o Senhor na verdade era apenas uma divindade secundária? Por certo esse é o raciocínio de Rabsaqué ao vangloriar-se do que os assírios fizeram em outras terras e o que farão com Judá (Is 36.18-20). Mas Isaías insiste que Deus não faz parte desse sistema cósmico. Sua grandeza não deve ser equiparada com a grandeza de Israel ou Judá. Os grandes impérios não avançam apesar dele, mas sim por causa dele. Ele é o Senhor de todas as nações, não apenas de Israel. Todas as nações, inclusive Israel, estão sujeitas ao julgamento de Deus. Assim a derrota de Israel nas mãos da Assíria não representa uma derrota de Deus nem uma vitória dos deuses assírios. Trata-se de um ato de justiça divina sobre Israel, pelo qual a Assíria não pode receber crédito algum. Não há como enfatizar o suficiente a importância des sas idéias para a sobrevivência da fé hebraica em meio a tudo aquilo que lhe ocorreu ao longo dos três séculos entre 750 e 450 a. C. As evidências de que Deus não faz parte do sistema cósmico são apoiadas em grande medida na predição profética. Isso fica especialmente claro nos caps. 40— 48, em que se imagina um pleito entre Deus e os deuses. Deus chama os deuses para, por meio de testemunhas, provar que são verdadeiramente divindades. A prova pedida é que demonstrem terem, em qualquer dado momento, predito de modo específico um acontecimento que veio a ocorrer posterior mente. Ao falar por Deus, Isaías declara com certeza impressionante que nenhum dos deuses sequer será capaz de apresentar essa prova. Por outro lado, Deus afirma que ofereceu profecias específicas desde o princípio e que os israelitas são testemunhas de que estas se cumpriram. A profecia sobre Ciro é, obviamente, uma parte fundamental de toda a argumentação, e os críticos que negam que Isaías teria feito tal predição estão, consciente ou inconscientemente, negando a argumentação central do livro favorável ao caráter único de Deus. A argumentação de Isaías tem por finalidade mostrar que os deuses fazem parte do sistema cósmico, especialmente pela associação deles com os ídolos, feitos de materiais da natureza, por obra da sabedoria e aptidão humanas (esp. Is 44.6-20). Assim, é evidente que os deuses não podem prever o futuro. Uma vez que são parte do sistema, não fazem idéia do que esse sistema fará amanhã, e muito menos cem anos no futuro. Então como é possível o Deus 719
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de Israel agir de outro modo? Porque ele não faz parte do sistema, mas é o seu Criador. Isaías afirma repetidamente que foi Deus e somente Deus quem fundou a terra e estendeu os céus (40.21-26, etc). Somente ele existe por si próprio e todas as coisas dependem dele para conti nuar a existir (44.6-8). Ele não é condicionado pelo sistema; antes, é ele quem o condiciona. Nâo é o sistema que determina o caráter de Deus, mas é o caráter de Deus que determina o sistema. E claro que isso significa que ele pode fazer coisas nunca antes ocorridas (43.14-21). Ao contrário dos deuses, ele não está preso a uma repetição constante de coisas que sempre ocorreram. Ele é livre, contido apenas por sua justiça e fidelidade. b. Redentor. A santidade de Deus não se revela apenas em seu poder como Criador Senhor da história, mas também fica aparente em sua graça como Redentor. Esse paralelismo fica especialmente claro na maneira como o termo Santo de Israel é empregado. De modo ge ral, essa expressão é usada nos caps. 1—39 para referir-se à insensatez de se tentar viver como se Deus não tivesse poder absoluto. Assim, por exemplo, muitos israelitas “rejeitaram a lei do Senhor dos Exércitos e desprezaram a palavra do Santo de Israel” (Is 5.24b). Porém, nos caps. 40— 55, a expressão é associada com mais freqüência ao poder de Deus de libertar: “Nosso Redentor, o Senhor dos Exércitos é seu nome, o Santo de Israel” (Is 47.4). Nos dois casos, temse em vista o poder transcendente de Deus, mas no primeiro caso a expressão é mencionada para revelar a loucura da desobediência, enquanto no segundo, tem propósito de estimular a fé. Quanta insensatez desobedecer Aquele que fez a terra e está sobre ela, e quanta sabedoria crer Naquele que pode tomar os destroços da terra e reconstruí-la. Nisso consiste a santidade: não apenas na luz austera e branca da perfeição, mas no amor infinitamente criativo que pode tomar aquilo que está corrompido e sujo e criá-lo outra vez. 2. O Messias. Se Deus é o Criador, o Senhor da história e o Redentor, então a histór deve vindicar seu governo redentor. Apesar de, num futuro próximo, Israel não precisar derrotar as potências mundiais a fim de provar a grandeza de Deus, virá o dia em que a história aponta rá para seu Senhor. Além disso, as promessas que Deus fez a Davi e à sua casa não podem ser ignoradas levianamente (p. ex., Is 55.3-5). Assim, toma-se necessário outro elemento impor tante da teologia de Isaías: o reino messiânico. Em última análise, as evidências mostrarão, no tempo e no espaço, onde Deus escolheu revelar-se e que todas as coisas se sujeitam à soberania de Deus. Por fim, quando um governo de paz e justiça prevalecer na terra e quando a casa de Davi esclarecer qual era, de fato, o objetivo da história, tudo aquilo que a Bíblia afirmou sobre a realidade e sobre Deus será demonstrado. Os conceitos dc Messias no livro de Isaías giram em tomo de dois pólos: O Rei Daví dico e o Servo Sofredor. Há quem sugira, por vezes, que se trate de designações incompatíveis, mas um estudo mais cuidadoso mostra que se encontram, na verdade, entretecidas. O enfoque dos caps. 1—39 é sobre o aspecto real do Messias. Sem dúvida isso se deve ao fracasso da casa meramente humana de Davi. Tendo como ponto mais baixo o rei Acaz, a casa de Davi é inquestionavelmente apóstata (Is 7.13), mas mesmo em seu ponto mais alto — o rei Ezequias — ainda é capaz de mostrar falta de visão e de fé (39.1-4). Em contraste com essa descrição, é apresentado o rebento que sairá do tronco de Jessé, que reinará com justiça e eqüidade, não apenas sobre Israel, mas sobre todo o mundo (11.1 -5). O mais extraordinário é que esse rei será semelhante a uma criança. Não reinará com força despótica, mas pelo poder da humildade. Seu reino será um reino de inocência ( 11.9). Em Isaías 40—66, o Messias é apresentado ao leitor como o Servo do Senhor por in termédio do qual as nações conhecerão a Deus corretamente. Mais uma vez, parece haver uma relação entre essa metáfora e o assunto tratado nessa seção. O assunto é o fracasso do povo em cumprir a missão para a qual foram chamados: ser luz para as nações. Esse destino foi procla 720
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mado à nação logo de início, no cap. 2, mas como poderá esse povo cego, rebelde e prisioneiro de seus pecados levar a cabo essa incumbência? A resposta para sua serventia fracassada é o Servo. Será a Luz que eles não foram. Ao brilhar por meio deles, o mundo ao redor finalmente verá a verdadeira Luz. O fato de ser esse Servo quem trará justiça às nações (42.1; 49.6), um papel do Rei messiânico na parte anterior do livro, deixa claro que há uma coesão essencial entre as duas figuras. Da mesma forma, a humildade do Servo nos caps. 40— 55 é, em tudo, congruente com a humildade e a inocência do Messias nos caps. 1— 39. A visão do domínio redentor de Deus chega ao auge em Isaías 60— 62, que tem como centro o cap. 61, a declaração do Messias. Aqui, a nação que buscava significância em sua própria glória (Is 2.6-22) recebe como dádiva a glória de Deus. A nação que havia estado cega e cativa é libertada pela palavra do Messias. Como resultado, todas as nações dirigem-se à Jerusalém, em submissão e com o propósito de ver a glória de Deus que dali emana. Deus, o Criador e Senhor da história, o Redentor, resplandecerá para todo o mundo por intermédio de seu povo. 3. Confiança. O retrato rico e variado de Deus conduz diretamente à característica pr cipal do relacionamento divino-humano de acordo com a concepção de Isaías: a sabedoria da confiança em Deus e a absoluta necessidade dessa sabedoria. Em vários aspectos, o livro como um todo é uma súplica ao povo de Deus para confiar em seu Senhor. Por certo essa súplica é muito mais explícita na primeira seção (Isaías 1—39) em que, antes de confiar em Deus, o povo mostra-se propenso a confiar em qualquer uma das nações, sejam elas amigas ou inimi gas, para livrá-lo da opressão. No entanto, também aparece na segunda e terceira seções (caps. 40— 55; 56— 66). Na segunda seção, o povo é chamado a crer tanto no desejo quanto no po der de Deus de livrá-lo e, na terceira seção, deve deixar de confiar em sua eleição e começar a crer que Deus pode, em sua retidão, dar ao povo o poder da retidão. O objetivo de toda essa argumentação fica particularmente claro no contexto do paganismo. Nessa visão da realidade, a confiança não tem quase participação alguma. Os deuses fazem parte do sistema cósmico e são, em essência, forças concebidas em termos humanos com o propósito tanto de compreender tais forças quanto de manipulá-las. De modo geral, são separados em dois grupos: construtivos e destrutivos. Em última análise, essas forças não podem ser desviadas de seus cursos regulares e repetitivos. São arbitrárias e despóticas, mas acredita-se que por meio da mágica imitativa podem provocar algum efeito que lhes seja conveniente. A visão bíblica (e de Isaías) é radicalmente distinta. Deus é profundamente pessoal; não é preso a coisa alguma a não ser à graça do seu caráter e, de modo algum, pode ser mani pulado pela mágica imitativa. Além disso, é absolutamente confiável e cumpre aquilo que se propõe a fazer. Assim, não se deve confiar em Deus apenas por ser a confiança o único modo de se relacionar com ele, mas porque Deus é digno dessa confiança. A palavra de Isaías sobre Deus é de que há um motivo duplo para se confiar em Deus. Em primeiro lugar, deve-se confiar em Deus porque qualquer outra coisa sobre a qual se de positar a confiança falhará. Na verdade, não apenas falhará, como se voltará contra a pessoa que confiou nela e a destruirá. Excelentes exemplos são a Assíria e Acaz. Isaías diz a Acaz que, uma vez que ele confiou na Assíria e não em Deus, quando Israel e a Síria o ameaçaram, um dia a Assíria virá sobre Judá como uma inundação (Is 8.6-8). No entanto, há mais um motivo pelo qual se deve confiar em Deus: Ele não abandonará seu povo quando seu povo for des truído por suas falsas esperanças. Nessa hora, ele se aproximará dele, oferecendo verdadeira esperança, socorro e livramento (10.24-27). Um Deus como esse não é digno de confiança? E sobre isso que fala 12.2: “Eis que Deus é minha salvação; confiarei e não temerei”. O Deus que não dá as costas quando é rejeitado, mas que continua a estender a mão em amor é um Deus no 721
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qual se pode confiar. Em última análise, é disso que tratam os caps. 36— 39. São muito mais do que um simples anexo histórico, como o consideram vários estudiosos. Antes, são o ponto culminante de toda a seção, dando prova absoluta da sabedoria de se confiar em Deus, ainda que todo o poder do mundo se volte contra o que confia. O tema da confiança aparece de uma forma ligeiramente distinta em Isaías 40—55. Aqui, o profeta volta-se para o dia em que os exilados de Judá terão perdido as esperanças. Não será uma questão de falsa esperança, mas sim de ausência total de esperança (Is 40.27). Deprimi dos e desesperados, estarão propensos a duvidar de todas as promessas, quaisquer que sejam elas. Assim, o profeta deve convencer os leitores da natureza imutável do amor de Deus e da natureza insuperável do seu poder. Deve levá-los a um ponto em que terão de acreditar que, mesmo parecendo impossível, Deus poderá livrá-los das garras da maior potência do mundo. Tudo isso é predito com grande antecedência a fim de que, quando tais coisas ocorrerem, nin guém possa dar crédito a nenhum deus persa (48.5). Na última parte, o profeta volta a falar das falsas esperanças. Trata-se de uma confiança equivocada na eleição, algo que poderia surgir facilmente depois da volta do exílio. Tendo em vista que o povo de Judá não seria livrado em decorrência de nenhuma coisa que tivesse feito, mas simplesmente em função do amor eletivo de Deus, seria fácil para esse povo supor que comportamentos e atitudes piedosos não eram, de fato, necessários. Portanto, Isaías declara que a retidão será o padrão exigido por Deus, mas que só pode ser alcançado pela dependência em Deus (ver esp. 59.9-21). 4. Pecado. Acima de tudo, em Isaías o pecado é descrito como rebelião. Aparece n primeiro v. depois do cabeçalho (1.2) e no último v. (66.24) e repetidamente ao longo de todo o livro. Essa rebelião se manifesta de várias maneiras, mas o parâmetro para o julgamento de todas essas manifestações é a aliança. Apesar de o profeta não se referir explicitamente à aliança com freqüência, ela encontra-se subentendida em toda parte. No Sinai, Israel havia jurado com sangue que seria leal somente a Deus e faria aquilo que ele havia indicado que devia ser carac terístico de seus seguidores. Fica claro então que Israel se rebelou contra o Senhor. Uma das manifestações dessa rebelião é reconhecer a existência de outros deuses e adorá-los (17.7-9). Porém, de certa forma, esse comportamento é apenas sintomático de outro: a exaltação da hu manidade. Trata-se da grande questão do livro: De quem é a glória que enche a terra? A todo instante, o orgulho humano volta a aparecer: Israel adula os poderosos (2.12-17); a Assíria não está disposta a aceitar o fato de que seja um simples instrumento na mão do Todo-Poderoso (10.12-16); a Babilônia teima que só ela existe e que não há nenhuma outra (47.10-11); o rei da Babilônia insiste que se assentará no trono do céu (14.13-14); Jerusalém anda a passos curtos, coberta de arrogância e de adornos (3.16-23) e os doutos em religião zombam dos adoradores menos eruditos (65.1-5). Isaías chama tudo isso de rebelião, o que significa deixar de dar ao Senhor dos Exércitos, o Santo de Israel, o lugar que é devido somente a ele. Essa rebelião também se manifesta na tentativa de reduzir o comportamento religio so à execução de procedimentos rituais, em vez de uma vida na qual o caráter de Deus é colocado em prática no relacionamento com outros. Essa idéia aparece imediatamente em Isaías 1.10-15 e, de tempos em tempos, ao longo de todo o livro, até que se manifesta com força total nos últimos capítulos. Assim como os outros profetas, Isaías diz que Deus não quer um comportamento religioso, mas sim um comportamento piedoso. Porém, o compor tamento piedoso é uma questão diária e uma questão de colocarem-se de lado as próprias prerrogativas visando ao bem dos outros. O comportamento religioso só traz mais satisfação e exaltação para os arrogantes. Isaías 66.1-6 usa termos semelhantes aos do cap. 1 para fa lar da insensatez do enaltecimento próprio. Ao invés de apaziguar a Deus, desperta sua ira. 722
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A contrição e a humildade são sinais dessa obediência pactuai, a única coisa que garante a presença de Deus (Is 57.15; 66.2). 5. Humanidade. Apesar de o orgulho e a rebelião serem os principais elementos que descrevem o pecado no livro, isso não significa que Isaías tenha uma visão negativa da huma nidade. Aqui, de maneira tão clara quanto em qualquer outra parte da Bíblia, surge o grande paradoxo da vida humana. Quando procuramos exaltar-nos à custa de Deus, só encontramos despropósito, impureza e morte (Is 2.20-22; 14.14-15; 34.1-3; 65.1-5). Mas quando, em nossa condição decaída e desesperada, mudamos de atitude e assumimos a posição de servos, vemonos elevados a um lugar de relevância insubstituível. Isso fica especialmente claro nos caps. 40—48. Nessas passagens, o povo hebreu sente-se eternamente rejeitado. Seus pecados se acu mularam até aos céus e a terra prometida o vomitou. Por certo, Deus não quer mais saber dele. Mas a verdade é bem outra! Não apenas Deus não rejeitou o povo, como também declara que são seus servos escolhidos, por meio dos quais o mundo inteiro verá que somente o Senhor é Deus (43.10, etc.). Deus está disposto a associar tudo o que é decorrente de sua divindade nas evidências da vida de seu povo. Nisso encontra-se a relevância do ser humano. 6. Salvação. O uso que Deus faz dos homens como testemunhas da divindade dele mostra o conceito que Isaías tem da salvação. Em primeiro lugar, consiste numa revelação da retidão de Deus. Uma das características interessantes do livro é o uso do termo heb. $edãqâ, retidão. Em Isaías 1—39, esse termo é usado quase que exclusivamente para falar do comportamento reto que Deus espera de seu povo. Porém, nos caps. 40— 55, é empregado com semelhante exclu sividade para se referir à retidão de Deus em livrar seu povo. Nos caps. 56— 66, as duas idéias aparecem juntas quando, por intermédio da retidão de Deus, o povo é capacitado para viver em retidão. Isso mostra, acima de tudo, como Isaías considera que a salvação vem somente de Deus. O povo não tem poder algum de salvar a si mesmo. Mas os atos de salvação consistem numa expressão do caráter fiel de Deus. Seu livramento é retidão, tanto pelo fato de ser o cum primento de promessas antigas a Abraão como pelo fato de estar inteiramente de acordo com a natureza e o caráter de Deus, cuja intenção final é sempre o exercício da graça. Tal salvação encontra-se dentro do tempo e do espaço e espera-se que tenha resultados no tempo e no espaço. Não se trata de algo limitado a uma experiência completamente interna e psíquica. A condição do povo é mudada e espera-se que seu comportamento também seja mudado, de modo especial e particular no tocante ao tratamento de uns para com os outros. Refere-se a resultados (a realidade do cativeiro físico) e a causas (o pecado que levou à ser vidão). A salvação se concretiza por meios temporais (Ciro) e espirituais (a expiação vicária do Servo). Espera-se que redunde em testemunho e num relacionamento transformado pela atividade do Espírito Santo (Is 32.15-17; 44.3-5). Se é possível argumentar que se tem aqui uma visão evangélica da salvação, então talvez, deva-se dizer que a visão evangélica é seme lhante à de Isaías! Ao se fazer um levantamento geral da teologia de Isaías, pode-se ver que não é injustificá vel sugerir que Isaías resume a teologia bíblica melhor do que qualquer outro livro da Bíblia. B ib l io g r a f ia
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Isaque
Isaque
Isaque (plTT [yi$hãq], # 3663).
AT 1. O nome Isaque aparece 80x em Gênesis e 32x em outros livros, sempre com refe rência ao patriarca. Fora de Gênesis, ocorre com mais freqüência numa tríade de patriarcas, Abraão, Isaque e Jacó. Em quatro referências, aparece com a variação ortográfica yishãq (SI 105.9. Jr 33.26; Am 7.9, 16). Nas referências de Amós, o nome serve de paralelo para Israel. Alguns estudiosos argumentam que o nome em Amós é uma personificação do reino do Sul e que o profeta, que era do Sul, estava fazendo uma alusão a uma migração anterior de sua terra para o Norte para ressaltar os laços do povo do Sul com o país de Amós. Abraão (->) ri de alegria e descrença diante da garantia de que terá um filho, mesmo em idade avançada (Gn 17.17-19). Sara ri de incredulidade com a perspectiva de ter um filho (18.12), apesar de negar depois que o tivesse feito (18.15). Em Gênesis 21.6-7, Sara vê-se dividida entre a alegria e o medo de ser objeto de escárnio. Em 21.19, Sara tem a impressão de que Ismael está se diver tindo à custa de Isaque (me$ahêq) e exige que Ismael seja expulso. Em Gênesis 26.8, Isaque acaricia (me^ahêq) Rebeca de uma forma que leva o rei Abimeleque a ficar sabendo que ela é esposa do patriarca. Ao contrário dos outros patriarcas, o nome Isaque não aparece no sem. do noroeste como nome próprio. 2. O nome Rebeca (# 8071) ocorre 30x, sempre em Gênesis e sempre com referência a ela ser esposa de Isaque. Rebeca é filha de Betuel, que é filho de Naor, irmão de Abraão. A genealogia é significativa, pois era importante que o filho de Abraão não se casasse com uma cananéia (Gn 24.3). Etimologias mais antigas derivam o nome do radical rbq. Também é pos sível que o termo constitua um trocadilho com a palavra heb. para gado com a metátese de rês (Jbãqãr). Com isso, o termo seria análogo a outros nomes nas narrativas patriarcais como Raquel (ovelha) ou Lia (vaca). No heb. da Mix., está relacionado à idéia de parelha (de bois). 3. Isaque e Rebeca são parte integrante do tema de Gênesis referente à dádiva de vida e à promessa de sua continuidade, apesar das muitas ameaças contra ela. A palavra estrutural chave em Gênesis é tôledôt, lit. “gerações”, encontrada 5x na história primitiva (Gn 1.1— II .26) e 5x na proto-história de Israel (11.27—50.26). tôledót (-> Genealogia) é uma genealogia que pode encerrar uma cessão (5.1; 10.1; 11.10, etc.), mas a expressão funciona como título de um novo ciclo narrativo (6.9; 11.27; 37.2). A tôledôt de Isaque (25.19) dá início ao ciclo de Jacó. A vida dos protagonistas Abraão, Jacó e José são apresentadas na estrutura das gerações de seus pais Terá, Isaque e Jacó, respectivamente (Fokkelman, 41). O elemento da posteridade ocupa uma posição central nas histórias patriarcais, mesmo naquelas que parecem secundárias. Ao comentar sobre Gênesis 38, Alter observa que “a história de Judá e seus descendentes, assim como toda a história de José e, aliás, de todo o livro de Gênesis, é sobre a inversão da lei ine xorável da primogenitura, sobre a eleição — por meio de alguma mudança do destino — de um filho mais jovem para levar adiante a sua linhagem (6). Em Isaque, Deus estabelece e confirma a promessa de vida e posteridade (Gn 17.2, 7, 19, 21); a terminologia empregada é, especificamente, aquela da continuidade pactuai e não do inicio de uma nova aliança (Dumbrell, 4). As narrativas sobre Isaque ressaltam a iniciativa e promessa divinas. A ordem para Abraão abrir mão de Isaque (Gn 22.1-19) forma uma con tinuidade com a primeira ordem dada a Abraão (12.1-3) para que ele fosse ao lugar que Deus lhe mostraria para que ele pudesse servir a Deus (Janzen, 77-78). Encontramos aqui a repetição da promessa de Gênesis 12.3 de que Abraão é o instrumento pelo qual as nações podem ser abençoadas (22.17-18). O meio de abençoar as nações também ocupa o cerne das histórias da “antepassada em perigo” (Gn 12; 20; 26). O tema de maldição e bênção é ressaltado no epi sódio de Rebeca com a ênfase sobre a natureza da transgressão como um sacrilégio (26.10) e 724
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sobre o patriarca como mediador de bênçãos (Biddle, 609). A repetição da promessa original feita a Abraão como instrumento de bênção serve de introdução para a história (26.3-4), uma verdade que será confirmada pela boca do rei estrangeiro Abimeleque (26.29). 4. É possível que a oração “temor de Isaque” (3 1.42, 53) esteja relacionada ao radi aram. phd, coxa, em vez do heb., medo (Malul, 192-96), referindo-se a um juramento como aquele de Abraão (Gn 24.2) e Jacó (Gn 47.29-31). Nessas referências, a palavra “coxa” é uma metonímia para juramento (-> # 7064). Um juramento feito enquanto se segurava a genitália era especialmente simbólico em relação à posteridade familiar e terras. -> Gênesis: Teologia B ib l io g r a f ia
ABD 3:462-70; K. T. Aitken, “The Wooing of Rebekah: A Study in the Deveiopments of the Tradition", JSOT 30, 1984, 3-23; W. F. Albright, From Stone Age to Christianity, 1957, 24349; R. Alter, The Art o f Biblical Narrative, 1981; M. Biddle, “The ‘Endangered Ancestress’”, JBL 109, 1990, 599-611; W. J. Dumbrell, “The Covenant With Noah”, RTR 38, 1979, 1-9; J. R Fokkelman, “Genesis”, in The Literary Guide to the Bible, ed. R. Alter e F Kermode, 36-55, 1987; J. G. Janzen, Genesis 12-50: Abraham andAll the Families o f the Earth, 1993; M. Malul, “More on pahad yiçhãq (GENESIS XXXI 42-53) and the Oath by the Thigh”, VT 35, 1985, 192-200; G. A. Rendsburg, “Notes on Genesis XXXV”, VT 34, 1984, 361-66. A. H. Konkel
Israel: História de
Israel ('?!Oíp'’ lyisrã el], # 3776; História de).
0 fim do reino unido. Em 931/930 a. C., depois da morte de Salomão (->), seu filho Roboão não teve dificuldade alguma em suceder o pai em Jerusalém. No entanto, as tribos do Norte nâo aceitaram prontamente a autoridade de Roboão: é provável que tenham considera do aquele momento propício para negociar certas condições a serem incorporadas num novo tratado, como no caso de Davi (2Sm 5.3). Tendo isso em mente, foi marcado um encontro com os anciãos no centro tribal de Siquém (Josué 24). A recusa obstinada de Roboão a atender ao pedido de aliviar os impostos ordenados por Salomão e que incidiam sobre as tribos do Norte levou-as rapidamente à secessão (IRs 12.1-16). Esse cisma mostrou que as idéias de indepen dência tribal, liderança carismática (Noth, 228; Mulder, 49-50) e “democracia primitiva” (Jacobsen, 159) ainda estavam bem vivas e atuantes em Israel, o reino do Norte, e que Israel ainda não havia aceito a idéia de uma dinastia. Para Roboão, foi absolutamente impossível conter a rebelião resultante e o rei teve que se contentar em governar sobre Judá e Benjamim (IRs 12.16-24; 2Cr 11.1-4). A desintegração da monarquia e as guerras esporádicas subseqüentes deixaram tanto Israel quanto Judá — como as duas nações passaram a ser conhecidas — numa situação debilitada (Bright, 1984,229). 1 .Jeroboão 1. Jeroboão (->) subiu ao trono da mesma forma que Saul: foi designado pelo profeta Aías ( 1Rs 11.29-32) e, em seguida, foi aceito por aclamação popular ( 12.20). Je roboão consolidou sua autoridade sobre Israel e estabeleceu a capital em Siquém, um centro cultuai e político da antigüidade ( 12.25). A fim de neutralizar qualquer possível subversão resultante de visitas freqüentes ao templo em Jerusalém, instituiu um culto cismático a Javé e construiu santuários nacionais em Dã e Betei ( 12.28-29), cidades associadas a práticas cul tuais da antigüidade (Gn 12.8; 28. 12- 15; Juizes 17— 18). A natureza apóstata desse culto é 725
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expressada nas imagens dos touros de ouro que o rei mandou fazer para esses centros (lRs 12.28). Esses touros, símbolos da potência sexual masculina, foram chamados depreciativa mente de “bezerros” (Soggin, 206). Com a introdução dessa forma alternativa de adoração, Jeroboão foi condenado pelo profeta em termos (14.7-14) que indicam uma transgressão da aliança do Senhor (Hillers, 68-69). 2. O golpe de Baasa. Em 909/908 a. C., Jeroboão foi sucedido pelo filho Nadabe ( I Rs 14.20). Porém, depois de assassinar Nabade em 908/907, Baasa fundou uma nova dinastia em Israel. Sem dúvida perpetuou a política religiosa de Jeroboão e foi condenado pelo profeta Jeú, filho de Hanani (1 Rs 16.2-4) nos mesmos termos que Aías empregou para condenar Jeroboão. Inflamado pela ambição pessoal (Noth, 229), Zinri assassinou Elá, que sucedeu o pai, Baasa, em 885/4, e ocupou o trono por apenas um ano. Zinri, que era comandante de metade dos car ros (lRs 16.9), não recebeu uma nomeação profética e nem o reconhecimento de Israel. Isso explica porque só conseguiu reinar por sete dias (16.15). 3. A dinastia de Onri. A notícia da conspiração de Zinri chegou aos ouvidos de Onri, comandante do exército, durante o cerco da cidade filistéia de Gibetom. Uma vez que ninguém foi designado para ocupar o trono, o exército proclamou Onri seu rei ainda no campo de bata lha (1 Rs 16.16). Onri voltou imediatamente para casa e cercou Tirza. Sem ter nenhum apoio, Zinri cometeu suicídio ao incendiar o palácio em que estava. Uma vez que era fiel comandante maior do exército, Onri não foi a Tirza como usurpador, mas sim como um defensor do trono que lhe havia sido confiado pelo exército. Seus atos fazem lembrar o que Davi fez depois da morte de Saul ao vingar a morte deste e de Isbosete (2Sm 1.16; 4.6, 12). Tendo em vista que a reivindicação de Onri pelo trono foi contestada porTibni (lR s 16.21-22), ele só passou a go vernar quando este último morreu (16.22). Onri reinou durante doze anos — os seis primeiros em Tirza e os seis últimos em Samaria (16.23-24). Apesar de o AT revelar pouca coisa sobre Onri (->), informações extrabíblicas sugerem que ele foi um soldado e estadista competente que desfrutou reconhecimento internacional, como pode ser visto no fato de ele ser mencionado nos anais assírios de Salmaneser III (859-825 a. C.), Tiglate-Pileser III (745-727 a. C.) e Sargão II (722-705 a. C.; cf. Oppenheim, 284-85). Demonstrou sua capacidade de governar dando início a procedimentos que resultaram em es tabilidade política e prosperidade econômica. O casamento diplomático de seu filho Acabe (->) com Jezabel, filha de Etbaal, rei de Sidom, deu-lhe acesso ao comércio fenício com os países do Mediterrâneo. Outro casamento diplomático, este de sua neta Atalia (2Rs 8.18,26) com Jeorão de Judá, redundou em relações mais amigáveis com seu vizinho do Sul. Também negociou a paz com os arameus na fronteira nordeste ao abrir mão de território no Norte e permitir que desenvolvessem uma rua de comércio (bazares) em Samaria (lR s 20.34). Essa política criou uma cadeia de países aliados que se mostrou eficaz na neutralização da ameaça filistéia. Além disso, deu a Onri espaço suficiente para aventurar-se em direção ao sudoeste a fim de conquis tar e explorar Moabe. Essa expansão, por sua vez, supriu o rei com os produtos agrícolas (2Rs 3.4 e a Inscrição de Mesa, linhas 5 — 10) necessários para o mercado de exportação criado por seu tratado com Tiro. Por meio dessa iniciativa, Onri também adquiriu controle sobre as rotas de caravanas que passavam por território moabita (Pienaar, 157; Fensham, 591-92). Tendo garantido uma relativa estabilidade e prosperidade, Onri lançou-se num programa de construção. Deixou Tirza para fundar a nova capital, Samaria (-^), no monte que comprou de Semer (1 Rs 16.24) mais a oeste. Essa movimentação para o oeste revela uma disposição simpá tica para com os sidônios e uma preocupação com a ameaça constante dos arameus (Piemaar, 152). Tal decisão também faz lembrar o método de Davi de consolidar sua dinastia conquis tando com seus mercenários Jerusalém (2Sm 5.6; cf. Noth, 191) e assim, criando uma capital 726
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num território que lhe pertencia. Os dois tinham em mente territórios neutros, bem como uma propriedade pessoal que poderia ser passada aos herdeiros e, com isso, promoveram o conceito de uma dinastia. Os artífices fenícios contratados por Onri construíram uma cidade tão mag nífica que, durante séculos, seu esplendor foi incomparável (Kenyon, 76). A parte do palácio ocupava todo o centro de Samaria e era separada do resto da cidade por uma muralha (Kenyon, 74-82). E verdade que Onri trouxe a estabilidade e prosperidade econômica tão necessárias, mas a um preço que sua dinastia e, mais tarde, Israel não poderiam pagar (Merril, 340), pois as relações com Tiro exigiam uma disposição tolerante para com o culto de fertilidade cananeu (lR s 16.32-33; cf. Fohrer, 230; Ackroyd, 345; Hermann, 209; Pienaar, 157; Jagersma, 139-40; Miller, 273-74; Mulder, 52; Barkay, 320). Isso resultou na condenação profética tanto de Onri quanto de seu filho Acabe (Mq 6.16). Depois de sua morte, Onri foi sucedido pelo filho Acabe (->), que reinou durante 22 anos (1 Rs 16.29). De um modo geral, Acabe manteve e desenvolveu a política que seu pai ha via iniciado ao confirmar a aliança de amizade com os sidônios, com Judá e, talvez, até com o Egito. De acordo com a Inscrição de Mesa, deu continuidade ao domínio de Israel sobre Moabe. Mas sua posição com relação aos arameus foi diferente. Logo depois da ascensão de Acabe ao trono, o rei foi provado de maneira bastante séria quando Ben-Hadade e suas tropas araméias penetraram no território israelita, num avanço que os levou a sitiar Samaria (1 Reis 20). Acabe conseguiu virar o jogo e, numa segunda batalha em Afeca, o exército de Ben-Hadade foi com pletamente derrotado e ele se humilhou diante de Acabe. Para o espanto de um profeta desco nhecido (lR s 20.35-43), Acabe tratou Ben-Hadade como um igual e assinou um tratado com ele em vez de executá-lo. É provável que Acabe e Ben-Hadade estivessem convivendo com a crescente ameaça que a Assíria representava e, mais tarde, como parte de uma coalizão contra Salamanesser III, Acabe e Ben-Hadade lutaram juntos em Qarqar em 853 a. C. Apesar de a prosperidade gerada pelas políticas da dinastia de Onri jamais ter sido com partilhada com o povo em geral, proveu Acabe (->) com os fundos necessários para completar o programa de construção iniciado por Onri. Nisso estava incluído o palácio de marfim em Samaria (Kenyon, 71-89), outras cidades com potentes fortificações (1 Rs 22.39) e um sistema de abastecimento de água sofisticado em Megido e Hazor (Yadin). Essas cidades fortificadas encontravam-se em locais estratégicos: Samaria ocupava uma localização central, apropriada para um governo estável; Dã (Biran, 176-79), Hazor e En-Gedi protegiam a fronteira nordeste com os arameus, enquanto Megido guardava a rota de acesso ao vale de Jezreel (Pienaar, 15158) e Jezreel protegia a passagem ao norte, conduzindo à Samaria e possivelmente a Jericó, na entrada de Moabe (Olivier, 15). O casamento de Acabe com a agressiva Jezabel (->) teve influência negativa sobre a vida religiosa de Israel, uma vez que, para indignação dos javeístas, Jezabel promoveu o culto a Baal com fervor missionário no meio dos israelitas. É importante observar-se que, à princípio, Acabe desfrutava o favor do profeta de Javé a tal ponto que chegou a aceitar o conselho profé tico durante o cerco a Samaria ( I Reis 20). Porém, à medida que foi crescendo a influência da esposa, a popularidade dos profetas de Javé na corte real foi se dissipando. Por fim, isso levou às confrontações freqüentes de Elias e Acabe, culminando com o conflito no monte Carmelo, onde Israel escolheu servir Javé em vez de Baal (1 Reis 17— 19). Isso explica porque Jezabel queria tanto capturar e executar Elias (19.1 -2), sendo que depois desse episódio o profeta fugiu para o monte Horebe, onde o Senhor ordenou que ele ungisse Hazael como rei de Damasco, Jeú como rei de Israel e Eliseu como sucessor na missão profética (19.15-17). Acabe foi sucedido pelo filho Acazias depois de ser ferido mortalmente numa batalha contra os arameus (1 Rs 22.34-37). Acabe ainda era nominalmente javeísta, conforme ilustram 727
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os nomes teofóricos que deu aos filhos. Acazias, porém, consultava abertamente a Baal-Zebube, o deus de Ecrom (2Rs 1.2). Morreu sem filhos depois de ocupar o trono por dois anos e foi su cedido pelo irmão Jorão. Durante seu reinado, o império que o avô e o pai haviam construído começou a desintegrar. As forças unidas de Israel e Judá não conseguiram reprimir a revolta moabita (cap. 3). Inspirados pelos profetas Elias e Eliseu (IRs 19.15-18; 2Rs 9.1-10), tanto Damasco quanto Israel desenvolveram um movimento contra as dinastias existentes. Em Da masco, Hazazel foi ungido rei por Eliseu (2Rs 8.7-15) e um profeta desconhecido ungiu Jeú (->) enquanto ele e o exército guardavam a fronteira com Arã em Ramote-Gileade (9.6). Jeú tomou o trono em um golpe de Estado sangrento enquanto Jorão estava em Jezreel se recupe rando de um ferimento que havia sofrido numa batalha contra os arameus. Na carnificina que se seguiu, Jeú exterminou os dois reis, a rainha mãe e todos os príncipes da dinastia de Onri, bem como todos os adoradores de Baal em Samaria (2Rs 9.1— 10.28). Essa matança represen tou o fim de todas as relações com os países vizinhos e, com isso, da fonte de prosperidade e segurança de Israel (Bright, 250). 4. A nova dinastia de Jeú. Mais para o final do século X, o novo império assírio surg como potência dominante no OMA. As campanhas sistemáticas realizadas pelos assírios no levante ao longo do século seguinte encontraram a resistência de uma coalizão de nações, que incluía Israel e Arã. E possível que a revolução de Jeú tenha sido incentivada pelos assírios, o que sugere que ele seguia uma política pró-assíria. Com isso, Israel ficou numa situação desesperadora, sem vizinhos aliados, e Jeú não teve outra escolha senão pagar tributo a Salmaneser III em 841 a. C. (de acordo com o Obelisco Negro, ver ANET, 280). O que se seguiu foi um período de alívio para Israel, uma vez que os arameus (->) tiveram que lutar contra os assí rios ( ) . Porém, depois de 838, ocorreram novas incursões araméias enquanto Salmaneser se ocupava com outra parte de seu império. Durante o reinado dc Jeú (841-814) e também de seu filho Jeoacaz (814-798), Israel sofreu ataques dos arameus, contra os quais não tinha nenhuma defesa (2Rs 10.32-33; 13.7). É provável que a conduta agressiva dos filisteus e amonitas à qual Amós se refere (1.8, 13) indique esse período (Noth, 249). Hazael chegou a colocar Judá sob pressão e extorquir um resgate de Joás (2Rs 12.18; 2Cr 24.23-24). A ascensão de Jeoaz (= Joás, 798-782) ao trono indica uma mudança na relação de Is rael com Damasco (-^). Em seu leito de morte, Eliseu profetizou que Jeoaz libertaria Israel dos arameus (2Rs 13.14-19). Esse acontecimento coincidiu com a conquista de Damasco por Adade-Nirari III, que reativou as expedições assírias a essa região. Depois de sua campanha bem sucedida contra Edom, Amazias de Judá atacou Israel. O cronista explica o que levou a essa agressão (2Cr 25.5-24). Amazias contratou mercenários israelitas para completar seu exército na campanha que havia planejado contra Edom, mas dispensou-os sem chegara usá-los. Tamanha foi a fúria dos mercenários que eles saquearam algumas cidades judéias no caminho de volta para casa. Quando Amazias tomou conhecimento desse fato, declarou guerra a Jeoaz. O rei de Judá foi derrotado em Bete-Semes e Jerusalém foi saqueada (2Rs 14.8-14; 2Cr 25.17-24). A subjugação de Damasco criou as condições necessárias para o sucesso de Jeroboão II (->) e para a recuperação política e econômica de Israel. Jeroboão conseguiu recuperar o território que Israel havia perdido (2Rs 14.25, 28) e a prosperidade gerada pode ser vista nas fortificações construídas por ele em Samaria nessa época. Ainda que por um breve período, Israel voltou a ser uma potência política respeitada na região. Infelizmente, sua prosperidade andava lado a lado com a erosão de sua moralidade, o que pode ser observado no acúmulo de riqueza nas mãos dos privilegiados (Am 4.1). Os profetas lembraram Israel que Javé exigia justiça e não sacrifícios (Am 5.22, 24) e instaram: “convertei-vos ao Senhor” (Os 14.1-2). As mesmas condições favorecerem Judá, onde Azarias filho de Amazias ocupava o trono (2Rs 728
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15.1-7; 2Cr 26.16-23). Azarias também recuperou território e lançou amplos programas de construção (2Cr 26.6-15). 5. A volta da anarquia em Israel. Jeroboão 11 morreu em 753 a. C. e foi sucedido pelo filho Zacarias, que foi assassinado por Salum depois de um breve reinado de seis meses (2Rs 15. 8, 10), encerrando assim a dinastia de Jeú da mesma forma como ela havia se iniciado. Isso marcou o fim da prosperidade de Israel e o começo de um novo período de mais anarquia, quando, depois de apenas um mês de reinado, Salum foi assassinado por Menaém (2Rs 15.1314). A fim de garantir seu reinado (15.17), Menaém pagou tributo à Assíria (15.19-20). A po lítica expansionista de Tiglate-Pileser III (Pul, 2Rs 15.19; Tiglate-Pileser) trouxe mais uma vez um tempo de repressão à medida que o império assimilava os países menores do Oeste. Essas nações decidiram não lutar contra a Assíria, como haviam feito no tempo de Salmaneser 111, mas sujeitar-se e oferecer tributos. Meaném foi sucedido pelo filho Pecaías que, depois de anos, foi assassinado por Peca (2Rs 15.27). Peca, que seguiu uma política anti-Assíria, formou uma aliança com Damasco e os dois tentaram forçar Judá a juntar-se a eles. Tendo recursos à sua disposição, Acaz comprou a ajuda da Assíria, que acabou com a conseqüente guerra siroefraimita(->) contra Judá, atacando Damasco (2Rs 16.7-8; Is 7.1-25). Damasco caiu em 732 e várias cidades israelitas ao norte foram invadidas e seus habitantes exilados (2Rs 15.29). 6. O último capítulo da existência política de Israel. O último cap. da história de Is rael teve início quando Oséias assassinou Peca e proclamou-se rei em Samaria (2Rs 15.30; cf. também ANET, 283-84). A princípio, pagou tributo a Tiglate-Pileser III. Mais tarde, porém, conspirou com o Egito contra a Assíria (17.4), decisão que trouxe conseqüências trágicas. Sal maneser invadiu Israel e sitiou Samaria durante três anos (17.5). Morreu durante o cerco e foi sucedido por Sargão II (722-705). O fim chegou por volta de 722/21, quando Samaria caiu e os israelitas foram deportados (2Rs 17.6). De acordo com registros assírios, essa deportação foi seguida de outra em que 27 290 israelitas foram levados de sua terra. O motivo para a queda de Israel é apresentado em 2 Reis 17.7: “Os filhos de Israel peca ram contra o Senhor, seu Deus”. O pecado de Israel foi a tolerância ao culto de Baal e a adesão às práticas rituais relacionadas. Com o tempo, exilados de outros países foram assentados em Israel (17.24) e assimilados pelo que havia restado de habitantes israelitas. A monarquia exerceu uma influência nítida sobre o desenvolvimento religioso de Israel, como mostram claramente os livros de Reis. No culto apóstata a Javé iniciado por Jeroboão, abriu-se caminho para as práticas pagãs, uma vez que os símbolos do touro também estavam intimamente associados ao culto de fertilidade cananeu (cf. 2 Reis 1; Os 3.3-4; 4.9-18; 8.4-5; 9.10; 10.1 -2,5). Durante o reinado da dinastia de Onri, a influência desse culto alcançou o auge com Jezabel que promoveu sua religião com fervor missionário (Bright, 52-54). No conflito que se seguiu entre os adoradores de Javé e Baal, evidenciou-se uma forma tradicional e nâo adulterada de javeísmo, personificada em Elias (->) e Eliseu. Também fica clara a reflexão te ológica sobre a história de Israel. O povo adorava um Deus, em contraste com os muitos deuses de Canaã. Era um Deus zeloso, cuja adoração excluía todos os outros deuses; era também um Deus que fez aliança com seu povo eleito, colocando desse modo a vida toda dessa nação sob a vontade carinhosa e as exigências dele (Fohrer, 297-300). No livro 2 de Crônicas, essa história é quase totalmente ignorada. Não era intenção do cronista reescrever a história de Judá ou Israel, mas sim ensinar o povo certas lições de sua história. Assim, ele usou somente material que cumpria esse propósito (Myers, XX). Para ele, o culto no templo era a única forma verdadeira de adoração; a dinastia de Davi era de suma importância e a secessão do reino do Norte, Israel, representou a separação entre esse reino e 729
Jacó
Deus. Os únicos verdadeiros israelitas eram aqueles que haviam permanecido leais à casa de Davi (Myers, 65). (-> Crônicas: Teologia) B ib l io g r a f ia
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Jacó
Jacó (2j?5?! [ya 'aqõb], # 3620).
OMA Nomes semelhantes como ya 'qob-har e ya ‘aqob-iI são conhecidos de fontes sem. do segundo milênio a. C. (H. B. Huffmon, APNM, 1965, 203-4). AT O estudo das narrativas sobre Jacó em Gênesis contém considerações sobre Labão, o tio de Jacó; as duas esposas do patriarca, Lia e Raquel; as esposas secundárias, Bila e Zilpa, e os lugares em que Deus se revelou a ele, Betei, Maanaim e Peniel. Há uma grande quantidade de material escrito sobre essas narrativas em comentários e introduções ao AT e em livros so bre a história e a religião de Israel, considerando-os sob um ponto de vista literário, da história da tradição, da historicidade e das ligações com a cultura e religião contemporâneas de outros povos do OMA. O propósito deste artigo é considerar a relevância teológica das narrativas de Jacó da maneira como se encontram reunidas no livro canônico de Gênesis e como são refe ridas subseqüentemente em outras partes do AT e NT. De acordo com sua apresentação em 730
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Gênesis, a história de Jacó pode ser mais bem estudada em cinco tópicos principais: 1. Jacó em seu relacionamento com Esaú; 2. Jacó em seu relacionamento com Labão; 3. os casamentos de Jacó e dos filhos; 4. os encontros de Jacó com Deus e 5. Jacó em seu relacionamento com José na mudança para o Egito. (-> Gênesis: Teologia) 1. Jacó em seu relacionamento com Esaú. A história dos relacionamentos entre Jacó e Esaú começa com o relato do nascimento dos filhos gêmeos de Isaque e Rebeca e até mesmo antes disso com o medo de Rebeca quando “os filhos lutavam no ventre dela” (Gn 25.22), um presságio de como seria essa relação. Rebeca recebeu o seguinte oráculo: “Duas nações há no teu ventre, dois povos, nascidos de ti, se dividirão: um povo será mais forte que o outro, e o mais velho servirá ao mais moço” (Gn 25.23). Quando Jacó saiu do ventre da mãe, “segura va com a mão o calcanhar de Esaú” e por isso, recebeu o nome Jacó, ainda que, como tantos nomes do AT (aliás, vários na história de Jacó), é possível que não se trate de uma questão de etimologia científica, mas de um trocadilho ou uma semelhança verbal. E possível também que o nome “Jacó” tivesse como significado original “que Deus o proteja”. Não fica claro se Isaque sabia do oráculo dado a Rebeca e, portanto, se agiu deliberada mente contra ele, procurando abençoar Esaú. Sem dúvida há indícios de problemas domésticos na declaração “Isaque amava Esaú porque se saboreava de sua caça; Rebeca, porém, amava Jacó” (Gn 25.28). A maneira como Jacó tomou o direito de primogenitura de Esaú não serve de crédito algum para ele, mas a culpa maior é atribuída a Esaú, que estava preparado para sacrificar sua bênção futura em troca da necessidade imediata e premente de uma refeição. Assim, é compre ensível que o NT refira-se a esse fato na exortação: “nem haja algum impuro ou profano, como foi Esaú, o qual, por um repasto, vendeu o seu direito de primogenitura” (Hb 12.16). É natural tomarmos partido de Esaú quando Rebeca enreda seu plano ardiloso para que Isaque abençoe Jacó em vez de Esaú, mas a narrativa indica que, da sua parte, Isaque também agiu furtivamente. No final da vida de Jacó, sua bênção foi pronunciada na presença de toda a família (Gn 49.1). Isaque estava decidido que a lei de primogenitura (cf. Dt 21.16) devia ser mantida, mesmo que o oráculo divino indicasse outro rumo para que o propósito de Deus se cumprisse. W. Brueggermann fala da justaposição do conflito humano com a interferência divina dentro da história como um todo (210). Por trás dos intentos de Isaque, da falta de con sideração de Esaú pelos valores espirituais, dos ardis de Rebeca e da dissimulação de Jacó, encontra-se a realização do propósito de Deus e o fato de que não é o mérito nem o costume (a regra da primogenitura), mas sim a graça de Deus que prevalece e que uma pessoa não é escolhida por sua bondade, mas sim aperfeiçoada por Deus por meio das circunstâncias nor mais da vida. Contra sua própria opinião ou vontade, Isaque deu sua bênção a Jacó e, como consideravam todas as partes envolvidas, as palavras de bênção pronunciadas por um patriarca em idade avançada não podiam ser revogadas nem contrariadas, mas deviam cumprir-se pelo simples fato de terem sido proferidas (Gn 27.30-38). Jacó teve de fugir da ira de Esaú, mas quando voltou, vinte anos depois, era um homem que havia sofrido a devida disciplina. Chegou com temor e tremor e enviou presentes adiante de si como uma súplica pela reconciliação, juntamente com uma oração de penitência, rogando pela graça de Deus (Gn 32.9-12). Nesse episódio, Esaú não tomou para si nenhum dos presen tes de Jacó e os dois se reconciliaram. 2. Jacó em seu relacionamento com Labão. Entre o começo e o fim da história da relação de Jacó com Esaú, encontra-se o relato do relacionamento de Jacó com Labão. Rebeca tenta poupar Jacó da vingança de Esaú e influencia Isaque para que ele envie Jacó à casa de Betuel, o pai de Rebeca, em vez de permanecer na terra e encontrar uma esposa dentre as mulheres 731
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hititas (Gn 28.1 -5). Betuel e Labão apareceram anteriormente na história de Gênesis (cap. 24), quando o servo de Abraão foi enviado para encontrar uma esposa para Isaque. Nessa passa gem, Harã é chamada de terra de Abraão e da família de Betuel e seus parentes (v. 4). Labão, identificado como neto de Naor, irmão de Abraão (Gn 11.26-27; 29.5), parece ter contribuído de forma significativa com as providências para que Rebeca fosse entregue a Isaque (24.50), e ela é chamada com freqüência de irmã de Labão. Labão recebe Jacó de braços abertos, dizendo-lhe; “De fato, é meu osso e minha carne” (29.14), e, posteriormente, concorda em dar em casamento sua filha Raquel. Nesse ponto, Jacó, que tramou contra Esaú, é vítima de uma trama de Labão, e desenvolve-se entre Jacó e Labão uma constante disputa de perspicácia. Labão entrega Lia como esposa em lugar de Raquel, e por Raquel Jacó deve servir Labão por mais sete anos. Em seguida, depois de servir por ainda mais seis anos a fim de obter rebanhos de ovelha e gado, Jacó diz a Labão: “dez vezes me mudaste o salário” (31.41). Por fim, Jacó escapa furtivamente c é perseguido por Labão, mas pelo fato de ser advertido em sonho para não atentar contra Jacó (31.24), Labão entra em aliança com ele e os dois fazem a promessa mútua de não atentarem um contra o outro. Labão, que tem seus próprios deuses do lar (31.30), ainda assim diz a Jacó: “O Deus de Abraão e o Deus de Naor, o Deus do pai deles, julgue entre nós” (31.53). Dentro da narrativa dos relacionamentos entre Jacó e Labão, a volta de Jacó à terra prometida a Abraão é de suma importância, pois lá Jacó receberia a bênção do Senhor (31.3, 13). Como vimos, Labão foi advertido a não fazer coisa alguma que pudesse servir de obstáculo para o cumprimento do propósito divino (31.24), e, apesar de Jacó ainda ter várias lições espirituais para aprender, possuía fé para reconhecer que o Senhor havia estado ao lado dele para garantir o cumprimento dos propósitos do Senhor e a concessão da bênção divina (31.42). 3. Os casamentos de Jacó e dos filhos. Entretecido na história dos relacionamentos Jacó com Labão, encontramos o relato dos casamentos de Jacó e dos filhos dessas uniões. Nâo é sem motivo que von Rad comenta sobre essa parte da história de Gênesis: “durante longos capítulos depois disso, o leitor perde Deus e seus atos inteiramente de vista em meio à selva de manifestações nâo edificantes da natureza humana. Nessa passagem, encontra-se um relato extremamente mundano” (O T T 1:171). E, no entanto, vê-se de modo repetido o reconhecimen to de que os filhos são a dádiva de Deus. Nos nomes dados aos filhos de Lia temos: Rúben, “pois disse: O Senhor atendeu à minha aflição”; Simeão, “soube o Senhor que era preterida e me deu mais este” (Gn 29.32-33). Então, depois de Levi, nasceu Judá, sobre o qual ela disse: “ Esta vez louvarei (ydh) o Senhor” (Gn 29.35). Quando Raquel, com inveja por causa dos fi lhos da irmã, disse a Jacó: “Dá-me filhos, senão morrerei”, a resposta dele foi, “Acaso, estou eu em lugar de Deus que ao teu ventre impediu frutificar?” (Gn 30.1-2). Então Bila, a serva de Raquel é entregue a Jacó, e, quando ela lhe dá um filho, este re cebe o nome de Dã quando Raquel diz: “Deus me julgou, e também me ouviu a voz, e me deu um filho” (Gn 30.6). Bila teve outro filho, Naftali e então Lia também entregou sua serva Zilpa a Jacó e esta deu-lhe dois filhos, Gade e Aser. A idéia de que os filhos eram dádivas de Deus persiste quando Lia tem o quinto filho, Issacar e reconhece: “Deus me recompensou, porque dei a minha serva a meu marido” (Gn 30.18); então vem o sexto filho, Zebulom, sobre o qual ela diz na ocasião do nascimento: “Deus me concedeu excelente dote” (Gn 30.20). No entan to, talvez seja importante observar que nenhum desses nomes contém uma designação divina (como El), algo que pode ser encontrado com tanta freqüência em outras partes do AT. Por fim, a história prossegue relatando que “Lembrou-se Deus de Raquel, ouviu-a e a fez fecunda” e “Ela concebeu, deu à luz um filho e disse: Deus me tirou o meu vexame. E lhe chamou José, dizendo: Dê-me o Senhor ainda outro filho” (Gn 30.22-24). Mais adian 732
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te no relato, vem a resposta de sua oração, mas Raquel morre no nascimento de Benjamim (Gn 35.16-18). A história dos casamentos e filhos de Jacó é, sem dúvida, muito humana, revelando as tensões inevitáveis de um lar polígamo, cheio de ciúmes e rivalidade entre as esposas e, no entan to, em meio a tudo isso há uma intensa consciência de que os filhos são uma dádiva de Deus. Várias das coisas relacionadas ao que acontece em Harã — o serviço de Jacó em troca de suas esposas, a entrega de servas para serem esposas secundárias, o significado dos deu ses do lar — encontram paralelos nas tábuas Nuzi da Mesopotâmia, do século XV a. C. (ver Millard e Wiseman, 93-138). 4. Os encontros de Jacó com Deus. Há uma grande tensão presente nas narrativas q envolvem os encontros de Jacó com Deus, narrativas estas com forte ênfase na iniciativa e na graça de Deus. Alguns estudiosos encontraram tradições tribais e não pessoais nos relatos sobre Jacó, como acontece com Isaque e Abraão, mas é difícil interpretar a descrição desses encontros com Deus de outra forma senão em termos explicitamente pessoais. Von Rad as considera da seguinte maneira: “Abraão, Isaque e Jacó foram, sem dúvida, os primeiros a receber a revela ção de uma divindade que se comprometeu a cuidar deles e guiá-los, e que lhes deu a promes sa dc uma terra arável e de grande descendência” (OTT 1:7). Da mesma forma, H. H. Rowley ressalta as narrativas patriarcais envolvendo a verdadeira história pessoal e ressalta ainda que, mais importante do que o sacrifício na religião dos patriarcas, é o fato dc sua adoração conter um encontro pessoal com Deus ( Worship in Ancient Israel, 1967, 1-36). O primeiro desses encontros (registrado em Gn 28.10-22) ocorreu na noite depois que Jacó partiu de Berseba a caminho de Harã. Enquanto dormia, sonhou com uma escada entre a terra e o céu e com anjos do Senhor subindo e descendo por ela. O termo heb. sullãm (# 6150, sub # 6148) indica uma rampa em vez de uma escada, algo semelhante a um zigurate mesopotâmio. Acreditava-se que o zigurate abrigava um templo terreno que tinha contato com o céu. Porém, Javé usou-o para mostrar que o céu estava aberto para a terra e vice-versa. Javé falou a Jacó por meio da visão e renovou a promessa de terra, conforme esta havia sido feita a Abraão e Isaque. Nessa palavra divina, veio também a garantia: “Eis que eu estou contigo, e te guardarei por onde quer que fores, e te farei voltar a esta terra, porque te não desampararei, até cumprir eu aquilo que te hei referido” (28.15). Jacó sentiu medo na presença de Deus, chamou o lugar de “Betei”, casa de Deus (-> # 1078), erigiu uma coluna ali (talvez tanto como altar quanto como memorial) e fez um voto típico dentro do que era costumeiro no AT, um voto que talvez possa ser traduzido mais corretamente como “Se Deus for comigo, e me guardar nesta jornada que empreendo, e cuidar de mim, de maneira que eu volte em segurança para a casa de meu pai, e se o Senhor for o meu Deus, então esta pedra, que erigi por coluna, será a Casa de Deus” (cf. Gn 28.20-22). Jacó ainda tinha uma boa distância a percorrer em sua peregrinação antes de poder fazer uma confissão pessoal de fé. Em seu retomo a Canaã, depois de deixar para trás a aliança com Labão, mas ainda tendo diante de si a apreensão de rever Esaú, Jacó teve outro encontro com Deus. Uma breve descrição desse encontro pode ser vista em Gênesis 32.1, em que se diz que quando Jacó es tava seguindo seu caminho, “anjos de Deus lhe saíram a encontrá-lo”, talvez uma lembrança da comunicação entre o céu e a terra que lhe havia sido mostrada no sonho da escada. A par tir daquilo que viu, Jacó deduziu que “este é o acampamento de Deus” (ou talvez, “este é o exército de Deus). Assim, surge o nome Maanaim (que significa “acampamentos”) e o lugar é mencionado diversas vezes no restante do AT como uma cidade levítica (Js 21.38), a base de operações de Isbosete quanto ele tentou tomar-se rei (2Sm 2.8) e o lugar onde Davi se refugiou enquanto fugia de Absalão (2Sm 17.27; 19.32). O encontro com Deus é descrito dessa forma 733
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sucinta, mas a atitude de Jacó, apresentada nos versículos seguintes, é significativa. “Jacó teve medo e se perturbou” enquanto orava ao Deus de Abraão e Isaque, por acreditar que Deus o havia chamado para voltar à terra dele, Jacó, e que havia lhe prometido prosperidade. O pa triarca reconhece, então, sua necessidade e vê-se diante do Senhor: “sou indigno de todas as misericórdias e de toda a fidelidade que tens usado para com teu servo” (Gn 32.7-12). Por fim, há o encontro em Peniel, apresentado na estranha narrativa de Gênesis 32.2232. Tendo-se retirado para um tempo e um lugar de solitude na véspera de seu encontro com Esaú, Jacó luta com um “homem”, mas toma-se evidente que luta na escuridão com alguém muito mais que humano. O termo heb. 'e lõhim costuma significar Deus, mas deve-se conside rar possível a interpretação de Oséias 12.4 “lutou com o anjo”. E, no entanto, pode-se dizer de Jacó: “Iutaste com Deus e com os homens e prevaleceste” (Gn 32.28). Jacó chama o lugar de “Peniel” ou Penuel (que significa face de Deus), pois, “Vi a Deus face a face, e a minha vida foi salva” (Gn 32.30). Pode-se entender a partir disso que, por um lado, é a determinação de Jacó de obter a bênção de Deus, de “cativar” Deus, como coloca von Rad (O T T 1:182), e, por outro, é o fato de que Jacó teve de experimentar um quebrantamento (simbolizado pelo deslocamento de sua coxa) a fim de que Deus pudesse abençoá-lo e transformá-lo de Jacó em Israel, o homem que tem poder com Deus. Dessa luta, surge um novo Jacó, simbolizado pelo novo nome. Oséias lembrou a Israel de seu tempo dessa experiência de Jacó e das implicações para os israelitas: “Lutou com o anjo e prevaleceu; chorou e lhe pediu mercê; em Betei, achou a Deus, e ali falou Deus conosco. O Senhor, o Deus dos Exércitos, o Senhor é o seu nome” (Os 12.4-5). Depois disso, Jacó volta para Betei (Gn 35.1-15), constrói um altar ali e ordena à sua família que se desfaça dos “deuses estranhos”. Existe nesse episódio o que Brueggemann (281) compara com um voto batismal de purificação e renúncia. Jacó reconhece a bondade de Deus desde o tempo em que o Senhor foi ao encontro dele em Betei, quando Jacó ainda fugia de Esaú. Esse foi o cumprimento do voto no lugar onde ele havia sido feito e, da parte de Deus, há/ houve uma promessa, feita anteriormente a Abraão e Isaque e renovada a Jacó (cf. Gn 48.3-4). Não importa o que “El Betei”, o Deus de Betei, pode ter significado para outrem com muitos deuses, mas para Israel, dali em diante, Javé era El Betei, pois Betei era o lugar da revelação própria do Senhor. A teofania em 35.1 remete especificamente àquela do cap. 28. 5. Jacó em seu relacionamento com José e em sua mudança para o Egito. Em seg da, Jacó aparece em Efrata (Belém), sepultando a esposa Raquel logo depois do nascimento de Benjamim (Gn 35.16-20) e, então, com os doze filhos na terra de Canaã (37.1). Lá, quando Jacó segue os passos dos pais e mostra predileção por José, o resultado é a inimizade dos outros irmãos, sendo que José é vendido como escravo e levado ao Egito. José é a figura central des sa história contada de modo vivido e que ocupa mais de dez capítulos de Gênesis. A narrativa relata sua humilhação e, na seqüência, sua exaltação como “primeiro ministro” do Egito. Seus irmãos o procuram (sem reconhecê-lo) para solicitar alimento e, por fim, quando José se revela a eles, pede que seu pai desça até o Egito. A relutância de Jacó em ir para lá é compreensível, mas o patriarca recebe a garantia da mensagem divina: “Eu sou Deus, o Deus de teu pai; não temas descer para o Egito, porque lá eu farei de ti uma grande nação. Eu descerei contigo para o Egito e te farei tomar a subir, certamente” (Gn 46.3-4; cf. Dt 26.5). Assim, Jacó desceu ao Egito, permanecendo lá até o dia de sua morte, mas não sem antes abençoar os filhos e os dois filhos de José (Gênesis 48) (cap. 49), tendo uma profunda consciência daquilo que Deus havia feito por ele, Jacó, em sua vida tão cheia de altos e baixos. Jacó (Israel) os assegura de que voltarão a Canaã (48.21) e, nessa fé, dá-lhes instruções para que o sepultem no mesmo lugar em que Abraào e Sara, Isaque e Rebeca e também Lia foram sepultados (49.29-32). 734
Jafé
O povo de Israel não podia esquecer-se da história de seu antepassado, um “arameu prestes a perecer” (Dt 26.5), fraco, astucioso e intriguista e porque, por intermédio dos profetas e salmistas eles eram chamados de “Jacó” em vez de “Israel”, talvez se tratando de uma refe rência justamente à humanidade de seu antepassado, bem como deles mesmos. E, no entanto, Jacó era herdeiro das promessas e, por meio dele, estas foram transmitidas para as gerações seguintes. O patriarca recebeu a revelação da graça de Deus pelo próprio Javé e, em decorrência disso, o Deus de Israel seria sempre “o Deus de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó” (Êx 3.6; no NT, ver Mc 12.26 e At 3.13). Pelo fato de Deus ter feito sua aliança com Jacó, como fez com Abraão e Isaque (Lv 26.42), podia ser chamado de “Poderoso de Jacó” (Gn 49.24; SI 132.2, 5; At 7.46). Quando nem mesmo Abraão foi epônimo de sua nação, foi pelo nome de Jacó/Israel que o povo passou a ser chamado. Dos doze filhos de Jacó, vieram as doze tribos. Em sua própria história, o povo se identificava mais com a história de Jacó/Israel do que com a de Abraão ou Isaque. Assim, tanto Jacó como seu povo depois dele podiam ser chamados de servos de Javé (Is 41.8; 44.1,2, 21; 48.20; 49.5) e, por fim, o apóstolo Paulo poderia explicar em detalhes, no mais profundo nível teológico, que, na eleição divina, os propósitos do Senhor devem se cumprir por intermédio de Isaque e não de Ismael, por meio de Jacó e não de Esaú (Rm 9.6-13; cf. MI 1.2-3). B ib l io g r a f ia
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Jafé
Jafé (F1D’ \yepet], # 3651).
OMA É possível que o nome seja derivado do radical yph, ser justo (-> # 3636), ou de pth II, ser largo (# 7332). A associação com este último radical é feita pelo texto das Escrituras (Gn 9.27). Speiser encontra Jafé refletido em lapetos, um dos Titãs.
AT 1. De acordo com Gênesis, Jafé era um dos três filhos de Noé. Na arca, Noé e a esposa foram salvos da destruição provocada pelo dilúvio (-> Dilúvio: Teologia). Juntamente com seu irmão Sem, Jafé cobriu a nudez do pai (Gn 9.23). Como ancestral das nações, ele (e, assim, elas também) encontraria sabedoria nas tendas de Sem (9.27). O suj. do vb. v^yiÈkõn, em 9.27, é Jafé (de acordo com Skinner, 185; Hamilton, 326) e não Deus (de acordo com Kaiser, 82). Em oposição a Kaiser, a estrutura poética sucinta evita a intrusão de um suj. mais claro; a oração em questão “habite ele nas tendas de Sem” não é antitética à oração anterior, “engran deça Deus a Jafé”; a estrutura geral é de que Canaã, o amaldiçoado, servirão os dois “irmãos” (v. 25), ou seja, Sem (v. 26) e Jafé (v. 27); o vb. Skn, habitar, aparece em outras partes de Gênesis com referência a pessoas e não a Deus, tendo como suj., p. ex., Ismael (16.12), os patriarcas de Israel (35.22) e Zebulom (49.13). Jafé foi pai de várias nações, esp. dos povos marítimos que ocuparam as regiões do Egeu e da Anatólia (10.2-5). 2. Jafé aparece nas genealogias de Crônicas como filho de Noé, de maneira semelhan à Tabela das Nações (1 Cr 1Cr 1.4, 5-7). P-B A lit. PB não diz muita coisa sobre Jafé que não tenha aparecido anteriormente na Bíblia. Ele não aparece no NT. 735
Javé
Cam;
Noé; -> Sem
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# 3902 (kad, jarro)
Javé hoste
Javé (mn’ [yhwh], # 3378; rr [yãh], Yah, # 3363; t [yhwh .yehã ’ôt]. Senhor dos Exércitos < 20 V [yãbã *], exército,
# 7372).
OMA 1. O nome ocorre 19x em diversas inscrições datadas do século IX ao século V a. C., todas com referência ao Deus de Israel. Para estas e outras possíveis referências, ver TDOT 5:502-13. AT 1. Yah é a forma abreviada de Javé/Yahweh (50x), usada principalmente na poesia. O nome Javé (aproximadamente 6800x, em todos os livros com exceção de Ester, Eclesiastes e Cântico dos cânticos), é usado a partir de Gênesis 2.4, invocado pela primeira vez em 4.26 e utilizado ao longo do AT (para a relação entre El e Elohim, -> # 446) como o NP do Deus de Israel. É chamado de tetragrama em função de suas quatro consoantes heb. (yhwh). Apesar de Javé ser usado ao longo de todo o livro de Gênesis, dois textos de Êxodo falam de uma re velação específica do nome de Javé a Moisés (3.14-15; 6.2-3). De acordo com o AT, o nome Javé foi revelado por Deus a Israel, e, no entanto, o uso em Gênesis numa ocasião separada dessa revelação indica que o nome Javé possuía uma existência pré-israelita (um epíteto de El) ou que o relato dessas histórias deu-se sob o ponto de vista do javeísmo mosaico (Moberly, 36-78). As tentativas de encontrar uma “origem” para o nome (p. ex., entre os midianitas, Êx 3.1; 18.10-12) mostraram-se infrutíferas, apesar de alguns lugares terem sido eliminados (p. ex., Canaã). 2. Êxodo 3.14 é um dos versículos mais enigmáticos do AT. O nome dado a pedido Moisés — 'ehyeh ’aser 'ehyeh, consiste da forma repetida do vb. ser (hyh [->#2110], sendo hwy a forma ainda mais antiga) na primeira pessoa do sing. mais a partícula relativa (o próprio Javé pode ser uma forma impf. da terceira pessoa; a vogal indica uma forma hi., mas esse as pecto não é atestado no AT e nem no sem. do Noroeste). A tradução mais comum é “EU SOU O QUE SOU”. Alguns estudiosos sugerem que essa resposta seja uma recusa a dar o nome divino, resultante de uma crença que conhecer o nome dá um certo controle sobre aquele que é chamado por essa designação: na verdade, “Eu sou o que sou e não é da tua conta saber o meu nome”. No entanto, essa é uma opinião que demonstra desespero e não se encaixa com a prática divina de revelar um nome quando aparecia aos antepassados de Israel (Gn 35.11; Êx 3.6). Além disso, pelo fato de Javé ser usado em aposição imediata com “o Deus dos vossos 736
Javé
pais” nos vv. 15-16 indica um significado mais positivo. É difícil crer que as 6800x em que Javé é usado no AT sejam apenas um testemunho da recusa de Deus. Sem dúvida, o nome Javé apresenta uma falta de definição. Mas. como acontece com todos os nomes, isso simplesmen te serve para reconhecer os limites de se fazer inferências a partir de um nome com relação à natureza daquele que é chamado por ele. Dentre outras traduções, pode-se citar “Eu serei (quem) eu serei”; “Eu farei ser quem eu farei ser”; “Serei quem eu sou/sou quem eu serei”. Esta última, pode ser a melhor opção, em essência: “Eu serei Deus para você”. A força do nome não é simplesmente o fato de Deus ser ou de Deus estar presente, mas de que Deus será Deus fielmente para eles na história que está por vir (ver vv. 16-17). O uso da mesma forma verbal em 3.12 e 4.12, 15 (cf. 6.7; 29.45) também sugere isso. Deus será Deus com e para esse povo a todo tempo e lugar; essa expressão indica uma fidelidade divina ao seu próprio caráter. Israel não precisa se preocupar com ne nhuma arbitrariedade ou com um caráter caprichoso da parte de seu Deus. Os israelitas podem estar certos de que ele será quem ele é. A história de Israel é considerada a partir do nome de Javé e esse nome, a partir da história de Israel; esse será o nome que dará forma à história de Israel, mas a história também tomará o nome ainda mais rico. Isso significa que Deus também tem algo em jogo; e precisa fazer jus ao nome dado. Há muito tempo, Êxodo 6.3 (-> 'êt) é motivo de controvérsia. Os estudiosos costu mam chegar à conclusão de que esse versículo é prova da existência de fontes separadas (J e S). Para uma reavaliação recente, ver Garr, Moberly. No atual contexto, a interpretação mais provável é que um novo nome ou, melhor ainda, uma nova importância para um nome antigo (um epíteto de El?) se revela diante desses importantes acontecimentos inéditos no relaciona mento de Deus com Israel. A tradução Senhor (com maiúsculas em algumas versões) é um tanto problemática por vários motivos. O termo SENHOR obscurece o fato de que Javé seja um nome e não um título ou epíteto. O uso de SENHOR baseia-se na prática judaica pós-AT de usar ’adõnãy (Senhor) no lugar de Javé em função de uma consciência cada vez maior da santidade associada a Javé, seguida do uso de kyrios na LXX. A fim de facilitar a leitura, as vogais para o termo aram. que significa “o Nome” (que se tomou sinônimo de Javé no judaísmo pós-bíblico), foram sobre postas às consoantes para Javé no texto heb.; ou seriam as vogais de 'adõnãy, desconsiderandose, nesse caso, a vogal “a” do início. Na expressão ‘adõnãy yhwh (305x, Gn 15.2), as vogais de 'elõhim são usadas com yhwh; nesses casos, várias traduções usam a expressão “Senhor Deus” (reconhecendo implicitamente que o significado deyhw h não é Senhor, o que resulta ria na tradução “Senhor SENHOR”). Diante dessa realidade, pode-se argumentar que, assim como no caso de outros nomes pessoais, simplesmente transliteramos aquilo que se acreditava ser o original heb.: Javé (essa pronúncia é apenas uma suposição, baseada em grande parte em referências do cristianismo primitivo). A transi iteração da atual forma heb. “Jeová” não representa nenhuma pronúncia antiga conhecida, mas sim de uma forma que surgiu na Idade Média e que tem sido usado com sig nificado sagrado nos hinos cristãos. Uma alternativa seria acompanhar-se a prática do NT de usar a designação “Deus”. Com isso também se poderia lidar com a preocupação de alguns de que a palavra Senhor dá a milhares de textos uma metáfora masculina que não se encontra presente no original heb. (ver “Yahweh”, ABD 6:1012). 3. O que essa designação divina significa para Israel? Existem dois extremos que d vem ser evitados. Por um lado, a significação de um nome não é apenas uma insígnia de iden tificação; por outro lado, não pertence ao âmbito da magia, como se ao saber ou pronunciar um nome fosse possível exercer controle sobre a divindade. A passagem várias vezes citada de 737
Javé
Gênesis 32.29, na qual o pedido de Jacó para que seu atacante se identifique é negado, não é pertinente neste caso, pois Deus já revelou seu nome a Jacó em 28.13. A designação divina tem implicações em várias dimensões. Ela implica um caráter característico; separa Deus de outros que têm nomes, inclusive deuses. Além disso, qualquer um cujo nome seja conhecido torna-se parte da comunidade daqueles que têm nomes; assim Deus escolhe participar da comunidade histórica. Mais ainda, dar o nome Javé com referência ao Deus dos pais daquele povo associa Deus a uma determinada história. Por isso, a própria história de Deus é integrada à história de seu povo e, nesse texto, Deus se compromete a ser parte da história de Israel. Ademais, dar o nome acarreta um certo tipo de relacionamento, abre a possibilidade — e, de fato, admite o desejo — de uma certa intimidade nesse relacionamento. Uma relação sem um nome significa, inevitavelmente, um distanciamento; os nomes são elementos necessários para a proximidade. As designações possibilitam a verdadeira comunicação e reunião, indicam disponibilidade. Ao dar seu nome, Deus toma-se acessível. Agora, Deus e o povo podem se en contrar e dirigir-se um ao outro. E, no entanto, pelo fato de o nome não ser a pessoa, identidade ou caráter (um equívoco repetido com freqüência), permanece ainda uma certa separação, até mesmo um mistério sobre o ser que é chamado por aquele nome. O uso de nomes também implica vulnerabilidade. Ao tomar-se disponível para o mun do, Deus está, até certo ponto, à disposição daqueles que podem chamá-lo pelo nome. O nome de Deus pode ser usado, abusado e também honrado. Ao dar o seu nome, Deus se abriu para o sofrimento. A designação divina traz consigo a possibilidade de sofrimento divino (cf. 3.7). É provável que esse seja o fator que serve de base para o mandamento sobre o nome de Deus (Êx 20.7). Sobre a questão acima, ver T. Fretheim, Exodus, 63-65, 4 .yhwh $ebã'ôt. O significado dessa expressão (284x, incl. 18x com o acréscimo de ’elõhê a yhwh e 5x no lugar dele) é motivo de grande controvérsia. Costuma-se traduzi-la como “Senhor dos Exércitos” e está associada à batalha (ISm 4.4; Is 31.4), sendo que os exércitos são identificados com hostes humanas ou divinas (angelicais). Para os primeiros, ver 1 Samuel 17.45, “em nome do Senhor dos Exércitos, o Deus dos exércitos de Israel”. Nos textos em que Deus envia seu julgamento sobre Israel, muitas vezes por meio de exér citos inimigos, estes continuam sendo hostes de Deus a serviço de um objetivo divino (Is 1.24-25). Os exércitos divinos podem ser encontrados em textos como Juizes 5.20 (cf. Is 13.4); as estrelas (também chamadas de “hostes” juntamente com outros corpos celestiais) simbolizam as hostes celestiais, os anjos da corte de Javé que obedecem às ordens dele ( lRs 22.19; Jó 38.7; SI 103.19-21), em tempos de guerra ou paz. A associação das hostes celes tiais, num sentido astrológico, com a idolatria (Dt 4.19), pode ter sido um fator limitante dessa concepção em certos períodos. No entanto, não é preciso escolher entre uma posição ou outra. Pelo fato de fjãbã ’ I (exér cito, guerra, # 7372) na esfera humana não referir-se apenas a exércitos (1 Sm 8.11 -12), mas a obreiros a serviço de Deus (Êx 38.8) e, de fato, à Israel como um todo (12.41), é possível que cada uma das idéias acima estivesse sendo considerada em um ou outro contexto. No sentido figurativo, o termo exércitos refere-se a qualquer tipo de grupo — humano ou divino, chamado por Deus para mediar um objetivo divino, que pode ou não ser de natureza militar. O fato de a expressão ocorrer 25 lx nos Profetas pode mostrar o profeta como um membro do conselho divino (Jr 23.18, 22) e, assim, a palavra de Deus toma-se um instrumento divino, muitas ve zes para fins de julgamento (23.9). Outra abordagem seria considerarem-se “exércitos” como um plural de intensificação ou majestade, especialmente tendo em vista a tradução da LXX de exército como “Todo-Poderoso”. Faltam, porém, evidências convincentes para tal abstração. 738
Javé
5. Metáforas e epitetos diversos. Não fica inteiramente claro se um ou mais dos e mentos dessa categoria constituem, de fato, um nome para o Deus de Israel. E possível uma metáfora ser elevada à condição de nome. Todas as metáforas desse tipo têm um “Sim” e um “Não” com respeito a Deus; são uma extensão da realidade que Deus constitui, mas não apre sentam uma correspondência exata. a. qãdôs, “Santo” (-> # 7705). A designação divina como “Santo de Israel” ocupa uma posição de destaque especialmente em Isaías (1.4; 5.19, 24). Essa linguagem expressa o ca ráter distinto ou transcendente de Deus — ele não é um ser humano (Nm 23.19; Os 11.9). Ao mesmo tempo, esse Santo habita no meio de Israel (Is 12.6; Os 11.9) e, portanto, a santidade não expressa indiferença ou distância. E justamente em sua imanência, na maneira como se encontra presente e ativo no meio do povo, que Deus é revelado como um ser transcendente. Deus está, ao mesmo tempo, separado e próximo; na verdade, Deus “enche” a terra (Jr 23.24), como também o faz a glória de Deus (Is 6.3) e o seu amor (SI 33.5). b. 'ãbír, “Poderoso” (->#51). Esse termo (o mesmo que ’abbir, mas indicado de modo a não confundir Deus com “touro”) é usado na expressão “o Poderoso de Jacó” (Gn 49.24; Is 49.26; 60.16; SI 132.2, 5; é possível que a forma abbír seja usada para Deus no SI 78.25, “pão dos anjos”, um forma pl. de majestade?). Ocorre em par. com Javé no Salmo 132 e com metáforas como rocha (Gn 49.24) e Redentor (Is 49.26). O uso do termo como metáfora fica claro pelo emprego da palavra para referir-se a homens, esp. figura heróicas (SI 76.5[6]), e até mesmo a animais conhecidos pela força (p. ex., cavalos, Jz 5.22; touros, Is 34.7). E possível que a iniciativa de Jeroboão de erguer imagens de touros em Dã e Betei (IRs 12.26-30) seja um reflexo dessa imagem de Javé e, a princípio, não tivesse um caráter idólatra. Porém, pelo fato de essa imagem também ser usada para o deus cananeu Baal, com o tempo, acabou levan do à confusão idólatra. c. pahad, “Temor (de Isaque)” (-> # 7064). Esse nome está associado à era dos ante passados (Gn 31.42,53). O uso de pahad em 1 Samuel 11.7 para o pavor que Javé faz sobrevir aos inimigos de Israel, indica que o tema principal seja a questão da proteção divina da família escolhida, sendo possível também que se trate do temor reverente. d. b a ‘al, senhor (-> # 1251). Essa palavra do quotidiano para um chefe de família (Gn 20.3) era usada como metáfora para divindades por todo o OMA e, com o tempo, tomou-se o nome do deus da tempestade, responsável pelo domínio do âmbito da fertilidade, tanto em Canaã como nas regiões vizinhas. É possível que os primeiros israelitas tenham se apropriado do epíteto ba ‘al para Javé (como no caso de El), o que fica evidente no uso de ba ‘al no nome de alguns adoradores de Javé (p. ex., os filhos de Saul e Jônatas, 1Cr 9.39-40). No entanto, diante de um crescente sincretismo (cf. 1Rs 18.21; cf. 11.5) esse epíteto não tardou a ser con siderado inapropriado e cada vez mais repreensível. De fato, a parte ba 'al do nome Isbaal foi trocada posteriormente por editores por bõset, vergonha (cf. ICr 8.33-34 com 2Sm 2.8; 4.4; ver Jr 11.13). A relação entre Baal-Berite (Jz 9.4) e El-Berite (9.46) ainda não foi estabelecida de modo satisfatório. Ao mesmo tempo, os israelitas apropriaram-se da linguagem e temas dessa tradição cananéia, usando-as abertamente para complementar sua maneira de referir-se a Javé (p. ex., imagens relacionadas à tempestade, SI 18.14-15; conflito com o mar/dragão, 74.12-15; “An cião de Dias”, Dn 7.9-14; a metáfora de casamento e morte/ressurreição em Oséias). Isso não constituía uma “baalização” de Javé num sentido teórico, mas era um reconhecimento (como no caso de El) que concepções não israelitas possuíam pelo menos alguma compreensão da verdade sobre Deus (por meio da revelação geral). O uso dessa metáfora também pode ter sido útil para propósitos polêmicos ao fazer determinadas declarações sobre Javé (ver Os 2.8), 739
Javé
talvez até mesmo com objetivos missionários, estabelecendo certas ligações com o pensamento do mundo dos seguidores de Baal. No futuro prometido em Oséias, a imagem do casamento permanece intacta, mas é afirmado expressamente que Javé será chamado de marido e não de ba'al (2.16 [18]). e. ’ãb, Pai (# 3). Essa metáfora é comparativamente rara com referência a Deus (15x). Apesar de ser possível chamar Deus de Pai (Jr 3.4, 19), seu uso pouco freqüente dificulta a proposta de que se trate de um nome. E surpreendente observar que a designação Pai é usada em grande parte em textos que são relacionados, nâo com poder e autoridade, mas com criação (ls 64.8), intimidade (Jr 3.19), compaixão (SI 103.13; Jr 31.9) e até mesmo amizade (Jr 3.4), e é usada em par. com metáforas como Salvador e Redentor (Is 63.16). f. Pode-se encontrar no AT várias metáforas de Deus que, por vezes, são negligenciadas. Só no livro de Salmos, há mais de cinqüenta metáforas desse tipo. Algumas delas são: Deus como marido (Is 62.5), rei (SI 95.3), juiz (Gn 18.25), pastor (SI 23.1), Redentor (Is 44.24), oleiro (Jr 18.1 -6), guerreiro (Êx 15.3) e rocha (SI 18.2[3]). Apesar de Deus nunca ser chamado de mãe, são usadas imagens femininas para Deus que refletem as experiências particulares de mulheres, esp. a maternidade (Is 42.14; 66.13); a imagem de uma criança no ventre da mãe ou em seu seio pode transmitir uma sensação inigualável de unidade e intimidade com Deus. 6. De modo geral, os diversos nomes e metáforas usados para Deus no AT reflete três realidades que interagem umas com as outras de várias maneiras em diferentes períodos da história de Israel e conforme estas são formuladas pelos teólogos israelitas sob pontos de vista distintos. a. Deus como aquele que revela. Ao contrário das pessoas ou de outros deuses, ninguém dá nomes a Deus (Gn 16.13 constitui uma exceção). Apesar de não revelarem inteiramente sua pessoa ou caráter, os nomes de Deus proporcionam uma percepção mais profunda sobre ele, como também o faz a linguagem que Deus usa a respeito de si mesmo. A essência dessa pa lavra sobre Deus e aquilo que dá continuidade ao diálogo sobre Deus por meio das gerações não se encontra num conceito abstrato de algo como o monoteísmo (por mais importante que este seja). Certas declarações de fé que ocorrem ao longo do AT resumiam a essência daquilo em que Israel cria e proporcionavam um fundamento intrabíblico para a avaliação de todas as reflexões sobre Deus. A mais comum dessas declarações aparece pela primeira vez em Êxodo 34.6-7: “Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia e fideli dade; que guarda a misericórdia em mil gerações, que perdoa a iniqüidade, a transgressão e o pecado, ainda que não inocenta o culpado”. b. Algumas metáforas e outras formas de linguagem para Deus são tiradas do contex to do OMA e “batizadas” de modo a fazer parte da fé peculiar de Israel. Essa dependência em temos de lingüística e metáfora não é, porém, simplesmente formal. Verdades sobre Deus encontravam-se, de fato, à disposição dos vizinhos de Israel, e as concepções de Israel eram enriquecidas por esse contanto (o que traz à memória os ensinamentos teológicos de Abimeleque em Gênesis 20 e seu papel como confessor de Abraão). De modo algum a singularidade da fé israelita é enfraquecida por esse testemunho da obra do Deus Criador na vida e pensa mento de povos não escolhidos, aos quais o povo de Deus devia ter mais gratidão do que tem sido o caso tantas vezes. c. A experiência contínua de Israel com Deus, em grandes acontecimentos, ocasiões de adoração e encontros diários, produziu reflexões teológicas e o desenvolvimento de uma nova linguagem para Deus. É impressionante como a linguagem para se referir a Deus está associada a realidades quotidianas; ela vem do lar e da família, dos âmbitos sociais, comerciais e políti cos, dos relacionamentos humanos e de entidades não humanas. O aspecto mais fundamental 740
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de toda essa linguagem é seu caráter relacionai, revelando um Deus que não é distante nem indiferente para com o mundo, mas sim um Deus que entrou em relacionamentos verdadeiros com as pessoas e que opera dentro e por meio das complexidades e ambigüidades da vida delas em favor da missão divina de salvar o mundo. Deus; ’ãb (Pai, # 3); -> 'ãbir (Poderoso, #51); ’adõnãy ([Meu] Senhor, # 151); ’êl V (Deus, # 446); -> ’elõhim (Deus, # 466); ba 'al (Mestre, # 1251); gibbôr (Guerreiro Divino, # 1475a); -> pahad 1 (Temor [de Isaque], # 7065); -> .yiir I (Rocha, # 7446); -> gãí/ôi (O Santo, # 7705); Javé: Teologia B ib l io g r a f ia
/fS£> 4:1001-11; 6:1011-12; TDOT 1:59-72,242-61,267-84; 5:500-52\ ; T H A T \ :25-27,701 -7; “Name of God in the O T ’, HBD, 1985, 685-87; F. Cross, Canaanite Myth and Hebrew Epic, 1973; R. Garr, “The Grammar and Interpretation of Exodus 6:3”, JBL 111, 1992, 385-408; T. Mettinger, In Search o f God, 1987; R. W. L. Moberly, The Old Testament o f the Old Testament: Patriarchal Narratives and Mosaid Yahwism, 1992, 5-78; J. C. deMoor, The Rise ofYahwism, 1990; M. Smith, The Early History ofG od, 1990. Terence Fretheim
Jefté
Jefté (nnp’ [yiptãh], ele [Deus] abre, # 3653).
AT 1. Jefté foi um dos líderes militares de Israel no tempo dos Juizes, que reuniu e conduziu Israel à vitória contra os amonitas na Transjordânia. Seu grande sucesso militar foi posterior mente solapado pelo sacrifício de sua filha única, em cumprimento a um voto, e pelo massacre de efraimitas numa guerra intertribal. Jefté é lembrado na carta aos Hebreus como um daqueles que viveram pela fé (Hb 11.32). A história de Jefté (Jz 11.1— 12.7) é apresentada por uma perícope teológica (10.6-8) que repete o mesmo triste ciclo de apostasia religiosa em Israel encontrado anteriormente no livro. A seqüência de Israel deixando Javé para buscar ídolos, sofrendo opressão de nações hostis, suplicando a Javé por socorro e então sendo libertada por um “juiz” (sp( [-> # 9149]) levantado por Javé, aparece pela primeira vez em Juizes 2.6-19 e se repete ao longo de todo o livro como um triste refrão que indica o começo de uma nova narrativa. Dessa vez, porém, o ciclo é interrompido por uma expressão de impaciência divina com a morosidade de Israel em aprender. Numa repreensão cheia de ironia e estruturada sobre um modelo de justiça equitativa, Javé lembra Israel que, apesar do fato de os israelitas terem servido sete deuses e, em decorrên cia disso, terem sido oprimidos por sete nações, continuam a renunciar a Javé. Ele responde às súplicas deles para que eles sejam livrados dos filisteus e dos amonitas sugerindo que clamem não para ele, mas para os deuses estrangeiros aos quais preferiram. Humilhada e arrependida, a nação admite a culpa, deixa os falsos deuses e entrega-se à mercê de Javé. Por fim, o Senhor tem misericórdia “por causa da desgraça de Israel” (10.16). Assim, o leitor é informado que os acontecimentos políticos e militares que se desenrolarão a seguir estão predeterminados por um Deus comprometido com o livramento do seu povo. 2. A narrativa de Jefté começa com os comandantes de Gileade reunidos no local sag do de Mispa a fim de eleger um defensor para liderar o ataque contra os invasores amonitas. Jefté não está presente quando esse processo se inicia e, da maneira típica das narrativas he braicas antigas, o escritor interrompe o fluxo da história e nos informa o motivo. Apesar de ser 741
Jefté
reconhecido como um “homem valente” (gibbôr hayil, 11.1), ainda assim ele é considerado um pária, privado de sua herança e expulso da família pelos irmãos por ser filho ilegítimo do pai deles, Gileade, com uma prostituta. Nesse ponto, outra das várias ironias da história fica evi dente quando os gileaditas, que haviam rejeitado Jefté, voltam-se para ele pedindo libertação e oferecem-lhe o caigo de “chefe” (qãsiti, 11.6; ver também Js 10.24) sobre “o povo [de Gileade]” (Jz 11.11). Um tanto incrédulo, Jefté aceita a oferta de liderança política, elevada à posição de governante (rõ s, 11.8), e em seguida intervém em favor deles junto ao rei de Amom. O que se segue é ímpar nas narrativas de Juizes. Em vez de uma solução militar para o conflito de Gileade com os amonitas, primeiro Jefté busca uma resolução diplomática. De maneira não muito diferente dos conflitos territoriais modernos, Jefté e o rei trocam declara ções oficiais sobre suas respectivas reivindicações quanto à Transjordânia. A versão de Jefté da história da disputa relata um ataque não provocado de Seom, rei dos amonitas, contra Is rael, ocasião em que o Deus de Israel deu a vitória a seu povo e as terras antes governadas por Seom. Em linguagem da diplomacia antiga, Jefté sugere que a situação dos últimos trezentos anos prevalece e que cada país deve aceitar o que seus respetivos deuses (Quemos e Javé) lhe deu. Jefté conclui sua argumentação com um apelo para o papel de Javé como “juiz” (sõpê(, Jz 11.27, usado como subs. somente nesse versículo), naquilo que constitui o ponto culminante teológico da narrativa de Jefté, senão do livro de Juizes como um todo (Boling, Judges). Javé é o verdadeiro árbitro do destino de Israel, não as nações que a ameaçam ou os juizes humanos que se levantam para salvá-la. Quando o rei de Amom rejeita a argumentação de Jefté, os gileaditas se preparam para a guerra. Encorajado pelo espírito de Javé (cf. também Jz 3.10; 6.34; 13.25), Jefté consegue reunir um exército das regiões de Gileade e Manassés. No entanto, não são as negociações de Jefté com seus compatriotas israelitas que determinam o resultado da batalha, mas sim as ne gociações com Javé. Numa tentativa de granjear o apoio divino, Jefté faz um voto de que, se regressar vitorioso, sacrificará como holocausto “quem primeiro da porta de minha casa me sair ao encontro” (Jz 11.31). A implicação do que se segue é que esse voto imprudente cons titui nada menos do que um ato de infidelidade (Trible). Em vez de ser um gesto de devoção, foi uma tentativa de manipulação, procurando influenciar a divindade. Revela a mesma mo tivação por trás da forma como os israelitas trataram a arca (1 Sm 4.1 -11) e do sacrifício não autorizado feito por Saul (ISm 13.5-14). A ironia do que se segue não pode ser considerada outra coisa senão condenação divina. Jefté acaba caindo na própria armadilha que tentou usar para Deus. Aquele que havia procu rado constranger Deus a lhe dar vitória, agora se vê diante de uma obrigação que representará para ele sua maior perda. Sem dúvida ele esperava que o primeiro a sair da casa quando ele voltasse seria um dos animais domésticos comuns nos lares da Idade do Ferro. Ao invés disso, é sua filha que o recebe, sua única filha! O sacrifício humano, um ato desesperado até mesmo no meio dos vizinhos de Israel (2Rs 3.27) era estritamente proibido pela lei israelita (Lv 18.21; Dt 12.29-31). E, no entanto, mesmo que estivesse ciente dessas proibições, Jefté é impelido por seu voto. Uma vez proferido, o voto deve ser mantido (para outros exemplos da natureza irrevogável dos votos e outras promessas feitas sob juramento, ver Gn 27.30-40; Nm 30.2; Js 9.15-21). Quer por superstição ou um senso distorcido de devoção, Jefté mostra-se determinado a cumprir sua parte da barganha. Numa seqüência desorientadora de acontecimentos, ele culpa a filha pela situação trágica, permite que ela pranteie a virgindade (pois morrerá sem se casar) por dois meses e então “lhe [faz] segundo o voto por ele proferido” (Jz 11.39; para a idéia de que ela dedicou a vida ao serviço religioso celibatário, cf. KD). De modo muito apropriado, toda essa ocorrência trágica passou a ser comemorada anualmente em Israel, não em reconhe 742
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cimento pela liderança política e militar de Jefté, mas em homenagem à filha dele, uma vítima inocente do voto irrefletido do pai (11.39-40). 3. O relato da expedição de Efraim contra Jefté (Jz 12.1-6), que serve de pós-escr para a carreira de Jefté, leva imediatamente a uma comparação com o relato do conflito de Gi deão com os efraimitas (7.28— 8.3). O que estava em jogo era a suposta ameaça que o sucesso militar de cada um desses líderes representava para os interesses políticos de Efraim dentro da confederação das tribos. Mas enquanto Gideão apazigua a agressão de Efraim, não é o que Jefté resolve fazer. Insistindo que sua campanha unilateral contra Amom não é motivada por nenhum tipo de quebra de protocolo da parte dele, mas sim dos efraimitas, Jefté convoca então as forças de Gileade contra Efraim. Os gileaditas reúnem-se para a batalha cheios de entusias mo, tendo seu fervor ainda mais instigado pelo escárnio arrogante de Efraim, “Fugitivos sois de Efraim, vós, gileaditas, que morais no meio de Efraim e Manassés” (12.4). O episódio ter mina com a fuga desordenada do exército derrotado dos efraimitas e o massacre subseqüente dos sobreviventes nos vaus do Jordão. A história de Jefté, que provavelmente é uma colcha de retalhos composta de materiais de fontes escritas e não escritas independentes, pode ser considerada uma unidade literária e teológica. Todos os seus componentes convergem para o tema central de que Javé é o verdadeiro “Juiz” de Israel e de que o destino de sua nação não é determinado por aquilo que o “homem propõe”, mas pelo que “Deus dispõe”. B ib l io g r a f ia
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# 7426 (.wm, jejum)
Jeorão
Jeorão (0'IÍrP [)^hôrãm], # 3393); ( □ ‘l i ’ [yôrãm], Jorão, # 3456). T
AT 1. Jeorão, a forma completa do nome abreviado Jorão (Javé exalta), é o nome de cinco indivíduos no AT, sendo que os mais conhecidos são o nono rei de Israel e o quinto rei de Judá. Estudiosos propuseram que se fundisse a identidade desses dois reis, cujas cronologias se so brepõem (Strange, 191-201), mas essa teoria vai além das evidências bíblicas (Soggin, 210). 2. Jeorão, rei de Israel, reinou durante doze anos (c. 852-841) e foi obscurecido p figura do profeta Eliseu, que começou seu ministério sozinho durante o governo desse rei. Foi o último rei da dinastia de Onri, conhecida por sua perversidade e foi morto num golpe de Es tado liderado por Jeú, um de seus comandantes. (-> Israel: Teologia) O registro bíblico cita apenas uns poucos gestos positivos da parte de Jorão, mas na a lise final, apresenta-o sob uma ótica negativa. Tanto a tentativa de fazer uma reforma religiosa limitada (2Rs 3.2) quanto a sensibilidade para com a situação moral hedionda de canibalismo na capital sitiada de Samaria (6.27-30) são obscurecidas pelos relatos acerca da insensibilidade teológica ainda muito maior de Jeorão (3.3; 6.31). 743
Jeorão
Jeorão manteve uma aliança anterior com o reino do Sul, mas seu governo foi marcado por uma constante agitação política com as nações ao redor, especialmente com a Síria (-> Arã) ao norte. Durante seu reinado, Mesa, rei de Moabe, chegou ao auge de uma rebelião contra Is rael (ANET 3,320-21), que levou a uma tentativa infeliz da parte de Jeorão, em conjunto com 0 reino do Sul e seu aliado edomita, de recuperar o controle sobre Moabe (2Rs 3.4-9). Pode-se vislumbrar a insegurança de Jeorão durante uma frágil trégua com Ben-Hadade 1 da Síria. Nessa ocasião, Naamã, um comandante sírio, foi procurar em Israel a cura para uma enfermidade da qual estava sofrendo. A reação de Jeorão à visita de Naamã (2Rs 5.7) sem dúvi da mostra a falta de um relacionamento firme com Deus ou com seu profeta. Quando o período de paz chegou ao fim, Jeorão recebeu inicialmente a ajuda de Eliseu contra os atacantes sírios, até que Samaria (->) foi sitiada e reduzida a uma falta desesperadora de alimento. O desejo de Jeorão de procurar matar Eliseu, o qual ele culpava por aquela situação, é outra indicação do conflito existente entre esse rei e o profeta. Um novo conflito com a Síria levou à batalha de Ramote-Gileade, mais uma vez numa coalizão com o reino do Sul. Jeorão foi ferido e acabou sendo morto por Jeú em Jezreel, onde estava se recuperando dos ferimentos. 3. Jeorão de Israel aparece mais no texto bíblico do que Jeorão de Judá e, enquanto primeiro recebe grande atenção no livro de Reis, o último, dentro dos moldes do cronista, re cebe maior reconhecimento no livro de Crônicas. (-> Judá: História) Jeorão de Judá reinou de 848 a 841 a. C. (Thiele, 64-71) e para ele o texto bíblico só reserva comentários negativos. Como primogênito e herdeiro do reino, sucedeu ao pai, Josafá. Na ocasião de sua ascensão, garantiu o trono ao assassinar os irmãos (2Cr 21.4). Tanto Reis quanto Crônicas mencionam o interesse de Jeorão pelas práticas idólatras de Israel em fun ção do casamento com Atalia, filha de Acabe, resultante de uma aliança com o reino do Norte (2Rs 8.18; 2Cr21.6). Sob o governo de Jeorão, Judá enfraqueceu-se a ponto de Edom e Libna poderem se rebelar com sucesso. Jeorão liderou seus exércitos contra Edom numa tentativa de recuperar o controle da região e, sem dúvida, das rotas comerciais do sul, mas fracassou em sua campanha. Outros problemas surgiram no Oeste e no Sul quando os filisteus, juntamente com os árabes, invadiram Judá e conseguiram tomar as esposas de Jeorão e todos os seus filhos, exceto um (2Cr 21.16-17). Um acontecimento marcante relatado pelo cronista é a carta enviada a Jeorão pelo profeta Elias (->). Essa menção de Elias pelo cronista é tão incomum que alguns estudiosos consideraram-na uma invenção desse escritor (Williamson, 306). Os argumentos contra a au tenticidade da carta são provenientes da ausência de referências a ela, mas um exame atento do texto revela a possibilidade de tal correspondência (ver Dillard, 168). O acontecimento em si ressalta os aspectos negativos de uma aliança com o reino do Norte e o fato de que Jeorão, ao contrário de seu pai, não impediu que as influências da idolatria penetrassem o reino de Judá. (-> Crônicas: Teologia) Jeorão teve uma morte triste e dolorosa, conforme havia sido profetizado por Elias e como foi observado pelo cronista. Além disso, o registro declara que poucos prantearam a morte de Jeorão ou lhe deram importância. B ib l io g r a f ia
R. B. Dillard, 2 Chronicles, 1987; A. Soggin, A History o f Ancient Israel, 1984; J. Strange, “Joram, King of Israel and Judah”, VT 25, 1975, 191-201; E. R. Thiele, Mysterious Numbers o f the Hebrew Kings, 1965; H. G. M. Williamson, I and 2 Chronicles, 1982. Robert Spender 744
Jeremias
Jeremias (nv?T [yirmeyâ, # 3758] ou liT7?T [virmeyãhú, #3759]). Jeremias foi profeta em Judá na virada do século VI a. C., cujo ministério e vida viramse politicamente entremeados pela expansão da Babilônia para o oeste e, por fim, pela captu ra de Jerusalém por ela, em 587 a. C. Os oráculos de julgamento, mas também de salvação, proferidos por Jeremias ao longo de um período de 30 a 40 anos, encontram-se registrados no Livro de Jeremias, o livro mais longo da Bíblia (em número de palavras). 1. Os primeiros anos. Acredita-se, de modo geral, que Jeremias nasceu c. 640 a. C., du rante o reinado de Josias em Judá. Ao contrário da maioria dos profetas (cf., porém, Ezequiel), Jeremias veio de uma família de sacerdotes. Vivia em Anatote, no antigo território de Benjamim, cerca de cinco quilômetros de Jerusalém. E possível que seu pai, Hilquias, fosse descendente de Abiatar, o qual Salomão expulsou do sacerdócio (1 Rs 2.26-27). Foi convencionado que o chamado de Jeremias, possivelmente quando ele ainda era adolescente, ocorreu no ano 627 a. C., 13Sano de Josias (Jr 1.2) e segue o modelo de outros chamados divinos (p. ex., Moisés, Êxodo 3). Jeremias apresenta suas objeções (é jovem demais e também falta-lhe fluência), mas Deus promete capacitá-lo e estar com ele (Jr 1.4-10). Outros estudiosos (p. ex., Hyatt; Holladay, 1989, 25-26) argumentam, em parte pelo fato de não ser possível datar-se nenhum oráculo claramente entre 627-609, que 627 não é o ano do chamado de Jeremias, mas sim de seu nas cimento. O chamado de Jeremias ocorreu quase simultaneamente com três acontecimentos de grande importância: a morte de Assurbanípal, a declaração de independência da Babilônia e o começo das reformas de Josias. Seguindo as instruções de Javé, Jeremias não se casou (16.2). É bem provável que tenha apoiado a reforma de Josias (621 a. C., cf. 2Rs 22.1—23.20), mas essa conclusão é, em grande parte, inferencial (cf. Jr 11.1-8). Ainda há controvérsias sobre a historicidade dos relatos biográficos. Uma das aborda gens mais antigas era “psicobiográfica” (Skinner), enquanto outras consideraram o “eu” como sendo corporativo e inserido no contexto cultuai (p. ex., Reventlow). A concepção “maxima lista” (p. ex., Blank, Bright, Thompson, Holladay) apóia-se no livro de Jeremias para a narra tiva de sua vida, suas palavras e seus feitos; a concepção “minimalista” considera que a maior parte dos registros é uma coletânea de tradições acumuladas ou longo do tempo, ou mesmo de caráter fictício (p. ex., Carroll; cf. Jobling e outros artigos em Perdue e Kovacs). 2. Destaques da carreira de Jeremias. O livro de Jeremias não relata os acontecimentos em ordem cronológica, portanto o que se segue é uma reconstituição aproximada. Jeremias foi, possivelmente, um “defensor de Josias” (640-609 a. C.; de acordo com Holladay, 1989,27). É provável que, durante o reinado de Josias, Jeremias tenha anunciado a vinda do inimigo do nor te (Babilônia, e nâo os cítios, como se pensava antes). Logo no início do reinado de Jeoaquim (609-598), o profeta pregou o que hoje é considerado seu famoso sermão do templo (Jeremias 7; 26). Em 605 a. C., o ano da batalha de Carquemis (Egito contra a Babilônia), Jeremias ditou um rolo a Baruque (->), seu escriba. O rolo foi lido para os líderes de Judá e, por fim, ao rei Jeoaquim, que o queimou e ordenou a prisão de Jeremias e de Baruque (Jeremias 36). Jeremias aconselhou o rei Zedequias (597-587) e outras nações vizinhas a se sujeitarem à Babilônia (Jeremias 27) e usou um jugo de madeira para ressaltar o apelo. Zedequias, porém, acabou apoiando o partido pró-Egito. Jeremias entrou em conflito com o profeta Hananias sobre a questão da duração do exílio (cap. 28; conflitos semelhantes no cap. 29). Durante o reinado de Zedequias, Jeremias foi lançado ao cárcere (Jr 37.11 -16), lançado a uma cisterna (37.17-21) e transferido para o átrio da guarda (38.13). Apesar de encontrar-se na prisão, Jeremias obedeceu às instruções do Senhor para que comprasse uma propriedade como símbolo de esperança (32.6.15). Sobreviveu à tragédia da Jeremias
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Jeremias
destruição de Jerusalém e foi tratado com deferência pelos babilônios vitoriosos (39.11-14; 40.1 -6). Associou-se, então, a Gedalias, o governador nomeado sobre os judeus que ficaram na terra depois do exílio (40.6), e, junto com parte desse remanescente, foi para o Egito (43.6-7) onde se acredita que tenha falecido. 3. A vocação profética de Jeremias. Os oráculos de Jeremias referem-se principalmen te ao julgamento contra Judá e Jerusalém pela deslealdade dessas duas cidades a Javé e à sua aliança (Jeremias 2—20). O chamado de Jeremias “para arrancares e derribares, para destruíres e arruinares e também para edifícares e para plantares” estendia-se para além de Israel, até outras nações (1.10; cf. cap. 25 e os oráculos nos caps. 46— 51). Do ministério dele fez parte a intercessão (11.14; 14.11; 17.16). Diferentemente de outros profetas, contou com os serviços de um escriba, Baruque (36.4; 45.1). Além dos oráculos, Jeremias transmitiu suas mensagens no contexto de visões (p. ex., vara de amendoeira, Jr 1.11-12; panela ao fogo, 1.13-19; cestos de figos, 24.1-10) e por meio de sermões práticos (p. ex., cinto de linho, Jr 13.1-11; fazer/destruir vasos de barro, caps. 18— 19; comprar terras, 32.1-44; rolo a ser lançado ao rio, 51.59-64). Seu estilo loquaz de prosa é caracterizado muitas vezes como deuteronomista. Ele usa de repetição (4.19; 51.2023), imagens vividas e metáforas (2.13; 4.30-31; 5.8; 22.28) e trocadilhos (28.15-16; 34.1518). A mensagem de Jeremias (aliança, metáfora do casamento) tem afinidades com a pre gação de Oséias. O ministério público de Jeremias lançou-o num redemoinho de conflitos. Gente de sua própria vila conspirou contra a vida dele (11.18-23). Apesar de Jeremias usar palavras benignas para falar do rei Josias (22.15-16), os outros reis de Judá receberam dele a censura mais severa (Jeoacaz [Salum], 22.10-12; Jeoaquim, 22.13-19; Joaquim [Jeconias], 22.24-30 e Zedequias, 34.1-7). O profeta também se indispôs com líderes religiosos (p. ex., profetas, Jr 23.9-40; 29.8-9, 21-23; Hananias [->], 28.1-17 e sacerdotes, 20.1-6). Suas confidências sobre seus conflitos in ternos com Deus (seguindo a concepção maximalista) encontram-se nos chamados “lamentos” ou “confissões” (p. ex., Jr 11.18— 12.6; 15.10-18; 20.7-12, 13-18). Em função destes, sabe-se mais sobre Jeremias do que sobre qualquer outro profeta. Apesar de serem voltadas principalmente para o julgamento, as mensagens de Jeremias também continham oráculos de salvação, reunidos no livro de Consolação (caps. 30— 31 [33]). Anunciou que, um dia, os exilados voltariam à terra num novo êxodo (31.12-14) e, mais impor tante ainda, proclamou a nova aliança de Javé (Jr 31.31-34). (-> Jeremias: Teologia de) 4. A estatura de Jeremias. Jeremias foi uma figura de grande importância na vida política, cultural, religiosa e até internacional de seu tempo, tendo sido comparado a Moisés e Samuel (Dt 18.15,18; Jr 1.4-10; cf. Holladay, JBL 83,1964,153-64). Alguns estudiosos acreditam que é a Jeremias que se referem os cânticos do servo em Isaías (Is 42.1 -4; 49.1 -6; 50.4-11; 52.13— 53.12). E possível que seu estereótipo seja o de profeta que chora (Jr 8.18,21; 9.1; 13.17), mas sua carreira de sofrimento e aparente derrota e uma história de coragem e heroísmo. Jeremias exerceu profunda influência na história. De acordo com uma estimativa, há dez referências diretas a seus escritos no NT. E de se entender que Jesus tenha sido interpre tado dentro da tradição profética de Jeremias (Mt 16.14). A passagem sobre a nova aliança (Jr 31.31-34) é repetida no livro de Hebreus (8.8-12; cf. 10.16-17). Na literatura, o termo “jeremiada” quer dizer “lamúria”. Escultores (p. ex., Donatello, no século XV) e pintores (p. ex., Rembrandt, “Jeremias lamentando a destruição de Jerusalém,” c. 1630) retrataram Jeremias na arte de maneira memorável. -> Jeremias: Teologia 746
Jeremias: Teologia de
B ib l io g r a f ia
S. H. Blank, Jeremiah: Man and Prophet, 1961; J. Bright, Jeremiah, AB, 1965; R. P. Carroll, From Chaos to Covenant: Prophecy in the Book o f Jeremiah, 1981; A. J. Heschel, The Prophets, 1962; W. Holladay, Jeremiah 1, Hermenéia, 1986; idem, Jeremiah 2, Hermenéia, 1989; J. P. Hyatt, “Introduction and Exegesis, Jeremiah”, in IB 5:775-1142; D. Jobling, “The Quest ofthe Historical Jeremiah: Hermeneutical Implications o f Recent Literature”, USQR 34, 1978, 3-12 (=Perdue and Kovacs (eds.), A Prophet to the Nations, 285-97); L. G. Perdue e B. W. Kovacs (eds.), A Prophet to the Nations: Essays in Jeremiah Studies, 1984; idem, “Jeremiah in Modem Research: Approaches and Issues”, in Perdue and Kovacs (eds.), A Prophet to the Nation, 1-32; T. Polk, The Prophetic Persona: Jeremiah and the Language o f the S e lf JSOTSup 32, 1984; H. G. Reventlow, Liturgie undprophetisches Ich bei Jeremiah, 1963; J. Skinner, Prophecy and Religion, Studies in the LifofJerem iah, 1922; J. A. Thompson, The Book o f Jeremiah, N1COT, 1980; A. C. Welch, Jeremiah. His Time and His Work, 1955. ElmerA. Martens Jeremias (Epístola de) -> Apócrifos
O livro de Jeremias, um dos três principais livros pro féticos, é um dos mais longos da Bíblia. Na teologia cristã, o livro é mais conhecido por seus ensinamentos sobre uma nova aliança, um tema cen tral do NT, e seu retrato do próprio Jeremias (->) como o “profeta que chora” e exemplo de vida de oração. Jeremias: Teologia de
A. Contexto Histórico O Livro de Jeremias abrange o longo ministério do profeta, desde seu chamado em 626 a. C., até o exílio do povo de Judá na Babilônia em 587 a. C. e além, chegando à libertação do rei exilado Joaquim e de sua prisão babilônia em 562 a. C. (Jeremias 52). Jeremias continuou seu trabalho depois da queda de Judá e é visto pela última vez no Egito, tendo acompanhado um grupo de refugiados judeus que se mudaram para lá (Jeremias 40— 44). Não se sabe como ou quando ele morreu. Assim, o período em questão é o último estádio da existência do reino de Judá. O reino do Sul estava sozinho desde 722 a. C. quando sua vizinha e irmã, Israel, havia sido conquista da pela Assíria, a grande potência da região naquela época. Assim, Judá era tudo o que havia restado do antigo império davídico e portadora das promessas feitas a Davi de um reino eter no (2Sm 7.12-17). O reino sobreviveu à pressão mais intensa da Assíria em 701 a. C. (2 Reis 18—20), apesar de ter sido condenado à condição de vassalo na maior parte do século seguinte, durante o reinado de Ezequias e Manassés. Este último, em particular, procurou desenvolver uma política “assíria” na religião oficial que adotou para o Estado. Tudo isso mudou com dois acontecimentos. Em primeiro lugar, ocorreu um enfraque cimento do poder assírio sobre a região no último quartel do século VII, e o grande império acabou sendo conquistado por uma nova potência, a Babilônia, em 612 a. C. Em segundo lu gar, o rei Josias de Judá realizou uma reforma religiosa iniciada em 628 a. C. (2Cr 34.3) e que chegou ao auge em 621 a. C. com a descoberta do “Livro da Lei” (provavelmente Deuteronô mio ou uma forma dele) durante reparos que estavam sendo realizados no templo (2Rs 22.8). A reforma girou em tomo de uma renovação da aliança (2Rs 23.1-3), que submetia o povo a um novo relacionamento com Javé e a um compromisso de deixar todos os outros deuses que 747
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haviam provado ser uma grande tentação para as gerações. Trata-se de dois acontecimentos inter-relacionados. A reforma também teve um aspecto político, uma vez que a declaração de posse de novos territórios feita por Josias (de acordo com a promessa da aliança; ver Deutero nômio) só pôde concretizar-se com o declínio da Assíria. No entanto, esse período de tranqüi lidade não durou muito tempo. Josias, a grande esperança de independência de Judá, foi morto numa batalha em 609 a. C., numa missão malfadada para impedir o Egito de apropriar-se de um território (2Rs 23.29; cf. o relato ligeiramente diferente em 2Cr 35.20-24). As disputas sub seqüentes pela região entre o Egito e a Babilônia resultaram em sujeição, primeiro do Egito e depois da Babilônia, até que os babilônios obtiveram uma vantagem decisiva em 605 a. C. (na batalha de Carquemis). A causa da reforma sumiu no esquecimento e tentativas esporádicas de reafirmar a independência resultaram apenas naquilo que, por pouco, havia sido evitado durante o domínio da Assíria um século antes — o fim do reino de Judá (2 Reis 25; Jeremias 52). Assim, Jeremias trata das mesmas questões históricas e teológicas enfrentadas nos li vros de Reis. No entanto, o livro de Jeremias difere destes outros por não dar nenhum espaço para a reforma de Josias, fazendo apenas uma menção elogiosa ao rei como uma exceção numa história nacional desanimadora (Jr 22.15-16). O profeta retrata apenas desprezo flagrante pela aliança por parte do povo e uma queda lenta, porém inexorável, que levaria à tragédia na for ma do avanço dos babilônios. Trata-se de algo extraordinário, tendo em vista o fato de que o chamado de Jeremias ocor reu durante o período da reforma, como podemos reconstituir pelos dados de Reis e Crônicas. Foram feitas várias tentativas de conciliarem-se essas duas conjunturas. Alguns acreditam que Jeremias aprovou a reforma e calou-se em relação a ela para ver o que aconteceria (Skinner). Essa solução já não recebe muito apoio, uma vez que a cronologia de Crônicas passou a ter uma aceitação mais ampla do que em tempos passados e, de acordo com esta, a reforma havia come çado antes de Jeremias iniciar suas pregações (Nicholson, Deuteronomy and Tradition, 7-13). Outra opção é a chamada baixa cronologia da vida e ministério de Jeremias, de acordo com a qual o início de seu trabalho ocorreu no tempo do rei Jeoaquim (609-597 a. C.), supondo-se que a impressão criada pelas datas é enganosa (Holladay). Outros estudiosos sugerem um tipo mais radical de resposta, de acordo com a qual o livro tem pouca relação com a história em si, sendo na verdade o produto de escritos deut. (Carroll) o que elimina essa dificuldade. A reconstituição histórica é particularmente importante para a teologia do livro. O que foi dito acima deixa claro que a tentativa de colocá-la em seu contexto histórico traz complica ções. Isso se deve em parte ao fato de o período ser extenso e de os acontecimentos ocorrerem numa seqüência rápida, mudando o cenário político e religioso de uma hora para a outra. Os estudiosos mostram-se divididos quanto à autoria do livro — se pode ser atribuído inteiramente ao próprio Jeremias ou se é produto de uma época posterior, com um núcleo maior ou menor de material autêntico de Jeremias. O critério clássico para distinguir entre a obra do próprio Jeremias e acréscimos posteriores costumava ser o contraste entre o discurso em forma poética ou de prosa (Duhm, Mowinkel). No entanto, esse critério deixou de ser considerado decisivo, tendo sido superado por duas tendências opostas, sendo que uma delas atribui menos conteú do do livro ao profeta (Carroll), enquanto a outra permite que tanto prosa quanto poesia sejam consideradas de autoria dele (Weippert, Holladay). A questão da redação do livro, portanto, também se encontra intimamente associada à da teologia. A concepção crítica predominante é de que o livro é produto de uma longa his tória de crescimento, atribuída informalmente ao movimento deuteronômico. Há evidências claras provenientes das tradições textuais divergentes do Texto Masorético hebraico (TM) e da Septuaginta grega (LXX) de que o material no livro foi moldado de acordo com os propósitos 748
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teológicos. O texto da LXX é consideravelmente mais curto e, como foi observado acima, apre senta diferenças importantes com relação ao TM no que se refere à seqüência do material (ver também Janzen, Stulman). Os estudiosos ainda não chegaram a uma conclusão satisfatória se a versão mais curta da LXX é mais antiga do que o TM ou não. Porém, as variações textuais, maiores aqui do que em qualquer outro livro do AT, mostram claramente que o processo do oráculo profético até a página impressa não foi simples nem uniforme. Podem ser interpretadas como evidências de expansão e revisão do texto, apesar de não se saber ao certo se isso conti nuou ocorrendo depois da vida e da influência do profeta. Também é impossível determinar-se até que ponto ele participou da produção das diferentes formas do texto. De qualquer modo, um estudo da teologia deve oferecer uma teoria sobre a relação do livro com a história. O que está em jogo é se se trata de um verdadeiro produto, até mesmo uma florescência final da profecia heb., ou se é, de fato, uma obra da teologia judaica posterior ao exílio. Se esse é um trabalho essencialmente de Jeremias, escrito logo depois da queda do reino, ainda resta saber por que difere de Reis em sua apresentação da história. Na realidade, veremos que há motivos teológicos para essa discrepância. B. Estrutura literária O livro pode ser dividido nas seguintes seções: Jeremias 1
a narrativa do chamado
Jeremias 2— 6
primeiros oráculos pedindo o arrependimento e anunciando o julgamento
Jeremias 7—20
transição para o julgamento inevitável: as orações de lamentação de Jeremias (“confissões”)
Jeremias 21— 24
Judá deve curvar-se sob o flagelo babilônio
Jeremias 25— 36
o exílio é inevitável, porém limitado; a salvação encontra-se mais adiante
Jeremias 37— 45
a queda de Judá e suas conseqüências
Jeremias 46— 51
oráculos contra as nações; a queda da Babilônia, Judá redimida
Jeremias 52
pós-escrito
C. Temas teológicos Os temas teológicos serão discutidos de acordo com as seções do livro, conforme o esboço apresentado na seção Estrutura Literária. 1. Jeremias 1: A narrativa do chamado. Apresenta os detalhes básicos da biografia de Jeremias, o qual pertence a uma linhagem de sacerdotes da cidade levítica de Anatote, próxima a Jerusalém. Essa seção ainda não contém discursos de Jeremias, mas traz um diálogo entre ele e Deus, que segue um padrão de chamado encontrado em outras partes do AT; nesse diálogo, o profeta protesta dizendo-se incapaz e Deus lhe garante que dará forças especiais a ele (cf. Moisés, Êxodo 4 e, com algumas diferenças, Isaías em Isaías 6). 2. Jeremias 2—6: Os primeiros oráculos pedindo arrependimento e anunciando o ju l gamento. Trata-se do primeiro conjunto de oráculos proferidos pelo profeta. São tipicamente desprovidos de datas, mas costuma-se crer que representam os primeiros oráculos, possivel 749
Jeremias: Teologia de
mente do tempo de Josias. Se esse é o caso, então colocam em dúvida a impressão transmitida pelos livros de Reis (se, de fato, era essa a intenção desses livros) de que Judá passou por uma reforma radical durante esse período. A ênfase aqui é sobre a apostasia contumaz do povo, que rompeu a aliança antiga, abandonando a fidelidade que costumava ter para com Javé no tempo do deserto (2.2-3). (Aqui, assim como em outros aspectos. Jeremias assemelha-se a Oséias, que foi um profeta do Norte mais de um século antes e que também retratou o período no de serto de modo idealizado, Os 2.14-15 [16-17]; contrastar, porém, com Ez 20.13). Seu pecado característico é a idolatria, a adoração ao deus cananeu Baal em suas várias formas (Jr 2.23, 28). Esse pecado capital é comunicado (também como em Oséias) por meio da metáfora da prostituição (2.20, 33). Nesse contexto, Deus procura prevalecer sobre Judá a fim de que ela se volte para Deus. O artifício retórico dentro dos padrões de um pleito judicial, empregado pelos profetas em ou tros textos (Os 4.1-3; Mq 6.1 -5; ver Huffmon), é usado para mostrar ao povo a negligência das obrigações pactuais deste, enquanto Deus havia sido inteiramente fiel às suas (Jr 2.4-13, 29). Também há apelos diretos ao povo para que se arrependa (3.12-14; 4.1-2). No entanto, podemse encontrar indicações de que tais apelos caíam em ouvidos moucos. O arrependimento na boca do povo (3.22b-25) não parece sincero (Polk); não diminui o fluxo de mais acusações e apelos (4.5-8, 14 e o contexto geral). Além disso, há uma visão de um retomo dos exilados, com nova obra da graça de Deus, antevendo a nova aliança do cap. 31 (3.15-18). Trataremos abaixo desse ponto. O tom predominante dessa seção é de julgamento. Jeremias 4— 6 está repleto de imagens do terror da invasão, da guerra e da derrota com suas conseqüências cruéis. A vividez dessas evocações é uma característica da profecia (4.13-17,29-31; 6.1-5). As visões são tão nítidas e o profeta identifica-se a tal ponto com o sofrimento de seu povo que o próprio Jeremias sente a dor desses acontecimentos. Há uma sensação de inevitabilidade quanto ao julgamento vindouro e a seção se encerra com a indicação de que toda disciplina é inútil (6.29). Portanto, essa seção apresenta vários temas que serão desenvolvidos posteriormente no livro. O que predomina é o julgamento, mas há vislumbres de esperança mais adiante (5.10-11 sugere a idéia de um remanescente). É anunciado também o papel principal do próprio Jere mias em suas profecias. 3. Jeremias 7—20: transição para o julgamento inevitável, as orações de lamentaçã de Jeremias ("confissões ”). Essa seção traz algumas das principais transposições e aconteci mentos do livro. Fomece mais dados para a reconstrução dos episódios, pois traz uma narrativa em terceira pessoa sobre a vida do profeta, bem como uma revelação de sua existência interior. Em termos estilísticos, apresenta uma mistura de prosa e discurso poético tão característica de Jeremias, mas que não estava presente na seção anterior. A passagem de abertura é o chamado “sermão do templo” (7.1-15). O texto não for nece uma data, mas se esse é outro relato de um acontecimento já registrado em 26.1-6, como se acredita ser o caso, é possível datar o texto do início do reinado de Jeoaquim, ou seja, 609 a. C. O sermão oferece ao povo uma escolha: obedecer aos mandamentos de Deus e assim, continuar desfrutando das bênçãos da terra e prosperidade, ou continuar simplesmente man tendo as aparências em rituais vazios e, dessa forma, perder tudo (7.3-7). A força da mensagem encontra-se em seu questionamento da convicção de que a essência da religião consiste em guardar as festas antigas de Israel e Judá (trata-se, supostamente, de uma dessas ocasiões) e manter as liturgias do templo. E possível que essa convicção fosse legado de uma assimilação da promessa à dinastia davídica (“para sempre”, 2Sm 7.13) às idéias da mitologia cananéia, que mesmo em condições ideais não eram muito diferentes do simbolismo do Templo e do culto. 750
Jeremias: Teologia de
A menção perspicaz ao destino de Siló (onde no passado havia existido um templo de algum tipo para a adoração de Javé [ISm 3.3], mas que desapareceu), provavelmente destruída pelos filisteus, mostra que não se podem fazer tais suposições sobre Deus. A reação violenta a essa mensagem (registrada em Jr 26.8-11) comprova como foi severa ao povo e também mostra a coragem de Jeremias ao transmiti-la. Não há dúvidas que, da parte de Jeremias, o objetivo desse sermão era levar o povo de volta para Deus. Porém, na forma atual do livro, o sermão parece ocupar um lugar importante e ter uma função programática. (Essa impressão é reforçada pelo fato de essa mensagem ser usada novamente mais adiante no livro e de também aparecer próxima ao início de uma seção.) De maneira típica da aliança, é colocada uma escolha diante do povo (Dt 11.26-28). No entanto, o contexto também indica que se trata de uma parte da história que, pelo menos inicialmente, não tem como obter um resultado positivo. Isso porque, logo depois da narrativa sobre o sermão, Jeremias recebe a ordem de não orar pelo povo (Jr 7.16). É o primeiro caso de uma proibição desse tipo nessa seção do livro (ver também Jr 11.14; 14.11; 15.1; implícito). No contexto da mediação da aliança, a intercessão é uma das funções do profeta (a própria passagem de Jr 15.1 é um texto clássico dessa prática, uma vez que Moisés e Samuel são invocados aqui como intercessores por excelência; cf. Êx 32.11-14; ISm 12.23; SI 99.6; ver porém, Gn 20.7; também Wilson, esp. 161-66 e Muilenburg). Essa proibição, portanto, tem um caráter extremamente ominoso para o povo e a relevância do tema nesse ponto do livro é um forte indício de que o problema a ser tratado é como entender o julgamento e não como este pode ser evitado. A tendência geral desses capítulos é mostrar que o julgamento está, de fato, a caminho. Isso é feito por meio de vários recursos redacionais. Um exemplo que chama a atenção é a jus taposição de duas narrativas sobre o oleiro (Jr 18.1-11; 19.1-15), sendo que a primeira parece deixar em aberto a possibilidade de arrependimento, enquanto a última exclui completamente essa possibilidade (McConville, 52-53). O movimento redacional no sentido de acabar com todas as esperanças de se evitar o julgamento corresponde a sinais ao longo do livro de que se trata de um resultado inevitável para Judá em função da infidelidade crônica do povo dali. O povo mostrou de modo persisten te falta de vontade ou incapacidade para guardar a aliança. O povo estava perdidamente cor rompido. A falsidade prevalece sobre a “verdade” que deveria ser o padrão da vida na aliança (Jr 8.22—9.7; ver Overholt). A necessidade de disciplinar ou “acrisolar” o povo é retomada do final da primeira seção principal (9.7; cf. 6.29), mas agora, devido a questões contextuais, parece significar que o castigo severo é iminente. Em paralelo com essa tendência em Jeremias 7—20, pode-se ver outra característica ex tremamente significativa dessa seção, a saber, as orações de Jeremias, chamadas pelos estudio sos de “confissões”. São elas: Jeremias 11.18-23; 12.1-6; 15.10-14,15-21; 17.14-18; 18.18-23; 20.7-13, 14-18. Têm em comum não apenas o fato de serem orações do profeta, mas também de conterem um certo elemento de protesto pessoal (p. ex., 15.18). Os motivos para isso ficam claros nas orações em 11.18-23 e 18.18-23, em que se faz menção a conspirações para tirar a vida do profeta, instigadas por ninguém menos do que o povo da própria cidade dele (cf. Lc 4.24). Nesse sentido, pode-se perceber que os relatos da vida exterior e interior do profeta se entremeiam. As orações são semelhantes a certos salmos, a saber, aqueles conhecidos como “lamentos individuais”; têm em comum com eles não apenas os elementos formais de protesto, a súplica por vindicação e, em alguns casos, reafirmação (Jr 11.21 -23; 15.19-21), mas também as supostas circunstâncias de alguns dos lamentos, a saber, a opressão causada por inimigos pessoais (Salmo 3; para um relato do “Lamento”, ver J. Day, 19-38). 751
Jeremias: Teologia de
As “confissões” desenvolvem a característica da profecia de Jeremias que observamos em 4.19 (cf. 10.19), isto é, a sensibilidade do profeta em relação às conseqüências de sua men sagem. No entanto, aqui são introduzidos elementos novos. Acreditava-se que as “confissões” fossem simplesmente orações particulares do profeta, percepções da vida interior de um homem profundamente religioso (Skinner). Tomou-se claro, porém, que havia algum tipo de relação entre essas confíções e as experiências do povo de Judá como um todo. No extremo oposto à idéia de que eram orações particulares, acreditava-se que não passassem de formas litúrgicas, salmos de lamento no sentido pleno dessa designação, considerados aqui como declarações do povo mediadas pelo profeta e sem nenhuma relação com a experiência pessoal deste último (Reventlow). A verdade encontra-se entre esses dois pontos de vista. Ao observar a presença de características de lamento, Baumgartner insistiu, ainda assim, que essas orações eram, de fato, do profeta, mas, ao fazê-lo, não explicou devidamente a função pública delas. A com preensão mais satisfatória é aquela que dá espaço para a individualidade desses poemas como sendo provenientes da experiência do profeta, articulando porém, num certo sentido, a situa ção do povo como um todo (Polk, McConville). Essa concepção procura fazer justiça tanto ao contexto “pessoal” que o livro oferece e pressupõe para os poemas quanto à função “pública” que possuem em virtude de sua condição de contexto canônicos. As “confissões” sugerem uma certa função representativa do profeta. A ameaça à vida, que ele começa a experimentar como um tipo de morte (Jr 20.14-18), é paralela à ameaça à existência de Judá. E, no entanto, essa morte tem uma contraposição na promessa de livra mento e vida, uma palavra de graça que responde ao julgamento que se apoderou do profeta, ainda que ele próprio fosse inocente. Uma passagem que ilustra essa idéia (15.19-21) tem um paralelo direto na palavra a Judá em 31.18-20. É como se o próprio Jeremias se tomasse, jus tamente na vida e ministério que deve desenvolver como profeta, uma personificação da graça suprema de Deus para com seu povo, mesmo enquanto o povo sofre o julgamento executado por Javé. Nesse sentido, Jeremias mostra uma forte semelhança com a figura do Servo Sofre dor de Isaías 53 (Goldingay). O papel representativo do profeta nâo se limita, porém, a representar o povo em so frimento; também possui um aspecto de “encarnação”. Por vezes, a aflição do profeta parece refletir o sofrimento do próprio Deus. Em Jeremias 8.22— 9.3, o pranto do profeta e dc Deus se confundem; a oração “diz o Senhor” (9.3; cf. v. 6) causa surpresa e indica que, em seu so frimento, Jeremias está transmitindo algo do desejo de Deus para o seu povo. Também há uma analogia entre o abandono de Jeremias por sua “casa”, ou seja, sua família (11.21-23; 12.6), e Deus rejeitando sua “casa”, a saber, Judá. Essa dor de Deus, refletida no padecimento do pro feta, também pode ser vista em Oséias, que precisou suportar a infidelidade da esposa a fim de retratar a infidelidade de Israel (ver Os 11.8-9, para a tristeza de Deus). Desse modo, a profecia bíblica começa a dar testemunho da cruz (Mauser). 4. Jeremias 21—24: Judá deve curvar-se sob o flagelo babilônio. Essa pequena seçã encontra-se, de modo apropriado, no centro da profecia, pois começa a articular a resposta para o problema que foi apresentado. É derivada do final do ministério de Jeremias, durante o reinado de Zedequias (597-587 a. C.), pouco antes do exílio. Uma vez que ainda há materiais de períodos anteriores a serem vistos, essa seção ilustra claramente a natureza temática da or ganização das diversas partes do livro. E ladeada por duas passagens que registram palavras de Jeremias ao rei (Jr 21.3-10; 24). O que está em questão não é o arrependimento, que a essa altura deixou de ser uma possi bilidade. Nesse sentido, esses caps. seguem de forma bastante adequada a seção anterior, que nos preparou de várias maneiras sutis, para o caráter inevitável do julgamento. A questão agora 752
Jeremias: Teologia de
é se Judá aceitará com humildade o castigo que Deus lhe impõe. A imagem de Deus voltado contra seu próprio povo, numa inversão dos temas do “guerreiro divino” e da “guerra santa”, é profundamente lúgubre (21.5). E, no entanto, também nisto há uma mensagem positiva, não apenas na implicação, encontrada até mesmo na palavra de julgamento, de que tudo se encon tra dentro dos propósitos de Deus, mas de maneira explícita, na proclamação de um recomeço depois do julgamento (24.7), mais uma prefiguração, agora inequívoca da nova aliança. Os caps. aqui interpostos sepultam de uma vez por todas a monarquia histórica de Davi (Jeremias 22), mas prosseguem com a promessa de um novo rei que governará com justiça e levará a salvação a Judá (23.5) — uma observação messiânica que acompanha o movimento em direção a uma nova teologia da aliança. É nessa passagem que o tema da falsa profecia é tratado pela primeira vez em maior profundidade. A relação entre esse tema e aquele do con trole de Deus sobre a história nos acontecimentos do presente aparecerá com maior força na seção seguinte. 5. Jeremias 25—36: o exílio é inevitável, porém limitado, a salvação encontra-se m adiante (Livro da Consolação e nova aliança [30—33]). O núcleo da seção seguinte é o chamado Livro da Consolação (Jeremias 30— 33) que, por sua vez, tem como ponto central a promessa de uma nova aliança (Jr 31.31 -34). Essa seção, portanto, retoma a promessa feita anteriormen te em 24.7, que falou de esperança em meio ao desespero. Assim, é apropriado que essa seção comece com uma passagem que mostra como o papel de agente da Babilônia no castigo de outras nações, inclusive Judá, resultará na destruição do destruidor. A história de julgamento tem uma lógica e um fim. Depois de setenta anos, a Babilônia será castigada e o sofrimento de Judá terminará (25.11 -14). A importância dessa mensagem nesse estádio da profecia é ressaltada ainda mais na LXX que, a essa altura, manifesta a maior de todas as suas diferenças em relação ao TM ao incluir aqui (imediatamente depois de Jr 25.13 no TM e nas versões em português) o bloco extenso de “oráculos contra as nações” que encontramos em Jeremias 46— 51. Esse segmento chega ao auge com palavras marcantes de julgamento sobre a Babilônia. A urgência dessa mensagem fica clara quando considerada sob o ponto de vista do exí lio. Era preciso mostrar como um longo exílio podia ser coerente com a bondade de Deus para com o seu povo. É possível que a mensagem oposta também tivesse parecido deveras atraente, ou seja, que na realidade a babilônia não prevaleceria e que o povo de Deus seria aliviado da condenação. Essa era a idéia defendida por alguns que aparecem em Jeremias como “falsos profetas”. A principal elaboração desse tema ocorre nessa seção, em decorrência da confronta ção de Jeremias com Hananias (Jeremias 28). Essa passagem mostra reflexos de uma contenda verdadeira e talvez até severa dessa questão em Judá. Assim, esta seção tem como tema principal uma inversão da sorte que ocorrerá tanto na vida de Judá quanto da Babilônia e que explica de todo a ira de Deus contra as transgressões de seu povo. O livro de Jeremias deseja mostrar o motivo do exílio dentro do contexto da aliança de Deus com Judá. O resultado final é parte dessa explicação. O exílio tem um limite e Deus, por fim, salvará seu povo. Enquanto isso, Deus não se esquece do povo. A carta de Jeremias aos exilados (Jr 29.4-28) mostra que o banimento deles para uma terra estrangeira continua fazendo parte dos propósitos de Deus para eles d (vv. 10-14). Existe até mesmo uma indicação de que os exilados podem levar bênção para a cidade de seus captores por estarem esses exila dos ali presentes com suas orações (29.7) — o que talvez possobilitasse o desenvolvimento de uma teologia sobre a “cidade” ou o mundo incrédulo e a responsabilidade dos crentes nisso. Um movimento pronunciado em direção à salvação pode ser observado na primeira aparição de uma oração que normalmente é traduzida como “mudar a sorte” (v. 14) e que se repetirá várias vezes no Livro da Consolação a seguir. 753
Jeremias: Teologia de
O Livro da Consolação (Jeremias 30—33) propriamente dito é uma compilação de orá culos que mostram pela sua organização que o julgamento dá lugar à salvação (p. ex., 30.4-7, seguido de 30.8-11). Coloca em primeiro plano uma porção de temas introduzidos anterior mente. Um tema predominante é a “mudança da sorte”, a idéia apresentada em 29.14. Porém, encontramos aqui promessas de restauração para Sião, o sacerdote e o rei (30.9, 18, 21; 31.14; 33.14-26). A restauração refere-se principalmente à aliança. A nova aliança (31.31-34) pode ser considerada uma aliança renovada, uma idéia que faz parte do próprio conceito de aliança (cf. Js 24; 2Rs 22.1 -3). Nesse sentido, é coerente com o passado. A nova aliança será realizada com toda a casa de Israel, ou seja, com os dois reinos. E sem dúvida o profeta tem em mente a forma física de Jerusalém quando lhe retrata o futuro (Jr 31.38-40; também 32.1-15, que eqüi vale a uma promessa de que, no devido tempo, a vida normal em Judá será retomada, apesar de todas as probabilidades contrárias). No entanto, parece haver algo novo e mais profundo subentendido nessas palavras. O cerne da afirmação é que a lei (a Torá) será escrita no coração do povo de Deus, para que ninguém precise de um mestre, pois todos terão conhecimento e disposição (vv. 33-34). Isso levará à reconstituição da aliança e a um perdão conclusivo do pecado. Assim, a nova alian ça é um modo de resolver o problema fundamental identificado em partes anteriores do livro (e em outras passagens do AT), a saber a falta de fidelidade do povo da aliança. Soluciona o problema ao anunciar uma nova iniciativa de Deus de tomar efetiva a obediência do povo. Esse é o milagre que leva Deus a asseverar (na forma de uma pergunta retórica prenunciada pela declaração de Jeremias) que nada é difícil demais para ele (32.27; cf. v. 17), o que pode, justificadamente, ser considerada a afirmação teológica central do livro. A questão talvez dê a impressão de apresentar um problema de causação: Deus passa por cima do livre arbítrio? A questão aparece novamente em 32.39-40. O texto não dá nenhuma resposta filosófica e, no entanto, fica claro que o AT não pretende, de modo algum, acabar com o livre arbítrio. Em ter mos bíblicos, a questão mais importante se refere à natureza e ao tempo da ação de Deus, que o NT identifica com a vinda de Cristo. (Ver mais abaixo — contexto canônico.) Enquanto o Livro da Consolação ocupa uma posição central nesta seção, há outros ma teriais contidos nele que ressaltam o quanto o povo resiste à salvação e, assim, toma necessá ria uma nova iniciativa de Deus. O segundo relato do sermão do templo (Jr 26.1-6), com seu retrato da ira contra a mensagem profética, aparece no começo da seção. Além disso, o relato tem um correlativo, no encerramento da seção, na famosa passagem em que o rei Jeoaquim destrói sistematicamente o rolo contendo as palavras proferidas por Jeremias até então (Jere mias 36). Esse relato é, a propósito, uma reação oposta à recepção penitente do “Livro da Lei” pelo piedoso rei Josias (2 Reis 22—23). É reforçada a mensagem de que o futuro de Judá não pode encontrar-se nas presentes organizações religiosas e políticas. 6. Jeremias 3 7—45: A queda de Judá e suas conseqüências. Essa seção serve de ence ramento para a narrativa do livro, relatando as confrontações finais entre o profeta e o rei (Jr 37.17-21; 38.14-28; cf. 21.3-7), a queda da cidade e suas conseqüências. Nessa seção, o papel de Jeremias como profeta sofredor toma forma em sua prisão, que de uma maneira curiosa, parece espelhar a situação da Judá sitiada (37.20-21; 38.28; cf. 32.2). Somente a queda da ci dade leva à soltura do profeta. Quando ele próprio é deixado em Judá com aqueles que não são levados à Babilônia, a insistência dele de que Judá deve curvar-se sob o castigo da Babilônia se adapta à nova situação. O remanescente em Judá deve permanecer na terra, sob o governo nominal de Gedalias, na verdade sob jurisdição babilônia (42.10-22). Quando o povo se recusa a ouvir esse último apelo, as palavras finais de Jeremias — agora no Egito — são apenas uma 754
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confirmação de sua mensagem até aquele momento (cap. 44), sendo que apenas Baruque, servo de Jeremias, é aliviado das sentenças mencionadas no cap. precedente (cap. 45). 7. Jeremias 46—51: oráculos contra as nações; a queda da babilônia, Judá redimi da. Os “oráculos contra as nações” já foram mencionados acima (pois se encontram depois de 25.13 na LXX). No TM, ocupam essa posição culminante, permitindo que o livro termine com um tom positivo de salvação. Jeremias foi designado “profeta às nações” (Jr 1.5). Agora ele traz palavras de julgamento especificamente contra elas. (Para os oráculos como adapta ções da linguagem tradicional de guerra santa, ver Christensen.) Para algumas dessas nações, porém, há palavras extraordinárias de salvação que vão além do julgamento (Moabe, 48.47; Amom, 49.6; Elão, 49.39), ecoando palavras dadas a Judá no Livro da Consolação (Jr 30.3, etc.). (A autenticidade dessas palavras foi questionada, pois elas não se encontram na LXX, mas as provas contra elas não são irrefutáveis; McConville, 144-45.) No entanto, tais promes sas não se estendem à Babilônia, que é finalmente condenada (caps. 50— 51). Trata-se de uma enorme inversão, na qual Deus aparece como “Redentor” de Judá (50.34). E revelada, por fim, toda a lógica dos propósitos de Deus para Judá. Há esperança depois do julgamento e a correção de muitos erros. 8. Jeremias 52: Pós-escrito. Esse cap. apresenta grande semelhança com o último cap. de 2 Reis, relatando novamente a queda de Jerusalém. E possível que a repetição da história nessa seção tenha por objetivo registrar a libertação de Joaquim do cativeiro (vv. 31 -34). Levando-se em consideração 22.30, dificilmente, trata-se de uma indicação de que a salvação encontra-se na restauração da monarquia. E, no entanto, pode haver uma sugestão de que os ventos mudaram de direção e que os grandes propósitos de Deus para o seu povo estão prestes a se cumprir. D. Temas característicos O livro de Jeremias é um dos pontos culminantes daquilo que pode ser chamado de pro fecia clássica. Possui características presentes em outros livros proféticos, mas com aspectos distintos. Em reconhecimento a essas diferenças, por vezes, é colocado dentro de uma tradição profética particular do AT associada aos profetas do Norte (Elias, Samuel, Oséias) e dentro da mesma linha de outras literaturas consideradas oriundas do Norte (Deuteronômio, “ E”; ver Wilson). O elemento em comum mais importante dessa genealogia profética é a aliança, que alguns consideram um elemento de distinção do Norte, em contraste com a preferência demons trada pelo Sul por metáforas do templo e visões (Petersen). No entanto, essa idéia de distinção é equivocada, uma vez que a antítese entre aliança/palavra (“do Norte”) e templo/visão (“do Sul”) não é, de maneira alguma, definida (ver mais em McConville, 163-71). Na realidade, Jeremias encontra-se dentro de uma ampla tradição profética que defende a religião antiga da aliança em Israel, religião esta que foi desafiada e enfraquecida durante gerações pelo culto a Baal. Esse culto fora promovido e apoiado pelas monarquias em suas aberrações do javeísmo e na inclinação que tinham para uma religião estatal dentro dos modelos cananeus. Foi nesse contexto que, assim como outros profetas, Jeremias pregou que reis, sacer dotes, profetas (!) e o povo deveriam abandonar a lealdade a outros deuses ou então sofrer a ira de Deus, reconhecida como a execução das maldições da aliança. Assim como o primeiro estádio de desenvolvimento da profecia ocorreu aproximadamente na época da queda do reino do Norte, a profecia de Jeremias pode ser considerada um segundo estádio de desenvolvimen to, por volta da época do exílio na Babilônia. Isso reflete a teologia profética de que Deus, que está no controle de toda a história e de todas as potências humanas, traz nações fortes para jul gar seu povo (cf. Is 10.5-12). Jeremias mostra esse fato em mais detalhes no caso do exílio na Babilônia, concentrando-se na necessidade do castigo e, ao mesmo tempo, na intenção de Deus 755
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de fazer o melhor pelo seu povo, agindo verdadeiramente com justiça dentro de um plano mais abrangente (daí as palavras sobre os setenta anos de exílio e a derrota final da Babilônia). 1. A aliança. A teologia subjacente da aliança é desenvolvida de modo considerável e Jeremias. Tem em comum com Amós, uma relação com a forma abraâmica de aliança. Amós havia lançado mão desta para dar ênfase ao tema das obrigações específicas do povo da aliança (Am 3.2; cf. Gn 18.19) e parecia saber também das implicação que continha com referência à bênção de outras nações (Am 9.7, 12). Jeremias também faz alusão a essa bênção das nações e considera-a vinculada à obrigação de Judá de guardar a aliança (Jr 4.1-2). A sugestão de restauração para Moabe, Amom e Elão também pode ser vista dentro desse contexto. Existe, portanto, em Jeremias, uma teologia de aliança que vai alem da convicção do amor de Deus somente por Judá (Israel), mesmo que essa teologia das nações não se mostre tão desenvolvi da quanto em Isaías 40— 55. É possível que se trate de um reflexo da consciência de que toda a criação pertence a Deus e de que a obediência de Judá à aliança ocorre dentro do cenário de toda a ordem criada, sendo que as duas coisas encontram-se intimamente relacionadas (Jr4.2328; as repercussões de Gênesis 1 nessa passagem são evidentes). O desenvolvimento mais importante da aliança consiste, evidentemente, na nova alian ça. E, no entanto, também nisso Jeremias não é de todo inovador. A transição do julgamento de Deus sobre seu povo da aliança para um novo ato de salvação é, na verdade, típica dos livros proféticos. Por certo há várias explicações possíveis para isso. Aliás, uma opinião fortemente representada nos meios acadêmicos críticos é de que os profetas eram, na realidade, mensageiros apenas do julgamento, sendo que essas notas de esperança foram inseridas durante ou depois do exílio por redatores que desejavam apresentar a esperança de restauração. A estrutura de promessas de julgamento, porém, pode ser atribuída aos próprios profetas. As analogias mais próximas que temos com as transições observadas em Jeremias podem ser vistas em Oséias, cuja vida e ministério abrangeram um tempo e acontecimentos semelhantes em caráter aos de Jeremias e que parece ter passado pelas fases de pregação do arrependimento e proclamação do julgamento, chegando às esperanças de restauração, encontradas em um novo ato de Deus (Os 14.1 -4; ver Davies para um relato das transições em Oséias). Sem dúvida, apesar de as pro messas de Oséias não usarem esses termos, referem-se a uma “nova aliança”. O mesmo pode ser dito de Amós, Isaías e Ezequiel e até mesmo de Deuteronômio (Deuteronômio 30). Jeremias, porém, trouxe à baila a questão da relação entre a aliança mosaica e a nova obra que Deus faria depois do julgamento. O profeta levou à reflexão sobre o relacionamento entre a dimensão exterior e corporativa da aliança (as casas de Israel e Judá) e a realidade in terior dessa mesma aliança (a lei escrita no coração). Sua resposta não é a piedade “individu alista” considerada por vezes (e de modo típico no passado) resultado de sua força espiritual, devido parcialmente à qualidade de sua vida de oração (p. ex., Skinner). Isso porque a dimen são histórica e corporativa não é abolida pelo chamado à obediência radical. Na verdade, a nova aliança deve ser vista, em parte, como uma resposta para o problema de uma sociedade desintegrada. O tema da organização humana é de importância considerável na proclamação de Jeremias. O retrato de uma sociedade corrupta dentro da qual não existe mais confiança alguma (Jr 8.22— 9.9) também é uma análise incômoda do mundo de hoje. Há ima gens permanentes de profetas, sacerdotes e reis que faltaram com as obrigações que lhes foram determinadas por Deus. Além disso, é apresentada uma compreensão mais profunda da política corporativa com sua estratificação, instabilidade e irracionalidade arriscada (cap. 26). Jeremias também refletiu sobre a idéia da permanência da aliança. Esse elemento da promessa feita a Davi (2Sm 7.13) tomou-se uma das questões difíceis levantadas com o exílio (expressadas com extrema perplexidade no Salmo 89). Jeremias trata dessa questão diretamente 756
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no sermão do templo (Jr 7.1 -15; 26.1 -6), no qual insiste que a promessa não pode ser conside rada garantida. E, no entanto, volta a afirmar a permanência dela, em 33.14-26 (uma passagem que não se encontra na LXX e que, em parte por esse motivo, é considerada secundária). Essa passagem não se harmoniza com o sermão do templo, no qual é depreciada a idéia de mera permanência. Apesar disso, as duas passagens podem ter coesão por meio da teologia da nova aliança, que soluciona o problema da incapacidade do povo de ser fiel. Uma vez resolvida essa questão, o caminho fica aberto para a reafirmação das promessas da aliança. 2. O papel do profeta. Oséias já havia mostrado que a vida e as experiências do profe ta estão intimamente ligadas à mensagem profética. Porém, é em Jeremias que essa tendência chega ao auge. Como vimos anteriormente, a sondagem da vida interior do profeta exerce uma função dentro das proclamações. Isso porque o envolvimento do profeta com sua mensagem é uma sugestão do envolvimento de Deus com a história do mundo que ele criou. Mauser mostrou-se correto ao traçar uma linha da teologia de “encarnação” que parte de Oséias, passando por Jeremias e chegando em Jesus. Assim, a profecia não é apenas uma questão de palavras dadas e proferidas, mas sim, de se viver uma mensagem. A verdade é vivida em sua essência. As “confissões” de Jeremias, bem como sua experiência de ostracismo, prisão, solidão (é proi bido de casar-se, 16.2) e a ameaça real de morte (cf. Jeremias 26, em que Urias, outro profeta fiel, acaba fazendo o sacrifício supremo) são, portanto, uma revelação e promessa da cruz de Cristo. Desse modo, a cruz tem um lugar nos relacionamentos entre Deus e os homens antes de Cristo manifestá-la por meio de um ato doloroso e definitivo de reconciliação. Justamente por isso, sem falar no seu propósito de expiação, a cruz é considerada uma caracterização da vida de fé e testemunho para um mundo incrédulo e desdenhoso. 3. O Messias (e a nova aliança). A própria vida do profeta apresenta uma linha da teo logia messiânica, mas o livro, com sua reflexão sobre Davi, também contribui para a teologia messiânica do AT. A crítica inflexível do livro à dinastia histórica de Davi mostra sem sombra de dúvida que não vê esperança alguma para a salvação numa restauração política (Jr 22.30). Nesse sentido, o livro é mais explícito em sua rejeição aos reis do que sua obra contemporâ nea, o livro de Reis. É mais surpreendente, portanto, que se volta para a linguagem e imagens do reinado davídico a fim de expressar esperança para o futuro (Jr 23.5-6; 30.9; 33.15-22; é interessante como, em 23.5-6; 33.15-16, o nome dado ao rei, yhwh sidqênú é estranhamente parecido com o nome Zedequias — talvez num toque de ironia). Assim, a esperança de um Messias davídico é apresentada, mas também adiada (“Eis que vêm dias”, Jr 23.5) e, tendo em vista 22.30, dificilmente pode-se dizer que ela se cumpriu na libertação de Joaquim do cativeiro. Antes, a esperança messiânica de Jeremias está associada à esperança da nova aliança. Outros livros proféticos adotam temas davídicos para expressar a esperança de salvação futura (Is 9.6-7 [5-6]; Ez 34.23-24). Mas enquanto o livro de Isaías contribui de modo acentu ado para o retrato de Jesus como Servo, é Jeremias quem se encontra por trás da proclamação feita pelo Senhor da nova aliança em sua própria obra (Lc 22.20; 1Co 11.25). Tanto Paulo (2Co 3.6) quanto o escritor da carta aos hebreus (Hb 8.8-13; 10.16-17) retomam a idéia de uma nova aliança para explicar o significado do ministério de Cristo. Em Hebreus, diz-se que ela se cum priu na obra de Cristo, cujo sangue é o sangue da nova aliança (Lc 22.20; ou seja, ele é o sacri fício pelo qual essa aliança é ratificada e colocada em vigor; cf. Ex 24.6-7) e, como mediador da nova aliança, ele supera de modo incomparável tudo o que Moisés havia feito. É evidente que os ensinamentos do NT vão além de Jeremias, adotando uma aborda gem sintética da interpretação do AT, sendo um exemplo importante disso a assimilação dos temas de Páscoa àqueles da nova aliança. E, no entanto, como vimos, Jeremias não deixa de apresentar sua teologia da cruz. 757
Jeremias: Teologia de
E. Contexto canônico A relevância de Jeremias no contexto canônico mais amplo já foi, em sua maior parte, delineada nas reflexões anteriores. Consiste essencialmente na teologia de uma nova aliança e nos recursos que fornece para o messianismo e para uma teologia da cruz. O cumprimento da nova aliança em Cristo é, por fim, a resposta do NT ao paradoxo apresentado pela insis tência de Jeremias na permanência da aliança apesar da incapacidade comprovada do povo de manter-se fiel a ela. O Livro da Consolação de Jeremias havia ventilado esse problema e mos trado que, de algum modo, Deus tomaria sobre si a responsabilidade de solucioná-lo. Quando essa promessa é considerada à luz do NT, fica claro que a resposta encontra-se na teologia da expiação, na qual Cristo, por meio de sua vida e morte, cumpre todos os requisitos da aliança e traz seu povo para junto de si em sua própria vida com Deus. Assim, a nova aliança representa um nítido desafio à interpretação cristã do AT, a sa ber, se fecha as portas para algum outro meio de salvação para o judeu. Abordagens diferentes dessa questão foram apresentadas por R. Rendtorff e H. W. WolfT, sendo que cada um deles escreveu um ensaio com o título “What is New in the New Covenant?” [O que há de novo na Nova Aliança?] O objetivo desses dois textos era contribuir para o diálogo entre judeus e cris tãos, mas cada um deles partiu de um ponto de vista diferente. Tanto em seu ensaio quanto na obra em que ele aparece (Canon and Theology), Rendtorff afasta-se da visão cristã tradicional e histórico-salvífica do AT, enquanto WolfT segue uma linha cristã mais tradicional, conside rando a vida de Cristo como o fator decisivo para o cumprimento da promessa de perdão feita nas profecias e expressando a esperança de que os judeus possam encontrar o cumprimento dessas profecias além da Torá. Se isso não acontecer, para ele a possibilidade de reconciliação entre judeus e cristãos encontrar-se-á mais em termos éticos do que doutrinários. A diferença entre WolfTe Rendtorff ilustra o desafio que é para a teologia cristã articular uma confissão de Cristo dentro de uma sociedade de múltiplas religiões. Uma forma relacionada do mesmo problema é o cumprimento da nova aliança em Cristo, ainda que se aplique originalmente a uma restauração histórica e política de Judá, à custa de outras nações, especialmente da Babilônia. O NT retrata a nova aliança como um instrumen to para a reconciliação de todo o mundo com Deus num relacionamento que é, antes de mais nada, espiritual e que não possui fronteiras nacionais. Quanto a isso, deve-se reconhecer que a visão de Jeremias era limitada. Interpretações do livro que procuram profecias “judaicas” políticas que ainda estão para se cumprir (a restauração dos judeus à Palestina, a reconstrução do templo e a reinstituição do sacerdócio [Jr 30.9; 31.12; 33.14-26]) também devem fazê-lo dentro do contexto da exegese do NT. Jeremias deve ser lido em conjunto com as profecias de Isaías sobre o Servo que seria “luz para os gentios” em cuja “aliança com o povo” aparen temente estariam incluídas outras nações além de Judá (Is 42.6) e, de fato, se estenderia “às extremidades da terra” (Is 42.10-13). B ib l io g r a f ia
Comentários: R. P. Carrol, Jeremiah, 1986; P. C. Craigie, P. H. Kelley e J. F. Drinkard, Jeremiah 1-25, 1991; B. Duhm, Jeremia, 1901; W. L. Holladay, Jeremiah II, 1986, 1989; D. R. Jones, Jeremiah, 1992; J. A. Thompson, Jeremiah, 1968. Outros: W. Baumgartner, Jeremiah s Poems o f Lament, ET 1988; J. Blenkinsopp, A History o f Prophecy in Israel, 1983; J. Bright, “The Date o f the Prose Sermons in Jeremiah”, JBL 70, 1951,15-35; D. L. Christensen, Transformations o f the War-Oracle in Old Testament Prophecy, 1975; G. I. Davies, Hosea, 1993; J. Day, Psalms, 1992; A. R. Diamond, The Confessions o f Jeremiah in Context, 1987; J. Goldingay, G ods Prophet, G ods Servant, 1984; H. B. Huffmon, 758
Jericó
“The Covenant Lawsuit in the Prophets”, JBL 7 8 ,1959,285-95; N. Ittmann, Die Konfessionen Jeremias, 1981; J. G. Janzen, Studies in the Text o f Jeremiah, 1973; U. Mauser, Gottesbild un Menschwerdung, 1971; J. G. McConville, Judgment andPromise: An lnterpretation o f the Book o f Jeremiah, 1993;G. E. Mendenhall, Law and Covenant in the Ancient Near East, 1955; idem, “Covenant”, in ABD 1 ,1992,1179-1202; S. Mowinckel, Zur Komposition des Buches Jeremia, 1914; J. Muilenburg, “The ‘Oficce’ ofthe Prophet in Ancient Israel”, in J. P. Hyatt, ed., The Bi ble in Modern Scholarship, 1965, 74-97; E. W. Nicholson, Deuteromony and Tradition, 1967; idem, Preaching to the Exiles: A Study o f the Prose Tradition in the Book ofJeremiah, 1970; T. W. Overholt, The Threat ofFalsehood, 1970; D. L. Petersen, The Roles o f Israel s’ Prophets, 1981; T. Polk, The Prophetic Persona, 1984; R. Rendtorff, Canon and Theology, 1993; H. G. Reventlow, Liturgie und Prophetisches Ich bei Jeremia, 1963; J. S. Skinner, Prophecy and Religion, 1922; L. Stulman, The Prose Sermons o f the Book o f Jeremiah: A Redescription o f the Correspondences with the Deuteronomistic Literature in the Light o f Recent Text-Critical Research, 1986; W. Thiel, Die deuteronomistische Redaktion von Jeremia 1-25, 1973; idem, Die deuteronomistische Redaktion von Jeremia 26-45, 1981; J. Unterman, From Repentance to Redemption, 1987; H. Weippert, Die Prosareden des Jeremiabuches, 1973; C. Westermann, Basic Forms o f Prophetic Speech, ET 1967; R. R. Wilson, Prophecy and Society in Ancient Israel, 1980; H. W. Wolff, Confrontations with Prophets, 1983. J. Gordon McConville
Jericó
Jericó (in T [y^rihô], # 3735).
AT Apesar das tentativas de associar o nome com termos heb. que significam aroma ou lua, é quase certo que se trata de uma palavra não sem. como demonstra sua terminação pré-sem. (também encontrada em Aco, Ono e Megido). Não se sabe ao certo o seu significado. A cidade situava-se num oásis ao norte do mar Morto, cerca de 10 quilômetros a no roeste da foz do rio Jordão, c. 21 quilômetros a leste-nordeste de Jerusalém. Era (e ainda é) a cidade habitada mais baixa do mundo, com uma altitude 250 metros abaixo do nível do mar, servida por uma fonte perene que fornece irrigação para a região. Trata-se, portanto, de um lugar bastante fértil desde seu primeiro assentamento c. 8000 a. C., quando o homem neolítico começou a cultivar sementes para alimento (cf. Dt 34.2, “cidade das Palmeiras”). A cidade do AT localizava-se em Tel es-Sultan e a cidade do NT fica próxima desta, perto dos luxuosos palácios hasmoneus e herodianos à beira das águas do Qelt. A cidade mais antiga foi fundada no começo do sétimo milênio, com casas arredonda das, um muro e uma torre de pedra (com uma escadaria intema). Uma característica de habita ções subseqüentes era a presença de crânios bastante realistas feitos de barro e incrustados nas paredes da casa. O nível de vida era elevado na Jericó da Alta Idade do Bronze, mas a cidade foi destruída c. 2.300 a. C. por uma civilização menos culta. Esses ocupantes amorreus acabaram se juntando aos cananeus da Idade Média do Bronze, cujos túmulos fornecem provas de realizações consideráveis nas áreas de cerâmica, marcenaria e metalurgia. É provável que este seja o período dos patriarcas hebreus na Pales tina (c. 1900-1600 a. C.). Em algum momento por volta de 1600 a. C., Jericó foi destruída novamente, mas voltou a ser ocupada entre c. 1400 e o final do século XIV. Pouco se sabe sobre essa cidade da Bai xa Idade do Bronze (não é mencionada nas cartas de Tel el-Amama) e, a menos que Bimson esteja certo ao propor um êxodo israelita do Egito no século XV, a data mais provável desse 759
Jeroboão
acontecimento (da metade para o fim do século XIII) não fornece evidências arqueológicas que apoiam a famosa destruição de Jericó por Josué. Porém, os níveis mais altos dos escom bros da cidade, escavados e analisados conclusivamente por K. M. Kenyon, sofreram erosão considerável (como também havia ocorrido com as cidades da Média e Alta Idades do Bron ze) e a escassez de artefatos do século XIII (alguns artigos de cerâmica, túmulos reutilizados) não significa que não houvesse ali uma cidade ocupada no tempo de Josué. Por certo, depois de c. 1200 há evidências de que a cidade ficou abandonada por alguns séculos, o que apoiaria o relato bíblico de uma destruição total causada pelos israelitas (Js 5.13— 6.27). A muralha destruída da cidade que Garstand atribuiu a esse período, na verdade pertencia à destruição ocorrida na Alta Idade do Bronze. Desafiando a maldição de Josué (Js 6.26), Hiel de Betei tentou fundar a cidade nova mente no século IX, o que resultou em mortes, conforme havia sido previsto (lR s 16.34), mas foi no século VII que ocorreu uma ampla reocupação (das periferias) do local que durou até o exílio na Babilônia, quando Zedequias foi capturado nas cercanias (2Rs 25.5). Antes e depois dessa ocupação, encontramos apenas referências passageiras a Jericó no AT (Jz 3.13; 2Sm 10.5; 2Rs 2.4-5, 18-22 e Ne 3.2). Esdras 2.34 e Neemias 7.36 relatam que 345 homens vindos da Babilônia haviam voltado para lá. A Jericó hasmonéia e herodiana foi o local do afogamento do conhecido jovem sumo sacerdote Aristóbolo III (Josefo, Ant. 15.3), da cura de Bartimeu por Jesus, do chamado de Jesus para Zaqueu (Lc 18.35— 19.19) e da história do bom samaritano (Lc 10.30-37). O oásis que havia testemunhado o triunfo militar de Israel sobre seus inimigos viu o triunfo da cura, do perdão e da compaixão sobre a enfermidade, o preconceito e a intolerância. A cidade que havia resistido à vinda do povo de Deus em êxodo foi testemunha (Lc 19.28) da partida do Filho de Deus para o êxodo que estava prestes a se realizar em Jerusalém para a salvação de toda a humanidade (9.30-31). A história da cidade havia sido de constantes derrotas, sem dú vida facilitadas pelo clima debilitantc e pela posição exposta. Tanto quanto se sabe, nenhum dos grandes homens e mulheres da Israel antiga vieram de Jericó. B ib l io g r a f ia
J. J. Bimson, Redating the Exodus and Conquest, JSOTSup 5, 1978; K. M. Kenyon, “Jericho”, EAEHL, 1976, 2:550-75; idem, Digging UpJericho, 1957; idem, The Bible and Recent Arehaeology (revised ed. P. R. S. Moorey), 1987; idem, “Jericho”, AOTS, 264-75; J. Mowry, “Settlements in the Jericho Valley During the Roman Period (63 B.C.-A.D. 134)”, BA 1 5 ,1952, 26-42; G. A. Smith, The Historical Geography o f the Holy Land, 1904, 266-68. P. J. M. Southwell
Jeroboão
Jeroboão (Dy?T [yarob‘ãm], # 3716).
1. Jeroboão I Logo depois da morte de Salomão em 931/930 a. C., o reino de Israel dividiu-se em duas partes, ficando dez tribos ao Norte, conhecidas coletivamente como Israel (ou Efraim; ver Is 7.2, 5, 8, 9; 11.13; 28.1, 3; Os 4.17; 5.3, 5) e duas tribos ao Sul que, juntas, eram conheci das como Judá. Roboão, filho de Salomão, sucedeu ao pai e govemou Judá durante dezessete anos, de 930 a 913 a. C .(lR s 11.43; 12.20-21; 14.21; cf. 2Cr 9.31; 10.16-17; 12.13) (Thiele, 80). O primeiro monarca do reino do Norte foi Jeroboão, filho de Nebate que, por ter mais tar de um sucessor com o mesmo nome, passou a ser chamado de Jeroboão I. Reinou sobre Israel durante 22 anos (lR s 14.20). 760
Jeroboão
Ao que parece, o nome Jeroboão é um subs. composto da forma vb. rbb com o subs. 'am, significando “(que) meu povo se multiplique” ou algo semelhante (Gray, 292). Sabe-se pouco sobre o começo da vida de Jeroboão, exceto pelo fato de que ele era filho de Nebate e Zerua, que se tomou viúva antes, ou logo depois do casamento com Nebate. No caso desta última possibilidade, é possível que Jeroboão tenha crescido órfão de pai, o que tomaria sua ascensão à proeminência ainda mais extraordinária (1 Rs 11.26). Natural da tribo de Efraim, Jeroboão era da cidade de Zereda, provavelmente a moder na Deir Ghassâneh, cerca de dezesseis quilômetros a noroeste de Betei (Aharoni, 443). Desde cedo mostrou ter potencial impressionante, sendo descrito pelo narrador como valente (gibbôr hayif) e ambicioso ( ‘õsêh melã ’kâ, lit., trabalhador, laborioso; 1Rs 11.28). Chamou a atenção de Salomão, que estava no processo de realizar várias obras de construção em Jerusalém e ar redores. Foi incumbido pelo rei de supervisionar as forças de trabalho recrutadas do distrito tribal de Efraim. Nos anos posteriores de seu governo, o rei Salomão começou a abandonar Javé, to lerando e até mesmo adotando outros deuses e seus cultos (1 Rs 11.1-8). Em resposta, veio a mensagem de julgamento de Javé de acordo com a qual grande parte do reino seria tomado de Salomão e, depois de sua morte, sua dinastia seria entregue ao servo de Salomão, Jeroboão (11.11-13). Jeroboão tomou conhecimento disso mesmo antes de Salomão morrer, pois um profeta chamado Aías, o silonita, deixou essa mensagem clara ao sucessor do rei ao tomar sua capa, rasgá-la em doze pedaços e devolver-lhe dez deles. De acordo com Aías, esse gesto simbolizava a divisão do reino, por causa da apostasia de Salomão, entre Jeroboão e a casa de Davi (11.29-32; 2Cr 10.15). Essa revelação dramática chegou aos ouvidos de Salomão, que procurou matar Jeroboão e, desse modo, evitar o julgamento de Javé conforme este havia sido profetizado. No entanto, Jeroboão fugiu para o Egito e encontrou refúgio com Sisaque (945-924 a. C.), um governante da XII Dinastia do Egito (IRs 11.40; 2Cr 10.2). Foi ele quem invadiu Judá durante o quinto ano do reinado de Roboão (IRs 14.25) e quem, de acordo com textos egípcios, avançou até Is rael (Merrill, 323-24). É possível que tenha feito isso, pois, em troca do refugio que encontrou naquela terra, talvez Jeroboão tenha assumido um compromisso com o Egito, compromisso este do qual possivelmente se havia esquecido ao tomar-se rei de Israel. Quando Salomão faleceu, os líderes das tribos do Norte mostraram-se ansiosos para evitar a continuidade das políticas fiscais rigorosas do rei por seu filho Roboão e, assim, cha maram Jeroboão para que voltasse do Egito. Jeroboão foi escolhido para ser porta-voz dos líderes, pois acreditavam que ele teria o apoio do Egito no caso de qualquer movimento por independência. O controle tênue de Roboão sobre a região norte do reino fica claro no fato de que ele encontrou-se com os representantes de Israel não na capital em Jerusalém, mas em Siquém, no interior do Norte (IRs 12.1; 2Cr 10.1), a cidade que Jeroboão mais tarde usou como sua primeira capital (IRs 12.25). No entanto, qualquer boa vontade que porventura se produzisse por essa concessão acabou se perdendo rapidamente quando Roboão se recusou a ouvir as reclamações da delegação do Norte, optando, em vez disso, por aumentar a tributa ção e impor outras medidas opressoras que haviam caracterizado o govemo de Salomão (IRs 12.10-11; 2Cr 10.10-11). O resultado foi previsível. Os israelitas repudiaram a soberania de Roboão, declara ram sua independência da dinastia davídica e nomearam Jeroboão como rei (IRs 12.16-20). Quaisquer idéias que Roboão ainda considerava para uma reunificação à força foram coibidas pelo profeta Semaías, que deixou claro que a separação do reino era inevitável, pois vinha do próprio Javé (12.24; 2Cr 11.4). 761
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Assim, Jeroboão fundou a primeira dinastia do reino do Norte, Israel, em 930, uma di nastia que durou apenas o tempo do seu reinado (930-909 a. C.; ver 1Rs 14.20) e o de seu filho Nadabe (909-908; 15.25) (Thiele, 81,87). Foi um tempo de guerras incessantes com Judá (14.30) e também de decadência espiritual (12.26-33; 13.33-34; 14.7-9, 16). Tanto que a perversidade de Jeroboão tomou-se paradigma para medir-se a perversidade dos reis subseqüentes de Israel (16.19, 26; 22.52; 2Rs 3.3; 9.9; 10.29,31; 13.2,6, 11; 14.24; 15.9, 18, 24). O pecado de Jeroboão consistiu particularmente de sua fundação de centros e práticas cultuais em Betei e Dã, marcando respectivamente as extremidades sul e norte de seu reino (lRs 12.29). Ali ele sancionou a adoração a bezerros de ouro, refletindo, talvez, um elemento da tradição do êxodo (Aberbach e Smolar, “Aaron, Jeroboam, and the Golden Calves”). Estes serviam de pedestais para Javé, o Deus invisível (lR s 12.28) (Dr Vries, 162). Também alterou a data do festival de outono (12.32) e ordenou sacerdotes que não eram levitas para ministrar em seus santuários (13.33). O propósito e a natureza da instituição religiosa de Jeroboão não ficam inteiramente claros e são motivo de controvérsia considerável (Bailey, 97-115). Evidentemente, trata-se de uma variação do javeísmo e não de um culto inteiramente estrangeiro e pagão como aqueles introduzidos mais tarde por Acabe (1 Rs 16.30-33). É significativo o fato de não ser dito sobre Acabe que ele pecou da mesma forma que Jeroboão, uma omissão que pode sugerir uma dife rença qualitativa nos respetivos desvios das normas cultuais. A escolha de Siquém, um local associado à antiga aliança (Js 24.1; cf. Gn 12.6) por Jeroboão para ser sua capital, indica a sensibilidade dele para essas tradições e para o jave ísmo normativo (Allan, 353-54). Por motivos práticos, porém, colocou seus centros cultuais nas fronteiras sul e norte, em Betei, que também era sancionada por aparições anteriores de Javé (Gn 12.8; 28.19; 31.13; 35.15), e em Dã, relacionada a um culto aberrante do passado (Jz 18.30-31). Esses locais foram escolhidos a fim de tomar conveniente a adoração comunitária dos israelitas a Javé sem que precisassem percorrer o longo caminho até Jerusalém (1 Rs 12.2628). E claro que isso vai contra a injunção deut. segundo a qual essa assembléia deveria ocorrer num determinado lugar central (Dt 12.5), considerado no tempo de Jeroboão como sendo Jeru salém (cf. lRs 8.27-30). Só esse fato era suficiente para desqualificar as inovações religiosas de Jeroboão, mas a representação de Javé pelos bezerros de ouro ou o uso deles para represen tar a entronização de Javé em Betei e Dã foi ainda mais grave, consistindo numa violação ao Decálogo (Ex 20.4-5). A outra inovação de Jeroboão, a observação da Festa dos Tabemáculos no oitavo mês em vez do sétimo também revela mais uma falta de consideração pelo caráter sagrado dessas datas e lugares do que uma adoção do paganismo. Em resumo, o culto ilícito de Jeroboão constitui um meio termo entre o mosaismo orto doxo e o paganismo. No entanto, isso não diminui a perversidade desse culto, mas sim, constitui o motivo pelo qual a maldade desse rei tornou-se o padrão referencial para o comportamento de todos os reis subseqüentes de Israel. Em resposta a essa falta de consideração para com os propósitos de Deus para ele e a nação, Jeroboão ficou sabendo que seu altar pagão seria des truído (lR s 13.2, 3; cf. 2Rs 23.15, 16), que seu filho pequeno morreria (IRs 14.12, 17) e que sua dinastia seria breve e teria um final violento (14.10, 11; cf. 15.27, 28). II. Jeroboão II Jeroboão II, que tem o mesmo nome que o primeiro monarca do reino do Norte, Israel, foi o quarto rei da dinastia fundada por Jeú em 841 a. C. (2Rs 14.23-29). A fim de realizar uma reconstituição cronológica exata é necessário que seu reinado apresente uma sobreposição de cerca de dez anos com o reinado de seu pai, Jeoás, de modo que sua vice-regência pode ser datada 762
Jeroboão
como tendo ocorrido entre 793-782 e seu reinado independente, entre 782-753 (Thiele, 116). Esse é o período dos profetas Oséias (Os 1.1), Amós (Am 1.1) e Jonas (2Rs 14.25), sendo que este último viu-se envolvido diretamente na transmissão de uma mensagem de Deus para o rei. De acordo com o testemunho de Oséias e Amós, ambos voltados especificamente para o reino do Norte, a era de Jeroboão representava um tempo de ascensão nacional e prosperidade física e material extraordinárias para as classes privilegiadas da sociedade israelita (Os 8.14; 10.1; 12.7, 8; 13.15; Am 3.12, 15; 4.1,2; 5.11; 6.1, 4-6). A mesma avaliação é feita pelo escri tor de Reis, que fala de Jeroboão como aquele que restaurou as fronteiras de Israel da entrada de Hamate no extremo norte, até o mar de Arabá (ou seja, o mar Morto) ao sul (2Rs 14.25). Assim, Jeroboão conduziu a nação a um ápice de poder e influência quase comparável ao dos dias gloriosos de Salomão (cf. 1Rs 4.20-25; 2Cr 9.26) (Merril, 374-75). No entanto, esses mesmos profetas deixaram claro que essa primeira metade do século VIII também foi um tempo de corrupção moral e espiritual em Israel. Assim como uma esposa adúltera, Israel havia rompido sua aliança com Javé (Os 1.2; 2.2). Essa realidade manifestou-se na idolatria (Os 4.11-14, 17; 8.11-14; Am 8.14), em alianças indevidas (Os 5.13; 7.8, 11; 8.9, 10; 12.1) e em todo tipo de pecado cultuai e social (Os 2.13; 4.2, 8, 11; 7.3-7; 9.1,2, 9; 10.4, 13; 11.7, 12; 12.11; Am 2.6-8; 3.10; 4.1, 4-5; 5.7, 10-12, 18,21,22; 6.4-6; 8.4-6). O fato de Jeroboão tolerar todo esse mal — isso se ele não chegou mesmo a apoiá-lo — fica claro pela afirmação suscinta do historiador de que Jeroboão “fez o que era mau perante o Senhor” (2Rs 14.24). Sua perversidade é equiparada à de Jeroboão I, o rei antidavídico com o qual os reis de Israel são repetidamente comparados ao longo de 1 e 2 Reis (ver acima). A conciliação da pecaminosidade de Jeroboão e seu povo de um lado com o crescimento e a prosperidade de Israel do outro encontra-se, como indica o narrador, na bondade imerecida de Deus para com eles. Javé viu a terrível aflição de seu povo e a ausência de qualquer ajuda extema. Em consideração à promessa da aliança de não exterminar o povo da face da terra (ver 2Rs 13.23), o Senhor levantou Jeroboão para ser o salvador de Israel (14.26-27). Assim, já nos tempos do AT, a base para o favor de Deus concedido à humanidade era considerada a graça que partia inteiramente dele e era absolutamente imerecida. Mesmo operante e eficaz na restauração das fronteiras nacionais e da prosperidade anterior do povo, essa graça não trouxe resultados mais profundos no que se refere a Jeroboão em termos pessoais, assim como também não teve influência sensível para o bem do caráter moral e espiritual de seu povo. Amós dá a última palavra, uma palavra sobre o julgamento que, a seu tempo, viria so bre Jeroboão e Israel. O profeta anunciou que a “salvação” e as bênçãos eram apenas tempo rárias. Pelo fato de Israel haver resistido ao chamado de Javé para que Israel se arrependesse, Jeroboão (isto é, sua dinastia [Am 7.9]) morreria pela espada (2Rs 15.10) e Israel seria levada cativa para fora da terra (Am 7.11). B ib l io g r a f ia
M. Aberbach e L. Smolar, “Aaron, Jeroboam and the Golden Calves”, JBL 86, 1967, 129-40; Y. Aharoni, The Land o f the Bible, 1979; N. Allan, “Jeroboam and Shechem”, VT 24, 1974, 353-57; L. Bailey, “The Golden C alf’, HUCA 42, 1971, 97-115; J. Debus, Die SündeJeroboams, FRLANT 93, 1967; S. J. de Vries, I Kings, 1985; D. W. Gooding, “The Septuagint’s Ri val Versions o f Jeroboam’s Rise to Power”, VT 17, 1967, 173-89; R. P. Gordon, “The Second Septuagintal Account of Jeroboam: History or Midrash?”, VT 25, 1975, 368-93; J. Gray, I & IIK ings, 1970; H. Kosmala, TDOT2:374; E. H. Merrill, Kingdom ofpriests, 1987; E. Thiele, The Mysterious Numbers o f the Hebrew Kings, 1983. Eugene H. Merrill 763
Jerusalém
Jerusalém
Jerusalém (D1^Ç,’1T [y^rüsãlayim], # 3731).
OMA O nome Jerusalém aparece fora do AT já no século XIX a. C. nos Textos de Execração Egípcios. Também ocorre com ortografia ligeiramente variada em vários documentos em escrita cuneiforme, como nas Cartas de Amarna (Untsalim) e no prisma de Senaqueribe (Ursalimmu). A forma aram. é y^ríisãlem (# 10332).
AT 1. Torá. A cidade de Jerusalém não é mencionada diretamente em parte alguma da Torá. No entanto, Moriá aparece em Gênesis 22.2, indicando uma região geral constituída de vários montes (ver Clifford, Cohn). Bem depois disso, o cronista associou a localização de Jerusa lém com o monte Moriá (2Cr 3.1), que parece estar relacionado com a região mencionada em Gênesis 22.2. Além disso, faz-se referência a uma certa Salém (Gn 14.18). Em sua única ou tra ocorrência no AT, Salém aparece numa construção paralela com Sião (SI 76.2), indicando uma associação entre esse local e Jerusalém (cf. Josefo, Ant 1.10.2). Apesar de tal associação ter sido questionada em termos geográficos (ISBE 2:973), o que tem importância teológica é o fato de os NG Moriá e Salém constituírem uma linha contínua ligando Jerusalém ao patriarca Abraão. 2. Profetas Antigos. Ao longo de Josué, Juizes e 1 Samuel, Jerusalém é uma cidade e trangeira habitada porjebuseus. Na verdade, pelo menos uma parte da cidade foi chamada de Jebus durante algum tempo (Js 18.28; Jz 19.10; cf. Miller). Apesar de haver diversos relatos sobre conflitos entre os israelitas e os jebuseus durante esses primeiros anos, a cidade só passou a ser controlada em definitivo pelos israelitas no tempo de Davi (2Sm 5.7). É desse ponto em diante que começa a crescer a relevância de Jerusalém para a história bíblica. Atribui-se a Davi duas medidas estratégicas que fornecem um contexto provável para a ascensão de Jerusalém a uma posição de relevo (Roberts, 343). Diante de uma tensão possi velmente explosiva entre os habitantes do Sul e os do Norte de seu reino, Davi escolheu para sua capital a cidade de Jerusalém, localizada numa região central (2Sm 5.9). Além disso, esta beleceu uma centralização semelhante no âmbito religioso ao providenciar para que a arca da aliança fosse levada para lá (2Sm 6.12-15; 15.29). Em decorrência disso, Jerusalém passou a ser tanto o centro político quanto religioso (uma distinção que não era conhecida na mentali dade israelita, mas que ainda assim é útil para nós). Assim também, a importância do reinado de Davi e a relevância da cidade de Jerusalém, duas idéias distintas, porém relacionadas, tornaram-se, de certa forma, unidas em um só conceito (Ollenburger, 59-66). Tanto que Jerusalém transformou-se na Cidade de Davi (2Sm 5.7). Essas idéias embrionárias foram mais desenvolvidas ao longo do restante dos escritos dos Profetas Antigos. Como era de esperar, Jerusalém aparece repetidamente em contextos envolvendo conflitos políticos e militares, não apenas servindo de centro mas também de sím bolo para o reino em sua totalidade. Porém, mais interessante ainda, é a importância teológica associada à cidade. Em vez de ter sido escolhida por uma mente política perspicaz, Jerusalém é descrita como a cidade de Javé, a cidade onde ele colocou seu próprio nome (1 Rs 11.36; 14.21; 2Rs 21.4; etc.). Essa idéia chega a ter relevância internacional, pois o comandante as sírio sabia da suposta importância teológica de Jerusalém (2Rs 18.22)! Ao mesmo tempo em que é a Cidade de Davi (uma ligação mantida em várias dessas passagens), Jerusalém é, em última análise, a Cidade de Javé. Por mais ideal que parecesse, a importância da centralidade teológica de Jerusalém sem dúvida apresentou várias implicações inquietantes ao longo do tempo. Em primeiro lugar, ser viu compreensivelmente para aumentar a tensão que já existia entre o Norte e o Sul. Depois da 764
Jerusalém
divisão do reino, por exemplo, Jeroboão considerou essa convicção como uma séria ameaça para o reino dele (lR s 12.27-28). Semelhantemente, convicções religiosas legítimas deram, por vezes, lugar a provincianismos teológicos, perceptível pelo menos na tendência do Sul de considerar todo o povo do Norte infiel (o cronista fala mais' sobre esse assunto). Além disso, a centralidade de Jerusalém, juntamente com acontecimentos como o livramento da cidade das mãos de Senaqueribe (2 Reis 19), levaram cada vez mais a uma idéia de invencibilidade. Em termos teológicos, os sentimentos de invencibilidade pessoal ou corporativa são contrários à ênfase bíblica na confiança em Deus. Em decorrência parcial disso, fica ao encargo do editor de 2 Reis explicar por que Deus acabou abandonando a cidade escolhida por ele. Em suma, foi o povo de Jerusalém que abandonou Javé (2Rs 23.26-27). 3. Profetas Posteriores. Tendo em vista o desenvolvimento geral observado nos tex dos Profetas Antigos, podemos analisar as aparições de Jerusalém nos escritos dos Profetas Posteriores dentro de três categorias gerais, a. Como representante de toda a comunidade e, com freqüência, paralela a Judá, faz-se referência à cidade repetidamente em discursos de tra gédia ou julgamento. Tais alusões são comuns em Isaías 1—23, Ezequiel, Miquéias e, parti cularmente, em Jeremias. Embora o contexto histórico desses discursos varie consideravelmente, surgem diversas concepções teológicas: i. as tragédias que sobrevêm Jerusalém são muito mais o resultado do julgamento divino de Javé do que de uma inferioridade política ou militar; ii. tais julgamentos ocorrem em resposta a uma infinidade de pecados, inclusive a desconsideração por Javé (Is 22.11), a idolatria (Jr 7.17-18; Ez 8.3), o rompimento da aliança (Jr 11.2-3), a corrupção no meio dos líderes políticos e religiosos (Jr 13.13; Mq 3.10) e a não observância do sábado (Jr 17.19-23). Ezequiel ressalta ainda mais essa idéia ao chamar Jerusalém pelo mesmo nome — “Oolibá” (“minha tenda está nela”) — de uma suposta prostituta egípcia! (Ez 23.4); iii. uma vez que a desobediência é seguida de julgamento, reflexões posteriores ressaltam em particu lar aquilo que já é pressuposto em outras passagens: o julgamento é totalmente merecido (Ez 14.22-23; 33.21-29). b. Jerusalém aparece como uma representante corporativa em discursos sobre salvação ou livramento. Em outras palavras, os discursos sobre tragédias são, muitas vezes, compen sados por mensagens mais esperançosas nas quais a futura prosperidade de Jerusalém retrata vividamente o fato de que o julgamento não é a última palavra de Javé. Por vezes, o contexto indica libertação de um perigo ou perseguição imediatos. Nesses casos, as lágrimas daqueles que vivem em Jerusalém cessarão (Is 30.19), pois o castigo sobre a cidade foi retirado (Sf 3.1415). Em outras ocasiões, o que está em questão é a restauração da comunidade do pós-exílio. Depois dc ter sido rejeitada por algum tempo, a cidade de Javé será testemunha do regresso de um remanescente fiel (Ez 14.22). A cidade será reconstruída (Is 44.28), seu território voltará a ser habitado (Is 44.26) e o templo será restabelecido (Zc 1.16). Jerusalém que, em certas oca siões, é recipiente coletiva do julgamento de Javé, serve também de símbolo para a misericórdia e o perdão temporais dados por Javé. c. Há diversas passagens da literatura profética nas quais as dimensões temporais de esperança e salvação tomam-se indistintas ou desaparecem e a imagem resultante situa-se em algum lugar num futuro mais distante. No primeiro caso, a palavra do Senhor sairá de Jerusa lém (Is 2.3; Mq 4.2) e as nações se reunirão ali para adorá-lo (Jr 3.17). Além disso, em outras passagens relacionadas retratando expectativas messiânicas claras, Jemsalém receberá o seu tão esperado rei (Zc 9.9,10), um renovo da linhagem de Davi (Jr 33.15-16). Então, o povo será purificado (Is 4.4; Ml 3.3-4) e viverá em segurança, a cidade será chamada “Senhor, Justiça Nossa” (Jr 33.16) e o Espírito de Deus será derramado abundantemente (J1 2.32 [3.5]). 765
Jerusalém
Se nas passagens acima, as dimensões temporais tomam-se praticamente indistintas, em outras desaparecem de todo. Nessas passagens apocalípticas ou escatológicas, o domínio de Javé sobre a terra será firmemente estabelecido, dando início a uma nova era (Is 24.23; 65.18, 19). Durante esse processo, as nações do mundo serão julgadas, mas o povo de Deus será pou pado (J1 3.16 [4.16]). Jerusalém será santa (3.17 [4.17]) e indestrutível (3.17 [4.17]; Zc 14.11) e servirá de fonte de água viva (Zc 14.8). Nunca mais haverá dúvidas de que Jerusalém seja a cidade onde Javé habita (J1 3.17 [4.17]). Em vez de simplesmente constituir o centro das ins tituições políticas e religiosas de Israel ou mesmo ser um símbolo de salvação temporal, Jeru salém passa a simbolizar a consumação absoluta do plano glorioso de Javé. 4. Escritos, a. 1 e 2 Crônicas retomam várias das mesmas idéias encontradas nos Últim Profetas, ressaltando que Jerusalém é a cidade onde Javé habita (ICr 23.25; 2Cr 12.13; 33.4, 7), a relação de Jerusalém com Davi (2Cr 6.6) e a ira de Javé contra o pecado da cidade (2Cr 24.18; 29.8). No entanto, o cronista articula de maneira ainda mais vivida o papel absoluto de Jerusalém em contraste com qualquer coisa que o reino do Norte tenha a oferecer. Ao descrever a divisão do reino, por exemplo, todos os sacerdotes e leigos fiéis de todas as tribos do reino do Norte abandonaram seus lares e foram para Jerusalém (2Cr 11.14,16). Ao que parece, ninguém interessado em buscar ao Senhor permaneceu ao norte da fronteira entre os reinos! b. Esdras e Neemias. Em três ocasiões importantes, ouve-se a teologia de Jerusalém sendo proferida por governantes persas que, ao pemiitirem a volta do povo, reconhecem que o Deus de Israel vivia nessa cidade (Ed 1.3; 7.15, 19) ou colocara nela o nome dele (6.12). Na mente dos próprios exilados que regressaram, os muros caídos da antiga cidade eram uma desgraça (Ne 2.17), uma lembrança dolorosa de um passado ainda mais sofrido. Assim, a consagração dos novos muros da cidade foi pretexto para uma grande comemoração (12.43), constituindo uma espécie de renascimento. Nesse contexto do regresso à terra, Jerusalém é chamada de “santa cidade” (11.1), e um grande senso de expectativa volta a ser alimentado. Porém, o fato de nem todos compartilharem dessas mesmas convicções fica evidente no fato de muitos escolherem não regressar. c. Salmos. O nome Jerusalém não aparece com freqüência nos salmos, sendo que o ter mo preferido é Sião (->). Quando é encontrado, aparece em vários tipos literários, não havendo um tipo predominante. Como é de se esperar, a maioria das ocorrências retrata Jerusalém com grande entusiasmo. Nos chamados Cânticos de Ascensão, por exemplo, adorar em Jerusalém é um privilégio (SI 122.2-3) e testemunhar a prosperidade dessa cidade é uma bênção compa rada a ver os próprios netos (128.5-6). Jerusalém serve como imagem de segurança (125.2) e sua paz e prosperidade são motivos de oração constante (122.6). Tudo isso, sem dúvida, pode ser atribuído mais uma vez à convicção subjacente de que Jerusalém é o lugar onde Javé ha bita (135.21). Em termos de cronologia geral, os salmos refletem o mesmo padrão básico evidente tanto nos Profetas Antigo quanto nos Posteriores. Num lamento nacional, a destruição de Je rusalém nas mãos de nações invasoras é atribuída à ira de Javé (79.1, 3). Depois da destruição da cidade, aqueles que estão no exílio declaram sua lealdade a ela (137.5-6). A lembrança da cidade é fonte de grande alegria e a esperança de sua construção ou reconstrução incentiva promessas de adoração renovada e agradável (51.18-19 [20-21 ]). Concluída a reconstrução, o Senhor é louvado por seus feitos maravilhosos (147.2, 12). Para completar a seqüência, o livro de Salmos preserva um lamento que se volta para um futuro distante. Nessa ocasião, os povos e nações se reunirão em Jerusalém para adorar ao Senhor (102.21-22 [22-23]). Essa imagem de conclusão faz lembrar claramente as cenas semelhantes em Isaías 2.2-3; Miquéias 4.1-2 e Zacarias 14.16. 766
Jeú
d. As ocorrências restantes de Jerusalém nos Escritos, mostram uma tendência de ref çar idéias expressadas de maneira mais completa em outras passagens. Em Lamentações, por exemplo, a idéia da suposta invencibilidade da cidade adquire dimensões internacionais; todos no mundo se surpreendem com a queda da cidade (Lm 4.12). Por fim, a oração de Daniel, que numa passagem anterior mostrou respeito por Jerusalém e pelas suas tradições ao orar voltado para ela (Dn 6.10), ressalta novamente que apesar de a destruição da cidade ter sido resultante de infidelidade (9.7), Jerusalém será reconstruída (9.25). P-B Jerusalém aparece diversas vezes, em vários materiais posteriores ao AT. Com relação a isso, ver TDNT 7:292-338; NIDNTT 2:324-30. B ib l io g r a f ia
D. Bahat, The Illutrated Atlas o f Jerusalem, 1990; R. E. Clements, G odand Temple, 1965; R. J. Clifford, The Cosmic Mountain in Canaan and the Old Testament, 1972; R. L. Cohn, “Jeru salem: The Senses o f a Center”, JAAR 46, 1978, 1-26; J. M. Miller, “Jebus and Jerusalem: A Case of Mistaken Identity”, ZDPV 90, 1974, 115-27; B. Ollenburger, Zion, City o f the Great King: A Theological Symbol o f the Jerusalem Cult, 1987; J. J. M. Roberts, “The Davidic Origin of the Zion Tradition”, JBL 92, 1973, 329-44; P. W. L. Walker (ed.), Jerusalem: Past and Present in the Purpose o f God, 1992; Hans Wildberger, “Die Võlkerwallfahrt zum Sion, Jes 2, 1-5”, VT 7, 1957, 62-81. Terry L. Brensinger
Jeú
Jeú (Xirr \yêhü ], # 3369).
OMA Jeú (acad. ia-c-a), rei de Israel, é mencionado no Obelisco Negro de Salmaneser III e retratado num baixo-relevo beijando os pés do rei. A inscrição junto ao relevo relaciona os tributos trazidos por Jeú da casa de Onri (mãr m hu-um-ri), um acontecimento que não é men cionado no AT (ANET 3,281. ANEP 2, 355). As tentativas de identificá-lo como Jeorão, filho de Onri não receberam aceitação muito ampla. AT 1. Há cinco pessoas chamadas Jeú no AT: um profeta, um rei de Israel, um oficial benjaminita de Davi (IC r ICr 12.3) e dois indivíduos relacionados pelo cronista nos registros ge nealógicos (1 Cr 1Cr 2.38; 4.35). 2. Jeú (“Javé é ele”), o profeta, filho de Hanani, proferiu uma repreensão severa contra o rei Baasa de Israel por afastar-se de Deus e adorar ídolos (1 Rs 16.1 -7). Quando era de idade avançada, profetizou em Judá como o pai, o profeta Hanani. Lá, repreendeu o rei Josafá pela aliança deste com Israel depois da tentativa frustrada de juntar-se a Acabe na batalha, mas elogiou-o pela posição zelosa contra a idolatria (2Cr 19.2-3). Sob esse rei, serviu ainda como cronista da corte (20.34). 3. Jeú, rei de Israel (c. 842-815 a. C.), é infame pelo extermínio sangrento dos mem bros da dinastia de Onri. As instruções iniciais de Deus a Elias, para que ungisse Jeú como rei, foram por fim seguidas por um dos discípulos dos profetas, por ordem de Eliseu (2Rs 9.2-13). Jeú foi ungido, em reservado, na frente de batalha em Ramote-Gileade, uma cerimônia que levou rapidamente ao reconhecimento oficial por seus companheiros comandantes, como se pode observar na proclamação deles “Jeú é rei!” (2Rs 9.13). Instruído pelo profeta anônimo para destruir de todo a casa de Acabe (dinastia de Onri), Jeú executou essa ordem de modo 767
Jeú
rápido e impiedoso. Seus atos mostram que era um homem de perspicácia política e mente aguçada. Ao isolar Ramote-Gileade, conseguiu o apoio dos militares e garantiu o sucesso de sua missão com o elemento da surpresa. O episódio de Jeú em seu carro dirigindo-se a toda velocidade para Jezreel, onde o rei Jeorão estava se recuperado de ferimentos, tornou-se uma lenda. A execução do rei Jeorão (9.24), assegurou a vitória inicial de Jeú no golpe de Estado, e a ordem para a execução de Acazias — o rei de Judá que estava visitando Israel — foi con siderada pelo cronista como providencial (2Cr 22.7). Depois disso, Jeú foi diretamente para a residência da famosa rainha Jezabel e conseguiu ainda mais apoio quando providenciou para que a rainha fosse atirada da torre. O espírito vingativo de Jeú pode ser visto ainda quando o texto observa que “Jeú a atropelou” (2Rs 9.33). A rendição da capital, Samaria, mostra em profundidade ainda maior a astúcia e impie dade de Jeú. Ao escrever cartas para os anciãos e oficiais convocando-os para uma batalha, ele recebeu de início o apoio deles, e o usou em seguida para exterminar todos os setenta filhos do rei Jeorão. (Tendo-se em vista o contexto da narrativa, quando Jeú escreve ordenando “tomai as cabeças dos homens, filhos de vosso senhor” [2Rs 10.6], é extremamente improvável que essa ordem fosse a convocatória para um censo, como sugeriram alguns estudiosos.) A cena repulsiva das setenta cabeças enviadas a Jeú em cestos e então empilhadas dos dois lados da porta cidade com propósitos políticos, revela a determinação dele (10.10). A carnificina promo vida por Jeú continuou quando foi morto o restante dos parentes de Jorão em Jezreel; depois, com a execução de 42 parentes de do rei Acazias e, por fim, quando foram mortos os parentes de Acabe cm Samaria. O zelo de Jeú por Javé suscitou o apoio de Jonadabe (líder de um clã religioso e so cialmente conservador; cf. Jeremias 35) quando atacou Samaria e, por fim, contendeu com os adoradores locais de Baal. Usando de outro ardil, Jeú convocou uma assembléia para Baal, sob o pretexto de adorá-lo, mandando matar todos aqueles que compareceram e ordenando que o santuário fosse despedaçado e transformado numa latrina (2Rs 10.24-28). Seu cuidado para não matar nenhum adorador de Javé demonstra verdadeira dedicação ao Senhor (10.23). A sensibilidade de Jeú para com os pronunciamentos proféticos foi interpretada, por vezes, como um acréscimo. No entanto, não se trata de um aspecto coerente com sua visão firmemente javeísta, como o demonstra o fato de Jeú atribuir a Javé as profecias de Elias quando Jeú mesmo ordenou que Jorão fosse atirado na vinha de Nabote (2Rs 9.25), e, seme lhantemente, na cena da morte de Jezabel (9.36). A liberdade do escritor de Reis de fazer uma observação semelhante (10.17) também favorece essa idéia. A obediência de Jeú foi elogiada pelo Senhor, mas a persistência em apoiar a idolatria foi condenada e indicada como um moti vo para a crescente fragilidade política (10.30-31). A condenação por parte do profeta Oséias é mais forte, quando ele observa que a carnificina de Jezreel pela casa de Jeú seria castigada pelo Senhor (Os 1.4). Israel: Teologia B i b i .i o c r a f i a
J. Bright, A History o f Israel. 1981; B. Halpem, “Yaua, Son ofOmri, Yet Again”, BASOR 265, 1987, 81-85; J. M. Miller & J. H. Hayes, HAIJ, 1986; P. K. McCarter, “Yaw, Son o f ‘Omri’: A Philological Note on Israelite Chronology”, BASOR 216, 1974, 5-7; E. R. Thiele, “An Additional Chronological Note on ‘Yaw, Son of Omri’”, BASOR 222, 1976, 19-23. Robert Spender 768
Jezabel
Jezabel
Jezabel
(tarx [ ’izebel], # 374).
Jezabel era casada com o rei Acabe de Israel (874-853 a. C.; cf. Comey, 78). Era filha de Etbaal, sacerdote-rei dos sidònios (1 Rs 16.31), que governou aproximadamente entre 887 e 856 a. C. (Katzenstein, 129). O objetivo do casamento com Acabe era confirmar uma aliança entre Israel e a Fenícia. 1. O nome Jezabel. E provável que o significado original de 'izebúl fosse “Onde está o príncipe?” O nome Jezabel, “Onde está o esterco?” (cf. 2Rs 9.37), conforme este aparece escrito no texto heb., é claramente uma paródia expressando a desafeição que os massoretas tinham para com ela (Gray, 368). 2. Suas tendências religiosas. O casamento dc Jezabel com Acabe teve uma profunda influência negativa sobre a vida religiosa de Israel. Jezabel foi educada para adorar a Baal e, como era costume desde o tempo de Salomão (1 Rs 11.1-8), tinha seu próprio santuário a Baal em Samaria (lR s 16.32). Uma vez que era uma mulher determinada, promoveu sua religião em Israel com fervor missionário (Bright, 52). Seus seguidores acabaram sendo servidos pelos “quatrocentos e cinqüenta profetas de Baal e os quatrocentos profetas do poste-ídolo que comem da mesa de Jezabel” (lR s 18.19). Entre as medidas que ela estava preparada para tomar a fim de garantir o culto a Baal estava a perseguição aos profetas de Javé e a destruição dos altares de Javé (Donner, 406; cf. lRs 18.4, 10, 13; 19.1, 10,14; 2Rs 9.7). Fica evidente, portanto, que a presença dessa religião e dos oficiais nela envolvidos levou à resistência daqueles que se de dicavam a servir exclusivamente a Javé, como era o caso do profeta Elias (lR s 17.1— 19.21; 21.1-26; cf. Noth, 242). Jezabel exerceu uma forte influência religiosa sobre o filho, Acazias, que sucedeu Acabe em 854/853 a. C. Depois de cair pelas grades de um quarto no piso supe rior de sua casa, ficou incapacitado e enviou uma delegação a Baal-Zebube, o Deus de Ecrom para consultar-se com ele e saber se poderia recuperar-se (2Rs 1.2). Depois da morte de Acabe, Jezabel continuou exercendo influência como rainha mãe. 3. A influência política de Jezabel. O conceito de monarquia de Jezabel era conflitante com o conceito teocrático israelita (de Vaux, 98-99). Ela vinha de um país em que os direitos individuais não eram respeitados na mesma medida que em Israel, como fica claro pelo episó dio com Nabote (lR s 21.4). Durante a revolução de Jeú, ela vestiu-se e enfeitou-se de modo suntuoso (Gray, 550) para que Jeú reparasse nela (2Rs 9.30). Este, por sua vez, ordenou que ela fosse atirada de uma janela do castelo e pisoteada pelos cavalos e o carro de Jeú para ser devorada pelos cães (9.31-37). Com o fim dela, cumpriu-se a profecia de Elias (2Rs 9.33-37; cf. 1Rs 21.23). A referência aos restos de Jezabel mortais como “esterco” (v. 37) deve ser vista à luz do significado apresentado anteriormente para o nome. Assim como o marido Acabe, ela enfrentou a morte com grande coragem. Israel (Reino de): Teologia B ib l io g r a f ia
J. Bright, The Kingdom o f God, 1952; R. W. Comey, The Reigns o f Omri and Ahab, 1970; H. Donner, “The Separate States o f Israel and Judah”, in J. H. Hayes & J. M. Miller, Israelite and Judaean History, 1977, 381-434; H. J. Katzenstein, The Histoty ofTyre, 1973; E. H. Merrill, Kingdom o f Priests, 1987; M. Noth, The Histoty o f Israel, 1960; C. F. Pfeiffer, The Divided Kingdom, 1967; R. de Vaux. Anclsr, 1961. D. N. Pienaar 769
Jezreel
Jezreel (VxjnT’ \yizre 'el’], filho de Oséias e Gomer, # 3475).
Jezreel
AT Jezreel era nome de lugar e um nome próprio que significa “Deus semeia”. Como NG (->), indica uma cidade na região montanhosa de Judá (Js 15.56), terra natal de uma das espo sas de Davi, Ainoã (1 Sm 25.43) e uma cidade em Issacar (Js 19.18). Há um judeu com o nome de Jezreel (ICr 4.3), mas talvez a pessoa mais conhecida com esse nome seja o filho mais velho do profeta Oséias (Os 1.4), nascido do casamento de Oséias com Gomer. O profeta recebeu do Senhor a ordem de dar à criança o nome de Jezreel para simbolizar o julgamento de Deus sobre o povo pecador (vv. 4-5). Para se compreender o significado simbólico desse nome, é necessário lembrar alguns dos acontecimentos sangrentos que caracterizaram a história da cidade de Jezreel. Primeiro, foi o sangue de Nabote que correu ali (1 Reis 21); logo depois, Jeú (-> # 3369) entrou em cena e foi a Jezreel para se vingar contra a casa de Acabe (2 Reis 9— 10). E mesmo no tempo de Oséias, essa situação (derramamento de sangue e usurpação) ainda persistia na esfera monárquica (cf. Os 7.3-7). O nome simbóli co do primogênito de Oséias, portanto servia de lembrança e acusação constante da história deficiente e sangrenta da instituição da monarquia no reino do Norte (Jeremias, Hosea, ATD, 1983, 31). Porém, o Deus da ira também é um Deus de amor. Em Oséias 2.23 [25], vemos a promessa de que esse nome simbólico de julgamento um dia será transformado em redenção: “Semearei Israel para mim na terra” (-> z r \ -> # 2445). Paul A. Kruger -> Oséias: Teologia;
Sinais e Símbolos: Teologia
Jó: Teologia de A. Estrutura literária O livro de Jó é constituído de vários discursos dentro do contexto de um relato antigo sobre o sofrimento de Jó. A narrativa (caps. 1—2) é escrita num estilo simples, compacto e direto, semelhante a várias narrativas encontradas em Gênesis. Mais que depressa, envolve o público nas provações de Jó e transmite a mensagem do livro com grande impacto. O escri tor da atual obra adaptou a narrativa antiga e redigiu vários discursos para explorar as muitas questões levantas pelo sofrimento do justo. Os três consoladores — Elifaz, Beldade e Sofar — expressam diversas nuanças da teologia tradicional. Os discursos deles compõem três ciclos, sendo que um consolador fala de cada vez, ao que se segue um discurso de Jó. A maldição de Jó sobre o dia do seu nascimento prepara o cenário para o diálogo (cap. 3). Discursos adicionais colocados depois do diálogo indicam outras perspectivas teológicas: a declaração de inocência de Jó (caps. 29— 31), quatro discursos consecutivos de um jovem impetuoso chamado Eliú (caps. 32—37) e dois discursos de Javé (Jó 38.1— 40.2; 40.6— 41.34 [41.26]), para os quais Jó oferece apenas respostas sucintas (40.3-5; 42.1-6). Uma ode à Sabedoria (cap. 28) liga o diálogo (caps. 4—27) à série de discursos (caps. 29— 41). B. Temas teológicos O conteúdo teológico desse livro se revela pela investigação de suas várias dimensões, inclusive a história básica, os discursos e a estrutura dramática do livro (cf. Hartley, 43-47). Fa zendo uso dessas dimensões, a mensagem teológica será estudada dentro de quatro categorias: 770
Jó: Teologia de
o caráter da provação de Jó e sua resposta, questões referentes à justiça, as contribuições dos discursos de Javé e uma consideração dos princípios teológicos para os cristãos. 1. O caráter da provação d e J ó e a reação do profeta. A provação de Jó é exposta seis cenas encontradas no prólogo: a apresentação de Jó (1.1 -5), o primeiro diálogo entre Deus e Satanás no conselho celeste (1.6-12), a perda repentina sofrida por Jó de todos os bens e fi lhos (1.13-22), o segundo diálogo no conselho celeste (2.1 -7a), a aflição do corpo de Jó (2.7b10) e a apresentação dos três líderes sábios que se dispuseram a consolar Jó (2.11 -13). Um dos propósitos mais importantes da obra é declarado no diálogo entre Deus e Satanás no conselho divino. Deus afirma a possibilidade de um homem crer nele como resultado de um coração puro, fato demonstrando por seu servo Jó; mas Satanás nega tal afirmação de Deus, argumentando que Jó era um servo fiel de Deus somente por causa de toda a fartura que Deus lhe concedeu. Se essa riqueza desaparecesse, sem dúvida Jó amaldiçoaria o Senhor. Deus discorda, certo da existência daqueles que o serviam pela alegria de sua presença e não pelas bênçãos resultan tes. Para provar que a piedade deles nâo era motivada por interesse próprio, Deus permite que Satanás teste Jó tomando tudo dele. Jó vindicou esse risco que Deus assumiu, passando pelo teste ao manter intacta a confiança em Deus. Na segunda cena do conselho celeste, Deus declara com ousadia que Satanás foi desmen tido quanto à fidelidade de Jó. Satanás discorda, dizendo que Jó ainda não fora suficientemente testado. Satanás expressa sua posição num provérbio mordaz: “Pele por pele, e tudo quanto o homem tem dará pela sua vida” (Jó 2.4). Satanás afirmou que no fundo do coração toda pessoa é egoísta. Em circunstâncias que ameaçam sua própria identidade como ser humano, elas abrem mão de qualquer princípio a fim de se protegerem. Para provar que Satanás estava errado, Deus permite que Satanás submeta Jó ao sofrimento mais excruciante possível, mas sem atentar con tra a vida de Jó. Em decorrência disso, o corpo de Jó é acometido de uma doença terrível que o obriga a deixar sua posição elevada para viver fora dos muros da cidade. Depois de resistir ao conselho da esposa para que amaldiçoasse Deus, Jó suporta a aflição em silêncio. Para uma interpretação correta desse livro extraordinário, é importante determinar-se que Jó confiou plenamente em Deus e viveu de modo reto tanto antes quanto durante sua pro vação. Essa posição é declarada diversas vezes ao longo de todo o livro: • • • •
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Jó é apresentado como aquele que temia a Deus e se desviava do mal (1.1); O fato de Jó ser verdadeiramente justo é apoiado pela descrição de sua grande ri queza, que servia de prova das bênçãos de Deus sobre ele (1.2-3); Nas duas cenas do conselho celeste, o próprio Deus testemunhou em favor do ca ráter justo de Jó (1.8; 2.3); O movimento dramático do prólogo leva à compreensão de que pouco antes da tragédia extinguir todos os seus bens, Jó havia oferecido holocaustos para expiar qualquer possível pensamento rebelde contra Deus que pudesse ter passado pela mente de seus filhos (1.4-5). Uma vez que esses sacrifícios expiavam até mesmo o princípio de pecado num membro da família, vê-se que, quando começaram as provações, Jó encontrava-se num relacionamento firme com Deus; Jó testemunhou muitas vezes em favor da própria inocência (p. ex., 9.15, 20, 21; 10.7a; 12.4; 23.11 -12). Na verdade, a certeza que possuía de sua integridade tomouse ainda mais forte enquanto lamentava e buscava vindicação (p. ex., 27.2-6). Na instrução final de Deus para os três consoladores, o Senhor afirmou sobre Jó: “Vós não dissestes de mim o que era reto, como o meu servo Jó” (42.8). Assim, em momento algum Jó cometeu qualquer pecado, quer antes ou durante sua provação, ao qual pudesse ser atribuído o seu sofrimento. 771
Jó: Teologia de
Além da mais absoluta severidade do sofrimento físico de Jó, dois fatores explicam por que a aflição dele pode representar o sofrimento humano como um todo. Em primeiro lugar, vê-se o princípio de que a severidade do sofrimento aumenta de modo inversamente propor cional ao sucesso do indivíduo. Uma vez que Jó era a pessoa mais exaltada da antigüidade em função de sua posição dentro da comunidade (Jó 29.7-10, 21-25) e de sua riqueza (1.2-3), sua queda foi a mais dramática possível em termos humanos. Em segundo lugar, Jó suportou um sofrimento terrível em todos os níveis da experiência humana: físico, espiritual, social e emocional. No âmbito físico, perdeu suas muitas posses e os dez filhos de uma só vez. Além de perder tudo, sofreu o choque causado pelo caráter repentino dessas perdas. Em seguida, foi acometido de uma enfermidade debilitante. O corpo de Jó foi tomado de dores (30.17); a febre o deixava com delírios (7.3-4), criando pesadelos terríveis que o privavam de qualquer des canso (7.13-14a). Sem saber que Deus havia proibido Satanás de tirar a vida a Jó, a gravidade da doença de Jó o convenceu de que a morte estava próxima. Clamou: “Os meus dias se vão apagando, e só tenho perante mim a sepultura” (17.1). No âmbito espiritual, Jó perdeu o rumo na vida. A falta de um motivo para o sofrimento de tamanha tragédia o deixou desorientado e colérico (Jó 3.24-26). Aquilo em que havia acre ditado com tanta convicção de repente lhe parecia uma mentira. E especialmente perturbador o sentimento de Jó de que Deus havia mudado de súbito de amigo íntimo (29.4) para alguém que o estava usando dc modo implacável como alvo para praticar o cerco a um poderoso ini migo: “Os terrores de Deus se arregimentam contra mim” (6.4; cf. 16.13-14; 19.10-12). Tal impressão gerou profunda angústia em Jó (10.1-2). Mais angustiante ainda era a frustração de todas as tentativas dele de encontrar a Deus (23.8-9). O silêncio de Deus era quase terrível demais para que Jó pudesse suportar. Outro aspecto espiritual doloroso da aflição de Jó foi o fato de sua comunidade, tomando por base o princípio da doutrina da retribuição, interpretar a condição dele como prova de que Deus estava desmascarando algum mal que Jó havia feito em segredo. Assim, o próprio corpo de Jó lhe testemunhava claramente a culpa, transformando suas declarações de inocência cm mentiras descaradas (16.7-8). Em decorrência disso, ele não tinha nenhum meio de convencer aquela comunidade de que, apesar das evidências condenatórias em seu corpo, as alegações de inocência feitas por ele fossem verdadeiras,. Trata-se de um dilema que levou Jó a um profundo terror espiritual. Socialmente, Jó sofreu por completo. Da noite para o dia, o ancião honrado passou da mais nobre condição na qual se via cercado de admiradores, para o estado de assentar-se junto ao lixo fora do muro da cidade. Não mais um homem venerado na assembléia (Jó 29.7-10), tomou-se o tema de uma canção de escárnio (30.9) e até mesmo da zombaria dos bandidos mais desprezíveis (30.1-15; cf. 12.4). O sofrimento afastou-o de todo o povo (19.13-20). Esse tratamento produziu em Jó o mais profundo sentimento de vergonha. Emocionalmente, Jó ficou terrivelmente agitado (rgz, # 8074; Jó 3.26; cf. v. 13). Não conseguia encontrar alívio algum para seu sofrimento. Aborrecido ao extremo (6.2), abomina va sua dor (6.7). Para ele, o peso das angústias era maior do que toda a areia do mar (6.3). O sofrimento emocional de Jó intensificou-se até o grau máximo, aumentando ainda mais com as aflições tão violentas nos outros níveis. Depois de suportar seus transtornos em silêncio durante vários dias, Jó irrompeu num discurso veemente, revelando a profundidade de seu desespero. Começou amaldiçoando o dia do próprio nascimento (cap. 3); desejando jamais ter existido, procurou desfazer a criação desse dia. Se pudesse tê-lo feito, jamais teria sentido dor tão horrível. A profundidade do desespero de Jó fica evidente na inversão que fez de quatro símbolos-chaves usados pelos antigos para orientar a vida (cf. Perdue, 1986, 306-12). Em contraste com os antigos que buscavam manter 772
Jó: Teologia de
Leviatã calmo para evitar catástrofes naturais, Jó proferiu um encantamento para suscitar esse poderoso dragão do mar a fim de que ele tragasse o dia do nascimento de Jó (Jó 3.8). Se isso acontecesse, ele jamais teria existido. Em vez de apreciar a grande alegria superabundante que acompanha o nascimento, Jó desejou ter sido um aborto (3.11-13, 16). Também exaltou os tú mulos decrépitos acima dos enormes monumentos erigidos para homenagear a posição e as realizações dos homens (3.14-15). Idealizou o reino dos mortos — normalmente considerado um lugar tenebroso e lúgubre onde os mortos têm uma existência miserável como meras som bras — como um lugar onde todos se vêem livres das agruras da terra (3.17-19). O anseio de Jó pela morte era maior que o desejo de um caçador de tesouros por riquezas enterradas (3.21). Nesse discurso, Jó encontrava-se numa luta intensa com a perda de rumo na vida. Nos discursos seguintes, Jó continuou lamentando seu sofrimento numa linguagem rica e variada. Esses discursos são constituídos de diversos componentes, inclusive de uma descrição vivida do sofrimento de Jó (p. ex., 9.25-38; 16.6-17) e do questionamento de Deus sobre os motivos para tamanha aflição (p. ex., 9.22-24; 10.3-14). Há várias recitações de hinos louvando o poder e a majestade de Deus (p. ex., 9.5-13; 10.8-12; 12.13-25). Foi esse elemento que manteve a atenção de Jó em Deus como aquele com o qual Jó devia tratar. De quando em vez, ele suplicava ao Senhor para que lhe desse algum alívio das dores antes da morte (p. ex., 7.7-10, 16-21; 14.13-17). Um dos componentes de vários discursos era a busca de Jó por um modo de provar sua inocência. Essas passagens são repletas de linguagem jurídica (9.2-4, 1424, 30-35; 13.4, 13-28; 16.17-21; 19.23-27; 23.2-7; 27.2-6; 31.1-40). A livre expressão de seus pensamentos perturbados permitiu que Jó desse vazão ao ve neno amargo de sua angústia. O poder que o lamento possui de redirecionar a visão de mundo de alguém profundamente perturbado fica evidente no primeiro ciclo do diálogo (caps. 4— 14). A princípio, Jó ansiava pela morte, esperando encontrá-la de qualquer maneira possível (cap. 3). A vida lhe era tão desagradável que Jó implorou para que Deus o deixasse em paz (Jó 7.16). Sua rejeição a Deus levou Jó ao ponto mais baixo de dor emocional/espiritual. No entanto, pode-se encontrar uma mudança extraordinária em seu último discurso do primeiro ciclo. Jó transfor mou seu desejo inicial de morrer no ventre da mãe (3.16) numa pergunta retórica como queixa contra Deus (10.18-19; Fohrer, “Form und Funktion,” 74). O jogo de palavras tão comovente usado por Jó sobre um tema que vem do cerne de sua agonia indica que seu desejo de morrer se dissipou diante do desejo de desafiar Deus a declará-lo inocente. O caráter pleno dessa mu dança é confirmado pela especulação sobre a possibilidade de Deus o estar escondendo no reino dos mortos a fim de que possa ter algum alívio do sofrimento (Jó 14.7-12). Quando a ira de Jó tivesse arrefecido, Deus se lembraria dele e o traria de volta à vida normal na terra (14.13-14). O próprio fato de que Jó imaginava um retomo à vida depois de um hiato no Seol mostra que havia adquirido controle suficiente sobre sua mente agitada para prezar uma vida honrada na terra acima de uma existência miserável no reino dos mortos. A lamentação de Jó o levou a perceber que readquirir sua posição diante de Deus era muito mais importante do que procurar na morte uma fuga do sofrimento. Esse caminho levou Jó a proferir uma longa declaração de inocência numa nítida tentativa de provar esse fato (caps. 29— 31). 2. Questões acerca da justiça. Nesta seção, consideraremos várias questões referen à justiça como esta é tratada no livro de Jó, entre elas o padrão ético elevado, a maneira de se relacionar com o sofrimento de alguém, o princípio da retribuição, a busca de vindicação pes soal daquele que é vítima de falsas acusações, a necessidade do homem de ter um intermediário ao defrontar-se com Deus, a prostração de Jó diante de Deus, a intercessão de Jó por seus con soladores e o final feliz descrito no epílogo. É preciso deixar claro desde o início que a justiça não é um princípio abstrato, mas sim, um padrão que emana da essência de Deus. Deus governa com justiça, pois ela lhe permite ser fiel tanto a si mesmo quanto à sua criação. 773
Jó: Teologia de
a. A primeira questão relacionada à justiça é o elevado padrão ético dos patriarcas exem plificado no livro de Jó. Para eles, a devoção a Deus significava ajudar os fracos e os debilita dos (Jó 4.3-4 ), e Jó seguia rigorosamente esse padrão. Havia ajudado os fracos a lidarem com as fraquezas — servindo de olhos para os cegos, pés para os coxos e pais para os necessitados (29.15-16). Havia socorrido os pobres e órfãos que tinham suplicado por ajuda sem receber nenhuma resposta (29.12-13). Ao contrário dos inescrupulosos que costumavam aumentar a própria riqueza à custa do povo impotente (cf. 31.21), Jó chegava ao extremo de examinar até a causa de um estranho para que pudesse defendê-lo com sucesso no tribunal (29.16). Jó atuava de modo agressivo para que a justiça prevalecesse na comunidade dele. No juramento de inocência de Jó, no qual são enumerados vários pecados que ele não havia cometido, esse padrão moral chegou ao nível mais elevado do qual se tem conhecimento antes do Sermão da Montanha (cap. 31), pois Jó foi além do apreço de boas obras e dedicou-se a um completo escrutínio de suas motivações. Jó procurava sinceramente manter seu coração puro ao eliminar qualquer emoção que pudesse levá-lo a pecar. Controlava mais especifica mente os olhos, pois é por meio deles que idéias e desejos entram no coração. Essa disciplina evitava que ele cobiçasse uma mulher ou os bens de outra pessoa (31.1, 7-8). A atitude de Jó com relação aos servos é especialmente esclarecedora. Ele trabalhava no sentido de buscar o bem-estar de seus servos, pois considerava que haviam sido feitos pelo mesmo Criador que ele (31.13-15). Trata-se de uma premissa revolucionária, pois deixa implícita a igualdade entre as pessoas. Quando essa verdade encontra uma concretização plena, leva à eliminação de toda discriminação partindo de qualquer preconceito, como o nível social e o sexo. Além disso, Jó evitava amaldiçoar os inimigos (31.29-30). Nâo depositava confiança em outra coisa senão no Criador, desviando-se assim da sedução da riqueza (31.24-25) e da atração exercida pelo esplendor dos corpos celestiais (31.26-28). Sempre que pecava, não escondia esse pecado, temendo o que a comunidade poderia dizer. Cheio de ousadia, confessava sua transgressão a fim de manter a comunhão com Deus (31.33-34). Essa declaração é crucial, pois revela que Jó não permitia que sua posição elevada dentro da comunidade o forçasse a viver dentro de um padrão falso de piedade apenas para evitar humilhação. Antes, colocava o temor no Senhor acima da aclamação pública. b. Outra questão associada à justiça refere-se às maneiras apropriadas e inapropriadas de relacionar-se com alguém cuja experiência não apenas é diferente dos ensinamentos para digmáticos da comunidade da fé, como chega, de fato, a desafiar a validade das suas convic ções mais estimadas. Os resultados da abordagem dos três consoladores de Jó mostram que um crente vigoroso não precisa recorrer a chavões inadequados a explicações confusas para defender Deus ou a verdade (Jó 13.4-12). Os amigos de Jó estavam tão preocupados em pro teger a honra de Deus e suas convicções na retribuição equitativa das queixas fervorosas de Jó que a retórica deles, na verdade, tentou Jó a seguir a Deus visando ao benefício próprio. O zelo religioso os levou a condenar Jó, justamente a pessoa que tinham ido consolar. Apesar de ser correto incentivar aquele que está lamentando a voltar-se para Deus, o Senhor nâo é honrado por aqueles que o defendem com tanta veemência a ponto de tentarem aquele que está em dificuldades para que rejeite a Deus. Quando uma pessoa deseja transmitir uma palavra de consolo de Deus a alguém que está sofrendo, mas não sabe como responder às palavras mordazes e cheias de dor que são despejadas da boca para fora, é muito melhor sim plesmente manter-se próximo a essa pessoa, oferecendo-lhe uma palavra breve de compaixão do que filosofar na tentativa de responder às perguntas do sofredor. Em situações como essas, ouvir é mais eficaz do que falar como meio de transmitir a graça de Deus aos aflitos, uma vez que o fervor que se esforça para defender Deus com falsos chavões não alcança esse propósito. 774
Jó: Teologia de
c. Outra questão de justiça é a percepção de que esta não pode ser igualada com a dou trina da dupla retribuição, a qual afirma categoricamente que os justos são abençoados e os perversos sofrem perdas. A atitude dos confrontadores indica como era grande a tenacidade deles em se apegarem ao corolário dessa doutrina de que todo aquele que sofre pecou. A crença no caráter inviolável dessa idéia os levou à conclusão de que Jó era um pecador empedernido. Jó respondeu à rígida doutrina deles argumentando que o dogma da retribuição não funciona perfeitamente na vida, como demonstram os inúmeros exemplos de perversos que têm uma vida longa e próspera e que nunca se depararam com dificuldade alguma (Jó 21.7-16). Alguns ímpios são tão atrevidos que expulsam Deus ostensivamente de suas vidas e, mesmo assim, continuam prosperando (21.14-15). Mesmo sendo verdade que, por vezes, há ímpios que so frem perdas, isso acontece com freqüência insuficiente para que se possa aplicar o principio de recompensa e castigo de modo tão categórico (21.17-21). Além do mais, pelo fato de Deus não ter um cronograma regular de julgamento, os perversos muitas vezes dominam os pobres e desafortunados (24.1-11). Apesar de o princípio da retribuição funcionar de um modo geral nos assuntos da humanidade, isso ocorre de maneira excessivamente imperfeita. O motivo pelo qual Jó buscava tão energicamente provar o dogma de que os perversos nem sempre são castigados era determinar a possibilidade do inverso, a saber, a existência de justos que experimentam dificuldades ainda que sua integridade se encontre intacta. Se esse é o caso, então os consoladores estavam errados ao afirmarem que todos aqueles que sofrem são culpados de alguma transgressão. Em decorrência disso, o relacionamento de uma pessoa com Deus não pode ser julgado nem pela extensão da prosperidade dele e nem pela dureza das dificuldades que suporta. No processo de procurar provas a sua integridade, Jó se deu conta de que o princípio da justiça devia ser separado do dogma da retribuição. Sua busca o colocou em contato com os princípios da justiça que uma vida de retidão lhe havia gravado profundamente no pensa mento. Assim, ele sondou várias maneiras de conseguir que a justiça o livrasse do sofrimento. Como a vítima de um estupro, por exemplo, Jó gritou “Violência!”, na esperança de que al guém que o estivesse ouvindo fosse salvá-lo (Jó 19.7). No entanto, ninguém respondeu, nem mesmo Deus. Ainda assim, Jó continuou crendo que há justiça e que devia ser buscada com diligência. Diante do crescimento dessa convicção, ele decidiu que a única maneira de restaurar sua honra era levar Deus ao tribunal (13.3, 13-17), pois continuava crendo que diante do trono divino era possível defender sua causa e receber um veredicto justo de Deus (23.3-7). Porém, a mente de Jó ainda estava perturbada com a suposta hostilidade de Deus. Ao mesmo tempo em que estava certo de que Deus tinha um compromisso com a justiça, o medo de que Deus o estava castigando sem nenhum motivo aparente desafiava essa certeza (cf. 9.5-13; 13.23-28). Esse raciocínio conflitante revela como foi necessário que Jó reunisse toda sua determinação a fim de levar a cabo seu pleito com Deus. A determinação de Jó era uma profissão de fé, a qual lhe orientava oss pensamentos perturbados. d. Ainda outra questão referente à justiça é a necessidade humana de um intermediário para tratar com Deus. Em função de sua experiência do poder extraordinário de Deus e da quase impossibilidade de provar sua inocência, pela própria natureza da razão humana, Jó percebeu que precisava de alguém que o ajudasse a provar que era verdadeiramente justo. Trata-se de um tema de grande importância em vários de seus discursos. Foi introduzido por Leifaz quan do este negou a existência de um ser celestial (Jó 5.1). Assim, Jó teve que elevar-se acima da declaração de Elifaz em busca da restauração de seu relacionamento com Deus. A primeira vez que Jó agonizou diante da possibilidade de provar sua inocência (9.2-4, 14-24, 32-35), num ato de frustração, deixou escapar seu desejo de ter um juiz ou árbitro, 775
Jó: Teologia de
alguém que pudesse refrear Deus a fim de que os dois tivessem como se reconciliar (9.33). A linguagem de Jó indica que ele estava pensando em termos especulativos. Depois de haver-se firmado na resolução de levar seu pleito a Deus (cap. 13), Jó declarou que havia alguém no céu que testemunharia em sua defesa (16.19). Nessa linha de pensamento, a testemunha de Jó falaria em favor nâo apenas de sua declaração de inocência, como também atuaria como de fensora e intérprete diante do tribunal celeste (16.20-21). Uma vez que a aflição de Jó o havia isolado de todos que poderiam desempenhar esse papel (19.13-19), ele voltou-se para o céu em busca de um ajudador. Em seu discurso seguinte, (19.23-27), Jó dedicou maior atenção a esse ajudador, identificando-o com um parente-resgatador (g ô ’êl, # 1457). Em Israel, um parente-resgatador era alguém que tinha a responsabilidade de resgatar um parente próximo de dificuldades mais sérias (Lv 25.23-55). Havia quatro ou cinco condições que exigiam que alguém atuasse de tal forma; p. ex., libertação de um membro da família que se tomara escravo por dívidas, reapropriaçâo de patrimônio que havia sido entregue para pagamento de dívida ou libertação de um parente que havia sido feito cativo. Nesse caso, Jó acreditava que seu resgatador devia agir de modo agressivo a fim de conseguir-lhe uma audiência diante do tribunal divino. O fato de um resgatador também ter a responsabilidade de se esforçar para garantir um julgamento justo para um parente em apuros é comprovado em: Salmo 119.154; Provérbios 23.11; Jeremias 50.34; Lamentações 3.58-59. Surge a grande questão interpretativa: Quem seria o resgatador de Jó? Foram apresen tadas diversas propostas: seus amigos, um anjo no céu que teria o papel oposto ao de Satanás, o promotor público, numa posição oposta à de Satanás (p. ex., Habel), a personificação da sú plica de Jó (p. ex., Clines) ou, ainda. Deus. De todas essas propostas, a candidata mais forte é Deus, uma vez que Israel chamava Deus afetuosamente de Redentor por ele haver livrado o povo da escravidão no Egito (p. ex., Êx 6.6; 15.13; SI 74.2; 77.15 [16]). Esse título divino transmitiu a esperança de que Deus continuaria a resgatar seu povo de dificuldades graves. Isaías lançou mão desse significado ao empregar tal título com freqüência na descrição para Israel da esperança de um novo êxodo (p. ex., Is 41.14; 43.14; 44.6,24; 48.17; 49.7, 26). Uma vez que o livro de Jó pode ter sido escrito por volta da mesma época que o de Isaías — uma posição postulada por Anderson e por mim mesmo — ao ouvir esse termo, o público do tempo em que Jó foi escrito teria associado com Deus. No entanto, foram apresentados argumentos de que falta credibilidade a essa posição, pois ela requer que Deus sirva de testemunha legal contra si próprio. Apesar de tratar-se de um argumento forte, é preciso lembrar que essa tensão encontra-se no centro da história bíblica de redenção. Jesus, o Filho de Deus, experimentou a ira de Deus na morte para que pudesse obter de seu Pai o perdão para aqueles que cressem nele. Porém, a questão crucial é se o conceito de tal tensão é possível ou não em Jó. A resposta encontra-se no juramento complexo feito por Jó em 27.2-4. Ele jurou sua inocência pelo nome de Deus e, ao mesmo tempo, dentro da estrutu ra do juramento, acusou Deus de negar-lhe o direito e transformar-lhe a vida numa existência amarga. Assim, apelou a Deus contra Deus no contexto enérgico de um juramento. Pode-se encontrar mais apoio para essa identificação do redentor no acréscimo do vb. “vive” depois de “Redentor” (19.23-25). No contexto imediato, “vive” determina um contraste nítido entre a existência do “Redentor” e o desejo de Jó de que suas palavras sejam gravadas em pedra como testemunho perpétuo de suas declarações de inocência. Jó abandonou esse de sejo ilusório em troca de um advogado vivo. Ao acrescentar o termo “vive”, criou deliberada mente uma ligação com a confissão “o Deus vivo”, o que significa que Deus é o sustentador de toda a vida (Dt 5.26 [23]; Js 3.10; Jr 10.10; 23.36). O Redentor de Jó não pode ser outro senão o próprio Deus. 776
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Esse tema de um intermediário é desenvolvido por Eliú com o ensinamento de que Deus envia um mensageiro ou anjo àquele que confia em Deus e esteja passando por circunstâncias extremamente difíceis. (Jó 33.23-28). O anjo leva uma mensagem bem-vinda para o sofredor dizendo: “Redime-o para que não desça à cova; achei resgate” (33.24). O anjo atua de modo a restaurar a vítima a um relacionamento renovado e feliz com Deus. Esse anjo é “um dos mi lhares”, ou seja, “singular”, o que significa que existe apenas um anjo desse tipo. Eliú reco nhece que ninguém aqui da terra pode cumprir esse papel. Ele deve ser desempenhado por um mensageiro celestial. Antes da descrição do papel desse mensageiro, Eliú havia apresentado a concepção de que Deus usa sonhos e dores para guardar de fazer o mal aquele que confia nele (33.14-22, 29-30). Ou seja, a todo tempo. Deus procura instruir aqueles que lhe são fiéis para que se desviem de atos de arrogância que conduzem à morte prematura e para que possam continuar desfrutando uma vida abundante (36.5-12). Assim, as funções de Deus e do mensa geiro celestial são idênticas. e. Mais uma questão que diz respeito à justiça pode ser encontrada nas respostas de Jó a Deus. Depois que Deus havia honrado Jó ao vir e falar com ele, de acordo com o protocolo Jó devia apresentar uma réplica. No entanto, para o primeiro discurso de Deus Jó dá apenas uma breve resposta, asseverando que se mantinha firme em seu juramento de inocência (Jó 40.3-5). A convicção que Jó tinha de sua própria inocência e sua ira por Deus haver lhe causado sofri mento injustamente ameaçavam tomar-se uma barreira entre Jó e Deus. O orgulho não permitia que ele fizesse nenhuma concessão a Deus. A fim de que Jó pudesse ter mais tempo para refletir sobre como lidar com esse orgulho. Deus, em sua compaixão, proferiu um segundo discurso. As questões fundamentais que apresentou a Jó foram: “Acaso, anularás tu, de fato, o meu ju ízo? Ou me condenarás para te justificares?” (40.8). A fim de trazer à tona todo o significado da posição de Jó, Deus colocou diante dele a opção de subir ao trono do universo e reinar com mais competência do que Deus ou então de abrir mão de sua queixa. Deus estava revelando a Jó que se ele persistisse em manter sua declaração de inocência, estaria, em essência, se exaltando acima de Deus. Tal obstinação poderia levá-lo a cometer o pecado quintessencial de insolência. Para resguardar Jó de tomar esse passo, Deus mostrou-se compassivo, prolongando a descri ção do Leviatã e oferecendo a Jó a oportunidade de ponderar numa outra linha de pensamento, diferente de sua declaração de inocência e assim, evitar esse pecado. À medida que Deus falava, Jó chegou a uma conclusão diferente ao confessar: “Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem” (42.5). Prosseguiu humilhando-se e retratando-se no pó e nas cinzas (42.6). Esse último v. é difícil no original e várias versões em nossa língua tomam-no ainda mais problemático ao traduzirem o termo nhm como “arrepen der-se” (-^ # 5714) em vez de “retratar-se”. Essa versão dá ao leitor uma impressão equivo cada, pois Jó não usou o termo habitual para “arrepender-se” (swb, # 8740). Se ele tivesse se arrependido dessa maneira, teria seguido pelo caminho defendido energicamente por seus consoladores e previsto por Satanás. Antes, Jó usou o termo nhm, que significa deixar de lado uma determinada trajetória e traçar um novo rumo dc acordo com a convicção de que esse novo caminho é o certo. Com essas palavras, Jó retirou seu juramento de inocência, que im plicava uma reivindicação a Deus e submeteu seu destino inteiramente ao controle de Deus, depositando toda a sua confiança no Senhor. A resposta de Jó nos dá um entendimento mais profundo de como o homem não deve deixar que a busca por uma posição correta se tome uma barreira separando-o de Deus. f. Outra questão ainda relacionada à justiça é a abundância das riquezas de Jó depois de sua provação. O retrato de felicidade descrito no epílogo é perturbador, pois parece reinstituir a doutrina da retribuição, justamente a doutrina que foi redefinida na história de Jó. Uma 777
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reflexão sobre essa tensão leva a um esclarecimento do propósito essencial do livro de Jó. Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que os ensinamentos desse livro não negam o fato da re tribuição atuar de modo geral nos assuntos da humanidade. Antes, argumenta que esse prin cípio está subordinado tanto à soberania de Deus quanto à liberdade que ele concedeu a todas as partes de sua criação. Assim, a retribuição é um modelo geral para explicar os padrões de causa e efeito na experiência humana, mas esse princípio é incapaz de levar em consideração todos os aspectos complexos dessa experiência. Trata-se de um princípio que funciona, porém de modo imperfeito. Além disso, o resultado abençoado para Jó não concilia a justiça de Deus com o ensinamento acerca da retribuição, pois este último dogma é limitado demais para ser equiparado à justiça de Deus. Tendo-se em vista essas limitações, os julgamentos feitos sobre a situação de uma pessoa diante de Deus baseados na abundância ou carência são enganosos e promovem o preconceito. Em decorrência disso, o livro de Jó ensina que nem todos aqueles que prosperam são justos e nem todos os que sofrem cometeram algum pecado de conseqüên cias mais graves. Portanto, é errado condenar uma pessoa justa simplesmente por ela estar so frendo. A experiência de Jó comprova que tal severidade do sofrimento que recai sobre uma pessoa não lança dúvidas sobre a integridade do caráter dessa pessoa. Como se deve interpretar, então, a maior prosperidade de Jó depois de sua provação? Por definição, a doutrina da retribuição considera isso normal. No entanto, no contexto do livro como um todo, a prosperidade de Jó depois da provação é interpretada de maneira mais correta como resultado da presença de Deus na vida dele e não uma recompensa por ter atravessado tal provação com sua confiança em Deus intacta. Essa colocação é apoiada pela observação de que o retomo da prosperidade de Jó ocorreu ao longo de um período extenso. Há dois pontos do texto que indicam esse fato. Em primeiro lugar, quando a provação de Jó terminou, seus paren tes chegaram e ofereceram-lhe um presente. Pode-se entender esse presente como um costume normal que Deus usou para prover a Jó uma base para o patriarca reconstruir suas propriedades. Em segundo lugar, vários anos se passaram até que ele tivesse mais dez filhos. Além disso, a restauração de Jó a uma posição de honra é essencial a fim de proclamar a verdade de que a presença de Deus na vida de uma pessoa tem como propósito final promover a felicidade dela e nâo causar-lhe mal. O compromisso de Deus com uma pessoa não impede que ela passe por fases de tristeza — até mesmo longas fases — mas, em última análise, a graça de Deus a conduz em meio às aflições até uma vida abençoada. Sob a ótica do NT, um crente que tenha uma vida difícil na terra será abençoado com a vida depois da morte. Se, a longo prazo, Deus nâo promovesse a felicidade daqueles que o adoram, não haveria motivo algum para servir a esse Deus. Servir a um Deus que causa dor e que aumenta essa dor de maneira diretamente proporcional à fidelidade com que a pessoa o serve seria o auge da insensatez. De qualquer modo, esse seria o retrato de Deus no livro de Jó se o patriarca tivesse morrido sem se recuperar do sofrimento. Porém, depois de um tempo de sofrimento. Deus lhe restituiu as forças e a honra. Assim, adorar o Deus que triunfa sobre o sofrimento e conduz a uma vida abençoada para a edificação da comunidade redunda na mais profunda alegria. Portanto, o epí logo de Jó é essencial para um retrato correto da maneira como Deus se relaciona com aqueles que continuam depositando nele sua confiança durante os tempos de aflição. E importante acrescentar que, na concepção teológica da época em que o livro de Jó foi escrito, a resolução das aflições de Jó não poderia ter sido adiada até o céu, pois a crença numa existência celeste ideal depois da morte ainda não havia sido revelada. Isso é confirmado pela passagem na qual Jó especula sobre ressurgir para uma vida feliz depois de passar pelo reino dos mortos (Jó 14.7-12, 14). O fato de ele desconsiderar a possibilidade de um indivíduo ressuscitar está de acordo com outras passagens das Escrituras, uma vez que elas ensinam a 778
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ressurreição de toda a humanidade no final da história e não ressurreições aleatórias de indi víduos ao longo dela. 3. A contribuição dos discursos de Javé. A exploração rica e inquisitiva de várias qu tões ao longo de todo o diálogo cria certas expectativas elevadas quanto aos discursos de Javé. Da primeira vez que ouvem esses discursos, porém, a maioria das pessoas fica decepciona da ao extremo. Alguns estudiosos chegam a considerar os discursos de Javé completamente irrelevantes para as questões levantadas no diálogo. Tal abordagem, porém, deixa escapar a profundidade encontrada nessas palavras. O estudo mais cuidadoso desses discursos mostra que eles esclarecem vários aspectos do sofrimento do justo e da tristeza humana em geral (cf. 7.1-2; 14.1-3). É preciso ressaltar, desde o início, que Javé apareceu a Jó por sua própria iniciativa e não porque o juramento de Jó o obrigou a falar. Essa idéia é transmitida tanto pela localização dos discursos de Eliú (caps. 32— 37) depois da declaração de inocência de Jó (caps. 29— 31) quanto pela abordagem empregada por Deus. Apesar de Jó haver chamado Deus como juiz supremo, em sua soberania e corno uma expressão do que esta vem a ser Deus chegou e se dirigir a Jó não como juiz ou monarca poderoso, mas como o mestre supremo da sabedoria. Na condição de mestre, ele apresenta a Jó uma série de perguntas retóricas, esperando que Jó reflita sobre elas e adquira um maior entendimento acerca de seu relacionamento com Deus no contexto da criação em sua totalidade. Deus partiu do pressuposto de que Jó possuía a capacidade de usar as evidências dadas a ele a fim de obter uma compreensão mais clara das questões que havia levantado. Mais uma vez, Deus demonstra grande confiança em sua criação humana. Com a aquisição de uma nova perspectiva da parte de Jó, a intenção de Deus era fazer com que Jó considerasse o próprio sofrimento de maneira diferente em vez de visar apenas a uma decla ração de inocência. O principal objetivo de Deus era restabelecer seu relacionamento com Jó tomando por base uma reconciliação pessoal e não um pronunciamento legal. A abordagem escolhida por Deus nos mostra que, o grande Criador deseja fazer com que os homens tenham uma compreensão mais profunda da situação e agonias deles. Em resposta às queixas de Jó, Deus o questionou sobre a natureza do universo que Deus mesmo havia criado e sobre a maneira como era governado. A argumentação de Deus é essencialmente a de que as coisas inexplicáveis para o entendimento humano se explicam dentro do contexto da sabedoria divina. Em termos mais específicos, o caso do sofrimento humano não desmente a idéia de que Deus governa com justiça. Aquilo que para os homens é motivo de perplexidade e, por vezes, considerado uma transgressão revoltante da justiça não é inexplicável para Deus. Esse tema da sabedoria de Deus é explorado na bela Ode à Sabedoria (cap. 28), que louva as diferenças incomensuráveis entre a compreensão humana e a sabedoria de Deus. A engenhosidade humana leva a realizações tecnológicas extraordinárias, como se pode ver nas técnicas de mineração, pelas quais os mineiros chegam às profundezas da terra a fim de extrair pedras magníficas e valiosas (Jó 28.1-11). Nesses exemplos, os homens demonstram a superiori dade de sua inteligência em comparação com o leão ou o falcão, pois essas criaturas majestosas que dominam sua própria esfera, jamais penetraram tais profundezas (28.7-8). Além disso, ao mesmo tempo em que a engenhosidade humana permite que alguns ajuntem grande quantidade de riquezas, a soma de todas as riquezas acumuladas não é suficiente para comprar sabedoria (28.12-19). Mais importante, porém, é que a genialidade humana, ainda que maravilhosa em suas realizações, não tem a mesma qualidade que a sabedoria de Deus (28.23-27). Somente Deus conhece os caminhos dessa sabedoria (28.28). Ainda assim, os homens podem provar um pouco de tal sabedoria ao desenvolverem uma atitude de temor ao Senhor (28.28) 779
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Uma vez que conhece os caminhos da sabedoria. Deus a emprega com todo seu po tencial em seu empreendimento criador. Como diz a ode: “então, viu ela a sabedoria e a ma nifestou; estabeleceu-a e também a esquadrinhou” (28.27). Nesse processo de criação Deus estava descobrindo as capacidades espantosas da sabedoria. As inúmeras maravilhas naturais dão testemunho de que foi Deus quem criou os mundos em sabedoria. Em decorrência disso, ao provarem os frutos da sabedoria, os homens chegam a descobertas extraordinárias por meio do estudo da ordem natural. Diante dessa Ode à Sabedoria, não é de admirar que Deus falou a Jó sobre a ordem da criação. Ao orientar as idéias do patriarca em torno da sabedoria. Deus evitou que ficasse entre a frigideira e o fogo ao refletir que se Deus é bom e o sofrimento existe, então Deus nâo é onipotente ou se é onipotente e permite o sofrimento, então não é bom. Desse modo, Javé rejeitou a queixa de Jó de que o poder de Deus levava Deus a passar por cima de sua justiça; e ao rejeitar essa queixa, Deus demonstrou a Jó que havia criado o mundo em sabedoria e que continuava a governá-lo pela sabedoria. E em decorrência de tal sabedoria que o poder e justiça não são conflitantes no governo de Deus. No entanto, falta aos homens a capacidade de discer nir como tanto o poder quanto a justiça de Deus são mantidos em sabedoria sem que nenhum dos dois seja enfraquecido. Um dos principais motivos pelos quais os homens têm dificuldade em compreender essa verdade encontra-se na tendência que têm de reconhecer todas as coisas em termos utilitários. Deus, no entanto, criou o mundo não apenas para funcionar de modo eficiente, mas também para que fosse um âmbito de alegria, festividade e maravilha. Pelo fato de esses elementos nâo serem quantificáveis, os homens muitas vezes deixam de considerar a própria importância ao julgarem Deus à luz da criação. Em sua descrição da criação. Deus não negou a existência das forças do mal, mas as severou explicitamente que ele é Senhor de tudo. Essa declaração é apoiada pelo fato de que ele conhece todos os recessos mais distantes da ordem criada: as fontes que alimentam o mar, o lugar onde habitam a luz e as trevas, os depósitos de neve e morada dos ventos (Jó 38.1624). Essa argumentação baseia-se na premissa de que aquele que controla as extremidades do universo é senhor da ordem criada. No início da criação. Deus fez o mar, que simboliza os po deres mais furtivos de oposição a ele e envolveu-o em mantos de nuvens (38.9). O mar pode atuar tanto de modo benéfico quanto destrutivo em relação à humanidade. Devido ao seu po tencial destrutivo, Deus determinou limites que o mar não pode ultrapassar, significando que, por mais furiosa que seja sua agitação, está sujeito a Deus (38.10-11). O mar também é o lugar onde habita um grande monstro que personifica o poder de destruição e que recebe vários no mes nos escritos originais, como Raabe (9.13; 26.12), Leviatã (# 4293; Jó 3.8; 40.25— 41.26 [41.1-34]) e a serpente (tannm, -> # 9490; Jó 7.12). Nos mitos das nações vizinhas de Israel, o monstro representa o mal cósmico, mas para Israel, ao mesmo tempo em que esse monstro pode causar devastação sobre a terra, é simplesmente uma criatura feita por Deus para ser parte da diversão e da beleza da criação. Tais poderes são representados nos discursos de Javé, pelo Beemote (Jó 40.15-24) e pelo Leviatã (Jó 38.12-15), possivelmente o hipopótamo e o crocodilo, nessa ordem. Suas descrições são um misto de características terrenas e míticas, especialmente o retrato do Leviatã — uma mistura indicativa de que esses animais representam as forças do mal. E provável que o Beemote simbolize forças naturais que, por vezes, causam vasta destrui ção e o Leviatã simbolize as forças cósmicas do mal, as quais atuam de modo poderoso que, de tempos em tempos, surgem para desorganizar a vida na terra. Mesmo sendo mais fortes do que os homens e tendo certa independência, de modo algum esses monstros são capazes de governar ou limitar Deus. 780
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É interessante observ ar que, ao mesmo tempo em que Deus usa esses retratos para se referir às dimensões cósmicas do sofrimento de Jó, Deus não menciona sua discussão com Sa tanás. Essa abordagem tem suas origens numa visão monística das Escrituras. Apesar de uma força maligna ser a causa imediata da aflição de Jó, era preciso que ele tratasse apenas com Deus e não com a força do mal. Assim, os homens devem apresentar os obstáculos que en contram diante dc si a Deus e não às forças cósmicas por trás desses obstáculos. A seu modo, Deus tratará com as forças cósmicas, pois ele nâo deu aos homens a capacidade de lidar com elas diretamente. Ao longo de todo o seu primeiro discurso. Deus afirma de diversas maneiras que co locou a justiça dentro da estrutura do universo. A cada manhã, dá luz para se apoderar da ter ra e mandar os perversos para seus esconderijos, como quem sacode migalhas de uma toalha (38.12-15). Para cada um dos elementos diversos da criação, ele fez algum tipo de canal que os dirige e que determina um perímetro dentro do qual devem operar. Há limites para as chuvas (38.25, 27), um caminho para os relâmpagos e trovões (38.25-35), arreios e laços para guiar as constelações (38.31-32) e leis para governar os corpos celestes (38.33). Do mesmo modo. Deus deu aos diversos elementos e criaturas certa medida de liberdade. Como resultado, há ocasiões em que uma força, ao exercer sua liberdade, mesmo dentro dos limites determinados por Deus, pode causar algum mal a outra criatura ou a outra força. Quando duas ou mais dessas forças entram em conflito, há um grande tumulto. Ainda assim, ao atribuir a elas uma medida limitada de liberdade, Deus não transgride a própria justiça nem limita o próprio poder, pois, em última análise, a ordem toda se sujeita às leis de Deus e não há poder que possa tirar Deus de seu trono. Nada pode ocorrer fora do perímetro delimitado por ele. Do ponto de vista de Deus, a ordem criada não existe apenas para os homens. A dádiva da chuva ilustra as diferenças incomensuráveis entre a sabedoria divina e a compreensão hu mana. Enquanto os homens, especialmente aqueles que vivem em regiões nas quais a chuva é escassa, gostariam de concentrar toda essa chuva sobre suas terras. Deus faz cair a chuva no deserto e nas terras ermas (38.25-27). Com essa ilustração, Deus está afirmando que, em sabedoria, ele governa sobre toda a terra para o bem de todas as criaturas. Deus também ilus tra como distribui medidas distintas de sabedoria a diferentes criaturas. Enquanto os homens têm dificuldade em prever as condições do tempo, certas aves são dotadas de uma medida de sabedoria que pode anunciar com precisão quando se aproxima a aurora ou uma tempestade (38.34-38). Nesse assunto específico, as aves têm mais entendimento que os homens. Com essa ilustração, Deus procura colocar os homens nos devidos lugares. Deus expande o tema de sua sabedoria e cuidado com sua criação numa série de des crições de animais. O cuidado terno de Deus pode ser visto na forma como ele sabe o momen to do parto das cabras monteses (Jó 39.1-4). Além disso, em sabedoria. Deus deu aos vários animais uma condição exaltada. No entanto, a maioria dos animais desfruta essa condição ao ter que suportar dificuldades. O jumento selvagem, por exemplo, tem liberdade de vagar pelas estepes, sem precisar sujeitar-se à voz de seu mestre (39.5-8). Mas o preço dessa liberdade é ter que viver do suprimento parco de alimentos proporcionado pelas terras salgadas (estéreis). Não obstante, essa liberdade dá ao jumento selvagem o prazer de rir-se de seu correlativo do méstico, o burro, que precisa ouvir os gritos ríspidos daquele que o conduz. Semelhantemente, o boi selvagem é majestoso, e seu grande poder nunca se sujeita ao controle humano (39.9-12). Em troca de sua liberdade, deve procurar comida em terra onde esta é escassa. A fim de ter liberdade, o boi renuncia o privilégio de comer os grãos espalhados para ele na eira do dono. Apesar de nenhum homem poder conter a força desses dois animais vigorosos, Deus é o Senhor do homem. O avestruz, por outro lado, é um pássaro de aparência estranha (39.13-18) e, apesar 781
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de ser ave, não consegue voar. Ainda assim, não lhe falia a própria glória, pois esse pássaro estranho pode correr mais rápido do que o majestoso cavalo. Por meio dessas descrições dos animais, Jó descobre que, muitas vezes, a criatura deve suportar as dificuldades em troca de uma habilidade ou qualidade valiosa que se toma a sua glória. As características e hábitos desses animais são, também, testemunho da sabedoria de Deus como criador e sustentador de sua criação. Ele é Senhor dos membros majestosos, or gulhosos, rebeldes e ferozes da criação, inclusive daqueles animais que são desprezados pe las pessoas. Ao contrário de Deus, os homens não têm o entendimento, a capacidade e nem a energia para cuidar de todos esses tipos diferentes de criaturas; mas Deus o faz. No entanto, ao contrário dos animais, os homens têm o potencial para grandes realizações morais. O preço desse potencial, porém, é precisar suportar situações trágicas e dificuldades características da vida na terra (Jó 14.1-2). Desse modo, Deus está se dirigindo a Jó na expectativa de que era necessário que Jó tomasse uma decisão moral sobre sua declaração de inocência diante da for ma como Deus governa a criação. Nesses discursos, os exemplos apresentados por Javé apóiam a premissa de que ele é, ao mesmo tempo, justo e onipotente. Ele é justo, pois determinou limites para todas as forças e criaturas, inclusive aquelas que causam destruição; é justo pois governa o mundo pela lei e porque, em sua compaixão, cuida de todos os tipos de criatura. Ele é onipotente, pois nenhuma outra força, natural ou cósmica pode opor-se-lhe ao domínio. A sabedoria, a serva de Deus, mantém unidos esses dois atributos para que Deus, aquele que criou essa ordem, governe sua criação de maneira fiel à sua natureza. Pelo fato de faltar aos homens compreensão para explicar os acontecimentos e processos misteriosos de várias partes da criação, é-lhes impossível alcançar algum entendimento pelo qual pudessem provar que Deus é culpado de administrar indevidamente a ordem por ele mesmo criada. Tendo em vista as complexidades e provas contraditórias proporcionadas por um estudo da natureza e das ocorrências humanas, a única passagem verdadeiramente aberta para os homens cresce rem em sabedoria é cultivar o temor do Senhor em seus corações. Esse exercício os conduz à convicção de que aquilo que é confuso e misterioso do ponto de vista deles é explicável dentro da sabedoria de Deus. O temor ao Senhor é o caminho que os homens devem tomar para provar um pouco dessa sabedoria. Esse temor também lhes dá a certeza de que o Deus Todo-Poderoso governa com justiça. 4. Princípios teológicos para os cristãos. Outra maneira de explicar essa mensagem teológica é extrair inferências do livro de Jó dentro do contexto do cânon. Uma verdade bá sica aprendida pela experiência de Jó é que mesmo o pior sofrimento não tem o poder de impedir uma pessoa de buscar a Deus. A certeza inabalável de Jó quanto à própria inocência ao longo das provações alerta todos os crentes para a necessidade da certeza de estar-se num relacionamento correto com Deus. Se as circunstâncias levarem um membro da comunidade da fé a duvidarem de sua situação diante de Deus, esse membro deve apoiar-se firmemente na convicção de que é filho de Deus. Para um, o fundamento dessa convicção pode ser o dia da conversão. Para outro, pode ser a lembrança da presença confirmadora de Deus numa ex periência inesquecível. Para outra ainda, pode ser a participação fiel como um canal da graça oferecido pela igreja, como a Eucaristia. Para outra, pode ser um determinado ato de Deus na vida dela. Ao gravar no mais profundo da mente a convicção do perdão de Deus, o crente é capaz de passar pelas mais tenebrosas provações sem duvidar de sua situação no relacio namento com Deus. Esse fundamento que confere a certeza da aceitação de Deus torna-se um firme alicerce para buscar a Deus nas ocasiões nas quais se tem a impressão de que ele se ausentou da vida do crente. 782
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Além disso, a perseverança de Jó prova que é possível ao crente servir a Deus fielmente mesmo em meio às circunstâncias mais sofridas. O próprio Deus está certo dessa capacidade do justo de apegar-se à integridade a despeito do que possa acontecer. Em meio às agonias do sofrimento, Jó aprendeu de maneira mais profunda que o valor mais elevado da vida é ver Deus, conforme expressou ao dizer “agora os meus olhos te vêem”. Ver a Deus confere à pes soa uma profunda consciência de significado para a existência, algo que transcende todas as circunstâncias aqui da terra. O livro de Jó oferece uma importante contribuição para a mensagem bíblica da salvação ao provar que aquele que sofre ao extremo não é necessariamente um pecador em função desse sofrimento. Essa verdade é essencial para Isaías desenvolver o retrato do Servo Sofredor (Is 42.1-9; 49.1-7; 50.4-9; 53.1-12). Esse servo de Deus sofre a mais cruel das aflições e, mesmo assim, mantém-se firme em sua retidão. Pelo fato de o servo ser justo e obediente a Deus, o Senhor lhe confere o mérito vicário do sofrimento (cap. 53). No entanto, do ponto de vista do ensinamento da retribuição, o sofrimento terrível desse servo seria considerado pela maioria como prova de que, na verdade, ele é um pecador sendo submetido a aflições pelo próprio Deus (53.4). O relato de Jó, porém, mostra que essa interpretação é equivocada. A maior verdade concedida aos homens é a de que, por causa da inocência e obediência fiel do servo, o mérito vicário de seu sofrimento pode declarar a justiça de muitos (53.7-12). Para que fosse possível compreender o significado pleno da obra de Cristo na cruz, os escritos do NT voltaram-se para o Cântico do Servo, constante em Isaías. Por meio dos ensi namentos desse cântico, juntamente com a mensagem do livro de Jó, cria-se com convicção que Jesus era, de fato, absolutamente sem pecado, apesar da gravidade de seu sofrimento. Por ser verdadeiramente justo, Deus fez expiação pelo pecado, morrendo como Cordeiro de Deus. Como resultado de sua obra, Deus pode declarar justos todos aqueles que crêem nele (Rm 3.24-26). Nesse sentido, a mensagem do livro de Jó contribuiu sobremaneira para o significa do da morte de Jesus. O conceito de mérito vicário adquirido pelo sofrimento encontra-se, na realidade, pre sente de modo incipiente nas instruções dadas por Deus aos consoladores (Jó 42.7-9). Depois que Jó estava reconciliado de todo com Deus, o Senhor instruiu os consoladores a pedirem que o patriarca orasse por eles, uma vez que não haviam falado de Jó corretamente. O fato de Javé confiar a Jó essa responsabilidade indica que Jó havia adquirido maturidade espiritual ao manter sua integridade durante o sofrimento imerecido pelo qual passou. As instruções de Deus aos consoladores também mostram de modo mais profundo a maneira como Deus deseja que as pessoas se relacionem entre si. Tendo triunfado sobre seu sofrimento terrível, apesar da falta de apoio de seus consoladores, seria natural que Jó sentisse prazer na desgraça desses homens, uma vez que lhe haviam faltado quando ele estava com a razão. No entanto, Javé pediu a Jó que se abstivesse de tal vangloria pessoal a fim de interceder por eles. Com isso, Jó aprendeu que sua vitória era para o crescimento de sua própria relação com Deus e para o bem de outros que precisam receber o perdão de Deus e não para a exalta ção pessoal. Desse modo, em meio ao triunfo, Jó precisou humilhar-se para agir em favor do bem espiritual daqueles que haviam falhado com ele. A excelência desse livro encontra-se em seu rompimento com a equação categórica de que pecado é igual a sofrimento, concepção que tem predominado em uma parte tão grande do pensamento religioso. Ao realizar essa ruptura, o livro adquire uma enorme força libertadora para os membros da comunidade da fé. Estes aprendem que o sofrimento não é acompanhado de condenação espiritual. Em decorrência disso, os aflitos podem declarar com ousadia e certeza sua confiança em Deus durante o pior sofrimento, sabendo que no final, Deus os honrará. 783
Jó: Teologia de
B ib l io g r a f ia
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Joaquim
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Joaquim
Joaquim ( P ^ in ’ ou # 3422).
|'^ hôyãkin,yôyãkin). # 3382,
AT 1 .0 nome Joaquim foi dado ao penúltimo rei de Judá antes da queda de Jerusalém. Ele era filho de Jeoaquim, apesar de ser surpreendente encontrar-se um nome que significa “Javé estabelecerá” ou “Que Javé estabeleça” dado por um pai que mostrou tão pouca consideração por Javé quanto Jeoaquim. Ele também é conhecido como Jeconias (1 Cr ICr 3.16) ou, em al gumas versões, como Conias (Jr 22.24) (= “Javé é fume” ou “permanente”). De acordo com 2 Reis 24.1 -5, Jeoaquim tomou-se vassalo da Babilônia, mas depois se rebelou e, portanto, enfrentou a ira de Nabucodonosor. Essa derrota foi o julgamento de Deus pela repetição dos “pecados cometidos por Manassés” (v. 3) e “também por causa do sangue inocente que ele derramou” (v. 4). Depois de sua morte, Jeoaquim foi sucedido pelo filho Joa quim que, aos dezoito anos de idade, tomou-se rei e logo teve de enfrentar o ataque vingativo da Babilônia. Os registros babilônios são paralelos a 2 Reis 24.8 ao falarem do reinado de três meses do rei Joaquim. Uma determinada tábua (DOTT, 80) afirma que, no sétimo ano de Nabuco donosor, no mês de quisleve (ou seja, dezembro de 598 a. C.), o rei babilônio marchou à terra de Hati (Palestina), sitiou a cidade de Judá e, no segundo dia do mês de adar (16 de março de 597), tomou a cidade e capturou o rei. O registro de 2 Reis 24.10-17 (cf. 2Cr 36.9-10) fala da rendição de Joaquim e de como os tesouros do templo e da casa do rei foram levados. Os escritores bíblicos consideravam a queda de Jerusalém e o exílio do rei e do povo o julgamento do Senhor pela infidelidade de les, a rejeição da lei de Deus e a recusa em ouvir as advertências dos profetas. Partindo dessa base teológica, Jeremias afirmou que era melhor sujeitar-se à Babilônia do que resistir (p. ex.. Jeremias 27). Em sua parábola dos figos, o profeta descreveu aqueles que foram levados para o exílio com Joaquim como os “bons figos”, e aqueles que ficaram com o rei Zedequias como os “figos ruins”. Sobre os primeiros, o Senhor disse: “Porei sobre eles favoravelmente os olhos e os farei voltar para esta terra” (Jr 24.6). 2. Jeremias resistiu ao otimismo insensato de Hananias (Jeremias 28), o qual preg que em breve o jugo da Babilônia seria quebrado e Joaquim, bem como todos os outros exi785
Joás
lados, retomaria a Jerusalém. Jeremias escreveu uma carta (cap. 29) garantindo que o Senhor tinha propósitos para os exilados, mas que estes se cumpririam a longo prazo e não em dois anos como Hananias havia dito. Os exilados deviam ficar satisfeitos em assentar-se na Babilô nia. Javé os havia feito ir para o exílio e os manteria lá e, depois de setenta anos, ele os traria de volta. (-> Jeremias: Teologia) Joaquim foi visto de duas maneiras distintas, porém não contraditórias, por Jeremias e Ezequiel. Jeremias o considerou como uma vasilha quebrada, um homem sem filhos, sem descendentes para herdar o trono de Davi em Jerusalém. Deus removeu o anel real de Davi da mão de Joaquim (Jr 22.24-30) a fim de entregá-lo para um membro fiel da linhagem davídica depois de exílio, a saber, Zorobabel (Ag 2.20-23). Tendo em vista a forma como as profecias de Ezequiel foram datadas a partir do exílio de Joaquim na Babilônia (e não de acordo como reinado de Zedequias), e pelas evidências de fragmentos de cerâmica que se referem a ele, tem-se a impressão de que Joaquim era considerado o rei legítimo e não Zedequias, aquele que Nabucodonosor havia colocado no trono em Jerusalém. 3. Os versículos finais de 2 Reis (25.27-30 = Jr 52.31 -34) registram que depois da morte de Nabucodonosor, seu sucessor Evil-Merodaque libertou Joaquim no 378 ano de seu exílio e deu-lhe um lugar de honra à mesa do rei para o resto da vida. Essa conclusão parece ter a in tenção de indicar que tal acontecimento deixava implícita a possibilidade de um reavivamento nacional sob a liderança de um rei davídico (G. H. Jones, 1 & 2 Kings, NCB 2:648). Pode-se dizer, ao menos, que, apesar de o julgamento sobre Joaquim (Jr 22.24-30) ter-se cumprido no exílio na Babilônia e de nenhum de seus descendentes ter se assentado no “trono de Davi e ainda reinar em Judá” (v. 30), houve restauração do exílio e, como mostra Mateus 1.11-12, Joaquim (Jeconias) tem um lugar na linhagem messiânica. B ib l io g r a f ia
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Joás
Joás (ttJNi1 [yô ’õs], rei de Judá, # 3409).
AT 1.2 Reis 11— 12 relata a história de Joás (nome que também é grafado Jeoás) de Judá, que reinou aproximadamente durante os últimos quarenta anos do século IX a. C. Seu pai, Acazias, foi morto (2Rs 9.27-28) quando Jeú tomou o trono da casa de Acabe. Ao saber da morte, Atalia, a mãe de Acazias, matou os príncipes (2Rs 11.1) e usurpou o trono. No entan to, Joás — que na época estava com um ano de idade — foi escondido pela tia, Jeoseba (2Rs 11.2-3). Depois de seis anos, o sacerdote Joiada alertou os líderes militares secretamente para o fato de que Joás ainda estava vivo. Eles providenciaram para que Joás recebesse uma escolta militar até a área do templo, onde o sacerdote Joiada realizou a coroação do menino (11.4-12) e, depois disso, Atalia foi morta (11.13-16). Joiada estimulou uma renovação da aliança com o novo rei e o povo da terra, após a qual o povo destruiu o templo de Baal e matou os sacerdotes 786
Joás
desse deus e Joás foi colocado no palácio (11.19-20). Como rei, Joás instituiu um sistema de arrecadação para financiar reformas no templo (12.4-16) que, de acordo com a avaliação do historiador, foram uma iniciativa bem-sucedida. Quando Hazael da Síria ameaçou Jerusalém, Joás enviou-lhe os tesouros reais e do templo para evitar o ataque. Joás foi morto pelos próprios servos (12.20-21). 2. Joás foi objeto de elogias com ressalvas do historiador deuteronomista. De modo favorável, o historiador atribui a Joás as reformas instituídas em seu reinado (2Rs 12.2, no con texto). No entanto, alguns indícios sutis no texto indicam alguma ambivalência, uma vez que em duas ocasiões o historiador apresenta ressalvas para declarações positivas sobre Joás. Uma dessas declarações caracteriza os modelos teológicos deut. ao observar que Joás não destruiu os lugares altos de Baal (2Rs 12.3; cf. IRs 13.23; 15.14, etc.). A segunda ressalva (2Rs 12.2) fica implícita: “Fez Joás o que era reto perante o Senhor, todos os dias em que o sacerdote Joiada o dirigia". O leitor percebe que houve mudanças com a morte de Joiada, apesar de Reis não registrar nenhuma explicação (ver, porém os comentários abaixo sobre Crônicas). Além disso, como filho de Acazias, Joás deu continuidade à linhagem real de Davi que havia sido ameaçada por Atalia, neta de Acabe. (-> Teologia Deuteronômica) 3. 2 Crônicas 22.10—24.17 complementa o relato de 2 Reis 11— 12 sobre Joás e mo dela a história de Joás de acordo com a apresentação teológica que o cronista faz da história (-> Crônicas, Teologia; Dillard, 76-81). a. Os complementos fornecem dados históricos ou biográficos que não se encont presentes em Reis e informações explicativas que esclarecem a narrativa, i. Entre os comple tos históricos / biográficos estão: uma descrição do estado civil de Joás (2Cr 24.3), um relato do destino de Joiada (24.15-16) e uma lista ligeiramente divergente de conspiradores (24.2627). ii. Os complementos explicativos são mais complexos: O cronista afirma que a tia de Joás era esposa de Joiada (2Cr 22.11), esclarecendo, desse modo, como Joiada ficou sabendo sobre Joás; o cronista elucida o motivo de o templo estar em péssimo estado de conservação, a saber, pelo fato de os filhos de Atalia terem invadido o templo e roubado alguns dos seus tesouros a fim de usá-los para os baalins (24.7). O cronista explica também como Joás abandonou Javé depois da morte de Joiada (24.17-22), tomando explícita a mudança que fica subentendida em 2 Reis 12.2. A configuração teológica mais relevante refere-se ao caráter central do papel dos levitas em Crônicas, uma vez que estes não são mencionados em 2 Reis 11— 12. O cronista apresenta levitas — e uma divisão militar — como a escolta de Joás quando este foi levado ao templo (cf. 2Cr 23.6-7 com 2Rs 11.7-8). O cronista também destaca o papel dos levitas em outras partes desse relato (bem como do livro) (2Cr 23.2, 4, 8, 18-19, etc.). Além disso, o cronista ressalta a participação de “todo o Judá” (Cr. 23.5, 8) na coroação do rei Joás. Essas observações suge rem que a teologia do cronista exigia que ele removesse ou fizesse ressalvas quanto a qualquer impressão de que a coroação fora instigada somente pela força militar. Por fim, o cronista descreve em detalhes, e de duas maneiras, a morte de Joás. Primeiro, apresenta a ameaça da Síria como tendo sido mais direta. O cronista omite qualquer menção a Gate e inclui na sua narrativa (em vez de deixar implícito) um ataque direto sobre Jerusalém pelo exército arameu (2Cr 24.23). Então, o cronista especifica que Joás foi ferido na batalha contra os sírios antes de ser morto pelos próprios servos (24.25). (-> Crônicas: Teologia) NT Joás não é mencionado no NT, o que é significativo à luz da genealogia de Mateus (Mt 1.2-16) que traça a linhagem davídica de Jesus passando pelos reis de Judá. Essa omissão não deve ser interpretada como um julgamento negativo contra Joás, uma vez que Mateus omite três 787
Joel: Teologia de
reis davídicos sucessivos (Acazias, Joás, Amazias) e a rainha não davídica (Atalia). O padrão empregado por Mateus de três grupos de quatorze gerações (Mt 1.17) exigia que se fizessem adaptações nos registros dinásticos. B ib l io g r a f ia
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Assim como Elias, o nome Joel (yó el, # 3408) signifi ca “Javé é Deus” e serve de testemunho para a fé carac terística dos pais israelitas cujo desejo era que o filho compartilhasse dessa fé. É o nome de mais de uma dúzia de indivíduos e especialmente, de um profeta que deu seu nome a um livro. Os nomes pessoais que combinam o nome de uma divindade nacional ou local com “deus” ( ’êl) como elemento predicativo numa confissão de fé eram comuns no OMA. Outros exemplos são Il-Adade em aram., Samas-ilu e Merodaque-ilu e Mlk’l em palmireno. Joel: Teologia de
A. Estrutura literária Esse livro curto que, apesar de sua complexidade parece ser um único texto; registra a reação do profeta a uma praga de gafanhotos que ameaçava destruir o povo de Deus. Não há nenhuma indicação direta de data e, enquanto alguns defendem uma data anterior ao exílio, a aparente referência à queda de Jerusalém em 587 a. C. e aos seus resultados em Joel 3[4].2-3, 6, bem como a profecias anteriores ao longo de todo o livro, apontam para um período depois do exílio. Depois do título em 1.1, o livro pode ser dividido em três partes, sendo que cada uma delas menciona o conhecimento de Deus (J1 2.14, 27; 3[4].17): 1. exortações para participar da lamentação comunitária em 1.2—2.17; 2. as respostas positivas de Deus com referência ao problema imediato em 2.18-27; 3. as respostas de Deus com referência a questões mais radicais em 2.28— 3.21 [3.1—4.21].
B. Temas teológicos I. O livro reflete a concepção geral da aliança como uma ligação triangular entre Javé povo e a terra (ver esp. J12.18). A terra é considerada o barômetro que registra o relacionamento espiritual entre Deus e Israel. Uma praga de gafanhotos, que teve um efeito devastador sobre as plantações (1.7, 10-12, 17) e os pastos (1.18), colocou em risco o suprimento de comida da comunidade e também as ofertas regulares no templo (1.9,13). Uma estiagem subseqüente im pediu o crescimento de nova vegetação e deixou secos os ribeiros sazonais, de modo que até os animais selvagens foram afetados (1.19-20). A descrição dos ruídos desses animais comoventes em termos de oração mostra que é assim que Deus os ouve, em sua preocupação com a terra e seus ocupantes (cf. Jó 38.41; SI 104.21; 147.9). Os apelos de Joel aos setores específicos da comunidade (J1 1.5-14) e ao povoem geral (2.1-17) para que tomem uma atitude espiritual em relação ao problema, ao se lamentarem e tomarem para Deus (2.12-13), indica que a praga e a seca eram castigos divinos cujo propósito era incentivar o arrependimento (cf. Am 4.9) ou uma maldição da aliança visando ao mesmo fim (Lv 26.18-20). Conformemente, as promessas di vinas de chuva e fertilidade que seguem o arrependimento do povo (Jl 2.19,22-26; cf. 3[4].18) 788
Joel: Teologia de
são evidências de uma comunhão renovada entre Deus e seu povo que se encontra, então, aberto para a bênção da aliança (cf. Lv 26.3-4; Dt 28.1-12) (-> bPrit, aliança, # 1382). 2. O templo em Jerusalém é considerado o ponto central da comunicação entre Javé e seu povo. Localiza-se no “santo monte” (Jl 2.1; 3[4].I7), onde Deus habita em santidade inviolável (3[4].17, 21; cf. 2.32 [3.5]). O templo é o cenário da adoração sacrificial de Israel ( 1.9, 13, 16). E também uma casa de oração, como em 1 Reis 8.28-45 (cf. Is 56.7), para onde o povo tem de ir e oferecer suas orações. A lamentação comunitária é expressada pelos sacerdo tes em nome de Israel (Jl 2.17; cf. IRs 8.37-38). O lamento constituía uma estrutura religiosa dentro da qual uma crise pessoal ou comunitária podia ser relatada a Deus e, talvez, resolvida (-> qinâ, lamento, # 7806). A súplica por socorro pode declarar uma inocência relativa (ver SI 44.17-21 [18-22]) ou, como no caso de Joel, ser um instrumento para a confissão de pecados (cf. SI 79.8-9). Era acompanhado de ritos externos de jejum (Jl 1.14; 2.12, 15) e roupas de luto consistindo de panos de saco e trajes rasgados (1.13; 2.13; cf. 2Rs 19.1). Em Joel, o lamento comunitário age como uma expressão de arrependimento. Deve ser sincero: o povo deve colocar-se diante de Deus não apenas com as vestes rasgadas, mas também com o coração quebrantado que tais vestes representavam (Jl 2.12-13; cf. Lm 3.41). Apesar de os profetas antes do exílio condenarem o uso incorreto do ritual, Joel aprova seu uso devido como uma expressão de espiritualidade. Por trás de seu papel castigador. Deus é descrito como sendo fundamentalmente cheio de graça (Jl 2.13; cf. Ex 34.6). E, no entanto, sua soberania magnífica é guardada por uma incerteza quanto à sua resposta. “Quem sabe?” (Jl 2.14) ou “talvez” são elementos característicos dos chamados bíblicos ao arrependimento (ver Am 5.15; Sf 2.3; At 8.22; 2Tm 2.25). Orar não significa impor uma vontade própria sobre Deus, mas estar aberto para a vontade dele. 3. O “dia do Senhor” é o tema teológico que une toda a obra (Jl 1.15; 2.1, 11, 32 [3.5]; 3[4].14). Na primeira parte do livro, é usado como uma interpretação ameaçadora da praga, visando convencer a comunidade de sua triste situação espiritual. Lança mão do uso profético anterior da expressão, que descrevia nesses termos a intervenção punitiva de Deus contra Is rael e outras nações (Am 5.8; Sf 1.5; ver também Is 13.6-13; Ez 30.2-3). Os gafanhotos são um exército invasor, destruindo tudo segundo as ordens de Deus. Assim como em Sofonias 2.3, o arrependimento cria a possibilidade de um fim para essa devastação. O uso da expressão em Joel 2.32 [3.5]; 3[4];14 entretece o tema do dia de Javé num esquema escatológico abrangente. O tema profético possuía um caráter universal: antes disso, Sofonias prenunciou esse acontecimento como uma deflagração de julgamento contra Judá e outros povos, seguida de um tempo de salvação para os dois grupos (Sf 1.2-18; 3.8-14). Obadias deu ao tema um caráter histórico apresentando-o em termos da queda de Jerusalém e anteviu o desenvolvimento disso como julgamento das nações e salvação para o povo de Deus (Ob 1017). Vê-se em Joel o reflexo desse contexto passado. Uma Judá arrependida encontra-se imune ao aspecto de julgamento do dia de Javé (Jl 2.32 [3.5]; 3[4].16) e aguarda em segurança a a execução desse julgamento na forma de castigo contra as nações (2.30-31 [3.3-4]; 3[4], 1-15). Assim como em Obadias 15, o motivo do julgamento foi o sofrimento do povo nas mãos dos gentios na queda de Jerusalém (cf. Is 10.5-12). De um ponto de vista pastoral, não há espaço para mencionar-se a possível salvação das nações. Naquele momento, o povo aflito precisava da garantia de justiça e vindicação (cf. Ap 6.10). 4. Fica claro que Joel trata não apenas do problema imediato dos gafanhotos, mas tam bém de uma consciência cada vez maior de uma crise que se abate sobre a comunidade do pós-exílio. Ainda vítima do julgamento divino associado ao exílio, ela não descarta a salva ção escatológica prometida pelos profetas anteriores. Onde está a lei gravada no coração de 789
Jonas: Teologia de
Jeremias 31.33 ou o novo coração e espírito de Ezequiel 11.19; 36.26? Diante disso, em Joel 2.28-29 [3.1-2], o povo recebe uma promessa de tal renovação. Essa versão se vale do desejo de Moisés para o povo em Números 11.29 e também da linguagem de Números 12.6, relacio nando esses elementos ao espírito da profecia. Numa parte anterior do livro, somente o profeta Joel estava em sintonia com a vontade de Deus, em meio a um povo alienado de Javé. Deus irá criar uma comunidade de “Joéis”, por assim dizer, de pessoas abertas para a revelação de Deus e comprometidas com os propósitos dele. C. Contexto canônico O livro de Joel parece ter sido colocado ao lado do de Amós em reconhecimento aos te mas literários que os dois livros têm em comum. Os gafanhotos de Amós 4.9 fazem lembrar Joel 1—2, enquanto o tema do dia de Javé em Amós 5.18-20 se relaciona com o livro todo de Joel. O bramido de Joel 3[4]. 16 aparece novamente em Amós 1.2 e a bênção em Joel 3(4], 18 em Amós 9.13. O terremoto, mencionado em Joel 2.10; 3.[4],16, também encontra-se em Amós 1.1; 8.8; 9.5. Desse modo, colocar os dois livros lado a lado serviu para que um esclarecesse o outro. O fundador da comunidade de Qumran era chamado môrêh ha^edeq, o mestre da justiça (lQpHab 1:13; 2:2; 5:10; 7:4; 8:3; 9:9; 11:5; lQpMic 10:4; 2QpPsa3:15, 19;4QpPsb 1:4; 2:2; CD 1:11; 20:32). O título costuma ser derivado da expressão môreh liçdãqâ, a chuva de outono é justiça, em Joel 2.23 em que, em conjunto com Oséias 10.12, podia ser encontrada uma referên cia a um profeta escatológico. Alguns círculos de judeus ortodoxos também tinham essa mesma concepção da expressão, como indicam as traduções semelhantes em Simc., Vg. e Targum. O livro de Joel se reflete no NT de duas maneiras distintas. Em primeiro lugar, o livro de Apocalipse faz uso extenso de Joel para retratar o desenlace escatológico relacionado ao segundo advento de Cristo (p. ex., Ap 6.12, 17; 9.7-9; 14.15-20; 22.1). Essa repetição direta também ocorre em Marcos 4.29, que usa Joel 3[4].13. Em segundo lugar, a promessa de Joel 2.28-29 [3.1-2] e a linguagem referente ao dia de Javé em 2.30-32 [3.3-5] são interpretadas em termos de uma escatologia já iniciada em Atos 2.10-22,33, 38-40. Também, em Romanos 10.11-13, Paulo apresenta uma referência cruzada dc Joel 2.32 [3.5] com Isaías 28.16, asso ciando-a à justificação de todos os crentes determinada em Romanos 4. Assim, a concepção é de um novo particularismo em termos de judeus cristãos e de gentios, contrastando com todo aquele que não crê em Cristo. B ib l io g r a f ia
L. C. Allen, The Books ofJoel, Obadiah, Jonah and Micah, N1COT, 1976; F. E. Deist, “Parallels and Reinterpretation in the Book o f Joel: A Theology of the Yom Yahweh?”, Text and Context: OT and Semitic Studies fo r F. C. Fensham, JSOTSup 48,1988,63-79; D. A. Hubbard, Joel and Amos, TOTC, 1989; G. S. Ogden e R. R. Deutsch, A Promise o f Hope—A Call to Obedience, ITC, 1987; W. S. Prinsloo, The Theology o fth e Book o f Joel, BZAW 163, 1985; H. W. Wolff, Joel and Amos, Hermenéia, 1977. Leslie C. Allen
Jonas: Teologia de A. Contexto histórico A interpretação do livro de Jonas depende quase inteiramente do material no próprio livro e do conhecimento derivado de seu contexto histórico sugerido. Sabe-se que Jonas era 790
Jonas: Teologia de
filho de Amitai, que veio de Gate-Hefer (provavelmente localizada alguns quilômetros a nor deste de Nazaré) e que profetizou durante o reinado do monarca do Norte Jeroboão II. O nome de Jonas é citado apenas uma vez no restante do AT (2Rs 14.25). Jonas e seu ministério são conhecidos por fontes judaicas em função de referências nos Apócrifos. Quando Tobite está morrendo, chama o filho Tobias e lhe diz: “está próxima a ruína de Ninive, porque a palavra de Deus nâo falha” (Tob 14.6) Josefo também faz referência a Jonas ao relatar seu ministério em Ninive, apesar de situar essa cidade na Cilícia (An/. 9.10.2). Tanto a data quanto o gênero do livro são considerações importantes, pois afetam o modo como são compreendidos o propósito e a teologia da obra. Não se sabe ao certo a data do livro, uma vez que a redação não é necessariamente contemporânea aos acontecimentos. Hoje em dia, costuma-se rejeitar uma data mais recente, uma vez que existem conceitos universalistas em livros proféticos do século VIII (cf. ls 2.2-5; || Mq 4.1-5) e, diante de argu mentos lingüísticos, é difícil sustentar a concepção anterior de que a linguagem do livro exi gia que fosse considerado uma obra do pós-exílio. Não há nenhum motivo convincente que obrigue o livro a ser datado de um período bíblico diferente daquele do ministério de Jonas, conforme 2 Reis. A Assíria, tendo Ninive como uma de suas cidades principais, havia atuado em termos militares na região durante dois séculos e ainda era uma grande potência e ameaça para Israel e Judá. Como segundo profeta do AT com uma mensagem para Ninive, Jonas junta-se a Naum. Enquanto Naum é constituído de oráculos contra Ninive, Jonas é narrativo e, em alguns aspectos, semelhante a episódios narrativos curtos inseridos em livros históricos como Samuel e Reis, ou em livro proféticos como Isaías, Jeremias, Ezequiel e Amós. Ainda que muitos considerem o livro de Jonas uma parábola e, se esse for o caso, é difícil explicar o fato de sua extensão não ter paralelos e de a obra usar um personagem conhecido. O melhor é considerar-se o livro “não apenas uma narrativa profética, mas uma narrativa profética didá/icá" (Stuart, 435; ver a discussão de Stuart sobre outras caracterizações propostas para o livro, 435-37). B. Estrutura literária A estrutura do livro também deve ser considerada importante para a compreensão de sua mensagem. A obra é constituída de duas seções: caps. 1—2 e caps. 3— 4. A passagem de abertura em Jonas 1.1-3a tem um paralelo em 3.1-3a, enquanto a oração de Jonas em 2.2 é pa ralela a 4.2. Além disso, o contraste entre Jonas e os pagãos no cap. 1 tem paralelo no cap. 3, em que mais uma vez, o texto mostra os pagãos orando a Deus e o reconhecendo. Fica implícito que os pagãos também podem agradar a Deus com atitudes e ações corretas, enquanto mesmo os próprios servos do Senhor podem desagradá-lo com atitudes e desobediência pecaminosa. A organização simétrica do livro coloca ênfase nas duas comissões recebidas por Jonas e na resposta divina para a reação de Jonas em cada caso (para uma tabulação dos paralelos, ver ISBE, ed. rev., 2:1114). O público para o qual o livro era dirigido também é importante. Não se tratava de uma mensagem escrita para ser distribuída em Ninive ou em outra cidade gentia. Antes, era dirigi da a Israel. Fica claro que a mensagem do livro deve ser considerada uma comunicação para a rebelde Israel, apesar de ser difícil saber-se o quão claramente o povo de Israel veria em Jo nas o simbolismo da imersão de sua pátria nas águas da aflição e a recuperação subseqüente a fim de cumprir uma missão junto aos gentios. O retrato da Assíria apresentado em outros livro proféticos (p. ex., Is 5.26-30, Naum) deve servir de contexto para a avaliação das atitudes com relação a Ninive no tempo de Jonas. O livro de Jonas é um texto que tem como objetivo tratar certos pontos de vista teológicos de Israel que precisavam ser corrigidos. 791
Jonas: Teologia de
C. Temas teológicos São defendidas várias idéias quanto ao propósito do livro. Muitos estudiosos acreditam que constitui um texto universalista. Allen (190) afirma que o termo universalismo é ambí guo, uma vez que poderia referir-se ao poder e reinado universais de Deus ou à maneira como o privilégio da aliança é aberto aos gentios. Ele sugere que, com relação ao livro de Jonas, trata-se desse último caso. Apesar de ser verdade que o poder universal de Deus é mostrado de várias maneiras ao longo da narrativa, a principal preocupação dela é o interesse misericor dioso de Deus por Nínive. Quando considerada à luz das confissões anteriores de Jonas sobre a natureza compassiva de Deus (4.2), a pergunta com a qual o livro se encerra (Jn 4 .11) indica um interesse teológico que Jonas e seus compatriotas israelitas precisavam compreender. Se a odiada cidade de Nínive podia ser objeto da misericórdia de Deus, não seria possível então a compaixão soberana de Deus ser mostrada de maneira ainda mais ampla? Além disso, a figura central do livro não é Jonas, mas Deus. É dele tanto a primeira ( 1. 1- 2) quanto a última palavra (4.11 ). Ele é o ator principal, desde quando dá início à amea ça contra Nínive até a repreensão final dirigida a Jonas. Deus providencia (conforme indica o heb.) o grande peixe ( 1. 17 ) e, depois, atua novamente tanto para livrar (4 .6 ) como para afligir Jonas (4 .7). A oração de Jonas também ilustra esse aspecto. Ela é dirigida a Javé (2 .2 ) e termina com a declaração “Ao Senhor pertence a salvação!” Esse salmo é parte integrante do livro e, como G. M. Landes (3-31) o demonstrou, o livramento divino é um elemento central de Jonas e o conteúdo do salmo reforça essa característica. Trata-se de um cântico de ação de graças por aquilo que o Senhor fez por Jonas: “ele me respondeu”; “tu me ouviste a voz”; “fizeste subir da sepultura a minha vida” (Jn 2.2 , 6). Quando se considera a correlação desse salmo com outras partes do livro (Stuart, 471- 72 ), fica claro que o salmo ressalta aspectos que constituem parte vital do restante do relato. O poder de Deus também é essencial na apresentação. Ele controla as forças da natu reza ao lançar sobre o mar uma grande tempestade (Jn 1.4) e depois traz a calmaria quando Jonas é atirado para fora do navio (1.15). Em seguida, prepara um grande peixe para engo lir Jonas (1.17) e o profeta é depositado em terra seca de acordo com a orientação do Senhor (2.10). Nos caps. 3— 4, a soberania e onipotência de Javé continuam a ser mostradas quando ele poupa Nínive (3.10), fornece de um dia para o outro uma planta e um verme para comê-la (4.6-7) e depois um vento quente do Oriente para perturbar Jonas (4.8). Deus é soberano sobre indivíduos e nações, sobre a vida e a morte, sobre toda a criação. O livro não apenas concentra-se na salvação como sendo proveniente do Senhor, mas também define em maiores detalhes a natureza desse Deus de salvação. Jonas 4.2, em particu lar, apresenta a declaração do profeta: “sabia que és Deus clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e que te arrependes do mal”. Trata-se praticamente da declaração de um credo, emprestada de Êxodo 34.6 (cf. Nm 14.18; Ne 9.17; SI 86.15; 103.8; 145.8; Na 1.3). Essa citação ressalta tanto a natureza de Deus como a rejeição deliberada a ela, por parte de Jonas. O profeta não desejava que Deus fosse Deus e, assim, usasse de misericór dia para com Nínive. Ele sabia que, por sua própria natureza, Deus teria compaixão das nações e até mesmo de uma cidade perversa como Nínive. Essa compaixão se estende também a um profeta rebelde como Jonas. Ao longo do livro, Deus age de modo coerente com seu caráter declarado tanto com relação a judeus quanto a gentios. Apesar de Jonas não ser a figura central do livro, sua posição é importante. Na reali dade, não é tanto por si mesmo que o profeta é relevante, mas pelo fato de cumprir um papel representativo na história. Jonas serve de representante de Israel, assim como Nínive represen ta todos os gentios (de acordo com Stek, 39; para outros pontos de vista, ver especialmente T. 792
Jonas: Teologia de
D. Alexander, 81-91). Todos em Israel se veriam retratados nele e, assim, tomariam para si a repreensão administrada a ele. É provável que também fariam “uma outra associação entre a experiência de Jonas com o peixe e os anúncios proféticos de Amós e Oséias de que, por cau sa do seu pecado, Israel estava prestes a ser tragada pelas nações a fim de que Javé pudesse apresentá-la purificada para cumprir o propósito dela em meio às nações” (Stek, 39-40). O último aspecto significativo da teologia é a referência aos animais em Jonas 4.11. Deus se preocupa com a cidade e sua grande população humana, bem como a enorme quantidade de animais. Essa declaração retoma um tema central da aliança com Noé, uma vez que, naquela ocasião. Deus mostrou sua preocupação com todos os seres vivos e os incluiu na aliança (Gn 8.21; 9.9-10, 12). Esse ponto de vista se reflete em asserções como a do Salmo 145 de que os olhos de todos se voltam para o Senhor e ele abre a mão e satisfaz os desejos de todos (SI 145.15-16; cf. também 104.27-28). A ternura expressada pelo acréscimo das palavras “muitos animais” reforça a idéia de como a misericórdia de Deus está explícita no contexto. E necessário fazerem-se também alguns comentários sobre o emprego da experiência de Jonas nos ensinamentos de Jesus. Estudiosos como E. J. Young afirmam que o propósito fun damental do relato de “Jonas sendo lançado nas profundezas do Seol e, no entanto, trazido de volta com vida, é uma ilustração da morte do Messias, por pecados que não são dele, e de sua ressurreição. Jonas era um israelita e servo do Senhor, e sua experiência ocorreu pelos pecados das nações (Ninive). O Messias foi o israelita e verdadeiro Servo do Senhor, cuja morte ocorreu pelos pecados do mundo” (E. J. Young, 263). O fato de haver uma relação entre o ministério de Jonas e o de Jesus é evidente, mas não há nada no próprio texto de Jonas que confirme essa idéia, assim como ela também não é considerada essencial nas passagens dos Evangelhos que falam de Jonas (Mt 12.39-41; 16.4; Lc 11.29-32). O contexto de Mateus 16.1-4 não explica a relação, a não ser pela declaração de que uma geração perversa e adúltera não receberia outro sinal além do sinal de Jonas. Em Mateus 12.39-41, o uso do personagem simbólico de Jonas parece ser mais com relação à morte do que à ressurreição. Assim como a descida de Jonas ao Seol era um sinal de que a geração perversa e a adúltera de seu tempo devia morrer, também a morte de Jesus seria um sinal do julgamento iminente sobre a geração perversa e adúltera dos seus dias (ver J. Woodhouse, 33-41). O uso do símbolo de Jonas em Lucas 11 é diferente no sentido de que Jesus parece estar falando de modo profético sobre a incredulidade da geração perversa de seu tempo, que se recusaria a responder até mesmo ao sinal da ressurreição dele. Os ninivitas condenariam essas gerações, pois haviam se arrependido ao ouvir a pregação de Jonas. O propósito fundamental do livro era ensinar a seus primeiros leitores a natureza com passiva de Deus e, somente em nível secundário, serviu como sinal do ministério, morte e ressurreição de Jesus. B ib l io g r a f ia
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Jordão
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Jordão
Jordão (137’ \yardên], # 3720).
OMA A referência mais antiga ao Jordão aparece em registros egíp. da XIX Dinastia como vo — ar — du — na (ANET, 242). Uma fonte egíp. trata de qual é a melhor forma de passar o vau do rio (ANET, 477; cf. TDOT4:323). A derivação do nome é motivo de extensas discussões. A etimologia mais comum associa o termo com o radical sem. yrd, descer, daí o Jordão ser o “rio que desce” (BDB, 434; TW O T1:402). Para Alden, o nome significa “o rio é o juiz”, uma com binação do huriano iar, água, com o sem. dm, julgar (Alden, ZPEB 3.684). Ao observar o uso comum do art. def. junto com a palavra, Smick argumenta quçyardên costumava ser um subs. comum que significava rio e não um nome próprio (Smick, Arehaeology o f theJordan Valley, 1973,26-31). Sua sugestão é apoiada pelo uso do nome Jordão para rios em Creta e na Grécia, evidência que leva alguns a sugerirem que se trata de um nome de origem indo-européia e não sem. (ver TDOT, 4:3232; Thompson, ABD 3:954; TDNT 6:609-10). Cohen (IDB 2:973) opta por uma derivação indo-ariana que combina yor, o mesmo radical de ano, e don, rio, de modo que Jordão significaria então rio perene. Vogel (1SBE 2:1119) determina como origem o rad. ár. wrd, vir, transmitindo a idéia de pessoas e animais buscando uma fonte de água. O Jordão também é conhecido em ár. como as-sari‘à, o lugar de irrigação/abastecimento ou como asSart‘â al-Kabirâ, a grande água (Thompson, ABD 3:954).
AT 1. Contexto geral. A palavra yardên descreve tanto o rio mais importante da Palestina quanto o vale por onde ele corre (vale da Fenda). A depressão do Jordão, parte da enorme fis sura do período Miocênico que se estende do norte da Síria até a parte central da África, é o ponto mais baixo da terra. O rio Jordão, com suas nascentes alimentadas por fontes, córregos e neve derretida do monte Hermom (cerca de 3.000 metros acima do nível do mar), ajunta-se no lago Huleh (drenado na década de 1950) e depois corre por cerca de dez quilômetros para o sul até o mar da Galiléia. O lago de água doce mais baixo do mundo, cerca de duzentos metros abaixo do nível do mar, o mar da Galiléia separa o Alto Jordão (ao norte do mar da Galiléia) do Baixo Jordão (ao sul do mar da Galiléia). Quando o rio chega ao mar Morto, encontra-se a quase quatrocentos e cinqüenta metros abaixo nível do mar. O rio corta uma extensão de cerca de oitenta quilômetros desde sua nascente até o mar Morto, mas, devido ao seu curso sinuoso, corre por mais de cento e cinqüenta quilômetros. Com exceção de Jó 40.23 e do Salmo 42.6 [7],yardên aparece sempre no TM com o artigo definido (177x). E provável que esse uso constante do artigo seja uma indicação de que o termo é mais do que apenas um nome e que adquiriu a natureza de um título (ver TD O T4:324). 2. O Jordão como fronteira. Grande parte das referências do AT ao Jordão encontranos livros de Números, Deuteronômio e Josué enquanto Israel se desloca do êxodo, vagando até a entrada da terra prometida e a conquista. Dentro desse contexto, o rio Jordão toma-se re levante tanto como fronteira geográfica e histórica quanto como fronteira teológica. a. O Jordão como fronteira geográfica. Como fronteira geográfica, o rio Jordão mar o limite a oeste da terra prometida a Israel por Javé (ver p. ex., Nm 32.1-13; 34.1-12; Dt 2.29) 794
Jordão
e também ajuda a definir a distribuição de território entre as tribos (ver p. ex., Js 16.7; 17.5; 18.20; cf. Thompson, ABD 3:953). A fenda e o rio proporcionavam uma barreira natural que servia como forma de defesa. O controle dos vaus do Jordão era uma estratégia militar crítica para a segurança tribal e nacional (ver Jz 3.28-29; 7.24-25; 12.5-6). b. O Jordão como fronteira teológica. Mais importante que as questões geográficas a relevância teológica do Jordão como fronteira. A promessa inicial de Javé a Abraão continha a concessão de terra de Canaã aos descendentes de Abraão (Gn 12.7). Os limites exatos des sa terra nâo foram inicialmente especificados, mas a separação de Abraão e Ló (Gênesis 13) proporcionou esclarecimentos importantes. O desejo de Abraão de manter a paz e de fornecer pastos adequados tanto para os seus rebanhos como para os de Ló resultou na separação dos dois. A escolha de Ló da planície bem irrigada do Jordão o levou claramente para o Leste, para além do Jordão e fora da terra que Javé havia prometido aos descendentes de Abraão (13.1011; cf. L. Helyer, JSOT, 26, 1983, 77-88). Abraão permaneceu na terra de Canaã (13.12). De pois da partida de Ló, Javé reafirmou e esclareceu com mais detalhes sua promessa inicial da terra para Abraão (13.14-17). As promessas de Javé a Abraão determinavam o Jordão como uma fronteira geográfica importante com profundo significado teológico. Cabia às gerações posteriores agir de acordo com essas promessas, atravessar o Jordão e tomar posse da terra prometida (Josué 3— 4). Fica claro que, para os israelitas, a permanência no lado oriental do Jordão seria um ato de desobe diência às ordens de Javé, desafiando seu plano para seu povo e deixando de possuir a terra que ele havia dado e reiterado ao longo das gerações passadas e presentes (p. ex., ver Nm 32.1-15; cf. Gn 15.17-21). Não é de admirar que o pedido às tribos de Rúben, Gade e da meia tribo de Manassés para ficarem do lado oriental do Jordão pareceu tão inapropriado e surpreendente, tendo sido atendido apenas depois de exigências rigorosas (ver Números 32). O Jordão simbo lizava a última barreira às promessas da aliança de Deus; era impensável não completar a jor nada. Atravessar o Jordão exigiu coragem, compromisso e fé por parte dos israelitas. A missão foi expressada em terminologia militar (ver Nm 32.5,21,29,32). Na verdade, nem a travessia nem a conquista subseqüente poderiam se concretizar somente com as forças de Israel; Javé iria adiante como “fogo que consome” (Dt 9.3; cf. 31.3). Foi ele quem dividiu as águas agita das do rio (Js 3.14-17; 4.19-24; cf. S. D. Waterhouse, 621-37) e quem conduziu seu povo na conquista. O Salmo 114 celebra a soberania de Deus sobre o Jordão e caracteriza a travessia do rio com uma profunda significação teológica (ver esp. 114.3, 5). A recusa de Javé em permitir que Moisés atravessasse o Jordão para a terra prometida é igualmente profunda (ver Dt 3.21 -29). O rio diante de Moisés era uma lembrança inequívoca da desobediência de Moisés. A terra do outro lado era, sem dúvida, algo a ser almejado, mas o Jordão só podia ser atravessado por aqueles que mostrassem obediência e fidelidade. Em vez de ter permissão para atravessar, Moisés precisou confiar a Josué a tarefa de conduzir Israel ao outro lado do rio (Dt 3.28). Essa tomou-se a primeira grande tarefa de Josué na posição de líder (Js 1.2) e o meio pelo qual Javé o instituiu único sucessor de Moisés (3.7). Assim, a tra vessia do Jordão significou uma “divisa” entre os dois líderes. Para os israelitas que viviam dentro da terra prometida, cruzar o Jordão de oeste para leste era sinal de problema. Abner e Isbosete tiveram de recuar para além do rio a fim de esca par aos invasores filisteus (2Sm 2.8) e, temendo pela segurança de sua família em função das agitações sociais, Davi transportou seus pais para além do Jordão até a terra de Moabe (ISm 22.3-4). Posteriormente, depois do adultério com Bate-Seba e do tumulto familiar subseqüente, Davi abdicou do trono em Jerusalém e fugiu para além do Jordão a fim de escapar da revolta de seu filho Absalão (2Sm 17.22). A travessia de Davi do leste para o oeste do rio, no caminho 795
Jordão
de volta para Jerusalém, foi, pelo contrário, saudada com grande pompa e cerimônia (2Sm 19; cf. TDOT 4:328). Israel parecia estar sempre preocupada com a terra e o povo do outro lado do rio (Js 22.25; cf. TDOT 4:326-27), como se atravessar o Jordão fosse o mesmo que se re mover da presença e da proteção de Javé. Na visão apocalíptica de Ezequiel, o Jordão serve de fronteira oriental, separando Gileade da terra de Israel (Ez 47.18). No entanto, a visão de Ezequiel também apresenta o Jordão como muito mais do que uma fronteira, mais até do que uma fronteira com implicações teológicas importantes. 3. O Jordão como fonte de bênçãos. Na visão de Ezequiel, o rio corre do templo p o vale do Jordão (Ez 47.8), para onde leva o poder da purificação e toma-se uma fonte de vida em abundância. Com esse fluxo, as águas salgadas do mar Morto transformam-se em água doce. O rio é a origem de inúmeros seres vivos, produz peixes de todo tipo e rega árvores que dão frutos todos os meses e cujas folhas possuem poderes medicinais (Ez 47.8-12; cf. TDOT 4:327). O retrato apocalíptico do Jordão como fonte de bênção sobrenatural é prenunciado pela experiência de Naamã. Acometido de lepra, Naamã viajou de Arã até Israel buscando a cura com o profeta Eliseu. Este, porém, orientou Naamã para que fosse até o rio: “Vai, lava-te sete vezes no Jordão, e a tua carne será restaurada, e ficarás limpo” (2Rs 5.10). Apesar de protestar, Naamã finalmente seguiu as instruções e viu sua lepra ser curada (2Rs 5.13-14). Qualquer po der terapêutico do Jordão encontrava-se claramente sujeito à palavra e ao ministério do profeta (cf. 2.7-8, 13-14; 6.1-7), mas a cura de Naamã revela a função do rio como um instrumento de bênção. A reação do rio ao poder do profeta confirmou a bênção de Javé sobre o ministério de Eliseu, comunicando essa verdade a outros (2.7-8; 13-15). NT O Jordão como um lugar de batismo. O rio Jordão ocupa uma posição de destaque nas cenas de abertura do NT, mas não em outras passagens. Nâo é citado pelo nome em nenhuma outra passagem do NT além dos Evangelhos (cf. o AT, em que a maior parte das ocorrências é em Números, Deuteronômio e Josué). O Jordão proporcionou um lugar apropriado para o mi nistério de João Batista, um profeta dentro dos moldes de Elias. João anunciou a vinda de um novo reino e convidou todos a participarem desse reino e se submeterem ao ritual do batismo no rio Jordão (Mt 3.1-12; Lc 3.1-20). O paralelo com os acontecimentos em Josué, com o ba tismo no lugar da “travessia” parece claro demais para ser coincidência (ver p. ex., Js 1.10-11; 3.5). O batismo de Jesus foi o auge do ministério de João e não resultou na divisão das águas do rio, mas na abertura dos céus, de onde o Pai falou, confirmando Jesus como seu Filho amado. Algo absolutamente novo estava se iniciando no plano divino. Das águas do Jordão, emergiu alguém maior do que Josué, maior do que Moisés, para trazer consigo o reino de Deus, um reino sem fronteiras, sem limitações geográficas e sem restrições étnicas. O judaísmo pós-bíblico não associou nenhum valor expressivo ao rio Jordão e nem suas águas receberam grande consideração da parte dos rabinos (TD N T6:611-13). Ao que parece, a igreja e o cristianismo primitivos só tratavam do Jordão com relação a questões envolvendo o rito do batismo (TD NT6:618-23). -> Rios: Teologia Canal, rio, córrego, corrente: -> nãhãr (rio, # 5643); tural de água, # 8940); Rios: Teologia
selah II (canal construído, canal na
B ib l io g r a f ia
BDB, 434; NIDNTT3:991; TDNT6:608-23; TDOT4:322-30; TWOT 1:909-10; R.Alden “Jorà&n'\APEB 3:684-92; D. Baly, The Geographv o f the Bible, 1974,191-209; S. Cohen, “Jordan”, 796
Josafá
IDB 2:973-78; J. M. Houston, “Jordan”, NBD, 615-17; E. B. Smick, Archaeology' o f the Jordan Vdlley, 1973; H. O. Thompson, “Jordan River”, ABD 3:953-58; E. K. Vogel, “Jordan”, ISBE 2:1119-25; S. D. Waterhouse, “The River-Dragon: Its Meaning in Scripture”, in The Archaeology o f Jordan and Other Studies, 1986, 621 -37. Tim Powell
Josafá
Josafá (usçnn’ [y^hôsãpãt], # 3399).
AT 1. Josafá (“Javé julga”) é o nome de quatro homens no AT: um cronista da corte de Davi e Salomão (2Sm 8.16), um dos doze governadores distritais de Salomão (lR s 4.17), o pai de Jeú (->) rei de Israel (2Rs 9.2) e, o mais conhecido deles, o rei de Judá (->). 2. Josafá, quarto rei de Judá (c. 873-848), além de suceder o pai Asa, depois de t anos de regência conjunta com ele (c. 873-870 a. C.; ver Thiele, 70-71) também seguiu-lhe os passos. (Ver Dillard, 1987, 129-30 — Asa como um paradigma para Josafá em Crônicas.) Suas primeiras medidas concentraram-se em reformas internas e no fortalecimento do reino. Entre os esforços de Josafá para consolidar seu reino, houve o envio de oficiais para ensinar ao povo a lei do Senhor (2Cr 17.9) e o reforço tanto das defesas militares quanto das cidades. Sua posição foi ainda mais fortalecida pelo tributo pago por territórios estrangeiros, o que é mencionado pelo cronista como resultado da obediência do rei ao Senhor e sublinhado pelo uso positivo incomum da expressão “tomou-se-lhes ousado o coração” para seguir os cami nhos do Senhor (2Cr 17.6). A aliança de Josafá com o reino do Norte (-> Israel) é um elemento essencial a fim de compreender-se o relato bíblico sobre esse rei. Selada com o casamento de seu filho Jeorão com Atalia, a filha de Acabe (2Rs 8.18), essa aliança foi provada pela primeira vez quando Josafá visitou o rei Acabe de Israel e foi envolvido numa batalha para libertar Ramote-Gileade das mãos da Síria (Arã; [->]). Tanto Reis quanto Crônicas relatam delongadamente os aconte cimentos adjacentes a essa batalha com pequenas variações (lR s 22.2-38; 2Cr 18.2-34). Temse a impressão de que o foco da narrativa é o rei Acabe, mas são mencionados vários pontos significativos sobre Josafá, inclusive a insistência dele em ouvir o verdadeiro profeta de Deus (Micaías), a desobediência à palavra do Senhor e como escapou da morte por um triz (um in cidente que, em 2 Crônicas 18.31, é atribuído à proteção divina). Tendo em vista o desejo do cronista de salientar a obediência a Deus, as reformas de Josafá são apresentadas em detalhe. Logo depois de voltar de Ramote-Gileade, Josafá deu início ao segundo estádio das reformas, que se concentrou na lei. Juizes e sacerdotes foram nomeados para adjudicar questões legais e arbitrar decisões no “temor do Senhor” (2Cr 19.7). (-> Crônicas: Teologia) Pela segunda vez, Josafá toma medidas quanto à sua aliança com o reino do Norte, mas dessa vez com o filho de Acabe, o rei Acazias. Reis e Crônicas apresentam perspectivas ligeira mente distintas desse acontecimento, mas é possível que a aliança inicial referente aos navios, em 2 Crônicas 20.36-37, que acabou na destruição dos navios e em tragédia para Josafá, tenha sido o motivo pelo qual ele rejeitou mais pressão de Acazias para continuar as campanhas, conforme o relato de 1 Reis 22.48-49. Outro episódio com a aliança do Norte, mencionado somente em Reis, ocorreu quan do o rei de Israel, agora Jeorão filho de Acazias, propôs que se formasse uma coalizão com Judá e Edom para atacar Moabe. Um contexto mais amplo para 2 Reis 3.5, em que o texto diz simplesmente que depois da morte de Acabe, “revoltou-se o rei de Moabe contra o rei de Is rael”, é apresentado pela Inscrição de Mesa, que fala da conquista prévia de Moabe por Israel 797
José
(ANET3,320-21). Jeorão (->) negociou com Josafá e Edom, que aparentemente encontrava-se sob o domínio de Judá (1 Rs 22.47), para que atacassem Moabe. Percorrendo uma rota para o sul, contornando o fim do mar Morto talvez com o intuito de obter um elemento de surpresa, os exércitos dos três reis ficaram sem água. Eliseu, que reconheceu somente Josafá, profetizou tanto sobre a campanha quanto sobre o resultado da batalha (2Rs 3.11-19). Somente Crônicas relata uma aparente represália de Moabe por causa de um ataque anterior, quando Moabe, numa coalizão com os amonitas e uma gente do monte Seir (sobre os meunitas de 2Cr 20.1, ver Dillard, 1987, 155), avançou, a partir de seu território além do mar Morto, contra Judá e Jerusalém . A longa narrativa ressalta que Josafá fiava-se no Senhor para receber orientação (20.6), que lhe compreendia a palavra (20.8-9) e que tinha conhecimento da história (20.10), sendo que tudo isso foi aplicado àquele problema. Mais uma fez, foi um profeta [Jaaziel] que serviu de fonte de ânimo ao informar Josafá e Judá que a batalha estava sob o controle de Deus (20.15). O reinado de 25 anos de Josafá foi permeado por suas atividades constantes com os aliados do Norte e a incapacidade dele de remover todos os lugares de idolatria de Judá (1 Rs 22.43 e 2Cr 20.33, enquanto 2Cr 17.6 provavelmente registra uma iniciativa anterior, porém incompleta). No entanto, em sua vida, o rei sempre apoiou Javé e não foi influenciado por Baal, um fato que recebe destaque tanto em Reis quanto em Crônicas, em parte para explicar a pros peridade e a paz (lRs 22.44; 2Cr 17.10; 20.30) que caracterizaram o tempo de Josafá como sendo provenientes de Deus e não de realizações políticas. E bastante visível a extensa atividade profética no tempo de Josafá, o que serviu para salientar a relação entre o desejo de Josafá de seguir Javé e a comunicação recíproca do Senhor. Apesar dos problemas políticos, as reformas de Josafá e sua fé em Javé distinguem-no como um dos grandes monarcas do reino do Sul. B ib l io g r a f ia
W. F. Albrigth, “The Judicial Reform of Jehoshaphat”, in Alexander Marx Jubilee Volume, 1950, 61-82; R. B. Dillard, “The Chronicler’s Jehoshaphat”, TrinJ, 7,1986,17-22; idem,2 Chronicles, 1987; S. Herrmann, A History o f Israel in Old Testament Times, 1975; E. R. Thiele, The Mysterious Numbers o f the Hebrew Kings, 1965; H. G. M. Williamson, 1 and 2 Chronicles, 1982. Robert Spender
José
José (tlpV \yôsêp], # 3441).
José, o décimo primeiro filho de Jacó e primeiro filho do patriarca com Raquel (Gn 30.22-24), é uma das figuras notáveis do AT. A história de José serve de ponte que liga a vida dos patriarcas na Palestina à estada dos hebreus no Egito. Uma vez que a história ocupa uma posição tão crítica na teologia do AT, a mensagem dos acontecimentos normalmente encontrase ligada à narrativa, como é o caso com José. (-> Gênesis: Teologia) 1. A narrativa. José era o predileto de seu pai por ser o filho de sua velhice (Gn 37.3 sem dúvida, por ser o filho da esposa mais querida do pai, Raquel. E mais do que compreensível que o tratamento preferencial que Jacó reservava para José tenha provocado a hostilidade dos outros irmãos (37.4). O problema tomou-se ainda mais grave com os sonhos de José, que tan to os pais quanto os irmãos interpretaram como sendo indicação que, de algum modo o jovem José — nessa época com apenas dezessete anos (37.2) — ocuparia uma posição superior à de sua família. O resultado disso foi o ódio contra José, tanto que os irmãos procuraram livrar-se dele. Usaram a ocasião de uma visita de José ao acampamento deles em Dotã, na região norte 798
José
de Canaã, para vendê-lo a comerciantes medianitas-ismaelitas que o transportaram para o Egito e venderam-no a um oficial egípcio chamado Potifar (37.28-36). No Egito, José mostrou-se uma aquisição valiosa para o seu senhor egípcio (Gn 39.1 -6). Da XII e XIII Dinastia (c. 1963-1633; todas as datas egípcias citadas aqui são do texto de K. A. Kitchen “Egypt, History o f (Chronology)” in ABD 2:328-330) em diante, servos domésti cos de origem semita tomaram-se comuns nas casas da nobreza egípcia, como atesta o Papiro do Brooklyn 35.1446 (W. C. Hayes, A Papyrus o f the Late Middle Kingdmon in the Brooklyn Museum, 1955,87-103). O cargo de José estava de acordo com as práticas desse período. Pelo fato de se recusar a “pecar contra Deus”, cometendo adultério com a esposa de Potifar, José foi injustamente acusado de estupro e levado para a prisão (Gn 39.7-23). O adul tério também era um comportamento inaceitável para os egípcios e sujeito a penalidades (C. J. Eyre, “Crime and Adultery in Ancient Egypt,” JEA 70, 1984,92-105). Na prisão, devido à sua competência e seu caráter moral elevado, José foi incumbido de algumas responsabilidades. Com a ajuda de Deus, conseguiu interpretar os sonhos de dois funcionários de Faraó. Depois de um sonho enigmático de Faraó, o copeiro chefe — que havia sido restituído ao cargo con forme o sonho de José havia previsto — informou a Faraó da existência do prisioneiro hebreu. Sempre que possível, José procurou dar crédito a Deus como aquele que interpretava os sonhos, dizendo: “Não está isto em mim; mas Deus dará resposta favorável a Faraó” (Gn 41.16). Em todo o OMA, os sonhos eram vistos como um instrumento de comunicação entre divindade e indivíduos (ver A. L. Oppenheim, The Interpretation o f Dreams in the Ancient Near East with a Translation ofan Assyrian Dream Book. Transactions of the American Philosophical Society, N.S. 46, pt. 3, 1956 e Sarah Israelit-Groll, “A Ramesside Grammar Book of a Technical Lan guage o f Dream Interpretationm” in Pharaonic Egypt: The Bible and Christianity, Ed Sarah Israelit-Groll, 1985, 71-118). A interpretação mostrou-se favorável a Faraó e ao povo do Egito, pois revelou o que ocorreria na economia do país ao longo de um período de quatorze anos. As cheias anuais do Nilo seriam abundantes durante sete anos, seguidos de outros sete anos de escassez. Na Ilha de Elefantino, na fronteira ao sul do Egito, havia um sistema de medição (o nilômetro) que re gistrava os níveis da água a fim de determinar se o Nilo se encheria e irrigaria os campos ou se seria um Nilo baixo, o que significava que haveria tempos difíceis para a economia pela fren te. O nilômetro só era capaz de apresentar uma projeção para aquela estação. Vários anos de níveis baixos resultariam em fome e grande dificuldade para o povo do vale do Nilo. Devido à interpretação do sonho de Faraó, o Egito poderia preparar-se para os anos de fome. Faraó recompensou José, colocando-o como “autoridade sobre toda a terra do Egito” (Gn 41.41). O equivalente exato desse cargo egípcio é motivo de controvérsia (cf. Vergote, Janssen, Redford, Kitchen). José também foi condecorado com uma corrente de ouro em volta do pesco ço (41.42). Cerimônias desse tipo são atestadas por toda parte em cenas retratadas em túmulos durante o Novo Império (1550-1069 a. C.). Essa era a forma de recompensarem-se administra dores e oficiais militares por serviços prestados fielmente, e tais homenageados mostravam-se mais do que satisfeitos em mandar registrar sua posição privilegiada em seus túmulos. Nos estádios iniciais da fome, que também atingiu a Palestina, Jacó enviou os filhos para o Egito a fim de comprarem cereais, e foi lá que tiveram o encontro dramático com o ofi cial de Faraó encarregado da distribuição de alimentos — José (Gênesis 42— 45). Depois de ter revelado sua identidade aos seus irmãos, José insistiu para que sua família emigrasse para o Egito até que a penúria tivesse terminado. No restante desse período da história, provavelmen te a era dos hicsos (1633-1550 a. C.), os filhos de Israel viveram confortavelmente nas terras 799
José
de Ramsés ou Gósen (Gn 47.11), na região nordeste do delta, até uma mudança de dinastias, quando começaram as hostilidades contra eles (Ex 1.8-11). 2. Questões críticas. Os críticos da fonte afirmam que a história de José é, em grande parte, o resultado da combinação das fontes J e E. No entanto, novas abordagens literárias leva ram outros estudiosos a sugerirem que a história possui uma coesão literária (ver Robert Alter, The Art o f Biblical Narrative, 1981, 155-77). Com referência ao gênero literário, em tempos recentes, G. W. Coats declarou que “de acordo com o consenso, a história de José é um conto” (G. W. Coats, “Joseph, Son of Jacob,” ABD 3:980). Coats prossegue explicando que um conto é “uma composição criativa do autor” e que “não se preocupa com o relato de acontecimentos históricos” (loc. cit.). Redford argumentou em favor do século VII como data de origem da narrativa, tomando por base a datação menos antiga de nomes pessoais e topônimos da histó ria. Essa obra foi criticada em detalhes por Kitchen (1973), o qual demonstrou que uma data durante o segundo milênio é igualmente plausível. Como resultado, os meios acadêmicos mais recentes reduzem a história de José a uma composição criativa, que por sua vez contribui para desenvolver a concepção da década de 1980 de que os israelitas não habitaram temporaria mente no Egito, mas que eram, na verdade, um povo cananeu que “surgiu” como nação em Canaã ao final do segundo milênio (ver G. W. Ahlstrom, Who Were the Israelites? 1986; T. L. Thompson, The Origin Tradition o f Ancient Israel: I. The Literary Formation o f Genesis and Exodus 1-23, 1987; R. B. Coote, Early Israel: A New Horizon, 1990). A autenticidade da história de José é apoiada por elementos claramente egípcios e particularidades locais que refletem com precisão a cultura egípcia e as práticas religiosas e sociais, o que seria desnecessário no caso de um conto. Uma parte da história que há décadas representa uma complicação para os estudiosos é o fato de o nome de José não ser atestado em fontes egípcias, apesar do cargo elevado ocupado por ele. A esse problema, junta-se a incerteza quanto a um estrangeiro ser promovido a uma posição como a de José. Deve-se observar com relação a essas questões que, se José de fato viveu no tempo dos hiesos, não é de surpreenderse que seu nome não esteja nos registros da época, uma vez que se trata de uma era obscura para os historiadores. No inverno de 1993, na escavação de Avaris (atual Tel el D’aba), a ca pital dos hiesos, foi descoberta uma nova inscrição citando o nome de um rei hieso até então desconhecido, fato que ainda não foi publicado (recebi essa informação da artista da escavação, Leila Brock. que copiou o texto). Uma descoberta feita na década de 1980 era o túmulo Aper-el Sakkara, a necrópole da capital, Mêmfis. O proprietário do túmulo era o vizirdo Baixo Egito no século XIV a. C., no período de Faraó Aquenáton. Trata-se de um achado extraordinário, pois “Aper-el” é um nome semita, como também o é o nome da esposa dele, indicando que ambos eram de origem semita (ou seja, semitas que assimilaram a cultura egípcia). Essa descoberta mostra que era possível semitas serem nomeados para os cargos mais elevados daquela terra durante o segundo milênio. Tendo em vista o caráter central do êxodo na teologia do AT, a estada temporário dos israelitas no Egito não pode ser rejeitada com tal arrogância. Semelhantemente, sem a história de José, não há explicação alguma para o fato de os hebreus terem ido viver no Egito. Portanto, esse relato é um elo essencial para a teologia do AT. 3. Teologia na história de José. Apesar de José não pertencer à linhagem messiânica, a história dele tem a mesma extensão que a de Abraão e de Jacó e a José são dedicadas mais linhas do que a Isaque, seu avô. Naturalmente nos perguntaríamos o porquê disso. A relevância teológica da história pode ser observada tanto em um nível mais amplo quanto em outro mais restrito. O tema geral é identificado explicitamente na declaração de José aos seus irmãos: “Deus me enviou adiante de vós, para conservar vossa sucessão na terra e para 800
Josias
vos preservar a vida por um grande livramento” (Gn 45.7). O tema da preservação é reiterado em Gênesis 50.20. Se a família de Abraão morresse em decorrência da fome, de que maneira se cumpririam as promessas divinas aos patriarcas com respeito à grande nação e à terra? De que maneira todas as nações da terra seriam abençoadas se a família de Jacó não tivesse so brevivido à penúria? Logo, José é responsável por preservar a linhagem davídico-messiânica, o que faz dele uma figura chave na história da salvação. O caráter central do tema da “preservação da vida” nessa narrativa volta a ser ressaltado pelo nome egípcio de José — Zafenate-Panéia (41.45). Apesar de não haver consenso algum sobre a etimologia exata da palavra, concorda-se que o elemento final, 'enêah, representa a palavra egípcia 'nh, que significa vida. Também Faraó reconheceu que Deus havia dado a José um conhecimento sobre o futuro, conhecimento esse que lhe preservaria a vida. Vários pontos teológicos surgem em nível mais restrito: a. A presença de Deus. Gê nesis 39.2 afirma que no Egito, “O Senhor era com José”. Fica claro que Javé não se limita va aos santuários erguidos pelos patriarcas em Canaã. Ele era um Deus universal que atuava além das fronteiras da terra prometida, b. O propósito de Deus. A soberania de Deus estava em funcionamento de modo a cumprir seus propósitos e não havia coisa alguma que pudesse frustrá-los, nem mesmo as más intenções de indivíduos corrompidos, c. A proteção divina. Ao longo da história, é um elemento evidente, tanto com relação a José quanto à família de Jacó. Os egípcios também são protegidos da fome, o que deixa implícito que Deus se interessa pela humanidade como um todo. B ib l io g r a f ia
G. W. Coats, From Canaan To Egypt: Structural and Theological Contextfor the Joseph Story, CBQMS 4,1976; J. M. F. Janssen, “Egyptological Remarks on the Story of Joseph in Genesis”, Jaarbericht Ex Oriente Lux, 14, 1955-56, 63-72; K. A. Kitchen, “Joseph”, in ISBE 2:1126-30; idem, reviewof A Study o f the Biblical Story o f Joseph (Genesis 37-50), SVT 20,1970, in OrAnt 12, 1973,223-42; idem, review o f J. Vergote, Joseph in Égvpte: Genèse chap. 3 7-50 à lumière des études égyptologiques recentes, 1959, in JEA 47, 1961,158-64; R. E. Longacre, Joseph: A Stoty ofD ivine Providence: A Text Theoretical and Text Linguistic Analysis o f Genesis 3 7 and 39-48, 1989; D. B. Redford, A Study o f the Biblical Stoiy o f Joseph (Genesis 37-50), SVT 20, 1970; J. Vergote, Joseph in Egypte: Genèse chap. 37-50 à lumiére des études égyptologiques récentes, 1959; A. Zivie, Dêcouverte à Saqqara: Le vizer oublié, 1990. James K. Hoffmeier
Josias
Josias # 3 2 8 8 )/
[võ ’Siyvâ], # 3287,
[yõ 'Siyyãhü],
AT 1. Josias (“que Javé conceda”) foi um rei piedoso de Judá, o décimo sétimo da linha gem de Davi. Era filho de Amom e neto de Manassés. A maior parte das informações sobre ele pode ser encontrada em 2 Reis 22— 23 e 2 Crônicas 34.35. De acordo com os registros em Reis, Josias tinha oito anos de idade quando se tomou rei e governou por 32 anos (c. 640-609 a. C.). Em seu décimo oitavo ano ocupando o trono, foi encontrado, durante a restauração do templo, um Livro da Lei. Hilquias, o sumo sacerdote, e Safà, o secretário, deram o livro ao rei, ao que ele rasgou suas vestes como sinal de pranto. A pedido do rei, a profetisa Ulda foi consultada para saber se o castigo de Deus sobreviria em decorrência das transgressões. Ela confirmou que sim, mas anunciou também que Josias mor 801
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reria em paz e não teria que testemunhar a vingança do Senhor. Então, Josias reuniu o povo, leu o Livro da Lei e renovou a aliança no sentido de que, daquele momento em diante, o povo obedeceria aquelas leis. Lemos um relato dos trabalhos de restauração realizados por Josias em 2 Reis 23.4-20. Ele purificou o templo e profanou os lugares altos. Os ídolos foram destruídos e queimados. Também destruiu o altar feito por Jeroboão em Betei, no reino do Norte constituído das dez tribos. Os túmulos dos profetas de Baal foram abertos e os ossos foram queimados. Abriu-se uma exceção para os profetas de 1 Reis 13 (o trabalho de Jeroboão foi arruinado!) A reforma estendeu-se até mesmo a Samaria. Nos vv. 21-23, o rei ordena a celebração da Páscoa. O v. 25 traz um testemunho de louvor a Josias: antes e depois dele, não houve rei que servisse a Javé de todo o coração de acordo com a lei de Moisés. (O escritor de Reis aplica essa norma a todos os reis, usando Davi como um exemplo em 22.2.) Ainda assim, a ira de Deus se acenderia contra Judá e o templo seria destruído. Josias foi morto na batalha contra Faraó Neco e foi sucedido pelo filho Joás. (-> Reis: Teologia) 2. O livro de Crônicas fornece mais algumas informações. No oitavo ano de seu reina do, Josias passou a buscar o Deus de seu pai Davi e, em seu décimo segundo ano de governo, começou a expurgar Judá e Jerusalém da idolatria. Também expurgou parte do reino do Norte. Depois disso, o cronista descreve a restauração e recuperação do Livro da Lei, o que ocorreu no décimo oitavo ano de seu reinado. A Páscoa foi comemorada exatamente no décimo quarto dia do primeiro mês e é descrita em detalhes. O texto também apresenta o aviso de Faraó Neco para que Josias fique longe da batalha e o relato de que Jeremias compôs lamentos por Josias (cf. Zc 12.11). (-> Crônicas: Teologia) 3. História da exegese. Até o século XVIII, o livro de Crônicas era tratado, de modo ge ral, como uma obra histórica escrita de um ponto de vista diferente de Reis, tendo ainda assim valor histórico, uma vez que cada relato continua e complementa o outro. O exegeta alemão W. M. L. de Wette foi o primeiro a contestar consideravelmente a credibilidade histórica de Crônicas e ainda hoje tem vários seguidores (cf. Graham). De acordo com De Wette, o relato de 2 Crônicas 34 é tendencioso, pois a piedade do rei Josias devia ser anterior à descoberta do Livro da Lei. Além disso, De Wette afirmou que o Livro da Lei, equivalente a Deuteronômio, foi escrito pouco antes de ser descoberto, não estando, pois, relacionado a Moisés. Nessa legislação nova e atualizada, Jerusalém recebe uma posição singular — é uma cidade escolhida por Deus e o único lugar em que é permitido oferecer sacrifícios. Outros lugares (os altos) devem ser destruídos. De Wette considerou que essa era uma nova regulamentação que só pôde começar a vigorar depois da descoberta do Livro da Lei. A descrição da reforma de Ezequias (em 2Rs 18.4,22 e, mais detalhadamente, em 2 Crônicas 29— 31) não se baseia em fatos históricos. De Wette partiu do pressuposto de que a religião de Israel desenvolveu-se de um estádio primiti vo, no qual era permitido sacrificar em qualquer lugar (cf. Êx20.24-26), para um estádio mais desenvolvido, no qual os sacrifício só podiam ser realizados no templo (Deuteronômio 12). Assim, Deuteronômio não deve ser datado antes do décimo oitavo ano do reinado de Josias. Depois desse ano, o rei introduziu uma porção de reformas. J. Wellhausen aceitou inteiramente essa concepção em sua obra Prolegomena zur Geschichte Israels (1878) e transformou-a no ponto de partida para sua reconstituição da história de Israel. (-> Deuteronômio: Teologia) Vários estudiosos adotaram a datação de Deuteronômio como ponto de partida para a crítica ao Pentateuco. Além disso, tomando-se por base 2 Reis 22— 23, foram apresentadas teorias de todos os tipos sobre as origens do livro de Reis (cf. a teoria de redação dupla de F. M. Cross e a data do exílio de R. Smend). 802
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4. De fato, tem-se a impressão de que 2 Reis 23 contenha uma longa lista de medidas adotadas por Josias. A julgar pela sua extensão e distribuição geográfica, parece pouco provável que tudo isso tenha ocorrido durante o décimo oitavo ano do reinado de Josias e dificilmente tais mudanças ocorreram antes da comemoração da Páscoa. Em Reis, a ênfase recai exclusi vamente sobre o décimo oitavo ano do govemo de Josias. Foi nesse tempo que ocorreram os principais acontecimentos: a descoberta do Livro da Lei e a comemoração da Páscoa. O livro de Crônicas apresenta informações mais detalhadas que permitem uma fácil conciliação dos fatos. Assim sendo, é provável que a restauração do templo já estivesse em andamento quando o Livro foi descoberto. As atividades de construção podem ter levado à descoberta, pois como seria possível comemorar a Páscoa no meio dos ídolos? De Wette e Wellhausen apresentam uma concepção dominada por uma crença no progresso típica do século XIX e promulgada por uma lacuna nas descobertas arqueológicas. É possível que a reforma de Josias tenha ocorrido em vários estádios, dependendo, em parte, da fragilidade política da Assíria. 5. O livro da lei. Costuma-se dar crédito a De Wette como primeiro exegeta a identifi car o Livro da Lei com Deuteronômio. Na verdade, ele adota uma idéia que já era corrente há séculos. No judaísmo e no cristianismo primitivo e medieval, sem dúvida, essa era a concepção mais geralmente aceita. De acordo com o Talmude, o rei Josias estava lendo a passagem de Deuteronômio 28.36! No entanto, nem sempre fica claro se apenas (uma parte de) Deuteronô mio foi encontrado ou todo o Pentateuco. (-> Teologia deuteronômica/deuteronomística) 6. Lugar de sacrifício. Deuteronômio 12 é considerado muitas vezes um novo estatu to que não se encaixa no tempo de Moisés e dos Juizes. De fato, Samuel e outros realizaram sacrifícios em vários locais. Devemos, porém, fazer uma distinção entre o santuário central (o tabemáculo, o templo) e os altares locais. Só era permitido haver um santuário central (Deute ronômio 12, Josué 22), mas, além deste, o povo tinha permissão de oferecer sacrifícios em ou tros locais (Êx 20.24-26; Dt 16.21; 27.5-7; 33.18-19; I Rs 18; 19.10,14). Na prática, os altares locais eram um convite à idolatria. Isso explica as avaliações desfavoráveis aos altos no livro de Reis. Tendo sido escrito no contexto do exílio, o livro de Reis procura analisar as causas da tragédia que recaiu sobre o povo (Hobbs, xxvi e segs.). O rei Josias agiu em concordância com Joás (2 Reis 12) e Ezequias (2 Reis 18); não precisou de um novo estatuto para combater a adoração idólatra. 7. Aliança. A pergunta feita pelo rei a Ulda e a renovação da aliança só podem ser expli cadas de modo satisfatório se todas as partes estivessem convencidas de que aquilo que havia sido encontrado era um livro da lei autêntico, cujos mandamentos haviam sido infringidos. As fases das atitudes tomadas podem ser ilustradas por outros exemplos de renovação da aliança, tanto do AT como de outras culturas, nas quais o vassalo se humilha diante do soberano, supli cando, desse modo, por misericórdia (cf. Paul 1990). 8. Paz. A morte de Josias no campo de batalha parece um tanto inadequada, uma vez que havia sido anunciado que o rei morreria em paz. No entanto, o significado mais provável desse pronunciamento é o de que sua morte ocorreria antes dos julgamentos previstos pela lei e especialmente do julgamento do exílio. O tema do adiamento do castigo é mencionado ante riormente em 2 Reis 8.19; 13.14-19; 14.25-27; 17.18; 20.1-11. B ib l io g r a f ia
C. Conroy, “Reflection on the Exegetical Task. Apropos o f Recent Studies on 2 Kings 22-23”, in C. Brekelmans & J. Lust, Pentateuchal and Deuteronomistic Studies, 1990, 255-68; M. P. Graham, The Utilization o f l and 2 Chronicles in the Reconstruction o f Israelite History o f the Nineteenth Century, 1990; T. R. Hobbs, 2 Kings, WBC, 1985; N. Lohfink, “Zur neueren 803
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Diskussion über 2 Kon 22-23”, in N. Lohfink (Hrsg.), Das Deuteronomium: Entstehwig, Gestalt undBotschaft, 1985,24-48; R. H. Lowry, The Reforming Kings: Cults andSociety in First Temple Judah, 1991; J. Niehaus, “The Central Sanctuary: Where and When?”, TynBul 4 3 ,1992, 3-30; M. J. Paul, Het Archimedischpunt van de Pentateuchkritiek: Een historisch en exegetisch onderzoek naar de verhouding van Deuteronomium en de reformatie van koning Josia, 1988; idem, “King Josiah’s Renewal of the Covenant (2 Kings 22-23)”, in C. Brekelmans & J. Lust, Pentateuchal and Deuteronomistic Studies, 1990,269-76; A. J. Rosenberg, Miqra 'otgedolot—// Kings, 1985; W. M. L. de Wette, Beitrâge zur Einleitung in das Alte Testament, 1-11, 1806-7. Maarten J. Paul
Josué
Josué (inunn’ [^hôsiia'], # 3397).
AT 1. Josué filho de Num (y^hôsúa ‘ ben-nun) era neto de Elisama, conforme o registro na genealogia da tribo de Efraim (1 Cr 7.26; cf. Nm 13.8; 26.35). Seu nome pode ser encontrado de várias formas e com diversas grafias: hôsêa.', salvação (Nm 13.8); ví’MsY/er‘, o Senhor sal va/livra (Nm 13.16; cf. ICr 7.27); NT_yêsoiM, Jesus. Josué aparece pela primeira vez em Êxodo 17.9 como um líder militar, e é mencionado 28x no Pent. (Êxodo, Números, Deuteronômio). Além disso, foi assistente pessoal (mesãrêt) de Moisés desde a juventude, dando-lhe um apoio inabalável (Nm 11.28) e realizou pelo menos algumas atividades de escriba em várias ocasiões ao longo da vida. Segue-se uma apresenta ção canônica de suas funções. a. Josué liderou Israel em batalha, derrotando os amalequitas, depois do que ele regis trou esse acontecimento, inclusive uma maldição para exterminar os amalequitas (Êx 17.8-14). Testemunhou Moisés entrar numa nuvem no alto do Sinai depois de acompanhá-lo na subida da montanha (24.13-16) e, juntamente com Moisés, viu a rebelião representada pelo bezerro de ouro quando voltaram do Sinai para o acampamento. Teve permissão de entrar na tenda da congregação que Moisés usava (33.9-11), presenciando um encontro de Moisés face a face com o Senhor. Ninguém conhecia tão bem o relacionamento singular de Moisés com o Senhor quanto Josué. É possível que parte de seu trabalho fosse servir a Moisés como escriba. b. Moisés mudou o nome de seu servo de Oséias, “ele livrou”, para Josué, “Javé livra” (Nm 13.16), prenunciando desse modo a futura relevância de Josué no livramento de Israel de seus inimigos e na conquista da terra de Canaã (cf. Dt 3.28). Josué e Calebe creram que o Senhor podia dar a terra de Canaã a Israel (Nm 14.7, 8, 14, 30). Foi pela fé no Senhor que os israelitas sobreviveram aos quarenta anos em que vagaram pelo deserto (14.38). Josué foi empossado por Javé como sucessor de Moisés (Nm 27.18-21). Moisés e o sacerdote Eleazar oficiaram a cerimônia, dando a Josué autoridade específica para liderar na batalha. Essa junção de um sacerdote (Eleazar) com um líder civil se repetirá posteriormente em Zacarias, com o sacerdote Josué e o líder civil Zorobabcl (Zacarias 3—4). Eleazar e Josué também distribuíram as terras de Canaã entre as diversas tribos (Nm 34.17). c. Deuteronômio repete a maior parte do que foi dito sobre Josué nos livros anteriores (Dt 1.38; 3.21, 28). A comissão de Josué como sucessor de Moisés e líder de Israel é reiterada e ampliada (31.1-8, 14, 23). Josué testemunha também um ato de Moisés, o de escrever e re citar um cântico (32.44; cf. Êx 17.14). Josué recebe o Espírito Santo quando Moisés impõe as mãos sobre ele (Dt 34.9 / cf. Nm 27.18, 23). (-^ Deuteronômio: Teologia) d. Josué é o personagem principal do livro com o seu nome. Seu respeito pelo Livro da Lei é reiterado, uma vez que guardar esses preceitos fielmente era essencial para o sucesso de 804
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Israel (Js 1.6-9). Josué encontrou-se com o príncipe do exército do Senhor (sar-$eh ã ‘yhwh; 5.15), assim como seu senhor, Moisés, havia se encontrado com o mensageiro de Javé (Êx 3.5). A Josué foi dito enfaticamente que as batalhas nas quais devia combater eram do Senhor e não dele próprio nem de Israel (Josué 13— 14). Josué serviu como juiz de Acã quando este confessou seus pecados contra o Senhor/Israel (Js 7.19-20). Na velhice de Josué, apesar de muita coisa ter sido realizada, ainda havia um bocado de terra a ser conquistada (13.1). E, no entanto, no tempo de Josué, o Senhor havia, em essência, cumprido todas as promessas que havia feito ao povo (21.43-45; 23.14). As palavras de despedida de Josué ressaltaram mais uma vez a obediência ao Livro da Lei de Moisés (23.6; cf. 1.8). O último sermão de Josué foi sua vida — ele serviria somente a Javé e a nenhum outro ao convocar Israel para a renovação da aliança em Siquém (24.15). Josué morreu aos 110 anos de idade. Sua influência piedosa protegeu aquela geração. Depois da morte de Josué, Israel rompeu a aliança e teve início uma era em que “cada qual fazia o que achava mais reto” (Jz 17.6; 18.1; 19.1; 21.25; cf. Dt 12.8). Israel não seguiu a lei e deixou de guardar a aliança (Dt 17.18-20). (-> Josué: Teologia) e. Livros posteriores do AT reiteram as tradições de Josué. 1 Reis observa que Josué havia falado como um profeta, proibindo a reconstrução de Jericó (1 Rs 16.34; cf. Js 6.26). Neemias 8.17 mostra ainda o grau elevado de reverência dedicado à era de Josué, pois a Festa dos Tabemáculos no tempo de Esdras só podia ser comparada em qualidade à mesma festa realizada no tempo de Josué. f. Josué é mencionado apenas duas vezes no NT. Estêvão refere-se a ele em relação à conquista (At 7.45). O autor de Hebreus fala de um segundo “descanso”, pois Josué não con seguiu obter o primeiro cm função da desobediência de Israel (Hb 4.8). 2. Josué, filho de Jozadaque (y^hôsua' ben-yfihô^ãdãq) foi o sumo sacerdote dep que os judeus regressaram do exílio na Babilônia em 538 a. C. (Ag 1.1). Foi sob a liderança dele e a do governador Zorobabel que o templo foi reconstruído e o grande altar de holocaus tos contínuos foi restaurado. Ageu e Zacarias profetizaram, encorajando o povo e dando apoio ao sacerdote e assim, o templo foi concluído em 12 de março de 516 a. C. (Ed 5.1-2; 6.15; Ag 1.1, 12). Numa cena bastante vivida, Josué, imundo por causa do pecado e sob acusação do adversário, recebe o perdão divino e é restituído à função de sacerdote. A terminologia messiânica “o Renovo” é usada para o sumo sacerdote Josué (Zc 3.8; 6.12). Ele parece ser o Renovo e ao mesmo tempo representar a promessa do servo por vir (3.8), que abrange as funções reais e também as sacerdotais (6.13). Tanto Josué quanto Zorobabel foram ungidos pelo Senhor para servi-lo (4.14). E evidente que foi essa combinação que levou os membros de Qumran a imaginar a existência de duas figuras messiânicas: uma referente à realeza e à linhagem de Davi e outra referente à função de sumo sacerdote. B i b u (x ; r a f i a
ABD 3:999-1000; 1DB 2:988; NBD 2:621-22. Eugen Carpenter/MichaeI A. Grisanti
Josué: Teologia de A. Contexto histórico O livro de Josué constitui uma transição entre o Pent. e o restante dos livros do AT. Sob a liderança de Moisés, Israel havia sido tirada do Egito (Êx 1— 15) e entrado em aliança 805
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com Javé no monte Sinai (Êx 19— 24). Os israelitas haviam sido sustentados durante 38 anos vagando pelo deserto (Nm 14— 36) e levados às campinas de Moabe, onde Moisés desafiou o povo a permanecer fiel à aliança quando atravessassem o Jordão e entrassem na terra de Canaã (Dt 1—34). Moisés não acompanharia o povo até Canaã (Nm 20.1-13; Dt 1.37; 3.21-27), mas nomeou seu colega Josué, filho de Num, como líder que levaria Israel à terra prometida aos seus pais (Nm 27.12-13; Dt 21.1-8). As narrativas do livro de Josué descrevem o assentamento de Israel na terra prometida sob a liderança de Josué. As principais seções do livro são narra tivas com respeito à entrada em Canaã (Josué 1— 5) e à conquista (caps. 6— 12), bem como à divisão da terra (caps. 13— 22), seguida do desafio de Josué a Israel para que permanecesse fiel à aliança depois que ele morresse (caps. 23— 24). De modo geral, Josué é um livro caracterizado pelo otimismo e pelo sucesso. Israel havia atingido um ponto alto de sua história. As promessas divinas dadas aos patriarcas sobre a ocupação da terra de Canaã pelos descendentes deles (Abraão: Gn 12.7; 15.18-19; 17.7-8; Isaque: Gn 26.1 -5; Jacó: Gn 28.10-15; 35.12) haviam se cumprido. Javé demonstrara sua fideli dade para com o povo. O livro descreve o início da vida de Israel em Canaã e dá uma descrição detalhada das fronteiras dos territórios das diversas tribos que, em sua maioria, permaneceram intactas ao longo do restante do período do AT. Em certos sentidos, o livro de Josué é paralelo à posição de Atos no NT, pois este último retrata a igreja primitiva num ponto alto de sua vida e vigor espiritual. Mas assim como Atos contém exemplos de pecado e desobediência (p. ex., Ananias e Safira, At 5.1 -11), em Josué ocorreu o episódio trágico de Acã quando este tomou das “coisas condenadas” (Josué 7), bem como indícios de que Israel ficaria aquém da conquis ta que Javé havia ordenado (Js 18.3 e a advertência no cap. 23). Assim, Israel não se encontra apenas num ponto alto, mas também numa encruzilhada. O desafio é claro. Tanto Josué quanto Moisés, antes dele, instaram o povo a permanecer fiel à aliança. A pergunta em aberto era como Israel responderia ao apelo de seus líderes. B. Estrutura literária A melhor maneira de formular a teologia do livro de Josué é procurar descobrir que ênfases teológicas surgem de uma investigação da organização literária e das características estruturais do livro. Dar atenção à estrutura literária ajuda o leitor a discernir as idéias que go vernaram o processo de seleção e organização de material pelo escritor. Tal observação, por sua vez, esclarece os conceitos teológicos que se formam e que também são expressados na obra. Com isso, não se está afirmando que a relevância teológica limita-se a tópicos embutidos dire tamente nos elementos estruturais, mas sem dúvida a estrutura dentro da qual as narrativas são colocadas oferece o contexto para uma reflexão sobre os temas teológicos de Josué. Tomando por base essas considerações, a reflexão sobre a teologia do livro de Josué deve começar com uma análise de sua estrutura. Uma revisão dos comentários mostra que os comentaristas de modo geral concordam em que as principais seções do livro de Josué referemse à entrada, conquista e divisão da terra, seguidas pelo desafio de manter a fidelidade à aliança de Deus. Apesar dessa concordância mais geral, ainda existem certas diferenças quanto à abran gência exata dessas seções principais, suas subdivisões e a maneira como os diversos segmentos do livro encontram-se relacionados ao todo. A dissertação de H. J. Koorevaar (De Opbouw van hei Boek Jozua, 1990) apresenta um estudo bastante detalhado desses tipos de questões. Koorevaar empregou dois critérios literários e teológicos para especificar as principais seções no livro: “as atividades de Deus para a posse de Canaã” e “a conclusão depois de reali zadas as atividades de Deus”. Koorevaar usa a expressão “atividades de Deus” para se referir a um novo ato de Deus no qual uma tarefa específica dada a Josué encontra-se diretamente 806
Josué: Teologia de
ligada à conquista de Canaã (->). Ele vê quatro atividades desse tipo (Js 1.1-9; 5.13— 6.5; 13.1-7; 20.16). A característica das “conclusões” é o fato de serem diferentes do texto que as antecede — o qual é apresentado pelas atividades divinas — e de conduzirem a essência da quela determinada atividade divina ao seu desfecho, sendo que Koorevaar encontra seis dessas conclusões (5.1-12; 11.16— 12.24; 19.49-51; 21.43-45; 24.29-33). Ao analisar a estrutura literária do livro de acordo com essas atividades e conclusões, Koorevaar descobriu que uma das atividades e uma das conclusões estâo subordinadas a uma atividade mais ampla e geral. Também descobriu que há uma conclusão a mais do que as ativi dades, pois a seção final do livro não é introduzida por uma atividade divina, mas sim por três atividades humanas (ver detalhes abaixo). Depois de esboçar o material do livro dessa maneira, Koorevaar dividiu-o ainda em 28 unidades narrativas individuais tomando por base o conteúdo e as características literárias: (1) Josué 1.1 -9; (2) 1.10-18; (3) 2.1 -24; (4)3.1 — 4.24; (5)5.1-12; (6)5.13—6.5; (7) 6.6-26; (8) 7.1 —8.29; (9) 8.30-35; (10) 9.1 -17; (11) 10.1 -43; (12) 11.1 -15; (13) 11.16— 12.24;(14) 13.1-7; (15) 13.8-33; (16) 14.1-5;(17) 14.6-15;(18) 15.1 — 17.18;(19) 18.1-10; (20) 18.11— 19.48; (21)19.49-51; (22) 20.1 -6; (23) 20.7—21.42; (24) 21.43-45; (25) 22.1-34; (26) 23.1-16; (27) 24.1-28; (28) 24.29-33. De acordo com o esboço de Koorevaar dessas unidades, pode-se observar a estrutura literária e teológica esboçada a seguir. Em Josué 1.1-9 (a primeira iniciativa divina). Deus deu a Josué a tarefa de liderar o povo na travessia do Jordão. Essa tarefa tem um significado teológico importante (ver abaixo) e é acompanhada de várias promessas. As narrativas subseqüentes (até o cap. 4) são todas re lacionadas à travessia do Jordão. Essa seção é concluída com 5.1-12, em que o texto nos diz que imediatamente depois da entrada em Canaã, Josué circuncidou a nova geração de israe litas que haviam nascido no deserto e, então, liderou-os na celebração da Páscoa. Josué disse ao povo que, por causa da circuncisão foi “[removido] (glí) o opróbrio do Egito” (v. 9). Nesse jogo de palavras com o nome Gilgal (gilgãl), Josué indicou que uma questão importante ha via sido concluída. A comunhão pactuai entre Deus e seu povo havia sido restaurada. Com a entrada de Israel em Canaã, os egípcios não podiam mais dizer que Javé era incapaz de levar seu povo à terra que havia prometido lhes dar (cf. Êx 32.12; Dt 9.28). Os acontecimentos em Gilgal proporcionam, assim, a conclusão para a primeira atividade de Deus. A segunda atividade de Deus encontra-se em Josué 5.13— 6.5. Nessa passagem, Josué encontrou-se com o “príncipe do exército do Senhor” (5.14). Quando Josué perguntou “Que diz meu senhor ao seu servo?” (5.14), a resposta foi dada em duas partes. Em primeiro lugar, lhe foi dito para tirar as sandálias, pois o lugar onde estava pisando era “santo” (5.15). Em se gundo lugar, lhe foi dito como tomar Jericó (6.2-4). Esse episódio faz lembrar muito a expe riência de Moisés, quando Javé lhe apareceu na sarça ardente e disse-lhe para primeiro tirar as sandálias, pois estava pisando em solo sagrado e, em seguida, deu a Moisés a tarefa de livrar Israel do Egito e levá-lo à terra de Canaã (Êx 3.7-10). Assim, Josué aparece nessa passagem como um segundo Moisés. Jericó foi a primeira cidade que Israel capturou quando entrou em Canaã e, como tal, representa em principio a conquista de toda a terra. Quando Josué sinteti za a conquista em 24.11, Jericó é a única cidade cujo nome ele cita, apesar de mencionar sete nações que foram derrotadas quando Israel ocupou a terra. Em passagens diferentes do livro, a conquista de outras cidades e reis é comparada à conquista de Jericó, que passou a ser usada como parâmetro (8.1 -2; 10.28; 10.30). O “príncipe do exército do Senhor” só é mencionado com relação à tomada de Jericó, ainda que em outras passagens, a conquista seja sempre atribuída aos atos de Javé, como aquele que lutou por seu povo (cf. p. ex., Js 10.42; 23.3, 9, 10; 24.18). O comandante chegou (5.14), de modo que a conquista pode começar. Essa seção, portanto, 807
Josué: Teologia de
refere-se à conquista de toda a terra dc Canaã conforme esta é representada na tomada de sua primeira cidade, Jericó. A conclusão da segunda seção principal do livro encontra-se em 11.16— 12.24. Esse segmento começa com a declaração: “Tomou, pois, Josué toda aquela terra”. Esta é seguida de uma descrição do território e dos povos que foram conquistados. Dá-se ênfase em particular à destruição dos anaquins (11.21-22), justamente o povo que os israelitas da geração anterior haviam temido (Nm 13.28, 33). Segue-se outra declaração de que “tomou Josué toda esta ter ra” (Js 11.23). Em seguida, o cap. 12 apresenta uma relação dos reis conquistados tanto na Transjordânia quanto em Canaã. Aqui, pode-se questionar se a passagem dc 12.1-24 deve fi car junto com 11.16-23 ou se deve ser considerada uma unidade separada. Uma investigação mais minuciosa revela que as duas seções estão intimamente relacionadas: 12.7-24 descreve em detalhes o território e os reis que foram tomados em Canaã e que foram mencionados de maneira geral em 11.16-18; 12.1-6 descreve os reis e territórios conquistados na Transjordânia e encontra-se no meio de uma unidade maior, cercado de modo quiasmático por dois resumos da conquista de Canaã. A estrutura ressalta, desse modo, a coesão das tribos ao indicar que o escritor considerava as 2 Vi tribos que habitavam a Transjordânia como partes integrantes e importantes de Israel como nação. A terceira atividade de Deus encontra-se em 13.1-7. Nessa passagem. Deus encarrega Josué de dividir a terra entre os israelitas. A conclusão dessa seção é apresentada em 19.49-51, que começa com a oração “Acabando, pois, de repartir a terra em herança, segundo os seus territórios” e termina com a declaração “E assim acabaram de repartir a terra”. Entre essas duas expressões paralelas, há duas orações. Na primeira, o texto diz que os israelitas deram Timnate-Sera a Josué como herança pessoal (19.49-50) e, na segunda, que todo esse territó rio havia sido dividido sob a liderança de Josué e do sacerdote Eleazar “em Siló, perante o Senhor" (19.51). A quarta atividade de Deus aparece em 20.1-6. Javé ordena a Josué que diga aos israe litas para separarem as cidades de refúgio. Essas cidades devem oferecer proteção do vingador de sangue para alguém que tenha acidentalmente tirado a vida de outra pessoa. Josué 20.7-9 cita seis cidades de refúgio, três de cada lado do Jordão. Em seguida, o cap. 21 designa 48 ci dades dos levitas. As cidades de refúgio mencionadas anteriormente são incluídas entre essas cidades entregues aos levitas (cf. Nm 35.1-34). O texto introduzido pela quarta atividade de Deus é subordinado à atividade anterior (que começa em Js 13.1-7) referente à divisão da terra entre os israelitas, de modo que a terra foi dividida em duas etapas, que podem ser chamadas de “profana” (divisão entre as tribos) e “sagrada” (cidades de refúgio e cidades dos levitas). Josué 21.43-45 apresenta a última conclusão para a divisão da terra: “Desta maneira, deu o Senhor a Israel toda a terra que jurara dar a seus pais; e a possuíram e habitaram nela... Nenhuma pro messa falhou de todas as boas palavras que o Senhor falara à casa de Israel; tudo se cumpriu”. Depois desse resumo, os caps. 22—24 constituem a seção final do livro. Essa última seção não começa com uma atividade divina, apesar de ter uma conclusão clara com a morte de Josué (Js 24.29-33). Não há uma atividade nova de Deus para dar início a essa parte final, pois as promessas de Deus com referência à ocupação da terra se cumpriram todas (21.43-45). Agora, a responsabilidade não está mais sobre Deus, mas sim sobre o povo. Desse modo, a última parte do livro registra três atividades de Josué, apresentadas em 22.1 (a volta das 2 lA tribos); 23.1 -2 (o discurso de despedida de Josué) e 24.1 (a renovação da aliança em Siquém). Todos esses textos giram em tomo do tema de servir a Javé, que é o propósito maior para o qual Israel recebeu Canaã. Essa seção se encerra com uma descrição da morte e sepultamento de Josué (24.29-33). 808
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Koorevaar salienta que essa formulação da estrutura de Josué revela um padrão que, por sua vez, transmite a mensagem teológica do livro. As quatro atividades de Deus e as cinco conclusões fornecem a estrutura para quatro principais seções do texto (considerando a quarta atividade e conclusão como subordinadas à terceira atividade; ver acima). A quarta seção não é iniciada por uma atividade de Deus, mas sim caracterizada por três atividades de Josué. Cada uma das seções principais de material pode ser distinguida por uma palavra-chave. Assim, as quatro seções principais do livro são: 1.1—5.12
ATRAVESSAR ( 'br) 1.1-9 A primeira atividade de Deus: atravessar o Jordão 5.1-12 Primeira conclusão: circuncisão e Páscoa em Gilgal
5.13— 12.24 CONQUISTAR (Iqh) 5.13— 6.5 A segunda atividade de Deus: tomar Jericó 11.16— 12.24 Segunda conclusão: recapitulação das vitórias 13—21
DIVIDIR (hlq) 13.1-7 19.49-51
20. 1-6
22—24
A terceira atividade de Deus: dividir Canaã Terceira conclusão: Conclusão da divisão de Canaã e a herança de Josué A quarta atividade de Deus: determinar as cidades de refúgio Quarta conclusão: conclusão final
21.43-45 SERVIR ( bd) 22.1; 23.1-2; 24.1 Três atividades de Josué Quinta conclusão: morte e sepultamento de Josué 24.29-33
Koorevaar afirma em seguida que o propósito teológico revelado do livro de Josué como um todo em termos estruturais pode ser encontrado na terceira seção principal: atraves sar + conquistar = dividir. Dentro dessa seção, Koorevaar vê a seguinte estrutura quiasmáticaconcêntrica: A. 13.8-33 2 Vi ficam na Transjordânia B. 14.1-5 Os princípios da divisão C. 14.6-15 Início: A herança de Calebe D. 15.1— 17.18 A sorte para Judá e José E. 18.1-10 A tend a da congregação é levada p ara Siló e a distribuição dos territórios D ’. 18.11— 19.48 A sorte para as sete tribos restantes C’. 19.49-51 Fim: a herança de Josué B \ 20.1-6 A quarta atividade de Deus: determinação das cidades de refúgio A’. 20.7— 21.42 Cidades de refúgio e cidades dos levitas No centro da estrutura, a tenda da congregação é erguida em Siló. Para Koorevaar tratase do cumprimento de uma importante promessa do Pentateuco: “Porei o meu tabemáculo no meio de vós, e a minha alma não vos aborrecerá. Andarei entre vós e serei o vosso Deus, e vós sereis o meu povo” (Lv 26.11-12). Essa era a última promessa da lista de bênçãos apresentada por Moisés em Levítico 26. 809
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A essa altura do livro de Josué um objetivo importante foi alcançado. Israel não apenas recebeu Canaã, mas Javé também passou a habitar no meio do seu povo na terra. Koorevaar resume a mensagem de Josué dizendo: “Pelo fato de Deus ter realizado determinadas ativi dades para que a posse da terra de Canaã se concretizasse, o povo de Israel pôde atravessar o Jordão e conquistar a terra. Como resultado dessas duas atividades, Josué pode dividir a terra entre as tribos de Israel, tomando por base a terceira atividade de Deus. Quando o a tenda da congregação foi erguida em Siló, Deus cumpriu sua última promessa e Israel passou a ter como tarefa servir a Javé na terra e manter-se firme nesse serviço” (291). C. Temas teológicos 1. Temas principais. A atividade e a presença de Deus. A interpretação da estrutura do livro de Josué apresentada acima ressalta dois temas teológicos distintos. O primeiro é a ati vidade divina. Fica evidente de imediato que o escritor reconhece que um Deus soberano está operando nos acontecimentos da conquista a fim de cumprir as promessas patriarcais e mo saicas. Deus escolheu Abraão e prometeu ao patriarca e aos seus descendentes que possuiriam a terra de Canaã. Deus tomou a iniciativa de tirar Israel do Egito sob a liderança de Moisés e de entrar em aliança com os descendentes de Abraão no monte Sinai. Deus também tomou a iniciativa de levar Israel à terra prometida. Canaã não devia ser conquistada em função das aspirações nacionalistas de Israel ou de sua força militar, mas sim, ser recebida como uma dá diva da graça de Deus, quando Israel agisse pela fé e em obediência às instruções recebidas de Deus. O segundo tema é a presença divina. Deus não apenas escolheu Israel com seu povo da aliança, mas também habitou no meio deles. A presença de Deus com seu povo era um grande privilégio que separava Israel de todas as outras nações da terra. Porém, a presença divina trazia consigo uma responsabilidade enorme. Essa presença não era apenas uma bênção, mas também uma ameaça. Javé era um Deus santo, que exigia a obediência absoluta das estipulaçòes da sua aliança. Josué reconheceu a seriedade dessas prescrições quando disse a Israel: “Não podereis servir ao Senhor, porquanto é Deus santo, Deus zeloso, que não perdoará a vossa transgressão nem os vossos pecados. Se deixardes o Senhor e servirdes a deuses estranhos, então, se volta rá, e vos fará mal, e vos consumirá, depois de vos ter feito bem” (Js 24.19-20). Esses dois te mas — a atividade e a presença de Deus — que surgem da estrutura do livro, são os conceitos teológicos integrativos para a obra com um todo. Em algumas seções, um dos temas mostra-se predominante em relação ao outro. Em outras seções, os dois temas trabalham juntos de ma neira que podem ser distinguidas outras mais, difíceis de serem separadas. 2. Temas secundários, a. O tema do guerreiro divino. O tema chamado com freqüência de tema do guerreiro divino encontra-se intimamente relacionado com as expressões claras da atividade divina para a conquista. Seguindo a mesma linha de pronunciamentos anteriores em Êxodo (cf., p. ex., Êxodo 15) e Deuteronômio (cf., p. ex., Deuteronômio 20), Javé é retrata do no livro de Josué como aquele que comanda Israel na batalha e lhe dá vitórias (ver Cross, 91-111, 155-77; Miller, The Divine Warrior, Longman, 290-307). Assim, é Javé quem toma a iniciativa da conquista. A atividade e a presença de Deus encontram-se intimamente ligadas na figura do guerreiro divino. Será Javé quem conduzirá seu povo para dentro de Canaã (“O Senhor, teu Deus, passará adiante de ti; ele destruirá estas nações de diante de ti, e tu as possuirás; Josué passará adiante de ti, como o Senhor tem dito”, Dt 31.3). A idéia do guerreiro divino está em toda a parte no livro de Josué, expressada de várias maneiras diferentes: nas palavras do narrador(Js 10.10-11, 14, 30,42; 11.20; 21.44), nas palavras do próprio Javé (6.2; 8.1; 10.8; 11.6), de Josué (4.23-24; 8.7; 10.19, 25; 23.3, 5, 9-10) e de outros (p. ex., Raabe [2.10], os espias [2.24] e o povo [24.18]). A presença constante desse tema indica que ele é 810
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crucial para a perspectiva teológica do escritor. A força cumulativa dessas declarações ressalta energicamente que a intervenção soberana de Deus em favor do seu povo permitiu ao povo entrar na terra, conquistá-la e nela habitar. Deve-se observar que o conceito de guerreiro divino (->) não é transmitido apenas pelas afirmações diretas do papel de Javé nas vitórias de Israel, mas por vezes fica implícito dentro da narrativa. Um exemplo disso pode ser encontrado na descrição da aparição do “príncipe do exército do Senhor” a Josué imediatamente antes de Israel marchar contTa Jericó (Js 5.13-14). A malograda divisão em capítulos nas traduções modernas obscurece a unidade dessa passagem (5.13— 6.5). Em 6.2-5, Josué recebe desse “príncipe” instruções sobre como Israel deve tomar Jericó. Essas instruções são apresentadas com a declaração: “Então disse o Senhor a Josué”. O contexto mostra claramente que “um homem que trazia na mão uma espada nua” (5.13) e que se autodenomina “príncipe do exército do Senhor” é o próprio Javé. Foi ele quem tomou a iniciativa de liderar Israel na conquista de Jericó e, por extensão, na conquista de toda a terra de Canaã, e é sua presença que garante a vitória a Israel. Outro episódio como esse faz parte do relato da captura de Ai (Josué 8), quando Javé disse a Josué: “Estende para Ai a lança que tens na mão; porque a esta darei na tua mão; e Josué estendeu para a cidade a lança que tinha na mão. Então, a emboscada se levantou apressada mente do seu lugar, e, ao estender ele a mão, vieram à cidade e a tomaram; e apressaram-se e nela puseram fogo” (8.18-19). A finalidade dessa instrução para Josué e o propósito da inclusão dela no livro consistem em deixar claro que a vitória vem de Javé, não somente da força ou da estratégia militar. Esse episódio apresenta uma semelhança impressionante com aquele em que Moisés segurou a vara de Deus na mão enquanto os israelitas lutavam contra os amalequitas (Êx 17.8-15). Quando as mãos de Moisés estavam levantadas, as forças israelitas avançavam, mas quando ele abaixava as mãos, os amalequitas ganhavam terreno. Assim como havia ocor rido sob a liderança de Moisés, também sob a liderança de Josué, Deus mostrou aos israelitas que as vitórias só eram conquistadas quando as batalhas eram travadas numa dependência consciente da capacitação divina. b. A terra como uma dádiva ou herança. A atividade divina que promoveu o assen mento de Israel na terra de Canaã também é vista repetidamente em declarações de que Israel “receberia” a terra como “herança” de Javé. As raízes desse conceito podem ser encontradas em Êxodo (ver, p. ex., dar [ntn\. Êx 6.4, 8; herdar [yr.v], herança [nahalâ]\ Êx 15.17; 23.30; 32.13) e Deuteronômio (ver, p. ex., dar: Dt 1.6-8; 4.38, 40; 5.31; 7.13; 8.1-10; 9.4-6; 11.8-12, 17; 26.1, 9; 32.49, 52; 34.4; herdar, herança: 2.31; 4.21, 38; 12.9; 15.4; 19.10; 20.16; 21.23), mas a idéia recebe ênfase especial no livro de Josué (ver, p. ex., dar: Js 1.2, 3, 6, 11, 13, 15; 2.8, 24; 11.23; 18.3; 21.43; 23.13; 24.13; herdar, herança: 11.23; 13.6, 7, 8, 23, 28; 14.1, 2, 3.9 , 13; 15.20; 16.5, 8, 9; 17.4; 18.2,4, 7, 20, 28; 19.1,2, 8, 9, 10, 16, 2 3 ,3 1 ,3 9 ,4 8 ,4 9 ,5 1 ; 23.4). Israel não tinha direito algum nem podia reivindicar coisa alguma com relação à terra (Dt 9.4-6). A terra devia ser recebida como uma dádiva de Javé, baseada no amor dele por seu povo (7.7-10) e na promessa divina feita a Abraão, Isaque e Jacó (Dt 9.5; Js 1.6; 5.6; 21.43, 44). Uma vez que a terra pertencia a Javé (Lv 25.23) e Israel havia entrado em seu território e passado a habitar ali puramente pela graça de Deus, a posse da terra por Israel estava ligada à fidelidade à aliança com Javé (Js 23.12-16). Afirmar que a terra era uma dádiva ou herança de Javé e dizer que Javé era o guerrei ro divino que lutaria por Israel nas batalhas de conquista não significa que Israel nâo tivesse responsabilidade alguma nessa conquista (Js 1.3; 10.7-9; Miller, 455, 456). Israel recebeu a ordem de “possuir a terra” que Javé estava lhe dando (ver, p. ex., Js 1.11, 15; 18.3). O esforço humano não é excluído da atividade divina; antes, é usado por Javé para cumprir seus propósitos 811
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quando realizado em conformidade com as diretrizes de Deus. Isso explica alguns aspectos da conquista que costumam perturbar os leitores do livro de Josué. Quando Israel recebeu a ordem de tomar posse da terra de Canaã, também lhe foi ordenado que exterminasse (hrm, cf. N. Lohfink, TDOT5:180-99) os habitantes dela (Dt 7.2-6; 13.15-16; 20.10-18; JS 2.10; 6.15-19,21; 8.26; 10.28; 11.11, 18-20). A prática de hêrem (entregar coisas ou pessoas irrevogavelmente a Javé, com freqüência destruindo-as de todo) é considerada por alguns como sendo subcristã (Bright, 143-47). A implicação de tal avaliação é que o uso de hêrem por Israel é duvidoso à luz de outras revelações bíblicas, especialmente do NT. Para alguns, chega até mesmo a sig nificar que o conceito de Deus no AT é inferior àquele do NT. Deve-se observar, porém, que Gênesis 15.16 dá a entender que quando chegasse a hora da conquista, Israel seria usado por Deus como instrumento de julgamento divino contra os cananeus por causa dos pecados desses povos. Os cananeus haviam corrompido a terra a tal ponto que ela “vomitou os seus moradores” (Lv 18.24-28). Assim, a destruição dos cananeus pelas mãos dos israelitas não é um exemplo de agressão subcristã contra os habitantes inocentes de Canaã. Antes, deve ser considerada a execução do julgamento divino sobre os perversos em conseqüência de seus pecados, e Israel é o instrumento da execução. E a atividade divina em meio à conquista que tira hêrem (-> # 3051) da esfera de todas as outras guerras agressivas motivadas por interesses nacionais e co loca essa prática na posição singular de demonstrar de antemão o destino final que aguarda todos aqueles que rejeitam o Deus que é “Senhor dc toda a terra” (Js 3.11; ver também 3.13; 4.24 para outras designações de Javé que denotam seu domínio universal). É isso que distingue a destruição dos cananeus pelas mãos dos israelitas de todas as outras “guerras santas”. A expressão guerra santa em sua atual acepção comum (uma guerra motivada pelo fanatismo religioso) tem conotações claramente negativas, de modo que, quando é usada in discriminadamente para caracterizar a conquista de Canaã por Israel, pode colocar em dúvida a ética de toda essa campanha militar. Várias discussões modernas sobre guerra santa no AT consideram as narrativas de Josué não como uma descrição daquilo que de fato ocorreu, mas sim o produto de reflexões teológicas posteriores sobre as origens de Israel, com raízes no culto israelita (ver von Rad, Holy War). O propósito dessa suposta reapresentação das tradições histó ricas de Israel foi uma tentativa de recuperar um pouco da fé antiga de Israel para aqueles que vieram bem depois no período do AT. Normalmente essa concepção é associada a uma visão da conquista como “infiltração” ou “revolta camponesa”, de modo que o retrato todo da conquista conforme este é apresentado no livro de Josué é considerado uma ficção teológica. Esse tipo de abordagem ao livro de Josué não faz justiça à seriedade e realidade da mensagem teológica das narrativas da conquista. Deve-se observar que a expressão guerra santa não é usada em parte alguma do AT para descrever a conquista. Um termo mais apropriado é guerra de Javé (“Guerras do Senhor”, Nm 21.14; ISm 18.17; 25.28; cf. Smend, Yahweh War). A realidade da ira e do julgamento divinos sobre o pecado conforme esta se reflete nas narrativas da conquista de Canaã, que foi empreendida por iniciativa divina e realizada com a presença divina, é um tema que se encontra presente em toda a Bíblia. E, também, um tema que tanto o AT quanto o NT acreditam que, por fim chegará ao seu auge no dia escatológico do Senhor (Isaías 13; Joel 2— 3; Am 5.8-20; Zc 14.1-11; ITs 5.1-10; 2Pe 3.10). Essa concepção mostra que a conquista de Canaã não deve ser vista como um exemplo de “evolução interrompida” no âmbito ético, mas sim como um exemplo de “escatologia prenunciada” (Kline, 162-64). 3. Temas da aliança. Os temas do “guerreiro divino” e da “terra como dádiva” cm Josu não aparecem de maneira isolada, mas encontram-se intimamente associados a várias outras evidências do livro, sendo que todas elas têm suas raízes nas promessas da aliança feitas aos 812
Josué: Teologia de
patriarcas, bem como às cláusulas dessa aliança apresentadas no Sinai. A atividade divina e a presença divina estão unidas na instituição e nas prescrições dessas duas alianças. a. O tabemáculo, a arca e Siló. As estipulaçòes da aliança em Êxodo contêm instruções detalhadas com referência à construção do tabemáculo e da arca da aliança que devia ser colo cada dentro do tabemáculo atrás de uma cortina no Santo dos Santos (Êx 26.33-34). Seria ali no tabemáculo, acima dessa arca e entre os dois querubins, que Deus iria habitar no meio do seu povo e encontrar-se com ele (25.22). O ponto culminante do livro de Êxodo não é o livra mento do povo do Egito, mas a vinda de Javé para o tabemáculo a fim de habitar no meio do seu povo (40.34.36). O êxodo foi um meio de se atingir esse fim (3.12; 5.1; 29.44-46). Esse é o contexto que explica a importância da arca da aliança nas narrativas de Josué, incluindose as referências repetidas a ela nas descrições da travessia do rio Jordão (Js 3.3, 6, 8, 11, 13, 14, 15; 4.5, 7, 9, 10, 11, 16, 18), na captura de Jericó (6.4, 6, 7, 8, 9, 11, 12, 13), no pecado de Acã (7.6; Josué “se prostrou em terra sobre o rosto perante a arca do Senhor”) e na renovação da aliança no monte Ebal (8.33). A arca simboliza a presença de Javé com seu povo (cf. Nm 10.35-36) e essa presença determinante e dinâmica é a grande força motriz por trás dos acon tecimentos no livro de Josué. É a importância da presença divina para a vida de Israel na ter ra que também explica a relevância estrutural no livro de Josué dada à proclamação de que o tabemáculo seria colocado em Siló (Js 18.1, ver acima). Foi em Siló, “perante o Senhor”, que Josué dividiu a terra entre as sete tribos que ainda não haviam recebido suas heranças (18.1; 19.51). A presença de Javé vivendo no meio delas exigia ainda uma resposta adequada de ado ração e serviço ao Grande Rei (caps. 22— 24). b. Israel devia crer e não temer. Um dos compromissos importantes que Javé assumiu com seu povo no Sinai foi a promessa de que se os israelitas seriam fiéis à aliança; Javé seria “inimigo dos inimigos [deles], e adversário dos adversários [deles]” (Êx .23.22). Essa declaração é chamada, por vezes, de “cláusula de proteção” da aliança do Sinai. Apesar de Israel ter rece bido a promessa de vitória sobre os cananeus (23.20-31) e ter sido lembrado dessa promessa por Josué e Calebe em Cades-Baméia (Nm 14.8-9), o povo teve medo dos habitantes da terra de Canaã e se rebelou contra a liderança de Moisés e Arão (Números 13— 14). Uma vez que não confiou nas promessas de Javé, o povo foi condenado a vagar durante quarenta anos pelo deserto até que viesse a nova geração para possuir a terra prometida. No final da vida de Moisés, quando a nova geração havia chegado às campinas de Moabe e estava prestes a atravessar o rio Jordão para entrar na terra de Canaã, Moisés lembrou-a mais uma vez da promessa de Javé de acompanhá-la nas batalhas, de protegê-la dos inimigos e de conduzi-la à terra da promessa (Dt 6.17-19). Por causa dessas promessas, os israelitas não deviam temer (20.1-3), mas sim crer, “pois o Senhor, vosso Deus, é quem vai convosco a pelejar por vós contra os vossos inimigos, para vos salvar” (20.4). Esse tema é retomado e levado adiante no livro de Josué. Na conclusão da primeira atividade divina (Js 1.1-9), que incumbiu Josué de atravessar o Jordão, Javé disse: “não temas, nem te espantes, porque o Senhor, teu Deus, é contigo por onde quer que andares” (1.9). Exortações semelhantes são encontradas ao longo de todo o livro (8.1; 10.8; 11.6). c. Fidelidade pactuai. Pelo fato de Javé haver depositado seu amor sobre seu povo, li bertado os israelitas do Egito e os levado para a terra de Canaã, o povo devia reciprocar com um amor por ele que seria expressado por meio da obediência às estipulaçòes da aliança (Dt 6.1-12; 11.1-32). A obediência traria bênção, mas a desobediência traria maldição (Levítico 26; Deuteronômio 27— 28). A obrigação de Israel de praticar a fidelidade pactuai e as impli cações do sucesso ou fracasso de Israel nesse dever são ressaltados em Josué 22—24. No cap. 22, Josué desafiou as tribos do Leste que estavam voltando para seus territórios do outro lado do Jordão, dizendo: “ameis o Senhor, vosso Deus, andeis em todos os seus caminhos, guardeis 813
Judá, Montanhas de
os seus mandamentos, e vos achegueis a ele, e o sirvais de todo o vosso coração e de toda a vossa alma” (22.5b). Essa exortação resume a obrigação fundamental de Israel de exercitar a fidelidade dentro da aliança. No cap. 23, Josué lembra aos líderes do povo que Javé era aque le que havia lutado por eles e que os havia trazido para dentro da terra (23.3, 9). Em seguida, diz-lhes que se permanecessem fiéis a Javé, ele os capacitaria para completarem a conquista (23.4-11). Porém, caso se afastassem de Javé, aqueles que haviam restado dos cananeus se tor nariam armadilhas para eles e o Senhor não mais os capacitaria para terminarem a conquista. Josué conclui dizendo: “Quando violardes a aliança que o Senhor, vosso Deus, vos ordenou, e fordes, e servirdes a outros deuses, e os adorardes, então, a ira do Senhor se acenderá sobre vós, e logo perecereis na boa terra que vos deu” (23.16). No cap. 24, Josué reúne o povo em Siquém para desafiá-lo a renovar seu juramento de fidelidade a Javé ao entrarem naquela nova etapa de sua história que viria depois da morte de seu líder. As bênçãos e maldições de Le vítico 26 e Deuteronômio 27—28 que dependiam da obediência ou desobediência à aliança, garantiam a vitória ou a derrota de Israel por seus inimigos. Além disso, se Israel persistisse em sua desobediência, acabaria sendo expulsa da terra de Canaã e dispersada entre as nações (Lv 26.27-35; Dt 28.58-68). Herança: yrs I (tomar posse, ser despojado, expulsar, destruir, despojar, # 3769); -> nhl (ter como posse/herança, dividir para posse, # 5706) B ib l io g r a f ia
TDOT5:180-99; R. G. Boling, Joshua, A R , 1982; J. Bright, The Authority o f the Old Testament, 1967; T. C. Butler, Joshua, WBC, 1983; F. M. Cross, Canaanite Myth and Hebrew Epic, 1973; M. Kline, The Structure o f Biblical Authority, 1972; T. Longman, III, “The Divine Warrior: The New Testament Use of an Old Testament M otif', WTJ 4 4 ,1982,290-307; P. D. Miller, Jr., “The Gift of God: The Deuteronomic Theology of the Land”, Int 2 3 ,1969,451 -65; idem, The Divine Warrior in Early Israel, 1973; G. von Rad, Der heilige Krieg im alten Israel, 19583, ET, Holy War in Ancient Israel, 1991; R. Smend, Yahweh War and Tribal Confederation: Reflections Upon Israel ’s Earliest History, 1970; G. J. Wenham, “The Deuteronomic Theology of the Book of Joshua”, JBL 90, 1971, 140-48; M. H. Woudstra, The Book o f Joshua, NICOT, 1981. J. Robert Vannoy Júbilo
#2146 (hll I, louvar, alardear, exultar)
Judá, M ontanhas de
Judá, Montanhas de (rn in ’ [y^húdá], # 3373).
AT A região montanhosa (de Judá) é uma das quatro regiões principais da cordilheira central da Palestina, que se eleva abruptamente do deserto da Judéia até o vale do rio Jordão a leste. Suas características essenciais são o solo fértil, cortado em terraços para o cultivo de árvores frutíferas e vinhas, e uma estrada importante no sentido norte-sul, ligando cidades importantes como Jerusalém, Belém e Hebrom. Devido aos seus despenhadeiros íngremes a leste, junto ao mar Morto, repletos de extensos cânions cortados por inúmeros ribeiros sazonais, e ao deserto (que impedia o deslocamento no sentido leste-oeste), a região montanhosa de Judá era, de certo modo. uma área isolada. Tendo-se em vista que a Palestina localiza-se na parte sudoeste do Crescente Fértil, as principais estradas internacionais cortavam a região no sentido norte-sul. Essas estradas — o 814
Judá, Montanhas dc
Caminho do Mar que passava pela planície costeira e a Estrada do Rei, que passava a leste do vale do Jordão — não cruzavam as montanhas de Judá. O fato de não estarem junto a essas vias de acesso significava que não tinham parte em seu comércio, com os respectivos benefí cios econômicos e intercâmbio cultural, de modo que Judá era de natureza mais provinciana. Por outro lado, esse isolamento significava ser invadido com menos freqüência pelos exércitos inimigos que passavam ou lutavam por essas “terras de ligação”, ponte entre o Egito no con tinente africano e os impérios da Ásia (assírios, babilônios, persas, etc.). 2. Nisso encontram-se algumas das diferenças, não apenas de geografia física, mas também de cultura, e até mesmo religião, entre o reino do Norte, Israel, e o reino do Sul, Judá. O Norte era mais susceptível às influências estrangeiras (incluindo-se suas práticas idólatras) e também ao controle. Não é de admirar que, estando “no caminho” e, portanto, mais vulne rável, o Norte caiu sob o domínio assírio quase um século e meio antes de o reino do Sul ser capturado pela Babilônia. E possível que essa vulnerabilidade também tenha tomado o Norte mais beligerante: muitas vezes, o reino de Israel declarava soberania sobre o Sul e participa va de aliança com vizinhos não israelitas, lutando até mesmo contra compatriotas israelitas do Sul (2Rs 16.5; Is 7.1 [uma ocasião para revelação profética, 7.2— 8.15, inclusive para uma previsão messiânica, 7.14]; no entanto, deve-se observar que Judá também buscou a ajuda de não-israelitas [assírios] 2Rs 16.7-9). Outra diferença entre os reinos do Norte e do Sul, criada por suas geografias bastantes distintas referia-se aos recursos naturais: Judá não possui nenhum equivalente aos vales férteis e bem irrigados da baixa Galiléia e, no geral (exceto por algumas regiões férteis como aquelas ao redor de Hebrom), se parece mais com os desertos do Sul e é mais apropriada para o pastoreio de rebanhos. 3. Na era dos cananeus, uma parte considerável da região era coberta de florestas, com grandes áreas desabitadas. Jerusalém era a principal cidade, mas as cidades cananéias das montanhas no sul de Judá e norte do Neguebe eram fortes o suficiente para evitar a entrada de israelitas em Judá (Nm 21.1,4, 10-12). Quando entraram em Canaã durante a conquista, as tribos israelitas conseguiram assentar-se nas regiões desabitadas junto às cidades cananéias já existentes, as quais foram conquistando gradualmente. A vitória israelita na batalha de Gibeão (Js 10.1 -15) deu a Judá a oportunidade de ocupar a região montanhosa (daí o seu nome). Du rante suas conquistas, “veio Josué e eliminou os anaquins da região montanhosa... de Judá” (11.21). Entre as cidades de refúgio e as cidades separadas para os levitas estavam “QuiriateArba, ou seja, Hebrom, na região montanhosa de Judá” (20.7; 21.11). Foi nessa região que Davi conquistou a lealdade dos habitantes contra a casa de Saul (1 Sm 30.26-31). Ali, Jotão “edificou cidades na região montanhosa de Judá e nos bosques, castelos e torres” (2Cr 27.4). 4. Tendo em vista as características montanhosas da região, a importância teológica dela vem principalmente do significado das montanhas nas Escrituras, bem como da relevância teo lógica das tribos relacionadas (esp. Judá [->]) e de seus lideres. A grandeza de Deus é vista no fato de que ele “pesou os montes em romana e os outeiros em balança de precisão” (Is 40.12) e de que pode mover as montanhas (Zc 4.7) ou nivelá-las (Is 40.4). As montanhas são um lugar para encontrar-se com Deus (Ex 3.1-6) e adorá-lo (esp. com sacrifícios, Gn 22.2, 4, 14), e também um lugar de revelação (Ex 19.20). Deus visita seu povo esp. no monte Sinai e no monte Sião, sendo que este último estabeleceu-se como lugar de adoração (Dt 12.5; SI 48.1-3). Além dessas idéias, a associação messiânica de Judá propor ciona o contexto para as narrativas do nascimento em Lucas: “por toda a região montanhosa da Judéia foram divulgadas estas coisas” (Lc 1.65). Talvez não seja de admirar que os montes também podem ser o lugar de adoração idólatra: Jeorão “fez altos nos montes de Judá, e sedu ziu os habitantes de Jerusalém à idolatria, e fez desgarrar a Judá” (2Cr 21.11). 815
Judá, Reino de
Os montes dão refúgio (esp. em suas muitas cavernas): “os que estiverem na Judéia, fujam para os montes” (Mt 24.16 par.). O próprio Deus é uma rocha e um refúgio para o seu povo (SI 27.5; 28.1). Por fim, o reino de Deus é simbolizado por um monte que enche toda a terra (Dn 2.35, 44). A igreja é construída sobre uma rocha como essa (Mt 16.18-19). Montanha, colina, lugar alto: -> bümá (lugar alto cultuai,# 1195); gib a I (colina,# 1496); har (montanha, colina, # 2215); -> y^rêkâ (coxa, parte posterior da montanha, # 3752); nôp (altura, # 5679); -> me$ãd(baluarte, # 5711); ‘wz (refugiar-se, # 6395); 7/; (subir, esca lar, elevar, # 6590); silr I (pedra, matacâo, # 7446); -> sãpón I (norte, # 7600); -> rwm (ser elevado, exaltado, orgulhoso, # 8123); sgb (ser alto, fortificada, proteger, # 8435) B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, Land o f the Bible: A Historical Geographv, 1979, Denis Baly, The Geography o f the Bible: A Study in Historical Geography, 1957, George Adam Smith, The Historical Geo graphy o f the Holy Land, 1906; George Ernest Wright e Floyd Vivian Filson, The Westminister Historical Atlas to the Bible, 1956. William Moulder
OMA O reino de Judá é citado em vários textos extrabíblicos, quase todos eles de fontes assírias e babilô nias. Os primeiros referem-se a ele como ia-ú-du (AN ET2, 288) e os últimos como ia-ú-du ou ia-ahu-du (Wiseman, 72, 86). Judá, Reino de
AT 1 .0 nome do reino de Judá deriva da tribo que constituiu a base histórica e cultural desse reino. Os descendentes dessa tribo continuaram a fornecer grande parte do conteúdo ét nico do reino ao longo de toda a história. O AT é unânime ao insistir em que o reino de Judá é a nacionalização de uma tribo originária do quarto filho do patriarca Jacó (Gn 29.35; cf. Gn 49.10; ICr 2.1-17; SI 76.2; 78.67-70). 2. Essa coesão de tribo (->) e nação (->) confere relevância teológica a Judá, pois seu antepassado patronímico, apesar de não ser o primogênito de seu pai, foi motivo de louvor especial de sua mãe a Javé (daí a etimologia popular vdh, louvar, dar graças [-> # 3344; Gn 29.35; HALAT, s.v. ydh]). Esse filho ocupa uma posição de destaque nas narrativas de Gênesis (cf. Gn 37.26-28; 38.1-30; 43.1-15; 44.14-34; 46.28) e é recipiente de bênçãos promissórias de seu pai que prevêem importância singular para a tribo e reino do filho (Gn 49.10-12; Dt 33.7). A genealogia de Davi, cm Rute 4.18-22, faz questão de relacionar o reino de Davi (e assim, o reino de Judá) com seu antepassado epônimo (4.11-12) e, desse modo, com a aliança abraâmica. Com isso, cria-se uma ligação entre as alianças de Abraão e Davi (E. H. Merril, 1985, 130-41). 3. Depois da conquista de Canaã sob a liderança de Josué, a tribo de Judá assentou-se na região ao sul de Jerusalém, norte de Cades-Baméia, e entre o mar Morto a leste e o mar Mediterrâneo a oeste (Js 15.1-12). Em função de seu relativo isolamento, Judá tornou-se in dependente em sua visão de mundo, espírito e até em sua linguagem, apesar de, formalmente, fazer parte da confederação das tribos dc Israel. Essa idéia de bifurcação entre Judá (e também Simeão, cujo território era encravado dentro de Judá; 19.1 -9) e as outras tribos é comprovada pela falta de envolvimento de Judá em certos assuntos pertinentes a toda Israel (cf. Jz 5.12816
Judá, Reino de
18) e pela distinção freqüente entre Israel e Judá mesmo antes do reinado de Davi (cf. ISm 11.8; 15.4; 17.52; 18.16). Aquilo que se encontrava latente, tornou-se cada vez mais reconhe cido com a ascensão de Davi, um judaíta, em oposição a Saul, o rei de Israel. Mais uma vez, Judá foi vista como uma entidade separada de Israel (ainda que, teoricamente, fizesse parte dela), uma situação acentuada pelo antagonismo de Saul para com Judá e o sentimento de alienação da parte de Judá com relação à monarquia do Norte (cf. 22.5; 23.19-23). Quando, por fim, Saul morreu, nem sequer ocorreu a Davi que devesse sucedê-lo em Gibeá, a capi tal de Israel. Antes, traçou seus planos para tomar-se rei apenas de Judá, uma vez que tinha plena consciência da autonomia de facto de Judá a essa altura e da impropriedade de sequer tentar impor sua regência sobre a região Norte de Israel (2Sm 2.1-4). No entanto, o destino de Judá como único reino da promessa e cumprimento da aliança ainda não era tão evidente para todos os outros líderes, nem mesmo para aqueles do Norte, de modo que não tardou para que Davi recebesse a deferência de toda Israel e se tomasse rei no lugar de Saul (1 Cr 11.1-3; 12.1 -40). (-> Davi: Teologia) Porém, essa união obtida era apenas superficial e frágil, uma coesão que mal durou além dos 75 anos equivalentes aos reinados de Davi e seu filho Salomão. O favoritismo de monstrado por este último para com Judá em função das origens tribais dele permitiu que essa tribo recebesse isenção de várias das pesadas tributações do rei (cf. 1Rs 4.7-19, em que chama a atenção a ausência de Judá). Além disso, os narradores bíblicos insistem em fazer distinção entre Judá e Israel, prenunciando o cisma inevitável que pairava sobre o reino (cf. 1.35; 4.20). Essa questão passou a ocupar o primeiro plano depois da morte de Salomão e de sua sucessão por seu filho intemperado, Roboão. Ignorando o conselho de seus anciãos para que aliviasse as regulamentações severas de seu pai, Roboão encurtou as rédeas ainda mais, o que resultou na rebelião de Israel contra ele, um rompimento do Norte com Judá que persistiu ao longo da história dos dois reinos (12.1-24). (-> Roboão: Teologia) A ruptura da monarquia das doze tribos resultou em duas entidades: uma conhecida como Israel (o reino do Norte) e outra como Judá (o reino do Sul). Contudo, a separação não era tão clara quanto a poder indicar a terminologia, pois além de ter a tribo de Simeão incorporada em sua jurisdição, Judá logo anexou também a tribo de Benjamim (lR s 12.21; cf. 2Cr 11.1, 10, 23). É provável que o motivo para essa mudança inesperada se encontre na contigüidade en tre Benjamim e Judá, na localização de Jerusalém, a capital nacional, entre as duas tribos e na rapidez demonstrada anteriormente pelos líderes de Benjamim em se identificarem com Davi logo depois de sua volta do exílio na Transjordânia (cf. 2Sm 19.16-17). Mesmo antes disso, Abner, um primo de Saul e, portanto, um benjaminita, havia feito aliança solene com Davi para entregar-lhe o reino de Saul (3.12-13,17-21). Uma vez que Benjamim encontrava-se no centro desse reino, nem mesmo a ruptura entre Jeroboão e Roboão foi suficiente para levar Benjamim a juntar-se ao reino do Norte. (-> Israel, Reino de: Teologia) Ao longo do restante da história do AT, Benjamim nunca aparece como uma entidade independente. Juntamente com Simeão, encontra-se incluída na designação “Judá”, ainda que, conforme será observado abaixo, os três elementos reapareçam de modo separado e distinto na listagem escatológica das tribos de Israel. A única concessão é a ocorrência freqüente de “Judá e Benjamim” como descrição do reino do Sul, uma designação que continuou a ser usada mesmo depois do exílio. No entanto, é interessante observar-se que ela não aparece na “história deuteronomística” (cf. 2Cr 14.8; 15.2, 8-9; 25.5; 31.1; 34.29-33; Ed 1.5; 4.1; 10.9; Nm 11.4). Mais importante ainda é o fato de que na divisão do Estado davídico, este foi reduzi do somente ao reino de Judá. O motivo para isso é óbvio: Davi era um judaíta, de modo que aqueles que se assentaram no trono de Davi tomaram-se, por definição, governantes somente 817
Judá, Reino de
sobre aquela parte da nação que restou dos simpatizantes de Davi em decorrência das políticas absolutamente tacanhas de Roboão. Na verdade, o anúncio de que o reino de Davi se restrin giria somente a Judá ocorreu antes da morte de Salomão (1 Rs 11.31-32). Em termos mais do que claros, o profeta Aías declara o motivo: “[Judá] me deixou... e não andou nos meus cami nhos para fazer o que é reto perante mim, a saber, os meus estatutos e os meus juízos, como fez Davi, seu pai” (1 Rs 11.33). 4. Os fatos históricos da existência de Judá indicam — porém não apresentam em d talhes — a sua relevância teológica. O quadro mais geral contém também a. a preservação das promessas da aliança por intermédio de Judá; b. as implicações messiânicas de Judá como reino de Davi; e c. Judá como uma realidade escatológica. a. A primeira das promessas da aliança era muito anterior a Israel como uma entidade nacional, quanto mais ao cisma histórico que redundou em Judá como único reino davídico. Judá, o quarto filho de Jacó, alcançou a primazia devido à desqualificação de seus irmãos mais velhos, Rúben, Simeão e Levi, um fato indicado nas narrativas de Gênesis (Gn 34.30; 35.22) e atestado sem dúvida alguma na bênção dada por Jacó aos filhos (49.3-7). De certo modo, portanto, o privilégio de receber e transmitir a aliança foi dado a Judá simplesmente porque foi ele quem restou como filho mais velho qualificado para isso. Em nível mais profundo, porém, não se devem desprezar os propósitos eletivos de Deus, o qual desde o princípio tinha Judá em mente como um instrumento salvífico e real dele próprio. Claro que o mais impressionante é a promessa de que “o cetro não se arredará de Judá, nem o bastão de entre seus pés, até que venha Siló; e a ele obedecerão os povos” (49.10; Emerton, 83-88; von Rad, 420). A nature za monárquica dessa promessa é evidente, e Davi entendeu a expressão “ate que venha Siló” como uma referência a ele mesmo como rei de Sião (ou Judá; cf. SI 2.6-9; 45.6-7 [7-8]; 48.1-2 [2-3]). A Davi, o judaíta, foi concedida uma aliança que prometia salvação ao povo eleito de Deus (2Sm 7.10). b. As implicações messiânicas de Judá como reino de Davi estão explícitas nas narra tivas que descrevem a divisão de Israel em reino do Norte e reino do Sul. Em decorrência do pecado de Salomão e do fato de Israel ter abandonado a aliança, a monarquia davídica perde ria tudo menos Judá. Essa tribo, porém, sobreviveria e seria o centro da redenção de Javé para o seu povo como um todo, pois Javé havia escolhido Davi e Davi havia guardado os manda mentos e estatutos de Javé (lR s 11.34). Além disso, Judá sobreviveria “para que Davi, meu servo, tenha sempre uma lâmpada diante de mim em Jerusalém, a cidade que escolhi para pôr ali o meu nome” (v. 36). As dimensões mais amplas dessa promessa podem ser encontradas na declaração da aliança davídica com relação ao estabelecimento do reino de Davi. Surgirá um descendente e “este edificará uma casa ao meu nome, e eu estabelecerei para sempre o trono do seu reino” (2Sm 7.13). Essa profecia de um reino eterno cumpriu-se de maneira absoluta — como o prova a revelação subseqüente — no Filho de Davi por excelência, o Senhor Jesus Cristo. Descen dente de Davi (Mt 1.6-16), ele nasceu em Belém da Judéia (Mq 5.2) e foi reconhecido com Rei dos Judeus, ou seja, Rei de Judá, o reino de Davi (Mt 2.2; 27.11, 29, 37; Jo 18.33-39). A sobrevivência do nome Judá no termo étnico “judeu” afirma a identidade de Jesus como o rei davídico de Judá em cumprimento à promessa antiga feita a Davi (cf. At 2.29-36). c. Isso nos leva, por fim, à concepção de Judá como uma realidade escatológica. O Apocalipse fala de todas as tribos (exceto Dã) apresentando testemunhas no fim dos tempos (Ap 7.5-8), e Judá encontra-se no alto da lista. Ezequiel descreve a distribuição escatológica do reino entre as tribos e, mais uma vez, Judá tem um papel central, ocupando uma localização adjacente à região sagrada (Ez 48.8-22). Por fim, entretanto, Judá e Israel se tomarão termos 818
Juizes: Teologia de
intercambiáveis para descrever o povo unido de Deus (Zc 12.1 -2). A vara quebrada da comuni dade da aliança (11.14) será restaurada e Israel e Judá “se tomarão apenas um na minha mão”, diz Javé (Ez 37.19). Não haverá um reino de Judá ou um reino de Israel naquele dia, mas sim, um só povo do Senhor, aquele que diz: “O meu servo Davi reinará sobre eles; todos eles terão um só pastor” (v. 24). B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land o f the Bible, 1979; J. Bright, A History o f Israel, 3d ed., 1981; F. M. Cross, “A Reconstruction of the Judaean Restoration”, JBL 94, 1975, 4-18; J. A. Emerton, “Some Diffícult Words in Genesis 49”, Words and Meanings, ed. by R R. Ackroyd e Bamabas Lindars, 81-93; M. Fishbane, Biblical lnterpretation in Ancient Israel, 1985, 501-2; L. Grabbe, “Josephus and the Reconstruction of the Judean Restoration”, JBL 106, 1987, 231-46; J. Grenbaek, “Benjamin und Juda”, VT 15, 1965,421 -36; Z. Kallai, Historical Geography o f the Bible, 1986; idem, “The Southern Border o f the Land o f Israel-Pattem and Application”, VT 37, 1987, 438-45; E. Lipinski, “L’étymologie de ‘Juda’”, VT23, 1973, 380-81; E. H. Merril, Kingdom o f Priests, 1987; idem, “The Book o f Ruth: Narration and Shared Themes”, Bsac 142, 1985, 130-41; A. Millard, “The Meaning of the Name Judah”, ZAW 86, 1974, 216-18; N. Na’aman, “The Kingdom of Judah Under Josiah”, TelAviv 18, 1991, 3-71; M. Noth, “The Jerusalem Catastrophe o f 587 B.C. and Its Significance for Israel”, The Laws in the Pentateuch and Other Essays, 1966, 260-80; G. von Rad, Genesis, 1961, 419-20; D. J. Wiseman, Chronicles o f Chaldaean Kings, 1956; G. E. Wright, “The Boundary and Providence Lists of the Kingdom of Judah”, JBL 75, 1956, 202-26; Y. Yadin, “The Fourfold Division o f Judah”, BASOR 163, 1961,6-12. Eugene H. Merrill Judeu
# 3374 {y^hüdi I, judeu)
Judite -> Apócrifos Jugo
# 6585 ( 'õl, jugo)
Juizes: Teologia de A. Contexto histórico O livro de Juizes descreve as condições da terra de Israel entre a morte de Josué (Jz 1.1) e o nascimento de Samuel (1 Samuel 1). Durante esse tempo, era responsabilidade de cada tri bo israelita consolidar a conquista de Canaã dentro de seu próprio território (Josué 13— 21) e viver de maneira coerente com as estipulações determinadas na aliança (deut.) no Sinai. Essa aliança havia sido renovada nas campinas de Moabe, antes da morte de Moisés (Deuteronômio), e novamente em Siquém, pouco antes da morte de Josué (Josué 24). Agora que Israel havia entrado na terra e se assentado nela, a aliança do Sinai tinha por finalidade funcionar como uma constituição nacional, tendo Javé como rei. Não havia exército nem governo central per manentes. As tribos deviam ser unidas por suas histórias em comum e sua fidelidade à Javé. A obediência voluntária às estipulações da aliança garantiria a conclusão da conquista e traria a bênção divina sobre a terra e o povo (Deuteronômio 28.1-14). A transgressão da aliança traria opressão política e desordem social (28.15-68). 819
Juizes: Teologia de
É difícil determinar-se um contexto cronológico preciso para o período dos Juizes; trata-se de um processo que envolve a questão complexa e controversa da datação do êxodo (sendo que os pontos de vista costumam se dividir entre uma data mais antiga [c. 1440 a. C.] e uma data mais recente [c. 1290 a. C.]), bem como uma compreensão do grau de sobreposição entre os períodos de governo dos vários juizes e os tempos de descanso da opressão (governo dos juizes: 9.22; 10.2,3; 12.7,9, 11, 14; 15.20; descanso: 3.11, 30; 5.31; 8.28; opressão: 3.8, 14; 4.3; 6.1; 10.8; 13.1 [uma somatória total de 410 anos]) que são mencionados no próprio livro de Juizes. A cronologia interna de Juizes, abrangendo o comentário de Jefté (11.26) de que Israel já ocupava o território a leste do Jordão havia trezentos anos, encaixa-se muito mais prontamente com a data mais antiga para o êxodo do que com a data mais recente. Partindo-se do pressuposto de que a data mais antiga seja a correta, parece bastante provável que o perío do descrito no livro de Juizes compreenda cerca de trezentos anos, desde o começo do século XIV a. C. até o começo do século XI a. C. Durante esse tempo, Israel não sofreu ameaças militares das principais potências mun diais. Por volta de 1200 a. C., o Egito havia perdido territórios fora de suas fronteiras e havia sido forçado a defender essas fronteiras de ataques dos Povos do Mar. O império hitita também havia ruído por volta de 1200 a. C. como resultado dc golpes de inimigos do Oeste e, nessa mesma época, a Assíria havia entrado num período de fragilidade que, com exceção de um breve ressurgimento sob o governo de Tiglate-Pileser I (c. 1100 a. C.), continuou até o começo do século IX a. C. Tudo isso se encaixa bem com as condições descritas no livro de Juizes. As opressões de Israel mencionadas no livro não vêm de grandes potências do OMA, mas sim de cananeus e pequenos Estados vizinhos, com os moabitas, amonitas, midianitas e filisteus. B. Estrutura literária A vasta estrutura literária do livro de Juizes é clara. Os comentaristas concordam em que o livro é composto de três seções nitidamente distintas: 1. um prólogo de duas partes (Jz 1.1—2 .15; 2.6— 3.6), contendo um texto introdutório (1.1 —3.6); 2. um corpo principal, con tendo narrativas sobre os juizes maiores e menores (3.7— 16.31) e 3. um epilogo de duas partes (17— 18; 19—21) retratando o caos religioso e moral característico da época (17— 21). Uma análise mais detalhada revela uma estruturação complexa das unidades narrativas de modo a formar um todo coerente (ver: Gooding, “Composition,” 70-79; Webb, Judges, 1987), indi cando que o livro é produto de um só escritor e não de uma série de redatores e também que o escritor organizou o material cuidadosamente de modo a retratar uma era turbulenta do início da história de Israel de maneira a ressaltar vários temas teológicos importantes. A estrutura do livro sugere fortemente que o fracasso de Israel em completar a conquista da terra levou a nação a entrar numa espiral descendente rumo ao caos religioso, moral e social. Essas condições surgiram quando Israel adaptou-se às crenças e práticas religiosas dos cana neus e abandonou a fidelidade à aliança com Javé, seu Grande Rei. Ao mesmo tempo, tem-se a impressão de que o objetivo do escritor era ressaltar a grande misericórdia de Javé para com seu povo rebelde. Apesar de Israel ter repetidamente dado as costas para Javé e adorado outros deuses, em sua graça, Javé persistiu em levantar juizes para livrar o povo da opressão. Ten do em vista os comentários do escritor de que os males descritos no epílogo ocorreram numa época em que “Israel não tinha rei” (17.6; 18.1; 19.1; 21.25), parece claro que ele escreveu a obra depois que a monarquia havia sido estabelecida e que parte do seu propósito era justificar a introdução do governo monárquico na estrutura da teocracia. É necessário observar mais de perto a estrutura a fim de discernir de que maneira esses temas principais são ressaltados pela organização do material dentro do livro. 820
Juizes: Teologia de
O prólogo (Jz 1.1— 3.6) se divide em duas partes claramente definidas (1.1—2.5 e 2.6— 3.6), cada uma delas introduzida por uma oração parecida (1.1, “Depois da morte de Jo sué, os filhos de Israel consultaram o Senhor...” e 2.6, “Havendo Josué despedido o povo...”). A primeira seção (1.1— 2.5) recapitula os sucessos e fracassos das tribos de Judá (juntamente com Simeão), Benjamim, Manassés, Efraim, Zebulom, Aser, Naftali e Dã em suas tentativas de completar a conquista de seus respectivos territórios. Em 1.27-36, fica claro que em vez de concluírem a conquista, muitas das tribos contentaram-se em viver no meio da população cananéia da terra. Em 2.1 -5, o anjo de Javé informa Israel que, em virtude de sua desobediência, esse remanescente cananeu permaneceria na terra e se tomaria uma cilada para os israelitas. Isso explica em grande medida o transcurso dos acontecimentos descritos no restante do livro. A segunda seção do prólogo (2.6— 3.6) apresenta uma perspectiva teológica para a com preensão das experiências históricas de Israel durante o período dos Juizes. Nessa passagem, o tema não é tanto o fracasso de Israel no processo de expulsão dos cananeus, mas sim a apostasia de Israel para com Javé, a adoração de deuses dos cananeus (2.12-13) e as conseqüências no civas desse comportamento. Pelo fato de Israel persistir em afastar-se de Javé, ele o entregava repetidamente nas mãos dos inimigos, que sujeitavam o povo à mais terrível opressão (2.1415). Em sua aflição, os israelitas clamavam a Javé, que tinha compaixão deles e levantava um juiz para livrá-los da aflição (2.16-18). E esse ciclo de apostasia, opressão e livramento que caracteriza o corpo principal do livro. O reconhecimento da repetição desse ciclo não deve ser entendido, porém, como uma sugestão de que a história simplesmente se repetia. A narrativa mostra claramente que a situação estava se movendo numa espiral descendente. Isso torna-se aparente de várias maneiras, como no declínio progressivo na conduta religiosa e moral dos próprios juizes, bem como na declaração da segunda parte da introdução: “Sucedia, porém, que, falecendo o juiz, reincidiam e se tornavam piores do que seus pais...” (2.19). O paralelo óbvio entre uma introdução com duas partes e um epílogo também com duas partes, indica, por si só, a simetria estrutural do livro. O epílogo (caps. 17—21) consiste de duas histórias que ilustram o caos religioso e moral do tempo dos Juizes. Os dois relatos envolvem um levita. No primeiro relato, a gravidade do declínio moral é demonstrada pela descrição da idolatria ostensiva combinada com o oportunismo religioso e a corrupção da instituição leví tica (17.1 — 18.31). A segunda história sublinha a decadência moral dessa era ao descrever a violência sexual contra a concubina de um levita de integridade duvidosa e o assassinato dela, o que, por sua vez, leva a uma guerra civil brutal, a qual, por pouco não destruiu a tribo de Benjamim (19.1—21.25). A simetria do livro é confirmada ainda por vários paralelos entre o prólogo e o epílogo (adaptado de Gooding, 77-78). Na primeira parte do prólogo, “os filhos de Israel consultaram o Senhor, dizendo: Quem dentre nós, primeiro, subirá aos cananeus para pelejar contra eles? Respondeu o Senhor: Judá subirá...” (1.1-2), e, no seu correlativo no epílogo, “os israelitas... consultaram a Deus, dizendo: Quem dentre nós subirá, primeiro, a pelejar contra Benjamim? Respondeu o Senhor: Judá subirá primeiro” (20.18). Apesar de haver uma semelhança impres sionante no paralelo, também há um contraste ressaltando o declínio, pois no prólogo Judá é bem-sucedida, enquanto no epílogo, Judá é derrotada. No prólogo, observa-se uma união tribal, uma vez que Judá age em cooperação com Simeão (1.3), enquanto no epílogo, vê-se um confli to tribal no qual Judá ataca Benjamim. No prólogo, os benjamitas não conseguem expulsar os habitantes da cidade de Jebus (1.21), enquanto no epílogo, o levita deliberadamente evita passar por Jebus, uma “cidade estranha, que não seja dos filhos de Israel” (19.12), quando procurava um lugar onde pernoitar, só para depois sofrer com a brutalidade dos israelitas habitantes de Gibeão, em Benjamim (19.22-28). No prólogo, os israelitas choram diante do anjo do Senhor 821
Juizes: Teologia de
depois de serem informados que os cananeus não serão expulsos por causa da desobediência de Israel (2.1-5). No epílogo, Israel chora e jejua perante o Senhor, depois de ser derrotado pelos benjamitas, numa batalha em que 22 mil e 18 mil israelitas foram mortos (20.21-23; 25-26). O corpo principal do livro também dispõe de certa simetria, consistindo de sete unida des narrativas dispostas em um quiasmo concêntrico. A. OTONIEL (3.7-11) Ao contrário dos israelitas que tomaram filhas dos gentios por esposas (3.6), a esposa de Otoniel incentivou-o a capturar Quiriate-Sefer(= Debir) e depois pressionou-o para pedir um campo ao pai dela (ver 1.11-15). B. EÚDE (e Sangar) (3.12-31) Eúde anunciou ao rei de Moabe: “tenho uma palavra secreta a dizer-te, ó rei” (3.19-20); e então, com a ajuda dos efraimitas, tomou os vaus do Jordão e matou o inimigo (3.28-30). C. DÉBORA, BARAQUE, JAEL (4.1—5.31) Uma mulher trespassou o crânio do comandante do inimigo com a estaca de uma tenda e, assim, acabou com a guerra. D. GIDEÃO Gideão combateu a idolatria (6.1-32), mas não apenas lutou contra o inimigo (6.33— 7.25), como também atacou compatriotas israelitas em Sucote e Penuel (8.1-21). Depois de uma recusa justificada de ser declarado rei (8.22-23), posteriormente ele próprio acabou se entregando à idolatria (8.24-32). C ’. ABIMELEQUE (e também Tola e Jair) (8.33— 10.5) Uma mulher esmagou a cabeça do inimigo com uma pedra de moinho e as sim, acabou com a guerra. B’. JEFTÉ (e também Ibsã, Elom e Abdom) (10.6— 12.15) Jefté enviou mensageiros ao rei (11.12-13) e tomou os vaus do Jordão, matando 42 mil efraimitas (12.1-6). A’. SANSÃO (13.1— 16.31) Sansão tomou para si esposas gentias que o pressionaram para contar-lhe seu se gredo e, desse modo, acabaram sendo a ruína dele. Essa correlação entre os componentes paralelos do quiasmo indicam que essa estru tura não é acidental e, portanto, deve ser levada em consideração na tentativa de discemir-se a mensagem (ou as mensagens) teológica do livro. A estrutura coloca a história de Gideão no centro, chamando a atenção, desse modo, para a importância fundamental da narrativa de Gi deão para os propósitos do livro. Gideão é o único juiz cuja oposição à idolatria é descrita com algum detalhe, o que é feito no início da carreira dele (6.25-32). E, no entanto, no final de sua trajetória como juiz, ele fez uma estola de ouro (8.24-27) e "todo Israel se prostituiu ali após ela” (8.27). A tendência descendente da carreira de Gideão reflete o declínio religioso e moral do período dos Juizes como um todo. Depois de quarenta anos de paz que seguiram a vitória de Gideão (8.28), o livro não faz mais referência a períodos desse tipo (são referências ante riores 3.11,30; 5.3; 7.28). Os próprios juizes mostram um envolvimento cada vez maior com a perversidade do povo; isso chegou ao auge em Sansão, cujos atos, muitas vezes, questionáveis refletem a de sobediência de Israel como um todo. Do tempo de Gideão em diante, os juizes não apenas lu 822
Juizes: Teologia de
taram contra os inimigos de Israel, mas tomaram parte cada vez mais em conflitos com outros israelitas (Gideão contra os homens de Sucote e Penuel [8.4-9, 14-17]; Abimeleque, filho de Gideão [apesar de não ter sido um juiz] contra seus irmãos e também contra Siquém e Tebes [9.5, 34-54]; Jefé contra os efraimitas [12.1-6] e Sansão, em que a situação é inversa, sendo ele entregue por seus compatriotas israelitas aos filisteus [15.9-13]). Na primeira seção do epílogo, os danitas atacaram Laís a fio da espada e incendiaram a cidade (18.27). Na segunda seção do epílogo, uma força conjunta de israelitas matou 25 mil benjamitas (20.46) e “passa ram a fio de espada tudo o que restou da cidade, tanto homens como animais, em suma, tudo o que encontraram; e também a todas as cidades que acharam puseram fogo” (20.48). Desse modo, quando o livro de Juizes chega ao fim, a “Guerra de Javé” está sendo combatida contra os israelitas em vez dos cananeus. A narrativa sobre Gideão contém vários episódios, sendo que cada um tem seu próprio ponto culminante (ver Webb, 144-54). O primeiro desses pontos descreve a vitória extraordi nária sobre os midianitas e a execução dos seus comandantes (7.19-25). Segue-se a história da perseguição dos reis midianitas Zeba e Salmuna (8.1-21), que chega ao auge quando Gideão encarrega-se pessoalmente de matá-los (v. 21). Depois dessa vitória impressionante, Gideão atingiu o auge de seu poder pessoal quando os israelitas lhe pediram: “Domina sobre nós, tan to tu como teu filho e o filho de teu filho, porque nos livraste do poder dos midianitas” (8.22). Essa proposta é o verdadeiro ápice das narrativas de Gideão e encontra-se no centro do livro. A proposta levanta a questão de quem tem o direito de governar Israel. Pode-se dizer em fa vor de Gideão que ele respondeu corretamente quando disse: “Não dominarei sobre vós, nem tampouco meu filho dominará sobre vós; o Senhor vos dominará” (8.23). A soberania de Javé não apenas é reconhecida como também ressaltada por sua presença nessa parte importante da estrutura do livro. C. Temas teológicos 1. A apostasia de Israel. Um tema predominante do livro de Juizes é o fracasso dos raelitas em manterem sua lealdade à aliança com Javé uma vez assentados na terra de Canaà. Haviam recebido a promessa de que Javé estaria com eles e lhes daria vitória desde que per manecessem fiéis e obedientes aos mandamentos dele (Dt 7.1 -5,17-26; 20.16-18). Israel havia sido instruída por Moisés a destruir todos os habitantes cananeus da terra para que não fosse levada a adorar os deuses deles. Os israelitas não deviam fazer nenhum tratado com os cana neus nem casar-se com eles. Assim como Moisés, antes dele, Josué havia advertido os israelitas para não se assentarem em terras junto com os cananeus, para que estes não se tomassem laço e rede para eles (Js 23.12,13). Uma vez completada a conquista soba liderança de Josué (11.23), tomou-se responsabilidade de cada tribo ocupar seu próprio território ao expulsar os cananeus restantes (13.1; 18.3; Juizes 1). Depois da morte de Josué, era tempo de Israel completar esse trabalho e tornar-se uma nação na qual Javé governava como seu rei divino. O assentamento em Canaã trouxe consigo mudanças enormes para as tribos israelitas. Em vez de uma existência seminômade e do sustento pela provisão diária de maná (Js 5.12), o povo precisava plantar suas próprias lavouras, cuidar dos rebanhos e desenvolver uma eco nomia agrária. Para isso, era preciso aprender as épocas e procedimentos para arar, plantar e colher. Com relação a tais coisas, os cananeus eram a fonte mais óbvia de instrução e orienta ção. Porém, para eles, a agricultura encontrava-se intimamente relacionada às práticas e rituais religiosos. As divindades cananéias eram personificações de forças da natureza, de modo que a prostituição cultuai era essencial para garantir a produtividade das lavouras e a fertilidade dos animais, assim como reverenciar a divindade correta era essencial para garantir a chuva e 823
Juizes: Teologia de
as boas colheitas. O prólogo de Juizes explica que Israel não completou a conquista (1.21 -36), que os israelitas não obedeceram as ordens de Javé (2.2), que começaram a adorar as divinda des cananéias (2.11-13, 19) e que chegaram até a casar-se com os cananeus (3.6). Essa desobe diência é resumida na declaração explícita de Javé: “Porquanto este povo transgrediu a minha aliança que eu ordenara a seus pais e não deu ouvidos à minha voz” (2.20). Esse mesmo tipo de acusação é repetido ao longo de todo o livro. Depois da época de Gideão, o narrador diz: “Morto Gideão, tomaram a prostituir-se os filhos de Israel após os baalins e puseram BaalBerite por deus. Os filhos de Israel não se lembraram do Senhor, seu Deus, que os livrara do poder de todos os seus inimigos ao redor” (8.33-34). Na verdade, as histórias de cada um dos juizes são apresentadas por uma ou outra variação da oração: “Os filhos de Israel fizeram o que era mau perante o Senhor” (3.7, Otoniel; 3.12, Eúde; 4.1, Débora; 6.1, Gideão; 10.6; Jefté; 13.1, Sansão). O Salmo 106.34-36 resume o tempo dos Juizes dizendo: Não exterminaram os povos, como o Senhor lhes ordenara. Antes, se mesclaram com as nações e lhes aprenderam as obras; deram culto a seus ídolos, os quais se lhes converteram em laço.
2. A fidelidade de Deus. Em contraste com esse retrato claro da persistência de Isra em dar as costas a Javé, o livro de Juizes também ressalta a fidelidade pactuai do Deus de Israel. Quando o anjo de Javé falou aos israelitas em Boquim (2.1-5), lembrou-os que Javé os havia tirado do Egito e os havia conduzido até a terra de Canaã. Também os lembrou das palavras de Javé: “nunca invalidarei a minha aliança convosco” (2.1). Quando Israel afastouse do seu Deus e Javé declarou que o restante dos cananeus seria deixado na terra para “pôr Israel à prova, se guardará ou não o caminho do Senhor, como seus pais guardaram” (2.22), isso não significa que Javé estava anulando sua aliança com Israel. Pelo contrário, demonstra que Javé executaria suas sanções. Apesar de a apostasia subseqüente levar à opressão de Israel por vários povos vizinhos, não se tratava de uma transgressão da aliança da parte de Javé, mas sim de sua medida disciplinar com o propósito de levar Israel ao arrependimento e obediência renovada a Deus. É comum os comentaristas sugerirem que o ciclo descrito na segunda parte do prólogo (2.11-19) e repetido nas histórias de vários juizes é de rebelião, retribuição, arrependimento e livramento. Uma observação mais minuciosa de 2.11-19, porém, revela que o prólogo não faz nenhuma referência ao arrependimento (ver Wilcock, 36-39; Davis, 37-43). A retribuição pela apostasia é descrita nos vv. 14-15 (“os entregou nas mãos dos inimigos... estavam em grande aperto”), mas é imediatamente seguida de: “Suscitou o Senhor juizes que os livraram da mão dos que os pilharam” (v. 16). Não há nenhuma referência ao arrependimento entre as descri ções de retribuição e livramento. Ao olhar-se para as histórias dos diversos juizes, pode parecer que a inserção do elemento de “arrependimento” no ciclo é justificada em virtude da declara ção repetida de que, em sua aflição, os israelitas “clamaram ao Senhor” (ver 3.9, o tempo de Otoniel; 3.15, quando o tempo de Eúde; 4.3, o tempo de Débora; 6.6, 7, o tempo de Gideão; 10.10, o tempo de Jefté). Alguns comentaristas sugeriram que essa aparente discrepância en tre o ciclo relatado no prólogo e o ciclo representado nas histórias dos juizes é prova de que o prólogo e as histórias são provenientes de escritores distintos. Essa conclusão baseia-se em parte na pressuposição de que “clamar” (z'q\ #2410) implica necessariamente “arrependi 824
Juizes: Teologia de
mento”. No entanto, tal pressuposição não é de modo algum incontestável (ver Davis, 49-51). Um estudo de z ‘q indica que o termo denota “clamar por ajuda em meio à profunda aflição”. Em alguns casos, “clamar” pode estar associado a arrependimento (ver, p. ex., Jz 10.10; ISm 12.10), o que fica claro nesses exemplos somente por causa de alguma declaração adicional indicando que esse é o caso. O arrependimento não é inerente ao termo z 'q. Assim sendo, esse fato chama a atenção para um interpretação teológica importante. Quando Javé levantava um libertador (um juiz), não estava necessariamente respondendo ao arrependimento de Israel. Quando o Senhor livra seu povo, o que se vê é uma prova da fideli dade pactuai de Deus. Javé agiu repetidamente em função de seu amor e misericórdia para com o povo ao responder à aflição e sofrimento do povo apesar de seus pecados. O livro de Juizes deixa claro que o livramento de Javé não era merecido (Jz 6.7-10; 10.11-14). Na verdade, ao que parece, tanto os períodos de opressão quando os tempos de descanso eram dados por Javé como chamados ao arrependimento. A misericórdia dele para com seu povo era demonstrada sempre e repetidamente. Ele não expulsou os israelitas da terra nem os destruiu, como poderia ter feito justificadamente; mas, em sua misericórdia, chamou-os de volta para si vezes seguidas. Trata-se de uma atitude coerente com as ações de Deus em relação ao seu povo ao longo de todo o período do AT. Posteriormente, no tempo de Jeoás do reino do Norte, o escritor do livro de Reis dirá: “Porém o Senhor teve misericórdia de Israel, e se compadeceu dele, e se tomou para ele, por amor da aliança com Abraão, Isaque e Jacó; e não o quis destruir e não o lançou ainda da sua presença” (2Rs 13.23). Quando escritores posteriores do AT olharam para trás, para o tempo dos juizes, avaliaram essa época da mesma forma. Nas palavras de Neemias: Pelo que os entregaste nas mãos dos seus opressores, que os angustiaram; mas no tempo de sua angústia, clamando ($ ‘q) eles a ti, dos céus tu os ouviste; e, segundo a tua grande misericórdia (rhm), lhes deste libertadores que os salvaram das mãos dos que os oprimiam. Porém, quando se viam em descanso, tomavam a fazer o mal diante de ti; e tu os desamparavas nas mãos dos seus inimigos, para que dominassem sobre eles; mas, convertendo-se eles e clamando (z ‘q) a ti, tu os ouviste dos céus e, segundo a tua misericórdia, os livraste muitas vezes (Ne 9.27-28). De acordo com o salmista, Muitas vezes os libertou, mas eles o provocaram com os seus conselhos e, por sua iniqüidade, foram abatidos. Olhou-os, contudo, quando estavam angustiados e lhes ouviu o clamor; lembrou-se, a favor deles, de sua aliança e se compadeceu, segundo a multidão de suas misericórdias (heseif) (SI 106.43-45).
3. Soberania e aliança. Todo o tempo, o livro de Juizes retrata Javé como o gran Soberano de Israel. Tanto entregou a terra de Canaã nas mãos de Israel (Jz 1.2,4), como entre gou os israelitas nas mãos dos inimigos (2.14-15; 3.12) quando o povo “transgrediu a minha aliança” (2.20). Foi ele quem permitiu que os cananeus permanecessem na terra para provar os israelitas (3.1). Também foi ele quem entregou a Israel os inimigos (Cusã-Risataim, rei de Arã, a Otoniel, 3.10; Moabe a Eúde, 3.28; Jabim e Sísera a Débora e Baraque, 4.7, 9, 14, 15, 23; os midianitas a Gideão, 6.7; 7.2, 9, 15, 22; os amonitas a Jefté, 11.32). Foi ele quem “suscitou... 825
Juizes: Teologia de
juizes” (2.16) e lhes deu poder pelo seu Espírito para libertar o povo (Otoniel, 3.10; Gideão, 6.34; Jefté, 11.29; Sansão, 13.25; 14.6, 19; 15.14). Porém, ao levantar juizes para liderar e livrar o povo, Javé não abria mão de sua posição de juiz supremo (cf. Gn 18.25), como o reconheceu Jefté quando disse: “o Senhor, que é juiz, julgue hoje entre os filhos de Israel e os filhos de Amom” (Jz 11.27). E enquanto, por um lado, os juizes lideraram os israelitas nas batalhas contra os inimigos, por outro lado, Javé se revelava nesse livro como já havia aparecido em Josué, na forma de “guerreiro divino”, que, em última análise, é aquele que conduz o povo à batalha e lhe dá a vitória. Quando Débora, Baraque e Jael derrotaram Jabim e Sísera, o texto nos diz que “o Senhor derrotou a Sísera” (4.15) e “Deus, naquele dia, humilhou a Jabim” (4.23). O relato poético dessa vitória diz que: “desde os céus pelejaram as estrelas contra Sísera, desde a sua órbita o fizeram” (5.20), uma forma poética de se dizer que Deus lutou em favor de Israel. No mesmo relato poético, Meroz (uma cidade em Naftali) é amaldiçoada, pois seus habitantes “não vieram em socorro do Senhor, em socorro do Senhor e seus heróis” [ou seja, contra Jabim e Sísera] (5.23). Javé disse a Gideão que, com os trezentos homens que beberam água levando a mão à boca, “eu vos livrarei, e entregarei os midianitas nas tuas mãos” (7.7). Quando Gideão e seus homens chegaram ao acampamento midianita, “o Senhor tomou a espada de um contra o outro, e isto em todo o arraial” (7.22). Quando Sansão matou mil filisteus com a queixada de um jumento, ele disse a Javé “por inter médio do teu servo deste esta grande salvação” (15.18). Ao longo de todo o livro de Juizes, é Javé, o “guerreiro divino” que dá ao seu povo a vitória sobre os inimigos. No livro de Juizes, a soberania divina absoluta é um conceito que une os papéis de Javé como Juiz supremo, guerreiro divino e rei. Javé é soberano não apenas sobre o povo de Deus e seus atos, mas também sobre a natureza (Jz 4.7; 5.4, 5, 20, 21) e as nações ao redor de Israel (7.23). O reconhecimento desse fato é ressaltado pela resposta de Gideão ao pedido de que reinasse sobre Israel: “Não dominarei sobre vós, nem tampouco meu filho dominará so bre vós; o Senhor vos dominará” (8.23). Essa declaração que se encontra no centro do livro, expressa a afirmação fundamental da aliança de Israel com Javé: ele é o rei divino, governante e defensor de Israel. Apesar dessa ênfase na soberania divina, o escritor (que evidentemente viveu no pe ríodo monárquico, talvez antes de Davi capturar Jerusalém, cf. 1.21) também reconhece que a espiral descendente do comportamento religioso e moral de Israel no período dos Juizes exigia uma mudança na estrutura da teocracia, de modo que uma monarquia humana seria instituída para pôr ordem onde havia caos e renovar o compromisso com Javé onde havia contínua apos tasia. Essa idéia se reflete nas declarações repetidas mais para o final do livro de que “naque les dias, não havia rei em Israel; cada qual fazia o que achava mais reto” (17.6; 18.1; 19.1). Aliás, o escritor sublinha particularmente essa idéia fazendo dela a declaração conclusiva do livro todo (21.25). Apesar dessa forte indicação, no final do livro, de que a ausência de um rei humano havia contribuído para o crescimento das condições caóticas durante o período dos Juizes, su gerindo que a monarquia é desejável, alguns intérpretes argumentam que esse livro, quando visto como um todo, é antimonárquico (para uma crítica dessa discussão, ver Gerbrandt, 12340). A base para essa idéia encontra-se no fato de Gideão ter, por um lado, recusado a oferta de governar como rei e, por outro, ter declarado a soberania de Javé (8.22-23), juntamente com um apelo ao relato trágico do reinado de Abimeleque no cap. 9. Na verdade, alguns intérpretes acreditam que a tensão encontrada entre a concepção positiva da monarquia nos caps. 17—21 e a idéia supostamente negativa dos caps. 8—9 é tão fundamental que as atitudes conflitantes só podem ser explicadas ao levar-se em consideração diferentes níveis do texto. Fora essa so 826
Juizes: Teologia de
lução, outros intérpretes argumentam que as declarações nos caps. 17—21 sobre não haver rei e cada um fazer “o que achava mais reto”, deve ser, de algum modo, entendidas como tendo um sentido positivo (!) sendo, portanto, coerentes com a perspectiva negativa do livro com relação à monarquia (ver Boling, 293, Dumbrell, 28-32). Grande parte dessa discussão deixa passar um ponto importante. Os caps. 8 e 9 de Juizes nâo são fundamentalmente contrários à monarquia humana e os caps. 17—21 nâo indicam que o governo humano, em si, seja a solução para os problemas de Israel. Juizes 8.22-23 não diz que a monarquia humana é errada, mas afirma energicamente a importância de se reconhecer a soberania de Javé. Nesse contexto, é a negação da soberania de Javé, combinada com a oferta de reinado para Gideão que leva Gideão a responder como fez. Os israelitas dizem: “Domina sobre nós... porque nos livraste do poder dos midianitas” (8.22). Essa avaliação equivocada de quem era responsável pela vitória de Israel sobre os midianitas encontra-se em contradição direta tanto com o chamado de Gideão para agir antes da batalha, quando disse que “o Senhor entregou o arraial dos midianitas nas vossas mãos” (7.15), quanto com a declaração de Javé de que Israel não deveria vangloriar-se dizendo “a minha própria mão me livrou” (7.2). Nesse contexto, Gideão não podia fazer outra coisa senão rejeitar a proposta e, ao mesmo tempo, afir mar de modo absolutamente claro o reinado constante de Javé sobre seu povo. Como observa Gerbrandt (128): “Javé é o libertador de Israel, e isso é algo de que Israel não deve esquecer-se. A monarquia é errada quando usurpa a posição de Javé dentro dessa esfera" (ênfase minha). Apesar de a história de Abimeleque ser decididamente negativa em sua avaliação do governo fracassado de um dos filhos de Gideão sobre Siquém, isso não constitui uma condenação à mo narquia em si, sendo antes uma crítica à monarquia quando esta se baseia no crime e na injustiça e segue o exemplo dos governos encontrados nas cidades-Estados cananéias daquela época. Um ponto de vista mais equilibrado que a perspectiva do livro de Juizes apresenta para a questão dos méritos relativos do papel dos juizes e reis é de que nenhuma dessas institui ções é a solução final para os problemas de Israel como nação. Enquanto, em alguns aspectos, uma monarquia devidamente concebida e exercida serviria para corrigir o caos do período dos Juizes ao fomecer uma autoridade governamental central e um soberano visível para liderar o povo pelos caminhos da aliança, a monarquia também se encontra sujeita às limitações e de feitos de qualquer instituição humana. Ainda assim, a monarquia integrada à aliança, ou seja, um conceito de reinado que continua afirmando a soberania suprema de Javé sobre seu povo, não é censurada em parte alguma do livro de Juizes. O AT mostra-se coerente ao considerar tanto a instituição dos juizes quanto do rei uma parte importante do plano divino de redenção. Na verdade, é o próprio fracasso dos juizes que aponta para o futuro, para a necessidade de um Juiz que ainda haveria de vir (2Tm 4.8), assim como, posteriormente, é o fracasso dos reis de Israel e Judá que aponta para a necessidade de um Grande Rei que ainda haveria de vir (Jo 1.49; Ap 19.16). 4. Os Juizes e o Juiz. Uma leitura do livro de Juizes revela que todos os juizes tinh suas falhas. Dentro da espiral descendente do livro, essas falhas tomam-se mais evidentes nas narrativas de Sansão. Paradoxalmente, porém, quando se coloca as narrativas de Sansão no contexto das Escrituras como um todo, são justamente os erros dc Sansão que apontam mais claramente para o Juiz que é maior do que Sansão (para uma discussão detalhada dessa com paração entre Sansão e Jesus, ver H. de Jong, Israel, De Filistijen Over U!). Sansão é o único juiz sobre o qual há uma narrativa tanto do nascimento quanto da morte. Vê-se nessa característica uma semelhança estrutural entre as narrativas de Sansão e as de Jesus. Tanto o nascimento de Sansão quanto o de Jesus foram anunciados à mãe da criança por um anjo (Jz 23.3-24; Lc 1.26-38). Diz-se de Sansão que “ele começará a livrar Israel do 827
Juizes: Teologia de
poder dos filisteus” (13.5) e de Jesus que “ele salvará o seu povo dos pecados deles” (Mt 1.21). O livramento que começou a ocorrer por intermédio de Sansão com os filisteus, foi realizado completa e inteiramente por Jesus com respeito ao pecado. Depois do nascimento de Sansâo, o texto nos diz que “o menino cresceu, e o Senhor o abençoou. E o Espírito do Senhor passou a incitá-lo em Maané-Dã” (13.24-25); enquanto sobre a infância e juventude de Jesus, nos diz que “crescia o menino e se fortalecia, enchendo-se de sabedoria; e a graça de Deus estava sobre ele... E crescia Jesus em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens” (Lc 2.40, 52). Tanto em Sansão quanto em Jesus, as pessoas reconheciam alguém que era uma delas e, no entanto, também era diferente. Sansão foi consagrado como nazireu (Jz 13.4). Como Jesus, Sansão devia-se preocupar com as coisas do Pai Celestial e, em decorrência disso, os pais de Jesus e também os de Sansão viram-se confusos com o comportamento de seus respectivos filhos (Jz 14.4; Lc 2.48-50). Por causa de sua força sobrenatural, Sansão se parece quase com Hércules, o herói gre go, metade deus e metade homem. Sansão é separado de outros homens de uma forma que é ao mesmo tempo semelhante e diferente de Jesus. No caso de ambos, é levantada a pergunta: “Quem é este?” (cf. Jz 16.5; Mt 21.10; Lc 7.49; Jo 1.19). Depois de uma vida inteira envol vendo-se em conflitos com os filisteus, por vezes de maneiras surpreendentes e questionáveis, descobrimos que Sansão foi entregue nas mãos dos filisteus por seu próprio povo (Jz 15.12), assim como Jesus foi entregue às autoridades romanas pelo seu próprio povo (Mt 27.2). No entanto, Sansão rompeu as cordas que o amarravam e matou mil filisteus (Jz 15.14-15). Jesus, pelo contrário, submeteu-se voluntariamente à morte na cruz quando foi entregue a Pilatos. Assim como ocorreu com Jesus, o ponto alto da vida de Sansão foi a morte, mas nesse caso o contraste é gritante. Sansão morreu com os filisteus, mas Jesus morreu pelo seu povo. Na morte, o sangue de Jesus simboliza coisas muito melhores que o de Sansão (cf. Hb 12.24). E justamente nos pontos de conformidade da vida desses dois homens que vemos a grande di ferença. Em última análise, Sansão foi um libertador imperfeito. Era necessário haver outro maior do que ale. Sansão é uma preparação negativa para as boas novas do grande Juiz e Li bertador que haveria de vir. B ib l io g r a f ia
R. G. Boling, Judges: lntmduction. Translation and Commentary, AB, 1975; A. E. Cundall e L. Morris, Judges and Ruth, TOTC, 1968; D. R. Davis, Such a Greant Salvation: Expositions o f the Book o f Judges, 1990; W. J. Dumbrell, “In Those Days There Was No King in Israel; Every Man Did What Was Right in His Own Eyes. The Purpose of the Book o f Judges Reconsidered”, JS O T 25, 1983, 23-33; G. E. Gerbrandt, Kingship According to the Deuteronomistic History, SBLDS 87, 1986, 123-40; D. W. Gooding. “The Composition of Judges”, Eretz-lsrael. Archaeological. Historical and Geographic Studies, 16, 1982, 7-79; D. M. Howard, Jr., “The Case for Kingship in Deuteronomy and the Former Prophets”, WTJ 52, 1990, 101-15; H. de Jong, Israel. De Filistijnen Over U! 1992; J. P. U. Lilley, “A Literary Appreciation of the Book o f Judges”, TynBul 18, 1976, 94-102; P. E. Satterthwait, ‘“No King in Israel’: Narrative Criticism and Judges 17-21", TynBul 44.1, 1993, 75-88; B. G. Webb, The Book o f Judges: An Integrated Reading, 1987; M. Wilcock. The Message o f Judges, BST, 1992. J. Rohert Vannoy Juízo ->#7131 (peli/â, decisão) Julgamento -> # 5477 (mispãt, julgamento, petição legal) 828
Justiça
Jumento -> # 2789 (hamôr I, asno) Junco
# 7866 (qãneh, junco, cana, cana de medir, haste, balança)
Juramento
# 8678 ( i i ', jurar, fazer um juramento, adjurar)
Justiça (139TO [m/ípã/], subs. julgamento [caso, proces so judicial, veredicto, sentença], justiça, direitos, requi sito, prática [-> # 5477]); < ÜDU7 (spt), q., ni., po. julgar, executar um julgamento, governar (-¥ #9149). Justiça
OMA Ainda que raramente, são atestados subs. cognatos no ugar. mtpt, jurisdição, governo ( WUS, 2921; UT, 2727; soberania; cf. H. Cazalles, “mtp( à Ugarit,” Or 53, 1984, 177-82) e no fen. msp( (DNWSI, 705: Ahiram, KAI 1,2, governo, domínio). A oração ugar. ysal m(p{yld, ele pergunta sobre o destino da criança, pode ser par. a Juizes 13.12 (RS 24.274, UT, 2727). Em seu uso, porém não em sua forma, o acad. Siptu(m), AHw, 1247, corresponde ao heb. mispaf. A divindade e o monarca como avalista da justiça é um conceito afirmado por todo o OMA: o ugar. e o fen. ^dq-msr/ysr, justo e reto e o acad. kittum u m iíãm m , verdade e eqüidade, corres pondem, basicamente, ao heb. mispãt úsedãqâ (cf. Weinfeld, Social Justice in Ancient Israel and in the Ancient Near East, caps. 1-2). AT mispãt é o termo heb. mais importante usado com referência à justiça humana e divina. Derivado do vb. spt, que descreve uma ampla gama de atividades envolvidas no estabelecimento e preservação da ordem (-> # 9149), mispãt é um subs. verbal que se refere principalmente ao ato ou conseqüências de algo spt. Isso é confirmado pelo uso de mispãt como objeto interno do vb. sp( (Dt 16.18; IRs 3.28; Jr 5.28; Lm 3.59; Ez 16.38; 23.45; Zc 7.9; 8.16). Assim, pode referir-se tanto à lei ou às instruções dadas por Deus como aos diversos aspectos do processo judicial (tribunal, caso, julgamento, veredito, sentença) ou quaisquer outros atos autoritários necessários para restaurar e manter a ordem e aos resultados esperados desses atos (justiça, defesa dos direitos). A distribuição estatística de mispãt no AT é a seguinte: Pent., 20 por cento; livro histó ricos, 18 por cento; profetas, 34 por cento; Salmos e Lamentações, 16 por cento; livros de sa bedoria, 12 por cento; a palavra ocorre com mais freqüência nos Salmos, em Ezequiel e Isaías. No sing. (30 lx) refere-se principalmente a atos individuais de julgamento ou justiça em geral; no pl. (123x) refere-se principalmente às leis de Israel ou a atos gerais de julgamento divino. Os vbs. empregados com mais freqüência juntamente com mispãt são 'sh, fazer, executar, e smr, manter — sendo que este último costuma ser combinado ou apresentado em par. com o primeiro, apesar de ‘sh ocorrer mais vezes do que a forma sing. do substantivo. Outros vbs. usados são sm ‘ (# 9048), dbr, pronunciar (#1819), sym, estabelecer (# 8492) e n!h [hi.], colo car de lado (# 5742). O sujeito desses vbs. pode ser qualquer um investido de poder ou capaz de contribuir com a justiça (Deus, o rei, os líderes, os juizes, o povo em geral, bem como os perversos que a subvertem). De acordo com a argumentação de G. Liedke (78-83), o significado fundamental de mispãt é aquilo que pertence a alguém por direito, p. ex., uma reivindicação, um dever, aquilo que é apropriado, retribuição, ou seja, castigos ou recompensas. Quase todas as ocorrências de mi$pã( podem ser relacionadas a uma dessas nuanças. Em várias formas de uso jurídicas, nem 829
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sempre fica claro exatamente qual tradução é preferível, apesar de o contexto normalmente indi car qual aspecto do processo é considerado mais relevante. Diante do uso do vb. correspondente, não é apropriado dar-se uma ênfase estritamente jurídica nem uma ênfase estritamente ética. Âmbito semântico: entre os subs. (e vbs.) que são associados muitas vezes a — e em alguns contextos praticamente intercambiáveis com — miSpãf (p. ex., em paralelismo poético ou no contexto imediato) pode-se citar rib (contenda, pleito), normalmente com referência ao desenrolar de um caso no tribunal, enquanto mispãf refere-se à decisão; din (julgamento), um termo mais estritamente jurídico do que mispãf (# 5477); hôq/huqqâ, estatuto (# 2976), com o qual aparece muitas vezes em conjunto (é possível que hôq ressalte uma ordem legal, enquan to mispãf ressalta a decisão provida de autoridade, de acordo com Lohfink, 5-6; em oposição a Liedke, 94-97); e $edãqã, justiça (# 7407), que ressalta estar ou agir em conformidade com uma norma enquanto mispãf ressalta o ato em si. Uma vez que o padrão de justiça de Israel não se baseia num código de leis humanas, mas no caráter, nas ações e nos preceitos de Deus, há um número relativamente pequeno de ocorrências de mispãf que não são fundamentalmente de natureza teológica. As ações humanas são, em essência, uma resposta a decisões divinas anteriores, e refletem, desse modo, obediên cia/desobediência ou justiça/injustiça. (-> Lei de Deus: Teologia) O fato de as ações humanas de julgamento serem dependentes da revelação divina é indicado repetidamente no AT. Entre as vestes do sumo sacerdote, há o “peitoral do juízo” (hõsen mispãf, Ex 28.15, 29, 30), assim chamado pois contém o Urim e Tumim, o meio deter minado para indicar a vontade divina aos israelitas (cf. Nm 27.21; Pv 16.33; para hõsen, ver # 3136). E significativo que Juizes 4.5 descreva os israelitas procurando a profetisa Débora e não um juiz para julgá-los, p. ex., para discernir a vontade de Deus (ver abaixo). Deus revelou suas leis exclusivamente a Israel (SI 147.19-20). Por intermédio do Espírito do Senhor, o pro feta Miquéias vê-se cheio de juízo (Mq 3.8). Se alguém busca (bqS) o Senhor, entende o que é justo (Pv 28.5; cf. Sf 2.3). 1. Julgamento. O BDB atribui o significado de julgamento a quase metade (204) d ocorrências de mispãf, sendo que muitas dessas podem ser mais bem traduzidas como justiça, uma vez que esse é o resultado esperado sempre que se realiza um julgamento. O AT inidica que havia diversos níveis de jurisdição em Israel: os anciãos locais na porta da cidade (Rt 4.1-14), juizes e oficiais nomeados para cada tribo (Dt 16.18. Sõpe(im, sõf?rim), um tribunal superior no santuário central para tratar de casos difíceis (17.8) e, com a monarquia, o rei (2Sm 15.2,4, 6; 1Rs 3.28), apesar de não ficar claro qual era a jurisdição do rei (cf. Macholz). a. Ato de julgamento: mispãf pode referir-se a um ato de julgamento, tanto humano (Dt 1.17; lRs 3.28; Pv 24.23) quando divino (SI 1.5; 94.15; 143.2; Ec 3.16); é usado em orações que descrevem o lugar onde são realizadas as atividades judiciais (SI 122.5, os tronos de justiça; 1Rs 7.7, a Sala do Julgamento; cf. Jó 9.32, “vindo juntamente a juízo”, bammiípãf). b. O subs. mispãf também pode referir-se aos diversos aspectos do processo legal. Ini ciar um julgamento é entrar em juízo ou trazer a juízo (com b w ’ q. e hi.: Jó 14.3; 22.4; 34.23; SI 143.2; Ec 11.9; 12.14; Is3.14;com 'md, apresentar para juízo: Nm 35.12; Js 20.6; Ez 44.24; cf. Dt 25.1; Is 40.27). A pessoa encaminha a sua causa ( ‘rk mispãf, Jó 13.18; 23.4; ações ju diciais por crimes de sangue, Ez 7.23) e pode até recomendar um parecer oficial (Nm 27.4-7, 2Sm 15.4 — com referência à rib, contenda [# 8190] de uma pessoa, e mispãf [Is 32.7; cf. 1Rs 20.40]; ver Liedke, 88-92). Com mais freqüência, mispãf refere-se a uma decisão judicial ou veredito (Dt 17.9, 11; cf. também 2Rs 25.6; 2Cr 19.6; Jó 36.17; SI 149.9; Jr 39.5; 52.9; sen tença de morte, lit., julgamento de morte: Dt 19.6; 21.22; Jr 26.11), bem como à execução da sentença punitiva (Is 34.5; Ez 23.24,45; 39.21). Essas passagens muitas vezes empregam ou 830
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tros termos legais além de rib , como dar testemunho, condenar (rs' [# 8399]) ou absolver (fdq [hi.]; # 7405; p. ex., Is 50.8). 2. Justiça. No AT, o julgamento e a justiça são inseparáveis, e apartar os dois é tra sobre si a ira divina (Dt 27.19), apesar de ficar claro que a injustiça não ocorre somente nos tribunais (Jr 21.12). O radical spt é usado mais de lOOx no AT em conjunção muito próxima com os derivativos sdq. mispã{ e ^ dãqâ são usados em conjunto mais de 50x no AT; mispãt ü ^d ã q ã pode ser mais bem compreendido como uma hendíadis para “justiça social”, na qual a ordem dos seus elementos não é importante. Usado com o vb. ‘sh, o sintagma significa rea lizar atos justos e não simplesmente pronunciar um veredito justo (= mispãf çedeq, Weinfeld, 25, 33-34). A oração ou o termo mispãf sozinho também é usado com outros subs. denotando eqüidade e lealdade (Ijesed, ’emet, mêsãrim). a. Justiça divina. O rei divino garante justiça para todos os seus súditos e a exige deles. A retidão faz parte do caráter divino (Jó 34.17; SI 9.16 [17]; 97.2; Jr 12.1; Sf 3.5); portanto, ele ama a justiça (SI 33.5; 37.28; 99.4; Is 61.8). A pergunta retórica de Abraão quando estava inter cedendo em favor de Sodoma e Gomorra expressa bem esse aspecto: “Longe de ti o fazeres tal coisa, matares o justo com o ímpio, como se o justo fosse igual ao ímpio; longe de ti. Não fará justiça o Juiz de toda a terra?” (Gn 18.25; cf. Dt 32.4; Jó 34.12; Is 30.18; Jr 9.24 [23]). b. Justiça humana. A justiça de Deus tem duas conseqüências. Por um lado, os israelitas podem, como indivíduos, invocar a justiça de Deus em favor deles para livrá-los de situações críticas (1 Rs 8.45 || 2Cr 6.35, 39; SI 119.149). Por outro lado, Deus espera que todos aos quais ele delegou autoridade façam justiça. Começando por Abraão como recebedor da justiça divina: deve praticar e ensinar aos seus filhos a justiça — num contraste gritante com os habitantes de Sodoma e Gomorra. Esse comportamento justo resultará na bênção tanto de seus descendentes como das nações (Gn 18.19). Como rei, Davi cumpre essa exigência (2Sm 8.15 || ICr 18.14). A rainha de Sabá reco nhece que Deus espera o mesmo de Salomão (1 Rs 10 .9 1| 2Cr 9.8) e Salomão pede capacitação divina para realizar essa tarefa (lR s 3.11. 28; cf. SI 72.1-2). Da mesma forma, espera-se que os juizes nomeados para esse cargo julguem o povo com justiça (Dt 16.18) e Josafá lembra aqueles a quem ele nomeia (2Cr 19.6-7): “Vede o que fazeis, porque não julgais da parte do homem, e sim da parte do Senhor, e, no julgardes, ele está convosco. Agora, pois, seja o temor do Senhor convosco; tomai cuidado e fazei-o, porque não há no Senhor, nosso Deus, injusti ça, nem parcialidade, nem aceita ele suborno”. Os mesmos parâmetros aplicam-se aos oficiais sacerdotais que tomam decisões judiciais (Ez 44.24). Como ancião da cidade, supostamente encarregado de preservar a justiça, Jó declara: “como manto e turbante era a minha eqüidade” (Jó 29.14), pois ele libertava, socorria e cuidava dos pobres, necessitados e desamparados, por meio de atos judiciais, ainda que não somente por esse meio (v. 16, chegando até a investigar os casos sobre os quais ele não tinha conhecimento). Porém, uma vez que a justiça envolve mais do que o apoio legal, Deus pode exigir jus tiça mesmo daqueles que estão fora dos sistemas de poder: “Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o Senhor pede de ti: que pratiques a justiça ( ‘asôt mispãt), e ames a mise ricórdia, e andes humildemente com o teu Deus” (Mq 6 .8 , um versículo que indica a relação próxima entre as dimensões verticais e horizontais dos relacionamentos humanos; cf. também Os 12.6[7]). O salmista profere uma bênção para aqueles que costumam fazer justiça (part., SI 106.3; cf. 112.5, 9 —justiça significa também dividir o que se tem com os pobres, usando-se de generosidade). c. Os necessitados e a subversão da justiça. Apesar de a lei ter por finalidade promover a justiça (deve existir, por exemplo, uma só regulamentação tanto para o cidadão como para o 831
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estrangeiro, Lv 24.22; Nm 15.16), muitas vezes a justiça é subvertida, especialmente no caso de alguns membros da sociedade: a viúva, o órfão, o estrangeiro e o deficiente físico. Isso pode ocorrer nos tribunais em que os ricos recebem tratamento preferencial (Lv 19.15, 35; Dt 1.17; 16.19; Pv 18.5; 24.23), quando se dá falso testemunho (Pv 19.28) ou quando o juiz aceita su borno (Êx 23.6-8; Dt 16.19; ISm 8.3; Pv 17.23); mas, como indica o contexto adjacente, pode também acontecer no âmbito econômico, quando grandes proprietários de terras oprimem os pobres e tomam-lhe as propriedades. Nos dois casos, a justiça devida aos membros da socie dade é negada (nth, hi.: Êx 23.6; Dt 16.19; 24.27; 27.19; ISm 8.3; Pv 17.23; 18.5; Lm 3.35; cf. Is 10.2; Ml 3.5). O Senhor, porém, jamais perverterá a justiça (Jó 8.3; 34.12), conforme é resumido no cântico de Moisés (Dt 32.4): “Eis a Rocha! Suas obras são perfeitas, porque todos os seus ca minhos são juízos (mispât); Deus é fidelidade, e não há nele injustiça; é justo e reto”. Assim, mais do que qualquer um, é ele quem garante os direitos dos oprimidos (Dt 10.18; SI 103.6) e condena e castiga aqueles que os infringem (Am 5.7; 6.12; Ml 3.5: “Chegar-me-ei a vós outros para juízo (lammispât). Serei testemunha veloz contra os feiticeiros, e contra os adúlteros, e contra os que juram falsamente, e contra os que defraudam o salário do jomaleiro, e oprimem a viúva e o órfão, e torcem o direito do estrangeiro, e não me temem, diz o Senhor dos Exér citos”). É interessante observar como em nenhum dos oráculos proféticos contra as nações estrangeiras a deturpação de mispât é mencionada como base para o julgamento. Com isso, a argumentação de Johnson de que é o opressor estrangeiro e não o israelita quem é responsável pela “paralisia da Torá em Habacuque 1.4” perde grande parte de sua força. d. O que é devido. Pelo fato de mtèpãt referir-se principalmente à manutenção da jus tiça, pode, por vezes, ser traduzido como aquilo que é devido a alguém, no sentido de castigo (Jr 49.12; Ez 16.38; 23.24, 45) ou de recompensa (ls 49.4). e. Justiça escatológica. Como autoridade humana mais elevada em Israel, o rei é respon sável pela administração de justiça. Porém, na maior parte das vezes, os reis israelitas falhavam nessa incumbência. Assim, uma das esperanças escatológicas mais fervorosas é dc um futuro rei da linhagem de Davi cujo reinado será caracterizado pela mais absoluta e perfeita justiça (Is 9.7 [6 ]; 16.5; 32.1, 16; Jr 23.5; 33.15) e completa obediência. Em Isaías 40— 55, a tarefa do servo não é apenas a de restaurar Israel, mas também promulgar (v.y ’) o direito (mispât) às nações (ls 42.1-4 — em vez de julgar as nações) e estabelecer (sym) mispât na terra, o que significa, entre outras coisas, abrir os olhos dos cegos, libertar os cativos e dar luz (42.6-7) — atividades que dificilmente justificam a tradução preferida “verdadeira religião” (cf. North, The Second Isaiah, 1964, 107-8: “Ele revelará o conjunto de mandamentos que expressam a vontade de Deus” é uma oração mais provável de ser expressada pelo termo mispât, pl.). 3. Direitos. De acordo com James Barr, em algumas das ocorrências de mispât, ch ga-se perto de um conceito moderno de direitos humanos, uma nuança de mispât que está de acordo com o significado básico do termo sugerido por Liedke — “aquilo que é devido” a al guém (Barr, 25). Na maioria das passagens relevantes, mispât é usado em combinação com a designação do grupo cujos direitos estão sendo descritos: os direitos de uma filha (Êx 21.9), do órfao, da viúva ou do estrangeiro (Dt 10.18; 24.17; 27.19), do sacerdote (Dt 18.3; ISm 2.13), do primogênito (Dt 21.17), possivelmente do nazireu Sansão (Jz 13.12; mispâ(-hanna ar iima 'asêhú, seus direitos e seus deveres; mas ver 5 abaixo), do rei (1 Sm 8.9, 11, que deve ser distinguido de mispât hammelükâ, 1Sm 10.25), do servo de Jó (Jó 31.13), daqueles que amam o nome de Deus (SI 119.132; com L. C. Aliem, Psalms 101-150, WBC 21, 1983, 132), dos pobres e necessitados (SI 140.12 [13]; Jr 5.28); cf. também os direitos de redenção ou herança do profeta (Jr 32.7-8). É provável que esse uso, também se encaixe com Ezequiel 21.27 [32] 832
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(“A ruínas a reduzirei, e ela já não será, até que venha aquele a quem ela pertence de direito ( ’aser lô hammiSpãl); a ele a darei.” ), uma passagem possivelmente messiânica que faz alusão a Gênesis 49.10. (Ver a discussão em W. Zimmerli, Ezekiel 1, 1979, 447-48, que rejeita essa interpretação, pois Ezequiel não usa mispãf dessa maneira em nenhuma outra parte, o que, di ficilmente é um argumento convincente). 4. Leis. Na maioria das ocorrências de mispãf no pl., o termo refere-se às contidas compilações do Pentateuco. Em algumas passagens, são usados mais de dois termos para lei numa mesma lista (p. ex., Dt 6.1, 20) ou em conjunção próxima um com o outro (SI 19; 119), indicando que a ordem, o número e os significados individuais dos termos são menos impor tantes. Com mais freqüência, porém, mispãtim aparece junto com huqqim (14x em sé em Deu teronômio; ver # 2976), normalmente tendo mispãtim como segundo elemento. a. O significado de huqqim e mispãtim. O uso freqüente desse par de palavras, em es pecial para apresentar ou concluir seções importantes contendo legislação (Lv 19.37; 20.22; 26.46; Nm 36.13; Dt 5.1; 12.1) levanta a seguinte pergunta: Esses termos são indicações de gênero? Liedke apresentou a defesa mais recente e detalhada da tese de que huqqim designa leis apodícticas e mispãfim leis casuísticas. Apesar de ser uma idéia atraente e plausível em termos etimológicos (mispãfim como precedente legal), também é anacrônica e sugere um sistema perfeito demais para a categorização de todas as leis. O sintagma é usado ainda em passagens que aparecem exclusivamente na forma apodíctica (p. ex., Lv 18.4-5, 26). A interpretação de Lohfink das orações como uma hendíadis é mais convincente (1-6); o termo descreve a origem autoritária da lei por meio de um decreto (huqqim) e/ou de uma decisão judicial (mispãfim). b. Leis e regulamentações individuais. Para três das quatro passagens em que os dois termos ocorrem juntos no sing., a explicação de Liedke é impossível: Em Êxodo 15.25, depois do episódio da água amarga, a oração refere-se ao chamado de Deus à obediência no v. 26; em Josué 24.25 designa o documento de renovação da aliança; em 1 Samuel 30.25, refere-se ao decreto de Davi com relação à distribuição dos espólios, que serviu de precedente legal (cf. também Ed 7.10). Apesar de mispãt (sing.) poder se referir coletivamente a todos os preceitos divinos (2Rs 17.26-27 em contraste com as leis de outras nações, v.33; cf. o pl. no v. 34), normalmente refere-se a leis individuais, que tenham sido promulgadas no Sinai ou instituídas ao longo da história de Israel depois do Sinai. O mispãt do boi que chifra alguém (Êx 21.31), da observação da Páscoa (Nm 9.3) ou das ofertas prescritas de manjares e libações (Nm 15.24). Em vários casos, o subs. sing. é precedido da preposição k? (de acordo com) que, correspondendo à refe rência de tempo, exige ou indica obediência ao procedimento ou preceito divino. (Observe-se essa ênfase em 1 Crônicas: ICr 6.32 [17]; 15.13; 23.31; 24.19; 2Cr4.20; 30.16; 35.13; cf. Ed 3.4; Ne 8.18.) c. Obediência à lei. Pelo fato de essas leis terem sido dadas por Deus (Ne 9.13: “Desceste sobre o monte Sinai, do céu falaste com eles e lhes deste juízos retos [mispãtim y^sãrim v^tôrôt 'emetJ, leis verdadeiras, estatutos e mandamentos bons”) e constituírem estipulações da aliança no Sinai, regulamentando o relacionamento entre Deus e sua nação escolhida, Israel (Dt 26.16-17), elas devem ser obedecidas (cf. o uso freqüente dos vbs. 'sh [# 6913] e smr [# 9068] com mispãf) e ensinadas (Dt 33.10; Ed 7.10). Nos livros históricos, observa-se muitas vezes que o maior dever do rei é obedecer e fazer cumprir as leis divinas como um requisito fundamental para o sucesso pessoal e nacional desse rei (ou seja, a bênção da aliança) (2Sm 22.23 || SI 18.22 [23]; 1Rs 2.3; 6.12-13; 9.4-5; ICr 22.13; 2Cr 7.17). A desobediência a essas leis traz o castigo divino (1 Rs 11.33; Ne 9.29-31), e a história de Israel é, em grande parte, uma história de desobediências (Ez 20.11, 13, 16, 18-19, 833
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21,24,-25). Assim, o conjunto de textos proféticos encerra com a admoestação: “Lembrai-vos da Lei de Moisés, meu servo, a qual lhe prescrevi em Horebe para todo o Israel, a saber, esta tutos e juízos (huqqim iim ispâfim )" (Ml 4.4, 7[3.22, 25]). Trata-se, verdadeiramente, de uma questão de “vida ou morte” (Dt 30.15-20)! Num contraste gritante com o retrato da desobediência nacional às leis de Deus que os livros históricos e proféticos apresentam, vê-se o testemunho do escritor do Salmo 119, um salmo que expressa repetidamente o desejo do salmista de ensinar, guardar e obedecer o mispãfim de Deus (vv. 7, 13,20, 30, 39, 43, 52, 62, 75, 91, 102, 106, 108, 120, 137, 156, 164, 175). Os profetas não olham apenas para o passado e ao redor para a desobediência pecamino sa de sua nação, mas também olham para o futuro, para a transformação escatológica do povo por meio da intervenção de Deus, resultando na obediência completa aos mandamentos dele (Ez 11.20; 36.27; 37.24). 5. Outras instruções divinas e decisões autoritárias. A autoridade de Deus estende-se além da entrega da lei mosaica, pois ao longo da história de Israel, o Senhor continua dando ao povo instruções específicas que também são chamadas de mispãt. Os israelitas marcharam sete vezes ao redor de Jericó “da mesma sorte” (Js 6.15, kammispãt hazzeh), ou seja, conforme as instruções dadas nos Josué 6.2-5. Toda Israel subia até Débora “a juízo” (Jz 4.5), ou seja, para receber a decisão divina com referência ao clamor por socorro, o que levou ao chamado de Baraque (v. 6 ). Manoá, com relação ao filho e ao papel deste como futuro libertador de Israel, pediu ao anjo do Senhor o pronunciamento divino (Jz 13.12; cf. v. 5); a resposta só tratou das restrições alimentares para a esposa de Manoá, a qual estava grávida. O mispãf hammeluká de 1 Samuel 10.25 fala dos preceitos divinos com relação à monarquia, os quais foram então registrados por Samuel para servir de futura referência. A LXX entendeu a pergunta em 2 Reis 1.7 da mesma forma (meh mispãf hã 'is = tis hê krisis, “qual era a aparência”, como “qual é o julgamento”), tomando por base a descrição, feita pelos mensageiros, dos trajes de Elias em resposta à essa pergunta. (Para uma discussão mais detalhada dessa categoria, cf. Block, 244 n. 55, que também sugere as seguintes passagens proféticas com referência aos pronuncia mentos em forma de oráculos: Is 28.6; 41.1; 59.9-21; Ez 21.26-27 [31-32]; Os 5.1; Mq 3.1-4; Ml 2.13—3.1.) Tanto o tabemáculo quanto o templo foram construídos de acordo com instruções di vinas (Êx 26.30, k^mispãfô; lRs 6.38; 2Cr 4.7; cf. ICr 28.12, 19; talvez por analogia, o uso obscuro de mispãt em Ez 42.11 com referência ao futuro templo). 6 . O domínio universal de Deus. Deus governa sobre todas as nações (SI 97.1, 9), está envolvido ativamente no estabelecimento da justiça por meio de atos de livramento e de jul gamento (vv. 2, 8 ). A justiça divina é vasta em sua abrangência, preservando tanto as pessoas quanto os animais e dando refúgio aos poderosos e também aos humildes (36.6-7 [7-8]). Es ses “juízos dos seus lábios” são citados juntamente com milagres e prodígios (IC r 16.12 || SI 105.5 — todos os atos desse tipo são precedidos do pronunciamento divino; cf. Os 6.5) e estão em toda a terra (SI 105.7). Os perversos arrogantes consideram-se imunes aos julgamentos de Deus (10.5, observar, porém, o v. 16). No entanto, Jeremias anuncia que os julgamentos serão pronunciados tanto para o povo de Deus (Jr 1.16) quando para as nações (48.21, 47; 49.12; 51.9; 52.9). Tais atos, porém, não são meras demonstrações dc poder: “Quando os teus juízos reinam na terra, os moradores do mundo aprendem a justiça” (Is 26.9). 7. Significados derivados. Há várias passagens nas quais o significado de mispãf não fica claro ou não se encaixa numa das categorias anteriores. Em Gênesis 40.13, mispãf referese aos direitos ou deveres passados do copeiro. Em Juizes 18.7, refere-se às leis dos sidônios: “Nenhuma autoridade havia que, por qualquer coisa, o oprimisse” (de acordo com R. Boling, 834
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Judges, AB, 1975, 263;cf.2Rs 17.33,alei ou prática cultuai das nações). Em 1 Samuel 27.11, mispât refere-se à política firme de Davi ao realizar ataques; em 1 Reis 18.28 trata de deter minados rituais dos sacerdotes de Baal para conseguir a atenção do seu deus. Em 4.28 [5.8], a palavra refere-se às quantias prescritas de cereais a serem entregues nos estábulos reais; em 2 Reis 11.14, diz respeito ao lugar correto do rei postar-se junto ao templo de acordo com o pro tocolo real. Com exceção desses exemplos, ao que parece, quase todas as ocorrências podem ser atribuídas a apenas algumas categorias principais de uso e não houve desenvolvimentos semânticos significativos no sentido do termo mispât ao longo da história literária israelita. (Para outra opinião quanto ao desenvolvimento semântico, cf. Niehr, 396-400.) Em resumo, mispãf (subs. sing. e pl.) designa as regras válidas e obrigatórias da vida numa determinada situação e assim, fazer mispãf é fazer o que é justo ou direito. 8. Dimensões teológicas de mispât. a. No Pent. e nos livros históricos, os requisitos Deus quanto à obediência e justiça e os altos e baixos de Israel em preenchê-los são apresen tados em retratos bastante vividos. Os Salmos exaltam as demonstrações universais da justiça de Deus, especialmente com relação a Israel (SI 99.4) e também os atos divinos na libertação de indivíduos que confiam em Deus e o obedecem, mesmo que para isso seja preciso destruir os perversos (9.4, 7, 16 [5, 8 , 17]). Tais pessoas não suplicam apenas por justiça (pois ninguém é verdadeiramente justo), mas também por misericórdia (143.1-2). No Salmo 119, o salmista usa mispât em todas as estrofes, com exceção de .(êt e duas vezes em nún e rês, normalmente no pl. e para designar a lei de Deus, mas emprega o sing. nos vv. 84, 121,132 e 149 (porém 11 MS pl.) para pedir que a justiça de Deus seja executada, para declarar sua própria justiça e para reivindicar seu direito, como alguém que ama o Senhor, de ser vivificado pela justiça divina — possivelmente, explorando de modo intencional as diversas nuanças do termo ao empregar o sing. no v. 149, mas o pi. no v. 156, que se expressa em palavras semelhantes. b. Na literatura de sabedoria, o livro de Jó está repleto de terminologia legal e apre senta Jó declarando a própria justiça ao mesmo tempo em que questiona a justiça de Deus, a base para a argumentação de Eliú (Jó 34.12), bem como o motivo da repreensão divina (40.8). Eliú também questiona se Deus tem necessidade de passar pelo processo de um tribunal a fim de determinar a culpa (34.23; cf. 9.32; 14.3; 22.4) e, por fim, Jó retira o seu pleito diante de Deus (m s, 42.6; cf. Scholnick, 521-29). O pregador (Qoheleth) apega-se firmemente à sua convicção do julgamento e da justiça de Deus (Ec 8.5-6; 11.9; 12.4), apesar de observações pessoais contrárias (3.16; 5.8 [7]). O sábio de Provérbios entende as dimensões éticas da sa bedoria (Pv 1.3; 2.8-9) e reflete sobre o relacionamento entre Deus, o rei e a justiça (Pv 16.8, 10, 11,33; cf. Cox). c. Nos profetas, mispât ocorre mais de 30x em cada um dos seguintes livros: Isaías, Jeremias e Ezequiel. De acordo com o livro de Isaías, o julgamento e a justiça de Deus irão restaurar a justiça a Israel (ls 1.21, 27; 3.14; 4.4; 5.7, 16) bem como promover a vinda de um rei escatológico justo (9.7 [6 ]; 16.5; 32.1). O servo descrito na segunda metade de Isaías trará justiça não apenas para Israel (40.27), mas também para as nações (42.1, 3,4). Enquanto isso, a injustiça de Israel impede que a justiça divina seja manifestada (58.2; 59.8, 9, 11, 14, 15). Não fica claro se várias nuanças de mispãf estão sendo usadas em Isaías 42 ou 59 (cf. Beuken, Jeremias e Kendall). O profeta Jeremias luta em nível pessoal com a justiça divina (Jr 12.1). Pede a Deus que o discipline com justiça (10.24) e Deus responde declarando que essa é sua intenção para a nação toda (46.28). A justiça de Deus é tão importante (e tão rara em Israel) que ele perdoará Jerusalém se for possível encontrar ali uma única pessoa justa (5.1). A volta de Israel para a justiça e a fidelidade a Deus será a garantia de bênção para as nações (4.1 -2). O profeta Ezequiel 835
Justiça
concentra-se na desobediência de sua nação à mispãtim de Deus (Ez 5.6-8). Somente o julga mento divino (23.24-45) e a transformação divina podem levar o povo de volta à obediência (36.26-27; 37.24) e prepará-lo para ser apascentado com justiça (34.16). P-B A LXX costuma traduzir mispãt como krima (182x), krisis (142x) e dikaiõma (38x). mispãf ocorre várias vezes em Qumran, especialmente em 1QS e CD (cf. Kuhn, Konkordanz, 136-38; Delcor, 1954, 533-53; 1955, 60-75). De acordo com Delcor, 1954, 541, mispãf em Qumran pode-se referir tanto à lei divina como às leis da comunidade, que abrange o código penal da seita. NT No NT, o tema do julgamento e justiça do AT é desenvolvido de forma ainda mais ex tensa. Os ensinamentos de Jesus explicam melhor a idéia de um “dia” de julgamento universal (cf. Mt 10.15; 11.22, 24; 12.41, 42, também v. 36 e par.; At 17.31; Ap 14.7; 19.11). Mateus 12.17-21 cita Isaías 42.1 -4 como uma profecia que se cumpriu no ministério de Jesus (cf. tam bém At 8.32-33, que cita Is 53.7-8). Jesus repreende os escribas e fariseus por estarem deixando a justiça de lado como aspecto mais importante da lei (Mt 23.23-24; Lc 11.42). A parábola da viúva insistente em Lucas 18.1-9 reflete a garantia do AT de que Deus concederá justiça aos membros fracos e oprimidos da sociedade. Justiça, julgamento: -> dyn (julgar, contender, governar, administrar, # 1906); -> mispãh (infração da lei, # 5834); -> p ll I (assentar-se para julgar, arbitrar, esperar, # 7136); -> ,jdq (ser justo, reto, justificado, # 7405); -> spt (julgar, realizar julgamento, juízo, # 9149) Lei de Deus: hõq (porção, obrigação, limite, lei, ordem, # 2976); -> mi.ywâ (ordem, man damento, # 5184); -> mispãf (julgamento, decisão, caso legal, reivindicação legal, # 5477); ‘êdút (estatutos, estipulações, sinal de advertência, lembrança, # 6343); -> piqqúdtm (orienta ções, ordem, # 7218); para tôrâ (orientação, instrução, lei, a lei, # 9368); Decálogo: Teolo gia: -> Ética: Teologia; -> Lei de Deus: Teologia B ib l io g r a f ia
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Lamentações: Teologia de
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# 7547 ($emer, lã)
Lábio -> # 8557 (sãpâ, linguagem, lábio, litoral/costa) Labuta Lagar Lágrimas
# 6661 ( ‘ml, labor, labuta) # 1780 (gat I, lagar) # 1963 (dm \ derramar lágrimas)
Lama *> # 2567 (hõl 1, lama, areia) Lambida -> # 4308 (Ihk, lamber, consumir)
O nome do livro de Lamentações é originário da Vg. Lamenta (cf. Threni na LXX e qinôt noTalm. [6 . B. Bat. 14b], todos eles com o mesmo significado). Como é costume, seu título em heb. baseia-se na palavra de abertura do livro, nesse caso, o evocativo ’êká, “Como...!; Quão terrível!; Ai!”. No cânon judaico tradicional, Lamentações está incluído nos Cinco Rolos (os outros são Rute, Eclesiastes, Cantares de Salomão e Ester), sendo que cada um é lido anualmente num dia san to ou festival específico. De modo bastante apropriado, Lamentações é lido no nono dia de ab (Tisha b 'Ab), que, de acordo com a tradição judaica, é o dia em que tanto o primeiro quanto o segundo templo foram destruídos (587 a. C. e 70 d. C.), os exército de Bar Cosba foram der rotados em Betar (135 d. C.) e os judeus foram expulsos da Espanha em 1492 d. C. Nas pala vras de S. J. D. Cohen (20), a leitura de Lamentações no nono dia de ab tomou-se “o lamento eterno por todas as tragédias dos judeus, sejam elas passadas, presentes ou futuras” (observese que somente a queda de Betar pode ser datada exatamente do nono dia de ab; as outras datas são próximas, e imprecisas). No cânon da Septuaginta, que se reflete na maioria das Bíblias cristãs, Lamentações vem depois do livro de Jeremias. Lamentações: Teologia de
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Lamentações: Teologia de
O período mais provável para a redação de Lamentações é o tempo logo depois da des truição de Jerusalém pelos babilônios em 587 a. C., descrevendo aquela que pode muito bem ser chamada de tragédia máxima: a cidade santa foi saqueada, o rei davídico — o ungido do Senhor — foi deposto e exilado juntamente com todos menos os mais pobres do povo e até mesmo o templo de Javé — o santuário do Deus de todo o mundo aqui na terra — teve a santi dade violada e sua construção incendiada, seus utensílios sagrados profanados e levados para uma terra pagã. Lamentações 2.20-21 pinta um retrato sombrio e aterrorizante: “Vê, ó Senhor, e considera a quem fizeste assim! Hão de as mulheres comer o fruto de si mesmas, as crianças do seu carinho? Ou se matará no santuário do Senhor o sacerdote e o profeta? Jazem por terra pelas ruas o moço e o velho; as minhas virgens e os meus jovens vieram a cair à espada; tu os mataste no dia da tua ira, fizeste matança e nâo te apiedaste” . Nada poderia ter sido mais devastador para o povo judeu. Era como se todas as pro messas da aliança, todos os livramentos de outrora, todas as histórias da intervenção de Javé em favor de seu povo tivessem simplesmente desaparecido. Havia poucas lembranças dos dias passados de glória, muitas memórias vividas da derrota recente e dolorosa e incontáveis imagens presentes e horrorizantes de sofrimento, humilhação e desolação. A culpa coletiva nacional ha via transformado Javé, Guardião e Defensor de Israel, em Destruidor e Juiz de Israel. A cidade de ouro, “a cidade que denominavam a perfeição de formosura, a alegria de toda a terra” (Lm 2.15), não passava de um monte de escombros, opróbrio entre as nações. Apesar de haver controvérsias quanto à autoria de Lamentações (ver parágrafo seguin te), seu contexto histórico é claro. Esses poemas melancólicos foram escritos por um autor que vivia em Jerusalém ou perto da cidade logo depois que ela foi destruída. Os relatos devem ser considerados provenientes de uma testemunha ocular contemporânea e não de alguém vivendo na Babilônia ou no Egito, ou de um autor mais recente recordando uma trágica derrota do pas sado. Apesar de ter sido mostrado que textos semelhantes do OMA foram escritos por ocasião da reconstrução de um templo, muito depois de sua destruição, a maioria dos estudiosos rejeita corretamente essa argumentação para o caso de Lamentações. As imagens de bebês morrendo de fome, de mães transtornadas e de jovens pranteando, de um templo arruinado desprovido de sacerdotes e adoradores, de uma cidade ainda queimando lentamente com a ira de Deus e com o fogo do inimigo encontram-se vividas demais na mente do escritor. Aliás, no versículo de conclusão do livro, o desespero do escritor é tal que ele questiona se, de fato, um dia haverá restauração (ver discussão abaixo). O livro de Lamentações foi escrito por Jeremias? Sem dúvida segue naturalmente a seqüência do livro magistral de Jeremias e há certas semelhanças estilísticas e léxicas entre as duas obras (cf. p. ex., o uso de seber — um termo da preferência de Jeremias — em Lm 2.11, 13; 3.47-48; 4.10; ou cf. Jr 8.23; 9.1 juntamente com Lm 3.48; a oração mãgôr missãbib, em Jr 6.25; 20.3, 10; 46.5 e Lm 2.22, deve ser observada; cf. mais em M. Lõhr). Também há tra dições antigas claras que apoiam a autoria de Jeremias, refletida nas palavras de abertura da LXX, Vg., Pexita e Trg.; cf. também 2 Crônicas 35.25, TalmB, Baba Batra 15a e o testemunho unânime da igreja primitiva. O TM, porém, não preserva tal tradição e a maioria dos estudiosos modernos rejeita a autoria de Jeremias tomando por base diferenças teológicas ou filosóficas observadas entre os escritos de Jeremias e Lamentações. Versículos como 1.10; 4.17 (contras tar com Jr 2.18; 37.5-10); 4.20 (contrastar com Jr 37.17, ambos com referência a Zedequias) são considerados inapropriados para Jeremias. Alguns estudiosos também sugeriram diferentes escritores para os poemas distintos (cf., porém, D. Marcus para evidências estilísticas que indi cam claramente um único escritor), enquanto outros procuraram identificar a escola teológica ou ideológica (profética, sacerdotal, deut., etc...) que melhor explica as origens do escritor (ou 838
Lamentações: Teologia de
dos escritores) (cf., p. ex., N. K. Gottwald; B. Albrecktson; H.-J. Kraus). De qualquer modo, pode ser um tanto intencional o fato de a identidade do escritor não ser revelada e, por tanto, não receber menção no TM, tendo em vista que esse lamento representa simplesmente o la mento da cidade e do povo e a aflição individual do autor articula a aflição coletiva. Sua voz não é única, mas perde-se no meio dos gritos estridentes e lamentos chorosos de uma nação profundamente ferida. A. Estrutura literária Os estudiosos não apresentam um consenso quanto à seqüência da composição dos ca pítulos individuais, com exceção de uma concordância geral de que todos os cinco capítulos são do período logo depois da destruição de 587 a. C. (em oposição a W. Rudolph que argu menta que o cap. 1 foi redigido depois do ataque violento de 597 a. C.). De qualquer modo, a simetria e estrutura geral de Lamentações são claras. Os caps. 1— 2 e 4— 5 são constituídos de 22 versículos cada um (sendo que todos, com exceção do cap. 5, são acrósticos; ver porém, a proposta recente de S. Bergler), enquanto o cap. 3 é um acróstico triplo constituído de 6 6 ver sículos. No entanto, a extensão dos capítulos na verdade é semelhante, uma vez que as estrofes poéticas variam em sua divisão e versificação, encurtando os versículos do cap. 3. Assim, a composição literária cuidadosa do texto facilita a identificação do seu centro, sendo interessante observar-se que Lamentações chega a seu ponto central exato em 3.31-36, os versos kap e lãmed, que constituem tanto o cerne numérico quanto temático: “O Senhor não rejeitará para sempre; pois, ainda que entristeça a alguém, usará de compaixão segundo a grandeza das suas misericórdias; porque nâo aflige, nem entristece de bom grado os filhos dos homens. Pisar debaixo dos pés a todos os presos da terra, perverter o direito do homem perante o Altíssimo, subverter ao homem no seu pleito, não o veria o Senhor?”. De fato, 3.31-36 for mam o núcleo de um conjunto mais amplo de otimismo e expectativa confiante que começa em 3.21-23 (“Quero trazer à memória o que me pode dar esperança. As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade”) e termina em 3.40-47, com o chamado para a con fissão e contrição públicas (cf. também F. Lindstrõm de 3.37-38; ver ainda S. Weissblueth). Porém, esses pontos culminantes psicológicos e espirituais, localizados como estão no centro do livro, não contrabalançam inteiramente a realidade da crise presente, assim como também não aliviam a dor (cf. ainda B. Johnson; J. KraSovec). Concentrando-se nos capítulos específicos, Hiller sugere os seguintes títulos: 1. “Há outra dor como a minha dor?”; 2. “O Senhor tomou-se como um inimigo”; 3. Um homem comum; 4. O limite do sofrimento; 5. Uma oração. Esses títulos indicam alguns dos pontos de vista diferentes usados pelo escritor, uma vez que, em certas ocasiões, ele fala como Jeru salém personificada (p. ex., 1.11 b-16), como um observador e testemunha ( 1.1 -11 a) ou mes mo como um homem qualquer (cf. 3.1; para outras perspectivas relacionadas, cf. P. Joyce; A. Mintz; W. F. Lanahan). Como um homem comum, o escritor utiliza a forma do vocabulário dos lamentos bíblicos individuais. Observe-se, p. ex., a personalização dos ataques do inimi go em 3.14, 52-66, um tema comum nos Salmos (cf. p. ex., SI 38.19-20; 40.14-15; 41.5-11; 69.4 [5] [cf. sõneay hinnãm com 'õy^bay hinnãm em Lm 3.52]; 89.50-51 [para argumentos relacionando Lamentações 3 a uma figura real, cf. M. Saeba; H. Gottlieb, 1987]). Ao descre ver a queda da cidade, seu estilo assemelha-se, por vezes, so do gênero dos lamentos sobre cidades do OMA (cf. P. W. Ferris, Jr., W. C. Gwaltney, Jr., ver também T. F. McDaniel). Tudo isso indica qual é o público-alvo, o uso litúrgico do material e as fórmulas padronizadas dos lamentos pela cidade, possivelmente conhecidas pelo escritor e empregadas por ele, tendendo 839
Lamentações: Teologia de
a universalizar a natureza da destruição de Jerusalém e, ao mesmo tempo, ressaltando o ca ráter peculiar da fé israelita. Quanto à estrutura métrica, Lamentações (esp. o cap. 3) proporciona a prova clássica da métrica qinâ, associada, desde K. Budde, ao lamento funeral, em função de sua estrutura métrica desigual (p. ex„ 3-2, ou 4-3, ou 4-2), que dá a impressão de paradas, engasgos, soluços de choro, sugerindo até possivelmente o andar claudicante da procissão fúnebre. No entanto, estudos feitos desde Budde reconheceram que os poetas hebraicos usavam essa mesma estrutu ra métrica em passagens que não eram de lamento, enquanto outros lamentos bíblicos seguem o padrão de qinâ. Ainda assim, o gênero de Lamentações é classificado corretamente como de lamento comunitário, mesmo que não haja uma métrica específica e exclusiva de lamento na BH. Para mais discussões sobre qinâ, ver W. R. Garr; Hillers e considerar W. H. Shea que observa uma estrutura 3-2 até mesmo nas divisões de capítulos do livro. B. Temas teológicos 1. A queda e o pecado de Jerusalém. O livro de Lamentações pode ser resumido um versículo (5.16): “Caiu a coroa da nossa cabeça; ai de nós, porque pecamos!” A queda de Jerusalém, que por definição foi tanto uma tragédia nacional quanto regional, é, portanto, o tema predominante dos poemas. O povo encontra-se completamente desamparado: “Com pe rigo de nossa vida, providenciamos o nosso pão, por causa da espada do deserto. Nossa pele se esbraseia como um forno, por causa do ardor da fome. Forçaram as mulheres em Sião; as virgens, nas cidades de Judá. Os príncipes foram por eles enforcados, as faces dos velhos não foram reverenciadas. Os jovens levaram a mó, os meninos tropeçaram debaixo das cargas de lenha; os anciãos já não se assentam na porta, os jovens já não cantam. Cessou o júbilo de nosso coração, converteu-se em lamentações a nossa dança” (5.9-15). Isso tudo, porém, é decorrente do pecado (cf. Gottwald com referência aos resultados efêmeros da reforma de Josias): “Jeru salém pecou gravemente; por isso, tomou-se repugnante” (1.8 a); cf. também 5.7: “Nossos pais pecaram e já não existem; nós é que levamos o castigo das suas iniqüidades”; 1.5b: “O Senhor a [Jerusalém] afligiu, por causa da multidão das suas prevaricações”; ver também 1.14. Assim, trata-se de uma questão essencialmente espiritual: “emoiiu com violência o seu tabemáculo, como se fosse uma horta; destruiu o lugar da sua congregação; o SENHOR, em Sião, pôs em esquecimento as festas e o sábado e, na indignação da sua ira, rejeitou com desprezo o rei e o sacerdote. Rejeitou o Senhor o seu altar e detestou o seu santuário” (2.6-7a). O Senhor tomou-se, portanto, como um inimigo (2.4-5 observar, porém, que quase to das as menções de “inimigo(s)” em Lamentações referem-se a adversários terrenos; o Senhor é “como” um inimigo). Ele não move uma palha sequer enquanto os pagãos violam o povo, a cidade e templo do Senhor. Na verdade, foi ele quem abriu as comportas de destruição, uma vez que “apregoou contra mim um ajuntamento, para esmagar os meus jovens” (1.15b) e “or denou o Senhor acerca de Jacó que os seus vizinhos se tomem seus inimigos” (1.17b). Por certo, “retirou sua destra de diante do inimigo” (2.3b) e “entregou nas mãos do inimigo os mu ros dos seus castelos [de Jerusalém]” (2.7b). Mas ele próprio também está envolvido nos atos de destruição: “Intentou o SENHOR destruir o muro da filha de Sião; estendeu o cordel e não retirou a sua mão destruidora” (2.8a-b); cf. ainda 1.12-15, 17, 21; 2.17, 20-22; 3.1-16, 43,45; 4.16. (-> Guerreiro Divino: Teologia) Os profetas deveriam ter advertido o povo sobre a destruição iminente, mas, em vez disso, disseram palavras falsas de tranqüilização dizendo “Paz, paz” (salôm, salôm) quando não havia, de fato, paz (ver Jr 6.14; 8.11; cf. 23.16-29; Is 30.10-11; Ez 13.10-12, 20-23; Mq 2.6-11; 3.5). Assim, o escritor condena energicamente essas sentinelas adormecidas em 2.14 840
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(cf. 4.11): “Os teus profetas te anunciaram visões falsas e absurdas e não manifestaram a tua maldade, para restaurarem a tua sorte; mas te anunciaram visões de sentenças falsas, que te levaram para o cativeiro”. O dia do acerto de contas havia chegado e tanto o profeta quanto o sacerdote, tanto o príncipe quanto o pobre foram pegos desprevenidos. O pecado de Jerusalém havia deixado seu único e verdadeiro Amparo temporariamente impotente: “Que poderei dizerte? A quem te compararei, ó filha de Jerusalém? A quem te assemelharei, para te consolar a ti, ó virgem filha de Sião? Porque grande como o mar é a tua calamidade; quem te acudirá?” (2.13; ver também Dt 28.27, 35; Jr 19.11; Os 5.13-15). A tristeza, que é tão profunda, paira como uma nuvem espessa sobre o escritor, encobrindo os raios de esperança e promessa que, apenas raramente irrompem nos céus escuros (cf. 3.44: “De nuvens te encobriste para que não passe a nossa oração”). Ainda que a salvação viesse algum dia, em que isso ajudaria aqueles que estavam morrendo nas ruas naquele dia? De que serviria para consolar a geração que seria lembrada para sempre como os objetos da ira ardente de Deus? 2. A ira concretizada. Lamentações apresenta vários temas característicos. Apesar de as bênçãos e maldições da aliança (Levítico 26; Deuteronômio 28) advertirem claramente que tal dia de furor e castigo chegaria para os desobedientes e, apesar de os profetas terem acrescenta do o seu testemunho ao da Torá (cf. 2Rs 17.13-15; 2Cr 36.15-16), Lamentações é singular pois foi escrito do ponto de vista da ira concretizada. Quando, por fim, o julgamento chegou, foi absolutamente feroz. Sião personificada pergunta: “Considerai e vede se há dor igual à minha, que veio sobre mim, com que o Senhor me afligiu no dia do furor da sua ira. Lá do alto enviou fogo a meus ossos, o qual se assenhoreou deles; estendeu uma rede aos meus pés, arrojou-me para trás, fez-me assolada e enferma todo o dia” (1.12b-13). De fato, “o Senhor pisou, como num lagar, a virgem filha de Judá” (1.15c). O cap. 2 começa com referências repetidas à ira ardente de Deus (v. 1 — “cobriu de nuvens, na sua ira” e “no dia da sua ira”; v. 2 — “no seu furor”; v. 3 — “no furor da sua ira... ardeu... como labareda de fogo”), chegando a um ponto culminante em 2.4-5: “Entesou o seu arco, qual inimigo; firmou a sua destra, como adversário, e destruiu tudo o que era formoso à vista; derramou o seu furor, como fogo, na tenda da filha de Sião. Tomou-se o Senhor como inimigo, devorando Israel; devorou todos os seus palácios, destruiu as suas fortalezas e mul tiplicou na filha de Judá o pranto e a lamentação”. De fato, “deu o Senhor cumprimento à sua indignação; derramou o furor da sua ira; acendeu fogo em Sião, que consumiu os seus fun damentos” (4.11). Essas demonstrações de ira também são experimentadas como um ataque violento e pessoal: “Fez-se-me como urso à espreita, um leão de emboscada. Desviou os meus caminhos e me fez em pedaços; deixou-me assolado. Entesou o seu arco e me pôs como alvo à flecha. Fez que me entrassem no coração as flechas da sua aljava” (3.10-13). Somente cm Jó são encontradas descrições tão vividas e violentas para caracterizar os atos do Senhor contra um sofredor (cf. p. ex., Jó 16.7-9). Seu ataque parecia absolutamente selvagem. 3. Jó e Lamentações: Comparações e Contrastes. Isso nos leva a três observações im portantes. a. Podem-se contrastar as aflições e Jó e Jerusalém, uma vez que no caso de Jó, fo ram imerecidas, vindas como um completo abalo. O Deus a quem ele havia servido fielmente ao longo de décadas parecia ter-se voltado contra ele sem causa ou motivo algum (cf. hinnãm em Jó 2.3; 9.17). Não foi esse o caso de Jerusalém. Mesmo que a severidade do ataque inimigo tivesse sido surpreendente e mesmo que o ódio dos adversários de Sião parecesse injustificado (cf. novamente hinnãm em Lm 3.52), as aflições em si eram consideradas um julgamento me recido. Ver as declarações explícitas em 1.5, 8 ; 5.7, observando especialmente 1.18a: “Justo é o Senhor, pois me rebelei contra a sua palavra”; 3.39-40: “Por que, pois, se queixa o homem vivente? Queixe-se cada um dos seus próprios pecados”. Essa atitude fornece uma base mais 841
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firme para intercessão e petição (cf. Esdras 9; Neemias 9; Daniel 9), enquanto para Jó só resta esperar pelo impossível. b. A violência do ataque é tal que tanto em Jó quanto em Lamentações surge o questiona mento da aparente falta de misericórdia do Senhor. No primeiro livro, é bastante compreensível que tais perguntas sejam explícitas, surgindo por vezes como verdadeiros ataques contra o pró prio caráter de Deus (p. ex., Jó 9.22-25). Tais sentimentos não são encontrados em Lamentações. Porém, vêem-se alguns indícios de que mesmo ojulgamento sendo merecido, era insuportável. A misericórdia característica de Javé parecia estar completamente ausente (contrastar, porém, Lm 3.22-24), como o indicam as referências ao Senhor destruindo e matando sem piedade em 2.2,17,21; 3.43. Cf. também 4.6, em que o castigo de Jerusalém é considerado mais terrível do que o de Sodoma; observar também 5.20. Tudo isso confere ao texto um elemento de profunda compaixão humana, uma vez que os sofredores ainda são frágeis criações das mãos de Deus, o único que pode socorrer, livrar e consolar. Procuram em vão o toque carinhoso de seu Pai de amor, mas só conseguem sentir os golpes do Senhor irado. E verdade que, de acordo com sua natureza terrena, pecaram e fizeram o que era mau. Porém, será que Deus, de acordo com sua natureza celestial (cf. 3.41b), não deveria perdoar? Lamentações 3.42 poderia ser traduzido de forma expandida como: “É verdade que, de nossa parte, cometemos transgressões e nos rebe lamos; mas da tua parte, tu não perdoaste”. c. Isso ajuda a explicar por que Lamentações usa o termo yhwh quase duas vezes mais do que ’adõnãy (32x e 14x, respectivamente, apesar de haver diferenças nos MSs do TM)? Em outras palavras, seria mais fácil o escritor atribuir atos de destruição ao “Senhor” e não a Javé, o Salvador que cumpre sua aliança com Israel? Hillers (74) acredita que não haja diretrizes claras para o uso de ’adõnãy e yhwh, indicando também as variações nos manuscritos. Além disso (de acordo com a maioria dos MSs), alguns dos atos mais terríveis são atribuídos a Javé (cf. p. ex., 1.5,12,17; 2.8; 4.11, 16). No entanto, é ’adõnãy (mais uma vez, de acordo com os MSs) quem se toma “como inimigo” (2.5a), enquanto quase todas as súplicas e declarações cheias de esperança são dirigidas diretamente a yhwh (cf. 1.9, 11,20; 2.20; 3.18,22,24-26,40, 50,55, 59,61,64; 5 .1,1 9 ,2 1 com yhwh, ao contrário de 2.18; 3.31,36, 58 que usam ’adõnãy). Assim, a maioria das referências a yhwh em Lamentações aparecem no contexto de oração e esperança, enquanto grande parte das referências a ’adõnãy ocorre no contexto de julgamen to, apesar de pequenas variações nos manuscritos. (Não há nenhuma explicação, porém, para o fato da designação 'elõhím, Deus, não ser mencionada em parte alguma do livro; e/ ocorre em 3.41 e ‘elyôn [Altíssimo] em 3.35, 38.) 4. A transcendência de Javé. Em outras partes do AT, o próprio Deus declara que as ções usadas por ele para julgar seu povo foram longe demais (cf. o locus classicus, Zc 1.15; ver Is 10.5-11). Lamentações apresenta o ponto de vista das vítimas dessa crueldade injustificada. E, no entanto, em meio a tudo isso, o Deus de Israel permanece transcendente. Não foi derro tado nem profanado. Na verdade, é tão grande que permite que seu nome seja blasfemado por nações estrangeiras e idólatras (cf. Ez 36.16-23) em vez de tolerar que seu lugar de habitação seja corrompido e as estipulaçòes de sua aliança sejam ignoradas. No final, o nome dos outros deuses — que, por um momento, parecem haver triunfado — seria esquecido para sempre. Assim, em Lamentações, de modo algum, é cogitado que Javé pudesse ter nenhuma fraqueza ou demonstrar nenhuma impotência. Ele ordenou a destruição, ele estava por trás dela e seria somente por sua graça que ocorreria a restauração. Pode-se fazer uma comparação em menor escala com 1 Samuel 4— 6 , em que o Senhor permite que seu povo seja derrotado na batalha contra os filisteus, mesmo com sua arca no meio dos exércitos israelitas, simbolizando que ele estava lutando por eles (4.5-9). O pecado dos israelitas os havia desqualificado para receber a 842
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ajuda e intervenção do Senhor, e tudo indicava que os deuses dos filisteus eram mais podero sos. Não demorou muito, porém, para os filisteus descobrirem, de maneira inequívoca, que o Deus de Israel era, de fato, o Todo-Poderoso (5.1 -6 .12). Também é importante observar-se que o fato de o escritor reconhecer a transcendência do Senhor faz da destruição de Jerusalém um acontecimento de proporções globais — para não dizer cósmicas. Trata-se de algo que todos os povos devem considerar (1.12, 18); assim, 4.12 pode até mesmo declarar: “Não creram os reis da terra, nem todos os moradores do mundo, que entrasse o adversário e o inimigo pelas portas de Jerusalém”. Todos sabiam que Javé era o Deus verdadeiro e que sua cidade e santuário eram invioláveis! Esse fato também parece tomar a vitória do inimigo ainda mais mordaz (cf. es. 1.1 0 e 2 .16-17; vertambém 1.5,7,9, 16, 17,21; 2.3, 7,22; 3.46, 52,62 para referência aos inimigos de Sião, alguns dos quais haviam sido alia dos que se voltaram contra Judá [1.2]). Assim, o escritor clama: “Vê, Senhor, a minha aflição, porque o inimigo se toma insolente” (1.9c). Essa não era a ordem pretendida por Deus. C. Contexto canônico Lamentações afirmam certas verdades fundamentais do AT. Jerusalém e seu povo esta vam seguros somente enquanto guardavam a aliança do Senhor. De outro modo, Deus destruiria seu povo e o mandaria para o exílio (cf. esp. 2Cr 7.19-22). Conforme foi dito acima, porém, a concretização desse fato na história ainda estava transtornando a psique nacional e afetando o coração da comunidade. Profetizar que Deus se tomaria o maior adversário de Judá era uma coisa; mas tê-lo de fato como inimigo, era outra completamente diferente. Porém, apesar do pecado de Jerusalém, haveria retribuição divina contra as nações que estavam castigando o povo de Deus (p. ex., 1.21 b), especialmente contra Edom (4.21-22), cuja decisão de tomar par tido dos babilônios foi para o povo judeu a maior de todas as traições possíveis, o que ajuda a explicar os sentimentos expressados em Obadias e no Salmo 137.8-9. Há certas áreas, porém, que podem parecer divergentes de outros temas freqüentes do AT. Uma das questões está relacionada aos pecados dos pais, conforme expressado em 5.7: “Nossos pais pecaram e já não existem; nós é que levamos o castigo das suas iniqüidades". Os profetas não declararam que o provérbio “Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram” não se referia mais a Israel (Jr 31.29-32; Ez 18.2-4)? E Deutero nômio 24.16 não afirmava que os filhos não seriam mortos pelos pecados dos pais? Na verda de, esse último versículo, conforme é explicado em outras passagens do AT (cf. 2Rs 14.6; 2Cr 25.4) referia-se simples e exclusivamente ao código penal. Além disso, o princípio de Êxodo 20.5-6 não havia sido revogado, a saber, que o Senhor visita os pecados de uma geração pecadora na próxima geração pecadora (cf. Lm 5.7 com 5.16b). Porém, os oráculos das “uvas verdes” conforme eles aparecem nos livros de Jeremias e Ezequiel, descrevem o começo do final de um ciclo (cf. Lm 4.22a; ver também Is 40.2. Gerações anteriores (particularmente a de Manassés, cf. 2Rs 24.1-4) cometeram pecados gravíssimos, deixando um legado de julga mento vindouro suspenso sobre a cabeça de seus descendentes. O pronunciamento das uvas verdes, feito em Jeremias no contexto das promessas de restauração (ao longo de Jeremias 31 e imediatamente antes da seção sobre a nova aliança em 31.31-34), afirma que naqueles dias em que estavam sendo profetizadas renovação e bênçãos, nenhum julgamento seria deixado para o futuro. Antes, haveria retribuição imediata pelos pecados. Não se tratava de algo a ser considerado uma bênção! Cf. também Ezequiel 18.2-4, em que uma perspectiva ligeiramente distinta é esclarecida, a saber, que os filhos justos não seriam punidos pelos pecados dos pais ímpios; cf. ainda C. F. Keil. 843
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Uma última observação encontra-se relacionada às mais conhecidas descrições de Javé na Torá, nos Profetas e nos Salmos, a saber, que ele é tardio em irar-se e grande em miseri córdia (cf. Êx 34.6; Nm 14.18; Ne 9.17; SI 86.15; 103.8; 145.8; Jl 2.13; Jn 4.2; Na 1.3). Esse princípio ainda era válido? Sem dúvida Lamentações reconhece que esse dia de julgamento vinha-se formando há muito tempo (cf. Lm 2.17), e, assim, o Senhor — verdadeiramente tar dio em irar-se — havia, por fim, procedido conforme sua ira. Porém, de acordo com determi nados salmos (sendo o Salmo 88 o exemplo mais conhecido), Lamentações não pode eliminar a certeza de restauração e reconciliação. Ao contrário dos salmos, que depois do Salmo 8 8 , acrescenta os louvores vitoriosos do Salmo 89, Lamentações na verdade termina em desespero, uma vez que a súplica esperançosa de Lamentações 5.21 ainda deixa espaço para o desalento de 5.22 (a menos que se siga aqui a interpretação de R. Gordis). Assim, cabia a outros livros do AT transmitir as promessas proféticas infalíveis, bem como os relatos históricos dos primeiros passos de restauração espiritual e natural. Antes de mais nada. Lamentações dá testemunho das terríveis conseqüências do pecado (cf. M. S. Moore para a ênfase sobre o sofrimento hu mano) e dos horrores da ira de Deus, porém não sem nos fazer relembrar que sua fidelidade é grande e suas misericórdias se renovam a cada manhã (3.22-23). De modo a reforçar esse fato, o TM repete 5.21 em letras pequenas e sem as vogais depois do versículo de encerramento, segundo um costume semelhante e de efeito mitigador que se reflete no TM ao final de Isaías, Malaquias e Eclesiastes. Portanto, numa adaptação canônica interna, o TM de Lamentações se encerra como as palavras: “Converte-nos a ti, Senhor, e seremos convertidos; renova os nos sos dias como dantes”. B i b l i o <; r a f i a
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n r p (qínâ I), subs. canto fúnebre (# 7806); > (qyn), polel ou pilpel (KBL), entoar um canto fúnebre
(# 7801).
AT 1 . 0 conceito de lamento no AT apresenta um problema interessante. Por um lado, tem-se o uso do termo específico para lamento, expressado em heb. pelo subs. qínâ e pelo v derivado qônên, que no AT invariavelmente encontra-se relacionado a contextos de morte e tragédia e acompanhado de vários termos para tristeza e luto. Se as palavras do lamento apa recem especificadas, são dirigidas ao falecido ou àquilo que foi destruído (Jônatas, 2Sm 1.26; Abner, 3.34; Tiro, Ez 27.32-36), ou, ainda, a testemunhas do fato, quer reais ou imaginárias 845
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(os montes de Gilboa, as filhas de Israel, 2Sm 1.21, 24), mas nunca a Deus (que, aliás, não é mencionado em momento algum) e são palavras que se voltam para o passado. Por outro lado, tem-se o fenômeno chamado de “lamento” pelos estudiosos modernos, ou seja, certo tipo de oração, sempre dirigida a Deus e que se volta, pelo menos parcialmente, para o futuro. Ocorre de modo saliente nos Salmos e também pode ser encontrado em outras partes do AT, especial mente em Isaías, Jeremias e Habacuque. O termo qinâ nunca é usado para esse tipo de oração e o AT não apresenta nenhuma terminologia característica — os títulos de salmos do livro de Salmos não parecem relacionados ao conteúdo do texto que apresentam (como no caso de maskíl, termo usado com freqüência para lamentos como nos Salmos 42, 44, 55, 74, 8 8 , 89 e também em salmos que não constituem lamentos, como os Salmos 32, 45, 78). De qualquer modo, parece inteiramente apropriado empregar-se o termo lamento para descrever o conteúdo dos salmos relevantes, nos quais o salmista clama ao Senhor num tempo de provação. A relação entre esses dois tipos de lamento no AT é totalmente obscura. Existe uma semelhança básica evidente entre eles, uma vez que cada um é uma reação verbal angustiada à uma situação de morte ou semelhante. Porém, no AT nunca aparecem justapostos, exceto talvez em Lamentações (em que tudo indica que haja uma confluência dos dois tipos). Isso pode sig nificar que havia um contexto comum para os dois tipos de lamento e o fato de nenhum relato desse contexto ter chegado até nós é simplesmente um acidente histórico; ou pode significar que, na prática, eram de natureza bastante distinta. Não é necessário nos preocuparmos com esse problema histórico (ver esp. Ferris) e simplesmente seguiremos a forma como o AT trata dos dois tipos de lamento em separado. Deve-se observar desde o princípio que os tipos diferentes de lamento levantam questões interpretativas completamente distintas. Enquanto o sentido mais antigo encontra-se relacionado principalmente a costumes religiosos e sociais do mundo antigo e que tem pouca relação com os costumes de hoje, o sentido moderno de lamento levanta de modo mais direto questões de grande relevância teológica para a vida de fé contemporânea. 2. qinâ e termos relacionados no AT. A prática de qinâ na Israel antiga era um element no processo ou ritual de pranto. O ritual de pranto é visto em sua forma mais básica ou pura como uma reação à morte, mas ocorre naturalmente em várias outras situações semelhantes à morte, como em calamidades e tragédias. Pelo fato de o pranto ser um processo que envolve vários elementos, qinâ não é sempre necessariamente um elemento, ou pelo menos, um grande número de relatos de pranto no AT que não fazem referência alguma a qinâ. Há diversos termos heb. para os vários elementos do pranto, sendo que muitos deles costumam ocorrer em conjunto e alguns parecem ser intercambiáveis. Em vez de apresentar uma discussão completa sobre cada radical, o que ocasionaria muita sobreposição e repetição, será mais proveitoso observar-se inicialmente o significado principal dos diversos termos do vocabulário de pranto e também ilustrar o modo como são usados regularmente em conjun ção com outros termos. Desse modo, pode-se ver como os diversos termos acabam resultando num todo multifacetado. a. qinâ. Nosso principal interesse é no termo qinâ e no vb. derivado qônên. Tratava-s de uma elocução na forma de elegia proferida em funerais (ou, como no caso do lamento de Davi sobre Jônatas [2Sm 1.17-27] numa situação mais parecida com um memorial, uma vez que as circunstâncias tomavam impossível a realização de um funeral). Sempre que o conteúdo de qinâ é especificado — e com exceção das Lamentações anônimas, somente Davi e Ezequiel apresentam elegias — trata-se de palavras não apenas dirigidas retoricamente ao falecido ou testemunhas (como foi observado anteriormente), mas que também adquirem forma poética. Ao que parece, o AT costuma partir do pressuposto de que em momentos especiais da vida, o 846
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discurso deve transformar-se em poesia, de modo que tanto a forma como o conteúdo da elo cução devem refletir a natureza especial da ocasião (as primeiras palavras humanas registradas — Adão expressando sua alegria pela criação de Eva — encontram-se em forma de poesia, Gn 2.23). No contexto da poesia qinâ, é possível observar-se até um padrão tônico característico do tipo 3-2, em que o segundo elemento mais curto pode transmitir uma idéia de definhamento, apropriada para a ocasião de pranto. Porém, apesar de esse padrão ser usado com regularidade em Lamentações e nos lamentos de Ezequiel (p. ex., Ez 19.1-14; 27.25-36), de maneira algu ma aparece em todos os lamentos do AT e não está presente no mais antigo e mais conhecido lamento, o de Davi sobre Saul e Jônatas. Um exemplo claro de qinâ no contexto de pranto ritual pode ser visto depois da morte de Abner, em 2 Samuel 3.31 -35. “Disse, pois, Davi a Joabe e a todo o povo que com ele estava: Rasgai as vossas vestes, cingi-vos de panos de saco (spd) e ide pranteando diante de Abner. E o rei Davi ia seguindo o féretro. Sepultaram Abner em Hebrom; o rei levantou a voz e chorou (bkh) junto da sepultura de Abner; chorou também todo o povo. E o rei, pranteando (qnn) a Abner, disse: Teria de morrer Abner como se fora um perverso? As tuas mãos não estavam atadas, nem os teus pés, carregados de grilhões; caíste como os que caem diante dos filhos da maldade! E todo o povo chorou (bkh) muito mais por ele. Então, veio todo o povo fazer que Davi comesse pão, sendo ainda dia; porém Davi jurou, dizendo: Assim me faça Deus o que lhe aprouver, se eu provar pão ou alguma coisa antes do sol posto”. Além do qinâ como ponto culminante do pranto, deve-se observar os vbs. associados (spd, bkh) e as práticas relacionadas de rasgar as vestes, vestir panos de saco (tecido grosso usado junto à pele) e jejuar. Um exemplo interessante de qinâ no qual o conteúdo não é especificado aparece no relato de Crônicas da morte do rei Josias: “Jeremias compôs uma lamentação sobre Josias; e todos os cantores e cantoras, nas suas lamentações, se têm referido a Josias, até ao dia de hoje; porque as deram por prática em Israel, e estão escritas no Livro de Lamentações (qinôt)” (2Cr 35.25). Surgem, com isso, duas questões. Em primeiro lugar, apesar de nenhum desses lamentos ter sido preservado no AT, o retrato de Jeremias compondo lamentos pode ter contribuído para a tradição que atribui a ele o livro canônico de Lamentações. A LXX de Lamentações começa com uma frase imaginando Jeremias proferindo o que segue: “Depois o cativeiro de Israel e da desolação de Jerusalém, Jeremias encontrava-se assentado chorando e compôs esta elegia (ethrênêsen ton thrênon touton — Irêneo, trênos são os equivalentes G do heb. qônên e qinâ) sobre Jerusalém”. (-> Lamentações: Teologia) Em segundo lugar, diz-se que os lamentos sobre Josias tomaram-se uma prática regular em Israel. Talvez o costume fosse simplesmente para se lembrar de Josias, mas é possível que as palavras ditas originalmente sobre ele tenham sido reutilizadas para outras pessoas em ou tros contextos, uma vez que muitos provavelmente não eram capazes de compor suas próprias elegias. Por um lado, isso levou à prática de terem-se mulheres que se dedicavam a proferir lamentos elegíacos, que podiam liderar os outros em expressões apropriadas de tristeza (Jr 9.17, 20[16, 19]). Por outro lado, é provável que tanto essas mulheres quanto outras pessoas considerassem conveniente usar as formas já existentes de elegias. O lamento de Davi sobre Saul e Jônatas não apenas devia ser ensinado ao povo de Judá (2Sm 1.18); também no contex to de Macabeus, quando Judas Macabeus é morto “Todo o povo de Israel caiu na desolação e o chorou longamente, guardando o luto por vários dias, dizendo: Como sucumbiu o valente salvador de Israel?” (IMac 9.20, 21). A primeira linha do lamento indica fortemente a reutili zação das palavras famosas de Davi. O mesmo acontece na conclusão curiosa do qinâ de Eze quiel sobre os príncipes de Israel: “Esta é uma lamentação e ficará servindo de lamentação” (Ez 19.14). E possível que em alguma ocasião subseqüente ao uso original do material por 847
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Ezequiel, a elegia tenha sido considerada apropriada para o uso com referência a líderes de Israel em outros contextos. b. 'bl I, prantear, observar ritos de pranto (-> # 61). Uma das palavras mais comuns de lamentação é 'bl, com o vb. abai, o adj. 'ãbêl e o subs. 'êbel. O mais freqüente é o vb. no hitp., caso no qual as pessoas são sempre o sujeito (quando o vb. encontra-se no q., é usado muitas vezes de modo metafórico). Seu significado é mais amplo que chorar (bkh), pois se refere à pratica de prantear em sua totalidade e em suas diversas manifestações, com freqüência durante um período prescrito. Dois exemplos claros, dentre muitos outros, encontram-se em Gênesis. Em primeiro lugar, observe-se a reação de Jacó diante da suposta morte de José (Gn 37.34-35): “Então, Jacó rasgou as suas vestes, e se cingiu de pano de saco, e lamentou ( 'bl, hitp.) o filho por muitos dias. Levantaram-se todos os seus filhos e todas as suas filhas, para o consolarem; ele, porém, recusou ser consolado e disse: Chorando ( 'ãbêl), descerei a meu filho até à sepul tura. E de fato o chorou {bkh) seu pai.” Uma vez que o pranto durava um período prescrito (Dt 34.8; 2Sm 11.27), a natureza imoderada da reação de Jacó diante da suposta morte de seu filho predileto é indicada pela recusa em reconhecer o limite de tempo para o pranto. Em segundo lugar, vê-se a reação de José e dos egípcios na ocasião da morte de Jacó (Gn 50.3, 10-11): “E os egípcios choraram (bkh) setenta dias... [Em seguida, Jacó é levado para ser sepultado em Canaã]... Chegando eles, pois, à eira de Atade, que está além do Jordão, fizeram ali grande e intensa lamentação (spd mispêd); e José pranteou ( 'êbel) seu pai durante sete dias. Tendo visto os moradores da terra, os cananeus, o pranto ( 'êbel) na eira de Atade, disseram: Grande pranto ( 'êbel) é este dos egípcios. E por isso se chamou aquele lugar de Abel-Mizraim. que está além do Jordão". (Abel-Mizraim significa pranto dos egípcios, mas nesse caso, ocorre um trocadilho em hebraico. A forma do nome é paralela a outros nomes de lugares do AT que começam com 'ãbêl, p. ex., Abel-Meolá [Jz 7.22; 1Rs 19.16; cf. Nm 33.49; Jz 11.33; IRs 15.20] em que o termo 'ãbêl pode significar “córrego”. Assim, um lugar que normalmente estaria associado com os egípcios em termos um tanto vagos recebe um signifi cado diferente ao ser associado com a tradição marcante dos egípcios pranteando o antepas sado epônimo de Israel.) c. spd, som de lamento, prantear (# 6199). Outro termo importante para o pranto é spd, com o vb. s p d e o subs. mispêd (# 5027). Ao que parece, o principal significado é de lamento choroso, ou seja, a expressão de clamores ou exclamações que não tinham por intenção ser um qinã mais formal. Dois exemplos claros podem ser encontrados em Jeremias. Por um lado, Zedequias recebe a promessa de que será honrado em sua morte e todos os em Judá o “prantearão, dizendo: Ah! Senhor!” (Jr 34.5). Por outro lado, diz-se do corrupto e opressivo Jeoaquim que em sua morte “Não o lamentarão (spd), dizendo: Ai, meu irmão! Ou: Ai, minha irmã! Nem o lamentarão (spd), dizendo: Ai, meu Senhor! Ou: Ai, sua glória!” (Jr 22.18). Nesse último texto, o uso de “minha irmã” ( 'ãhôt, irmã) é surpreendente no contexto de Jeoaquim, uma vez que di ficilmente poderia ser chamado desse modo. E provável que o profeta esteja citando as palavras bondosas usadas de um modo geral em sepultamentos (talvez pelos pranteadores uns para com os outros, bem como em relação ao falecido), sendo que a falta destas indicará a anormalida de do sepultamento não pranteado de Jeoaquim. Em ambas as passagens e cm 1 Reis 13.30 e Amós 5.16, em que são dados outros exemplos de spd, é sempre usado o termo heb. hôy (em Am 5.16 é usado hô). Trata-se de um termo claramente onomatopéico e em nossa língua, uma tradução menos formal do que “ai”, talvez “ah” ou “oh”, pode captar mais precisamente seu significado ao descrever o tipo de som articulado. Normalmente, quando spd é usado, não é apresentada nenhuma indicação do conteú do e a palavra aparece em conjunto com outros termos relacionados. Além de Gênesis 50.10 848
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e 2 Samuel 3.31, já citados anteriormente, pode-se observar a reação inicial de Davi e seus homens à morte de Saul e Jônatas quando spd é associado à prática de se rasgar as roupas, chorar (bkh) e jejuar (2Sm 1.11 -12) ou ainda, ver Jeremias convocando o povo: “cinge-te de cilício e revolve-te na cinza; pranteia (mispêd) como por filho único, pranto ( ’bí) de amargu ras” (Jr 6.26). E possível que spd indicasse também algum tipo de movimento bem como o som de choro, pois em duas ocasiões, o termo é contrastado com dança (SI 30.11 [12]; Ec 3.4) e é intrinsecamente provável que as expressões de lamento fossem acompanhadas de gestos demonstrando perturbação. d. bkh, chorar, lamentar (# 1134). A outra palavra mais comum no contexto do pranto é bkh, chorar, verter lágrimas, bem como seu subs. associado bek í (também bekeh. bãkút, bekit, sendo que cada um deles aparece somente uma vez). E evidente que o choro é um fenômeno humano que ocorre numa grande variedade de situações, sendo que muitas não se encontram relacionadas ao pranto em si. Assim, a esposa de Sansão o persuade com lágrimas (Jz 14.1617), Ana chora quando Penina a insulta por causa da esterilidade (1 Sm 1.7-8) e a Palticl só resta chorar em meio ao desamparo quando sua esposa Mical é tomada dele por pessoas poderosas (2Sm 3.14-16). Porém, bkh também é usado com freqüência em conjunto com outros termos para pranto. Além das passagens citadas acima, pode-se observar Davi chorando pela morte de Absalão (bkh, 'bl, hitp., 2Sm 18.33; 19.1 [19.1-2]), a angústia de Jeremias pelo estado de solado do território de Judá: “Pelos montes levantarei choro (beki) e pranto (nehí) e pelas pas tagens do deserto, lamentação (qinâ)" (Jr 9.10 [9]); ou a tristeza imaginária de Raquel quando Israel está sendo levada para o exílio: “Ouviu-se um clamor em Ramá, pranto (nehí) e grande lamento(Z>eA:/); era Raquel chorando (bkh) por seus filhos” (Jr 31.15). e. Termos auxiliares. É natural encontrar termos referentes a lágrimas (dim ’â\ # 1965) numa relação muito próxima com chorar (beki). dim ‘á é usado, por vezes, em conjunto com os termos observados anteriormente (p. ex., Jr 31.16; Ez 24.16), mas não possui nenhuma re levância independente para nosso assunto em questão. Uma palavra mais comum que parece significar lamento choroso é o vb. nhh I (# 5629) juntamente com o subs. neh i(# 5631). Além do uso observado no parágrafo anterior, é empregado três vezes, por exemplo, em conjunto com qinâ em Jeremias 9.17-21 [16-20], Mais uma vez, o termo não tem nenhuma relevância independente. Da mesma forma, o radical qdr, que significa escuro e é usado metaforicamente para prantear, supostamente com referência à expressão e às vestes do pranteador (p. ex., SI 35.14; 42.9 [10]; 43.2), não possui uma relevância independente. Há quatro vbs. importantes, cada um associado a subs., que indicam formas diversas de clamar e são por vezes empregados com os radicais mencionados acima. i. y ll (hi.), bramir, la mentar com choro (-> # 3536). O vb. ocorre apenas em textos proféticos e, surpreendentemente, nunca é usado para a prática de prantear os mortos, apesar de, em certas ocasiões, acompanhar spd (p. ex., Jr 4.8; Mq 1.8). ii. sxv' (pi.), clamar por socorro (# 8775). O vb. quase sempre tem Deus como objeto e é relevante principalmente para o lamento no sentido mais amplo de apelo a Deus em tempos de dificuldades (p. ex., Jó 19.7; Hc 1.2). iii. z ‘<7, clamar (-> # 2410), usado numa grande variedade de contextos, muitas vezes para clamar a Deus em oração. Pode ser empregado no contexto de lamento (p. ex., Davi por Absalão, 2Sm 19.4 [5]) e na lamentação a Deus num sentido mais amplo (p. ex., Êx 2.23; Hc 1.2 , em que cada ocorrência é acompa nhada de sw'). iv. í 'q I, clamar (-> # 7590), que é uma variação de z ‘q e não possui relevância quando aparece sozinho. (Para mais sobre esses dois últimos radicais, ver R. N. Boyce, The Cry o f God in the Old Testament, SBLDS 103, 1988.) Por fim, além do uso ocasional de ’nh (-> # 627) como termo geral para pranto (p. ex., Is 3.26, em que é paralelo a ’bl), há quatro radicais que expressam lamento, clamor choroso 849
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ou clamor de ansiedade, sendo que cada um ocorre apenas uma vez e não possui significa do independente: ybh (# 3291; Jz 5.28), ’lh (# 458; J1 1.8), nhg (# 5628; Na 2.7 [8 ]) e dmm (# 1958; Is 23.2). 3. O rimai de pranto no AT. Como ficou evidente, o contexto de pranto, do qual qí fazia parte, envolvia uma série de práticas relacionadas. A fim de apresentar todas as evidên cias mais importantes, será de grande ajuda citar quatro passagens proféticas, sendo que cada uma delas retrata uma situação de pranto. a. A advertência sobre o julgamento vindouro em Amós 8.10: “Converterei as vossas festas em pranto e todos os vossos cânticos em lamentações (qínâ)', porei pano de saco sobre todos os lombos e calva sobre toda cabeça; e farei que isso seja como pranto ( ’bl) por filho úni co, pranto cujo fim será como dia de amarguras (mar)". Pode-se observar que a antítese entre festas religiosas (hag) e pranto ( ’b!) confirma o sentido de ’bl como algo que dura um período determinado e retrata, no mínimo, tanto comportamento público visível quanto sentimento in terior. Além disso, por vezes qínâ é traduzido incorretamente como choro (termo para o qual o heb. seria l&kf); o fato é que o cântico, que no contexto de uma festa normalmente seria ale gre, se tomará um tipo específico de canto, o lamento fúnebre ou elegia (como foi observado acima, o qínâ é uma composição poética, diferente dos clamores breves descritos por spd). Por fim, o pranto será particularmente triste, pois será como o choro pela morte de um filho único, o qual, para uma família da antigüidade representava o bem mais precioso e esperança para o futuro. Essa tristeza excepcional também é mencionada em Jeremias 6.26 e Zacarias 12.10, sendo que, nesses dois casos, assim como em Amós 8 .10, é usada alguma forma de mrr para retratar o quanto é terrível a situação. b. O Senhor proíbe Jeremias de participar de práticas formais de pranto na ocasião vin doura de tragédia e morte em Judá: “Porque assim diz o Senhor: Não entres na casa do pranto (marzêah), não vás a lamentá-los (spd), nem te compadeças deles; porque deste povo retirei a minha paz, diz o Senhor, a benignidade e a misericórdia. Nesta terra, morrerão grandes e pe quenos e nâo serão sepultados; não os prantearão (spd), nem se farão por eles incisões, nem por eles se raparão as cabeças. Não se dará pão (tradução de lehem, cf. LXX artos, em vez do TM lãhem) a quem estiver de pranto, para consolá-lo por causa de morte; nem lhe darão a beber do copo de consolação, pelo pai ou pela mãe” (Jr 16.5-7). Esse texto apresenta várias dificulda des e faremos apenas dois comentários, i. O significado de marzêah é controverso, apesar de referir-se claramente à prática comunitária associada ao pranto. A interpretação do termo como uma refeição já é sugerida pela LXX (thiasos, banquetear) e geralmente é a preferida hoje em dia; uma alternativa possível é alto clamor. A única outra ocorrência da palavra (em Amós 6.7) não esclarece seu significado. Não fica claro de que modo tal refeição pode ser relacionada à pratica de jejuar no contexto do pranto (p. ex., 2Sm 1.12; 3.35; 12.15-23). É possível que as práticas apresentassem variações nos diversos períodos históricos e localizações geográficas, ii. O sentido exato de se oferecer comida aos que estâo pranteando não é evidente, sendo ainda mais obscura a relação com uma refeição funeral. Porém, sabe-se ao menos que algumas das necessidades básicas da vida, como comer e beber, adquirem formas e significados distintos no contexto do pranto quando sua prática normal é suspensa. c. Numa passagem não muito diferente daquela citada com referência a Jeremias, o Senhor diz a Ezequiel para não chorar por sua esposa quando ela morrer: “Filho do homem, eis que, às súbitas, tirarei a delícia dos teus olhos, mas não lamentarás (spd), nem chorarás (bkh), nem te correrão as lágrimas (dim 'a). Geme em silêncio, não faças lamentação pelos mortos ( ’bl), prende o teu turbante, mete as tuas sandálias nos pés, não cubras os bigodes e não comas o pão [dos pranteadores] que te mandam.” (Ez 24.16-17; cf. vv. 22-23). Vemos aqui os elemen 850
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tos comuns com exceção de qinâ, que não precisa ser especificado como uma prática proibida nesse caso, pois estaria automaticamente excluído caso os elementos mais básicos do pranto não estivessem presentes. A referência a não derramar lágrimas parece redundante depois da proibição de chorar, e é omitida na LXX; caso se mantenha o TM, então bkh nesse contexto poderá denotar gemer ou soluçar e o derramamento de lágrimas poderá referir-se a algo silen cioso. Supõe-se que a remoção do turbante tivesse a finalidade de deixar o cabelo solto como sinal de anormalidade, com a possibilidade ainda de espalhar pó e cinzas sobre a cabeça (cf. Jó 2.12). A remoção dos sapatos e a cobertura da parte inferior do rosto são atestadas em outras passagens no contexto de tristeza profunda (ISm 15.30; Mq 3.7), sendo que seu significado exato é incerto, porém mais uma vez, o que está em questão é a suspensão do comportamento normal como parte do pranto. d. Ezequiel imagina marinheiros lamentando a queda de Tiro, um centro de comé marítimo: “Farão ouvir a sua voz sobre ti e gritarão (z 'q) amargamente; lançarão pó sobre a cabeça e na cinza se revolverão; far-se-ão calvos por tua causa, cingir-se-ão de pano de saco e chorarão (bkh) sobre ti, com amargura de alma, com amargura e lamentação (mispêd). Levantarão lamentações sobre ti no seu pranto [lit. com lamento choroso (nPhi) erguerão um lamento (qinâ) por ti], lamentarão (qônên) sobre ti, dizendo: Quem foi como Tiro, como a que está reduzida ao silêncio no meio do mar?” (Ez 27.30-32). Trata-se de uma boa ilustração de como o ponto culminante do ritual todo podia ser a elocução de uma elegia sobre quem havia morrido. 4. Tendo em vista esse material a respeito de qinâ no contexto da prática do pra pode-se fazer quatro observações: a. Com referência ao ritual de pranto em si, fica claro que havia variações consideráveis disso em Israel. Práticas mencionadas em alguns contextos, como andar descalço (2Sm 15.30; Ez 24.17), rasgar as vestes (2Sm 3.31; Jó 1.20) ou vestir panos de saco (2Sm 3.31; Ez 27.31) não aparecem em outros. Esse silêncio pode indicar que tais práticas eram tomadas por certo, mas pode também significar que não ocorriam. Algumas práticas parecem incompatíveis entre si, como jejuar (2Sm 1.12; 3.35) e banquetear (Jr 16.7; Ez 24.17); apesar de ser perfeitamente possível colocá-las em seqüência, primeiro o jejum e depois o banquete (e tal seqüência é intrinsecamente possível), o texto não as combina dessa forma e é provável que fossem práticas distintas em diferentes contextos. Além disso, a prática de rapar a cabeça (cf. cortar-se, Jr 16.6; 41.5), que é mencionada como sendo aparentemente comum em Isaías 3.24; 15.2 (em Moabe) 22.12; Jeremias 16.6 Eze quiel 7.18; 27.31; Amós 8 .10, e que é parte da reação de Jó, um paradigma desse ritual (Jó 1.20), é proibida em Deuteronômio 14.1 (cf. Lv 19.28; 21.5, que também proíbe o ato de cortar-se). Não fica clara qual seja a relação entre as práticas e as proibições. Em termos gerais, é evidente que, na intensidade do momento, as expressões de tristeza podem tomar-se excessivas e não chega a surpreender que a lei normativa de Israel apresentasse certas restrições. Com referência à pratica de cortar-se, não é de admirar que fosse considerada indesejável (independentemente de sua associação com os profetas de Baal, 1Rs 18.28, ou qualquer outra associação simbólica possível). A situação com referência a raspar a cabeça é mais complexa, pelo simples fato de que há uma variedade enorme de coisas que se pode fazer com os cabelos e pelo fato de estes terem tantos significados simbólicos diferentes (como fica visível de imediato ao considerar-se o nazireu Sansão e as restrições de Paulo [ICo 11.14]). Não fica claro de que modo a proibi ção de, lit., “fazer calva sobre a testa” (cf. Dt 14.1), o que pode ser entendido como um tipo de corte simbólico e parcial do cabelo na testa, se relaciona com as referências gerais à calvície ou a rapar o cabelo de outras partes. Ainda assim, em seu contexto, Deuteronômio 14.1 dá a impressão de que certo tipo de integridade seja apropriado para os israelitas como filhos do Senhor e que cortar a pele ou o cabelo no contexto do pranto seja um gesto associado a práticas 851
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que (por representarem uma diminuição da vitalidade dos que estão vivos?) não estão dentro da visão deut. da posição de Israel sob o govemo de Deus. Em resumo, a natureza precisa do ritual de pranto variava claramente tanto em termos de tempo quanto de lugar, mas, em geral, o AT apresenta uma impressão coerente das práticas que rompem as rotinas normais da vida. b. Há também a questão do significado das práticas de pranto. Apesar de o pranto ( ’bí) acompanhado de choro (bkh) e lamentação, por meio de clamores exclamativos (mispõd) ou de elegia (qinâ), não precisar de muitos comentários, há certas práticas relacionadas a ele so bre as quais é preciso que se faça algumas observações. Em parte alguma, o AT explica o sig nificado de nenhuma de suas práticas de pranto, e os historiadores da religião sugerem com certa freqüência que as origens dessas práticas podem estar ligadas a oferendas para os mortos, comunhão com eles, apaziguamento dos que faleceram ou disfarces para que os pranteadores não sejam reconhecidos pelos mortos. Porém, qualquer que seja a possível origem hipotética, o AT transmite a impressão de que todas as suas práticas de pranto fazem parte de um ritual importante no qual o pranteador expressa sua tristeza, envolvendo toda a sua pessoa nessa ex pressão. A tolerância do desconforto físico, p. ex., ao vestir panos de saco e jejuar, pode repre sentar um meio realista de se quebrar as rotinas a fim de expressar devidamente e vivenciar a mais profunda tristeza. Além disso, a natureza pública dc grande parte do ritual de pranto acrescentava a ele uma dimensão importante. Significava que o pranto era comunitário e não apenas individual, que estava dentro de costumes passados de uma geração para a outra ao lon go do tempo, de modo que podia haver uma sensação implícita de tradição que transcendia o contexto presente. A observância plena do ritual de pranto durante um período prescrito podia ainda permitir a adaptação psicológica a uma vida normal com uma probabilidade menor de uma perturbação mais duradoura, ainda que, obviamente isso jamais pudesse ser tomado por certo (como mostra o exemplo de Jacó [Gn 37.34-35]). c. O reconhecimento dos padrões habituais de pranto pode expandir a compreensão de quanto era extraordinária a interrupção causada por esse ritual no AT. Jó perde tudo o que tem, uma perda que chega ao auge com a morte dos filhos dele (Jó 1. 13- 19). Suas primeiras ações, ao rasgar as vestes e rapar a cabeça, devem dar início a um ritual normal de pranto. Até mes mo o gesto de lançar-se por terra pode ser parte comum desse ritual (cf. Ez 27 .30). Mas então, exatamente no ponto em que se pode esperar a elocução de um lamento, encontramos, de fato, uma elocução poética — mas, em vez de ser uma elegia de grande tristeza, encontramos uma profunda expressão de confiança e louvor (Jó 1.21). Tal transformação do padrão habitual res salta a natureza excepcional e, por certo, inigualável, da resposta de Jó a Deus. Apesar de Jó lamentar-se posteriormente (e talvez a aparição de seus amigos [2.11] seja a primeira atestaçâo da prática tradicional judaica da família reunir-se ao redor daquele que está de luto, sendo que nesse caso os amigos assumem o lugar da família que foi exterminada), isso não deve diminuir a relevância de seu retrato inicial. d. Resta, ainda, a questão de qual deve ser o significado — caso esse exista — da des crição do pranto no AT para a fé cristã de hoje (a situação é diferente no caso do judeu, para o qual as práticas bíblicas foram completamente moldadas em termos rabínicos de modo a cons tituir um ritual sábio e ressoante, apesar de, mesmo assim, os problemas de tais práticas no mundo moderno serem ainda maiores; ver Lamm). E fácil supor-se que esse ritual não tenha relevância alguma para a atualidade. Por um lado, a fé cristã concentra-se na ressurreição de Jesus, espera pela vida depois da morte, esperança que é atestada apenas de modo secundário no AT (esp. Is 26.19; Dn 12.2, ficando possivelmente implícita em alguns salmos, p. ex., SI 17.15; 73.24). Por outro lado, a prática do pranto em Israel era parte de um padrão social e re ligioso muito mais amplo do mundo antigo, um padrão que é devidamente atestado em outros 852
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textos da antigüidade e é de duvidar-se de que qualquer uma das características mencionadas acima fosse, de algum modo, exclusiva a Israel. Além disso, nenhuma parte do material que consideramos encontra-se relacionada com princípios teológicos significativos e nenhuma das práticas foi, em momento algum, prescrita como sendo de importância religiosa (ainda que, como foi observado, duas dessas práticas tenham sido prescritas). Ou seja, a prática de pran tear era simplesmente uma parte da vida na antigüidade. O fato de ela ser apresentada no AT pode nâo ser mais significativo para a fé cristã do que, por exemplo, o fato de cultivar vinhas ou falar hebraico. A fim de buscar uma relevância contemporânea, deve-se considerar que esta prova velmente encontra-se na maneira geral como a avaliação de períodos históricos, que não os nossos próprios, podem lembrar-nos de coisas que, então, eram tidas como naturais e que pos sivelmente eram feitas dc modo bastante distinto em outras culturas; e, a fim de se procurar fazer uma comparação avaliatória, pode acontecer de não ser a outra cultura a ficar na posição desfavorável. Não há como se reproduzirem as práticas de pranto do OMA com sua forma e força no Ocidente moderno. E, no entanto, numa cultura que mostra fortes tendências a ser individualista, sem raízes, apressada e, muita vez, confusa quanto à reação apropriada para a morte, uma reflexão sobre as práticas comunitárias, tradicionais e morosas da Israel antiga (e de seus vizinhos) pode talvez indicar que uma certa sabedoria pragmática se perdeu e precisa ser resgatada. 5. O pranto como metáfora religiosa no AT. Até aqui, consideramos o lamento em contexto primário do pranto comum. Muitas vezes, porém, na linguagem do AT, o pranto é usado no contexto da humilhação própria do homem diante de Deus. Isso porque a tristeza pela morte ou tragédias pode naturalmente ser muito próxima da tristeza pelos pecados do passado — tanto o remorso (tristeza sem a decisão de mudar), quanto o arrependimento (tris teza com a determinação de mudar) — ou da ansiedade com relação a uma ameaça futura. A premissa básica é de que, assim como o pranto requer a suspensão das atividades normais e um envolvimento pessoal total na expressão da tristeza, o mesmo se aplica a buscar a Deus, especialmente em momentos de crise, o que pode ter um alto preço. E possível que as pessoas tenham que optar por abrir mão de passatempos e prazeres legítimos a fim de permitir que sua busca por Deus seja aprofundada por meio de sua expressão em formas que implicam intrinsecamente grandes exigências. Num contexto de comemoração inoportuna em Jerusalém, Isaías diz: “O Senhor, o Senhor dos Exércitos, vos convida naquele dia para chorar (bkh), prantear (spd), rapar a cabeça e cingir o cilício. Porém é só gozo e alegria que se vêem...” (Is 22.12-13). Temos aí a terminologia co nhecida usada para a necessidade de Judá de tomar medidas drásticas a fim de buscar a Deus, apesar de o povo não mostrar-se disposto a dar ouvidos à mensagem do profeta. Uma linguagem semelhante é usada em resposta à praga de gafanhotos em Joel: “Cingivos de pano de saco e lamentai (spd), sacerdotes; uivai (ylt), ministros do altar; vinde, ministros de meu Deus; passai a noite vestidos de panos de saco” (1.13). “Ainda assim, agora mesmo, diz o Senhor: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração; e isso com jejuns, com choro e com pranto. Rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao Senhor, vosso Deus” (2.12-13). “Chorem os sacerdotes, ministros do Senhor, entre o pórtico e o altar, e orem: Poupa o teu povo, ó Senhor” (2.17). Quando o profeta declara “Rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes”, é pouco provável que esteja dizendo que o ato de rasgar as vestes não tem seu devido lugar. Antes, o ato público e simbólico só tem significado se estiver acompanhado de um quebrantamento interior diante de Deus. A maneira hebraica de dizer que “A é mais importante que B” muitas vezes é dizer “não B, mas A”, como cm Oséias 6 .6 : “Pois misericórdia quero, e 853
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não sacrifício” (c.f., SI 51.16-19 [18-21]). Semelhantemente, quando em Deuteronômio Moi sés fala da prioridade da circuncisão do coração (Dt 10.16; 30.6), não há motivo para supor que a circuncisão do prepúcio tivesse sido, com isso, suspensa. A questão é sempre a crítica à tendência humana de cumprir os rituais sem a presença de uma realidade interior que confere ao ato público o seu significado. No contexto religioso, o simples cumprimento dos rituais (o que talvez seja outra for ma de distinguir-se o remorso do arrependimento), parece uma forma natural de interpretar o choro (bkh) de Israel diante de Deus em várias ocasiões, especialmente em Juizes (p. ex., Jz 2.4-5; 20.23; 21.2; cf. Nm 25.6). A necessidade de se usar de discernimento fica particularmen te clara em Jeremias 3.21— 4.4 (cf. 14.7-10). O povo é descrito se entristecendo: “Nos lugares altos, se ouviu uma voz, pranto (bkh) e súplicas dos filhos de Israel; porquanto perverteram o seu caminho e se esqueceram do Senhor, seu Deus”, mas a resposta imediata é que devem se arrepender/voltar (swb), “Voltai, ó filhos rebeldes”. O povo responde afirmativamente: “Eisnos aqui, vimos ter contigo; porque tu és o Senhor, nosso Deus... porque temos pecado contra o Senhor, nosso Deus”; mais uma vez, porém, é lançado o desafio de que deve ser um ato ge nuíno: “Se voltares. ó Israel, diz o Senhor, volta para mim; se removeres as tuas abominaçôes de diante de mim, nâo mais andarás vagueando...” Por vezes, porém, os escritores do AT deixam claro que as lágrimas derramadas diante dc Deus são sinceras e verdadeiras. Por exemplo, quando Isaías disse a Ezequias que o rei iria morrer: “Então, virou Ezequias o rosto para a parede e orou ao Senhor, dizendo: Lembra-te, Senhor, peço-te, de que andei diante de ti com fidelidade, com inteireza de coração, e fiz o que era reto aos teus olhos; e chorou (bkh) muitíssimo”. Ao que Deus respondeu: “Ouvi a tua oração, e vi as tuas lágrimas (dini a); eis que eu te curarei” (2Rs 20.2-3, 5 || Is 38.2-3, 5). Em outra ocasião, quando os habitantes de Judá se comovem profundamente ao ouvir a Lei sendo lida para eles, Neemias dá uma resposta memorável: “Este dia é consagrado ao Senhor, vos so Deus, pelo que não pranteeis ( ’bl, hitp.), nem choreis (bkh). Porque todo o povo chorava (bkh), ouvindo as palavras da Lei. Disse-lhes mais: ide, comei cames gordas, tomai bebidas doces e enviai porções aos que não têm nada preparado para si; porque este dia é consagrado ao nosso Senhor; portanto, não vos entristeçais, porque a alegria do Senhor é a vossa força” (Ne 8.9-10). 6. O lamento no sentido moderno de clamar-se a Deus num momento de dificuldade. reflexão sobre o pranto como metáfora religiosa conduz naturalmente a uma consideração do lamento no seu uso acadêmico atual, como voltar-se para Deus em oração num momento de afli ção. Trata-se de algo que de nenhum modo está limitado ao contexto religioso e social do mundo antigo, mas que é uma questão de relevância permanente para a vida de fé. (-> Oração) E apropriado, a princípio, colocar esse lamento num contexto geral. Apesar de o AT ressaltar constantemente a importância da confiança (bth, # 1053), da fé ( ‘mn, -> # 586) e da obediência (sm ', # 9048) como uma caracterização da resposta humana sincera a Deus, a apresentação canônica é tal que esses elementos não são concebidos de maneira simplista, como se a vida fosse, essencialmente, uma questão de “obedecer ordens” . Antes, vê-se repeti damente uma descrição da vida com Deus como tendo espaço para um diálogo com ele, tendo lugar para perguntas e respostas. A obediência a Deus deve ser colocada num contexto de um relacionamento inteligente e não estúpido. a. Abraão é conhecido como modelo de fé. E, no entanto, sua resposta às palavras ve mentes de garantia de Deus é: “Senhor Deus, que me haverás de dar, se continuo sem filhos...?” (Gn 15.1 -2). E quando Deus faz uma promessa firme a Abraão, “Eu sou o Senhor, que te tirei de Ur dos caldeus, para dar-te por herança esta terra”, Abraão não responde com sujeição afável; 854
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em vez disso, pergunta: “Senhor Deus, como saberei que hei de possuí-la?” (15.7-8). É impres sionante que, em nenhuma das ocasiões. Deus demonstra nenhuma irritação com a reação de Abraão. Antes, leva suas perguntas a sério e as responde de modo apropriado. Numa situação de perplexidade, em que o cumprimento da promessa é difícil de ser imaginado, questionar a Deus é considerado algo perfeitamente legítimo. Também pode ser importante observar-se que, quando a história de Abraão é contada em Gênesis, essas palavras de questionamento são as primeiras palavras, entre as que Abraão dirige a Deus, cujo conteúdo é especificado no texto. b. Moisés é aquele que institui a religião de Israel e, na narrativa de seu chamado, ele é retratado como o exemplo supremo dos profetas de Israel que irá tanto falar como agir em nome do Senhor (Ex 3.1-4, 17). E, no entanto, a reação de Moisés à comissão de confrontar o Faraó do Egito e tirar de lá o povo de Israel — a tarefa mais assustadora que se pode imaginar — é de apresentar uma série de quatro objeções ou desculpas. Em cada uma delas. Deus leva as palavras de Moisés a sério e as responde em seus próprios termos, irando-se somente quando a hesitação de Moisés transforma-se em recusa total (4.13-14). Apesar de, depois das duas pri meiras perguntas (3.11,13), Deus repetir sua ordem a Moisés, dizendo-lhe “Vai” e oferecendolhe mais palavras de garantia (3.16-22), Moisés persiste em seu tema de inadequação pessoal e hesitação (4.1, 10), mas até esse momento, Deus não demonstra ira. Tanto Abraão quanto Moisés são mostrados em situações difíceis e não há nenhuma impressão de que foi impróprio questionarem Deus sobre elas. Uma dinâmica semelhante pode ser observada nas histórias de Gideão (Jz 6.11-24) e Samuel (ISm 16.1-3). Uma evolução natural dessa consciência de propriedade do questionamento de Deus em situações difíceis é a forma ainda mais específica de questionamento quando as coisas pa recem estar dando errado, ou seja, o lamento. O primeiro lamento da história de Israel vem dos lábios de Moisés. Depois de ser comissionado pelo Senhor, Moisés confronta Faraó com um discurso profético cheio de segurança: “Assim diz o Senhor, Deus de Israel: Deixa ir o meu povo...” (Ex 5.1). Infelizmente, Faraó não se impressiona nem um pouco e rejeita duramente as palavras de Moisés (5.2). Moisés tenta formular um discurso mais flexível (5.3), mas é igual mente malsucedido. Na verdade, a única resposta de Faraó é tomar a vida do povo de Israel ainda mais difícil num ato de opressão cínica que leva os líderes de Israel a se queixarem de Moisés (5.4-21). Esse é justamente o contexto no qual se poderia esperar que Deus, que havia se revelado há tão pouco tempo a Moisés como o Senhor, começasse a agir com poder. E, no entanto, não há menção alguma da ação de Deus na história e o Senhor parece conspícuo por sua ausência. Uma promessa divina (3.8, 10), a obediência humana e grandes expectativas (4.29-31) — seguidas de decepção, quando Deus dá a impressão de estar ausente. É natural que essa situação dê origem a um lamento (ainda que não seja usado nenhum termo específico para designá-lo. O vb. com o qual Moisés se dirige a Deus é um vb. comum para o ato de fa lar, ’mr): “Então, Moisés, tornando-se ao Senhor, disse: O Senhor, por que afligiste este povo? Por que me enviaste? Pois, desde que me apresentei a Faraó, para falar-lhe em teu nome, ele tem maltratado este povo; e tu, de nenhuma sorte, livraste o teu povo” (5.22-23). Deus não se explica nem se justifica, mas tranqüiliza Moisés (6.1-8) e, no devido tempo, a promessa de Deus começa a se cumprir. c. Esse retrato impressionante da natureza possivelmente problemática da vida com Deus se repete em várias outras partes do AT. O livro de Isaías contém o testemunho pessoal extraordinário do servo do Senhor: “e me disse: Tu és o meu servo, és Israel, por quem hei de ser glorificado. Eu mesmo disse: debalde tenho trabalhado, inútil (hebel) e vãmente gastei as minhas forças” (Is 49.3-4). Ou seja, o servo havia sido comissionado com uma promessa de ser um canal para a glória do Senhor. Mas ao fazer uma retrospectiva do seu ministério até então. 855
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não consegue ver coisa alguma que valha a pena, de modo que caracteriza seu trabalho com o termo hebel, que é usado de modo mais conhecido como a palavra que dá o tom do retrato de Eclesiastes de uma vida sem sentido ou fútil (Ec 1.2). E, no entanto, sendo uma pessoa de fé, o servo nâo se desespera, mas prossegue com palavras de esperança: “todavia, o meu direito está perante o Senhor, a minha recompensa, perante o meu Deus” (Is 49.4b). d. Menos conhecido, talvez em função de seu contexto e texto difíceis, é o lamento que aparece numa passagem anterior do livro de Isaías: “Como a mulher grávida, quando se lhe aproxima a hora de dar à luz, se contorce e dá gritos nas suas dores, assim fomos nós na tua presença, ó Senhor! Concebemos nós e nos contorcemos em dores de parto, mas o que demos à luz foi vento; não trouxemos à terra livramento algum, e não nasceram moradores do mundo” (Is 26.17-18). A tradução “na tua presença” provavelmente é incorreta, constituindo uma tradu ção natural de lepãneykã, enquanto o TM mippãneykã costuma ser causativo, “por causa de ti”. A última linha depende da interpretação do TM yippe hi, lit., “eles caem”, sendo que a versão acima parte do pressuposto de que dentro da metáfora do parto, trata-se de uma expressão para a criança que “cai” para fora no momento do nascimento. Essa idéia, porém, é forçada, sendo preferível o sentido literal, “e os povos do mundo não cairão”. Da mesma forma, o tempo do vb. precedente indica a tradução “nâo traremos salvação à terra”. Ao que parece, essa é uma referência à queda das nações incrédulas do mundo, com sua respectiva submissão a Israel (c. f. 45.14). A questão central do lamento, portanto, é que o povo de Deus suportou grande dor e angústia por causa do Senhor, talvez especificamente em função de alguma promessa daquilo que o povo faria por Deus, o que deu ao povo esperanças e expectativas elevadas. No entanto, o resultado de toda a angústia dos israelitas, tâo dolorosa quanto dar à luz, ainda não foi a alegria de uma nova vida. mas sim a decepção. A agonia deles não produziu coisa alguma, nada mudou e não vêem nenhuma perspectiva de realizar o tipo de transformação no mundo que haviam esperado como resultado de todo o seu trabalho. Não se trata, porém, da última palavra, pois se segue uma passagem de tranqüilização quanto aos propósitos do Senhor (26.19-21) e, perto do final de toda a coleção profética, a mesma metáfora de nascimento é retomada de maneira afirmativa e cheia de alegria (66.7-11). Ainda assim, fica claro que lidar com a decepção e falar com Deus sobre ela faz parte da vida de fé. e. Os lamentos mais conhecidos fora do livro de Salmos encontram-se no livro de Jere mias (para um guia de estudos recentes mais extensos, ver McConville, cap. 3). A interpretação das chamadas “confissões” de Jeremias (Jr 11.18; 12.6; 15.10-21; 17.12-18; 18.18-23; 20.7-18) é problemática, uma vez que, no contexto do livro de Jeremias como um todo, essas parecem tomar a situação de Jeremias paradigmática em certos sentidos, tanto com relação ao povo de Judá quanto com relação ao julgamento do Senhor e a angústia referente a ambos. Ainda as sim, essas dimensões não negam a validade de se interpretar os textos dentro dos termos do próprio ministério de Jeremias. Nessas confissões encontramos um profeta cujo ministério não produz resultado algum a nâo ser o escárnio, o abuso e a perseguição. Na angústia decorrente, ele volta-se para o Senhor, por vezes em tom repreensivo: “Por que dura a minha dor continuamente, e a minha ferida me dói e não admite cura? Serias tu para mim como ilusório ribeiro, como águas que enganam?” (Jr 15.18; contrastar com 2.13 quando Israel é repreendida por abandonar o Senhor que é fonte de água viva). Apesar de haver, em algumas ocasiões, palavras de tranqüilização do Senhor, a tendência é que sejam um tanto bruscas (12.5-6; 15.19-21). Na última ocasião em que Jeremias fala por si mesmo, chega ao extremo de amaldiçoar o dia de seu nascimento, terminando com uma pergunta: “Por que saí do ventre materno tão-somente para ver trabalho e tristeza e para 856
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que se consumam de vergonha os meus dias?” (20.18). Essa pergunta não recebe resposta além daquela que já havia sido dada no início do livro (1.5). Ademais, o transcurso do ministério de Jeremias não melhora em momento algum. Apesar de sua pregação ser vindicada pela queda de Jerusalém, essa vindicação não deve ter trazido grande consolo a um homem que chorou pela destruição de seu povo (Jr 9.1 [8-23]; 10.19; 17.16). Depois da queda de Jerusalém, as esperanças de um recomeço são rapidamen te frustradas e, contra sua vontade, Jeremias é levado para o Egito onde se acredita que tenha morrido no exílio. Apesar de Jeremias antever um futuro renovado para Israel na terra prome tida (caps. 30-33, esp. 32), ele próprio não vive para participar desse futuro. Não é de admirar que a teologia cristã tenha considerado muitas vezes o caminho de Jeremias pela vida como um prenuncio do caminho do Getsêmani até o Calvário. f. O livro de Habacuque é singular entre os profetas no sentido de que não apresenta em momento algum as expressões proféticas típicas como “assim diz o Senhor”, assumindo, em vez disso, a forma de lamento e resposta. Podem-se observar quatro pontos, i. O livro começa com o clamor “Até quando?” (Hc 1.2) que também constitui uma forma enfática de lamento no Salmo 13. Esse clamor é acompanhado do reconhecimento de que o Senhor nâo ouve nem salva (Hc 1.2), ou seja, que a oração do profeta parece nâo fazer diferença alguma, ii. A primeira resposta do Senhor (1.5-11) dificilmente chega a ser tranqüilizadora, pois sua mensagem dá a impressão de que as coisas vão piorar ao invés de melhorar — a terra será devastada pelos ba bilônios. iii. Vê-se uma imagem impressionante do profeta dialogando com Deus: “Pôr-me-ei na minha torre de vigia, colocar-me-ei sobre a fortaleza e vigiarei para ver o que Deus me dirá e que resposta eu terei à minha queixa” (2 . 1 ). É provável que as últimas palavras devam ser traduzidas como “com referência à minha reclamação”, sendo que Habacuque espera continu ar pleiteando seu caso com Deus mesmo depois que Deus lhe responder, iv. O teor da resposta do Senhor com relação a como lidar com a decepção e dor não fica absolutamente claro, mas provavelmente pode ser encontrado nas palavras tão conhecidas de Habacuque 2.4 (-> 'mn, ser fiel, crer [# 587]). g. Os lamentos ocorrem com maior freqüência nos Salmos. Na verdade, o tipo mais numeroso de salmo, mais até do que os hinos de louvor, é o lamento. Apesar de esse fato ser observado de forma rotineira nas introduções aos Salmos, sua relevância é menos explorada. Essa predominância de lamentos no cerne das orações de Israel significa que os problemas que dão origem ao lamento não são algo secundário ou incomum, mas sim um elemento central da vida de fé (cf. a investigação dessa questão em Jó). Além disso, mostram que a experiência de angústia e perplexidade na vida de fé, não é um sinal de deficiência da fé, algo a ser supera do e deixado para trás quando ocorre o crescimento, mas sim uma parte intrínseca da própria natureza da fé. Em vez dos problemas da vida de fé serem colocados de lado, como se a ado ração devesse ser apenas uma questão de louvor e ação de graças, esses problemas recebem uma posição central no próprio ato de oração e adoração. O realismo prático desses salmos é absolutamente admirável. (-> Salmos: Teologia) A classificação dos diferentes tipos de salmos de lamento é importante (para Broyles, é fundamental). Talvez o mais comum seja dividir os lamentos em individuais (p. ex., Salmos 13, 22) e comunitários (p. ex., Salmos 74, 80). Apesar de essa distinção ser perfeitamente válida, há outras duas mais significativas. Em primeiro lugar, tem-se a distinção entre salmos que são, em essência, apenas clamores por socorro, nos quais normalmente encontra-se a expectativa confiante de que Deus dará livramento (p. ex., Salmos 4, 5; uma situação comum também na narrativa, p. ex., Êx 2.23) e aqueles que consideram Deus como sendo de algum modo respon sável pela dificuldade e contêm elementos de queixa e reprovação com relação a Deus (p. ex., 857
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Salmos 13, 74). No primeiro caso, a situação é o problema e Deus é a solução, enquanto, no último, Deus é o problema. E provável que o primeiro caso deva ser chamado de “clamor por socorro” ou “súplica”, ficando o termo específico “lamento” ou talvez “queixa” reservado para o último caso. É este último que se mostra mais interessante do ponto de vista teológico e no qual iremos nos concentrar neste estudo. A segunda distinção é entre os salmos que terminam e os que não terminam com um tom de tranqüilização e louvor. Em termos gerais, o final positivo é característico do lamen to individual (p. ex., Salmos 13, 22) e não do lamento comunitário, apesar de também haver exemplos deste último (p. ex., Salmos 60,77). A forma como a transformação de lamento para certeza ou louvor dentro de um salmo deve ser interpretada é motivo de ampla discussão e só pode ser conjecturada inteligentemen te, uma vez que o texto bíblico não apresenta nenhuma indicação direta. Apesar de haver, por exemplo, referências ocasionais a Deus ter ouvido o lamento (SI 6.8-10 [9-11]; 22.24 [25]; cf. 85.8 [9]), não se sabe se a intenção é mostrar um processo dentro do espírito do adorador ou um processo público pela mediação de um homem falando em nome de Deus. A tendência dos intérpretes modemos é preferir essa última possibilidade, de modo que uma explicação comum é relacionar esses salmos com o contexto provável de adoração no templo, no qual uma pessoa autorizada pode pronunciar palavras de tranqüilização em nome do Senhor, o que conduz o adorador, então, a uma nova direção (o que seria análogo à prática comum dentro da adoração cristã de contrição e confissão seguidas de absolvição, levando na seqüência, a um cântico de louvor). Mas ainda que esta seja uma apuração correta da origem desses salmos, não explica como devem funcionar da forma como se encontram no presente, sem um comentário interpretativo e dentro de uma variedade de contextos. Em sua forma presente, é provável que esses salmos devam ser vistos como a expressão de um paradoxo teológico, o lamento e o louvor, a tristeza e a alegria andam juntos. Apesar de ser necessário expressar a dor e a perplexidade na adoração, estas não são incompatíveis com o louvor. Antes, o louvor de certa forma toma ex plícito o contexto de fé e esperança dentro do qual o lamento é proferido, a confiança de que, sob o controle de Deus, no final tudo ficará bem. Isso também corresponde ao formato geral dos Salmos, em que os lamentos tendem a se agrupar na parte inicial da coleção, sendo que os salmos finais são uma longa seqüência de hinos de louvor. Em termos teológicos, os salmos mais interessantes por apresentarem certas questões de modo mais pronunciado, são aqueles que consideram Deus responsável pela situação e que não terminam em um tom positivo. Desses, os três que expressam o lamento de modo mais pleno e incisivo são os Salmos 44, 88 e 89. O Salmo 88 é conhecido como o salmo mais desolado de todos. Trata-se de um la mento individual de angústia incessante no qual o salmista repreende Deus como causa de sua dor: “Sob o peso dos teus terrores, estou desorientado... Para longe de mim afastaste amigo e companheiro; os meus conhecidos são trevas” (88.15, 18 [16, 19]). Talvez não haja muitos comentários úteis a serem feitos além de que o salmo serve de uma espécie de demarcação de limites na vida de fé, uma lembrança dc que a sensação de ser abandonado por Deus pode ser ao mesmo tempo sobrepujante e sem alívio. Há mais o que dizer no caso dos Salmos 44 e 89, ambos lamentos comunitários, pois mostram todos os indícios de que foram redigidos cuidadosamente a fim de apresentar o paradoxo da aparente ausência de Deus na vida de fé (apesar de se prestarem a outras interpretações). O Salmo 44 é composto de cinco unidades claras e seqüenciais: a. vv. 1-3 [2-4], uma espécie de confissão de fé sobre a bondade de Deus para com Israel, a provisão de Deus aos pais de Israel no passado; b. vv. 4-8 [5-9], que apresentam uma confissão de fé semelhante sobre a bondade 858
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de Deus e sua provisão para com Israel no presente. Juntos, esses elementos constituem a fé oficial de Israel, c. A terceira seção, porém (vv. 9-16 [ 10- 17]), retrata o estado atual da comu nidade, que se encontra em oposição direta com a confissão anterior de fé. Em vez de “com o teu auxílio, vencemos os nossos inimigos”, agora, “tu nos fazes bater em retirada à vista dos nossos inimigos” e em vez de “em Deus, nos temos gloriado continuamente”, agora, “a minha ignomínia está sempre diante de mim; cobre-se de vergonha o meu rosto”. A realidade presen te é conflitante com a confissão de fé. d. A quarta seção (vv. 17-22 [ 18- 23 ]) explora o possível motivo disso. Se Israel tivesse sido infiel, então poderia entender o que estava ocorrendo como uma forma de julgamento por seu pecado. Mas, na verdade, os israelitas haviam sido fiéis e justamente sua fidelidade a Deus é que havia lhes causado a situação trágica em que se encon travam (“Mas por amor de ti [ aleykã, vv. 22( 23 )] somos entregues à morte continuamente”), e. Nos vv. 23-26 [24 - 27 ], o salmista apela para Deus “por amor da tua benignidade” (hesed, a última palavra do salmo). E importante observar a força da linguagem empregada: “Desperta! Por que dormes, Senhor? Desperta! Não nos rejeites para sempre!”. Uma vez que Israel confes sa em outra passagem que, em seu cuidado para com seu povo Deus “não dormita nem dorme” ( 121.4 ) e que Elias zomba dos profetas de Baal que o deus deles, que não é Deus, pode estar “a dormir e despertará” (1 Rs 18.27 ), trata-se de uma linguagem que destoa e, supostamente tem a intenção de destoar, da fé oficial de Israel. Na expressão de dor profunda, por vezes, pode ser preciso deixar de lado as nuanças mais suaves do discurso teológico. Pode-se observar um padrão semelhante no Salmo 89. Nesse caso, o salmo é composto de quatro unidades distintas e seqüenciais, a. Os vv. 1-18 [2-19] formam um hino de louvor ao Senhor. O hino o louva por seu poder soberano incomparável (vv. 5-13 [6-14]) e o tema que se repete ao longo da composição é a fidelidade do Senhor, ’emúnà, mencionada cinco vezes (vv. 1, 2, 5, 8 , 14 [2, 3, 6 , 9, 15] no último caso, a variação 'emet é usada como parte de um par convencional de palavras hesed we ’emet). E possível que um hino já existente tenha sido reutilizado, pois apesar de sua tonicidade ser predominantemente 4 — 4, há duas linhas iniciais impróprias em 3 — 3, os vv. 3-4 [4-5], Não apenas seu padrão métrico é distinto, mas também apresenta uma leitura deselegante no heb., na qual falta a expressão introdutória atenuante, “Pois disse” (normalmente acrescentada pelos tradutores), sendo que esses dois fatores indicam a inserção de material novo num texto mais antigo. O propósito da inserção dessas duas linhas nesse ponto é apresentar desde o início a preocupação teológica que controla todo o salmo, ou seja, a questão da fidelidade de Deus à aliança que fez com a casa de Davi. b. Os vv. 19-37 [20-38] são inteiramente dedicados a repetir as promessas de Deus à casa de Davi, sendo que no centro da passagem encontra-se a promessa de uma dinastia (ver 2 Samuel 7). Depois de recapitular em termos entusiasmados o compromisso de Deus de apoiar e fazer prosperar a casa de Davi e de observar que a desobediência de um rei davídico levará à disciplina, mas não ao fim da aliança, o salmista descreve o compromisso de Deus com a casa de Davi nos termos mais firmes possíveis: “Não violarei a minha aliança, nem modificarei o que os meus lábios proferiram. Uma vez jurei por minha santidade (e serei eu falso a Davi?): A sua posteridade durará para sempre, e o seu trono, como o sol perante mim. Ele será esta belecido para sempre como a lua e fiel como a testemunha no espaço” (vv. 34-37). Trata-se do compromisso mais forte e enfático de Deus em todo o AT, mais forte até do que Jeremias 31.35-37. Assim, temos um hino ao Deus de poder soberano, que é conhecido por sua fideli dade e que assumiu um compromisso absoluto de ser fiel à casa de Davi. c. “Tu, porém, o repudiaste e o rejeitaste; e te indignaste com o teu ungido. Aborreceste a aliança com o teu servo”. Assim começa a terceira seção (vv. 38-45 [39-46]), retratan do a realidade presente que se encontra em oposição total com o que havia sido prometido. 859
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“Esmagarei diante dele os seus adversários” (v. 23), transformou-se em “Exaltaste a destra dos seus adversários” (v. 42) e “Não violarei minha aliança” (v. 34) tomou-se “aborreceste a aliança com o teu servo” (v. 39). A discrepância entre a promessa e aquilo que de fato ocorreu não poderia ser mais gritante. d. A última seção (vv. 46-51 [47-52]) é constituída de um clamor ao Senhor, apelan como no Salmo 44 para a hesed do Senhor (v. 49 [50]), mas sem receber resposta alguma nem palavra de tranquilização. Pode-se argumentar sobre três pontos nesses dois salmos, a. Foram feitas diversas ten tativas de se datar os salmos e indicar as histórias que deram origem a eles (quando não foram considerados parte de um ritual repetitivo do templo envolvendo a humilhação simbólica do rei davídico). Os dois salmos usam linguagem militar de derrota, de modo que foram sugeri das várias ocasiões da história de Israel. Seria particularmente tentador atribuir-se o Salmo 89 ao periodo do exílio ou após ele, quando a suspensão da monarquia davídica (e sua restaura ção frustrada em Zorobabel) deve ter tomado ainda mais acentuado o problema da promessa de Deus. Porém, além da dificuldade específica de ter-se a impressão de que é o próprio rei quem fala nos vv. 50-51 [51-52], essa tentativa de associar-se os salmos a um determinado contexto sem dúvida interpreta indevidamente o gênero deles. Como foi observado, cada sal mo é redigido cuidadosamente de modo a apresentar o problema teológico do conflito entre a fé reconhecida de Israel em Deus e a situação terrivelmente decepcionante que pode surgir (e supõe-se que tenha surgido em várias ocasiões). Isso fica particularmente claro na elaboração do Salmo 89.34-37 [35-38] com a finalidade de mostrar o contraste com 89.38-45 [39-46] do modo mais nítido possível. Ademais, uma boa parte dos salmos começa diretamente com o lamento ou, se esse elemento é adiado, como p. ex., nos Salmos 9, 27, 90, é precedido das ex pressões convencionais de louvor e confiança. Nâo há paralelos à elaboração sistemática dos Salmos 44 e 89, mesmo em lamentos comunitários que, de outro modo, parecem semelhantes, como os Salmos 74 e 80. Portanto, um dos motivos pelos quais os Salmos 44 e 89 não têm uma nota final de tranqüilização ou louvor, como em vários outros lamentos, pode-se dever ao fato de não terem sido compostos para funcionar do mesmo modo que outros lamentos. Apesar de esses salmos serem, de fato, lamentos, em certos sentidos importantes, são parecidos com os salmos de sabedoria (do tipo criticamente reflexivo e não didático). A preocupação central desses salmos é o problema teológico em si, e, assim, o tipo de tranqüilização apropriada para muitos dos lamentos comuns poderia ficar deslocado nesses casos. b. A fim de compreender-se cada salmo, é essencial que a tensão entre seus elementos conflitantes, a confissão formal de fé e as circunstâncias problemáticas sejam mantidas. Ou seja, é fácil demais dissolver a tensão ao negar-se um ou outro aspecto. A pessoa de fé pode ser tentada a procurar defender essa fé ao negar que o problema é, de fato, tão sério quanto parece ou o povo pode ver-se tão sobrepujado pelo problema a ponto de simplesmente abandonar toda a fé como sendo uma proposição falsa. Essas duas abordagens são mais do que compreensíveis, mas nenhuma delas é a abordagem do salmista, para o qual é essencial que os dois elementos sejam mantidos em coesão. O conflito pode ser agonizante e insolúvel, mas é característico do salmista que esse conflito deve ser encarado e suportado para que a fé seja autêntica e despro vida de qualquer irrealidade ou desespero. E isso que confere a esses lamentos sua relevância teológica fundamental. c. Deve-se observar que o Salmo 89 tem um versículo final que ainda nâo foi conside rado: “Bendito seja o Senhor para sempre! Amém e amém!”. A princípio, o motivo para essa doxologia é o simples fato de que ela marca a conclusão do terceiro livro dentro dos Salmos e que cada livro desses temiina com uma doxologia (SI 41.13 [ 14]; 72.18-19; 106.48, sendo que 860
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o Salmo 150 é uma doxologia para toda a coleção). Assim, é razoável dizer-se que a doxologia não possui nenhuma relação intrínseca com o salmo do qual faz parte no presente. Ainda assim, é possível pelo menos imaginar se se deve ver algum significado no fato de a doxologia ter sido anexada a esse salmo específico, não como uma palavra de tranqüilização como nos outros lamentos, mas como um testemunho impressionante da vitalidade e profundidade da fé de Israel — de que o povo poderia usar esse salmo, que de fato tomou-se testemunho do dile ma permanente da fé de Israel depois da suspensão da monarquia em 587 a. C. e, ainda mais, usá-lo para louvar ao Senhor. 7. O lamento no contexto canônico. Tendo em vista a importância do lamento para testemunho do AT da dinâmica da vida de fé, cabe aqui considerar rapidamente a questão sob a ótica do NT. a. O lamento ainda é apropriado à luz do NT? Não há salmos de lamento no NT. A morte e a ressurreição de Cristo mudam as coisas de tal forma que o tom cristão característico deve ser, nas palavras de Paulo: “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo: alegrai-vos” (Fp 4.4)? Sem dúvida, a vida de fé no NT tem diferenças relevantes em relação ao AT. Por um lado, toma-se universal e aberta a todos, sem a particularidade da Torá. Por outro lado, seu en foque na morte e ressurreição de Cristo lhe dá novas e importantes dimensões: há a esperança clara de vida além da morte; há a presença permanente do Espírito Santo, e a cruz dá a todo o problema do sofrimento um novo enfoque como algo que faz parte e é esperado na vida de fé: sermos transformados segundo o modelo de Cristo. É característico que o motivo de per plexidade no Salmo 44, o sofrer “por amor de ti”, seja considerado por Paulo justamente algo a ser esperado, mas também a ser superado pelo poder de Cristo (Rm 8.35-37). Ainda assim, nenhum desses aspectos altera a dinâmica fundamental de uma vida de confiança em Deus e obediência a ele, um Deus que se revelou em sua graça e, apesar disso, continua tendo caminhos inescrutáveis. Desse modo, é mais do que provável que haja ocasiões nas quais Deus parecerá ausente, às vezes mesmo quando é mais necessário, como os cristãos muitas vezes atestam. Apesar de a fé cristã dever ser caracterizada pela alegria, esta também se encontra presente constantemente no AT. E preciso observar o uso repetido de smh, regozijar-se, nos Salmos (p.ex.,Sl 16.9; 33.21; 64.10 [ 11]; 104.34; 105.3) e, em menor grau, em Deuteronômio (p. ex., Dt 12.7, 12, 18; 16.11, 14). E a alegria de Paulo, conforme é expressada de modo triunfante em Romanos 8.31-39, não era incompatível com seu sentimento de “grande tristeza e inces sante dor no coração” (Rm 9.2; cf. o uso de lupeõ/lupê em 2Co 2.1-5; 6 .10). Em termos gerais, portanto, não há motivo para se supor que a prática do lamento é inapropriada ao contexto do NT. O lamento é, sem dúvida, uma daquelas áreas vitais nas quais se deve considerar que o testemunho do NT pressupõe e complementa o testemunho do AT e, que de fato, o primeiro é potencialmente inadequado sem o último. b. Apesar de não haver lamentos propriamente ditos no NT, há passagens que indicam esse tipo de expressão. O clamor das almas martirizadas sob o altar no céu (Ap 6.10) ecoam lamentos do AT como os Salmos 13.1-2; 94.3. Apesar de o texto não nos revelar o teor da ora ção de Paulo sobre o espinho em sua came (2Co 12.8), alguns dos salmos de lamento teriam sido apropriados para isso, e a resposta de Cristo é, num certo sentido, análoga às palavras de tranqüilização ao final de certos lamentos. Mais importante ainda, não devemos jamais nos es quecer de que talvez o mais comovente dos clamores de lamento dos salmos venha dos lábios de Jesus na cruz. conforme registram dois dos evangelhos: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mt 27.46; Mc 15.34). Se a crucificação de Jesus é o ceme da salvação, então há motivos de sobra para supor-se que aquilo que caracterizou o processo de Jesus trazer-nos 861
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a salvação também irá caracterizar seus seguidores ao entrarem nessa salvação e colocarem-na em prática, como de fato fica claro no chamado ao discipulado (Mc 8.34-37 e par.). Sem dúvida, o clamor de abandono foi central para a teologia de Lutero, que o considerou paradigmático para a natureza da fé — o Deus oculto quebranta e recria os crentes. Em tempos mais recentes, a tradição luterana foi reelaborada e reformulada por J. Moltmant em O Deus Crucificado [The Crucified God], que é bem reconhecido como uma obra importante da teologia contemporânea. Mais uma vez, o reconhecimento honesto da dor e da confusão e sua expressão em oração são considerados elementos integrais da vida cristã de fé. c. Se os dois pontos anteriores estão, de algum modo, corretos, é um exercício tremamente sério refletir sobre grande parte do conteúdo da adoração cristã cm comparação com o que é encontrado nos Salmos. Apesar de ser uma tradição cristã antiga considerar-se os Salmos como o cerne da oração cristã, trata-se de algo muito menos praticado hoje em dia do que costumava ser no passado e, por vezes, a forma como os salmos são usados não per mite que o adorador se aproprie de todo o poder dessa forma de expressão. Em que medida a adoração cristã usa intencionalmente salmos de lamento ou seus equivalentes? Pouquíssimos hinos expressam lamento e os salmos que são usados numa paráfrase moderna quase nunca são salmos de lamento, mas, com muito maior freqüência, exprimem louvor. Além disso, a liturgia dificilmente deixa espaço para a expressão do lamento. O fato de os lamentos terem sido praticamente excluídos de grande parte da adoração cristã traz consigo a forte mensa gem implícita de que tais lamentos não tenham um devido lugar na adoração. E, no entanto, a maioria das congregações tem, na maior parte do tempo, alguém em seu meio que sofre. Não é de causar espanto que alguns cristãos sintam-se levados à depressão ou à superficialidade e que outros abandonem completamente a fé por acharem que lhes falta integridade e realidade. A fim de que a fé cristã e a adoração dos dias de hoje sejam edificadas pelo testemunho bíbli co e se abram para as reformas desse testemunho, o resgate da dimensão do lamento deve ser considerado prioritário. Gemido, suspiro, rosnado: -> 'nh (suspirar, gemer, # 634); -> ’nq (gemer, # 650); hgh I (gemer, lamentar-se, suspirar, meditar, refletir, gorjear, murmurar, # 2047); -> hãgig (gemer em oração, # 2052); -> z'q (clamar, bradar, prantear, # 2410); n ’q (gemer, # 5543); -> nhm (rosnar, gemer, # 5637); nwh II (gemer de expectativa, # 5664); p ‘h (gemer no parto, # 7184); -> i ’g (rugir, #8613) Lamento, pranto: -> 'bl I (prantear, observar ritos de pranto, # 61); -> 'nh I (lamentar, # 627); bkh (chorar, deplorar, # 1134); -> d m ' (derramar lágrimas, # 1963); z 'q (clamar por so corro, chamar às armas, reunir, proferir um clamor lamentoso, # 2410); -> nhh I (lamento, prantear, suspirar, # 5629); spd (som de lamento, prantear, # 6199); qdr (ser/estar escuro, prantear, # 7722); -> qinâ I (canto fúnebre, # 7806); -> Lamento: Teologia B ib l io g r a f ia
O lamento como qinâ: Anclsr, 1961, 56-61; IDB 3:452-54; TDNT 3:150-51, 836-41; TDOT 1:44-48; 2:116-20; 6:82-87; O. Eissfeldt, The Old Testament: An Introduction, 1965, 94-98; P. J. Ferris, The Genre o f Communal Lament in the Bible and the Ancient Near East, SBLDS 27, 1992; T. H. Gaster, Myth, Legend and Custom in the Old Testament, 1969, 590-604; H. Jahnow, Das hebràischeLeichenleidim Rahmen der Vòlkerdichtung, BZAW 36,1923; W. Janzen, Mourning Cry and Woe Oracle, BZAW 125, 1972; M. Lamm, The Jewish Way in Death and Mouming, 1969,1977; J. Morgenstern, Rites ofBirth, Marriage, Death andKindredOccasions Among the Semites, 1966, ch. 14; H. Ringgren, Israelite Religion, 1966, 239-42. 862
Lameque
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Lameque
Lameque
[lemek], # 4347).
OMA Todas as propostas com referência à atestação mais antiga desse nome são incertas e nenhuma delas esclarece a origem do seu significado. O componente Imk pode estar re presentado no sum. lumga, o título do deus do céu Ea como patrono da música e do canto. E possível que o nome heb. Lameque corresponda aos nomes do acad. antigo, Lam-ki-um e Lam-ki-Ma-rí. O acad. lumakku designa uma classe inferior de sacerdotes e o ár. ylm k signi fica um jovem forte. AT 1. Filho de Metusael. Esse patriarca antediluviano foi a sétima geração de descenden tes de Caim (->), e sua família marca o final da genealogia cainita, que serve para apresen tar a propagação da cultura e da criatividade humana em três esferas: a criação de animais, a música e os trabalhos de artífices (Gn 4.18-24). Lameque é o primeiro caso registrado de poligamia. Com Ada, teve um filho chamado Jabal, o criador de rebanhos nômade, e outro chamado Jubal, o fundador da música. Com Zilá, teve Tubalcaim, o metalúrgico, e uma fi lha, Naamá. Dificilmente pode-se interpretar a genealogia como uma condenação explícita da poligamia que só é criticada abertamente bem mais tarde (Dt 17.17). Ainda assim, a bi gamia de Lameque é um desvio sem precedentes do ideal da monogamia que Deus havia estabelecido com o primeiro casal. Apesar de a humanidade crescer em tamanho e aptidão, praticamente não se desenvolve, e Lameque só mostra ainda mais o caráter violento de seu antepassado, Caim. O poema de Lameque (Gn 4.23-24) constitui uma ostentação de seu compromisso com a retaliação desmedida. Esse poema, por vezes chamado de cântico, é um excelente exemplo de versos heb. antigos, especialmente em seu uso de pares fixos, como “ouvi-me” e “escutai” (Gevirtz, 26-27). Esse paralelismo nítido no começo do poema se desintegra progressivamente a ponto de a última linha estar inteiramente fora dos padrões convencionais. Sua forma impres sionante complementa sua mensagem violenta: como vingança por um ferimento, Lameque matou um jovem. O "homem” ( 'is) e o “rapaz” (yeled) do v. 23 são, provavelmente, a mesma pessoa: um jovem guerreiro. Esse é o código ético desequilibrado de Lameque: “Sete vezes se tomará vingança de Caim, de Lameque, porém, setenta vezes sete” (4.24). De acordo com outra possibilidade, se o poema for interpretado no tempo presente, não se trata de uma resposta a um ato específico, mas sim de uma ameaça jactanciosa com a finalidade de intimidar o inimigo. As duas interpretações são viáveis e, qualquer que seja o caso, o poema revela a mesma tendência de violência crescente. Quando o povo deixa de “invocar o nome do Senhor” (4.26), o avanço tecnológico toma-se uma espada de dois gumes e, à medida que a civilização progride, também 863
Lameque
cresce a capacidade de destruição mútua. Lameque jurou executar onze vezes mais vingança que seu antepassado Caim, mas há também uma diferença qualitativa. Enquanto Caim sentia a necessidade do auxílio contínuo de Deus (4.13-14), Lameque depende somente de si mesmo (Vos, 46). Seu poema revela o espírito de “arrogância titânica’’ que “leva na mão o seu deus, a saber, sua espada” (KD 1.119; cf. Jó 12.6; I lc 1.11). As palavras “feriu” (pesa'; # 7206) e “pisou” (habbúnr, -> # 2467), em Gênesis 4.23, não constituem um par poético fixo, mas aparecem na lei de talião em Êxodo 21.23-25, que determina um limite para a retaliação a fim de proteger a sociedade de indivíduos intimidantes como Lameque. Desse modo, o excerto histórico da vida de Lameque serve não apenas para registrar a degeneração da humanidade, mas também para ilustrar a necessidade de um código legal. Com o fim da genealogia cainita, Gênesis prossegue imediatamente para a apresentação da linhagem de Sete, o descendente eleito dc Adão. Esse modelo, no qual se conclui a linhagem não eleita antes de dar continuidade à história dos escolhidos, também é usado no caso dos três filhos de Noé (Jafé, Cam e Sem), de Ismael e Isaque, bem como no de Esaú e Jacó. 2. Filho de Matusalêm. Esse patriarca antediluviano nasceu quando seu pai estava co 187 anos de idade. Foi pai dc Noé(->) aos 182 anos e morreu com 777 anos de idade (Gn 5.2531, mas o sam. e a LXX apresentam idades diferentes). Assim como o Lameque da linhagem de Caim, o Lameque da linhagem de Sete também tem algumas de suas palavras registradas na genealogia. Enquanto o primeiro Lameque é um vingador, o segundo é um profeta que ex pressa esperança em vez de ira. Ao dar ao filho o nome de Noé (nõah), Lameque também diz que “Este nos consolará (nhm, # 5714) dos nossos trabalhos e das fadigas de nossas mãos, nesta terra que o Senhor amaldiçoou” (5.29, refletindo sobre 3.17). A assonância poética das duas palavras destaca a importância da idéia de descanso (nwh; -> # 5663) no ministério de Noé e, de fato, no restante do Pentateuco. P-B Com referência à vingança do Lameque da linhagem de Caim, os Pseudepígrafos men cionam que Lameque foi condenado setenta vezes sete (T. Benj. 7.4). Várias obras apresentam mais detalhes sobre o Lameque da linhagem de Sete. Além de ter sido pai de Noé, a esposa era Betenos e passou adiante fielmente para o filho os ensinamentos que havia recebido de seu Matusalêm e Enoque (lEn. 10.1; Jub 4.27-28; 7.38). O Apócrifo de Gênesis (1 QaoGen, chama do a princípio equivocadamente de “O Livro dc Lameque”), destaca a história do Lameque da linhagem de Sete ao concentrar-se em sua piedade e na beleza evidente de seu filho Noé (cols. 2-5). Quando Lameque se pergunta se o verdadeiro pai do menino é um ser angelical, recebe a garantia da esposa Bitenos, de Matusalêm e de Enoque, que o filho é mesmo dele, Lameque. Ainda assim, Lameque reconhece que Deus interveio a fim de ajudar a raça humana. Josefo não acrescenta muitos detalhes ao relato de Gênesis (A n /1.2.2,1.3.4) e, na maior parte, seus números confirmam aqueles do TM. A LR traz lendas do hagadá sobre o Lameque da linhagem de Caim, afirmando que era cego e que se tomou acidentalmente o assassino de Caim. NT O NT situa o Lameque da linhagem de Sem na genealogia de Jesus (Lc 3.36). A ex pressão “setenta vezes sete” proferida pela primeira pelo Lameque da linhagem de Caim no contexto da vingança, é encontrado no NT nas instruções de Jesus a Pedro sobre a extensão do perdão (Mt 18.21-22). Caim 864
Laquis
B ib l io g r a f ia
ABD 4:136-37; EncJud 10:1365-67; ISBE 1:129-31; 3:63-64; U. Cassuto, A Commentary on the Book o f Genesis: Part I, From Adam to Noah, 1961; J. A. Fitzmyer, The Genesis Apocryphon o f Qumran Cave 1, 1971; S. Gevirtz, Patterns in the Early Poetry o f Israel, 1963; G. Vos, Biblical Theology, 1948; G. J. Wenham, Genesis 1-15, WBC 1, 1987; C. Westermann, Genesis 1-11, 1984. Robert C. Stallman Lâmpada / candelabro -> # 4963 (menôrâ, lâmpada, candelabro) Lamúrias -> # 7590 (.? 'q, lamuriar, clamar) Lança -> # 2851 (hanit, lança) Lançamento -> # 8959 (skl I, atirar, lançar)
Laquis
Laquis
[lãkís], # 4337).
AT 1 . 0 termo heb. lãkis (LXX, lakiê) referia-se a uma cidade que dominava as colinas do litoral da Palestina. Apesar de haver sinais de ocupação na Era Calcolítica (antes de 3000 a. C.), Laquis foi um grande forte do século X ao século XVI a. C. Laquis é citada 20x no AT e diversas vezes em documentos extrabíblicos (como as cartas de Amama) e em inscrições (como os relevos na parede do palácio de Senaqueribe em Ninive). A referência mais antiga à cidade encontra-se nos textos comerciais de Ebla, de 2400 a. C. (cf. G. Pettinato, Archives o f Ebla, 1981, 226). Hoje em dia, Laquis é associada inequivocamente a Tel ed-Duweir, no Su doeste de Israel, quase na metade do caminho entre Jerusalém e Gaza. 2. Em termos teológicos, Laquis serve de modelo, de símbolo que lembra a vulnera lidade de Israel às vicissitudes da história. Laquis era um posto de guarnições militares com uma só missão: fortificar as colinas do Oeste no caso de um ataque. Assim, é bem provável que suas defessas contassem com a melhor tecnologia que o reino era capaz de desenvolver. E quando Laquis caiu nas mãos de conquistadores estrangeiros, os historiadores da Bíblia (Js 10.31 ss.; 2Rs 8.13; 2Cr 32.9-10; Is 39.5-8; Jr 34.7; Mq 1.10-16), bem como os profetas, não tardaram em observar que mesmo cidades como essas não podiam resistir aos julgamentos de Javé. A importância estratégica de Laquis para Israel e seus vizinhos se devia inteiramente à sua geografia. Laquis guardava importantes rotas de acesso para o interior de Israel. Hebrom ficava a apenas 23 quilômetros a leste passando por vales transitáveis. Uma vez que Laquis fi cava mais para o interior na Rota do Mar, não tinha o mesmo papel de controle sobre o comér cio costeiro que Gaza possuía. Porém, quando a monarquia de Israel alcançou a proeminência, o domínio dessas rotas ocidentais que passavam pelo Sefelá (as colinas costeiras) tomou-se uma preocupação fundamental. Laquis não tardou em transformar-se numa das posses mais importantes de Israel. As escavações de Laquis dão testemunho da importância da cidade. Tel ed-Duweir é uma das maiores cidades de toda a Palestina, abrangendo uma área de dezoito acres. Em termos comparativos, Megido (a cidade fortificada que guardava a passagem pelo noroeste dos montes do Carmelo) cobre uma área de treze acres e a cidade alta de Hazor (o forte na extremidade 865
Laquis
oeste do vale de Huleh que guardava as rotas noroeste e nordeste) abrange 25 acres. Assim, Laquis era uma cidade enorme que precisava ser transposta sempre que o exército assírio ou babilônio desejava conquistar a região. Sua posição ao sul constituía mais especificamente a primeira linha de defesa contra qualquer ataque do Egito. Para Israel, era um posto avançado importantíssimo para a defesa da região montanhosa contra invasões. 3. Laquis aparece pela primeira vez no AT nas histórias da conquista de Josué. A “c alizão” formada para deter Josué e liderada por Adoni-Zedeque de Jerusalém alistou Jáfia, rei de Laquis, cuja influência concentrava-se anteriormente no oeste. Durante a guerra, Josué derrubou Laquis, bem como Gezer, outro forte inimigo próximo de lá ao norte (Js 10.31-33). Apesar de a cidade ter sido entregue à tribo de Judá (15.39), ficou praticamente abandonada depois da conquista. Escavações desse período (1600-1200 a. C.) encontraram um exemplar completo de um templo cananeu, inclusive com os restos de esqueletos de animais ali sacrifi cados. Escavações arqueológicas indicam que Laquis não se desenvolveu durante os séculos XII e XI a. C. Com o avanço de sua monarquia, Israel passou a ter uma influência regional mais forte além das colinas centrais e Laquis readquiriu valor. Uma escavação revelou um palácio de um governador provincial construído nesse período, além fortificações impressionantes. O monte de escombros do palácio em si (35 m2) é construído como o “Milo” em Jerusalém, com uma colina reforçada de mais de 7 metros de altura. Roboão fortificou a cidade (2Cr 11.9) como parte do sistema de fortificações de Judá diante da desintegração do domínio de Salomão so bre a região mais ampla. Sem dúvida esse trabalho teve continuidade no reinado de Asa (14.7) e Josafá (17.12-13), culminando com imponentes muralhas defensivas duplas. Sua muralha superior tinha mais de 6 metros de espessura, com torres de guarda em intervalos regulares. Uma segunda muralha (contestada por Ussishkin) ficava a cerca de dezesseis metros da cidade e tinha 4 metros de espessura. Essas fortificações mostraram-se inestimáveis no século VIII. A campanha de Sena queribe em 701 a. C. concentrou-se em Laquis como mais uma passagem (juntamente com os vales de Azeca e Elá) para Israel. Sua destruição também impediria que qualquer ajuda do Egito chegasse a Jerusalém. É possível que Ezequias (que fortificou Jerusalém e construiu um novo sistema de distribuição de água) também tenha ordenado a construção de um reservatório em Laquis (24 x 26 x 26 metros) com uma capacidade de (170.000 m3). Mas esses esforços mostraram-se inúteis e o cerco de Senaqueribe foi bem-sucedido. Escombros desse nível iii. dão um triste testemunho da luta: foram encontradas armaduras escamadas, pontas de flechas, pedras de fundas e até um capacete assírio. Em Ninive, há um relevo real que mostra a con quista em detalhes: as muralhas sendo atacadas, prisioneiros judeus sendo torturados e leva dos embora e os conquistados suplicando por misericórdia. Uma inscrição diz: “Senaqueribe, rei da Assíria, assentado em seu trono enquanto o espólio da cidade de Laquis passava diante dele” (ANET, 288). Depois da destruição causada pelos assírios, Laquis voltou a ser fortificada e uma nova muralha foi construída. Mais uma vez, a cidade serviu de posto de guarnições no Sefelá. Em 586 a. C., porém, com a vinda dos exércitos babilônios sob o comando de Nabucodonosor, Laquis teria que enfrentar o inimigo novamente, protegendo o acesso à região montanhosa. A cidade foi derrotada, mas sua força extraordinária foi observada por Jeremias, o qual relatou que, jun tamente com Azeca, Laquias foi a última cidade a cair nas mãos da Babilônia, mesmo depois da destruição de Jerusalém (Jr 34.7). O caos desse período encontra-se registrado nas “Cartas de Laquis”, comunicados militares escritos em cacos de cerâmica e encontrados por arqueólogos na sala de uma das torres das portas da cidade. Um túmulo numa caverna desse período tam 866
Lei de Deus
bém forneceu evidências importantes da guerra. Nele foram encontrados quase dois mil corpos empilhados — muitos deles parcialmente queimados como resultado da devastação. Laquis voltou a ser ocupada no período após o exílio e, durante o domínio persa, foram construídas residências, depósitos e palácios fortificados. A escavação de Laquis teve três períodos de trabalho. A primeira escavação foi realizada de 1932-1938, sob a direção de J. L. Starkey. Y. Aharoni liderou um trabalho em conjunto da Universidade da Carolina do Norte e da Universidade Hebraica de 1966-1968. Por fim, David Ussishkin trabalhou no local de 1973-1984 com a Universidade de Telavive e a Sociedade de Exploração de Israel. B ib l io g r a f ia
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# 1074 (bayit I, casa, habitação, construção, família, dinastia)
Largura -> #8143 (rhb, escancarar, alargar, estender) Larva
# 8231 (rimmà, verme, larva)
Lascívia
# 9291 (ta'abâ, anseio, desejo, lascívia)
Laticínios *> # 2692 (hãlãb, leite) Lavagem -> #8 175 (rhs, lavar) Lealdade Leão
# 2876 (hesed II, obrigação, lealdade, fidelidade)
# 787 ( 'arí, leão)
Lei de Deus
Lei de Deus (rn in [tôrâ], subs. orientação, instrução, lei, a lei, # 9368). 867
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OMA Há controvérsias se o termo tôrâ é derivado de yrh I, lançar, atirar (-> # 3721) ou yrh 11, instruir, ensinar (-> # 3723). Este último parece mais provável, mesmo que, até o momento, não se tenha chegado a uma conclusão sobre o assunto. Existe ainda a possibilidade de ser um termo estrangeiro emprestado do acad. têrtu(m), orientação, ordem, instrução. A forma sam. é türa. O radical também parece ter relação com o aram. 'ôritã ’ e o etp. 'õrit. O termo ár. é taurãt. AT O subs. ocorre aproximadamente 220x no AT, distribuído da seguinte maneira: Pent. (54x; 36x em Lv e Dt; lx em Gn [26.5]); livros históricos (63x; com mais freqüência em 2Cr [ 16x] e Ne [20x], 8 x em Js; 1Ox em 2Rs); Salmos (36x; 24x no Salmo 119; 3x no Salmo 78; 2x no Salmo 1.2); literatura de sabedoria (12x em Pv; lx em Jó [22.22]); literatura profética (46x; 12x em ls; 1lx em Jr; 6 x em Ez; 4x em Dn; e 13x nos profetas menores [5x em Malaquias]). A única outra ocorrência está em Lamentações 2.9. A fim de se começar a compreender a teologia da tôrâ no AT, é bastante proveitoso de linear as diversas maneiras como o termo é empregado ao longo do AT. Em termos gerais, tôrâ designa um padrão divino de conduta para o povo de Deus. O termo não se limita a questões cultuais ou cerimoniais, tampouco à lei civil/social e, em certas ocasiões, às partes narrativas do Pentateuco. Por vezes, tôrâ refere-se às palavras dos profetas, podendo referir-se também às palavras de instrução de um pai ou de uma mãe ao filho. Segue-se um esboço das formas de uso de tôrâ no AT. 1. Questões cultuais/cerimoniais. A tôrôt cultuai/cerimonial abrange um espectro rela tivamente amplo de regulamentações. São ordens divinas que se referem à questão de como o relacionamento apropriado do indivíduo com Deus deve ser mantido. a. Sacrifício e ofertas. O livro de Levíticos descreve de modo bastante detalhado a tôrôt, as leis que regem a oferta de sacrifícios. Há estatutos para ofertas pelo pecado (expiação de determinados pecados involuntários; Lv 6.24[18]; 7.7; ver Nm 15.29). Há ofertas pela culpa (para certos pecados involuntários; Lv 7.1, 7), holocaustos (expiação de pecados e ato volun tário de adoração; 6.8[2]; 7.37), ofertas de manjares (expressão de gratidão pela provisão de Deus; 6.14[7]) e ofertas pacíficas (ação de graças e comunhão com Deus; 7.11). O propósito de tais estatutos era restaurar e garantir a continuidade da comunhão com Deus. De acordo com Levítico, esses estatutos deviam ser seguidos na Tenda da Congregação. b. Sábados e festas. Também havia regras específicas que dirigiam a celebração dos sábados e das festas. Neemias 8.13 refere-se às “palavras da Lei” nas quais Esdras encontrou a legislação mosaica para a observância da Festa dos Tabemáculos (-> # 6109a; v. 14; cf. Ex 23.16; Lv 23.34). Neemias também se refere às “leis verdadeiras” que foram dadas a Moisés no Sinai com referência ao Sábado (->). c. Adoração geral no templo. Ezequiel 43.11, 12 e 44.5 fazem referência à “lei do tem plo”, que diz respeito ao sistema geral e às regras para a adoração no templo encontradas em Ezequiel 40—43 (portas e vestíbulos do templo). Uma lei relacionada a essa encontra-se em Esdras 3.2 e Neemias 10.34 [35] e diz respeito ao altar. d. Limpo e imundo. A designação de certos aspectos da vida diária como limpos ou imundos foi ordenada por Javé a fim de manter o caráter separado de seu povo escolhido. A definição exata do que era limpo ou imundo era delineada de acordo com certas tôrôt, par ticularmente em Levítico. Havia regras sobre os alimentos (Levítico 11.46), purificação de pois do parto (12.7), contato com fungos (13.59), doenças de pele (14.2, 32, 57), purificação depois da emissão de sêmen, da menstruação ou de relações sexuais entre um homem e uma mulher cerimonialmente imunda (15.32-33). Números 19.2 trata de uma lei referente à “água purificadora” (v. 21) para alguém que tivesse entrado com contato com um cadáver. Questões 868
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relacionados dizem respeito a regras para a purificação de espólios de guerra (contra os midianitas) por meio do fogo e da água purificadora (31.21) e à “lei do nazireu”, com relação à sua separação do resto dos israelitas (6.13,21). (-> Limpo e Imundo: Teologia) e. A Páscoa e a consagração do primogênito. Os regulamentos sobre a celebração da Páscoa (Êxodo 12) e a consagração do primogênito (cap. 13) são chamados de tôrâ em 12.49; 13.9; 2 Crônicas 30.16; Neemias 10.36 [37], (Páscoa: Teologia) f. Exclusão dos estrangeiros. Tanto Esdras quanto Neemias referem-se a uma regra que impede os israelitas de desenvolverem relacionamentos muito próximos com estrangei ros. Esdras 10.3 parece lançar mão de uma lei que proíbe o casamento com estrangeiros. Não se sabe ao certo a que essa lei diz diga respeito (talvez Deuteronômio 7.3), apesar de a refe rência ser, talvez, à maneira correta de se divorciar da esposa (24.1-4). Neemias 13.3 referese de modo mais geral à exclusão de estrangeiros da congregação tomando por base a lei de Deuteronômio 23.3-6. g. Idolatria. Jeremias 16.11 faz referência explícita à lei sobre a adoração de outros deuses. Tal ato é mencionado com mais freqüência como uma transgressão da aliança. 2. Questões civis, sociais e judiciais. Apesar de ser preciso usar de muita cautela ao distinguir entre os âmbitos “sagrados” e “seculares” da Israel antiga, é útil justapor as formas de uso cultuais/cerimoniais de tôrâ com seu emprego em questões civis em outras partes do AT. Deve-se ter em mente, porém, que é difícil manter uma distinção rígida entre os dois, uma vez que as responsabilidades civis dentro da Israel antiga encontravam-se sob a égide da lei de Deus tanto quanto as regras cultuais. A diferença entre os dois não estava em seu caráter sa grado, mas nas áreas da vida que abrangiam. As regras cultuais referiam-se ao relacionamento dos israelitas com Deus, enquanto as regras civis diziam respeito às questões comunitárias ou sociais. Mesmo assim, estas últimas ainda eram ditadas pelos parâmetros do governo de Deus sobre seu povo. Em Êxodo 18, Jetro aconselha Moisés a escolher setenta anciãos para ajudá-lo a admi nistrar os assuntos do dia-a-dia. Moisés devia ensinar esses anciãos os devidos estatutos e leis (tôrôt) para resolver contendas (v. 16) e outras incumbências da vida diária (v. 20). De acordo com Deuteronômio 17.11, casos difíceis demais de serem julgados eram levados para os levitas. A decisão deles devia ser irrevogável: “Segundo o mandado da lei (hattôrâ) que te ensinarem e de acordo com o juízo que te disserem, farás”. Os juizes nomeados por Josafá (2Cr 19.10) deviam servir ao Senhor fielmente ao julgar de modo apropriado quaisquer casos que o povo levasse diante deles, inclusive questões de homicídio e litígio. Isaías 51.4 justapõe a vinda da lei (tôrâ) e da justiça (mispãt) como características do reinado do Servo (cf. 2.3; 42.4). Haba cuque clama a Javé, falando da aparente relutância de Deus em punir as injustiças cometidas em Judá: “A lei se afrouxa” (Hc 1.4). Em Malaquias 2.9, os sacerdotes são repreendidos por demonstrarem parcialidade ao julgarem questões da lei. 3. Deuteronômio. Ao logo do livro de Deuteronômio e da literatura deut., o termo tôrâ, bem como vários outros títulos, parece ser uma designação para o livro de Deuteronômio, ou pelo menos para o material legal dentro do mesmo livro. Deuteronômio 44.4, por exemplo, apresenta a lei mosaica do restante do livro como hattôrâ (cf. 1.5 e 4.8). Seguem-se as diversas maneiras de como a palavra tôrâ é usada nos títulos dados a Deuteronômio: “Lei” (Dt 1.5; 4.8, 44; 17.18, 19; 27.3, 8,26; 28.58; 29.29[28]; 31.12; 32.46; 3 1.11; Js 1.7; 22.5; 2Rs 17.13[?]; 23.24 [pl., 17.34, 37]); “Livro da (desta) Lei” (Dt 28.61; 29.21 [20]; 30.10; 31.26; Js 1.8; 8.34; 2Rs 22.8); “Lei de Moisés” (Js 8.31; 23.6; 2Rs 14.6); 869
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“Livro da Lei de Moisés” (Js 8.32; lRs 2.3; 2Rs 23.25); “Livro da Lei de Deus” (Js 24.26); “Lei do Senhor” (2Rs 10.31 [ver também SI 1.2]). Títulos semelhantes aparecem em outras passagens do AT, mas, nesses casos, não é pos sível determinar a que se referem com tanta clareza quanto na literatura deuteronômica. Dentre esses títulos, podem-se citar, por exemplo, “Lei” (2Cr 15.3; 14.3 [4]; 34.19; Ne 8.2,9), “Livro da Lei do Senhor (de Deus)” (2Cr 17.9; 2Cr 34.14, 15; Ne 8.3, 8 , 18; 9.3), “Lei do Senhor” (2Cr 12.1; 35.26). Apesar de vários desses títulos serem os mesmos, o conteúdo da tôrâ em Crônicas e Neemias de modo algum é necessariamente idêntico ao seu conteúdo em Deutero nômio, Josué ou Reis. Na verdade, tudo indica que ao chegar ao período posterior ao exílio, quando Crônicas e Neemias foram redigidos, esses títulos designavam mais do que apenas o conteúdo de Deuteronômio. Neemias 10.34 [35], por exemplo, fala da manutenção correta da lenha no altar “como está escrito na Lei”. Apesar de não ficar claro qual seja o referente dessa lei, é provável que ela seja originária de Levítico 6.12-13 e não de Deuteronômio. No entan to, é difícil determinar-se se esses títulos dizem respeito ao Pent., a material legal contido no Pent. ou a alguma outra coisa. 4. Instruções humanas para uma vida de piedade. Mais uma vez, apesar de ser difícil substanciar-se a dicotomia entre “sagrado” e “secular” da Israel antiga, um uso particular do termo tôrâ encontrado ao longo de todo o livro de Provérbios não é de natureza cultuai nem judicial. O filho é admoestado a dar ouvidos à tôrâ de seu pai (Pv 3.1; 4.2; 6.23; 7.2) e de sua mãe (1.8 ; 6.20). Outras passagens parecem referir-se aos ensinamentos do mestre sábio (13.14; 28.4, 7, 9; 29.18). Provérbios 31.26 trata dos ensinamentos da esposa excelente. O contexto dessas passagens indica que o conteúdo da tôrâ diz respeito às instruções sábias e piedosas que visam encorajar uma conduta de sabedoria. Semelhantemente, o Salmo 78.1 começa com o salmista instando o povo a ouvir seus ensinamentos. Essas formas de uso do termo tôrâ nos dão uma idéia da diversidade de significados que o termo possui no AT. 5. Outros. Além dessas quatro categorias relativamente bem definidas, há inúmeras formas de uso para tôrâ que não se prestam a essa categorização. Em vez de reduzir artificial mente a diversidade do termo tôrâ no AT a fim de encaixá-lo em um desses títulos, talvez seja mais prudente mencionar em separado outras maneiras como tôrâ é usado. Numa passagem curiosa em Gênesis 26.5, diz-se que Abraão obedece, entre outras coi sas, o tôrôt de Deus (ver o uso semelhante de swh, “ordenar”, em 18.19). No entanto, Gênesis não especifica exatamente o que são essas leis, um fato que pode indicar que 26.5 apresenta um retrato pós-mosaico de Abraão ou então que essas leis eram normas divinas gerais sem ne nhuma relação com a legislação mosaica. Outras formas de uso de tôrâ: uma referência às tá buas de pedra (Ex 24.12); estatutos sobre a coleta de maná (16.4,28); a prova para uma esposa infiel (Nm 5.30); o modo como Deus trata com as pessoas (2Sm 7.19). Além disso, como foi mencionado acima, várias das formas de uso do termo tôrâ simplesmente desafiam qualquer categorização clara (ver também Jr 9.12; 26.4; 44.10; Lm 2.9). Nem toda menção de tôrâ sig nifica a mesma coisa. Assim, quanto o termo tôrâ é usado sem maiores especificações, muitas vezes fica difícil dizer ao certo e com precisão qual é o conteúdo dessa tôrâ. O que parece ser certo, porém, é que tôrâ refere-se a uma autoridade e costume reconhecido pela comunidade como algo obrigatório e, pelo menos em termos gerais, de origem divina. Disso fazem parte também instruções “humanas” como aquelas de Provérbios (Waltke, 65-78). 6 . Mestres da tôrâ. Os padrões de conduta de Deus e suas respectivas implicações deviam ser ensinados ao povo. A incumbência de ensinar e executar corretamente a tôrâ era 870
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confiada a vários grupos e os mais conhecidos deles eram os sacerdotes e escribas (2Cr 15.3; Ed 7.6, 10; Ne 8.7; Ml 2.6-8). Tendo em vista sua grande responsabilidade, esses indivíduos tinham a obrigação de realizar suas tarefas com fidelidade e integridade. Nem sempre era o que acontecia e algumas palavras duras são reservadas àqueles que não se dedicavam devidamente a esse cargo elevado (Ne 9.34; Jr2.8; 8 .8 ; 18.18; Ez 7.26; 22.26; Os 4.6; 8.12; Zc 3.4). Dizse que o próprio Deus ensina a íôrâ. O Salmo 94.12, por exemplo, declara: “Bem-aventurado o homem, Senhor, a quem tu repreendes, a quem ensinas a tua lei” (ver também Jó 22.22). Em Isaías 8.16 e 20, a lei à qual o profeta se refere não é apenas responsabilidade dele, mas provavelmente, também diz respeito às próprias palavras do profeta sobre a crise assíria (ver também Dn 9.10). Por fim, como foi mencionado acima, tôrâ também é o ensinamento dos pais aos filhos e aos outros. 7. Atitude geral em relação à tôrâ no AT. Dc modo geral, a atitude do AT em relação tôrâ costuma ser positiva. E bem provável que quaisquer declarações negativas explícitas se refiram aos abusos da tôrâ (p. ex., incredulidade) ou digam respeito a questões cultuais (um dos vários significados de tôrâ, ver ISm 15.22-23; Is 1.11-20; Jr 7.21-22; Os 6 .6 ; Am 5.21-24; Mq 6 .6 - 8 ). Com exceção dessa minoria de avaliações negativas, a tendência geral do AT com refe rência à tôrâ, ainda que deva ser definida de acordo com cada caso em particular, é de caráter favorável. A lei é o prazer do salmista (SI 1.2; 119.70, 77, 92, 174). É um objeto de devoção (2Cr 31.4) e de estudo e observância minuciosos (Dt 6.25; 31.11-16; Js 1.8; Ne 8.3, 13). É uma fonte de maravilhas (SI 119.18) e de graça (119.29). É preciosa (119.72) e verdadeira (119.142). Não deve apenas ser obedecida, mas também amada (119.97,113,163,165). O profeta aguarda com grande expectativa o dia em que a lei de Deus estará entranhada no povo de Deus: “Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei” (Jr 31.33). Deve ser ensinada às crianças (Dt 31.33; cf. 11.19-21). Essa visão positiva da lei pode ser mais bem compreendida dentro do contexto da aliança. A lei é uma expressão do amor de Deus por seu povo e de seu compromisso com eles. Ao desfrutarem um relacionamento especial com Javé, os israelitas receberam o privilégio de dirigir toda a vida de acordo com seus padrões de conduta divinos, padrões esses que são um reflexo do caráter de Deus (VanGemeren, 24-25). A fim de se captar a essência de tôrâ no AT, os termos “instrução” ou “ensinamento” com suas conotações modernas particulares podem ser mais apropriados para fazer jus à sua variedade de formas de uso. tôrâ é instrução, quer cultuai ou civil, quer na forma de estatutos legais específicos ou palavras menos formais de orientação de um pai para o filho, quer um conjunto claramente definido de leis como Deuteronômio ou tôrôt, mais difícil de definir-se com precisão. O Salmo 78 é um salmo de relevância particular pelo fato de que não apenas apresenta um exemplo impressionante da diversidade da tôrâ no AT, mas também serve para esclarecer como a tôrâ era compreendida no pós-bíblico e no NT. No v. 1, o salmista exorta seus leitores a lhe ouvirem os ensinamentos, ou seja, a tôrâ. A revelação encontra-se no conteúdo desses ensinamentos. O salmista irá falar de “enigmas dos tempos antigos” (v. 2 ), aquilo que foi pas sado de pai para filho ao longo de gerações sucessivas (vv. 3-4). tôrâ, lei, no v. 1, é paralelo a mãsãl, parábolas no v. 2, ligados de modo quiasmático por pí. A história toda de Israel funcio na como uma parábola que precisa ser interpretada. Um conteúdo específico do ensinamento do salmista é o relato dos “louvores do Senhor, e o seu poder, e as maravilhas que fez” (v. 4). O propósito do salmista ao relatar esses feitos magníficos é o de que as gerações posteriores sejam fiéis ao Senhor e não rebeldes como os pais delas haviam sido (vv. 5-9). Que feitos são esses? O salmista fala do livramento dos israelitas do Egito, do tempo em que vagaram pelo deserto e da entrada deles em Canaã (vv. 9-55). Prossegue recapitulando a rebeldia dos israe 871
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litas mesmo depois de terem entrado na terra prometida e instituído a monarquia; e, por fim, a nomeação de Davi como pastor fiel do povo, um fator que pode indicar aproximadamente o período em que esse salmo foi escrito (vv. 56-72). E importante observar-se que tôrâ compreende não apenas instruções legais ou morais específicas, mas também uma revisão histórica do passado de Israel, ou seja, as partes nar rativas do Pentateuco. Em outras palavras, o Salmo 78 indica que o Pent. como um todo era considerado tôrâ. O salmista emprega os acontecimento e personagens do passado como um meio de instruir seus leitores sobre o que significa (e o que não significa) seguir fielmente ao Senhor. As próprias partes narrativas do Pent. tomaram-se o conteúdo da instrução. Essa visão da tôrâ toma-se comum e até mesmo característica do período pós-bíblico. O Pent. como um todo transforma-se num livro de instrução divina para uma vida de piedade. P-B Na LXX, o termo tôrâ costuma ser traduzido como nomos. O judaísmo pós-bíblico sem dúvida se preocupava em manter um relacionamento apropriado com Deus por meio da obser vância das estipulações legais. A motivação para o desenvolvimento da tradição da lei como um todo (esp. da Mixná e do Talmude) era essencialmente garantir que os santos decretos de um Deus misericordioso e compassivo continuassem a ser observados minuciosamente diante de um mundo em transformação, a saber, a influência do helenismo, a opressão política que chegou ao auge com a destruição do templo e a Diáspora subseqüente. Nesse sentido, a tôrâ foi um ponto de concentração dominante do judaísmo pós-bíblico. Essa concepção da tôrâ pode ser encontrada não apenas em sua codificação na literatura mais importante da lei, mas também por todos os MMM (1 QpHab, IQS, 1QH, CD). Não há dúvida de que a literatura acadêmica sobre a tôrâ no período pós-bíblico é extremamente extensa e a compreensão do papel da lei no período intertestamental passou a ser objeto de escrutínio cada vez maior (ver esp. os ensaios de F. Thielman e D. J. Moo). Contudo, uma percepção correta das questões gerais envolvidas constitui o pano de fundo necessário para o NT, especialmente para a avaliação paulina da tôrâ como um padrão constituído de estipulações legalmente compulsórias. Como vimos no Salmo 78, tôrâ significa mais do que instruções especificamente legais (cultuais e civis) ou de caráter mais geral (Provérbios). Também abrange as partes narrativas do Pentateuco. Assim sendo, o Pent. como um todo, inclusive as pessoas e acontecimentos regis trados em seu texto, tomou-se o conteúdo da instrução para o povo de Deus. De que maneira o povo de Deus deve agir nos dia de hoje? O que deve fazer para viver de maneira agradável ao Senhor? As respostas podem ser encontradas não apenas nos mandamentos explícitos, ou “leis”, mas em todos os acontecimentos e personagens que dominam as narrativas do Penta teuco. As histórias desses cinco livros eram relatadas de modo a elevar ao máximo o conteúdo moral dele visando com isso beneficiar o povo de Deus. Os acontecimentos do passado eram considerados exemplos dos feitos poderosos de Deus, feitos que podem ocorrer em qualquer época e que trazem consigo ensinamentos claros sobre a natureza de Deus e a maneira como ele trata com seu povo. O uso didático do material do Pent. também pode ser observado no modo como Isaías emprega o êxodo como paradigma para a libertação da Babilônia. Persona gens importantes do passado (Adão, Moisés, os patriarcas e outros) eram vistas como lições práticas de conduta moral para o presente. Desse modo, vemos uma tendência da literatura pós-bíblica de retratar esses personagens do passado de modo rígido, em preto e branco, ou seja, sem nenhuma ambigüidade moral. O fenômeno da “Bíblia recontada”, ou seja, de se extrair instruções das narrativas do Pent., é comum no judaísmo pós-bíblico. Dois dos muitos exemplos nas pseudepígrafes são Jubileu e o Livro das antigüidades bíblicas, de Filo. Nos apócrifos, encontramos Judite, Ben 872
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Sira e Sabedoria de Salomão. Sabedoria 10.1-21 é um modelo particularmente útil, não ape nas para ajudar a demonstrar o fenômeno da Bíblia recontada no judaísmo pós-bíblico, mas também na reconsitutição de um contexto adequado para exemplificar o mesmo fenômeno no NT. Sabedoria 10.1-21 apresenta uma recapitulação da história divina de Adão, Caim, Noé, Abraão, Ló, Jacó, José e, por fim e de modo mais detalhado, Moisés e a geração do êxodo. O propósito do autor ao falar desses personagens não é simplesmente dar uma lição de história, mas também de mostrar a presença fiel de Deus no meio de seu povo fiel. Cada personagem serve de lição moral para os leitores, quer pela iniqüidade desses personagens, como no caso de Caim, ou pela retidão deles, no caso dos outros sete. Uma rápida leitura de Sabedoria 10.1 -21 e Eclesiástico 44— 50 revela semelhanças evidentes entre o fenômeno da Bíblia recontada no judaísmo pós-bíblico e várias passagens do NT. NT A palavra G usada com mais freqüência para se referir à lei, nomos, pode ser encontra da ao longo de todos os evangelhos, no conjunto completo das obras de Paulo, bem como em Hebreus e Tiago. A relação da lei do AT com a mensagem do evangelho e, por extensão, com a vida do cristão é um assunto amplamente discutido (ver Strickland [ed.], The Law). Isso se deve principalmente à reavaliação acadêmica recente (e contínua) do significado da “lei” no judaísmo intertestamental. Foram apresentadas argumentações convincentes (sendo a obra de maior influência, possivelmente a de E. P. Sanders, Paul and Palestinian Judaism) de que a visão pós-reformista do judaísmo dos tempos do NT como um movimento morto e legalista, em sua maior parte, pode ser apoiada pela literatura judaica da época. Antes, o Deus do juda ísmo intertestamental é apresentado na literatura da época como sendo amável, cheio de graça e disposto a perdoar. Esse fato levanta várias questões, sendo que uma não menos importan te é a natureza e exatidão da avaliação que Paulo faz de seus contemporâneos (e que, até sua conversão, eram colegas dele). Também desafia a igreja a reavaliar, talvez nem tanto a visão de Paulo da lei, mas a viabilidade do paradigma da Reforma de “justificação pela fé” (esp. no caso de Martinho Lutero), que serviu de base para uma parte tão significativa da teologia pro testante entender as concepções de Paulo. O que os estudiosos têm mostrado nos últimos tempos é a complexidade de questões envolvidas numa compreensão correta da relação do NT com a lei. Qualquer tentativa de resu mirmos essas idéias aqui, ou de apresentarmos um contexto para essa relação, simplesmente serviria como mais um exemplo de reducionismo. Ainda assim, apesar de ser difícil formular declarações abrangentes, é verdade que uma leitura do NT nos dá certas impressões sobre a ligação entre o evangelho e a lei. 1. A lei não é um elemento inteiramente negativo no NT. Não se pode falar de uma dicotomia genérica de lei/evangelho que coloca em conflito os sistemas do AT e do NT. 2. Num certo sentido, Jesus considerava a si mesmo e à sua missão como o cumpri mento da lei do AT (Mt 5.17). 3. A visão de Paulo acerca da lei é extremamente complexa e não permite uma avalia ção simplista. Paulo faz tanto declarações positivas quanto negativas a respeito do papel da lei para aqueles que estão “em Cristo”. 4. As declarações de Paulo sobre a lei não devem ser entendidas fora do contexto no qual Paulo fez tais afirmações. Paulo não estava envolvido em especulações teológicas abstratas. An tes, era um “teólogo-pastor”, dirigindo-se a pessoas específicas com problemas específicos. 5. Por mais positiva ou ambígua que seja a forma como o NT retrata a relação entre a lei e o evangelho, a vinda de Cristo deu início a uma nova era que tomou obsoleto qualquer sistema soteriológico, inclusive o AT, que atuasse fora desse acontecimento. Em outras palavras. 873
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existe tanto continuidade quanto descontinuidade entre a era antes da vinda de Cristo e aquela depois de sua vinda em termos da relação lei — evangelho. Não nos parece seguro ir além disso no presente estudo. Recomendamos que o leitor consulte a bibliografia, especialmente o ensaio de F. Thielman, como ponto de partida para explorar esse assunto em maior profundidade. Como foi indicado acima, pelo menos no período intertestamental, a tôrâ passou a con ter mais que apenas as seções legais do Pentateuco. Sem dúvida, bem antes da época de Jesus, “a Lei” transformou-se numa forma abreviada do Pent. como um todo (Mt 5.17). Pode-se ver em diversas partes do NT que o conteúdo das partes narrativas do Pent. também foi utilizado em função de seu valor didático e existe uma semelhança clara entre essas passagens do NT e outras do AT como o Salmo 78 e obras intertestamentais como Eclesiástico e Sabedoria de Salomão. O uso que o NT faz do gênero conhecido como “Bíblia recontada”, pode ser visto de modo mais evidente em Atos 7.1-53; 13.13-22; Hebreus 11.1 -40; 2 Pedro 2.4-16/Judas 5— 16. E interessante ainda observarem-se aqui não apenas os paralelos entre o NT e a literatura inter testamental com respeito ao gênero da Bíblia recontada, mas também o fato de que, ao recontar o AT, o NT diz certas coisas sobre o AT semelhantes àquilo que pode ser encontrado somente em fontes intertestamentais e não no AT em si. Compreender a tôrâ com esse duplo sentido (elementos legais e narrativos) e procurar basear o uso que o NT faz da tôrâ no meio literário no qual os escritores do NT redigiram seu material, permite que se considerem as grandes complexidades da questão, desafiando assim os participantes da discussão a usarem de cautela em suas próprias avaliações. B ib l io g r a f ia
N1DNTT 2:438-51; TDNT 4:1022-91; THAT 2:1032-43; TWOT 1:403-5; S. H. Blank, “The LXX Renderings o f Old Testament Terms for Law”, HUCA 7, 1930,259-83; G. Braulik, “Die Ausdrücke fur ‘Gesetz’ im Buch Dt.”, Bib 51, 1970, 39-66; J. Charlesworth e C. Evans, eds., The Pseudepigrapha and Early Biblical Interpretation, 1993; Z. Falk, “Hebrew Legal Terms”, JSS 5, 1960, 350-54; JSS 12, 1967, 241-44; JSS 14, 1969, 39-44; S. Greengus, R. Sonsino e E. P. Sanders, “Law”, ABD, 1992,4:242-65; D. J. Moo, “Law”, in Dictionary o f Jesus and the Gospels, 1992,450-61; E. P. Sanders, Paul, the Law Jewish People, 1983; idem, Paul and Palestinian Judaism, 1977; W. G. Strickland ed., The Law, the Gospel and the Modern Christian, 1993; F. Thielman, “Law”, in Dictionary o f Paul andH is Letters, 1993, 529-42; N. T. Wright, The Climax o f the Covenant, 1991; W. A. VanGemeren, “The Law Is the Perfection o f Righteousness in Jesus Christ—a Reformed Perspective”, in Five Views on the Law, 24-35; B. Waltke, “The Authority of Proverbs: An Exposition o f Proverbs \ .2-6", Presbyterion 13, 1987, 65-78; E. Würthwein, “Der Sinn des Gesetzes im Alten Testament”, ZThK 55, 1958, 255-70. Peter Enns Lembrança
# 2349 (zkr I, lembrar)
Lepra -> # 7665 ( s r sofrer de uma doença de pele) Lesão
# 7205 (p s', machucar)
Leste -> # 4667 (mizrâh, nascer do sol. Leste) Levedura -> # 2806 (hms I, ser/estar azedo, levedado) 874
Levítico: Teologia de
Leviatã -> # 4293 (Hwyãtãn, Leviatã) Levita -> # 4290 (lêwi, levita)
Levítico é um livro profundamente teológico. Abriga o cerne do material ritual do sacerdócio do Pent. e, na verdade, de todo o AT. Os estatutos em si costumam ser específicos e detalhados, entretecidos com os aspectos mais intrínsecos da vida pessoal e comunitária da Israel antiga, partindo sem pre, porém, de um ponto de vista notadamente sacerdotal. Levítico é repleto de vários tipos de estatutos que influenciam teologicamente tanto o AT quanto o NT em diversos níveis (p. ex., santidade, pureza, expiação sacrificial, perdão, etc.). Muitos estudiosos observaram que as principais seções da lei do AT começam com leis acerca do altar. A única lei sobre o altar em Êxodo 20.22-26 antecede o Livro da Aliança (Êx 21— 23); Levítico 17 encontra-se no início do Código de Santidade (Lv 17—25; o cap. 26 é a seção sobre as maldições e bênçãos da aliança, e uma comparação de 26.46 com 27.34, indica que o cap. 27 é um suplemento) e limita a imolação de animais no deserto ao altar do tabemáculo. Além disso, os estatutos sobre o santuário central e o altar em Deuteronômio 12, apresentam o cerne das leis deut. (ou seja, Dt 12—26; ver Kaufman, 106 e a literatura ali cita da). Uma vez que Êxodo 25—40 (exceto os caps. 32—34, o episódio com do bezerro de ouro) concentra-se na construção do tabemáculo, inclusive seus altares, também se pode dizer que a legislação sobre o altar antecede as leis sacerdotais do tabemáculo que se estendem de Êxodo 25 a Levítico 16. Ademais, cada um desses mesmos conjuntos de leis terminam com uma legislações sobre a adoração ritual. Os estatutos do Livro da Aliança (Êx 20—23) concluem com a ado ração cultuai para: os sábados (23.10-13), as três principais festas (vv. 14-17) e as ofertas das primícias ao Senhor (vv. 18-19; vv. 20-33 exortam o povo à fidelidade, mas nâo são verda deiramente de caráter legislativo). O Código Sacerdotal (Êxodo 25-Levítico 16) termina com uma santa convocação extremamente importante para a purificação geral do tabemáculo — o dia anual da expiação (Levítico 16). O Código de Santidade em si (Levítico 17—25) conclui com uma lista de estatutos para todos os principais sábados e festas a serem observados a fim de preservar a santidade do povo e da terra (Levítico 23—25). Por fim, Deuteronômio 12— 26 termina com estatutos para a festa das primícias (26.1-11) e a festa do dízimo do terceiro ano (vv. 12-15; cf. 14.28-29). Essas e outras questões de interesse indicam que a preocupação central de todos os conjuntos canônicos de lei do AT era, acima de tudo, a adoração fiel ao Senhor, o único Deus de Israel. O livro de Levítico em particular, concentra-se no sistema de adoração no tabemá culo e a preocupação associada a este com a santidade e pureza da comunidade. Seu interesse teológico central é a presença de Deus no meio do povo de Israel (Wenham, 16-18; Hartley, lxii-lxiv; para a relação entre as abordagens críticas superiores ao livro e sua teologia, ver mais adiante a seção sobre estrutura literária). Levítico: Teologia de
A. Contexto histórico 1. Desde o princípio de seu ministério, Moisés havia-se firmado na promessa da sença e do auxílio de Deus (Êx 3.12, o Senhor disse a Moisés: “Eu serei contigo”) e, de acordo com a ordem dada por Deus a Moisés, esse era o propósito essencial do tabemáculo: “E [os is raelitas] me farão um santuário, para que eu possa habitar no meio deles” (25.8). Na realidade. 875
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o plano do Senhor era habitar no meio deles de maneira visual (cf. o mesmo posteriormente com relação ao templo, 2Sm 7.1-2,5-7, 13; 1Rs 8.27). Pode-se dizer que o Senhor Deus fez-se, literal, tangível e até “fisicamente” presente no tabemáculo ainda que um lugar como esse não pudesse contê-lo (cf. 1Rs 8.13, “Na verdade, edifiquei uma casa para tua morada, lugar para a tua etema habitação”, 8.27, “Mas, de fato, habitaria Deus na terra? Eis que os céus e até o céu dos céus não te podem conter, quanto menos esta casa que eu edifiquei”). O episódio do bezerro de ouro (Êxodo 32—34) separa a seção de instruções daquela de realização dentro do relato da construção do tabemáculo (caps. 25— 31 e 35— 39, respec tivamente). No meio desse incidente, o Senhor falou a Moisés: “Enviarei o Anjo adiante de ti” (33.2), pois o Senhor concluiu que se ele próprio fosse com eles certamente acabaria por destrui-los no caminho (v. 3). Moisés, por sua vez, disse: “Se a tua presença não vai comigo, não nos faças subir deste lugar. Pois como se há de saber que achamos graça aos teus olhos, eu e o teu povo? Não é, porventura, em andares conosco, de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da terra?” (33.15-16). O Senhor respondeu à súplica de Moisés concordando em continuar com sua própria presença no meio do povo (v. 17). 2. Essa promessa da presença divina serve de pano de fundo para o último cap. de Êxo do, no qual Moisés construiu e preparou o tabemáculo para o Senhor (Êx 40.1-33), depois do que Deus passou a habitar ali na forma de uma nuvem de glória com fogo dentro de si duran te a noite (40.34-38; cf. a teofania do monte Sinai, 19.16-25; 20.18-21; e a coluna de nuvem durante o dia e de fogo durante a noite já no caminho para o Sinai, 13.21-22). Em Números 9.15-23, encontramos uma segunda descrição expandida da nuvem e sua função de conduzir Israel pelo deserto. Essas duas descrições da nuvem e do fogo de glória cercam o ritual ligado ao tabemáculo e a legislação comunitária em Levítico 1.1—Números 9.14. A relevância literária e teológica dessa estrutura geral apresenta três partes, a. A única menção da aparição da glória do Senhor ao povo entre Êxodo 40 e Números 9 encontra-se em Levítico 9.23 (cf. v. 6 ). Nesse contexto, “a glória do Senhor apareceu a todo o povo. E eis que, saindo fogo de diante do Senhor, consumiu o holocausto e a gordura sobre o altar” (9.23-24). b. A única passagem entre Êxodo 40 e Números 9 na qual o texto declara explicitamente que a nuvem de glória do Senhor apareceu é em Levítico 16.2, em que o Senhor explica: “aparecerei na nuvem sobre o propiciatório”. c. A morte de Nadabe e Abiú em 10.1-2 ocorreu em algum momento ao longo do mesmo dia em que o Senhor manifestou a sua glória a todo o povo, conforme relata Levítico 9 (ver esp. 9.1, 23-24), mas antes da realização esperada da refeição sacrificial da oferta pelo pecado da qual os sacerdotes tomaram parte no mesmo dia (cf. 10.1619 com 9.15 e a discussão mais detalhada dessa tragédia no artigo sobre “Limpo e Imundo”). Assim como o fogo havia saído de diante do Senhor e consumido as ofertas sobre o altar em 9.23-24, alguns versículos depois, “saiu fogo de diante do Senhor e os consumiu; e morreram perante o Senhor” (10.2). Além disso, 16.1-2 remete à tragédia de 10.1-2 como contexto e base para as regras minuciosas do dia da expiação. Assim, a morte de Nadabe e Abiú foi uma oportunidade para que o Senhor declarasse os princípios fundamentais subjacentes da teologia sacerdotal e, portanto, resumisse as principais preocupações teológicas do livro de Levítico (ver Temas Teológicos, seç. 1). Todas essas questões centrais refletem, antes de mais nada, o fato de que o Senhor estava habitando no meio de Israel. Estava presente ali no tabemáculo, manifestando sua glória na forma de nuvem e fogo. B. Estrutura literária 1. A estrutura geral de Levítico. Levítico se divide naturalmente em duas seções pri cipais, Levítico 1— 16 e 17—27. A primeira seção trata essencialmente da consagração e puri 876
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ficação do tabemáculo em si; a segunda seção, apesar de ainda tratar da santidade e pureza do tabemáculo, amplia o seu enfoque de modo a abranger toda a terra e o povo em geral. Pode-se dizer que ocorre um movimento da santidade e pureza do tabemáculo para a santidade e pu reza nacionais. Essa distinção entre o mundo do tabemáculo e a vida dos israelitas comuns como naçâo, porém, leva à conclusão de que os dois não foram intimamente ligados ao longo da história de Israel (em oposição à proposta de Knohl, The Sanctuary o f Silence, 225-30). Muito pelo contrário, uma das principais características da proposta do Senhor de entrar em aliança com a nação, quando os hebreus chegaram ao Sinai, era que Israel se tomaria um “reino de sacer dotes” (Êx 19.6). Foram consagrados como tal no ritual de 24.3-8. O sangue consagrador do animal sacrificial foi aplicado em toda a congregação. “Então, tomou Moisés aquele sangue, e o aspergiu sobre o povo, e disse: Eis aqui o sangue da aliança que o SENHOR fez convosco a respeito de todas estas palavras” (24.8). Para os sacerdotes, o sangue foi aplicado à ponta da orelha direita, ao polegar da mão direita e ao polegar do pé direito de cada um deles (29.20-21; ver selem, oferta pacífica, # 8968, para uma explicação completa sobre essa relação entre 24.8 e 29.20-21). Com respeito ao livro de Levítico, o sacerdócio nacional de todo o povo cor responde à necessidade de santidade e pureza nacionais, conforme Levítico 17—27. A família dos sacerdotes arônicos, porém, era encarregada do tabemáculo e, portanto, tinha a responsa bilidade de certificar-se de que nem eles e nem o povo (individualmente ou como um todo) profanassem a santidade e pureza do tabemáculo, conforme Levítico 1— 16. Uma análise teológica minuciosa do livro de Levítico relaciona as categorias de santi dade e pureza (ou seja, santo e comum / imundo e limpo, ver Temas Teológicos, seç. 1) tanto ao tabemáculo em si quanto à nação como um todo. Da mesma forma, a expiação se aplica a ambos e, na verdade, recebe ênfase especial no ponto de transição do livro (ou seja, Levítico 16, o dia da expiação), concentrando-se mais uma vez na preocupação central com a presença de Deus no tabemáculo no meio da comunidade israelita. Assim, a estrutura interna literária e teológica do livro apresenta esses três tópicos principais: expiação, santidade e pureza do ta bemáculo e santidade e pureza nacionais. 2. Levítico 16 como centro literário e teológico. Ainda que em termos estruturais Le tico 16 seja a conclusão da primeira seção principal do livro (ou seja, Lv 1— 16, ver abaixo), também serve de centro teológico para a obra e liga suas duas metades. O dia da expiação vi sava à santidade e pureza tanto do tabemáculo quanto de Israel como nação (Milgrom, 51; ver Wright para uma análise completa da “eliminação da impureza” na Israel antiga). Na verdade, eram realizadas cinco ofertas nesse dia: as duas ofertas pelo pecado com expiação por sangue pelos sacerdotes e o povo (16.3,5 e esp. vv. 11 -19), a oferta de um só bode expiatório por toda a congregação (inclusive os sacerdotes e o povo, 16.20-22) e, por fim, dois holocaustos pelos sacerdotes e pelo povo (16.23-24). Diz-se especificamente que todas essas ofertas tinham como propósito fazer expiação (vv. 6 , 10, 11, 16, 17, 18, 20, 24, 27, 30, 32, 33, 34). Os rituais de oferta pelo pecado com expiação por sangue pelos sacerdotes e pelo povo purificavam e (re)consagravam o tabemáculo das impurezas do povo (16.11-19; observar esp. vv. 16e 19; cf. 5.3; 7.20-21; 14.19; 15.3, 19-25,30-31; 18.19; 22.3,5). O ritual do bode expia tório, que era um tipo diferente de oferta pelo pecado, mas ainda assim dentro dessa categoria (16.5, 7-10, 20-22; kpr, # 4105), também realizava uma espécie de expiação (v. 10). Nesse caso, porém, a expiação facilitava a remoção de todas as iniqiiidades de todo o povo de Israel como nação ao mandá-las embora de seu tabemáculo e sua nação na cabeça do bode que ia para o deserto (16.20-22; observar esp. vv. 2 1 - 2 2 e o termo, 'ãwôn, iniqüidade, traduzido por vezes como perversidade, culpa ou castigo, em 5.1, 17; 7.18; 10.17; e esp. 17.16; 18.25; 19.8; 20.17, 19; 22.16; 26.39-43). 877
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Desse modo, os rituais de ofertas pelo pecado do dia da expiação purificavam não apenas o tabemáculo (Lv 16.32-33, com referência aos rituais de sangue em 16.11 -19) mas também o povo (16.29-31, com referência ao ritual do bode expiatório em 16.20-22). 3. Levítico 1— 7 e as ofertas. Os estatutos referentes à santidade e pureza do tabemá culo em Levítico 1— 16 encaixam-se em duas subseções principais, caps. 1— 7 e 8— 16. Esta última apresenta as ocasiões às quais se aplicavam as ofertas descritas na primeira. Assim, os caps. 1— 7 são constituídos de regras detalhadas para os procedimentos sacrificiais básicos (veros resumos gerais em Wenham, 25-29; Hartley, lxvii-lxxii; Milgrom, 49-51; -> Ofertas e Sacrifícios: Teologia; para comentários mais detalhados -> õlâ I, holocausto, # 6592 [1.3-17 com 6.8-13 (1-6) e 7.8]; minhâ, dádiva, oferta de manjares, # 4966 [2.1-16 com 6.14-23 [7-16] e 7.9-10]; selem, oferta pacífica, # 8968 [3.1-17 e 7.11-34]; ha((ã't, oferta pelo pecado, # 2633 [4.1-5.13 e 6.24-30 (17-23)]; e asãm, oferta pela culpa, # 871 [5.14-6.7 (5.14-26) e 7.1-7]). Levítico 1.1 associa esses estatutos acerca dos sacrifícios nos caps. 1— 7 com a construção e ocupação do tabemáculo relatada em Êxodo 40: “Chamou o Senhor a Moisés e, da tenda da congregação, lhe disse...” (Lv 1.1). A presença do Senhor não é apenas a principal preocupação teológica de Levítico, mas também a força motivadora e a razão de ser do livro. Os indicadores estruturais em Levítico 1—7 são bastante úteis. Levítico 7.35-36 é a conclusão dos estatutos acerca dos deveres dos sacerdotes em 6 .8— 7.34 [6 .1—7.34] e 7.37— 38 encerra a seção toda que vai de 1.1 a 7.38. Em decorrência disso, têm-se duas divisões princi pais nos caps. I —7: a descrição dos rituais em 1.1 —6.7 [5.26] (ver acima) e os estatutos acerca das porções para os sacerdotes e para o povo em 6.8 [6.1]— 7.34. Subdividindo o texto ainda mais, Moisés aparece 4x em Levítico 1.1-6,7[5.26]: a. 1.1 “Chamou o Senhor a Moisés e, da tenda da congregação, lhe disse...”; b. 4.1, “Disse mais o Senhora Moisés...”; c. 5.14, “Disse mais o Senhor a Moisés...”; d. 6.1 [5.20], “Falou mais o Senhor a Moisés, dizendo...” (para detalhes sobre essa estrutura, ver 'õlâ 1, holocausto, # 6592; hattã’t, oferta pelo pecado, # 2633; ’ãsãm, oferta pela culpa, # 871; e o artigo “Ofertas e Sacrifícios”, secs. 12-13). De um modo ou de outro, cada uma dessas introduções constitui uma interrupção literária dentro da unidade de Levítico 1—7. 4. Levítico 8—16 e o tabemáculo. Diante da referência à oferta de ordenação em 7.37, tem-se a impressão de que Levítico I— 7 foi colocado no começo do livro, pelo menos em parte, devido ao fato de ser um pano de fundo necessário para as narrativas de ordenação e consagração do tabemáculo e dos sacerdotes em Levítico 8 e 9. Levítico 8 .1-2 abre essa seção do livro com o Senhor ordenando a Moisés que consagre o tabemáculo e o sacerdócio. Leví tico 9 descreve a consagração do tabemáculo, que termina com o fogo do Senhor consumindo os sacrifícios (9.22-24), bem como Nadabe e Abiú (10.1-2; ver acima. Contexto Histórico). Levítico 16 volta ao episódio de Nadabe e Abiú (vv. 1-2) tomando-o por base para a legislação do dia anual da expiação, cujo propósito era purificar e consagrar o tabemáculo, o sacerdócio e a congregação para o ano seguinte. É esp. importante perceber-se a relação entre a primeira consagração do tabemáculo em Levítico 9 e a renovação anual do sistema do tabemáculo no dia da expiação no cap. 16. Há diferenças significativas entre os dois capítulos (p. ex., o bode expiatório, que aparece no cap. 16, mas não no cap. 9 e, por outro lado, a oferta pacífica presente no cap. 9, mas não no cap. 16), mas em ambos os casos o enfoque é claramente no tabemáculo em si e há tanto ofertas pelo pecado quanto holocaustos pelos sacerdotes e também pelo povo (cf. 9.7-17 com 16.519,24). Os procedimentos de ordenação no cap. 8 prepararam o sacerdócio para o trabalho no tabemáculo como representantes da congregação toda nos caps. 9— 16. 878
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Não cabe aqui tratarmos de detalhes (-> Limpo e Imundo), mas Levítico 11— 15 cons titui uma lacuna dentro da estrutura narrativa dos caps. 8— 16. Os capítulos em si formam uma unidade coesa de estatutos que se concentram quase que exclusivamente nos problemas de san tidade, pureza e expiação (cf. 10 . 10 , 17), sua importância para a comunidade e especialmente com relação à presença de Deus no tabemáculo (15.31: "Assim, separareis os filhos de Israel das suas impurezas, para que não morram nelas, ao contaminarem o meu tabemáculo, que está no meio deles” ). Esses três temas — santidade, pureza e expiação — constituem as categorias teológicas centrais de Levítico (ver Estrutura Literária, seção 4; Temas Teológicos, seção 1). No OMA era comum o povo lutar contra o medo de forças malignas sobrenaturais (p. ex., feitiçaria, demônios, deuses perversos, etc.), que podiam voltar-se contra ele na forma de doenças ou infortúnios na vida, especialmente se uma pessoa quebrava algum tipo de tabu. Alguns estudiosos diriam que tais preocupações também faziam parte essencial do sistema ritual de Israel no AT. Apesar de ser verdade que o povo talvez tivesse sofrido a influência de certas concepções da magia no contexto cultural dele (ver p. ex., Levine, 1974, 63-91, esp. 77-78 para um resumo bastante útil dessa idéia), ainda assim o AT em si não dá crédito algum a esses temores. Antes, o único perigo verdadeiro era que o povo de Israel pudesse profanar o santuário de Deus, levando Javé a voltar-se contra os israelitas (p. ex., 10.1 -2) ou abandonar de todo o santuário (p. ex., Ez 8 — 11; ver Milgrom, 42-44,47, para essa visão oposta à magia dentro do sistema levítico). Levítico 15.31 ressalta essa questão. Muitos leitores do AT consideram a ênfase na pureza e impureza físicas um tanto per turbadora. Como observamos anteriormente, é importante reconhecer que, no AT, Deus se fez presente de modo visual e até físico em Israel ao habitar no tabemáculo na forma de uma nuvem de glória (ver acima. esp. o comentário sobre Ex 40.34-38; Lv 9.22-24; 16.1-2; Nm 9.15-23). Esse lugar de presença física visível é justamente o enfoque da visão de mundo a da teologia sacerdotais com as quais o livro de Levítico se identifica de maneira tão próxima. As leis de pureza física correspondem à presença física do Senhor no tabemáculo. No tocante a ofertas e sacrifícios, de acordo com Hebreus 9.13, “ o sangue de bodes e de touros e a cinza de uma novilha, aspergidos sobre os contaminados, os santi ficam, quanto à purificação da carne”. Em termos simples, os sacrifícios do AT purificavam fisicamente a carne dos israelitas antigos, numa correspondência com a presença visual (ou seja, física) de Deus no meio deles (tabemáculo). O versículo seguinte de Hebreus diz: “muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito etemo, a si mesmo se ofereceu sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência de obras mortas, para servirmos ao Deus vivo!” (9.14). O sacrifício de Cristo purifica a consciência, que corresponde à presença do Espírito Santo em nosso meio de forma espiritual (ver o detalhes em “Limpo e Imundo”, seção 2; “Ofertas e Sacrifícios: Teo logia”, secs. 14-16). Na realidade, a preocupação fundamental de Deus nas leis sobre animais limpos e imundos era com a santidade do povo (ver Budd, para uma breve crítica das opiniões de estu diosos a esse respeito, e Houston, para uma monografia completa recente). E nesse contexto que encontramos a primeira ocorrência canônica do lema: “Vós sereis santos, porque eu sou santo” (Lv 11.44-45). A santidade em Israel começava com a santidade do tabemáculo e dos sacerdotes (ver esp. 8.10-15,30; 10.3, 12.13, 17-18; 16.19,24), mas estendia-se a todo o povo e nação, que eram o enfoque principal do “Código de Santidade” (ou seja, caps. 17—27; ver esp. a relação de 11.44-45 com 20.22-26 e a seção seguinte). A concepção de mundo sacerdo tal abrange toda a criação e sua relação com Israel como uma nação no meio da qual o Senhor habita (Gorman). Dentro dessa nação como lugar da presença de Deus, havia diferentes graus de santidade que ia desde o Santo dos Santos no tabemáculo até à comunidade fora da área 879
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do tabemáculo (Jenson). Tratava-se não apenas da dimensão espacial, mas também da dimen são individual (de ofertas santas a santíssimas) e temporal (do sábado semanal aos dias santos festivos anuais). 5. Levítico 17—27 e a santidade epureza nacionais. A conclusão de Levítico 16, no 34, e a menção de Moisés, novamente em 17.1, indicam outra interrupção estrutural e, dessa vez, um tanto longa. O desenvolvimento estrutural e temático dos caps. 17—26 (a segunda maior seção do livro, chamada de Código de Santidade, desde Klostermann no final do sécu lo XIX e abreviada como H) é mais difícil de distinguir do que o desenvolvimento dos caps. I — 16 (o cap. 27 é um acréscimo). A relação literária e teológica entre essas duas seções do livro é igualmente complicada (ver um resumo sucinto das críticas dos estudiosos sobre os caps. 17—26 em Knohl, 1995, 1-6; o levantamento geral em “Ofertas e Sacrifícios”, seçs. 10II e os parágrafos a seguir). Nas palavras inequívocas de Wellhausen, “o conjunto de leis contidas em Levítico xviixxvi, como bem se sabe, foi simplesmente redigido e incorporado pelo autor do Código Sacer dotal e, a princípio, era um conjunto independente de escritos que marcava a transição do Deu teronômio para o Código Sacerdotal, ora mais aproximado de um, ora de outro” (Wellhausen, 86 n. 1). Ademais, “é fato universalmente reconhecido que a última edição da Lei da Santidade é procedente do Código Sacerdotal” (ibid., 379) e “a crítica de Levítico xvii seq. nos leva ao resultado de que um conjunto de leis formadas durante o período do exílio foi incorporado ao Código Sacerdotal e reavivado dentro dele" (ibid. 384). Assim, de acordo com Wellhausen, “H constitui um estádio intemiediário entre as fontes J, E e D e a fonte S, e, desse modo, ainda contém parte do espírito da adoração ritual popular, mas também mostra sinais da concepção Sacerdotal que atingiria sua consolidação plena em S” (Knohl, 1995, 4). Por mais bem aceita que a teoria de Wellhausen sobre S e H tenha sido entre os estudio sos críticos do final do século XIX e no século XX, há aqueles que observaram que pelo me nos dois elementos dos costumes rituais de S já eram conhecidos no OMA no segundo milênio a. C. (ver Weinfeld). Certos estudiosos usaram esses dados para apoiar uma data mais antiga (ou seja, anterior ao exílio) para S, o que, por sua vez, cria problemas sérios para a datação de H no período do exílio ou logo após o exílio, determinando a prioridade histórica de H sobre S. Podem-se observar duas tendências ou propostas gerais entre os estudiosos com referência a S (ver Knohl, 1995, 4-6). Um grupo de estudiosos considera H uma parte essencial de S e não uma fonte distinta. Outro grupo argumenta que P e H eram fontes distintas, sendo que am bas foram escritas por sacerdotes que constituíam uma elite cujo contato e influência sobre o povo comum era limitado. Em tempos mais recentes, Knohl propôs outra solução. Ele considera H e P duas fontes sacerdotais completamente distintas que foram produzidas por duas escolas sacerdotais separa das: a escola S, que produziu a Torá Sacerdotal (TS), e a escola H (EH), que produziu o Código de Santidade. Porém, ele inverte a ordem da redação, sugerindo que a escola H foi responsável pela edição e formatação final do Pentateuco. Em termos de sua teologia, “A filosofia da TS concentra-se nas concepções sacerdotais da crença e do ritual e na diferenciação destas da cren ça e do ritual das massas, enquanto a EH procura entretecer e mesclar os elementos sacerdotais da crença e do ritual com as tradições e costumes populares” (ibid., 6-7). Assim, Knohl acaba numa bifurcação entre a visão de mundo estritamente sacerdotal de Levítico 1— 16 (ou seja, TS) e a visão de mundo mais socialmente integrada de Levítico 17— 26 (ou seja, EH). Knohl chega a argumentar, em oposição a Milgrom, que “TS percebe uma separação total entre a esfera ética e a cultuai” e a afirmar que “o sistema legal promulgado no tempo de Moisés não contém um só mandamento cuja única preocupação seja a manutenção da morali 880
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dade e da justiça social” (ibid., 226). Sua conclusão é que o ponto de vista profético enfatizava a moralidade e a justiça social em oposição a TS, que enfatizava a ordem cultuai de modo a excluir as preocupações éticas e morais dos profetas. “Somente com o surgimento da escola Sacerdotal posterior, a ‘Escola da Santidade’ é que encontramos uma interpenetração das con siderações éticas e cultuais” (ibid., 229-30). Não cabe aqui resumir, analisar e criticar a posição de Knohl em todos os seus detalhes. Em termos gerais, aquilo que temos, na mudança de Levítico 1— 16 para Levítico 17—27, é mais uma alteração de perspectiva (ver a seção seguinte sobre a relação entre o cap. 27 e os caps. 17—26) do que uma mudança de assunto. Levítico 17—27 apresenta outra visão dos pro cedimentos cultuais da perspectiva mais ampla da comunidade e nação como um todo. Esses pontos de vista distintos, porém, não são teologicamente contraditórios, mas sim complementares. Além disso, não precisam ser historicamente seqüenciais, podendo ter sobrevivido e, de fato se desenvolvido lado a lado contemporaneamente. Teria sido natural os sacerdotes verem o tabemáculo de dentro para fora, mas, a fim de relacionar o tabemáculo com o povo, também era preciso que o vissem de fora para dentro, o ponto de vista natural do povo comum. Em termos essenciais, essa é a distinção entre Levítico 1— 16 e Levítico 17—27, respectivamente. Conforme a colocação de Milgrom, apesar de haver diferenças gritantes entre S e H (Milgrom, 48-49), ainda assim, de modo geral, S e H “constituem um só conjunto contínuo: H articula e desenvolve aquilo que é incipiente e até mesmo latente em S” (ibid., 42). Apesar de Levítico 17—27 ainda fazer referência às ofertas sagradas, por exemplo, elas são consideradas do ponto de vista de como os sacerdotes, suas famílias e o resto do povo de Israel devem lidar com elas durante as festas comunitárias (cap. 22) ou quanto à relação entre aquilo que foi consagrado e a comunidade em geral (cap. 27). Da mesma forma, essa seção do livro refere-se ao tabemáculo, mas o faz de uma perspectiva mais ampla, tratando do efeito que a reverência pela presença de Deus no tabemáculo deve ter sobre a nação como um todo quer seja em sua viagem pelo deserto (cap. 17) ou depois de assentados na terra prometida (ver esp. 19.30; 20.3; 26.2). 6. Santidade e pureza nacionais com respeito à adoração no tabemáculo (Levítico 1 No que se refere à estrutura do livro, Levítico 17 mostra-se problemático, pois tem relações estreitas tanto com Levítico 1— 16 quanto com 18—27. Por um lado, assim como o cap. 27, Levítico 17 não usa as fórmulas padronizadas tão características do Código de Santidade pro priamente dito nos caps. 18—26 (ver Temas Teológicos, seção 3). Além disso, o cap. 17 trata da relação entre o tabemáculo e o povo durante a viagem pelo deserto, ao passo que os caps. 18—27 mudam o enfoque para a ocupação da terra pelos israelitas. Essas características indi cam que o cap. 17 deve ser considerado separadamente dos caps. 18— 27. Por outro lado, a fórmula de obediência em Levítico 21.24 (“Assim falou Moisés a Arão, aos filhos deste e a todos os filhos de Israel”) parece concluir uma subseção introduzi da exatamente pela mesma terminologia em 17.2 (“Fala a Arão, e a seus filhos, e a todos os filhos de Israel”). Além disso, o objetivo principal dos estatutos do cap. 17 era reforçar uma das principais preocupações do Código de Santidade: a exclusividade absoluta da adoração a Javé. Ao exigir que todos os animais domésticos abatidos para uso na alimentação fossem le vados ao tabemáculo como ofertas pacíficas ao Senhor (v. 5), o cap. 17 removia até mesmo a oportunidade de envolvimento naquilo que chama de “prostituição” espiritual (v. 7), pelo me nos enquanto o povo estivesse a caminho da terra prometida. O mesmo termo é empregado no Código de Santidade propriamente dito (ou seja, caps. 18—26) para a adoração a Moloque e o serviço de médiuns e espíritas, que se tomariam um perigo em potencial especialmente depois 881
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que os israelitas tivessem ocupado a terra de Canaã, onde tais práticas eram comuns (20.5-6; cf. 18.21; 19.31; 20.27). E particularmente significativo que, apesar de Levítico I— 16 certamente partir do pressuposto de que a adoração em Israel devia ser dedicada exclusivamente a Javé, a primeira proibição expressada contra a idolatria em Levítico encontra-se no cap. 17 e corresponde ao primeiro elemento do sumário em 26.1: “Não fareis para vós outros ídolos...”. Nos caps. 17— 27, em vez da fidelidade cultuai nacional ser pressuposta, é legislada e enfatizada. Trata-se de parte de uma perspectiva nacionalista mais ampla do Código de Santidade em sua relação com a presença do Senhor no tabemáculo em meio à nação. 7. Santidade epureza nacionais na terra (Levítico 18—20). A ênfase nacionalista con tinua em Levítico 18— 20, que é destacado como uma unidade distinta pela correspondência entre a introdução em 18.1-5 e a conclusão em 20.22-26. Em 18.2-3, o Senhor dá a Moisés a seguinte instrução: “Fala aos filhos de Israel e dizei-lhes: Eu sou o Senhor, vosso Deus. Não fareis segundo as obras da terra do Egito, em que habitastes, nem fareis segundo as obras da terra de Canaã, para a qual eu vos levo, nem andareis nos seus estatutos”. Levítico 20.23-26 conclui na mesma linha: “Não andeis nos costumes da gente que eu lanço de diante de vós, porque fizeram todas estas coisas; por isso, me aborreci deles... Eu sou o Senhor, vosso Deus, que vos separei dos povos... Ser-me-eis santos, porque eu, o Senhor, sou santo e separei-vos dos povos, para serdes meus” (cabe lembrar aqui de nossos comentários anteriores sobre as leis acerca dos animais limpos e imundos no v. 25). Assim, Levítico 18—20 exorta a nação israelita especificamente a seguir os padrões de santidade e pureza que a distinguiria das outras nações com as quais haviam tido ou teriam contato, como os egípcios e cananeus. Levítico 18.4-5 e 20.22-24 referem-se aos estatutos e ordenanças intervenientes que, caso fossem seguidos, separariam os israelitas das outras nações. Nessa seção, o perigo de contaminar o tabemáculo (20.3; cf. 15.31) é expandido de modo a tratar do perigo de contaminar a terra (18.24-30), e do perigo de profanar o nome do Senhor ao prestar falso juramento (19.12) estende-se a profanar uma filha “fazendo-a prostituir-se” (19.29). A primeira vista, Levítico 20.27 dá a impressão de estar deslocado, mas um exame mais minucioso desse versículo mostra que ele ajuda a envolver as leis por precedência em 20.9-21 (cf. 20.6-8 e 20.22-27 como seção inicial e final, respectivamente). Essas passagens que emol duram o restante do texto entre elas também se encontram dispostas de maneira quiasmática: a proibição relativa a médiuns e espíritas (vv. 6 e 27), variações da fórmula da santidade (vv. 7 e 25-26) e referências aos estatutos (e julgamentos; vv. 8 e 22-24). Ao mesmo tempo em que, em termos estruturais essas passagens emolduram as leis por precedência em 20.9-21, em termos teológicos, voltam a ressaltar a importância da santidade nacional. E possível que seja preciso acrescentar 20.1-5 ao quiasmo e usar essa passagem para ligar o cap. 20 aos caps. 21—22, em que o enfoque volta-se mais uma vez para o santuário (cf. 20.3). 8 . A santidade e pureza do santuário nacional na terra (Levítico 21—22). Em 20.7-8, o Senhor diz por intermédio de Moisés: “Portanto, santificai-vos e sede santos, pois eu sou o Senhor, vosso Deus... Eu sou o Senhor, que vos santifico”. Variações semelhantes da fórmula da santidade se repetem ao longo dos caps. 21-22 (ver esp. 21.8, 15, 23; 22.9, 16) até a con clusão com outra referência à nação toda, como nação santa, santificada pelo Senhor para si: “Não profanareis o meu santo nome, mas serei santificado no meio dos filhos de Israel. Eu sou o Senhor, que vos santifico, que vos tirei da terra do Egito, para ser o vosso Deus. Eu sou o Senhor” (22.32-33; cf. Ex 19.6a, “Vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa"). Porém, as outras referências aqui dizem respeito não à santidade de Israel como um todo, mas sim, à 882
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santidade dos sacerdotes (21.8,15), das diversas partes do tabemáculo (21.24) e dos sacrifícios sagrados (que provavelmente é a melhor interpretação para “os” em 22.9, 16). Mais uma vez, contudo, apesar de o enfoque voltar para o tabemáculo, ainda assim o tabemáculo em si é visto do ponto de vista do contato dele com a comunidade a seu redor e com a nação. Um sacerdote ou sumo sacerdote podia contaminar e profanar tanto a si mesmo como ao nome de seu Deus por meio do tipo indevido de contato ou envolvimento com a co munidade (21.1-15). Um sacerdote imperfeito podia profanar os santuários (21.16-23). Um sacerdote contaminado ou uma pessoa comum podia profanar as coisas sagradas (22.1-16). Por fim, a pessoa comum dessa nação santa podia profanar o nome do Senhor ao manusear in corretamente suas porções dos diversos tipos de ofertas pacíficas (22.17-31). Este último caso mostra que pelo menos um elemento de santidade transpõe a separação entre os caps 18— 2 0 e 21—22, a saber, a ênfase na santidade do nome do Senhor Deus que aparece em todos os capítulos (18.21; 19.12; 20.3; 21 .6 e 22.32). 9. Observância nacional do sábado na terra (Levítico 23—27). A preocupação co nome de Deus continua na subseção seguinte, em que o enfoque principal se desloca do san tuário para a santidade sabática em Israel. Levítico 24.10-23 levanta a questão do que fazer se alguém em Israel “blasfemou o nome do Senhor e o amaldiçoou” (v. 11). A resolução judicial desse caso (vv. 13-16, 23) fomece um pretexto para uma expansão textual de modo a contem plar a legislação para a resolução judicial de outros casos de morte e ferimento na Israel antiga (vv. 17-22; cf. Êx 21.23-25). A expansão legislativa nessa passagem e, de fato, em um número considerável de outros estatutos e ordenanças em outras passagens no Código de Santidade é semelhante a algumas partes do Livro da Aliança (Êx 21—23). Em termos gerais, esses paralelos parecem indicar que o Código de Santidade é o aspecto que o tipo de lei encontrado no Livro da Aliança adquire quando observado do ponto de vista da santidade em vez do processo legal. Afinal, tudo indica que Moisés recebeu o Livro da Aliança do Senhor antes de haver um tabemáculo. O Código de Santidade pode ter sido a forma de o Senhor mostrar o aspecto de tudo isso do ponto de vista de sua presença pessoal como Deus que habitava no tabemáculo. O termo santo é muito usado para se referir aos estatutos sabáticos em Levítico 23 e 25. A legislação sobre o sábado semanal e as festas anuais começa no cap. 23; os estatutos sobre os anos sabático e de jubileu no cap. 25 concluem a legislação sabática. Levítico 24 encontrase no meio dessa legislação e enfatiza a presença diária (vv. 1-4) e semanal (vv. 5-9; ver “sá bado” no v. 8 ) do Senhor no tabemáculo e, diante disso, a importância de tratar tanto o Nome do Senhor (vv. 10-16, 23) quanto o seu povo (vv. 17-22) com o devido respeito (ver acima). No entanto, a preocupação com os sábados não se limita aos caps. 23—25. No cap. 19, o man damento para observar os sábados aparece quase em seguida à formula de santidade (v. 2 ) e logo depois do mandamento para respeitar mãe e pai (v. 3). No mesmo capítulo, é colocado juntamente com a reverência pelo santuário como uma das principais preocupações quanto à santidade na Israel antiga: “Guardareis os meus sábados e reverenciareis o meu santuário. Eu sou o Senhor” (Lv 19.30). A introdução ao capítulo de conclusão do Código de Santidade usa os mesmos termos de Levítico 19.30 para resumir duas das principais preocupações teológicas dessa seção do li vro: “Guardareis os meus sábados e reverenciareis o meu santuário. Eu sou o Senhor” (26.2). Do ponto de vista literário, bem como da perspetiva de seu enfoque nos anos sabático e de jubileu, Levítico 25 flui diretamente para o cap. 26 sem nenhuma interrupção ou divisão. Na verdade, quase no final do cap. 26, a explicação lógica por trás do futuro exílio é apresentada em termos sabáticos: “Mas a terra na sua assolação, deixada por eles, folgará nos seus sábados; 883
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e tomarão eles por bem o castigo da sua iniqüidade, visto que rejeitaram os meus juízos e a sua alma se aborreceu dos meus estatutos” (26.43; cf. vv. 34-39). Levítico 25 termina com o Senhor reivindicando para si a nação como seus servos, pois foi ele próprio quem os livrou da escravidão do Egito e seu povo pertence somente a ele: “meus servos são eles, os quais tirei da terra do Egito. Eu sou o Senhor, vosso Deus” (v. 55b). O Senhor usa o tema da libertação do Egito novamente no final do cap. 26, quando ressalta sua futura fidelidade e compromisso permanente com a nação apesar da natureza rebelde dos israelitas: “Antes, por amor deles, me lembrarei da aliança com os seus antepassados, que tirei da terra do Egito à vista das nações, para lhes ser por Deus. Eu sou o Senhor” (26.45). Tanto em 25.55 quanto em 26.45, a lembrança do livramento do Egito leva à fórmula do Código de Santidade: “Eu sou o Senhor (vosso Deus)”. Assim, o que está em questão nos caps. 17— 26 parece ser que a nação de Israel foi livrada do Egito para tomar-se uma nação santa, consagra da inteiramente à adoração e serviço exclusivos ao único Deus verdadeiro, Javé, que estava presente pessoalmente no tabemáculo no meio do povo. Por fim, Levítico 27 costuma ser considerado um acréscimo ao livro (cf. 26.46 com 27.34). Apesar de também concentrar-se em questões relacionadas à santidade, não usa a fór mula padrão “Eu sou o Senhor (vosso Deus)” encontrada nos caps. 18—26; antes, consiste num conjunto de estatutos referentes à consagração e redenção de votos e ofertas votivas (27.1-14), ofertas voluntárias (27.15-25), animais primogênitos (27.26-27), coisas consagradas (27.28-29) e dízimos (27.30-33). Num certo sentido, porém, é relacionado às leis nos caps. 17—26 assim como as leis em 6.8— 7.36 são associadas àquelas em 1.1— 6.7, ou seja, referem-se à disposi ção das coisas santas uma vez que foram consagradas (ver também 22.17-29). C. Temas Teológicos 1. 0 cerne teológico triplo de Levítico. Em Levítico 10.3, Moisés explica o que o Senhor fez contra Nadabe e Abiú: “Isto é o que o Senhor disse: Mostrarei a minha santidade naqueles que se cheguem a mim e serei glorificado diante de todo o povo”. Vêem-se aqui duas catego rias de pessoas: aqueles que “se [chegam]” ao Senhor (ou seja, os sacerdotes) e “todo o povo”. De uma forma ou de outra, o Senhor mostrará sua santidade a fim de que possa ser glorificado no meio do povo. Nesse caso, ele cumpriu esse propósito ao eliminar os dois filhos de Arão que não haviam dado a devida atenção aos requisitos de santidade quando se “chegaram” ao Senhor e “trouxeram fogo estranho perante a face do Senhor” (10.1). O Senhor sublinhou a importância dessa lição ao falar diretamente a Arão (e não a Moisés) em Levítico 10.9-11 e instruir Arão e seus filhos a: a. evitar “vinho e bebida forte” ao se aproximarem do Senhor a fim de não morrerem em sua presença (v. 9; ao que parece, a be bida poderia turvar a mente deles e causar uma tragédia semelhante); b. fazer diferença “entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo” (v. 10; cf. Ez 22.26; 44.23) e c. ensinar “aos filhos de Israel todos os estatutos que o Senhor lhes tem falado por intermédio de Moisés” (v. 11). A fim de compreender o cerne teológico do livro de Levítico, é essencial ter-se uma per cepção clara das duas polaridades do v. 10 (ou seja, santo e profano e imundo e limpo), que são preocupação central dos estatutos de Deus nesse contexto (v. 11; para resumos bastante úteis, ver Hartley, lvi-lxiii; Wenham, 18-25; Milgrom, 43-49). Levítico 10.17 acrescenta ou tro elemento essencial a esse cerne teológico: a “expiação”. Moisés salientou essa prática em suas palavras a Arão: “Por que não comestes a oferta pelo pecado no lugar santo? Pois coisa santíssima é; e o Senhor a deu a vós outros, para levardes a iniqüidade da congregação, para fazerdes expiação por eles diante do Senhor”. 884
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O santo em contraste com o profano (v. 10 a) refere-se à condição de uma pessoa, lugar ou coisa. Limpo ou imundo (v. 10b) trata da situação da pessoa, qualquer que seja a condição dela (ou seja, santo ou profano). Alguns estudiosos têm mostrado uma tendência de agrupar essas categorias duais deixando que percam seu caráter próprio (ver, p. ex., a tese de que a “santidade chamava Israel à pureza... a santidade requer pureza”, Gammic, 195, e ao longo de sua monografia, de qualquer modo, excelente). Sem dúvida, a santidade e a imundícia deviam ser mantidas separadas, mas a imundícia não é o oposto da santidade. De acordo com 10.10, “santo” é o antônimo de “profano” e “imundo” é o antônimo de “limpo” (ver o comentário mais completo no artigo “Limpo e Imundo”, seção 5). A expiação (v. 17; do latim expiatione, cujo significado, porém, está mais próximo de reconciliação ou concordância) é o ponto central dos procedimentos sacrificiais para tratar da transgressão dos limites ou das transições entre as categorias de santo e profano ou limpo e imundo (para uma discussão completa, ver kpr, # 4105). Com referência à questão de limpo e imundo, era preciso fazer expiação para purificar a imundícia irregular ou mais grave (p. ex., Lv 12.6-8, a mulher depois do parto; 14.18-20, o leproso; 15.13-15, 25-30, fluxos irregula res da genitália masculina e feminina). Com referência ao santo e ao profano, a expiação era exigida nos procedimentos de consagração para santificarem-se pessoas, lugares ou coisas e tomá-los santos (p. ex., 8.15, 34, o tabemáculo e os sacerdotes). Por fim, a expiação traz per dão pela transgressão dos estatutos do Senhor (10.11; cf. 4.20, 26, 31; 5.10, 13, 16, 18; 6.7 [5.23], etc.), quer estejam relacionados a qualquer um dos mandamentos do Senhor (4.2, 13) ou, especificamente, a questões de limpo e imundo (5.2-3) ou, ainda, à transgressão dos limi tes da santidade (5.15-16). Estes são, portanto, os três conceitos teológicos centrais do livro de Levítico: santidade, pureza e expiação. Os muitos e, por vezes, complexos estatutos ligados a essa teologia de con sagração, purificação e expiação são tratados em outros artigos (-> esp. tm ', imundo, # 3237; (hr, limpo, # 3197; kpr, fazer expiação, # 4105; hatf al, oferta pelo pecado, # 2633; 'ãsãm, oferta pela culpa, # 871; e os artigos sobre “Limpo e Imundo” e “Ofertas e Sacrifícios: Teolo gia”). A discussão a seguir limita-se à maneira como os conceitos e os estatutos associados a eles conferem substância e forma teológica ao livro de Levítico em sua totalidade. 2. Foi observado anteriormente que, do ponto de vista literário, as regras para os h caustos, ofertas de manjares e ofertas pacíficas, em Levítico 1— 3, constituem um todo unificado, separado dos estatutos para ofertas pelo pecado e pela culpa em 4.1—5.13 e 5.14— 6.7 [5.26], respectivamente, e que, por sua vez, são separados um do outro (ou seja, as seções sobre oferta pelo pecado e oferta pela culpa são separadas pela menção de Moisés em 5.14; ver Estrutura Literária, seção 5). A primeira interrupção literária é relevante, pois reflete a realidade históri ca de que fora do tabemáculo os holocaustos e ofertas pacíficas (juntamente com as ofertas de manjares e libações que costumavam acompanhá-los) constituem um sistema de adoração ritual usado pelos fiéis em altares javeístas isolados por toda a parte na terra (ver, p. ex., Gn 12.7-8; 22.2, 9; Êx 24.4-8; Dt 27.5-8; Jz 6.25-27; cf. Ofertas e Sacrifícios: Teologia, seções 8-9). É evidente que essas ofertas, incorporadas ao sistema de adoração do tabemáculo, já exis tiam antes dele num sistema de altares isolados. Como dádiva ao Senhor, o holocausto aceitável tinha o mesmo efeito em relação a Deus que os presentes de Jacó para Esaú em Gênesis 32.20 [2 1 ] — faziam-no olhar de modo favorável para o adorador (ver kipper, fazer expiação, tanto em Lv 1.4 quanto em Gn 32.20 [21 ]). As ofertas pacíficas concentravam-se mais na comunhão entre o Senhor e seus adoradores e também na comunhão dos adoradores entre si. As ofertas ao Senhor das partes com gordura e a distribuição da came para ser consumida pelo povo e pelos sacerdotes conferia a essa oferta um sentido característico de comunidade e comunhão que não 885
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é expressado no ritual do holocausto. Juntas, essas duas ofertas, bem como suas respectivas ofertas de manjares e libações (cf. Lv 2; Nm 15.1-16), constituíam o alicerce do sistema de ofertas e sacrifícios do tabemáculo (ver Ofertas e Sacrifícios: Teologia, seções 3-4). Devido ao efeito geral de expiação do sangue (Lv 17.11), a manipulação deste nos ho locaustos e ofertas pacíficas tomou-se intimamente relacionada à expiação com sangue, que era o enfoque central das ofertas pelo pecado e pela culpa (Lv 4.1-6, 7 [5.26]). Assim, de acordo com Êxodo 29.33, por exemplo, a oferta de ordenação, que era um tipo de oferta pacífica para os sacerdotes, tinha o efeito de fazer expiação (cf. Lv 1.4 e 16.24 para o holocausto; cf. 'õlâ I, holocausto, # 6592; selem, oferta pacífica, # 8968, para estudos mais completos dos assuntos aqui apresentados). Por certo o sistema de adoração sacrificial do santuário requeria mais ofertas e sacrifício, esp. as ofertas pelo pecado e pela culpa (Lv 4.1 -6 ,7). O principal motivo para esses acréscimos ao sistema era o fato de o santuário ser mais que um altar por meio do qual o indivíduo podia se aproximar do Deus do céu e ter comunhão com ele. Devia ser o lugar da residência perpétua de Deus (ou seja, a casa ou tenda de Deus, ver acima). Era possível haver um altar e adoração junto a ele mesmo sem um santuário (ver mizbêah, altar, # 4640), mas trata-se de algo bem diferente dos requisitos essenciais para a devida manutenção da presença do Senhor que era o enfoque central dos procedimentos rituais do tabemáculo (Knohl, 152; Milgrom, 176). O fato de o Senhor habitar no santuário do tabemáculo ou templo exigia que se dedi casse especial atenção à santidade e pureza de sua presença naquele local. Como observamos anteriormente, a distinção “entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo” era fundamen tal para as responsabilidades sacerdotais no tabemáculo (Lv 10.10, ver acima). A interrupção entre a seção sobre a oferta pela culpa (4.1-5.13; ver a segunda menção de Moisés em 4.1) e a seção sobre a oferta pelo pecado (5.14-6.7[5.26]; ver a terceira menção de Moisés em 5.14) corresponde aproximadamente à dicotomia dual em 10 . 10 . Quanto à oferta pelo pecado, Levítico 15.31 adverte: “Assim, separareis os filhos de Is rael das suas impurezas, para que não morram nelas, ao contaminarem o meu tabemáculo, que está no meio deles”. Levítico 16 vem logo em seguida com suas várias ofertas pelo pecado para a purificação e reconsagração do tabemáculo (-> kpr, #4105). Assim, a expiação com sangue da oferta pelo pecado concentrava-se principalmente na preocupação em purificar o tabemáculo e o altar (ou seja, tomá-los limpos, em contraste com o que era imundo), mas, enquanto isso, também podia-se (re)consagrar o tabemáculo e o altar (ou seja. tomá-los santos, em contraste com o que era profano; ver, p. ex., 16.19, para essa combinação de purificação e consagração do altar pelas ofertas pelo pecado). A forma de manipulação do sangue no cap. 16 e em outras passagens mostra o propósito purificador do ritual de sangue no caso da oferta pelo pecado(-> ha((ã'(, oferta pelo pecado, # 2633), que se referia ao limite entre o limpo e o imundo. A oferta pela culpa, porém, referia-se principalmente à necessidade de tratar-se dos problemas de profanação causados pela transgressão do limite entre o santo e o profano e não entre o limpo e o imundo (cf. Lv 10.10a, citado acima e 'ãsãm, oferta pela culpa, # 871). A nova menção de Moisés em 6.1 [5.20] divide a perícope da oferta pela culpa em duas seções. Os detalhes já foram tratados em outros textos (-> 'ãsãm, oferta pela culpa, #871; ha((ã >, ofer ta pelo pecado, #2633), mas é esp. importante ressaltar aqui que 5.1-6 e 6 .1-7 [5.20-26] ligam essas questões da purificação e consagração do tabemáculo pela expiação sacrificial, com as preocupações e práticas morais e judiciais da comunidade em geral. A santidade e a pureza do tabemáculo estavam intimamente ligados à santidade e pureza da comunidade (ver abaixo os comentários dos caps. 17—27). 886
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3. As leis acerca dos animais limpos e imundos que ameaçavam manter o “muro de separação” entre os judeus e os gentios no tempo do NT (ver abaixo, Levítico no NT), na ver dade servem como uma das principais ligações entre Levítico 1— 16 e 17—27 e suas ênfa ses teológicas. De acordo com 20.25-26, “Fareis, pois, distinção entre os animais limpos e os imundos... as quais coisas apartei de vós, para tê-las por imundas. Ser-me-eis santos, porque eu, o Senhor, sou santo e separei-vos dos povos, para serdes meus”. Nâo há lei alguma acerca de animais limpos e imundos nos caps. 17—20. Antes, 20.25-26 pressupõe o cap. 11, e, desse modo, os animais limpos e imundos servem para ligar os caps. 1— 16 a 17—27 apesar das se parações e diferenças explícitas entre os dois. Do ponto de vista da santidade, tanto Levítico 11 quanto 20 relacionam as leis acerca dos animais limpos e imundos à formula de santidade (p. ex., “Vós sereis santos, porque eu sou santo”, 11.45), mas fazem essa ligação de duas formas diferentes. Levítico 11 concentra-se simplesmente na questão do contato físico com animais imundos (11.44-45). Mas no contexto de Levítico 20, a expressão “Ser-me-eis santos, porque eu, o Senhor, sou santo” refere-se ao efeito desejado das leis acerca dos animais limpos e imundos sobre o processo de separar Israel “dos povos” ao seu redor (ver acima a citação de 20.25-26; cf. 19.2; 21.8). Essa separação de Israel das outras nações era a intenção de Deus desde o início da existência nacional de Israel como um “reino de sacerdote, nação santa” (ver Êx 19.6). Existe uma ligação literária evidente entre a fórmula de santidade mencionada acima e a fórmula “Eu sou o Senhor (vosso Deus)” que ocorre muitas vezes em Levítico 18— 26 (ver 18.2,4, 5, 6 , 21, 30; 19.3,4, 10, 12, 14, 16, 18,25,28, 30, 31, 32, 34, 36, 37; 20.7, 8,24; 21.8, 12, 15,23; 22.2,3, 8 , 9, 16,30, 31, 32, 33; 23.22, 43; 24.22; 25.17, 38,55; 26 .1,2,13,44,45; cf. 11.44, 45). No original, as duas começam com “Eu sou” e 20.7, por exemplo, mostra uma combinação de ambas: “Portanto, santificai-vos e sede santos, pois eu sou o Senhor, vosso Deus”. Em seus contextos variados, essa fórmula, “Eu sou o Senhor (vosso Deus)”, ressalta a importância da aliança exclusiva e obediência a Javé, pois ele é, verdadeiramente, o Senhor. É com Javé como Deus e Legislador que Israel deve se preocupar. 4. As leis relacionadas à pureza sexual (-> Estatutos sobre o sexo: Teologia) eram de interesse específico em Levítico 1— 16 (ver esp. caps. 12 e 15), mas, nesse caso, a preocupa ção era evitar a impureza física pessoal a fim de que ninguém profanasse o tabemáculo. Le vítico 18 e 2 0 regulamentam o casamento, o relacionamento sexual e o parto em outro nível. A perspectiva nacionalista mais ampla traz como resultado a preocupação de que a transgres são dessas leis poderia acabar contaminando a terra (e não apenas o tabemáculo), que por sua vez iria “vomitá-los” (cf. 18.24-30). Levítico 20.10-21 apresenta o meio judicial de tratar das transgressões dessas mesmas proibições referentes ao sexo em Israel. Com respeito à idola tria, 18.21 e 20.1-5 proíbem o povo especificamente de se “[prostituir] com Moloque” (20.5). O motivo de os caps. 18 e 2 0 concentrarem-se nessa forma específica de idolatria é a relação direta dela com a fertilidade sexual, o nascimento de filhos. A nação não deve profanar o nome do Senhor (18.21; 20.3) e, assim, contaminar o santuário em seu meio (20.3) ao oferecer seus filhos a Moloque. Levítico 20.6 vai diretamente da adoração a Moloque para outra forma de prostituição, a saber, a procura por médiuns e espíritas. É interessante que a lei contra amaldiçoar pai ou mãe encontra-se antes da lista de leis casuístas em Levítico 20.9-21. Levítico 19 começa com “Santo sereis, porque eu, o Senhor, vosso Deus, sou santo” (19.2b) e prossegue apresentando uma relação dos diversos tipos de es tatutos e ordenanças (19.37) que afetariam a santidade e pureza nacionais de Israel. O primeiro mandamento é: “Cada um respeitará a sua mãe e o seu pai” (19.3a). Nesse caso, o conjunto se guinte de leis é bastante diversificado e é provável que a ocorrência particularmente freqüente 887
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da fórmula “Eu sou o Senhor (vosso Deus)” deva-se à necessidade de separar cada unidade daquelas ao redor (vv. 3,4, 10, 12, 14, 16, 18, 25,28, 30, 31, 32, 34, 36, 37). Não temos como tratar de todos os detalhes neste estudo, mas o propósito geral de colocar-se Levítico 19 entre os caps. 18 e 20 é ampliar ainda mais as questões de pureza e santidade de modo a que conte nham todos os níveis de relacionamento em Israel e não apenas o sexo e a família. A santidade em Israel devia exercer influência sobre todos os aspectos da vida e sobre todos aqueles que viviam ali, não apenas a família e seus vizinhos israelitas (observar esp. vv. 17-18), mas até mesmo forasteiros e estrangeiros na terra (vv. 33-34). A presença do Senhor santo em seu meio exigia um estilo de vida que separava essa nação das outras nações (ver o desenvolvimento desse tema por Gammie nos escritos sacerdotais, proféticos e sapienciais do AT). 5. A palavra aliança ocorre lOx no livro de Levítico, 8x em Levítico 26 (vv. 9, 15, 25, 42 [3x], 44, 45; cf. em outras passagens — somente em 2.13 e 24.8). Em termos de crítica à forma, o cap. 26 encaixa-se “nos moldes das mais antigas alianças do Oriente Médio” (ou seja, as bênçãos e maldições; Hartley, 1xvi; Wenham, 29-32) e dá forma e detalhes ao relacionamen to de aliança entre Deus e Israel principalmente em termos da observância dos sábados, mais especificamente dos sábados da terra (25.1-17), bem como a obediência aos outros estatutos e ordenanças delineados nos caps. 18—25 (cf. 18.4-5 com 26.2-3; ver abaixo). De acordo com 26.43, “A terra na sua assolação, deixada por eles, folgará nos seus sábados; e tomarão eles por bem o castigo da sua iniqüidade, visto que rejeitaram os meus juízos e a sua alma se abor receu dos meus estatutos”. No versículo que antecede e no que segue essa declaração (vv. 42 e 44), a palavra “aliança” aparece 5x do total de lOx no livro todo de Levítico, referindo-se à aliança abrâmica e à aliança mosaica, respectivamente. Essas alianças são apresentadas como o motivo subjacente para a fidelidade contínua do Senhor a Israel apesar da falta de fidelidade do povo ao Senhor. De acordo com 26.44, por mais que os israelitas testem a graça de Deus, ele não desistirá de seu povo: “estando eles na terra dos seus inimigos, não os rejeitarei, nem me aborrecerei deles, para consumi-los e invalidar a minha aliança com eles, porque eu sou o Senhor, seu Deus”. 6. A conclusão do Código de Santidade propriamente dito é Levítico 26, que contém as bênçãos pela obediência à aliança e as maldições pela desobediência à aliança. Israel não deveria ter outros deuses; somente o Senhor é seu Deus. Na verdade, isso também teria o efeito de distin guir Israel das outras nações que adoravam e serviam outros deuses (p. ex., Moloque; cf. 18.21 e 20.1 -5). Portanto, uma forma válida de considerar o Código de Santidade é pelo ponto de vista do sumário em 26.1 -2: “Não fareis para vós outros ídolos, nem vos levantareis imagem de escultura nem coluna, nem poreis pedra com figuras na vossa terra, para vos inclinardes a ela; porque eu sou o Senhor, vosso Deus. Guardareis os meus sábados e reverenciareis o meu santuário. Eu sou o Senhor”. Mais uma vez, esses dois versículos introdutórios terminam com a oração “Eu sou o Senhor (vosso Deus)”. Podem-se observar três tipos de preocupação nessa passagem: a. com a fidelidade nacional ao Senhor (ou seja, sem nenhuma idolatria e com uma vida comunitária pura e santa, caps. 17—20; cf. 26.1), b. com o santuário nacional e a reverência às coisas santas (caps. 21— 22; cf. 26.2b) e c. com a observância nacional do sábado (caps. 23—25; cf. 26.2a). No geral, a teologia do livro de Levítico concentra-se na presença de Deus no tabemáculo, mas essa presença devia exercer sua influência sobre tudo e todos na Israel antiga. D. Levítico no NT Existe um contraste importante entre as leis de pureza física do AT associadas à pre sença física do Senhor no tabemáculo (ver Contexto Histórico, seção 1 e Estrutura Literária, seção 4) e a concepção do NT da presença de Deus na igreja. A presença do Senhor na igreja 888
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do NT está relacionada à habitação do Espírito Santo (Jo 14.17) e o conceito do templo onde Deus habita pode ser aplicado de maneira metafórica à comunidade dos crentes (ICo 3.16-17) ou aos indivíduos (6.19-20) e nossa purificação é “pela fé no coração” (At 15.9). A presença de Deus dentro de nós e em nosso meio é, por natureza, particularmente espiritual (cf., em seu contexto, Jo 4.24: “Deus é espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade”). E claro que isso não significa que o Senhor estava presente na Israel antiga ape nas em sentido físico visível. Onde ele está fisicamente presente, também está ali em espírito e se preocupa, por exemplo, não apenas com a circuncisão física (Gn 17.9-14), mas também com a circuncisão do coração (Lv 26.41; Dt 10.16; Jr4.4; cf. Rm 2.26-29). Somente esta úl tima podia transformar os israelitas num povo que amaria o Senhor de todo o coração e toda a alma (Dt 30.6b). Assim também, a presença do Espírito Santo do Senhor na igreja do NT como uma comunidade e na vida do cristão como indivíduo sem dúvida terá manifestações físicas em termos de caráter moral (1 Co 6.18-20) e serviço ao Senhor (3.16-17). Isso, porém, não é o mes mo que as leis físicas sobre limpeza e imundícies em Levítico 11— 15. Na verdade, o muro de separação que tais leis ergueram naturalmente entre judeus e gentios foi derrubado na era da igreja justamente porque a igreja é constituída tanto de judeus quanto de gentios (cf. Ef 2.1122, esp. vv. 15 e 18; ver também At 15.5,9, 19-21, 28-29). A visão de Pedro do lençol descen do do céu em Atos 10.10-16 ilustra o lugar especial que os estatutos acerca de animais limpos e imundos em Levítico 11 ocupava na separação entre judeus e gentios no contexto do AT e que teria, de outro modo, continuado a ocupar nos tempos do NT (cf. os conflitos entre Pedro e Paulo sobre essa questão em Gálatas 2; ver “Limpo e Imundo”, seção 7 para os princípios subjacentes de Levítico 11). B ib l io g r a f ia
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Líbano 0P331? [Iebãnôn], # 4248). 889
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AT No AT, (o) Líbano refere-se tipicamente a uma região ao norte de Israel, que se estende da cadeia dc montanhas do Líbano até a cadeia do Antilíbano. Historicamente, o contato do povo de Judá e Israel com essa região ocorreu por meio de relações comerciais com as cidadesEstado fenícias de Tiro e Sidom. Juntamente com Biblos, essas cidades costeiras empregavam um forte sistema de transporte marítimo para controlar o comércio intenso que se desenvol veu ao redor da indústria do cedro. Evidências epigráficas do Egito indicam que os cedros do Líbano constituíam a base do comércio de exportação da região do Líbano desde a metade do terceiro milênio a. C. {ANET, 227). Evidências arqueológicas indicam o uso constante de cedros na Palestina desde a Idade Média do Bronze (c. 1800 a. C.) passando por todos os pe ríodos da antigüidade, até os períodos romano e bizantino (Liphshitz e Biger). O Líbano não é mencionado no NT, mas aparece com relativa freqüência no AT. O AT menciona o Líbano 70x, sendo que a maioria delas gira em tomo de 4 temas interrelacionados: 1. a posição do Líbano como parte do reino ideal; 2. o uso da madeira do Líbano como material de construção de grande valor; 3. o Líbano como metáfora poética para beleza e fertilidade; e 4. o Líbano como metáfora para força política. 1. O Líbano como parte do reino ideal. Vários textos colocam a região do Líbano ex plícita (Dt 1.7; II .24; Js 1.4) ou implicitamente (Dt 3.25) dentro das fronteiras ideais da Israel prometida a Moisés. Essa expectativa gera tensão, uma vez que em raras ocasiões o Líbano encontra-se sob o controle de governantes israelitas. O livro de Josué relata que batalhas con tra coalizões de reis complicaram a conquista do Líbano (Js 9.1; 12.7) de modo que Josué só chegou à beira do Líbano (11.17; 12.7). Tanto Josué (13.5-6) quando Juizes (Jz 3.3) mostram que o Líbano não foi conquistado nem assentado por israelitas. Essa última passagem forne ce o motivo pelo qual o Líbano permaneceu fora do domínio de Israel: Javé desejava testar Israel e ensinar a guerra aos israelitas (Jz 3.1-2), de modo que deixou povos nativos na terra. Somente em uma ocasião o relato bíblico indica que um rei israelita exerceu controle sobre a região do Líbano. 1 Reis 9.19 e seu texto paralelo (2Cr 8.6) podem sugerir o controle de Salomão sobre aquela região, mas o contexto mais amplo de seus negócios com Hirão (IRs 9.11-14) tomam obscura a natureza exata desse controle. O período depois do exílio trouxe consigo expectativas de um reino davídico renovado, o que levou novamente à esperança de que o Líbano ficasse sob o domínio de Judá (Zc 10.10), esperança esta que nunca se concre tizou. Em termos teológicos, o fato de o Líbano não passar a fazer parte da jurisdição política de Israel dá origem a várias explicações. Alguns estudiosos interpretam essas fronteiras como sendo ideais ou estereotípicas, descrições que não tinham a intenção de ser demarcações abso lutas de fronteiras. Outros supõem que as qualificações implícitas em Juizes 3.4 significavam que a promessa de Deus dependia, de certa forma, da obediência de Israel dentro da aliança: “para saber se dariam ouvidos aos mandamentos que [o Senhor] havia ordenado”. De qualquer modo, a Bíblia nâo menciona nenhuma campanha militar que tivesse procurado estabelecer o domínio israelita sobre o Líbano. 2. O uso da madeira do Líbano como material de construção de grande valor. Uma série de textos que mencionam o Líbano indicam o quanto essa região serviu como fornecedora de madeira para os projetos de construção mais importantes de Israel (IRs 4.33[5.13]; 5.6, 9, 14[20], 23,28]; 7.2; 10.17,21; 2Cr 2.8; 9.16, 20; Ed 3.7; Ct 3.9). Ao construir o templo e o pa lácio real e sua mobília, Salomão empregou Hirão de Tiro para enviar cedro e outras madeiras de valor do Líbano. Essas passagens pressupõem que a madeira do Líbano representava o ma terial de melhor qualidade disponível. No período após o exílio, Esdras 3.7 relata que Ciro da Pérsia permitiu que Israel comprasse cedro das cidades costeiras fenícias para usar na recons trução do templo. Sem dúvida o desejo de imitar o primeiro templo teve um papel importante 890
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em termos teológicos nessa decisão de adquirir cedro do Líbano, mas essa imitação também pressupõe que o cedro ainda era um material extremamente valorizado. 3. O Líbano como metáfora poética para beleza e fertilidade. Devido à reputação dos cedros do Líbano, vários textos ilustram como o Líbano evocava imagens de beleza e fertilidade (SI 72.16; 92.12 [13J; 104.16; Ct 4.8, 11,15; 5.15; 7.4 [5]; Jr 18.14; Os 14.5,6, 7 [14.6, 7, 8]). Diversas dessas metáforas fazem pressupor-se que a reputação do Líbano como um lugar de abundância é derivada em grande parte da fragrância das árvores (Ct 4.11; 5.15) e da beleza de suas montanhas verdejantes (SI 72.16). Assim, os elementos de beleza podem abranger simul taneamente a fragrância (Ct 4.11 ;5.15), o vigor (SI 104.16; Ct 7.4 [5]), a grandiosidade de suas montanhas (Ct 4.15), a estabilidade permanente (Os 14.6 [7]) e fertilidade agrícola ( 14.7[8]). De vez em quando, o Líbano aparece em formulações paralelas com outras regiões (Carmelo e Basã) associadas ao crescimento fértil e que se encontram dentro das fronteiras tradicionais de Israel (p. ex., 2Rs 19.23; ls 35.2; Na 1.4; Zc 11.1). 4. O Líbano como metáfora para força política. Outra série de textos encontra-se re lacionada de modo bastante próximo com os conceitos de fertilidade e vigor, mas transfere essas imagens para a esfera política a fim de indicar poder político enérgico e estável. Em sua parábola politicamente mordaz. Juizes 9.15 ameaça que os espinheiros do Líbano consumirão os cedros do país com fogo. Os cedros representam, desse modo, uma potência política mais forte que será dominada por outra mais fraca. Assim também, em 2 Reis 14.9 (= 2Cr 25.18), Jeoás, rei de Israel, reage a uma convocação para a batalha feita por Amazias de Judá ao contar uma parábola sobre o cardo do Líbano cuja arrogância não intimidava o cedro do Líbano. Nesse caso, o cedro (Jeoás) prevaleceria sobre o cardo (Amazias). Jeremias 22.6 imagina o Líbano como um símbolo da grandeza de Judá, que o Senhor está prestes a destruir. Da mesma forma, Ezequiel usa o cedro do Líbano para simbolizar entidades políticas: Judá (17.3), Assíria (31.3) e Tiro (27.5). Por vezes, a metáfora é generalizada a fim de indicar força política sem que se identifique uma entidade específica nela (Is 2.13; 40.16). Todas essas passagens conceitualizam o Líbano exclusivamente como uma imagem positiva, com a conotação de estabilidade, fertilidade e fonte de madeira valiosa. A região do Líbano só é tratada indiretamente de modo negativo no AT, por meio da condenação de Tiro e/ou Sidom, como nos oráculos proféticos contra as nações (Isaías 23; Ezequiel 26— 28; Am 1.9-10) B ib l io g r a f ia
M. Dunand, De I 'Amanus au Sinai: Sites et Monuments, 1953; F. C. Eiselen, Sidon: A Study in Oriental History, 1907; D. Harden, The Phoenicians, 1962; G. Herm, The Phoenicians: The Purple Empire o f the Ancient World, 1975; P. K. Hitti, The Near East in History: A 5000 Year Story, 1961; N. Jidejian, Byblos Through the Ages, 1968; N. Liphshistz e G. Biger, “Cedar of Lebanon (Cedrus libani) in Israel During Antiquity”, IEJ 41, 1991, 167-75. James D. Nogalski Liberdade
# 2002 {cfírôr III, livramento, libertação)
Libertação
# 2926 (hps, liberto)
Limiar -> # 6197 (sap II, limiar) Limpeza
#3197 (thr, purgar, limpar completamente, declarar limpo, purificar) 891
Limpo e imundo
1. O objetivo deste rário e teológico mais amplo possível, para que se com preendam os conceitos de limpo e imundo, relacionando-os aos conceitos de santo e comum (ou profano) e aos procedimentos rituais de purificação e consagração que permitiam às pes soas, animais e objetos passarem de um estado comum para santo, ou de condições imundas para puras e vice-versa. Sem uma compreensão devidamente fundamentada desses termos e procedimentos, chamados aqui de “leis de pureza”, não é possível entender nem o raciocínio histórico e contextual, e o propósito do sistema ritual levítico em sua totalidade (ou seja, a le gislação levítica e sua teologia, por assim dizer), nem a relação desse sistema ritual com o conjunto maior de leis dentro do qual ele se encontra. Em outras palavras, esses conceitos afe tam tudo o que há nesse sistema, inclusive os principais sacrifícios e o Dia da Expiação. Nosso propósito aqui não é tratar em detalhes da terminologia e dos conceitos relacio nados à questão do que vem a ser limpo ou imundo. O leitor encontrará estudos mais completos nos artigos lexicais relevantes, especialmente em (hr, limpo, puro (#3197) e em fm ', imundo, impuro (# 3237) e seus derivados (apresentaremos ainda referências cruzadas com outros ter mos relacionados). Nossa intenção é propor uma abordagem e uma perspectiva exegética, con textual e teológica correta que possibilite uma visão mais ampla e satisfatória desses aspectos do sistema ritual. Mesmo uma leitura rápida de uma concordância mostra que a terminologia concentra-se em certas partes do AT, especialmente em Levítico 10— 15 (em menor grau, em Lv 18— 22; Nm 5—9; 18— 19; Dt 12— 15; Ez 22; 24; 3 6 — 37; 39; 43—44; a repetição de (ãhôr em Ex 25—39, para referir-se a ouro puro e fino não é relevante aqui). Portanto, tomaremos Levítico 10— 16 como ponto de partida, usando seu texto como passagem central em torno da qual se poderá entender com mais clareza os conceitos de limpo e imundo. Sem dúvida, tratase da parte mais importante do material sobre esse assunto no livro de Levítico e, de fato, em todo o AT. Outras passagens também serão levadas em consideração — à medida que se tor narem pertinentes à análise desses capítulos — e, também suas implicações para o restante da legislação ritual e do cânon como um todo. Na realidade, os dados bíblicos com relação à natureza e explicações da pureza ritual e da purificação e especialmente aos conceitos de limpo e imundo, apresentam um alto grau de complexidade. No entanto, o contexto canônico adjacente, a estrutura da seção e certos versí culos dentro dessa passagem são, por sua natureza, úteis para nos ajudar a isolar e discernir os contornos desse assunto em sua totalidade. É nesse trecho das Escrituras que se pode chegar aos fundamentos da teologia sacerdotal do AT. Animais, pessoas e coisas puros e imundos, bem como os elementos e processos de purificação são tratados de forma básica nessa seção de Levítico e apresentados como parte dos alicerces de todo o sistema ritual. 2. A tragédia de Nadabe e Abiú em Levítico 10 ocorreu depois dos sete dias do proces de ordenação dos sacerdotes, descrito em Levítico 8 (ver esp. 8.35), e em algum momento du rante a solenidade nacional de inauguração do tabemáculo, no oitavo dia relatado em Levítico 9 (ver esp. 9.1), mas antes da carne do sacrifício ser comida naquele mesmo dia. Com referência a esta carne do sacrifício, é bastante instrutiva a confrontação de Arão por Moisés por causa do sacrifício pelo pecado realizado indevidamente em 10.16-20, esp. no que se refere à objeção de Arão no v. 19, afirmando que, nesse caso, ele e os filhos nâo deveriam ter comido do sacrifí cio pelo pecado, pois “hoje, meus filhos ofereceram a sua [própria] oferta pelo pecado e o seu holocausto perante o Senhor” e dois deles morreram por causa disso (ver Milgrom, 1991, 596, 626 sobre os vv. 1 e 19). O fogo do Senhor, em Levítico 9.22-24, consumiu somente o holo causto e a gordura dos outros sacrifícios, mas não a carne do sacrifício pelos pecados do povo e nem das ofertas pacíficas que, para começar, não eram colocadas sobre o altar (ver Lv 3—5; Limpo e imundo
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cf. 9.15,18-21). Em circunstâncias normais, os sacerdotes deveriam ter consumido o sacrifício pelo pecado do povo dentro do santuário, daí a reação de Moisés em Levítico 10.16-17. Esse incidente nos proporciona um ponto de partida para as leis de pureza física que seguem, um assunto que para as pessoas de hoje é confuso, tanto nos princípios como nos de talhes desse sistema. De acordo com Levítico 12.6-8, por exemplo, uma mulher que dava à luz devia levar uma “oferta pelo pecado (ou seja, de purificação)” para que se purificasse. Até mesmo no NT, Maria, a mãe de Jesus, levou essa oferta por dar à luz o Senhor (Lc 2.22-24). O que a levou a fazê-lo? Certamente Maria não pecou ao dar à luz o Salvador. Esse procedimento pode ser entendido mais facilmente ao considerar-se que a oferta pelo pecado era, na realidade, uma oferta de purificação e que não tinha necessariamente re lação direta com o pecado moral. Em vez disso, era usada com freqüência para limpar uma pessoa das imundícias físicas (-> haf(ã't, oferta pelo pecado, # 2633). No entanto, esse fato serve apenas para levantar questões ainda mais fundamentais com relação ao sistema em sua totalidade. Em primeiro lugar, por que Deus se preocupava com a pureza física? E como fun cionava esse sistema de pureza física? Trataremos agora da primeira questão e deixaremos a segunda para uma parte posterior deste artigo e para os artigos lexicais relacionados. A resposta para a primeira questão só pode ser compreendida ao entender-se um fato essencial e seu res pectivo corolário: Deus estava fisicamente presente no tabemáculo de Israel na antigüidade. Assim, as leis de pureza fisica eram importantes para que a presença física do Senhor fosse devidamente mantida no meio do povo (cf. 2Cr 34.8). De acordo com Êxodo 25.8, o Senhor ordenou a Moisés a instruir o povo para “me [fazer] um santuário para que eu possa habitar no meio deles”. Essa mesma presença física e a pureza física correspondente também se aplica ao templo (lR s 8.1-21; Nm 9.15-23). Trata-se de um contraste com a presença espiritual de Deus no NT, por meio da habi tação do Espírito Santo no templo da igreja, em seu sentido corporativo (1 Co 3.16-17), e nos cristãos, como indivíduos (6.19-20). O Senhor não se encontra fisicamente presente em nosso meio da forma como se encontrava no tabemáculo do AT. Não vemos a nuvem de glória dele pairando sobre o tabemáculo, nem nos conduzindo na forma de uma coluna de nuvem, duran te o dia, e de fogo, durante a noite (Êx 13.21-22; 40.34-38; Nm 9.15-23). Assim, no mundo do NT, estamos mais acostumados a pensar em termos de pureza moral e espiritual, o que se deve à presença correspondente de Deus no plano espiritual. Isso, por sua vez, faz com que a terminologia relativa à pureza empregada no AT seja aplicada no NT exclusivamente em sen tido espiritual e moral e não no sentido nível de purificação e lavagens como acontecia no AT (ver p. ex.; Mt 15.1-2; 10-12. 17-20; 23.25-26; 2Co 7.1; Ef 5.25-27; lPe 1.13-22; Tg 4.8; 1Jo 1.7-9). Aliás, as leis sobre animais limpos e imundos são abolidas no NT (ver Mc 7.19b; At 10.10-16). Além disso, o sistema sacrificial do AT era caracterizado como purificação apenas do exterior da pessoa, ao contrário do sacrifício de Cristo: “Portanto, se o sangue de bodes e de touros e a cinza de uma novilha, aspergidos sobre os contaminados, os santificam, quanto à purificação da came, muito mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito etemo, a si mesmo se ofereceu sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência de obras mortas, para servirmos ao Deus vivo!” (Hb 9.13-14). É claro que, no lugar onde se encontra a presença física do Senhor, ele também está es piritualmente presente. Assim, apesar de as questões de pureza física serem uma preocupação central no sistema de leis de pureza ritual referentes ao santuário, o Senhor considerava também a pureza espiritual e moral. Se Levítico 10— 16 se preocupa tanto com a manutenção da pureza física do tabemáculo do Senhor, então Levítico 18— 20 mostra-se igualmente preocupado com a pureza moral e espiritual de Israel como nação (ver seção 7). Além do mais, a primazia da 893
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pureza espiritual e moral, mesmo no AT, manifesta-se de maneira clara em passagens como, por exemplo, os Salmos 51.7 [9], 10 [ 12], 16-18 [ 18-21 ] e serve de fundamento no AT para o enfoque do NT sobre a pureza moral e espiritual correspondentes à presença espiritual do Senhor dentro da igreja e com ela. 3. O tema da presença física do Senhor no meio de Israel na antigüidade aparece no mente, e de maneira ainda mais explícita, em Êxodo 33. A nação havia acabado de cometer o pecado de idolatria do bezerro de ouro (Êxodo 32). Êxodo 34 relata uma renovação da aliança. Entre uma coisa e outra, em Êxodo 33, Deus e Moisés trataram justamente da questão da pre sença pessoal contínua de Deus com Israel. O Senhor disse (Êx 33.2): “Enviarei o anjo adiante de ti”, pois concluiu que se ele próprio acompanhasse o povo acabaria por destruí-lo no cami nho (v. 3). A reação do povo foi de decepção (v. 4) e, por fim, como resultado da intervenção de Moisés (vv. 12-13), o Senhor cedeu e disse: “A minha presença (lit., meus rostos) irá contigo, e eu te darei descanso” (v. 14), ao que Moisés respondeu: “Se a tua presença não vai comigo, não nos faças subir deste lugar. Pois como se há de saber que achamos graça aos teus olhos, eu e o teu povo? Não é, porventura, em andares conosco, de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da terra?” (vv. 15-16). É possível que haja alguma distinção entre Deus e aquilo que é chamado ali de sua “Presença”, uma questão talvez relacionada à chamada “teologia nominal” que aparece em outras partes nesse contexto e em Deuteronômio 12.2-5, 11, mas essa Presença não parece referir-se ao anjo proposto no v. 2. Êxodo 33 foi recapitulado aqui porque o mesmo tema e terminologia dessa passagem se repetem na transição de Levítico 9 para Levítico 10. Como parte da consagração do tabernáculo, o Senhor manifestou sua presença física naquele lugar. Depois que os sacerdotes ha viam colocado os sacrifícios sobre o altar, “a glória do Senhor apareceu a todo o povo. E eis que, saindo fogo de diante do Senhor, consumiu o holocausto e a gordura sobre o altar; o que vendo o povo, jubilou e prostrou-se sobre o rosto.” (Lv 9.23b-24; cf. a nuvem dc glória do Senhor e a relação dela com a habitação do Senhor no tabemáculo em Êx 40.34-38; Lv 16.2; Nm 9.15-23). Então, logo depois disso, naquele mesmo dia, “Nadabe e Abiú, filhos de Arão, tomaram cada um o seu incensário, e puseram neles fogo, e sobre este, incenso, e trouxeram fogo estranho perante a face do Senhor, o que lhes não ordenara. Então, saiu fogo de diante do Senhor e os consumiu; e morreram perante o Senhor.” (Lv 10.1-2). Assim, a preocupação e contexto centrais para entender-se a aniquilação de Nadabe e Abiú vêm justamente do fato de que Deus estava fisicamente presente no meio de Israel na antiguidade e, onde ele está presente, existe também o risco de ele voltar-se contra o povo de modo físico. A mesma questão surge na parte final dessa seção de Levítico como pano de fun do para se entender as leis de pureza e os motivos para a existência do Dia da Expiação. De acordo com Levítico 15.31: “Assim, separareis os filhos de Israel das suas impurezas, para que não morram nelas, ao contaminarem o meu tabemáculo, que está no meio deles”. Além disso, a apresentação das regras para o Dia da Expiação diz: “Falou o Senhor a Moisés, depois que morreram os dois filhos de Arão, tendo chegado aqueles diante do Senhor. Então, disse o Senhor a Moisés: Dize a Arão, teu irmão, que não entre no santuário em todo tempo, para dentro do véu, diante do propiciatório que está sobre a arca, para que não morra; porque aparecerei na nuvem sobre o propiciatório.” (Lv 16.1-2). Essa passagem mostra explicitamente tanto a pre sença física quanto o perigo acarretado por ela. Também, como observou Milgrom, “.... o cap. 16 dá continuidade ao cap. 10. Assim, os caps. 11— 15 são uma inserção que especificam as impurezas que podem contaminar o santuário (Lv 15.31); por causa disso, é ordenado o ritual de purificação do cap. 16” (Milgrom, 1991,1011). 894
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4. Desse modo, temos bases para isolar Levítico 11— 15 como a unidade principal leis de pureza, sendo que a ocasião imediata e a aplicação mais rigorosa dessas leis podem ser encontradas em Levítico 10 e 16, respectivamente. Uma vez que o próprio incidente de Nadabe e Abiú dá oportunidade para algumas das declarações mais fundamentais da teologia subjacente das leis de pureza, é perfeitamente lógico que o escritor tenha colocado o material de Levítico 11— 15 nesse trecho. As declarações fundamentais são três: Levítico 10.3, 10-11 e 17. Em primeiro lugar, de acordo com Levítico 10.3, a primeira reação de Moisés à tragé dia foi dizer a Arão: “Isto é o que o Senhor disse: Mostrarei a minha santidade naqueles que se cheguem a mim e serei glorificado diante de todo o povo”. Assim, “Arão se calou”. Os sa cerdotes — e mais especificamente os dois filhos de Arão — não haviam honrado ao Senhor com seus atos. É possível que tivessem entrado no santuário no momento errado (cf. Lv 16.1-2 citado acima) ou levado consigo incenso estranho (cf. Ex 30.34-38), ou ainda que estivessem embriagados (cf. as possíveis implicações de Lv 10.9, que podem se refletir nesse contexto imediato). Qualquer que seja o caso, haviam profanado a santidade do Senhor que habitava no meio deles e, portanto, haviam deixado de honrá-lo perante o povo. Portanto, o Senhor respon deu aplicando o princípio declarado no v. 3. Em segundo lugar, em Levítico 10.10-11, o próprio Senhor explica essas preocupações diretamente a Arão de maneira mais detalhada (cf. v. 8, nesse caso não acontece nenhuma me diação por meio de Moisés, um fato incomum): “Para fazerdes diferença entre o santo e o pro fano e entre o imundo e o limpo e para ensinardes aos filhos de Israel todos os estatutos que o Senhor lhes tem falado por intermédio de Moisés”. Trata-se de uma preocupação dupla: a. a manutenção do santuário pelos sacerdotes, de modo que refletisse a santidade e a pureza do Senhor e b. a responsabilidade sacerdotal de instruir o povo a honrar ao Senhor seguindo seus decretos com referência à santidade e à pureza. Esses decretos abrangiam a santidade e a pu reza da presença de Deus no tabemáculo (Lv 10— 16), a santidade e a pureza de Israel como nação, em contraste com as nações ao redor (Lv 17—20), e a santidade e a pureza da adoração ao Senhor por Israel na condição de nação escolhida (Lv 21- 27). Em terceiro lugar, Levítico 10.17 registra um confronto entre Moisés e Arão: “Por que não comeste a oferta pelo pecado no lugar santo? Pois coisa santíssima é; e o Senhor a deu a vós outros, para levardes a iniqüidade da congregação, para fazerdes expiação por eles diante do Senhor”. A expiação sacrificial era o meio pelo qual os sacerdotes deveriam atuar como mediadores de Israel com referência à santidade e à pureza do santuário e da comunidade em geral. O Dia da Expiação, que encerra a seção de Levítico 10— 16, chama a atenção para os procedimentos rituais de purificação tanto do tabemáculo (16.11 -20a, 32-34) quanto do povo (16.20b-22, 29-31; cf. kpr I, # 4105). Assim, a seção como um todo incorpora, dentro da narrativa da tragédia de Nadabe e Abiú, os pontos centrais da perspectiva sacerdotal e da concepção de mundo no AT. Levítico 9.22— 10.2 ressalta a importância crucial da presença do Senhor no tabemáculo. Levítico 10.3 identifica para Israel (e para nós) a principal preocupação do Senhor com referência ao trata mento que ele deveria receber como Deus que habitava no meio de seu povo. Levítico 10.1011 isola os princípios centrais e mostra de antemão a estrutura das coisas em termos de limpo e imundo, santo e comum (ou profano), que é desenvolvida mais detalhadamente em Levítico 11— 15. Por fim, Levítico 10.17 adianta os procedimentos de purificação sacerdotal dos caps. 12, 14 e 15. O ponto culminante encontra-se em Levítico 16 (ou seja, o Dia da Expiação) que, conforme observamos anteriormente, recorda o incidente de Levítico 10 que deu início a tudo. Estas questões, a presença de Deus no meio de seu reino de sacerdotes, as estruturas conhe cidas como limpas e imundas, santas e comuns, que são a principal preocupação do Deus que 895
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se encontrava presente ali, bem como os procedimentos para tratar dessas estruturas, são os elementos que se entretecem para formar toda a trama da teologia sacerdotal subjacente das leis de pureza (-> Levítico: Teologia de). 5. ]ncluindo-se Levítico 10.10, há três passagens no AT em que a combinação dup de distinção “entre o santo (qõdes, # 7731) e o profano (hõl, # 2687) e entre o imundo (tãm ê', # 3237) e o limpo ((ãhôr, # 3197)” é declarada de maneira explícita (cf. também Ez 22.26; 44.23). Em outras passagens, há várias ocasiões em que é apresentado um contraste nítido en tre o imundo e o puro. O povo deve, por exemplo, “fazer a diferença entre o imundo e o limpo e entre os animais que se podem comer e os animais que se não podem comer”. (Lv 11.47; cf. 14.57 com referência à contaminação de pessoas, lugares ou coisas por lepra, conforme trata do no cap. 14; Lv 20.25, sobre animais limpos e imundos novamente; e Nm 19.19; Dt 12.15, 22; 15.22; Ec 9.2, sobre pessoas limpas ou imundas). Vemos refletidos aqui dois níveis de concemência: Em primeiro lugar, o contraste entre os conceitos mais amplos de santo e comum em comparação com limpo e imundo, e, em segundo lugar, a distinção mais específica entre os conceitos mais limitados de limpo e imundo. A seguir, iremos nos concentrar na estrutura conceituai e na delimitação prática dos conceitos de limpo e imundo; mas, antes, é necessário que algo seja dito com referência ao contraste mais amplo entre santo e comum, em compara ção com limpo e imundo. Os conceitos de santo e comum estão relacionados à condição de pessoas, lugares, coi sas e épocas (ver Jenson), ao contrário de limpo e imundo, que se referem apenas à condição de uma pessoa, lugar ou coisa. Devemos entender a distinção desses dois conceitos duplos. E verdade que santo e imundo podem, em certo sentido, ser considerados opostos conceitualmente. Por certo alguém ou algo imundo que entrava em contato com o algo santo constituía uma profanação do sagrado. No entanto, também é necessário ter outras questões em mente. Um sacerdote era considerado uma pessoa santa (ver sua consagração em Levítico 8), contrastan do, por exemplo, com uma pessoa comum de Israel. Porém, um sacerdote considerado santo podia encontrar-se numa situação de limpeza ou imundícia (p. ex., um sacerdote podia casarse e ter filhos, mas, de acordo com Levítico 15.16-18, as relações sexuais tornavam as pessoas ritualmente imundas). Assim, somente a primeira metade da seguinte declaração é verdadeira: “Ser limpo não torna algo santo, mas aquilo que é santo é sempre limpo” (Hartley, 141; cf. a confusão dessas categorias em Wenham, 18-20; Milgrom, 1991, 731-32). Por um lado, tomar-se imundo não mudava a situação do sacerdote de santo para comum — não era necessário que ele passasse por outra série de procedimentos de (re)consagração, a fim de voltar a atuar como sacerdote depois que era purificado de sua imundícia. Por outro lado, se ele entrasse no tabemáculo estando imundo, iria profaná-lo e deveria oferecer um sa crifício pelo pecado por ter profanado a presença de Deus no tabemáculo (Lv 4.3-12; cf. 16.1114 para o Dia da Expiação; e para a aplicação do mesmo princípio ao consumo de alimentos sagrados pelos sacerdotes, ver 22.4-7). Além disso, por um lado a condição de imundícia não afetava a situação de sacerdote santo, mas a imundícia dele podia transmitir impureza pelo simples contato com pessoas, lugares ou objetos santos ou comuns. Por outro lado, também, a santidade dele não era transmissível para pessoas, lugares ou coisas comuns por simples con tato (ver esp. Ag 2.12-13). Semelhantemente, tratar alguém ou algo considerado santo como se fosse comum (= profano) é o mesmo que profanar ou violar a santidade dessa pessoa ou coisa (ver p. ex., Lv 21.12 vb. pi. hll [# 2725]; cf. hõl em Lv 10.10 acima), e o processo de transferir alguém ou algo da classificação de comum para santo é a consagração da pessoa ou do objeto (ou seja, santificar a pessoa ou o objeto; ver p. ex., Lv 8.30 vb. pi. qds [# 7727] para a consagração dos 896
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sacerdotes; cf. qõdes em Lv 10.10). Nossa preocupação maior neste estudo é com a relação entre os conceitos de limpo e imundo, ou seja, com a condição física e ritual, e não com a situação de pessoas, lugares ou coisas (santos ou comuns). O meio de transferir alguém de uma condi ção de imundícia para uma condição de pureza e vice-versa é respectivamente a purificação (ver, p. ex., Lv 16.30, purificar, vb. pi. /hr, # 3197; cf. tãhôr em Lv 10.10) e a contaminação (ver, p. ex., Lv 15.31, “contaminando o meu tabemáculo”, vb. pi. tm ', # 3237; cf. tãm ê' em Lv 10.10). Esses termos são estudados em detalhes nos artigos lexicais relevantes. 6. Conforme observamos anteriormente, Levítico 10 contém certas declarações conci sas e claras sobre a essência daquilo que o Senhor desejava realizar por intermédio do sistema ritual levítico (Lv 10.3, 10-11 e 17; ver seções 4-5). Além disso, encontramos declarações su márias espalhadas pelo texto dos caps. II— 16 que sintetizam praticamente todo o conteúdo desses capítulos (Lv 11.46-47; 13.45-46; 14.54-57; 15.31.33; 16.29-34). A única exceção é o cap. 12, que constitui uma seção relativamente curta sobre a purificação de uma mulher depois do parto. Os pequenos trechos de textos aos quais fazemos referência aqui como declarações sumárias nos permitem isolar e compreender a substância e os contornos essenciais do material para o qual essas declarações sumárias servem de estrutura literária. As duas principais classificações são animais limpos e imundos (Lv 11; cf. também os comentários sobre Lv 20.22-26, na seção 7) e pessoas limpas e imundas (caps. 12-15). Levítico 16 relaciona tudo isso diretamente com a questão de pureza do tabemáculo e da comunidade, da ausência de pecados e imundícia. Neste artigo, é necessário tratar dessas questões de ma neira geral e abrangente, pois devemos ler esses caps. tendo em mente tanto o limpo quando o imundo, sem isolar um do outro. O cerne do texto nessas passagens é justamente a preocupação com o contraste entre esses conceitos, no que se refere aos animais e às pessoas (Lv 11— 15), e a maneira como esse contraste afetava a pureza do tabemáculo (Lv 16; cf. 15.31; 16.29-34). 7. Conforme observamos anteriormente, as regras sobre limpo e imundo em Levítico 11— 16 começam com o reino animal. Levítico 11.46-47 diz: “Esta é a lei dos animais, e das aves, e de toda alma vivente que se move nas águas, e de toda criatura que povoa a terra, para fazer diferença entre o imundo e o limpo e entre os animais que se podem comer e os animais que se não podem comer”. As quatro principais categorias de animais em Levítico 11.46 são basicamente as mesmas que encontramos em Gênesis 1.24-31 — animais, aves, peixes do mar e répteis que rastejam sobre a terra. De acordo com Levítico 11.47, a principal questão é a distinção entre “animais” (um termo que se aplica a todos os seres viventes relacionados no v. 46) comestíveis e não comestíveis. O termo “animais” no v. 46 é o mesmo empregado nos vv. 2b-8. Em Gênesis 1.24-30, normalmente é traduzido como “gado”. Em seguida, Levítico 11.9-23 trata da comestibilidade das aves (inclusive insetos voadores) e criaturas aquáticas. Há vários pontos que devem ser ressaltados. a. De acordo com Gênesis 1, as aves e peixes foram criados no quinto dia e, é claro, não compartilhavam exatamente do mesmo domínio natural que os animais terrestres (e os homens) criados no sexto dia. Essa mesma distinção reflete-se em Levítico 11. Os animais terrestres não comestíveis são chamados de imundos (tãmê ’), enquanto os peixes e aves são chamados de abominações (seqeç, # 9211), bem como as criaturas que rastejam sobre a terra, sendo que todos são considerados não comestíveis e abominações (vv. 41-43a). Assim, a teologia levítica se desenvolve a partir da cosmologia de Gênesis em termos de estrutura do mundo animal. Há um grau significativo de semelhança entre a maneira como Deus criou o mundo no princípio e o modo como sua comunidade escolhida deve agir em relação a essa criação. b. Por mais óbvio que seja, é importante ressaltar-se que não havia plantas imundas. A luta que passou a fazer parte do reino animal como resultado da queda criou um caos cujos 897
Limpo e imundo
extremos deviam ser evitados na Israel da antigüidade por meio da alimentação. Assim, os ani mais terrestres que ruminam são, por natureza, herbívoros e, se têm o casco fendido, também são limpos e comestíveis. Por esse motivo, aves que comem carne em putrefação não podem servir de alimento. Nossa compreensão da lógica por trás das leis referentes a animais limpos e imundos deve começar nesse ponto. c. Em Lv 20.22-26, o Senhor aplica essa lei acerca de animais limpos e imundos (e o chamado “lema da santidade” — “sereis santos, porque eu sou santo”, 11.45b) à separação de Israel dos costumes de outras nações. O Senhor diz: “Fareis, pois, distinção entre os animais limpos e os imundos e entre as aves imundas e as limpas; não vos façais abomináveis por cau sa dos animais, ou das aves, ou de tudo o que se arrasta sobre a terra, as quais coisas apartei de vós, para tê-las por imundas. Ser-me-eis santos, porque eu, o Senhor, sou santo e separeivos dos povos, para serdes meus” (Lv 20.25-26). Em Levítico 11.44-45, o lema da santidade encontra-se relacionado à santidade em meio à corrupção da própria criação; mas, em 20.25-26, relaciona-se à santidade em meio à corrupção das outras nações ao redor de Israel. Portanto, as leis acerca de animais limpos e imundos cumpria outro propósito teológico prático: separar Israel das nações corruptas que a cercavam. A visão de Pedro do lençol descendo do céu, em Atos 10.9-16, ilustra o fato de que o efeito separatista nacional dessas leis acerca dos animais limpos e imundos pode ser sentido ao longo das eras (ver mais comentários sobre isso na se ção NT de (m ’, # 3237). d. De acordo com Gênesis 7 e 8, Noé conhecia a distinção entre animais limpos e imun dos. Não se sabe ao certo se eram distinguidos da mesma forma que em Levíticos. E provável que os israelitas do tempo de Moisés partissem do pressuposto de que essa distinção era igual. De qualquer modo, Gênesis 9.3-5 relata que depois do dilúvio o Senhor deu permissão para que se comesse carne, mas não há nenhuma menção de uma distinção entre animais limpos e imun dos para a alimentação (apesar de Noé haver oferecido somente animais limpos ao Senhor em Gn 8.20). Os homens em geral podem comer qualquer animal, um fato que também valia para os tempos de Moisés. Aliás, essa é a relevância que se pode inferir das leis acerca de animais limpos e imundos em Levítico 20.25-26 (ver acima). Essa passagem relaciona as leis de caráter principalmente social de Levítico 18—20 com Levítico 11. Em 11.44-45, o lema da santidade refere-se à santidade em meio à corrupção da própria criação, mas Levítico 20.25-26 trata da santidade em meio à corrupção das nações ao redor de Israel. Isso, por sua vez, pode indicar que algumas das leis acerca de animais limpos e imundos baseavam-se numa lógica totalmen te diferente daquela discutida acima. Algumas dessas leis podem ser relacionadas aos hábitos alimentares ou sacrificiais e rituais de outras nações. Regras alimentares diferentes serviriam para impedir qualquer tipo de relação social ou religiosa com essas outras culturas. e. Um grande número de bases lógicas já foram propostas para explicar as regras acer ca de animais limpos e imundos em Levítico 11 (cf. Dt 14; para um bom resumo geral dos diversos pontos de vista e bibliografia, ver Budd, 282-90). Dentre as mais importantes, pode mos citar: i. a abordagem da alimentação saudável ou da higiene (p. ex., Harrison, 122-26), ii. a proposta mais recente de caráter estrutural antropológico e social apresentada por Mary Douglas, de acordo com a qual os animais limpos constituem o todo (ou seja, preenchem todos os requisitos para encaixarem-se em determinados conceitos de animais “inteiros, completos ou normais”) e portanto simbolizam a inteireza de Deus e sua preocupação com essa mesma característica em meio a seu povo (ver as propostas mais refinadas e as variações em Budd, 282-90). iii. a abordagem ética e humanitária, na qual se ressalta a oposição binária entre vida e morte, sendo que o propósito da classificação dos animais em limpos e imundos seria evitar a matança indiscriminada ao se limitar o abate a um determinado número de espécies (Mil898
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grom, 1991,704-42). Em termos históricos, devido às dificuldades relativas à compreensão da base lógica para a classificação dos animais em limpos e imundos, vários estudiosos (p. ex., Maimonides) chegaram à conclusão que essas classificações são simplesmente arbitrárias. No entanto, tal idéia nâo é adequada, pois as classificações são apresentadas de acordo com padrões de taxonomia, etc. e não de modo arbitrário. Minha proposta é que existe uma intersecção dos três principais fatores referentes às regras acerca de animais limpos e imundos: i. a própria estrutura do mundo animal (ou seja, a cosmologia, em sua dimensão zoológica), ii. a preocupação em evitar-se a ingestão do sangue ao comer animais que se alimentam de came e sangue e iii. o aspecto prático de separar-se os israelitas dos povos vizinhos até mesmo no que diz respeito às necessidades mais básicas da vida, como a alimentação (ver os comentários acima sobre Lv 20.22-26). 8. Uma pessoa podia ser contaminada ao comer a carcaça de um animal imundo o mesmo ao tocá-la, sendo que, nesse caso, deveria seguir a seguinte prescrição: “lavarás as suas vestes e será imundo até à tarde” (Lv 11.40). Com isso, cria-se uma relação entre as leis acerca de animais limpos e imundos em Levítico 11 com as leis acerca de pessoas limpas e imundas em Levítico 12— 15. Levítico 13 e 14 tratam do indivíduo que costuma ser chamado de le proso. Por uma questão de conveniência, usaremos esse termo, ainda que a expressão “pessoa com doença de pele” possa ser mais precisa e apropriada. Levítico 13 concentra-se principal mente no diagnóstico e na condição do leproso, enquanto Levítico 14 trata especialmente do processo de purificação do leproso. Para as considerações de nosso estudo, o mais importante é o sumário de Levítico 13.45-46: “As vestes do leproso, em quem está a praga, serão rasga das, e os seus cabelos serão desgrenhados; cobrirá o bigode e clamará: Imundo! Imundo! Será imundo durante os dias em que a praga estiver nele; é imundo, habitará só; a sua habitação será fora do arraial”. E importante observar que tal pessoa deve viver “fora do arraial” (as questões levanta das por Nm 5.1 -3 são tratadas no artigo sobre (m # 3237). Trata-se de uma imundícia bastante diferente daquela à qual Levítico 12 e 15 (os dois capítulos adjacentes à passagem sobre a le pra) se referem. Alguns tipos de imundícia exigem que a pessoa viva fora do arraial enquanto outros permitem que ela permaneça nele. Neste último caso, há uma preocupação quanto ao contato com o resto da comunidade, uma vez que pessoas limpas podem contrair uma forma secundária; mas apesar disso, tais pessoas não são expulsas do arraial. Ainda que nâo seja possível tratarmos de todo o assunto em detalhes, fica claro que há uma hierarquia de imundícia. Existe uma imundícia “normal”, a qual exige que, uma vez cessado um fluxo normal, quer seja ele menstruai ou seminal (Lv 15.16-24), as pessoas sejam consideradas imundas durante um determinado período (de um e sete dias, respectivamente), devem purificar-se pela oferta de sacrifícios. Esse tipo de imundícia não permite que a pessoa entre no tabemáculo, para que nâo o profane. Existe ainda uma imundícia “anormal”, a qual exige que, uma vez cessado um fluxo — quer seja ele um fluxo masculino anormal, por exemplo (Lv 15.1 -15), ou um fluxo de sangue na mulher depois do parto (Levítico 12) — as pessoas se purifiquem pela oferta de sacrifícios. Em nenhum desses casos de imundícia (normal ou anormal), a pessoa é expulsa do arraial. No entanto, existe ainda um tipo de imundícia que pode ser chamado de “grave”, o qual exige que, uma vez que a pessoa não esteja mais acometida de determinado mal, como por exemplo a lepra (Levítico 13— 14), passe por uma lavagem associada a certos rituais sacerdotais (Lv 14.2-9) e, então, ofereça sacrifícios, não sendo possível discutir aqui a função específica de cada um deles. Depois de tudo isso, a pessoa não apenas volta a ter acesso ao tabemáculo, mas também é readmitida na comunidade em geral. 899
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A questão mais global é que, por vezes, certas condições de limpeza ou imundícia (Lv 10.10) e certos procedimentos de purificação (Lv 10.17) estavam associados não somente à limitação de acesso ao tabemáculo (a fim de que este não fosse profanado), mas também à comunidade ao redor do tabemáculo (Jenson propõe um “Espectro de Santidade” que leva em consideração as dimensões espaciais, pessoais, rituais e temporais da existência humana; ver esp. seu quadro, p. 37). Os rituais do Dia da Expiação tratam de ambos: isto é, removem a profanação tanto do tabemáculo quanto da comunidade (para detalhes, kpr I, #4105; cf. esp. Wright, para uma análise bastante útil da eliminação da impureza em Levítico 16 e em outras passagens). Limpeza, pureza: -> brr I (expurgar, separar, manter puro, peneirar, # 1405); -> zkh (estar puro, limpar-se; # 2342); hap (puro, limpo, # 2899); -> thr (limpo, limpar, purificar, #3197) Impureza, profanação, contaminação: -> g 'l II (ser contaminado, profanado, macular, # 1458); -> hnp I (ser ímpio, contaminado, # 2866); -> (m ' (ser/tomar-se cerimonialmente im puro, contaminar-se, profanar, # 3237); piggúl (came impura, # 7002) B ib l io g r a f ia
ABD 5:454-61; TDOT 5:287-96,330-42; P. J. Budd, “Holiness andCuIt”, The World o f Ancient Israel, 1989, 275-98; J. E. Hartley, Leviticus, WBC, 1992; R. K. Harrison, Leviticus, TOTC, 1980; P. P. Jenson, Graded Holiness: A Key to the Priestly Conception o f the World, JSOTSup 106, 1992; B. A. Levine, Leviticus, The JPS Torah Commentary, 1989; J. Milgrom, Leviticus 1-16, AB, 1991; idem, Numbers, The JPS Torah Commentary, 1990; G. J. Wenham, The Book o f Leviticus, NICOT, 1979; D. P. Wright, The Disposal oflm purity, SBLDS 101, 1987. Richard E. Averbeck Língua -> # 4383 (lãsôn, língua, linguagem) Linguagem -> # 8557 (sãpâ, linguagem, lábio, litoral) Linho -> # 7324 (pêset, fibra de linho, linho) Lira -> # 4036 (kinnôr, lira) Liso
# 2744 (hlq I, ser liso, tomar escorregadio, lisonjear)
1. A missão da litera bíblico é uma forma de literatura altamente estilizada, caracterizada por seu método de revelação e sua escatologia do irrompimento do reino de Deus. A missão da literatura apoc. era desenvolver uma teologia que fosse apropriada para Israel, numa época em que, com a ascensão das potências gentias e a perseguição aos judeus fiéis, o cumprimento do destino de Israel no plano político-histórico era claramente inatingível. As características do material apoc. bíblico foram expandidas e ilustradas por obras judaicas pos teriores, como 1 Enoque, 4 Esdras, 2 Baruque, o Apocalipse de Abraão e pelo Apocalipse do NT, escrito por João. No entanto, é no livro de Daniel que o material apoc. do AT chegou à sua consumação depois de haver passado por um desenvolvimento inicial a partir do estímulo re cebido da literatura profética (cf. Is 24 —27). (-> Daniel: Teologia de) Literatura Apocalíptica
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2. Os escritos proféticos e o material apocalíptico. Apesar de o material apoc. estar inti mamente associado aos escritos proféticos, o método de revelação do material apoc. é diferente. Enquanto as profecias preocupavam-se principalmente com mensagens de Deus referentes às implicações de seu relacionamento com seu povo. a literatura apoc. era voltada para o futuro e expressava sua mensagem num simbolismo vivido, codificado em sonhos e visões, como no livro de Daniel. Como o nome apocalipse (“revelação”) sugere, essa literatura contém o des dobramento dos mistérios celestiais referentes ao plano divino para a história, o julgamento do mal e a maneira como o reino de Deus virá no fim escatológico, juntamente com o julgamento mundial associado a ele e que ocorrerá nessa ocasião. A fim de validar a revelação, os escritos mais recentes recorriam a pseudônimos, tomando para sua obra o nome de alguma figura ilustre da antigüidade (Enoque, Abraão, Moisés, etc.). Os escritos proféticos do cativeiro situavam o exílio no contexto de uma aliança rom pida (Jr 31.31-34). Foi especialmente por meio dos escritos de Jeremias e de Ezequiel que surgiu a crença de que o julgamento de Israel se cumpriria por meio do sofrimento e que Javé encontraria uma forma de renovar a aliança. A partir de então, a fé deveria ser depositada numa ressurreição nacional, pois a teologia da fé exigia que a vindicação da soberania de Javé fosse vista no livramento extraordinário de seu remanescente fiel, como pode ser observado em Da niel. Outros exemplos de escritos apoc. dentro do AT podem ser encontrados em Isaías 24— 27; 34— 35; 40—66; Ez 38— 39; Joel 3 e o Livro de Zacarias. Ver também Sofonias 1.15-18. (-> Profecia: Teologia) 3. Daniel e os escritos apocalípticos. O livro de Daniel começa num período em que as esperanças de Israel pareciam frustradas. O propósito do livro era garantir mais uma vez aos leitores que Javé ainda era soberano e que Israel tinha um futuro definido. Os principais temas da história da salvação de Israel não ofereciam consolo algum no confronto com a crise do exílio e outras crises posteriores e não são proeminentes em Daniel e nem em textos apoc. mais recentes. Nâo apenas o exílio e acontecimentos subseqüentes pareciam negar sua relevân cia como também — e mais importante ainda — a Israel política que havia transmitido esses temas, não seria restaurada depois do exílio a uma forma exatamente igual de organização. O livro de Daniel trata do assunto central do pensamento apocalíptico: os dois reinos em conflito — o reino de Deus e o reino deste mundo representado em Daniel por quatro impérios mun diais. O livro levanta a questão de qual reino prevalecerá. Daniel (capítulo 7; cf. Is 24— 27) deixa claro que a oposição cósmica do poder do mal permeou as estruturas da própria criação. A oposição existente entre ordem e desordem, que caracteriza a escatologia das Escrituras ca nônicas, também aparece em Daniel e em materiais apoc. posteriores. 4. A teologia apoc. da história. A literatura apoc. é caracterizada ainda por sua parti cular teologia da história. Os escritos proféticos haviam considerado o advento do reino de Deus por meio da operação e testemunho de Israel dentro da história. Mas a era do exílio e o período que o seguiu trouxeram uma mudança de pensamento, uma vez que uma concepção estritamente política da história não era mais desejável. A teodicidade exigia que as experiên cias do presente estivessem relacionadas à história como um todo, sendo que o problema do exílio fazia parte da história. No entanto, não podia haver nenhuma insinuação de que Deus perdera o controle da história, e a teologia apoc. da história era calculada de modo a afirmar a unidade histórica divina diante das aparentes contradições do fato. Assim, o material apoc. sistematizou o que os profetas israelitas haviam apenas vislum brado: a totalidade da história e a história que ainda estava por se desdobrar, e, para a qual, Israel fiel era a chave. A sujeição prolongada ao domínio estrangeiro levou a certo pessimismo sobre a operação de Deus na ordem presente. A literatura apoc. contrapôs essa idéia declarando que 901
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a intervenção de Deus nos últimos dias criaria uma nova ordem de existência, o irrompimento do reino de Deus. Contudo, essa visão apoc. da história só diferia dos escritos proféticos em termos de mudanças de ênfase e alterações das circunstâncias históricas. Essa visão apoc. con tinuava sendo escatológica, pois a história ainda tinha um fim a ser concretizado. (-> História do AT: Uma perspectiva hermenêutica) O compromisso do material apoc. com o reino de Deus significava que a história ainda era voltada para um objetivo. Porém, como mostra o primeiro v. do livro de Daniel, o futuro não podia ser considerado de modo separado da relação de Deus com Israel no passado. O judaísmo ainda era a corporificação da verdadeira religião para toda a humanidade e o domínio mundial de Deus seria estabelecido por meio de uma Israel firme em sua fé. A visão apoc. da história presente era pessimista. A ordem mundial ia de mal a pior, mas o fim estava próximo. A visão negativa da história teve origem na situação desesperadora na qual os crentes se encontravam. O material apoc. não partiu de um dogma de que Deus não pudesse agir neste mundo, mas da simples observação de que desde 587/6 a. C. não se podia vê-lo em ação. A crença num fim iminente foi afirmada desde Daniel até 2 Baruque (século II d. C.), apesar do cumprimento desse fim não haver ocorrido e deixar transparecer um abandono da esperança para a era presente. No entanto, a ética c a responsabilidade teológica de testemunhar para o mundo presente não foram abandonadas e os escritos apoc. combinam seus conceitos visionários com relatos do heroísmo de crentes na era presente. O grande desfecho da histó ria estava próximo. Deus daria início a esse grande ato de nova criação como havia feito com a própria criação do mundo. Pelo fato de Deus haver operado em favor de Israel em tempos passados, ele operaria em favor dos santos, o remanescente de Israel no futuro, como afirma Daniel 7. Por intermédio de Daniel, Deus revelaria os contornos do futuro e o remanescente de Israel herdaria o reino de Deus. Os impérios mundiais se sucediam ao longo do tempo, mas constituíam uma unidade ideológica básica (Daniel 2). Diante da tirania e da opressão, a literatura apoc. acreditava na vitória final de Deus. Essa era gloriosa não surgiria do presente, mas viria do além e irromperia na história. O significado oculto por trás da história, pressuposto pelos profetas, tomou-se então evidente, pois na atual confusão da história, podia-se ver claramente a mão de Deus. Em contraste com os profetas, que apresentavam uma escatologia dentro do plano da história, os escritos apoc. proclamavam uma escatologia transcendente. A história não podia mais ser considerada somente a história dc Israel e não era mais, como nas profecias, o palco onde a humanidade seria aperfeiçoada juntamente com sua sociedade. A intervenção de Deus na sociedade traria uma nova ordem de existência. Na superfície, as lutas eram entre os judeus e os impérios da época, mas na verdade, a luta final seria entre os poderes das trevas e os po deres da luz, entre o reino de Satanás e o reino de Deus. Israel era o instrumento de Deus, e por meio desse instrumento o domínio mundial de Deus seria estabelecido. a. Determinismo. Os apocalípticos acreditavam que a história toda havia sido mapea por Deus de maneira determinista (Dn 11. 36 ; 2Ed 4 .36 - 43 ). A história do mundo era dividida em grandes épocas — milênios ou períodos de diferente duração — pela ascensão e queda de impérios (Dn 2 ; 7 ; 8- 12, 1:29 ; lEn. 91 . 12- 17; 93 . 1- 10; Levi 16- 18; 2Bar 36 - 40 ; 53- 74 ). Todo o curso da história, desde a criação até o fim dos tempos já havia sido escrito nos livros celestiais (Dn 7 . 10 ; Jub 1.29 ; 32.21 - 22 ). A história do mundo estava se movendo inexoravel mente em direção ao seu objetivo predeterminado ■— o estabelecimento do reino de Deus — e nada que os homens fizessem poderia mudar esse fato. Essa visão apoc. dc mundo não era uma resignação pagã ao destino, mas sim a fé na graça de Deus e, deste modo, juntamente com o 902
Literatura Apocalíptica
determinismo um tanto negativo de Daniel 11, também encontra-se a convicção em Daniel 9 de que Deus julga seu povo pela rebeldia e responde ao arrependimento. b. Dualismo. A história era considerada hostil a Deus e a Israel. Assim, os impérios deste mundo eram apresentados como parte de um dualismo cósmico, representado por bestas que surgem do mar, em Daniel 7. Forças do mal dominam esta era, mas na era vindoura, Deus reinará supremo. No pensamento apoc. posterior, o mundo toma-se eticamente dividido em esferas de bem e mal, luz e trevas, enquanto o dualismo psicológico, apresentado como um conjunto de princípios de bem e mal, é interiorizado como impulsos internos dentro da humani dade. Daniel também pressupõe um dualismo espacial entre o céu e a terra, como fica evidente com os nomes de Deus no livro (Deus do Céu, Altíssimo, Deus Altíssimo, Senhor do céu. Rei do céu). De qualquer modo, devemos ter o cuidado de ressaltar que para o pensamento apoc., Deus sempre permaneceu no controle e devemos falar, portanto, de um dualismo aparente e não real. A literatura apoc. não abandonou a retidão nem a soberania de Deus. Juntos, o dualismo e a escatologia eram os dois focos do sistema teológico apoc. (Dn 2.31-45; 7; 8; lEn. 91-93; TestLevi 16-18). O eschaton pertencia a tempos vindouros, apesar de já existir dentro da era contemporânea, juntamente com a eternidade, oculto desde o princípio (4Ed. 7.26; 2Bar 24; Ap 20.12). Era, acima de tudo, o Dia do Julgamento no qual Deus iria jul gar as obras da humanidade(Dn 7.10; lEn. 47.3; 90.20; 2Bar 24; Ap 20.12). A ameaça presente à ordem carecia de uma escatologia. Essa crença de que a vida humana e a história estavam se movendo rumo a um alvo além da morte (Dn 12.2) permitia ao crente fazer uma avaliação apropriada do presente. O pensamento apoc. trouxe consigo um novo senso de responsabilidade com relação ao mundo, pois alimentava-se da esperança de transformação do mundo. c. O reino de Deus. Apesar de essa expressão não ocorrer no AT, o conceito encontra-se representado em seus escritos. Em Daniel 2, a vinda do reino marca o grande ápice da história. Os reinos gentios não passavam de fases no processo do mundo, cujo fim é o reino de Deus. Nos primeiros estádios do AT, prevalecia a visão profética de que o reino messiânico chegaria à terra como a era dourada e a fase final da história. No material apoc., surgiu um conceito de nova salvação além da catástrofe final da história, uma salvação de caráter paradisíaco, uma nova criação. Esta seria precedida de uma Jerusalém na qual Deus, ou o Messias, derrotaria os malfeitores e castigariam os inimigos de seu povo. Sem dúvida a questão de como esse reino surgiria era assunto para intensa especulação nos meios do exílio. A conclusão a que Daniel chega, comum aos escritos apoc. posteriores, é de que o domínio de Deus daquele momento em diante seria um elemento oculto que se manifestaria somente no fim dos tempos. O desafio universal da iniqüidade exigia uma correção de todas as injustiças, uma elimi nação do mal no mundo todo ou até mesmo no cosmo. A vinda do reino será responsabilidade exclusiva de Deus e constituirá um reino no qual todos reconhecerão a soberania de Deus. A vinda desse reino será um fim, além do qual é impossível ver. Como um reino que se firmará neste mundo, substituirá todas as imperfeições e circunstâncias trágicas desta vida na qual a perversidade parece triunfar. O reino será dado especificamente aos santos do Altíssimo, ou seja, aos fiéis de Israel (Dn 7.18,27), que governarão com plena autoridade recebida de Deus. Normalmente, pode-se encontrar alguma alusão ao reino vindouro nos escritos apoc., sendo que esse reino assume as características básicas da entronização do Juiz celestial e da execução do julgamento (Dn 7.914; lEn. 90.20-38; 4Ed. 7.33-34; Ap 20). Ao vir sem nenhum aviso, o reino levará a história à sua conclusão (Dn 2.44). d. Anjos. Observa-se no pensamento apoc. um desenvolvimento considerável no que se refere a espíritos e ordens de anjos (Dn 8-12; lEn. 6-12; Test Levi 3.5) em decorrência de 903
Literatura Apocalíptica
uma crescente percepção da transcendência de Deus. Alguns anjos haviam se rebelado. Na li teratura apoc. intertestamentário, Satanás e seus anjos são representados como arquiinimigos de Deus, determinados a controlar — e assim destruir — não apenas a raça humana, mas até mesmo o próprio cosmo. O reino de Deus enfrenta o reino de Satanás; os exércitos angélicos colocam-se em formação e a guerra no céu prossegue. Esse conflito de anjos guardiões e seus séquitos (Dn 10.13-20) tem seu par. aqui na terra nos conflitos entre as nações. Esses acontecimentos terrenos não passam de reflexo da realidade celeste. Assim, o mundo dos espíritos é dividido entre anjos bons e anjos caídos. O mundo presente encontrase nas mãos de principados e potestades e a sorte dos homens está nas mãos de Satanás e seus anjos, pois Deus permitiu que os representantes angélicos das nações triunfassem temporaria mente nos céus, de modo que as nações do mundo também triunfam temporariamente na terra. Porém, enquanto as nações são governadas por anjos, Israel é governada por Javé. Virá o dia final em que o reino de Satanás será aniquilado e o reino de Deus será estabelecido por todo o universo (Test Judá 25.3). e. O Messias / Filho do Homem. A teologia apoc. normalmente contém a marca de um mediador designado por Deus. Em Daniel 7, aquele “como o Filho do Homem” é claramente uma contraposição às bestas rebeldes e, assim, a ele é dado o reino c o domínio. Israel, ou tal vez o rei de Israel, parece ser identificada pela expressão “filho do homem” (ver SI 80.8,13 [9, 15], em que Israel como uma vinha é destruída por um animal selvagem). Tomando por base o Salmo 8.4 [5], podemos ver o “filho do homem” como um retrato de Adão/Israel, o herdeiro das promessas de Deus à humanidade em Gênesis 1—2, que recebe domínio para os santos, ou seja, os fiéis de Israel. Assim, os santos realizarão o objetivo de domínio de Adão, sob a autoridade de Deus. O reino do “filho do homem” é permanente, contrastando com o caráter temporário do domínio das bestas, que não reconhecem o lugar de Israel na ordem criada. A identificação de um “filho do homem” preexistente com o Messias supramundano ocorre pos teriormente em / Enoque. O Messias do AT é, essencialmente, uma figura presente neste mundo e que govema como rei. Não é indispensável ao reino escatológico e não ocupa uma posição de destaque na literatura apoc., uma vez que o reino vindouro tem sua origem no outro mundo e será governa do pelo próprio Deus. Do período macabeu (c. 168 a. C.) em diante, houve um reavivamento no interesse pelo Messias, como fica evidente nos Salmos de Salomão (c. 50 a. C.). Ao longo do restante do século I a. C., a figura de um Messias nacional passou a fazer parte da esperança popular, como é mostrado claramente no Novo Testamento. Em 4 Esdras (final do século I d. C.) o Messias davídico é uma figura humana cujo reino é interino entre a antiga dispensação e a nova. O Messias também ocupa uma posição de destaque no século II d. C. (2Bar 29.3; 39.7; 72.2). Nos textos de Qumran (e nos Testamentos dos Doze Patriarcas), espera-se a vinda de um messias-sacerdote escatológico além do Messias da linhagem de Davi, o que talvez tenha sido influenciado por Zacarias 4 e sua imagem de uma diarquia civil e sacerdotal. f. A mitologia apoc. e a guerra santa. Para os textos apoc. — de maneira muito mais pronunciada do que nos textos proféticos — as ações relevantes ocorriam no céu. Essa mudança de ênfase é aparente em Daniel, porém parcialmente visível em Isaías 24—27. Foi acompa nhada de um uso maior dos elementos míticos, que davam a impressão de criar uma aura de tensão indicando a presença de poderes maiores do que os humanos. Assim, em última análi se, o contexto de Daniel 7 parece ser, ainda que indiretamente, derivado do mito cananeu da entronização de Baal por El depois que o primeiro derrotou Iam, o deus do mar. A descrição do Ancião de Dias, o conflito com monstros marinhos, a chegada de “um como o Filho do Ho mem” nas nuvens e a entrega do reino a ele parecem indicar o uso do mesmo esboço mítico. 904
Livro da Vida, dos Vivos, da Memória, da Verdade
No entanto, em Daniel 7, o modelo mítico é quebrado, uma vez que não há batalhas e as bestas são destruídas pelo julgamento de Deus no conselho celestial. g. O Dia do Senhor. Esse antigo termo profético que se refere ao julgamento esperado do mundo por Javé consiste em mais um tema da literatura apocalíptica. Não aparece explici tamente em Daniel, mas o conceito está presente Daniel 12.1-2. Em Joel 3, a idéia desse dia é de uma grande sessão num tribunal onde Deus julgará as nações do mundo, sendo que, depois desta, surgirá para os fiéis uma nova era de bênçãos. Em vez de operar por meio de agentes humanos, como nas profecias israelitas, na literatura apoc., Deus intervém diretamente a fim de trazer-nos o seu reino e dar início à era vindoura. A figura do “anticristo” encontra-se cla ramente associada ao fim e trata-se de uma idéia fundamental que já estava presente em Eze quiel 38—39, mas que, na verdade, já existia antes disso, no conflito primordial de Deus com o caos. A conquista dessa oposição básica é precursora da nova criação (Is 65.17). Aquilo que o Criador intentou e planejou no tempo da criação se cumprirá no fim dos tempos (Jub 1.29; 23.26-31; /£«45.4-6; 90.37-39; 91.16; Tesl Levi 18.10-14). h. Vida depois da morte. Esse assunto, comum na teologia apoc., é discutido em Da niel 12.1-3 no contexto da ressurreição do corpo. Apesar de o AT tratar do conceito da vida no além-túmulo como uma existência sombria no Seol, dá-se pouca atenção ao destino dos justos. Em Daniel 12.2, o contraste parece ser entre o destino dos justos, que serão ressusci tados, e o dos perversos, que não serão ressuscitados. A ressurreição para a vida eterna ocorre em Daniel 12.2, num ponto crítico das eras em conjunção com o julgamento escatológico. Na literatura apoc. mais recente, existem vários pontos de vista quanto à questão da ressurreição e o destino dos ressurretos. B ib l io g r a f ia
J. J. Collins, The Apocalyptic Imaginalion in Ancient Judaism, 1984; P. D. Hanson, The Dawn o f Apocalyptic, 1975; D. Hellholm (ed.), Apocalypticism in the Mediterranean World and the Near East, 1983; C. C. Rowland, The Open Heaven, 1982; D. S. Russeli, The Method and Message o f Jewish Apocalyptic, 200 B.C. — A.D. 100, 1964. W. J. Dumbrell Litoral -> # 8557 (sãpâ, linguagem, lábio, litoral) Livramento -> # 1457 (g'l I, redimir, livrar, resgatar)
AT 1. No Salmo 69.28 [29], o ponto culminante da súplica para que Deus castigue seus perseguidores é marcado pelo desejo de que sejam “riscados do Livro dos Vivos, e não tenham mais registro com os justos”. O conceito de livro da vida é, sem dú vida, derivado da prática secular de manter um rol de cidadãos (cf. Ed 2.2-62; Ne 7.5-64; Jr 22.30). Aplicava-se ao povo da aliança que desfrutava da comunhão com Deus, no qual se en contrava o “manancial da vida” (SI 36.9 [10]; cf. Jr 2.13; hayyim, # 2644). É possível que os sacerdotes tivessem listas no santuário, mas o tema pode ser simplesmente uma extensão metafórica do costume secular transposto para termos de um livro celeste (-> Escrita: Teolo gia). Era uma prerrogativa divina manter essa lista e, assim, continuar a abençoar com o dom da vida aqueles que honravam a aliança com Deus, mas apagar o nome daqueles que se opu nham a ela (SI 109.13; cf. “escrito no chão”, Jr 17.13). Semelhantemente, em Êxodo 32.32-33, Livro da Vida, dos Vivos, da Memória, da Verdade
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Livro da Vida, dos Vivos, da Memória, da Verdade
Moisés pede para ser apagado do livro de Deus juntamente com Israel depois de o povo pecar ao adorar o bezerro de ouro. Em seguida, recusa a oferta de Deus de tomar o lugar de Israel nos propósitos divinos (v. 10); Deus responde, porém, que apagará de seu livro somente o nome dos pecadores. O Salmo 139.16 também fala do livro de Deus. Sua onisciência é ilustrada pelo fato de ele saber de antemão quanto tempo alguém viverá (cf. Jó 14.5). É possível que por trás desse tema encontre-se uma lista genealógica, como a que há em Gênesis 5, na qual é registra da a extensão da vida; mas, no caso do livro da vida. trata-se de um registro prévio e não de fatos já ocorridos (-> Genealogia: Teologia) 2. Na literatura profética, o tema recebe uma dimensão escatológica. Em Ezequiel 13.9, aos profetas que haviam transmitido falsas mensagens de esperança é devidamente negado um lugar na lista escrita na qual Deus relaciona aqueles que serão restaurados à terra (cf. Ez 20.38). “Não serão inscritos nos registros (ketãb, documento escrito) da casa de Israel”. Em Isaías 4.3, os membros do remanescente purificado que sobrevivem ao julgamento vindouro de Deus são retratados como os “inscritos (kãtúb, escritos) em Jerusalém, para a vida”. Essa profecia faz lembrar a purificação e renovação de Jerusalém e a sobrevivência dos penitentes prometida em Isaías 1.25-27. Em Daniel 12.1, o povo de Deus que desfrutaria uma nova era de salvação, uma era de “vida eterna” que seria experimentada até pelos mortos (v. 2), é descrito como “todo aquele que for achado inscrito no livro”. Nem mesmo a morte poderia privar sua participação como cidadãos do reino dc Deus. E num cântico de Sião, Salmo 87, o tema do livro da vida surge no que parece ser um cenário escatológico, numa promessa da participação das nações na adora ção no templo (cf. Is 2.2-4; Zc 14.16): sua cidadania em Sião seria reconhecida por Deus “ao registrar (kfitãb) os povos” (SI 87.6). 3. Num contexto secular, essa expressão ocorre em Ester 6 .1 como sêper hazzikrõnôt, o “Livro dos Feitos Memoráveis”, e em Esdras 4.15 como o separ dokrãnayyã ’, “Livro das Crôni cas”, numa referência aos registros oficiais do império persa. Malaquias 3.16 usa essa expressão contemporânea de forma teológica, em termos de um registro divino não dos feitos humanos, mas dos nomes daqueles que fazem parte do verdadeiro povo de Deus e que foram fiéis a ele. Assim, num sentido escatológico, esse rol corresponde ao livro da vida (cf. Ml 3.1-5,17). 4. Em Daniel 10.21, Daniel recebe a promessa de que será informado de acontecimen tos futuros que se encontram na “escritura (ou documento escrito) da verdade (k?tãb ’em et)'\ Essa oração expressa de modo concreto uma asserção teológica de que o futuro está sob o controle seguro de Deus ( ’emet, # 622) e que se move em direção a um ponto culminante planejado (cf. Ap 5.1—8.1). E possível que haja uma ligação disso com o conceito babilônico de “tábuas do destino” celestes, nas quais se encontrava gravado o futuro da humanidade para o ano seguinte (cf. Meissner, 2:124-25). Deve ser distinguido dos “livros” de Daniel 7.10 (cf. Ap 20.10), registros de feitos humanos do passado e registrados por Deus, um conceito subja cente também em Neemias 13.14; Salmo 56.8 [9]; 149.9; Isaías 65.6. P-B 1. A literatura intertestamentária continua a usar a expressão de modo escatológico. Dois textos de Qumran referem-se a esse tema. 1QM 12:3 afirma que Deus tem consigo no céu o livro de nomes do seu povo e que registrou sua aliança de paz para eles com hrt hyym, uma ferramenta de gravação. 4Q504 6:14 descreve o povo de Deus como “todos que se encon tram inscritos no livro da vida”. 1 Enoque 108.3 e Jubileus 36.10 falam dos pecadores serem riscados do livro da vida; cf. “o livro dos vivos” em 1 Enoque 47:3 e “as tábuas celestiais” em Jubileus 19.9; 30.19-20. 2. Malaquias 3.16 é repetido, com aplicações para a comunidade de Qumran em CD 20:19. 906
Lo-Ami
NT O sentido escatológico do livro da vida aparece em Filipenses 4.3; Apocalipse 3.5; 13.8; 17.8; 20.12, 15; 21.27. O tema também é subjacente em Lucas 10.20; Hb 12.23 (-> NIDNTT 1:243-44). -> hayyim (vida, # 2644) zikkãrôn (memorial, # 2355) Escrita B ib l io g r a f ia
TDNT 1:617-20; THAT2:162-73; TW ATAM 5-91, 5:929-44; B. Glazier-McDonald, Malachi: The Divine Messenger, 1987, 220-21; W. Herrmann, “Das Buch des Lebens”, Das Allertum 20, 1974, 3-10; L. Koep, Das himmlische Buch in Anlike un Christentum, 1952; B. Meissner, Babylonien und Assyrien, 2, 1925. Leslie C. Allen
Lo-Ami
Lo-Ami Oa? X1? [lõ' 'ammi], não meu povo, # 4204).
AT O nome simbólico do terceiro filho de Oséias e Gomer. No nome peculiar dessa crian ça, que significa “Não meu povo”, o julgamento de Deus atinge o ponto culminante. Se Israel é chamada de Lo-Ami, é porque Deus não é Deus de Israel (v. 9). O heb. dessa passagem (w . 4-9) é elaborado de tal modo que o texto concentra-se nesse nome (Jeremias, Hosea, 29). Lo-Ami transmite uma realidade dura: o relacionamento de aliança se rompeu. O Deus da aliança que, no passado prometeu “Tomar-vos-ei por meu povo e serei o vosso Deus” (Ex 6.7) tomou-se “Não... vosso Deus” (lit., “Eu, eu não sou por vós”, Os 1.9). No entanto, o mesmo Deus que mudou os nomes ominosos do irmão de Lo-Ami, Jezreel e da irmã Lo-Ruama, numa bênção, um dia também mudará o nome de Lo-Ami: ele voltará a ser Ami (“Meu povo”, 2.23 [25]; -> ‘am, # 6639). Paul A. Kruger Oséias: Teologia Lodo -> # 3226 (?//, lama, Iodo, barro) Lombo
#5516 (motnayim, lombo)
Lo-Ruama
Lo-Ruama (HDITI N'*? [lo’-ruhãmâ], # 4205).
AT O nome simbólico do segundo filho de Oséias e Gomer, uma menina. Esse nome es tranho (“Desfavorecida”) que, na verdade é uma frase, “Aquela pela qual não é demonstrada compaixão”, é único no AT (rhm # 8 163). Seu nome, assim como o de seu irmão mais velho Jezreel, confirma o julgamento do Senhor sobre o povo apóstata. O nome simbólico deve ser considerado intimamente ligado ao de Jezreel. Lo-Ruama representa uma intensificação do jul gamento de Deus. Enquanto Jezreel é dirigido apenas contra a instituição monárquica, o nome de Lo-Ruama diz respeito à nação como um todo: “Não mais tomarei a favorecer a casa de Israel” 907
Maer-Salal-Hás-Baz, Sear-Jasube
(Os 1.6). A compreensão desse nome não pode ser separada do atributo mais essencial de Javé com relação a seu povo, a saber, a misericórdia de Javé (F. I. Andersen & D. N. Freedman, Ho sea, AB, 1980,187). Ele é “Deus compassivo (rhm), clemente e longânimo” (Êx 34.6; Dt 4.31; SI 86.15; J12.13). Então, quando Deus retira sua compaixão pelo povo, deixa implícito que com isso o povos perde a base para o relacionamento com o Senhor. No entanto, esse mesmo Deus não “conserva para sempre a sua ira” (SI 103.9). Virá o tempo em que ele “[compadecer-se-à] (rhm) da Desfavorecida” (Os 2.23 [25]), ou seja, terá compaixão de Lo-Ruama. (-> Oséias: Teologia) Paul A. Kruger Loucura
# 8713 (sg ‘, delirar, enlouquecer, comportar-se como um louco)
Lua -> # 3734 (yãrêah, lua) Lucro
# 3603 (y'l, lucrar, beneficiar, ser útil, ser prestativo)
Luta -> # 7349 (pll, torcer, lutar, ser esperto, astuto) Luxo -> # 6357 ( ‘dn 1, deliciar-se, viver com luxo, deleitar-se) Macabeus (1,2) -> Apócrifos Maçaneta -> #4117 (kaptôr II, maçaneta) Machado -> # 7935 (qardõm, machado) Mãe
# 562 ( ‘êm, mãe)
Maer-Salal-Hás-Baz, Sear-Jasube
Maer-Salal-Hás-Baz (72 U/n Y w IHO [mahêr sãlãl hás bãz], # 4561); Sear-Jasube (31ÍÍ)
[Se ’ãryãsúb], # 8639). AT Esses são os nomes dos filhos de Isaías que, juntamente com uma criança chamada Emanuel, servem de sinais proféticos para o rei Acaz (ls 8.18). Os nomes aparecem nos caps. 7 e 8 (Sear-Jasube [ARA: “Um-Resto-Volverá”] em 7.3, com uma provável alusão em 10.2022; Maer-Salal-Hás-Baz em 8.3). Sear-Jasube significa “Um-Resto-Volverá (se ar yãsüb)" e Maer-Salal-Hás-Baz quer dizer “Rápido-Despojo-Presa-Segura”. Os dois nomes apresentam um presságio de dois gumes. Ao mesmo tempo em que são essencialmente ominosos, tam bém têm um elemento secundário de esperança. Era por volta do ano 735 a. C. e Israel e Síria estavam preparados para atacar Judá, provavelmente pelo fato de Acaz (->) ter-se recusado a participar da coalizão contra a Assíria. O propósito declarado deles era colocar um outro rei no trono, possivelmente, um monarca que fosse mais submisso às políticas dessas nações. Tomado de pânico, Acaz enviou um tributo enorme aos assírios, seus verdadeiros inimigos, implorando pela ajuda deles contra os adversários daquele momento. A resposta de Isaías a essa decisão não foi animadora. Levando consigo seu filho cha mado “Um-Resto-Volverá”, o profeta foi desafiar Acaz a dar um passo de fé em Deus. O fato 908
Maer-Salal-Hás-Baz, Sear-Jasube
de o filho do profeta ter recebido esse nome e de ter sido levado com o pai pode indicar que Isaías sabia de antemão que Acaz não reagiria de modo favorável a esse desafio. O rei estava excessivamente comprometido com as próprias tentativas de se livrar das ameaças. Mas o re sultado. como 8.6-8 deixa claro, seria uma nação quase inteiramente destruída pelos supostos salvadores de Acaz. O significado duplo do nome de Sear-Jasube fica evidente em 10.20-22. De fato, ape nas um remanescente sobreviveria quando a semente mortal que Acaz havia plantado desse frutos. No entanto, haveria um remanescente! Uma parte do povo sobreviveria como testemu nho da fidelidade de Deus para com suas promessas da antigüidade. Seria uma tragédia, mas ela teria alívio. Enquanto Sear-Jasube nasceu e recebeu seu nome antes de Acaz ter recusado a oferta bondosa de socorro do Senhor, Maer-Salal-Hás-Baz nasceu e recebeu seu nome depois dessa recusa. Mais uma vez, o tom principal é ominoso. Acaz havia ficado tão aterrorizado com seus inimigos do Norte que até mesmo a medida radical de apelar para o socorro de um inimigo ainda maior parecia justificada. Contudo, Isaías declarou de várias maneiras que as duas nações não tinham outra coisa a apresentar senão ameaças falsas e logo essas nações nâo existiriam mais. O espólio de Israel e o saque de Damasco logo seriam levados sem nenhum esforço da parte de Acaz (Is 8.4). Essa era uma boa notícia, mas pelo fato de Acaz haver recusado a ajuda do Senhor, não tardaria para que os espólios de Judá seguissem rapidamente o mesmo caminho daqueles de Israel e Damasco. Se Acaz tivesse se mostrado disposto a se apegar às promessas de Deus, o Senhor teria permitido que permanecesse firme diante de qualquer ameaça (7.9). Porém, tudo pelo que Acaz havia se esforçado seria levado embora. Há motivos para crer-se que Maer-Salal-Hás-Baz e Emanuel são dois nomes para a mesma criança. Ambos têm aproximadamente a mesma relevância para Acaz, e a linguagem que descreve a concepção e nascimento dos dois é semelhante. De acordo com as palavras do profeta sobre Emanuel em Isaías 7.16, “antes que este menino saiba desprezar o mal e escolher o bem, será desamparada a terra ante cujos dois reis tu tremes de medo”. Compare-se essa de claração com 8.4: “Porque antes que o menino saiba dizer meu pai ou minha mãe, serão levadas as riquezas de Damasco e os despojos de Samaria, diante do rei da Assíria”. Assim como os outros dois nomes, Emanuel também possui duplo sentido. Se alguém confia em Deus, a pre sença do Senhor é uma bênção, mas se confia em seus próprios esforços, a presença de Deus não é bênção alguma. Também é interessante que as referências a Emanuel (7.13-17; 8.6-10) emolduram as referências a Maer-Salal-Hás-Baz. Se essa sugestão está correta, apóia a idéia de um cumprimento duplo do sinal de Emanuel, um a curto prazo (Maer-Salal-Hás-Baz) e outro a longo prazo (Jesus Cristo, Mt 1.23). De acordo com alguns estudiosos, um argumento importante contra a identificação de Emanuel com Maer-Salal-Hás-Baz é a dificuldade de explicar como a mãe dele poderia ser a vir gem mencionada no cap. 7. Tendo em vista que Isaías já era pai de Sear-Jasube, seria necessário supor que o profeta enviuvara e que a mulher, à qual 8.1 se refere, era sua segunda esposa. Isaías (Teologia de) B i b l k x ;r a f ia
G. Hasel, The Remnant: The History and Theology o f the Idea o f the Remnant from Genesis to Isaiah, 1980; H. Wolf, “A Solution to the Immanuel Prophecy in Is. 7:14 - 8:22”, JBL 191, 1972, 449-56. John N. Oswalt 909
Malaquias: Teologia de
Mágica -> # 4175 (ksp, praticar magia, feitiçaria) Mágoa -> # 6772 ( ‘çb 11, ferir, entristecer, ofender) Magogue -> Gogue Majestade
# 2086 (Aôí/ I, esplendor, majestade)
Malaquias: Teologia de A. Contexto Histórico Malaquias (wa/ akí) foi o último representante da profecia corrente do AT. Não fica claro se Malaquias, que em heb. significa “meu mensageiro”, é um nome próprio ou um título descritivo, talvez dado a alguém que o associou à promessa “Eis que eu envio o meu mensa geiro (mal'ãkí), que preparará o caminho diante de mim” (3.1). Não sabemos coisa alguma sobre o profeta, nem mesmo a data aproximada de seu ministério. Pertence ao período depois do exílio, uma vez que o templo encontra-se em funcionamento e ele faz referência a um “go vernador” e não a um “rei” (1.8). É Javé, por sua vez, que se descreve como um “grande Rei” em 1.14. Alguns dos abusos criticados pelo escritor foram objeto das reformas de Neemias, especialmente aqueles relacionados aos dízimos e casamentos mistos (2.11; 3.6-12; cf. Ne 13.10-14,23-27) e acredita-se que seria difícil imaginar a situação que ele descreve depois do trabalho de Esdras. Por esse motivo, costuma-se determinar a data de Malaquias em pouco antes da metade do século V a. C. É bem possível que essa seja uma estimativa correta, apesar de Malaquias nâo se referir à profanação do sábado, uma das questões tratadas por Neemias, e do fato de a lassidão religiosa ter a tendência de se repetir. As tentativas de datarem-se esses escritos com base na referência a um dos códigos de Israel, como o “Código de Santidade” ou o “Código Sacerdotal” não inspiram convicção; uma vez que Malaquias não se mostra preso de nenhum modo a um código específico, a data da forma final desses conjuntos de leis tam bém é assunto para conjectura. Em certo sentido, as advertências e promessas de Malaquias a seus contemporâneos têm uma relevância tão permanente que seu contexto histórico exato não é uma questão de suma importância. B. Estrutura Literária O formato da profecia de Malaquias é singular. A mensagem dele encontra-se dentro de seis alternâncias de perguntas e respostas com seus ouvintes (1.1-5; 1.6-2.9; 2.10-16; 2.17-3.5; 3.6-12; 3.13-4.3 [3.13-21]). Outros profetas já haviam empregado perguntas retóricas, porém Malaquias o faz de modo mais constante e repetido do que qualquer um deles. A forma varia, mas, de modo geral, o profeta faz uma declaração ou pergunta de abertura, quer em suas pró prias palavras ou num discurso divino em primeira pessoa, seguindo-se então uma pergunta de seus ouvintes. A resposta para essa questão constitui o tema principal do oráculo ainda que, por vezes, este também apresente mais uma pergunta. E pouco provável que tudo isso seja uma transcrição exata de um diálogo entre Malaquias e seus ouvintes, apesar de, sem dúvida, esse profeta de coração extremamente sensível ter uma consciência aguçada das perguntas que seus ouvintes estavam fazendo e das dificuldades que estavam enfrentando em sua vida de fé (p. ex., 2.17; 3.14). Em vez disso, Malaquias emprega uma forma fixa que, com seu estilo retórico, é muitas vezes descrita como uma “altercação profética” (ver Glazier-McDonald, 19-23). 910
Malaquias: Teologia de
C. Temas Teológicos O oráculo de abertura (1.2-5) levanta questões teológicas mais profundas com sua de claração: “Todavia, amei a Jacó, porém aborreci a Esaú”. Trata-se de uma afirmação não ape nas teologicamente severa, mas também estranha diante das críticas contra Israel no restante do livro. Foram feitas tentativas de contomar-se o problema teológico do favoritismo divino ao dizer que, no heb., “amar” e “odiar” representam preferência e não ódio ou rejeição literal da parte de Deus, mas tal idéia dificilmente alivia o problema. Mostrando maior pertinência, McKenzie e Wallace (1983) chamaram a atenção para as dimensões da aliança relacionadas ao vb. amar, e Elliger (190-91) coloca de modo plausível que, ao começar com essa declaração da eleição de Israel pela graça, Malaquias toma suas acusações contra a conduta do povo ainda mais fortes, de maneira semelhante àquelas de seu antecessor, Amós (Am 3.1-2). Também é possível que, nesse caso, “Edom” (1.4) tenha adquirido sua função em grande parte da litera tura do pós-exílio, como um símbolo de tudo o que é perverso e se opõe a Deus (Cresson) e que esse oráculo servia de advertência geral, até mesmo para os israelitas, contra toda forma de perversidade. Nenhum privilégio eletivo toma a obediência desnecessária, um ponto de vista reforçado na advertência contra Israel em 4.6 [3.24], A acusação de abertura é voltada contra os sacerdotes (1.6— 2.9) pela lassidão deles no cumprimento dos deveres, especialmente na aceitação de animais imperfeitos oferecidos como substitutos baratos para sacrifícios a Deus (1.8). A enormidade do pecado deles é exacerbada diante do chamado vocacional para ensinar o povo de Deus. Malaquias é o único profeta do AT a falar de uma aliança de Deus com os sacerdotes (apesar de esta ficar implícita em outras passagens, p. ex., Jr 33.21) e somente nesse livro o sacerdote é “mensageiro do Senhor dos Exércitos” (2.7), apesar de o pape! do sacerdote de ministrar a Torá ao instruir sobre questões éticas e rituais ocupar posição de destaque no AT. O fato de Malaquias atacar malversações cultuais como essas, juntamente com a falta de zelo do povo no pagamento dos dízimos (3.6-12) e seus casamentos mistos com estrangei ros (2.11-12), levou alguns estudiosos a incluírem o profeta em suas acusações gerais de que a profecia do período após o exílio preocupa-se demais com o ritual exterior e a observância reli giosa. Para eles, trata-se de um contraste decepcionante com os profetas do período anterior ao exílio, que pareciam pôr de lado ou atenuarem tais questões ao proclamar as grandes exigências éticas de Deus: justiça e compaixão. Não se pode esquecer, porém, que, para Malaquias, ques tões como o pagamento dos dízimos são relevantes à medida que indicam um relacionamento verdadeiro com Deus (“Tomai-vos para mim, e eu me tomarei para vós outros, diz o Senhor dos Exércitos”, 3.7). Para ele, a saúde de qualquer comunidade depende em grande medida do relacionamento correto de seus líderes com Deus e esse será o objetivo do processo de refina mento de Deus quando ele julgar e oferecer salvação (3.2-4). Porém, para Deus, toda injustiça ética, onde quer que se encontre, é intolerável e o propósito dele é criar uma sociedade na qual não haja lugar para a opressão e a injustiça” (3.5). Além disso, para Malaquias a qualidade de vida numa comunidade depende da fide lidade de seus membros uns para com os outros e isso, por sua vez, depende do reconheci mento da fidelidade de Deus para com todo o seu povo (2.10). Os exemplos específicos que Malaquias apresenta da falta dessa coesão na sociedade são o divórcio (se é a isso que o heb. sallah, repudiar, se refere em 2.16) e a violência contra os membros da comunidade da aliança (2.10, 16). Sem dúvida o retrato, apresentado no livro, do casamento como uma aliança entre duas pessoas diante de Deus (2.14) é comovente. Devemos nos lembrar ainda que Malaquias não é tão ritualista a ponto de preferir manter as portas do templo abertas simplesmente para dar continuidade a uma adoração formal e superficial (1.10). 911
Malaquias: Teologia de
Em Malaquias, a ausência de uma percepção estritamente nacionalista e exclusiva do relacionamento de Deus com a humanidade (apesar de 1.2-5) é demonstrada pela declaração extraordinária de 1.11. Em contraste com a indiferença do sacerdócio oficial judaico, é elogiada a autenticidade do sentimento de gratidão ao Criador demonstrado pelo povo de outras nações em suas ofertas de ação de graças. Isso não significa, necessariamente, que todas as pessoas adoram, de fato, o mesmo Deus e que as diferenças entre elas não importam. É provável que a citação do Salmo 50 na abertura, enfatizando a necessidade de verdadeira gratidão a Deus no lugar da exatidão ritual, dê à declaração o sentido pretendido. No entanto, esse versículo tem causado tantas dificuldades que alguns consideram que se refere à adoração dos judeus na Diáspora, enquanto uma série constante de interpretações cristãs o entende como uma esperança de um futuro a se concretizar. Esse conceito se reflete em algumas versões e foi defendido mais recentemente por Glazier-McDonald (61). Malaquias é sensível às dúvidas e questionamentos daqueles cujas esperanças foram frustradas tantas vezes c que duvidam se vale a pena servir a Deus (2.17; 3.14-15). A resposta desse profeta, que se preocupa tanto com o templo e a adoração ali, é inequivocamente escatológica. O próprio Deus virá depois do ministério preparatório de seu mensageiro e, ao julgar os perversos e vindicar aqueles que se mantiveram firmes na fé, estabelecerá um reino de jus tiça (3.5; 3.16-4.3 [3.16-3.21]). A advertência de 4.6 [3.24] é um modo austero de concluir não apenas Malaquias e o Livro dos Doze Patriarcas, mas todo o cânon profético, e pode ser por esse motivo que a LXX colocou as palavras mais esperançosas do v. 4 [3.22] no final. Em termos canônicos, a Torá mosaica tem a função de colocar a Torá a e Profecia cm pé de igualdade quanto à autoridade, enquanto a esperança da vinda de Elias parece basear-se em Deuteronômio 18.18, com sua promessa de que Deus levantaria outro profeta como Moisés. E possível que Elias tenha sido escolhido, pois foi o primeiro profeta de maior proeminência e porque não teve morte normal, mas foi assunto ao céu (2Rs 2.1-12). Num tempo em que a voz ativa da profecia não estava sendo ouvida, essa concepção deu origem à esperança de que um sinal da era messiânica seria a renovação do dom divino de profecia (1 Mac 4.46; 14.41), uma esperança que ainda mostrava bastante vigor no tempo de Jesus, especialmente com relação a Elias (Mc 6.15; 15.35). B ib l io g r a f ia
Ver os Comentários sobre Malaquias ; também J. G. Baldwin, Haggai, Zechariah, Malaehi, TOTC, 1972; idem, “Malaehi 1:11 and the Worship o f the Nations in the Old Testament”, TynBul 23, 1972, 117-24; Th. Chary, Aggée-Zacharie 1-8, Malachie, Sources bibliques, 1969; R. J. Coggins, Haggai, Zechariah, Malaehi, OTG, 1987; B. C. Cresson, “The Condemnation of Edom in Post-Exilic Judaism”, The Use o f the Old Testament in the New and Other Essays, J. M. Efird (ed.), 1972, 125-48; K. Elliger, Die Propheten Nahum, Habakuk, Zephanja, Haggai, Sacharja, Maleachi, ATD, 1964; B. Glazier-McDonald, Malaehi: The Divine Messenger, SBLDS 98,1987; R. P. Gordon, “Targumic Parallels to Acts XIII 18 and Didache XIV 3”, NovT 16, 1974, 285-89 (287-89); idem, “Dialogue and Disputation in the Targum to the Prophets”, JSS 39, 1994, 7-17; R. A. Mason, “The Prophets of the Restoration”, in R. Coggins et al., Israels Prophetic Tradition, 1982, 137-54; idem, Preaching the Tradition: Homily andHermeneutics After the Exile, 1990; S. L. McKenzie, H. N. Wallace, “Covenant Themes in Malaehi”, CBQ 45, 1983, 549-63; W. Rudolph, Haggai, Sacharja 1-8, Sacharja 9-14, Maleachi, KAT, 1976; R. L. Smith, Micah-Malaehi, WBC, 1984; W. A. VanGemeren, lnterpreting the Prophetic Word, 1990, 202-8; P. A. Verhoef, The Books o f Haggai and Malaehi, NICOT, 1987, 179-84; 912
Maldição, imprecação
R. Vuilleumier, Malachie. Commentaire de 1’A ncien Testament, 19882; A. S. van der Woude, “Der Engel des Bundes”, FS Wolff, 1981, 289-300. Rex Mason Maldade
# 8317 ( r “ I, ser mau)
No AT, uma maldição geralmente contém a invocação de uma determinada sorte sobre alguém caso ocorra a contravenção de determinados padrões de comportamento esperados; ou, como no caso da maldição da aliança, se uma promessa feita sob juramento (maldição) não for cumprida. Nor malmente, implica a incapacidade do indivíduo, por motivos legais, morais ou práticos, de aplicar a sanção pessoalmente. A maldição invocada sobre aquele que profanasse um túmulo, como no Túmulo de Siloé (ver 'rr, maldição, [# 826]) representa um caso extremo da incapa cidade de aplicar-se a sanção pessoalmente. Por vezes, Deus é invocado diretamente por ter autoridade e poder para executar a maldição. Um exemplo desse caso é a expressão “maldito diante do Senhor” (Js 6.26; ISm 26.19), mas mesmo nas passagens em que a referência nâo é explícita, pode-se, muitas vezes, inferir que está implícito um apelo à autoridade divina. Em outras ocasiões, a maldição aparece na forma de uma oração pedindo a intervenção divina, sendo que os efeitos desejados podem ser comparados aos elementos de maldição numa alian ça ou tratado (-> Ifirít, tratado, # 1382), como em Jeremias 18.21-23. Para que uma maldição entrasse em vigor era preciso que tivesse autoridade divina e fosse dirigida contra a pessoa certa. O AT deixa bem claro esse segundo ponto: uma maldição indevida não recairá sobre a vítima pretendida (Pv 26.2) e uma imprecação injustificada pode voltar-se contra aquele que a proferir (SI 109.17-20). No entanto, não há muito o que se dizer sobre a idéia bastante aceita no passado de que o cumprimento de uma maldição se devia ao simples fato de ela haver sido pronunciada, uma vez que essa concepção baseava-se na pre missa duvidosa de que na sociedade israelita da antigüidade considerava-se que as palavras possuíam um poder criativo que garantia seu cumprimento, quer imediato ou posterior. Tal idéia pode estar presente no pedido de Balaque a Balaão em Números 22.6, mas essa história como um todo aponta para a necessidade de uma autoridade divina a fim de que a maldição tome-se eficaz (cf. Thiselton, 296). A maldição aparece de maneira mais formal nas relações entre Deus e os homens quan do estas são expressadas em termos de lealdade pactuai entre Javé e Israel. As maldições são particularmente predominantes em comparação com as bênçãos na tradição mosaica da alian ça, num paralelo com as tendências mais desenvolvidas dos tratados do OMA e como sinal da gravidade de Israel ousar afastar-se das leis dadas pelo Deus que havia se revelado ao seu povo e o livrado no êxodo (-> Êxodo do Egito: Teologia), concedendo a esse mesmo povo a nacionalidade. O recebimento das leis no Sinai é retratado em Deuteronômio 27— 28 em parte como um compromisso de Israel com as diversas maldições da aliança relacionadas nesses ca pítulos. Outras referências à aliança também indicam a mesma relação bastante próxima entre a aliança mosaica e as penalidades da maldição da aliança (cf. 2Cr 34.24; Ne 10.29 [30]; Is 24.6; Dn 9 .11; Zc 5.3). É difícil comprovar-se de modo relevante as distinções entre os principais lexemas de maldição, como a idéia de que ’lh deixa implícita uma maldição condicional, enquanto 'rr está relacionado a maldições relativas às autoridades. Apesar de ser verdade que ’lh é usado para maldições relacionadas à aliança entre Deus e Israel, em Deuteronômio 29.19 [18]—21 [20]; Maldição, imprecação
913
Manassés
30.7 (cf. também a referência no final do parágrafo anterior), esse uso é contrabalançado pelo fato de a expressão 'ãrúr, amaldiçoado (-> # 826) repetir-se em Deuteronômio 27—28 na pró pria recitação das maldições. Deus é o sujeito tanto quando ocorre ’lh (Nm 5.21; Dt 30.7) como quando é empregado >r(Gn 3.14,17; 4.11; 5.29; cf. também a forma subst. em Pv 3.33; Ml 2.2 e, da mesma forma, com qllem Dt 29.27 [26]). O caráter intercambiável desses termos também é ilustrado pelo uso de ’rr em Gênesis 5.29 e ql! em 8.21, quando Deus amaldiçoa o solo. O envolvimento divino na maldição é um conceito que Israel possuía cm comum com os membros de outras culturas do Oriente Médio, e, apesar de não ocupar o primeiro plano na maioria dos textos do AT, aparece de forma relevante, talvez mais do que em qualquer outra passagem, na história dos primórdios em Gênesis 1— 11. No entanto, esses capítulos também apresentam elementos compensatórios de esperança. Em primeiro lugar, na história da queda. Deus amaldiçoa a serpente e o solo (Gn 3.14, 17), mas não o casal humano pego no ato de desobediência flagrante que o levou a perder o Éden. É quase como se o escritor bíblico con tornasse a idéia de que o primeiro casal pudesse sofrer a maldição de Deus (contrastar com o caso de Caim, em Gn 4.11). Em segundo lugar, de Abraão em diante, a história dos primórdios dá lugar à história da salvação, que é expressada em termos de bênçãos e maldições, mas es pecialmente de bênçãos (ver Gn 12.3). Maldição: 'lh I (praguejar, amaldiçoar, colocar sob juramento, # 457); -> 'rr (amaldiçoar, ser amaldiçoado, # 826); -> brk (abençoar [eufemismo para amaldiçoar], # 1385a); gdp (injuriar, blasfemar, # 1552); -> z'm (ficar zangado, amaldiçoar, # 2404); -> nqb (trespassar, perfurar, distinguir, amaldiçoar, # 5918); qbb (amaldiçoar, # 7686); -> qU (ser leve, ágil, pare cer desprezível, tratar com desdém, # 7837); -> Maldição: Teologia Robert P. Gordon Manada -> # 6373 ( ‘õder I, rebanho, gado) Manassés (Oração de)
Manassés
Apócrifos
Manassés (ntPJD [menasseh], # 4985).
AT 1 .0 nome Manassés (menasseh) significa “fazer esquecer” (das dores de parto?), como em Gênesis 41.51. Manassés rei de Judá era filho do piedoso rei Ezequias e sua rainha Hefzibá e subiu ao trono em 697 a. C. Governou como único rei, desde a morte do pai em 687 até 642, tendo assim o reinado mais longo da história de Judá (cf. 2Rs 21.1). Informações sobre o reinado de Manassés podem ser encontradas nos textos de 2 Reis 21 e 2 Crônicas 33, sendo que cada passagem usa fontes anteriores chamadas de Livro de crônicas dos reis de Judá (2Rs 21.17), As crônicas dos reis de Israel (2Cr 33.18) e “História dos videntes” (33.19). Outros relatos do reinado de Manassés são apresentados em Sofonias e Jeremias (ver abaixo), nos livros Apócrifos Oração de Manassés e Martírio de Isaías e nos Prismas de Esaradom e Assurbanípal. Pode ser conveniente separar esse material em três es tádios de desenvolvimento. 2 .0 editor (ou editores) deut. de Reis refere-se a Manassés como um governante perve so que deixou a piedade de seu pai em troca do sincretismo de seus antecessores. Reconstruiu os santuários pagãos que haviam sido destruídos, fez altares para Baal, ergueu um poste-ídolo, adorou as constelações dentro da área do templo, sacrificou o próprio filho e praticou adivi 914
Manassés
nhação e necromancia, que na época estavam bastante em voga na Assíria. Para completar sua lista de iniqüidades, o rei derramou sangue inocente em Jerusalém (2Rs 21.16). Quando mor reu, não foi enterrado nos sepulcros reais, mas “no Jardim de Uzá” (um dos nomes do planeta Vênus) — sendo impossível dizer-se se isso ocorreu por motivos de apostasia ou por proble mas de espaço (2Rs 21.26; cf. Ez 43.7-9, posteriormente). A única esposa de Manassés cujo nome chegou até nós é Mesulemete, que não era judia, mas filha de um edomita (21.19). Seu sucessor por pouco tempo foi Amom (642-640 a. C.), cujo nome pode ser egípcio. Amom foi assassinado por uma conspiração da corte real e os grandes proprietários de terras aproveita ram a oportunidade para colocar no trono o rei Josias, na época com oito anos de idade e que preparou o caminho para uma reforma. A avaliação deut. de Manassés considera perversos os modos dele como sendo, em grande parte, os responsáveis pelo exílio de Judá no século VI. A apostasia dele foi tão grande e tão típica da tendência apóstata de Judá, que nem mesmo as reformas incomparáveis de Josias puderem amenizar os efeitos dessa apostasia (2Rs 23.26-27; 24.3-4). Esse relato é confirmado, pelo menos parcialmente, pelos registros assírios. Esaradom (680-669 a. C.) fala dele como um dos vários reis do Levante que forneceram materiais de constmção para seu palácio em Nínive, indicando desse modo uma condição de vassalagem (ANET, 291), e Assurbanípal (668-633 a. C.) registra o tributo, deferência e cooperação de Manassés numa campanha egípcia (ANET, 294). 3. No segundo estádio (2 Crônicas 33), porém, o cronista relata outras característica reinado de Manassés, que mesmo sendo tão remotas, podem corresponder à realidade. Manassés foi preso e levado pelo rei da Assíria para a Babilônia (sic), onde passou por uma regeneração e devotou-se a Javé, o Deus de Israel (33.11-12). De modo algum se trata de um cumprimento artificial de 2 Reis 20.18 ou de uma ex plicação de como Manassés viveu e reinou impune por tanto tempo, pois, de fato, a Babilônia participou de uma revolta (reprimida em 648 a. C.) liderada por Samas-Sum-Uquim, o irmão de Assurbanípal e é bem possível que nessa época Manassés tenha visto uma oportunidade de independência. (Em Reis, o desejo de independência de um governante imperial é sempre ligado à devoção a Javé.) Esdras 4.2,10 relata uma afluência de estrangeiros para a Palestina nessa épo ca, talvez para conter tais tendências rebeldes. O cronista também fala de projetos de construção expressivos realizados por Manassés depois disso, como parte de seu arrependimento (33.14-16), o que o associaria com o processo de desenvolvimento da Assíria (cf. Ahlstrõm, cap. 5). Não obstante os estádios finais da tradição (p. ex.. Oração de Manassés, uma parte de uma hagiografia G posterior), as evidências dos profetas mostram que faltaram características redentoras a esse rei (Jr 15.1-4; Sf 1.4-9; 3.1 -7) e que a mão pesada da Assíria continuou a ser temida (Na 3.8-10 et passim ). O pseudepígrafo Martírio de Isaías relata Isaías sendo serrado ao meio por ordem de Manassés (cf. Hb 11.37), mas não fala de nenhum arrependimento sub seqüente. Ainda era necessário que ocorresse a reforma de Josias. Tudo indica que uma com binação de poder quando ainda era muito jovem (aos 12 anos de idade), rebeldia natural contra um pai poderoso e piedoso, a expansão da Assíria no Levante e facções políticas domésticas rivais, tanto nos meios políticos quanto religiosos, foram fatores que levaram ao paganismo desenfreado de Manassés, ao passo que, mais tarde, a insensatez de sua rebelião contra a Assí ria e a memória da vida de seu pai podem tê-lo conduzido a um fim mais sóbrio de seu reinado que, de outro modo, tinha sido muito turbulento. B ib l io g r a f ia
IJH, 1977, 452-58; G. W. Ahlstrõm, Royal Administration and National Religion in Ancient Palestine, 1982; J. Bright, A History o f IsraeB, 1981; J. McKay, Religion in Judah under the 915
Massá e Meribá
Assyrians, SBT, 2nd series, 26, 1973; H. F. W. Saggs, Assyriology and the Study o f the Old Testament, 1969. P. J. M. Southwell Mancha
# 1353 (bãrõd, malhado, pintado)
Mandamento -> # 5 1 8 4 (miçwâ, comando, mandamento) Manhã -> # 1332 (bõqer II, manhã, alvorecer) Manta, capa -> # 4059 (ksh, cobrir, esconder, colocar [roupas], vestir) Mântico -> # 7876 (qsm, praticar adivinhação) Manto -> # 5077 (me ‘il, manto) Manuseio
# 5976
II, armado)
Mão -> # 3338 (v<5, mão, poder, lado) Mar
# 3542 (vã/n, mar, mares)
Maravilha -> # 7099 (pele’, maravilha) Marca
# 253 ( ’ôt, sinal, marca)
Marcha
# 2005 (íM \ caminhar, marchar)
Marfim -> # 9094 (&?«, dente, marfim) Marinheiro
# 2480 (hõbêl, marinheiro)
Martelo -> # 8392 (rc? ‘ , martelar) Masmorra -> # 4995 (misgeret, fortaleza, beira, base)
Massá e Meribá
Massá (HOD [massá], # 5001) e Meribá (n3, 1D [meribâ II],#5313).
AT 1. Massá e Meribá são NG de pontos de parada no deserto do Sinai ao longo do caminho percorrido pelos israelitas em sua rota do êxodo do Egito para o monte Sinai (Ex 17.7). massá significa literalmente testar ou tentar/provar (ver nsh, # 5814) e meríbâ quer dizer contenda ou luta (ver ryb, -> # 8189). Até hoje não se sabe a posição exata desses dois lugares. A narrativa do êxodo situa Massá e Meribá em Horebe, próximo a Refidim, um outro local não identificado do AT (Ex 17.6,8). Tanto Números (20.13) quando Ezequiel (48.28) situam os acontecimento ocorridos em 916
Massá e Meribá
Massá e Meribá perto de Cades-Baméia. É isso que leva Propp a conjecturar que provavelmente se trata de um lugar imaginário (ABD 4:600). Outros relacionam Meribá-Cades (Nm 20.13; Dt 32.51) com Ain Qadeis, próximo a Ain Qudeirat (Wenham, Numbers, TOTC, 1981, 150). A aparente confusão dos relatos bíblicos ao situarem os acontecimentos de Massá e Meribá nas proximidades de dois locais geográficos diferentes (Horebe em Ex 17.7 e CadesBaméia em Nm 20.13) levou os críticos das fontes a descartarem a idéia de uma tradição uni ficada no AT com referência a essa rebelião no deserto (cf. J. P. Hyatt, Exodus, NCB, 1971, 181-82; J. I. Durham, Exodus, WBC 3, 1987, 229-32). Antes, são identificadas duas linhas de tradições: a do eloísta, que situa Massá e Meribá nas cercanias de Refidim (Ex 17.6, 8), e a dos documentos sacerdotais, que situam os dois lugares no deserto de Zim (Nm 20.13). De acordo com Hyatt (182), as variações nas tradições bíblicas são resultantes da fusão de fontes em combinação com intenções literárias alternativas, uma vez que S desloca do povo de Israel — conforme J e E — para Moisés o tema da provação. G. Wenham (Numbers, 149-51), pelo contrário, rejeita a análise das fontes que consi deram Êxodo e Números como relatos repetidos do mesmo incidente e propõe que a narrativa represente dois episódios distintos de murmuração do povo de Israel durante suas jornadas de pois do êxodo (cf. B. A. Levine, Numbers 1—20, AB 4, 1993, 490-91, que lista três Meribás, sugerindo, talvez, três incidentes separados de prova e contenda). Números 20 não apenas in clui Arão na história, como também pressupõe o florescimento da vara de Arão em Números 17 (cf. 20.3, 8). Por fim, se Êxodo e Números relatam o mesmo acontecimento é ainda “mais enigmático... o motivo de o comportamento de Moisés nessa ocasião ser considerado mais con denável, enquanto em Refidim ele agiu com impunidade semelhante” (Wenham, 150). 2. Em termos teológicos, o salmista usa Massá e Meribá tanto como metáfora para a prova divina quanto como símbolo da falta de confiança de Israel em Javé, o Deus que o livrou do Egito (SI 81.7 [8]; 95.8; 106.32). É interessante observar que o episódio em Massá e Meribá foi um ato tanto da graça de Deus quanto do seu julgamento (81.7 [8]). De acordo com o co mentário de Kidner, o episódio em Meribá foi uma forma de “educar por meio do encontro... do silêncio... e do aparente descaso” (Psalms 73— 150, TOTC, 1975, 294-95). Anderson observa como Êxodo 17.1-7 relata que Israel tentou o Senhor, enquanto o Salmo 81.7 [8] declara que Javé experimentou (bhn,-$ # 1043) Israel em Meribá (Psalms 73—150, NCB, 1972, 589-90). O autor questiona se foram, de fato, os indivíduos que puseram Deus à prova, uma vez que é a provação divina que tem o propósito de expor as tramas do interior do coração das pessoas (Dt 8.2). Por esse motivo Estevão argumentou que, em seu coração, o povo nunca deixou o Egito (At 7.39) e o escritor de Hebreus responsabilizou a nação de Israel, e não Deus, por sua incredulidade, desobediência e julgamento (Hb 3.12-18). 3. Um resultado importante do incidente em Meribá em Números 20.1-13 foi o “mal” que sucedeu a Moisés em decorrência de seu comportamento naquele local (SI 106.32). A proi bição divina que impediu Moisés de conduzir Israel até a terra da promessa da aliança não foi tanto uma prova da fé de Moisés, mas sim um castigo por seu pecado ao deixar de glorificar a Deus diante do povo de Israel (Nm 20.9-12). Ao desobedecer a instrução divina e demonstrar desrespeito para com o símbolo da presença de Deus, Moisés deixou de reconhecer publica mente a pureza e o caráter separado de Deus (Wenham, Numbers, 151). Por fim, Cole (Exodus, TOTC, 1973, 135) comete um equívoco ao entender “tentar” como um termo neutro em Êxodo 17.7. A LXX sempre traduz o heb. nsh com uma forma de peirazõ, enquanto para o heb. bhn, usa uma forma de dokimazõ. Na maioria das vezes, nsh pos sui conotações pejorativas no sentido de que esse tipo de prova tenha por objetivo diagnosticar e revelar incredulidade, rebelião e desobediência (cf. Êx 17.2,7; SI 78.18,41). Porém, o termo 917
Megido
bhn indica o ato de testar com o propósito de aprovar a fé e desenvolver um caráter piedoso (cf. ICr 29.17; SI 66.10). Observa-se que os homens não podem pôr Deus à prova (nsh) par tindo da incredulidade (Ml 3.15), mas podem prová-lo (bhn) quando motivados pela fé e pela obediência (3.10). Mais importante ainda é que Deus tem a liberdade de iniciar os dois tipos de prova a fim de cumprir sua vontade divina (Gn 22.1; SI 17.3; cf. Tg 1.2-3, 12-13). B ib l io g r a f ia
ABD 4:600-602; ISBE 3:277; ATO/V7T2:635, 638; 3:800-801, 806; G. W. Coats, Rebellion in the Wilderness, 1968; W. H. Propp, Water in the Wilderness, HSM 40, 1987; J. Licht, Testing in the Hebrew Scriptures and in Post-Biblical Judaism, 1973. Andrew E. Hill Massa
# 1302 (beseq, massa)
Massacre -> # 2223 (hereg, carnificina, massacre) Matacão, rocha -> # 7446 (súr 1, rocha, matacão) Medição
# 4499 (mdd, estender, medir)
Meditação Medo
# 2047 (hgh I, gemer, lamentar, suspirar, meditar, refletir)
# 3707 (y r ' 1, temer, estar atemorizado, ser considerado com honra)
Megido
Megido (ill?p [megiddô], # 4459).
Nas Escrituras, Megido refere-se a um vale ou a uma cidade antiga. 1. O vale de Megido (2Cr 35.22) é outro nome para, no mínimo, a porção ocidental do vale«de Jezreel, que em G é chamado de Esdraelom. O vale situa-se entre a cadeia de monta nhas do Carmelo e os montes da baixa Galiléia. Possui a forma aproximada de um triângulo equilátero cujos lados têm cerca de quarenta quilômetros de extensão e é cortado pelo ribeiro de Quisom. Uma área bastante pantanosa na antigüidade, o vale tomou-se uma excelente área de cultivo desde a implantação de projetos de drenagem na região nas décadas de 20 e 30. Em termos teológicos, Megido tem relevância por ser uma região onde, em duas oca siões, Deus interveio miraculosamente em favor de seu povo — dando vitória a Débora e Baraque sobre os cananeus em Hazor (Jz 4.15) e a Gideão sobre os midianitas (cap. 7). Também foi nesse local que Deus executou o julgamento sobre Saul e seu exército pela desobediência de Saul (ISm 31.8) e, posteriormente, onde Elias providenciou para que os profetas idólatras de Baal fosse executados depois de vencê-los de modo miraculoso no monte Carmelo (lR s 18.40). Essa associação do vale de Megido com grandes batalhas é retomada no livro de Apo calipse, em que se toma o lugar da última e culminante batalha da história. Diz-se que, sob a liderança da besta e do falso profeta, os reis de todo o mundo se reunirão nesse vale “para a peleja do grande Dia do Deus Todo-Poderoso” (Ap 16.14). O lugar é chamado de Armagedom (16.16), nome de clara origem aram., har megiddô, colina de Megido. 2. A relevância da cidade de Megido é decorrente de sua localização de destaque na extremidade sul do vale de Jezreel, onde guardava a passagem na qual a estrada costeira se di 918
Melquisedeque
rigia para o interior. Assim, a cidade era capaz de exercer um certo controle sobre o comércio entre o Egito e a Mesopotâmia. Foi lá que Josias de Judá tentou impedir Faraó Neco do Egito de atravessar essa região com seu exército numa expedição para ajudar os assírios. Durante o combate, Josias sofreu um ferimento mortal (609 a. C.; 2Rs 23.29-30; 2Cr 35.20-24). Com a morte de Josias, Judá entrou rapidamente em declínio até que foi destruída por Nabucodonosor da Babilônia cerca de 25 anos depois. Tel el-Muteselim, o monte onde se localiza a antiga Megido, foi considerado o sítio arqueológico mais importante da Palestina, com uma história praticamente ininterrupta que se estende do quarto milênio até o quarto século a. C. Foi nesse lugar que o Instituto Oriental da Universidade de Chicago lançou um projeto para escavar todo o monte até o leito de rocha e servir como um laboratório de importância excepcional para a ciência emergente da arqueologia, bem como para os estudos do OMA. A iniciativa foi dirigida por C. S. Fisher, P. L. O. Guy e G. Loud. Depois de quatorze anos (1925-39), seus trabalhos foram interrompidos pela Segun da Guerra Mundial, após a escavação apenas dos quatro primeiros de vinte estratos. O Estrato IV gerou interesse considerável, pois foi identificado como sendo do período salomônico. De acordo com as Escrituras, Salomão reconstruiu Megido como uma cidade para os carros dele (1 Rs 9.15; cf. 10.26-29). No Estrato IV, os pesquisadores encontraram duas grandes estruturas que identificaram como áreas de estábulos, com capacidade para cerca de 450 cavalos, o pa lácio do governador, muralhas e a porta da cidade. Porém, em 1960,1961, 1966, 1967 e 1971, Yigael Yadin trabalhou nesse sítio e alterou as conclusões do estudo de Chicago. Atribuiu as muralhas, a porta da cidade e o palácio ao tempo de Salomão, mas datou os supostos estábulos do reino de Acabe, juntamente com um amplo sistema de distribuição de água, datado anterior mente do século XII. O Estrato IV é dividido agora em duas fases: IV-B, salmônica e IV-A, do reinado de Acaz. Nem todos os estudiosos seguem Yadin. Uma observação final de relevância teológica é o fato de não haver evidência alguma de sincretismo entre a religião de Javé e os cultos nativos locais em achados datados do final do Estrato III, por volta de 600 a. C. B ib l io g r a f ia
ISBE 3:309-11; M. Avi-Yonah, ed., EAEHL 3,830-56; Y. Aharoni e Y. Shiloh, NewEncyclopedia ofArchaeological Excavations in the Holy Land, 3, 1003-24; D. W. Thomas, ed., Archaeology and Old Testament Study, 1967, 209-28. H owardE Vos Mel
# 1831 (íPhas, mel)
Melquisedeque
Melquisedeque (plX- , 3l70 [malki-çedeq], # 4900).
AT 1 .0 nome Melquisedeque (malkí-sedeq) significa “(Meu) rei é sedeq", “Melek/Milku é justo” ou “(Meu) rei é justo” e ocorre em Gênesis 14.18-20 e no Salmo 110.4. Melquisedeque era rei de Salém (= Jerusalém? Cf. SI 76.2 [3] e IQapGen 22:13) e também sacerdote do Deus Todo-Poderoso ( el ‘elyôn). Seu nome se assemelha ao de Adoni-Zedeque, um rei posterior de Jerusalém (Js 10.1). Melquisedeque levou pão e vinho para Abraão (cf. Dt 23.4 [5]) depois que o patriarca havia derrotado a aliança de Quedorlaomer e o abençoou em nome do Deus Todo-Poderoso (Gn 14.19; o primeiro cumprimento da promessa de 12.1-3). O cognome “Criador dos céus e da terra” [ou “Aquele que possui os céus e a terra”] é aplicado posteriormente ao Deus de Israel 919
Melquisedeque
(SI 115.15; 121.2). Apesar de El ser o nome do deus principal do panteão ugarítico e apesar de 'elyôn provavelmente ser um cognome relacionado a ele, tudo indica que Abraão reconheceu a legitimidade política do sacerdote, pois aceitou o ministério de Melquisedeque. Além disso, Abraão usa o mesmo nome para o rei de Sodoma em 14.22, porém precedido nesse caso pelo nome Javé (de acordo com o TM; uma indicação de que, sem dúvida, o Deus dos patriarcas era o mesmo Javé que seria adorado posteriormente por Israel). Abraão deu a Melquisedeque o dízimo de todos os espólios, da mesma forma como Jacó também prometeu fazer a Deus (28.22) e como os israelitas deviam dar os seus dízimos aos levitas, cumprindo uma obrigação cultuai (Lv 18.21 -24). Abraão reconheceu o Deus de Melquisedeque como o Criador dos céus e da terra. Melquisedeque é um dos muitos exemplos de indivíduos não judeus que reconhe ceram a mão de Deus operando na vida de Abraão e seus descendentes. 2. No Salmo 110, um rei davídico recebe a promessa divina “Tu és sacerdote para sem pre, segundo a ordem de Melquisedeque”. O contexto dessa promessa é a posse de Jerusalém, em decorrência da qual Davi e sua casa tomaram-se sucessores de Melquisedeque, partindo-se do pressuposto mencionado acima de que Salém é Jerusalém. Na estrutura organizacional de Israel, há uma separação entre os cargos dc rei e sa cerdote. O primeiro é reservado aos descendentes de Davi (da linhagem de Judá) e o segun do aos descendentes de Arão (da linhagem de Levi). A iniciativa do rei Uzias de oferecer incenso no templo pode ser considerada uma tentativa de abolir essa distinção (2Cr 26.1618). É verdade que o rei de Israel tinha certos deveres a cumprir em relação ao santuário, mas não possuía direitos sacerdotais. Em Israel havia uma distinção maior entre esses dois cargos do que nos países vizinhos. Tomando por base a separação entre os dois cargos, pa rece difícil que as palavras sejam dirigidas ao próprio Davi (Paul, 195-202); em vez disso, o mais provável é que se tenha em vista uma nova situação futura. Porém, L. C. Allen (8182) e E. H. Merrill (1987, 265-6) argumentam que essa promessa é feita ao próprio Davi como sacerdote. Merrill defende a idéia de que Davi é tanto o autor do Salmo 110 quanto seu destinatário (1993). Vários exegetas consideram o Salmo 110.4 uma afirmação de que o sacerdócio de acor do com a ordem de Melquisedeque é diferente do sacerdócio levítico pela possibilidade de um sacerdote também poder ser rei. Essa interpretação não identifica as características particulares de tal sacerdócio. Essa peculiaridade não encontra maior expressão na qualificação “para sem pre”, pois esse atributo também é usado para definir o sacerdócio de Arão (Ex 29.9). P-B Melquisedeque é um salvador divino, lutando com os filhos da luz numa batalha es catológica contra os filhos de Belial (ver lQapGen 22:14-17; I lQMelch). O tratado “Melqui sedeque” de Nag Hammadi, com sua tendência contrária ao docetismo, datado talvez desde o século II, identifica Melquisedeque com Jesus Cristo. NT É possível que o NT forneça informações adicionais em Hebreus 7, que esclarece o Salmo 110 e as características do sacerdócio de Melquisedeque. Hebreus 7.3 descreve Mel quisedeque como aquele “sem pai, sem mãe, sem genealogia”. Não se trata de um argumento proveniente do silêncio de Gênesis 14 com relação à linhagem de descendentes. Pode ser mais bem explicado da mesma forma que a declaração rabínica sobre um pagão que se converteu à fé judaica: “um pagão não tem um pai (legal)”. Apesar de um pagão ter um pai natural, para a lei judaica, não havia um pai legal para ele. Diante disso, Hebreus 7.3 poderia ser entendido como uma declaração de que Melquisedeque tinha pais, mas não aqueles necessários para fazer dele um sacerdote ou rei. Seus direitos para ser sacerdote e/ou rei não eram derivados de seus 920
Melquisedeque
pais em função de prerrogativas hereditárias. A única possibilidade era receber essas funções por nomeação (com um juramento, v. 21). Jesus, que é da linhagem de Judá (v. 14), não po dia ser sacerdote segundo a ordem de Arão. Portanto, é provável que na expressão “segundo a ordem dc Melquisedeque”, o Salmo 110.4 apresente uma qualificação para o sacerdócio que não é obtida por herança (do pai ou da mãe), mas por juramento. Desse modo, existe a possi bilidade de um rei davídico tomar-se, igualmente, um sacerdote. O Salmo 110 aponta para um cumprimento futuro. Em Hebreus 5 e 7, o NT também declara que o cumprimento se dá em Jesus Cristo. Seu sacerdócio sobrepuja o sacerdócio arônico no sentido de que não é heredi tário, mas sim um sacerdócio que dura eternamente e proporciona reconciliação completa da humanidade com Deus. Abraão Sacerdotes e levitas: 'abnêt (cinto, esp. de sacerdotes, # 77); 'êpôd 1 (estola, veste sa cerdotal, objeto de veneração, # 680); hõíen (peitoral do sumo sacerdote, # 3136); -> khn (cumprir os deveres de um sacerdote, # 3912); kõmer (sacerdote pagão, # 4024); -> lêwi (levita, # 4290); -> m igbã‘â (tiara, # 4457); miknãsayim (calças, # 4829); -> pa ’amôn (cam painha [na sobrepeliz do sacerdote], # 7194); -> tasbês (quadriculado [túnica do sacerdote], # 9587); Arão: Teologia; Sacerdotes e levitas: Teologia B ib l io g r a f ia
L. C. Allen, Psalms 101-150, WBC, 1983, 78-87; B. Demarest, A History o f Interpretation o f Hebrews 7:1-10 from the Reformation to the Present, 1976; F. L. Horton, The Mechizedek Tradition, 1976; P. J. Kobeski. Melchizedek und Melchiresa, 1981; E. H. Merril, Kingdom o f Priests: A History o f OT Israel, 1987; idem, “Royal Priesthood: An Old Testament Messianic M otif’, Bsac 150, 1993, 50-61; M. J. Paul, “The Order of Melchizedek (Ps 110:4 and Heb 7:3)”, W TJ49, 1987, 195-211; B. A. Pearson, “Melchizedek (IX, 1)”, in J. M. Robinson (dir.), The Nag Hammadi Library in English, 1977, 399-403. MaartenJ. Paul Memorial
# 2355 (zikkãrôn, lembrança, memorial)
Menina -> 5855 (n a ‘arâ 1, menina, donzela) Menino, jovem -> # 5853 (na "ar 11, jovem) Mensageiro -> # 4855 (mal 'ãk, anjo, mensageiro) Menstruação
# 1864 (dwh, menstruar)
Mentira -> # 3941 (kzb, mentir, ser mentiroso, enganar) Mercadoria -> # 6088 (sehõrã, mercadoria) Mescla
# 8057 (rbk, mesclar, misturar)
Metade -> # 2936 (/(.?/;, dividir; ser dividido) 921
Micaías
Micaías
Micaías OITO’?? [míkãy^hii], # 4781)
Micaías, Miquéias ou Mica são formas abreviadas de mikãyãhú, que significa Quem ê como Javé? As pessoas com esse nome no AT são: 1. Mica, da região montanhosa de Efraim (Jz 17.1— 18.27), que tomou prata consa grada de sua mãe. Depois que ele havia lhe devolvido o dinheiro, ela lhe deu parte da soma, com a qual um ourives confeccionou uma imagem de escultura. Mica também fez uma estola e ídolos do lar e colocou-os num santuário particular. Nomeou o filho como sacerdote, mas substitui-o posteriormente por um levita de Belém. Perdeu tanto seu sacerdote quanto seus ob jetos cultuais para danitas que estavam de passagem pelas terras dele e que levaram as coisas para um santuário em Dã. Essa história reflete um período no qual a religião de Javé ainda se encontrava centralizada (Miller & Hayes, 108-9). E possível que também explique a origem do culto apóstata praticado em Dã tempos depois (1 Rs 12.28-31). 2. 2 Crônicas 13.2 cita Micaías, a filha de Uriel como mãe de Abias, o sucessor de Ro boão, rei de Judá. 3. Micaías, filho de Inlá era profeta em Israel. Apesar do tratamento ríspido que recebeu do rei Acabe, teve coragem de profetizar a verdade sobre a morte iminente do monarca israeli ta pelas mãos dos sírios em Ramote-Gileade (1 Rs 22.5-28; 2Cr 18.4-27). Em sua oposição ao rei Acabe, Micaías personificou uma convicção obstinada acerca do caráter predominante da profecia sobre as questões políticas (De Vries, 45). Ao contrário dos outros profetas, Micaías era o único presente que podia reivindicar a revelação inspirada pelo Espírito do Senhor (1 Rs 22.19-28; cf. De Vries, 45). 4. O profeta Miquéias mencionado em Miquéias 1.1, possivelmente originário de Moresete-Gate (Mq 1.14) no Sefelá (Aharoni, 331). Profetizou no tempo dos reis Jotão, Acaz e Ezequias de Judá e foi, portanto, contemporâneo de Isaías (Is 1.1; cf. Miller e Hayes, 344). (-> Miquéias: Teologia) B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land o f the Bible, 1979; S. J. De Vries, Prophet Against Prophet, 1979; J. M. Miller & J. H. Hayes, A History o f Israel andJudah, 1986. D. N. Pienaar
Midiã
Midiã Cl’77? [midyãri], # 4518).
1. Midiã em relação a Israel. Midiã era filho de Abraão com a concubina Quetura (Gn 25.2; ICr 1.32), mas, para proteger a herança de Isaque, Abraão enviou Midiã para a “terra oriental” (Gn 25.6). Várias gerações depois, quando fugia de Faraó, Moisés se refugiou no meio dos midianitas na península do Sinai e casou-se com a filha de Jetro, sacerdote de Midiã (Ex 2.15-22). Enquanto apascentava os rebanhos de Jetro, Moisés teve um encontro com Javé, o Deus vivo de seus pais, que enviou Moisés para resgatar Israel do Egito (3.1-4.23). Apesar da ocorrência freqüente do nome Javé em Gênesis, a maioria dos estudiosos entende que é em Êxodo 6.3 que Moisés aprende esse nome. A inferência mais provável é que, por meio do êxodo, Javé se revelaria mais plenamente como o Deus que redime e salva. Mais tarde, Jetro reconheceu a grandeza de Javé e tomou-se um midianita crente no Senhor (Êxodo 18). 2. Midiã como inimiga de Israel. Há evidências de que Midiã exerceu um protetorado sobre Moabe, Edom e o Sinai, de c. 1250 a 1000 a. C. (Eissfeldt). Em várias ocasiões, Midiã 922
Miguel
se opôs a Israel ou tomou-se uma influência subversiva. Moisés guerreou contra Midiã (Nm 22— 25; 31), como o fez Gideão quando Midiã forçou os israelitas a se refugiarem nos mon tes e roubou propriedades de Israel (Juizes 6). Tomado do Espírito de Javé, Gideão reuniu as tribos do Norte, reduziu a própria força tarefa a meros 300 homens, usou táticas de choque e conquistou uma retumbante vitória (Juizes 7). Javé foi o herói conquistador, e o episódio, chamado posteriormente de “dia de Midiã”, tomou-se um exemplo manifesto da intervenção decisiva do Senhor visando à salvação (SI 83.9-11 [10-12]; Is 9.4; 10.26). Midiã nunca mais voltou a invadir Israel. B ib l io g r a f ia
O. Eissfeldt, “Protektorat der Midianiter über ihren Nachbam”, JBL 87, 1968, 383-93; G. A. F. Knight, AChristian Theology o f the OT2, 1964, 38-53; J. A. Motyer, The Revelation o f the Divirte Name, 1959; J. P. J. Olivier, “The Day o f Midian and Isaiah 9:3b'\JN SL 9, 1981, 14349; G. von Rad, OTT 1, 1962, (Ger. 1957), 8-11, 179-87. Joyce Baldwin
Miguel
Miguel (*?X3,P [mikã ’êl), # 4776). O nome próprio Mi guel pode ser o nome de um homem (cf. Nm 13.13) ou
do anjo Miguel, protetor de Israel.
AT 1. É comum os anjos do AT serem classificados de acordo com as hierarquias militares ou astrais, conhecidas coletivamente como hostes celestiais ou exércitos dos céus (Dt 4.19; 1Rs 22.19) ou então, receberem referências individuais como figuras de poder. Sabe-se de ocasiões em que intervieram nas guerras de Israel (Jz 5.20; 2Rs 6.17). Eram liderados por um capitão ou príncipe que se manifesta como “príncipe do exército do Senhor” (Js 5.14). 2. Em Daniel, os anjos da guarda nacionais são chamados desãrím, príncipes (Dn 8.25 O príncipe da Pérsia se opôs a Miguel, que é um dos “primeiros príncipes” (Dn 10.13). Miguel também é o anjo da guarda de Israel, aquele que dará início à era escatológica (12.1). Tendo em vista Israel ser o povo eleito de Deus (Dt 32.8-9), Miguel é identificado de maneira muito pró xima com o ser divino, conforme indica a etimologia de seu nome (“Quem é como Deus?”). P-B O conceito de sete ou quatro arcanjos é encontrado com freqüência nos escritos do pósexílio (Tob 12.15; lEn. 9.1). Muitas vezes, são “anjos da presença” sumo-sacerdotal (Jub 2.2; Test Levi 8.2; para 4QshirShabb, ver Newsom, Songs, 31 -38). Miguel, Sariel e Uriel aparecem de diferentes formas nas tradições de Enoque. Em 4QAram, Miguel, com o nome secreto de Melquisedeque, enfrenta Belial, Melkiresha* (Kobelski, 24-48). Anjos B ib l io g r a f ia
H. Bietenhard, Die himmlische Welt im Urchristentum und Spàtjudentum, WUNT 2, 1951; J. J. Collins, The Apocalyptic Vision o f the Book o f Daniel, 1977; W. Eichrodt, TOT, 2:15-228; P. J. Kobelski, Melchizedek and Melchiresha, CBQMS 10, 1981. Stephen F. Noll Mil -> # 547 ( 'elep, mil) 923
Miquéias: Teologia de
Mimo -> # 7167 (pnq, mimar)
Miquéias: Teologia de A. Contexto Histórico Os oráculos inspirados de Miquéias interpretam a história de Israel à luz da aliança de Deus com esse povo. Miquéias profetizou dos dias de Jotão (740-732 a. C.) até o tempo de Ezequias (715-686), período em que o império neo-assírio estava em ascensão. O rei assírio Tiglate-Pileser III (744-727) havia lançado a Assíria num plano político ambicioso de expansão imperial. Salmaneser V (726-722) atacou Samaria de 725 a 722 e a cidade caiu sob o ataque de Sargão II (721-706; cf. 1.2-7). Rebeliões ocasionais das nações na Síria-Palestina contra os tributos cobrados pela Assíria imperial mantinham o povo dessas regiões sob o medo constante de represálias assírias. Senaqueribe (704-681) tomou todas as fortificações de Judá nos contra fortes (cf. 1.10-16) e apenas Jerusalém sobreviveu miraculosamente (cf. 2.12-13). Apesar de proceder do seu contexto histórico, a linguagem de Miquéias é poética e abstrata, de modo que o povo de Deus sob circunstâncias semelhantes é capaz de se identificar com as mensagens de Miquéias. A maioria dos estudiosos considera Miquéias o escritor de grande parte dos caps. 1—3, mas muitos atribuem o restante do texto a sucessores anônimos desde o tempo do exílio até o período seguinte. Baseiam—se no presuposto de que a profecia se restringe a acontecimentos contemporâneos a ela. De acordo com esse ponto de vista, seria impossível, por exemplo, Mi quéias ter previsto o cativeiro na Babilônia, que só viria a ocorrer mais de um século depois (cf. 4.9-10). Porém, a Bíblia parte do pressuposto de que o Soberano que governa a história levanta profetas que predizem o futuro (Dt 18.21-22; Is 41.21-29). Nâo há nenhum dado lingüístico ou histórico que conteste Miquéias 1.1, que identifica Miquéias como o autor do livro do qual é epônimo. Muito pelo contrário. Renaud (La Formation, 252-53), que atribui partes de 5.1-6 [4.14-5.5] a Miquéias, afirma que, devido à menção da Assíria como subordinada da Babilô nia, 5.5-6 [4-5], deve ser datado no período de Miquéias. Além disso, o termo incomum nesikê (líderes, príncipes) em 5.5 [4] ocorre numa inscrição assíria de 720, ajudando a corroborar essa data mais antiga. O uso do pronome na primeira pessoa do pl. com relação à invasão em 5.1 [4.14] e 5.5-6 [4-5] e sua menção da Assíria em 5.6 [5] sugere fortemente que Miquéias, assim como os outros remanescentes, esteja passando pelo cerco da Assíria a Jerusalém. B. Estrutura Literária Para compreender-se e dar o devido valor às contribuições teológicas de Miquéias, é de grande ajuda considerar em primeiro lugar a estrutura literária do livro e a situação histórica que ocasionou o que foi profetizado no livro. O estilo um tanto abrupto do livro se deve ao fato de reunir oráculos, anteriormente iso lados, num só todo coerente. Depois do título (1.1), há cerca de treze oráculos distintos. Estes diferem em forma, mas podem ser classificados sobretudo como oráculos de repreensão e/ou perdição e de esperança. Miquéias organizou-os em três séries (caps. 1—2,3— 5,6— 7), sendo que cada uma começa com a ordem Sim'ü, que costuma ser glosada como “Ouvi!” (1.2; 3.1; 6.1), deslocando-se dos oráculos de repreensão/perdição (1.22-2.11; 3.1-12; 6.1-7) para os de esperança (2.2-13; 4.1-5.15 [14]; 6.7-20). Miquéias 2.12 constitui uma transição de perdição para esperança na primeira série, e 7.7 é um Janus (ou seja, aquele que olha para os dois lados) na terceira série. A mudança na segunda série entre os caps. 3 e 4 é impressionante e, ainda 924
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assim, as duas seções são encaixadas habilmente com palavras-chave que ligam o oráculo de perdição contra Sião (3.9-12) ao oráculo de esperança (4.1-5): “Sião” e “Jerusalém” (3.10,12; 4.1-2); “colina / monte” (heb. har.) (3.12; 4.1); “chefes / cabeças” (3.9, 11) (heb., rõ's) e “en sinar” e “julgar” (3.11; 4.2-3). A costura editorial que liga as duas primeiras séries, “Disse eu” (3.1), indica que Mi quéias editou seu próprio material. C. Temas Teológicos 1. A teologia da aliança. Os oráculos de repreensão/perdição de Miquéias baseiam-se na aliança realizada no Sinai, na qual Israel comprometeu-se a manter as estipulaçòes dessa aliança. As mensagens de julgamento austeras de Miquéias apoiam-se nessas estipulaçòes éticas elevadas. No oráculo de repreensão (mais especificamente uma “controvérsia”) preservado em 6.1 -8, Miquéias chama Israel para o banco dos réus e convoca as montanhas como um tribunal para testemunhar quanto à veracidade do pleito de Deus e a acusação contra seu povo de que este transgrediu a aliança (vv. 1-2). Séculos antes, Moisés havia convocado os céus e a terra como um tribunal cósmico para testemunhar a aliança no Sinai e o fato de que Deus ameaçava o povo de morte caso o povo voltasse atrás em sua palavra (cf. Dt 4.26). Em resposta à pergunta do falso adorador, “Com que me apresentarei ao Senhor?”, Miquéias diz: “Ele te declarou, ó homem, o que é bom” (v. 8), um termo que resume as estipulaçòes da aliança (Mays). Israel aceitou as obrigações impostas pelo Senhor, pois o Senhor havia constituído Is rael como nação por meio dos atos de sua “poderosa mão” (cf. Êx 19.4; Dt 6.20-22). Agora, Miquéias insta o povo a se lembrar desses atos (6.5). De acordo com Childs (56), “lembrar” significa “colocar o passado em prática no presente” e não simplesmente trazer à memória acontecimentos passados como numa investigação histórica. Com essa implementação do passado, Childs quer dizer que as gerações separadas do acontecimento pelo tempo transcor rido podem ter um encontro íntimo com os grandes atos de redenção ao se lembrarem desses feitos do passado. Em resumo, Miquéias convoca o povo de Israel a experimentar novamente a graça de Deus por meio da lembrança e, baseando-se nesse alicerce espiritual, a guardar a aliança feita no Sinai. Jerusalém se recusou a responder (6.9-12), de modo que Deus começou a destruí-la (6.13-15). As tragédias ameaçadas nas maldições da aliança estavam sendo executadas (cf. Lv 26.26; Dt 28.15, 18,40,51). As maldições repetidas nessa unidade agem como um código que permite a Israel interpretar esses horrores como provenientes de Deus, que adverira o povo de antemão sobre as conseqüências de se abandonar a aliança. Os oráculos de esperança, por outro lado, fundamentam-se nas obrigações que Deus impôs sobre si mesmo quando fez a aliança eterna com Abraão e os patriarcas e seus descen dentes posteriormente (Gn 17.7). Miquéias conclui seu livro lembrando o Senhor da aliança abrâmica: “Mostrarás a Jacó a fidelidade e a Abraão, a misericórdia, as quais juraste a nossos pais, desde os dias antigos” (Mq 7.20). 2. Verdadeiros e falsos profetas. Miquéias, o representante plenipotenciário do Senhor do tribunal celeste para Samaria e especialmente para Jerusalém, distingue-se em parte dos falsos profetas pela confirmação de ambas as alianças. Os falsos profetas, por outro lado, pregavam somente sobre as promessas de Deus e não sobre o julgamento que ele havia ameaçado. Em um oráculo contra os falsos profetas (2.6-11), Miquéias se queixa: “Não babujeis, dizem eles. Não babujeis tais coisas, porque a desgraça não cairá sobre nós”. Em outro oráculo (3.9-12), condena a falsa teologia: “e ainda se encostam ao Senhor, dizendo: Não está o Senhor no meio de nós? Nenhum mal nos sobrevirá”. No oráculo anterior, 3.5-7, Miquéias supõe que os falsos 925
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profetas eram capazes de adivinhações e tinham visões, mas seus dons lhes seriam tomados (3.6). O que faltava aos falsos profetas não era o dom, mas sim a ética (cf. Dt 13.1-5). Em seus oráculos de perdição e repreensão, Miquéias nâo hesitou em transmitir uma mensagem extremamente malquista de que o salário do pecado é a morte. Era fervoroso em seus sentimentos pela classe média que sofria a opressão da classe alta e abastada de Jerusalém (2.1 -5,8-9). Os ricos proprietários de terras eram protegidos por magistrados corruptos (3.1 -4) e incentivados pelos profetas e sacerdotes que só buscavam os próprios interesses (3.11). Cheio de um espírito defensor da justiça, Miquéias por sua vez nâo podia ser comprado (3.8). Não era um poeta moralizador, mas sim um reformador dinâmico chamando a nação de volta para suas tradições espirituais (6.1 -8). Por fim, o profeta prevaleceu (Jr 26.18). 3. O remanescente. Havia uma tensão entre a aliança mosaica e a aliança abrâmica. A primeira ameaçava uma nação pecadora com a morte; a última garantia a Israel uma posi ção eterna dentro do plano divino de redenção. Os verdadeiros profetas conciliavam as duas alianças por meio da doutrina de que Deus preservaria um remanescente piedoso durante o julgamento. O remanescente desempenha um papel importante nos oráculos dc esperança para cada uma das três séries. Na primeira série, Israel é enviada para o exílio e sua terra santa é varrida pelo caos em decorrência do pecado do povo (1.2—2.11). No entanto, o Senhor promete ajuntar um re manescente eleito em Jerusalém para sobreviver ao cerco assírio e promete também tomar-se seu rei (2.12-13). Na segunda série, depois de destruir Jerusalém em função da liderança fracassada desta (3.1-12), o Senhor exaltará a cidade acima das nações (4.1 -5) e lá reunirá o remanescente aflito, que restaurará o domínio de Deus sobre a terra (4.6-8). Miquéias compara o remanescente de Israel no exílio da Babilônia como uma mulher em trabalho de parto, que em meio a dores dà à luz uma nova era (4.9-10). Também o assemelha ao orvalho do Senhor em meio às nações e a um leão em meio aos animais da floresta (5.7-9 [6-8]). O profeta conclui a segunda série com a previsão de que, depois de o Senhor haver depurado a nação pelo julgamento, ele protegerá seu reino purificado (5.10-15 [9-14]). Miquéias conclui a terceira série de seu livro com um cântico de vitória (7.8-20) que celebra, entre outras coisas, o fato de que todas as nações encontrarão salvação no reino recons truído de Sião (vv. 11-12), seguido da desolação mundial (v. 13). O futuro glorioso encontra-se na graça de Deus para perdoar os pecados do remanescente (v. 18). Em sua famosa pergunta “Quem, ó Deus, é semelhante a ti?”, Miquéias faz um trocadilho com seu próprio nome, que significa “Quem é semelhante a Deus?” 4. Messianismo. Nos caps. 4— 5, sete oráculos de esperança giram em tomo do Mes sias, aquele que governará sobre o remanescente (5.1-6 [4.14— 5.5]). No tempo de Miquéias, Jerusalém encontrava-se cercada pelo exército imperial assírio, formado por mercenários de diversas nações e ao qual o rei de Israel nâo podia resistir (5.1 [4.14]). Ainda assim, o remanes cente escondido em Jerusalém não devia perder as esperanças, pois a pequena Belém, que no início da monarquia deu a Israel seu primeiro rei verdadeiro, voltaria a dar-lhe um governante (5.2 [ 1]). Até que o remanescente lhe dê à luz (ver 4.10), Israel ficará abandonada sem um rei; mas quando ele vier, o resto de seus irmãos será convertido e se juntará ao remanescente (5.3 [2]). Então, o Messias apascentará seu rebanho e eles habitarão em segurança (5.4 [3]). D. Contexto Canônico Observamos anteriormente que os oráculos de repreensão/perdição de Miquéias ba seiam-se na aliança feita no Sinai e que seus oráculos de esperança tomam por base a aliança 926
Miriã
abrâmica e também que Miquéias insta Israel a colocar o êxodo em prática na vida. Miquéias fala do passado de Israel de várias outras maneiras. Em 5.2 [1] a disposição dos nomes de lu gares (Belém-Efrata e Judá) lembra o público de Jessé, o pai de Davi (1 Samuel 16), de cujo tronco nasceria um Rebento que voltaria a dar fruto (Is 11.1). Em seu hino de vitória, Miquéias refere-se ao êxodo quando canta: “Tomará a ter compaixão de nós” (7.19). A libertação de Is rael do domínio egípcio no começo de sua história toma-se um tipo de salvação espiritual ain da maior, o qual liberta da escravidão do pecado. Assim como o Senhor lançou Faraó e seus soldados no fundo do mar(Êx 15.4-5), no futuro lançará as iniqüidades do remanescente “nas profundezas do mar” (7.19). No NT, o Messias prometido é identificado como Jesus, que nasceu em Belém (Mt 2.1 -6). O remanescente que lhe dá à luz cumpre-se em fiéis como Zacarias e Elizabete, Simeão e Ana, José e, acima de tudo, Maria (Lc 1.5; 2.38). Tendo ajuntado um remanescente eleito, Cristo deu início ao seu reino da cidade celestial de Sião quando enviou o Espírito Santo sobre esses eleitos, no Cenáculo, e, por intermédio deles, começou a tomar o resto de seus irmãos para si, como relata Lucas em sua história, no livro de Atos. Porém, Deus manteve guardado o “mistério” que revelou a Paulo, de que os gentios também herdariam as alianças de Israel, para se tomarem, junto com o remanescente, a nova Israel de Deus (Ef 3.2-6; G1 6.16). De acordo com o texto, as profecias de M iquéias 4— 5 se cumprirão “naquele dia” (4.1, 6; 5.10 [9]) e Pedro equipara esses “últimos dias” à vinda do Espírito Santo, pelo meio do qual o Senhor govema sua igreja (Atos 2). Por certo, a maioria dos irmãos do Messias ainda não se voltou para ele, mas Deus preserva um remanescente até que todos os seus irmãos eleitos estejam salvos (Romanos 11). Nesse ínterim, a nova Israel é um cheiro de morte ou aroma de vida em meio às nações (cf. 2Co 2.14-16). B ib l io g r a f ia
L. C. Allen, The Books ofJoel, Obadiah, Jonah and Micah, NIC, 1976,237-404; B. S. Childs, Memory and Tradition in Israel, SBT, 1962; G. F. Hasel, The Remnant, 1974; D. G. Hagstrom, The Coherence o f the Book o f Micah, 1988; D. R. Hillers, Micah, Hermenéia, 1984; J. L. Mays, Micah, OTL, 1976; B. Renaud, La formation du livre de Michée, Études bibliques, 1977; T. E. McComiskey, “Micah”, EBC, 1985,393-445; B. K. Waltke, Micah, TOTC, 1988, 133-207; idem, “Micah”, in The Minor Prophets, T. McComiskey (ed.), 1993, 591-764; idem, Micah, NBC, 1994, 822-33; J. T. Willis, The Structure, Setting and Interrlationships o f the Pericopes in the Book o f Micah, 1966; H. W. WolfT, Micah, 1990. Bruce K. Waltke
Miriã
Miriã (□’1!p [miryãm], # 5319).
1. Irmã de Moisés. Quando a vida do bebê Moisés (->) foi ameaçada pelo decreto Faraó (Êx 1.22), três mulheres contribuíram para salvá-lo, mas a figura chave foi a irmã dele, cujo nome não é mencionado. Tendo observado quando a filha de Faraó se aproximou do ces to no meio dos juncos, essa menina ousada se ofereceu para encontrar uma ama hebréia que cuidasse do bebê, o qual, desse modo, foi criado pela própria mãe (Êx 2.4-8). Se essa irmã era, de fato, Miriã, então desde cedo se mostrou cheia de coragem e iniciativa, qualidades que usou para proteger o futuro libertador de Israel. “Em termos humanos, a história do êxodo deve seu início não a Moisés, mas a Miriã e outras mulheres” (Trible, 1989, 18). 927
Miriã
2. A profetisa Miriã. Miriã é assim chamada quando seu nome aparece pela primeira vez em Êxodo 15.20, em que também é chamada de “irmã de Arão”. Uma vez que Arão ha via sido designado o “profeta” ou porta-voz de Moisés (Êx 7.1), Miriã completava um grupo de três profetas, todos da mesma família. “Nunca mais se encontrou em Israel uma família como essa de personagens proféticos” (Kaufmann, 227). Logo depois que Israel atravessou o mar em segurança, Moisés e toda Israel entoaram juntos um salmo de louvor a Javé (Êx 15.1-18), no qual Miriã dirigiu um acompanhamento musical que continha canto e dança. “A mediadora tomou-se percucionista, compositora, vocalista, profetisa, líder e teóloga” (Trible, 1989, 20). Há evidências de que as mulheres em Israel compunham cânticos de vitória para dar as boas vindas aos seus homens quando eles voltavam das batalhas: o cântico de Débora (Juizes 5) e o refrão das mulheres que saudaram Davi (1 Sm 18.7; 21.11). É provável que as mulheres tivessem tempo para compor os cânticos enquanto os homens estavam envolvidos ativamente nas batalhas, como no Salmo 68.11-12: “O Senhor deu a palavra, grande é a falange das men sageiras das boas-novas. Reis dos exércitos fogem e fogem”. Miriã não foi a única a ter essa vocação e é possível que tenha sido a principal responsável pela composição de Êxodo 15.1-18 (Brenner, 52; Trible, 190-98). Moisés estava plenamente cônscio de que não sabia falar bem (Êx 6.30), daí o Senhor prover Arão para ser seu porta-voz e, talvez, nessa ocasião, Miriã, para expressar em poesia o louvor enlevado de Israel. 3. O desafio à autoridade de Moisés. Miriã e Arão (nessa ordem) acraditaram ser apro priado questionarem o direito de liderança exclusiva de Moisés (Números 12). Levantaram objeções contra a esposa cuxita dele e declararam ser profetas tão verdadeiros quanto ele. Mais velhos do que Moisés (Êx 7.7), ressentiram-se da proeminência dele na família de profetas e rebelaram-se contra ele. Miriã deseja deixar claro que o Senhor também falava por intermédio dela, uma mulher (Nm 12.2)? A repreensão do Senhor foi explícita (Nm 12.6-8) e Miriã foi escolhida para ser julgada diante de toda a comunidade. Foi acometida de lepra, uma doença de pele que a levou a ser excluída da sociedade de Israel e que a tomou imunda e marcou sua vida, enquanto Moisés foi vindicado. Ainda assim, ele não guardou rancores e, em resposta ao pedido de Arão, orou pela cura da irmã. Depois de ficar excluída do arraial durante sete dias, limpa mas disciplinada, Miriã foi restituída à sua posição. A experiência por que passou tornouse um aviso para as gerações futuras (Dt 24.9). Miriã morreu e foi sepultada em Cades-Baméia, perto da terra prometida (Nm 20.1). Numa ocasião em que faltou água para o povo de Deus, Moisés e Arão viram-se mais uma vez sob pressão. Apesar de terem feito jorrar água de uma rocha, atraíram sobre si o desprazer do Senhor e nenhum dos dois pôde entrar na terra prometida (Nm 20.12). Os três membros dessa família extraordinária aparecem na referência do profeta Miquéias ao êxodo: “Pois te fiz sair da terra do Egito e da casa da servidão te remi; e enviei adiante de ti Moisés, Arão e Miriã” (Mq 6.4). B ib l io g r a f ia
B. I. Anderson, “The Song of Miriam Poetically and Theologically Considered”, in Directions in Biblical Hebrew Poetry, JSOTSup 40, 1987, 284-96; A. Brenner, The Israelite Woman, 1985, 51-62; R. J. Bums, Has the Lord Indeed Spoken Only Through Moses?, SBLDS 84, 1987; F. M. Cross e D. N. Freedman, “The Song of Miriam”, JNES 14, 1955, 237-50; S. Hermann, Israel in Egypt, 1973,59,63; D. Jobling, The Sense o f Biblical Narrative, JSOTSup 7, 1978, 26-62; Y. Kaufmann, The Religion o f Israel, 1961, 122; E. Leach, “Why Did Moses Have a Sister?” Structuralist Interpretations o f Biblical Myth, 1983, 33-67; P. Trible, God and 928
Moabe
the Rhetoric ofSexualitv, 1978,22; idem, “Bringing Miriam out of the Shadows”, BibRev 5.1, 1989, 14-25, 34. Joyce Baldwin Miséria
# 7650 ($ãrà I, miséria, angústia, aflição, transtorno)
Mistério
# 6676 ( 'mq I, ser profundo, misterioso, aprofundar)
Mistura -> # 6850 ( 'êreb II, mistura, povo misturado)
Moabe
Moabe (3NÍD fmó ab], Moabe, moabita, # 4566).
OMA 1. Em sua esteia comemorando a consagração de um lugar alto para seu deus Quemos (Smelik, 69) encontrada na cidade bíblica de Dibom, Mesa. filho de Quemos-Iate, rei de Moabe, relata como sua divindade nacional o conduziu à vitória sobre os inimigos. Cita em particular o nome de “Onri, rei de Israel” e “seu filho” entre aqueles que ofenderam Moabe a assim, provocaram a ira de Quemos. Em sinal de desprezo, Mesa não cita o nome do filho de Onri, mas, ao que parece, esse filho (ou seja, descendente) era o neto de Onri, Jeorão = Jorão (Smelik, 81; cf. AL4/2:174)e não seu filho Acabe (W. F. Albright, ANET, 320). A tribo israelita de Gade, que havia habitado a terra de Atarote desde a antigüidade, é citada pelo nome (cf. Nm 32.34). Mesa relata ainda como tomou da cidade de Nebo certos utensílios pertencentes a Javé, a divindade nacional de Israel, e os colocou no santuário de adoração a Quemos. Judá, o reino do Sul, não é mencionada, mas Lemaire (1994) sugeriu que o texto fosse restaurado como “casa de Davi” (bt[djwd) num contexto entrecortado, que faz sentido em termos paleográficos, contextuais e históricos. Entre as traduções da inscrição de Mesa estão: ANET, 320-21; KAI, 168-69; TSSI 1:75-77; Lemaire, 33; Smelik, 63-66; Van Zyl, 189-92. Lemaire prometeu uma editio princeps para breve. 2. Inscrições reais neo-assírias de Tiglate-Pileser III (ANET, 282; Timm, 303-20), Sargão II (ANET, 287; Timm, 334-45), Senaqueribe (Timm, 346-59), Esaradom (ANET, 291; Timm, 360-70) e Assurbanípal (ANET, 294, 298, 301; Timm, 371-96) citam os moabitas juntamente com outros povos do interior da Asia. O rei moabita Shalamãn (= acad. Salamanu) é mencionado no mesmo contexto que Jeoacaz, rei de Judá (ANET, 282; Timm, 312) e o rei moabita Mururi é citado com o Manassés, rei de Judá (ANET, 291; Timm, 361). Apesar de alguns estudiosos haverem identificado o acad. Salamanu com Salamã que destruiu Bete-Arbel em Oséias 10.14 (Van Zyl, 23-24), outros expressaram cepticismo em relação a isso (Timm, 318-20). AT 1. De acordo com Gênesis 19.30-38, Moabe é filho da filha mais velha de Lóe do pai, embriagado, com ela. A história mostra que Israel considerava os moabitas como parentes, mas, ao mesmo tempo, olhava-os com desdém em função de suas origens incestuosas. Apesar de o TM não apresentar nenhuma etimologia popular para Moabe, esta pode ser encontrada na LXX, que explica o significado do termo como “de meu pai”, ek tou patros mou, inter pretando mô ’ãh como um termo composto pelo acréscimo da prep. m-, de, ao subst., ’ãb, pai. E possível que essa interpretação seja reflexo de um texto heb. e não de uma exegese do tradutor da LXX. Porém, tal interpretação retrovertida seria então secundária, refletindo a exegese antiga. 929
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2. No cântico de Moisés (->), comemorando o livramento de Israel do exército egípcio no mar Vermelho pelas mãos do Senhor, o poeta retrata a reação de medo despertado entre as nações, inclusive os “poderosos de Moabe” (Ex 15.15). 3. Uma vez que Israel derrotou o rei amorita Seom, o qual, por sua vez, havia derrota do os moabitas, Moabe tinha bons motivos para temer os israelitas (Nm 21.23-31). Em decor rência disso, o rei moabita Balaque fez um acordo com os midianitas e contratou Balaão (->) para amaldiçoar Israel. Numa série de oráculos proféticos, Balaão pronuncia uma bênção sobre Israel e maldições sobre Moabe (Nm 22— 24)! Balaão profetiza especificamente sobre uma figura real, chamada metaforicamente de “estrela” e “cetro” de Jacó/Israel, que aniquilaria militarmente os moabitas (24.17). 4. Enquanto estavam em Sitim, homens israelitas participaram da adoração a Baal-Peor, juntamente com mulheres moabitas, do que aparentemente fazia parte a imoralidade sexual (Nm 25.1 -3). Em decorrência disso, a ira do Senhor se inflamou contra Israel e 24 mil pessoas morreram por causa de uma praga (25.9). Balaão foi parcialmente responsável por esse epi sódio e acabou pagando com a própria vida pelo envolvimento dele (31.8, 16; cf. Judas 11). O centro cultuai de Bete-Peor e a adoração de Baal-Peor tomaram-se símbolos de apostasia religiosa para as gerações vindouras (Dt 4.3-4; Js 22.17; SI 106.28; Os 9.10). Ironicamente, o terceiro oráculo de Balaão e os outros subseqüentes foram pronunciados do alto do monte Peor (Nm 23.28). 5. De acordo com a lei, por causa de seus pecados de ódio contra Israel, os moabitas e amonitas deviam ser excluídos da assembléia do Senhor (Dt 23.3-6 [4-7]; cf. Ne 13.1). 6. Moisés morreu e foi sepultado em Moabe (Dt 34.5-6). 7. Josué 13.8-32 descreve a divisão da terra a leste do rio Jordão designada por Moi sés nas campinas de Moabe para as tribos de Manassés, Rúben e Gade. O termo “campinas de Moabe” (v. 32; Nm 22.1) “referia-se à parte sudeste do vale do Jordão mesmo quando a região não se encontrava mais sob o domínio de Moabe” (Liver, 17). 8. Em Juizes, a história do libertador Eúde e do rei moabita Eglom (Jz 3.12-30) serve de exemplo para o ciclo de pecado de Israel (v. 12), seguido de seu conseqüente julgamento e opressão por uma nação estrangeira (vv. 12-14), seu arrependimento (v. 15) e subseqüente libertação (vv. 15-30). No tempo de Jefté, Israel deixaria o Senhor outra vez para adorar os deuses de Moabe juntamente com os deuses de outras nações (10.6), atraindo sobre si o jul gamento divino. 9. Em Samuel, Moabe aparece em listas que apresentam um resumo dos inimigos de Israel (1 Sm 14.47; 2Sm 8.2, 11-12). E, no entanto, numa ocasião em que Saul tramava matálo, Davi pediu refúgio para os pais ao rei de Moabe (1 Sm 22.3-4). 10. Dentro dos propósitos dos livros dc Reis de demonstrar que a destruição de Israel e o exílio de Judá foram conseqüência dos pecados do povo e de seus reis, o escritor relata como Salomão casou-se com mulheres moabitas e, depois disso, construiu um lugar alto para o seu deus Quemos nas imediações de Jerusalém (IRs 11.1, 7). No tempo do reavivamento promovido por Josias, esse lugar foi chamado de “monte da Corrupção” (har-hammashit; 2Rs 23.13). Quando Mesa, rei de Moabe, deixou de pagar tributo a Israel, Jorão (= Jeorão) de Israel entrou em aliança com Josafá, rei de Judá e lutou contra o rei moabita (2Rs 3.4-27). O escritor descreve a barbárie do rei de Moabe ao registrar que este sacrificou o próprio filho na muralha da cidade numa tentativa de obter o favor de seu deus (v. 27). 11. Na obra do cronista, a guerra contra Moabe serve de oportunidade para descrever a reação ao mesmo tempo receosa e piedosa do rei Josafá de Judá diante da aproximação dos exércitos inimigos, ao voltar-se para Deus em oração (2 Crônicas 20). A resposta do Senhor — 930
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uma palavra de encorajamento — foi dada por intermédio do levita Jaaziel, filho de Zacarias: “Não temais, nem vos assusteis por causa dessa grande multidão, pois a peleja não é vossa, mas de Deus” (v. 15). Na opinião de Van Zyl (19-20), 2 Crônicas 20 descreve acontecimentos que ocorreram depois daqueles apresentados em 2 Reis 3.4-27. 12. Moabe ocupa uma posição de destaque nos oráculos proféticos de julgamento contra as nações, sendo considerada uma inimiga que se aproveitou de Israel e zombou dos israelitas quando estes se encontravam aflitos (Is 15— 16; Am 2.1-3; Jr48; cf. Nm 21.27-30; Ez 25.8-11; Sf 2.8-11). Os pecados pelos quais Moabe foi julgada por Deus foram orgulho, presunção, in solência, arrogância, altivez (Is 16.6; Jr 48.29-30), falsas práticas religiosas envolvendo lugares altos, falsa confiança em Quemos (Jr 48.13 e 35), rebeldia contra o Senhor (Jr 48.42), insultos e escárnio contra o povo de Deus e ameaças contra a terra de Deus (Sf 2.8, 10; cf. Ez 25.8). O “povo de Quemos” (Jr 48.46; cf. Nm 21.29) seria castigado. Sem dúvida há julgamento reser vado para todos os inimigos de Deus e de seu povo. Somente Jeremias expressa uma esperança de que um dia Moabe seria restaurada — não por Quemos, mas por Javé (Jr 48.47). 13. No apocalipse de Isaías, Moabe aparece sozinha, representado as nações altivas e hostis contra Deus, aniquiladas na vitória final so Senhor (Is 25.10). A emenda sugerida de “Moabe” (mw ’b) para “inimigo” ( 'wyb), encontrada em BHK, não foi repetida em BHS e não conta com o apoio dos comentaristas mais recentes. Essa menção isolada pode ser um reflexo da profecia de Números 24.17. 14. De acordo com o livro de Rute, os habitantes de Judá tinham liberdade de ir a Moa be, e os moabitas podiam ir a Judá, refletindo tempos de uma relação amigável. Rute era uma moabita que aparece na linhagem do rei Davi (Rt 4.16-21; Mt 1.5). Sua conversão ao culto a Javé (“o teu Deus é o meu Deus”, Rt 1.16) legitimou sua inclusão no povo de Deus e na linha gem real. (-> Rute: Teologia) 15. Num lamento comunitário ocasionado por uma humilhação nacional de Israel numa derrota militar, Moabe é descrita como uma “bacia de lavar” na qual a futura Israel vitoriosa lavaria os pés (SI 60.8 [10]; cf. 108.9 [10]). Essa metáfora retrata a humilhação e vassalagem de Moabe diante de Israel, o que só poderia se concretizar com a ajuda do Senhor. 16. Na literatura do período após o exílio, os moabitas exemplificam povos vizinhos com falsas religiões capazes de fazer a Israel restaurada desviar-se por meio dos casamentos mistos (Ed 9.1). O contato com eles, principalmente por meio desse tipo de casamento, e a conseqüente inclusão dos cônjuges na assembléia do povo de Deus, devia ser evitado em obe diência estrita à lei (Ne 13.1; cf. Dt 23.3-6 [4-7]). Apesar de Moabe não existir mais como nação distinta (Van Zyl, 157-58; Rosner, 207-9,225), continuou servindo de paradigma para a situação daquele momento e como lembrança das transgressões passadas e do respectivo jul gamento. O povo de Deus não deve misturar-se por meio do casamento com aqueles que se dedicam a falsas religiões. 17. Na literatura apocalíptica, quando o rei iníquo do Norte (Antíoco Epifano ou o Anticristo) vier à “terra gloriosa” (ou seja, Israel), muitas cidades ou habitantes sucumbirão, mas Moabe escapará, juntamente com Edom e a elite de Amom (Dn 11.41). Moabe, Edom e Amom são citadas como as inimigas tradicionais de Israel que escapam ao colaborarem com o tirano perverso, ou ainda, como lugares para onde os refugiados israelitas vão buscar asilo como fizeram no tempo da destruição pela Babilônia (cf. Jr 40.11-12). P-B 1 .0 texto heb. de Eclesiástico 36.12 diz hsbt r's p ’ty mw ’b, “dai fim aos cabeças dos templos (ou seja, príncipes) de Moabe”, fazendo lembrar Números 24.17 (cf. Jr 48.45). B. G. Wright (No Small Difference, Sirach s Relatiomhip to Its Hebrew Parent Text, Septuagint and 931
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Cognate Studies, 26, 1989, 171) considera a ver heb. mw'b, Moabe, uma harmonização pos terior ao texto bíblico de Números 24.17, no lugar do original 'wyb, inimigo, atestado numa versão marginal em heb. e no grego. 2. Na LQ, Números 24.17 é considerado uma profecia messiânica (4QTestim 12-13; cf. 1 QM 11.6) (1QM 1.1). Em decorrência disso, Moabe aparece entre os filhos das trevas que constituem o exército de Belial, contra o qual os filhos da luz guerreiam (1QM 1.1). Em 4QFlor 1.4, os moabitas são agrupados com os amonitas, os bastardos e outros indivíduos indesejáveis a serem excluídos da assembléia de Deus, numa alusão a Deuteronômio 23.2-5. 3. No NT, Jesus como “a brilhante Estrela da manhã” (Ap 22.16) pode ser uma refe rência a Números 24.17 (cf. Mt 2.2). B ib l io g r a f ia
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# 3221 ((hn, moer) # 8947 (sulhãn, mesa) # 7781 (q(n, ser pequeno, insignificante)
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Moisés (HWb [mõseh], # 5407).
Moisés foi o homem escolhido por Deus para ser o líder dos hebreus na libertação de les da escravidão do Egito; Moisés passou com eles pela península do Sinai e, por fim, chegou à fronteira da terra prometida. Como fundador da religião de Israel, sem dúvida Moisés é a figura mais importante do AT. 1. Nome. Êxodo 2.10 afirma que Moisés recebeu esse nome pois “das águas [eu, a filha de Faraó] o tirei'. Alguns estudiosos argumentam que mõseh corresponde ao vb. egípcio msi. 932
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gerar, dar à luz, ou ao subs. ms, criança. Semelhantemente, outros supõem que mõseh é uma forma hipocorística de um nome teóforo (p. ex., har-mose, Hórus nasceu), no qual o elemen to divino é eliminado, talvez por motivos monoteístas. O fato de o nome de Moisés aparecer em nada menos do que dois textos egípcios originários da XIX dinastia (século XIII a. C.) dá ainda mais apoio a essa idéia (A. Gardiner, 268-69,277). Apesar de ser perfeitamente possível que o nome Moisés venha de um radical egípcio, no texto de Êxodo, a etimologia apresentada é mostrada como uma paronomásia com o vb. msh, retirar (# 5406). O fato de o nome mõseh ser formalmente um part. ativo (“aquele que tira”), enquanto Moisés é o objeto desse ato (por ter sido “tirado das águas”) não representa dificuldade alguma, tendo-se em vista que o escritor não estava procurando criar uma correspondência perfeita entre o nome e a ação. 2. Historicidade. a. Há diversas discussões acadêmicas sobre o caráter histórico Moisés. Por um lado, alguns afirmam que as tradições do Pent. com referência a Moisés são inteiramente fictícias. Entre os representantes dessa posição extrema estão Martin Noth e John Van Seters. Noth, por exemplo, afirmou que a figura de Moisés no Pent. serve apenas como um elo literário que une as tradições do Pent., as quais, a princípio eram díspares e independentes (Pentateuchal Traditions). Nessa mesma linha, Van Seters argumenta que “a busca pelo Moisés histórico é um exercício inútil” (Encyclopedia o f Religion, 10:116) devido ao fato de as supostas fontes literárias J e S (que fornecem as tradições mosaicas) terem sido escritas posteriormente e, juntas, terem formado a introdução para a história deut. do tempo do exílio (Deuteronômio — 2 Reis). Por outro lado, há aqueles que argumentam que as tradições mosaicas essenciais sejam impecáveis (Harrison, Kitchen). Entre esses dois pólos, encontra-se a visão intermediária de que Moisés foi um indivíduo que, de uma forma ou de outra, representou um papel central no nascimento de Israel como nação (Widengren, Coats, Bright). O argumento mais forte contra a historicidade de Moisés diz respeito à escassez de re ferências a ele no AT. Em resposta a isso, é essencial colocar que, em primeiro lugar, Moisés é citado em textos anteriores ao exílio (p. ex., Os 12.13 [14]; Mq 6.4). Em segundo lugar, o fato de Moisés ser mencionado com pouca freqüência em textos antes do exílio certamente está de acordo com a tendência pronunciada do AT de ressaltar os atos salvíficos de Javé e não os personagens envolvidos. Na verdade, até mesmo em Deuteronômio, um “discurso” de Moisés, pode-se encontrar 2 1 casos em que o texto afirma, com variações, que “o Senhor” tirou (ys ’ [hi.];-> # 3655) o povo do Egito; somente em Deuteronômio 9.12, Moisés é o sujeito. Os argumentos mais convincentes em favor da historicidade de Moisés são provenientes das descobertas arqueológicas. Bright (seguindo Albright) demonstrou que todas as tradições bíblicas mais importantes para a vida de Moisés — a escravidão dos hebreus no Egito, o êxo do e o povo vagando pelo deserto — têm apoio arqueológico. Com referência à escravidão no Egito, pode-se dizer, em primeiro lugar, que os nomes egípcios mais comuns no começo de Is rael, como Moisés, Hofni, Finéias, Merari e, possivelmente, Arão e outros indicam uma relação com o Egito. Em segundo lugar, no final do segundo milênio centenas de palavras scmíticas foram incorporadas à língua egípcia, enquanto os deuses cananeus passaram a fazer parte do âmbito religioso daquele país. Em terceiro lugar, do século XV em diante, tem-se a presença dos 'apiru no Egito. Trata-se de um grupo que viveu à margem das estruturas sociais por toda a parte ocidental da Ásia do fim do terceiro ao fim do segundo milênio. Apesar de não ser o caso de determinar uma correlação direta entre os hebreus ( ‘ibri) e os 'apiru, a correspondên cia lingüística entre esses dois termos é impressionante, como também a realidade sociológica de que ambos eram povos sem terras. Por fim, de acordo com Êxodo 1.11, os hebreus partici param da construção de Ramsés, que foi concluída na mesma época em que os programas de construção de Setos I e Ramsés II nos séculos XIV e XIII. 933
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Apesar de não haver nenhuma evidência extrabíblica do êxodo e poucos dados sobre as jornadas pelo deserto, o fato de os poemas mais antigos do AT se referirem a essas tradições in dica sua confiabilidade. O “Cântico do Mar” (ver abaixo) em Êxodo 15.1b-18, datado do século XII pela escola de Albright, refere-se à travessia do Mar de Juncos (vv. 3-10) e, com respeito à Deus, fala da “habitação da tua santidade” (v. 13), do “monte da [sua] herança” (v. 17), ou seja, o Sinai. O “Cântico de Débora”, em Juizes 5, costuma ser datado da segunda metade do século XII e faz referência ao Sinai (vv. 4-5) e, possivelmente, à conquista da terra prometida (v. 19). Outros poemas antigos relacionados estão em Números 23— 24; Deuteronômio 33; Salmos 68 e Habacuque 3.3-6. Referem-se aos principais acontecimentos na vida de Moisés e de Israel, sendo razoável concluir-se que Israel estava “comemorando todo esse panorama como herança comum no máximo um século depois da ocorrência dos acontecimentos” (E. J. Campbell, 144). É claro que tudo isso confirma necessariamente o caráter histórico do relato bíblico sobre Moisés, mas, sem dúvida, demonstra que as tradições bíblicas referentes a ele são uma parte antiga e integrante da religião de Israel. A conhecida conclusão de Bright com respeito a esse assunto é bastante apropriada: “Os acontecimentos do êxodo e do Sinai exigem a presença de uma grande personalidade por trás deles. Também é certo que uma fé tão singular quanto a de Israel requeira um fundador, como foi o caso do cristianismo ou mesmo do islamismo. Negar esse papel de Moisés nos obrigaria a propor uma outra pessoa com o mesmo nome!” (J. Bright, 127). b. O Cântico do Mar. Quase todos os aspectos dessa canção extraordinária (Êx 15.1-1 já foram motivo de grande controvérsia. Argumentos convincentes foram aduzidos para apoiar uma data mais antiga, i.e, o século XIII ou XII também sendo apresentados contra-argumentos para apoiar uma data bem mais recente, ou seja, o tempo da monarquia ou o período após o exílio (Brenner, 3-21). Além disso, os estudos sobre a forma literária do cântico levaram a identificá-lo como um hino, um salmo de entronização, um salmo de ação de graças ou de vi tória, uma litania, uma ode de triunfo, um cântico de entrada processional ou uma combinação de formas como, por exemplo, um poema de ação de graças e louvor. Ademais, não faltam teorias sobre a pré-história do cântico. Nos últimos tempos, tem-se tomado popular a idéia de que se trata de um cântico de Miriã que posteriormente foi atribuído a Moisés (P. Trible). Ao mesmo tempo em que análises importantes da poesia e da metáfora do cântico lhe esclarece ram o significado, também contribuíram para as discussões sobre sua pré-história e data (ou seja, M. Howell). Mais uma vez, não faltam teorias sobre o Sitz im Leben (contexto) do poe ma, ou seja, sua possível relação com a Páscoa, com os festivais associados à entronização, ao outono ou ao Ano Novo ou, uma idéia ainda mais convincente, à vida de adoração coletiva de Israel. No entanto, contrastando com esses vários aspectos controversos do poema, encontrase a clara relevância teológica do cântico para a história de Israel e para a continuidade da vida da comunidade da fé. i. O conteúdo do cântico. Ele é apresentado como o cântico que Moisés e os israeli entoaram a Javé e começa com uma declaração de louvor: “Cantarei ao Senhor” (Êx 15 .1). Em seguida, o poeta trabalha em detalhes os motivos de seu louvor ao Senhor, o Senhor guerreiro, o seu Deus e o Deus de seus pais (vv. 2-3). O Senhor é a força, o cântico e a salvação do poeta (v. 2). É um Deus que opera maravilhas incomparáveis, majestoso em sua santidade, terrível em glória (v. 11). Deus é o rei que ama, redime, guia e planta seu povo (vv. 13, 16-17) e que reina para todo o sempre (v. 18). A primeira seção do cântico (Êx 15.1 b-12) concentra-se no ato magnífico de Javé ao re dimir Israel do Egito, motivando os hebreus a louvá-lo. O livramento é descrito minuciosamente: 934
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O cavalo c seu cavaleiro (v. 1), os carros de Faraó e seu exército foram lançados ao mar (v. 4); os melhores oficiais de Faraó se afogaram (v. 4); as águas profundas os cobriram e afundaram como pedra e chumbo (vv. 5,10), a terra os engoliu (v. 12); o inimigo foi despedaçado, derribado e consumido (vv. 6-7); as águas se amontoaram, permaneceram firmes como uma muralha e coalharam no coração do mar (v. 8). Apesar de ficar claro que a intenção do poeta é descrever o acontecimento maravilhoso em si, ele vai além da descrição, passando a um louvor declarativo ao concentrar-se repetidamente no caráter daquele que realizou tão grande livramento no mar (vv. 1,2, 3,6, 7, 11,12). As palavras do inimigo jactancioso e egoísta (v. 9) contrastam com as palavras do poeta, cujo enfoque é exclusivamente Javé, o guerreiro vitorioso (vv. 3,6-7, 11). A segunda seção (vv. 13-18) vai além do acontecimento no mar, ainda que, pela escolha das palavras, este acontecimento seja interpretado como um ato de redenção (Childs, 251). Os novos inimigos serão aterrorizados e, pelo braço poderoso que derrotou os egípcios, também se emudecerão como pedra (vv. 15-16). O povo de Javé será plantado no monte da herança de Deus, sua habitação e seu santuário (v. 17). O hino de louvor se encerra com a declaração do reinado eterno do Senhor (v. 18). Como antes, o poeta menciona tanto os atos do Senhor como seus atributos dignos de louvor (ou seja, o amor inabalável, a força, o poder e o reino eterno). Além disso, como observou Childs, a conclusão do poema não define o papel de Israel na terra, mas reflete sobre a função de Israel como comunidade de adoradores e, possivelmente, indica um contexto litúrgico na composição do poema (Childs, 252; cf. a tese de Brenner de que os filhos de Asafe foram responsáveis pela autoria do poema, Brenner, 177-89). ii. Relevância teológica. A posição do cântico no livro de Êxodo fornece uma chav importante para a interpretação do cântico. Conforme Childs observou, o cabeçalho em Êxodo 15.1a tem a função de unir o poema à narrativa que o precede, que se encerra com o comen tário de que o povo “temeu ao Senhor e confiou no Senhor”. Childs argumenta corretamente que “na seqüência, o poema proporciona a resposta de fé da parte do povo que experimentou no mar a redenção das mãos dos egípcios... O povo remido irrompe em louvor Aquele que fez e continua a fazer grandes coisas por ele” (Childs, 248-49). Com referência a esse louvor, Childs explica: “Sem dúvida a linguagem do louvor jubiloso é um componente fundamental dos redimidos” (Childs, 238). O cântico de Moisés serviu de modelo para uma resposta de fé aos grandes atos de redenção de Deus e pode estar por trás de narrativas históricas como os Salmos 78, 105, 106 e outras referências ao acontecimento no mar(ou seja. Is 51.9-11; 63.11-19; SI 77.15-20). O cântico é mencionado especificamente em Apocalipse 15.3, em que essa ocorrência é sem dú vida alguma subjacente à visão do mar de vidro e da vitória iminente sobre o inimigo (a besta, sua imagem e o número de seu nome são assemelhados aos egípcios). Paralelos entre esses dois cânticos ficam evidentes quando aqueles que vencem a besta cantam a grandeza dos feitos do Senhor, seu reino eterno e seu caráter incomparável. A reação de angústia, terror e medo outrora despertada nas nações toma-se uma atitude de temor reverente, culto e adoração (Êx 15.14-16; Ap 15.4). Além disso, Êxodo 15 apresenta um contraste entre Israel e as nações. Por um lado, as nações são descritas como completamente paralisadas de medo do poder de Javé (Durham, 208). Israel, por outro lado, tem um relacionamento especial com Deus. É uma nação redimi da, amada, conduzida, guiada, levada para dentro e plantada. No entanto, o relacionamento de Israel com Javé não era merecido; antes, era um ato da graça de Deus. Mas a contrapartida ju bilosa de louvor pela redenção não duraria para sempre. Na verdade, a história de Israel atesta a necessidade de um novo êxodo, de uma nova aliança, de uma liberdade duradoura da escravidão do pecado e da morte, que foram supridos na cruz e na ressurreição de Jesus (Hb 8.7-13). 935
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A correspondência de Israel à sua redenção concentra-se de modo visível exclusivamen te em Javé. Assim como muitos outros hinos de louvor e ação de graças no AT, Javé é tanto o sujeito quanto o objeto da adoração do profeta. E evidente que não se faz nenhuma menção do papel que Moisés ou os israelitas tiveram na derrota do Egito ou na conquista e colonização da terra. Trata-se de um contraste gritante com os cânticos de vitoria do OMA, que glorificavam os líderes humanos como os vencedores (Cassuto, 173; Sarna, 113). Sem dúvida, como sugeriu Durgam, é o enfoque do poema exclusivamente em Javé que lhe confere uniformidade teoló gica; o poema de Êxodo 15 “consiste mais numa celebração de Javé e do tipo de Deus que ele é do que numa celebração de tudo aquilo que Javé fez no mar e ainda faria posteriormente... celebra Javé presente com seu povo e fazendo por ele o que deus algum, em parte alguma e em momento algum, teria o poder de estar presente para fazer. Como tal, o poema é uma espécie de resumo da base teológica de todo o livro de Êxodo” (Durham, 210). A estrutura narrativa do poema também lhe dá um contexto histórico definido. No en tanto, o poema em si possui uma qualidade atemporal, uma vez que “os acontecimento que são louvados estendem-se em direção ao futuro, muito além do tempo de Moisés... o Deus que atuou na história de Israel é o mesmo que está e continuará ativo” (Childs, 249). Ademais, a ênfase do cântico sobre o caráter do Deus que resgata, ama, guia e planta, permite que gerações sucessivas de redimidos se identifiquem com o poeta e entrem no espírito de adoração à medida que Javé é louvado não apenas por aquilo que fez e fará, mas também por quem ele é. Assim, o poema continua trazendo esperança para os oprimidos, conforto para os aflitos, alegria para os abatidos e fé renovada para aqueles que precisam ser lembrados que Deus entrou na história humana e redimiu seu povo, por intermédio do qual todas as nações serão abençoadas. 3. A vida, o trabalho e o ministério de Moisés, a. Infância e juventude. A história nascimento de Moisés numa família levita é marcada pelo suspense e pela ironia dramática quando a filha do mesmo Faraó que havia decretado que todo bebê hebreu do sexo masculino fosse lançado no Nilo salvou um menino hebreu dos juncos na margem desse rio. A ironia se intensifica quando essa princesa aceita a oferta da irmã de Moisés, a menina que vinha obser vando tudo à distância, de encontrar uma ama para o bebê choroso. Assim, a mãe de Moisés foi paga pela princesa para criar o próprio filho até que ele fosse desmamado, quando se tor nou então filho da filha de Faraó. Desse modo, o resgate de Moisés se deveu à compaixão e sabedoria das mulheres (cf. as parteiras em Êx 1.15-21). Os temas entretecidos de violência, opressão, compaixão e misericórdia que iniciam a história de Moisés, são repetidos nas narra tivas dobre ele no Pent. (G. W. Coats, 1971, 170-81). O AT se cala quanto à infância e juventude de Moisés na corte egípcia, apesar da rele vância delas na preparação de Moisés para sua futura vocação ser indiscutível (cf. At 7.22). Na cena seguinte da vida de Moisés (Êx 2.11-22), ele se desloca de uma posição de poder no Egito, na qual observa com empatia a situação oprimida de seu povo, para uma po sição de impotência como fugitivo longe de casa e pastor apascentando os rebanhos de seu sogro midianita que lhe oferece um novo lar. Nessas duas histórias, Moisés é retratado como defensor dos oprimidos: primeiro, quando mata o egípcio que estava espancando outro hebreu e, depois, como um defensor “egípcio” dos oprimidos quando salva sete mulheres midianitas das mãos de alguns pastores. A relevância teológica desses dois episódios relacionados é extremamente controver sa. Por um lado, a tentativa de Moisés de libertar seu compatriota hebreu ao matar o opressor egípcio recebe uma avaliação positiva. Calvino, por exemplo, segue a interpretação do NT para esse incidente e escreve: “Armado da ordem de Deus e ciente de sua legítima vocação, assumiu correta e judiciosamente o caráter que Deus lhe havia determinado” (citado em Childs, 40). 936
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Em tempos mais recentes, Coats sugeriu que Moisés, o defensor dos oprimidos, o líder que se identifica com as necessidades do povo, serve de modelo para o ministério pastoral (Co ats, 1993, 104-14). Por outro lado, vários intérpretes, como Agostinho, levantam a questão da autoridade de Moisés para matar o egípcio e enfatizam o caráter humano dele, interpretando o homicídio como um ato de violência irado, impetuoso e imprudente (Childs, 41). Daí, Von Rad escrever: “Essa erupção descontrolada de furor não serve para colocar em andamento a libertação de Israel do Egito. Trata-se de um ato violento de um homem que ainda não havia ouvido o chamado de Deus” (G. von Rad, II). A relevância teológica desses incidentes é complicada pelo fato de que o testemunho do NT ao episódio em que Moisés mata o egípcio apresenta perspectivas bastante diversas sobre a história do AT (At 7.23-29,35; Hb II .24-28). Childs observa que o testemunho bíblico da vida de fé é ressaltado quando a história do êxodo e o testemunho do NT são colocados lado a lado em Hebreus 11.24-28. Hebreus retrata o ato de Moisés como sendo de orientação escatológica, enquanto Êxodo dá relevância ao presente, ao “ato abnegado... obscurecido rapidamente pela violência”. Assim, “a fé como esperança escatológica, a fé como uma contrapartida no pre sente” e a fé “como uma decisão clara de compromisso e confiança e a fé como ação confusa rumando para a obediência em meio à complexidade de diversas alternativas” dão testemu nho da natureza bilateral da fé bíblica (Childs, 42-43). Ultimamente, esse episódio da vida de Moisés tem sido considerado um recurso para abrir uma discussão sobre a questão de se usar a violência como um instrumento de transformação social. Em oposição a tal interpretação, Childs argumenta energicamente que as ambigüidades do ato de violência de Moisés (ou seja, o sigilo do ato de justiça de Moisés, a reação negativa ao seu comportamento por parte de seu compatriota hebreu e o resultado final desse ato) indicam que esse texto não dá uma resposta clara para o problema de se usar a violência com a finalidade de realizar transformações so ciais, apesar de levantar o tipo de pergunta que precisa ser feito ao se tomar decisões morais como essas (Childs, 45-46). b. O chamado de Moisés: dc pastor a libertador. A história do chamado de Moisés co bina o comum com o extraordinário. Enquanto estava cuidando das ovelhas do sogro, deparouse com uma teofania — uma sarça ardente que não era consumida — e recebeu o chamado de Deus (Êx 3.1-10). Porém, em sua aparente relutância em deixar para trás a antiga vida de pastoreio e dar início a uma nova vida como libertador, Moisés apresentou quatro objeções. A primeira objeção (3.11) reflete sua sensação de inadequação pessoal, constituindo uma reação típica daqueles que ouviram o chamado de Deus no AT (Jz 6.15; 1Sm 9.21; Jr 1.6). A respos ta de Deus — a promessa de sua presença e um sinal que é selado com um juramento de que Moisés voltará com o povo para adorar naquele mesmo monte (Êx 3.12) — confirma que o chamado de Moisés não depende de sua própria capacidade, mas sim de sua disposição dc ser usado no plano divino de libertação. A segunda objeção questiona a identidade e a intenção do Deus que está enviando Moi sés para libertar os israelitas. A réplica enigmática de Deus, “Eu sou o que sou”, um trocadi lho com o nome divino ( ’ehyeh ’aser ’ehyeh) é uma resposta e, possivelmente, também uma recusa em responder (Êx 3.14). Proclama que a intenção de Deus será revelada em seus atos futuros, os quais ele realizará por intermédio de seu mensageiro, Moisés, ao qual Deus revelou seu nome eterno (Childs, Exodus, 76). A terceira objeção de Moisés, de que o povo não acreditaria nele nem lhe daria ouvidos (Êx 4.1), é refutada com os sinais da vara/serpente, da mão leprosa e da transformação de água em sangue, que têm por finalidade convencer Moisés, os israelitas e os egípcios da comissão divina de Moisés. 937
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A última e desesperada objeção de Moisés, na qual ele volta a levantar a questão de suas qualificações pessoais e seu pedido subseqüente para que Deus envie uma outra pessoa suscitam tanto a ira quanto a compaixão de Deus quando ele cede à sensação de inadequação de Moisés quanto à capacidade de falar e designa Arão para ser o porta-voz de Moisés. Por fim, Moisés aceita a missão como mensageiro divino de libertação. Como os primeiros exegetas judeus reconheceram, o tempo que Moisés passou cuidan do das ovelhas do sogro foi uma preparação para sua verdadeira missão (Childs, 84). Von Rad também levanta a questão da providência divina com a sugestão de que “um ato imprudente de violência que abateu o egípcio (Ex 2.11-12), encaixou-se de modo estranho no propósito providencial de Deus, uma vez que foi no asilo na terra de Midiã que o chamado de Deus veio a Moisés” (von Rad, 18). No entanto, o aspecto mais relevante da narrativa do chamado de Moisés concentra-se na revelação de Deus a ele como o Deus que havia-se dado a conhecer aos patriarcas no passado e que, então, estava prometendo sua presença a Moisés e também a libertação do povo cujos clamores ele havia ouvido (-> Javé). Além disso, a revelação do ser divino encontra-se inextrincavelmente associada à expectativa da resposta do homem. Nas pa lavras de Childs: “A revelação não consiste em informações sobre Deus e seu natureza, mas num convite para crer naquele cuja manifestação de si mesmo é um antegozo da herança pro metida. Para a comunidade da fé, o futuro não é um salto no escuro, pois Aquele que há de vir acompanha os fiéis até esse fim” (Childs, 89; ver N. Sama). Essa narrativa também trata da questão da vocação. Em primeiro lugar, Deus chama as pessoas para o ministério para que realizem a vontade dele. Em segundo lugar, Deus espera que seus servos respondam a esse chamado apesar da própria sensação de inadequação pes soal nutrida por eles. Em terceiro lugar, Deus, na sua graça, responde às objeções legítimas e garante sua presença aos seus servos. c. A missão de Moisés como libertador. Acompanhado do irmão e com o respaldo d anciãos de Israel, Moisés deu início ao plano do Senhor para libertar os israelitas do sofrimento por que passavam (Ex 4.27-31). Porém, o primeiro pedido que Moisés apresenta a Faraó, de que Israel tenha permissão para sair, desencadeia uma disputa entre Javé e Faraó, a qual, por sua vez, leva a uma opressão ainda maior aos israelitas bem como à primeira das várias expe riências pelas quais Moisés ainda passaria de aparente fracasso e crítica (5.21). Moisés buscou o Senhor e recebeu garantias de que era, de fato, o plano de Deus conquistar a vitória final so bre Faraó, libertar os israelitas do jugo dos egípcios e dar aos israelitas a terra prometida aos antepassados deles (5.22—6.8). O ato divino de libertar os israelitas do Egito, que se tomou um paradigma de redenção tanto no AT quanto no NT, foi uma demonstração notória da graça soberana, onipotência e poder de Deus e a base sobre a qual a relação de aliança devia ser edificada (Êx 6.2-8; 19.3-6; cf. G. Vos, 124-37). Do plano faziam parte a confrontação de Faraó obstinado com sinais miraculo sos, prodígios e julgamento na forma de uma série de pragas cujo propósito era convencê-lo a libertar os israelitas (caps. 7— 11; -> Pragas). Porém, foi somente a décima praga, a morte dos primogênitos, que convenceu Faraó a permitir que os israelitas deixassem o Egito (cap. 12). No entanto, a vitória inicial não tardou a se deparar com a oposição quando Faraó mu dou de idéia e decidiu perseguir os fugitivos israelitas (Êx 14.5-31). Assustado, o povo cul pou Moisés novamente pelo perigo. Moisés respondeu com fé tranqüilizando os israelitas e instando-os a confiarem que, sem dúvida, o Senhor levaria a cabo a libertação prometida. Em seguida, o Senhor orientou Moisés a erguer a vara e estender as mãos sobre o mar de Junco, primeiro para dividir as águas a fim de que os israelitas pudessem atravessar por terra seca e, depois, para fazer as águas voltarem ao lugar, a fim de afogar o exército egípcio. Esse acon 938
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tecimento foi uma grande vitória do Senhor sobre Faraó e os egípcios (14.4, 17-18). Também foi uma lição para os israelitas, que responderam com temor ao Senhor e confiança tanto em Javé quanto em seu servo Moisés (14.31). A grande vitória de Deus no mar foi celebrada com cântico e dança (15.1-21). Os cânticos de Moisés e Miriã interpretam o acontecimento como uma vitória clara de Deus. O papel de Moisés nessa vitória foi simplesmente de servo do Senhor (ver acima, “Cântico do Mar”). No exercício do chamado para conduzir os israelitas para fora do Egito, Moisés mostra as qualidades de um líder forte e fiel. Assume prontamente o papel de mediador no confronto entre Javé e Faraó. Também é retratado como uma figura profética e um realizador de prodí gios, apesar de seu papel principal ter sido o de demonstrar o poder divino (ver a discussão de Childs sobre o uso do oráculo profético e o paralelo entre a confrontação de Moisés com Faraó e, posteriormente, a constante batalha entre profetas e reis [Childs, 105, 145-49]). Mas, apesar das qualidades extraordinárias, dos dons e da importância de Moisés, ele é descrito como uma figura extremamente humana, um homem que experimenta o fracasso, que sente raiva e desânimo. Sua maneira de lidar com essas experiências é exemplar: reconhece seus problemas, admite seus sentimentos, leva suas dificuldades e queixas para Deus, encontra nas promessas de Deus coragem e forças para tentar novamente e segue as instruções de Deus em obediência. Além disso, apesar de Moisés ser uma figura-chave na história do êxodo, é signi ficativo como ao longo de toda a narrativa a atenção concentra-se no Senhor, aquele que, com mão poderosa, é verdadeiramente capaz de salvar seu povo escolhido da opressão do Egito (Êx 12.42,51; 13.3, 14, 16). d. Do Egito ao Sinai. Apesar de Moisés ter-se mostrado um líder fiel e servo obediente de Deus, seus problemas ainda não haviam terminado. As dificuldades físicas da jornada do Egito levaram o povo a criticar Moisés e todo aquele empreendimento. De modo típico, Moi sés respondia às murmurações dos israelitas transmitindo as queixas deles a Deus, que, por sua vez, atendia à necessidade em questão (ou seja, a água amarga transformada em água doce [Êx 15.22-25]; a falta de alimento resolvida com a provisão do maná e das codomas [16.1-36] e a necessidade de água suprida ao ferir uma pedra para que desta jorrasse água [17.1-7]). Os israelitas também se depararam com inimigos militares. Na guerra contra os amalequitas, Moisés assumiu seu posto no alto de uma colina segurando a vara de Deus nas mãos enquanto Josué liderava o exército na batalha. Enquanto Moisés mantinha as mãos estendidas (tradicionalmente, uma posição de oração, apesar de, nesse caso, as mãos servirem de condu tores do poder divino de Javé, ver Childs, 316; J. I. Durham, 238), os israelitas predominavam na batalha. Mas quando Moisés abaixava as mãos, era o inimigo que predominava. Por fim, a vitória é atribuída a Javé (17.8-16). O relato da visita oportuna de Jetro, sogro de Moisés, revela mais uma vez o lado huma no do líder (sua recepção calorosa e o tempo que gastou conversando com Jetro, Êx 18.1-27). Também deixa claras as pesadas responsabilidades de Moisés como juiz, que tinha de arbitrar contendas, transmitir a vontade divina, ensinar as leis e decretos de Deus e representar o povo diante de Deus (18.1 -23). Porém, seguindo a sugestão de Jetro, Moisés delegou a maior parte de suas responsabilidades judiciais a líderes competentes, adjudicando somente os casos mais difíceis (18.24-26). Assim, as energias de Moisés foram poupadas e o povo ficou satisfeito. Esse episódio é um retrato vivido da verdade teológica de que a vontade de Deus pode ser comuni cada não apenas por meio de uma palavra divina dada a Moisés, mas também por intermédio da sabedoria e da experiência (ver Childs, 335-36). e. Moisés no monte Sinai. O relato das experiências de Israel no monte Sinai mostra Moi sés como o mediador entre o Deus santo e temível e Israel, um povo pecador e amedrontado. É 939
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em seu papel de mediador que Moisés transmite as palavras de Deus aos israelitas, que podem então entrar numa relação de aliança com o Senhor, prometendo obedecer as leis de Deus (Êx 19— 24). Contudo, quando Moisés passou quarenta dias e quarenta noites na montanha rece bendo mais instruções e as duas tábuas de pedra com as leis, liderados por Arão, os israelitas confeccionaram e adoraram um bezerro de ouro (Êx 24.25-32). Tanto Deus quanto Moisés se encolerizaram profundamente com esse episódio. Moisés expressou sua ira quebrando as tábuas gravadas e exercendo seu ofício legal aplicando o castigo (32.25-29). Porém, Moisés também assumiu o papel abnegado de intercessor de seu povo diante de um Deus ofendido, chegando até a oferecer sua própria vida como uma expiação pelo pecado dos israelitas (32.30-32). Em resposta à súplica de Moisés para que Deus lhe mostrasse a glória divina, o Senhor revelou seus atributos sublimes de misericórdia, graça, paciência e abundância de amor inabalável e confiabilidade (32.34— 34.9). Assim, Moisés recebeu a ordem de subir a montanha outra vez com duas tábuas de pedra a fim de receber as leis pactuais e renovar a aliança entre o Senhor e o povo. E em sua atribuição de mediador das leis divinas e da aliança e também de legislador que Moisés recebe maior reverência. O papel de Moisés como mediador da lei divina é prova de seu relacionamento singular e íntimo com Deus. O estabelecimento da Tenda da Congregação, na qual o Senhor falava com Moisés face a face, como um homem que fala a um amigo, e a revelação da glória de Deus a Moisés também são testemunhas da natureza especial do relacionamento de Deus com Moi sés (Êxodo 33). De fato, quando Moisés desceu da montanha com as tábuas, seu rosto estava tão radiante que assustava as pessoas e precisou ser coberto com um véu. Não fica claro qual seja o significado desse brilho divino em Moisés. O vb. qrn (-> # 7966; 34.29, 30, 35), um denom. do subs. qeren, chifre (-> # 7976), levou alguns a crerem que Moisés teve chifres (cf. a Vg.), apesar de ser maior a probabilidade de tratar-se de uma interpretação mais metafórica de qrn, relacionada a raios e símbolos de poder ou divindade (cf. Hc 3.4; 2Co 3.7-18; Childs, 604, 609-10). Porém, como Durham (467) sugere, a chave para se compreender o que ocorreu com o rosto de Moisés deve estar em Javé e não em Moisés que, a princípio, não se deu conta desse brilho. Assim, Durham (467) afirma que talvez o narrador “tivesse a intenção de indicar uma luz ou brilho separado da pessoa de Moisés, uma luz anexa e exterior que foi uma dádiva de Javé a Moisés, um sinal justamente de uma autoridade que lhe pertencia em virtude de sua comunhão especial com Javé”. Paulo interpretou o uso do véu como se Moisés não quisesse que as pessoas vissem sua glória desaparecendo (2Co 3.13). f. Do Sinai a Moabe. Moisés acampou com os israelitas durante quase um ano nas r dondezas do monte Sinai (Nm 10.11-12). Quando a marcha para a terra prometida finalmente continuou, Moisés voltou a ser confrontado com inúmeras reclamações sobre a jornada e sua liderança e teve que intervir quando a ira de Deus pesou sobre os israelitas (11.1 -3,4-15; 12.13; 14; 20.2-7; 21.4-7). Seu casamento e sua liderança, por exemplo, foram questionados por Arão e Miriã, mas a posição especial de Moisés como mediador e servo do Senhor e seu papel de interceder pelo povo e curá-lo também foi reafirmado (cap. 12). Ademais, a reação negativa de Israel ao relatório dos espias sobre a terra de Canaã, refletindo falta de fé nas promessas do Senhor e na liderança de Moisés, levou ao julgamento do Senhor, de acordo com o qual a geração que havia deixado o Egito não entraria na terra prometida, mas passaria quarenta anos vagando no deserto (13.17— 14.45). Outra rebelião sob a liderança dc Corá, Datã e Abirão (->) mostrou mais uma vez as lutas pelo poder dentro da comunidade da aliança (caps. 16— 17). Foi no contexto de mais um episódio de descontentamento que o próprio Moisés foi julgado por não seguir as instruções de Deus e que lhe foi negado o privilégio de levar os israelitas para dentro da terra prometida (20.12; 27.13-14; Dt 32.50-52). 940
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Depois de uma dentre várias vitórias militares, os israelitas voltaram a ficar impacien tes com a jornada e foram castigados com serpentes abrasadoras (Nm 21.1-9). Moisés res pondeu ao pedido do povo para que intercedesse em seu favor e confeccionou uma serpente de bronze que serviu de instrumento para o poder de cura divina, dando vida a qualquer um que tivesse sido picado (ver Coats, Moses Tradition, 139-40). Essa serpente pode ser con trastada com a serpente que provocou morte no jardim (Gênesis 3). Jesus comparou-se com a serpente em sua crucificação e ascensão e ao dar vida àqueles que olham para ele com fé (Jo 3.14; cf. 12.32). Não é de surpreender que Moisés muitas vezes sentisse que o fardo da liderança era excessivo. A consagração de setenta anciãos que receberam uma porção do Espírito que estava sobre Moisés marca uma experiência positiva no sentido de permitir que Moisés lidasse com o peso do povo e serve como mais um exemplo do estilo de liderança compartilhada de Moisés (Mm 11.11 -25). A oração de Moisés para que todos do povo fossem profetas (11.29) é amplia da pela afirmação de Joel de que nos últimos tempos esse seria o caso (JI 2.28 [3.1]). A oração de Moisés e a profecia de Joel se cumpriram em Pentecostes (At 2.17). Ao longo de todo o relato da jornada rumo à terra prometida, Moisés se destaca como um servo obediente e fiel do Senhor — em contraste com os israelitas que haviam se com prometido anteriormente a ter um relacionamento de aliança com o Senhor — mas também demonstrando repetidamente incredulidade, desrespeito, rebelião, desconfiança, ingratidão e falta de entendimento (SI 95.7-11; Hb 3.7-19). Por certo as falhas de Moisés são retratadas em cores vividas, a saber, sua ira, sua falta de paciência, frustração e talvez até uma certa pretensão como líder; e foram alguns desses aspectos que levaram Moisés a ser castigado (Nm 12, 16; Dt 1.37). Ainda assim, Moisés foi um homem extraordinário. Seu relacionamento com Deus mostrou-se inigualável: ele recebeu uma medida extraordinária do Espírito de Deus e falou com o Senhor face a face. Moisés também teve os dons de profetizar, curar, interceder e servir. Foi considerado a pessoa mais mansa da terra (Nm 12.3; cf. Harrison, 195; C. Rogers, 257-63). Sem dúvida, Moisés é um exemplo a ser seguido em termos de liderança forte, eficaz e responsável: identificava-se com o povo, cuidava de suas necessidades físicas e espirituais e não visava à primazia sobre ele. Exercia a liderança com um senso aguçado de justiça e compaixão; era fiel e constante; levava seus problemas para o Senhor e expressava abertamente seus sentimentos. Exercia sua autoridade de maneira apropriada; delegava responsabilidades a outros e fracassou em várias ocasiões, mas encontrou a coragem de prosseguir nas promessas e no poder de Deus (para o insucesso de Moisés, ver mais detalhes em Coats, Moses Tradition, 115-24). g. Morte. Antes de sua morte, Moisés recebeu a oportunidade de ver a terra que D havia prometido aos israelitas (Nm 27.12-14). Impôs suas mãos sobre Josué, comissionando-o como seu sucessor (27.16-23). A última batalha de Moisés foi contra os midianitas e ele nego ciou o assentamento da terra do lado leste do Jordão com as tribos de Rúben, Gade e a meia tribo de Manassés (31.1-54; 32.1-42). Além disso, deu instruções finais e uma legislação aos israelitas, ressaltando acima de tudo que escolher o Senhor significava escolher a vida. Moi sés terminou de escrever as palavras da lei num livro que devia ser colocado ao lado da arca da aliança do Senhor (Dt 31.24-26) e compôs um cântico (32.1 -43). Em seguida, abençoou os israelitas e morreu aos 120 anos de idade (caps. 33— 34). Num episódio marcante, Moisés foi sepultado por Deus (o referente mais provável do demonstrativo “este” em 34.6) e o local de seu sepultamento não foi revelado (Coats). 4. Fora do Pentateuco. a. Antigo Testamento. A importância de Moisés em Josué é u extensão de uma das suas funções centrais de Êxodo a Deuteronômio, a saber, a de legislador. Essa função é levada ainda mais longe depois de sua morte pela lembrança de seus manda 941
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mentos e por meio do “Livro da Lei” que ele havia escrito (p. ex., Js 1.8; 8.31, 34; 23.6). De fato, as principais ordens de Josué ao povo eram apenas aquilo que Moisés já havia ordenado (p. ex., 4.10; 11.23; 20.2). Dentro desse tema, pode-se ver a ênfase sobre a grandeza de Moisés. Ele é chamado de “servo do Senhor” 17x, enquanto Josué recebe a designação de “servidor de Moisés” (1.1). No entanto, quando Moisés morre, Josué também recebe o título honorário de “Servo do Senhor” (24.29; Jz 2.8). Assim como o livro de Josué, os livros de Reis, Esdras e Neemias também sublinham a centralidade da lei de Moisés. O mesmo se aplica aos livros de Crônicas, mas, nesse caso, ressaltam-se as leis de Moisés que se referem ao culto em Israel (lC r 15.15; 2Cr 8.13; 23.18; 30.16; 35.6). Em Juizes, Moisés é mencionado duas vezes com referência à lei (Jz 1.20; 3.4) e duas vezes em relação à sua linhagem (4.11; 18.30). 1 Samuel 12.6,8 apresenta o papel de libertador que Moisés representa. Em Miquéias 6.4, vemos ressaltada a liderança excepcional de Moisés no período de formação de Israel (ver Waltke, Micah in Minor Prophets, 1993, 729-31). Nos Salmos, depois de lamentar no Salmo 89, no final do Livro III, a aliança davídica que aparen temente havia fracassado, o Livro IV apresenta Moisés, começando com um salmo de autoria dele (Salmo 90) e mencionando-o mais seis vezes nesse livro (99.6; 103.7; 105.26; 106.16,23, 32), ao passo que, antes disso, havia sido mencionado apenas uma vez (77.20 [21]). O futuro de Israel não depende da monarquia, mas do compromisso anterior de Deus com Israel (ver G. H. Wilson, Editing the Psalter, 1985,213ss.). Daniel 9.11, 13 atribui o exílio à infidelidade para com a lei de Moisés. Moisés foi o primeiro a receber, escrever e ensinar a revelação de Deus e pode, portan to, ser considerado o manancial de todos os profetas (W. VanGemeren, 30). A maior diferença entre Moisés e os profetas bíblicos posteriores encontra-se no relacionamento com Deus: en quanto os outros profetas receberam a revelação divina em visões e sonhos. Deus falou a Moi sés claramente e não por enigmas (Nm 12.6-8); na realidade. Deus falou com Moisés “face a face, como qualquer fala a seu amigo” (Êx 33.11). Assim, Moisés é o profeta prototipico (Dt 18.15-18) e um revisor de Deuteronômio pôde até mesmo dizer que, desde a morte de Moisés, “Nunca mais se levantou em Israel profeta algum como Moisés, com quem o Senhor houvesse tratado face a face” (Dt 34.10). O efeito canônico dessa declaração conclusiva do Pentateuco não é simplesmente o de tomar Moisés um profeta, mas também de fazer com que toda pro fecia seja subserviente à lei. Apesar de os Profetas Posteriores não se referirm a Moisés com tanta freqüência quanto seria de se esperar (Is 63.11-12; Jr 15.1; Os 12.13 [14]; Mq 6.4; Ml 4.4), as mensagens deles pressupõem a aliança mosaica e, por vezes, fazem alusão ou citam trechos do Pentateuco (p. ex., Is 1.2; 5.24; 24.5; Jr 2.8; 9.13; Os 4.6; Am 2.4; cf. D. Stuart, xxxi-xlii). Há fortes indícios de que a figura do Servo Sofredor em Isaías era considerada um segundo Moisés, uma vez que o contexto dos Cânticos do Servo apresenta paralelos diretos com o ministério de Moisés. O segundo cântico é precedido (ls 49.1-6) de uma referência ao relato de Moisés ferindo a rocha (ls 48.21). Logo antes do terceiro cântico (50.4-11), faz-se alusão à travessia do mar de Juncos e também à praga lançada sobre o Nilo e a praga da escu ridão (50.2-3). O quarto cântico (52.13—53.12) é precedido de uma referência à jornada dos patriarcas para o Egito (52.3-4) e de uma alusão ao novo êxodo (52.11-12). Entre esses dois cânticos, pode-se ver uma referência inequívoca ao êxodo (51.9-11). O fato de o objeto desses cânticos ser chamado de 'ebedyhwh, “servo do Senhor”, um título conferido com freqüência a Moisés (17x; em outras ocasiões, refere-se a Josué [2x] ou a Davi [2x]) apoia ainda mais essa argumentação. Dentro dessa linha, tem-se no NT a identificação de Jesus Cristo como Servo Sofredor (p. ex., At 8.32-35) e um segundo Moisés (ver abaixo). 942
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b. Intertestamental. Consoante com a ênfase do judaísmo sobre o Pentateuco nos séculos que antecederam o cristianismo, pode-se encontrar uma superabundância de lendas que se de senvolveram em tomo da vida e do ministério de Moisés durante esse período. E preciso fazer distinção aqui entre o judaísmo henelístico e o palestino. Os relatos extremamente adornados do helenismo (encontrados principalmente na obra de Filo, Vita Moses, e de Josefo, Contra Apionem e Ant.) retratam-no como o homem ideal: é o pai de toda a sabedoria, da cultura egíp cia e da filosofia grega, bem como fundador da sociedade ideal, a teocracia de Israel (TDNT 4:850). Enquanto os retratos helenísticos tendem a idealizar o retrato de Moisés, os relatos pa lestinos preocupam-se mais com o papel dele como o mediador por excelência da revelação. Entre muitas outras coisas, diz-se que Moisés fora ordenado como mediador da aliança desde o princípio do mundo e que havia aprendido a forma oral da Torá no Sinai ( TDNT4:853). Apesar de a comunidade de Qumran apresentar, sem sombra de dúvida, uma perspectiva escatológi ca e, portanto, ressaltar os textos proféticos e apocalípticos, ainda assim a lei de Moisés teve um papel central na organização da comunidade. Na verdade, o propósito expresso da Regra da Comunidade é fazer o que é certo e justo diante de Deus “conforme ordenado pela mão de Moisés e seus servos [de Deus], os profetas” ( 1QS 1:3). Cada um dos membros da comunidade devia fazer o voto de converter-se à lei de Moisés (1 QS 5:8) e qualquer membro que transgre disse “uma palavra da Lei de Moisés por impertinência ou por descuido” devia ser expulso da assembléia da comunidade (1 QS 8:22). c. Novo Testamento. A maioria das passagens do NT que fazem referência a Moisés diz respeito à figura histórica ou à cristologia de Moisés. Com respeito à história, a principal função de Moisés é de legislador (Lc 2.22; Jo 7.23; Hb 10.28), de modo que o nome “Moisés” é usado em várias ocasiões como abreviação para “a lei de Moisés” (Mc 7.10; Lc 16.29, 31; At 15.21; 21.21; 2Co 3.15). “Moisés” também é retratado como um profeta que escreveu so bre Jesus (Lc 24.27,44; Jo 5.46) e predisse a ressurreição (Lc 20.37) bem como a missão aos gentios (Rm 10.19). Por vezes o NT complementa as tradições do AT sobre Moisés fazendo uso de tradições intertestamentais: enquanto vivia com a realeza egípcia, “foi educado em toda a ciência dos egípcios e era poderoso em palavras e obras” (At 7.22); tinha quarenta anos de idade quando matou o egípcio e fugiu para Midiã (7.23-29), onde passou quarenta anos (7.30); sofreu a oposição de Janes e Jambres (2Tm 3.8); foram anjos que lhe entregaram a lei (At 7.38; G1 3.19); e o arcanjo Miguel contendeu com o diabo pelo corpo de Moisés (Judas 9). Com referência à cristologia, a visão farisaica de Moisés como legislador que aparece nos Sinópticos é usada como pano de fundo contrastante com os ensinamentos de Jesus. Apesar de Jesus defender a lei de Moisés (Mt 8.4; cf. 5.17-20), desacreditou as interpretações legalistas dela (Mc 7.9-13) e, numa ocasião, foi ainda mais longe, dizendo que a lei de Moisés com re lação ao divórcio era incompatível com o propósito de Deus, uma vez que Moisés só permitiu o divórcio por causa do coração endurecido do povo (Mt 19.7-8). Essa função também pode ser encontrada em João 7.23, em que se vê em andamento uma polêmica contra a falsa lealda de a Moisés: apesar de os fariseus afirmarem ser discípulos de Moisés (9.28), não guardavam sua lei (7.19) nem a compreendiam corretamente (7.23; cf. 7.53— 8.11). Na verdade, Moisés havia escrito a respeito de Jesus (1.45; 5.46) e a lei mosaica era simplesmente a precursora da graça e da verdade em Jesus Cristo (1.17). Alguns textos sugerem que Moisés é um tipo de Cristo. Essa idéia fica implícita em Hebreus, em que o escritor afirma que Jesus é digno de honra maior do que aquela conferida à Moisés, pois Moisés era um servo de Deus, enquanto Cristo é o Filho de Deus (Hb 3.1 -6), e também fica subentendida em Atos 3.22-23 (cf. 7.37), em que Pedro cita Deuteronômio 18.15-16, 18 com referência a Cristo. Certas passagens de Mateus são particularmente indicativas dessa tipologia: Jesus fugindo de Herodes e indo para 943
Moisés
o Egito corresponde a Moisés fugindo de Faraó e indo para Midiã (cf. esp. Mt 2.13-14 com Êx 2.15 e Mt 2.20 com Êx 4.19); os dois jejuando durante quarenta dias (Mt 4.1-2; cf. Êx 34.28) e, acima de tudo, o fato de Jesus, que se referiu explicitamente à lei de Moisés, ser retratado como o novo legislador (Mt 5— 7; cf. Êx 19—20). Moisés também possui um papel escatológico no NT. Em vez de defendê-los no jul gamento final, Moisés será o acusador dos “judeus” que não creram em Cristo (Jo 5.45). É bem provável que Apocalipse 11 tenha em mente os profetas Elias e Moisés, como fica evi dente pela descrição dos poderes dessas duas testemunhas (11.6): Assim como Moisés foi o principal agente de Deus para castigar o Egito no início da história dc Israel, também será um agente da ira de Deus conta os ímpios dos últimos dias. Esse papel escatológico também pode encontrar-se esboçado em Marcos 9.4-5 (= Mt 17.3-4; Lc 9.30, 33) a ponto de textos apocalípticos pré-cristãos procurarem dois precurosores do Messias (lEn. 90.31; 2 Ed 6.26; cf. Jo 1.20-21). BlliI.IOC.RAHA
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# 4887 (mlk, ser rei, governar)
Montanha -> # 2215 (har, montanha, colina) Monte -> # 1496 (gib 'â I, monte) 944
Nabucodonosor
Morada -> # 5061 (mã'ôn II, covil) Mudança -> # 2200 (hpk, virar, destruir, mudar) Mudez -> # 519 ( 'Im I, ser/estar mudo, ficar quieto, atar) Mulher ->#851 ( 'issâ, mulher) Multidão -> # 8045 (ròò I, tornar-se numeroso, muito, grande) Muro -> # 2570 (hômâ, muro)
Nabucodonosor ( 1 XX 3 7 0 1 3 3 [ne bükadne í-ja/-], # 5557). 1. Babilônio Nabü-kudurri-u$ur “Ó Nabu, protegei a minha prole”, escrito em h como nebükadne ’$$ar (58x), G. Nabouchodonosar e em Jeremias e Ezequiel também como rfibukadre 's$ar (33x). Ao que parece, a mudança de r para n é uma característica aramaica. Nabucodonosor reinou sobre a Babilônia de 605 a 562 a. C. Na metade do ano de 605, comandou suas tropas à vitória sobre Neco do Egito em Carquemis, voltando rapidamente para a Babilônia ao receber a notícia de que seu pai, Nabopolassar, fundador do império neobabilônio ou caldeu, havia morrido (15/16 agosto). Subiu ao trono em 6/7 de setembro. A Crônica Babilônia narra as atividades militares dos primeiros anos de seu reinado. No primeiro, terceiro e quarto anos foi ao Levante consolidar o controle sobre a região, forçando Jeoaquim de Judá, que havia sido nomeado por Neco do Egito, a se sujeitar a ele, Nabucodonosor, e levando con sigo os tesouros de Jerusalém (2Rs 23.34-35; 24.1; cf. Dn 1.1,2). Em 601 a. C., Nabucodonosor lutou contra os egípcios perto da fronteira deles, uma batalha que obrigou a Babilônia a recuar para se reequipar sem, no entanto, permitir que o Egito avançasse. É provável que esse tenha sido o momento escolhido por Jeoaquim para virar a casaca novamente (2Rs 24.1). Depois de mais algumas ofensivas contra os árabes no deserto na fronteira da Síria em 600 a. C., Nabu codonosor ocupou-se com assuntos na Babilônia até 598, quando partiu para o ataque contra Jeoaquim. O rei de Judá faleceu antes de Jerusalém ser tomada; seu filho Joaquim o sucedeu; os babilônios tomaram a cidade, levando consigo o resto dos utensílios de ouro do templo e parte da população (março 15/16,597 a. C., de acordo com a Crônica Babilônia; ver 2Rs 24.117; 2Cr 36.5-10; Jr 24.1; 27.20). Nabucodonosor colocou Matanias no trono de Judá, mudando o nome dele para Ze dequias (->). Assim como Jeoaquim, Zedequias se rebelou, provocando a captura e o saque devastador de Jerusalém no dia 25 de agosto de 587 ou 586 a. C., dependo do cálculo do ano novo em nisan ou tisri (2Rs 24; 2Cr 36.11 -21; Jr 32.1; 37.1; 39.1 -10; 52.4, 12). A atitude de Nabucodonosor para com Jerusalém foi a mesma dos reis assírios quando precisavam lidar com rebeliões repetidas. A Crônica Babilônia para os anos após 594 a. C. não foi recuperada, de modo que se sabe pouco sobre as atividades de Nabucodonosor em outros lugares. Depois de um longo cerco, tomou a cidade de Tiro, e há indícios de que também realizou uma expedição ao Egito. Assim, conquistou um reino que se estendia do Golfo do Egito e do sul da Anatólia até o norte da Arábia. Na Babilônia, Nabucodonosor reconstruiu vários templos, muralhas, portas de cida des e palácios suntuosos e também restaurou templos em outras cidades. Era comum gravar-se Nabucodonosor
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Nabucodonosor
ou entalhar o nome dele em tijolos e nas lajes de pavimentação para garantir que a posteridade lhe daria o devido crédito. Suas inúmeras inscrições proclamam que foi escolhido pelos deuses para ser rei e declaram a devoção dele às divindades, por meio de frases tradicionais. Assim como para Senaqueribe, para Nabucodonosor as campanhas militares com o objetivo de con trolar ou subjugar regiões rebeldes eram uma estratégia normal, sendo que ambos afirmavam realizá-las em obediência às ordens de seus deuses. 2. Para a história bíblica, a notoriedade de Nabucodonosor se deve à forma como trato Jerusalém. A destruição da cidade e do templo e a deportação de um grande número de pessoas marcaram o fim de uma era. Em 604 a. C., Jeremias prenunciou essa tragédia e anunciou os setenta anos de exílio (Jr 25.1, 11, 12; cf. Dn 9.2). Em várias ocasiões, escritores posteriores responsabilizaram o rei ao fazerem referência a esses acontecimentos (p. ex., ICr 6 .15[5.41]; Ed 1.7; 2.1; Ne 7.6; Et 2.6; Dn 5.2). Os profetas reconheceram que Deus estava usando Nabucodonosor, “meu servo” (Jr 25.9), para castigar Judá por sua infidelidade à aliança do Sinai (Ez 33.21-33), uma atitude que se refletiu na política instável de seus últimos reis, que fizeram promessas aos seus conquistadores e depois as quebraram levianamente (2Rs 24.1; 2Cr 36.13). A vitória em Carquemis (Jr 46.2) mostrou o crescente poder da Babilônia, levando Jeremias a instar os líderes de Judá a salvar o que ainda podiam se sujeitando, pois Judá era apenas um dentre vários Estados pequenos que Deus estava colocando sob o domínio de Nabucodonosor (Jr 27.6; Edom, Moabe, Amom, Tiro [cf. Ez 26.7] e Sidom; Jr 49.28: Quedar e Hazor; Hc 1.5-11). O Senhor daria até o Egito aos babilônios (Jr 43.10, 11; 46.13, 26; Ez 29.18, 19; 30.10). Os escritores bíblicos tinham consciência das questões internacionais em dois níveis: sabiam em termos humanos como a mudança constante de lealdade podia causar a ira do suserano e, ao mesmo tempo, viam Deus controlando e ordenando essas questões para cumprir os seus propósitos. Jeremias deixou isso claro (28.14; 32.28) e os historiadores reconheceram esse fato (Ed 5.12). Assim, Nabucodonosor seria o último a aniquilar Israel (Jr 50.17), mas, de pois de destruir outros, ele também seria devastado (Jr 51.34) bem como sua cidade (Jeremias 50, 51). Essa profecia se cumpriu parcialmente na história relatada pelo livro de Daniel. Os textos babilônios não apresentam correlatos das narrativas sobre Nabucodonosor, seus reféns, sua imagem e a fornalha de fogo, os sonhos e suas interpretações (Daniel 1—4). São textos inteiramente de acordo com os costumes da Babilônia no século VI a. C., mas não o tipo de material que a Crônica Babilônia (que no momento não se encontra disponível para a parte final do reino) registraria obrigatoriamente. Dificilmente seria incluída em alguma inscrição pública uma referência à loucura do rei (4.28-37 [25-34]), mas a jactância presunçosa que levou a tal insanidade ecoa nas inscrições em tijolos e outros monumentos. E possível que o texto dos MMM entitulado “A oração de Nabônido”, seja um relato equivocado da mesma situação. Quanto a Belsazar, cujo “pai” foi Nabucodonosor, de acordo com Daniel 5.2, 11, 13, 18, mas que, de acordo com os registros cuneiformes era filho de Nabônido, o último rei da Babilônia, é possível que sua mãe fosse a filha de Nabucodonosor casada com Nabônido, que antes de subir ao trono ocupou uma posição elevada na corte de Nabucodonosor. B ib l io g r a f ia
M. Cogan, H. Tadmor, IIK ings, AB II, 1988, 305-27; T. C. Mitchell, “Judah until the Fali of Jerusalem, IV the Last Kings o f Judah”, CAH 3.2, 322-38; R. H. Sack, Images ofNebuchadnezzar: The Emergence o f a Legend, 1991; D. J. Wiseman, Nebuchadnezzar and Babylon, 1985; idem, “Babylonia 605-539 B.C.”, CAH 3.2, 229-40. Alan Millard 946
Nações / Nacionalidade
Nações / Nacionalidade A. Terminologia ’Í3 (gôy), sing., nação, gentio, povo pagão, prosélito (556x; D C H 1:329-34; H A LA T1:182-83; # 1580). OMA Entre os cognatos estão o acad. de Mari gõ 'um/gãwum, grupo, equipe (de trabalhado res), provavelmente uma palavra tomada emprestada do semO (AHw, 285; CAD 5:59). AT gôy, a designação mais comum para “nação” no AT, parece ter sido um termo exclusi vamente do semO, atestado apenas no heb. apesar de haver surgido um cognato gã 'umlgãwum, grupo, equipe (de trabalhadores) nos textos de Mari. Apesar de gôy ser colocado muitas vezes junto a 'am, povo, um termo caloroso de parentesco, a natureza claramente política do primeiro se reflete em sua combinação comum com melekJmamlãkâ, rei/reino. O termo gôy se aplica a várias entidades, entre elas, as tribos cananéias pré-israelitas (Dt 7.1), tribos do deserto como as dos beduínos (Is 60.5-7), cidades-Estados (2Rs 19.13), nações-Estados (Israel) e um grande número de Estados imperiais (Egito, Babilônia, etc; Jr 25.17-26). gôy era um termo bastante objetivo que não se prestava a grandes variações de forma. Somente em casos excepcionais eram aplicados sufixos pronominais (Gn 10.5,20, 31, 32; SI 106.5; Ez 36.13-15; S f 2.9; ver mais em Block, “Foundations”, 84-127). OV ( ara II), sing.: povo, nação, clã, parente, cidadão (# 6639) O termo ‘am ocorre com maior freqüência do que gôy no AT e tem uma esfera semântica muito mais abrangente. Porém, essas duas expressões (esp. as formas pl.), aparecem em várias ocasiões como correlativos de “nação/nações”. Apesar de a nuança nem sempre ficar clara de imediato, quando uma nação é chamada de ‘am, fica implícita uma consciência de comunidade étnica baseada em relacionamentos consangüíneos. No entanto, a expressão também é usada quando o escritor deseja ressaltar o relacionamento de uma nação com a divindade, como no caso de “povo do Senhor”, povo de “Quemos”, etc. (ver mais em Block, “Foundations” 12-83) Dix’? (le 'ôm), sing.: povo, nação (35x; HALAT468; # 4211). OMA Entre os cognatos encontram-se o ugar. 1’imm, povos (T U # 1346) e o acad. limu, mil (AHw, 553-54; CAD L, 197-98). AT le ôm é um termo arcaico raro que ocorre somente em textos poéticos (dois terços dessas ocorrências encontram-se em Salmos e Isaías). A palavra raramente aparece sem um correlativo (sempre gôy ou ‘am ou um termo que é associado a essas palavras em outros ca sos). Do ponto de vista morfológico, a expressão parece ter se estagnado numa forma pl. pa drão, sendo que o sing. aparece somente em Gênesis 25.33; Provérbios 11.26; 14.28; Isaías 51.4. A formalidade fria de le ôm faz lembrar gôy, mas a forma sing. nos textos de Provérbios pede a tradução “população”, um sentido mais próximo de ‘am. (Ver mais detalhes em Block, “Foundations”, 128-37.) ’!< ( 71), sing.: ilha, litoral, região costeira (36x; DCH 1:203-4; HALAT 1:38; # 362). 947
Nações / Nacionalidade
OMA Pode-se encontrar um cognato no fen. 7, ilha, península (DISO, 11). AT Apesar de a etimologia de 7 continuar obscura (BDB, 15, propõe um radical Wi), de acordo com seu uso no AT, o termo denota fundamentalmente, uma terra cujas fronteiras são determinadas por água. Costuma-se referir às ilhas e regiões costeiras do Mediterrâneo. Po rém, seu significado “nacional” é indicado por expressões como “reis das terras dalém mar" (Jr 25.22; cf. SI 72.10) e pela associação com gôy, como em “ilhas das nações” (Gn 10.5; Sf 2.11), mas especialmente pela junção de 'ivyim com gôyim (Is 40.15; 66.19; Jr 31.10) e ‘ammim, povos (Is 41.1; 51.5) e le ummlm, povos (Is 49.1), em construções par. (Jr 31.10). A expressão é particularmente importante em Isaías, em que “ilhas” serve de designação para nações es trangeiras, juntamente com nações, povos, confins da terra, reis e rainhas (Hollenberg, 28; S. L. Stassen). DSX ( 'ummã), clã, nação (3x, heb; 8x, aram.; DCH 1:312; HALAT 1:62; # 569). OMA Entre os cognatos, encontram-se os acad. ummãnu e ummãtu, exército, povo, clã (AHw, 1413-14). AT O termo 'ummã denota “nação” somente no Salmo 117.1 (|| gôyim', cf. clã, Gn 25.16; Nm 25.15). O cognato aram. aparece em Daniel 3.4, 7, etc. (associado a ‘am e lãsôn, língua, linguagem) e em Esdras 4.10. Se a palavra é derivada de 'mm, mãe, o uso gentio pode deixar implícita a descendência do grupo de uma mesma mãe (cf. A. Malamat, 528-29; ver mais em Block, “Foundations”, 138-46).
B. Concepções de Nação na Antigüidade As contradições na compreensão moderna de nacionalidade são evidentes. Por um lado, a idéia de nações-Estados, que amadureceu na Europa durante o século XIX, era baseada no ideal romântico dc fazer as fronteiras étnicas, lingüísticas e culturais coincidirem com as fronteiras políticas. Simultaneamente, essas mesmas nações estavam moldando o resto do mundo como Estados-súditos, nos quais as fronteiras muitas vezes não tinham relação alguma com divisas étnicas. Porém, isso levanta a seguinte pergunta: O que significa ser uma nação? A resposta do Ocidente moderno a essa questão tende a ser tão incoerente quanto as idéias do OMA. Pode-se identificar vários fatores que contribuíram em diferentes graus para se identificar a autoconsciência nacional dos antigos. 1. Etnicidade. A importância desse fator variava. Nos Estados territoriais do Nor da Síria (que abrangiam os fenícios e arameus), esse elemento parece ter sido irrelevante na determinação das fronteiras nacionais. Nos Estados nacionais mais para o sul, a etnicidade era um dos principais fatores determinantes da nacionalidade. O AT comprova uma percepção aguçada de coesão étnica no meio dos hebreus antigos. Essa convicção se reflete: a. no uso do epônimo Israel como nome nacional; b. na designação de sua nação como “filhos de Is rael” ou “casa de Israel/Jacó” e “descendência de Israel/Jacó”; c. nas genealogias nacionais e tribais; e d. nas tradições dos antepassados patriarcais preservadas com grande zelo. Isso não significa que tais nações eram étnica ou racialmente puras. Elementos estrangeiros eram in troduzidos muitas vezes por meio de casamentos mistos (Gn 34.15-16, “então, vos daremos nossas filhas, tomaremos para nós as vossas, habitaremos convosco e seremos um só povo” ; ver também Rt 1.16, “o teu povo [ ‘am] é o meu povo[ am]”), da identificação dos estrangeiros com Israel em sua adoração a Javé (Êx 12.48), da incorporação de nativos cananeus (p. ex., os 948
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gibeonitas, Josué 9), casamentos dinásticos, que traziam consigo comitivas enormes de servos da terra natal da princesa (p. ex., Jezabel, IRs 16.31) e do envolvimento com estrangeiros no serviço real (cf. os acessores de Davi, 2Sm 15.18-23; ICr 27.30-31). Calebe, filho de Jefoné, o quenezeu de origem edomita representa o caso mais claro de intergação total (cf. Nm 13.6; 26.65; 32.12; Js 14.6). No entanto, o núcleo da população era considerado etnicamente unido. Enquanto os hebreus viam os edomitas, amonitas e moabitas como sendo basicamente coesos em termos étnicos como eles (Gn 19.37-38; 36.1-43), faltam evidências para provar que essas nações também tinham essa imagem de si mesmas. 2. Território. Como foi sugerido anteriormente, nos tempos do AT havia dois tipos básicos de nação no Levante. Os membros dos Estados territoriais eram definidos pelo simples fato de residirem dentro do território do Estado (gâv), sem nenhuma consideração referente à origem étnica ou afiliação ( ‘am). O tamanho desses Estados tendia a depender do poder político, militar e econômico do rei que governava na capital. Assim, um único grupo étnico ou cultural ( ‘am) podia encontrar-se dividido entre uma série de Estados (gôyim), um padrão que fica evidente nas regiões araméias e fenícias (p. ex., Damasco, Hamate, Tiro, Sidom). Os membros dos Estados nacionais eram definidos de acordo com sua afiliação a um grupo étnico e a tendência era as fronteiras étnicas coincidirem com as divisas políticas (p. ex., Israel, Amom, Moabe, Edom; cf. Liverani,v4fíD4:1032; Buccellati, 13-14). As divisas dos Estados territoriais variavam, de pendendo da capacidade do rei de controlar sua região ou incorporar mais terras. Para esses dois tipos dc Estado, o território exercia uma função crítica no desenvol vimento nacional. A terra era mais do que um lugar de residência; servia de contexto no qual podia se encontrar plenitude de vida (Dt 4.40; etc.), prosperidade (observe expressões como “terra que mana leite e mel”, Êx 3.8, 17; Dt 8.7-10; 11.9-12; 2Rs 18.31-32; ver também o comentário de Azitawadda [ANET, 654], “Que esta cidade tenha muito o que comer e vinho para [beber]! Que tenha muitos filhos, que sejam fortes numericamente... em virtude de Ba‘l e dos Deuses [El]”) e segurança (observe-se a ênfase sobre a terra como um lugar de descanso [menühà, Dt 12.9] e o povo vivendo em segurança [Lv 25.19, etc.]). Por isso, a promessa de terra para Abraão representa um corolário natural para a promessa de que seus descendentes se tomariam uma grande nação (gôy gãdôí). Em função desse forte vínculo da residência na pátria, os conquistadores imperais da antigüidade (especialmente os assírios) tinham a política de deportar populações inteiras de terras conquistadas a fim de desintegrar a consciência na cional (cf. B. Oded, Mass Deportations in the Neo-Assyrían Empire, 1979). 3. Teologia. No OMA, costumavam-se identificar as nações com sua divindade prote tora particular. Assim, os amonitas eram conhecidos como “filhos ( ‘am) de Amom” (Jr 49.1), os moabitas eram o “povo ( 'am) de Quemos” (Nm 21.29; Jr 48.46), assim como os israelitas se consideravam o “povo ( 'am) de Javé”. Isso explica a declaração impressionante de com promisso feita por Rute: “o teu povo é o meu povo, o teu Deus é o meu Deus” (Rt 1.16). Na concepção dos fenícios e arameus, assim como dos mesopotâmios, um povo se relacionava com um deus específico em função de sua residência na terra desse deus. Os hebreus, pelo contrário, consideravam que sua associação com Javé era direta; a terra de Canaã representava a concessão de Javé ao seu povo depois que ele havia se estabelecido como seu Deus por meio da aliança. De acordo com essas associações, a função do protetor divino era manter seu povo feliz fazendo-o prosperar materialmente e defendendo-o de agressões estrangeiras. O povo, por sua vez, era encarregado de manter o culto ao seu Deus e preencher suas expectativas mo rais. A desobediência resultaria na partida da divindade (cf. Block, Gods o f the Nations, 12561) ou na expulsão do povo da terra (Lv 26.33-39; Dt 28.63-68). A concepção de Israel de seu relacionamento com Javé era singular dentro do contexto do OMA. Javé nâo apenas havia se 949
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estabelecido como Deus dos israelitas antes da presença do povo na terra, como também con tinuou sendo seu protetor divino mesmo depois que eles foram expulsos da terra. No entanto, essa idéia de divindades nacionais não era absoluta. Os deuses das nações fora de Israel toleravam que seus adoradores venerassem outras divindades, mesmo dentro de sua própria pátria ou cidade e os adoradores sentiam liberdade de se devotar a outros deuses em casa e especialmente quando viajavam para uma nova terra. Em Israel, porém, o sistema era diferente. Para os javeístas ortodoxos, Javé não era apenas o único Deus que os israelitas deviam adorar (Dt 6.4-7); ele era o único Deus (Êx 20.1 -6; Dt 4.35, 39). Ele não apenas sepa rou a terra de Canaã para Israel, como também os edomitas, moabitas e amonitas (Dt 2.5, 9, 19) e todas as nações da terra receberam seus direitos de posse territorial das mãos dele (Dt 32.8; Am 9.7). Apesar de Javé ter estabelecido um relacionamento especial com Israel como seu povo e ter se declarado o Deus desse povo (Lv 26.12; etc.), recebia de bom grado a ado ração dos que nâo eram israelitas. De fato, os profetas proclamavam que ele era o Deus uni versal (Is 54.5; Jr 32.27). 4. Monarquia. Tanto nos Estados territoriais quanto nacionais, a monarquia era o ele mento de união entre os súditos de uma naçâo. Tendo-se em vista tudo o que era esperado dos reis — a. que demonstrassem liderança nas guerras, na administração da justiça (ISm 8.5-6, 19-20) e no apoio à religião nacional; b. que dessem aos cidadãos o exemplo dos ideais mais elevados de coragem, dignidade, justiça e piedade; e c. que personificassem as aspirações coleti vas do povo — teoricamente, a monarquia como instituição deveria ter promovido a consciência nacional (Dt 17.14-20). Sem dúvida, antes da monarquia em Israel, a falta de um rei criou um sério complexo de inferioridade para essa nação. Por não ter ela um rei (melek), consideravase aquém de um gôy (1 Samuel 8). Porém, pelo fato de a prática da monarquia ter a tendência de ser motivada pela ambição e pela proteção dos interesses daqueles que se encontravam no poder, essa instituição exerceu, em várias ocasiões, influência negativa sobre o bem-estar na cional; isso quando não era motivo de constrangimento (cf. lRs 14.7-19; 16.30-34; 2Rs 17). Em vez de personificarem as aspirações coletivas de sua nação, os reis de Israel tomaram-se objeto de desconfiança e ódio gerais, opróbrio para a naçâo (cf. I Rs 11.26; 12.1 ss.). 5. Linguagem. Diversos tipos de evidência do AT indicam que o povo do OMA reco nhecia uma ligação entre a linguagem e a nacionalidade: a. a presença de lãsôn, línguas na tabela das nações (Gênesis 10) como uma das características distintas juntamente com as famí lias (mispãhôt), terras ( ’arã$ôt) e nações (gôyim)\ b. a conjunção de lãsôn, língua, com termos como 'am, povo e 'ummà, naçâo, como nas partes em aram. do livro de Daniel (p. ex., Dn 3.4, 7, etc.); c. a identificação de línguas específicas com base no nome das nações (p. ex., aramaico, Dn 2.4; Ed 4.7; judaico, 2Rs 18.26; cf. asdodita, Ne 13.24); d. o uso de certas expressões fixas como “cada povo segundo a sua lingua” (Et 1.22; cf. a associação da linguagem com uma escrita nacional em 8.9); e. referências a estrangeiros como aqueles que falavam outra língua (Dt 28.49: SI 81.5 [6]; 114.1; Is 33.19; Jr 5.15; Ez 3.5-6); e f. a questão do shibboleth em Juizes 12.1-7. Porém, o fato de as designações para linguagem (lãsôn, sãpâ, lábio) ocorrerem somente 36x no AT e, pelo que se sabe, não aparecerem em textos do noroeste sem. indica que a rela ção entre linguagem e nacionalidade talvez não fosse objeto de muita reflexão. Gênesis 11.1-9 representa uma tentativa incomparável da literatura antiga de explicar as origens da diversida de lingüística. As tradições do AT deixam implícito que as nações do sul da Síria (os filisteus, Edom, Moabe, Amom, Israel) abriram mão de suas línguas, trocando-as por um dialeto cananeu sem nenhuma perda de identidade nacional (ver mais em Block, JBL 103, 1984, 321-40). 6. A naçâo de Israel. Graças ao AT, temos um registro mais completo da evolução de Israel como nação do que de qualquer outra nação da antigüidade. Ao mesmo tempo em que 950
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as opiniões dos estudiosos sobre o valor histórico desses textos difere de forma acentuada, se deixarmos que os textos simplesmente transmitam seu conteúdo, o crescimento de Israel pode ser esboçado da seguinte maneira: a. Javé chama o antepassado Abraão (Gênesis 12) para entrar num relacionamento especial com ele, prometendo-lhe que seus descendentes se tomarão um povo numeroso (17.2, 6, etc.) e que Javé será a divindade nacional deles (17.7-8), dando-lhes um território como pátria (17.8; 35.12) e até mesmo um rei (17.16); b. de acordo com Deute ronômio 26.5-10, o período de formação de Israel, rumo à sua condição de nação, ocorre no Egito, sem depender de uma pátria e sem um rei, quando os doze filhos de Jacó (tfinêyisrã eí) são transformados em doze tribos, cuja população chega a ameaçar o próprio Faraó (Êx 1.1 -7); c. as doze tribos fogem do Egito e rumam para o Sinai, onde entram numa relação de aliança com Javé, seu protetor divino (caps. 19—24); d. o vínculo entre nação e terra é estabelecido sob a liderança de Josué quando Israel entra na terra de Canaã; e. tendo Samuel como juiz, a nação passa pela transição de uma associação informal de tribos para uma monarquia unida e com isso, alcança a posição de gôy, f. no reinado de Davi, a nação finalmente incorpora toda a terra prometida, proporcionando uma base segura para o reino de Davi (não Israel), que se estende do Egito até o interior da Mesopotâmia; g. daí em diante, a nação entra em processo de desintegração, começando com a divisão do reino de Davi e Salomão nos reinos de Israel [norte] e Judá [sul] em 931 a. C., seguida da assimilação do reino do Norte pelo império assírio em 722 a. C. e da queda de Judá e Jerusalém diante da Babilônia em 586 a. C. Diante do reconhecimento anterior da relevância da etnicidade, do território, da teo logia e da monarquia na percepção da identidade nacional na antigüidade, as visões escatológicas de muitos dos profetas adquirem um novo significado. Os acontecimentos de 722 e 586 a. C. levantaram sérias dúvidas sobre a eternidade das promessas da aliança feitas por Javé a Abraão, à nação como um todo no Sinai e a Davi. Porém, de acordo com a convicção antiga, o caráter irrevogável das palavras de Deus nessas alianças e da promessa de graça no final (Dt 30.1-10) exigia uma restauração completa de Israel como nação (para outras motivações atu antes na restauração de Israel, ver Martens). De acordo com as concepções da antigüidade, os profetas dificilmente poderiam ter imaginado uma Israel completamente restaurada sem: a. o envolvimento de toda a casa de Israel; b. o regresso dela à terra de Canaã; c. uma renovação espiritual do relacionamento com Javé, sua divindade protetora; e d. a restauração da monar quia nacional davídica (messiânica) (p. ex., Jr 23.3ss.; 30.8-11, 18-22; 33.4-25; Ez 34.1-31; 37.18-28; Os 1.10—2 .1 [2.1-3]). A ausência de qualquer um desses elementos teria colocado em dúvida a integridade de Deus e frustrado o processo de restauração. Apesar do retrato positivo de Israel como nação, em vários contextos a identificação de Judá / Israel como um gôy cria o estigma de uma nação infiel para com Javé e a coloca no mesmo nível do resto das nações, especialmente aquelas de Canaã. Contudo, a caracterização de Israel como um gôy não é sempre negativa, como afirmam alguns estudiosos (Cody). Isaías 26.2 mostra-se extremamente positivo: “Abri vós as portas, para que entre a nação (gôy) justa, que guarda a fidelidade”. Jeremias 31.36 não descreve a rejeição de um gôy incrédulo, mas exatamente o oposto: o compromisso de Javé com a preservação de Israel como um gôy diante dele (cf. também SI 33.12; 106.5). Em Ageu 2.14, o tom de repreensão é expressado não tanto no uso de gôy ( 'am aparece como um correlati vo), mas no uso do demonstrativo “este” (cf. Ml 3.9; ver J. Boehmer, JBL 45, 1926, 124-48). Além disso, apesar de o termo ter adquirido uma conotação negativa tempos depois, a identificação da comunidade do pós-exílio com um gôy, ainda que consistisse de uma população limitada e não tivesse rei, comprova a grande flexibi lidade de uso do termo. 7. As nações estrangeiras. Tomando-se por base as evidências do AT, a percepção Israel das nações estrangeiras pode ser resumida em algumas declarações: a. A genealogia das 951
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nações (Gênesis 10) descreve todas as nações do mundo como originadas de um ancestral comum, Noé. Esse documento extraordinário representa a única tentativa no OMA, da qual se tem conhecimento, de apresentar uma base teórica para a existência das nações e suas interrelações do ponto de vista humano. Usando uma mistura de epônimos, nomes tribais, designa ções gentias e topônimos, o escritor reconhece não apenas a “filiação” dos povos de todas as terras ( ’arã$ôt), línguas (lesõnôt), grupos monárquicos (mispãhòt) e entidades políticas (gôyím); nesse contexto, representam o cumprimento da ordem dada a Noé para que enchesse a terra (9.6). Em seu atual contexto literário, esse documento também confere uma posição firme à eleição de Abraão (e às origens de Israel) na linha da história universal. Ao fazê-lo, o texto vai além das narrativas patriarcais (que ligam Israel genealogicamente a Edom, Moabe e Amom) e trata Israel como membro de uma família universal muito mais ampla. b. Javé exerce controle soberano sobre todas as nações. Ele não apenas determinou em quantas nações a população do mundo devia ser dividida, mas também deu a cada nação a posse de um território, determinando as fronteiras dessas terras (Dt 32.8; cf. 2.5,9, 19). Javé dirige a migração das nações (Am 9.7); ele exalta nações e depois as destrói (Jó 12.23-25; Is 40.23-24). Javé as emprega como hospedeiras para o seu povo, proporcionando-lhe um contexto dentro do qual o povo pode experimentar a bênção divina da multiplicação (Ex 1.1 -7) ou a maldição do declínio (Lv 26.33-39). De fato, Javé usa as nações diretamente como agentes de provação e castigo contra o povo dele (Dt 28.32-57; Jz 2.21—3.4; Hc 1.5-11; etpassim). c. O AT parte do pressuposto de que todas as nações devem prestar contas a Javé, mes mo que ele as tenha usado como agentes para castigar Israel e mesmo que não façam parte da aliança de Javé. Assim, os oráculos contra as nações proclamam o julgamento de Deus contra elas por sua arrogância e violência (Is 13—24; Jr 46— 51; Ez 25—32; Am 1.3—2.4; Hc 2.420). Nas visões escatológicas dos profetas, o conflito entre Israel e as nações toma-se uma ba talha com o próprio Javé. E ele quem as convoca para Sião e desfere contra elas o golpe final (Is 24— 27; Ez 38—39; Jl 3 [4]; Zc 9— 14). Depois do exílio, a polarização de Israel e das nações se completa. Esdras ordena que o povo da nova comunidade se separe de suas esposas estrangeiras pois “se misturou a linhagem santa com os povos dessas terras” (Ed 9.2). d. Javé se preocupa com a salvação e o bem-estar de todas as nações. Ele não apenas oferece o perdão quando a nação se arrepende dos seus pecados (Jn 3.1— 4.2); desde o princípio, pretende dar-lhes o que há de melhor. Quando Javé chamou Abraão, foi para que ele e seus des cendentes pudessem ser agentes das bênçãos de Deus para as nações (Gn 12.2-3; 2 2 .18; 26.4). Quando chamou Israel para entrar num relacionamento de aliança consigo, foi para que o povo pudesse exercer uma função mediadora sacerdotal entre Deus c as nações da terra (Ex 19.4-6). Vários textos proféticos chamam a atenção para o reconhecimento universal de Javé em linhas gerais (p. ex.. Is 2.1 -4; 66.18-20; Jl 2.28-32 [3.1 -5]; Mq 4.1 -3; Zc 2.11; 8.20-23; 14.16-17 e es pecialmente a fórmula de reconhecimento “saberão que eu sou o Senhor”, encontrada 25x em Ezequiel [p. ex., 25.11 ]). Em Isaías 19.25, Javé refere-se especificamente ao Egito como “meu povo” ( 'ammí) e à Assíria como “obra de minhas mãos” enquanto, na mesma seqüência, chama Israel de “minha herança”. E possível que a demonstração mais clara desse universalismo se encontre no Cântico do Servo, em Isaías. O Servo traz justiça às nações (Is 42.1; cf. 51.4-5); é uma aliança para o povo e uma “luz para os gentios (gôyim)" e cumpre essa missão abrindo os olhos dos cegos e libertando os cativos dos cárceres (42.6-7; cf. 49.8ss.; 61.1-2). B ib u o g r a u a
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# 8466 (shh, nadar, fazer nadar, transbordar)
Naum: Teologia de A. Contexto Histórico O cabeçalho do livro de Naum diz: “Sentença contra Ninive. Livro da visão de Naum, o elcosita”. Não se sabe coisa alguma sobre o profeta Naum e a localização de Elcos, seu lu gar de origem, é desconhecida. Jerônimo acreditava que Elcos ficava na Galiléia, enquanto o Pseudo-Epifãnio localizava a cidade na Judéia. Até pouco tempo atrás, o livro de Naum havia recebido pouca atenção dos estudiosos. O texto é atestado entre os MMM, no Pexer de Naum (4QpNah) e no rolo hebraico dos Profetas Menores de Wadi Murabba‘at (Mur 88). Trechos de um texto G dos Profetas Menores foram encontrados em Nahal
Naum: Teologia de
que os oráculos podem ter se originado nesse período. Outra data possível é 614 a. C., quando os medos capturaram Assur, de modo que Ninive viu-se claramente ameaçada. B. Estrutura Literária e Conteúdo A primeira seção principal do livro apresenta um salmo acróstico incompleto comparável a certos salmos do livro canônico de Salmos (ver SI 25, 34,37, 111, 112, 119). O tema consiste numa teofania com efeitos devastadores sobre a natureza e, por fim, sobre os inimigos de Deus (Na 1.8). Segue-se uma série de oráculos de ameaça contra os inimigos de Deus e de seu povo (1.9—2.2 [1.9—2.3]), com palavras intermitentes de encorajamento e esperança para Judá (1.12-13, 15 [1.12-13; 2.1]). O restante do livro descreve a queda de Ninive (2.3-13 [2.4-14]), lamentando a cidade destruída (3.1-7) e, depois, zombando dela em sua derrota (3.8-19). O livro de Naum trata da destruição iminente de Ninive e do julgamento de Deus contra a Assíria. Pelo fato de nenhum dos oráculos do livro chamar o povo de Judá ao arrependimento e de conter, em sua maior parte, exultação pela queda de Ninive, alguns intérpretes consideram Naum um profeta nacionalista ou “otimista”, que proporciona poucos vislumbres teológicos em seus oráculos (G. Fohrer, Introduction to the Old Testament, 1968,451). No entanto, esses oráculos contra Ninive são semelhantes a oráculos contra as nações encontrados em outros li vros proféticos. O tema deles é o poder do Senhor exercido em favor do seu povo. O hino de teofania apresenta um caráter parcialmente acróstico. Esse acróstico chega até a letra kap e as tentativas de estudiosos mais antigos de reconstituir um acróstico que fosse completo devem ser consideradas malsucedidas e desnecessárias (K. J. Cathcart, BibOr 26, 1973, 12; D. L. Christensen, ZAW 87,1975, 17-30). Diante da natureza incompleta desses ver sos, é possível que Naum tenha modificado um salmo já existente e o empregado como uma introdução aos seus oráculos. O hino retrata Javé como o Guerreiro Divino vingador e como Rei. Contém uma descrição do poder de Javé em ira e julgamento, descendo sobre Ninive na última parte do livro. Tem um papel importante no livro e a consciência intensa da soberania de Deus e de seu domínio sobre a história encontra-se tão presente nesse hino quanto nos oráculos que seguem. Nos oráculos, há uma associação histórica dos assírios com os inimigos e forças do mal no hino. A soberania de Deus sobre o mundo é o que detém as força do mal ( = caos). Assim, o Deus vingador (1.2), como rei e juiz, castigará os assírios para salvar o povo dele. (Para uma discussão sobre o radical nqm em Na 1.2, cf. H. G. L. Peels, 199-207). O Senhor da tempestade, que repreende o “mar” (= caos) a fim de estabelecer seu domínio e afirmar sua soberania, derrota os assírios por intermédio dos agentes dele — os medos e babilônios — e define o destino do rei da Assíria. O destruidor (2.2) que ataca Ninive age em nome da ira do Senhor, que arde contra seus inimigos (1.3). “Que nação pode resistir ao Deus que dominou o caos primitivo?” (Childs, 443-44). Naum 1.2-3 tem paralelos em Êxodo 20.5; 34.6, 14; Josué 24.19; Salmo 145.8, etc. Como ressaltou R. J. Coggins, Naum é ligado à “tradição corrente do Antigo Testamento” (Coggins, 83). Os oráculos em 1.9— 2.2 [ 1.9—2.3] apresentam certa dificuldade e os estudiosos suge riram que se encontram fora de ordem. Porém, 1.9 parece ser dirigido aos inimigos de Javé em geral e constitui um ponto de transição ou ligação entre o salmo e os oráculos subseqüentes. É preciso partir-se do pressuposto de que os assírios sejam os inimigos em questão. Cabe observarse que a expressão acabar de vez, consumir (klh 'sh), nos vv. 8 e 9 e os vbs. pensar, maquinar, nos vv. 9 e 11, reforçam a idéia de que o v. 9 constitua uma ponte entre o salmo introdutório e os oráculos. Os vv. 10-11 e 14 fazem ainda mais ameaças contra os assírios, Ninive e o rei assírio, respectivamente. Essas ameaças são interrompidas pelas promessas a Judá nos vv. 12-13. No 954
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entanto, é possível que o v. 11 seja dirigido a Judá ou Jerusalém e não a Nínive. De qualquer modo, sem dúvida aquele que maquinou o mal contra o Senhor é o rei da Assíria. Naum 1.15 [2.1] começa com uma série de imperativos proferidos pelo atalaia (mebassêr), o mensageiro do Senhor, o Guerreiro Divino, que está prestes a combater os assí rios (cf. Miller, 12-23, 66-74). Essa mensagem de salvação para Judá é seguida em 2.1 [2.2] de uma mensagem de julgamento contra Nínive — a capital assíria é instada a preparar-se para um ataque. Apesar de o v. 2 [3] encontrar-se numa posição um tanto estranha, seu objetivo é ser uma declaração do propósito dos atos de Javé conta Nínive: o livramento de seu povo e a restauração da “glória de Jacó”. A descrição da queda de Nínive (2.3— 3.19 [2.4— 3.19]) apresenta um relato vivido do ataque contra a cidade e o pânico e destruição resultantes. Naum 2.3-13 [2.4-14] constitui uma unidade independente; o v. 7 [8] provavelmente refere-se à deusa assíria lstar (Cathcart, BibOr 26, 1973, 96-98; 1979, 7-8; Delcor, 73-83) que é levada embora e, no v. 13 [14], a linguagem é semelhante àquela das maldições encontradas, por exemplo, nos tratados do OMA (Cathcart, CBQ 35, 1973, 182-83). Um novo oráculo começa em 3.1 e continua até o v. 17. Do ponto de vista retórico, porém, a passagem pode ser dividida da seguinte forma: 3.1-7, uma descrição da humilhação e destruição de Nínive; 3.8-17, uma passagem repleta de escárnio e ironia, res saltando a futilidade das tentativas de Nínive de se defender. Por fim, 3.18-19 se assemelha a um cântico ou lamento fúnebre, no qual é dito ao rei assírio que ele será mortalmente ferido e que o colapso é iminente. C. Mensagem teológica O livro de Naum contém alguns dos poemas mais impressionantes do AT, com várias figuras de linguagem sagazes e um claro efeito entrecortado ao descrever o ataque militar e o massacre resultante nos caps. 2— 3 .0 tema central da mensagem do profeta é a retribuição de Deus sobre seus inimigos. Se a idéia de vingança divina apresentada no hino teofãnico de 1.2-8 é generalizada, nâo demora a tomar-se específica no caso da Assíria e sua capital, a cidade de Nínive, os principais agentes de crueldade e despotismo do OMA no século VII a. C. Como foi mencionado rapidamente acima, Naum sofreu a acusação de ser excessiva mente nacionalista, deixando de expressar qualquer condenação ou correção ao seu próprio povo pelas falhas tão evidentes desse povo conforme as descrições de outros profetas do pe ríodo em geral. Esse posicionamento foi atribuído ao fato de Naum ter atuado como profeta cultuai, mas não há indicação alguma de tal função no texto bíblico. Juntamente com os diver sos profetas canônicos que incluíram “oráculos contra as nações” em seus repertórios, Naum condenou a Assíria pela depravação, confrontando os assírios desde o início do livro, na atual disposição canônica deste, com a realidade de Deus na teofania. Se a realidade histórica por trás do julgamento é o avanço dos medos e babilônios e a vitória final deles sobre a Assíria, então a inclusão dessa ameaça político-militar no meio dos atos do próprio Javé proporcio naria uma comparação com Amós, um membro mais antigo da fraternidade profética para o qual a ameaça que assomava contra o reino do Norte de Israel no século VIII não era tanto a Assíria, que não passava de uma “nação” (ver Am 6.14), mas sim o próprio Deus (4.12). A descrição do avanço teofãnico de Deus em 1.2-8 é, portanto, a resposta do profeta ao avanço assustador da Assíria contra seus inimigos no auge do poder assírio (cf. Is 10.5-11,28-34). O fato de Naum não ser motivado apenas por um nacionalismo estrito fica evidente no último versículo do livro: “Todos os que ouvirem a tua fama baterão palmas sobre ti; porque sobre quem não passou continuamente a tua maldade?” (3.19). Na opinião de Childs, os oráculos de 955
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Naum servem de “ilustração surpreendente do triunfo escatológico fmal de Deus sobre todos os seus adversários” (445). Na série Jowett de palestras em 1899, R. H. Charles referiu-se ao “dia do Senhor” da seguinte forma: “Trata-se de uma concepção relacionada ao povo como um todo e não ao indiví duo. Significa essencialmente o dia no qual Javé se manifestará em vitória sobre seus inimigos” (Charles, 86-87). Charles incluiu Naum em sua discussão dos textos sobre o “dia do Senhor” (cf. também Cathcart, 1975, 68-76). Foi no “dia do Senhor” que o Juiz Supremo castigou os culpados, pois aquele foi um “dia de julgamento”. No entanto, foi também um “dia de vitória”, em que o Senhor afirmou o seu poder sobre a criação e sua soberania sobre as nações. B ib l io g r a f ia
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# 9509 (ta 'ar, navalha, canivete) # 639/41 ( ’°n t / ’0nivyà, navio)
Necessidade -> # 4575 (mwk, deprimido, ficar pobre) 956
Neemias
Neemias
Neemias (rPOTO [nehemyâ], # 5718).
AT Neemias era um funcionário da corte do rei persa Artaxerxes e, em duas ocasiões, foi governador de Judá. No entanto, é lembrado especialmente por ter reconstruído os muros de Jerusalém (Neemias 3—6). Mais do que apenas uma figura política, porém, Neemias também foi um líder religioso dinâmico. Em termos teológicos, Neemias reforçou os temas que Esdras (->) havia ressaltado e deu a eles nova ênfase. Um dos temas principais encontrado ao longo de toda a narrativa é a questão da separação e pureza. E simbolizado pelos muros reconstruídos, que ilustram a necessidade de uma separação entre o judaísmo e o paganismo. O compromisso de Neemias com a pureza foi demonstrado ainda quando, em seu segundo mandato como go vernador, expulsou Tobias, o amonita, do templo (13.4-9). Assim como Esdras, Neemias tratou do problema dos casamentos mistos e a respectiva ameaça à pureza e santidade de sua nação (13.23-30). Lidou ainda com questões cultuais como a provisão de recursos para o serviço no templo (13.12-14) e a observância do sábado (13.15-22). Neemias representa a epítome da união da fé com a ação. Instou seus compatriotas judeus a terem fé em Deus e, ao mesmo tempo, trabalharem para a reconstrução dos muros de Jeru salém, para confiarem em Deus e, no entanto, defenderem-se com todas as forças. Não fechou os olhos para a injustiça social dentro da própria comunidade judaica e confrontou aqueles que desrespeitavam as obrigações impostas pela aliança com relação ao seu próprio povo (Ne 5.113). Ao longo do relato, Neemias é retratado como um homem de piedade e oração. Ele jejuou, orou e confessou quando foi informado sobre o estado deplorável de Jerusalém (1.4-11). Em outras ocasiões, quando as circunstâncias não permitiam súplicas formais, fez orações curtas no lugar onde estava (2.4; 4.9). Acima de tudo, Neemias possuía a convicção de que a mão de Deus estava sobre ele em todos os seus empreendimentos (2.8, 18; 7.5). Juntamente com Esdras, Neemias atuou no sentido de restabelecer a relação de aliança de Israel com Deus. Para um povo que havia suportado o julgamento de Javé e a humilhação do exílio numa terra impura, a única maneira de alcançar esse objetivo era pela separação, pu rificação e dedicação à Torá. B ib l io g r a f ia
W. J. Dumbrell, “The Theological Intention of Ezra-Nehemiah”, RTR 45, 1986, 65-72; H. G. M. Williamson, Ezra, Nehemiah, 1985. Owert Dickens
Apesar de o livro de Neemias aparecer como uma obra separada nas versões da Bíblia em nossa língua, é tra dicional e corretamente considerado parte integrante de uma única obra composta dos livro de Esdras e Neemias (cf. Williamson, 1985, xxi-xxii). Apesar da discordância de alguns es tudiosos (p. ex., VanderKam; Kraemer, 73-92), os caps. 8— 10 de Neemias são apresentados como o ápice conjunto do trabalho dos dois reformadores, de modo que também deve-se consultar o livro de Esdras para uma avaliação completa da teologia do livro de Neemais. (-> Esdras: Teologia) Vários estudiosos argumentam ainda que a própria obra de Esdras-Neemias, de fato, não passa de uma continuação dos escritos do cronista. No entanto, trata-se de uma concepção contestável e que tem sido questionada energicamente nos últimos anos (-> Crônicas: Teologia). Uma vez que essa questão afeta a interpretação de Crônicas muito mais do que a de Neemias, Neemias: Teologia de
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não será considerada em maior profundidade neste estudo, sendo que prosseguiremos nossa discussão sem debatermos essa hipótese. O início do trabalho de Neemias pode ser determinado com certeza em 446-445 a. C. (cf. Ne 1. \,p a ce Saley). Assim, situa-se na metade do período durante o qual não apenas a Pa lestina, mas a maior parte do OMA encontrava-se sob o domínio do grande império persa (-> Pérsia). Judá, cuja capital era Jerusalém, não passava de uma província secundária dentro do território administrativo mais amplo ou satrapia do Além-Rio (cf. Rainey, 51-78; Williamson, 1988,59-82). Jerusalém havia sido destruída e parte de sua população exilada na Babilônia du rante os cerca de cinqüenta anos de domínio opressor dos babilônios. Com o incentivo dos reis persas Ciro e Dario, porém, perto do final do século VI a. C. (cf. Esdras I—6) havia se iniciado a restauração da comunidade judaica e de suas principais instituições, como o templo. Nosso conhecimento histórico do intervalo de aproximadamente setenta anos antes do período de governo de Neemias é, na melhor das hipóteses, bastante incompleto e mesmo o conhecimento limitado que temos é questionado por diversos historiadores. Não se sabe coisa alguma sobre o período de meio século antes de 458 a. C. quando, de acordo com o relato bí blico, Esdras foi a Jerusalém (Esdras 7— 10) e alguns estudiosos afirmam ainda que o trabalho de Esdras deve ser datado do reino de Artaxerxes II (398 a. C.), apesar de essa concepção, outrora amplamente aceita, não receber muito apoio nos dias de hoje (para uma discussão sobre isso, cf. Williamson, 1987,55-69). Do ponto de vista persa, é provável que a missão de Esdras fizesse parte de um movimento mais abrangente no sentido de intensificar o controle sobre a região do Levante como um todo em face das várias ameaças internas e externas (cf. Hoglund; Williamson, 1989,141-61). Desse modo, a interpretação equivocada dos esforços para recons truir os muros de Jerusalém (que provavelmente ocorreu pouco antes do tempo de Neemias e que é relatado fora de seqüência cronológica em Ed 4.7-24) como um ato de rebelião, adquire uma importância particular. Explica nâo apenas o contexto da missão de Neemias (cf. Rowley, 211-45) e sua grande cautela ao abordar o rei pela primeira vez (Ne 2.1-8), mas também o es tado de desânimo da comunidade de Jerusalém e a hostilidade dos povos ao redor. A. Estrutura Literária A história literária do livro de Neemias é complicada e, em decorrência disso, constitui um objeto de controvérsia considerável entre os comentaristas. O relato em primeira pessoa de Neemias sobre si mesmo é a parte mais fácil de ser isolada. Apesar de não se ter certeza da delimitação exata de sua extensão (cf. Kellermann, 4-56; Williamson, 1985, xxiv-xviii), essa seção parece compreender os caps. 1— 7, parte de 12.31 -43 e 13.4-31. Tudo indica que se trate de uma versão reelaborada e estendida de um relatório oficial anterior sobre aproximadamente o primeiro ano de sua comissão. Apesar de ser preciso dar a devida consideração ao fato óbvio de que nessa seção Neemias procura apresentar a si mesmo e suas realizações da maneira mais positiva possível, de modo que uma certa desconfiança hermenêutica não é inapropriada (ver Clines, 124-64), esse material continua sendo uma fonte histórica de primeira categoria. Um outro conjunto de palavras parece ter em comum o fato de relatar realizações iguais ou semelhantes àquelas encontradas no relato de Neemias de um ponto de vista sacerdotal, in dicando, desse modo, a preservação de certos materiais do templo. Compare-se, por exemplo, o cap. 10 com o 13, 11.1-20 com 7.4-6, cap. 3 (que por diversos motivos dá a impressão de ser um registro independente da construção dos muros que Neemias pode ter escolhido incluir em suas memórias, sendo que o v. 1 indica a redação sacerdotal original do texto) e o material combinado com o relato em primeira pessoa de Neemias em 12.27-43. Por fim, é provável que Neemias 8 (e, possivelmente, parte de 9.1-5) seja a versão reescrita de material que, a princípio, fazia parte da fonte de Esdras (encaixar-se-ia historica 958
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mente entre Esdras 8 e 9), sendo que 9.6-37 pode muito bem ter constituído um texto litúrgico independente, e 11.21— 12.26 contém várias listas de sacerdotes tanto levitas quanto não levitas. As opiniões quanto à forma como todo esse material foi combinado no livro que temos hoje variam de acordo com as posições adotadas quanto à questão mais ampla da relação de Esdras-Neemias com a obra do cronista referida acima. Aqueles que vêem em l Esdras (apro ximadamente uma tradução G de 2Cr 35—36, Esdras e Neemias 8.1-13, além de alguma ma terial adicional) como uma fonte importante para o final original da obra do cronista são obri gados a pressupor uma série complicada de redações posteriores, processo durante o qual as Memórias de Neemias e outras fontes foram, aos poucos, incorporadas no texto. Aqueles que acreditam que o próprio cronista incorporou ao texto as Memórias de Neemias também tendem a ver acréscimos posteriores à segunda metade do livro e ainda (porém não necessariamente), crer que partes dos caps. 8— 10 se extraviaram ao longo da transmissão do texto. Algumas dessas complicações são evitadas se, por outro lado, a redação de Esdras-Neemias for inteira mente separada da composição de Crônicas, o que toma possível explicar de maneira simples como um só editor pode ter combinado os relatos das realizações de Esdras e Neemias com a maior parte do material restante em Neemias na forma de uma narrativa teologicamente coe rente do período de restauração, como será sugerido abaixo, com o acréscimo posterior apenas de 11.21— 12.26 (para descrições mais completas, ver Williamson, 1985, xxxiii-xxxv; 1987, 37-47). As interpretações literárias e canônicas mais recentes tendem a apoiar essa conclusão (p. ex., Childs, 624-38; Eskenazi; Shaver). B. Abordagens Literárias A interpretação do livro de Neemias varia inevitavelmente de acordo com os interesses predominantes do comentarista. Uma interpretação histórica naturalmente irá tratar a análise das fontes como sendo de importância fundamental, resultando no possível desenvolvimento de uma seqüência cronológica diferente daquela apresentada na ordem atual dos acontecimentos dentro da obra. Outros, porém, em função de interesses homiléticos, são motivados a estudar o caráter e a liderança de Neemias, uma iniciativa em si mesma legítima, mas que enfrenta di ficuldades ao tratar especialmente da segunda metade do livro. A preocupação em se fazer justiça à forma atual do livro como um todo tem inspirado duas interpretações recentes, sendo que ambas lançam mão de métodos modernos de análise. A obra de Eskenazi, In An Age o f Prose [Numa Era de Prosa], 1988, traz o subtítulo apro priado A Literary Approach to Ezra-Neemiah [Uma abordagem literária de Esdras-Neemias]. Partindo das listas repetidas em Esdras 2 e Neemias 7, Eskenazi divide Esdras-Neemias em três seções, que ela chama de “potencialidade (definição do objetivo)” (Ed 1.1-4), “processo de realização” (Ed 1.5; Ne 7.72) e “sucesso (objetivo alcançado)” (Ne 8.1— 13.31). Da mes ma forma, a análise de Eskenazi dá origem a três temas importantes: “a centralidade do povo, a expansão da casa de Deus de modo a abranger a cidade e a primazia do texto escrito como veículo de autoridade” (176). Tollefson e Williamson propuseram uma interpretação sócio-antropológica do livro de Neemias isoladamente. Ao aplicarem o modelo de Wallace de revitalização cultural ao texto em seu presente estado, sugerem que todos os elementos previstos pelo modelo ocorrem na ordem esperada. Caso justificado, tal estudo voltaria a atenção do leitor para as dimensões so ciais do texto, concentrando-se não tanto nas realizações do líder como indivíduo — por mais importantes que estas sejam como um dos estádios do processo de revitalização — mas sim nos mecanismos por meio dos quais seus valores e preocupações iniciais passam a ser os da 959
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comunidade como um todo e no processo de “rotinização”, no qual “os novos elementos da visão tomam-se integrados à vida diária do povo” (48). Tollefson e Williamson consideram essas observações especialmente significativas para a avaliação da mudança que ocorre den tro do livro de um relato predominantemente individual na primeira metade para um relato de caráter predominantemente comunitário na segunda parte. C. Formato Teológico Resta, porém, o desafio de integrarem-se todas essas abordagens numa interpretação verdadeiramente teológica que ainda assim faça justiça à forma do livro como um todo, evitan do concentrar a atenção em apenas diferentes pontos relevantes selecionados. O que se segue é apenas um esboço de tal interpretação, sendo que ainda há muitos detalhes a serem tratados e, para estes, o leitor é orientado a consultar os principais comentários (ver bibliografia). Do mesmo modo, o espaço limitado impede uma análise de temas teológicos mais importantes do livro (para os quais, ver, por exemplo, Kidner, 19-27; Williamson, Ezra andNehemiah, 77-98), sendo que o estudo desses temas só deve ser realizado depois de uma avaliação do formato teológico geral da obra. Em primeiro lugar, é preciso observar como um pressuposto fundamental daquilo que segue, que apesar de o livro parecer inicialmente uma narrativa histórica direta, na verdade, não considera a cronologia com tanta rigidez quanto o faz o historiador moderno. Os aconte cimentos relacionados à restauração em Esdras e Neemias como um todo abrangem mais de um século; porém, apenas alguns período breves, raramente com mais dc um ano de duração cada um, são escolhidos como foco de atenção. Apesar de esse fato poder ser explicado em parte pela natureza das fontes à disposição do editor, fica claro que ele considera esses acon tecimentos isolados como sendo associados, não pelo processo humano normal de causa e efeito, mas diante dos esclarecimentos que prestam quanto aos propósitos de Deus para o seu povo. O desenvolvimento aparentemente aleatório dos acontecimentos históricos encontra-se ligado àquilo que pode ser chamado apropriadamente de história da salvação. Evidente desde Esdras (p. ex., 6.14; 7.1), ela é levada adiante em Neemias por meio do relato entretecido do trabalho dos dois reformadores nos caps. 8— 10 (ver abaixo), nas listas de 12.1-26, que atuam como elemento unificador de todas as fases da reforma (ver especialmente v. 26) e por 12.47, em que toda Israel “nos dias de Zorobabel e nos dias de Neemias” tem exatamente essa mes ma função. A atenção à relação teológica entre os diversos acontecimentos coloca a seqüência histórica num plano secundário. Tendo isso em mente, pode-se observar um padrão claro nos três primeiros “capítu los” de Esdras-Neemias como um todo. Operando por meio de reis persas como seus agen tes, Deus dá a seu povo a oportunidade de retomo do exílio. Em seguida, um estádio por vez, Deus ajuda o povo a completar de modo bem-sucedido o processo de restauração, a despeito da oposição externa ou interna da comunidade. Assim, Esdras 1— 6 concentra-se na recons trução do templo, e, os caps. 7— 10, na definição da comunidade de acordo com “a lei do teu Deus e a lei do rei” (7.26). O ponto culminante e a celebração que encerram essa parte são, no entanto, adiados para que o todo possa ser apresentando como um único ato de restauração sob a orientação de Deus. O terceiro “capítulo” (Neemias 1—7) segue o padrão dos dois primeiros. A ênfase sobre a oração em Neemias 1 e 2.1 -10 mostra que a autorização do rei é vista mais uma vez como um instrumento da iniciativa divina. A jornada, a oposição e, por fim, a conclusão bem-sucedida da tarefa — nesse caso, a construção dos muros como um símbolo de segurança e respeito próprio da comunidade — seguem conforme o esperado. Aqui também, contudo, a comemoração final 960
Neemias: Teologia de
é adiada e, dessa vez, o fato de não haver coisa alguma das Memórias de Neemias entre o final do cap. 7 e a comemoração em 12.27-43 mostra claramente que se trata de algo resultante de um planejamento editorial deliberado. Depois desses três ingredientes essenciais de restauração, em Neemias 8— 12 o texto alcança o ponto culminante adiado de uma forma que reúne as preocupações dos três “capítu los” anteriores. Na introdução, em vez de um comando real, encontramos a proclamação da lei de Deus. Como Childs ressaltou corretamente, “Esdras não faz a leitura da lei com o intuito de reformar Israel para que Israel se tome o povo de Deus. Antes, o que prevalece é o contrário. A lei é lida para o povo reformado” (636; cf. Blenkinsopp; Shaver). De acordo com essa idéia, sem dúvida alguma importante, a leitura da lei em Neemias 8 faz parte de um contexto mais amplo, que abrange materiais de várias origens e é apresentada como uma cerimônia de reno vação da aliança: lei (cap. 8); confissão (cap. 9) e renovação do compromisso com a aliança em geral e com suas estipulações específicas (cap. 10). Assim, o trabalho dos reformadores chega ao devido ápice graças à comunidade como um todo, reconhecendo a graça de Deus na restauração e aceitando as exigências dele, recém-compreendidas como sendo a atitude ade quada. Em seguida, Neemias 11 volta para o registro da concretização bem-sucedida e im portante do objetivo de Neemias de repopular a cidade, antes da consagração dos muros, e de serem concluídos no templo (12.27-43), levar à celebração conjunta pelo trabalho de Esdras e Neemias (ambos mencionados no relato). Um fato significativo, porém, é a que a obra não acaba nesse tom, o que teria dado uma impressão de triunfalismo, de conclusão bem-sucedida sem futuro algum. Em vez disso, a confissão de Neemias 9 já deixa embutida na renovação da aliança o reconhecimento de que, apesar de todas as realizações do passado, ainda há muito o que ser feito em termos da situa ção política mais ampla de servidão da comunidade, o que requer melhorias (cf. McConville), apesar de o tempo certo para tal iniciativa ser deixado firmemente, com sabedoria e oração, nas mãos de Deus. Essa idéia se desenvolve no cap. 13, por meio de um desafio para que se demonstre fidelidade e ação. Neemias 12.44— 13.3 ilustra a possibilidade de “rotinização”, ou seja, de transpor para um rotina diária os ideais elevados apresentados na celebração prece dente. O restante do cap. 13, porém, demostra o quão rapidamente é possível afastar-se desse ideal, uma vez que todos os abusos tratados por Neemias nessa passagem já foram objeto de juramento do povo no cap. 10. Além disso, as referências ao templo e a seus serviços (p. ex., v. 11), à separação dos estrangeiros (vv. 23-28) e ao uso dos muros (vv. 15-22) fazem-nos lem brar claramente das realizações registradas nos três primeiros “capítulos” da obra. Porém, o fato de haver no final certo abuso nessas áreas, que necessita ser corrigido, transmite-nos uma sensação clara de “agora mas ainda não”. A estrutura narrativa do livro como um todo aponta, desse modo, para as realizações do passado como modelos para aspirações futuras. B ib m o c r a fia
Obras principais: L. W. Batten, The Books o f Ezra and Nehemiah, 1913, A. Bertholet, Die Bücher Esra und Nehemia, 1902; J. Blenkinsopp, Ezra-Nehemiah 1988; D. J. A. Clines, Ezra, Nehemiah and Esther, 1984; F. C. Fensham, The Books o f Ezra and Nehemiah. 1982; A. H. J. Gunneweg, Nehemia, 1987; F. D. Kidner, Ezra and Nehemiah, 1979; J. M. Myers. Ezra, Nehemiah, 1965; W. Rudolph, Ezra und Nehemia, 1949; H. E. Ryle, The Books o f Ezra and Nehemiah, 1897; H. Schneider, Die Bücher Esra und Nehemia, 1959; H. G. M. Williamson, Ezra, Nehemiah, 1985. Outras: P. R. Ackroyd, The Chronicler in His Age, 1991; B. S. Childs, Introduction to the Old Testament as Scripture, 1979; D. J. A. Clines, “The Nehemiah Memoir: The Perils of 961
Neguebe, Sul, Região Sul
Autobiography”, in What Does Eve Do to Help? And Other Readerly Questions to the Old Testament, 1990, 124-64; F. M. Cross, “A Reconstruction of the Judean Restoration”, JBL 94, 1975,4-18; T. C. Eskenazi, In An Age o f Prose. A Literary Approach to Ezra-Nehemiah, 1988; A. H. J. Gunneweg, “Zur Interpretation der Bücher Esra-Nehemia”, SVT 32, 1981, 146-61; K. G. Hoglund, Achaemenid Imperial Administration in Syria-Palestine and the Missions o f Ezra and Nehemiah, 1992; W. Th. In der Smitten, “Die Gründe fur die Aufnahme der Nehemiaschrift in das chronistische Geschichtswerk”, BZ N.F. 16, 1972, 207-21; U. Kellermann, Nehemia: Quellen, Überlieferung und Geschichte, 1967; D. Kraemer, “On the Relationship of the Books of Ezra and Nehemiah”, JSO T 59, 1993, 73-92; J. G. McConville, “Ezra-Nehemiah and the Fulfilment of Prophecy”, VT 36, 1986, 205-24; S. Mowinckel, Studien zu dem Buche Ezra-Nehemia, 3 vols., 1964-65; M. Noth, The Chroniclers History, 1987 (German original, 1943); A. F. Rainey, “The Satrapy ‘Beyond the River’”, AJBA 1, 1969, 51-78; H. H. Rowley, “Nehemiah’s Mission and Its Background”, in Men o f God, 1963, 211-45; R. J. Saley, “The Date o f Nehemiah Reconsidered”, in G. A. Tuttle (ed.), Biblical and Near Eastern Studies: Essays in Honor ofW illiam Sanford LaSor, 1978, 151-65; J. R. Shaver, “Ezra and Nehemiah: On the Theological Significance of Making Them Contemporaries”, in E. Ulrich et al. (eds.), Priests, Prophets and Scribes: Essays on the Formation and Heritage o f Second Temple Judaism in Honour o f Joseph Benkinsopp, 1992, 76-86; K. D. Tollefson e H. G. M. Williamson, “Nehemiah as Cultural Revitalization: An Anthropological Perspective”, JSO T 56, 1992, 4168; C. C. Torrey, The Composition and Historical Value o f Ezra-Nehemiah, 1896; J. C. VanderKan, “Ezra-Nehemiah or Ezra and Nehemiah?” in E. Ulrich et al., (eds.), Priests, Prophets and Scribes: Essays on the Formation and Heritage o f Second Temple Judaism in Honour o f Joseph Blenkinsopp, 1992, 55-75; G. Widengren, “The Persian Period”, in J. H. Hayes e J. M. Miller (eds.), Israelite and Judaean History, 1977, 489-538; H. G. M. Williamson, Ezra and Nehemiah, 1987; idem, “The Govemors of Judah Under the Persians, TynBul 29, 1988, 5982; idem, “The Concept of Israel in Transition”, in R. E. Clements (ed.), The World o f Ancient Israel, 1989, 141-61. H. G. M. Williamson Negligência
# 1719 (g ô ‘al, aversão, negligência)
Negócio -> # 4856 (melã 'kâ, missão, negócio, tarefa, serviço)
Neguebe, Sul, Região Sul
Neguebe, sul, região sul (313 [negeb], # 5582).
AT 1 .0 Neguebe é a parte sul da Palestina, uma depressão árida ao sul da região monta nhosa de Judá. O termo Neguebe é derivado do radical ngb, ser/estar seco, ressecado. Ao que parece, a palavra referia-se a princípio á terra árida ao sul de Israel (hannegeb, a região sul [-> # 5582]), passando a significar “sul” como sinônimo de têmãn I, sul (-> # 9402) e dãrôm, sul (-> # 1999). O termo é usado para referir-se à direção sul, ou seja, “para o Sul” (Gn 13.14; Ex 26.18; Nm 34.3; Js 15.2, etc.; ver HALAT 628). O Neguebe (c. 1.750 km2) estende-se da ponta do golfo de Acaba até a extremidade sul da região montanhosa de Judá no formato de um triângulo invertido. Seu vértice superior fica encostado ao golfo de Ácaba, próximo a Elá, enquanto a extremidade norte é definida aproximadamente por uma linha que vai da extremidade sul do mar Morto, atravessa a região de Berseba, chegando ao Mar Mediterrâneo junto a Gaza. O lado leste do triângulo fica junto 962
Neguebe, Sul, Região Sul
do vale de Arabá, enquanto o lado oeste passa pela região noroeste do Sinai, próximo a CadesBaméia. Árida demais para qualquer tipo de cultivo normal, certas áreas do Neguebe produziam vegetação suficiente para pastagem, apesar de algumas partes serem cultivadas pelo método de alagamento no qual a água era coletada e canalizada para áreas de captação a fim de aumentar a produtividade das lavouras. A extensão exata do Neguebe nos tempos bíblicos continua sendo motivo de controvérsia, mas tudo indica que sua parte norte seja uma das principais regiões de referência. Apesar de árido e quase desabitado, o Neguebe devia sua relevância às importantes rotas comerciais que o cortavam levando até o Egito. 2. As referências mais antigas ao Neguebe no AT estão relacionadas às jornadas dos patriarcas. Abraão viajou para o Egito pelo Neguebe e, assim como Isaque, viveu na região norte/noroeste desse local, próximo a Berseba (Gn 24.62; 25.11). Foram feitas várias tentati vas de se ligar a inatividade no Neguebe durante a Alta / Média Idade do Bronze com o tempo dos patriarcas, mas J. J. Bimson observa que as evidências arqueológicas não são inteiramente incompatíveis com a atividade dos patriarcas nessa região (“Archeological Data”, 79-82). Quando deixaram o Monte Sinai depois do exôdo, os israelitas se aproximaram do Ne guebe pelo sul. Foram enviados espias para atravessar essa região, saindo de Cades-Baméia (‘Ain el-Qudeirat) na extremidade oeste do Neguebe. Esse lugar tomou-se a fronteira sul de Israel conforme o que Deus havia determinado e recebeu essa designação em passagens descre vendo a terra prometida (Dt 1.7; 34.3). Tal demarcação foi confirmada em relatos da conquista, em que declarações sucintas descrevem “toda aquela terra” em termos semelhantes usando o Neguebe como fronteira ao sul (Js 10.40; 11.16; 12.8). 3. A ascensão da monarquia unida trouxe maior estabilidade política para Israel, o que permitiu sua expansão territorial. Em uma ocasião, Saul foi instruído por Samuel a derrotar os amalequitas no Neguebe, executando assim o julgamento do Senhor contra eles por haverem atacado Israel quando este procurava entrarem Canaã (ISm 15.2-3; cf. Ex 17.8-16; Dt 25.1719). A campanha de Saul resultou numa vitória imediata, mas por causa de sua desobediência, deixou de redundar num triunfo definitivo, uma vez que, mais tarde, Davi também teve que lutar contra os amalequitas. O relacionamento cada vez pior entre Saul e Davi acabou por levar Davi a fugir para o deserto. Durante algum tempo, enquanto vivia em território filisteu, Davi atacou povos nô mades da região sob o pretexto de estar investindo contra o Neguebe de Judá e seus aliados do sul (1 Sm 27.8-10). Quando os amalequitas atacaram seu quartel general em Ziclague, Davi conquistou uma vitória importante sobre eles no Neguebe, dividindo os espólios com os ho mens de Judá (1 Sm 30.7-31). Durante o reinado de Salomão, o controle israelita sobre o Neguebe se expandiu de modo a abranger Eziom-Geber, uma cidade portuária no golfo de Acaba. Tel el-Kheleifeh foi, a princípio, identificada como Eziom-Geber, e, quando Nelson Glueck realizou escavações nesse local, ele sugeriu que se tratava de uma das áreas da indústria de cobre de Salomão. Pos teriormente essa idéia sofreu alterações e uma reavaliação recente das evidências disponíveis questionou sua cronologia (ver Pratico, “Nelson Glueck’s 1938-1940 Excavations”). Foram encontrados mais de quarenta fortalezas da Idade do Ferro no Neguebe. Alguns estudiosos atri buíram essas construções a Salomão (Cohen, “The Fortresses King Salomon Built”), enquanto outros afirmam que são resultantes de grupos nômades locais e que, em termos arquitetônicos, refletem seus agrupamentos de tendas (Finkelstein, Archeology, 242, 263). A divisão do reino deu mostras da fraqueza israelita e de sua perda de controle sobre a região do Neguebe. A princípio, Roboão conseguiu manter a parte norte e ocorreram mais expansões no reinado de Josafá, que controlou Edom por meio de um governador (1 Rs 22.47). 963
Neguebe, Sul, Região Sul
Vários anos depois, quando Jeorâo era rei, Edom conseguiu se rebelar contra Judá (2Rs 8.2022). O domínio sobre o Neguebe foi enfraquecendo até que Amazias, seguido de seu filho Uzias, investiu contra os edomitas a fim de estender esse controle até Elá (2Rs 14.21 -22). O ataque de Edom a Judá no tempo de Acaz deixou clara a força crescente dos edomitas nessa região (2Cr 28.17). Depois da destruição do reino do Sul, as forças conquistadoras praticamente tomaram conta da região. Neemias (Ne 11.30) cita alguns reassentamentos próximos a Berseba depois do exílio, mas há poucas evidências de ocupação do Neguebe até a ascensão do reino nabateu. 4. O uso simbólico do Neguebe, encontrado em grande parte nos profetas, está ligado ao fato de ser uma região árida e acidentada ao sul. Isaías retratou o Neguebe como um lugar assustador, descrevendo-o como “horrível terra” e “terra da aflição e angústia”, simbolizando também a origem dc ventos fortes de tempestade (Is 21.1; 30.6). O Neguebe era tão destituído de água que a chuva rara foi usada como uma imagem de refrigério concedido pelo Senhor (SI 126.4). Uma vez que o Neguebe era a fronteira sul de Israel, foi usado para representar a exten são do julgamento de Deus sobre Judá (Jr 13.19; Ez 20.46-47 [21.2-3]), bem como a extensão da restauração do povo de Deus. Depois do exílio, os judeus viveriam e comprariam terras no Neguebe (Jr 32.44; 33.13; Obadias 20), ede lá viria gente para adorar ao Senhor em Jerusalém (Jr 17.26). Essa região representava até onde chegaria a nova terra na visão de Jerusalém e a nova localização de Gade (47.19; 48.27-28). (-> Judá: História) 5. O termo foi usado para o rei do Egito na expressão “o rei do Sul” (Dn 11.5, 6, 9, 11, 14, 15, 29) e refere-se aos monarcas ptolomaicos do Egito; em 11.40, porém, a referência é ao rei do Sul. Deserto, ermo, terra assolada: -> bõhú (devastação, # 983); bqq I (assolar, ser agitado, # 1327); horbâ (ruína, devastação, # 2999); -> yPSimôn (ermo, devastação, # 3810); midbãr I (ermo, # 4497); -> 'arãbâ (estepe. # 6858); §ehihá (terra ressecada, # 7461); siyyâ (de serto, # 7480); -> s Vi (destruir, desolar, # 8615); smm (ficar desolado, deserto [adj.], assolar, estremecer, ficar horrorizado, # 9037); Deserto: Teologia. Direções: -> dãrôm (sul, # 1999); -> yãm (oeste, mar, # 3542); -> yãmin I (direita, sul, # 3545); mizrãh (nascer do sol, leste, # 4667); m a'arãb II (oeste, #5115); negeb (sul, Neguebe, # 5582); çãpôn I (norte, # 7600); qãdim (lado leste, vento leste, # 7708); semõ 7 (lado esquerdo, mão esquerda, desafortunado, em direção ao Norte, # 8520). têmãn 1 (Sul, # 9402) B ib l io g r a f ia
JBD 2:1068-70; ISBE 3:511-13; ZPBE 4:402-4; Y. Aharoni, The Land o fth e Bible, 23-24; D. Baly, The Geography o f the Bible, 252-66; J. J. Bimson, “Archaeological Data and the Patriarchs”, in Essays on the Patriarchal Narratives, 1983, 53-89; O. Borowski, “The Negev—The Southern Stage for Biblical History”, Brev, 5:3,1989,40-44; R. Cohen, “The lron Age Fortresses in the Central Negev”, BASOR 236,1979,61 -79; idem, “The Fortresses King Solomon Built to Protect His Southern Bordcr”, BARev 11, 1985, 56-70; M. Evenari, The Negev: Challenge o fa Desert, 1982; 1. Finkelstein, The Archaeology o fth e Israelite Settlement, 1988; I. Finkelstein e Avi Perevolotsky, “Processes of Sedentarization and Nomadization in the History o f Sinai and the Negev”, BASOR 279, 1990, 67-88; N. Glueck. Rivers in the Desert, 1959; O. Kell, M. Küchler, Orte und Landschaften der Bibel, 1982, 138-367; A. Mazar, Archaeology o f the Land o fth e Bible, 1990; G. Pratico, “Nelson Glueck’s 1938-1940 Excavations at Tell el-Kheleifeh: 964
Noé
A Reappraisal”, BASOR 259, 1985, 1-32; T. L. Thompson, The Settlement o f Sinai and the Negev in the Bronze Age, 1975. Cleon L. Rogers, Jr./Robert Spender Neta -¥ # 1426 (bat 1, filha, neta) Neto -> # 1201 (bên I, filho, neto, membro de um grupo) Ninho -> # 7873 (qnn, estar aninhado, fazer um ninho) Nivelamento ^ # 9164 (spl, ser baixo, ser nivelado, humilhar; arrasar)
Noé
Noé (rn [nõah], # 5695).
OMA A figura de Noé não aparece em nenhuma outra literatura do OMA. No entanto, há di ferentes relatos de um dilúvio universal na mitologia suméria e babilônia. O herói da história babilônia do dilúvio é Atraasis (que significa “extremamente sábio”), exceto na Tábua XI do Épico de Gilgamés, em que ele é chamado de Utnapistim (que significa “ele encontrou vida”). O nome Utnapistim pode ser uma reinterpretação do nome do herói da história suméria, Ziusudra (que quer dizer “vida de longos dias”) (Bailey, 165-66; Tigay, 229-30). Alguns estudiosos sugeriram que Noé significa “longo (em dias)” tomando por base o etp. nw], ser longo. Porém, o significado “descansar”, baseado no heb. nwh que é cognato do etp. «vvj (W. Leslau, Comparative Dictionary, 1987,409) parece ser mais apropriado. No texto bíblico, o importante nâo é a derivação, mas sim a associação auricular do nome nõah com o vb. nhm, consolo (Gn 5.29). A versão dianapausei (dará alívio; hapleg.) que aparece na LXX, um equivalente formal do TM y^nahamênú (consolará, < nhm), em 5.29, pode ser um reflexo de uma técnica de tradução e não uma variação heb. yPníhênú (dará descanso, < nwh). Se, de fato, reflete uma variação heb., esta é secundária e surge da necessidade de uma harmonização contextual. O radical verbal wuj, descansar, aparece em alguns nomes amorreus (H. B. Huflfmon, Amorite PersonalNames in the Mari Texts, 1965, 237). AT 1. De acordo com Gênesis, Noé ocupa uma posição única na história da humanidade, ligando a raça antediluviana ao presente. Ele é filho de Lameque e neto de Matusalém. Apare ce pela primeira vez na genealogia linear de Gênesis 5, chamada por vezes de “genealogia da morte”, como o nono descendente de Adão, na linhagem virtuosa de Sete. Seu pai, Lameque, deu-lhe o nome Noé (nõah) com um significado especial para a humanidade, explicado pelo radical heb. nhm, consolo (-> # 5714): “Este nos consolará (nhm) dos nossos trabalhos ( ’sh) e das fadigas de nossas mãos ( '$b), nesta terra que o Senhor amaldiçoou” (Gn 5.29). A expli cação do seu nome lembra claramente a maldição do solo como castigo pelo pecado de Adão (3.17-19) e provavelmente prenuncia a viticultura a ser iniciada por Noé (9.20). A introdução da história do dilúvio repete propositadamente as origens heb. da explicação genealógica do nome de Noé. Em reação à perversidade geral da humanidade, “se arrependeu (nhm) o Senhor de ter feito ( ‘sh) o homem na terra, e isso lhe pesou no coração ( ’$b)" (6.6). Diferentemente dessa geração perversa, “Noé achou graça diante do Senhor” (6.8). (-> Gênesis Dilúvio) Na seção chamada de tôledõt de Noé (Gn 6.9—9.28), Noé é citado como um homem justo (çaddiq) e íntegro (tãmim) entre sua geração (6.9; 7.1). Faz tudo exatamente segundo o 965
Noé
que Deus lhe ordena (6.22; 7.5). Como seu bisavô Enoque antes dele (5.22,24), “Noé andava com Deus” (6.9), uma expressão que denota o relacionamento íntimo e correto de Noé com seu Criador (cf. 17.1). A integridade de Noé o separava de seus contemporâneos, que eram ca racterizados pela mais absoluta corrupção e violência (6.11-13). E com o íntegro Noé que Deus estabelece aliança (Gn 6.18), a primeira mencionada explicitamente na Bíblia. O compromisso de Deus nessa aliança preserva Noé e a família na arca. Em meio à destruição do dilúvio, Deus se lembra de Noé (8.1). Depois de sair da arca, Noé oferece um sacrifício ao Senhor sobre um altar (8.20), Deus abençoa Noé e os filhos com fertilidade e domínio (9.1-2), como havia feito à humanidade no jardim (1.26-28). Noé ocupou o lugar de Adão como aquele que Deus escolheu para repovoar e reabastecer a terra. Noé é chamado de “lavrador” que planta vinhas (Gn 9.20). Bebeu de seu vinho e ficou embriagado (9.21). A Bíblia não comenta a embriaguez de Noé, que é condenada pela maioria dos comentaristas, porém não por todos. Não há evidência alguma no texto que sugira que aquele vinho continha o vigor sexual necessário para repovoar a terra (cf. a abordagem psicanalítica de Cohen). Para a história bíblica, o importante é que a embriaguez de Noé permite que o filho Cam veja a nudez do pai, o que leva Noé a amaldiçoar Cam é abençoar Jafé. A embriaguez de Noé mostra que até mesmo os íntegros pecam e carecem da redenção de Deus, que se desdo bra subseqüentemente no livro de Gênesis e na Bíblia. O problema da raça humana na história universal (2.4— 11.26) é o pecado, e sua esperança, a redenção. 2. Numa mensagem profética de esperança, Noé aparece como símbolo da fidelidade de Deus aos seus relacionamentos de aliança (Is 54.9). Enquanto nos dias de Noé Deus pro meteu jamais destruir a terra com água outra vez, também na volta do exílio, Deus assumiu o compromisso de ser um cônjuge fiel de Judá/Jerusalém. Declarou que seu amor infalível não seria abalado e que sua aliança de paz não seria removida. 3. Num oráculo profético de julgamento, Noé aparece juntamente com Daniel e Jó como exemplo de integridade numa geração perversa (Ez 14.14, 20). 4. Na genealogia de abertura em Crônicas, Noé aparece, sem maiores explicações, na décima geração a partir de Adão e como pai de Sem, Cam e Jafé (IC r 1.4). P-B A literatura judaica fora do NT concentra-se em Noé como um homem justo. Num longo hino em homenagem aos estimados antepassados de Israel, Noé é louvado como um indivíduo “perfeito e justo” (Ecli 44:17-18). Desde Adão até Moisés, a sabedoria estava operando para proteger os justos e livrá-los do mal, inclusive a Noé, que é mencionado em Sabedoria somente pelaa descrição dele como “o homem justo” (Sab 10:4). A LQ traz adomamentos da história de Noé, inclusive uma narrativa na qual o pai dele duvida que Noé seja seu filho e pensa que, na verdade, o menino foi gerado pelos anjos, identificando a mãe com Bitenos (1 QapGen col. 2). O livro de Noé, que constituía originalmente uma obra independente anexada a 1 Enoque (caps 106— 107), apresenta uma versão mais completa da narrativa sobre a dúvida do pai dele que o considera uma criança extraordinária, especialmente com referência à retidão do filho. Em seu tratado Da agricultura, Filo contrasta o lavrador justo Noé, que cultivava o solo e a alma, com o lavrador ímpio Caim, que buscava apenas o prazer. Um midraxe bastante conhecido interpreta o homem justo do Salmo 1 como sendo Noé, que não andava no conselho dos con temporâneos ímpios, mas se deleitava na lei do Senhor (Gen R. 26.1; Midr. Tehillim 1.12). NT No NT, Noé é lembrado principalmente nos contextos de julgamento escatológico e de perseguição presente. Jesus comparou a complacência da geração que estará viva quando o “Filho do Homem” vier em julgamento, com a geração que viveu quando Noé construía 966
Números: Teologia de
a arca antes do julgamento do dilúvio (Mt 24.37-38; Lc 17.26-27). Durante a construção da arca, Deus reteve pacientemente o seu julgamento, dando a todos a oportunidade de se arre penderem (lPe 3.20). Nas epístolas católicas, Noé serve de exemplo de fé como um indivíduo temente a Deus diante da perseguição e como pregador da justiça que foi protegido e recom pensado por Deus (Hb 11.7; 2Pe 2.5). Também aparece na genealogia de Jesus apresentada por Lucas (Lc 3.36). B i b l h x ;r a f ia
L. R. Bailey, Noah the Person and the Story in History and Tradition, 1989; H. H. Cohen, The Drunkenness ofNoah, 1974; A. Heidel, The Gilgamesh Epic and Old Testament Parallels, 1949; I. M. Kikawada e A. Quinn, Before Abraham Was, 1985; W. G. Lambert e A. R. Millard, AtraHasis, The Babylonian Story o f the Flood, with M. Civil, The Sumerian Flood Story, 1969; J. P. Lewis, A Study o f the Interpretation ofNoah and the Flood in Jewish and Christian Litera ture, 1968; R. Stichel, Die Namen Noes, seines Bruders und seiner Frau, 1979; J. H. Tigay, The Evolution o fth e Gilgamesh Epic, 1982; W. von Soden, Einfxihrung in die Altorientalistik, 1985 (ET The Ancient Orient), 1994, 210-13. JeromeA. Lund Nome -> # 9005 (sêm I, nome, reputação, renome) Novo -> # 2542 (hds, tomar novo, restaurar, renovar) Nudez
# 6567 ( ‘êrôm, nu)
Números é o quarto livro de uma coleção de cinco obras, o Pentateuco. É ligad messas (Clines) e maldições. Vem depois de Levítico e, como este, contém estatutos cultuais dados no Sinai. Números é uma narrativa que abrange quarenta anos da jornada de Israel do Sinai a Moabe, a porta de entrada da terra prometida. Serve de “ponte” para Deuteronômio, que traz os discursos feitos por Moisés nas campinas de Moabe. Números: Teologia de
A. Estrutura Literária A estruturação do livro de acordo com seus indicadores geográficos resulta em três se ções: o acampamento no Sinai (1.1— 10.10), nos arredores de Cades-Baméia (10.11—20.13) e a caminho das campinas de Moabe (20.14— 36.13). A primeira seção é constituída de ins truções de Deus sobre o recrutamento militar, a organização do acampamento, os levitas e questões cultuais. A segunda seção, apesar de ser desprovida de material prescritivo, consis te principalmente de relatos de episódios relacionados à jornada. Tal jornada é, na realidade, uma campanha militar. Sob essa ótica, a primeira seção representa a “preparação” e a segunda, a “execução” (Knierin). Uma estruturação em termos cronológicos resulta numa divisão em duas partes: o primeiro censo (antiga geração; 1.1—25.16) e segundo censo (nova geração; 26.1—36.13)(01son). Investigar a teologia de Números significa atentar aos fundamentos teológicos do livro e questionar qual é (em termos teológicos) sua força motivadora. A identificação dos gêneros do livro é de grande ajuda no processo de sintetização da obra. Esses gêneros são: instruções (primeira metade) e relato da jornada de Israel (segunda metade, cf. esp. 33.1-49). Em ambos 967
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os casos, pode-se detectar uma certa dose do dinamismo entre Deus e o povo uma vez que não se trata de um relacionamento estático. O último versículo não apenas resume o livro, como também apresenta uma estrutura para um sumário teológico: “São estes os mandamentos e juízos que ordenou o Senhor, por intermédio de Moisés, aos filhos de Israel nas campinas de Moabe, junto ao Jordão, na altura de Jericó” (36.13). O estudo teológico trata dos conceitos de Javé, dos lideres e do povo dentro do contexto dos mandamentos e de uma jornada rumo à terra prometida.
B. Temas Teológicos 1. Deus. a. Guia soberano e legislador. O deserto pode não ter caminhos definidos, mas o povo viajante é guiado por Javé. O fato de Israel avançar e parar ao longo dessa jornada de acordo com as ordens de Javé expressa uma concepção fundamental: Javé é suserano sobre seu povo. Deus assumiu o controle. No entanto, Javé não se encontra afastado, dando ordens à distância. A arca é prova da presença dele (10.35-36; cf. 23.21; 35.34b), como também o é a glória (kãbôd) (9.15-23; cf. 16.19). Esses dois elementos são lembranças permanentes de que Deus se encontra com seu povo. O livro é estruturado sobre a dinâmica dessa interatividade, dando ênfase â constância (hesed) de Deus. Versos líricos retratam o significado do envolvi mento de Javé com seu povo; é líder do povo, incontestável e vitorioso: “Levanta-te, Senhor, e dissipados sejam os teus inimigos... Volta, ó Senhor, para os milhares e milhares de Israel” (10.35-36). A teologia estaria, aqui, captada na forma de poesia? b. Provedor e disciplinador bondoso. Ao prover a lei, Deus mostrou-se beneficent Israel não é deixada sem orientação sobre as mais diversas questões, sequer sobre a organi zação do acampamento, os deveres dos levitas e os procedimentos no caso de contaminação. Javé não é um Deus cheio de caprichos, sobre cujas expectativas Israel precisa conjecturar. A vontade de Deus é revelada e o padrão de comportamento é deixado claro. As instruções ao longo da jornada ressaltam especialmente o cuidado providencial de Deus. Ele provê lideran ça na pessoa de Moisés, Arão e outros (18.6). Em termos materiais, fornece maná, codomizes e água de modo miraculoso (11.1-35; 20.2-13) e dá vitória sobre forças hostis (21.3, 21-35; 31.1-12). A bênção arônica mostra Deus pronto para abençoar (dar poder, tomar produtivo), para beneficiar o povo com a presença dele e dar-lhe paz (6.22-27). Porém, os episódios ao longo da jornada retratam um Deus que não é incondicional mente afável. A ira de Javé é suscitada pelo comportamento pecaminoso do povo: a murmuração (11.1, 10, 13), o desafio à autoridade de Moisés (12.9), a desobediência em Cades-Baméia (14.1-45; 32.10, 13), a rebelião de Corá, Data e Abirão (->) (16.20; cf. 16.46) e o atrevimento de Balaão (22.22). Apesar de isto não estar declarado explicitamente em Números, a concep ção predominante é de que Deus é cuidadoso, bondoso e comprometido com seu povo, mas que também tem um compromisso com a justiça. Deus não tolera a perversidade. Preocupa-se tanto com o povo quanto com a justiça. Assim, a ira de Deus não é o oposto do cuidado dele: sua ira e seu cuidado são faces da mesma moeda — o amor. Uma inserção lírica expressa o encanto e também o presságio: “O Senhor é longânimo e grande em misericórdia, que perdoa a iniqüidade e a transgressão, ainda que não inocenta o culpado, e visita a iniqüidade dos pais nos filhos até à terceira e quarta gerações” (14.18). d. Expressão suprema da santidade e perdão de pecados. As leis pressupõem especi camente que Deus deseja pureza, uma pureza que não é apenas higiênica, mas que “é absoluta mente desligada da discriminação social” (Douglas, 159). São vários os estatutos sobre a conta minação (5.1-4, 29; 6.12; 19.10-22). Os levitas formam um cordão de isolamento a fim de que pessoas desqualificadas não invadam o santuário (1.51; cf. 3.10; 16.40). Porém, as instruções 968
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que exigem pureza também apresentam providências a serem tomadas quando o povo não for puro (15.22-29). São especificadas as ofertas pelo pecado, sendo que a expressão “oferta pelo pecado” aparece mais de 30x (cf. caps. 7; 29). Episódios da jornada, como aqueles em Meribá (20.2-13) e Cades-Baméia (14.1-45), reforçam a exigência de retidão, o que contempla a obediência às instruções de Deus. Nos relatos da jornada, vê-se o exercício do perdão e da reconciliação de outras formas além do sacrifício: A ira de Deus é mitigada pela intercessão de Moisés (14.17-20) e o castigo é retido pelo ato de zelo piedoso de Finéias (25.6-11). Números desperta os sentimentos de reverência e temor de Deus. 2. O povo de Deus. a. Um povo unido e organizado. A estrutura de tribo, clã e famíli a base não apenas para a realização de um censo (1.2-47; 2.32-33) e para a seleção dos espias (13.1), mas também para a distribuição das terras na qual até mesmo os interesses das famílias são levados em consideração (27.1-11; 36.1-13). Em seu acampamento, o povo é organizado por tribos dispostas ao redor do centro, o tabemáculo (2.1-31), uma disposição que ressalta a idéia de que Israel é um só povo sob o domínio de Deus e também de que todas as tribos são herdeiras da promessa. Quando essa união é testada, como no pedido de Gade e Rúben para se assentarem na Transjordânia, Moisés trata o acontecimento como uma crise. A solução é que as tribos da Transjordânia participem da conquista do território a oeste do Jordão (32.1-42). b. Um povo do destino — reino messiânico. Israel constitui um sacerdócio real diante de Deus, como as borlas de cordão azul servem de lembrança para todos (15.37-41). O objetivo e o destino do povo são ressaltados no Ciclo de Balaão, a unidade de texto independente mais extensa do livro (caps. 22— 24). Situada no relato seguinte ao episódio em que o povo falou contra o Senhor e Moisés, ao que Deus respondeu enviando as serpentes abrasadoras (21.4-9), essa série de bênçãos que constituem um ponto alto da narrativa mostra que a pecaminosidade do povo não frustrou o plano divino. Antes, por intermédio de um adivinhador estrangeiro que toma-se profeta, o quarto oráculo de Balaão anuncia (mais uma vez, em forma poética): “Vêlo-ei, mas não agora; contemplá-lo-ei, mas não de perto; uma estrela procederá de Jacó... ferirá as têmporas de Moabe... De Jacó sairá o dominador e exterminará os que restam nas cidades” (24.17, 19a). A profecia se cumpriu no reinado de Davi e, de modo mais pleno e absoluto, em Jesus, o Messias. O destino de Israel é a terra prometida e, a caminho desta, os israelitas entram em con flito com os povos vizinhos. São derrotados pelos cananeus em Cades-Baméia (14.44-45) mas os vencem posteriormente (21.1-3). Apesar do pedido diplomático e cortês de Moisés, Edom se recusa a dar passagem (20.14-21), de modo que Israel toma outro caminho. No entanto, os israelitas destroem outros estrangeiros impiedosamente: o rei Siom (21.21 -32; observar a poe sia, vv. 27-30), Ogue de Basã (21.33-35) e especialmente os midianitas (cap. 31) em resposta à sedução licenciosa de Israel. Bases lógicas adicionais são apresentadas pela alusão a uma obra extraviada ao longo do tempo, o Livro das Guerras do Senhor (21.14). É Javé quem ordena as guerras e que luta por Israel (cf. 21.34). c. Um povo submisso e insubmisso. O retrato de Israel não deixa de ser interessante. Os príncipes de Israel demonstraram generosidade nas ofertas da consagração (7.1-88). Israel fez tudo o que o Senhor ordenou (1.54; 2.34; 5.4; 9.5, 23; 10.13). Moisés também seguiu as instruções de Deus (mais de 15x; 1.17-19; 3.16, 42, 49-51; 4.37, 41, 45, 49; 7.6-8; 8.3-4, 2022; 11.24-25; 17.7; 26.3-4; 27.22; 29.40; 31.3-24, 31), fato este que toma a desobediência de Moisés (20.9-13) ainda mais surpreendente. O diário da jornada de Israel traz relatos principalmente de um povo propenso à insubmissão e ao mal. Os israelitas ficam insatisfeitos e se queixam das provisões de Deus (episódio das codomizes em 11.1-34); falta-lhes confiança e obediência (13.1— 14.45); são impacientes 969
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(21.5-9) e insubordinados (Corá, 16:1-40) e ignoram abertamente os mandamentos (p. ex., envolvem-se em relações sexuais ilícitas com as midianitas, 25.1-5). Como líder, o próprio Moisés desobedece ao ferir a pedra em vez de falar-lhe (20.1-13). Fica claro que o pecado é multidimensional. É evidente que existe uma ligação entre o pecado e suas conseqüências. A transgres são tem resultados trágicos — inevitavelmente — para Miriã e Arão (12.10), para Coré e seus partidários (16.15-34) e para o povo de Deus como um todo (caps. 14— 24; 25.5). O livro de Números é uma advertência (32.8-15,23) e também um desafio para a nova geração. 3. Líderes, a. Lideres mediadores. Os líderes e o ministério de liderança são uma dádi va (18.5-7, 19). A necessidade de líderes deve-se, em parte, ao seu papel mediador. Javé, que nunca fala diretamente ao povo, transmite suas mensagens por meio do líder Moisés. Cerca de 50x, o relato informa que “falou o Senhor a Moisés”. Os líderes sacerdotais exercem sua função oferecendo sacrifícios, p. ex., o incensário e o incenso de Arão durante uma praga (16.46-50). A intercessão também faz parte do serviço mediador dos líderes (11.2; 12.13; 14.13-20; 16.22; 21.7). Por trás da descrição do papel de mediador, encontra-se o conceito de uma distância significativa entre o povo e a divindade, mas também o desejo divino de contato e envolvimento. b. Múltiplos e atenciosos. Ainda que Moisés seja o líder, a natureza da liderança é múl tipla (31.13). Miriã e Arão são parte de um círculo mais estreito (12.1-5). Por ordem de Javé, em resposta à queixa de Moisés de estar sobrecarregado, são escolhidas setenta pessoas para ajudar o líder (11.16-29): indivíduos que se distinguem por terem sobre eles a presença signi ficativa do Espírito (16.17, 26-29). São providenciados sucessores para Arão (Eleazar; 20.2229) e para Moisés (Josué ; 27.12-23). A investidura de Josué descreve não apenas a posição privilegiada do líder mas, ainda, por meio da imagem do pastor, ressalta a função de cuidado da liderança (27.12-23; cf. a ordenação dos levitas em 8.5-26). c. Privilegiados e responsáveis. Os privilégios dos sacerdotes são tantos (cf. serviço no tabemáculo, 3.5-8; 48 cidades que lhes foram dadas, 35.1-15; os dízimos do povo, 18.8-32) que pode não ser inteiramente incorreto dizer que o objetivo do livro de Números era legitimar os sacerdotes, especialmente os levitas. Deus declara enfaticamente: “porquanto os levitas se rão meus” (3.45; 8.14). A questão de condição social/sucessão/serviço também era importante (Ez 44.15-31). Os dois casos de revoltas contra o líder Moisés (a saber, Miriã/Arão em Nm 12.1-16; Corá, Datã e Abirão em 16.1-40) deixam a impressão de que os líderes nomeados por Deus são intocáveis (cf. 17.1-12). Que ninguém ouse ir contra eles. Porém, a eleição do líder diz respeito mais à responsabilidade do que ao privilégio. Logo no início do livro, a le gislação toma todo o cuidado de especificar claramente os deveres dos vários grupos (p. ex., os coatitas, gersonitas e meratitas, 4.1-49). Em termos gerais, os sacerdotes (filhos de Arão) apresentam os sacrifícios (16.46; 25.13), realizam a purificação (5.11-31; 19.1-10) e ofere cem a bênção sacerdotal (6.22-26). Os levitas — que não aparecem diferenciados tão nitida mente em outros livro — são apresentados em Números numa posição estratificada (abaixo dos sacerdotes) como zeladores do tabernáculo (1.47-54; 3.5-9; 31.30, 47). Essas estruturas de governo eram absolutamente essenciais para um povo escravo recém-emancipado e não acostumado à autogovemança. 4. Leis. a. Não se considerando os códigos impessoais. O número considerável de diretrizes, instruções e leis referem-se a mais áreas do que simplesmente o culto ou a ética, abrangendo praticamente a vida toda. Há diretrizes sobre o censo (política, 1.2-54; 26.2-63), sobre a distribuição, demarcação e herança da terra (economia, cap. 34), sobre a esposa infiel e os votos das mulheres (assuntos domésticos, caps. 5, 30), sobre a disposição dos espólios 970
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de guerra (âmbito militar, cap. 31) e especialmente sobre o culto (ofertas, festas, purificação, caps. 7 , 29 ; 18.9 ). Essas diretrizes — todas provenientes de Javé — retratam uma dinâmica da interatividade de Javé e seu povo. As instruções (leis) não são um conjunto codificado de es tatutos preparados por legisladores anônimos, mas sim a vontade de Deus, o suserano. O fato de essas leis não serem vistas como promulgações ocorridas dentro de um vácuo social fica claro pela alternância de lei (L) e narrativa (N) desde o início: 1— 10.10 L; 10.11— 14.45 N; 15 L; 16— 17 N; 18— 19 L; 20—25 N; 26— 27.11 L; 27 . 12-13 N; 28—30 L; 31— 33.49 N; 33 . 50- 56 ; 34— 36 L (de acordo com J. Milgrom, Numbers, xv). b. Precedentes e lei. Uma característica marcante das leis em Números é que estas muitas vezes surgem de um caso ou pleito excepcional. É o que ocorre, por exemplo, no episódio das pessoas que se tornaram imundas pelo contato com um cadáver, do que surge a diretriz segun do a qual, para tais indivíduos, a comemoração Páscoa pode ser adiada até que estejam limpos (9.6-14). A falta de clareza com relação à natureza do castigo para aquele que não santifica o sábado, mas, em vez disso, junta lenha em desobediência ao mandamento é assim resolvida: o homem deve ser apedrejado (15.32-36). O caso único de um homem com apenas duas fi lhas que não podem herdar as propriedades do pai é solucionado por meio de um decreto que, de certa forma, reverte um mandato anterior (27.1-11; 36.1-13). A lei apresenta uma fluência relativa. Essa concepção da lei e das circunstâncias individuais não é muito diferente daquela formulado por Jesus: “O sábado foi estabelecido por causa do homem, e não homem por cau sa do sábado” (Mc 2.27). É possível que D. T. Olson (183) tenha ido longe demais ao afirmar que o propósito do livro de Números é ajudar a nova geração a se beneficiar das experiências de gerações anteriores e adaptar as leis às novas situações. Ainda assim, existe uma certa fle xibilidade em relação às “diretrizes”. c. Os dez mandamentos. Apesar de os dez mandamentos não serem relacionados e nem mesmo mencionados, há vários incidentes e até mesmo diversas leis que os pressupõe como leis fundamentais. A idolatria (cf. o segundo mandamento) é mencionada brevemente (25.2). Vê-se um caso de profanação do sábado (15.32-36). O quinto mandamento, que se refere ao respeito pelos pais (figuras de autoridade), pode explicar a medida rigorosa contra Miriã/ Arão e Corá e outros (12.1-16; 16.1-40). A lei contra o adultério serve de contexto para o en volvimento sexual com as midianitas (25.1-18) e o julgamento de uma esposa culpada dessa transgressão (5.11 -31). A integridade (“não darás falso testemunho”) é a questão em jogo nos estatutos sobre os votos (30.1-16). A inobservância ao mandamento contra o homicídio é o assunto de 35.16-34. Balaão viu-se exposto à tentação da cobiça (caps. 22— 24; cf. Judas 11 e o décimo mandamento). 5. Terra. a. Promessa e dádiva. O motivo da jornada é a terra prometida concedida Abraão. A terra é uma dádiva (32.7,9, 11) e também uma promessa (11.12; 14.16). O episódio dc Cades-Baméia declara, sem dúvida alguma, que a terra não deve ser simplesmente tomada à força. Em vez disso, deve ser recebida nos termos de Javé ou deixada para trás. A graça ine rente a essa dádiva fica evidente na constatação de que, mesmo o pecado em Cades-Baméia tendo fechado as portas para aquela geração, o texto prossegue dizendo: “Quando entrardes na terra” (15.2). Da mesma forma, a apostasia em Peor (25.1-18) não é, cm si, motivo suficiente para revogar a promessa; logo em seguida, tem-se a partilha da terra (26.52). O segundo censo é prova de que o veredicto de castigo é mantido (26.64-65) e o mesmo acontecerá com a pro messa da terra. O que é dito sobre a terra é a última palavra (caps. 34— 36). b. Abundância. Da mesma forma que em outras passagens, Canaã é descrita em term atraentes, como uma terra que mana leite e mel (14.8). Prova disso é o relato dos espias e sua amostra dos frutos da terra (13.26). O episódio com os espias não é estratégico apenas para 971
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mostrar a atitude negativa do povo, mas também para oferecer um “antegosto” da excelente qualidade e abundância da terra. c. Ética. Pressupõe-se como fundamento a concepção de que há um comportamen apropriado para a terra prometida. Os últimos capítulos (caps. 34— 36) concentram-se princi palmente na partilha correta, nos indivíduos que marcarão as divisas e na resolução de casos especiais, como o desejo dos gaditas e rubenitas (32.1 -42), bem como as apreensões familiares quanto às filhas de Zelofedade (27.1-14). O homicídio e o derramamento de sangue contami nam a terra (35.33-34). O estilo de vida do povo tem conseqüências ecológicas. C. Resumo Teológico Os dois gêneros principais de Números, lei e narrativa da jornada (cf. 36.13) se referem à questão de um relacionamento dinâmico (em transformação) entre Deus e o povo. Até mes mo as leis (que nesse sentido diferem de Êxodo e Levítico) são contingentes, estando sujeitas a alterações resultantes das circunstâncias. O retrato dessa interatividade, que em Números aparece de forma bastante bilateral é nitidamente distinto do que aparece em Êxodo, Levítico e Deuteronômio, em que predomina a forma unilateral (de Deus para o povo). Então, qual é a teologia de Números? Suas prioridades são o culto e a governança. Daí, sua teologia voltar-se para a pureza, mas também para a autoridade e a liderança — sua legitimação por meio das nomeações e capacitação, os procedimentos para a transferência de liderança, suas designações e responsabilidades. Javé é um Deus de ordem (cf. ICo 14.40). Partindo da estrutura do livro, a atenção concentra-se em Deus como o legislador, guia e cum pridor das promessas, e na apostasia do povo. Em resumo, a teologia de Números gira em tomo de Deus como uma divindade tão atenciosa e inteiramente envolvida com seu povo na jornada rumo à terra, que nem mesmo a apostasia dos israelitas pode frustrar as promessas que o Senhor lhes fez. D. Contexto Canônico Num certo sentido, com suas leis, o livro de Números é um prenúncio de Deuteronômio e, com sua jornada rumo à terra prometida, da qual fazem parte as campanhas militares, adian ta o que se verá no livro de Josué. Temas isolados em Números voltam a aparecer em outras passagens. Os poetas de Israel incorporam o tema da rebelião em seus escritos (SI 78.12-55; observar o v. 52; 106.13-33). Os profetas falam menos sobre sacrifícios do que o faz o livro de Números, e mais sobre o arrependimento, um assunto no qual Números praticamente não toca. A questão da santidade de Javé (marcante em Levíticos) é repetida por Ezequiel, que também trata em maior profundidade da “glória” e da presença de Javé (cf. 40— 48). Os pro fetas também apresentam temas relacionados ao deserto e avaliados de maneiras opostas (Jr 2.2; Ez 20.10-26). Quanto ao NT, Cristo é a “estrela” de Jacó e o “cetro” de Israel (Nm 24.17). De acordo com o modelo de interpretação da tipologia, diz-se que Cristo representa de maneira mais plena aquilo que foi simbolizado pelo maná (Jo 6.22-59) e a água da rocha (4.1-15; 7.37-39), sendo ele próprio a Rocha (ICo 10.4). O ato de levantar o Filho do Homem é comparado à serpente de bronze levantada no deserto (Jo 3.14; cf. Nm 21.4-9). Em termos estruturais, W. Smartley (7, 44-94,95-113) argumenta que a história mais ampla de Israel, inclusive o segmento no deserto, se reflete na estrutura do evangelho o no tema da jornada dentro do evangelho. Assim como Israel, a igreja é um povo escolhido (1 Pe 2.9). Os líderes devem ensinar a palavra e ser exemplos de santidade (1 Timóteo 3; Tt 1.5-9), tendo eles direito a recompensas materiais ( ICo 9.13-14; lTm 5.17-18). A questão do dízimo é reiterada (Mt 23.23; cf. Números 972
Números: Teologia de
18). Advertências aos coríntios sobre comportamentos indevidos são ilustradas com exemplos de Números (ICo 10.1-11). O episódio em Cades-Baméia também serve de base para uma advertência em Hebreus 3.17-19 (cf. Judas 5). As admoestações de Judas contra a rejeição da autoridade e a cobiça são baseadas em Números (Judas 11). Arão; Balaão; Ética; Coate; Coré (Rebelião de); Miriã; Moisés; Dez Mandamentos Terra: 'adãmâ (chào, pedaço de terra, solo, terra, reino dos mortos, # 141); -> 'ere.j (planeta terra, terra, # 824); -> têbêl (mundo, # 93 15) Oferta, sacrifício: -> 'azkãrâ (oferta simbólica, # 260); -> 'isseh (sacrifício por fogo, # 852); -> ’ãsãm (sacrifício pela culpa, # 871); -> zbh (abater, sacrificar, # 2284); -> hattã’a t( sacrifí cio pelo pecado, # 2633); tbh (matar, # 3180); -> minhâ (presente, dádiva, oferta, sacrifício, # 4966); ma 'asèr (dízimo, #5130); ndr (fazer um voto, # 5623); -> nwp I (mover para frente e para trás, balançar, # 5677); -> I (derramar, ser consagrado, libação, # 5818); -> 'õlâ I (holocausto, # 6592); 'arisâ (oferta de manjares, # 6881); -> qorbãn (oferta, presente, # 7933); í/?/1 (matar, # 8821); j í e / e m (sacrifício de compensação, # 8968); -> tãm id(ofer ta regular, # 9458); -> firüm á (tributo, contribuição, # 9556); -> Arão: Teologia; Oferta: Teologia; -> Sacerdotes e Levitas: Teologia Impureza, profanação, contaminação: -> gV II (ser contaminado, profanado, macular, # 1458); hnp I (ser ímpio, contaminado, # 2866); -> tm ’(ser/tomar-se cerimonialmente im puro, contaminar-se, profanar, # 3237); -> piggítl (carne impura, # 7002). B ib l io g r a f ia
R. B. Allen, “Numbers”, EBC 2,1990,657-1008*; idem, “The Theology of the Balaam Oracles”, in Tradition and testament: Essays in Honor o f Charles Lee Feinberg, ed. J. S. Feinberg e R D. Feinberg, 1981,79-119; T. R. Ashley, The Book o f Numbers, 1993,8-11*; P. J. Budd, Numbers, WBC 5,1984, XXXI-XXXII*; D. J. A. Clines, The Theme o f the Pentateuch, JSOTSup 10,1978; G. W. Coats, The Murmuring M otif in the Wilderness Traditions o f the Old Testament: Rebelion in the Wilderness, 1968; M. Douglas, In the Widerness: The Doctrine o f Defdement in the Book o f Numbers, JSOTSup 158, 1993; G. B. Gray, A Criticai and Exegetical Commentary on Numbers, ICC, 1903; W. Harrelson, “Guidance in the Wilderness: The Theology of Numbers”, Int 13, 1959, 24-36*; R. K. Harrison, Numbers: An Exegetical Commentary, 1990,25-28*; R. P. Knierim, “The Book of Number”, in Die Hebrãische Bibel und ihre zweifache Nachgeschinchte, Festschrift fúr R. Rendtorff, ed. by E. Blum, C. Macholz e E. W. Stegemann, 1990, 15563; idem, The Task o f Old Testament Theology, 1995, 380-88; B. Levine, Numbers 1-20, AB, 1993; E. H. Merril, “A Theology o f the Pentateuch”, A Biblical Theology o f the Old Testament, ed. by Roy Zuck, 1991, 1-87 [59-62]*; J. Milgrom, Numbers, The JPS Commentary, 1990*; idem, “Numbers, Book o f', ABD 4:1146-55 [1151-54]*; M. Noth, A History o f Pentateuchal Traditions, trans. B. W. Andersen, 1972; idem, Numbers: A Commentary, tr. J. D. Martin, OTL, 1968; D. T. Olson, The Death o f the Old and the Birth o f the New: The Framework o f the Book o f Numbers and the Pentateuch, BJS, 71, 1985, 179-86*; J. Philip, Numbers, Communicator’s Commentary, 1987; J. Sturdy, Numbers, CBC, 1976, 7-9*; W. M. Swartley, Israels Scripture Traditions and the Synoptic Gospels: Story Shaping Story, 1994; A. C. Tunyogi, The Rebellions o f Israel, 1969; G. Wenham, Numbers, TOTC, 1981, 39-49*. ElmerA. Martens Nuvem
# 6727 ( ‘ãnãn, [aglomerado de] nuvens) 973
Obadias: Teologia de
Localizado entre os livros de Amós e Jonas, Obadias é o quarto livro dos Doze no cânon hebraico. Seus 21 versículos (291 palavras em heb.) distinguem essa obra não apenas como a mais curta dos Pro fetas Menores, mas também como o livro mais breve do AT. Nem o cabeçalho do livro e nem o oráculo em si fornecem nenhuma informação referente ao profeta. Os livros históricos de Reis, Crônicas e Esdras-Neemaias registram pelo menos onze homens com esse nome, mas é pouco provável que algum deles possa ser identificado com o escritor desse livro. A concepção tradicional de que o escritor seja Obadias, um servo de Acabe que teve contato com Elias (1 Rs 18.1-15) perdeu força ao longo dos anos. Obadias: Teologia de
A. Contexto Histórico O cabeçalho do livro, hazôn 'õbadyã, a visão de Obadias (v. 1a), que é o mais curto de todos os profetas que registraram suas mensagens por escrito, não dá informação alguma acerca do contexto histórico do livro. A localização canônica de Obadias entre dois profetas do século VIII (Amós e Jonas) é de ajuda apenas para um exame da história da sua interpretação. Dados do livro (vv. 10-14), que retratam a invasão de Jerusalém, atribuem, para a escritura do livro, a data de vários períodos históricos. De acordo com as propostas defendidas mais vezes, o livro é do tempo de Jeorão (c. 848-841; 2Cr 21.8-20), quando a cidade foi atacada pelos filisteus e árabes, ou do tempo da queda da cidade para os babilônios em 586 a. C., sendo que esta última continua sendo a data preferida por aquelas propostas. B. Análise Literária e Estrutura Várias características literárias importantes sustentam a eficácia retórica do livro e ser vem para definir-lhe a estrutura. 1. Voz. Pode-se identificar cinco vozes diferentes no discurso. A primeira voz é ouvida no cabeçalho: hazôn 'õbadyâ, a visão de Obadias (v. Ia). A segunda voz (v. lb-c) fornece uma breve introdução à voz predominante da obra, a saber, a de Javé: “Assim diz o Senhor Deus a respeito de Edom” (v. lb), “temos ouvido as novas do Senhor” (v. lc). O suj. pl. “nós” não é identificado. Essa mesma voz aparece em três expressões subseqüentes de autoridade profética (citatório), a saber, ne 'um yhwh, declaração do Senhor (“diz o Senhor”, vv. 4d, 8b) e kiyhw h dibbêr, porque o Senhor o falou (v. 18). A terceira voz, a do próprio Javé, é ouvida pela primeira vez no v. 1, anunciando que “às nações foi enviado um mensageiro”. O wãw prefixado em «■/> indica que essa oração é o conteúdo da mensagem de Javé e não uma oração circunstancial retra tando o envio de um mensageiro como um acontecimento paralelo ao ato de ouvir a mensagem. A quarta voz é a do enviado, ouvida nas duas últimas orações verbais do versículo 1: “Levan tai-vos, e levantemo-nos contra Edom, para a guerra”. A quinta voz é a de Edom. Numa breve porém insolente interrogação no final do versículo 3, Edom diz: “Quem me deitará por terra?” 2 .0 uso daforma interrogativa. Além do pronome interrogativo encontrado na expressão de jactância de Edom, “Quem (mi) me deitará por terra?”, há três ocorrências do interrogativo hê prefixado à partícula negativa, a saber, halô ’, sendo que todas esperam uma resposta afir mativa enfática: “Não furtariam só o que lhes bastasse?” (v. 5a); “Não deixariam pelo menos alguns cachos?” (v. 50; “Não acontecerá... que farei perecer os sábios de Edom?” (v. 8a). 3. O uso da form a exclamativa. Em duas ocasiões, a partícula ’êk, “O, como...!” é usado para descrever a devastação e saque de Edom (vv. 5b, 6a). 4. O uso de imagens vividas. As descrições vividas acentuam a caracterização de Edom e a natureza e extensão do julgamento de Deus: construir no alto como águia (v. 4a), pôr o ninho entre as estrelas (v. 4b), beber e sorver (v. 16b-d), a casa de Jacó como fogo (v. 18a), a 974
Obadias: Teologia de
casa de José em chamas (v. 18b), a casa de Esaú como restolho (v. 18c), incendiada e sendo consumida (v. 18d-e). 5. Palavras-chave. A repetição e distribuição de lexemas-chave ao longo de todo o culo provocam não apenas um enfoque e desenvolvimento temático, mas também servem para reforçar a estrutura de unidades literárias significativas: nsh, enganar (# 5958; w . 3a, lb)\yôm , dia (# 3427; bayyôm hahú, naquele dia [8a], beyôm ‘amodkã, no dia em que estando tu presen te [v. 11a], beyôm sebôt zãrím, no dia em que estranhos lhe levaram os bens [v. 11b]; bPyôm 'ãhikã, no dia do teu irmão [v. 12a], beyâm nokrô, no dia da sua calamidade [v. 12b], beyôm 'obdãm, no dia da sua ruína [v. 12d], beyôm fãrâ, no dia da angústia [w . 12e, 14c], hfiyóm 'êdãm, no dia de sua calamidade [v. 13b], heyôm ’êdô, no dia da sua calamidade [v. 13d, f], yôfnyhwh, o Dia do Senhor [v. 15a]); krt, fazer perecer, exterminar (#4162; w . 9b, 10c, 14b); cf. bçr, colheita (# 1305; v. 5e); h a r(# 2215; na expressões har 'êsãw, monte de Esaú [vv. 8d, 9b, 19a, 21b]; har$iyyôn, monte Sião [vv. 17a, 21a] e har qodsí, meu santo monte [v. 16a]); yrs, possuir (# 3769; vv. 17c, 19a, 19c, 20e) e sth, beber (# 9272; v. 16a [3x]). Vê-se abaixo a estrutura literária do oráculo: Cabeçalho Fórmula da mensagem Origem da mensagem: o Senhor Javé Assunto da mensagem: Edom Destinatário da mensagem: nós Origem da mensagem: o Senhor Javé Mensagem de julgamento e restauração A mudança da sorte de Edom Acusação contra Edom A acessibilidade de Edom Os aliados de Edom como seus inimigos A culpabilidade e os crimes de Edom O Dia do Senhor O dia de Edom O dia de Judá O Dia do Senhor O fim de Edom Axioma dc julgamento O julgamento de Edom com todas as nações Reversão dos danos de Edom Restauração
(la) (1 b-c) (Iba) (1 bb) (lca) (lcb) (1 d-20) (1 d-7) (2-4) (5-6) (7) (8-15a) (8-10) (11) (12-14) (15a) (15b-21) (15b-d) (16) (17-18) (19-21)
A mudança da sorte de Edom é descrita nos versículos 2-7 sem nenhuma referência ao que Edom fez. Esse povo se considera seguro e protegido, inviolável e inacessível nas alturas: “ó tu que habitas nas fendas das rochas, na tua alta morada, e dizes no teu coração: Quem me deitará por terra?” (v. 3). O Senhor adverte: "Se o colocares no alto como águia e puseres o teu ninho entre as estrelas, de lá te derribarei, diz o Senhor” (lit., v. 4). O hi. tagbiah (v.4) não se refere ao vôo da águia, mas sim à construção do ninho dela. O objeto direto requerido por essa forma hi. fica em aberto no v. 4a, mas é fornecido por 4b, daí, “se o (= ninho) colocares”. O final da seção é marcado pelo termo citatório ne 'um-yhwh, declaração de Javé. 975
Obadias: Teologia de
A fim de introduzir e desenvolver o tema da acessibilidade de Edom nos vv. 5-6, são apresentadas várias situações envolvendo a vinda de ladrões (v. 5a), saqueadores noturnos (v. 5b) e vindimadores (v. 5e; cf. 9b, 10c, 14b!), ou seja, ceifadores. Esses versículos encontramse repletos de partículas, a saber, 'im, se (3x), ek, “O como...!” (2x) e o interrog. + neg. (es perando uma resposta afirmativa enfática) halô ’, “Não seria?” (2x). O padrão de partículas demonstrando uma seqüência dc reversão começa a retratar na forma aquilo que se tomará cada vez mais claro no conteúdo: Edom considera-se invulnerável. A expressão que aparece duas vezes, “Se viessem a ti (a ti viessem)...” contraria essa percepção. Um segundo conjunto de três elementos é introduzido no v. 7. Serão justamente aquelas relações que Edom cultivou para garantir seu bem-estar e segurança, que servirão para facili tar sua destruição. “Todos os teus aliados”, “os que gozam da tua paz” e “os que comem o teu pão” expulsarão, prevalecerão e desalojarão Edom. Os crimes de Edom são apresentados em detalhes nos vv. 8 -15a. A eficácia da ação divina contra Edom já foi mencionada nas perguntas retóricas com relação aos ladrões e vin dimadores (v. 5). A certeza do julgamento do Senhor e da destruição é expressada inequivo camente no versículo 8. Pela terceira vez no oráculo, e com crescente severidade, uma forma verbal em primeira pessoa tem Javé como sujeito: “Eis que te fiz pequeno” (v. 2a); “De lá te derribarei” (v. 4c); “Não acontecerá, naquele dia, diz o Senhor, que farei perecer os sábios de Edom...?” (v. 8a). A referência à extinção do entendimento de har 'êsãw, monte de Esaú, in troduz no oráculo um novo tema exclusivo a esse livro. O monte de Esaú aparece em Obadias como correlato de har-$iyyôn, monte Sião, o santo monte de Deus. O resultado, propósito e motivo da destruição causada por Javé são dados no v. 9. Dirigindo-se diretamente a Tcmã, o Senhor declara: “Os teus valentes... estarão atemorizados, para que, do monte de Esaú, seja cada um exterminado pela (lit., por causa da) matança”. A preposição prefixada no subs. qetel indica o motivo para o “extermínio” por Javé e não o meio empregado para esse fim. Edom será exterminada “por causa” da matança (v. 9b). Um terceiro conjunto de três elementos é in troduzido no v. 11, mas, dessa vez, Edom é identificada como um desses elementos: 1. zãrím, estranhos (v. 11 b), 2. nokrtm, estrangeiros (v. 11c) e 3. gum attá ke 'aliad mêhem, tu mesmo eras um deles! (v. 1le). Em seguida, são apresentados oito jussivos nos vv. 12-14 expressando a natureza e a culpabilidade de Edom. Tanto atitude (v. 12) quanto ações (vv. 13-14) demonstram que Edom estava inteiramente envolvida na violência perpetrada contra Jerusalém. Um dos aspectos ca racterísticos dessa seção é que a maioria dos lexemas usados na litania de culpa de Edom já foi empregada nos vv. 1-11 para descrever o que está reservado para ela: ’ãh, irmão (vv. 12a; 10a); nkr, alienar, estrangeiro (vv. 12b; 11c); ’bd, fazer perecer, arruinar (vv. 12d; 8c); b w ', vir, entrar (vv. 13a; 5a, 5e, 11c); sa ‘ar, portas (vv. 13a; 11c); gum 'attá, tu mesmo (vv. 13c; 11e); .s7/i, lan çar mão, enviar (vv. I3e; ld, 7a); hayil, riqueza (vv. 13e; 1lb); '/nd. parar, estar presente (vv. 14a; 1la); krt, exterminar (vv. 14b; 9b, 10c). Em outras palavras, o que Edom fez é exatamente o que lhe acontecerá. Sem sombra de dúvida, Edom teve o seu dia! Agora, Javé o Senhor terá o dele! (15a): “Porque o dia do Senhor está prestes a vir sobre todas as nações” (v. 15a). Os vv. 15b-21 constituem a seção final do oráculos. O axioma em vigor no julgamento de Javé é declarado no v. 15b-c: “como tu fizeste, assim se fará contigo”. Mais especificamente, “o teu malfeito tornará sobre a tua cabeça” (v. I5d). No v. 16, o julgamento do Senhor sobre Edom é colocado no contexto do julgamento ao qual todas as nações serão submetidas. De fato, beberão (do cálice da ira do Senhor) e serão como se nunca tivessem existido. Porém, o monte Sião será restaurado e a casa de Jacó recuperará suas posses (vv. 17-18) e território (vv. 19-20) e o reino pertencerá a Javé (v. 21). 976
Obadias: Teologia de
C. Temas característicos 1. Reversão. O tema da reversão é apresentado ao longo de todo o oráculo tanto na for ma quanto no conteúdo. “Como tu fizeste, assim se fará contigo” (v. 15b-c) define Edom nas alturas (vv. 3b-c, e, 4a-b), porém sendo derribada (v. 4c). Edom é arrogante (v. 3), mas será feita pequena entre as nações (v. 2a) e extremamente desprezada (v. 2b). Edom é confiante e segura (v. 3), inacessível e cheia de aliados (v. 7a-c), mas é vulnerável (vv. 3a, 5a, 5b, 5e, 7b) e será devastada (vv. 5c, 9a), saqueada (v. 6), expulsa (v. 7a) e desalojada (v. 7c). Edom ficou nas encruzilhadas para exterminar seu irmão (v. 14a-b), de modo que ela também será exter minada para sempre (vv. 9b, 10c). Edom agiu de modo traiçoeiro contra seu próprio irmão Jacó (v. 11), de modo que os aliados de Edom e seus companheiros mais chegados usarão de traição contra ela (v. 7). Edom regozijou-se no dia da destruição dos filhos de Judá, de modo que Edom será coberta de vergonha e destruída. Profanou o monte santo de Deus (v. 16a), mas esse monte tomará a ser santo (v. 17b). O monte Sião era um lugar de onde fugir (v. 14), mas voltará a ser um lugar de livramento. (-> Retribuição: Teologia) 2. Dia do Senhor. O julgamento de Edom representa o julgamento que Deus fará vir sobre todas as nações. A restauração de Israel indica a obra restauradora universal de Deus. 3. Continuidade e descontinuidade. O livro de Obadias apresenta afinidades tanto te máticas quanto verbais com outras passagens do AT. A participação de Edom na destruição de Jerusalém é descrita no Salmo 137.7; Lamentações 4.21-22 e Ezequiel 25.12-14; 35.5, 12-15. Obadias 1—5 é um paralelo quase perfeito de Jeremias 49.14-16, 9, sugerindo dependência de um dos textos no outro ou dependência mútua de uma fonte em comum. Amós 9.11-12 dá a entender que a restauração da casa de Israel, ou seja, o dia em que o tabemáculo caído de Davi será levantado, ocorrerá “para que possuam o restante de Edom, e todas as nações que são chamadas pelo meu nome, diz o Senhor, que faz estas coisas”. -> yôm I (luz do dia, dia, dia escatológico, hoje, # 3427) B ib l io g r a f ia
T. D. Alexander, D. W. Baker, B. K. Waltke, Ohadiah, Jonah, Micah, TOTCk, 1988, 17-44; L. C. Allen, The Books o f Joel, Obadiah, Jonah and Micah, NICOT, 1976, 127-72; J. R. Bartlett, “The Rise and Fali ofThe Kingdom of Edom”, PEQ 104, 1972, 36-37; idem, “The Moabites and Edomites”, in POTT, 1975, 243-44; W. W. Cannon, “Israel and Edom: The Oracles of Obadiah”, Theology 15, 1927, 129-40, 191-200; A. Condamin, “L’unité d ’Abdias”, RB, 9, 1900, 261-68; R. A. Coughenour, “A View of Value from a Servant of Yahweh”, Reformed Review 24, 1971, 119-23; M. B. Dick, “A Syntactic Study of the Book of Obadiah”, Semitics 9, 1984, 1-29; J. H. Eaton, Obadiah, Nahum, Habakkuk, Zephaniah, Torch, 1961; T. J. Finley, Joel, Amos, Obadiah, WEC, 1990, 339-80; N. Glueck, “The Boundaries of Edom”, HUCA 11, 1936, 141-57; J. Gray, ‘T he Diaspora o f Israel and Judah in Obadiah v. 20”, ZAW 65, 1953, 53-59; P. R. House, The Unity o f the Twelve, 1990; B. A. Jones, The Formation o f the Book o f the Twelve: A Study in Text and Canon, 1995; J. J. Niehaus, “Obadiah”, in The Minor Prophets: An Exegetical and Expository Commentary, 1993, 495-541; B. K. Smith e F. S. Page, Amos, Obadiah, Jonah, NAC, 19b, 1995, 171-201; J. M. P. Smith, “The Structure o f Obadiah”, AJSL 22,1906, 131-38; J. A. Thompson, “Obadiah”, in IB 6, 1956,855-67; J. D. W. Watts, Obadiah: A Criticai Exegetical Commentary, 1969; H. W. WolíT, Obadiah and Jonah, 1986. Dennis R. Magary Obediência -> # 9048 (sm ', ouvir, escutar, entender, dar ouvidos, obedecer) 977
Ofertas e Sacrifícios
Observação
# 8011 (r ’h, ver, ter visões, escolher)
Obstinação
# 9244 (serirút, obstinação)
Ocultação -> # 6623 ( ‘Im, ocultar, esconder, ser secreto) Ocupação
# 6271 ( ‘inyãn, negócio, assunto, ocupação)
Ódio
# 8533 (iw o d ia r, aquele que é um inimigo)
Oeste
# 5115 (m a‘arãb II, pôr-do-sol, Oeste)
Oferta -> # 4966 (minhâ, dádiva, presente, oferta, sacrifício) Oferta movida -> # 9485 (tfinúpâ, oferta movida) Oferta pacífica -> # 8968 (selem, sacrifício de acordo/quitação) Oferta pela culpa
# 871 ( 'ãsãm, oferta pela culpa, responsabilidade, culpa)
Oferta pelo pecado -> # 2631 (hatã a, oferta pelo pecado) Oferta voluntária -> # 5605 (wí/ò, oferecer, dar uma oferta voluntária)
1. Definição de termos. Nossa palavra “oferta” vem de um termo em lat., que se refere à apresentação de uma dádiva (offere, oferecer, apresentar). “Sacrifício” é derivado de uma combinação de palavras do lat. que significam sagrado e fazer (sacer, santo, maisfacere, fazer) e, portanto, refere-se a tomar algo sagrado, consagrar. Assim, alguns estudiosos usam o primeiro termo para indicar apenas a apresentação de algo como uma dádiva e o segundo termo para desig nar a dádiva como algo apresentado e oferecido especialmente para um ser divino. Outros usam o termo “sacrifício” para se referir a qualquer “oferta” que contenha a imolação ritual de um animal. Em ambos os casos, “oferta” é um termo mais geral do que “sacrifício” (Henninger, 544-45). A expressão heb. “apresentar uma oferta” é uma combinação do vb. apresentar, trazer para perto, oferecer (hi. hiqríb, radical qrb, # 7928; Lv 1.2; 2.1; 3.1; etc.) e seu subs. cognato, oferta (qorbãn, # 7933; Lv 1.2; 2.1; 3.1; etc.; cf. Mc 7.11 para uma transliteração desse termo [“Corbã”]). Na estrutura geral do discurso de Levítico 1—3, por exemplo, “trazer uma oferta” serve de contexto para a introdução do holocausto, das ofertas de manjares e das ofertas pací ficas, respectivamente. O adorador podia trazer um holocausto (1.3), uma oferta de manjares (2.1) ou o sacrifício de uma oferta pacífica (3.1). A palavra heb. traduzida normalmente como “sacrifício” (zebafj) só ocorre em Levítico 1—3 aa partir de 3.1 na introdução da seção sobre a oferta pacífica (ver também vv. 3, 6, 9), na qual continua sendo usado o termo para oferta (vv. 1, 2, 6, 7, 8, 12, 14). A oferta pacífica era um tipo específico de oferta que também era um sacrifício, ou seja, dela fazia parte um animal que era imolado e, depois, consumido como parte de uma refeição comunitária. Em Levítico e ao longo de praticamente todo o AT, tanto o Ofertas e Sacrifícios
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Ofertas e Sacrifícios
subs. sacrifício quando seu vb. cognato, sacrificar, são usados apenas com referência às ofertas pacíficas (-> Selem, # 8968; zbh, # 2283, para mais detalhes). Portanto, estritamente falando, do ponto de vista do AT, deve-se limitar o uso do termo “sacrifício” somente à oferta de um animal e, mais especificamente, às ocasiões em que o ani mal era abatido e consumido como parte de uma refeição comunitária, excluindo desse modo os holocaustos, ofertas pelo pecado e ofertas pela culpa. Uma vez que nosso termo “sacrifí cio” tem um significado mais amplo do que a palavra heb. (ver acima), é comum os estudiosos empregarem-no de maneira mais informal para referirem-se a qualquer tipo de oferta de ani mal em contraste com a oferta de manjares. Neste artigo, a palavra “oferta” será usada, por um lado, como um termo abrangente para ofertas animais e vegetais, inclusive para aquelas em que a imolação visa especificamente à refeição comunitária. Por outro lado, o termo “sacrifício” será limitado às ofertas em que os animais são imolados para uma refeição comunitária (ou seja, oferta de sacrifícios pacíficos, que é uma variação da oferta pacífica; -> selem, # 8968). A expressão “sistema sacrificial” pode ser usada para se referir a todo o sistema de ofertas e sacrifícios do AT considerados em conjunto. Os estatutos do AT para ofertas e sacrifícios são conhecidos tanto acadêmica quanto popularmente por seus detalhes numerosos e complicados. Parte da confusão e dificuldade se deve, infelizmente, ao fato de os escritores do AT pressuporem, de modo geral, que o leitor compreende a lógica por trás dos procedimentos rituais e, portanto, muitas vezes esses escri tores nâo apresentarem explicações para tais procedimentos (ou seja, é possível que, para os antigos, o significado estivesse implícito e compreensível na própria ação). Na verdade, essa falta de explicações detalhadas se deve em parte à natureza inerente da atividade ritual em si, na qual o significado é principalmente demonstrado e não explicado. Por isso, toda a questão do significado dos rituais está repleta de dificuldades. 2. Teorias sobre as ofertas e sacrifícios. Ao longo do último século, aprox., os tropólogos da cultura, os sociólogos e os historiadores da religião propuseram várias teorias diferentes sobre a origem e o significado inicial desse fenômeno religioso (p. ex., a dádiva, a refeição, a consagração, concepções mágicas e miméticas do sacrifício; ver os resumos em Henninger, 550-54; Anderson, 871-73 e Brown, 424-25; e a discussão neste artigo). A maior parte dessas teorias é reducionista (ou seja, reduz indevidamente a diversidade do fenômeno sacrificial a uma única explicação lógica) ou evolucionistas (propondo que todas as ofertas e sacrifícios tenham evoluído a partir de uma forma primitiva). Os estudiosos de hoje tendem a desconsiderar as características reducionistas e evolu cionistas das diversas teorias e tratá-las como mutuamente complementares e não contraditórias, sugerindo a possibilidade de alguma verossimilhança em todas ou na maioria delas, pelo menos em certas culturas e sistemas rituais. Por mais empolgantes que sejam, porém, várias das teorias ou alguns dos aspectos dessas explicações baseiam-se em visões idiossincráticas da sociedade, religião e da relação entre as duas que não resistiram, ou provavelmente não resistirão, à prova do tempo, ou ainda que não se encaixam com aquilo que a Bíblia diz sobre as ofertas e sacri fícios. Um exemplo relativamente recente é a concepção de Rene Girar dos sacrifícios como uma forma de violência social mimética deslocada ( Vtolence and the Sacred, 1977). Sua teoria é interessante e pode ajudar a explicar alguns aspectos da religião e do sacrifício globalmente, mas é preciso lembrar-se que não se trata de uma idéia apresentada explicitamente no próprio AT com referência ao sacrifício de animais. O mesmo vale para o que segue: a. a teoria psicológica da redução da ansiedade por meio da oferta de sacrifícios a uma divindade; b. as várias explicações associadas a mitos/ritu ais, de acordo com as quais a imolação ritual de um animal representava e encenava novamente 979
Ofertas e Sacrifícios
a morte de um deus ou rei em favor da sociedade; c. as teorias mágicas, segundo as quais, de uma forma ou de outra, a destruição da vítima sacrificial liberava uma força mágica que resultava no benefício do(s) ofertante(s). Nenhuma dessas concepções tem o apoio substancial das Escrituras, apesar de constituírem, de fato, fenômenos que podem ser encontrados em vários outros sistemas rituais religiosos. Nossa abordagem será trabalhar a partir da termino logia heb. e de conceitos do AT, movendo-nos em direção a constructos teóricos que possam explicar melhor esses determinados conjuntos de terminologia e conceitos. Nossa proposta é que três teorias contribuíram significativamente para tomar mais claro o sistema de ofertas e sacrifícios do AT. 3. A teoria da dádiva. Em primeiro lugar, em algumas partes do AT, as ofertas parece ser consideradas principalmente dádivas para o Senhor. O primeiro termo sacrificial impor tante usado no AT é minhâ , oferta, presente, tributo, dádiva (Gn 4.3-5, o episódio de Caim e Abel; ver Levítico 2 para o significado mais técnico desse termo na BH, oferta de manjares; ver também minhâ, # 4966). Quando Tyler propôs sua teoria da dádiva de sacrifícios em 1871, reduziu todas as ofertas e sacrifícios à concepção mecânica de reciprocidade ou suborno: “Eu lhe dou para que você me dê em troca”. Essa teoria baseava-se no animismo (ou seja, na idéia de que os espíritos habitam na natureza e, portanto, são amorais), de modo que, inicialmente, o sacrifício não possuía um significado moral e não era uma expressão de verdadeira adoração em nenhum sentido relevante. Era, em essência, uma transação comercial como aquelas que ocorrem entre homens. Tal idéia é discordante de Gênesis 4, o caso mais antigo registrado de sacrifícios de cereais e carne na história humana dc acordo com a Bíblia. Tudo indica, porém, que Caim e Abel levaram suas dádivas para reverenciar e obter a atenção de um Deus pessoal que podia se impressionar ou não com a dádiva do ofertante. Além disso, esse Deus se preocu pava com os atos e respostas morais, como indica o contexto subseqüente. Assim, uma teoria não evolucionária e não reducionista de dádivas que considera a dádiva como uma expressão de reverência, ação de graças e afins, ajuda-nos a compreender o sistema de ofertas e sacrifícios do AT. Sem dúvida, Caim e Abel consideravam suas ofertas como dádivas (ou tributos, ou algo do gênero) ao Senhor, e o termo minhâ, muitas vezes, sig nifica exatamente isso, especialmente nos contextos não levíticos. Outro termo importante que se presta naturalmente à teoria da dádiva é qorbãn, ofer ta, dádiva (-> # 7933). Ocorre 80x no AT e, com exceção de 7x, entre Levítico 1 e Números 9, sendo, portanto, o termo padrão levítico para uma dádiva que é levada ou apresentada (cf. o verbo correspondente do radical qrh, # 7928) ao Senhor em seu santuário (em Levítico, mi nhâ normalmente significa oferta de manjares e não dádiva). O termo aparece inicialmente em Levítico 1.2 (2x), “Fala aos filhos de Israel e dize-lhes: Quando algum de vós trouxer oferta (qorbãn) ao Senhor, trareis a vossa oferta (qorbãn) de gado, de rebanho ou de gado miúdo”. Aqui, o termo refere-se ao holocausto (v. 3), mas também é usado especificamente para fazer referência à oferta de manjares (p. ex., 2.1), oferta pacífica (p. ex., 3.1), oferta pelo pecado (p. ex., 4.28), outros tipos de ofertas (p. ex., Nm 5.15) e, por vezes, como um termo geral para a combinação de vários tipos de ofertas: “Ele apresentará a sua oferta (sing. heb.) ao Senhor, um cordeiro de um ano, sem defeito, em holocausto, e uma cordeira de um ano, sem defeito, para oferta pelo pecado, e um carneiro, sem defeito, por oferta pacífica, e um cesto de pães asmos, bolos de flor de farinha com azeite, amassados, e obreias asmas untadas com azeite, como também a sua oferta de manjares e as suas libações” (Nm 6.14-15). O vb. dar e seus derivados nominais são usados por vezes com referência a (partes de) diversos tipos de ofertas e sacrifícios (ver Êx 22.29-30; 28.38; Lv 23.38; Nm 18.11-12). Além disso, dentro do sistema levítico propriamente dito, o termo 'iiseh significa dádiva ou 980
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presente e é empregado para ofertas de carne e também de manjares (ver Lv 1.9; 2.3; 3.5; etc.; há paralelos propostos no ugar. e no ár.; 'isseh, # 852). A tradução comum desse termo para nossa língua como “oferta queimada” baseia-se numa derivação questionável do heb. es, fogo. Observe-se que o termo 'isseh por vezes se refere a ofertas que jamais deviam ser queimadas no altar (p. ex., o pão da propiciação no tabemáculo, Lv 24.7,9). Do ponto de vista bíblico e do OMA, há outro aspecto importante na idéia de que as ofertas constituíam dádivas. Não é mera coincidência que, em sua maior parte, as dádivas sacrificiais ao Senhor eram diversos tipos de alimentos. No mundo do OMA, as ofertas de alimentos eram, pelo menos em algumas ocasiões, consideradas como fonte de sustento para o(s) deus(es). Em alguns textos e rituais mesopotâmios, o cuidado para com os deuses e sua alimentação era parte importante da ideologia associada às estátuas que os representavam em suas casas (ou seja, os templos) e em outros lugares (p. ex., em procissões ou viagens, ver Oppenheim, 18398). De modo geral, os estudiosos consideram essas ofertas de alimentos como dádivas ao(s) deus(es) que poderiam angariar o favor divino para o(s) ofertante(s). Por certo, não havia estátua alguma de Deus na antiga Israel e, de acordo com o AT, o Deus da antiga Israel não precisava se alimentar (ver SI 50.12-14). Ainda assim, as ofertas eram, por vezes, chamadas de “manjares” do Senhor (Lv 3.11, 16; 21.6, 8, 17, 21-22; 22.25; Nm 28.2,24; Ez 16.19; 44.7; Ml 1.7) e sua queima produzia um “aroma agradável ao Senhor” (ver, p. ex., holocaustos [Lv 1.9], ofertas de manjares [2.2], ofertas pacíficas [3.5], ofertas pelo pecado [4.31]; cf. Gn 8.21; Nm 15.3,7; 28.6,8; e para ofertas a ídolos, ver esp. E z 6 .13; 16.19; 20.28) e o altar do holocausto era chamado de “mesa do Senhor” (Ml 1.7, 12; Ez44.16). Além disso, os holocaustos diários contínuos, oferecidos a cada manhã e no final da tarde com suas respectivas ofertas de manjares e libações, podiam indicar ao israelita comum que havia uma refeição matinal (desjejum) e outra vespertina (jantar) do Senhor em sua casa (Ex 29.38-45; Lv 6.20; Nm 4.16; 28.3-8, 10, etc.; 1Cr 16.40; Ed 3.5; Ez 46.13-15; Dn 8.11 -13; 11.31; 12.11; cf. as refeições dos deuses em seus templos na antiga Mesopotâmia). Ademais, o pão da propiciação era colocado todos os sábados sobre a mesa de ouro do santuário (Êx 25.30; 40.22-23; Lv 24.8; Nm 4.7; 1Rs 7.48; 2Cr 2.4); havia sempre luz no santu ário (Êx 27.20-21; Lv 24.2-4) e o incenso estava sempre emanando sua fragrância (Êx 30.7-8). A partir disso, poder-se-ia concluir facilmente que o Senhor estava, de fato, vivendo fisicamen te naquele local, como pessoas viveriam em suas casas. Êxodo 29.42-45 ressalta exatamente essa questão na conclusão da legislação sobre o holocausto: “Este será o holocausto contínuo por vossas gerações, à porta da tenda da congregação, perante o Senhor, onde vos encontrarei (Moisés), para falar contigo ali. Ali, virei aos filhos de Israel, para que, por minha glória, sejam santificados... E habitarei no meio dos filhos de Israel e serei o seu Deus”. Poder-se-ia considerar que as dádivas de ofertas de alimentos, bem como as diversas expressões relacionadas resumidas acima dão a entender, que, de acordo com o AT, o Deus de Israel de fato consumia as ofertas de alimentos. Porém, uma leitura integrada do AT indica que, de acordo com a teologia sacerdotal do AT, o verdadeiro propósito dessas expressões era deixar claro para o povo e para os sacerdotes o fato de que Deus estava verdadeiramente presente de modo físico, habitando no tabemáculo (-> Levítico: Teologia). Que melhor maneira haveria de transmitir tal idéia do que exigir que todas as necessidades comuns de uma casa fossem su pridas continuamente no tabemáculo e oferecidas ao seu residente da maneira correta (ou seja, por meio dos holocaustos diários, etc.)? O fato de que Deus, na verdade, nâo se alimentava, mas ainda assim estava presente para o sacrifício ao mesmo tempo em que residia no céu foi transmitido nas cerimônias de inauguração dos altares de holocaustos no tabemáculo (Lv 9.22-24) e no templo (2Cr 7.1-3) 981
Ofertas e Sacrifícios
bem como em outros episódios e declarações (p. ex., Jz 13.15-23; IRs 8.27-30). É claro que o povo também podia entender mal e começar a pensar que Deus precisava ou queria que lhe dessem ofertas de manjares para que pudesse comê-las, mas essa idéia é firmemente censurada no Salmo 50 e em outras passagens do AT (p. ex., ver as repreensões proféticas em Is 1.10-17; Jr 7.21-26; Os 6.6; Am 5.21-24; Mq 6.6-8). 4. A teoria da comunhão. Em segundo lugar, há outras passagens do AT nas quais sistema sacrificial concentra-se na comunhão com o Senhor. O fato de que Deus habitava dc verdade no meio do povo no tabemáculo (e posteriormente no templo) e desejava ter um rela cionamento com esse povo é fundamental para o sistema de ofertas e sacrifícios prescrito no Sinai (ver os comentários acima sobre Êx 29.42-45). É a (zebah)selãmin, (sacrifício da) oferta pacífica que chama a atenção para o aspecto de comunhão do sistema sacrificial do AT (ver esp. Lv 3.1-7 e 7.11 -21; zhh, # 2283; selem, # 8968). É verdade que a parte de gordura da oferta era uma dádiva de alimento ao Senhor, semelhante ao holocausto como um todo e às porções memoriais das ofertas de manjares (cf. os comentários acima e expressões como oferta queima da, aroma agradável ao Senhor, 3.5; cf. 3.11, 16; 7.25). Porém, a característica distinta da oferta pacífica era o fato de que os ofertantes costumavam consumir quase toda a carne como parte de uma refeição comunitária diante do Senhor. Somente a gordura e o sangue eram entregues diretamente ao Senhor no altar (7.22-27) e apenas determinadas porções da carne eram dadas aos sacerdotes como prebenda (ou seja, remuneração pelos serviços prestados, 7.28-34). Quando W. Robertson Smith propôs sua teoria da comunhão para a origem do sacrifí cio em 1889, baseou-a na suposição de que todas as religiões eram, a princípio, totêmicas. De acordo com sua versão dessa teoria, a fim de sustentar a vida da comunidade era necessário imolar o animal tribal totêmico e consumir sua carne numa refeição comunitária. O animal totêmico representava tanto a tribo quanto o deus e era uma espécie protegida exceto quando imolado para aquele fim. O consumo da carne do animal criava uma comunhão entre o deus e sua comunidade de pessoas. De acordo com Smith a idéia de um sacrifício como dádiva (ver acima) só se desenvolveu bem depois. É claro que na Bíblia não há indicação alguma de que um animal tenha, em algum mo mento, servido de totem do Senhor. Além disso, a idéia de que todos os outros tipos de sacri fícios originaram-se da natureza comunitária da refeição sacrificial não encontra apoio nem no AT nem em fontes extrabíblicas do OMA e de outras religiões. Ainda assim, ao colocar-se de lado o seu totemismo, evolucionismo e reducionismo, a teoria da comunhão tem muito que proporcionar para a compreensão da oferta pacífica e da importância dela para a comunhão relacionai entre o Senhor e seu povo da aliança. Apesar de o termo oferta pacífica (selãmim) ocorrer pela primeira vez em Êxodo 20.24, o subs. relacionado zebah, sacrifício (# 2285; e seu vb. zbh [# 2284]) aparecem em Gênesis 31.54 com relação ao sacrifício que foi oferecido e consumido para sancionar o acordo dc aliança entre Jacó e Labão (cf. 26.30; outras ocorrên cias mais antigas do subs. e/ou vb. estão em Gn 46.1; Êx 8.27, 28; 10.25, 12.27; 18.12; 20.24; 23.18). O termo selãmim em si indica que relações pacíficas estavam sendo estabelecidas ou praticadas entre aqueles que participavam do ato de se alimentar (cf. o termo bastante conhecido sãlôm, paz, bem-estar). Além disso, naquele tempo, tanto quanto ou provavelmente até mais do que hoje em dia, o próprio ato da refeição conjunta deixava implícitas relações amigáveis e um envolvimento significativo. Assim, não é de surpreender que fossem apresentadas ofertas pacíficas juntamente com os holocaustos na ratificação da aliança no Sinai em Êxodo 24.5. Como sempre, a carne dos holocaustos era inteiramente consumida pelo fogo no altar, mas é provável que a carne das ofertas pacíficas tenha feito parte daquilo que o grupo de representantes comeu diante 982
Ofertas e Sacrifícios
do Senhor na montanha (Êx 24.1-2, 9-11). Além disso (apesar de não haver registro algum), é possível que, ao mesmo tempo, a congregação toda estivesse consumindo carne de ofertas pacíficas ao sopé da montanha. O propósito de comer dessa oferta era simbolizar o compro misso de relacionamento que havia sido estabelecido entre Deus e seu povo. Sempre que tal oferta era apresentada, simbolizava novamente esse mesmo compromisso e podia ter o efeito de chamar o povo para que demonstrasse uma lealdade renovada ao Senhor e para com os membros da comunidade. 5. A teoria da consagração. Em terceiro lugar, em alguns contextos do AT, o princi motivo para se apresentar uma oferta era consagrar alguém ou algo ao Senhor e aos seus santos propósitos, ou seja, conferir a algo ou a alguém uma condição sagrada, tomá-lo santo e, por tanto, removê-lo da esfera de uso comum (Lv 10.10a, “para fazerdes diferença entre o santo e o profano”). Quando Henri Huvert e Mareei Mauss propuseram sua teoria da consagração em 1898, argumentaram que o sacrifício ou oferta em si não era apenas uma dádiva ao Deus (ver acima), mas também era consagrado (ou seja, tomado santo) à divindade. Além disso, podia servir, ao mesmo tempo, para tomar alguém ou alguma outra coisa santa (ou seja, sagrada) à divindade (ver a explicação geral dos diversos efeitos desse sacrifício em Hubert e Mauss, 9-13). De qualquer modo, a oferta mediava entre o sagrado (= santo) e o profano (= comum) em favor do(s) ofertante(s). Assim, o ofertante penetrava o mundo do sagrado e realizava al guma coisa (p. ex., oferta de uma dádiva ou tributo, expiação, comunhão, etc.), enquanto, ao mesmo tempo, resguardava-se do risco de entrar em contato direto com o ser divino, o que era, por natureza, perigoso. Essa teoria evita alguns dos problemas evolucionários e reducionistas das teorias da dá diva e da comunhão (ver acima), mas baseia-se numa visão puramente sociológica da religião. Ou seja, qualquer visão determinada do mundo do(s) deus(es) era considerada por Hubert e Mauss como uma criação da sociedade que a produzia. Ofertas e sacrifícios eram, na realida de, atos dc abnegação, nos quais o ofertante reconhecia e se submetia a uma sociedade e não a uma divindade (cf. a sociologia de E. Durkheim). De acordo com o AT, porém, o Senhor esta va, de fato, presente. Javé não era e não é um constructo criado pela sociedade. Em vez disso, ele era quem estava criando e moldando a sociedade israelita para que ele pudesse continuar a habitar em meio a ela. Ainda assim, apesar de sua tendência originalmente sociológica, a teoria da consagração sem dúvida corresponde a certas realidades do sistema de ofertas e sacrifícios do AT. De acordo com o AT, o Senhor é um Deus santo e um dos seus principais mandamen tos para a nação de Israel na legislação sacerdotal foi “sereis santos, porque eu sou santo” (Lv 11.45b; cf. 19.2; 20.26; também lPe 1.16 no NT). O embasamento lógico da ordem dada por Deus para que os israelitas fossem santos pois o Senhor seu Deus era santo, vem das primeiras promessas e obrigações da aliança no Sinai. De acordo com Êxodo 19.5b-6a, o plano promissivo do Senhor com relação a Israel era, “sereis a minha propriedade peculiar dentre todos os povos; porque a terra é minha; vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa...” Há inúmeras interpretações sobre o significado de Israel tomar-se um “reino de sacerdotes” (ver o resumo de pontos de vista diferentes cm Durham, 263). É provável que isso contivesse duas idéias principais e que não são mutuamente exclusivas: a. Em comparação com as outras nações, Israel era “propriedade peculiar” (19.5b) e, portanto, atuaria como mediadora sacerdotal em favor dos outros povos (cf. esp. Is 61.6; 66.21). Na BH, o “vós” no início de Êxodo 19.6 é enfático, indicando que, apesar de todas as nações pertencerem ao Senhor, careciam da mediação de Israel, como reino de sacerdotes, em favor delas. b. O ritual de ratificação da aliança em 24.3-8 na verdade foi uma cerimônia de ordenação de Israel como reino de sacerdotes; ou seja, uma nação santa (19.6b) que possuía 983
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acesso direto a Deus por meio da presença dele no tabemáculo, para onde os israelitas iriam e adorariam (Scott, 216-19). Do procedimento ritual, em Êxodo 24, fazia parte a aspersão com sangue do holocausto e das ofertas pacíficas (v. 5) tanto sobre o altar (v. 6) quanto sobre o povo (v. 8). Essa asper são de sangue sobre o povo é singular em Israel e, ao que parece, teve o efeito de consagrar o povo ao Senhor (ver Nicholson, 172; Van Seters, 123-24). Existe, porém, uma semelhança impressionante entre o ritual de Êxodo 24 e a consagração dos sacerdotes arônicos em Êxodo 29 (cf. Levítico 8), no que diz respeito a aplicar-se um pouco de sangue da oferta (pacífica) de ordenação na orelha direita, polegar da mão direita e polegar do pé direito de Arão e seus filhos e, depois disso, aspergir parte desse sangue ao redor do altar (Êx 29.20; Lv 8.23-24). As diferenças entre Êxodo 24.5-8 e 29.20 devem-se, provavelmente, a um dos seguintes fatores ou a ambos: a. a consagração em Êxodo 24 referia-se ao sacerdócio de toda Israel, de modo que era apropriado para o significado do ritual realizar uma aspersão geral e corporativa do sangue, e b. o grande número de pessoas envolvidas em Êxodo 24 impediu que Moisés tocasse especificamente o corpo de cada pessoa como no caso dos sacerdotes. A sugestão de uma relação próxima entre os atos de consagração em Êxodo 24 e 29 é apoiada ainda pelo ritual de manipulação do sangue da oferta pela culpa na purificação ritual do leproso (Levítico 14). O procedimento nesse caso era praticamente idêntico àquele para a consagração dos sacerdotes (14.14). Ao que parece, a lógica por trás disso era que, pelo fato do leproso ter sido expulso de sua nação santa (ou seja, profanado; cf. 13.46 para a expulsão do leproso da comunidade), tornava-se necessário consagrá-lo novamente (ou seja, tomá-lo santo outra vez; asãm, oferta pela culpa [# 871 ], para o significado disso em relação ao problema da profanação) e assim, readmiti-lo na comunidade nacional, a qual, completando o círculo, havia sido estabelecida a princípio como uma comunidade consagrada pelo ritual em Êxodo 24. Esses três rituais de consagração com manipulação de sangue (Êxodo 24; 29 e Le vítico 14) são os únicos casos no AT de aplicação do sangue sacrificial no corpo dos membros do povo. Assim, a manipulação do sangue em Êxodo 24.6-8 teve o feito de consagrar a nação como “reino de sacerdote” e “nação santa” ( 19.6). Por um lado, tudo indica que sempre que uma oferta era apresentada ao Senhor, pela lógica subjacente, tal oferta era, com isso, consagrada a ele. Qualquer que fosse o fim dado à carne (Lv 3.16-17; 7.22-27), no mínimo o sangue era sempre oferecido ao Senhor no altar de algum modo determinado, pois representava a vida (ou seja, a alma) da vítima sacrificial (Lv 17.11; -> kpr I, expiar, expiação, # 4105) e a gordura era queimada no altar como a porção do Senhor (sua dádiva, ver seção 3). Por outro lado, se o propósito de uma oferta em particular era consagrar algo ou alguém ao Senhor por meio da oferta, então havia mais indicações desse objetivo. Muitas vezes, era preciso algum tipo de procedimento especial de manipulação do sangue, semelhante aos procedimentos observados em Êxodo 24; 29 e Levítico 14. Levítico 16.19, por exemplo, afirma explicitamente que no Dia da Expiação, a manipulação especial do sangue da oferta pelo pecado no altar do holocausto tinha o efeito não apenas de purificar, mas também de consagrar o altar (-> hattã’t, oferta pelo pecado, # 2633). Assim, é evidente que o sangue era uma parte importante do mecanismo de consagra ção ritual dentro do sistema sacrificial do AT. Na oferta e manipulação do sangue, algo que por natureza já pertencia ao Senhor e somente a ele, o sangue era usado para criar um vínculo entre o Senhor e a pessoa ou coisa a ser consagrada a Deus. Isso fica evidente em Êxodo 24; 29 e Levítico 14. Nesses três casos, o sangue tinha contato direto com o Senhor (ou seja, o altar, que representava o Senhor) e a(s) pessoa(s) a ser(em) consagrada(s), criando assim uma ligação entre ela(s) e Deus. Essa idéia fica ainda mais clara em Êxodo 24.6-8. A seqüência é 984
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importante: Moisés aspergiu metade do sangue da oferta no altar (v. 6b), o povo fez um jura mento de fidelidade à aliança (v. 7) e Moisés aspergiu a outra metade do sangue sobre o povo (v. 8), enquanto proclamava: “Eis aqui o sangue da aliança que o Senhor fez convosco a res peito dc todas essas palavras”. A combinação de elementos nos vv. 6-8, em que sem dúvida alguma é realizado um julgamento entre as duas manipulações de sangue, e com relação a elas, torna difícil não se chegar à conclusão de que ao realizar esse ritual, Moisés determinou uma aliança de juramento de sangue entre o Senhor e a nação de Israel (McCarthy, 253 em oposição a Nicholson, 131, 168-72, esp. 171, que procura argumentar incorretamente, com base em sua análise históricocritica redacional de Ex 24.1 -11, que, apesar de o ritual de sangue nos vv. 6-8 ter consagrado os israelitas ao Senhor, não podia ter estabelecido e não estabeleceu um vínculo de aliança en tre Israel e o Senhor). A base lógica inequívoca em Êxodo 24 deve orientar a compreensão da consagração pelo sangue ao longo de todo o sistema levítico (p. ex., Êx 29.20; Lv 14.14). Além disso, é muito provável que essa lógica fundamental seja inerente ao sistema como um todo, ainda que a natureza e o propósito de vários dos procedimentos rituais não pu dessem refleti-la tão claramente quanto o ritual em Êxodo 24. Na purificação e consagração do altar em si em Levítico 16.19, por exemplo, a aplicação do sangue da oferta pelo pecado ao altar não pode ser igualada com a aplicação sobre uma pessoa (como p. ex., em Êxodo 24; 29 e Levítico 14), pois era o próprio altar do Senhor que estava sendo consagrado. O objetivo não era usar o sangue para ligar o altar já consagrado ao povo a fim de consagrá-los ao Senhor, mas sim, de consagrar em primeiro lugar o altar em si (cf. Lv 8 .15, “depois, derramou o resto do sangue à base do altar e o consagrou, para fazer expiação por ele”). É nisso que se encontra uma das principais linhas de distinção entre os diversos tipos de ofertas e sacrifícios dentro do sistema levítico. 6. Dádivas, comunhão, consagração e as ofertas do AT. Por um lado, o holocaus e a oferta de manjares funcionavam basicamente como dádivas consagradas ao Senhor (ver acima, seção 3, a teoria da dádiva; cf. p. ex., Lv 1.9; 2.2 e 'iSSeh, oferta queimada, # 852). Por outro lado, na oferta pacífica, apenas certas partes eram entregues como dádivas consagradas ao Senhor, particularmente as porções de gordura (3.16-17; 7.22-27; ver os comentários acima). Assim, os holocaustos foram importantes em Êxodo 24 como dádivas ao Senhor, mas foi pre ciso realizar ofertas pacíficas a fim de fornecer a carne necessária para a refeição de comunhão da aliança (v. 11). Aliás, o fato de certas porções da oferta pacífica serem queimadas ao Senhor (especialmente a gordura) enquanto a carne era consumida pelos ofertantes (certas porções eram reservadas para os sacerdotes e suas famílias: o t^ríimâ, contribuição, # 9556 e tenúpâ, oferta movida, # 9485) indicam um compromisso simbolizado ritualmente entre o povo e o Senhor, semelhante àquele refletido na cerimônia de juramento de sangue em Êxodo 24.6-8. Naquele caso, metade do sangue foi aplicado ao altar do Senhor e metade sobre o povo da aliança (ver acima), ou seja, o sangue foi dividido entre o Senhor e o povo, o que corresponde à distribui ção das porções comestíveis da vítima oferecida no ritual comum da oferta pacífica (para uma apresentação clara dos tipos de sacrifícios e ofertas, ver o quadro nas páginas ....). Porém, em Êxodo 24.5-8, Moisés usa o sangue tanto dos holocaustos quanto das ofer tas pacíficas para consagrar o povo ao Senhor por meio do juramento da aliança (vv. 6-8; ver seção 5). A oferta de ordenação em Êxodo 29.19-34 (cf. Lv 8.22-35) também foi uma “oferta pacífica especializada” (Rainey, 496) uma vez que as porções foram consumidas pelos ofer tantes, nesse caso, os próprios aspirantes a sacerdotes (Êx 29.33-34; -> Selem, # 8968; também os comentários acima). É importante observar que apesar de a oferta pacífica concentrar-se normalmente na comunhão, seu sangue também podia ser usado para fins de consagração de 985
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pessoas ao Senhor, quando aplicado tanto ao altar quanto às pessoas de maneira semelhante àquela em Êxodo 24.6-8. Em certos aspectos, a oferta pela culpa é semelhante à oferta pacífica, mas também há algumas diferenças significativas. Por um lado, semelhantes à oferta pacífica, as porções de gordura eram ofertadas como uma dádiva consagrada ao Senhor (Lv 7.3-5; esp. 'isseh, uma oferta queimada [# 852] no v. 5) e o sangue dessas ofertas podia ser usado para consagrar as pessoas ao Senhor num procedimento parecido com o das ofertas pacíficas (p. ex., a oferta pela culpa feita pelo leproso em Lv 14.14; cf. as ofertas pacíficas/de ordenação em Êxodo 24 e 29 e os comentários acima). Porém, diferentemente da oferta pacífica, não há nenhuma refeição comunitária associada à oferta pela culpa. Além disso, nessa situação, a lógica fundamental da oferta pacífica indica que a consagração por meio da manipulação do sangue era realizada com o propósito de retificar o problema da profanação inerente à expulsão do leproso da co munidade (Lv 13.46; -> 'ãsãm, # 871). É extremamente significativo o fato de o ritual da oferta pela culpa em Levítico 14 ser realizado imediatamente depois da readmissão do leproso na comunidade (cf. 14.8-9 como contexto para os vv. 10-18). A oferta pela culpa era realizada antes da oferta pelo pecado e do holocausto, respectivamente (vv. 19-20). Na verdade, a oferta pela culpa tomava a consagrar o leproso como parte do reino de sacerdotes (cf. Êx 19.6 e a discussão na seção 5). Além disso, a principal passagem para a oferta pela culpa em Levítico 5.14-16 relaciona esse ritual ao ato de “cometer ofensa... nas coisas sagradas do Senhor”. Assim, o sangue da oferta pela culpa também resolvia o problema da profanação de objetos sagrados e não apenas de pessoas (-> 'ãsãm, # 871). A oferta pelo pecado é uma questão separada (-> hattã 't, # 2633). Mais uma vez, esse procedimento abrangia a oferta das partes de gordura ao Senhor (Lv 4.8-10). Nesse caso, diziase que eram queimadas “sobre o altar, em cima das ofertas queimadas ao Senhor” (4.35; cf. 5.12), o que, para alguns estudiosos indica que as porções de gordura em si talvez não fossem consideradas uma 'isseh, oferta queimada (# 852; é provável que uma tradução mais adequada seja dádiva ou presente), ainda que as porções de gordura da oferta pelo pecado possam ser chamadas de “aroma agradável ao Senhor” (4.31; essa é a opinião de Milgrom, Leviticus 1—16, 161-62, ver, porém, a discussão crítica em 'isseh, # 852). De qualquer modo, assim como na oferta pela culpa, o povo comum jamais podia consumir a carne da oferta pelo pecado (6.26,29 [19, 22]). Isso distingue a oferta pelo pecado da oferta pacífica, concentrada especificamente na comunhão entre Deus e seu povo. Ademais, nem mesmo os sacerdotes podiam consumir a carne de uma oferta pelo pecado que tivesse sido realizada em favor deles ou de toda a congre gação à qual eles pertenciam, pois o sangue dessa oferta era levado para dentro do santuário e aplicado ao altar de incenso e/ou outras partes do santuário interior e seus utensílios (para estes últimos, ver 4.11 -12,21; 6.30[23]; 16.11-19). Isso distingue a oferta pelo pecado da oferta pela culpa, pois o sangue da oferta pela culpa nunca era levado para dentro do santuário, de modo que a carne dela podia sempre ser consumida pelos sacerdotes (Lv 7.6-7). Outra característica distinta da oferta pelo pecado era o fato de o sangue nunca ser apli cado no povo e, portanto, de nunca ser usado para consagrar pessoas ao Senhor (contraste-se com a oferta pelo pecado e a oferta pela culpa, discutidas acima). Antes, os sacerdotes usavam esse sangue para limpar (ou seja, purificar, tomar limpo; ver abaixo) e consagrar objetos ao Senhor, aplicando tal sangue diretamente ao tabemáculo e aos utensílios sagrados dentro dele (ver, Êx 29.12; Lv 8.15; 16.14, 15, 18-19). Disso fazia parte até mesmo o altar sobre o qual as dádivas consagradas deviam ser oferecidas (Êx 29.12; Lv 8.15; 16.18-19). Mesmo no dia da expiação, nenhuma gordura ou came era queimada no altar do santuário até que o próprio altar 986
Ofertas e Sacrifícios
tivesse sido purificado e consagrado com oferta de sangue (comparar os Lv 16.18-19 com vv. 24-25; ver... Êx 29.12-13; Lv 4.7-11,30-31). O sangue possuía um efeito consagrador pelo fato de ser algo que pertencia somente ao Senhor por natureza. Por extensão, sendo um líquido, o sangue podia simbolizar a lavagem no sentido divino, pois esse determinado líquido era, por natureza, santo para o Senhor (contrastese com as lavagens com água em Levítico 15.13-14,16-28; etc.; para uma discussão detalhada, ver Limpo e Imundo). Assim, tanto a consagração quanto a purificação (ou seja, lavagem ritual) pelo sangue encontram-se intimamente ligadas à oferta pela culpa. De acordo com Levítico 16.19, por exemplo, no dia da expiação, “[Arão] Do sangue aspergirá, com o dedo, sete vezes sobre o altar, e o purificará, e o santificará das impurezas dos filhos de Israel”. No ritual de purificação do leproso, a oferta pelo pecado (Lv 14.19) vinha depois da oferta pela culpa (vv. 12-18), pois a pessoa precisava fazer parte da comunidade antes que a purificação e reconsagração do tabemáculo pudessem ser realizadas em favor dela por meio da oferta pelo pecado. Assim, dentro do sistema sacrificial do AT, a oferta pelo pecado resolvia o problema de contaminação das coisas sagradas (contraste-se com a oferta pela culpa para a consagração de coisas santas acima; ver também a discussão sobre hatfã # 2633). 7. Consagração, purificação e expiação no sistema sacrificial do AT. O leproso via ser readmitido à comunidade (Lv 14.1-9, o ritual da “ave de expiação”; cf. Lv 16.21-22 e a discussão sobre hatfã # 2633) antes de poder ser reconsagrado como membro do reino de sacerdotes (14.10-18, o ritual da oferta pela culpa) e ele próprio devia ser reconsagrado an tes que o tabemáculo pudesse ser purificado e reconsagrado em favor dele (14.19, o ritual da oferta pelo pecado). A relação entre a consagração e a purificação no sistema ritual do AT é especialmente significativa. Logo depois da tragédia com Nadabe e Abiú (Lv 10.1-2), Moisés explicou os atos do Senhor contra eles da seguinte maneira: “Isto é o que o Senhor disse: Mostrarei a minha san tidade naqueles que se cheguem a mim e serei glorificado diante de todo o povo” (10.3). Essa passagem se refere a dois grupos de pessoas: aqueles “que se [chegam]” ao Senhor (ou seja, os sacerdotes consagrados ou santos) e “todo o povo”. De uma forma ou de outra, o Senhor mostrará sua glória para que seja honrado como Deus santo no meio do povo. Nesse caso, ele o fez exterminando os dois filhos de Arão que não haviam dado a devida atenção aos requisitos de santidade ao levarem “fogo estranho perante a face do Senhor” (10.1). O contexto subseqüente lança mão do mesmo conceito de santidade quando o Senhor diz diretamente a Arão que deve fazer “diferença entre o santo e o profano e entre o imundo e o limpo...” Para se compreender a teologia do livro de Levítico é essencial uma percepção clara dessas duas polaridades (ou seja, o santo em contraste com o profano e o limpo em con traste com o imundo), além do conceito de expiação, que Moisés ressaltou posteriormente no cap. 10 ao perguntar a Arão: “Por que não comestes a oferta pelo pecado no lugar santo? Pois coisa santíssima é; e o Senhor a deu a vós outros, para levardes a iniqüidade da congregação, parafazerdes expiação por eles diante do Senhor” (v. 17; -¥ kpr I, expiar, # 4105, para uma discussão completa; ver também haltã oferta pelo pecado, # 2633). Em primeiro lugar, a questão de santo em contraste com o comum (v. 10a) se refere à condição de uma pessoa, lugar ou coisa. Em segundo lugar, a questão do limpo em contraste com o imundo (v. 10b) diz respeito à situação de uma pessoa, lugar ou coisa, qualquer que seja a condição deles (para uma discussão detalhada -> Limpo e Imundo). Em terceiro lugar, a expiação (v. 17) é a principal perspectiva de vários procedimentos sacrificiais para tratar-se da transgressão de limites ou da transição entre as categorias de santo e profano ou limpo e imundo (-> kpr I, # 4105). Com referência ao limpo e ao imundo, a expiação era necessária 987
Ofertas e Sacrifícios
para purificar imundícias graves ou irregulares (p. ex., 12.6-8, a mulher depois do parto; 14.1820, o leproso e 15.13-15, 25-30, fluxos irregulares da genitália masculina e feminina). Com referência ao santo e ao profano, a expiação era necessária nos procedimentos de consagração para a santificação de pessoas, lugares ou coisas a fim de tomá-los santos (ver, p. ex., 29.3637; também 8.15; 16.19 para a consagração do tabemáculo; Êx 29.33; Lv 8.34 para a consa gração dos sacerdotes). 8. Ofertas e sacrifícios em altares isolados (ou seja, fora do tabemáculo e o do tem plo). Seria difícil exagerar-se o significado das ofertas e sacrifícios para a teologia da Bíblia. Mesmo antes da revelação no Sinai, eram uma parte essencial da prática do relacionamento com Deus, desde Caim e Abel (Gn 4.2-7) até Noé (8.20-21) e os patriarcas (p. ex., 12.7, 9; 13.18; 3 1.54). O pedido de Moisés antes do Sinai, para que Faraó permitisse ao povo ausentarse temporariamente para servir ao Senhor por meio de ofertas e sacrifícios num lugar distante três dias de jornada no deserto provocou um conflito de interesses entre Moisés e Faraó (Êx 3.18; 5.3; 8.25-28; 9.28; 10.7-11, 24-26; 12.31-32), o que resultou nas pragas no Egito e, por fim, no livramento permanente do povo de Israel da escravidão naquela terra. Depois que os israelitas chegaram ao Sinai, Jetro, sacerdote de Midiã e sogro de Moi sés, “tomou holocausto e sacrifícios para Deus” a fim de realizar um banquete com Moisés, Arão e os anciãos de Israel (Êx 18.12). A seqüência de acontecimentos, conforme o relato dc Deuteronômio 1.6, 9-18, indica que a visita de Jetro, em Êxodo 18, na verdade, ocorreu de pois dos acontecimentos de Êxodo 19— 24 e, de fato, pouco antes de os israelitas partirem do Sinai rumo à terra prometida (comparar Dt 1.6, 9-18 com Êx 18.13-27; ver também Nm 10.11-12). Antes disso, no começo de sua estada no Sinai, mesmo antes das instruções para o tabemáculo terem sido dadas (ver Êx 25—31, esp. 27.1-8; -> mizbêab, altar, U 4640), quando este nem sequer havia sido construído nem consagrado para o uso (Êx 35— 40; cf. Lv 8— 9), Moisés construiu um altar isolado e ofereceu “holocaustos e sacrifícios pacíficos de novilhos” ao Senhor como parte dos procedimentos para a ratificação da aliança (para as ofertas, ver a discussão de Êx 24.4-8 nas seções 4-5 acima; para o altar, ver Êx 20.24-26 e a discussão em mizbêah, altar, # 4640). Tudo foi feito de acordo com o modelo determinado no mandamento acerca do altar em Êxodo 20.24-26 (cf. Dt 16.21 — 17.1; 27.5-7). Na verdade, depois que o tabemáculo já havia sido estabelecido, a nação continuou a oferecer holocaustos, oferta de manjares, libações e ofertas pacíficas em altares de terra bem como no altar do tabemáculo. Mesmo tendo à disposição o altar do tabemáculo, o próprio Senhor ordenou que os israelitas construíssem um altar isolado em Siquém (ou seja, no monte Ebal) e oferecem holocaustos e ofertas pacíficas ali como parte de uma cerimônia inicial de aliança na terra (Dt 27.5-7; ver Js 8.30-31, para o cumprimento dessas instruções por Josué). Pelo menos parte do propósito dessa cerimônia parece ter sido o de apropriar-se da terra que o Senhor prometera a Abraão havia muito tempo, quando o patriarca entrou em Canaã pela primeira vez e ergueu um altar em Siquém (Gn 12.6-7). Em alguns casos, esses altares e os holocautos e/ou ofertas pacíficas oferecidos neles eram uma forma de invocar o nome do Senhor em situações específicas (p. ex., Gideão em Jz 6.24-27; os benjamitas em 21.3-4; Samuel em ISm 7.8-10; Davi em 2Sm 24.25; Elias em IRs 18.23-24, 30, 36-39). Em outros casos, os altares em lugares altos eram usados para refeições sacrificiais comunitárias perante o Senhor (ou seja, ofertas pacíficas; p. ex., ISm 9.11-14, 22-24). É verdade que o livro de Juizes mostra levitas como sacerdotes até mesmo em altares locais ou domésticos (p. ex., Juizes 17) e até sacerdotes arônicos por vezes oficiavam em alta res isolados por toda a terra (p. ex., 2Rs 23.8-9). Nos primeiros anos em Canaã, porém, não era necessário e nem mesmo normal um sacerdote arônico realizar holocaustos ou ofertas pacíficas 988
Ofertas e Sacrifícios
nesses altares isolados. Gideão, por exemplo, construiu altares e ofereceu holocaustos (Jz 6.2427) apesar de ser da tribo de Manassés (Jz 6.15). Os pais de Sansão, Manoá, o danita, e a es posa, apresentaram holocautos e ofertas de manjares aceitáveis ao Senhor num altar de pedra (Jz 13.19, 23; cf. Js 22.23, 29). Samuel era levita, mas não pertencia à linhagem sacerdotal de Arâo (ICr 6.28, 33-38; seu pai, Elcana, era efraimita apenas no sentido de que era um levita vivendo no território tribal de Edraim, ISm 1.1). Era conhecido por realizar procedimentos sacriíiciais em altares isolados (ver acima). Trata-se de uma argumentação baseada no silên cio, mas é um fato impressionante que apesar de Samuel ser um servo levítico de Eli, o sumo sacerdote, não temos nenhum registro dele cumprindo seus deveres sacrificiais de sacerdote no tabemáculo. Quanto a Davi, ele não era da tribo de Levi, mas ainda assim, em algumas ocasiões realizou sacrifícios em altares isolados (p. ex., 2Sm 24.25). Uma vez, ofereceu uma libação independente ao Senhor (23.14-17; cf. ICr 11.18). Pode-se citar ainda muitos outros exemplos. Passagens como I Samuel 7.17 e 1 Reis 18.30; 19.10 indicam que tais altares eram comuns e não podem ser atribuídos simplesmente a teofanias, adoração espontânea ou ordens específicas do Senhor de que um altar fosse construído em detemiinado local. A ordem para erguer um altar em Êxodo 20.24-26 validou esse procedimento desde o princípio da história da aliança em Israel. 9. Ofertas e sacrifícios em altares dos santuários (ou seja, no tabemáculo e no templo Sem dúvida, as ofertas e sacrifícios também foram elementos centrais dos sistemas rituais do tabemáculo, do primeiro e do segundo templo e, portanto, essenciais para a teologia da pre sença de Deus no AT (-> Levítico: Teologia). Do sistema de ofertas e sacrifícios do santuário, faziam parte os holocaustos e as ofertas de manjares e pacíficas que eram parte da adoração em altares isolados de fiéis desde o tempo de Noé até durante grande parte do período monárquico anterior ao exílio (ver acima). Em outras palavras, o mesmo sistema externo de adoração com o qual o “reino de sacerdotes” israelitas (ou seja, a nação santa em sua totalidade, Êx 19.6) já estava habituado antes do Sinai foi adaptado de modo a se encaixar no sistema do tabemáculo, onde, no entanto, os principais elementos do ritual só podiam ser realizados por “sacerdotes do reino” (ou seja, o sacerdócio arônico; ver Êxodo 29 e Levítico 8 na seção 5). Por um lado, no santuário, somente os sacerdotes arônicos podiam ter contato direto com o altar de holocaustos ou passar pelo véu do tabemáculo e entrar no santuário ou no Santo dos Santos (ver, p. ex., Nm 18.7). Assim, apenas os sacerdotes arônicos tinham permissão de colocar o sangue e a gordura das ofertas animais e a porção memorial das ofertas de manjares, etc., no altar de holocaustos próximo à porta da área do tabemáculo. Por outro lado, nos altares externos isolados, indivíduos que não eram sacerdotes podiam realizar esses rituais (ver, p. ex., Gideão em Jz 6.25-27; Samuel em ISm 7.9; Elias lRs 18.32-33). Além disso, o sistema do santuário exigia ofertas e sacrifícios adicionais, especialmen te as ofertas pelo pecado e pela culpa (Lv 4.1—6.7). O motivo principal desses acréscimos ao sistema era o fato de o santuário ser mais do que um altar por meio do qual a pessoa podia se aproximar do Deus do céu e ter comunhão com ele (cf. as teorias da dádiva e da comunhão nas seções 3-4). Devia ser um lugar da residência perpétua de Deus (ou seja, a casa de Deus [ou tenda, no caso do tabemáculo]; ver, p. ex., Êx 25.8, “E me farão um santuário, para que eu possa habitar no meio deles”; ver também 2Sm 7.2, 5-7, 13). Uma vez que o Senhor estava física, literal e visivelmente (ou seja, fisicamente bem como espiritualmente) presente no tabemáculo (ver a nuvem e o fogo em Êx 40.34-38; Lv 9.2224; 16.2; Nm 9.15-23) e, depois, no templo (lR s 8.10-11; 2Cr 7.1-3), ele se preocupava com a santidade e pureza visíveis daqueles que se aproximavam dele em seu santuário (para uma discussão completa dessa presença física do Senhor no tabemáculo -> Levítico: Teologia). O 989
Ofertas e Sacrifícios
próprio Deus e sua residência deviam ser tratados como santos (ou seja, sagrados, Lv 10.3,10a; cf. a teoria da consagração na seção 5) e mantidos limpos (ou seja, puros, 10.10b; 15.31; Nm 19.13,20). O meio processual para estabelecer e manter a santidade e a pureza no tabemáculo era a realização da expiação (Lv 10.17). Levítico 1—7 apresenta estatutos detalhados para a devida manipulação das ofertas e sacrifícios mais importantes a serem oferecidos no santuário (o lugar sagrado, ou seja, o ta bemáculo e, posteriormente, o templo). Essas leis eram uma parte essencial das estipulações da aliança dadas no Sinai. Depois da ratificação inicial do relacionamento de aliança entre o Senhor e Israel com base nas promessa e obrigações estabelecidas em Êxodo 19—24, Moisés voltou a subir o monte Sinai, onde recebeu as instruções para construir o tabemáculo (caps. 25— 31; cf. a construção propriamente dita nos caps. 35—39). As instruções para a construção do tabemáculo e o relato do cumprimento delas são separados pelo registro do episódio do be zerro de ouro nos caps. 32— 34 que, na verdade, ressalta a importância da presença do Senhor com a nação (33.1-4, 12-16; -> Levítico: Teologia). Toda a passagem de Êxodo 25— 39 serve, portanto, de contexto para seu último ca pítulo, no qual Moisés concluiu e preparou o tabemáculo para o Senhor (40.1-33), o que foi seguido imediatamente da habitação de Deus naquele local na forma de uma nuvem de sua glória, que tinha fogo dentro de si durante a noite (40.34-38; cf. a teofania no monte Sinai, 19.16-25; 20.18-21; e a coluna de nuvem durante o dia e de fogo durante a noite ainda a cami nho do Sinai, 13.21-22). O primeiro versículo de Levítico parte do contexto em Êxodo 40.3438. Moisés não conseguiu entrar na Tenda da Congregação no tabemáculo, pois a nuvem de glória a havia enchido (cf. Lv 16.2). Assim, quando Moisés estava ao lado da porta do tabernáculo (Êx 40.33), “Chamou o Senhor a Moisés e, da tenda da congregação, lhe disse...” (Lv 1.1). Ao longo do mês seguinte, Moisés e o povo receberam a revelação apresentada no livro de Levítico, a começar pelos estatutos sobre as ofertas e sacrifícios em Levítico 1— 7 (cf. Êx 40.2, 17 com Nm 1.1; ver também Êx 19.1 e Nm 10.11 para os limites externos do ano quase completo que passaram no Sinai). 10. A história dos estudos sobre a religião e o sistema cultuai de Israel. Em 1878, J lius Wellhausen apresentou e popularizou uma tese que havia sido proposta anteriormente por Graf e outros (Wellhausen, 3-4). De acordo com essa tese, o sistema sacerdotal de ofertas e sacrifícios concentrado em Levítico 1— 16 era uma invenção da instituição sacerdotal do pe ríodo após o exílio (essa é a porção legislativa de S, “Fonte Sacerdotal” da teoria JEDS; uma variação crítica mais moderada é a de que S é do tempo do exílio; ver o resumo em Hurvitz, 143-44, 155; antes de Wellhausen, o consenso entre os estudiosos era que S fazia parte de E e era, na verdade, a fonte mais antiga do esquema redacional). Esse sistema desenvolveu-se por meio dos incentivos religiosos que se refletem em Crônicas, Esdras e Neemias e não foi re velado a Moisés no monte Sinai (se, de fato, houve um Moisés histórico). Wellhausen baseou essa visão da história da religião e do culto do AT em cinco pilares de investigação: o lugar de adoração (Wellhausen, 17-51), o sacrifício (52-82), as festas (83-120), o clero (sacerdotes e levitas 121-51) e o sustento material do clero (p. ex., o dízimo, 152-67). No que se referia às ofertas e sacrifícios, Wellhausen observou que os holocaustos e ofertas pacíficas encontravam-se amplamente representados nos livros históricos anteriores ao exílio e nos profetas (ou seja, Josué-2 Reis e Oséias, Amós, Isaías, Miquéias; etc.) e sugeriu que, em termos históricos, a oferta pacífica (ou seja, o sacrifício para uma refeição festiva co munitária) ocupava, sem dúvida, uma posição de grande relevância até mesmo em comparação com o holocausto. As ofertas pelo pecado e pela culpa só aparecem pela primeira vez em Eze quiel (Wellhausen, 69-75) e só se desenvolveram plenamente depois do exílio. A ficção histó 990
Ofertas e Sacrifícios
rica que situava o sistema ritual sacerdotal completo na antigüidade mosaica foi desenvolvida depois do exílio pelo sacerdócio que, diante da ausência de uma monarquia nativa, viu-se com poder político suficiente para promover sua própria centralidade e prosperidade, pelo menos no sentido local (ibid., 141-51, 164-67). Nas últimas décadas, poucos favoreceram a posição de Wellhausen exatamente confor me ele a propôs, mas muitos ainda apóiam-na implicitamente (ver, p. ex., Levine, Leviticus, xxv-xl; Anclsr, 510; e a crítica deste último em Weinfeld, 114-16). Esses estudiosos admitem que “o Código Sacerdotal contém costumes e rituais antigos”, mas afirmam em seguida que “esses costume antigos foram adotados por S no período posterior ao exílio” (Hurvitz, 95). Assim, argumentam que S em si é do pós-exílio, ainda que fique claro, a partir de documentos ainda existentes do OMA, que vários dos elementos dentro de S são derivados (ou pelo menos poderiam ser derivados) de períodos muito mais antigos. Weinfeld e outros afirmam que se. por exemplo, os tipos de ofertas de S já existiam no mundo do OMA no segundo milênio a. C., então “nâo há justificativa alguma para se datar S do período posterior ao exílio” (Hurvitz). Weinfeld rejeita a hipótese de Wellhausen, baseado num levantamento relativamente detalhado de documentação do contexto do OMA (ver 95— 103 e 105— 16, em que Weinfeld concentrase particularmente nas ofertas e sacrifícios). Não apenas holocaustos e ofertas pacíficas, mas também ofertas pelo pecado e pela culpa são amplamente atestadas nos primórdios do período anterior ao exílio no OMA. Grande parte das provas do OMA apresentadas por Weinfeld não existiam no século XIX d. C., de modo que não se pode culpar Wellhausen por não levá-las em consideração (ibid., 128-29). Porém, outros estudiosos chamaram a atenção para o fato de Wellhausen ter ignorado até mesmo aquilo que tinha à sua disposição com relação a esse assunto (Kaufmann, 205-6, n. 16). O próprio Wellhausen admitiu que “no caso de certos povos, mesmo na mais remota antigüidade, ocorre a crença na dependência dos sacrifícios e outros atos sagrados com uma obediência diligente e rígida aos ritos tradicionais e normativos” (Wellhausen, 79, n. 1). Assim, é bem provável que ele não tivesse encontrado muito mais dificuldade do que seus seguidores modernos em aceitar o que Weinfeld coletou do mundo do OMA. Contudo, Wellhausen prossegue dizendo: “Porém, com relação aos israelitas, a julgar pelo testemunho dos livros históricos e proféticos, esse não era inteiramente o caso assim como também não o era para os gregos antigos; nenhum deles tinha brâmanes ou magos” (ibid.). Em outras palavras, ele argumenta que o verdadeiro problema encontra-se no fato de que outra literatura bíblica anterior ao exílio não dá nenhum motivo substancial para se afirmar que o sistema ritual de S estivesse operante ou mesmo existia antes do exílio. O sistema plenamente desenvolvido é conspícuo por sua relativa ausência nos livros históricos e proféticos do perío do anterior ao exílio. Isso significa que apesar de ser possível argumentar-se (de acordo com Weinfeld) que o material do contexto do OMA enfraqueça os alicerces da proposta de Wel lhausen mesmo em sua forma moderna, a lógica principal para a idéia de um S mais recente não é, com isso, refutada (cf. Milgrom, Leviticus 1—16, 3). Esse é o cerne do ataque de Yehezkel Kaufmann à teoria recente de S, proposta por Wellhausen: a suposta lógica da discussão bíblica interna (Kaufmann, 153-211). Kaufmann argumentou que a lógica, na verdade, se desloca na direção contrária. A Torá, inclusive todo o JEDS de Wellhausen, “é um testemunho à primeira era da religião israelita, a era anterior à sua profecia literária” (211). Especificamente com referência às ofertas e sacrifícios, os profetas “consideravam a moralidade como a essência da religião e valorizavam-na acima do culto” (p. ex., Os 6.6, “Pois misericórdia quero, e não sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos”). Porém, quanto à Torá, “Os aspectos religiosos e morais recebem a mesma 991
Ofertas e Sacrifícios
ênfase e enconlram-se justapostos indiscriminadamente” (p. ex., Levítico 19). A conclusão a que Kaufmann chega a partir dessa distinção é oposta à de Wellhausen: “Não se pode dizer que uma tendenciosidade sacerdotal posterior para com os elementos cerimoniais seja respon sável por silenciar o acento moral na Torá. O judaísmo posterior, sem dúvida completamente tomado pelo cerimonial, não... ignorou a doutrina profética. A ausência dessa idéia é um sinal, nâo de um estádio posterior ao da profecia, mas sim de um estádio anterior a ela” (ibid., 160, grifos meus). Em tempos recentes, Menahen Haram chegou a uma linha de argumentação semelhante ao sugerir que “os sacerdotes do pós-exílio dificilmente poderiam ter inventado” o conjunto básico de ritos em Levítico (Haran, 4). De acordo com Haran, “não há nenhuma correspondência básica relevante entre essa fonte e as condições reais daquele tempo” (ibid., 8). Assim, “S é o produto literário de círculos de sacerdotes de Jerusalém do período do Primeiro Templo e não do período do Segundo Templo... todas as fontes do Pentateuco... chegaram, de fato, a uma cristalização literária durante o período do Primeiro Templo, diferindo umas das outras apenas em caráter e datas de redação” (5-6). Seu apoio à explicação sociológica em contraste com a explicação cro nológica para o caráter distinto de S é especialmente importante. Haran conclui: O que distingue S de D (bem como de J e de E) não c necessariamente sua suposta localização no final de uma escala evolucionária dialética, mas seu caráter extraor dinariamente sacerdotal, que o separa como um elemento distinto em meio às fontes do Pentateuco. Essa separação tem como origem, evidentemente, a particularidade do contexto sociológico e do meio criativo, bem como da idiossincrasia que mar cou o sacerdócio. Tal distinção, no entanto, não deve ser removida de seu contexto sócio-tipológico e transformada numa questão de seqüência histórico-cronológica. S recebeu seu caráter particular não pelo fato de o sacerdócio haver adquirido prima zia na teocracia do Segundo Templo... mas simplesmente porque sua fonte é produto do sacerdócio (7-8: cf. também Weinfeld, 115-16).
Essa consideração sociológica obtém ainda mais apoio no fato de que em Ugarite “a terminologia técnica sacrificial dos textos sacrificiais é consideravelmente distinta da termino logia dos textos épicos e mitológicos” (Anderson, 1992, 874a; cf. também idem, 1987,34-55). Assim, nâo se deve esperar que a literatura histórica e profética do período anterior ao exílio empregue a mesma terminologia e desenvolva as mesmas questões de ritual da mesma forma que a literatura sacerdotal desse mesmo período. Há pouco tempo, Avi Hurvitz procurou argumentar em favor de um S anterior ao exílio usando evidências lingüísticas de que a linguagem das seções S do Pentateuco é significativa mente mais antiga do que a linguagem do tempo do exílio encontrada em Ezequiel (Hurvitz). Jacob Milgrom considera que essa seja a prova mais convincente em favor de um S anterior ao exílio (Milgrom, 1991,3-13). Também aceita a proposta recente de Israel Knohl de que CS (ou seja, o Código da Santidade, Lv 17—26) e S, (ou seja, esp. Lv 1— 16) devam ser claramente diferenciados; CS é posterior a S e CS foi, na verdade, responsável pela edição de S (Milgrom, 1991, 13-15; ver agora Knohl). Porém, Milgrom reage à idéia de Knohl de que S considera o santuário como um lugar de silêncio, inteiramente dedicado aos procedimentos rituais sacer dotais e separado do povo comum bem como das questões de moralidade e justiça (Milgrom, 1991, 16-28; ver agora Knohl, 124-67, e esp. sua resposta a Milgrom, 225-30). 11. A seçâo anterior apresenta uma crítica breve e, em grande parte, unilateral de alg aspectos mais salientes da história do estudo desse assunto. Existem, sem dúvida, outras ques 992
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tões que foram levantadas acerca de S ao longo dos últimos cinqüenta anos. M. Noth acreditava que a fonte S foi a base para a compilação do Pentateuco (Campbell e 0 ’Brien, 9). De acordo com ele, J e E já haviam sido combinados e foram usados por S nessa compilação. F. M. Cross propôs que S não fosse sequer uma fonte, mas sim, que representava uma redação da fonte JE já existente (ibid., 10). R. Rendtorrt'considera que a composição do Pentateuco seja uma re dação feita pelo D de ciclos anteriores de tradição. Em essência, D foi o primeiro escritor do Pentateuco na forma de redação total do livro. Das redações posteriores, faz parte aquilo que os estudiosos chamam hoje de S (ibid., 12-13; ver também Rendtorff, 157-64). Em oposição a Rendtorff, J. Van Setters argumenta energicamente que foi o javeísta (ou seja, J) quem compilou o Pentateuco e que o próprio javeísta foi um escritor do final do exílio e não do século IX a. C. como costuma supor o consenso acadêmico. Mais uma vez, porém, S é considerado uma redação pós-javeísta ainda mais recente e não um documento independente que tenha servido de fonte (Campbell e 0 ’Brien, 11-12; Van Seters, The Life o f Moses, 100-112). As abordagens literárias mais atuais mostram uma tendência a deixar-se para trás toda a questão das Fontes subjacentes à redação literária final do Pentateuco (Campbell e 0 ’Brien, 13-15). No balanço geral, a maioria dos estudiosos bíblicos continua a apoiar e não a rejeitar Wellhausen com relação ao caráter mais recente da suposta Fonte (ou redação) S no Pentateuco. Além disso, mesmo aqueles autores citados acima, que propõem uma data anterior ao exílio para S, não costumam argumentar em favor da idéia tradicional de que Moisés tenha escrito o Levítico. Haran e Knohl. por exemplo, associam a redação da Fonte S com a crise da fé e da história na segunda metade do século VIII a. C. (no tempo de Acaz e Ezequias). No que se refere aos comentaristas cristãos evangélicos, alguns se apegam rigorosamente à redação mo saica de Levítico (p. ex., Harrison, 23), mas muitos deles deixaram a questão relativamente em aberto (p. ex., Wenham. 13), ou, pelo menos, fizeram concessões para uma grande quantidade de acréscimos e mudanças redacionais e criativas posteriores do cerne originalmente mosaico do livro (p. ex., Hartley, xli-xliii). O AT, em sua presente forma, indica que, no começo da história de Israel (esp. antes de Davi e Salomão, mas também depois), havia dois sistemas aceitos e concomitantes de ado ração no altar: um, em altares isolados espalhados por toda a terra e um, no santuário central (ver seções 8-9). A adoração no altar do santuário era realizada no tabemáculo, onde quer que este se encontrasse em determinado momento (ver, p. ex., ISm I— 3; lRs 3.4 = 2Cr 1.5-6) ou, posteriormente, no templo em Jerusalém ( I Rs 8; 2 Crônicas 6— 7). A adoração em altares isolados ocorria por toda a terra, muitas vezes por ordem direta ou com a aprovação do Senhor (p. ex., Js 8.30-35; Jz 6.25-26; ISm 7.17; lRs 18.30-38). É verdade que esta última forma de culto corrompeu-se com o passar do tempo, mas o mesmo ocorreu no santuário central (ver 2Rs 23.4-20). Esse elemento da historiografia bíblica não recebeu a devida atenção na discussão da história do sistema de ofertas e sacrifícios do AT. Wellhausen propôs que a relativa falta de referências ao sistema de ofertas no santuário nos livros históricos e proféticos anteriores ao exílio se deve ao fato de o sistema sacerdotal de ofertas no santuário só haver entrado em vigor depois do exílio. Para isso, Wellhause ra ciocinou em termos cronológicos (ver acima). No entanto, pode-se dizer que a suposta discre pância histórica observada por Wellhausen se deve na verdade ao fato de a esfera sacerdotal encontrar-se expressivamente isolada sociológica e teologicamente — e não cronologicamente — do mundo do historiadores e profetas anteriores ao exílio (supondo-se que os historiadores que escreveram Josué— 2 Reis também eram profetas). Kaufmann e Haran apresentaram essa idéia, mas não a desenvolveram o suficiente. Em tempos recentes, Knohl foi longe demais e terminou por isolar S quase completamente do 993
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mundo real. Num certo sentido, esses três estudiosos continuaram a conduzir sua argumentação em termos cronológicos e não a partir de um ponto de vista firmemente sociológico. Do ponto de vista cronológico, a compilação realizada por Weinfeld de documentos de contexto extrabíblico e ritual do OMA toma plausível não apenas uma data anterior ao exílio, mas até mesmo uma data mosaica para o conteúdo principal de Levítico (p. ex., os documentos ugar. datados de antes dc 1200 a. C.). Além disso, o fato de os livros históricos e proféticos anteriores ao exí lio refletirem mais o sistema de adoração em altares isolados do que um sistema de santuário deve ser esperado, uma vez que o mundo no qual e para o qual estavam falando era, em grande parte, o mundo dos profetas, sendo que estes se relacionavam de maneira mais próxima com os políticos e o povo de sua época em geral e não com os sacerdotes. Desse modo, os argumentos Wellhausen e seus correlatos modernos perdem muito de seu caráter irrefutável. Assim, há poucos motivos para objetar não apenas a uma data anterior ao exílio, mas até à monarquia ou mesmo uma data mosaica para o sistema sacerdotal de ritual e adoração no santuário. Os sistemas de adoração em altares isolados e no santuário foram paralelos ao longo de toda a história do AT desde Moisés até Davi (p. ex„ ICr 16.37-43; 21.26— 22.1) e Salomão (p. ex., IRs 3.3-4) e até mesmo durante a monarquia dividida (p. ex., IRs 8.1-66; 18.30-38) até o tempo de Josias (2Rs 23.4-14; -> mizbêah, altar, # 4640). Era natural os profetas e his toriadores do período anterior ao exílio concentrarem sua atenção no uso e abuso do sistema de altares isolados. Quando as coisas estavam indo bem, o povo do reino de sacerdotes ia ao santuário central para certas ocasiões e, assim, tinha contato com os sacerdotes do reino e o sistema de ofertas e sacrifícios do santuário (ver seção 9), mas em outras épocas, era mais do que normal concentrar a atenção na adoração ao Senhor localmente. O sistema sacerdotal no santuário funcionava legitimamente apenas em um local por vez (ver, portanto, a peregrinação incomum de Elcana em 1 Samuel I—3); desse modo, tal sistema mantinha uma esfera de influência relativamente restrita apesar de ser possível o seu sacerdócio e sistema de ofertas e sacrifícios manter-se em funcionamento, desde que os sacer dotes encarregados fossem fiéis. E evidente que Jeroboão procurou eliminar a influência do santuário centrai sobre o reino do Norte ao estabelecer outros santuários e não apenas altares (esp. em Betei e Dã,lRs 12.25-33). Alguns reis do Sul tentaram expandira influência do tem plo (p. ex., Ezequias, 2 Crônicas 29— 31; Josias, caps. 34— 35), mas a tendência natural até o exílio era o povo adorar em seus próprios altares regionais (observe-se que Josias eliminou os altares dos altos onde sacerdotes legítimos adoravam e levou esses sacerdotes para Jerusalém, embora não os mandasse executar, 2Rs 23.8-9). Ao que parece, o sistema de adoração no tem plo só adquiriu verdadeira importância na vida do povo comum quando o povo voltou à sua terra depois do exílio, como uma comunidade pequena reunida ao redor de Jerusalém com o propósito específico de reconstruir o templo e reinstituir seu sistema de adoração (ver Ed 3.113; ver também a menção dos profetas do pós-cxílio em Ed 6.13-15). Por fim, aqueles que usam a abordagem cronológica costumam argumentar em favor de uma determinada seqüência para S (Levítico 1— 16) em contraste com o CS (Levítico 17—26). Nesse sentido, Kaufmann, Haran, Milgrom e especialmente Knohl continuam a ser vítimas da falácia diacrônica: a diferenciação deve ser explicada em termos cronológicos. Conforme ob servamos acima, desde Wellhausen, a maioria dos estudiosos afirma que o CS vem antes de S, mas, há pouco tempo, Knohl argumentou que S vem antes do CS. Mais uma vez, se a questão for considerada do ponto de vista sociológico, parece razoável buscar-se outra abordagem. No livro de Levítico, o chamado S vem antes do chamado CS. No que diz respeito aos aspectos literários, lógicos e sociológicos, trata-se de algo coerente com a idéia de que Levíti co 17—26 desenvolve a teologia de Levítico 1— 16 para além da aplicação dessa teologia no 994
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sistema ritual do tabemáculo para mostrar as implicações dela para a nação como um todo (-> Levítico: Teologia para uma discussão completa da relação entre essas seções de Levítico). Não há necessidade de se supor que um desses pontos de vista sobre a teologia sacerdotal do AT precisava obrigatoriamente ter sido proposto na antiga Israel algum tempo antes de o outro ter-se desenvolvido. Knohl está certo ao afirmar que o CS é um incremento de S (ou seja, que Lv 17—26 é um desenvolvimento dos caps. 1— 16), mas a expansão da teologia nos caps. 1— 16 para os caps. 17—26 foi natural, o que indica que podem muito bem ter sido redigidos juntos e, es sencialmente, na mesma época. Na verdade, o cap. 16 cria uma ligação estreita entre o culto e a comunidade ao combinar as ofertas pelo pecado para a purificação do tabemáculo com o bode expiatório (oferta pelo pecado) para a purificação da comunidade (-> kpr I, expiar, # 4105). Mais uma vez, é preciso que a argumentação se desloque da dimensão cronológica para a dimensão sociológica da religião na Israel antiga. Uma seção (Lv 1— 16) concentra-se na presença de Deus e na santidade partindo do ponto de vista do santuário, enquanto a outra (Lv 17— 26) concentra-se na presença de Deus e na santidade partindo de um ponto de vista co munitário. Trata-se de visões complementares e contemporâneas e não mutuamente exclusivas ou cronologicamente seqüenciais. 12. Tipos de textos sobre ofertas rituais. Há dois tipos de textos sobre os sacrifícios n AT: a. regras gerais para a realização dos procedimentos de cada um dos rituais (p. ex., esta tutos para a apresentação e realização dos holocautos, ofertas de manjares, ofertas pacíficas, pelo pecado e pela culpa em Lv 1—7) e b. aplicações específicas das diversas combinações desses tipos variados de ofertas e sacrifícios em determinadas situações (p. ex., o novilho da oferta pelo pecado, os dois carneiros para o holocausto e para as ofertas pacíficas de ordenação em Lv 8.2, 14-35; ver também as ofertas usadas para a purificação da mulher depois do parto em 12.6-8; a purificação dos leprosos em 14.10-20; a purificação por fluxos corporais anor mais em 15.13-15,25-30; o dia da expiação no cap. 16 e as ofertas regulares diárias, semanais, mensais e festivais em Nm 28—29). a. As regras gerais para a apresentação das diversas ofertas e sacrifícios em Levítico 1.1— 6.7 [5.26] vêm do Senhor e são dirigidas aos filhos de Israel (ou seja, toda a congrega ção, 1.2; 4.2) por intermédio de Moisés. Os estatutos para sua realização começam em 6.8 [6.1] e continuam até 7.34. A primeira parte dessa seção é dirigida somente aos sacerdotes, Arão e seus filhos (6.8— 7.21; cf. 6.9, 25). O texto volta a falar para toda a congregação em 7.22-34, pois trata especificamente das partes da oferta pacífica que devem ser separadas para o Senhor (7.22-27, a gordura e o sangue; ver “filhos de Israel” no v. 23) e para os sacerdotes (7.28-34, o peito e a coxa direita; ver “os filhos de Israel” no v. 29). A carne era usada para a refeição comunitária perante o Senhor. As ofertas pacíficas eram as únicas às quais o povo comum tinha acesso depois de apresentá-las ao Senhor. Assim, todo o povo precisava saber como manusear as diferentes partes da oferta pacífica, mas a realização de outras ofertas era responsabilidade somente dos sacerdotes e, por esse motivo, as regras naturalmente foram di rigidas somente a eles. b. Dentro da categoria de aplicações particulares podem-se observar dois grupos: tex tos prescritivos e textos descritivos (ver um bom resumo em Anderson, 1992, 876-77, e a lit. citada ali, esp. Levine e Rainey). Os textos rituais prescritivos indicam em detalhes as combi nações e o número de ofertas a serem usadas em determinadas ocasiões (p. ex., a conclusão do voto nazireu exigia holocaustos, ofertas pelo pecado, pacíficas e de manjares, Nm 6.14-15). Os textos rituais descritivos retratam a maneira de realizar os procedimentos rituais em seqüência (p. ex., na realidade, a ordem das ofertas pela conclusão do voto nazireu era oferta pelo pecado, holocausto, oferta pacífica e oferta de manjares, respectivamente, Nm 6.16-20). 995
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Por um lado, a ordem dos textos prescritivos pode ser explicada muitas vezes pelo valor decrescente daquilo que está sendo oferecido (p. ex., Lv 14.10 coloca dois cordeiros machos antes da cordeira de um ano, apesar de a cordeira ser oferecida antes do segundo cordeiro; cf. w . 12-20, o texto descritivo correspondente). Por outro lado, a ordem dos textos descritivos segue um padrão geral de procedimentos que conduz de um estádio para o seguinte no proces so ritual como um todo, desde a expiação até a celebração da comunhão sacrificial (de acordo com Rainey, 498, a seqüência é “expiação, consagração, comunhão”). O procedimento ritual como um todo deveria começar então com uma oferta pelo pe cado ou pela culpa (ou ambas; ver, p. ex., Lv 14.12-19; Nm 6.9-12). Seguia-se o holocausto com sua respectiva oferta de manjares e libaçâo (p. ex., Lv 14.19-20; cf. Nm 15.1-16 para as ofertas de manjares e libações habituais para holocaustos e ofertas pacíficas). Tudo indica que, para se fazer a expiação completa, era necessário uma oferta pelo pecado e/ou pela culpa e um holocausto (Rainey, 498, n. 5, faz referência à oferta pelo pecado em Lv 16.11-19, combinada com os holocaustos do v. 24, sendo que ambos eram declarados explicitamente como tendo o propósito de fazer expiação; observe-ae também que, quando rolas ou pombinhos eram usados pelos pobres, uma das aves era uma oferta pelo pecado e a outra, um holocausto; Lv 5.7-10; cf.Nm 8.12 e esp. Lv 9.8-17). Nos casos apropriados, podia haver na seqüência outros holocaustos voluntários (cf. Nm 15.3, 8) e, depois disso, finalmente as ofertas pacíficas, que simbolizavam a comunhão entre a comunidade de fiéis e seu Senhor (Lv 9.18-21). Como dádiva oferecida inteiramen te ao Senhor, o holocausto específico que estava associado intimamente à oferta pelo pecado ou pela culpa “completava o compromisso assumido pelo ofertante e exigido para a expiação total” (Rainey, 498). Os outros holocaustos e ofertas pacíficas podiam simbolizar e expressar vários estados de espírito e sentimentos de adoração (ver, p. ex., as ofertas votivas e voluntárias citadas em Lv 22.18,21; Nm 15.3,8). 13. Estrutura literária em Levítico 1—16. Os quatro últimos versículos de Levítico encerram a seção anterior do livro com dois resumos sobrepostos de Levítico 1— 7. Levítico 7.35-36 resume a seção de procedimentos em 6.8— 7.34, e 7.37-38 resume o conteúdo geral dos caps. 1— 7, tanto as a seções de apresentação como as de procedimentos (ou seja, I. I—6.7 [5.26] e 6.8 [6.1]— 7.34, respectivamente). Ambos também se referem de antemão à unção e ordenação do sacerdócio no cap. 8 e, portanto, ligam as regras nos caps. 1— 7 às aplicações delas e às narrativas relacionadas nos caps. 8— 16. Levítico 8 relata a ordenação do sacerdócio e o cap. 9, a inauguração do tabemáculo. A adoração ritual no cap. 9 sofre uma interrupção trágica com a morte de Nadabe e Abiú, conforme registrado no cap. 10. Levítico 16.1 remete de volta a esse episódio como oportunidade de apresentar a legislação para o dia da expiação no cap. 16. Entre uma coisa e outra, os caps. 11— 15 constituem uma coleção de leis dedicada a questões de santidade, pureza e expiação em Israel, sendo que a transgressão desses estatu tos foi justamente o que levou à tragédia de Nadabe e Abiú (ver esp. 10.10, 17; -> Limpo e Imundo: Teologia; hattã 't, oferta pelo pecado, # 2633). Do ponto de vista literário, os estatutos para holocaustos, ofertas de manjares e pacífi cas em Levítico 1— 3 constituem um todo unificado. A repetição da fórmula introdutória e o discurso voltado para os filhos de Israel em 4.1-2 (cf. 1.1-2) separam os estatutos das ofertas pelo pecado e pela culpa em 4 .1—6.7 das regras nos caps. 1—3. Trata-se de um reflexo literá rio da realidade histórica de que antes, e até mesmo depois, da construção do tabemáculo, os holocaustos ( o/ã, # 6592) e ofertas pacíficas (selem, # 8968; zbh, sacrifício, # 2283; ou uma combinação dos dois) e suas respectivas ofertas de manjares e libações (minhâ, # 4966; nsk, # 5818; ver Levítico 2 e Nm 15.1-16) constituíam um sistema de ofertas usado pelos adoradores 996
Ofertas e Sacrifícios
nos altares javeístas isolados fora do tabemáculo (ver acima). Da mesma forma, a repetição da fórmula de introdução em Levítico 5 .14a cria uma interrupção significativa entre as seções sobre ofertas pelo pecado e pela culpa. 14. Ofertas e sacrifícios no NT. O NT atesta a existência de sacri fícios e ofertas idólatras em seu mundo, a continuidade do funcionamento do sistema sacrificial no templo, segundo o AT, e, o mais relevante do ponto de vista teológico, a relação entre Jesus e o sistema sacrificial do AT, bem como entre o cristão e esse sistema. Uma leitura séria do NT resulta em inúmeras observações sobre Jesus como nosso sacrifício, tomando por base o contexto do sistema sacrificial do AT (p. ex., Mc 10.45; Jo 1.29; Rm 4.25; 8.3; 1Co 5.7; E f5 .2 e e sp . Hb9.14; 10.10, 19-20), sobre Jesus como nosso sumo sacerdote (Hb 5.5-10) e acerca de nosso compromisso cristão e ministério como um sacrifício a Deus de nós mesmos e de nosso trabalho para o reino (p. ex., Rm 12.1; 15.16; Fp 2.17; Hb 13.15-16). Na verdade, os fundamentos históricos e metafóricos para a compreensão de grande parte da teologia do NT baseiam-se no sistema sacrificial do AT. Para os paralelos detalhados entre a terminologia do AT e do NT e sua relevância teológica, ver especialmente: 'ãsãm, oferta pela culpa, (# 871); hat(ã ’t, oferta pelo pecado (# 2633); minhâ, dádiva, presente, oferta, sacrifício (# 4966); 'õlá 1, holocausto (# 6592); qorhãn, oferta, dádiva (# 7933); selem, oferta pacífica (# 8968); zbh, sacrifício (# 2283), bem como alguns dos outros termos secundários (p. ex., nsk I, libação [# 5818 e # 5821]; m a ’asêr, dízimo [#5130]). O problema é que uma listagem e um tratamento isolado do uso individual dos termos não esgotam a influência teológica do sistema sacrificial do AT sobre o NT nem proporciona uma percepção holística de sua forma. Toma-se necessário apresentar aqui um rápido resumo geral a fim de complementar a natureza isolada dos comentários nos vários artigos sobre os termos individuais (ver a lista acima). 15. Jesus Cristo e as ofertas e sacrifícios do A T. Durante sua encarnação, Jesus honrou expressamente o sistema sacrificial mosaico (Mt 8.4; Mc 1.44; Lc 5.14; 17.14; cf. Lv 14.220). Viveu como um judeu e incentivou outros a fazerem o mesmo guardando “até um i ou um til da lei” (Mt 5 .18). No entanto, também se mostrou de acordo com a crítica profética do AT com relação ao culto (ver, p. ex.. Is 1.10-15; Jr 7.21-26; Os 6.6; Am 5.21-26 e esp. Mq 6.6-8). No sermão da montanha, por exemplo, Jesus indicou que a relação com o próximo devia ser resolvida antes de apresentar ofertas no templo (Mt 5.23-24). Também expressou frustração com as incoerências do sistema sacerdotal da época que permitia a transgressão de outras leis (p. ex., o mandamento para honrar pai e mãe ao cuidar deles podia ser anulado com uma substituição na forma de piedade cultuai fazendo ofertas ao Senhor [Mt 15.5; Mc 7.11, a conhecida passagem sobre o “Corbã”]). Ver também m a'asêr, dízimo (# 5130), para comentários sobre Mateus 23. De acordo com o NT, outra dimensão da relação entre Jesus e o sistema sacrificial do AT é a identificação pessoal dele próprio com diferentes aspectos do sistema. Podem-se citar duas: Jesus como nosso Sumo Sacerdote (Hebreus 5— 10) e Jesus como a vítima sacrificial oferecida a Deus no altar (ver esp. Hebreus 9— 10). E importante lembrar-se que o NT apre senta uma aplicação metafórica dos elementos do sistema de ofertas e sacrifícios do AT a Jesus a fim de explicarem-se e ilustrar as diversas maneiras pelas quais a morte dele na cruz iria nos beneficiar. Jesus não foi, por exemplo, literalmente imolado no altar de holocausto, seu sangue não foi aplicado ali e seu corpo nâo foi queimado nele. Além disso, um animal não podia ser usado para mais de um tipo de oferta, enquanto Jesus é chamado, por vezes, de nosso sacrifí cio pascal e, em outras ocasiões, de nossa oferta pela culpa, etc. (para mais detalhes, ver a lista de artigos relacionados). Os diferentes tipos de ofertas e sacrifícios servem de metáforas para ilustrar os vários propósitos e a eficácia absoluta da morte de Jesus na cruz. 997
Ofertas e Sacrifícios
Parte-se, aqui, do pressuposto de que o leitor do NT compreende em profundidade o sistema de ofertas e sacrifícios do AT, de modo que este pode ser usado prontamente como contexto para entendermos o que Cristo fez por nós. Trata-se de uma pressuposição que era justificada no tempo do NT. Os judeus eram educados dentro desse sistema, pelo menos até o ano 70 d. C., quando o templo foi destruído e a Bíblia dos cristãos gentios no tempo do NT era a LXX grega. Hoje em dia, o sistema do AT é menos conhecido tanto para judeus quanto gentios, de modo que os fundamentos usados para explicar Jesus para nós no NT não são assim tão claros. Essa falta de conhecimento prévio dificulta uma compreensão básica de certas par tes do NT e, em função disso, o poder transformador da verdade do NT acerca de Jesus Cristo vê-se reduzido nas igrejas e na vida particular dos cristãos. Hebreus 9— 10 representa uma contribuição importantíssima nessa discussão do sistema sacrificial do AT com relação ao sacrifício de Cristo. A passagem começa com um resumo do sistema do santuário no AT, partindo de uma descrição do santuário em si e terminando com a distinção entre os sacrifícios que eram oferecidos ao longo do ano em contraste com o dia da expiação (Hb 9.1-7). O contexto é a citação da passagem sobre a nova aliança — Jeremias 31.31-34 — em Hebreus 8, passagem à qual o escritor volta em 10.16-17. Entre uma coisa e outra, o texto de 9.1— 10.15 é dedicado a uma comparação entre: a. o sistema sacrificial do AT em geral e o sacrifício de Cristo (9.8-14); b. o sacrifício de ratificação da aliança do AT (Êx 24.5-8) em contraste com o sacrifício da nova aliança de Cristo (Hb 9.15-20); c. a purificação do tabemáculo do AT com sangue (Êx 29.10-14; Lv 8.15; Nm 7.1) e o sangue de Cristo puri ficando o tabemáculo celestial (Hb 9.21-24); e d. o dia da expiação do AT (Levítico 16) e o sacrifício de Cristo (Hb 9.25— 10.14; cf. também 10.18-22). Com referência ao sistema sacrificial em geral, o escritor começa dizendo que uma vez que mesmo o sumo sacerdote só podia entrar no Santo dos Santos uma única vez por ano (Hb 9.7), o Espírito Santo queria mostrar dessa forma “que ainda o caminho do Santo Lugar não se manifestou, enquanto o primeiro tabemáculo continua erguido” (9.8). O escritor volta precisamente a esse ponto depois do excurso intercessor sobre o sistema sacrificial: “Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou pelo véu, isto é, pela sua came, e tendo grande sacerdote sobre a casa de Deus...” (10.19-21). O excurso em si, portanto, inicia-se justamente com a ra zão de sua existência: mostrar que temos acesso infinitamente melhor a Deus por intermédio do sangue de Cristo do que o caminho que se encontrava disponível por meio do sistema do santuário no AT. O primeiro motivo para isso é o fato de as ofertas e sacrifícios do AT serem “ineficazes para aperfeiçoar aquele que presta culto” (Hb 9.9b; cf. “sincero coração” e “tendo o coração purificado de má consciência e lavado o corpo com água pura” em 10.22). Trata-se de um con traste com o sacrifício de Cristo, nosso sumo sacerdote. Ele não apenas entrou no tabemáculo celestial em vez daquele aqui na terra (v. 11), como também ofereceu ali o próprio sangue em vez do sangue de bezerros e bodes a fim de obter para nós a redenção eterna e não só temporá ria (v. 12). De modo geral, pode-se dizer que o sangue dos sacrifícios do AT realizava apenas a “purificação da came” (v. 13), enquanto o sangue de Cristo purificou “nossa consciência” (v. 14). No sistema sacrificial do AT ocorria uma purificação verdadeira, mas esta era apenas no sentido do tabemáculo terreno. Cristo entrou no tabemáculo celestial para nos purificar em outro nível — o da consciência —, de modo que não precisássemos mais praticar obras mortas, mas sim, “para servirmos ao Deus vivo!” (v. 14b). 16. Os cristãos e as ofertas e sacrifícios do AT. A atuação dos sacrifícios do AT e sacrifício dc Cristo no NT em níveis completamente distintos se reflete também no fato de que 998
Ofertas e Sacrifícios
Paulo estava disposto a continuar oferecendo sacrifícios no templo muito depois de haver se tomado cristão. Na verdade, ele até pagou para que outros cristãos judeus fizessem o mesmo e, desse modo, incentivou tal prática (At 21.23-26; cf. 24.17-18 e o fato de que, portanto, estava aparentemente cumprindo as práticas do AT para um voto nazireu, 18.18; 21.23). Se tal prática tivesse constituído uma contradição com a eficácia plena do sacrifício de Cristo, Paulo certa mente não se teria envolvido nessa atividade. Seu axioma conciliatório não se aplicava a esses casos de contradição: “Procedi, para com os judeus, como judeu, a fim de ganhar os judeus; para os que vivem sob o regime da lei, como se eu mesmo assim vivesse, para ganhar os que vivem debaixo da lei, embora não esteja eu debaixo da lei” (1 Co 9.20). Paulo estava disposto a se colocar contra a teologia e as práticas judaicas sempre que elas se mostravam conflitantes com o evangelho de Jesus Cristo (Atos 15; praticamente o livro todo de Gálatas; etc.). Apesar de não considerar a si mesmo e a nenhum outro cristão, judeu ou gentio como estando sob a lei (ver até mesmo a declaração parentética em ICo 9.20), o apóstolo Paulo, sem dúvida, vè o sistema sacrificial do AT como um meio legitimo de os crentes judeus do primeiro século expressarem piedade e adoração. É evidente que tudo isso acabou quando o templo foi destruído no ano 70 d. C., mas àquela altura, Paulo também já havia saído de cena. Enquanto isso, ele usava o sistema sacrificial como alicerce metafórico para ensinar princípios e práti cas da vida cristã. As fundações para esse descolamento metafórico foram lançadas já no AT, em que en contramos declarações como “Sacrifícios agradáveis a Deus são o espírito quebrantado; o co ração compungido e contrito, não o desprezarás, ó Deus” (SI 51.17). Essas palavras contrastam com o v. 16 em que Davi escreveu: “Pois não te comprazes em sacrifícios; do contrário, eu tos daria; e não te agradas de holocaustos” e com o v. 19 em que descobrimos que se o coração estiver em ordem, “Então, te agradarás dos sacrifícios de justiça, dos holocaustos e das ofertas queimadas; e sobre o teu altar se oferecerão novilhos”. A questão é que Deus não se agradaria de sacrifícios levados por alguém cujo coração não estivesse em ordem com ele (cf. a crítica profética ao culto, p. ex., Is 1.10-17; Mq 6.1-8). Em termos metafóricos, o sacrifício mais im portante era “o coração compungido e quebrantado”. Tendo em vista as inúmeras misericórdias recebidas de Deus, o apóstolo Paulo insta os cristãos: “apresentei o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional” (Rm 12.1). A abundância de termos cultuais nesse versículo lança mão diretamente do AT. O termo sacrifício é óbvio, mas apresentar, santo, agradável e culto racional também é algo claramente baseado no sistema sacrificial do AT. Este último termo foi usado na versão G do AT para traduzir a palavra heb. que se refere, muitas vezes, ao serviço prestado a Deus na adoração (ver, p. ex., Êx 12.25-26; Nm 8.11; lCr 28.13). A palavra “racional” na última parte da oração é problemática, mas provavelmente significa que esse ato de oferecerse a Deus era a única maneira correta de um cristão viver. Devemos ser sacrifício “vivo” e não morto, mas isso significa que devemos viver de um determinado modo. Várias coisas fazem parte desse modo de vida. Para Paulo significava que ele estava disposto a ser “oferecido por libação sobre o sacrifício e serviço” da fé dos filipenses e de ou tros que ele conduziu ao Senhor (Fp 2.17; -> nsk I, libação, #5818). As vezes isso implicava sofrimento. Paulo sabia muito bem disso e o apóstolo Pedro usa o exemplo de Jesus como o Servo Sofredor (Isaías 53; 'ãsãm, oferta pela culpa, #871) para encorajar os cristãos a se mostrarem dispostos a sofrer pacientemente por Cristo (1 Pe 2.18-25). Outras aplicações metafóricas do NT para a lei sacrificial na vida cristã concentramse no serviço e na adoração que podemos oferecer a Deus. Paulo considerava os frutos do seu ministério entre os gentios, por exemplo, como uma oferta “agradável... [uma vez] santificada 999
Ofertas e Sacrifícios
pelo Espírito Santo” (Rm 15.16b). Por fim, o escritor de Hebreus nos exorta dizendo: “Por meio de Jesus, pois, ofereçamos a Deus, sempre, sacrifício de louvor, que é o fruto de lábios que confessam o seu nome” e também, “Não negligencieis, igualmente, a prática do bem e a mú tua cooperação; pois, com tais sacrifícios, Deus se compraz” (Hb 13.15-16). Em certo sentido, portanto, assim como Jesus cumpriu as leis sacrifíciais do AT, podemos cumpri-las do mesmo modo ao viver como Jesus. Também nisso ele foi exemplo para nós (Ef 5.1-2; cf. Fp 2.1-11). Oferta, sacrifício: ’azkãrâ(oferta simbólica, #260);-> 'isseh (sacrifício por fogo, # 852); 'ãsãm (sacrifício pela culpa, # 871); -> zbh (abater, sacrificar, # 2284); -> haffã at (sacrifí cio pelo pecado, # 2633); -> tbh (matar, # 3180); -> minhâ (presente, dádiva, oferta, sacrifício, # 4966); -> ma 'asêr (dízimo, # 5130); -> ndr (fazer um voto, # 5623); nwp I (mover para frente e para trás, balançar, # 5677); -> nsk I (derramar, ser consagrado, libaçâo, # 5818); -> 'õlá I (holocausto, # 6592); -> ’arisâ (oferta de manjares, # 6881); -> qorbãn (oferta, presente, # 7933); í/i/1 (abate, # 8821); se/em (sacrifício de compensação, # 8968); -> tãm id(ofer ta regular, # 9458); -> íeríimâ (tributo, contribuição, # 9556); -> Arão: Teologia; Oferta: Teologia; -> Sacerdotes e Levitas: Teologia Tabemáculo, tenda, templo: -> o/je/ (tenda, aquele que habita em tendas, # 185); dPbir I (Santo dos Santos, # 1808); -> mó ‘êd (lugar de congregação, assembléia, tenda da congregação, # 4595b); miqdãs (santuário, # 5219); -> miskãn (santuário, # 5438); pãrõket (cortina diante do Santo dos Santos, # 7267); -> suMâ (tabemáculo, tenda, barraca, abrigo, # 6109); Arão: Teologia; -> Sacerdotes e Levitas: Teologia B iiil k x ír a f ia
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Oficio -> # 3093 (hãrãs, artífice)
Ogue
Ogue ( r á , [ 'ôg], # 6384).
AT O nome Ogue é usado no AT somente para um indiv íduo, a saber, o rei da terra de Basã (# 1421). De acordo com Aharoni (37— 38), Basã é a região norte da Transjordânia, que circunda os limites superiores do rio larmuque e se estende para o norte em direção ao que é chamado hoje de colinas de Golã. A cadeia de montanhas de Jebel Druze (monte Haurã e, provavelmente, o monte Basã que aparece na Bíblia, SI 68.15 [16], de acordo com Emerton, 37) encontra-se a leste, formando uma barreira protetora que impede a invasão do deserto e que também cria chuvas orográficas, fazendo de Basã uma região plana fértil e bem regada. Sua localização relativamente afastada e sua fertilidade conferem à região um caráter quase lendário. Assim, a BH fala muitas vezes (60x) de Basã, seus leões (Dt 33.22), seus bois gordos (Ez 39.18; cf. Am 4.1), excelentes carneiros (Dt 32.14), touros fortes (SI 22.12 [13]), grande carvalhos (Is 2.13) usados para fazer remos (Ez 27.6) e suas montanhas escarpadas e majestosas (SI 68.15 [ 16]). O deuteronomista relacionou Ogue com a cidade de Astarote como sede de poder (Dt 1.4 e Js 9.10), ao passo que a batalha com os israelitas ocorreu em Edrei (Nm 21.33; Dt 1.4; 3.1). Os dois lugares são mencionados em fontes egíp. ao longo de todo o segundo milênio (ANET., 242, 329,486). Uma esteia de Setos I e um relevo de Ramsés II foram encontrados na região de Astarote (Bartlett, 267). Fica claro que a região era importante e não causa surpresa o fato de aparecer na tradição do assentamento de Israel. De acordo com os relatos de Núme ros 21.33-35 e Deuteronômio 1.4; 3.1-14, sob a liderança de Moisés, os israelitas derrotaram primeiro o rei de Siom, que governava em Hesbom, e depois Ogue, o rei de Basã, na batalha de Edrei. Em seguida, a região foi assentada pelos israelitas, mais especificamente Manassés, enquanto Rúben e Gade assentaram-se na região de Siom (Nm 32.33). Os detalhes relatados em Números 32 indicam que o processo de ocupação foi um pouco mais complicado do que Números 21 dá a entender. O contexto histórico do assentamento na região da Transjordânia, especialmente no local de Ogue é controverso. Em parte, a dificuldade encontra-se na tradição bíblica (Nm 13.29), que considera Ogue e seu vizinho do sul, Siom, como reis amorreus. Van Seters sugere que “amorreus” era um termo geográfico usado pela tradição eloísta, enquanto os javeístas empregavam a designação “cananeus” (Amorite, 64-81). Senaqueribe usa o nome Amurru para descrever toda a região da Síria-Palestina (AS, 30). Bartlett (257-77) afirma que a descrição específica de Ogue e Siom como reis dos amorreus (Dt 3.8), reflete uma reminiscência posterior, quando os amorreus já haviam perdido sua localização territorial específica e haviam se tomado sim plesmente parte da trama do mito da conquista. E possível que a topografia do território desses reis estrangeiros esteja mais ligada a divisões tribais exatas do Deuteronômio (entre Rúben, Gade e Manassés) do que a uma reminiscência histórica real. 2. Vários detalhes sobre o rei de Ogue encontrados em Deuteronômio 3.11 são consid rados indícios de uma origem lendária. Foi o último dos refains (cf. Dt 2.10-12) e a estrutura de sua cama era de proporções consideráveis (cerca de 4,5 x 2 metros). Nenhuma dessas ca racterísticas em si é, necessariamente, mítica. Diz-se que o povo refaim, descrito como sendo “alto como os anaquins” havia sido conquistado pelos amonitas (Dt 2.20-21). De acordo com Bartlett (269), é possível que a Bíblia tenha usado o termo refaim para descrever figuras obs curas do passado. Segundo Gottwald (The Trihes, 739), a cama foi uma peça de mobília toma da pelos amonitas como um troféu de guerra e depois exposta na capital deles, Rabá (3.11). 1001
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Alguns estudiosos chegaram a sugerir que a cama fosse um sarcófago de basalto ou um dólmen; mas nenhuma dessas sujestões supera a interpretação literal do termo hebraico, ou seja, de que se trate de uma cama de ferro semelhante às camas de madeira de Tutancâmom (ver também ANEP, 140). Se, de fato, a cama foi tomada pelos amonitas, então a história de Ogue entrou para a tradição israelita quando os amonitas tomaram-se parte da federação tribal (Gottwald, 215,431-33,556). A pergunta “não está porventura...?”, em 3.11, dá a entender que o D estava preparado para usar a existência do móvel como comprovação de seu relato. Vários estudiosos (p. ex., Jagersma, 64-65) argumentam com bases literárias que Núme ros 21.33-35 deriva de Deuteronômio 3.1-3, indicando que Ogue seria um constructo lendário do Dt, enquanto a tradição de Siom (do cântico antigo em Nm 21.27-30) é ainda mais remota (pertencente a E) e, portanto, autêntica. Porém, Aharoni (208) conclui que a tradição de Ogue certamente é antiga e que as investigações arqueológicas da região comprovam a existência de um assentamento pré-israelita em Basã (60 cidades fortificadas em Dt 3.5), incorporado sub seqüentemente ao reino de Davi com outras partes da Transjordânia (2Sm 12.26-31). Não há como ir-se além da conjectura quanto à maneira exata em que os elementos da saga de Ogue se reuniram e que papel tiveram na história do assentamento de Israel. A relevância bíblica de Ogue transcende sua participação como um rei secundário no reino de Canaã e suas redondezas e, portanto, dentro da história de Israel. O papel simbólico de Ogue fica evidente na persistência da tradição. A maior parte das referências a ele trata da batalha em si e do contexto dela (Nm 21.33; Dt 3.1-4, 10; 4.47; Js 12.4) ou da localização das divisões tribais (Nm 32.33; Dt 3.13; Js 13.12, 30). As outras referências constituem uma parte da crença relacionada à tradição da conquista, que o Deuteronômio emprega no discurso de Moisés (Dt 29.7-8 [6-7]), de Josué (31.4), de Raabe (Js 2.10) e dos gibeonitas (9.10). A tradição volta a aparecer nos escritos do cronista (Ne 9.22) e duas vezes nos Salmos (SI 135.11; 136.20). A crença da conquista usa Ogue como uma figura de grande importância que representa um dos grande reis (gigantes) da Transjordânia, que foi derrotado pelo israelitas. E um emblema do poder de Deus que capacitou um grupo heterogêneo de israelitas a assentar-se na terra fértil de Basã, ainda que esta fosse fortificada por sessenta cidades e governada por um gigante cuja cama foi, por séculos, um objeto a ser admirado. Paradoxalmente, Ogue tomou-se parte da his tória da salvação de Israel, entretecido na tradição israelita da conquista (->) da terra. B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land o f the Bible, 1979; J. R. Bartlett, “Sihon and Og, Kings of the Amorites”, VT 20, 1970, 257-77; J. Bright, History o f lsreal, 1980; J. A. Emerton, “The ‘Mountain of God’ in Psalm 68:16”, SVT 50, 1993, 24-37; N. K. Gottwald, The Tribes ofYahweh, 1979; B. Halpem, The Emergence o f Israel in Canaan, 1983; IJH, 213-84; H. Jagersma, History o f Israel in the Old, 44; J. A. Thompson, Deuteronomy, 1974; D. J. Wiseman, ed., People o fO ld Testament Times, 1973. W. R. Domeris Oleiro Óleo
# 3450 (võyêr, oleiro) # 9043 (semen, óleo)
Olhar -> # 8011 (r'h, ver, ter visões, escolher, perceber) Olho -» # 6524 ( 'ayin, olho) 1002
Oliveiras, Monte das
01íbano-> # 4247 (lebõnâ I, olíbano, resina branca) Oliva
# 2339 (zayit, oliveira, oliva)
1. A cadeia de colinas alto que o templo. Obstrui a visâo a leste e, juntamente com o declive íngreme do vale de Cedrom, forma uma barreira eficaz desse lado, protegendo a cidade e, ao mesmo tempo, dificultando qualquer fuga para fora dela. Essa barreira é men cionada pela primeira vez nas Escrituras quando, por causa da revolta de Absalão, Davi fugiu da cidade para um lugar chamado em heb. de “encosta das Oliveiras” (2Sm 15.30). Para o rei legítimo da cidade, aquele se tomou um lugar de pranto (cf. Lc 19.41). Um monte “a leste de Jerusalém” foi escolhido por Salomão como local para a adoração de deuses estrangeiros como Quemos, Moloque e outros, e seu sincretismo foi alvo da censura divina (IRs 11.7-13). Só na reforma de Josias em 621 a. C. é que esses santuários ao sul do “monte da Destruição” foram demolidos (2Rs 23.13, 14). A reforma de Josias chegou tarde demais para reverter o julgamento de Deus sobre Judá; os babilônios destruíram Jerusalém e levaram os habitantes dali para o cativeiro. A tragédia foi explicada por Ezequiel que havia visto a glória de Deus deixar Jerusalém e parar “sobre o monte que está ao oriente da cidade” (Ez 11.23). O Deus de Israel tomou o monte das Oliveiras para si e iria voltar em glória vindo do Oriente quando o templo estivesse reconstruído (Ez 43.2). 2. O nome do monte das Oliveiras é citado especificamente na profecia de Zacar (Zc 14.4). Os capítulos 9— 14 apresentam um calidoscópio de temas contrastantes. A derrota por forças sobrepujantes alterna-se com a intervenção divina em favor de Israel. Não faltam referências a pessoas e acontecimentos da experiência passada de Israel, especialmente do exílio trágico e da restauração de Jerusalém. A luz da restauração do templo, o profeta me dita sobre o mistério de como Deus trata com Israel, ora com julgamento, ora com miseri córdia. O Rei justo (9.9) contrasta com o pastor inútil (11.17) e então sobrevem a tragédia, pois a espada deve ferir aquele que é companheiro do Senhor Todo-Poderoso (13.7). Tendo em vista a associação antiga existente entre rei e pastor (Nm 27.17; 2Sm 5.2), a morte do pastor de Deus continua sendo um enigma (Zc 13.7-9). Jerusalém será derrotada completa e terrivelmente (14.2), mas se trata de uma obra do Senhor e, posteriormente, o Senhor se co locará sobre o monte das Oliveiras para lutar contra os exércitos das nações unidas quando atacarem. O uso de linguagem alusiva levanta questões quanto ao significado que envolve o monte das Oliveiras nesse caso. A primeira vista, parece tratar-se dc uma recapitulação do cerco de Jerusalém em 587 a. C.: metade da população permanece na cidade enquanto a outra metade é levada para o exílio (2Rs 24.10-20). Porém, o inimigo nesse caso nãoé a Babilônia, mas sim “todas as nações”, e os acontecimentos sofrem uma reviravolta com a aparição do Senhor, intervindo pessoalmente para lutar contra o poder dessas nações aliadas. O toque de seus pés faz essa cadeia de montanhas fender-se ao meio de modo que o monte das Oliveiras, em vez de ser uma barreira, toma-se uma “vereda a nosso Deus” (Is 40.3-4). O movimento cataclísmico das montanhas é um sinal para uma série de mudanças cósmicas. O domínio do Senhor sobre toda a terra é simbolizado apropriadamente por luz, calor e água viva jorrando de uma fonte perene. As forças inimigas morrem de uma praga, como os exércitos assírios no tempo de Ezequias (2Rs 19.35, 36) e a santidade transforma até mesmo os utensílios de adoração no templo. E evidente que se trata de um mundo diferente daquele que conhecemos, pois a geografia, o clima e a alternância de Oliveiras, Monte das
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dia e noite passaram por alterações, revertendo a promessa antiga de Deus a Noé (Gn 8.22). A profecia deu lugar ao apocalipse. Apesar do surrealismo que aponta para “o fim”, a visão se limita a Jerusalém e suas cercanias, e o escritor imagina a adoração tendo continuidade no templo. Assentado no monte das Oliveiras, Jesus surpreende os doze apóstolos ao prenunciar a destruição do templo e falar do fim dos tempos (Mateus 24). Do monte das Oliveiras, Jesus é “elevado às alturas” à vista dos discípulos (At 1.9), aos quais é dito que Jesus voltará da mesma forma como o viram ser assunto ao céu (1.11-12). Essa declaração não deixa implícito necessariamente que Jesus voltará ao monte das Oliveiras, mas, diante das palavras de Zacarias 14.4, trata-se de uma inferência plausível. Essa região é uma área de terremotos, sacudida aproximadamente a cada cinqüenta anos por tremores mais intensos e, portanto, em termos puramente geológicos, a abertura de um vale nessa cadeia a leste de Jerusalém pode ser considerada uma possibilidade. Em termos teológicos, a relevância de tal acontecimento pode ter sua origem determi nada em referências do AT. Havendo trilhado com dificuldade esse aclive íngreme enquanto procurava refugio das forças rebeldes, Davi chegou ao cume “onde se costuma adorar a Deus” (2Sm 15.32). Esse comentário, considerado em conjunto com o uso que Salomão fez do monte das Oliveiras como local de seus templos ilícitos, mostra a deslealdade de Israel para com o Senhor da aliança. Essa deslealdade redundou na destruição tanto do templo quanto da cidade. Apesar de Zacarias ter testemunhado trabalhos de reconstrução em Jerusalém, esse não foi o fim da história. Num lugar que passou séculos sendo contaminado por ídolos, o Senhor descerá em julgamento e fenderá a montanha ao meio. Com isso se cumprirá o propósito de Deus de formar um grande caminho para Jerusalém partindo do Leste, que será uma rota de fuga plana, porém, mais importante ainda, uma vereda triunfal para a procissão de vitória do Senhor até sua capital exaltada (Zc 14.5,9, 10). NT A pergunta dos discípulos sobre o sinal da vinda de Jesus no fim dos tempos foi feita no contexto do ensinamento profético justamente sobre o monte no qual se encontravam as sentados (Mt 24.4). Nos últimos anos, milhares de pessoas entenderam as palavras do profeta de modo tão literal que providenciaram para ser sepultadas nesse monte a leste-de Jerusalém. Talvez o mais acertado seja considerar Zacarias 14.4 um simbolismo pictórico para a vitória final de Deus sobre todas as pretensões inimigas. B ib l io g r a f ia
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# 8900 (sekem I, ombro) # 1644 (gal II, onda)
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Onri CtOV [ 'omrí\, # 6687).
Onri
1. Suas origens. Pelo fato de os antepassados de Onri não serem mencionados no AT, são propostas diferentes idéias quanto à sua ascendência. Gray (364) considera a possibilidade de uma origem cananéia, enquanto Noth (230) fala de uma origem não israelita. Esse ponto de vista pode ser apoiado pelo fato de que o nome de Onri é citado num texto ugar., como amry (Gordon, U T2:184; # 84:8). A menção ao nome de Onri na Crônica Samaritana II reflete talvez uma ascendência efraimita (Mcdonald, 163). Outra possibilidade é que, assim como Baasa, ele fosse da tribo de Issacar (1 Rs 15.27; cf. I Cr 27.18). Houve outras pessoas do AT com esse mesmo nome (cf. 1Cr 7.8; 27.18). 2. Onri torna-se rei de Israel. Zinri, comandante de metade dos carros de Israel assassi nou Elá (IRs 16.8) e eliminou todos os concorrentes ao trono (16.11), cumprindo assim a pro fecia de Jeú, filho de Hanani (16.1-5). A notícia do golpe de Zinri chegou a Onri, comandante do exército, durante o cerco à cidade filistéia de Gibetom. O exército proclamou Onri seu novo rei (16.16) e ele voltou imediatamente para casa e sitiou Tirza. Uma vez que não tinha nenhum apoio, Zinri cometeu suicídio incendiando o castelo onde se encontrava (16.18). 3. Principais realizações. Apesar de o reinado de Onri ser o assunto de apenas oito ver sículos ( I Rs 16.21 -28), a ascensão dele ao trono de Israel dá início a uma nova era para ambos os reinos, uma era que durou cerca de quatro décadas (Miller, 250). Onri implantou políticas características desse período que levaram prosperidade e estabilidade ao país, que lembravam os tempos de Davi e Salomão. 4. O reinado de Onri foi contestado a tal ponto por Tibni (IRs 16.21-22) que culmi nou numa guerra civil (Noth, 229), a qual só teve fim com a morte de Tibni, seis anos depois ( 16.22). Onri reinou por doze anos (885-874 a. C.; cf. Comey, 78), os seis primeiros em Tirza e os outros seis em Samaria ( 16.23-24). 5. A política internacional de Onri. Apesar de o AT revelar pouca coisa sobre Onri, informações extrabíblicas indicam que ele foi um estrategista e estadista competente que desfrutou reconhecimento internacional, que se reflete nos Anais Assírios (ANET, 284-85). Iniciou com sucesso procedimentos que resultaram em estabilidade política e prosperidade econômica. O casamento de seu filho Acabe com Jezabel selou uma aliança lucrativa com o pai de Jezabel, Etbaal, rei de Sidom, dando a Onri acesso ao comércio mediterrâneo fenício. Outro casamento diplomático, o de sua neta Atalia (2Rs 8.18, 26) com Jeorão de Judá. anunciou relações pacíficas com o reino do Sul. Também negociou relações amigáveis com os arameus, na fronteira nordeste ao entregar-lhes território ao Norte e permitir que desen volvessem ruas de comércio em Samaria (1 Rs 20.34). E provável que tenha cultivado ainda relações amigáveis com os assírios (Pienaar, 39). O programa de construção de Onri visava edificar cidades fortificadas em locais estratégicos, com sistemas complexos de abastecimen to de água em Megido e Hazor (Yadin, 227-47). Samaria, com sua posição central, contribui para um governo eficiente. Dã (Biran, 176-79), Hazor e Engeve guardavam a fronteira nor deste com os arameus. Megido guardava a rota de acesso ao vale de Jezreel (Pienaar, 153). Jezreel protegia o acesso ao norte para Samaria e é bem provável que Jericó protegesse a passagem para Moabe (Olivier, 15). Essas alianças conseguiram neutralizar a ameaça filistéia e deram a Onri a ousadia de se aventurar para o sul a fim de conquistar e explorar Moabe (2Rs 3.4; cf. a inscrição Mesa, linhas 5— 10; ANET, 320; DOTT, 196), conferindo-lhe o controle sobre rotas de caravanas que cortavam o território moabita (Pienaar, 157; Fensham, 591/2). 6. As políticas nacionais de Onri. A estabilidade e prosperidade relativas de seu tempo permitiram que Onri desse início a um programa de construção que teve continuidade com seu filho Acabe. Uma das grandes realizações de Onri foi a construção de Samaria (IRs 16.24). 1005
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Não apenas sua localização era estratégica, mas também o monte de Semer situava-se numa posição central e próxima a uma estrada importante (Kenyon, 73). Nesse monte praticamente descoberto, Onri pôde desenvolver sua capital de acordo com idéias próprias, sem a obstrução de construções já existentes. Ao edificar sua capital sobre um território que lhe pertencia, é provável que Onri tenha pensado o mesmo que Davi quando este capturou Jerusalém com seu exército pessoal, depois do que a cidade foi considerada propriedade particular de Davi (2Sm 5.6; cf. Noth, 191; Bright, 195). Assim como Davi, Onri promoveu a idéia de uma dinastia, o que havia sido impossível de estabelecer em Israel anteriormente. Os artífices fenícios que Onri empregou construíram uma cidade tão magnífica que o esplendor dela permaneceu insuperado por séculos. Tomando todo o centro da cidade, a área real era separada do resto de Samaria por uma muralha ao redor (Kenyon, 74-82), demonstrando uma falta de confiança em seus próprios súditos, caso se tenha em mente o assassinato de reis anteriores. 7. Conclusão. Onri foi o primeiro rei do Norte a estabelecer uma dinastia perpetua por três gerações. Seus métodos de governo trouxeram para o reino a estabilidade política e prosperidade econômica tão necessárias mas a um preço que, no final, seria alto demais para sua dinastia e para Israel (Merrill, 251), pois o relacionamento de Onri com Tiro exigiu tolerân cia ao culto de fertilidade cananeu (lR s 16.32-33; cf. Pienaar, 157; Jagersma, 139-40; Miller, 273-74; Mulder, 52; Barkay, 320). Essa transigência acabou resultou em confrontos com os profetas Elias (caps. 17— 19; 2Rs 1.1-16) e Micaías (1 Rs 22.13-28) e levou à censura profética de Miquéias (Mq 6.16). Apesar de suas realizações, Onri foi lembrado como um rei perverso por ter tolerado a religião cananéia (1 Rs 16.25-26). -> Israel (Reino de Israel: Teologia) B ib l k m ;r a h a
G. Barkay, “The Iron Age II-III”, in Amnon Ben-Tor, ed., The Arehaeology o f Ancient Israel, 1992,302-73; A. Biran, “Tell Dan-Five Years Later", BA 43,1980, 176-82; J. Bright, A History o f Israel, 1972; R. W. Comey, The Reigns o f Omri and Ahab: An Essay in the Reconstruction o f the History o f Israel, 1970; F. C. Fensham, “The Relationship Between Phoenicia and Is rael During the Reign of Ahab”, Atti de I Congresso Internazionale di Studi Fenici e Punici, Volume Secondo, 1983, 589-94; C. H. Gordon, Ugaritic Textbook, 1965; J. Gray,1 & IIKings, 1970; H. Jagersma, A History o f Israel in the Old Testament Period, 1978; K. Kenyon, Royal Cities o f the Old Testament, 1971; J. McDonald, The Samaritan Chronicle No II, BZAW 107, 1969; E. H. Merrill, An Histórica! Survey o f the Old Testament, 1966; J. M. Miller e J. H. Hayes, HAIJ, 1986; M. J. Mulder, “The World of the Old Testament”, in A. S. van der Woude. ed., Bible Handbook, 1989, 2:2-76; M. Noth, The History o f Israel, 1960; H. Olivier, “A Tale ofTwo Cities”, M í7 T 28/1:2-19, 1987; A. L. Oppenheim, “Babylonian and Assyrian Historical Texts”, in J. B. Pritchard, ed., ANET, 1969, 265-322; D. N. Pienaar, “The Role ofFortified Cities in the Northern Kingdom During the Reign on the Omride Dynasty”, JNSL 9, 1981, 151 -57; idem, “Aram and Israel During the Reigns of Omri and Ahab Reconsidered”, JSS, 6, No 1, 1994, 34-45; D. W. Thomas, DOTT, 1958; Y. Yadin, Hazor, The Rediscovery o f a Great Citadel o f the Bible, 1975. D. N. Pienaar Ontem -> # 621 ( 'emes, ontem) Opressão 1006
# 6700 ( 'nh II, ser afligido, humilhado; oprimir, sujeitar)
Oração
1. A linguagem da nicação explícita com Deus (Staudt, Prayer and the People in the Deuteronomist, 1980, 58). Ele contém um elemento de intencionalidade que a toma distinguível de outras formas mais gerais de comunicação (Balentine, 31; Westermann 8:1214). Qualquer que seja o critério usado para definir-se a oração (como sendo, propriamen te, uma atividade humana), esta é, em sua essência, formada pela confissão sobre o Deus so berano e pessoal, Todo-Poderoso e acessível, que é tanto a fonte quanto o sustento da oração (Balentine, 32-33,47). No AT a oração é, antes de tudo, um ato de fé, pois o suplicante crê fir memente que Deus “[atende] à oração do desamparado e não lhe [desdenha] as preces” (SI 102.17 [ 18]). Sendo uma comunhão com Deus, a oração consiste na súplica, intercessão, ado ração, louvor, confissão e ação de graças (Liefeld, 931). Comparado com o mundo greco-romano da antigüidade, o AT não contém uma palavra de abrangência absoluta para oração, como o G euche e euchomai (cf. E. von Severus, 1162). No entanto, o AT apresenta várias palavras e expressões que denotam oração, sendo que, entre elas, encontra-se a primeira e mais importante,/?// [hitp.] e seu susbt. relacionado fipillâ (# 9525). O vb. p //A possui diversos significados (-> # 7136): pi. intervir, executar julgamento (SI 106.30), mediar, arbitrar (1 Sm 2.25), decidirem favor de uma opinião, esperar (Gn 48.11), com le, defender (dar garantia) (Ez 16.52). Algumas formas derivadas são palll, julgar (Dt 32.31 [ARA: atestar], incerto, # 7130), p elilá, decisão (Is 16.3; #7131 ),p elill, algo que requer julgamento (Jó 31.28; # 7133) e pe liliyyâ, decisão, julgamento (Is 28.7; # 7133). O hitp. normalmente é derivado de um segundo radical,/?// B: orar, tendo pillâ como subs. relacionado (# 9525; cf. H A L A T 77//I7’2:430-31 ).pll hitp. e pillâ não ocorrem em outras línguas sem., com exceção do neopúnico tplt, oração (cf. TH A T 2:427 e Walton, 13566. com referência a uma forma de dirigir-se a uma divindade no OMA). Apesar de a etimolo gia ser contestada (cf. THAT2:427; TIVAT 6:607; HALAT 881), o significado de pll hitp. e de fipillã fica claro no contexto. O âmbito semântico das duas formas se restringe exatamente a orar e, respectivamente, à “oração" (TIVAT6:608). Esse significado é endossado pelas traduções antigas. Na LXX, pll hitp. é traduzido 8x como euchomai e, em algumas ocasiões, comoproseuchomai, que é o significado padrão tanto no judaísmo helenista antigo como no cristianismo para orações cultuais (cf. Greeven e Herrmann, “eu[xopai” TWNT 2:774-808; H. Schõnweiss, “Gebet”, Theologisches Begriffslexikon zum NT, 1:421-24). A Vg. traduz pll hitp. como orare / oratio, orar, oração, e também como rogare, pedir, supplicare, suplicar, implorare, implorar, invocar, petere. precare, reivindicar, solicitar, orar e derivativos. Os termos aram. para oração são be', hnn e 1$ Em textos heb. extrabíblicos, a forma e o significado de p ll hitp. foram mantidos, ainda que em ocorrências reduzidas; p. ex. Eclesiástico 36.22; 38-9; 51.11, enquanto outras formas foram empregadas, como por exemplo, o aramJ palpel, discutir, contestar e o heb. médio pilpel, investigar. O subs. relacionado pillâ manteve seu papel principal como uma indicação de oração em Eclesiástico 7.10, 14, nos escritos de Qumran (1QH 12:4; 1QM 15:5) e na LR. especialmente no Mixná (cf. TWAT 6:608). 2. pll e pillâ no AT. a. pll ocorre 74x com o sentido de orar. Essa oração é predo nantemente de intercessão e súplica. Como intercessão,/?//(hitp.) é combinado com várias pre posições a fim de indicar que a oração é oferecida por, em favor de (be 'ad, 'al) alguma outra pessoa, ao ( ’el) Senhor e também sem se fazer menção do objeto. Por exemplo: Abraão devia orar por (be 'ad) Abimeleque (Gn 20.7). Moisés orou pelo (be ’ad) povo (Nm 21.7) e Samuel prometeu interceder junto ao Senhor por (be 'ad) Israel (1 Sm 7.5). Com a preposição 'al, Eze quias orou por ( ‘al) todos aqueles que haviam comido a Páscoa, diferentemente do que estava Oração
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escrito (2Cr 30.18), etc. Num contexto de intercessão, certas pessoas oraram ao ( 'al) Senhor/a Deus (Gn 20.17; Nm 11.2; 21.7; Dt9.26; ISm 7.5, etc.). Uma súplica p ll (hitp.) é combinada com as preposições 'el para enfatizar que a ora ção é dirigida ao Senhor, ou que é oferecida na presença (lipnè) do Senhor. Em uma ocasião, a preposição le é usada com o sentido de “ao” (Senhor, Dn 9.4). Em 1 Samuel 1.10a preposição ‘al é usada com o sentido de 'el (cf. ‘el em alguns MSs). Em várias ocasiões, a oração foi ofe recida voltada para ( el), em direção ao (derek) templo e à cidade. Por exemplo: Ana pediu um filho ao Senhor (1 Sm 1.26); Samuel orou ao Senhor, pois estava descontente com Israel (8.6); Davi ofereceu oração ao Senhor Todo-Poderoso, Deus de Israel (2Sm 7.27); em sua oração de consagração, Salomão suplicou ao Senhor para que ouvisse as orações do povo, até mesmo dos estrangeiros, que seriam oferecidas a ele e voltadas para ( el e derek) a cidade e o templo. (1 Rs 8.30, 35,42,44, 48). Em contextos nos quais pll (hitp.) ocorre como intercessão e súplica, a idcia de oração é, por vezes, intensificada por termos do mesmo âmbito semântico, como buscar (bqs [-> # 1335]; 2Cr 7.14), dizer ( 'mr [-» # 606]; 1Sm 2.1; 2Rs 6.17; 2Cr 20.2; Dn 9.20; Jn 4.2), confes sar iydh [-> # 3344]; IRs 8.33, 35; cf. 2Cr 6.26; Ne 1.6), invocar (qr '[-> # 7924]; Jr 29.12), clamar por socorro ( z ‘q [-> # 2410]; s ‘q [-> # 7590]; rinnâ [-> # 8262]; í w ‘ [ # 8775]; ver SI 5.2 [3]; 2Cr 32.20, etc.), fazer súplicas (hnn, hitp. [-> # 2858]; 1Rs 8.28; 2Cr 6.24), prostrar-se diante de (hitnappal lipnê, Dt 9.25), rogar ( ‘Ir ni. [-> # 6983]; 2Cr 33.13). b. O termo fipillâ é derivado de ou relacionado a pll hitp. Seu significado principal nos diversos contextos é petição, com um forte elemento de intercessão. pillâ, oração, é seme lhante em termos semânticos a uma súplica por misericórdia (^hinnâ [-> # 9382]; IRs 8.28, 45, 49, 54; 9.3; SI 6.9[ 10]; 55.1 [2]), um clamor por socorro (íw ‘ SI 39.12 [13]; 102.1 [2]), o gesto de levantar as mãos (141.2), palavras da boca (54.2 [4]), um clamor ao Senhor (qr ’ 'el [-> U 7924]; 61.1-2 [2-3]), rogar ao Senhor (p g ’[~^ # 7003]; Jr 7.16; 11.14), buscar a Deus (bqs, pi., Dn 9.3) ou voltar (lit. dar) a face para o Senhor (Dn 9.3), clamando (z ‘q), Todas essas orações são oferecidas ao Senhor, mesmo quando são “voltadas para” o templo (1 Rs 8.29). Sabe-se que o Senhor está no céu. Cabia aos sacerdotes e levitas abençoar o povo, e Deus os ouvia, pois as orações deles chegavam ao céu, a santa morada do Deus (2Cr 30.27). A súplica de Salomão é para que o Senhor ouça do céu a oração do povo (IRs 8.45, 49; cf. 2Cr 6.35, 39). Toda oração pressupõe, fundamentalmente, que Deus responda. Por isso, as pessoas na Bíblia rogam a Deus que dê atenção às orações (1 Rs 8.28), que ouça (1 Rs 8.29; Ne 1.6; SI 17.1, 6), que escute (SI 39.12[13]; 54.2[4]; 55.1 [2]) e que dê ouvidos (17.1). Essa pressuposição é um ato de fé: “atendeu à oração do desamparado e não lhe desdenhou as preces” (102.17 [ 18]). Deus é louvado pois ouve as orações (65.2[3]), pois não rejeitou as orações (66.20). “O Senhor está longe dos perversos, mas atenda à oração dos justos” (Pv 15.29). Sem dúvida, inúmeras orações foram respondidas. O próprio Senhor atesta o fato de que respondeu favoravelmente as orações de Salomão (IRs 9.3; cf. 2Cr 7.12), Ezequias (2Rs 20.5) e Manassés (2Cr 33.19). E angustiante quando as orações voltam sem respostas (SI 35.13), quando estão sendo recusadas (Lm 3.8) e quando Deus se encobre de nuvens para que não passe oração alguma (3.44). E ainda mais grave quando a ira de Deus está ardendo contra as orações do seu povo (SI 80.4 [5]), quando ele considera abomináveis as orações do seu povo, que faz ouvidos moucos para a lei (Pv 28.9) ou porque tem as mãos cobertas de sangue (Is 1.15). O golpe final do julgamento de Deus ocorre quando ele não deseja ouvir a oração dos profetas (Ez 9.8; 11.13; Am 7.1-5), especialmente quando admoesta Jeremias: “Tu, pois, não 1008
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intercedas por este povo, nem levantes por ele clamor ou oração, nem me importunes, porque eu não te ouvirei” (Jr 7.16; 11.14). A oração é, por certo, um assunto sério; a Bíblia a considera a mais fundamental de todas as experiências religiosas (cf. Clements, 2). Refere-se aos sentimentos mais profundos e às motivações mais essenciais das pessoas que estão oferecendo oração a Deus, e diz respeito ao relacionamento de aliança, com suas bênçãos e sanções, como o entrelaçamento inevitá vel da comunhão viva entre o povo e seu Deus. Orar é um ato de fé no Deus todo-poderoso e cheio de graça que responde às orações de seu povo. Orar é um privilégio, mas também uma responsabilidade. E um privilégio comunicar as necessidades e desejos mais profundos a um Deus que ouve, mas ao mesmo tempo, é uma grande responsabilidade fazer a oração de tal modo que ela seja aceitável a Deus. A confissão de Jó é, pois, bastante cabível: “Embora não haja violência em minhas mãos, e seja pura a minha oração...” (Jó 16.17). O AT faz distinção entre a verdadeira e a falsa oração. A verdadeira oração vem do cora ção, ou seja, envolve a pessoa toda (cf. Jr 29.12-14). A oração falsa, pelo contrário, é oferecida meramente pelos lábios (Is 1.15; 29.13; cf. Am 5.23-24). Nesse mesmo contexto, o AT também faia dos empecilhos para a oração, p. ex., desobediência (Is 1.15-17; 58.1-2; cf. Dt 1.43-46), falta de amor para com o próximo (Is 58.3-10) e injustiça (Mq 3.1-4) (cf. N1DNTT2:864-66). 3. Exemplos de oração no AT. Neste breve levantamento de orações específicas do limitamo-nos a alguns dos exemplos mais extraordinários de oração. Para um estudo mais ex tenso, ver W. L. Liefeld, 931-33. A primeira oração mencionada encontra-se em Gênesis 4.26: “Daí se começou a in vocar o nome do Senhor” (liqrõ’Ifisêm yhwh). Antes dessa época, os “homens” (Adão, Eva, Caim) conversavam diretamente com o Senhor (3.8-19; 4.6-7, 9, 10-15). Então, para transpor o abismo que aos poucos foi se formando, as pessoas começaram (hll I, ho.) a se comunicar com Deus por meio da oração. Juntamente com as ofertas, também mencionadas pela primei ra vez em 4.3-5, essa invocação do nome do Senhor indica um ato cultuai, como é o caso de Abraão (12.8; 13.4) e Isaque (26.25). É provável que Gênesis 4.26 vá além do simples ato de orar e lance os alicerces para a toda oração verdadeira: reconhecimento do nome divino (ver 12.8; 21.33; SI 80.18[19]; 86.12; 145.1-2; Dn 9.19; Mt 6.9; cf. Liefeld, 932, e para a história da exegese de Gn 4.26, S. Sandmel, HUCA, 32, 1961,19-29). Um exemplo importante de uma expansão ideal da oração para uma comunhão contínua com Deus é o “andar com Deus” de Enoque (Gn 5.22-24). Trata-se de um protótipo de muitas das “orações” subseqüentes sem palavras. A oração de Abraão (Gn 18.16-33) em favor dos justos em Sodoma serve de modelo para a intercessão, que caracteriza um dos principais elementos das orações. A oração é apre sentada na forma de um diálogo entre Abraão e Deus. A oração de intercessão de Moisés em Números 14.13-19 apelou para a reputação de Deus, que, nas palavras de Moisés, seria colocada em risco se Deus destruísse os israelitas no deserto. Moisés baseou sua súplica no caráter bondoso e clemente de Deus. Liefeld afirmou corretamente que essa preocupação com a reputação de Deus e o apelo ao seu caráter carac terizado pela graça são elementos presentes em súplicas ao longo de todas as Escrituras (932; ver Êx 33.15-16; Nm 16.22; Js 7.6-9). A oração de Ana (ISm 2.1-10) não é uma súplica pedindo algo. Antes, é um “louvor descritivo de Deus”, dizendo quem é Deus, como ele é e o que fez no passado (cf. Clements, 59-67). A oração de Davi em 2 Samuel 7.18-29 é fundamental. É uma resposta a uma mensa gem de Deus por intermédio do profeta Natã (7.1 -17). Davi entrou na casa do Senhor e “ficou” 1009
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perante ele (7.18), aparentemente, diante da “arca de Deus [que] se acha numa tenda” (7.2). O vb. original indica que Davi estava “assentado” (}’sb) diante do Senhor, o que é excepcional. A postura habitual de oração é em pé (Gn 18.22; Êx 3.5) ou ajoelhado (Js 5.14; ISm 1.3, 28; 2Sm 12.20). Em resposta ao oráculo de Natã, Davi profere uma oração de deferência grata e de autoridade ousada. É essa combinação maravilhosa de entrega e insistência que marca o que há de melhor na fé de Davi e na oração de Israel. Em termos de forma, a oração de Davi é uma súplica simples a Deus para que o Senhor mantenha para sempre a promessa que fez a ele e sua casa (7.25). O reconhecimento expressado por Davi, de que Deus é o Senhor Soberano; do reconhecimento da grandeza e do caráter incomparável de Deus e o apelo de Davi às promessas de Deus com referência ao trono e dinastia desse rei são de grande relevância teológica. Outra oração de Davi apresenta características impressionantes (ICr 29.10-20); a lin guagem é belíssima; o elemento de súplica concentra-se em dois pedidos específicos: “conserva para sempre no coração do teu povo estas disposições e pensamentos, inclina-lhe o coração para contigo” (v. 18) e “a Salomão meu filho dá coração íntegro para guardar os teus mandamentos, os teus testemunhos e os teus estatutos...” (v. 19). A oração de Salomão em 1 Reis 3.3-15 começa com uma declaração veemente de três coisas que Deus fez: mostrou sua grande bondade para com o pai de Salomão, Davi; continuou demonstrando essa bondade ao dar a Davi um filho para assentar-se no trono do pai, e Deus colocou Salomão para ser rei no lugar de Davi (vv. 6-7). A súplica em si é apresentada em seguida com a mais absoluta e simples dignidade: “Dá, pois, ao teu servo coração compreen sivo para julgar a teu povo, para que prudentemente discirna entre o bem e o mal; pois quem poderia julgar a este grande povo?” (v. 9) Na oração de Salomão na consagração do templo, havia uma oração pela família real, pelo verdadeiro significado do templo e por problemas materiais, como derrotas, secas e outras calamidades (1 Rs 8.22-53; cf. 2Cr 6.12-42; ver W. S. LaSor, NBC, 1970, 332). O lamento de Ezequias, em Isaías 38.9-20, é semelhante aos clamores de Jó (cf., p. ex., Jó 7) e a alguns salmos (cf., p. ex., Salmo 88). A oração em si tem duas partes principais: um lamento expressando tristeza e amargura diante da morte iminente (vv. 10-15) e uma súplica pela cura com uma conseqüente garantia de que o Senhor irá salvá-lo (vv. 16-20). As última palavras, nas quais o sing. dá lugar ao pi. indicam um uso público do salmo (cf., p. ex., SI 25.22; 51.18-19 [20-21]). A força e a intensidade emocional dessa oração, no entanto, são de caráter particular e pessoal (ver Clements, 132). (-> Lamentações: Teologia) A oração de Jó representa um ápice espiritual do livro todo, uma vez que é o ato con trito dele de submissão e aceitação em resposta ao discurso de Deus (Jó 42.1 -6). Apresenta uma ênfase dupla: um reconhecimento da ignorância e fragilidade humana e submissão a Deus com total aceitação de sua providência bondosa. O maior número de referências à oração nos escritos dos profetas é feito por Jeremias (p. ex., Jr 1.6; 4.10; 7.16; 11.5, 14; 12.1-7; 18.19-23; 20.7-18; 32.16-25; 33.3). Uma dessas orações encontra-se em 32.16-25. Depois que Jeremias havia entregue a escritura de compra a Baraque, orou ao Senhor. A oração pode ser dividida em quatro seções: a. um louvor geral descritivo do Senhor Soberano (vv. 16-19); b. ações de graças pela bondade particular de Deus para com Israel (vv. 20-23a); c. uma confissão de cul pa e um clamor de aflição (vv. 23b-24) e d. garantia divina e submissão a Deus (v. 25) (ver Clements, 141-42). O livro de Daniel contém várias orações (p. ex., Dn 2.20-23; 4.34-35 [31-32]; 6.26-27 [27-28]). A oração que mais se destaca nesse livro e que representa uma das mais importantes das Escrituras é a confissão em 9.4-19. Dentre os elementos a serem observados, tem-se a des crição de Deus como justo, misericordioso e clemente; a descrição contrastante do suplicante 1010
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e seu povo como vergonhosamente pecadores; sua desobediência às leis reveladas de Deus e a preocupação com a reputação de Deus, especialmente nos vv. 16-19. Os paralelos bíblicos mais próximos da oração de Daniel podem ser encontrados nas orações de Esdras (9.6-15) e dos levitas (Ne 9.5-38). A intercessão vicária de Esdras (Ed 9.6-15) serve de exemplo para todos que desejam ser intercessores (Cundall, NBC, 403). Esdras não se separa do povo condenando-o com frieza. Em vez disso, apesar de não estar pessoalmente envolvido com os pecados do povo, e identifica-se plenamente com ele em culpa e necessidade. A grande confissão nacional em Neemias 9.5b-38 começa com um reconhecimento da majestade de Deus e continua com uma exposição dos pontos mais críticos da história de Is rael; o chamado de Abraão (vv. 7-8), o êxodo e a entrega da Lei (vv. 9-14), a boa misericórdia de Deus no deserto em contraste com a rebelião de seu povo (vv. 15-23), a conquista de Canaã (vv. 24-25) e a rebelião contínua de Israel apesar das advertências do profetas e do livramento em diferentes ocasiões por intermédio dos juizes (vv. 26-27, 30). Deus disciplinou seu povo por intermédio de outras nações (vv. 30-31), uma medida que, por fim, havia levado Israel à humildade, arrependimento e confiança absoluta em que eram elementos essenciais na aliança entre Deus e Israel. Todas essas e outras orações no AT são caracterizadas pelo reconhecimento de Deus, o louvor descritivo a Deus, o apelo à reputação de Deus e preocupação com ela; pela confissão de pecados na qual o suplicante se identifica com a culpa e a necessidade do povo, e por todos os elementos essenciais de intercessão e súplica, sendo este último caracterizado de vez em quando por uma deferência grata e autoridade ousada. 4. Tempo, lugar e postura das orações. A oração não se restringia a um lugar especial de adoração, mas podia ocorrer em qualquer local (cf. Gn 24. 26-27, 63). No entanto, foi mais promovida nos primeiros santuários (Siló, 1 Samuel 1; Hebrom, 2Sm 15.7) e, posteriormente, no templo em Jerusalém, que era chamado de “Casa de Oração” (Is 56.7). As orações particu lares costumavam ser feitas em casa (Dn 6.11). No AT, não havia nenhum decreto quanto a um tempo determinado para a oração. As festas costumavam ser uma ocasião para se orar (1 Samuel 1). Faziam-se orações à noite (Sal mo 4), na hora dos sacrifícios da tarde (Ed 9.5) e pela manhã (Salmos 5). O salmista clamava angustiado “à tarde, pela manhã e ao meio-dia” (55.17 [ 18]), o que pode significar “todo o dia” (25.5) ou “dia e noite” (88.1 [2]), ou seja, continuamente. A prática de Daniel de orar três vezes ao dia (Dn 6.10 [11]) se assemelha ao Salmo 55.17 [18]. (Ver At 10.9.) A postura habitual de oração era ajoelhar-se (kr') diante do Senhor (1 Rs 8.54; 2Cr 6.13; Ed 9.5); no futuro, ajoelhar-se será uma forma de prestar homenagem (Is 45.23), como faz o vassalo diante de seu suserano. Essa postura era acompanhada pelo gesto de estender (prs kappayim) ou levantar as mãos. Para ambos os gestos, ver Êxodo 9.29, 33; 1 Reis 8.38, 54; Jó 11.13; Salmo 143.6; Isaías 1.15 e Salmos 28.2; 63.4 [4]; 119.48; 141.2; Lamentações 2.19. Outra postura freqüente era curvar-se ou prostrar-se (hwh) perante o Senhor (Gn 47.31; Êx 4.31). Israel era terminantemente proibida de prostrar-se diante de ídolos (Êx 20.5; Is 44.17). Esdras 10.1 apresenta uma forma legítima de postura, registrando como Esdras orava, confes sava, chorava e se prostrava diante da Casa de Deus. Vê-se adoradores em pé ( 'md ou rtsb) ou mesmo assentados (ysb) diante do Senhor (cf. 1Sm 1.26; 2Sm 7.18; 1Rs 8.22; cf. as ilustrações z m B H H 1:521-22). 5. A teologia da oração. Além dos comentários teológicos acima, concluímos o seguin te. Como forma explícita de comunicação com Deus, a oração é fundamentalmente um diálogo entre Deus e seu povo dentro do relacionamento de aliança (ver Balentine, 261 -64). As orações 1011
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da Bíblia esclarecem de maneira especial uma das suas características mais marcantes, a saber, uma visão de Deus como um ser pessoal (ver Clements, 5; também lRs 19.15; 1Cr 29.10, 18; 2Cr 14.11; 20.6-7, 12; Dn 9.9-10, 13-14, 17) e também acessível. A maneira como a natureza e o caráter de Deus sâo concebidos e apresentados determi na o caráter e o conteúdo da oração. A oração é feita no “nome” do Senhor Deus. O direito de usar o nome na oração é, portanto, de suma importância e o abuso desse nome constitui uma ofensa grave (ver Clements, 8; também Êx 20.7). Balentine afirma corretamente que as descrições de Deus nas orações confirmam os atributos divinos (265). Ezequias, por exemplo, ressalta a soberania exclusiva de Deus (2Rs 9.15, 19); Asa e Josafá, o poder de Deus (2Cr 14.11; 20.12); Daniel e Neemias, a misericórdia e a justiça de Deus (Dn 9.4, 7, 9; Ne 9.8, 17, 19, 27-28, 31). Esses e outros atributos divinos (p. ex., amor, compaixão) constituem muitas vezes a retórica da oração. Da parte do homem, a oração é um ato de fé, uma prática de dirigir-se a Deus tão im portante no céu quanto na terra (Balentine, 268-71). B ib l io g r a f ia
THAT2'A21-?>2\ TWAT6:606-\1\ D. R. Ap-Thomas,“Noteson SomeTerms Relating to Prayer”, VT 6, 1956, 225-41; S. E. Balentine, Prayer in lhe Hebrew Bible, 1993; R. E. Clements, The Prayers ofthe Bible, 1985; M. J. Greenberg, Biblical Prose Prayer, 1983; W. L. Liefeld, “Prayer", ISBE 3:931-39; D. F. 0 ’Kennedy, “Die gebed om vergifnis in die OT”, D.Th., thesis, Univ of Stellenbosch, 1994; H. G. Reventlow, Gebet imAT, 1986; J. F. A. Sawyer, “Types o f Prayer in the Old Testament: Some Observations on Hitpallel, Hithannan, etc.”, Semitics 7, 1980, 13143; H. Schõnweiss, “Prayer, etc.”, NID NTT2:1976; E. von Severas, “Gebet I”, RAC 8, 1972, 1134-1258; J. H. Walton, Ancient Israelite Literature in Its Cultural Contexts, 1989, 143-60; C. Westermann, “Gebet II”, RAC 8, 1213-17. P. A. Verhoef Orientação
# 5627 (ngh I, dirigir, liderar, conduzir)
Oriente -> # 4667 (mizrãh, nascente. Leste) Ornamentação Orvalho Oscilação
# 6335 ( ‘dh II, colocar ornamentos/adornos)
# 3228 ((al, orvalho, chuva fraca, chuvisco) # 4572 (mw(, oscilar, cambalear, vacilar, sacudir, balançar)
Oséias
Oséias (VUnn [hôsea‘], # 2107).
OMA Há várias pessoas no AT com esse nome. É o nome original de Josué (Nm 13.8, 16), o nome de um dos oficiais de Davi (lC r 27.20), do último rei de Israel (2Rs 15.30), de um profeta (Os 1.1) e de um chefe do povo sob a liderança de Neemias (Ne 10.23 [24]). O nome encontra-se na forma pf. e o elemento teofórico foi omitido. Significa “Ele (o Senhor) socorreu/ livrou (y.f “)” e é provável que expresse a ajuda recebida pelos pais por ocasião do nascimento de um filho ou em relação a algum outro acontecimento (Wolff, Hosea, Hermenéia, 1974,4). Os nomes com o elementoy s ', livrar (-> # 3828) eram comuns no mundo bíblico: Isi (1 Cr 4.20; 1012
Oséias: Teologia de
5.24); Jesaías (1 Cr 26.25), Isaías (Is 1.1), Hosaías (Jr 42.1), Maressa (1 Cr 2.42), Jesua (Ne 3.19) e o nome de Jesus em G (Iêsous, Mt 1.1; ver também Fowler, Theophoric Personal Names in Ancient Hebrew, 1988, 348). Além disso, era um nome apropriado para um mensageiro de Deus, como o profeta Oséias, que recebeu a tarefa nada invejável de pregar em um meio onde o povo esperava ser livrado por poderes de toda espécie (os baalins, [“prostituições”] Os 2,4; os assírios e o Egito, 7.11), menos pelo Senhor (-¥ Oséias: Teologia). A experiência de Oséias com a esposa infiel, Gomer (->), o levou a identificar e com preender o sentimento de rejeição, tristeza e perda de Deus ao ser privado da esposa infiel, a nação de Israel. A angústia divina da rejeição era tão real quanto a angústia de amar uma es posa infiel. O amor de Oséias ilustrava o amor de Deus para com um povo que havia rejeitado esse amor divino dentro da aliança. Oséias: Teologia B ib l io g r a f ia
F. I. Andersen, D. N. Freedman, Hosea, AB, 1980; H. Balz-Cochois, “Gomer oder die Macht der Ashtarte: Versuch einer feministischen Interpretation von Hos 1-4”, E vT42, 1982,37-65; P. A. Forseth, “Hosea, Gomer and Elective Grace: Reflection o f an Armchair Theologian”, Reformed Journal 35, 1985, 15-18; B. D. Napier, “The Omrides of Jezreel”, PT 9, 1959, 366-78; K. G. 0 ’Connell, “Those Lively Prophets: Hosea, a Prophet o f Passion”, CurTM 4, 1977, 104-8; G. G. Swain, “Hosea the Statesman”, in Biblical and Near Eastern Studies, 1978, 177-83; A. S. van der Woude, “Three Classical Prophets: Amos, Hosea and Micah”, in Israels Prophetic Tradition, 1982,32-57; W. Vogels, “Hosea’s Gift to Gomer (Hosea 3:2)”, Bib 69, 1988,412-21; R. J. Weems, “Gomer: Victim o f Violence or Victim o f Metaphor”, Semeia, 1989, 87-104. Paul A. Kruger
Oséias: Teologia de A. Contexto histórico A introdução do livro de Oséias nos apresenta o seguinte cenário histórico para a pro clamação profética: “Palavra do Senhor, que foi dirigida a Oséias, filho de Beeri, nos dias de Uzias, Jotão, Acaz e Ezequias, reis de Judá, e nos dias de Jeroboão, filho de Joás, rei de Israel” (Os 1.1). É importante observar a preferência dada à dinastia davídica no cabeçalho de um li vro de um profeta escritor israelita — o único que viveu e trabalhou no reino do Norte. Tratase de uma indicação clara de que a forma final do livro lhe foi conferida nos meios judeus; o único rei israelita mencionado nesses escritos é Jeroboão II. Tendo em mente o fato de que esse reinado estendeu-se por um período de quarenta anos (787-747 a. C.), toma-se evidente que é impossível determinar com precisão o início do ministério do profeta Oséias. No entanto, a maioria dos estudiosos concorda que as palavras do cap. 2 com referência à prosperidade e dos caps. 4— 5 sobre o desenvolvimento da idolatria refletem o período politicamente estável dos últimos anos de Jeroboão II. Se esse é o caso, o início da carreira de Oséias pode ser de terminado por volta de 755/50. Quanto ao resto dos escritos, é difícil estabelecerem-se datas precisas, pois não fica claro se foram ou não organizados cronologicamente. A afirmação de Alt (Kleine Schriften, 1953,2:163-87) de que Oséias 5.8ss. refere-se a acontecimentos ligados à guerra siro-efraimita (733/2) é uma idéia bastante aceita. Assim, Oséias 8.7-10 pode ser um reflexo do resultado 1013
Oséias: Teologia de
desses acontecimentos quando a coalizão siro-efraimita se desintegrou e os territórios da Galiléia e Gileade foram separados do restante por Tiglate-Pileser III e transformados em provín cias assírias (Donner, 56; Assíria, # 855). Talvez Oséias 5.13 deva ser relacionado às con seqüências dessa guerra, quando o rei Oséias (731-723), o assassino de Pecá (que era membro da coalizão siro-efraimita) entregou-se aos assírios e pagou um pesado tributo (cf. 2Rs 17.3; Aliança siro-efraimita: História). As palavras de Oséias 9— 12 são mais inteligíveis quando encaixadas no período tranqüilo depois da ascensão de Salmaneser V ao trono em 727 (Wolff, xxi). Contudo, pouco tempo depois (c. 724), não se contentando em permanecer leal ao trono assírio, o rei Oséias se revoltou. Em seguida, tentou estabelecer relações diplomáticas com o rei egípcio (2Rs 17.4). É bem provável que Oséias 9.3 e 12.1 [2] pressuponham essas propostas para o Egito. E possível que 13.16 [14.1] refira-se às medidas punitivas resultantes da revolta. A queda de Samaria (722) não aparece nesse livro e, portanto, podemos imaginar que a ativi dade profética de Oséias em Israel chegou ao fim pouco antes da destruição final do reino do Norte. (Israel: História de)
B. Estrutura literária 1. Capítulos 1—3. O Livro de Oséias consiste de duas partes claramente distintas saber, caps. 1—3 e caps. 4— 14. Os caps. 1—3 têm como tema geral o casamento de Oséias e seu significado simbólico. Cada um desses capítulos concentra-se num aspecto desse relacio namento: 1. 1-9 registra constituição do laço matrimonial e o nascimento de filhos com nomes simbólicos; 2 . 2-15 [4-17] é voltado para a conduta adúltera de Israel como esposa de Javé e nas medidas tomadas por Javé para conquistá-la de volta, enquanto o cap. 3 registra o início de uma nova relação matrimonial entre Oséias e sua esposa. Cada uma dessas unidades encerra-se com uma mensagem de esperança: 1.10— 2.1 [ 2 . 1- 3 ]; 2 . 16-23 [ 18- 25 ]; 3 . 5 . Nos caps. 1— 3 pode-se distinguir dois tipos de apresentação literária: O cap. 1 é bio gráfico, enquanto o cap. 3 é autobiográfico. O mais provável é que os dois primeiros caps. sejam provenientes de discípulos do profeta ou de seguidores próximos a ele. O cap. 3 reflete um estádio posterior dos oráculos proféticos, uma vez que pressupõe os relatos anteriores nos caps. 1 e 2. Pode-se conjecturar que os caps. 1—3, com seu tema predominante do casamento, foram originalmente transmitidos em separado e, então, ulteriormente acrescentados ao segun do bloco (caps. 4— 14). Como um conjunto de mensagens, os caps. 1—3 constituem um todo estruturado. Andersen e Freedman (122-41) mostraram de modo convincente que, dentro desses caps., padrões entrelaçados de introversão unificam longos trechos do texto. Vê-se uma espécie de cresci mento orgânico. À medida que cada tema é trabalhado, novos temas vão se desenvolvendo a partir dele e não há transições bruscas para um material novo. Há pouca coisa nos caps. 1—3 que poderia ser considerada isoladamente e que não possui nenhum correlato estrutural em alguma outra parte desses capítulos. Palavras e orações que já foram usadas são retomadas e integradas a uma composição unificada. A correspondência de palavras e orações entre os caps. 1 e 2 ilustra claramente que existe uma arquitetura definida por trás dessa obra de arte literária. Além disso, as idéias diferentes em Oséias 2.2-12 [4-14] e 2.14-23 [16-25] são organizadas de tal forma a corresponder, em ordem inversa, ao v. 15 que constitui o eixo (D. Lys, “J’ai deux amours ou 1’amant jugé,” ETR 51, 1976, 59-77). Outra característica proeminente de estilo no cap. 2 é o uso constante da primeira pes soa (como forma verbal ou sufixo pronominal) para retratar os feitos de Javé, em contraste com a terceira pessoa que descreve a resposta de Israel. Compare-se o uso freqüente de “eu” e “meu” quando Javé fala e o uso de “seu/sua” (seu marido, seus seios, seus filhos, seus aman 1014
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tes, etc.) quando a referência é a Israel. Ao adotar esse estilo, as transgressões de Israel pare cem ainda mais graves em comparação com a benevolência de Javé. Esse recurso estilístico é usado para intensificar a emoção e acentuar o contraste. Possivelmente, é derivado da idéia de Javé deliberando consigo mesmo antes de anunciar sua decisão a respeito de Israel dentro do “conselho divino”. Apesar de os caps. 1 e 3 serem parte integrante da metáfora do casamento, também pertencem à categoria literária dos atos proféticos simbólicos, com estes três elementos carac terísticos: a. instrução de realizar o ato simbólico (Os 1.2; 3.1), b. a execução do ato (1.3; 3.2) e c. a explicação de seu significado (1.4-6; 3.4). E impossível compreender-se devidamente o cap. 2 sem o 1.2-9. Mais adiante, é descrita a consumação do laço matrimonial, bem como o nascimento dos filhos. No cap. 2, fica pressuposto o divórcio (2.2 [4]), mas o solilóquio des loca-se rapidamente para além das circunstâncias do casamento do próprio Oséias para uma reflexão sobre o plano de Javé de trazer Israel, sua esposa, de volta para junto de si. Assim, os caps. 1—3 representam uma combinação singular de atos simbólicos e descrições metafóricas. Constituem uma composição artisticamente estruturada que toma quase impossível separar unidades literárias distintas. 2. Capítulos 4—14. 0 segundo e maior conjunto de mensagens (Oséias 4— 14)é intro zido pela convocação em 4.1 e encerra-se com a fórmula profética em 11.1. Essa segunda parte apresenta uma série de oráculos individuais. E difícil descrever-se a coerência interna estrutural uma vez que há uma ausência clara da típica fórmula profética: “Assim diz o Senhor”. Dian te desse fato, é compreensível que tantos estudiosos do passado tenham considerado os caps. 4— 14 como um conjunto amorfo de materiais. J. Jeremias (“Hosea 4-7: Beobachtungen zur Komposition des Buches Hosea,” FS Würthwein, 1979,47-58) demonstrou, porém, a existência de um certo princípio subjacente que opera na estruturação dos caps. 4— 7, a saber, uma ligação progressiva de termos e idéias mencionados anteriormente. Como no caso do primeiro conjunto, os caps. 4— 11 também são encerrados com uma mensagem de esperança (11.10-11). Os caps. 12— 14 pertencem a outro conjunto de mensagens, como fica claro pela his tória da transmissão deles. Por exemplo, a expressão “o Senhor, teu Deus”, que pode refletir tradições litúrgicas, ocorre somente nesse conjunto (WolfF, xxxi). Foi sugerido que, original mente, Oséias 14.1 -8 [2-9] não fazia parte dos caps. 12— 13, mas que devia ser atribuído a uma comunidade posterior (pós-exílio?) de adoradores, que adaptou os oráculos proféticos para o uso no âmbito cultuai (P. A. Kruger, “Yahweh’s Generous Love,” 1:27-48). O ditado de sabe doria em 14.9 [ 10] é proveniente de um redator final que, talvez preocupado com a natureza simbólico-metafórica complexa dos oráculos proféticos, elogia o livro como sendo palavras de sabedoria que exigem uma reflexão cuidadosa (cf. Sheppard, 129-36). C. Temas teológicos 1. Capítulos 1—3. O assunto predominante desses caps. é o casamento simbólico profeta. O cap. 1 registra a consumação do casamento, o nascimento dos filhos e a explicação dos seus nomes simbólicos (Jezreel, Lo-Ruama e Lo-Ami). Oséias 2.2-13 [4-15] começa com um processo legal de divórcio. Os filhos, que foram os atores principais do cap. 1, ocupam nesse cap. uma posição secundária, sendo mencionados apenas nos vv. 2, 4, 5 [4, 6, 7]. A ex tensão e a motivação da promiscuidade da esposa (Israel) são apresentadas no texto narrativo nos vv. 5b-13 [7b-15]. Ela é acusada de considerar Baal em vez de Javé como concessor da fertilidade da tenra. Nos vv. 14-23 [16-25], observa-se uma mudança radical na conduta de Javé com relação à esposa. Enquanto os vv. 2-13 [4-15] são cheios de ameaças, o tom desses vv. é conciliatório e construtivo. D. J. A. Clines comentou que o cap. 2 apresenta as opções 1015
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consideradas por Javé, enquanto ele decide o que fazer com a esposa rebelde. Cada uma dessas opções aparece em tom jurídico, apresentada pela conjunção transicional “portanto” (lãkên, vv. 6, 9, 11, 14 [8, 11, 16]). Mas é somente no terceiro cap. que Javé decide implementar sua conclusão, um julgamento que na verdade é uma decisão de tratar a transgressora com bonda de (Studia Biblicti 1, 1978, 83-103). O cap. 3 descreve a repetição da ordem de Javé ao profeta para que este, mais uma vez, mostre amor por uma determinada esposa (que provavelmente é sua própria e infiel Gômer) (v. 1). 2. Capítulos 4—14. A segunda parte do livro trata dos pecados morais, cultuais e po líticos de Israel. Os vv. introdutórios do cap. 4 determinam exatamente de qual enfermidade essas transgressões são apenas os sintomas: “porque nela [na terra de Israel] não há verdade, nem amor, nem conhecimento de Deus” (v. 1). Essa situação triste devia-se à negligência dos sacerdotes, que eram, em primeiro lugar, os responsáveis por transmitir o conhecimento reli gioso (4.4-10). O próximo aspecto a ser alvo da condenação profética é a vida política de Israel: no âmbito interno, havia as revoltas palacianas e no âmbito externo, a luta entre Israel e Judá (5.815), enquanto a diplomacia internacional israelita era marcada por pedidos expedientes de ajuda dirigidos ora ao Egito e ora à Assíria (Os 7.8— 8.10). A partir de Oséias 9.10, são as tradições históricas de Israel que ocupam o primeiro plano — o período no deserto (9.10), a conquista da terra prometida (10.1), o êxodo do Egito (cap. 11) — fazendo referência até mesmo às tradições patriarcais (cap. 12). O profeta usa es sas retrospectivas para ilustrar a longa história de pecado de Israel em contraste com os atos contínuos de bondade da parte de Deus no passado. 3. Polêmica contra a religião cananéia. Ao longo de todo o livro, o culto e a mitologia do deus Baal são alvo de grande parte das declarações proféticas (Mays, 8). Tal abordagem envolve uma estratégia dupla: a. ataca o culto a Baal com suas próprias armas e b. faz uso de certos conceitos dos cananeus para descrever o javeísmo de uma forma inédita e fascinante. Nessa abordagem, o profeta se dedica a um processo de reinterpretação, de modo a deixar cla ro que a religião javeísta não se preocupava com idéias mitológicas, mas sim com realidades históricas (Kinet, 218ss). Para isso, Oséias cria a metáfora do casamento como o molde no qual ele forma suas concepções. É provável que um dos principais motivos que contribuíram para a criação dessa imagem tenha sido o fato de que, devido à sua natureza peculiarmente sexual e orgiástica, as práticas idólatras cananéias já fossem conhecidas no tempo de Oséias por termos descritivos insultantes como “adultério” ou “prostituição” (zenúnim, Os 1.2; ver, por exemplo, as palavras de Jeú a Jorão em 2Rs 9.22, em que é empregado o mesmo termo heb.; -» znh I, # 2388). No entanto, foi o próprio casamento de Oséias, com seu significado simbólico, que ofe receu a profundidade e emoção necessárias para essa metáfora sexual. Ao contrário da visão predominante no tempo de Oséias de que o papel de um deus no relacionamento deus-homem devia ser compreendido em sentido sacro-cultual, em Oséias 2, o ponto em comum é aquele dos princípios judiciais que regiam a instituição do casamento. A metáfora do casamento nesses caps. funciona em dois níveis diferentes, porém habilmente integrados, a saber, o jurídico e o cultual-religioso. Vista superficialmente, descreve o casamento infeliz entre Javé e sua esposa, Israel, e as conseqüências judiciais. Porém, ao se estudar o contexto da imagem, toma-se evi dente que o profeta está, na verdade, atacando as crenças fundamentais do culto de fertilidade cananeu. Os temas de procurar e encontrar (2.7 [9]), tão fundamentais aos mitos de fertilidade do OMA (W. H. Schmidt, “BaalsTod und Auferstehung,” ZRGG, 15,1963,1-13), encontramse especialmente em destaque nessas passagens. 1016
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4. O pecado de Israel. Desde o começo do livro, dá-se grande ênfase ao caráter p fundamente arraigado e à severidade da apostasia de Israel. Era um fenômeno que vinha se desenrolando ao longo da história e nâo algo que surgira na conquista (Os 10.1), no período no deserto (9.10), ou mesmo no Egito (11.1). Era mais antigo do que isso. A culpa de Israel ficara evidente já na conduta dissimulada de seu antepassado Jacó (12.2-6). A fim de retratar a apostasia do povo, são empregadas várias descrições e imagens. An tes de mais nada, são acusados de terem o mesmo comportamento que prostitutas (znh). Essa figura era especialmente conhecida ao se retratar as transgressões de Israel de modo geral (o radical znh ocorre 22 vezes no livro). Essa idéia de prostituição é empregada até mesmo no âmbito político: “Efraim mercou amores (vendeu-se por um preço de prostituta)” (8.9). Outras descrições dos atos pecaminosos de Israel afirmam que ela “se esqueceu” (2.13 [15]; 4.6; 8.14; 13.6). Quanto ao povo, “ao Senhor deixaram de adorar” (4.10), “(foram) atrás de seus amantes” (2.5,13 [7,15]), “ fugiram” de Javé (7.13), “rebelaram contra” ele (7.13; 8.1), “aleivosamente se houveram/se portaram” (5.7; 6.7), Israel foi “rebelde” (4.16; 9; 15) “(praticou) a falsidade" (7.1; 10.2) e a “mentira” (7.3; 10.13; 11.12 [12.1]; ver Wolff, xxviii). Apesar de Oséias usar o termo beríl, aliança (-> # 1382), com sentido teológico ape nas uma vez (8.1), algumas dessas descrições mencionadas acima (p. ex., ir atrás, rebelar-se, ser infiel ao Senhor e prostituir-se) só podem ser devidamente compreendidas no contexto da idéia de aliança. O profeta seleciona imagens de casamento como um instrumento para enfati zar certos aspectos cruciais do relacionamento de aliança. Ao longo de todo o AT, o casamento apresenta uma natureza judicial. É esperado o cumprimento de certas obrigações e são conce didos certos privilégios a cada cônjuge num acordo mútuo. Eram exatamente essas caracterís ticas que tomavam esse modo de vida tão absolutamente apropriado para expressar o que Javé havia concedido a Israel e também o que era direito dele exigir de sua “esposa”. M. Weinfeld (“Berit — Covenant vs. Obligation,” Bib 56, 1975, 120-28) afirma que a fórmula matrimonial do OMA (“serei teu marido; serás minha esposa”), na verdade é a declaração que está por trás da “Bundesformel,” “Serei o teu Deus e serás o meu povo” (Êx 6.2-7; Lv 26.9-12; Dt 29. 1213 [11-12]). Com referência a isso, o anúncio de Oséias 1.9 - “Vós não sois meu povo, nem eu serei vosso Deus” — constitui inequivocamente uma negação dessa fórmula. Em 2.23 [25], porém, esse relacionamento rompido é sanado mais uma vez quando Deus promete: “Tu és o meu povo! Ele dirá: Tu és o meu Deus!”. O profeta emprega imagens fortes para descrever a promiscuidade política de Israel entre as nações: “Efraim se mistura com os povos” como os ingredientes para o pão são mis turados (7.8); “É um pão que nâo foi virado” (7.8); “Efraim é como uma pomba enganada” (7.11). Contudo, Javé não podia permitir que seu povo agisse dessa maneira rebelde. Numa imagem assustadoramente ousada e incomparável. Deus é assim representado: “para Efraim serei como a traça, e para a casa de Judá, como a podridão” (5.12). E Javé diz: “sou, pois, para eles como leão... como ursa roubada de seus filhos” (13.7-8). A crise política de Israel era conseqüência direta de sua crise religiosa (Utzschneider, 86ss). Nessas duas áreas, Javé não recebia o lugar que lhe era devido. A relação íntima entre política e religião é ilustrada claramente em Oséias 8.4: “Eles estabeleceram reis, mas não da minha parte; constituíram príncipes, mas eu não o soube”. No entanto, essa passagem não pode ser separada de todas as outras que também criticam a monarquia: 7.3-7; 10.3; 13.10 (Gelston, OTS 19, 1974, 71-85). Duas objeções sérias são levantadas contra essa instituição: sua legiti midade e sua incapacidade de salvar o povo num momento de dificuldade. 5. 0 amor de Javé. Apesar da gravidade do pecado de Israel, não há outro livro profétic do AT em que a intensidade do amor divino é demonstrada de maneira mais clara do que em 1017
Oséias: Teologia de
Oséias. Deus simplesmente não podia separar-se de seu povo apóstata. Uma demonstração do caráter eterno e bondoso desse amor divino pode ser encontrada na metáfora do casamento do cap. 2. Nos vv. 2-13 [4-15], o tema é a promiscuidade da esposa, Israel, mas os vv. 14-23 [ 1625] retratam uma mudança inesperada e radical na conduta de Javé para com seu povo. Apesar da apostasia de Israel, o relacionamento matrimonial começará outra vez: um novo namoro (Os 2.14 [16]), dote (v. 15 [17]) e noivado (vv. 19-20 [21-22]). O deserto, o lugar onde a desamparada Israel foi abandonada para morrer de sede (v. 3[5]), toma-se o lugar de onde Javé realizará suas novas obras (v. 14 [16]). Animais selvagens, que no passado sempre representaram um perigo para os homens (v. 12 [14]), também são objeto de uma aliança (v. 18 [20]), de modo que a terra possa viver em paz. A cevada e o vinho, suspensos devido ao comportamento promíscuo de Israel (v. 9 [11]), voltam a ser gentilmente concedidos ao povo (v. 22 [24]). O “vale de Acor”, que significa lit. “vale da infelicidade” (Js 7.25-26), se tomará uma “porta de esperança” (v. 15 [17]). Nessa nova era, o período no deserto (2.14 [16]; ver também 9.10; 11.3; 12.10,14; 13.5) tem, justificadamente, um papel crítico, pois constituiu um momento decisivo na história de Is rael: encontra-se a meio caminho entre os grandes atos de salvação do êxodo e a entrada na terra prometida. Enquanto o limiar da terra dos cananeus é o símbolo da apostasia de Israel (9.10; 10.13; 11.2), o deserto significa o tempo de harmonia imperturbada entre Deus e seu povo. A fim de retratar a grandeza da compaixão e disciplina divinas, é escolhida a metáfora do pai e filho (cap. 11). Deus havia eleito o povo de Israel (v. la) e o havia conduzido e cui dado dele (vv. 3-4), mas Israel havia respondido de forma negativa a esses gestos da graça de Deus (v. 2) e, portanto, tiveram que se curvar sob o julgamento divino (vv. 5-6). Mas Deus não foi capaz de obrigar-se a destruir o próprio povo. O v. 8 registra o que acontece no cora ção de Deus quando há um conflito entre o amor divino e a ira divina. Ao invés de aniquilar Israel como as cidades de Admá e Zeboim na antigüidade, como mereciam, o coração de Deus é levado a uma outra disposição (é comovido) e sua compaixão é suscitada. O amor divino é sempre mais forte do que a ira divina. D. Contexto canônico O livro de Oséias, assim como todos os outros livros proféticos do AT, foi “ouvido, mol dado e preservado” (Childs, IOTS, 377) por uma sucessão de comunidades da fé. Ao que parece, seu desenvolvimento literário passou pelas seguintes principais adaptações canônicas: 1. O cerne e grande parte do material do livro são originários de Oséias ou de seus se guidores mais próximos e dirigidos ao povo de Israel. E provável que diferentes partes (1— 3; 4— II; 12— 13.16 [14.1]) já estivessem organizadas numa compilação mais extensa quando chegaram a Judá depois da destruição de Samaria e, em Judá, foram adaptadas para um novo público (Jeremias, 18). 2. Indícios de uma redação antiga em Judá que suplementa as palavras originais de modo a ir ao encontro do novo contexto histórico são, possivelmente, detectáveis nas referências à salvação (1.7; 3.5) e em outros acréscimos redacionais, que tomaram as acusações proféticas e ameaças originais e aplicaram-nas a uma nova situação (4.15a; 5.5b; 6.11a; cf. WolíT, xxxii). Porém, Emmerson, 9-116, adota uma abordagem mais pertinente (ou seja mais dentro do estilo de Oséias) das palavras de salvação e referências favoráveis à dinastia davídica. 3. Foi sugerido que 14.1-8 [2-9] deve sua forma atual a uma adaptação de um material com o estilo de Oséias (do pós-exílio), escrito por uma comunidade de adoradores cuja intenção era aplicar as palavras proféticas às necessidades cultuais dela (Kruger, OTE 1, 1988, 27-48; cf. H. McKeating, Hosea, CBC, 1971, 151). 1018
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4. Oséias 14.9 [ 10] emprega “linguagem de sabedoria” para refletir sobre a mensagem livro e oferecer uma perspectiva para uma leitura esclarecida do livro. Ao mesmo tempo, a maioria dos termos usados nesse v. ocorre em outras partes de Oséias (cf. Sheppard, Wisdom, 129-36). -> Gomer; Oséias; Jezreel; Lo-Ami; Lo-Ruama B ib l io g r a f ia
F. I. Andersen e D. N. Freedman, Hosea, AB, 1980; J. Blenkinsopp, A History o f Prophecy in Israel, 1983, 96-106; W. Brueggemann, Tradition fo r Crisis: A Study o f Hosea, 1968; M. J. Buss, The Prophetic Word o f Hosea, BZAW 111, 1969; D. J. A. Clines, “Hosea 2: Structure and Interpretation”, in E. A. Livingstone (ed.), Studia Biblica I, 1978, 83-103; H. Donner, Israelunterden Võlkern, SVT 11, 1964,G. I. Emmerson, Hosea: An Israelite Prophet in Judean Perspective, 1984; A. Gelston, “Kingship in Hosea”, OTS 19, 1974, 71-85; J. Jeremias, Der Prophet Hosea, ATD, 1983; D. Kinet, Baal und Yahwe: Ein Beitrag zur Theologie des Hoseabuches, 1977; P. A. Kruger, “Yahweh’s Generous Love”, Old Testament Essays, 1988, 1:2748; J. L. Mays, Hosea, OTL, 1969; E. W. Nicholson, God and His People, 1986, 179-88; H. H. Rowley, “The Marriage o f Hosea”, in Men o f God, 1963, 66-97; G. T. Sheppard, Wisdom as a Hermeneutical Construct, BZAW 151, 1980, 129-36; H. Utzschneider, Prophet von dem Ende, 1980; W. A. VanGemeren, Interpreting the Prophetic Word, 1990, 105-20; G. von Rad, The Message o f the Prophets, ET, 1968, 110-17; H. W. Wolff, Hosea, Hermenéia, 1974. Paul A. Kruger Osso -> # 6795 ( ’e$em I, osso, pele, corpo, a própria pessoa) Ouro -> # 2298 (zãhãb, ouro) Ouvido -> # 265 ( 'õzen, ouvido) Ovo -> # 1070 (bê.fà, ovo) Pagamento -> # 8966 (sim, reembolsar, recompensar, retribuir, fazer as pazes) Pai -> # 03 ( ’ãb, pai) Painço
# 8463 (sôrâ, painço)
Palácio -> # 2121 (hêkâl, palácio, templo) Palha
# 7990 (qas, palha)
Pancada -> # 4804 (makkâ, pancada, golpe, ferimento, praga, derrota) Panela
# 1857 (düd, panela de cozinhar)
Pântano -> # 1288 (bõ$, pântano) Pão asmo -> # 5174 (ma$$â I, pão asmo) 1019
Pão, Bolo
No mundo bíblico, o elemento básico da alimentação era o pão, como ainda é o caso no Oriente Médio. Uma grande parte da rotina diária era dedicada a preparar pães e bolos, desde a colheita das safras até o preparo final do alimento. E bastante natural, portanto, que o pão, com seus vários for matos e tipos, tenha adquirido um grande simbolismo tanto nas práticas religiosas quanto no sociedade. Ter pão significava que Deus estava cuidando de seu povo. A presença do pão dependia de uma boa colheita e, para as plantações crescerem, era preciso haver chuva. Portanto, ter pão era sinal da bênção de Deus. Desse modo, o livro de Rute diz que, enquanto estava em Moabe, Noemi ficou sabendo que “o Senhor se lembrara do seu povo, dando-lhe pão (lit.)” — havia chovido, haviam tido uma boa colheita e havia comida outra vez (Rt 1.6). 1. Todo tipo de pão, quer em formato grande de filão, pão chato ou bolos, era feito de farinha. O termo qemah significa farinha, cereal moído (# 7854), e é derivado de um vb. que quer dizer triturar, moer (em ár., trigo). Parte da preparação do pão de cada dia era a moagem do cereal. Dessa farinha podia-se preparar pães sem grande demora, especialmente pães asmos. Em Gênesis 18.6, Abraão tomou farinha para fazer bolos para seus visitantes naquele mesmo dia. Gideão fez bolos asmos (maçsâ; # 5174) com um efa de farinha (Jz 7.13). Usava-se trigo para fazer pão, mas o grão de cevada era o principal cereal, especial mente das classes mais pobres. E interessante que na história de Gideão, um homem teve um sonho no qual um pão redondo de cevada atingiu Midião. Isso foi interpretado como a espada de Gideão, o conquistador militar inesperado (Jz 7.13). Eram usados três tipos de farinha: uma grossa, feita com um pilão e almofariz — "grãos esmagados” (Lv 2.14,16); a farinha comum, moída mais fina(Êx 29.2) e a Ilorda farinha, para visitantes ilustres ou cultos religiosos (Gn 18.6; Lv 2.1). 2. No entanto, podia-se fazer bolos de outros produtos além de cereais. O termo debêlá refere-se a um bolo de figo (# 1811). A palavra pode descrever uma massa de figos prensados, como aqueles que Isaías foi instruído a pressionar sobre a úlcera de Ezequias (2Rs 20.7). Pode ainda descrever figos prensados de modo a formar um bolo. 1 Samuel 25.18 conta como Abigail levou a Davi e seus homens “duzentos pães, dois odres de vinho, cinco ovelhas preparadas, cinco medidas de trigo tostado, cem cachos de passas e duzentas pastas de figos”. O presente para Davi e os homens dele não apenas satisfaria o apetite como tam bém seria deleitável. Assim também, a palavra ’asísâ (# 862) provavelmente significa bolo de passas, apesar de ser chamado de jarro de vinho nas traduções mais antigas. O termo pode ser encontrado em 2 Samuel 6.19, em que estão relacionados os alimentos que Davi deu ao povo quando a arca foi mudada de lugar. Deu a todos "um bolo de pão (hallat lehem), um bom pedaço de carne (ou um bolo de tâmaras; 'espãr, # 882) e passas ( ’aslsâ)". Em Oséias 3.1,0 bolo de passas ( ’asisâ) está relacionado como uma das ofertas sacrificiais feitas aos deuses cananeus. Alguns estudio sos sugerem que se o termo estava tão fortemente associado aos rituais de fertilidade cananeus que o uso dele no Cântico dos cânticos pode ser igualmente afrodisíaco. De qualquer modo, o texto diz apenas: “Sustentai-me com passas (bolos de passas), confortai-me com maçãs, pois desfaleço de amor” (Ct 2.5). O pl. masc. ocorre em Isaías 16.7, em o povo geme pelas pastas de uvas de Quir-Haresete. E bem provável que o TM esteja se referindo a bolos de passas, um dos melhores produtos de Moabe, especialmente pelo fato de o contexto falar de campos e vi nhas que foram pisoteados (v. 8). Outra palavra usada para descrever bolos ou pãezinhos é ’espãr (cf. 2Sm 6.19, em que se refere a um bolo de tâmaras; ver também ICr 16.3). Pão, Bolo
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Pão, Bolo
3. O processo de fabrico do pão de trigo ou cevada começava com o esfregar, o bater ou o moer dos grãos (cf. também Nm 11.8). Em seguida, a farinha era misturada com água e sovada para formar a massa. O termo heb. para sovar é hvs (# 4297; cf. Gn 18.6: “Amassa depressa três medidas de flor de farinha e faze pão assado ao borralho”). Tudo indica que no Egito o pão era sovado com os pés, mas os israelitas possuíam pequenas gamelas, tigelas ra sas ou bandejas de madeira que podiam ser facilmente amarradas nas roupas e transportadas (Êx 8.3; 12.34). Depois de sovada, a massa podia ser assada logo em seguida. Os bolos ou pães preparados não eram levedados, como os pães asmos da Páscoa (Êx 12.34). Era comum fazer-se pão todos os dias, pois o pão amanhecido podia ficar duro; assim, o pão asmo era par te normal das refeições. As instruções para a observância religiosa, especialmente da Páscoa, proíbem o uso de fermento (se 'õr, # 8419). Nesses casos, devia-se preparar pães asmos. Normalmente, se o pão não era consumido de imediato, misturava-se um pouco de massa mais velha e levedada à massa fresca e sovada. Com isso, ocorria a fermentação e o pão crescia, passando a ser chamado de “pão azedo” (hamêç; # 2809), em contraste com o “pão asmo” (ma^sá) — assim chamado pois costumava ter a forma de bolos achatados. A massa fresca misturada com a massa do dia anterior era colocada de lado para crescer até que estivesse completamente levedada. Muitas vezes o padeiro deixava aceso um fogo baixo para manter a massa aquecida e acelerar o processo. Depois disso, a massa levedada estava pronta para ser assada. Assim, o lêvedo ou fermento adquiriu vários significados no mundo bíblico. Sem dúvi da referia-se àquilo que era velho. Os israelitas no Egito prepararam pães asmos, pois deviam comer apressadamente, sem esperar que a massa fermentasse. Porém, por sua própria nature za, o fermento tomou-se um símbolo daquilo que domina ou controla (como os ensinamentos hipócritas dos fariseus; Mt 13.33; 16.6) ou daquilo que corrompe (ver ICo 5.7). Assim, os cristãos devem acautelar-se de tal “fermento” e eliminar da vida qualquer coisa que possa ser representada por ele — especialmente a maldade e a malícia. Pela lei, era proibido usar femiento em ofertas queimadas ao Senhor (Êx 29.2; Lv 2.11; 7.12; 8.2; Nm 6.15), pois o sacrifício devia ser fresco e puro e não velho, fermentado ou de algum modo contaminado — por fermento ou mel. No entanto, o povo de Deus podia usar fermento para a oferta pacífica (Lv 7.13) e para os pães movidos diante do Senhor na Festa das Semanas (Lv 23.17), pois esses pães seriam comidos pelos sacerdotes. Alguns estudiosos sugerem que na tipologia das Semanas, ou seja, Pentecostes, o pão representava o povo que, portanto, ainda não era puro. Porém, a proibição mais conhecida do uso de fermento refere-se à Páscoa e à Festa dos Pães Asmos (Êx 12.15). Os israelitas foram instruídos a eliminar todo o fermento de suas ca sas e gamelas. Não devia haver fermento algum em toda a terra durante sete dias (Dt 16.4). É possível que muitos israelitas seguissem essa instrução de modo rotineiro, sem refletir muito sobre as implicações teológicas. Mas as Escrituras revelariam aos poucos que o efeito desejado da redenção pelo sangue era a pureza, ausência de corrupção. 4. Nem todos os cereais eram assados na forma de bolos ou pães. Por vezes, os grãos eram simplesmente tostados e consumidos assim (qãli, grão torrado ou tostado [#7833];
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pão entre os alimentos que não deviam ser ingeridos na Festa das Primícias até que tivessem sido feitas as ofertas ao Senhor (Lv 23.14). 5. O pão em formato de filão servido no mundo ocidental não era conhecido no OM Os bolos ou pães normalmente eram achatados e possuíam formato circular. Podiam ter cerca de dezessete centímetros de diâmetro e pouco mais de dois centímetros de espessura. Também se faziam pães mais finos, especialmente quando eram asmos e não cresciam muito. O termo habittlm descreve “bolos achatados” que eram assados numa panela (# 2503). A palavra mahabal é usada para um prato ou assadeira (# 4679). 1 Crônicas 9.13 diz que, den tre os exilados que voltaram, havia um levita chamado Matatias, que era encarregado do que se fazia nas assadeiras. O subs. çappihit (# 7613) é relacionado ao vb. ár. que significa estender, alargar, e no etp., espalhar. Esse termo é usado em Êxodo 16.31 para descrever o maná que tinha sabor de “bolos de mel”. O termo heb. ‘ ugà (# 6314) é usado para um pão em forma de bolo ou um disco (Gn 18.6; IRs 19.6). O vb. significa traçar um círculo, e no ár. descreve algo dobrado ou curvado. Em Oséias 7.8, o termo descreve o pão que não foi virado, ou seja, que só foi assado de um lado, e que não presta mais. Um subs. relacionado é m ã ‘ôg (SI 35.16). Por causa de seu formato, esses pães circulares costumavam ser chamados de kikkãrôi. A palavra kikkãr quer dizer algo redondo, um círculo, e também pode ser usada com outros sentidos, como uma região (o “círculo do Jordão”) ou um peso cilíndrico (-> # 3971). O ter mo é empregado com freqüência para descrever-se um bocado de pão (kikkar lehem). Ao que parece, três pães desses constituíam uma refeição normal (ver ISm 10.3, o sinal sobre Saul). Mas, na prisão, a ração era de um kikkar lehem por dia (Jr 37.21; -> Ihm II [alimentar-se de, comer, #4310; lehem, alimento, pão, # 4312]). E em casos de caridade, a doação também se limitava a uma unidade, como na profecia sobre os sacerdotes depostos tendo que mendigar por um bocado de pão para o novo sacerdote (ISm 2.36). Provérbios 6.26 também usa essa expressão para descrever a quantidade mínima de mantimentos: ao procurar uma prostituta, o indivíduo é reduzido a um kikkar lehem. O bolo circular é chamado de $elúl / ^ l i l (# 7501), em Juizes 7.13. Trata-se da visão do pão redondo de cevada no sonho relatado a Gideão. Assim, o pão mais comum era redon do e achatado, de modo que, em seus ensinamentos, Jesus compara adequadamente pães com pedras (Mt 7.9). Alguns bolos eram bem mais finos que os pães habituais. Podiam ser enrolados ou do brados e usados como colher para retirar alimentos de uma vasilha comum (ver Mt 26.23). O termo lebibâ (# 4223) é empregado para esses pães achatados. O subs. e o vb. a ele relaciona do aparecem na narrativa de Amom e Tamar (ver 2Sm 13.6, 8, 10). Amom queria que Tamar fosse fazer bolos (o vb.) na presença dele. E evidente que Tamar satisfez o desejo de Amom e levou-lhe os bolos (lebibâ) que havia feito. Outro nome para pão é rãqiq (# 8386; Lv 8.26). Trata-se de um bolo fino (IC r 23.29). Esse termo é sempre usado com referência a pães asmos que, pelo processo de preparo, eram sempre finos (Êx 29.2, 23; Lv 2.4; 7.12; 8.26; Nm 6.19). Por fim, a palavra haspas (# 2892) é usada para descrever o maná, e é traduzida como esfoliado ou descarnado (part. pass.) e provavelmente indica que o maná era crocante ou que bradiço (“coisa fina e semelhante a escamas”; Êx 16.14). Termos relacionados aparecem no aram. para referir-se a “escama de peixe” e no ár., entre outras coisas, para “ter uma crosta de ferida”. 1022
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A textura desses pães não era sempre a mesma. Algumas palavras sugerem que certos pães finos eram perfurados. Um desses termos é hallâ (# 2705), um pão em forma de anel. Po rém, o vb. hll II (# 2726) significa perfurar, trespassar, sendo usado em Provérbios 26.10 para a ferida ou perfuração de uma flecha, e, em Isaías 53.5, para o trespasse ou ferimento do Servo Sofredor. No ár., o vb. significa perfurar, e, no aram., deixar oco, de modo que hallâ prova velmente se refere a um bolo redondo e perfurado. Foi isso que Davi distribuiu na ocasião da mudança da arca (2Sm 6.19). Assim, eram os doze pães de flor de farinha colocados perante o Senhor no santuário (Lv 24.5). E na cerimônia de ordenação (Lv 8.26), um desses pães — m a ^â — era tomado e queimado no altar a fim de ser comido com a oferta pacífica. Outra palavra, niquddim (# 5926), pode ser uma referência a bolos salpicados de se mentes aromáticas ou bolos perfurados, pois o heb. nqd significa ponto, pontilhar. O modo como o termo é usado indica um tipo de bolo que se esfarela facilmente e que, portanto, era perfurado. E usado em Josué 9.5 para descrever o pão “seco e bolorento” que os gibeonitas carregavam ao enganarem Josué. O pão quebrado ou pedaços partidos de pão são mais bem representados pelos termos pat,pãtôt, bocado (# 7326; # 7336). O vb. ptl significa partir, esfarelar (# 7359). O sub. pat, portanto, quer dizer um fragmento ou bocado de pão. Por vezes, é usado para um pedaço de pão — Gênesis 18.5, (lit.) “trarei um bocado de pão”. No entanto, a passagem indica que para isso era necessário preparar o pão sovando-o e assando-o. Em Juizes 19.5, a palavra também é usada para a provisão de um pedaço de pão como forma de hospitalidade (semelhante à ex pressão “alguma coisa para comer”). Assim também em Rute 2.14, Boaz disse a Rute para molhar o bocado dela, um pedaço de pão, no vinho. Costumava-se partir o pão e não cortá-lo. A palavra bocado é a que melhor descreve o pedaço partido. No ritual, é usada para os pedaços partidos de pão (pittim) que os israelitas deviam apresentar como oferta (Lv 6.21 [14]). Uma boa ilustração do significado desse termo vem do seu uso para partículas de gelo. O Salmo 147.17 diz, “Ele arroja o seu gelo em migalhas (bocados)”. Assim, pat, muitas vezes significa um bocado, no sentido de um pequeno pedaço de pão. Provérbios 17.1 usa o termo para falar de uma vida simples, humilde: “Melhor é um bo cado (pat harêbâ) seco e tranqüilidade do que a casa farta de carnes e contendas” . Provérbios 23.8 emprega o termo para descrever um pequeno pedaço de alimento que pode ser vomitado, e Provérbios 28.8 usa o termo numa hipérbole, dizendo “até por um bocado de pão o homem prevaricará”. Ezequiel 13.19 registra o espanto diante dos falsos profetas que corromperam a fé por um pedaço de pão (pãtôt). 6. Era comum prepararem-se os pães ou bolos com óleo. A palavra lãsãd descreve um pão assado com azeite de oliva, ou que tem o gosto de azeite fresco (# 4382). Basicamente, a palavra transmite a idéia de úmido ou umidade, sendo, de fato, usada no Salmo 32.4 para líqui dos e umidade do corpo. Porém, em Números 11.8a palavra também é empregada na descrição do maná: “O seu sabor era como o de bolos amassados com azeite (lesad hassãmeri)". Bolos ou pães feitos com óleo são diferentes de pães finos e achatados untados com azeite (Êx 29.2). Em ambos os casos, porém, tratava-se de um alimento mais aprazível do que o pão seco. 7. Duas palavras são usadas em contextos que tratam de pães, mas nenhuma delas in dica com precisão o formato ou a substância, hõri I, bolo (# 3035), descreve os pães dentro do cesto, na visão do padeiro (Gn 40.16). O radical é Itwr, ser branco, pálido, tomar-se alvo (-> # 2578). Pode descrever os pães dentro do cesto ou, mais possivelmente, o tipo de cesto usado, pois o texto acrescenta que na parte de cima do cesto havia todo tipo de alimentos assados. kanwãn (# 3924) refere-se a algum tipo de bolo sacrificial, mas é impossível determinarem-se 1023
Partículas
detalhes. O subs. é relacionado a kwn, que no hi. significa preparar, aprontar (-> # 3922). As sim, o subs. descreve algum tipo de bolo preparado (kawwãn) para a Rainha do Céu como parte da adoração a ela (Jr 7.18; 44.19). 8. Portanto, o pão com seus vários formatos e modos de preparo constituía a base dieta. Encontrava-se tão ligado à agricultura da terra que era prontamente associado às bênçãos concedidas por Deus a seu povo. Naquela terra, o povo era, de fato, dependente de Deus para o sustento. Nada mais natural, portanto, do que orar “O pão nosso de cada dia dá-nos hoje”. Essa era uma demonstração diária do cuidado de Deus por seu povo, bem como da dependên cia diária de Deus. Além disso, o pão ocupava um lugar de destaque no ritual dos sacrifícios. O sacrifício de consagração ou minhà (-> # 4966; Levítico 2) requeria a oferta de vários pães, especial mente quando realizado em conjunto com a Festa das Primícias. Também era necessário haver sempre duas fileiras de pães sobre a mesa do lugar santo, sendo que estes deviam ser trocados toda semana, a fim de representar a dependência e gratidão das tribos ao Senhor. O pão era ainda o símbolo de hospitalidade — partir o pão conjuntamente indicava paz e comunhão. Não importava como era preparado, quando oferecido, o pão devia ser aceito. Re cusar pão era rejeitar a hospitalidade e demonstrar falta de amizade. Por isso Jesus não aceitou o pão de inimigos do Evangelho (Mc 6.8). No entanto, partir o pão conjuntamente tomou-se o sinal de união dos crentes em Cristo. Cozimento, fervura: b sl(ferver, cozinhar,# 1418); tbh (matar, #3180); nãzid(prato, cozido, sopa grossa, # 5686); -> rth (levantar fervura, # 8409); -> Assadura, fervura, cozi mento: Teologia Comida, alimento, sustento, sabor: -> 'kl (comer, consumir, devorar, # 430); -> brh (co mer porções, tomar rações, # 1356); bãsãr (came [alimento], alimento, tecido [do corpo], # 1414); gzr II (cortar, abater, rasgar, rapinar, # 1616); zwn (prover, suprir, # 2315); -> t ‘m (provar, testar, sentir, discernir, # 3247); krh III (servir, dar um banquete, oferecer, #4127); Iht II (devorar, # 4266); Ihm (algo para ser engolido, bocado seleto, iguaria, # 4269); -> Ihk (lamber, #4308); -> Ihm II (alimentar-se de, comer, # 4310); l'l (engolir, fazer/deixar engolir, # 4358) Fermentação, asmo, massa: -> b$q (avolumar-se, # 1301); hms I (estar azedo, fermentado, # 2806); masçâ I (pão asmo, # 5174); -> 'arísâ (massa, farinha grossa, # 6881) B ib l io g r a f ia
P. Connolly, Living in the Time o f Jesus ofNazareth, 1988; P. Fairbaim, ed., Bible Encyclopedia, 1, 1957; J. M. Freeman, Manners and Customs o f the Bible, 1972; V. H. Matthews, Manners and Customs in the Bible, 1988. Allen P. Ross Parente -> # 4530 (m õdã‘, parente, membro da família) Parque -> # 7236 (pardês, parque, floresta)
O termo “partículas” é usado para descrever uma classe de palavras no heb. que abrange advérbios, preposições, conjunções e termos modais (inclusive negativos e interjetivos). Ver IBHS, 64-68 para uma Partículas
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Partículas
discussão sobre as “Partes do Discurso” na BH e especialmente a utilidade de uma abordagem baseada nas classes de palavras. As partículas desempenham um papel importante na sintaxe da BH. Os advérbios modificam uma oração verbal ou o verbo em si, enquanto as preposições definem a relação entre as orações nas quais ocorrem com o vb., ou por vezes, num contexto mais vasto. As exclamações muitas vezes servem para chamar a atenção para algo novo ou inesperado, ou então constituem parte de uma expressão padronizada, como juramentos ou oráculos de ais. A partícula 'êt (# 906) serve para marcar o acusativo no discurso em prosa da BH, mas também pode ter a função mais ampla de chamar a atenção para a palavra à qual está ligada. Apesar de nem todas as perguntas serem pontuadas na BH, a maioria é introduzida por uma partícula interrogativa. A narrativa da Bíblia apresenta uma aparente simplicidade, mas graças a uma variedade de partículas (das quais w<5w [# 2256] é, de longe, a mais comum) as orações podem ser ligadas umas às outras com precisão. As partículas ocorrem com tanta freqüência na BH que é difícil dividi-las em categorias segundo o uso. Determinam a ligação entre palavras e frases e, no entanto, não receberam a mesma atenção dedicada a outras partes da gramática hebraica. As dificuldades de se tratar es pecificamente das partículas são demonstradas em várias traduções, nas quais é comum as par tículas simplesmente serem deixadas de fora. Além disso, estamos lidando apenas com a forma escrita na qual o discurso heb. foi transmitido e não temos conhecimento algum da entonação e dos gestos que costumavam acompanhar o diálogo. É evidente que casos como fórmulas de juramento deviam estar relacionados a certos atos rituais que contribuíam para o significado das palavras registradas na forma escrita. A discussão da relevância das partículas envolve diversas questões, inclusive aquelas relacionadas à etimologia, seqüência de palavras, definição de ên fase e entonação. Este artigo fará um levantamento de seu uso e comentará sobre os aspectos importantes, especialmente nos casos em que o uso afeta a tradução e interpretação. A. Advérbios Normalmente, na BH, o adv. vem depois de outros elementos importantes da frase. Exis tem, porém, duas variações que ocorrem muitas vezes. Em primeiro lugar, vários adv. comuns são inseridos entre dois dos elementos principais de uma frase (sujeito, vb., objeto). E sobre tudo o caso com advs. curtos que indicam tempo ou lugar, como hayyôm, hoje (Jz 21.6; 1Sm 24.11) e sãm (# 9004; Gn 2.8; Jz 3 1. 13; 2Sm 15.21). Em segundo lugar, pode-se observar que vários advs. aparecem no começo de uma frase. No caso de diversos deles como kõh, assim, aqui (# 3907; Gn 15.5; Êx 3.14. 15), kên, assim, portanto (# 4027; Jz 7.17; ISm 1.7; Jr 14.10), 'al-kên (Gn 20.6; SI 1.5; 45.7[8]) e 'úlay, talvez (#218; Gn 16.2; Is 47.12), não parece haver nenhuma ênfase resultante simplesmente da posição deles dentro da frase. No entanto, em um número maior de casos, a posição inicial do adv. visa à ênfase ou ao contraste. É interessante que o adv. tenha essa função com mais freqüência no diálogo do que na prosa narrativa. Um bom exemplo é gam (# 1685), normalmente traduzido como “também”; em várias passagens parece ser usado como uma partícula de ênfase, denotando uma declaração que é um fato óbvio. Podem-se encontrar exemplos em Gênesis 20.12; 42.28; Salmo 25.3; Provér bios 18.9 e Isaías 26.12 (ver a discussão sobre gam por Labuschagne [ 193—203] e considerar também as críticas à posição em Muraoka [ 144— 45]). Um caso notável do uso de gam ocorre em 1 Samuel 19.19-24. Saul enviou mensageiros para buscarem Davi em Ramá e estes tam bém (gam hêmmâ. 3x) profetizaram. Então o próprio (gam hii ’, 3x) Saul foi a Ramá e também profetizou. O uso de ’ap, e, também (# 677), é mais simples do que o de gam e muitas vezes serve como um coordenador que dificilmente pode ser distinguido em uso de w^, e, mas, então (# 2256). Porém, quando é seguido de ki, para, a fim de que, porque, quando (# 3954), pode 1025
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ter uma função enfática (p. ex., Ez 14.21; 15.5); é mais comum na poesia e em estilo de prosa elevado, como em Levítico 26 e Isaías 40—48. A partícula 'êpô, onde (# 686), está relacionada com 'ap, e é uma partícula enclítica usada muitas vezes depois de interrogações e que indica a ligação entre a declaração e/ou pergunta na qual ocorre e a declaração anterior. Apesar de nossa língua ter vários advérbios que alteram uma oração em relação ao seu discurso, o heb. possui apenas dois: ’onmâ (# 593) e ’omnãm ( 597; 'umnãrn [# 598] em perguntas) definem a forma da elocução, “em verdade, verdadeiramente” e fica claro que são originários do radical 'mn (-> # 586). Entre as maneiras não adverbiais de expressar a mesma coisa há o uso da oração preposicional be 'emet, verdadeiramente (# 622). Há quatro advérbios em ke, semelhante a, como (# 3869), que podem servir de indi cadores lógicos. Destes, kõh, aqui, agora, assim (# 3907; 58 lx), ocorre em posição inicial; ki (4.470x) e kên (695x) são mediais; enquanto kãkâ, assim, portanto (# 3970; 37x), pode ocorrer em qualquer uma dessas posições; kõh pode servir de adv. de lugar (“aqui”) ou, o que é mais comum, como uma introdução para um discurso direto, normalmente com o vb. 'mr (# 606); também pode dar início a uma seção de discurso introduzindo ação (depois do vb. ‘sh, fazer, realizar[# 6913]); um termo intimamente relacionado a ele é kãkâ, que pode ser usado para introduzir um discurso remetendo de volta à ação anterior ou pode resumir o material anterior (ver Glinert, 121-22). kên é usado muitas vezes em comparações, em que se refere àquilo que veio antes na prótase, apesar de algumas vezes ocorrer sem que esteja dentro de uma declaração comparativa formal. Neste último caso, sua força comparativa é determinada exclusivamente pelo contexto. A partícula adverbial kên também ocorre nas combinações lãkên e ‘al-kèn. lãkên muitas vezes tem o sentido de “portanto” e, nos livros proféticos, costuma introduzir uma de claração ou ordem divina (p. ex., Is 5.13, 14,24; 7.14; 10.16; Jr 7.32; Os 2.6 [8], 14 [16]; Am 4.12). Em discursos proféticos de julgamento, lãkên costuma formar a transição da discussão para a proclamação (Am 6.7; Mq 2.3). O uso de 'al-kên parece introduzir mais comumente “a afirmação de um fato e não uma declaração” (BDB, 487); em termos específicos, é usada com mais freqüência quando se tem em vista a origem de um nome ou costume (p. ex., Gn 2.24; 10.9; 11.9; Êx 13.15; 15.23). A partícula mais comum na BH é ki, que também ocorre em textos extrabíblicos (a inscrição de Siloé e as cartas de Laquis), apesar de ser usada com freqüência muito menor no heb. medieval e moderno. Relacionada a K e kõh, k i é uma partícula que “aponta ou mostra o caminho adiante” (Muilenberg, 136); ela introduz uma nova oração e o faz para mostrar alguma ligação entre duas orações ou para indicar ênfase. O primeiro caso é de uso mais comum, apesar de a palavra “pois”, que aparece muitas vezes nas traduções em nossa língua, nem sempre ser a tradução mais apropriada, uma vez que em diversas ocasiões não há ligação lógica aparente entre as duas orações. A tradução “pois” é apropriada no caso de orações causais, mas nos casos em que ki apresenta orações temporais, o mais adequado é “quando”, apesar de acontecer, por vezes, de haver orações praticamente condicionais, tomando apropriado, desse modo, o uso de “se”. Quando ki é empregado juntamente com 'im, se (# 561), para expressar por que algo pode não acontecer, é possível usar-se a tradução “exceto” ou “antes”. Em alguns casos, ki so zinho possui força adversativa e deve ser traduzido como “mas, antes, pelo contrário” (p. ex., Gn 24.3-4; 45.8; Êx4.10; 23.24; Dt4.26; 2Sm 20.21; Am 7.14). Apesar de o uso de ki mostrando ênfase ter sido reconhecido há muito tempo (BDB, 472), a comparação com o k enfático do ugar. levou a mais estudos sobre o uso de ki no AT. Essa investigação chegou ao ponto mais extremo com M. Dahood (Psalms 3, 1970, 402-6), ainda que, de modo geral, a maioria dos estudiosos mostre que têm suas reservas em seguir todas as sugestões de Dahood (ver especialmente a discussão de A. Schoors [240—76]). O fato de o k 1026
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enfático ocorrer no ugar. apenas com vbs. indica que é o equivalente de um ki asseverativo em heb. Dentre os bons exemplos do uso enfático de ki, podem-se citar Gênesis 18.20; 2 Samuel 23.5; Salmo 49.15 [16]; Isaías 7.9; 15.1; Lamentações 3.22; Amós 3.7. Fica claro que ki tem força enfática quando é usado em imprecações ou juramentos, e é possível que seu uso enfáti co seja originário de um contexto legal (de acordo com Williams, # 449; Muraoka, 160). Dois exemplos excelentes são 1 Samuel 20.3: “Tão certo como vive o Senhor, e tu vives, Jônatas, apenas há um passo entre mim e a morte” e 2 Samuel 12.5: “Tão certo como vive o Senhor, o homem que fez isso deve ser morto”. Outros exemplos podem ser encontrados em Gêne sis 42.16; 1 Samuel 26.16; 1 Reis 18.15; Isaías 49.18; Jeremias 22.24. Além disso, depois da fórmula “faça-me o Senhor o que lhe aprouver” (lit., “faça-me o Senhor isto e ainda mais” ), a maldição é apresentada por ki (p. ex., Rt 1.17; ISm 14.44; 2Sm 3.9; 1Rs 2.23; 19.2). Além do uso temporal, os advs. 'attâ, agora (# 6964; 433x), e az, então, agora (# 255; 130x), ’azay (# 259), muitas vezes têm também uso enfático. No caso de ‘attâ, isso pode ser observado especialmente quando ocorre a combinação vv6 ‘attâ. Em vários casos, denota um novo estádio de uma discussão sem que se mude de assunto; em Isaías 5.3-5, isso fica particu larmente claro, uma vez que a repetição de ‘attâ serve para dividir a passagem em três está dios. Nos profetas, ‘attâ é usado para apresentar atividades iminentes de Javé, quer de bênção ou de maldição. O uso de az é mais amplo. Pode marcar um novo estádio ou (esp. na poesia) ser usado para dar ênfase. Quando empregado em combinação com ‘attâ, serve para criar um contraste entre “outrora” e “agora” (p. ex., Js 14.11). Um determinado grupo de partículas adverbiais apresenta várias semelhanças em re lação aos advs. enfáticos. Pertencem a esse grupo raq, somente (# 8370; 109x), 'ak, somente, certamente (#431; 161 x), 'ãkên, certamente (# 434; 18x) e ’abãl, mas, de fato (# 66; 11x). Esses termos marcam uma descontinuidade entre as orações, mas também servem para enfa tizar a oração específica em que ocorrem, raq é principalmente uma partícula restritiva, mas também possui força asseverativa. Tem essa força quando se encontra no início de uma frase ou oração que não possui uma relação próxima com o contexto anterior ou quando se acha no início de uma oração imperativa (ver Muraoka, 131, n. 66); porém, o uso enfático dessa par tícula é relativamente raro; em geral, seu sentido restritivo está presente quando introduz um resumo (p. ex.,D t4.9)ou um esclarecimento daquilo que a precede (p. ex., Dt 12.13, 15; IRs 3.3). Também se deve observar que raq é um termo raro na poesia; quanto à sua forma de uso, é semelhante a 'ak, que também funciona tanto como partícula enfática quanto restritiva. Não é necessário assumir-se uma posição extrema como a de Snaith (221), segundo o qual ak é sempre restritivo e, por vezes, adversativo. Porém, em certas ocasiões é difícil fazer-se uma distinção clara entre os dois. O significado enfático fica evidente em passagens como Gênesis 29.14; 44.28; Êxodo 31.13. A partícula 'ãkên, por sua vez, possui um elemento característico — ocorre somente no início de uma frase e quase sempre apresenta uma característica disjuntiva; costuma inverter o que foi dito imediatamente antes (p. ex., Is 49.4; 53.34), mas também possui força enfática (como em Gn 28.16; 1Rs 11.2; Is 40.7). ’abãl tem as mesmas funções que as outras partículas desse grupo, inclusive a inversão de crenças ou expectativas. Acredita-se, de modo geral, que ’abãl tenha um significado mais antigo e outro mais recente (cf. Muraoka, 129), mas nâo há evidências históricas que apóiem essa hipótese. Dois advs., 'ãz, então (# 255), e (erem, antes (# 3270; muitas vezes combinado com a preposição be, dentro de. com [# 928]), são importantes em seu uso antes de formas verbais com prefixo. Aparecem em orações temporais para denotar acontecimentos passados. Exem plos desse uso são: az, Êxodo 15.1; Números 21.17; 1 Reis 8.1; terem. Gênesis 27.33; Êxodo 12.34; Josué 3.1. Dos dois, az é o mais comum e, em 15 ocasiões, parece indicar que a ação 1027
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designada pela forma verbal que o segue ocorreu antes do acontecimento anterior ter sido completado (cf. I. Rabinowitz, 54). E possível que esse uso estivesse ocorrendo gradualmente com menos freqüência na BH, uma vez que o cronista emprega 'ãz apenas 2x com uma forma verbal com prefixo. Por fim, há um grupo de advs. que têm em comum a terminação característica -ãm. O mais provável é que se trata de uma terminação acusativa antiga, -a, com um m enclitico. Esse grupo contém termos como yômãm, diariamente (# 3429; # 8897). Porem, é preferível considerarem-se essas duas palavras como remanescentes de um -u adverbial sem. encontrado especialmente em formas babilônias como qirbum bâbili, dentro da Babilônia, misericórdia que também aparece no ugar. e no ár. (ver a discussão de E. J. Young [151 -54]).pit om aparece 25x no AT e, com uma exceção (a referência em 2Cr 29.36 às reformas de Ezequias terem sido realizadas subitamente), diz respeito sempre à chegada súbita de uma tragédia ou julgamento. O termo composto 'êtmôl silsôm mostra como esse grupo de advs. muitas vezes perde o signi ficado literal de seus radicais de origem. Essa oração não significa “ontem e anteontem”, mas sim “previamente”. B. Exclamações Três grupos de exclamações heb. requerem comentários. No primeiro grupo, há hinnêh, olhar, contemplar (# 2180; I057x) e hên, olhar contemplar (# 2176; lOOx). Essas duas partí culas não diferem em seu uso e ambas introduzem exclamações de efeito imediato ou mais longas e completas que definem o material subseqüente, hinnêh é mais comum no discurso di reto, enquanto w6hinnêh é freqüente em narrativas. Em várias ocasiões, hinnêh é inflexionado com um pronome, muitas vezes em resposta a uma convocação (cf. Is 6.8), apesar de ser usado também com um sufixo seguido de um particípio para anunciar o que acontecerá. Em 94 por cento desses casos, o sujeito é Deus e a exclamação se refere a uma ameaça ou promessa di vina. São partículas enfáticas no sentido de que chamam a atenção do leitor para algo novo ou inesperado, que pode ser uma única palavra de uma declaração ou uma declaração completa. (Para uma excelente discussão de hinnêh, ver T. O. Lambdin, Introduction to Biblical Hebrew, 169-70; para considerações acerca da questão da ênfase, Muraoka, 137-40.) O segundo grupo está relacionado a juramentos e desejos. Apesar de um juramento nâo exigir uma exclamação introdutória, pode ser precedido de uma partícula positiva (ki, 'im lõ ', ou ki ’im) ou de uma partícula neg. ( 'im). Um juramento também pode scr precedido de hay, vida (# 2644; que provavelmente deve ser considerado um subs., cf. M. Greenberg, 34-39), normalmente junto com o nome de Deus ou algum substituto e, então, seguido de uma oração introduzida por uma das partículas. Apesar de a tradução normal para nossa língua da fórmula de juramento (“tâo certo como vive o Senhor”) indicar uma ligação gramatical bastante próxi ma entre as duas orações, estas nâo formam prótase nem apódose. Várias partículas costumam ser consideradas como introdutórias a oráculos de ais. As duas comuns são hôy, ai (# 2098; 51 x) e oy, ai (# 208; 23x), mas hôy em particular nem sempre ocorre num contexto de desgraça; pode ser usada como um termo geral de convocação, como em Isaías 55.1 (“Ah!; cf. Zc 2.6-7), mas, em mais de 40 ocasiões, envolve advertências, sendo que seis ocorrências se referem à lamentação pelos mortos (como em 1Rs 13.30). hôy pode ser seguida de um vocativo ou de um tópico, apesar de, em ambos os casos, o subs. subseqüente ser colocado em aposição com hôy. Todas as ocorrências de hôy são em passagens proféticas. O clamor onomatopéico oy, (22x; uma vez na forma expandida oyâ [# 210]) é muitas vezes 1028
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seguido do / preposicional e de um sufixo pronominal na primeira pessoa, como uma expres são de desespero (p. ex., Is 6.5) e com um sufixo de segunda ou terceira pessoa (ou subs.) para denotar uma ameaça de julgamento vindouro (p. ex., Nm 21.29; Jr 13.27; Ez 24.6, 9). Várias das ocorrências de ’ôy são seguidas de uma oração de motivo (e, em doze casos, essa oração é introduzida por ki) e “nesses casos, oy adquire seu significado específico em cada caso da oração subseqüente” (TDO T3:360). Os outros clamores, como 'allay (# 518), 'abòy(# 16), 7(# 365), ’a hãh (# 177), hê ’ (# 2026), hãh (# 2081) e hô (# 2082) são raros e ocorrem principalmente como hápax. As outras exclamações não constituem um grupo unificado. Há algumas como ah (# 277), que é um grito de dor (Ez 6.11; 21.20), enquanto he ’ãh (# 2027) é uma exclamação de alegria de uma pessoa (SI 35.21, 25; Ez 25.3). A interjeição has (# 2187; 7x) tem força impe rativa como uma ordem de silêncio (p. ex., Am 8.3; Hc 2.20) e, em duas ocasiões, é tratada como se fosse um vb. (Nm 13.30; Ne 8.11). O desenvolvimento oposto ocorreu com hah (# 2035), uma forma hortativa do vb. yhb, “Vinde" (p. ex., Gn 11.3,4, 7; 38.16). A partícula enclítica nã' (# 5528) é usada em súplicas ou exortações, muitas vezes depois do imperativo a fim de amenizar a aspereza da forma vb. simples. É empregada com formas imperfeitas (esp. com co-hortativos) que expressam um desejo ou anseio e pode ser ligada a partículas como 'á l, nenhum (# 440), im, se (# 561) e hinnêh\ com 'im ocorre na oração que busca uma pre disposição favorável para um pedido: 'im-nã' maçã'ti hên be 'êneykã, “se acho mercê em tua presença” (Gn 18.3; 47.29; 50.4; Êx 33.13; 34.9). É possível que o uso de n ã ’ mostre que a ordem é o resultado lógico da declaração anterior ou da situação em geral (Lambdin, Introduction to Biblical Hebrew, 170). C. O indicador 'et (# 906) O caso acusativo não costuma ser indicado pela forma na BH, como acontece com o genitivo, que é denotado por uma preposição ou um subst. no construto. No entanto, a partí cula ’êt é empregada muitas vezes para indicar o acusativo, mas somente num grau limitado e não traduzível. É usada somente com subs. definidos (com o artigo ha [# 2021] que toma-se definido com o acréscimo de um sufixo pronominal ou no caso de um subs. próprio). Mes mo assim, seu uso é ainda mais limitado no sentido de que raramente é empregado na poesia. Esse fato fica evidente por uma investigação das passagens poéticas inseridas nas narrativas históricas (cf. o Cântico de Moisés, Êx 15.1-18; O Cântico de Débora e Baraque, Jz 5.2-31; a oração de Ana, ISm 2.1-10). Além disso, a presença de 'êt nem sempre indica o acusativo, uma vez que também ocorre juntamente com o substantivo. São exemplos do uso de 'êt com subs.: 'et-habbarzel, “machado” em 2 Reis 6.5; ’et-simekã, “teu nome” em Gênesis 17.5 e ’et-benêkem, “os vossos filhos” em Deuteronômio 11.2. É possível que a função dc 'êt seja dc chamar a atenção para a palavra à qual está ligada e não a de ser um indicador sintático. A presença de 'êt em Gênesis 4.1 é problemática. Pode ser entendida como indicação do objeto, de modo que Eva expressa confiança de que a criança à qual ela deu à luz é, de fato, o Senhor, cumprindo desse modo a promessa de Gênesis 3.15. Porém, a maioria das traduções e exegetas toma por certo que a palavra é uma preposição ligada à preposição acad. itti, que quer di zer “do". Daí várias traduções aceitarem essa derivação e parafrasearem de modo a apresentar “com o auxílio do Senhor”. D. Partículas interrogativas Na BH, não há necessidade de as perguntas serem indicadas por um ponto de interroga ção, uma vez que a entonação serve para diferenciar uma pergunta de uma afirmação. Porém, 1029
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a maioria das perguntas é indicada por uma partícula introdutória. O pron. animado comum é mi, quem (# 4769) (422x), invariável tanto em gênero quanto em número. Quando tem uma função genitiva, é precedido de le, para, a fim de (# 4200), ao passo que é sempre encontrado com et quando se encontra no acusativo. Pode ser usado para perguntas diretas ou indiretas, estar embutido numa frase ou simplesmente servir de pronome indefinido (alguém, qualquer um). Normalmente, mi indaga sobre a identidade ou descendência de uma pessoa (p. ex. Êx 10.8; Dt 3.24; 5.26; ISm 18.18; 2Sm 7.23; SI 24.8; 25.13 [12]; Is 48.14; Ez 27.32). Por vezes, pode não ficar evidente de imediato, como no caso de m i semeka, “Qual é o seu nome?” no qual se considera que o nome represente a pessoa. O pronome inanimado é mâ, o que (# 4537) (747x), que também funciona como subs., genitivo (raro) e acusativo (porém nunca precedido de ’êt); possui maior relevância teológica quando ocorre ligado a “nome”. Enquanto m i procura identificação, má busca o caráter ou qua lidade por trás de uma pessoa. Moisés previu uma pergunta que seus irmãos lhe fariam: “Qual é o seu nome?” (Êx 3.13). O desejo era conhecer o caráter de Javé para que pudessem estar certos de que seria capaz de libertá-los da condição deplorável em que se achavam. Da mesma forma, em Gênesis 2.19, Deus leva os animais até Adão para ver como (de que nome, mâ) lhes chamaria, e o v. 20 indica que a situação envolvia questões qualitativas. Perguntas exclamativas muitas vezes começam com mâ, que pode ser seguido de um adjetivo (“Quão magnífico”, SI 8.1 [2]) ou um vb. (“Como nos justificaremos”, Gn 44.16). Perguntas retóricas também podem ser introduzidas por mâ (2Rs 8.13), inclusive aquelas que esperam uma resposta energicamente negativa (IRs 12.16); a combinação preposicional mais comum é com mâ e lãmâ, porquê?, e não parece haver nenhuma diferença real entre lãmâ e o termo composto maddúa'. Há uma variedade de partículas relacionadas à forma básica e, onde (# 361), que ocor re como absoluto (p. ex., Gn 4.9), mas também com zeh, isto (# 2296) (p. ex. IRs 13.12; Jr 6.16), ou com sufixos pronominais (p. ex., Gn 3.9; Êx 2.20), quando combinado com mizzeh, e indaga com referência à direção de onde alguém esteja vindo (p. ex., Gn 16.8; ISm 30.13). Outras partículas que ocorrem com o significado de “onde” são 'ayyeh (# 372) e 'êpõh (# 407) (relacionada também a põh). A primeira é mais comum e difere de 'êpõh por não ser usada com verbos. A forma 'ayin, nenhum, não há nenhum (# 4 0 1; numa contração com ew), aparece combinada com a preposição min, de (# 4946) a fim de fornecer uma outra forma interrogativa direcional e é praticamente sinônima de 'ê mizzeh. Do termo 'ãn (# 625), com o acréscimo de hê, localidade, vem a forma "ãnâ, que significa “para onde, aonde, onde?”. Outro conjunto de formas também originárias de e tem o acréscimo de um elemen to k; a saber: 'êk, como, o que (# 375), 'êkâ, como, onde (# 377) e 'êkãkâ. O primeiro desses termos é relativamente comum, enquanto os outros dois são raros. Todos os três são usados com o sentido de “como” em perguntas verdadeiras. Muitas vezes, ’êk é usado em perguntas retóricas e expressa emoções como horror, espanto e desespero. ’êk e 'êkâ são empregados em declarações exclamativas, apesar de ’êkâ ter uma carga enfática um pouco maior do que 'êk. Das duas partículas, 'êkâ ocorre com muito mais freqüência nessa forma de uso, especialmente no caso do livro de Lamentações, onde aparece como palavra de abertura do livro e lhe con fere seu nome hebraico. Existe também uma forma hêk, que ocorre apenas duas vezes no heb. mais recente (1 Cr 13.12; Dn 10.17) e pode muito bem ser apenas uma variação de 'êk( cf. ICr 13.12 com o paralelo em 2Sm 6.9, 'êk). Perguntas temporais são introduzidas por mãtay, quando (# 5503; 43x), combinado com as preposições le ou ‘ad: lemãlay, quando?; 'ad mãtay por quanto tempo? (21 x; praticamente sinônimos de ‘ad mâ; cf. SI 80.4 [5] com 79.5). mãtay ocorre principalmente em perguntas retóricas, por vezes usadas pelo próprio Deus (cf. 1Sm 16.1; SI 82.2), apesar de ser usado com 1030
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mais freqüência em referência a pessoas a quem Deus está se dirigindo (cf. SI 42.2 [3]; 90.13; 101.2) ou a pessoas se dirigindo a outras pessoas (cf. Gn 30.30; 1Rs 18.21). A BH possui duas partículas existenciais: 'ayin, nenhum, não há coisa alguma (# 401), construto. 'ên (789x), uma partícula negativa e seu antônimo yêS, há (# 3780) (140x) (ver a discussão dessas partículas em Muraoka, 77-82, 99-111). Não ocorrem em frases apenas como vbs. de ligação; antes, deixam implícito, com uma certa ênfase, a idéia de existência ou inexistência. As formas de uso de 'ayin são tão variadas que é impossível dar-se apenas um equivalente para o termo em nossa língua, mas sempre que ocorre, está presente a idéia de ne gação; é usado particularmente para negar um subs. ou oração subs. (GK.C # 152d, i-o) e pode indicar a ausência de algo (Gn 2.5) ou sua inexistência (ISm 10.14; Ec 3.14). O termo pode ser usado para expressar alternativas como uma coisa ou outra (Gn 30.1) ou nenhuma coisa nem outra (45.6). Há expressões compostas que fazem uso de 'ayin, e nelas a partícula tomase praticamente um advérbio. Alguns exemplos são ’ên-qê.$ (ls 9.7 [6]), 'ên qê$h, interminável (ís 2.7 bis), 'ên mispãr, inumerável (Jr 2.32; lC r22.4;2C r 14.12) e "ên misqãl, impossível de ser pesado (1 Cr 22.3). A partícula positiva yês é usada de maneira semelhante à 'ayin, mas chama a atenção para a existência de uma qualidade ou um objeto; apenas em uma ocasião, é usada de forma substantiva (Pv 8.21), na qual indica riqueza ou substância. Quando aparece isolada depois de perguntas, indica uma resposta afirmativa, enquanto sua presença numa pergunta pode deixar implícita uma dúvida quanto à existência daquilo sobre o que se está perguntando (p. ex., Jr 5.1). Em duas ocasiões, aparece como 'is (2Sm 14.19; Mq 6.10), em função de uma mudança de 'ãlep e yõd iniciais, que também é atestada em outros textos (ver Waltke e 0 ’Connor, IBHS 93). Tanto 'ayin quanto vês aceitam sufixos pronominais e os dois também ocorrem com a pre posição le para indicar posse ou falta de posse (p. ex., yeS-li-kõl, tenho suficiente, Gn 33.11; 'ên lãh wãlãd, ela não tinha filhos, Gn 11.30). E. Partículas negativas Há várias partículas usadas para indicar negação e, ao mesmo tempo em que cada uma delas tem formas específicas de uso, certas funções são entremeadas. Orações verbais inde pendentes em prosa são negadas pelo uso de lõ ', nenhum, não (# 4202) (5200x), qualquer que seja a estrutura de tempo. O termo é usado para o tempo passado (“Nâo te chamei”, ISm 3.6), presente (“Eu não sou profeta”, Am 7.14), futuro (“Nunca jamais será habitada”, Is 13.20) e para declarações gerais (“cuja folhagem não murcha”, SI 1.3). As vezes, lõ ’ possui uma nuança ligeiramente distinta, como em Gênesis 29.7; Ageu 1.2; Esdras 3.6, em que deve ser tradu zido para nossa língua como “ainda não” (cf. G. E. Whitney, “Lõ ’ as ‘Not Yet’ in the Hebrew Bible”, 43-48) ou em passagens como Deuteronômio 5.3 e Jeremias 7.22, em que o significa do é “não apenas” (cf. G. E. Whitney, “Altemative Interpretations o f lõ ”\ 157; G. T. Manley, NBC, 214). Em certas ocasiões, lõ' é ligado a um adj. que nega, chegando quase a formar uma expressão composta (p. ex., lõ ’- el, não é Deus, Dt 32.21; bên lõ ’hãkãm, filho insensato”, Os 13.13). Deve-se observar também que, por vezes, o texto heb. faz confusão entre lõ ’elô (p. ex., SI 100.3). Em alguns casos, inclusive em Isaías 9.3 [2], é preferível aceitar-se que a forma é a preposição de Ie acrescida de sufixo, apesar de outros casos não serem tão claros. Há vários termos compostos, inclusive belõ ', 'im lõ ’ e bfllõ'. Este último é o mais co mum e ocorre em todos os livros da Bíblia com exceção de Levítico, Cântico dos cânticos, Lamentações, Daniel, Oséias, Naum e Sofonias. Na maioria das vezes, bPlõ' é usado em per guntas verdadeiras que esperam uma resposta afirmativa (p. ex., Ex 4.11; Am 9.7; MI 2.10), mas também ocorre em casos nos quais a pergunta simplesmente chama a atenção para um fato 1031
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óbvio. Há diversos casos em que halõ' é praticamente equivalente a hinnêh e nos quais pode ser traduzido para nossa língua com o imperativo “veja” (cf. Gn 13.9; ISm 20.37; Is 10.11; a LXX traduz esses exemplos como idou). Em outros exemplos, halõ ’ introduz declarações afirmativas, às quais o termo é prefixado como cortesia, de maneira comparável à nossa decla ração “como todos sabem” (Dt 11.30) ou “por favor” (1 Sm 26.14). Ver a discussão completa de H. A. Brongers sobre este e outros aspectos, “Some Remarks on the Biblical Particle halõ ' ", 177-89. Foi proposto que uma partícula do noroeste sem., hahV, significa “certamente” (Brown, 201-19). O heb. não possui imperativos negativos, usando, em vez dele, a forma juss. precedida de 'al, nenhum, não (# 440) (730x) para indicar um desejo (Gn 13.8; Jz 19.23) ou uma prefe rencia (Pv 17.12). Em função desse modo de uso, trata-se de uma forma apropriada para a ex pressão de súplicas a Deus em oração (cf. “Ó Senhor... não te retardes, Dn 9.19; “Preza-te, ó Deus, em livrar-me; dá-te pressa, ó Senhor, em socorrer-me”, SI 71.1). Apesar de ser aceito de modo geral que as formas lõ ’ são preferíveis ao uso com ’al quando é necessária uma ordem negativa enfática (como uma ordem de Deus), ainda assim é mais provável que lõ ’ ocorra na legislação enquanto al é empregado em uma situação urgente (ver IBHS, 567). Em uma oca sião, 'al é usado numa expressão composta de maneira semelhante a lõ ’ ( 'al-mãwet, não há morte, Pv 12.28) e também ocorre sem um vb. (2Sm 1.21; SI 83.1). É possível que, em algu mas ocasiões, al tenha função enfática antes de um imperfeito como no ugar. (cf. J. C. Exum, 416-19, e a avaliação basicamente negativa de Muraoka, 123-25). Um grupo de partículas negativas tem origem no radical blh, envelhecer, desgastar-se (# 1162). Destas, bal, nenhum, não (# 1153) (69x) é usada exclusivamente na poesia, em vez de lõ', e repetida muitas vezes no mesmo contexto (p. ex., 7x em Isaías 26; 6x em Isaías 33). Foi argumentado (cf. C. F. Whitley, “The Positive Force of the Hebrew Particle Va”, 213-19) que bal pode ter uma conotação positiva, como no caso de Isaías 44.8 e outras passagens, como tem no ugarítico. No entanto, Muraoka (125-27) expressa dúvida quanto à existência de um caso verdadeiro de bal afirmativo. No caso de beli, sem, nenhum, não (# 1172) (57x), a partícula ocorre uma vez como subst. em Isaías 38.17 (“cova da corrupção”, ou seja, Seol). O mais comum é que o termo funcione como um adv. de negação juntamente com o adj. (p. ex., 2Sm 1.21) e particípios (p. ex„ SI 19.4 [3]) ou seja ligado a um subs. com o sentido de “sem” (p. ex., sem água, Jó 8 .11; sem roupas, Jó 24.10). Mais de metade de suas ocorrências dão-se em combinação com as preposições min, le, he e 'ad, a, até (# 6330), e cada caso individual deve ser examinado para se observar a presença de uma nuança particularmente negativa. Há também um subs., bêlet (112x), que ocorre duas vezes com sufixos, que em outras partes apa rece sempre na forma combinada bilti (# 1194); ocorre como adv. com o significado de “exce to” (p. ex., Gn 21.26; Ex 22.19; Js 11.19; Os 13.4), mas também como uma conjunção depois de uma negativa expressa ou implícita (p. ex., Gn 43.3; Nm 11.6; Is 10.4). Depois de infiniti vos, bihi ocorre com três preposições diferentes, especialmente com le. Entre essas formas de uso com le, há orações finais negativas (“para que o seu temor esteja diante de vós, a fim de que não pequeis" [lebilti tehe(ã ’ú], Êx 20.20) e combinações com o inf. (“Comeste da árvore que ordenei que não [lebiltí] comesses?”, Gn 3.11). Também aparece com min (Nm 14.16; Ez 16.28) e com ad (Js 8.22). Outra partícula negativa é pen, a fim de que não, de outro modo (# 7153; 133x), que aparece no início de uma oração (sendo Pv 5.6 a única exceção) e quase sempre é seguida de uma forma imperfeita do vb. (as duas exceções são 2Sm 20.6 e Re 2.16); várias de suas ocor rências expressam precaução, como em Provérbios, em que aparece depois de proibições (Pv 9.8; 26.4-5; 30.6, 10) e imperativos afirmativos (25.16-17). 1032
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F. Partículas conjuntivas e disjuntivas A parte mais comum do discurso na BH é a conjunção M'ãw (# 2256), que ocorre cerca de 50.000x e serve para unir subs. e ligar orações. E a maneira comum de unir uma série de subs. (ver Os 2.10), sendo omitida somente em raras ocasiões (Os 1.1). Aparece muitas vezes no início de uma frase como partícula introdutória com o significado de, por exemplo, “então”. Na verdade, o livro de Êxodo começa com esse wãw, mas, enquanto algumas versões traduzem-no como “agora”, outras simplesmente deixam-no de fora; também pode ser usado para formar uma hendíadis, como nestes casos: “em tenda, em tabemáculo”, 2 Samuel 7.6; “come ebebe”, 1 Reis 18.41; “sabe, pois, e vê”, Jeremias 2.19. Quando é usada depois de uma oração negativa, a partícula wãw indica alternativas (cf. a forma como o wãw repetido funciona nessa frase: “pois não os salvarei pelo arco, nem pela espada, nem pela guerra, nem pelos cavalos, nem pelos cavaleiros”. Os 1.7). Apesar de subs. em aposição não costumarem ter nenhuma conjunção, ainda assim existem casos em que wãw é inserida, funcionando como “isto é”, “a saber”, em nossa língua (p. ex., ISm 17.40, “pôs no alforje de pastor, que trazia, a saber, no surrão”; ISm 28.3, “o tinha sepultado em Ramá, que era sua cidade”). Em outros exemplos, wãw ocorre na parte não aposicional da oração, servindo, nesses casos, para explicar ou res saltar (para uma discussão desses casos, ver D. W. Baker, 129-36). A ligação de orações no heb. é feita de várias maneiras, mas, sem dúvida, a mais fre qüente se dá pelo uso de wãw. Isso confere uma aparente simplicidade à narrativa heb., para a qual muitas vezes as gramáticas mais antigas chamavam a atenção. Assim, ao compararem o heb. com o lat. e o G, David e McFayden afirmam: “O hebraico tem o costume de coordenar em vez de subordinar, e um vb. principal segue outro com uma regularidade que faz lembrar o discurso simples das crianças” (Introductory Hebrew Grammar, 24a ed., 2). Trata-se de uma concepção que subestima em muito a capacidade do heb. de expressar ligações lógicas e que, particularmente não dá espaço para a forma como wãw funcionar com precisão (ver os comentários de Waltke e 0 ’Connor, IBHS, 649). wãw ocorre em construções relativas, tanto junto de conjugações com sufixos quanto com prefixos; para uma discussão sucinta, ver Lambdin, Introduction to Biblical Hebrew, 162-65; e para um comentário bem mais completo, ver Waltke e 0 ’Connor, IBHS, 519-63. Com relação à conjugação com sufixo, a forma combinada v^qil ocorre 6.378x no AT, enquanto a forma correspondente, com a conjugação com prefixo, wayyqtl, ocorre 14.972x. Com a conjunção com sufixo, wãw ocorre mais comumente na forma de partícula relativa, subordinando uma situação a outra. Muitas vezes, depois de uma prótase introduzida por ’im ou ki, a apódose é introduzida por vfiqü. Gênesis 28.20-21 é um excelente exemplo (lit.): “Se Deus for comigo, e me guardar... e me der pão para comer e roupa que me vista, de maneira que eu volte em paz para a casa de meu pai, então (wehyh), o Senhor será o meu Deus”. Em contraste com isso, o copulativo vfiqtl apresenta duas situações coordenadas entre si, quer como dois aspectos de uma situação complexa (p. ex., “Já envelheci e estou cheio de cãs”, ISm 12.2) ou como dois episódios coordenados dentro de uma narrativa (p. ex., “le vantou altares a Baal... [e] edificou altares na Casa do Senhor”, 2Rs 21.3-4). O uso da forma combinada wayyqtl é a forma verbal mais comum do AT e, no entanto, continua-se discutindo a origem tanto do elemento way quanto do elemento yqtl. Ver a antiga argumentação de G. R. Driver em J. Weingreen, A Practical Grammar fo r Classical Hebrew, 252-53 e uma mais recente em Waltke e 0 ’Connor, IBHS, 543-47. Esta última resume o uso da seguinte maneira: "O wãw relativo, com uma forma com prefixo, representa uma situação normalmente sucessiva e sempre subordinada à declaração anterior. A sucessão pode ser ab soluta ou subjetiva e, muitas vezes, a distinção entre uma e outra é obscura” (547). De modo geral, a maioria das ocorrências de formas wayyqtl denota situações que sucedem a oração 1033
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anterior, temporal ou logicamente, daí ser a forma comum usada em seqüências narrativas; no entanto, também pode funcionar de forma exegética (p. ex., Gn 36.14; 1Sm 15.17) e até mesmo representar situações em conjugações mais-que-perfeitas. Neste último caso, a forma wawyqtl denota uma ação anterior ao vb. precedente (cf. Gn 19.27; Nm 1.48; 2Sm 12.27). W. J. Martin referiu-se a esse uso como “narrativa assincrônica” (179-86) e esta pode ter implicações no caso de várias passagens com problemas exegéticos (inclusive Gn 2.19). O uso de wãw depois de formas volitivas é importante. Depois de imperativos (e tam bém depois de co-hortativos e jussivos), a construção mais comum para descrever uma situação conseqüente é h^qãlalti. Assim, também a forma vt^yqtl costuma introduzir uma oração de propósito, o equivalente nesse caso a hina mais o subjuntivo em G. ("para que”, cf. Jz 9.7; 2Sm 19.38; Jr 40.15). Ao ligar orações nas quais wãw não precede uma forma verbal, wãw pode ter uma função disjuntiva, que pode fornecer um contraste com o que antecede (p. ex., Gn 41.54), a fim de afirmar circunstâncias contemporâneas (p. ex., 39.11) ou apresentar uma comparação (p. ex., em ditados proverbiais, como em Pv 25.25; 26.14). Especialmente no caso de prótases/ apódoses. wãw pode introduzir uma oração que explica ou esclarece a anterior (para exemplos contendo conjugações com sufixo, ver Gn 17.20; 26.22; 1Sm 7.15-16; para conjugações com prefixo, ver ISm 15.17; IRs 2.5; Jó 1.21). É mais difícil ser preciso com referência ao wãw exegético na poesia bíblica em que normalmente precede um subs., mas não há dúvidas de que, em expressões paralelas, essa partícula explica ou dá ênfase (p. ex., 1Sm 2.2; Is 40.10; 44.1). Uma conjunção coordenada empregada com freqüência muito menor é o (319x), sendo que 75 porcento de suas ocorrências encontram-se no Pentateuco. A principal função dessa par tícula é servir de separadora de alternativas em orações principais ou subordinadas. Esta segun da forma de uso pode ser observada especialmente em narrativas legislativas, em que introduz uma alternativa ou apresenta uma exceção à regra. Aparece lOx em Levítico 13.47-49. A conjunção relativa comum ’aser (# 889) (c. 5.500x) também faz parte de um grupo de partículas usadas em orações finais e de resultado. Um exemplo de uma oração final é Gê nesis 13.16: “Farei a tua descendência como o pó da terra; de maneira que, se alguém puder contar o pó da terra...”; Rute 2.2, por sua vez, ilustra o uso da partícula numa oração de resul tado (lit.): “Deixa-me ir ao campo afim de apanhar espigas atrás daquele que mo favorecer”. ya 'an (# 3610) e ma ‘an (# 5100) são também usados de maneira semelhante. Apesar de vários estudiosos afirmarem que essas duas palavras são idênticas, ainda assim é mais aconselhável manter a diferença na forma e também observar a distinção no significado. Ambas podem trans mitir uma idéia de propósito, mas ya ‘an muitas vezes comunica uma idéia de causação, o que não ocorre com ma ‘an. O termo ma ‘an é usado sempre com a preposição le, lema 'an (270x) e pode ou não ser acompanhado de 'aser (p. ex., sem 'aser, Êx 4.5; ISm 15.15; com 'aser, Gn 18.19; Dt 27.3; Js 3.4). lema'an pode reger um vb. finito (Êx 4.55) ou uma construção infini tiva (ISm 15.15; Jr 27.15) em orações finais, e Brongers sugeriu que lem a ‘an também pode introduzir uma oração de resultado, e citou Levítico 20.3; 2 Reis 22.17 e Amós 2.7 (Brongers, “Die Partikel in der biblisch-hebraischen Sprache”, 84-96). Semelhantemente, ba'abúr (50x) ocorre com ou sem 'aser (Gn 27.10; SI 105.45). Orações finais negativas podem ser in troduzidas por ’a ser lõ (Gn II .7), pen (Jz 9.54), lebilti (Êx 20.20) ou lema ‘an lõ ’ (SI 119.11), enquanto orações de resultado negativo podem empregar 'aser lõ ’ (2Rs 9.37) ou uma oração infinitiva depois de min (Êx 14.5). Muitas vezes, orações comparativas são introduzidas por partículas, especialmente por ka ’aser. A seqüência mais comum em orações comparativas é que a prótase seja introduzida por ka ’aser e a apódose por kên (p. ex., “Como [ka'aser] o leão e o cachorro do leão rugem... assim (kên) o Senhor dos Exércitos, descerá para pelejar”, Is 31.4). 1034
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G. Preposições O estudo das preposições heb. apresenta certas dificuldades óbvias, sendo uma delas o número enorme de textos em questão. Até mesmo as cinco preposições mais freqüentes ( 'el [# 448]; be [# 928], le [# 4200], min [# 4946] e "al II [# 6584]) ocorTem, em seu total, c. 54.000 vezes (para uma relação mais completa do número de ocorrências de preposições, ver Waltke e 0 ’Connor, ÍBHS, 192, n. 16). Faremos alguns comentários de natureza geral, tratando espe cialmente de problemas referentes ao estudo das preposições e, na seqüência, consideraremos algumas preposições em particular. Apesar de ser possível encontrar-se a origem de certas prep. em radicais heb. conheci dos, em vários casos não há como fazê-lo. Trata-se de algo que pode ser uma vantagem, uma vez que os léxicos tendem a depender demais do significado do radical e, desse modo, conferir peso excessivo à origem de uma palavra em vez de ater-se ao uso variado dela no texto bíblico (cf. o verbete b em CHALOT, 32a: “significado básico local e instrumental, em, dentro de, no, naí'). Uma vez que um significado básico é atribuído a uma preposição, será sempre difícil explicar formas de uso que não se encaixam nesse suposto significado radical. Assim, dá-se precedência à etimologia no lugar da gramática sintática, e as preposições são tratadas de ma neira isolada em vez de serem vistas como parte de um conjunto que consiste de preposição mais subs. ou vb. mais preposição (mais substantivo). Deve-se levar em consideração ainda que uma abordagem diacrônica também já foi empregada. Pode-se ter a impressão de que as preposições heb. mais antigas possuíssem uma gama de significados muito maior que no heb. recente. No caso de b, por exemplo, as evidên cias indicam que essa preposição possuía uma esfera semântica mais ampla no heb. antigo, inclusive os significados denotados em nossas preposições “em” e “de”. Com a introdução de mn no heb., b passou a ser cada vez menos usada como “de”, ainda que o caráter paralelístico da poesia bíblica tenha permitido que, durante um bom tempo, b mantivesse uma parte de sua esfera mais completa de significado. O ugar. não possui mn e, portanto, é impossível que o uso preposicional no ugar. e no heb. tivesse sido o mesmo. A maioria das preposições possui uma ampla esfera semântica e não há duas preposi ções que tenham a mesma esfera de abrangência. Na verdade, ocorre da esfera semântica de diferentes preposições apresentar certos pontos de interseção, de modo que são intercambiáveis somente em contextos extremamente restritos. Apesar de duas preposições heb. ocorrerem com o mesmo vb. em expressões sinônimas (p. ex., íth, b, sth mn), isso não significa que tais preposições possam ser intercambiadas com outros verbos. A falácia metodológica pode ser ilustrada pelo uso de “sobre” e “por” em nossa língua. Trata-se de preposições praticamente sinônimas no caso de verbos como “julgar” e “chorar” (“julgou-o sobre/por seus atos”, “chorou sobre/por seu erro”), mas que não são intercambiáveis quando usadas com vbs. como “falar” ou "pensar”. Ainda há outros fatores que devem ser observados. A junção de vbs. e preposições e a questão do aspecto são particularmente de grande relevância. Várias junções de vbs./preposições são bastante fixas, apesar de variações à norma poderem muito bem ser de origem esti lística (cf. p. ex., bth b, b(h ‘al, b(h 'el). Certos intercâmbios de preposições em paralelismos, especialmente a ocorrência de b e mn (p. ex., ver 2Sm 2.31; 22.16; Jó 7.14; SI 148.1; Is 7.4; 28.7; Ez 27.18), também podem ser atribuídos a variações estilísticas. E preciso levar-se em consideração ainda o fato de que os interlocutores heb. talvez tivessem um sistema de orienta ção diferente do nosso e a forma de usarem as preposições reflete essa diferença. A distinção em termos de aspecto toma-se objeto da atenção quando considerada a partir de um ponto de vista interidiomático. Assim, com relação às expressões para beber quando é especificado um 1035
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recipiente, tanto o português quanto o inglês usam uma preposição que denota “de” (beber da xícara, drinkfrom the cup), enquanto no francês diz-se “na xícara” (dans la tasse). Com refe rencia a esse tipo de expressão, o ugar. e o heb. têm expressões idiomáticas semelhantes, que aliás são mais próximas da forma de expressão do francês do que do português ou do inglês (ugar. sty b, heb. sth b). Vários outros fatores exercem influência sobre o estudo do uso das preposições. O in tercâmbio das preposições W, 'al e le pode, por vezes, ser feito com base em fatores fonológicos, uma vez que os sons guturais perderam sua pronúncia clara no período do massoretas (cf. o uso intercambiável de le ’ / ’el / 'al na Crônica Samaritana II, J. Mcdonald, The Samaritan Chronicle II, 212-13), enquanto o intercâmbio de b e m, em alguns casos, pode ser devido a uma permuta bastante comum de consoantes bilabiais. Foi proposto também que variações dia léticas têm efeito sobre o intercâmbio preposicional, mas, para se provar essa hipótese, seria necessário encontrarem-se exemplos, num determinado livro do AT, cuja proveniência fosse inequivocamente determinada e contrastá-los com outras partes do AT. Uma explicação orto gráfica das variações, especialmente aquelas que se encontram nas passagens sinóticas, deve ser tratada com cautela. A confusão entre letras como “è” e “m" e “6” e “k" só é concebível quando o texto paleo-hebraico encontrava-se em uso e a coerência geral entre os manuscritos de Qumran e o TM com referência às preposições indica a necessidade de cautela quanto a isso. Apesar de a preposição normalmente ser repetida quando rege vários objetos, costumam ocorrer ambigüidades em função da ausência dessa repetição (ver IBHS. 222-23). Estudos comparativos do sem. do Noroeste ajudaram a esclarecer certos aspectos do emprego preposicional hebraico. O fato de ter havido dificuldades para se traduzirem diversas preposições heb. é demonstrado pelos verbetes dos léxicos mais antigos. A mudança em tempos recentes pode ser vista, por exemplo, no verbete b do HALAT, 101, que apresenta uma lista de passagens para as quais foi atribuído um significado ablativo para b, apesar de ser estranho que todas essas passagens sejam de textos em prosa. A maioria dessas passagens é problemática, apesar de exemplos de textos poéticos como Salmos 18.13 [ I4J; 141.4; Provérbios 9.5; Oséias 7.14 serem mais convincentes. Semelhantemente, apesar de ter sido negada muitas vezes a existência de um k asseverativo ou kap verítatis (cf. BDB, 454a; GKC, 376), passagens como Números 11.1; Neemias 7.2; Salmo 122.3; Lamentações 1.20; Obadias 11 mostram que o k asseverativo era usado com subs. e orações na BH; não há exemplo algum, porém, de seu uso como prefixo de um verbo. Também são citadas evidências do ugar. em apoio a um uso de 1no ablativo, e passagens como 2 Samuel 15.19; Jó 15.20; Salmos 40.10 [11]; 68.21 [20] servem como exemplos disso. Apesar de a existência de um lãmed ter sido afirmada há muito mais tempo por Haupt e Eitan. estudos do ugar. deram novo ímpeto à discussão com relação a essa forma de uso. Muraoka (123) continua cético quanto a passagens que são citadas, apesar de deixar em aberto a possibilidade de que o lãmed enfático possa ser colocado como prefixo em formas verbais finitas (Rt 2.13; Jó 8.12; 14.16; 23.17; 33.14; Jr 4.27; 5.10, 18) ou como prefixo para o sujeito ou predicado de uma oração nominal (SI 89.18 [ 19]; Lm 4.3). Waltke e 0'C onnor são mais positivos em sua avaliação (IBHS, 211), como também o é Williams, o qual observa que se trata de um uso arcaico da preposição limitado à poesia (50-51). A distinção do lãmed enfático da preposição ainda é motivo de controvérsia, apesar de ficar claro que os massoretas não faziam tal distinção entre eles. A questão de o heb. também ter um lãmed vocativo é ou tro ponto de discussão (para uma avaliação negativa, ver P. D. Miller, “Vocative Lamed in the Psalter", Ugarit-Forschungeng 11, 1979, 617-37; cf. porém, M. Dahood, “Vocative Lamedh in I Kings 19, 10.14", 407-8; “Vocative Lamedh in Psalm 78, 49”, 262-63). 1036
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Há muito tempo, os léxicos heb. reconhecem que mn possui uma esfera semântica que abrange os conceitos de “sobre/em” e “dentro de/em” (cf. o uso de mn com expressões que de notam os pontos cardeais: mqdm, mmzrh, no Leste; mym, no Oeste; mspwn, no Norte; mngb, no Sul). O locativo mn pode dar ainda a impressão de estar presente em 2 Samuel 13.34; 2 Crônicas 15.8; Salmos 28.7; 137.3; Provérbios 20.4. É possível ainda que em ocasiões raras, 'al também tenha um significado ablativo no heb., como acontece no ugar. e no fenício. Passa gens nas quais esse uso é mais provável encontram-se em Jó 29.7; 30.2; Salmos 4.6[7]; 81.5[6]; Provérbios 25.22; Daniel 2.1. O estudo do uso das preposições tem uma longa história. Fica claro que os massoretas estavam conscientes dos problemas gerados pela forma como certas preposições eram empre gadas, o que se reflete na versão Q de várias passagens (para uma lista de exemplos, ver R. Gordis, 143-44; A. Sperber, 283). Da mesma forma, dentre as anotações chamadas de Sebirin, há um número considerável de observações relacionadas ao uso de preposições (ver C. D. Ginsburg, 187-96). Quando os estudiosos judeus medievais passaram a produzir obras grama ticais e lexicais proveitosas, começaram a comentar em mais detalhes o uso das preposições. No século X, Saadia observou o intercâmbio de preposições, como também o fez Ibn Janah no século seguinte; o contemporâneo deste, o estudioso e comentarista franco-judeu Rashi, procurou em seus comentários apresentar uma base mais sólida para a explicação exegética ao acrescentar notas gramaticais e filológicas. Em vários lugares, chamou a atenção para a ampla esfera de significado de certas preposições (para mais detalhes, ver J. Pereira-Mendoza, Rashi as Philologist, 36-38). As obras posteriores de Ibn Ezra (século XII) e David Kimhi (séculos XII-XIII) desenvolveram a obra antiga de Saadia, mas deram elas exemplos adicionais espe cialmente do intercâmbio de preposições. O estudo recente do sem. do Noroeste deu novo estímulo para se reexaminarem as pre posições heb., apesar de os resultados obtidos de uma investigação das preposições ugar. não poderem ser impostos sobre o hebraico. É preciso dar-se menos importância à etimologia da preposição e maior importância à definição das nuanças preposicionais em seus contextos no AT. Uma análise mais detalhada das preposições pode levar a um exame das variações e equivalências estilísticas de certas preposições dentro de determinadas construções. Além disso, é necessário estudar-se a ausência de preposições não apenas na poesia, mas também em constru ções prosaicas, nas quais esperar-se-ia que preposições estivessem presentes. Numa outra área, F. I. Anderson mostrou como uma combinação da lingüística moderna com o estudo sistemático das formas de uso heb. pode levar a resultados significativos. Estudos futuros, tanto de partículas quanto de preposições, não podem redundar em outra coisa senão numa melhor compreensão da sintaxe heb. com resultados satisfatórios tanto para tradutores quanto para exegetas. B ib l io g r a f ia
F. I. Andersen, The Hebrew Verbless Clause in the Pentateuch, 1970; D. W. Baker, “Further Examples of the Waw Explicativum", VT 30, 1980, 129-36; J. Blau, “Zum Angeblichen Gebrauch vonJIN vor dem Nomativ”, VT4, 1954,7-19; J. Bright, “The Apodictie Prohibition: Some Observations”, JBL 92, 1973, 185-204; H. A. Brongers, “Altemative Interpretationen des sogennanten Waw copulativum”, ZA W 90, 1978, 273-77; idem, “Die Partikel IVD1? in der biblisch-hebrãischen Sprache”, OTS 18, 1973, 84-96; idem, “Some Remarks on the Biblical Particle hal õ " \ OTS 21, 1981, 177-89; M. L. Brown, “‘Is It Not?’ or ‘Indeed’”, Maarav 4, 1987, 201-19; J. Carmingnac, “L’emploi de la negation | ’X dans la Bible et à Qumrân”, RevQ 8, 1974, 407-13; W. T. Claassen, “Speaker-Orientated Functions of ki in Biblical Hebrew”, JNSL 11, 1983, 29-46; R. J. Clifford, “The Use o f hôy in the Prophets”, CBQ 28, 1966, 4581037
Partículas
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Páscoa
AT A palavra heb. pesah (nOB -> #7 1 7 5 ) ocorre em várias orações para descrever a festa que teve início da ocasião do êxodo de Israel do Egito. E chamada de “Páscoa do Senhor” {pesah [hú ’] layhwh) em Êxodo 12.11, 27; Levítico 23.5 e Números 28.16 da mesma forma como são descritas ou tras ordenações (p. ex., o sábado [Êx 16.25]; o ano sabático [Êx 23.10; Lv 25.2-7]; o voto nazireu [Nm 6.2, 5, 12]). Faz-se referência ainda ao “sacrifício da Páscoa” (zebah-pesah, Êx 12.27) e ao “sacrifício da Festa de Páscoa” (zebah hag happasah, Êx 34.25). A palavra pesah ocorre sempre no sing. exceto em 2 Crônicas 30.17, em que é encontrado o pl. pesãhim, que denota os cordeiros do sacrifício propriamente ditos e não a festa em geral (cf. também em 2Cr 35.7-9). Vários vbs. diferentes são usados com pesah, como zbh (sacrificar, Dt 16.2), ‘sh (rea lizar, celebrar, Nm 9.2), shí (imolar, 2Cr 35.6) e 'kl (comer, 30.18). 1. A etimologia da palavra é incerta. O vb. psh ocorre apenas 7x no AT (-> # 7174). Três delas, em contextos não relacionados à Páscoa e, neles, denota claramente dançar, coxear ou ficar aleijado (2Sm 4.4; 1Rs 18.21,26). As outras, em Êxodo 12.13,23,27 e em Isaías 31.5, não se encaixam imediatamente nessa idéia (cf., porém, CHALOT, 294). O uso em Isaías 31.5, em que é par. a vbs. com o sentido de “proteger” ou “defender”, sugere um significado semelhante ao de Êxodo 12. Há outras sugestões como os radicais acad., assir. e ár., mas elas se sustentam em bases frágeis e a probabilidade de ter ocorrido um empréstimo do termo dessas línguas é muito pequena (para uma análise das diferentes concepções, ver Segai, 95-101). A explicação preferida ainda é que em Êxodo 12 o termo signifique que Deus “saltou” ou “passou por cima” das casas dos israelitas quando executou o julgamento contra os egípcios. 2. A legislação relacionada à Páscoa encontra-se em Êxodo 12.1-28, 43-49; 13.3-10; 23.15; Levítico 23.5-8; Números 28.16-25; Deuteronômio 16.1-8. É postulada muitas vezes uma relação entre a Páscoa e a festa que os israelitas pediram permissão a Faraó para come morarem (Êx 5.1; 8.1,27; 10.9), mas não há nenhuma evidência que corrobore essa conjectura. É possível que festas religiosas, inclusive aquelas que envolviam peregrinações, já fizessem parte da vida religiosa antes do êxodo. A explicação mais detalhada da Páscoa está em Êxodo 12.1 — 13.10, que apresenta a instrução divina a Moisés (12.1 -20,43-51), seguida da transmis são das leis por Moisés aos anciãos (12.21-27; 13.3-10) e contém uma breve observação sobre o cumprimento das instruções do Senhor (12.28). Fica claro que se tinha em vista uma festa principal compreendendo a Páscoa e a Festa dos Pães Asmos, as quais, apesar de serem duas festas separadas, eram comemoradas em seqüência. A Páscoa era celebrada no crepúsculo do dia 14 do mês de abib (posteriormente chamado de nisan) e a Festa dos Pães Asmos acontecia ao longo dos sete dias seguintes (do dia 15 ao 21 de abib). Os termos do AT para essas duas festas hag hamma$$ôt (Êx 34.18) e hag happãsah (Êx 34.25) também são usados por Josefo (“a festa dos pães asmos... que chamamos dc Páscoa”, Josefo, Ant. 14.2.1) e nos Evangelhos Sinópticos (Mt 26.2, 17; Mc 14.1; Lc 2.41; 22.1). A Páscoa era inicialmente uma festa doméstica. Um cordeiro ou cabrito sem defeito era escolhido quatro dias antes da cerimônia e imolado no crepúsculo (heb. “entre as noi tes”; cf. Dt 16.6, “ao Pôr-do-sol” ) do 144 dia do mês. Durante a combinação de festas da Páscoa e Pães Asmos, não era permitido usar fermento algum (cf. 16.3), nem tê-lo em casa. O sangue do animal era aspergido nas ombreiras e na verga da porta, prática esta que, sem dúvida, foi omitida quando, subseqüentemente, a Páscoa passou a ser celebrada no santuá rio central e, ao que parece, substituída pela aspersão de sangue no altar (cf. 2Cr 35.11). O animal inteiro devia ser comido naquela noite juntamente com pão asmo (m a^ôt) e ervas amargas (merõrim), sendo que os participantes deviam fazer a refeição como se estivessem prontos para uma jornada. Nenhum osso do animal devia ser quebrado e aquilo que sobrasse Páscoa
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Páscoa
para a manhã seguinte devia ser queimado. A primeira Páscoa foi celebrada em pé, com os participantes prontos para partirem às pressas do Egito, mas não é dada nenhuma prescrição sobre a postura deles em referências posteriores. Toda a comunidade israelita participava, e os estrangeiros e escravos só tinham permissão de tomar parte caso tivessem sido circuncidados (Êx 12.43,48). A legislação posterior adaptou os requisitos em alguns aspectos. Levítico 23.11 leva em consideração o futuro assentamento na terra de Canaã ao estipular a cerimônia de apresen tação do primeiro molho de cereal ceifado na época da Páscoa. Também foi convenicionado que aqueles que não pudessem participar no tempo determinado (por motivo de ausência ou impureza ritual) deviam celebrar um mês depois (Nm 9.9-13). Apesar de nâo ser tão detalhada quanto Êxodo 12— 13, a legislação deut. alterava os procedimentos de várias maneiras; tinha em mente a celebração num santuário central ("no lugar que o Senhor escolher para ali fazer habitar o seu nome”, Dt 16.2), de modo que a festa ressaltasse o fato de Israel haver se tomado uma única nação ou uma grande família diante de Deus. A estipulação com referência ao tipo de animal permitido também dá a impressão de ter sido ampliada, sendo permitido qualquer animal do rebanho ou do gado (16.2). É possível que se tratasse de uma concessão que levava em conta as duas tribos e meia da Transjordânia que já estavam de posse dos seus territórios e eram ricas em rebanhos de gado (cf. 3.19). 3. Há somente evidências fragmentárias relacionadas à observância da Páscoa depois da entrada de Israel em Canaã. Em Gilgal, foi realizado o ritual de circuncisão e os israelitas guardaram a Páscoa no I4S dia do primeiro mês (Js 5.10-11). Durante o reinado de Salomão, o rei oferecia holocaustos e ofertas pacíficas três vezes por ano (IRs 9.25), o que é explicado pelo cronista como sendo as três festas anuais ordenadas por Moisés: a Festa dos Pães Asmos, a Festa das Semanas e a Festa dos Tabemáculos (2Cr 8.13). Supõe-se que a Festa dos Pães Asmos abarcasse também a Páscoa. O cronista fornece ainda informações sobre três outras celebrações importantes da Pás coa. As duas primeiras ocorreram no tempo dos reavivamentos de Judá, durante os reinados de Ezequias e Josias e, nos dois relatos (2Cr 30.1-27; 35.1-19; cf. 2Rs 23.21-23), faz-se menção do caráter incomparável dessas comemorações. No caso da Páscoa de Ezequias, a data foi alterada para o segundo mês de acordo com Números 9.10-11 devido à falta de sacerdotes consagra dos e ao fato de o povo ainda não ter se reunido em Jerusalém. Depois do regresso do exílio, o povo celebrou a Páscoa após a consagração do templo, mostrando com isso a normalização das atividades do templo (Ed 6.19-22). É observado que essa celebração foi acompanhada de grande alegria, que também é característica da Páscoa de Ezequias (6.22; cf. 2Cr 30.21). Não há nenhuma referência explícita à Páscoa nos escritos dos Profetas, exceto pela descrição feita por Ezequiel de uma Páscoa no templo restaurado (Ez 45.21-24). Podem-se encontrar referên cias a festas nos textos dos profetas (Is 30.29; Os 2.11 [13]; 9.5; Am 5.21; 8.10), mas não há como ter certeza de que estas abarcavam a Páscoa. 4. O significado da Páscoa pode ser visto de várias maneiras. A primeira Páscoa foi realizada na expectativa de que Deus livraria seu povo da última praga, a morte do filho pri mogênito de todos os lares. Os israelitas evitaram esse perigo por meio do sacrifício pascal de sangue — um sacrifício de caráter substitutivo — e Deus livrou seu povo (observe-se o uso de nsl, hi. em Êx 12.27, como na promessa original de 6.6). O sangue foi aplicado nas ombreiras e verga das portas das casas e, nesse sentido, a Páscoa mostrou-se semelhante à oferta pelo pecado. Assim como todos os outros sacrifícios, tratava-se de um ato expiatório. O sangue (vida) de um animal sem nenhum defeito e, portanto, que supostamente não devia morrer, era derramado para que outra vida sob julgamento fosse poupada. Por intermédio do sangue, os 1040
Páscoa
beneficiados eram redimidos não apenas do pecado, mas também para serem a propriedade peculiar de Deus. Celebrações anuais subseqüentes tinham por objetivo levar os participantes a lem brar do acontecimento histórico por meio do qual haviam sido libertados da escravidão no Egito. Os elementos da observância reforçavam o significado total da cerimônia e a lem brança do contexto histórico. O uso dos pães asmos (chamados em Dt 16.3 de “pão da afli ção”), por exemplo, significava a separação de toda corrupção natural e também a pressa em partir do Egito, enquanto o uso das ervas amargas denotava a amargura da escravidão. O ritual incorporou um aspecto didático, de modo que a cada Páscoa a história da redenção era repetida, chamando a atenção para o fato de Deus haver poupado as casas dos israelitas quando atacou os egípcios e explicando que cada filho primogênito devia ser redimido (Êx 12.25-27; 13.14-15). O interrogatório ritual levou ao termo Haggadah (lit. explicar, contar), que bem mais tar de tomou-se um termo usado para o livro que explica o significado da Páscoa. O caráter festivo da Páscoa era importante. Diferentemente das ofertas pelo pecado, a Páscoa era uma celebração comunitária e não individual, o que, juntamente com o fato de ser consumida, a aproxima em caráter das ofertas pacíficas. Assim como as outras ofertas pacíficas, era sinal de comunhão com Deus na aliança. É provável que a relevância da Páscoa para seus participantes dependesse de ensinamentos sacerdotais e proféticos, juntamente com a imperfeição intrínseca do sacrifício propriamente dito, estando, desse modo, voltada para um cumprimento escatológico. P-B Quando a LXX foi traduzida, os judeus já estavam acostumados a chamar a Páscoa pelo nome aram. dela, pishã ", termo este que foi usado na LXX para traduzirpesah, mas em 2 Crônicas e Jeremias 31.8 é empregado o termo phasek. No período intertestamental e no tempo do NT ocorreram mudanças significativas na observância da Páscoa, especialmente depois da destruição do segundo templo. O estudo da Mix. sobre Pesahim contém a codifi cação dessas alterações. Festas e festivais: bikkíirím (primeiros frutos ou primícias, # 1137); hag (procissão, dança em círculo, festival, festa, # 2504); -> hanukkâ (consagração, Festa da Consagração, # 2853); mô 'èd (tempo determinado, # 4595); -> massôt (Festa dos Pães Asmos, # 5174a); marzêah (banquete cultuai, refeição fúnebre, # 5301); -> sukkôt (Festa dos Tabemáculos, # 6109a); -> ‘a$ãrci (assembléia festiva, # 6809); -> piirtm (festival de Purim, #7052a); -> pe sah (Festa ou sacrifício da Páscoa, #7175 [-> Páscoa: Teologia]); -> rõ s hõdes (festival da lua nova, #8031 a); rõ s hassanâ (começo do ano, # 8031 b); sahu ’ôt (Festa das Semanas, #8651 a); -> sabbãt (sábado, # 8701 [-> Sábado: Teologia]) B ib l io g r a f ia
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# 7606 (sippôr I, pássaros) 1041
Páscoa
Passo
#7193 (pa ‘atn, pé, passo)
Pasto -> # 8286 ( r ‘h 1, alimentar, pastar, pastorear, governar) Pátio -> # 2958 (hãçêr, recinto cercado, pátio, assentamento, vila) Patriarcas antediluvianos -> Caim e Sete Pau -> # 8657 (sêbet, tribo, pau, bastão, arma, cetro) Pavor Paz
# 8547 (i r 1, estar atemorizado, aterrorizado, arrepiar-se de pavor) # 8934 (sãlôm, paz, prosperidade, saúde, salvação)
Pé -> # 8079 (regei, pé) Pecado -> # 2627 (Af ’, pecar, apresentar uma oferta pelo pecado, purificar) Pedra -> # 74 ( ’eòe«, pedra, rocha) Peito
# 8716 (sad, peito)
Pele -> # 6425 ( ‘ór, pele, couro cru) Penalidade -> # 6740 ( Vis, impor uma penalidade, pena, taxação) Penetração -> # 5737 (n/i/, marchar, penetrar, assentar) Penhor -> # 6292 ( ‘bt, tomar emprestado, tomar um penhor) Penumbra
# 7513 (selem II, lugar sombreado, sombra)
Pequenez -> # 7837 (qll, ser pequeno, veloz, parecer insignificante) Perambular Percepção
# 9494 (/'/», perder-se) # 2600 (hzh, ver, perceber, contemplar)
Percurso -> # 2 1 4 3 (hlk, ir, andar, comportar-se, partir) Perdão
# 6142 (s//i, absolver, perdoar)
Perenidade Perfeição
# 419 (
I, corrente perene de água, permanente, duradouro)
# 9462 (ftnw, ser/estar sem defeito, inteiro)
Perfuração -> # 5918 (nqb, trespassar, perfurar, distinguir, amaldiçoar) 1042
Período Intertestamental
Pergunta
# 8626 (i 7, perguntar, inquirir, requisitar)
Perigo -> # 6 122 {skn 1, ser útil, expor-se ao perigo)
O período intertestamental compreende cerca de 450 anos, desde o tempo da volta para a Palestina até a des truição do templo em 70 d. C. A teologia desse tempo é a contribuição singular de sábios e profetas profundamente religiosos que procuraram compreender o AT à luz de seu próprio tem po — um período que testemunhou a dominação persa, grega e romana — e lutaram para re sistir a essas culturas estrangeiras. As respostas dos judeus a essas novas influências foram variadas, indo desde o abandono consciente da lei em favor do helenismo até a resistência ar mada a qualquer mudança. Entre esses dois extremos, houve exemplos como Filo de Alexan dria, que procurou confiar suas tradições aos colegas doutos de Alexandria ao explicar a lei em termos alegóricos de modo a demonstrar o conteúdo filosófico superior dela. Outros, talvez de modo subconsciente, foram influenciados em diferentes graus pelas teologias persas e gregas e usaram elementos destas que se mostravam análogos às próprias tradições deles. A luta contínua para preservar as crenças judaicas bem como sua identidade nacional (uma vez que as duas encontravam-se inextrincavelmente associadas) resultou numa produção literária considerável. Mais de oitenta livros ou trechos de livros sobreviveram — sem contar os que foram produzidos pelos essênios — e muitos deles adquiriram um desenvolvimento li terário e teológico amplamente difundido. Essa literatura é chamada de modo geral e um tanto vago de pseudepigráfica e contém gêneros como o de sabedoria, o apocalíptico, o histórico, as orações litúrgicas e cânticos, as histórias de edificação, etc. Os autores desses livros exor tavam seus companheiros judeus a permanecerem fiéis a Deus e sua lei, diante da certeza de vindicação futura. Os livros de sabedoria e os apocalípticos são particularmente interessantes, pois seus autores interpretam os sábios e profetas do AT e são seus sucessores. A fim de garantir que teriam leitores, os autores intertestamentais muitas vezes escreviam com um pseudônimo, usando nomes de figuras respeitadas do AT como Enoque, Abraão ou Moisés. Além disso, buscavam, por meio de declarações, segundo as quais haviam recebido uma revelação divi na, uma autoridade semelhante àquela dos livros canônicos que interpretavam. Na literatura de sabedoria são revelados os segredos da lei, conferindo aos discípulos fiéis a compreensão mais elevada possível da natureza e da experiência humana. E, por meio de “revelações” em sonhos e visões, os profetas de Israel escreviam sobre os segredos do passado e do pre sente e também sobre lugares e seres espirituais. A seguir descreveremos em mais detalhes o conteúdo dessas teologias. Período Intertestamental
A. Teologia de sabedoria 1. Antigo Testamento. Recebedor das dádivas de Deus, foi Salomão quem iniciou a sa doria em Israel e, possivelmente, conferiu-lhe sua mais elevada forma dc expressão (1 Rs 4.2934 [5.9-14]). Otimismo e pessimismo coexistem em livros como Jó, Provérbios e Eclesiastes; e a vida madura pode ser alcançada pela reflexão sobre a natureza, a existência humana e os princípios divinos que governam o mundo. No entanto, são poucos os que fazem da sabedoria seu maior objetivo, e mesmo aqueles que a buscam com fervor, nunca são capazes de com preender plenamente a sabedoria de Deus revelada na natureza. Ainda assim, tomando como partida o temor do Senhor, por meio da integridade moral, diligência e evitando a companhia 1043
Período Intertestamental
dos perversos, podem-se desfrutar das bênçãos de uma vida longa e o contentamento que a sabedoria concede aos seus apreciadores. 2. Período intertestamental. A sabedoria era exaltada no judaísmo intertestamental. Ainda um atributo de Deus, por vezes por meio da personificação, a sabedoria é, em certos aspectos, um ser igual a Deus. Como sopro de Deus (Sab 7.25), a sabedoria instrui a humanidade (7.722). Estava presente na criação (9.9) e agora governa o mundo (8.1). Por meio de todas essas funções, a sabedoria, em essência, representa a presença de Deus no mundo (1.7). Além disso, a verdadeira sabedoria é uma dádiva especial de Deus (Ecli 1.26). O estudo da natureza e da experiência humana não é mais suficiente. A sabedoria deve instruir a mente, assim como, no passado, o Espírito instruiu os profetas. Só então a mente é capaz de compreen der os segredos divinos contidos na lei (Ecli 24.25-33; 39.6; cf. Bar 3.35-37). Ao restringir a disponibi lidade da sabedoria e ao localizar sua expressão mais elevada na lei, essa teologia exalta não apenas a sabedoria, mas também Israel como o povo de Deus que recebeu a sabedoria dele em tamanha abundância como nenhuma outra nação (Ecli 24.6-12). Enquanto no passado a sabedoria era igualada ao temor do Senhor, agora passa a conter também o cumprimento da lei, a herança particular de Israel. Desse modo, o judaísmo procurou recu perar e guardar seus seguidores da influência do helenismo e da importância que o helenismo dava à sabedoria por meio da filosofia. Assim, a literatura de sabedoria representou o começo da apologia judaica. Por intermédio de seus líderes extraordinários e sua história singular de bênçãos divinas e livramento, a literatura de Israel é elevada a uma posição de preeminência entre todas as nações (Sab 10.15-21; 19.22; Ecli 24.23; 44.1— 50.24). Em suma, a lei é o depósito da sabedoria de Deus e, por meio do sopro/sabedoria de Deus, ela instrui Israel no significado e aplicação que essa lei tem em relação à vida como um todo. Rejeitar a lei é rejeitar a Deus e, assim, voltar-se para a insensatez e a idolatria. Apropriandose explicitamente dessa sabedoria, os livros intertestamentais de sabedoria tanto defendiam a cultura judaica quanto recebiam a autoridade necessária para falar em nome de Deus. 3. Movo Testamento. As tradições do evangelho indicam que Jesus usou a teologia de sabedoria para descrever a si mesmo e ao seu ministério e que a igreja primitiva preservou e usou algumas das palavras de Jesus. Mateus, em especial, apresenta Jesus como um mestre da sabedoria que revelou a Israel o significado da lei baseada na retidão interior e não na observân cia exterior. Ele estrutura várias das declarações de Jesus em cinco grandes blocos que fazem lembrar o Pentateuco. As palavras de Jesus têm mais autoridade até mesmo do que a lei (Mt 5.21-22, 27-28; etc.) e, no final do sermão do monte (uma nova “lei”?), aqueles que ouvem e obedecem são considerados sábios (7.24-27). Por outro lado, rejeitar Jesus é rejeitar a sabedoria de Deus. Tanto João quanto Jesus são mensageiros da sabedoria e, ainda que tenham sido rejeitados, “a sabedoria é justificada por suas obras” (Mt 11.16-19/ Lc 7.31-35). Jesus chega a falar como sabedoria, clamando em alta voz (como em Ecli 5 1.23-27), oferecendo descanso a qualquer um que o seguir (Mt 11.28-30). Jesus é ainda maior do que Salomão, a epítome de sabedoria na história e folclore judaicos (Mt 12.42), e, como sabedoria, ele profetiza o julgamento vindouro sobre Israel pelo povo haver rejeitado todos os seus mensageiros de sabedoria (Mt 23.34-35 / Lc 11.49). A medida que a fé se espalhou entre os gentios, esse material do evangelho, cujo sig nificado pleno era derivado da teologia de sabedoria judaica, passou, compreensivelmente, a desempenhar um papel limitado no restante do NT. É verdade que Paulo usou uma forma res trita da tradição de “Jesus como sabedoria” em seus escritos às igrejas de Corinto (1 Co 1.1825; 2.4-5). Assim como no judaísmo posterior, Paulo ainda considera a sabedoria uma dádiva 1044
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de Deus (2.13), mas agora, a sabedoria reside em Cristo e não na lei (1.24). (Para um estudo mais completo da sabedoria no NT, -> Apócrifos.)
B. Teologia apocalíptica A literatura apocalíptica também se desenvolveu consideravelmente no período inter testamental e exerceu uma influência profunda sobre a teologia cristã. Escritos por autores pseudônimos, mas que eram verdadeiros intérpretes e sucessores dos profetas, livros como 4 Esdras e 1 Enoque afirmavam divulgar segredos divinos revelados por sonhos e visões a pessoas notáveis do AT. Os temas que se mostram mais característicos nessa literatura são a existência de seres e lugares de outro mundo, por vezes visitados pelo recebedor humano da revelação, tendo um anjo como guia e também a promessa de uma nova era por meio da intervenção de Deus. Nessa era, os perversos serão julgados e os justos receberão a devida recompensa. 1. Realidades de outro mundo. a. Seres de outro mundo. Sem dúvida os seres espirit e suas atividades estão presentes no AT, mas, pela primeira vez, encontramos uma verdadei ra riqueza de detalhes sobre eles na literatura apocalíptica. As hostes angelicais passam a ser organizadas numa hierarquia com líderes, classes e responsabilidades diversas. Alguns anjos guardam o trono de Deus, outros supervisionam processos naturais como a operação dos corpos celestes, das estações do ano, etc. e outros ainda servem como mensageiros de Deus. Anjos perversos também ocupam uma posição de destaque e ajudam a explicar a pre sença do mal na terra. Nos tempos antediluvianos, desceram à terra, casaram-se com mulheres e ensinaram inúmeros segredos da ciência e da magia para a humanidade despreparada, re sultando na corrupção moral e violência que se espalharam por toda a parte (lEn. 6— 8; Jub 5.1-6; 7.20-25; cf. Gn 6.1-4). Como castigo, Deus instruiu o arcanjo Miguel a amarrar esses anjos e prendê-los nas trevas até o dia do julgamento (lE n. 10.11-14; cf. Jd 6; 2Pe 2.4). Deus também castigou a humanidade por ter ela participado dessa perversidade ao permitir que os espíritos dos gigantes que nasceram daqueles casamentos antinaturais permanecessem na terra em vez de descerem ao reino dos mortos e que afligissem o povo até o fim dos tempos (lE n. 15.8— 16.1). Essa tradição é uma das explicações para a origem dos demônios, e talvez fique implícita em passagens como Mateus 8.29 e 12.43-45. Anjos perversos também exercem sua influência sobre a história como governantes espirituais de nações, mas, contrastando com eles, Miguel é encarregado de Israel, o povo de Deus. Em um determinado conflito, Gabriel se vê obrigado a travar uma batalha espiritual com o príncipe da Pérsia e, somente depois de 21 dias, quando Miguel interfere nessa luta, é que Gabriel consegue transmitir a mensagem de Deus a Daniel (Dn 10.12-13, 20-21). Uma boa parte dessa angelologia apresenta reflexos no NT, ainda que não com detalhes tão elaborados. Gabriel continua sendo o mensageiro de Deus, aquele que explica a Maria a importância do filho que ela dará à luz (Lc 1.26-38). Há hierarquias de anjos que ainda resistem a Deus (Ef 6.12; Cl 1.16), e demônios continuam afligindo a humanidade — chegando até à possessão (Lc 11.14-26), talvez numa imitação da encarnação. Satanás é seu líder incontestá vel (Lc 4.5-6), sendo importante observar-se que de todas as figuras messiânicas desse tempo, somente Jesus identificou Satanás, e não Roma, como sendo o verdadeiro inimigo de Deus. b. Lugares de outro mundo. a. Céu. Enquanto a LR fala de sete céus, a maioria livros bíblicos e apocalípticos parecem se referir à estrutura básica de três, correspondendo à atmosfera terrestre ou firmamento, ao espaço e à esfera dos anjos e do próprio Deus (Levi 2—3). Assim, Paulo é arrebatado a esse terceiro nível para receber revelações (2Co 12.2-4). Os retratos de Deus no céu ressaltam-lhe a majestade e poder por meio de descrições vividas do seu trono e do louvor incessante de inúmeros anjos que cercam e guardam o trono (lEn. 71; 1045
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Dn 7.9-10). Muitas vezes, o lugar de habitação de Deus é apresentado como um templo (cf. Hb 9.11-12, 23-24; Ap 11.19). ii. O mundo dos mortos. No AT, o Seol é descrito como um lugar escuro onde ficam representações tenebrosas ou sombras daqueles que um dia foram pessoas (Jó 10.20-22; Is 14.9). Enquanto os saduceus conservaram essa concepção da vida após a morte até o início do período intertestamental, nos meios apocalípticos, essa teologia se desenvolveu consideravel mente. Em tennos mais específicos, a personalidade ou alma mantém consciência plena depois da morte física. O Seol passa a ser um lugar de distinção moral, provido de compartimentos separados onde os justos já (antes do julgamento final) desfrutam a felicidade suprema e os perversos sofrem tormentos ( lE n. 22.9-13). Por fim, o Seol toma-se uma habitação temporária para as almas que partiram e não o lugar de descanso final, pois, no último julgamento, todos se apresentarão diante de Deus (4Ed. 4.42; cf. Ap 20.13). Normalmente, uma ressurreição fí sica faz parte dessa cena do fim dos tempos, uma crença que é apenas aludida no AT, mas que se mostra comum na teologia judaica posterior. Apesar de não ser canônica, ainda assim essa literatura é perpetuada no cânon, pois muitos de seus temas encontram-se no NT. O homem rico e Lázaro, em seus respectivos com partimentos, experimentam as conseqüências de sua vida aqui na terra (Lc 16.19-31). Diz-se que os anjos lascivos do tempo de Noé estão no Tártaro, a parte mais inferior do mundo dos mortos segundo a crença dos gregos (2Pe 2.4; Jd 6). A ressurreição física dos mortos é uma doutrina central da escatologia cristã. E, apesar das divergências acadêmicas, o NT sugere fortemente que, como parte de seu ato salvador, Jesus desceu ao Seol/Hades depois da morte, levando dali consigo os justos para o Paraíso (Mt 12.40; Lc 23.43; At 2.25-31; Ef4.8-10; lPe 3.18-20; Ap 1.18). 2. Expectativa. A expectativa de uma renovação física e espiritual de todas as coisa aparece pela primeira vez nos profetas do AT. No entanto, esse tema é praticamente a razão dc existir dos escritos apocalípticos e, neles, encontramos sua articulação mais fervorosa e detalhada. a. Controle divino sobre a história. A fé absoluta na soberania de Deus é o fundamento de todas as esperanças para o futuro. Por esse motivo, a literatura apocalíptica é sempre oti mista. Por mais desanimador que o presente pareça, Deus tem um plano predeterminado para 0 futuro que nenhum poder é capaz de frustrar. O mal existe apenas com a permissão de Deus e, no devido tempo, Deus removerá toda a corrupção da terra. Os apocalípticos são retratados muitas vezes como aqueles indivíduos que esperam um fim iminente da história, o que, na verdade, não é uma imagem precisa. Antes, a ênfase recai sobre as diversas eras ou períodos do plano divino para a terra e o lugar dos recipientes hu manos dentro desse esquema. De modo geral, o fim ainda encontra-se um tanto distante. Em 1 Enoque 91.12-17; 93.1-10, o plano de Deus é composto de dez semanas e ainda há três por vir. Outros esquemas envolvem sete eras, períodos de jubileus de 49 anos ou doze eras, como em 4 Esdras, em que duas eras e meia ainda estão por vir (14.10-12). b. Sinais do fim . A medida que a nova era se aproxima, os processos naturais começam a entrar em colapso e os últimos e desesperados esforços dos anjos perversos enchem a terra de grande perversidade, culminando num breve período de tribulações sem precedentes. Há diversos sinais que pressagiam o fim e que se encaixam em três categorias gerais: declínio na tural, social e espiritual. Fazem parte do declínio natural um aumento do número de catástrofes comuns, como terremotos, doenças e fome. o colapso dos processos naturais resulta em más colheitas e no mar lançando fora os peixes. Fazem parte também ocorrências incomuns como sangue vertendo de madeira, pedras falando e bebês deformados. O declínio social implica 1046
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uma perda da afeição natural no meio da humanidade, resultando em guerras, caos e confli tos familiares. Intimamente associado a esse colapso social, ocorrerá o desprezo da verdade e depravação moral excepcional. Para exemplos dessas três categorias, ver / Enoque 91.5-7; 4 Esdras 5.1-13; 6.17-24; 2 Bamque 27. Tudo isso leva a uma crise de proporções globais, uma intensificação do ataque das nações contra Israel (Ezequiel 38). O enfoque de Daniel apresenta de maneira mais nítida tan to esse tempo de aflição sem precedentes (Dn 12.1) quanto o indivíduo (Antíoco IV serve de modelo) que o instiga (7.23-27) e, desse modo, oferece um retrato clássico do inimigo escatológico de Deus, que no NT é chamado de “homem de iniqüidade” (2Ts 2.3), o anticristo (1 Jo 2.18) e a besta (Ap 13.1). c. A nova era. As descrições dessa crise são complexas e nem sempre coerentes, m os principais temas têm coesão. A nova era será resultante de uma intervenção sobrenatural e não da restauração do trono de Davi por meio de acontecimentos históricos normais. Com freqüência, mas nem sempre, o Messias é aquele por intermédio do qual Deus estabelece o seu reino. Uma variação interessante da crença messiânica pode ser encontrada em Qumran, uma comunidade escatológica que esperava pela vinda de dois messias, o messias tradicional de Judá e outro da tribo de Levi (1 QS 9:11). Em sua maior parte, porém, a teologia apocalíptica de Qumran é relativamente compatível com o que descrevemos aqui, ainda que seja interpre tada de modo a aplicar-se especificamente àquela comunidade, como a verdadeira Israel, ou aos inimigos dela. A resolução da crise dá início a uma nova era, em que o mal não é mais tolerado. Os anjos perversos e a humanidade são julgados e toda a criação é renovada, resultando em um aumento extraordinário da produtividade do solo e da longevidade dos homens (4Ed 6.25-28; 7.26-44; lEn. 100; 2Bar 29; 40; 73— 74). A presença desses temas na predição de Jesus toma-os ainda mais relevantes para o cristão, e mostra que não se pode ter uma compreensão plena de Jesus sem considerar-se a teo logia apocalíptica do AT e do período intertestamental. O declínio natural, social e espiritual encontra-se presente no discurso do Monte das Oliveiras (Marcos 13 e paralelos). Mas Jesus diminui o valor desses temas como sinais dos tempos ao afirmar que caracterizam esta era pre sente e perversa e que podem ocorrer em qualquer época. Os verdadeiros prognosticadores do fim são a grande tribulação e os sinais celestes subseqüentes (Mc 13.14-25). O próprio Jesus, como filho do homem e Messias, virá com anjos para reunir os seguidores dele e estabelecer o reino de Deus (Mc 13.26-27; cf. Ap 19.11-21). A igreja também considerou a teologia apocalíptica adequada para expressar sua visão do futuro, acrescentando vários detalhes importantes às predições de Cristo. O inimigo escatológico de Cristo será levantado por Satanás (2Ts 2.3-4, 9), uma idéia desenvolvida por João com uma paródia da Trindade envolvendo Satanás, a besta e o falso profeta (Ap 13). A volta de Cristo dá início ao Dia do Senhor, profetizado em Amós 5.18 (ITs 5.2) e constitui umaparousia, na qual a comitiva de Cristo e os anjos recebem na terra as boas-vindas de seus seguidores, que por sua vez são arrebatados para encontrar-se com ele (ITs 4.15-17). Assim, foi no NT que os escritores intertestamentais alcançaram um nível de influência maior do que esperavam e a igreja ainda exalta a Cristo como sabedoria de Deus e o aguarda como Filho do Homem, Messias e Rei apocalíptico. B ib l io g r a f ia
J. Blenkinsopp, Wisdom andLaw in the Old Testament, 1983; J. H. Charlesworth, ed., The Old Testament Pseudepigrapha, 2 vols., 1985; J. L. Crenshaw, Old Testament Wisdom, 1981; H. 1047
Pérsia
Koester, Introduction to the New Testament, vol. I, History, Culture and Religion o f the HellenisticAge, 1982; R. E. Murphy, The TreeofLife, 1990; D. S. Russell, The MethodandMessage ofjew ish Apocalyptic,, 1964; G. T. Sheppard, Wisdom as a Hermeneutical Constriict, 1980; J. Wood, Wisdom Literature, 1967. David G. Clark Perna
# 8079 (regei, pé, perna)
Perseguição
# 8103 (rdp, estar atrás de, ir no encalço de, perseguir)
Pérsia
Pérsia (D1S [pãras], # 7273).
1. Depois de sua entrada triunfal na Babilônia (->) em 539 a. C., o persa Ciro (->)ane xou de uma só vez todo o antigo império babilônio, inclusive Israel, aos domínios dele. Apesar de os dois séculos seguintes de governo persa terem passado por períodos de graves agitações internas e grandes conflitos com potências vizinhas, a dominação persa sobre a Palestina rara mente foi questionada. De fato, é bem provável que essa região tivesse, muitas vezes, recebido um tratamento favorável cm função da posição estratégica que ela tinha na fronteira com o Egi to, o qual foi conquistado por Cambises, sucessor de Ciro, mas que readquiriu a independência ao final do século XV, e que representou uma fonte contínua de problemas, tanto antes disso quanto em tempos subseqüentes. Mesmo que tal fato não seja mencionado nas fontes bíblicas que abrangem esse período, é possível relacionar quase todos os principais pontos críticos na história de Judá após o exílio com as questões internacionais mais amplas da parte do poder imperial (ver, por exemplo, Hoglund, Achaemenid). Apesar de os persas haverem adquirido uma reputação de conquistadores benevolentes e liberais, tais atitudes não devem ser atribu ídas a nenhum altruísmo da parte deles. As políticas de governo dos persas eram motivadas por interesses próprios tanto quanto às de seus antecessores e os persas podiam ser igualmente opressores e cruéis quando julgavam necessário. Inevitavelmente, a influência persa aflorou em diversas outras áreas além daquelas di retamente políticas e administrativas. Mesmo sendo culturalmente conservadora, a província de Judá atesta a influência gradual dos padrões persas na maioria dos tipos de restos materiais encontrados (cf. Stem, Material Culture). Em termos lingüísticos, várias palavras empresta das do persa antigo podem ser encontradas na BH, porém mais importante do que isso é que o aram., usado pelos persas como linguagem diplomática, foi adotado gradualmente pelos judeus como linguagem vernacular. Além de essa língua aparecer em selos e moedas, partes dos livros de Esdras e Daniel são escritas em aram. e a quantidade de aramaísmos aumenta notadamente no heb. desse período. A influência da religião persa, no entanto, é muito menos evidente. Apesar das afirmações de alguns estudiosos de que o zoroastrismo influenciou bastante as formas posteriores de judaísmo, essa opinião deixa espaço para questionamentos e certamente não pode ser comprovada com relação ao período persa em si. O máximo que se pode afirmar com certeza é que os judeus possivelmente se adaptaram às formas persas de expressão (como o título divino “o Deus do céu”) por motivos diplomáticos. Apesar de nosso conhecimento acerca dos acontecimentos em Judá ser irregular, trata-se de um período de importância crucial para o desenvolvimento dos Estados outrora soberanos de Israel e Judá no judaísmo dos séculos posteriores. Vários livros do AT se passam explici 1048
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tamente durante o domínio persa; outros certamente foram escritos nessa época; e é provável que vários outros, senão a maioria, chegaram à sua forma final nesse tempo. 2. Tendo-se em vista o período em questão, as variações na sorte da comunidade do p exílio e as diferenças na visão de mundo adotada por diversos grupos dentro da comunidade, não é surpreendente descobrir que o AT reflete uma atitude ambivalente para com os persas. Em primeiro lugar, o modo como eles trataram os judeus, autorizando a volta dos exilados na Babilônia para Jerusalém, a permissão e apoio material dos persas para a reconstrução do templo e também a nomeação subseqüente de líderes como Esdras (->) e Neemias (->) são fatos recebidos como atos da graça de Deus para com seu povo. O próprio Ciro é aclamado o messias de Deus em Isaías 45.1. Enquanto os governantes assírios e babilônios anteriores haviam sido considerados instrumentos de Deus e até mesmo “servos” dele ao executarem o julgamento sobre o reino pecador de Judá (p. ex., Is 10.5; Jr 25.9), não há precedentes de uma avaliação tão positiva de um governante estrangeiro. O decreto de Ciro, que desencadeou a volta do exílio, é atribuído claramente à inspiração de Deus (Ed 1.1), e a continuação das polí ticas de Ciro por Dario é vista sob a mesma ótica (6.14, 22). Posteriormente, Esdras bendiz ao Senhor pela bondade demonstrada para com ele, Esdras, por Artaxerxes (7.27-28) e descreve a relativa restauração desfrutada pela comunidade sob decreto do rei como uma expressão da misericórdia de Deus (Ed 9.9), ao passo que Neemias também percebe “a boa mão do meu Deus” por trás das atitudes desse mesmo rei para com ele, Neemias (Ne 2.8, 18). Estas e outras expressões semelhantes vão muito além daquilo que poderia ser considerado necessário por motivos diplomáticos da parte de administradores provinciais de segundo escalão, sujeitos ao que provavelmente parecia ser um poder imperial invencível. Tais palavras indicam uma teo logia mais ampla capaz de conter até a maior potência da qual se tinha conhecimento debaixo da soberania de Deus. Por outro lado, tanto nesses mesmos livros como em outros textos, algumas vozes ergueram-se num tom diferente (ver esp. McConville, 205-24). A confissão extraordinária de Neemias 9, em particular, termina com o lamento de que o povo continuava escravo em sua própria terra e que “seus abundantes produtos são para os reis que puseste sobre nós por causa dos nossos pecados; e, segundo a sua vontade, dominam sobre o nosso corpo e sobre o nosso gado; estamos em grande angústia” (Ne 9.36-37). Além disso, não se deve esquecer que várias passagens e livros proféticos posteriores, que costumam ser descritos como “proto-apocalípticos”, antevêem uma grande revolta na ordem mundial presente e o início do governo de Deus sobre a terra a partir de Jerusalém. Apesar de a Pérsia não ser mencionada explicitamente nes ses textos, fica claro que esses escritores estavam à espera de um tempo no qual Judá não seria mais um povo subserviente dentro de um império pagão do mundo. Por fim, qualquer ponto de vista que se tome quanto à historicidade do livro de Ester, não resta dúvida alguma de que o retrato do governante persa é satirizado, senão difamado, nes sa obra (cf. Clines, The Esther Seroll) e que Daniel 6 é semelhante nesse sentido. Apesar de se ter de buscar o propósito central dessas narrativas em outros aspectos delas mesmas, fica claro que, do seu ponto de vista, o império persa não é a última palavra de Deus para seu povo. Alguns estudiosos procuraram explicar essa atitude ambivalente como um reflexo de diferentes grupos sociais dentro da comunidade dos judeus, abordagem contra a qual foram levantados sérios questionamentos. Em termos teológicos, parece razoável colocar-se, ao mes mo tempo, a gratidão pelo fato de que “agora, por breve momento, se nos manifestou a graça da parte do Senhor, nosso Deus, para nos deixar alguns que escapem” (Ed 9.8) ao lado da ma nutenção de uma fé cheia de expectativa de que, a seu próprio tempo, Deus faria cumprir as grandes promessas guardadas e mantidas vivas nos escritos proféticos. 1049
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B ib l io g r a f ia
D. J. A. Clines, The Esther Scroll: The Story o f the Story, 1984; J. M. Cook, The Persian Empire, 1983; W. D. Davies e L. Kinkelstein (eds.), The Cambridge History ofJudaism, 1: Introduction; The Persian Period, 1984; R. N. Frye, The History o f Ancient Iran, 1984; I. Gershevitch (ed.), The Cambridge History o f Iran, 2: The Median and Achaemenian Periods, 1985; K. G. Hoglund, Achaemenid Imperial Administration in Syría-Palestine and the Missions o f Ezra andNehemiah, 1992; A. Kuhrt, “The Cyrus Cylinder and Achaemenid Imperial Policy”, JSOT 25, 1983, 83-97; J. G. McConville, “Ezra-Nehemiah and the Fulfilment o f Prophecy”, VT 36, 1986, 205-24; E. Stem, Material Culture o f the Land o f the Bible in the Persian Pe riod 538-332 B.C., 1982; G. Widengren, “The Persians”, in D. J. Wiseman (ed.), POTT, 1973, 312-57; idem, “The Persian Period”, in J. H. Hayes e J. M. Miller (eds.), IJH, 489-538; H. G. M. Williamson, “The Govemors of Judah under the Persians”, TynBul 29, 1988, 59-82; idem, “The Concept o f Israel in Transition”, in R. E. Clements (ed.), The World o f Ancient Israel, 1989, 141-61; idem, “Ezra and Nehemiah in the Light o f the Texts from Persepolis”, BBR 1, 1991, 41 -61; E. Yamauchi, Persia and the Bible, 1990. H. G. M. Williamson Perspiração
# 3299 (zê‘â, suor, perspiraçâo)
Perversidade -> # 8399 ( r i ', agir de modo perverso) Pesagem -> # 9202 (sql, pesar, pesar uma quantidade determinada, pagar) Pesca -> # 1899 (dyg, apanhar peixes) Pescoço -> # 7418 (sawwã V, pescoço) Picada -> # 1823 (deber II, picada) Piche -> # 2413 (zepet, piche) Pingo Piscadela
# 5752 (ntp, pingar, derramar) # 7975 (qrç, piscar, beliscar)
Pisoteamento -> # 8252 (rms, pisotear) Plano -> # 3619 (y ‘í, planejar, deliberação, conselho) Planta -> # 6912 ( ‘êseb, plantas verdes, grama) Plantação -> # 9278 (stl, plantar, transplantar) Plenitude -> # 4848 (m l’, estar cheio, encher, completar, cumprir, realizar) Pobreza -> # 36 ( ’ebyôn, pobre, necessitado) Poço -> # 931 (be ’êr I, poço) 1050
Pragas do Egito
Poda -> # 2377 (zmr II, podar) Poder -> # 3946 (írõa/i I, força, poder, posse, recursos) Poeira
# 6759 ( ‘p r, empoeirar)
Pomar -> # 1703 (gan, jardim, pomar) Pombo -> # 3433 (yônâ I, pombo) Populacho
# 671 ( ’asapsup, populacho)
Porão -> # 2844 (hãnút, porão, depósito subterrâneo) Porão -> # 2844 (hãnút, porão, câmara) Porção -> # 4713 (m aW õqet, porção, quota, divisão) Porta
#9133 (sa'ar I, porta)
Portão -> # 1946 (delet, portão, porta) Posse
# 3769 (yrs I, tomar posse, destruir, desapropriar)
Povo -> # 6638 ( a/w II, povo, povos, cidadãos) Praga
# 4487 (maggêpâ, praga, tormento, pestilência)
Pragas do Egito
Pragas do Egito (11330 [maggêpâ], # 4487; < *113 [wgp], q. atingir, ferir, tropeçar em; ni. ser golpeado, atingido;
hit. tropeçar [ -> # 5597]).
AT 1. A palavra maggêpâ significa um golpe devastador desferido por Deus contra seu povo desobediente, resultando em morte (Nm 14.37), morte súbita ou na deflagração de peste bubônica (ISm 6.4; 2Sm 24.21, 25). 2. O êxodo (->) do Egito (->) é considerado um dos acontecimentos mais importan da história da salvação de Israel. As pragas (maggêpõt, ver Êx 9.14) que antecederam a partida do Egito foram ocorrências dirigidas por Deus que levaram Faraó obstinado a deixar que os israelitas partissem. Os “sinais e prodígios” são relembrados em textos bíblicos posteriores e em hinos heb. antigos (p. ex.. Salmos 78, 105, 135, 136). (-> Sinal: Teologia) W. M. F. Petrie investigou a possível origem fenomenológica das pragas. A sugestão de G. Hort, expandindo a proposta de Petrie, de que as seis primeiras pragas podem estar associa das a uma seqüência de ocorrências naturais decorrentes de uma cheia incomum do Nilo, pode não mostrar-se convincente em todos os seus pontos, mas certamente lança dúvidas sobre as conclusões dos críticos da fonte de que uma série de tradições literárias encontram-se por trás dessas narrativas. Aceitar a idéia de que as pragas foram “ocorrências naturais” não deprecia 1051
Pragas do Egito
de maneira alguma o envolvimento de Deus nos fenômenos das pragas, como observa N. M. Sarna: “Do ponto de vista teológico, são casos em que Deus exerce o domínio sobre as forças da natureza para cumprir seus propósitos históricos” (93). 3. Tanto W. M. F. Petrie, quanto U. Cassuto, J. J. Davis e C. Aling procuraram rela cionar determinadas divindades egípcias com as pragas. De fato, uma das conseqüências das pragas é que Javé mostra-se mais poderoso do que os deuses do Egito (cf. Ex 12.12; 18.10-11; Nm 33.4). A argumentação em favor de uma divindade ou instituição sagrada egípcia por trás de cada praga não é convincente. Na primeira praga, o Nilo é transformado em sangue ou adquire a aparência de sangue (Ex 7.19-21). Com relação a essa praga, Aling afirma: “Trata-se de modo um tanto óbvio de um ataque contra o deus do Nilo, Hapi. O deus e o Nilo são sinônimos” (106). No entanto, Hapi não é o Nilo e nem mesmo o deus do Nilo! Por certo, Hapi é associado a uma cheia anual (ver “Hymn to Hapi”, M. Lichtheim, Ancient Egvptian Literature, 1973, 1:204-9; ver também J. Baines, The Fecundity Figures, 1985, que diz claramente “/) 'pj não é o Nilo”, 112-16). Uma investigação minuciosa das outras pragas e divindades egípcias revela que o maior propósito das pragas não era demonstrar a supremacia de Javé sobre os deuses do Egito, apesar de esse ter sido um dos resultados. 4. Uma alternativa é que as pragas mostraram o poder de Deus sobre Faraó. Foi suge rido que as expressões heb. “mão forte” e “braço estendido” nas narrativas do êxodo foram empregadas deliberadamente com o propósito de criar polêmica com relação ao conceito egíp cio do braço poderoso e conquistador de Faraó, conceito este presente por toda a parte na arte e literatura egípcias (Holfmeier, 1986). Essa proposta tem o apoio da linguagem do Pent. que descreve o braço de Javé derrotando o de Faraó, demonstrando assim a superioridade do Deus dos hebreus em relação a Faraó (cf. Êx 15.6, 12, 16; Dt 9.29; 26.8). A luta entre Faraó e Javé adquire maior relevância quando se compreende o conceito egípcio de ordem cósmica e o papel de Faraó na manutenção dessa ordem. Faraó era o deus do Estado egípcio, responsável por manter a ordem cósmica ou m ict na terra (ver Wilson, 8096; Frankfort, 5 1-60; Kemp in Ancient Egypt: A Social History, 71 -76). Como encarnação de Hórus, o rei era responsável pela fertilidade da terra bem como pelo fluxo correto do Nilo (ver Wilson, 89-90; Frankfort, 57-58). Além disso, Faraó ostentava o título de “Filho de Rá”, o deus sol, daí ser associado a “iluminar as duas terras” (ver Frankfort. 59). (Nesse caso, é sugestiva uma ligação com a nona praga.) Todos os anos, o rei liderava uma série de festivais e rituais relacionados à vitalidade da terra (ver Frankfort, 79-88). Sem dúvida, as nove pragas mostraram que um conflito cósmico estava em andamento e desafiaram a capacidade do rei de manter a ordem do cosmo. Se o rei não cumprisse devi damente seus deveres, a terra sofreria, ou seja. ficaria num estado de caos (isft). A literatura egípcia fala da terra entrando num estado como o descrito em Êxodo nas ocasiões em que o governo central do Egito se desintegrou, como foi o caso durante o Primeiro e Segundo Pe ríodos Intermediários. Porém, quando um rei forte surgiu para reunir as terras politicamente, a m3ct foi restabelecida e a natureza reagiu conformemente. Os temas de ordem e caos se repe tem na literatura egípcia. A obra “Admoestaçõcs de Ipuwer" lamenta as condições deploráveis dentro do Egito: Vede! Hapi alaga e ninguém ara por ele, todos dizem, “não sabemos o que aconteceu na terra”. Vede! As mulheres estão estéreis, nenhuma delas concebe, Khnum não forma por causa do estado da terra... Vede! O rio é sangue e, quando alguém bebe dele, se afasta das pessoas e tem sede de água... arqueiros de outras terras vêm para 1052
Pragas do Egito
o Egito... Vede que a terra é privada de um reino, pois umas poucas pessoas ignoram o costume... [Roubada] é a coroa de Rá, que pacifica as Duas Terras. (M. Lichtheim, Ancient Egyptian Literature, 1973, 1:151 -56). O mesmo pode ser encontrado na “Profecia de Nefertite” datada do início da XII Di nastia (1970-1950 a. C.). Diferentemente do tom puramente mórbido de Ipuwer, com a vinda do rei, Nefertite passa da melancolia à glória. Essa reviravolta se deve à Ascensão de Amenemete como rei. Nefertite declara: Seco está o rio do Egito, pode-se atravessar a água a pé; busca-se água sobre a qual navegar as embarcações, seu curso tomou-se em margens... A terra está encurvada de aflição, devido aos cevadores, asiáticos que vagam pela terra. Inimigos surgiram do Oriente, asiáticos atacaram o Egito... Rá se afastará da humanidade: Porém a seu tempo se levantará, ninguém há de saber quando virá o meio dia. Então um rei virá do Sul, Amcni... Ele tomará a coroa branca, usará a coroa vermelha... Então a Ordem (m3ct) voltará ao seu lugar, enquanto o Caos (ixft) é banido. (Lichtheim, Ancient Egyptian Literature, 1:141 -44). Nesses documentos, há uma infinidade de problemas com a natureza quando a ordem cósmica se deteriora. Em primeiro lugar, o Nilo está extremamente baixo devido a poucas cheias ou ainda, encontra-se de algum modo contaminado, de modo que as lavouras morrem. Em se gundo lugar, falta um reinado para unir e controlar a terra. Em terceiro lugar, há estrangeiros no Egito. Fica claro nesse texto de Nefertite que, quando o rei traz união à terra e governa de acordo com o arquétipo mítico, o caos é desfeito e a ordem é restabelecida. Por fim, as pragas convenceram esse monarca intransigente a deixar Israel partir (Ex 12.31-33). Porém, no último confronto no mar. Deus revelou a Moisés o motivo desse último ato de julgamento: Eis que endurecerei o coração dos egípcios, para que vos sigam e entrem nele; serei glorificado em Faraó e em todo o seu exército, nos seus carros e nos seus cavalarianos; e os egípcios saberão que eu sou o Senhor, quando for glorificado em Faraó, nos seus carros e nos seus cavalarianos. (Êx 14.17-18) Sem dúvida as pragas mostraram a Faraó que ele não estava no controle das forças da natureza. Antes, era Javé, o Criador dos céus e da terra que mantinha sua criação. 5. A questão da ordem moral encontra-se intimamente relacionada às inquietações cós micas. Para T. E. Fretheim, esse fato é uma questão teológica central em Êxodo. Ele afirma que “a base teológica para as pragas é uma compreensão da ordem moral, criada por Deus visando à justiça e ao bem do mundo. A ordem moral de Faraó é um fracasso e perturba gra vemente esse desígnio divino, daí tornar-se objeto do julgamento inerente à ordem de Deus” (1991a. 110). 6. No entanto, em última análise, o propósito de Deus era convencer os israelitas de que ele era seu Deus e somente ele podia redimir Israel para si. Essa intenção se reflete na de claração de Deus a Moisés: “Portanto, dize aos filhos de Israel: eu sou o Senhor, e vos tirarei de debaixo das cargas do Egito, e vos livrarei da sua servidão, e vos resgatarei com braço es tendido e com grandes manifestações de julgamento. Tomar-vos-ei por meu povo e serei vosso Deus; e sabereis que eu sou o Senhor, vosso Deus, que vos tiro de debaixo das cargas do Egito” 1053
Preceitos sobre o sexo
(Êx 6.6-7). Aqui, as “grandes manifestações de julgamento” (ou seja, as pragas e a divisão das águas do mar) estão relacionadas ao julgamento sobre o Egito e à salvação concedida a Israel. O propósito teológico dessas pragas explica a centralidade disso para a liturgia posterior de Israel. (-> Êxodo: Teologia) Doença — praga: -> deber I (peste bubônica, # 1822); -> f hõrím (peste, # 3224); -> maggêpâ (peste, # 4487); -> nega‘ (peste, aflição, # 5596); -> resep I (pestilência, # 8404); -> .yr ‘ (sofrer de doença de pele, # 7665). Para verbetes relacionados hlh I (ficar fraco, cansado, doente, # 2703); Pragas: Teologia Mão, braço, dedo: -> ‘ (dedo, # 720); -> /?/? (estender as mãos, # 2063); z^rôa ‘ (bra ço, antebraço, # 2432); yãd (mão, poder, lado, # 3338); kap (mão, mão vazia, # 4090); tq‘ (impelir, empurrar, bater palmas, tocar trombeta, empenhar, # 9546) Prodígio, maravilha: -> 'ôt (sinal, marca, # 253); tôfãpõt (símbolo?, # 3213); -> (prodígio, sinal, # 4603); -> p i' (ser maravilhoso, difícil, #7098) B ib l io g r a f ia
C. F. Aling, Egypt and Bible History: From Earlies Times to 1000 B.C., 1981; B. J. Kemp, “Old Kingdom and Second Intermediate Period, c. 2886-1556”, in Ancient Egypt: A Social History, eds. B. Trigger, B. J. Kemp, D. 0 ’Connor, D. B. Lloyd, 1983, 71-76; A. M. Cartun, ‘“Who Knows Ten’? The Structural and Symbolic Use o f Numbers in the Ten Plagues: Exodus 7:14-13:16”, USQR 45, 1991, 65-119; U. Cassuto, A Commentary on the Book o f Exodus, 1967; J. J. Davis, Moses and the Gods o f Egypt: Studies in Exodus, 1971: H. Frankfort, Kingship and the Gods, 1948, 51-60; T. E. Fretheim, “The Plagues as Ecological Signs of Historical Disaster”, JBL 110, 1991, 385-96; idem, Exodus, Interpretation, 1991; J. K. Hoffmeier, “The Arm of God Versus the Arm o f Pharaoh in the Exodus Narratives”, Bib 67, 1986, 378-87; idem, “Egypt, Plagues”, in ABC, 1992, 2:374-78; G. Hort, “The Plagues of Egypt”, ZAW 69, 1957, 84-103 and ZAW 70, 1958, 48-59; S. E. Loewenstamm, The Evolution o f the Exodus Tradition, 1992; S. B. Noegel, “The Significance o f the Seventh Plague”, Bib 76, 1995, 532-39; W. M. F. Petrie, Egypt and Israel, 1911; N. M. Sarna, Exploring Exodus, 1987; J. Wilson, “Egypt, the Function o f the State”, in Before Philosophy: The Intellectual Adventure o f Man, 1946, 80-96. James K. Hojfmeier Pranto -> # 61 ( ’bl I, prantear, observar ritos de pranto) Prata
# 4084 (kesep, prata, dinheiro)
Prazer -> #3137 (hSq, ter prazer, desejo, anseio, lascívia)
OMA 1. Uma característica peculiar dos textos acad. e ugar., é a alusão à prostituição ritual. Nos templos das deusas da fertilidade (Inana, Ishtar, Astarote) havia prostíbulos anexos no qual trabalhavam mulheres consagradas que representavam a deusa, o princípio feminino da fertilidade. Por meio da prostituição sagrada, os adoradores tinham comunhão com o princípio divino da vida e re novavam suas forças vitais (cf. Fisher, 225-36). Preceitos sobre o sexo
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Preceitos sobre o sexo
2. Em textos acad., o adultério era uma ofensa cometida contra o marido pelas duas partes envolvidas: a esposa e seu amante. Por vezes, as providências legais tomadas contra eles pelo marido coincidiam ou eram coordenadas por motivo de política pública, mas eram, em essência, diferentes. O marido tinha o direito de castigar a esposa por transgredir seu dever conjugal de fidelidade a ele. Tinha permissão de vingar-se do amante dentro dos amplos limi tes estabelecidos pela lei e podia ainda, se bem lhe aprouvesse, receber um resgate no lugar da vingança. Ao mesmo tempo, o adultério era um pecado que podia resultar em castigo divino. A aquiescência do marido podia anular a ofensa, mas não necessariamente o pecado. Dentro dos mesmos princípios referentes ao adultério, o futuro marido podia tomar as medidas necessárias para sanar problemas de infidelidade pré-conjugal durante o período em que a esposa ainda se encontrava sob a autoridade do pai (Westbrook, 542-80). 3. A mitologia ugar. fala do deus Baal copulando com uma novilha. De acordo com o épico babilônio de Gilgamés, o herói Enquidu teve relações sexuais desse tipo até ser afastado de seus companheiros animais pela relação com uma prostituta sagrada. No delta oriental do Nilo, havia um culto que envolvia a coabitaçâo de mulheres e bodes. As leis hititas proibiam algumas formas de bestialidade (Laws 187-88), mas permitiam outras (Laws 199-200) (Kai ser, 195-96).
AT 1. Termos sexuais, a. O AT apresenta uma estranha combinação de franqueza e reticência no que diz respeito ao sexo. Apesar de toda a importância e sinceridade ligadas ao sexo no meio dos israelitas, é praticamente impossível encontrar-se uma terminologia sexual exata. Não há uma palavra específica para o comportamento sexual. Referências a atividades e órgãos sexuais são sempre expressadas por meio de termos eufemísticos e são evitadas referências diretas aos órgãos sexuais. Assim, nâo há nenhuma palavra para o órgão sexual masculino, que é chama do de bãsãr, carne (-> # 1414; Gn 17.14; Lv 15.2-3; Ez 44.7, 9). O mesmo termo eufemístico também é usado para a genitália feminina (Lv 15.19). Quando se faz referência à genitália do homem ou da mulher com o qual é proibido ter relações sexuais, emprega-se o termo ‘erwà, nudez (-> # 6872), que tem a conotação definida de nudez vergonhosa (Lv 18.6-19; 20.17-21; ISm 20.30; Lm 1.8; Ez 16.37; 23.10,29). O mesmo termo é usado na lei deut. sobre o divórcio como razão suficiente para um homem se divorciar de sua esposa (Dt 24.1). Tanto os órgãos genitais masculinos quanto os femininos também são aludidos como regei, pés (-> # 8079; Êx 4.25; Dt 28.57; Jz 3.24; ISm 24.3 [4]; ls 7.20; Ez 16.25) ouyãd, mâo (-» # 3338; Is 57.8). Outros termos eufemísticos para o órgão reprodutor masculino é Sopkã, escoadouro (# 9163; “membro viril”, Dt 23.1 [2]) e trfibüsim, vergonhas (# 4434; Dt 25.11). Há quem sugira ainda que 'ãqêb, calcanhar (-> # 6811) em Gênesis 25.26 deve ser entendido como eufemismo para a genitália (Smith, 464-73). b. Nenhum desses termos é usado quando se mostra necessário empregar uma lingu gem particularmente refinada. Antes, é usado o nome para a região geral do corpo em que se encontra a genitália, yãrêk coxa/quadril (-> #3751), que é outro eufemismo para o órgão re produtor masculino. Em várias ocasiões, faz-se referência aos descendentes como aqueles que saíram dos quadris de uma pessoa (Gn 46.26; Êx 1.5; Jz 8.30). O indivíduo que deve prestar juramento toca o órgão sexual do homem ao qual ele jura enquanto profere as palavras solenes (cf. Malul, 491-92) e o juramento toma-se, desse modo, especialmente rigoroso. Assim, quan do Abraão quer que Eliézer faça um juramento importante, em vez de dizer-lhe para tocar seu pênis, ordena que Eliezer coloque a mão por baixo de sua coxa (Gn 24.2,9; cf. também 47.29). Uma palavra relacionada é halã^ayim, lombo (# 2743), considerada o lugar onde se localiza a fertilidade (Gn 35.11; 1Rs 8.19; 2Cr 6.9). 1055
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c. Somente dois termos referem-se, de fato, à partes da genitália masculina. O primeiro, 'esek, testículo, é mencionado lx como um termo anatômico relacionado a uma lista de defi ciências físicas que excluem automaticamente um sacerdote do serviço do templo (Lv 21.20). O segundo, ‘orlâ, prepúcio (-> # 6889) é mencionado em relação à cerimônia religiosa da cir cuncisão (Gn 17.11). Não há um termo exato para a genitália feminina. No entanto, em função do significado religioso-ritual da menstruação, o termo niddii, menstruação (-> #5614) denota o estado de impureza mensal de uma mulher (Lv 12.2; 15.19). As palavras rehem, ventre (-> # 8167; Nm 12.12; Jr 1.5; 20.18), e beten, ventre ( ^ # 1061; Gn 25.23-24; 38.27; Os 12.3 [4]), são usadas com o sentido de espaço quando se tem em vista a formação/crescimento da criança antes do nascimento. Em Oséias 2.10 [12], nablút, genitália (# 5578) é empregado no contexto da exibição vergonhosa, especialmente dos órgãos sexuais femininos. Não havia nenhum me lindre em se falar de certas partes do corpo que a sensibilidade ocidental não permitiria men cionar abertamente, p. ex., as referências freqüentes a sad, seio (Ct 1.13; 4.5; 7.3 [4], 7 [8], 8 [9]; 8.8, 10), dad, bico do seio (Pv 5.19; Ez 23.3, 8, 21) ou 'orlâ, prepúcio (1 Sm 18.25, 27). O subs. zera' refere-se ao sêmen (-> # 2446; Lv 15.16, 32; 22.4; Nm 5.28) e a descendentes (Gn 3.15), especialmente na linhagem prometida de Abraão, lsaque e Jacó. Nessa última acepção, costuma ser usado como um subs. coletivo no sing. (nunca no pl.). Assim, o termo designa a linhagem inteira como uma unidade e, no entanto, é deliberadamente flexível o suficiente para denotar uma pessoa ou epitomizar o grupo todo ou muitas pessoas nessa linhagem de descen dentes naturais ou espirituais (cf. também TDOT4 :150-62). d. O ato ter relações sexuais é expressado pelo vb. qrb, chegar-se a (-> # 7928; Lv 18.14, 19); skb, deitar-se com (-> # 8886; Lv 18.22); b w coabitar (-> # 995; Gn 29.23,30); ou y d \ conhecer (-> # 3359; G n4.1; 19.8; Nm 31.17, 35; Jz 11.39; 21.11; ISm 1.19; lRs 1.4). A prática do coito interrompido é chamado de “[deixar] o sêmen cair na terra” (Gn 38.9). Sempre que os derivativos do vb. skb, deitar-se com, são usados no contexto dos relaciona mentos sexuais, trata-se de relações ilícitas (Gn 30.15, 16;2Sm 11.11 podem ser exceções). O mesmo aplica-se ao próprio vb. Este é usado em declarações legais que proíbem certos tipos de relações sexuais; em Êxodo 22.16 [ 15] o vb. aparece no contexto da fornicação; em Deuteronômio 22.22, do adultério; em Levítico 18.22; 20.13, com respeito às relações ho mossexuais e em Deuteronômio 27.21 com referência à bestialidade. Fora dos textos legais, o termo é usado em seções narrativas que descrevem episódios de conduta inapropriada. As filhas de Ló embriagaram seu pai e deitaram-se com ele (Gn 19.33). Um dos súditos de Abimeleque quase cometeu adultério involuntário com Rebeca (26.10). O vb. é usado para descrever o estupro de Diná, filha de Jacó, por Siquém (34.2, 7). Rúben deitou-se com Bila, a concubina de seu pai, na ausência de Jacó (35.22). Os filhos de Eli se envolveram com mu lheres que trabalhavam na entrada do santuário (ISm 2.22). Amom estuprou sua meia-irmã Tamar(2Sm 13.11, 14). Por outro lado, quando se trata de uma referência a relações sexuais dentro dos limites da vontade de Deus, costuma-se usar o vb. y d ‘\ p. ex., quando Adão coabitou com sua esposa e ela concebeu (Gn 4.1, 17); ou o vb. bw \ como quando Abraão pos suiu Hagar e ela concebeu (16.4). 2. Diferenciação sexual, a. O AT contém termos que distinguem claramente entre sexos, tanto no caso de homens quanto de animais: 'is, homem (-> # 408); 'issã, mulher (-> # 851) e zãkãr, macho (-> # 2351); neqêbâ, fêmea (-> # 5922). De acordo com o primeiro relato da criação. Deus criou os homens como homem e mulher (Gn 1.27). No segundo relato Deus criou a mulher da costela do homem: ela é osso dos seus ossos e carne da sua carne (Gn 2.23). É semelhante a ele e, no entanto, diferente. É oposta a ele em termos de diferenciação sexual e igual a ele em termos de humanidade e dignidade (Waltke, 17). Essa afirmação é apresentada 1056
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como o motivo pelo qual o homem deve deixar pai e mãe e unir-se à esposa, tomando-se uma só carne com ela (2.24). b. A descrição do homem e da mulher como objetos do desejo sexual um do outro continua ao longo de todo o AT. Em alguns casos, como de Jacó e Raquel, o desejo sexual e o amor romântico encontravam-se intrinsecamente entretecidos (Gn 29.20). Em outros, como por exemplo no caso de Davi e Bate-Seba, o que surgiu à primeira vista foi o desejo sexual que depois amadureceu e transformou-se em amor (2Sm 11.2; 12.24). Em outros casos ainda, enquanto o desejo sexual de um homem não é satisfeito, é descrito como algo tão sobrepujante que rompe todas as barreiras da decência e dos costumes honráveis. Porém, depois de obter a satisfação, transforma-se em desprezo odioso para com a mulher violada brutalmente por esse homem, como no episódio de Amom e Tamar (2Sm 13.1-17). c. A beleza feminina excita o desejo sexual do homem. O ideal de beleza feminina no meio dos israelitas pode ser sintetizado a partir das passagens espalhadas ao longo do livro de Cântico dos cânticos: pele branca, olhos como os das pombas, cabelos negros ou tingidos de púrpura com hena, dentes uniformes, lábios vermelhos, nariz proeminente, têmporas rosadas, pescoço longo e reto, seios firmes, quadris cheios e arredondados, abdômen arredondado, corpo aprumado como uma palmeira e andar gracioso (Gn 12.11, 14). A mulher bela usava muito per fume, jóias pendentes e tintinantes e olhava sedutoramente por seu véu transparente. A beleza das mulheres pode transformá-las em vítimas dos homens que abusam de sua força e posição superior a fim de possuí-las: Faraó desejou e tomou Sara pois ela era bela (2Sm 11.2), como também o fez Davi com Bate-Seba (13.1). Semelhantemente, a beleza de Tamar levou Amom a estuprá-la (Gênesis 38). No entanto, não há história alguma de uma mulher que tenha usado sua beleza ou atratividade erótica como arma para controlar ou manipular os homens. Tamar (Gênesis 38) e Rute atraíram homens para um relacionamento sexual a fim de obterem bene fícios diretos de uma família e descendência. O amor de um homem por uma mulher baseado na atração sexual é indicado muitas vezes pelo radical 'hh, amor (-> # 170) e encontra-se re lacionado ao casamento (Gn 24.67; 29.20, 30; Dt 21.15, 16). d. O sexo foi criado para dar prazer, como mostra a alegoria breve porém alegre de Pro vérbios 5.15-21 ao se referir a deleitar-se com a esposa da sua juventude. A visão pronunciada mente favorável do valor do prazer sexual lícito é expressada na atitude positiva e afirmativa com relação ao sexo dentro do casamento, seu único contexto legal e moralmente aprovado. Não apenas foi permitido, mas até ordenado, que homens e mulheres se casassem e dentro de seu enlace legalmente sancionado, não apenas podiam, mas na verdade deviam desfrutar o ato sexual um com o outro. De acordo com a lei religiosa e as expectativas sociais, tinham a res ponsabilidade de gerar muitos filhos. e. O homem era senhor e dono de sua casa, suas mulheres e filhos. Seu desejo pela mulher não o colocava numa posição subordinada ou subserviente a ela. Para ele, possuí-la, saciar sua sede sexual na fonte dela (Ct 4.12, 15) e inebriar-se com o vinho dela (5.1) era uma bênção, uma experiência miraculosa. Para a mulher, a situação era outra. Devia sofrer as dores de parto e sujeitar-se ao domínio do seu senhor. O sofrimento de Eva representa o sofrimento de todas as mulheres e deve-se à sua rebeldia contra o Criador (Gn 3.16; W. A. VanGemeren, The Progress o f Redemption, 90-92). Apesar de haver exemplos da igualdade entre homens e mulheres em termos de natureza e dignidade, um ideal de acordo com Gênesis 2.22-24 (Waltke, 17-21), o AT reflete a autorida de/prioridade masculina, especialmente nas questões sexuais. Nos tempos que antecederam a monarquia, o chefe da casa possuía grande autoridade. As mulheres deviam prestar contas aos homens, fossem eles os pais ou maridos (Nm 30.3-16 [4-17]). A fim de proteger seus hóspedes 1057
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de sofrerem violência sexual, Ló ofereceu no lugar deles suas filhas virgens aos homens de Sodoma (Gn 19.5-8) e o homem idoso ofereceu a concubina do levita e sua filha virgem aos homens de Gibeá (Jz 19.22— 5). Os homens são retratados como indivíduos ativos, que to mam a iniciativa, enquanto as mulheres devem ser passivas. A mulher que tomava a iniciativa era considerada perversa e perigosa (Pv 6.24-26). Ao que parece, as mulheres possuíam seus próprios aposentos (Jz 15.1) e a virgindade da mulher antes do casamento era considerada ex tremamente importante (Dt 22.13-21). A questão da virgindade masculina antes do casamento, pelo contrário, não era mencionada. O período de impureza depois do parto era de sete dias para um bebê do sexo masculino e duas semanas para um bebê do sexo feminino (Lv 12.2-5). Havia diferenças gritantes nos padrões de fidelidade no casamento (Nm 5.11-31). Um homem tinha direito de tomar para si várias esposas e as convenções permitiam que, dentro de certas restrições, tivesse acesso a mulheres escravas e cativas (Lv 19.20; Nm 31.18-19; Dt 21.11-14), bem como a prostitutas (Gn 38.12-19; Js 2.1). f. Observa-se no âmbito divino uma ausência de sexualidade. A imagem de Deus, nor malmente masculina, não é fálica — não representa a virilidade. Apesar de os profetas usarem metáforas conjugais bastante fortes para o relacionamento entre Deus (marido) e Israel (esposa), em momento algum essa relação é descrita em linguagem erótica. Deus não serve de modelo nem concede potência ou atratividade sexual. g. O sexo entre os animais era considerado uma forma de fazer aumentar os rebanhos (Gn 30.38-42) dos quais o povo dependia para suas roupas, abrigos, alimentos e ofertas a Deus. 3. Moralidade sexual, a. Nâo é possível encontrar-se nas Escrituras nenhuma conde ção do sexo. O sexo é considerado uma dádiva de Deus, a ser usada não apenas para o prazer erótico, mas também para a procriação. O pressuposto de que o sexo reprodutivo é bom pode ser percebido no tom da narrativa da criação. Deus cria uma humanidade heterossexual, orde nando e abençoando a função reprodutiva (Gn 1.27-28). Ao terem filhos, as mulheres são hon radas (Gn 24.60; SI 113 [112].9). Os filhos do sexo masculino são necessários para preservar o nome e a figura do pai (cf. Gn 15.2). Assim, as relações sexuais são importantes para toda a família ou clã, de modo que o nascimento de uma criança é comemorado por toda a comu nidade (Rt 4.14-17). A sexualidade serv iu o propósito divino de preservar a geração de Abraão (Gn 17.2-7). Assim, para um homem fazer parte da comunidade de Israel, era necessário que fosse circuncidado (17.10). Porém, mais do que isso, devia ter órgão sexuais ilesos (Dt 23.2). O caráter sagrado da genitália masculina como local do poder reprodutivo era invocado quando se rea lizava determinado tipo de juramento. Quando Abraão confiou ao seu servo Eliézer a missão importantes de escolher uma esposa para Isaque numa terra distante, fez o servo jurar dessa maneira (Gn 24.2-4, 9). Quando Jacó estava prestes a morrer, pediu ao seu filho José que co locasse a mão debaixo da sua coxa e prometesse usar de sinceridade para com ele (47.29). A função do sexo na preservação e perpetuação do nome da família é motivo de uma rejeição veemente do abuso e das perversões sexuais. b. De fato, desfrutar de relações sexuais em intervalos regulares era um direito do ma do, da esposa e até mesmo da concubina. O direito das co-esposas de receber a mesma atenção conjugal do marido foi firmemente consolidado no tempo dos patriarcas. A legislação codi ficada vários séculos depois dos patriarcas também dava direitos semelhantes às concubinas. Êxodo apresenta uma lei quanto à conduta de um homem com relação à sua concubina: mesmo que ele transferisse seus afetos a outra mulher, não devia negar nem depreciar os direitos da concubina compartilhar do alimento, vestuário e do leito conjugal. Na realidade, esses direitos eram considerados tão fundamentais que a negação dos mesmos dissolvia automaticamente a 1058
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relação senhor-concubina e anulava os direitos de propriedade obtidos pelo senhor ao adqui rir a moça de seu pai (Êx 21.10-11). Essa lei colocava a relação sexual no mesmo nível que a alimentação e o vestuário, como uma necessidade básica da vida. Não se pode imaginar um testemunho mais eloqüente da importância do sexo legítimo. c. Se a sedução feminina com o propósito de despertar o apetite sexual do homem vi nha de mulheres perversas, tal sedução era considerada, em si, uma forma de perversidade. Se, por outro lado, as mesmas atrações e encantos eram demonstrados pela esposa ou noiva de um homem, eram consideradas boas e louváveis do ponto de vista moral. Isaías condenou as filhas perversas de Sião, que se comportavam como meretrizes ao andarem de um lado para o outro com uma postura altiva, dando passos curtos e fazendo tinir os adornos em seus calcanhares (Is 3.16-17). E, no entanto, essa mesma sedução perversa tomava-se encanto abençoado quando era observada na noiva amada durante as comemorações do casamento (Ct 1.10; 4.4; 7.1 [2]). Quando a mulher adúltera perfumava sua cama com aloés e mirra e convidava o jovem para embriagar-se com seu amor até pela manhã (Pv 7.17-18), tratava-se obviamente de uma epítome da abominação. E, no entanto, esses mesmos gestos sedutores eram altamente recomendados e considerados tema de poemas de amor quando serviam para realçar o amor legítimo entre a noiva e seu noivo (Ct 4.13— 5.1; 5.5-6). d. O fato de um homem poder ter várias esposas, enquanto uma mulher pertencia somen te a um marido de cada vez deixa implícita uma liberdade sexual muito maior para os homens do que para as mulheres. A relação extra ou pré-conjugal de homens casados ou solteiros só se tomava punível se a mulher envolvida era casada ou uma moça solteira que devia prestar con tas de sua conduta ao seu pai, irmãos ou parentes. Em tais casos, o homem que tinha relações com ela cometia um crime contra o marido ou o parente da mulher e era punido com a morte, quer por meio das autoridades legalmente instituídas ou pelas mãos dos parentes, que atuavam como vingadores sob a lei dos costumes sancionada pela tradição. Era permissível um homem relacionar-se com uma prostituta e se isso tomava-se público, ele continuava sendo um membro respeitado da família e do grupo social ao qual pertencia. Essa era a atitude patriarcal desde o início, com referência a homens visitarem prostitutas, o que é ilustrado claramente na história de Judá e Tamar (Gn 38.15-23). No entanto, o sexo fácil é condenado em Provérbios e o cap. 2.16-18 desse livro adverte claramente contra a prostituição e o sexo extra ou pré-conjugal. O salário de uma meretriz não deve ser levado à casa do Senhor, pois Deus abomina a prostitui ção (Dt 23.18 [19]). e. A parte mais sensível da combinação poder-honra patriarcal era a moralidade sexual das mulheres. Uma transgressão nessa área era punível com a morte, executada pelo pai no caso de uma filha solteira, pelo marido no caso de uma mulher casada ou ainda pelo sogro no casó de uma viúva. A história de Judá e Tamar em Gênesis 38 é um exemplo desse último caso. Quando Judá ficou sabendo que Tamar, a viúva de seu filho, havia cometido adultério e, em decorrência disso havia engravidado, decretou sumariamente que ela deveria ser quei mada (38.24). Judá tinha poder sobre Tamar pois ela era viúva do seu filho e, uma vez que ela não tinha filhos, devia esperar para se casar com um outro filho de Judá ou algum parente de seu marido falecido a fim de ter um filho com ele (Patai, 133). Uma vez, porém, que Tamar mostrou-se leal à família de seu marido, Judá chegou à conclusão de que ela estava em seu direito e não ele. f. O culto ao sexo no OMA representava uma ameaça permanente à integridade de Is rael. De fato, até voltarem da Babilônia, os israelitas viram-se continuamente envolvidos com essas religiões. Sempre que Israel abandonava a lei, ainda que temporariamente, a conseqüência desses breves períodos de apostasia eram as orgias de natureza sexual, como mostra o episódio 1059
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com o bezerro de ouro (Êx 32.6, 19) e a prostituição com mulheres moabitas em homenagem a Baal Peor (Nm 25.1). Esses comportamentos, porém, foram condenados com veemência por líderes e profetas. A lei da santidade em Levítico 18.1-30 declarava que em vez de se envol verem com tais práticas perversas, homens e mulheres seriam muito mais felizes seguindo as leis de Deus, pois viveriam por elas (18.5). g. Há um forte sentimento negativo ligado à nudez. Ela era parte do estado inocen original do homem (Gn 2.25). Depois da queda, tomo-se inerente ao ser humano cobrir o cor po (3.21) e a nudez passou a ser vergonhosa (3.7, 10). A exposição das partes íntimas (nudez) constituía um tabu sexual. Era vergonhoso e abominável mostrar os órgãos sexuais. Cão quebrou esse tabu quando viu a nudez dc seu pai embriagado (9.21-23). Enquanto estavam cumprindo seus deveres nas plataformas, os sacerdotes deviam usar calções por baixo de suas vestimen tas a fim evitar uma exposição inapropriada (Êx 20.26). A nudez era um sinal de humilhação e degradação. Assim, os prisioneiros de guerra eram sujeitados a ela (Is 20.3 [3-4]). Uma nação odiada era vista como uma virgem cuja nudez seria exposta para todos (Is 47.3). 4. Prescrições sobre o sexo. a. As prescrições bíblicas que governavam as relaçõ sexuais mostram que todas as funções sexuais resultavam em impureza ritual. Quando Israel encontrava-se acampada ao redor do monte Sinai e estava prestes a testemunhar a revelação da lei, os israelitas foram advertidos por Moisés a prepararem-se para o terceiro dia não se apro ximando de nenhuma mulher (Êx 19.15). Somente aqueles que havias se abstido de mulheres podiam comer do pão sagrado (1 Sm 21.4-5 [5-6]). Os homens em combate também deviam manter-se em condições de pureza sexual abstendo-se de ter relações (2Sm 11.11-13). O casal que tivesse relações sexuais devia lavar-se com água e ficava impuro até à noite (Lv 15.18). As considerações que interferiam temporariamente com a vida sexual baseavam-se na convicção de que o estado de impureza decorrente da relação sexual era incompatível com a realização de certos atos ou incumbências de ordem religiosa que, por sua própria natureza exigiam um estado de pureza ritual. A menstruação e o parto era fenômenos do ciclo sexual das mulheres que incapacitavam-nas temporariamente e tomavam as relações sexuais com elas ilícitas e pe caminosas. Esse fato está inteiramente de acordo com o resto do sistema simbólico expressa do por meio de preceitos de pureza e santidade da lei sacerdotal. Só podiam chegar-se a Deus aqueles que eram homens puros, que desfrutavam a plenitude da vida. Os impuros eram aque les que, de algo modo, encontravam-se envoltos pela aura da morte no sentido de que estavam aquém da integridade física. Assim, aqueles que haviam sofrido a perda de fluídos corporais, quer fosse sangue ou sêmen, eram proibidos de adorar até que tivessem se recuperado de tal perda (Wenham, 432-34). (-> Limpo e Imundo: Teologia) b. O sangue menstruai era considerado imundo. Em decorrência disso, a lei determin va que o casal não devia ter relações sexuais durante a menstruação da esposa e mesmo algum tempo depois de sua cessação. Levítico 15.24; 18.19; 20.18 (expandido em Ez 18.5-9) exigia sete dias de abstinência das relações sexuais durante a menstruação, quarenta dias depois do nascimento de um filho (Lv 12.2-4) e oitenta dias depois do nascimento de uma filha (12.5). A lei levítica da impureza menstruai era uma das mais severas (15.19-24). Ao contrário da lei men cionada acima, que simplesmente pronunciava impuro durante sete dias o homem que tivesse se deitado com uma mulher menstruada (15.24; 18.19), uma lei levítica subseqüente impôs a pena de morte tanto para o homem como para a mulher que cometessem esse pecado (20.18). É interessante observar que a proibição das relações sexuais com uma mulher menstruada possuía conotações morais. Essa idéia vem das palavras de Ezequiel, que lista entre as observâncias de um homem justo que este não se aproximava de uma mulher quando ela encontrava-se impura (Ez 18.6). Nenhum homem podia reivindicar direitos absolutos e irrestritos sobre uma 1060
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mulher. A fim de mostrar que marido algum era soberano sobre sua esposa ou o corpo dela, mas que, em última análise, tudo pertencia a Deus, os homens casados eram obrigados a se abster das relações sexuais em certas ocasiões específicas a fim de evitar uma ofensa grave contra o Deus vivo. Essa proibição servia como um sinal de Deus de que ele é a fonte suprema de vida e Senhor sobre domínios que ser humano algum pode transgredir. c. Não era incomum mulheres ricas e mimadas sentirem-se incapacitadas pela menstru ação a ponto de tal estado tomar difícil até elas se levantarem. Quando Labão entrou na tenda de sua filha Raquel em busca dos terafins, os deuses do lar que ela havia roubado dele, sentada sobre a sela de camelo onde ela havia escondido os deuses Raquel lhe disse: “Não te agastes, meu senhor, por não poder eu levantar-me na tua presença; pois me acho com as regras das mulheres” (Gn 31.35). Labão aceitou essa desculpa como algo natural. d. Leis semelhantes determinavam a conduta de qualquer mulher que tivesse algum fluxo durante vários dias fora do tempo de sua impureza e qualquer homem que tivesse um fluxo dc sua carne. Tais indivíduos eram considerados impuros enquanto durasse esse fluxo e mais sete dias depois da cessação do mesmo e contaminavam a tudo e todos que tocavam (Lv 15.2-5, 25-30). e. Além das regras mensais, uma mulher era considerada impura e, conseqüentemente, não podia ter relações sexuais, depois de dar à luz. De acordo com a lei, a mãe que tivesse dado à luz um filho, ficava impura durante sete dias, que deviam ser seguidos de um período de pu rificação que durava trinta e três dias. No quadragésimo dia, a mulher devia levar uma oferta que resultava em sua purificação do fluxo de sangue. Se a criança nascida fosse uma menina, o período de impureza durava quatorze dias, seguidos de um tempo de purificação de sessenta e seis dias, de modo que a oferta de um sacrifício e a purificação subseqüente da mãe ocorriam no octogésimo dia (Lv 12.1-8). Apesar de a lei não afirmar especificamente, ainda assim fica claro que durante os períodos de quarenta e oitenta dias, respectivamente, era proibido a jovem mãe ter relações com seu marido. f. A relação sexual, uma união física de um homem e uma mulher, levava os dois a tomarem-se uma só carne (Gn 2.24). A união sexual estabelecia um vínculo entre o homem e a mulher semelhante àquele que existe entre parentes consangüíneos de primeiro grau. Assim, o homem era proibido pela lei levítica de ter relações com sua mãe (Lv 18.7), madrasta (18.8), irmã (18.9), neta (18.10), meia-irmã por parte de pai ou mãe (18.11; 20.17), tia paterna (18.12), tia materna (18.13), esposa do tio paterno (18.14), nora (18.15), esposa do irmão (18.16) ou irmã da esposa (20.18-19). Pelo fato de o marido e da esposa serem uma só carne, descobrir a nudez de um cônjuge eqüivalia a expor o outro cônjuge. Em decorrência disso, a carne de um era a carne de outro. A nudez da irmã de um irmão também era a nudez do irmão. Consideradas em conjunto, as leis acerca do incesto definiam e esclareciam os limites dentro da famílias. A base para lista é de ordem social e não genética, pois primos não eram considerados tabu, apesar de serem geneticamente próximos em termos de parentesco biológico; mas várias esposas de parentes eram tabu, apesar de não terem nenhum parentesco biológico. Em todos os relacionamentos especificados, o contato sexual podia transtornar o equilíbrio das relações dentro da família em geral. Não se pode permitir que as relações sexuais tomem indistintos os limites dos relacionamentos familiares. Em quase todos os casos, a mulher é es pecificada em termos do homem cujos direitos estariam sendo desrespeitados por um ato de incesto. Enquanto para várias ofensas as penas são especificadas, no caso da pena para o in cesto, tudo indica que esta ficava ao encargo divino, uma vez que os transgressores eram amal diçoados (Dt 27.20-23). Não fica claro o motivo da filha não aparecer na lista, mas a história de Ló e suas filhas mostra que esse caso também era tabu. Se existe alguma justificativa para 1061
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o incesto das filhas de Ló, pode-se considerar como motivo apenas a necessidade de manter viva a linhagem de sua família. g. Os órgãos sexuais masculinos eram invioláveis. De acordo com uma injunçâo, se dois homens estivessem lutando e a esposa de um deles tentasse ajudar seu marido ao ferir os órgãos genitais de seu oponente, como castigo a mão dessa mulher era cortada fora (Dt 25.1112). Alguém que tivesse o órgão sexual amputado ou os testículos quebrados não podia parti cipar da assembléia do Senhor (Lv 20.20; Dt 23.1 [2]). h. Se um homem descobria que sua noiva não era virgem, tinha motivos para castigála com o apedrejamento (Dt 22 . 20-21). Um exemplo da preocupação de Deuteronômio com a castidade feminina é o estatuto para a noiva não virgem ( 22 . 13- 19). Se seu noivo a acusasse e pudesse provar que ela nâo era virgem, a moça devia ser apedrejada, uma forma comunitária dc execução reservada para as transgressões que perturbavam a ordem do universo e, portan to, ameaçavam toda a comunidade. Se os pais da noiva apresentavam aos anciãos os lençóis nupciais manchados de sangue, então o noivo acusador era açoitado e multado e devia per manecer casado com a moça para o resto da vida. Caso os lençóis manchados de sangue não fossem apresentados, a moça era apedrejada. A moça e os pais teriam quer ser ignorantes de modo a não encontrar algum sangue para manchar os lençóis e, sabendo disso, é pouco pro vável que um noivo fizesse tal acusação. No entanto, essa regra mostra claramente que, como executores, os anciãos e o povo se preocupavam com a castidade da moça e agiriam de modo a proteger esse interesse. De acordo com Êxodo 22.16 -17 [ 15-16], um homem que seduzia uma virgem tinha que pagar o preço-da-noiva e ela passava a ser sua esposa. Se o pai se recusasse terminantemente a entregar a filha a esse homem, ainda assim ele devia pagar o preço-da-noiva determinado para virgens. Se a filha de um sacerdote não era casta, devia ser queimada por desonrar seu pai (Lv 21 .9 ). i. Israel considerava a sexualidade extraconjugal com a maior severidade possível, prescrevendo a pena de morte para o adultério. Interesses adúlteros pela esposa de um outro homem eram proibidos (Êx 20.14; Lv 18.20; 20.10; Dt 22.22-29). O adultério era visto tanto como uma ofensa contra os direitos do marido como uma ofensa contra Deus (Pv 6.27-35). Os contrastes de padrões para a fidelidade dentro do casamento apresentavam divergências gri tantes. A esposa adúltera podia ser submetida à prova da infidelidade (Nm 5.11-31). O marido adúltero, por outro lado, apesar de ser advertido de que sua conduta era reprovável e levava à perdição moral (Pv 2.16-19; 7.24-27), não era sujeito a nenhuma sanção legal a menos que tivesse violado os direitos de outro homem da mulher em questão, o que acarretava em vingan ça ou no pagamento de uma multa pelos danos causados. A exigência de exclusividade sexual para as esposas tinha por objetivo evitar que as mulheres estabelecessem relações que podiam enfraquecer a unidade familiar (cf. também Filipenses 3—25). (-> Ética: Teologia) 5. Estupro, a. Pode-se encontrar relatos de vários episódios de estupro no AT: o caso Diná, a filha de Lia (Gn 34.7); da concubina violentada por uma turba de homens e, em decor rência disso, o estupro das virgens de Jabes Gileade e das filhas de Siló (Jz 19.25; 21) e o es tupro de Tamar por Amom (2 Samuel 13). Quando um homem tinha relações com uma mulher sem antes tomar as providências apropriadas esse ato era considera estupro mesmo quando a mulher consentia. Esse uso do termo é encontrado na história de Diná e Siquém (Gênesis 34). Diná havia saído e, ao vê-la, Siquém deitou-se com ela e teve relações ilícitas. Assim, ele a tra tou como uma meretriz e nâo como uma mulher de bem cujos pais deviam ser consultados. b. O estupro premeditado é censurado como um ato de insensatez (2Sm 13.12). Amo seria conhecido em Israel como nãbãl, louco (-> # 5572) (13.13). Esses atos eram chamados 1062
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de loucura pois implicavam uma violação dos padrões morais em Israel. O mesmo se aplicava à declaração do noivo sobre a castidade de sua noiva (Dt 22.21; Jz 20.6; Jr 29.23). c. Havia leis contra o estupro (Dt 22.23-29) e a sedução de uma menina que ainda n estava noiva (Ex 22.16-17[ 15-16]) ou de uma moça comprometida (Dt 22.25-27). Se um homem estuprasse uma virgem que ainda não estava noiva, devia pagar ao pai dela o preço-de-noiva, quer se casasse com ela ou não (Ex 22.16-17[ 15-16]). No entanto, o pai tinha o direito de re cusar essa oferta de casamento e determinar o destino da filha. De acordo com Deuteronômio 22.28-29, o homem devia casar-se com ela e não podia jamais pedir o divórcio, não havendo menção alguma do direito de recusa do pai. A diferença entre Êxodo e Deuteronômio se deve à emergência em Deuteronômio da preocupação pública e controle do comportamento sexual: em Deuteronômio, a comunidade inteira tinha o interesse de garantir a castidade de suas jovens (cf. Stulman, 46-63). Se um homem estuprava uma virgem noiva em circunstâncias nas quais ela não tinha como conseguir socorro, ele era apedrejado e ela não sofria nenhum castigo. Porém, se tivesse sido possível ela pedir ajuda, ela também era apedrejada (Dt 22.23-27). 6. Prostituição, a. A história de Judá e Tamar (Gênesis 38) retrata um lugar no int rior onde uma meretriz viajante solitária exercia sua profissão à beira da estrada e esperava ter como clientes os nômades ricos que por ali passavam. Nas cidades, as prostitutas tinham suas próprias casas nas quais recebiam seus visitantes. A prostituta Raabe tinha sua casa no muro da cidade de Jericó. Lá, podia receber tanto pessoas da cidade como forasteiros (Js 2.1; 6.25). O mais interessante na história de Raabe, porém, é o fato de ela poder se dedicar a essa ocupação apesar de seu pai estar vivo e de ela ter irmãos (2.12-13). Fica evidente que seu pai e seus irmãos, os guardiões naturais de sua moral, não tiveram como impedi-la de tomar-se uma prostituta. É possível que ela fosse uma viúva que tivesse escolhido esse modo de vida em vez de voltar para a casa de seu pai. Vivia sozinha mas tinha um relacionamento amigável com seus familiares e salvou-os da morte ao reuni-los em sua casa pouco antes dos israelitas atacarem e tomarem a cidade (Js 2.13, 18; 6.22-25) (Patai, 146). A salvação de sua casa se deu em função de sua fé no Deus de Israel. b. Não se faz nenhum julgamento moral sobre a prostituição ad hoc de Tamar ou so bre o meretrício profissional de Raabe. Semelhantemente, a declaração de que Jefté era filho de Gileade com uma prostituta não é acompanhado de nenhuma reprovação (Jz 11.1). Mesmo quando os outros filhos de Gileade, nascidos de sua esposa legítima, expulsaram Jefté, não o castigaram fazendo referência à sua mãe meretriz, como seria de se esperar numa sociedade na qual a prostituição era considerada vergonhosa (11.2). Também a visita de Sansão à prostituta em Gaza (16.1) é mencionada sem nenhuma censura, apesar de o próprio Sansão ser um nazireu, um homem consagrado ao Senhor desde o ventre de sua mãe. A história das duas prosti tutas que brigaram pelo filho que havia sobrevivido e que procuraram Salomão para julgar sua causa (IRs 3.16-27) apresenta uma série de detalhes importantes sobre a posição social das prostitutas no tempo da monarquia. Era possível duas ou mais prostitutas dividirem a mesma casa. Queriam filhos tanto quanto mulheres casadas. Tinham acesso à câmara de audiências do rei como qualquer outro súdito (Patai, 146-47). c. As prostitutas faziam parte da sociedade urbana. Podiam ser vistas por toda a parte, lavando-se nos açudes públicos (1 Rs 22.38); passando pelas mas da cidade, cantando e tocando harpa (Is 23.16); assentadas nos cruzamentos das ruas (Pv 7.10-12; Ez 16.24-25) ou nos degraus de suas próprias casas (Pv 9.14); chamando os transeuntes (9.15) ou exibindo suas roupas pro vocantes (7.10). A casa da meretriz, vista pela primeira vez pelas tribos hebraicas em Jericó, tomou-se um elemento permanente da vida urbana israelita da antigüidade (5.8), onde bandos de homens lascivos se reuniam (Jr 5.7). No arsenal da prostituta pode-se encontrar impudência 1063
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e arrogância, comportamento desordeiro e rebelde, palavras suaves e olhares sedutores (Pv 2.16; 5.3; 6.24-25; 7.5, 11; Jr 3.3). Outra atitude em relação à prostituição é expressada em várias ocasiões (Pv 2.16-19; 5.3-11; 7.25-27; 2-.3). Como foi observado anteriormente, tudo indica que, aos poucos, desenvolveu-se a idéia de que a prostituição não era nociva apenas para as mulheres que se envolviam com ela, mas também para os homens que faziam uso de seus serviços. No período dos patriarcas, a única falta imputada contra Judá (Gênesis 38) foi o fato de ele não haver honrado a regra do levirato; o fato de ele haver usado Tamar como pros tituta não recebe nenhum comentário. No entanto, posteriormente, a relação com prostitutas é condenada como sendo insensata, perigosa e errada. Levítico 19.29 advertia contra fazer com quem uma filha se tomasse prostituta. d. A posição da prostituta é esclarecida ainda mais pela legislação levítica que proib os sacerdotes, os descendentes de Arão, de se casarem com prostitutas ou mulheres divorciadas (Lv 21.7) e que prescreviam a pena de morte (ser queimada viva) para a filha de um sacerdote que se tornasse uma meretriz (21.9). Fica evidente que outros israelitas, isto é, aqueles que não eram sacerdotes, não eram proibidos de se casar com prostitutas e que as filhas de outros israe litas, apesar de serem advertidas a não se entregarem ao meretrício (19.29), não eram mortas caso o fizessem (Patai, 147). 7. Prostituição sagrada, a. Não há uma distinção clara entre a prostituta comum/pro na e a prostituta cultuai/sagrada. O uso de dois termos distintos, zòná para a prostituta profana e qedêsá para a sagrada indica que considerava-se que as duas exerciam funções diferentes. No entanto, a linha divisória entre elas era variável (Patai, 149). Essa falta de distinção entre a prostituição sagrada e a profana se reflete no episódio de Judá e Tamar. Quando Judá viu uma prostituta coberta por um véu, pensou tratar-se de uma zônâ, uma prostituta profana (-> # 2390; Gn 38.15). Sem dúvida o acordo sobre o pagamento pelos seus serviços foi uma negociação profana. E, no entanto, o amigo adulamita de Judá perguntou sobre uma qedêsâ, uma prostituta cultuai (-> #7728; 38.21-22). b. De acordo com as práticas de Canaã, as prostitutas eram ligadas aos santuários locais e serviam aos visitantes e peregrinos. Tanto homens como mulheres exerciam essa função como adjuntos dos santuários. As palavras de Eli, sumo sacerdote do santuário de Silo, onde repreen deu seus dois filhos por se deitarem com mulheres que se reuniam na porta da Tenda da Con gregação (ISm 2.22-24) reflete claramente a condenação profética dessas práticas idólatras. c. Realizar um ato sexual em homenagem a uma divindade era uma prática religiosa dos povos nativos de Canaã e de povos vizinhos, costume este ao qual as tribos dos hebreus sucumbiram inevitável e continuamente. Um desses incidentes ocorreu em Sitim, enquanto os israelitas ladeavam o território de Moabe a leste do Jordão. No relato fragmentado e confu so dessa ocorrência, são mencionados de uma só vez a prostituição com as filhas de Moabe, sacrifícios aos seus deuses e a reunião com Baal Peor (Nm 25.1-3). Os transgressores foram punidos com a pena de morte que, de acordo com a narrativa foi executada por Moisés (25.4) (Patai, 150). d. Os profetas avaliaram de forma negativa a prostituição cultuai feminina e mascu lina. Ao longo dos livros de Reis, a existência dessa prática e sua condenação constituía uma abominação idólatra (Patai, 151). Deuteronômio 23.17 [18] afirma que nenhum homem ou mulher israelita devia dedicar-se à prostituição cultuai. e. Durante o governo de Roboão, várias práticas idólatras foram mantidas, inclusive a prostituição sagrada masculina (lR s 14.24). Porém Asa, neto de Roboão, acabou com os ho mens que se dedicavam a essa ocupação na terra (lRs 15.12). Asa não teve sucesso em sua tentativa de erradicar a prática completamente e assim, seu filho Josafá teve que dar cabo do 1064
Preceitos sobre o sexo
restante dos prostitutos cultuais na terra (lR s 22.46 [47]). Esse decreto real também nâo foi eficaz ou tomou-se rapidamente ineficaz, o que fica aparente em Oséias que, algum tempo depois, queixou-se que Israel tinha relações com prostitutas profanas e sacrificava com pros titutas cultuais (Os 4.14) e em outra passagem histórica na qual se afirma que, ao longo de sua reforma abrangente, Josias destruiu a casa de prostituição masculina que ficava na casa do Senhor, onde as mulheres teciam coberturas (lit. casas) para as 'asêrâ (2Rs 23.7). Apesar da referência na última parte do versículo não ficar clara, não há dúvidas de que no século VI a. C. os prostitutos cultuais ainda viviam no templo de Jerusalém, onde seus serviços encontravamse à disposição das mulheres que visitavam o local. No entanto, mesmo depois dessa reforma, a prostituição sagrada nâo desapareceu dc todo. Tanto a prostituição sagrada feminina quanto masculina continuaram fazendo parte da vida religiosa dos israelitas em Jerusalém e em outras partes até o tempo do exílio. 8. Homossexualidade, a. Era convicção geral dos israelitas que o coito devia ser heterossexual conforme a ordem criada. A idéia de atos homossexuais aparece em Gênesis 19.4-7 e Juizes 19.22. Tais práticas são proibidas 3x (Lv 18.22; 20.13; Dt 23.17 [18]). Isso valia tanto para a homossexualidade masculina quanto para a feminina (lesbianismo). No entanto, é interessante observar que ao mesmo tempo em que homens e mulheres são ad vertidos contra a prática da bestialidade, a lei levítica não faz menção alguma da homosse xualidade feminina. b. A homossexualidade era tratada como uma abominação (Lv 18.22; 20.13). Uma so licitação de relações homossexuais era considerada um ato de loucura (Jz 19.23-24). Assim, quando duas pessoas do mesmo sexo tinham relações, ou seja, deitavam-se uma com a outra, violavam a ordem fundamental designada na criação e causavam a profanação do povo. c. As turbas em Sodoma e Gibeá eram afeitas às práticas homossexuais (Gn 19.4-8; Jz 19.22-26). A condenação e execração ocorrem em função do desejo dos homens de Sodoma e Gibeá de abusar dos visitantes forasteiros. Tais atos teriam sido estupro, tão pecaminosos quanto estupro de uma mulher — na verdade, até piores, pois também teriam sido uma viola ção flagrante da instituição sagrada da hospitalidade. Tanto o episódio de Sodoma quanto o de Gibeá indicam claramente que os homens envolvidos nas brutalidades eram bissexuais e não exclusivamente homossexuais em seus apetites carnais. d. Um possível exemplo de relacionamento afetivo voluntário entre dois homens é aquele de Davi com Jônatas. O amor entre os dois jovens é descrito exatamente com os mes mos termos e orações empregados com relação ao amor entre um homem e uma mulher (1 Sm 18.1; 19.1; 2Sm 1.26). No entanto, o ponto de vista do historiador deut. não tem como inten ção insinuar que o relacionamento de Davi e Jônatas era homossexual. Antes, seu amor era um compromisso pactuai no qual cada parte prometia proteger e honrar a outra (-> berít, tratado, acordo, pacto, aliança; # 1382). 9. Bestialidade. a. O ato sexual com quadrúpedes é mencionado 4x: 3x na lei e lx nas maldições da lei (Êx 22.19 [18]; Lv 18.23; 20.15-16; Dt 27.21). O ato sexual em si é referido como “deitar-se” (Lv 18.23). b. A bestialidade é condenada e também chamada de tebel, confusão (Lv 18.23). Ultra passar os limites determinados por Deus entre homens e animais era profanação. Tais confu sões e misturas foram condenadas como sendo inaturais. Êxodo 22.19[ 18] e Levítico 20.15-16 prescrevem a morte incondicional para esses casos. c. As nações que Deus expulsou de Canaã diante dos israelitas eram culpadas de tais abominações (Lv 18.24-25; 20.23). Essa lei tinha por objetivo evitar que Israel seguisse os costumes dos cananeus. 1065
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10. Outros casos. O travestismo (vestir roupas do sexo oposto) é proibido em Deuter nômio 22.5. Essa legislação fundamentava-se na manutenção da santidade dos sexos conforme o estabelecido na ordem criada. A tendência de obliterar todas as distinções levava muitas vezes à licenciosidade e promovia abominações contrárias à ordem criada. Essa prescrição referia-se principalmente às roupas do indivíduo como indicação de seu sexo. P-B 1. As palavras para os gêneros masculino e feminino no NT não são diferentes em sig nificado dos termos encontrados no AT. O termo sarx, carne, em momento algum especifica ou refere-se separadamente ao órgão sexual masculino. Da maneira como o termo é usado em Mateus 19.5, 6; Marcos 10.8; 1 Coríntios 6.16; Efésios 5.31, refere-se à união de um homem com uma mulher pelo ato sexual, por meio do qual os dois tomam-se uma só carne. 2. Os ensinamentos do NT exerceram uma influência revolucionária sobre essa ques tão. Apesar de a desigualdade social dos sexos não ter sido erradicada do pensamento do NT, a essência dos exemplos de Jesus e dos ensinamentos de Paulo era de que se tratava de uma questão temporária e pragmática, relativa e condicionada pelas circunstâncias sociais. Porém, com referência a Cristo que fez todas as coisas novas, há uma ênfase na igualdade com as de vidas distinções (G1 3.28). 3. No NT, Paulo manteve distinções nítidas entre o masculino e o feminino, entre a esfera pública e a privada e, conseqüentemente, atribuiu papéis e prescreveu roupas e comportamentos em termos de sexo e gênero. De acordo com a concepção de Paulo, a homossexualidade era uma paixão vergonhosa pois as relações entre pessoas do mesmo sexo são antinaturais (Rm 1.26-27). O parceiro do mesmo sexo inverte a forma natural da relação. Assim, a atividade sexual com alguém do mesmo sexo significa uma escolha equivocada pois um dos parceiros comporta-se como uma mulher (se os parceiros são do sexo masculino) ou como um homem (se são do sexo feminino) (Stegemann, 164-65). Paulo decreta que é correto um homem ficar sem uma mulher, mas caso seja preciso, deve tomar uma esposa para si a fim de evitar a imoralida de (1 Co 7.1-2). Paulo também relaciona vários pecados e o julgamento de Deus sobre aqueles que os praticam, inclusive a imoralidade sexual (6.9— 7.40). Os textos de Qumran referem-se a uma multa aplicada por expor a nudez (1QS 7:14). 4. A expressão “cova” para se referir ao útero ocorre no Mish. e no Talmude. Quando a criança está nascendo, a cova — ou seja, o ventre da mãe — se abre. A cova começa a se abrir quando a mulher é colocada na cadeira de parto ou quando o sangue começa a fluir de seu corpo e, segundo diferentes opiniões, permanece aberta por três, sete ou trinta dias (Patai, 157). 5. De acordo com Paulo (ICo 7.5) e o Mish. (Yoma 8.1), a oração “afligireis a vossa alma” nos estatutos sobre jejuar no décimo dia do sétimo mês (Lv 16.31; 23.29; Nm 29.7), refere-se à proibição das relações sexuais. 6. Referências explícitas à atividade sexual são relativamente comuns na LR. Os rabi nos não eram puritanos nem reticentes quanto ao uso de imagem sexual em suas discussões e ensinamentos públicos. O uso da linguagem sexual aparece dos termos ousadamente realistas aos eufemismos corteses. A declaração de Adão na criação de Eva de que ela era osso dos seus ossos e carne da sua carne, o rabino Eleazar, um sábio do Talm. acrescentou seu próprio comen tário de que Adão teve relações com os animais e todas as feras, mas que só sentiu satisfação quando teve relações com Eva (Patai, 179-80). Outra explicação interpreta o referente dessa declaração como um momento no tempo, ou seja, quando o sino toca. A imagem de um sino tocando possui significado sexual. O formato do sino insinua a região genital do corpo da mu lher, enquanto o badalo conota o órgão sexual masculino (Lachs, 247-48). 1066
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Menstruação: -> dwh (menstruar, # 1864); -> n^hõset II (menstruação, luxúria, # 5734) Relações sexuais: -> ’esek(testículo, #863); -> z/rmá (falo, emissão, # 2444); mebiãim (ór gãos genitais, # 4434); -> nablút (órgãos genitais, # 5578); nehõset II (menstruação, luxúria, # 5734); -> 'gn (manter-se isolado; # 6238); -> 'õ/iá (coabitação, relação sexual, # 6703); stò (deitar-se, ser violado, ser colocado na cama, # 8886); -> .fW? (apresentar testículos fortes, ter forte desejo carnal, # 8889); io p tó (canal de fluído do órgão masculino, órgão / túbulo urinário, # 9163); -> Preceitos sobre o sexo: Teologia B ib l io g r a f ia
/4SD 15:1144-46; IBDSup, 1817-20;TDOT 14;143-62; P. L. Day, Gender and Difference in Ancient Israel, 1989; E. J. Fischer, “Cultic Prostitution in the Ancient Near East? A Reassessment”, BTB, 1976,225-26; W. C. Kaiser, Jr., Toward Old Testament Ethics, 1983; S. T. Lachs, “Sexual Imagery in Three Rabbinic Passages”, JSJ, 1992, 224-48; M. Malul, “Touching the Sexual Organs as an Oath Ceremony in an Akkadian Letter”, VT, 1978, 491-92; C. Meyers, Discovering Eve: Ancient Israelite Womem in Context, 1988; A. Phillips. “Another Look at Adultery”, JSOT. 1981,3-25; R. Patai, Sex and Family in Bible and the Middle East, 1959; S. H. Smith, “ ’HeeP and ‘Thigh’: the Concept o f Sexuality in the Jacob-Esau Narratives”, VT, 1990,464-73; W. Stegemann, “Paul and the Sexual Mentality of His World”, BTB 23, 1993, 162-67; L. Stulman, Sex and Familial Crimes in the D Code: A Witness to Mores in Transition”, JSOT, 1992,47-63; P. Trible, God and Rhetoric o f Sexuality, 1993; W. A. VanGemeren, The Progress o f Redemption: The Story from Creation to the New Creation, 1995; B. Waltke, “The Role of Women in the Bible”, paper to be published in Crux, 1992, 1-29; G. J. Wenham, “Why Does Sexual Intercourse Defile?”, ZAW, 1983,432-34; R. Westbrook, “Adultery in An cient Eastem Law”, RB, 1990, 542-80. Jackie A. Naudê Precipitação -> # 2905 (hpz, estar com pressa) Preço, valor -> # 3700 (yqr, ser precioso, caro, valioso, tomar raro) Preguiça -> # 6788 ( ‘$1, ser moroso) Preguiçoso
# 6789 ( ‘õjê/, lento, preguiçoso)
Prejuízo -> # 6618 ( 7 / 1, agir ou tratar de modo prejudicial, respigar) Preocupação -> # 6701 ('nh III, estar preocupado, ocupado com) Preparação
# 6963 ( 'td, preparar, aprontar, destinado a)
Pressa -> # 4554 (mhr I, apressar) Pressão -> # 7210 (p$r, instar, premer, empurrar) Pressão
# 5080 (m 'k, pressionar, apertar, esmagar)
Presunção -> # 2294 (zêd, orgulhoso, presunçoso) 1067
Profecia
Pretensão -> # 2372 (zmn, pensar, planejar, pretender, tramar, intentar o mal) Preto -> # 8837 (shr I, ficar preto) Primícias
# 1137 (bikkúrim, primícias)
Primogenitura Príncipe Prisão Procissão
# 1144 (Mr, dar frutos prematuros, tratar como primogênito)
# 5592 (nãgíd, príncipe, governante, chefe) # 6806 ( '.yr, encarcerar, aprisionar, parar, fechar) # 2504 (/iag, procissão, festival, festa)
Profanação -> # 2725 (A//1, profanar, contaminar, poluir, começar)
profecja OMA 1.A palavra heb. para profeta, n ã b i'(# 5566), _______________________________ que também é encontrada na literatura extrabíblica, ou seja, nas cartas de Laquis, costuma ser derivada do vb. acad. nabú, chamar, proclamar. No entanto, há diferentes opiniões quanto a considerar-se o subs. com um sentido ativo ou pas sivo. Os estudiosos modernos, de modo geral, tendem a considerá-lo passivo: aquele que é chamado, nomeado (cf. Jeremias, 2.7, para uma discussão com mais literatura). Concorda mos com C. H. Peisker (3:77) que Deus seja o agente por trás da forma pass., uma vez que é ele quem chama.
AT 1. Dados gerais, a. O subs. nãbV é encontrado 315x no AT (ver Jeremias, 7— 8, para as estatísticas e ocorrências nos vários livros do AT). b. O termo nãbV no sing., com um art. depois do nome do profeta é usado para indicar o cargo e a função do profeta. c. O pl. nebt'tm refere-se aos profetas como um grupo. São usados três subs. para indi car a natureza dos grupos: hebel I, equipe, grupo (de profetas, # 2474), !ahaqâ, a comunidade venerável (de profetas, # 4272) e benê-hannebi 'im, discípulos dos profetas (ver abaixo). d. As formas derivadas são o feminino neb ia , profetisa (# 5567) e o subs. abstrato nebü'â, a palavra profética, profecia (# 5553). Formas pertencentes a esse âmbito semântico: m assã’ II, pronunciamento (-> # 5363) e ne 'um, declaração, decisão (# 5536). e. Títulos alternativos para um profeta: rõ 'eh I (-> # 8014) ou hõzeh I, vidente (-> # 2602), 'is ha ’elõhim, homem de Deus, 'ebedyhwh, servo de Javé, mal 'ãkyhwh, mensageiro de Javé e dois títulos que indicam o profeta como sentinela: mesappeh (-> # 7595) e sõrnêr (-> # 9068). Juntos, esses títulos definem o profeta como um homem que foi chamado para comunicar a palavra revelada de Deus, como um homem que possui relação íntima com Deus como servo dele e mensageiro e aquele cuja tarefa é ser um sentinela guardando o povo de Deus. 2. a. O vb. nh ’, ni./hitp. falar ou comportar-se como um profeta (# 5547) é derivad desse substantivo. Nos textos mais antigos, o uso predominante é do hitp., enquanto o ni. pre domina nos textos mais recentes. De acordo com a sugestão de Peisker (77), nos tempos mais antigos, o que prevalecia na profecia era um comportamento extático, expressado pelo hitp., que depois se tornou suspeito. Mais adiante ainda (de Jeremias para frente), o vb. deixou de 1068
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indicar êxtase e podia ser usado sem nenhum constrangimento. (Ver abaixo para mais sobre essa sugestão.) b. Ver Jeremias (8 e 16-17) para ocorrências e estatísticas nos vários livros do AT epara uma suposta distinção em significado entre o ni. e o hitp. De acordo com Jeremias (16) não há nenhuma distinção clara entre o ni. e o hitp. com referência ao significado, no que diz res peito ao radical, mas os dois diferem em sua forma de comunicação: o ni. expressa profecias enquanto o hitp. concentra-se no comportamento profético (16). 3. Considerações teológicas. Nosso ponto de partida é a distinção teologicamente levante feita em Deuteronômio 18.19-20 entre: a. profetas que falam em nome do Senhor; b. profetas que ousam proclamar uma mensagem em nome do Senhor quando ele não ordenou que 0 fizesse; e c. profetas que falam em nome de outros deuses. Discutiremos essas categorias de profetas na seguinte ordem: os profetas que falam em nome de outros deuses, os verdadeiros profetas e os chamados falsos profetas. a. Profetas relacionados ao culto pagão. i. Profetas e profecias em seu contexto. OMA e no mundo helenístico adjacente, podem-se encontrar vários fenômenos, especialmente nas chamadas cartas de Mari, que são comparáveis aos profetas e profecias no AT. Cremos ser suficiente indicar alguns dos títulos usados para esses supostos profetas no OMA. Em alguns documentos encontrados em Ebla, ocorre o título nabfutum , que é o equivalente mais próximos do heb. nãbi’. Outros títulos que, em termos mais amplos possui um significado semelhante são barú, vidente, mahhú(m) (em textos de Mari, muhhú(m), um extático, e ãpilu(m), um respondente, aquele que responde. O equivalente G é prophêtês, lit. aquele que prenuncia, mas, em seu uso comum,prophêtês indica qualquer pessoa que tem algo a dizer em público (cf. J. Lindblom, 1963,26-29). ii. Práticas pagãs citadas no AT. As referências a práticas pagãs de adivinhação e feitiçaria, ou seja, práticas mânticas e mágicas, encontram-se resumidas em Deuteronômio 18.10-11, 14: “Não se achará entre ti quem faça passar pelo fogo o seu filho ou a sua filha, nem adivinhador (qãsênr, # 7877), nem prognosticador (me 'ônên; -> # 6726), nem agoureiro (menahês\ # 5727), nem feiticeiro (mekassêp; -> #4175); nem encantador (hõbêr hãber, -> # 2042), nem necromante (sõ'êl ’ôb\ -> # 200), nem mágico (yidde'õni\ # 3362), nem quem consulte os mortos (dõrês 'el-hammêtim)... Porque estas nações que hás de possuir ouvem os prognosticadores (me ‘ônên) e os adivinhadores (qõsênr, -> # 7876); porém a ti o Senhor, teu Deus, não permitiu tal coisa”. Uma indicação clara daquilo que era praticado entre as nações também pode ser encontrada em Jeremias 27.9. O profeta admoesta os enviados dos reis de Edom, Moabe, Amom, Tiro e Sidom dizendo-lhes: “Não deis ouvidos aos vossos profetas (nãbi’) e aos vossos adivinhos (qõsêm), aos vossos sonhadores (halônr, -> # 2706), aos vossos agoureiros ( 'ônên) e aos vossos encantadores (kassãp; -> # 1477), que vos falam, dizendo: Não servireis o rei da Babilônia”. Pode-se encontrar ainda referências a práticas pagãs em Josué 13.22; Juizes 9.37; 1 Samuel 6.2; 2 Reis 10.19; Jeremias 2.8; 29.8; Daniel 5.7, etc. ( Para o fenômeno mântico, ver qsm, praticar adivinhação # 7876). iii. Israel é proibida de envolver-se com essas práticas. Tais práticas eram expressamente proibidas em Israel. Não era permitido a pessoa alguma juntar-se às nações na realizações de atos mànticos e mágicos (Dt 18.10, 14). Essa proibição é confirmada em Levítico 19.26-28, 31; 20.6, 27, etc. iv. Práticas pagãs realizadas por Israel. A distinção entre o lícito e o ilícito no âmbito religioso se aplica a esse aspecto da religião de Israel. Em oposição à ordem de Deus, ao longo de sua história, os israelitas se entregaram à realização de práticas de adivinhação e feitiçaria. Saul teve que expulsar da terra todos os que tratavam com fantasmas e espíritos (“os médiuns 1069
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e adivinhos”, ISm 28.3). Jezabel manteve sua idolatria obscena e sua feitiçaria abominável (2Rs 9.22). Um dos motivos para a calamidade que caiu sobre o reino do Norte, Israel e seu exílio, foi o fato de se praticarem ali agouros e adivinhações (17.17). Manassés ignorou os tensivamente a ordem explícita de Deus: “E queimou a seu filho como sacrifício, adivinhava pelas nuvens, era agoureiro e tratava com médiuns e feiticeiros”(2 1.6). O rei Josias se livrou de todos aqueles que invocavam fantasmas e espíritos (23.24). Essas práticas religiosas ilícitas também podem ser vistas em textos como Isaías 2.6; 3.1-3; 8.19-20; 44.25; Jeremias 14.14; Ezequiel 12.24; 13.6; Miquéias 5.12; Zacarias 10.2, etc. b. Os verdadeiros profetas do Senhor, i. A questão do início. A fim de responder a pe gunta, “Quando teve início a profecia?”, será preciso fazer uma distinção entre o início histó rico e o início oficial da profecia. Em termos históricos, a profecia como uma comunicação entre Deus e a humanidade já existia desde os priniórdios da história humana. De acordo com Cristo, no sangue de todos os profetas, derramado desde a fundação do mundo, está o de Abel (Lc 11.51). Judas 14 faz men ção de Enoque como alguém que “profetizou” contra os pecadores do seu tempo. Noé atuou como profeta quando deu ouvidos às advertências sobre o futuro desconhecido (Hb 11.7). No AT, o profeta é mencionado nos mais diversos contextos e com diferentes funções: Abraão foi chamado de profeta devido à sua intercessão (Gn 20.7; cf. SI 105.12-15); Arão foi o porta-voz de Deus e de Moisés (Ex 7.1; cf. 4.16); Miriã recebeu o título de profetisa (Ex 15.20) por cau sa de seu cântico quando os israelitas atravessaram o mar Vermelho; Moisés, o mediador da lei, o líder de seu povo, também era um profeta (Nm 12.1-8; Dt 18.15, 18; 34.10; Os 12.13), etc. (-> Moisés, # 5407) Em termos oficiais, a instituição do ofício de profeta coincide com a instituição de Is rael como povo de Deus no Sinai. Trata-se de um fato afirmado de modo bastante claro em Deuteronômio 18.16-20, juntamente com 5.23-33 e atestado por Amós 2.9-11 e Jeremias 7.25. Apesar de ser mais do que um profeta, Moisés deve ser considerado modelo e paradigma do ofício profético. Essa idéia não é contradita pela concepção adotada pelo judaísmo posterior e no NT (cf. At 3.24; 13.20; Hb 11.32), de que a profecia começou, de fato, com Samuel. As duas tradições são válidas. ii. Profetas e profetisas. Os judeus contaram 48 profetas e 7 profetisas, sendo estas ú timas Sara, Miriã, Débora, Ana, Abigail, Hulda e Ester (Talmude, tratado Megila). A função e o papel dos profetas individuais, sem se considerarem os chamados profeta escritores, deve ser avaliados em diferentes níveis. Alguns atuaram ocasionalmente de modo profético sem serem profetas em si, p. ex., Abel, Enoque, Noé, Abraão, Isaque, Jacó, Davi, Salomão, Asafe, Hemâ e Jedutum (cf. lCr 25.1). Eldade, Medade e os setenta anciãos (Nm 11.24-29), bem como Saul (ISm 10.6-10; 19.18-24) foram levados pelo Espírito Santo a agir como profetas apenas uma vez (Nm 11.25; cf. ISm 10.6; 19.23). Há seis profetas anônimos (Jz 6.7-10; lRs 13 e 20; 2Rs 9.1-10). No entanto, a distinção geralmente aceita entre profetas “atuantes” e “escritores” é arbitrária. Há vários profetas individuais cujos escritos são mencio nados pelo cronista como parte de suas fontes literárias. Com relação a isso, ele cita os livros de Samuel o vidente, Natã o profeta e Gade, o vidente (lC r 29.29-30); a Profecia de Aías de Siló; as Visões de Ido (2Cr 9.29); o Livro da História de Semaías e o de Ido, o vidente (12.15), que também é chamado de profeta (13.22); as Crônicas de Jeú, filho de Hanani, que foram in cluídas na História dos Reis de Israel (20.34); as visões do profeta Isaías (32.32) e, de modo geral, os discursos dos videntes (33.18-20). O fato de essas fontes literárias serem indicadas de maneiras diferentes, a saber, histórias/crônicas, profecias, visões e discursos, não deve levar à 1070
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idéia de que elas fossem de todo distintas. O conteúdo delas é basicamente histórico, mas visto sob a ótica da intervenção de Deus na história de Israel. Seis profetas individuais tiveram um papel importante na história e religião de Israel. São eles Samuel, Gade, Natã, Micaías filho de Iniá, Elias e Eliseu. Samuel reunia em suas fun ções os ofícios de juiz, tanto no sentido militar (1 Sm 11.12) quando judicial (1 Sm 7.15-17), sacerdote (7.9-10; cf. 13.8-15) e profeta (3.19— 4.1; 9.6-10, etc.). Não aceitamos a idéia de que a “história” de Samuel fora obscurecida pela interpretação teológica a ponto de não haver o que se dizer sobre o Samuel “histórico” (em oposição a J. Blenkinsopp, 65). Gade, o profeta que é chamado de “vidente de Davi” (2Sm 24.11), ocupou uma posição importante no séquito de Davi desde o tempo em que Davi fugiu de Saul (ISm 22.5) até o fim do reinado de Saul, quando o profeta teve que confrontar seu rei com o julgamento de Deus devido à realização do censo (2Sm 24.1-25; cf. lCr 21.1—22.1). Juntamente com Natã, Gade foi de grande ajuda na reorganização da música do templo (cf. 2Cr 29.25) e os acontecimentos do governo do rei Davi foram registrados do princípio ao fim nas crônicas de Gade, o vidente ( lCr 29.29). Natã, o profeta e conselheiro de Davi, desempenhou um papel importante em pelo menos três oca siões: quando repreendeu o rei pelos crimes contra Urias e esposa (2Sm 11.1— 12.23); quando Davi pediu o conselho do profeta com relação à sua intenção de construir um templo para o Senhor (2 Samuel 7; cf. 1Cr 17.1 -27) e quando teve uma participação crítica na instituição de Salomão como sucessor de Davi (1 Rs 1.8, 22-27). Natã assistiu a organização da música do templo (2Cr 29.25), e seus escritos sobre o reinado de Davi (lC r 29.29) e o de Salomão (2Cr 9.29) foram parte das fontes literárias do cronista. De acordo com os rabinos, Natã era primo de Davi. Micaías, filho de Inlá (1 Reis 22 = 2 Crônicas 18), Elias o tesbita, originário Tesbe, em Gileade (I Reis 17— 19; 21.17-29; 2 Reis 1—2) e seu sucessor Eliseu, filho de Safate, de Abel-Meolá (1 Rs 19.16; 2Rs 2.1-18, etc.) tiveram um papel importante na confrontação divina de Acabe e do culto a Baal. Alguns profetas (secundários) dignos de nota são Aías de Siló (lR s 11.29-39; 14; cf. 2Cr 9.29); Ido, o vidente (hõzeh 2Cr 9.29) e profeta (13.22; cf. 12.15); o vidente (hãrõ 'eh) Hanani (16.7-10) e seu filho, o profeta Jeú (lR s 16.1-7); o profeta Azarias, filho de Odede, sobre o qual veio o Espírito de Deus (2Cr 15.1-8) — suas palavras ao rei Asa foram consideradas “profecia” (f^ b ü a , v. 8); Semaías, o homem de Deus (1 Rs 12.22; 2Cr 11.2); Jaaziel, filho de Zacarias, sobre o qual veio o Espírito do Senhor (2Cr 20.14-17), e que era um levita, membro do grupo de cantores de Asafe; Eliezer, filho de Dodavá, que “profetizou” contra Josafá (20.37); Zacarias, filho do sacerdote Joiada, que proclamou o julgamento de Deus sobre o rei Joás e pagou por isso com a vida (24.17-22; cf. Lc 11.51); Odede, um “profeta do Senhor” que disse ao exército vitorioso do reino do Norte, Israel, para libertar os cativos judeus na guerra siroefraimita e que foi acatado (2Cr 28.9-15), e Urias, filho de Semaías, o último profeta-mártir do qual se tem conhecimento (Jr 26.20-23) — profeta este que é mencionado também nas cartas de Laquis. Cinco profetisas são citadas: Miriã(Êx 15.20), Débora (Jz4.3-5), Hulda (2Rs 22.1420; cf. 2Cr 34.22-28), Noadia (Ne 6.14) e a esposa de Isaías, da qual não sabemos o nome (Is 8.3). Noadia foi uma das adversárias de Neemias que tentou intimidá-lo e, portanto, faz parte da categoria dos falsos profetas. O mesmo se aplica às mulheres de Israel “que profetizam de seu coração” (Ez 13.17-21). As atividades proféticas entre as mulheres faziam parte da herança religiosa e cultural do OMA, o que contemplava o mundo helenístico. Em resumo: •
Todos os profetas individuais, com exceção de Jaaziel, são indicados pelos títulos habituais de nãbílrfibVâ, r õ ’eh/hõzeh e “homens de Deus”. 1071
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De modo geral, a linhagem e condição social desses profetas e profetisas são des conhecidas. Natã era neto de um servo egípcio chamado Jacarta (cf. ICr 2.34-36 com lRs 4.5). Jaaziel era membro do coral levítico de Asafe e Zacarias era filho do sacerdote Joiada. Hanani e Jeú eram pai e filho, a única relação de parentesco entre dois profetas. Em todos esses casos, os profetas mencionados acima desempenharam esse pa pei, transmitindo a revelação de Deus a pessoas específicas. Micaías, filho de Inlá, apresentou uma definição clássica de profecia quando respondeu à insinuação do mensageiro do rei para que concordasse com a resposta favorável sobre a qual os profetas do rei eram unânimes: “Tão certo quanto vive o Senhor, o que o Senhor me disser, isso falarei” (1 Rs 22.14; cf. 2Cr 18.13). Um aspecto importante de quase todos os profetas (inclusive algumas das profe tisas) é que dirigiram suas mensagens aos reis em questão, exatamente como foi feito nas cartas de Mari. O conteúdo dessas mensagens geralmente era de julgamento e castigo, com algu mas exceções, a saber, a profecia de Natã a Davi com sua perspectiva messiânica (2 Samuel 7; cf. cap. 23) e a de Jaaziel, que disse ao rei Josafá e aos habitantes de Judá e Jerusalém: “Não temais, nem vos assusteis por causa dessa grande multidão, pois a peleja não é vossa, mas de Deus” (2Cr 20.15). Os profetas Gade e Natã contribuíram para a reorganização da música do templo. As atividades dos profetas acarretavam certos riscos: Hanani e Micaías, filho de Inlá, foram presos e tanto Zacarias, filho de Joiada quanto Urias, filho de Semaías, perderam a vida. Um aspecto importante da experiência de alguns desses profetas era o fato de o Es pírito do Senhor vir sobre eles: Azarias, filho de Odede; Jaaziel, filho de Zacarias e Zacarias, filho de Joiada.
iii. Grupos de profetas. Dois grupos de profetas, chamados pelo plural nebí'im , perten cem à classe de verdadeiros profetas. Outros grupos estão associados a cultos pagãos (1 Reis 18; 2 Reis 10) ou a falsos profetas (1 Reis 22 = 2 Crônicas 18). E necessário fazer-se uma distinção entre os profetas individuais, considerados um grupo separado de “oficiais’ dentro da esfera religiosa de Israel e basicamente duas classes de profetas pertencentes a grupos que constituíam comunidades monásticas separadas. Com respeito à primeira classe, as Escrituras referem-se a eles como bonam e como mulam partem (cf. para bonam, ver Nm 11.29; 2Rs 17.13; 21.10; 2Cr 20.20; 24.19; SI 105.15; Jr 7.25; 35.15; Os 6.5; Am 3.7, etc.; para malam partem, ver Is 9.13-14; 28.7; 29.10, e em várias partes de Jeremias e Ezequiel). Os profetas pertencentes a grupos podem ainda ser divididos em dois segmentos: o grupo de profetas no intervalo entre os Juizes e a monarquia em Israel e os profetas do tempo de Elias e Eliseu. A relação íntima entre os grupos de profetas citados em 1 Samuel 10 e 19 é expressada por duas palavras heb.: hebel neb i’im, grupo ou equipe de profetas (10.5) e laPqal hanneb i’hn, a comunidade venerável de profetas (19.20; cf. W. L. Holladay). Possuíam seus próprios aloja mentos, chamados de Naiote, que significa pastagem, habitação, residência (“casa dos profe tas”, 19.18-22). O comportamento deles era caracterizado pela efusisividade e entusiasmo. De acordo com 1 Samuel 10, as atividades proféticas deles eram acompanhadas de instrumentos musicais especialmente apropriados para acentuar movimentos rítmicos (cf. 18.10; Êx 15.20; 1072
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2Rs 3.15; para um contraste, ver 1 Samuel 19). Os atos proféticos daqueles são indicados duas vezes pela forma ni. do vb. (10.11; 19.20) e dez vezes pelo hitp. (10.5, 6, 10, 13; 18.10; 19.20, 21 [bis], 23, 24) sem nenhuma distinção aparente de significado (cf. 19.20). A tradução desses vbs. como “gritando e dançando” ou “em êxtase/frenesi profético” conforme algumas versões, parece um tanto sobrecarregada em termos semânticos! Aqueles profetas simplesmente agiam ou se comportavam como profetas. As ações de Saul e, posteriormente, de seus mensageiros, foram inspiradas (heb. çlh, ser forte, eficaz, poderoso [com 'al, sobre alguém]) pelo Espírito do Senhor (ISm 10.6, 10; 19.20, 23). O conteúdo das “profecias” deles (10.5) deve ser entendido em relação à unção de Saul como rei (caps. 9— 10): Consiste de declarações proféticas breves, acompanhadas de gestos e músicas, que receberam consideração especial por haverem ocorrido nas vizinhanças de um acampamento filisteu (10.4). A participação de Saul nas atividades proféticas foi motivo de es panto para os observadores (10.11 -12), mas indicou, por si mesma, que a monarquia dc Israel encontrava-se intimamente ligada à legitimação profética. De acordo com 19.20, o grupo de profetas estava agindo ou falando (ni.) como profetas, enquanto Samuel (lit.) apresentava-se como aquele que era encarregado deles. Assim, Samuel era líder deles, seu “regente” deles, um comentário de relevância teológica: esses profetas agiram em conjunto com Samuel e não podem, portanto, ser relacionados a cultos ou protótipos pagãos. A segunda classe ou grupo de profetas é indicada sempre como benê-hannebi ’im, dis cípulos dos profetas, no sentido de “Prophetengenossenschaft", uma comunidade de profetas (IRs 20.35; 2Rs 2.3, 5, 7, 15; 4.1, 38; 5.22; 6.1; 9.1; Am 7.14). Vários desses grupos encontravam-se em Gilgal, Betei e Jericó. Seus profetas eram casados, tinham filhos e viviam em suas próprias residências; de acordo com 2 Reis 4 e 6, eram pobres. Com exceção de 1 Reis 20.3543, das narrativas sobre os discípulos dos profetas Eliseu fazia parte como líder e mestre, o que fica especialmente claro em 2 Reis 4.38 e 6.1, em que é dito que os profetas encontraram-se com Eliseu. O vb. ysb tem o sentido duplo de “assentar-se” e “habitar”. Em 4.38 a intenção é, obviamente, indicar que era costume (part.) dos profetas assentarem-se aos pés de Eliseu, deixando implícito que ele os ensinava. Em 6.1, os profetas se queixam de que o lugar onde normalmente (part.) habitavam/assentavam-se com Eliseu tornou-se apertado demais. Uma vez que Eliseu não permanecia em um só lugar, mas sim viajava por toda parte, essa expressão assentar-se diante dele / habitar com ele só podia significar o lugar onde, de tempos em tem pos, Eliseu ensinava os discípulos. É pouco provável que o objetivo desses “seminários” fosse ensinar a esse homens como se tomarem profetas, como receber a revelação de Deus, pois o conteúdo de suas mensagens como profetas nâo podia ser aprendido, mas apenas recebido. Assim, é possível que Eliseu lhes ensinasse a história da revelação de Deus, as questões morais contidas na tôrà e, talvez, o cuidado pastoral. Salvo raras exceções, não fica claro se os discípulos dos profetas chegavam a exercer a função profética. As exceções são as narrativas de dois discípulos individuais dos profetas que agiram “por ordem do Senhor” ( IRs 20.35; cf. 2Rs 9.1-13). O comentário desfa vorável dos generais de Jeú de que o discípulo dos profetas era um “louco” (heb. hamsuggã', 9.11) foi injustificado, pois o ato de ungir uma pessoa para ser rei era uma prática bastante conhecida na história de Israel ( ISm 10.1; 16.12-13; IRs 1.39,etc.). Em nenhuma das narrati vas sobre os discípulos dos profetas eles agem ou se comportam como extáticos ou “loucos”. O fato de Amós negar que pertencia à comunidade de benê-hannebi'im (Am 7.10-17) indica uma degeneração dos padrões morais desses profetas, especialmente a ponto de supervalorizarem suas necessidades materiais mais prementes ao profetizarem em troca de alimento. O fenômeno de grandes personalidades proféticas como Samuel e Eliseu, cercados de grupos de 1073
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profetas também ocorre com relação a Isaías (8.16-20) e Jeremias (Baruque) e especialmente com o Grande Profeta, Jesus Cristo (Mt 4.18-21, etc.). iv. Os profetas “escritores”. O título profético nãbí' ocorre 156x nos livros dos profet escritores, especialmente em Jeremias (95x) e Ezequiel (17x) e o vb. em sua forma hitp., apare ce 7x e na forma ni., 80x, mais uma vez, principalmente em Jeremias e Ezequiel, 35x em cada um (cf. J. Jeremias, 8). A questão é se os profetas escritores antes de Jeremias consideravam-se nebi'im. De acordo com o estudioso J. Jeremias, não se sabe ao certo se esse era o caso (14, com referência a A. H. J. Gunneweg, Miindliche and schriftliche Tradition der vorexilischen Prophetenbiicher, 1959,98-106). Essa questão, porém, só pode ser respondida se o termo pro feta for considerado no contexto da controvérsia entre profeta e profeta, entre os verdadeiros e falsos profetas. O ataque manifesto dos profetas escritores à instituição profética é, de fato, uma rejeição apenas a uma forma substitutiva da instituição e não da instituição em si. Ao procurar solucionar esses problema, não devemos nos apressar em lançar mão da prática exegética de eliminar passagens como sendo secundárias pelo fato de as considerarmos fora do contexto. Amós, o mais antigo dos profetas escritores, é um exemplo que estabeleceu preceden tes nesse sentido. A rejeição de Amós da acusação de Amazias — de que Amós era um “vi dente” que ganhava a vida profetizando (Am 7.12) — deve ser considerada tendo-se em vista a degeneração clara dos profetas pertencentes a certos grupos (cf. Mq 3.5, 11). Amós negou categoricamente pertencer a essa classe de profetas. Ele não era, de fato, um profeta atuante desde o começo da vida; a ocupação dele era a de boieiro e cultivador de sicômoros (Am 7.14). No entanto, isso não nega o fato de que estivesse atuando como profeta naquele momento! O Senhor veio a Amós quando este estava seguindo seu rebanho e lhe disse: “Vai e profetiza ao meu povo de Israel” (7.15). Amós não tinha dúvida alguma em sua mente de que estava atu ando e falando como verdadeiro profeta do Senhor. Por isso pôde prosseguir dizendo: “Ora, pois, ouve a palavra do Senhor. Tu dizes: Não profetizarás contra Israel, nem falarás contra a casa de Isaque. Portanto, assim diz o Senhor: Tua mulher se prostituirá na cidade, e teus filhos e tuas filhas cairão à espada, e a tua terra será repartida a cordel, e tu morrerás na terra imunda, e Israel, certamente, será levado cativo para fora da sua terra” (7.16, 17). A consciência que Amós tinha de si mesmo como verdadeiro profeta é apoiada por 2.11 -12 e, especialmente, por 3.7: “Certamente, o Senhor não fará coisa alguma, sem primeiro revelar o seu segredo aos seus servos, os profetas”. (-> Amós: Teologia) Oséias identifica-se com os profetas que foram inspirados pelas palavras com que Deus despedaçou seu povo e o abateu (Os 6.5), por meio dos quais Deus se expressou (12.10 [11]> e fez subir Israel do Egito (12.14 bis). Aos olhos de seus adversários, Oséias agiu como insensato (9.7), mas isso se devia aos pecados deles. Deus, pelo contrário, designou Oséias para ser um sentinela ($õpeh) a Efraim (9.8), como um membro verdadeiro da “Oppositionsgemeinshaft" (Wolff, Stud., 233, citado por J. Jeremias, 14). O pleito de Deus com os sacerdotes abrangia os (falsos) profetas (4.4-5). (-> Oséias: Teologia) Isaías é identificado como nãbí' somente na seção histórica de seu livro (Is 37.2, cf. v. 6; 38.1, cf. v 4; 39.3, cf. v. 5). Em algumas outras passagens, o julgamento de Deus sobre Jerusalém e Judá recaía também sobre os (falsos) profetas (3.2; 9.14; 28.7; 29.10). Isaías não se considerava necessariamente um “vidente” (diferentemente da opinião de J. Jeremias, 15), apesar de fazer referência a uma “visão” (hãzôn) que ele “teve” (hzh 1.1). Em 2.1 essa visão é identificada com haddãbãr, a palavra ou mensagem que ele “viu” (hzh). Em 37.6; 38.4 e 39.5 foi a palavra do Senhor que veio a ele e sobre a qual ele teve que meditar. Em 8.3, a esposa de Isaías é chamada de hannebi a, a profetisa. (-> Isaías: Teologia) 1074
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Miquéias transmitiu as palavras de julgamento do Senhor contra os (falsos) profetas (Mq 3.5-6, 11). Jeremias estava profundamente cônscio de seu chamado profético (Jr 1.5; 19.14; 26.12) e essa consciência foi defendida ao longo de todo o livro, no sentido de que especialmente nas passagens narrativas, ele é identificado como hannãbi’, o profeta (31x, cf. 20.2; 25.5, 6, etc.). Isaías considerava-se membro de uma série de profetas verdadeiros (28.8; cf. 2.30; 5.13; 26.16-19). O título nãbi' ocorre 95x no livro de Isaías e o vb. no hitp., 5x e no ni., 35x (cf. J. Jeremias, 8, 15). (-> Jeremias: Teologia) Ezequiel também se considerava um nãbi’, cujo chamado ocorreu-lhe enquanto ele estava prostrado no chão devido à luz ofuscante que mostrou a presença do Senhor: “Filho do homem, eu te envio aos filhos de Israel... Eles, quer ouçam quer deixem de ouvir, porque são casa rebelde, hão de saber que esteve no meio deles um profeta” (Ez 1.28—2.5; cf. 22.1; 33.33). O título nãbi', especialmente no pl., ocorre 17x e refere-se, na maior parte das vezes, aos falsos profetas (cf. caps. 13 e 14; também 22.25 [de acordo com o TM; a LXX apresenta “príncipes”]). A comissão de Ezequiel pelo Senhor para falar como profeta foi descrita nos termos de uma fórmula estereotipada: o ni. imperativo com as preposições 'el (6.2; 21.2[conj. a/]; 21.7; 36.1; 37.9) ou ‘al (4.7; 11.4, etc.) ou com o perfeito consecutivo de ’mr, profetizar e dizer (21.28 [33]; 30.2; 34.2, etc.). O hitp. é usado apenas duas vezes (13.17 e 37.10), espe cialmente em 37.10 sem nenhuma distinção. (-> Ezequiel: Teologia) O título nãbi ’ aparece num total de 21x nos livros de Habacuque (2x), Sofonias (lx), Ageu (5x), Zacarias (12x) e Malaquias (1 x). O ni. do vb. ocorre somente em Zacarias (3x). Em três livros, o título faz parte do cabeçalho que geralmente (injustamente?) é considerado secun dário (cf. Habacuque, Ageu, Zacarias). O ofício profético de Ageu e sua função como profeta são devidamente atestados; ele é chamado de “o profeta” em sete das onze ocorrências de seu nome na Bíblia(cf. Ag 1.1,3,12; 2.1, 10; Ed 5.1; 6.14). Como “enviado do Senhor” (Ag 1.13; cf. Ml 1.8), Ageu é representado em seu livro como um instrumento de Deus investido de au toridade (ver Verhoef, The Books o f Haggai and Malachi, 1987, 3, 51). O mesmo se aplica ao profeta Zacarias (Zc 1.1,7), cuja comissão era lembrar o povo daquilo que Deus havia feito e dito por intermédio de profetas anteriores (1.4-6; 7.7, 12; 8.9). Ageu também se dirigiu a pes soas que afirmavam indevidamente ser profetas (13.2-5). De acordo com Sofonias, o pecado de Jerusalém se devia basicamente aos seus líderes políticos, profetas e sacerdotes locais (Sf 3.1-5). Os profetas eram irresponsáveis e traiçoeiros (vs. 4). A única referência de Malaquias é ao profeta Elias (Ml 3.23 [4.5]). v. A mensagem dos profetas escritores. Ao analisar o conteúdo da mensagem dos pr tas devemos, como ponto de partida, considerar tanto a dimensão vertical quanto a horizontal dessa mensagem. Os profetas eram, em primeiro lugar e acima de tudo, pregadores da Palavra de Deus (dãbãr, Jr 18.18; 27.18) e da sua revelação (hãzõn, Is 1.1; 2.1; Ez 7.26). Essa pala vra “veio” a eles (Jr 1.2, 4; 2.1, etc.), está dentro deles (Hc 2.1), é falada a eles pelo Senhor (Jr 46.13), que os capacita para falar em nome do Senhor (Dt 18.20) ou então é a palavra que o Senhor falou por intermédio deles (Jr 37.2; cf. Ag 1.1, 3, etc.). O próprio Senhor cumpre a palavra; vigia para que elas se concretizem (Jr 1.12); para que suas ordens sejam obedecidas (Ez 12.25,28); ele garante o cumprimento das palavras dos profetas (Ez 33.33; Dn 9.24); essa palavra não deixará de realizar tudo o que Deus planejou para ela (Is 55.10-11; cf. J. Jeremias 18). A iniciativa dessa mediação da palavra foi, por vezes, tomada pelos profetas no sentido de que agiam em oração e súplica em favor do povo de Deus; no entanto, geralmente, a iniciativa parte do Senhor. A indicação específica de que a palavra do Senhor “veio” aos profetas subli nha o caráter objetivo e real dessa fórmula de revelação; a palavra não teve origem na mente 1075
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dos profetas, mas ocorreu, manifestou-se e, assim, foi recebida e comunicada pelos profetas (cf. Verhoef, Haggai and Malachi, 45; J. Jeremias, 18). A dimensão horizontal da mensagem dos profetas encontra-se no fato de que recebe ram a comunicação dentro do contexto religioso, histórico e cultural da época (cf. J. Jeremias, 21). Essas mensagens eram proferidas de acordo com as circunstâncias e condições concretas tanto de Israel quanto das nações. Com relação à história, a mensagem dos profetas abrangia o passado, o presente e o futuro. A dimensão futura encontrava-se na natureza de uma advertên cia, na qual o futuro era ligado à situação presente do ouvinte. Concordamos com Peisker (79) que não se tratava de uma predição, uma vez que nesse caso a atenção é tirada do presente e voltada para um ponto no futuro, prenunciando o que acontecerá nos dias vindouros. Os temas da mensagem dos profetas compreendiam toda a série de revelações de Deus por intermédio de atos e palavras, mas concentrava-se especialmente em quatro áreas da vida: a ético-religiosa, a socioeconômica, a política (tanto interna quanto externa) e a escatológica. Em todas essas esferas, os profetas proclamavam o julgamento de Deus e, ao mesmo tempo, anunciavam a salvação (cf. J. Jeremias, 20— 22). Peisker resumiu perfeitamente as evidências referentes aos profetas: “O profeta do Antigo Testamento é um proclamador da palavra, chamado por Deus para advertir, exortar, consolar, ensinar e aconselhar, prestando contas somente e Deus e assim, desfrutando uma liberdade singular” (79). vi. Daniel (->), que constitui parte dos Escritos na BH, é considerado um exemplo de escritos apocalípticos judaicos (->). Essa forma de literatura se distingue da profecia pelo cará ter sobrenatural; de acordo com W. Baumgarten, isso se dá por meio de “sua pseudonímia, sua impaciência escatológica, preocupação com a história mundial e o horizonte cósmico, simbo lismo numérico e linguagem esotérica, doutrinas dos anjos e esperança de vida depois da morte (“Ein Vierteljahrunder Danielforschung”, TRu 11,1939,136-37, citado por Peisker, 80). Apesar de a literatura apocalíptica e da profecia serem diferentes uma da outra, ambas compartilham o mesmo vínculo essencial com a revelação e o elemento da expectativa. A profecia é como um avião decolando da pista da história e alçando vôo até o futuro escatológico, enquanto a lite ratura apocalíptica é o avião irrompendo por céus tempestuosos a fim de aterrissar numa pista de contornos ainda rudimentares no futuro. Os rabinos consideravam corretamente a literatura apocalíptica como a sucessora legítima da profecia (Seder ‘olam Rabhah 30). vii. O Salmo 74.9 (cf. Lm 2.9, 20) deixa subentendida a cessação da profecia, o que é apoiado por 1 Macabeus 9.27 (cf. 4.46; 14.41), mas a profecia em si é honrada e cumprida nas realidades do NT (Hb 1.1; cf. Mt 1.22; 2.15, 23; 13.35; 21.4, etc., e Peisker com uma extensa literatura). c. Falsos profetas. Um falso profeta no AT é um contraprofeta em dois sentidos: a fo te de sua “inspiração” é uma revelação substitutiva e ele e o profeta verdadeiro encontram-se constante e ativamente em conflito um com o outro. A história das duas classes de profetas encontra-se, na realidade, implicitamente entretecida e pode ser descrita desde o começo da história da revelação de Deus. Em certo sentido, poderíamos considerar o diabo como o primei ro falso profeta, sendo a sua participação na desobediência da humanidade o primeiro ato no drama da falsa profecia (Gênesis 3; cf. Jo 8.44). A primeira referência explícita à falsa profecia e advertência sobre ela encontra-se em Deuteronômio 13.1-5 e 18.20, e o auge das atividades dos falsos profetas é mencionado em 1 Reis 22 = 2 Crônicas 18 e especialmente nos livros de Jeremias, Ezequiel e Miquéias. Jeremias, por exemplo, refere-se a eles em 14 dos 52 capítulos de seu livro (2; 4; 5; 6; 8; 14; 18; 23.9-40; 26; 27.9-16; 28; 29; 32). Os falsos profetas mostraram-se particularmente ativos nas décadas antes da destruição da cidade e do templo em 587 a. C.; de acordo com Lamentações, eles foram responsáveis pela calamidade do país: “Os teus profetas 1076
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te anunciaram visões falsas e absurdas e não manifestaram a tua maldade, para restaurarem a tua sorte; mas te anunciaram visões de sentenças falsas, que te levaram para o cativeiro” (Lm 2.14; cf. 4.13). Os falsos profetas devem ser avaliados em dois níveis: em primeiro lugar, à luz das Escrituras e, em segundo lugar, de acordo com as percepções do povo comum. i. O veredicto das Escrituras é inequivocamente negativo: ousam proclamar uma mensagem em nome do Senhor quando este não lhes ordenou que o fizessem (Dt 18.20). As palavras-chave para descrever suas atividades são sã w ', imprestável, em vão, engano (cf. Ez 12.24; 13.6, 7, 8, 9, 23; 22.28), kãzãb, mentira, falsidade (cf. 13.6, 7, 8, 19; 22.28) e l ‘h (hi.), fazer desviar, enganar (13.10). O Senhor não enviou seus profetas (Dt 18.20; Jr 14.14; 23.21, 32; 28.15; Ez 13.6, etc.); inspiram a si mesmos e criam suas próprias visões (Ez 13.3); estão levando o povo a crer numa mentira (Jr 28.15; 29.31); estão ocultando os pecados do povo como homens caiando uma parede (Ez 22.28; cf. 13.10-15); estão relatando seus sonhos que são repletos de mentiras (Jr 23.32); são irresponsáveis e traiçoeiros (Sf 3.4); o povo é enganado por profetas que prometem paz àqueles que lhes pagam (Mq 3.5; cf. Ez 13.19); o comportamen to moral deles é vergonhoso: de tão embriagados, cambaleiam pelas ruas (ls 28.7); eles e os sacerdotes são ímpios; fizeram o que era mau dentro do próprio templo (Jr 23.11); os pecados dos profetas de Jerusalém são piores até mesmo do que os pecados dos profetas de Samaria: cometem adultério e contam mentiras; ajudam o povo a fazer o que era errado, de modo que ninguém pára de praticar o mal (Jr 23.14). O Senhor certamente castigará esses profetas: ele os fará tropeçar e cair (Jr 23.12). Nenhum deles jamais soube os pensamentos secretos do Senhor. “ Eis a tempestade do Senhor! O furor saiu, e um redemoinho tempestuou sobre a cabeça dos perversos” (Jr 23.19). Deus está prestes a castigar os profetas que têm visões falsas e fazem previsões enganosas (Ez 13.9). No futuro escatológico, o Senhor purificará os descendentes de Davi e o povo de Jerusalém de seu pecado e idolatria, o que significava, também, livrar-se de qualquer um que declare falsamente ser um profeta (Zc 13.1-6). ii. Do ponto de vista do povo, era praticamente impossível distinguir entre os verda deiros e os falsos profetas. Isso se deve a vários fatores. Em primeiro lugar, o termo “falsos” profetas, que ocorre na LXX (ou seja, Jr 6.13; 23.7, 8, 11, etc.) e no NT (cf. Mt 7.15; 24.11, 24; Mc 13.22; Lc 6.26; At 13.6; 2Pe 2.1; 1Jo 4.1; Ap 16.13; 19.20; 20.10), nâo aparece no AT. Os títulos que se referem a esses profetas são geralmente os mesmos empregados para os ver dadeiros profetas: nãbí' e hõzeh e, ocasionalmente, qõsêm (cf. Mq 3.7). Em segundo lugar, não existe praticamente nenhuma diferença formal nos papéis e funções desses dois tipos de profetas: • ambos atuavam e falavam como profetas (1 Rs 22.10, 12; Jr 28.2, 11; Ez 13.2, etc.); • ambos recebiam “revelações” por meio de visões e sonhos (cf. 1Rs 22.11); • ambos recorriam ao Espírito de Deus como fonte de inspiração (cf. I Rs 22:11); • ambos defendiam suas mensagens ao realizar atos simbólicos (lR s 22.11; Jere mias 28); • as Escrituras chegam a deixar espaço para a possibilidade de cumprimento das pro messas de um milagre ou prodígio por falsos profetas (Dt 13.1-5; Ez 13.6); • até mesmo a acusação de mau comportamento moral podia ser feita contra os ver dadeiros profetas (cf. 2Rs 9.11-12; Jr 29.26-27; Os 9.7); • a pressuposição de que os falsos profetas eram extáticos, como os profetas de Baal (1 Reis 18; cf. 2Rs 10.18-31) não costuma ter fundamento. É possível que alguns deles agissem desse modo (cf. Zc 13.6), mas sem dúvida não se tratava de uma prática comum. 1077
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Em terceiro lugar, as próprias Escrituras apresentam o cumprimento das profecias como norma para distinguir entre verdadeiros e falsos profetas (Dt 18.20-22; Jr 28.9; Ez 13.6; 33.33). Esse critério, porém, é válido somente quando o povo pode experimentar tal cumprimento, como no caso da morte de Acabe (lR s 22.29-40 = 2Cr 18.28-34) e também de Hananias (Jr 28.17). Na maioria dos casos, o cumprimento ocorre num estádio bem mais remoto da história, sendo esta, portanto, uma norma inapropriada de distinção. Em quarto lugar, uma característica importante para se discernir a verdadeira profecia da falsa consiste em compará-las com o conteúdo da Torá (cf. Dt 13.1-5; Is 8.19-20; Jr 6.16) e com os pronunciamentos de profetas anteriores (Jr 26.18; 28.8; Zc 1.4; 7.7, etc.). Até mesmo essa marca de distinção tem sua analogia na prática dos falsos profetas, “que furtam as minhas palavras [do Senhor], cada um ao seu companheiro” (Jr 23.30). Em quinto lugar, um dilema inescapável enfrentado pelo povo era distinguir entre o conteúdo teológico da fé de Israel e sua aplicação no dia do julgamento de Deus. A proclama ção de sãlôm para o povo podia ser teologicamente justificada em termos da teologia da alian ça de Israel: “Não está o Senhor no meio de nós? Nenhum mal nos sobrevirá” (Mq 3.11; cf. 2.7, 12-13; Jr 23.16-17, 25; 28.1-4, 11; Ez 13.10, 16; Am 2.9-16; 3.2; 5.18-20). Para o povo, as declarações dos falsos profetas eram o evangelho da verdade: “[Vós mentis] assim para o meu povo, que escuta mentiras” (Ez 13.19; cf. 13.10, 16; Jr 6.14; 8.11; 23.17; Mq 2.7; 3.5-8, 11; Lc 6.26). Na realidade, o povo não gostava das profecias dos verdadeiros profetas (Is 28.9, 10; Jr 26.9; 29.24-28; Os 9.8; Am 7.12,16; Mq 2.6-11; 3.5). Por fim, o exílio (->) foi uma calamidade de proporções abrangentes para a pequena nação, mas em especial para os falsos profetas; suas esperanças otimistas e garantias teológi cas foram completamente destruídas. Somente Zacarias se referiu a eles, mas num contexto negativo e escatológico: o Senhor se livrará de qualquer um que afirmar (falsamente) ser um profeta (Zc 13.2). O NT adverte contra eles muitas vezes (Mt 7.15; 24.11, 24; Mc 13.22; Lc 6.26; At 13.6; 2Pe 2.1; Uo 4.1; cf. Ap. 16.13; 19.20; 20.10). B ib l io g r a f ia
D. E. Aune, Prophecy in Early Christianity, 1983; J. A. Blenkinsopp, A History o f Pmphecy in Israel, 1983; S. J. DeVries, Prophet Against Prophet, 1978; J. Jeremias, “Prophet”, THAT, 2:7-26; J. Lindblom, Prophecy in Ancient Israel, 1963; A. Malamat, Mari and the Bible: A Collection o f Studies, 1975; idem, “A Forerunnerof Biblical Prophecy: The Mari Documents”, in P. D. Miller, P. D. Hanson e S. D. McBride, Ancient Israelite Religion, 1987, 33-52; C. H. Peisker (e C. Brown), “Prophet”, NIDNTT, 3:74-89, with extensive bibliography; G. V. Smith, “Prophet, Prophecy”, ISBE, 1986, 3:986-1004; W. A. VanGemeren, Interpreting the Prophetic Word, 1990; R. R. Wilson, Prophecy and Society in Ancient Israel, 1980; idem, “Prophet”, H arpers Bible Dictionarv, 1985, 826-30. P. A. Verhoef Profeta -> # 5566 (nãbi’, profeta) Proibição legal -> # 3049 (hrm I, banir, consagrar à interdição) Prole
# 2446 (zera', semente, prole, descendentes)
Propriedade -> # 8223 (rks, adquirir propriedade) Prosperidade 1078
# 7541 (smh, brotar, prosperar, fazer crescer)
Provérbios: Ditados e Temas
Prostituição -> # 2388 (znh l, cometer fomicação, meretrício) Prostração
# 9164 (spl, ser/estar baixo, ser nivelado, humilhar; abater)
Proteção -> # 8435 (sgb, ser alto, fortificado, proteger) Prova -> # 3247 (t 'm, provar, testar, sentir, discernir) Provação
# 4999 (massâ 1, tentação, provação)
Provérbio -> # 5439 (msl I, criar um provérbio, propor um enigma)
Os livro de Provérbios, Jó e Eclesiastes costumam ser classificados como a literatura de sabedoria do AT e, juntos, constituem parte importante de uma literatura característica e da linha teológica que corre por eles. Em Jeremias 18.18 (cf. Ez 7.26; Mq 3.11), o “conselho” do sábio é colocado junto da “lei” (Torá) dos sacerdotes e da “palavra” do profeta como fontes de autoridade e orientação divinas para a vida da comunidade. É um fato expressivo que essa distribuição tripartida se reflita, na divisão canônica da BH, em Lei, Profetas e Escritos — sendo que dessa última seção faz parte a literatura de sabedoria. 1. De modo geral, o livro de Provérbios é reconhecido como o depósito mais antigo e mais representativo da sabedoria israelita. A questão do contexto original do material contido nesses provérbios tem sido motivo de uma certa controvérsia. Em termos de forma e conteúdo, apresenta diversos pontos em comum com a literatura de sabedoria egípcia, especialmente com a Instrução de Amenemope, cujos trinta capítulos podem ter sido adaptados de modo a gerar os “trinta ditados” em Provérbios 22.17—24.22. A instrução de sabedoria egípcia girava em tomo da corte real e tinha como propósito treinar os príncipes reais e altos funcionários do Estado. Assim, foi sugerido que a sabedoria israelita teve origem no meio dos escribas reais na corte israelita e que dependeu da instrução egípcia, refletindo, desse modo, um etos da “classe alta”; outros argumentam que as raízes dela são nativas dos próprios clãs israelitas primitivos. Ao mesmo tempo em que o livro mostra laços estreitos com a corte real (cf. 1.1; 25.1) e contém ditados que se referem ao rei e seus oficiais, a maioria dos ditados dizem respeito à comunidade em geral. Assim, parece mais provável que a sabedoria tenha nascido de vários contextos, com vários expoentes: p. ex., o pai, o ancião, o escriba real e o conselheiro do período monárquico (Ecli 51.23, 26, 28; cf. Ec 12.9). O fato de mais de uma dessas influências ter atuado na reda ção de Provérbios ajuda a explicar a riqueza e a diversidade do material contido nessa obra e das muitas facetas da sabedoria que revela. 2. O livro é constituído de várias coletâneas de ditados (1.1 — 9.13 [“Os provérbios de Salomão”]; 10.1—22.16 [“Os provérbios de Salomão”]; 22.17— 24.22 [“As palavras dos sá bios”]; 24.23-34 [“São também estes provérbios dos sábios”]; 25.1—29.27 [“São também estes provérbios de Salomão, os quais transcreveram os homens de Ezequias, rei de Judá”]; 30.1-33 [“Palavras de Agur, filho de Jaque”]; 31.1-9 [“Palavras do rei Lemuel”]; e 31.10-31 [“a mulher virtuosa”]). Essas coletâneas foram compiladas em épocas diferentes antes de serem reunidas de modo a compor o livro em sua forma presente. É provável que Provérbios só tenha sido completado no período depois do exílio. A atribuição da maior parte deles a Salomão reflete o quanto o rei promoveu a sabedoria na sua corte e também mostra o papel de Salomão como arquétipo do “homem sábio” (IRs 3.9, 16-28; 4.29-34 [5.9-14]). Provérbios: Ditados e Temas
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O livro se apresenta como um programa educacional com o objetivo de ensinar espe cialmente os jovens (os “simples", ou seja, jovens sem instrução) como viver com sabedoria (cf. 1.2-6). O livro contém, sobretudo, três tipos de materiais: 1. instruções nas quais um “pai” (mestre) dá orientações ao “filho” (aluno) (caps. 1—9; 22.17—24.22; 31.1-9); 2. discursos da sabedoria personificada (1.20-33; 8.1-36; cf. 9.1-6) e 3. ditados proverbiais curtos (principal mente caps. 10.1—22.16; 24.23—30.33). 3. Os ditados proverbiais tratam de uma grande variedade de assuntos. Muitos desse ditados estão relacionados a tipos diferentes de personagens e outros, a tipos diferentes de contextos para a sabedoria. a. Tipos de personagens, i. Dá-se destaque especial ao contraste entre o insensato e o sábio e surgem duas principais características contrastantes. Em primeiro lugar, enquanto o in sensato não está disposto a aprender a sabedoria, quer pela instrução (17.16), disciplina (17.10), conselho (12.15) ou sua própria experiência (26.11), o sábio está determinado a aprender como ser ainda mais sábio (17.24; 15.24) e recebe de bom grado os conselhos (12.15) e até mesmo as repreensões (9.8; 17.10). Em segundo lugar, enquanto o insensato nâo tem domínio próprio, o sábio exercita a moderação disciplinada em tudo o que faz: “O sábio é cauteloso e desvia-se do mal, mas o insensato encoleriza-se e dá-se por seguro” (14.16; cf. 10.23; 12.16; 29.11). Na melhor das hipóteses, o insensato simplesmente fala demais (13.3; 18.7), sem pensar nem ouvir (18.3), porém o mais típico é que seu discurso seja malicioso (10.18; 18.6; 20.19) e destrutivo (12.18; 18.21). A pessoa sábia reconhece quando é hora de ficar calada e quando é hora de falar (10.14; 17.27) e cultiva o poder harmonioso e leniente das palavras (12.18; 15.4; 16.23-24). ii. O simples (peti, -> # 7343) é o jovem ao qual falta experiência de vida e conhecimento do mundo (1.4). Não é precavido (22.3), é crédulo (14.15) e propenso a ser vítima da estultícia (14.18; cf. cap. 7). Porém, enquanto o insensato é maduro e obstinado em sua insensatez, a insensatez do simples surge da falta de instrução. Daí a tarefa do sábio de educar o simples antes de o simles tomar-se um insensato (cf. 1.4). iii. Outros tipos descrevem em mais detalhes as diferentes espécies de insensatos, p. ex., o humilde em contraste com o soberbo (11.2; 16.18; 30.13) — que em seu estado mais arrogante e presunçoso é chamado de escarnecedor(14.6; 15.12; 21.24; /ã? [# 4370]); o diligente em contraste com o preguiçoso (13.4; 21.25; 24.30-34; 26.13-16; cf. também 6.6-11); o generoso em contraste com o avarento (11.24-25; 23.6-8); o beberrão (20.1; 23.19-21,29-35); o lisonjeador (26.23; 29.5) e o sussurrador, i.e, o fofoqueiro ou difamador (16.28; 18.8; 20.19; 26.20). Para mais sobre os justos e perversos, ver a seção 4. b. Contextos da sabedoria, i. O lar. Os pais são aconselhados sobre como criar os filhos (22.6; 23.13-14; 29.17), enquanto os filhos são aconselhados a honrar e obedecer os pais (13.1; 19.26; 30.17). São tecidos alguns comentários corrosivos sobre as esposas que importunam o marido continuamente (21.9, 19; 27.15-16). ii. A comunidade. Ditados voltados para a comunidade em geral discorrem sobre vári questões e sobre os relacionamento pessoais, p. ex., amizades e boa vizinhança (18.24; 25.17; 26.18-19; 27.10, 14); a maneira de tratar os inimigos (20.22; 25.21-22); os males do ódio e da contenda (10.12; 15.17; 17.14; 26.17); o cuidado dedicado aos pobres (14.21, 31; 19.17); a aquisição de riquezas (10.2; 13.11; 20.17) e seu valor relativo (11.28; 15.16; 22.1). Ao que parece, existem pelo menos duas preocupações principais subjacentes a esses ditados e que mostram a motivação didática de seu conselho. O primeiro é a prática de se evitar tudo aquilo que perturbe a harmonia (sãlôm, paz, bem-estar) da vida comunitária. A aptidão para instigar contendas é uma característica em comum na maioria dos tipos de personagens (p. ex., 15.18; 18.6; 22.10; 26.20; 29.8). A segunda preocupação é com o valor de uma boa reputação (cf. 1080
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22.1: “Mais vale o bom nome do que as muitas riquezas; e o ser estimado é melhor do que a prata e o ouro”). Granjear favor e honra, ou seja, a aprovação e o respeito da comunidade (ver Jó 29) toma-se, portanto, um princípio norteador importante e um objetivo na conduta dentro da comunidade (11.27; 21.21). iii. A porta da cidade. Um grande número de ditados comenta sobre as atividades que ocorriam na porta da cidade, especialmente aqueles que executavam justiça. Em sua maioria, esses ditados dizem respeito à corrupção da justiça por meio do falso testemunho (12.17; 14.25; 25.18) ou da parcialidade dos juizes, especialmente em função subornos (17.15,23; 18.5). Al guns deles também tratam das práticas comerciais no mercado (11.26; 16.11; 20.10, 14) e da insensatez de se servir de tlador (11.15; 17.18; cf. 6.1-5). iv. A corte real. Os ditados referentes à corte tratam do rei, de seu herdeiro legítimo e de seus cortesãos. A principal característica do rei sábio é a perceptividade e integridade com as quais ele preserva a justiça (16.10; 20.8,26; cf. I Rs 3.16-28), especialmente a causa dos po bres e oprimidos (Pv 29.14; cf. 3 1. 1-9). Os cortesão são aconselhados sobre como aumentar a probabilidade de sucesso em suas carreiras, p. ex., sobre o risco de suscitar a ira do rei (14.35; 20.2), sobre as virtudes do discurso diplomático (22.11; 25.15) e sobre como se comportar na presença do rei (25.6-7; cf. 23.1-3). 4. Os caps. 1—9 ocupam um lugar especial dentro da estrutura literária do livro. Form uma introdução mais extensa para as coletâneas nos caps. 10— 31 nas quais é desenvolvido mais plenamente o caráter ético e teológico da sabedoria. Alguns tópicos e temas mostram-se predominantes nessa seção do livro. a. O temor (yir a;-> # 3707) do Senhor. Esse tema tem um papel programático em Pro vérbios. De acordo com a declaração de 1.7 e 9.10, o temor do Senhor é o começo ou o prin cípio inicial da sabedoria e é a partir disso que se desenvolve a estrutura para os caps. 1—9 e para o livro como um todo (cf. Jó 28.28; Ec 12.13). O temor do Senhor representa não apenas os alicerces, mas o fim ou objetivo da busca pela sabedoria: Encontrar a sabedoria é conhecer o temor do Senhor (Pv 2.5). O temor do Senhor envolve a confiança em Deus e não na sabedoria individual (3.5-8), leva a pessoa a evitar o mal (3.7; 8.13) e promove uma vida longa, segura e feliz (cf. 10.27; 14.26-27; 16.20; 19.23; 29.25). b. Homens perversos e mulheres imorais. Dá-se atenção especial às instruções sobre as atividades dos homens perversos (1.8-19; 2.10-19) e das mulheres imorais (caps. 5, 7). O con selho do “pai” é que o jovem fique longe de ambos (1.15; 5.8). A sabedoria é uma necessidade para proteger uma pessoa de ser desviada pela sedução de fazer o que é mau (2.1-19). c. Os dois caminhos (derek;-$ # 2006). Ao longo dos capítulos, observa-se um contraste entre dois caminhos, uma metáfora bíblica comum (cf. p. ex., SI 1.1,6; Mt 7.13-14), sendo eles i. o caminho da sabedoria, a vereda dos justos e ii. o caminho da insensatez, a vereda dos per versos (ver esp. 2.8-22; 4.10-27). Esse tema dos dois caminhos tem em vista particularmente a dimensão ética e moral da sabedoria. Serve de metáfora para os comportamentos ou estilos de vida contrastantes do justo e do perverso e também para o destino contrastante que os espera. Assim, o caminho do justo é o caminho da vida, enquanto o caminho do perverso é o caminho da morte (p. ex., 2.19; 5.5-6; 6.23). d. Vida e morte. O contraste entre vida e morte é expressado no final do discurso da Sabedoria personificada em 8.35-36: “Porque o que me acha acha a vida... Todos os que me aborrecem amam a morte”. A sabedoria tem em sua mão direita a vara da vida (3.16-18) e é uma “fonte de vida" (16.22). A adúltera que, em 9.13-18 aparece como a personificação da insensatez e da perversidade habita, pelo contrário, na boca do inferno e arrasta suas vítimas para o reino dos mortos (2.18; 7.27; 9.18). Como um fruto da sabedoria, a vida representa não 1081
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apenas longevidade, mas também a riqueza e plenitude da vida. Semelhantemente, como con seqüência da perversidade, a morte não significa apenas um fim prematuro. Mais do que isso, simboliza uma “morte em vida”, ou seja, o caminho que conduz à morte é o caminho para tudo o que deprecia a plenitude da vida e consome sua vitalidade. c. Retribuição. O contraste entre a vida e a morte gira em tomo da teoria da retribuição, i.e, na recompensa dos justos e no castigo dos perversos. Essa teoria é formulada de maneira bastante clara nos caps. 1—9 com relação aos dois caminhos (p. ex., 1.19, 3 1; 2.20-22; 3.2326, 33-35; 4.18-19) e também reiterada nos ditados proverbiais, esp. naqueles que falam do justo e do perverso. Uma vez que a vida e a morte têm um sentido prolífico, uma variedade correspondente de recompensas encontra-se reservada para o justo e vários castigos estão à espera do perverso. Dentro de Provérbios, a retribuição é considerada parte da ordem natural: conseqüências positivas ou negativas são inerentes aos atos em si, como também o é colher aquilo que foi semeado (1.31-32; 5.22; cf. 14.14; 22.8; 26.27). Ao mesmo tempo, Deus tam bém é considerado aquele que mantém sua ordem moral recompensando o justo e castigando o perverso (3.33; 5.21; cf. 10.3,29; 12.2; 14.9). A doutrina da retribuição ocupa uma posição central dentro da teologia da lei da aliança (cf. esp. as maldições e bênçãos da aliança; Deuteronômio 28) e é aplicada à vida nacional de Israel pelos profetas. No entanto, sua aplicação ao indivíduo apresentava certos problemas (cf. Ezequiel 18; Jo 9.1 -3), que são reconhecidos apenas de passagem por Provérbios. O livro admite que, por vezes, os ímpios prosperam e os justos sofrem, mas se limita apenas a recomendar pa ciência. A prosperidade dos perversos é insubstancial e, mais cedo ou mais tarde, será apagada como uma lâmpada (24.19-20), enquanto os justos sempre se levantarão e florescerão (24.16). No livro de Jó, essa teoria é submetida a um escrutínio mais profundo e todo o enigma do so frimento do inocente é apresentado, e talvez até mesmos explicado, de modo conclusivo. f. A Sabedoria personificada e a criação. A característica mais marcante dos caps. 1— é a série de discursos da Sabedoria personificada em 1.20-33 e 8.1-36. Em 1.20-33, a Sabedoria aparece no papel de um profeta, arengando e instando os homens a receberem o conselho dele e advertindo-os sobre a destruição que sobrevirá àqueles que a rejeitarem. Rejeitar a Sabedoria é o mesmo que rejeitar a Deus (1.29). No segundo discurso, a Sabedoria recomenda a si mesma para os homens como aquela que visa ao bem de cada um e é digna de lealdade e obediência exclusivas (8.1-21). Em seguida, ela apresenta suas referências e as bases para a sua autoridade (vv. 21-31) em termos de sua origem divina, sua proximidade de Deus e sua precedência so bre a criação; além disso, fala de seu papel ao lado de Deus quando ele criou o mundo (8.30). No entanto, não se sabe ao certo o significado exato do termo heb. em questão. E possível que a Sabedoria tenha demonstrado suas habilidades como “artífice mestra” (cf. 3.19-20) ou que tenha brincado alegremente diante de Deus como uma “criancinha”. A origem e significado dessa figura já foi avaliada de diversas maneiras; alguns estu diosos sugerem paralelos com divindades e propõem uma origem mitológica para ela. Outros acreditam que a figura teve origem como uma personificação israelita nativa, quer da sabedo ria divina ou da “ordem” estabelecida por Deus na criação (von Rad). De qualquer modo, essa figura ajuda a explicar a condição do livro de Provérbios como revelação divina, afirmando que a sabedoria de seus preceitos e provérbios adquiridos pela experiência do mundo e a Sa bedoria pela qual o mundo foi criado são uma só coisa. Dentro do judaísmo, a sabedoria foi posteriormente identificada com a Lei (Eclesiástico 24) ou com o Espírito de Deus (Sabedoria 7.22-26). No NT, a sabedoria é identificada com Cristo ( ICo 1.24, 30), sendo usada a lingua gem de Provérbios para expressar a preexistência e relevância cósmica de Cristo (Cl 1.15-17; cf. Jo 1.1-3; Hb 1.2-3; Ap 3.14). 1082
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Insensatez, estultícia, loucura, despudor: -> ’ewil I (tolo, insensato, #211); -> b ‘r\W (ser estúpido, # 1279); -> hll III (ser confuso, tolo, comportar-se como louco, # 2147); -> ksl I (ser tolo, # 4071); Ihh (comportar-se como louco, # 4623); -> «6/ II (agir com desdém, # 5571); -> sW (comportar-se com insensatez, tomar ridículo, frustrar, #6118); -> I (ser inexpe riente, ser ingênuo, enganar, persuadir, # 7331); s g ‘ (delirar, enlouquecer, # 8713); -> tpl I (falar coisas sem nexo, # 9520) Sabedoria, conhecimento, aptidão: ôyw (entender, discernir, # 1067); -> /i/rm (ser sábio, tomar-se sábio, agir com sabedoria, # 2681); y d ‘ (entender, saber, # 3359); I (ad moestar, corrigir, disciplinar, # 3579); -> leqah (ensinamento, dom de persuasão, # 4375); -> n^zim m â (consideração, plano per\'erso, trama, # 4659); ‘oqbâ (astúcia, esperteza, # 6817); V/w II (ser astuto, prudente, tomar prudente, # 6891); iA/1 (ter sucesso, entender, tomar sábio, agir com discernimento, # 8505); tahbulòt (conselho, orientação, # 9374) B ib l io g r a f ia
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Provérbios: Teologia de A. Gênero literário Ao longo do tempo em que supervisionou a redação do AT, Deus falou aos seus servos inspirados de diversas maneiras, produzindo assim uma variedade de formas literárias (Hb 1.1). A Moisés, o legislador, Deus falou claramente, dando-nos a literatura legal da Bíblia; aos profetas falou por meio de sonhos proféticos e visões, produzindo a literatura profética (cf. Nm 12.6-8) e o Espírito do Senhor falou a Davi, o entoador dc cânticos de Israel, dando-lhe composições na forma de hinos (2Sm 23.1-2). Deus também inspirou sábios, acima de tudo Salomão (1 Rs 4.29-34), que redigiram a literatura de Sabedoria: Provérbios, Jó, Eclesiastes e textos isolados, como o Salmo 49. Neste artigo estudaremos as características da literatura de Sabedoria em geral e, mais em particular, de Provérbios. Inspiração. Diferentemente do caso de Moisés, Deus não falou com os sábios face a face e, diferentemente dos profetas, não lhes deu visões nem revelações verbais. Deus falava por meio dos sábios quando eles faziam observações sobre a criação e o comportamento huma no e quando tinham reflexões piedosas, orientadas pela fé, acerca daquilo que viam. Salomão nos leva até seu lugar de trabalho enquanto esboça um de seus provérbios: “Passei pelo campo do preguiçoso... eis que tudo estava cheio de espinhos... e o seu muro de pedras, em ruínas. Tendo-o visto, considerei; vi e recebi instrução”. Tomando por base suas observações sobre a vinha do preguiçoso, Salomão elabora um provérbio: “Um pouco para dormir, um pouco para torquenejar, um pouco para cruzar os braços em repouso, assim sobrevirá a tua pobreza como ladrão, e a tua necessidade, como um homem armado” (Pv 24.30-34; ver 6.10-11). O Prega dor, que contribui com grande parte de Eclesiastes, também demonstra peofundidade em suas observações e reflexões: “Atentei para todas as obras que se fazem debaixo do sol... Disse co migo...” (Ec 1.12-16). Jó reflete sobre sua provação dolorosa. Os escritores de Provérbios, porém, refletem sobre a criação e o comportamento so cial sob a ótica da fé. Salomão havia sido ensinado por sacerdotes e seu pai, instruído nas leis de Moisés (Dt 17.17-20; IRs 2.3). Salomão, muitas vezes, usa o nome de Deus, “o Senhor” (p. ex., 1.7), que indica a relação de aliança com Israel (Ex 3.13-15; 6.2-8; Javé). Essa fé permitiu que ele afirmasse uma ordem moral que transcendia observações e reflexões restritas às obras “debaixo do sol”. 1084
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Existe uma congruência teológica entre os ensinamentos de Provérbios e outras expres sões da aliança de Deus com Israel conforme esta encontra-se formulada em partes diferentes do AT (ver Waltke, “Proverbs and OT Theology”, 302-17). Porém, como diz Kidner (Proverbs, 13), o livro de Provérbios: “[contém] detalhes de caráter pequeno o suficiente para escapar à malha da lei e aos ataques enérgicos mais amplos dos profetas, e que, no entanto, são críticos para as questões pessoais”. Assim também, de acordo com Murphy (1975, 119): “Há outras áreas da vida que não são tratadas pelo Decálogo: diligência pessoal, autocontrole, atitudes com relação aos pobres, orgulho, confiança no próprio bom senso, etc. Em resumo, o desen volvimento de um caráter responsável, além dos objetivos do Decálogo, constitui o cerne dos ensinamentos de sabedoria”. Estilo. Como resultado da inspiração distinta do livro, não se pode encontrar nos escri tos dos mestres morais de Israel as palavras “Assim diz o Senhor” ou expressões equivalentes. Antes, em sua maior parte, costumavam cunhar provérbios (ou seja, aforismos sagazes) a fim de expressar a verdade. Apesar de o estro da literatura de sabedoria ser diferente da literatura de lei, narrativas e profecias, é igualmente inspirador e investido de autoridade. Vocabulário. Os sábios de Israel faziam observações e reflexões usando um vocabulário característico. Nos escritos desses sábios, podem-se encontrar referências repetidas a “sabe doria”, “conhecimento”, “entendimento”, “compreensão” e “prudência”. Esse “arco-íris” de termos (ver 1.2-6) é usado com sagacidade para referir-se à ordem moral na qual Deus mantém a ligação moral entre boas/más obras e um bom/mau destino. Assuntos. Também como resultado de sua inspiração distinta, os sábios de Israel tratavam da criação e da humanidade em geral e não de Israel em particular. Veja-se a quem se dirige o Salmo 49: “Povos todos, escutai isto; dai ouvidos, moradores todos da terra, tanto plebeus como os de fina estirpe, todos juntamente, ricos e pobres” (vv. 1-2). Provérbios. Provérbios trata, em parte, da sabedoria de Deus vista na criação: “o Senhor, com sabedoria (ou seja, inteligência, planejamento, diligência, paciência e generosidade”) fun dou a terra, com inteligência estabeleceu os céus” (Pv 3.19). Em termos mais específicos, o texto se concentra na ordem e nos limites observados na criação. A Sabedoria personificada diz: “Quando ele preparava os céus, aí estava eu... quando firmava as nuvens de cima; quan do estabelecia as fontes do abismo; quando fixava ao mar o seu limite, para que as águas não traspassassem os seus limites...” (8.26-29). O texto trata, ainda, da ordem nos relacionamentos humanos. Vejam-se estas advertências: “Não removas os marcos antigos que puseram teus pais” (22.28) e “Quando te assentares a comer com um governador... mete uma faca à tua garganta, se és homem glutão” (23.1-2). O livro de Provérbios prescreve a liberdade dentro da lei, inde pendência dentro dos moldes e relacionamentos amorosos dentro dos limites (5.15-20).
B. Contexto Histórico O contexto histórico de Provérbios depende, em parte, das questões de sua autoria e a quem o livro era dirigido. Tais questões são importantes para a interpretação do livro e sua teologia. A declaração da obra quanto à sua autoria é confiável ou deve ser interpretada de ma neira menos direta? É verdade que os autores foram inspirados por Deus e falam com autori dade divina? As coleções de textos atribuídos a Salomão faziam parte, originalmente, de uma renascença salomônica? R. C. Van Leeuwen (81-82), por exemplo, está certo ao interpretar Provérbios 25.7-10 como uma passagem que trata principalmente do comportamento dos cor tesãos disputando posições dentro da corte real? 1. Autores. O editor final do livro reuniu sete coletâneas distintas, de acordo com introduções em prosa contidas nelas próprias e de acordo com a forma delas. O título extenso, 1085
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“Provérbios de Salomão, filho de Davi, o rei de Israel” (1.1) serve de título tanto para o livro quanto para a Coletânea 1(1.1 —9.18). O título curto “Provérbios de Salomão” dá início à Co letânea II (10.1—22.16), mas como K. A. Kitchen (“Proverbs”, 70-102) mostrou usando para lelos egípcios, é parte integrante junto com 1.1— 9.18. A Coletânea III (22.17-22), distinta pela forma, pode ser chamada de “Palavras do sábio” (cf. v. 17), confirmadas pelo título do próprio editor para a Coletânea IV: “São também estes os provérbios dos sábios” (24.23-34). O títu lo extenso, “São também estes provérbios de Salomão, os quais transcreveram os homens de Ezequias, rei de Judá” (25.1), encontra-se no início da Coletânea V (25.1—29.27). “Palavras de Agur, filho de Jaque, de Massá. Disse o homem” dá início à Coletânea VI (30.1-33) e “Pa lavras do rei Lemuel, de Massá, as quais lhe ensinou sua mãe” (31.1-31) introduz a Coletânea VII. O livro apresenta o nome de três escritores: Salomão, Agur e Lemuel. a. Salomão. E provável que Salomão (c. 950 a. C.) tenha sido o autor (ou seja, que nha cunhado e/ou reunido) as coleções I-IV (1.1— 24.34). Tomando por base as “instruções” comparáveis de sábios do Egito, Mesopotâmia e do Levante, estendendo-se pelo mundo bíblico desde o terceiro milênio até os tempos greco-romanos, Kitchen (“Proverbs”, 70-102) mostrou que 1.1-7 serve de título com preâmbulo para o principal e maior obra literária de Salomão (1.1— 22.16). No que se refere à sua estrutura, esse conjunto de textos encontra-se em total conformidade com várias destas “instruções” do OMA: titulo principal com preâmbulo (1.1 -7), prólogo (1.8— 9.18), subtítulo (10.1), texto principal (10.2— 22.16). Salomão inclui as Cole ções III e IV nesse conjunto de textos adotando duas coleções distintas de “palavras do sábio” como sendo de autoria dele. O(s) autor(es) das Coleções III e IV não é(são) citado(s), mas trata-se de provérbios que podem muito bem ser atribuídos a Salomão. Se não fosse assim, essas coleções seriam uma anomalia. As outras trinta ou quarenta coleções de instruções do OMA são atribuídas a autores cujos nomes são mencionados. Além disso, se a Coleção III é obra de algum outro escritor e não de Salomão, nesse caso o “eu” que fala no prólogo (22.17-21) não tem precedentes. Por meio do paralelismo de 22.17, “Inclina o ouvido, e ouve as palavras dos sábios, e aplica o co ração ao meu conhecimento”, Salomão declara que adotou e adaptou a sabedoria de outros. E significativo que essa seja justamente a coleção que apresenta maior semelhança com a “Ins trução de Amenemope”, cuja redação costuma ser atribuída hoje em dia ao período da dinas tia de Ramsés, época em que, de acordo com o consenso geral, as tribos de Israel já haviam se tomado uma nação. No entanto, o egiptologista J. Ruffle (1977) levantou dúvidas quanto à existência de uma ligação direta entre essas duas obras. Por volta de 700 a. C., os homens de Ezequias, que imitou o reinado de Salomão, com pilaram outros provérbios de Salomão na Coleção V. Em resumo, Salomão foi, essencialmente, o autor de Provérbios 1.1—29.27. Os paralelos bastante próximos entre a estrutura redacional em termos de conteúdo, forma e posição elevada dentro da nobreza, inclusive os próprios reis (Queti I: pai de Mericare; Amenemate I, todos um milênio antes de Salomão) corroboram o testemunho bíblico da autoria salomônica (ver também 1 Reis 3; 4.29-34 [5.9-14]). P. Humbert chamou a atenção para analo gias temáticas entre Provérbios e esses correlatos egípcios e C. Kayatz mostrou correspondências impressionantes entre as formas e temas de Coleção I e instruções egípcias anteriores a Salomão. Ao comparar a estrutura de Provérbios com textos análogos do OMA, Kitchen (“Proverbs”, 99) concluiu: “Baseando-nos firmemente nas evidências diretas, externas e independentes que temos hoje em dia à nossa disposição, descobrimos que é bem mais provável que a data literá ria de Salomão I [ 1.1—24.34] seja inteiramente compatível com o nome do autor apresentado no título do livro, ou seja, Salomão, de c. 950 a. C.”. Infelizmente, com exceção de Garret e Ross, nenhum comentário desde 1977 reagiu à argumentação de Kitchen. 1086
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Apesar de, segundo a observação de W. Baumgarter, “haver novamente uma disposi ção maior de se levar seriamente em consideração a atribuição dos dois conjuntos de textos [ 10.1—22.16; 25—29] a Salomão”, muitos ainda continuam céticos quanto ao testemunho bí blico. Nas palavras de J. L. Crenshaw (1976,44), um monte inconquistável chamado Fantasia, encontra-se entre os intérpretes bíblicos e o Salomão histórico”, ao que D. Kidner (1985, 51) respondeu: “Correndo o risco de parecer loquaz, tudo indica que é justo dizer que se trata de uma montanha para a qual um grão de mostarda de fé seria bem apropriado...” . O conteúdo dos provérbios em si sugere que foram criados durante a monarquia. Observem-se as referên cias ao rei nas Coleções I (8.15), II (16.10-15), V (25.1-4) e VII (31.1-4). A negação da autoria salomônica se deve ao ceticismo acadêmico herdado do criticismo histórico do século passado e não a nenhum dado científico. Os lábios de Salomão proferem um oráculo de Deus(16.10;cf. 1Rs 4.29 [5.9]). Salomão personifica a Sabedoria como uma mulher em 1.20-33 e 8.22-31 e, mais especificamente, como uma mediadora divina (cf. Waltke, 1988; Kidner, 1985, 23). Na pele dessa personagem, Salo mão apresenta sua sabedoria como originada no tempo primitivo de Ur, antes que qualquer coisa existisse (8.22-31), e diz que foi por meio dela que o Senhor criou o Universo (3.19-20). Uma discussão entre os estudiosos é se a pessoa da Sabedoria deve ser considerada mais especifica mente como “artífice” ou como uma “criança pequena”, dependendo da forma como interpre tam o hapleg. 'ãmôn em 8.30. As duas interpretações requerem que se modifique o texto ou que se empregue o termo em questão com um significado incomum. Tanto Hofftnan (Schriftbeweis 1:97, citado por Delitzsch) como Plõger, de modo independente dele, traduzem 'ãmôn satisfato riamente como “de modo coerente/fiel/constante”. Apesar de tratar-se de um hapleg., essa inter pretação é plausível em termos gramaticais, não confunde nem dissipa a mensagem dos vv. 22-31 e, acima de tudo, combina com os paralelos “dia após dia” e “em todo o tempo”. Observe-se o paralelismo do versículo conforme este é representado pela tonicidade masorética (trad. literal): E estava
ao lado dele
fielmente;
E estava
me deleitando
diariamente;
celebrando diante dele
em todo o tempo.
Infelizmente, Plõger enfraqueceu sua argumentação ao dizer que a forma deve ser ni. (como também o fez Delitzsch, 190). A forma ni. (part.), porém, é apropriada como um adjetivo e não como um advérbio; o inf. abs. ni. de 'mn não é atestado (-> 586). Por fim, com referência à inspiração e autoridade de Salomão, observe-se que ele representa sua boca como a boca de Deus: “Filho meu, se aceitares a minha palavra... então, entenderás o temor de Deus e acharás o conhecimento de Deus. Porque o Senhor dá sabedoria, e da sua boca vem a inteligência e o entendimento” (2.1 -6). Surge, no entanto, a pergunta óbvia: Se Salomão era tão sábio, então por que morreu como alguém tão insensato? (cf. 1Rs 11.1 -25) Ele se enforca em seu próprio cadafalso: “Filho meu, se deixas de ouvir a instrução, desviar-te-ás das palavras do conhecimento” (19.27). Os sucessos espirituais de hoje não são garantia alguma de piedade e ética amanhã. Os discípulos devem cuidar de sua vida espiritual a todo tempo. Além disso, os provérbios reais sobre o rei ideal que executa justiça perfeita (p. ex., 16.10-15; 20.26-28) sugerem um rei mais sábio do que Salomão (Mt 12.42; Lc 11.31) (ver abaixo). b. Agur. Agur é um sábio profético e não da realeza. O título de sua obra apresenta elementos essenciais de um título (30.1a), seguidos de seus floreios (30.1b), exatamente da 1087
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mesma forma que em alguns paralelos extrabiblicos. Além de chamar o autor de “Agur, filho de Jaque” (como “Salomão, filho de Davi” [1.1], e o par. egípcio “Queti, filho de Duauf'), ele refere-se à sua obra como “as palavras” (ver 1.6; 22.27) e “oráculo [ameaçador]” (hammassã ’) A designação “as palavras” é ambígua no sentido de que pode referir-se tanto a um discurso profético quanto sapicncial (ver Crenshaw, 1989, 52-53), mas o termo “oráculo rcfere-se ine quivocamente à profecia”. Para vários estudiosos, essa referência inesperada ao gênero pro fético indica que hammassã' deve ser mudado para a designação gentia “o massaíta”, uma referência a Massá, uma região ao noroeste da Arábia (Kitchen, "Proverbs”, 101). Se esse é o caso, então Agur é claramente um prosélito. No entanto, o paralelo quiasmático no acréscimo análogo, “Disse o homem” (lit. “o oráculo do homem”, ne ’um haggeber, [30.1b]), emprega sem dúvida alguma vocabulário profético. ne 'um é um termo comum na fórmula profética “diz o Senhor” (p. ex., Jr 23.4, 11, 12) e nas outras duas exceções (Nm 24.3, 15; 2Sm 23.1), nas quais é textualmente duvidoso, salvo no caso do Salmo 36.2 [1], refere-se às declarações inspiradas de Balaão e Davi, respectivamente (ver Nm 23.4, 16; 2Sm 23.2). Assim, não se deve fazer nenhuma distinção pronunciada entre o discurso do Senhor e o de seus porta-vozes inspirados. E interessante observar-se que nesses dois exemplos, haggeber também é usado em aposição a nomes próprios: “Palavra de Balaão, filho de Beor... palavra de haggeber" (Nm 24.3) e “Palavra de Davi, filho de Jessé, palavra de haggeber” (2Sm 23.1) formam um para lelo bastante próximo com “Palavras de Agur, filho de Jaque... Disse o homem” (Pv 30.1). Ao comentar sobre a fórmula nP 'um haggeber nessas três passagens, Kosmala ( TDOT2:378-79) afirma que geber refere-se a um homem que possui um relacionamento especial com Deus e não indica força física ou virilidade. Além disso, em outras passagens, os sinônimos proféticos para a revelação divina, massa ’e ne 'um, aparecem juntos para designar profecia (p. ex.. Is 17.1, 3; 19.1, 4; esp. Zc 1.1). A fim de concluir a argumentação de que Agur é um sábio profético, deve-se mencionar que Kayatz (124-25) mostrou que a perícope em 1.20-33 combina formas de discurso proféticas e sapienciais. apesar de esse não ser o caso aqui. No prólogo de sua coleção (30.2-6), Agur confessa em primeiro lugar sua ignorância (ou seja, um homem autônomo jamais consegue alcançar a verdade absoluta por conta própria, v. 2). Agur fracassou na tentativa de encontrar a sabedoria (v. 3), pois, a menos que pudesse ver a realidade como somente Deus a conhece (ou seja, do ponto de vista do próprio céu), não seria capaz de saber de coisa alguma com certeza (v. 4a). Nenhum sábio ou seu filho subiu aos céus e depois voltou à terra (v. 4b). Nos vv. 5-6, Agur substitui seu ceticismo de encontrar a sabedoria por meio da razão humana sem nenhum outro auxílio pela confissão de sua confiança religiosa nas sagradas Es crituras. Sem nenhum apoio do texto, Crenshaw (1989, 58) deturpa esses versículos como se ditos por outra pessoa e não por Agur: “Aqui, um outro locutor assume um papel sagrado e o emprega para criticar Agur”. Na verdade, usando aquilo que os estudiosos modernos chamam de intertextualidade, Agur cita Davi com referência à perfeição absoluta das Escrituras, “Toda palavra de Deus é pura” (cf. v. 5 com 2Sm 22.31 [= SI 18.31 ]; cf. SI 105.19; II 9.4), bem como Moisés com referência à inteireza e canonicidade do texto, “nada acrescente às suas palavras” (cf. v. 6 com Dt 4.2 e 12.32[ 13.1 ]). O profeta verdadeiro deve estar de acordo com as Escrituras anteriores (cf. Dt 13.1-11; 18.18-20). Usando o gênero da sabedoria, nosso sábio profético não procura validar sua confissão com referência à inspiração plenária das Escrituras com a razão humana. Caso procurasse fazê-lo, faria do raciocínio humano limitado o árbitro definitivo da verdade, voltando ao ponto de partida da argumentação e, mais uma vez, à necessidade de dar cabo do ceticismo. A mente finita não é capaz nem de deduzir c nem de atestar a verdade infi nita. A verdade absoluta encontra-se nas próprias Escrituras que dão testemunho de si mesmas 1088
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para os que são puros de coração. A resolução que Agur apresenta para o problema não será satisfatória para aqueles que desejam encontrar a sabedoria na autonomia humana. c. Lemuel. A maioria dos estudiosos atribuem somente 31.1-9 à mãe do rei Lemue acredita que 31.10-31 venha de um autor anônimo. No entanto, Kitchen (“Proverbs”, 100-101) argumenta que se trata de algo improvável, i. “O assunto dos versículos 10-31 [a “esposa virtu osa”] é inteiramente coerente com a suposta origem da obra (a mãe de Lemuel e não o próprio Lemuel)”. ii. “O uso de duas seções no texto para dois assuntos separados (nesse caso, a so briedade do rei e uma boa esposa) é um fenômeno atestado muitas vezes em outras obras”, iii. “Assim, se os versículos 10-31 devem ser excluídos do que foi escrito por Lemuel, então, a. a “obra” resultante com apenas nove versículos toma-se absurdamente curta e b. a suposta segun da “obra” dos w . 10-31 toma-se um poema isolado sem título algum e não se encaixa de modo algum no gênero literário instrutivo”, iv. Por fim, os dois poemas, “O Rei Sábio” (vv.2-9) e “A Mulher Virtuosa” estão ligados entre si por palavras-chave. Ambos começam com uma referên cia a uma mulher (vv. 3, 10) e uma preocupação com hayil (força, caráter nobre). O rei, como também a mulher virtuosa, “abre a boca” (vv. 8, 9, 26) e se preocupa com os pobres (vv. 9, 20). 2. Destinatários. Apesar de a Coleção I ter paralelos bastante próximos com “inst ções” egípcias em termos de estrutura e conteúdo, difere radicalmente desta no tocante aos seus destinatários. Tanto sábios mesopotâmios como egípcios de todas as épocas dirigem-se aos filhos, aprendizes ou crianças com o propósito específico de preparar os rapazes para serem bem-sucedidos em seus cargos ou altos postos entre os oficiais da corte. As instruções desses sábios referem-se à ética profissional. O título de Provérbios (1.1), por outro lado, não indica nenhum destinatário ou cargo. Antes, trata-se supostamente de um texto para toda Israel, inclu sive a corte, e é chamado acertadamente por Gemser (12) de “democrático”. Apesar de a mãe de Lemuel ter originalmente dirigido palavras ao filho, seu filho (31.2), Lemuel, por sua vez, democratizou-as. Por certo, antes de serem reunidos, alguns provérbios desse livro referiam-se à corte real (cf. 23. 1; 25.7- 10), mas, dentro do livro em si, passam a ter como função a forma ção do caráter nacional. O Pregador ensinou o povo pela instrução (Ec 12.9). Salomão, porém, dirige-se a um “filho” anônimo (cf. 1.8; 10.1; 23.19; 27.11); Quem é ele? Tanto nas instruções egípcias quanto nas mesopotâmias, que eram originalmente dirigidas ao filho de um cortesão, citando o nome do seu destinatário, essas instruções eram posterior mente transmitidas dentro das escolas que treinavam jovens oficiais em início de carreira. E provável que, assim como Moisés transmitiu as leis para que os pais as ensinassem em casa (Dt 6.7-9), também Salomão, tendo criado e/ou reformulado seus provérbios, colocou-se na boca dos pais de Israel que, sendo responsáveis pela instrução moral dc seus filhos (ver Crenshaw, “Education in Israel”), deviam disseminar a sabedoria em Israel de geração em geração. O en sinamento dava-se principalmente pela transmissão oral, a lição era lida em voz alta e a acei tação dos ensinamentos era apresentada para ser “ouvida”, o que implicava “obedecer” (cf. Êx 24.7; cf. Mt 7.24-27; Tg 1.22-25). Hubert cita uma passagem na instrução egípcia Merickare que fala de “cantar” o texto com o mestre ou com o aluno. A menção à “mãe” em 1.8 indica que a educação de toda a família, de filhos e filhas, ocorria dentro do lar. De acordo com o comentário de Whybray (1974, 42): Aqui [ 1.8 e 6.20], o pai e mãe são colocados exatamente no mesmo nível como mes tres de seus filhos... em introduções a instruções formais do tipo que se assemelha mais àquelas do Egito. A fraseologia dessas orações corresponde quase precisamente àquela de seus correlatos egípcios, mesmo em detalhes como as combinações de or dens positivas (‘ouvi’) com uma advertência negativa (‘não rejeites/não desprezes’). 1089
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o que ressalta ainda mais uma das características que é inteiramente singular a elas: a menção à mãe. É difícil deixar de concluir que essa característica seja um exem plo de adaptação da tradição egípcia à sua situação peculiar na qual as instruções israelitas foram redigidas: uma situação doméstica na qual o pai e a mãe dividiam a responsabilidade de educar o filho. Diante dessas referências à mãe, não é prudente conferir a “pai” e “filho” os significados técnicos figurativos de “mestre/sábio” e “aluno/discípulo” (em oposição a TDOT2:152, # 6), que eram seus significados no Egito e na Mesopotâmia, e reconstituir na Israel antiga essa situação hipotética semelhante ao ambiente de uma escola (ou seja, lugares específicos freqüentados pelos jovens e onde se pagava pelos serviços de um mestre) para a instrução moral dos jovens. A palavra “escola” (bêt-midrãs) ocorre pela primeira vez cm Eclesiástico (51.23). No entanto, não há consenso algum (ver Whybray, 974, e Crenshaw, 1985) quanto à existência ou não de escolas em Israel durante o período bíblico. Ninguém contesta, porém, que a educação ocorria em casa. É provável que houvesse uma diversidade considerável na educação em Israel, mas Crenshaw (614) chega à seguinte conclusão: “Essa concepção marcante de pai e filho dentro de Provérbios sem dúvida deve refletir um contexto familiar, e a referência ocasional à mãe não pode ser atribuída justificadamente à necessidade de um paralelismo”. A influência educacional da mãe em Israel ia além dos filhos pequenos, como indicam os ensinamentos extensivos da mãe do rei Lemuel. Mais impressionante ainda é ver uma mu lher ensinando um rei. Nenhuma outra educação realizada por mulheres chegou até nós pela literatura do OMA. O termo “filho” não se encontra em oposição clara a “filha”. A fim de que a mãe pudesse transmitir uma instrução fiel (31.26), ela própria precisava ter sido previamen te ensinada. O filho recebe maior destaque pois, por natureza, é mais tentado a se desviar da tradição herdada. Conforme observa Follis (178), “Costuma-se acreditar que os filhos representem o espírito aventureiro de uma sociedade, forçando ao máximo os limites externos da circunfe rência da comunidade. As filhas, por outro lado, estão associadas à estabilidade, à construção de uma sociedade, ao cuidado com a comunidade, constituindo seu cerne e coração”. Além disso, os filhos herdarão a maior responsabilidade pela identidade espiritual da própria famí lia (cf. Números 30; Pv 4.3-4). A expectativa era de que a mulher se sujeitasse à liderança de seu marido. O “filho”, provavelmente com cerca de vinte anos, encontra-se à porta da idade adulta. Chegou a hora de ele atravessar seu limiar e passar à maturidade. Duas visões de mundo con flitantes apresentam atrativos: “sabedoria/insensatez, o verdadeiro/falso bem, vida e morte” e deve-se escolher entre elas (cf. Van Leeuwen. 1990,114). Essas duas concepções que competem entre si são representadas de duas maneiras nas repetidas metáforas de dois caminhos (1.1019; 4.14-19), duas mulheres, Loucura (cf. 5.1-23; 6.20-35; 7.5-27) e Sabedoria (4.5-9; 7.1-4; 8.1-36), que têm duas casas (9.1-6,13-18; cf. 2.16-19; 7.14-20). O caminho apontado pelo pai e pela Sabedoria-Mulher e sua casa representa a sabedoria herdada do inspirado rei Salomão. Se alguém tomar esse caminho e abraçar a Sabedoria, encontrará vida tanto agora quanto no futuro, a qual se estende além da morte física. A pessoa já se encontra no caminho para a vida ou para a morte, sendo que cada caminho leva a um “destino” final (5.4, 11; cf. 14.12; 16.25; 23.17-18; 24.19-20). Influenciados pela literatura apocalíptica posterior, os evangélicos tendem a valorizar o destino enquanto Provérbios valoriza o caminho. Nesse momento crítico em que é necessário tomar uma decisão, o rapaz encontra-se mais vulnerável ao dinheiro e sexo fáceis, pois as paixões sexuais dele são mais fortes e a ten 1090
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dência do jovem a mostrar-se sábio para si próprio ainda não foi moderada pela realidade. Uma vez que um reino espiritual e duradouro não pode basear-se simplesmente no poder, o pai usa as palavras persuasivas e inspiradoras que herdou de Salomão em vez das sanções legais de Moisés como forma de orientar o filho. A competição entre os discursos sábios e sedutores se traduz em conflitos nas subunidades, perícopes e Prólogo, disputando o coração dos filhos. C. Estrutura Literária Uma reflexão teológica válida sobre Provérbios depende de uma exegese precisa de todos os detalhes dos provérbios isolados; e, se estes foram deliberadamente organizados em contextos mais amplos e cheios de significado, constituídos de textos proverbiais, dependem também de seu contexto literário. Se, no entanto, os provérbios são apenas uma justaposição aleatória de dizeres isolados, então cada um é uma entidade em si e não possui outro signifi cado mais rico obtido por meio do contexto literário ao redor. Ao longo da história da interpretação, a maioria dos comentaristas observou ocasional mente alguns arranjos dentro da literatura de Provérbios dos caps. 10— 29; mas, na maior parte, o contexto mais amplo criado por esses arranjos não foi levado em consideração na análise do provérbio isoladamente. Além disso, Gemser, Baricq, Aitken, Farmer, Bostrom, Hubbard, et. al, apesar de terem reorganizado os provérbios de modo proveitoso em função dos assuntos e de haverem feito reflexões criteriosas sobre eles, acabam — ainda que de modo desintecional — separando os dizeres de seus contextos literários. Pesquisas recentes, porém, exigem uma nova abordagem tanto da exegese do livro quanto da reflexão teológica sobre ele. Em 1962, U. Skladny preparou o caminho para a maioria das discussões subseqüentes acerca da organização dos provérbios dentro de seus contextos. Ao usar a análise da forma, do conteúdo e do estilo e ao empregar estatísticas para quantificar suas descobertas, Skladny delineou subconjuntos ainda menores: A (= 10— 15), B (= 16.1—22.16), C (= 25—27) e D (= 28—29). Essa análise encontra-se parcialmente em conformidade com as observações edito riais da estrutura do livro em 10.1; 22.17; 25.1; 30.1. McKane, R. B. Y. Scott e Westermann negam a existência de um contexto na redação das frases dentro das unidades literárias defini das. Porém, em 1968, H. J. Hermisson levou a análise de Skladny um passo adiante ao procurar discernir unidades poéticas e temáticas constituindo a Coleção A. Em 1972, ao usar de certos métodos do estruturalismo francês, G. E. Bryce demonstrou que Provérbios 25.2-27 constitui uma unidade literária. Em 1978, B. W. Kovacs encontrou a Coleção B, que começa em 15.28, como personificação de uma visão coerente de mundo. Em 1979, R. N. Whybray mostrou que um editor escolheu deliberadamente colocar os dizeres de Javé em 10.1— 22.16. Em 1984, por meio do estruturalismo, da poesia e da semântica, R. C. Van Leeuwen demonstrou dc modo convincente que os provérbios na Coleção C são organizados em composições literárias mais amplas. Em 1985, B. V. Malchow propôs que a Coleção D está organizada de modo bastante complexo e serve de “Manual para os Futuros Monarcas”. Os comentários recentes de Plõger, Meinhold e Garret procuraram interpretar provérbios individuais dentro de unidades literárias mais amplas. O mais bem-sucedido nessa tarefa é Meinhold. Em 1987, S. C. Perry confirmou o estudo de Bõptrom (1928), de acordo com o qual Provérbios é estruturado por ligações paronomásticas (trocadilhos com sons e palavras). Desde 1968, os críticos retóricos vêm desenvolvendo a disciplina da poética. Os esfor ços incansáveis desses críticos e inúmeras publicações mostram que os escritores bíblicos — designação que engloba colecionadores, editores e/ou redatores — deram unidade artística ao seu trabalho por meio de técnicas como a inclusão (ou seja, marcação de uma unidade literária ao fazer com que o final combine com o início), o jânus (ou seja, a ligação de seções por meio 1091
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de um segmento redigido de modo a relacionar-se simultaneamente com o que o antecede e sucede), palavras-chave que mostram o enfoque do texto e/ou palavras de efeito que alinha vam o texto, sinônimos, paronomásia (ou seja, todo tipo de trocadilho com sons das palavras e normalmente relacionados ao significado delas), repetição de formas gramaticais, modelos estruturais empregados muitas vezes em conjunto com a crítica à forma, quiasmos (ou seja, inversão da estrutura), acrósticos, etc. A fim de observar o valor dessa abordagem para a abstração da teologia de Provérbios, deve-se considerar a perícope 15.30— 16.15. A crítica retórica revela que essa perícope consti tui uma unidade, o que implica um significado repleto de contexto teológico, e consiste de três seções: uma introdução (15.30-33), o corpo principal dos provérbios de Javé (16.1-10) e uma conclusão dos provérbios do rei (16.11-15). As introduções às unidades literárias em 10.1—22.16, tão claramente quanto em 1.8— 9.18 (ver 1.8; 2.1; 3.1; etc.), dizem respeito aos sábios que aceitam a sabedoria e/ou honram os pais (p. ex., 10.1; 12.1; 13.1; 16.16; etc.). Apesar de cada um dos ditados gnômicos da in trodução em 15.30-33 poder ser aplicado isoladamente às mais diversas situações, juntos eles também servem de introdução para os provérbios cuidadosamente organizados que seguem em 16.1-15. Nesse contexto literário, “a luz dos olhos que alegra o coração [tr. literal]” refere-se principalmente aos olhos dos pais e dos mestres; “as boas novas que fortalecem a pessoa intei ra” [lit. que “engordam os ossos”] [tr. literal] (v. 30) referem-se à sua instrução em 16.1-15; e “os ouvidos que atendem a correção vivificadora” [tr. literal] (v. 31), dizem respeito ao filho/ aluno. Apesar de encontrarem-se escritas na forma de máximas, a teoria do discurso e ação indica que essas introduções louvando a sabedoria têm por objetivo incentivar o filho/aluno a apegar-se aos ensinamentos e conformar a vida com eles. Esses quatro provérbios são entretccidos de maneira muito próxima como uma unidade coesa por meio de uma série de palavraschave: as características anatômicas, “olhos” (v. 30a), “ossos” (v. 3ob) e “ouvidos” (v. 31); o radical sm \ ouvir (-> # 9048), representado pelo subs. semíi a, notícias, boas novas, relato (v. 30a) e o part. sõma ‘aí, o ouvido que atende (v. 31 a); suas formas compostas, sõma 'al/sômêa ‘ lôkahat, atende à repreensão (v. 31 a, v. 32b); o subs. músãr, instrução (vv. 32a, 33a), e hakãmim / hokmâ, sábio/sabedoria (vv. 31b e 33a). A introdução e o corpo principal são ligados pelo termo-chave “Senhor” (15.33a; 16.1 b). O termo-chave “Senhor”, presente na parte a ou em b [as duas metades de um par pa ralelo de idéias, respectivamente] de cada versículo, com exceção do v. 8, dá torna coerente o corpo principal (vv. 1-9). A outra metade de cada um desses versículos diz respeito à huma nidade, conceito expressado de várias maneiras como homem (v. la, 2a, 6, 7a, 9a), tu (v. 3), perverso (v. 4b) e todos (v. 5). O corpo principal apresenta o Senhor e a humanidade envolvidos numa dança. A hu manidade realiza suas atividades, mas, no final, é Deus quem cumpre seus propósitos. A in clusão, vv. 1 e 9, liga essa parte ao todo por meio de sinônimos e declara inequivocamente o seu tema: a soberania do Senhor sobre as atividades dos homens. “Os planos do coração per tencem ao homem, mas a resposta da língua vem do Senhor” (v. I) [tr. literal]; “o coração do homem planeja tomar um certo rumo, mas quem firma seus passos é o Senhor” (v. 9) [tr. lite ral]. Observem-se as palavras-chave coração (lêb) e homem ( aJõm) na parte a dos versículos e “o Senhor” na parte b. Os versículos 1-7 são constituídos de duas unidades (vv. 1-3 e 5-7), ligadas pelo v. 4, um versículo jânus. A primeira unidade apresenta a soberania do Senhor sobre a iniciativa hu mana, e a segunda, a justiça soberana do Senhor sobre a moralidade humana. O termo jânus é derivado do deus romano que guarda os portais e que olha para trás e para frente (o mês de 1092
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janeiro, que olha tanto para trás/para o ano velho, bem como para frente/para o ano novo tam bém é derivado desse nome.). O versículo 4a apresenta a soberania do Senhor sobre a ativida de humana, encaixando-se aos vv. 1-3, enquanto o v. 4b, a justiça do Senhor com relação aos perversos, encaixa-se aos vv. 5-7. O versículo 5 declara em termos absolutos que o arrogante é uma abominação para o Senhor e que será castigado. Pelo fato de os arrogantes mostrarem-se impiedosos no relacionamento com Deus, também nâo serão éticos nas atividades relacionadas aos outros homens. Como a biografia de Caim nos mostra, quando a humanidade fracassa no altar, também fracassa nos campos. O v. 7, pelo contrário, afirma, “quando o Senhor se agrada dos caminhos de uma pessoa, compele todos os inimigos dela a se renderem a ele” [tr. literal]. Interposto a esse dois versículos, o v. 6 dá instruções tanto para expiar pelos pecados do pas sado como para evitar os pecados do futuro — a saber, pela fidelidade à aliança (v. 6a) e pelo temor do Senhor (v. 6b), respectivamente. O versículo 8, um provérbio do tipo "melhor é”, fica separado dos outros, advertindo implicitamente que a justiça do Senhor não é executada de imediato (ver abaixo). Para o nosso estudo, é suficiente comentar em mais detalhes sobre os vv. 1-3, a fim de mostrar a relevância teológica dessa abordagem. A interação da humanidade com Deus envolve situações nas quais os erros devem ser reparados. “Os planos [ma ‘arãk, preparativos, # 5119] do coração” de consertar os erros pertencem à humanidade, mas uma resposta certa e eficaz, “eine richtige Antwort... daspassende Wort” (Ringgren, 68), a resposta que acerta o alvo em cheio, é uma dádiva do Senhor (v. 1). Diferentemente do nosso termo “resposta’, m a'aneh, implica exclusivamente uma resposta verdadeira e correta para uma circunstância e não apenas numa “réplica” verbal. O subs. ocorre 6x com referência a uma “resposta” sábia adequada à situação. Os três amigos de Jó lhe deram respostas, mas Eliú fez uma avaliação correta ao dizer que “não havia resposta (m a'aneh, refutação) para Jó na boca dos seus amigos” (lit., Jó 32.3, 5; cf. Pv 15.23). Diante disso, o filho se vê livre da responsabilidade final de suprir as necessidades das quais ele trata e todo louvor pertence ao Autor de toda dádiva boa e perfeita. O v. 2 volta-se para as motivações. O provérbio dá continuidade ao tema da soberania de Deus sobre a atividade humana e é ligado ao v. 1 pela palavra-chave “Senhor”, pelos ter mos sinônimos para a humanidade em geral, ser humano ( adãm) e pessoa ( 75) e para a psique humana em particular, o coração (lêb) e as motivações (riihôt). O provérbio contrasta a ava liação que uma pessoa faz de seus próprios atos com a avaliação que Deus faz das motivações dessa pessoa. O provérbio não ensina que “os homens jamais condenam sua própria conduta” (Toy), mas sim, conforme o comentário de Meinhold (265), que o fato das pessoas justifica rem todas as suas ações levará ao conflito de opiniões. Uma vez que o veredicto final quanto à pureza das motivações pertence ao Senhor e não àquele que as realiza, ainda que a pessoa se considere pura, não deve se vangloriar nem decidir sua recompensa de antemão, mas sim depender do Senhor, pois somente ele pode avaliar verdadeiramente as motivações (SI 19.12; 139.23-24; ICo 4.5-6; Hb 4.12-13). Além disso, se uma pessoa não é capaz de julgar as pró prias motivações, deve julgar menos ainda as motivações alheias (Mt 7.1). O melhor a fazer é entregar todas as obras ao Senhor (v. 3), a fim de que os caminhos do obreiro sejam sempre agradáveis a Deus (cf. Pv 16.7). Pelo uso da segunda pessoa do discurso direto, o versículo 3 volta-se para as “tuas obras” {ma 'aseykã — observe-se a paronomásia de ma ’aseh com ma ‘arkê e especilamente ma "aneh no v. 1), admoestando o filho a entregar o domínio sobre suas obras de justiça ao Senhor, para que Deus possa estabelecê-las permanentemente como parte de sua história que se estende além do triunfo temporário dos perversos. O versículo 2 adverte que o Senhor está avaliando as motivações por trás de m a'aneh (v. 1) e m a ‘aseh (v. 3). E provável que a resposta efetiva 1093
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(v. I) e a obra duradoura (v. 3) impliquem a necessidade do Senhor, aquele que é moralmen te irrepreensível, considerá-las moralmente puras (v. 2). Quando as motivações humanas são puras, o Senhor as integra à sua ordem justa determinada (cf. 10.22; cf. Salmo 127). Os fiéis não devem se inquietar nem preocupar com a eficácia e pureza de seus próprios planos, pois a avaliação e realização desses planos dependem de Deus e não de um homem (SI 22.9; 37.5; 55.23; lPe 5.7). O melhor que o filho tem a fazer é entregar-se à avaliação de Deus, com re ferência à pureza das obras que esse filho realiza, e confiar que o Senhor as ratificará ou veta rá. Uma vez que o Senhor pode levar nossos planos à concretização, o sucesso deles pode ser atribuído somente a Deus. A conclusão (vv. 10-15) está ligada ao restante pelo termo-chave “rei”, que ocorre em todos os versículos, exceto no v. 11, e pelo tema de viver-se sob o governo do rei sábio. Esses seis versículos, por sua vez, são constituídos de quartetos. A coesão do primeiro (vv. 10-11) se deve à idéia de justiça, mispãf, pela assonância dos termos iniciais, qesem (= veredicto inspira do) e peles (= balança), dos termos finais, piw (= sua boca) e kis (= bolsa) e pelo tema (ou seja, o Senhor administra seu reino justo por intermédio de seu rei sábio). O segundo, o par com plementar e antitético (vv. 12-13), está ligado pelo termo “rei(s)” na parte a de ambos, sendo que o plural do versículo 12 contrasta com o singular nos w . 10, 13 e 14 e pelos antônimos já usadas “abominável” e “agradável” (v. 13 “é o contentamento”; cf. vv. 5 e 7) e “impiedade” e “justiça”. Os dois provérbios ilustram a prática da justiça (cf. vv. 10-11) por meio das análises do rei sábio: de maneira negativa com referência aos atos do perverso (v. 12), e positiva, com referência às palavras do justo (v. 13). Os versículos começam e terminam de modo quiasmático, referindo-se às preferências morais do justo: “abomina” e “ama”. O terceiro quarteto, o par antitético (vv. 14-15), confere unidade a uma conclusão intensa ao contrastar o furor do rei, que anuncia a morte, com seu favor, que proclama a vida. O mesmo contraste pode ser encontrado em 19.12. Os dois últimos quartetos estão ligados pela idéia de favor (“contentamento” no v. 13a e “semblante alegre” no v. 15b). Além disso, de acordo com Meinhold (263), os provérbios de Javé (vv. 1-9) e os pro vérbios do rei (vv. 10-15) possuem referências mútuas tão próximas que podem ser vistos como um conjunto. Ele observa que: a. Diz-se que tanto Deus quanto o rei abominam, tô ‘abat (vv. 5,12) e também favorecem, re.'>ôtlre^ôn (radical r$h) (vv. 7, 13,15). b. É especialmente digno de nota que, no original, o vb. expiar aparece somente no provérbio de Javé (v. 6) e no provér bio do rei (“apaziguar”, v. 14). c. No entrelance dos dois grupos de provérbios são ainda mais importantes os dois versículos que interrompem os provérbios de Javé no penúltimo lugar e os provérbios do rei no segundo lugar. Trata-se de uma ligação teologicamente relevante. O Senhor, o Soberano (vv. l-4a) e governante moral, Senhor do mundo (vv. 4b-7), leva a efei to o seu governo por intermédio do seu rei. “Nos lábios do rei se acham decisões autorizadas (qesem)" (v. 10) — mas em última análise, o Senhor é o responsável pela justiça (v. 11). O rei é justo (vv. 12-13), castiga os perversos (v. 14) e recompensa os retos (v. 15). Meinhold (269) comenta que nesse caso o rei é um ser humano correspondente a Javé, executando e protegendo a retidão e a justiça por meio de sua comissão. O NT identifica esse rei ideal com Jesus Cristo, ao qual o pai confiou todo o julgamento (Jo 5.22). D. Reflexão Teológica As promessas concretas de Provérbios para aqueles que guardam seus ensinamentos parecem distantes das realidades da terra. Em 3.1-10, as ordens condicionais nos versículos ímpares são combinadas com promessas conseqüenciais nos versículos pares. A admoestação desenvolve-se a partir de uma introdução típica, para que se guarde os ensinamentos do pai (v. 1), passando à ordem de não abandonar o amor e a fidelidade à humanidade (v. 3); estabelecer 1094
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e manter um relacionamento com Deus: confiar no Senhor (v. 5), ser humilde diante de Deus (ou seja, não ser sábio aos próprios olhos e assim, pensar e agir ímpia e perversamente; v. 7), honrar o Senhor (v. 9) e não rejeitar a disciplina do Senhor (v. 11) (cf. Newsom, 149-51). Esses mandamentos são combinados com as seguintes promessa concretas: longevi dade e prosperidade (v. 2), favor e boa compreensão diante de Deus e da humanidade (v.4), desfrutar de um caminho reto ou plano (v. 6), saúde mental e física (v. 8) e celeiros transbordantes (v. 10). Porém, ao serem comparadas com as experiências de Jesus Cristo, que guardou perfeitamente todos esses mandamentos, essas promessas parecem falsas. Ao invés de ter uma vida longa, Jesus morreu prematuramente no auge da sua vida. Em vez de ter o favor de Deus e da humanidade, clamou “Deus meu, Deus meu. por que me abandonaste?” e foi despreza do e rejeitado pelas pessoas. Em vez de um caminho reto ou plano, deparou-se com rejeição e oposição todos os dias de sua vida, com a indiferença dos escribas ao seu nascimento e a matança de inocentes decretada por Herodes até o momento final de Jesus na cruz. Em vez de saúde mental e física, antes da cruz, suou gotas de sangue e na cruz, foi desfigurado a ponto de ficar irreconhecível. Em vez de barris transbordando de vinho novo, não tinha onde descansar a cabeça. E, no entanto, Jesus Cristo jamais negou a autoridade das Escrituras; de Provérbios, tampouco (Jo 10.35). E preciso que tenhamos em mente vários fatores a fim de resolver a tensão entre as promessas celestiais de Provérbios e as realidades duras aqui da terra. Em primeiro lugar, os provérbios são epigramáticos, de modo que por sua própria natureza, constituem declarações parciais que não podem se ocultar atrás de qualificações. De acordo com Von Rad (32): “E par te da natureza do epigrama que a verdade seja expressada com a maior concentração possível num assunto e com o desprezo total de qualquer pressuposto, circunstâncias, etc... No caso de uma frase da antigüidade, [com que facilidade] pode-se chegar a um ponto em que o signifi cado dela é distorcido pelo simples motivo de haver-se perdido de vista os fatos ideológicos e religiosos que eram elementos fundamentais de sua essência”. Provérbios isolados expressam uma verdade, mas não a verdade toda; devem ser lidos dentro de seus contextos literários que ajudam a qualificá-los. A declaração “O pobre é odiado até do vizinho” (14.20), por exemplo, deve ser considerado com um par proverbial do versículo seguinte, “O que despreza ao seu vizinho peca, mas o que se compadece dos pobres é feliz” (14.21). Em segundo lugar e de modo correlativo, a ligação existente entre os atos e o destino é modificada por “contraprovérbios” que a contradizem. Observe-se. por exemplo, como o pro vérbio do tipo “melhor é”, em 16.8, qualifica a justiça nos vv. 5-7. Outros provérbios do tipo “melhor é” (p. ex., 15.16-17; 16.16, 19; 17.1; 19.22b; 21.3; 28.6) também ligam a pobreza à justiça e a riqueza à perversidade, deixando perfeitamente claro que os atos de piedade e mo ralidade, na experiência real, nâo levam invariavelmente a benefícios morais e sociais. Além disso, muitos provérbios reconhecem as falhas da justiça. Nas palavras de Van Leewun (“Wealth and Poverty”, 29), “Há vários ditados que declaram ou deixam implícito que os ímpios prospe ram e os inocentes sofrem” (p. ex., 10.2; 11.16; 13.23; 14.31; 15.25; 18.23; 19.10; 21.6, 7, 13; 22.8, 22; 23.17; 28.15-16a, 27; 30.14). Van Leewun lamenta justificadamente que um número excessivo de estudiosos não reconhece as limitações impostas por esses contraprovérbios. Ao insistirem que o livro de Provérbios ensina um dogmatismo metódico de moralidade e piedade, esses estudiosos comparam esses ditados, supostamente distantes da realidade, como os cinco quartetos de Provérbios 3.1-10, com o realismo do Pregador e de Jó e, assim, desacreditam aqueles facilmente em função destes. Em terceiro lugar, apesar de a obediência às verdades proverbiais não garantir o “suces so” imediato, a experiência costuma vindicar tais verdades: o sóbrio (cf., 23.29-35), o diligente 1095
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(p. ex., 10.4-5), o que é sexualmente virtuoso (26.23-28) e o pacífico — (ou seja, aquele que é sábio) — em contraste com o indivíduo bcberrâo, preguiçoso, sexualmente impuro e colé rico — encontra vida e paz. Apesar de Salomão saber que Deus é inescrutável e que ninguém pode manipular o destino (cf. von Rad. 131-48, 166-70), ainda assim cria que o Deus de Is rael amasse a piedade e a moralidade e abominasse o oposto delas (11.1; 12.2; 15.8-9; 17.15; 20.10; 23; 21.3, 27; 28.9). Em quarto lugar, Provérbios olha para o final, para as conseqüências da piedade em contraste com a impiedade, da justiça em contraste com a perversidade e da sabedoria em con traste com a insensatez. O princípio da moralidade não se refere aos sofrimentos dos justos. O efeito desse gênero, desse ponto de vista, pode ser observado claramente em 24.15-16: “Não le ponhas de emboscada, ó perverso, contra a habitação do justo... porquanto sete vezes cairá o justo e se levantará; mas os perversos são derribados pela calamidade”. O número “sete” re presenta plenitude. O provérbio admite que pessoas justas possam ser derrubadas várias vezes, mas, ao final, sempre se levantam. O mesmo não ocorre com os perversos. Jó e Eclesiastes, por outro lado, tratam dos pobres oprimidos. Apesar de seus pontos de vista serem diferen tes, os três livros apresentam verdades importantes e devem ser lidos em conjunto. O erro do chamado evangelho da riqueza e prosperidade é que ele busca a glória sem o sofrimento que deve antecedê-la. Concluindo: o fim antevisto se estende além da morte física. Nesse livro, o falecimento refere-se à morte absoluta e não ao fim da vida física, como o termo costuma ser compreendido. Em Provérbios 5.11, o fim da vida desse insensato é descrito como “quando se consumirem a tua carne e o teu corpo”. A vida, por outro lado, refere-se à existência eterna em comunhão com Deus. Se não fosse o caso, a primeira lição já desintegraria o livro. Em 1.8-19, assassinos causam a morte prematura de um inocente. E, no entanto, Provérbios afirma repetidamente que Deus castiga os perversos mas recompensa os justos (ver 16.5-7). “Ele escarnece dos escarnecedores, mas dá graça aos humildes” (3.34). Uma vez que os pecadores enviaram sangue inocente prematuramente para o reino dos mortos, o indivíduo oprimido deve encontrar a graça num futuro que vai além da sepultura. Vários versículos comprovam essa inferência. Uma exegese detalhada de 14.32 (ver o ensaio “Crítica textual do Antigo Testamento, Exegese e Teologia”, no Guia) confirma o TM: “Em sua morte, o justo busca refúgio no Senhor”. Rashi, o mais famoso intérprete ju deu comenta sobre isso: “Quando ele morrer, será na confiança de que estará a caminho do Jardim do Éden” . Provérbios 12.28b também expressa de maneira bastante criativa que os justos mantêm um relacionamento com Deus para sempre: a morte física não rompe essa relação com o Senhor. A grande maioria dos códices da tradição masorética diz: “Na vereda da justiça está a vida e a jornada de seu caminho estreito é a imortalidade ( 'al mawet)". De acordo com Delitzsch (269), “Se compararmos xiv. 32 com essas palavras, fica evidente que a ‘sabedoria’ começa a ... rom per os limites dessa vida presente e anunciar uma vida fora do alcance da morte”. Porém, assim como 14.32, a declaração de 12.28 confronta o exegeta novamente com um problema textual. Todas as versões antigas e mais de vinte códices medievais dizem “até a morte”, 'el-mãwet e não ’al-mãwet, “imortalidade”. Os argumentos da crítica textual, bem como aqueles de ordem fílológica, contextual e teológica favorecem, em sua maioria, o TM. Do ponto de vista da crítica textual, a preferência é para 'al-mãwet. Trata-se de um hapleg. e, portanto, da versão mais difícil de eliminar-se com qualquer explicação. Então, da mesma forma, a versão alternativa exige que se altere o termo netibâ, apesar de não haver um consenso sobre como isso deve ser feito. A LXX, (cf. o Trg. Sir.), traz mnêsikakõn, “mas 1096
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aqueles que têm malícia” (< cJerek meribâ / 'õz ?). Seguindo Gemser, Fichtner (= BHS) emen da o termo para mesúbâ, [o caminho da] apostasia, ou para tô ‘êbà, da abominação, sendo que as duas versões têm o objetivo de facilitar a leitura e não se mostram aceitáveis do ponto de vista da crítica textual. Oesterly sugere que o part. niph. sing. fem. de nit'ãb [o caminho] que é abominável, mas, assim como Toy (260), apresenta a objeção de que "isso não é provável”. Toumay (1962,495-97), seguido de McKane (451), apresenta a emendap elib ã ’, vem a insen satez (cf. 1.22), mas esta não conta com nenhum fundamento textual. Além disso, não é pos sível justificar-se o termo difícil ’al, a menos que este se encontre firmemente arraigado numa tradição oral confiável. “Um conjunto complexo de evidências indica que o TM nâo poderia, de nenhuma maneira séria ou sistemática, representar uma reconstituição ou falsificação dos dados” (IBHS 1.6.3h). Nos casos que envolvem a tradição oral, dá-se preferência ao TM em relação às versões antigas. Do ponto de vista filológico, é preciso observar-se, em primeiro lugar, que Even-Shoshan relaciona ’al-mãwet como uma palavra comum para “imortalidade” nas fontes judaicas pósbíblicas e, em segundo lugar, que essa oração também denota a imortalidade no ugar. (ver HALAT, 48). J. F. A. Sawyer (204-5) argumenta de modo convincente que essa evidência do ugar. e do heb. pós-biblico indica “um grau extraordinário de coesão [no significado de “imor talidade] da Síria do segundo milênio [.v/c/] a. C. com a literatura judaica pós-bíblica. Delitzch comenta: “Nada é mais natural do que dizer que o Chokma, com seus contrastes constantes entre a vida e a morte, começa expressando a idéia de athanasia, ‘sem morte’... que Aquila interpretou equivocadamente com o 'l-mwt, SI xlviii. 15”. Do ponto de vista contextual, é de se esperar um paralelo antitético e não sintético (em oposição a McKane). Seções de provérbios costumam terminar no paralelismo sinônimo mais raro e uma nova seção começa com um aforismo referente à receptividade dos sábios ao ensino e ao caráter incorrigível dos insensatos. A relação de 12.28 com 13.1 equipara-se exatamente à de 11.31 com 12.1 e à de 12.14 com 15. Novamente, nas palavras de Delitzch: “O provérbio xii.28 é tão sublime, tão momentoso, que forma inequivocamente uma oração e uma conclu são. Isso é confirmado pelo provérbio seguinte, que começa como x. I (cf. 5) e mais uma vez, marca esse conjunto como sendo voltado para os jovens”. Em termos teológicos o livro deixa a imortalidade do justo implícita repetidamente (ver 2.19; 10.2, 16; 11.4, 19; 12.3, 7, 12, 19). A idéia de que a morte seja o fim absoluto do justo é impensável nesse livro. Uma expressão patente de imortalidade nessa obra não deve ser motivo algum de surpresa. Meinhold (216) interpreta a situação equivocadamente quando diz que essa doutrina só pode ser encontrada mais adiante, na Sabedoria de Salomão: “pois a justiça é imortal” (1.15); “Deus criou o homem para a incorrupção e o fez à imagem de sua própria eternidade” (2.23). Provérbios 23.17-18 também aponta para a imortalidade: “Nâo tenha o teu coração inveja dos pecadores... porque deveras, haverá futuro, não será frustrada a tua esperança ( ’aharít)", juntamente com 24.19-20: “Não te aflijas por causa dos malfeitores... porque o maligno não terá bom futuro ( 'aharít)". Von Rad (202-4) diz: “Nâo se pode jamais julgar a vida de acor do com a aparência do momento. Antes, deve-se ter sempre em vista ‘o destino final’. Não é possível que esse termo importante, ’aharít, tão característico do pensamento aberto para o futuro, se referisse sempre à morte. Trata-se de uma palavra que também pode ser traduzida por ‘futuro’. Assim, o texto fala do resultado de algo, o objetivo de um acontecimento pelo qual se espera”. E, comentando sobre o uso de ’a harit no Salmo 49.16, Von Rad afirma: “A solução mais provável, portanto, é entender-se a oração como a expressão da esperança de uma vida de comunhão com Deus que continuará além da morte”. 1097
Provérbios: Teologia de
Por certo, não há como se verificar o futuro, como observa Gladson criticamente, po rém sem esse tipo de esperança, não se pode agradar a Deus. Se é possível viver pelo que se pode ver e não pela fé, então por que confiar no Senhor (3.5)? No entanto, sem uma definição, a ordem “confia no Senhor” não passa de uma trivialidade; nada representa para o pensamento do indivíduo, a menos que o Senhor tenha se revelado. Aqui, vê-se o Senhor ligado implici tamente à sua revelação nos ensinamentos do pai (ver 2.6). O filho deve revestir-se de toda a armadura forjada nesse livro. Ademais, o Senhor deve manter a ligação entre os atos e o des tino. No prólogo dos trinta ditados do sábio, Salomão volta a dizer: “Para que a tua confiança esteja no Senhor, quero dar-te hoje a instrução, a ti mesmo” (22.19). Von Rad (191) descarta os vários provérbio que pedem confiança no Senhor (3.5; 14.26; 16.3,20; 18.10; 19.23; 28.25; 29.25; 30.1 -14) como sendo essencialmente irrelevantes. De acor do com ele, o sábio não ensinou a confiança no Senhor, “mas sim, algo que parece ser bastante distinto, a saber, a realidade e as evidências da ordem que controla a vida como um todo, em grande parte, da forma como isso aparecia na relação entre atos e conseqüências. Na verdade, a ordem existia de fato e podia, em última análise, falar por si mesma”. A idéia de se a “ordem” e os “atos e conseqüências” no lugar do Senhor tomou-se algo muito influente nos estudos da literatura de sabedoria. Alguns estudiosos removem Deus inteiramente de qualquer envolvi mento com o mundo ou, na melhor das hipóteses, reduzem-no a uma causa prima dentro de uma visão deísta da realidade. E justa a queixa de E. F. Huwiler (64): “Em sua forma extrema, a síndrome dos atos e conseqüências remove a divindade da esfera de atuação do mundo. De acordo com essa concepção, as conseqüências seguem os atos propriamente ditos e Javé, cujo poder é limitado, encontra-se envolvido diretamente apenas como uma parteira ou um catalisa dor químico, apesar de estar envolvido indiretamente como criador, que deu início à síndrome dos atos e conseqüências”. Por certo, vários ditados declaram uma relação entre caráter, atos e conseqüências, mas, como Huwiler (68-69) afirma, não “pressupõem uma inatividade divina”. Em última análise, Deus mantém essa ligação e, assim, o filho confia nele. Conforme foi observado, o Senhor não mantém a ordem moral de acordo com um cálculo metódico dentro do qual a justiça é imediatamente recompensada e a perversidade, castigada. Se fosse assim, as pessoas confundiriam prazer com moralidade; todos se comportariam de modo reto por motivos egoístas e não pela mais pura virtude fundamentada na fé, na esperança e no amor. Colocariam o eudemonismo (ou seja, o sistema de pensamento que baseia a ética e a obrigação moral no prazer) no lugar da virtude verdadeira (cf. Rm 5.2-5; 1Pe 1.5-8). Os sá bios confiam em que o Senhor cumprirá seus provérbios éticos no tempo devido e da maneira apropriada, mesmo quando os perversos prosperam e os justos sofrem. B ib l io g r a f ia
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Provérbios: Teologia de
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Queda da Humanidade
Prudência
# 6874 ( ‘ãrúm, esperto, arguto, astuto, prudente)
Prumo [fio de] -> # 974 (tfidil, escória, estanho, prumo [fio de]) Pulo -> # 7055 (pws, saltar, pular) Pungência
# 2477 (hêbel, pontadas [de dor], trabalho de parto, feto)
Putrefação -> # 5245 (mqq, putrefazer, apodrecer, definhar) Quadrado Quadril
# 8062 ( r è ' 11, tomar quadrado) # 3751 (yãrêk, coxa, quadril)
Quatro -> # ( ‘arba ‘ , quatro) Quebra -> # 8689 (íftr I, quebrar, demolir, esmagar, despedaçar) Queda -> # 5877 («/>/, cair)
A doutrina da queda dos homens, da bondade original para um estado pecaminoso, é um ensinamento do NT (Rm 1.18—3.23; 5.12-21; ICo 15.21-22), mas não há nenhum termo técnico no AT para des crever o ato ou a condição resultante. Esse acontecimento, portanto, é derivado da narrativa que o descreve (Gn 3.1-8), e constitui uma necessidade lógica e teológica pressuposta no tes temunho persistente da Bíblia sobre o problema do pecado e sua resolução. A declaração que resume a obra criativa de Deus, inclusive a criação dos homens, afirma que “Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom” (Gn 1.31). Apesar de a expressão heb. (âb me od, muito bom, não transmitir inerentemente a idéia de impecabilidade, seu uso no contexto da criação, antes da primeira tentação e desobediência, favorecem claramente tal conclusão (cf. von Rad, 59). A proibição de comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal (Gn 2.1617) também indica inocência, pois “conhecer” (yd‘ ; # 3359) em heb. não tem significado cognitivo quando se refere a conceitos abstratos como o bem (-> ;ôb I, bem, # 3202) ou o mal (-> r a ' ; # 8273a). Antes, é sinônimo de captação por experiência (von Rad, 86). Gênesis 3.5 afirma que Deus “conhece” o bem e o mal. A maioria dos estudiosos concorda que “bem e mal” provavelmente constituem um merisma, uma figura de linguagem para denotar conhecimento absolutamente abrangente e não uma participação em atos ou comportamentos moralmente bons ou maus. Trata-se de uma referência à onisciência de Deus, a uma sabedoria reservada para ele e para ninguém mais. A busca humana pela sabedoria foi um ato de arrogância pecaminosa (Wenham, 63-64). Quando Adão (->) e Eva comeram do fruto (Gn 3.6), seus olhos se abriram (Gn 3.7) e eles tomaram-se como Deus (Gn 3.22), no sentido de que adquiriram sabedoria pela experiência e não pelo temor ao Senhor (Pv 1.7). A relação entre pecado, morte e a queda encontra-se implícita na ameaça de que Adão e Eva morreriam no dia em que comessem da árvore (Gn 2.17), no fato de que os olhos deles se abriram, mostrando a consciência de sua situação (Clines, 11), a qual estará explicitada nos ensiQueda da Humanidade
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Qumran: Uma Teologia de
namentos de Paulo sobre esse assunto. O apóstolo argumenta que “a morte veio por um homem” (ou seja, Adão) e que toda a humanidade está morta, seguindo o pai da raça humana ( I Co 15.21 22). Adão morreu porque pecou, e deixou como legado a morte para todos os seus descenden tes (Rm 5.12-14). Em termos mais específicos, ele morreu por causa de uma transgressão, uma única violação da lei do Senhor (Rm 5.16). Esse único pecado foi, obviamente, comer o fruto proibido, o que levou à queda da humanidade da comunhão e dos propósitos da graça de Deus. Os resultados da queda manifestaram-se na inclinação da humanidade a fazer o mal a partir da transgressão de Adão. Assim, “viu o Senhor que a maldade do homem se havia multi plicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração” (Gn 6.5; cf. 8.21). A palavra “desígnio” (yêser; # 3671) descreve o propósito da mente (BDB, 428) determinada a seguir determinado modo de agir. (Dt 31.21; “propósitos”, Is 26.3). A queda, portanto, causou uma predisposição para o pecado, tanto que não há quem escape dessa propensão (1 Rs 8.46; Jó 4.17-21; SI 78.38 [39]; 103; 10; 143.2; Pv20.9; Ec 7.20). Davi expressa o resultado da queda em uma confissão comovente: “Eu nasci na iniqüidade, e em pecado me concebeu minha mãe” (SI 41.5). Assim, apesar de nenhum conceito de queda da humanidade ser articulado no AT nesses termos, a condição humana descrita por toda a parte no AT tem como origem a inclinação humana para o pecado, uma disposição que encontra suas raízes na desobediência e queda de Adão e Eva. NT
NIDNTT 1:84-88
B ib l io g r a f ia
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# 8488 (syh, queixar-se, refletir, estudar, falar, meditar)
1. Introdução. Só se Manuscritos do Mar Morto: que quase tudo está em movimento. Essa idéia é apoiada pelo número de teorias diferentes sobre praticamente todos os aspectos da pesquisa dos papiros. Depois de mais de uma década de especulações cada vez maiores e mais intensas, e dos conflitos sobre problemas referentes à publicação desses papi ros, um avanço positivo foi a reação oportuna dos comitês relevantes de colocarem todo o ma terial textual do deserto da Judeia à disposição dos pesquisadores sérios (Sanders; Tov & Pfann). Essa medida retificadora sem dúvida levará à formulação de novas teorias e ao teste sistemá tico das já existentes. Este artigo concentra-se nos papiros que podem ser definidos como papiros de Qumran. Os Manuscritos do Mar Morto contêm, em sua totalidade, mais do que os escritos encontrados Q um ran: Unia Teologia de
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Qumran: Uma Teologia de
em Quirbete Qumran, a noroeste do Mar Morto. Mais para o sul, em Wadi Murabba‘at e Nahal Gever, por exemplo, foram encontrados materiais textuais de importância crucial que muda ram a compreensão anterior da história textual da BH (cf. Barthélemy; Tov, 1982). Essas con cepções reconsideradas baseiam-se principalmente nos textos bíblicos, mostrando em alguns casos uma correspondência impressionante com os textos da Septuaginta (cf. Tov, 1993). Os documentos conhecidos como não bíblicos (também chamados de sectários), porém, são o as sunto desta nossa contribuição. É nesses documentos que se encontram as idéias “teológicas” da comunidade de Qumran. Não é uma tarefa simples escrever uma “teologia de Qumran” pois, mesmo havendo uma unidade em termos de conceitos religiosos ao longo desses papiros (Dimant 532), não existe um consenso sobrelevante com relação a nenhum dos aspectos individuais. Várias ques tões também influenciaram a perspectiva teológica daqueles que foram responsáveis pelos papiros de Qumran. 2. Questões Introdutórias. Nos últimos tempos, os conceitos sobre os indivíduos re ponsáveis pelos papiros têm se refinado: já está claro que não foram os caraítas da Idade Média (Wacholder). Ao que parece, há um amplo consenso de que esses textos devem ser relacionados aos essênios, os quais reuniram um grupo numeroso de sectários (numa referência àqueles que se distinguiam do judaísmo tradicional) desligado da liderança religiosa de Jerusalém naquela época (Vermes, XVII). Trata-se de uma afirmação absolutamente oposta à concepção de Golb, segundo a qual os papiros de Qumran foram tirados de diferentes bibliotecas de Jerusalém e, na realidade, representam a literatura do judaísmo como um todo. Garcia Martínez e Van der Woude formularam aquilo que chamaram apropriadamente de “Hipótese ‘Groningen’das Origens e História Primitiva de Qumran”. Essa teoria de motivações válidas contém uma síntese de idéias e pode, por ora, ser usada como uma hipótese geral para desenvolvermos nosso trabalho. Os autores estabelecem uma relação direta entre esse grupo e os essênios sem precisar aceitar que esses grupos eram idênticos (537). A história dos essênios e dos sectários de Qumran é complicada (cf. Callaway; Collins, 36-39). Alguns consideram o assentamento em Qumran como o quartel general dos essênios. 1QS fornece as regras segundo as quais a comunidade devia viver. De acordo com Josefo, havia seguidores vivendo por todo o país. É provável que CD esteja voltado para a organiza ção desses grupos. No entanto, esse documento foi submetido a uma “revisão de acordo com Qumran” (Davies, 1983, 2) e, ao que parece, é um documento importante do movimento essênio em geral. No que se refere ao contexto histórico dos essênios, há uma diferença clara de opiniões quanto a se considerar a Palestina ou a Babilônia como o local (original) de habitação deles. Garcia Martínez e Van der Woude (537), bem como vários outros estudiosos (cf. Cross 1992, 11-14), determinam a Palestina como origem do movimento essênio em geral, movimento esse que teria raízes na tradição apocalíptica palestina antes do advento trágico de Antíoco Epifãnio no começo do século II a. C. Outros acreditam que a Babilônia tenha sido o local de origem dos essênios (Albright). Cross (1961, 192) apresentou evidências textuais importantes (a tra dição protomassorética) para indicar possíveis contatos entre esse grupo e a Babilônia, sem aceitar a Babilônia como lugar de origem dele (Cross, 1992, 11). Davies (1983, 46), seguindo a mesma concepção de Murphy-0’Connor, chegou à conclusão de que o nome Damasco em CD deve ser considerado um símbolo que pode referir-se somente à “Babilônia”. Talvez não seja necessário contrastar esses dois pontos de vista. Os conceitos religiosos singulares, como o dualismo encontrado nos papiros, podem ter sido introduzidos na Palestina vindos da Babi lônia bem antes da era dos macabeus. 1102
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Uma última questão diz respeito às raízes ideológicas judaicas do movimento. Alguns estudiosos buscam as origens em círculos hassídicos. Stegemann (1971) acredita que o hassidismo do período macabeu se dividiu, dando origem aos essênios de Qumran e aos fariseus. Murphy-0’Connor (142), por outro lado, argumenta que os essênios tiveram origem na Babi lônia como parte da comunidade do exílio, mas voltaram para a Palestina, onde enfrentaram oposição política e religiosa. Isso os levou a se separarem e fundar o grupo de Qumran. Nos últimos tempos, Schiffman (1992) argumentou em favor de origens saducéias para os essê nios. Esse autor (Schiffman 1992,43) apresentou evidências de uma polêmica “anti-farisaica” num fragmento recém-pesquisado chamado de MMT (Miqxat Ma 'aseh Hattôrâ) (cf. a crítica de VanderKam). É provável que o núcleo dos membros originais do grupo de Qumran fosse composto de sacerdotes insatisfeitos durante os mandatos de Jônatas e Simão. Isso pode expli car o caráter saduceu do halakah encontrado nos papiros (Garcia Martínez & Van der Woude, 537). Os essênios (inclusive os membros de Qumran) são, portanto, evidentemente, movimen tos sectários judaicos. 3. A exegese de Qumran. Os papiros apresentam várias características surpreendente mente singulares, sendo que uma delas — o método interpretativo — é fundamental. O modelo Pecher fornece a chave para a compreensão das crenças de Qumran. A interpretação da oração “para que aquele que ao ler possa correr” (lit., Hc 2.2) pelo chamado Mestre da Retidão no Midrache de Habacuque (lQpHab 7:3-4), é fundamental para todas essas idéias. A paráfrase acrescentada ao texto bíblico é: “Sua interpretação refere-se ao Mestre da Retidão ao qual Deus revelou todos os mistérios das palavras de seus servos, os profetas”. Essa citação já demonstra a forma singular do Pecher, que possui estruturas um tanto fixas, tomando uma citação bíblica como ponto de partida para um comentário com tins “escatológicos”. Assim, para transmitir um comentário como esses, são usados, por vezes, criptogramas. O nome “Quitim”, por exemplo, que é usado em lQpHab 2:12, 14, um comentário de Habacuque 1.6, é mais provavelmente uma referência aos romanos. Semelhantemente, re ferências simbólicas como o Homem de Mentiras, a Casa de Absalão e até mesmo o Mestre da Retidão são usadas com um sentido apocalíptico (pseudônimo). Em decorrência disso, a pas sagem bíblica é reinterpretada num contexto contemporâneo, pois o Mestre recebeu de Deus esse conhecimento exclusivo. Há um exemplo de uma referência histórica direta a Demétrio e ao rei Antíoco no comentário de Naum da caverna 4, cap. 1:2 (Lohse, 263). 4. Apocalipticismo e literatura apocalíptica. Nem todos estão convencidos de que a comunidade de Qumran deva ser mesmo considerada um movimento apocalíptico. Stegemann (1983) nega com veemência que esse fosse o caso. Apesar de as definições do significado de apocalipticismo e literatura apocalíptica estarem passando por reformulações (de Villiers), pa rece existir um consenso relativamente definido de que os papiros em discussão devem estar, de fato, relacionados aos movimentos apocalípticos do começo do século II a. C. (Collins, 46). Na realidade, isso constitui o contexto dentro do qual os documentos extrabíblicos de Qumran devam ser avaliados. Foi um tempo turbulento, conducente à criação de novos paradigmas re ligiosos. Para fins interpretativos, é importante lembrar de que a literatura apocalíptica não é apenas um gênero literário singular, mas também um fenômeno social (Hanson; Deist). Assim, o contexto histórico desses papiros é de importância crucial. 5. Dualismo. E possível que a visão dualista de bem e mal seja a doutrina religiosa central do material extrabíblico. Em termos práticos, tudo nesses documentos — sua antropo logia, cosmologia e angelologia — é visto sob uma ótica dualista, como pode ser observado na passagem clássica do Manual de Disciplina (1QS 3:13-25): 1103
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(15) Do Deus do conhecimento vem tudo o que é e será. Antes de todas as coisas existirem, ele já havia determinado todos os seus planos, (16) e quando passaram a existir, completaram a obra dele, de acordo com as instruções que foram dadas a elas, em harmonia com o plano glorioso dele e sem mudar coisa alguma. Nas mâos dele (17) estão as leis para todas as coisas e ele a todas as coisas mantém em todos os aspectos. Ele criou o homem para governar ( 18) e lhe conferiu dois espíritos para que o homem pudesse caminhar com eles até o tempo designado de sua visitação: são eles os espíritos (19) da verdade e da injustiça. De uma fonte de luz, vêm as gerações da verdade e de um poço de trevas vêm as gerações da injustiça. (Knibb. 94)
Essa passagem levanta vários problemas literários e histórico-tradicionais. IQS é cla ramente um documento composto. No entanto, a passagem acima reflete, de forma resumida, as idéias da comunidade. Representa um desenvolvimento interessante em comparação com idéias mais antigas. Esse dualismo cosmológico é, em parte, resultante de influências exter nas, provavelmente persas. Na religião persa do periodo arquimênida, o conceito de um Deus supremo acabou dando lugar à crença em duas divindades, uma (Aúra Masda) representando o Bem e outra (Arimã), constituindo a origem do Mal. Essa forma de pensamento nos escritos de Qumran é, em última análise, o resultado do exílio devastador na Babilônia, que levou inevitavelmente a uma desintegração das idéias tra dicionais, resultando na formulação de perspectivas inéditas e idealistas que constituíam parte da iniciativa da comunidade de encontrar algum sentido numa crise incapacitante (Vorster, 163). Porém, ao se considerar a possibilidade de um dualismo na Divindade — o que é dia metralmente contrário à concepção monoteísta tradicional do judaísmo — é de se imaginar se essa idéia não causou problemas para o(s) autor(es). Ao que parece, não foi o caso, pois essa passagem difere dos textos paralelos persas em um aspecto crítico. Uma cisão da divindade está fora de questão. Nâo há poder sobrenatural e supremo algum semelhante ou igual a Deus. Deus é o único e soberano criador e sustentador do mundo. Nesse sentido, a doutrina da predestinação é da maior importância. A partir da passa gem citada, fica claro que todas as coisas foram preordenadas por Deus. Isso representa uma solução criativa para o problema da teodicidade; significa que nâo é possível haver nenhum mal que tenha “fugido ao controle”. O verdadeiro problema é resolvido por um sistema daquilo que Dimant (533) chama de “dupla predestinação”. Não apenas os acontecimentos mas também o seu caráter são predeterminados: se serão bons ou maus. Outro fenômeno extraordinário é a correspondência existente entre o dualismo cosmoló gico e o ético. Por um lado, diz-se que os dois espíritos foram designados aos homens para que eles pudessem controlar o mundo. Isso é feito enquanto anjos lutam no coração da humanidade (IQS 4:23-24). Por outro lado, esses espíritos representam domínios inteiros. Em 1QM, o Anjo da Luz (Miguel) controla o reino da Luz e Belial é o comandante do Mal. Ao que parece, portanto, a pessoa (ou as pessoas) responsável por esses documentos não teve nenhum problema evidente com essas formulações dualistas. E bem provável que isso fosse resultado do fato de as doutrinas serem fundamentadas em conceitos do AT, como por exemplo a crença de que Deus é um só e soberano e de uma doutrina de predestinação e eleição. E nessas áreas que os papiros têm esclarecimentos importantes a proporcionar para o NT (Cook, 1993). 6. Predestinação e eleição. Vários dos papiros sectários mostram evidências de um crença numa predestinação rigorosa. Diversos conceitos são empregados em relação a isso. O termo heb. gôrãl (quinhão, porção) é especialmente relevante. Em 1QM, cada espírito ou anjo 1104
Qumran: Uma Teologia de
recebe um “quinhão”. Em 1QS o “quinhão” é usado com relação à humanidade, descrita no cap. 2:2 como “os homens da porção de Deus que andam perfeitamente em todos os caminhos dele...”; e no cap. 2:5 como “os homens do quinhão de Belial”. No que se refere à história, o conceito de qê.% fim, com o significado de períodos pre determinados, é decisivo. Em última análise, a história encontra-se nas mãos de Deus e é con siderada uma seqüência de fases predestinadas. Estas, no entanto, não ficam claras para os que não são iniciados, pois pertencem aos mistérios de Deus (razzê ’êl). De acordo com 1QS, esses mistérios foram revelados aos profetas, mas o verdadeiro significado desses mistérios é obscuro para todos exceto o Mestre da Retidão. Ele foi predestinado por Deus para revelar os mistérios, mas somente para alguns dos filhos de Israel, a saber, aqueles que foram eleitos por Deus. A doutrina da predestinação também tem raízes no AT, mas não deve ser entendida como se os homens fossem apenas instrumentos passivos manipulados por forças externas. Tudo in dica que exista uma certa liberdade de escolha da parte das pessoas. Conceitos como pecado, arrependimento, graça, julgamento e salvação aparecem em vários documentos de Qumran. Ci tando apenas um exemplo: durante a cerimônia de ingresso na aliança, todos os novatos devem confessar e recitar por repetição as palavras dos sacerdotes (1 QS 1:24s): “Cometemos iniqüidade (25) e transgredimos, pecamos e agimos perversamente, nós e nossos pais antes de nós... (11.1) mas ele nos concedeu sua graça generosa de eternidade a eternidade” (Knibb, 83). Em decorrência disso, era possível um “filho das trevas” tornar-se um “filho da luz”. A raça humana é pecadora e carece de arrependimento. Porém, isso não pode ser realizado de livre e espontânea vontade; para fazê-lo, é preciso que o indivíduo tenha sido escolhido (1QS 4:20: “Então Deus purificará por intermédio de sua verdade todos os feitos dos homens e refinará para si a estrutura dos homens, removendo de dentro da carne deles todo espírito de injustiça (21) e purificando-os de todos os atos perversos com o espírito de santidade... Pois Deus os escolheu para a aliança eterna...”) (Knibb, 101). 7. Escatologia. A maioria dos escritos extrabíblicos apresenta traços de expectati relacionadas ao fim dos tempos. Existem, porém, certos escritos sectários que são, fundamen talmente, composições escatológicas. O melhor exemplo é, provavelmente, 1QM. Conhecido como Guerra dos Filhos da Luz Contra os Filhos das Trevas, o texto é uma descrição da guerra escatológica final entre os exércitos da luz e das trevas. Esse documento apresenta uma combinação estranha de elementos celestiais e terrenos. Tudo indica que se trate de uma descrição de uma guerra real e, conseqüentemente, são men cionadas nações pagãs como Edom, Moabe, os amonitas e os filisteus, bem como Quitim da Assíria e o Egito! Essas nações são chamadas, no entanto, de exército de Belial, podendo de fato, serem assistidas por Belial e pelos guerreiros angelicais dele (cap. 16:11). Do outro lado, vê-se Israel e os seres celestiais (os anjos) (18:1) da luz. Depois de uma seqüência intensa de batalhas, os filhos das trevas serão finalmente derrotados quando Deus intervier (cap. 18). O sucesso da guerra é garantido pois é preordenado. Pode-se observar mais uma vez a influência do AT. Os exércitos são organizados da mesma forma que os israelitas eram quando estavam vagando pelo deserto — em tribos, acam pamentos, famílias e números (Êx 18.21-25) e os sacerdotes exercem uma função de suma importância na guerra em si. A posição especial que Israel recebe no plano de Deus é crítica e fica claro que Israel é definida em termos chauvinistas, pois a comunidade de Qumran é a verdadeira Israel que con tinua viva no fim dos tempos. O estilo de vida rigoroso, relevando a purificação e obediência à lei de Moisés, representa um esforço para voltar a um passado ideal. Essa idéia levou alguns estudiosos a descreverem a escatologia de Qumran como “restaurativa” em contraste com uma 1105
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escatologia “utópica” (Scholem também usa essa descrição com relação ao messianismo [Schiffman, 1989, 1]) que procura alcançar um futuro ideal (cf. Dimant, 538). Ao que tudo indica, elementos de ambas as escatologias podem ser encontrados em Qumran. E justamente essa guerra final, a retomada subseqüente de Jerusalém e a reconstrução do templo que prepararão o caminho para o Ungido, dando início ao escathon (Dimant, 540). Essa seqüência de aconte cimentos conduz imediatamente a um estado de êxtase eterno para os filhos da luz, enquanto seus adversários serão relegados ao fogo eterno (IQS 2:4; 4:7 e IQM 1:13). 8. Messianismo. No judaísmo, a idéia messiânica constitui um fenômeno um tanto complexo e, em decorrências disso, há diversas concepções acerca do messianismo. O messia nismo de Qumran apresenta dois aspectos característicos. A combinação das duas tendências, restaurativa e utópica, parece ter surgido pela primeira em Qumran (SchifTman, 1989,8, mas cf. também Dimant, 538). Outra característica é a expectativa da vinda de dois Messias. Apesar de não se ter certeza se os membros de Qumran referiam-se, de fato, a dois Messias, tudo indica que haja referências textuais suficientes para confirmar essa idéia. IQS 9:10-11; CD 12:22-23; 13:20-22; 19:34— 20:1; 14:18-19 e 19.9-11 referem-se todos a um Messias sacerdotal e político (de Arão e Israel) (cf. Talmon, 288). Essa doutrina não é exclusiva de Qumran; Van der Woude (190-216) mostrou que tradições semelhantes ocorrem na literatura apócrifa. 9. Conclusão. Nas raízes das perspectivas teológicas encontradas em Qumran podese encontrar a situação histórica trágica da Palestina selêucida. Esse período repleto de crises ansiava por novas soluções e salvação. Nesse caso específico, essas soluções eram baseadas em conceitos conhecidos do AT. Os membros de Qumran esperavam a ocorrência iminente da guerra escatológica que daria início a uma ordem inteiramente nova, livre de qualquer supres são ou sofrimento. A vinda há tanto esperada do Messias seria simplesmente a concretização do plano preordenado de Deus para os filhos da luz no fim dos tempos (Laubscher). B ib l io g r a f ia
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Raabe (DHT [rahab], ser semidemoníaco ou Egito, #
AT Raabe refere-se a um ser semidemoníaco gigantesco (SI 89.10[ 11 ]; Jó 9.13; 26.12) ou à nação do Egito (SI 87.4; Is 30.7). Por vezes, a distinção entre uma entidade histórica verda deira e um monstro primitivo de proporções míticas é um tanto obscura (Is 51.9). Qualquer que seja a conotação exata disso, em praticamente todos os casos, a questão teológica ressaltada é a soberania e onipotência absolutas de Deus. 1. Nas referências em que Raabe é a força ou ser monstruoso do mal, a ênfase está poder de Javé sobre a ordem criada. Tudo nos céus e na terra deve tanto a existência quanto o vigor a Deus que criou todas as coisas. Não importa o modo de expressão, o poder natural é, em última análise, derivado da divindade que não apenas cria mas também sustenta o universo e tudo o que há nele. Segue, logicamente, que a força agregada do mundo natural não é capaz de se equiparar ao poder de Deus, pois o Criador é maior do que aquilo que criou. Somente Deus é a fonte suprema de poder humano, natural ou cósmico, onde quer que este se encontre e de qualquer maneira que venha a se expressar. Sem o Deus Criador, não haveria universo algum e, portanto, poder algum. Assim, quer o poder seja bom ou mau, quer promova ou di ficulte os propósitos de Deus, no balanço final, deve prestar contas e estará sob o julgamento dessa divindade soberana. O mesmo se aplica a seres sobrepujantes e temidos como Raabe que, à primeira vis ta, parece superior à outras forças da natureza como o mar ou o céu. Porém, Deus permanece inabalável. Javé pode subjugar tanto os elementos naturais como os antagonista inaturais com a mesma facilidade (Jó 9.1-13; 26.5-12). Apesar de todo o seu vigor, no final das contas, Ra abe é algo criado. Como tal, o resultado de sua batalha com Javé é previsível. Assim como o Senhor pode subjugar oceanos, montanhas e corpos celestes, também pode tratar com os ele mentos monstruosos. Não há absolutamente coisa alguma na ordem criada que tenha poder ou recursos suficientes para desafiar com sucesso esse Deus soberano. A idéia contrária não passa de ilusão. 1107
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Sem dúvida, essa exposição da onipotência de Deus pode criar problemas. O salmista teve dificuldade em compreender como Javé foi capaz de voltar seu poder divino contra Israel e o ungido (Salmo 89). No entanto, tratou-se de um exercício da santidade e justiça de Javé e não de força. Aliás, no caso do pecado contumaz e obstinado de Israel, o poder divino transformou-se pelo menos temporariamente em maldição ao invés de bênção. Da mesma forma, Jó admirou-se com o domínio extraordinário de Javé sobre Raabe e outras forças da natureza (Jó 9.13; 26.12). Mas essa foi uma espécie de abstração. Na realidade concreta das circunstân cias miseráveis de Jó, a soberania e o poder inexpugnável de Deus pareciam apenas exacerbar o sofrimento de Jó (Jó 12). Apesar de suas declarações de inocência, Jó sabia muito bem que era impotente diante dessa dimensão do poder divino. De fato, quando Deus é considerado exclusivamente em termos do poder que tem, a única reação concebível é a prostração por terra na presença divina. Até mesmo achegar-se a Deus, uma iniciativa que em tantas circunstâncias deve ser incentivada e afirmada, pode tomarse um risco (p. ex., Ex 33.3, 5; ISm 6.19; 2Sm 6.6-7). E, no entanto, apesar dessas dificuldades éticas e teológicas, o testemunho bíblico é inabalável ao mostrar um Deus soberano que pode derrotar e de fato derrota todos os rivais, até mesmo aqueles que parecem sobrenaturais. Nem mesmo um inimigo descomunal como Raabe poderia representar uma ameça a Deus. 2. Sempre que Raabe representa um país, a ênfase permanece na soberania e força d Deus, mas com uma nuança ligeiramente distinta. Ao mesmo tempo em que Israel no AT é um povo, um país, um empreendimento sociopolítico, com uma história e sociologia próprias, também transcende essas realidades terrenas. Em termos teológicos, Israel é o povo especial e peculiar de Deus (p. ex., Ex 19.3-6; Dt 7.6-8), uma dimensão que tem precedência sobre aque las mais tangíveis como território e história. Uma interpretação parecida se aplica aos inimigos “históricos” de Israel. Por um lado, eram nações-Estados comuns, cujos interesses políticos mostravam-se naturalmente conflitantes com os interesses de Israel. Por outro lado, esses países simbolizavam povos hostis a Israel e, conseqüentemente, um impedimento para aquilo que Deus procurava realizar por intermédio de seu povo, a saber, abençoar o mundo todo (Gn 12.1-3). Ninguém teve um papel simbólico negativo mais enfático do que o Egito. O êxodo do Egito continua sendo a história mais essencial da salvação no AT, um história na qual o Senhor se identifica com um grupo de escravos fracos, marginalizados e desfavorecidos e os resgata (Êxodo 1— 15). Esses escravos eram absolutamente desprovidos de poder, não tendo nenhum recurso exceto seu Deus e as promessas divinas que ele havia feito aos ancestrais deles, os pa triarcas e as matriarcas de Israel (Gênesis 12—50). Do ponto de vista egípcio, esses escravos serviam para ser usados como parecesse melhor ao Egito. Os poderosos estavam destinados a dominar sobre os impotentes. Essa forma de organização, porém, ia contra a justiça de Deus. Além disso, o Egito não era apenas uma superpotência em termos convencionais. Era também uma superpotência mítica, como é demonstrado pelos mágicos egípcios que foram capazes de contrapor alguns dos primeiros milagres e pragas dirigidos contra eles (Êx 7.11-12, 22; 8.7). A postura arrogante do Egito era decorrente de sua convicção de que nada podia fazer frente à sua soberania; seu poder, sancionado e sustentado por seus deuses, era considerado sufi ciente para neutralizar qualquer ameaça, fosse ela humana ou divina. O Egito se recusou até mesmo a reconhecer a divindade que Israel dizia seguir (5.2). Por esse motivo, dificilmente é um fato acidental que as pragas sejam retratadas como “excessos da criação”, que sobrepujam e devastam toda a resistência que o Egito é capaz de reunir em reação aos ataques de Deus (Fretheim, 109). 1108
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Raabe é o Egito e o Egito é Raabe. Trata-se de um arranjo que simboliza todo poder e potestade que acredita ser possível desafiar a Deus, ao seu povo e à sua vontade. Uma vez que o Senhor procura cumprir sua vontade salvífica para o mundo por meio de Israel, qualquer tentativa de impedir Israel eqüivale a colocar-se no caminho de Deus. Assim, Deus coloca sua própria soberania e poder contra a força de qualquer um que se lhe oponha, inclusive superpo tências opressoras como o Egito (-> Egito: Teologia) Do ponto de vista do mundo, o poder convencional de um Estado como o Egito é intimidante e assustador, pois parece invencível. Os “Egitos” do mundo têm toda a riqueza e po der necessários à disposição; podem fazer o que quiserem, quando quiserem e sem apresentar justificativas. Protestos só levam à escravização, empobrecimento, humilhação e, possivel mente, aniquilação. Se o Egito é Raabe e Raabe é o Egito, então, desde o princípio, todos os desafiantes estão condenados ao fracasso. Quem além de Javé pode confrontar uma potência dessa magnitude? Quer Raabe represente o poder natural ou político, ou os poderes contrários à criação (Fretheim, 105-12), o Senhor subjuga até mesmo esse monstro. Deus tem planos para o mundo. Aqueles que rejeitam a vontade de Deus ou procuram solapá-la acabarão, de uma forma ou de outra, tendo que enfrentar o julgamento soberano terrível de um Deus onipotente. Apesar de, inicialmente, Raabe parecer invencível, seu reino sempre é efêmero e, em última análise, ilu sório. No momento escolhido pelo Senhor, os Raabes do mundo serão destruídos juntamente com todas as outras potestades e poderes que, em arrogância, confrontaram o Deus vivo. B ib l io g r a f ia
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Raabe
Raabe p r n [rãhãb II] nome de uma meretriz cananéia, #8147).
AT Nome da meretriz cananéia que abrigou espias israelitas enviados por Josué para fazer um reconhecimento de Jericó antes da conquista da terra prometida (Josué 2). 1. O episódio que mostra Raabe é parte de um conjunto mais amplo de narrativas q apresenta Israel como um paradigma de obediência (Childs, 249). Isso se deve, em parte, às promessas absolutas feitas pelo Senhor a Josué e Israel (p. ex., Js 1.2-6, 11, 13, 15) antes de os israelitas tomarem posse da terra, bem como a vários resumos ressaltando de que modo tudo o que havia sido prometido se cumpriu (p. ex., 10.40-43; 11.16-23 [com exceções nos vv. 19,22]; 21.43-45). A concretização desse ideal de cumprimento das promessas não é prejudicada por referências segundo as quais nem todos os habitantes da terra foram aniquilados ou expulsos (conforme ordenado pela Torá; Dt 20.16-18; cf. Js 1.7-8), ou pelo fato de a terra não ter sido inteiramente ocupada de uma só vez (p. ex., Js 2.14, 17-19; 6.17, 22-23, 25; 7.8-9, 12; 9.1-21, 26; 11.19; 13.1,2-6,12-13; 16.10; 17.12-13; 23.11-13). Não se trata de contradições históricas, assim como também não são indícios de que as declarações de conquista total eram hiperbó licas (em oposição a Younger). Antes, as justaposições dessas declarações opostas acentuam 1109
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a teologia dinâmica do livro como um todo. Em sua função de Escritura, por um lado, o livro de Josué admoesta a comunidade a ser obediente e sensível à graça divina como o era a “Israel paradigmática” e, por outro lado, conscientiza o povo das conseqüências graves da desobe diência, da decadência e do julgamento divino. 2 .0 episódio de Raabe desempenha um papel estratégico nessa teologia dinâmica. Entre outras coisas, Raabe representa a essência cananéia, não em termos étnicos, mas sim religiosos e morais (cf. Dt 7.4-5,25-26; 20.18; Js 23.7, 13). Ela é identificada como uma zôná, meretriz ou prostituta (-> # 2390). Considerá-la a dona de uma hospedaria (Meg. 14b, 15a; Rashi sobre Josué 2; Wiseman, 8-11) ou uma prostituta cultuai (qedêsá) atenua a natureza radical da história. Uma vez que ela se encontra numa casa onde é natural que as pessoas pagem para se hospedar, Raabe pode ser considerada uma “Madame”, porém não menos do que isso. Até mesmo o nome Raabe é sugestivo. O significado básico de rhb no heb. é largura, extensão e, em outras línguas sem., refere-se, por vezes, à genitália feminina. Nesse caso, é pro vável que seu nome seja uma alusão grosseira e impudica à profissão exercida por ela (Barstad, 43-49). Além disso, a perícope apresenta outras alusões sexuais. Uma delas ocorre quando o narrador diz que os espias “pousaram” lá (Js 2.1). O heb. skb pode significar “deitar-se, dormir ou pousar” (-> # 8886) sem nenhuma nuança sexual. Porém, em diversos contextos, observase esse tipo de conotação (p. ex., 2Sm 11.4). Assim, quando se diz que os espias “pousaram” na casa de uma zônâ (-> #2390), o sentido duplo é inconfundível (Mitchell, 164; Butler, 31). Além disso, quando os homens do rei confrontam Raabe, sua fraseologia é marcada por um sarcasmos obscenos (v.3): Iit., “Entrega os homens que entraram em ti (hã'anãsim habbaim elayik)... isto é, que entraram no teu estabelecimento ( 'aser-bã’ú lebêtêk)\” Muitas vezes, o vb. b w ', vir (-> #995) possui uma conotação sexual (p. ex., lRs 11.2) o que, no contexto dessa história, é quase certamente o caso. No entanto, as nuanças sexuais do relato não se referem ao sexo em si. Quando o AT fala de “prostituição”, nem sempre diz respeito ao comportamento ilícito entre pessoas. “Prostituir-se com outros deuses” é uma metáfora bastante conhecida para idolatria (p. ex., Ex 34.15-16; Lv 17.7; 20.5; Dt 31.16; Jz 2.17; 8.27, 33; Jr 3.1; Ez 20.30; Os 2.7). Assim, Raabe representa a essência cananéia no sentido de que o nome e a profissão dela indicam a tentação de buscar-se outros deuses, algo com o que Israel lutou ao longo de toda a sua história. Até mesmo a referência de Josué 2.1 a Sitim pode ser uma alusão à apostasia em Peor (Números 25; Ottosson, 420-21), outro episódio de idolatria. Quando os espias “entraram” na casa de Raabe e “pousaram” lá, há uma insinuação de que Israel estava se aproximando perigosamente da ruína moral e espiritual. Raabe simbolizava tudo o que era oposto à mais excelente identi dade religiosa de Israel. 3. E isso que toma a reviravolta na história ainda mais extraordinária. A pessoa que justamente a antítese do que Israel deveria ser em termos religiosos e morais mostra-se uma israelita ideal. Ela o faz por meio de uma confissão chocante de sua fé (Js 2.8-11), uma confis são que impressiona mais do que a de qualquer israelita desse livro (Polzin, 86). A declaração de Raabe começa com as palavras “Bem sei que” (yãda ‘ti kí), uma expressão usada mais de uma vez quando um estrangeiro reconhece a verdade israelita (p. ex., Êx 18.11; lRs 17.24; 2Rs 5.15; Is 45.3) (Mitchell, 162). Além disso, Raabe observa que a conquista iminente não se limita a Jericó, mas abrange “esta terra” (Js 2.9; cf. 1.2,6,11, 13,15). Trata-se do conhecimen to de alguém “de dentro” de Israel — é como se ela conhecesse os pormenores das promessas de Deus ao seu povo. De fato, ela é a única estrangeira que usa a designação yam süp para as águas que o Senhor fez secar no êxodo (cf. I Sm 4.7-8). Além disso, conhece a terminologia técnica da “proibição” ou “proscrição” (v. 10; hrm), uma palavra usada apenas em raras ocasiões 1110
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para atividades militares convencionais (p. ex., 2Rs 19.11; Is 37.11). A expressão hú ’ ’elõhim (v. II) — “Deus é...” — pode ser encontrada apenas outras três vezes no AT, sendo que cada uma delas ocorre numa passagem que serve de confissão de fé (2Cr 20.6; SI 100.3; Jr 10.10). Por fim, a linguagem “Deus em cima nos céus e embaixo na terra” (v. 11) é usada somente pelos israelitas mais importantes (Dt 4.39; IRs 8.23; 2Cr 20.6). Com efeito, Raabe recita aquilo que para um israelita seria equivalente ao “Credo dos Apóstolos”. A confissão dela não é aquela de alguém que tem consciência apenas dos aspectos mais rudimentares da fé. Antes, essa cananéia tão típica profere uma confissão de fé essencial mente israelita. A declaração de Raabe é constituída de elementos da aliança entre o Senhor e Israel e essa confissão também serve, em parte, de base para aliança que Raabe faz com os espias (Js 2.12-14, 17-21; Campbell, 243-44; MitchelI, 163; Ottosson, 422-24). No final, a confissão de Raabe e seu acordo com os espias fazem dela e de sua família parte de Israel “até o dia de hoje” (6.25). Trata-se de uma história de conversão. 4. A teologia da narrativa sobre Raabe toma-se ainda mais evidente quando compara com sua correlata dentro da narrativa geral: a história de Acã (Josué 7). Acã é o pólo oposto de Raabe (Rowlett, 20), é a essência israelita assim como Raabe é a essência cananéia. Não por acaso, a genealogia de Acã é delineada de modo incomum quatro gerações para trás até justa mente Judá (Js 7.1), a tribo da qual “o cetro não se arredará” (Gn 49.10). Seria impossível uma posição mais privilegiada do que a de Acã em Israel. É isso que toma tão assustador o fato de a história de Acã terminar em tragédia em vez de em vitória. Raabe foi salva por sua confissão de fé e por proteger os espias, ressaltando seu apoio às prioridades teológicas israelitas. Acã foi destruído por sua incredulidade ao transgredir a proscrição sagrada vigente durante a con quista (Js 7.1), ressaltando sua falta de apoio às prioridades teológicas israelitas. Como resul tado final, Acã e sua família foram removidos de Israel. A confissão de Raabe conferiu-lhe (e à sua família) o direito de ingressar em Israel; a transgressão odiosa de Acã levou-a obrigato riamente à remoção dela (e de sua família) do meio do povo, praticamente uma “excomunhão” da comunidade da fé. A relevância teológica da confissão de Raabe pode ser ainda mais destacada num tro cadilho relativo ao “cordão de fio de escarlata” que ela usou para ajudar os espias a descerem pela janela (Js 2.18). No AT, a cor escarlate possui várias conotações eróticas ou está associada, pelo menos indiretamente, à prostituição (p. ex., Gn 38.28,30; Ct 4.3; Jr4.30). Para Isaías, essa é a cor do pecado (Is 1.18)! Walters sugere que o cordão escarlate era a marca da prostituta, de modo que Raabe vivia no “bairro do cordão escarlate”. Além disso, o termo para cordão tiqwá, tem o significado mais comum de esperança (-> # 9536). Daí, o “cordão” ser a “esperança” da prostituta de ter clientes\ Uma vez que ela havia confessado Javé como seu Deus e aceito a fé israelita como sua própria, o “cordão” dela indica um novo tipo de “esperança”, não de conseguir clientes, mas de um estilo de vida completamente diferente. B ib l io g r a f ia
H. M. Barstad, “The Old Testament Feminine Personal Name rãbãb: An Onomastic Note”, SEA 54, 1989,43-49; T. C. Butler, Joshua, WBC, 1983; K. M. Campbell, “Rahab’s Covenant: A Short Note on Joshua II 9-21”, VT22, 1972, 243-44; B. S. Childs, Introduction to the Old Testament as Scripture, 1979; G. MitchelI, Together in the Land: A Reading o f the Book o f Joshua, JSOTSup 134, 1993; M. Ottosson, “Rahab and the Spies”, in Studies in Honor ofA ke W. Sjõberg, ed. H. Behrens, 1989, 419-27; R. Polzin, Moses and the Deuteronomist, 1980; L. Rowlett, “Inclusion, Exclusion and Marginality in the Book of Joshua”, JSO T 55, 1992, 1523; D. J. Wiseman, “Rahab of Jericho”, TynBul 14, 1964, 8-11; S. D. Walters, artigo inédito, 1111
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Knox College, Toronto; K. L. Younger, Ancient Conquest Accounts: A Study in Ancient Near Eastern and Biblical History Writing, JSOTSup 98, 1990. Frank Anthony Spina Rachadura -> # 1324 (b q \ rachar, arrombar) Radiância -> # 7966 (qrn, emitir raios, ser radiante) Rainha -> # 4893 (malkâ, esposa de um rei, rainha) Raiz -> # 9245 (srs, erradicar) Ramo -> # 580 ( a/w/V, ramo, galho) Rapadela -> # 1662 (g/A, rapar) Rasgão -> # 7973 ( q r rasgar em pedaços) Raspagem -> # 6081 (í /í/í, remover raspando) Rastejamento -> # 8253 (rm.v, rastejar, enxamear) Rebanho -> # 7366 (.võ V;, rebanho, pequeno rebanho) Rebeldia
# 6047 (.swg I, desviar, digressionar, ser desleal, rebelde)
Rebelião -> # 5277 (mrd, revoltar-se, rebelar-se) Rebento -> # 7541
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brotar, prosperar, fazer crescer)
Recabita [t^kãbí], # 8211; < 3D"l [rkb], cavalgar / montar -» # 8206).
AT Os recabitas eram um clã de israelitas conhecidos nos escritos de Jeremias por se de votarem às instruções de Jonadabe, antepassado deles (Jr 35.6; cf. Jonadabe, 2Rs 10.15). Não há informações sobre as origens dos recabitas. Eles próprios ressaltam que não deviam cons truir casas, semear nem cultivar vinhas (Jr 35.6-7). A partir dessa descrição, conclui-se que eram nômades, mas também é possível que fossem artífices (ABD). No tempo do cerco de Nabucodonosor a Jerusalém, encontraram abrigo na cidade e abriram mão do suposto estilo de vida nômade. Não se sabe o que aconteceu com os recabitas depois da tragédia de 587 a. C. Há, porém, uma referência a um certo Malquias, filho de Recabe, que ajudou a reconstruir a Porta do Monturo no tempo de Neemias (Ne 3.14). Malquias é descrito como governante do distrito de Bete-Haquerém. Além disso, o cabeçalho do Salmo 71 na LXX refere-se aos des cendentes de Jonadabe. Em termos teológicos, os recabitas são importantes como excelentes exemplos da disci plina da obediência. O antepassado deles, Jonadabe, filho de Recabe, proibiu seus descendentes 1112
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de beberem vinho. A tenacidade deles em guardar essa instrução era tal que mesmo quando o profeta Jeremias ofereceu-lhes vinho depois de tê-los levado para o templo, os recabitas recu saram. Essa determinação em cumprir os desejos de um antepassado contrasta de modo gritante com o povo de Judá que era conhecido por transgredir a aliança com Javé (Jr 35.12-17). A obe diência dos recabitas nas questões de dieta é total; Israel, pelo contrário, se rebela em questões fundamentais, como a obediência a Javé (35.16). A palavra-chave ao longo de todo o capítulo é sm ', ouvir, escutar. O capítulo sobre os recabitas deve ser lido em comparação e contraste com Jeremias 34, a história de um rei que não levou a sério as questões da aliança. A história da leal dade dos recabitas a Javé remete aos dias de Jeú (2Rs 10.15-27). A obediência dos recabitas às instruções de seu antepassado garantiu-lhes um lugar permanente no serviço a Javé (Jr 35.19). B ib l io g r a f ia
ABD 5:630-31; IDB 4:14-16; ISBE 4:53; J. H. Charlesworth, The History o f the Rechabites, vol. 1, The Greek Recension, 1982; J. Levenson, “On the Promise to the Rechabites", CBQ 38,1976, 508-14; S. Talmon, "hêm m àhaqqínm habbã'im mêhammat ’abibêt-rêkãb'\IE J 10, 1960, 174-80; H. G. M. Williamson, l and 2 Chronicles, NCBC, 1982, 55-56. J. A. Thompson/Elmer A. Martens Recenseamento -> # 7212 (pqd, castigar, reunir, registrar, nomear) Recepção -> # 4374 (Iqh, tomar, abrigar, receber, render) Receptáculo -> # 3998 (k?li, jarro, recipiente, receptáculo) Recinto -> # 2958 (hã.fêr, recinto, pátio, assentamento, vila) Recompensa
# 7190 (pe 'ullâ, salário, castigo, recompensa, ações)
Redenção -> # 7009 (pdh, resgatar, redimir, libertar) Redução
# 1757 (g r' I, cortar fora, reduzir)
Refaim -> # 8327 (r^pã 7m, sombras, espíritos que pereceram) Refinação -> # 7671 Reflexão
fundir, testar por refinação)
# 8488 (syh, queixar-se, refletir, falar; meditar)
Refreamento -> # 1178 (btm, refrear) Refugio -> # 2879 {hsh, buscar refúgio) Regência Região
# 5540 (msl II, reger, governar) # 2475 (hebel II, cordão, corda, terra, região)
Registro -> # 3509 (y/ri, registrar-se) 1113
Reis (1 e 2): Teologia de
Rejeição -> # 5540 (n Regozijo
rejeitar, desdenhar, tratar com desrespeito)
# 8464 (sws, regozijar-se)
Reino dos mortos -> # 8619 (se ’ôl, Seol, reino dos mortos)
Reis (1 e 2): Teologia de A. Contexto histórico Os livros de 1 e 2 Reis contam a história de Israel do final o reinado de Davi (1 Reis I—2) até a queda do reino de Judá para os babilônios e o exílio de um grande número de judeus na Babilônia (2 Reis 24— 25). Assim, sua narrativa abrange aproximadamente quatrocentos anos da história israelita. Os livros começam com uma descrição do conflito para determinar qual dos filhos de Davi o sucederia no trono. Salomão sai vitorioso sobre Adonias e recebe instruções de Davi sobre como deve reinar ( I Rs 1.1-2.11). Deve guardar a lei de Moisés, de modo que o Senhor cumpra sua promessa a Davi de dar-lhe uma dinastia eterna sobre Israel, e deve também agir com sabedoria. A narrativa subseqüente é estruturada em função dessas duas idéias de sabedoria e lei (2.12— 11.43). Durante boa parte do tempo, a sabedoria de Sa lomão exerce uma função positiva, uma vez que os israelitas desfrutam da prosperidade e da paz do império salomônico e vêem o templo do Senhor em meio a eles (caps. 4— 8). Tanto no começo quanto no final do seu reinado, porém, a sabedoria de Salomão é usada mais em inte resse próprio, quando ele se livra daqueles que são considerados uma ameaça ao seu lugar no trono e ao acumular para si mesmo riquezas excessivas (caps. 2 ,9 — 10). Além disso, ao longo da maior parte da narrativa, o rei também é apresentado como alguém comprometido com o Senhor e os seus caminhos (3.4-15). E, no entanto, desde o começo, surgem dúvidas quanto à fidelidade total do rei à lei (3.1-3) e, por fim, Salomão dá as costas para o Senhor e passa a adorar outros deuses ( 11.1 -8). O que surpreende, porém, é que a desobediência de Salomão não leva ao fim da dinastia de Davi. Um profeta anuncia que o castigo será adiado até os dias do filho de Salomão, que perderá apenas uma parte do reino e não todo ele (11.9-38). Essa separação de uma parte de Israel da casa de Davi não durará para sempre (11.39); será apenas um fenômeno temporário. A dissolução do império é devidamente descrita na narrativa sobre Jeroboão, filho de Nebate, que lidera a região norte de Israel à independência de Roboão e Judá (1 Rs 12.1-24). No entanto, trata-se de um êxodo para a escravidão, uma vez que o reino do Norte acaba, mais que depressa, sendo cativado pela adoração a outros deuses e nunca mais consegue se libertar da influência, quer seja dos deuses confeccionados por Jeroboão (12.25-33) ou daqueles vindos de outros lugares (16.29-33). Os profetas se opõem aos reis apóstatas, cujas dinastias passam com maior ou menor rapidez à medida que o julgamento de Deus recai sobre elas. Desses profetas, os mais notáveis são Elias e Eliseu, cujas atividades ocupam uma parte considerável de 1 Reis 17—2 Reis 13. São eles próprios que, num certo sentido, mitigam a ira de Deus sobre Israel, oferecendo salvação em meio ao julgamento. De qualquer modo, o julgamento final demora a vir em função das promessas de Deus e de sua compaixão para com o seu povo (2Rs 10.30; 13.23). Porém, a seu tempo, o julgamento chega e, em decorrência de seus pecados, o reino do Norte, Israel, é levado para o exílio na Assíria (2 Reis 17). Apesar de, a princípio, a situação religiosa de Judá não ser muito melhor do que a de Israel(lRs 14.22-24; 15.3-5), a história de Judá depois disso não é de apostasia contínua. Reis 1114
Reis (1 e 2): Teologia de
relativamente bons governam nas lacunas entre os reis perversos (lRs 15.9-22.50; 2Rs 12.115.38) e, mais para o final da história, surgem dois dos melhores monarcas (2Rs 18.1-20.21; 22.1-23.30), reis que reformam o culto em Israel, obedecem a Deus e confiam nele. Ainda as sim, o pecado aos poucos se acumula e, apesar de inicialmente ter-se a impressão de que Deus tratará Judá com menos severidade do que Israel em função de seu compromisso com Davi, no final esse compromisso serve apenas para retardar o julgamento e não para evitá-lo de todo. Os pecados de Manassés são excessivos (cap. 21) e Judá termina por ser exilada na Babilônia (caps. 24— 25). Tudo indica que o futuro da linhagem davídica encontra-se pendurado pelo fio muito fino de um monarca deposto assentado à mesa do rei da Babilônia (25.27-30). Não há uma concordância entre os estudiosos quanto ao contexto histórico no qual essa narrativa, ou uma boa parte dela, foi redigida. Alguns afirmam que, na verdade, havia uma porção considerável e contínua da narrativa sobre a monarquia israelita já no século IX a. C. (p. ex., Campbell). A maioria, porém, dúvida de que tal relato existisse pelo menos até o século VII (p. ex., Provan, 1988, 153-55; McKenzie, 117-34). Vários estudiosos mostramse propensos a crer que os livros não foram escritos pelo menos até o tempo do exílio (p. ex. Noth). Para uma discussão completa da história da pesquisa da redação de 1 e 2 Reis, ver mais em Provan, 1988,1-55; McKenzie, 1-19. Tendo-se em vista o ponto em que a narrativa pára (a saber, com a libertação do rei Joaquim da prisão no ano 37 do seu exílio e a vida dele depois disso, 2Rs 25.27-30), é certo que os livros em sua presente forma não podiam existir antes da metade do século VI a. C. Se as obras foram completadas em grande parte por volta dessa época ou se o processo de complementação e edição durou um período mais longo ou curto depois disso, também é motivo de discussão nos meios acadêmicos. O ponto de vista de uma pessoa com relação a essas questões depende de seu ponto de vista quanto a elementos incer tos sobre a procedência dos livros (Palestina? Babilônia?) e sua relação exata com os livros de Crônicas (o cronista conhecia os livros de Reis em sua presente forma ou numa versão di ferente e mais curta?). Em resumo, não há um consenso sobre exatamente onde o processo de redação provavelmente se iniciou e nem onde terminou. E bem possível que os livros tenham se desenvolvido gradualmente até a sua presente forma, à medida que gerações diferentes de israelitas contaram e recontaram a história de seu passado à luz das experiências presentes com seu Deus e o mundo. B. Estrutura literária Pode-se reconhecer facilmente a estrutura literária de Reis. A narrativa como um todo é organizada ao redor das chamadas fórm ulas reais, declarações sucintas que dão ao leitor de talhes breves do reinado dos diversos monarcas que são mencionados no livro e apresentam uma avaliação parcial de seu tempo no trono do ponto de vista religioso. A fórmula introdu tória para cada rei normalmente apresenta informações relativas à cronologia do reinado em questão, sincronizando-a com o governo do monarca da outra parte de Israel (Norte ou Sul), a duração de seu reinado e a localização da capital e (no caso dos reis de Judá), a idade do rei na ocasião de sua ascensão e a identidade de sua mãe. A fórmula de avaliação, conhecida normal mente como fórm ula de julgamento, examina o desempenho religioso do rei em termos de sua fidelidade ao Deus de Israel, sua rejeição a outros deuses e sua adesão a um lugar central de adoração em Jerusalém. Muitas vezes, essas fórmulas fazem comparações ou contrastes entre o atual monarca e seus antecessores. A fórmula de conclusão para cada reinado é composta de uma observação bibliográfica que encaminha o leitor para outras fontes de informação sobre o rei, detalhes de sua morte e sepultamento e uma observação sobre sua sucessão. As fórmulas reais apresentam uma regularidade de expressão ao longo dos dois livros de Reis, apesar de nem 1115
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todos os elementos descritos acima serem incluídos no caso de todos os reis. Essas fórmulas fornecem as bases literárias que dão estrutura e direção aos livros, um contexto no qual podem ser encontradas outras informações sobre o rei e seu reinado e as várias outras narrativas mais extensas sobre reis, profetas e o povo. 1 Reis 15.9-24 oferece um bom exemplo das fórmulas reais para os reis de Judá (observe a fórmula introdutória em 15.9-10, a fórmula de julgamento em 15.11 e 14 e a fórmula de conclusão em 15.23-24) e 2 Reis 13.1-9 mostra a fórmula para os reis israelitas (observe-se a fórmula introdutória em 13.1, a fórmula de julgamento em 13.2 e a fórmula de conclusão em 13.8-9). As fórmulas de julgamento são de importância fundamental para a compreensão da maneira como a narrativa se desenvolve dentro da estrutura mais ampla das fórmulas. Isso porque é dentro dessa estrutura literária que os livros de Reis vão além da descrição e apresen tam avaliações explícitas, e é por meio delas que o escritor interpreta o movimento da história que elas descrevem. O governo de cada rei é avaliado em termos de ele fazer o que era reto perante o Senhor (p. ex., lRs 15.11) ou o que era mau perante o Senhor (p. ex., 2Rs 13.2). Essa avaliação básica é associada então com outras declarações que ajudam o leitor a formar uma impressão com referência aos parâmetros para essa avaliação. No caso dos reis do Norte, fazer o que é mau costuma ser associado a seguir o mesmo caminho dos pecados do primei ro rei israelita, Jeroboão (p. ex., 2Rs 13.2), que, em I Reis 12.25-33, aparece instituindo seu próprio culto e incentivando a adoração de deuses (os dois bezerros de ouro) em vez do Deus de Israel. Alguns reis são descritos acrescentando ainda outros deuses a essa adoração (p. ex.. Acabe em I Rs 16.29-33). Assim, no contexto dessas fórmulas do Norte, fazer o mal eqüivale à idolatria, como também acontece no caso dos poucos reis do Sul que são acusados da mesma transgressão (p. ex., Jeorão e Acazias, 2Rs 8.16-29, que são atraídos para a idolatria do Norte por causa de seus casamentos). Fazer o que é reto, por outro lado, é, por implicação, ser orto doxo em termos religiosos, adorando somente o Deus de Israel. A preocupação fundamental das fórmulas de julgamento, portanto, é se um rei mostra-se sincero ou não em sua adoração a Deus, se ele é “como Jeroboão” ou “como Davi” (p. ex., 1Rs 15.11). Todos os reis de Israel recebem uma avaliação negativa, a maioria dos reis de Judá é avaliada de forma positiva e o governo de Salomão sobre o reino unido recebe uma avaliação mista (1 Rs 3.2-3; 11.4-6). Essas últimas referências a Salomão fazem lembrar um subtema importante das fórmu las de julgamento. Apesar de os reis de Judá serem elogiados por sua fidelidade a Deus, ainda assim, na maioria dos casos, são criticados por uma determinada deficiência: que durante seus reinados, os “altos” não foram removidos (p. ex„ IRs 3.2-3; 15.14). Não é fácil encontrar-se uma constância no uso do termo “altos” em Reis. Em certas passagens, são claramente conside rados lugares idólatras de adoração, locais onde eram praticadas abominações (p. ex., 11.7-8). No contexto das fórmulas de julgamento que elogiam os reis de Judá, porém, esse não pode ser o caso. A narrativa depois de 3.2-3, a primeira ocasião em Reis na qual ocorre uma mistura de elogio e crítica desse tipo, deixa particularmente claro que Salomão adorou o Deus de Israel nos altos em Gibeão e que Deus se agradou dele e lhe prometeu bênçãos naquele lugar. Portanto, ao que parece, a crítica contra os altos nesses contextos deve estar relacionada ao lugar onde estava sendo prestada a adoração e não ao tipo de adoração sendo prestada. Ou seja, a crítica das fórmulas de julgamento basicamente elogiosas para os reis de Judá era relacionada ao fato de estes não centralizarem a adoração de Deus no templo cm Jerusalém e não a uma omissão no sentido de erradicar a idolatria em si. Outro subtema importante das fórmulas de julgamento é a preservação da dinastia davídica das conseqüências trágicas das transgressões, um resultado da promessa de Deus, a Davi. de um reino eterno (cf. 2 Samuel 7). Enquanto as dinastias do reino do Norte passam 1116
Reis (1 e 2): Teologia de
pelos ciclos de ascensão e queda, à medida que Deus as julga por seus pecados (p. ex., 1 Reis 16), por causa dessa promessa, a dinastia do Sul sobrevive mesmos aos seus reis apóstatas (cf. 11.9-13, 29-39; 15.1-5; 2Rs 8.16-19). Entraremos em mais detalhes sobre esse ponto impor tante em breve. Em termos estruturais, as fórmulas de julgamento com as condenações e elogios qua lificados aos diversos monarcas ao longo de 1 Reis e 2 Reis 1— 16 e o uso da promessa feita a Davi para explicar a sobrevivência da dinastia davídica, no primeiro caso apontam para as narrativas de 2 Reis 17—20. E nessa parte do livro que o reino do Norte sofre o julgamento fi nal por seus pecados (cap. 17) e, nela também, é sob o reinado de Ezequias que, num contraste nítido, Judá experimenta tanto a salvação como a reforma religiosa para a qual as fórmulas de julgamento anteriores haviam apontado e levado o leitor a esperar (caps. 18—20). As fórmulas de julgamentos sobre Ezequias encontram-se em 2 Reis 18.3-4: “Fez ele o que era reto perante 0 Senhor, segundo tudo o que fizera Davi, seu pai. Removeu os altos...” Se as fórmulas estavam buscando um rei que fosse verdadeira e completamente “como Davi”, o escritor (ou os escritores) encontra esse homem em Ezequias e, de fato, ressalta nos vv. 7-8 que Ezequias é, como Davi, de uma forma como nenhum outro rei israelita já foi ou jamais será. Dos reis davídicos em Samuel e Reis, somente de Davi e Ezequias diz-se que “foi o Senhor com ele” (cf. 1 Sm. 16.18; 18.12, 14; 2Sm5.10; 2Rs 18.7) e que o rei teve êxito (skl) na guerra (ISm 18.5, 14-15; 2Rs 18.7). Somente de Davi e Ezequias diz-se que derrotaram (nkh) os filisteus (ISm 18.27; 19.8; 2Rs 18.8). Até mesmo o piedoso Josias que reinou posteriormente e que, de modo geral é considerado semelhante a Davi (2Rs 22.2), não é comparado com Davi de modo tão detalhado. Ezequias é o segundo Davi por excelência, aquele que toda a estrutura dos livros de Reis antevê. Da mesma forma, a declaração sobre Ezequias ter profanado os altos é o ponto culminante do “tema dos altos”. Se até então todos os bons reis de Judá haviam sido criticados por não removerem os altos (habbãmôt lõ'-sãrü\ [lRs 15.14; 22.43-44; 2Rs 12.3-4; 14.4; 15.4, 35] cf. também as declarações sobre Salomão e o povo em lRs 3.2-3), de Ezequias o escritor diz enfaticamente que “foi ele quem removeu os altos” {hú' hêsir 'et-habbãmôt, sendo que a ênfase fica de fora das versões que trazem apenas “removeu os altos”). E evidente que Josias também tomou providências com relação aos altos (2 Reis 23), mas a forma como são descri tas não incentiva o leitor a vê-lo como o rei que os livros têm em mente desde o começo, como aquele que removeria de modo absoluto os lugares altos. Em última análise, é para Ezequias que os temas de Davi e dos altos apontam (ver Provan, 1988,57-131, para uma discussão deta lhada desses temas em Reis) e sua confiança inigualável no Senhor (18.5) é vindicada quando a invasão de Senaqueribe a Judá fracassa às portas da cidade escolhida de Jerusalém (18.13— 19.37), e Judá escapa de ter o mesmo fim que Israel. Os caps. 18— 20 já deixam transparecer, porém, que nem tudo acabará bem para o reino de Judá (cf. a profecia do exílio na Babilônia em 20.12-19) e no final, nem mesmo as reformas do justo rei Josias (23.1 -30) são capazes de compensar pela iniqüidade de Manassés (21.1-18; 23.26-27; 24.3-4). Judá também cai sob o julgamento de Deus e perde sua terra (-> ver ainda Ezequias). C. Temas teológicos 1. Deus. Passando de uma descrição geral da estrutura literária e do desenvolvime dos livros de Reis para uma discussão mais específica de seus temas teológicos, observa-se em primeiro lugar aquilo que eles têm a dizer a respeito de Deus. Para o escritor (ou escritores) dos livros de Reis, Deus é, de fato, Deus. Não deve ser confundido com os vários deuses adorados dentro e fora de Israel, pois estes não passam de criações humanas (1 Rs 12.25-30; 2Rs 17.16; 19.14-19). São parte da ordem criada, assim como as pessoas que os adoram e, portanto, impo tentes e inúteis (1 Rs 11.5; 16.13; 18.22-40; 2Rs 17.15; 18.33-35). O Senhor, pelo contrário, é 1117
Reis (I e 2): Teologia de
o Criador incomparável dos céus e da terra (IRs 8.23; 2Rs 19.15). É absolutamente distinto do mundo que criou e, no entanto, poderosamente ativo dentro dele. É ele, e não um deus qualquer, que controla a natureza (IRs 17— 19; 2Rs 1.12-17; 4.8-37; 5.1-18; 6.1-7, 27). É ele, e não um outro deus, rei ou profeta qualquer que controla a história (1 Rs 11.14,23; 14.1 -18; 22.1 -38; 2Rs 5.1-18; 10.32-33; 18.17-19.37). É possível que esse último fato encontre-se ilustrado de manei ra mais clara na maneira como os profetas atuam de modo geral nesses livros, descrevendo o futuro antes de Deus realizá-lo (1 Rs 11.29-39; 13.1-32; 16.1-4; 20.13-34; 2Rs 19.6-7, 20-34). Nada pode impedir o cumprimento dessa palavra profética, ainda que o próprio Deus, em sua liberdade, possa alterar esse cumprimento de acordo com os seus propósitos (ver 1Rs 21.1729, em que o cumprimento é adiado em função do arrependimento e 2Rs 3.15-27, em que não ocorre um cumprimento pleno por motivos que em momento algum ficam inteiramente claros). Existe, portanto, somente um Deus vivo, e ele é o Senhor (1 Rs 18.15; 2Rs 5.15). 2. A adoração. Uma preocupação relacionada do escritor (ou escritores) de Reis diz respeito à adoração. Uma de suas convicções predominantes é que a adoração do Deus de Is rael, de modo algum, dá a Israel a liberdade de decidir em termos de conteúdo ou lugar. Antes, é uma atividade que deve ser constrangida e dirigida pela vontade de Deus. Existe um tipo de adoração aceitável e outro tipo inaceitável. E inaceitável adorar outros deuses juntamente com, ou em vez de, o Senhor (p. ex., IRs 11.4-6; 16.31-33; 2Rs 17.24-41), especialmente quando isso envolve a participação em práticas dos cultos de fertilidade cananeus (p. ex., 1Rs 14.22-24; 2Rs 17.10-13). As narrativas sobre Elias, em I Reis 17— 19, tratam claramente dessa questão na forma extensa de relato. O povo de Israel nâo consegue decidir a quem adorar, e oscila entre duas opiniões (18.21); apesar do fato de Baal ter falhado visivelmente em tomar a terra pro dutiva no período anterior (cap. 17), uma simples palavra do Senhor pôs fim à seca e à fome. Elias exige, então, devoção renovada e absoluta e, como resultado do confronto que se segue no monte Carmelo, o povo rejeita Baal e volta a adorar o Senhor (18.36-39). É essa lealdade indivisa que Deus requer de seu povo. E inaceitável adorar outros deuses junto com ele ou em vez dele. Também é inaceitável interferir em aspectos divinamente ordenados do culto, como as datas das festas (12.32-33), a composição do sacerdócio (12.31-32) ou o estilo e o emprego dos utensílios do templo em Jerusalém (2Rs 16.10-18). Por fim, em menor proporção, é ina ceitável adorar o Senhor fora de Jerusalém, nos lugares altos. Não é apenas a fórmula de jul gamento de Judá que deixa claro que essa falha é menos grave do que as outras. A narrativa de Elias, mencionada acima, também fala de um lugar provincial de adoração como este, o altar do Senhor no monte Carmelo, o qual Elias reconstrói (IRs 18.30-32) sem nenhuma sugestão de crítica ou justificação por parte do escritor. É possível que a adoração ao Senhor nos lugares altos não seja o ideal, mas não se trata de uma prática indiscutivelmente perversa. 3. A lei. Qual é o parâmetro para que a adoração inaceitável seja considerada como tal nos livros de Reis? Acredita-se que a lei seja o meio principal pelo qual Deus transmite sua vontade quanto à essa questão (e outras). O modo como Israel vive e adora na terra deve ser constrangido e dirigido pelas leis que o próprio Deus lhe deu. O discurso de despedida de Davi para Salomão na parte inicial dos livros (1 Rs 2.1 -9) deixa isso claro com respeito ao seu reinado: “Guarda os preceitos do Senhor, teu Deus, para andares nos seus caminhos, para guardares os seus estatutos, e os seus mandamentos, e os seus juízos, e os seus testemunhos, como está escri to na Lei de Moisés” (2.3) e ao longo das narrativas subseqüentes, fazem-se várias referências a essa legislação, ilustrando sua importância como fundamento teológico para a interpretação da história israelita (p. ex., 2Rs 10.31; 14.6; 17.9-13; 21.8). De fato, o segundo ponto alto da narrativa depois do relato do reinado de Ezequias em 2 Reis 18—20 é a história do reinado de Josias nos caps. 22—23. Nesses capítulos, o sumo sacerdote Hilquias encontra o Livro da Lei 1118
Reis (1 e 2): Teologia de
no templo, o que leva a uma grande reforma religiosa por Josias, na qual são tomadas medi das enérgicas e decisivas contra a adoração idólatra tanto em Judá (23.4-14) quando em Israel (23.15-20) e o culto é centralizado no templo em Jerusalém. O Livro da Lei serve de base para a reforma que, em seus detalhes, remete (tanto por meio do contraste como da comparação) a várias das descrições anteriores das atividades ou da inatividade religiosa dos israelitas e seus reis. Com isso, a atenção volta-se para Josias, dizendo-se que nem antes nem depois houve outro igual a ele em sua consagração ao Senhor, “que se convertesse ao Senhor de todo o seu coração, e de toda a sua alma, e de todas as suas forças, segundo' toda a Lei de Moisés” (23.25). Nem mesmo Davi obedeceu a lei do modo como o fez Josias (23.21-23). Se Ezequias é o segundo Davi dos livros de Reis, então Josias é o segundo Moisés, ao colocar a lei mosaica em prática em todas as suas dimensões. A lei define o que é certo ou errado na adoração. A que tipo ou conjunto específico de leis os livros de Reis se referem? Há algum tempo existe um consenso no meio dos estudiosos do AT de que foram particularmente as leis do livro de Deuteronômio que influenciaram as idéias do escritor (ou dos escritores) de Reis e que, de fato, o código encontrado em 2 Reis 22 deve ser entendido como esse livro (cf. de Wette, Dissertation Critica, 1805). Uma leitura rápida de Deuteronômio 12 é suficiente para demonstrar até que ponto há determinadas ligações entre Reis e Deuteronômio em termos tanto de lingua gem quanto de idéias (cf. Weinfeld. esp. 320-65). Nesse capítulo, o tema é o lugar único de adoração. Os israelitas devem destruir completamente todos os lugares cananeus de adoração nos montes altos, nas colinas e debaixo de todas as árvores frondosas, inclusive os altares, as pedras sagradas e os postes-ídolos de Aserá (12.2-3; cf. lRs 14.23; 2Rs 17.9-12; 18.4; 23.6, 14-15). Devem evitar as práticas abomináveis dos cananeus (Dt 12.31; cf. lRs 14.24; 2Rs 16.3; 17.17; 21.2, 11; 23.24), entre elas o holocausto de crianças como sacrifícios (Dt 12.31; cf. 2Rs 16.3; 17.17; 21.6; 23.10). Em vez disso, devem adorar em um só lugar escolhido pelo Senhor “para ali pôr o seu nome e a sua habitação” (Dt 12.4-5, 11, 14; IRs 8.29; 9.3; 11.36; 2Rs 18.19-25; 23.4-25). Fica claro que o escritor (ou os escritores) de Reis narra sua história no contexto da lei deut. e os estudiosos acreditam, de modo geral, que se trate de um fato válido não apenas para Reis, mas, em vários sentidos, também para Josué, Juizes e Samuel. Esse amplo consenso dos últimos anos, desde a influência da primeira obra de Martin Noth, Überlieferungsgeschitliche Studie (1943) tem-se tomado cada vez mais difundido (cf. a tradução dessa obra com o título The Deuteronomic History, 1981), defendo a concepção de que os livros de Josué a Reis de vem ser considerados uma unidade, um “história deuteronomística” que conta a história de Is rael na terra prometida do ponto de vista de grupos dentro de Israel (“deuteronomistas”), para os quais as leis e as concepções teológicas de Deuteronômio são de importância fundamen tal. Afirma-se que os livros de Reis formam os capítulos conclusivos dessa história. Assim, a teologia dos livros de Reis é chamada com freqüência de “deuteronomística” (ou, por vezes, “deuteronômica”). Trata-se de uma designação útil à medida que chama a atenção para as li gações teológicas evidentes que existem entre Deuteronômio e Reis. No entanto, é importante lembrar-se sempre de que a “teologia deuteronômica/deuteronomística” é uma abstração, como também o é a “história deuteronomística”, um conceito imaginado por estudiosos na teorização do conjunto de visões do escritor (ou escritores) original de Deuteronômio-Reis e não a teologia de um determinado livro considerado em sua totalidade em sua forma atual. Certos livros tendem a mostrar uma sutileza e complexidade teológica muito maior do que o previsto por essa abstração (cf. McConville para uma discussão mais completa). Sem dúvida, é o caso de Deuteronômio e também de Reis. Assim, é um tanto surpreendente que — mesmo no meio de estudiosos atualmente muito mais interessados que seus antecessores em ler os livros do 1119
Reis (1 e 2): Teologia de
AT em sua forma final (que, de acordo com qualquer teoria da redação é, supostamente, uma forma pós-deut.) — termos como “teologia deuteronômica/deuteronomística” (->) e “história deuteronomística” ainda sejam empregados de forma tão ampla. 4. Retribuição. Sendo aquele que deu a lei e que define a verdadeira adoração e os pen samentos e comportamentos corretos em geral, também é o Senhor quem executa o julgamento sobre os transgressores. O mundo de Reis é um mundo moral em que o mau procedimento é castigado, quer o pecador seja um rei (1 Rs 11.9-13, com relação a Salomão; 14.1-18, com re lação a Jeroboão), um profeta (13.7-25, com referência a um profeta de Judá cuja obediência foi parcial; 20.35-43, com referência aos discipulos dos profetas) ou um israelita comum (2Rs 5.19-27, com relação a Geazi; 7.17-20, com relação a um soldado desrespeitoso). No entanto, nâo se trata de um mundo mecânico, no qual cada pecado resulta numa retribuição automática e padronizada. Nâo existe uma correlação perfeita entre pecado e julgamento em Reis, pois é dito a todos que se deve obedecer a Deus para ser abençoado por ele (1 Rs 2.1-4; 11.38). Essa falta de uniformidade se deve, em grande parte, ao caráter compassivo do Juiz, que nâo deseja que o julgamento final recaia sobre suas criaturas (2Rs 13.23; 14.27) e está sempre pronto a en contrar motivos para adiar ou mitigar tal julgamento (1 Rs 21.25-29, sobre Acabe; 2Rs 22.15-20, sobre Josias). A graça dc Deus pode ser encontrada por toda parte no livro de Reis, frustrando a expectativa formada pelo leitor com base na lei (cf. a mitigação inesperada no caso da apostasia de Salomão em IRs 11.9-13, e declarações igualmente surpreendentes em 15.1-5; 2Rs 8.19). Ainda assim, o pecado pode se acumular a tal ponto que o julgamento sobrevem não somente a indivíduos, mas também a culturas inteiras, eliminando os que são relativamente inocentes junto com os culpados (2Rs 17.1-23 e a queda de Israel pelos assírios; 23.29—25.26 e a queda de Judá pelos babilônios). (-> Retribuição: Teologia) 5. Aliança epromessa. Por fim, intimamente relacionadas à idéia de lei em Reis, temse as idéias de aliança e promessa. O livro da lei de 2 Reis 22— 23 não é apenas o Livro da Lei (22.8, 11), mas também o Livro da Aliança (23.2, 3, 21), cuja descoberta leva não apenas à reforma, mas, antes de mais nada, a uma cerimônia de renovação da aliança (23.1-3), na qual o rei e o povo se comprometem com uma fidelidade renovada ao Senhor. A Aliança (->) é o contexto no qual a lei é colocada em prática. E óbvio que, dificilmente, isso pode ser consi derado motivo de surpresa, uma vez que o próprio livro de Deuteronômio é escrito na forma de um documento de aliança; as “cláusulas da aliança” (leis) de Deuteronômio 12—26 encontram-se inseridas num livro mais amplo que, antes e depois delas, apresenta textos dc um tipo bastante conhecido nos documentos de tratados políticos de todo o OMA (cf., por exemplo, Weinfeld, 59-178). Aqui também, a aliança é o contexto para a lei. A aliança a que se referem dos dois contextos (Deuteronômio e 2 Reis 22—23), bem como outras passagens de Reis (1 Rs 8.9, 23; 11.11; 19.10, 14; 2Rs 17.15, 35, 38; 18.12), é, evidentemente, aquela realizada entre Deus e o povo de Israel no Sinai/Horebe, com todas as suas bênçãos e maldições (Deuteronô mio 27—28) para a obediência e desobediência, respectivamente (cf. a reação de Josias ao ler esse documento em 2Rs 22.13). No entanto, o escritor (ou escritores) dos livros de Reis também menciona outras alianças em sua narrativa. A mais importante delas é a que foi mencionada várias vezes acima: a aliança entre Deus e Davi, com a promessa de que Davi teria uma dinastia eterna (cf. 2 Samuel 7). A aliança davídica aparece de forma curiosamente paradoxal. Em grande parte da narrativa, ela serve de explicação para o fato de a casa de Davi sobreviver enquanto o mesmo nâo acontece com as outras dinastias, apesar da desobediência dos sucessores de Davi (1 Rs 11.36; 15.4; 2Rs 8.19). Essa aliança é considerada, em outras palavras, como sendo de natureza incondicional. Outras vezes, porém, a continuidade da dinastia está ligada diretamente à obediência dos su 1120
Reis (1 e 2): Teologia de
cessores de Davi ( lRs 2.4; 8.25; 9.4-5), ou seja, a aliança é considerada condicional. Tem-se a impressão de que, à medida que o livro se desenrola, essa última visão passa a ser predomi nante, uma vez que o pecado cumulativo coloca a aliança em seu aspecto incondicional sob excessiva tensão e, no final, faz recair sobre Judá um julgamento divino tão severo quanto aquele que recaiu sobre Israel (2Rs 16.1-4; 21.1-15; 23.31—25.26). E, no entanto, Joaquim sobrevive (25.27-30). Sua sobrevivência em meio à tragédia praticamente absoluta, assim como a sobrevivência de seu antecessor Joás (cap. 11), indica a possibilidade de recuperação para a linhagem davídica. Indica também a possibilidade de que, no final das contas, a promessa da aliança transcende o pecado e de que Davi de fato voltará a reinar sobre toda Israel (cf. lRs 11.39). Dá a entender que a graça pode, em verdade, triunfar sobre a lei na história do futuro de Israel, como o fez em grande parte da história de seu passado. Fica claro que se tem uma possibilidade parecida em mente com referência à outra gran de promessa mencionada no livro: a promessa feita a Abraão, Isaque e Jacó de descendentes e de direito eterno de posse da terra de Canaã. Essa também é uma promessa que influência o modo como Deus trata seu povo na narrativa de Reis (2Rs 13.23 e, implicitamente, em lRs 4.20-21, 24; 18.36) e uma promessa que se encontra por trás da oração de Salomão em lRs 8.22-53, quando ele antevê a possibilidade de perdão depois do julgamento. Os livros de Reis insistem em que a graça não pode ser tida como certa, mas pode-se esperar por ela tomando por base o caráter e as promessas de Deus. O fim do Estado de Judá não é necessariamente o fim do povo da aliança de Deus. D. Contexto Canônico A história de Reis, com esses temas centrais, não é um relato independente. Antes, é parte da história toda da Bíblia, que se estende de Gênesis até Apocalipse e deve ser lida pelo cristão tendo em mente esse contexto canônico total. As Escrituras constituem o ambiente den tro do qual os livros individuais devem ser lidos. Os leitores cristãos são compelidos de modo particular a lerem Reis à luz das palavras e dos atos do personagem central de toda a histó ria, Jesus Cristo. Quando lida dessa forma, uma das coisas que se toma imediatamente clara na história bíblica é o seu padrão. Ou seja, ela é contada de tal modo que os acontecimentos e personagens dos capítulos posteriores lembram acontecimentos e personagens de capítulos anteriores por meio de comparações e contrastes. Isso fica aparente nos próprios livros de Reis. Os reis de Judá são comparados e con trastados com Davi; Jeroboão é descrito vividamente, primeiro como Moisés e depois como Arão; tanto Manassés quanto Josias, cada um a seu modo, fazem lembrar Acabe e assim por diante (cf. mais sobre esse assunto em Provan, 1995). No entanto, é algo que também fica evidente no NT, cujos escritores contam a história de Jesus de maneira que venha à mente a todo tempo os livros de Reis. quer em nível temático geral (Deus; adoração; pecado e julga mento; graça e promessa) ou em nível de um personagem ou acontecimento específico. Em outras palavras, a história de Reis atua de modo tipológico em relação à história posterior do NT, preparando-lhe o caminho e adquirindo significado pleno somente quando lida tendo-se a essa história em mente. Também funciona tipologicamente com respeito às pessoas às quais o NT se dirige (ou seja, aos leitores). Ela convida a pessoa a identificar sua própria vida com a vida dos personagens, relacionar a história do leitor a uma narrativa mais ampla como um todo e adquire seu significado pleno somente quando o leitor começa a compreender a si mesmo dentro desse contexto (cf. ainda Goppelt). E assim, por exemplo, que Jesus aparece nos Evangelhos como aquele que é maior do que Salomão, a cuja sabedoria o povo deve dar ouvidos, como a rainha de Sabá deu ouvidos 1121
Reis (1 e 2): Teologia de
a Salomão (Mt 12.42; Lc 11.31); e a referência ao esplendor de Salomão aparece em con textos nos quais é expressada a preocupação de que as necessidades materiais não devem in terferir com a busca pelo reino de Deus (Mt 6.25-34; Lc 12.22-31). Elias exerce de maneira explícita essa mesma função tipológica com relação a Jesus (a missão de Jesus contempla os gentios, de modo semelhante à missão de Elias) em Lucas 4.24-26, e de maneira implícita em passagens como Mateus 4.1-11 (cf. lRs 19.5-8); Mateus 12.22-28 e Lucas 11.14-20 (cf. lRs 18.20-40; 2Rs 2.2-17) e Mateus 14.13-21 e 15.29-39 (cf. lRs 17.7-24). Ao mesmo tem po, Elias também é um tipo de João Batista (cf. por exemplo, Mt 3.4; 11.1-19; 17.11-13; Lc 1.11 -17) e de crentes individuais, ensinando sobre o modo como Deus trabalha com “rema nescentes” de seu povo, sobre a fé e a oração (Rm 11.1 -6; Hb 11.32-39; Tg 5.13-18). Outros personagens importantes são Eliseu (também mencionado em Lc 4.27), cujo ministério mira culoso apresenta, de modo claro, paralelos com o ministério de Jesus (cf., por exemplo, 2Rs 5 e Mt 8.1-14/Jo 9.1-12; 2Rs 2.19-22 e Jo 2.1-11; 2Rs 4.8-37 e Mc 5.21-43/Jo 11.17-37; 2Rs 4.1-7,42-44 e Mt 14.13-21/Jo 6.1-15) e Ezequias e Josias, os monarcas piedosos dos livros de Reis que servem de modelo para o futuro Filho de Davi/Messias (ver ainda -> Ezequias). De todas essas maneiras e de muitas outras, a narrativa de Reis é usada no NT para explicar e ilustrar a história cristã, sendo que a teologia da narativa de Reis proporciona os postulados para o que vem depois dela. (-> Israel;
Judá)
B ib l io g r a f ia
A. F. Campbell, O f Prophets and Kings: A Late Ninth-Century Document (1 Samuel 1-2 KingsIO), 1986; B. S. Childs, Biblical Theology o f the Old and New Testaments: Theological Reflection on the Christian Bible, 1993; L. Goppelt, Typos: The Typological Interpretation o f the Old Testament in the New, 1982; T. R. Hobbs, 1, 2 Kings, 1989; J. G. McConville, Grace in the End: A Study in Deuteronimic Theology, 1993; S. L. McKenzie, The Trouble With Kings: The Composition o f the Book o f Kings in the Deuteronomistic History, 1991; R. D. Nelson, First and Second Kings, 1987; M. Noth, The Deuteronomistic History, (Eng.) 1981; I. W. Provan, Hezekiah and the Books o f Kings, 1988; idem, I and 2 Kings, 1995; G. von Rad, OTT, 1, 1962, 334-47; M. Weinfeld, Deuteronomy and the Deuteronomic School, 1972; H. W. Wolff, “The Kerygma of the Deuteronomic Historical Work”, in The Vitality o f Old Testament Traditions, ed. W. Brueggemann e H. W. Wolff, 1975, 83-100. I. W. Provan Relâmpago
# 1397 (brq, relâmpago, raio)
Remanescente
# 8636 (s >, restar)
Remoção -^ # 8 1 7 8 (rhq, ser/estar distante, remoto) Renovo
# 1614 (g èza', renovo, cepa)
Reparo -> # 980 (bdq, reparar) Repetição 1122
# 9101 (Snh, mudar, repetir)
Répteis
1. Vocabulário. rtJ73 pleg.; # 652); üDh (hõmet), subs. lagarto (hapleg.; # 2793); r ó (kõah II), subs. lagarto varano (hapleg., # 3947); nXU*? (le(ã a), subs. lagarto de pa rede (hapleg.; # 4321); 2X (sãb II), subs. grande lagarto (hapleg.; # 7370); n'OOÍP (semãmit), subs. lagarto (hapleg.; # 8532); npttftri (tinsemet I), subs. camaleão (hapleg.; # 9491). 2. Outras Línguas. As línguas cognatas mencionam répteis pelo nome, mas a identifica ção exata deles e seu relacionamento com o heb. é obscura. $ãb II pode ser relacionado ao sam. $ãb, ao sir., 'abbã, ao ár. áabb, um lagarto comestível; ao heb. pós-bíblico e aramj. sabbã ’. O termo 'anãqâ é igual ao sir. ’amaqtã , um lagarto, kõah II corresponde ao sam. wükka , ao aramJ. kõhã ’ e ao ár. hukã ’at. E provável que l e(ã ’â seja um lagarto; cf. ár. la(a ’a. agarrar-se ao chão; aram J. haltãtã ’ e heb. pós-bíblico le(ã ’â. Para hõme(, cf. o acad. jülm iffu , lagarto, dra gão (cf. jam ãtu, apressar; aram. hamat, ajoelhar-se) e o sir. j iilm ãfa ’, camaleão. O H ALA T faz distinção entre tinsemet I, camaleão e tinsemet II, coruja branca (Lv 11.18; Dt 14.16). O acad. taslamtu é um lagarto. & mãmit concorda com o ár. sãmm abras (“o leproso”, lagarto pintado); sir. samãmítã, lagarto venenoso e o heb. pós-bíblico semãmit ou semãmit, aranha. 3. Répteis no AT. a. Identificação. Os nomes desses répteis tem sido motivo de perple xidade para intérpretes e tradutores antigos e modernos. Para aumentar a dificuldade, é possível que um nome especificasse criaturas distintas em diferentes regiões do OMA. Os lagartos são divididos em duas famílias; os lacertideos conseguem escalar certas superfícies e têm uma pele que não adere ao corpo; a pele dos cincideos adere ao corpo mas eles não conseguem escalar, pois possuem pernas curtas, quando as têm. Se $ãb é a mesma criatura que o ár. dubb, então é provável que se trate de um lagarto de cauda espinhosa (Uromastyx spinipes) que pode chegar aos sessenta centímetros. Uma vez que Levítico 11.29 usa o termo “segundo a sua espécie” (leminêhú), a proibição de consumo e contato aplica-se ao gênero todo. A designação ’anãqâ é um termo onomatopéico que descreve o som dessa criatura, uma lagartixa (cf. 'nq, suspirar, gemer). A lagartixa das pedras (Ptyodactylus syriacus) é especial mente comum na Galiléia. O candidato mais provável para hõmet é um lagarto cincídeo, consumido como ali mento pelos árabes. Se o nome kõah II é relacionado ao subs. kõah I, força, então é possível que se refi ra ao camaleão tenaz ou ao varano do deserto ( Varanus griseus), mas é pouco provável que lagartos como esses entrem na cozinha (Lv 11.31-35). E possível que se trate de um lagarto pintado (Milgrom). O subs. le(ã 'â é um nome genérico para lagartos médios e pequenos. O HALAT identi fica o termo com Platodactylus muralis. Uma vez que o semãmít pode ser pego com a mão (Pv 30.28), é provável que se trate de algum tipo de lagarto pequeno e não de uma aranha. Para mais informações, ver HALAT 1247. Se tinsemet I vem do radical nsm, ofegar, respirar, resfolegar, então é uma descrição apropriada do camaleão. Em Levítico 11.18, fica claro que a mesma palavra refere-se a uma coruja pequena ou a uma coruja branca (Tyto alba). A presença dessa palavra extremamente incerta em duas listas de animais (aves e répteis) redunda na distinção feita no HALAT. b. Pureza ritual e restrições alimentares. Com exceção do semãmít, todos esses répt aparecem juntos com dois roedores numa lista de criaturas denominadas imundas (Lv 11.29-30). O propósito desse capítulo é instruir os sacerdotes a “fazer diferença entre o imundo (lãm êr) e o limpo ((ãhõr) e entre os animais que se podem comer e os animais que se não podem comer” Répteis
1123
Répteis
( 11.47); o grupo tãm ê' compreende vários quadrúpedes (11.1-8, 24-28) e esses oito roedores e répteis (29-40). Consumir essas criaturas e tocar a carcaça delas toma o sacerdote tãmê ’. O restante do capítulo trata dc vários animais aquáticos, aves, insetos e répteis que são seqes, abominaçâo (11.9-12, 13-19, 20 e 23, 41-42). A ingestão desses animais causa impureza, mas o contato com eles não. Desse grupo amplo de criaturas (tãm ê' e seqeç), algumas também são designadas especificamente como seres, uma categoria mista de criaturas enxameantes: os ani mais aquáticos (9-12) são seqes, mas os oito roedores e répteis (29-30) são tãmê'. (-¥ Limpo e Imundo: Teologia) A lógica para as restrições alimentares de Israel costuma ser considerada arbitrária — é simplesmente a vontade de Deus. No entanto, uma vez que o sistema revela uma ordem, os intérpretes foram em busca dc uma base mais sólida. Maimônides propôs a higiene como fator característico; o porco e o coelho podem ser hospedeiros de doenças, mas isso não explica a exclusão do camelo, que não é um hospedeiro. Em tempos mais recentes, Durkheim sugeriu que várias taxonomias animais refletiriam o sistema peculiar de valores de uma sociedade. Mary Douglas combinou essa idéia com uma teoria de que a imundícia é aquilo que está “fora de ordem” e aplicou o resultado a Levítico 11. Para ela, os animais encontram-se classificados de acordo com o ambiente em que vivem (água, ar, terra), e sugeriu que os animais limpos possuíssem um meio apropriado de locomoção, enquanto os imundos seriam mistos, como no caso dos animais aquáticos que não possuem barbatanas nem escamas. Tal análise apresenta erros e a teoria apresentada não é capaz de explicar todos os fatos; mas um princípio básico permanece: se Javé era separado das divindades pagãs, em função de sua lealdade à aliança, Israel devia separar-se dos alimentos de seus vizinhos. c. Sabedoria. Provérbios 30.28 observa que o semãmit pode ser pego com a mão, mas ainda assim é encontrado em palácios reais. Como acontece com outras três criaturas, nesse caso a sabedoria compensa a pequenez. Davi experimentou essa verdade em ação nos seus confrontos com o leão, o urso, Golias, Saul e outros. 4. Répteis nas línguas pós-biblicas. A LXX e Trg. Ps-J procuraram identificar esses animais, porém o resultado não foi além das conjecturas e alguns deles nem são répteis. A lista em Levítico 11.2-30 aparece em llQTemple 50:22. A Mixná e o Talmude tratam de questões de pureza ritual e alimentação; o tratado hullin reconhece duas famílias de lagartos e coloca o ’anãqâ , kõah, le(ã'ã e o hõmet no grupo daqueles que têm a pele esticada junto ao corpo. 5 . Répteis no NT. A ordem fundamental de Levítico, “sereis santos, porque eu sou san to” ( 11. 44, 45 ; cf. 19. 2 ; 20. 7 , 26 ), ecoa na ordem de Jesus, “sede vós perfeitos, como perfeito é o vosso Pai celeste” (Mt 5 .48 ). Jesus redefiniu a questão da pureza ao declarar que aquilo que sai de uma pessoa é que a toma impura (Mt 15. 10-20 || Mc 7 . 14- 23 ). Apesar de os cristãos não considerarem obrigatórias as regras alimentares dos judeus, os líderes da igreja primiti va usaram de cortesia para com os cristãos farisaicos ao proibirem a ingestão de sangue e da carne de animais estrangulados (At 15. 20 ). Trata-se de uma restrição nascida da consideração do amor c não da ordem de uma lei (Rm 14.14-21). Ao mesmo tempo em que o NT interpreta as leis alimentares do AT em termos de pureza, a crescente separação entre o cristianismo e o judaísmo também levou a uma compreensão polêmica do AT que, nesse caso, forneceu uma base para a missão da igreja entre as nações (At 11. 5- 18). Quando Pedro teve a visão dos ani mais imundos e uma voz lhe disse para matá-los e comê-los (10.11 -16), abandonou sua repul sa inicial e entendeu esse acontecimento como uma expressão da abrangência étnica do plano redentor de Deus: nenhum gentil deve ser considerado impuro ou imundo e, portanto, privado da oportunidade de ouvir o Evangelho de Jesus Cristo ( 10. 28 ). 1124
Restauração
Animais: -> behêmci (quadrúpedes, # 989); -> zãnãb (rabo, # 2387); -> /iazír (porco, # 2614); ha\yâ I (animal, # 2651); -> keleb (cão, # 3978); 'akbãr (rato, # 6572). -> ^p a rd êa ' (sapo, # 7630); -> qippõd (ouriço/coruja?, # 7887); -> /vwí (rastejar, enxamear, # 8253); -> ír$ (enxamear, fervilhar, # 9237); -> (chacal, # 9478); -> Répteis: Teologia; procurar, no índice: Pássaros; Camelo; Cervo; Jumento; Pomba; Rebanho/Bando; Gazela; Insetos; Leão; Larva; Cobra, etc. B ib l io g r a f ia
ISBE 3:147-48; 4:140; I. Aharoni, “On Some Animais Mentioned on the Bible”, Osiris 5, 1938,461 -78; F.S. Bodenheimer, Animais and Man in Bible Lands, 1960, 65; G. S. Cansdale, Ali the Animais o f the Bible Lands, 1970,199-202; D. Daube, “A Quartet o f Beasties in the Book o f Proverbs”, JTS 36, 1985, 380-86; M. T. Douglas, Paríty and Danger, 1966; J. Milgrom, Leviticus 1-16, AB 3, 1991; G. Wenham, Leviticus, NICOT, 1979. Robert C. Stallman Repugnância -> # 7752 (qw(, sentir repugnância) Requisição Reserva
# 8626 (í
inquirir, requerer)
# 732 ( $r> acumular, ajuntar, armazenar)
Reservatório -> # 5225 (miqwâ, reservatório) Resina -> # 7661 (íp ri/^ri, bálsamo, resina) Respiga -> # 6618 (7/1, agitar, tratar com, prejudicar, respigar) Ressecamento
# 3081a (hrr II, ser/estar ressecado)
1. Importância. O pe divisor de águas na vida e fé do povo de Israel. Ainda que o número de pessoas levadas para a Babilônia não tenha sido grande (Jr 52.28-30 dá um total de 4.600 pessoas para as três deportações, em contraste com 2Rs 24.14, que fala de 10.000 pessoas só na primeira deportação), todas as instituições mais importantes do javeísmo foram suprimidas: a monarquia, a existência como um Estado nacional, Jerusalém, a mesma cidade que Deus havia escolhido para ser sua habitação “para sempre” (SI 132.13-14), e o templo, com seus sacrifícios e grandes festivais religiosos. (-> Exílio: Teologia) Assim, a restauração certamente seria um acontecimento muito mais abrangente do que um simples regresso em termos geográficos, com alguns exilados judeus e seus descendentes voltando da Babilônia para Judá. Envolveria a renovação de instituições antigas, a criação de algumas novas e uma reinterpretação do que significava ser “povo de Deus” numa situação em que não havia mais um Estado nacional independente sob o governo monárquico de uma dinastia davídica, mas sim uma pequena e remota província no vasto império persa. 2. As visões de Ezequiel. Ninguém captou essa dimensão teológica da restauração maneira mais vivida do que Ezequiel (-> Ezequiel: Teologia de). Para ele, a tragédia do exílio não foi apenas militar e política, mas também a manifestação do fracasso final de Israel como Restauração
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Restauração
povo de Deus. Numa de suas visões, Ezequiel contemplou a glória (kãbôd) de Deus, que para Ezequiel significava a presença de Deus no meio do povo, visível no “shekinah” (ou “nuvem tabemacular”), partindo do templo e da cidade (Ez 10.18). Assim, quando essa glória voltasse, significaria uma renovação total da comunidade. A maioria dos profetas do pré-exílio que havia previsto a derrota militar e o exílio tinha vislumbrado algum tipo de propósito divino do outro lado desse julgamento, pelo menos para um “remanescente” purificado (p. ex., Os 2.14-23; Is 1.21-26) (-> Remanescente). Jeremias havia ido mais longe e falado de uma nova aliança, na qual o relacionamento entre Israel e seu Deus seria renovado e mantido, pois Deus escreveria sua lei no coração do povo (Jr 31.3134) (-> Jeremias: Teologia de). Ezequiel, porém, vai mais longe ainda. Ele vê uma renovação nacional que só podia ser descrita em termos de uma nova criação, quando Deus voltaria a colocar seu “sopro de vida” no povo morto de Israel como havia feito com a argila inanimada ao formar Adão (Ez 37.1-14). Essa renovação teria um aspecto político, uma vez que traria de volta os judeus exilados (36.24), reuniria os antigos reinos de Israel e Judá (37.15-23) e res tauraria a dinastia davídica (37.25). No entanto, essa restauração exterior teria uma respectiva purificação do pecado (36.25), uma renovação do coração e da mente pelo dom do Espírito de Deus dentro do povo (36.26-27), o qual reagiria com um arrependimento verdadeiro (36.31), reencontrando a paz paradisíaca e a prosperidade na terra (36.28-30). Tudo isso seria um ato da graça soberana de Deus, a atuação de Deus “por amor ao seu nome” e não o resultado de alguma iniciativa ou esforço humano. Assim, a restauração como um tema do AT, possui uma dimensão política e outra religiosa ou espiritual. 3. Contexto histórico epolítico. Os acontecimentos históricos e políticos da restauraç são um tanto obscuros. Isso se deve, em parte, à falta de provas arqueológicas e em parte ao fato de os registros bíblicos apresentarem algumas aparentes incoerências. Na verdade, o inte resse dos escritores bíblicos era mais teológico do que histórico. A versão hebraica do decreto de Ciro autorizando o retomo aparece duas vezes (2Cr 36.23; Ed 1.2-4), sendo que no segundo caso pede aos judeus que permaneceram na Babilônia que prestem ajuda financeira àqueles que estão voltando para trabalhar na reconstrução. Existe, ainda, uma versão aramaica do decre to (Ed 5.13) (-> Ciro). Alguns estudiosos consideram a forma de expressão desse decreto um tanto improvável para um rei estrangeiro; outros, no entanto, sugerem de modo plausível que a redação do documento pode ter sido realizada por um alto funcionário judeu na corte babilônica (ver Galling, 72-74). A historicidade geral está atestada pelas próprias palavras de Ciro registradas no Cilindro de Ciro: “Sob o comando de Marduque, recoloquei intactos em seus santuários... todos os deuses da Suméria e da Acádia, os quais Nabucodonosor havia trazido para a Babilônia” (ANET, 315-16). Contudo, nossos registros apresentam algumas confusões sobre quem fez o quê e quando, depois da volta. A fonte aramaica do livro de Esdras registra que Ciro nomeou Sesbazar como governador da região de Judá e o autorizou a reconstruir o templo e colocar de volta nele os utensílios que Nabucodonosor havia tirado de lá antes do exílio e levado para a Babilônia. A carta prossegue dizendo que “veio o dito Sesbazar e lançou os fundamentos da Casa de Deus, a qual está em Jerusalém; e, daí para cá (o reinado de Dario durou de 522 a 486), se está edificando e ainda não está acabada” (Ed 5.16). Essas palavras parecem contradizer Esdras 3, que indica que Josué e Zorobabel começaram a supervisionar a reconstrução do templo no segundo ano depois de sua chegada (Ed 3.8-13), e o sentido natural desses versículos parece ser de que isso ocorreu imediatamente depois do regresso autorizado por Ciro. Um aspecto mais dramático é que os dois relatos mostram-se conflitantes com a afir mação clara de Ageu, em 520, de que o templo “permanece em ruínas” (Ag 1.4) e a observação 1126
Restauração
de que foi sob a influência da pregação de Ageu que Josué e Zorobabel começaram a trabalhar supervisionando a reconstrução do templo (1.12-14). (-> Ageu: Teologia) Não podemos ter certeza, mas é bem possível que Sesbazar (identificado por vários es tudiosos com Senazar, em I Cr 3.18, um dos filhos de Jeconias, o que significaria que os persas haviam nomeado alguém da linhagem de Davi como governador de Judá, como haviam feito com Zorobabel) tenha começado o trabalho de reconstrução do templo (-> Zorobabel). No en tanto, as dificuldades enfrentadas pelos judeus, descritas de modo tão vivido por Ageu (1.5-11; 2.15-19), e a oposição dos povos ao redor, descritas no livro de Esdras (4.1-5), confrontaram o povo desde o início e lhes frustraram as tentativas de tal modo que, em 520, o templo ainda podia ser descrito como “em ruínas”. De fato, uma autorização mais antiga para a reconstrução do templo daria ainda mais peso às acusações de Ageu contra o povo por haver este neglicenciado essa tarefa enquanto cuidava de seus próprios interesses. E provável que o melhor seja considerar-se Esdras 3 e 4 não como relatos puramente históricos, mas como um resumo de motivação teológica para a situação do povo de Deus depois do exílio. Por um lado, o povo era chamado para ser um povo adorador e obediente a Deus, mas por outro, via-se quase que constantemente cercado pelas duras realidades da oposição e da pobreza (ver Williamson, 43-45). 4. Tensões. Não fica claro exatamente qual era a região de jurisdição controlada pelos governadores de Judá no pós-exílio. Ao que parece, esses governadores tinham certa autono mia no exercício do poder sobre Judá e seus habitantes. No entanto, faziam parte da “Província além do Rei”, designação persa para o que chamamos hoje de “Margem Ocidental” e para a terra de Israel, sendo que o controle geral dessa província era exercido a partir de Samaria. E evidente que essa situação dava espaço para a tensão, sendo que esta aflorou com intensidade durante a administração de Neemias, mas sempre esteve presente na forma de uma tendência. Por certo, lemos sobre a oposição contínua e as tentativas de controlar os planos dos judeus de reconstruir tanto o templo quanto, posteriormente, os muros da cidade. E bem provável que os vizinhos de Judá estivessem tão relutantes em considerar esse ressurgimento de uma Judéia forte quanto os vizinhos árabes de Israel têm estado desde a Segunda Grande Guerra; mas. naquele tempo, assim como nos dias de hoje, os judeus tinham o apoio influente de uma potência mundial: a Pérsia. Também é possível que tenham surgido conflitos entre os judeus que regressaram da Babilônia e os que haviam ficado para trás. Ao que parece, havia discórdias bastante sérias den tro da comunidade (Is 65.1 -16). P. D. Hanson (1975) determinou como origem desses conflitos a rivalidade entre o sacerdócio zadoquita, que regressou ao templo depois de quase todos os seus membros terem sido exilados da Babilônia, e os levitas que haviam dado continuidade ao seu ministério em Judá durante o exílio, mas que foram removidos de sua posição e, posterior mente, rebaixados ao papel de meros assistentes no templo (ver Ez 44.10-19). 5. Período de renovação. Fica claro que houve várias intensões e tentativas de se re constituir a fé de Israel nessa situação inédita. Ezequiel (esp. caps. 40—48), Ageu e Zacarias (Zacarias 1—8) vislumbraram na reconstrução do templo, na presença de um governador da vídico e na glória de Deus novamente no meio de seu povo (-> Zacarias, Teologia de), uma renovação da teologia da antiga Siâo (-> Sião). Esses profetas ressaltaram a natureza de Israel como uma teocracia, um povo de Deus (e não como uma nação no sentido político), sabendo que a graça de Deus e sua presença no templo eram mediadas pela nomeação do sacerdócio devidamente consagrado e de todo o sistema sacrificial por meio do qual o relacionamento do povo com Deus era constantemente renovado. 1127
Restauração
O cronista retratou a construção do templo como a principal realização de Davi e mostrou que a natureza da comunidade do pré-exílio estava sujeita à Torá e condicionada pela adoração. Desse modo, o cronista procurou mostrar ainda que a comunidade do templo do pós-exílio era a herdeira legítima das promessas e propósitos anteriores de Deus. (-> Crônicas: Teologia) Os escritos do pós-exílio procuram apresentar uma reinterpretação teocrática do sig nificado do javeísmo dentro da nova situação política. Sem dúvida, com o passar do tempo, outros começaram a se sentir insatisfeitos com a subjugação política constante e procuraram uma intervenção mais dramática de Deus na história do mundo a fim de instituir um reino que, para eles. ia mais ao encontro das esperanças proféticas e promessas feitas a Davi na antigüida de. Há alguns sinais disso em Isaías 56— 66 (p. ex., 65.17-25), e o conceito ganhou expressão mais nítida na literatura apocalíptica de Isaías 24— 27, Joel, Zacarias 9— 14 e, posteriormente, no livro de Daniel. Fica claro que o exílio e a restauração tomaram-se um tema teológico. Assim como Isaías (-> Isaías: Teologia ) havia visto o regresso da Babilônia como um segundo êxodo do Egito (p. ex., 51.9-11), um conceito expressado também em Ageu 2.5, o tempo de exílio na Babilônia e a volta miraculosa graças à operação divina por intermédio de Ciro tomaram-se, igualmente, um símbolo de morte e ressurreição, opressão e libertação, sofrimento e livramen to. Esses conceitos aparecem nos retratos apresentados por Ezequiel do renascimento de sua nação depois do exílio (ver acima). O escritor do livro de Daniel viu a perseguição sob Antíoco no século II a. C. e o livramento vindouro em termos semelhantes, uma vez que Daniel estava certo de que a promessa dc Jeremias de um fim dos setenta anos de exílio na Babilônia se cumpriria em breve (Dn 9.1-2, 24-27) (-> Daniel: Teologia). Trata-se de um tema que mais tarde também será desenvolvido pelo escritor de Apocalipse (14.8). NT O cativeiro do povo de Deus na Babilônia tornou-se um paradigma para o sofrimen to, o pecado e a opressão que o povo de Deus experimenta em seu serviço neste mundo. A restauração é a promessa da intervenção de Deus em poder e graça para salvar seu povo e, como tal, adquire um significado mais profundo no NT. A convicção de que a luz prometida da restauração já havia começado a resplandecer é mostrada na genealogia em Mateus, na qual as divisões importantes ocorrem entre os períodos de Abraão a Davi, de Davi ao exílio na Babilônia e da volta da Babilônia ao nascimento de Jesus. Desse modo, o NT testemunha a convicção cristã de que a restauração da escravidão do pecado — tipificado pela Babilônia — já ocorreu em Cristo. B ib l io g r a f ia
P. R. Ackroyd, Exile and Restoration, 1968; idem, “The Temple Vessels: A Continuity Theme”, Studies in the Religion o f Ancient Israel, SVT 23, 1972, 16-81 = Studies in lhe Religious Tradition o f the Old Testament, 1987, 46-60; J. Bright, A History o f Israel, 19813, 341-72; P. D. Hanson, The Dawn o f Apocalyptic, 1975; A. Kuschke (ed.), Verbannung und Heimkehr: Beitrãge zur Geschichte und Theologie Israels im 6 und 5. Jahrhundert v. Chr., FS W. Rudolph, 1961; G. Widengren, “The Persian Period", in IJH, 489-538; H. G. M. Williamson, Ezra, Nehemiah, WBC, 1985. Rex Mason Restolho -> # 9320 (tehen, hastes picadas, palha) Resultado 1128
# 344 ( ’aharít, fim, conseqüência)
Retribuição: Teologia da
Retenção -> # 4979 (m n ', reter) Retidão -> # 3842 (yisrâ, retidão) Retomo -> # 8740 (swò, arrepender-se, retomar, restaurar)
Retribuição: Teologia da A. Explicação do Conceito A retribuição (do vb. lat. retribuere, dar novamente, dar o que é devido) costuma ser entendida como a recompensa de acordo com os méritos ou castigos, especialmente no caso do mal. O conceito de retribuição ocupa uma posição de destaque no AT, em que se refere, por vezes, a transações entre homens, mas, com muito mais freqüência, diz respeito à administração da justiça divina. Nesse sentido teológico, o termo descreve como Deus concede recompensas e castigos pelos atos de bondade e perversidade dos homens. Pelo fato de o AT considerar Deus sempre como um ser pessoal que é justo em tudo o que faz, uma correlação apropriada entre o comportamento humano e a recompensa ou castigo subseqüente é um pressuposto fundamental da literatura do AT. Essa idéia se expressa nos textos legais (as bênçãos e maldições da aliança do Sinai), em textos narrativos (cf., p. ex„ o castigo de Data e Abirão em Números 16; o castigo de Acã em Josué 7), nos Salmos (SI 6.1 [2]; 18.20 [21 ]; 94.15), nos textos de sabedoria (Pv 11.19,24,25) e nos textos proféticos (a ratificação das bênçãos e maldições da aliança, a proclamação do julgamento sobre as nações pagãs). Na verdade, alguns textos do AT parecem refletir a premissa de uma estrutura moral divinamente ordenada subjacente à existência humana em sua totalidade e discemível numa espécie de justiça poética embutida na natureza da realidade (cf. p. ex., SI 7.14-16; 37.14, 15; Pv 26.27). Uma pessoa colherá aquilo que semeou (Jó 4.7-9; SI 126.5,6; Pv 11.18; 22.8, 9; Os 8.7; 2Co 9.6; G1 6.7). Essa idéia um tanto geral de retribuição encontra uma expressão mais específica nas declarações de vários Salmos e Provérbios de que o caminho do justo prosperará enquanto o caminho do perverso perecerá (cf. p. ex., SI 1.32; 37; 128; Pv 13.21). Tomando por base textos desse tipo, Klaus Koch escreveu um ensaio influente sobre o sentido jurídico estrito dessa palavra no AT. Em vez da retribuição, ele encontra uma relação intrínseca e sistemática entre o destino de uma pessoa e os atos dela. O destino de uma pessoa é criado pelo próprio comportamento dela — seja ele bom ou mau — e não pela recompensa ou pelos castigos divinos. O papel de Javé nisso não é de um juiz que declara uma sentença externa, mas sim de uma parteira que garante a conclusão daquilo que o indivíduo iniciou. Koch fala de “ Tun-Ergehen-Zusammenhang" (“a relação ato-conseqüência”). Deus trabalha de dentro para fora, garantindo a conclusão do processo e não de fora para dentro como um juiz. Assim como, a seu tempo, a semente dá frutos, o comportamento humano também acaba por dar resultados intrinsecamente bons ou maus. Dessa forma, Javé é o “fiador da ordem moral”, “atua como um trabalhador que supervisiona o funcionamento contínuo das máquinas” (14). De acordo com Koch, os tradutores da LXX foram, em grande parte, os responsáveis por in troduzir o conceito de retribuição judicial no AT. Apesar de G. von Rad (OTT, 265-72, 384-87,436-37) concordar com as conclusões de Koch, especialmente dentro da tradição da literatura de sabedoria, essa teoria não foi bastante aceita. P. D. Miller (134) comenta que na literatura profética “não se pode expressar plenamente a relação entre o pecado e o julgamento como sendo de fato-e-efeito sob a orientação de Deus. 1129
Retribuição: Teologia da
Apesar de diversas passagens não darem maiores esclarecimentos sobre o assunto, há várias outras que ressaltam a idéia de correspondência, mas não de conseqüência entre os atos de uma ou mais pessoas e o julgamento que recebem, uma relação que não é necessariamente in terna, mas que se pode consider como baseada na divisão divina e não como algo que ocorre em separado dessa decisão ou determinação”. De modo geral, pode-se concluir que a teoria de Koch é abrangente demais para fazer justiça ao grande número de textos do AT que represen tam Javé intervindo em diversas situações de modo a determinar bênçãos ou castigos em seu papel de guerreiro e juiz divino (cf. p. ex., Dt7.10; ISm 24.19 [20]; Pv 12.2; 15.25; ver mais abaixo). Em última análise, essa teoria restringe a liberdade de ação de Deus e deixa implícita uma visão deísta do Senhor, algo bastante distinto do que se encontra no AT. Apesar de haver um consenso de que a idéia de retribuição divina do bem e do mal encontra-se profundamente arraigada no AT, esse conceito não se cristaliza num dogma simplista no qual todo infortúnio é considerado um sinal de pecado e todo sucesso é con siderado um sinal de obediência e piedade. Os livros de Jó e Eclesiastes, bem como alguns Salmos (cf. p. ex., 34; 49; 73; 94), Provérbios (cf. p. ex., 15.16; 28.6) e textos proféticos (cf. p. ex., Jr 5.27,28; 12.1; Ml 3.15) levantam sérias dúvidas quanto a igualar uma boa vida com uma vida próspera. Na verdade, os conselheiros de Jó são repreendidos por promoverem a idéia de que os justos sempre prosperarão e os perversos sempre sofrerão, juntamente com o princípio de que o sofrimento comprova a pecaminosidade do indivíduo e a prosperidade comprova a retidão. Essas considerações distintas, encontradas em diversas partes do AT, são difíceis de conciliar de modo a formar um padrão coerente. Alguns estudiosos analisaram a diversidade de perspectiva sobre essa questão como um reflexo de teologias irreconciliavelmente conflitantes dentro das próprias Escrituras. Outros encontram nessas aparentes tensões, o desenvolvimento progressivo do pensamento teológico dentro do AT, bem como a distinção entre a abstração de uma verdade geral e a realidade de sua aplicação específica nas experiências pessoais, nas quais pode haver uma porção de variáveis envolvidas (cf. Jó I). O AT reconhece claramente a exis tência de diversos exemplos na experiência humana que mostram como os inocentes sofrem e os perversos prosperam. No entanto, esse reconhecimento não anula o conceito subjacente do AT de uma ordem moral estruturada por Deus e seu respectivo conceito de retribuição divina do bem e do mal, mas significa que em alguns casos, existe uma ligação inescrutável entre a soberania divina e a relação de causa e efeito das ações e suas conseqüências. Deus continua livre na administração da justiça. Não apenas o julgamento é determinado sobre Judá apesar da reforma de Josias (2Rs 23.26-27), mas também é demonstrada misericórdia para com aque les que não a merecem. Em resumo, Deus não se permite manipular pelos homens. Em alguns casos, é possível que a administração final de recompensas ou castigos seja postergada até o fim dos tempos (SI 49.5-15; Dn 12.2). B. O tema das bênçãos/maldições na aliança no Sinai Uma investigação das diversas passagens do AT nas quais a idéia de retribuição vem à tona revela uma ênfase específica na experiência de Israel de ser abençoada ou amaldiçoada por Deus em função da obediência ou desobediência à aliança. Apesar de essa estrutura ter sido considerada muitas vezes como a prova mais clara da teologia da retribuição no AT, deve-se usar de cautela. Apesar de ficar claro que a obediência à aliança costumava resultar em bênção ou prosperidade para um indivíduo (cf. p. ex., Jr 22.15, 16) ou para a nação (cf. 2Rs 18.1-8; 19.14-37), há algumas questões sérias quanto a ser possível considerar as bênçãos associadas à fidelidade pactuai como recompensas merecidas. Há muito tempo, G. Vos (127) ressaltou 1130
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que, apesar de haver uma ligação inequívoca entre a observância da lei e a bênção divina no AT, é incorreto concluir-se que essa relação seja meritória. De acordo com Vos, a relação deve ser considerada como parte do âmbito típico-simbólico de propriedade de expressão e não do âmbito legal do mérito. Tendo em vista a idéia fundamental da retribuição ser de “recompensa ou castigo merecido”, isso significa que, em termos estritos, as bênçãos da aliança não consti tuem uma forma de retribuição, pois não são merecidas. A validade dessa observação é apoiada por várias passagens nas quais as benevolências de Deus para com Israel são retratadas como favores imerecidos e não recompensas merecidas (Dt 9.4-6; 2Rs 13.22-23; 14.26-27; Ne 9.1935; Jr 2.6; Am 2.9-11). Deve-se reconhecer que mesmo ficando claro que Deus escolheu abençoar seu povo em várias ocasiões por sua obediência à aliança, essa obediência era sempre falha e deficiente (Is 64.6, “todas as nossas justiças, [são] como o trapo da imundícia”; cf. também SI 130.3; 143.2). Assim, a prosperidade e a bênção podem ser mais apropriadamente relacionadas à graça que deu início à aliança do que à idéia de mérito decorrente da obediência aos requisitos dela (cf. Herion, 4 :156). Por trás desse postulado, encontra-se o reconhecimento tácito do AT de que Israel era “profundamente incapaz de ser fiel à aliança” (McConville, Grace, 133). Em função disso, as maldições da aliança são muito mais importantes do que suas bênçãos nos livros histó ricos e proféticos do AT. Fica claro que a desobediência de Israel à aliança levou repetidamente à execução das maldições da aliança, processo que chegou ao auge quando Israel foi mandada para o exílio. Aqui, o conceito de “retribuição” é muito mais apropriado, uma vez que Israel certamente merecia qualquer castigo que Deus escolhesse lhe dar. Isso tudo não quer dizer que a estrutura de bênçãos e maldições apresentada em Levítico e Deuteronômio — e que assume uma posição de destaque nos livros históricos e proféticos do AT — perca a importância. Pelo contrário, esse padrão transmite a mensagem crucial de que há uma ligação entre a obediência aos preceitos de Deus e a possibilidade de se alcançar uma vida próspera e feliz dentro de uma sociedade ordeira. Devido à incapacidade inata do ser humano, essa ligação não se baseia no mérito e também não possui uma forma de operação automática ou mecânica. Ainda assim, porém, aponta para a existência de um equilíbrio estru turado por Deus na ordem moral das coisas, dentro do qual, de acordo com o plano de Deus, a obediência normalmente é associada à bênção e a desobediência, à maldição. A ligação de bênção com obediência e de castigo com desobediência desempenha um papel importante em toda a história e literatura subseqüente do AT. De acordo com G. McConville: “As bênçãos e maldições são uma parte importante do ensinamento de Deuteronômio de que o universo de Deus é racional e moral. Os homens não se encontram à deriva num mar de dúvida e raiva. Podem estar certos das coisas fundamentais da vida, pois sabem como Deus é; podem, de fato, conhecer o próprio Deus” (“Deuteronomy”, 225). Como um profeta anônimo de Javé anunciou ao sacerdote Eli: “Porque aos que me hon ram, honrarei, porém os que me desprezam, serão desmerecidos” (1 Sm 2.30). No contexto das concepções do OMA de um universo caótico e imprevisível, controlado por várias divindades operando de maneiras arbitrárias e irracionais, essa segurança de uma ordem moral determina da por Deus dava perspectiva e esperança para o povo de Israel em meio a todas as incertezas da vida diária num mundo caído. C. Ênfase sobre a retribuição punitiva Um dos temas de maior destaque na história de Israel no período do êxodo até o exílio é a transgressão repetida da aliança pelos israelitas e, como resultado, a execução das maldições da aliança. Amós 4.6-11 é uma das muitas passagens que descrevem os inúmeros chamados ao arrependimento que o Senhor enviou a Israel na forma de maldições da aliança. Pelo fato de 1131
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essas advertências terem caído em ouvidos moucos, Israel acabou sendo enviada para o exílio (5.27; 6.14). Essa seqüência de acontecimentos já é antevista nos discursos de Moisés aos fi lhos de Israel nas campinas de Moabe, pouco antes da morte de Moisés. Deuteronômio 30 e 32 prevêem que o povo de Israel não viverá de acordo com os requisitos da aliança e indica que as bênçãos e maldições de Deuteronômio 28 não devem ser vistas tanto como possibilidades alternativas, mas sim como realidades sucessivas (cf. McConville, Grace, 135). A obediência total à exortação de 30.11-14, segundo a qual aquele que obedecer o mandamento viverá e multiplicará, baseia-se, em última análise, numa nova iniciativa da graça divina (30.6). E por esse motivo que Josué advertiu Israel: “Não podereis servir ao Senhor, porquanto é Deus san to, Deus zeloso, que não perdoará a vossa transgressão nem os vossos pecados. Se deixardes o Senhor e servirdes a deuses estranhos, então, se voltará, e vos fará mal, e vos consumirá, depois de vos ter feito bem” (Js 24.19-20). Na verdade, desde o tempo do episódio com o bezerro de ouro (Êxodo 32— 34), fica evidente que a retribuição punitiva ocupará um lugar de destaque na história de Israel (cf. 33.3). D. Terminologia Apesar de a idéia dc retribuição encontrar-se por toda a parte no AT, a BH nâo tem uma palavra usada regularmente para o conceito tanto dos aspectos benevolentes quanto dos aspec tos punitivos da retribuição. A palavra “retribuição” nem aparece em algumas versões, sendo que em outras, aparece poucas vezes e somente no NT (cf. a idéia de retribuição em Rm 11.9; Hb 2.2). No entanto, o conceito de retribuição pode ser encontrado inúmeras passagens: (SI 69.22; ls 34.8; 66.6; 35.4; 59.18; Jr 5.9, 29; 9.9; 11.20; 15.15; 20.12; 46.10; 51.56; Rm 11.9). Outros termos mais gerais relacionados são “restituição”, “recompensa” ou semelhantes (cf. Nm 5.7, 8; Rt 2.12; 2Sm 19.36; Jó 34.33; Pv 20.22; Is 40.10; 62.11; 65.6; Jr 16.18; 25.14; 50.29; Ez 7.3; também Dt 32.35; 2Sm 19.36; Jó 15.31; Is 35.4; 40.10; 61.8; 62.11; Jr 18.20; 51.56; Os 9.7; e ainda, Gn 50.15; Dt 32.6; 2Sm 2.6; 16.12; 2Rs 9.26; SI 10.14; 4 1.10; Jr 51.56; lTm 5.4) e “vingança" ou semelhantes (Lv 19.18; 26.25; Nm 31.2, 3; Dt 32.43; ISm 24.12; 2Rs 9.7; Et 8.13; Is 1.24; Jr 46.10: Os 1.4; Lc 18.3,5, 7, 8; Rm 12.19; Ap 6.10; também Lv 26.25; Dt 32.35, 43; ISm 24.12; 2Sm 3.27; 2Rs 9.7; Et 8.13; SI 79.10; Is 1.24; Jr 5.9, 29; 9.9; 15.15; 51.36; Rm 12.19; Hb 10.30; Ap 6.10; e ainda Nm 31.2; Dt 32.43; 1Sm 24.12; 2Rs 9.7; 2Cr 24.22; Is 1.24; JI3.21; Rm 12.19; Ap 6.10). Com exceção de “vingança”, porém, nenhum desses termos é usado com um sentido somente de retribuição. No heb., a idéia de retribuição é expressada com mais freqüência por termos gerais que adquirem esse significado dentro de contextos específicos. Os mais comuns dentre esses termos são os vbs. ou subst. derivativos de skr, contratar por um salário fixo (-> # 8509; cf., p. ex., Gn 15.1; 30.18; SI 127.3; Is 40.10; 62.11 [ todas as formas de uso são subs.]); o pi. de sim, recompensar, pagar(-> # 8966; cf., p. ex., Dt 7.10; 32.35,41 [par. nqm\, ISm 24.19[20]; Rt 2.12; ls 34.8; Jr 16.18 [duas vezes]); gml, recompensa (-> # 1694; c f , p. ex., 2Sm 22.21; 2Cr 32.25 [subs.]; SI 7.4[5]; Is 35.4); pqd, visitar, no sentido de castigar ou libertar (-> #7212; cf., p. ex., SI 59.5[6]; Jr 14.10); zkr, lembrar-se, no sentido de recompensar (-> # 2349; cf., p. ex., Dt 25.17; ISm 25.31; Ne 6.14; Jr 15.15); vM, repreender (-> # 3519; cf., p. ex., 2Sm 7.14; SI 6.1 [2]; Hc 1.12); swb, devolver, no sentido de dar dc volta o mal ao malfeitor (-> # 8740; cf., p. ex., lRs 2.33; Et 9.25; SI 7 .16[ 17]; Obadias 15) e justiça ao justo (SI 94.15) e aquilo que uma pessoa faz, volta para ela (Pv 12.14); e nqm, vingar(-se) (-> # 5933; cf., p. ex., Dt 32.43; SI 99.8; Is 1.24; Na 1.2; ver a discussão mais completa abaixo). Esses termos (especialmente nqm) são, por sua vez, associados muitas vezes a palavras do âmbito semântico da ira, como 'ap (-» # 678; Mq 5.15[14]), hêmâ (-» # 2779; Ez 24.8; Na 1.2) e ntr (-» # 5757; Na 1.2). Também 1132
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podem ser associados a termos legais como spt, julgar (-> #9149; Jz 11.27; ISm 24.13) edyn (-> # 1906; Dt 32.36); ryb, contender (-> #8189; Is 34.8; Jr 11.20); ou à idéia de livramento, por meio de termos co m o v i' (-> # 3828),plt(-> # 7117) e g 7 (-> # 1457). Uma vez que o vo cabulário para retribuição é amplo e nqm é o único termo heb. usado sempre com esse sentido (ainda que somente no aspecto punitivo), trata-se de um termo que merece mais atenção.
E. Os textos com nqm O AT emprega o vb. nqm, vingar-se e seus derivativos subs., nâqãm e neqãmâ (vin gança, -> # 5933), 59x. Essas passagens podem ser divididas em duas categorias principais, tomando por base se o sujeito da ação é Deus ou um ser humano. Podem ser distinguidas ainda ao se analisar dc que modo os termos são empregados dentro dessas categorias principais (a seguinte classificação desses textos é emprestada de Peels). 1. Homens como sujeitos. As passagens nqm nas quais o sujeito é um ser humano di videm-se em três subcategorias. a. Passagens nas quais a vingança tem como conotação a represália ou um espírito vin gativo (Lv 19.18; SI 8.3; 44.17; Jr 20.10; Lm 3.60; Ez 25.12, 15). Nesses textos nqm expres sa uma atitude destrutiva e cheia de ódio que leva a atos de represália. A retribuição em seu devido significado, tem um papel secundário nesses textos. Esse tipo de vingança é proibido em Levítico 19.18. b. Passagens nas quais a vingança ocorre no contexto judicial e refere-se à execução de uma decisão legal (Gn 4.15,24; Êx 21.20-21; Pv 6.34). Em Êxodo 21.20-21, nqm ("punir” ) é usado com relação à penalidade legal para o assassinato de um escravo. Não se trata de um exemplo de espírito vingativo, mas sim de retribuição justa, na qual a comunidade atua em vez de dar espaço para que o indivíduo procure executar a vingança de sangue. Em Gênesis 4.15, 24 o contexto judicial não fica tão claro, mas a retribuição punitiva tem uma função protetora. A distorção dessa prática por Lameque beira o tipo dc vingança proibida em Levítico 19.18. c. Passagens nas quais a vingança ocorre num contexto de guerra (Js 10.13; Jz 15.7; 16.28; ISm 14.24; 18.25; Et 8.13). A guerra (que na maioria dos casos parece ser a “guerra do Senhor”) é considerada nessas passagens como uma execução de nqm. Israel luta como nação (Js 10.13; ISm 14.24; 18.25), como povo dispersado no exílio (Et 8.13) ou representada por um indivíduo (Sansão: Jz 15.7; 16.28). Na guerra do Senhor, a vingança adquire uma função judicial pela qual Javé, como o grande Juiz e Guerreiro age a fim de defender e livrar seu povo. Essa distinção entre vingança pessoal (categoria I acima) e execução legítima da guerra do Senhor, apesar de ser importante e válida, mostra-se um tanto difícil de colocar em prática nos casos de Saul (ISm 14.24) e Sansão (Jz 15.7; 16.28). 2. Deus como sujeito. As passagens nqm nas quais o sujeito é Deus se dividem em qua tro subcategorias. A grande maioria dos textos nqm encontra-se nessa categoria. a. A vingança de Deus nas profecias contra Israel (Lv 26.25; Is 1.24; 59.17; Jr 5.9, 9.8[9]; Ez 24.8). Levítico 26.25 (“Trarei sobre vós a espada vingadora da minha aliança") é um texto particularmente importante pois se encontra no contexto de uma enumeração das maldições da aliança (26.14-39) e liga explicitamente a vingança divina com a transgressão da aliança. Como comenta Pitard (18): “Reflete e pressupõe o direito legal de Javé de executar a retribuição no caso em que seus direitos como soberano foram infringidos”. Nesse contexto, a função não é a retribuição só por vingança, mas sim com o objetivo de restaurar a comunhão na aliança (26.40-45). Isaías 1.24 (“Tomarei satisfações aos meus adversários e vingar-me-ei dos meus ini migos”) descreve como Deus irá restaurar a justiça à cidade de Sião (vv. 26-27). Aqui, mais 1133
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uma vez, nqm é usado num contexto legal, porém com o detalhe surpreendente de que os “ad versários” e “inimigos” dos quais o Senhor vai se vingar não são nações estrangeiras, mas os habitantes israelitas de Jerusalém. Apesar de a perversidade do próprio povo de Deus não po der ser tolerada por um Deus justo, aqui, bem como em Levítico 26, o propósito da vingança divina é a redenção do povo (v. 27: “Sião será redimida pelo direito”). Isaías 59.17 apresenta uma mensagem semelhante. O uso interrogativo que Jeremias faz de nqm num refrão repetido três vezes (“Deixaria eu de castigar estas coisas?”; Jr 5.9,29; 9.9 [8]) tem o objetivo de justificar o julgamento divino que está prestes a ser executado contra Israel na forma do exílio na Babilônia. A declaração de Javé em Ezequiel 24.8: “Para fazer subir a indignação, para tomar vingança, eu pus o seu sangue numa penha descalvada", também descreve a destruição de Jerusalém pelos babilônios. b. A vingança de Deus em profecias contra as nações estrangeiras (Dt 32.35,41,43; 34.8; 35.4; 47.3; 61.2; 63.4; Jr 46.10; 50.15, 28; 51.6, 11, 36; Ez 25.14, 17; Mq 5.14; Na 1.2). Trata-se do maior conjunto de textos nqm e contém profecias dirigidas num sentido geral contra os adversários ou inimigos de Javé, bem como aquelas voltadas especificamente contra Edom (Is 34.8; 63.4; Ez 25.14), o Egito (Jr 46.10), a Babilônia (ls 47.3; Jr 50.15,28; 51.6, 11, 36), a Filistia (Ez 25.17) e a Assíria/Nínive (Na 1.2). As declarações com nqm no Cântico de Moisés (Dt 32.35,41,43) são particularmente importantes para essa classe de textos como um todo. Nesse cântico, que Moisés ensinou aos israelitas nas campinas de Moabe (cf. 31.19), Javé adverte seu povo que se eles deixarem a aliança, ele também os deixará e executará sobre eles as maldições da aliança, inclusive o exí lio (vv. 23-26). No entanto, não é somente sobre seu povo rebelde que Deus trará julgamento. No devido tempo, os inimigos de Israel, que são os instrumentos do julgamento de Javé sobre seu povo, também serão julgados por seu orgulho e incredulidade (vv. 27-33, 41-43). E esse julgamento sobre os inimigos de Israel que se encontra descrito no Cântico de Moisés, como Javé executando a “vingança” contra os seus “adversários” (vv. 35,41,43). Nesse caso, a vin gança demonstra tanto a justiça de Deus (cf. Is 10.5-19; Jr 25.8-14) como o meio usado por ele para livrar o seu povo (Dt 32.36-39). O povo todo é chamado a “louvar” (v. 43) por essa obra julgadora e castigadora de Deus, pois a vingança significa justiça e redenção (v. 43b). Esses conceitos se repetem de maneiras diversas em todas as outras passagens desse grupo. Um exemplo claro dessas idéias pode ser encontrado em Naum 1.2. Nessa introdução a um hino de louvor a Javé por julgar seus inimigos (nesse caso, a Assíria; vv. 2-6) e trazer a salvação ao seu povo (vv. 7-8), o nome divino Javé é associado três vezes à forma participial de nqm (cf. Salmos 99 e Isaías 6, em que se diz 3x que Javé é “santo”). Javé é descrito ainda como sendo “tardio em irar-se”, porém “jamais inocenta o culpado” (Na 1.3). Deus opera na história com o mesmo poder extraordinário que demonstra na natureza (vv. 4-6). Aqui, bem como em outras passagens, há uma ligação entre vingança e livramento. Essa passagem também faz a declaração importante de que a ira de Deus e sua bondade não se contradizem (vv. 2, 7). Em todos os textos dessa categoria, nqm representa a retribuição punitiva contra as na ções que se opõe a Javé ou ao povo dele (Ezequiel 25); que demonstram uma sede exagerada pelo poder político além de suas fronteiras (Assíria, Naum I; Babilônia, Isaías 47; Jeremias 50— 5 1; Egito, Jeremias 46) ou exaltam a si mesmas em seu orgulho e arrogância humanos, colocando-se acima de Javé (Deuteronômio 32; Jeremias 50— 51; Miquéias 5; Naum 1). No entanto, essa vingança é ligada ao livramento que Deus concede ao próprio povo (Is 35; 61) e, no caso em que as nações inimigas assumem um significado típico (cf. p. ex., Edom, Is 34.8; 63.4), ela indica que sua execução se dará num contexto escatológico. 1134
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c. Os pedidos pela vingança de Deus nos Salmos (SI 58.10[ 11 ]; 79.10; 94.1; 149.7; cf. ISm 24.13) e nas “Confissões de Jeremias” (Jr 11.20; 15.15; 20.12). O Salmo 58.10 [11] diz: “Alegrar-se-à o justo quando vir a vingança; banhará os pés no sangue do ímpio”. Trata-se de um texto perturbador, que causa uma sensação incômoda em vários leitores pelo fato de asso ciar a alegria do justo com o banho de sangue realizado pela retribuição divina. Para muitos, essa combinação de idéias é considerada uma expressão do pior de todos os tipos de fascismo religioso. A. Weiser (432) comenta: “Ao falar do efeito do julgamento sobre o justo, a con clusão do salmo demonstra... uma exultação maligna descarada e o espírito cruel de vingança de um fanatismo religioso intolerante (cf. SI 68.23); é uma daquelas florescências venenosas e perigosas que pode aparecer mesmo na árvore do conhecimento religioso e mostrar clara mente os limites determinados para a religião do A T’. Pode-se discutir, porém, se essa é uma interpretação válida do texto. A injustiça desenfreada no tempo do salmista (58.1 -8 [2-9]) é tal que ele questiona seriamente se faz algum sentido servir a Deus. Os três últimos versículos do salmo expressam a convicção do salmista de que, no final, a justiça prevalecerá e o mal será castigado (vv. 9-11 [10-12]). A confissão final, “Na verdade, há recompensa para o justo; há um Deus, com efeito, que julga na terra” (v. 11 [12]) toma essa declaração retumbante, ape sar de as aparências do momento indicarem o contrário. Sem dúvida essa verdade profunda é motivo de alegria. Esse grupo de textos nqm encontra-se intimamente relacionado com os salmos imprecatórios (os Salmos 7; 35; 58; 59; 69; 83; 109; 137; 139 costumam ser citados como exemplo, apesar de as declarações imprecatórias aparecerem em vários outros salmos) que pedem o julgamento divino dos ímpios. As imprecações desses salmos são, muitas vezes, consideradas expressões de ódio pessoal e explicadas como manifestação de um nível baixo de maturida de religiosa e moral no AT. Alguns estudiosos usaram o contraste dessas declarações com as prescrições do NT para amar os inimigos (Mt 5.39, 44; Rm 12.14) como base para concluir que o NT abandona o conceito de vingança do AT e pede uma ética mais elevada, fundamen tada no amor e não no ódio. No entanto, é impossível comprovar esse tipo de antítese entre os Testamentos. Não apenas o AT possui um amor ético e proíbe a vingança (Lv 19.17-18), como também é possível encontrar no NT (cf., p. ex., Mt 25.41; At 8.20; 13.10-11; G1 1.8-9; ICo 16.22; Ap 6.10) declarações que falam mais claramente da realidade e seriedade da ira de Deus (cf., p. ex., 2Ts 1.5-10) do que o AT. Assim, as imprecações do AT devem ser entendidas como súplicas apropriadas por um julgamento justo de Deus sobre aquilo que deprecia sua glória ou prejudica o advento do seu reino. Existe, porém, uma diferença importante entre os Testamentos. No NT a história da redenção encontra-se num estádio mais avançado. Agora o povo de Deus vive num tempo en tre os adventos de Cristo. É um tempo no qual o julgamento de Deus já foi revelado na cruz de Cristo e no qual o povo de Deus espera pela sua revelação final no último dia (Tg 5.9; Ap 11.18). Esse período é retratado no NT como um tempo da paciência e graça de Deus e durante o qual o evangelho deve ser levado a todos os povos (Jo 3.17; 12.47) a fim de que possam se arrepender (Rm 2.4; 2Pe 2.9; 3.9). Dentro dessa progressão da história redentora, os cristãos devem “abençoar os que [os] perseguem” (Lc 6.27, 28; Rm 12.14), orar pela conversão deles (At 7.60) e entregar o próprio destino àquele que julga com justiça (lPe 2.23; Rm 12.19). d. A vingança de Deus na literatura histórica (Nm 31.2-3; Jz 11.36; 2Sm 4.8; 2Rs 9.7; 2Sm 22.48/S1 18.48; SI 99.8). Em Números 31.2-3, Moisés é ordenado por Javé a vingar-se dos midianitas pela tentativa destes de levar Israel à idolatria (Números 22—25). Tendo em vista que os atos dos midianitas desonraram Javé, as palavras do vidente pagão Balaão, que havia sido contratado para amaldiçoar Israel (“Benditos os que te abençoarem, e malditos os 1135
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que te amaldiçoarem”, Nm 24.9b; cf. Gn 12.3) são executadas. Israel deve ser o instrumento da vingança sobre os midianitas, mas Deus é o autor desse ato (cf. “a vingança do Senhor”, v. 3) e a vingança pertence somente a ele. Em 2 Reis 9.7, Jeú é o instrumento da vingança de Deus sobre a casa de Acabe pela participação desta em conduzir Israel à idolatria (cf. lRs 16.30-33; 19.10; 21.25) e matar os servos de Javé, os profetas (cf. lRs 18.4, 13; 19.2). Deuteronômio 32.35-36 havia anunciado que ao Senhor pertencia a “vingança” pelo sangue dos seus “servos". Mais uma vez, a vingança do Senhor garante que a injustiça nâo terá a última palavra (cf. Ap 6.10). Assim, esse grupo dc textos proporciona exemplos de vingança divina executada no tempo do AT. Por vezes, Javé intervém numa situação pessoal (1 Samuel 24; 2 Samuel 4) e, em outras ocasiões, nas relações entre nações (Números 31; Juizes 11). Em alguns casos, Deus usa instrumentos humanos (cf. p. ex.. Números 31; 2 Samuel 4), mas a vingança ainda é dele. 3. Conclusão A partir desse levantamento de textos do AT. Peels conclui que a vingança de Deus é um dos temas mais importantes ao longo de toda a revelação do AT (235-36). Na grande maioria dos textos nqm (c. 85 por cento). Deus é o sujeito (inclusive nas passagens em que Deus usa instrumentos humanos para executar sua vingança). Nesses textos a vingança é retratada com mais freqüência como uma função do papel de Deus como Juiz e Guerreiro divino no contexto da administração da justiça e do combate militar. A metáfora original por trás da atuação de Javé como Juiz e Guerreiro é sua realeza e sua autoridade real. Assim, em última análise, a vingan ça de Deus é sua operação como Rei divino visando implementar seu domínio soberano sobre todos aqueles que aviltam sua majestade profanando sua honra, sua lei ou seu povo. No AT existe uma relação particularmente próxima entre a vingança de Deus e sua alian ça (cf. Lv 26.25). Muitas vezes, a vingança de Deus serve de retribuição punitiva sobre Israel quando o povo transgride a aliança, o que se manifesta na apostasia religiosa e no formalismo combinado com a injustiça social (Dt 32.1 -26; Is 1.59; Jr 5.9). No entanto, também pode aplicarse às nações pagãos que profanam a aliança de Deus tentando afastar Israel de Javé (Números 31) ou procurando arruinar Israel (Dt 32.27-35,41-43; Salmos 79; Ezequiel 25). Apesar dessa ligação entre a vingança e a aliança ocupar um lugar de destaque, é um engano considerar “vin gança” um termo estritamente pactuai, como argumenta Mendenhall (cf. a crítica de Pitard). De acordo com o comentário de Pitard (25): “Fica claro que Mendenhall não é bem-sucedido em sua tentativa de colocar a palavra de Amarna e o termo heb. nqm dentro de um só conjun to geral relativo à aliança”. A vingança possui uma abrangência muito maior. Deus não é rei apenas sobre seu próprio povo; o domínio de Deus é universal e ele reina e julga sobre todas as nações e povos. A vingança de Deus é dirigida não apenas contra aquelas que transgridem ou desprezam sua aliança, mas também contra qualquer um que de algum modo lhe desafie a autoridade ou lhe rejeite a majestade (Salmo 149; Jeremias 46; Mq 5.15). Em resumo, o AT fala da vingança de Deus de várias maneiras (cf. Pccls, 242). Existem diversos motivos para a vingança divina, inclusive a transgressão da aliança, a perversão da justiça, a depreciação da honra de Deus, a opressão de Israel, a perseguição dos servos de Deus e a expansão agressiva do poder político. A vingança divina também tem vários propósitos, inclusive a restauração da aliança, a manutenção da justiça, o exercício da disciplina, o livra mento do povo de Deus e o reconhecimento de Javé pelas nações pagãs. Apesar das diferenças de motivação, objeto, situação e execução da vingança divina, os textos nqm se combinam de modo a retratar essa vingança de maneira a reconhecer Deus como Juiz, Guerreiro e Rei. Peels observa (242) que a vingança de Deus no passado, presente e futuro é colocada à serviço do domínio real de Javé. A vingança de Deus no passado é descrita nos livros históri 1136
Rio
cos do AT: vingança sobre Moabe (Números 31), Amom (Juizes 11), a casa de Acabe (2 Reis 9), etc. As súplicas do livro de Salmos pedem a vingança de Deus no presente. Os livros pro féticos proclamam a vingança de Deus no futuro: o dia da ira virá para Israel e as nações. Essa vingança divina é ressaltada de maneira particular na pregação escatológica dos profetas pois é ela quem prepara o caminho para o reino da paz e que constitui um elemento importante da proclamação da vinda do reino de Deus. É a vingança de Deus que dá esperança à humanidade caída de que no final, a justiça triunfará em um mundo onde a injustiça e a perversidade pros peram. Ela é que dá ao povo de Deus motivos para juntar-se ao salmista e dizer, “Na verdade, há recompensa para o justo; há um Deus, com efeito, que julga a terra” (SI 58.11 [12]). Retribuição: sim (ter satisfação, reembolsar, recompensar, retribuir, fazer as pazes, # 8966) Vingança: gmr (estar no fim, cessar, fracassar, # 1698); -> nqm (vingar, desforrar, vingarse, # 5933) B ib l io g r a f ia
TDNT4:695-728; J. G. Gammie. “The Theology o f Retribution in the Book of Deuteronomy”, CBQ 32, 1970, 1-12; G. A. Herion, “Retribution”, ISBE 4:154-59; K. Koch, “Gibt es ein Vergeltungsdogma im Alten Testament?” ZKT 52, 1955, 1-42; J. K.. Kuntz, “The Retribution Motif in Psalmic Wisdom”, ZAW 89, 1977, 223-33; G. McConville, Grace in the End, 1993; idem, “Deuteronomy”, NBC, 1994; G. E. Mendenhall, “The ‘Vengeange’ of Yahweh”, The Tenth Generation, 1973, 69-104; P. D. Miller, Sin and Judgement in the Prophets, 1982; H. G. L. Peels, The Vengeance o f God, OTS 31,1995; W. T. Pitard, “Amama ekêmu and Hebrew nãqam". Maarav 3/1, 1982, 5-25; G. von Rad, OTT 1, ET, 1962; G. Vos, Biblical Theology, 1948 (reprinted 1975); A. Weiser, The Psalms, OTL, 1962; P. Zerafa, “Retribuition in the Old Testament”, Ang 50, 1973,464-94. J. Robert Vannoy Reverência
# 1593 (gwr II, temer, ter grande receio, ficar amedrontado)
Rim -> # 4000 (kilyâ, rins)
AT 1. Rios no OMA e em Canaã. As terras que fazem _______________________________ fronteira com Canaã são cortadas por rios que servem de força vital para as civilizações que se desenvolvem às suas margens. Em função da grande za que lhes foi conferida pelos rios, o Egito e a Mesopotâmia constituem os pólos do OMA, tendo Canaã como a “terra intermediária” ou “ponte de terra”. Na profecia, esses dois pólos aparecem muitas vezes como objetos da ira de Deus e, algum dia, juntos eles serão seus súdi tos: o reino messiânico fornece circulação livre e desimpedida e verdadeira comunhão entre essas duas potências (Is 19.23; ver também Zc 10.10). No Egito, a cheia do Nilo era um dos fenômenos naturalmente recorrentes mais confi áveis, tão conhecido por todo o OMA a ponto de ser usado em provérbios (Is 23.10; Jr. 46.7; Am 8.8; 9.5). Apesar de as cheias não serem, de modo algum, regulares em termos de altura a cada ano, o período dos patriarcas é apresentado como um tempo que elas eram muito mais garantidas do que a as chuvas na Palestina (Gn 12.10; 13.10). Mesmo nas épocas do ano em que não havia cheias, o rio fornecia água, plantas e vida animal e, como via hidrográfica, era 1137
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usado para o transporte de mercadorias. As cheias traziam nâo apenas água, mas também um lodo rico que cobria a terra nas duas margens. Ezequiel apresenta o melhor exemplo profético de que o julgamento contra o Egito implica julgamento contra o Nilo. Não se trata apenas do Nilo secar (Ez 30.12), mas também cessar a atividade em suas margens. As duas ocorrências de dlh em Ezequiel 32.13 (-> # 1931) indicam que a agitação das águas no Nilo causada pelas pessoas ou animais é característica de uma cultura fluvial saudável: assim o julgamento causará a cessação dessa atividade. Tanto em Ezequiel 29.3-7 quanto em 32.2-8, o julgamento consiste em Faraó, retratado como tannin (-> # 9490) ser removido do Nilo, o que resulta na impotência do monarca, um homem que não influencia o ambiente ao seu redor mais sim, é destruído por ele. (Observação: como no caso de praticamente todos os rios da antigüidade, especialmente daqueles que carregam lodo consigo, o curso do Nilo mudou ao longo dos milênios [por exem plo: até 3 km no local de Mênfis só nos últimos dois mil anos]). Assim como o Nilo, os rios Tigre e Eufrates na Mesopotâmia também tinham suas cheias anuais, apesar de não serem tão abundantes quanto as do Nilo nem beneficiarem tanto a agri cultura (as cheias dos dois rios não ocorriam numa época de plantio). Os dois rios forneciam água e serviam como via de transporte de mercadorias (e, em pelo menos uma ocasião, para a passagem, de uma armada, conforme registrado nos anais de Senaqueribe quando ele navegou em embarcações de fabricação fenícia até o território elamita em 694 a. C.). Reis da antigüi dade construíram novos canais e, quando era considerado estratégico e possível interromper o abastecimento de água de uma cidade, os canais eram desviados. Havia rios que cortavam Nínive (o rio Coser, um afluente do Tigre) e a Babilônia (o rio Eufrates). No caso da Babilônia, porém, trata-se na verdade de duas cidade separadas, cada uma construída de um lado do rio (o relato de Heródoto da captura da Babilônia pelos persas usando como entrada a porta do rio é bastante questionável, apesar de o cerco implicar uma drenagem do fosso e possivelmente do próprio Eufrates através de canais laterais). (Observação: O curso dos dois rios na antigüidade, especialmente do Eufrates com seu conjunto de canais interligados, em vários casos não era o mesmo do que se encontra nos mapas modernos: p. ex., no passado, a cidade de Eridu ficava num braço do Eufrates.) 2. Rios na Transjordânia e em Canaã. Um terreno montanhoso, vales contíguos e a mai quantidade de córregos privaram a Palestina dos rios maiores que depositavam lodo em suas margens como nos casos mencionados acima. Navegava-se pouco pelos rios da Palestina por vários motivos: o pequeno tamanho deles e as águas mais rápidas, variações de profundidade ao longo dos cursos dos rios (e leitos pedregosos) e seu caráter imprevisível durante a estação seca. Os rios e uádis de Canaã e da Transjordânia podem ser divididos geograficamente em três regiões. As terras altas da Transjordânia contribuem com quatro rios perenes que desembocam no Jordão: o larmuque, o Jaboque, o Amom e o Zerede. A segunda região compreende os rios que correm do leste para o Jordão passando pelo declive acentuado do caminho que atravessa a bacia norte-sul que desce em posição perpendicular ao vale do Jordão (Nahal [N.] Tabor e N. Bezeque são exemplos de córregos temporários; N. Harode, um rio alimentado por uma fonte, é perene). Por fim, os rios e uádis dos vales do oeste desembocam no mar Mediterrâneo. O principal rio perene é o larmuque, mas o N. Soreque também atravessa um vale importante, fornecendo uma passagem crucial de Jerusalém para a estrada costeira no sentido leste-oeste. A relevância dos rios para a navegação e a demarcação de fronteiras pode ser vista em duas linhas geograficamente perpendiculares. Em primeiro lugar, as viagens ocorriam ao longo das margens dos rios e pelos uádis. Além de serem uma fonte imediata de abastecimen to de água, esse trânsito em suas margens era um fator crítico para a localização de cidades. Alguns exemplos são: a. a estrada rumo ao interior de Jope até Tel Gerisa, onde o caminho 1138
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encontra a margem do Iarcom e dirige-se para o leste (Dorsey, 61-62) e b. a passagem norte (n. do Carmelo), ou Desfiladeiro Jokneam, para Megido, que durante algum tempo acompa nha o ribeiro Quisom. Em segundo lugar, os rios serviam de fronteiras. Apesar dessa segunda questão não precisar ser ressaltada (costuma-se considerar que o Jaboque era a fronteira norte de Amom, apesar de os amonitas terem expandido seu território o máximo que puderam para o norte do rio; o mesmo se aplica ao Amom e os moabitas), trata-se de um aspecto importante, uma vez que os rios maiores eram, por vezes, difíceis de serem vadeados e, tanto quanto se sabe, não tinham pontes (Dorsey, 35-36). Os desfiladeiros profundos cortados pelos quatro principais afluentes que corriam para o Jordão e para a região do mar Morto vindos das terras altas da Transjordânia (acima) são bons exemplos disso: na Estrada do Rei, criam passagens estreitas que podem ser facilmente defendidas. Ao se aproximar do mar Morto, o Amom não pode se quer ser atravessado em função de seus desfiladeiros intransitáveis que erguem de ambos os lados com altitudes de mais de trezentos metros. 3. Relevância teológica. No que se refere à linguagem da teologia bíblica, os rios c tumam ser usados para metáforas abstratas: um elemento do significado dos rios em geral, ou um hipônimo da categoria “rios” é selecionado e usado para ilustrar um conceito abstrato. O principal exemplo é o conceito de subitaneidade. Os rios temporários e uádis se enchiam rapi damente sempre que o escoamento superficial da chuva era intenso. Por vezes, o próprio ato de encher o uádia de maneira súbita e inesperada era considerado, pelo ponto de vista proféti co, um livramento divino (p. ex., 2Rs 3.16-20). Porém, para a linguagem da teologia, a cheia normal e muitas vezes súbita dos uádis fornecia uma metáfora para qualquer situação inversa ou repentina (p. ex., a falsidade dos amigos [Jó 6.15] ou a volta dos exilados [SI 126.4]). O primeiro contexto de uso teológico em termos de rios específicos é o da criação, a saber, Gênesis 2.10-14. O rio único que se divide em quatro é uma criação especial com o obje tivo de beneficiar o ser humano. Enquanto a terra em gral é regada por uma fonte que traz água do subsolo (o sentido mais provável de ed no v. 6; para esse conceito como um método secun dário de irrigação, ver Stordalen, 12-15), o jardim era regado por um rio propriamente dito (v. 10). Assim como o rio principal contribui para a riqueza do jardim, seus tributários contribuem para a riqueza das terras mais afastadas, o que é representado por ouro e pedras preciosas (ver comentários; assim como a árvore da vida volta a aparecer em Apocalipse 22, o rio de pedras preciosas também volta a ser mencionado [22.1 e 21.18-21, respectivamente]). Assim, desde as primeiras páginas do cânon, os rios constituem uma das fontes necessárias de vida e uma das origens preferidas de prosperidade. Os quatro rios (“braços”, v. 10) podem muito bem ser os dois rios da Mesopotâmia juntamente com Pison e Giom como mares (Neiman, 321-28, ver também Gispen, 115-24, para Risom como toda a Arábia). Se esse é o caso, todas as principais massas de água eram cobertas e os homens podiam se beneficiar desses “braços”, mas depois da queda, perderam o acesso às suas nascentes. (Para a idéia menos provável de contradição e absurdo intencionais na descrição dos rios a fim de ensinar o leitor que o Éden não fica loca lizado em lugar algum, ver Radday.) Esse sentido de rios como um símbolo de bênçãos pode ser observado ao longo de toda a métrica heb. (p. ex., SI 46.4 [5]; 65.9 [10]). Depois do uso específico dos rios como um sinal de bênção na criação, o segundo uso teológico mais importante é do Nilo e do Eufrates, que são empregados como metáforas para suas respectivas civilizações. Pode-se subdividir esse emprego em três áreas: a. em momentos históricos de crise, um único rio representa uma única nação com a qual Israel encontra-se em conflito (Is 8.7-8; 11.15; 19.5-8; Ezequiel 31); b. assim, esses rios muitas vezes representam não apenas suas respectivas nações mas todas as nações pagãs e c. os dois rios mencionados 1139
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em conjunto, podem ser usados para os dois pólos dos OMA, considerados muitas vezes como o mundo todo. Um exemplo dessa terceira área, uma prática crucial para a compreensão das fronteiras patriarcais prometidas a Abraão (Gn 15.18) é não concentrar-se na localização exata mas na importância metafórica dos rios: os descendentes de Abraão herdariam terras não apenas até, mas dentro do cerne dos dois pólos do OMA, ou seja, herdariam o mundo. O terceiro contexto para um uso teológico dos rios é a era messiânica, ou a nova cria ção do mundo. Em retratos messiânicos e idealistas, os rios em geral (J1 3.18), bem como o rio que corre de Jerusalém para a região do mar Morto (Ez 47.1-12; Zc 14.8) servem de imagens de renovação e abundância. Canal, rio, córrego, torrente: -> nãhãr (rio, # 5643); -> selah II (canal, rego, # 8940); -> Rio: Teologia B ib l io g r a f ia
TDNT 6:595-608; D. Dorsey, The Roads and Highways o f Ancient Israel, 1991; W. Gispen, “Genesis 2:10-14”, Studia Biblica et Semitica, 1966, 115-24; D. Neiman, “Gihon and Pishon: Mytological Antecedents of the Two Enigmatic Rivers o f Eden”, Proceedings o f the Sixth World Congress ofJewish Studies, 1977, 321-28; Y. Radday, “The Four Rivers o f Paradise”, HS 23, 1982, 23-31; T. Stordalen, “Man, Soil, Garden: Basic Plot in Genesis 2-3 Reconsidered ",JSO T 53, 1992,3-26. Ronald L. Giese. Jr. Riquezas -> # 6947 ( ‘sr, ser rico, enriquecer, tomar rico) Riso -> # 8471 (shq, rir, zombar, alegrar-se, celebrar, dançar)
Roboão
Roboão (QVDrtl [r^hab ‘ãm], # 8154).
AT 1. Roboão foi o filho de Salomão que o sucedeu no trono de Israel e cujas políticas opressoras levaram à cisão do reino. Iniciou seu reinado aos 41 anos de idade e reinou durante dezessete anos em Jerusalém, 930-913 a. C., como governante do pequeno reino do Sul, Judá (lR s 14.21; 2Cr 12.13 [datas segundo Thiele, Mysterious Numbers o f the Hebrew Kings, 3a ed.]). (Numa expansão de acordo com lRs 12.24, o G antigo afirma que Roboão tinha dezes seis anos de idade e reinou apenas doze anos [12.24a], mas não há evidências disso em outros textos; o próprio G antigo concorda com o TM no que se refere à idade de Roboão quando subiu ao trono [aos41 anos] e à duração do seu reinado [17 anos] em lRs 14.21; 2Cr 12.13). A história de Roboão encontra-se em 1 Reis 12.1-24; 14.21-31; 2 Crônicas 10— 12. A mãe de Roboão era Naamá, uma amonita (lR s 14.21, 31). Assim como seu pai, Ro boão teve muitas esposas e concubinas. O texto cita o nome de duas de suas dezoito esposas: Maalate e Maaca, sendo que as duas eram primas dele (da parte de filhos de Davi). Teve tam bém 60 concubinas, 28 filhos e 60 filhas (2Cr 11.18-21). O nome de Roboão significa “o povo é farto” ou o “povo é amplo” (cf. Albright; Noth), um trocadilho revelador com o seu nome aparece no Ecli 47.23: “Salomão... deixou depois de si um de seus filhos, farto em insensatez e falto em sabedoria”. Quando Salomão, pai de Roboão, faleceu, o povo de Israel foi procurar o novo rei e pediu-lhe que aliviasse a carga tributária e de serviços que Salomão havia imposto (1 Rs 12.4; 1140
Roboão
cf. 4.22-23 [5.2-3], 26-28 [6-8]; 11.25-29). Roboão seguiu as orientações de seus conselheiros mais jovens e imprudentes, insultando o povo e prometendo aumentar ainda mais a carga (12.615). Em decorrência disso, foi rejeitado por todo o povo, com exceção de Judá (12.16-20), e o reino se dividiu em dois, apesar de as sementes dessa cisão terem sido plantadas pela aposta sia do pai de Roboão. Salomão (cap. 11, esp. vv. 31-39). Roboão tentou reunir um exército às pressas e fazer frente àqueles que o rejeitaram, mas o profeta Semaías o advertiu para que não empreendesse essa campanha e o rei desistiu dela (12.21-24). 2. O reinado de Roboão foi perverso e, durante seu governo, criou novos padrões iniqüidade ( IRs 14.21-24). A terra foi invadida e saqueada por Sisaque (Chechonq I), rei do Egito, mas Roboão foi poupado (14.25-29). Ao longo de seu reinado, as guerras entre os reinos do Norte e do Sul foram contínuas (14.30). (-> Judá: História) Os relatos em 2 Crônicas 10— 12 são muito semelhantes aos de 1 Reis, exceto pelo fato de que 2 Crônicas acrescenta um volume considerável de material, com destaque principal mente para 11.5-23, em que é apresentada a longa lista de fortificações de Roboão (11.5-12) e no qual lemos que vários dos sacerdotes e levitas fiéis do Norte afluíram para o Sul diante da apostasia de Jeroboão (apesar da apostasia do próprio Roboão). No entanto, isso, apesar de ter durado pouco, representou algo de positivo para o reino (11.13-17). O cronista nos diz que Roboão tinha muitas esposas e concubinas, como foi observado acima, e que agiu com sabedo ria durante parte de sua administração (11.18-23). 2 Crônicas 12.3-8 acrescenta mais detalhes sobre a invasão de Sisaque. No final, porém, a avaliação que o cronista apresenta de Roboão é a mesma que se encontra em 1 Reis: “Fez ele o que era mau, porquanto não dispôs o coração para buscar ao Senhor” (2Cr 12.14). Em termos religiosos, Roboão não exerceu a mesma influência negativa e por tanto tempo quanto seu correlato do Norte, o rei Jeroboão. Ou seja. Roboão não foi um grande mo delo de perversidade, com o qual a maioria dos reis posteriores seria comparada. Enquanto os reis de Israel que seguiram Jeroboão foram maus, sendo quinze dos dezenove comparados es pecificamente a ele quanto à perversidade, a maldade de Roboão não foi tão influente a ponto de ele servir de modelo. Dos dezenove monarcas que vieram depois dele, oito foram bons reis. Dos outros onze, somente seu filho Abias é comparado especificamente a ele. Os outros reis de Judá são igualados em termos de perversidade aos reis de Israel (Jeorão, Acazias, Acaz), a ninguém (Atalia), aos vizinhos pagãos de Judá (Manassés), a Manassés (Amom), ou, de modo mais geral, ao(s) “pai(s)” (Jeoacaz, Jeoaquim, Joaquim, Zedequias). NT Depois de sua morte e da ascensão de seu filho ao trono, Roboão é mencionado na Bíblia de passagem na genealogia de Jesus (Mt 1.7). B ib l io g r a f ia
W. F. Albright, “The Amorite Form of the Name Hammurabi”, AJSL 38, 1992, 140; R. Case, II, “Rehoboam: A Study in Failed Leadership”, Presbyterion 14, 1988, 55-77; D. Evans, “Rehoboam’s Advisors at Shechem and Political Institutions in Israel and Sumer”, JNES 25, 1966, 273-79; A. Frisch, “Shemaiah the Prophet Versus King Rehoboam: Two Opposed Interpretations o f the Schism”, VT 38, 1988, 466-68; G. N. Knoppers, “Reboboam in Chronicles: Villain or Victim?” JBL 109, 1990, 423-40; M. Noth, Die Israelitische Personennamen im Rahmen der gemeinsemitischen Namengebung, 1966 [1928 original], 193, n. 4; M. Weinfeld, “The Counsel o f the ‘Elders’ to Rehoboam and Its Implications”, Maarav 3.1, 1982, 27-53. David M. Howard. Jr. 1141
Rute: Teologia de
Rocha
#6152 (sela', rocha)
Rolagem -> # 1670 (gll I, rolar, rolar embora, escorrer, chafiirdar) Rosto -> # 7156 (pãnim, rosto, visível, ataque) Roubo
# 1608 (gzl, roubar)
Roupa (traje)
# 955 (beged II, roupa, traje)
Roupas, uso de -> # 4252 (//js, colocar, vestir, usar) Rugido -> # 8616 (í 7» II, rugir) Ruína -> # 2990 (hãrêb, ser/estar seco ou desolado; arruinado) Rumor -> # 1804 (dibhá, rumor)
Rute: Teologia de
Rute ( m i [rá/], NP, # 8134) é a nora moabita de Elimeleque e Noemi, bisavó de Davi e heroína do livro da
Bíblia que leva o seu nome. Fontes extrabíblicas não fornecem nenhum indício nem do nome e nem da figura bíblica de Rute. Textos mesopotâmios atestam o nome ru-ut-um (século XVII a. C.), mas é duvidoso que tenha alguma ligação com o nome bíblico. O subs. ryt (um objeto de satisfação, espetácu lo?) ocorre na Pedra Moabita, mas não serve de esclarecimento para o nome bíblico pois seu radical é incerto (rwy ou r ’>’?). O que se sabe sobre Rute é derivado exclusivamente do livro de Rute no AT. Feliz mente, o livro proporciona um rico filão de teologia a ser garimpado. O significado do nome continua incerto, mas Rute provavelmente quer dizer refrigério, consolo (rwh, encharcar, irri gar, refrescar [->#8115]). Se esse é o caso, é possível que o nome simbolize o papel de Rute como aquela que ofereceu refrigério/consolo a Noemi em meio a várias tragédias (ver 4.15). O subs. rvt não possui uma letra gutural e, uma vez que letras guturais não costumam formar contrações no heb., outros dois significados derivados de radicais com guturais parecem pouco prováveis: amizade (ou seja, a contração de r6 'üt, amiga) ou vista (contração de te ‘út a partir de r ’h, ver; -> # 8011).
A. Estrutura Literária 1. A história. Em termos literais ou em forma literária, o livro é um conto que nar acontecimentos envolvendo antepassados de Davi. Num conjunto de ocorrências lamentáveis, enquanto estavam vivendo temporariamente em Moabe por causa de uma escassez de alimen tos na região de Belém (1.1-2), Elimeleque e seus dois filhos morrem, deixando sua esposa Noemi sozinha (vv. 3, 5). Quando a situação em Belém é normalizada, Noemi volta para lá acompanhada de Rute, a viúva moabita de um de os filhos (vv. 6-22). De modo impressionante, num período de três semanas a sorte das viúvas sofre uma reviravolta total. Boaz, um cidadão importante e parente de Elimeque, faz amizade com Rute e lhes provê alimento em abundân cia (2.1-23). Num encontro secreto, Rute propõe casar-se com Boaz (3.1-9), uma vez que ele 1142
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é um parente resgatador (gõ'êl). De acordo com o costume, o primogênito do sexo masculino do casal daria continuidade à linhagem da família de Noemi e herdaria suas propriedades. No dia seguinte, Boaz toma Rute para si como sua esposa e ainda se apropria das terras de seus antepassados por meio de negociações com outro parente com direitos prioritários sobre ambos (3.10— 4.12; cf. 3.10-18). Rute dá à luz Obede, que se toma o herdeiro legal de Noemi (4.1317a) e — surpreendentemente! — o antepassado de Davi (4.17b-22). 2. Características literárias. O livro de Rute é uma obra-prima literária e um dos m tivos para a popularidade e caráter influente do livro é a perícia de seu escritor. A estrutura da história reflete o uso consciente de inclusões e paralelismos. Rute 1.6 e 22 formam uma inclu são ao empregar uma palavra-chave (swb, voltar), abrindo e fechando um parêntese na seção temática sobre a volta de Noemi a Belém (cf. 1.7-8, 10-11, et al.). As cenas dos caps. 2 e 3 são claramente paralelas entre si e tem como interposição os encontros cruciais de Rute com Boaz (2.3-17; 3.6-15) intercalados com diálogos entre Rute e Noemi (2.2, 18-23; 3.1-5, 16-18). O paralelismo dos caps. 1 e 4 concentra-se mais no desenvolvimento de temas do que nas estruturas das cenas. Assim como o cap. 1 tratou da inanidade de Noemi, o cap. 4 trata de sua restauração à plenitude. Privada de marido e filhos (1.3,5,21), Noemi comemora um novo marido (ou seja, o casamento de Boaz com Rute) e seu novo filho, o primogênito de Rute e Boaz (4.13, 16; cf. 3.17). Além disso, assim como as mulheres comentam sobre o triste re gresso de Noemi de Moabe (1.19), também comentam sobre a alegre bênção de seu herdeiro recém-nascido (4.14, 17). A genealogia final de Perez (4.18-22) acrescenta uma espécie de apêndice à narrativa principal. O mais impressionante é que, ao contrário da maioria das narrativas do AT, no livro de Rute essa genealogia aparece no final e não no começo da história (cf. Gn 5.1-32; 10.1-32; 36.1-40; et al.). Em decorrência desse recurso, a história é colocada no contexto mais amplo da orientação providencial oferecida por Deus a Israel desde os patriarcas (ou seja, Judá, v. 18) até os reis (ou seja, Davi, v. 22). Assim a história passa a simbolizar um microcosmo do plano soberano e mais amplo de Deus para Israel. O escritor é um mestre no uso sutil das palavras. No cap. 3, termos com possíveis co notações sexuais (p. e x .,y d \ conhecer [-> # 3359], vv. 3-4; Skb, deitar-se [-> # 8886], vv. 4, 7-8) criam um ambiente sensual para a cena da eira. Mais importante ainda, é a repetição de palavras-chave que entretecem a história e desenvolvem seus temas principais. O reaparecimento de yeled, criança, indica que o recém-nascido Obede (“menino”, 4 .16) substitui os outros dois “filhos” que Noemi havia perdido (1.5; cf. menühâ / mãnôah e kãnãp, ver abaixo). O escritor também é um mestre das surpresas, introduzindo várias complicações inespe radas em momentos críticos da narrativa. Assim, quando os leitores pensam que Rute e Boaz vão se casar, Boaz surpreende ao mencionar os direitos de casamento de um outro parente (3.12). Além disso, o cap. 3 leva o leitor a esperar que o cap. 4 comece com uma discussão na porta da cidade sobre o desejo de Rute de se casar. Em vez disso, de modo inesperado, Boaz começa a tratar da questão da propriedade de Eimeleque (4.3) e só mais tarde toca no assunto da situação de Rute (v. 5). Nesses dois casos, o efeito de tais surpresas é magistral — aumenta a tensão da história ao adiar sua resolução no exato momento em que o final feliz parece ser iminente. B. Temas Teológicos A primeira vista, o livro de Rute dá a impressão de ser um tanto secular. Deus parece quase ausente dos seus acontecimento, atuando diretamente apenas em duas ocasiões (1.6; 4.13). Essa impressão, leva alguns a questionar se o livro possui, de fato, alguma teologia (Sasson, 1143
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Ruth, 249). É justificado, porém, que a maioria dos estudiosos encontre discernimentos teoló gicos significativos escondidos por trás da fachada supostamente “secular" do livro. 1. A concepção teológica. O livro vê o Senhor como o Deus da aliança de Israel. Os personagens humanos clamam repetidamente a ele usando seu nome na aliança — Javé — pe dindo que responda orações (1.8-9; 4.11-12), endosse juramentos (1.17; 3.13) e conceda bênçãos (2.4, 20; 3.10). Até mesmo as acusações amarguradas de Noemi sobre a falta de fidelidade de Deus (1.21) partem claramente do pressuposto de que são obrigações pactuais não cumpridas. Posteriormente, Javé recebe o crédito que lhe é devido por sua fidelidade em mudar a sorte de Noemi (4.14). Como Deus da aliança, Javé supre as necessidades de viúvas vulneráveis como Noemi e Rute; sob as asas do “Senhor. Deus de Israel”, Rute encontra refúgio (2.12). De fato, um dos temas principais do livro acompanha a restauração da sorte de Noemi por Deus, pas sando da inanidade (rêqãm, vazio, 1.21; 3.17) à plenitude (4.14; cf. melê'â, cheio, 1.21). Ainda que de modo mais sutil, o livro considera Javé o soberano cósmico do universo. Em sua queixa, Noemi invoca Javé como Shadai (“Todo-Poderoso”, 1.20-21), um título do AT para Deus como governante sobre a criação (p. ex., Gn 49.25; Jó 37.23). É como Todo-Poderoso que Javé dirige a ordem moral do mundo, recompensando os bons e castigando os maus (Jó 8.3-6). Uma vez que Rute é moabita (1.22; 2.2,6,21), uma não-israelita, é a Javé como soberano cósmico que Boaz pede para recompensar Rute com conseqüências proporcionais aos seus atos (2.12). A mesma pressuposição encontra-se por trás da oração de Noemi para que Javé recom pense sua nora por sua dedicação leal (hesed; 1.8-9; ver Hubbard, “Ganzheitsdenken”). 2. Atividade divina e humana. Duas observações simples revelam a perspetiva teológica incomum do livro quanto ao relacionamento de Deus com o mundo. a. No final, Deus recebe todo o crédito por prover um herdeiro para Noemi (4.14) e, no entanto, ao longo do caminho, faz relativamente pouca coisa. E verdade que seus dois atos de intervenção — alimento para Judá (1.6) e a gravidez de Rute (4.13) — constituem um inclusão teológica ao redor do livro. Afirmam quietamente a orientação soberana de Deus sobre tudo o que acontece. Mas na ver dade, são os personagens humanos — e não o próprio Deus — que fazem as demais coisas importantes — respigar o cereal, fazer amizades, planejar um casamento, realizar as negocia ções legais, etc. b. O autor tem o cuidado de manter viva ao longo de todo o livro a consciência da pr sença de Deus. Por um lado, ele faz os personagens humanos proferirem muitas vezes o nome de Javé (1.8-9; 2.12; 4.14; et al.). Por outro lado, em duas partes críticas, parece intencionalmente minimizar o papel da orientação divina. Usando de palavras escolhidas com cuidado, diz que Rute encontrou o campo de Boaz por acaso e não pela providência divina (2.3). Mais adiante, relata que Obede é o avô de Davi (4.17b), mas ao contrário de vários escritores bíblicos, evita outra vez de dar crédito à providência divina. Ao que parece, essa minimização da atividade direta de Deus constitui um recurso literário — um tipo de “ênfase por subestimação”. Ao mi nimizar o envolvimento divino, o escritor leva o leitor a ficar ainda mais consciente dele. Por trás dessas duas observações encontram-se convicções teológicas importantes. O livro afirma claramente a soberania contínua e total de Javé e, no entanto, considera que essa soberania fica nos bastidores dos acontecimentos. Além disso, pressupõe uma visão incomum da atividade humana — que nesse caso Deus trabalha nas ações dos personagens humanos e por meio delas, em outras palavras. Deus intervém de dentro da história e não de fora dela. A profunda consciência do livro dessa soberania deixa implícito que a providência divina conduz Rute até o campo de Boaz (2.3), inspira o plano arriscado de Noemi (3.1-4), sincroniza a che gada do parente anônimo no tribunal (4.1-2) e dirige as negociações astutas de Boaz (4.1-8). 1144
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Uma repetição de palavras cheia de significado ilustra a concepção teológica do livro, de acordo com a qual Deus opera por intermédio dos homens. Em 2.12, Boaz ora a Javé — sob cujas asas (kãnãp) Rute encontrou refúgio — pedindo que o Senhor recompense Rute por sua dedicação à Noemi. Em 3.9, Rute pede a Boaz que estenda a sua capa {kãnãp) sobre ela — ou seja, que se case com ela (cf. Ez 16.8). Na verdade, as palavras de Rute são um pedido para que Boaz responda a oração que ele próprio havia feito antes — um pedido para que sua “asa” protetora conjugal seja um instrumento da “asa” protetora divina de Javé. Em resumo, o livro ensina que, às vezes, o controle soberano de Deus é exercido de modo secreto, envolto por acontecimentos conduzidos pelos homens. 3. A vida de hesed. Os personagens de Rute e Boaz servem de modelo para um dos mas do livro, o estilo de vida de hesed (lealdade, devoção, bondade) como sendo agradável a Deus. De acordo com o livro, hesed exige um compromisso radical e leal com outros. Rute dá o exemplo ficando ao lado de Noemi depois da morte de seu marido (1.8-9), cortando todos os laços com seu passado moabita (1.16-17; 2.11) e oferecendo-se para dar à luz um herdeiro para Noemi em vez de casar-se por amor ou por dinheiro (3.10). Boaz é exemplar quando, ao contrário do parente anônimo, mostra-se disposto a assumir o dever oneroso de parente-resgatador para Noemi e Rute (4.1-8). Quando necessário, hesed também envolve correr grandes riscos. Boaz não tem garan tia alguma de que suas negociações legais serão bem-sucedidas, ou de que o público aceitará sua iniciativa com respeito a Rute. Uma terrível vergonha pública assombrava a incursão de Rute no campo de Boaz (cap. 2) e a conversa secreta dos dois na eira no meio da noite (cap. 3). No entanto, ambos eram pessoas de valor (havil 2.1; 3 .11), pessoas dedicadas, a qualquer custo, aos preceitos de hesed. Ao mesmo tempo, apesar de serem acertivos, seguiram outra prescrição de hesed - pro ceder do modo apropriado. No campo de Boaz, Rute permaneceu dentro dos limites do costume de respiga (talvez expandindo esses limites ao pedir para ter acesso ao cereal que normalmen te nâo ficava à disposição dos respigadores; 2.7-9). Da mesma forma, ainda que sem dúvida tivesse sido tentado pela sexualidade de Rute, Boaz não se aproveitou dela na eira. Apesar de correr o risco de perdê-la para outro homem, ele seguiu todo o procedimento correto para pro videnciar o casamento. Javé é o paradigma perfeito e supremo de hesed. Rute e Boaz demonstram que ele re compensa generosamente aqueles que se dispõe a viver com hesed. Por fim, Boaz toma Rute como esposa e vem a ser lembrado como bisavô de Davi (4.13, 17, 21). Noemi e Boaz oram para que Javé recompense Rute por sua lealdade (1.8-9; 2.12; cf. 3.10) e ele responde — com grande generosidade. Javé repõe suas perdas anteriores — um novo marido, um lar perma nente (rrfinúhâ 1.9; mãnôah 3.1), um outro povo e um novo Deus ( 1.16; cf. 4.11-12). Por cer to, um dos temas secundários do livro acompanha a ascensão de Rute da condição de intrusa naquela sociedade cidadão israelita. Estrangeiros como Rute que aceitam os ideais de Israel, são bem-vindos. O fato de que Israel se lembraria dela, uma imigrante moabita, para sempre como a avó heróica de Davi é uma bonificação inesperada da generosidade divina. Javé recompensa hesed e sua recompensa pode, de fato, superar as expectativas. Essa ênfase serve para apresentar o tema final conclusivo do livro: a providência divina conduziu a ascensão de Davi ao poder e, portanto, legitimiza o seu direito de reinar. Rute é uma das cinco mulheres incluídas na genea logia de Jesus (Mt 1.5). Em termos teológicos, é possível que a menção de seu nome seja uma indicação de que, assim como Israel recebeu Rute, o reino de Deus também recebe de braços abertos os estrangeiros que aceitam pessoalmente a mensagem do evangelho (cf. At 1.8). 1145
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C. Contexto Canônico A literatura judaica pós-bíbiica não faz menção alguma da Rute da Bíblia, mas o livro gerou um Trg completo em aramaico. Fragmentos de três manuscritos do livro foram encon trados em Qumran (2QRutha, 2QRuthb, 4QRutha, 4QRuthb). B ib l io g r a f ia
H. Bruppacher, “Die Bedeutung des Namens Ruth”, TZ 12, 1966, 122-28; E. Campbell, Jr., Ruth, AB, 1975; M. Gow, The Book o f Ruth: Its Structure, Theme and Purpose, 1992, 97-112; R. Hals, The Theology o f the Book o f Ruth, 1969; R. Hubbard, Jr., The Book o f Ruth, NICOT, 1988;_____ , “Theological Reflections on Naomi’s Shrewdness”, TB 40, 1989, 283-92; W. Prinsloo, “The Theology o f the Book o f Ruth”, VT 30, 1980, 330-41; J. Sasson, “Divine Providence or Human Plan?” Int 30, 1976,415-19;______ , Ruth: A New Translation with a Philological Commentary and a Formalist-Folklorist Interpretation, 19892. Robert L. Hubbard, Jr.
Sábado (nau? [sabbãt\, subs., sábado [# 8701]; [miSbãt], cessação [# 5404]; |Íra tP [Sabbãtôn], dia de descanso; banquete de sábado [# 8702]). Relação controversa com o vb. Sbt, q. parar, parar de trabalhar, tirar folga; ni. ser levado a parar; hi. remover, fazer descansar (# 8697). Sábado
OMA Apesar de haver um cognato no aram., sir. Sabbttã', é pouco provável que o subs. heb. Sabbãt (consoante do meio dobrada) possa ser derivado do termo acad. Sablpattu para o “déci mo quinto dia/dia de lua cheia”, em função da última consoante dobrada desse termo. Também não se sabe ao certo se é possível que haja uma ligação entre Sabbãt e o acad. sétimo, Sibbitim (ambos formas fem.). O heb. para sete é Seba' e até o agora não foi apresentada nenhuma expli cação convincente para o fato de as consoantes finais terem mudado. Apesar de as evidências comparativas do OMA não terem levado a nenhuma conclusão e das especulações etimológicas não terem dado resultado, divisões cronológicas sétuplas podem ser encontradas em textos ugar.: sete anos (ciclo Dnl); sete dias (lenda Krt). Isso não implica uma cronologia universal de divisão sétupla no OMA, mas indica uma certa tendência, qualquer que seja o motivo, de se usar uma divisão sétupla (Kapelrud, 494-99). Numa inscrição heb. antiga, o Óstraco de YabnehYam (datado do século VII a. C.), as linhas 5-6 contém a oração IpnySbt. Apesar dessa oração ter sido traduzida como “antes do sábado”, não se sabe ao certo se se refere, de fato, ao sábado (Delekat, 455; Davies. 491). AT 1. Uso. O subs. sabbãt é usado 104x no AT; os livros com a maior freqüência de uso são: Levítico 24x; Ezequiel 15x; Êxodo 14x; Neemias 14x; 1—2 Crônicas 8x; Isaías 7x; Jeremias 7x; 2 Reis 5x; Números 3x; Deuteronômio 3x. É empregado uma vez em Salmos, Lamenta ções, Oséias e Amós. Essas estatísticas indicam um uso muito mais freqüente nos livros do AT nos quais predomina uma influência sacerdotal e também mostram sua ausência na literatura de sabedoria, em que não se faz referência direta alguma ao sábado. Sabbãtôn é um subs. denom. e é provável que o sufixo —ôn indique um significado abstrato, “repouso” (GK.C 86s, 240). Essa derivação de Sabbãt designa o sábado semanal (Êx 16.23; 31.15; 35.2; Lv 23.3), o dia da expiação (Lv 16.31; 23.32), o ano sabático (Lv 25.4-5), o dia de descanso solene comemorado com o toque de trombetas (Lv 23.24) e o primeiro e oi tavo dias da festa de Sucote (Lv 23.39). 1146
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O prefixo m é usado para modificar o significado do radical sbt de modo a formar um subst. com sentido abstrato, misbãt, que ocorre somente em Lamentações 1.7 (1BHS, 90). Esse hapleg. costuma ser emendado pelos comentaristas, mas uma vez que é relacionado a sbt, uma tradução como “cessação” ou “destruição” também se encaixa no contexto da Jerusalém des truída (Hillers, 70). 2. Quando o sábado era observado? Até hoje, nenhuma hipótese astrológica, menológica, sociológica, etimológica ou cultuai obteve o consenso dos estudiosos (ABD 5:851). a. O fato de o sábado ser mencionado juntamente com a lua nova em vários textos ante riores ao exílio (2Rs 4.23; Is 1.13; Os 2.11 [13]; Am 8.5) levou à suposição de que o sábado era um resquício de um culto antigo à lua (essa teoria foi proposta pela primeira vez por Meinhold em 1905 e mais recentemente por Robinson em 1988). Há semelhanças importantes entre o sá bado e a luz nova: nesses dois dias, era habitual visitar um homem santo (“de Deus”, 2Rs 4.22, 23) e tanto os negócios quanto o comércio eram interrompidos (Am 8.5). Esses dias de lua cheia ou luanova eram, porém, considerados agourentos e não há nenhuma argumentação convincente sobre como ou por quê o sábado se desenvolveu de modo independente do ciclo lunar. b. Várias culturas identificam certos dias da semana para uma determinada forma de trabalho e outros para a cessação do trabalho. Os romanos, por exemplo, escolhiam os dias de mercado como seus dias de descanso e o sábado como um dia antigo de mercado foi apresen tado como uma teoria para explicar o desenvolvimento original do sábado (cf. Jenni). Até o momento, essa hipótese interessante ainda não foi comprovada com referência ao sábado com um/o dia de descanso no contexto da cultura e religião de Israel. c. Foi observado anteriormente que períodos de sete dias eram conhecidos por todo o OMA, mas não há nenhum caso claro de um descanso semelhante no sétimo dia em outra cultura fora de Israel. Eichrodt (132) afirma de modo não qualificado: “Assim, mesmo que o nome sábado não seja israelita, aquilo que ele denota só pode ser encontrado em Israel”. É extremamente problemático definir se o sétimo dia sempre foi chamado de sábado em Is rael. Um fato significativo é que algumas das referências mais antigas ao dia de descanso (Ex 23.12; 31.17; 34.21) não usam o subs., mas sim o vb. sbt (Andreasen, 121). Isso pode indicar um tempo na história religiosa de Israel em que o sábado não era usado como uma referência ao sétimo dia, apesar de ser possível que a prática do descanso no sétimo dia já existisse. De qualquer modo, o fato é que as duas versões do Decálogo deixam bem claro que o sábado é o sétimo dia (Êx 20.10; Dt 5.13). 3. Por que o sábado era observado? Nessa seção, nos concentraremos em dois argu mentos apresentados para o quarto mandamento do Decálogo (Êxodo 20 e Deuteronômio 5) e para o sábado dentro do contexto teológico da aliança (Êxodo 31). A narrativa em Êxodo 16 sobre a coleta de maná também deve ser mencionada com esse respeito pois fornece mais uma etiologia (além da narrativa da criação em Gênesis 1) para a identificação do sétimo dia com o sábado (£7 14:558). a. Em Êxodo 20.11, o sábado é motivado pelos atos criadores de Deus, que descansou sétimo dia depois de fazer os céus e a terra. O quarto mandamento em Êxodo 20 é associado ao relato da criação em Gênesis 1—2.4a , que chega à sua conclusão no sétimo dia como o dia de descanso para o Criador (Zimmerli, 126). Essa ligação entre o sábado e a criação não indica, de modo algum, que existe algum tipo de ordem divina de criação no qual o trabalho e o descan so se alternam. Alguns estudiosos entendem a narrativa da criação em Gênesis 1—2.4a dentro do contexto turbulento de incerteza teológica durante e depois do exílio, quando as promessas de terra e reino davídico não pareciam mais se aplicar a Israel — um período durante o qual a ligação teológica entre a criação e o sábado toma-se ainda mais significativa (Schmidt, 92). 1147
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De acordo com Childs (70): “Israel dá testemunho de que Deus criou o mundo ao separar esse dia como sendo especial”. Para uma concepção do sábado com relação à criação, ver W. A. VanGemeren, The Progress o f Redemption, 46-58. b. De acordo com Deuteronômio 5.15. o sábado tem como fundamento a redenção de Israel de seu tempo como escravos no Egito. O sábado traz à memória a redenção de Israel por Deus, e contempla os escravos no dia de descanso. “Desse modo, os descendentes daqueles que Javé libertou manterão seus olhos abertos para os que estão sobrecarregados pela labuta ao lado deles” (Zimmerii, 126). Dentro de seu contexto deut., o quarto mandamento é de im portância social crucial pois a ordem se aplica à toda a humanidade (os livres e os escravos) e até mesmo aos animais (Vriezen, 396). A estrutura literária atual do Decálogo em Deutero nômio indica uma posição central relevante significativa para o quarto mandamento e a ênfa se teológica sobre a justiça social ao se guardar o sábado é ressaltada pela preocupação geral com as relações sociais no livro de Deuteronômio (Miller, 83-85). Essas duas motivações para o sábado no Decálogo devem ser compreendidas dentro de uma ligação muito próxima pois “a criação e a salvação constituem dois aspectos dc uma só realidade teológica” (Childs, 70). Qualquer reflexão teológica sobre o sábado deve promover um equilíbrio entre a ênfase sobre a questão social e a história da salvação em Deuteronômio 5 e o enfoque teológico teocêntrico e referente à criação em Êxodo 20 (Preuss, 254-55). (-> Decálogo: Teologia) c. O motivo para se guardar o sábado é ainda mais ampliado quando se torna um sinal da aliança e de Israel ser separado como um povo especial (Êx 31.13, 16-17; Ez 20.12, 20). A observância do sábado e a circuncisão tomaram-se uma confissão de status e as duas eram consi deradas “sinais da aliança” (Von Rad, 83-84). As profecias em Isaías 56.2-7 e 58.13-14 destacam a observância do sábado como um mandamento extremamente importante e também indicam sua crescente relevância teológica. O sábado serv ia como uma lembrança semanal da aliança com Deus e era usado para calcular as datas dos festivais religiosos judaicos (Lv 23.1-42). d. O sábado como um sinal da aliança vai além da mera abstenção de atividades pro fanas e revela um conceito novo de tempo como sendo sagrado, algo peculiarmente israelita (McKenzie, 80). Esse conceito de tempo sagrado se reflete no uso de sabbãtôn como um para digma para os dias de festas (Êx 31.15; 35.2; Lv 16.31; 23.3; 25.4-6). Apesar de o sábado não desempenhar um papel sacrificial importante no culto, é chamado muitas vezes de dia santo (Êx 16.23; 31.14-15; 35.2) e é santificado por Deus e Israel (Gn 2.3; Êx 31.13; Lv 23.2; 25.10). Jenson (195) sugere que essa concepção de santidade não depende de atos ou pessoas ligados ao culto, nem de um lugar sagrado como o tabemáculo (Êx 31.12-17). O caráter geral do sába do chama a atenção para a presença de Deus no meio de seu povo como um todo e não apenas no meio dos sacerdotes ou nos santuários. Assim, a santidade do sábado tem suas raízes na co memoração jubilosa de Deus como criador e redentor no passado e na experiência da presença de Deus no descanso do sétimo dia como um sinal da aliança no presente (ABD 5:852). Esse usufruto do sábado por Israel como um todo se reflete no perdão das dívidas e libertação dos escravos no ano sabático e no ano de jubileu (Lv 25.10; Dt 15.1-11). 4. De que maneira o sábado era observado? Deve-se usar de cautela na interpretaç teológica de algumas das estipulações mais específicas do AT sobra a observância do sábado. Com respeito a isso, pode-se mencionar as proibições referentes à constmção de uma casa (Êx 31.12-17), à colheita de lavouras (34.21), a acender um fogo (Nm 15.32-36) e a carregar qual quer tipo de fardo (Jr 17.22). Esta discussão tratará da questão difícil, porém teologicamente mais relevante, da extensão da observância cultuai do sábado de acordo com o AT e se esta era uma atividade particular ou comunitária. 1148
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a. A maioria das referências ao sábado no AT são caracterizadas pela proibição de rea lizar qualquer tipo de trabalho e não por uma atividade cultuai específica (Alt, 132). Pesquisas recentes realizadas por McKay (18) também concluem que o AT proporciona poucas evidências de que era praticado extensivamente no período anterior ao exílio como seria de se esperar pela interpretação habitual dos mandamentos. Albertz (407-10) mostrou até que ponto, durante o tempo do exílio, a família tomou-se um instrumento para a manutenção da identidade de Judá e aquilo que ele chama de “religião oficial de Javé”. Ele parte do pressuposto de que no perío do anterior ao exílio, uma família se abstinha do trabalho a cada sete dias e que esse costumo não tinha nenhuma conotação cultuai (Albertz, 409). O cativeiro é considerado o crisol no qual ocorreu uma combinação do festival da lua cheia do tempo anterior ao exílio (cf. Robinson) com o costume das famílias de descansar a cada sete dias. Apesar dessa avaliação da família como uma entidade social e religiosa ser algo há muito necessário, a explicação evolucionária perfeita do desenvolvimento histórico da observância do sábado ncessita um escrutínio acadêmico muito mais rigoroso. No pos-exílio, há algumas evidências de uma celebração do sábado que implicava mais do que apenas o descanso e continha uma assembléia festiva no templo (Ez 46.1,9). b. O AT deixa claro que os sacerdotes deviam trabalhar no sábado e também eram ins truídos a oferecer sacrifícios adicionais a cada sábado (Números 28—29; Ezequiel 45—46). Tem-se a impressão de que os israelitas comuns não possuíam práticas religiosas específicas e características do sábado e de que o descanso era, senão a única, pelo menos a mais importan te prescrição a ser seguida (McKay, 247). Muitas vezes, a interpretação do AT pressupõe uma equivalência infeliz entre o sábado como um dia santo separado para Deus e uma observância cultuai peculiar a esse dia. Assim, é importante dar o devido valor à relevância teológica dos israelitas comuns se absterem do trabalho sem lançarem mão de nenhuma festividade cultuai reservada para o sábado. De modo algum isso significa que não havia nenhum tipo de atividade religiosa durante o sábado mas, ao que parece, essa atividade era realizada pelos sacerdotes e não reservada para ocorrer apenas no sábado (Schmidt, 88-91). c. A construção paronomástica Sabbãt Sabbâtôn tem a função de superlativo para indicar que todas as formas de trabalho eram proibidas. Isso valia não apenas para o sábado (Lv 16.31), mas também para o dia da expiação (Lv 23.32). Nos casos em que apenas o termo Sabbâtôn é usado com referência aos festivais religiosos, diz-se que um Sabbâtôn ocorre apenas no pri meiro e no oitavo dia (Lv 23.34). De acordo com a explicação do exegeta judeu Rashi, isso indica que os israelitas eram proibidos de realizar qualquer tipo de trabalho nesse dia, mas que podiam preparar o alimento necessário para sustentar a vida (Levine, 110). Tudo indica que se fazia uma distinção entre o sábado (com a abstinência total do trabalho tendo como objetivo o descanso) e os festivais sazonais (quando o indivíduo abstinha-se do trabalho a fim de celebrar a festa) (Levine, 155). O termo Sabbâtôn indica que outras ocasiões sagradas são comparadas ao sábado e que as características do sábado serviam de exemplo sobre o que devia ser feito durante os outros festivais religiosos. Ao começar e encerrar as comemorações religiosas com o Sabbâtôn e sua referência ao descanso (ou seja, o primeiro e o oitavo dia), a atividade cultuai da festa religiosa passava a ser qualificada em termos teológicos pelo sábado e seu objetivo de desfrutar a presença de Deus como Criador e Rendentor. P-B 1. LXX. E surpreendente que na maioria dos casos, o singular (Sabbãt) no TM seja tra duzida pela LXX com um pl. (ta sabbata). Isso pode ser explicado pelo fato de a LXX transliterar o aram. SabhPtã' (7'ir/f7'7:1056). 1149
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2. Apócrifos. Por um lado, o livro de Macabeus refere-se a um episódio no qual os judeus escolheram a morte em vez de se defenderem de Antíoco IV no sábado (I Mac 2.3138); por outro lado, permite que o mandamento do sábado seja quebrado a fim de salvar vidas (2.40-41). De acordo como Livro de Jubileus (2.17-32; 50.6-13) a pena de morte continua em vigor para qualquer transgressão do sábado. Entre essas transgressões estão diferentes formas de locomoção, jejuns e ter relações conjugais no sábado (EJ 14:562). 3. Qumran. A reverência atribuída ao sábado na comunidade de Qumran era significati va. De acordo com o Papiro dos Salmos (11 QPs 27:4-8), Davi compôs cinqüenta e dois salmos para o sábado (cf. o salmo [Salmo 92] que Davi escreveu para o sábado no Livro de Salmos do AT). Um texto conhecido como “Cânticos do Sacrifício do Sábado” (4Q400-407; 1lQShirShabb) contém uma liturgia angélica com louvores celestiais para os três primeiros sábados do ano (Newsom, 211). No Documento de Damasco, pode-se encontrar prescrições complexas sobre pureza e limpeza no sábado (CD 11-12) e o sábado faz parte da lista de dias santos no Papiro das Guerras (1QM 2.4), aparecendo mais uma vez juntamente com a lua nova. A LQ apresenta algumas das evidências mais claras em favor da interpretação tradicional do sábado como um dia de festividade cultuai e indica um aumento marcante na importância teológica do sábado dentro da comunidade religiosa judaica. 4. Literatura rahinica. Depois de 400 a. C., o sábado tomou-se a característica distinti va dos judeus como povo de Deus, numa correspondência bastante próxima com a circuncisão e as leis alimentares (ISBE 4:250). Pode-se encontrar várias referências ao sábado no Mish. (esp. Sabbat 7.2), mas esses mesmos escritos (Ag 1.8) advertem que as leis sobre o sábado são como montanhas dependuradas de um fio de cabelo, pois as Escrituras dizem muito pouco so bre o assunto e, no entanto, são muitas as regras sobre ele (EJ 14:564). Sem dúvida a minúcia das referências rabínicas ao sábado reflete sua prioridade teológica, o que faz da advertência rabínica sobre sua falta de evidência nas Escrituras ainda mais importante.
NT 1. O subs. heb. sabbât é traduzido pelo subs. G tõn sabbatõn e usado 38X nos Evan gelhos Sinópticos, 11x em João, 9x em Atos e 1x em Colossenses e Hebreus. De acordo com os Evangelhos e Atos, as sinagogas eram lugares onde as Escrituras eram lidas e discutidas, mas são poucas as evidências de atividades cultuais aos sábado como orações e sacrifícios que podem ser coletadas desses livros (McKay, 172-75). As comunidades cristãs retratadas nos Evangelhos Sinópticos observavam as prescrições do AT para o sábado e a fim de determinar qual era o comportamento adequado para esse dia, valeram-se das palavras de Jesus, inclusive as dos episódios nos quais o mandamento do sábado foi suspenso ou anulado por Jesus (Weiss, 24). O Quarto Evangelho se preocupou menos com “como” da observância do sábado pois esse dia adquiriu um caráter escatológico sem ser, no entanto. No Evangelho de João, constitui uma escatologia concretizada enquanto no livro de Hebreus parece estar voltado para o futuro (Weiss, 320-21). 2. Também há algumas evidências da proeminência do primeiro dia no culto da com nidade cristão primitiva. E mencionada a reunião para repartir o pão no primeiro dia da semana (At 20.7). De acordo com Paulo, os fundos para a igreja de Jerusalém deviam ser separados no primeiro dia da semana (1 Co 16.2). Em Apocalipse 1.10, o título “dia do Senhor” é conferido ao primeiro dia, apesar de alguns exegetas argumentarem a esse respeito em favor de um sig nificado escatológico (Lincoln, 383). Festas e festivais: -¥ bikkürim (primeiros frutos ou primicias, # 1137); hag (procissão, dança em círculo, festival, festa, # 2504); hanukkâ (consagração. Festa da Consagração, # 1150
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2853); -> m ô ê d (tempo determinado, # 4595); ma.tfôt (Festa dos Pães Asmos, # 5174a); -> marzêah (banquete cultuai, refeição fúnebre, # 5301); sukkôt (Festa dos Tabemáculos, # 6109a); -> (assembléia festiva, #6809); -> pürim (festival de Purim, #7052a); -> pesah (Festa ou sacrifício da Páscoa, # 7175 [Páscoa: Teologia]); rõ ’i hõdes (festival da lua nova, #8031 a); rõ ’i hassãnà (começo do ano, # 8031 b); iãèi/ o/ (Festa das Semanas, #8651 a); -> sabbãt (sábado, # 8701 [Sábado: Teologia]) Santo, consagração devotamento: Ijnk 1 (treinar, consagrar, # 2852); -> /jr/n I (banir, colo car sob interdição, # 3049); -> wzr (consagrar-se a uma divindade, # 5692); -> (ser santo, consagrar, # 7727) Descanso, quietude, repouso: dmh II (chegar ao fim, repousar, ficar calado, em silêncio, # 1949); -> nwh I (descansar, # 5657); -> nwh 1(assentar, descansar, esperar, estacionar, depositar, # 5663); /g ' (formar uma crosta sobre, parar, ficar quieto, # 8088/89); i ’« (estar tranqüi lo, imperturbado, # 8631); sWi II (silenciar, acalmar, aquietar, # 8656); -> iefte/ (sentar-se tranqüilamente, descansar, # 8699, 8700); -> stq (acalmar-se, #9284) Tempo: -> 'õbêd (desde então, # 7); -> opew (o tempo certo, # 698); -> g/7 I (uma estapa da vida, # 1636); zmn (ser nomeado, # 2374); ‘ôlãm (um longo tempo ou duração, # 6409); eí (tempo, # 6961); -> p a ‘am (pé, passo, tempo, # 7193); -> peto' (instante, # 7353); /ãm/úf (prosseguimento, continuidade, oferta regular, # 9458) B ib l io g r a f ia
/IflD 5:849-56; £ / 14:558-72; GKC 86f, 240; HALAT 1310-12; IBHS, 90; ISBE 4:247-52; NIDNTT 3:405-15; TD N Tl:\-35\ TWAT1\\041-51\ R. Albertz, A History ofIsraelite Religion in the Old Testament Period, 2, 1994; A. Alt, Essays on Old Testament History and Religion, 1966; N-E. A. Andreasen, The Old Testament Sabbath: A Tradition-Historical Investigation, 1972; R. T. Beckwith e W. Stott, The Christian Sunday, 1978; B. S. Childs, OTTCC, 1986; G. I. Davies, Ancient Hebrew Inscriptions, 1992; L. Delekat, “Ein Bittschriflenwurf eines Sabbatschãnders (KAI 200)”, Bib 51, 1970, 453-70; W. Eichhrodt, TOT 1, 1961; E. Haag, Vom Sabbat zum Sonntag, TTS 52, 1991; D. R. Hiller, Lamentations, AB, 1992; E. Jenni, Die theologische Begriindimg des Sabbatgebotes im Allen Testament, ThStud 46, 1956; P. P. Jenson, Graded Holiness. A Key to the Priestly Conception o f the World, JSOTSup 106, 1992; A. S. Kapelrud, “The Numbers Seven in Ugaritic Texts”, VT 18, 1968, 494-99; B. A. Levine, Leviticus, JPSTorah, 1989; A. T. Lincoln, From Sabbath to Lord's Day, ed. D. A. Carson, 1982, 343-412; H. A. McKay, Sabbatah andSynagogue, 1994; J. L. McKenzie, A Theology o f the Old Testament, 1986; J. Meinhold, Sabbat und Woche im Alten Testament, 1905; P. D. Miller, “The Human Sabbatah: A Study in Deuteronomic Theology”, SB 6, 1985,81-97; C. Newsom, Songs o f the Sabbath Sacrifice: A Criticai Edition, 1985; H.-D. Preuss, Theologie des Alten Testa ment, Band 2, 1992; G. Robinson, The Origin and Development o f the Old Testament Sabbath, BET 21, 1988; W. H. Schmidt, The Faith o f the Old Testament, 1983; J. Siker-Gieseler, “The Theology of the Sabbath in the Old Testament. A Canonical Approach”, StBib 11, 1981, 5-20; W. M. Swartley, Slavery, Sabbath, Warand Woman, 1983; M. Tsevat, “The Basic Meaning of the Biblical Sabbath”, ZAW 84, 1972, 447-59; W. A. VanGemeren, The Progress o f Redemption: The Story o f Redemption from Creation to the New Creation, 1995; G. von Rad, OTT 1, 1962; T. C. Vriezen, An Outline o f Old Testament Theology, 1970; H. Weiss, “The Sabbath in the Synoptic Gospels”, JS N T 38, 1990, 13-27; idem, “The Sabbath in the Fourth Gospel”, JBL 100, 1991, 311-21; D. T. Williams, “The Sabbath: Mark o f Distinction”, Them 14, 1989, 96101; W. Zimmerli, OTTO, 1984. H endrikL. Bosman 1151
Sabedoria
A fé revelada da antiga Israel, com seu destaque para a aliança com Javé e para a obediência à vontade dele contida na Lei, pode dar a impressão de que houvesse pouco espaço para o exercício do inte lecto humano ou mesmo da apreciação estética no meio do povo de Deus. Pode parecer que a vida sob a Lei era dominada pela obrigação e o dever, sendo a observância dos mandamentos mais importante do que a análise e compreensão do mundo no qual os homens se encontram. Assim, é um tanto surpreendente descobrirem-se nas páginas do AT inúmeros ensaios literários cheios de reflexão e energia que buscam expressar a reverência e admiração dos homens cati vados pela excelência e complexidade de seu mundo. A gratidão e louvor vão muito além do simples reconhecimento da bondade e provisão do Criador e celebram a beleza e prazer infi nitos da própria criação. Junto com esses peãs de louvor, também é espantoso encontrarem-se investigações pro fundas do funcionamento do mundo e da natureza humana dispostas a reconhecer a dor onde esta existe, perserutando e questionando a operação do propósito divino que, com tanta freqüência, permanece oculto de nossas vistas. Essas mesmas buscas humanas pela compreensão muitas vezes beiram o cinismo e o pessimismos e, por vezes, os recônditos mais escuros da fé. O fato de as Escrituras canônicas permitirem que essas visões alternadas da vida e do mundo criem uma tensão com os requisitos de obediência e dever é testemunho da vitalidade e discernimento da tradição da sabedoria em Israel, que é fonte de grande parte desse ímpeto de conhecer, compreender e apreciar a natureza e o caráter de Deus. O grande valor da sabe doria encontra-se em suas análises profundas, por mais difíceis ou elevadas que sejam, sobre a condição humana — análises que têm origem no exercício do intelecto humano por meio da observação e das experiências, mas que, em último caso, tomam-se a palavra canônica do próprio Deus. Tais palavras não obscurecem nem enfraquecem os ensinamentos bíblicos da aliança e da lei. Antes, encontram-se numa tensão santa por meio da qual proporcionam as tão necessárias “palavras de sabedoria”. Essas importantes análises da tradição de sabedoria não devem ser ignoradas, mas sim, cuidadosamente integradas a uma compreensão dos ensinamentos teológicos do AT. No texto a seguir, a origem e o desenvolvimento da sabedoria israelita são considerados numa breve discussão de seu caráter e principais visões teológicas. 1. A origem e o desenvolvimento da sabedoria em Israel continuam sendo motivo controvérsia. A redução da sabedoria bíblica ao cânon literário oficial conhecido nas Escrituras exige algum tipo de local específico reconhecido e revestido de autoridade para sua compilação, preservação e promulgação. No outro extremo do espectro, parece bastante provável que pelo menos parte da sabedoria proverbial tivesse como origem as interações da vida em família e dentro do clã. Vários provérbios são compatíveis com a transmissão de proveitosos ensinamentos que passam de pai para filho; e a adoção dc uma terminologia familiar semelhante para definir a relação entre o sábio e seu aluno (“Filho nieu...”) confirma que a família é fonte original de sabedoria. Ao mesmo tempo, toma-se mais difícil distinguir-se a sabedoria familiar e do clã daquela de caráter mais “oficial”, uma vez que a terminologia de ambas se sobrepõe. Em função disso, há pouca discussão sobre o contexto do exercício da sabedoria na literatura bíblica, o que levou à proposta de várias opções para esse contexto. Alguns estudio sos sugerem que, quando o povo entrou na terra prometida, a sabedoria hebraica desenvolvi da dentro dos clãs foi adaptada às formas cananéias regionais. Outros relacionam a sabedoria escrita a modelos egípcios de ensino dos cortesãos nas escolas da corte. Uma vez que se sabe pouco sobre a existência e natureza do sistema educacional de Israel (ver Educação), é difícil apresentar uma solução definitiva para essa questão. Tendo em vista que os sábios são mencioSabedoria
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nados como parte dos círculos oficiais da corte (G n4l.8; Êx 7.11; Et 1.13; Pv 16.14; 24.5-6; Is 19.11-12; Jr 50.35; 51.57; Dn 2.12), parece seguro concluir que a existência de um conjunto de escritos da sabedoria bíblica contém elementos de uma longa interatividade histórica da sa bedoria popular com a sabedoria da corte e com os mestres posteriores da sabedoria canônica. O que vai além, fica ao encargo da conjectura. 2. A sabedoria é compreendida de várias maneiras e pode ser considerada um conju de características, de modo geral, identificáveis c demonstradas por aqueles que são conside rados sábios; uma forma de ver a vida ou uma visão de mundo (semelhante a uma posição filosófica comparável ao existencialismo); uma coletânea de literatura distinguida por seu pró prio conjunto de convenções literárias, contento reflexões selecionadas de proponentes dessa visão de mundo. a. Características identificáveis, i. Como indica a discussão do vocabulário relacion ao radical hkm, aqueles que eram considerados sábios apresentavam em comum uma série de características identificáveis. A mais geral delas é uma certa eficiência ou domínio com rela ção a alguma tarefa tisica (aptidão) ou, no caso da sabedoria intelectual, à vida como um todo. Artífices “sábios" tinham conhecimento das maneiras de realizar seu ofício com aptidão e ta lento, enquanto “os sábios” encontravam-se em tamanha sintonia com a vida pela observação perceptiva e pela experiência discemente, que conheciam a reação humana apropriada para cada momento da vida. Como resultado, havia algo na vida daqueles que eram verdadeiramente sábios que podia ser considerado correto ou adequado e que, em alguns casos, expressava-se na forma de riqueza, mas que, em todas as circunstâncias, era reconhecido como justo e reto. ii. Em termos mais específicos, as características em comum desses sábios são consti tuídas a partir de várias comparações positivas e contrastes negativos. As exortações e admoestações de Provérbios são particularmente de grande ajuda na formação de um retrato definido do caráter tradicional do sábio. Pessoas que buscam a sabedoria são descritas como indivíduos diligentes (Pv 6.6-8; 10.4; 13.4; 2 1.5), enquanto os insensatos são preguiçosos (6.9-11; 26.15-16) e desprezam a sabedoria. Ao contrário do insensato, que é dominado pelas emoções (22.24-25; 29.22), os verdadeiramente sábios possuem domínio próprio ( 15.32; 16.32; 29.11), paciência (14.29; 19.11) e são receptivos à instrução (9.8-9; 12.15; 13.1, 10) e à disciplina (1.7; 15.5). O sábio é caracterizado pela humildade (11.2; 22.4), prudência ( 1.4; 8.5, 12; 14.8; 15.5), genero sidade (19.17; 22.9) e cautela (12.18, 23, 26; 15.28), enquanto os insensatos agem com impru dência (12.23) e soberba (3.33-35; 13.10; 18.12; 22.3) prejudicando a si mesmos e a outros. Aqueles que possuem sabedoria verdadeira são honestos (12.19,22), esquivando-se do suborno (Dt 16.19), da extorsão (Ec 7.7) e da desonestidade nos negócios(Pv 11.1, 16, 18). iii. Uma característica particularmente importante do sábio é seu o das palavras e o dis curso. Vemos que o Pregador procurou “achar palavras agradáveis e escrever com retidão pa lavras de verdade” (Ec 12.10). As palavras (tanto escritas quanto faladas) são o principal meio pelo qual o sábio transmite sua riqueza de conhecimento adquirida durante anos de observação, experiência e reflexão (Pv 1.1-6; 10.13,31 -32). Pois “a língua do sábio adorna o conhecimento, mas a boca dos insensatos derrama a estultícia” (Pv 15.2; cf. 15.7). O que importa para o sábio é a qualidade do discurso e não a quantidade de palavras. "O homem se alegra em dar resposta adequada, e a palavra, a seu tempo, quão boa é!” (15.23). “Alguém há cuja tagarelice é como pontas de espada, mas a língua dos sábios é medicina” (12.18). “Quem retém as palavras possui o conhecimento, e o sereno de espírito é homem de inteligência” (17.27). “No muito falar não falta transgressão, mas o que modera os lábios é prudente” (10.19). Por outro lado, até mesmo os insensatos podem ser considerados sábios quando permanecem calados (17.28; cf. Jó 13.5). Os sábios possuem uma profunda consciência do poder das palavras para fazer o bem ou ferir 1153
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(P v ll.U , 13; 14.3; 17.19,20; 18.6, 7,2 1;E c 10.12) e aconselham o uso criterioso do silêncio e a moderação como o caminho prudente para a sabedoria (Pv 11.12; 21.23; Ec 9.17). As pa lavras dos sábios, reunidas e apreciadas por gerações subseqüentes, constituem um depósito de sabedoria para suprir e guiar aqueles que se dispõem a trilhar o caminho da sabedoria (Pv 1.1-6; 21.20; Ec 12.11). b. Uma visão de mundo. Além de descrever um conjunto de características em comu de todos aqueles que são considerados modelos de perspicácia, a sabedoria do AT também des creve um modo mais formal de se ver o mundo, baseado numa série de princípios e conjecturas o mais próximo daquilo que poderíamos chamar de postura filosófica. Essa visão de mundo é decorrente de uma reflexão ponderada sobre como o mundo funciona e de que maneira os ho mens podem se comportar mais produtivamente dentro das limitações desse mundo. i. Teologia da criação. No que se refere às suas conjecturas básicas, o pensamento da sabedoria está intimamente relacionado e fortemente influenciado pela teologia israelita da cria ção. Para os sábios, o mundo havia sido criado por Deus e fazia parte dos propósitos divinos. A sabedoria de Deus exerceu uma função ativa no processo criativo e continua a influenciar o progresso dos acontecimentos aqui na terra. ii. Observação e experiência. Assim como a sabedoria é uma parceira ativa na criação e continua a moldar e ordenar a vida, também a marca da sabedoria encontra-se estampada nas estruturas e relações do cosmo e pode ser identificada por aqueles que a procuram. A presença da sabedoria em toda a criação enche a vida de um propósito divino ordenado que a remove do ciclo caótico interminável característico da maior parte das formas de politeísmo do OMA, colocando-a numa jornada linear de peregrinação rumo aos propósitos de Deus. Apesar de esse propósito ordenado não ser demonstrado superficialmente nem ser imediatamente óbvio, os sábios dedicavam a vida à suposição de que tal propósito se revelaria àqueles que se dedicas sem a buscá-lo e que o fizessem da maneira correta. Talvez o método mais importante de busca pela sabedoria praticado entre os sábios fosse a investigação reflexiva de suas observações e experiências de vida cumulativas. O uso de várias formas verbais e adj./subst. do radical hkm indica que a sabedoria é uma facul dade intelectual que pode ser adquirida e ampliada por meio do estudo diligente e da expe riência (ver especialmente Pv 1.1-6). O narrador de Eclesiastes (primeira pessoa) aplica-se intencionalmente a uma busca pelo entendimento que resulta numa sabedoria cada vez mais extensa e mais ampla, que excede aquela de todos os antecessores dele (Ec 1.16). O impera tivo “sê sábio, meu filho” (Pv 27.11) indica que, por meio dos devidos esforços, os leitores podem responder em obediência. Semelhantemente, acredita-se que o relacionamento com sábios resulte em maior sabedoria pois “quem anda com os sábios será sábio” (13.20). Daí, a exortação freqüente dos sábios — para que seu ouvinte/aluno/discípulo busque a sabedoria e o entendimento por meio dos ensinamentos do sábio (2.1-5) — basear-se na pressuposi ção subjacente de que a sabedoria encontra-se à disposição daqueles que a buscam resoluta e apropriadamente. iii. O mundo inteiro serve de laboratório para os sábios. A observação e a experiência sapienciais estendem-se ao céu, ao mundo físico, ao mundo dos animais e às relações e com portamentos humanos. Salomão era conhecido por seus 3 mil provérbios e mil e cinco cânticos, nos quais ele descrevia “todas as plantas, desde o cedro que está no Líbano até ao hissopo que brota do muro;... [falando] dos animais e das aves, dos répteis e dos peixes” (1 Rs 4.32-33). Tais observações perspicazes do comportamento animal são abundantes em Provérbios e abrangem: aves (1.17; 26.2; 27.8); gazela (6.5); formigas (6.6); boi, cervo e ave (7.22-23); porco (11.22); urso (17.12); leão (19.12; 20.2; 22.13; 28.1); cobra e basilisco (23.32); cavalo e jumento (26.3); 1154
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cão (26.11, 17); rebanhos de ovinos e caprinos (27.23-27); leão e urso (28.15); sanguessuga (30.15); corvos e águias (30.17); água e cobra (30.18-19); formigas, arganazes, gafanhotos e gecos (30.24-28); leão, galo e bode (30.29-31). Por meio de comparações e contrastes muitas vezes bem-humorados, os sábios conseguem esclarecer o comportamento humano, incentivan do as atitudes corretas e desencorajando seus seguidores a trilharem os caminhos destrutivos. O pregador explora de maneira mais mordaz as semelhanças e diferenças entre os animais e os homens, questionando se os homens têm alguma vantagem sobre os animais, uma vez que “como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida, e nenhuma vanta gem tem o homem sobre os animais... Todos vão para o mesmo lugar; todos procedem do pó e ao pó tomarão. Quem sabe se o fôlego de vida dos filhos dos homens se dirige para cima e o dos animais para baixo, para a terra?” (Ec 3.19-21). O mundo físico também ocupa uma posição de destaque na visão crítica dos sábios acerca do seu universo, como se pode ver em Provérbios. Tempestades (Pv 1.27; 10.25), chu va (16.15; 25.14, 23; 26.1; 28.3), orvalho (3.20; 19.12), neve (25.13; 26.1) e fontes fluentes (16.22) fornecem material extenso para as reflexões do sábio, como também o fazem a obstru ção dolorosa dos espinhos (15.19), a decepção da fonte turvada (25.26), o refrigério da água fria (25.25), a irritação do gotejar incessante (19.13; 27.19) e a natureza indefmível tanto do vento quanto da água (30.4). Os sábios voltam o olhar preciso com mais freqüência e atenção para o universo do comportamento e dos relacionamentos humanos. O lar (Pv 15.17,20; 17.6; 21.9) e o local de trabalho (10.5, 26; 11.1; 12.11,27; 16.11, 20, 26), o mercado (20.14, 23), o tribunal (17.26; 18.17; 19.5) e a administração do governo (16.12-15) servem todos de laboratórios prolíficos para que os sábios escrutinem os caprichos da natureza humana, moldando a vida em todos os níveis e possibilitando esperança de mais sabedoria, entendimento e controle. O sábio e o insensato, o filho obediente e o rebelde, reis e camponeses, os preguiçosos e os trabalhadores diligentes, o honesto e o enganador, a esposa virtuosa e a resmungona — todos eles têm um papel no mosaico vivido da existência humana criado pelas palavras dos sábios. E, apesar de esse mosaico ser incompleto (há pouca ou nenhuma discussão da vida cultuai religiosa de Is rael), o todo transmite a impressão de uma visão holística da vida que proporciona orientação individual e social, bem como esperança de maestria cada vez maior. iv. O conhecimento produz benefícios. A sabedoria não apenas se encontra disponív como também é benéfica para aqueles que a adquirem. “Feliz o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire conhecimento; porque melhor é o lucro que ela dá do que o da prata, e melhor a sua renda do que o ouro mais fino” (Pv 3.13-14). A sabedoria prolonga a vida e traz prosperidade (3.1-2; 4.4); livra o homem das “veredas tortuosas” dos perversos (2.9-15); é fonte de esperança para o futuro (24.14). Até mesmo o narrador pessimista de Eclesiastes pode descrever os benefícios da sabedoria: “Boa é a sabedoria, havendo herança, e de proveito, para os que vêem o sol. A sabedoria é um abrigo, como também o é o dinheiro; mas o proveito da sabedoria é que ela dá vida ao seu possuidor” (Ec 7.11-12); Além dos benefícios materiais de longevidade e prosperidade, a sabedoria proporcio na várias outras vantagens intangíveis. Não é apenas um caminho que leva à opulência e à riqueza; para o sábio, representa ainda um objetivo e foco mais elevados: “Quanto melhor é adquirir a sabedoria do que o ouro! E mais excelente, adquirir a prudência do que a prata!” (Pv 16.16); “A aquisição da sabedoria é melhor que a das pérolas” (Jó 28.18; cf. Pv 3.15; 8.11). Em decorrência disso, o sábio perceptivo está disposto a sacrificar a riqueza a fim de possuir sabedoria. “O princípio da sabedoria é: Adquire a sabedoria; sim, com tudo o que possuis, ad quire o entendimento” (Pv 4.7). 1155
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Dentro dessa perspectiva dos benefícios da sabedoria, pode-se encontrar em vários pro vérbios a aceitação otimista do funcionamento da retribuição. Se a sabedoria gera benefícios, então a insensatez traz conseqüências negativas. “Os lábios do insensato entram na contenda, e por açoites brada a sua boca” (Pv 18.6). “A boca do insensato é a sua própria destruição, e os seus lábios, um laço para a sua alma” (18.7). “Os lábios do justo apascentam a muitos, mas, por falta de senso, morrem os tolos” (10.21). “O sábio de coração aceita os mandamentos, mas o insensato de lábios vem a arruinar-se” (10.8). Assim, do ponto de vista da sabedoria, há duas maneiras de realizar a jornada desta vida: trilhar o caminho da sabedoria que conduz a benefícios e vida ou trilhar o caminho oposto da insensatez, que termina em destruição e morte. Pode-se passar facilmente desse reconhecimento geral dos benefícios vivificadores da sabedoria para uma ligação mais automática c egoísta da atitude sábia com a saúde e a pros peridade, como se vê em alguns escritos de sabedoria. “A bênção do Senhor enriquece, e, com ela, não traz desgosto” (10.22). “O temor do Senhor prolonga os dias da vida, mas os anos dos perversos serão abreviados” (10.27). “Aos sábios a riqueza é coroa, mas a estultícia dos insen satos não passa de estultícia” (14.24). “O que atenta para o ensino acha o bem, e o que confia no Senhor, esse é feliz” (16.20). “O galardão da humildade e o temor do Senhor são riquezas, e honra, e vida” (22.4). No entanto, vários provérbios mostram que os sábios possuíam uma percepção aguçada de que nem toda riqueza era resultante de uma vida sábia e justa, mas que podia ser acumulada pela ganância e desonestidade implacável. “A mulher graciosa alcança honra, como os podero sos adquirem riqueza” (Pv 11.16). Essa riqueza não era efêmera nem uma fonte insatisfatória de segurança. “As riquezas de nada aproveitam no dia da ira, mas a justiça livra da morte” (11.4). “Quem confia nas suas riquezas cairá, mas os justos reverdecerão como a folhagem” (11.28). “Não te fatigues para seres rico; não apliques nisso a tua inteligência. Porventura, fitarás os olhos naquilo que não é nada? Pois, certamente, a riqueza fará para si asas, como a águia que voa pelos céus” (23.4-5). “O que aumenta os seus bens com juros e ganância ajunta-os para o que se compadece do pobre” (28.8). Por certo alguns provérbios parecem refletir uma sabedoria estritamente pragmática: “Pedra mágica é o suborno aos olhos de quem o dá, e para onde quer que se volte terá seu proveito” (Pv 17.8). “O presente que o homem faz alarga-lhe o caminho e leva-o perante os grandes” (18.16). “Ao generoso, muitos o adulam, e todos são amigos do que dá presentes” (19.6). “O presente que se dá em segredo abate a ira, e a dádiva em sigilo, uma forte indigna ção” (21.14). Em sua maior parte, porém, os sábios tinham o cuidado de promover um fun damento moral para a sabedoria. Nesse contexto a sabedoria toma-se sinônimo de retidão, enquanto a insensatez não é apenas ignorância, mas também perversidade. “O perverso aceita subomo secretamente, para perverter as veredas da justiça” (17.23). “Os tesouros da impieda de de nada aproveitam, mas a justiça livra da morte” (10.2). “A obra do justo conduz à vida, e o rendimento do perverso, ao pecado” (10.16). “Abomináveis para o Senhor são os perversos de coração, mas os que andam em integridade são o seu prazer. O mau, é evidente, não ficará sem castigo, mas a geração dos justos é livre" (11.20-21). Assim, em última análise, o objetivo dos sábios é inculcar em seus discípulos uma vida de sabedoria justa e agradável a Deus e não um pragmatismo sagaz e egocêntrico. v. A tensão na sabedoria. De acordo com a premissa básica da sabedoria, o uso c rente da reflexão analítica sobre os resultados das observações cumulativas dos sábios e suas experiências de vida produzirá uma compreensão mais adequada da ordem complexa e divina mente determinada da vida e, assim, proporcionará a mestria benéfica. No entanto, esse mes mo conjunto de ferramentas (observação, experiência, reflexão, análise) poderia levar — e de 1156
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fato levou — a diferentes conclusões no meio dos sábios. A tensão concentra-se em tomo de duas perguntas importantes: A retribuição funciona, de fato? (ou seja, o sábio/justo prospera enquanto o insensato/perverso perece?); E verdadeiramente possível para a compreensão hu mana descobrir o propósito ordenado de Deus no universo? Quanto à primeira pergunta, os sábios deixaram, ao longo dos provérbios, indicações sutis da consciência que tinham de que a sabedoria não era garantia alguma contra a pobreza ou o so frimento. Assim, podem falar de um “jovem pobre e sábio” (Ec 4.13; 9.15) e admitir que até mesmo os sábios devem enfrentar as tempestades da vida (Pv 10.25). Uma série de provérbios sobre o que é “melhor” celebra a vocação da sabedoria e da justiça em oposição à sedução das riquezas. “Melhor é o pouco, havendo o temor do Senhor, do que grande tesouro onde há inquie tação” (15.16). “Melhor é o pouco, havendo justiça, do que grandes rendimentos com injustiça” (16.8). “Melhor é ser humilde de espírito com os humildes do que repartir o despojo com os soberbos” (16.19). “Melhor é um bocado seco e tranqüilidade do que a casa farta de cames e contendas” (19.1). “Melhor é o pobre que anda na sua integridade do que o perverso, nos seus caminhos, ainda que seja rico” (28.6). A maneira exata como esse “melhor” favorece o sábio irrepreensível não é descrita claramente em momento algum, mas pode muito bem referir-se ao reconhecimento comunitário da integridade e retidão do sábio. ( Retribuição: Teologia) Até mesmo essa última recompensa está sujeita a um certo escrutínio em Jó, em que a provação divina (Jó 1— 2) leva Jó a perder, na seqüência, a família, a riqueza e a saúde e o coloca sob os olhares cheios de suspeita dos amigos, desprovendo-o também de qualquer aceitação de sua integridade fundamental. Assim, alheio à prova que lhe causou esses males e incapaz de prever a restauração que o aguarda no último capítulo, Jó deve decidir se vale a pena apegar-se a um Deus que se recusa a reconhecer a profunda necessidade de Jó de ser declarado justo. No final, a aparição teofãnica de Deus (caps. 38— 41) desarma inteiramente as objeções de Jó e, assim, não resta a ele outra saída senão admitir que Deus é, de fato, digno e, ainda que alguém perca tudo — incluisive qualquer reconhecimento de retidão — , o caminho da sabedoria continua sendo o certo. (-> Jó: Teologia) Assim como Jó, Eclesiastes também questiona qualquer funcionamento automático do princípio da retribuição. Suas observações o levam a perceber exatamente o contrário. “Ainda há outra vaidade sobre a terra: justos a quem sucede segundo as obras dos perversos, e perver sos a quem sucede segundo as obras dos justos. Digo que também isto é vaidade” (Ec 8.14). Jó pergunta se existe um “melhor” quantitativo que faça distinção entre o sábio e o insensato, o justo e o perverso, o ser humano e o animal. Tanto os sábios como os perversos estão fada dos a morrer e nenhum deles é lembrado por muito tempo. Em última análise, até mesmo a sabedoria é vaidade (2.12-17; 6.8). Eclesiastes vai ainda mais longe e questiona se é possível a sabedoria humana discernir e compreender os propósitos de Deus no mundo. “Aplicando-me a conhecer a sabedoria e a ver o trabalho que há sobre a terra—pois nem de dia nem de noite vê o homem sono nos seus olhos—., então, contemplei toda a obra de Deus e vi que o homem não pode compreender a obra que se faz debaixo do sol; por mais que trabalhe o homem para a descobrir, não a enten derá; e, ainda que diga o sábio que a virá a conhecer, nem por isso a poderá achar” (Ec 8.1617). Uma vez que a compreensão dos propósitos de Deus acaba por escapar até ao mais sábio dos sábios (a identificação de Eclesiastes com Salomão, o grande pai da Sabedoria em Israel toma esse argumento ainda mais enfático), então a mestria da vida é algo fora de questão. Aos homens só resta esperar, comer, beber e encontrar satisfação em seu trabalho na terra enquan to desfrutam qualquer bem que possa lhes ocorrer. Esse é o destino dos homens e a dádiva de Deus (5.18-19). (-> Eclesiastes: Teologia) 1157
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O fato de ser permitido que essa discussão tensa dentro da sabedoria bíblica apareça em sua totalidade nas Escrituras é testemunho da verdade que os editores bíblicos encontraram presente em todas essas vozes. Nenhuma delas sobrepuja as outras, mesmo sabendo-se que existe a possibilidade de a pena do editor ter eliminado dali as idéias conflitantes. As Escrituras permitem que Jó e Eclesiastes permaneçam juntamente com Provérbios sem nenhuma concor dância. Na verdade, a condenação dos amigos de Jó por Deus (Jó 42.7-9) serve para confirmar que as palavras de Jó são corretas e as declarações no final de Eclesiastes não deixam dúvida alguma quanto à aceitação dos seus ensinamentos: “O Pregador, além de sábio, ainda ensinou ao povo o conhecimento... Procurou o Pregador achar palavras agradáveis e escrever com re tidão palavras de verdade” (Ec 12.9-10). No entanto, a intenção não é sugerir com isso que não houvesse nenhuma tentativa de resolver essa tensão. Naquela que pode ser chamada de última formatação do conjunto de es critos de sabedoria da Bíblia pelos editores canônicos, um escrutínio mais cuidadoso revela a existência de movimentos em direção a uma resolução. Em primeiro lugar, o fato de ser per mitido que essas vozes tão diversas, com seus pontos de vista opostos, convivam lado a lado dentro das Escrituras canônicas é uma indicação de que cada uma delas fosse considerada uma expressão verdadeira. Em decorrência disso, essas vozes devem ser lidas como declarações complementares que demarcam os parâmetros da fé e não como pontos de vista opostos dentre os quais só se pode escolher um. A resposta apropriada para cada uma dessas vozes é “sim!” A postura adequada de fé é considerar essas declarações distintas da verdade em conjunto, dentro de uma santa tensão, de modo que cada uma delas possa ser ouvida e que esse diálogo possa ter continuidade na vida do cristão. Em segundo lugar, declarações relativamente claras ao longo de todos os escritos de sabedoria procuram determinar limites para aquilo que a sabedoria humana é capaz de realizar. A sabedoria é um dom divino; é concedida por Javé a quem lhe apraz(lRs3.12; SI 51.6 [8]; Pv 2.6) e pode ser tomada daquele ao qual ela é dada (Is 29.13-14; 44.24-26; Jr 8.8-9). Há limites para a capacidade da sabedoria humana refletir sobre os pensamentos de Deus (Jó 28, 38-41; Ec 8.16-17; Is 55.6-9). A verdadeira sabedoria encontra-se à disposição somente daqueles que se aproximam corretamente da sabedoria de Deus. A porta da sabedoria permanece fechada para aquele que é “sábios aos [seus] próprios olhos” (Pv 3.7; 26.5, 12, 16; 28.11; Is 5.21). O começo (e o fim) da devida receptividade da sabedoria é o “temor do Senhor” (Jó 28.28; Pv 1.7; 2.1-6; 9.10; 15.33; Is 33.6). Não se trata de um terror abjeto, nem simplesmente de um medo reverente, mas sim de uma humildade profundamente arraigada na consciência perma nente da dependência absoluta da misericórdia imerecida de Javé para a própria existência. E somente por meio dessa humildade e dependência que o coração humano pode estar preparado para perceber e receber a sabedoria que Deus concede. Em terceiro lugar, diante das limitações da sabedoria humana de refletir por si mesma sobre os pensamentos de Deus, há um movimento na sabedoria canônica no sentido de ouvir essas vozes distintas dentro da fé tradicional e revelada da Torá. Essa relação é apresentada ao longo de todo o conjunto de escritos de sabedoria bíblica de maneiras por vezes sutis e, outras vezes, nem tanto. Em Provérbios 1—9, faz-se referência aos preceitos da sabedoria em termos normalmente reservados para a Torá (3.1 -3; 6.20-23; 7.1-3; 8.35-36). No epílogo de Eclesiastes, essa ligação é feita de forma ainda mais clara: “De tudo o que se tem ouvido, a suma é: Teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo homem” (Ec 12.13). A ligação entre a Torá e a sabedoria também ocupa uma posição de destaque em Deuteronômio, no qual é a obediência de Israel aos decretos e leis de Javé que mostrará a sabedoria desse povo às nações (Dt 4.5-8). Essa união da sabedoria com a Torá tem continuidade na literatura de 1158
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sabedoria do período intertestamental, na qual a identificação de ambas fica evidente. O temor de Javé toma-se sinônimo da observância da lei mosaica (Ecli 2.16; 23.37; 32.15-17; 33.1-3) e a Torá é o auge da sabedoria. c. Um corpo literário. A sabedoria também se refere a um corpo literário por meio qual as reflexões coletivas dos sábios são transmitidas às gerações subseqüentes. Trata-se de um processo seletivo mas não completo; um grande volume de materiais existentes não foi incluído nele, de modo que o motivo para a inclusão de determinados textos — ainda que não declarado explicitamente — deve ter sido importante. i. O principal conjunto de escritos bíblicos de sabedoria compreende Jó, Provérbios e Eclesiastes, sendo expandido na literatura apócrifa pelos livros de Sabedoria de Salomão e Eclesiástico. A maioria desses textos é poética e emprega, de maneira eficaz, os elementos do estilo poético hebraico — especialmente o paralelismo antitético nas comparações e contrastes proverbiais, nos ditados numéricos (Provérbios 30), nos discursos mais extensos (Provérbios 1—9, Eclesiastes) e nos diálogos/discussões (Jó). ii. A literatura de sabedoria israelita tem vários elementos em comum com o contexto mais amplo da sabedoria internacional no OMA. Tanto o Egito quanto a Mesopotâmia conhe ciam a sabedoria proverbial que derivava orientações a partir de observações da experiência humana. Existem, ainda, diálogos e discussões mais pessimistas. Tendo em vista que uma boa parte da sabedoria era resultante da observação e da experiência, podia-se facilmente transpor as fronteiras nacionais. Ao que parece, Israel estava a par da sabedoria de seus vizinhos, che gando por vezes a satirizá-la (Gênesis 41; Jr 49.7; Daniel 1—2), mas sem receio de aprender com ela também. E um fato comumente aceito que Provérbios 23.17—24.22 deva muito de seu texto à Sabedoria deAmenemope, que também contém trinta seções (cf. 22.20), sendo algumas destas paralelas a ditados dessa parte de Provérbios. Ao considerarem a palavra m assã' (30.1; 31.1) como um NG, outros encontram sabedoria não israelita nos ditados a Agur e Lemuel (caps. 30—31). Os ensinamentos de Jó, que é descrito como “o maior de todos os [ h o m e n s ] do Oriente” (Jó 1.3) também podem ser de origem não israelita. iii. A influência sapiencial foi detectada ainda em outros textos fora dos livros reco nhecidos de sabedoria e que apresentam vocabulário, interesse e visão de mundo semelhantes à literatura de sabedoria. Alguns dos salmos encaixam-se claramente nessa categoria (SI 1,32, 3 3 ,3 6 ,3 7,4 9 ,5 0,5 3 ,58 , 73,78,82,94, 111, 112, 119, 125, 128), empregando explicitamente o vocabulário sapiencial, demonstrando interesse pela retribuição e os dois caminhos — o do justo e o do perverso. O livro profético de Oséias conclui com um epílogo inequivocamente sapiencial (Os 14.9), que coloca a interpretação desse livro dentro do contexto da reflexão sábia e das escolhas retas para a vida. Formas mais sutis de influência da sabedoria foram atribuídas a textos narrativos que apresentam uma visão de mundo compatível com aquela da sabedoria. A história de José (Gênesis 37—50) descreve a ascensão de um “homem pobre, porém sábio” (Ec 9.15), um escravo hebreu que chega a um cargo de grande influência no Egito como resul tado da bênção de Deus sobre seu modo de viver cauteloso, moderado, fiel e justo. As histórias em aramaico de Daniel e seus três amigos (Daniel 1— 6) têm em comum com a narrativa de José o tema dos hebreus alcançando o poder e a influência dentro de uma sociedade estran geira como resultado do exercício dos dons da sabedoria e de uma lealdade íntegra a Javé. O tema da interpretação dos sonhos e agouros que aparecem em destaque nesses textos levaram alguns estudiosos a questionar se a relação com a sabedoria mais intelectual do corpo princi pal da Bíblia é real ou imaginária. Numa consideração alternativa, pode-se ver nesses textos a influência da sabedoria mãntica, que compartilhava com a sabedoria intelectual a ênfase so bre a observação e análise da experiência, mas se concentrava principalmente nas ocorrências 1159
Sabedoria
naturais repetidas que podiam ser usadas ou manipuladas a fim de fornecer informações sobre acontecimentos presentes ou futuros. (-> Daniel: Teologia) 3. Conclusão. Quer a sabedoria do AT seja considerada um conjunto de caracterís cas, uma visão de mundo ou um corpo literário, o entendimento que proporciona por meio de provérbios e poesia, discursos articulados e introspecções atormentadas, continuam a desafiar aqueles que desejam viver no mundo real com retidão e sabedoria. De acordo com o conselho dos sábios, a verdadeira fé é colocada em prática entre os parâmetros do pessimismo e da espe rança, da submissão e da confrontação, do lamento e do louvor. Ensinam que Deus encontra-se tanto obscuramente oculto quanto imediatamente presente junto aos homens que continuam a se debater com o valor, significado e propósito da vida. E, se no fim somos levados — assim como aqueles sábios da antigüidade — ao “temor do Senhor”, que é tanto o início quanto o fim da sabedoria, então teremos fincado nossos pés firmemente no caminho de Deus. Sabedoria, conhecimento, aptidão: -> byn (entender, discernir, # 1067); hkm (ser sábio, tomar-se sábio, agir com sabedoria, # 2681); ->_)>' (entender, saber, # 3359); ysr I (admoes tar, corrigir, disciplinar, # 3579); -> leqah (ensinamento, dom de persuasão, #4375); mezimmâ (consideração, plano perverso, trama, # 4659); 'oqbâ (astúcia, esperteza, # 6817); 'rm II (ser astuto, ser esperto, tomar esperto, # 6891); -> skl I (ter sucesso, entender, tomar sábio, agir com discernimento, # 8505); -> tahbulôt (conselho, orientação, # 9374) Insensatez, estuitícia, loucura, despudor: -> ’ewíl I (tolo, insensato, #211); -> b 'r IV (ser estúpido, # 1279); hll III (ser confuso, tolo, comportar-se como louco, #2147); ksl I (ser tolo, # 4071); Ihh (comportar-se como louco, # 4623); -> nbl II (agir com desdém, # 5571); skl (comportar-se com insensatez, tomar ridículo, frustrar, #6118); pth I (ser inexpe riente, ser ingênuo, enganar, persuadir, # 7331); -> sg ‘ (delirar, enlouquecer, # 8713); tp! I (falar coisas sem nexo, # 9520) Provérbios: Teologia B ib l io g r a f ia
J. L. Crenshaw, “Method in Determining Wisdom Influence Upon ‘Histórica’ Literature”, JBL 88, 1969, 129-42; idem, Old Testament IVisdom: An Introduction, 1981; H.-P. Müller, “Magisch-mantische Weisheit und die Gestalt Daniels”, Ugaritische Forschung I , 1969, 79-94; R. E. Murphy, Wisdom Literature: Job, Proverbs. Ruth, Canticles, Ecclesiastes, Esther, FOTL 13, 1981; G. von Rad, Wisdom in Israel, 1972; J. C. Rylaarsdam, Revelation inJewish Wisdom Li terature, 1946; G. T. Sheppard, Wisdom as a Hermeneutical Construct, BZAW 151, 1980; R. N. Whybray, The lntellectual Tradition in the Old Testament, 1974; G. H. Wilson, “The Words o f the Wise: The Intent and Significance of Qohelet 12:9-14”, JBL 103, 1984, 175-92; idem. “Wisdom in Daniel and the Origin of Apocalyptic”, HAR 9, 1985, 373-81. Gerald II. Wilson Sabedoria -> # 2681 (hkm, ser sábio, tomar-se sábio, agir com sabedoria) Sabedoria de Jesus Filho de Siraque -> Apócrifos, Eclesiástico Sabedoria de Salomão
Apócrifos
Sacerdote -> #3912 (khn, realizar as incumbências de um sacerdote) 1160
Sacerdotes e levitas
A emergência de classes ou famílias distintas como sa cerdotes e especialistas cultuais nos principais templos é um fenômeno comum no OMA. Em função da centralidade do templo e da importância do acesso aos seres divinos, os sacerdotes desempenhavam um papel fundamental tanto em termos políticos e econômicos como religiosos. O sacerdócio israelita reflete o mesmo padrão geral, porém com algumas ênfases extraordinárias como a dominância de Moisés e as limitações im postas para o poder econômico do sacerdócio. A história do sacerdócio israelita e, especialmente da relação entre os levitas e o sa cerdócio é uma das áreas mais controversas dos estudos modernos. O Pentateuco descreve a origem de um sacerdócio oficial no Sinai, uma conseqüência necessária da fundação de um santuário nacional com seus respectivos rituais que exigiam o conhecimento de especialistas. Os sacerdotes eram escolhidos dentre os membros da tribo de Levi, dentro da qual havia uma hierarquia tripla: o sumo sacerdote (Arão e seus sucessores), os sacerdotes (os filhos de Arão) e os outros clãs levíticos. Para Wellhausen (Prolegomena, 1885, 121-51), uma delineação completamente dife rente dessa história foi um elemento-chave para sua reconstituição da história de Israel. Com algumas variações (Gunneweg, de Vaux, Cody), essa continua sendo a base para aquilo que pode ser chamado de abordagem padrão. Em primeiro lugar, os levitas sacerdotais deixaram de ser considerados apenas descendentes de uma tribo secular mais antiga, e passaram a ser definidos principalmente por sua função sacerdotal. Em segundo lugar, a ordem hierárquica dos sacerdotes e levitas surgiu como resultado da centralização do culto no reinado de Josias (2 Reis 23). Os levitas, que deixaram de ter permissão para exercer funções sacerdotais em outros santuários, tornaram-se subordinados ao sacerdócio zadoquita. Deuteronômio procurou conferir a todos os levitas os mesmos direitos ao classificá-los como “sacerdotes levíticos”, mas essa tentativa não foi bem-sucedida. Ezequiel apresentou o rebaixamento permanente dos levitas como parte da idéia que tinha de um culto restaurado no templo (Ezequiel 44) e essa situação é presumida pelos textos sacerdotais do exílio ou do pós-exílio — Êxodo, Levítico e Números. Em terceiro lugar, as genealogias que ligam o patriarca Levi aos levitas Moisés, Arão e Zadoque são harmonizações posteriores de um conjunto mais complexo de relações entre os diversos grupos. Essa reconstituição influenciou as discussões da história, exegese e filologia, mas, ultimamente, vem sendo contestada por diversos pontos de vista (Abba, Haran, McConville, Duke). O artigo sobre os levitas (-> # 4290) é mais voltado para as questões históricas e exegéticas, enquanto o artigo sobre os sacerdotes (-> # 3912) é mais sistemático e teológico. Outros artigos tratam das vestes sacerdotais, uma vez que eram uma característica distinta do sacer dócio, de acordo com os textos sobre o assunto no livro de Êxodo. Somente Arão, como sumo sacerdote, usava quatro vestimentas externas: a estola ( 'êpôd), o peitoral (hõsen), uma sobrepeliz e a mitra de ouro (sis ou nêzer). Ele e seus filhos usavam quatro peças de roupa de baixo: uma túnica (ketõnet), um cinto ( 'abnêt), uma tiara (miçnepet para o sumo sacerdote; migbã'â para os sacerdotes) e calções (miknãsayim). As roupas de baixo eram de qualidade e santidade inferior àquela das roupas mais externas, apesar de, no caso do sumo sacerdote, se rem geralmente superiores às dos sacerdotes em termos de feitura e materiais. Trata-se de uma correspondência com a maior santidade do sumo sacerdote e sua maior proximidade de Deus durante os deveres rituais. Sacerdotes e levitas
Sacerdotes e levitas: 'abnêt (cinto, esp. de sacerdotes, # 77); 'êpôd 1 (estola, veste sa cerdotal, objeto de veneração, # 680); -> hõsen (peitoral do sumo sacerdote, # 3136); khn 1161
Salmos: Teologia de
(cumprir os deveres de um sacerdote, # 3912); -> kõmer (sacerdote pagão, # 4024); -> léwi (levita, # 4290); -> migbã ‘â (tiara, # 4457); -> miknãsayim (calças, # 4829); -> pa 'amõn (cam painha [na sobrepeliz do sacerdote], # 7194); -> tasbêç (quadriculado [túnica do sacerdote]. # 9587); Arão: Teologia; Sacerdotes e levitas: Teologia B ib l io g r a f ia
J. Gabriel, Untersunchungen Über das alttestamentliche Hohepriestertum mil besonderer Berücksichtigung des hohepriesterlichen Ornates, Theologische Sudien der Õsterreichischen Leo-Gesellschaft 33,1933; M. Haran, “Priestly Vestments”, EncJud 13,1971,1063-69; idem, Temples and Temple-Service in Ancient Israel, 1978; R. P. E. Haulotte, Symbolique du vêtement selon la Bible, Théologie 65, 1966; H. W. Hõning, Die Bekleidung des Hebrãers: Eine biblischarchàologische Untersuchung, 1957; P. P. Jenson, Graded Holiness: A Key to the Priestly Conception o f the World, JSOTSup 106,1992; A. Jirku, “Zur magischen Bedeutung der Kleider in Israe”, ZA W 37, 1917-18, 109-25; M. Levin, Melekhet Hammishkan (Hebrew), 1968. P. Jenson Saco
# 8566 (saq, bolsa, saco, pano de saco)
Sacrifício -> # 2284 (zbh, imolar, abater, sacrificar) Saia
# 8767 (súl, saia)
Sal -» # 4873 (mlh 11, salgar) Salário Saliva
# 5832 (maskõret, salário) # 8202 (rir, saliva, muco)
Salmos: Teologia de A. Títulos O título desse livro é derivado da LXX Psamoi (Códice B) e Psalterium (Códice A), por meio da Vg. Liber Psalmorum. Em cabeçalhos, o sing. G. psalmos é usado para o heb. mzmôr. Refere-se ao cântico que acompanha a música de um instrumento de cordas; pela in fluência da Bíblia G e pelo avanço do cristianismo, esse significado foi relegado ao segundo plano e “salmo” passou a significar “cântico de louvor”. Esse desenvolvimento alinhou esses títulos com o título heb. t?hillim, louvores. Alguns cabeçalhos, porém, têm como identificação do seu gênero o termo fipillôt, oração. É possível que um título mais antigo fosse “as orações de Davi” (cf. SI 72.20). No entanto, com exceção do Salmo 88, a “ovelha negra dos Salmos”, todas as orações conduzem ao louvor. Um estudo do contexto históricos, das formas, uso litúrgico, edição e uso dessas petições e louvores no NT levarão a um melhor entendimento acerca de sua interpretação e teologia.
B. Contexto Histórico 1. Introdução. Os contextos históricos dos Salmos devem ser extraídos tanto de se cabeçalhos quanto de seu conteúdo. Infelizmente, na última parte do século passado, vários aca 1162
Salmos: Teologia de
dêmicos, influenciados pelo criticismo histórico, reconstituíram o contexto histórico lançando mão de um conhecimento limitado de filologia e com uma concepção equivocada da evolução da religião de Israel. Em decorrência disso, estudiosos como Duhm, Cheyene, Haupt e Briggs, recentemente falecido, chegaram à mesma conclusão errônea de que o livro de Salmos era, essencialmente, o hinário do Segundo Templo e interpretaram vários Salmos com referência aos macabeus (ver Sellers). Atribuíram, o Salmo 3, por exemplo, a “um líder envolvido nas batalhas e lutas partidárias daquela época” (Mays, 151). Hoje em dia, essa interpretação não tem mais aceitação alguma. De qualquer modo, como diz B. S. Childs (IOTS, 520): “Nos últimos cem anos, os es tudos levaram a um consenso de que os títulos são acréscimos secundários sem informações confiáveis para se determinar o verdadeiro contexto histórico dos Salmos”. Em decorrência disso, há mais de um século os estudos sobre Salmos mostraram-se desorientados em meio a opiniões conflitantes sobre suas datas e significados. Felizmente, a maré de opiniões acadêmicas com referência à antigüidade e confiabilidade dos cabeçalhos está mudando lentamente diante do peso das evidências. 2. A antigüidade e confiabilidade dos cabeçalhos em geral. Textos rituais sumério acádios do terceiro milênio a. C. contêm rubricas que correspondem aos elementos dos cabe çalhos (Wilson, 13-24), o que também pode ser visto em hinos egípcios da VIII Dinastia m diante (ANET, 365-81). Alguns salmos atribuídos a Davi contêm palavras, imagens e paralelismos autenticados nos textos ugar. (c. 1400 a. C.) (Dahood, xxix-xxx). Apesar da obscuridade para os tradutores de vários termos técnicos encontrados no cabeçalho (indicando uma perda nas tradições vivas e uma extensa lacuna temporal entre sua redação e o período tanaítico, a LXX e os Trgs.), esses tradutores não os alteraram nem omitiram; nenhuma versão antiga ou ms. hebraico deixa esses termos de fora. Com referência à antigüidade dos salmos em si, quase não resta incerteza. Muitos crêem que o Salmo 29 depende de um antigo contexto cananeu. As diferenças lingüísticas, estilísticas, estruturais, temáticas e teológicas são tão grandes entre o livro de Salmos e seu salmo imitativo de ação de graças nos escritos de Qumran que não dei xam espaço para dúvidas quanto à antigüidade muito maior dos Salmos bíblicos. a. "De D avi". A autoria dos salmos e, portanto, seus contextos históricos, depende, parte, do significado da preposição “de” (heb. le ) com referência a Moisés (Salmo 90), Davi (73x), Salomão (Salmos 72, 127) e às guildas e sacerdotes relacionados a Davi: os filhos de Corá (Salmos 42— 49, 84— 87), os filhos de Asafe (Salmos 50, 73— 83), Hemã (Salmo 88) e Etã (Salmo 89). Apesar de le poder significar “pertencente a uma série” (BDB, 513, verbete 5b), costuma denotar autoria, como em outras línguas semitas (GKC, 129c). Dentro de outros gêneros literários, le nos cabeçalhos significa “por” (cf. Is 38.9; Hc 3.1). No AT, assim como em outras obras literárias do OMA, os poetas, diferentemente dos narradores, não são anôni mos (cf. Êx 15.1; Jz 5.1). O significado “por” é incontestável nos cabeçalhos sinópticos de 2 Samuel 22.1 e do Salmo 8.1. Outras passagens das Escrituras apresentam inúmeras evidências de que Davi era um músico e escritor de poesia sacra. Saul o descobriu quando procurava um músico talentoso para ser seu harpista (ISm 16.14-23). Amós (6.5) relaciona o nome de Davi com a música do templo. De acordo com o cronista, Davi e seus oficiais incumbiram diversas guildas de mú sicos de dirigir o culto musical inspirado e diz ainda que esses grupos eram regidos pela mão de Davi (ou seja, ele os conduzia pela quironomia, como é retratado na iconografia do Egito já no Baixo Império) (Wheeler; cf. lCr 23.5; 2Cr 29.26; Ne 12.36). O cronista também mos tra o rei Ezequias renovando as nomeações davídicas para a salmodia. Ezequias ofereceu os sacrifícios e dirigiu os louvores que o acompanharam, sendo que nesses cantos os destaques 1163
Salmos: Teologia de
foram os instrumentos c composições de Davi e seu assistente, Asafe (2Cr 29.25-30). Nas pa lavras de Sawyer (6): “No tempo do cronista.... dificilmente se podia duvidar do significado da expressão “de Davi”. Foi essa a interpretação de Ben Siraque (Ecli 47.8-10), dos rolos de Qumran (1 lQPsa), de Josefo (Ant, viii. 305s) e dos rabinos (Briggs, liv). Essa interpretação é essencial para a avaliação que o NT faz dos livro de Salmos, considerando-o um testemunho de Jesus como o Messias (Mt 22.43, 45; Mc 12.36, 37; Lc 20.42; At 1.16; 2.25; 4.25; Rm 4.6; 11.9; Hb 4.7). No tocante à objeção de que o templo de Salomão no monte Sião fica subentendido no Salmo 24.7,9, observemos que se parte do pressuposto que a casa de Deus se refira a uma ins tituição e não a um edifício (cf. 1Sm 1.7). Quanto à objeção de que os aramaismos no Salmo 139 indicam uma data mais recente, observemos que agora fica claro “que provas de influências aramaicas não podem ser consideradas isoladamente como prova usada para uma argumentação em favor de uma data mais recente para um determinado texto” (Hurvitz, 234). Como poeta laureado de Israel, Davi compôs a oração de consagração do templo (Salmo 30) e também pro jetou de antemão e fez os preparativos para a construção dele (1 Crônicas 28). b. Uma interpretação mais abrangente do papel do rei. Apesar de o “eu” nos salmos pós-monárquicos referir-se a um líder anônimo ou personificar Israel, o “eu” de vários salmos anteriores ao exílio diz respeito ao rei e, se esse é o caso, por que não a Davi? Eaton (20-26) proporciona argumentos convincentes em favor de uma interpretação mais abrangente do papel do rei: i. Até mesmo os salmos de dos filhos de Corá (cf. Salmos 44, 84) c de Etã (cf. 89) são relativos ao rei. ii. A música do templo como um todo foi promovida pelo rei (ver 1 Crônicas 15— 16; 2 Crônicas 29; Isaias 38). iii. Por todo o OMA, o rei era responsável pela adoração. Na Mesopotâmia, os salmos de lamento eram de autoria do rei. iv. Os inimigos são, muitas vezes, outras nações (p. ex., SI 18.43 [44]; 20; 21; 28; 61; 63; 89; 144). v. A interpretação mais abrangente do papel do rei confere integridade a salmos para os quais, de outro modo, falta unidade (p. ex., Salmo 4). vi. “A única ‘situação’ atestada com certeza é a do rei: ele é o sujeito em vários salmos e a controvérsia se limita a determinar em quantos deles. Não se pode dizer o mesmo sobre outras formas de uso sugeridas” (22). vii. O caráter representativo do rei explica o problema específico apresentado pelos salmos nos quais “eu” (ou seja, o rei) e “nós” (ou seja, o povo/exército) aparecem alternadamente (cf. 44; 60; 66; 75; 102). viii. Ao longo dos “salmos pessoais” ocorrem cerca de vinte e quatro temas ou expressões especificamente apropriadas para um rei. Gunkel (1993, 147-48) identificou as seguintes: todas as nações dão atenção às ações de graça desse indivíduo (18.49 [50]; 57.9 [10]; 119.46); seu livramento tem vastas repercus sões (22.27-31 [28-32]); ele invoca um julgamento mundial para retificar sua causa (7.7-8); ele retrata a si mesmo como vitorioso sobre as nações por intermédio da intervenção de Deus ( 118.10); é como um touro erguendo os chifres em sinal de triunfo (92.10). Essa interpretação que favorece o rei, afeta a exegese e a teologia do livro de Salmos de diversas maneiras, i. Permite ao leitor ouvir os pensamentos mais íntimos do maior rei de Israel, ii. Confirma a atribuição do NT de certos salmos a Davi. iii. Proporciona uma base his tórica sólida para a interpretação messiânica dos salmos pelo NT. c. Observações históricas. De acordo com seus cabeçalhos, os Salmos 34, 52, 54, 56, 57,59. 142 são datados do tempo do exílio de D avi(l Samuel 16— 31); os Salmos 18 e 60 do tempo em que ele encontra-se sob a bênção (2 Samuel 1— 10), e os Salmos 3, 51, 63, do tempo em que se encontra sob a ira (2 Samuel 11—20). Os Salmos 7 e 30 não possuem uma classifi cação específica quanto a suas datas (2 Samuel 21—24). Além dos argumentos apresentados acima em favor da credibilidade dos cabeçalhos, levantamos a seguinte pergunta: Se estes são um acréscimo secundário, por que os outros 59 salmos de Davi são deixados sem observações 1164
Salmos: Teologia de
históricas, especialmente quando vários deles poderiam facilmente ser atribuídos a algum acon tecimento da vida do rei (cf. Archer, 28)? E também, por que editores posteriores iriam inserir materiais nos cabeçalhos dos Salmos 7,30 e 60 que não se encontram nos livros históricos e não podem ser inferidos imediatamente a partir dos próprios salmos? Por fim, por que é aceitável que os salmos nos livros históricos tenham cabeçalhos com observações históricas (cf. Êx 15.1; Dt 31.30; cf. 32.44; Jz 5.1; 2Sm 22.1; Jonas 2; Is 38.9) mas o mesmo não vale para a coletânea de salmos, apesar da sintaxe ser, por vezes, semelhante (b + construção no infinitivo)? Diante dessas observações históricas, o “eu” dos salmos toma-se um personagem ver dadeiro e pode-se ver com mais clareza os seus inimigos. Os Salmos representam a teologia em ação na vida real e permitem aos leitores atuais empregá-los de modo mais apropriado em situações específicas correspondentes (cf. Kidner, 17). Alem disso, conferem profundidade teológica à interpretação do salmo. Apesar de o Salmo 3 atribuir todo o louvor a Deus por seu livramento, 2 Samuel 15.17, texto referido em seu cabeçalho, mostra que Deus usou a língua talentosa de Husai para realizar tal livramento. d. Indicações históricas do conteúdo. Moisés (Salmo 90) redigiu o salmo mais antig os mais recentes foram compostos no exílio (137) ou logo depois (126). Não é prudente, porém, reconstituir-se um contexto histórico que não é dado; nem se pode, sequer, ressaltar demais esse contexto nos casos em que está presente, uma prática lamentável de comentaristas mais anti gos (p. ex., Delitzsch, Perowne, Alexander). A maioria dos salmos, inclusive aqueles em que o autor é identificado, foram escritos em termos abstratos, sem referência a episódios históricos específicos, de modo que outras pessoas pudessem usar essas palavras em adoração. C. Forma Literária Na interpretação da teologia dos Salmos também é importante uma compreensão de suas formas literárias. Infelizmente, porém, vários críticos da forma apresentam uma aborda gem contrária aos cabeçalhos. Em termos tradicionais, costumava-se reconhecer que os salmos visavam a diversas circunstâncias espirituais. Em seu prefácio ao livro de Salmos em alemão (1528), Lutero comentou: “[Cada santo,] quaisquer que sejam suas circunstâncias, encontra nesse livro salmos e palavras apropriadas para as condições em que esse santo se encontra e que suprem as necessidades dele de modo tão adequado que pareçam ter sido redigidas exclu sivamente para ele” (citado por Weiser, 20). Na virada do século, H. Gunkel apresentou em sua obra magistral, Form-Criticial Introduetion [Introdução à crítica da forma], um estudo avançado dos salmos, ao observar em suas comparações das súplicas e louvores dos salmos com outra literatura em forma de hinos no OMA, semelhanças impressionantes em termos de conteúdo, tom, expressões, temas e es trutura. Ao comparar esses critérios, Gunkel foi levado a fazer uma distinção entre pelos menos cinco tipos básicos: 1. lamento individual (também chamado de súplica); 2. lamento comu nitário; 3. ações de graças; 4. louvor e 5. do rei. Os Salmos 21 e 72 são para o aniversário do rei; 132 para o aniversário do santuário real e do palácio; 45 para o casamento do rei; 20 para antes da guerra e 18 para depois dela; 2, 101 e 110 para a entronização do rei; 144.1-11 e em menor grau 89 como súplica do rei. A categoria que se refere ao “rei” em distinção às outras formas é questionável, pois depende do uso da palavra “rei” ou “Davi” e não da forma do sal mo. Além disso, sua distinção entre lamento individual e comunitário também é questionável, pois os pronomes “eu” e “nós” são, por vezes, usados juntos. As evidências de Eaton em fa vor de uma interpretação mais abrangente do papel do rei nos salmos também questiona essas duas categorias. Uma avaliação crítica do critério de Gunkel nos deixa com três tipos básicos: súplicas, ações de graças e louvor. 1165
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O cronista confirma a análise de Gunkel. Em seu relato acerca das atividades de Davi durante a liturgia da arca (1 Crônicas 15— 16), o cronista observa: “[Davi] Designou dentre os levitas os que haviam de... celebrar [suplicar/ invocar] (heb. lehazkir), e louvar (heb. lehôdôt), e exaltar(heb. lehallel lyhwh) o Senhor” (1 Cr 16.4). Essa concordância extraordinária entre as evidências externas e intemas das três formas de salmos não deixa dúvidas de que os poetas de Israel tinham consciência dessas formas. A seqüência do cronista é intencional: súplicas levam ao louvor declaratório e este, por sua vez, conduz ao louvor descritivo. 1. Salmos de súplica/lamento. Os temas comuns dos salmos de súplicas são o discurso dirigido a Deus (cf. SI 54.1-2 [3-4]), um lamento e/ou queixa para dar vazão às emoções e es timular Deus a agir (v. 3 [4]), confiança (v. 4 [5]), súplica (v. 5 [6]) e louvor em amplo sentido (vv. 6-7 [7-8]). a. As súplicas sempre começam com um discurso direto dirigido a Deus: “Dá ouvidos. Senhor...” (SI 3.1; 5.1; 6.1). Ao voltar-se para Deus em aflição e dirigir-se a ele, o suplicante mostra dependência total de Deus. Buscar o livramento em outro lugar seria o equivalente à idolatria. Davi suscitou a ira de Deus quando fez a contagem dos homens aptos para a bata lha, pois, como ele próprio confessou, “Quanto a mim, dizia eu na minha prosperidade: jamais serei abalado” (30.6 [7]; cf. 1 Samuel 24). Dirigir as súplicas a Deus é algo que está de acordo com outros salmos que enfatizam como não se pode jamais confiar nos recursos dos homens (cf. SI 118.6-7; 146.3). Somente Deus pode socorrer (62.7-9); todas as outras coisas e pessoas não passam de ilusão (33.16-18). O perverso diz que não há Deus (10.4, 11; 14.1). Deixar de voltar-se para Deus numa crise é, de acordo com Ringgren (35), “o que os babilônios chamam de ‘viver in ramtmixu', ou seja, viver por conta própria, com recursos próprios, sem depender de Deus. Mas isso é a essência do pecado”. b. No lamento e queixa e em outras partes do livro de Salmos, o salmista mecniona a enfermidade, ainda que, em certas ocasiões, esta seja metafórica (SI 6, 3 1, 38, 39, 88, 102; cf. Is 38.9-20). Também fala de falsas acusações (SI 7, 17,26,27), perseguições (3,9, 10, 13, (?), 35, 52, 55, 56, 57, 62, 69, 70, 86, 109, 120, 139, 140, 141, 143), crises militares (12, 44, 58, 60, 74, 79, 80, 83, 90, 137) e secas (cf. 4). Essas situações assemelham-se àquelas antevistas por Salomão na consagração do templo (lRs 8.27-53). Nessa seção, o salmista concentra-se em seu distanciamento de Deus (13.1; 22.1), nos inimigos demasiadamente poderosos (em 47 dos 50 salmos de lamento) que causam ou exploram a aflição dele (cf. 38, 39, 41) e em sua própria situação extrema — não pode mais prosseguir (6.6-7 [7-8]; 88.3-7). O temor que o sal mista tem da morte nâo se deve a uma apreensão por si próprio, mas ao fato de estar em jogo a fidelidade de Deus à aliança feita com Davi (cf. 6, 25, 38,41). Uma forma característica de salmo de súplica diz respeito ao pecado. No Salmo 51, depois das súplicas iniciais (vv. 1-2 [3-4]), um representante nacional primeiro lamenta (ou seja, confessa) seus atos pecaminosos manifestos (vv. 3-4 [5-6]), observando que todo o pecado é contra o Legislador, de modo que o perdão depende da graça de Deus e não da humanidade implacável. Em seu adultério com Bate-Seba e no assassinato do marido dela (cf. os cabeçalhos [1-2]), Davi cometeu tanto pecados “intencionais” quanto “involuntários”. Nâo havia como restituir a pureza a Bate-Seba nem devolver a vida a Urias. Ainda assim, por meio do sangue purificador no hissopo (vv. 7-9 [9-11]) — observe-se que ele não rejeita sacrifícios, como é alegado muitas vezes — o rei encontrou o perdão. Além disso, Davi confessa sua impotência moral (vv. 5-6 [7-8]). De acordo com o comentário de Dalglish (124), “Nas profundezas do ventre, o ser essencial do salmista foi formado num contexto de pecado (v. 5 [7]); mas há um outro fator: o salmista sabe muito bem do desejo divino de que a verdade seja um imperativo moral mesmo nos estádios de formação do homem dentro do ventre materno... e tem cons 1166
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ciência de que mesmo ali, a sabedoria lhe estava sendo ensinada” (v. 6 [8]). Diferentemente de Freud, porém, Davi não justifica sua impotência moral, mas suplica para que o Espírito de Deus faça dele uma nova criação (vv. 10-12 [12-14]). Davi louva os atributos benevolentes de Deus: sua graça, misericórdia e amor, de modo que todos os santos, quando pecarem, experi mentem o perdão de Deus usando esse salmo (vv. 13-15 [15-17]). No entanto, diferentemente do louvor convencional com um sacrifício animal, o louvor de Davi será acompanhado de um espírito quebrantado que não será recusado (vv. 16-17 [18-19]). Outros salmos de penitência são 6,38, 102, 130, 143. Alguns salmos, porém, observam que Deus castiga os atos perversos (68.35; 76.12; 90.7, 11). c. A seção sobre confiança, introduzida várias vezes pela expressão “Porém tu” SI 3.3 [4]), muda o tom de desespero sombrio para esperança reluzente em preparação para a súplica que segue. Em várias ocasiões, o salmista baseia sua confiança nos atributos sublimes de Deus e na fidelidade do Senhor no passado, em sua própria eleição e em sua inocência. Essa seção apresenta uma alta concentração de elementos teológicos. Aqui e em partes diferentes dos Salmos, o salmista concentra-se, entre outros atributos (como o poder de Deus), naqueles que se referem à benevolência divina, revelados a Moisés em Êxodo 34.6 (cf. SI 86.15; 103.8): o Deus compassivo (rahiim) e clemente (hannún), longânimo ( 'erek ‘appayim) (ver Gruber, Áspects, 485-87), repleto de amor (rab-hesed) e fidelidade ( ’emet) (cf. 26.3; 40.11 [12]). A primeira estança do cântico de confiança no Salmo 22.1-10 [2-11] consiste de duas estrofes que misturam lamento e confiança. Na primeira estrofe (vv. 1-5 [2-6]), Davi equipara sua rejeição por Deus com a fidelidade que Deus teve para com os pais de Davi: “Nossos pais confiaram em ti; confiaram; e os livrastes” (v. 4 [5]). Na segunda estrofe (vv. 6-10 [7-11]), o salmista equipara sua rejeição pelos homens com a fidelidade passada de Deus para com ele: “Tu és quem me fez nascer; e me preservaste, estando eu ainda ao seio de minha mãe” (v. 9 [10]). No Salmo 77, um salmo de louvor declaratório, o salmista confessa ter quase perdido a fé quando comparou a fidelidade passada de Deus com a situação presente de Israel: “Tão perturbado estou, que nem posso falar. Penso nos dias de outrora, trago à lembrança os anos de passados tempos” (vv. 4-5 [5-6]). Em seguida, porém, ao refletir mais profundamente, encontrou na fidelidade passada de Deus uma fonte de confiança: “Então, disse eu... Recordo os feitos do Senhor, pois me lembro das tuas maravilhas da antigüidade...” (vv. 10-12 [11-13]). No Salmo 3, o rei fundamenta sua confiança no poder de Deus, “Porém tu. Senhor, és o meu escudo”, e em sua própria eleição, “és a minha glória e o que exaltas a minha cabeça” (v. 3 [4]). No Salmo 4, dirige-se aos seus líderes imprestáveis (heb. tfinê ’is = “homens nobres de nascimento” [cf. 49.2; 62.9]) e lamenta que o estão humilhando na crise, provavelmente uma seca, ao voltarem-se para falsos deuses (v. 2 [3]). A fim de restaurar a confiança deles em seu rei, que deveria ser coberto das bênçãos divinas e poderoso em sua oração (ver Eaton, 142-46, 185-87), ele declara: “Sabe, porém, que o Senhor distingue para si (o heb. hiplâ sig nifica “distinguir alguém dentre os outros de maneira extraordinária a fim de que os outros possam reconhecer a dignidade do eleito”) o piedoso; o Senhor me ouve quando eu clamo por ele” (v. 3 [4]). Para muitos, os protestos de inocência que acompanham algumas das seções de confian ça são perturbadores. Citando o Salmo 26, em que o “homem bom” declara: “tenho andado em minha integridade” (v. 1) e até mesmo “com os ímpios não me assento” (v. 5), C. S. Lewis (58) acusa o salmista de que, com essas palavras, conduz “diretamente ao farisaísmo”. No entanto, Lewis interpreta equivocadamente a função desses protestos. O salmista deve estar convencido da própria inocência a fim de suplicar confiantemente a Deus para livrá-lo e/ou, castigar aqueles que o atormentam. De outro modo, o salmistapode sentir que seu sofrimento é merecido e que 1167
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não tem direito de receber livramento e/ou vindicação. A confiança só é possível para aqueles que não sentem condenação alguma; se há pecado, esperam que Deus lhes mostre, como no caso de Acã: “Se tivéssemos esquecido o nome de nosso Deus ou tivéssemos estendido as mãos a deus estranho, porventura, não o teria atinado Deus, ele, que conhece os segredos dos cora ções?” Uma vez que nenhuma voz profética de condenação se apresenta, o rei e seu exército concluem: “Mas, por amor de ti, somos entregues à morte continuamente, somos considerados como ovelhas para o matadouro” (SI 44.20-22[21-24J; cf. Rm 8.36). Assim, o rei pode orar: “Desperta! Por que dormes, Senhor?... Levanta-te para socorrer-nos” (vv. 23-26). Alguns salmos são inteiramente cânticos de confiança ou fé (p. ex., 16; 23; 62; 91; 121). O mais famoso é o Salmo 23. Em sua primeira parte (vv. 1-4), usando da metáfora de um pastor apascentando suas ovelhas, Davi louva com uma série de declarações a provisão de Deus (“nada me faltará”) (v. 1), sua renovação (“refrigera-me a alma”) (v. 3) e sua proteção (“não temerei mal nenhum”) (vv. 3-4). Na segunda parte (v. 5), Davi intensifica esses atributos usando a metáfora de um anfitrião com um convidado: “o meu cálice transborda”, “unges-me a cabeça com óleo”, “na presença dos meus adversários”. Na terceira parte (v. 6), deixa a esfe ra das imagens para voltar à realidade do templo, na qual resume os atributos benevolentes de Deus em consideração nesse cântico: sua “bondade e misericórdia” eternas (v. 6). Apesar de o Salmo 139 ser um salmo de lamento, a confiança que ele inspira faz dele também um cântico de fé. O salmista não se acovarda diante dos inimigos (vv. 19-24) pois Deus o conhece (vv. 1-6) e está com ele, quer no céu ou no mais profundo abismo (vv. 7-12), e ele está certo disso pois foi Deus quem o criou (vv. 13-18). d. A seção de súplica consiste normalmente de um apelo a Deus em favor do salmista fim de livrá-lo (heb.ys ‘) e/ou de castigar-lhe os inimigos. O termo “livrar” diz respeito tanto ao âmbito militar quanto ao jurídico; denota uma intervenção militar ou física em função daquilo que é de direito de alguém (Sawyer, 479). Em outras passagens, o salmista fala da “justiça” de Deus (ou seja, ele faz o que é certo para com seu companheiro de aliança) (cf. 4.1 [2]; 23.3). Seria incoerente com o caráter de Deus abandonar o companheiro de aliança e entregá-lo nas mãos dos seus inimigos para sempre. Trinta e cinco dos salmos de súplicas pedem a Deus que castigue o inimigo. Esses sal mos causam uma certa perturbação em várias pessoas. Lewis (23) refere-se a eles como “Sal mos terríveis (ou, ousamos dizer?) desprezíveis”. Na verdade, porém, ao refletir sobre essas passagens, vemos que ensinam uma sã doutrina (2Tm 3.16) e são verdadeiramente sagrados, i. Essas súplicas são feitas por santos (esp. o rei que sofre inocentemente), que foram vítimas das mais graves injustiças. São poucos os comentaristas que passaram pela agonia da mais pura agressão inteiramente sem motivo, ii. São retas e justas; pedem a retribuição rigorosa (cf. Lv 24.17-22). Aqui, o comentário de Lewis (28) mostra-se proveitoso, pois ele observa que tais expressões não podem ser encontrados na literatura pagã, uma vez que Israel possuía uma cons ciência muito mais forte do certo e do errado. Devemos acrescentar ainda que o NT confirma a justiça de Deus (Lc 18.6-8; cf. Mt 7.23 com SI 6.8; Mt 25.46; 2Ts 1.6-9). iii. Trata-se de sú plicas repletas de fé (cf. ISm 24.1-13; 26.1-12); nelas, os salmistas confiam em Deus e não em si mesmos, para vingar as injustiças praticadas contra eles. Nas palavras de Kidner (26): “Fo ram foram mais capazes do que Davi de mostrar generosidade quando atacados pessoalmente, como o provou Davi em suas atitudes para com Saul e Absalão, isso sem falar em Simei”. Os perversos, pelo contrário, tomam a vingança nas próprias mãos (cf. SI 8.2 [3]). iv. São orações éticas, pedindo a Deus para distinguir entre o certo e o errado (cf 7.8-9; 2Tm 4.14-16). v. São teocráticas, uma vez que buscam o estabelecimento de um reino justo governado pelo Administrador Moral do Universo (cf. Salmos 72, 82). O rei terreno só 1168
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pede ao Rei Celeste aquilo que este último já havia requerido daquele (cf. Dt 13.5; 17.7, 12; 19.13, 19; 21.9, 22; 22.22, 24). vi. São teocêntricas, tendo como objetivo ver Deus louvado por manifestar sua retidão e justiça aos olhos de todos (cf. SI 35.27-28; 58.10-11). vii. São evangelísticas, buscando a conversão das nações ao permitir que todos vejam que o Senhor é Altíssimo sobre toda a terra (SI 83.17, 18). viii. São pactuais, pois o mal feito a um santo é considerado uma agressão a Deus (SI 69.7-9, 22-28; 139.19-22) (cf. Martin, 537-53). ix. São orações orientais, repletas de figuras de linguagem, especialmente hipérboles (cf. Jr 20.14-18) (Kirkpatrick, xcii-xciii). x. São políticas (cf. Sheppard). Se podemos supor que o inimigo ouviu a oração, é por que ele foi revelado publicamente como aquele que se opõe ao reino de Deus. Além disso, os justos se identificam com o salmista e se reúnem ao redor dele para defendê-lo (SI 142.7; cf. a queixa de 38.11). Sem dúvida o inimigo e possível malfeitor pode ser instruído e convertido por meio da oração (cf. 51.13; 94.8-11). Apesar de serem teologicamente corretas, porém, es sas súplicas por retribuição não são apropriadas para a igreja, por vários motivos; entre eles: o julgamento ocorrerá no fim dos tempos (Ap 20.11-15; cf. Is 61.1-2... Mt 13.30; 25.46; Lc 4.1820; Jo 15.15; 2Co 6.2; 2Ts 1.5-9); pecado e pecadores são diferenciados de maneira mais clara (cf. Ef 6.11-18), permitindo que o cristão odeie o pecado e, ao mesmo tempo, ame o pecador. A luta do cristão é contra os poderes espirituais das trevas, na qual ele sai vitorioso ao dar a outra face e orar pelo perdão dos inimigos (Mt 5.39-42, 43-48; 6.14; Lc 6.28, 35; At 7.60). e. Os salmos de súplica terminam com louvor (p. ex., SI 13.6). i. Louvor declara rio. O heb. ydh costuma ser traduzido por “agradecer”. Na verdade, porém, o heb. não possui equivalente algum para o nosso vb. “agradecer”. Uma tradução mais fiel seria “confessar em louvor”. Nos chamados “salmos de ações de graças”, o salmista reconhece publicamente (ou seja, confessa) e louva especificamente o que Deus fez por ele. Westermann (27-28), que chama esses textos de “salmos de louvor declaratório”, faz uma distinção bastante útil entre o nosso termo “agradecer” e o heb. ydh, louvar: 1. No louvor aquele que está sendo louvado é exaltado...; no agradecimento, aquele que o recebe permanece na mesma posição. 2. No louvor, me dirijo inteiramente àquele que louvo...; no agradecimento expresso minha gratidão. 3. A liberdade e a espontaneidade pertencem à essência do louvor; agradecer pode tomar-se uma obri gação. 4. O louvor tem um foro e sempre ocorre em grupo, o agradecimento é par ticular, pois não precisa ser da conta de mais ninguém além daquele que está sendo agradecido. 5. ... O louvor é sempre espontâneo; o agradecimento, porém, precisa muitas vezes de motivação externa. 6. A marca verbal característica mais importante é que a ação de graças ocorre ao se pronunciar a frase “[eu] te agradeço”...; o louvor autêntico e espontâneo ocorre numa frase na qual aquele que está sendo louvado é o sujeito: “tu tens feito...” ou “tu és...”.
O louvor declaratório (p. ex.. Salmos 18,2 1,3 0 ,32 , 34,92, 103, 107, 116, 118, 124, 138) costuma seguir uma estrutura: A. Uma introdução, em que o adorador declara a intenção de louvar o Senhor (cf. SI 116.1-2). B. Uma seção principal, na qual o adorador narra sua ex periência de livramento (vv. 3-9). C. Uma conclusão, em que ele volta a dar testemunho do ato de bondade do Senhor ou oferece uma homilia à congregação (vv. 10-19). ii. Salmos de louvor. Diferentemente do louvor declaratório, o louvor descritivo cele a pessoa de Deus e suas obras em geral e não um ato específico de livramento ou a resposta a uma súplica. Acima de tudo, esses salmos louvam a Deus por seu hesed, que ocorre 127x no 1169
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livro de Salmos (TH AT1:601). Esse termo rico em significado é traduzido de várias maneiras: “misericórdia”, “amor inabalável”, “constância, amor”, “amor que nunca falha”. Esse termo, referente à aliança, refere-se ao socorro infalível aos desamparados. Nos salmos, muitas ve zes é paralelo a “bondade” (SI 23.6), “salvação” (85.7), “fidelidade” (89.2; 100.5), “justiça” (ver acima) (103.17), “verdade (ou seja, confiabilidade)” (25.5). B. W. Anderson (Ou! o f the Depths, 59) chega à seguinte conclusão: “Diferentemente dos deuses inconstantes e cheios de caprichos do mundo antigo, o Deus que Israel adora é fiel às promessas que faz, é constante e tem um comportamento coerente”. Em suas formas mais simples, o louvor descritivo é constituído de um chamado para louvar (SI 117.1), um motivo de louvor (v. 2) e um novo chamado para louvar (v. 2b). Esses hinos louvam a Deus como Criador (Redentor) de Israel (100, 111, 114), como Criador do mundo, que é seu templo (8, 104, 148) e como Criador e Soberano da história (33, 103, 113, 117, 145— 147, 150). 2. Outras formas. Existem, também, outros tipos de salmos. Os Salmos 50 e 81 sã liturgias que têm por objetivo renovar a aliança de Israel. Salmos de sabedoria visam instruir Israel na piedade e na ética (37,49,73,112, 127— 128). Salmos expositivos ou narrativos têm por objetivo instruir Israel sobre sua história sagrada (78,105, 106, 135— 136). Os cânticos de Siâo celebram a eleição de Sião por Deus (46,48, 76, 84, 87, 121— 122). Vários salmos apre sentam uma mistura desses elementos. O Salmo 34, um salmo declaratório (vv. 1-10), encerrase com um longa pregação na forma de sabedoria (vv. 11 -22). D. A abordagem litúrgica Para Gulkel, o contexto de vida no qual as diversas formas de salmos eram cantados não importava. Ele reconheceu que as origens disso encontravam-se na realeza e no templo do período anterior ao exílio, mas considerou-os “cânticos espirituais” mais recentes da vida religiosa do indivíduo. O discípulo de Gulkel, S. Mowinckel (1962), porém, resgatou o con texto original de diversos salmos como parte de cerimônias litúrgicas do primeiro templo. As evidências internas dos próprios salmos, bem como as evidências externas, tomam essa tese inquestionável. Além disso, como foi observado, é igualmente certo que o ungido do Senhor, o “fôlego de ... vida” de Israel (Lm 4.20) desempenhava um papel importante nessa liturgia. No entanto, Mowinkel não se mostra convincente em sua teoria de que muitos dos salmos eram entoados numa festa anual, no equinócio de outono, quando a seca do verão terminava e iniciavam-se as primeiras chuvas, constituindo cânticos por meio dos quais o Senhor “tomavase rei”. Mowinkel deduziu a existência dessa festa tomando por base o festival de Aquitu na Babilônia e não o AT. A. Weiser (esp. 35), também associou a maioria dos cânticos com uma festa específica de outono, mas, de acordo com ele, essa festa servia para renovar a aliança de Israel, sendo semelhante à cerimônia de Josué 24. H. —J. Kraus (1966) imaginou um festival mais complexo, mas não obteve mais consenso para sua teoria do que os outros dois. Waltke resgatou a teoria de Thritle de acordo com a qual a oração “Ao mestre de can to (+ uma oração prep. opcional)” que apresenta 55 salmos, era originalmente um pós-escrito (P.S.) do salmo anterior e não parte original dos cabeçalhos. Entre outras coisas, Waltke ar gumentou em favor de sua teoria tomando por base a comparação com a literatura do OMA; o exemplo paradigmático de Habacuque 3; a capacidade da teoria de explicar vários dilemas, inclusive a resolução da conhecida crux interpretum nos cabeçalhos do Salmo 88 que, contra riando a lógica, especificam dois gêneros e dois autores; e, por fim, os paralelos da LXX e de 11 QPsa. Caso Waltke esteja correto, então os cabeçalhos referem-se à redação dos salmos e os pós-escritos à execução litúrgica dos salmos. 1170
Salmos: Teologia de
As evidências internas dos salmos para uma interpretação litúrgica são convincentes apesar das objeções de Szorenyi. Pode-se encontrar ali referências freqüentes a “Siâo”, um local litúrgico, bem como à “casa do Senhor” ao “santo monte”, etc (p. ex., SI 2.6; 3.5; 49.1; 63.14; 74.3; 76.2; 92.12, 13; 100.4; 114.2; 116.18, 19; 118.19, 20). Também é possível encontrar-se uma mistura de referências a ofertas (22.25-26; 96.8; 107.23; 116.14, 17-19), festas (50.8; 69.22), visitas a amigos (22.22-24) e procissões públicas (15, 24, 26.6-8[cf. 43.4]; 47.1; 59.8; 68.24-27; 84). Além disso, há uma coletânea inteira intitulada “cânticos de romagem [= pere grinação?]” (120-34). Também faz-se referência a objetos sagrados: altar (84.3; 118.27), cálice (116.13), pendões (20.5) e instrumentos musicais (47.5; 150). Dentre as figuras sagradas, há anjos (103.20-21), sacerdotes (132.8-9), levitas (135.19-21), guerreiros e adoradores (Salmos 20—21) e, acima de tudo, o rei ungido. Por certo, alguns salmos foram redigidos longe de Sião (42— 43) ou depois da destruição do templo (74,79). No entanto, até mesmo estes estão “intimamente relacionados ao santuário e suas tradições cultuais, de modo que não restam no livro de Salmos muitos hinos sobre os quais seja possível dizer que estejam ‘dissociados’ do culto nem muitos outros criados exclu sivamente para a edificação pessoal” (Weiser, 81). Em 1924, Mowinckel reconheceu apenas dois ou três salmos que não eram litúrgicos (1, 11, 127). Acrescentou então à salmografia de instrução: 1, 34, 37, 49, 78, 105, 106, 111, 112, 127 que atribuiu aos sábios. Porém, os sacer dotes instruíam o povo na Torá, e o rei Salomão escreveu provérbios. Holm Nielsen redefiniu o culto de modo a incluir nele a sinagoga do pós-exílio, na qual não é possível separar-se o ensino da lei da adoração divina. Murphy também não admitiu uma separação clara entre as esferas da sabedoria e do culto, apesar de não ter certeza do contexto exato dos Salmos 1, 32, 34,37,49, 112, 128. Baab (59) apresenta um excelente resumo da importância da interpretação litúrgica para a teologia do livro de Salmos: “Ao usar essa literatura, o indivíduo e o grupo se fundiam, e o mesmo espírito que movia o grupo passava a mover também o indivíduo; quer fosse isso a disposição, um momento de contrição, a fé ou a ação de graças jubilosa. Por meio de sua participação irrestrita nos atos de adoração comunitária, o indivíduo encontrava a si mesmo e também o Deus pelo qual sua alma ansiava; e, nesses ritos, os recursos abundantes e as tradi ções inspiradoras da história de seu povo eram colocados à disposição dele”. Buss (322) rejeita a definição de Hegel para o culto como a participação da existência finita no ser essencial, porque tal definição não é apropriada para Israel, onde há uma tensão entre o Senhor e seus adoradores. O Senhor exige fidelidade à aliança para que se tome parte no culto: “No culto israelita, a relação entre Deus e o homem não é natural, no sentido de algo pressuposto. E preciso haver uma decisão; certas leis são determinadas e a aliança tem o res paldo de ameaças e promessas. Deus e o homem encontram-se frente a frente, numa situação pessoal”. E. A Edição do Livro de Salmos O livro de Salmos começa com cânticos de indivíduos, escritos sob circunstâncias tóricas singulares. Esses poemas eram usados na liturgia de adoração em Israel e posteriormen te foram compilados nas primeiras coletâneas. O Salmo 72.20, “Findam as orações de Davi, filho de Jessé” é o arremate de uma coletânea mais antiga. A observação em 2 Crônicas 29.30 indica que no tempo de Ezequias existiam duas coletâneas: “as palavras de Davi” (cf. Salmos 3— 41, exceto 33) e “as palavras de Asafe” (50, 73— 83). E provável que o salmos dos filhos de Corá (42— 49, 84— 88 [mas não 86]) constituíssem uma outra coletânea. Os chamados 1171
Salmos: Teologia de
“Salmos Eloístas” (42— 83), provavelmente uma coletânea anterior, estão divididos hoje entre os Livros II e III, cuja junção encontra-se nos Salmos 72 e 73. Essa coletânea é marcada por um contraste estatístico gritante entre o uso dos nomes divinos yhwh e elohim. Enquanto em 1— 41 e 84— 150, yhwh ocorre 584x e elohim 94x, em 42— 83 yhwh é usado 45x e elohim 210x. Além disso, no res tante do livro de Salmos, yhwh ocorre na maioria das vezes na parte a do versículo e elohim na parte b, mas em 42— 83, a situação se inverte. Por fim, nos Salmos sinópticos os nomes são invertidos (cf. 14.2, 4, 7 com 53.3, 5, 7; 40.14a, 17 com 70.2a, 5). Não se chegou a um con senso quanto a uma explicação para a existência dos “Salmos Eloístas”. Os 150 salmos que agora temos em mãos — apesar de os Salmos 9— 10 e 42—43 constituírem originalmente unidades que foram posteriormente separadas em suas partes por motivos litúrgicos — são divididos em cinco livros. Os livros são demarcados por doxologias que consistem de bênçãos sacerdotais, a expressão “Bendito seja o Senhor” e as respostas da congregação, “Amém”, no final dos Salmos 41, 72,89, 106. Os livros também são demarcados, em suas junções, por uma mudança de escritores. As variações nessas doxologias podem ser mais bem explicadas ao considerá-las como partes integrantes dos salmos às quais encontramse anexadas e não como acréscimos de um só redator (Wilson, 183-86). Uma vez que o Salmo 106 (cf. v. 47) termina com uma oração pela reunião de Israel depois do exílio e o Salmo 107 (cf. v. 3) começa considerando esse ajuntamento um fato realizado, é plausível concluir-se que a divisão nessa junção ocorreu depois da volta de Israel do exílio (c. 536 a. C.). Os MMM (c. 150 a. C.) também apresentam esse arranjo com cinco livros e, assim, marcam o termius ad quem para sua edição (ver DJD l:133;Arens, 107). O judaísmo rabínico também estava ciente dessa divisão (Braude). A tradição judaica explicava esse segundo “Pentatcuco” como um eco intencional do primeiro. Um midrache do período talmúdico sobre o Salmo 1 diz: “Assim como Moisés deu cinco livros da lei para Israel, também Davi deu cinco livros de Salmos para Israel” (Braude 1:5). Sem dúvida, trata-se de algo apropriado. Moisés instituiu o elementos litúrgicos de Is rael: seus objetos, festas, pessoas e atividades sagradas. Davi, o Mozart de Israel, transformou a liturgia mosaica numa ópera ao colocá-la no palco do templo e dar-lhe o acompanhamento com música e o libreto de seus salmos. Essa edição final afeta significativamente tanto a interpretação quanto a teologia do li vro de Salmos. A maioria dos estudiosos concorda que os Salmos 1— 2 sejam uma introdução e que 146— 150 sejam o apogeu final de louvor. De acordo com Childs (IOTS, 513), o Salmo 1 transforma o conteúdo do livro de súplica viva e louvor na liturgia do templo para uma obra de reflexão e meditação: “Por certo, em seu estádio final de desenvolvimento, o Salmo 1 ad quiriu uma função extremamente significativa como um prefácio para os salmos que devem ser objeto de leitura, estudo e meditação...” Wilson (207) concorda: “(Salmo 1) indica que se trata de uma coletânea para ser lida e não cantada; volta a atenção do contexto cultuai individual de composições isoladas para o contexto literário mais amplo do todo”. Essa mudança também afeta as doxologias sacerdotais e os Améns da congregação. De acordo com Jenni (117— 18), “O ‘Amém’ do povo não é mais uma resposta aos feitos majestosos de Deus, mas sim às pa lavras majestosas de Deus”. O segundo salmo apresenta o assunto principal, o rei em oração. Na sua coroação, o rei recita uma variação profética do decreto da aliança davídica (cf. 2Sm 7.14): “Pede-me, e eu te darei as nações por herança e as extremidades da terra por tua possessão” (SI 2.8). No restante do livro de Salmos, o leitor encontra as súplicas e louvores do herdeiro de Davi. “O ungido” tem um papel importante não apenas nessa introdução, mas também nas junções do 1172
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livro. Salmos 72 e 89. Os Livros 1a III estão inequivocamente relacionados ao rei. Nas palavras de Wilson (208): “A presença do pós-escrito em 72.20, anunciando a conclusão das ‘orações de Davi, filho de Jesé’ indica que os Livros Um e Dois podem ter sido combinados de modo a formar uma coletânea anterior introduzida e concluída por ‘Salmos do Rei’, a qual, em fun ção de seu conteúdo predominantemente davídico (60 dos 70 salmos), pode muito bem justi ficar a descrição ‘orações de Davi’”. Dentro desses livros, Wilson enxerga uma progressão no pensamento. O Salmo 2 apresenta o conceito da aliança davídica, os Salmos 3 e 41 falam da garantia que o rei tem da proteção e segurança do Senhor diante de seus inimigos e o Salmos 72 traz várias súplicas para o filho do rei: que ele reine com justiça; que seu domínio seja pro tegido de seus inimigos; que tenha uma vida longa e seja abençoado. “Assim, a aliança que Javé fez com Davi (Salmo 2), e em cujas promessas Davi descansava confiantemente (Salmo 41), é passada adiante para os descendentes de Davi nessa série de súplicas em favor do filho do rei" (Salmo 72) (211). No Livro III e no hino de conclusão, o Salmo 89, obtém-se uma nova perspectiva. Trata-se do livro sombrio dos Salmos. A aliança é considerada como estabelecida num passado obscuro e, o mais importante, é vista como uma aliança rompida: “Na conclusão do terceiro livro, logo antes da pausa que separa os primeiros livros dos últimos, tem-se a impressão de que existe a memória de uma aliança, mas se trata de uma aliança fracassada. A aliança daví dica apresentada no Salmo 2 não deu em nada e a combinação dos três livros encerra-se com o clamor an gustiado dos descendentes de Davi” (Wilson, 213). No Livro IV, tem-se ainda outro ponto de vista. Desprovida de um rei, Israel volta-se para a sua herança. Os israelitas fazem uma retrospectiva relacionada a Moisés, que é mencionado 7x ali (90.1; 99.6; 103.7; 105.26; 106.16, 23, 32), enquanto até então havia sido mencionado apenas uma vez (77.21), e cujo único cântico em Salmos dá início ao Livro IV. Além disso, Israel volta a olhar para o seu Rei eterno, o Senhor: “Senhor, tu tens sido o nosso refúgio, de geração em geração... de eternidade a eternidade, tu és Deus” (cf. 90.1 -2). Nos Salmos 93—99, pode-se encontrar os chamados “Salmos de Entronização”: O Senhor é Rei! Ele foi o refúgio de Israel no passado, muito antes da existência da monarquia e continuará sendo o refúgio de Israel agora que a monarquia não existe mais; bem-aventurados são aqueles que confiam nele. O Livro V tem uma ligação clara com o Livro IV. O Salmo 106.47 encerra o Livro IV com a oração “Salva-nos, Senhor, nosso Deus, e congrega-nos de entre as nações”. O Livro V começa com o pressuposto de que esse ajuntamento é um fato consumado: “E [nos] congre gou de entre as terras” (107.3). As dificuldades do exílio haviam sido superadas. Dois grupos de coletâneas davídicas podem ser encontrados nesse livro: 108— 110; 138-—145. A intenção do redator é apresentar Davi como um modelo em resposta às preocupações dos salmos ante riores a esses: Assim, nos Salmo 108— 110, Davi aparece como o “sábio” (107.43) que atenta para as advertências de 107.39-42 e se apóia somente no amor inabalável de Javé. A disposição de Davi para cantar louvores a Javé “entre os povos” ( 108.3) toma-se um paradigma a ser seguido, quer por aqueles que ainda estão no exílio ou no meio daqueles que voltaram e se encontram vulneráveis e cercados pelos inimigos. Davi sabe que somente a confiança em Javé é eficaz... (108.12)... Da mesma forma, no primeiro grupos de salmos davídicos. Davi serve de exemplo nos Salmos 138— 144 depois do clamor lamentoso expressado nas palavras do Salmo 137, imediatamente anterior a essa seqüência”. (Wilson, 221) 1173
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Além disso, alguns desses salmos davídicos apresentam uma acentuada esperança messi ânica. No Salmo 110.1 a , usando de linguagem claramente profética, “Disse o Senhor (ne um)", Davi antevê um rei maior do que ele próprio: “Disse o Senhor ao meu Senhor” (Mt 22.41-46) como Jesus repetiu com veemência. Este rei será um sacerdote-rei e guerreiro segundo a ordem de Melquisedeque. A direita de Deus (v. 1b) e tendo Deus à direita de si (v. 5), esse rei e seu exército aniquilarão os reis rebeldes e dominarão sobre a terra (vv. 6-7). No Salmo 118, Israel solta brados de louvor ao rei que foi rejeitado pelos construtores, mas que Javé constituiu como pedra angular (vv. 22-23), “Bendito o que vem em nome do Senhor” (v. 26). O messianismo não teve origem no período intertestamental do judaísmo posterior, mas no ideal monárquico da antiga Israel, conforme expresso nos salmos do rei. Esse ideal não se deveu ao Hofstil do OM A, como afirmou Gunkel, mas à esperança verdadeira de Israel aplica da aos reis em exercício (cf. Mowinckel, 1956, 98). Quando o livro de Salmos foi finalmente editado, os salmos do rei, ou seja, a maioria deles, atingiram a plenitude como salmos messi ânicos. Ao representarem o rei visual e idealmente para o povo, esses salmos eram sempre re pletos de expectativa messiânica, mas, depois do exílio, quando Israel ficou sem um monarca, também teve em mãos essa coletânea de salmos do rei, com os mantos reais à espera de um soberano digno de vesti-los. Há um tom messiânico em todo o livro de Salmos que temos em mãos nos dias de hoje. F. A Interpretação dos Salmos Jesus de Nazaré identificou-se como o Messias, o Cristo, e também foi visto como tal por seus apóstolos. O NT considera Davi e Israel, os representantes do reino de Deus sob a antiga aliança, como tipos de Cristo e sua igreja, representantes fundamentais do reinos sob as provisões da nova aliança. O NT faz citações explícitas do livro de Salmos, dando importância secundária às paixões de Davi e primária às de Cristo (cf. SI 6.3 [4] com Jo 12.38; SI 41.9 [10] com Jo 13.18; SI 42.6 com Mt 26.38; SI 22.1 [2] com Mt 27.46; SI 31.5 [6] com Lc 23.46; SI 35.19 com Jo 15.25; SI 22.18 [19] com Jo 19.24; SI 34.20 com 19.36; SI 69.21 [22] com Mt 27.34, 48; SI 109.24 [25] com Mt 27.39; SI 109.8 [9] com At 1.20; SI 2.1 com At 4.25-26). O fervor do ungido (SI 69.9 [10]) tipifica o fervor do Ungido (Jo 2.17). Os ensinamentos régios do salmista prenunciam os ensinamentos régios de Jesus (cf. SI 78.2 com Mt 13.35; SI 37.11 com Mt 5.5; SI 48.2 com Mt 5.36; SI 78.24 com Jo 6.31; SI 82.6 com Jo 10.34). A glória do rei ungido do AT toma-se a glória do Rei Ungido do NT (cf. SI 118.22-23 com Mt 21.42; SI 16.9 com At 2.25-31; SI 22.22 [23] com Hb 2.10-12; SI 110.1 com Mt 22.44; SI 18.49 [50] com Rm 15.9; SI 45.6 [7] com Hb 1.8-9). Alguns desses salmos são tão indiretamente tipificados que o o uso deles no NT indica com forte probabilidade que todos os salmos sejam uma tipificação de Cristo. Outros salmos empregam um vocabulário tão específico e singularmente concretizado na carreira de Cristo e não na do salmista que há pouco espaço para dúvida — para aqueles que não impõem limites sobre o dom profético — de que o salmista seja um profeta prenunciando os sofrimentos e as glórias de Jesus Cristo. Alguns salmos específicos que falam indiretamente de Cristo são: “minha alma está profundamente perturbada” (SI 6.3 [4]), “nas tuas mãos, entrego o meu espírito” (31.5 [6]), “os meus inimigos gratuitos” (35.19) e “Por que estás abatida, ó minha alma?” (42.5 [6]). Nas palavras de Kidner (23-24): “Uma observação mais atenciosa da forma como esses salmos são tratados indicará que são considerados amostras de um conjunto de textos mais amplo. Não seria exagero inferir-se, a partir desse tratamento, que onde quer que Davi ou o rei davídico apareça nos salmos... prenuncia em maior ou menor grau o Messias”. E evidente que, a fim 1174
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de a história progredir, o antítipo deverá ser maior do que o tipo. Enquanto o salmista (o tipo) confessa seus pecados. Cristo (o Antítipo) não tem pecado algum. Ademais, enquanto o tipo é filho de Deus em sua condição de herdeiro da aliança davídica (cf. Jo 1.49), Cristo é Filho de Deus pela concepção virginal (Lc 1.35) e por sua glória pré-encamada como Pai (Jo 17.1-5). No Salmo 2.6, no horizonte histórico o termo “filho” é escrito com letra minúscula, mas no horizonte profético, “Filho” deve ser escrito com letra maiúscula. Alguns salmos claramente proféticos são: “Repartem entre si as minhas vestes e sobre minha túnica deitam sortes” (SI 22.18); “Preserva-lhe todos os ossos, nem um deles sequer será quebrado” (34.20) e “Disse o Senhor ao meu senhor (de Davi)” (110.1). O NT comprova a argumentação de que esses salmos devem referir-se a Jesus Cristo. Vale a pena repetir que essa argumentação baseia-se muitas vezes nos cabeçalhos que atribuem a autoria do salmo a Davi. Com referência ao imperativo em 110.1, “Assenta-te à minha direita”, Ehrlich afirma: “Do ponto de vista do AT, era absolutamente impensável, mesmo em termos metafóricos, des crever um mortal assentado à direita de Javé”. Infelizmente, sob a influência do criticismo histórico, os acadêmicos limitam o dom profético e muitas vezes, enfraquecem o NT. Seguindo a LXX, Pedro interpreta, por exemplo, que o Salmo 16.10b quer dizer, “nem permitirás que o teu Santo veja corrupção”. Baseado nisso, Pedro argumenta que, pelo fato de o corpo de Davi ter-se decomposto, Davi era um pro feta e prenunciou a ressurreição de Cristo, “que nem foi deixado na morte, nem o seu corpo experimentou corrupção” (At 2.24-31). Algumas versões, porém, prejudicam a argumentação de Pedro ao traduzirem o Salmo 16.10b como “ou permitirás que o teu fiel veja a Cova” (heb. Sahat). A BDB aceita “cova” como o único significado para sahat, e HALAT 1365 atribui-lhe o significado em 16.10b. Tais evidências, porém, nâo sustentam interpretações como essas. O subs. Sahat ocorre 25x no AT, sempre em textos poéticos. Pode ser derivado do vb. Swh, afundar ou do vb. sãhat, arruinar. Os subs. do tipo Sahat, derivados de radicais II wãw (p. ex., swh-, 8755), são fem. (ou seja, o t final é o sufixo fem); os subs. derivados desse último tipo de vb. são masc. (ou seja, o t faz parte do radical). Em decorrência disso, podem haver homônimos, um na forma fem. e outro na masc. nahat (fem.; BDB, 629; -> # 5739) de nwh, significa “quietude / descanso”, mas nahat (masc.; BDB, 639; -> # 5663), de nãhat, significa “descendência / descendente”. Todas as versões antigas consideravam Sahat um ho mônimo. Ninguém nega que, por vezes, signifique “cova”, mas a LXX e a Vg. consideraram que o sentido fosse de “corrupção” ou “decomposição” nos Salmos 9.16; 29[30].10; 34[35].7; 48[49].10; 54[55].24; 102[103].4. Sím. entendeu o termo dessa forma nos Salmos 35.7; 55.24 e Aq. o considerou assim nos Salmos 7.16; 30.10, Teodósio em Jó 33.22, 30. Além da LXX, para Jerônimo e o texto da Sir., esse era seu significado no Salmo 16.10. Aparentemente alheio a Sahat (masc.), Pope (Job, 1965, AB, 75) reconhece que provavelmente signifique “imundície” em Jó 5.31 e tenta explicar essa conclusão como devida à natureza putrescente do reino dos mortos. Porém, um exemplo claro de sahat masc. pode ser encontrado em Jó 17.14: “Se ... (Sahat) eu clamo: tu és meu pai; e aos vermes (rimmâ, vermes, fem. coletivo; -> # 8231): vós sois minha mãe e minha irmã”. No final do século XIX, K. Brugmann mostrou que o gê nero gramatical orientava a imaginação poética na personificação (citado por IBHS, 100, P. 6.3. le). “Verme” (rimmâ) é fem., daí a personificação “minha mãe e minha irmã”. Podemos inferir seguramente, portanto, que sahat, personificado como “pai”, é a forma masc. “corrup ção / decomposição”. Ademais, é possível determinar-se que se tem em vista a forma masc. “corrupção” e não a fem. “cova”, no Salmo 16.10, pelo vb. “ver” (lir ’ôt). “Ver” expressa conceitos como “experi mentar”, “suportar”, “provar” e outros semelhantes, e tem como objeto um subs. indicativo da 1175
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condição da alma ou do corpo: p. ex., ver a morte (SI 89.48[49]), ver / suportar a adversidade (90.15; Jr 44.17), ver trabalho e tristeza (Jr 20.18), ver espada e fome (5.12), ver a afl ição (Lm 3.1). Quando, pelo contrário, indicam a idéia de lugar (p. ex., cova, sepultura, Seol, portas do além, etc.), o escritores heb. usam um vb. de movimento; p. ex., entrar (Jó 5.26), ir (Is 38.10; Ec 9.10), abeirar-se (SI 88.3 [4]; 107.18), descer (Jó 21.13), cair (SI 7.15[ 16]; 57.7). A expres são “descer à cova” ocorre 4x no livro de Salmos; 9x em Ezequiel; cf. Provérbios 1.12; Isaías 38.18. Nesse caso, são as versões antigas — e não os lexicógrafos moderno — que apresentam a melhor argumentação, como também o faz o NT. As previsões específicas de alguns salmos que se cumprem em Jesus Cristo, combi nadas com o uso do livro de Salmos no NT, indica que todo o conjunto de salmos diz respeito a Jesus Cristo e sua Igreja. O NT identifica o Criador eterno com Jesus Cristo (cf. SI 102.2527(26-28] com Hb 1.10-12). Os apóstolos não hesitaram em usar os salmos com referência ao presente (cf. SI 34.12-16 com lPe 3.10-12; SI 55.22 [23] com lPe 5.7; SI 90.4 com 2Pc 3.8; SI 4.4 [5] com E f4.26; SI 112.9 com 2Co 9.9; SI 116.10 com 2Co 4.13; SI 24.1 com ICo 10.26; SI 146.6 com At 4.24; 14.15). B ib l io g r a f ia
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Salomão (nÒVli? [selõmõh\, # 8976).
AT 1 .0 segundo filho de Davi e Bate-Seba (a primeira criança morreu no parto), assim que nasceu, Salomão recebeu o nome de y^dic^yâ, o Amado de Javé, do subs./adj. relativamente raro yãdid, amado, adorável. E provável que o nome Salomão, selõmõh, do radical bastante conhecido Sim, estar em paz (-> #8966) fosse sua designação como rei, ressaltando a expecta tiva de paz que cercava o jovem monarca. 2. Salomão sucedeu seu pai, Davi, c. 950 a. C., por meio de manobras políticas arti culadas com a ajuda da mãe, do sumo sacerdote Zadoque e do profeta Natã que o colocaram na frente do irmão mais velho. Tudo indica que Salomão fosse um excelente político e que se aproveitou da lacuna de poder existente na Síria/Palestina (c. 1200-750 a. C.) para construir um reino vasto e pacífico que durou até sua morte c. 932 a. C. (1 Rs 4.21). Esse reino manteve e expandiu a coalizão complicada dos interesses das tribos do Norte e do Sul, iniciada por Davi cerca de quarenta anos antes (4.25). 3. O reino de Salomão era protegido por forças armadas poderosas, especialmente em função de seus carros (lR s 4.26; 10.26-29) e pelo alistamento forçado de soldados e traba lhadores (5.13-18; 9.15-22; 12.4). O rei construiu cinturões defensivos de cidades fortificadas tanto no Norte quanto no Sul (9.15-18). Por meio dos estudos arqueológicos, foi possível de finir os aspectos característicos das principais fortalezas salomônicas, inclusive os chamado “portais salomônicos” que guardavam a entrada das cidades de Gezer, Hazor e Megido. (Para 1177
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disucssôes em andamento sobre esses portais, ver a bibliografia.) Salomão também fez alianças com várias potências estrangeiras, principalmente por meio de casamentos de caráter político, o que significava, possivelmente, a tolerância a religiões estrangeiras em Israel (11.1-8). Um destaque dentre essas esposas de outros povos foi a filha de Faraó (3.1; 11.16, 24). A ligação profícua de Salomão com o rei Hirão de Tiro (5.1-11) trouxe para Israel trabalhadores e artesãos habilidosos necessários para os diversos projetos de construção de Salomão. 4. O desenvolvimento econômico também foi parte da expansão imperial de Salomão. O rei importava carros e cavalos do Egito e exportava-os para os reis do Norte (lR s 10.2829). Uma frota de navios de Eziom-Geber na península oriental do mar Vermelho (próximo à atual Eliate) abriu o reino de Salomão para o comércio com o Oriente (9.26-28). O intercâmbio com Ofir, a rainha de Sabá e com os reis da Arábia beneficiou Salomão com grandes quanti dades de ouro, pedras preciosas, especiarias e a rara madeira de sândalo (10.1-14). Outra frota do posto naval de Társis ocupava-se com as rotas comerciais do Mediterrâneo, voltando com ouro, prata, marfim, bugios e pavões (10.22). Salomão também controlava as regiões ricas de mineração de cobre no sul do Neguebe. 5. Os rendimentos do comércio foram investidos na campanha de construção monu mental e característica do reinado de Salomão. Além das fortificações mencionadas acima, o rei também construiu cidades-celeiros por toda a terra ( I Rs 9 .17-19). No entanto, suas realizações mais extraordinárias deram-se em Jerusalém, onde passou treze anos construindo seu próprio palácio e um conjunto de edifícios administrativos, e gastou mais sete anos para completar o templo (6.37; 7.1). Salomão é conhecido justamente por este último, que se tomou o centro da adoração israelita até ser destruído pelos babilônios em 587 a. C. 6. Nem todos os resultados da expansão imperial de Salomão foram positivos. A reor ganização das terras em distritos tributários não respeitou as antigas demarcações das tribos e gerou hostilidades que persistiriam por longo tempo. A reação à política salomônica de recru tamento de trabalho foi violenta e constituiu uma das causas por trás da divisão do reino depois da morte de Salomão (lR s 12.1-19). Os tratados políticos urdidos por ele por meio de casa mentos foram considerados oportunidades para a infiltração de influências religiosas (11.1-8) e motivo da desaprovação e censura divinas (11.9-40). 7. E interessante observar que, apesar de o texto bíblico avaliar Salomão como um dos maiores reis de Israel, não há menção alguma a Salomão em outras fontes extrabíblicas além daquelas do historiador judeu Josefo. 8. Em termos teológicos, ressaltam-se cinco imagens importantes de Salomão. a. O herdeiroprototipico da aliança com Davi. O tema de maior abrangência associad a Salomão e ao qual as imagens restantes são relacionadas é a condição emergente desse rei como primeiro e prototipico herdeiro da aliança davídica (2Sm 7.4-17). Salomão não é apenas o herdeiro primário da dinastia davídica como também passa a ser um referencial teológico para a avaliação dos descendentes ulteriores. Na condição de herdeiro prototipico, Salomão é descrito tanto em termos positivos quanto negativos. Os aspectos positivos de seu reinado são ressaltados nas narrativas iniciais da humildade de Salomão, da sabedoria concedida por Deus, bem como da opulência do reino e da preocupação com a vida religiosa de Israel centralizada no templo em Jerusalém (esp. 1Rs 3— 5). Esses elementos tornam-se critérios para a avaliação de reis davídicos posteriores e indicadores com base na aliança davídica para determinar se esses reis são dignos da assistência ou da condenação divina (2Sm 7.13-14; Dt 17.18-20). No outro prato da balança, porém, a confiança de Salomão em seu poderio militar, a manipulação de casamentos políticos e a riqueza tomam-se parâmetros negativos para medirem o insuces so dos reis davídicos na manutenção da aliança (esp. Dt 17.8-20). Em certo sentido, Salomão 1178
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personifica o que houve de melhor e de pior na monarquia pós-davídica e fornece um para digma rigoroso para a conduta correta, bem como uma ilustração vivida das conseqüências de se optar pelo mal. b. O construtor do templo. A construção do templo de Jerusalém por Salomão é descrita em 1 Reis 5—9 (cf. 2Cr 2— 7). Tanto em 1 Reis quanto em 2 Crônicas, diz-se que o projeto foi concebido por Davi e realizado por Salomão. O relato em Reis é um tanto reticente quanto à organização das ordens dos funcionários do templo e da adoração ritual. Salomão parece ser a figura ativa nesse processo, enquanto o envolvimento de Davi limitou-se a visualizar o projeto e preparar alguns dos utensílios do templo (1 Rs 7.51). Em 2 Crônicas, porém, o papel de Davi apresenta uma expansão considerável. De acordo com o cronista, foi Davi quem projetou o templo e seus elementos suplementares, organizou os funcionários do templo e preparou o ri tual a ser seguido na adoração. Davi chegou até a coletar material para a construção, de modo que o papel de Salomão limitou-se quase que exclusivamente à supervisão das obras. Apesar da atenção que o cronista dedica a Davi, o templo de Jerusalém e a adoração naquele local conti nuaram a ser associados a Salomão (Ed 2.55, 58; Ne 7.57, 60; 12.45; Jr 52.20; At 7.47). c. O rei sábio. A sabedoria de Salomão é um dos principais elementos de sua identida de bíblica. Quando Salomão subiu ao trono, Deus propôs atender qualquer pedido do jovem rei. Salomão pediu sabedoria para reinar corretamente, discernindo entre o bem e o mal (lRs 3.3-14). Posteriormente, Salomão usou de um bom senso perspicaz para esclarecer uma con trovérsia enredada entre duas mães. A reputação de Salomão como rei sábio espalhou-se por toda Israel e pelo OMA, o que tomou esse rei extremamente requisitado (3.16-28; 4.29-34; 10.1-13, 23-24). Diz-se que a sabedoria de Salomão excedia a de todos os povos do Oriente, incluive a dos egípcios (4.29-31). Ele redigiu 3.000 provérbios, 1.005 cânticos e pesquisou as ciências naturais: árvores, animais, répteis e peixes (4.32-34). Grande parte da literatura bíblica de sabedoria é associada a Salomão. Ele aparece como escritor de algumas seções do livro de Provérbios (esp. 10.1—22.16; 25.1—29.27) e o livro todo recebe o seu nome (mislê selõmõh, provérbios de Salomão). No livro de Eclesiastes, apesar de o nome de Salomão não ser mencionado diretamente em momento algum, a intenção clara das passagens que descre vem o Pregador como “filho de Davi, rei de Jerusalém/rei de Israel em Jerusalém” (Ec 1.1,12) é associar a busca pela sabedoria, que constitui o cerne da narrativa, ao grande rei da sabedo ria. Essa associação confere peso e autoridade às observações do Pregador, o qual poderia, de outro modo, ser rejeitado como inexperiente ou, sem dúvida, pouco ortodoxo em suas idéias. O rei é ligado ainda ao livro de Cântico dos cânticos, talvez em função das referências a Sa lomão em 3.9,11; 8.11-12. Os livros apócrifos levam essa associação ainda mais longe com a inclusão do livro da Sabedoria de Salomão, uma coletânea de dezenove capítulos de exortação didática influenciada fortemente pela literatura bíblica de sabedoria, mas datado pela maioria dos estudiosos como sendo do primeiro século a. C. A sabedoria de Salomão também aparece na literatura do NT. Tal sabedoria, que chegou a atrair até mesmo a rainha da Sabá, empalidece em comparação com a grandeza de Jesus (Mt 12.42; cf. Lc 11.31). d. O rei opulento. As referências bíblicas costumam destacar Salomão como um exem plo por excelência da monarquia opulenta. A ênfase recai sobre a riqueza acumulada durante seu reinado e o luxo em que ele próprio vivia (lR s 10.14-28; cf. lCr 9.13-28). Até mesmo a grande sabedoria de Salomão é subordinada ao interesse do escritor na riqueza do rei (1 Rs 10.23-25). Apesar de o texto nos dizer que “todo o mundo” procurava Salomão por sua sabe doria, a passagem concentra-se no fato de que cada visitante levava para um rei um presente valioso. As aparições de Salomão no Cântico dos cânticos também se encaixam nessa cate goria (com exceção do título em 1.1). Salomão é descrito sendo carregado para sua cerimônia 1179
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de casamento em meio ao luxo, numa liteira perfumada, coberta de prata e ouro, cercada de guardas (Ct 3.6-11). Ele é dono de uma enorme vinha (8.11-12). O NT também reconhece a opulência de Salomão. No Sermão do Monte, Jesus compara a beleza dos lírios dos campos com a suntuosidade dos mantos reais de Salomão como prova do cuidado de Deus para com aqueles que confiam nele (Mt 6.27-33; cf. Lc 12.27). e. O rei insensato. A última imagem de Salomão no AT é a de um rei insensato. E inte ressante como o rei de renome mundial, da mais extraordinária sabedoria, aquele que construiu o templo, um modelo invejado por sua magnificência, toma-se para os escritores bíblicos a epítome da insensatez pecaminosa. Todas essas imagens encontram-se justapostas em 1 Reis 10— 11 de tal modo a sugerir que a tensão não é acidental, mas sim de importância teológica (ver esp. 10.23— 11.13). O texto afirma que na velhice, Salomão abandonou a sabedoria inicial e a lealdade a Javé e envolveu-se na loucura dos casamentos políticos com estrangeiras, acom panhados de obscuridade religiosa (11.4-8). A divisão do reino israelita logo depois da morte do rei Salomão é considerada um castigo divino por essa insensatez (11.9-13). Sem dúvida, não é por acaso que a insensatez pela qual Salomão é condenado toma-se um parâmetro importante para o fracasso monárquico na interpretação deut. da história de Israel. Muitos estudiosos observaram que a concepção altamente negativa da monarquia descrita por Samuel, na tentativa de dissuadir o povo da insistência em ter um rei, é uma referência não muito tácita aos excessos do reinado de Salomão (ISm 8.10-18). Da mesma forma, as instru ções de Moisés quanto aos limites apropriados para a monarquia israelita (não ter cavalos do Egito, nem muitas esposas para desviar de Javé o coração do rei e também não acumular rique zas) parece estar voltada justamente para tais desatinos associados a Salomão (Dt 17.14-20). A insensatez de Salomão é mencionada por Neemias como argumento contra o casamento com mulheres estrangeiras, uma vez que elas foram capazes de conduzi-lo ao pecado (Ne 13.26). O NT não faz nenhuma menção à insensatez salomônica, talvez pelo fato de essa im gem estar bastante associada à rejeição de qualquer tipo de relação com os gentios. E evidente que tal rejeição não é um padrão que Jesus e seus seguidores desejavam reforçar. Tudo indica que os textos do AT que descrevem a insensatez do grande e sábio rei Salomão aconselham que se use de cautela ao supor que a grande sabedoria leva o indivíduo inequivocamente à fé verdadeira. Há quem tenha sugerido que Eclesiastes fosse o produto negativo dos anos poste riores de insensatez na vida de Salomão, enquanto a maioria considera que a relação do livro com o grande rei da sabedoria seja uma confirmação da profundidade e autoridade da busca e da luta registradas em suas páginas. A literatura de sabedoria do AT reconhece claramente que a verdadeira sabedoria não pode, em momento algum, separar-se da fé, mas deve ter como início (Pv 1.7)efim (E c 12.13) o “temor do Senhor”. B ib l io g r a f ia
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# 8376 (rqd, saltar, pular)
Salvação -> # 3828 (y s', ser vitorioso, receber ajuda, salvar, resgatar)
Samaria
Samaria (lilQW [sõmerôn], # 9076).
O nome Samaria é usado no AT tanto para a capital do reino do Norte estabelecida pelo rei Onri quanto para a região intimamente associada a ela (2Rs 18.34). O rei Onri de Israel (->) começou a reinar em Tirza (885/84 a. C.; cf. Comey, 78), mas depois de tomar-se o único so berano, construiu sua capital no alto de um monte nas terras altas centrais de Israel. Comprou esse monte de Sem er(lRs 16.24), do qual deriva o nome heb. Samaria (1 Rs 16.23-24). 1. Localização. Samaria possuía uma localização ideal tanto para assegurar uma admi nistração eficiente do reino como para as políticas internacionais adotadas pelos governantes da dinastia de Onri (Miller, 207). O monte sobre o qual Samaria foi construída se eleva próximo à atual rodovia norte-sul que percorre o caminho das montanhas de Ebal até Gerizim. E possível que a antiga rota de comunicação seguisse essa mesma linha, garantindo contato tanto com a Fenícia quanto com a Síria (Sukenik, Samaria-Sebaste 1:1; Kenyon, 1971,73; Dorsey, 57-70). O monte em si ficava cerca de 100 m acima do vale e 430 m acima do nível do mar (Kenyon, 1979,260) e era isolado dos montes ao seu redor (Kenyon, 1971, 73), revelando a posição es tratégica de Samaria em tempos de cercos militares (Samaria-Sebaste 1.1; cf. Miller, 207). O vale ao redor do monte é belo e fértil (Is 28.1; cf. Samaria-Sebaste 1.1). 2. História. Depois que Onri tomou-se rei incontestável sobre o reino do Norte c. 880/879 a. C., começou a construir a capital em Tirza. No entanto, os estudos arqueológicos mostram claramente que ele abandonou Tirza (de Vaux, 381) em favor do monte de Semer (Kenyon, 1979, 259), 11 km ao norte de Siquém. Comprou o local de Semer por dois talentos de prata ( I Rs 16.24). Acabe sucedeu Onri e reinou vinte e dois anos (1 Rs 16.29). A dinastia de Onri chegou ao fim com a revolução de Jeú por volta de 841 a. C. A dinastia de Jeú durou quase um século. Samaria chegou ao ápice de seu desenvolvimento durante o reinado próspe ro de Jeroboão II (793-753 a. C.; cf. Avi-Yonah & Stem, 1227). Ele estendeu as fronteiras de Israel “desde a entrada de Hamate até ao mar da Planície” (2Rs 14.25). Ao longo desses anos, as injustiças e luxos excessivos da afluente sociedade israelita levaram à censura profética de Amós (3.9— 4.13). Depois da morte de Jeroboão, o declínio rápido de Israel teve início com o assassinato do seu filho, Zacarias (2Rs 15.8-10) por Salum, que foi seu sucessor no trono (2Rs 15.13) e com o reavivamento do interesse da Assíria nessa região (Ahlstrõm, 630-31). Sama ria serviu de capital para Israel até ser capturada por Sargão II da Assíria em 722 a. C. (2Rs 17.6; 18.9-12). De acordo com textos assírios, Samaria foi reconstruída e tomou-se o centro administrativo do governador (Oppenheim, 284), permanecendo como tal durante o domínio babilônio e persa (Avigad, 1035). 1181
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3. Arqueologia. Duas expedições realizaram escavações em Samaria. Sob a direção de G. Schumacher e, posteriormente, de G. A. Resiner e C. S. Fisher, a Universidade de Harvard escavou esse local entre 1908-1910. Uma expedição em conjunto patrocinada Universidade de Harvard, o Fundo para a Exploração da Palestina, a Academia Britânia, a Escola Britânica e Arqueologia em Jerusalém e a Universidade Hebraica, dirigida por J. W. Crowfoot escavou Samaria entre 1931 e 1935 (Avigad, 1037). Tirza, identificada com Tell eI-Far‘ah, 9 km a nordeste de Siquém (Albright, 241 -5 1) no uádi Far‘ah, foi a capital do reino do Norte de Israel durante o golpe malogrado de Zinri (1 Rs 16.9). O cerco de Onri a Tirza e a conseqüente morte de Zinri na violenta conflagração (1 Rs 16.17-18) se encaixam com as evidências arqueológicas de destruição do Estrato III de Tell el-Far‘ah (de Vaux, 380). Algumas escavações no local revelaram uma construção inacabada, fornecendo provas claras de que a cidade foi abandonada por volta de 885 a. C. (Kenyon, 1971, 73; de Vaux, 380-81), o que coincide com o estabelecimento da nova capital, Samaria. Onri fundou sua nova capital num monte praticamente descalvado e isolado onde podia desenvolver uma cidade de acordo com suas próprias idéias, sem ser estorvado por prédios já existentes. As partes principais de Samaria eram a área reservada para o rei no alto do monte e a cidade baixa (Samaria-Sebasle 1:5-21). Infelizmente, a maior parte da cidade do tempo de Onri e Acabe encontra-se debaixo dos prédios modernos da cidade moderna de Sebaste (Kenyon, 1979,263). Em função da história anterior de regicídios, Onri desenvolveu o conceito de uma área fechada reservada para o rei que dominava o centro da cidade (Kenyon, 1971, 74). Uma vez que o topo do monte não tinha espaço suficiente para ele construir seu palácio e os respec tivos anexos, Onri usou terraços sustentados por muros de arrimo (Kenyon, 1971, 75). Nessa área ampliada no alto do monte, Onri construiu seu palácio, que depois recebeu anexos e foi cercado por uma muralha de casamata, possivelmente no tempo de Acabe (Kenyon, 1971,8182). Esse conjunto de construções ocupava uma área de 145 m x 76 m e mostra sinais claros da influência fenícia (Samaria-Sebaste 1; Kenyon, 1971, 76). A área reservada para o rei representava um conceito inteiramente novo no sistema isra elita de planejamento urbano. Até certo ponto, parecia-se com a acrópole associada às cidades gregas. Essa área era cercada por uma muralha e a fase final de construção transformou o lugar numa fortaleza dentro da cidade (Kenyon, 1971, 82). Por detrás desses muros, o rei autocrata e sua família podiam prosperar tranqüilamente (Kenyon, 1979, 262). A disposição da cidade comprova uma importante revolução social e administrativa em Israel. A suntuosidade dessa parte da cidade se reflete nos entalhes em marfim do século IX encontrados no local. Esses entalhes eram usados como decoração nos painéis das paredes e na mobília (Kenyon, 1979, 263). A “casa de marfim” de Acabe é mencionada em 1 Reis 22.39, numa suposta referência aos entalhes desse material. Uma grande parte dos entalhes do período do reinado de Acabe (Samaria-Sebasle 2:50-53) mostra uma influência egípcia (Samaria-Sebaste 2:49; cf. Kenyon/ Moorey, 1987,97). As relações de Acabe com o Egito são confirmadas por um grande vaso de alabastro com vestígios de volutas de Osorkon II (Kitchen, 324). Os Ostracos de Samaria são sessenta e cinco fragmentos de cerâmica contendo ins crições, encontrados em 1910 pela expedição da Universidade de Harvard. Essas inscrições registram carregamentos de azeite e vinho recebidos como uma tributação em gênero, para uso no palácio real. São de grande valor para o estudo da linguagem, escrita, nomes próprios, sistemas tributários e administração do reino (Avigad, 1044). Os nomes que aparecem nes sas inscrições também possuem significado religioso. Alguns desses nomes são combinados com ãb (Abibaal), ah (Acaz), 'ê! (Eliseu), Yãh (Abiau), 'êgel ( ‘egelyau) e ba'al (Meribaal) (Schofield, 206-7). 1182
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A quantidade ínfima de fragmentos arquitetônicos encontrados nesse local é representa da por capitéis proto-jônicos que provavelmente ornavam uma estrutura na entrada de Samaria (Kenyon, 1979, 263). Os artífices fenícios empregados por Onri construíram uma cidade tão magnífica e demonstraram tamanha perícia que, durante séculos, seu esplendor permaneceu incomparável (Kenyon, 1971, 76). B i b l k x ;r a f i a
Anclsr, 231 -35; G. W. Ahltrõm, The History o f Ancient Palestine from the Palaeolithic Period to Alexander's Conquest, 1993; W. F. Albright, “The Site o f Tirzah and the Topography o f Western Manassah”, JPOS 11, 241-51; M. Avi-Yonah & E. Stem, EAEHL 4, 1978; N. Avigad, “Samaria”, in M. Avi-Yonah & E. Stem, EAEHL 4, 1978, 1032-50; R. W. Comey, The Reigns o f Omri and Ahab, 1970; J. W. Crowfoot, K. M. Kenyon e E. L. Sukenik, SamariaSebaste I: The Buildings, 1942; J. W. & G. M. Crowfoot, Samaria-Sebaste II: Early Ivories from Samaria, 1938; R. de Vaux, “Tirzah”, in D. Winton Thomas, ed., Archaeology and Old Testament Study, 1967, 371-83; D. A. Dorsey, “Shechem and the Road NetWork o f Central Samaria”, BASOR 268, 1987,57-70; K. Kenyon, Archaeology in the Holy Land, 1979; idem, The Bible and Recent Archaeology, revised by R R. S. Moorey, 1987; idem, Royal Cities o f the Old Testament, 1971; idem, Archaeology in the Holy Land, 1979; K. A. Kitchen, The ThirdIntermediaze Period in Egypt, 1973; J. M. Miller, The Omride Dynasty in the Light o f Recent Literary and Archaeological Research, 1964; L. Oppenheim, “Babylonian and Assyrian Historical Texts”, in J. B. Pritchard (ed.), ANET, 1969; J. D. Price, “Samaria”, R. K. Harrison, ed., Major Cities o f the Biblical World, 1985, 223-33; J. N. Schofield, “Inscribed Potsherds from Samaria”, in D. W. Thomas, ed., DOTT, 1958, 204-8; K. Schoville, Biblical Archaeology in Focus, 1978. D. N. Pienaar
Samuel: Teologia de A. Contexto Histórico Os livros de Samuel encaixam-se na categoria conhecida em termos canônicos tradi cionais judaicos como “Profetas Antigos” e, no linguajar acadêmico mais moderno, seguindo Martin Noth em sua obra Überlieferungsgeshichtliche Studient I como “História Deuteronomística”. A designação “Profetas Antigos” reflete uma concepção existente desde a antigüi dade segundo a qual os livros históricos do cânon hebraico foram escritos por profetas. No caso de Samuel, até mesmo os capítulos subseqüentes a 1 Samuel 25.1, que relata a morte do profeta, foram explicados por Josefo como escritos por Samuel, que recebeu uma visão dos acontecimentos que ocorreriam depois de sua vida. No entanto, o verdadeiro valor desse termo canônico não consiste em sua utilidade como informação histórica, mas na perspec tiva teológica que ele propõe dos livros em questão, inclusive de Samuel e Reis. Ao longo desses livros, a palavra de Deus mediada pela profecia influencia de maneira determinante os acontecimentos históricos e sua interpretação. A avaliação do grau de influência deut. so bre Samuel apresenta grandes variações mas, ainda assim, seções críticas como 1 Samuel 12, sobre a instituição da monarquia e 2 Samuel 7, sobre a aliança davídica, costumam ser con sideradas exemplos expressivos de teologia deut. (->), ainda que Noth não tenha incluído 2 Samuel 7 em sua lista de discursos deut., pois sua interpretação da história não dava espaço para nenhuma “esperança davídica”. 1183
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Os livros de Samuel são considerados o primeiro e segundo volume de uma série de quatro “Livros dos Reinados”, segundo a tradição da Septuaginta, a qual ressalta corretamen te o fato de que o objetivo principal de 1—2 Samuel é, em primeiro lugar, o estabelecimento inicial da monarquia israelita e, depois, a ascensão do Davi (->) de Belém à condição dereiimperador e dinasta. Há diversas tradições relacionadas, de uma forma ou de outra, ao profeta Samuel ( - ) ) nos primeiros capítulos de I Samuel, mas não seria incorreto afirmar acerca de sua importância que esta consiste principalmente no fato de ele supervisionar a introdução da monarquia em Israel e ungir os dois primeiros reis. Além disso, sem dúvida o cântico de Ana, em 2.1-10, cujo tema predominante é a inversão das sortes dos homens por meio da interven ção de Deus, tem em mente mais do que a reviravolta de sua própria sorte quando conclui com a declaração confiante de que Deus “dá força ao seu rei e exalta o poder do seu ungido” (v. 10). Mesmo a questão formalmente distinta do sacerdócio em Siló, tratada nos caps. 1—3, pode ser incluída na categoria da monarquia, visto que a substituição de Siló como santuário central israelita, que acaba levando à transferência da arca da aliança para Jerusalém (2 Sa muel 6), contribui para o reconhecimento da capital de Davi como sendo também a capital de Israel. Ao que parece, 1 Samuel 2.35 também faz referência ao sacerdote Zadoque, que serviu tanto Davi quanto Salomão, desfrutando autoridade sacerdotal exclusiva no reinado deste úl timo quando Abiatar foi dispensado por haver apoiado a tentativa malograda de Adonias de suceder ao pai no trono. No entanto, esses primeiros capítulos de I Samuel argumentam, antes de mais nada, sobre o caráter ilegítimo do regime de Siló por meio de um contraste entre Ana (->) e o filho, e Eli (->) e os dois filhos dele. Assim, a narrativa trata de muito mais coisas do que a tradição e a história ao ilustrar o valor e a eficácia de um compromisso verdadeiro com Deus e os perigos inerentes a se trilhar um caminho de arrogância distante de Deus. O papel que Ana desempenha dentro da narrativa como esposa estéril e mulher de oração é extraordinário, pois é em respos ta à iniciativa dela que Samuel, o profeta que ungiu os primeiros reis, é dado a Israel. Eli, o suposto luminar religioso da história, cumpre um papel meramente coadjuvante em relação a essa mulher de visão, enquanto o marido dela entende muito bem que ela sabe o que é melhor (1 Sm 1.23). Quando o menino Samuel começa sua carreira em Siló, seu progresso é observado, primeiro em relatos curtos que se alternam com os comentários mais sombrios acerca dos filhos de Eli (2.11-26) e, posteriormente, num relato completo de sua importância como profeta por toda Israel (3.19— 4. Ia). A essa altura, já é evidente que o oficio divino ao qual Israel deve se submeter agora que se encontra estabelecida não é tanto aquele do sacerdócio ou judicatura, mas sim ao da profecia. Outros aspectos da história de Samuel serão discutidos de modo mais conveniente dentro da divisões temáticas na seção C abaixo. B. Estrutura Literária A narrativa composta de 1—2 Samuel apresenta algumas junções (p. ex„ 1Sm 3.19—4 ,1a; 7.1-2; 2Sm 20.26— 21.1), mas estas não são numerosas e a impressão geral é de um relato contínuo da história de Israel do final do período pré-monárquico até os últimos dias de Davi (cf. 2Sm 23.1; I Reis 1—2 completa a história de Davi). Há diferentes opiniões acerca de al guns dos pontos de transição e sua possível relevância como indicações de documentos lite rários separados (p. ex., ISm 8.22— 9.1). Nesses casos, o melhor é fazer um esboço de 1—2 Samuel que apresente o conteúdo de acordo com os diversos segmentos narrativos e divisões tópicas aparentes no texto. 1 Samuel 1—3 representa a primeira dessas divisões, contendo três seções distintas relacionadas ao sacerdócio em Siló (1.1—2.26 [inclusive o cântico de Ana em 2.1-10]; 2.27-36; 3.1-18). Essas seções, que tratam principalmente da ascensão do profeta Sa 1184
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muel à proeminência, são seguidas da chamada “Narrativa da Arca” (1 Sm 4.1 b— 7.1), a qual descreve as circunstâncias que levaram a arca da aliança a ser perdida numa batalha contra os filisteus, bem como a devolução subseqüente dela graças à intervenção divina, seqüência esta na qual Samuel não aparece. Quaisquer que sejam os motivos para essa ausência, 3.19—4. Ia divide claramente as tradições de Siló, presentes nos caps. 1—3, das aventuras da arca, con tidas nesses capítulos. 1 Samuel 8— 12 apresentam explicitamente o tema da monarquia e o início dela co Saul, mas há motivos de sobra para considerar-se que o cap. 7 nâo apenas propõe uma resolu ção para os problemas dos capítulos anteriores, como também serve de prólogo para o relato da instituição da monarquia (ver abaixo). Os caps. 8— 12 costumam ser divididos em várias seções (9.1 — 10.16; 10.17-27; 11.1-5; 12.1-25), e considera-se que estas reflitam diferentes concepções da monarquia e, desse modo, revelem suas origens díspares. Sem dúvida alguma, as diferenças de perspectiva foram exageradas no passado, apesar de ser igualmente certo que a instituição da monarquia tenha despertado reações conflitantes na Israel antiga e em Judá. O reinado de Saul ocupa o restante de 1 Samuel, mas há motivos para crer-se que os caps. 13— 15 tenham por finalidade corresponder a um relato formal do reinado de Saul (ver abaixo). Os capítulos restantes ( 16— 31), com os quais também é necessário relacionar os primeiros capí tulos de 2 Samuel (geralmente 1.1—5.10 e partes do cap. 7), recebem muitas vezes a designa ção “História da Ascensão de Davi”, segundo a sugestão de Leonhard Rost, visto que tratam do processo de ascensão de Davi da obscuridade à posição de governante de Israel e possuem, supostamente, uma certa ênfase (em especial, um forte interesse apologético) que marca essas passagens como uma unidade literária distinta. Entre esse longo relato do aspirante Davi e a história da família de Davi posteriormente em 2 Samuel, encontra-se o cap. 7, uma passagem teologicamente seminal que apresenta as bases para a doutrina da aliança davídica, fornecendo os alicerces teológicos para o governo de Davi sobre Israel e Judá. 2 Samuel 8 dá um resumo das realizações militares de Davi, como que para indicar o cumprimento inicial do oráculo di nástico do capítulo anterior. A segunda unidade narrativa mais extensa proposta por Rost para 1—2 Samuel é a “Nar rativa da Sucessão” ou “História da Corte de Davi”, que se inicia com 2 Samuel 6.23 e abrange elementos significativos de 2 Samuel 9— 20 e 1 Reis I —2. De acordo com a proposta de Rost, é provável que o tema conectivo da “sucessão” não mereça a primazia que lhe é conferida, mas sem dúvida alguma é um elemento importante desses capítulos. A continuidade com 1 Reis é interrompida pela atual colocação do “Suplemento de Samuel” (2 Samuel 21—24) que, com a organização concêntrica de seus elementos principais (21.1-14; 21.15-22; 22.1-51; 23.1-7; 23.8-39; 24.1-25), situa as realizações de Davi dentro do contexto de sua própria fraqueza hu mana e da misericórdia predominante de Deus.
C. Temas Teológicos 1. Javé em 1—2 Samuel. 1 Samuel 1.3 é um versículo digno de nota pois representa primeira ocorrência canônica do título divino “Senhor Todo-Poderoso” (em algumas versões, “Senhor dos Exércitos”), que possivelmente era relacionada especialmente à adoração em Siló ou ao festival de outono do sétimo mês ou, ainda, a ambos (cf. Jz 21.19; Zc 14.16). Quer os “exércitos” em questão sejam as hostes celestiais ou as forças militares de Israel, o título celebra Javé como o Deus Guerreiro, que recebeu o devido crédito pelas vitórias de seu povo sobre os inimigos. De acordo com o cântico de Ana, o domínio de Javé é extenso: as colunas da terra pertencem ao Senhor e é ele quem julgará as extremidades da terra (ISm 2.8, 10). Não faltam a 1— 2 Samuel textos que mostrem uma perspectiva restrita da influência ou atividade do Deus 1185
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Os vários segmentos narrativos que constituem 1 Samuel 8— 12 apresentam um veredicto geral negativo quanto à monarquia, mesmo que as seções centrais em 9.1— 11.15 mostram-se favoráveis a Saul como pessoa. No primeiro exemplo, a concentração de poder nas mãos de um monarca é interpretada como uma rejeição da soberania de Deus sobre seu povo. Assim, quando monarquia se toma um fato e Saul passa a ser o líder de seu povo, continua valendo o preceito de lealdade a Deus, especialmente com relação ao culto (12.14-15,20-21; cf. 8.7-8) e o papel de Samuel como representante da profecia é garantido (12.23). Os efeitos sociais nocivos de uma monarquia quase absolutista também contribuem para a rejeição em 1 Samuel 8.11-18, um relato desalentador apresentado como argumento contra a introdução da monarquia, que trata da exploração do povo e dos recursos pelo r e i. A história do reinado de Salomão serve de ilustração para o modo como as exigências de um sistema de governo centralizado podem ins pirar a desafeição do povo para com seu monarca. Se, porém, alguns leitores dos caps. 8— 12 percebem um certo grau de ambivalência com relação ao princípio da monarquia, trata-se de uma percepção justificada, uma vez que essa instituição estava fadada a ocupar uma posição ambígua ao longo dos vários séculos entre Davi e o exílio. Por um lado, não foi um desenvol vimento universalmente popular que atraiu impopularidade ao deixar de corresponder às es peranças dos seus defensores, por outro lado, foi a introdução da monarquia que possibilitou a grandeza memorável de Davi, a dinastia davídica e toda a ideologia ligada à realeza que era celebrada na coroação e em outros rituais religiosos do templo e que alimentava a expectativa de que os dias de glória voltariam sob um rei digno e honrado da linhagem de Davi. O fato de o conceito de monarquia em Samuel significar essencialmente a monarquia davídica fica evidente pelos termos empregados nos livros com referência às eleições de Saul e Davi e pela forma como tratam do reinado de Saul. Em primeiro lugar, quando Deus consente com o pedido dos anciãos por um rei em 1 Samuel 8.22, Samuel é instruído a nomear um rei para eles, enquanto a escolha divina de Davi é anunciada da seguinte maneira em 16.1: “Escolhi... um rei para mim” (trad. do autor., cf. Mq 5.2, “de ti me sairá o que há de reinar em Israel”). O fato de Davi ser o rei escolhido pelo próprio Deus também é indicado pela declaração em 13.14 de que Deus escolheu um homem segundo o seu coração (“que lhe agrada”) e, no caso de se considerar a acepção mas costumeira, o termo “coração” nesse tipo de contexto significa “vontade” ou “inclinação” (cf. McCarter, 1980,229; Gordon, 1986, 134). Em segundo lugar, apesar de o relato sobre Saul continuar até o final de 1 Samuel, há indicadores narrativos claros em 15.26— 16.1 de que o escritor deseja comunicar que o reinado de Saul encerrou-se efetivamente nesse ponto, apesar de Saul continuar sendo rei em mais de zesseis capítulo. Daí em diante, é Davi quem desfruta o poder que lhe é concedido pelo Espírito divino (16.13) e o selo da proteção divina representado pelas expressões “o Senhor é/está com ele” (16.18; 18.14; etc.) e “pelejas as batalhas do Senhor” (25.28). A partir de 16.14. Davi faz seu progresso inexorável ramo ao trono, tendo como principal dúvida não o seu sucesso (que, obviamente já se concretizou quando a narrativa tbi escrita), mas sim por que meios alcançará o seu objetivo e cumprirá o propósito de Deus. O interesse apologético central da narrativa é limpar o nome de Davi diante das suspeitas e acusações de sua cumplicidade na morte dos membros da família de Saul, tendo em vista o fato de que ele parecia ser o maior beneficiado pela infortúnio deles. Além disso, o conceito de santidade do monarca no trono, mesmo sendo ele Saul, é tão essencial para o conceito de monarquia que se toma um cuidado enorme ao longo desses capí tulos para proteger Davi da aparência de ser um ofensor da majestade do rei (cf. 25.30-31). A ideologia da monarquia davídica foi cultivada dentro de uma consciência de aliança que se expressa de maneira mais definida em 2 Samuel 7, em que Davi recebe a promessa di vina garantindo o domínio de sua casa sobre Israel para sempre. Essa é a “aliança eterna” de 1188
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2 Samuel 23.5, apesar de a palavra “aliança”, em sim, não aparecer em 2 Samuel 7. A seção na qual a aliança é desenvolvida (7.1-16) ressalta com veemência a iniciativa divina. Foi Deus quem deu a Davi o descanso de todos os seus inimigos (v. 1) e a promessa de Deus de uma casa real eterna é sua resposta à proposta de Davi de honrar (ou beneficiar?) a Deus com a constru ção de um templo, agora que a vitória mais abrangente já foi concedida ao vice-regente terreno do Senhor. No entanto, Davi é informado que não será ele o rei que construirá o templo. An tes, Deus mostrará seu favor para com Davi ao dar continuidade aos interesses de sua próprio dinastia em nome de Davi e seus descendentes. Essa idéia de uma dinastia davídica perpétua sem dúvida recebeu mais crédito à luz do contraste com as adversidades sofridas pelo reino do Norte nos séculos VIII e IX, quando reis e dinastias passaram em rápida sucessão, muitas vezes como resultado de assassinatos políticos. 3. Profecia. A inclusão de 1—2 Samuel entre os escritos dos “Profetas Anteriores” n lembra que em vários aspectos importantes, a história de Israel conforme esta é relatada no AT é uma história profética, no sentido de que é relatada de um ponto de vista profético (-deut.). O principal profeta em consideração nesse caso é, evidentemente, o epônimo Samuel e boa parte dos primeiros capítulos de 1 Samuel apresenta suas credenciais como porta-voz de Javé, cuja autoridade, a certa altura, era conhecida “desde Dã até Berseba” (ISm 3.20). Mesmo como um profeta inexperiente, Samuel toma-se um mensageiro de julgamento (3.11-14), de maneira se melhante a tantos de seus sucessores na tradição profética. Também é retratado cumprindo o papel de intercessor, característico de muitas vocações proféticas, no episódio descrito em 7.5-9, quando intercede em favor de uma comunidade arrependida numa situação de crise militar. A nova ordem que Israel havia escolhido para si trazia consigo o corolário de que não haveria mais lugar para Samuel no centro dos assuntos nacionais, mas o profeta mostra o cuidado de redefinir para si mesmo um ministério de instrução e intercessão que é imitado na história dos profetas de séculos posteriores. Nenhum profeta subseqüente viu-se numa posição de exercer os vários tipos de responsabilidade associados a Samuel em 1 Samuel, mas quer tenham sido ouvidos ou marginalizados em suas respectivas gerações, todos eles foram capazes de cumprir as condições de 12.23. Para a função do profeta como intercessor, ver, por exemplo, Gênesis 20.7; Êxodo 32.11-14; Jeremias 11.14; 14.11; Amós 7.2-3, 5-6. O próprio Samuel foi lembrado como um intercessor por excelência em tempos posteriores, tanto que, nesse sentido, pode ser associado especialmente a Moisés no Salmo 99.6 e em Jeremias 15.1. (-^ Oração; Profecia) E possível que 1 Samuel 15 seja uma indicação de um tipo de intercessão, pois nessa passagem, tendo sido instruído a informar Saul de sua rejeição final por Deus, Samuel passa a noite clamando a Deus (v. 11). O fato de seus esforços não terem efeito algum reflete simples mente o caráter irrevogável da decisão que havia sido tomada contra Saul. O problema de Saul constituiu um microcosmo representativo do problema de toda Israel ao longo de grande parte de sua história, visto que o relato da “interdição” parcial executada contra os amalequitas gira em tomo da questão da obediência e, mais especificamente, da obediência à palavra de Deus mediada por seu profeta. Essa também é a questão no cap. 13, em que Saul é declarado culpa do de agir precipitadamente ao oferecer um sacrifício e em que o fato da sua desobediência é mais ressaltado do que a natureza dessa mesma obediência, a julgar pela dificuldade enfren tada pelos intérpretes na tentativa de explicar exatamente em que o rei errou. A conclusão da questão é expressada em forma poética, na parelha de versos em 15.22: “Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender, melhor do que a gordura de carneiros”, uma expressão tão profética (ou deut.) quanto qualquer outra que pode ser encontrada em todo o conjunto de textos proféticos. A questão da obediência também é levantada na resposta póstuma de Samuel a Saul em Endor, em 28.16-19: “Como tu não deste ouvido ao Senhor... por isso, hoje o Senhor 1189
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te fez, hoje, isto” (v. 18). Vê-se aqui também a introdução do tema prenunciação-cumprimento profético tão conhecido especialmente nos livros de Reis: “Porque o Senhor fez para contigo como, por meu intermédio, ele te dissera” (v. 17). A combinação de interesses do profeta e do Deus em nome do qual ele fala fica mais evidente em 1 Samuel 8, na resposta do profeta ao pedido dos anciãos por um rei. Samuel, que já havia mostrado uma fraqueza por uma forma própria de organização dinástica (vv. 1-2), considera o pedido uma rejeição de sua posição, enquanto a questão principal do capítulo é que o próprio Deus foi rejeitado pelo povo. E, pelo fato de Samuel ser, em tantas ocasiões um porta-voz de Deus em 1 Samuel como um todo, é fácil para um capítulo como 1 Samuel 8 dei xar de separar os dois pontos de vista e, desse modo, não ver até que ponto nessa narrativa o profeta pode estar em desarmonia com a interpretação de Javé dessa situação. E o que aconte ce mais obviamente no cap. 16, em que Samuel vai a Belém para ungir um dos filhos de Jessé como sucessor de Saul. O profeta aplica o critério conhecido da aparência e boa apresentação ao pensar no que cabe a um rei, mas recebe a correção de Javé com respeito a isso: “O homem vê o exterior, porém o Senhor, o coração” (v. 7). Como foi observado acima, o papel de Samuel em 1 Samuel pode ser resumido razo avelmente como sendo de constituir reis, papel este que ele desempenha tanto em relação a Saul quanto a Davi. Nos vários movimentos da história da ascensão de Saul ao trono, Samuel é uma figura onipresente (ISm 9.1— 10.16; 10.17-27; 11.1-5; 12.1-25), conduzindo o proces so até sua ratificação final. Nessas passagens fica tão claro quanto em qualquer outra parte a reivindicação profética de atuar sobre a monarquia como seu monitor apontado por Deus. O fato de Samuel também ungir Davi como rei é igualmente essencial em termos de importância para a avaliação de seu próprio papel como profeta, mas também para a sucessão profética em geral. Uma vez que Davi foi o fundador da dinastia que reinou sobre Judá ao longo de toda a sua história como Estado soberano, o envolvimento de um representante do movimento profé tico no nascimento da dinastia indicava um certo tipo de interesse proprietário da parte desse movimento pelos assuntos da casa de Davi dessa época em diante — um interesse que contava com o respaldo do próprio Javé em sua escolha inicial de Samuel e em sua comissão de pro fetas subseqüentes para dirigirem-se aos monarcas de Judá em seu nome. No reino do Norte, durante os séculos IX e VIII, a situação foi outra, não tanto por esse reino poder ser conside rado constitucionalmente rebelde à casa de Davi, mas pelo fato de sua história tumultuada e o colapso freqüente das dinastias servir de maior oportunidade para que figuras proféticas de carisma afetassem o transcurso dos acontecimentos. Natã é outra figura profética importante em 1— 2 Samuel. Ainda que sua presença se restrinja a 2 Samuel 7 e 12 (ver também 1 Reis 1), sua intervenção tem um peso decisivo. Ape sar de o termo “profeta da corte” não ser especialmente significativo quando aplicado a Natã, sua primeira aparição é como um defensor prestativo e nada crítico dos planos de Davi para a construção do templo (2Sm 7.3). A essa altura, porém, sua verdadeira relevância encontra-se no fato de ele servir como o profeta que anunciou a Davi a aliança davídica, por meio da qual Deus prometeu manter a dinastia davídica para sempre, o que se devia única e exclusivamente ao favor divino para com seu povo e Davi, seu rei. O anúncio no cap. 7 é estruturado de ma neira simples por uma declaração de introdução e outra de conclusão sobre o papel de Natã em transmitir a Davi os termos da aliança e, no entanto, só o fato de haver um profeta envolvido e um dos grandes momentos decisivos da teologia israelita pode ser visto como uma contribuição para o tema geral da submissão de Israel à palavra de Deus mediada por seus profetas. A submissão pessoal de Davi fica evidente quando Natã reaparece na narrativa de 2 Samuel 12. Por meio de uma parábola de julgamento (vv. l-4),oprofeta le v a o re ia ju lg ara si 1190
Samuel: Teologia de
mesmo e então pronuncia as palavras aterradoras: “Tu és o homem” (v. 7). Aqui, assim como na narrativa que envolve a figura menos importante de Gade em 2 Samuel 24, o rei encontrase sob o escrutínio e julgamento proféticos, como acontecerá com os reis de Judá e Israel ao longo do período monárquico. Tal situação já é mostrada no discurso de Samuel depois do es tabelecimento do reinado de Saul, no qual o profeta antevê o destino final da Judá monárqui ca: “Se, porém, perseverardes em fazer o mal, perecereis, tanto vós como o vosso rei” (1 Sm 12.25; cf. 2Rs 24.20). Assim os livros de Samuel reforçam a idéia de que monarquia era um enigma no cerne da sociedade israelita do período que antecedeu o exílio. Por um lado, a casa de Davi foi as sociada a uma certa medida de sucesso e esplendor imperiais nos reinados de Davi e Salomão e, por meio da sua ideologia real e pactuai, recebeu a promessa de um futuro garantido e, por fim, a recuperação de suas glórias passadas. Por outro lado, os teólogos canônicos de Israel consideravam a dinastia davídica uma das maiores responsáveis pelo fim do Estado, um pon to de vista que aparentemente se reflete no relato do governo do próprio rei Davi, que em sua maior parte, é apresentado como uma demonstração triste do fracasso humano acompanhado dos elementos da misericórdia e do julgamento de Deus. O “Suplemento de Samuel” em 2 Sa muel 21—24 confirma esse veredicto ao desviar-se da linha da narrativa principal que prosse gue até I Reis I—2 e inserir narrativas e poemas organizados concentricamente. Esse relatos e poemas destacam de maneira não menos penetrante que os capítulos anteriores, os problemas e fraquezas que assolavam o rei Davi e que, no entanto, têm como elemento central um salmo de livramento (22.1-51) e um apelo à aliança entre Deus e Davi como uma base sólida e eter namente válida (23.1-7; esp. v. 5). B i b l k x ;r a f ia
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Sansâo
Sangue -> # 1947 (dam, sangue, chacina, assassínio, homicídio)
Sansão
Sansão Oitf!?®1’[.v/w.vôm], pequeno sol, # 9088).
Sansão, um dos libertadores (sõpêl,-¥ # 9149) de Israel no tempo dos juizes, é lem brado, sobretudo, por seus feitos sobre-humanos de força e suas relações românticas com mu lheres estrangeiras. Ao contrário da maioria dos juizes, cm momento algum Sansão reuniu um exército; antes, travou uma guerra particular contra os filisteus, vizinhos incircuncisos do clã danita de Sansâo. (Juizes: Teologia) 1. A história de Sansão (Juizes 13— 16) emprega diversos temas, gêneros literários e formas retóricas para criar um drama rico em suspense e de profundidade teológica. A narra tiva começa com a história do nascimento de Sansâo (13.1-24), que apresenta características em comum com várias outras histórias desse tipo na Bíblia. Como no nascimento de Isaque, Jacó e Esaú, José, Samuel e João Batista, Sansâo nasceu de uma mulher que havia sido esté ril (13.2-3). Semelhante a Sara no AT e Isabel e Maria no NT, a esposa de Manoa recebeu um visitante divino, que lhe comunicou as notícias do futuro nascimento. Essa parte da narrativa, uma história de reconhecimento, também apresenta temas em comum com outros relatos bíbli cos desse tipo. Aos poucos, o visitante celestial revela sua verdadeira identidade (cf. também Gn 18.1-15; 32.22-32; Js 5.13-15), respondendo de modo obscuro quando Manoa pergunta o “nome” dele (13.17-18; cf. também Gn 32.29). Uma vez que Manoa e sua esposa percebem que estão na presença de um ser divino, reagem como Jacó, Moisés, Josué e Isaías e são to mados de pavor (Jz 13.22). O cerne desse anúncio do nascimento é a consagração da criança a uma vocação espe cial. Como no caso de Samuel (1 Sm 1.11), essa consagração de Sansão devia expressar-se na forma de um voto nazireu (Jz 13.4-14; cf. Nm 6.1-21). Ao contrário de Samuel, porém, Sansão não dá valor a essa vocação e, ao longo de grande parte da narrativa, age como um homem extremamente irreligioso. 2. Os conflitos violentos entre Sansão e os filisteus servem de estrutura para o resto da história. Aqui, também, o ator emprega uma rica variedade de gêneros literários e técnicas retóricas. No primeiro conflito (Jz 14.1-20), os acontecimentos se desenrolam em tomo de um enigma (hídâ -> # 2648; 14.12) inspirado pela ocasião em que Sansão mata um leão para, pos teriormente, descobrir que havia mel na carcaça do animal (Nel, Riddle). Sansão propôs o enig ma na sua festa de casamento com uma jovem filistéia que os pais de Sansão não aprovavam. Sansão aposta pagar trajes completos para seus companheiros caso descubram o significado da charada: “Do comedor saiu comida, e do forte saiu doçura” (14.14). Os filisteus respondem com seu próprio enigma. Exatamente como o de Sansão, é constituído de apenas seis palavras em heb., sendo que cinco delas começam com mem, “Que coisa há mais doce que o mel e mais forte do que o leão?” (14.18a). O trocadilho usado nessa passagem é típico da narrativa e mos tra o gosto do escritor por jogos de palavras (Blenkinsopp). É impossível não se observar o papel central da noiva de Sansão nesse episódio. Sua investigação implacável do segredo do noivo finalmente o faz ceder e o deixa vulnerável à ex ploração nas mãos dos filisteus. Em termos retóricos, esse episódio não apenas introduz uma importante trama secundária da narrativa (um relacionamento com uma mulher estrangeira resultando em conseqüências possivelmente trágicas), mas também serve para apresentar de antemão exatamente a dinâmica que levará à grande queda de Sansão. Esta, por sua vez, não passa de uma variação do tema bem mais amplo da narrativa heb.: a queda do homem poderoso 1192
Sansão
pelas mãos de uma mulher ardilosa. O guerreiro cananeu Sisera morre pelas mãos de Jael (Jui zes 4— 5), o traiçoeiro Hamã encontra o destino final pela intervenção de Ester (Ester) e a bela Judite dá cabo de Holofemes (Judite). A história continua se desenrolando ao longo de um ciclo de violência cada vez mais intensa. Sansão paga a aposta matando trinta homens de Asquelom e roubando as roupas deles (Jz 14.19). Ainda mais enfurecido, quando descobre que, em sua ausência, sua esposa havia sido entregue ao padrinho de casamento, ele captura trezentas raposas (ou chacais), coloca tochas na cauda dos animais e solta-os nos campos filisteus, cobertos de cereais pron tos para a colheita (15.4-5). Os filisteus respondem a essa provocação ateando fogo à esposa de Sansão e ao pai dela e ambos morrem (15.6). A violência continua a gerar violência até que três mil homens de Judá tentam dar um basta. Com o consentimento de Sansão, eles o amarram com cordas novas e o entregam aos filisteus. A medida que o inimigo se aproxima, porém, o Espirito de Deus vem sobre Sansão outra vez (cf. 14.6, 19) e, com força sobre humana, ele mata mil filisteus com a queixada de um jumento (15.9-15). A esse episódio são entretecidos um cântico de vitória (15.16) e uma oração (15.18), bem como duas etiologias topográficas (15.17, 19). Em seu encontro com Dalila (Jz 16.4-22), pela terceira e última vez, Sansão é exposto à exploração nas mãos dos inimigos por meio do relacionamento dele com uma mulher es trangeira. Cada um dos dois episódios anteriores, prepara o leitor para o terceiro. No primeiro episódio, o leitor fica sabendo que os segredos de Sansão são vulneráveis à persuasão femini na (14.15-18). No segundo, o leitor descobre que Sansão confia que sua força extraordinária pode salvá-lo de qualquer mal ao qual ele venha a se expor em função de relacionamentos im prudentes (16.1-3). Esses dois temas convergem de modo a levar a narrativa ao seu e revelar seu significado. Como é típico em narrativas hebraicas, o diálogo é usado como um artifício para conduzir a história ao desfecho. Por três vezes, a ardilosa Dalila (delilã, sedutora) pres siona Sansão a fim de descobrir o segredo de sua força descomunal e três vezes ele responde com uma mentira, apesar de, a cada mentira, aproximar-se mais da verdade; primeiro sobre o número (sete, 16.7) e, depois, sobre a substância (tranças de cabelo, 16.13) que simbolizavam a força extraordinária dele. A repetição tripla serve não apenas para mostrar a crescente frustração de Dalila e a revelação gradativa do segredo, mas também para dar ao leitor um vislumbre da verdadeira dinâmica do episódio. Quem está enganando quem? Sansão é um tolo guiado pelas próprias concupiscências, uma pobre vítima dos ardis de uma mulher? Ou é um manipulador cons ciente, seguro de sua força e à procura de mais uma ocasião para massacrar os filisteus que espreitam na escuridão, prontos para atacá-lo? As próprias declarações de Sansão indicam de antemão que se trata do último caso. Ao longo de todo o relato de seus confrontos violentos com os filisteus, tanto em sua justificativa lógica para atacá-los (Jz 15.3, 7, 11) quanto em sua comemoração da vitória (15.16; comparar com o cântico de vitória dos filisteus louvando seu deus, 16.24), Sansão concentra-se inteiramente em si mesmo. Mesmo que ele se considerasse um agente de Javé, alguém cujo poder era concedido pelo Espírito, como indicou o anúncio do anjo antes do nascimento de Sansão (13.5) e as afirmações parentéticas do autor (13.25; 14.4, 6, 19; 15.14), não deixa transparecer essa consciência em momento algum. Até mesmo a única declaração que pode sugerir tal idéia, a oração de Sansão em 16.18, parece mais uma tentativa de convencer a divindade a saciar a sede do que um louvor a ela pela vitória. Quando, depois de tanto ser importunado, Sansão finalmente deixa escapar o segredo de sua força, tal revelação não passa de uma indicação final numa série de muitos outros sinais de que Sansão jamais respeitou o voto que lhe havia sido imposto desde o nascimento. Nenhum 1193
Sansão
nazireu sério teria tocado a carcaça de um leão para se alimentar (Jz 14.8-9) nem escolhido a queixada de um jumento como arma (15.15) e muito menos se vangloriado disso (15.16). Sem dúvida, Boling está certo quando observa que o enredo da narrativa de Sansão “não gira tan to em tomo de um voto que foi quebrado, mas sim de um voto que nunca foi levado a sério” (Boling). Quando Sansão cede diante da persistência de Dalila, não sucumbe à lascívia, mas ao orgulho. Tendo rejeitado a vocação sagrada, a vida de Sansão fora impelida pelo egoísmo e não por um desejo de cumprir o chamado de Deus. A luta colossal de Sansão contra os filisteus não foi uma guerra santa, mas sim uma guerra particular e para a qual ele não foi buscar no alto as forças que lhe deram vitória, mas sim dentro de si mesmo. Confiante de que podia recorrer a essas forças mais uma vez, Sansão conta a Dalila o verdadeiro segredo da vida dele — não o segredo do voto, mas o segredo de sua recusa em cumpri-lo. O Sansão adormecido — com o cabelo então rapado — desperta com o alerta de q os filisteus estão se aproximando. Sem perceber que “o Senhor se tinha retirado dele” (Jz 16.20), Sansão busca a força que sempre o havia servido, mas esta não pode mais ser encon trada. A comparação com o rei Saul é praticamente inevitável (ISm 16.14): o texto relaciona a infidelidade de Sansão à profissão sagrada com a partida do “Espírito do Senhor”. Do modo semelhante a Sail, a perda de carisma de Sansão redunda na perda de poder. Agora que só lhe resta a própria força para defendê-lo, Sansão vê-se impotente diante de seus atacantes e acaba “amarrado” ( sr, observe-se o uso do mesmo termo na pergunta de Dalila, 16.6, 10, 13) pelos inimigos, perdendo a visão e a liberdade pessoal. 3. Em mais um lance magistral, o escritor dá um vislumbre do último episódio da n rativa sobre Sansão com a observação promissora de que “o cabelo da sua cabeça, logo após ser rapado, começou a crescer de novo” (Jz 16.22). A última parte da história (16.23-31) é claramente teológica, colocando Dagom num confronto com Javé sobre a questão de quem é, de fato, deus. A narrativa é repleta de ironia e provoca comparações com a história da captura da arca da aliança pelos filisteus no tempo de Eli (1 Samuel 5— 6). Derrotado, Sansão é exi bido diante de Dagom como prova do poder superior desse deus e daqueles que o adoram. A última oração de Sansão (Jz 16.28) articula a teologia de toda a narrativa. Chamando Javé de “Soberano” ( ’adõnãy), ele pede ao Senhor que lhe dê “força” (hqz) para vingar-se dos inimi gos. Deus atende o pedido, dando a Sansão sua maior vitória e colocando um ponto final em sua guerra particular com a Filístia (e talvez com Javé). Ao longo desse final, ao mesmo tem po feliz e cruel, o leitor recebe uma última indicação do propósito da narrativa. Javé — e não Sansão — é o Salvador de Israel. Anunciado, comissionado, revestido de poder e, por fim, jul gado por Javé, o egocêntrico Sansão pode ter “começado” (yãhêl 13.5) a libertação de Israel, mas é Javé quem a levará a cabo. B ib l io g r a f ia
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Sara
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# 7630 ($epardêa \ sapo)
Saque -> # 1024 (bzz, saquear, pilhar)
Sara
Sara (rntp [sõrã], # 8577;
[sãray], Sarai, # 8584).
AT 1. Sarai/Sara era a esposa principal de Abrão e também sua meia irmã da parte de seu pai, Tera (Gn 20.12). Acompanhou Abrão em sua jornada de Ur, passando por Harã, até a terra de Canaã. Em duas ocasiões, se passou por irmã de Abraão (Gênesis 12 e 20). Sua esterilidade representava uma vergonha contínua para ela e a levou a maltratar sua serva Hagar e a rir quan do Abraão recebeu a notícia de que, dentro de um ano, ela teria um filho (caps. 16; 18; 21). Em 17.15 seu nome é mudado de Sarai para Sara e todas as referências subseqüentes empregam essa nova designação. Morreu aos 127 anos de idade em Quiriate Arba (isto é, Hebrom) e foi sepultada na cavema que se encontrava no campo de Macpela, próximo a Manre (cap. 23). (-> Gênesis: Teologia) 2. Sara é citada em Isaías 51.2 como um exemplo de confiança em Javé. NT Paulo cita tanto Abraão quanto Sara entre aqueles cuja fé lhes foi imputada para justiça (Rm 4.19) e refere-se a Sara como a mãe dos filhos da promessa (Rm 9.9). Em Gálatas 4.21-31, Pauk) faz uma distinção entre Sara como uma mulher “livre” e Hagar como “escrava”. As duas mulheres representam as duas alianças e nesse contexto, Sara é identificada com “a Jerusalém lá de cima” (v. 26). Os escritores de Hebreus e 1 Pedro consideram Sara um modelo de fé (Hb 11.11) e sub missão (lPe 3.6). (Ver P. J. Budd, NIDNTT 1:80; M. Gray, NBD, 1962, 1144.)
Sarom
Sarom
[sãrôn], # 9227)
AT Apesar de literatura do OMA atestar vários locais designados pelo termo topográfico Sarom, o principal deles é a planície de Sarom na planície costeira de Israel. A área abrangida estendia-se aproximadamente de Jope (logo abaixo da confluência dos rios Nahal Aijalom, Caná e larcom) numa faixa estreita (c. treze a dezenove quilômetros de largura) rumo ao norte, por volta de oitenta quilômetros até Dor (ao norte do rio Crocodilo). A paisagem da planície de Sarom é dominada pela areia de tom marrom avermelhado (as Areias Vermelhas do Período Paleolítico Mounsterian) que tem a capacidade de manter a água na superfície. Juntamente com um nível elevado dos lençóis de água, essa característica 1195
Sarom
transformou a região numa área pantanosa repleta de arbustos e florestas de carvalho. De acor do com esses último fenômeno, alguns estudiosos sugeriram que o some Sarom pode ter um significado associado a “terra/planície arborizada”. Seu caráter naturalmente pantanoso e a presença de florestas densas fazia de Sarom uma região a ser evitada, de modo que os viajan tes passavam por sua extremidade oriental. Nessa região surgiram várias cidades, formando um corredor importante entre o Egito e as terras do Norte, pelo qual passaram muitos soldados egípcios e assírios. Apesar da natureza geralmente inóspita da região, suas partes mais baixas ainda podiam ser usadas como pastagem para rebanhos, especialmente nos anos em que a precipitação pluviométrica reduzida impedia que as cheias se espalhassem por áreas muito extensas. Assim, a região adquiriu renome suficiente por sua fertilidade a ponto dos rebanhos do rei Davi pasta rem ali. As condições naturais de Sarom também tomavam o local propício para vários tipos de vegetação, sendo um deles talvez (alguns sugerem outro local), a conhecida Rosa de Sarom (que sem dúvida não era uma rosa, mas sim algum tipo de flor silvestre de grande beleza). 2. O renome de Sarom como um lugar de umidade e abundância de folhagens é a base para várias passagens dos AT que apresentam implicações teológicas. O profeta Isaías observa que durante a crise assíria de sua época, a pilhagem dos invasores foi tão terrível que regiões antes verdejantes haviam se tomado secas e estéreis. Até mesmo Sarom havia ficado tão árida quanto o Arabá (Is 33.9). Para Isaías, a lição espiritual era clara. Com todo seu orgulho, Israel havia confiado em si mesma e não em Deus. Faziam parte das bênçãos de Deus a fertilidade e produtividade da terra. Uma vez que tais bênçãos eram resultado da obediência ao Deus da aliança, em sua desobediência, Israel estava sofrendo o julgamento justo de Deus. Assim a ari dez de Sarom refletia a aridez espiritual do coração do povo. Em outra passagem, Isaías cita Sarom com relação ao julgamento de Israel por sua pro pensão obstinada à idolatria, mas também lhe dava uma mensagem de esperança (Is 65.1-12). Deus poupará um remanescente fiel por meio do qual tanto o povo quanto a terra experimenta rão as bênçãos divinas. Toda a terra, de Sarom a oeste até o vale de Acor a leste se tomará tão fértil que, assim como Sarom, será um lugar onde o gado poderá pastar e encontrar descanso. Nessa era magnífica, a glória de Deus fará com que até as terras ressecadas se assemelhem ao esplendor de Sarom. Assim, a terra constituirá um lugar apropriado para a habitação do rema nescente que voltará e desfrutará a felicidade etema que pertence àqueles que encontram seu descanso espiritual em Deus (Isaías 35). B ib l io g r a f ia
D. Baly, The Geography o f the Bible, 1974,127-30; Y. Karmon, “Geographical Aspects in the History ofthe Coastal Plain”, IEJ, 6, 1956, 33-50; A. F. Rainey, “Sharon”, ISBE 4:451-53; W. L. Reed, “Sharon”, IDfí 4:308-9; George A. Tumer, Historical Geograpy o f the Holy Land, 1973, 131-33; H. R. Weeks, “Sharon”, 5:1161-63. Richard D. Patterson Satisfação
# 8425 (sb ', ser/estar satisfeito)
Saturação ->#8115 (rwh, aproveitar ao máximo, encharcar) Saudação -> # 1385 (brk II, abençoar, louvar, saudar) Saúde -> # 8934 (sãlôrn, paz, prosperidade, saúde, salvação) 1196
Saul
Saul
Saul CntlW [sã’úl\, # 8620).
Vários indivíduos do TM são chamados de sã ’/?/: um rei de Edom (Gn 36.37-38, etc.); um filho de Simeão (Gn 46.10, etc.); um levita (lC r 6.24 [6.9]) e, aquele que sem dúvida é o mais famoso de todos, Saul filho de Quis e primeiro rei de Israel (1 Samuel 9— 31, passim). Enquanto as referências ao rei edomita, ao filho de Simeão e ao levita são escassas e, ao que tudo indica, de pouca relevância teológica, Saul filho de Quise é mencionado mais de 350x e representa um dos personagens mais enigmáticos do AT. 1. A história da ascensão, reinado e, por fim, da queda de Saul tem, há séculos, s motivo de perplexidade para os intérpretes, levando muitos a questionarem a boa vontade e justiça não apenas de Samuel como profeta, mas até mesmo de Deus. Gunn (129), p. ex., es creve: "Se devemos condenar Saul pela sua perseguição invejosa de Davi, quanto mais então não devemos condenar Javé por sua perseguição invejosa de Saul!... Javé manipula Saul sem nenhuma misericórdia... O rei é insultado, sente inveja e ansiedade de justificar-se. É tentador dizer que essa é a face humana de Deus — mas dizer isso talvez seja o mesmo que denegrir o ser humano... Antes, podemos dizer que vemos o ladro negro de Deus”. A maioria dos intér pretes não chega nem perto de um ponto de vista tão extremo, porém muitos ainda lutam para aceitar a maneira como Saul é tratado por Samuel e pelo Deus a quem ele serve. Além das perguntas teológicas que levanta, a história de Saul causa perplexidade de outras maneiras. Vários estudiosos expressaram dúvidas quanto à coerência literária ou lógica das narrativas que descrevem a carreira de Saul. A partir de Wellhausen. costuma-se distinguir pelo menos duas fontes no relato da ascensão de Saul (1 Samuel 8— 12) e considerá-las in compatíveis tomando por base suas atitudes aparentemente distintas com referência à monar quia. Supõe-se ainda que se os relatos sobre Saul não constituem uma narrativa sensata, então dificilmente podem transmitir um registro confiável da história. Ishida (42) fala em nome de diversos estudiosos quando afirma que “é inútil desde o princípio procurar reconstituir uma história harmoniosa a partir de todas as narrativas”. Assim, os relatos sobre Saul são confusos em três níveis: o teológico, o literário e o histórico. No entanto, estudos recentes têm busca do uma interpretação literária mais integrada das narrativas sobre Saul e, à medida que são bem-sucedidos, também esclarecem questões teológicas e históricas (p. ex., Berges, Edelman, Long, Polzin). Saul, cujo nome (sã'úí) se parece com um part. passado q. do radical s ’l (-> # 8626) e como tal, significaria algo semelhante a “perguntado/pedido”, é apresentado em I Samuel 9.1 -2. Porém, alguns comentaristas dizem poder detectar sua presença velada antes disso. Uma vez que o radical verbal s 7 ocorre muitas vezes na história do nascimento de Samuel (1.17,20, 27,28; 2.20), alguns estudiosos imaginam que essa narrativa é, na verdade é uma reelaboração do relato original do nascimento de Saul (p. ex., McCarter, 63; para um ponto de vista oposto, ver Tsevat). No entanto, parece mais provável que o narrador bíblico tenha aproveitado o uso do radical S ’l no relato do nascimento de Samuel a fim de simplesmente prenunciar o papel significativo que Saul posteriormente no livro e talvez, antever o fato de que Samuel, aquele que havia sido “pedido” pela piedosa Ana, estaria envolvido diretamente na ascensão e queda de Saul, aquele que havia sido “pedido” pelos anciãos do povo pecador de Israel (8.4-9; 10.1719; cf. Polzin, 24-25; Garsiel, 1990, 72-75; idem. 1991, 19, 244-45). De qualquer modo, a apresentação explícita de Saul é feita em 1 Samuel 9.1-2, em que ele é descrito como um modelo extraordinária de homem, bãhúr wãtôb, belo e excelente. Apesar de supor-se muitas vezes que, a essa altura da narrativa, Saul não passava de um “ra paz acanhado”(lrwin, 121; cf. Birch, 35), a observação de que ele era bem mais alto do que os 1197
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outros de sua idade enfraquece tal suposição. Também vale a pena observar que apesar de um tom relativamente positivo, a primeira descrição de Saul concentra-se apenas em qualidades exteriores, ao contrário, p. ex., da apresentação de Davi (16.18) a qual, às suas excelentes qua lidades exteriores acrescenta ainda as observações de que era valente e de que “o Senhor [era] com ele” (cf. Humphreys, 20). 2. Dentro da mesma linha das omissões de sua apresentação, não demora a ficar clar que apesar de Saul ser um exemplo de excelência física, faltam-lhe as qualidades espirituais necessárias para ser bem-sucedido como rei de Israel. Uma indicação importante do caráter inadequado de Saul é o fato de ele se recusar repetidamente a obedecer a Palavra de Deus transmitida por intermédio de Samuel. Observa-se muitas vezes que o ofício profético adquire um caráter autônomo com o início da monarquia em Israel (p. ex., Cross, 223). Ou seja, numa situação diferente daquela encontrada no livro de Juizes, em que Gideão, por exemplo, tanto recebe quanto executa instruções divinas (Juizes 6— 8), a ascensão da monarquia traz uma divisão de responsabilidades, de acordo com a qual as instruções de Deus são, muitas vezes, transmitidas ao por intermédio de um profeta, sendo que o rei deve, então, executá-las em obediência ao profeta (Bach, 111-12; Weiser, 22). Evidentemente, a fim de que o domínio de Deus (ou seja, teocracia) seja mantido dentro dessa estrutura, é de suma importância que o rei obedeça o profeta. Mas, como a Bíblia nos diz, não é isso que Saul faz. Apesar de os episódios mais conhecidos da desobediência de Saul encontrarem-se em 1 Samuel 13 e 15, é possível que o primeiro desses casos já apareça no cap. 10. Na ocasião da unção de Saul por Samuel, são dados três sinais que servem de confirmação. De acordo com o texto, quando o terceiro sinal for dado, Saul deve “[fazer] o que a ocasião [lhe] pedir” (de acor do com as instruções de Samuel em 10.7) e depois disso (de acordo com outras orientações do profeta em 10.8), ele deve descer a Gilgal e aguardar mais instruções com referência à batalha contra os filisteus que sua primeira atitude certamente provocará. Ao seguir esse plano, Saul terá dado prova de sua disposição de submeter-se a uma “estrutura teocrática de autoridade” e assim, terá confirmado com adequação para a posição de rei. Terá, ainda, dado mais um passo rumo ao trono, seguindo um padrão triplo de nomeação (por unção), demonstração (um ato de coragem, p. ex., “o que a ocasião [lhe] pedir”; 10.7) e, por fim, a confirmação pelo povo e pelo profeta (para esse padrão, ver Halpem, Edelman). Infelizmente, tem-se a impressão de que Saul recua diante da ordem de 10.7 e assim, coloca um obstáculo no processo de ascen são. Apesar de a vitória de Saul sobre os amonitas em cap. 11 ser suficiente para satisfazer o povo e levar à “renovação” do reino de Saul (11.14), fica aparente pelo tom do discurso de Samuel no cap. 12, que pelo menos na mente do profeta, para tomar-se rei, Saul ainda deve passar por uma prova. Em 1 Samuel 13.3 é Jônatas, e não Saul, quem faz quilo que deveria ter sido feito an tes, lançando o desafio aos filisteus. Ao que parece, depois de reconhecer que a ordem de 10.7 havia sido cumprida, mesmo que por Jônatas, Saul desce imediatamente a Gilgal, de acordo com 10.8 e esperar chegada de Samuel. Quando Samuel demora a vir, Saul não espera por ele e prossegue com a oferta dos sacrifícios que deveriam anteceder a batalha, julgando que a si tuação militar não lhe permitia aguardar mais tempo. Assim que Saul começa os sacrifícios, Samuel chega e, depois de ouvir as desculpas de Saul, anuncia que ele agiu de modo insensato e que seu reino não permanecerá. Por vezes, os comentarias procuram justificar, ou pelo menos trivializar as atitudes de Saul e criticar a reação de Samuel como sendo excessivamente severa (p. ex., Brueggemann, 99). No entanto, diante da importância da ordem dada em 10.7-8 como prova de adequabilidade, tais interpretações não se mostram válidas. No episódio da primeira rejeição de Saul, como também no segundo (cap. 15), os atos específicos de desobediência do 1198
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rei são apenas sintomas de sua incapacidade fundamental de se sujeitar aos requisitos neces sários numa monarquia teocrática. Em resumo, são sintomas de sua falta de fé verdadeira em Deus (cf. lCr 10.13). 3. Depois de sua rejeição definitiva em 1 Samuel 15, Saul deixa de ser o rei por dir to aos olhos de Deus (apesar de permanecer no trono por mais alguns anos) e Deus volta sua atenção para outro homem, a saber, Davi (->). 1 Samuel 16—31 descreve a desintegração emo cional e psicológica de Saul, exacerbada por seu medo de Davi (18.29), o qual ele percebe ser o substituto escolhido por Deus para a sua posição no trono (18.8; 20.31). Depois de falar em várias tentativas de tirar a vida de Davi, Saul acaba tirando sua própria vida (31.4). Ao longo de todos esses acontecimentos, mesmo que indiretamente, Davi é protegido de modo provi dencial e conduzido ao trono. Se essa interpretação da ascensão e queda de Saul está correta, pelo menos em seus contornos fundamentais, então representa um grande avanço na resolução das supostas dificul dades literárias do relato. Começa, também, a perscrutar as profundezas teológicas da história de Saul e remove a idéia de que sua rejeição é um tanto injustificável. A rejeição de Saul não se deve a questões técnicas ou mesmo trivialidades, mas sim, à sua repetida desobediência à palavra profética. Essa desobediência prova que Saul não tem a capacidade ou disposição de sujeitar-se à estrutura de autoridade estabelecida na ocasião de sua unção. E, uma vez que não se mostra adequado para governar como vice-regente de Deus, não é adequado para ser rei de Israel. Por fim, além de solucionar dificuldades literárias e teológicas, a interpretação acima das narrativas sobre Saul abre a porta para uma avaliação mais positiva do que se tem considerado até agora em termos de valor histórico desses relatos (para um estudo completo da interpreta ção acima, ver Long, 1989; 1994, cap. 6). Samuel: Teologia B ib l io g r a f ia
R. Bach, Die Aufforderungen zur Flucht und zum K am pf im alttestamentlichen Prophetenspruch, WMANT 9, 1962; U. Berges, Die Verwetfung Sauls: Eine thematische Untersucung, Forschung zur Bibel 61, 1989; B. C. Birch, The Rise o f the Israelite Monarehy: The Growth and Development o f I Samuel 7-15, SBLDS 27, 1975; W. Brueggemann, First and Second Samuel, 1990; F. M. Cross, Canaanite Myth and Hehrew Epic, 1973; D. V. Edelman, “Saul’s Rescue of Jabesh-Gilead (1 Sam 11:1-11): Sorting Story from History”, ZA W 96, 1984, 195205; idem, King Saul in the Historiography ofJudah, JSOTSup 121, 1991; M. Garsiel, The First Book o f Samuel: A Literary Study o f Comparative Structures, Analogies and Parallels, 1990 (Hebrew, 1983); idem, Biblical Names: A Literay Study o f Midrashic Derivations and Puns, 1991; R. P. Gordon, I & II Samuel: A Commentary, 1986; D. M. Gunn, The Fate o f King Saul: An lnterpretation o f a Biblical Story, 1980; B. Halpem, The Constitutions o f the Monarehy in Israel, HSM 24, 1981; W. L. Humphreys, “The Tragedy o f King Saul: A Study of the Structure o f 1 Samuel 9-31”, JSO T 6, 1978, 18-27; W. A. Irwin, “Samuel and the Rise of the Monarehy”, AJSL 58, 1941, 113-34; T. Ishida, The Royal Dynaties in Ancient Israel: A Study on the Formation and Development o f Royal-Dynatic Ideology, BZAW 142, 1977; V. P. Long, The Reign and Rejection o f King Saul: A Case fo r Literary and Theological Coherence, SBLDS 118, 1989; idem, The Art o f Biblical History, Foundations o f Contemporary lnterpretation 5, 1994; idem, “How Did Saul Become King? Literary Reading and Historical Reconstruction”, in Faith, Tradition and History, 271 -84, 1994; R. Polzin, Samuel and Deute ronomistic: A Literary Study o f the Deuteronomic History, Part 2: I Samuel, 1989; M. Tsevat, 1199
Sefelá
“Die Namengebung Samuels und die Substitutionstheorie”, ZA W 99, 1987,250-54; A. Weiser, “I Samuel \ 5", ZA W 54, 1936, 1-28. V. Philips Long Seco -> # 2990 (hrb I, estar seco ou desolado; arruinado) Sede Sedução
# 7532 ($m ’, estar sedento) # 6077 (.vw/, atrair, apartar, incitar)
Sefelá
Sefelá
[sepêlâ], # 9169).
AT 1. Em termos geográficos, o nome Sefelá refere-se exclusivamente a uma faixa de cam pina que se estende de norte a sul, com cerca de quinze quilômetros de largura, entre a planície filistéia e a região montanhosa de Judá. A região é cortada pelo leito de vários rios e riachos, formando vales no sentido leste-oeste que servem de acesso entre as duas regiões. Esses vales constituíram o cenário de diversos embates entre filisteus e hebreus durante a era subseqüente à conquista de Canaã. A ameaça constante dos filisteus levou Saul a realizar uma campanha contra eles e Salomão e Roboão a erguer fortificações em diversos locais. Apesar disso, os fi listeus invadiram o vale no tempo de Acaz. Estendendo-se no sentido norte-sul no Sefelá, o vale de Aijalom (->) foi o cenário de várias batalhas decisivas da antigüidade. No tempo da conquista, foi o local do memorial poético para o “dia longo” de Josué, quando o sol e a lua foram ordenados a se deterem (Js 10.10-15). O vale de Soreque, a região geral das aventuras de Sansão, testemunhou a volta da arca depois de sua estada tumultuada em território filisteu e também urna guerra civil no tempo de Amazias e Jeoás. O vale de Elá foi o local dos combates depois da morte de Golias e, posteriormente, serviu de refúgio para Davi quando este fugia de Saul. O vale de Zefatá foi o campo de batalha no qual Asa fez recuar as forças do etíope Zera, possivelmente o co mandante de Faraó Osorcão 1. Na extremidade sul do Sefelá, os vales do uádi Qubeibá e do uádi el-Hesi testemunharam incursões militares constantes a partir da época da conquista, culminando com a captura de Laquis pelo rei neobabilônio Nabucodonosor II pouco antes da queda de Jerusalém. O Sefelá continuou a ocupar uma posição de destaque nas atividades israelitas até o período romano. 2. Parte da importância estratégica do Sefelá se reflete na profecia de Miquéias (Mq 1.10-16) sobre as cidades da região. Usando de trocadilhos bem elaborados com o significado e o som das palavras, o profeta anuncia a destruição futura das cidades do Sefelá de Bete-Leafra (que se “revolveriam no pó”, v. 10 [ apãr]) até Maressa (que seria conquistada por um outro “herdeiro”, v. 15 [um trocadilho com o heb. võrês]). O colapso das principais defesas no Sefelá, deixando o interior de Judá aberto para o perigo iminente, serviria então de lembrança de que a desobediência espiritual pode trazer a calamidade sobre o povo de Deus, por mais poderosos que pareçam ser os recursos humanos. Por meio de vários profetas, pode-se atingir um discernimento teológico mais profun do sobre os contextos nos quais o Sefelá aparece. Jeremias coloca o Sefelá com outras regiões adjacentes a Judá beneficiadas pelas bênçãos de Deus ao guardar os mandamentos dele (p. ex., o sábado, Jr 17.19-27), especialmente na grande era de paz associada ao início da nova aliança (32.42-44; 33.12-13; cf. Obadias 19; b^rít, tratado, # 1382). 1200
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Da mesma forma, Zacarias (Zc 7.4-7) se refere ao Sefelá com relação à apostasia espi ritual. No passado, aquela região desfrutou de uma segurança que proporcionava paz e prote ção; agora, porém, a terra toda estava sofrendo por causa da desobediência espiritual. Pelo fato de Israel continuar a realizar suas atividades espirituais como simples rituais religiosos, corria o risco de sofrer uma disciplina ainda maior. A observância religiosa e os deveres espirituais cumpridos perfunctoriamente só serviram para aumentar a hipocrisia e não podiam receber a aprovação de um Deus justo. 3. A relevância crucial do Sefelá para a posse da terra da promessa dada por Deus a Isr é ressaltada nos fatos históricos e nos pronunciamentos dos profetas. Apesar do grande cuidado com a segurança, todas as medidas seriam inúteis. Israel seria lembrada de que a verdadeira força encontra-se somente em Deus e na vida de obediência aos preceitos por ele revelados. As passagens proféticas relativas ao Sefelá corroboram a idéia, constantemente lembrada no AT para os fiéis, de que, apesar de o futuro ser de bênção, essa bênção é um dom gracioso de um Deus que cumpre suas promessas. B ib l io g r a f ia
D. Baly, The G eographyofthe Bible, 1974,134,140-43; B. J. Beitzel, The Moody Atlas o f Bible Lands, 1985,96-98; H. Brodsky, “Shephelah”, ABD 5:1204; W. H. Morton, “Shephelah”, IDB 4:324-25; A. F. Rainey, “Shephelah”, ISBE 4:473-74; C. Rasmussen, Zondervan N1VAtlas o f the Bible, 1989, 47-48; G. A. Smith, The Histórica! Geography o f the Holy Land, 1966, 143-71. Richard D. Patterson Segredo
# 6259 (str, esconder, manter em segredo)
Segurança -> #7117 (pl(, salvar, colocar em segurança) Seis
# 9252 (sês I, seis)
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Sem (□]£>’ [sêm II], # 9006).
OMA O NP Sem significa “nome”, podendo ter a conotação de “honrado, estimado” (cf. ansê sêm, Nm 16.2; ’ansêsêm ôt, 1Cr 5.24; semuy, louvado, honrado, eslimado). Alguns estudiosos sugeriram que Sem é uma abreviação de um nome teofórico, do qual o elemento teofórico foi abolido. De acordo com essa concepção, tomando por base o cognato acad. sumu, que pode significar “filho” bem como “nome”, atribui-se ao suposto elemento inicial sêm o significado “filho (de)”. Palavras compostas com sêm são bastante atestadas em nomes do OMA (ver M. Noth, Die israelitischen Personnamen im Rahmen der gemeinsemitischen Namengebung, 1928, 123-24; J. J. Stamm, DieakkadischeNamengebung, M V À G 44,1939,40-42, 139-43,145,148, 155-56, 158, 236, 261, 303-4, 366-67; H. B. Huffmon, Amorite Personal Names in the Mari Texts, 1965, 247-49); p. ex., acad. Su-um-dsin, filho de Sin; dMarduk-suma-ibni, Marduque criou um herdeiro, dNabú-sum-lisir, Ó Nabu, que prospere o herdeiro!; dSin-nãdin-sumT, Sin é o doador de filhos. AT 1. Sem era um dos três filhos de Noé, possivelmente o mais velho (dependendo da exe gese da oração ’ahiyepet haggãdôl em Gn 10.21, em que a LXX e outras exegeses judaicas entendem haggãdôl como um modificador de yepet e não ’aht), que foi livrado do julgamento 1201
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do dilúvio ao entrar na arca com sua esposa. Sempre aparece em primeiro lugar quando é ci tado com seus irmãos — ou seja, na seqüência Sem, Cam e Jafé (5.32; 6.10; 7.13; 9.18; 10.1; 1 Cr 1.4). Porém, na Tabela das Nações (Gênesis 10) ele aparece em terceiro lugar (vv. 21 -31), depois de Jafé (vv. 2-4) e Cam (vv. 6-20). Sua importância para a história da redenção se deve ao fato de ser um antepassado de Abraão e, conseqüentemente, do povo de Israel. Assim, em presta seu nome à seção tõledõt que contém uma genealogia linear da linhagem da promessa (11.10-26), que se encerra com a história universal e serve de ponte para a história patriarcal. Juntamente com seu irmão Jafé, cobriu a nudez de seu pai, Noé (Gn 9.23). Noé chamou o Senhor de “Deus de Sem”, fazendo com que tanto o Criador do universo como o futuro Re dentor de Israel tivesse um relacionamento especial com Sem e, desse modo, com os descen dentes de Sem (9.26). Assim, o relacionamento de uma nação com Sem (e seus descendentes, o povo de Israel) resultaria em maldições e bênçãos (-> Gênesis: Teologia) 2. Sem aparece nas genealogias de Crônicas como o filho de Noé do qual veio Abraã (lC r 1.4, 17-27). P-B Na LR, Sem recebe muitas vezes o epíteto “o Grande”, de modo a significar que ele foi o filho mais importante de Noé. Por ser antepassado do povo judeu, ele é descrito como aluno devoto da Torá e fundador da primeira academia para o estudo da Torá (bêt midrãS). As “tendas” de Gênesis 9.27, são casas de estudo da Torá, onde tanto os devotos de Israel quanto das nações podem encontrar sabedoria. Melquisedeque é, por vezes, identificado com Sem (p. ex., Tig. Neofiti, Gn 14.18). De acordo com Jubileus 10.27-34, a terra que pertencia por direito a Sem foi usurpada por Canaã, que deu seu nome à terra (ou seja, a Canaã que Israel deveria possuir). Sem é mencionado apenas uma vez no NT, na genealogia de Jesus apresentada por Lucas (Lc 3.36). Jerome A. Lund
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AT Dados léxicos. O termo Sema vem de VOU? ma ‘), ouvir (imp. masc. sing., primeira palavra de Dt 6.4). O vb. é derivado de VDtC' (s/w'), ouvir, escutar (-> # 9048). 1. Deuteronômio 6.4 é chamado de Sema, o cerne fundamental da fé de Israel. Decla a unidade e singularidade de Deus: “Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor” (em heb. sem a ‘yisrã'êl yhwh ’elõhênú yhwh ’ehãd). O Sema constitui uma confissão teológica, o credo por excelência do judaísmo. Seguindo a instrução de Deuteronômio 6.7, é recitado pela manhã e à noite como um dever e proclamação de fé, sendo acompanhado de várias bênçãos (Mi. Berakoth 1.4; 2.2). Quando o templo ainda existia, os sacerdotes se reuniam durante um intervalo pela manhã para recitar o Sema naquele local (Mish. Tamid 5.1). À medida que o costume de recitar o Sema se desenvolveu ao longo dos séculos, a comunidade judaica passou a considerar sua recitação como um meio distinto pelo qual os indivíduos podiam dar testemunho da essência da fé judaica. Por esse motivo, no texto heb. de Deuteronômio 6.4, o V ( ‘) de sema ‘ e o 1 d. de ’ehãd, um, costumam ser escritos em tamanho maior do que as outras letras heb. (p. ex., ver BHS) de modo que a combinação dessas duas consoantes maiores formem a palavra "TV ( ‘êd), testemunha. Os meninos deviam memorizar o Sema assim que aprendiam a falar (T. B. Sukkah 42a). Mártires e enfermos em seus leitos também se dedicavam à proclamação do Sema. A inspira ção para essa prática vem do grande rabino Akiba (c. d. C. 50-135), sobre o qual se diz que, 1202
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durante sua execução pelos romanos, recitou o Sema prolongando a palavra 'ehãd até expirar (TalmB Berakoth 61b). Assim, desde a mais tenra infância até o momento da morte, os judeus são ensinados a dar testemunho da singularidade do nome de Deus. Esse elemento teológico central — o reconhecimento de um Rei Supremo — chegará ao seu auge na era messiânica. Nessa ocasião, “O Senhor será Rei sobre toda a terra; naquele dia; um só será o Senhor, e um só será o seu nome” (Zc 14.9). 2. As palavras heb. do Sema já foram o centro de inúmeras discussões (ver Mober Alguns estudiosos traduziram as palavras depois de í em a ‘ yisrã'êl, como uma só frase, en quanto outros, consideraram tratar-se de duas frases. No entanto, talvez mais importante ainda seja o significado da última palavra, 'ehãd, um termo que gerou diferentes interpretações entre judeus e cristãos. De modo geral, os comentaristas judeus consideram que “é o único Senhor” (Dt 6.4), expressão muitas vezes combinada com “Eu sou o Senhor, teu Deus” (Ex 20.2) — o primeiro dos Dez Mandamentos de acordo com a cálculo tradicional judaico — constitui uma declaração de monoteísmo. No ambiente religioso do OMA, em que imperava o panteísmo, politeísmo e dualismo, os hebreus deviam saber que havia somente um Deus e não uma porção de divindades (cf. Is 43.10-11). Além disso, Javé é singular, é eterno e incomparável, um ser absolutamente distinto de qualquer coisa (Dt 4.39). Apesar de concordarem com o enfoque principal do Sema em seu contexto original, contrastando com o mundo de adoração politeísta à natureza, vários intérpretes cristãos in sistem que 'ehãd não é, obrigatoriamente, uma só unidade, como uma pessoa, 'ehãd também pode ser usado para especificar uma unidade composta na qual “um” pode ser tanto um só quanto muitos ao mesmo tempo (Gn 2.24; Ez 37.17). Ao reconhecerem a “diversidade dentro da unidade”, alguns estudiosos cristãos argumentam que o monoteísmo trinitariano pode ser encaixado no 'ehãd do Sema. NT O NT confirma a mensagem do monoteísmo centrado no Sema (lTm 2.5; Tg 2.19). Quando um mestre da lei pergunta a Jesus, “Qual é o principal de todos os mandamentos?”, Jesus responde recitando o Sema (Mc 12.29). Ele associa a confissão “Ouve, Israel” ao man damento de amar a Deus e ao próximo (vv. 30, 31; cf. Dt 6.5; Lv 19.18). Do ponto de vista de Jesus, a crença exclusiva no Deus de Israel leva a um amor obediente e exclusivo para com ele e inclusivo para com outros. B ib l io g r a f ia
M. Adler, “Judaism’s Central Affirmation”, in L. Edelman, sd.,Jewish Heritage Reader, 1965, 38-43; C. H. Gordon, “His Name is ‘One’”, JNES, 29, 1970, 198-99; J. H. Hertz, Authorized Daily Prayer Book (rev. ed. 1948), 108-29, 263-69; L. Jacobs, “Shema, Reading o f ’, EJ 14:1370-74; J. G. Janzen, “On the Most Important Word in the Shema (Deuteronomy VI:4-5)”, VT 37, 1987, 280-300; J. Jeremias, Prayers o f Jesus (Eng. tr. 1967), 66-81; G. A. F. Knight, “The Lord Is One”, ExpTim 79, 1967/68, 8-10; TD O T1:193-201; R. W. L. Moberly, “Yahweh Is One: The Translation of the Shema”, STV 41, 1990, 209-15; M. F. Walsh, “Shema Yisrael: Reflections on Dt 6:4-9”, TBT 90, 1977, 1220-25; B. E. Willoughby, “AHeartfelt Love: An Exegesis of Deuteronomy 6:4-19”, ResQ 20, 1977, 73-87. Marvin R. Wilson Semana -> # 8651 (sãbüa período de sete, semana) Semeadura
# 2445 (z r \ semear, espalhar sementes, formar sementes) 1203
Senaqueribe
Semelhança
# 1948 (dmh I, ser/tomar-se parecido, comparar, ponderar, imaginar)
Semente -> # 2445 (z r \ semear, espalhar sementes, formar sementes)
Senaqueribe
Senaqueribe (3,'inilD [sanhêríb], # 6178).
AT O nome Senaqueribe significa “O deus-lua Sin substituiu irmãos”, indicando que irmãos mais velhos haviam morrido. A forma heb. é uma versão precisa do termo no dialeto assírio da época. Senaqueribe tomou-se rei da Assíria depois da morte de seu pai, Sargão II numa batalha em 705 a. C. Até então, vinha auxiliando na administração do império como príncipe herdeiro e subiu ao trono sem oposição interna. Sargão havia governado sobre a Babilônia como rei desde 709 a. C. e foi lá que Senaqueribe enfrentou um problema extremamente persistente. Merodaque Baladã, o líder caldeu subjugado por Sargão, procurou mais que depressa estender seu domínio sobre toda a Babilônia, levando Senaqueribe a devastar o país e colocar no trono um babilônio, Bel-ibni, como governador sob o seu controle (703 a. C.). Bel-ibni foi subornado e, depois de forçar Merodaque Baladã a fugir para o Elão, Senaqueribe colocou no governo seu próprio filho Asur-nadin-sumi. A hostilidade dos caldeus persistiu, de modo que Senaqueribe os atacou de navio nas regiões alagadiças e no Golfo. Apesar de suas tropas terem sido vito riosas naquela região, uma força elamita penetrou a parte norte da Babilônia, onde os líderes locais lhes entregaram Asur-nadin-sumi e colocaram no trono seu próprio líder, Nergalusezibe (694 a. C.). Senaqueribe decidiu vingar-se e capturou Nergalusezibe. Em 693, atacou o Elão e em 691 lutou contra os elamitas numa batalha importante, porém não decisiva em Halule. Os babilônios conseguiram manter seu novo rei, Musezibe-Marduque durante dois anos, mas em 689 os assírios tomaram a Babilônia depois de um longo e duro cerco. A cidade foi devastada, canais foram desviados de modo a destruir suas construções e as estátuas dos deuses foram destruídas, com exceção da estátua de Marduque, o deus mais importante dos babilônios, que foi levado em triunfo para Asur. Outras rebeliões levaram à realização de campanhas nos montes Zagros e no Irã (702 e aproximadamente 698 a. C.), resultando em tributo dos medos, entre outros. Em 696 e 695, generais assírios marcharam para a Cilícia, capturando Tarso e lutando contra Tabal (o Tubal da Bíblia) nos montes Taurus. A última investida de Senaqueribe da qual se tem registro foi contra tribos árabes que ele perseguiu até Dumá (atual Al-Jawf) no norte da Arábia em c. 690 a. C. Não há registros históricos disponíveis da última parte de seu reinado. Esse período não documentado levou estudiosos a suporem que Senaqueribe liderou uma segunda expedição contra Judá em seus últimos anos. No entanto, não há nenhuma evi dência satisfatória de mais de uma operação no Levante, a terceira campanha de Senaqueribe em 701 a. C. Ao que parece, a morte de Sargão serviu de ocasião para vassalos menores do oeste se revoltarem com o apoio do Egito e dos caldeus. (A embaixada de Merodaque Baladã enviada a Ezequias, conforme o relato de 2Rs 20.12-19 = Isaías 39, pode ser data de antes dos acontecimentos de 701 a. C. em 2 Reis 18— 19). Ezequias de Judá foi um dos principais re beldes, aprisionando Padi, o rei pró-assírio de Ecrom, deposto pelo partido rebelde de Ecrom. Esse ato rompeu o tratado que seu pai, Acaz, havia feito com a Assíria (16.7-10), de modo que o castigo assírio já era esperado. Os anais de Senaqueribe relatam seu avanço pela costa, com vários reis locais se apres sando em provar sua lealdade. Em Judá, seu exército lançou um ataque violento contra Laquis, que é atestado por vestígios arqueológicos e ilustrado em placas esculpidas usadas para reves 1204
Senaqueribe
tir as paredes de uma sala do palácio de Ninive. A partir dali, Senaqueribe enviou suas tropas para forçar Ezequias a se submeter, mas não foi bem-sucedido (2Rs 18.17— 19.8). Diante de um avanço dos egípcios, os assírios enviaram um ultimato por escrito para Jerusalém; este também foi recusado e levou à profecia de Isaías da queda dos assírios (19.9-34). Os anais de Senaqueribe vangloriam-se da captura de quarenta e seis cidades em Judá e da deportação de 200.150 pessoas, mas nâo fazem nenhuma declaração sobre terem tomado Jerusalém, dizendo apenas que Ezequias enviou um tributo pesado para Ninive. Essas declarações podem ser con sideradas propaganda política assíria encobrindo a tragédia descrita em 19.35-36. O milagre do anjo do Senhor que dizimou o exército assírio não deve ser descartado como uma lenda ou ficção teológica. Antes, é um exemplo da maneira antiga de expressar a intervenção divina no momento exato e que de outro modo seria inexplicável, constituindo um conceito que apresenta paralelos em materiais assírios e em outros textos. Como revelam as escavações arqueológicas, os assírios subjugaram Judá, deixando Ezequias com um reino reduzido e em ruínas. A ajuda do Egito fracassou, como Isaías havia dito (Isaías 30— 31). Em Elteque, na Filístia, os assírios derrotaram o exército liderado pelo egípcio Tiraca, chamado prolépticamente de rei em 2 Reis 19.9 (Tiraca subiu ao trono em 690 a. C.). Para o historiador bíblico, o assassinato de Senaqueribe no vigésimo Tebet (décimo mês) de 681 a. C. completa a história. Foi um acontecimento lembrado durante muito tempo na Assíria e na Babilônia, apesar de os registros nativos não citarem os parricidas, como faz 2 Reis 19.37 e mencionarem apenas um filho. A Assíria sob o governo de Senaqueribe foi, para Isaías em particular, um instrumento usado por Deus para castigar Judá por sua desobediência. O profeta prognosticou a invasão no tempo do tratado de Acaz com a Assíria (Is 8.5-8), mas proclamou posteriormente que a Assíria seria castigada por ir além da sua incumbência (10.5-19; cf. 14.24-27) e que haveria uma vida renovada para o povo ferido de Deus. E difícil dizer quanto consolo isso trouxe para o povo de Judá que passou pela guerra descrita nesses versículos. (Vários comentaristas consideram que 10.28-34 revela o caminho percorrido pelos assírios em sua marcha rumo a Jerusalém.) A caracterização que o profeta apresenta dos assírios reflete os títulos de Senaqueribe nas inscri ções desse rei, retratando-o como um governante mundial invencível, vice-rei do deus Asur, agindo sob o comando dessa divindade. B ib l io g r a f ia
M. Cogan, H. Tadmor, 2 Kings, AB 11, 1988,215-63; A. K. Grayson, “Sennacherib”, in J. Boardman et al., eds., CAH 3.2,2, 1991, 103-22; T. C. Mitchell, “Ahaz and Hezekiah”, in CAH, 344-70; A. R. Millard, “Sennacherib’s Attack on Hezekiah”, TynBul 36, 1985, 61-77; idem, “Assyrian Royal Names in the Old Testament”, JSS 21, 1976, 8. Alan Millard Sentimento -> # 5491 (mss, tocar, sentir) Seol
# 8619 (se 'ôl, Seol, reino dos mortos)
Separação
# 976 (bdl, separar-se)
Sepultamento Sepultura
# 7699 (qbr, sepultar)
# 7700 (qeber, sepultura, cemitério, sepultamento) 1205
Servo, Escravo
Ser -> #2118 (hyh, tomar-se, acontecer) Ser vivente -> # 2644 (hay I, vida, juramento) Serafim -> # 8597 (sãrâp I, serafim, cobra, serpente) Setpente -> # 5729 (nãhãs I, serpente) Serviço -> # 6268 ( 7>c/, trabalhar, servir)
Servo, Escravo A. Vocabulário Podemos encontrar quatro termos principais no âmbito semântico da servidão. 1. Í1D1J ( amâ), susb. escrava, criada (-> # 563) 2. p n i (nãtin), servo do templo (-> # 5987). Aram. 1’Hí (netín), servo do templo (# 10497); < "[na («/«), dar, apresentar, oferecer, consentir, permitir, render-se, enviar, assentar, pôr, colocar (-> # 5989). 3. nnçiP (siphâ), subs. escrava, serva (-> #9148). 4 . 13V ( 'ebed), subs. servo, escravo, súdito, oficial (-> # 6269), encontrado também nos nomes próprios Abda, Abdeel, Abdi, Abdiel, Abdon, Abednego, Ebed e Ebed-Meleque; aram. ( ‘abêd), subs. servo (# 10523); < ( ‘bd), q. trabalhar, realizar, servir, adorar, levar a cabo, honrar; ni. ser lavrado, trabalhado; ser trabalhado; hi. escravizar, fazer trabalhar, fazer servir; ho. ser levado/influenciado a servir; ser levado a adorar (# 6268). Este artigo se con centrará no uso de ‘ebed. B. ‘ebed no OMA O radical 'bd é atestado na maioria das línguas sem., com exceção do , tendo como significado principal escravo ou adorador. Todas as formas básicas de uso do AT encontramse em uma ou mais línguas sem. (cf. especialmente inscrições do noroeste sem., D N W SI81619). No ugar., 'bd é usado para designar escravos e vassalos, membros de equipes de trabalho ou guildas e cortesão ou oficiais do rei, ocorrendo também muitas vezes em nomes próprios ( UT, 1801). O acad. abdu é uma palavra emprestada do semO, substituindo o termo habitual (wjardu/wardatu (AHw, 6a). Esse último termo é usado na fórmula bastante atestada “servo de DN” em documentos de escrita cuneiforme na Mesopotâmia e em selos em forma de cilindro tanto como uma descrição geral quanto como um título cultuai específico. O uso de “servo” como uma autodenominação aparece muitas vezes nas cartas de Amama (usando ardu) e Laquis (usando ‘bcf), sendo que a pessoa que fala costuma acrescentar de modo aposicional “um cão”, a fim de indicar postura de humildade (cf. C. Lindhagen, 6-39). Um selo heb. datado da primeira metade do século VIII a. C. contém a fórmula teologicamente relevante “NP ‘ebed y h w h “Pertencente a Miqnêyaw, servo de Javé” (Imqnw 'bdyhwh), alguém que, de acordo com F. M. Cross, era um funcionário do sistema cultuai. C. 'ebed no AT ‘ebed, o termo principal heb. para escravo/servo, ocorre c. 800x na BH (em todos os li vros, exceto em Rute, Cântico dos cânticos e em seis dos Profetas Menores; a forma aram. ‘abêd 1206
Servo, Escravo
ocorre 7x). 'ebedè usado para descrever um relacionamento dinâmico entre dois indivíduos (so mente três textos empregam a palavra para seres nâo humanos: Jó 4.18; 41.4 [40.28]; SI 119.91), o escravo/servo e o dono/senhor, um relacionamento que pode ser permanente ou temporário, voluntário ou involuntário — ficando ou não implícitos certos deveres correspondentes — e literal ou figurativo. Essa relação costuma ser indicada de modo sintático: mais de 400x, com um sufixo pronominal (“seu escravo”), mais de 200x por meio de uma combinação (“escravo de x”) e mais de 40x com o uso possessivo da preposição le. De acordo com Riesener (17-24), hyh + le, tomar-se um escravo de, é usado para indicar sua condição que nem sempre foi esta ou nem sempre será, enquanto a oração nominal “x é um escravo” é empregada para indicar uma condição duradoura (cf. Gn 44.1 com Pv 22.7). Qualquer que seja o relacionamento, a posição e o papel do servo depende da condição social do seu senhor. A natureza exata da relação entre o subs. ‘ebede o vb. do mesmo radical, ‘bd, trabalhar, servir, é controversa (cf. Lindhagen, 41 e Zimmerli, 11). Além disso, já se discutiu bastante o significado do conceito básico subjacente a 'ebed que permite ao termo descrever tanto a con dição social mais baixa, a escravidão abjeta, quanto o maior privilégio concedido a uma pessoa — ser servo de Deus. Uma vez que 'ebed pode ser usado para descrever uma relacionamento que não envolve nenhuma obrigação, inferioridade social e outras condições temporárias (p. ex., quando Roboão é aconselhado a tomar-se um servo dos seus súditos “hoje”, a fim de que eles sejam “servos” dele para sempre, lRs 12.7), o mais aconselhável é entender-se o 'ebed como alguém que depende de outrem e, assim, faz sua vontade ou age visando ao bem deste e nâo a outras formas de uso comuns como a distinção clara de condição social (Baudissin), o caráter exclusivo do relacionamento (Rengstorff) ou o fato de se pertencer a outrem (Zimmerli) (cf. Riesener, 3-4,269 e Van der Ploeg). O amplo campo semântico de 'ebed por vezes dificulta o processo de determinar num certo texto a condição exata daquele que é designado como 'ebed (cf. as diversas nuanças das nove ocorrências de ‘ebed em 2 Samuel 9). Uma vez que a língua heb. não faz distinção entre servo, escravo e criado, seria enganoso traduzir-se a palavra sempre como “escravo” apesar de não se dever permitir que as associa ções negativas derivadas da prática moderna da escravidão, envolvendo a servidão opressiva e uma condição degradante do ser humano como se este fosse apenas um bem, influencie a compreensão dessa instituição da antigüidade e nem da imagem bíblica. 1. Escravo/servo doméstico. Mais de um quinto das formas de uso designam ou escr ou servo doméstico, conforme a concepção dos israelitas ou de nações estrangeiras. A maio ria dos escravos durante o período do AT era constituída de prisioneiros de guerra (Js 9.23), indivíduos comprados de nações vizinhas (Gn 39.17; Lv 25.44-45), pessoas individadas (Gn 47.25; Lv 25.39; 2Rs 4.1; Pv 22.7) e filhos de outros escravos (Gn 14.14-15) (Dandamayev em ABD 6:63-64). a. Nas narrativas patriarcais, escravos e escravas são, muitas vezes, relacionados jun tamente com os animais domésticos como sinal de riqueza pessoal e bênção divina, apesar da escassez de informações sobre a origem desses escravos. Entre os deveres do escravo estavam proteger seu senhor (Gn 14.15), procurar uma esposa para os filhos dele (24.9) e cavar poços (26.15). O retrato detalhado do escravo mais antigo de Abraão em Gênesis 24, possivelmen te Eliézer de Damasco (15.2), ressalta o relacionamento próximo deste com seu senhor, sua grande responsabilidade e sua liberdade considerável, dificilmente encaixando-se, assim, no conceito mais limitado da condição de escravo. Gideão também é descrito como tendo pelo menos dez escravos (Jz 6.27). b. A legislação do Pent. não critica a instituição da escravatura, mas contém um gran de número de leis que protegem os escravos de acordo com os vários direitos de um cidadão, 1207
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quaisquer que tenham sido as circunstâncias que o levaram à escravidão. Essas leis são impor tantes em termos teológicos, pois há um amplo consenso entre os estudiosos de que as atitudes israelitas com relação aos escravos e no tratamento destes era singular no OMA (C. J. H. Wright, 239-40; L. Epsztein, 119). A explicação pode ser encontrada no Deus de Israel e na história do povo. A história nacional de Israel começou quando Javé o tirou da “terra do Egito, casa de escravidão” (Êx 20.2 || Dt 5.6; cf. Dt 7.8; 13.5, 10 [6, 11]; Js 24.17; Jz6.8), um acontecimento do qual os israelitas jamais deviam esquecer-se (Êx 13.3, 14; Dt 6.12, 21; 8.14). i. Os escravos israelitas deviam desfrutar o descanso do sábado (Êx 201. || Dt 5.14) e participar integralmente dos festivais israelitas (Êx 12.44; Dt 12.12,18; 16.11,14), pois, no pas sado, os israelitas haviam sofrido como escravos (Dt 5.15; 16.12). Isso também pode explicar o motivo de os escravos serem protegidos de violências físicas infligidas por seus senhores (Êx 21.20-21, 26-27) e o fato de dever-se dar asilo a escravos fugidos (Dt 23.15-16 [16-17]). ii. As mulheres e homens hebreus que haviam se tomado escravos em função de dívi das, deviam ser libertados depois de seis anos de serviço (Êx 21.2-4) e receber um suprimento generoso de bens materiais, supostamente para ajudá-los a a evitar a escravidão no futuro (Dt 15.12-18). A explicação para essa lei também se refere à escravidão e redenção de Israel no passado — um povo libertado nâo deve prolongar a escravidão de um de seus compatriotas (v. 15). Israel não precisava depender desse tipo de escravidão. Antes, se os israelitasobedecessme os preceitos de Deus, Deus os abençoaria abundantemente (v. 18). A lei do Jubileu espe cifica que tais cidadãos empobrecidos deviam ser tratados como trabalhadores contratados ou residentes temporários e não como escravos (Lv 25.39,40, 53a, lõ ’ta ’abõdbô 'abõdat 'ãbed) e que não deviam ser subjugados impiedosamente (bepãrek) como havia ocorrido no Egito (25.43, 46, 53b; cf. Êx 1.13, 14). Essa lei repete o princípio teológico fundamental: “Porque são meus servos, que tirei da terra do Egito; não serão vendidos como escravos” (Lv 25.42; cf. v. 5 e Ne 5.5-9). O uso de escravos hebreus em Êxodo 21.2-6; Deuteronômio 15.12-18 e Jeremias 34.822 era especialmente regulamentado. Quer o termo heb. ‘ib r i seja ou não derivado de j abini. nesses contextos, refere-se claramente a israelitas. O uso da expressão “escravo hebreu” pode ter por objetivo trazer à memória a experiência de Israel no Egito (cf. N. Na’aman). De acor do com Epsztein (119), “nas pequenas propriedades agrícolas da Israel da antigüidade, onde o trabalho era realizado pelo proprietário, sua família e um número limitado de escravos, estes últimos eram, de certa forma, tratados como membros da família à qual pertenciam”. Regula mentada dessa maneira, a escravidão por dívida pode até mesmo ser uma situação desejável, o que toma compreensível a opção de continuar como escravo por amor ao senhor depois do ano de libertação (Êx 21.5; Dt 15.16). iii. Apesar de os textos bíblicos concentrarem-se principalmente na escravização de in divíduos, a escravização de nações inteiras também ocorria e podia implicar trabalhos forçados. Conforme observado acima, os descendentes de Jacó foram obrigados a servir os egípcios, re alizando trabalhos de construção e cultivo da terra (Êx 1.14). Os gibeonitas serviam Israel em caráter permanente como rachadores de lenha e tiradores de água (Js 9.23). Salomão recrutou os estrangeiros que ainda havia na terra para trabalhar como escravos ( lemas 'õbêd), mas ne nhum israelita foi escravizado ([/<5 'nãlart... 'ãbed], lRs 9.20-23 || 2Cr 8.7-10). Essa condição de escravo pode ser considerada resultante de um julgamento divino ou maldição (p. ex., Canaã: Gen 9.25-27; Esaú: 27.37; Israel entre as nações: Dt 28.68; Gibeão: Js 9.23). iv. Apesar do tratamento relativamente humanitário dos escravos em Israel, de modo geral, essa condição não costumava ser considerada positivamente. Os escravos não eram vistos apenas como pessoas, mas também como propriedades a serem compradas, vendidas e herdadas 1208
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(cf. especialmente Êx 21.20-21). De acordo com a sabedoria proverbial, um escravo era conside rado inadequado para posições de liderança (Pv 19.10; 30.22), indiferente à repreensão (29.19) e perigoso caso fosse mal-acostumado (29.21). Um insensato podia tomar-se escravo do sábio (Pv 11.29). No entanto, um escravo podia ser sábio ou insensato (14.35) e a sabedoria podia melhorar a condição dele (17.2). Ainda assim, o destino do escravo costumava ser o trabalho árduo, de modo que ansiava diariamente pela noite (cf. Jó 7.2) e até mesmo a morte era bemvinda, uma vez que finalmente o libertava de seu senhor (3.19). Essa idéia ressalta a relevância da alegação de Jó de ter tratado seus escravos e escravas com justiça e seu modo de raciocinar: “Aquele que me formou no ventre materno não os fez também a eles?” (31.13-15). 2. Vassalos, súditos e oficiais. Quase um quarto das ocorrências de ‘ebed descrevem relação de povos ou indivíduos com reis (especialmente israelitas) e outros governantes, uma forma de uso encontrada principalmente nos livros históricos. O termo pode ser empregado para designar vassalos e nações e povos subservientes e politicamente subordinados, os concidadãos do rei, ou seja, seus súditos e subordinados em geral e uma grande variedade de ocupações militares e civis em particular. Os escritores bíblicos não restringem o uso do termo a Israel, aplicando-o a vários povos e nações: p. ex., os servos (na maioria dos casos, os oficiais ou cortesãos) de Abimeleque (Gn 20.8), de Faraó (40.20; 41.37-38; 45.16; 50.7; Êx 5.21; mais de 20x em Êxodo 7— 15 — de acordo com 9.20, os escravos de Faraó também tinham escravos), Balaque (Nm 22.18), Hirão de Tiro (IRs 5.1, 6, 9 [15, 20, 23]; 9.27), o rei edomita (11.17), Ben-Hadade de Arã (IRs 20.6, 12, 23, 31; 2Rs 6.8, 11, 12), Nabucodonosor (2Rs 24.10, 11; 25.8), Senaqueribe (2Cr32.9, 16) e o rei Xerxes (Et 1.3; 2.18; 3.2, 3; 4.11; 5.11). a. Vassalo. Um povo ou nação subordinado a outra como resultado de uma derrota militar pode ser descrito como seu escravo, o que, por sua vez, pode implicar o pagamento de tributo ou em trabalho forçado. Em seu confronto com Davi, Gol ias propõe uma aposta: “Se ele puder pelejar comigo e me ferir, seremos (hãyâ le) vossos servos (escravos); porém, se eu o vencer e o ferir, então, sereis nossos servos (escravos) e nos servireis” (ISm 17.9 — os filisteus não cumpriram sua parte desse acordo). No tempo de Davi, Moabe, F.dom e a Síria tornaram-se escravos de Israel (2Sm 8.2, 6, 14 || ICr 18.2, 6, 13) e os reis vassalos de Hadadezer o arameu se entregaram e serv iram Israel (vb. 'bd, 2Sm 10.19 || 1Cr 19.19). À medida que a monarquia foi enfraquecendo, Israel tomou-se vassala de Arã (IRs 20.9) e Judá foi obrigada a tomar-se vassala do Egito (2Cr 12.8), da Assíria (2Rs 16.7; 17.3), da Babilônia (2Cr 36.20) e da Pérsia (Ed 9.9; Ne 9.36-37, “segundo a sua vontade, dominam sobre o nosso corpo e sobre o nosso gado”). Essa forma de uso também pode aplicar-se a indivíduos; na opinião do fllisteu Aquis, Davi havia se alienado de tal modo de seus compatriotas israelitas que seria obrigado a ser servo, ou seja, vassalo ou aliado de Aquis para sempre (ISm 27.12). b. Súditos. A nação como um todo também podia ser descrita como escravos do rei, atendendo voluntária ou involuntariamente à sua vontade. Ao procurar dissuadir Davi de rea lizar o censo, Joabe replicou: “Multiplique o Senhor, teu Deus, a este povo cem vezes mais; porventura, ó rei, meu senhor, não são todos servos do meu senhor?” (1 Cr 21.3). Os anciãos aconselharam Roboão: “Se, hoje, te tomares servo deste povo, e o servires, e, atendendo, falares boas palavras, eles se farão teus servos para sempre” ( I Rs 12.7 || 2Cr 10.7). A advertência de Samuel contra a instituição da monarquia, porém, reflete o aspecto negativo desse relacio namento: “Vós lhe sereis por servos” (1 Sm 8 .17). c. Oficiais e cortesãos. No entanto, 'ebedé empregado com mais freqüência nesse sen tido para designar vários indivíduos que serviam ao rei. É usado como uma categoria geral para distinguir os oficiais da corte do populacho (por exemplo, ao longo dos relatos do êxodo sobre as pragas). Os generais, oficiais e o exército como um todo eram servos do rei (2Sm 11.1, 17; 1209
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18.7, 9; 21.15, 22; I Rs 16.9; 20.12; 2Rs 5.6; 6.11-12; 24.10-12; 25.8), como também o eram seus cortesãos, oficiais, embaixadores, conselheiros e ministros (ISm 18.22-26; 2Sm 10.2-4; 15.34; lRs 1.2,9; 11.26; 15.18; 2Rs 3.11; 19.5; 22.12) e até mesmo os artífices e profissionais (1 Rs 5.6 [20]; 9.27; 1Rs 22.49 [50]; 2Cr 8.18 — nesses textos, lenhadores e marinheiros). Em vários casos, é difícil determinarem-se exatamente quais são as responsabilidades em questão (2Rs 7.12-13) ou mesmo se o termo refere-se aos cargos mais baixos ou a servos do palácio (2Sm 11.9, 13). Em muitos desses textos, o termo “servo” deve ser considerado um título honorífico, concedendo ao indivíduo privilégios na corte e influência. Tais indivíduos dependiam do favor e da provisão do rei para os cargos e sobrevivência deles e executavam as ordens reais ain da que, ocasionalmente, os servos desafetos se rebelasse e assassinassem seu monarca (1 Rs 16.9; 2Rs 12.20-21 [21 -22]; 21.23). Um exemplo interessante é Tobias, o amonita, descrito em Neemias 2.10, 19 como ‘ebed, sem nenhuma indicação de quem era seu senhor. E bem pro vável que se deva considerar o termo como um título honorífico e possivelmente hereditário que Neemias empregou de modo pejorativo em função das nuanças contrastantes da palavra 'ebed (cf. H. G. M. Williamson, 183-84). Outro uso singular de 'ebed, encontrado na relação daqueles que regressarem do exílio, é a oração “Os filhos dos servos de Salomão” (Ed 2.55, 58; Ne 7.57, 60; 11.3), que se refere mais provavelmente a um grupo de oficiais cultuais he reditários e não a escravos no sentido mais restrito do termo (como argumenta J. P. Weinberg; cf. Williamson. 35-36). 3. O termo servo como uma autodenominação. Aproximadamente um sexto das re rências a ‘ebed no AT ocorre no discurso direto, no qual aquele que fala chama a si mesmo ou ao outro de servo daquele com quem está falando, referindo-se muitas vezes a este como “meu senhor”. Uma vez que a maior parte dessas passagens diz respeito ao contexto da corte, na qual aquele que fala pode, logo de início, ser descrito como 'ebed do rei, é possível que essa forma de uso seja derivada da categoria anterior, refletindo as formalidades corteses (ou bajulado res?) do diálogo palaciano. No entanto, essa convenção é usada quase exclusivamente quando uma pessoa apresenta um pedido diante de outra que é política, militar ou espiritualmente mais poderosa, sendo que a autodenominação serve para iniciar ou trazer à memória uma relação já existente de dependência senhor/escravo. Indica um reconhecimento temporário ou a longo prazo da outra pessoa e submissão a ela a fim de beneficiar-se do favor ou provisão do senhor. Essa forma de uso implica uma expressão particular daquele que fala como sendo dependente daquele a quem se dirige e na disposição deste de fazer o que for necessário para facilitar que o pedido seja concedido, como é confirmado em 2 Reis 10.5, que registra a mensagem dos líderes de Samaria a Jeú: “Teus servos somos e tudo quanto nos ordenares faremos... faze o que bem te parecer”. Da mesma forma, em Gênesis 32— 33, Jacó refere-se a si mesmo repetidamente como servo de Esaú e a este como seu senhor, instruindo seus servos a fazerem o mesmo (32.4, 18, 20 [5,19,21 ]; 33.5,14). O propósito desse relacionamento temporário de senhor/servo é apazi guar Esaú (32.20) com palavras, gestos e presentes, evitando assim um ato temido de vingança da parte do irmão que Jacó havia repetidamente enganado e que se encontra acompanhado de 400 homens. Fica claro que Jacó depende da boa vontade de Esaú nessa situação e o patriarca indica esse fato por meio da terminologia relativa a um escravo. Os irmãos de José empregam repetidamente a linguagem de senhor/escravo ao dirigirem-se a José na corte egípcia, não simplesmente por uma questão de cortesia (43.28), mas também por causa das acusações de José — de que seriam espias e desonestos — e pelo fato de, a princípio, precisarem de cereais e, posteriormente, do perdão de José (Gn 42.10, 11, 13;44.7,9, 16, 18,etc.; 50.18). Ao longo 1210
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de suas negociações com José, os irmãos quase se tomam literalmente escravos dele (44.16, hinnennü 'abãdim cf. v. 33 e 50.18). Eles também se referem a si mesmos como servos de Faraó (conforme as instruções de José) ao pedirem permissão para assentarem-se em Gósen (46.34; 47.3-4). A terminologia de senhor/escravo é usada de maneira semelhante pelos israelitas quando apelam a Faraó a fim de não serem mais açoitados (Ex 5.15-16); pelas duas tribos e meia quan do pedem a Moisés permissão para assentarem-se a leste do Jordão, concordando em cumprir as condições impostas por Moisés (Nm 32.4-5, 25, 27, 31); pelos gibeonitas ao procurarem realizar uma aliança de proteção com Israel (Js 9.8,9, 11); por Davi ao pedir a ajuda de Jônatas com respeito a Saul (ISm 20.7-8) e ao pedira Saul que parasse de persegui-lo (26.18-19); por Simei e Mefibosete, ao suplicarem pela vida diante de Davi (2Sm 19.19-20,26-28 [20-21, 27-29], cf. lRs 2.38); por Bate-Seba ao pedir que Salomão fosse feito rei (lR s 1.26-27); por Adonias ao suplicar a Salomão que lhe poupasse a vida (1.51); por Obadias ao temer que Elias lhe causaria a morte (1 Rs 18.9, 12); pelos oficiais de Ben-Hadade ao procurarem salvar a vida dele diante de Acabe (20.32); pelo capitão do rei diante de Elias depois que 100 são consumi dos por fogo divino (2Rs 1.13); por Naamã ao fazer seu pedido a Eliseu (5.15, 17, 18); e por Daniel ao pedir uma mudança nas regras alimentares (Dn 1.12-13). 4. Uso teológico: o servo de Deus. John McKay chamou a imagem de servo de “símb lo mais importante da Bíblia e da religião cristã” (“The Form of a Servant”, Theology Today, 15, 1958-59, 304). Quase um terço das referências a ebedè de natureza religiosa (Riesener, 108), descrevendo o indivíduo ou nação como servo de Deus. Apesar de a expressão “servo(s) do Senhor” (25x) ou “servo de Deus” (4x) ser o exemplo mais conhecido dessa forma de uso, nâo pode ser separada de várias outras expressões desse relacionamento servo humano/senhor divino. Pode-se distinguir duas formas de uso principais porém claramente relacionadas entre si: passagens nas quais aquele que fala descreve a si mesmo ou a outro como servo de Deus, ao dirigir-se ao próprio Deus (autodenominação), e passagens nas quais Deus, um outro locutor ou o narrador descreve alguém como servo de Deus quando não está se dirigindo a Deus. a. Servo de Deus como autodenominação. Esse uso pode ser entendido como análo a (e possivelmente derivado da) categoria 3: ao dirigir-se a Deus em oração, o indivíduo ou representante do povo evoca a terminologia servo/senhor com o propósito de reconhecer sua dependência em relação a Deus para ter um desejo atendido, mesmo quando o faz tomando por base o relacionamento com Deus na esperança de que esse desejo seja atendido. No entanto, não se deve entender isso como uma reivindicação arrogante, pois muitas vezes se encontra arraigada no fato de que Deus anteriormente havia declarado a Israel ou ao indivíduo que este era seu servo (fomia de uso [b.] abaixo). i. O uso da terminologia servo/senhor ao dirigir-se a Deus pode ser encontrado ao lo de toda a literatura narrativa. Aquele que fala costuma chamar a si mesmo de servo de Deus (Jacó , Gn 32.10[ 11]; Moisés, Êx 4.1; Nm 11.11; Dt 3.24; Sansão, Jz 15.18; Samuel, 1Sm 3.9-10; Davi, 23.10-11; 2Sm 7 || lCr 17 [lOx cada]; 24.10; Salomão, 1Rs 3.7-9; Elias, 18.36; Neemias, Ne 1.6, 11), mas também pode pedir a Deus que aja em favor de outra pessoa que é serv a de Deus (o servo de Abraão com respeito a Isaque, Gn 24.14; Moisés com respeito a Abraão, Isaque e Jacó / Israel, Êx 32.13; Dt 9.27). A oração de Salomão na consagração do templo (1 Reis 8) é um exemplo notável. Ele usa a palavra 'ebed 12x: 5x como autodenominação, 3x para referirse a Davi, lx com respeito a Moisés e 3x para referir-se ao seu povo (1 lx no texto paralelo, 2 Crônicas 6). Essa terminologia também pode ser usada ao dirigir-se aos representantes de Deus (Ló aos anjos, Gn 19.2,19; cf. Abraão, 18.3,5; Josué ao príncipe do exército do Senhor, Js 5.14; cf. Daniel àquele que era “como semelhança dos filhos dos homens”, Dn 10.17). 1211
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Aqueles que empregam a autodenominação de servo podem fazê-lo em virtude de seu chamado particular ou papel como portador das promessas da aliança, como líder ou profeta; alguns são designados explicitamente no discurso divino como servos de Deus. De qualquer modo, é uma determinada circunstância que leva o indivíduo a evocar seu relacionamento de servo com Deus: para Jacó, o encontro iminente com Esaú; para Sansão, a sede extrema; para Elias, o confronto com os sacerdotes de Baal no alto do monte Carmelo. É equivocado com preender-se isso simplesmente como uma submissão humilde; antes, o indivíduo reconhece sua dependência em seu senhor divino e espera que seu pedido seja atendido. Na verdade, Elias pede a vindicaçâo divina de sua condição de servo (1 Rs 18.36-37) e Moisés sugere que, como servo de Deus, merece um tratamento melhor (Nm 11.10-15; Dt 3.23-25). Nos casos em de Samuel e Sansão, o fato de evocarem a linguagem de servo pode ser considerado o reconhecimento de que essa relação especial iniciou-se naquele momento (ISm 3.7, 9-10, 19; lRs 3.4-15). ii. Nos Salmos, a expressão “teu(s) servo(s) é usada 29x (26x no sing., 3x no pl.) com uma autodenominação em onze salmos diferentes (cf. também SI 35.27, que emprega “seu servo” de maneira semelhante). Trata-se de uma forma de uso considerada muitas vezes como sendo substancialmente distinta do modo como é usada nos contextos narrativos. No entanto, é importante observar-se que, de acordo com seus títulos, sete desses salmos são relacionados a Davi (ou seja, ledãwid). Assim, do ponto de vista canônico, pode-se entender isso como Davi ou o rei davídico invocando sua condição divinamente declarada de servo como representante de Israel ao dirigir-se a Deus e não como apenas um israelita piedoso falando, ainda que a de voção pessoal também possa ser expressada desse modo (p. ex., 86.2, “Preserva a minha alma, pois eu sou piedoso [hãsíd]', tu, ó Deus meu, salva o teu servo que em ti confia”). A condição de servo não é apenas uma convenção cortês, mas constitui a própria base do apelo (143.12). Também é importante observar que sete desses salmos são lamentos: a linguagem do servo é usada quase exclusivamente nas súplicas do indivíduo (27.9; 31.16[ 17]; 69.17[ 18; 86.2,4, 16; 109.28; 143.2) e da comunidade (90.13, 16). (-> Salmos: Teologia) O gênero do Salmo 89 pode ser controverso, mas a centralidade da aliança davídica é evidente (v. 3, 20 [4, 21]). Em 89.50 [51], em que uma interpretação no sing. é devidamente apoiada em termos de crítica ao texto (24 MSs heb. e Ecli) e preferível em relação ao contexto do que a forma pl. (cf. 89.38-39 [39-40] com 50-51 [51-52]), o indivíduo que fala provavelmen te não está se referindo a si mesmo como “teu servo”, mas ao rei davídico (cf. v. 39 [40]). No Salmo 116, um salmo dc louvor individual, a linguagem do servo é especialmente apropriada: “Senhor, deveras sou teu servo, teu servo, filho da tua serva; quebrastes as minhas cadeias” (v. 16). Ele foi libertado para servira Deus. Os Salmos 19 e 119 (que usam o sing. “teu servo” 13x, além do pl. no v. 91, que provavelmente se refere a todo o universo criado como servos de Deus) costumam ser categorizados como salmos de sabedoria, mas também contêm súpli cas (19.13 [14]; 119.17,38,49, 65,76, 84, 122, 124, 125, 135, 176). Apesar de o termo 'ebed normalmente deixar implícita a obediência à vontade do senhor, o Salmo 119 apresenta uma definição singular de um servo de Deus como alguém que se dedica inteiramente à compreen são e obediência da lei de Deus, chegando a fazer disso o objeto de suas súplicas (vv. 124-25, 135). O último versículo ( 176) combina duas imagens de dependência em Deus — uma vez que o salmista é um servo que não se esqueceu dos mandamentos de Deus, o Senhor irá procurá-lo como uma ovelha em perigo (ou seja, desgarrada). Além do uso de “teu(s) servo(s)” como autodenominação, em três salmos o salmista pede aos “servos do Senhor" que louvem ao seu Deus” (1 13.1; 134.1-2; 135.1-2). Os dois últi mos salmos descrevem o público, a quem se dirigem, como pessoas em cargos religiosos, que servem a Deus permanentemente no recinto do templo. 1212
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b. O servo de Deus como designação divina ou descritiva. Uma ampla variedade d indivíduos ou entidades coletivas é chamada ou descrita no AT como servos de Deus. Em ter mos sintáticos, o relacionamento com Deus como senhor divino é sempre indicado pelo uso de terminações sufixas pronominais, “meu”, “seu” ou “teu” servo pela formulação “servo(s) de Javé/Deus” (em termos gramaticais, uma relação de combinação) ou pelo uso possessivo da preposição le. i. Servos individuais de Deus. O termo 'ebedé aplicado com mais freqüência a duas guras predominantes da história de Israel: Moisés (37x) e Davi (38x). Eles são servos de Deus em dois sentidos: 1. de modo análogo ao uso de 'ebed no contexto da corte, lhes é conferido o grande privilégio de servir ao senhor divino, relacionando-se intimamente com ele e sendo envia dos para realizar tarefas cruciais para ele (cf. SI 105.26) e 2. são exemplares em sua obediência a ele e na consciência de que dependem dele. Além disso, há mais de vinte passagens nas quais vários indivíduos ou os profetas como um só conjunto são chamados de servos de Deus. 1. Moisés. As quatro referências a Moisés (->) como servo no Pent. ressaltam o re cionamento íntimo dele com Deus: como resultado da demonstração do poder de Deus, os is raelitas confiavam tanto em Deus quanto no servo dele, Moisés (Êx 14.31). Moisés é descrito como um servo fiel sobre toda a casa do Senhor; Deus fala com ele diretamente, face a face; assim, ninguém deve ousar falar contra o servo de Deus (Nm 12.6-8). O relato da morte de Moisés em Deuteronômio 34.5, apresenta a expressão que é usa da quase exclusivamente para descrever Moisés: “servo do Senhor”. Dezoito de suas vinte e três ocorrências referem-se a Moisés, bem como todas as quatro ocasiões em que é empregada a expressão alternativa, “servo de Deus” (IC r 6.49 [34]; 2Cr 24.9; Ne 10.29 [30]; Dn 9.11). Essas passagens constituem dois terços das referências a Moisés como servo nos livros his tóricos. Elas ressaltam a autoridade contínua de Moisés no papel de primeiro líder de Israel, especialmente com respeito às instruções específicas dadas por ele e, com mais freqüência, como promulgador da lei. Por meio do uso dessa expressão 14x em Josué, a imagem de Moisés ainda é marcante ao longo de toda a conquista. Em Josué 1.1 -2, a oração é usada para ressaltar o vazio na lideran ça que é preenchido, então, por Josué. Na maioria das passagens, porém, “o servo do Senhor” é um epíteto para Moisés acentuando o privilégio e autoridade dele como promulgador da lei e emissor de preceitos específicos a serem seguidos quando Israel entrar na terra prometida como, por exemplo, com referência à conquista e distribuição da terra (1.7, 13, 15; 8.31, 33; 11.12; 12.6; 13.8; 18.7; 22.2, 4, 5; cf. também 9.24 e 11.15). Assim como Moisés é chamado de “servo do Senhor” no final da vida, Josué, por sua vez, recebe essa designação pela primei ra vez no relato de sua morte em Josué 24.17 (também usado em Jz 2.8). Desse modo, o livro de Josué é emoldurado pelas referências à morte de dois servos supremos de Javé cujas vidas são marcadas pelo serviço humilde e obediente a ele. Com respeito às referências restantes a Moisés como servo de Deus, as passagens em 1 —2 Reis ressaltam o papel de Moisés no processo de tirar os israelitas do Egito e proclamar as grandes promessas de Deus (1 Rs 8.53, 56) e também na mediação das estipulações da aliança no Sinai, sendo que a transgressão dessa aliança causou a queda de Israel e Judá (2Rs 18.12; 21.8; da mesma forma, as orações de confissão em Ne 1.7-8; 9.14; 10.29[30]; Dn 9.11). As re ferências em 1 Crônicas concentram-se nas ordens específicas de Moisés e em suas realizações cultuais (ICr 6.49 [34]; 2Cr 1.3; 24.6, 9). O conjunto de textos proféticos termina de maneira bastante apropriada com uma referência ao “meu servo Moisés” (Ml 4.4 [3.22]). O profeta ad verte solenemente aqueles que esperam com ansiedade o dia do Senhor que, a menos que dêem ouvidos à lei de Moisés, esse dia trará maldição em vez de cura para a terra (4.1-6[3.19-24]). 1213
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2. Davi. Apesar de Davi (->) ser designado servo de Deus com tanta freqüência quanto Moisés, a ênfase e o uso são nitidamente distintos. A oração “servo do Senhor” se aplica a Davi somente nos cabeçalhos dos Salmos 18 e 36. Na maioria das passagens (23x), é o próprio Deus quem chama Davi de “meu servo” em função da aliança davídica: “Também escolheu a Davi, seu servo” (SI 78.70; cf. 2Sm 7.5, 8 || lCr 17.4, 7; SI 89.3, 20[4, 21]). Davi e seus descenden tes reais são recipientes de uma aliança etema (2Sm 7.16; lCr 17.12, 14; SI 89.4 [5]). Sem dúvida, o rei davídico foi colocado sobre a casa e o reino de Deus ( lCr 7.14), desfrutando, as sim, ao que tudo indica, de uma posição e privilégio semelhante àqueles de Moisés no passado (Nm 12.7). De acordo com 2 Samuel 3.18, a eleição de Davi como servo também implica sua incumbência de agente de livramento dos israelitas de todos os seus inimigos, estabelecendo desse modo firmemente o reino sobre o qual ele deve reinar. Em função da promessa divina de manter a linhagem de Davi, Deus anuncia repetidamente a intenção de intervir no livramento ou suportar pacientemente o seu povo em vez de destruir Judá, e o faz “por amor de Davi, meu servo” (1 Rs 11.13,32,34,36;2Rs 19.34; 20 .61| Is 37.35; cf. 2Rs 8.19: “por amor de Davi, seu servo”), um livramento que o próprio Davi experimentou (SI 144.10). 1 Reis 14.8 indica mais um aspecto por meio do qual o serviço de Davi é expressado: “Davi, meu servo, que guardou os meus mandamentos e andou após mim de todo o coração, para fazer somente o que parecia reto aos meus olhos”. As promessas divinas a Davi associadas à sua condição de servo são reconhecidas como promessas que estavam se cumprindo (1 Rs 3.6; 8.24,66 || 2Cr 6.15) e que também são invocadas na ascensão de Salomão ao trono (1 Rs 8.25-26 || 2Cr 6.16-17,42; cf. SI 132.10). Jeremias afirma que as promessas de Deus a seu servo Davi sobreviverão à destrui ção de Jerusalém e ao exílio (Jr 33.21, 22, 26). E dessas promessas que surge a esperança de um novo governante davídico, um pastor, um príncipe (n õ íí’) e rei que dominará na terra para sempre sobre um povo obediente e pacífico (Ez 34.23-24; 37.24-26). 3. Os profetas. Profetas individuais (Aías, IRs 14.18; Elias, 2Rs 9.36; 10.10; Jonas, 2Rs 14.25; Isaías, Is 20.3) e os profetas de modo geral (17x) também são descritos muitas vezes como servos de Deus. A primeira referência encontra-se em Amós 3.7, um versículo que fala do privilégio especial do profeta de ter conhecimento do plano divino (sôd). Textos posterio res apresentam os profetas como uma linha contínua de mensageiros enviados por Deus, que transmitem a “palavra do Senhor” a Israel, chamando o povo repetidamente a obedecer a lei de Deus, advertindo-o sobre o julgamento iminente. Como servos de Deus, são imbuídos de autoridade divina; rejeitar “meus servos, os profetas” ou ignorar sua proclamação é o mesmo que despertar a ira divina, causando, por fim, a extinção da monarquia (2Rs 9.7; 17.23; 21.10; 24.2). O livro de Jeremias, que é considerado portador da mesma tradição ou acento “deuteronomística” que o escritor de 1—2 Reis, emprega essa designação mais vezes do que os outros profetas (Jr 7.25; 25.4; 26.5; 29.19; 35.15; 44.4;... Ez 38.17; Dn 9.6; cf. Ed 9.10-11). Vários desses textos descrevem especificamente os profetas como transmissores dos mandamentos de Deus (2Rs 17.13; Ed 9.10-11; Dn 9.10; Zc 1.6), sendo provável, desse modo, entender Moisés como um profeta, ocasionando assim, “a indeterminação de uma distinção excessivamente rí gida entre a lei e a profecia ao colocarem-se ambas na categoria de palavra profética falada de Deus” (Williamson, 137). (-> Profecia: Teologia) 4. Outros servos individuais de Deus. Há inúmeras referências espalhadas por todo o AT de outros servos de Deus. Em alguns casos, é difícil determinar exatamente o que os toma dignos dessa designação específica ou o que está sendo acentuado com ela. a. A condição de servo como resultado de uma obediência exemplar. Deus chama Cale de “meu servo... visto que nele houve outro espírito, e perseverou em seguir-me” (Nm 14.24). O rei babilônio Nabucodonosor reconhece Sadraque, Mesaque e Abede-Nego como servos de 1214
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Deus que foram salvos pois “confiaram nele, pois não quiseram cumprir a palavra do rei, pre ferindo entregar o seu corpo, a servirem e adorarem a qualquer outro deus, senão ao seu Deus” (Dn 3.26,28); e o rei persa Dario dirige-se a Daniel depois que este passa a noite na cova dos leões como “Daniel, servo do Deus vivo... a quem tu continuamente serves” (Dn 6.20 [21]). 0 indivíduo mais conhecido nessa categoria é Jó, cuja designação como servo é defendida por Deus diante de Satanás em duas ocasiões, uma vez que Jó é “homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desvia do mal” (Jó 1.8; 2.3), e reafirmada na conclusão do livro, apesar de todas as palavras duras e questionadoras ditas por Jó (42.7-8). Nessa acepção, o termo servo pode ser generalizado (de forma análoga ao uso dela como autodenominação nos Salmos) para descrever todos os que servem a Deus por meio da adoração e da obediência — como em 2 Reis 10.23, em que Jeú contrasta os servos (subs.) do Senhor com os servos (part.) de Baal; e em 9.7, em que aqueles que são martirizados por Jezabel. além dos profetas, são descritos como “servos do Senhor” (da mesma forma, no SI 79.2, 10). O salmista suplica a Deus muitas vezes para intervir em favor de seus servos, que depen dem do seu livramento ou vindicação (SI 34.22 [23]; 69.36 [37]; 79.2, 10; 90.13, 16; 102.14, 28 [15, 29]; 135; 14). Orações paralelas nessas passagens ajudam a esclarecer quem pode ser qualificado como servo de Deus: aqueles que se refugiam nele (34.22 [23]), que amam o nome dele (69.36 [37]) e até mesmo o pó de Sião (102.14 [15]) e aqueles que são santos (hasidim 79.2). Chamar tais indivíduos de servos é declarar ou asseverar a retidão do comportamento deles como base para a atenção recebida de Deus. b. A condição de servo em função de um papel singular no desdobramento do plano de Deus. Dentre aqueles que são chamados de servos devido à incumbência especial delegada a eles pelo rei divino encontram-se os herdeiros da aliança davídica. De acordo com 2 Crônicas 32.16, “Os servos [de Senaqueribe] falaram ainda mais contra o Senhor Deus e contar Ezequias, seu servo”; essa formulação acentua a relação próxima entre servo e mestre. Como governador de Judá depois do exílio, Zorobabel é escolhido, tomado e feito (Ag 2.23) bhr (# 1047), Iqh (# 4374), sym (# 8492), um anel selar de Deus, a ilustração vivida que atesta “a eleição renovada da linhagem de Davi” (P. A. Verhoef, The Books o f Hagai and Malachi, N1COT, 1987, 147). Diante dessa passagem, é bem provável que a referência imediata em Zacarias 3.8, quando ele fala do “meu serv o, o Renovo” seja ao papel político de Zorobabel em seu tempo (cf. Zc 6.12, em que o “Renovo” é descrito como aquele que construirá o templo, D. L. Petersen, Haggai and Zecharia 1-8, OTL, 1984, 210-11, 276-77). No entanto, diante do uso da palavra renovo (çemah # 7542) em outras passagens para se referir ao futuro rei davídico (cf. especialmente Jr 23.5; 33.15, e, num caso menos provável, Is 4.2), é bem possível que a passagem também vá além dos tempos do profeta, vislumbrando a vinda de um rei ainda maior (cf. G. Van Groningen, Messianic Revelation in the Old Testament, 1990, 880). Os recipientes da aliança patriarcal também são servos de Deus: Abraão (Gn 26.24; SI 105.6,42), Jacó/Israel (ICr 16.13; Ez 28.25; 37.25) e os filhos de Jacó (Gn 50.17). É possível que 1 Crônicas 16.13 coloque “Israel” no lugar de Abraão, conforme o paralelo no Salmo 105.6, de acordo com a ênfase “toda Israel” que aparece nos livros de Crônicas (H. G. M. Williamson, 1 and 2 Chronicles, NCB, 1982, 129). Fica claro nesse contexto que a referência a Jacó / Israel em Crônicas e Ezequiel é ao indivíduo e não à nação (IC r 16.13 refere-se aos “descendentes de Israel”; Ez 28.25 fala da promessa de terra a Jacó, mas se refere à nação como “casa de Is rael”; quanto à formulação, Ez 37.25 é paralelo a 28.25). c. Formas de uso teológicas singulares. Em Jó 4.18, os mensageiros angelicais são cha mados de servos de Deus (cf. 15.15). Em Isaías 20.20, Eliaquim é chamado de “meu servo” quando é anunciada a sua promoção a administrador do palácio no lugar de Sebna (cf. 36.3). À 1215
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luz do significado da palavra “servo” no livro de Isaías, é pouco provável que essas passagens a apliquem de modo sarcástico àquele que tem “sobre o seu ombro a chave da casa de Davi” (22.22, em oposição a J. H. Hayes c S. A. Irvine, Isaiah lhe Eighth Century Prophet, 1987, 286-87). Em vez disso, em associação com o rei davídico, nesses casos o termo “servo” pode ressaltar o enorme privilégio e responsabilidade de um futuro cargo. Até mesmo o rei babilônio Nabucodonosor é descrito como servo de Deus em Jere mias 25.9; 27.6; 43.10, a única forma de uso teológica do termo na qual não fica implícito um relacionamento íntimo com a divindade ou um compromisso de fé com ela. Apesar de essa designação não ter o apoio da LXX nos três texto, é provável que tenha sido considerada ofen siva e, assim, eliminada, não sendo o caso, portanto, de estar ausente no original (ver, porém, W. McKane e W. E. Lemke). Aqui, Nabucodonosor é chamado de servo de Deus no sentido técnico de que é seu vassalo (cf. Z. Zevit, que cita o uso contemporâneo do termo no OMA), aquele que executa o julgamento divino sobre Judá e as nações e, em certo sentido, análogo às designações de Ciro como “meu pastor” e “[meu] ungido” em Isaías 44.28; 45.1. ii. Toda Israel como servo de Deus. A nação toda — e não só seus indivíduos fiéis — é serva de Deus e deve servi-lo apropriadamente. Esse uso poderia ser considerado uma exten são lógica da condição de servo dos patriarcas (ver acima). No entanto, a lei dos Jubileus de senvolve o conceito de outra maneira: os israelitas são servos de Deus em virtude do êxodo do Egito (Lv 25.42, 55). Uma vez que foram libertados da escravidão imposta por Faraó, devem agora servir a Javé. E surpreendente como há um número pequeno de outras referências a Israel como serva de Deus: o Cântico de Moisés (Dt 32.36), a oração de Salomão na consagração do templo (1 Rs 8.23, 32, 36 || 2 C r6 .14, 23, 27), a oração de Neemias (Ne 1.6, 10, 11), um salmo (SI 136.22) e dois oráculos de salvação em Jeremias anunciando a libertação de Israel do exílio (Jr 30.10; 46.27-28). Essas passagens ressaltam a obediência esperada de Israel e a compaixão e bondade divinas esperadas por Israel em sua condição de serva. iii. O servo do Senhor no livro de Isaías. No livro de Isaías, a condição de Israel como serva de Deus é um tema importante (e extremamente controverso) que apresenta tanto ca racterísticas corporativas quanto individuais que devem, portanto, ser tratadas separadamente. Já se escreveu muito sobre a identificação do “servo do Senhor” em Isaías 40— 55, apesar de essa expressão aparecer somente em 42.19. Nossa discussão concentra-se nos textos que são conhecidos geralmente como “Cânticos do Servo”. O problema pode ser resumido da seguinte maneira: apesar de o fato de algumas ocorrências de ‘ebed nessa seção de Isaías referirem-se claramente a Israel (41.8: “Mas tu, ó Israel, servo meu, tu, Jacó, a quem elegi, descendente de Abraão, meu amigo”), outras parecem referir-se a um indivíduo e ter um conteúdo divergente (53.11: “Ele verá o fruto do penoso trabalho de sua alma e ficará satisfeito; o meu Servo, o Justo, com o seu conhecimento, justificará a muitos, porque as iniqüidades deles levará sobre si”). (-> Isaías: Teologia) Há uma grande variedade de sugestões que foram apresentadas com referência à identi dade desse último servo, principalmente como a Israel corporativa (quer a nação inteira, a Israel ideal ou um remanescente fiel) ou como um indivíduo histórico, futuro ou ideal (quer profé tico, como um segundo Moisés ou um segundo Isaías; real, como o Messias; ou sacerdotal), sendo que os proponentes de cada concepção buscam apoio para ela em diversos aspectos da descrição do servo. (Para os estudos mais recentes sobre esse assunto, ver G. P. Hugenberger; cf. também as pesquisas de H. Haag e C. R. North). Vários problemas estão associados à interpretação dos “Cânticos do Servo”. Em primeiro lugar, a designação “Cânticos do Servo” deriva de uma análise histórico-crítica que atribui essas passagens a um poeta desconhecido do pós-exílio (cf. B. Duhm, Das Buch Jesaia, 1922, 14), 1216
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constituindo, possivelmente, parte de uma coleção maior e nâo mais existente, apesar de haver poucos fundamentos textuais para essa teoria. Em segundo lugar, o número e extensão desses poemas continua sendo discutido. Duhm identificou como “Cânticos do Servo” as passagens de 42.1-4; 49.1-6; 50.4-9 e 52.13— 53.12. Em terceiro lugar, e de maior seriedade, essa consi deração isola tais passagens de seu contexto mais amplo dentro de Isaías 40— 50 (cf. a crítica de T. Mettinger) e ignora o uso temático de 'ebed no livro de Isaías como um todo. Uma abordagem holística da questão da identidade do “servo do Senhor” em Isaías 40— 53 deve começar com a observação de que a palavra ‘eb ed o co m 39x no livro todo, sendo que somente seis delas podem ser categorizadas como não-teológicas. Como foi observado acima, em passagens anteriores do livro, o profeta Isaías (20.3; cf. 44.26) e Eliaquim, o admi nistrador do palácio (22.20), bem como Davi (37.35), são chamados de servos de Deus. Em Isaías 40— 53, ‘ebed é usado 19x no singular (no original, 14x com “meu”, 3x com “teu”, lx em “servo do Senhor” e 1x “servo dos tiranos”), descrevendo, por um lado, a nação escolhida de Deus, Israel, de modo coletivo como um servo cego e indiferente no cumprimento de seus deveres e, por outro lado, como um indivíduo que serve a Deus correta e fielmente, levando sobre si a culpa de Israel e restaurando a nação. Logo depois do clímax constituído de uma descrição da morte substituinte do servo justo, que justificará muitos (53.11), o tema sofre uma mudança extraordinária: em Isaías 54— 66, ‘ebed é usado exclusivamente no pl. (no original, 1 lx: 6x “meu”, 3x “teu”, lx “seu” e lx “servos do Senhor”) designando um grupo obediente dentro de Israel em contraste com os rebeldes dessa nação (cf. especialmente 65.13-15). Quanto ao desenvolvimento temático dentro do livro de Isaías, a obra do servo individual restaura o servo nacional de modo que os indivíduos em Israel podem voltar a servir a Deus. Quando o tema é introduzido em 41.8-10, o acento recai sobre a eleição divina (bhr) e o apoio (fortalecimento, auxílio, sustento [tmk; #9461]) da serva Israel, remetendo a Abraão. Depois da descrição de 41.25 daquele que Deus “suscitou” do Norte e que “pisará magistrados como lodo e como o oleiro pisa o barro”, com referência a Ciro, o libertador político de Israel (cf. 44.25— 46.7), é apresentado um outro servo que, como a nação, também é escolhido e sustentado por Deus (bhr, tmk), mas, ao contrário daquele que vem do Norte, este estabelecerá justiça na terra sem sequer “[esmagar] a cana quebrada” (42.1-4). Esse servo terá duas tare fas: Deus fará dele “mediador da aliança com o povo” (ou seja, uma forma de [rejestabelecer o relacionamento de Israel com Deus) e “luz para os gentios” (42.6), aquele que faz os cegos enxergarem e liberta os cativos (42.7). No entanto, a serva de Deus, Israel, é surda, cega e in diferente (42.18-20) e consiste de testemunhas que ainda não reconhecem, crêem nem compre endem o poder singular de Deus (43.10, cf. v. 8). Ainda assim, justamente por sua condição de serva, Israel não foi abandonada por Deus (44.1-5,21) (cf. P. Stem). Por amor à sua serva Israel, Deus levantará um libertador que nem sequer reconhece aquele que o chama a servir (45.4), um aliado (lit., amigo, ’ahêbô) que cumprirá os seus propósitos contra a Babilônia e libertará Israel, a serva exilada (48.14, 20). K. Baltzer observou que o uso repetido da terminologia da redenção nessa seção de Isaías contribui para o desenvolvimento do tema do servo: Israel foi vendida pois não serviu; Deus vai além de sua obrigação para com sua serva ao redimir Israel da escravidão estrangeira (pdh [#7009], 51.11, cf. 50.2) e restaurar a ela a condição anterior de serva de Deus (g 7 [# 1457], 43.1; 44.22, 23; 48.20; 52.9; 63.9). Em Isaías 49.1 -7, considera-se problemático o fato de que o servo que fala é identificado tanto como Israel (v. 3, apesar de “Israel” não aparecer no ms. heb.; Kennicott 96) quanto como o responsável por levar Israel de volta a Deus (swb [#8740], polel no v. 5, hi. no v.6) e ser uma luz para os gentios (cf. 42.6-7 com 49.6, 8-9). A fim de se manter a palavra Israel nesse texto, é preciso considerá-la uma indicação de que a Israel exilada é incapaz de cumprir a tarefa de 1217
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serva sem que haja um recomeço por meio de outro indivíduo escolhido por Deus como um patriarca, uma segunda Israel ou uma Israel ideal (para uma discussão sobre os argumentos em favor de se eliminar o termo como uma glosa, ver R. N. Whybray, Isaiah 40-66, NBC, 1987, 137-38). Como agente escolhido de Deus, ele será tanto desprezado quanto odiado, um “servo de tiranos” abjeto que, ao mesmo tempo, receberá a deferência de reis (49.7), sendo que essa passagem prenuncia a descrição mais completa do sofrimento e exaltação do servo em 50.4-9 e 52.13—53.12. A descrição que constituiu o auge da obra do servo é precedida e sucedida pelas referências ao “meu Servo” (52.13; 53.11) que é ferido pela transgressão do “meu povo” e leva sobre si a iniqüidade de muitos. Apesar de esse servo individual exercer as funções de profeta (sua palavra é obedecida. 50.10) e sacerdote (ele asperge [nzh\ # 5684] muitas nações [em algumas versões, “causará admiração às nações”] e apresenta sua vida como uma oferta pela culpa, asãm [# 871], 52.15; 53.10), ele mostra tantas características e deveres relativos à realeza que sua identificação com o futuro rei davídico de Isaías 1— 30 é justificável (cf. R. Schultz, 154-59). Como resultado do recomeço, tem-se a “democratização” do tema do servo, de modo que, a partir de Isaías 54, são mencionados somente os servos (pl.). Na verdade, como obser vou W. A. W. Beuken, as bênçãos experimentadas pelos “servos do Senhor” surgem como um dos principais temas do restante do livro; a ira divina momentânea é substituída pela bondade e compaixão eternas (54.8). A instrução divina (54.13), sua justiça e segurança (54.14) serão a “herança” dos servos do Senhor (54.17). O mais impressionante é que até mesmo estrangeiros podem agora tomar-se servos de Deus (56.6). Em resposta ao lamento de seus servos (63.7— 64.12, esp. 63.17), Deus anuncia sua vinda com grandes atos de salvação e julgamento (caps. 65—66), que por fim, farão a distinção entre seus servos — as boas uvas (65.8, também 65.9, 13, 14, 15) — e seus inimigos (66.14) — a nação obstinada e idólatra como um todo (65.1 -7). A identidade e a obra do “servo do Senhor” em Isaías 40— 55 só podem ser compreendidas corretamente no contexto do desenvolvimento temático do livro de Isaías em sua totalidade. 5. Campo semântico, 'ebed possui poucos sinônimos além de seus correlativos fe ’ãmâ, siphâ e, mais raramente, na ‘arâ (# 5855). O termo na 'ar (# 5853) é usado por vezes para designar servos jovens, apesar de a palavra não significar obrigatoriamente uma condição de escravo, mas sim o vigor da juventude necessário para realizar tarefas pesadas (p. ex., 2Sm 9.9; 16.1; 19.17 [ 18]). O escravo/servo é contrastado principalmente com o dono/senhor ( ’ãdôn), mas também pode ser contrastado com outras condições ou posições sociais superiores (p. ex., o jomaleiro, sãkír Lv 25.39-40). D. O termo ebed na literatura posterior 1. Na LXX 'ebed é traduzido com mais freqüência como pais (340x), doulos (31 Ox) e therapõn (42x). O Hodayoth de Qumran emprega 'ebed em várias ocasiões como uma autodenominação. A comunidade de Qumran usava a linguagem das passagens de Isaías sobre o servo para descrever a missão e expectativas de seus líderes, inclusive o sofrimento, apesar de essas expressões não implicarem necessariamente o uso de terminologia associada a 'ebed (cf. S. H. T. Page). 2. O uso teológico do termo servo no AT tem continuidade no NT, especialmente em citações do AT (p. ex., Mt 12.18; At 2.18), discursos (Lucas 1; Atos 3) e no livro de Apocalip se. Servos do AT, como Moisés (Ap 15.3, doulos), Davi (Lc 1.69; At 4.25, pais em ambos os casos), Israel (Lc 1.54, pais) e os profetas (Ap 10.7; 11.18, douloi em ambos os casos), tam bém são chamados de servos no NT e o termo é usado ainda como uma autodenominação ao dirigir-se a Deus (Lc 1.38; 2.29). 1218
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É mais importante ainda observar que Jesus é chamado servo de Deus (At 3.13, 26; 4.27, 30, pais), o que provavelmente o identifica com a figura do servo em Isaías; além disso, os Evangelhos aplicam repetidamente os textos de Isaías sobre o servo ao ministério de Jesus (cf. R. T. France; D. Guthrie, New Testament Thology, 1981, 258-68; O. Cullmann, The Christology o fthe New Testament, [em ing.] 1963, cap. 3). Apesar de a instituição greco-romana da escravidão certamente ser uma imagem subjacente em várias das referências feitas a servos no NT (especialmente douloí), é provável que o contexto hebraico seja mais importante quando o termo G [syw-] doulos é usado para designar os escritores das epístolas (Rom 1.1; Fp 1.1; Tt 1.1; Tg 1.1; 2Pe 1.1; Judas l;A p 1.1), os obreiros cristãos (1 Co 3.5; G1 1.10; Cl 1.7;4.12;2Tm2.24) e os cristãos em geral (1 Pe 2.16; Ap 2.20; 6.17; 7.3; 19.2,5, 10; 22.3,9), uma vez que a idéia de eleição, vocação e privilégio é mais importante do que o conceito de dever e submissão. Servo, escravo: (servo, # 6269);
amâ (escrava, # 563); rfitiním (escravos do templo, # 5987); -> 'ebed siphâ (escrava, serva, # 9148)
B ib l io g r a f ia
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Sião: Teologia de
Sete
Caim
Siâo: Teologia de
Sião (IVX [siyyôn], Sião, # 7482).
AT O nome da teologia de Sião é originário do NG do monte do templo na antigüidade. Esse monte histórico era um pequeno outeiro na cadeia de montanhas entre Cedrom e os valestiropeanos, onde ficava a cidade de Davi (“a fortaleza de Sião”, 2Sm 5.7). Em relação ao local, o nome referia-se também ao cume desse monte, onde foi construído o templo de Salomão e que, hoje em dia, é ocupado pela mesquita de Al-Aqsa e seu santuário, o Domo da Rocha. A atual identificação do monte Sião como o monte a oeste da cidade antiga de Davi é uma tradição recente datada do século IV. Esse monte, cuja elevação é de apenas 800 metros (o monte das Oliveiras eleva-se a 900 metros e o atual monte Sião, c. de 850 metros) era reverenciado pelo sacerdócio real de Jerusalém como o alto monte na interseção do céu, da terra e do mundo dos mortos, a partir do qual Deus controlava o cosmo. Apesar de não ter sido determinada uma etimologia inequívoca para o termo Sião (çiyyôn) como nome próprio, Sião adquiriu um significado relevante e peculiar durante a monarquia de Judá. A teologia de Sião abrangia um conjunto importante de idéias que giravam em tomo da concepção do Deus de Israel como o Grande Rei da assembléia divina e não deve ser confun dida com o movimento sionista do século XX. Servindo de teologia real na dinastia de Davi, a teologia de Sião afirmava que o Senhor é o Grande Rei divino que controla todas as forças do caos, provendo desse modo a segurança e fertilidade de sua nação. 1. Conceitos centrais. Os estudiosos identificaram cinco temas retóricos importantes, p meio dos quais a teologia de Sião é expressada. Os quatro primeiros desses temas foram identi ficados por Edzard Roland. Em primeiro lugar, o monte Sião é considerado um monte elevado ou está associado ao monte Zafom. Em segundo lugar, um rio corre de Siâo e fertiliza a terra. Em terceiro lugar, o caos é conquistado por Javé. Em quarto lugar, Javé protege a cidade de Jerusalém. Essa lista foi completada posteriormente por Hans Wildberger, que acrescentou um quinto elemento, a peregrinação das nações ao monte Sião a fim de reconhecerem a soberania de Javé. Esses temas dão expressão a um manancial teológico que constitui a perspectiva teo lógica de grande parte da BH, especialmente os Salmos e Isaías. Esse manancial das tradições de Sião pode ser discutido de modo mais conveniente em três categorias amplas. a. O Senhor é o Grande Rei. Fundamentalmente, a teologia de Sião declara que Javé Deus de Israel (chamado daqui em diante de Senhor), é o rei divino que governa sobre o céu e a terra. Sua presença invisível habita no trono dentro do templo que se encontra sobre o monte Sião. Assim, o Salmo 47.7-9 [8-10], datado do tempo da monarquia diz: Deus é o Rei de toda a terra; salmodiai com harmonioso cântico. Deus reina sobre as nações; Deus se assenta no seu santo trono. Os príncipes dos povos se reúnem, o povo do Deus de Abraão, porque a Deus pertencem os escudos da terra; ele se exaltou gloriosamente. O Salmo 146.10 associa especificamente o monte Sião com a soberania do Senhor: “O Senhor reina para sempre; o teu Deus, ó Sião, reina de geração em geração”. Esses salmos apre 1220
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sentam um retrato claro do Senhor habitando no trono, reinando sobre o mundo todo. Mesmo durante o exílio, depois que o templo de Jerusalém havia sido destruído, ainda persistia a cren ça de que o Senhor era o Grande Rei que voltaria a ser entronizado no monte Siâo. Assim, no 259 ano do exílio na Babilônia, o profeta Ezequiel anteviu o trono futuro do Senhor na Israel restaurada (Ez 43.7). “Filho do homem, este é o lugar do meu trono, e o lugar das plantas dos meus pés, onde habitarei no meio dos filhos de Israel para sempre”. A referência a um lugar para a planta dos pés do Senhor diz respeito a um estrado para os pés [escabelo], um acessório comum dos tronos no OMA. Mesmo diante da tragédia de 586 a. C., Ezequiel e seus colegas de sacerdócio consideravam que o Senhor era o Grande Rei, que governava sobre o mundo e que um dia voltaria e colocaria sua sala do trono no monte Sião. O reinado do Senhor como Grande Rei baseia-se na metáfora poética de que ele lutou contra o caos e o derrotou (Halpem, 1981,61-95; Day, 18-38). Essa vitória marcial estabelece a soberania de Deus que, por sua vez, requer a construção de um templo. O conflito entre o Grande Rei e o caos constituía a formulação teológica comum do povo do OMA, como pode ser visto na literatura cananéia e mesopotâmia. (Longman, 270, n. 19). Não deve ser motivo de surpresa, portanto, o fato de que Israel também expressou suas crenças sobre o Senhor em termos semelhantes, ao mesmo tempo em que afirmou a superioridade e singularidade de Javé (VanGemeren, 630). O tema da vitória do Senhor é visto em maior ou menor grau ao longo de todo o livro de Salmos (p. ex., SI 65.6-7 [7-8]; 89.9-13 [10-14]; 93; 104.1-9). Observe-se o exemplo do Salmo 74.12-14: Ora, Deus, meu Rei, é desde a antigüidade; ele é quem opera feitos salvadores no meio da terra. Tu, com o teu poder, dividiste o mar; esmagaste sobre as águas a cabeça dos monstros marinhos. Tu espedaçaste as cabeças do crocodilo e o deste por alimento às alimárias do deserto. As águas, que são retratadas como um monstro marinho, representam as forças do caos. A batalha vitoriosa do Senhor sobre tal poder é relatada nessa passagem e associada explicita mente à soberania do Senhor (cf. também SI 29.10; 93.1). Vários estudiosos argumentam que essa batalha era simulada de modo ritual na cerimônia anual de entronização durante o festival de Ano Novo no outono (Halpem, 1981, 85-95; Da, 18-21). Mowinckel argumentou que esse festival retratava somente a batalha mítica com o caos (Mowinckel, 80-84). F. M. Cross afir mou que desse ritual também faziam parte os inimigos históricos de uma nação (Canaanite Myth and Hebrew Epic, 79-111). Outros estudiosos, porém, observaram que faltam aos textos bíblicos evidências inequívocas de um ritual de entronização e a maioria dos argumentos em favor desse festival apóiam-se em grande parte no festival babilônio de Aquitu (Longman, 267, n. 3; K. A. Kitchen, Ancient Orient and Old Testament, 1966,102-6). De qualquer modo, o que se pode encontrar no cerne da teologia de Sião é a crença fundamental de que o Senhor onipotente reina sobre toda a terra como Grande Rei. Na literatura cananéia, a soberania está associada à construção de um templo. No ciclo de Baal, por exemplo, depois que Baal derro ta as águas caóticas, é decretado e construído um templo para ele (CTA 4 IV, 62-5, 63; 4 VI, 35-38). O Enuma Elixe retrata uma situação semelhante, na qual Marduque recebe um templo depois de derrotar Tiamate, o monstro do caos. Apesar de a concepção do OMA — de acordo com a qual um templo é uma recompensa pela vitória — não aparecer de modo tão evidente na BH, o templo de Jerusalém é o lugar onde Javé estabeleceu o seu trono (cf. Ezequiel 40—43, esp. 43.7; Zc 1.7—6.15; cf. Halpem, “Chaos” ). 1221
Sião: Teologia de
O Senhor também é retratado como Grande Rei sobre o conselho divino (Mullen), visto de forma conveniente na expressão usada com freqüência, “Javé Sabaoth” (traduzida daqui em diante como “Senhor Todo-Poderoso”). Dentre outras formas de uso, essa expressão também parece ter exercido a função de um termo técnico no culto antigo no templo de Jerusalém (para uma visão mais ampla desse título, verG. Vos, Biblical Theology, 1948, 260 - 62 ; TW OT2:15051). Nesse sentido restrito, personifica o Deus de Israel assentado no trono divino diante do conselho celestial (Mettinger, “YHWH SABAOTH”, 19). O Salmo 89 .5-7 [ 6 - 8] proporciona um retrato vivido do Senhor cercado pelo seu conselho: Celebram os céus as tuas maravilhas, ó Senhor, e, na assembléia dos santos, a tua fidelidade. Pois quem nos céus é comparável ao Senhor? Entre os seres celestiais, quem é semelhante ao Senhor? Deus é sobremodo tremendo na assembléia dos santos e temível sobre todos os que o rodeiam. A iconografia do templo de Jerusalém refletia a teologia de Sião de várias maneiras, sendo os exemplos de maior destaque os querubins e a arca que ficavam dentro Santo dos San tos no templo. A combinação dos querubins e da arca constituía um trono e nele se assentaria a presença invisível do Grande Rei (Mettinger, Dethronement, 19- 24 ). Em 1 Reis 6 .23- 28 , o texto relata que dentro do Santo dos Santos havia dois querubins. As asas externas dos queru bins tocavam as paredes externas do templo, enquanto as asas internas de um querubim toca vam as do outro. 2 Crônicas 3.13 acrescenta que essas figuras se encontravam voltadas para fora, olhando para o Santo dos Santos, em direção ao santuário. A arca ficava sob as asas dos querubins ( 1Rs 8 .7 ). Pode parecer um arranjo um tanto confuso até que se adquira um maior conhecimento sobre os tronos do OMA e sobre a ideologia por trás de sua configuração. Os tronos da antigüidade costumavam ser constituídos de dois querubins cujas asas se tocavam, criando um trono para o rei ou deus. Uma caixa ou receptáculo servia de estrado para os pés. Pode-se observar, por exemplo, a figura do trono encontrado no sarcófago de Airão de Biblos, datada do final do segundo milênio a. C. Nessa figura, as criaturas aladas olham para frente, conforme a especificação de 2 Crônicas. Além disso, o rei ou deus descansa os pés numa caixa que serve de estrado. Outros exemplos iconográficos, encontrados em Megido, são datados do século XIII a. C. A teologia de Sião também atribui uma posição singular ao monte do templo. Pelo fato de o monte Sião ser a sede do Grande Rei, quer por eleição (p. ex., Rohland, 120- 23 ) ou por criação (p. ex., Ollenburger, Zion, 61- 63 ), apesar de ser um outeiro um tanto baixo, esse monte é considerado o cume da mais alta montanha, que chega até o céu (p. ex., SI 2 .6 ; 68.16 [ 17]; 87.1; 99 .9 ; Is 2 .2-4 [= Mq 4.1 - 3 ]; 27. 13; 66 .20 ; Ez 40 .2 ; Zc 14. 10). Mais uma vez, trata-se de um conceito paralelo à concepção cananéia de um monte cósmico, ou seja, um monte que contém toda a realidade — tanto a terra como o céu (cf. ClifTòrd, Cosmic Mountain). Os textos ugar. afirmam que o templo de Baal situa-se no monte Zafom CTA 4 . v. 116- 19), o pico mais alto do mundo (Roberts, “Zion”, 100; acreditava-se que o Zafom ficava no norte e passou a ser usado como subs. próprio para “o Norte”). O Salmo 48.2 [3 ] na verdade identifica o monte Sião com o monte Zafom: “É belo em sua imponência, a alegria de toda a terra. O monte Sião é a maior de todas as elevações de Zafom, a cidade do Grande Rei” (tradução minha). Nesse versiculo, a teologia de Siâo literalmente absorveu o conceito do monte Zafom, classificando-o sob o nome de monte Sião (cf. Roberts, Zion, 100 n. 25 ; Levenson, 146; P. C. 1222
Sião: Teologia de
Craigie, Psams I—50, WBC, 352-53). Como um monte cósmico, Sião encontra-se no limiar entre o céu e a terra (ver também SI 20.2,6 [3,7]). Israel também afirmava que esse monte era o centro ou (de acordo com alguns) o umbigo da terra, a principal ligação entre Deus e a huma nidade (Levenson, 115-22). E evidente que essa concepção representava mais uma declaração abstrata da importância do monte Sião do que uma realidade geográfica. O rei em Jerusalém encontrava-se integralmente relacionado ao Grande Rei; era o regen te do Senhor na terra (Halpem, Constitution o f the Monarchy, 125-48; cf. também S. Talmon, “The Biblical Idea of Statehood”, em The Bible World, ed. Gary Rendsburg, et al 1980, 239). No texto, a dinastia davídica é retratada como sendo especificamente escolhida pelo Senhor para servir como seus reis na terra (2 Samuel 7; SI 78.65-72; 132.11-18). O Salmo 2.7 declara com maior destaque: “Tu és meu Filho, eu, hoje, te gerei”. A antiga Israel não considerava seu rei um filho divino do Senhor. Antes, essa era uma linguagem comum em alianças indicando que o Senhor era soberano sobre o rei israelita e que o rei humano era seu vassalo — um conceito que também pode ser observado nas culturas em Ugarite e na Mesopotâmia do segundo milênio a. C. Em sua função de regente, uma das obrigações mais importantes do rei era construir e cuidar do templo do Senhor (1 Rs 8.13; SI 78.69). Uma vez que o rei é o vassalo ou regente do Senhor na terra, a teologia de Sião desem penhou um papel de grande relevância na legitimação da dinastia davídica (SI 2.12), daí ela ser a teologia oficial de Judá. Ao mesmo tempo, no entanto, a teologia de Sião exigia um reino ético e justo do vassalo do Senhor. Pelo fato de o Grande Rei ser justo, o seu regente também devia ser justo (cf. SI 89.15 [16], 30-34 [31-35]). A teologia de Sião também leva em conside ração os reis estrangeiros, chamados por vezes de “príncipes” (nãgid) responsáveis diante do Grande Rei, apesar de não lhes ter sido concedido o favor de serem regentes eleitos do Senhor (p. ex., SI 76.12[ 13]; Ez 28.1-10; cf. Mullen, 232-37). Dessa base conceituai do Senhor como o Grande Rei, derivaram duas inferências teológicas importantes. b. O Grande Rei e Protetor. Conforme observado acima, o Senhor era considerado Guerreiro Divino, aquele que destruiu as forças do caos. Isso significava que o Senhor era ca paz de destruir os inimigos de Israel aqui na terra. O monte Sião, que eqüivalia a Jerusalém, tomou-se portanto, um refúgio para os israelitas. O Salmo 48.3-5 [4-6], por exemplo, diz: Nos palácios dela. Deus se faz conhecer como alto refúgio. Por isso, eis que os reis se coligaram e juntos sumiram-se; bastou-lhes vê-lo, e se espantaram, tomaram-se de assombro e fugiram apressados Esses versículos mostram que a teologia de Sião confiava no Senhor como protetor de Israel, apesar do ataque violento das nações. As profecias de Isaías são pregadas com base nessa certeza. Diante do perigo representado pela aliança de sírios e israelitas (c. 735 a. C.), Isaías instou Acaz, o rei de Judá, a confiar na força do Senhor (Isaías 7— 8). E em outra oca sião, diante do escárnio e das ameaças da Assíria, Isaías encorajou o rei Ezequias a confiar no poder do Senhor (Isaías 36— 37; cf. 2 Reis 18— 19; Jr 26.18-19). Os estudiosos têm discutido se Israel entendia essa proteção como sendo algo provisó rio ou permanente. Até pouco tempo atrás, o consenso era de que, segundo a teologia de Sião, a proteção do Senhor era incondicional e Sião era inviolável. Essa tese foi expressada por J. H. Hayes e, mais recentemente, por J. Day (125-38), que argumenta que a inviolabilidade de 1223
Sião: Teologia de
Sião era associada à sua eleição, uma tradição existente desde os reis jebuseus que governa ram Jerusalém antes de Davi (cf. ISm 5.6-7). Como fica evidente em vários salmos de Sião (Salmos 46, 48 e 76), essa tradição persistiu até depois da conquista davídica da cidade e foi reaplicada à capital real de Davi. Essa tese foi contestada recentemente por Ronald Clements (72-89), que argumenta que a doutrina da inviolabilidade de Sião desenvolveu-se somente de pois que Jerusalém foi livrada do ataque assírio em 701 a. C. O livramento de Jerusalém, como é demonstrado em Isaías, foi resultado da piedade de Ezequias. De acordo com Clements, as indicações do caráter inviolável dc Sião nos Salmos são resultantes de uma compreensão equi vocada de expressões poéticas do suplicante declarando sua confiança na capacidade e desejo do Senhor de livrar Sião. A discussão sobre a proteção incondicional ou condicional de Sião tem implicações importantes com referência às exigências éticas que a teologia de Sião impõe ao povo. Se a proteção do Senhor sobre Sião é incondicional, então o povo não se encontra sujeito às estipulações da aliança; as únicas obrigações são da parte do Senhor (Levenson, 93-94, 98-101). Para esses estudiosos, profecias como Jeremias 7.1 -15 são consideradas advertências teológicas. No entanto, aqueles estudiosos que acreditam que a inviolabilidade de Sião seja um acréscimo posterior à tradição consideram o discurso de Jeremias no templo principalmente como um chamado para que povo volte às suas crenças mais antigas e tradicionais. Não se pode negar que dentro do texto há um chamado inequívoco à moralidade no âmbito nacional. Como foi observado acima (cf. seção I .a.), a responsabilidade pela moralidade nacional recai em grande medida sobre o rei, que é chamado a liderar com justiça. No entanto, além do rei, somente os retos, aqueles que andam em conformidade com a natureza justa do Senhor, podem viver no monte Sião e ser beneficiados por suas bênçãos de segurança e prosperidade. Os profetas ins tam o rei e o povo a serem obedientes aos preceitos do Senhor (p. ex., Is 33.13-16; Mq 3.8-12; ver VanGemeren, 355-56). A derrota das nações é retratada muitas vezes como um fenômeno natural. O Senhor rugindo ou trovejando de Sião, por exemplo, leva as nações a fugirem aterrorizadas (p. ex., SI 46.6 [7]; 76.6-8 [7-9]; Am 1.2; Jl 3.16 [4.16]). Essa imagem é paralela ao que aparece em tex tos ugar. nos quais Baal troveja contra seus inimigos de seu templo no monte (CTA4.vii.3037). Em outras ocasiões, o Senhor derrota as nações por intermédio de um vento oriental (p. ex., Ex 10.13; 14.21; SI 48.7 [8]; Ez 17.10; 19.12; 27.26). A estrutura conceituai por trás de todos esses casos é a idéia de que a natureza é lançada num estado de desordem quando o Grande Rei que habita em Sião sai para a batalha ou fala de seu templo. Além disso, é possível que a derrota das nações fosse encenada de alguma forma na cerimônia de entronização (ver o comentário acima). Ela serve de fundamento conceituai para o Dia do Senhor (Halpem, 1981, 87,98-105; Mowinckel, 145). A destruição das nações traz consigo dois resultados positivos: o mundo ex perimenta uma grande paz (SI 46.8-10 [9-11]; 76.3, 8 [4, 9]) e as nações reconhecem o Senhor (SI 46.10 [11]; 76.10-12 [11-13]; Zc 14.16-19). Apesar desse reconhecimento se dar, talvez, em termos de louvor e adoração, não deve ser confundido com uma assimilação dessas nações na comunidade em aliança com o Senhor. Antes, deve ser considerado um reconhecimento do Senhor como o poder supremo que conquista e controla as forças do caos. c. O Grande Rei e Provedor. O outro lado da derrota das forças do caos é que o Senh dá prosperidade às nações do mundo. O Senhor lega essa prosperidade ao manter a ordem. Observe-se que a criação em Gênesis 1 é realizada pela ordenação das águas caóticas pelo Senhor (Gn 1.2). Cada dia da criação produz um mundo sucessivamente mais ordenado. Essa ordem redunda na fertilidade das plantas, animais e seres humanos. Na antiga Israel, onde as secas, lavouras improdutivas e mortalidade infantil eram reais e trágicas, reconhecia-se facil 1224
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mente essa relação entre a ordem e a prosperidade. A teologia de Sião afirmava que, por meio de um regente humano (ou seja, o rei de Israel) que guardaria em obediência o culto no templo em Jerusalém, o Senhor abençoaria a terra com a fertilidade decorrente da derrota das forças destrutivas do caos. Essa esperança é expressada com maior veemência no tema do rio do paraíso (p. ex., SI 46.4 [5]; Is 33.21-23; Ez 47.1-12; J1 3.18 [4.18]; Zc 14.8). Na passagem em Ezequiel, o profeta vê um grande rio fluindo do templo de Sião. Ao longo do percurso desse rio, a terra floresce por causa da fertilidade. Por fim, o rio chega ao mar Morto e toma suas águas salo bras tão puras que o mar se enche de vida. Esse tema também coincide com outros que podem ser encontrados em textos ugar. sobre a habitação de El entre dois rios (CTA 2.III.4; ClifTord. Cosmic Mountain, 38-41). E provável que esse tema também seja o pano de fundo para a pre sença do rio fértil encontrado no jardim do Éden (p. ex., Gn 2.10). Assim como é o caso com outros elementos da teologia de Sião, essa fertilidade não se restringia exclusivamente a Israel, ainda que essa nação fosse sua maior beneficiária. Antes, o mundo inteiro seria abençoado com fertilidade (Gn 12.1-3). Assim, a nação de Israel e principalmente seus reis e sacerdotes sentiam-se responsáveis não apenas por sua própria prosperidade mas, em última análise, pela prosperidade do mundo inteiro. 2. Contexto histórico e trajetória teológica. Os estudiosos determinaram os cont nos da teologia de Sião com um certo grau de certeza e clareza. As teorias com referência ao contexto original das tradições de Sião têm sido motivo de mais controvérsia. Ao longo dos últimos 25 anos do século XX, o que predominou nos meios acadêmicos foi a teoria de que a teologia de Sião foi produto do culto pré-davídico e pré-israelita em Jerusalém. Ao observar os diversos paralelos entre a teologia de Sião e as crenças religiosas cananéias, vários estudiosos concluíram que a dinastia davídica adotara a mitologia do culto jebuseu (ou seja, da Jerusalém pré-davídica) como teologia real para a dinastia. Esse argumento explicava particularmente a natureza da aliança com Davi encontrada nos Salmos 89 e 132. Em tempos mais recentes, porém, os estudiosos têm-se deslocado da teoria das origens jebuséias para aquela das origens na corte real de Davi (essa posição foi defendida com maior vigor por J. J. M. Roberts). Esses estudiosos afirmam que a concepção da teologia de Sião do Senhor como o Grande Rei sobre o conselho divino só podia ser defendida num período da história de Israel em que a realidade coincidia com essa confissão teológica. Assim, afirmam que os reinados de Davi e Salomão, o período de maior abrangência do poder de Israel, seria o contexto mais lógico. Tais estudiosos não negam as ligações com os conceitos cananeus. Antes, desejam apenas argumentar que a verdadeira formação das tradições de Sião é produto da corte de Davi. Qualquer que seja a conclusão das discussões sobre as origens da teologia de Sião, o fato é que esse complexo teológico dominou a corte real da dinastia davídica em Jerusalém ao longo de toda a monarquia de Judá. Apesar do fato de Judá e Israel terem se separado e de um rei davídico não mais controlar as terras vizinhas num sistema de vassalagem, a teologia de Sião continuou sendo a ideologia do Estado e dirigindo as aspirações do rei e da corte de Judá. No entanto, a nação não sobreviveu ao ataque violento de Nabucodonosor e dos babilônios. Nessa ocasião, as circunstâncias históricas obrigaram os hebreus a reavaliarem sua ideologia nacional (Mettinger, Dethronement, 39-115), resultando no predomínio das teologias do Nome (sêm-> # 9005) e da Glória (kãbód-> # 3883). Mas a teologia de Sião nunca se extinguiu com pletamente, voltando a ocupar uma posição de destaque nas esperanças dos sacerdotes que trabalharam na restauração de Israel nos tempos depois do exílio. Assim, os conceitos básicos da teologia de Sião aparecem de modo relevante em livros como Ezequiel, 1 e 2 Crônicas e Esdras-Neemias. 1225
Sião: Teologia de
Com o passar do tempo, as esperanças de uma restauração nacional esmoreceram-se. A fé viva do povo de Israel, porém, reaplicou os princípios da teologia de Sião à situação instá vel em que o povo se encontrava. As tradições de Sião não foram mantidas como um comple xo teológico unificado. Antes, foram disseminadas por toda a fé de Israel no pós-exílio e, em decorrência disso, sofreram alterações. Nos últimos salmos, por exemplo, Sião ou Jerusalém não é apresentada mais como refúgio; em vez disso, os israelitas são ordenados a refugiar-se na Torá (cf. Salmos 119). De modo ainda mais dramático, o apocalipticismo separou as aspi rações da teologia de Sião deste mundo, deslocando-as para um reino celestial. O Senhor era o rei do céu, mas foi permitido aos reis caóticos da terra que reinassem por algum tempo (Dn 7.23-25; 11.36). A esperança de salvação encontrava-se exclusivamente no final da história e viria de fora da esfera física. Os justos sofrerão nas mãos dos reis terrenos perversos até que 0 Senhor os livre e lhes castigue os inimigos depois de uma batalha vitoriosa e derradeira (Dn 11.33-35; 12.1-3). A transferência das esperanças da teologia de Sião da esfera física para a espiritual pode ser encontrada facilmente no texto bíblico de Daniel. Essa visão de mundo apocalíptica, repleta de símbolos e idéias relacionados a Sião, constituiu uma boa parte do pano de fundo teológico para a compreensão que a igreja do século 1 tinha de Jesus e que, em última análise, encontra-se por trás de uma porção considerável do NT. Os conceitos relacionados a Sião podem ser observados com mais facilidade, porém, no apocalipse. Em Apocalipse 14.1-5, vê-se o Cordeiro sobre o monte Sião com os 144 mil. Ao longo do Apocalipse, o Senhor é retratado como um rei assentando no trono (cap. 4; 5.1; 21.5). Satanás é apresentado como um dragão, o símbolo antigo do caos das águas, que de acordo com a teologia de Sião, foi derrotado pelo Senhor (20.7-10). Depois dessa derrota, é estabelecida uma nova Jerusalém, exatamente como indica a teologia de Sião (21.1 -4,9-27). Com essa nova Jerusalém, o rio do Paraíso, visto em Ezequiel 47.1-12, também volta a aparecer (Ap 22.1-6). Essa idéia de salvação ocorre fora da história, indicando que a teologia de Sião não sobreviveu intacta à destruição de Israel. Em vez disso, foi assimilada nas novas experiências da comuni dade de fé. Apocalipse afirma enfaticamente, por exemplo, que o templo não será reconstruído (21.22), o que é conseqüência clara da idéia que a igreja primitiva tinha da relevância de Jesus e da experiência da destruição do templo de Israel em 70 d. C. Mesmo na igreja modema, as doutrinas básicas da teologia de Sião ainda continuam existindo. Em qualquer manhã de domingo, pode-se encontrar comunidades da fé reunidas e cantando hinos como “Castelo Forte é Nosso Deus”, declarando sua fé num Deus que é um refúgio inviolável e “Santo, Santo, Santo, Deus Onipotente”, repetindo as palavras dos serafins na visão de Isaías do Grande Rei em meio ao conselho divino (Isaías 6). Apesar de ser um elemento mais central na teologia calvinista, a doutrina da soberania de Deus é afir mada por todas as linhas do cristianismo ortodoxo. E, ao longo de sua história até o presen te, a igreja no mundo todo continua fazendo a oração do Pai Nosso diariamente, declarando desse modo os conceitos fundamentais da teologia de Sião de que Deus é o Grande Rei que protege e provê: “Venha o teu reino; faça-se a tua vontade, assim na terra como nos céus; o pão nosso de cada dia dá-nos hoje... não nos deixes cair em tentação (ou: salva-nos do tem po de tribulação); mas livra-nos do mal pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém” (Mt 6.9-13). B ib l io g r a f ia
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Siló (Ifrç? [Silõh], # 8926).
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Investigações e escavações arqueológicas foram realizadas em Quirbete Seilum, com certa intermitência, desde 1922. A combinação dos resultados, esclarecida mais recentemente (1981-84) por uma expedição do Departamento para os Estudos da Terra de Israel da Univer sidade Bar-Ilan sob a direção de Israel Finkelstein, indica que o local era habitado na Idade Média do Bronze, teve algum tipo de atividade na Baixa Idade do Bronze e foi destruído num grande incêndio na Idade do Ferro I (Finkelstein, 1983,267-68; 1993,4). Depois de um resumo dos dados do AT sobre Siló (o local não é mencionado no NT), estudaremos as maneiras como os diversos achados das escavações podem ser relacionados a esses dados. 3. Na metade do processo de distribuição da terra para as diversas tribos depois da co quista de Canaã, a comunidade de israelitas montou acampamento — e a Tenda da Congre gação — em Siló (Js 18.1). Lá, Josué lançou sortes na presença do Senhor para as sete tribos que ainda não haviam recebido sua herança na terra (18.8-10; 19.51). A distribuição foi feita em Siló, e dela fizeram parte cidades para os levitas (21.1-3). Não era permitido nenhum outro altar para holocaustos e sacrifício além daquele em Siló (22.9-34). Durante o período dos Juizes, a “casa de Deus/do Senhor" (ou seja, o tabemáculo), incluindo-se, obviamente, a arca da aliança (ISm 4.3-4), permaneceu em Siló (Jz 18.31; ISm 1.7, 24; 3.15) durante o que parece ter sido um tempo relativamente longo (cf. a discussão em Schley, 20-40). O acampamento (principal?) de Israel também ficou ali (Jz 21.12) por um ou mais períodos extensos (1 Sm 4.12). As referências a uma festa anual (Jz 21.19; 1Sm 1.3) dei xam claro que em várias ocasiões alguns (se não todos) israelitas realizavam uma peregrinação até Siló (ISm 1.3). Os homens da tribo quase aniquilada de Benjamim tomaram esposas dentre as mulheres de Siló, que trabalhavam nas vinhas da região (Jz 21.21). Eli (-^) era “sacerdote do Senhor em Siló” (ISm 14.3) e seus dois filhos réprobos(2.12) também ministravam ali (1.3). A menção ao “pilar do templo do Senhor” (1.9; cf. também 3.3, 15) sugere que, aparentemente, a Tenda da Congregação havia se tomado parte do acampa mento que continha construções auxiliares de pedra. Siló foi o local da consagração do profeta Samuel ao Senhor (1.24) e foi lá que o Senhor se revelou a Samuel “por sua palavra” (3.21). Em Siló, um “homem de Deus” cujo nome não é citado (2.27), proferiu um oráculo contra a casa sacerdotal de Eli. A morte não tardaria a chegar para os dois filhos de Eli (4.11), bem como para ele próprio (4.18). De fato, o único membro da família de Eli que o Senhor não iria “afastar do [seu] altar” (2.33) seria Abiatar (lR s 2.27), que seria, a curto prazo, substituído por Zadoque de acordo com as ordens de Salomão (2.35), e, em última análise, por Jesus, por determinação divina (Hb 5.10; 6.20). Quase ao final do reinado de Salomão, um certo “profeta Aías, o silonita” (1 Rs 11.29), talvez um homônimo de um sacerdote anterior de Siló (ISm 14.3; cf. Schley, 166), informou Jeroboào que ele reinaria sobre dez das tribos (lR s 1.30-31; 12.15; 2Cr 10.15), pois Judá ha via pecado contra o Senhor ao adorar ídolos (1 Rs 11.33). Mais tarde, Aías profetizou contra Jeroboào (14.2-8), pois Jeorboão havia levado o povo de Israel a cometer o mesmo pecado (15.29-30). Vários acontecimentos do reinado de Salomão foram, a seu tempo, registrados por escrito como “Profecia de Aías, o silonita” (2Cr 9.29). Bem antes de Salomão construir o templo em Jerusalém, o Senhor “abandonou o tabernáculo de Siló, a tenda de sua morada entre os homens” (SI 78.60). Supõe-se que Siló (inclu sive as construções anexas aos tabemáculo, mas não o tabemáculo em si; cf. lCr 21.29, que atesta a continuidade de sua existência no tempo de Davi) tenha sido destruída pelos filisteus, quando estes capturaram a arca da aliança (SI 78.61; cf. ISm 4.10-11) ou logo em seguida. Muito tempo depois, Jeremias disse aos habitantes de Jerusalém para irem a Siló e verem as ruínas dela — uma dura lembrança do fato de que, assim como o Senhor havia destruído o 1228
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lugar em que “no princípio [fez] habitar o [seu] nome” (Jr 7.12), estava prestes a destruir “a casa que se chama pelo [seu] nome, na qual [vós, o os israelitas] confiais [falsamente]” (7.14), bem como a cidade propriamente dita (26.6, 9; para detalhes, cf. Niehaus). Recusando-se a dar ouvidos, muitos do povo veriam a profecia de Jeremias se cumprir no ataque violento da Babilônia em 586 a. C. Três meses depois que a cidade foi destruída, Gcdalias — o governador fantoche de Nabucodonosor— foi assassinado por um grupo de judeus renegados. No dia seguinte, alguns homens de várias cidade do Norte reuniram-se numa tentativa lamentável de levar ofertas à “casa do Senhor” que, a essa altura, não passava de um monte de ruínas. Siló estava entre essas cidades (Jr 4 1.5) e, depois disso, no que se refere ao AT, caiu em esquecimento. Não é de surpreender que Siló tenha sido escolhida por Israel como o lugar para a per manência mais longa do tabemáculo. As escavações de Quirbete Seilum apresentam evidên cias arquitetônicas e outros indícios de atividades sacras contínuas no local no mínimo desde a Idade Média do Bronze 1IB (c. 1750-1650 a. C.) até no mínimo a Baixa Idade do Bronze 1IA (século XIV a. C.). E bem provável que o santuário de Israel na Idade do Ferro I se localizasse próximo ao cume do monte (cf. Kaufman). Entre as construções sustentadas por pilares datadas do mesmo período havia, possivelmente, uma ou mais das estruturas anexas ao tabemáculo (Finkelstein, 1986,40). Não foi encontrada nenhuma habitação entre as construções descobertas até hoje na Idade de Ferro I de Siló, cuja área na época era de aproximadamente doze mil metros quadrados. O fato de a densidade demográfica dos vilarejos vizinhos ser, naquele tempo, duas ou três vezes maior do que qualquer outra da qual se tenha conhecimento no sul de Samaria (Filkelstein, 1986,40; 1993, 385-88) argumenta em favor da importância de Siló como centro político e religioso para uma ampla área ao redor no final do período dos Juizes. A Siló da Idade do Ferro I foi destruída (pelos filisteus?) num grande incêndio por volta de 1050 a. C. — ou seja, pouco antes de Saul tomar-se rei (Eissfeldt, 138-41 ,BARev, 1/2,4-5). Resquícios dessa destruição são evidentes em várias partes do monte. Uvas passas carbonizadas foram encontradas num cômodo de uma construção com pilares da Idade do Ferro I (Finkelstein, 1986,38; 1993, 361), o que não é de causar espanto, tendo em vista as vinhas mencionadas em Juizes 21.21. Além disso, “agora fica claro que o local não foi ocupado durante os primeiros estádios da Idade do Ferro II; que no final da Idade do Ferro II era um assentamento pequeno e insignificante; e que esse local do fim da Idade do Ferro II não foi destruído pelo fogo, mas sim, ao que tudo indica, foi sendo abandonado aos poucos” (Finkelstein, 1993, 389). Assim as evidências arqueológicas da Idade do Ferro podem ser devidamente inseridas nas referências de Siló em Jeremias 7,26 e 41 (Finkelstein, 1986,39). O fato de “Siló nunca ter se recuperado de todo da destruição pelos filisteus por volta de 1050 a. C.” (ibid. 41) anula, com efeito, a teoria de que Jeremias estava se referindo a uma suposta destruição posterior pelos assírios no final do século VIII a. C., como propõem alguns estudiosos (p. ex., Pearce, 108; Schley, 179). 4. A idéia tradicional de que “Siló” em Gênesis 49.10 seja um nome (ou metáfora) p o Messias já existia pelo menos desde o b. Sanh. 98b: “Disse o rabino Yohanan com referência ao Messias: ‘Qual é o nome dele? ... Siló é o seu nome, como é dito 'Até que venha Siló...’ ” Porém, o TalmB. foi compilado do século 111 ao IV d. C. e o NT não cita Gênesis 49.10 como um texto messiânico. Aliás, a interpretação messiânica de Gênesis 49.10 só ganhou populari dade a partir do século XVI. 4QPBless, um comentário sobre Gênesis 49.10, parece considerar “Siló” nesse versículo como sendo um termo messiânico: “Até que venha o Messias da Justiça [ou seja, o Legítimo Messias], o Renovo de Davi” (linhas 3-4; cf. Allegro 174-6; cf. também com alterações, Margulis, 202-5 [esp. 205 n. 6]). No entanto, uma vez que o termo “Siló” não aparece no 4QPBless (nem no 4Q252, um texto semelhante, cf. Bateman, 20-21) não se pode 1229
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saber ao certo que parte do texto está sendo comentada. Na verdade, as versões antigas são praticamente unânimes ao interpretarem a palavra em seu(s) Vorlage(n) heb. de outras manei ras e não como um NP (cf. as observações oportunas de Mora, 414-15; Treves, 354 n.4). De qualquer modo, a interpretação heb. K. sylh em Gn 49.10 é única e, portanto, não proporciona alívio algum para aqueles que desejam considerar o termo como um título messiânico ou, até mesmo, como o NG Siló (p. ex., Wordsworth, 142; Eissfeldt, 141; Treves, 356; Sabottka, 226; Schley, 89, 163). A proposta de que se trata do nome Selá, o terceiro filho de Judá, tomando por base a tradução slh atestada em vários manuscritos do TM e alguns manuscritos samaritanos é interessante apenas por sua excentricidade (Good, 430). A oração ‘d-b ’ 'sr-lw hmspt, “até que venha aquele a quem ela pertence de direito” (Ez 21.27 [32]) é destacada muitas vezes como um paralelo da oração 'dky-yb 'sylh em Gê nesis 49.10. Tomando por base o texto de Ezequiel, vários estudiosos indicaram sylh como sellõh e traduziram a oração de Gênesis como “até que venha aquele a quem pertence”, ci tando normalmente como apoio o texto das versões antigas. No entanto, essa interpretação não só é difícil gramaticalmente, como também é “artificial” e “desnecessariamente obscura” (Moran, 410). A solução mais satisfatória para o termo anômalo sylh em Gênesis 49.10 é dividir as consoantes em duas palavras, resultando say lõh, “tributo a ele”. O termo say significando “dá diva oferecida como homenagem” (BDB, 1009) e “tributo” é atestado em outras passagens: Salmos 68.29 [30]; 76.11 [12]; Isaías 18.7. (traduzido sempre como “presente[s]”). Em Gêne sis 49.10, essa tradução mantém o texto consonatal do TM, é inteiramente viável em termos gramaticais e, sozinha, proporciona um paralelo adequado para a linha seguinte (Moran, 412; Youngblood, 278-79). A oração ‘dky-yb 'sy Ih poderia ser traduzida então como “até que venha a ele o tributo” e seria seguida apropriadamente de “e a obediência das nações lhe pertence”. A relação íntima dessa passagem com aquela de Ezequiel 21.27 [32] não é afetada (para detalhes, cf. Moran, 415-24) como também não o é, portanto, o seu caráter messiânico. Cumprida ini cialmente em Davi, no devido tempo a promessa se concretizará plenamente em Jesus Cristo. Afinal, ele é o Rei dos reis e assim, em última análise, aquele a quem é devido todo o tributo e adoração de todas as nações (Mt 2.11; Fp 2.10; Ap 7.9; 11.15). B ib l io g r a f ia
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Siloé
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Siloé
Siloé (nVw [selah 111], canal, aqueduto, rego [HALAT]; Selá em Neemias 3.15 [# 8940]; nVtt? [Silõah], Siloé em
Isaías 8.6 [#8942]).
AT 1. Tanto em selah quanto em silõah, as consonantes heb. são idênticas. O subs. próprio Siloé ocorre 3x no NT (Lc 13.4; Jo 9.7, 11). Em João 9.7, o evangelista explica que Siloé sig nifica “Enviado”, associando o nome, desse modo, ao vb. heb. slh, enviar (-> # 8938). O termo parece ter ligação com o acad. silihlu, curso de água (ver CAD 14:443). A ligação lingüística acima entre Siloé e o ato de ser “enviado” ou “conduzido” pode indicar que, a princípio, Siloé referia-se a um canal. Na antiga Jerusalém, o canal principal corria para o sul, da fonte de Giom, ao longo do vale de Cedrom. A água de Giom era coletada em um ou mais tanques localizados próximo à extremidade sul da cidades de Davi (montes de Ofel). Os arqueólogos identificaram o primeiro “Tanque de Siloé” (ver dicionários bíblicos para a localização específica”. Esse tanque é chamado de Açude de Selá (cf. Ne 3.15), açude baixo ou antigo (atual Birket-el-iamra ou “o açude vermelho”). O açude alto mais novo (século VIII a. C.; atual Birket Silwan), cerca de 100 acima, era abastecido pelo túnel de Ezequias. O açude alto tomou-se bastante conhecido pela descoberta em da Inscrição de Siloé em 1880. A região próxima aos açudes alto e baixo também é chamada de Siloé, como pode ser observado na expressão “torre de Siloé” (Lc 13.4). Nos dias de hoje, o nome ainda é mantido pela vila árabe moderna de Silwan, defronte à Cidade de Davi. 2. Isaías extrai um significado teológico de Siloé ao citar o fato de o povo “ter desp zado as águas de Siloé, que correm brandamente” (Is 8.6). No tempo de Isaías, esse fluxo de água referia-se provavelmente a um aqueduto parcialmente coberto, cujos restos ainda podem ser vistos no local. Por meio de um declive gradual, esse aqueduto levava a água de Giom até o Tanque de Siló (Açude Antigo). Esse canal, cujas águas corriam lentamente, tinha aberturas em suas paredes orientais para a irrigação das plantações ao longo do vale de Cedrom. Essa era a água viva (proveniente de uma fonte) dos judeus, comparada com aquela que ficava guardada em cisternas (cf. Jr 2.13). A metáfora de Isaías é clara. Os cidadãos de sua terra haviam rejeitado o que, externamente, parecia frágil e inútil: depositar a confiança nas poucas águas de Siloé, ou seja, no poder protetor de Deus. Em vez disso, haviam escolhido depositar a confiança no grande e impetuoso rio Eufrates (cf. Is 8.7) que representava a Assíria, uma nação que inun daria as cidades de Judá (v. 8). NT A relevância teológica de Siloé é levada adiante no NT. No tanque chamado “Enviado” (Jo 9.7), o homem cego tem a visão restaurada por Jesus, o “Enviado” de Deus (cf. 20.21). Essa associação entre Jesus, Siloé e “Enviado” pode ter sido indicada em Gênesis 49.10, em que é usado um termo semelhante. Esse texto promissivo diz que “o cetro não se arredará de Judá, nem o bastão de entre seus pés, até que venha Siló”, palavras consideradas messiâni cas por intérpretes judeus e cristãos (-> Siló para uma interpretação diferente). Além disso, o ensinamento de Jesus sobre saciar a sede espiritual por meio de sua oferta de “água viva” (Jo 1231
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7.37-39) é transmitido na Festa dos Tabemáculos, quando se tirava água do tanque de Siló para derramá-la no templo (Mi. Sukkah 4:9) B ib l io g r a f ia
ABD 6:24-26; IBD 3:1452-54; IDB 4:352-55; G. P. Gray, The Book o f Isaiah, ICC, 1912, 1:144-46; J. Simons, Jerusalem in the Old Testament, 1952; J. D. W. Watts, Isaiah 1-33, WBC, 24:115-18; J. Wilkinson, “The Pool of Siloam”, Levant 10, 1978, 116-25. Marvin R. Wilson Simplicidade
# 6705 ( 'ãnãw, pobre, humilde)
“Um símbolo é um objeto ou padrão que, por algum mo tivo, age sobre o homem e o afeta; vai além do reconhe cimento do que é transmitido em termos literais na forma apresentada” (Goodenough, 28). A partir dessa definição, fica claro que o símbolo liga, de algum modo, duas entidades, a saber, o objeto e seu efeito. Essa ligação também é inerente ao radical G symballõ, juntar, relacionado a juntar duas partes (symbola) que, originalmente, deviam estar unidas (Dillistone, 14). Tanto o símbolo quanto o sinal (-^ ô t# 253) funcionam com base na analogia. Os dois representam algo diferente deles próprios. Porém, apesar de as semelhanças entre eles, símbo lo e sinal apresentam distinções significativas. Todos os símbolos são sinais, mas nem todos os sinais são símbolos. Um símbolo tem o potencial de expressão muito maior do que o sinal. “Enquanto o sinal possui uma relação direta com um elemento de cada vez, o símbolo se re laciona com vários elementos ao mesmo tempo” (Fawcett, Symbolic Language, 28). Não há uma palavra específica para “símbolo” na Bíblia, mas a idéia de simbolismo é comum a todas as religiões (BHH 3 :1897) e o AT não constituiu uma exceção. O texto a seguir é uma seleção de algumas categorias relevantes e da teologia por trás delas. 1. Símbolos divinos, humanos e mitológicos. Vários símbolos são, na verdade, metáfo ras, pois se baseiam em analogias com a experiência humana (Barbour, 14). Pode-se dizer o mesmo da percepção humana do divino: as pessoas só são capazes de falar dessa “outra rea lidade” em termos de analogias conhecidas em seu próprio universo de experiências. Além disso, um símbolo é ligado à cultura e à história. Isso explica por que o símbolo de Deus como pastor era tão importante na história primitiva de Israel. Numa sociedade em que o principal meio de subsistência era o pastoreio de ovinos, um símbolo como esse do pastor podia ser as sociado a Deus com facilidade. E, se Deus é imaginado como um pastor, então seu povo é um rebanho (Salmo 23; Is 40.11; Jr 23.1-4; Ezequiel 34). Em outras passagens, Deus também é um pai e seus seguidores são filhos (Is 1.3; Os 11.4). No contexto do AT, esse símbolo abrange uma grande variedade de pontos de comparação, como a obediência, o cuidado e a disciplina. Outro símbolo comum para Deus no AT é o de rei. Tendo em vista o princípio de que a natu reza do ambiente imediato é o fator constituinte que dá forma a um símbolo, o mais provável é que esse símbolo não possa ter sido criado antes da monarquia israelita. No retrato do poder e majestade de Deus, Deus é representado como um leão pelos profetas Oséias (5.14) e Amós (1.2). A fim de expressar a proteção segura que oferece aos justos. Deus é retratado com mais freqüência como uma rocha e um refúgio (SI 18.2 [3]; 28.1; 62.2 [3]; 71.3; 91.2). Semelhantemente, vários símbolos foram usados para descrever a natureza dos homens. Um desses símbolos é a vinha, que aparece no AT e no NT. Essa imagem também constitui um excelente exemplo da flexibilidade de certos símbolos. Por vezes, a vinha é empregada Sinal e Símbolo: Teologia
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para retratar os atos da graça de Deus em favor de seu povo no passado (Is 5.1-7) e em outras ocasiões, serve como uma figura bastante apropriada da inadequação da vida religiosa dos is raelitas (Jr 2.21). No Salmo 80.8-16 [9-17], a vinha é usada até mesmo para retratar a eleição de Israel como nação e sua expansão política durante o reinado de Davi. (Para exemplos do NT, cf. Mc 12.1-9; Jo 15.1-8.) Outro tipo de símbolo no AT é de ordem messiânica. Esses símbolos podem ser reco nhecidos com facilidade por suas referências freqüentes ao simbolismo da raiz, renovo e árvore (Is 11.1; Jr 23.5; Zc 3.8; 6.12). O AT apresenta ainda uma categoria que pode ser chamada de símbolos mitológicos. Apesar de as forças do caos terem sido conquistadas no passado pelo Deus da criação, os is raelitas acreditavam que esse conflito ainda se repetia nos acontecimentos históricos (Fawcett, 206-9): o Egito é visto como o monstro mítico Raabe ([->]; ver SI 87.4; 89.8-10[9-11 ]); diz-se de Faraó: “crocodilo enorme, que te deitas no meio dos seus rios” (Ez 29.3) e em Isaías 14.12, a Babilônia é identificada com a figura mítica de Helel, “estrela da manhã” (Vg. Lucifer). 2. Símbolos cultuais e religiosos. Outro categoria importante de símbolos diz respe ao âmbito cultuai e religioso. Pode-se distinguir nesse caso entre a. símbolos da aliança, b. ob jetos cultuais simbólicos e c. símbolos histórico-salvíficos. a. Símbolos da aliança. Esse conjunto ressalta determinados aspectos do relacionamen to de aliança (tfirit -> # 1382) entre Deus e sua criação. O primeiro desses símbolos ( 'ôt # 253) é o arco-íris, um sinal da aliança entre Deus e Noé e todos os seres viventes (Gn 9.12; Noé). O propósito desse símbolo é lembrar Deus de sua aliança, sendo que esta consiste de promessas de que ele jamais permitirá que um dilúvio volte a destruir toda a vida na terra (v. 15). O símbolo seguinte de aliança é o da circuncisão (-> mwl I, circuncidar [# 4576]); seu objetivo é tomar Israel distinto de todas as outras nações; é um sinal da incorporação de Israel de modo a formar o povo de Deus e, como tal, constitui um pré-requisito para a participação em atividades religiosas (p. ex., Êx 12.44-51; ver de Vaux, Anclsr 1:48). Outro símbolo da aliança é o “pão da proposição” (lehempãnim, Ex 25.30) no tabemáculo. De acordo com Levítico 24.5-9, foi ordenado a Moisés que colocasse doze pães feitos da flor da farinha em duas fileiras sobre a mesa que ficava diante do Santo dos Santos. Esse pão servia de símbolo da aliança eterna (berit ‘ôlãm, v. 8 ) com o povo de Israel. A instituição do sábado (->) também adquiriu um significado simbólico específico. Qualquer que seja a origem desse dia especial no contexto mais amplo do OM A, no AT é re pleto de um significado religioso específico (de Vaux, Anclsr 2:480). O AT apresenta diferen tes motivos para a observância desse dia: o Livro da Aliança proporciona razões humanitárias (Êx 23.12), enquanto Deuteronòmio 5.15 associa o sábado à história da salvação. Em Êxodo 31.12-17, o sábado toma-se um símbolo da aliança (v. 16), “por meio do qual o mundo todo deve reconhecer a existência dessa relação [de aliança?]” (Noth, Exodus, 241; ver também Is 56.4-7; 58.13-14; Ez20.12, 20). b. Objetos cultuais simbólicos. Um dos objetos do templo que apresentou diferentes significados ao logo da história de Israel foi a arca (-^). A princípio, a arcaera considerada o símbolo supremo da presença de Deus e, por esse motivo, era por vezes levada à batalha (cf. Js 3.1-17; 6.6-20; ISm 4.3-11). É difícil determinar-se de que maneira essa presença de Deus era compreendida com relação à arca. No relato de 1 Samuel 4, a arca é chamada de “arca do Senhor dos Exércitos, entronizado entre os querubins” (v. 4). Assim, ao que parece, esse objeto era considerado o trono do Deus invisível (Schmidt. 114). Outro objeto cultuai que se tomou um dos símbolos mais característicos do povo judeu é o candelabro dc sete hastes (menôrà), descrito em Êxodo 25.31-40. A explicação mais antiga 1233
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para o significado simbólico desse objeto é apresentada em Zacarias 4.2-14. Numa visão, o profeta viu “um candelabro todo de ouro e um vaso de azeite em cima com as suas sete lâmpa das” (v. 2). As sete lâmpadas representavam “os olhos do Senhor, que percorrem toda a terra” (v. 10b). Desde então, esse símbolo recebeu vários significados novos nos tempos bíblicos e ao longo da história judaica e cristã (Lurker, 187-89). c. Símbolos histórico-salvificos. Outra categoria de símbolos cultuais religiosos é d natureza “histórico-salvífica” (Ruppert, 96). Dentre eles, pode-se citar a cobertura de bronze do altar e a vara florescente de Arão (Nm 1.6— 17; -> ’ôt). A estes podem ser acrescentados ainda o maná que Deus ordenou a Moisés que guardasse na arca (Hb 9.4) como lembrança de que Deus havia dado pão aos israelitas no deserto (Êx 16.32). Porém, a serpente de bronze (heb. nehustãn) associada simbolicamente à cura maravilhosa realizada por Deus no deserto (Nm 21.4-9), tomou-se posteriormente um objeto de idolatria e foi removida por Ezequias em sua reforma religiosa (2Rs 18.4; ver também BHH 1:371-72). Da mesma forma, as ocasiões festivas tomaram-se sinais e símbolos que lembravam Israel de acontecimentos passados. A Festa dos Pães Asmos (Êx 23.15; 34.18) e a Festa da Páscoa (34.25; Festas e Festivais) que, a princípio, talvez fossem provenientes de diferen tes origens, passaram a ser associadas simbolicamente ao êxodo do Egito (cap. 12). O sangue usado para cobrir as soleiras e umbrais, e que originalmente possuía um significado apotropaico, passa a transmitir uma mensagem diferente. Toma-se um sinal da “passagem de Deus pelo povo” {psh, v. 13; ver também Schmidt, 122). Semelhantemente, a Festa dos Tabemáculos (sukkôt), que também era conhecida como Festa da Sega, consistia, a princípio, de uma festa puramente agrícola que, mais tarde, passou a ser associada à história da salvação. Tornou-se o símbolo da libertação de Israel do Egito recordando as tendas nas quais Javé fez os pais habi tarem depois do êxodo (Lv 23.43). 3. Símbolos proféticos. Esses símbolos (-> ot) constituem uma categoria diferente, uma vez que são uma forma de pregação profética (media praedicationis\ Fohrer, 91). Pode-se dis tinguir dois tipos de símbolos proféticos: palavras simbólicas (p. ex., nomes simbólicos) e atos simbólicos (p. ex., atos que os profetas eram ordenados a realizar). O padrão de apresentação mais freqüente desses atos simbólicos é a ordem a ser cumprida seguida de sua explicação (Is 8.1-4; Jr 16.2-4, 5-7, 8-9; 19.1- 11a; 27.1 - 12; Ez 4.1-3,4-8, 9-17; 5.1- 17; cf. Fohrer, 18). O ato simbólico e sua explicação operam com base em analogias. Esse procedimento pode ser visto claramente em Jeremias 19.1-11: “Vai, compra uma botija do oleiro... sai ao vale do filho de Hinom (vv. 1-2)... Então quebrarás a botija... e lhes dirás... (vv. 10-11) (ordem )... Deste modo quebrarei eu este povo e esta cidade, como se quebra o vaso do oleiro, que não pode mais re fazer-se” (v. II) (explicação). Outros exemplos de linguagem profética simbólica podem ser encontrados nas visões dos profetas: uma vara de amendoeira ( 1. 11- 12 ), uma panela ao fogo, cuja boca se inclina do norte (1.13-14), os dois cestos de figos (24.1-10), o prumo e o cesto de frutos (Am 7.7; 8.1) e as visões noturnas de Zacarias repletas de linguagem apocalíptica (1.7— 6.15) (Ruppert, 94-95). 4. Gestos simbólicos. Um tipo diferente de linguagem simbólica usado muitas vezes pelos povos do OMA era a dos gestos simbólicos (por vezes chamados de “comunicação não verbal”). Tratava-se de um meio importante de comunicação, no qual a linguagem corporal e os gestos serviam de veículo para as partes se comunicarem. Gestos simbólicos são atestados em todos os âmbitos da vida do AT: emocional, religiosa e jurídico. a. O âmbito emocional. O AT nos proporciona uma grande variedade de gestos sim bólicos relacionados a esse âmbito (Gruber). i. Posturas de oração e súplica: estender as mãos (Êx 9.29, 33; lRs 8.22, 38-39); levantar as mãos (SI 28.2; 63.4[5]; 134.2; 141.2); ajoelhar-se 1234
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(Dn 6 .10); curvar-se ( lCr 19.20; SI 22.27[28]; 66.4); prostrar-se com o rosto em terra (Gn 17.3; lCr 21.16; Ez 3.23). ii. Deferência: lamber o pó (SI 72.9; Is 49.23). iii. Respeito/reverência: tirar as sandálias (Êx 3.5; Js 5.15); pôr a mão sobre a boca (Jó 21.5; 29.9; Mq 7.16). iv. Es cárnio/desprezo: menear a cabeça (SI 44.14 [15]); mostrar a língua (Is 57.4); bater os pés (Ez 6 .11; 25.6); cuspir no rosto (Nm 12.14; Dt 25.9). v. Consolo: lit. balançar a cabeça (Jó 2.11; Is 51.19; Jr 15.5; Na 3.7). vi. Alegria: bater palmas (SI 47.1 [2]; Is 55.12; Na 3.19). vii. Tristeza/ mortificação: rasgar as roupas (Gn 37.34; 2Sm 1.11; Jó 1.20); vestir panos de saco (Gn 37.34; 2Sm 3.31); tirar os sapatos (2Sm 15.30; Is 20.3); pôr as mãos na cabeça (2Sm 13.19; Jr 2.37); colocar pó sobre a cabeça (Js 7.6; ISm 4.12; Ne 9.1); sentar-se no chão (Is 47.1; Lm 2.10; Ez 26.16); bater no peito (lit.) (1 Sm 25.1; 2Sm 11.26; Na 2.7 [8 ]); fazer cortes no corpo (Dt 14.1; Jr 16.6). viii. Depressão: pôr o rosto entre os joelhos (1 Rs 18.42). ix. Ansiedade, medo: cobrir o rosto (1 Rs 19.13). x. Humilhação: despir alguém (2Sm 10.4; Os 2.3 [5]). b. O âmbito religioso. Os gestos simbólicos também eram especialmente comuns nessa esfera. Dentre eles, pode-se citar, a imposição das mãos do sacerdote sobre a cabeça do car neiro (Êx 29.19), levantar as mãos ao prestar juramento (Gn 14.22; Dn 12.7) e encher as mãos dos sacerdotes (= consagração) como parte do procedimento de ordenação (Êx 28.41; Lv 8.33; Nm 3.3; Jz 17.5, 12). c. O âmbito jurídico. O AT também atesta a existência de símbolos legais (ver Viberg). Comparem-se os seguintes exemplos: lavar as mãos (Dt 21.6; SI 26.6; 73.13), que denota simbolicamente estar livre da responsabilidade de uma injustiça cometida ou liberação de um compromisso ou acordo; sacudir as dobras das vestes (Ne 5.13), significando a declaração de inocência de uma pessoa (Malul, 418), mas explicado em seu uso numa dramatização de uma parábola de julgamento; o aperto de mão (Ed 10.19; Ez 17.18; etc.) como um gesto simbólico indicando um compromisso ou promessa solene; remover a capa (ISm 18.4) para expressar a virtual abdicação (ver D. Jobling, The Sense o f Biblical Narrative, 1:20); pegar na orla da veste (Zc 8.23) para indicar o início de um relacionamento; ou bater com as mãos (Pv 6.1; 11.15; 17.18) para indicar que se está assumindo a responsabilidade de fiador para a dívida de outra pessoa. NT -» N1DNTT, 2:620-35. Marco: çiyyún (lápide, baliza, # 7483); / 7/ (demarcar, # 9292); twh I (marcar, # 9344); -> tamrürim II (balizas, postes itinerários, # 9477) Maravilha, prodígio: -> ’ôt (sinal, marco, # 253); -> tôtãpôt (símbolo?; # 3213); -> môpêt (maravilha, sinal, # 4603); p l' (ser maravilhoso, difícil, # 7098) B ib l io g r a f ia
G. Barbour, Myths, Models and Paradigms, 1974; G. B. Caird, The Language and Imagery o f the Bible, 1980; R. de Vaux, Anclsr, 1961; F. W. Dillistone, The o f Symbols, 1986; T. Fawcett, The Symbolic Language o f Religion, 1970; G. Fohrer, Die symbolischen Handlungen der Propheten, 21968; E. R. Goodenough, Jewish Symbols in the Graeco-Roman Period, IV, 1953; M. I. Gruber, Aspects ofNon-Verbal Communication in the Ancient Near East, 1980; M. Lurker, Wõrterbuch biblischer Bilder undSymbole, 1973; M. Malul, Studies in Legal Symbolic Acts in Mesopotamian Law, UMI, 1983 = AO AT 2 21,1988; S. Niditch, TheSymbolic Vision in Biblical Tradition, 1980; M. Noth, Exodus, OTL, 1962; L. Ruppert, “Symbole im Alten Testament”, Freude am Gottesdienst, FS fiirJ . G. Plõger, 1983, 93-105; W. H. Schmidt, The Faith o f the Old Testament, 1983; W. D. Stacey, Prophetic Drama in the Old Testament, 1990; G. Sãhlin, 1235
Siquém
“Symbol", BHH, 1962-66, 3:1897-1904; A Viberg, Symbol o f Law: A Contextual Analysis o f Legal Symbolic Acts in the Old Testament, Stockholm, 1992. Paul A. Kruger
Siquém
Siquém (D3W [sekem II], # 8901).
OMA Baseado no radical do semO [km, ombro, esse nome descreve um local (Tell balatah) na parte central da região montanhosa da Palestina, entre os montes Ebal e Gerizim. Cinco aspectos de Siquém, três textuais e dois arqueológicos, são relevantes para a teologia bíblica e religião. 1. Siquém é atestada na inscrição egípcia de K.hy-Sebek e nos textos de Execração, ambos do início do segundo milênio a. C. (Ahituv, 173-74). Sua presença no Papiro Anastasi I, como parte da expressão “monte de Siquém” (Wente, 107) pode relacioná-la ao monte Ebal, o pico mais elevado da região. As principais fontes extrabíblicas pré-helenísticas do termo Si quém são as cartas 252,253 e 254 de Amama, enviadas a um Faraó do século XIV por Labaia, um governante de Siquém. Essas e outras referências a Labaia e os filhos por outros líderes contemporâneos de cidades na Palestina descrevem Siquém como uma cidade que aproveitava ao máximo seu isolamento do Egito a fim de exercer uma política independente de expansão e influência (Hess, 1993b). Apesar de a correspondência ter resultado na prisão de Labaia, os textos dão testemunho da herança (lingüística, cultural e política) cananéia de Siquém e seu papel como rebelde das terras altas, uma papel que viria a constituir um elemento importante na interpretação teológica da Bíblia acerca da cidade. 2. Esses textos também falam de uma divindade à qual Labaia se refere como ili, meu deus (EA 252.12). A referência descreve a captura da cidade de Labaia bem como dessa divinda de, considerada sua imagem. E possível que se trate de uma divindade pessoal de Labaia (Hess, 1993b, 102). Nesse caso, pode-se observar paralelos religiosos com os relatos dos patriarcas, nos quais seu relacionamento pessoal com Deus girava, por vezes, em tomo de Siquém. 3. Um aspecto da religião de Labaia pode ter sido preservado no nome de seu filho muut-ba- ah-lum (EA 255.3). Esse nome pode ser interpretado como “homem/devoto de Baal” (a presença desse nome em EA 256, em que o segundo elemento é escrito com um determinativo divino, dá a certeza de que se trata de uma divindade, a saber, Baal; cf. Hess 1993a, 114-15). Não há como provar se a imagem roubada de Labaia era ou não uma estátua de Baal, mas o nome de Labaia e de seu filho são de origem semO semelhantes aos nomes dos siquemitas no Pent., Josué e Juizes. 4. A presença de um santuário em Tell Balatah com um altar e uma pedra ali ergui da (cf. Js 24.26-27), preservado ao longo da Baixa Idade do Bronze até o período dos Juizes comprova a existência do santuário de El-Berite (“El/deus da aliança” ) mencionado em Juizes 9.46 (Mazar, 1990,251). 5. No terceiro pico mais elevado do monte Ebal, o pesquisador A. Zertal encontrou uma estrutura do século XII a. C. a qual identificou como um centro religioso e que, de acordo com ele, deve ser relacionada às atividades de renovação da aliança mencionadas em Josué 8 e 24. A falta de itens normalmente associados a um centro religioso levou outros estudiosos a questionarem a função dessa construção. Ao que parece, Siquém passou para as mãos dos israelitas sem evidências de destruição, encontrando-se talvez enfraquecida na época por destruições anteriores (Toombs, 1979). A re construção da cidade no período salomônico foi seguida de uma série de estratos com níveis de destruição que o pesquisador G. F.. Wright (366-67) relaciona com invasões históricas, inclusive as de Faraó Sisaque, Ben-Hadade 1 de Damasco, Hazael e o assírio Tiglate-Pileser III. 1236
Siquém
AT Há três características associadas à Siquém do AT: 1. um centro geográfico da região montanhosa das tribos de Manassés e Efraim; 2. um centro religioso para os patriarcas e para Israel logo depois do assentamento em Canaã e 3. um centro político para a rebelião dos israe litas contra a autoridade divinamente ordenada. 1. Siquém aparece como descendente de Manassés em três linhagens bíblicas: Números 26.31; Josué 17.2 e 1 Crônicas 7.19, 28. Tudo indica que essas genealogias contém algumas variações (cf. Edelman, 1991), mas todas são associadas a locais no território de Manassés. A cidade de Siquém propriamente dita parece ter se situado no fronteira da divisão dos territórios tribais de Efraim e Manassés, na região montanhosa de Efraim (Na’aman, 145-66). Nos Salmos 60.6 [8 ] e 108.7 Siquém representa essa região toda, bem como talvez em algumas das ocor rências do nome em Gênesis. De fato, as cartas de Amama descrevem um território controlado pela cidade-Estado de Siquém semelhante àquela de Efraim e Manassés (Alt, 19n). 2. Nas narrativas dos patriarcas em Gênesis, Siquém é o local do primeiro altar de Abrão (Gn 12.6) e a primeira terra comprada por Jacó para sua tenda (33.19). Nos dois casos, é o local de residência inicial dos patriarcas depois de suas longas jornadas vindos das terras de suas fa mílias na Síria. Sua localização na região montanhosa pode servir de símbolo da habitação dos cananeus em geral, ou seja, os patriarcas entraram novamente em Canaã habitando em Siquém. É por lá que começam a tomar posse da terra prometida de Canaã, quer por meio da oferta de sacrifícios ou da aquisição comercial. As conotações religiosas continuam quando Jacó enterra ali as imagens de divindades estrangeiras (35.4). (-> Gênesis: Teologia) No livros de Josué, Siquém aparece como uma cidade de refúgio (Js 20.7; cf. lCr 6.67) e também como uma cidade levítica (Js 21.21). Sua proeminência gira em torno da renova ção da aliança que Josué celebra com o povo, um acontecimento religioso que chega ao seu auge com o sepultamento dos ossos de José num pedaço de terra comprado por Jacó do pai de Siquém (o discurso de Estevão em At 7.16 lembra ainda dos corpos de outros patriarcas que foram trazidos do Egito e sepultados em Siquém). Com isso, encerram-se os acontecimen tos da Siquém patriarcal, tendo a cidade como o centro da vida religiosa israelita, bem como de sua identidade política. Pode-se encontrar outras associações à região, especialmente aos montes Ebal e Gerizim, nas instruções referentes à proclamação das bênçãos e maldições da aliança a Israel (Dt 11.26-32; Js 8.30-35) e com relação ao altar do monte Ebal (Dt 27.1-26; cf. Nielsen, 37-85). 3. Seguindo a tipologia cananéia já observada, a tigura de Siquém em Gênesis 34 pode representar o cananeu típico que profana a filha de Jacó/Israel e que enganou e destruiu os filhos de Israel. Ainda que nenhum dos lados seja isento de culpa por essa tragédia, (Fewell e Gunn, Sternberg), trata-se de uma história da falta de lei. fora do controle de Jacó/Israel, que prepara o leitor para acontecimentos posteriores do relato bíblico ali descritos. E para Siquém que os irmãos de José se dirigem numa jornada que os levará à traição de seu irmão (37.12-14). As associações cananéias prosseguem na Siquém do tempo dos Juizes. Se Josué ressalta a conquista da terra de Canaã enquanto Juizes descreve o que ainda resta para ser conquistado, Josué também descreve Siquém como um lugar de unidade diante de Deus. enquanto para Juizes a cidade é o centro das políticas que ameaçam levar Israel à desintegração. Siquém é associa da de modo inequívoco com Abimeleque em Juizes 9. Assim como em Gênesis 34, é o local da vingança envolvendo um grande massacre. Passa a ser também o lugar de uma monarquia rebelde, que não é implementada pelo Deus de Israel e nem aceitável a ele (Exum, 419-20). Quer se trate ou não de uma polêmica mais ampla contra a parte norte do reino (Brettler), Si quém toma-se a cidade associada às rebeliões contra a unidade política divinamente instituída em Israel (-^ Juizes: Teologia) 1237
Sodoma
Em 1 Reis 12.1, 25 e 2 Crônicas 10.1, Siquém serve de centro para o reconhecimento das tribos do norte de seu rei. E para Siquém que Roboão se dirige a fim de ser reconhecido pelas dez tribos e lá, é rejeitado em favor de Jeroboão. Assim, o reino rebelde do norte é esta belecido em Siquém, que também constitui sua primeira capital. Oséias 6.9 descreve a estrada para Siquém como um dentre três lugares perigosos onde bandos estão à espreita para cometer homicídios. Em Jeremias 41.5, Siquém é um dentre três lugares ao norte dos quais homens vi rão depois da destruição de Jerusalém para apresentar ofertas na casa do Senhor. Assim, os temas aparentemente contraditórios da ausência de lei e do centro religioso predominam nos textos bíblicos que descrevem Siquém (cf. Laato). P-B Siquém aparece em Eclesiástico 50.26. Nesse livro, o autor despreza seus habitantes que “nem sequer são um povo”, refletindo a opinião negativa dos judeus com respeito aos samaritanos. Acaso Siquém é escolhida para representar os samaritanos pelo fato de ser um im portante centro populacional em função de suas associações bíblicas com a rebelião contra a ordem de Deus? B ib l io g r a f ia
Sh. Ahituv, Canaanite Toponyms in Ancient Egyptian Documents, 1984; A. Alt, “Das System der Stammesgrenzen im Buche Joshua”, FS Sellin, 1927, 13-24; repr. A. Alt, Kleine Schriften zur Geschichte des Volkes Israel, 1953, 1:193-202; M. Brettler, "The Book o f Judges: Literature as Politics”, JBL 108, 1989, 385-93; D. Edelman, “The Manassite Genealogy in 1 Chronicles 7:14-19: Form and Source”, CBQ 53, 1991, 179-201; J. C. Exum, “The Centre Cannot Hold: Thematic and Textual Instabilities in Judges”, CBQ 52, 1990,410-31; D. N. Fewell e D. M. Gunn, “Tipping the Balance: Stemberg’s Reader and the Rape o f Dinah”, JBL 110, 1991, 193-211; R. S. Hess, Amarna Personal Names, ASOR Dessertation Series 9, 1993a; idem, “Smitten Ant Bites Back: Rhetorical Forms in the Amarna Correspondece from Shechem”, in J. C. de Moor e W. G. E. Watson, Verse in Ancient Near Eastern Prose, AOAT 42, 1993b, 95111; K. Jaros, Sichem: Eine archãologische und religionsgeschichtliche Studie mit besonderer Berücksichtigung von Jos 24, OBO 11,1976; A. Laato, “Antimonarkismen och den ideale David”, Teologinen A ikakauskirja 93, 1988, 403-10; A. Mazar, Archaeology and the Land o f the Bible: 10,000-586 B.C.E., ABRL, 1990; N. Na’aman, Borders andDistricts in Biblical Historiography, Biblical S tudies4 ,1986; E. Nielsen, Shechem: A Traditio-Historical Investigation, 1955; M. Stemberg, “Biblical Poetics and Sexual Politics: From Reading to Counter-Reading”, JBL 3, 1992, 463-88; L. E. Toombs, “Shechem: Problems of the Early Israelite Era”, in F. M. Cross, ed., Symposia Celebrating the Seven-Fifth Anniversary ofthe Founding o f the American Schools o f Oriental Research (1900-1975), 1979,69-83; E. Wente (trans.), Lettersfrom Ancient Egypt, Writings from the Ancient World 1, 1990; G. E. Wrhght, “Shechem”, D. W. Thomas ed., Archaeology and Old Testament Study, 1967, 355-70; A. Zertal, “Has Joshua’s Altar Been Found on Mt. Ebal?” BARev 11/1, 1985, 26-43; idem, “How Can Kempinski Be So Wrong!” BARev 12/1, 1986,43,47,49-53; idem, “Early Iron Age Cult Site on Mount Ebal: Excavation Seasons 1982-1987”, TelAviv 13-14, 1982-87, 105-65. Richard S. Hess
Sodoma (DTD [sedõm], # 6042); Gomorra (rnbV [ ‘amõrâ], # 6 6 8 6 ); Adamá (PIDIN [ 'admâ], # 144); Ze[^ b õ 'im, $ebõ 'im], # 7375; # 7391).
Sodoma boim (D1!Ò^, 1238
Sodoma
AT 1. As “cidades da campina” (Gn 13.12; 19.29) — Sodoma, Gomorra e Admá — são relacionadas juntamente com Bela [ou Zoar] como quatro das cinco cidades que ficavam na extremidade sul de Canaã (Gn 14.2; cf.10.19). Apesar de não se saber a localização precisa dessas cidades, descobertas recentes em Bab edh-Dhra e em locais vizinhos na península co nhecida como el-Lisan ou próximos a ela, na extremidade sudeste do mar Morto, indicam que se situavam nessa região. Escavações descobriram ruínas que possivelmente correspondem às cinco “cidades da campina”, localizadas em uádis que levam à bacia sul do mar Morto. Todos os restos encontrados mostram sinais de perto do final da Alta Idade do Bronze. Os registros patriarcais associados a Abraão sugerem que os reis dessas cinco cidades entraram em guerra contra uma coalizão de quatro reis invasores que tinham como objetivo saquear a região rica próxima às rotas comerciais que levavam ainda para o sul até a península Arábica. Registros antigos contemporâneos da Mesopotâmia, nos quais se encontram preservadas observações sobre grande alianças numa era de conflitos entre as cidades-Estados, argumentam em favor da existência dessas cidades e da confiabilidade do registro de Gênesis. Pode-se supor que as cinco cidades pereceram na destruição descrita em Gênesis 19. 2. Uma vez que Sodoma, Gomorra, Admá e Zeboim foram destruídas em decorrência do julgamento divino (Gn 13.10; Dt 29.23), cada uma dessas cidades serve para lembrar que o Senhor julga o pecado. A perversidade de Sodoma e Gomorra era tanta e tão conhecida que o nome das cidades foi preservado por sua infâmia (cf. Gn 18.20; Is 1.10; 2Pe 2.6; Ap 11.8 ). Sua impureza sexual ostensiva era particularmente abominável (Gn 19.5-8; Judas 7), bem como a arrogância demonstrada por elas na falta de consideração pelos necessitados (Ez 16.46-50). Até mesmo as nações (Jr 49.18; Sf 2.9) e cidades (Is 13.19; Jr 50.40) que Deus usou para realizar seus propó sitos na história foram advertidas de que Deus as trataria como Sodoma e Gomorra (Dt 32.3233). O povo de Deus também não estava isento de um perigo semelhante, pois se transgredisse os princípios e normas de sua aliança com Javé, o julgamento de Deus seria como o daqueles lugares antigos (Dt 29.23; cf. Jr23.14; Lm 4.6; Am 4.11-12). Jesus advertiu que a indiferença do povo para com a proclamação da mensagem do evangelho colocava ô povo numa situação mais perigosa do que a de Sodoma e Gomorra (Mt 10.15) e, se tal situação persistisse em fun ção da negligência do povo, poderia levar esse povo à aniquilação (Mt 11.23-24; Lc 17.28-30). Essas quatro cidades servem de lembrança perpétua da aversão de Deus ao pecado e a determinação de julgá-lo. No entanto, são usadas também em contextos que ressaltam a mise ricórdia do Senhor e sua provisão de uma saída para o salário do pecado. Apesar de a iniqüida de de Israel colocar em risco a própria existência da nação, Deus, em sua graça, preservou um remanescente (Is 1.9-10), um fato que Paulo acentua ao reconhecer com gratidão a preservação de uma Israel remanescente fiel dentro da igreja (Rm 9.29). Sem dúvida, uma Israel fiel ain da há de experimentar o perdão desse Deus compassivo e santo e desfrutá-lo para sempre (Os 11.7-11). Assim, ao discorrer sobre essas quatro cidades, o texto das Escrituras é entrecortado pelos rios da esperança e do julgamento, correntes temáticas que servem de canais de desafio e consolo para todos. B ib l io g r a f ia
Ver comentários, enciclopédias e também; W. C. van Hattem, “Once Agaim: Sodom and Gomorrah”, BA 44, 1981, 87-92; D. M. Howard, Jr., “Sodom and Gomorrah Revisited”, JETS 27, 1984, 385-400; J. E. Jennings, “Bab edh-Drha”, N1DBA, 1983, 84-85. RichardD. Patterson Soerguimento
# 6641 ( 'md, ficar em pé, tomar uma posição, postar, designar) 1239
Sofonias: Teologia de
Sofonias: Teologia de A. Contexto Histórico De acordo com o primeiro versículo dessa coletânea de profecias, essas palavras pro féticas foram recebidas no tempo do piedoso rei Josias, o 16- rei de Judá (2Rs 21.24— 23.30; 640-609 a. C.). As reformas religiosas de Josias restauraram um javeísmo que havia perdido grande parte do poder durante os reinados iníquos dos perversos Manassés (21.1-18; 687-642 a. C.) e seu filho Amom (21.19-26; 642-640 a. C.), avô e pai de Josias, respectivamente. Esses dois homens não haviam tardado a esquecer do esforço de Ezequias, pai de Manassés, para fortalecer a adoração a Deus (caps. 18—20;716-687 a. C.). A piedade dos pais de Sofonias, mesmo diante da apostasia religiosa de seu tempo, é demonstrada na escolha do nome de seu filho. Sofonias quer dizer “Javé escondeu/protegeu”. E possível também que se tenha em mente o caráter de Sofonias na longa genealogia do início do livro. A mais extensa das genealogias de todos os profetas, ela vai até Ezequias, numa pro vável referência ao mesmo rei piedoso que era o antepassado de Josias (Wilson, 279-80). Isso indica, portanto, uma ligação natural e teológica com a piedade de gerações anteriores, uma piedade para a qual Sofonias queria que o povo se voltasse. O período exato no qual as profecias foram transmitidas durante o reinado de Josias é motivo de controvérsia. A condenação das práticas religiosas (1.4-9) levou a uma sugestão de que as profecias eram anteriores a 621 a. C., uma vez que foi então que tiveram início as reformas de Josias e supõe-se que a partir de então tais práticas tivessem cessado. Não se tra ta de uma argumentação convincente, uma vez que a condenação de determinadas práticas por um profeta não significa que elas cessassem imediata e inteiramente. Os mesmos tipos de prática ainda foram condenados por Jeremias, contemporâneo de Sofonias (2.8; 8.2; 19.5, 13; 32.35), havendo a necessidade de que outros profetas continuassem a fazê-lo depois do tem po de Sofonias, o que indica que as reformas de Josias não foram tão difundidas quanto seria desejável. Assim, é possível que as profecias tenham sido proferidas num período posterior do reinado de Josias. A menção a várias nações estrangeiras no livro não apenas ajuda a datá-lo como tam bém proporciona uma compreensão maior da cultura na qual essa obra foi escrita. A destrui ção profetizada de Nínive (Sf 2.13), a capital da Assíria, onde hoje se encontra o Iraque (ver Jonas), ajuda-nos a identificar a data dessas profecias. Uma vez que Nínive caiu para os seus vizinhos, os babilônios, em 612 a. C., e o império assírio como um todo foi subjugado até 605 a. C., pelo menos Sofonias 2.13-15 deve ser anterior a 612 a. C. A Etiópia (Sf 2.12; também chamada de Cuxe) havia perdido o controle sobre o Egito durante a XII Dinastia egípcia (c. 716-663 a. C.). Os etíopes, por sua vez, foram derrotados pelos babilônios em 663 a. C. Uma data antes dessa derrota causaria dificuldades com relação aos ou tros fatos mencionados acima. E provável que, nessa passagem, “etíopes” seja uma designação alternativa para o Egito em sua totalidade, como é o caso em Isaías 20.4 e Ezequiel 30.1-9. Todas essas principais potências mundiais, bem como outras nações secundárias no ce nário mundial, como os filisteus (2.4-7) e Moabe e Amom (2.8-11), enfrentarão o julgamento do Deus Todo-Poderoso de Israel. B. Estrutura Literária Depois do título (1.1), Sofonias é dividido em duas coletâneas desiguais de profecias, sendo que a primeira seção, que é a mais longa, diz respeito ao julgamento ( 1 .2 — 3.8), e a segunda refere-se à esperança (3.9-20). Após uma introdução geral ao julgamento (1.2-3), 1240
Sofonias: Teologia de
a primeira seção trata mais especificamente de Judá ( 1.7—2.3; 3.1-8) e, em seguida, de ou tras nações (2.4-18). C. Temas Teológicos O desenvolvimento profético dojulgamento/esperança segue os acontecimentos históri cos, sendo que Judá é julgada por meio do exílio em 587 a. C., mas recebe permissão de voltar desse exílio em 538 a. C. Alguns estudiosos sugeriram que, diante dessa divisão julgamento/ esperança, os doze últimos versículos do livro sejam um acréscimo feito depois da volta do exílio. Essa idéia baseia-se numa suposição de que uma mensagem de julgamento seja neces sária enquanto ainda existir a possibilidade de arrependimento e restauração que possa evitar o julgamento iminente, enquanto a esperança seria a mensagem lógica para aqueles que já es tejam sofrendo por causa de suas transgressões. Apesar de esta ser uma situação possível, de modo algum é singular e nem conta com o apoio das evidências bíblicas, as únicas disponíveis nesse caso e que, com freqüência, apresentam um misto de julgamento e esperança (ver, por exemplo, Isaías 1—2; Oséias 2; Amós 9). Essa combinação de julgamento e esperança não deve ser motivo de surpresa, uma vez que reflete o caráter de um Deus que é, por um lado, justo e santo e, por outro, compassivo e clemente. O princípio unificador do livro que abrange tanto a seção de julgamento quanto a de es perança é o “dia do Senhor”. Nesse dia, Deus voltará a intervir na história humana com energia para transformá-la, restabelecendo a ordem pretendida por ele, a qual fora distorcida por suas criaturas pecadoras. Apesar de não ser, de maneira alguma, o único profeta a tratar desse tema (cf. Is 2.13; 34; Jeremias 46— 51; Ezequiel 7; Joel), Sofonias apresenta-o como o princípio central e organizador. O profeta mostra que o dia do Senhor tem dois lados. Ao se considerarem povo escolhido de Deus, os israelitas esperavam um dia de grande prosperidade e esperança para si e um dia de julgamento para os inimigos (ver Am 5.18). Deus mostra para Judá que os critérios deste estão distorcidos. A verdadeira base para a bênção ou julgamento era o relacionamento de uma nação com o próprio Deus e não com Israel. Assim, apesar de ser chamada de povo de Deus, Judá também perderia as bênçãos daquele dia se abandonasse a aliança. Portanto, esse povo também foi mencionado nas passagens de julgamento de Sofonias. Os dois lados do dia do Senhor mostram que esse dia é mais complexo do que pare ce à primeira vista. Na verdade, há evidências dentro do livro de que se trata de mais de um dia. Há pelo menos dois; um dia de julgamento (ver 1.7, 10, 14) e um dia de esperança para Israel (3.9, 16). Na verdade, haverá ainda um dia escatológico derradeiro que nos trará a de vida ordem de modo finai e inalterável, bem como vários dias menores e antecipatórios de julgamento e esperança, todos apontando para essa culminância final. Logo, acontecimentos como a queda de Jerusalém para os assírios (586 a. C.) ou, antes disso, a queda de Nínive, a capital assíria, para os babilônios, são considerados exemplos de caráter antecipatório des ses “dias do Senhor”. O julgamento é desencadeado pela perversidade de vários reis. Dentre estas, podemse citar práticas religiosas pagãs (1.4-9), corrupção da liderança (3.3-4) ou mesmo a traição e orgulho de nações estrangeiras (2.8, 10, 15). Uma das transgressões mais insidiosas de Judá, alvo de uma das repreensões mais rigorosas, era sua complacência, a descrença no fato de que Deus ainda estava atuando no mundo (1.12). Ao que parece, uma atitude de indiferença enfa dada é ainda pior do que um zelo para com as coisas erradas. Essa atitude foi condenada de maneira específica em Judá, cuja própria existência como nação baseava-se numa intervenção de Deus. um ato que agora negavam ser possível. 1241
Sofonias: Teologia de
As atitude que Deus desejava, as práticas que podiam levar às bênçãos do dia do Senhor e não ao julgamento não eram apenas de caráter religioso. De fato, o povo é chamado a “[Buscar] o Senhor” (2.3), e é condenado por não fazê-lo (1.6 ). Sem dúvida, essa busca contém questões como os sacrifícios e os festivais. As práticas rituais fazem parte da conclamação de Sofonias (1.4-9), mas também há lugar para a ética pessoal, uma vida íntegra em sociedade por meio da demonstração de humildade, bondade e confiabilidade (3.12-13). O modo de viver correto não deve ser voltado apenas para Deus, mas também deve cuidar dos interesses e necessidades da humanidade, uma mensagem que nunca perde a relevância. O caráter central da presença de Deus, além de seus atos de bênção e dos acontecimen tos do dia do Senhor são ressaltados na profecia. Javé, nome do Senhor em relação à aliança, traduzido na maioria de nossas versões simplesmente por “Senhor”, envolve todo o livro ao aparecer em sua abertura ( 1. 1) e em seu encerramento (3.20), ocorrendo ainda muitas vezes em outras partes das profecias. Javé é o Deus do passado que não apenas entrou numa relação de aliança com Israel, mas também criou todas as coisas (Gn 1.1— 2.4). Ele é o Deus do presente, que exige ações e atitudes corretas na vida do povo de Judá nesse momento. Também é o Deus do futuro, trazendo bênçãos ou calamidades de acordo com a resposta do povo no presente. A interrelação dessas esferas temporais pode ser vista em 1.3. Nesse versículo, o passado, o pre sente e o futuro se encontram na ocasião em que Deus destruirá “homens e animais... as aves... e os peixes”, exatamente as mesmas criaturas encontradas no relato original da criação — ape nas em ordem inversa (Gn 1.26,25,21). Quando deixou as mãos do Criador, essa criação era boa (1.31), mas quando ela é pervertida por aquele que recebeu a incumbência de cuidar dela (1.28), Deus não hesita em causar um longo período de destruição (ver um exemplo anterior em Gênesis 6 —9). Toda a criação é dependente e sofre ou exulta de acordo com a moralidade do povo de Deus (ver Gn 3.17; Jr 12.4; Rm 8.19-22) (-> b r \ criar, # 1343). Essa menagem fortíssima de responsabilidade e julgamento é, muitas vezes, excessiva, silenciada até mesmo pelo povo de Deus nos dias de hoje, apesar de ser ela o chamado vibrante dos profetas do AT bem como do próprio Jesus (p. ex., Mt 11.21-24; 23.13-39). A ira de Deus no AT não é simplesmente convertida em amor no NT. Antes, os dois encontram-se entretecidos nos dois Testamentos. O julgamento e a esperança são coexistentes e a omissão de um ou de outro distorce o retrato bíblico de Deus. D. Contexto Canônico O tema do dia do Senhor é expressado em Joel 2.1 -11 em termos que apresentam pa lelos bastante próximos com Sofonias 1.14-18. Tendo em vista que a data da redação de Joel é incerta, não se pode dizer se um livro tomou emprestados conceitos do outro, mas tudo indica que houvesse o predomínio de uma tradição escatológica em comum. Apesar de não citar exatamente Sofonias 3.3-4, é evidente que o profeta Ezequiel (22.2528) usa a tradição encontrada nessa passagem de Sofonias para expandir sua própria repreensão à perversidade dos líderes de Israel (Fishbane, 1985, 461-63). Assim, Ezequiel acrescenta a autoridade da tradição à sua mensagem de condenação: Deus não mudou de idéia; usar inde vidamente o poder oficial continua sendo errado. Citações específicas dessas profecias ocorrem somente no uso de Sofonias 3.13 em Apocalipse 14.5. Neste último, a pureza moral do remanescente piedoso de Judá fica evidente na vida dos fiéis, que são redimidos do mundo corrupto e pagão pelo Cordeiro. João vê uma semelhança entre a decadência ética nos dias de Sofonias e aquela do fim dos tempos, no dia final do Senhor. 1242
Sofonias: Teologia de
Além de ser usado em Escrituras posteriores, Sofonias também recebeu atenção e co mentários em textos pós-bíblicos. Na comunidade de Qumran, Sofonias foi interpretado usando a forma literária do Pexer (lQpZeph 1:18-2:2; 4Qzeph 1:12-13; Horgan, 1979, 63, 191-92). Nesse tipo de interpretação, uma comunidade posterior separava textos das Escrituras que po diam ser aplicados imediatamente à sua própria realidade histórica. O Apocalipse de Sofonias (século l a. C. — século 1 d. C.) apresenta uma jornada ce lestial escatológica realizada por Sofonias. São mostradas a ele, entre outras coisas, cenas do céu e do inferno, com quatro cenas iniciadas pelo toque de uma trombeta (cf. Apocalipse 8 —9; Wintermute, 508-15; para a história da interpretação de Sofonias, ver Ben Zvi, 21-38). B ib l io g r a f ia
E. Achtemeier, Nahum-Malachi, 1986; D. W. Baker, Nahum, Habakknk, Zephaniah, 1988; E. Ben Zvi, A Historical-Critical Study o f the Book o f Zephaniah, 1991; M. DeRoche, “Zephaniah I 2-3: The ‘Sweeping’ o f Creation”, VT 30, 1980, 104-9; M. Fishbane, Biblical lnterpretation in Ancient Israel, 1985, 461-63; M. P. Horgan, Pesharim: Qumran Interpretations o f Biblical Books, 1979,63,191-92; J. P. Hyatt, “The Date and Background of Zephaniah”, JNES 7,1948, 25-29; R. Patterson, Nahum, Habakkuk, Zephaniah, 1991; B. Renaud, “Le livre de Sophonie: La thème de YHWH structurant de la synthese redactionnelle”, RevScRel 60, 1986, 1-33; J. J. M. Roberts, Nahum, Habakkuk and Zephaniah, 1991; W. A. VanGemeren, Interpreting the Prophetic Word, 1990,214-25; L. Walker, “Zephaniah”, EBC, 7,537-65; D. L. Williams, “The Date of Zephaniah”, JBL 82, 1963, 77-88; R. R. Wilson, Prophecy and Society in Ancient Is rael, 1980; O. S. Wintermute, “Apocalypse of Zephaniah (First Century B.C. — First Century A.D.)”, The Old Testament Pseudepigrapha I, Apocalyptic Literature and Testaments, ed. Ja mes H. Charlesworth, 1983,497-515. David W. Baker Sol -> # 9087 (semes, sol) Solidão -> # 969 (bdd, estar isolado) Som -> # 7754 (qôl, voz, som, trovão, brado) Sombra -> # 7511 (sll III, ser, ficar escuro; lançar uma sombra) Sombras -> # 8327 (t^pã ’im, fantasma, espíritos dos mortos) Sonho -> # 2731 (hlm, sonhar, ter um sonho revelador) Sono
# 3822 (ySn I, sono)
Sopro (vento) -> # 5622 (ndp, levar embora [com o vento], espalhar) Sorteio
# 3341 (yyd I, lançar)
Sortes -> # 1598 (gôrãl, sorte) Subida -> # 6590 ( ‘Ih, subir, ascender, trazer erigir) 1243
Tabor, Monte
Submissão
# 8 8 8 6 (skb, submeter-se, ser saqueado)
Subomo -> # 8816 (sõhad, presente, suborno) Subsídio Subversão Sucesso Suco
# 786 ( ’aruhâ, porção, subsidio) # 4550 (mahpêkâ, subverter) # 7502 (.?//;, ser bem-sucedido, ser próspero)
# 6747 ( ‘ã r â , suco de uva [não fermentado])
Suor -> # 2399 (zê'á, suor, transpiração) Susana
Apócrifos
Suspensão -> # 9434 (//»/, pendurar) Sustento -> # 6184 (í , sustentar, apoiar) Tabemáculo -> # 4595 (m ô'êd, local de congregação, tenda da congregação)
Tabor, Monte (1130 [tãbôr]; [heb. har tãbôr], localiza do na extremidade nordeste do vale de Jezreel, a cerca de dez quilômetros a leste de Nazaré e vinte quilômetros a sudoeste da extremidade sul do mar da Galiléia [# 9314]). Tabor, Monte
OMA E possível que o termo Tabor derive do fenício e que reflita o nome de uma divindade semita chamada em grego de Zeus Atabirios. Em Rodes, esse deus era adorado num monte sa grado conhecido como Atabirion. Em textos G, o termo Itabirion é usado muitas vezes para o monte Tabor. No entanto, Lewy sugeriu que Atabirion e Tabor podem ser derivados do termo acad. tibira, ferreiro, nome preservado no termo “Tibira”, um título da divindade Tamuz (cf. Ez 8.14). AT 1 .0 termo Tabor ocorre lOx na BH. Tudo indica que esse monte abaulado, cuja apa rência chama a atenção, marcava a divisa entre os territórios de Issacar, Naftali e Zebulom (cf. Js 19.12, 22, 34; 1Cr 6.77 [62]). O “carvalho de Tabor” (ISm 10.3) ficava no território de Benjamim e não se sabe de nenhuma relação entre essa árvore e o monte Tabor. O monte Tabor eleva-se a aproximadamente seiscentos metros acima do nível do mar, sendo visível a uma grande distância. Dele, pode-se ver o vale fértil de Jezreel (que significa Deus semeia) cortado por uma importante estrada da antigüidade no sentido norte-sul. Essa localização critica do monte Tabor dentro de uma importante região de produtividade agrícola em Israel pode ter sido um dos principais fatores que levou esse marco notável a ser usado como centro religioso. Ao que parece, Deuteronômio 33.18-19 sugere a existência de um santuário primitivo comum no monte Tabor. Apesar de o nome do pico não ser mencionado especifica mente, o texto indica que Zebulom e Issacar “chamarão os povos ao monte; ali apresentarão 1244
Tabor, Monte
ofertas legítimas”. Tomando por base considerações lingüísticas, J. Lewy concluiu que o monte Tabor fosse, provavelmente, um lugar de adoração a Tamuz. É possível que o profeta Oséias reforce a idéia de que certas práticas religiosas eram realizadas no alto desse monte ao se referir à corrupção de Israel e a laços de armadilha como “rede estendida sobre o Tabor” (Os 5.1). 2. O acontecimento mais conhecido do AT associado ao monte Tabor ocorreu quand Débora instruiu Baraque a reunir nesse monte dez mil guerreiros das tribos de Zebulom e Naftali (Jz 4.6,12). Baraque desceu de lá com suas tropas até a planície e derrotou Sísera, o general cananeu, e seus 900 carros de ferro (4.14-15). O Cântico de Débora (Jz 5; ->) foi escrito como um peã a fim de louvar o Senhor pela concessão da vitória. Jeremias parece comparar o poderio imponente de Nabucodonosor que excedia a força do Egito com a presença dominadora do Tabor e do Cannelo junto ao mar (Jr 46.18). Holladay, por outro lado, argumenta que, por ser um pico isolado, nesse caso o Tabor pode ser uma refe rência ao Egito ou a Faraó, que ficaria isolado e seria lançado ao mar. No Salmo 89.12 [13], a beleza majestosa do Tabor e do Hermom são relacionadas entre si e o salmista afirma que esses dois elementos inanimados da criação de Deus exultam em nome do Senhor. P-B No século III a. C., Antíoco III tomou Atabirion, ou seja, o Tabor (Políbio, Histórias 5.70.6). No século II a. C., os judeus tomaram o monte Tabor (lit. Itabirion) sob o comando de Alexandre Janeus (Ant. 13.15.4). No século seguinte, porém, o general romano Pompeu tomou o Tabor durante a conquista da Palestina. No tempo da primeira revolta dos judeus contra Roma (66-73 d. C.), Josefo fortificou Itabirion (Guerra 2.20.6), mas logo o perdeu nos avanços do exército romano. NT A tradição cristã associou o monte Tabor à transfiguração de Jesus. Os relatos dos Evangelhos (Mt 17.1-7; Mc 9.2-8; Lc 9.28-36), no entanto, não citam o nome do monte. Em 326 d. C., Helena, mãe de Constantino, construiu uma igreja no monte Tabor para servir de memorial da Transfiguração. B ib l io g r a f ia
ABD 6:304-5; P. C. Craigie, “Deborah and Anat: A Study o f Poetic lmagery (Judges 5)”, ZAW 90, 1978, 374-81; W. L. Holladay, Jeremiah, Hermenéia, 1989,2:325-26; J. Lewy, “Tabor, Tibar, Abatyros”, HUCA 23:357-86; R. Patterson, “The Song o f Deborah”, in J. S. Feinberg e P. D. Feinberg, eds., Tradition and Testament, 1981, 123-60; L. E. Stager, “The Song o f Deborah: Why Some Tribes Answered the Call and Others DidNot”, BARev 15, 1989, 50-64. Marvin R. Wilson Tábua
# 7983 (qeres, tábua)
Tagarelice -¥ # 1051 (bt'/bth, falar, tagarelar, fazer um juramento precipitado) Talento [dinheiro] Talho
# 3971 (kikkãr, talento)
# 7915 (qçs, cortar, aparar, remover, cortar em pedaços)
Tambor -> # 9528 (tpp, tamborilar, tocar, bater) Tanque -> # 1391 (berêkâ, tanque) 1245
Tempo e Eternidade
Tatuagem -> # 7882 (qa 'aqa, tatuagem, incisão) Teimosia
# 5286 (mrh, ser teimoso, obstinado; obstinação)
Tempestade -> # 8548 (í VII, levar embora com o vento de uma tempestade) Templo -> # 2121 (hêkãl, templo, palácio) Tempo -> # 6961 ( ‘êí, tempo)
Tempo e Eternidade
Tempo e Eternidade (nv [ ‘et], tempo, # 6961; OVÍS [ 'ôlãm], longo tempo ou duração, # 6409).
AT 1. Os dados lexicais referentes a tempo no AT — exceto dia, semana, mês e ano como unidades de tempo — são constituídos de uma série de termos heb. e aramaicos. Na BH, os termos são ‘êt, qê.y, m ô ‘êd, ‘ôlãm e 'ad. Os termos aram. são zPman, ‘iddãn, s ã ‘â e ‘ãlam. A palavra mais importante para tempo é ‘êt. O subs. ‘êt ocorre apenas no hebraico. Fora do AT, também é encontrado no óstraco de Laquis n. 6 , cf. K.AI, # 196, naquela época e no fen. púnico, no tempo da colheita. O subs. acad. inu/iitu (enu/ettu) para tempo não é reconhecido nos dicionários modernos (cf. Jenni, THAT2:370). O subs. ‘êt, tempo, ocorre em várias orações e contextos lexicais. Aparece sozinho, tam bém como sujeito ou objeto e, muitas vezes, está relacionado a sufixos preposicionais e afixos pronominais. Assim, a palavra é traduzida com diferentes sentidos, como pode ser visto em al gumas versões da Bíblia: tempo, tempos, estação, quando, sempre, constantemente, enquanto, em tempos determinados, agora, no tempo determinado, circunstâncias, etc. A palavra ‘êt ocorre 297x no AT, principalmente em Eclesiastes (40x), Jeremias (36x) e Salmos (22x). O termo ‘êt apresenta duas formas derivadas: o adj. 'ittí, aquele que estará por perto no tempo determinado ou no momento em que algo acontecer (Lv 16.21) e o adv. ‘attâ, agora, então, portanto (# 6964). a. O principal componente do significado de ‘êt não é o tempo em sua duração, mas sim, o momento ou ponto determinado no tempo em que algo acontece; em alemão, Zeitpunkt. E o tempo ou o momento, como nas seguintes expressões: “hora em que as moças saem a tirar água” (Gn 24.11); “não é tempo de se recolherem os rebanhos” (29.7); “a seu tempo, quando resvalar o seu pé” (Dt 32.35), etc. b. Com o sentido de um ponto determinado no tempo, 'êt é usado com várias preposi ções, das quais a mais comum é Ifi (137x). Assim, é estabelecida uma variação com um signi ficado ampliado. A oração, “naquele tempo” que apresenta o contexto temporal de um episó dio com relação a outros, refere-se na maioria das vezes a uma ocasião do passado (Gn 21.22; 38.1, etc.); mas, em contextos proféticos, também diz respeito a um determinado momento no futuro (Is 18.7; 20.2, etc.). Com a preposição le, expressa-se o momento determinado de uma ação (Synt., par. 107b). Observemos Eclesiastes 3.2-8, em que é ressaltado o efeito frustrante do tempo sobre a vida do ser humano e seu trabalho. A preposição k? (Synt., 109b) é empregada com 'ê/em diversas orações: “amanhã, por este tempo” (Êx 9.18; ISm 9.16; 20.12); “daqui a um ano” (Gn 18.10, 14; 2Rs 4.16, 17), etc. Outras preposições utilizadas são ‘ad, até (Js 8.29, etc.); min, desde, no momento em que ocorre (Is 48.16; Ez 4.10, 11, etc.) e 'el, em: “Seus ir mãos... tinham de vir, de tempo em tempo” (lC r 9.25). 1246
Tempo e Eternidade
c. Como uma locução independente, ‘êt é usado em expressões que qualificam o mo mento determinado no tempo. Por exemplo: “E tempo de angústia para Jacó “ (Jr 30.7); “é tempo de vingança do Senhor" (5 1.6); “sendo tempo de grandes chuvas” (Ed 10.13). Também é usado em expressões que afirmam o tempo específico em questão. Por exemplo: “Passando eu por junto de ti, vi-te, e eis que o teu tempo era tempo de amores” (Ez 16.8). d. Como suj. combinado como vb., bw ’, por vir. Por exemplo: “Está prestes a chegar o seu tempo, e os seus dias não se prolongarão” (Is 13.22); “porque veio sobre eles o dia da sua ruína e o tempo do seu castigo” (Jr 46.21). Como objeto, é combinado como vb .yd ', saber. Por exemplo: “Sabes tu o tempo em que as cabras monteses tem os filhos...? Ou sabes o tempo do seu parto? (Jó 39.1-2). E usado também com smr, observar. Por exemplo: “observam o tempo da sua arribação” (Jr 8.7), etc. e. Em muitos casos, ‘êt designa o tempo certo para algo, o tempo apropriado ou favo rável. Por exemplo: “de tal modo que não haja nem dia nem noite a seu tempo” (Jr 33.20); “de tempo em tempo a comerás” (Ez 4.10; cf. v. 11); “porque é tempo” (Os 13.13), etc. A idéia de um tempo apropriado pode, por um lado ser neutralizada, como no caso de expressões do tipo “em todo tempo”, “permanente”, “sempre que” (Ex 18.22,26), ou, por outro lado, pode ser reforçada, como por exemplo em “desde a manhã até ao tempo que determinou” (2Sm 24.15, etc.). f. Num contexto escatológico, ‘êt pode designar a hora vindoura de julgamento, por exemplo: “está prestes a chegar o seu tempo, e os seus dias não se prolongarão” (Is 13.22); “veio sobre eles o dia da sua ruína e o tempo do seu castigo” (Jr 46.21; cf. 50.31; 51.33); “Por que está perto o dia, sim, está perto o dia do Senhor” (Ez 30.3, cf. 21.25 [30]). Num contexto escatológico, ‘êt é combinado, por vezes, com qê.y, fim, como, por exemplo, em: “esta visão se refere ao tempo do fim” (Dn 8.17; cf. 11.35,40; 12.4, 9). Em conjunto com mó ‘êd, o “tem po do fim” é designado como um “tempo determinado”, estabelecido por Deus, a saber, “esta visão se refere ao tempo determinado do fim” (8.19; cf. 11.27, 29, 35). A declaração, “isso seria depois de um tempo, dois tempos e metade de um tempo” (12.7), possui lit. “um tempo determinado, tempos determinados e meio (tempo determinado)”. g. O uso do pl. ‘ittim / ‘ittôt parece, por vezes, acrescentar os momentos isolados no tempo de modo a constituir períodos de tempo sem, no entanto, deixar de lado o significado básico do singular (cf. SI 9.9[10]; 10.1, etc.). Também nesses casos, o conteúdo do tempo às vezes é mais importante do que o significado puramente temporal. Quando, por exemplo, o salmista declara pela fé, “Nas tuas mãos, estão os meus dias” (SI 31.15 [ 16]), não está se refe rindo a diferentes fases de sua vida, mas às suas experiências, circunstâncias, sorte, os tempos de enfermidade e cura, as ocasiões de aflição e confiança, etc. Nessa forma de uso, temos uma transição que sai do sentido estritamente temporal (cf. Barr, 123). h. Um elemento característico da visão de tempo do AT é a fé no Deus vivo e eterno (Ex 15.18; SI 90.1-2; Is 40.28; Dn 12.7) como Criador e Senhor do tempo em todas as dimensões do tempo (cf. H.-C. Hahn, NIDNTT 3:846). Esse ponto de vista aplica-se ao âmbito da natu reza (Lv 26.4; Dt 28.12; Jó 5.26; 38.32; SI 1.3, etc.), ao culto de Israel (Êx 23.14-19, etc.), ao tempo de vida dos homens (SI 31.15 [ 16]; Ec 3.2; 7.17, etc.), e, de modo geral, às experiências passadas de Israel com o tratamento de Deus em relação aos israelitas e também em relação às expectativas deles para o futuro. Concordamos que, para os israelitas, o tempo e a história encontram-se inseparavelmente ligados (cf. Hahn, 841). Ao longo de todo o AT, pela expressão estereotipada bã ‘êt h a h i naquele tempo, a atenção volta-se para os acontecimentos da história da salvação no passado e, semelhantemente, para as expectativas do futuro. Para referências aos acontecimentos da história da salvação no passado, ver Deuteronômio 1.9,16,18; 2.34,3.4; 4.14 e para o futuro de julgamento, mas também de redenção de Deus, Isaías 18.7; Jeremias 3.17; 4.11; 8.1; 50.20; Daniel 12.1; Joel 3.1 [4.1]; Amós 5.13; Miquéias 3.4; Sofonias 3.19-20. 1247
Tempo e Eternidade
2. Os dados lexicais para o conceito de eternidade no AT consistem de várias palav heb. e aramaicas. Na BH, os termos são nêsah ', ‘ad I e 'ôlãm. O termo aram. é alam. O mais importante desses termos é ‘ôlãm / ‘ãlam. O subs. 'ãlam, tempo remoto, ocorre em todas as línguas sem. do Noroeste (cf. THAT 2:228, HALAT). A etimologia de ‘ôlãm l ‘ãlam ainda não foi explicada (cf. Jenni, THAT2:22S). a. O termo heb. ‘ôlãm, um longo tempo ou duração, ocorre 440x no AT, principalmente em Salmos (143x), Isaías(46x), Jeremias (35x), 1 Crônicas (23x) (cf. Jenni, op. cit., 229); apa rece em várias orações e contextos lexicais. Salvo raras exceções, não é usado como um subs. independente, mas, geralmente, combinado com as preposições min, de (27x), 'ad, até (81 x) e le, até (181 x). Como substituição para as construções preposicionais, aparece ocasionalmente como um acusativo adverbial ou como um segundo elemento de uma construção composta (cf. IDB 4:644). Assim, a palavra é traduzida com vários significados, como pode ser visto na NIVExhaustive Concordance, ver # 6409. Algumas dessas tradução são: para sempre, eterno, eternidade, antigo, há muito tempo, eternamente, permanente, velho, antiquissimo, ademais e, na neg., nunca, nunca mais, etc. b. O termo correlato aram. ocorre 20x no AT, a maioria delas no livros de Daniel, sen do traduzido como eternamente (Dn 2.4,44; 3.9; 5.10; 6 .6 [7], 21 [22], 26) ou de eternidade a eternidade (min- ‘ãlm ã' < ‘ad- ‘ãlmã ’ < 2.20; cf. 7.18), de geração em geração (4.3 [3.33], 34 [3 l])e eterno (7.14, 27). c. O elemento principal que compõe o significado de ‘ôlãm é, de acordo com o consenso, “o tempo mais remoto” com referência tanto ao passado quanto ao futuro e, por vezes, a ambos. De acordo com J. Guhrt (NIDNTT 3:821), ‘ôlãm reflete uma idéia concreta tipicamente bíblica que deve ser compreendida em relação à vida toda de um homem. Para Guhrt, o significado básico de ‘ôlãm não é tanto a antigüidade remota, mas sim a extensão de um período, o tempo de vida. Quando a orelha de um servo é furada num ato público e oficial (Ex 21.6; Dt 15.17), ele torna-se um servo “para sempre” (le ‘ôlãm cf. também Êx 29.9; ISm 1.22, etc.). Em todos esses casos e outros semelhantes, esse tempo determinado estende-se por toda a vida da pessoa em questão, mas também é limitado a ela (cf. Guhrt,3:827-28). d. O significado de um tempo de vida também se aplica às gerações e até mesmo à exis tência de uma nação como um todo (cf. Êx 32.13; 40.15; Js 4.7, etc.). Em outras passagens, o significado “para sempre” tem como paralelo a expressão “para mil gerações” (1 Cr 16.15; cf. Is 13.20). Guhrt comenta corretamente que, mesmo nesses contextos e em outros semelhantes, o significado de ‘ôlãm não é uma questão de uma eternidade concebida em termos abstratos e infinitos, mas da vida de uma pessoa em relação a Deus (NIDNTT, 3:828). e. As promessas de Deus, que são estabelecidas para sempre, continuavam ligadas ao próprio ponto de referência e não são, portanto, automática, eterna e irrevogavelmente válidas. Essas promessas pressupõem como condição um relacionamento vivo com Deus em termos das obrigações da aliança. Pelo fato de terem desprezado o Senhor, Eli e sua casa não desfrutariam a promessa de Deus de um ministério que duraria “perpetuamente” (ISm 2.30; 3.13-14). O termo ‘ôlãm só mantém seu significado básico de uma duração completa em relação ao Deus vivo. Nesse sentido, é verdade que, pelo fato de Deus viver e de ser, ele próprio, etemo, seus atos, promessas e salvação também são eternos (Is 45.17; 55.3), e seus preceitos são incontes táveis (Êx 12.14-16; 27.21) (cf. Guhrt, NIDNTT, 3:828). f. Isso explica por que se pode encontrar ‘ôlãm sendo usado não apenas para designar um tempo subseqüente e futuro (Gn 13.15; Êx 14.13; Dt 13.16; 23.3; 29.29; Js 8.28; Mq 4.7), mas também a antigüidade remota (Gn 6.4; Dt 32.7; Mq 5.2[ 1]). Todo o tempo está relacionado à atuação do Deus vivo na história (JI 2.1-11) (cf. Guhrt, NIDNTT, 3:828). 1248
Teofania, Teologia da
P-B Em documentos como a LQ e as fontes da Mix., pode-se observar várias mudanças im portantes no uso dos termos. Em Qumran, 'êt continua sendo usado muitas vezes para tempo. No entanto, para fases dentro da periodização divina das épocas históricas, o termo qêij tomouse, de fato, mais comum. Em alguns casos, qê$ pode significar um momento e não um período extenso, como “no tempo da visitação” (CD 19.10-11). mô ‘êd continua sendo usado para um “tempo determinado”, especialmente em passagens teológicas sobre tempos designados para algo e estabelecidos por Deus. Nas formas de uso da LR, o lugar de ‘êt como termo comum para tempo foi, em gran de parte, tomado por zeman, que é muito mais freqüente na Mixná. Assim como em Qumran, qêf é usado para tempos e períodos relacionados aos propósitos divinos e, por vezes, de modo mais explícito, à vinda do Messias (cf. Barr, 124-25). 2. Esse sentido de 'ôlãm também pode ser encontrado em escritos apocalípticos m antigos do judaísmo e em papiros de Qumran (p. ex., 1QS 2:1, 3-4, 8 ; 2:15, 17,25; 1QM 4:1, 3, 7-8; 1QH1:3, 7-8). No judaísmo rabínico, foi desenvolvida a teoria das duas eras e Deus é considerado Senhor sobre ambas, ha 'ôlãm hazzeh, esta era, com seu pecado e dor, um dia será substituída por ha 'ôlãm hahbã ’, a era vindoura, que consistirá de uma nova terra onde a justiça prevalecerá (cf. 2Pe 3.13). Tempo: -> obêd (desde então, # 7); -> 'õpen (o tempo certo, # 698); gil I (uma etapa da vida, # 1636); zmn (ser nomeado, # 2374); ‘ôlãm (um longo tempo ou duração, # 6409); -> 'êt (tempo, # 6961); p a ‘am (pé, passo, tempo, # 7193); -> p e ta ‘ (instante, # 7353); tãmid (prosseguimento, continuidade, oferta regular, # 9458). B ib l io g r a f ia
NIDNTT 3:826-49; 77^12:370-85; TWAT 5:1066-74, 1144-59, 6:463-82; J. Barr, Biblical Words fo r Time, 1969; M. A. Beek, “Zeit, Zeiten und eine halbe Zeit”, in Studia Biblica et Semitica, Th. C. Vriezen dedicata, 1966; S. J. De Vries, Yesterday, Today and Tomorrow: Time and History in the Old Testament, 1975; J. Muilenburg, “The Biblical View o f Time”, in HTS 54, 1961, 225-71; J. M. Spier, Tijden Eeuwigheid, 1953. P. A. Verhoef Tenda
# 185 ( 'ôhel, tenda, aquele que habita em tendas)
Uma teofania é uma verdadeira manifestação da pre sença de Deus, ou seja, uma aparição de Deus. A palavra teofania deriva de um termo composto G, theophaneia, formado pelo subs. theos, deus e o vb. phainõ, aparecer. O original G era usado para descrever um festival em Delfos, no qual as ima gens dos deuses eram apresentadas para o povo (H. G. Liddell e R. Scott, A Greek-English Lexicon, 1974,315). Falta ao heb. um tradução equivalente exata, sendo o termo mais próximo o vb. r'h, ver, no ni., com o significado de “aparecer”. As teofanias bíblicas possuem várias características em comum, entre elas: iniciativa divina, caráter temporário, um advento de sal vação/julgamento, concessão de santidade, simultaneidade de revelação e ocultação, evocação do temor humano, ocasião de sublevações naturais, escatologia adumbrada e revelação verbal (cf. J. K. Kuntz, The S e lf Revelation o f God, 31 -46; Niehaus, 1995, 20-30). 1. Iniciativa divina. Todas as teofanias de Javé são iniciadas por ele. Isso representa contraste com outras práticas religiosas do OMA, que podiam envolver esforços estrênuos para Teofania, Teologia da
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Teofania, Teologia da
a evocação da divindade desejada. Um bom exemplo é a série de tentativas inúteis dos 450 pro fetas de forçarem a manifestação de Baal no monte Carmelo (1 Rs 18.16-29). Javé “aparecia” (r ’h [ni.]), muitas vezes, no AT, mas, em absolutamente nenhuma ocasião, o esforço humano o “levou a aparecer” (hi.). 2. Temporalidade. A aparição de Javé numa teofania é temporária. Esse fato não con tradiz a onipresença de Deus, que é claramente asseverada em passagens como: “Para onde me ausentarei do teu Espírito? Para onde fugirei da tua face?” (SI 139.7, cf. vv.8-10). Antes, dis tingue as teofanias da revelação contínua de Deus em toda a natureza (cf. Robinson). O caráter temporário está relacionado ao propósito de uma teofania: Deus aparece com um propósito, cumpre esse propósito e depois desaparece. 3. Salvação ejulgamento. Deus muitas vezes aparece para salvar. A revelação divina de si mesmo no AT diz respeito à Heilsgeshichte (história da salvação), que por sua vez, implica uma teofania. Moisés, por exemplo, relaciona as duas idéias quando lembra Israel que Javé se revelou em feitos poderosos no Egito e falou-lhe do meio do fogo no Sinai para salvar seu povo (Dt 4.33-35; cf. Jo 20.30-31). Porém, a mesma aparição gloriosa que traz salvação tam bém pode trazer julgamento. Essa revelação divina de si mesmo, que salvou Israel, por exem plo, levou julgamento sobre Faraó e os deuses do Egito (cf. J. J. Davis, Moses and the God o f Egypt, 1971). Da mesma forma, no NT, a teofania escatológica gloriosa de Cristo, que salva os eleitos, também representará julgamento para os incrédulos (2Ts 1.9-10). 4. Concessão de santidade. Um outro fato aparece nas teofanias bíblicas: Deus é santo e confere santidade onde quer que apareça e enquanto estiver presente (cf. von Rad, 1961,1:272). Javé adverte Moisés, por exemplo, de que Moisés está em “terra santa” (Êx 3.5). Enquanto Javé se encontrar naquele lugar, a terra é santa pois a presença dele a santifica. Posteriormente, a santidade do Senhor é um atributo transmitido ao seu mensageiro, o príncipe do exército de Javé, que também adverte Josué: “Descalça as sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é santo” (Js 5.15). A santidade de Javé também consagra a Tenda da Congregação (Êx 29.4243) e o templo de Salomão (1 Rs 9.3). No entanto, a santidade de Deus não permanece depois que ele parte (Ezequiel 10), como também não prende Deus ao lugar (Jr 7.9-15). É a presença de Deus que toma o lugar santo — mas apenas enquanto o Senhor estiver ali. 5. Revelação e ocultação. Uma teofania de Javé não é espiritualmente neutra. Pelo fato de Deus ser santo, sua aparição aos homens traz consigo julgamento. Por causa de sua santida de, uma revelação plena da glória de Deus seria insuportável (cf. Êx 20.19; Dt 18.16). Assim, quando Javé se revela, ele também se oculta. A revelação pode ocorrer como lampejos de gló ria, semelhantes a relâmpagos e fogo. A ocultação pode tomar a forma de uma nuvem densa e escura. Exemplos desse tipo de teofania ocorrem no Éden depois que Adão e Eva pecaram (Gn 3.8; cf. J. Niehaus, “ In the Wind of the Storm: Another Look at Genesis III 8 ”), no Sinai (Êxo do 19), no tempo em que o povo vagou pelo deserto (40.34-38), na consagração do templo de Salomão (1 Rs 8.10-11), na visão inicial de Ezequiel (Ezequiel 1) e, no NT, na Transfiguração (Mt 17.18) e em caráter escatológico (26.64). 6 . O temor humano. Outro aspecto das teofanias de Javé intimamente relacionado à santidade dele é a reação dos mortais. Na Bíblia, a reação humana típica à teofania é de medo: “Moisés escondeu o rosto, porque temeu olhar para Deus” (Êx 3.6); Israel “[temeu] o fogo e não [subiu] ao monte” (Dt 5.5); Elias “envolveu o rosto no seu manto” na presença de Deus (lR s 19.13). Ver ainda as reações de medo de Isaías, Ezequiel e Pedro, Tiago e João (Is 6.5; Ez 1.28; Mt 17.6). Pode-se tratar de um mysterium tremendum (cf. Eichrodt, TOT 2:269), mas não é apenas o mistério ou o poder que assusta os mortais na presença de Javé — é a santidade de Deus (Vriezen,135). A santidade de Deus julga automaticamente os homens decaídos, de 1250
Teofania, Teologia da
modo que ninguém pode contemplar a face de Deus e viver (cf. Êx 33.18-23). Aos homens, só resta reagir com reverência e temor, não por causa de sua humanidade, mas por sua natureza decaída, mesmo na presença do Deus que os salva. 7. Sublevação natural. Os homens não são os únicos a reagir quando Deus aparece: a natureza também sofre perturbações (cf. Jeremias, 7). Talvez o melhor exemplo seja o encontro de Elias com Deus no monte Horebe (Sinai): quando Javé passa pela caverna onde Elias se en contra, um vento fortíssimo rasga a montanha, um terremoto despedaça as pedras perante Javé e, depois do terremoto, vem o fogo. Todos esses fenômenos, assim como o tremor do Sinai quando Javé desceu sobre o monte em forma de fogo e nuvem escura (Êx 19.18), são manifestações da sublevação natural causada pela aparição de Javé. É possível que algumas outras descrições de perturbações naturais na aparição de Deus sejam puramente literárias — p. ex.. Juizes 5.4, que relembra de forma poética a aparição de Deus no Sinai; Salmo 18.7-9, que retrata a o salva mento antevisto do suplicante como uma teofania de tempestade; e Miquéiasl .4, que descreve a natureza se desintegrando quando Javé chega para julgar Israel. No entanto, várias passagens mostram perturbações atmosféricas que acompanham a teofania propriamente dita. 8 . Escatologia adumbrada. Outro fato referente às teofanias gloriosas de Javé é que antevêem a volta escatológica dele. A maneira como Deus se revelou no Sinai, por exemplo, prenuncia como será sua aparição no dia em que “castigará, no céu, as hostes celestes, e os reis da terra, na terra” (Is 24.21; cf. 24.17-23). Assim como o Senhor desceu nas nuvens com grande poder e glória para entregar a Lei (Êxodo 19— 20), também virá para julgar aqueles que transgrediram essa Lei (cf. Mt 26.64; Rm 2.5-11). 9. Palavras teofánicas. Quando Deus aparece como Salvador ou Juiz, não permanece calado. Como disse um estudioso, “Deus aparece com o propósito de falar” (cf. Burrows, 28). As palavras de Deus são uma parte essencial da teofania em todas as suas ocorrências. O pro nunciamento divino é de suma importância, pois, sem ele, o fenômeno da teofania permaneceria inexplicado. Quando, por exemplo, Javé revelou-se a Abraão numa teofania flamejante, explicou que estava lá para fazer uma aliança com ele (Gn 15.17-21). Quando Javé apareceu a Moisés, explicou que o enviaria a fim de conduzir o povo para fora do Egito (Êx 3.1-10). Quando Javé apareceu a Isaías (Isaías 6 ) e Ezequiel (Ezequiel 1), ele o fez para ordená-los como profetas com o intuito de transmitir o pleito de Deus, segundo sua aliança, contra um povo rebelde. O elemento visual de todas essas teofanias era importante e até mesmo atemorizante. Mas o cerne da questão em cada um dos casos era o que Javé tinha a dizer. Os escritores bíblicos de diferentes épocas e lugares retrataram as teofanias de Javé de maneiras semelhantes. Por vezes. Deus aparecia como o “Anjo do Senhor” (Gn 16.7-14; Êx 3.2-6), como o “Anjo de Deus” (Gn 31.11-13; Êx 14.19-24) e, em outras ocasiões, como um homem (Gênesis 18; 32.22-30; cf. Niehaus,1995, 19). É provável que essas passagens devam ser consideradas em termos teológicos como manifestações pré-encamadas da segunda pessoa da Trindade (cf. D. Kidner, Genesis, 1967, 33-34). Na maioria das vezes, porém, Deus apare cia em glória e suas teofanias possuíam as características mencionadas acima. De acordo com o testemunho bíblico, assim como Deus apareceu em glória no AT, também aparecerá no fim dos tempos (Isaías 24; Apocalipse 19—22) para julgar os vivos e os mortos e para ser admirado por aqueles que nele crêem. B ib l io g r a f ia
M. Burrow,/í« Outline o f Biblical Theology, 1946; W. Eichrodt, TOT2, 1967; J. Jeremias, Theophanie: Die Geschichte einer alttestamentlichen Gattung, WMANT, 1965; J. Lust, “A Gentle Breeze or a Roaring Thunderous Sound?” V T 25, 1975, 110-15; J. J. Niehaus, “ln the Wind of 1251
Teologia deuteronômica/deuteronomista
the Storm: Another Look at Genesis 111 8 ”, VT44,1994,263-67; idem; G odat Sinai: Covenant and Theophany in lhe Bible and Ancient Near East, SOTBT, 1995; G. von Rad, 07T; H. W. Robinson, Inspiralion and Revelation in the Old Testament, 1946; Th. C. Vriezen, An Outline o f Old Testament Theology, 1958. Jeffrey J. Niehaus
1. logia deuteronômica” não dever ser equi parada à teologia do Deuteronômio. Antes, pode ser definida mais amplamente como um agru pamento de tendências e temas teológicos associados a esse livro, mas que também ocorrem em outras obras da literatura relacionada a ele. Ficará evidente de imediato que a idéia de uma “teologia deuteronômica” está ligada ao estudo das origens e à história do desenvolvimento de uma boa parte da literatura do AT. Isso torna-se aparente na hesitação, já no título deste artigo, entre os termos “deuteronômico” e “deuteronomista” (sendo que o primeiro refere-se estrita mente ao proto-Deuteronômio e o segundo à literatura considerada posterior e amplamente dependente dele — mesmo que esses dois termos não sejam sempre distinguidos claramente; ver mais abaixo). A idéia de uma tendência “deuteronômica” dentro da teologia do AT tem um longo histórico nos estudos acadêmicos. Quando Wellhausen estabeleceu proto-Deuteronômio (a forma original hipotética do livro) como um ponto central na história religiosa de Israel, isso acarretou num movimento teológico distinto. Ao centralizar o culto em Israel, refletido, a seu ver, nas leis de Deuteronômio 12— 18 (Wellhausen, 17-38), esse movimento passou a protestar contra a lassidão passada nas práticas religiosas. Por um lado, esse movimento deuteronômico mostrou-se distinto em seu interesse pela literatura sacerdotal que Wellhausen encontrou em partes de Gênesis-Números e que assumiu o controle da religião central bem mais adiante. No entanto, o proto-Deuteronômio de Wellhausen não marcava para ele o ponto final da teologia deuteronômica, pois ele considerava que partes do livro foram redigidas depois de Josias, no mínimo até o tempo do exílio. Essa idéia de um desenvolvimento teológico dentro de uma tra dição foi crucial para as tentativas de articular-se a teologia deuteronômica. O conceito de um movimento deuteronômico, definido em termos mais amplos encontrase, portanto, numa vasta gama literária do AT. E o caso do comentário de B. Duhm sobre o livro de Jeremias. Esse estudo que marcou época atribuía aquilo que ele considerava material não autêntico em Jeremias a uma edição deuteronômica (Duhm, XI-XIII). Duhm foi seguido pela tese de grande influência de Mowinckel (31 ss.). Desde então, é uma idéia amplamente aceita que os livros proféticos de modo geral passaram por uma expansão e edição deuteronomista (p. ex., Wolff, Joel and Amos, 112-13). Para os estudiosos, a grande dificuldade tem sido definir-se o caráter da teologia deu teronômica. Essa questão teológica encontra-se inseparavelmente associada a outras questões literárias e históricas. Uma vez que o proto-Deuteronômio de Wellshausen consistia do códi go legal (Deuteronômio 12—26), seguia-se que Deuteronômio era essencialmente de caráter legal. Outros, pelo contrário, acreditavam que a idéia do amor ou “graça” de Deus predomi nava sobre a lei. No caso de von Rad, isso era ligado à sua idéia de que a lei da centralização (Dt 12.5, etc.) não era parte original do código, mas que havia surgido num contexto pactuai do Norte, antes da reforma de Josias e separado dela (von Rad, “The Form-Critical Problem”; também Studies, 14). Von Rad via na edição de Deuteronômio uma “deterioração da graça para a lei” (von Rad, “Promised Land,” 91). Outros resistiram à idéia de que esses pólos represen Teologia deuteronômica/deuteronomista
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Teologia deuteronômica/deuteronomista
tam tendências teológicas conflitantes, considerando-os, antes, dentro de uma tensão criativa (Nicholson, Deuteronomy and Tradition, 40-44). De fato, a lei e a graça representam uma das polaridades importantes na discussão da teologia de Deuteronômio e na literatura correlata, ainda que não seja, de modo algum, o único desses antagonismos. Outra questão igualmente importante é a relação de Deuteronômio com as tradições teológicas mais essenciais de Israel e, em especial, a concepção da natureza de Israel e a base para seu direito de posse da terra prometida (ver mais abaixo). 2. Teologia deuteronômica e história deuteronômica. A discussão moderna dess questões ocorre no contexto das teorias de redação e interpretação da história deuteronômica (ou deuteronomista; HDt) como um todo. O ponto de referência universal para essa discussão é a tese de M. Noth (The Deuteronomistic History) de que a coleção completa de obras que constituem Deuteronômio, Josué, Juizes, 1 e 2 Samuel e 1 e 2 Reis foi redigida por um único autor que viveu no período após o exílio. Esse autor sujeitou todos os materiais das fontes que usou ao seu conceito abrangente, a saber, que o exílio de Israel e Judá havia ocorrido por cau sa da transgressão cometida por eles da antiga aliança. O tom teológico predominante da HDt é, portanto, de julgamento. A tese de Noth marcou uma nova era no estudo de Deuteronômio, mais em decorrência de uma abordagem ampla do que pela tese em particular. (Trata-se de uma abordagem histórico-tradicional, na qual uma busca por um proto-Deuteronômio deu lugar a um enfoque no desenvolvimento e diálogo dentro da tradição contínua.) Seguindo o mesmo caminho de Noth, houve várias tentativas diferentes de se caracterizar a teologia da HDt. Von Rad encontrou uma teologia cheia de esperança e, de fato, messiânica, na HDt, em função da promessa feita a Davi em 2 Samuel 7 e da significativa libertação de Joaquim da prisão (2Rs 25.27-30; Studies, 7491). Apesar do interesse de Noth pelos discursos programáticos da HDt, ele não havia levado 2 Samuel 7 e seu tom mais positivo em consideração. Além disso, H. W. Wolff encontrou uma chave para compreender o conjunto total de obras no tema do arrependimento (“Querigma”). Um fato mais relevante, porém, é que houve um afastamento da idéia de uma interpre tação unitária da HDt. F. M. Cross introduziu a idéia, agora bastante aceita, de uma redação dupla, que atribui uma primeira edição (e maior parte) da obra ao tempo de Josias, acreditando que esta celebrava o restabelecimento da aliança de Davi durante o governo de Josias. Essa edição é sobreposta por outra (do tempo do exílio) que se concentra no julgamento. Assim o Dtr2 de Cross apresenta uma forte semelhança com o autor/compilador único de Noth (27389; cf. Nelson; Lohfink, “Zur neuren Diskussion”). R. Smend, cuja tese foi seguida e levada mais adiante por W. Dietrich e outros, criou um esquema, de acordo com o qual, a partir do exílio, surgiram três edições separadas. Cada uma delas pode ser caracterizada em termos teológicos: DtrG, otimista, partindo do pressupos to de que a conquista da terra é completa; DtrN, legalista (N = “nômico”), no qual a posse da terra é incerta; e DtrP, intermediária entre essas duas edições e de caráter “profético” (Smend; Dietrich; cf. Veijola, Dynastie; Kòningtum). Apesar de considerar estritamente uma redação dupla, que ele encontra e acompanha ao longo de todos os livros da HDt, A. D. H. Mayes não se distancia de Smend em sua concepção desse material, sendo que sua segunda edição evi dencia um maior caráter condicional do que a primeira na compreensão da posse da terra por Israel (Mayes, Story o f Israel, P. ex., 41-43; cf. sua obra Deuteronomy). A tendência tipificada por Smend pressupõe uma tendência mais radical de realizar-se uma revisão interna da tradição do que a escola de Cross e vai muito além do deuteronomista d. basicamente homogêneo de Noth. (Um incentivo importante veio de Minette de Tillesse, que desafiou a homogeneidade do Deuteronômio, afirmando que as variações entre sing. e pl. 1253
Teologia deuteronômica/deutcronomista
no discurso denunciavam a existência do trabalho de dois redatores. No entanto, ver também Weinfeld em TDOT.) Apesar de a escola de Smend fazer asserções sobre o conjunto total de obras, a tendência dela é promover uma investigação detalhada das partes individuais do livro (o ensaio de Smend tomou por base passagens em Josué e Juizes; cf. também Spieckermann. Pode-se argumentar que Smend foi precedido pela tese de A. Jepsen sobre Reis, que postulava três redações no período do exílio e após o mesmo [Quellen]). Em princípio, portanto, a “teologia deuteronômica” pode tomar-se extremamente matiza da e diversa. Aliás, as tendências mais recentes no estudo crítico da literatura deixaram de lado todas as restrições impostas e partiram do pressuposto de que é possível haver um crescimento mais ou menos ilimitado tanto nas elaborações redacionais quanto teológicas, ainda que dentro de determinados parâmetros puramente deuteronòmicos. Assim, M. Rose (95) acreditava que podia esboçar um desenvolvimento dentro da idéia deuteronômica de “exclusividade” saindo de um enfoque do povo para um enfoque no santuário, que podia ser explicado pela perda da unidade nacional depois de Salomão. O estudo realizado por S. Mittmann de Deuteronômio 1.1— 6.3 vai além de Tillesse na identificação de camadas deuteronômicas, aplicando o critério da mudança numérica e, ainda assim, encontrando diferentes níveis redacionais mesmo dentro das seções em que é usado o plural. Em seu estudo, a diferenciação teológica ocorre em gran de parte em termos de ênfase e elaboração. Assim, sua segunda camada (camada secundária) acrescenta à parênese a idéia de medo, expande as cláusulas organizacionais do cap. 1 e, de modo geral, possui um caráter mais parenético (Mittmann, 164-77). Em seus extensos escritos sobre Deuteronômio, N. Lohfínk determinou que o livro foi desenvolvido durante e depois do exílio, e descobriu, por exemplo, uma preocupação em se redefinir a relação do povo com a lei fora da terra (Lohfink, "Huqqim "). L. Perlitt, que busca uma influência deuteronômica mais ampla em todo o Pent. (Bundestheologie) levou a idéia de expansão dentro de Deuteronômio possivelmente mais longe do que qualquer outro estudioso, encontrando em Deuteronômio 1.1-5, por exemplo, cinco complementos do v. Ia (Deuteronomium, 5). Assim, como Lohfink, ele encontrou evidências de que Deuteronômio tratasse de condições diferentes depois da queda do Estado (ou seja, depois de 586 a. C.) e argumentou que a orientação do livro era, fundamen talmente religiosa e não política (sendo que Dt 17.14-20 possui um caráter claramente idealista e desligado das realidades do período monárquico; Perlitt, “Staatsgedanke”). 3. Avaliação. Sem dúvida os estudos modernos têm ressaltado alguns dos importante tópicos teológicos que podem ser, justificadamente, chamados de “deuteronòmicos”. O levan tamento acima observou de passagem os seguintes temas: a graça e a lei, a aliança, a história e o julgamento, a terra e a adoração, a eleição de Israel e sua natureza como entidade política e/ou religiosa. São esses elementos que constituem a teologia deuteronômica. Contudo, esse levantamento também mencionou algumas dificuldades referentes à definição da teologia deuteronômica. Em primeiro lugar, algumas teorias possuem um aspeto “autodeterminante”. A crítica de Lohfink ao uso que Spieckermann faz do paradigma de Smend em seu estudo de 2 Reis 23 é um exemplo pertinente (Lohfink, “Zur neueren Dikussion”, 44). McKane, por sua vez, caracterizou de maneira memorável o método de W. Thiel para se determinar o que é “deuteronômico” em Jeremias como “Cara eu venço, coroa você perde!” (W. McKane, 224). Nesse mesmo sentido, há um forte elemento subjetivo em algumas das diferenças entre as camadas que os estudiosos detectaram (p. ex., o fato de Mittmann ter encontrado uma força parenética mais intensa em sua segunda expansão plural). Além disso, os livros da HDt e, acima de tudo, o Deuteronômio em si, são suscetíveis a interpretações amplamente variadas. A teoria geral adotada por um estudioso exerce grande influência em sua exegese. Um exemplo é a lei do rei (Dt 17.14-20), a qual é compreendida de diversas maneiras: como absolutamente impraticável 1254
Teologia deuteronômica/deuteronomista
(Perlitt) ou como um programa efetivo de governo (p. ex., Weinfeld, Deuteronomic School, 16771). Num certo sentido, encontramos aqui um problema inevitável, mas por vezes, os estudos mostram-se mais confiantes sobre o contexto histórico e literário do que é razoável supor. Por fim, a abordagem histórico-tradicional comum à maioria desses autores e mencionada acima pode obscurecer o caráter individual dos livros da HDt. Este último ponto merece maiores explicações. A tentativa clássica de se descrever a HDt como uma unidade (Noth) é percebida quase que imediatamente como uma abordagem que força a credibilidade por não ser capaz de explicar a diversidade desse amplo conjunto de escritos. Em decorrência disso, nota-se uma crescente tendência a enfatizar as diferenças entre os livros individuais da HDt. Pode-se determinar a origem dessa idéia primeiramente na con vicção bastante difundida de von Rad, de acordo com a qual “[é] difícil pensar-se que a edição dos livros de Juizes e Reis ocorreu como uma única obra” (von Rad, OTT 1, 347). (Podemos lembrar também que von Rad mostrou-se mais disposto do que Noth a reconhecer a tensão entre a promessa dinástica cheia de esperanças feita a Davi [2 Samuel 7] e a ênfase dada ao pecado e julgamento nos livros de Reis.) G. Fohrer negou a existência de uma HDt “como entidade literária única; antes, temos uma série de livros, de Deuteronômio a Reis, cada um deles redigido ou editado de maneira diferente” (Fohrer, 195). Sua idéia encontra repercussão em C. Westermann, que sublinha a importância da tradição oral na formação separada dos li vros, ainda que admita a ocorrência de uma revisão deuteronomista final de todo o conjunto das obras. Por fim, essa tendência recente a enfatizar a individualidade dos livros também tem sido alimentada pelo novo tipo de abordagem literária dos escritos do AT, especialmente das narrativas, cujo interesse no aspecto artístico valoriza em extremo a integridade e a individu alidade. B. Webb, por exemplo, chega precisamente a esse tipo de conclusão em seu estudo sobre o livro de Juizes (211). Uma exposição de Noth e seus detratores modernos mostra o problema essencial de se falar sobre teologia deuteronômica. Isso porque na HDt (para nos atermos somente a esse conjunto de obras), tanto os argumentos em favor da unidade quanto aqueles que favorecem a diversidade são fortes. Ainda que promova a diversidade dos livros, Westermann volta à idéia de uma redação deuteronômica para explicar as simetrias teológicas. 4. Teologia deuteronômica. Talvez a conclusão do que foi dito acima seja que é possív descrever a teologia deuteronômica sem que se faça uma exegese de todo o conjunto de obras de Deuteronômio a Reis! Ainda assim, fica claro que qualquer tentativa de descrevê-la deve tomar como ponto de partida o próprio Livro de Deuteronômio. Mais que depressa, isso levanta a seguinte questão: A obra toda de Deuteronômio pode, francamente, ser considerada “deutero nômica” tendo em vista a concepção que distingue entre um ceme original (deuteronômico) e uma ou mais expansões subseqüentes (deuteronomistas)? Dentre as distinções propostas, pode-se citar: a. uma discrepância entre história e lei; b. distinções crítico-Iiterárias, especialmente entre os discursos no singular e no plural; c. concepções diferentes de aliança e condicionalidade. A primeira destas distinções vem da proposição de Noth de um código legal incorporado à histó ria do livro, mas subestima a relação muito próxima existente entre a história e a parênese no pensamento de Deuteronômio. Vários estudiosos demonstraram a instabilidade do critério de discursos no singular e no plural (Mayes, Deuteronomy, 35-37), apesar de ainda ser emprega do por alguns (p. ex., Rose). E a última distinção levanta inevitavelmente a questão do método na exegese, ou seja, as diferenças de ênfase ou expressão devem ser consideradas indícios de diversidade (Perlitt) ou elementos de um discurso teológico mais aprimorado? Em resumo, as distinções propostas muitas vezes apóiam-se em bases pouco sólidas. Um fato relevante é que M. Weinfeld, ao mesmo tempo em que aceita em princípio vários dos axiomas crítico-literários 1255
Teologia deuteronômica/deuteronomista
tradicionais a respeito do livro, refere-se ao “gênero” deuteronômico de Deuteronômio 1—4 (do período de exílio), observando em particular seu caráter parenético e mostrando outras afi nidades com Deuteronômio 5—28 (Deuteronomy l - l l , 14). (Para um estudo mais completo dessas questões complexas, ver, do mesmo autor, Grace in the End. 15-44). 5. Teologia deuteronômica e Sitz im Leben [contexto vital]. Os motivos assim re cionados justificam em princípio o procedimento de tomar-se o Deuteronômio como ponto de partida para a descrição da teologia deuteronômica. Tal procedimento apresenta seus pró prios problemas, sendo que um dos maiores é determinar um contexto para Israel e Judá. As críticas realizadas acima sobre as principais interpretações do livro sugerem que não é seguro datá-lo no período que vai de Josias ao exílio, mas não chegam a eqüivaler a uma teoria al ternativa. Essa teoria encontra-se prontamente disponível na concepção conservadora de que, afinal, Deuteronômio é essencialmente mosaico e pode ser datado como uma obra do final do segundo milênio a. C. Essa concepção foi e continua sendo discutida em diversos comentários (Craigie, Merril) e deve parte de sua efetividade à descoberta de semelhanças formais consi deráveis entre o livro e tratados do OMA, especialmente tratados hititas do segundo milênio. Também se pode apresentar argumentos que mostram que, pelo menos em Deuteronômio, é bem provável que partes do livro já existissem havia algum tempo no começo do período mo nárquico (cf. McConville, Law and Theology, 44-48, sobre a lei que permitia o abate profano, Dt 12.15-25; Grace, 45-64). No entanto, uma crítica da concepção em voga não confirma de imediato a concep ção tradicional de uma forma que torna desnecessária uma investigação cuidadosa do caráter específico de Deuteronômio. As características do livro que levaram à síntese predominante no último século de interpretação ainda carecem de explicações. E aqui, há dois fatores (que não apontam, necessariamente, para a mesma direção) a serem observados. O primeiro é que as características próprias de Deuteronômio não são, de modo algum, singulares no discurso político-religioso do mundo antigo. Suas preocupações, especialmente com território, defesa e bem-estar material num contexto de aliança com uma divindade e mesmo elementos da lin guagem utilizada são praticamente o padrão em termos de discurso pactuai tanto no primeiro quanto no segundo milênio (Kitchen, 115). Ainda assim, Weinfeld, que tende a enfatizar o pa ralelismo com tratados assírios do primeiro milênio, mostra, com freqüência, analogias muito próximas com os tratados hititas (Weinfeld, Deuteronomy 1-11). Apesar de haver distinções importantes entre os modelos hititas e assírios, também é verdade que existe alguma conti nuidade na tradição de tratados no mundo bíblico. Portanto, Deuteronômio associa-se a um tipo de pensamento e linguagem de caráter universal em seu mundo. Uma das conseqüências disso é, em princípio, possibilitar que o livro tenha sido escrito em várias datas diferentes. Ao mesmo tempo em que os elementos hititas fortalecem a argumentação conservadora a favor de uma data no segundo milênio, deve-se ter o cuidado de não determinar uma data fiando-se somente nos aspectos formais. E, de fato, a característica mais geral (a saber, a universalidade da linguagem deut.), serve de empecilho para uma determinação exata do Sitz im Leben do livro de acordo com esse motivo. Se, por um lado, Deuteronômio possui semelhanças com a literatura do mundo antigo, nossa segunda observação deve ser — conforme defendem os estudiosos — de que se trata, de fato, de uma obra diferente no AT. No contexto do Pent., Deuteronômio é independente em termos de estrutura e original quanto ao estilo. A descrição feita por S. R. Driver do estilo deu teronômico ainda é válida (Driver, Ixxvii-xci). E o caráter independente do livro é um fator relevante na discussão de suas formas. 1256
Teologia deuteronômica/deuteronomista
Além disso, há características deuteronômicas no conteúdo e na teologia. Há muito tempo se reconhece a existência de diferenças entre as leis do Deut. e aquelas que aparecem em outros livros do Pent. (Driver, 168-71, sobre a lei do dízimo, Dt 14.22-29). Conforme ar gumentei em outro texto, as leis de sacrifício têm conhecimento das leis de Êxodo e Números, embora sejam estruturadas de acordo com um conceito, a saber: a realização correta e ampla delas, tanto como uma resposta adequada para Deus como também enquanto função da bênção divina (ver ainda McConville, Law and Theology, 78-87, também sobre o dízimo). Deutero nômio também é independente em sua narrativa do êxodo e na aproximação da terra prometi da (Deuteronômio I—3). Nesse livro, a jornada de Horebe a Moabe é elevada à condição de tema teológico, expressando o fato de que Israel deve encontrar-se novamente com Deus em experiências semelhantes àquelas de Horebe (McConville e Millar; em oposição a Noth, 14, o qual acreditava que os acontecimentos relacionados nessas passagens eram simplesmente de interesse histórico). Assim como nas leis, detalhes presentes em Êxodo e Números são deixa dos de fora em Deuteronômio por causa da forma de argumentação deste livro. Desse modo, Deuteronômio 1.9-18 não faz menção a Jetro (contrastar com Êxodo 18) a fim de concentrarse na meditação da Torá feita por Moisés para o povo. Do mesmo modo, a missão dos espias é apresentada em Deuteronômio como uma iniciativa do povo e, implicitamente, como um exemplo de sua arrogância, enquanto Números 13,1-3 apresenta essa missão como uma ini ciativa de Javé. (-> Deuteronômio: Teologia) É possível conciliar certas diferenças existentes entre Deuteronômio e outras partes do Pentateuco. No entanto, é difícil fazê-lo sem recorrer-se ao propósito ou ênfase de Deuteronô mio. Assim, essas harmonizações não devem partir do pressuposto de que interpretar significa simplesmente investigar os livros em questão em busca de figuras subjacentes, deixando-se de levar em consideração as peculiaridades do texto. 6. Teologia deuteronômica: um esboço, a. Palavra. Tanto Deuteronômio como os liv seguintes constituem uma teologia da relação entre Deus e Israel no contexto de sua história como um todo, desde a promessa aos patriarcas, até o exílio e depois dele. Não é um trata do isolado, mas sim uma aliança que teve como origem as experiências com Deus em meio à vida e à morte. No cerne desse tratado encontra-se o próprio Deus, Javé, o único Deus que exige lealdade exclusiva de seu povo (Dt 6.4). Javé age dessa forma, pois redimiu o povo da escravidão no Egito, revelou-se a ele em Horebe, fez aliança com ele e deu-lhe uma terra que lhe suprirá todas as necessidades. Nesse retrato da revelação de Deus, vê-se uma forte ênfase na palavra divina como forma de articular a necessidade e a possibilidade de uma renovação da aliança a cada geração. b. Presença. Em Deuteronômio, o tema da palavra encontra-se intimamente ligado da presença divina (Dt 4.10) e essa tendência chega a ofuscar a manifestação visível relatada em Êxodo 19; 24.9-11. De acordo com uma concepção bastante aceita, por uma questão de princípios, Deuteronômio se opõe à idéia de presença efetiva de Deus, especialmente no lugar de adoração. Diz-se que isso ocorre por causa da teologia do Nome (von Rad, Studies; Weinfeld, Deuteronomic School). A mesma idéia também é encontrada em partes da HDt (esp. 1Rs 8.27-30). Nesse sentido, a literatura deuteronômica é retratada como ideologicamente oposta a “P”, que enfatiza a presença real de Deus no santuário (Êx 25.22). Diz-se que a rejeição do conceito da presença de Deus no santuário deriva de uma visão mais espiritual de Deus do que aquela encontrada em “P”. No entanto, há provas de que essa situação supostamente contradi tória entre Deuteronômio e “P” é infundada (I. Wilson; cf. Gordon, “Deuteronomic School”). A hesitação de Deuteronômio quanto à presença visível não deixa implícito que Deus não esteja. 1257
Teologia deuteronômica/deuteronomista
de fato, presente (observe-se o uso freqüente da expressão “perante o Senhor”; Dt 12.7, 12, etc.). Assim, a teologia da palavra não apresenta conflito com a teologia da presença. c. História e eleição. A teologia da palavra também se encontra relacionada a uma forte percepção do passado e do futuro, da interpretação da história encontrada em Deuteronômio. O AT não é o único material do mundo antigo que possui uma interpretação histórica. Porém, por adotar a doutrina do Deus único — Javé que domina sobre todas as nações e em todo o tempo -, a concepção de história de Deuteronômio constitui uma excelente síntese. É nesse contexto que ele elege Israel, não pelo mérito anterior ou como motivo de glória própria (Dt 7.6), mas a fim de que Israel mantenha a aliança com Deus por uma questão de devoção sin cera (7.9; 10.12), abandonando completamente outros deuses e crenças, começando com uma guerra santa (7.1-5; 12.1-4) e, assim, servindo de testemunha diante das nações (4.6). O Deus único escolhe um só povo para viver perante ele na terra. d. Aliança. O conceito de aliança encontra-se presente por toda a parte, abrangendo os temas da palavra, presença, história e eleição. Em Deuteronômio, relembra o juramento fei to aos patriarcas, com sua ênfase na promessa divina (Dt 1.8; 7), e a aliança em Horebe que ocupa uma posição central nos caps. 4— 5, em que a teologia da palavra é desenvolvida tanto como uma forma da presença de Deus quanto como uma conclamação à fidelidade. Nesse úl timo contexto, o conceito de aliança pode praticamente ser equiparado ao Decálogo (Dt 4.13). Porém, na teologia deuteronômica, mantém-se sempre um equilíbrio entre os elementos de promessa e mandamento. No entanto, a teologia da aliança traz consigo a problemática central de Deuteronômio, a saber, a infidelidade de Israel como uma ameaça profundamente arraigada à possibilidade de atingir os objetivos da aliança (Dt 9.46). A lista de bênçãos e maldições (cap. 28), apresentada de acordo com as convenções de tratados, tende tão fortemente para as maldições que o fracasso de Israel já é mais do que esperado. A esperança do livro encontra-se, por fim, numa transcen dência do pecado e do julgamento, num ato de amor redentor da parte de Javé (Dt 30.1-10). (Para um relato mais completo, ver McConvilee, Grace in the End, 123-44.) e. Josué — Reis. Apesar de apresentarem interesses e características individuais, os livros seguintes revelam os mesmos temas que prevalecem em Deuteronômio. Podem ser descritos como uma história da aliança (Dumbrell). O acontecimento mais importante é a introdução de um rei no cenário da aliança (ISm 8 — 12; 2Sm 7), causando uma mudança irrevogável no relacionamento de Israel com Deus (ver mais abaixo). Contudo, assim como o plano em Deu teronômio, a história mostra-se problemática. i. O livro de Josué (->) concentra-se claramente na guerra travada sob ordens divinas e na posse da terra por direito, uma preocupação que relaciona esse livro com outras obras da literatura militar/ideológica do mundo antigo ao longo de um extenso período (1300-600 a. C.), como demonstrou-o L. Younger. A narrativa segue o modelo de Deuteronômio 2.34; 3.3; 7.1-5 ao retratar a “ordem de destruição total” em ação. Com isso, levanta-se a questão da situação dos povos que continuam a existir junto de Israel, um problema que não é necessariamente resolvido (ver G. Mitchell). Também definem-se os direitos das tribos ao território dentro do contexto de uma Israel unificada e defronta-se com as implicações da exigência de um só cul to (Josué 22). Desse modo, relaciona-se com os temas de Deuteronômio sobre a guerra santa (p. ex., Dt 7.1-5), a unidade de Israel e, obviamente, o culto unificado (Deuteronômio 12). ii. Juizes (-^ ) estuda a relação entre a vontade e a ação de Deus e dos homens, mostrando com clareza a insensatez humana de ignorar que o verdadeiro benefício encontra-se no serviço e na fidelidade à aliança (ver B. Webb). Isso é feito no contexto das questões pré-monárquicas, como a sobrevivência diante da hostilidade de diversos inimigos, inclusive de um que vive no 1258
Teologia deuteronômica/deuteronomista
mesmo território (os filisteus), a natureza da união das tribos (Juizes 5) e a liderança de Israel (Jz 8.22-35; 9). Além disso, repete Deuteronômio de diversas maneiras, a saber, na luta deste último com o paradoxo da exigência de lealdade absoluta a Javé — para um povo que é con siderado incapaz de ser fiel (Dt 9.4-6) — , em seu esforço para alcançar a pureza e em suas reservas com relação à monarquia (Dt 17.14-20; 28.36). iii. Os livros de Samuel (->) também têm como tema predominante o conceito de mo narquia, partindo da dificuldade teológica em tomo da exigência dos israelitas de terem um rei “como o têm todas as nações” (ISm 8.5), prosseguindo com Davi, aquele que Deus escolheu e “um homem que lhe agrada” (ISm 13.14) até a inclusão da monarquia na relação de aliança (Vannoy). Esses livros declaram firmemente que a dinastia de Davi foi iniciada por Deus (2Sm 23.5). No entanto, a fragilidade humana de Davi também é ressaltada, servindo como um aviso e fazendo lembrar a concepção de Deuteronômio de acordo com a qual o desenrolar da histó ria da aliança não estava destinado a ser tranqüilo. O papel dos profetas como portadores da palavra de Deus começa a adquirir expressão. Dentre eles, o que mais se destaca é Natã (2Sm 7.12), mas Gade também mostra-se importante (ISm 22.5; 2Sm 24.11-19). iv. Por fim, os livros de Reis (->) apresentam o declinio e a queda da monarquia conso lidada por Salomão e, ao mesmo tempo, enfraquecida pela apostasia, um prelúdio do fracasso de Israel e Judá que acabaria em exílio na Assíria e na Babilônia, respectivamente; e, assim, na execução da mais terrível de todas as maldições deuteronômicas contra o povo da aliança (Dt 28.64-68; McConville, “Narrative and Meaning”). Os reis e o povo, co-responsáveis sob a aliança, pecam e caem juntos, tendo recusado obstinadamente a palavra de Deus dita por in termédio dos profetas (2 Reis 17). O tom deuteronômico de esperança aparece de várias formas paralelas na HDt: i. na persistência do tema da graça, mesmo quando Israel encontra-se na situação mais reprovável (Juizes); ii. na promessa messiânica feita a Davi, e que, apesar do fim da narrativa da HDt, é “para sempre” (2Sm 7.13) e iii. na oração do rei Salomão na consagração do templo, na qual ele prevê o exílio do povo e ora pedindo a Javé que sua última palavra seja de compaixão (lRs 8.46-53). A expressão efetiva desses paralelos é variada, sendo que cada livro apresentaos sob as pressões de assuntos específicos (Mc Conville, “ 1 Kings viii 48-63”). B ib l io g r a f ia
P. C. Craigie, Deuteronomy, NICOT, 1976; F. M. Cross, Canaanite Myth and Hebrew Epic, 1973; W. Dietrich, Prophetie und Geschichte, 1972; S. R. Driver, Deuteronomy, ICC, 1895; B. Duhm, Jeremiah, K.HAT, 1901; W. J. Dumbrell, Covenant and Creation, 1984; G. Fohrer, Introduction to the Old Testament, 1970; R. P. Gordon, “Deuteronomy and the Deuteronomic School” (review of Weinfeld), TynBid 25, 1974,113-20; idem, 1 and 2 Samuel, OTG, 1984; A. Jepsen, Die Quellen des Kõnigsbuches, 1953; K. A. Kitchen,Ancient Orient and Old Testament, 1966; N. Lohfink, “Zur neuren Diskussion über 2 Kõn 22-23”, in Das Deuteronomium, 1985, 24-48; idem, “Die ‘Huqqim’ und ‘Mishpatim’ im Buch Deuteronomium und ihre Neubegrenzung durch Dtn. 12:1 ”, Bib 70, 1989, 1-27; A. D. H. Mayes. The Story o f Israel From Settlement to Exile, 1983; idem, Deuteronomy, 1979; J. G. McConville, Law and Theology in Deuteronomy, JSOTSup, 1984; idem, Grace in the End: A Study in Deuteronomic Theology, SOTBT, 1993; idem, “Narrative and Meaning in the Book of Kings”, Bib 70, 1989,31-49; idem, “ 1 King VIII 46-53 and the Deuteronomic Hope”, VT42,1992,67-79; idem and J. G. Millar, Time andPlace in Deuteronomy, JSOTSup, 1994; W. McKane, “Poetry and Prose in the Book of Jeremiah with Special Reference to Jer 3:6-11 and 12:14-17”, SVT, 1980, 220-37; E. Merrill, Deuteronomy, NAC, 1994; J. G. Millar (see McConville); G. Mitchell, Together in the Land: A R eadingof 1259
Tiglate-Pileser
pressões políticas não tardariam a levar Judá a quebrar o acordo que tinha com a Assíria, o que provocou uma invasão das tropas assírias aos territórios de Judá (7.13-25). B ib l io g r a f ia
M. Cogan, A. K. Grayson, “Tiglath-pileser 111", CAH, 3.2,1991,71-85; M. Cogan e H. Tadmor, 11 Kirtgs, AB 11, 1988, 169-94; T. C. Mitchell, “Tiglath-pileser and the Assyrian Threat", in CAH 322-38; A. R. Millard, “Israel and Aram in the Light of Inscriptions”, TynBul 41.2, 1990, 261-75; idem, “Assyrian Royal Names in the Old Testament”, J S S 21,1976,7; H. Tadmor, The Inscriptions o f Tiglath-pileser III: King o f Assyria, 1995. Alan Millard Tijolo -> # 4236 (Ibn II, moldar tijolos) Tio
# 1856 (dôd, tio [paterno])
Tipo -> # 4786 (min, tipo, variedade) Tirania
# 6683 ( ‘mr, tratar de modo tirânico)
Tobias
Apócrifos
Tocha -> # 4365 (lappid, relâmpago, tocha) Toque -> # 5595 (ng ‘, tocar, ferir) Toque (trombetas) -> # 9546 ( t q impelir, impulsionar, tocar trombeta) Torção -> # 7349 (ptl, torcer, lutar, ser esperto, astuto) Torre de vigia
# 4463 (migdãl I, torre, torre de vigia)
Torrente -> # 8673 (sibbõlet II, torrente, ondulação) Tosquia
1605 (gzz, cortar, tosquiar)
Trabalho# 6913 ( 'sh I, fazer, realizar, criar, trabalhar, manter em ordem) Traição
# 953 (bgd, agir de modo desleal, traiçoeiro, pérfido)
Tranqüilidade -> # 9201 (seqef, tranqüilidade) Transbordamento
# 8851 (ífp, lavar, inundar, transbordar)
Transgressão -> # 7321 (p ire b e la r, violar, transgredir) Transitoriedade -> #8120 (rüah, vento, sopro. Espirito) 1262
Transjordânia
Transjordânia037'!.'? [mê'êber le[lay]yardên],áo outro lado do Jordão). Quando a oração “dalém do Jordão” ocorre sem nenhuma outra qualificação, refere-se ao lado oriental do rio Jordão, o “outro lado” para alguém vivendo na Cisjordânia (= a oeste do Jordão). As principais exceções são Deuteronômio 3.20 e 3.25 em que, no discurso de Moisés, a expressão refere-se à Cisjordânia. E estranho que, em Josué 9.1, a pessoa que está falando (Josué) encontra-se na Cisjordânia, mas se refere à esta como “daquém do Jordão”. Normal mente, nos casos em que pode haver confusão, a expressão é modificada com uma direção: L = para leste ou em direção ao nascer do sol; O = em direção ao mar ou ao pôr do sol. Assim, ao contrário do que se costuma afirmar, não existe um padrão simples (nem do que fala nem do escritor). Em Números 35.14, apesar de a pessoa que está falando (Moisés) encontrar-se em Moabe, o heb. traz a expressão “do outro lado”, provavelmente porque ela reflete o ponto de vista do autor (ARA: “deste lado”). 1. Características geográficas. O rio Jordão divide a região em Cisjordânia (O Transjordânia (L). Do mar da Galiléia até o mar Morto, o rio Jordão corre num vale cujo fundo fica bem abaixo do nível do mar. O vale da Fenda (decorrente do movimento de placas conti nentais) propriamente dito estende-se “das fronteiras da Turquia... até o Moçambique” (Baly, 1974,23). As montanhas que se erguem do lado leste do Jordão constituem a extremidade oeste do maciço árabe. As regiões agrícolas formam um declive em direção ao leste até se incorpo rarem ao deserto árabe. O índice pluviométrico nesse planalto é comparável ao das montanhas da Cisjordânia, mas, uma vez que na Cisjordânia as chuvas diminuem sensivelmente do norte para o sul, Hermom e Basã (defronte à Galiléia) têm altos índices pluviométricos, enquanto Edom (ao sul do mar Morto), recebe poucas chuvas. A Transjordânia é dividida em regiões por dois domos, o domo de Gileade e o de Edom (Baly, 1974,82 os chama de “ilhas”). A planície de Basão ao norte é mais baixa do que Gileade (->) e começa ao sul com o uádi Iarmuque (que, estranhamente, não é mencionado nos livros bíblicos e portanto não tem um nome no AT). Basã estende-se até o monte Hermom. A região ao sul de Gileade é conhecida no AT como o Misor (misõr, Dt 3.10; 4.43; etc.). O limite sul do Misor é o Amom (uádi Mujib). Não há nenhuma barreira importante entre Misor e Gileade e o uádi Hesban não forma um canhão (por isso, Omi e Efrat consideraram tudo uma só unidade geográfica, 111-112.). Mas o tipo diferente de terra normalmente significava distinções cul turais e políticas e fazia de Gileade uma unidade independente (para as fronteiras bíblicas da terra, ver Hesbom). A região de planalto a nordeste de Hesbom, especialmente a região dentro da curva do Jaboque, constituía o interior do Estado amonita. A antiga capital Rabate-Amom, atual Amã, “localiza-se na bacia ampla e rasa da região mais alta” do rio Jaboque (Omi e Efrat, 112). A região a oeste de Amom, no vale do Jordão, era conhecida como “campinas de Moabe” (-> Moabe). E lá que se encontra o vau do Jordão para Jericó (Nm 22.1). O planalto continua ao sul do Amom (o interior de Moabe), elevando-se ligeiramente ao aproximar-se de Zerede {uádi Hasi), a fronteira com Edom. Tanto Gileade quanto a terra de Moabe são cortados por canhões profundos, erodidos pelos rios Jaboque e Amom, respec tivamente. A tendência das fronteiras políticas sempre foi de variar entre esses limites claros e as áreas culturais determinadas pelas regiões topográficas, mas normalmente estas últimas mostraram-se mais importantes. Conforme Baly mostra muito bem (1974,86-87; 1963, cap.3), somente Gileade produz com facilidade os três produtos mencionados na Bíblia: cereais, vinho e azeite de oliva. Em vários sentidos, essa região assemelha-se às regiões de plantio da Grécia. Baly conclui que os israelitas “jamais colonizaram nenhuma região onde esses três produtos pudessem ser cultivados Transjordânia
1263
Transjordânia
juntos”. Na verdade, Gileade é basicamente uma extensão dos montes de Samaria, pois a do bra geológica desse local corre no sentido nordeste, sendo cortada pelo vale da Fenda. Assim, fica evidente que Gileade forma uma só área de plantio com Samaria e que o Jordão não é uma barreira para a cultura, como também não o é o Jaboque. Não se pode dizer o mesmo, porém, de Judá (ênfase no vinho em Gn 49.11) e Moabe (ovelhas em 1Rs 3.4). Talvez, por esse motivo, fosse possível no AT chamar de Gileade a região toda da qual Israel tomou posse. O mais comum é que a região do Amom até Hesbom (aproximadamente defronte a Jericó) seja chamada de Misor; o planalto ao sul e norte do Jaboque, de Gileade; e dali para o norte, de Basã. 2. Vicissitudespolíticas. Os assentamentos na Transjordânia seguiram um padrão seme lhante àquele da Cisjordânia. As regiões mais bem regadas do Norte parecem ter sido ocupadas continuamente desde a Alta Idade do Bronze. Nas regiões do Sul (esp. ao sul do Amom) os assentamentos eram bem mais esparsos. Nem mesmo Diborn parece ter sido habitada na Alta Idade do Bronze II. Hesbom não mostra nenhum sinal de ocupação antes do século XII a. C. e, a partir de então, apenas assentamentos secundários até os séculos IX e VIII (Geraty). Na Idade do Ferro, as vilas começaram a adquirir importância cada vez maior e as ci dades, de modo geral, surgem no século VIII. Depois da conquista babilônia, ainda que não imediatamente, a região voltou a ter população esparsa. Ao que parece, cidades como Hesbom tiveram lacunas de assentamento entre 500 e 250 a. C. Qualquer controle que os israelitas porventura exercessem sobre a Transjordânia teve fim em 733 a. C., quando o assírio Tiglate-Pileser III tomou a região e, em seguida, organizou-a como a província de Gal’aza (Gileade), dividindo a antiga região araméia ao Norte em Haurini (colinas de Golã) e Qarnini (Camaim). Não se sabe qual era língua e nem a cultura (tampouco a religião) do povo de Gileade nessa época, mas é possível que os textos de Balaão encontrados em Deir ‘Ala (ao norte do Jaboque) estejam escritos em amonita. Ao sul do Jaboque, ficaram os reinos de Amom (->), Moabe (-^) e Edom (->). De acordo com 2 Reis 10.32-33, Israel controlou a Transjordânia de Basã até o Amom (seu território nominal), até esta ser tomada por Hazael de Damasco. Tudo indica que se trata de um conceito simbólico, uma vez que não há evidência alguma (nem na Bíblia nem em ou tros textos) de que o território por Moabe ao norte do Amom foi retomado. Assim como todos os documentos historiográficos, a Pedra de Moabe (ANET, 320) deve ser considerada com cautela; a história de sua descoberta é obscura. Caso seja confiável, ela confirma a conquista de grande parte de Misor (ver Hesbom) por Israel (mais especificamente, pelo rei Onri) — que tomou essa região de Moabe •— e o relato de que Mesa havia matado os “homens de Gade” que estavam vivendo em Astarote e colocou outros em seu lugar. Assim, a expansão de Israel foi parte de uma expansão do reino de Onri (chamado de bit ju-tim-ri-a em assírio) para o Sul. 3. Aspectos religiosos. A Transjordânia nunca fez parte da terra prometida a Abraão. Não faz parte da “terra de Canaã”, de modo que os povos que ali viviam antes dos Estados con temporâneos de Israel [em termos bíblicos, povos pré-abraâmicos] sempre foram chamados de amorreus e não de cananeus. A apropriação bíblica de grande parte da Transjordânia baseava-se na dádiva de Deus (esp. em D), no direito de conquista (esp. Números) e de ocupação (Juizes 11) (-> Hesbom). Caso Seom e Ogue tivessem dispostos a deixar Israel passar, o povo teria atravessado o rio e não teria tomado a terra da Transjordânia. Em D., a aquisição da terra está dentro dos planos de Deus: Deus “endurecera seu espírito e fizera obstinado o seu coração” (Dt 2.30). Números, porém, não se refere ao papel de Deus no episódio todo com Seom. A narrativa demonstra um certo grau de desconfiança com relação àqueles que ficaram na Transjordânia. Os rubenitas e gaditas vêem que a terra é boa e, assim, pedem-na para si 1264
Tribo
(Números 32). Em função disso, são chamados de “raça de homens pecadores” (32.14) e a ira de Moisés só é aplacada quando os homens prometem seguir com o exército, deixando apenas as mulheres e crianças. Em D, essa terra é dividida por Moisés (Dt 3.12), sem se fazer menção alguma a um conflito, apesar de Moisés ainda ordenar que os guerreiros atravessem o Jordão e lutem na conquista da Cisjordânia. Em D, surge um conflito quando as tribos (do qual fez parte, dessa vez, a meia tribo de Manassés; ver porém Js 22.32-34) constróem um altar na Transjordânia. D salienta que os sacrifícios podem ser realizados em um só lugar e as transgressões desse preceito são conside radas um escândalo. O povo da Transjordânia, porém, ressalta que o Jordão é uma barreira (o que é sentido principalmente por Rúben e Gade, v. 25) e juram que não irão sacrificar no altar, mas sim usá-lo apenas como um memorial. Essa promessa é suficiente para acalmar o resto do povo. A narrativa ressalta a dificuldade envolvida em persuadir o povo do outro lado do Jordão a ir até Jerusalém para realizar todos os sacrifícios. A dificuldade não é apenas de atravessar o Jordão, mas de subir até Jerusalém sem haver praticamente nenhum lugar no caminho que forneça água e alimento. (-> Teologia Deuteronômica / Deuteronomística) B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land o f the Bihle2, 1979; G. W. Ahlstrõm, The History ofAncient Palestine from the Palaeolithic Period to Alexanders Conquest, 1993, 64, 391-420; D. Baly, The Geography o f the Bible, 1974; idem, Geographical Companion to the Bible, 1963; L. T. Geraty, “Heshbon”, NEAEHL, 1993,2:262-30; S. Hart, “Some Preliminary Thoughts on Settlement in Southern Edom”, Levant 18, 1986, 51-58; E. Omi e E. Efrat, Geopraphy o f IsraeTi, 1971; J. A. Sauer, “Syro-Palestinian Archaeology, History and Biblical Studies”, BA 45, 1982, 201-9; H. O. Thompson, “Transjordan”, ABD 6:642-43; T. L. Thompson, “The Late Bronze— Iron Age Transition 8 , The Transjordan”, Early History o f the Israelite People: From the Written and Archaeological Sources, 1992, 293-300. Judith M. Hadley Trapos
# 6080 (sehabôt, trapos)
Tratado
# 1382 (berít, tratado)
Travessia -> # 6296 (br I, passar por/atravessar, vadear) Treinamento -> # 2852 (hnk, treinar, dedicar) Tremor Três
# 7064 (phd 1, tremer, sentir pavor) # 8993 (sãlõs, três)
Trespassar -> # 5918 (nqb, trespassar, perfurar, distinguir, amaldiçoar)
I. Dados lexicais, s bordão; arma; estandarte; instrumento; cetro; meteoro, cometa (?) (-> # 8657); matfeh, subs. bordão, bastão, tribo (-> # 4751). 2. Distribuição. A palavra sêbef é usada 190x no AT; seu significado semântico ger é vara, estandarte, haste, mas em suas formas de uso no AT é traduzida com mais freqüência Tribo
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Tribo
como tribo (c. 140x). Em nove livros do AT, o termo aparece 1Ox ou mais (Deuteronômio [ 18x], Juizes [16x], Ezequiel [16x], Salmos [13x], 1 Crônicas [12x], Isaías [12x], 1 Reis [1 lx],2 Sa muel [10x]), sendo seu uso mais freqüente, porém, no livro de Josué (33x). O termo mafteh serve de sinônimo para sêbet uma vez que pode significar vara, bordão ou tribo (apesar de não abranger todos os sentidos de Sêbet). De suas 251 ocorrências, ma((eh significa tribo em quase 180 delas. Ocorre mais vezes com o significado de tribo em Números (89x), Josué (55x) e 1 Crônicas (23x). Em três casos, esses dois subs. ocorrem como sinônimos no mesmo versículo (Nm 18.2; 36.3; Js 13.29). Também aparecem nas seguintes expressões semelhantes: tribo de Judá, Sêbet yZhúdá (lR s 12.20); mattehy^húdã (Êx 31.2); tribos de Israel, sib fêyisrã ’él (Dt 33.5), maftôt yisrã 'êl (Nm 31.4); tribos dos filhos de Israel, Sibfê ifinê yisrã '/(Js 4.5, 8 ), mattôt bPnêyisrã '/ (Nm 36.9); tribo(s) de teu(s)/nosso(s) pai(s), sêbet 'abikã (Nm 18.2), ma(tôt ’abôtãm (1.16). Este estudo de sêbe(/ma((eh tratará de suas principais formas de uso teológicas, políticas e sociais, aplicadas a cada um das tribos bem como na relação de umas com outras. Conclui remos a discussão com o uso da palavra como vara, estandarte, cetro, haste. Sêbetjmatteh, tribo, foi o grupo fundamental para organização da estrutura social de Is rael, bem como para seus aspectos territoriais, militares e políticos. A identidade tribal de um indivíduo determinava a terra que lhe cabia em Canaã; também era a base para o alistamento militar em tempos de guerra. As tribos eram compostas de vários subconjuntos: mispãhâ, clãs (-> # 5476), bêt- ab, as famílias e o indivíduo (cf. Js 7.16-18; Jz 6.15; 1Sm 10.20-21). As histórias distintas de cada tribo e seus relacionamentos são bastante complexas. Neste estudo, concentrar-nos-emos em questões teológicas relevantes. A palavra sêbet refere-se a qualquer tribo em Israel (Gn 49.16; lRs 8.16), a tribos es pecíficas (Nm 32.33; Dt 10.8; 18.1) ou a todas as tribos do grupo de doze (Êx 28.21; 39.14). É indicativa da organização prescrita para os israelitas quando estivessem acampados (Nm 24.2; Js 7.16). Israel é chamada de “tribos do Senhor” (SI 122.4). O termo é usado para as províncias (nomes) do Egito em Isaías 19.13. Apesar de as tribos de Israel agirem, muitas vezes, de modo independente, todas se mantinham fiéis a uma origem religiosa em comum. Eram, de modo ideal, uma unidade sob Javé. Desde os tempos mais remotos, no Egito e no deserto, havia doze tribos com as quais Javé constituiu toda a casa de Israel (Êx 40.38). 3. Tribos individuais. Várias passagens extensas apresentam considerações teológ importantes sobre as tribos de Israel (Gênesis 49; Números 24; Deuteronômio 33; Juizes 5; cf. Gn 35.23-26; 46.8-25 para listagens das tribos). De acordo com as evidências no Pent., as doze tribos são descendentes dos doze filhos de Jacó e, portanto, parte do cumprimento da promessa de Deus em sua aliança com Abraão de fazer dele uma grande multidão (12.1 -3). As doze tri bos/filhos de Jacó não eram apenas nascidas da carne, mas também — o que é mais importante — eram filhos da promessa. Eram todos abençoados por Javé (Nm 24.1-10). Jacó abençoou seus filhos, cujos descendentes se tomariam as doze tribos (sêbet) de Israel (Gênesis 49). Em síntese, essas bênçãos contêm uma descrição do passado, presente e futuro das doze tribos de Israel, tomando por base o caráter delas e as estipulações de Deus. a. Gênesis 48.1 -22 registra a adoção dos filhos de José, Efraim e Manassés, e a bên de Jacó para eles, apesar de serem filhos de uma mulher egípcia, Asenate, filha do sacerdote egípcio Potífera de Om (Gn 41.45). A fecundidade de Efraim e Manassés tomou-se notória em Israel (48.20). Em sua organização das tribos, Jacó pôs Efraim sobre Manassés, apesar de Manassés ser o filho mais velho. A primazia de Efraim manifestou-se posteriormente na his 1266
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tória de Israel. A eleição de Deus era mais importante do que a descendência biológica. No entanto, o fato de até mesmo essas duas tribos de José terem devastado uma à outra, também se tomou um retrato conhecido dos conflitos destrutivos mais profundos de Israel e de seu dis tanciamento de Javé (Is 9.21 [20]). Em Gênesis 49.22-26, José e, por meio dele, Efraim e Manassés, foram ainda mais abençoados. Eles são retratados como uma vinha com frutos em abundância, tendo como base para a sua prosperidade as palavras da bênção de Deus proferidas por intermédio de Jacó (v. 26). Em Deuteronômio 33.13-17, a bênção de José (Efraim/Manassés) estende-se até a “bene volência daquele [Deus] que apareceu na sarça” (v. 16; cf. Ex 3.2). Era uma bênção apropriada para os descendentes de José, que havia suprido o Egito e as nações vizinhas com alimentos numa época de grande fome (Gn 41.37-57). Em Juizes 5.14, Efraim, possivelmente represen tando Manassés também, é louvado por fornecer os homens que acompanharam Débora para lutar no vale contra o general cananeu Sísera. b. Um espaço apenas ligeiramente menor do que o usado para falar de José é dedicad à tribo de Judá (ver abaixo sobre cetro de Israel/Jacó) em Gênesis 49.8-12. Vários pontos sobre essa tribo (sêbe() importante são dignos de nota. As outras tribos louvariam Judá, enquanto ele dominaria (yãd) sobre seus inimigos. O fato de os irmãos de Judá se curvarem e prestarem ho menagem (v. 8 , ver n. em BHS) a ele sugere um tipo de primazia real de Judá. Em Gênesis, essa primazia é expressada como um acontecimento futuro na vida de Judá ou de algum represen tante dessa tribo. Não é preciso especular-se sobre o significado disso no tempo de Davi ou em nenhum outro tempo no qual Judá desfrutou de importância. Judá é descrito de modo bastante apropriado como um leão vitorioso sobre sua presa (v. 9; cf. Ez 19.5-7). O cetro/a vara (sêbef) não se apartará de Judá nem (em paralelo) aquele que apresenta os estatutos e leis (mehõqêq, cf. “o bastão entre seus pés”, v. 10, Speiser, 362, clava) se afastará do meio dela. A oração 'ad ki-yãbõ ’ em Gênesis 49.10b deu origem a várias traduções. Alguns estu diosos interpretam sylh como um NG que representa uma expansão da influência de Judá para além de suas fronteiras. A expressão “até que venha Siló” se refere a sylh como um sinal do Messias ou uma metonímia do Messias. “Até vir aquele a quem ele [o bastão] pertence” revocaliza sylh para ãellõh (pron. rei. + prep lamed + 3ms sufixos — a quem ou a quem pertence). Uma alternativa provável é a divisão das consoantes em duas palavras, iy Ih, e o reagrupamento delas como say lõh, tributo a ele (até que venha o tributo a ele, Moran, 412) (-^ Siló, para uma análise mais detalhada dessa questão). Essa vinda de tributo e obediência nacional (49.10b) cumpre-se, inicialmente em Deus e, um dia, cumprir-se-á em Cristo. A bênção de Moisés sobre Judá pede a ajuda de Deus ( ‘zr, # 6468) para essa tribo a fim de introduzir (hi. imperfeito de bw ’, ir [# 995]) Judá em seu povo (Dt 33.7). Aqui, a ênfase re cai sobre a necessidade da ajuda do Senhor parà concretizar as bênçãos prometidas em Gênesis 49.8-12. Gênesis 49.7 fala da vinda de Siló (q. imperfeito de bw', ir) ou de alguém vindo a ele. Tomando-se por base Deuteronômio 33.7, fica claro que as realizações de Judá se dão por meio do Senhor e não pelo poder da tribo. Trata-se de duas passagens complementares e não contra ditórias entre si. O conceito de uma prerrogativa real para Judá é reforçado pelo uso paralelo de estrela (kôkãb) e cetro (íêbet), ambos símbolos da autoridade real que virão de Jacó/Israel (Nm 24.17-19). Esse rei virá e destruirá Moabe e Sete, inimigos específicos de Israel, e também Edom e o monte Seir. O cumprimento históricos dessas palavras deu-se no tempo de Davi (2Sm 8.2, 13-14), mas é provável que tal previsão não estivesse limitada àqueles acontecimentos. Números 24.19 traz à memória Gênesis 49.10 e Deuteronômio 33.7. O domínio de Israel se propagaria por intermédio do(s) rei(s) originário(s) de Judá. O cronista mostrou-se interessado, acima de tudo, na linhagem e na tribo de Judá, dando pouca atenção ao reino do Norte. 1267
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Mesmo não se considerando as questões de realeza, Judá era uma tribo eminente. A construção do tabemáculo no deserto foi supervisionada por Bezalel, filho de Uri, filho de Hur, da tribo de Judá, pois o Senhor o encheu com seu Espírito divino (Ex 35.31). Quando as tribos do Norte se separaram do restante de Israel em 93 1 a. C., o reino sobre o qual Roboão gover nou foi chamado de Judá. Malaquias descortina a corrupção da conduta de Judá em relação à aliança do Senhor (Ml 2.11; 3.4), mas também indica a condição restaurada que as ofertas de Judá alcançarão quando o mensageiro de Deus purificar Levi, Judá e Jerusalém (3.4). c. A tribo de Levi (Gn 49.5-7) é condenada com severidade por sua violência contra os siquemitas (Gn 34.25-30). Num longo discurso crítico de retidão moral, Jacó censura a tribo pela ira, insensatez e crueldade demonstradas por ela. Como castigo, Jacó profetiza que ela será dispersa por Israel. Essa profecia se cumpriu quando os levitas receberam o sacerdócio e foram colocados no meio das outras tribos para serv irem de mediadores de paz e reconciliação entre Deus e seu povo. Um total de 48 cidades foram designadas aos levitas, sendo seis delas cidades de refugio ( # 5236). O sumo sacerdote tinha uma papel decisivo na vida daqueles que fugiam para uma dessas cidades (Nm 35.6-8; cf. Lv 25.32-34; Nm 35.1-34; Js 21; 1Cr 6.54-81). Assim, o castigo dos levitas continha uma bênção. Em Êxodo 32.25-29, a “violência” dos levitas é voltada para a direção correta e eles se entregam inteiramente a Javé. Recebem, então, o sacerdócio, tendo Moisés e Arão como membros mais ilustres (Êx28.1-4; 29; Levítico 8 ). Deuteronômio 33.8-11 traça um esboço da transição da tribo de Levi de símbolo de violên cia para um símbolo de paz e mediação em Israel. Apesar de os levitas terem recebido o dom de Deus na forma de sua santa lei e uma missão de instruir e guiar, os sacerdotes se corromperam (Ml 2.4-8). Mas o Senhor enviaria um mensageiro a fim de purificar os filhos de Levi (3.3). No templo ideal de Ezequiel, os levitas recebem propriedades junto dos sacerdotes mais fiéis, descendentes de Zadoque (Ez 48.13,22, 24). d. Rúben, o primogênito de Jacó (com Lia) fez um grande bem ao tentar salvar José (Gn 37.21-22), e um grande mal ao deitar-se com Bila, a concubina de seu pai (35.22). De homem forte que era, passou a fraco e instável (49.3-4). A tribo assentou-se no lado leste do Jordão (Nm 32.1-42). Os rubenitas foram derrotados pelos cananeus ou, pelo menos, ficaram paralisados de medo deles (Jz 5.15-16). Da mesma forma que Dã, Gade e Aser, cm Taanaque no vale de Megido, essa tribo não respondeu à convocação para lutar contra Sísera e seu exército canancu (Jz 5.16-20). Moisés, o homem de Deus, intercedeu pelos rubenitas para que pudessem viver e ser numerosos (Dt 33.6). e. Simeão (Gn 49.5-7) é mencionado juntamente com Levi. Também havia participado da violência contra os siquemitas (cap.34). Com o tempo, Simeão foi assimilado pela tribo de Judá (Js 19.1-9; 1Cr 4.28-33), pois o território dele era próximo ao de Judá e sofria fortes pres sões dos filisteus. A tribo de Simeão não é citada em Deuteronômio 33. No entanto, o nome e os descendentes de Simeão não foram esquecidos (Js 21.9). No templo de Ezequiel, “Simeão [terá] uma porção” (48.24, 33) e 12 mil da tribo de Simeão serão preservados (Ap 7.7). f. Zebulom devia se espalhar de seu território, que inicialmente ficava no interior (Js 19.10-16), e rumar para o litoral do Mediterrâneo, onde teria um porto no mar (Gn 49.13; Dt 33.18). Para alcançar Sidom, a tribo entraria no território de Aser, mas Zebulom é incentivado a alegrar-se com sua expansão até o mar. Tanto Naftali quanto Zebulom foram desprezados pelo Senhor em algum momento, mas, “nos últimos” (ou seja, no futuro), suas terras serão abençoa das e toda a região da Galiléia verá uma grande luz (Is 9.1-2 [8.23—9.1]). O povo de Zebulom recebeu uma menção honrosa por ter se mostrado disposto a entregar a vida para derrotar os 1268
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cananeus e Sísera (Jz 5.18). Zebulom tem uma parte para si no templo novo de Ezequiel (Ez 48.26,33); 12 mil dessa tribo serão preservados (Ap 7.8). g. Issacar — o sexto filho de Lia — e seus descendentes são mencionados rapidamente (Gn 49.14-15; Dt 33.18-19). Fica claro que a tribo de Issacar não estava disposta a expulsar os cananeus e, até certo ponto, tomou-se escrava deles. Os membros dessa tribo contentaram-se em ficar em suas tendas; no entanto, também conseguiram prosperar devido à abundância da terra e do mar e apresentar ofertas legítimas ao seu Deus. O povo de Issacar foi grandemente louvado por sua fidelidade à aliança do Senhor ao acompanhar Débora e Baraque na batalha no vale de Megido (Jz 5.15). A tribo é citada na visão do templo de Ezequiel (48.26, 33); 12 mil serão preservados (Ap 7.7). h. Dã era um dos dois filhos de Bila, a concubina de Jacó. O escritor faz uso de um tro cadilho com o termo heb. para Dã ao declarar: “Dã julgará o seu povo” (dãnyãdm , Gn 49.16). A tribo foi a primeira a assentar-se num território a sudoeste de Jerusalém, perto dos territórios de Judá e Benjamim (Js 19.40-48; Jzl 8.27-29). Apesar de os filisteus manterem essa região sob forte pressão, a situação política não serve de explicação absoluta para o fato de Dã ter perdi do grande parte de suas terras . Uma vez que Dã não conseguiu tomar posse de seu território tribal, a tribo se reassentou na cidade de Lesém/Laís, no extremo Norte (Js 19.47-48; Jzl 8.131). As viagens dos danitas são descritas como os caminhos percorridos pela serpente/víbora (nãhãs / septpõn) junto a uma vereda, perturbando o cavalo e seu cavaleiro. O caráter dos da nitas é ilustrado pela forma traiçoeira como destruíram Laís (Jz 18.27-29); o vigor deles, como o de um filhote de leão (gúr 'arvêh), foi demonstrado no deslocamento que fizeram da região Centro-Sul para a região Norte de Efraim e Naftali (Dt 33.22). Em seu novo assentamento, os danitas envolveram-se com as formas mais ostensivas de idolatria, usando os serviços de Mica, um ievita (Jz 18.18-27). Posteriormente, Jonatâ e seus filhos, descendentes de Moisés, serviram como sacerdotes aos danitas até que Israel fosse levada ao cativeiro (722 a. C.). A tribo foi censurada por demorar-se em seus navios e por não ajudar Israel a lutar contra os cananeus e Sísera (Jz 5.17). Sansão, um danita, serviu como juiz de moral duvidosa sobre Israel e começou a libertar os israelitas dos filisteus e, assim, tomou realidade as palavras segundo as quais Dã seria juiz (Jz 13.2, 5; 16.31). A expressão “desde Dã até Berseba” indica a extensão nacional de Israel de norte a sul (2Sm 3.10; 17.11; 1Rs 4.25). Sem sofrer nenhuma oposição, Jeroboào colocou um de seus bezerros de ouro em Dã (-> Dã) e outro em Betei (lRs 12.29). Amós usou Dã e Berseba (-> Berseba) como exemplos de cidades que representavam até que ponto a idolatria havia cor rompido a terra de Israel. Esses falsos deuses se mostrariam inúteis para Israel (Am 8.13-14). A tribo de Dã é mencionada na visão de Ezequiel do templo novo (Ez 48.1-2), mas não aparece na lista das tribos preservadas no NT, provavelmente devido à relação dela com um histórico de idolatria (Ap 7.4-8). i. A tribo de Gade é mencionada de passagem em Gênesis 49.19 e elogiada por seus atos futuros ao derrotar os amonitas (Juizes 11). No entanto, a tribo é condenada anteriormente como Gileade (Gade) que não prestou socorro a Israel contra os cananeus, mas ficou do lado oriental do Jordão (Jz 5.17). Cada tribo devia se defender, mas o ideal era que cada uma lutasse por toda Israel. Numa ocasião anterior, era o que Gade havia feito quando seu exército ajudou as outras tribos nas primeiras conquistas em Canaã (Nm 32.16-27). As escolhas e atitudes de Gade, tanto no que a tribo adquiriu para si quanto no que fez por toda Israel, são louvadas (Dt 33.20-21). Na visão de Ezequiel de um templo do futuro, Gade tem uma parte para si (48.27— 8, 34). No NT, 12 mil dessa tribo são preservados (Ap 7.5). 1269
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j. A descrição de Aser cita os benefícios da localização da tribo na faixa litorânea do Mediterrâneo além do monte Carmelo até a Fenícia (Gn 49.20; Js 19.24-31). A região possuía uma produção abundante de iguarias reais e alimentos ricos. Aser também seria “Bendito... entre os filhos”, ou seja, seria forte e próspero (Dt 33.24). Era o favorito dentre os irmãos e, dos filhos de Israel, era o mais abençoado em termos de localização e bens materiais. A bênção se reflete no significado de seu nome, “aquele que é feliz (abençoado)” (-> # 887). No que se refere à história, não fica claro quanto tempo Aser manteve controle dessas ricas regiões cos teiras. No entanto, a prosperidade da tribo transformou-se em maldição, pois, quando Débora e Baraque convocaram Israel para lutar contra os cananeus, Aser permaneceu no seu território confortável à beira do mar (Jz 5.17b). A tribo de Aser tem um lugar na visão do templo novo de Ezequiel (48.2-3, 34). É mencionada em Lucas 2.36 e em Apocalipse 7.6, em que 12 mil pessoas da tribo de Aser são preservadas. 1. A tribo de Naftali habitava logo ao sul de Dã e a noroeste do mar da Galiléia (Js 19 39; 20.7). A região ao redor do mar da Galiléia promoveu a liberdade de Naftali, de modo que os membros dessa tribo puderem crescer e prosperar sem opressão (Gn 49.21; cf. Dt 33.23). Teriam posse tanto do lago quanto do Sul (Dt 33.23b). No TM de Gênesis 49.21, é provável que a expressão Naftali é “[como] uma gazela libertada” deva ser seguida em paralelismo por uma tradução “que dá à luz/gera belos corços”. A tradução é difícil (cf. Speiser, 363-67). A tribo é elogiada em Juizes por arriscar a vida a fim de auxiliar toda Israel na luta contra os ca naneus (Jz 5.18b). m. Benjamim, a menor das tribos (SI 68.27 [28]), situava-se entre as tribos de Judá e Efraim, logo ao norte de Judá (Js 18.11-27). É difícil conciliar a descrição da tribo de Benjamim como sendo, ao mesmo tempo, um lobo voraz o dia todo, manhã e tarde (Gn 49.27) e também amada pelo Senhor, descansando em sua proteção. A tribo é louvada por haver lutado por toda Israel contra os cananeus (Jz 5.14). Os benjamitas foram quase exterminados por apoiarem os homens de Gibeá que haviam estuprado e morto a concubina do levita (Jz 20—21). Cerca de 25 mil guerreiros de Benjamim morreram em um só dia (Jz 20.46). Num gesto de graça, as outras tribos decidiram não permitir que Benjamim desaparecesse do meio de Israel (21.1-12). Benjamim mostrou ser o lobo voraz e implacável ao atacar uma concubina desamparada e se recusar a cessar o combate até que tivesse sido praticamente destruída. A tribo de Benjamim foi preservada pela misericórdia de Deus. Saul, o primeiro rei de Israel, era de Benjamim. Aca bou se desqualificando para o reinado ao recolher espólios dos amalequitas e tomá-los para si (ISm 15.10-22) (-» Saul). Quaisquer que sejam os comentários, positivos ou negativos, que se possa fazer sobre cada uma dessas tribos, todas elas são condenadas em Juizes 1—-2 pois, apesar de apenas oito tribos serem mencionadas como aquelas que não conseguiram conquistar seus territórios, o julgamento de Deus de não dar descanso a seu povo se aplica a todas as tribos (2.3). Assim, em função da desobediência de Israel, as outras nações permaneceram na terra com a permis são do Senhor. 4. Modelos de surgimento. Desde a década de 50, vários estudiosos dedicaram atenç considerável à origem de Israel e ao seu aparecimento na terra de Canaã. De acordo com a concepção tradicional, as doze tribos originaram-se dos doze filhos de Jacó e essas doze tribos empreenderam uma vasta conquista de Canaã. Muitos estudiosos, porém, desconsideram essa idéia e dão interpretações divergentes. Esses modelos interpretativos podem ser categorizados como: anfictionia, revolta camponesa e deslocamento populacional (cf. Merrill, 148-52). a. Modelos de anfictionia. A. Alt (175-221) e M. Noth (68-84) afirmam que a conqu ta de Canaã por Israel envolveu uma penetração gradual de pastores nômades não cananeus. 1270
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Esses nômades acabaram reunindo-se em tribos, incorporando diversos povos nativos de Canaã. Essa anfictionia (Noth, 88-109), que desenvolveu uma série de tradições religiosas em comum, centralizou-se, por fim, na adoração a Javé. W. F. Albright (273-89) e J. Bright (12943) argumentam que uma lealdade em comum a Javé serviu inicialmente — e não apenas mais tarde — como base para a união tribal dessa anfictionia. Esses dois estudiosos consideram os níveis de destruição do final do século XIII a. C. indícios do conflito que faz parte dessa con quista (numa escala muito menor do que o modelo de conquista tradicional). Em tempos mais recentes, Weippert (1979,15-34) explicou a conquista tribal de Canaã como resultado de uma infiltração pacífica das tribos. b. Modelos de revolta camponesa. Lançando mão da obra de G. Mendenhall (66-87) e de outros, Gottwald (210-19) argumenta que a confederação israelita se formou como resulta do de uma revolta camponesa organizada contra o Estado cananeu existente, libertando povos nativos oprimidos de seus senhores elitistas. De acordo com Gottwald, a Israel eloísta, aliou-se aos ‘apiru transumantes criadores de animais de Canaã e do Egito a fim de formar Israel, uma confederação que adorava Javé. c. Modelos de deslocamento (retirada pacífica) populacional. Tomando por base dados arqueológicos, informações encontradas em inscrições egípcias e fatores sócio-ambientais mo dernos, vários estudiosos (Coote, Whitelam, Halpem, Lemche e Finkelstein) reconstituíram o surgimento de Israel de acordo com padrões socioeconômicos. A sugestão desses estudiosos é que diversos fatores ambientais levaram um grande número de povos das planícies e dos vales a se mudar para os montes cananeus. Não houve conquista alguma dos montes cananeus por povos de fora. Antes, os israelitas emergentes mativeram uma relação simbiótica com os na tivos cananeus até o declínio das cidades-Estados cananéias (c. 1200 a. C.). Depois disso, os israelitas e filisteus assentaram-se em territórios que haviam pertencido aos nativos de Canaã (Fritz, 97-99). De acordo com Coote (1990, 6 ), “até o momento, nenhum autor está em condi ções de afirmar ter algum conhecimento preciso sobre a origem de Israel”. A maioria dos proponentes desses três modelos rejeita a historicidade ou confiabili dade do relato de Josué sobre a conquista de Canaã por Israel e a divisão das terras cananéias entre as tribos. 5. Outros significados, a. A palavra sêbef também descreve uma vareta usada para re lizar tarefas diárias, como sacudir sementes de cominho (Is 28.27b). Por vezes, o termo indica uma arma (2Sm 18.14) ou, metaforicamente, a correção ou castigo executado por Deus (Jó 37.13). Isaías descreve o rebento de Jessé, o Rei messiânico, ferindo a terra (hikkãh- ’eres) com a sêbef de sua boca (piw), ou seja, a palavra de sua boca = S b f(Is 11.4). b. O termo Sêbef refere-se ao bordão do pastor, sob o qual as ovelhas passavam à medid que eram contadas (SI 23.4; Mq 7.14). A vara de autoridade do educador (2Sm 7.14; SI 89.32 [33]; Pv 13.24) era conhecida como Jêèef, bem como aquele que a usava. Assim, não foi difícil a palavra passar a representar, por si mesma, a autoridade ou poder daquele que estava no co mando. O cetro/vara do rei é um cetro/vara de justiça/retidão, e Sêbef miSõr Sêbef malkútekã no Salmo 45 simboliza o governo do rei justo sobre Israel (45.6 [7]). Trata-se de um cetro eterno ( 'ôlãm wã 'ed). O cetro/vara de iniqüidade (Sêbef hãreSa') em 125.3, pelo contrário, é temporal, pois não permanecerá (lô 'yãnúah) sobre os que são justos. A palavra Sêbef tem um significado particular na declaração de Balaão sobre o futu ro (Nm 24.17). O termo Sêbef é paralelo a rrfihõqêq na segunda metade da primeira linha. “Uma estrela” (kôkãb) e “um cetro/vara” também se encontram em posição paralela; ambos são sinais de realeza e autoridade, no céu e na terra, respectivamente. O cetro deve, sem dú vida, ser associado ao cetro que se erguerá de Judá (Gn 49.10), provavelmente o rei Davi de 1271
Tribo
Judá (2Sm 2.13-14), mas não limitado somente a ele. A LXX traduz sêbet como “um homem” (anthrõpos), enquanto o siríaco usa tys, cabeça ou líder (Nm 24.17). Uma versão incorreta da Vg. traz virga, uma virgem. Dentre as sugestões recentes para a tradução de sêbet em Núme ros 24.17 pode-se citar meteoro, cometa e tribo (Albright, 207-50; Gemser, 301 -2). É provável que a ocorrência do termo em Ezequiel 21.10 [15] seja um acréscimo equivocado ao texto. O Targum traz m lk', rei, para kôkãb, estrela, enquanto a LXX, Sir. e Vg. dizem brilhará/surgirá do Oriente (cf. heb. zrh, brilhar [do Oriente]). Por fim, o Targum usa msyh ’, Messias, no lugar de sêbet. e, assim, apresenta “Um rei virá de Jacó, e o Messias surgirá de Israel”, salientando desse modo a autoridade real de Judá e seu futuro rei messiânico. P-B A LXX usa as seguintes palavras para sêbet'. 1. phylê (119x), tribo, doze; 2. rhabdos (28x), vara, bordão, cetro; 3. skêptron (17x), cetro, bordão. Outras doze palavras diferentes são usadas de 1 a 7x. Esse termo repete-se nos MMM cerca de 30x; o uso deles corresponde àquele do AT (TWAT 7:973). Gênesis 49.10 é interpretado messianicamente com referência ao rebento de Davi (4 QPB). A passagem citada com mais freqüência é Números 24.17. O cetro (sêbef) se refere: 1. ao Príncipe de toda a comunidade (CD 7:19-20) e 2. à comunidade exaltada propriamente dita (lQSb5:23-27). A esperança messiânica em Qumran estava num processo de cumprimento. NT No NT, a palavra phylê é encontrada na descrição dos 12 mil preservados de cada tribo, com exceção de Dã (Ap 7.4-8). A tribo mencionada com mais freqüência no NT é Judá. Jesus é da tribo de Judá (o Leão da tribo de Judá. Mt 1; 2; Lc 1.69;Hb7.14;Ap5.5). Belém, aquela que “não [é] de modo algum a menor” entre as principais de Judá, também é citada (Mt 2.6), pois foi lá que Cristo nasceu. A tribo de Levi é mencionada a fim de determinar a superioridade do sacerdócio de Cristo segun do a ordem de Melquisedeque (Hb 7.4-10). Um dos doze discípulos era um homem chamado Levi (Mc 2.14; Lc 5.27-29). Zebulom e Naftali são citadas em Mateus 4.13-16 (cf. Is 9.1-2 [8.23—9.1]) como lugares da Galiléia onde brilha a luz da salvação de Deus. A tribo de Aser também é mencionada (Lc 2.36). O apóstolo Paulo era da tribo de Benjamim (Fp 3.5). A palavra phylê é usada em Apocalipse 1.7; 5.9; 7.9; 11.9; 13.7; 14.6. Mateus descre ve todas as tribos (jhay phylai) se lamentando quando vêem o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu (Mt 24.30). O termo dõdekaphylõn refere-se às doze tribos que, de acordo com Paulo, almejam alcançar a esperança pela qual o apóstolo está sendo julgado (At 26.6-7). Família, parente, cidadão: -> ’ãb (pai, # 3); -> 'ah II (irmão, parente [homem da mesma fa mília], parente, compatriota, # 278), ’êm (mãe, # 562); -> bên I (filho, neto, membro de um grupo, # 1201); -> bat I (filha, neta, # 1426); dôd (tio, # 1856); hãm I (sogro, # 2767); -> htn (tomar-se parente em razão de casamento, tomar-se genro, #3161); -> mõdã ‘ (parente [homem da mesma família], parente, # 4530); -> mispãhâ (clã, classe, # 5476); -> am I (ci dadão, parente [homem da mesma família], parente, # 6638); ribbèa' (membro da quarta geração, # 8067); sillês (membro da sexta geração, # 9000) Casa, habitação, tabemáculo: bayit I (casa, habitação, construção, família, dinastia, # 1074); ysb (habitar, # 3782); mã 'ôn II (recanto, habitação, # 5061); nwh I (descanso, # 5657); skn (assentar-se, # 8905) Nação, povo: adãm (Adão, povo, # 132); Nação: Teologia Vara, bordão, bastão: -> hõter (vara, rebento, # 2643); rnôlá (jugo, vara para carregar far dos, #4574); -> ma(feh (bordão, vara, cetro, tribo, #4751); mãnôr (vara, # 4962); -> maqqêl (vara, galho, bordão, # 5234); -> sêbet (tribo, bastão, vara, amia, cetro, # 8657) 1272
Tribo
Tribo: -> degel (divisão tribal; estandarte(s), pendão, # 1840); -> matfeh (bordão, vara, cetro, tribo, # 4751); -> sêbet (tribo, bastão, vara, arma, cetro, # 8657) B ib l io g r a f ia
IDB 4:698-710; ISBE 4:904-13; TWAT7:966-74; ZPEB 4:813-20; W. Albright, From the Stone Age to Christianity, 1957; idem, “The Oracles o f Balaam”, JBL 63, 1944, 207-53; A. Alt, Essays on Old Testament Histor)’ and Religion, 1968; A. Brenner, “Matteh and sêbeb Semantically”, Les 44, 1979/80, 100-108; J. Bright, History o f Israel, 3d ed., 1981; R. Coote, Early: A New Horizon, 1990; R. Coote e K. Whitelam, The Emergence o f Early Israel in Historical Perspective, 1987; R Graigie, Deuteronomy, N1COT, 1976; I. Finkelstein, The Archaeology o f the Israelite Settlement, 1988; V. Fritz, “Conquest or Settlement? The Early Iron Age in Paiestine”, BA 50, 1987, 84-100; B. Gemser, “Der Stem aus Jacob (Num 24:17)”, ZA W 2, 1925, 301-2; N. Gottwald, The Tribes ofYahweh, 1979; H. L. Gunneweg, Leviten und Priester, 89, 1955; B. Halpem, The First Historians: The Hebrew Bible and History, 1988; N. P. Lemche, Early Israel, VTSup 37, 1985; G. E. Mendenhall, “The Hebrew Conquest of Palestine”, BA 25, 1962, 66-87; E. Merrill, “The Late Bronze/Early Iron Age Transition and the Emergence of Israel”, Bsac 152, 1995, 145-62; J. Milgrom, “Priestly Terminology and the Political and Social Structure ofthe Pre-Monarchic Israel”, . / ^ 69, 1978/79,65-81; W. Moran, “Gen 49,10 and Its Use in Ez 21,32”, Bib 39, 1958,405-25; M. Noth, The History o f Israel, 1960; E. Speiser, Genesis, AB, 1985; M. Weippert, The Settlement o f the Israelite Tribes in Palestine, 1971; idem, “The Israelite ‘Conquest’ and the Evidence from Transjordan”, Symposia, 1979, 15-34; G. Wenham, Genesis 16-50, WBC, 1994. Eugene Carpenter/Michael A. Grisanti Tributo -> # 4989 (mas, tributo, imposto) Tristeza -> # 3324 (ygh, afligir, magoar) Troca -> # 4614 (mwr I, ser mudado; trocar) Trombeta -> # 2955 (h$$r, fazer soar a trombeta) Trono -> # 4058 (kissê’, cadeira, trono) Tropeço
# 4173 (ksl, tropeçar)
Trovão -> # 8306 (r'm I, tempestade, trovão) Tumim Turba
# 9460 (tummim, Tumim) # 2167 (hamullâ, ruído, multidão ruidosa, multidão)
Turbante -> # 7565 (sõnip, turbante, diadema) Umbigo -> # 9219 (sõr, umbigo, cordão umbilical) Umidade -> # 8182 {r(b, ser/estar úmido) 1273
Uzias
Umidade -> # 8272 (rss I, umedecer) Unção -> # 5417 (msh, ungir) União -> # 4277 (Iwh I, acompanhar, unir-se, ligar-se) Urim -> # 242 ( 'ürim, Urim) Urina -> # 8875 (Sayin, urina) Urtiga -> # 6252 (sirpãd, urtiga) Uvas -> # 6694 ( ‘ênãb, uvas, cacho de uvas)
Uzias
Uzias (IT’TV [ ‘uzziyyâ], # 6459; in»TS ["uzziyyãhü], #6460).
AT 1 .0 reinado de Uzias estendeu-se aproximadamente de 792 a 740 a. C. (cf. 2Rs 14.21; 15.1-8, 17, 23, 27; 2 Crônicas 26), levando-se em consideração as soluções comuns para os problemas de sincronia/cálculo das co-regência (Thiele, 76-87, 205). Em nove ocasiões, Uzias é chamado de Azarias, uma mudança de nome muito mais ób via no heb. do que em português (com a diferença de apenas uma consoante — rês — ausente, daí: 'uzziyyâ em contraste com ‘azaryâ) e que não se deve a um equívoco textual (Honeyman, 20-22). O mais provável é que Uzias seja o nome do indivíduo como rei (daí, ser usado em todos os cabeçalhos proféticos referentes a ele: Is 1.1; 6.1; 7.1; Os 1.1; Am 1.1; cf. Zc 14.5), enquanto Azarias é seu nome pessoal (de acordo também com Kuntz). Uzias significa “minha força é Javé” e Azarias quer dizer “Javé ajudou”. Uzias entrou para a história bíblica como o monarca a exercer o segundo reinado mais longo em Judá (->), a saber, 52 anos (2Rs 15.1, 8 , 13, 17, 23, 27; 2Cr 26.3). Como sempre, deve-se levar em conta um período considerável de co-regência de pai e filho (2Rs 15.5b) e que, nesse caso, é particularmente complicado (Thiele, 82-89). Acreditou-se durante anos que o nome de Uzias encontrava-se gravado num fragmento com escrita cuneiforme pertencente aos anais de Tiglate-Pileser III, rei da Assíria; mas, hoje em dia, existe um consenso de que o nome Azriau de la-u-da-a-a (ANET, 282-83) na verda de se refere a Ezequias, o bisneto de Uzias, e os anais em questão são, de fato, do período de Senaqueribe, um outro rei da Assíria (Kuntz, 6:778). No entanto, Uzias é mencionado numa placa de mármore de um epitáfio em aramaico datado do final do período do segundo templo (asmoniano) (ISBE 4:461). 2. Quanto aos grandes feitos políticos esperados dos reis de Judá, o relato do livro de Re surpreende por sua escassez de informações acerca de Uzias: “Ele edificou a Elate e a restituiu a Judá, depois que o rei descansou com seus pais” (2Rs 14.22a). Mas caso se considere “ele” como sendo o antecessor mais próximo, a saber, Amazias, então o livro de Reis não revela coisa alguma sobre Uzias em termos políticos. Felizmente, têm-se os registros do cronista, provavel mente complementados pelo “livro dos anais dos reis de Judá”, uma fonte que não existe mais e à qual o escritor de Reis se refere muitas vezes (p. ex., 2Rs 15.6). As realizações de Uzias parecem se limitar à construção (Williamson, 336-37) e ao seu amor pela “agricultura” (2Cr 1274
Vale de Jezreel
26.6,9-10). Apesar de ter um “exército de guerreiros destros nas armas” (v. 11), são poucas as (re)conquistas registradas. Pode-se deduzir que estas ocorreram a partir de declarações como “Deus o ajudou...”, “os amonitas deram presentes a Uzias”, “se tinha tomado em extremo forte” e “[seu] renome se espalhara até à entrada do Egito” (vv. 7-8). (-> Reis: Teologia) 3. As informações sobre o comportamento religioso de Uzias são consideravelmente mais detalhadas. Apesar de ele fazer “o que era reto perante o Senhor” (2Rs 15.3), um comen tário que aparece sempre em Reis com referência à conformidade de um rei às estipulações de Deuteronômio, na verdade, Reis fala muito menos das atividades religiosas de Uzias do que de outros reis como, por exemplo, Asa, Ezequias ou Josias. A desaprovação habitual dos fatídicos “altos” também aparece (15.4). Mais uma vez, é o cronista quem complementa aten tamente o texto de Reis. No entanto, assim como faz com Amazias, Joaz e Jotâo, ele omite o fato de que Uzias não removeu os “altos” tão infames. Por quê? De acordo com Dillard (208), isso se deve à tendência do cronista de dividir os reinados de certos reis num período inicial bom e num distanciamento do Senhor. Assim, a seu ver e para todos os fins práticos, o período inicial foi impecável. 4. Tanto Reis (-> Reis: Teologia) quanto Crônicas (-> Crônicas: Teologia) falam da lepra de Uzias, mas somente o cronista associa essa enfermidade ao comportamento religioso do rei. Enquanto o escritor de Reis não dá nenhuma explicação, exceto “O Senhor feriu ao rei, e este ficou leproso” (2Rs 15.5), para o cronista esse foi um fator relevante na vida religiosa de Uzias, o que se pode notar pelo espaço dedicado a esse fato (um quarto do total). O orgu lho, provavelmente de suas construções, o levou a “[cometer] transgressões contra o Senhor seu Deus”, o que ficou aparente quando Uzias quis queimar incenso no altar do templo (2Cr 26.16). Uzias estava tão determinado que 81 sacerdotes corajosos tiveram que impedi-lo! Mas de nada adiantou; ainda assim o rei persistiu e foi acometido de lepra na testa. Essa intrusão parece ainda mais grave à luz da instrução que ele havia recebido quando menino de um certo Zacarias “que era sábio nas visões de Deus” (2Cr 26.5; cf. 2Rs 12.3). Resta-nos apenas conjecturar se esses ensinamentos sábios continham instruções sobre os privilégios sacerdotais. De qualquer modo, tanto Reis quanto Crônicas relatam que Uzias permaneceu leproso até o fim de seus dias e, conseqüentemente, vivendo em reclusão (2Rs 15.5; 2Cr 26.21). No entanto, de modo bastante característico, para o cronista isso significa que, ao mesmo tempo, o rei “foi excluído da casa do Senhor”. Como sempre, a preocupação teológica predominante era com a “teologia da retribuição” (-> Retribuição: Teologia) B ib l io g r a f ia
R. B. Dillard, 2 Chronicles, WBC 15, 1987; A. M. Honeyman, “The Evidence of Regai Names Among the Hebrews”, JBL 67, 1948, 13-25; J. K.. Kuntz, “Uzziah”, ABD, 1992, 6:777-79; N. J. Opperwal, “Uzziah”, ISBE (rev. ed. 1985) 4:961; E. R. Thiele, The Mysterious Numbers o f Hebrew Kings, 1983; H. G. M. Williamson, 1 and 2 Chronicles, NCBC, 1982. Daniel Schibler Vacuidade -> # 8 1 8 8 (riq, inanidade, imprestável) Vale -¥ # 1326 (biq a, vale)
Vale de Jezreel
Jezreel (VNinr [yizr^ 'e'f\, vale de, # 3476). 1275
Vale de Jezreel
AT 1 .0 nome Jezreel ocorre 41 x no AT, duas delas como NP (1 Cr 4.3; Os 1.4; ), 3x como nome do vale (Js 17.16; Jz 6.33; Os 1.5), 4x com referência ao território ou distrito de Jezreel (lRs 21.23; 2Rs 9.10, 36, 37), porém com mais freqüência referindo-se à cidade localizada na encosta noroeste do monte Gilboa (->). Jezreel pode ser traduzido como “Deus semeia”, “Que Deus tome frutífero” ou “Deus dispersa” (que é como Os 1.4 traduz o termo para se re ferir à forma como os lavradores dispersam as sementes quando estão plantando). É provável que o vale tenha adquirido seu nome da cidade da Idade do Ferro situada na extremidade leste do vale. Eusébio de Cesaréia (c. 270-340 d. C.) faz a seguinte referência a Jezreel: “Ainda há uma cidade bastante conhecida, Esdraela na Grande Planície entre Citópolis [= Bete-Seã] e Legio [próximo a Megido]” (Onomasticon 108.12-14). Há certa discordância quanto aos limi tes exatos do vale, sendo que alguns afirmam que se estende a leste até a cidade de Jezreel, a noroeste até a planície de Aco e ao sul, até Ibleão (Y. Aharoni, 24; R. G. Boling e G. E. Wright, Joshua, 1982, 418; C. G. Rasmussen, 36), enquanto outros acreditam que se refira apenas ao vale entre o monte Gilboa e o monte de Moré até Bete-Seã (J. B. Pritchard, The Harper Atlas oftheBihle, 1987,114; Oxford Bible Alias, ed. por H. G. May, 1984,49). A primeira concepção parece ter o apoio do livro de Juizes. De acordo com Juizes 6.33, os midianitas e amalequitas acamparam no vale de Jezreel; e Juizes 7.1 diz que Gideão (-^) c seu exército acamparam per to da fonte de Harode e que seus inimigos estavam ao norte no vale, junto ao outeiro de Moré. Essa descrição toma muito pouco provável que o vale entre o monte Gilboa e o monte Moré e que se estende até Bete-Seã seja o vale de Jezreel, a menos que os amalequitas e medianitas estivessem se deslocando, o que não é indicado pelo relato. 2. Essa região era uma ponte de comércio e comunicação estratégica entre Damasco e Egito e o único vale a ligar as regiões costeiras com o vale da Fenda ou com o vale do rio Jor dão. Quando devidamente drenada, é uma das terras mais produtivas de toda Israel, conhecida como o cesto de pão de Israel; mas caso permaneça alagada, toma-se um pântano malárico, como foi o caso no começo do século XX. A história registrada sobre esse vale, mostra que foi cenário de conflitos importantes desde o tempo de Faraó Tutmés III (1486 a. C.) até a Guerra dos Seis Dias em 1967. E provável que esse seja o motivo pelo qual é considerado o palco da grande batalha escatológica em Apocalipse 16.16 (Armagedom é a forma G de liar megiddô, montanha de Megido). Originalmente, o vale constituía parte do território dado a Manassés (Js 17.16) e a Issacar (19.18-21), ainda que mais tarde, ao longo da história de Israel, tenha sido controlado em várias ocasiões por outros povos como os cananeus ou arameus. Tanto Débora (Juizes 4) quanto Gideão (Jz 6.33) derrotaram exércitos extremamente fortes no vale de Jezreel, mas também foi no monte Gilboa que os filisteus mataram o rei Saul e seus filhos (1 Sm 31.1 - 8 ). No tempo do rei Saul, é bem possível que Jezreel tenha sido um centro político importante, pois é uma das regiões sobre as quais Abner declarou rei a Isbosete, depois da morte de Saul (2Sm 2.9; cf. 4.4). Porém, o direito de posse dos israelitas provavelmente não se referia a todo o vale de Jezreel, uma vez que o exército israelita havia sofrido uma grave derrota contra os filisteus no local. O mais provável é que se trate de uma referência à área adjacente a Jezreel, correspon dendo aproximadamente ao território tribal de Issacar (P. K. McCarter, IISamuel, 1984, 87; A. Alt; Essays on Old Testament History and Religion, 1968, 209-10). No tempo de Salomão a cidade já não possuía mais grande relevância política, servin do simplesmente para descrever a fronteira (IRs 4.12) e também não foi incluída nas listas de cidades que Sisaque conquistou no final do século X a. C. (M. Hunt, ABD, 1991, 3:850; Y. Aharoni, 327). Ao longo do século IX a. C., o rei Acabe fez de Jezreel sua capital de inverno. A posição num desfiladeiro voltado para o vale do Jezreel tomava o local tanto pitoresco quando 1276
Vegetação
protegido e, além disso, possuía clima ameno o ano todo. Foi durante a dinastia de Onri que ocorreu a maior parte dos acontecimentos do AT com referência a Jezreel: a. Elias correu adiante do carro de Acabe até Jezreel ( lRs 18.45-46); b. o rei Acabe cobiçou a vinha de Nabote, que ficava ao lado do palácio real (cap. 21); c. Jorão e toda a linhagem de Acabe foram mortos por Jeú em Jezreel (2 Reis 8 —9); e d. Jezabel também foi morta lá (cap. 9). Oséias foi ordenado a chamar o filho de Jezreel (Os 1.4-5), nome que significava uma mensagem de julgamento para a casa de Jeú pela forma bmtal como ele havia tratado seu antecessor. Deus promete que Israel será derrotada no vale de Jezreel (provavelmente lançan do mão do conceito negativo de “dispersar” no nome Jezreel), mas alguns vv. depois (v. 11), o nome Jezreel também é usado para confirmar que haverá uma restauração futura para a nação (usando o conceito positivo de “plantar”). B ib l io g r a f ia
Y. Aharoni, The Land o f the Bible, 1979, 24; M. Hunt, ABD, 1992, 3:850; J. D. Levenson e B. Halpem, “The Political Import of David’s Marriages", JBL 99, 1980, 507-18; C. G. Rasmussen, Zondervan N1V Altas o f the Bihle, 1989, 36. Paul Wegner Valor -> # 3700 (yqr, ser precioso, caro, valioso, tomar raro) Vangloria -> # 4329 (ly.% desprezar, vangloriar-se, escarnecer, ridicularaizar) Vara
# 4751 (matteh, vara, bastão, cetro, tribo)
Varão -> # 408 ( 'is I, homem, marido) Variedade -> # 4786 (min, tipo, variedade) Varrição
# 3589 (y ‘h, varrer)
Vaso -> # 3998 (k?li, jarro, recipiente, receptáculo) Vau
# 5045 (ma ‘abãrà, atravessar o vau, passar)
De acordo com Zohary, a Bíblia cita o nome de 110 plantas e “é, talvez, a escritura ou obra histórico-ritual mais impregnada de elementos da natureza (Plants o f the Bible, 28). Tendo em vista o fato de a menção da vegetação ser apenas suplementar aos propósitos dos escritos bíblicos, essa preo cupação com a vida botânica é significativa. No entanto, a simples quantidade de referências em questão nos permitirá apresentar aqui apenas um breve resumo das características mais re levantes teologicamente sobre a vegetação no AT. 1. Criação. No terceiro dia da semana da criação, Deus proveu abundantemente — n de modo direto, mas por intermédio da terra — a vegetação (dese‘\ #2013) de todo tipo que, em seguida, ele declarou como sendo bom (Gn 1.11-12). Esse suprimento farto de vegetação pelo Senhor tinha por objetivo cumprir um papel estético e servir de fonte imediata de alimen to para o reino animal e para a população humana (Gn 1.29-30; 2.9). Como tal, representava o cuidado de Deus com o bem-estar de sua criação (cf. Jó 38.25-27). Vegetação
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Vegetação
2. Comemorações. As principais comemorações do calendário religioso judaico no AT estão relacionadas a evento sazonais agrícolas. Em decorrência disso, as colheitas desempe nham um papel importante na relevância teológica desses eventos. Da Páscoa, por exemplo, faz parte a oferta das primícias no início da colheita da cevada na primavera (Lv 23.9-14); da Festa das Semanas, faz parte a oferta das primícias da colheita de outono e a expressão de gratidão a Deus pela abundância daquela safra (Dt 26.1-11). A Festa de Sucote no outono era associada ao fim da estação de cultivo da terra e a celebração da provisão de Deus por inter médio da produtividade da terra (Lv 23.39-43). Os frutos e ramos de várias árvores são citados como parte importante dessa comemoração (p. ex., palmas, árvores frondosas e salgueiros). Assim, no AT a vegetação tem um papel importante nas celebrações comunitárias da provisão de vida e saúde por Deus. 3. Estatutos. Vários estatutos e proibições da Torá são relacionados à maneira como as colheitas e a vegetação deviam ser manejadas. A fim de garantir que houvesse provisões sufi cientes para os pobres, por exemplo, uma parte da colheita era deixada propositadamente para os necessitados (Lv 19.9-10; 23.22; Dt 24.19-22). Os dízimos deviam ser entregues dos frutos da terra, de modo a sustentar os cultos no templo e os seus oficiantes naquele local (Lv 27.30). A meticulosidade na observância dessa prática no NT pode ser vista nos dízimos separados até mesmo dos condimentos usados em casa (Mt 23.23; Lc 11.42). Havia também restrições sobre o cultivo ininterrupto da terra, de modo a protegê-la do uso excessivo (Êx 23.10-11; Lv 25.2-7). O incenso, derivado de várias plantas e árvores tanto nativas quanto de lugares distantes, tinha um papel importante nas práticas religiosas (Êx 30.34-38). Estatutos como esses chamavam a atenção para o significado religioso da flora no judaísmo do AT. 4. Adoração e experiências de revelação. No AT, as árvores e plantas são associadas muitas vezes à adoração, quer no contexto pagão ou na adoração israelita a Javé. Em Oséias 4.13, por exemplo, o carvalho ( elôn; # 471), o choupo (libneh; # 4242) e o terebinto ( elâ; # 461) são mencionados por proporcionarem sombra suficiente de modo a incentivar a prática de formas indevidas de adoração no alto das montanhas. De acordo com Isaías 44.14, o cedro ( 'erez; # 780), cipreste (tirza; # 9360, cf. # 9309), carvalho ( ’allôn\ # 9560) e o pinheiro ( 'õren, #815) forneciam madeira apropriada para a confecção de ídolos atraentes. Deuteronômio 29.18 [ 17] adverte que a idolatria é uma raiz que produz veneno amargo (rõ 's v^la 'anâ). O hissopo é associado por metonímia à pureza cerimonial e ao perdão dos pecados (SI 51.7 [9]). Podem-se citar vários outros casos. No entanto, o exemplo clássico da vegetação asso ciada à adoração e à experiência de revelação é o de Moisés e a sarça ardente (Êx 3.2-6; cf. Dt 33.16). A sarça que Moisés viu queimando sem se consumir era o seneh, que pode talvez ser identificado com o arbusto da amora preta arbustiva (Rubus fruticosus; I. Lõw, Die Flora der Juden. 3:183-85; para uma discussão geral dos problemas de identificação dessa planta, ver R. Toumay, “Le nom du ‘buisson ardent’”, VT7, 1957,410-13) ou com a sena (Cassia senna; M. Zohary, Plants o f the Bible, 140-41; cf. idem, Flora Palaestina 2:33). Assim, um elemen to comum do deserto foi sujeitado a uma transformação miraculosa como forma de revelar a presença divina. Dessa forma, o comum tornou-se sagrado, exigindo que Moisés tirasse as sandálias em reconhecimento à santidade do local onde ele se encontrava. 5. Expressões de desprazer divino. Não raramente, a flora toma-se o pano de fundo para advertências acerca do desprazer de Deus com certas circunstâncias humanas. No cântico da vinha de Isaías, por exemplo, as alusões à ausência de uvas boas e a presença de espinhos e abrolhos indesejados em seu lugar são imagens fortes com o objetivo de transmitir a insatisfação de Deus com o povo e adverti-lo do exílio iminente (Is 5.6; cf. 7.23-25; 9.18; 27.4; 42.15). O oráculo contra Moabe contém o comentário “seca-se o pasto (hã^ir; # 2945), acaba-se a erva 1278
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(dese ’) e já não há verdura (yereq; # 3764) alguma”, provavelmente em decorrência das medi das tomadas pelos invasores assírios (15.6; cf. 1.30). O livro de Joel apresenta uma descrição vivida da destruição de toda a vegetação da terra por uma praga de gafanhotos de proporções incomparáveis. Os efeitos dessa praga puderam ser sentidos em todas as áreas da yida, até nos prazeres mais comuns (J1 1.5), nas práticas religiosas no templo (1.9) e na disponibilidade de mantimentos para a nação (1.11 -12). De acordo com Joel, os gafanhotos eram agentes de Deus (“meu grande exército”; 2.25), anunciando o dia iminente de Javé e chamando toda a população da terra ao arrependimento. O julgamento do Senhor sobre Senaqueribe da Assíria é expressado em termos que assemelham os assírios à vegetação que acabou de brotar e que, por ser frágil, é logo queimada pelo calor intenso do sol (Is 37.27 || 2Rs 19.26). 6 . Contrastes entre os justos e os perversos. Por vezes, a vegetação é usada no AT para ilustrar a prosperidade e segurança dos justos em contraste com a fraqueza e vulnerabilidade dos perversos. Pode-se encontrar vários exemplos dessa metáfora, mas sem dúvida, o mais conhe cido deles é o Salmo 1. Nele, uma árvore bem regada e frutífera com folhas que não murcham retrata os justos em contraste nítido com os ímpios, que são comparados à palha dispersada pelo vento e condenada a uma existência efêmera. Num sentido mais geral, a vegetação pode ilustrar a fragilidade e brevidade não apenas dos ímpios mas de toda a existência humana. Em Isaías 40.6, as pessoas são como a erva sujeita a secar e como as flores que caem — assim é a transitoriedade da vida humana (cf. 51.12). A palavra heb. 'êseb (-> # 6912) ocorre 33x no AT. Na maioria dos casos, é um termo geral para plantas comestíveis, que podem ser consumidas por animais (Dt 11.15; SI 106.20; Pv 27.25; Jr 14.6) ou homens (Gn 1.11;, 12,29, 30; 3.18; 9.3; SI 104.14; Zc 10.1). Por vezes, essa palavra é usada como um termo geral para vegetação ou lavouras recém-plantadas (Gn 2.5; Dt 29.23 [22]; 32.2; Pv 19.12; Mq 5.7 [6 ]). Esse tipo de planta é particularmente vulnerá vel aos ataques de gafanhotos (Ex 10.12, 15 [2x]; SI 105.35; Am 7.2). De acordo com Êxodo 9.22, 25, as plantas do Egito foram alvo específico do julgamento de Deus executado por in termédio de Moisés e manifestado na forma de granizo. Uma vez que a vegetação do Oriente Médio é especialmente susceptível à severidade dos verões quentes e secos, o termo 'êseb é usado muitas vezes em símiles que ressaltam o caráter transitório e frágil da vida humana, quer dos perversos em geral, dos opressores de Israel mais especificamente (2Rs 19.26 || Is 37.27; SI 92.7[8]), quer dos justos (SI 102.4 [5], 11 [12]). Por vezes, o termo faz lembrar a plenitude da prole humana abençoada pelo Senhor (SI 72.16; Jó 5.25). Dentre as expressões comuns que contêm esse termo podem-se citar 'êseb hã ’ãres (planta da terra) e yereq ‘êseb (planta verde). O termo aram. 'asab ocorre 5x no AT (Dn 4.15 [12], 25 [22], 32 [29], 33 [30]; 5.21), todas elas com referência ao período de loucura de Nabucodonosor, durante o qual ele comeu ervas como se fosse um boi. 7. Metáfora da restauração. Não é de surpreender que, no AT, as esperanças escatológicas de restauração e renovação da parte de um povo dedicado à agricultura sejam expressadas muitas vezes em termos botânicos. Citando apenas um exemplo, em Ezequiel 47.1 -12, na região antes infecunda do mar Morto, poderão ser encontradas árvores que, a seu tempo, sempre dão frutos e cujas folhas possuem propriedades terapêuticas miraculosas (cf. 34.27; 36.30). Tal re novação remete a uma efetivação de condições semelhantes às do Éden (cf. Gn 2.9-10). Isaías também profetiza sobre um tempo em que o deserto florescerá numa abundância de árvores e água disponível (Is 4 1.18-20; cf. 44.4; 51.3; 55.12-13; 65.21 -22). Podemos concluir, portanto, que a flora conhecida pelos escritores do AT oferecia vá rios conjuntos ricos de imagens que se prestavam facilmente à expressão de temas teológicos. Em termos vividos e inequívocos, os escritos bíblicos (assim como Jesus; p. ex., Mt 6.28-34) 1279
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empregaram a linguagem botânica para ensinar, exortar, advertir, ordenar, descrever e ilustrar assuntos relativos à verdade religiosa. O uso dessas metáforas conferia às imagens orais e escri tas uma qualidade pitoresca e uma relevância que ainda impressiona o leitor moderno, mesmo que já não o faça com tanta intensidade quanto no caso dos primeiros ouvintes e leitores para os quais essas mensagens se dirigiam. Vegetação: 'êzôb (hissopo, # 257); -> ds ’ (verdejar, brotar, # 2012); -> z r ‘ (semear, espa lhar sementes, formar sementes, # 2445); -> hã.sír I (grama, # 2945); -> h°sas (grama seca, # 3143); -> yereq (verde, verdor, # 3764); nt ‘ (plantar, estabelecer, realizar, # 5749); -> 'ãleh (folha, folhagem, # 6591); 'êseb (erva, ervagem, erva daninha, # 6912); qiqãvôn (planta de identidade indeterminada, # 7813); rõ ’s II (erva amarga e venenosa, # 8032); -> síah I (moita, arbusto, # 8489); -> sittâ (acácia, # 8847) RichardA. Taylor Velhice -> #3813 (vai/i, de idade avançada, bastante idoso) Velho -> # 2416 (zqn, ser/estar velho, envelhecer) Veloz
# 7824 (17a/, leve, ágil, veloz)
Venda -> # 4835 (/w/rr I, negociar, vender) Vento -> # 8120 (rüah, vento, sopro. Espírito) Ventre
# 8167 (rehem, ventre)
Verde
# 3762b (yqr II, ficar verde)
Vergonha -> # 1017 (ôwí I, envergonhado, envergonhar) Verme -> # 8249 (r/n/w I, apodrecer, ser/estar cheio de vermes) Vermelho -> # 137 ( 'ãdõrn, vermelho) Vestimenta -> # 8529 (simlâ, vestimenta, tecido, vestuário) Vexação -> # 7439 (svvç 1, constranger, pressionar, vexar) Viagem -> # 5825 (n.v', puxar para fora, viajar) Viço -> # 8315 ( r ‘n, ser/estar viçoso, verde) Vida -> # 2649 (hyh, estar vivo, ser reavivado, manter vivo, restaurar) Viga
#8112 (rãhi(, trave, viga)
Vigia -> # 5915 (m r I. vigiar, guardar, cuidar) 1280
Zacarias: Teologia de
Vigília -> # 1941 (dlp II, estar insone) Vila
# 4107 (kãpãr, vila)
Vingança
# 5933 (nqm, vingar, desforrar, vingar-se)
Vinha -> # 4142 (kerem I, vinha) Vinho
# (yayin, vinho)
Violação -> # 1458 [g ’l I, ser profanado, violar, macular) Violência
# 2803 (/iotí, cometer um ato de violência)
Visão -> # 5260 (mar'eh, visão, aparição, visão sobrenatural) Vítima -> # 3272 ((erep, vítima) Viúva
# 530 ( 'almãnâ, viúva)
Vizinho -> # 8907 (sãkên, residente, habitante, vizinho) Voluntariedade -> # 5605 («ító, oferecer livremente, apresentar uma oferta voluntária) Vômito
# 7794 (qy', vomitar)
Vontade
#3139 (héseq, inclinação, preferência, desejo, vontade)
Vôo -> # 6414 ( \vp 1, voar; voar em redor de; %'oar embora) Voto -> # 5623 (ndr, fazer um voto)
Zacarias: Teologia de A. Contexto Histórico O livro de Zacarias divide-se naturalmente em duas ou possivelmente três seções. A primeira seção principal (caps. 1— 8 ) compreende uma série de visões e oráculos clamente dis tintos em conteúdo, estilo e vocabulário do material de tipo mais apocalíptico encontrado nos caps. 9— 14. Essa segunda parte é dividida ainda, por vezes, em dois blocos menores de material com base no título “Sentença pronuncida pelo Senhor” que ocorre em 9.1 e 12.1. Costuma-se atribuir cada seção do livro a um profeta diferente e seus escritores são chamados respectiva mente de Proto-Zacarias, Deutero-Zacarias e Trito-Zacarias. No entanto, as diferenças entre os caps. 9— 11 e 12— 14 não são substanciais o suficiente para justificar que sejam tratadas com nenhuma certeza como entidades separadas, de modo que parece preferível examinar o livro em termos de, no máximo, duas seções. Os estudiosos também têm observado cada vez mais que os caps. 9— 14 contêm o desenvolvimento teológico de temas já apresentados nos caps. 1281
Zacarias: Teologia de
1— 8 . Assim, a melhor consideração a se fazer é procurar identificar as preocupações teológi cas distintas nos caps. 1— 8 e 9— 14, mas também não se pode deixar de lado outras questões teológicas evidentes ao longo de todo o livro. As profecias do livro de Zacarias pertencem ao período após o exílio. Juntamente com as profecias de Ageu, com as quais aquelas se sobrepõem, os caps. 1— 8 foram uma coleção de profecias datada com mais exatidão, no AT, do primeiro ano do imperador persa Dario I no pe ríodo de outubro de 520 a dezembro de 518 a. C. No que se refere aos judeus, o acontecimento mais importante desse período foi a conclusão do segundo templo, um acontecimento com o qual tanto Ageu quanto Zacarias estiveram inteiramente envolvidos (Ed 5.1 -2). No entanto, tudo indica que cada um deles teve um papel diferente — Ageu incitou o povo a retomar o projeto (Ageu 1) e Zacarias incitou o povo a completar o trabalho (Zacarias 4). As contribuições dos dois profetas refletem-se inteiramente em suas profecias, e a reconstrução do templo é, de fato, o assunto principal dos caps. 1— 8 . 0 contexto dos caps. 9— 14, pelo contrário, é caracterizado por uma imprecisão cronológica. Apesar de os estudiosos serem praticamente unânimes em si tuar esse material no período posterior ao exílio, mesmo havendo algumas possíveis alusões ao período anterior ao exílio (p. ex., 10.1 -2 , 11 ), a falta de qualquer ponto de referência específico indica que o autor não tinha em mente um contexto histórico em particular. Antes, a natureza apocalíptica do material concentra-se naquilo que ocorrerá no dia do Senhor e no período que levará até esse dia, quer essas coisas impliquem nações contemporâneas (9.1 - 8 ) ou o conflito escatológico final entre Javé e as nações do mundo (14.1-5). B. Estrutura Literária e Temas Teológicos 1. Caps. /—8. Os caps. 1— 8 são constituídos de uma série de oito visões intercala com oráculos proféticos (caps.l— 6 ), seguidos de mais uma série de oráculos (caps. 7— 8 ). Ao que parece, cada um desses dois tipos de material tem seu próprio conteúdo. Apesar de as visões serem o elemento mais evidente nos caps.l— 8 , na verdade, são os oráculos que se concentram na reconstrução do templo (Petersen, PT 34, 196-98). As visões, por outro lado, conferem uma perspectiva ao tema da reconstrução do templo que o coloca repetidamente no contexto de “toda a terra” (1.11; 4.14; 5.3, 6 ; 6.5), mas que também o leva além desta esfera terrena. Os objetos físicos nas visões, como chifres (1.18-21 [2.1-4]) ou oliveiras (4.3,11-14), são descritos muitas vezes em termos não físicos e os acontecimentos podem se desenrolar no conselho divino (3.1-5) ou “entre a terra e o céu” (5.9). Uma vez que tudo indica que o propó sito das visões e oráculos é de complementarem-se mutuamente (Meyers, lix), sua mensagem combinada parece mostrar que a reconstrução do templo não deve ser considerada apenas um acontecimento local nem uma tarefa terrena. Pelo contrário, é algo que se encontra ligado à história do mundo e possui uma dimensão espiritual invisível porém vital. Apesar das dificul dades práticas consideráveis que representam obstáculos para a conclusão do templo, Javé se certificará de que o projeto tenha sucesso, pois proporcionará uma garantia de paz entre as nações (1.7-11; 6.1-8) e os recursos espirituais necessários (3.1-5; 4.6-9). A análise das visões indica uma organização concêntrica na qual as duas visões centrais (3.1-5; 4.1-5, 11-14) refletem o cerne da mensagem do profeta (Meyers). As visões externas situam essa mensagem no contexto da atividade de Deus que fica evidente nas nações (1.8-13, 18-21 [2.1 -4]; 5.5-11; 6 . 1- 8 ) e na Jerusalém e Judá restauradas (2. l-5[5-9]; 5 .1-4). A mensagem em si é uma resposta ao problema duplo de como o templo será reconstruído e quem irá reconstruí-lo. Essas duas questões são, na verdade, dimensões diferentes de um mesmo problema, uma vez que, na opinião de Zacarias, o motivo de o templo encontrar-se inacabado é o fato de o sumo sacerdote ser culpável (3.1) e do líder civil Zorobabel estar desanimado (4.6-10a). 1282
Zacarias: Teologia de
Zacarias reage de duas maneiras. Primeiro, atribui a maior relevância possível ao templo ao fazer dele a mais alta das prioridades na restauração do judaísmo do pós-exílio. Essa idéia deriva, em parte, da maneira com que Zacarias confirma o papel tradicional do templo como local da habitação terrena de Javé, onde se pode sentir o fogo e a glória de Deus (2.5, 13 [2.9, 17]). Porém, ao associar o templo com a história das nações e ao fazer dele o ponto central da cidade restaurada de Jerusalém e da terra de Judá, Zacarias eleva o templo a uma importância que, até então, este jamais havia desfrutado. E provável que esse apoio profético ao templo se baseie na convicção de que somente quando os judeus reconhecerem a presença de Javé como a marca característica suprema de sua comunidade é que poderão readquirir sua identidade como povo da aliança de Deus. O templo e seu culto são, portanto, mais importantes para se estabelecer os alicerces da comunidade do que a monarquia ou a lei. Assim como a entrega da lei no Sinai (Êxodo 20— 23) foi precedida de uma experiência da presença majestosa de Deus (cap. 19), a presença de Javé no templo reconstruído também precederia a restauração da lei por intermédio de Esdras e Neemias. Em segundo lugar, as profecias de Zacarias influenciaram sobremaneira a teologia de liderança do AT. O profeta responde às inadequações dos líderes contemporâneos ressaltando o perdão completo de Deus concedido a Josué, em oposição às acusações satânicas, e a efi cácia do Espírito ao capacitar Zorobabel para completar a tarefa que este tinha diante de si. Esses estímulos baseiam-se numa consciência de recursos espirituais reais, porém invisíveis, para a liderança; consciência esta bastante intensificada em comparação com a abordagem de profetas anteriores. A mesma convicção encontra-se por trás das extensas referências a anjos noscaps. 1— 8 . Um desenvolvimento ainda mais importante, porém, ocorre no conceito que Zacarias tinha da liderança conjunta de Josué, como sumo sacerdote, e Zorobabel, que representa a li nhagem davídica. Essas figuras, uma sacerdotal e outra real, são descritas como líderes ungidos (4.14) e os dois são associados ao termo messiânico Renovo. Uma vez que essa palavra fora associada anteriormente à linhagem de Davi (Is 11.1; Jr 23.5), não é inapropriado relacioná-la a Zorobabel (4.11-12), apesar de a falta de perspectiva por parte dele de tornar-se rei ter leva do alguns contemporâneos a questionar a validade dessa profecia. O que é verdadeiramente inédito, porém, é a aplicação desse mesmo termo ao sumo sacerdote (6.11-12). Essa atribui ção é tão inesperada que os estudiosos de Wellhausen em diante reiteram que em 6.11 devese ler Zorobabel e não Josué, mas essa idéia não tem, de modo algum, respaldo no texto. Ao que parece, tanto em 3.8-9 quanto em 6.11-13, Zacarias está, de fato, ressaltando a natureza conjunta da liderança de Israel, uma vez que ele emprega uma linguagem semelhante para os dois indivíduos. Em 6.11-13, em particular, o sacerdote assume diversas características régias de maneira nunca antes vista no resto do AT. Outro problema é que Zacarias também fala da futura liderança do povo de Deus, especialmente no uso que faz do termo Renovo, de modo que Josué e Zorobabel constituem símbolos de coisas por vir bem como líderes contemporâ neos (p. ex., 3.8). Os oráculos de introdução (1.1 -6 ) e conclusão (7.1 —8.23) ressaltam que apesar de Za carias encontrar-se dentro da tradição profética, ele também representa uma verdadeira ruptura com seus antecessores. O chamado ao arrependimento no período do pré-exílio havia finalmente sido colocado em prática ( 1.6 ) e o tempo de jejum seria substituído por festividades jubilosas (7.1-7; 8.18-19). Mais uma vez, porém — especialmente no cap. 8 ■— Zacarias parece falar de um futuro ideal bem como de um desejo de seus contemporâneos de ter um novo modo de vida de acordo com os planos de Deus para o “bem” (8.14-17). 1283
Zacarias: Teologia de
2. Caps. 9—14. À primeira vista, as diferenças estilísticas consideráveis entre os cap 1— 8 e os caps. 9— 14 parecem ser acompanhadas de uma respectiva mudança em termos teo lógicos. A natureza apocalíptica de grande parte do material dos caps. 9— 14 é caracterizada por uma crescente preocupação com a escatologia, que chega ao auge no retrato do dia de Javé no cap. 14. No entanto, nos últimos tempos, os estudiosos têm observado que vários dos temas-chave dos caps. 9— 14 são um desenvolvimento de material anterior, encontrado não apenas nos caps. 1— 8 , mas na profecia como um todo (Mason) e até mesmo na literatura de sabedoria (Larkin). O tema da liderança é um dos elementos mais evidentes de continuidade com os caps. 1— 8 e, como antes, desempenha um papel central. A ênfase dos caps. 9— 14, porém, está no tema do pastor (11.4-17; 13.7-9) e não nas linhagens reais e sumo sacerdotais. Deus rejeita os pastores de Israel, ou seja, seus líderes, pois eles rejeitaram a liderança que o Senhor lhes proveu (11.4-17). Mas, no final, Deus usará o sofrimento de um outro pastor para aperfeiçoar e restaurar seu povo (13.7-9). Algumas das passagens sobre liderança possuem certas nuanças messiânicas, apesar de estas serem, em grande parte, alusões a um messias sofredor e, com ex ceção de 9.9-10, não são associadas à realeza. O conceito de um messias sofredor, cujo papel apresenta semelhanças com o Servo Sofredor de Isaías 40— 55, é de particular importância (9.9-10; 12.10; 13.1, 7-9). Até mesmo o rei davídido que entra vitorioso em Jerusalém é uma figura humilde montada num jumento (9.9-10). Achtemeier considera todas essas descrições de líderes sofredores referência ao Messias, mas o texto em si não faz nenhuma ligação direta entre as diferentes figuras. Assim, pode ser preferível falar-se da presença de um modelo de liderança nesses caps., um modelo de que fazem parte a humildade, a rejeição e a morte, sem maiores especulações sobre quem exatamente está sendo descrito. Outro tema importante diz respeito ao papel de Jerusalém com relação às nações do mundo. A idéia de que Deus protegerá a cidade já pode ser encontrada em 2.1-9 [5-13], mas o conceito passa por um desenvolvimento considerável nos caps. 9— 14, normalmente dentro do contexto dos últimos tempos (9.1-7; 12.1-9; 14.1-15). Duas ênfases surgem dessas passagens. Numa delas, o ataque a Jerusalém chegará ao seu ponto culminante quando todas as nações se reunirem contra ela, mas Deus defenderá a cidade o tempo todo e alcançará a vitória final quando ele próprio sair para combater os invasores (14.3). Na outra ênfase, pelo menos algu mas dentre as nações se juntarão aos israelitas para adorar Javé (14.16; cf. 2.11 [15]; 8.20-23). Uma vez que é essa ênfase sobre a adoração universal que recebe a última palavra no cap. 14, tudo indica que a batalha final não seja o ponto culminante do dia de Javé. Apesar do fato de que Jerusalém participará de um grande livramento, no final, a cidade se dedicará à adoração e não à guerra. E nesse contexto que o tema do templo, uma característica tão relevante nas descrições de Jerusalém nos caps. 1— 8 , encontra lugar nos caps. 9— 14. Zacarias 14.16-21 vislumbra um templo escatológico em Jerusalém, no qual os adoradores de todas as nações se reunirão para celebrar a Festa dos Tabemáculos. Assim, o templo dos caps. I — 8 continua presente nesse festival escatológico e um dos propósitos do templo do século VI é antever o tempo em que os representantes de todas as nações se reunirão para adorar Javé. No entanto, essa adoração uni versal só pode ocorrer depois de ter sido concluído o processo de purificação (13.1-3), confe rindo assim uma nova perspectiva a um outro tema dos caps. 1— 8 . Se num primeiro momento eram os pecados do sumo sacerdote que haviam sido perdoados (3.1-5), depois o perdão con templará toda a casa de Davi e a própria Jerusalém. Essa purificação também será muito mais eficaz do que a anterior, uma vez que uma fonte (13.1) substituiu o antigo ritual de aspersão (cf. Nm 8.7; Ez 36.25). Essa purificação também parece depender de um derramamento do 1284
Zacarias: Teologia de
Espírito de Deus (12.10), o que é caracterizado pela tristeza contrita em função do sofrimen to e da morte de um daqueles que foi escolhido por Deus. Assim como em 4.6, a presença do Espírito de Deus é uma garantia de que a profecia se cumprirá. C. Contexto Canônico O livro de Zacarias representa um estádio importante do desenvolvimento constante da profecia. Tanto a mensagem do livro quanto sua estrutura ilustram com freqüência como a profecia do AT adaptou-se continuamente a novas situações. Na verdade, esse processo fica evidente na maneira como o livro se apóia em grande medida em profecias anteriores, a maioria delas disponível na forma escrita e por meio da reaplicação dos temas principais dos caps. 1— 8 a outras circunstâncias no futuro. Em termos teológicos, portanto, o período de restauração é retratado em Zacarias como uma ruptura significativa com o passado e uma prefiguração do que ainda há de vir, inclusive os últimos tempos. Esse ponto deve ter influenciado profunda mente aqueles que foram capazes de compreendê-lo, pois, em vez de serem considerados uma comunidade isolada e esquecida, os exilados restaurados estavam sendo identificados com um movimento profético que chegaria ao auge no dia final de Javé. No entanto, os membros dessa comunidade ainda tinham um papel crucial a cumprir nesse processo, e o desafio de Zacarias para que concluíssem o templo era um convite prático para responder ao que Deus estava fa zendo e tornar-se parte desse processo. Um aspecto dos processos de transformação em Zacarias é o surgimento da literatura e teologia apocalípticas. Sem dúvida Zacarias é uma testemunha importante da maneira como o pensamento apocalíptico tornou-se uma característica predominante do judaísmo no período do pós-exílio, apesar de haver dúvidas quanto a se poder caracterizar o livro como um exemplo completo de literatura apocalíptica. As visões simbólicas nos caps. 1— 8 são um exemplo da maneira como o tema apocalíptico se desenvolve no livro. Essas visões se encontram arraiga das nas visões proféticas de Amós e Jeremias, mas a presença de um intérprete nos caps. 1— 8 , que não se encontra presente nas visões anteriores, confirma o valor contínuo dos oráculos proféticos nesse papel interpretativo juntamente com o material das visões. O conteúdo das visões nos caps.9— 14 representa ainda outro passo dentro desse processo e chega ao auge nas descrições do dia do Senhor no cap. 14. O caso específico das visões também tem a tendência de confirmar a concepção geral de que a profecia foi, de fato, o solo original no qual a semen te do pensamento apocalíptico germinou, quaisquer que tenham sido as outras influências que porventura contribuíram para esse processo. Uma conseqüência de se interpretar o livro de Zacarias dessa maneira é que se toma cada vez mais difícil aceitar a abordagem de Hanson, de acordo com a qual os caps. 1— 8 e 9— 14 seriam derivados de dois grupos completamente distintos dentro da comunidade do pósexílio. A caracterização dos caps. 1— 8 , como sendo derivados de um grupo mais tradicional preocupado apenas com a preservação da comunidade existente e com a própria posição den tro dela, em contraste com a perspectiva visionária dos caps. 9— 14, não faz jus à abrangência do conteúdo, especialmente dos caps. 1— 8 . O papel central de uma série de visões nos caps. 1— 8 ressalta a presença de uma perspectiva visionária ao longo de todo o livro, como também o faz a ocorrência de outras características apocalípticas (Coggins). Por fim, o livro de Zacarias continuou a exercer uma grande influência sobre a litera tura judaica e cristã, particularmente com relação à expectativa messiânica. Uma importante característica das crenças da comunidade de Qumran, por exemplo, era a expectativa de dois messias, um da linhagem real e outro da linhagem sacerdotal, numa relação direta com 3.8-9 e 6.9-15. No que se refere ao NT, Zacarias é citado com tanta freqüência quanto qualquer outro 1285
Zadoque
livro do AT de modo proporcional ao seu tamanho. A maioria dessas citações é extraída dos caps. 9— 14 e ocorre principalmente nos Evangelhos com relação ao sofrimento do Messias. Zacarias 9.9, por exemplo, é citado em Mateus 21.5 e João 12.15; Zacarias 11.13, em Mateus 27.9; e Zacarias 13.7, em Marcos 14.27. Enquanto a comunidade de Qumran continuou es perando pela chegada de seu Messias, os escritores do NT estavam certos de que ele já havia surgido na pessoa de Jesus (Bruce). B ib l io g r a f ia
E. Achtemeier, Nahum-Malachi, Interp. 1986, 107-69; J. G. Baldwin, Haggai, Zechariah, Malachi, TOTC, 1972; F. F. Bruce, “The Book o f Zechariah and the Passion Narrative”, BJRL 43, 1961, 336-53; B. S. Childs, IOTS, 1979, 476-87; R. J. Coggins, Haggai, Zechariah, Malachi, 1987; P. D. Hanson, The Dawn o f Apocalyptic, 19792; K.. Koch, The Prophets, 1983, 2:15975; K. Larkin, The Eschatology ofSecond Zechariah, CBET 6 , 1994; R. A. Mason, “The Relation o f Zechariah 9-14 to Proto-Zechariah”, ZAW 8 8 , 1976, 226-39; E. H. Merrill, Haggai, Zechariah, Malachi, 1994; C. L. e E. M. Meyers, Haggai, Zechariah 1-8, AB, 1987; D. L. Petersen, Haggai and Zechariah 1-8, OTL, 1984; idem, “Zechariah’s Visions: A Theological Perspective”, VT 34, 1984, 195-206; P. L. Redditt, Haggai, Zechariah, Malachi, NCB, 1995; R. L. Smith, Micah-Malachi, WBC, 1984; J. E. Tollington, Tradition andlnnovation in Haggai and Zechariah 1-8, JSOTSup 150, 1993. Martin Selman
Zadoque
Zadoque (i?Í"7S [çãdôq], # 7401);
OMA O nome Zadoque é atestado ao longo de toda a literatura do OMA. Nomes semelhantes {$idq / $dq / çaduq) ocorrem como designações pessoais e divinas em textos amoritas, ugar., fen. e púnicos, bem como em inscrições heb., nos Papiros Elefantinos e nas cartas de El Amarna (HALAT939; Hess, 240).
AT 1. Um sumo sacerdote israelita. A grande maioria das 53x em que o nome ocorre des crevem um Zadoque que atuou como sumo sacerdote israelita durante os reinados de Davi e Salomão. a. As origens de Zadoque. 2 Samuel 8.17 apresenta a primeira referência a Zadoque retrata-o como sumo sacerdote juntamente com Abiatar. Essa passagem também deu motivo para muitas discussões com referência às origens de Zadoque. Pelo fato de 1 Samuel 22.20 referir-se a Abiatar como filho de Aimeleque, a ordem invertida desses nomes em 2 Samuel 8.17 (Aimeleque, filho de Abiatar) levou a três explicações, sendo que a última delas mostrase relevante para as origens de Zadoque: i. deve-se inverter a ordem do último par de nomes (McCarter, 253-54,256); ii. deve-se manter a ordem e identificar esse Abiatar como neto do pai de Abimeleque, Abiatar (que recebeu o nome do avô; KD 365-67; Merrill, 283, n. 62; Youngblood, 911); iii. deve-se inverter a ordem dos quatro nomes (Abiatar filho de Aimeleque, filho de Aitube e Zadoque [Wellhausen, 177; Gunneweg, 99]), deixando Zadoque, desse modo, sem uma genealogia (posteriormente, um zadoquita inverteu a ordem desses nomes para garantir que Zadoque fosse de uma genealogia levítica). Dos muitos estudiosos que aceitaram a sugestão de Wellhausen, vários seguiram a identificação de H. Rowley de Zadoque como o sacerdote pré-israelita do santuário jebuseu de Jerusalém, convocado por Davi para servir como sacerdote de Israel em seu reinado (Rowley, 1286
Zadoque
113-41; Hauer, 89-94). Alguns dos argumentos em favor dessa proposta são o aparecimento súbito de Zadoque, os benefícios políticos de sua nomeação e a presença do radical sdq no nome de sacerdotes (Jeozadaque [lC r 6.14-15; Ed 3.2; et aí]) e reis de Jerusalém (Melquisedeque [Gn 14.18], Adoni-Zedeque [Js 10.1] e Zedequias [lRs 24.18]). Outros argumentaram que Zadoque era um descendente de Arão proveniente de Hebrom (Cross, 214-15), Quiriate-Gearim (J. Duss, 336-37), Cabzeel (Olyan, 185-90) ou Gibeom (Auerbach, 49-50). Quer alguma dessas referências indique o lugar de origem de Zadoque ou não, elas dão um vislumbre da história de Zadoque antes e depois de sua nomeação como sumo sacerdote de Israel (ver abaixo). 1 Crônicas 6 .8 ,53; 18.16 (|| 2Sm 8.17) e 24.3 também afirmam que o pai de Zadoque Aitube, um descendente do filho de Arão, Eleazar. O pai de Zadoque não deve ser confundido com o irmão de Icabode que tem o mesmo nome (neto de Eli, 1Sm 14.3) e com o avô de Abiatar (ISm 22.20; em oposição a Hayes e Miller, 114-15). A tentativa de ligar Zadoque à linhagem de Eli ignora a argumentação de 1 Samuel 2.27-36 e 1 Reis 2.26-27 que procura explicar como a família de Zadoque sobrepujou a família de Eli no serviço sacerdotal e não leva em conside ração o contraste repetido entre a descendência de Zadoque e Abiatar em 1 Crônicas. b. O ministério de Zadoque como sumo sacerdote durante os reinados de Davi e Sa lomão. A nomeação de Zadoque para a posição de sumo sacerdote pelo rei Davi deu início a um breve período durante o qual Zadoque dividiu seu sumo sacerdócio com Abiatar. Zadoque permaneceu fiel a Davi ao longo de todo o reinado deste (2Sm 15.24-29; 17.15-16; 19.11) e, no devido tempo, ungiu Salomão como sucessor de Davi (lR s 1.8, 45; 2.35; 4.4). Quando o outro sumo sacerdote de Davi (Abiatar) apoiou a tentativa de Adonias de tomar o trono para si, Zadoque apoiou Salomão (1.8, 26, 32-45). Depois que Salomão expulsou Abiatar do sacer dócio (2.26-27), Zadoque ministrou sozinho como sumo sacerdote (lC r 29.22). A substituição de Abiatar por Zadoque cumpre o fim profetizado do ministério sumo sacerdotal dos descen dentes de Eli (ISm 2.27-36; lRs 2.26-27). c. A presença de Zadoque em Hebrom e Gibeom. Um “Zadoque” é relacionado entre os homens de Levi que foram a Hebrom juntamente com vários outros representantes para decla rar seu apoio ao reinado de Davi sobre Israel (1 Cr 12.28). Josefo o identifica como o sacerdote Zadoque (Ant VII 2.2 [56]). Se esse é o mesmo Zadoque que posteriormente toma-se sumo sacerdote, a passagem descreve um contato inicial entre o rei Davi e seu futuro sumo sacer dote. 1 Crônicas 16.39-40 indica que Zadoque serviu como sumo sacerdote num tabemáculo de estilo mosaico em Gibeom no começo da monarquia de Davi. Ungiu Salomão na Tenda da congregação em Gibeon, ocasião em que Salomão ofereceu mil holocaustos no altar de bronze ali situado (1 Rs 3— 6 ). d. O mandato da linhagem de Zadoque no sumo sacerdócio. Depois do reinado de Davi, Zadoque e seus descendentes tomaram-se a linhagem sacerdotal governante em Jerusalém (1 Rs 4.2; 2Cr 31.10). Em meio à rebelião de Israel contra Javé, os zadoquitas cumpriram seus deveres sacerdotais com grande zelo (Ez 44.15). Conseqüentemente, era permitido somente aos filhos de Zadoque ministrar como sacerdotes no santuário (Ez 44.16; cf. 40.46; 43.19). 2. Outras referências a Zadoque. a. Várias passagens fazem referência a diferentes de cendentes de Zadoque (a linhagem de Eleazar) — o sumo sacerdote durante os reinados de Davi e Salomão — que usam o mesmo nome que ele (1 Cr 6 .12; 9.11; Ed 7.2; Ne 11.11). (BDB [843] sugere que as passagens de Neemias e 1 Crônicas refiram-se ao mesmo indivíduo.) b. Um homem chamado Zadoque era avô matemo do rei Jotão (pai de Jerusa, mãe Jotão, 2Rs 15.33; 2Cr 27.1). 1287
Zedequias
c. Dois participantes da construção dos muros durante o governo de Neemias (um des cendente de Baaná e um descendente de Imer, Ne 3.4,29) chamavam-se Zadoque. d. Um dos líderes da comunidade do pós-exílio que colocou seu selo na aliança de Ne emias (Ne 10.21 [ 10.22]) chamava-se Zadoque. e. Um escriba e um dos três homens nomeados por Neemias para supervisionar os de pósitos dos levitas (Ne 13.13) chamavam-se Zadoque. P-B A deposição do sumo sacerdote Onias III levou à instituição de um templo judaico (mi nistrado por zadoquitas) em Leontópolis, no Egito (TDNT 7:38-40; Josefo, Ant 13.3.1-3[6273]; Guerra 7.10.2-3 [421-32]) e serviu de ímpeto para a comunidade de Qumran, na qual os “filhos de Zadoque” ocupavam uma posição de liderança e autoridade (1QS 5:2, 9; lQsa 1:2, 24; lQSb 3:22; CD 3:21; cf. Liver, 3-30). NT E possível que o nome dos saduceus, um grupo político-religioso predominante na literatura do NT, tenha origem em $ãdôq, uma tentativa de conferir validade ao seu status sa cerdotal (apesar de o sacerdócio saduceu normalmente não ser de linhagem zadoquita e suas declarações e afiliações não sugerirem isso [Reicke, 153]). B ib l io g r a f ia
ISBE 4:1169-70; E. Auerbach, “Das Aharon-Problem”, SVT 17, 1969, 37-63; A. Cody, A His tory o fO ld Testament Prieslhood, 1969; F. Cross, Canaanite Myth and Hebrew Epic, 1973; I. Duguid, Ezekiel and the Leaders o f Israel, SVT, 1994; J. Dus, “Die Erzãhlung über den Verlust der Lade, 1 Sam. IV”, VT 13, 1963, 333-37; A. Gunneweg, Leviten undPriester, 1965; C. E. Hauer, “Who Was Zadok”, JBL 82, 1963, 89-94; R. Hess, Amarna Personal Names, 1993; J. Liver, “The ‘Sons of Zadok the Priests’ in the Dead Sea Sect”, RevQ 6 , 1967, 3-30; P. McCarter, Jr., 2 Samuel, AB, 1984; J. Mauchline, “Aaronite and Zadokite Priests: Some Reflections on an Old Problem”, TGUOS, 21, 1967, 1-11; J. McConville, “Priests and Levites in Ezekiel: ACrux in the Interpretations o f Israefs History”, TynBul 34, 1983, 3-31; E. Merrill, Kingdom o f Priests: A History o f Old Testament Israel, 1987; J. M. Miller e J. H. Hayes, HAIJ, 1986; S. Olyan, “Zadok’s Origins and the Tribal Politics of David”, JBL 101,1982,177-93; G. Ramsay, “Zadok”, ABD 6 , 1992, 1034-36; B. Reicke, The New Testament Era, 1968; H. H. Rowley, “Zadok and Nehushtan”, JBL 58, 1939, 113-41; J. Wellhausen, Der Text der Biicher Samuelis, 1871; R. Youngblood, “ 1,2 Samuel”, EBC 3, 1992, 553-1104. Michael A. Grisanti
Zedequias
Zedequias (H^TO [çidqiyyâ], # 7408; HTJTpi [sidqiyyâhü], Zedequias, # 7409).
OMA Assim como Melquisedeque (Gn 14.18) ou Adoni-Zedeque (Js 10.1), o nome desse rei possui um elemento teofórico que se refere à “retidão” de Deus. No entanto, diferentemente desses nomes, diz respeito ao Deus de Israel, enquanto os nomes cananeus referem-se a uma divindade local. AT Zedequias nasceu c. 617 a. C. e foi o terceiro filho do rei Josias de Judá (1 Cr 3.15). A mãe de Zedequias, Hamutal, era de Libna, uma cidade rebelde de Judá no Sefelá (2Rs 8.22); o irmão mais velho dele, Jeoacaz (Salum), havia sido escolhido pelas classes de proprietários de 1288
Zofar
terras (23.30) para suceder Josias, sendo preferido no lugar de seu irmão mais velho Jeoaquim, mas foi empossado como rei por Nabucodonosor em 6/7 de dezembro de 598 a. C. (de acordo com Wiseman), pouco antes da queda da cidade, no ano em que Jeoaquim morreu e seu filho Joaquim foi deposto e deportado. O nome original era Matatias (dádiva de Javé), mas Nabu codonosor lhe deu o nome de Zedequias (Javé é minha vindicação/justiça), talvez por seu tom mais triunfalista (ou até mesmo messiânico?). Esse nome, porém, provou a oposição de Jeremias (Jr 23.4-6 ), e esse profeta prenun ciou explicitamente o advento de um outro monarca da linhagem de Davi que seria justo e daria início a um período de justiça e salvação nacional: seu nome seria “Senhor, Justiça Nossa”. Ao que parece, Zedequias estava sob o controle de seus cortesãos e, apesar de uma tentativa débil de abolir o uso de escravos hebreus em Jerusalém (34.8-11) e de seu apoio vacilante e secreto a Jeremias (37.17-21; 38.14-28), o rei permitiu que Jeremias fosse perseguido e deixou de con servar a pureza da religião javeísta (2Rs 24.19-20; 2Cr 36.11-16). Desafiando seu juramento a Nabucodonosor (e com forte oposição da parte de Jeremias e Ezequiel), Zedequias criou alian ças militares locais e provocou uma retaliação severa da Babilônia em 594 (2Cr 36.13; Jr 27.1 -3 fpara a data correta, ver 28.1 e a LXX nas duas passagens]; 29.7-9, 21-23; Ez 17.11-21). A fraqueza do rei Zedequias foi agravada pela lealdade persistente de elementos den tre seus súditos em Judá bem como na Babilônia ao seu sobrinho deportado, o rei Joaquim (Jr 28.1-4). Na Babilônia, Joaquim era chamado de rei de Judá (Ez 1.2), e as alças de cântaros de vinho de Tel-Beite Mirsim, Bete-Semes e Ramate-Rael trazem a inscrição “Eliaquim mordomo de Joaquim” (esses bens do rei foram preservados para fornecer vinho ao exército babilônio?). A nação havia sido fragilizada pela deportação de “todos os príncipes, todos os homens valen tes”, artífices, ferreiros e homens “destros na guerra” em 597 (2Rs 24.14-16), bem como pela perda de territórios, e Zedequias teve que realizar um grande esforço para dar garantias de sua lealdade e competência a seus senhores babilônios (Jr 29.3; 51.59). Em 588, o Egito, Tiro e Amom juntaram-se a Zedequias numa revolta aberta. O Egi to retirou seu apoio e um enorme exército babilônio entrou em Jerusalém e saqueou a cidade conforme Jeremias havia predito, aconselhando com freqüência que o povo se rendesse. O rei foi capturado quando buscava refúgio em Amom e levado para ser julgado em Ribla (o quartel general de Nabucodonosor), onde os filhos desse rei foram mortos e ele cegado e deportado para o cativeiro na Babilônia, onde morreu (2Rs 25.1-7; 2Cr 36.11-21; Jr 39.1-10; 52.11). A vida de Zedequias é uma excelente ilustração da máxima de Tiago 1.8 : “[O] homem de ânimo dobre [é] inconstante em todos os seus caminhos” e também da insensatez de se rejeitar as advertências divinas. Apesar da incredulidade do escritor de Salmo 89 (esp. vv. 38-45), que pode ter sido o próprio rei Joaquim (cf. vv. 45, 50-51), a história de Zedequias serve para lembrar que a graça de Deus de acordo com sua aliança não pode ser tomada por certa. Por hora, a dinastia davídica havia cumprido seu propósito e era preciso que recebesse o castigo por ter pecado. Joaquim B ib l io g r a f ia
J. Bright, A History o flsra ell, 1981; J. C. L. Gibson, TSS1, 1971, 1:64-66; D. J. Wiseman, Nebuchadnezzar and Babvlon, 1985, esp. 36-39. P. J. M. Southwell
Zofar
Zofar ("IDÍX [sôpar], #7436). 1289
Zorobabel
AT Zofar era o terceiro “amigo” de Jó (Jó 2.11) e, dos três, o que foi mais mordaz em seu discurso. Não podia esperar até que Deus falasse com Jó e lhe mostrasse os caminhos perver sos que percorria (11.5,6). Zofar também aconselha Jó a redimir-se e deixar o pecado (11.14), apesar de ter pouca esperança de que Jó o fizesse. Dessa forma, Zofar repreende Jó, dizendolhe o que acontece com os pecadores (cap.20). Eliú; -> Elifaz;
Bildade; -> Jó: Teologia
B ib l io g r a f ia
J. C. Holbert, ‘“The Skies Will Uncover His lniquity’: Satire in the Second Speech ofZophar (Job XX)”, P T 3 1 ,1981, 171-79. Elmer B. Smick Zombaria -> # 329 (ly$, desprezo, vangloria, escárnio, zombaria)
Zorobabel
Zorobabel (V331T [zembbãbet), # 2428).
1. Identidade. O nome Zorobabel significa “renovo da Babilônia”. O nome dele faz parte da relação daqueles que, de acordo com o relato, voltaram da Babilônia depois do exílio (Ed 2.2; Ne 7.7); o relato dá a impressão de que Zorobabel regressou quase imediatamente depois do decreto de Ciro (->). Ao que parece, existe um bocado de confusão nas tradições associadas a Zorobabel, indicando que não havia detalhes claros sobre sua vida e carreira à disposição daqueles que passaram adiante a história do Regresso. Assim, muita coisa a respeito de Zoro babel continua mistério para nós. Uma tradição indica que Zorobabel fez parte de uma tenta tiva inicial de reconstruir o templo na época de Ciro (Ed 3.1— 4.4), mas isso parece entrar em contradição com a carta (em aram.) para Dario em 5.7-17, que atribui essa primeira tentativa a Sesbazar (5.16). Também parece ser conflitante com as evidências do livro de Ageu de que em 520 a. C. o templo estava em ruínas (Ag 1.4) e que Zorobabel, como governador, e Josué, como sacerdote, começaram a reconstrução naquela época sob a influência do próprio profeta Ageu (para uma discussão mais completa dessas aparentes incongruências -> Ageu, -> Res tauração; para a rejeição da identificação de Zorobabel com Sesbazar, ver H. G. M. Williamson, ISBE 4:1193). Em 1 Crônicas 3.16-19, Zorobabel é descrito como neto do rei davídico Jeoaquim, e Esdras 3.2 bem como o livro de Ageu apresentam o nome do pai de Zorobabel como sendo Sealtiel, apesar de 1 Crônicas 3.19 dizer que o pai dele era Pedaías, irmão de Sealtiel (a LXX corrige essa discrepância). Assim como as origens de Zorobabel são cercadas de mistério, também o fim dele é um enigma, pois não se faz nenhuma menção a ele depois do impulso dado à construção do templo em 520 a. C. Zorobabel não é sequer citado no relato da conclusão do templo em Esdras 6.15. Onde falta o conhecimento, entra a conjectura. Em 1 Esdras 3— 4, Zorobabel aparece como o vencedor de uma competição de sabedoria — um modo de justificar o fato de ele ter sido escolhido como enviado dos persas para supervisionar a reconstrução de Judá — , enquanto alguns estudiosos sugerem que uma espécie de guerra “messiânica” liderada por Zorobabel contra a Pérsia resultou na deposição dele (Pfeiffer, 605). Trata-se, na verdade, de uma série de relatos fantásticos. 2. Importância. A verdadeira importância de Zorobabel está no fato de ele ser consid rado descendente de Davi (-> Davi, # 1858). Ageu retatou Zorobabel como um “servo” e um 1290
Zorobabel
“anel de selar” de Deus (Ag 2.23), dois termos descritivos que representam os reis davídicos do período anterior ao exílio (cf. SI 89.20; Jr 22.24). Pelo menos Ageu parece ter antevisto tanto a reconstrução do templo de Jerusalém quanto a restauração da dinastia davídica depois do exílio e, em decorrência disso, uma renovação de todas as bênçãos associadas à cidade e ao rei escolhido por Deus (Ag 2.6-9, 15-19,20-23; cf. SI 132.11-18; ver Mowinckel, 1959, 11922). Essa opinião ainda mostra seus reflexos séculos depois. Como engrandecemos nós a Zorobabel? Porque ele também foi como um anel na mão direita, e do mesmo modo a Jesus, filho de Josedec? Os quais em seus dias edificaram a casa [de Deus], e levantaram ao Senhor o seu santo templo, destinado para uma glória sempitema. (Ecli 49.13-14 trad. Antônio Pereira de Figueiredo) Zacarias (contemporâneo de Ageu) não foi tão ousado em sua profecia, antevendo um governo conjunto de um rei e um sumo sacerdote (4.14), enquanto o papel de Zorobabel res tringia-se a construtor do templo (4.6-10) e não era um líder militar poderoso. Essa idéia é semelhante ao retrato de Davi traçado pelo cronista ( 1 Crônicas 22—29). Zacarias promete uma figura aparentemente messiânica que recebe o título de “Renovo”, mas seu nome não é mencionado e sua vinda é prevista para um futuro mais do que indefinido (Zc 3.8; 6.12-14). Em conjunto com a imagem totalmente distinta de uma renovação da antiga aliança davídica com toda a comunidade, trata-se de uma lembrança de que havia uma grande variedade de formas de esperança “messiânica” depois do exílio (cf. Is 55.1-5). Uma vez que não se faz menção alguma de um governador davídico depois de Zo robabel, tudo indica que essas esperanças morreram durante algum tempo ou passaram por uma transformação. O evangelho de Mateus é um exemplo desse último caso. Mateus traça a genealogia de Jesus de volta até Zorobabel (Mt 1.12-16). Como observa Ralph L. Smith: “O cumprimento demorou vários séculos e então, com a vinda de Cristo... as esperanças de Ageu com relação ao templo e Zorobabel foram cumpridas. E claro que a nova era ainda não alcan çou o auge. O poder dos reinos deste mundo ainda é forte, mas o resultado final da história é inexorável” (Micah-Malachi, WBC, 1984, 163). Crônicas: Teologia; -> Zacarias: Teologia; -> Ageu: Teologia B ib l io g r a f ia
P. R. Ackroyd, Exile and Restoration, 1968, 138-52; K.-M. Beyse, Die Kõnigserwartung der Propheten Haggai und Sachaija, 1972; B. T. Dahlberg, “Zerubbabel”, IDB, 1962,4:955-56; M. Noth, Die israelitischen Personennamen, 1928,63; C. L. & E. M. Meyers, Haggai, Zechariah 1-8, AB, 1987,9-13; S. Mowinckel, He That Cometh, ET, 1956; R. H. Pfeiffer, Introduction to the OT, 1948; H. G. M. Williamson, “Zerubbabel”, ISBE 4:1193-94; idem, “The Composition o f Ezra I-VI”, JTS, n.s. 34, 1983, 1-30. Rex Mason
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W i l l e m A . V a n G e m e r e n (PhD) é Professor de Antigo Testamento e Línguas Semíticas no Trinity Evangelical Divinity School.
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