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Rankel Ran kel,, Lui Luizz Fer Fernan nando; do; Sta Stahls hlschm chmidt idt,, Ros Rosâng ângela ela Mar Maria. ia. / Pro Pro-fssão Docente. / Luiz Fernando Rankel; Rosângela Maria
Stahlschmidt. — Curitiba : IESDE Brasil S.A., 2009. 156 p.
ISBN: 978-85-387-0191-0
1. Professores – Formação. 2. Professores – Treinamento. 3. Didática. 4. Prática de ensino. I. Título. II. Stahls Stahlschmid chmidt,t, Rosângela Maria. CDD 370.71
Capa: IESDE Brasil S.A. Imagem da capa: Jupiter Images/DPI Images
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Luiz Fernando Rankel Mestre em História pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Graduado em História pela Faculdade de Filoso�a Ciências e Letras de Palmas. Professor de Ensino Superior. Tem experiência na área de História, com ênfase em Teoria e Filoso�a da História. Atuando principalmente nos seguintes temas: Exposição Antropológica Brasileira, Museu Paranaense, Antropologia e Arqueologia, Brasil Império.
Rosângela Maria Stahlschmidt Mestre em Educação pelo Centro Universitário Diocesano do Sudoeste do Paraná. Especializada em Metodologia para o Ensino da Matemática pelo Centro Universitário Diocesano do Sudoeste do Paraná. Graduada em Pedagogia pela Faculdade de Filoso�a Ciências e Letras de Palmas, com habilitação em Orientação Educacional e Administração Escolar. Graduada em Ciências com habilitação em Matemática pelas Faculdades Reunidas de Admin. Ciências Contábeis e Econômicas de Palmas. Professora de Educação Básica da rede estadual de ensino do Paraná e do Ensino Superior.
Formação inicial e formação continuada ........................ 71 A formação clássica do professor ........................................................................................ 71 A necessidade da formação continuada........................................................................... 76 Educação e tecnologias da informação ............................................................................ 79
O professor re�exivo ...............................................................91 A educação como arte............................................................................................................. 91 Autonomia para aprender e para ensinar ........................................................................ 94 Gerenciando e re�etindo o exercício da pro�ssão........................................................ 97 Professor pesquisador e professor re�exivo.................................................................... 98
O professor iniciante .............................................................109 Choque de realidade ..............................................................................................................109 Estratégias de socialização ...................................................................................................114
Competências para ensinar ................................................123 A universidade como centro de excelência ...................................................................123 Os saberes didáticos e a ciência da educação ..............................................................124 A pesquisa como competência fundamental ...............................................................127
Gabarito .....................................................................................139
Referências................................................................................145
Finalizando, o oitavo capítulo traz a universidade enquanto centro de excelência para universalizar o conhecimento, transformando saber em sabedoria, contribuindo para a formação do aluno, desenvolvendo competências para ensinar, tendo a pesquisa como a competência fundamental para a atividade educativa. Sendo assim, re�etimos acerca da formação docente e reconhecemos as di�culdades da formação e atuação dos professores no exercício e na busca do reconhecimento pro�ssional. Mas ainda temos um longo caminho pela frente, para transpormos os obstáculos, de forma a imprimir novos rumos para a história da pro�ssão docente.
A (des)construção da identidade docente Luiz Fernando Rankel Falar sobre identidade remete a muitos signi�cados. Desde os mais simples e cotidianos como é o caso da carteira de identidade, documento responsável pela identi�cação dos indivíduos e indispensável em várias situações de exigência legal, até àquilo que ultimamente vem sendo debatido pelas ciências sociais em geral, como conceito cientí �co. É sobre este último que nossos esforços estarão direcionados a partir de agora. Assim, identi�car o desenvolvimento da identidade como conceito será de grande valia para desenvolver a problemática da identidade do pro�ssional da educação. Para Pereira e Martins (2002, p. 113) é de suma importância discutir o conceito de pro�ssional docente do Ensino Superior no Brasil, “sobretudo, porque a pós-modernidade reduziu o sistema de ensino a um atendimento de segunda categoria para a sociedade marginalizada”. Poder-se-ia estender esta “necessidade” aos vários níveis a que está ligado o professorado brasileiro, não deixando de lado, é claro, as especi�cidades que, por exemplo, o Ensino Fundamental e Médio exigiria em caso de uma análise mais profunda. Também a citação deixa claro a particularidade da chamada pós-modernidade, enquanto uma situação com características singulares, principalmente no que tange às transformações ocorridas na sociedade em função das tecnologias de informação, e por conseguinte o impacto que vem acarretando no ensino como um todo. Como sujeito social, histórico e político, o indivíduo membro de uma sociedade constrói sua identidade no processo de socialização primária e secundária, sendo a primeira mais direta e importante porque se refere aos contatos pessoais, que possuem forte conotação emocional, como a família, por exemplo. Os contatos secundários vão ocorrer ao longo da vida e são de caráter impessoal, não necessitam muito além das obrigações que as ocasiões do nosso dia-a-dia nos impõem. As de�ciências que porventura possam ter existido na socialização do indivíduo, principalmente na socialização primária, podem levar a casos de anomia1, ou seja, sentimen1
Termo cunhado por Durkheim na sua obra O Suicídio de 1897. Segundo o autor, na modernidade o racionalismo levou a uma perda dos laços que uniam as pessoas, ocasionando o sentimento de perda de valores, indispensáveis à coesão social e construção das identidades coletivas. Para Durkheim o comportamento suicida estaria intimamente ligado a este processo.
Pro�ssão Docente
to de vazio existencial e consequente perda de identidade coletiva. Para Michael Pollak, identidades coletivas são “todos os investimentos que um grupo deve fazer ao longo do tempo, todo o trabalho necessário para dar a cada membro do grupo – quer se trate de família ou de nação – o sentimento de unidade, de continuidade e de coerência” (POLLAK, 1992, p. 207). Percebe-se que a ênfase nesse sentido recai sobre a questão coletiva, isto é, são os aspectos (o sentimento de pertencimento per tencimento a um determinado grupo social, identi�cando-se com ele, suas características etc.) que “determinam” o comportamento do indivíduo na sociedade. Apesar de serem de suma importância, ultimamente tem-se dado muita atenção ao processo de construção individual, aquele que diz respeito à forma como o indivíduo recebe, reelabora e transmite as representações que constroem sua identidade. A análise das experiências pessoais surgem então como um ramo profícuo na tentativa de apreender a forma pela qual os professores dão signi�cado às suas práticas docentes. Nóvoa2 apud Pereira e Martins (2002, p. 120) “adverte “adverte que a identidade (ser e sentir-se professor) não é um dado, não é uma propriedade, não é um produto: identidade é um lugar de lutas e con�itos, é um espaço de construção de maneiras de ser e de estar na pro�ssão”. Esta autopercepção, e a maneira como é expressa, através da linguagem, é o fundamento da identidade pessoal, exatamente na construção simbólica de si como membro de um grupo. Assim, quando falamos em identidade docente estamos caracterizando-a como identidade construída, por um lado, externamente, atribuída pela sociedade e pelo Estado sobre o professor, por outro lado tem-se a identidade pessoal, ou interna, construída e elaborada pelo professor através da sua trajetória como pro�ssional da educação. O objetivo seria o de provocar uma ruptura em relação à visão externa, aquele conjunto de representações criadas em sua maioria a partir de imagens estereotipadas, rebaixando a atuação do professor como um mero técnico reprodutor de conteúdos e esquemas de aprendizado. No entanto, esta ruptura precisa acontecer a partir de dentro, da identidade interna, na busca pelo pro�ssionalismo e ética da pro�ssão. No âmbito da pro�ssão, embora não de forma unívoca, temos que ter uma luta consistente, nesse sentido é possível construir uma prática social de uma intenção de ruptura, procurando superar a identidade atribuída e fazendo desse atributo a possibilidade de ruptura, o que signi�ca exatamente essa possibilidade de produção de práticas que estejam sintonizadas com as demandas postas pela realidade. Não há práticas prontas e acabadas, mas práticas construídas de acordo com as demandas, carências e necessidades que são postas socialmente. (PEREIRA; MARTINS, 2002, p. 121) 2
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NÓVOA, António (Org.). Os Professores e sua Formação . 2. ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1995a.
A (des)construção da identidade docente
O pensamento dos autores citados, apresenta a necessidade do professorado re�etir sobre o processo de construção da identidade pro�ssional em suas múltiplas dimensões, ou seja, é necessário fazer uma ampla re�exão sobre suas práticas. Bourdieu se referiu à di�culdade que o etnólogo tem para referenciar como objeto de estudo – enquanto sujeito social e em uma relação de familiaridade com sua cultura – os esquemas que organizam seu próprio pensamento: “quanto mais tais esquemas encontram-se interiorizados e dominados, tanto mais escapam quase que totalmente às tomadas de consciência parecendo-lhe assim coextensivos e consubstanciais a sua consciência” (BOURDIEU, 1992, p. 204). Com algumas diferenças, Bourdieu segue interrogando se a escola não cumpriria a mesma função de organização dos esquemas de pensamento nas sociedades escolarizadas, semelhante à que os ritos e mitos cumprem nas sociedades que não possuem instituições escolares (BOURDIEU, 1992). São problemáticas que devem ser levadas a sério quando se trata de investigar a construção da identidade docente. Será que os professor professores es possuem as ferramentas teóricas e metodológicas necessárias para poder fazer um mergulho de grande profundidade justamente naquilo que nos escapa a todo o momento, que são os nossos “esquemas que organizam nosso pensamento”? Falar em professor re �exivo é justamente ter a capacidade de perceber a escola e a própria prática docente nas suas “funções” sociais. A construção da identidade da pro�ssão docente está muito ligada a esta re�exão que é de caráter histórico, social e político. Dessa forma pode-se efetivamente almejar o objetivo maior de ruptura em relação à identidade externa construída sobre falsos argumentos, a partir da tomada de consciência do professor como sujeito histórico e pro�ssional destacado na sociedade.
Identidade da pro�ssão docente Como ressaltamos, a identidade docente possui vários aspectos, várias dimensões que devem ser levadas em consideração quando se quer problematizá-la. Por ser de caráter histórico é, portanto, mutável, modi�cando-se interna e externamente de acordo com as transformações que ocorrem na sociedade ao longo do tempo. Aliás, muitos problemas e desa �os na educação podem ser avaliados através da defasagem que esta possui em relação às transformações do meio social. Para Pereira e Martins (2002, p. 123) “os avanços no campo do conhecimento centram-se na tecnologia. Assim, cabe ao docente assumir uma postura esclarecedora e crítica do papel da informática e dos mass media3 no processo 3
O termo mass media (2008) é formado pela palavra latina media (meios), plural de medium (meio), e pela palavra inglesa mass (massa). Em sentido literal, os mass media seriam os meios de comunicaç ão de massa (televisão, rádio, imprensa etc.).
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Pro�ssão Docente
de aprendizagem, analisando sua função social”. social”. Percebe-se que a tarefa do educador é dupla, pois precisa entender como se dá e quais as consequências das novas tecnologias de informação na sua pro�ssão e ainda, em uma perspectiva mais ampla, agir como mediador no entendimento da sociedade como um todo e identi�car qual é o impacto i mpacto dessas tecnologias sobre ela. Outro fator indispensável é a capacidade de avaliação crítica da realidade por parte do educador. Partindo dessas constatações, a construção da identidade docente pressupõe por parte do educador algumas atitudes: veri�car qual a “signi “signi�cação social da pro�ssão” e fazer sua constante revisão;
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fazer uma revisão das tradições, rea rea�rmando as práticas culturalmente adotadas e tidas como signi�cativas no atendimento das necessidades da realidade;
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confrontar teorias e práticas, e, também, também, a análise das práticas à luz luz das teorias existentes existentes e 4 a construção das novas teorias (PIMENTA , apud PEREIRA; PEREIRA; MARTINS, 2002, p. 123).
Tais atitudes são perpassadas pela ação primordial e necessária: a pesquisa. O pro�ssional docente, para estar preparado para os níveis de exigência que a pro�ssão apresenta hoje em dia, precisa demonstrar esta competência. O processo de formação deve ser contínuo, visando sempre o pro�ssionalismo intelectual. Uma vez que o professor trabalha essencialmente com o saber, com o conhecimento que foi e é produzido pela humanidade, o domínio da informação e da comunicação são elementos-chave na sua pro�ssão. Discutir a identidade docente faz-se necessário para atentar para as transformações que vêm ocorrendo, na forma como a sociedade conduz a produção e a circulação do conhecimento, pois inegavelmente há relações de poderes que permeiam as formas institucionalizadas de educação. Essas relações, frequentemente assimétricas, demonstram como a educação pode ser um dos fatores fundamentais na manutenção das desigualdades sociais, mas, igualmente, possui a capacidade intrínseca da intervenção transformadora. O trecho a seguir, retirado de Pereira e Martins (2002), apresenta como o professorado tem um desa �o a enfrentar quando se pensa no domínio da informação e da comunicação como características do pro�ssional docente atualizado, mostrando como isso possui uma importância na modi�cação da realidade. Há de se considerar que, por tradição, a escola sempre trabalhou com o conhecimento através de seus atores-autores produzindo-o, reelaborando-o ou reproduzindo-o. Com o advento da 4
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PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente . São Paulo: Cortez, 1999, p. 18-9.
A (des)construção da identidade docente
Terceira Revolução Industrial, trazendo em seu bojo a revolução dos meios de comunicação de massa que passam a veicular a informação com uma velocidade instantânea e num curto espaço de tempo, houve um descompasso entre escola e a informação, ou seja, professores e instituições de ensino não conseguiram acompanhar o ritmo frenético da transmissão de conhecimento dos mass media que deixou ambos inoperantes. Conclui-se que, no geral, os pro�ssionais de ensino e as escolas não conseguiram atualizar suas informações no cotidiano e muito menos o material didático utilizado. Perante esta di �culdade, a tarefa do professor consiste em trabalhar as informações para que sirvam de ligação entre a sociedade de informação e os alunos, possibilitando-lhes o desenvolvimento da capacidade re �exiva e a aquisição da sabedoria, bem como torná-los conhecedores nos elementos de sua situação para que tenham meios de intervenção na realidade, transformando-a com o intuito de ampliação da liberdade da comunicação e de colaboração mútua ente os seres humanos. (PEREIRA; MARTINS, 2002, p. 124-125)
Insistimos, portanto, no processo de tomada de consciência do professor como sujeito histórico que possui responsabilidades diferenciadas das outras pro�ssões, porque envolve a tarefa indispensável de provir os instrumentos necessários para que as pessoas possam interpretar a realidade de modo a transformá-la. E é justamente a realidade dos professores brasileiros que impede muitas vezes que se tenha possibilidade de atingir o grau de pro�ssionalismo tão exigido pela sociedade globalizada. Segundo Tardif e Lessard (2008, p. 10) “a partir do começo dos anos 1980 e ainda mais fortemente no início dos anos 1990, as ondas de restrições orçamentárias para a educação atingiram duramente os professores”; a isso se acresce o aumento da demanda escolar, salas com mais alunos e a necessidade do professor trabalhar muitas horas por semana, em vários estabelecimentos, não criando o vínculo necessário em relação à instituição escolar, o que seria fundamental para sua participação mais ativa na reelaboração das políticas organizacionais escolares. Decorrente disso, os autores a�rmam “que a carga de trabalho dos professores é mais pesada do que antes, e sobretudo mais absorvente, mais exclusivista e mais exigente, enquanto os meios e os �nanciamentos encolhem” (TARDIF; LESSARD, 2008, p. 10). É, portanto, considerando a realidade mais imediata da sala de aula, com toda a capacidade que o professor possui para resolver os problemas do cotidiano, bem como a dimensão macrossocial, que envolve as transformações pelas quais passa a educação na sociedade contemporânea, que se instala a perspectiva da problematização da identidade docente.
Crise da pro�ssão docente A pro�ssão docente passa atualmente por uma situação de crise de identidade. Abordar tal questão envolve, como já dissemos, aspectos de ordem interna e externa, que são importantíssimos para que se avalie com mais profundidade o 17
Pro�ssão Docente
problema. A visão que se tem do professor na sociedade de hoje passa pela descon�ança sobre seu pro�ssionalismo, uma vez que há muita confusão quanto a sua função na sociedade, chegando a alguns extremos, como o próprio questionamento sobre a necessidade deste tipo de pro�ssional em uma sociedade informatizada. É o que nos diz Libâneo (1998, p. 13): “muitos pais já admitem que melhor escola é a que ensina por meio de computadores, porque prepararia melhor para a sociedade informacional. [...] Desse modo, não haveria mais lugar para a escola e para os professores”. Será que o questionamento do autor procede? É uma real perspectiva que a educação seja feita por “Centros de Informação” totalmente autossu�cientes, sem a mínima intervenção de um pro�ssional mediador de conhecimento? Estas são questões que seguramente fazem todo sentido, basta que se atente para os rumos que a Educação Superior toma nos dias de hoje. Mas será que tecnologia e professorado são coisas excludentes? Achamos, ao contrário, que a �gura do professor é inapelavelmente indispensável, pois é muito questionável que tudo aquilo que faz parte das constituições dos estados democráticos – principalmente no Brasil, com seus casos de trabalho semiescravo, falta de saneamento básico e profundas desigualdades sociais – esteja realmente sendo respeitado no que tange, principalmente, aos direitos da criança e do adolescente e na educação como um todo. Nesse sentido, há muito que fazer para que se fale em uma pós-modernidade, pois as benesses do capitalismo e do estado de direito democrático não foram devidamente asseguradas a todos os cidadãos. Ainda assim, para se referir às mudanças econômicas, sociais, políticas e culturais que ocorreram durante a segunda metade do século XX e neste início de século XXI, muitos autores se referem a uma dita pós-modernidade, ou sociedade pós-industrial. Deixando de lado esta discussão sobre o termo mais apropriado para designar o momento histórico em que vivemos e, baseado em Libâneo (1998, p. 15-17), apresentaremos algumas das principais transformações que vêm ocorrendo na sociedade contemporânea. Talvez a mudança mais signi�cativa tenha ocorrido na esfera econômica, em função do processo de mundialização da economia de mercado. A globalização é a marca registrada deste panorama de competição acirrada que modi�ca os padrões de produção e consumo. O per �l da mão-de-obra se alterou, pro�ssões foram substituídas pela mecanização e informatização do processo produtivo. Das novas pro�ssões e dos novos pro�ssionais se exigem conhecimentos de tecnologias de comunicação, habilidades cognitivas para poder ter �exibilidade para enfrentar cenários de rápida transformação. A questão política, pensando na forma como se subordina à econômica, aparece, segundo Libâneo (1998), na forma de um comprometimento das soberanias 18
A (des)construção da identidade docente
dos países. Basta que recuemos um pouco para a geopolítica mundial do século XX, especialmente as políticas levadas a cabo pelos estadunidenses5 em relação à “ajuda” na reconstrução dos países envolvidos na Segunda Guerra Mundial, e também as ações intervencionistas na América Latina, para compreendermos como países passam a ser subordinados economicamente a superpotências mundiais. Fica muito difícil para os países cumprirem as exigências das agências �nanceiras internacionais e ao mesmo tempo proverem, aos cidadãos de seus países, qualidade de vida, entendida como acesso à educação, saúde, emprego e tudo aquilo que depende de investimentos e boa administração. Preocupam também as mudanças que ocorrem no campo ético. Há uma padronização dos hábitos e costumes, o que torna também os valores e princípios éticos pragmaticamente adequados às situações em que o lucro individual impera. O que dizer dos escândalos que temos visto quase que diariamente nas notícias dos telejornais? A situação se torna cada dia mais grave se levarmos em consideração que as pessoas que deveriam trabalhar pelo coletivo, responsáveis pela correta destinação do dinheiro público, assumindo cargos representativos, são os que dão os piores exemplos de conduta. Resta-nos lutar e fazer com que nossos direitos, que foram conquistados e não doados, sejam respeitados em toda sua plenitude. Com Libâneo (1998, p. 17-18) citando Frigotto6, destacamos �nalmente os impactos na sociedade das transformações do mundo globalizado: No plano socioeconômico, o ajustamento de nossas sociedades à globalização signi �ca dois terços da humanidade excluídos dos direitos básicos de sobrevivência, emprego, saúde, educação. No plano cultural e ético-político, a ideologia neoliberal prega o individualismo e a naturalização da exclusão social, considerando-se esta como sacrifício inevitável no processo de modernização e globalização da sociedade. No plano educacional, a educação deixa de ser um direito e transforma-se em serviço, em mercadoria, ao mesmo tempo que se acentua o dualismo educacional: diferentes qualidades de educação para ricos e pobres7. (LIBÂNEO, 1998, p. 17-18)
Diante de tais circunstâncias, as condições de trabalho do professor se alteraram profundamente nas últimas décadas. Segundo Brzezinski (2002, p. 12) o Estado vem agindo no sentido de desestimular a participação do professorado nas tomadas de decisão justamente sobre as políticas voltadas para a educação no Brasil. Há, ainda segundo a autora, um total descompasso entre o que estabelece os planos de governo, direcionados para a supervalorização da educação como arma do desenvolvimento, progresso social e expansão do emprego, e a real condição do estatuto social e econômico dos professores, causando o 5
Relativo às pessoas de nacionalidade norte-americana (EUA) (HOUAISS, 2008).
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FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a Crise do Capitalismo Real . São Paulo, Cortez: 1996.
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Grifo nosso.
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Pro�ssão Docente
aviltamento da classe e sua degradação social. Baseada em Enguita8, Brzezinski comenta que a atual situação dos professores é uma situação de proletarização, pela total falta de pro�ssionalismo: “o professorado, nas sociedades capitalistas, passou por um processo sucessivo, prolongado, desigual e con �itado de perda de controle sobre seus meios de produção, do objeto de trabalho e da organização de sua atividade, portanto, proletarizou-se”. Por outro lado, tal proletarização tem gerado, por parte dos professores, uma maior consciência do fato de que para mudar esta situação é imprescindível a busca pelo pro�ssionalismo como base para a construção de uma identidade consubstanciada pela leitura crítica do mundo atual. De forma mais precisa, Pereira e Martins (2002, p. 115-116) identi�cam, a partir de Villa9, vários problemas da situação em que se encontra o professor, dos quais reproduzimos os mais signi�cativos: �
preocupação, por parte do professor, mais com o “como” ensinar do que com “o que” ensinar, isto é, substituindo o fundamental (os conteúdos) pelos acessórios (os procedimentos e as técnicas);
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falta de fortalecimento da construção do conhecimento, na medida em que nossa sociedade não leva a sério a necessidade de formação e o nível cognoscitivo do professorado – caberia aos docentes valorizar as prerrogativas de sua própria formação didático-pedagógica;
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alto índice de doenças físicas ou incapacidades psicológicas do professorado geradas pela insatisfação do fazer pro�ssional;
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recrutamento dos professores já não ocorre entre as camadas superiores da escala social da população em virtude de não ser mais considerado uma promoção social o exercício do magistério, além da sua falta de atratividade para as gerações mais jovens de quaisquer classes;
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súbita necessidade de aumento do número do professorado em virtude da maior demanda de mão-de-obra que reduz o nível de exigências na seleção e na formação dos pro�ssionais;
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meio escolar não evolui com a mesma rapidez das mentalidades e dos costumes do meio social;
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falta de clareza do papel da escola no projeto da sociedade deixando vagos os objetivos, os programas e os métodos de ensino;
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ENGUITA, Mariano Fernández. A ambiguidade da docência entre o pro �ssionalismo e a proletarização. In: Teoria e Educação. Porto Alegre: Pannonica, n. 4, 1991, p. 41-61. 9
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VILLA, Fernando Gil. Crise do Professorado : uma análise crítica. Tradução de: BUGEL, Tália. Campinas: Papirus, 1998.
A (des)construção da identidade docente �
insistência no recurso à inteligência e à autonomia dos alunos, que modi�ca a noção de respeito devido ao professor, à disciplina, ao trabalho, à in�uência educacional e à autoridade.
Resta dizer e rea�rmar a importância da conscientização por parte dos professores de como se está construindo a identidade do pro�ssional docente, ou seja, quais as representações e discursos que estão sendo atribuídos aos professores, o que se está fazendo da imagem dos professores na sociedade. Esta atitude proporcionará ao pro�ssional docente desconstruir a possível imagem negativa e/ou estereotipada que o discurso educacional o�cial insiste em veicular, uma imagem que precisa ser negada e substituída por aquela construída a partir do envolvimento do professorado nesse movimento emancipatório. É o que Garcia, Hypolito e Vieira (2005, p. 47) a�rmam, pois: Tratar da identidade docente é estar atento para a política de representação que instituem os discursos veiculados por grupos e indivíduos que disputam o espaço acadêmico ou que estão na gestão do Estado. É considerar também os efeitos práticos e as políticas de verdade que discursos veiculados pela mídia impressa, televisiva e cinematográ �ca estão ajudando a con�gurar. A identidade docente é negociada entre essas múltiplas representações, entre as quais, e de modo relevante, as políticas de identidade estabelecidas pelo discurso educacional o�cial. Esse discurso fala da gestão dos docentes e da organização dos sistemas escolares, dos objetivos e das metas do trabalho de ensino e dos docentes; fala também dos modos pelos quais são vistos ou falados, dos discursos que os veem e através dos quais eles se veem, produzindo uma ética e uma determinada relação com eles mesmos, que constituem, a experiência que podem ter de si próprios.
Texto complementar A identidade do professor na perspectiva social (CEIA, 2008)
[...] Se visitarmos alguns fóruns na internet frequentados por professores e lermos as discussões que convergem para o problema da identidade do professor, invariavelmente as respostas que aparecem trazem sempre um problema administrativo como argumento principal, do tipo: “sou professora contratada, a concorrer pelo segundo ano e com muito pouca esperança de conseguir vir a fazer, a tempo inteiro, o que mais gosto”; “sou PROFESSORA, com muito gosto! Sou professora de Português, pro�ssionalizada, dou aulas há cinco anos e ainda sou apenas contratada, mas... mesmo assim sou feliz”. 21
Pro�ssão Docente
Há hoje um tipo único de resistência que faz com que o professor, mesmo em condições adversas de trabalho, ainda sinta motivação para o magistério ou tenha uma vontade legítima de sair de vez da caverna para onde foi condenado. Em um tempo de enormes pressões psicológicas sobre o professor, fala-se de um fenômeno que atinge a classe docente com grande impacto: numa primeira fase, todo o professor sofre de estresse e, numa fase mais problemática, pode sofrer de burnout , isto é, de uma hemorragia do self (aquilo que em psicanálise chama o Eu intrapessoal), e que mais facilmente se diagnostica quando o professor se vê confrontado na questão ontológica: quem sou eu? A esta questão essencial do ser do professor são então dadas respostas como “não sei já quem sou”, “não sou ninguém”, “não me (re)vejo mais como professor”. É aquele tipo de disposição mental autodestrutiva que encontramos na literatura quando Bocage diz: “já Bocage não sou” ou quando Fernando Pessoa abre uma longa elegia com um verso terrível: “nada sou” (“Tabacaria”). O professor sente muitas vezes como o poeta. A síndrome é entendida por Codo como um conceito multidimensional, que pode ser de�nido como “Síndrome da Desistência do Educador. Um homem, uma mulher, cansados, abatidos, sem mais vontade de ensinar, um professor que desistiu. (...) Será que este pro�ssional não percebe a importância do seu trabalho na formação de nossos �lhos? Não, muitas vezes não percebe mesmo. Será que não é capaz de envolver-se, emocionar-se por seu trabalho? Não, muitas vezes não é capaz mesmo”. O desgaste emocional da síndrome de burnout que atinge o professor das sociedades pós-industriais contribuiu para o crescimento de um elevado número de vocábulos do mesmo campo semântico: todos parecemos sofrer, em qualquer momento, de fadiga, frustração, desgaste, estresse, depressão, depleção, desajustamento, desesperança, drenagem emocional, exaustão emocional, angústia, desencorajamento etc. Há hoje uma certa paranoia do sofrimento intelectual que leva o professor a só encontrar conforto em alguém que sofre exatamente como ele. Por isso, ser professor hoje é também sofrer em comunidade, dentro de uma mesma caverna, e nunca um professor precisou tanto da solidariedade dos outros que são como ele professores para poder suportar as suas contrariedades mais profundas. A sociedade pós-industrial, pós-moderna e pós-realista não tem nenhuma ética para oferecer ao professor, mas, por não estranha contradição, abundam manuais de conduta do professor, códigos mais ou menos avulsos, que circulam pelas paredes das escolas, mas que raramente entram na sala de aula propriamente dita. Um código minimalista anônimo, que encontrei numa sala de professores de uma escola pública, contém as seguintes premissas: PARA 22
A (des)construção da identidade docente
SER PROFESSOR – sê presente; sê pontual; sê cordial; sê educado; sê prudente e prepara as aulas com antecedência; sê ativo; sê pro�ssional. O efeito que estes códigos éticos têm sobre nós é o mesmo que aqueles outros códigos que normalmente as secretárias de qualquer repartição ou instituição têm bem à vista de todos os que se lhes dirigem, do tipo: “para ser respeitado é preciso respeitar”, e que normalmente produzem um efeito contrário ao pretendido. Não é a esta sociedade que vamos buscar a essência do que somos. [...] A identidade do professor de hoje revela-se muito pelo seu discurso enquanto pro�ssional da educação: somos cada vez mais aquilo que dizemos que somos. O logocentrismo do professor deve ser reconhecido tanto no discurso pedagógico interior (Será que expliquei bem este assunto? Será que podia ter feito melhor? Será que quero mesmo continuar a ensinar? Será que me revejo nesta escola? etc. — eis algumas questões do professor para si próprio que se resumem à questão central da identidade: ensinamos realmente o que somos?) como no discurso cívico para a comunidade. Ninguém estranhará se concluirmos que o discurso interior é muitas vezes mais crítico e severo do que o discurso para os outros com quem convivemos. A autorre �exividade que caracteriza a pro�ssão tem uma atividade muito forte que raramente é compreendida pela sociedade civil. Aqui reside um dos grandes problemas do sofrimento pro�ssional do professor: como é que a sociedade pode compreender que eu me esforço por ser melhor professor todos os dias? O professor de hoje acaba por ter que negociar consigo próprio diferentes formas de motivação para ser capaz de acreditar que o que faz é socialmente válido. Contudo, nada mais devia ser exigido a quem chega a um estado de graça único que nos leva a ouvir dentro de nós a voz que comanda a nossa vida. O professor é o Deus e o Diabo de si próprio e nessa condição não se deve condenar o professor a beber da mesma cicuta a que Sócrates foi obrigado só por pensar mais do que o poder constituído. O professor é tão inseparável das coisas como é inseparável de si próprio; o professor e o mundo são postos conjuntamente, como esferas distintas entre si, mas inseparáveis uma da outra, tão inseparáveis como a consciência da nobreza da sua condição. O discurso solitário do professor para convencer-se a si próprio a agir positivamente tem também que lutar por vencer o imobilismo e a ine �cácia da pedagogia pós-moderna que o inunda de cursos de autoajuda sempre à volta de um grande paradigma: a pedagogia da compaixão, a pedagogia da diferença, a pedagogia dos afetos, a pedagogia da tolerância etc., isto é, 23
Pro�ssão Docente
o professor tem que aprender a libertar-se das próprias de �nições da sua personalidade pro�ssional para poder a�rmar a sua identidade. Finalmente, em poucas pro�ssões se exige tanto de um pro�ssional em termos éticos e talvez em nenhuma outra ocupação existam tantos objetivos decretados para o registro da identidade do professor. Talvez nenhum de nós fosse realmente professor se nos obrigassem a cumprir a ser tudo aquilo que a sociedade espera de nós (o inverso não interessa a nenhum tecnocrata ou político ou programador de ensino). [...]
Atividades 1. Descreva quais são as características do conceito de identidade para que
possa servir de base metodológica para a avaliação da situação docente nos dias de hoje.
2. Individualmente destaque um dos problemas mais signi�cativos que o professor
enfrenta atualmente e que foram apontados no texto. Justi�que sua resposta.
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A (des)construção da identidade docente
Dicas de estudo TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude (Orgs.). O Ofício de Professor: história, perspectivas e desa�os internacionais. Tradução de: MAGALHÃES, Lucy. Petrópolis: Vozes, 2008. Como indicação de estudos complementares temos o recente livro organizado por Maurice Tardif e Claude Lessard que trata do ofício de professor a partir da visão de vários pesquisadores de diferentes sociedades. A obra constitui um excelente aporte teórico para se pensar a crise da pro�ssão docente ocidental, e para que se compare as semelhanças e diferenças que existem em relação a como se dá o mesmo processo no Brasil. NOGUEIRA, Cláudio Marques Martins; NOGUEIRA; Maria Alice. A sociologia da Educação de Pierre Bourdieu: limites e contribuições, Educação & Sociedade, ano XXIII, n. 78, p. 15-36, abr. 2002. Disponível em: . O texto trata de forma clara e objetiva de uma das maiores contribuições da sociologia para os estudos da educação; também apresenta os limites desta interpretação, frente à complexidade e diversidade das realidades escolares.
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História da pro�ssão docente Luiz Fernando Rankel Quando se fala da história da pro�ssão docente, geralmente associa-se à história da educação e às in�uências das ideias �losó�cas nos processos de ensino-aprendizagem. Sob este prisma, o foco desloca-se das tra jetórias da pro�ssão docente para as doutrinas educativas que estiveram em voga em determinado período histórico, em função de determinada situação política e social. Obviamente que este viés tem proporcionado excelentes análises e contribuído para a formação de pro�ssionais de educação mais conscientes da história e da importância do seu ofício. O que se pretende aqui, no entanto, é usar tais doutrinas �losó�cas e pedagógicas como auxiliares no entendimento da problemática central que é a história da pro�ssão docente, seus variados aspectos que envolvem não somente os métodos educativos, mas também as práticas, as lutas, as leis e a intervenção do Estado, a ideologização da pro�ssão e do pro�ssional docente. Como escreveu António Nóvoa na apresentação da grande obra de Franco Cambi, História da Pedagogia, “a História da educação pode nos ajudar a cultivar um saudável ceticismo, cada vez mais importante num universo educacional dominado pela in�ação de métodos, de modas e de reformas educativas” (CAMBI, 1999, p. 13). Da mesma forma, compreender aspectos do processo histórico da constituição da pro�ssão docente no Brasil nos ajudará a re�etir com mais acuidade sobre os usos políticos da imagem do professor envolvida em discursos de “salvação nacional” sem que, no entanto, tenha havido mudanças signi�cativas, nas muitas vezes, árdua realidade do professorado brasileiro.
Contexto sócio-histórico do surgimento da pro �ssão docente A história da pro�ssão docente está intimamente ligada às transformações sociais, políticas e culturais da modernidade. Anthony Giddens
Pro�ssão Docente
de�niu-a, basicamente, como algo que “refere-se a estilo, costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua in �uência” (GIDDENS, 1991, p. 11). O desenvolvimento do capitalismo como modo de produção dominante é uma das principais características que frequentemente são levadas em consideração quando se fala de modernidade. Mas o conjunto de transformações que irromperam neste período histórico supera o limite da reprodução da vida material, para alcançar, como se referiu Giddens, uma nova forma de organização social, incluindo aí as mudanças tecnológicas e culturais. Giddens alude também à necessidade de investigar a “própria natureza da modernidade” pelas ciências sociais, pois, “em vez de estarmos entrando num período de pós-modernidade, estamos alcançando um período em que as consequências da modernidade estão se tornando mais radicalizadas e universalizadas do que antes” (1991, p. 12-13). É neste contexto que tratamos da pro�ssionalização do professor, um contexto marcado pelo surgimento de Estados-nação que tentaram homogeneizar, a partir da ideia de nação, povos e culturas, e que tomaram para si a tarefa de educar a população. Inclusive, a educação promovida pelos estados funcionou como um mecanismo para criar a homogeneização cultural a que nos referimos. Consideramos, portanto, que falar sobre o processo que levou à pro�ssionalização dos professores se encaixa na perspectiva de se investigar aspectos diferenciados da modernidade.
A reforma pombalina dos estudos secundários Existiu, segundo Ana Mendonça, duas grandes Reformas Pombalinas, a de 1759 e a de 1772, que criaram as condições necessárias para a progressiva pro�ssionalização dos professores, em Portugal e no Brasil (MENDONÇA, 2005, p. 29). Tais reformas podem ser consideradas como as primeiras tentativas de se regulamentar a pro�ssão. A autora chama atenção, apoiada principalmente em Nóvoa1, para o pioneirismo de Portugal no que se refere à criação de um sistema de ensino articulado pelo Estado. Teria sido em Portugal a primeira iniciativa no que tange a estatização do ensino, retirando a responsabilidade das câmaras municipais e da Igreja Católica, no contexto do despotismo esclarecido, como �cou conhecido a modernização com base no Iluminismo promovida pelo 1
NÓVOA, António. Le Temps des Professeurs : analyse sócio-historique de la profession enseignante au Portugal (XVIII-XX siècle). Lisboa: Instituto Nacional de Investigação Cientí �ca, 1987. 2 v.
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História da pro�ssão docente
Estado português. O Estado passava a controlar a organização escolar, entre elas a seleção dos conteúdos de ensino e os livros a serem adotados como material didático. Para Mendonça “a reforma de 1759 se constituiu em uma consequência direta da expulsão dos jesuítas dos territórios portugueses e visava à substituição do sistema escolar jesuítico, [...] por um sistema de aulas e de professores régios, controlados pelo Estado” (2005, p. 31). A reforma de 1759 deve ser entendida então como o primeiro movimento em direção a uma educação laica, patrocinada e controlada pelo Estado. Isso se deve também ao contexto político do século XVIII que levaria a uma crescente valorização da educação como um dos fatores fundamentais na constituição dos Estados nacionais. Aspecto este que no século XIX ganhará destaque nas políticas de homogeneização cultural, levadas a cabo por burocracias estatais de vários países que se formavam e precisavam construir uma identidade própria para as nações. Surge, a partir da reforma de 1759, um per�l do professor ideal, composto por características especí �cas que destacam a moralidade, o conhecimento e a intuição. Além disso, é lançado um concurso nacional que estabeleceria a condição necessária para, a partir de então, se exercer a pro�ssão docente em terras portuguesas. Mesmo assim, a maioria dos professores régios foi formada pelos jesuítas, o que mais uma vez ressalta a importância destas congregações religiosas na formação dos pro�ssionais e da pro�ssão docente. A reforma de 1772 aprofundou e consolidou as transformações trazidas pela reforma de 1759, principalmente com a existência de uma fonte regular de recursos que visavam a manutenção do sistema (MENDONÇA, 2005, p. 32-33). O que gostaríamos de ressaltar sobre essas reformas é justamente a ação do Estado português que, sob a inspiração das mudanças políticas e de mentalidade ocorridas durante o século XVIII passou a entender, de acordo com o espírito iluminista, que a educação tem um papel fundamental na construção de um mundo universalmente progressista e civilizado. Em Portugal, portanto, inicia-se o processo de estatização do ensino público e, por conseguinte, da pro�ssão docente, que passou a ser regulamentada e dirigida pela burocracia estatal. No século XIX, após a independência política, a discussão sobre a instrução popular e a consequente preparação dos professores, tomaram uma nova dimensão no Brasil, passando a existir um método especí �co de se educar em locais apropriados para a formação de professores.
A formação de professores no Brasil Foi em 15 de outubro de 1827 que a lei das escolas das primeiras letras, como �cou conhecida, estabeleceu os parâmetros sob os quais deveriam ser treinados 29
Pro�ssão Docente
os professores das províncias brasileiras, pois as províncias, além de serem responsáveis pelo ensino elementar, também deveriam responsabilizar-se pelo consequente preparo dos professores (SAVIANI, 2005, p. 12). Em 1835, a Província do Rio de Janeiro instala a primeira escola normal do Brasil, cuja Lei Provincial de 4 de abril de 1835 estipulava que [...] a escola será regida por um diretor que ensinará: os conhecimentos de leitura pelo método lancasteriano2, cujos princípios doutrinais e práticos explicará; as quatro operações de aritmética, quebrados, decimais e proporções; noções de geometria teórica e prática; elementos de geogra �a; princípios da moral cristã e da religião o�cial e gramática nacional. (SAVIANI, 2005, p. 12-13, apud VILLELA3, 2000, p. 109)
Este modelo adotado na escola normal do Rio de Janeiro será basicamente o mesmo utilizado em outras províncias e se manterá com retrocessos até o advento da República. Saviani assinala o fato de que mesmo com a mudança na forma de governo no Brasil não houve mudanças signi�cativas no campo educativo (SAVIANI, 2005, p. 13). Apesar dessa aparente estabilidade no que se refere à organização por parte do Estado da educação e da preparação dos professores há que se atentar para outros aspectos relacionados à pro�ssionalização do professorado brasileiro que estão diretamente relacionados à estatização da pro�ssão docente. Isto se deve às recentes mudanças na forma de se abordar o fenômeno da educação que se abre para âmbitos até então inexplorados. É a renovação dos estudos sobre a educação que revela novos objetos em função da utilização de novos documentos. Um exemplo desta renovação nos estudos sobre a educação é o trabalho de Alessandra Frota Schueler sobre as representações da pro�ssão docente construídas a partir do surgimento da imprensa pedagógica especializada, na segunda metade do século XIX, no mesmo momento em que se dá a estatização da pro�ssão e sua consequente regulamentação. O surgimento da imprensa especializada em educação, elaborada e publicada por membros atuantes ou envolvidos com o magistério, público ou particular, visando atingir basicamente professores e professoras, autoridades de ensino, os pais e as famílias dos alunos, [...] teve que esperar o alvorecer da década de 1870. Sem dúvida, o processo de estatização da pro �ssão docente e a a�rmação dos professores como classe pro �ssional de�niram os rumos do surgimento da imprensa pedagógica na cidade do Rio do Janeiro. (SCHUELER, 2005, p. 381)
A estatização da pro�ssão docente parece ser o ponto de partida para que os professores pudessem, a partir de então, organizar veículos de mídia capazes 2
“Também conhecido como ensino mútuo ou sistema monitoral, esse método pregava, dentre outros princípios, que um aluno treinado ou mais adiantado (decurião) deveria ensinar um grupo de dez alunos (decúria), sob a orientação e supervisão de um inspetor. Ou seja, os alunos mais adiantados deveriam ajudar o professor na tarefa de ensino. Essa ideia resolveu, em parte, o problema da falta de professores no início do século XIX no Brasil, pois a escola poderia ter apenas um ed ucador”. MÉTODO LANCASTERIANO. MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Dicionário Interativo da Educação Brasileira. São Paulo: Midiamix, 2002. Disponível em: . Acesso em: 13 set. 2008. 3
VILLELA, Heloísa de Oliveira Santos. O mestre escola e a professora. In: LOPES, Eliane Marta Teixeira; FARIA FILHO, Luciano Mendes; VEIGA, Cynthia Greive. 500 Anos de Educação no Brasil . Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 95-134.
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História da pro�ssão docente
de expressar os anseios de classe e também discutir os rumos que a educação deveria seguir no Brasil. O periódico “Instrução Pública: publicação hebdomadária” expressou um modelo de debate em torno dos problemas que a educação brasileira havia recém identi�cado, situações tributárias de um sistema educacional incipiente. Segundo Schueler, a revista demonstrava uma forma encontrada por alguns professores públicos e pelos agentes do governo que tiveram a clara intenção de criar um canal através do qual poderiam debater e viabilizar a instrução pública (SCHUELER, 2005, p. 382). É interessante perceber que desde que começaram as discussões em torno da educação no Brasil, bem como sobre a situação dos professores como classe pro �ssional, o Estado esteve presente, não apenas como um interlocutor que naturalmente seria – levando em consideração a relação entre a promoção da educação pública e a presença cada vez maior do Estado-nação na estrutura das sociedades ocidentais – mas na própria constituição em si da identidade docente, como que tentando moldar a �gura do professor às necessidades da própria imagem do Estado perante a sociedade. Isso teve efeitos indeléveis na história da pro�ssão docente e na educação brasileira como um todo. Figurar como uma nação civilizada e em franco progresso no quadro geral das nações europeias e os Estados Unidos era uma questão que fez o Brasil Imperial lançar mão de diversos mecanismos de cunho cultural e político durante o século XIX, principalmente na sua segunda metade. Basta que atentemos para a função inclusive pedagógica que os museus brasileiros tiveram ao expor objetos que representavam culturas ditas primitivas e que contrastavam com o progresso e a civilidade a que tínhamos chego, mesmo que as mazelas sociais – em que a exploração da mão-de-obra escrava negra e a destruição de culturas indígenas foram aspectos marcantes – mostrassem o lado nefasto da “evolução”. O Estado, portanto, promoveu a ideia de um professor como “agente fundamental da civilização e do progresso social e nacional” (SCHUELER, 2005, p. 383). Isso, por um lado, fortaleceu a imagem do pro�ssional da educação como �gura importante e fundamental na construção de uma nação ideal, gerando a partir dos novos parâmetros exigidos para a pro�ssão, um critério maior na contratação de docentes, o que certamente contribui para o pro �ssionalismo dos educadores. Mas é importante salientar o aspecto ideológico que permeou este processo de pro�ssionalização do educador brasileiro. A pro�ssão docente torna-se “o braço direito do Estado na tarefa de educar e instruir cidadãos, [...] como artí �ce fundamental para o progresso social” (SCHUELER, 2005, p. 383), criando assim a imagem da educação como o meio através do qual seriam resolvidos os problemas mais graves da sociedade rumo a um futuro melhor. As fontes indicam, 31
Pro�ssão Docente
segundo Schueler, uma gama de discursos em torno da imagem e da missão do professor na sociedade brasileira do presente e do futuro, “relatos sobre a missão crucial dos mestres na formação da cidadania abundavam, assim como eram recorrentes as narrativas queixosas sobre as di�culdades, a precariedade das condições materiais e o abandono do governo para com a instrução pública e os mestres-escolas” (SCHUELER, 2005, p. 383). Parece ser esse o momento a partir do qual se instala no Brasil o paradoxo que nos vem até hoje, aquele que apresenta a educação e os professores como fator de salvação da sociedade, uma imagem construída pelo Estado principalmente, mas acolhida e reproduzida pelos próprios professores e sociedade civil, e a realidade objetiva das condições em que se dá a educação, ou seja, os problemas da formação, da remuneração, da falta de escolas e de condições mínimas para o exercício digno da pro�ssão. O aspecto da formação dos professores foi amplamente debatido e foi considerado de suma importância a ponto de �gurar com destaque na reforma da Escola Normal de São Paulo de 1890. Saviani ressalta o Decreto 27 de 12 de março que estipulava que: “sem professores bem preparados, praticamente instruídos nos modernos processos pedagógicos e com cabedal cientí �co adequado às necessidades da vida atual, o ensino não pode ser regenerador e e�caz” (SAVIANI, 2005, p. 13). Percebam que as palavras regenerador e e�caz estão de acordo com a ideia da educação como portadora da transformação social, regenerando as pessoas para que pudessem se adequar à meta civilizatória do Estado; além disso, e de acordo com Saviani, o decreto dá ênfase à formação prática do ensino. É interessante que se analise o relatório de Caetano de Campos apresentado ao governador do Estado em 1891. Caetano assumira a direção da escola normal um ano antes, e neste relatório podemos perceber todas as diretivas da mudança que se propunha através da reforma; além disso, e de forma mais ampla, temos o re�exo das transformações do paradigma cientí �co que tiveram o �nal do século XIX e início do XX como um ponto crucial. Novas cadeiras foram criadas. Às matemáticas juntou-se o estudo da álgebra e escrituração mercantil: às ciências físico-químicas adicionaram-se as ciências biológicas; o estudo da língua materna foi ampliado; e a parte artística profundamente modi �cada no estudo do desenho, foi alargada com a cadeira de música (solfejo e canto escolar); a educação física foi criada com as aulas de calistenia, ginástica e exercícios militares; �nalmente, a geogra �a foi separada da cadeira de história, para maior latitude do ensino; e as ciências sociais contempladas com o acréscimo da cadeira de economia política e educação cívica, na qual se dão noções de direito e administração. (REIS FILHO4, 1995, p. 52, apud SAVIANI, 2005, p. 14)
Talvez uma das questões mais importantes neste relatório seja a presença das chamadas “ciências biológicas”, as quais in�uenciaram grandemente na foração 4
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REIS FILHO, Casemiro. A Educação e a Ilusão Liberal . 2. ed. Campinas: Autores Associados, 1995.
História da pro�ssão docente
das ciências sociais durante o século XIX e início do XX. Principalmente ciências como a Antropologia, que utilizou conceitos advindos da Biologia para estruturar suas primeiras interpretações sobre as diferenças culturais da humanidade. O determinismo biológico, que atribuía capacidades inatas às diferentes “raças” humanas foi largamente utilizado para interpretar e oferecer explicações cientí �cas para as desigualdades existentes entre as sociedades, internamente e em relação a outros países. Também podemos apontar a educação cívica, que acabou incorporando a ideia de que a educação serviria também para a constituição de cidadãos respeitadores da ordem. Se a ênfase recai, como se pode perceber, sobre o treinamento prático neste modelo de educação as escolas normais conhecerão mudanças signi�cativas a partir da década de 1930 no Brasil. As reformas de 1932, no Distrito Federal, e de 1933, em São Paulo, marcaram a educação brasileira pelas suas iniciativas de renovação do ensino baseadas na experimentação pedagógica de bases cientí �cas (SAVIANI, 2005, p. 16).
Trajetória da pro�ssão docente durante o século XX A pro�ssão docente no Brasil viveu durante o século XX um período de intensas transformações que principiaram com as reformas de 1932, direcionadas por Anísio Teixeira e de 1933, de iniciativa de Fernando de Azevedo. Para além das diferenças existentes entre estas duas propostas, o ponto em comum foi a consciência de que a escola normal não estava cumprindo com sua obrigação primordial: a quali�cação do pro�ssional docente. A crítica recaía na ambiguidade presente na estrutura curricular das escolas normais que, “pretendendo ser, ao mesmo tempo, escolas de cultura geral e de cultura pro�ssional, falhavam lamentavelmente nos dois objetivos” (VIDAL, 2001, p. 79-80, apud SAVIANI, 2005, p. 16). Dessa forma, as reformas tiveram como fundamento a reestruturação curricular da escola normal, que passava a oferecer uma formação de base cientí �ca aliada à experimentação destinada a cada área especí �ca de atuação pro�ssional, licenciaturas e cursos de Pedagogia. A citação de Saviani resume bem como �cou a formação dos professores no Brasil a partir das reformas empregadas: Em 1935, com a criação da Universidade do Distrito Federal, também por iniciativa de Anísio Teixeira, a Escola de Professores a ela foi incorporada com o nome de Escola de Educação. Algo semelhante ocorreu em São Paulo quando, em 1934, com a criação da USP, o Instituto de Educação Paulista a ela foi incorporado. E é sobre essa base que, em 1939, foram instituídos os Cursos de Pedagogia e de Licenciatura na Universidade do Brasil e na Universidade de São Paulo. [...] Aos cursos de Licenciatura coube a tarefa de formar professores para as disciplinas especí �cas que compunham os currículos das escolas secundárias; e os Cursos de Pedagogia �caram com o encargo de formar os professores das Escolas Normais. (SAVIANI, 2005, p. 17) 33
Pro�ssão Docente
As coisas permaneceriam desta forma até o advento da Ditadura Militar a partir de 1964. As principais mudanças ocorreram na legislação do ensino, reformulando o Ensino Superior, com a Lei 5.540/68 e o Ensino Primário e Médio, com a Lei 5.692/71. Uma consequência direta para a formação dos professores foi o desaparecimento das Escolas Normais, substituídas pela Habilitação Especí �ca de 2.º grau para o exercício do magistério de 1.º grau (SAVIANI, 2005, p. 19). Porém, muitos problemas surgiram com esta nova estrutura, pois a educação passa a atender ao modelo tecnicista, relegando a formação dos professores a simples executores de objetivos pré-programados por especialistas, cujo principal objetivo seria a formação do homem ideal para o mercado de trabalho, para a produtividade. Fusari (1992) aponta algumas consequências negativas que o tecnicismo deixou no sistema educacional brasileiro que persistem na atualidade: uma visão da educação muito economista e imediatista, em que o compromisso maior seria com a formação do homem para o mercado de trabalho (posto de trabalho); uma visão de educação escolar descolada dos problemas fundamentais da sociedade brasileira; uma fragmentação no processo ensino-apendizagem, em que o professor, juntamente com os especialistas, dividiram o espaço da educação escolar, cada um cuidando do seu espaço, reforçando assim a falta de uma visão de totalidade e, principalmente, uma atuação fragmentada e competitiva no interior da escola; uma falsa impressão de que as tecnologias resolveriam os problemas fundamentais da educação escolar, caso estes recursos chegassem de fato à escola e fossem bem utilizados pelos educadores; uma visão de tecnologia como um �m, quando, na realidade, é um meio para; uma ideia de planejamento educacional, especi�camente de ensino, como algo burocrático, supér�uo e desnecessário, descartando assim um meio importante e necessário ao bom desenvolvimento do ensino (FUSARI, 1992, p. 21-22).
Muitos autores se referem aos resquícios que este modelo educacional deixou no sistema educacional brasileiro. É inegável que o tecnicismo ainda permeia os currículos de formação de professores, e muito mais ainda a prática de muitos professores, que tiveram uma formação nesses moldes e que não passaram por um processo de atualização, afastados da vida acadêmica, da pesquisa e das publicações mais recentes. Outras tentativas foram feitas para se mudar a situação da educação e da formação dos professores no Brasil. Saviani comenta que a Constituição de 1988 abriu caminho para as reformas e que após alguns anos de discussões foi promulgada a Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996 (SAVIANI, 2005, p. 21). Porém, por falhas de redação, principalmente no que dizia respeito à exigência 34
História da pro�ssão docente
do Ensino Superior para a atuação na Educação Básica, a ambiguidade e consequente pluralidade de interpretações possibilitou aos mercenários da educação utilizar esta lei de forma pragmática e orientada para a geração de lucros. Poderia ter sido um momento decisivo para formação dos professores no Brasil, bem como para a educação como um todo. Portanto, a exigência da formação superior para a atuação em todos os níveis da Educação Básica elevaria o nível de quali�cação dos pro�ssionais da educação, e consequentemente o ensino escolar se bene�ciaria com pro�ssionais talvez mais conscientes de seu fazer pedagógico e melhor capacitados. Saviani conclui da seguinte forma a trajetória da formação dos professores no Brasil até a Lei de 1996: [...] as esperanças depositadas na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, consubstanciadas na Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996, no sentido de que ela viesse a enfrentar com êxito o problema da formação de professores, resultaram frustradas. Com efeito, abortado o dispositivo legal que elevaria o preparo de todos os professores ao nível superior; e considerando-se que a inovação dos institutos superiores de educação representa um forte risco de nivelamento por baixo, perdeu-se a possibilidade de se registrar um quarto momento decisivo na história da formação docente no Brasil. (SAVIANI, 2005, p. 25)
Para além das transformações que foram ocorrendo durante a trajetória da formação docente no Brasil deve-se ressaltar as permanências, os problemas que encontramos atualmente, como a remuneração e as condições de trabalho dos professores, e também a ideologização da �gura do professor e da educação como um todo praticada pelo Estado e a mídia.
Texto complementar As iniciativas dos anos 30 do século XX (SAVIANI, 2008)
Na década de 1920 desencadeou-se um amplo processo de organização do campo educacional impulsionado pelo movimento renovador. De fato, a organização do campo educacional implicava a pro�ssionalização da atividade dos educadores, de modo geral, e dos professores, em particular. E a pro�ssionalização, por sua vez, implicava uma formação especí �ca, o que se iniciou no século XIX com as tentativas intermitentes de criação de escolas normais para a formação de professores primários as quais vieram a adquirir alguma estabilidade no século XX. 35
Pro�ssão Docente
O movimento renovador não apenas deu maior visibilidade às críticas dirigidas às escolas normais consideradas como “um curso híbrido, que oferecia, ao lado de um exíguo currículo pro�ssional, um ensino de humanidades e ciências quantitativamente mais signi�cativo” (TANURI, 2000, p. 72); empenhou-se, também, em oferecer um novo modelo que corrigisse as insu�ciências e distorções apontadas. [...] As duas professoras contratadas por Caetano de Campos para efetivar a reforma, Maria Guilhermina e Miss Browne, tinham formação americana, cuja característica era uma “acentuada feição de treino, de domínio, por meio do exercício, de procedimentos pedagógicos, sem preocupação com suas diretrizes básicas ou fundamentação teórica” (REIS FILHO, 1995, p. 80). Assim, ainda que Caetano de Campos pensasse a Escola-Modelo como um espaço de experimentação pedagógica, ele contou com pessoas tecnicamente bem treinadas num procedimento pedagógico, o das “lições de coisas”, entendido ao nível do bom senso e, por isso, considerado como único procedimento, dotado de validade considerada natural. Ora, conclui Reis Filho, “não há experimentação pedagógica, quando não é possível discutir os fundamentos teóricos que a determinam”. As reformas de 1932, no Distrito Federal, encabeçadas por Anísio Teixeira, e de 1933, em São Paulo, de iniciativa de Fernando de Azevedo, ambas inspiradas no movimento renovador, tinham como pedra de toque as escolas-laboratórios que permitissem basear a formação dos novos professores na experimentação pedagógica concebida em bases cientí �cas. Provavelmente onde as novas ideias assumiram uma formulação mais orgânica e consequente, encarnando-se numa experiência prática, foi na gestão de Anísio Teixeira como Diretor Geral de Instrução do então Distrito Federal. Na Exposição de Motivos do Decreto 3.810 de 19 de março de 1932, Anísio Teixeira deixa clara a intenção de erradicar aquilo que ele considerava como o “vício de constituição” das escolas normais que, “pretendendo ser, ao mesmo tempo, escolas de cultura geral e de cultura pro�ssional, falhavam lamentavelmente nos dois objetivos” (VIDAL, 2001, p. 79-80). E em outro texto denominado “Como ajustar os ‘cursos de matérias’ na escola normal com os ‘cursos de prática de ensino’”, indicava o caminho a seguir: “Se a ‘escola normal’ for realmente uma instituição de preparo pro �ssional do mestre, todos os seus cursos deverão possuir o caráter especí �co que lhes determinará a pro�ssão do magistério” (2001, p. 80). 36
História da pro�ssão docente
Guiando-se por essa concepção Anísio traçou o programa ideal que deveria ser implantado nas escolas normais, compreendendo três modalidades de cursos: cursos de fundamentos pro�ssionais, cursos especí �cos de conteúdo pro�ssional e cursos de integração pro�ssional: A constituição da Escola de Professores do Instituto de Educação era exemplo prático de observância do modelo ideal. No primeiro ano geral do curso, estudavam-se: Biologia Educacional, Psicologia Educacional, Sociologia Educacional, História da Educação, Introdução ao Ensino – Princípios e Técnicas, Matérias de Ensino (Cálculo, Leitura e Linguagem, Literatura Infantil, Estudos Sociais, Ciências Naturais) e Prática de Ensino (observação, experimentação e participação). (VIDAL, 2001, p. 82)
Com uma estrutura de apoio que envolvia Jardim de Infância, Escola Primária e Escola Secundária, que funcionavam como campo de experimentação, demonstração e prática de ensino para os cursos da Escola de Professores; um Instituto de Pesquisas Educacionais, Biblioteca Central de Educação, bibliotecas escolares, �lmoteca, museus escolares e radiodifusão; e tendo como diretor Lourenço Filho, a Escola Normal, agora transformada em Escola de Professores, se empenhou em pôr em prática o modelo ideal acima descrito. Em 1935, com a criação da Universidade do Distrito Federal, também por iniciativa de Anísio Teixeira, a Escola de Professores a ela foi incorporada com o nome de Escola de Educação. Algo semelhante ocorreu em São Paulo quando, em 1934, com a criação da USP, o Instituto de Educação paulista a ela foi incorporado. E é sobre essa base que, em 1939, foram instituídos os Cursos de Pedagogia e de Licenciatura na Universidade do Brasil e na Universidade de São Paulo. Daí emergiu o paradigma que, adotado pelas demais instituições de Ensino Superior do país, equacionou a questão relativa à formação de professores para o ensino de nível secundário e para as próprias escolas normais. Aos cursos de licenciatura coube a tarefa de formar professores para as disciplinas especí �cas que compunham os currículos das escolas secundárias; e os Cursos de Pedagogia �caram com o encargo de formar os professores das Escolas Normais. Mas, se a proposta que deu origem ao modelo centrava a formação dos novos professores nas escolas experimentais fornecendo, com isso, uma base de pesquisa que pretendia dar caráter cientí �co aos processos formativos, a generalização do modelo centrou a formação no aspecto pro�ssional que seria garantido por um currículo composto por um conjunto de disciplinas a serem frequentadas pelos alunos, dispensada a exigência de escolas-laboratórios.
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Pro�ssão Docente
Em relação ao ensino normal, foi essa mesma orientação que prevaleceu em âmbito nacional com a aprovação do decreto-lei 8.530 de 2 de janeiro de 1946, conhecido como Lei Orgânica do Ensino Normal (BRASIL, 1946). Seguindo a estrutura dos demais cursos de nível secundário, o ensino normal foi dividido em dois ciclos: o primeiro ciclo, com a duração de quatro anos, correspondia ao ciclo ginasial do curso secundário, destinava-se a formar regentes do ensino primário e funcionaria em Escolas Normais Regionais; o segundo ciclo, com a duração de três anos, correspondia ao ciclo colegial do curso secundário, destinava-se a formar os professores do ensino primário e funcionaria em Escolas Normais e nos Institutos de Educação. Estes, além dos cursos citados, abrangiam Jardim de Infância e Escola Primária anexos e ministrariam também cursos de especialização de professores primários para as áreas de educação especial, ensino supletivo, desenho e artes aplicadas, música e canto e cursos de administradores escolares para formar diretores, orientadores e inspetores escolares. Se os cursos normais de primeiro ciclo, pela sua similitude com os ginásios, tinham um currículo marcado pela predominância das disciplinas de cultura geral, no estilo das velhas escolas normais, tão criticadas, os cursos de segundo ciclo contemplavam todos os fundamentos da educação introduzidos pelas reformas da década de 1930. Esse modelo de Escola Normal prevaleceu até a aprovação da Lei 5.692 de 11 de agosto de 1971.
Atividades 1. Descreva sobre a importância de se conhecer o contexto sócio-histórico em
que se deu o desenvolvimento da pro�ssão docente.
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História da pro�ssão docente
2. Faça uma pesquisa sobre o tecnicismo como modelo de educação e pontue
quais são as permanências deste modelo na educação de hoje.
Dicas de estudo Uma dica importante é conhecer um pouco mais sobre a história das ideias pedagógicas, para que se possa ter uma dimensão mais crítica sobre os métodos utilizados e as possibilidades de mudanças, que devem ser feitas sempre com bases seguras e fundamentadas. Assim sendo, uma boa obra para iniciar tais estudos é justamente a obra de Franco Cambi, História da Pedagogia, Unesp, 1999. 39
Ser professor: angústias e dilemas Luiz Fernando Rankel Muitas são as denominações para as transformações ocorridas em âmbito mundial ultimamente, principalmente no que diz respeito à economia dos países. Globalização, mundialização, desterritorialização são apenas algumas das denominações que são dadas pelos estudiosos ao processo que diminuiu as fronteiras, ou acabou com elas, através principalmente das tecnologias de informação. No plano da educação, a in�uência destas transformações é nítida, pois as escolas passaram e passam por um processo de adequação às novas tecnologias. Quando se fala em escolas e educação não poderíamos deixar de falar sobre os pro�ssionais que estão diretamente envolvidos neste complexo mundo. Os professores talvez sejam os pro�ssionais que estão enfrentando os maiores desa�os diante das mudanças cada vez mais aceleradas que nos são apresentadas pela mídia. Esses pro�ssionais são valorizados por seus discursos, sendo considerados como componentes fundamentais na preparação das pessoas para participarem, com competência, do mundo globalizado. Vivemos, portanto, na era do Estado mínimo, neoliberal, que caracteriza-se pelas privatizações e pela dependência de países hoje chamados de “países em desenvolvimento” em relação a organismos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) por exemplo. No Brasil, a redemocratização e a Constituição de 1988 prepararam o país para as novas tendências globais. Acontece o mesmo em relação à educação brasileira. As reformas educacionais nos anos 1990 visaram adequar a organização escolar no sentido de atender aos imperativos das políticas de contenção da pobreza. No contexto de mudança de paradigma do nacional-desenvolvimentismo para o globalismo, segundo Dalila Oliveira, houve mudanças na forma de se conceber a função primordial da educação, pois a ideia da escolaridade como elevador social, como fator de melhor distribuição de renda se arrefeceu (OLIVEIRA, 2004, p. 1.129). Há outras visões que discordam, ou pelo menos se distanciam da visão da autora. Muitos ainda percebem nos discursos o �ciais esta missão salvadora da educação, como única possibilidade de mobilidade social em um país desigual como o nosso. Dessa forma, nosso objetivo neste capítulo é discutir as características das recentes mudanças ocorridas no âmbito da
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educação, tendo os questionamentos acerca do exercício da pro�ssão docente como pano de fundo.
Retórica e precarização do trabalho docente No que tange a educação brasileira, as mudanças começaram pela nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996, Lei 9.394. Tais mudanças vêm ocorrendo em um contexto marcado, segundo Guiomar Mello, [...] pela modernização econômica, pelo fortalecimento dos direitos da cidadania e pela disseminação das tecnologias da informação, que impactam as expectativas educacionais ao ampliar o reconhecimento da importância da educação na sociedade do conhecimento. MELLO, 2000, p. 98)
Nesse sentido, identi�cam-se algumas das mudanças já a partir de alguns fatores destacados por Oliveira: �
a centralidade atribuída à administração escolar nos programas de reforma, elegendo a escola como núcleo do planejamento e da gestão;
�
o �nanciamento per capita, com a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), por meio da Lei 9.424/96;
�
a regularidade e ampliação dos exames nacionais de avaliação (SAEB, ENEM, ENC), bem como a avaliação institucional e os mecanismos de gestão escolares que insistem na participação da comunidade.
Apesar de as mudanças serem ainda muito recentes, podemos perceber situações em que a descentralização da gestão escolar tem funcionado relativamente bem, faltam informações mais precisas sobre como as escolas das diferentes regiões brasileiras, por exemplo, têm se portado diante da orientação que trata os currículos escolares como meios e não �ns em si mesmos para a construção das competências e aprendizagem dos alunos (MELLO, 2000, p. 98-99). A grande questão é que apesar de as reformas escolares propiciarem meios para uma gestão democrática, participativa e conectada às transformações que ocorrem na sociedade, os pro�ssionais envolvidos parecem não estar atendendo devidamente a estas “provocações”. Mas isto possui uma explicação. As reformas e a consequente expansão da Educação Básica colocaram o professor como centro do processo de reorganização escolar. Além do que, tais reformas apelam à participação da comunidade para a efetivação dos projetos de cidadania e democratização do ensino. Ninguém nega a importância do envolvimento ativo 42
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da sociedade na construção de uma educação cada vez mais democratizada e cidadã. Mas o que acontece é um processo concomitante de desquali �cação e desvalorização dos professores. Segue abaixo o pensamento da autora sobre esta questão: O professor, diante das variadas funções que a escola pública assume, tem de responder a exigências que estão além de sua formação. Muitas vezes esses pro �ssionais são obrigados a desempenhar funções de agente público, assistente social, enfermeiro, psicólogo, entre outras. Tais exigências contribuem para um sentimento de despro�ssionalização, de perda de identidade pro�ssional, da constatação de que ensinar às vezes não é o mais importante [...]. Nesse contexto é que se identi �ca um processo de desquali�cação e desvalorização sofrido pelos professores. (OLIVEIRA, 2004, p. 1.132)
As mudanças, portanto, estão atingindo o mundo escolar e sobrecarregando os professores que não possuem a formação adequada para dar conta dessas novas realidades. O que parece acontecer na maioria dos casos então é aquilo que António Nóvoa chamou de o excesso dos discursos e a pobreza das práticas 1. O texto de Nóvoa gira em torno da questão que é cada vez mais frequente chamarmos os professores a construir a sociedade do futuro, onde estes teriam a missão insubstituível de formar os cidadãos ideais deste futuro. A questão do excesso da pobreza se estende e conforma a situação dos professores de hoje nos seguintes pontos: �
do excesso da retórica política e dos mass media à pobreza das políticas educativas;
�
do excesso das linguagens dos especialistas internacionais à pobreza dos programas de formação dos professores;
�
do excesso do discurso cientí �co-educacional à pobreza das práticas pedagógicas;
�
do excesso das “vozes” dos professores à pobreza das práticas associativas docentes.
Estes pontos são discutidos pelo autor ao longo do texto. Eles re �etem as ambiguidades existentes na formação e nas políticas voltadas ao professorado e à educação. Isso demonstra como as sociedades ocidentais, apesar das incontestáveis especi�cidades culturais e históricas, vêm estabelecendo políticas muito parecidas em relação à educação e aos seus professores. Um exemplo são os países que foram colônias de exploração, e não há como não pensar na América Latina nesse sentido. 1
NÓVOA, António. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 11-20, jan./jun. 1999.
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Para Nóvoa há características similares na forma como estes países tratam sua história e sua memória, como conduzem as políticas públicas, incluindo a educação. Em sociedades marcadas por crises de legitimação política e por dé �cit de participação, surge sempre uma dupla tendência: por um lado, para pregar o civismo, o que compensaria a falta de uma autêntica vivência democrática; por outro, para evitar o presente, projetando todas as expectativas na ‘sociedade do futuro’. Para pregar o civismo ou para imaginar o futuro, nada melhor que os professores. É para eles que se viram as atenções dos políticos e da opinião pública quando não encontram outras respostas para os problemas. A in �ação retórica tem um efeito desresponsabilizador: o verbo substitui a ação e conforta-nos no sentimento de que estamos a tentar fazer alguma coisa. (NÓVOA, 1999, p. 13)
Dessa forma, a educação, a saúde e a segurança prosseguem sem que medidas de cunho prático, realmente e�cazes, sejam tomadas. Desse modo as campanhas políticas estão repletas desse tipo de excesso, elaboram um discurso que visa tocar pontos essenciais, tais como aqueles voltados a esperanças, que parecem sempre se renovar com a população. Mas apesar de toda essa retórica o que se vê nos anos que se seguem às eleições é a morosidade e a burocracia tomarem conta da administração pública. Às escolas continuam faltando recursos para situações básicas como os próprios prédios para funcionamento e muitas vezes a insegurança em relação à violência que há muito penetrou os muros das escolas, tornando o ato de educar um risco constante. Na outra ponta, a formação inicial e continuada dos professores nunca foi um negócio tão lucrativo. Nóvoa comenta o que acontece nos Estados Unidos: “A formação de professores e de educadores é um grande negócio numa nação que emprega mais de três milhões de educadores. Os dólares cintilam nos olhos daqueles que andam à procura de boas oportunidades de mercado” (NÓVOA, 1999, p. 14). Isso nos faz pensar se o mesmo não está acontecendo no Brasil, pois em algumas décadas atrás nunca foi dada tanta importância para a formação dos professores. Impressiona a quantidade de novas instituições que surgem a cada mês, dizendo ofertar “a melhor formação que o mercado pode oferecer”. Assim, os dados que falam sobre quantidade em educação nunca foram tão positivos; o mesmo não pode ser dito sobre a qualidade. Outra ambiguidade que Nóvoa detecta é em relação aos discursos muito alardeados hoje em dia sobre a autonomia do pro�ssional docente, bem como da re�exividade que deveria ter em relação a sua pro�ssão. Mas ao mesmo tempo vemos, [...] um desaparecimento dos movimentos pedagógicos, no sentido que este termo adquiriu na primeira metade do século XX, isto é, coletivos de professores que se organizavam em torno de princípios e propostas de ação, da difusão de métodos de ensino ou da defesa de determinados ideais. [...] Ao olharmos para a história, veri�camos que nunca a fragilidade associativa dos professores foi tão grande. (NÓVOA, 1999, p. 16)
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Ser professor: angústias e dilemas
Pode-se dizer que António Nóvoa, por ser português, esteja se referindo ainda ao que, implicitamente, acontece em seu país, ou a países europeus. Mas seria muita ingenuidade pensar que esta situação é uma prerrogativa europeia por assim dizer. A nossa realidade possui muitos aspectos que a diferenciam das demais, mas também que a aproximam. A situação da educação e dos professores re�ete uma condição que é mais ampla e diz respeito ao contexto geral das pro �ssões, do atual estágio das relações de trabalho. O que vemos, segundo Oliveira, é uma “desregulamentação do mercado de trabalho”, das leis trabalhistas, o que explica em parte a falta de associativismo comentada por Nóvoa. Há cada vez com maior intensidade a exigência de um novo per �l de trabalhador, que deve possuir algumas competências consideradas essenciais para ingressar no mercado de trabalho e, talvez mais importante que isso, manter-se lá. A �exibilidade é a ideia que está em voga, tais como a �exibilização das leis trabalhistas e a �exibilidade do trabalhador para se adequar às tarefas para as quais não foi preparado. Segundo Oliveira: A �exibilidade aparece na organização do trabalho nas empresas como necessária às novas formas de produção comandadas pelo mercado. Ao contrário do modelo fordista de produção em série, voltado para o consumo de massa, demandando grandes estoques, o momento atual sugere formas mais �exíveis de organização e gestão do trabalho. A rígida divisão das tarefas, característica marcante do fordismo, vem cedendo lugar a formas mais horizontais e autônomas de organização do trabalho, permitindo maior adaptabilidade dos trabalhadores às situações novas, possibilitando a intensi�cação da exploração do trabalho. (OLIVEIRA, 2004, p. 1.139)
É importante, portanto, estarmos atentos às mudanças que vêm ocorrendo no mercado de trabalho e na sociedade em geral. Muitas vezes os discursos são excessivos, como demonstrou Nóvoa, principalmente no caso da educação e formação dos professores, e a realidade do dia-a-dia das escolas difere em muito do que propugnam os programas de reforma educacional (NÓVOA, 1999). Há uma necessidade de se aprofundar pesquisas que levem em consideração as escolas, os programas de formação de professores, os professores que tiveram sua formação em outras épocas e agora estão enfrentando essas mudanças na concepção de sua pro�ssão e nas novas relações de trabalho. Só assim poderemos ter uma ideia mais precisa do impacto que as novas tecnologias de informação, por exemplo, estão tendo na educação como um todo. Além disso, poderemos identi�car em quais realidades estas transformações tecnológicas e de empregabilidade fazem realmente sentido, pois com tantas diferenças regionais e disparidades econômicas, as leis do mercado não têm o mesmo peso para todos os brasileiros. Assim como o trabalho em geral: [...] o trabalho docente tem sofrido relativa precarização nos aspectos concernentes às relações de emprego. O aumento dos contratos temporários nas redes públicas de ensino, chegando, 45
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em alguns estados, a número correspondente ao de trabalhadores efetivos, o arrocho salarial, o respeito a um piso salarial nacional, a inadequação ou mesmo ausência, em alguns casos, de planos de cargos e salários, a perda de garantias trabalhistas e previdenciárias oriunda dos processos de reforma do Aparelho de Estado têm tornado cada vez mais agudo o quadro de instabilidade e precariedade do emprego no magistério público. (OLIVEIRA, 2004, p. 1.140)
Diretrizes e enfrentamentos na formação dos professores A Educação Básica é composta pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Este conceito foi assumido desde a Lei 9.394/96, cujo artigo 22 estabelece que “a educação básica tem por �nalidade desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores.” Portanto, é um direito fundamental de cada cidadão ter esta oportunidade que deve ser oferecida com qualidade pelo Estado. O artigo 4.º da Lei 9.394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, estipula os seguintes critérios a serem obedecidos pelo Estado na oferta da educação escolar pública: I–
ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II – progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; III – atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino; IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade; V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; VII – oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola; VIII – atendimento ao educando, no ensino fundamental público, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde; IX – padrões mínimos de qualidade de ensino, de�nidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.
Mas como os professores estão sendo formados para atender a todos estes preceitos contidos na lei? O professor é peça fundamental para que toda esta organização possa funcionar na prática. Assim, podemos identi�car alguns problemas na formação dos professores no Brasil que são relacionados à questão mais geral da empregabilidade e da �exibilização que é uma característica das 46
Ser professor: angústias e dilemas
relações de trabalho modernas. Guiomar Mello identi�cou alguns destes problemas especí �cos da formação de professores em relação à Educação Básica. Para esta autora há em geral somente um tipo de estudante que ingressa no Ensino Superior com a opção de ensinar: o aluno do magistério. Para esses, diz a autora, “frequentemente não é oferecida a oportunidade de seguir aprendendo os conteúdos ou objetos de ensino que deverá ensinar no futuro” (MELLO, 2000, p. 100). Os demais estudantes, prossegue a autora, ingressam no Ensino Superior para serem biólogos, historiadores, matemáticos e não propriamente professores destas disciplinas. Há uma grande distância dos problemas da Educação Básica em relação aos conteúdos programáticos dos cursos de graduação no país. Ou seja, os pro�ssionais das licenciaturas não saem preparados e nem com interesse para atuar ou mesmo discutir os problemas da Educação Básica. Outra discrepância apontada por Mello é aquela sobre as instituições privadas e públicas. Torna-se Torna-se preocupante pelo fato de não haver avaliações de qualidade sobre os cursos de preparação docente, e precisamos concordar, concordar, pois a formação de professores, como assinala a autora, tem “um papel estratégico para todo o sistema educacional do país” (MELLO, 2000, p. 100). Assim, as distorções são graves da seguinte maneira: [...] nas regiões em que a oferta de cursos de formação docente é predominantemente privada, o poder público, que mantém a educação básica, garante o mercado de trabalho dos egressos do ensino superior privado sem dispor de mecanismos e �cientes de controle de qualidade desses professores; e nas regiões em que os cursos de formação de professores são predominantemente públicos estaduais, o poder público pode �nanciar com recursos da educação básica a formação de seus professores, o que caracteriza um duplo �nanciamento das instituições estaduais de ensino superior. (MELLO, (MELLO, 2000, p. 100)
Temos então uma situação que deve ser pensada a partir da assimetria que existe entre o que estipula a lei do ensino básico e a realidade das ações efetivas direcionadas à formação do pro�ssional docente. Mello propõe diversas ações que devem ser executadas para conseguir aquilo que chama de “arranjo institucional adequado para a formação de professores” (MELLO, 2000, p. 106-107). A preparação docente, segundo a autora, portanto, será mais bem quali �cadora quando os projetos pedagógicos se caracterizarem pelos seguintes aspectos 2: �
preparação para lecionar nos anos iniciais do Ensino Fundamental que inclua o domínio dos objetos de ensino: língua portuguesa, matemática, ciências naturais, história e geogra�a, pelo menos, o que implicará construir em nível superior o modelo do normal de nível médio, aproveitando o conhecimento
2
A autora apresenta pelo menos 18 pontos que considera importantes e necessários para uma formação consistente e de qualidade dos professores. Colocamos aqui aqueles que nos pareceram mais urgentes, tendo em vista as questões que vimos discutindo ao longo do capítulo.
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Pro�ssão Docente
e a experiência dos formadores de professores que se situam nos cursos de licenciatura tradicionalmente dedicados à formação do especialista; �
integração permanente e contínua entre teoria e prática desde o início do curso de graduação, em todas as disciplinas do currículo de formação pro�ssional, inclusive naquelas tradicionalmente consideradas “alheias” à formação docente. Essa integração deve ser trabalhada como contextualização dos conhecimentos no mundo social e natural de modo a propiciar situações de aprendizagem signi�cativa aos futuros professores, tanto nas áreas de conteúdo especí �co como nas áreas de fundamentos educacionais;
�
presença efetiva de disciplinas, recursos, laboratórios ou experiências que assegurem o uso das diferentes linguagens – a língua portuguesa, as linguagens artísticas, a informática, a matemática, as multilinguagens dos meios de comunicação – como recursos de construção do conhecimento no processo de formação pro�ssional do professor;
�
integração entre os diversos campos de ciências humanas e sociais com o objetivo de compreender e aplicar conhecimentos sobre a realidade nacional brasileira, sua diversidade e complexidade social, cultural e étnica, contextualizados por observações reais ou estudos de casos nos quais a questão da diferença é importante, para desenvolver a capacidade de ser proativo na construção de um clima acolhedor das variações e aproveitar a diversidade como recurso de enriquecimento das situações de aprendizagem de seus alunos;
�
conhecimento das condições de trabalho e carreira para ser capaz de compreender e atuar de modo autônomo frente aos con�itos, impasses e dilemas éticos próprios da pro�ssão de docente e do processo educacional em geral.
Dos cincos pontos que incluímos aqui, talvez o que mais tenha relação com o contexto de nossa discussão seja o último. É essencial conhecer as condições de trabalho e carreira do docente. Os outros pontos reforçam as competências para a atuação do professor frente aos desa�os e exigências que lhe são impostas. Eles também servem como preparação para que este último ponto não �que somente na retórica, mas que ele sirva como referência para a efetiva intervenção na realidade, através principalmente daquilo que Nóvoa chamava atenção, isto é, a capacidade de associação dos professores, a capacidade de eleger pautas reivindicatórias coerentes e de acordo com a situação geral da classe e do país. O investimento na Educação Básica e na quali�cação dos professores será de suma importância de forma que com professores preparados (MELLO, 2000, p. 101), “a educação continuada poderia ser quase inteiramente realizada na n a escola, 48
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sem a parafernália dos grandes encontros de massa, que os tornam eventos de interesse maior para a hotelaria do que para a educação” educação”..
Texto complementar Neoliberalismo e educação (MARRACH, 2008)
Qualidade total, modernização da escola, adequação do ensino à competitividade do mercado internacional, nova vocacionalização, incorporação das técnicas e linguagens da informática e da comunicação, abertura da universidade aos �nanciamentos empresariais, pesquisas práticas, utilitárias, produtividade, essas são as palavras de ordem do discurso neoliberal para a educação. O que signi�cam? Antes de mais nada, o que signi�ca neoliberalismo? O neoliberalismo torna-se ideologia dominante numa época em que os EUA detêm a hegemonia exclusiva no planeta. É uma ideologia que procura responder à crise do Estado nacional ocasionada pela interligação crescente das economias das nações industrializadas por meio do comércio e das novas tecnologias. Enquanto o liberalismo clássico, da época da burguesia nascente, propôs os direitos do homem e do cidadão, entre os quais, o direito à educação, o neoliberalismo enfatiza mais os direitos do consumidor do que as liberdades públicas e democráticas e contesta a participação do Estado no amparo aos direitos sociais. Representa uma regressão do campo social e político e corresponde a um mundo em que o senso social e a solidariedade solidarieda de atravessam uma grande crise, e uma ideologia neoconservadora social e politicamente. Por isso, a�na-se facilmente na sociedade administrada dos chamados países avançados, em que o cidadão foi reduzido reduzi do a mero consumidor, e cresce no Brasil e em outros países da América Latina, vinculado-se à cultura política predominantemente conservadora. O neoliberalismo parte do pressuposto de que a economia internacional é autorregulável, capaz de vencer as crises e, progressivamente, distribuir benefícios pela aldeia global, sem a necessidade de intervenção do Estado. Enquanto o liberalismo tinha por base o indivíduo, o neoliberalismo está na base das atividades do FMI, do Banco Mundial, dos grandes conglomerados e das corporações internacionais. A liberdade que postula é a liberdade econômica das grandes organizações, desprovida do conteúdo político democrático proposto pelo liberalismo clássico. [...] 49
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No discurso neoliberal a educação deixa de ser parte do campo social e político para ingressar no mercado e funcionar a sua semelhança. Conforme Albert Hirschman, este discurso apoia-se a poia-se na “tese da ameaça”, ameaça”, isto é, num artifício retórico da reação, que enfatiza os riscos de estagnação que o Estado do Bem-Estar Social representa para a livre iniciativa: para a produção de bens de consumo, maquinário, para o mercado, para a nova ordem mundial”. mundial”. No Brasil, embora não haja Estado do Bem-Estar Social, a retórica neoliberal é basicamente a mesma. Atribui à participação do Estado em políticas sociais a fonte de todos os males da situação econômica e social, tais como a in �ação, a corrupção, o desperdício, a ine�ciência dos serviços, os privilégios dos funcionários. Defende uma reforma administrativa, fala em reengenharia do Estado para criar um “Estado mínimo”, a�rmando que sem essa reforma o país corre o risco de não ingressar na “nova ordem mundial”. mundial”. A retórica neoliberal atribui um papel estratégico à educação e determina-lhe basicamente três objetivos: 1) Atrelar a educação escolar à preparação para o trabalho e a pesquisa acadêmica ao imperativo do mercado ou às necessidades da livre iniciativa. Assegura que mundo empresarial tem interesse na educação porque deseja uma força de trabalho quali�cada, apta para a competição no mercado nacional e internacional. Fala em nova vocacionalização, isto é, numa pro�ssionalização situada no interior de uma formação geral, na qual a aquisição de técnica e linguagens de informática e conhecimento, de matemática e ciência adquirem relevância. Valoriza as técnicas de organização, o raciocínio de dimensão estratégica e a capacidade de trabalho cooperativo. Sobre a associação da pesquisa cientí �ca ao ethos empresarial, é preciso lembrar, segundo Michael Apple, que na sociedade contemporânea a ciência se transforma em capital técnico-cientí �co. E as grandes empresas controlam a produção cientí �ca e colocam-na a seu serviço de diversas formas: a) pelo controle de patentes, isto é, de produtos de tecnologia cientí �ca. Assim, percebem as novidades e as utilizam, antecipando tendências no mercado; b) por meio da pesquisa cientí �ca industrial organizada na própria empresa; c) controlando o que Apple chama de pré-requisitos do processo de produção cientí �ca, isto é, a escola e, principalmente, a universidade, onde se produz conhecimentos técnico-cientí �cos. A integração da universidade à produção industrial baseada na ciência e na técnica, transforma a ciência em capital técnico-cientí �co co.. 50
Ser professor: angústias e dilemas
2) Tornar a escola um meio de transmissão dos seus princípios doutrinários. O que está em questão é a adequação da escola à ideologia dominante. Esta precisa sustentar-se também no plano das visões do mundo, por isso, a hegemonia passa pela construção da realidade simbólica. Em nossa sociedade a função de construir a realidade simbólica é, em grande parte, preenchida pelos meios de comunicação de massa, mas a escola tem um papel importante na difusão da ideologia o�cial. O problema para os neoliberais é que nas universidades e nas escolas, durante as últimas décadas, o pensamento dominante, ou especular, conforme Alfredo Bosi, tem convivido com o pensamento crítico nas diversas áreas do conhecimento e nas diversas práticas pedagógicas dialógicas, alternativas. Nesse quadro, fazer da universidade e da escola veículos de transmissão do credo neoliberal pressupõe um reforço do controle para enquadrar a escola a �m de que cumpra mais e�cazmente sua função de reprodutora da ideologia dominante. 3) Fazer da escola um mercado para os produtos da indústria cultural e da informática, o que aliás é coerente com a ideia de fazer a escola funcionar de forma semelhante ao mercado, mas é contraditório porque, enquanto no discurso os neoliberais condenam a participação direta do Estado no �nanciamento da educação, na prática, não hesitam em aproveitar os subsídios estatais para divulgar seus produtos didáticos e paradidáticos no mercado escolar. Enquanto o liberalismo político clássico colocou a educação entre os direitos do homem e do cidadão, o neoliberalismo, segundo Tomás Tadeu da Silva, promove uma regressão da esfera pública, na medida em que aborda a escola no âmbito do mercado e das técnicas de gerenciamento, esvaziando, assim, o conteúdo político da cidadania, substituindo-o pelos direitos do consumidor. É como consumidores que o neoliberalismo vê alunos e pais de alunos. A seguinte recomendação do Banco Mundial exprime esta visão: a redução da contribuição direta do Estado no �nanciamento da educação. Parte do que atualmente é gratuito deveria se tornar serviço pago pelos estudantes que, para tanto, receberiam empréstimos do Estado ou bolsas. A ideia de que o aluno é o consumidor da educação e de que as escolas devem competir no mercado está sendo posta em prática em Maringá, no interior do Paraná. Com apoio técnico da Fundação Getúlio Vargas, do Rio de Janeiro, a prefeitura de Maringá implantou a ideia dos “cupons”, de Milton Friedman.
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Em vez do Estado �nanciar diretamente a educação, passou a dar bônus aos pais dos alunos, isto é, uma quantia de dinheiro su�ciente para que eles, vistos como consumidores, matriculem seus �lhos numa escola de seu agrado. Os neoliberais acreditam que assim as escolas passariam a competir no mercado, melhorando a qualidade do ensino. Roberto Campos declarou, recentemente, que o ideal seria aplicar à educação as determinações contidas na Constituição de 1967: ensino público gratuito no Primeiro Grau, ensino no Segundo Grau pago pelos alunos que têm condições de arcar com as mensalidades, e bolsas para os que não têm. O curso superior deveria ser pago e aqueles que não pudessem pagar teriam bolsas que seriam devolvidas após a conclusão do curso (Entrevista ao Roda Viva, TV Cultura, 29 maio 1995). Como observamos, a novidade, se é que assim se pode chamar, do pro jeto neoliberal para a educação não é só a privatização. O aspecto central é a adequação da escola e da universidade pública e privada aos mecanismos de mercado, de modo que a escola funcione à semelhança do mercado. No que diz respeito à universidade pública, o discurso neoliberal condena o populismo, o corporativismo, o ensino ine �caz e a falta de produtividade. Nesta retórica maniqueísta, todas essas palavras soam como atributos negativos. Mas serão negativos? Com o termo populismo critica-se desde a relação dialógica entre professores e alunos até o funcionamento da democracia universitária, as eleições, as campanhas eleitorais. Com a palavra corporativismo a retórica neoliberal ataca desde os direitos trabalhistas, que passam a ser chamados de privilégios, até as reivindicações salariais. A expressão “falta de produtividade” tem em contrapartida a produtividade da pesquisa relevante, isto é, utilitária, bem �nanciada, altamente rendosa, segundo critérios mercantis. No fundo dessas três críticas, percebe-se que o que incomoda os neoliberais é a liberdade acadêmica, o distanciamento da universidade pública em relação aos mecanismos de mercado, a ausência de submissão aos critérios da produção industrial da cultura. [...]
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Atividades 1. Escreva o que signi�ca a expressão “excesso de retórica e pobreza das práti-
cas” no contexto da educação.
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2. Releia os artigos da Lei 9.394/96 e aponte itens sobre cada um dos nove pon-
tos tentando estabelecer comparações com a realidade da educação que lhes é conhecida.
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Dica de estudo Nossa dica de estudo é o site: , que possui diversos artigos referentes à educação brasileira, chats, fóruns e ainda há a possibilidade de fazer o download do livro Reescrevendo a Educação: propostas para um Brasil melhor , que foi lançado em 2007 e contou com a participação de várias personalidades que pensam a educação brasileira, como Cristovam Buarque.
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Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais Luiz Fernando Rankel A prática pedagógica sofreu transformações signi�cativas na segunda metade do século XX e neste início de século XXI. A função da educação está muito mais complexa hoje, pois a escola é vista como local onde além dos conhecimentos cientí �cos necessários à formação inicial, deve-se formar também o cidadão capacitado para agir em uma sociedade competitiva e que exige do indivíduo a capacidade de atender às demandas que o estado democrático lhe impõe. É por isso que as práticas pedagógicas mudaram em consonância com as mudanças da sociedade e também através da re�exão �losó�ca e teórica sobre a pro �ssão docente. Temos, portanto, novas práticas pedagógicas que devem ser conhecidas pelo pro�ssional docente. Sabemos que muitos aspectos sobre a formação docente se constroem no cotidiano, a partir do enfrentamento da sala de aula, na forma como os problemas são resolvidos, pois estes não aparecem em nenhum manual. A necessidade da formação teórica é indispensável justamente para poder enfrentar os problemas do dia-a-dia com mais competência e principalmente para poder fazer o exercício da re�exão sobre suas experiências enquanto parte integrante do processo maior de aprofundamento da didática docente. No que se refere às mudanças nas práticas pedagógicas elas acompanharam a mudança do paradigma cientí �co ocorrido no século XX, principalmente depois da Segunda Guerra Mundial quando este novo paradigma da ciência se espalha pelas disciplinas, causando rupturas e muitas discussões. De forma geral, a prática docente passou por in�exões que demonstraram processos de ruptura – mas também de continuidade – e que são geralmente classi�cados como tradicional, técnico e crítico-re�exivo. Este último é apresentado como sendo o representante da postura que prima pela valorização do confronto entre as concepções teóricas e a prática cotidiana, que valoriza a pesquisa como atributo indispensável para o melhor desenvolvimento de um arcabouço teórico-prático e que dê conta da diversidade cultural e social em que o pro�ssional docente esteja inserido. A interdisciplinaridade surgiu então, na segunda metade do século XX, como tentativa de fazer convergir
Pro�ssão Docente
metodologias e disciplinas, que haviam sido estreitadas e compartimentalizadas em função do modelo positivista anterior. Segundo Olga Pombo: O crescimento do conhecimento cientí �co resulta, pelo contrário, de um processo de reordenamento interno das comunidades levado a cabo por um reordenamento das disciplinas. A interdisciplinaridade traduz-se na constante emergência de novas disciplinas que não são mais do que a estabilização institucional e epistemológica de rotinas de cruzamento de disciplinas. Este fenômeno, não apenas torna mais articulado o conjunto dos diversos ‘ramos’ do saber (depois de os ramos principais se terem constituído, as novas ciências, resultantes da sua subdivisão sucessiva, vêm ocupar espaços vazios), como o fazem dilatar, constituindo mesmo novos espaços de investigação, surpreendentes campos de visibilidade. (POMBO, 2006, p. 3)
O que a autora chama de “estabilização institucional e epistemológica de disciplinas” para constituir “novos espaços de investigação” se dá, principalmente e primeiramente, através da utilização de instrumentos teóricos advindos de outras áreas das ciências. No caso da educação, uma das ciências que tem fornecido um aporte teórico e metodológico signi�cativo é a Sociologia. Isto é notável em relação à pro�ssão docente, a sociologia das pro�ssões tem contribuído efetivamente para uma avaliação mais precisa das práticas que envolvem a complexa rede de relações sociais que envolvem a atividade do professorado. Uma vez que os professores encontram-se inseridos em um contexto social especí �co e, levando em consideração a profícua relação que vem sendo desenvolvida entre a educação como pesquisa e a sociologia, elegemos um conceito que consideramos extremamente heurístico1 para analisarmos aqui. Trata-se do conceito de representações sociais. Este conceito tem sido ultimamente aperfeiçoado e adequado a ciências como a psicologia social, antropologia e história. O que pretendemos é fazer uma espécie de recensão e atualização teórica do conceito, seu uso clássico pela sociologia e como a psicologia social e a história têm contribuído para a efetivação de um conceito que pode ser utilizado em outras áreas das ciências sociais e também na educação. Faz-se necessária uma renovação conceitual e metodológica para que a pesquisa na área da educação consiga cumprir a demanda atual que exige o confronto entre os dados provenientes da realidade das escolas e dos professores e a epistemologia da ciência. Vejamos então qual a trajetória do conceito de representações sociais e como ele se modi�cou conforme seu uso foi se generalizando.
As representações coletivas em Durkheim Segundo Rodrigues (2001, p. 22) Durkheim desenvolveu ao longo de sua obra conceitos (coerção, solidariedade, representações coletivas etc.) que se opunham 1
Segundo o Dicionário Houaiss, a heurística é: 1. arte de inventar, de fazer descobertas; ciência que tem por objeto a descoberta dos fatos; 2. ramo da História voltado à pesquisa de fontes e documentos; 3. método de investigação baseado na aproximação progressiva de um dado problema; 4. método educacional que consiste em fazer descobrir pelo aluno o que se lhe quer ensinar.
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Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais
às abordagens atomistas2 e individualistas, principalmente aquelas da economia clássica que diziam que o crescimento do bem-estar social estava diretamente relacionado à busca do indivíduo pela sua realização pessoal. Com isso a preocupação de Durkheim estava voltada para a coesão social, sendo seus trabalhos considerados como introdutores a uma sociologia do conhecimento. Às a�rmações kantianas de que as categorias da sensibilidade e do entendimento seriam inatas, Durkheim opõe a teoria sociológica de que seriam antes construídas socialmente. Em seu livro de 1912, As Formas Elementares da Vida Religiosa, a partir da análise do totemismo 3 como a forma primeira das religiões primitivas, as categorias de entendimento, enquanto categorias verbais (rituais e simbólicas) de apreensão e compreensão do mundo transmitem uma classi�cação do mundo natural. Esta classi�cação está por sua vez correlacionada à hierarquização dos indivíduos componentes de determinado grupo. Dito de outra forma, as classi�cações são sistemas de noções hierarquizadas que tem origem nas relações sociais, e têm a função de proporcionar a coesão social. Podemos então “perceber como os homens encaram a realidade e constroem certa concepção de mundo e, mais ainda, como eles próprios se organizam hierarquicamente, informados por tal concepção” (RODRIGUES, 2001, p. 21). São as representações coletivas que permitem a gradativa socialização e inserção do indivíduo na sociedade, mais ainda, a sociedade cobra (coerção) deste indivíduo sua participação naquela “totalidade” construída e representada pelo seu grupo. Segundo Durkheim as representações coletivas [...] traduzem a maneira como o grupo pensa suas relações com os objetos que o afetam. Para compreender como a sociedade se representa a si própria e ao mundo que a rodeia, precisamos considerar a natureza da sociedade e não a dos indivíduos. Os símbolos com que ela se pensa mudam de acordo com a sua natureza [...] Se ela aceita ou condena certos modos de conduta, é porque entram em choque ou não com alguns de seus sentimentos fundamentais, sentimentos estes que pertencem à sua constituição. (DURKHEIM4, apud MINAYO, 1994, p. 90-91)
A partir desta hipótese sociológica a respeito das representações coletivas, Durkheim supera as concepções empiricistas5 que consideravam os conceitos advindos diretamente da experiência sensível, juntamente com o apriorismo6 kantiano para qual as categorias de entendimento (tempo, espaço) seriam dados 2
Atomismo, segundo o Dicionário Houaiss, signi �ca: 1. doutrina elaborada pelos pensadores gregos Leucipo (V a.C.) e Demócrito (460 -370 a.C.) segundo a qual toda a matéria é formada por átomos, partículas minúsculas, eternas e indivisíveis q ue, unindo-se e separando-se no espaço através de forças mecânicas, determinam o nascimento e a desagregação de todos os seres; 2. conjunto de teorias cientifícas que, a partir do século XIX, utilizam-se do conceito originariamente �losó�co de átomo na explicação dos fenômenos da natureza. 3
Totemismo: 1. crença na existência de parentesco ou de a �nidade mística entre um grupo humano (ou pessoa) e um totem; 2. conjunto dos ritos e práticas (como tabus alimentares e vocabulares) associados a uma relação totêmica; 3. sistema de organização social baseado nas a �liações totêmicas (HOUAISS). 4
DURKHEIM, Émile. As Regras do Método Sociológico . São Paulo: Abril, 1978. (Coleção Os Pensadores).
5
Segundo o Dicionário Houaiss, empiricista refere-se a: empiricismo ou o que endossa essa doutrina; empirista.
6
O apriorismo signi�ca: 1. doutrina (de tendência racionalista, criticista ou fenomenológica) que atribui um papel fundamental a conceitos e raciocínios a priori ; 2. convicção intelectual a respeito da existência de conhecimentos, princípios, ideias etc. de natureza a priori (HOUAISS).
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inatos do espírito humano. Um exemplo seria a questão da verdade, pois qualquer que seja sua natureza ela será de ordem eminentemente social, tendo sua aceitabilidade, portanto, sua existência, intimamente relacionada ao conjunto de representações coletivas vigentes. Não haveria assim oposição entre o con junto das crenças e a lógica, ao contrário, poderíamos encontrar a lógica própria de cada crença sem recorrermos desta forma a nenhuma concepção evolucionista, pois os fundamentos das representações coletivas são de ordem simbólica, existindo sobre e a partir do social, do cultural e do histórico, entendidos como processos. Ainda sobre as representações coletivas, temos com Durkheim que [...] são o produto de uma imensa cooperação que se estende não apenas no espaço, mas no tempo; para fazê-las, uma multidão de espíritos diversos associaram, misturaram, combinaram suas ideias e sentimentos; longas séries de gerações acumularam aqui sua experiência e saber”. (DURKHEIM, 1978, p. 216)
Para Durkheim então não há oposição entre individual e coletivo, o homem seria constituído duplamente, por estes dois aspectos. Sendo as representações construídas socialmente este âmbito ultrapassaria a mera soma das consciências individuais, tendo por isso certa autonomia e lógica própria, exterior ao indivíduo mas dependente dele para sua expressão e reprodução. Resulta que as representações sociais possuem as características do fato social: exterioridade em relação às consciências individuais e ação coercitiva sobre as consciências individuais (MINAYO, 1994, p. 91). Portanto, na sociologia durkheimiana, para procedermos ao estudo das representações coletivas devemos atentar para alguns aspectos principais: uma vez a sociedade sendo uma realidade sui generis7 e as representações que a exprimem sendo fatos sociais dizemos que, em relação ao comportamento e ao pensamento individuais, as representações coletivas seriam autônomas, exteriores e coercitivas.
Moscovici e as representações sociais No intuito de tornar a psicologia social mais social e menos comportamentalista Serge Moscovici deu início na década de 1960, em seu estudo La Psychanalyse: son image et son public, a uma tentativa, em termos tanto teóricos quanto metodológicos, de alargamento do conceito das representações coletivas. Moscovici buscou em Durkheim o conceito que seria ideal para amenizar o psicologismo da psicologia social praticada principalmente pelos norte-americanos, e aceita na maioria das comunidades cientí �cas da psicologia mundial. O conceito de representações coletivas apresentou-se como extremamente heurístico na 7
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Conforme o Houaiss a expressão sui generis signi�ca sem semelhança com nenhum outro, único no seu gênero; original, peculiar, singular.
Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais
tentativa de teorizar a dialética entre o sujeito individual e a sua sociedade. No entanto, Moscovici possui uma “visão” diferente, ou pelo menos mais abrangente das representações coletivas. Segundo ele a sociologia viu as representações sociais como artifícios explanatórios, irredutíveis a qualquer análise posterior (MOSCOVICI, 2003, p. 45). A tarefa da psicologia social seria a de “cindir as representações” para descobrir seus mecanismos internos e sua vitalidade, nesse sentido busca-se não somente aqueles fatores responsáveis pela coesão social, mas também os índices da mudança, da transformação na sociedade. Uma das principais diferenças seria, segundo Moscovici, que o que antes era considerado como um conceito passou a ser visto como um fenômeno (MOSCOVICI, 2003). A própria mudança na denominação – de representações coletivas para representações sociais – mostra o que Moscovici pretendia, pois para este autor o conceito de representações coletivas apresentava de forma implícita o perigo de obscurecer a ação do indivíduo na sociedade, pois é em relação a ele que se abrem as possibilidades de transformação social. Nas palavras do autor temos então que [...] se, no sentido clássico, as representações coletivas se constituem em um instrumento explanatório e se referem a uma classe geral de ideias e crenças (ciência, mito, religião etc.), para nós, são fenômenos que necessitam ser descritos e explicados. São fenômenos especí �cos que estão relacionados com um modo particular de compreender e de se comunicar – um modo que cria tanto a realidade como o senso comum. É para enfatizar essa distinção que eu uso o termo ‘social’ em vez de ‘coletivo’. (MOSCOVICI, 2003, p. 49)
Para Moscovici coexistiriam nas sociedades contemporâneas duas classes distintas de universos de pensamento: os universos consensuais e os universos rei �cados8. Neste último, bastante circunscrito, é que se produzem e circulam as ciências e o pensamento erudito em geral, com sua objetividade, seu rigor lógico e metodológico, sua teorização abstrata, sua compartimentalização em especialidades e sua estrati�cação hierárquica. Aos universos consensuais correspondem as atividades intelectuais da interação social cotidiana pelas quais são produzidas as representações sociais. No entanto, segundo Moscovici, a matéria-prima para a construção dessas realidades consensuais que são as representações sociais provém dos universos rei�cados (MOSCOVICI, 2003, p. 54). A psicologia social de Moscovici foi também alvo de críticas, as mais recorrentes apontavam para a falta de uma conceitualização mais precisa em relação às representações sociais. Para Moscovici, não obstante, residiria justamente aí a fecundidade da teoria e método das representações, pois à aparente inconsistência se oporia uma �exibilidade teórico-metodológica que permitiria o aperfeiçoamento ininterrupto do arcabouço epistemológico tanto do termo como 8
Do verbo rei �car que signi�ca: 1. encarar (algo abstrato) como uma coisa material ou concreta; coisi �car; 2. transformar em coisa; dar o caráter de coisa a; 3. tornar estático; paralisar (HOUAISS).
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Pro�ssão Docente
da própria psicologia social. Alguns de seus seguidores, porém, investiram na tentativa de circunscrever uma de�nição. Segundo Jodelet o conceito de representação social designa [...] uma forma especí �ca de conhecimento, o saber do senso comum, cujos conteúdos manifestam a operação de processos generativos e funcionais socialmente marcados. Mais amplamente, designa uma forma de pensamento social. As representações sociais são modalidades de pensamento prático orientadas para a comunicação, a compreensão e o domínio do ambiente social, material e ideal. Enquanto tais, elas apresentam características especí �cas no plano da organização dos conteúdos, das operações mentais e da lógica. A marcação social dos conteúdos ou dos processos de representação refere-se às condições e aos contextos nos quais emergem as representações, às comunicações pelas quais circulam, às funções que elas servem na interação com o mundo e com os outros. (JODELET 9 apud SÁ, 1998, p. 32)
Uma vez atrelada à construção dos saberes sociais, a dimensão simbólica ganha força, pois o símbolo tem a capacidade de evocar algo ausente. A partir das características principais dos símbolos – o signi�cado e o signi�cante – cria-se o objeto representado, onde uma nova “realidade” se constituirá, de modo que eles “provocam uma fusão entre o sujeito e o objeto porque eles são expressão da relação entre sujeito e objeto” (JOVCHELOVITCH, 1994, p. 74). É nesse espaço que as representações sociais são criadas, tanto no sentido de reforçar uma tradição como no sentido mais amplo da mudança social. Poderíamos então apreender o sentido das representações através da problematização daquilo que lhe é inerente: seus símbolos constitutivos.
Imaginário social e representações Para Baczko (apud PESAVENTO, 1995, p. 9) a interrogação atual das ciências humanas deriva da perda da certeza das normas fundamentadoras de um discurso cientí �co unitário sobre o homem e a sociedade. Na medida em que deixa de ter sentido uma teoria geral de interpretação dos fenômenos sociais, apoiada em ideias-imagens legitimadoras do presente e antecipadoras do futuro (o progresso, o homem, a civilização), ocorre uma segmentação das ciências humanas e um movimento paralelo de associação multidisciplinar em busca de saídas (PESAVENTO, 1995, p. 9-10). Neste sentido, aquilo que �gurava no programa dos Annales da década de 1930 seguramente persiste atualmente. O diálogo com as demais ciências representa vetor heurístico primordial no aperfeiçoamento teórico-metodológico da história, e é precisamente por este 9
JODELET, Denise. Représentations Sociales: phénomènes, concept et théorie. In: MOSCOVICI, Serge (Ed.). Les Représentations Sociales . Paris, Presses Universitaires de France, 1984.
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Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais
motivo que as representações sociais são de extrema importância para os estudos históricos. A ponte entre representações sociais e os estudos históricos tem sido frequentemente realizada através da utilização do conceito de imaginário social. Dessa forma a apropriação da teoria das representações sociais por parte da história dá-se a partir da percepção de que as representações são expressão do imaginário social (que tem historicidade própria), ou seja, é o processo de concretização dos imaginários. Representação, diz Le Goff (MOSCOVICI, 2003, p. 15), é tradução mental de uma realidade exterior percebida e liga-se ao processo de abstração. O imaginário faz parte de um campo de representação e, como expressão do pensamento, se manifesta por imagens e discursos que pretendem dar uma de�nição da realidade. Não obstante, é importante que se tenha em vista que intervêm no processo de formação do imaginário coletivo manifestações e interesses precisos. Não se pode esquecer que o imaginário é uma das forças reguladoras da vida coletiva, normatizando condutas e pautando per�s adequados ao sistema (MOSCOVICI, 2003, p. 23). Acompanhando o pensamento de Silva (2000, p. 82) “a categoria das representações, aplicada à história cultural, e mesmo à história em sua totalidade, visaria romper falsos dualismos que opõe objetivismo a subjetivismo, operando uma mediação entre o coletivo e o individual histórico”. Mediação esta que nos remete novamente ao imaginário social, pois com a representação o imaginário tem sua existência a�rmada pela concretude das imagens formadoras da dimensão simbólica das realidades, para Baczko (1985, p. 312) organizar e controlar o tempo coletivo no plano simbólico é a forma dos imaginários sociais intervirem na construção da memória coletiva.
Representações sociais e educação Em conexão com o conceito de imaginário social, a teoria das representações sociais consegue reunir os estudos históricos sincrônicos e diacrônicos como partes inerentes da dialética característica do método das ciências sociais. Como a�rmamos no início, o conceito de representações sociais pode ser extremamente útil aos estudos em educação, pois os professores, como membros da sociedade, constroem suas representações baseados em sua experiência cotidiana, pro�ssional e também nas representações construídas pela sociedade em geral a respeito deles. Instrumentalizando este conceito o pro�ssional docente poderá aprofundar suas pesquisas no sentido da interdisciplinaridade, sem perder seu campo especí �co de atuação. 63
Pro�ssão Docente
É somente com a aproximação com as outras ciências que se pode avançar no alargamento epistemológico dos estudos em educação, e a teoria das representações surge como possibilidade de apreensão da constituição dos saberes sociais, ou categorias de entendimento em termos durkheimianos. Os professores precisam investir na construção de um saber relativo à sua pro�ssão que avance acompanhando as transformações da sociedade, ou aquilo que pretensamente aparece como inovação. Como refere Sandra Jovchelovitch “a necessidade de defender a vida em comum, ameaçada hoje pela miséria, pela violência e pela desigualdade, é também a necessidade de recuperar o pensamento, a palavra e a plena possibilidade de construir saberes sociais” (1994, p. 82-83).
Texto complementar Razões para ser e não ser professor: re�exões à luz da teoria das representações sociais (SOUZA; CARVALHO; CARVALHO, 2008)
[...] As re�exões e análises estão ancoradas em autores que discutem o trabalho docente, tais como Maurice Tardif e Claude Lessard, Dalila Oliveira e na Teoria das Representações Sociais (TRS), doravante denominada TRS, de Serge Moscovici e demais colaboradores: Denise Jodelet e Jean-Claude Abric e Celso Sá.
Algumas proposições sobre ser professor Ao fazer uma escolha, ao tomar uma decisão ou mesmo no agir, o indivíduo não o faz de modo isolado, mas no processo de interação com outras pessoas. Isso nos leva a re�etir sobre os fatores que envolvem a escolha da docência como pro�ssão, como trabalho. Diversos fatores podem contribuir no momento de escolher uma graduação para cursar, o que pode não estar ligado necessariamente ao desejo da pessoa e sim àquilo que é possível fazer como: oferta de cursos, situação econômica dos alunos, falta de informação sobre as pro�ssões e outros fatores que podem envolver a opção por uma licenciatura. [...] os indivíduos estão submetidos às determinações do campo social, toda escolha é socialmente condicionada, restando, desta forma, con�gurar os modos próprios a cada classe social de assunção à atividade pro�ssional (SILVA, 1995, p. 41).
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Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais
Em nossa sociedade, segundo Tardif e Lessard (2005) o trabalho dos professores possui um estigma de uma ocupação secundária ou periférica em relação ao trabalho material e produtivo. É como se a docência �casse submetida a suprir as necessidades das esferas de produção, tendo como propósito: [...] preparar os �lhos dos trabalhadores para o mercado de trabalho. O tempo de aprender não tem valor por si mesmo; é simplesmente uma preparação para a ‘verdadeira vida’, ou seja, o trabalho produtivo, ao passo que, comparativamente, a escolarização é dispendiosa, improdutiva, ou, quando muito, reprodutiva. (TARDIF; LESSARD, 2005, p. 17)
Além do caráter de ocupação secundária, “ser professor hoje em dia deixou de ser compensador, pois, além dos salários nada atrativos, perdeu também o status social que acompanhava a função há poucas décadas passadas” (CODO, 2002, p. 99). Segundo Oliveira (2003) existe uma tensão para reconhecer a natureza do trabalho do professor como uma atividade pro�ssional, com estatuto próprio con�gurando-lhe status de pro�ssão e não fruto de uma vocação, um chamamento. Tardif e Lessard (2005, p. 31) dizem que “ensinar é trabalhar com seres humanos, sobre seres humanos, para seres humanos”. No centro do trabalho do professor está o ser humano, desta forma para que o trabalho do professor seja e �caz, uma vez que ele ocorre na interação é essencial a afetividade (CODO, 2002). Sejam lá quais forem as razões para exercer o trabalho docente, se é fruto de uma opção consciente e apaixonada, se é fruto das circunstâncias e oportunidades ou ainda das necessidades econômicas, o fato é que este trabalho tão antigo sempre esteve envolvido em debates, estudos e necessidade de transformação constante, ainda que em se tratando de sua prática pouca coisa mudou. As salas de aulas ainda são as mesmas, sua disposição física, o quadro na frente, carteiras en�leiradas e o professor reproduzem a prática de sala de aula de gerações antes da sua. Alguns recursos tecnológicos mudam, mas não muda a forma. [...]
Apresentação e análise dos dados Apresentamos os dados [...] referentes ao estudo sobre as representações sociais das razões para ser professor e das razões para não ser professor . Apresentamos a seguir, as categorias e os respectivos atributos eleitos por consenso pelo grupo de juízes que trabalharam de forma independente:
65
Pro�ssão Docente
Tabela 1 – Categorias comportando os atributos mais frequentes referentes ao mote: razões para ser professor CATEGORIAS
ATRIBUTOS
Bem-estar
Características pessoais
Relacionamento
F
%
gosto
32
16,33
afetividade
11
5,61
realização
7
3,57
prazer
7
3,57
satisfação
6
8,96
vocação
20
10,20
conhecimento
12
6,12
opção
9
4,59
compromisso
6
9,52
cooperação
10
5,10
educação
15
7,65
11
5,61
ensino
11
5,61
mudança
8
4,08
transformação
7
3,57
futuro
6
3,06
necessidade
7
3,57
196
100,00
Características do trabalho aprendizagem
Futuro
Conformismo
Total
Tabela 2 – Categorias comportando os atributos mais frequentes referentes ao mote: razões para não ser professor CATEGORIAS Condições do trabalho Características pessoais
Mal-estar
Relacionamento
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ATRIBUTOS
F
%
falta estrutura
8
3,98
condição
7
3,48
falta incentivo
6
2,99
impaciência
7
3,48
não gostar
7
3,48
baixo salário
66
32,84
desvalorização
24
11,94
falta reconhecimento
11
5,47
cansativo
10
4,98
desgastante
9
4,48
estresse
8
3,98
aluno
6
2,99
Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais
Pessimismo
desrespeito
15
7 ,46
desprestígio
6
2 ,99
2 01
10 0,00
Total
Atividades 1. Qual a importância do diálogo entre as ciências para o avanço da pesquisa
em educação?
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Pro�ssão Docente
2. Como o conceito de representações sociais poderia ser utilizado na constru-
ção de uma problemática a ser introduzida em um projeto de pesquisa em educação?
Dica de estudo Às vezes é necessário retornarmos aos clássicos, porque podemos ter interpretações diferenciadas que podem ser muito úteis no processo de imaginação criativa que guia as pesquisas. Nesse sentido, o livro de Émile Durkheim As Regras Regras do Método Sociológico, da Editora Martins Fontes, pode fornecer um aporte teórico importante já que partimos do princípio de que as teorias e metodologias da sociologia podem ser importantes para as investigações em educação.
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Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais
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Formação inicial e formação continuada Rosângela Maria Stahlschmidt Não é recente aliar a qualidade da educação aos seus pro�ssionais. Entende-se que um ensino de qualidade sempre esteve ligado à formação pro�ssional, daí a constante preocupação com a formação docente. É normal ouvir a�rmações como “os alunos não são mais os mesmos”; tal constatação exige a compreensão de que se os alunos não são mais os mesmos com certeza não poderiam ser, pois já não se pode mais ministrar aulas como se fazia em outros tempos. Assim, é essencial que o acadêmico e especialmente os formadores de docentes compreendam que são necessárias novas posturas, que sejam o re�exo do momento histórico vivido. Assim, nesta aula, nos propomos a re�etir sobre a formação inicial e continuada. A formação teórica e prática do professor pode contribuir para melhorar a qualidade do ensino, considerando que são as transformações sociais que poderão gerar transformações na educação. Assim, as constantes transformações econômicas, políticas, sociais e culturais têm levado a uma reavaliação do papel da escola e do professor, assumindo relevante importância a formação do docente.
A formação clássica do professor Dois processos de formação se apresentam historicamente: o autodidatismo (não há cursos e nem instituições formadoras), seguido pela fase em que surgem as instituições formadoras. Segundo Gonçalves e Peres (2002), a primeira preocupação em termos de quali�cação ocorreu por volta do século XVI, através de iniciativas esparsas em várias localidades do mundo. No século XVII foram implantadas as primeiras escolas normais na Alemanha e na Hungria. No século XVIII a divulgação do ideal de universalização da educação pelos �lósofos, a criação da imprensa com a consequente expansão
Pro�ssão Docente
da produção escrita, propicia o surgimento de um novo per �l de indivíduo, determinando o aumento da demanda por educação. A democratização do ensino no século XIX, especialmente nos países desenvolvidos, era uma realidade; é neste período que surgem no Brasil as primeiras escolas normais, oriundas de propostas que criaram um sistema dual: escola normal de excelência e escolas complementares de padrão inferior. Conforme Pereira (1999), as licenciaturas foram criadas nas antigas faculdades de Filoso�a, nos anos 1930, em resposta à preocupação com o preparo de docentes para a Educação Básica. Elas se constituíram segundo a fórmula 3 + 1, em que as disciplinas de natureza pedagógica, cuja duração prevista era de um ano, justapunham-se às disciplinas de conteúdo, com duração de três anos. Tal maneira de conceber a formação docente revela-se como o que se chamou de acordo com a literatura educacional de racionalidade técnica. Modelo este no qual o professor é visto como um técnico, um especialista que aplica com rigor, na sua prática cotidiana, as regras que derivam do conhecimento e do conhecimento pedagógico. Desta maneira, para formar um professor, por um lado, se considerava necessário um conjunto de disciplinas cientí �cas e, de outro, as disciplinas pedagógicas a �m de que se pudesse fornecer as bases para sua ação. É consensual que os currículos de formação de professores, baseados no modelo da racionalidade técnica, mostram-se inadequados à realidade da prática pro�ssional docente. Este modelo de racionalidade técnica resultou em críticas como: �
a separação entre teoria e prática na formação pro�ssional, a um longo tempo de preparação no qual era oferecido ao aluno um rol de disciplinas tanto técnicas como pedagógicas, e somente ao �nal da formação incluía-se o período da prática;
�
a prioridade dada à formação teórica em detrimento da formação prática;
�
a concepção da prática como mero espaço de aplicação de conhecimentos teóricos, sem um estatuto epistemológico próprio;
�
a convicção de que para ser bom professor basta o domínio da área do conhecimento especí �co que se vai ensinar.
Conforme se pode observar neste modelo de formação, não existe a preocupação com a questão social, ou seja, o campo de atuação onde o professor vai 72
Formação inicial e formação continuada
atuar parece não ser considerado, como se existissem fórmulas para a atuação do docente, e que todos os alunos reagiriam de uma mesma maneira, desde que o professor demonstrasse o domínio do conteúdo. De acordo com Pereira (1998), é importante ressaltar que este modelo não foi totalmente superado, já que as disciplinas de conteúdo especí �co continuam precedendo as disciplinas de conteúdo pedagógico, e articulando-se pouco com elas, que geralmente �cam a cargo das faculdades ou centros de educação, assim como o contato com a realidade escolar continua acontecendo, com mais frequência apenas nos momentos �nais dos cursos. O que se observa é que mesmo que as faculdades ofereçam as licenciaturas, estas estão baseadas na concepção da racionalidade técnica; apesar de a formação docente ser realizada desde o primeiro ano da licenciatura, esta é inspirada no bacharelado, ou seja, o ensino do conteúdo especí �co prevalece sobre o pedagógico, assumindo um papel secundário à formação prática. De acordo com Gómez (1997), a racionalidade técnica representa um avanço em relação ao modelo empírico, considerando que defende a aplicação do conhecimento do método cientí �co na análise da prática e na regulação da intervenção do professor. Conforme Zeichner (1993), os programas de formação de docentes estão impregnados de diferentes concepções, re�etindo uma prática que ainda tem como base o domínio do conteúdo especí �co desarticulado da realidade. A partir da década de 1990, um modelo alternativo de formação de docentes vem conquistando um espaço cada vez maior na literatura especializada, o chamado modelo de racionalidade prática. De acordo com Pereira (1999, p. 3), “nesse modelo, o professor é considerado um pro�ssional autônomo, que re�ete, toma decisões e cria durante sua ação pedagógica, a qual é entendida como um fenômeno complexo, singular, instável e carregado de incerteza e con�ito de valores.“ Desta maneira, a prática não é entendida apenas como aplicação de um conhecimento cientí �co e pedagógico, mas sim, um espaço de criação e re�exão, em que novos conhecimentos podem constantemente ser gerados e modi�cados. A partir das críticas ao modelo de racionalidade técnica e orientadas pelo modelo de racionalidade prática, vêm surgindo novas maneiras de representar a formação docente, re�etido pelas políticas atuais de formação. Através delas 73
Pro�ssão Docente
busca-se um esquema em que a prática é entendida como eixo da preparação, presente desde os primeiros momentos da formação. Gómez (1997) relata que ao longo das últimas décadas, a formação de professores está impregnada de uma concepção linear e simplista dos processos de ensino, abrangendo normalmente dois grandes componentes: �
um componente cientí �co cultural, com a pretensão de assegurar o conhecimento do conteúdo a ensinar;
�
um componente psicopedagógico que permite aprender como atuar e�cazmente em sala de aula.
Distingue-se no componente psicopedagógico duas fases principais: na primeira adquire-se o conhecimento dos princípios, leis e teorias que explicam os processos de ensino-aprendizagem e oferecem normas e regras para a sua aplicação racional, e na segunda a aplicação na prática real ou simulada de tais normas e regras, de modo que o docente adquira as competências e capacidades requeridas para uma intervenção e�caz. Atualmente, a formação docente se pauta numa perspectiva em que há a preocupação com a atividade cotidiana em sala de aula, construída a partir de dimensão participativa, �exível, ativa e investigadora, resultando em uma nova concepção da atividade docente. De acordo com Sacristán (1995), no que se refere à formação de docentes, é essencial que a re�exão e a tomada de consciência das limitações sociais, culturais e ideológicas sejam o ponto de partida. Entende-se assim, que os processos envolvidos na formação do docente devem estar de acordo com a realidade vivenciada pelos futuros docentes. Sacristán (1995) e Popkewitz (1997) consideram a pro�ssão como uma palavra de construção social, cujo conceito muda de acordo com as condições com que as pessoas a utilizam. Desta forma, entende-se que a formação docente deve estar em consonância com o momento histórico vivido, ou seja, durante o processo de formação não se pode �car alheio às características da sociedade, não podemos prescindir dos fatores sociais que interacionam durante a vida pro�ssional e pessoal do professor, gerando uma relação dialética de in�uências mútuas, com consequências para a sua atividade pro�ssional. O que se busca atualmente é um modelo de formação pro �ssional apoiado na ideia de que a formação de docentes supõe um continuum no qual, durante 74
Formação inicial e formação continuada
toda a carreira docente, fases de trabalho devem alternar com fases de formação contínua. Tal epistemologia baseia-se no princípio, segundo o qual a prática pro�ssional constitui um lugar original de formação e produção de saberes práticos, visto que é portadora de condições e de condicionantes especí �cos que não se encontram noutra parte, nem podem ser reproduzidos arti�cialmente num contexto de formação teórica no período de graduação. Vista nesta perspectiva, a prática pro�ssional adquire uma realidade própria, independente dos constructos teóricos dos pesquisadores e de procedimentos elaborados por técnicos. Assim vista, a prática se constitui em um espaço de aprendizagem autônoma e imprescindível de mobilização de saberes e de competências especí �cas, ou seja, uma instância de produção desses mesmos saberes e competências, ao incorporar uma parte da formação, torna-se um espaço de comunicação e de transmissão desses saberes e competências. A aplicação deste modelo supõe transformações importantes na prática vigente, as quais são destacadas a seguir conforme Tardif (2002, p. 288): “a formação habitual visa habituar os futuros docentes à prática pro�ssional de professores de pro�ssão e a fazer deles práticos re�exivos.” Signi�ca inicialmente que os programas de formação devem ser organizados em função de um novo centro de gravidade: a formação cultural (geral) e a formação cientí �ca (disciplinar), através das disciplinas contributivas, vinculadas à formação prática, que se torna quadro de referência obrigatório da formação pro�ssional. Tal ação exige que se conceda um espaço substancial à formação prática no meio escolar, resultando em estágios de longa duração, contatos repetidos e frequentes com os ambientes da prática. Signi�ca ainda, integrar os professores de pro�ssão no próprio currículo da formação inicial para o ensino, diferenciando-se do que tradicionalmente acontecia, pois os professores de pro�ssão se situavam na periferia da formação inicial. Zeichner (1993) assinala a importância de se conhecer as tradições da prática na formação de professores para que se possa perceber as diferenças entre as propostas de reforma contemporâneas: a) tradição acadêmica: o professor é especialista em conteúdos de ensino; b) tradição de e�ciência social: a formação se baseia na competência/desempenho; c) tradição desenvolvimentista: o desenvolvimento do aluno é a base do que deve ser ensinado aos alunos e aos professores; d) tradição de reconstrução social: o papel da escola e das forças progressistas é fundamental na reconstrução da sociedade. 75
Pro�ssão Docente
A�rma ainda que todos os programas de formação de professores tem relação com as quatro tradições da reforma, e que estes devem contemplar as concepções de ensino subjacentes às quatro tradições, no entanto, sem esquecer as dimensões de suas identidades.
Competências necessárias ao docente Conforme Nóvoa (1997), a primeira competência necessária ao docente trata-se de organização. Hoje um professor não é mero transmissor de conhecimento, mas também não é apenas uma pessoa que trabalha no interior de uma sala de aula. Trata-se de um organizador de aprendizagens, e de aprendizagens que articulam os novos meios da informática, por via dessas novas realidades virtuais. Assim, organizar o trabalho escolar é mais do que o simples trabalho pedagógico, é mais do que o simples trabalho do ensino, vai além destas dimensões. Torna-se um desa�o para o trabalho do professor garantir a aprendizagem dos alunos. Essas competências de organização são absolutamente essenciais para um professor. O segundo nível de competências é muito importante e está relacionado com a compreensão do conhecimento. Não basta deter o conhecimento e transmiti-lo a alguém, é preciso compreendê-lo, ser capaz de reorganizá-lo, de reelaborá-lo e de transpô-lo em situação didática em sala de aula. Tal compreensão do conhecimento é, absolutamente, essencial nas competências práticas dos professores.
A necessidade da formação continuada Partindo do pressuposto de que a prática do docente deve levar em conta o momento histórico, é preciso compreender a necessidade da formação continuada. Considerando a formação continuada do professor, a perspectiva histórico-social toma como base a prática pedagógica e situa, como �nalidade dessa prática, levar os alunos ao domínio dos conhecimentos acumulados historicamente pela humanidade. Para conseguir que os alunos se apropriem do saber escolar de modo a se tornarem autônomos e críticos, o professor precisa estar, ele próprio, apropriando-se desse saber e tornando-se cada vez mais autônomo e crítico. Segundo Pinto (1982, p.109): O educador deve compreender que a fonte de sua aprendizagem, de sua formação é sempre a sociedade. Mas esta atua de dois modos, um, indiretamente, mas que aparece ao educando (futuro educador) como direto (pois é aquele que sente como ação imediata): é o educador, do qual 76
Formação inicial e formação continuada
recebe ordenadamente os conhecimentos. E outro, diretamente, ainda que apareça ao educando (futuro educador) como indireto, pois não o sente como pressão imediatamente perceptível: é a consciência, em geral, com o meio natural e humano no qual se encontra o homem e do qual recebe os estímulos, os desa�os, os problemas que o educam em sua consciência de educador.
É fundamental compreender a ideia de que a prática cotidiana do professor normalmente encontra-se movida pelo senso comum pedagógico, este constituído de fragmentos de teorias. O senso comum acaba criando a ilusão de um domínio das teorias cujos elementos ele incorpora. O professor que está imerso na sua prática muitas vezes não percebe a necessidade de romper com essa relação imediata entre pensamento e ação, o que leva a uma rejeição da re �exão �losó�ca e das teorias educacionais mais elaboradas. Durante o seu processo de formação, o professor parece assumir uma postura semelhante à do homem comum, ou seja, vê a si mesmo como um ser prático que não precisa de teorias, os problemas encontram sua solução na própria prática, ou na forma de reviver uma prática passada que é a experiência. Pode-se dizer que a formação continuada trata-se de uma necessidade, tendo em vista a natureza inconclusa do ser humano, os limites da formação inicial, bem como a complexidade do trabalho docente e dos seus requerimentos para a prática pro�ssional. A formação continuada permite a passagem do exercício pro�ssional baseado na intuição para um processo pautado na racionalidade, tem a pretensão de dotar o pro�ssional docente de meios que possibilitem o aprofundamento do conhecimento sobre as atividades pedagógicas e didáticas, sua organização, coordenação, revisão e adequação às condições existentes. A formação continuada permite uma aproximação entre os campos de formação pro�ssional e o campo do exercício da pro�ssão, mediante a possibilidade de fazer dialogar os saberes da formação e os saberes da pro�ssão, permitindo o intercâmbio de saberes e experiências úteis. Assim, a formação continuada trata-se de um processo de escuta, discussão e socialização da prática pedagógica, com o intuito de aprofundar modos de seleção, organização e construção do conhecimento. De acordo com Nóvoa (2002, p. 23), “o aprender contínuo é essencial e se concentra em dois pilares, a própria pessoa como agente, e a escola, como lugar de crescimento pro�ssional permanente.” Veri�ca-se que uma das características essenciais da formação continuada é a dimensão coletiva, sendo a experiência e a re�exão os instrumentos contínuos de análise. 77
Pro�ssão Docente
Portanto, conforme Nóvoa (1997), a troca de experiências e o partilhamento de saberes faz com que cada professor desempenhe simultaneamente o papel de formador e de formando. Torna-se importante compreender que o desenvolvimento pro�ssional não ocorre apenas no curso superior, pois o conhecimento lá adquirido só fará sentido se for somado ao conhecimento acumulado ao longo da vida, a partir das experiências que são vivenciadas no cotidiano; daí a conclusão de que uma boa graduação não basta, pois é preciso estar sempre atualizado; isso nos remete à con�rmação da necessidade de formação continuada, havendo a necessidade da construção do saber no processo de atuação pro�ssional. A formação contínua concentra-se nas necessidades e situações vividas pelos práticos e diversi�ca suas formas: formação através dos pares, formação no ambiente de trabalho integrada numa atividade de pesquisa colaborativa. Tardif (2002) recomenda que a formação contínua não pode limitar-se a retomar os conteúdos e modalidades da formação inicial. A pro�ssionalização do ensino exige um vínculo muito mais estreito entre a formação contínua e a pro�ssão, baseando-se nas necessidades e situações vividas pelos práticos. Entende-se assim, que os professores não são mais considerados alunos, mas parceiros e atores de sua própria formação, que de�nirão em sua própria linguagem e em função de seus próprios objetivos.
As concepções de formação continuada Nóvoa (1997) organiza os modelos de formação continuada em dois grupos:
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modelo estrutural – que diz respeito à perspectiva universitária e escolar. Trata-se de um modelo fundamentado na racionalidade técnico-cientí �ca. Os projetos são oferecidos por agências detentoras de potencial e legitimidade informativa, exterior aos contextos pro�ssionais dos professores em processo de formação e possuem controle institucional de frequência e desempenho;
�
modelo construtivo – engloba o contratual e interativo-re�exivo, ou seja, parte da re�exão interativa e contextualizada, articulando teoria e prática, formadores e formandos. Este modelo prevê avaliações e autoavaliações do desempenho dos envolvidos, mas essas podem ter um caráter informal. Implica uma relação em que formadores e formandos são colaboradores, predispostos aos saberes produzidos em ação. O contexto é de cooperação em que todos são co-responsáveis pela resolução dos problemas
Formação inicial e formação continuada
práticos. É comum o uso de grupos focais, o �cinas, dinâmicas de debates, além de exercícios experimentais seguidos de discussões. Gatti (2003) considera que a formação continuada de professores consiste numa questão psicossocial, dada a multiplicidade de dimensões que tal formação envolve: �
especialidade – envolve a atualização de conhecimentos dos professores, estando ancorada na constante reavaliação do saber que deve ser escolarizável, é a que mais direciona a procura por projetos de formação continuada;
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didática e pedagógica – envolve o desempenho de funções docentes e a prática social contextualizada. Parte-se da compreensão de que a prática docente é uma prática social, e como tal historicamente de�nida pelos valores postos no contexto;
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pessoal e social – envolve a perspectiva da formação pessoal e do autoconhecimento, focada na necessidade de interação em contextos diversos e a necessidade de entender o mundo e a sua inserção pro�ssional neste mundo;
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expressivo-comunicativa – refere-se à valorização do potencial dos professores de sua criatividade e expressividade no processo de ensinar e aprender;
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histórico-cultural – esta dimensão diz respeito ao conhecimento dos aspectos históricos, econômicos, políticos, sociais e culturais.
O autor ressalta ainda que um projeto de formação continuada não pode ser construído se for ignorado o conjunto dessas dimensões que estão envolvidas, a natureza e as características psicossociais que enquadram as práticas dos professores em sua diversidade, bem como as demandas por educação que se constroem em campos bastante diferenciados.
Educação e tecnologias da informação À medida que reconhecemos que a sociedade torna-se cada vez mais tecnológica, torna-se necessária a conscientização da necessidade de sua inclusão nos currículos escolares. A sociedade do conhecimento exige uma abordagem diferente em que o componente tecnológico não pode ser ignorado seja qual for o ramo do conhecimento, especialmente na formação dos docentes. 79
Pro�ssão Docente
A dinâmica do mundo moderno exige, em todas as áreas, pro�ssionais questionadores e dinâmicos, cuja capacidade de pensar e decidir são essenciais para a assimilação de mudanças e para o confronto com os desa�os surgidos no cotidiano. De acordo com Lévy (1999), mesmo que uma pessoa não mude de atividade ao longo de sua trajetória pro �ssional, necessita acompanhar as mudanças de sua própria pro�ssão, considerando que os conhecimentos e habilidades empregados em um campo pro�ssional já não são estáveis, pois em intervalos muito curtos transformam-se ou se tornam obsoletos. Acredita-se que a formação do professor é um ponto-chave para o ensino. A necessidade de atualização cresce não apenas no que se refere à disciplina como também em relação às metodologias de ensino e às novas tecnologias. De acordo com Perrenoud (apud CHAKUR, 1995, p. 80), “é possível que a formação básica do professor não dê mais conta das mudanças rápidas e diversi �cadas que acompanham a evolução das condições do exercício do magistério.” Considerando o contexto de mudança que se presencia, espera-se que o professor oriente os educandos a transformar informação em conhecimento. Assim, os processos de aquisição do conhecimento assumem um papel relevante na chamada sociedade do conhecimento, exigindo um pro�ssional crítico, criativo, com capacidade de pensar e trabalhar em grupo, preocupação esta que deve estar presente na formação de docentes, uma vez que serão os responsáveis pela formação dos futuros cidadãos. Conforme Vieira (2008), a formação inicial do docente nos diversos cursos de graduação assume um papel mais reativo do que proativo na discussão, no planejamento e na adoção das tecnologias da informação, principalmente do ponto de vista metodológico. Tal constatação demonstra que há pouca preocupação e re�exão sobre a essência do ato de educar com as novas tecnologias, visto que o foco é exclusivamente instrumental, ou seja, a materialização das tecnologias da informação não se transforma em órgão funcional da mente, que ajudaria a organizar a aprendizagem de professores e alunos e nem consegue ou garante a realização de um objetivo maior que todos desejamos, isto é, a melhoria da educação, a motivação do aluno e a realização do professor. Atualmente, inúmeras escolas detêm um bom aparato tecnológico, no entanto, falta a conscientização de que as tecnologias da informação nada mais 80
Formação inicial e formação continuada
são do que instrumentos auxiliares do processo de ensino-aprendizagem. Por mais interessante ou atraente que seja para o aluno, não é a utilização de diversas tecnologias que vai garantir a aprendizagem. É importante ressaltar que as tecnologias da informação não podem ser vistas como um modismo, mas sim, como um instrumento possível para atingir objetivos educacionais. A introdução das tecnologias da informação na educação exige uma formação ampla e profunda do professor, ou seja, não basta criar condições para o professor dominá-las, mas sim, auxiliá-lo a desenvolver conhecimento sobre o próprio conteúdo e como podem ser integradas no desenvolvimento desse conteúdo. Esta formação possibilita a transição de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de conteúdo, voltada para a resolução de problemas especí �cos do interesse de cada aluno. Para Valente (1993), se não forem bem utilizados, os avanços tecnológicos podem desequilibrar e atropelar o processo de formação, fazendo com que o professor sinta-se eternamente um principiante. As tecnologias da informação abrem novas possibilidades à educação exigindo uma nova postura do educador, permitindo-lhe um trabalho melhor em relação ao desenvolvimento do conhecimento. É importante ressaltar que a inserção e a condução das tecnologias da informação na educação são de responsabilidade do docente, em sua utilização. Assim, a qualidade tão esperada na educação poderá ocorrer devido à forma de trabalhar o currículo, mediante o incentivo do emprego das tecnologias no ensino. De acordo com Frigotto (1996), a integração do trabalho com novas tecnologias no currículo, como ferramentas, exige a re�exão sistemática acerca de seus objetivos, suas técnicas, dos conteúdos escolhidos, das habilidades, en �m, do próprio signi�cado da educação. Entende-se assim, que a sociedade do conhecimento exige um novo per �l de educador, como o comprometimento. Sendo assim, o docente precisa estar comprometido com as transformações políticas e sociais, para tal, sua prática deverá estar revestida de signi�cado, considerando a diversidade presente no contexto educacional, mas essencialmente buscando mobilizar saberes essenciais, a �m de que a informação possa transformar-se em conhecimento.
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Pro�ssão Docente
Essa competência é evidenciada mediante uma sólida cultura geral de maneira a possibilitar-lhe uma prática interdisciplinar e contextualizada, dominando as tecnologias da informação, abordando as informações de forma crítica e re�exiva não apenas no âmbito de sua disciplina, mas a �m de instigar o educando à investigação. Assim, o processo de preparação dos professores não pode restringir-se a cursos ou treinamentos de curta duração, que tenham em vista a exploração de determinados programas, torna-se necessário que se dê a oportunidade de analisar as di�culdades e potencialidades de seu uso na prática pedagógica. Neste contexto, formar professores exige: �
mudanças na forma de concepção do trabalho docente, a �exibilização dos currículos nas escolas, bem como a responsabilidade no processo de formação do cidadão;
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o acesso à informação e produção de conhecimento indiscriminadamente;
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a integração de novos espaços de conhecimento, no qual este não se encontra centrado no professor, nem no espaço físico e tempo escolar, mas visto como processo de permanente transição.
Frigotto (1996) ressalta que o grande desa�o a ser enfrentado na formação do docente trata-se da questão da formação teórica e epistemológica, tarefa esta que não pode ser delegada à sociedade em geral. De acordo com Dowbor (1993) e Drucker (1993), as principais diretrizes teóricas na educação na sociedade da informação permitem desenvolver vários níveis de competência: �
conhecimento – a transformação da informação em conhecimento exige
a captura da informação relevante, senti-la, e especialmente ser capaz de relacioná-la com a vida. Ajudar a estimular o que é relevante na informação, a transformá-la, e saber integrá-la dentro de um modelo mental/emocional equilibrado e transformá-la em ação presente ou futura. Aprender a navegar entre tantas e tão desencontradas informações, entre modelos contraditórios de conhecimento e com visões de mundo opostas; �
desenvolvimento pessoal – sabe-se que hoje não basta dominar o conhe-
cimento historicamente acumulado, tão importante quanto a apreensão do mesmo é a integração pessoal, o desenvolvimento de uma identidade 82
Formação inicial e formação continuada
positiva. Desta forma a postura do docente é a de planejador e orientador da aprendizagem, que seja capaz de se comunicar, ser criativo e consciente de sua responsabilidade para contribuir com a transformação da sociedade, e de seus limites como pessoa e como pro�ssional em constante aperfeiçoamento, e principalmente assumindo conscientemente seu autoaperfeiçoamento. Suas experiências e sua prática docente devem se tornar a base para uma re�exão crítica, promovendo desta forma seu próprio desenvolvimento pessoal e pro�ssional; �
desenvolvimento cognitivo – quando voltados para a inteligência, os am-
bientes computacionais podem constituir-se num desa�o à criatividade e invenção; �
comunicação – manifestação clara do que o indivíduo é, o que sente e
deseja, captar o que é o outro em todas as suas dimensões, mediante as diversas linguagens – oral, escrita, áudiovisual e grá�ca – com todo o ser: corpo, mente, gestos; �
trabalho interdisciplinar – redes de computadores oferecem efetivas
oportunidades para trabalho cooperativo, no entanto, podem ocorrer problemas estruturais encontrados no contexto escolar para uso de redes, que incluem acesso, custos telefônicos para ligação on-line, tempo e equipamento, os quais podem di�cultar seu uso, devendo buscar alternativas para superar esses problemas; �
criticidade – não basta simplesmente que os alunos lembrem das infor-
mações: estes precisam ter a habilidade e o desejo de utilizá-las, relacionando-as, sintetizando-as, analisando-as e avaliando-as. É notória a necessidade de incentivar estudos relacionados não só à possibilidade do uso de novas tecnologias na formação de professores. É preciso que o professor esteja instrumentalizado para ler o novo, conhecer diferentes linguagens da mídia, estar atento a sua diversidade tanto no que se refere ao meio, quanto à forma. É importante ressaltar que a formação inicial e continuada se referem a dois tempos de uma mesma formação, visto que ambas estão comprometidas com a competência necessária ao exercício da docência com a comunidade e com a sociedade em que se inserem. Conforme Perrenoud (1997), a formação continuada deve ser entendida como uma ação na busca de um conhecimento formal, uma tomada de consciência de sua práxis, da própria atividade pedagógica. 83
Pro�ssão Docente
Texto complementar As concepções de formação continuada segundo os estudiosos do tema (DALBEN, 2008)
O que seria a formação continuada? Seriam os processos que acontecem em situações especí �cas, após a formação inicial, considerada aqui, como a formação desenvolvida durante a graduação? O que dizer, nos casos dos professores da Educação Básica que possuem a formação inicial no Nível Médio (professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental) que, em serviço, retornam às instituições de Ensino Superior para cursarem a graduação? E aqueles que, em busca de aprofundamento ou titulação, retornam à universidade para fazerem o mestrado e doutorado? Essas situações, às vezes, não são consideradas quando se discute a formação continuada e a ideia predominante refere-se, especialmente, àqueles projetos em que ações de formação acontecem em situações especí �cas, em espaços especí �cos, conforme propostas elaboradas a partir de demandas também especí �cas. A maioria dos autores, quando se referem às concepções de formação continuada de professores, apoia-se em Demailly (NÓVOA, 1992) que classi�ca esses projetos em quatro modelos:
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forma universitária – projetos de caráter formal, extensivo, vinculados a uma instituição formadora, promovendo titulação especí �ca. Por exemplo, quali�cações da pós-graduação ou mesmo na graduação;
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forma escolar – cursos com bases estruturadas formais de�nidas pelos organizadores ou contratantes. Os programas, os temas e as normas de funcionamento são de�nidos pelos que contratam e, geralmente, estão relacionados a problemas reais ou provocados pela incorporação de inovações;
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forma contratual – negociação entre diferentes parceiros para o desenvolvimento de um determinado programa. É a forma mais comum de oferta de cursos de formação continuada, sendo que a oferta pode partir de ambas as partes;
Formação inicial e formação continuada
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forma interativa-re�exiva – as iniciativas de formação se fazem a partir da ajuda mútua entre os professores em situação de trabalho mediados pelos formadores.
Nóvoa (1992) não traz novidades, mas reorganiza esses quatro modelos em dois grupos: �
modelo estrutural – engloba a perspectiva universitária e escolar. Fundamentado na racionalidade técnico-cientí �ca em que o processo de formação se organiza com base numa proposta previamente organizada, centrada na transmissão de conhecimentos e informações de caráter instrutivo. Os projetos são oferecidos por agências detentoras de potencial e legitimidade informativa, exterior aos contextos pro�ssionais dos professores em processo de formação e possuem controle institucional de frequência e desempenho;
�
modelo construtivo – engloba o contratual e interativo-re�exivo. Parte da re�exão interativa e contextualizada, articulando teoria e prática, formadores e formandos. Prevê avaliações e autoavaliações do desempenho dos envolvidos, mas essas podem ter um caráter informal. Implica uma relação em que formadores e formando são colaboradores, predispostos aos saberes produzidos em ação. O contexto é de cooperação em que todos são co-responsáveis pela resolução dos problemas práticos. É comum o uso de grupos focais, o�cinas, dinâmicas de debates, além de exercícios experimentais seguidos de discussões.
A escolha de um modelo e as dimensões da formação continuada Um programa de formação continuada se desenvolve em um campo complexo e a escolha do melhor modelo �cará condicionada à conjunção de forças desse campo. Isso signi�ca que um bom modelo para um grupo pode não o ser para outro, dependendo das expectativas e desejos dos participantes. Gatti (2003) diz que a formação continuada de professores consiste numa questão psicossocial, em função da multiplicidade de dimensões que essa formação envolve, a dizer: �
Especialidade – envolve a atualização do universo de conhecimentos dos professores. Ancora-se na constante reavaliação do saber que 85
Pro�ssão Docente
deve ser escolarizável sendo, por isso, a dimensão que mais direciona a procura por projetos de formação continuada; �
didática e pedagógica – envolve o desempenho das funções docentes e a prática social contextualizada. A prática docente é essencialmente uma prática social, historicamente de�nida pelos valores postos no contexto. Isso signi�ca que, por vezes, propostas didáticas poderão se confrontar com as experiências, expectativas pessoais ou desejos dos docentes;
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pessoal e social – envolve a perspectiva da formação pessoal e do autoconhecimento. Enfocada pela necessidade de interação em contextos diversos e a necessidade de entender o mundo e a sua inserção pro�ssional neste mundo;
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expressivo-comunicativa – valorização do potencial dos professores, de sua criatividade e expressividade no processo de ensinar e aprender. É uma busca de caráter operacional, técnico;
�
histórico-cultural – envolve o conhecimento dos aspectos históricos, econômicos, políticos, sociais e culturais incluindo a história da educação da Pedagogia e sua relação com as necessidades educativas postas no contexto.
Segundo a autora, um projeto de formação continuada não pode ser construído ignorando-se o conjunto das dimensões que estão envolvidas, a natureza e as características psicossociais do ato educativo. Os contextos institucionais e sociais que enquadram as práticas dos professores são diversos e as demandas por educação se constroem em campos bastante diferentes. No entanto, Kramer (1989) questiona as propostas de formação continuada no Brasil que ainda privilegiam a formação pro�ssional desconhecendo, por vezes, a pessoa ou o cidadão em formação. Para ela, essas estratégias privilegiam a formação técnica – treinamento com efeito multiplicador e/ou vivências pontuais, localizadas na socialização de experiências vividas. Marin (2002) é mais ousada. Para ela, a formação continuada de professores deveria transformar a escola em espaço de troca e de reconstrução de novos conhecimentos. Deveria partir do pressuposto da educabilidade do ser humano, numa formação que se dá num continuum, em que existe um ponto que formaliza a dimensão inicial, mas não existe um ponto que possa 86
Formação inicial e formação continuada �nalizar a continuidade desse
processo. Assim, a formação continuada é, em si, um espaço de interação entre as dimensões pessoais e pro�ssionais em que aos professores é permitido apropriarem-se dos próprios processos de formação e dar-lhes um sentido no quadro de suas histórias de vida.
Atividades 1. Tendo como base a leitura do texto, argumente quais competências consi-
dera essenciais na formação do professor.
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Pro�ssão Docente
2. Você considera que o eixo da formação do professor deve estar centrado na
teoria e prática? Justi�que sua resposta.
3. Em relação a sua própria formação, você considera que esteja mais voltada à
racionalidade técnica ou a outra formação? Argumente.
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Formação inicial e formação continuada
Dica de estudo PERRENOUD, P. Dez Novas Competências para Ensinar. Tradução de: RAMOS, Patrícia Chittoni. Porto Alegre: Artmed, 2000. Nesta obra, Perrenoud busca privilegiar práticas e competências emergentes, que deveriam orientar as formações iniciais e contínuas, aquelas que contribuem para a luta contra o fracasso escolar e desenvolvem a cidadania, que recorrem à pesquisa e enfatizam a prática re�exiva. O ofício de professor está se transformando, exigindo do educador aceitar os desa�os presentes na contemporaneidade. Assim, este livro trata-se de um referencial coerente destinado àqueles que desejam compreender o ofício de professor.
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O professor re�exivo Rosângela Maria Stahlschmidt A educação sempre se constituiu propulsora da civilização, assim é a ela que se deve a constante evolução técnica, cientí �ca e cultural. No mundo contemporâneo, a educação passa a ter um papel ainda mais decisivo sobre a sobrevivência, e é dela que se espera uma revolução. Desta forma, nunca houve tanta preocupação com a prática educativa desenvolvida em nossa sociedade como atualmente, pois é nela que repousa as esperanças de transformação em busca de uma sociedade mais justa e igualitária.
A educação como arte A mais antiga concepção a respeito da prática educativa vem da Grécia Antiga, remontando há mais de 2 500 anos e continua em vigor até os dias de hoje, mesmo tendo sofrido substanciais transformações. Esta concepção associa a atividade do educador como uma arte, isto é, a uma téchne, traduzido indistintamente pelas palavras técnica ou arte. A concepção de educação como arte elaborada pelos gregos se estendeu ao mundo romano, sendo retomada posteriormente pelo cristianismo, transmitindo aos tempos modernos importantes transformações, especialmente em relação à concepção da criança e do ser humano em geral. Tal concepção tende a ser abandonada nos séculos XIX e XX, devido ao surgimento de outras concepções, como a da educação como ciência. De acordo com Tardif (2002), nos últimos quinze anos, numerosos pesquisadores voltaram a se interessar por essa concepção, graças aos trabalhos de Schön (1983), teórico americano que estuda a atividade pro�ssional e a re� exão-na-ação. Na cultura grega antiga, particularmente na cultura �losó�ca, toma-se como referencial as obras de Platão e de Aristóteles, a arte (téchne) se distingue da ciência (epistéme) como o contingente se diferencia do necessário e o particular do universal, e por outro lado, a prática (práxis) signi �ca as atividades imanentes ao agente, desta forma a arte visava sempre um resultado exterior ao agente.
Pro�ssão Docente
Para uma melhor compreensão da educação enquanto arte, apresentamos a concepção de ação, arte e ciência de acordo com Tardif (2002, p. 156): Ação (Práxis)
Arte (Téchne)
Ciência (Epistéme )
Atividade típica
Atividade imanente ao Fabricação de uma obra Contemplação e coagente, ação moral. e produção de algo nhecimento rigoroso. (efeito, resultado etc).
Ator típico
O homem prudente, O artesão, o so�sta, o O sábio, o �lósofo, o o homem político, o médico, o educador. cientista. guerreiro, o gozador.
Natureza da atividade
Orientada por �ns Orientada por resul- Orientada por um imanentes ou naturais tados exteriores ao interesse relativo ao ao agente. agente. puro conhecimento.
Objeto típico da atividade
O homem e a existên- As coisas, os homens As realidades puracia humana. e os acontecimentos. mente intelectuais.
Saber típico
Antropologia, política.
Natureza do saber
Erudito, mas não rigo- Saber que trata do Rigoroso e necessário. roso e necessário. contingente e do particular.
Objeto do saber
ética, As técnicas e as artes; As ciências puras, a �o saber-fazer. loso�a.
Os �ns e as normas.
Os seres contingentes Os seres necessários e individuais. (os números, o divino).
É importante ressaltar que o objetivo da ação prática é ela mesma, enquanto a arte busca atingir um objetivo exterior à ação, ou seja, as artes eram concebidas a partir da categoria de produção ou de fabricação e não de categoria de criação, já a ciência busca a partir da aplicação de um método, a comprovação cientí �ca dos conhecimentos. Conforme Tardif (2002), a arte se baseia em disposições de habilidades naturais e em hábitos especí �cos, ou seja, em disposições desenvolvidas e con�rmadas pela prática e pela experiência de uma arte especí �ca. Portanto, nem todos aqueles que desejarem podem ser artistas ou artesãos, para tal é preciso ter certo talento. No entanto, talento sem a prática não serve para nada, considerando que é a prática que possibilita descobrir o talento e atualizá-lo em operações concretas e obras singulares. O artista não age por agir, sua ação não é a sua própria �nalidade (como ocorre com a práxis); ao contrário, ele visa produzir algo, sendo guiado por uma ideia prévia em relação ao objetivo a ser alcançado. Ressalta-se que essa ideia não é cientí �ca, pois seu objeto é contingente e particular. A arte atua sobre materiais singulares, ao passo que a ciência é aplicada ao geral e ao formal. O que caracteriza as realidades singulares da arte é a sua contingência e sua não-necessidade, decorrentes de sua materialidade. 92
O professor re�exivo
De acordo com os antigos, a arte não tem como objetivo desfazer e refazer o mundo conforme a imaginação criadora, mas busca aperfeiçoá-lo e mostrá-lo em sua epifania. Conforme Platão, em A República (VII, p. 518-519): A educação é a arte (téchne) que consiste em fazer a alma voltar-se ao modo mais expedito a si mesma. Não se trata de lhe dar a faculdade de ver, que ela já possui (por natureza); somente seu órgão não está bem dirigido, não se volta para onde se deve voltar, e isto é o que cumpre corrigir.
Ainda conforme Platão, a arte tem como objetivo a contemplação, a substituição e a reprodução da natureza, e quando não corresponde a esta função deve ser eliminada. A mesma ideia de Platão é encontrada em São Tomás de Aquino, no De Magistro (2001, p. 34), obra que servirá de base à doutrina católica na educação e na pedagogia. Também para Rousseau em Emílio, a arte educativa deve imitar a natureza, desta forma, entende que o educador deve deixar a criança se desenvolver conforme o seu livre desenvolvimento natural. A prática educativa que fundamenta essa concepção concebe o educador não como um cientista, visto que seu objetivo não é conhecer o ser humano, mas agir e formar, no contexto especí �co de uma situação contingente, seres humanos concretos. O educador não pode ser considerado um técnico ou um artista, na acepção moderna desses termos, sua ação não se baseia num saber rigoroso sobre fenômenos necessários que precisam ser organizados num sistema de causas e efeitos, assim como a atividade criadora não impõe a uma matéria uma forma arbitrária, saída da imaginação do artista. Muito pelo contrário, o processo de formação visa o desenvolvimento de uma forma humana de vida que tem em si mesma sua própria �nalidade, noção que engloba, a um só tempo, os �ns naturais, sociais e individuais do ser humano. De acordo com Tardif (2002, p. 159), com esta concepção, associa-se a ação do educador à atividade do artesão, ou seja, à atividade de alguém que: 1) possui uma ideia, uma representação geral do objetivo que deseja atingir; 2) possui um conhecimento adquirido e concreto sobre o material com o qual trabalha; 3) age baseando-se na tradição e em receitas de efeito comprovado especí �cas à sua arte; 4) age �ando-se também em sua habilidade pessoal; e, �nalmente 5) age guiando-se por sua experiência, fonte de bons hábitos, isto é, de ‘maneiras-de-fazer’, de ‘truques’, de ‘maneiras de proceder’ comprovadas pelo tempo e pelos êxitos sucessivos.
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Assim, a educação como arte está ligada à ideia de que a ação educativa está relacionada a realidades contingentes e individuais, portanto, que não podem ser julgadas de maneira cienti�camente rigorosa e necessária. A ação do educador-artesão é orientada em função da representação de uma �nalidade. Para Tardif (2002, p. 160), O que distingue a arte do escultor da arte do educador é que o primeiro age sobre um ser, um composto de matéria e de forma, que não possui em si mesmo, mas recebe do artista, o princípio (a causa e a origem) de sua gênese, ao passo que o segundo age com e sobre um ser que possui, por natureza, um princípio de crescimento e de desenvolvimento que deve ser acompanhado e fomentado pela atividade educativa.
Entende-se, então, que a arte de educar corresponde a uma atividade racional que não se fundamenta num saber rigoroso, exige uma capacidade de julgamento em situações de ações contingentes. Esta ação é guiada por uma �nalidade que, para os gregos, residia na ideia de que a criança é um ser em processo e, portanto, inacabado, e que o acabamento de tal processo é o adulto. Assim, segundo os antigos, o objetivo da educação não é formar uma criança, mas um adulto. Aplicado na atualidade, essa concepção da educação como arte signi�ca que o professor, numa sala de aula, não possui uma ciência de sua própria ação, conquanto ele possa alimentar sua atividade com conhecimentos cientí �cos. Age guiando-se por certas �nalidades, desta maneira, sua prática corresponde a uma mistura de talento pessoal, de intuição, de experiência, de hábito, de bom senso e de habilidades. Para Tardif (2002), a arte de educar nessa perspectiva tem um triplo fundamento: �
ela tem um fundamento em si mesma; é o ato de ensinar que torna bom o trabalho do professor;
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tem seu fundamento na pessoa do educador, assim, é possível aprender a educar desde que o educador já possua a arte do ofício;
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tem seu fundamento na pessoa do educando, a qual se constitui a �nalidade interna, imanente da prática educativa.
Autonomia para aprender e para ensinar É essencial reconhecer que o ensinar e o aprender não são processos distintos, estes caminham juntos. Mais do que ensinar conteúdos, a ação do professor está atrelada a abrir caminhos. 94
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O desejo e a vontade atuam como diferenciais no processo, autorizando e fazendo uso de diferentes ferramentas oferecidas para que se tornem instrumentos na construção do conhecimento e se alcance o objetivo �nal. O professor sensível instiga, preserva a autonomia e a liberdade responsável, propiciando, assim, o diferencial no processo, isto é, a alegria da descoberta e a autoria do próprio conhecimento, trazendo, ao aluno, as garantias para o verdadeiro aprender. Ser educador denota um trabalho árduo com um grande objetivo a ser alcançado. Conforme Freire (1996), se o educador tem uma opção democrática, com autocrítica e procura diminuir a distância entre o discurso e a prática, ele “vive uma difícil, mas possível e prazerosa experiência de falar aos educandos e com eles”. Segundo Alves (2006), o educador tem a função e o poder de mudar o destino de seus alunos, desde que tenha consciência de sua responsabilidade. Quando ele aponta um mundo antes desconhecido, semeia sonhos, e esses sonhos transformam o mundo. Contudo, é preciso que nos livremos de alguns paradigmas. O professor continua sendo facilmente identi�cado porque tem aquela postura de soberano, e os estudantes continuam a esperar pelo professor, mas é preciso conquistar autonomia, pois somente assim teremos um desenvolvimento signi�cativo. Para aprender e ensinar na contemporaneidade, torna-se necessário criar e desenvolver modos de saber-fazer, fomentando recon�gurações de atos e pensamentos. Durante o processo de ensino e aprendizagem, diariamente precisamos construir novos campos de sentido, de ações, intervenções e modos de ser. Desde o início da trajetória histórica da humanidade, aprender e ensinar são processos essenciais para a construção do conhecimento, inúmeros são os desa�os emergentes do cotidiano das organizações que procuram validar o trabalho que desenvolvem. O conceito de autoria de pensamento, de acordo com Fernandéz (2001) favorece a compreensão sobre as dimensões da originalidade do pensamento de cada um, uma vez que cada ser humano é capaz de criar e recriar signi�cações para os diferentes contextos vivenciados. Também Alves (2006) aponta interessantes trajetórias, quando mesclando uma discussão fundamentada sobre valores humanos e as questões da autoria de pensamento, propondo uma ressigni�cação das ações educativas a partir do fomento ao desenvolvimento de processos de autoria de pensamento. 95
Pro�ssão Docente
Conforme Freire (1996), ensinar inexiste sem aprender e vice-versa, e foi aprendendo socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar. Aprender precedeu ensinar, ou em outras palavras, ensinar se diluía na experiência realmente fundante de aprender. Portanto, é necessário que o educando mantenha sua curiosidade sempre acesa para aprender, ou caso contrário não haverá troca. De acordo com Freire (1996), pudemos perceber que quem ensina, aprende ao ensinar e quem aprende, ensina ao aprender, assim o aprender precedeu o ensinar. É de suma importância que exista dentro de quem ensina, uma vontade de sempre aprender, acompanhada de vontade, garra, autonomia de pensamento, imaginação, entre outros, tudo devidamente dosado. Portanto, ensinar é preparar o caminho para a total autonomia de quem aprende, fazendo um cidadão consciente de seus deveres e direitos. A tarefa do professor refere-se à busca intensa tanto do conhecimento como do aprimoramento técnico, sem se descuidar do sentido humano, ou seja, levar em conta que o indivíduo aprendente deve ser tratado com tolerância, respeito, carinho e doação. É preciso, mesmo estando permanentemente rumando no sentido da construção da autonomia em outro ser, tratando com elementos sociais de sensibilidade individual pertinentes a outro indivíduo, que atue no sentido de um modelo-político-social que possa garantir sua subsistência e dignidade pro�ssional. Outro fator de extrema importância é que o professor, no ato de ensinar, deve ser coerente, ou seja, suas atitudes devem estar de acordo com seu discurso. Portanto, é preciso estar aberto para avaliar sua prática, bem como aos novos conhecimentos e novas técnicas, tomando o cuidado para não buscar receitas prontas, antes de tudo é preciso ser autônomo ao ensinar, só assim formar-se-ão alunos autônomos. O aluno é um indivíduo repleto de culturas e de saberes desenvolvidos fora da escola, que vem a ela em processo de formação, aberto a novas aprendizagens, considerando-se um ser inacabado, curioso, inteligente; sendo assim, o aluno merece todo o respeito e dignidade no ato de aprender. De acordo com Freire (1996), o professor jamais pode entender a educação como uma experiência fria em que os sentimentos, as emoções, os desejos, e os sonhos devam ser reprimidos. É preciso compreender que tanto os professores como os alunos são seres que possuem sonhos, emoções e desejos, ávidos por ensinar e aprender. 96
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Gerenciando e re �etindo o exercício da pro �ssão De acordo com Freire (1998, p. 24), “a re�exão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria/prática sem a qual a teoria pode virar um ‘blábláblá’ e a prática, ativismo”. Inúmeras discussões vêm sendo travadas acerca da necessidade da re�exão sobre o exercício da pro�ssão. Nóvoa (1995b), ao escrever sobre as dimensões pessoais e pro�ssionais dos professores, mostra que os estudos foram marcados por uma separação entre o eu pessoal e o eu pro�ssional. Em relação à questão da pro�ssão de professor, Sacristán (1995, p. 65) entende “por pro�ssionalidade a a�rmação do que é especí �co na ação docente, isto é, o conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que constituem a especi�cidade de ser professor”. Para Libâneo (1998, p. 90), pro�ssionalismo “signi�ca compromisso com um projeto político-democrático, participação na construção coletiva do projeto pedagógico, dedicação ao trabalho de ensinar a todos, domínio da matéria e dos métodos de ensino, respeito à cultura dos alunos, assiduidade, preparação de aulas etc.”. Assim, a perspectiva para defender a necessidade da re�exão do professor acerca da sua prática é a rejeição da racionalidade técnica, em favor de uma racionalidade dialógica. Atualmente há uma busca constante em romper com a tradição de que o professor em sala de aula não re�ete sua prática e não produz conhecimento, considerando que o conhecimento válido só poderia ser produzido na academia. Entende-se a necessidade de um resgate no que se refere às condições de trabalho, a formação inicial e continuada, para que possa ocorrer a pro�ssionalização, exigindo para tal, desa�os que devem ser enfrentados e que trazem os seguintes desdobramentos: �
elevação do nível de formação inicial e continuada, na perspectiva teórico-metodológica em que coloca o professor e o objeto da formação no centro do processo;
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implementação de uma política de valorização do magistério que assegure condições dignas de trabalho e uma política salarial uni�cada;
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Pro�ssão Docente �
criação de um código ou princípio ético ou ordem pro�ssional que associe conjuntamente pro�ssão, formação inicial e continuada, reconhecimento e pro�ssionalização.
Veri�ca-se que tais desdobramentos exigem posturas diferenciadas não apenas por parte dos sistemas de ensino, mas essencialmente do professor, ocorrendo uma constante preocupação com sua própria formação, o que consequentemente exige o repensar de sua prática a partir da consolidação da teoria, ou seja, a prática desenvolvida deve ser objeto de constante re�exão, considerando os vários fatores que interferem no processo de ensino-aprendizagem. Perrenoud (1999) a�rma que vem surgindo uma nova etapa de pro�ssionalização. Observando os diversos níveis do percurso escolar, podemos observar que os professores, em sua maioria, não se encontram mais presos à aplicação de metodologias, com uso de técnicas e truques, mas buscam a construção de processos didáticos orientados globalmente, porém adaptados à diversidade dos alunos, ao seu nível e às condições materiais e morais do trabalho.
Professor pesquisador e professor re �exivo Nos últimos anos, muitos estudos vêm sendo realizados no que diz respeito ao professor pesquisador e ao professor re�exivo, considerando que tais posturas se constituem em uma exigência e desa�o para este século de mudanças constantes. O conceito de professor re�exivo emerge inicialmente nos Estados Unidos, em oposição ao movimento que enfatizava a aprendizagem de técnicas, e considera que o racionalismo técnico passa a considerar o professor como um intelectual em contínuo processo de formação. Entre estes estudiosos destacamos Schön (apud NÓVOA, 1995b), que considera a re�exão como um ato solitário, já Zeichner (1997), a considera como um ato coletivo. De acordo com Alarcão (1996), Schön ( apud NÓVOA, 1995b) retomou as propostas de Dewey e sugeriu uma maneira nova de o professor desempenhar seu papel: enfrentando, de maneira pessoal, a multiplicidade de desa�os na medida em que estes se apresentassem, re� etindo continuamente sobre suas estratégias, reelaborando-as quando oportuno. Na Europa, Elliot desenvolveu teses parecidas, retomando a herança de Stenhouse e ampliando a ideia de professor pesquisador na sua prática docente (ELLIOT, 1986). 98
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Geraldi et al. (1998, p. 248) esclarece que Dewey “de�niu a ação re�exiva como uma ação que implica uma consideração ativa e cuidadosa daquilo que se acredita ou que se pratica, iluminada pelos motivos que a justi�cam e pelas consequências a que conduz” e que “a busca do professor re�exivo é a busca do equilíbrio entre a re�exão e a rotina, entre o ato e o pensamento”. A ação re�exiva envolve intuição, emoção e não é somente um conjunto de técnicas que podem ser ensinadas aos professores. Entende-se que a proposta de formação de professores, tendo em vista uma perspectiva de re�exão, exige que no período de formação o futuro docente tenha a possibilidade de experimentar e que esta experimentação se constitua em objeto de re�exão, e como tal, fonte de conhecimento. Entende-se que uma postura re�exiva do professor exige que este se torne um pesquisador, no sentido de pensar a sua prática, levando em conta os diversos fatores intervenientes, o que pode-se comprovar com as palavras de Libâneo (1998), quando esclarece que a tarefa de ensinar a pensar exige do professor o conhecimento de estratégias de ensino, bem como o desenvolvimento de competências de ensinar. O professor necessita, então, aprender a regular as suas próprias atividades de pensamento e, principalmente, “aprender a aprender”. As propostas desenvolvidas por Nóvoa (1995b), em relação ao professor re�exivo e pesquisador, analisando a proposta de Zeichner (1997), apontam para a importância da aceitação, por parte dos cursos de formação de professores da pesquisa-ação, de Tardif (2000), que sintetizou e descreveu os saberes pro�ssionais dos professores, quali�cando-os como temporais, plurais e heterogêneos e ainda, personalizados e situados. Finalmente, Perrenoud (1999), que focalizou o desenvolvimento das competências adquiridas pelos professores no exercício e na re�exão sobre sua prática como necessário para enfrentar os problemas da escola, abre uma perspectiva mais ampla sobre o tema. Considerando que o educador trabalha com realidades e situações adversas, o ensino re�exivo passa a ter relevância, visto que a re�exão intencional se faz extremamente necessária. É preciso que os professores re�itam sobre o seu ensino, aceitando a realidade de suas escolas, e principalmente concentrando esforços na busca de meios mais e �cientes para atingir seus objetivos e encontrar soluções para problemas decorrentes de seu cotidiano escolar. Alarcão (1996) ressalta que a re�exão realizada pelos professores não pode �car restrita à sala de aula, é preciso pensar o ensino além do contexto imediato, caso contrário haverá um reducionismo do conceito de ensino re�exivo. 99
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Freire (1996, p. 32) considera que “faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa”. No contexto de uma prática re �exiva crítica, ele chama a atenção para a importância do pro�ssional, como sujeito histórico-cultural, que produz uma prática pedagógica rica e signi�cativa e que considera valores como “amorosidade, respeito aos outros, tolerância, humildade, gosto pela alegria, gosto pela vida, abertura para o novo, disponibilidade à mudança, persistência na luta, recusa aos fatalismos, identi�cação com a esperança, abertura à justiça” (FREIRE, 1996, p. 36). Esses são importantes saberes, produtos de ações pedagógicas, cultivados no espírito democrático e não apenas saberes produzidos com ciência e técnica. Entende-se que o exercício da pesquisa deve estar associado à prática re�exiva, compreende o professor como pesquisador, reconhecendo nele a postura de produtor de conhecimentos sobre situações vividas em sua prática docente. Assim, a teoria é resultado da prática e se tornam abstrações efetuadas a partir dela. Geraldi et al. (1998, p. 249) recomenda que para optar pela perspectiva da formação do professor como aquele que re�ete e investiga a sua prática, torna-se necessário observar determinados pressupostos e implicações, a saber: �
a constituição de uma nova prática exige uma re �exão acerca da experiência de vida escolar do professor, suas crenças, seus posicionamentos, seus valores, suas imagens e, consequentemente, seus juízos pessoais;
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a formação docente precisa ser considerada como um processo que ocorre durante toda a carreira docente;
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o desenvolvimento do professor cabe a si mesmo;
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é essencial que o processo de re �exão ocorra no grupo, possibilitando o estabelecimento de uma relação dialógica;
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a re�exão dever ser alimentada pela contextualização sociopolítica e cultural.
Portanto, a experiência docente não pode ser vista como adjetivo de praticismo, e sim como parte do conhecimento desenvolvido na vida do professor, constituindo-se em um importante componente na construção de um pro�ssional pesquisador/re�exivo, desvelando a possibilidade de administrar situações adversas e imprevistas, e consequentemente possibilitando a mudança no contexto de uma determinada realidade. Entende-se assim que a formação de um professor pesquisador encontra-se ligada ao desejo de transformação e de reconstrução social. Assim, esta prática 100
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consiste em ser pensada de maneira contextualizada pautada em diversos segmentos educacionais e sociais. Dickel (1998, p. 41), argumenta: Reivindico a formação do professor-pesquisador como aquele pro�ssional que, ao optar pela luta (que é fundamentalmente) coletiva por alternativas viáveis e comprometidas com a especi�cidade e o valor do trabalho docente e com uma educação que fomente nas crianças a potencialidade de inventar e lançar as bases de um mundo diferente daquele anteriormente esboçado, seja capaz de se engajar na busca de uma pedagogia e de uma escola que consigam trabalhar nesse meio adverso.
Texto complementar A pesquisa e o professor como pesquisador (SILVA, 2008)
Mas, de onde vem o paradigma do professor como pesquisador? O que justi�ca a pesquisa ser tomada, nos dias de hoje, como uma proposta, de certa forma, “inovadora” para a formação de professores? [...] não seria a pesquisa, sua prática, sua incorporação no fazer docente, algo intrínseco à natureza do ser professor? A�nal, conseguiríamos tranquilamente conceber em nosso imaginário um professor que se limite às práticas de transmissão de conteúdos, alguém facilmente substituível, cuja utilidade se esgota diante da riqueza e da diversidade das novas tecnologias da comunicação e da informação? Sem dúvida alguma, quando nos situamos no contexto da cibercultura (RAMAL, 2002) em que vivemos, é impossível não reconhecer que estamos no âmago de um processo de reconceptualização tanto da escola enquanto instituição educativa nos novos tempos, quanto do professor, enquanto agente aprendiz e construtor do conhecimento, cuja identidade, ainda ligada a um modelo tradicional transmissor de conteúdos, é duramente criticada. Ramal ilustra bem esse novo contexto, quando diz que [...] o professor – se continuar agindo apenas como um bom transmissor de conteúdos, será substituído por softwares interativos, com maior capacidade de memória, que passem as informações com imagens coloridas, músicas e vídeos divertidos. O momento é, portanto, decisivo para que se redescubra o valor do espaço escolar e para que o per�l docente seja reinventado (2002, p. 15). 101
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O momento presente, portanto, exige do professor a atitude de busca, de construção do conhecimento, seja sob a égide da orientação dos organismos internacionais e do poder o�cial, como a do “aprender a conhecer” (DELORS, 2003), seja sob o reconhecimento decorrente da re�exão individual e coletiva dos próprios professores de que a docência implica mais que apenas ensinar, no sentido estrito do termo. Segundo Freire (1997, p. 32), para quem ensinar exige pesquisa, o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador. Com esse pensamento, Freire nos remete ao fato de que pesquisa e professor são intrínsecos, bem como à consciência de que a discussão atual sobre que tipo de pesquisa seja cabível ao professor, pode ser considerada um despropósito para com a docência. Como negar ao professor a perspectiva da produção do conhecimento sobre a prática educativa, independente de que esta prática seja ou não a sua? Como negar-lhe a possibilidade de, sendo docente, aprofundar uma re�exão sobre a natureza e as questões práticas, epistemológicas, �losó�cas e políticas envolvidas no fazer educativo? Dito de outro modo, como não contemplar no currículo de formação de professores, a pesquisa como eixo fundamental? Nas discussões atuais, o paradigma do professor pesquisador está muito associado ao de professor re�exivo, desde as proposições de Schön (1992, 2000), baseadas nas ideias de “conhecer na ação”, “re�exão na ação” e “re�exão sobre a re�exão na ação”. De acordo com Pimenta (2002, p. 20), é o movimento representado pela “re�exão sobre a re�exão na ação” que “abre perspectivas para a valorização da pesquisa na ação dos pro�ssionais, colocando as bases para o que se convencionou denominar o professor pesquisador de sua prática”. Note-se, no entanto, a que tipo de pesquisa se destina o professor na citação de Pimenta: à pesquisa de sua prática. Qual, então, a �nalidade dessa pesquisa que o professor deve realizar? A concepção de pesquisa na formação de professores, assumida sob a égide da epistemologia da prática , tem tomado a prática do professor como
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o principal referencial de produção de conhecimento a voltar-se para si mesma num movimento cíclico: a prática alimenta a produção do novo conhecimento que, por sua vez, deve realimentá-la de volta. Entretanto, que tipo de conhecimento se constrói sobre uma prática que é diretriz de si mesma, fonte e destino de sua própria evolução? Como a perspectiva da epistemologia da prática pode fazer com que essa prática transcenda a si mesma numa dimensão teleológica? Moraes e Torriglia (2003), ao discutirem a con�guração contextual desse novo paradigma de formação de professores (professor pesquisador-re�exivo), evidencia o risco das práticas centradas em si mesmas, circunscritas somente ao espaço escolar. Nesse contexto em que se situa a epistemologia da prática, há o que Moraes (2003) denomina de “recuo da teoria” na produção de “conhecimento”. Para Moraes e Torriglia (2003), as práticas de formação de professores, embora possam e devam estar diretamente articuladas às vivências da docência, carecem da fundamentação das teorias pedagógico/educacionais em estreito diálogo com as ciências sociais e humanas. Em suas palavras: [...] se com frequência é preciso priorizar a experiência docente cotidiana – pois em tantos momentos se faz necessária a intervenção sob a pressão do tempo, sob o risco de perder oportunidades únicas –, isso não signi�ca que a teoria abandone seu lugar catalisador. Ao contrário, o fato de estarmos cuidando da prática, de seu movimento cotidiano, de suas múltiplas epidermes, implica estarmos atentos à sua gênese, seus con �itos e contradições, os quais não encontram inteligibilidade exclusivamente nos limites dos muros escolares. A relação entre o que se passa na escola e o mundo que a transcende é inerente ao processo educativo, faz parte de seu ethos. (p. 48)
Esta questão é preocupante, principalmente, porque não é possível dizer que, no paradigma de professor pesquisador re�exivo que se vem construindo exista uma preocupação em que esse novo ator re�ita sobre sua ação in�uenciada por fatores culturais, sociopolíticos e ideológicos, tampouco que busque orientar sua própria prática em função de uma postura crítica diante desses fatores. No bojo da epistemologia da prática está a crítica ao intelectualismo acadêmico – que distancia a universidade dos processos reais que ocorrem na escola e na prática educativa – enredada no discurso da pro�ssionalização, mas, ao mesmo tempo, está o que Shiroma (2003) vem denunciar como um processo de “desintelectualização” do professor, rati�cado pelas políticas de reforma educacional. 103
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Para esta autora, [...] mesmo que o professor apresentasse maior autonomia de ação, as opções dentro do espaço de trabalho, o aumento da �exibilidade funcional e sua transformação em expert iriam colocá-lo em di�culdade para compreender que as soluções para os problemas não advêm apenas da re �exão sobre sua prática, especialmente quando enclausurada no espaço da sala de aula ou limitada pelos muros escolares. Isto é, a re �exão sobre a prática é necessária, porém insu �ciente. A insistência dos reformadores sobre o primado da prática, das competências, da pesquisa para produzir conhecimento útil e resolução de problemas revela a concepção funcionalista que norteia esta política. (SHIROMA, 2003, p. 76-77)
Assim, há que se reconhecer, por um lado, a crítica ao intelectualismo acadêmico, haja vista que, de fato, a universidade e os cursos de formação pro�ssional em educação não podem discutir as práticas educativas nem tentar apreender a complexidade de seus processos se deles não se aproxima, se com seus sujeitos não dialoga. Por outro lado, vale destacar mais uma vez o pensamento de Moraes e Torriglia (2003, p. 57), quando defendem que “as categorias ‘produção de conhecimento’ e ‘pesquisa’ não se prendem ao campo do imediato”, justi�cando que somente a atividade experimental não é su�ciente para fazer compreender a experiência, “uma vez que é preciso considerar o caráter estruturado dos objetos e do mundo”.
Atividades 1. Evidencie com suas próprias palavras o que você entende por educação
como arte.
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2. Comente os pressupostos que devem ser observados, quando se opta pela
formação do pro�ssional re�exivo.
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3. “Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa”.
Freire, no contexto de uma prática re�exiva crítica, chama a atenção para a importância do pro�ssional, como sujeito histórico-cultural, que produz uma prática pedagógica rica e signi�cativa e que considera valores como “amorosidade, respeito aos outros, tolerância, humildade, gosto pela alegria, gosto pela vida, abertura para o novo, disponibilidade à mudança, persistência na luta, recusa aos fatalismos, identi�cação com a esperança, abertura à justiça” (FREIRE, 1996, p. 32). Comente a a�rmação relacionando-a às principais características abordadas no texto no que se refere ao professor re�exivo.
Dica de estudo Pedagogia da Autonomia é um livro pequeno �sicamente falando, mas gigan-
te em esperança e otimismo, que condena as mentalidades fatalistas e conformistas com a ideologia imobilizante de que a realidade é assim mesmo e pronto. Freire nos mostra, não apenas nesta sua obra, mas em todas as outras, o comprometimento que tem com a verdade e com a criticidade que lhe é peculiar. Sem deixar de lado, por nenhum momento, o seu espaço humano e humanizador, deixa-nos à vontade para ver como somos incompletos e que não estamos sós, abre espaço para a nossa re�exão e nos posiciona entre a teoria e a prática, na medida certa do humano e cientí �co. 106
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O professor iniciante Rosângela Maria Stahlschmidt Nesta aula, abordaremos o que chamamos de choque de realidade , ou seja, o momento em que o professor se depara com a realidade diversa da sala de aula, em que inúmeras condições parecem não condizer com o que foi estudado na academia; o período de transição de estudantes para professores, bem como a forma como ocorrem as estratégias de socialização e os simbolismos presentes que farão parte da formação da identidade do pro�ssional. Inúmeros teóricos defendem a ideia de que é no início do exercício da pro�ssão que se consolida o processo de tornar-se professor, portanto, o aprendizado ocorre a partir de seu exercício. Esta construção ocorre à medida que o professor torna efetiva a articulação entre o conhecimento teórico-acadêmico, a cultura escolar e a re�exão sobre a prática docente.
Choque de realidade A entrada no mundo do trabalho constitui uma etapa marcante na vida de qualquer pessoa, considerando que encerra um conjunto diversi�cado de experiências e de aprendizagens. Esta etapa se constitui em um período vivido com emoção e entusiasmo, mas também com alguma apreensão e ansiedade dadas as novas responsabilidades assumidas pelos docentes. Conforme Garcia (1995), o conceito de choque de realidade foi popularizado a partir dos estudos de Simon Veeman, referindo-se à situação pela qual passam inúmeros professores no seu primeiro ano de docência. De acordo com Borko (apud Garcia, 1995), a fase em que ocorre o que chamamos de choque de realidade acontece no período dos primeiros anos de docência, constituindo-se em um tempo de tensões e aprendizagens intensivas em que os professores iniciantes precisam, além de conseguir conhecimentos pro�ssionais, manter certo equilíbrio pessoal. Trata-se de uma etapa em que se questionam os conhecimentos teóricos adquiridos, pois os professores iniciantes se dão conta de que as receitas
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não surtem os efeitos desejados, considerando a multiplicidade de fatores que entram em jogo, ou seja, a prática parece não corresponder ao conhecimento teórico adquirido no processo de formação inicial. Também Esteves (1995) considera que o professor passa por um “choque de realidade” ao enfrentar a situação da escola, na atualidade, pela distância muito grande que há entre as condições ideais de realização pro�ssional e as condições reais de desempenho do trabalho docente, provocando muitas vezes o desencanto com a pro�ssão. Sentem-se incapazes e impotentes para enfrentar os desa�os da realidade da sala de aula e da escola, que lhes são impostos, e sem ânimo para acatar as mudanças necessárias. Desta maneira, o que se propõe é que os cursos de formação de professores assumam juntamente com outras instâncias educativas, o planejamento e o desenvolvimento de programas de iniciação à prática pro�ssional. Entende-se assim que durante o período de formação inicial, torna-se necessário que as instituições busquem para seus futuros pro�ssionais da educação, períodos de confrontação com a realidade que vão além do estágio supervisionado. Conforme Tisher (apud GARCIA, 1995, p. 66) tais programas deveriam esforçar-se por: �
desenvolver o conhecimento do professor relativamente à escola e ao sistema educativo;
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incrementar a consciência e compreensão do professor principiante relativamente à complexidade das situações de ensino e sugerir alternativas para as enfrentar;
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proporcionar aos professores principiantes serviços de apoio e recursos dentro das escolas;
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ajudar os professores principiantes a aplicar o conhecimento que já possuem ou que podem obter por si próprios.
Conforme as sugestões de Tisher, acredita-se que os cursos de formação de professores deveriam ter, além das disciplinas de prática de ensino, professores capazes de conduzir os futuros professores de forma segura, para que tornem-se capazes de enfrentar a realidade tal como se apresenta, com base em fundamentos teóricos, mas também fazendo-os reconhecer a necessidade da re�exão como eixo do trabalho docente.
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Gómez (1995) sugere que o professor que dará o suporte aos professores iniciantes, deverá ter larga experiência docente, possuir uma teoria-prática coerentes, explícita e relevante, constituindo sua prática como base para a tomada de decisões e da atuação docente. Ao se deparar com a realidade, os professores iniciantes compreendem que a pro�ssão docente não é mero campo de aplicação da investigação cientí �ca. A partir deste contato com a realidade, percebe que sua competência exige ir além dos conhecimentos cientí �cos, envolve um saber-fazer que precisa ser construído individualmente pelos sujeitos, que este saber-fazer necessita estar articulado da forma mais produtiva possível; ou seja, conhecimentos cientí �cos com os conhecimentos intuitivos, capacitando-os mediante a re�exão ao enfrentamento de con�itos e de contradições inter e intrapessoais. Trata-se, portanto, de competências teórico-práticas interdependentes e inseparáveis, que são decorrentes do uso de esquemas de ação, que incluem tomadas de decisão, avaliação, julgamento, planejamento, comunicação, os quais estão por trás da maioria de nossas operações mentais e ações. De acordo com Sacristán (1995, p. 76), “é preciso considerar a prática educativa como prática histórica e social que não se constrói a partir do conhecimento cientí �co como se tratasse de uma aplicação tecnológica.” A compreensão da interdependência teórico-prática exige do professor iniciante uma postura re�exiva, a �m de que a partir desta, possa agir com mais segurança e consequentemente fará com que se sinta mais livre de subsídios teóricos. É importante ressaltar que tal constatação não nega a importância da contribuição teórica para a prática, no entanto, assevera que entre teoria e prática, entre conhecimento e ação, em educação, as relações são recíprocas, dispersas e não-diretas. Perrenoud (1993) a�rma que as representações cientí �cas são uma parte das representações dos professores e que desempenham um papel estéril se não forem capazes de mobilizar os esquemas de ação. Acreditamos que a prática possibilita ao professor uma apropriação de seu saber e seu fazer à medida que busca ir além das demandas imediatas do dia-a-dia para alcançar a práxis, ou seja, uma prática pensada e re�etida. Huberman (1992) traça uma descrição de tendências, em seus estudos sobre o desenvolvimento da carreira docente, permitindo a identi �cação do 111
Pro�ssão Docente
que caracteriza como “o ciclo de vida dos professores”. Conforme este estudo, o professor passa por uma fase de “sobrevivência” e “descoberta” ao iniciar seu percurso pro�ssional. Isso possibilita o confronto com o novo e a exploração de possibilidades de ação, avançando, gradativamente, para uma fase de “estabilização”, em que começa a tomar uma maior consciência do seu papel e responsabilidade, enquanto educador. Este ciclo não se constitui em etapas �xas, mas sim num processo dinâmico e bem peculiar ao percurso pessoal de cada professor. De acordo com Zabalza (1994), o conjunto de situações problemáticas que podem se apresentar ao professor, na sua atividade pro�ssional, identi�ca dois aspectos que considera importantes: a identi�cação de situações dialéticas e/ou con�itantes que se produzem nas situações didáticas e o rompimento da ideia da linearidade da conexão pensamento-ação. Caetano (1997, p. 218) ressalta que “os dilemas são fenômenos potenciais sobre os quais deve se centrar a formação dos professores, utilizando-os como ponto de partida nos processos de investigação sobre a ação e consequentemente dos saberes constituídos pelo professor nesse entremeio.” De acordo com a autora, a resolução dos con �itos vividos pelo professor não é fácil, nem sempre é possível, mas acima de tudo, é importante que seja fonte de inquietação, que a partir do processo de re�exão, poderá vir a se constituir a origem da mudança. É comum observar-se que aos professores iniciantes parecem ser dadas as turmas mais difíceis. Tal realidade também é apontada em outras pesquisas que focalizam o professor iniciante, considerando como os piores anos do exercício pro�ssional o início e o �nal da carreira. Veenman, conforme discussão de Guarnieri (1996), a�rma que um dos fatores que contribuem para o “choque de realidade” em professores iniciantes é o fato de serem alocados para as classes difíceis. Pesquisas realizadas por Lüdke e Mediano (1992) con�rmam que professores iniciantes atribuem a si próprios as di�culdades do processo. Nenhum deles diz que “as crianças não aprendiam” ou “com aquelas crianças não tinha jeito”, como é comum ouvirmos atualmente de grande número de docentes experientes, ao se referirem às crianças de camadas populares. Conforme Kuzmic (apud FREITAS, 2002), esta forma de enfrentamento dos problemas, por parte do professor iniciante, como responsabilidade apenas sua, se constitui em uma di�culdade desse professor perceber os constrangimentos
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O professor iniciante
institucionais que se re�etem em seu trabalho. Por outro lado essa postura pode ser analisada como um fator que contribui para a sua socialização pro�ssional, fazendo com que este lute com todas as suas forças para superar as di�culdades encontradas em sua prática, mobilizando estratégias para conseguir realizar um trabalho melhor e, desta forma buscando minimizar sua culpa. Eddy (apud TARDIF, 2002, p. 82-83), realizou através de seus estudos uma descrição do início de carreira que se tornou clássica, distinguindo três fases ou etapas desse processo: A primeira fase, na transição do idealismo para a realidade, é marcada pela reunião formal de orientação que ocorre vários dias antes do início do ano letivo. Na segunda fase o grupo informal de professores inicia os novatos na cultura e no folclore da escola. Diz-se claramente aos novatos que devem interiorizar esse sistema de normas. Os novatos são também inteirados a respeito do sistema informal de hierarquia entre professores. Embora não sendo reconhecido pela administração, esse grupo, em particular aqueles que estão no topo dessa hierarquia, exerce uma profunda in �uência sobre o funcionamento cotidiano da escola. Os novos professores, principalmente os mais jovens, compreendem rapidamente que estão na parte mais baixa da hierarquia, sujeitos ao controle de diversos subgrupos acima deles. Em contato com esses grupos, eles �cam por dentro de elementos como a roupa apropriada, assuntos aceitáveis nas conversas e qual o comportamento adequado. Essas regras informais, que tratam essencialmente de assuntos não acadêmicos, representam um segundo choque com a realidade para os novos professores. É na famosa sala dos professores que essas normas são inculcadas e mantidas. A terceira fase está ligada à descoberta dos alunos reais pelos professores. Os alunos não correspondem à imagem esperada.
De acordo com Huberman, Vonk, Ryan et al. (apud TARDIF, 2002), os primeiros sete anos de pro�ssão docente se constituem em um período realmente importante da história pro�ssional do professor, determinando inclusive seu futuro e sua relação com o trabalho. Segundo Zeichner e Gore (apud TARDIF, 2002), duas fases ocorrem durante os primeiros anos de carreira. �
Fase de exploração (de um a três anos), trata-se da fase em que o professor escolhe provisoriamente a sua pro�ssão, inicia-se através de tentativas e erros, sente necessidade de ser aceito por seu círculo pro �ssional e para tal experimenta diferentes papéis. Durante esta fase, muitos acabam abandonando a pro�ssão dado o choque com a realidade. De acordo com Veenman (apud TARDIF, 2002, p. 83):
Na verdade, o choque com o real se refere à assimilação de uma realidade complexa que se apresenta incessantemente diante do novo professor, todos os dias que Deus dá. Essa realidade deve ser constantemente dominada, particularmente no momento em que se está começando a assumir suas funções no ensino.
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Fase de estabilização e consolidação, caracteriza-se pelo investimento a longo prazo na sua pro�ssão e os demais membros da instituição reconhecem suas capacidades. Período em que ocorre uma con�ança maior do professor em si mesmo e pelo domínio dos diversos aspectos do trabalho, especialmente os pedagógicos, o que se manifesta através de um melhor equilíbrio pro�ssional, de um interesse maior pelos problemas de aprendizagem dos alunos, ou seja, o professor está menos centrado em si mesmo e na matéria e mais em seus alunos.
É importante ressaltar que a estabilização e consolidação não ocorrem naturalmente, decorrentes do tempo cronológico decorrido desde o início da carreira, mas em função também dos acontecimentos constitutivos que marcam a trajetória pro�ssional, inclusive as condições de exercício da pro�ssão.
Estratégias de socialização O mundo contemporâneo vem sendo marcado por inúmeras mudanças e diversos processos, e estudos realizados sobre educação apontam na direção de que se impõe à escola a rede�nição do compromisso social e pedagógico, exigindo por parte do professor uma re�exão acerca das opções teóricas a �m de que possa de�nir novas estratégias à sua ação. As mudanças decorrentes do mundo contemporâneo exigem que os professores assumam um novo posicionamento. Nóvoa (1995b) assegura que este precisa ter uma consciência crítica do processo pedagógico de forma ampla e abrangente, não se restringindo apenas às di�culdades especí �cas do cotidiano, mas estabelecendo uma relação dialógica com os seus colegas. As instituições educacionais brasileiras têm sido marcadas por uma busca de quali�cação, decorrentes das intensas exigências sociais e legais apontadas relativas ao exercício da função docente. Uma grande preocupação que vem sendo apontada é a socialização do professor. Investigações desta perspectiva apontam que as principais in�uências, que atuam junto aos professores em seu processo de socialização, atuam por meio de indivíduos. Considera-se que os primeiros anos na carreira docente constituem-se em um período muito signi�cativo, pois é a partir da vivência deste período que o professor vai consolidando suas práticas, tendo extrema importância a socialização, à 114
O professor iniciante
medida que vai tomando consciência dos simbolismos presentes na escola, que parece ir assumindo uma postura mais con�ante dos con�itos que são inerentes ao processo didático. Considerando que a socialização trata-se de um processo de interação entre os membros de um grupo de uma determinada cultura, valores e crenças, é preciso ressaltar que estas vão sendo alteradas ou não a partir de experiências vividas pelos sujeitos. A partir disto, pode-se dizer que cada professor compartilha de uma cultura docente com a qual interage constantemente sendo esta constituída de valores, de con�itos e tensões. No entanto, a maneira com a qual ele irá se relacionar vai depender das disposições que foram sendo adquiridas por ele no decorrer de sua trajetória, pois, de acordo com Bordieu (1998), é preciso compreender que a cultura não se trata apenas de um código comum, nem mesmo um repertório comum de respostas e problemas recorrentes. A cultura constitui um conjunto comum de esquemas fundamentais, puramente assimilados, e a partir dos quais se articula, segundo uma “arte da invenção” análoga à da escrita musical, uma in�nidade de esquemas particulares, diretamente aplicados a situações particulares. A relação que um indivíduo mantém com sua cultura depende, fundamentalmente, das condições nas quais ele a adquiriu, visto que o ato de transmissão cultural é, enquanto tal, a atualização exemplar de um certo tipo de relação com a cultura. Bordieu (1998) salienta ainda que o processo de socialização não ocorre de forma linear, somente através da incorporação dos valores do grupo de pertencimento, nem o agente socializado é objeto passivo das condições socializadoras. Ou seja, os professores manifestam diferentes maneiras de pensar, assim como apresentam diferentes reações mediante situações vivenciadas, decorrentes das condições de existência vivenciadas, isto é, do habitus de cada um, revelando um terreno fértil para se investigar como ocorre esse processo. Para Bourdieu (1998, p. 53-54), habitus é um sistema de disposições duráveis, ou seja, trata-se de um conjunto de tendências e comportamentos que vão sendo adquiridos pelo indivíduo através de experiências práticas e das condições materiais de existência que são os preceitos, os conceitos, as preocupações produzidas primeiramente nas relações familiares e, posteriormente, nas demais agências de socialização com as quais ele irá se deparar no decorrer de sua vida, tais como a escola, clubes, igreja, vida pro�ssional etc. Tais disposições é que orientam as atitudes, as opções, as ações do indivíduo em seu agir cotidiano que poderão se manifestar ora de forma consciente, ora inconsciente e constantemente em reformulação. 115
Pro�ssão Docente
A socialização pro�ssional ocorre na articulação entre o agente em socialização e o meio pro�ssional no qual o professor está inserido, portanto, se faz necessário compreender tanto as estratégias e interações dos agentes quanto o espaço em que ocorre o processo. O processo de socialização pro�ssional constitui-se na aprendizagem dos valores, crenças e formas de concepção do mundo, próprios de uma determinada cultura ocupacional. Tal processo é identi �cado através da aquisição de um ethos pro�ssional, tácito, que muitas vezes não se encontra expresso em palavras, atribuindo ao agente da socialização o sentido do jogo, oferecendo-lhe as condições necessárias para discriminar como deve se portar e atuar, qual o grau de tolerância do grupo pro�ssional para com as diferenças e divergências, que expectativas pro�ssionais pode alimentar, que questões podem ser explicitadas, quando, como e a quem se dirigir, o que deve ser valorizado e o que deve ser esquecido ou, pelo menos, não problematizado explicitamente. A construção gradual de sua identidade pro�ssional advém da tomada de consciência em relação aos diferentes elementos que fundamentam a pro�ssão e sua integração na situação de trabalho e leva à construção gradual de uma identidade pro�ssional (TARDIF, 2002).
Texto complementar O professor iniciante e os programas de iniciação à docência (FERREIRA; REALI, 2008)
No âmbito da formação continuada são diversos os investimentos na melhoria da atuação docente. Um grande número de programas e projetos tem se voltado para esse espaço formativo, pautando-se na ideia do professor como sujeito aprendente e ativo na consolidação de sua própria aprendizagem, e pelo entendimento do ensino como uma prática re�exiva não espontaneísta e automática. Uma das características desses modelos tem sido “dar a voz” aos professores e oferecer condições para que possam construir adequadamente seu 116
O professor iniciante
conhecimento pro�ssional. Nesses casos, os professores não são mais vistos como meros executores de políticas públicas/propostas pedagógicas idealizadas por terceiros; seus saberes e o dia-a-dia pro�ssional são levados em conta e as motivações dos professores não são vistas de maneira homogênea, levando em conta os diferentes ciclos de vida pro�ssional e as necessidades formativas que deles advêm. Considerando tais enfoques formativos e relacionando-os aos ciclos pro�ssionais, o início da carreira apresenta peculiaridades interessantes que se destacam pelos dilemas e di�culdades vividas pelo professor iniciante. Alguns autores identi�cam esse período denominando-o de “choque com a realidade” (VEENMAN, 1984; SILVA, 1997). O professor iniciante geralmente está inseguro e ansioso pela situação nova que vai viver; é absorvido pelas inúmeras informações que lhe chegam, a visualização da escola e a relação com os alunos; enfrenta o contato com os outros docentes; tem que dar conta de questões burocráticas da sala de aula como preencher o diário de classe ou ainda planejar sua aula; dentre outras tantas tarefas. Além do enfrentamento da nova situação pro�ssional, os professores que iniciam a carreira geralmente recebem as salas mais complicadas; ressentem-se da falta de colaboração e apoio por parte dos professores mais experientes da escola; passam por um aumento do estresse no primeiro ano de docência; são cobrados, por parte da escola, com as mesmas exigências que os professores mais antigos; têm pouco apoio do ensino superior nessa fase de transição de aluno para recém-professor (GUARNIERI, 1996; FONTANA, 2000; FREITAS, 2002). Em virtude dessas di�culdades, a necessidade da oferta de programas de iniciação para professores principiantes tem sido apontada como uma estratégia adequada para minimizar os problemas por eles enfrentados (MARCELO-GARCIA, 1999; FEIMAN-NEMSER, 2001; WANG; ODELL, 2002). Os programas de iniciação à docência, também denominados programas de indução, são aqueles voltados para os professores nas suas primeiras inserções pro�ssionais. Têm como objetivo auxiliar o ingresso na pro�ssão de um modo menos traumático, tendo em vista o conjunto de demandas que recaem sobre os pro�ssionais iniciantes e que exigem mudanças pessoais, conceituais e pro�ssionais. No geral, esses programas oferecem apoio e orientação, na perspectiva de promover a aprendizagem e o desenvolvimento da
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base de conhecimento pro�ssional e auxiliar na socialização com a cultura escolar desses pro�ssionais. Segundo Tetzlaff e Wagstaff (1999) esses programas balizam-se pela concepção de que a formação docente ocorre em um continuum e que a fase inicial da carreira do professor apresenta necessidades especí �cas. São importantes na medida em que podem proporcionar uma assessoria aos docentes iniciantes, possibilitando a construção de uma rede de apoio e um elo entre a formação inicial e o desenvolvimento pro�ssional ao longo da carreira. No Brasil não há uma tradição de programas formativos dessa natureza, o que justi�ca a realização de investigações sobre os motivos da reduzida utilização de tal prática, bem como elementos que permitam melhor compreender este tipo de iniciativa e sua inserção no contexto brasileiro. Dentre as inúmeras estratégias formativas adotadas, uma que ganha destaque nesses programas refere-se ao apoio e assessoria realizada por professores mentores/tutores aos professores nas fases iniciais de suas carreiras. Segundo Hulling-Austin (apud MARCELO-GARCIA, 1999, p. 120-121) nos programas de iniciação à docência a �gura de um mentor/tutor tem o importante papel de se caracterizar como “ professor de apoio (algumas vezes chamado de professor mentor, professor colega, ou o colega do professor)” para o docente que está começando a sua atuação pro�ssional. E complementa: Os professores principiantes que durante o seu primeiro ano de trabalho como docentes contam com a colaboração de um professor mentor apresentam atitudes e percepções signi�cativamente mais saudáveis em relação ao que os outros que não dispõem desta possibilidade de apoio pessoal.
O termo saudável, destacado pela autora, envolve o desenvolvimento de novas competências, bem-estar pessoal e pro�ssional e a socialização exitosa dos professores em suas respectivas culturas escolares e o não abandono do ensino. As nomenclaturas mentor/tutor, embora apresentem signi�cados comuns, possuem origens distintas; mentor advém da cultura britânica e norte-americana, e tutor da espanhola. Nesse estudo se fará uso do termo mentor, considerando a de�nição da língua portuguesa que se mostra mais adequada que o termo tutor. Segundo Ferreira (1988, p. 428) mentor é “pessoa que guia, ensina ou aconselha outra; guia, mestre, conselheiro”. [...]
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O professor iniciante
Atividades 1. Analise a trajetória pro�ssional e conceitue o que signi�ca o “choque de rea-
lidade”.
2. De acordo com Tardif (2002), explique as duas fases pelas quais o docente
passa em seu período de pro�ssionalização.
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Pro�ssão Docente
3. Como ocorre a socialização do pro�ssional de educação e quais são as estra-
tégias mais comuns durante o período inicial?
Dica de estudo ALMEIDA, Jane S. de. (Org.). O professor seus saberes e sua identidade. In: _____. Estudos sobre a Pro�ssão Docente. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2001. O capítulo sugerido aborda o processo de como ocorre a construção dos saberes do professor, a trajetória de sua caminhada pro�ssional, bem como os fatores intervenientes na construção de sua identidade, possibilitando a consolidação dos conhecimentos desta aula. 120
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Competências para ensinar Rosângela Maria Stahlschmidt Nesta aula será abordada a função da universidade enquanto difusora do conhecimento e das competências, apresentando a pesquisa entendida como meio de compreensão e intervenção na realidade, considerando que se constitui em atividade essencial para a formação do cidadão.
A universidade como centro de excelência A universidade, conforme se pode observar pelo próprio nome, pressupõe a universalidade de conhecimentos. A ideia de universidade está acompanhada da ideia de multidisciplinaridade, tornando-se claro que, para criar uma nova universidade, deve ser contemplada a atuação de diversas áreas do conhecimento cientí �co. Sendo assim, a universidade atua em três frentes: o ensino, a pesquisa e a extensão universitária. O ensino tem como objetivo a formação pro�ssional, técnica e cientí �ca. A pesquisa consiste na base para a busca e descoberta do conhecimento cientí�co. É através desta que a universidade desenvolve a ciência em busca do conhecimento da realidade. Tão importante quanto as demais frentes, tem-se a extensão universitária, que se materializa na prestação de serviços à sociedade e na integração com a mesma. Enquanto centros de investigação, promoção e difusão da ciência e da cultura, as universidades têm a responsabilidade de analisar problemas sociais, tendo em vista a mobilização do conhecimento existente, identi�cando alternativas e propondo soluções. O ponto básico para transformar a universidade em centro cultural 1 por excelência consiste em transformar o saber em sabedoria, reencontrando a vida cultural, fazê-la reintegrar-se no dia-a-dia. Pode-se dizer que universidade é um centro cultural por excelência, pois ela encerra formalmente o processo 1
A cultura pode ser entendida como o esforço humano para dominar a natureza, transformá-la pela criação e subordiná-la aos �ns da pessoa humana.
Pro�ssão Docente
educacional e inicia o pensar sobre o mundo, e recomenda-se que deve ter uma atividade criadora na qual a pesquisa deve envolver toda a instituição universitária. Conforme Faure, a educação no mundo contemporâneo deve suprir a formação do homem completo, deixando para trás os conhecimentos tidos como de�nitivos, pois estes já não são su�cientes, necessitando um preparo para elaborar, ao longo de toda a vida, um saber em constante evolução e de aprender a ser, ou seja, “é preciso que o novo homem seja capaz de compreender as consequências globais dos comportamentos individuais, de conceber as prioridades e de assumir as formas de solidariedade que constituem o destino da espécie” (FAURE, 1973, p. 32). A universidade ocupa uma posição fundamental na dinâmica dos processos de inovação tecnológica, de produção e difusão da ciência e da cultura, bem como desempenha um papel estratégico no desenvolvimento socioeconômico do país. Assim, a tarefa de quali�car os recursos humanos é uma peça chave para a modernização da sociedade e fator relevante na melhoria da Educação Básica. É oportuno assinalar que os diversos sistemas de educação superior, existentes em países que ocupam uma posição destacada no processo de desenvolvimento socioeconômico, apresentam uma forte diversidade institucional e desempenham uma pluralidade de funções na formação acadêmico-pro�ssional.
Os saberes didáticos e a ciência da educação Entende-se que muitos são os saberes didáticos a serem desenvolvidos a �m de que os professores adquiram uma formação consistente. Assim, as universidades, enquanto disseminadoras do saber, para que possam oportunizar estratégias e�cazes, precisam identi�car determinadas necessidades, que segundo Hewton (apud Garcia, 1985) são:
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necessidades relativas aos alunos – necessidades de aprendizagens, tratamento da diversidade, problemas de disciplina, rendimento, motivação;
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necessidades relativas ao currículo – o desenvolvimento dos novos planos curriculares implica a necessidade de aperfeiçoamento pro�ssional dos professores, novos estilos de ensino, de apresentação da informação, de comunicação, de avaliação, de de�nição dos objetivos;
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necessidades dos professores – são voltadas mais para a abordagem dos professores enquanto pro�ssionais e como pessoas, do que ao ensino propriamente dito;
Competências para ensinar �
necessidades da escola/instituto enquanto organização – necessidades da globalização da instituição, do currículo, dos alunos (formas de agrupamento), da organização e dos professores (papéis e responsabilidade, comunicação entre professores, do clima interno, das relações com o exterior).
Cumpre ressaltar que nenhuma competência será desenvolvida nos docentes, se não estiver alicerçada em um contexto real, assim, seja qual for o programa de formação inicial ou continuada, deverá estar pautado nas di�culdades a serem encontradas na prática pedagógica. Considerando a atual conjuntura educacional das escolas de ensino básico, é preciso admitir que a formação de docentes apresenta graves de�ciências, mostrando-se precária e fragilizada, tornando-se ainda mais grave em escolas públicas, onde o professor parece não estar preparado para atender alunos advindos das mais variadas situações socioeconômicas e culturais. De acordo com Lara, Mosquera e Ramos (1998), um professor não se faz de repente, para tornar-se um verdadeiro professor, faz-se necessário um processo de formação pro�ssional que lhe proporcione uma vasta liberdade de escolhas, atuação consciente e comprometimento social, fundamentado em valores que o levarão a desenvolver uma ação competente, crítica, transformadora e interativa. Conforme Apple (1996), o ofício de ensinar exige a descoberta contínua, a incorporação e a aplicação de novas e mais e�cientes habilidades e conhecimentos sobre o desenvolvimento e aprendizagem do aluno. Portanto, é essencial o entendimento de que ensinar não representa o ato de reprodução do conhecimento historicamente acumulado, mas sim um contínuo processo de construção e reconstrução do conhecimento. Portanto, existem teóricos que enfatizam que para ensinar é preciso ter competência técnica, enquanto outros valorizam mais a competência política ou pessoal, no entanto, acreditamos que todas são fundamentais para ensinar. Perrenoud (2002) a�rma ainda que, para ser um bom professor não signi�ca apenas a capacidade de transferir conhecimento, é necessário ter uma postura re�exiva, ter a capacidade de observar, de regular, de inovar, de aprender com outros, apresentando assim dez dimensões de competências que devem ser desenvolvidas no professor, por meio da formação inicial e contínua, a saber: organizar e dirigir situações de aprendizagem; administrar e dirigir a progressão das aprendizagens; conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação; envolver alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho; trabalhar em equipe; 125
Pro�ssão Docente
participar da administração da escola; informar e envolver os pais; utilizar novas tecnologias; enfrentar os deveres e os dilemas éticos da pro �ssão; administrar sua própria formação contínua. É importante observar que as competências técnica, política e pessoal isoladas, não fazem de um docente um bom professor, entende-se que estas estão intimamente ligadas, pois no processo de ensino-aprendizagem todas elas precisam ser mobilizadas para que o ensino ocorra de forma e�caz. Kuenzer (1998) assevera que o professor deve também ter a capacidade de transformar teoria pedagógica em prática pedagógica escolar. Para tal, precisa fazer a articulação entre a escola e o mundo das relações sociais e produtivas, utilizando procedimentos metodológicos apoiados em bases epistemológicas adequadas. É também essencial que organize o espaço escolar de forma democrática, oportunizando experiências pedagógicas escolares e não-escolares em que a meta se constitua em uma educação que re �ete o desejo coletivo da sociedade almejada, uma sociedade justa e igualitária. Vários estudiosos dos saberes necessários à prática docente vêm delimitando propostas com o intuito de de �nir o per�l de competências necessárias ao exercício da docência, recomendando que a formação inicial deva basear-se:
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na formação pessoal, social e cultural dos futuros docentes – este eixo da formação consiste em favorecer o desenvolvimento de capacidades de re�exão, autonomia, cooperação e participação, a interiorização de valores, capacidade de percepção de princípios, de relação interpessoal e de abertura às diversas formas da cultura contemporânea;
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na formação cientí �ca, tecnológica, técnica ou artística na respectiva especialidade – ou seja, pode-se dizer que corresponde à competência técnica, possuindo, com um elevado grau de competência, o domínio dos conteúdos que precisa transmitir, isso proporciona ao professor certa segurança em relação ao processo de aprendizagem;
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na formação no domínio educacional: a compreensão das ciências da educação e a organização pedagógica deverão estar atreladas à re�exão sobre os problemas educacionais do mundo contemporâneo. As contribuições de investigações realizadas pela didática e por outras áreas das ciências da educação consistem em elementos essenciais na constituição do docente;
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no desenvolvimento progressivo das competências docentes a integrar no exercício da prática pedagógica – ao professor não é su�ciente conhecer
Competências para ensinar
teorias, perspectivas e resultados de investigação, é preciso que ele se torne capaz de construir soluções adequadas em relação aos diversos aspectos de sua ação pro�ssional, ou seja, é preciso que o professor torne-se capaz de construir soluções apropriadas para mobilizar e articular o conhecimento teórico em situações práticas; �
no desenvolvimento de capacidades e atitudes de análise crítica, de inovação e de investigação pedagógica – compreensão clara que o papel de professor não equivale ao papel de um técnico, ao longo de sua carreira deve tornar-se um pro�ssional capaz de identi�car e analisar os problemas que surgem na sua atividade, possibilitando a construção de soluções adequadas.
Freire (1996) acrescenta ainda um fator importantíssimo que a prática educativa requer: a afetividade, o que se con�rma com as palavras de Codo e Gazzotti (1999, p. 76), “[...] na atividade de ensinar o afeto torna-se indispensável, constitui-se em obrigatoriedade, o que permitirá a efetividade do trabalho”. Ressalta ainda que, quando não se estabelece o vínculo afetivo entre o professor e os alunos, torna-se ilusório pensar que o sucesso do educador será completo, ou seja, a aprendizagem do aluno não será signi�cativa, ocorrerá lacunas no processo de ensino-aprendizagem. Entende-se assim, que a competência do professor deve constituir-se em aspecto relevante da educação e da organização escolar neste novo século, pois se torna cada vez mais evidente que o sucesso da escola depende de sua prática pro�ssional. Conforme Tessaro e Guzzo (2004), não são su �cientes apenas construir mais escolas, abrir mais vagas para os alunos e melhorar a estrutura física, é preciso que os professores sejam capazes de ensinar os alunos e transformá-los em cidadãos críticos e criativos.
A pesquisa como competência fundamental Entende-se que a atividade investigativa deve ser percebida enquanto espaço de pesquisas no campo das práticas pedagógicas, considerando a investigação como uma maneira de pensar sobre os limites de uma ação qualitativa que não se apresentam em falta de escolas ou da democratização do ensino, mas sim na incapacidade de dar espaço ao novo, di�cultando as sugestões de movimentos que possibilitem a articulação entre teoria e prática. Freire (1996) e Demo (2002), que possuem um amplo referencial acerca da pesquisa enquanto objeto de estudos, consideram-na essencial à prática docente, 127
Pro�ssão Docente
visto que o professor que assume a pesquisa na sua prática pedagógica mostrase comprometido com a elaboração da mesma, produzindo questionamentos com base na emancipação política, na formação da cidadania, na criatividade, na descoberta e na redescoberta. Esses autores ressaltam que só o professor pesquisador detém as condições necessárias para transmitir o ensino de qualidade, pois à medida que assumem a postura de questionadores, mostram-se desacomodados. O questionamento em relação à prática, faz com que sejam repensadas e recriadas as suas ações, levando-os à compreensão de seu papel político diante da educação e assim, assumindo-se como um pro�ssional competente, socialmente e politicamente responsável, tornando-se capaz de construir e reconstruir, construir e transmitir. Desta forma, a pesquisa precisa ser compreendida enquanto uma necessidade e como um dos mais importantes desa�os na busca de uma educação de qualidade. Freire (1996) acredita que a pesquisa pode ainda ser considerada como promotora da cidadania e do processo emancipatório de cada indivíduo, uma vez que investiga a realidade tal como se apresenta. É essencial que o professor compreenda que cada indivíduo deve ser entendido como construtor e reconstrutor da sociedade em que vive. Sociedade que também está sempre em constante transformação, necessitando assim de novas ideias, práticas e inovações que podem ser construídas e reconstruídas por meio da pesquisa. A re�exão sobre a teoria que o educador carrega e a prática que efetiva na construção da própria concepção e aplicação da pesquisa, consiste em repensar o papel de professor e recriá-lo, para que, ao assumir uma atitude de pesquisador e compreender a relevância da pesquisa para a educação, deixe de ser um transmissor de conteúdos historicamente acumulados e descontextualizados, para se tornar um mestre, um sujeito pro�ssionalmente quali�cado, de acordo com a responsabilidade que carrega e conforme a importância de sua pro�ssão. Demo (2002, p. 84) recomenda: A primeira preocupação é repensar o ‘professor’ e na verdade recriá-lo. De mero ‘ensinador’ – instrutor no sentido mais barato – deve passar a ‘mestre’. Para tanto, é essencial recuperar a atitude de pesquisa, assumindo-a como conduta estrutural, a começar pelo reconhecimento de que sem ela não há como ser professor em sentido pleno.
É importante reconhecer que a prática da pesquisa deve nascer no meio acadêmico, especialmente resultante do contato com a prática, nos períodos de estágio, nos cursos de formação, ou seja, a re�exão da ação deve ser uma constante na 128
Competências para ensinar
vida daqueles que se dispõe a intervir na formação de indivíduos tendo em vista torná-los cidadãos éticos e competentes. Para Demo (1998, p. 127), “a alma da vida acadêmica é constituída pela pesquisa, como princípio cientí �co e educativo, ou seja, como estratégia de geração de conhecimento”. Desta forma, é preciso considerar a pesquisa, no meio acadêmico, como formadora de futuros professores pesquisadores, pois, conforme Demo (2002, p. 15), “professor é quem, tendo conquistado espaço acadêmico próprio através da produção, tem condições e bagagem para transmitir via ensino. Não se atribui a função de professor a alguém que não é basicamente pesquisador”. Re�etindo sobre o pensamento de Demo (2002), entende-se que o aluno no período de formação não pode ser apenas um ouvinte das aulas do professor, pois assim não aprenderá a construir conhecimento, apenas adquirirá a instrução, tornando-se incapaz de elaboração própria, de emancipar-se politicamente, ou seja, não se constituirá cidadão. Considerando este contexto, o conceito de pesquisa é fundamental, é ela quem está na raiz da consciência crítica questionadora, possibilitando a recusa de ser massa manipulada. A pesquisa possibilita, ainda, o despertar da curiosidade, da inquietude, do desejo de descoberta e criação, sobretudo atitude política emancipatória de construção do sujeito social competente e organizado. Conforme Freire (1996, p. 29): “Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, contatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade. “ Freire (1996) defende ainda que o papel político do professor no mundo não deve restringir-se ao de quem apenas constata o que ocorre, mas também daque le que intervém como sujeito de ocorrências, constatando que a educação não pode constituir-se em um ato de simples adaptação social, mas deve constituir de uma ação para obter mudanças, pois examinando é que nos tornamos capazes de intervir na realidade. Conforme as próprias palavras de Freire (2000, p. 102): O exercício de pensar o tempo, de pensar a técnica, de pensar o conhecimento enquanto se conhece, de pensar o quê das coisas, o para quê, o como, o em favor de q uê, de quem, o contra quê, o contra quem são exigências fundamentais de uma educação democrática à altura dos desa�os do nosso tempo.
É através da pesquisa que o professor tem a possibilidade de confrontar a relação teoria e prática, repensando a prática pedagógica em suas possibilidades e compromissos. 129
Pro�ssão Docente
Para Hoff mann (2002, p. 101): Não se pode ensinar ao professor o que ele precisa aprender. As aprendizagens signi �cativas são construções próprias do sujeito [...]. Ele pode até sentir a necessidade de mudança, mas se não entender o signi �cado essencial de uma proposta pedagógica numa direção, não saberá como construí-la. Não basta alguém dizer-lhe que deve fazer diferente se ele não pensar diferente sobre o que faz.
A formação do educador depende de inúmeros fatores e segundo Demo (1994), a educação pela pesquisa apresenta como condição essencial que este seja um pesquisador, percebendo-a como princípio cientí �co e educativo, e como tal faça parte de seu cotidiano. Entende-se, assim, que a pesquisa deve ser contemplada como de�nição inerente à prática pedagógica, trata-se de um compromisso intrínseco à formação do verdadeiro mestre, pois, para Demo (1994, p. 34), “o professor que não constrói conhecimento, como atitude cotidiana, nunca foi. Quem pesquisa, teria o que transmitir. Quem não pesquisa, sequer para transmitir serve, pois não vai além da cópia da cópia”. O que se recomenda é que a pesquisa seja assumida como uma atitude processual cotidiana, inerente a toda prática que deseja de fato modernizar-se e aperfeiçoar-se, pois quem assume atitude de pesquisa está em constante estado de preparação. De acordo com Arends (1995), o propósito de investigação e pesquisa, para o educador, assim como para outros pro �ssionais, se mostra ainda como uma prática pouco desenvolvida, apesar de que se reconheça sua relevância para a produção de mudanças na prática educativa, redimensionando-a complexamente, na tentativa de que o pro�ssional se torne competente. De acordo com Freire (1996), é imprescindível que o professor esteja consciente de seu papel político de atuação social, buscando, assim, a construção de propostas educativas e emancipatórias, tornando o questionamento e o diálogo com a realidade uma prática para despertar atores políticos, capazes de criar soluções. Em seu sentido mais amplo, a educação deve ser compreendida como uma leitura crítica da realidade, pois o verdadeiro mestre motiva o aluno a dominar a escrita, a leitura e outros conhecimentos, como instrumentação formal e política do processo de formação do sujeito social emancipado. Não apenas para ler, escrever, calcular e decorar, mas dominar as técnicas fundamentais para poder ocupar espaço próprio na sociedade, onde a pesquisa torna-se fundamental. É importante também que o professor pesquisador possibilite situações práticas aos seus alunos, oferecendo-lhes a oportunidade de experimentação da 130
Competências para ensinar
teoria na prática de construção e reconstrução de hipóteses, analisando como funciona no cotidiano, ou seja, que o aluno, ao experimentar, discutir e analisar a teoria possa, de fato, ressigni�cá-la para sua vida.
Texto complementar Referencial de competências (CYSNEIROS, 2008)
Por questões práticas, Perrenoud (2000, 2001 b) postula dez domínios de competências prioritárias para a formação de professores de nível fundamental e médio. Cada um dos dez domínios é desdobrado em quatro ou cinco competências de segundo nível, perfazendo 44 no total. Outros desdobramentos seriam possíveis, porém ao preço de perda da facilidade de utilização do referencial em situações concretas. Neste trabalho organizamos os dez domínios de competências em quatro categorias. I - Quatro domínios referem-se especi�camente ao ensino, aos proble-
mas perenes de qualquer didática: 1. Organizar e dirigir situações de aprendizagem (cerne do ofício do
professor) �
Conhecer os conteúdos a serem ensinados e sua tradução em ob jetivos de aprendizagem.
�
Trabalhar a partir das representações dos aprendizes.
�
Trabalhar a partir dos erros e obstáculos à aprendizagem.
�
Construir e planejar dispositivos e sequências didáticas.
�
Envolver os alunos em atividades de pesquisa, em projetos de conhecimento.
2. Administrar a progressão das aprendizagens (visão longitudinal do
todo) 131
Pro�ssão Docente
�
Conceber e administrar situações-problema ajustadas ao nível e possibilidades dos aprendizes.
�
Adquirir uma visão longitudinal dos objetivos do ensino.
�
Estabelecer laços com as teorias subjacentes às atividades de aprendizagem.
�
Observar e avaliar os aprendizes em situações de aprendizagem, de acordo com uma abordagem formativa.
�
Fazer balanços periódicos de competências e tomar decisões de progressão rumando em direção a ciclos de aprendizagem.
3. Conceber e fazer evoluir dispositivos de diferenciação (evitar as
mesmas lições e exercícios para todos, pois a diversidade de aprendizes é a norma). �
Administrar a heterogeneidade no âmbito de uma turma.
�
Abrir, ampliar a gestão de classe para um espaço mais amplo.
�
Fornecer apoio integrado e trabalhar com aprendizes portadores de grandes di�culdades.
�
Desenvolver a cooperação entre os alunos e formas simples de ensino mútuo.
4. Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho (mo-
tivação) �
Despertar o desejo de aprender, explicitar a relação com o saber, o sentido do trabalho escolar e desenvolver a capacidade de autoavaliação.
�
Instituir um conselho de alunos e negociar tipos de regras e de contratos.
�
Oferecer atividades opcionais de formação.
�
Favorecer a de�nição de um projeto pessoal do aprendiz.
II - Três domínios focalizam a atividade do professor na escola como instituição:
132
Competências para ensinar
5. Trabalhar em equipe (cooperar com colegas, especialistas, adminis-
tradores) �
Elaborar um projeto em equipe e representações comuns.
�
Dirigir um grupo de trabalho, conduzir reuniões.
�
Formar e renovar uma equipe pedagógica.
�
Enfrentar e analisar em conjunto situações complexas, práticas e problemas pro�ssionais.
�
Administrar crises e con�itos interpessoais.
6. Participar da administração da escola (não �car apenas na sala de aula) �
Elaborar e negociar um projeto de instituição.
�
Administrar os recursos da escola.
�
Coordenar e dirigir uma escola com todos os seus parceiros.
�
Organizar e fazer evoluir, no âmbito da escola, a participação dos alunos.
�
Trabalhar em ciclos de aprendizagem.
7. Informar e envolver os pais (em relacionamentos de parceria) �
Dirigir reuniões de informação e de debate.
�
Fazer entrevistas, ouvir e compreender, negociar.
�
Envolver os pais na construção de saberes, sem temores ou subterfúgios, considerando-os como parceiros.
III - Dois domínios são relativos ao próprio educador : 8. Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da pro�ssão �
Prevenir a violência na escola e fora dela.
�
Lutar contra preconceitos e discriminações sexuais, étnicas e sociais.
�
Participar da criação de regras comuns referentes à disciplina na escola, às sanções e à apreciação da conduta.
133
Pro�ssão Docente
�
Analisar a relação pedagógica, a autoridade e a comunicação em aula.
�
Desenvolver o senso de responsabilidade, a solidariedade e o sentimento de justiça.
9. Administrar sua própria formação contínua �
Saber explicitar as próprias práticas.
�
Estabelecer seu próprio balanço de competências e seu programa pessoal de formação contínua.
�
Negociar um projeto de formação comum com os colegas (equipe, escola, rede).
�
Envolver-se em tarefas em escala de uma ordem de ensino (fundamental ou médio) ou do sistema educativo local, regional e nacional.
�
Acolher a formação dos colegas e participar dela.
�
Ser agente do sistema de formação contínua.
IV - Um último domínio abrange as categorias anteriores: 10. Utilizar novas tecnologias da informação e comunicação
Aqui Perrenoud destaca quatro competências de segundo nível: �
Utilizar editores de texto.
�
Explorar a potencialidade didática de aplicativos.
�
Comunicar-se a distância por meio da telemática.
�
Utilizar ferramentas multimídia no ensino.
Como esta última família de competências trata de uma área em mutação, com o constante surgimento de novas ferramentas e sobre as quais muitas coisas interessantes (e outras questionáveis) têm sido escritas, consideramos que merece revisão dentro do próprio modelo. O capítulo que trata deste tema foi escrito em abril de 1998, quando as novas tecnologias da informação não tinham a maturidade que têm hoje. Além disso, com notável honestidade intelectual, no último capítulo do livro sobre o referencial, utilizando a metáfora de uma viagem, Perrenoud 134
Competências para ensinar
reconhece ter conduzido o leitor “em uma jornada rápida e um pouco super�cial” por lugares que mereceriam uma estada mais longa: “[...] Alguns dos continentes (famílias de competências) e dos países (competências especí�cas) eu os percorri muitas vezes. De alguns outros, tenho uma ideia menos precisa, conhecimentos de segunda mão. Alguns me apaixonam, outros menos [...]” (PERRENOUD, 2000, p. 171). É possível que um dos “continentes” pouco vividos tenha sido o domínio de tecnologias. Um dos indicadores desta suposição é que as autorreferências, apenas duas, com datas de 1992 (quando não havia internet) e 1998, tratam do uso de novas tecnologias na educação.
Atividades 1. Cite qual foi o enfoque dado na aula sobre a universidade como centro de
excelência.
135
Pro�ssão Docente
2. Para tornar-se um professor pesquisador, que postura este pro�ssional deve-
rá assumir perante a realidade?
Dica de estudo THURLER, Mônica G. O desenvolvimento pro�ssional dos professores: novos paradigmas, novas práticas. In: PERRENOUD, P. As Competências para Ensinar no Século XXI: a formação de professores e o desa�o da avaliação. Porto Alegre: Artmed, 2002. Perrenoud traz ao leitor textos nos quais os autores apoiaram suas falas em um ciclo de conferências proferidas em quatro cidades brasileiras em 2001. Os assuntos abordados são de grande valor e possibilitam tomadas de decisões importantes com relação ao aprimoramento do ensino. Este capítulo aborda os novos paradigmas da prática pedagógica, enfocando o trabalho do professor de modo diferenciado e construtivo.
136
Competências para ensinar
137
Gabarito A (des)construção da identidade docente 1. Os alunos devem responder citando as características do conceito de
identidade interna e externa. Além disso, a resposta deve conter a importância da desconstrução da identidade atribuída pelo discurso escolar o�cial. 2. Ao dar preferência aos procedimentos e técnicas de ensino, o profes-
sor pode, muitas vezes, perder o foco da aula, não atingindo seu objetivo, deixando de assegurar a aprendizagem do aluno. Portanto essa re�exão torna-se importante para o uso equilibrado e consciente dos métodos de ensino valorizando os conteúdos.
História da pro�ssão docente 1. Os alunos devem relatar a respeito das condições históricas e socioló-
gicas que in�uenciaram na formulação de reformas educacionais e leis sobre a educação. Da mesma forma, devem levantar a questão da ideologia econômica e política dominante, identi �cando quais foram as interferências que os setores citados in�uenciaram sobre a educação. 2. As respostas devem conter aspectos propagados pelo tecnicismo tais
como: o professor é visto como um técnico que prepara o material para o aluno; o aluno é impedido de criar e pensar; a escola técnica tinha como função social “ditar” as regras de conduta impostas pelos militares, os aparelhos tecnológicos eram mais valorizados que os conteúdos de ensino etc. Na resposta deve conter ainda que devem ser detectadas as consequências negativas que o tecnicismo legou ao sistema educacional brasileiro, citadas por Fusari.
Pro�ssão Docente
Ser professor: angústias e dilemas 1. O aluno deverá identi�car em sua resposta que existe um excesso de oratória,
expressando as expectativas de mudanças e ações que devem ser tomadas para melhorar a qualidade educacional, no entanto di�cilmente essas ideias são colocadas em prática. Assim temos belos discursos sem realizações. 2. Devem-se apontar os pontos em que estão sendo atendidas as exigências da
lei, os que não estão sendo cumpridos e as possíveis soluções para que a lei seja respeitada na sua plenitude.
Pro�ssão docente, ciência interdisciplinar e representações sociais 1. É necessário que o aluno identi�que que as ciências avançam e abrem novos
espaços para investigação quando interagem entre si, portanto para ampliar e fornecer um avanço epistemológico nas pesquisas em educação é importante que haja este diálogo entre as ciências. É relevante que o aluno destaque que na educação, a ciência que fornece subsídios teóricos e metodológicos de maneira signi �cativa é a Sociologia. No entanto é necessário que os professores invistam em sua formação inicial e continuada para acompanhar as transformações da sociedade. 2. Aqui os alunos precisam discutir possibilidades de projetos de pesquisa ten-
tando utilizar o conceito de representações como modelo teórico. Por exemplo, um projeto que envolva a questão das identidades dos pro�ssionais docentes atuantes em qualquer nível de ensino; ou até uma pesquisa que confronte as opiniões que a sociedade, os veículos de comunicação, o Estado e os próprios professores possuem em relação à educação brasileira, em que o conceito de representações sociais servirá como referencial teórico.
Formação inicial e formação continuada 1. O aluno deve contemplar em sua resposta as duas competências citadas por
Nóvoa: o professor enquanto organizador de aprendizagens e o professor capaz de compreender o conhecimento. O aluno deve apontar nessas duas competências, suas características e o que as faz importantes no processo de sua formação. 140
Gabarito
2. Tendo em vista que a teoria e a prática são complementos, o aluno deve
identi�car que a formação do docente precisa estar pautada nesses dois eixos, sendo assim é necessário que a prática não seja deixada para os últimos anos de sua formação mas que a teoria e a prática caminhem juntas. 3. Nesta resposta o aluno precisa indicar aspectos referentes a sua formação,
se ela valoriza a racionalidade técnica, onde o professor é tido como um especialista que aplica na sua prática cotidiana o rigor das regras que derivam do conhecimento; ou seja, o professor aplica um modelo pronto, desconsiderando a realidade social do aluno e da escola em que se insere. Caso essa concepção não seja adotada na formação do aluno, ele deverá descrever qual é a concepção adotada para a formação de professores.
O professor re�exivo 1. O aluno deverá identi�car em sua resposta que a educação como arte está
ligada às realidades eventual e individual desenvolvendo a capacidade sensível do sujeito, desconsiderando o julgamento cientí �co rigososo. 2. O aluno precisa apontar em sua resposta as implicações e pressupostos abor-
dados por Geraldi. Assim, o aluno poderá re�etir sobre a importância desses cinco tópicos na prática re�exiva do professor. 3. Os alunos devem notar que no texto apresenta-se a concepção de Geraldi,
que a�rma que o professor busca o equilíbrio entre a ação e o pensamento e esta ação é baseada na intuição e emoção. Essa teoria vem de encontro com a citação de Paulo Freire quando cita os valores das quais este pro�ssional se vale para ensinar. O aluno deve citar outra característica importante que o texto traz: o professor enquanto pesquisador. Segundo Libâneo é imprescindível para o professor “aprender a aprender”. Tal fato também é citado por Freire. Sendo assim, para o professor é necessário a pesquisa constante e a busca da formação continuada.
O professor iniciante 1. É preciso que o aluno indique em sua resposta que o choque de realidade
acontece logo no início da carreira docente quando o professor inicia sua prática em sala de aula. Esse “choque” ocorre com o professor ao se deparar 141
Pro�ssão Docente
com a realidade que se mostra totalmente diversa daquelas situações estudadas em sua formação. 2. Os alunos devem identi�car que na primeira fase, de exploração, o professor
está conhecendo e experienciando a realidade a partir de tentativas e erro. Já na segunda fase, de estabilização, o professor está se �rmando, consolidando-se pro�ssionalmente, obtendo maior equilíbrio pro�ssional, concentrando-se mais na aprendizagem do aluno. 3. O aluno deve destacar que o ideal para socialização do professor iniciante é
estabelecer uma relação dialógica com seus colegas, pois à medida que vai tomando consciência dos simbolismos e da cultura presentes na escola, o professor assume uma postura mais con�ante para enfrentar os con�itos da pro�ssão docente.
Competências para ensinar 1. Deve-se apontar que o enfoque dado na aula refere-se ao fato que a univer-
sidade deve ser transformada como centro cultural por excelência transformando a informação em conhecimento e o saber em sabedoria, integrando a cultura e desenvolvendo a pesquisa no dia-a-dia. 2. O aluno deve identi�car que para tornar-se um pesquisador o professor
compromete-se com sua prática pedagógica, com a formação da cidadania, com a criatividade, descoberta e redescoberta, adotando a postura de questionador de sua prática repensando e recriando suas ações, compreendendo seu papel político perante a educação e o ato educativo. Assim, o professo assume-se enquanto pro�ssional competente, social e politicamente responsável, capaz de construir e reconstruir; construir e transmitir. Outra característica importante que merece destaque é que o professor deve adotar uma postura re�exiva acerca do seu papel enquanto professor, adotando uma atitude de pesquisador.
142
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