SOARES, SOARES, Magda. Magda. Que professor professor de Português Português queremos queremos formar? Boletim da ABRALIN – Associação Brasileira de Linguística . Brasília, n. !, ago. ""#.
QUE PROFEOR !E POR"U#U$ QUERE%O FOR%AR& Magda Soares A pergunta que d$ título a esta e%posi&'o e%posi&'o en(ol(e outras, que a pre)edem* que sa+er es)olar este, a que )-amamos Português? Que )ritrios temos para definir o profissional que se responsa+ilie pelo ensino e pela aprendiagem desse sa+er es)olar? Para responder a essas perguntas, duas ordens de fatores de(em ser )onsideradas* de um lado fatores e%ternos / pr0pria dis)iplina Português 1 fatores de naturea so)ial políti)a, )ultural, de outro lado, fatores internos / dis)iplina 1 fatores relati(os ao estatuto da $rea de )on-e )on-e)im )imen entos tos so+re so+re a língua língua.. 2ma persp perspe)t e)ti( i(a a -ist0 -ist0ri) ri)a a que re)up re)upere ere o pro)es pro)esso so de institui&'o do Português )omo dis)iplina es)olar e os pro)essos de )onstitui&'o do profissional 3professor de Português3, e, assim, re(ele o papel determinante desses fatores ao longo do tempo, permitir$ )ompreender o presente 1 que professor de Português estamos formando 1 e definir a meta para o futuro4 que professor de Português queremos 5ou de(emos6 formar. A ne)essidade, ne)essidade, num país de língua portuguesa, de uma dis)iplina, no )urrí)ulo es)olar, es)olar, que ten-a por o+7eto e o+7eti(o o estudo dessa língua, e de um profissional formado espe)ifi)amente espe)ifi)amente para en)arregar1se do ensino dessa dis)iplina pare)e, aos ol-os de -o7e, 0+(ia e indis)utí(el. 2ma perspe)ti(a -ist0ri)a mostra que n'o assim, )om tal denomina&'o 1 8íngua Portuguesa ou Português 1 a dis)iplina s0 passou a e%istir nos )urrí)ulos es)olares +rasileiros tardiamente, nas 9ltimas d)adas: do s)ulo ;<;, depois de 7$ -$ muito organiado o sistema de ensino, e o pro)esso de forma&'o do professor para tal dis)iplina dis)iplina s0 te(e ini)io rios anos =" do s)ulo ;;. At meados do s)ulo ;><<<, no sistema de ensino do Brasil 5)omo no de Portugal6, o ensino do português restringia1se / alfa+etia&'o, ap0s / qual aqueles pou)os alunos que tin-am a)esso a uma es)olaria&'o mais prolongada passa(am diretamente / aprendiagem do latim, +asi)amente da gram$ti)a da língua latina, e ainda da ret0ri)a e da poti)a* quando a Reforma Pom+alina 5#!@6 tomou o+rigat0rio, em Portugal e no Brasil, o ensino da 8íngua Portuguesa, esse ensino seguiu a tradi&'o do ensino do latim, isto , definiu1se e realiou1se )omo ensino da gram$ti)a do português, ao lado do qual mante(e1se, at fins do s)ulo ;<;, o ensino da ret0ri)a e da poti)a Assim, quando, em #=, foi )riado, no Rio de aneiro, o Colgio Pedro <<, que se tornou, durante d)adas, o modelo e padr'o para o ensino se)und$rio no Brasil, o estudo da língua portuguesa foi in)luído no )urrí)ulo so+ a forma das dis)iplinas Ret0ri)a e Poti)a, a+rangendo esta a 8iteratura* )uriosamente, s0 no ano seguinte, em #=, o regulamento do Colgio passa a men)ionar a Dram$ti)a a)ional )omo o+7eto de estudo. Ret0ri)a, Poti)a, Dram$ti)a estas eram, pois, as dis)iplinas nas quais se faia o ensino da língua portuguesa at o fim do
Por outro lado, fatores internos e%pli)am a persistên)ia, por tanto tempo, de um ensino da língua entendido )omo estudos de gram$ti)a, ret0ri)a e poti)a* o )on-e)imento que ent'o se tin-a da língua era aquele transferido do )on-e)imento da gram$ti)a do latim, da ret0ri)a e da poti)a aprendidas de e em autores latinos e gregos. Que outra )oisa se poderia ensinar? Assim, na dis)iplina Português, durante todo esse período, estuda(a1 se a gram$ti)a da língua portuguesa, e analisa(am1se te%tos de autores )onsagrados, ou se7a* persistiu, na (erdade, a dis)iplina gram$ti)a* para a aprendiagem so+re o sistema da língua, e persistiram a ret0ri)a e a poti)a, estas adquirindo, (erdade, no(as roupagens ao longo do tempo. / medida que a orat0ria foi perdendo o lugar de destaque que tin-a at meados do s)ulo ;<; tanto no )onte%to e)lesi$sti)o quarto no )onte%to so)ial, a ret0ri)a e a poti)a foram assumindo o )ar$ter de estudos estilísti)os, tal )omo -o7e os )on-e)emos, e foram1se afastando dos pre)eitos so+re o falar +em, que 7$ n'o era uma e%igên)ia so)ial, para su+stituí1los por pre)eitos so+re o es)re(er +em 7$ ent'o e%igên)ia so)ial. Assim, em+ora a dis)iplina )urri)ular se denominasse Português persistiram, em+utida nelas, as dis)iplinas anteriores, at mesmo )om indi(idualidade e autonomia, o que se )ompro(a pela )on(i(ên)ia na es)ola, nas quatro primeiras d)adas deste s)ulo, de dois diferente e independentes manuais did$ti)os4 as gram$ti)as e as )oletJneas de te%tos. E(iden)iam essa )on(i(ên)ia )om independên)ia a pu+li)a&'o )on)omitante de gram$ti)a e seletas, am+os os gêneros )om forte presen&a na es)ola, nas primeiras d)adas do s)ulo ;;. Quem eram, ent'o, os professores de Dram$ti)a, Ret0ri)a, Poti)a e, posteriormente, de Português, nessa po)a em que ainda n'o e%istiam instJn)ias de forma&'o do professor? 8em+rem1se4 estas s0 surgem nos anos ="6. Eram estudiosos autodidatas da língua e de sua literatura, )om s0lida forma&'o -umanísti)a, que, a par de suas ati(idades profissionais 5eram mdi)os, ad(ogados, engen-eiros e outros profissionais li+erais6 e do e%er)í)io de )argos p9+li)os, que quase sempre detin-am, dedi)a(am1se tam+m ao ensino* e%emplos s'o o'o Ri+eiro, 9lio Ri+eiro, KranLlin H0ria, Carlos de 8aet, Kausto Barreto, Antenor as)entes, Kran)is)o da Sil(eira Bueno, Eduardo Carlos Pereira, nomes )on-e)idos por suas pu+li)a&es4 gram$ti)as, antologias, estudos filol0gi)os, estudos liter$rios. A )ompetên)ia atri+uída a esses professores de Português que -o7e )-amaríamos 3leigos3 fi)a e(iden)iada nos manuais utiliados nas es)olas4 as gram$ti)as n'o tin-am )ar$ter did$ti)o, eram apenas e%posi&'o de uma gram$ti)a normati(a, sem )oment$rio pedag0gi)os, sem proposta de e%er)í)ios e ati(idades a serem desen(ol(idas pelos alunos* as antologias limita(am1se / apresenta&'o de tre)-os de autores )onsagrados, n'o in)luindo, em geral, nada mais alm deles 5nem )oment$rios ou e%pli)a&es, nem e%er)í)ios ou question$rios6. Assim, o professor da dis)iplina Português era aquele que )on-e)ia +em a gram$ti)a e a literatura da língua, a Ret0ri)a e a Poti)a, aquele a quem +asta(a, por isso, que o manual did$ti)o l-e forne)esse o te%to 5a e%posi&'o gramati)al ou os e%)ertos liter$rios6, )a+endo a ele, e a ele s0, )oment$1lo, dis)uti1lo, analis$1lo, e propor questes e e%er)í)ios aos alunos. A partir dos anos !" que )ome&a a o)orrer uma real modifi)a&'o nas )ondi&es de ensino e de aprendiagem da dis)iplina Português 1 fatores e%ternos4 uma progressi(a transforma&'o das )ondi&es so)iais e )ulturais e, so+retudo, das possi+ilidades de a)esso / es)ola (ai e%igindo a reformula&'o das fun&es e dos o+7eti(os dessa institui&'o Em primeiro lugar4 a partir desse momento que )ome&a a modifi)ar1se profundamente o alunado, )omo )onseqIên)ia da )res)ente rei(indi)a&'o, pelas )amadas populares, do direito / es)olaria&'o* demo)ratia1se a es)ola, e 7$ n'o s'o apenas os fil-os da +urguesia que po(oam as salas de aula, S'o tam+m os fil-os dos tra+al-adores 1 nos anos N", o n9mero de alunos no ensino mdio quase tripli)ou, e dupli)ou no ensino prim$rio. Em segundo lugar, e )omo )onseqIên)ia da multipli)a&'o de alunos, o)orreu um re)rutamento mais amplo e, portanto, menos seleti(o de professores em+ora estes fossem, 7$, em grande parte, oriundos das re)m1)riadas Ka)uldades de Kilosofia, formados n'o s0 em )onte9dos de língua e de literatura, mas tam+m de pedagogia e did$ti)a. As )ondi&es es)olares e pedag0gi)as, as ne)essidades e e%igên)ias )ulturais passam, assim, a ser outras +em diferentes. o entanto, n'o -ou(e grande altera&'o nos fatores internos, isto , nos )on-e)imentos so+re a língua* esta )ontinuou a ser )on)e+ida )omo um sistema )u7a gram$ti)a de(eria ser estudada, e )omo um instrumento de e%press'o para fins ret0ri)os e poti)os. Assim, n'o -ou(e altera&'o signifi)ati(a no o+7eto e nos o+7eti(os da dis)iplina Português. E (erdade que
gram$ti)a e te%to, estudo so+re a língua e estudo da língua, )ome&am a dei%ar de ser duas $reas independentes, e passam a arti)ular1se4 ora na gram$ti)a que se ('o +us)ar elementos para a )ompreens'o e a interpreta&'o do te%to, ora no te%to que se ('o +us)ar estruturas lingIísti)as para a aprendiagem da gram$ti)a. Assim, ou se estuda a gram$ti)a a parti do te%to, ou se estuda o te%to )om os instrumentos que a gram$ti)a ofere)e. Quanto / )on)ep&'o de professor, esta se altera fundamentalmente, o que fi)a )laramente e(iden)iado nos manuais did$ti)os que su+stituem, a partir dos anos !", as gram$ti)as e as antologias4 num 9ni)o li(ro apresentam1se )on-e)imentos gramati)ais e te%tos para leitura, e, so+retudo, in)luem1se e%er)í)ios de (o)a+ul$rio, de interpreta&'o, de reda&'o, de gram$ti)a. Assim, 7$ n'o se remete ao professor* )omo anteriormente, a responsa+ilidade e a tarefa de formular e%er)í)ios e propor questes4 o autor do li(ro did$ti)o assume ele mesmo essa responsa+ilidade e essa tarefa, que os pr0prios professores passam a esperar dele, o que surpreende, se re)ordar que 7$ ent'o os professores tin-am passado a ser profissionais formados em )ursos espe)ífi)os. Algumas raes tal(e e%pliquem esse aparente parado%o. 2ma delas que nessa po)a que se intensifi)a o pro)esso de depre)ia&'o da fun&'o do)ente. A ne)essidade de re)rutamento mais amplo e menos seleti(o de professores, 7$ anteriormente men)ionado, resultado da multipli)a&'o de alunos, (ai )onduindo a re+ai%amento salarial e, )onseqIentemente, a pre)$rias )ondi&es de tra+al-o, o que o+riga os professores a +us)ar estratgias de fa)ilita&'o de sua ati(idade do)ente4 uma delas transferir ao li(ro did$ti)o a tarefa de preparar aulas e e%er)í)ios. A)res)ente1se a isso o fato de que o re+ai%amento salarial, e )onseqIente perda de prestígio da profiss'o do)ente, muda signifi)ati(amente a )lientela dos )ursos de 8etras, que )ome&am a atrair para o magistrio indi(íduos oriundos de )onte%tos pou)o letrados, )om pre)$rias pr$ti)as de leitura e de es)rita. Enquanto isso, os Kormadores de professores, nas Ka)uldades de Kilosofia, eram espe)ialistas que des)on-e)iam as no(as )ondi&es de letramento de seus alunos, futuros professores, e tam+m, des)on-e)iam a no(a realidade da es)ola e do alunado / espera desses futuros professores, o que se e%pli)a por se terem formado em outras )ondi&es so)iais e edu)a)ionais. Por isso, n'o se propun-am propriamente o o+7eti(o de formar professores, mas estudiosos da língua e da literatura. Assim, pode1se afirmar que as modifi)a&es nas )ondi&es de ensino e de aprendiagem da dis)iplina Português, o)orridas a partir dos anos !", n'o alteraram fundamentalmente o ensino dessa dis)iplina, que )ontinuou a orientar1se por uma )on)ep&'o da língua )omo sistema, )ontinuou a ser ensino so+re a língua, quer )omo ensino de gram$ti)a normati(a, quer )omo ensino de gram$ti)a normati(a, quer )omo leitura de te%tos para )on-e)imento e apropria&'o da língua padr'o. Em síntese4 o alunado tornou1se outro, radi)almente diferente, os professores passaram a ser formados em institui&es espe)ífi)as, mas, ao mesmo tempo, passaram a originar1se de grupos so)iais menos letrados* as )on)ep&es de língua e de ensino de língua )ontinuam, porm, as mesmas. al(e este distan)iamento entre os fatores e%ternos e os fatores internos se7a a prin)ipal e%pli)a&'o para o t'o )itado e )ompro(ado fra)asso do ensino e da aprendiagem do Português na es)ola As no(as teorias desen(ol(idas na $rea das )iên)ias lingIísti)as a partir, so+retudo, da segunda metade dos anos " que )ome&aram a alterar fundamentalmente essa situa&'o.
passado? Quais s'o essas pr$ti)as atuais de leitura e de es)rita, que demandas de leitura e de es)rita s'o feitas e ser'o feitas aos alunos nas so)iedades grafo)êntri)as em que (i(emos? Que pr$ti)as de leitura e es)rita têm aqueles que pretendem formar1se professores de Português? Que gêneros de te%to, que portadores de te%to )ir)ulam nessas so)iedades? Que fun&es e que usos têm a leitura e a es)rita no grupo )ultural a que os futuros professores e os futuros alunos desses professores perten)em? Pode1se )on)luir do e%posto que a resposta / pergunta 3Que professores de Português queremos formar?3 s0 pode ser en)ontrada )onsiderando1se fatores internos / pr0pria dis)iplina 3Português3, isto , fatores relati(os ao estatuto atual da $rea de )on-e)imentos so+re a língua, e fatores e%ternos, relati(os ao )onte%to so)ial, políti)o, )ultural. A ine(it$(el )onsidera&'o dos fatores e%ternos e%ige resposta /s perguntas4 Que grupos so)iais est'o -o7e demandando a profiss'o de professores de Português e, para isso, freqIentam as salas de aula dos )ursos de 8etras? Por outro lado, que grupos so)iais têm -o7e a)esso $ es)ola fundamental e mdia, quem s'o esses para quem os professores que formamos ensinar'o Português? Em outras pala(ras* quem s'o estes que de(emos formar )omo professores de Português, e quem s'o esses a quem ensinar'o eles a língua? E mais4 que e%pe)tati(as, interesses, o+7eti(os tem a so)iedade em rela&'o / es)ola e ao Português que se de(e ensinar e aprender nela? Em que estrutura de sistema edu)a)ional se insere a es)ola e o ensino da língua? A )onsidera&'o dos fatores internos e%ige resposta /s perguntas* no atual est$gio de desen(ol(imento em que se en)ontram os )on-e)imentos so+re a língua, que )onte9dos de(em )ompor a forma&'o de professores? Corno esta+ele)er a rela&'o entre esses )on-e)imentos e o ensino da língua? Que )on)ep&'o se de(e ter, -o7e, da língua nos )ursos de forma&'o de professores, e, portanto, que )on)ep&'o se de(e ter do ensino da língua? ConseqIentemente, e n'o menos importante4 que forma&'o de(em ter os que formam os professores? ...