As aventuras de um tecladista brasileiro no Japão S N I F A & Ano 2 - Número 16 - Agosto 2015 www.teclaseafins.com.br
Rogerio Tutti O desafio de misturar concerto e show em um novo filão da indústria do entretenimento
iPad
E mais: Nova coluna: A Alma do Blues MIDI e VST: o setup necessário para um show Arranjo exclusivo: “Encontros e Despedidas” Harmonia: a utilização das dissonâncias
Tudo sobre a ferramenta para produção musical e os melhores aplicativos para você baixar
Sample & Hold A unidade de síntese da sonoridade sci-fi
S N I F A &
Ano 2 - N° 16 - Agosto 2015 Publisher
Nilton Corazza publisher@teclaseafins.com.br Gerente Financeiro
Regina Sobral financeiro@teclaseafins.com.br Editor e jornalista responsável
Nilton Corazza (MTb 43.958) Colaboraram nesta edição:
Alex Saba, Alexandre Porto, Eloy Fritsch, Fabio Ribeiro, Ivan Teixeira, José Osório de Souza, Maurício Pedrosa, Rosana Giosa, Turi Collura, Wagner Cappia Diagramação
Sergio Coletti arte@teclaseafins.com.br Foto da capa
Êdi Pereira Publicidade/anúncios comercial@teclaseafins.com.br Contato contato@teclaseafins.com.br Sugestões de pauta redacao@teclaseafins.com.br Desenvolvido por
Blue Note Consultoria e Comunicação www.bluenotecomunicacao.com.br Os artigos e materiais assinados são de responsabilidade de seus autores. É permitida a reproduação dos conteúdos publicados aqui desde que fonte e autores sejam citados e o material seja enviado para nossos arquivos. A revista não se responsabiliza pelo conteúdo dos anúncios publicados.
EDITORIAL Esta edição de Teclas & A fins está diferente! A começar por nossa matéria de capa, em que damos destaque a uma proposta artísticomusical levada a termo por um jovem e talentoso pianista: a mistura de show e concerto como forma de entretenimento para o público e realização para o artista, desbravando novos mercados e possibilidades. O responsável pela iniciativa é Rogerio Tutti, que reuniu as experiências que absorveu em diversas par tes do mundo para apresentar um tipo de produto ainda não explorado por artistas brasileiros. Mas a proposta de trazer novidades em nossa ediçã o não para por aí. A nossa prestigiada e qualificada equipe de colaboradores ganha mais dois integrantes. O tecladista e produtor Fabio Ribeiro inicia nesta edição uma série de artigos sobre o uso profissional do dispositivo iPad para produção musical, indo além do básico e aprofundando conceitos e informações. Ao lado dele, o experiente músico Maurício Pedrosa começa uma série de artigos sobre o Blues, abrangendo história, técnicas, exercícios e tudo mais relacionado a o estilo. Com o objetivo de levar o melhor do universo das teclas a nossos leitores, Teclas & Afins continua em busca de novidades, lançamentos, mais informação e, sobretudo, qualidade, apresentando referências e trabalhando para o desenvolvimento de músicos, professores, alunos, escolas, artistas e mercado. Aguarde muito mais nas próximas edições. Boa leitura!
Nilton Corazza Publisher
Rua Nossa Senhora da Saúde, 287/34 Jardim Previdência - São Paulo - SP CEP 04159-000 Telefone: +55 (11) 3807-0626 4 / junho 2015
teclas & afins
NESTA EDIÇÃO VOCE EM TECLAS E AFINS 6
44 vida de musico
O espaço exclusivo dos leitores
As aventuras de um tecladist a brasileiro no Japão
INTERFACE 10
As notícias mais quentes do universo das teclas
Por Ivan Teixeira 48 alma de blues
Primeiros passos Vitrine 14
Por Maurício Pedrosa
Novidades do mercado musica movel 20
iPad
50 palco
Na ponta dos dedos Por Wagner Cappia
Ferramenta de produção musical materia de capa 28
Rogerio Tutti
54 cultura hammond
Hammond-Leslie e o Blues Por José Osório de Souza
O desafio de uma proposta artística sintese 36
Sample & Hold
58 arranjo comentado
Valsa brasileira Por Rosana Giosa
Por Eloy Fritsch livre pensar 40
A inspiração do Marquês de Sade Por Alex Saba
teclas & afins
62 harmonia e improvisacao
Densidade harmônica e emancipação das dissonâncias Por Turi Collura
junho 2015 / 5
vOCE em teclas & afins
Vamos nos conectar? Amilton Godoy é Genial. (Tiquinho Santos, em nossa página no Facebook) Muito fã...Outro dia estava escutando um álbum importante do Zimbo. Este aí é o maior legatário do Brasil do piano popular de qualidade. (Felipe Kern Moreira, em nossa página no Facebook) R.: O objetivo de Teclas & Afins sempre foi o de apresentar boas referências para aqueles que se dedicam ou amam os instrumentos de teclas e a música de qualidade. Amilton Godoy não poderia ficar fora dessa lista. Parabéns pela longevidade da revista! Prova da qualidade! Abraços. (Marcio Buzelin, em nossa página no Facebook) R.: O entrevistado capa de nossa primeira edição muito nos honra com seu comentário. Quando iniciamos a publicação de Teclas & Afins , sabíamos que podíamos contar com o apoio de músicos de qualidade como Marcio Buzelin.
Mostre todo seu talento! Não importa o instrumento: piano, órgão, teclado, sintetizadores, acordeon, cravo e todos os outros têm espaço garantido em nossa revista. Mas tem que ser de teclas! Como participar: 1. Grave um vídeo de sua performance. 2. Faça o upload desse vídeo para um canal no Youtube ou para um servidor de transferência de arquivos como Sendspace.com, WeTransfer.com ou WeSend.pt. 3. Envie o link, acompanhado de release e foto para o endereço contato@teclaseafins.com.br 4. A cada edição, escolheremos um artista para figurar nas páginas de Teclas & Afins, com direito a entrevista e publicação de release e contato. Teclas & Afins quer conhecer melhor você, saber sua opinião e manter comunicação constante, trocando experiências e informações. E suas mensagens podem ser publicadas aqui! Para isso, acesse, curta, compartilhe e siga nossas páginas nas redes sociais clicando nos ícones acima. Se preferir, envie críticas, comentários e sugestões para o e-mail contato@teclaseafins.com.br 6 / agosto 2015
teclas & afins
vOCE em teclas & afins
Essa é a minha paixão. Lembro de Rick Wakeman e suas óperas-rock como Viagem ao Centro da Terra. Vou compartilhar! (Valdir Silva, em nossa página do Facebook, sobre a matéria a respeito dos Moog modulares). R.: Ficamos felizes em saber que nosso público está curtindo nossas postagens nas redes sociais e compartilhando conteúdo. Dessa forma, mais do que aumentar nosso número de leitores, faremos crescer a cultura dos instrumentos de teclas em nosso País. Amei a entrevista, parabéns, vivendo e aprendendo com pessoas que fazem a diferença! (Maria Cristina Quintana, em nossa página do Facebook, a respeito da entrevista com Ruriá Duprat) Sabedoria de quem conhece a fundo! Vídeo altamente recomendável! (Elisandra Klawa, em nossa página do Facebook, a respeito do vídeo com Ruriá Duprat) R.: Mais uma referência do mundo das teclas que nos deu a honra de falar aos nossos leitores. Ruriá Duprat, além de extremamente agradável, tem muito a ensinar. Onde encontrara em Niterói a revista para comprar? Se não, qual o outro meio. Desde já agradeço a atenção (Joel Rodrigues, por e-mail) R.: Teclas & Afins é uma revista digital, disponibilizada em seu próprio site e em websites de parceiros. Ela não é impressa ou distribuída, o que permite que seja gratuita. Mas a ideia de uma versão impressa existe. Acreditamos que em um futuro breve isso será possível. Agradecemos seu interesse por nossa publicação.
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agosto 2015 / 7
vOCE em teclas & afins
A longa jornada Do início na música gospel à formação de um trio de jazz, músico sergipano corre atrás da realização profissional O pianista Weide Morazi atualmente desenvolve um cuidadoso trabalho interpretativo sobre standards de jazz, clássicos da bossa-nova e grandes canções da MPB e da música internacional. Paralelamente ao Nova Bossa Jazz Trio, se dedica ao grupo que leva seu próprio nome, com o qual dá vazão à criatividade e ao prazer de fazer música, sobre um repertório seleto de clássicos. Pode-se dizer que seu estilo é um amálgama de diversas vertentes jazzísticas como o bebop, o modal, o jazz contemporâneo e a música brasileira. Mas o caminho para a afirmação de seu modo de tocar não foi curto, muito menos fácil.
8 / agosto 2015
Natural de Aracaju, no Estado de Sergipe, Morazi despertou para a música, como muitos outros de sua geração, graças à comunidade evangélica: “Comecei basicamente, como autodidata”, conta. “Tive meu primeiro contato com o instrumento na igreja que frequentava, já na adolescência. Nessa época, apenas ficava observando pessoas que já tocavam e quem estava aprendendo mas havia descoberto o instrumento antes de mim”, diz o músico. Depois de absorver o que pôde, Morazi passou a integrar bandas gospel e, na sequência, grupos de música popular, onde teve contato com outros gêneros e passou a tocar profissionalmente, acompanhando cantores e instrumentistas da cena local, em shows e gravações. Em meados da década de 1990, o pianista conheceu Alejandro Habib, saxofonista argentino radicado no Brasil, com quem passou a se apresentar regularmente. “Posso dizer que - além, é claro, de um grande amigo - Alejandro foi um divisor de águas no caminho que acabei trilhando”, confessa o pianista. “Conheci o jazz por meio dele. Até então, tinha ouvido basicamente música instrumental brasileira: o grupo Cama de gato, e músicos como Léo Gandelman, Nico Assunção e Hélio Delmiro, que eram as principais influências de alguns amigos. Mas, o jazz (americano), realmente conheci com o Alejandro, porque acabei indo tocar em um hotel de Aracaju, em que ele já trabalhava. E ele, apaixonado pelo estilo, queria tocá-lo comigo e passou a me mostrar gravações e me explicar os conceitos envolvidos nessa teclas & afins
vOCE em teclas & afins
NA REDE
forma de arte.” O conhecimento veio com a audição de fitas cassete com coletâneas de gravações de gigantes do jazz, como Charlie Parker, John Coltrane, Thelonious Monk, Lennie Tristano e outros. A parceria rendeu bons frutos, e entre quintetos, quartetos e duos, a formação escolhida para a gravação de um primeiro CD foi sax, piano e percussão. O grupo chamado Aratrio, gravou três composições próprias e quatro de outros compositores (Charlie Parker, Thelonious Monk, Bill Evans e Maurício Einhorn) no álbum Sl. 23, trabalho independente de 2008. A proposta era fazer jazz mesclando as principais influências musicais de cada um dos integrantes, entre elas os autênticos ritmos brasileiros e latino-americanos. Em 2009, Morazi fez as malas e se mudou para São Paulo. “A ideia de construir uma carreira, para mim, sempre teve como foco o eixo Rio-São Paulo, por que sempre era ali que as coisas aconteciam no cenário musical brasileiro”, explica. “Sempre soube que, mais cedo ou mais tarde, acabaria me mudando”. Com os trabalhos escasseando em Aracaju e o desejo de se transferir para o Sudeste ficando cada vez mais forte, decidiu-se por arriscar a sorte. “Graças a Deus, as coisas foram acontecendo, e eu fui, pouco a pouco, encontrando pessoas que me ajudaram a conseguir os meus primeiros trabalhos e me firmar como músico”. Como pianista, atuou em casas noturnas e se dedicou ao trabalho em duo teclas & afins
com o baterista Ricardo Berti, explorando a livre improvisação. Foi apenas na capital paulista que teve aulas com professores particulares e desenvolveu sua técnica. “Estudei com uma professora maravilhosa, Nilze Cruze. Aprendi muito com ela, que foi hipergenerosa comigo, tanto na transmissão de conhecimentos quanto no preço realmente simbólico que cobrou por isso”, conta. “Popular, estudei com o Evaldo Soares, grande pianista e mestre da harmonia jazzística, que também me ajudou bastante, tanto com o conteúdo das aulas (muita harmona!) quanto com o valor cobrado”, reconhece o músico. “Aulas de improvisação, nunca tive. A linguagem que acabei desenvolvendo veio por meio da transcrição de patterns de músicos que amo”, ensina. “Já vi alguém se referir a esse tipo de abordagem, nas artes e na ciência, como “subir nos ombros de gigantes”, e acho que é isso mesmo. A gente aprende com os grandes, depois modifica um pouco aquilo, e acrescenta outros elementos, de modo a expressar a nossa própria personalidade musical.”
agosto 2015 / 9
INTERFACE
MAIS QUE AGUARDADO Jean- Miche l Jarre ,
o mestre da música eletrônica, finalmente anunciou a data de lançamento e o título do novo trabalho. Chamado E-Project , o tão aguardado álbum – o primeiro desde Téo & Téa, de 2007 - trará 16 faixas em colaboração com vários artistas e grupos, entre eles M83, Massive Attack, Tangerine Dream e Gesaffelstein, cujas faixas já foram divulgadas. “ Tenho vontade de contar a história da música eletrônica do meu ponto de vista e de minhas experiências, desde quando comecei até hoje”, disse Jarre. “Então, planejei colaborações com vários artistas que estão direta ou indiretamente ligados à cena das últimas quatro décadas durante as quais me dediquei a fazer música eletrônica. São artistas que admiro pela sua contribuição única para o nosso gênero, que representam uma fonte de inspiração para mim porque também têm um som imediatamente reconhecível. No início, não tinha ideia de como fazer evoluir este projeto, mas estava feliz porque todos os artistas que contatei aceitaram meu convite”. O lançamento está marcado para o dia 16 de outubro, mas a pré-venda já está aberta. 10 / agosto 2015
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INTERFACE
SESC Jazz & Blues De 13 a 30 de agosto, o festival leva shows que apresentam um panorama da produção contemporânea dos gêneros a cidades do interior do Estado de São Paulo e à capital. Entre os artistas, os destaques ficam por conta dos pianistas Gilson Peranzetta , Makoto Kuriya, Kenny ‘Blues Boss’ Wayne, Shai Maestro e Laurent de Wilde, além do tecladista Eumir Deodato. Mais informações podem ser obtidas no site do SESC.
ARREPENDIDO O Maroon 5 cancelou dois shows que faria na China em setembro após o tecladista da banda, Jesse Carmichael, parabenizar o Dalai Lama, líder espiritual tibetano, via Twitter. Replicada da conta do Instagram do músico, a mensagem foi postada no dia 4 de julho, lembrando também a independência americana. Sem dar explicações, Carmichael a deletou poucas horas depois. Segundo a imprensa daquele país, o comentário de Jesse Carmichael dividiu a opinião dos chineses e, provavelmente, irritou as autoridades locais. A China acusa o Dalai Lama de lutar pela independência do Tibete, criticando duramente os encontros do líder espiritual com autoridades e personalidades internacionais. Exilado desde a ocupação chinesa do Tibete em 1959, o Dalai Lama já recebeu apoio de diversos artistas, que, por isso, viraram “personas non gratas” no país asiático. Responsável pelos shows em Xangai e Pequim, a produtora Live Nation não explicou o motivo do cancelamento. teclas & afins
agosto 2015 / 11
interface
TRÊS GRANDES PERDAS Ivan Moravec, pianista tcheco que construiu sua reputação como um dos grandes intérpretes de Chopin, morreu em Praga, aos 84 anos. O pianista de jazz John Taylor , co-fundador do Azimuth Trio e que tocou com Norma Winstone, Kenny Wheeler, Soft Machine e Charlie Haden, entre outros, sofreu um ataque cardíaco ao piano enquanto se apresentava na França, aos 72 anos. O mesmo mal vitimou Eddie Hardin, aos 66 anos, tecladista do Spencer Davis Group, do Axis Point e do duo Hardin and York.
12 / agosto 2015
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VITRINE
Toque nos produtos para acessar vídeos, informações e muito mais!
Korg Pa600BR
Pride Music – www.korg.com.br
O teclado arranjador KORG Pa600BR traz como diferencial timbres e 40 ritmos genuinamente brasileiros, produzidos e gravados nos melhores estúdios do País, por músicos de cada região onde esses ritmos e sons surgiram. A coleção de novos ritmos traz desde Samba Enredo e Pagode a Forró Universitário, passando pelo Arrocha, pelo Vaneirão e pelo Funk Carioca. Entre os timbres, foram obser vados detalhes para imprimir o máximo de realismo possível, desde a ressonância de um surdo de bateria até a tessitura das cordas de uma viola caipira. E, para torná-lo ainda mais completo, a Korg manteve a principal biblioteca de timbres e ritmos do Pa600 e todas as funções desse modelo como mecanismos de som Enhanced RX (Real eXperience) e DNC (Defined Nuance Control); massiva memória PCM interna; duas chaves programáveis e um joystick de quatro posições para controle total dos diversos níveis de articulação sonora; gabinete compacto e elegantemente desenhado; potente sistema de amplificação; display TFT colorido TouchView; interface gráfica intuitiva com a nova função Search (busca) para recuperação facilitada de qualquer arquivo ou recurso musical; mais de 360 Styles de fábrica, cada um incluindo três Intros/Endings, quatro Variations e quatro Fill In + Break, além de dez Favorite e três bancos User para armazenamento de seus Styles personalizados; modo Guitar 2 aprimorado, para partes de guitarra ainda mais realísticas, além de Pads sincronizados; função Chord Sequencer que pode gravar qualquer progressão de acordes durante a performance; conjunto General MIDI aprimorado para Standard MIDI Files, compatibilidade com formatos populares de Lyrics (letras), incluindo gráfico (+G), além de Text Viewer, Marker, e Score; player de MP3 com funções Transpose e Tempo Change;quatro Stereo Master Effects (125 algoritmos de efeito); banco de dados SongBook totalmente programável, baseado em Styles, SMF, Karaoke, e MP3, com chamada instantânea de qualquer ajuste de músicas e listas personalizadas pelo usuário.
14 / agostO 2015
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VITRINE
Kurzweil Forte
ProShows – www.proshows.com.br O stage piano Forte é um dos mais recentes lançamentos da Kurzweil e o mais avançado da marca. Oferece 16 GB de novos sons amostrados a partir dos modelos Steinway D Hamburgo, Yamaha C7, Rhodes 73’ e 77’, Wurlitzer e Clavinet D6 entre outros, além de conter uma nova gama dinâmica que permite maior realismo do pianíssimo mais delicado ao fortíssimo mais estrondoso. A biblioteca conta ainda com os timbres da linha PC3 e a síntese V.A.S.T. O teclado de 88 teclas traz mecanismo FATAR TP/40L Hammer-action com Velocity e Aftertouch. O Forte apresenta novo design e display LCD colorido 480 x 272, além de equalizador e compressor global no painel frontal. Os 23 controles físicos programáveis e os nove sliders/drawbars com Led permitem acesso rápido aos programas favoritos e ao controle do KB3 Tone Real Organ, com polifonia total. Um software permite edição ampla e profunda dos parâmetros e efeitos, incluindo programação em até 16 zonas.
Yamaha Reface
Yamaha Musical do Brasil – www.yamaha.com.br Os miniteclados portáteis da linha Reface são releituras dos clássicos teclados Yamaha das décadas de 1970 e 1980, como os consagrados sintetizadores CS80 e DX7, dos órgãos da linha YC e dos pianos CP. Denominados CS, DX, YC e CP, os modelos oferecem 37 miniteclas (três oitavas) e funcionam também à pilha. Todos possuem alto-falantes embutidos, conexão MIDI USB, saída P10 e entrada auxiliar P2 estéreo. Destinados a tecladistas, criadores de música e sonoplastas, funcionam também como controladores MIDI, pois os controles do painel (específicos de cada modelo) enviam mensagens MIDI CC. O Reface CS é um sintetizador digital de modelagem analógica, com oito vozes de polifonia, cinco formas de onda e efeitos embutidos. Oferece o recurso looper, que permite gravar frases MIDI. Esse mesmo recurso pode ser encontrado no Reface DX , sintetizador FM de quatro operadores (similar ao FB-01) com interface multitouch e possibilidade de salvar programações. O Reface YC traz cinco modelos de órgãos, com drawbars e demais controles no painel, ao passo que o Reface CP traz seis timbres de pianos elétricos, clavinete e toy piano.
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agosto 2015 / 15
VITRINE
Cluster Sisters Cluster Sisters
Som Livre O trio vocal londrinense Cluster Sisters lança seu primeiro CD, depois de uma trajetór ia de destaque na TV. O grupo composto por Gabr iela Catai (mezzo), Giovanna Correia (contralto), M aitê Motta (soprano), Emilio Mizão (guitarra e violão), Filipe Barthem (contrabaixo), Bruno Cotrim (bateria), Wesley César (saxofone e clarinete), André Siqueira (trompete e flauta) e Mateus Gonsales (piano) dedica-se ao resgate histórico do Swing Jazz e das harmonias vocais imortalizadas por grupos como Andrews Sisters e Ross Sisters. De fác il e rápida identificação, o estilo exige ótimas interpretações vocais e afinação precisa. E esse é o grande trunfo das vocal istas. O álbum traz repertório que vai de “Tico Tico no Fubá” e “What a Wonderful World” a “Route 66” e “Sing Sing Sing”, passando por “Tuxedo Junction” e “Boogie Woogie Bugle Boy”. Os arranjos próprios trazem deliciosas releituras, além de qualidade musical impecável, mas, apesar do sabor fresco, as vocalizações tornam-se cansativas após algumas audições. Ótimo, em doses homeopáticas. (Nilton Corazza)
Tomada Tomada
MZA Music Formada por Ricardo Alpender (voz), Pepe Bueno (baixo), Paulo Navarro (bateria), Mateus Schanoski (teclados) e Vagner Nascimento (guitarra), a banda paulistana Tomada já tem um tempo de estrada. O rock bem-feito vem acompanhado de elementos da música brasileira. Em seu primeiro EP digital homônimo, lançado pela MZA Music – selo do renomado produtor Marco Mazzola -, a banda coloca em evidência um som com energia e batuque. O álbum abre com o rock pesado e cadenciado de “(Quero Ter Uma) Música Forte”. Na sequência, o primeiro single de trabalho – “De Verdade”, mostra vocais presentes, percussões brasileiras e elementos folk. Produzido pela banda, o álbum conta também com mais quatro faixas: a balada “Entro em Órbita”, “Ela não tem Medo”, “Hoje Eu Não Tenho Nada A Dizer” e “DC*3”, uma canção épica com veia progressiva. A versão deluxe do disco vem também com dois clipes: “Ela Não Tem Medo” e “De Verdade”, que une animação e imagens da banda. 16 / agostO 2015
teclas & afins
VITRINE
Conheça as publicações da SOM & ARTE E D I T O R A
INICIAÇÃO AO PIANO POPULAR Volumes 1 e 2 L A NÇ A Inéditos na ME NT O área do piano
Irreversible Remove Silence
Independente O novo EP do Remove Silence chega ao mercado em agosto trazendo muitas novidades. A primeira delas é a formação da banda: Ale Souza, no baixo, Fabio Ribeiro, nos teclados, Danilo Carpigiani, na guitarra, e Leo Baeta, na bateria. A outra é a sonoridade, moderna, com melodias e timbres mais refinados e o uso intensivo de tecnologia, principalmente no que diz respeito à utilização de iPads, tanto na criação quanto nas performances do tecladista (veja matéria à página 20). É notável a importância dos dispositivos na construção da nova sonoridade do grupo, muito mais madura e próxima do progressivo. O disco abre com “The Waiting”, em que os teclados dominam a cena. A faixa-título mostra a faceta mais pesada da banda. “Frequencies” e “Miracle” são as faixas em que o uso de texturas fica mais evidente, em oposição a “Decline of Modern Life”. “Our Song” fecha o EP como um grande resumo das intenções que nortearam o projeto. Imperdível para todos aqueles que gostam de boa música e querem estar atualizados com as tendências existentes. (Nilton Corazza) teclas & afins
popular, são livros dirigidos a adultos ou crianças que queiram iniciar seus estudos de piano de forma agradável e consistente.
MÉTODO DE ARRANJO PARA PIANO POPULAR Volumes 1, 2 e 3 Ensinam o aluno a criar seus próprios arranjos.
REPERTÓRIO PARA PIANO POPULAR Volumes 1, 2 e 3 Trazem 14 arranjos prontos em cada volume para desenvolvimento da leitura das duas claves (Sol e Fá) e análise dos arranjos.
Visite nosso site para conhecer melhor os 3 Métodos e os 3 Repertórios
www.editorasomearte.com.br Contato:
[email protected] agosto 2015 / 17
musica movel
Por fabio ribeiro
FERRAMENTA PARA PRODUÇÃO MUSICAL O sistema cresce e é aprimorado incessantemente, mas, afinal, em que nível está o iPad para o uso do m úsico profissional e do produtor? 20 / agostO 2015
teclas & afins
musica movel
O tempo passa. Ainda me lembro com clareza dos ensaios com minhas prime iras bandas e da dificuldade de conquistar nossos primeiros registros em áudio. O objetivo inicial de qualquer banda brasileira, na época, não era o de lançar álbuns comerciais logo de cara, “viralizar” no YouTube ou alcançar o discutível grau de “celebridade” da noite para o dia. Apesar da pouca idade e da inexperiência, tínhamos uma boa noção dos inúmeros degraus a serem escalados e do fato de que qualquer projeto sólido e duradouro deveria ser edificado aos poucos, com profissionalismo e qualidade musical. Mas, o que fazer quando você está na adolescência e não dispõe de recursos financeiros nem mesmo para as coisas triviais? Pensar em um investimento tão alto, como o de simplesmente lançar o nome de uma banda no mercado naqueles dias, era algo surreal. Não existia nem sombra do grau de auto-suficiência que existe hoje nesse sentido. Se o desejo fosse lançar uma banda de forma profissional,
o músico inevitavelmente precisaria de uma gravadora, de alguém que bancasse e regularizasse o processo todo. Então, um dos primeiros passos para os iniciantes era o de gravar a tão almeja da “fita demo” em um estúdio profissional, uma espécie de carta de apresentação em áudio para que alguém pudesse se dispor a lhe ouvir. Sim, fita magnética, em formato cassete, coisa de museu para muitos hoje em dia. Mesmo assim, era uma empreitada para a qual a maioria de nós tinha que economizar dinheiro de mesada, de lanche do colégio, deixar de comprar aquele LP... Geralmente, eram meses de vacas magras até que o montante para gravar uma ou duas músicas fosse alcançado. Hoje, analiso este dispositivo que tenho em minhas mãos e vejo como trinta anos de desenvolvimento tecnológico podem fazer toda a diferença para quem procura andar sempre antenado. Enquanto escrevo este texto, tiro pequenas pausas para terminar de programar alguns sons em um dos meus sintetizadores virtuais,
Remove Silence: pioneirismo na produção com iPads teclas & afins
agosto 2015 / 21
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recolher algumas amostras digitais do som da colher batendo no copo de café para usar no meu sam pler, ou acertar mais alguns detalhes na mixagem da minha nova música, que provavelmente será lançada comercialmente, com um nível de qualidade inimaginável nos anos 80. E tudo no mesmo dispositivo. Não preciso sequer levantar do so fá. Afinal, após quase meia década de discussões sobre o uso do iPad para música, o dispositivo já pode ser encarado como uma ferramenta de uso profissional ou permanece como um simples a cessório ou até mesmo um “brinquedo” como alguns insistem em classificá-lo? Em minha opinião, a arte, a tecnologia, a diversidade e a inovação podem e devem andar de mãos dadas.
Panorama Entrei tardiamente nessa onda: meu primeiro dispositivo foi um iPad 3, que ainda uso nos shows. Foi um modelo de transição, o primeiro com tela de retina. Logo em seguida, o iPad 4 e o iPad Air trouxeram mais poder de fogo. Esses são os modelos usados no estúdio. O que me atraiu em um primeiro momento foram
Peter Vogel CMI Pro: Fairlight por 50 dólares 22 / agostO 2015
Pulse Code Modular: sintetizador modular completo que apresenta a mesma sonoridade, arquitetura e design dos sistemas analógicos, excelente para o sintesista tradicional e também para o ensino de Síntese Básica
as possibilidades exclusivas de interação com a tela e o modo como isso pode trabalhar com sintetizadores e demais dispositivos musicais, além da mo bilidade característica e da facilidade de uso. Sua simplicidade e sua objetividade nos convidam a fazer música. Além disso, o dispositivo é altamente inspirador, muitas vezes o remédio perfeito para o inevitável bloqueio de criatividade que enfrentamos em diversas situações durante nossas jornadas musicais. Pode também tornar-se um vício para aqueles que procuram pelo “cálice sagrado do som que ninguém ouviu” como eu, pois muitos teclas & afins
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dos aplicativos disponíveis pertencem a uma classe isolada em termos de sonoridade, com sistemas de síntese e processamento de áudio combinados que não estão presentes dessa forma em dispositivos dedicados de hardware como os sintetizadores, workstations e equipamentos de efeito atuais. Isso, para nós, foi um prato cheio. Muitas das sonoridades presentes nas produções mais recentes da minha banda – Remove Silence - são baseadas nas diferentes texturas exclusivas que os aplicativos do sistema iOS podem proporcionar e diversas músicas do nosso novo EP Irreversible - foram na verdade compostas e pré-produzidas no sistema. Agora, após três anos de uso contínuo e inúmeras experiências, posso afirmar também que o iPad, embora ainda careça de potencial de hardware para tomar definitivamente o lugar do laptop como plataforma integrada para produção musical final e completa - coisa que não deve demorar muito - já é um aparato absolutamente indispensável para o músico sério que procura se diferenciar e, principalmente, para o produtor que busca praticidade e, acima de tudo, inovação.
Waldorf Nave: síntese aditiva e Wave Table no melhor estilo “touch screen”., com formas-de-onda meticulosamente manipuláveis por meio da tela teclas & afins
Seu sintetizador preferido Para nós, tecladistas, o iPad entrou no mercado com grandes atrativos já em suas primeiras gerações. Em pouco tempo, empresas icônicas como Korg, Moog e PPG disponibilizaram aplicativos para o sistema. Diversos outros vieram na sequência, como Novation e Waldorf. Até mesmo o cobiçado Fairlight CMI, com o qual eu apenas sonhava ao ler as páginas de anúncios de publicações internacionais - instrumento que tinha sua faixa de preço na casa das dezenas de milhares de dólares, por tratar-se de uma revolução tecnológica para a época - está disponível em versão virtual para o iPad com sua biblioteca completa de sons originais. Por 50 dólares... Apesar do investimento inicial em um iPad não ser mais tão baixo nestes tempos conturbados de nossa pátria, a relação custo-benefício que o dispositivo apresenta continua sendo indiscutível. O preço a ser pago por uma coleção de instrumentos virtuais, processadores de efeito ou aplicativos de gravação é inacreditavelmente baixo se comparado aos mesmos itens para desktop ou em hardware. O processamento e a memória
Setup com múltiplos apps combinados por meio do sistema Audiobus, com canais de recepção MIDI independentes (IK Multimedia “iGrand Piano”, “iLectric Piano”, “SampleTank” e Yonac “Galileo”) agosto 2015 / 23
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desta sexta geração (iPad Air 2) já permitem que a qualidade de áudio e o desempenho de aplicativos complexos isolados ou de um conjunto bem balanceado de aplicativos combinados sejam equiparáveis aos de um computador ou de dispositivos musicais dedicados. Podemos contar com dezenas de sintetizadores virtuais de boa qualidade, cujo preço varia entre 5 e 30 dólares, diversos dos quais simulam diretamente instrumentos existentes. Talvez o universo da simulação de síntese analógica seja o mais extenso no sistema iOS, o que pode fazer que os adeptos de sistemas mais “antigos”, como eu, se sintam imediatamente em casa. Isso também coloca o dispositivo em um a posição privilegiada para a área de ensino de tecnologia musical. No momento, o iPad é minha principal ferramenta para as aulas de programação de sintetizadores, por causa da facilidade de manuseio e também do acesso imediato dos alunos a determinados equipamentos “históricos” em suas versões em software. Praticamente todos os sistemas de síntese sonora conhecidos podem ser abordados e, o que é melhor, explorados musicalmente síntese subtrativa, síntese aditiva, síntese
granular, Waveshaping, Wave Table, Sampling, FM, Physical Modeling... O iPad é um paraíso para o sintesista tradicional e também para o mais ambicioso experimentalista. Obviamente, instrumentos tradicionais como pianos acústicos e elétricos, órgãos litúrgicos e eletromecânicos, aplicativos de múltiplos timbres baseados em sample playback para simulação de instrumentos acústicos etc. também estão disponíveis em diversas formas para o sistema, o que direciona o iPad no caminho certo para substituir seu rack de geradores de som ou até mesmo seu laptop em uma situação ao vivo. Tudo o que você precisa é de um bom controlador MIDI e de conectores específicos para o iPad, como o Camera Connection Kit (USB), da própria Apple, ou o iRig MIDI da IK Multimedia (com conectores MIDI padrão).
Bit Shape TC-Data: Controlador MIDI e OSC (Open Sound Control)
ApeSoft iDensity: aplicativo baseado em síntese granular
24 / agostO 2015
Um novo instrumento musical O grande atrativo do iPad para qualquer finalidade é a interação com a tela de múltiplos toques, altamente sensível, imediata e dinâmica. Para música, isso não poderia ser diferente. Na verdade, é um dos fatores que distinguem o iPad dos
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musica movel
demais instrumentos musicais (acústicos e eletrônicos) e de suas versões virtuais em computadores comuns. O dispositivo pode tornar-se um instrumento musical completamente novo nas mãos de músicos criativos, resultando em sonoridades inéditas e, até mesmo, em novos tipos de música. Sim, é muito legal ter uma versão de um sintetizador clássico no seu laptop, mas que tal um sintetizador cujos sons você nunca ouviu? Além disso, é muito mais legal poder tocar esses instrumentos com múltiplos toques dinâmicos por meio de um aplicativo como, por exemplo, o Bit Shape TC-Data (controlador MIDI), com seus comandos totalmente programáveis para completa articulação através da tela e dos sensores de movimento do iPad. A Bit Shape disponibiliza também o TC-11, com as mesmas pos sibilidades de controle sobre um mecanismo de síntese interno muito flexível. Ambos possuem um apelo visual surpreendente e possibilidades de performance praticamente infinitas. São aplicativos que exploram a tela em sua melhor forma e podem ser ótimos elementos para enriquecer performances ao vivo. Existem vários apps que permitem controles alternativos sobre seus sons e também sobre geradores externos via MIDI. Alguns apps permitem que você toque a forma-de-onda de um som, literalmente. Instrumentos baseados em sampling e síntese granular, como o Samplr, de Marcos Alonso, e o iDensity, da ApeSoft, permitem manipu lar amostras de áudio de maneiras muito criativas através da tela. Outros instrumentos para iOS como o Moog Animoog e o PPG WaveMapper, ambos baseados em Wave Tables, ap licam mais dois conceitos muito interessantes teclas & afins
TTrGames MiMiX: maneira prática de administrar os sinais de áudio
possíveis com o iPad - glide polifônico e aftertouch polifônico. Imagine tocar um acorde e poder mover as frequências das notas independentemente com cada dedo, aplicando glides e bendings separadamente, ou controlando a dinâmica ou qualquer outro aspecto de um som de forma completamente distinta para cada nota. Isso não pode ser obtido em um teclado convencional. E você também não pode reconfigurar livremente os graus, o tamanho ou o formato de sua escala em aspecto físico em um instrumento comum, coisa muito freqüente nos aplicativos musicais para iOS. Esse detalhe nos leva a mais um aspecto positivo - a facilidade de criar música também para quem não entende do assunto. Além dos aplicativos estritamente didáticos, os próprios apps musicais parecem seguir a tendência da simplicidade desde o início, o que certamente atrai um público muito maior para o dispositivo. Não é incomum encontrar aplicativos que permitem obter resultados musicais muito bons, mesmo por quem nunca colocou as mãos em um instrumento musical. Se você já é um instrumentista, mesmo que não seja tecladista, provavelmente agosto 2015 / 25
musica movel
também vai encontrar um app que lhe permita ampliar suas capacidades musicais e sonoridades com facilidade. Aplicativos baseados em instrumentos de cordas, como guitarras, baixos, instrumentos de orquestra etc., muitas vezes possuem suas
iFretless Guitar: app com ótimos sons de guitarra e violão, que pode também ser usado como controlador MIDI para outros apps e dispositivos externos
26 / agostO 2015
interfaces configuráveis de acordo com o aspecto visual do instrumento original. Isso convida esses instrumentistas a experimentarem de forma natural e espontânea as inovações que os recursos da tela multitouch e os diversos tipos de processamento de áudio podem proporcionar aos sons com os quais e stão acostumados. O mesmo acontece com os aplicativos direcionados para bateria, percussão e outros instrumentos.
Fabio Ribeiro Produtor, consultor de tecnologia musical, tecladista da banda Remove Silence
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KORGPA600BR.COM.BR
materia de capa
NILTON CORAZZA
Rogerio Tutti: seguindo a trilha do sucesso
28 / agostO 2015
teclas & afins
materia de capa
Caminhos cruzados A frente de uma orquestra formada por ele próprio, o pianista Rogerio Tutti se lança ao desafio de misturar concerto e show em um novo filão da indústria do entretenimento
teclas & afins
agosto 2015 / 29
materia de capa
Ganhador de vários concursos internacionais, bacharel em Piano, Mestre em Música pela University of North Dakota, nos Estados Unidos, e graduado em piano pela New England Conser vatory, em Boston, doutor em Música pela Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo, além de ter estudado no Conservatório Tchaikovsky, na Rússia. Nada mal para quem iniciou os estudos na cidade de Bauru, no Estado de São Paulo e, aos 16 anos, foi premiado no Concurso Internacional Amadeo Roldan, em Cuba, dando início à carreira internacional. O pianista Rogerio Tutti carrega conhecimento e técnica de sobra para rivalizar com qualquer grande músico internacional de sua geração. Mas, seguindo a tendência da busca por um público mais exigente que o das modas musicais passageiras, mas não
tão preparado para a sala de concertos, apostou em um formato que vem ganhando fervorosos adeptos - tanto no meio musical quanto na plateia – e pode abrir as portas para o sucesso comercial: a mistura de show e concerto. Nascido Rogerio Lourenço dos Santos – o Tutti, por mais coincidência que possa parecer, é apelido de infância –, o pianista gravou em São Paulo, durante o mês de maio, seu segundo DVD (o primeiro, intitulado “Concerto de Piano”, com obras de Beethoven, Chopin, Liszt e Villa-Lobos, foi gravado em 2007 e transmitido para mais de 40 países). Com uma orquestra de aproximadamente 30 músicos entre selecionados e convidados, painéis de LED, dançarinos e cantores, o show lotou as dependências do Citibank Hall em São Paulo, comprovando que a mistura de concerto e show caiu nas graças do
a r i e r e P i d Ê ©
Crossover performance: produção caprichada 30 / agostO 2015
teclas & afins
materia de capa
público. A ideia, nascida e testada durante as apresentações do artista em cruzeiros ao redor do mundo, ganhou corpo e o pianista pretende excursionar pelo Brasil e pelo exterior apresentando seu “crossover performance”. Conversamos com Tutti pouco depois da gravação e pudemos saber mais sobre suas concepções e perspectivas. Como foi sua formação musical e o início de sua carreira?
Eu comecei estudando em Bauru, onde nasci, com professores particulares. Foi tudo muito rápido, porque quando comecei a estudar seriamente e me decidi, “vou ser pianista”, aos 16 anos, participei de um concurso em Cuba. Ganhei um prêmio, uma bolsa, e fiquei estudando em Cuba. Desde quando comecei a estudar, fiz isso muito seriamente, ficava de 8 a 10 horas no piano. Qual escola técnica você segue?
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Virtuose: carreira internacional
mercado tão maior, tão mais estabelecido lá fora. Existem escolas centenárias, de muita tradição. E isso é muito difícil de estabelecer. Isso é tradição! Vai demorar um tempo ainda para termos uma tradição estabelecida no Brasil. Volto a dizer: há gente muito boa no Brasil. Mas acho bom passar por essa experiênc ia de estudar fora. Há uma maior exposição também, mais visibilidade, outras pessoas. A cultura do estudo é muito legal. Fora a vida artíst ica. Aqui em São Paulo ainda há um grande Atualmente, para um músico que movimento. No Rio de Janeiro também. quer se firmar, estudar fora do país é Mas fora disso, não há muitos concertos, artistas internacionais se apresentando, fundamental? Não acredito que seja regra. Há gente então, não há muito em quem se inspirar. muito boa no Brasil, excelentes professores Mas, em um grande centro, há vários e pianistas. E o país está crescendo muito concertos, artistas, masterclasses. E isso nesse aspecto nos últ imos anos. Mas há um é muito legal. Aqui no Brasil ainda é Nem sei muito diferenciar, mas acredito que siga mais a escola russa, porque tive uma professora cubana que estudou na Rússia e eu também estudei um pouco lá. Quando a gente olha para trás, na história, isso é muito separado: técnica russa, alemã, francesa. Hoje em dia, isso está tão misturado... Nas grandes escolas há professores de todas elas, tudo está muito globalizado. Mas minha maior influência é a escola russa.
teclas & afins
agosto 2015 / 31
materia de capa
a r i e r e P i d Ê ©
Multifunção: pianis ta, regente, a nfitrião, apresen tad or
necessário criar uma tradição maior. Essa altos, o que eleva os níveis de performance. experiência internacional, então, é sempre bem-vinda. Não é ela que vai determinar Como você vê o ensino de música no uma carreira, mas é algo sempre bem-vindo. Brasil hoje? Vejo o nível muito mais alto, mesmo em Qual sua opinião sobre concursos de concursos. Há 10 ou 15 anos o panorama era um e agora é outro completamente piano? Acho muito legal a preparação. Isso faz diferente. A tendência é que cresça muito o músico ter um foco muito grande, se nas próximas gerações. desenvolvendo. Isso do lado do pianista. Há “zilhões” de concursos hoje, mas os Qual o conceito que norteou a gravação que realmente alavancam a carreira são do DVD? Tchaikovsky, Chopin, Van Cliburn, Leeds e Recentemente, há uns 4 anos, comecei a talvez algum outro. O músico sai desses fazer shows e apresentações em cruzeiros, concursos com uma grande exposição e até mesmo recitais e concertos. Foram toca com várias orquestras. Mas há casos várias experiências. Houve uma vez em também em que a pessoa qu e não ganhou que meu empresário me disse que haveria o concurso é a que tem carreira de maior um show, mas que ele gostaria que eu sucesso. Mas também acredito que isso utilizasse a orquestra do navio. E eu tinha não seja determinante, mas é ótimo para o apenas uma semana. Pesquisei o que iria músico, pois há níveis de exigência muito fazer e surgiu uma ideia. Mas eu não tinha 32 / agostO 2015
teclas & afins
materia de capa
material algum, então comecei a escrever arranjos, fiz algumas reduções. E achei muito legal... Eu não era mais “apenas” o pianista, que chegava lá e estava tudo pronto. Logo que comecei a escrever e sentir os resultados, achei muito legal. É necessário criar muitas coisas e, também, fazer um roteiro de show, não mais um concerto, para entreter as pessoas. E eu gostei disso, porque foi muito desafiador e minha abordagem com o piano nesses shows continuou a mesma. Na verdade, tive que criar mais, foi mais desafiador. Então, comecei a desenvolver isso. Cada vez mais, eu ouvia uma música, pensava no arranjo, o que podia colocar em qual instrumento, o que o piano faria. Minha cabeça mudou completamente. Então, são shows de piano. Não é mais aquele conceito do concerto clássico.
São ótimos exemplos porque buscamos uma mistura dos dois. O que acho legal no André Rieu é a presença dele no palco, o fato de ele ser o anfitrião, o formato de show, o tipo de orquestra que ele usa. É tudo muito alegre. Isso é algo muito legal. Os shows são, todos, grandes produções. Acho isso fantástico. Mas ele não demonstra todo o virtuosismo dele. Ele é meio um regente que toca junto, um humorista, um showman. O David Garrett é virtuose e demonstra isso ao violino, interage com a orquestra ou banda. Às vezes, faz uns arranjos de rock... Essa mistura desses dois artistas me chamou a atenção. O repertório do show é bem eclético,
Qual foi o primeiro show nesse formato?
Comecei fazendo concertos clássicos mesmo. O primeiro foi em um cruzeiro gigantesco pelo Caribe. Eram 1.200 pessoas no teatro e a orquestra era muito boa. Foi muito legal e eu adorei. Tive que fazer os arranjos, compor, idealizar, fazer o roteiro, reger – porque a orquestra funciona, mas alguém tem que cuidar dela. E cada vez mais fui desenvolvendo isso e os arranjos e os shows foram crescendo. Tenho feito muito esse tipo de coisa. E aí surgiu a constatação de que eu precisava crescer, atingir mais público, fazer mais shows. O público gosta muito. A receptividade é muito boa. Então surgiu a ideia do DVD do show. E começamos a pensar como seria a orquestra. No show são claras as influências de músicos como André Rieu e David Garrett. A ideia é essa mesmo? teclas & afins
a r i e r e P i d Ê ©
Ecletismo: show e concerto agosto 2015 / 33
materia de capa
indo de concerto de Tchaikovsky a Gershwin, tango e rock-and-roll. Como são escolhidas as músicas e elaborados os arranjos?
Há várias facetas, mas eu me manifesto pelo piano. Por mais que eu tenha que reger a orquestra, interagir com o público, gosto de dar prioridade ao piano e deixar a parte dele bastante elaborada. Gosto muito de estudos. São peças curtas e desafiadoras. Então procuro colocar elementos desses estudos nos arranjos. Em “Libertango”, por exemplo, que já é linda como é, me insp irei no Estudo Opus 25 N° 12 de Chopin. Utilizo aquele tipo de técnica. Você acredita que pode levar seu público para a sala de concertos, para que ele conheça mais coisas?
Acredito que sim. David Garrett, por exemplo, toca “November Rain” nos shows e, depois, sola o concerto de Mendel ssohn com Zubin Mehta. Se esse público vê que o David Garrett vai tocar com orquestra, provavelmente assiste. Nesse sentido, acredito que sim. No show de gravação do DVD, fizemos o contrário: atraímos o público que me conhecia do erudito. Meu público está acostumado com concerto, com Chopin, Liszt e, no caso desse show especificamente, chamamos o público da
sala de concertos para a casa de shows. Você não tem medo, principalmente no Brasil, dos shows te afastarem das salas de concerto?
Uma coisa que me deixa co m a consciência tranquila em relação a isso é que faço bem. Para mim, não é nada menos fazer os shows do que tocar concertos. A minha dedicação, o trabalho, os arranjos, é tudo muito elaborado. Então, não vejo razão para isso acontecer. Para mim, isso é mero preconceito. Há alguns anos o mercado fonográfico vem tentando emplacar um formato: a violinista Vanessa Mae, o quarteto Bond, o próprio David Garrett e outros, que utilizam outro tipo de apelo além de tocar bem. A sua geração está mais aberta a isso. Você acha importante essa mudança de imagem do músico erudito para que ele tenha uma carreira mais promissora e rentável?
O próprio mercado está pedindo isso. Mas cada um encontra seu caminho. Houve um tempo em que o músico ficava estudando e não queria saber de nada de relacionamento com a mídia. Mas não há como negar que quando alguém vai assistir a um show ele vai ver a imagem. Isso é fundamental nos dias de hoje.
NA REDE a r i e r e P i d Ê ©
34 / agostO 2015
teclas & afins
SINTESE
POR ELOY FRITSCH
Sample and Hold Unidades de síntese como o Sample and Hold (amostra e armazena) são utilizadas para geração automática de uma sequência de alturas aleatórias, cujo efeito produzido, além da música eletrônica, pode ser ouvido em trilhas sonoras na sonoplastia de cenas de filmes que simula sons de computadores
Vários sons produzidos por sintetizadores causam estranhamento aos ouvintes menos acostumados com o repertório da música eletrônica. Alguns soam abstratos ao passo que outros apresentam característica mimética. Certas unidades de síntese como o Sample and Hold (amostra e armazena) são utilizadas para geração automática de uma sequência de alturas aleatórias ou de uma melodia. Além da música eletrônica, o efeito produzido por essa unidade pode ser ouvido em
trilhas sonoras na sonoplastia de cenas de filmes que simula som de computadores e em jogos de computador, quando vários LEDs aparecem ligando e desligando. A unidade de Sample e Hold, inicialmente presente em sintetizadores analógicos, produz níveis discretos de voltagem. Ao receber um disparo (trigger), ou pulso, o módulo irá guardar na memória (amostragem), o nível de voltagem até que o próximo pulso seja recebido. Se o sinal de entrada é randômico (no caso de
Ficção científica: Sampler and Hold a todo vapor 36 / agosto 2015
teclas & afins
sintese
No gráfico acima, o Sampler and Hold recebe um sinal de baixa frequência do VCO mais à esquerda e o sinal de ruído para produzir o sinal de controle que irá modular o oscilador (VCO) mais à direita. No esquema à direita, pode-se ver graficamente as formas de onda da entrada e da amostra, e o sinal S/H resultante.
ruídos brancos ou rosas), o sinal de saída vai ser constituído por séries de voltagens randômicas que podem ser ligadas ao controle de entrada de um oscilador, por exemplo, para produzir uma série randômica de notas (melodia aleatória). Se uma onda dente-de-serra for produzida para ser processada pelo circuito S&H, a saída será uma onda em forma de escada, podendo produzir uma melodia arpejada. A unidade de S&H pode receber um pulso externo ou possuir seu próprio pulso interno denominado clock (relógio).
Algumas unidades de S&H possuem seu próprio gerador interno de ruído branco (sinal randômico) que pode ser mixado com qualquer sinal de entrada para produzir variações imprevisíveis do som. Por já ser um recurso conhecido dos músicos eletrônicos, os fabricantes de sintetizadores digitais e Music Workstations disponibilizam presets pré-programados com a sonoridade do S&H. A linha XP de sintetizadores e Music Workstations da Roland, por exemplo, apresenta presets programados para reproduzir os efeitos do Sampler and Hold.
Korg MS-20: Sampler and Hold tradicional teclas & afins
agosto 2015 / 37
SINTESE
Utilização Na síntese modular, a unidade de Sample and Hold é alimentada por duas entradas. Ela requer uma entrada de sinal de controle de trigger e uma entrada para o áudio. O controle de trigger pode ser obtido a partir de um sinal randômico, como um ruído, ou um sinal de clock (tipicamente uma forma de onda pulse abaixo de 20Hz de frequência). O S&H seleciona um nível de voltagem baseado na informação da entrada do sinal de áudio e o envia até ele ser disparado novamente pelo sinal de controle para selecionar um novo nível.
Roland Modular System-700: detalhe da unidade de Sample and Hold
Eloy F. Fritsch Tecladista do grupo de rock progressivo Apocalypse, compositor e professor de música do Instituto de Artes da UFRGS onde coordena o Centro de Música Eletrônica. Lançou 11 álbuns de música instrumental tocando sintetizadores, realizou trilhas sonoras para cinema, teatro e televisão.
24 horas no ar Uma das mais ouvidas no Mundo!
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38 / agosto 2015
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livre pensar
POR ALEX SABA
Lalo Schifrin: temática insólita para música de qualidade
40 / agosto junho 2014 2015
teclas & afins
livre pensar
A inspiração do Marquês de Sade Em um dos álbuns de título mais longo de toda a história fonográfica, Lalo Schifrin diverte-se às custas do famoso nobre Entrei um dia em uma discussão infindável com meu faz tudo do estúdio - o famoso Sevé - sobre o Marquês de Sade. Não sei como ele sabia de tanta coisa sobre o nobre em questão, de quem muita gente fala e não tem a menor ideia de que m foi. Mas Sevé sabia tudo, do nome completo (Donatien Alphonse François de Sade) à data de nascimento (2 de junho de 1740) e até mesmo o nome de uma personage m criada por ele, uma ingênua defensora do bem, chamada Justine. Curiosamente, Sevé não sabia nada sobre um disco de jazz sobre Sade, mais especificamente um disco do século passado (1966) chamado The Dissection And Reconstruction Of Music From The Past As Performed By The Inmates Of Lalo Schifrin’s Demented Ensemble As A Tribute To The Memory Of The Marquis De Sade. Sempre adorei esse gigantesco e nem um pouco singelo título. A brincadeira era enorme, mas a música bem séria... se bem que não. Não dá para ter um título desses e não se divertir tocando. Essa foi a conclusão do Sevé - e minha também - principalmente com esse “demented essemble” de Lalo Schifrin.
Creed Taylor, que pouco depois fundaria a prestigiosa CTI, para a Verve, e gravado por Van Gelder, famoso engenheiro da Blue Note que relançou vários discos importantes de jazz gravados em seu estúdio. Schifrin criou um clássico ao fazer sua “adaptação” da música europeia pré-clássica. Como diz no encarte, “o difícil de um projeto desses é a aparente não relação entre as antigas tradições e o novo enfoque musical”. “The Blues For Johann Sebastian” é uma prova de como ele se saiu bem. Dedicado à memória do filho mais novo de J.S.Bach, J.Gottfried
O álbum
O álbum foi idealizado e produzido por teclas & afins
agosto junho 2015 2014 / 41
livre pensar
Bernhard (1715-1739), é “uma tentativa de expressar o dramático lirismo da escola barroca no formato de doze compassos do blues”. “Renaissance” é peça baseada na progressão harmônica característica do período. Flauta, piano e guitarra improvisam sobre o tema tocado inicialmente pelo alaúde. “The Wig” é bem interessante, ainda mais sabendo que Schifrin estava tentando compor enquanto ouvia Count Basie, Ramsey Lewis e R olling Stones (Sevé me perguntou como al guém consegue compor ouvindo Rolling Stones, mas deixa pra lá!). O compositor afirma que o resultado é chocante, mas é muito mais que isso. “Beneath A Weeping Willow Shade” é a transcrição de uma peça de um dos primeiros compositores americanos, Francis Hopkinson (1737-1791) e o solo de flauta poderia muito bem ter sido tocado por Ian Anderson do Jethro Tull, mas é de Jerome Richardson. Schifrin novamente nos diz sobre essa faixa: “mudei a mel odia e a letra com o propósito de expressar minhas impressões sobre o bigode da Mona Lisa”. “Versailles Promenade” abre com o ineditismo do cravo improvisando em uma gravação de jazz. Grady Tate (bateria) e Richard Davis (baixo) compõe com Lalo o trio jazz-clássico. Schifrin comenta que essa música “parte do charme e da elegância do período rococó; não há dúvida que este tipo de música foi a verdadeira causa da Revolução Francesa”. “Troubadour” tem Grady Tate arrasando sutilmente enquanto Schifrin improvisa e os metais acentuam certas passagens. O improviso da flauta cita descaradamente música mexicana, enquanto a tônica são os poetas-cantores do século XII e a sua versão contemporânea (em 1966), os músicos de jazz. 42 / agosto junho 2014 2015
“Marquis De Sade” é “em memória (do próprio), um dos fundadores da moderna psicologia ao lado de Aeschylus, Shakespeare e Freud”. Schifrin também disse: “eu imagino que esse era o tipo de melodia que ele murmurava durante suas alucinações”. Destaque para as intervenções do sax tenor de Ernie Royal. O álbum fecha com “Bossa Antique”, baseada em uma figura grave do tipo usada por Carl Phillip Emmanuel Bach. “Estou quase certo que essa seria a forma como ele teria escrito e ssa peça se tivesse tido oportunidade de visitar o Brasil com seu amigo Johann Joachim Eshenburg”. Exageros à parte, que não passam de uma brincadeira de Schifrin para descrever sua música, este é um álbum imperdível. Em tempo, para quem não associa o nome ao tema, Lalo Schifrin, nascido Bóris Claudio Schifrin, em Buenos Aires, em 21 de junho de 1932, é o autor do tema do famoso seriado de TV dos idos anos de 1966, Missão Impossível .
Lalo Schifrin: Freud explica! teclas & afins
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vida de musico
por ivan teixeira
FESTIVAL BRASIL-JAPÃO Quando o primeiro mundo da tecnologia musical e o primeiro mundo da ar te brasileira tornaram diferente um tecladista tupiniquim
Com certeza, nunca estive tão longe de casa. Mas ao mesmo tempo, por coincidência, nunca estive tão perto de coisas que sempre corri atrás como pessoa e como profissional. Em uma ótima mistura de civilidade e organização, pude conhecer Tóquio, uma cidade gigantesca, com todo tipo de música e, para minha alegria, especialmente aquela produzida por sintetizadores. Minha missão foi o show no Festival Brasil - o Brazilian Day Tokyo, como nos acostumamos a chamar - com a ótima cantora Luiza Possi, prestigiada pelos brasileiros do Japão tanto quanto aqui. Já de início, minha responsabilidade era dobrada porque, além de mim, o único tecladista brasileiro do festival era simplesmente o grande Guilherme Arantes. Representar as teclas do meu País junto com ele já foi motivo mais que suficiente para estar muito feliz. Mas como já previa, não parou por aí. Não quero fazer desta matéria um guia de
Festival Brasil Japão 2015: matando as saudades 44 / agosto 2015
viagem, mas não posso deixar de dizer que em Tóquio talvez exista uma cena musical tão rica quanto cidades como Nova York, por exemplo. Música de todos os lugares, vários clubes de jazz e casas de apresentações mais informais abarrotam a grande cidade, que tem como seu principal meio de mobilidade urbana uma complexa malha ferroviária, com trens e metrôs. E lá na estação, em pé, aguardando um trem, tive uma suspeita a respeito das vinhetas de avisos do serviço de alto-falantes da estação. Cada assunto, como horários, atrasos, informações, tinha uma vinheta específica. E tudo feito com um Yamaha DX7. Em uma “googada” - na internet megarrápida e gratuita da estação - constatei o que meus ouvidos estavam suspeitando: tudo feito com esse grande e consagrado synth 100% japonês. O evento brasileiro na terra do sol nascente reúne imigrantes de várias cidades japonesas, gente que, em sua maioria, tem ascendência nipônica e vai pra lá no sonho de trabalhar e ter uma condição de vida melhor. A distância de 27 horas de voo e o alto preço dessa passagem faz que muitos deles, vivendo a 12 ou 15 anos ali, tenham uma única oportunidade de voltar para o Brasil durante esse tempo. Ouvir nossa música, ainda mais executada por brasileiros, é uma grande ocasião para matar um pouco a saudade. E eles não a deixaram escapar. Tocar para brasileiros fora do Brasil é uma experiência única. É uma saudade coletiva. Digo isso porque pude perceber as pessoas curtindo as músicas de olhos fechados, às teclas & afins
vida de musico
vezes chorando, em um contexto de que muita história foi deixada para trás, em busca de dias melhores. Em compensação, não encontrei nenhum brasileiro (pelo menos eu não encontrei...) arrependido. Nosso show ocorreu no Yoyogi Park e teve presença marcante de mais de 2 mil oriundos daqui. E mesmo com o acesso a tantas expressões musicais, os músicos brasileiros com que tive contato dizem que, de certa forma, nossa música é absolutamente muito procurada, não somente aquilo que é notadamente brasileiro, mas também para as propostas mais modernas. Para gente que vive aqui e toca por aqui na maior parte do tempo, fica difícil entender esse pop brasileiro, a mistura da nossa expressão moderna com aquilo que é raiz para todos os tecladistas daqui. Mas eles sentem a diferença. Falando da nossa área, os japoneses lidam com sintetizadores com muita fluência. Ter um sintetizador é parte da linguagem. É incrível que, em pleno século XXI - em um mundo globalizado e altamente tecnológico - a gente por aqui sofre um pouco de preconceito ou pudores à utilização dos synths. No Brasil, produtor musical que usa mais sintetizadores, tecladistas - e qualquer músico ligado a síntese - tem um selo de “modernidade”. Lá, é o default. Quase que um “não faz mais do que a obrigação”. Eles não têm esse freio, e o grande barato é sintetizar tudo. É reler o folclore através dos synths. Afinal, eles são os grandes desenvolvedores de toda essa tecnologia no mundo, tendo as principais marcas de síntese e máquinas do gênero: Korg, Yamaha e Roland.
FIVE-G: tudo o que você sempre quis ver
como forma de competição. É porque é. Na Yamaha, em sua loja conceito (Yamaha Hall), um prédio enorme de cinco andares em um bairro badaladíssimo chamado Ginza, funciona uma escola de música dos sonhos. Um andar é apenas para venda de partituras (nesse momento me senti moderninho com meu iPad e meu forScore), outro apenas para instrumentos de sopro, tecnologia, guitarras, e o meu favorito: um andar só com as melhores séries de pianos acústicos e digitais da Yamaha. Um lugar para passar o dia tocando e chorando. No prédio da Kawai também funciona uma loja com todos os modelos disponíveis da linha deles. Mas o Cuidado com os aprendizes piano de acrílico na vitrine da loja da Kawai Tanto a Kawai quanto a Yamaha possuem era o ponto realmente mais “turístico” para escolas muito sérias de piano. Estive nas qualquer amante das teclas. duas unidades e posso dizer que não existe Para nós, músicos, outro ponto incrível: as nada parecido no Brasil. Falo isso sem o lojas de instrumentos musicais. Até comprei menor problema, porque não comparo um violão japonês, pois não resisti. Todos teclas & afins
agosto 2015 / 45
os lançamentos dos grandes fabricantes (como o JD-XA, da Roland, e a nova série da Yamaha, Reface), tudo à vontade para tocar e se esbaldar, sem ninguém “enchendo o saco”. Destaque para o momento gasto com os três Prophets (06, 08 e 12) sem ninguém me perturbar. Para a nossa alegria, as lojas de instrumentos usados - ou second hands, como são conhecidas também - são imperdíveis. O paraíso para qualquer um. Os equipamentos usados sempre estão bem mais baratos. Pena que não dá pra ir para o Japão só com a roupa do corpo para poder carregar as malas de equipamentos. Lá, tem de tudo, em um estado de conservação impecável. A pérola que você precisa conhecer É aqui que paro para dizer que estive em um paraíso chamado FIVE-G, uma loja que reúne tudo o que você sempre quis ver. É quase um museu, de tantas peças em tão bom estado, contando nas prateleiras boa parte da história dos sintetizadores e as evoluções que aconteceram no decorrer do tempo. Recomendo pelo menos visitar o site www.fiveg.net e dar uma navegada com o Google Tradutor. Siga a loja também no instagram: @fiveg_music. Vale a pena! Vai ser uma pesquisa personalizada, você receberá as atualizações das postagens e se surpreenderá com a quantidade de equipamento interessante que existe por aí. Nessa loja, pude ter uma conversa interessantíssima com o proprietário, Kiyotsugu Suzuki, que contou sua história de garimpagem ao redor do mundo nos últimos 20 anos, bem como a criação de uma oficina técnica exclusiva para fazer manutenção e recuperar todos os sintetizadores disponibilizados na loja, da
mesma forma que tivessem acabados de ser construídos, mesmo os modelos com mais de 30 anos. Poder experimentar teclados da década de 1970 não tem preço. E dar de cara com outros modelos raros e quase completamente desconhecidos, como John Bowen, Waldorf e Dave Smith, foi mágico. Fim da jornada Minha reflexão para essa experiência é uma simples constatação. Em nosso solo, existe muito espaço a ser explorado por nós. É inegável a importância dos sintetizadores na música moderna. Talvez seja até a presença deles que a faça ser definida assim. Temos a missão de colocar nossa criatividade, nossa curiosidade, nossa experimentação a serviço da nossa música. Somos, inclusive, as novas “cores” da próxima música, aquela que seus netos vão escutar. Existe uma possibilidade que possamos deixar o nosso legado. Mesmo que não seja com os equipamentos mais modernos ou menos acessíveis. Temos condição de reinventar a utilização daquilo que está à nossa mão, não tenho a menor dúvida disso. Me coloco junto de vocês, como representante da música brasileira, porque a vivo todos os dias. Isso não é privilégio meu, nem minha responsabilidade individual. Volto para o Brasil mais motivado em fazer a minha parte e poder influenciar com minha voz aqueles que também têm algo a dizer sobre sua forma de pensar música através de seus sintetizadores. Mãos à obra!
Ivan Teixeira Pianista de formação erudita, tecladista por sua própria escolha, Ivan Teixeira é proprietário da produtora de áudio IMUSI, produzindo, compondo e arranjando diversos projetos para cantores, cinema, publicidade e games. Trabalha com nomes importantes da música brasileira e tem sua própria carreira e seus discos gravados. 46 / agosto 2015
teclas & afins
alma de blues
POR mauricio pedrosa
Primeiros passos Um iniciante nos estudos de piano ou órgão, que procura aprender blues, provavelmente vai achar difícil tocar os vários estilos do gênero. E há várias razões para isso
O blues é muito mais do que um simples riff. Tocar esse estilo, com todo o som característico dele, requer mais habilidade, mesmo nas músicas mais simples, do que muitos outros gêneros musicais. O baixo, na mão esquerda, é quase sempre tocado de três maneiras: em progressão lenta (slow rolling), ao estilo boogie, ou “caminhando”
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(stride piano style). A melodia na mão direita é, normalmente, tocada mais rapidamente e utiliza contratempos ou ritmos sincopados. Isso significa que, em um solo de blues, ou mesmo em um acompanhamento, as duas mãos tocam em velocidades diferentes e acentuando notas em tempos completamente distintos.
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alma de blues
Quase todos os livros de blues, em sua maioria importados, vão diretamente às descrições das escalas, notas blue e contratempos, além de fazer referência a uma grande variedade de elementos de teoria. Apesar de nenhuma dessas questões ser de difícil compreensão, os livros que tratam do assunto tendem a requerer do leitor alguma interação com o que é ensinado. Mesmo aqueles destinados a iniciantes explicam os conceitos pressupondo que o leitor já conhece música. E que deseja compreender a diferença entre o blues e outros estilos. Os riffs de piano blues, geralmente, exigem agilidade nos dedos acima do nível de iniciante. Portanto, se há, “realmente” e “seriamente”, interesse em aprender blues, é recomendável que se comece o trabalho, primeiramente, por meio de livros sobre piano popular para iniciantes, que são fáceis de serem encontrados. A p rincípio, o ideal é aprender a executar melodias simples, a tocar usando as duas mãos ao mesmo tempo, a ler música, compreendendo as notas e ritmos. Dedicar-se, em particular, aos exercícios para os dedos e trabalhar a independência das mãos. Memorizar escalas e acordes e tornar-se apto a tocálos bem. Quando se atinge um nível básico, é possível começar a mergulhar no maravilhoso mundo do piano blues. Não é necessário passar anos estudando
o básico antes de começar com o gênero. Contudo, é preciso praticar tempo suficiente para desenvolver uma base adequada, sobre a qual estarão apoiados os estudos. E quanto tempo é adequado, então? Obviamente a resposta vai depender do quanto o aluno irá praticar e do tipo de método que seguirá. Em geral, porém, um mínimo de um ano de estudo, com prática de seis a 1 2 horas semanais, o colocarão no estágio ideal para começ ar a se dedicar ao estilo. Alguns podem discordar, achando não ser necessária uma boa preparação antes de iniciar os estudos desse gênero musical, pois algumas pessoas com tal ento natural estão aptas a isso. Contudo, para a maioria, aprender piano blues requer conhecimento e prática anterior dos conceitos básicos. Atualmente, não é regra para um iniciante de piano popular passar horas a fio estudando Hanon (estudo reser vado mais aos pianistas clássicos). Será muito útil, porém, se algumas horas forem dedicadas a essa prática. Nunca se deve esquecer, também, da tradição “auditiva” do blues. Aprende-se muito de ouvido e, sendo assim, quanto mais se ouvir, maior será o entendimento e a familiarização com os vários estilos do gênero. Isso, aliado ao estudo da teoria e da técnica, é bom para que se esteja em forma quando o blues cruzar o seu caminho.
Mauric io Pedrosa Tecladista, vocalista, compositor e produtor. Foi integrante das principais bandas do cenário do rock brasileiro, como Ursa Maior, Made in Brazil, Walter Franco e R ita Lee & Tutti-Frutti . Nos anos 80 emplacou um sucesso nacional - “Só Delírio” - com a banda de pop rock Telex. Acompanhou artistas internacionais como Pepeu Gomes, Mathew Robinson, Lil’ Ray Neal, Charlie Love, Tom Hunter, Nuno Mindelis, entre outros. Em 2001, participou do Festival Internacional de Jazz de Montreal. www.reverbnation.com/mauriciopedrosa teclas & afins
agosto 2015 / 49
PALCO
POR WAGNER CAPPIA
Na ponta dos dedos Com o avanço da tecnologia, cada vez mais músicos têm à disposição soluções que oferecem facilidade de utilização, qualidade sonora e domínio completo, em estúdios ou ao vivo
Foi em junho de 1981 que o mercado percebeu a necessidade de criar u m padrão de comunicação entre sintetizadores. Até então possível para os equipamentos monofônicos, e para os novos polifônicos, a comunicação ocorria geralmente entre equipamentos de um mesmo fabricante apenas. Dois anos mais tarde, era divulgado um padrão que foi adotado pelo mercado. Em poucos anos essa tecnologia evoluiu simples e rapidamente. Nascia o
Musical Instrument Digital Interface, ou simplesmente MIDI. Apesar de seus pouco mais de 30 anos, o MIDI sofreu poucas alterações, o que demonstra que o protocolo nasceu certo e hoje é a alma na comunicação entre equipamentos, não somente teclados, mas baterias eletrônicas (ou não), guitarras, pads e uma infinidade de dispositivos que “conversam” de forma simples e extremamente eficiente mesmo em
Jord an Rud ess : setup d e estúdio 50 / agosto 2015
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PALCO
cadeias complexas. Com uma plataforma tão poderosa, a indústria de software musical se desenvolveu amplamente diante um campo tão rico a ser explorado e o MIDI passou a ser uma base sólida também para colocar a música dentro do computador. Nesse processo, surgiram os editores de partitura e áudio MIDI, que utilizavam (e utilizam por padrão até hoje) o banco de som universal do protocolo MID I. Dentre as diversas implementações de software, está o Virtual Studio Technology ( VST), padrão desenvolvido pela Steinberg em 1996 . No início, o VST era uma série de plug-ins de efeitos, como Chorus, Reverb e outros. Em 1999, porém, a interface foi atualizada e passou a tratar não somente efeitos, mas também instrumentos virtuais recebendo o titulo de Virtual Studio Technology Instrument (VSTi). Outras tecnologias (padrões) concorrem nesse mercado, assim como hardwares específicos para o tratamento de instrumentos virtuais. O uso dessas tecnologias proporcionou um enorme leque de possibilidades e, conforme avança, os custos caem e a qualidade aumenta. Atualmente, com um investimento relativamente modesto, é possível obter resultados realmente interessantes como produto final, tanto em estúdios quanto ao vivo. Levando o sampler e o sintetizador para dentro de um computador por meio dos VSTi´s, pode-se obter sonoridades variadas que antes somente eram possíveis com a aquisição de uma dezena de teclados (e muitos dólares). Com uma interface de áudio com capacidades MIDI e um laptop - bem configurado e com recursos de processamento e memória amplos e de qualidade - é possível obter controle total sobre um ou mais teclados (synths ou controladores) via MIDI e uma gama de teclas & afins
MID I: protocolo “trintão” ain da no topo
timbres realmente impressionantes, além de total domínio sobre c ada equipamento no seu setup, incluindo seleção de timbres, splits, transposição, volume, metrônomo, trilhas de controle e click etc. O que se vai expor aqui é uma forma de acesso a uma sonoridade de qualidade com o menor custo possível. As soluções indicadas aqui não devem ser interpretadas de forma simplória, mas consideradas de forma objetiva e com a eficiência que elas oferecem. Dito isso, mãos a obra! Plataforma A primeira questão a resolver para operar uma estrutura dessas é o computador, laptop ou notebook. Sugiro um PC de marca renomada no mercado e que pos sua uma arquitetura física a mais robusta possível. Lembre-se: ele estará no palco ao lado do músico e precisa aguentar eventuais imprevistos, por mais cuidado que você tenha. Por padrão, as máquinas atuais possuem três portas USB, o que é suficiente para o que se pretende. No entanto, deve-se buscar discos rígidos mais rápidos (acima de 10.000 RPM) e memó ria RAM acima de 4Gb. O processador deve ser preferencialmente Intel. Um i3 vai funcionar, mas um i5 ou superior é mais recomendado. Nessa configuração, vale agosto 2015 / 51
PALCO
salientar que a quantidade de espaço em disco também é impor tante. VSTis ocupam muito espaço (muito mesmo!), então é sadio obter um disco e o particionar de forma que uma grande porção fique para o armazenamento dos dados (samplers) e outra menor para o sistema operacional. É possível trabalhar com o Windows 7 de 64bits, apesar de utilizar os software nas versões em 32bits por questões de compatibilidade de alguns plug -ins.
bem acessíveis com taxas superiores. A comunicação lógica da interface com o computador pode seguir também alguns padrões. O mais recomendado para ter a menor latência possível é o driver ASIO (Audio Stream Input / Output) e sua comunicação física será via cabo USB 2.0 ou superior. Isso é o necessário e o suficiente para a comunicação entre o computador e os dispositivos MIDI. As conexões dos equipamentos podem ser via portas MIDI na interface de áudio ou mesmo USB, nos Interface A segunda parte é a interface de áudio, equipamentos mais recentes, diretamente que nada mais é que uma placa de som, no computador. Utilizo, por exemplo, um interna ou externa, com maior poder controlador Launchkey 61, da Novation de processamento que a enviada de (MIDI via USB), um sintetizador X50, da fábrica com o seu computador. Sem ela, Korg (MIDI via USB), e um piano digital o processamento e o controle de toda a P-95b da Yamaha (MIDI via MIDI). estrutura não serão possíveis de forma eficiente. Uma boa interface deve trabalhar Softwares no mínimo com amostras de 44.1, 48 ou A terceira parte, o cérebro de tudo, está no 96khz e 16, 24 ou 48bits para obter bons software que irá controlar e disponibilizar resultados, embora já existam interfaces os plug-ins para toda a estrutura. Essa categoria de software é chamada de VST Host. Existem inúmeras soluções no mercado que atendem a esse propósito, como o Ableton Live, Bidule, Digital Performer e Reaper, entre outros. Alguns são voltados para a performance ao vivo, como o Cantabile e o Brainspawn Forte (atualmente o meu preferido para essa tarefa). O Forte é um produto com capacidades de hospedagem de VSTs e VSTis, além de outros padrões de mercado, e MIDI, permitindo um controle minucioso de cada equipamento por meio de uma interface extremamente intuitiva. Depois de configuradas a interface de áudio e as pastas de armazenamento dos plug-ins e reconhecidos todos os equipamentos conectados, o próximo passo é configurar cada VSTi que será Interface: comunicação de áudio e MIDI entre computadores e teclados 52 / agosto 2015
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PALCO
utilizado em sua apresentação. Com esse produto, é possível disponibilizar um VSTi com amostras de um coro completo e permitir que este seja mapeado para o controlador e, ao mesmo tempo, alterar o banco selecionado do sintetizador para um timbre de piano, por exemplo. Isso é tratado no produto como uma cena (scene). No momento seguinte, talvez seja preciso alterar o coro para um naipe de violinos e, em separado, efeitos sonoros cinematográficos. Para tanto, basta criar uma nova cena mapeando o plug-in dos violinos para o controlador e o plug-in de efeitos para o sintetizador, configurado agora em modo controlador, executando não seus timbres internos e sim o VSTi hospedado no Forte. Para cada mudança necessária em uma música, cria-se uma nova cena. Com todas as cenas criadas, basta criar e incluir uma música no set list e associar as cenas necessárias para sua execução a ela. Obviamente uma cena pode ser repetida (acionada) quantas vezes forem necessárias em uma música, além de estar disponível para qualquer uma no set list, o que, com o tempo, permitirá que se obtenha uma biblioteca de cenas com o seu estilo próprio, sempre à mão p ara seus projetos futuros.
Brainspawn Forte: software voltado para os palcos
O Forte trabalha com VSTs e pode tratar áudio em uma cena qualquer. É capaz, por exemplo, de mapear o áudio de um microfone conectado à inter face de áudio e aplicar um plug-in de efeitos como um double ou mesmo um reverb simples. Da mesma forma, para uma guitarra, podem-se aplicar plug-ins emuladores de amplificadores e efeitos de distorção, chorus etc. Ao vivo, a interface do forte permite acesso rápido a qualquer música do set list, ou apenas seguir a sequência determinada originalmente, ou ainda alterar configurações ou adaptar alguma configuração de timbre muito rapidamente, deixando seu setup completamente na ponta de seus dedos.
Wagner Cappia Iniciou seus estudos em piano clássico em 1982, com formação pelo Conservatório Dramático Musical de São Paulo. É sócio-diretor do Conservatório Ever Dream (Instituto Musical Ever Dream), tecladista, compositor e arranjador da banda Eve Desire e sócio-proprietário e responsável técnico do estúdio YourTrack. Músico envolvido na cena metal, procura misturas de estilos que vão desde sua origem natura l na música erudita até a música contemporânea, mesclando elementos clássicos e de ambiente em suas composições. Especialista em tecnologia musical, performance ao vivo para tecladistas, coaching para bandas, professor de piano, teclado e áudio. www.cappia.com.br - www.evedesire.com - www.institutomusicaleverdream.com teclas & afins
agosto 2015 / 53
cultura hammond
por Jose Osorio de Souza
Hammond-Leslie e o Blues Laurens Hammond e Don Leslie inventaram mais que um órgão eletrônico e uma caixa amplificada, mas um conceito que produz uma sonoridade única, criação que, com certeza, alcança seu nível mais alto quando usada pela alma do blues
Tocar um instrumento musical é algo que precisa ser, antes de tudo, divertido. É claro que diversão é algo relativo, mas com isso quero dizer que precisa ser prazeroso para quem toca, mesmo sendo o órgão usado para uma finalidade mais séria, como é, por exemplo, a performance litúrgica. Se a música precisa ser divertida, significa que pode ser mais que simples leitura e memorização de partitura: a improvisação dá ao organista a capacidade de imprimir uma identidade mais pessoal à performance. Para isso, o blues é ferramenta fundamental, seja no ambiente que for. for. Quando dizemos Hammond, nos referimos a mais que um instrumento eletrônico,
a uma marca, a um modelo, ou como muitos pensam, talvez equivocadamente, a um órgão simplesmente, mesmo que mais famoso que os outros. Laurens e Don não criaram apenas um instrumento eletrônico de teclas e uma caixa amplificada: eles fizeram isso de maneira única e original! Os engenhos internos, tanto do eletromecânico quanto dos falantes giratórios, produzem um timbre diferenciado. Mas mais ainda que isso, eles criaram um conceito que compreende recursos e acessos a eles que influenciaram toda a indústria: timbragem do órgão por meio de drawbars e ajuste de velocidade dos rotary speakers.
Gregg Allman: mistura infalível de blues e rock 54 / agosto 2015
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cultura hammond
Esse conceito nos mostra que muitos instrumentos eletrônicos com teclas, apesar de repletos de sons e de botões, são teclados eletrônicos e não o conceito Hammond-Leslie original, já que a habilidade necessária para tocar e ajustar esses teclados com gabinetes é diferente. Como dissemos, na música o mais importante impor tante é se divertir, e temos equipamentos para todos os gostos, “gastos” e habilidades. Mas se houver alguma dedicação de estudo e boa vontade, a música pode ser bem mais rica e eficiente para expressar a alma humana. Então vão aqui algumas dicas a muitos que, com alegria, usam o órgão eletrônico, principalmente dentro das igrejas, mas ainda com certa timidez. O conceito Hammond-Leslie Nove drawbars no órgão e três velocidades na Leslie: isso é muito mais que um órgão presetado, que um megateclado eletrônico multicolorido e repleto de controles. Qual é a diferença? Explico: um preset é uma imagem pronta, que pode ser escolhida pelo organista para expressar seu sentimento. Existe um número bem significativo de imagens dentro de muitos equipamentos? Sim, existe, mas são imagens criadas por outros. Contudo, mexer nos nove drawbars é usar uma aquarela de cores puras para produzir imagens, e depois, então, usar as imagens para expressar os sentimentos. Você até pode guardar essas registrações em memórias, mas faça isso depois de testar e ouvir todas as possibilidades de combinações e chegar à mais adequada para a sua preferência e uso. Quando se misturam os vários níveis de volume dos nove drawbars, o organista pinta sua própria tela, chega a um timbre testando e ouvindo, e tira do órgão sua identidade pessoal. Foi isso que Laurens Hammond criou: um conceito baseado nos puxadores dos órgãos teclas & afins
Chester Thompson: empolgação em projeto-solo e com o guitarrista Santana
de tubos que são usados para timbrar o instrumento. Mexer nos drawbars não precisa ser algo que se faz no início da música e que depois permanece estático. A música muda, sua estrutura, o clima emocional de estrofes, ponte e coro, e isso tudo pede modificações na timbragem, que podem ser feitas enquanto a música é executada alterando os ajustes dos drawbars. Trabalhando com os quatro primeiros drawbars puxados, por exemplo, tem-se uma timbragem mais fechada, adequada para música lenta, para um clima emocional mais tranquilo, reflexivo ou mesmo triste. Puxando os três últimos drawbars, todavia, adicionam-se harmônicos agudos ao corpo do timbre, ideal para uma música mais alegre, para o clímax de uma composição. A alternância das velocidades da Leslie é algo que se pode fazer o tempo todo. O organista competente aprende a trabalhar com pés e mãos de maneira que deixa com inveja qualquer pianista clássico. Ajustar o simulador de rotary speakers contido nos bons clones de Hammond, impacta - e muito - a sonoridade do órgão, fazendo-o o vibrar quando em velocidade Fast (Tremolo), ou soar mais tranquilo até descansar, quando passando para as velocidades Slow Sl ow (Chorale), Brake (ligado e sem movimento) e desligado. Enfim, aprenda, acostume-se e valorize os agosto 2015 / 55
cultura hammond
drawbars e os controles de velocidade da Leslie, a velha “half moon” do tonewheel original. Isso, mais o uso do pedal de volume, fará um órgão eletrônico elet rônico falar, fala r, cantar, chorar, rir. rir. Dará a ele alma, a alma do organista, que é muito mais que simplesmente operar um equipamento eletrônico frio e sem vida. Quando descobrimos a abrangência e a riqueza dos drawbars, não precisamos de mais nada em um órgão, achamos limitado Keith Appleton: para quem quer saber mais sobre imporvisação e blues usar um instrumento que não tenha esse recurso. Por outro lado, um organista de de tocar a escala, em andamento moderado blues ou de rock não faz música m úsica sem “passar “passar (nem precisa ser muito rápido), mas com a a mão” no ajuste do rotary speakers. dinâmica trabalhada (o que se faz em um órgão com o pedal de volume e com staccatos O blues e legatos nas frases, já que ele não possui Os recursos que a música de improvisação sensibilidade nas teclas) confere à música permite não são somente para serem um ambiente emocional marcante. Outra usados com aquelas invenções em tempo facilidade nas escalas de blues é que, apesar real que os músicos de jazz fazem. Podem de se poder variar a 3ª (executando escala também ser utilizados durante a leitura de maior ou menor), as menores são adequadas partitura, ou enquanto se toca decor o que tanto para tonalidades maiores quanto para se leu. Por isso, para u m organista completo, menores, sabendo onde e como usar. Além é importante que se aprenda não somente disso, o fato da escala ser construída com os princípios de órgão erudito, leitura de seis notas regulariza e diminui o caminho partitura e uso de m anuais e pedaleira, mas nas teclas, o que permite mais velocidade também o blues. Blues é base para toda a nas frases. Um pouco de estudo para decorar improvisação, depois das escalas maiores, as doze escalas de blues - sendo que se menores e da pentatônica, inicial para utilizarmos a pentablues podemos trabalhar improviso, é preciso conhecer as escalas com menos escalas - enriquece muito o de blues. repertório de frases para improviso, levando Existe uma magia no blues: o simples fato o organista a um nível mais alto.
Booker T. Jones: blues na alma 56 / agosto 2015
Trabalhe com a mão esquerda Se o organista usa a pedaleira para fazer o baixo, a mão esquerda pode ser utilizada para conferir mais ritmo à música. Ela não precisa ficar presa, segurando a harmonia. Comece trabalhando as inversões de acordes, andando no teclado, usando mais que uma oitava e meia. Outro recurso é usar o movimento contrário, em relação ao movimento da melodia que está sendo feito pela mão direita. Isso sofistica o arranjo. teclas & afins
cultura hammond
Depois, use clichês rítmicos. Os mais simples podem ser usados inicialmente, fazendo acordes no contratempo do baixo (baixo nos tempos ímpares e acordes nos pares, por exemplo, em compassos quaternários), o que já deixa a música bem mais viva, principalmente quando se está acompanhando grupo vocal (ou a congregação, nas igrejas). Se o organista não usa pedaleira para baixo, a mão esquerda pode fazer esse elemento, a exemplo dos organistas de jazz. Isso a princípio pode ser bem simples e produz um efeito eficiente. Use a oitava mais baixa do manual inferior com a registração 888000000, com Chorus e Vibrato desligados, trabalhando com as três notas da tríade mais a 6ª. Por exemplo, se estiver tocando na tonalidade de Do maior, use Do, Mi, Sol e La, uma nota de cada vez em movimento ascendente. A 6ª é mais interessante que a 7ªm, usada no blues, porque harmoniza com mais acordes e não choca com a 7ªM. No entanto, se estiver improvisando em blues, a 7ªm pode ser usada no lugar da 6ª. Organistas de jazz que usam a pedaleira para fazer o elemento baixo do arranjo também fazem uso de baixo na mão esquerda, ao mesmo tempo. Só que enquanto trabalham mais com a mão, usam os pés só para realçar as notas da cabeça de compasso, ou dos tempos mais fortes. Jose Osório de Souza Pianista de formação erudita, foi proprietário de estúdio e escola de música e Suporte Técnico da Roland Brasil. É tecladista da noite, compositor e escritor. Ama história e tecnologia dos sintetizadores e samplers, mas é apaixonado por teclados vintages, blues, rock progressivo e música de cinema. Atualmente atua como músico gospel na cidade de Itu (SP). teclas & afins
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arranjo comentado
por rosana giosa
Valsa brasileira Um compasso ternário e uma melodia simples podem se transformar em algo extremamente interessante com um arranjo bem elaborado
A canção “Encontros e Despedidas”, de Milton Nascimento e Fernando Brant, foi lançada em 1985 no álbum de mesmo nome do cantor e compositor carioca, mais conhecido por sua ligação com o Estado de Minas Gerais. Nela, os autores filosofam sobre um de seus temas mais recorrentes: a estação de trem e sua relação com as cidades do interior e a própria vida. Trata-se de uma composição em compasso ternário, que lembra uma valsa e também remete às lembranças do compositor de sua vida no interior. De melodia simples, a canção pede um tratamento mais arrojado no tocante à harmonia. Acordes dissonantes e movimentação rítmica mais intensa imprimem a variedade necessária para fugir do comum e manter o interesse do ouvinte. O arranjo O tema é composto de três partes: A, B e C, com repetição de cada uma delas. Para cada uma das partes foi criado algo novo para despertar mais interesse e criar novos climas. A1 - No início. o tema é exposto de forma simples com acordes distribuídos nas duas mãos e com pouco movimento rítmico na mão esquerda. A2 - Para dar um pouco mais de peso à melodia e diferenciá-la do A1, foram colocados acordes nos primeiros tempos do compasso. Na esquerda, um acompanhamento que se repete a cada dois compassos já imprime uma maior movimentação rítmica. B1 - Nesta segunda parte, a melodia é por si mais movimentada e com harmonia que traz a sensação de certa inquietação e de maior tensão. Para ajudar nesse clima da composição, a esquerda se movimenta ainda mais, em arpejos abertos, que se repetem a cada dois compassos. B2 - Na repetição desse mesmo trecho, foram colocados acordes com 9ª na melodia para criar ainda mais tensão e aumentar a dramaticidade desse trecho. A mão esquerda, agora, trabalha em arpejos mais fechados para dar espaço à direita. A3 - Voltando ao tema inicial, a melodia foi esvaziada de acordes para relaxar um pouco a tensão do B2. Contudo, para diferenciar do A1 e A2, a esquerda propõe um novo padrão de acompanhamento fazendo baixo pedal e baixos invertidos, em movimento descendente, para proporcionar certa suspensão harmônica e preparar a parte C final. C1 - Nesse momento, a melodia conclui a composição de forma mais explosiva e envolvente. Para contribuir com esse clima, são colocados alguns acordes na mão direita. C2 - Na repetição, a melodia foi dobrada em 8ª com alguns acordes no meio, para produzir maior peso e massa de som, para finalizar de forma mais intensa. 58 / agosto 2015
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arranjo comentado
“Encontros e Despedidas”
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arranjo comentado
60 / agosto 2015
teclas & afins
arranjo comentado
Rosana Giosa Pianista de formação popular e erudita, vive uma intensa relação com a música dividindo seu trabalho entre apresentações, composições, aulas e publicações para piano popular. Pela sua Editora Som&Arte lançou três segmentos de livros: Iniciação para piano 1, 2 e 3 ; Método de Arranjo para Piano Popular 1, 2 e 3 ; e Repertório para Piano Popular 1, 2 e 3. Com seu TriOficial e outros músicos convidados lançou o CD Casa Amarela, com composições autorais. É professora de piano há vários anos e desse trabalho resultou a gravação de nove CDs com seus alunos: três CDs coletivos com a participação de músicos profissionais e seis CDs-solo. Contato:
[email protected] teclas & afins
agosto 2015 / 61
HARMONIA E IMPROVISACAO
por turi collura
Densidade harmônica e emancipação das dissonâncias Em uma pequena viagem no tempo, obser varemos algumas mudanças estéticas e compositivas que se desenvolveram, ao longo dos séculos, na música ocidental, destacando dois assuntos interessantes para os músicos que se dedicam ao estudo da harmonia, da improvisação e da composição: o das tensões disponíveis em um determinado acorde e o da “emancipação das dissonâncias”
O século XVII foi um período de grandes Guitar Hero, Isaac Newton idealizava as leis avanços para a humanidade. Na ausência de reflexão e refração da luz; Galileo Galilei de distrações como o Netflix, o X-Box ou o colocava as bases da astronomia moderna;
Snarky Puppy: coletivo de músicos de reno me 62 / agosto 2015
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HARMONIA E IMPROVISACAO
René Descartes inventava a geometria analítica e fundamentava as bases do raciocínio matemático e da lógica dedutiva; e o matemático John Napier propunha publicamente o método de cálculo dos logaritmos enquanto um banco sueco emitia as primeiras cédulas de dinheiro da história. Foi então que o teórico, compositor e organista Andreas Werckmeister, aplicando à música os progressos da matemática, ofereceu ao mundo a afinação temperada, que permitiu estabelecer, definitivamente, o sistema tonal assim como o conhecemos e utilizamos atualmente. Desde então, com a exclusão de alguns fenômenos sonoros como o chamado “funk carioca” ou manifestações acústicas parecidas, foi possível ao homem compor música seguindo encadeamentos de acordes que hoje reconhecemos como familiares. Sequências harmônicas como, por exemplo,
(Djavan) ou em “Fly Me To The Moon” (o Google diz que seu compositor foi Bart Howard, mas trata-se daquela música que nos faz lembrar Frank Sinatra). A observação feita, nos diz que, desde a época Barroca, a cultura ocidental fundamenta a música tonal nas mesmas “regras”, de certa maneira, resumidas em alguns pontos chave: - a centralidade de uma tônica; - a existência de três áreas tonais (tônica, dominante e subdominante); - movimentos e resoluções de trítonos; - clichês harmônicos relacionados com a sequência IV-VII-III-VI-II-V-I; - e por aí vai... Podemos nos perguntar: no que diz respeito à harmonia e à melodia, o que mudou, de Bach para cá? Algumas coisas se alteraram, mas vamos destacar duas: - a densidade harmônica - a que gosto de chamar de “emancipação das dissonâncias”.
Cm7 - F7 - Bb - Eb - Aø7 - D7 - Gm fazem parte de uma extensa cultura musical, de Bach a Ivan Lins. Bach, especificamente, utiliza a sequência citada acima no p relúdio da “Suite Inglesa n. 3”. Encontramos a mesma sequência na música “Autumn Leaves” (Joseph Kosma). Bastam pequenas variações para que possamos encontrar algo bem próximo na música “Flor de Liz”
Densidade harmônica O uso de intervalos de terças para a formação de acordes é característica da harmonia da música ocidental. Isto é, os acordes são compostos pela sobreposição de notas que se distanciam por intervalos de terças. Todos os intervalos são calculados a partir da fundamental do acorde. Vejamos o exemplo seguinte:
Observe: as notas utilizadas para a construção do acorde até a 13ª são as da escala (o que nos faz logo suspeitar que o acorde e a escala têm uma relação indissolúvel). teclas & afins
agosto 2015 / 63
HARMONIA E IMPROVISACAO
Desde épocas remotas, a humanidade coloca-se perguntas existenciais muito sérias, como no caso da antiga questão: “nasceu antes o ovo ou a galinha”? Já na música, a pergunta foi outra: “nasceu antes o acorde ou a escala”? No caso do ovo e da galinha, os estudos nunca consideraram o papel que o galo teve na questão. Já na música, podemos afirmar que a escala nasceu antes do acorde. A partir das notas disponíveis nas escalas, os músicos começaram a criar os acordes. No sistema tonal, acorde e escala são inseparáveis, de onde provém que melodia e harmonia andam estritamente juntas, podendo
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imaginá-las como os dois lados de uma mesma moeda. Feitas essas considerações, o que é “densidade harmônica”? Com esse termo nos referimos à quantidade de sons que utilizamos para a formação dos acordes. A densidade harmônica de uma música baseada apenas em acordes por tríades, por exemplo, é diferente de outra que utiliza acordes que incluam intervalos de sétima, nona, décima-primeira e décimaterceira. E a densidade harmônica mudou ao longo dos séculos. A figura seguinte nos fornece uma ideia muito interessante a respeito disso:
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HARMONIA E IMPROVISACAO
A ideia dessa figura é emprestada do livro do compositor francês Jaques Siron intitulado “La Partition Intérieure” e adaptada por mim no que diz respeito a alguns gêneros da música popular. Ao ler as informações da figura anterior,
aprendemos então que, na época de Bach, havia formações de acordes com densidade 4, isto é, de acordes com a sétima. Isso se dava, especialmente, em acordes de dominante (1-3-5-b7) e diminutos (1-b3b5-bb7).
O acorde Xm7 era admitido, sobretudo com função de IIm7, pois era considerado uma inversão do IV6:
É importante observar que, naquela época, a sétima maior era considerada uma dissonância, e que, portanto, o acorde X7M (1-3-5-7M) não era utilizado como tal. Essa consideração é válida até dias recentes: no jazz dos primórdios (até a assim chamada “era do swing”) esse tipo de acorde era raro, “exótico”. No livro “Swing to Bop”, de Ira Gitler, encontramos o depoimento de um guitarrista relatando o quanto era estranho tocar o primeiro acorde da música “Solitude” (Gershwin) com a sétima maior na nota mais aguda. Trata-se da mesma situação de “Eu Sei Que Vou Te Amar”, de Tom Jobim: a música começa com o acorde de C7M, e a melodia fica, ao longo do primeiro compasso, na nota si, reforçando a formação do acorde. Na música popular, a década de 194 0 foi um momento importante para a emanc ipação das dissonâncias. No jazz, a corrente chamada Bebop propôs a exploração de teclas & afins
acordes com sétima maior, dominantes alterados (b9, #9, b13) e outras guloseimas para os ouvidos. Essas observações nos levam ao segundo conceito que mencionei antes: o da “emancipação das dissonâncias”.
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HARMONIA E IMPROVISACAO
Emancipação das dissonâncias A história da música ocidental poderia ser escrita a partir de um ponto de vista interessante: o da emancipação das dissonâ ncias. Se para nossos antepassados do século X, um acorde composto pelas notas dó-mi-sol (primeiro acorde da figura seguinte) não representava o que significa para nós hoje, no âmbito jazzístico, um acorde como C7M(9,#11,13) pode remeter, atualmente, a um acorde de Dó maior, ainda com função de tônica!
É importante observar que, no âmbito da música da tradição europeia, a ampliação da gama de cores (cromatismos) nos acordes foi algo progressivo, que se deu ao longo do tempo. O século XIX foi um momento muito importante para isso. Richard Wagner (1813-1883) utilizou notas “estranhas” para colorir seus acordes, os quais ganharam muita liberdade de movimento, isto é, liberdade de “resolver” no acorde sucessivo de forma mais livre. A partir desse compositor, a música quebra o conjunto de regras tonais que, desde Bach até Wagner, constituíram o que o teórico Walter Piston definiu como a “prática comum”. O uso insistente de cromatismos levou, no final do século XIX, à crise dos valores tonais. Arnold Schoenberg foi na direção da desintegração do sistema tonal propondo novas organizações sonoras. O que acontece hoje na música “popular”? Dito que tenho certa dificuldade em rotular o Jazz feito a partir da década de 1940 e outras manifestações estéticomusicais dos séculos XX e XXI como sendo “música popular”colocando-as no mesmo caldeirão de algumas outras certamente distantes (se eu usasse o adjetivo simplórias estaria sendo preconceituoso), quero registrar, antes de fechar esse pequeno ensaio, algumas propostas estéticas de maior “densidade” tais como o Jazz modal da década de 1950, o Free Jazz da década de 1960 e a assim c hamada Fusion, surgida nas últimas décadas do século XX. Certamente estou deixando de mencionar grandes artistas com grandes propostas, como Herbie Hancock, Pat Metheny, Joshua Redman, Weather Repor t, McCoy Tyner, Carla Bley, John Scofield 66 / agosto 2015
Gretchen Parlato: personalidade musical eclética teclas & afins
entre muitos outros – sei que esta lista levantará discussões: por que não esse ou aquele outro? Desde já peço desculpas por isso. Acredito poder afirmar com certa tranquilidade que, de forma geral, no âmbito da canção que produzimos e consumimos em nossos dias, utilizamos frequentemente, ainda, uma linguagem fundamentada na harmonia definida pela “prática comum”. Mas cada período histórico contempla seu próprio círculo de artistas que buscam algo novo. Hoje, vivenciamos a pesquisa por rítmicas e grooves marcantes, assim como novas sonoridades, por meio de texturas inéditas – novas combinações instrumentais, por exemplo. Entre os artistas atuais que chamam a minha atenção, há as cantoras Gretchen Parlato e Esperanza Spalding, por exemplo, e o grupo Snarky Puppy, cada um misturando elementos do jazz de forma própria, explorando performances visuais e, sobretudo, conseguindo se vender no mercado. Como todos os fenômenos artísticos muito próximos, é difícil quantificar o impacto que suas propostas irão deixar. Mas vale a pena ficar de olho... Até a próxima!
Esperanza Spalding: voz e instrumento incomuns
Turi Collura Pianista, compositor, atua como educador musical e palestrante em instituições e festivais de música pelo Brasil. Autor dos métodos “Rítmica e Levadas Brasileiras Para o Piano” e “Piano Bossa Nova”, tem se dedicado ao estudo do piano brasileiro. É autor, também, do método “Improvisação: práticas criativas para a composição melódica”, publicado pela Irmãos Vitale. Em 2012, seu CD autoral “Interferências” foi publicado no Japão. Seu segundo CD faz uma releitura moderna de algumas composições do sambista Noel Rosa. Entre outras atividades, Turi é Coordenador Pedagógico do site www.terradamusica.com.br onde ministra os cursos online de “Piano Blues & Boogie”, e de “Improvisação e Composição Melódica” www.turicollura.com - www.terradamusica.com.br teclas & afins
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