SÉRIE KOÚS
9 HINOS ÓRFICOS: PERFUMES
HINOS ÓRFICOS: PERFUMES
Introdução, radução comentário e notas: Ordep Serra
Série Koúros
2015
ODYSSEUS
.
Dads Internacoais Ctaogação na Pubiaç (CIP) 074h
Hs Ós: fms ; ç, má s Op S. - S l Oysss E 15. (Sé Kú�s T ' Yµv SBN 978878763 L G ps 2 M G Of R A Hs ss G Op T S coo
88
Ís p ssmá ps
88
Pa Marina Martinelli Serr SÉRIE Koúos
e Carlos Martinelli Serra Lemos,
Todos os dretos desta edição reseados à: © 2015 Odsseus Editora Ltda.
criatus esplêndidas que têm os olhos a músia de Orfeu.
Tíulo orgna: 'pw Yµv Tradução: Ode Sera Resão, Jaez Oera Pedro Usen Caa: Tago Crilo / ST Edo: Stanos Tsirakis dyeu do da. Ra dos Macuns 495 05444-00 São Pauo/SP Tel/fax: (11) 38160835 ema edora@odsseuscob odsseuscombr ISBN, 978-857876037
Edção, Ano 205
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SUMÁRIO
Sére Koiíros 9 Abrevatus e sglas 13 Índce de lustções 16 Invenção de Orfeu
21
Hinos Órfcos 1- 87
SOBRE TRADUR
ÜRDEP RRA, Bacharel em Letras e Mestre em Antropoogia Socia pela UnB,
doutor em Anropoogia pela USP, aposenou-se como Proessor Associado da FBA onde ainda aua em um programa de pósgraduação e em ois grupos de pesquisa. Iniciou sua carreira docente na UnB ensinando ngua Grega a aunos de graduação e psgraduação c omo insrutor sob a orien tação e Eudo e Sousa Em seu outorado, oi orientao na USP por Haiganuc Sarian e no Centre Louis ee da EHESS (onde esagiou a convite o Prof Pierre Veant) peo P f Pierre VidaNacquet É memb a Sociedae Brasieira de Estudos Clássicos da Associação rasilira de An poogia da SBPC e da Academa de etras da Baia Foi três vezes premiado em concursos nacionais de iteraura Tem dez livros de ensaios pubicados participação com capítulos em oito obras ensasticas coetivas e quatro obras iterárias éditas três deas premiadas Em periicos cienficos e de diusão utural já eu a ume mais de cinquena artigos Traduziu obras eruditas de Waler Oo Kar Kerényi E. Haveock Bruce . Trigger A Snograss. Traduziu ambém a tragédia Rei Édipo, de Soces o Hino Homérico a Hrms e o Hio Homro a Dmtr. r
r
r
r
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17
Comentários e noas 05
Bblografa
727
ndes de ttulos e subttulos 740 brevaturas de autores e obs antga t adas 7 Caderno de magens 75
4
SÉRIE KOÚROS
A Odysseus Editora lançou em 2007 os primeiros volumes da Série Koúos, que se propõe a apresentar ao público brasileiro traduções de textos importantes da cultura clássica grega. Ao leitor queremos fazer um pequeno reato de nossa motivação e de nosso projeto Hoe, mais de vinte séculos depois que grande parte daquilo que nos dispusemos a trazer a público foi escrito devemos nos perguntar qual é a importância ou a urgência que devemos dar à tarefa de ler os clássicos O leitor certamente deleitar-seá com os textos da cultura clássica. Primeiro, porque possibilitam que tomemos contato com as raízes da cutura ocidental uma época em que se lançavam as bases da filosofia do teatro do esporte e do pen samento potico e revelam as crenças e os valores da cultura clássica. Segundo porque nos permitem lançar um olhar sobre os dilemas e angústias da existência humana que muitos séculos depois permanecem Temos a convicção de que a cultra de nossos dias tem muito a ganhar debruçandose sobre os clássicos e assimilando se não como modelo ao menos como referência o pensamento e as realizações formidáveis do esprito humano durante a An tiguidade. Aquelas produções mostramse ainda ao homem de hoe como um farol que permite e norteia o navegar num mo
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9
mento d e grand es transformações e poucas referências sólidas
religiosas então
para guiarem seu caminh o .
novos refúgios Se a sac ralização d o labor a juou a d esenvolve r
Ler fio com
as a
tragédias e
os
Hinos Homécos nos permite reatar
Antiguidade e redescobrir nas obras
o
o
que não foi
as
dominantes
e d a are e a ciênca fizera mse
ciências, nas let r as e nas arte s plástica s temos
a
impr essão
e qe reina ho je um onanismo que par ece apenas testar se
escamoteado, mas exposto pelos gregos : as múltiplas facet as d o
capacidae
esprito e d a complexidade humana tratadas com surpreen dente
parece que não conseguimo s mais nos s eduzir com a beleza do
compaixão e benevo lência . A everência
pr óprio homem pois a beleza também foi t ocada pela mão de Mias e transformouse em algo não mais revelado pelo esprito,
de
aos d eu se s
é ante s
mais nada, a reverência às múltiplas e intrincaas aptões/
facetas
evelada como arra njos possíveis essas forças eternas que nos fascinam O que restou da imensa prod ução dos ntigos g r egos
que não corro mpe
aina
desejo e conhecimento fazemos g ratificantes viagens pelas
há de receber
o
da
pers ona lidad e humana nos é
Nã o construmos n ovos mtos e
mas a l_o que o vil metal diz alcançar Nós, o s leitores quando nos d eparamos com uma tradução
do
homem A riqueza
de sonhar subsiste
a
reconhecimento de inúmeras gerações
e inspirá-las até que coloquemos no céu novas constelaçõe s
realizações
dignas
mas fiel possvel
e guiarem nossos passos ne ssa jornada ou por que
não izer? nessa
od isseia
e nos imbumos
do
esprito humano Um texto bem traduzido e aos sentido s originais tor nase
o
fecuno nova
mente Quando percebem os os traços e arro jo e beleza ficamos
que é a vida .
Pod erí amo s ir além e e specula r que séculos d e divórcio entre filosofia e ciência somente acentuaram a separação entre os mundos d a pr odução material
do
os s entidos originais
então a imagina o encantamento e s uscito
os
efeitos que aquela obra
em seu público origin al
Queremos a graecer aos tradutores que antes e qualquer
e aquele das conquistas d o esp
rito E poemos d esejar a inda alcançar um ponto d e observação
outra coisa, são
privil egiado para melhor avaliarmos os ganhos e as perdas que
rastros que as ieias fundadas lá atrás deixaram na linguagem do
o
estu diosos que procuram como caçadores os
nosso tempo E para r ecupe r a r aquelas out ras concepções que
cristianismo propiciou ao esprito humanista O homem servo de deu, cristão, maniquesta, depois d e tentar
poucos ind cios
deixa ram os t radutores
armamse e palavras
exorcisar infinitos demôni os tornouse eunuco extirpou seu
como que e cinzéi s e e sculpem para nós os text os com g rande
próprio 1; afina l a concepção judaicocri stã
evoção Somos muito gratos pelos d eleites para o espírito que
do
homem
como a lgo para s empre corrupto traz pouca coragem e luz ao es
essa
empreitada junto a e ss es homens tem nos propiciado
prito O homem ocid ental empenha se, d esde o Renascimento,
Para terminar queremos agraecer à eitora grega Káktos e
em resgatar a herança clássica Apararamse arestas refundouse
a seu editor O dysseas H atzopoulos que há 5 anos se lançou
o d ireito d e livrepensamento numa d isputa com
à he r cúlea tarefa e tra duzir para o g r ego moern o um enorme
as concepções .
10
!!
tesouro: a totalidade dos escritos remanescente s da Antiguidade (ho je seu catálogo soma quase mil volumes, supera ndo em nú mero coleções como as da Belles Lettres e de Ox ford) - por terem prontamente incentivado nosso pro jeto e cedido os textos em grego antigo digitalizados, para que os incluís semos nesta série. Em sua homenagem e com seu consentime nto usaremos a logomarca da Káktos como sí mbolo da S éi e K oúr os.
ABREVIATUR AS E SIGLAS
•
S. T
Nesta relação, as siglas que correspondem a publicações estão acompanhadas dos títulos sumariamente indicados mas na Bibliografia encontra-se a referência competa às obras em questã� com a respectiva sigla no final OF e OT assinalam no texto, fragmento(s) ou testemunho(s) órfico(s) com os números correspondentes nas respectivas edições, indicadas por uma letra ou um nome Assim por exemplo, OF 10 K indica o fragmento órfico que re cebeu o número na edição de Kern; OT 1 Bernabé corresponde ao testemunho que na edição de Bernaé recebeu essa numeração. Essas edições de fragmentos e testemu nhos órficos se acham na presente relação assinaladas do mesmo modo que as outras obras nela evocadas a referência completa se encontra na Bibliografia. A indicação dos Hinos Homéricos e dos Hinos Órficos citados se faz com as siglas correspondentes (HH e HO) mais o número que tradcionalmente lhes é atriudo No caso dos Hinos Óricos, os números que identificam cada um acompanham o respectivo título. Quanto aos inos Homéicos tomouse o cuidado de indicar no próprio texto o nome do deus a que é dedicado para facilitar a consulta do leitor interessado As siglas TOA e og Epi eme tem a fragmentos editad os por 1
Roxana B Martinez Nieto (2000) como se indica nesta relação e se mostra no texto As obras clássicas são citadas em latim com as abreviaturas convencionais "
I2
IJ
ANET Ancient Near Eastern Texts elating to the Old Testament. ABV [BEAZLEY Attic Black Figue Vase Paintes ARV [BEAZLEY. Attic Red Fige Vase Paintes ARW Achiv fü Religionswissenschat.
•
WUNSCH Antike Zaubegert aus Pegaon.
AZP BCH CIG CQ
Copus Inscriptionum Graecarum Classical Quarely.
CVA
Copus Vasou Antiquom.
Buletn de Coespondance Hélenique
DELG CHANTRAINE] Dicionnaie Étymologique d e la Langue Gecque DEL
[ERNOUT & MEILLETJ Dictionnaire étyoogique de la langue !atine
K
[DIELS & KRANZ Die Fagente de Vosokatike DML [BRUNEL Dicionáio de Mitos Liteáios DKP Die Keine Pauy.
G HS
nscptiones Gaecae. ounal of Hellenic Studies ounal of Indo-European Studes
ES KPh ahbüche fü k lassische hilologie MC exicon conographicum Mythologiae Classicae [IDDELSCOT/OHSON A GeekEngish Lexicon S MH
Museu Helveticum
OF OT
= fagmento(s) ófico(s) Orphicorum testmonmla = testemunho(s) elativo(s) a Oreu ou a atéia ófica
Paa
BEAZEY Paalipomena
Orphicormfgmentumla
PGM Papyi Gaecae Magicae. PMG RE Rsher
Poetae Melici Gaeci Paulys Realencylopdie de Altetumswissenschaft Ausfhrlischer Lexikon de Giechischen und Romische Mythoogie
Fig
Etymologicu Magnu Genuinum Figua
Schol Escólio SI Sylloge lnscriptionu Gaecarm
Fag
Fagmento.
SVF Stoico Veterum Fragena Teog. Epi [MARTINEZ NETO Teogonia de Epimênides.
EG
Die Fagente de Giechischen Histoike GRBS Geek, Roman and Byzantine Studies HH Hino Hoéico HO Hino Ófico FGrH
ThesCRA Thesauus Cultus et Rituum Aniquom TOA Teogonia Ófica Antiga (Matinez Nieto) ZPE
Zeitschift f Papyrilogie und Epigaphik
HOUASS Dicionáio Houass da Língua Potuguesa "
I4
15
ferdo no peito por uma mulher que o ataca com um chuço o herói se apoa no solo com a mão esquerda e com a d ireta ergue a lra. Outras damas se aproxmam erguendo pedras a im de lapidá-lo (nem todas são visíveis nesta reprodução da magem do aso). CVA 4 p 20. C. LIMC, art. Orpheus, cat 39.
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES (Cadero d Imagns, pp. 753-68)
•
e Oreu coroado de louros a tocar sua lira entre guerreiros trácios. Cratera ática de iguras vermehas de meados do século V a.C. Pintor de Nápoes. Hamburgo Museum ür Kunst und Gewerbe 196870 Para 450.21 423. C. LIMC s.v Orpheus, cat. 8.
e Morte de Oreu Ânora de Nola iguração do Pin tor de Nápoles, obra datável de circa 450 a.C. Nápoes Museo Nazonale H 314. Mulheres armadas atacam o poeta que ergue sua lra já aindo. ARV' 852 2 LMC s.v. Orpheus cat. 44.
e ' Oreu coroado de hera a tocar sua l!ra entre guer reros trácios Cratera ática de iguras vermelhas datvel de circa 450 a.C. procedente de Gela. Pintor de Oreu Berlin Antke Sammlung Staatlche Museen V. I. 3172 AR 1103-1104. C. LIMC, s.v Orpheus cat 9
e A cabeça de Oreu é encontrada por um homem (na praia de Lesbos? em presença da Musa Calíope Hídria ática de guras vermelhas datável de circa 440 a.C Autoria presumida de pintor do grupo de Poignoto. Baseia Antikenmuseum und Sammlung Ludwg. Número no Beaey Archiv: 37 35. LIMC s.v. Orphe, cat 68
2
e Oreu a tocar entre guerreiros trácios Cratera ática de guras vermelhas crca 430 aC Imagem atribuída ao Pintor da Centauromaquia do Louvre Museo Archeologico Regionale di Paermo 5502 (2562. AR 109040. C. LMC sv Orpheus, cat 1. e Oreu junto a guerreiro trácio que se volta para mulher armada Cratera ática em orma de sno em iguras vermelhas circa 440 a.C. atribuída ao Pintor de Londres Me tropolitan Museum o Art New York n. 24 9730. C. LIMC s.v. Orpheus cat. 26. e 5. Morte de Oreu. Stamnos ático de iguras verme lhas pintura de Hermonax circa 470 a.C. Paris Louvre, G. 416. 16
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e Estatueta mostrando Oreu a tocar a lira cercado de animais. Procedente de Egia século IV Hoje em exposição no useu Crstão e Bizantino de Atenas LIMC sv Orpheus, cat 143c. e Oreu e Eurídice Reevo romano em mármore da época imperial (quçá do século II de nossa era cpia de um a obra grega do século VI a.C possível componente do altar dos doze deuses da ágora ateniense Louvre inv. MR 702 e Oreu e as sereias. Lécto ático de iguras negras datável de circa 580 a.C. Bremmer 1991 p. 23 Cerqueira 2003 p 76 e p 84 17
Imagem Orfu nos infrnos tocr lir. Crtr d vo luts, tribuí o Pintor d Drio, circa 330 Nápols Muso zionl 8166 (H3222) LMC s.v Orpheus, ct. 83
Máic d Péro. Mornd, 2001, p. 202, Image m 8 T ábul
Imagem ' Orfu rodo por niis tocr lir Mosico d pvinto rono do prodo ipri• Plro, Muso Ar choloico Rionl di Plro Cf. LIMC sv Orpheus ct 06
plt dos frscos do s ão 5, uro Imagem A Squênci co i. Pompa Data provávl ntr 60 norte , da V ila di Mistr
Imagem Dioniso nino ntronizdo sduzo pr ort plos Titns. Pxid d rfi d Bolonh século V d noss r Muso Archoloico Cvco di Bolon inv. no. PCR12 Krényi 2002, fi 66b MC sv. nysos/Bacchus n. 267 Imagem Orfu nos infrnos tocndo ctr dint d u inicido. Ânfor ápul fiurs vrlhs Pintor d nids, circa 325 C Bsili Antikusu und Luwi Slun S 40 LMC sv Orpheus ct 88. Imagem Orfu nos infrnos co u fli d inicios Crtr ápul d voluts fiurs vrlhs. Obr o Pintor dos nfrnos, dtávl d 330310 .C Musu d Muniqu, Anti knslun, insr. 3297 (.849) Cf. Pns, 1970, fi 5; Srin, 1990, p 40 fi 3 Imagem Orfu nos infrnos prsntndo u dfunto. O vt posts dint do plácio d Prséfon fc d éct Vês is ci Dic (ou Euric?) brir u port. Fr Fnici (Ncrópol d Ruvo) MC s.v. Orpheus ct. 83.
pi 5.
50 antes de Cristo.
do cubiculu d V ill di Image m A'. do V lho Silno 60 50 nts d Cristo Mistri Pope i Dt prováv nt do cubculu d V ill Image m A3 do Dionso Moço 60 50 nts d e Mistri Pop i. Dt provávl ntr Cristo
Imagem Doysos Maó1eos: o dus dlirnt dspdçr u crvo titud d dnç Stnos áico d furs vr lhas, 480 C British Musu, Londrs, tcul BME 439 Cf. A 298643 CVA 3 t 19 174) LMC , 1 p 414-514 ct 151 Imagem Cristo Orfu d Ctcub d Pdro Mrclino. htp/coons.wikidiorwiiFl:ChristOphus_fro Roctcobj p
Imagem a aa "Cn d ctqus do frsco d Vill di Mistri slão 5 uro nort Popi Dt provávl ntr 60 e 50 C.
magem Protóono Rlvo Módn século d noss r Mon, Muso Civico Archoloico inv 2676
I8
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1
INVENÇÃO DE ORFEU Re f lexão sobr e os hinos ócos e seu p oêmo 10 Liv o dos P ems
O du verorener Gott! u, Unendiche Spur Nur weil dch ressend zuletz die Fendschaft verteite Sind wir d Hõrender jetzt und ein Mund der Natur. - Rainier Maia Rlke De Sonete an Ophus, XXVI
Orfeu é símbolo do fazer criativo que os gregos chamavam de poíesis, uma atividade que dá frutos em todas as esferas da imaginação. Assim a imagem ele atravessa os tempos e ressurge inúmeras ees, na literatura na msica no teatro na dança nas ares plásicas na fiosofia no cinema A invenção de Orfeu 1
' Gandes atista têm gaantido a pemanência de Ofeu no mundo modeno. Na liteatua, podemos cita poetas como Hugo Aponaie Valéy Rlke Piee Emanuel e Joge de Lima ente outos muitos outos pelo mundo aoa N tato b asta que se ecodem os damas de Victo Sgalen Jean Cocteau Jean Anouilh e Tns Wiiam po exemplo Na música já celebaram o poeta sagado os compoitoe Lizt Oenbach Gluc Montevedi Stawinsky Bo hilip Glass No cinema deam-lhe vida noa Cocteau e Macel Camu paa ica só com eses Nas ates páticas destaco Düe, lge Chaga e oudelle ent os muitos que nos to ueam nova imagns do canto abuloso A magníica "Geação de Oeu blhou em otuga com poetas do quilate de Fenando essoa e Máio de Sá Caneio alm de gandes pntoe a eemplo de Amadeo de Sousa Cadoo e Santa Ra into Uma elação de atitas ascinados po Oeu no mundo contempoâneo não cabeia nstas págnas Iso vem
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21
não acaba nunca: é infinita e ubíqua, segundo bem mostou o nosso poeta Jorge de Lima. Dela fazem pate os hinos aqui apesentados. Eles tazem o nome do misteioso poeta Ofeu é misteioso no sentido oiginal do temo, que e mete a Mistéios, a cultos de Mistio adjetivo "místico" tem a mesma aiz fala do silêncio em que se envolvia essa modali dade de culto. Ambas as palavas se viam empobecidas, a igo amesquinhadas com a edução do misteioso ao enigmático, do místico ao vago e obscuro. Tona-se impeativo emonta à fonte O culto de Mistéios envolvia iniciação, alentada pela espe ança de comunão com a divindade Enceava a pomessa de uma ligação adical com deuses a um tempo queidos e temidos Esta foma de culto distinguiase de todas as outas, na Gcia Antiga, pelo impeativo do segedo O nome substantivo mystéria que sempe se egista assim, no plual nos documentos mais antigos tal como seus cognatos mye ("nicia") e my'sthai (se iniciado") deiva de uma aiz *mu [pesente no latim mutus done o potuguês "mudo"] que tem o significado básico e "fecha". O mjses, o iniciao, alguém que mantem os lábios ceaos, guadando o segedo eligioso. A iniciação nos Mistéios constituía um ito de passagem Seguno podemos vislumba po meio de testemunhos sem pe incompletos, fequentemente elusivos, esse ito evocava a angústia da mote e sugeia um enascimento espantoso, capaz de longe. Para o Ocdente, Orfeu "enasceu no sculo XVI com Masio Fcno e co della Mrandla no despona de um noplatonsmo recrado em cepa cstã. Fcno raduzu os Hinos Ôrfics e des se valeu como músco e mago pos acedtava que ao entoá-los com seu mto muscal poda cua maes do corpo e peturbações da ama
2 2
e estenese paa am os iites da exstência uana, das fonteias qe sepaa vida e mote Cumpio esse ito e passae novos atos de sagação e novas ceebações tinam uga eguaente paa os mistas, compondo as leaí. 2
•
•
Vae a pena epensa a noção de mistio. Convém pati o qe gee os signos d a expeiência mstica pesentes no pensaento os antigos elenos na sua poesia pincipamente. ssi talve se tone possíve da outo alcance ao conceto nováo o um toque do antigo valo, emboa não se tate e ua vota ao sentio inicia Se a qeemos empega coo euso de pensamento paa a iluminação a vida pesente, o eseável que a ieia e mistio" vá aém do campo eligioso, aano mas ultapassando a foça poética dessa oigem. Deaado o popósito, diei como a paava meece se 2
Um rameno de uarco (168 = Stob Ah V, 52, 49) qe evoqu e traduz
em outro estudo (Serra 200, az anaoga ent o transe da more e a ncaão nos stéros Dse uma claa correspondênca ente a more e a ncaão t os nomes se aproxmam d utarco, ev ocando a semelança enr os noms â e 'morrer e ncarse. Na squnca le desdoba a anaoga: pncípo udo são errncas, penoso moverse em ccuos e deambuar pela escurdão por ncras vas e descamnos; em seuda, bem pero do m, oda espce d teror e mor, suores e caaros xtremo embarao De súbto pom, es que uma u maravlosa vem ao encontro do errante acodoes, espaos puos se descornam vergs em que eles dscernem voes suaves coros de danas procamas sagradas e sanas vses Ee vêse então, peretamente ncado e camna em lbedade despenddo d todo ao, a stejar cm outras pessoas sanas e puras coroado de lores E abao a seus ps dvsa os nã ncados, multdão mpua que se comprm merguando na brma e na ama .
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usada: mistéio deve chama-se o que só o silênco sabe dze. Mas há que escutálo Pos este sênco canta. Tem a mú sca de Ofeu hamona de magens, atos damátcos e vozes a comunica o dvno deikhnúmena, drómena, legómena. Caso me peguntem se sso faz setdo, se vale a pena da ouvdos a mstéo pestando atenção, de um modo novo, ao que há muto tanscoeu (ou se magnou) em ccunstâncias paa nós ecupeáves só tenho um jeto de ustfcálo peço que se econheça a foça nspadoa dos tos antgos maca dos po este nome Ela fez oa muta poesa e alentou o voo de um pensamento cativo Em testemunho dsso, basta que se eco�deuma passagem decsva, matz de um gande legado, de cua qeza anda nos valemos A fim de evocáo, apelae ao testemunho de Pau Fedaende (1928) confome ee bem mostou (dando a mas caa expessão a uma tese de Ds), Platão, em sua exubeante oba flosófca, eazou uma transposição intelectual dos Mistérios 3
3 A propósito, ver Eudoro de Sousa 197, p 245-256 No seu brihante estudo denomiado "Mto e dialética em Patão", que tem como subtítulo Da tranposição intelectual do Mistério o grande erudito brasilero cta em epgrafe, traduzdoa uma paagem admrável do lvro Platon de Paul Friedndr: Um camino da obs curdade para a cladade camho ecalonado viávl não sem dpêndo de mutos eorço mas em cujo término uma dvndade se mostra a nossos olos envota em luz desumbrate; a meta suprema cercada de um mistéro que não é mposto arb traramente e de qu não é preco cuidar que seja proanao por paavra. pos por palavras não pode ser expreso Abragedo de reace estes traços da ilosoa e do enso platôn cos como ão reconhecer a sua mutas aind ade com o mistéros, sobretudo os de Elêusis? (N 8 Em Elêusis como se sabe também loresceram o germes ricos) Logo no primero parágrao do etudo que tem essa epgrae Eudoro de Soua eclarece reumndo a eposção de redlander "Seja qua or o uo que
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Hoe poucos o questionam Mas uma advetência fazse neces sáia a iquea de Orfeu não se esgotou nessa tansposção Tampouco a aegoese neoplatônca a consumu O dálogo ente osofia e poesia que assim teve uga fo futífeo, poém a onte de que bebeam os pensadoes fascinados po Ofeu não se conteve em seus domnos Tansbodou Anda tansboda • • Oeu é um evelado que se ocuta pofundamente Ee não é menconado nos poemas de Homeo nem nas obas de Hesodo A pimea efeênca a seu nome que chegou até nós se enconta no fagmento 26 do poeta Íbico de Régio, de in cios do sécuo VI aC Segundo a sumáia sentença de Íbco Oeu ea um poeta de gande nomeada (onomaklytós) potanto á consagado naquela altua É cto nfe desse testemunho que obas do vate acamado á cculavam no sécuo VII Mas po que o sêncio pecedente? Afna, quem ea mesmo esse gande poeta que a pimea notca nos evela famoso Teá ee existido como um de nós, como um homem de cane e osso?
almete e ponuce sobre o que latão deve a tágora e a Oreu verdade bem a eguada que o grade dcpulo de Scrates no dálogos do período ntermedáro leou delibeadamete a m e a cabo uma raspoição ndcua o mtéo." etaquei redlade e Eudoo de Sousa por conta de ua rcas releõe sobre o assuto ma de uta ecoece que ea deia remonta a A i 192) e eu oje clássico Ao o Recetemete, Albeto Bernab 201) ez uma demontração cabal dea tee em um etudo muto agaz, percucete erudito e competo
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De um modo gera, os gregos antigos acreditavam que sim. A maioria dos modeos sustenta que não É que a figura de Orfeu tem inegáveis contornos míticos Seja como for, não se pode negar realidade à fonte primeira dos textos órficos ou seja, à imponderável matriz dos textos mais antigos dentre os tantos que produziram a nomeada de Orfeu Ao que tudo indica, essa fonte obscura terá sido bem remota Resuta difíci locaizá-la no tempo, situáa no espaço. Entendase: várias obras foram atribuídas a Orfeu em escri tos que se distribuem ao ongo de muitos séculos Essa atribuição se fez de duas maneiras Na mais simples, um deterinado autor cita uma teogonia, um hino, uma sentença, u receito ou um ensinamento que credita a Orfeu Às vezes porém, sucede coisa diferente: apresenta-se como Orfeu um autor que de outro modo não se dá a conhecer, mas pode ser situado no tempo, em gera a uma distância consideráve das mais antigas obras onde se lê o nome e se proclama a autoria do herói-poeta Em todo o caso, sempre se trata de alguém situáve a uma distância ainda 4
• Uma exceção notável com respito ao ponto de vista que prvalcia entre os antigos fo Aristótees, para qem Orfeu nnca existu: qem o dz é Cícero no D, 1at< deorum 1, 07 (OT 3 K). De acordo com a mesma notícia, o Estagirita atribuiu
a Cércope a verdadeira autoria dos ivros "órficos A citação do orador atino possi vemente se reporta ao dilogo aristotco prdido Pr! pbilosophía. Na Antigidade tamém se conjetou qe haveria dois o mais Orfeus A popósito vea-se o artigo Orphes de autoria de Otto ruppe no Roscher Lexikon vo tomo com destaqe para o primeiro tópico (co 058-062 Die Frage nach der Existen ines ode mehrerer Snger des Namns Orpheus Qanto aos modernos hov qem sstentasse a existência histórica de Orfe Foi o caso, por empo de R Bhm para quem Orfeu teria vivido nos tempos micênicos por vota dos sécuos XV-XI aC
época indefinida em que vel de percorrer da maior - impossí de uma Musa. cava o herói nascido a tradição colo ntra-se senta na Antiguid ade tardia enco Quem assim se apre ficas . O autor está, das primeiras criações "ór bem longe, claro ção a trato achase justamente nest situa do Hinrio de que •
•
s dedicados a divindades, este Além de oitenta e sete hino nder como Proêmio, que seu tí tulo dá a ente corpus e erra um pulo Museu. O tí tulo cifra-se em uma fala de Orfeu ao discí e se faz no cabeçaho de uma um endereçamento similar ao qu eliz mgo! - e os dois primeiros cta - De O u par Museu, Sêf versos desdobram o apelo: o Aprende, 6 Muse do rito de sagaçã
e. A prece principal, de t odas a mas subm
a. Museu nada O que o mestre ensina a seguir é uma ladainh ve na carne deste diz, permanece silencioso. A récita se inscre assim "daloga silêncio poderoso. O mestre e o discípulo que Orfeu, Museu comungam um traço perturbador: tanto quanto Deas se afigura, a nós modernos, menos rea que suas obras. nos chegaram apenas fragmentos, citações esparsas. Mas não as podemos ignorar. Não é só o tí tulo-endereço do Proêmio que atribui o exto a Orfeu. Alguns dos hnos sugerem ser esse herói o seu enun ciador a pessoa que neles fala. A rigor, insinua-se que é sempre Orfeu quem se dirige aos deuses celebrados, em todas as c om-
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posições do hinário. Sugerem-no diferentes passagens: se não é ee o místico Boiadeiro (Boukólos) que se apresenta no Hino a Hécate (HO 2, 10) e no Hino aos Curetes (HO 31 7) não pode ser outro o fiho de Caíope que saúda sua mãe tanto no Hino às Nereidas (HO 24 1) quanto no Hin9 às Musas (HO 76, 0). No Proêmio, portanto o autor dos Hinos Ôrficos inicia seu trabaho írico de modo dramático: pondo em cena o poeta a quem os atribui E vestindo sua máscara. Essa atribuição vem a ser o invento fundador de sua poesa Do ponto de vista históricofioógico, ee produziu um apócrifo No entanto seria injusto considera seu procedimento uma simpes fasificação Logo se vê o problem _a que significa faar de fasificação da obra de um autor mítico? E se mítico não ea, onde encontrar o verdadeiro Orfeu? Po certo, é inegáve que o hinário em apreço consttui um apócrifo Ora um apócifo é, por assim dizer, um págio às aves sas. Cá está o probema em princípio oa as obras ditas de Orfeu podem ser cassificadas desse eito A um cético que peça provas da aegada autoria deas, ninguém poderá satisfaze. No caso de Orfeu não dá paa identificar as produções "autênticas" Nada tem de incomum a produção de apócrifos ou pseu doepgrafos na Antiguidade, quando a autoia era bem menos consideada do que hoje e vaerse do nome de um escrtor iustre ea um meio de garantirse a atenção de um púbico 5
' Sinto-me nclnado a acatar a tese de peyer (197, p. 35-47) que propôs a ds tnção ntre duas forma de psudoepgaa rgosa clafcando uma de "au· têntica e outra de "nautêntca" Paa mm o erfumes atbuídos a Ofeu têm um aoma de autentcidade: são de fato nspirados em Orfeu, portanto órfcos
que o Meste da Academia diálogos " de Platão os m e T . ícil dif udo-Aristóteles que o esce veu. T emos um Pse ceamene não nciar do Estagirita. Mas logos pemitiu difere filó s do o alh ab a crí tica histórico-filo Aistóteles e de Platão que emos çbas de de Orfeu nenhum seem autênticas. No caso lógica nos gaante enticidade nos historiador ousa falar de aut filólogo nenhum eza, pela e vidência Apenas sabemos com cert mesmos emos não podem cetas obras creditadas a Orfeu do anaco:1ismo que s que a , emoto sempe longí nquo por mai se desse pesonagem nha Difí il apoximação: exige uma estra gene sepoxime dele. em da do pocurado, mas não consegu fé da pae de quem du vi esqui va-se da busca Ô o tardio poeta postulado por O escio dos Hinos rc os deixa muitas pistas, não dá nós, seus leioes de agoa - não em ou permitam inferi com sinais que efei vamente o identifiqu no mundo antigo. Sim po plena seguança a sua localização . Mas vê-se logo que esse de mos chamálo d e PseudoOrfeu " onmia como algum edao (ou edatores?) não v isa va a pseud qualquer, passível de de nós pode fazer: Ofeu não é um n ome a li ve criação de um escolha ente outros, dando espaço para nosso poeta não personagem. En volve uma pessoa especial, que o como Pessoa in venou, iso é não i ndustriou do mesmo mod o poeta fica teá ciado seus heteônimos. Se excluímos Ofeu perdem anônimo Mais ainda, fica nu de p essoa - e seus versos ou se ja anto herói c o o sentido. De algum modo, ele incorpoa encana o ob jeo de sua c ença, que sua crença ecria. Oculo na claeia d os hinos o poeta ignoto assume a cédito da origem sona e a autoidade de Ofeu p orque lhe dá o
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última de sua invenção - e porque, ao realizála "de novo (co os versos que lhe escreve) místicamente se identifica com ess impalpável pessoa sagrada: identifcase com o mestre do Mis tério o poeta por excelência. Há mais Nosso escritor quem que que ele tenha sido no jogo fictcio em cuja trama se nvolve profundamente fazse também Museu: dentificase com o receptor inspirado do discuso mtico. Procede como ele: retransmite a lição do mistagogo, enquanto silencia sobre si mesmo No processo o poeta oculto por certo se apropria também do tesouro de di ferentes hinos órficos anteriores a sua lavra O nome assumido lhe dá esse direito o tempo do escriba ignoto já existia uma ·vasta literatura credtada a Orfeu e Museu personagens sempre ligados a uma época muito remota para além do registro histórico. Vale recor dar segundo a legenda Orfeu teria participado da aventura dos Argonautas que a tradição dos mitógraos considerava anterior à guerra de Troia. 6
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Justifcava-s bm a ilação dos mitógrafos pois a Odissia faz rfrênca ao périplo
d Argos, cf Od. X 60 Na méopa do tesouro dos siciônios m Dlfos obra do sécuo VI ants de nossa ra gurouse Orfu entr os argonautas gurando uma ira junto a ouro músco com igua insumnto. Qu Orfu participou da fabuosa xpdi
Hypsipl, ypi/e frag 54 co 2 3 sq (Aim). Aponio de Rods
ção dcaam dois fragmntos da pdida tragédia uipidana Hipspila [Eu rag 1 co. 3 v. 8 Eur
na sua Argon«t 32) incuiu Orfu nt os hróis da grand aentua Um scóio
ao vrso 23 do cano I dssa epopia pora a tradção sgundo a qua hou dois Ür· fus um ds argonauta Prsras amém uma oba conhcida como Argonáuticas
Órfcas composa nre o quinto o sxto sécuo d nossa era. Nla, Ofu tm pap d dstaque: é o narrado da avnta Entr as ediçõs mais conhcidas das Aonáutca Ôf dstacas a d ian 2003) A rspio ver também Ws 93 p 37
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e há pouco: o escritor dos Hinos Retono ao que diss guo, refletido se oculto por um espelho ambí Aromas mantém-
nele em duas figuras.
É, a um tempo Orfeu e Museu. Assume
a que re ambas as pessoas: o santo poet ambas as imagens u
que escuta. A saudação inicial de Orfe cita, o eta santo uma texto uma espécie de epí stola mí stica, a Museu faz do o. Mas não há distância alguma entre a inst ução e um legad redator que supomos (temos de supor) lição e sua ática. No e o destinatário Com isso ele já confundem-se o emetente
órfico é preciso seguirlhe o está die .ndo que para faze-se ex empo tona-se Ofeu E Museu, é clao.
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- ou Passo agoa a faa bre vemente do pouco que se sabe reda de al do oc elhor, se con jetura a espeito da época e foram ção destes H inos Ór ficos. Muitas datações diferentes já sos propostas, mas ho je há razoá vel consenso entre os estudio
a esse espeito: tudo indica que o hinário e m apeço terá sido co posto ente o segundo e o quinto século de nossa era - mais po va velmente no segundo ou no máximo, no terceiro século. O vocabuláio é tpico do gego culto do perí odo mperia e ostra coincidências signficativas com a linguagem dos hinos ágicos, as também c om o léxico da epopeia Dionisíacas, de
Nono de Panópolis, escita na quinta centúra. O teor dos hinos a fora de sua construção, o modo como eles se inttulam e
seu encadeamento na syllogé sugerem a adequação a uma litu-
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gia mística. Eles dão testemunho de uma piedade pagã que o cristianismo ainda não pudera estancar nem absorver Graças à epigrafia as divindades menos conhecidas evoca das nos hinos ajudam a situá-los: inscrições onde se leem seus nomes assinalam seus centros de culto Cm base no testemunho delas, presumese que os poemas em apreço devem ter sido compostos na Ásia Menor em alguma cidade grega da Anató lia O sábio Otto Kern o grande fióogo a quem devemos a compiação pioneira por muito tempo "canônica dos Orphicorum Fgmenta, sugeriu que a composição do hinário em estudo se deu em Pérgamo no círculo místico igado ao santuário de Deméter (Kern 190 911) Tal como Graf (992) estou convencido de ue este con· junto de hinos é obra de um só autor um homem culto e reli gioso por certo um iniciado em mistérios órfeobáquicos quiçá um sacerdote de seu círculo místico Não me parece impossíve que ele portasse o títuo misterioso de Boukólos (Boiadeiro ) com que a voz enunciadora do Hino a Hécate se identifica7 Aém de conhecer bem a iteratura órfica o poeta enco berto era evidentemente versado em fiosofia em particular na estoica de que tirou muita inspiração Encontramse ainda em seus versos ecos neoplatônicos e neopitagóricos Um poeta erudito com certeza Mas de modo agum um puro retórico ão estava interessado apenas na performace da escritura hoje está superada a tese de Lobeck (1829 que viu nos Hnos Ôcos ' Ver a popósito Jaco, 2003 vol 2 p. 349 Cf Moand 201 cap V p. 25-276 apêndc 8 9
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O
destinado a um pequeno e x ercí cio literár io de um diletante,
. cír culo cultivado
hegouse a crer que algumas das divindades celebradas nos hinos deuses pouco conhecidos a exemplo de Mise e elínoe fossem fruto de imaginação poética. Mas a arueologia e a epigrafia comprovaram que elas eram efetivamente cultuadas na Ásia enor Como Dieterich (89) já sustentava e como hoje reafiram autoridades do porte de Fritz Graf e AnneFrances orand o hinário em questão por certo se compôs para ser vir de inrumento a uma liturgia mística A sábia francesa se epenhou na abordagem da ideologia do grupo religioso que se vaia desses hinos (Morand 2001) sem dar muito crédito ese da autoria única tese de que por minha parte estou convencido Em um artigo precioso em que explorou uma pista de ieterich o mestre suíço da Ohio State Universit y (Graf 9) buscou na ordem dos poemas os indicativos do processo litrgico É uma tese sedutora. Tudo leva a crer que nosso escritor oculto era um religoso sincero Há fervor em seus hinos e de sua leitura se deduz facilmente que ee tinha especial devoção por Dioniso Seus poeas reveam interesse de teólogo inspirado na tradição ística do orfismo mas também em obras filosóficas É bem possível que fosse um aristocrata de Pérgamo vivendo numa poca em que Roma já desfrutava da herança dos Atálidas e a cidade ostentava em sua acrópole o magnífico altar hoje con servado no Pergamonmuseum de Berlim Talvez o cristianismo começasse a vingar porém não era influente Podia ser ignorado por competo naquee meio O poeta dos Aromas representa
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bem a mística pagã que po sinal, deixou sua maca podero sa no imagináo cistão. Paa caacteiza o auto dos Hinos Ôrco não basta a evocação do esciba desconhecido. É peciso que se consdee o poeta com quem ee se identificou 1mpõe-se estuda-he a máscaa sagada fia a intangve pessoa de Ofeu O mito esponde pea fomação dessa mage Ea pode dexa-nos pepexos Mas há que contempá-a •
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De acodo com a tadição Ofeu seia u ácio fho de Eago u io da egião um ei fabuoso ou segundo outas fontes do deus Apoo Aceditavase que sua mãe ea uma das nove Musas Nos hinos de que fao esa Musa é caamente identficada: Caope a Beavoz Mas havia quem sustentasse que foi Ponia dos mutos cantaes quem o paiu 8
' Orfeu filho de Eago ei táco: T 23 K n as fêncas Kn ana a. Symp. 179d; Apo Rod , 23 Ncand Tim. 462 Pn d. ag 26 Apood 3 N uma gosa d Sévo (Sv H Verg. Aw VI 645) ago é dnfcado como um o vdn mn um deus o Ofeu flho de Aolo T 22 Acp Tag (FC 303 ag 8 d Mel. X 6 Rfnca a ambas as açõs n sco vd [bis 482 p 84 s Na Quaa d Píca (Pyth IV 313) Pndao ceba fu como "pocdn de Apoo mas não guo qu sso dva nnd-s em mos d uma aão naua Taez s a d pocdênca m sndo meafóco ou sja no mesmo sendo m ue sodo na Togona afma pocdm d Apoo odos os canos cados É co u aão na m men u e Musu nas passagens m u faa d angos poas fos de duss (c p e a _ 40d V a popóso Benab 200 p 34 5). J m vdo (Met. X 67 fu cama Apoo d "mus gno Orfeu fio de ua (T 2425 K aop apac m numosos esmunos como mã d feu 1
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: de acordo com os T ocaos aqui uma contradição orginal
este herói grego era trácio, ou se ja, um bárbaro. antgos helenos
hisSó paa lemba: a T rácia coesponde a uma egião eritóio hoje se dvide en óca o sudeste da Euopa, cu jo
Ao lese confinava com o Mar re Grécia, Turqua e Bulgária. por limies o esreito de Negro e o Bósforo; a sudese, tinha su banhava-se no Egeu Dardaneos e o Mar de Mármara; ao
a quando T odo o seu terrióro ornou-se su jeio à Macedôn
Felpe I nela estabeleceu a hegemonia de seu povo balcânco, deotano os súditos de Cesoblep es. Esses ácios á se acha
va na área a que deram noe anes da invasão dos chamados citas: uma área atravessada na proo-hisória pelos helenos em ondas sucessivas no seu avanço para o Medterrâneo, rumo ao Eeu e à Anatólia. Pelo meso corredor passaram, ao longo dos sécuos diferentes povos enre os quais os hiias, os frígios os
ldos e - bem ais arde os celas.
A ce em afimações dos gegos antigos os tácios eam sevagens desumanos de costumes besais Cuéis sanguinários, utos são aguns dos tuos que os heenos hes davam co ceta fequência No entanto os heenos ambm afiravam ue o seu poeta semidvino seu sano úsico, poceda desses eves bábaos de duvidosa humandade, em seu eio viva s pópas Musas eam igadas à Tácia f. pe a 364 o 24 0 Um scoasa d Apoôno d Rods (sco Apo od 23) ega ue aguns dzam s eu fo d Pona Ofeu fho d ua fa T 26 K = Tze Chil 2 305) Dscussão auada das gnaogas d fe e encona no ago peus do Rosc d auoa d Cupp e amm a gloa oepondene na R o ago pus assnado po K Zegk
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serve em outro estudo comentando o Prólogo da tragéda As Bacantes, de Eu r ípdes (Serra, 2012 p. 29) assim mesmo se apresenta o dvno personagem do famoso drama eurpdeano qando ele decide manfestar-se em Tebas O recémchegado Donso é ao mesmo tempo um estragero e um natvo da cdade grega que invade com seus ritos: mostra-se vestdo com trajes "bárbaros mas falando grego A Donso devotouse Orfeu o vate de Apoo Na tensão entre os dos rmãos dvinos muito próximos e todava opostos desenho-se a vida trágca do poeta. Mas antes de falar dessa tragéda fare uma associação que pode soa r muto ousada Aproxmare Orfeu de outro vate tráco també mítico que até pode serlhe ooo Tamíris. •
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Peço aos letores que votem por um momento a atenção para uma pintura desaparecda. Graças a um vaante muto atento ela pode anda ser contempada melhor dzendo ma gnada. Refirome a uma obra famosa de Polignoto a nkyia por ele pintada em um edifício conhecido como o Paratório Délfco ma oferenda dos Cnídios ao deus o racular. Pausânias no décmo lvro de sua obra (X251X309) descreveu esse mural em que o famoso artsta figurou o reino dos mortos. No Hades pntado de Polignoto entre outras personagens erocas via-se Orfeu com traes gregos sentado em uma espécie de colna com a harpa em uma das mãos e a outra a tocar os ramos de um salgueiro O lugar assm representado
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evidentemente o bosque de Perséfone. Do diz O periegeta, era ero m personagem vagamente dentf otro lado do salg medon parecia esctá-lo embevecido. Não cado pelo nome Pro do mural viase T amírs cego com longe, a mesma seção abatmento, longa b arba d esg renhada expressão de profndo
a lra qebrada a ses pés
da Ilíada (canto II, versos A magem se reporta a um trecho desatno e a mséria de um 594-600), em que Homero evoca o excelênca na msica, T amím ú sco .berbo: convencido de sua fontes que ele queria como rs desafo as Msas Narram outras desas canoras prêmio se vencesse - possuir todas as nove 0, (Scol n Er Rhes. 346; Asclep FGrH ! 7 10). de Zeus o derroflhas O ambcoso não teve scesso As ram taram. Ato contí no, elas o privaram de sa arte e o deixa para sempre leso: pérós. A palavra pérós pode tradzr a mdez do cantor mas tam
bm otros tpos de lesão qalfca o ceo Polgnoto e ó cles representaram Tamírs cego' e também o moene ro castgo com certeza. Mas corresponda a m tremendo sacriégio O Pntor da Nekya délfca aproximo para contrastá-los o poeta santo e o sacrlego Ora nos mitos o contraste f reqen temente traduz parentesco por vezes até identdade Neste caso notamse alguns ndícios qe permitem a aproximação 3
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' Na eceação da ragédia Tamíis, d Sófoes, qu damatzava a hia do inflz aedo (rag. 216-224 Nack), a máaa do hró na um oo po o ou az E poreor idcaa o ceamo do psonam
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assm como Orfeu, Tamírs era consderado flho de M usa (às vezes Erato, às vezes Melpômene);' 4
dza-se também que a mãe de Tamrs fo a nnfa Argop e (ou Agrope um nome dado à esposa de Orfeu, quçá u cognome de Eurdce; 5 segundo uma varante da genealoga de Orfeu evocada pr Tzetzes (Chi/. 1, 2 305) fo sua mãe a nnfa Menipe, ua flha de Tamrs;
6 ), Zeus o fulminou por que ele ousou revelar Pausânias (IX 30,
Mistér ios (o culto dos Mistér ios ). as homens s
prometiam franquear aos Entenda-se: inaugurando ritos que gar antir -lhes f elicidade mesmo depois da umans a beatitude, e guar dados pelos deuses. mr te Orfeu violou limites zelosament a sua mor t e ter r ível às Há ver sões que atribuem a essa façanha 17 mãos das mênades.
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Tamrs empenhou-se (de modo nfez num duelo canor com deusas. Orfeu, segundo Apoôno d< Rodes, se envove numa espéce de dsputa muscal com damas · sobre-humanas, cantoras quase sempre rresstves: as sereas (a dferença crucal é que Orfeu fo vtoroso); 6
Tamrs fo mutado por deusas, damas sacrossantas Orfe fo decaptado por damas consagradas (as bacantes) Devo anda acrescentar um tenebroso traço comum aos dos poetas certas varantes de sua hstóra mtca apresentam Orfe como acrílego. Mas qua fo seu sacrégo? Cá está segund " Cf. Eustath schol ad i, 594 sq.; Sudas sv Tyr. Plut D e 1s. I, 152b Apood. 3 Apo Rhod. 23 Cf Eustath scho ad li. 594 sq; Sudas sv Tyr; Plut D . I, 1152b Apood. , 3 Apo Rhod 23 Ké (1998 p 232) cometando a petnênca d ome g ao o das epcleses da Lua lema ue dscípuos uteoes de Ofeu que aás sustetavam se Musu fho do meste fzeam d Seene, a aha da ua sua mãe cf sho ad Ve V 557) '6 Cf Apol Rhod 23 escóo eoando catos mas beos, O feu mpedu que compaheos aonautas com a úca exceção de Buts sucumbss à atal sedução caoa das seeas.
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Já se vu que Orfeu era também consderado fho de Apoo, Senhr da medda Mas não se pode negar que o excesso o acompanhava Quando ee cantava reza môndes no frag ento 27 (Adrados as aves do céu voavam em bandos à vota de sua cabeça e os pexes satavam ao seu enconto desde os absmos do mar Bestas do campo e feras da seva se guam-he s passos mansamente, fascnadas peo som de sua ra, peo esplendor de sua voz, que também comova pedras e árvores, atrando até mesmo os seres nertes São magens de beleza onrca, mas é evdente que essas faanhas desafam a ordem do mundo, que a subvertem. Ora, para pensamento regoso dos helenos é sagrada es sa ordem, caada kósmo na sua lngua 18
rfeu fo anda mas onge no desafo às es do unverso: esceu vvo aos nfernos em busca da amada, para tentar 17 f at y 7 9c
tamb m Eu 560-564 Apol Rhod 23
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Isso nã é poc. Assim constataos qe Orfe já er conhecido aqela alta como agonata, famoso enqat argoata •
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Da grande viagem do Argos dá notícia a Odisseia (XII 697) A mençã ao bom scess d fablso navio se ecotr em m discso de Cice qado a divina feiticeira instr u Odisse sobre a ota e os perigs da vagem qe logo mas el epreendeá, deixand a iha Eea. O diálogo entre a desa e heró este interfere apeas para fazer ma pergnta ete vesos 1 e 14 estendese do verso 36 ' ao do eferid cato Toda a passage assim cmo o techo em qe se ara piplo annciad po Cce co certeza se inspira em tadiçã rema de qe o ato da Odisseia tinha ciênca: ma prisc Agonátca. Nós cohecems pemas mito posteriores c este ome mas a legenda era bem atiga coforme po aí se vê. Logo começo de sa longa fala Circe previne qant às seeias. O qe ela pediz e logo se veifica é mito sg fcativo pela segnda vez (pois tinha vido de pavors visita ao limiar do mnd dos mortos reino de Hades e Peséfoe) Odisse passa pelo nacessível Transpndo as rochas erantes beira da tremenda cavena pétrea qe dá para o Érebo (vers 80 itacense expermenta à peu prs ota catábase. Mas esse trâsto, o se qase ipssível êxto ele te m precedete qe o poeta acsa. O gande aedo ão fala em Orfe tampoc em Jasã embra Agos E isso lhe basta. Os natas de Argos conhece s
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Pyth. IV , 570 sq ) Ent e ut s testemuhos (cf Pind. deps p acha va O f eu. Não he oos d ousado na vio se s na vegantes r da g ande a vetua da legenda que o aut pdes deslgá-l de passagem. Não f o, portanto, po um puro da Oi �sea e vca
afs situa am O f eu em geração heroica ap h que s itóg ra 25 T udo indca que desde muito o ante à da gue a de T a t ipulação do f abulos Argos - e peta iteg a va na legenda,
ela tha papel desiv.
ligação com os inAs ser eas sã T odesdamonen, entes cuja os bem acusaram. 26 O f e ns, m Hades e Pe séf ne os trágc sua lira enf e ntando léit de Heidelbe g s ostra O fe u com a f igura têcas f eras, s pde es da morte. Cotempland d lét, vê-se bem que ele está li vr e (não atad coo Ods seu) a tar entre as t err íveis cantor as, que parecem escutá-lo f asnadas. Sua attude é de desaf io O herói citaredo tem uma
" ar a " pder sa que lhe per te o enfr entament. R eaiza ua f açaha que pa a ut os homens significaria a queda sem retorno no doínio d a mor te.
Era atiga ps, a lgação deste poeta com o mudo inf e . Ele deve te sid desde muto cedo, personagem de catábases. lsóates (Bus. 8 ) fez o ctaste etórico entre Busíris
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qe dava te as hes ates d tempo, e Orfe qe taza defts d e exte Este músico qe operava podígios " Cf. a propósit OT 7-21 K N gls rheus d Rsch (v I, m c. 1064-5), Oto Gruppe relacina s dvesas cnjeuas ds mógfs ngs qe suaram Orfeu sempre antes - mas viável dsâc d gção de heóis d Guerra de T roia.
' · Cf Soph frag. 7771 Eu H d 167 sq .
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