Música espanhola caliente. Quixote ergue a espada e saúda em tom vibrante. Pode até pedir palmas da platéia.) QUIXOTE — Salve o valente Amadis de Gaula, que nunca abaixou a crista! Salve o valoroso Felismarte de Mircnia, que jamais gastou pólvora em chimango! Salve o nunca assaz louvado Tirante, o Branco, eternamente enfrentativo! E salve também Dom Belianis da Grécia e todos os outros que porventura olvidei, não por desprezo, mas por ser urgente a minha partida e curta a vossa paciência!
CENA 8
(Na qual se narra com graça e nobreza o batismo do matungo finalmente conhecido como o Veloz Rocim Rocinante. Quixote apanha a vassoura que Miguel trouxe com as compras. Num ritual coreográfico, enfeita-a com esmero. Pendura fitas, como se fossem arreios; um bod de plumas, como se fosse a crina; improvisa uma sela com uma almofada. Tudo enquanto fala.) QUIXOTE (Para a vassoura.) — Poderia chamar-te Pégaso, como o corcel alado do herói Belerofonte, nascido da garganta decepada da medonha Górgona. Ou talvez Bucéfalo, para render homenagem à célebre montaria de Alexandre, o Grande. Mas digo-te em segredo e cá entre nós, para que não nos oiçam os intrigantes: no meu conceito pertences a uma estirpe ainda superior à daqueles dois. Pois embora não tenhas asas nem mítico nascimento, és valente e veloz como o vento que desgrenha a copa dos olivais. Fomos feitos um para o outro e, como um centauro, um só ser seremos. Teu nome entrará para a História, amigo, e esse nome desde já imortal precisa ser alto, sonoro, resplandecente. Digno de ti e também de mim, que sobre teu dorso percorrerei uma a uma as páginas das estradas e dos séculos, séculos amém. Pelo sangue derramado das veias dos bravos