LICENCIATURA EM QUÍMICA
Química forense : uma abordagem experimental
Marcelo Tubias dos Santos
São Paulo 202
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo Licenciatura em Química
Química Forense : uma abordagem experimental
Marcelo Tubias dos Santos
Orientador: Pro! "r! Pedro #iranda $unior
Tra%al&o de conclusão de curso a'resentado ao Instituto Federal de Educação, Ciência Ciência e Tecnologia de São Paulo como 'arte dos re(uisitos 'ara o%tenção do título de Licenciado em Química!
São Paulo )*+)
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo Licenciatura em Química
Química Forense : uma abordagem experimental
Marcelo Tubias dos Santos
Orientador: Pro! "r! Pedro #iranda $unior
Tra%al&o de conclusão de curso a'resentado ao Instituto Federal de Educação, Ciência Ciência e Tecnologia de São Paulo como 'arte dos re(uisitos 'ara o%tenção do título de Licenciado em Química!
São Paulo )*+)
Dedicatória Agradeço aos meus familiares, principalmente aos meus pais: Sandra Conceição Oliveira dos Santos e Juvenal Tubias dos Santos, por apoiarem meus estudos e não deixarem faltar algo quando q uando precisei.
Agradeço a minha companheira, que é muito mais do que apenas uma amiga e que me apoiou sempre que precisei: Talita de Cássia Dalmolin.
Agradeço a alguns professores, principalmente ao orientador Pedro Miranda Junior, pois sem ele esse trabalho nunca teria saído como planejado e ao professor José Otavio Baldinato, por mesmo sem ser o orientador do TCC, me ajudou várias vezes que precisei.
Agradeço a alguns amigos, principalmente a Keysy Nogueira, por me ajudar em vários momentos que precisei no TCC.
Agradeço aos Peritos Criminais Edison Antedomenico e Claudemir Rodrigues Dias Filho, por terem aceitado participar da entrevista estruturada.
Agradeço a Banca examinadora : Prof. Dr. Pedro Miranda Junior (IFSP), Profa. Dra. Andrea Santos Liu (IFSP) e Profa. Me. Isabel Letícia Eguia Poço (Instituto de Criminalística – SPTC), por terem aceitado participar na banca.
Resumo Química Forense : uma abordagem experimental O presente trabalho descreve a utilização da química forense f orense na contextualização contextualização do ensino de química, de modo a possibilitar um maior interesse do aluno por esta disciplina. Para tornar a aula diferenciada foram apresentadas algumas cenas do seriado CSI: Crime Scene Investigation, Investigation, motivando os alunos na realização das atividades planejadas. Foram realizados experimentos de química forense para detecção de sangue e de digitais, questionários foram respondidos pelos alunos para verificar a compreensão dos experimentos e de diferentes conceitos químicos. Verificou-se que a metodologia proposta foi adequada, percebe-se a partir da fala dos peritos criminais, em entrevista do tipo estruturada, que a escolha do seriado utilizado foi apropriada, já que grande parte das técnicas periciais empregadas são reais, deste modo, provocando interesse e curiosidade dos alunos pelo tema. Em relação aos questionários, percebe-se que a maioria dos alunos utilizou corretamente termos da química para a explicação dos experimentos realizados. A partir dos resultados obtidos verifica-se que a química forense é um tema enriquecedor para contextualização no ensino de química, fato comprovado pelo interesse dos alunos em relação à investigação do crime no seriado e das respostas apresentadas na discussão dos experimentos.
Abstract Forensic Chemistry: An experimental approach This paper discusses the possibility of contextualizing topics of teaching chemistry concepts and experiments with chemistry forensics to improve students’ interest. In order to turn the classes more attractive to the students, selected scenes from the TV series CSI: Crime Scene Investigation were were initially used to motivate students. Afterwards, experiments were performed to detect blood and digital impressions, and assessment questionnaires were proposed to students to check their understanding and mastery of different technical terms. It was found that the proposed methodology was appropriate, as verified from the statements of the forensic experts, in structured interviews, and that the choice of the particular TV series was appropriate, since much of the forensic techniques showed are effectively real, thus provoking interest and curiosity of students about the subject. In relation to the questionnaires, it is clear that the students used correctly terms of chemistry to the explanation of experiments. From the results it was found that the forensic chemistry is a topic for enriching context in teaching chemistry, as attested by the interest of students in relation to crime investigations in the TV show and answers provided in the discussion of the experiments.
Sumário Introdução ................................................................................................................. 06 Capítulo I – A Perícia Criminal .................................................................................. 08 +! O 'erito criminal !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! * +! Química Forense !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! *.! #anc&as de sangue !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! +* /! Im'ress0es digitais!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! +/
Capítulo II – Metodologia........................................................................................... 19 +! 1so de entre2istas!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! +)! Entre2istas com Peritos Criminais!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! )* .! Química orense no ensino e3'erimental de (uímica !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! ))
Capítulo III –Resultados e discussão ........................................................................ 27 +! 4n5lise dos resultados o%tidos na aula a'licada !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! )6 +!+! O caso do CSI !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! )6 +!)! O reagente de 7astle8#e9er !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! ) +!)! 4 identiicação de digitais com ressu%limação do iodo !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! .* )! 4n5lise das entre2istas estruturadas com os 'eritos criminais !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! .+
Considerações finais ................................................................................................. 35 Referências bibliográficas ......................................................................................... 36 Anexos ...................................................................................................................... 38
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Introdução Na abordagem de determinados assuntos em química no ensino médio é perceptível que muitos alunos demonstram dificuldades em aprender determinados conceitos, já que os assuntos tratados não fazem parte de seu vocabulário natural e de seu cotidiano, sendo então necessária a contextualização, aproximando o aluno do tema abordado, possibilitando uma melhor compreensão do significado daquilo que está sendo estudado, fazendo assim com que o assunto desperte um maior interesse do aluno. (ZANON & PALHARINI, 1995) Os parâmetros curriculares nacionais do ensino médio (PCNEM) consideram que é necessário que se tenha uma contextualização: “Os conteúdos nessa fase devem ser abordados a partir de temas que permitam a contextualização do conhecimento.” , assim, fazendo com que o conteúdo que está sendo ensinado seja tratado de uma maneira mais fácil de ser compreendida, isto é, “... ganham flexibilidade e interatividade, deslocando-se do tratamento usual que procura esgotar um a um os diversos “tópicos” da química (...)”. (Parâmetros curriculares nacionais – PCN Ensino médio) Pensando desta maneira, é possível a utilização de técnicas da química forense para a contextualização de alguns tópicos no ensino de química, ou até mesmo o uso de assuntos de assassinatos ou mortes acidentais explicados com base na química. Um exemplo disso são reportagens como: “Rondônia registrou seis casos de mortes por monóxido de carbono” (GI – Portal de notícias da globo) situações que ,
podem ocorrer facilmente na vida real e são explicadas pela interação entre moléculas de hemoglobina com monóxido de carbono. Pode-se também abordar a interação da hemoglobina com monóxido de carbono e seus limites de concentração no sangue, discutindo a forte complexação da molécula de CO com a hemoglobina. Na maioria das vezes, esses assuntos tratados na mídia são interdisciplinares, de modo que podem ser resolvidos utilizando conceitos de biologia, física e química. Em relação à química, processos de detecção de sangue baseiam-se em atividades catalíticas e processos de oxirredução, e a relação do sangue com a vítima é feita pela análise do DNA, área da biologia, e para verificar o tempo de morte da vítima, utilizase conceitos de perda de temperatura com o ambiente, conhecimentos tratados em física. (FILHO & ANTEDOMENICO, 2010) No desenvolvimento desse trabalho foi realizada uma atividade com alunos de uma turma de segunda série do ensino médio do Instituto Federal de São Paulo – Campus São Paulo. A atividade consistiu de uma aula em que foi abordado o estudo de caso de um episódio do seriado CSI: Crime Scene Investigation, dois experimentos
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relacionados à química forense: aplicação do método Kastle-Meyer para detecção de manchas de sangue e o uso do vapor de iodo para identificação de digitais, finalizando com aplicação de questionário para verificar a compreensão dos alunos referente ao tema discutido e como forma de avaliação da atividade proposta. Foram feitas ainda entrevistas com dois peritos criminais, de modo que foi possível correlacionar as falas dos peritos com a metodologia utilizada no desenvolvimento da atividade. Esse trabalho tem como objetivo a possibilidade de contextualizar tópicos do ensino de química com conceitos e experimentos da química forense, possibilitando maior interesse dos alunos pelos assuntos tratados em sala de aula.
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Capítulo I – A Química Forense 1.
O Perito Criminal Após a exibição de seriados americanos como o CSI, a profissão de perito passou a ter uma imagem melhorada. Porém, em muitos desses seriados, os peritos são tratados como nerds de laboratório que ficam trancados buscando provas para desvendar o crime, sendo que na vida real todos eles são especialistas em determinadas áreas. (COUTO, 2009) Segundo Farias (2010), muitas das funções do perito em uma cena de crime enquadram-se entre identificação e coleta (ou análise) dos vestígios. Dependendo da ausência ou presença de determinado material ou substância, poderá influenciar na resolução ou não de um caso. (FARIAS, 2010) De acordo com o código de processo penal 159, o mesmo estabelece que: “os exames de corpo de delito e as outras perícias serão feitas por dois peritos oficiais”, deste modo, Robson Farias (2010) considera que as ações que serão feitas mediante apenas um perito criminal será considerada como não legal. (ibid.) Mas, de acordo com Espindula, ocorreu a edição da Lei n° 11.690/2008 para a realização feita por apenas um perito: “Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior.”, assim, Espindula considera que perante a lei não há um limite para o número de peritos, sendo que caso houvesse um limite teria sido editado para “um perito oficial”, considerando então um maior número de peritos. (ESPINDULA, A. em “Criminalística”, 2012) Todo perito criminal, necessariamente, precisa de uma análise prévia do local do crime. O profissional deve manter-se em um local que tenha ampla visão da área, de modo que seja possível visualizar um maior número de evidências. Sabe-se que inicialmente não serão observadas todas as provas materiais, deste modo, é necessário que o perito se desloque para um local em que possam ser observadas essas evidências e que a área escolhida não esteja em conjunto com a cena de crime. Durante análise da cena do crime não deve ocorrer a contaminação ativa, ou seja, a contaminação da cena pelo perito criminal ou sua equipe. (REIS, 2011) Segundo Tochetto (2011), o perito ao perceber algum erro técnico, como incoerências com a verdade, é dever do mesmo apontar esse erro, de modo que se possam evitar injustiças em relação a outras pessoas. (TOCHETTO, 2011). Em uma análise de Tochetto para a obra “A investigação Criminal e os Métodos Científicos” de Edmond Locard, o perito tem a obrigação de dizer a verdade científica completa,
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finalizando sua manifestação com: O perito só tem uma lei e um direito: dizer a verdade”. (TOCHETTO apud LOCART) De acordo com Espindula (2012), para ser um perito criminal, segundo o Código de Processo Penal, artigo 145 § 1º, lei no 7.270/84, “os peritos serão escolhidos entre os profissionais de nível universitário” (ESPINDULA, A em “Criminalística, 2012”). Com isso, verifica-se que é necessário que na data da posse do concurso prestado, o candidato possua nível superior completo. Segundo o edital de concurso de perito criminal de 2012, do estado de São Paulo, apenas candidatos aprovados e classificados com curso de nível superior em bacharelado podem tomar posse do cargo, e com formação em determinadas áreas específicas. (Edital Perito Criminal – PC 1/2012)
2.
Química Forense
O termo “forense” é derivado da palavra “fórum” e química forense pode ser considerada como a química utilizada em função da lei. (Filho e Engelhardt, 2003). Assim como é tratado por Farias (2010), a química forense é um ramo investigativo, que pretende por meio do uso da química tratar de interesses judiciários. Têm-se alguns autores como Bell (2006) que classificam um químico forense semelhante a químicos analíticos, restringindo seu trabalho apenas a análises referentes a essa área, porém, sabe-se que diversas situações apresentam-se aos peritos, de modo que outros conhecimentos de outras áreas da química podem ser necessários. Exemplos disso são vestígios relacionados a fluídos corpóreos em que o químico forense necessitará de conhecimentos de bioquímica; no uso de técnicas para evidenciar diferentes tipos de substâncias são necessários conhecimentos provenientes de áreas como a físico-química, a química analítica, a química orgânica entre outras, logo, o químico forense necessita ter conhecimentos em diversas áreas, para que em determinados momentos possa utilizar variadas técnicas, já que o uso destas diferentes técnicas pode variar dependendo de cada caso. (FARIAS, 2010) Segundo Branco & Silva (2012), é possível verificar a influência da química na criminalística: “A Química (...) é frequentemente utilizada por outras ciências aplicadas à área da Criminalística (...), porém, a participação da química nem sempre é notada e essa invisibilidade resulta à magnitude de problemas comumente enfrentados pelas diferentes áreas forenses.” (BRANCO & SILVA, pg 1, 2012)
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Logo, é perceptível que a criminalística é uma área que necessita de conhecimentos químicos, neste caso, o químico forense utiliza conceitos e técnicas da química para elucidação de casos jurídicos. É importante ressaltar também que a química forense não trata apenas de casos relacionados a assassinatos, mas também de casos que envolvem, por exemplo, condições ruins de trabalho, ou até mesmo o meio ambiente. Dentre as áreas que o químico forense atua, estão: perícias policiais, trabalhistas, industriais (relativo a alimentos, medicamentos, entre outros), ambientais e doping desportivo. (FARIAS, 2010)
3.
Manchas de sangue
Antes do final da década de 1980, a análise de manchas de sangue era algo desprezível para os investigadores forenses. Os primeiros registros de estudos de manchas de sangue apareceram por volta de 1985, no livro “Origem, formato de distribuição das manchas de sangue dos principais ferimentos causados por golpes”, o mesmo tendo sido escrito Eduard Piotrowski, um médico assistente do Instituto de Medicina Forense, na Polônia. (COUTO, 2009). Atualmente, o sangue é importante instrumento para desvendar um crime, pois ao estar presente em grande parte das cenas de crime, é possível retirar várias informações, como dosagem de drogas, relação de quantidade de sangue com ferimento, identificação da vítima (ou suspeito), entre outras. Nesses casos, é necessário que o perito veja de maneira rápida se o composto encontrado é sangue, para isso realiza a coleta por um swap ( haste flexível com algodão na ponta), aplica alguns reagentes e verifica uma coloração magenta, concluindo assim ser sangue (FILHO & ANTEDOMENICO, 2010). Esse tipo de teste baseia-se em spot test , técnica criada por Fritz Feigl, utilizado para desvendar a mancha encontrada nos locais dos crimes. (FILHO, C.R. & ANTEDOMENICO, E. apud Espinola, 2004) Se o perito pretende verificar se tal mancha de sangue é de animal ou humano, utilizam-se, de preferência, 3 swaps , realizando assim a coleta das manchas, guardando em uma embalagem de papel e em um saco de papel. O uso da embalagem de papel irá favorecer que o sangue seque e não ocorra degradação. Feito isso, pode ser levado para o laboratório para uma análise do DNA. (REIS, 2011) Nas cenas de crime, é possível observar que as manchas de sangue têm diferentes formatos. Em seriados, grande parte das vezes observa-se o investigador forense seguindo as manchas de sangue e chegando até mesmo a dizer como ocorreram determinados golpes, em alguns casos diz até o que foi utilizado. Esse tipo
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de método pode ser visto, por exemplo, no seriado Dexter , em que o protagonista (interpretado por Michael C. Hall) é um investigador forense e utiliza essas técnicas de análise da cena do crime com base na posição, formato, quantidade e característica das manchas de sangue. Por mais incrível que pareça, são técnicas utilizadas atualmente, como é informado por Couto (2009): “Pode parecer um tanto exagerado ou apenas um efeito da produção da série televisiva, mas isso é resultado do desenvolvimento da ciência forense nos últimos tempos. As conclusões desses especialistas são precisas e minuciosas para ajudar na montagem de um caso contra um suspeito” (COUTO, S.P., p. 33, 2009)
Dorea e colaboradores (2012) também afirmam que a morfologia do sangue pode evidenciar o desenvolvimento do ato, baseando-se precisamente nas manchas, como: Manchas de projeção – Análise com base na ação gravitacional, tendo as gotas diferentes formatos ou aumento da quantidade a partir dos golpes efetuados na vítima; manchas por escorrimento – caracterizado por grandes poças de sangue da vítima imóvel; manchas por contato – feitas a partir de impressões de partes ensanguentadas; manchas por impregnação – ocorre quando se tem grandes quantidades de sangue, podendo impregnar peças caseiras como toalhas, tapetes, etc. Por fim, têm-se as manchas por limpeza – que são as áreas limpadas pelo assassino na tentativa de escondê-las. (DOREA et. al., 2012) Alguns fluídos biológicos como o sangue, podem ser detectados por meio de reações químicas que ocorram precipitações, um exemplo disto é quando macera-se a mancha com hidróxido de amônio concentrado (NH 4OH), ácido acético glacial (CH3COOH) e piridina (C 5H5N), acrescentando posteriormente solução de cloreto de sódio ( NaC l ) 1%. O resultado disso será o aparecimento de cloridrato de hematina ou cloreto de hemina, cristais de coloração castanhos que se apresentam de maneira isolada ou agrupada (FARIAS, 2010). Também podem ser utilizadas reações como o teste da benzidina (C 12H12N2), que consiste na mistura de benzidina com ácido acético cristalizado e peróxido de hidrogênio (H 2O2). Quando este reagente é utilizado na mancha, caso ocorra formação de uma coloração verde azulada, evidencia que a mancha analisada é sangue. (DOREA, 2012)
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O sangue possui certas propriedades para que essas reações possam ocorrer, como no caso da benzidina. Ele possui em sua composição moléculas de hemoglobina, presentes nos eritrócitos (glóbulos vermelhos). (CHEMELLO, 2007) A hemoglobina, representada na Figura 1, possui quatro cadeias polipeptídicas denominadas de globina, duas dessas cadeias são do tipo alfa e duas do tipo beta, pela qual possuem o grupo prostético heme, o que faz a ligação com o gás O 2 (Bioquímica na rede – UNESP). As globinas, coloração roxa, são responsáveis por efetuar a ligação com O 2 ou CO.
Figura 1: Representação da Hemoglobina Imagem retirada de: Bioquímica na rede – UNESP)
A reação da benzidina funciona com base na atividade catalítica da hemoglobina, como uma peroxidase, em que irá decompor o peróxido de hidrogênio, liberando assim gás oxigênio e, com isso, oxidando a molécula de benzidina (Figura 2) e evidencia a presença de sangue a partir da coloração. (CHEMELLO, 2007)
Figura 2: Reagente de benzidina antes e após sofrer oxidação. (Imagem: CHEMELLO, Química virtual – Manchas de sangue)
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Em outros exemplos também são utilizados a fenolftaleína reduzida com solução salina e peróxido de hidrogênio, que revelará a presença de sangue caso tenha-se coloração rósea da solução, assim como a leucobase verde malaquita com peróxido de hidrogênio misturado com a suposta mancha de sangue, caso apresente coloração verde, a substância é sangue. (DOREA, 2012) Para revelação de sangue, uma maneira de fácil acesso é a preparação do reagente de Kastle-Meyer. Para preparação desse reagente são misturados 0,1g de fenolftaleína, 2,0g de hidróxido de sódio e 2,0g de pó de zinco metálico com 10 mL de água destilada, sob aquecimento (Equação 1): (CHEMELLO, 2007) Equação 1: Zn(s) + 2NaOH(aq)+ 2H2O(l)
Na2[Zn(OH)4](s) + 2H2(g)
No início da reação, percebe-se que quando se adiciona fenolftaleína, rapidamente a solução se torna rosa, decorrente da alta concentração de íons OH -, que consequentemente aumenta o pH, e quando acima de 9,8 a solução torna-se rosa pela presença do indicador (ATKINS, 2006). Com o andamento da reação sob aquecimento, ocorre a formação do complexo tetraidroxizincato(II) de sódio, fazendo com que diminua a concentração de íons OH - da solução e assim tornando-a incolor. Na Figura 3 é possível verificar a mudança da estrutura da fenolftaleína antes e depois da reação. (CHEMELLO, 2007)
Figura 3: Redução e oxidação da molécula de fenolftaleína
É nesta reação que entra a parte importante para evidenciar a presença de sangue. Conforme o reagente entra em contato com a hemoglobina e o peróxido de hidrogênio, a atividade catalítica do sangue decompõe a molécula de H 2O2 em água e gás oxigênio, consequentemente, a molécula da fenolftaleína é oxidada apresentando
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coloração vermelha, logo, evidenciando a presença de sangue. É importante ressaltar que há compostos que interferem na reação, como o suco gástrico e sais de ferro, ou qualquer outro que possa oxidar a fenolftaleína. A reação da hemoglobina (Hb) com peróxido de hidrogênio é apresentada na equação 2. (FILHO & ANTEDOMENICO apud Zarzuela e Aragão, 1999)
Equação 2 : Hb + 2H2O2(aq)
Hb + 2H2O(l) + 2O2(g)
A decomposição da molécula de peróxido de hidrogênio pode ser explicada utilizando conceitos de reações redox, envolvendo as etapas representadas nas equações: 2H2O2 + 4H+ + 4e2H2O 2H2O2
4H2O E°= 1,78V O2 + 4H+ + 4e- E°= 1,23V 2H2O + O2 E° = 0,55V
Além da relação das manchas de sangue, os químicos forenses utilizam o DNA encontrado. Os primeiros registros permeiam os anos de 1987, nos Estados Unidos, em que o exame de DNA foi utilizado para condenar Tommi Lee Andrews, acusado de estupro, agressão sexual, entre outras acusações. (SPENCER, 2007) O DNA (ácido desoxirribonucléico) é uma dupla hélice composta por nucleotídeos, que são denominados como adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C), deste modo, a dupla hélice é formada justamente por pares entre adenina/citosina e guanina/timina, constituindo assim o código genético. Por ser um código genético, o mesmo é utilizado para identificação de vítimas quando são irreconhecíveis (casos de carbonização), ou utiliza-se o DNA mitocondrial (mtDNA), que é encontrado no núcleo das células, mas esse tipo de DNA só se utiliza quando se tem pequenas quantidade do DNA extranuclear. (FARIAS, 2010)
4.
Impressões digitais
O uso de impressões digitais na identificação não é algo atual. Um exemplo disso são os babilônios, que já em 2000 a.C utilizavam barro para marcação de impressões digitais e assim impedir a falsificação de documentos. (CHEMELLO, 2006) Para a identificação humana, a química forense exerce um importante papel para as revelações, essa área é chamada de papiloscopia. A papiloscopia é divida em três áreas: datiloscopia, que baseia-se nas impressões digitais, sendo considerada como a mais importante para identificação; a quiroscopia, identificação de digitais
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deixadas pela mão e a podoscopia, que estuda as digitais deixadas pelos pés. (FARIAS, 2010) Existem diferentes áreas da datiloscopia, como a datiloscopia civil e criminal, que tratam de identificação de pessoas e até mesmo casos de pessoas que foram acusadas ou indiciadas em inquéritos. (CHEMELLO, 2006) A identificação de digitais é um sistema válido para acusações, partindo de um ponto de vista biológico e estatístico não existem duas pessoas no mundo com uma mesma impressão digital (FARIAS, 2010). As impressões digitais são utilizadas quando uma pessoa pega um objeto, deixando a sua marca, a sua pele é algo descrito no código genético de cada indivíduo (DNA), assim como fatores ambientais que influenciaram na formação dos dedos. Por ser um processo tão complexo, é compreensível que não existam duas impressões idênticas. (COUTO, 2009) Existem várias técnicas para identificação, específicas para cada situação. A escolha da técnica errada pode inutilizar a impressão deixada, logo, é necessário que o profissional tenha certeza da técnica certa. (FARIAS 2010) Em uma cena de crime, é importante que se observe a mudança de posição de objetos, pois dependendo da superfície, poderão ter sido deixadas digitais. Esses vestígios encontrados são denominados como Impressões Papilares Latentes (IPL), denominadas entre ocultas e visíveis. As visíveis são facilmente evidenciadas, já que são formadas a partir da mão suja com sangue ou outras substâncias, já as ocultas podem ser evidenciadas levando em conta os compostos que são liberados pela pele humana. (CHEMELLO, 2006) Na Tabela 1 são apresentados os componentes liberados no suor da pele humana. (ibid.)
Tabela 1: Componentes do suor humano e as respectivas glândulas (CHEMELLO, E. Química virtual – Impressões digitais)
Glândulas Sudoríparas
Compostos Inorgânicos
Compostos Orgânicos
Cloretos
Aminoácidos
Íons metálicos
Uréia
Amônia
Ácido Lático
Sulfatos
Açúcares
Fosfatos
Creatinina
Água
Colina Ácido úrico
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Ácidos graxos Sebáceas
Glicerídeos Hidrocarbonetos Álcoois
Apócrinas
Ferro
Proteínas Carboidratos Colesterol
Dentre todas as técnicas, a mais utilizada é a técnica do pó, que é a passagem de uma camada de pó em um local que se imagina ter alguma impressão digital. Essa revelação se dá a partir dos variados compostos liberados pela pele, assim como a interações moleculares, como forças de Van der Walls e ligações de hidrogênio. Pelo fato das interações influenciarem tanto no uso desta técnica, é importante que a cena do crime seja a mais recente possível, isso porque essas interações são feitas junto com a água, e conforme se passa o tempo, terá uma menor quantidade dela por processos de evaporação e assim podendo comprometer a IPL. A composição química de diferentes tipos de pó é observada na Tabela 2. (FARIAS, 2010) Tabela 2: Tipos de pó usados para identificação de digitais (FARIAS, R. – Introdução a química forense, 2010)
Tipo de pó
Composição
Óxido de ferro
Óxido de ferro (50%) Resina (25%) Negro de fumo (25%)
Dióxido de manganês
Dióxido de manganês (45%) Oxido de ferro (25%) Negro de fumo (25%) Resina (5%)
Óxido de titânio
Dióxido de titânio (60%) Talco (20%) Caulim (20%)
Carbonato de chumbo
Carbonato de chumbo (80%) Goma arábica (15%) Alumínio em pó (3%) Negro de fumo (2%)
Fluorescente
Antraceno pulverizado
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Metálico
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Pó prateado (flocos de alumínio com pó de quartzo) Pó dourado flocos de bronze com pó de quartzo)
Outro exemplo de pó que possa ser preparado é descrito por Couto (2009), que é dissolvendo-se 1 g de brometo de potássio (KBr) em 25mL de água, adicionando-se em seguida, lentamente, 35g de amido de milho. Deixa-se então a mistura secar por 7 dias, assim, reduzindo-a a pó, é armazenada em um recipiente com sulfato de cálcio anidro. (COUTO, 2009) Levando em consideração então a pele humana, sabe-se que esta libera compostos lipídicos com o suor. Ao serem deixadas as digitais, estes compostos gordurosos irão ficar lá por um tempo, até que sejam deteriorados. É aí que entra o vapor de iodo com uma técnica para revelação. Quando o papel contendo a digital é passado no vapor, ocorre reações entre o iodo sublimado e os compostos insaturados liberados pelo corpo através da pele, logo, marcando o local. Verifica-se então que é um teste que não funciona para locais que não têm impressões recentes, assim como a análise da impressão revelada deve ser rápido, pois o iodo é um composto volátil. (FARIAS, 2010) O iodo é um composto que pode ser facilmente passado para a forma gasosa, o motivo disso é devido suas forças intermoleculares. As moléculas polares possuem como principal força o dipolo-dipolo. As moléculas apolares apresentam forças de dispersão de London, essas forças são geradas a partir de interações eletrostáticas entre núcleos e elétrons vizinhos de outro átomo. O que resulta em uma maior força de London é a polarizabilidade dos átomos, que pode ser considerada como uma “maciez” da nuvem eletrônica, representado na figura 4. (BROWN, 2005)
Figura 4: Representação das forças de dispersão de London e a polarizabilidade das moléculas. (Imagem – Química : A Ciência central – BROWN, T.L.)
Percebe-se então que moléculas de maior raio tem maiores forças de London, devido a maior quantidade de elétrons. Outro fator importante é que as interações de London, por serem forças encontradas em todas as moléculas, são do tipo que se somam as outras forças intermoleculares, sendo assim, moléculas que possuem
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apenas as forças de London tem interações mais fracas quando comparadas a outras moléculas como as polares, que possuem dipolo-dipolo. (BROWN, 2005) Substâncias apolares possuem maior pressão de vapor, que é o estado em que a condensação e vaporização de um líquido entram em equilíbrio, isto é, enquanto uma quantidade vaporiza, outra condensa quando encosta-se às paredes do recipiente fechado (ibid). Isso explica porque o Iodo se mantém em forma sólida e é facilmente vaporizado quando se mantém pouco aquecimento. Outro revelador pouco utilizado é do nitrato de prata, que reage com os íons cloreto liberados pela pele, e a precipitação do cloreto de prata (substância branca) revela a presença de digitais. Isso é demonstrado na equação 3. (FARIAS, 2010) Equação 3 :
AgNO3(aq)+ Cl
-
(aq)
AgCl (s) + NO3-(aq)
Reveladores como violeta de genciana e niridrina também revelam impressões latentes. O primeiro revelador citado emite uma coloração púrpura intensa, mais indicada para locais que foram contaminados, por exemplo, com óleos e graxas. Ele também reage com componentes do sangue, fazendo com que também ocorra a revelação. Já o revelador niridrina é empregado em superfícies porosas, como papel, madeira não tratada, entre outros. Reagindo com os aminoácidos do suor, emite uma coloração púrpura intensa, podendo evidenciar as digitais. O mecanismo é mostrado na Figura 5. (CHEMELLO, 2006)
Figura 5: Mecanismo da reação da niridrina com aminoácido, formando produto de coloração púrpura. (Imagem: CHEMELLO, E. – Química Virtual: Impressões digitais)
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Capítulo II – Metodologia 1.
Uso de entrevistas
O emprego de entrevistas na área acadêmica ocorre desde meados da década de 1930, para obtenção de dados em ciências sociais, porém, ao verificar sua grande utilidade como método de pesquisa, aproximadamente em 1940 passou então a ser utilizada em diversas áreas, como sociologia, comunicação, psicologia, pedagogia, etc. (DUARTE, 2005). É fato que não se é obrigatório utilização de uma entrevista para obter dados precisos, porém ela pode facilitar e muito a obtenção destes dados de uma maneira direta, mas, obrigatoriamente, esta deve estar bem planejada, em que deve ser agendada com antecedência com o participante, especificando o local que será gravada (ou escrita), deixando claro para o entrevistado o objetivo da entrevista, dando-lhe liberdade para interrupções durante o diálogo. Assim, quando estas informações estarem esclarecidas e aceitas pelo participante, pode-se dar início à entrevista. (BELEI, et. al, 2008) Existem apenas três tipos diferentes de entrevistas, a estruturada, a não estruturada e a semi-estruturada. A estruturada, assim como o nome propõe, é o tipo de entrevista que tem suas questões formuladas e estas são as mesmas feitas para todos os participantes, fazendo assim com que haja uma comparação de respostas dadas, logo, percebe-se que é um tipo de entrevista em que não há uma discussão entre o entrevistador e o participante, são respostas diretas sem mais informações. Os pontos positivos deste tipo de entrevista é que pode ser feita com um grande número de participantes e as respostas podem ser obtidas com uma melhor interpretação, evitando assim alguns erros. Outro ponto para se levar em consideração é que este tipo de entrevista pode ser utilizado como um complemento de outro tipo de entrevista para buscar um perfil do participante, neste caso, a semi-estruturada. A entrevista não-estruturada já é um tipo mais livre, em que não é necessária uma ordem correta das questões. Quando o entrevistado é questionado, este pode responder a pergunta e, assim que terminar sua resposta, o entrevistador pode fazer uma pergunta baseando-se em sua resposta a fim de se obter uma maior quantidade de informações de determinado assunto, os pontos negativos deste tipo de entrevista seria o caminho que esta entrevista levaria, isto é, a um tipo de diálogo que possivelmente não será relevante para a entrevista. (DUARTE, 2005) Segundo Belei (2008), baseando-se em uma análise feita por Fujisawa (2000), dentre as três entrevistas citadas, a semi-estruturada é a que mais é utilizada atualmente, que é um modelo que permite uma entrevista um tanto quanto flexível,
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fazendo com que as perguntas já formuladas sejam respondidas e, a partir destas, fazendo novos questionamentos, assim, fazendo com que aquela pergunta que inicialmente traria poucas informações estende-se de modo a aprofundar o conhecimento do entrevistador com mais dados. (BELEI, 2008 apud FUJISAWA, 2000). Geralmente, as entrevistas semi-estruturas são feitas com mais ou menos sete questões, assim, a extensão desta entrevista para formulação de novas questões dependerá muito do entrevistador, já que cada questão deverá ser analisada de forma profunda, a fim de esgotar totalmente as dúvidas que podem aparecer futuramente sobre determinado tema. Por isso, é necessário que as questões sejam formadas com um grau de profundidade considerável. (DUARTE, 2005) Durante a entrevista é normal que o roteiro se altere, supondo que o entrevistador chegou com oito questões, porém duas delas se complementam, seria válido então neste caso juntar as questões para uma resposta mais coerente, ou então dividir uma questão em duas para obter maiores resultados. (ibid)
2.
Entrevistas com Peritos Criminais
Como meio de se obter maiores informações para o trabalho, foram feitas entrevistas com dois peritos criminais, utilizando questões formuladas com bases na química forense e no ensino de química. A entrevista realizada foi a do tipo estruturada. Os peritos criminais participantes das entrevistas foram: Claudemir Rodrigues Dias Filho, bacharelado e Licenciado em Ciências Biológicas (UNICAMP), mestre em Genética e Biologia Molecular (UNICAMP). Edilson Antedomenico, bacharelado em Química (USP), discente do curso de direito e faz mestrado na área da educação.
Questões apresentadas aos peritos: “1. Qual a formação do entrevistado (graduação, mestrado, pós-graduação)?” Esta é uma questão para reconhecimento do profissional da perícia.
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“2. Resumo do Currículo profissional desenvolveu atividades além de perito):?”
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(se
Aqui, como a própria questão demonstra, buscamos verificar qual é o currículo dele, isto é, quais tipos de atividade desenvolve, como palestras em faculdades, cursos, se é professor de alguma universidade, etc. “3. Em seu cotidiano, como perito quais são os casos mais comuns investigados? Dentre eles quais são os conhecimentos conceituais e técnicos que são utilizados para elucidá-los?” Essa questão serviu para o perito fazer uma descrição dos principais testes e verificar se a maioria destes está correlacionado à química, ou até mesmo com a biologia e física, já que também são conteúdos interdisciplinares tratados nesse trabalho. “4. Dentre esses casos, têm algum que seja fácil de ser reproduzido sem grandes dificuldades em um laboratório de química de uma escola? Levando em consideração a utilização de materiais que sejam de fácil acesso.” O fundamento desta questão era verificar se existem outros experimentos que possam ser realizados em laboratórios, além do reagente de Kastle-Meyer e do vapor de iodo já propostos na atividade experimental deste trabalho. “5. Na sua opinião, qual a importância de abordar conceitos e técnicas da química forense nas aulas de química de ensino médio em escolas públicas e particulares?” Caso o perito já tenha tido alguma experiência como professor, ou tenha uma boa observação de como são as aulas de química, terá uma análise bem precisa para esta questão, já que atualmente, uma das grandes funções do professor é fazer com que o aluno tenha interesse pela aula, pois “ é interagindo com o mundo cotidiano que
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os alunos desenvolvem seus primeiros conhecimentos químicos .” (CARDOSO & COLINVAUX apud PIAGET) “6. A mídia frequentemente trata de assuntos relacionados à Química Forense, geralmente são crimes que chocaram a opinião pública. Você acredita que o uso destes delitos poderiam ser temas abordados no ensino de Química?” Questão própria para verificação de ferramentas em sala de aula, no caso, o uso de reportagens que ocorreram na mídia. Um exemplo disso é o dos peritos Claudemir Rodrigues Dias Filho e Edilson Antedomenico em “A Perícia criminal e a interdisciplinaridade no Ensino de Ciências Naturais”, em que utilizam o caso Nardoni como exemplo em cálculos de física e fenômenos químicos. (FILHO & ANTEDOMENICO, 2010) 7. A Química Forense tratada em seriados americanos como CSI e Dexter tem seus lados reais ou são pura ficção? Caso já tenha assistido algum destes ou outros seriados, poderia comentar um exemplo de um caso que seja considerado apenas ficção e outro que tenha ocorrido na vida real? O importante desta questão é ter a opinião dos peritos acerca dos seriados americanos, isto é, se eles podem ser utilizados como exemplos para as aulas de químicas, como no caso da aula experimental tratada neste trabalho, em que as cenas utilizadas foram do CSI: Crime scene investigation .
3.
Química forense no ensino experimental de química
Para analisar a influência da química forense no ensino de química para alunos de ensino médio foi planejada uma atividade experimental com 20 alunos da segunda série do ensino médio do IFSP, campus São Paulo. Para isso foram abordados alguns conteúdos tratados na grade curricular de química, correlacionados a experimentos intimamente ligados ao trabalho da química forense, como a verificação de sangue no local do crime e a identificação de digitais.
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No início da aula experimental foi feita uma breve introdução da química forense. Relatamos que a química forense é uma ciência, que no caso, tem como principal função analisar vestígios encontrados em locais de crime. Para realização destas análises, são utilizadas variadas técnicas de análises químicas, bioquímicas e toxicológicas, entre outras, para desvendar a face complexa dos crimes cometidos. (FORENSE WORLDWAR – TWO. Ciência Forense). Em seguida, relatamos um breve histórico citado pelo site FORENSE WORLD WAR – TWO, que apresenta um dos primeiros relatos de Química Forense, uma lenda relacionada à densidade feita por Arquimedes, em 287-212 A.C. Nesta lenda, o rei Hieron II de Siracusa mandou que o famoso matemático Arquimedes descobrisse se o ourives teria substituído uma parte da coroa de ouro por prata. Sem saber o que fazer para descobrir isso, Arquimedes em um momento de banho, ao entrar em sua banheira, percebe que o volume da água aumenta, chegando até mesmo a transbordar da banheira, percebendo assim que pode-se determinar a volume de um objeto pela quantidade de líquido derramado do recipiente. Feliz com sua descoberta, saiu nas ruas nu, gritando “Eureka” (MARTINS, 2000). Em um último histórico citado pelo site FORENSE WORLD, têm-se o século XX, que foram criadas as organizações Federal Bureau of Investigation (FBI) nos Estados Unidos da América (EUA) e, na Austrália, a Interpol. Neste mesmo século, foi inventado o primeiro sistema para identificação de impressões digitais, unindo-se aos poucos com a informática e assim aprimorando mais ainda as identificações de digitais. Para despertar a curiosidade dos alunos, foram projetadas cenas do episódio de número dezessete da terceira temporada do seriado CSI: Crime Scene Investigation . Neste episódio, a missão dos peritos era descobrir o que causou a morte por asfixia de uma mulher enquanto dormia, sendo que o principal suspeito neste caso era o marido da vítima, já que também estava dormindo ao lado dela, mas sobreviveu. Achamos interessante este episódio pelo fato de que os peritos, desde as primeiras cenas, estavam buscando vestígios que poderiam ter acarretado a morte da mulher. As cenas eram apresentadas aos poucos, e em cada interrupção era feita uma discussão com os alunos da turma, analisando os trechos das cenas para verificar o que teria causado a morte da mulher e como ocorreu este fato. Os peritos descobriram através de evidências no corpo que a vítima apresentava sinais de asfixia por monóxido de carbono (CO). Na determinação do teor de CO na cena do crime, percebeu-se que a maior quantidade estava na lareira, local em que foi encontrada uma substância de coloração preta, que em posterior análise laboratorial descobriu-se que se tratava de carvão ativo.
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Foi apresentada para os alunos a definição de carvão ativo, que são compostos de carvão, que possuem uma forma microcristalina, e que tem a porosidade interna aumentada a partir de tratamentos adequados. Após ocorrer este tratamento, pode-se dizer que “ativou” o carvão, a sua porosidade interna seria comparável uma rede de túneis que se que se bifurcam em canais menores. A alta adsorção do carvão ativo se dá a partir da sua elevada área superficial. Compostos que possuem carvão têm área superficial de adsorção em cerca de 10 a 15 m 2 /g, porém, quando ocorre a ativação, essa área passa a ser de 800 m 2 /g. O carvão ativo apresenta diversas aplicações, como em métodos de purificação de águas residuais e industriais, assim como na adsorção de gases. (CLAUDINO, 2003) Após a discussão sobre carvão ativo, finalizamos a apresentação dos vídeos que mostraram que o assassino retirou o carvão ativo do aquário e colocou na lareira, aumentando-se a quantidade de carbono o que resultou em uma combustão incompleta com maior liberação de monóxido de carbono. Como a lareira não estava funcionando adequadamente, os gases liberados na combustão incompleta da madeira e carvão ativo era lançado para dentro do ambiente, aumentando ainda mais a quantidade de monóxido de carbono. O assassino sabia que a quantidade de CO no ambiente seria impossível de matar o casal. Normalmente a quantidade de CO no sangue de indivíduos fumantes é maior que a de um indivíduo não fumante. Como o assassino sabia que o casal era fumante, ele pressupôs que a quantidade de CO no sangue seria aumentada, suficiente para causar a morte. A morte do casal não ocorreu como planejado pelo assassino, somente a mulher faleceu. O assassino não considerou que o homem deixou de fumar e que estava fazendo uso de adesivo de nicotina, por isso o homem apresentava menor teor de CO no sangue. O marido acordou no meio da noite, apagou a lareira e fez uma ligação pedindo resgate, logo, o carvão ativo colocado na lareira pelo assassino não foi completamente queimado, dando assim aos peritos a evidência do crime. Importante ressaltar aqui que, antes mesmo de apresentarmos a última cena, alguns grupos de alunos já sabiam quem era o assassino, porém não sabiam explicar como ele cometeu o assassinato. O monóxido de carbono é um gás inodoro e incolor, gerado a partir de escapamento de automóveis ou até mesmo na queima de cigarros. O problema mais sério neste caso é a ligação que o CO faz com o ferro da hemoglobina, que é uma ligação semelhante a do gás oxigênio (O 2), gás fundamental para sobrevivência dos seres vivos (TORTORA, 2006).
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No caso de acidentes com CO, acontece que quando ele se junta com a hemoglobina, esta ligação é cerca de 200 vezes mais fortes do que a ligação com o O2. Outro fator que influência muito é que o CO em pequenas concentrações, cerca de 0,1% do ar, combina com 50% das hemoglobinas disponíveis, o que abaixa drasticamente a quantidade normal para o transporte de O2. Quando o nível de CO aumenta tanto, poderá assim causar o envenenamento por monóxido de carbono, que uma das características de quando uma pessoa é afetada por isto é a coloração vermelho-cereja forte. (TORTORA, 2006) Para salvar uma pessoa envenenada com CO, deve-se colocar a pessoa numa atmosfera com altas concentrações de O 2, fazendo assim com que haja uma aceleração no desprendimento de CO das hemoglobinas (TORTORA, 2006). A ligação entre a hemoglobina e o gás CO é chamada de carboxiemoglobina, representada na Figura 6, em equilíbrio com a oxiemoglobina: (FARIAS, 2010)
Figura 6: Reação de equilíbrio na formação da carboxiemoglobina (Imagem: FARIAS, R. Introdução à química forense, 2010)
Não é por acaso que a molécula de monóxido de carbono possui uma afinidade tão grande com a hemoglobina, tanto o cianeto (CN -) quanto o CO são os ligantes mais fortes dentre os estudados na química inorgânica, isso é observado de acordo com a série espectroquímica: (FARIAS, 2010) (ligantes de campo fraco) I − < Br − < S2− < SCN− < Cl − < N 3− < F− < ureia < OH − < O 2− < H 2O < NCS− < piridina < NH 3 < etilenodiamina < bipiridina < fenatrolina < NO 2− < CH3− < C6H5− < CN− < CO (ligantes de campo forte). Relacionando-se então aos problemas com o fumo, o cigarro não só libera a quantidade de CO que dificulta a tarefa da hemoglobina de levar o O 2 para o organismo como também ocasiona na diminuição da elasticidade pulmonar, causando assim um enfisema, que é uma destruição dos alvéolos pulmonares (responsáveis por difusão de O 2 e CO2) e o colapso dos bronquíolos respiratórios (entrada que apresenta
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alvéolos pulmonares), logo, tornando ainda mais difícil do O 2 se ligar a hemoglobina. (TORTORA, 2006) Percebe-se então que o vídeo apresentado aos alunos não foge de uma realidade possível de se acontecer, até mesmo por terem notícias em jornais indicando a morte de pessoas por intoxicação de monóxido de carbono, como o caso de Rondônia, reportado pelo G1 – O portal de notícias da globo: “...um jovem casal foi encontrado morto, pela Polícia Militar, dentro de um carro no Parque Circuito, Zona Norte de Porto Velho. De acordo com o médico legista Nilton Schittinim, do IML de Porto Velho casos como esse podem ser evitados. "Quando o carro está ligado, deve-se manter o vidro um pouco aberto para evitar esse tipo de acidente, principalmente quando o aquecedor está ligado", diz o médico.“ G1 – Portal de notícias da Globo – “Rondônia registrou seis casos de mortes por monóxido de carbono” – 13/07/2012
Porém, como o próprio médico legista diz isso é um caso que pode ser evitado, mas no caso do vídeo as vítimas já estavam dormindo, o que facilitou o crime pelo assassino. O próximo ponto da aula foi à identificação de sangue. Na bancada principal foram espalhadas cinco espátulas de metal, todas com a mesma aparência física. A turma foi dividida em 5 grupos de alunos, e cada grupo pegou uma espátula. O propósito da aula naquele momento era de aplicar o reagente de Kastle-Meyer, a fim de se detectar qual das espátulas teve contato com sangue. É importante ressaltar que nenhuma das espátulas apresentava aspecto avermelhado, o que poderia induzir o aluno na sua escolha. Outro experimento utilizado na atividade foi o uso do vapor de iodo na identificação de digitais, em que os alunos mantiveram sob aquecimento brando uma amostra de iodo sólido até ocorrer a sua sublimação, podendo assim fazer a revelação das digitais com o vapor de ido. Por fim, como meio de se analisar os conteúdos apresentados aos alunos, foram entregues questionário avaliativos (anexo 1) contendo questões referentes ao reagente de Kastle-Meyer e a identificação de digitais a partir do iodo ressublimado.
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Capítulo III – Resultados e Discussão 1. Análise dos resultados obtidos na aula aplicada. Como método de análise de resultados foram elaborados dois questionários abordando a discussão ocorrida em sala de aula durante a realização dos experimentos de identificação de sangue e de digitais. O questionário proposto teve como objetivo principal verificar se os conceitos químicos aplicados à química forense e a relação com os experimentos realizados foram compreendidos pelos alunos.
1.1 – O Caso do CSI Para propiciarmos discussões em sala de aula referentes as técnicas da química forense e o ensino de química, as cenas iniciais influenciaram bastante, pois o uso desta tecnologia desperta a curiosidade dos alunos, parte importante no aprendizado, já que fará com que o estudante sinta vontade de saber o que realmente está acontecendo e participa positivamente do processo ensino-aprendizagem. O uso de tecnologias no ensino é discutido por José Manuel Moran (1995): “As tecnologias de comunicação não substituem o professor, mas modificam algumas das suas funções. A tarefa de passar informações pode ser deixada aos bancos de dados, livros, vídeos, programas em CD. O professor se transforma agora no estimulador da curiosidade do aluno por querer conhecer, por pesquisar, por buscar a informação mais relevante.” (MORAN, p. 24-26, 1995)
Assim, conforme fomos conduzindo as partes do vídeo, os alunos ficavam dando suas opiniões sobre o que poderia ter acontecido, assim como o suspeito do assassinato da mulher. Vários aspectos foram discutidos entre os alunos e os professores no momento da aula, para que no final da exposição do episódio descobrir o assassino, o motivo da morte mulher e, o mais importante, como ocorreu o assassinato. Essa parte da aula também é um importante fator, pois faz com que o aluno perceba como se chegou a tais conclusões tanto por parte de discussões feitas pelo professor, tanto por partes que foram evidenciadas no episódio trabalhado em sala de aula, forma de trabalho relatado por José Manuel Moran (1995):
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“Num segundo momento, coordena o processo de apresentação dos resultados pelos alunos. Depois questiona alguns dos dados apresentados, contextualiza os resultados, os adapta à realidade dos alunos, questiona os dados apresentados.” (MORAN, p. 24-26, 1995)
Ao ressaltarmos o uso do carvão ativo no crime, aproveitamos para tratar de outros assuntos relacionados com esse material, os quais ajudaram os alunos na interpretação da situação e das intenções do assassino que tinha conhecimentos prévios de química. A contextualização é um fator importante na aprendizagem. Segundo o PCN+ (Parâmetros curriculares nacionais), contextualizar é “propor situações problemáticas reais e buscar o conhecimento necessário para entendê-las e procurar solucioná-las” (PCN+, p.93), não que o ocorrido do vídeo tenha sido uma situação verídica, porém, no cotidiano isso é totalmente possível. O ponto importante que foi tratado neste momento da aula foi citar que uma das aplicações do carvão ativo é no tratamento de água, em que no vídeo mostrado, foi utilizado em um aquário. É fácil comprar carvão ativo atualmente, por ser vendido em locais especializados em animais, como os pet shops, assim, essa foi mais uma das informações relevantes para o caso que propomos aos alunos, já que em uma cena inicial, o perito que analisava o local do crime observou por um instante o aquário que estava no local, talvez já pensando que poderia ter sido tirada alguma coisa de lá. O objetivo aqui não era o do aluno descobrir o caso apenas com esta informação, mas facilitar o entendimento dele quando tudo fosse esclarecido. Para uma melhor compreensão dos alunos sobre o caso ocorrido, deixamos para explicar no final do vídeo o porquê do monóxido de carbono ser um gás tão perigoso, isto é, referente à forte complexação do CO com a hemoglobina.
1.2. O reagente de Kastle – Meyer Este experimento foi realizado de uma forma que possibilitasse que os próprios alunos se sentissem como um perito criminal, utilizando luminol para verificar qual espátula continha sangue, sendo assim, os alunos tiveram participação na aula utilizando o reagente de Kastle-Meyer. Segundo Arnoni e colaboradores (2004), a experimentação neste caso necessita de algo teórico, isto é, antes que seja aplicada esta experimentação, caso contrário a experimentação não será produtiva:
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“... é interessante ressaltar que as atividades experimentais despertam interesse no aluno, entretanto, se não forem trabalhadas segundo um pressuposto teórico-metodológico, caem num “ativismo improdutivo”, ou seja, o experimento pelo experimento, sem vinculação com o processo de ensino-aprendizagem.” (ARNONI et. al, p.286)
Logo, foi levado em consideração o conhecimento que os alunos tinham baseado em filmes e seriados televisivos, em que o perito normalmente utiliza o luminol para verificar se há sangue no local. Assim, a problemática de encontrar a espátula certa passa a ser algo importante para eles, deixando de ser improdutivo. Alguns resultados dos questionários obtidos foram bem promissores também, como na questão do reagente de Kastle–Meyer, que o aluno deveria demonstrar uma explicação da técnica baseada em química: Como se explica o fato observado? Aluno 1: “...sangue em contato com a mistura vai se decompor o peróxido de hidrogênio em água e oxigênio nascente. Então o oxigênio promoverá a forma colorida da fenolftaleína.” Aluno 2: “[1] – Reação entre zinco e o NaOH origina o hidrogênio.” “[2] – O hidrogênio é o responsável pela forma incolor da fenolftaleína.” “[3] – Se a amostra em questão for sangue, a hemoglobina (Hb) tem a capacidade de decompor o H 2 O 2 em água e oxigênio. O oxigênio (O) é responsável pela forma colorida da fenolftaleína, evidenciando a presença de sangue.” Percebe-se a partir das respostas destes alunos, que ambos souberam explicar o que aconteceu com base nos reagentes que foram adicionados, porém, não obtivemos respostas em que eram citadas as palavras oxidação e redução, já que o ensino destes conteúdos demandaria uma maior quantidade de tempo. Apesar disso, a análise dos alunos a partir da aplicação do reagente foram promissoras, mesmo que alguns alunos não apresentassem tamanha interpretação de resultados, como observado nas respostas abaixo: Aluno [3] : “Como o peróxido de hidrogênio reage com a hemoglobina, assim tendo reações químicas e mudando sua cor.”
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Aluno [4] : “Depois de se coletar o sangue ainda não perceptível com algodão, misturado com o reagente e água oxigenada, resultou em uma reação, que externamente, vimos a coloração rosada.” Tanto o aluno 3 quanto o aluno 4 entenderam como ocorreu o experimento, mas de uma maneira superficial, não utilizando termos técnicos da química na explicação. Isto evidencia que nem todos os alunos apresentam conhecimentos dos conceitos de química para explicar um fato, mas sabem descrever de forma adequada o que ocorreu no teste de detecção do sangue.
1.3. A Identificação de digitais com a ressublimação do iodo Neste experimento, os alunos foram orientados a pressionar os dedos sob um pedaço de folha de sulfite, enquanto mantinham sob aquecimento brando um béquer contendo iodo sólido e coberto com vidro de relógio, até que o interior do recipiente apresenta-se uma quantidade considerável de iodo vaporizado. Então, os alunos retiravam o vidro de relógio e passavam a folha pela qual foram pressionados os dedos. Rapidamente, no local em que foram deixadas as impressões digitais, o iodo as revelou de modo que foram bem visíveis. Para uma melhor análise, consideramos as respostas da questão 4, pois a partir dela é possível verificar como os alunos utilizaram conceitos da química para explicação da técnica de identificação de digitais. Explique como o vapor de iodo possibilitou a identificação das digitais no papel? Percebemos aqui que grande parte dos alunos interpretaram a situação em relação a reações com os compostos liberado pelo corpo, como se observa nas seguintes respostas: Aluno [1]: “O vapor de iodo quando se sublima, ele gruda no papel, devido a presença da gordura no dedo, ficando o contorno das digitais marcado de amarelo...” Algumas respostas apresentavam além de reações entre compostos liberados pelo corpo, o tipo de absorção que ocorria, como no caso deste outro aluno: Aluno [2]: “O vapor de iodo possui uma coloração acastanhada e, quando em contado com as impressões digitais forma um produto de coloração marrom. O vapor interage com a impressão através de uma absorção física.”
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Alguns alunos respondiam superficialmente, demonstrando entendimento do conteúdo, mas sem a utilização de termos técnicos: Aluno [3]: “O vapor de iodo ressublimou na folha na forma das digitais” Verificamos também que um dos alunos soube fazer também a análise baseada em diferentes temperaturas, como observasse abaixo esta resposta: Aluno [4]: “Como o papel estava a uma temperatura diferente da do béquer, o iodo que estava no estado gasoso ressublimou ao entrar em contato com o papel, pois a temperatura do papel era bem menor do que a do béquer, e se acumulou onde deixamos nossos óleos naturais que estão presentes em nossa pele, deixando assim, nossas digitais.” De uma forma geral, verificou-se que a maioria dos alunos respondeu de forma correta às questões propostas, demonstrando que os experimentos realizados foram adequados para contextualização e correlação das técnicas periciais com o ensino de química.
2. Análise das entrevistas estruturadas com os Peritos Criminais Algumas das questões foram para reconhecimento do perito, como a primeira e a segunda questão. Em seguida, foi planejado analisar algumas das afirmações do perito, de modo que se relacionem com o trabalho desenvolvido ou com a aula aplicada. Questão 3: Em seu cotidiano, como perito, quais os casos mais comuns que são investigados? Dentre eles quais são os conhecimentos conceituais e técnicos que são utilizados para elucidá-los? Verificamos aqui que o perito afirma a interdisciplinaridade em maior parte dos casos resolvidos: “A investigação pericial em local de crime é sempre uma atividade interdisciplinar, de forma que é difícil descrever pontualmente os conhecimentos que utilizamos em nossas análises.“
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Porém, apesar de serem usados conhecimentos de física e biologia, a química é também necessária nesses casos, para elucidação do crime: “Há, ainda, a possibilidade de terem sido deixados materiais entorpecentes em que serão necessários testes químicos para avaliação de conteúdo, como testes presuntivos (spot tests) ou testes analíticos (CG-MS e CCD).” O outro perito também cita o uso de técnicas da química, no caso, para perícia de identificação veicular: “Caso se observe alguma divergência, a superfície suporte da gravação do chassi é submetida a exames físico-químicos, com o propósito de que seja revelada a numeração original, para posterior identificação do veículo.” Questão 4. Dentre esses casos, têm algum que seja fácil de ser reproduzido sem grandes dificuldades em um laboratório de química de uma escola? Levando em consideração a utilização de materiais que sejam de fácil acesso. Nesta, os dois peritos comentam a dificuldade de obter um interesse por parte do aluno, assim, um deles cita os motivos pelo qual a perícia criminal como um tema de contextualização é favorável para o ensino de química: “(1) é um excelente pano de fundo para o ensino de ciências por fazer uso de alguns procedimentos simples e acessíveis; (2) é fascinante ensinar/aprender como o conhecimento científico pode auxiliar na elucidação de um crime; (3) as mídias de ficção e de informação estão sempre explorando essa temática em seriados e em notícias de casos reais, o que cativa o interesse do aluno; (4) é uma oportunidade de fazer o conhecimento de uma disciplina interagir com o de outra, valorizando a contextualização sugerida pelos Parâmetros Curriculares Nacional do MEC.” Um dos peritos também afirma que a contextualização pode ser feita através do uso de reportagens, a fim de tornar os conhecimentos de ciências naturais (química, física e biologia) mais acessíveis:
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“Uma das alternativas para se resolver essa problemática é promover a interação do conteúdo escolar com a vida discente, através da discussão de temas que façam parte da realidade e do cotidiano dos alunos. Assim, a perícia criminal desponta como uma ferramenta interessante para o ensino de ciências naturais.” Questão 6: A mídia frequentemente trata de assuntos relacionados a Química Forense, geralmente são crimes que chocaram a opinião pública.Você acredita que o uso destes delitos poderiam ser temas abordados no ensino de Química? Ambos os peritos confirmam que essa utilização é possível em sala de aula, mas um deles informa que deve ser trabalhado de forma adequada, de modo que as discussões não fujam do assunto que deva ser tratado: “... os casos divulgados pela mídia proporcionam uma oportunidade para o ensino. Claro que o professor deve trabalhar como sensor do que é discutido, para que a brutalidade do episódio não se torne o foco da discussão.” O mesmo perito também dá exemplos do uso de reportagens para algumas disciplinas, como é dado o exemplo para área da química: “Na disciplina de química, o professor poderia usar o mesmo caso Nardoni para explorar o conceito de quimioluminescência do luminol” Também se vê a confirmação do outro perito a cerca da interdisciplinaridade: “... a perícia criminal é um tema bastante atraente para os alunos e permite uma abordagem interdisciplinar e contextualizada no ensino de ciências naturais.” Questão 7: A Química Forense tratada em seriados americanos como CSI e Dexter tem seus lados reais ou são pura ficção? Caso já tenha assistido algum destes ou outros seriados, poderia comentar um exemplo de um caso que seja considerado apenas ficção e outro que tenha ocorrido na vida real? Aqui podemos verificar que o uso da cena de CSI como meio de tornar o conteúdo mais atrativo para os alunos é uma alternativa viável, isso partindo da afirmação do perito sobre o episódio tratado:
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“No caso do CSI: Crime Scene Investigation ... quase todas as técnicas são reais, mas, dada a limitação de tempo de cada episódio” O mesmo perito também cita que outros seriados, como Dexter, têm seus lados verdadeiros. Isso é também mencionado por Couto (2009) em “O segredo das investigações criminais”, em que o autor afirma que a evolução da ciência forense, atualmente, ajuda a montar o caso quando analisado desta maneira: (COUTO, 2009) “No mencionado Dexter, boa parte da atividade do protagonista está relacionada a avaliação de padrões de manchas de sangue ou à detecção de sangue. Estas técnicas existem e são utilizadas pela perícia criminal brasileira.” A entrevista completa pode ser verificada no anexo 2
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Considerações finais A partir da metodologia usada e das entrevistas realizadas, verifica-se que a química forense é um excelente tema para ser usado para contextualização do ensino de química. Isso pode ser observado levando-se em conta as discussões feitas pelos alunos durante o vídeo apresentado do CSI, assim como o interesse pela realização dos experimentos propostos, o da identificação de sangue na espátula e o de identificação de digitais com ressublimação do iodo. Com as entrevistas com os dois peritos criminais, verifica-se que a química forense é uma ciência importante na investigação do crime, isso por ser um conteúdo tratado nas ciências naturais, deste modo, sendo considerado como uma interdisciplinaridade, por serem tratados assuntos de química, física e biologia. Além disso, a utilização de vídeos como do seriado americano CSI: Crime Scene investigation é uma alternativa viável, pois segundo o perito, quase todas as técnicas são reais, fazendo com que não seja passada uma imagem não verdadeira da perícia criminal. Foi possível verificar também que o uso do vídeo não só demonstra as variadas técnicas da perícia criminal, mas também dá margem para o professor explicar variados assuntos, como no caso discutido, em que foi possível tratar assuntos relacionados ao uso do carvão ativo, combustão incompleta com liberação de gases como o monóxido de carbono, algumas das consequências que o fumo pode trazer para saúde, entre outras. Com isso, é possível afirmar que, apesar da complexidade de determinados termos da perícia criminal, assuntos não tão aprofundados podem ser utilizados como complementos da aula, isto é, na contextualização do ensino de química.
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ANEXO 1 – Questões Avaliativas Reagente de Kastle-Meyer
1. O que foi observado? 2. Como se explica o fato observado? 3. O que poderia interferir na análise?
Identificação de digitais
1. Quais são os fenômenos observados ou qual o fenômeno observado? 2. A forma cristalina de cada substância sublimada é a mesma antes e depois da sublimação? 3. Por que se colocou o vidro relógio sobre o béquer? 4. Explique como o vapor de iodo possibilitou a identificação das digitais no papel?
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ANEXO 2 – Entrevista com Peritos Criminais Respostas do Perito Claudemir Rodrigues Dias Filho Perguntas: 1. Qual a formação do entrevistado (graduação, mestrado, pós-graduação)? Bacharelado e Licenciado em Ciências Biológicas (UNICAMP), Mestre em Genética e Biologia Molecular (UNICAMP) 2. Resumo do Currículo profissional (se desenvolveu atividades além de perito)? Tenho trabalhado como docente universitário desde 2002, já desenvolvi atividades de ensino nas disciplinas de “Zoologia”, “Genética Evolutiva”, “Genética Molecular”, “Biologia Molecular” e, mais atualmente, “Medicina Legal e Criminalística” (UNIMES) e “Introdução à Perícia Criminal e à Biologia Forense” (UNICAMP). No meio forense, tenho ministrado cursos de treinamento e capacitação em “Entomologia Forense” e “Novas tecnologias aplicadas à perícia criminal”. Quatro ou cinco vezes ao ano, tenho participado de cursos e palestras em eventos acadêmicos. Além disso, tenho publicado artigos e capítulos em livros com a temática pericial criminal e educação. De forma bem resumida, é isso. 3. Em seu cotidiano, como perito, quais os casos mais comuns que são investigados? Dentre eles quais são os conhecimentos conceituais e técnicos que são utilizados para elucidá-los? Dentre os crimes previstos no Código Penal, os mais freqüentes estão relacionados aos crimes contra o patrimônio, especialmente o furto. Entretanto, crimes contra a pessoa não ficam muito atrás, como homicídio. A investigação pericial em local de crime é sempre uma atividade interdisciplinar, de forma que é difícil descrever pontualmente os conhecimentos que utilizamos em nossas análises. Em casos de furto, frequentemente avaliamos marcas e objetos para determinar a compatibilidade entre um e outro, ou para averiguar se um objeto pode ter sido utilizado em um arrombamento ou para facilitar uma escalada. Nessas situações, conhecimentos de física são mais freqüentes. Porém, o meliante pode ter deixado para trás vestígios biológicos, como uma mancha de sangue ou uma impressão dígito-papilar, que demandaram a aplicação de conhecimentos em biologia molecular e biometria. Há, ainda, a possibilidade de terem sido deixados materiais entorpecentes em que serão necessários testes químicos para avaliação de conteúdo, como testes presuntivos (spot tests) ou testes analíticos (CG-MS e CCD).
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4. Dentre esses casos, têm algum que seja fácil de ser reproduzido sem grandes dificuldades em um laboratório de química de uma escola? Levando em consideração a utilização de materiais que sejam de fácil acesso. Reproduzir uma caso completo, pode ser um desafio difícil de se conseguir. Porém, técnicas pontuais podem sim ser utilizadas para induzir o raciocínio discente. É o caso de alguns spot tests, como a constatação de sangue humano. Pensando nisso, escrevi junto com o amigo e colega Edilson Antedomenico um artigo para a Revista Química Nova na Escola cujo título é “A Perícia Criminal e a Interdisciplinaridade no Ensino de Ciências Naturais” (Vol. 32, No. 2, Maio 2010). Neste artigo, exploramos a oportunidade que algumas dessas técnicas periciais proporcionam ao ensino de ciências naturais e à interdisciplinaridade. 5. Na sua opinião, qual a importância de abordar conceitos e técnicas da química forense nas aulas de química de ensino médio em escolas públicas e particulares? Como professor, devo dizer que captar a atenção e o interesse do aluno nem sempre é uma tarefa fácil, sobretudo nos ensinos fundamental e médio. Assim, todo recurso que estiver disponível ao docente para vislumbrar o interesse discente deve pronto e preparado pelo professor para o emprego em sala de aula. A perícia criminal se enquadra como uma dessas ferramentas por vários motivos: (1) é um excelente pano de fundo para o ensino de ciências por fazer uso de alguns procedimentos simples e acessíveis; (2) é fascinante ensinar/aprender como o conhecimento científico pode auxiliar na elucidação de um crime; (3) as mídias de ficção e de informação estão sempre explorando essa temática em seriados e em notícias de casos reais, o que cativa o interesse do aluno; (4) é uma oportunidade de fazer o conhecimento de uma disciplina interagir com o de outra, valorizando a contextualização sugerida pelos Parâmetros Curriculares Nacional do MEC; etc. No entanto, penso que a principal importância no uso de química, biologia ou física forenses é a manutenção do interesse dos alunos em aprender mediante o aguçar da curiosidade discente.
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6. A mídia frequentemente trata de assuntos relacionados à Química Forense , geralmente são crimes que chocaram a opinião pública. Você acredita que o uso destes delitos poderiam ser temas abordados no ensino de Química? Sem a menor dúvida. Como expressei na resposta anterior, penso que os casos divulgados pela mídia proporcionam uma oportunidade para o ensino. Claro que o professor deve trabalhar como sensor do que é discutido, para que a brutalidade do episódio não se torne o foco da discussão. Porém, a oportunidade deve ser explorada. Em nosso artigo, exemplificamos com o caso Nardoni: a mídia divulgou que a menina Isabela teria atingido o solo com uma velocidade aproximada de 72km/h. O professor poderia explorar a informação questionado os alunos na disciplina de física sobre como se chegou a este valor de velocidade. Na disciplina de química, o professor poderia usar o mesmo caso Nardoni para explorar o conceito de quimioluminescencia do luminol utilizado no apartamento do casal para localizar manchas de sangue. 7. A Química Forense tratada em seriados americanos como CSI e Dexter tem seus lados reais ou são pura ficção? Caso já tenha assistido algum destes ou outros seriados, poderia comentar um exemplo de um caso que seja considerado apenas ficção e outro que tenha ocorrido na vida real? Depende do seriado. No caso do CSI: Crime Scene Investigation (o original, que se passa em Las Vegas, NV), quase todas as técnicas são reais, mas, dada a limitação de tempo de cada episódio, os resultados são disponibilizados de maneira muito mais rápida que a realidade. Já no seriado CSI:NY, o roteirista não tem o mesmo cuidado: em muitas cenas, um perito avalia uma amostra ao microscópio óptico e na tela aparece uma imagem de um microscópio eletrônico de varredura. No mesmo seriado, alguns peritos fazem uso de equipamentos do tipo sniffer (nariz eletrônico) que, no programa, são capazes de distinguir quaisquer combinações de substâncias e proporções da mistura... seria ótimo se contássemos, na vida real, com um equipamento e um banco de dados desse tipo. No mencionado Dexter, boa parte da atividade do protagonista está relacionada a avaliação de padrões de manchas de sangue ou à detecção de sangue. Estas técnicas existem e são utilizadas pela perícia criminal brasileira.
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Respostas do Perito Edilson Antedomenico 1. Qual a formação do entrevistado (graduação, mestrado, pós-graduação)? Eu sou formado em química, graduando em direito e mestrando em educação. 2. Resumo do Currículo profissional (se desenvolveu atividades além de perito)? Antes de entrar na perícia eu atuava como professor de química, física e matemática. 3. Em seu cotidiano, como perito, quais os casos mais comuns que são investigados? Dentre eles quais são os conhecimentos conceituais e técnicos que são utilizados para elucidá-los? Atualmente, estou trabalhando na parte da perícia especializada em identificação veicular, a qual tem como objetivo constatar se um veículo foi objeto de adulteração ou não. Para tanto, é feita uma comparação entre a numeração do chassi gravada no veículo e o padrão de gravação comumente utilizado pelo fabricante. Caso se observe alguma divergência, a superfície suporte da gravação do chassi é submetida a exames físico-químicos, com o propósito de que seja revelada a numeração original, para posterior identificação do veículo. 4. Dentre esses casos, têm algum que seja fácil de ser reproduzido sem grandes dificuldades em um laboratório de química de uma escola? Levando em consideração a utilização de materiais que sejam de fácil acesso. Acho que a parte da perícia que mais chama a atenção das pessoas é, sem dúvida, o crime de homicídio. Desse modo, aproveitando-se da repercussão gerada pela mídia, os professores podem, a título de exemplo, elencar os aspectos a serem observados e os conhecimentos científicos requeridos para a perícia em locais de crime de homicídio, que vão desde os exames bioquímicos para a constatação de manchas de sangue, passando pela genética molecular, até os métodos de estimativa do tempo post-mortem, dentre os quais se destaca o estudo da termologia durante o processo de resfriamento corporal e a entomologia forense (estudo de insetos e outros artrópodes associados à decomposição cadavérica).