O S
F I N S
D A
E D U C A Ç Ã O
CULTURA É ATIVIDADE DO PENSAMENTO e receptividade à beleza e ao humano s entimento. Fragmentos de informações nada têm a ver com ela. Um homem meramente bem informado é o maçante mais inútil na face da terra. O que deveríamos procura r produzir são homens que possuam cultura e conhecimentos especializados em algu m ramo particular. Seus conhecimentos especializados lhes darão um ponto de part ida, e sua cultura os levará até as profundidades da filosofia e às alturas da a rte. Precisamos lembrar-nos de que o desenvolvimento intelectual de valor é o de senvolvimento próprio, e que na grande maioria ele se dá entre as idades de deze sseis e trinta anos. Quanto ao treinamento, a parte mais importante é proporcion ada pelas mães antes dos doze anos. Um dito atribuído ao Arcebispo Temple ilustr a o que quero dizer. Alguém manifestara surpresa ante o êxito, em sua idade madu ra, de um homem, que como rapaz em Rugby fora figura bastante apagada. O Arcebis po respondeu: “O que importa não é o que eles são aos dezoito anos, e sim o que se tornam depois”. Ao prepararmos uma criança para a atividade do pensamento, devemos, ante s de tudo, precaver-nos contra o que chamarei de “idéias inertes”, isto é, idéia s que são simplesmente recebidas pela mente sem que sejam utilizadas ou testadas ou mergulhadas em novas combinações. O fenômeno mais chocante na história da educação é que escolas de pensam ento, que em uma época ressumbram uma fermentação de gênio, numa geração seguint e exibem meramente pedantismo e rotina. A razão é estarem elas sobrecarregadas d e idéias inertes. A educação com idéias inertes não é somente inútil; é, acima d e tudo, nociva - Corruptio optimi, péssima. Salvo raros intervalos de fermento i ntelectual, a educação no passado esteve radicalmente infectada de idéias inerte s. Essa é a razão pela qual mulheres incultas, porém inteligentes, que conhecem o mundo, constituem na maturidade a parte mais sábia da comunidade. Elas foram s alvas dessa horrível carga das idéias inertes. Cada revolução intelectual que es timulou a humanidade a conquistar maior grandeza foi um protesto apaixonado cont ra as idéias inertes. Depois, com patética ignorância da psicologia humana, pass ou, por meio de algum esquema educacional, a acorrentar a humanidade novamente a idéias inertes de seu próprio feitio. Vamos agora perguntar como em nosso sistema de educação deveríamos preve nir-nos contra essa aridez mental. Enunciemos dois mandamentos educacionais: “Nã o ensine matérias demais” e “O que ensinar, ensine bem”. O resultado de ensinar pequenas partes de grande número de matérias é a recepção passiva de idéias desconexas, não iluminadas por qualquer fagulha de vi talidade. Que as idéias principais introduzidas na educação de uma criança sejam poucas, porém, importantes, e que se permita sejam misturadas em todas as combi nações possíveis. A criança deveria torná-las suas e saber como aplicá-las sempr e em todas as circunstâncias de sua vida real. Desde o início de sua educação, a criança deveria experimentar a alegria da descoberta. A descoberta que tem que fazer é a de que as idéias gerais dão uma compreensão do curso de acontecimentos , o qual flui por toda a sua vida, o qual é sua vida. Por compreensão quero dize r mais do que mera análise lógica, embora isso esteja incluído. Refiro-me à “com preensão” no sentido em que é usada no provérbio francês “Quando se compreende t udo, perdoa-se tudo”. Os pedantes ridicularizam a educação útil; mas se a educaç ão não é útil, o que será? Será um bem destinado a ficar oculto algures? Natural mente a educação deve ser útil, qualquer que seja seu objetivo na vida. Foi útil a Santo Agostinho e a Napoleão. É útil porque a compreensão é útil. Serei breve quanto à compreensão que nos deve ser dada pelo lado literár io da educação. Também não desejo que suponham que eu faça pronunciamentos sobre os méritos relativos de um currículo clássico ou moderno. Quero unicamente obse rvar que a compreensão que desejamos é a compreensão de um insistente presente. A única utilidade de conhecer o passado está em aparelhar-nos para o presente. N ão existe perigo mais mortal para as mentalidades jovens do que depreciar o pres ente. O presente contém tudo o que existe. É solo sagrado, pois é o passado e ta mbém o futuro. Deve-se ao mesmo tempo observar que uma idade tanto é passado se
existiu há duzentos anos, como há dois mil anos. Não nos deixemos enganar pelo p edantismo das datas. As épocas de Shakespeare e de Moliére são tão passadas quan to às de Sófocles e Virgílio. A comunhão dos santos é uma assembléia grandiosa e inspiradora, mas tem somente um possível lugar de encontro, que é o presente; e o mero lapso de tempo, através do qual qualquer grupo de santos, em particular, deve viajar para atingir esse lugar de encontro, faz muito pouca diferença. Passando para o lado científico e lógico da educação, lembremo-nos de qu e neles também as idéias não utilizadas são positivamente danosas. Por utilizaçã o de uma idéia quero dizer relacioná-la à fonte que alimenta nossa vida e que se compõe de percepções dos sentidos, sentimentos, esperanças, desejos e atividade s mentais que ajustam os pensamentos entre si. Pode-se imaginar uma classe de se res que poderiam fortalecer suas almas analisando passivamente idéias desconexas . Mas, a humanidade não está construída dessa maneira, salvo talvez alguns redat ores de jornais. No treinamento científico, a primeira coisa a fazer com uma idéia é prov á-la; mas seja-me permitido, por um instante, estender o significado de “provar” ; quero dizer: provar seu valor. Uma idéia não tem grande valor a menos que as p roposições em que estiver corporificada sejam verdadeiras. Portanto, parte essen cial da prova de uma idéia é a prova, por experiência ou por lógica, da verdade das proposições. Mas não é essencial que esta prova da verdade constitua a prime ira introdução à idéia. Afinal, sua asserção pela autoridade de professores resp eitáveis é, para começar, prova suficiente. Em nosso primeiro contato com um gru po de proposições começamos por apreciar sua importância. Isso é o que todos nós fazemos na idade madura. Não tentamos, no sentido rigoroso, provar ou refutar c oisa alguma, a menos que sua importância seja digna dessa honra. Esses dois proc essos de prova, no sentido restrito, e de apreciação, não requerem uma separação rígida no tempo. Ambos podem avançar quase que simultaneamente; mas sempre que um dos processos deva ter prioridade, esta deverá ser a de apreciação pelo uso. Além disso, não deveríamos tentar usar as proposições isoladamente. Enfa ticamente, não me refiro a um perfeito grupo de experiência para ilustrar a Prop osição I e depois a prova desta mesma Proposição I, um perfeito grupinho de expe riências para ilustrar a Proposição II e depois a prova desta última, e assim po r diante até o final do livro. Nada seria mais enfadonho. As verdades inter-rela cionadas são empregadas em bloco; e as várias proposições, em qualquer ordem e c om qualquer reiteração. Escolham algumas aplicações importantes de seu assunto t eórico; em seguida, estudem-nas simultaneamente com a exposição teórica sistemát ica. Mantenham a exposição teórica simples e curta, mas que seja precisa e rígid a em sua enunciação. Não deverá ser longa demais a fim de ser entendida completa e exatamente. As conseqüências de uma pletora de conhecimentos teóricos mal dig eridos são deploráveis. A teoria também não deve ficar obscurecida pela prática. A criança não deve ter dúvidas quando está fazendo uma prova e quando se serve desta. Meu argumento é que o que for provado deverá ser utilizado, e o que é uti lizado deve, tanto quanto for prático, ser provado. Longe de mim afirmar que pro va e utilização sejam a mesma coisa. Neste ponto de minha dissertação posso mais diretamente avançar meu argu mento na forma de uma digressão. Estamos apenas começando a perceber que a arte e a ciência da educação requerem talento e estudo próprios, e que esse talento e ciência são mais do que um simples conhecimento de algum ramo da ciência ou da literatura. Essa verdade foi parcialmente vislumbrada na geração passada; direto res de escola, um tanto rudemente, tendiam a relegar a cultura em seus colegas a o exigir deles o gosto pelo futebol e jogos esportivos; mas cultura é mais do qu e o cricket, e mais do que o futebol, e mais que grau de conhecimentos. A educação é a aquisição da arte de utilizar os conhecimentos. É uma art e muito difícil de se transmitir. Sempre que se escreve um manual de verdadeiro valor educacional, pode-se estar quase certo de que algum crítico dirá que será muito difícil ensinar por meio dele. Naturalmente que será difícil. Se fosse fác il, o livro deveria ser queimado, pois não poderia ser educacional. Na educação, como em outras coisas, os lindos caminhos floridos levam a lugares desagradávei s. Esse mau caminho é representado por um livro ou série de palestras que pratic amente permitirão ao estudante decorar todas as perguntas que provavelmente apar
eçam no próximo exame. Posso dizer, de passagem, que nenhum sistema educacional é possível a menos que cada pergunta feita diretamente a um aluno em qualquer ex ame seja formulada ou revista pelo professor desse aluno naquela matéria. O asse ssor externo poderá fazer referência ao currículo ou ao desempenho dos alunos, m as nunca lhe deveria ser permitido fazer-lhes uma pergunta que não fosse estrita mente supervisionada pelo seu professor ou, pelo menos, inspirada por uma longa conferência com o mesmo. Existem algumas poucas exceções a essa regra, mas são e xceções e, como tais, podem facilmente ser permitidas sob a regra geral. Voltemos agora a meu ponto de vista inicial, que as idéias teóricas deve riam sempre encontrar aplicações importantes dentro do currículo do aluno. Esta não é uma teoria fácil de se aplicar, ao contrário muito difícil. Contém em seu âmago o problema de conservar vivo o conhecimento, de evitar que ele se torne in erte, o que constitui o problema central de toda a educação. O melhor processo dependerá de diversos fatores, nenhum dos quais pode s er negligenciado, a saber, o talento do professor, o tipo intelectual dos alunos , suas perspectivas na vida, as oportunidades oferecidas pelo ambiente imediato da escola e fatores correlatos dessa espécie. É por essa razão que os exames uni formes externos são tão perniciosos. Nós não os denunciamos por sermos fantasist as e gostarmos de denunciar as regras estabelecidas. Não somos assim tão infanti s. Naturalmente, tais exames também têm sua utilidade para testar a negligência. A razão de nosso desprazer é muita definida e muito prática. O sistema destrói a melhor parte da cultura. Quando se analisa sob o ponto de vista da experiência a tarefa central da educação, descobre-se que seu desempenho feliz depende do a justamento delicado de muitos fatores variáveis. A razão é que estamos tratando com mentes humanas e não com matéria morta. A evocação da curiosidade, do critér io, do poder de dominar um complicado emaranhado de circunstâncias, o uso da teo ria ao fazerem-se previsões em certos casos – todos esses poderes não devem ser comunicados por uma regra fixa incluída num programa de matérias de exame. Apelo para os senhores, como professores práticos. Com boa disciplina se mpre é possível lançar na mente dos alunos certa quantidade de conhecimentos ine rtes. Toma-se um manual e faz-se com que o aprendam. Até aí, muito bem. A crianç a saberá então resolver uma equação do segundo grau; mas qual a finalidade de en sinar uma criança a resolver uma equação do segundo grau? Há uma resposta tradic ional para essa pergunta: A mente é um instrumento que se afia primeiro e depois se usa; a aquisição da capacidade de resolver uma raiz quadrada faz parte do pr ocesso de afiar a mente. Existe verdade suficiente nessa resposta para fazê-la v iver através das épocas; mas apesar de sua meia verdade, ela encarna um erro rad ical que faz o possível para sufocar o talento no mundo moderno. Eu não sei quem foi o primeiro responsável por essa analogia da mente a um instrumento inerte. Tanto quanto sei, pode ter sido um dos sete sábios da Grécia ou uma comissão de todos eles. Fosse quem fosse o primeiro responsável, não pode haver dúvidas quan to à autoridade que adquiriu pela contínua aprovação concedida a ela por pessoas eminentes. Qualquer que seja o peso de sua autoridade, qualquer que seja a alta aprovação que possa citar, não tenho dúvidas em denunciá-la como uma das concep ções mais fatais, mais errôneas e perigosas jamais introduzidas na teoria da edu cação. A mente nunca é passiva; está em atividade perpétua, delicada, receptiva, que reage ao estímulo. Não se lhe pode adiar a vida até que tenha sido aguçada. Todo o interesse ligado à matéria em foco deve ser evocado imediatamente; as ca pacidades que se estejam fortalecendo no aluno devem ser exercidas imediatamente ; as possibilidades da vida mental que o ensino deve transmitir devem ser exibid as também imediatamente. É a regra suprema da educação, uma regra muito difícil de ser seguida. A dificuldade é justamente esta: a concepção de idéias gerais, os hábito s intelectuais da mente e o interesse agradável por êxito mental não podem ser e vocados por nenhuma forma de palavras, não importa o quanto sejam exatamente ada ptadas. Todos os professores práticos sabem que a educação é um processo pacient e de dominar detalhes minuto a minuto, hora a hora, dia a dia. Não existe estrad a real para a aprendizagem através de um caminho amplo de generalizações brilhan tes. Há um provérbio sobre a dificuldade de se enxergar o bosque por causa das á rvores. Essa dificuldade é exatamente o ponto que estou salientando. O problema
da educação é fazer o aluno enxergar o bosque por meio das árvores. A solução que apresento está em extirpar a desconexão fatal dos assuntos que destrói a vitalidade de nosso currículo moderno. Existe somente uma matéria para a educação, que é a Vida em todas as suas manifestações. Em vez dessa únic a unidade, oferecemos às crianças: Álgebra, da qual nada se segue; Geometria, da qual nada se segue; Ciência, da qual nada se segue; História, da qual nada se s egue; um ou dois idiomas, jamais dominados; e finalmente, a pior de todas, Liter atura, representada pelas peças de Shakespeare, com notas filosóficas e pequenas análises do enredo e personagens a serem, em substâncias decoradas. Pode-se diz er que tal lista represente a Vida, tal como é conhecida de quem a está vivendo? O melhor que se poderia dizer é que ela representa um sumário em que poderia pe nsar uma divindade que quisesse criar um mundo, e que ainda não houvesse determi nado como organizá-lo. Voltemos às equações do segundo grau. Ainda temos à mão essa questão par a resolver: Por que deveriam as crianças aprender a resolvê-las? A menos que as equações se enquadrem em um currículo conexo, não há naturalmente razão alguma p ara ensinar qualquer coisa a respeito delas. Além disso, extensivo como deveria ser o lugar da matemática em uma cultura completa, pergunto-me se, para muitos t ipos de meninos, as soluções algébricas das equações do segundo grau não estaria m no lado especializado da matemática. Quero lembrar que ainda nada falei sobre a psicologia ou o conteúdo da especialidade que constitui parte tão necessária d a educação ideal. Mas tudo isso é fugir de nossa verdadeira questão, e apenas fa ço a citação a fim de evitar um mal-entendido em minha resposta. As equações do segundo grau fazem parte da álgebra, e a álgebra é o inst rumento intelectual que se criou para tornar claros os aspectos quantitativos do mundo. Não há como escapar disso. O mundo está inteiramente infestado pela quan tidade. Para fazer sentido, é preciso falar em quantidades. Não adianta dizer qu e a nação é grande. Qual é sua superfície? Não adianta dizer que o rádio é um me tal raro. Quão raro? É importante fugir da quantidade. Pode-se escapar para a po esia e para a música, e a quantidade se defrontará nos ritmos e oitavas. Os inte lectos elegantes que desprezam a teoria da quantidade são mal desenvolvidos. São mais dignos de lástima que de censura. Os fragmentos de algaravia ensinados, em seus dias de escola, com o nome de álgebra, merecem apenas desprezo. Essa questão da degenerescência da álgebra em algaravia, tanto em palavr as como de fato, fornece exemplo patético da inutilidade da reforma dos programa s educacionais sem uma concepção clara dos atributos que se deseja evocar na men te viva das crianças. Há alguns anos gritou-se a respeito da necessidade da refo rma da álgebra escolar, mas concordou-se em geral que os gráficos dariam solução ideal. Portanto, toda a espécie de coisas foi excluída, e introduziram-se os gr áficos. A meu ver, sem nenhum propósito real, a não ser os gráficos em si. Agora todos os exames escritos têm uma ou duas questões em gráfico. Pessoalmente sou um entusiasta de gráficos. Mas, pergunto-me se já ganhamos algo com isso. Não se pode vitalizar nenhum programa de educação geral a menos que se consiga demonst rar sua relação com alguma característica essencial de toda percepção inteligent e ou emocional. É uma declaração dura, mas verdadeira, e não sei como torná-la m ais fácil. Ao fazerem essas pequenas alterações formais os professores estarão s endo vencidos pela própria natureza das coisas. Os mestres se verão lançados con tra um adversário hábil demais que sempre poderá ludibriá-los. A reforma deve começar da outra extremidade. Primeiro, deve-se resolver quais são os aspectos quantitativos do mundo suficientemente simples para serem introduzidos na educação geral; depois, deve-se enquadrar um programa de álgebra que encontrará sua exemplificação nessas aplicações. Não precisamos recear por nossos gráficos de estimação, haverá número suficiente deles quando começarmos a tratar a álgebra como um meio sério de estudar o mundo. Algumas das aplicações mais simples serão encontradas nas quantidades que ocorrem nos mais simples estu dos da sociedade. As curvas da história são mais vividas e informativas do que a s relações estéreis de nomes e datas que compreendem a maior parte daquele árido estudo escolar. O que se consegue com uma relação de reis e rainhas insignifica ntes? João, José ou Maria, estão todos mortos. As ressurreições gerais são fraca ssos, e seria melhor adiá-las. O fluxo quantitativo das forças da sociedade mode
rna é susceptível de exibição muito simples. Nesse meio tempo, a idéia de variáv el, de função, da velocidade de mudança, de equações e suas soluções, de elimina ção, estão todas sendo estudadas como uma ciência abstrata por si mesmas. Natura lmente, não nas frases pomposas com que me referi a eles, mas com aquela iteraçã o de simples casos especiais adequados ao ensino. Se for seguido esse curso, o caminho de Chaucer até a Peste Negra, desta aos embaraços do Trabalhismo moderno, ligará os contos dos peregrinos medievais à ciência abstrata da álgebra, ambos fornecendo diversos aspectos do tema único : Vida. Sei o que a maioria dos leitores estará pensando neste ponto. Que o cami nho exato que esbocei não é o caminho particular que teriam escolhido, ou que te riam entendido. Concordo plenamente. Não estou declarando que poderia fazê-lo eu mesmo. Mas a objeção é precisamente a razão pela qual um sistema de exame exter no comum é fatal para a educação. O processo de exibir as aplicações do conhecim ento deve, para ser coroado de êxito, depender essencialmente do caráter dos alu nos e do talento do professor. Deixei naturalmente de lado as aplicações mais si mples com as quais estamos mais familiarizados. Refiro-me aos ângulos quantitati vos das ciências, tais como a mecânica e a física. Outrossim, na mesma conexão, calculamos as estatísticas dos fenômenos so ciais em relação à dimensão tempo. Depois eliminamos o tempo entre pares apropri ados. Podemos então imaginar até onde demonstramos uma verdadeira conexão causat iva ou apenas uma simples coincidência temporal. Notamos que poderíamos ter calc ulado quanto ao tempo uma série de estatísticas para um país e outra para outro país, e assim, com escolha apropriada de assuntos, teríamos obtido gráficos que certamente demonstravam mera coincidência. Outros gráficos também demonstrariam conexões causais óbvias. Imaginamos como poderíamos discriminar, e assim continu amos a dar asas à imaginação até quando nos aprouver. Ao considerar esta descrição, devo, entretanto, pedir-lhes que se lembre m do que estive insistindo acima. Em primeiro lugar, um curso de pensamento não será adequado a todos os grupos de crianças. Por exemplo, eu esperaria que crian ças artesãs desejassem algo mais concreto e, em certo sentido, mais rápido do qu e expus aqui. Talvez eu esteja errado, mas essa seria minha hipótese. Em segundo lugar, não estou imaginando uma bela palestra que estimulasse, de uma vez por t odas, uma classe extasiada. Não é dessa maneira que se processa a educação. Não. Durante o tempo, todos os alunos estarão estudando arduamente para resolver exe mplos, desenhando gráficos e fazendo experiência, até que tenham domínio complet o sobre o assunto todo. Estou escrevendo as explicações interpoladas, as direçõe s que deveriam ser dadas a seus pensamentos. Os alunos devem ser obrigados a sen tir que estão estudando algo, que não estão meramente executando minuetos intele ctuais. Finalmente se os professores estiverem ensinando alunos para algum exame geral, o problema do ensino eficiente tornar-se-á mais complicado. Já notaram a lguma vez a modelagem em ziguezagues em volta de um arco normando? O trabalho an tigo é lindo; o trabalho moderno, horroroso. Isso é devido ao trabalho moderno s er feito segundo medidas exatas; o trabalho antigo variava de acordo com as idio ssincrasias do artífice. Aqui é pesado, ali apresenta-se leve. Ora, a essência e m fazer os alunos passarem nos exames está em dar igual valor a todas as partes do programa; contudo, a humanidade é naturalmente especialista. Um homem vê a ma téria inteira, onde outro pode encontrar somente alguns exemplos separados. Sei que parece contraditório dar margem à especialização em um currículo especialmen te destinado à cultura geral. Sem contradições, o mundo seria mais simples, e ta lvez mais sem graça; mas estou certo de que na educação, sempre que se exclui a especialização, se destrói a vida. Agora chegamos a outro grande ramo do ensino da matemática geral, isto é , Geometria. Os princípios são os mesmos. A parte teórica deveria ser nítida, rí gida, curta e importante. Deveria eliminar-se toda proposição não absolutamente necessária para demonstração da conexão principal das idéias, mas as grandes idé ias fundamentais deveriam estar todas presentes. Nenhuma omissão de conceitos, t ais como os de Similaridade e Proporção. Devemos lembrar-nos de que, devido à aj uda fornecida pela presença de uma figura, a Geometria é um campo de excelência sem paralelo para o exercício das faculdades dedutivas do raciocínio. Naturalmen
te segue-se o Desenho Geométrico, que constitui um exercício para os olhos e as mãos. Mas assim como a Álgebra, a Geometria e o Desenho Geométrico devem ser a mpliados para além do mero círculo de idéias geométricas. Em um bairro industria l, a maquinaria e prática de oficina constituem a extensão apropriada. Por exemp lo, nas escolas Politécnicas de Londres isso foi conseguido com notável êxito. R elativamente a muitas escolas secundárias, agrimensura e confecção de mapas são, em minha opinião, as aplicações naturais. Em particular, a agrimensura de pranc heta deveria levar os alunos a uma compreensão vivida das aplicações imediatas d as verdades geométricas. Aparelhos simples para desenho, uma corrente e uma búss ola de agrimensor deveriam permitir ao aluno ir desde o planejamento e medição d e um campo até a elaboração do mapa de um pequeno distrito. A melhor educação é encontrada na obtenção do maior número de informações por meio dos aparelhos mai s simples. O fornecimento de instrumentos complicados deve ser inteiramente cond enado. Elaborar o mapa de um pequeno distrito, considerar suas estradas, seus co ntornos, geologia, clima, relação com outros distritos, os efeitos na situação d e seus habitantes, ensinará mais história e geografia do que qualquer conhecimen to sobre Perkin Warbeck ou sobre o estreito de Behring. Não me refiro a uma vaga palestra sobre o assunto, e sim a uma séria investigação em que os fatos reais ficam definitivamente comprovados pela ajuda de conhecimentos teóricos exatos. U m problema matemático típico deveria ser: Faça o levantamento topográfico de tal campo, desenhe uma planta dele em certa escala e encontre a área. Seria um proc esso muito bom ensinar as proposições geométricas necessárias sem as provas. Dep ois, aprender-se-iam ao mesmo tempo as provas das proposições enquanto o levanta mento topográfico estivesse sendo feito. Felizmente, o lado de especialização da educação apresenta um problema m ais fácil do que a provisão de uma cultura geral. Existem muitas razões para iss o. Uma delas é que muitos dos princípios do processo a serem observados são os m esmos nos dois casos, não sendo necessário recapitulá-los. Outra razão é que o t reinamento especializado ocorre, ou deveria ocorrer, em um estado mais avançado do curso do aluno, havendo assim material mais fácil a ser trabalhado; mas sem d úvida a razão principal é que o estudo especializado é normalmente um estudo de interesse peculiar ao estudante. Ele está estudando porque, por alguma razão, qu er conhecê-lo. Isto faz uma diferença enorme. A cultura geral destina-se a alime ntar uma atividade da mente; o curso especializado utiliza essa atividade; mas n ão convém dar muita ênfase a essa antítese nítida. Conforme já vimos, no curso g eral surgirão focos de interesse especial; e similarmente no estado especial às conexões externas do assunto fazem com que se exteriorize o pensamento. Novamente, não existe um curso de estudos que simplesmente forneça cultu ra geral, e outro que forneça conhecimento especial. Os assuntos estudados para uma educação geral são assuntos especiais. Por outro lado, uma das maneiras de e ncorajar a atividade mental em geral é nutrir uma dedicação especial. Não se pod e dividir o estofo inteiriço do aprendizado. O que a educação tem a transmitir é um sentido íntimo para a força, a beleza das idéias e a estrutura destas últimas juntamente com uma estrutura particular de conhecimento que tenha referência peculiar à vida do ser que a possui. A apreciação da estrutura das idéias é aquele lado de uma mente culta qu e somente pode crescer sob a influência de um estudo especial. Refiro-me aquela atenção para o tabuleiro de xadrez inteiro, como imagem do que é ver a relação d e um grupo de idéias para com outro. Nada, salvo um estudo especial, pode levarnos à apreciação de uma exata formulação de idéias gerais, de suas relações quan do formuladas, de seu papel na compreensão da vida. A mentalidade disciplinada d essa maneira seria ao mesmo tempo mais abstrata e mais concreta; ela foi treinad a na compreensão do pensamento abstrato a na análise dos fatos. Finalmente, deveria crescer a mais austera de todas as qualidades mentai s: o sentido de estilo. É um sentido estético, baseado na admiração pela obtençã o direta de uma finalidade prevista, de modo simples e sem desperdício. Estilo e m arte, em literatura, em ciência, em lógica e em execução prática – têm fundame ntalmente as mesmas qualidades estéticas, isto é, realização e elegância. O amor por um assunto em si mesmo e por si mesmo – que não seja o sonolento prazer de
palmilhar mentalmente um tombadilho – constitui amor por estilo, a manifestar-se no estudo em causa. Aqui somos levados de volta à posição da qual partimos, à utilidade da e ducação. Estilo, em seu melhor sentido, é a última aquisição da mente educada; t ambém é a mais útil. Permeia o ser inteiro. O administrador que possui sentido d e estilo detesta o desperdício; o engenheiro que tem sentido de estilo economiza seu material; o artífice com sentido de estilo prefere o bom trabalho. Estilo é a moralidade definitiva da mente. Acima do estilo e do conhecimento há algo, uma vaga sombra como o destin o acima dos deuses gregos. Esse algo é Força. O estilo é o modelador da força, o moderador da força; mas, afinal, a força, o poder de atingir o fim almejado é f undamental. A primeira coisa a fazer é chegar lá. Não se preocupem com estilo, m as resolvam o problema, justifiquem os desígnios de Deus para o homem, administr em seu ofício, ou façam qualquer outra coisa que haja a fazer. E então, em que ajuda o estilo? Nisto, que com ele a finalidade é conseg uida sem questões laterais, sem levantar chamas indesejáveis. Com ele, conseguese chegar ao alvo e nada mais que ao alvo. Com ele, o efeito de sua atividade é calculável, e a previdência é o último dos presentes dos deuses aos homens. Com ele, sua força fica aumentada, pois sua mente não será distraída por irrelevânci as, e conseguirá o objetivo com maior certeza. O estilo é privilégio exclusivo d o perito. Quem já ouviu falar no estilo de um pintor amador, no estilo de um poe ta amador? O estilo é sempre produto de um estudo especializado, a contribuição peculiar da especialização à cultura. A educação inglesa em sua fase atual sofre de uma falta de finalidade de finida e de uma mecanização externa que mata sua vitalidade. Nesta exposição con siderei até aqui as finalidades que deveriam governar a educação. Quanto a isso, a Inglaterra paira entre duas opiniões. Ela não decidiu se deve produzir amador es ou peritos. A profunda mudança no mundo ocasionada pelo século dezenove é que o crescimento do conhecimento deu antevisão. O amador é essencialmente um homem capaz de apreciação e com imensa versatilidade para dominar uma dada rotina; ma s falta-lhe a antevisão que vem do conhecimento especializado. O objetivo destas palavras é sugerir como produzir o perito sem perda das virtudes essenciais do amador. O mecanismo de nossa educação é rígido onde deveria ser elástico, e frou xo onde deveria ser rígido. Sob pena de extinção, cada escola deve treinar seus alunos para um pequeno grupo de exames definidos. Nenhum diretor tem liberdade p ara desenvolver sua educação geral ou seus estudos especializados de acordo com as oportunidades de sua escola, as quais são criadas pelos professores, seu ambi ente, suas classes de alunos e suas doações. A meu ver, um sistema de exames ext ernos que primariamente procure julgar individualmente os estudantes só pode res ultar em prejuízo para a educação. Primeiramente são as escolas e não os estudantes que deveriam ser julgad os. Cada escola deveria dar seus próprios diplomas baseados em seu próprio currí culo. Os padrões dessas escolas deveriam ser verificados e corrigidos; mas o pri meiro requisito para a reforma educacional é a escola como uma unidade, com seu currículo aprovado, baseado em suas próprias necessidades e desenvolvido por seu próprio corpo docente. Se não conseguirmos tal medida, sairemos simplesmente de um formalismo para outro, de um monte de esterco de idéias inertes para outro. Ao declarar que a escola é a verdadeira unidade educacional em qualquer sistema nacional para a salvaguarda da eficiência, concebi o sistema alternativo como sendo o exame externo e individual do estudante; mas cada Cila está defron tado por sua Caríbdis, ou em linguagem mais simples, existem valas nos dois lado s da estrada. Será igualmente fatal para a educação se cairmos nas mãos de um de partamento supervisor que esteja sob a impressão de que pode dividir todas as es colas em duas ou três rígidas categorias, cada uma sendo forçada a adotar um cur rículo rígido. Quando digo que a escola é a unidade educacional, quero dizer exa tamente isso, nem unidade maior, nem menor. Cada escola deve ter a prerrogativa de ser considerada em relação a suas circunstâncias especiais. A classificação d as escolas para determinadas finalidades é necessária; mas não deveria ser permi tido o currículo inteiramente rígido, não modificado por seu próprio corpo docen te. Os mesmos princípios se aplicam exatamente, com as necessárias modificações,
às universidades e colégios técnicos. Quando consideramos em toda a sua amplitude a importância dessa questão da educação dos jovens de um país, as vidas despedaçadas, as esperanças frustrad as, os fracassos nacionais, que resultam da frívola inércia com a qual é tratada , é difícil dominar-nos contra um rancor selvagem. Nas condições da vida moderna a regra é absoluta, e a raça que não valoriza a inteligência treinada está cond enada. Todo o seu heroísmo, todo o seu encanto social, toda a sua sagacidade, to das as suas vitórias na terra e no mar, poderão desviar o dedo do destino. Hoje somos auto-suficientes. Amanhã a ciência terá avançado mais um passo ainda, e nã o haverá apelação no julgamento que então será pronunciado para os incultos. Só podemos contentar-nos com o velho resumo do ideal educacional sempre presente desde o alvorecer de nossa civilização. A essência da educação é que é religiosa. E que seria a educação religiosa? A educação religiosa é uma educação que inculca o dever e a reverência. O dever surge de nosso controle potencial sobre o curso dos acontecimentos. Onde o conhecimento possível poderia ter mudado a questão, a ignorância é a culpada do vício. E o fundamento da reverência é esta percepção de que o presente contém dentro de si a soma completa da existência, passada e futura, aquela amplidão c ompleta do tempo, que é a eternidade.