A História de Vanina Certa noite, terminada a ceia, o veneziano e o dinamarquês ficaram
a
conversar conversar na varanda. varanda. Do outro lado do canal via-se um belo palácio com finas colunas esculpidas. — Quem mora ali? — perguntou o Cavaleiro. — Agora ali só mora Jacob Orso com seus criados, mas antes também ali morou Vanina, que era a rapariga mais bela de Veneza. Era órfã de pai e mãe e Orso rso era era o seu seu tut tutor. or. Quan Quand do ela ela era era ain ainda cria crianç nça a o tuto utor prometeu-a em casamento a um seu parente chamado Arrigo. Mas quando Vani Vanina na cheg chegou ou aos aos dezo dezoit ito o anos anos não não quis quis casa casarr com com Arri Arrigo go porq porque ue o achava velho, feio e maçador. Então Orso fechou-a em casa e nunca mais a deix deixou ou sair sair senã senão o em sua sua comp compan anhi hia, a, ao domi doming ngo o para para irá miss missa. a. Durante os dias da semana Vanina prisioneira suspirava e bordava no interior interior do palácio, palácio, sempre rodeada, rodeada, espiada pelas suas aias. Mas à noite Orso Orso e aias aias ador adorme meci ciam am.. Entã Então o Vani Vanina na abri abria a a jane janela la do seu seu quart quarto, o, debruçava-se na varanda e penteava os seus cabelos. Eram loiros e tão comp compri rido dos s que que pass passav avam am além além da bala balaus ustr trad ada a e flut flutua uava vam m leves leves e brilhantes, enquanto as águas os reflectiam. E eram tão perfumados que de longe se sentia na brisa o seu aroma. E os jovens rapazes de Veneza vinham de noite ver Vanina pentear-se. Mas nenhum ousava aproximar-se dela, dela, pois pois o tutor tutor fizera fizera saber saber à cidade cidade inteir inteira a que mandar mandaria ia apunha apunhalar lar pêlos seus esbirros aquele que ousasse namorá-la. E Vanina, jovem e bela e sem amor, suspirava suspirava naquele naquele palácio. palácio. Mas um dia chegou a Veneza Veneza um homem que não temia Jacob Orso. Chamava-se Guidobaldo e era capitão dum navio. O seu cabelo preto era azulado como a asa dum corvo, e a sua pele estava queimada pelo sol e pelo sal. Nunca no Rialto passeara tão belo navegador. Ora certa noite Guidobaldo passou de gôndola por este canal. Sentiu no ar um maravilhoso perfume, levantou a cabeça e viu Vanina a penteares cabelos. Aproximou o seu barco da varanda e disse:
— Para cabelos tão belos e tão perfumados era preciso um pente de oiro. Vanina Vanina sorriu sorriu e atirou atirou-lh -lhe e o seu pente pente de marfim marfim.. Na noite noite seguin seguinte te à mesma hora, o jovem capitão tornou a deslizar de gôndola ao longo do canal. Vanina sacudiu os cabelos e disse-lhe: — Hoje não me posso pentear porque não tenho pente. — Tens este que eu te trago e que mesmo feito de oiro brilha menos do que o teu cabelo. Então Vanina atirou-lhe um cesto atado por uma fita onde Guidobaldo depôs o seu presente. E daí em diante a rapariga mais bela de Veneza passou a ter um namorado. Quando esta notícia se espalhou na cidade os amigos do capitão foram preveni-lo de que estava a arriscar a sua vida, pois Orso não lhe perdoaria. Mas ele era forte e destemido, e sacudiu os ombros e riu. Ao fim dum mês foi bater à porta do tutor. — Que queres tu? — perguntou o velho. — Quero a mão de Vanina. — Vanina está noiva de Arrigo e não há-de casar com mais ninguém. Sai depressa de Veneza. Tens um dia para saíres da cidade. Se amanhã ao pôr-do-sol não tiveres partido eu mandarei sete homens com sete punhais para te matarem. Guidobaldo ouviu, sorriu, fez uma reverência e saiu. Mas Mas ness nessa a noit noite, e, no silên silênci cio o da noit noite, e, a sua sua gônd gôndol ola a paro parou u junt junto o da varanda da casa de Orso. De cima atiraram um cesto só preso por uma fita e dentro dele o jovem capitão depôs uma escada de seda. O cesto foi puxado para a varanda, e a escada, depois de desenrolada, foi atada atada à balaus balaustra trada da de mármor mármore e cor-decor-de-ros rosa. a. Então, Então, ágil ágil e leve, leve, Vanina Vanina desceu com os cabelos soltos flutuando na brisa. Guidobaldo cobriu-a com sua capa escura, e a gôndola afastou-se e sumiuse no nevoeiro de Outubro. Na manhã seguinte as aias descobriram a ausência de Vanina e correram a prevenir o tutor.
Jacob Orso chamou Arrigo e com ele e os seus esbirros dirigiram-se para o cais. Mas quando ali chegaram o navio de Guidobaldo já tinha desaparecido. — Cont Contaa-me me o que que sabe sabes s — diss disse e Orso Orso a um velh velho o mari marinh nhei eiro ro seu seu conhecido. E o homem contou: — O capitão e a tua pupila chegaram aqui a meio da noite. Mandaram chamar chamar um padre que os casou, casou, além, naquela naquela pequena capela capela que é a capela capela dos marinh marinheir eiros. os. Mal termin terminou ou o casame casamento nto embarc embarcaram aram.. E ao primeiro nascer do dia o navio levantou a âncora, içou as velas e navegou para o largo. Jacob Orso olhou para a distância. O navio já não se avistava, pois a brisa asso assopr prav ava a da terr terra. a. As água águas s esta estava vam m verd verdes es,, clar claras as,, lige ligeir iram amen ente te ondulantes, cobertas de manchas cor de prata. O tutor tutor e Arrigo Arrigo queixaram queixaram-se -se à Senhor Senhoria ia de Veneza Veneza e ao doge. Depois Depois mandaram mandaram quatro navios à procura procura dos fugitivos: fugitivos: um que navegou para Norte, outro que navegou para Oriente, outro que navegou para o Sul, outro outro que 90 navegou navegou para Ocidente Ocidente.. Mas o mar é grande grande e há muitos muitos portos, muitas baías, muitas cidades marítimas, muitas ilhas. E Vanina e Guidobaldo nunca mais foram encontrados. Terminada a narração o Mercador encheu dois copos com vinho e ele e o dinamarquês beberam à saúde de Vanina e do navegador.
Sophia de Mello Breyner Andresen,
O Cavaleiro da Dinamarca
I 1. Aquando da passagem do Cavaleiro por Veneza, o seu anfitrião vai contar-lhe uma história de amor. 1.1 Identifica os protagonistas desta história. 1.2 Caracteriza fisicamente a personagem feminina. 1.3 Clarifica a relação existente entre Vanina e Jacob Orso. 1.4 Descreve física e psicologicamente Arrigo. 1.5 Que comportamento adopta o tutor perante a recusa de Vanina em casar-se com Arrigo? 1.6 Na tua opiniã opinião, o, como como pensas pensas que se sentir sentiria ia Vanina Vanina perante perante esta esta atitude? Justifica a tua resposta. 1.7 Como passava Vanina os seus dias? 1.7.1 E as noites? 2. Mas um dia, tudo mudou...
2.1 Que acontecimento contribuiu para essa mudança? 2.2 Traça o retrato físico do jovem capitão. 2.3 Que
reacção reacção tem
Guidobaldo Guidobaldo
quando quando vê,
pela
primeira primeira vez,
Vanina? 2.4 Por palavras tuas, expõe a estratégia utilizada por Guidobaldo para cativar Vanina. 2.4.1 O que concluis do perfil psicológico de Guidobaldo? Fundamenta a tua resposta. 2.4.2 Qual foi a reacção de Vanina? 3. «E daí daí em dian diante te a rapa raparig riga a mais mais bela de Veneza Veneza pass passou ou a ter ter um namorado.» 3.1 Que atitude tomaram os amigos de Guidobaldo face ao sucedido? 3.2 Que gesto corajoso teve o apaixonado de Vanina? 3.3 Refere o comportamento de Jacob Orso. 3.4 Descreve o plano arquitectado pêlos dois enamorados. Ilustra a tua resposta com elementos textuais. 4. Quando o tutor se apercebeu da fuga dos amantes, era já demasiado tarde. 4.1 Quem lhe deu a terrível notícia? 4.2 O que fez ele? 4.2. 4.2.1 1 Cons Conseg egui uiu u Jaco Jacob b Orso Orso atin atingi girr os seus seus obje object ctiv ivos os? ? Just Justif ific ica a tua tua resposta. 5. A história de Vanina e Guidobaldo constitui uma acção secundária de
O
Cavaleiro da Dinamarca.
5.1 Como se designa esta técnica de organização das sequências narrativas? 5.2 Quanto ao relevo, como se denomina a acção que envolve o Cavaleiro? 6. Faz a correspondência entre as figuras de estilo que se seguem e os respectivos exemplos.
Figu Figura ras s de esti estilo lo 1. Dupla
Exem Exempl plos os a. «O seu cabelo preto era azulado como a asa
adjectivação
dum corvo [. . .].» (II. 24-25)
2.
Hipérbole
3.
Anáfora
que navegou para o Sul, outro que navegou
4.
Comparação
para Ocidente.» (II. 89-90)
Tripla
b.
«[. . .] outro que navegou para Oriente, outro
5.
c.
«[. . .] o achava velho, feio e maçador» (l. 1 0)
adjectivação
d.
«[. . .] flutuavam leves e brilhantes [. . .].» (II. 1 6- 1 7)
e.
«E eram eram tão tão perf perfum umad ados os que que de long longe e se sentia na brisa o seu aroma.» (II. 1 7- 1 8)
7. Analisa sintacticamente os elementos destacados. a) «—Agora ali só mora Jacob Orso com seus criados [...].» (l. 5) b) «[...] Orso era o seu tutor.» (l. 7) c) «E Vanina, jovem e bela e sem amor, suspirava naquele palácio.» (l. 22) d) «Ora certa noite Guidobaldo passou de gôndola por este canal.» (l. 27)