Ciber-Religião 2⁰ Simpósio Internacional de História das Religiões XV Simpósio Nacional de História das Religiões ABHR 2016
Albio Fabian Melchioretto1
Resumo
Vivemos em momentos de conexão. Com a transformação de celulares a smartphones é possível permanecer o tempo inteiro conectados em redes sociais virtuais. Tais transformações comportamentais levam para o ciberespaço as ações do não-virtual e este fenômeno também atinge a religiosidade. Parto do pressuposto que novos territórios são construídos no ciberespaço e novas interações são possíveis quando a religião adentra nas redes sociais virtuais. O problema que a pesquisa se propõe é fazer uma cartografia de como a religião se territorializa nas redes sociais virtuais. Com isto chego ao objetivo de analisar os o s discursos da religião no Facebook, verificando a ação de um voluntário militante da Igreja Católica Apostólica Romana na cidade de Blumenau, em Santa Catarina. Para dar conta deste objetivo utilizarei a conceituação de Ciberespaço de Pi erre Lévy, territorialização a partir de Deleuze e Guattari e por fim, as reflexões da religiosidade midiática a partir de Jorge Miklos. Palavras-chave: Ciberespaço; Religião; Territorialização Territorialização Introdução
Tenho boas lembranças de minha infância. Uma delas é de minha primeira viagem feita a noite. Ela foi para o interior do Estado do Paraná. Acordado contemplava as estrelas em meio a escuridão da estrada. Ao fundo da paisagem encontrava aglomerados de luzes. Ao aproximar das luzes, havia uma que se destacava, uma cruz branca sobre um ponto alto. A paisagem naquela viagem repetiu-se várias vezes. Escuridão entre fazendas, luzes agrupadas e ao aproximar da luz, uma cruz branca iluminada sobre uma torre. Sem conhecer as cidadezinhas que passei e recuperando uma imagem da lembrança, posso afirmar que aquelas cruzes brancas representavam um ponto, ou melhor, marcavam
1 Mestrando,
FURB; PPGE-ME (Programa de Pós-graduação, Mestrado em Educação, Universidade Regional de Blumenau). Professor dos cursos técnico do SENAI/SC, Blumenau. E-mail:
[email protected].
um território em torno de uma igreja. Havia naquele espaço uma construção de territorialidade em volta da imagem, mesmo na escuridão. Vivemos um tempo de múltiplas conexões, onde diversos dispositivos nos levam para a rede. No espaço virtual, mesmo como crítica de Lévy (1999), reproduzimos diversas possibilidades. Partindo da ideia que a religião se terrotorializa questiono como ela o faz no ciberespaço? Será que ela repete a mesma forma que no espaço não-virtual? Para responder esta questão vou cartografar discursos ligados a religiosidade numa rede social virtual. Olharei os discursos, sem entrar na problemática do tipo de fiel que o ciberespaço está produzindo. A questão do território a partir de Deleuze e Guattari (2002) remete a uma ideia que não se restringe a um local físico e serve como referência para uma utopia, um espaço de platôs e não de propriedades. Algo que casa muito bem para pensar o ciberespaço. No espaço virtual os discursos religiosos se escapam de itinerários estabelecidos, assumindo uma característica de território território descrita por Deleuze e Guattari (1998). Para eles um território não pode ser capturado por uma fronteira e as falas que existem no espaço além-fronteiras se inter-laçam, se misturam como uma peça musical que não pode ser interrompida. Não é tema único, mas está intermezzo a tantos outros. A linguagem deleuziana por ser aplicada a religiosidade no ciberespaço, onde as fronteiras são móveis constituindo um novo espaço, sem a dominância de um discurso institucionalizado, potencializando potencializando uma mobilidade entre o religioso e o profano. Para construir esta possibilidade vou apresentar primeiro o espaço de conceitos, para depois situar os dados que foram capturados e por último retomo a discussão amarrando as diversas situações.
Problemática: um espaço de conceitos e dados
Vivemos em um espaço de conexões perenes e este fenômeno apresenta consigo muitas transformações. Estas transformações transformações também passam pelo campo da religião com a propagação de mensagens religiosas nas redes sociais virtuais, por exemplo, gerando novas conexões. O primeiro passo para a construção da reflexão acerca das mudanças e
transformações que vivenciamos é a apresentação conceitual onde trabalharei os conceitos de virtual; religião e redes sociais virtuais. Feito isto a apresentação dos conceitos seguirá com os dados coletados e a discussão entrelaçando entrelaçando conceitos e dados. Falar ciber-religião é pensar uma religião locada no espaço virtual. Para chegar a ciberreligião quero primeiro pensar pelo conceito de virtual. Para chegar ao conceito de virtual uso a abordagem de Pierre Lévy (1999). Ele apresenta inicialmente três sentidos, o técnico, o ligado à informática e por último o sentido filosófico. O sentido técnico representa a digitalização da informação. Os códigos de computadores que estão inscritos em discos rígidos são expressões do virtual. A informação, segundo Lévy (1999) encontra-se virtualmente presente em cada ponto da rede e manifesta-se através de comandos coordenados temporalmente. O segundo sentido está ligado a informática, onde onde o virtual é a informação informação digital traduzida por um código binário que está acessível aos usuários diante de alguma forma de exibição que acontece por meio de atualizações. Atualmente ainda usamos expressões como “realidade aumentada” ou “realidade virtual” para designar imagens virtuais que trazem para próximo do ser humano a atualização dos códigos binários. Através da mediação de dispositivos, os códigos digitais, são atualizados assumindo uma “forma” particular de uso. Para esta reflexão, vou partir do terceiro sentido de virtual que Lévy (1999) apresenta, o filosófico. Para ele, o virtual é “toda entidade desterritorializada, capaz de gerar diversas manifestações concretas em diferentes momentos e locais, sem, contudo, estar ela mesma presa a um lugar ou tempo participar” (LÉVY, 1999, p. 47). O virtual é aquilo que existe somente em potência, não em ato, como também não é oposição a realidade, porém é oposição ao atual. A virtualidade e a atualidade são dois modos diferentes da realidade, segundo Lévy (1999), o virtual existe sem estar presente. “O virtual é uma fonte indefinida de atualizações” (LÉVY, 1999, 1999, p. 48). Para elucidar este sentido, o autor usa o exemplo da “palavra” que é uma entidade virtual. Se tomar a palavra “árvore”, “árvore”, sabemos que ela pode ser pronunciada, ao mesmo tempo, em diversos locais. Cada enunciação é um elemento de atualização. Ao falar árvore, o vocábulo não está em nenhum lugar e não se encontra vinculado a nenhum momento em particular, mas é atualizado no lugar e no momento que é
pronunciado. Está para além da questão de território. No virtual há a construção de um espaço de novas enunciações, que Lévy (1999) chama de ciberespaço. Para Deleuze e Parnet (1998) o virtual não é tangível, o virtual é uma descompactação do atual e o atual é uma condensação do virtual. O atual é um ponto no espaço e no tempo e o virtual não é nem tempo, nem espaço. O virtual compreendido de maneira diferente da ideia comum de ciber. No ciberespaço (Lévy, 1999) o virtual está dentro e está fora ao mesmo tempo. Mas, as construções do ciberespaço não permanecem apenas ligadas ao virtual, são construções que abarcam todos os espaços criando nós de rede entre atores digitais e o mundo social físico. As duas apresentações de virtual não são antagônicas, mas se intercruzam na apresentação cartográfica da ciber-religião. Ao longo do texto vou aproximar a ideia de virtual como sinônimo de ciberespaço, mesmo diante da diferenciação proposta por Deleuze e Parnet (1998). O texto O que é religião? de Rubem Alves (1981)2, afirma que a “religião se apresenta como um tipo de fala, um discurso, uma rede de símbolos” (ALVES, (ALV ES, 1981, p. 24). A simbologia, para o autor, é a atualização de falas onde são atribuídos valores e nome às coisas. A linguagem dos símbolos faz o corpo estremecer e movimenta ações onde encontram-se pessoas dispostas a morrer e matar para legitimar o símbolo e crença interlaçada com ele. Através da construção simbólica o que está como objeto é atualizado em novo significado. “Uma pedra é imaginária, como tal, nada tem de religioso. Mas no momento em que alguém lhe dá o nome de altar, ela passa a ser circundada circu ndada com uma aura misteriosa” (ALVES, 1981, p. 26). A partir do momento que ‘A’ sofre uma atualização, o sentido antes convencionado, torna-se, em certo grau, virtual por meio da atualização. E na aura misteriosa, para usar a expressão do autor, há um limite entre o profano e o sagrado, entre aquilo que é da religião do que não é. Ou ainda aproximando Alves (1981) com Miklos (2012) encontramos no segundo que a “religião é um sistema solidário de crenças e práticas relativas a co isas sagradas” (MIKLOS, 2012, 2012, p. 19). 2
Escolho o referencial de Alves (1981) pela aproximação que Miklos (2012) faz a leitura de ciber-religião. Entretanto em PASSOS, João Décio, e USARSKI, Frank ( Orgs.). Compêndio de Ciência da Religião, São Paulo: Paulinas/Paulus, 2013, é apresentada uma discussão dos avanços da Ciência da Religião na última década, o que seria mais interessante para conceituar religião.
O terceiro conceito que apresento é o de redes sociais virtuais, feito a partir da leitura de Recuero (2009). “Uma rede é uma metáfora para observar os padrões de conexão de um grupo social, a partir das conexões estabelecidas entre os diversos atores” (RECUERO, 2009, p. 24). As conexões acontecem pela mediação de dispositivos que conectam os atores entre si no espaço virtual, proporcionando a criação de nós pelos envolvidos. Pensar a questão das Redes Sociais Virtuais é pensar a relação do ser humano com o ciberespaço. Recuero (2009) na introdução de seu livro chama atenção pela forma como nos relacionamos o tempo inteiro, formando nós, redes e interagindo no ciberespaço construindo novas territorialidades. Recuero (2009) escreve que vivenciamos um alastramento da vida cotidiana, fotografada nas redes sociais virtuais e com Lévy (1999) percebe-se uma construção de ações no espaço virtual. Esta construção retrata diversos aspectos da vida humana no virtual, inclusive as ações de caráter religiosa. A este fenômeno, da construção da religião no ciberespaço, Miklos (2012) chama de ciber-religião. Uma religiosidade, uma sacralidade de atos e símbolos que é levada para um espaço de interconexão interconexão com linhas que qu e se inter-cruzam numa esfera rizomática (DELEUZE; GUATTARI, GUATTARI, 2000) onde as paredes do físico desparecem despa recem e a estrutura física hierárquica tem peso minimizado. A ciber-religião é uma rede descentralizada que se reproduz continuamente. Apresentado os conceitos que trabalho nesta reflexão, vou apontar os dados coletados no ciberespaço. Os dados foram cartografados de uma rede social virtual, neste caso o Facebook (www.facebook.com). O Facebook é, ainda, a rede social virtual aberta de maior apelo popular com perfis ativos no Brasil. Os dois atores escolhidos são distintos, mas eles se inter-relacionam. O primeiro ator escolhido é a fan-page do setor de comunicação de uma diocese da Igreja Católica do Brasil, um ator institucional, e o segundo é um fiel voluntário deste setor, porém, de outra diocese, que representa um perfil pessoal. Estes atores foram selecionados porque responderam por primeiro ao “convite” da pesquisa, enviados pelo Facebook para diversas organizações religiosas e voluntários. As telas recortadas para a pesquisa foram as duas últimas postagens de cada um, analisados na primeira semana de maio de 2016.
Post n. 1
Post n. 2
Post n. 3
Post n. 4
Os Posts n. 1 e n. 2 referem-se a fan-page do setor de comunicações, enquanto enquanto que os outros dois Post, o n. 3 e 4 são do perfil do usuário. O Facebook oferece as duas possibilidades de construção, uma página de perfil, de caráter privado onde o usuário compõe uma rede com outros perfis e uma página, as chamadas fan-page, de acesso público, livre, a independer das
redes pessoais construídas. Os perfis contam com limitações de nós, enquanto que as páginas são ilimitadas. O que vemos claramente nos dois primeiros posts são mensagens de conteúdo religioso, uma oração ao Arcanjo São Rafael, um texto simples, que apresenta as necessidades do cotidiano numa linguagem de prece e necessidade de auxílio. A oração é dirigida para o anjo e feita em nome de uma divindade. O Post n. 2 anuncia a festa da Páscoa a partir de uma experiência de um grupo de vivência religiosa. A fan-page, apropria-se de posts divulgados no fluxo da rede incorporando ao seu perfil tais mensagens. O Post n. 3, o órgão de comunição, segue a mesma lógica do perfil. Uma apropriação alheia, fato comum na rede, de transmissão de uma mensagem de caráter espiritual. Já o Post n. 4 apresenta uma transcrição bíblica vinculado a celebração litúrgica daquele dia. As duas postagens mostram elementos do dia a dia do setor, mas não abordam questões específicas de um setor de comunicação.
Análise dos dados: a religiosidade no ciberespaço
Farei dois momentos de análise para pensar a questão da ciber-religião: a primeira visão é a leitura dos Post em si e a segunda leitura com as ligações (ou não-ligações) postas no ciberespaço. As postagens apontadas acima podem ser lidas como símbolo no virtual, mas não são exclusivas dele. Uma das críticas que Lévy (1999) menciona ao comentar as atitudes no espaço virtual é que os usuários estão usando o ciberespaço da mesma forma como são construídas as relações fora dele. Para o autor, a construção de discursos no ciberespaço deveria explorar outras formas de nós entre os atores. Mas a princípio, parece evidente, ao olhar para as postagens, que elas representam uma forma de comunicação que independe do espaço que estão locadas, por isso, farei uma leitura prévia dos Posts Po sts relacionando-os com os conceitos já apresentados. apresentados. Uma das definições que Alves (1981) apresenta na obra O que é religião? é a aproximação dela com a simbologia, com os discursos, as falas evidenciam uma aura de mistérios, mas não no sentido livre de mistérios, mas no olhar do mistério ritualizado. Para o
“invisível que a linguagem religiosa se refere ao mencionar as profundezas da alma, as alturas dos céus, o desespero do inferno, os fluidos e influências que cura” (ALVES, 1981, p. 26). A caracterização religiosa de Rubem Alves aparece de maneira intensa no Post n. 1. A oração descrita nesta postagem mostra o quanto apegado estão as palavras em questões do invisível. Aspectos da medicina estão relegados ao plano espiritual, a intervenção do invisível para curar as doenças do corpo e da alma. A mesma lógica repete-se no Post n. 3, o misterioso que forma um símbolo de fé impulsiona para a criatividade, para o entusiasmo. A aura misteriosa em torno da oração e do símbolo faz vislumbrar novas conexões que ligam o mundo ao plano espiritual. Aquilo que Miklos (2012) chama atenção para ideia do religare. “A palavra religare é formada pelo prefixo re (outra vez, de novo) e o verbo ligare (ligar, unir, vincular). O religare é a forma primeira de vínculo [...] a religião une os iguais e é pretexto para separar os diferentes” (MIKLOS, 2012, p. 18). A ideia de ligação é muito forte, o Post n. 2, está para construir uma ligação com uma mensagem direta entre o ícone e a palavra, a ligação do ato é evidenciada com a comunidade de vida que assina o ícone. Assim, como Alves (1981) chama atenção, os discursos presentes em todos os Posts, o discurso religioso não vive em si mesmo, ele é construído pelos símbolos, sejam eles invisíveis, como a figura de um anjo; ou uma ideia, a ressurreição ou ainda algo visível, como a cruz. A natureza do símbolo aqui não é o foco, mas sim, a relação construída pela ligação entre o símbolo e a luz. As postagens, como já mencionado, estão locadas no ciberespaço. A colocação delas no espaço virtual, para diferenciar do não-virtual, parte do princípio das conexões entre os diversos atores que compõe uma rede. Sem conexão, as postagens poderiam estar colocadas em quaisquer espaços, pois não são exclusivas do ciberespaço. Então, poderia, com certa tranquilidade afirmar que elas deveriam oferecer um padrão de conexão. Há uma mensagem com um tipo de foco e um espaço para um público alvo. Para Recuero (2009) as redes sociais, de maneira geral, formam laços entre os envolvidos. Estes laços dão origens a nós que constituem uma maneira de interação entre pares ou grupos envolvidos. O que diferencia uma interação de rede social no virtual para o não virtual é o fator do desconhecido. Utilizando os exemplos de Recuero (2009), numa rede social virtual um ator pode não se dar a conhecer. Ele pode permanecer no anonimato, ou ainda, as interações são assíncronas, pois não
necessitam de resposta imediata para terem validade. O Post n. 4 deixa claro esta possibilidade. Ele está representando o “Evangelho do dia” com uma mensagem montada para um dia específico, mas a leitura dele feita, ontem, hoje ou amanhã, não impede que seja construída uma forma de interação entre os atores. Os laços que Recuero (2009) apontam ficam registrados no ciberespaço, mas não são dependentes do momento para que aconteçam ou que tenham validade. A mensagem do Post n. 2 também se destina a uma época específica do ano, no caso a Páscoa, mas ele pode ser lido e provocar interações assíncronas também. Já os demais Posts, o n. 1 e n. 3 apresentam na mensagem uma provocação que não dependem do tempo, então qualquer interação entre os atores será feita pela mensagem. mensagem. Esta discussão, discussão, poderia representar um ganho da ciber-religião, uma adequação ao tempo dos atores e não o contrário, o ator adequando-se ao tempo da religião. A leitura de Jorge Miklos (2012) nos transporta para a questão da religiosidade a partir do ciberespaço. Para ele a ideia do religare continua vida mesmo no virtual. Porém uma nova estrutura religiosa é criada no ciberespaço, há uma “organização menos estruturada” (MIKLOS, 2012, p. 110) que permite uma criação de uma identidade religiosa diferente, talvez, menos menos “ligada” a um ideário hierárquico e mais próxima do espetáculo. O Post n. 4 deixa isto em evidência. O Evangelho do Dia é uma prática ritualizada, mas da forma como foi postada sugere uma apropriação da mensagem desvinculada da estrutura litúrgica que pertence, algo menos estruturado, mas estabelecido pelo espetáculo da popularização da rede. A mensagem da ligação religiosa continua, mas de maneira livre e criativa. Tão criativa como a sugestão do Post n. 3, que a mensagem fica apenas em duas frases desconexas com suporte na imagem. Mais espetáculo que ritual. Para Miklos (2012) este tipo de situação permite a aproximação de pares que formam, em torno da mensagem nós, atores que interagem com um princípio comum, a independer da denominação religiosa. Como se, em teoria, um post, pudesse agregar em torno de si uma rede que vai além da construção territorial religiosa presente no não-virtual. A possibilidade existe, mesmo nos Post n. 1 e n. 2 com uma mensagem mais focada. Porém, o Post n. 2 é o que tem maior maior número de “curtidas”. Todas as informações evidenciadas até então não caracterizam uma ciber-religião exclusivamente. Todos os posts da forma como estão colocados, no que se refere de
conteúdo, poderiam ocupar quaisquer mídias. Afinal, não estou analisando outro aspecto, senão, a mensagem. Para caracterizar uma atividade no ciberespaço é preciso olhar para a funcionalidade a partir do espaço que se encontram. Aquilo que Recuero (2009) chama de espaços de formação de laços sociais a partir de nós gerados pela interação entre os atores sociais. Neste olhar, que os posts escolhidos não conseguem agregar uma discussão ou comentários de conteúdos significativos, apenas mensagens gerais. Diante da postagem não houve nenhuma reação. Os atores que visualizaram, não criaram laços ou não formaram nós visíveis, porém, não se pode ignorar a possibilidade que os que visualizaram e concorram, mesmo sem o registro escrito. A pouca penetração das postagens pela rede sinaliza que o fenômeno da ciber-religião não acontece de maneira tão intensiva como a exploração dela nas mídias tradicionais, como rádios e televisões. Para Recuero (2009) a rede é usada como uma metáfora para deixar claro situações de ligações. O Facebook indica a ligação através do botão “compartilhar” onde usuários onde usuários podem se apropriar de postagens e torná-la parte de sua própria rede. Na amostragem escolhida isso não n ão acontece. O silenciamento de uma postagem acontece quando ela não é reconhecida, não é comentada, ou na linguagem no Facebook, ela não é curtida ou compartilhada, fato percebido nas postagens. Um fato próprio do ciberespaço, para Lévy (1996), é a construção de hipertextos que são ligações feitas entre diversas informações que se inter-relacionam a partir de um comando virtual. No Facebook, a hiperligação hipe rligação acontece através da ferramenta chamada “compartilhar” ou ainda nas postagens de links externos à rede, o que não apareceu nos posts selecionados. Para Lévy (1996) a hiperligação evidencia uma cultura de passagem, da fluidez, de as informações locadas no ciberespaço não pertencem a um autor, mas caminham por ondas virtuais sem direção fixa, com possibilidade de permear todas as direções. É possível afirmar, com certa segurança, que os Posts n. 1; 2 e 3 não são de autoria dos atores que os postaram, são apropriações de informações soltas no fluxo. Assim chegaram até ali. Se eles não formaram novos nós, mas, pelo menos, participaram da criação de nós ascendentes, no sentido de vir antes e não de superior, deixando a possibilidade da criação e envolvimento da ideia do religare no virtual. Não há continuidade, pelo que foi observado até o dia da coleta do dado, mas se aqui chegou é porque houve um momento anterior. Se a ideia de ciber-
religião não acontece a partir de, pelo menos, antes de, é possível afirmar que houve. A ideia de não-continuidade evidente da postagem mostra um momento da individualização da mensagem. O “eu” que se sobrepõe aos nós. Um discurso para o todo, feito na rede, sem um destinatário alvo, mas espaçado para o fluxo. A ideia de fluxo, do não estruturado, da ausência de hierarquias, da mensagem pela mensagem sem autoria sejam manifestações de uma nova forma de se relacionar indivíduo com a religião. Não mais com uma religião construída institucionalmente, mas uma forma virtual, deslocada de território no espaço de múltiplas possibilidades.
Considerações finais
A lógica do território é uma lógica norteadora. É pensar uma extensão ou uma jurisdição e o que cabe dentro dela ou o que pode ser administrado dentro deste espaço. Pensar território a partir de uma lógica norteadora é pensar uma estrutura rígida e fechada em fronteiras. Um olhar que não cabe quando o pensar recai sobre o virtual. A construção de um espaço no ciberespaço verte para um olhar que ultrapassa o que pode ser capturado por uma fronteira ou por uma lógica norteadora. A maneira como se é no lugar, toda forma de se ser tem a ver com as ideias, com as sensações na maneira de se construir o espaço e não no espaço em si. Territorializar tem a relação do como se é nas conexões que se especializam, como aponto na introdução, teço uma conexão com o símbolo religioso que marca uma luz, assim como as postagens, que especializam uma ideia, uma virtualidade que está num lugar, mas que ao mesmo tempo está, fisicamente, em lugar nenhum, a atopia. Territorializar no ciberespaço é perceber as possíveis conexões e rupturas que podem ser apresentadas ou capturadas. No caso da pesquisa, uma postagem, o que ela pode representar e ir além dos hipertextos que contém. Pensar território a partir de uma leitura deleuzeana pode ser a saída para uma questão levantada ao longo do texto. Lévy (1999) critica a reprodução do não-virtual no ciberespaço. Para o pensador é preciso explorar novas possibilidades e novas técnicas neste campo de atualizações perenes. Porém, se olhar para a reprodução do não-virtual no ciberespaço como
um espaço de platôs e não de propriedades como Deleuze e Guattari (2000) sugerem, há então, uma expansão da territorialidade, mesmo na reprodução do ciberespaço. E mesmo assim, quando o conteúdo não for exclusivo no não-virtual, como foi o caso dos Posts aqui analisados, o fato dele estar locado no ciberespaço permite afirmar que houve uma expansão do território original. Há uma remontagem do não-virtual em itinerários não estabelecidos. Pensei a questão do território, porém, uma outra questão qu estão poderia ser levantada diante dos atores escolhidos. Se fossem escolhidos atores “famosos, midiáticos”, a formação de nós obedeceria outros critérios. Aqui foram escolhidos atores que foram rede dentro de uma “normalidade” do cotidiano das RSV, perfis com números de conexões normais. Com os chamados “famosos” teríamos a formação de outro tipo de territorialidade em torno do perfil. Uma
formação
de
território
em
torno
do
Twitter
de
Papa
Francisco
(https://twitter.com/pontifex) (https://twitter.com/pontifex) é bem diferente da formação em torno do Twitter do padre da paróquia paróquia do interior, por exemplo. Questões, como o “tamanho” da popularidade do ator contribuir diretamente para que tipo e que “tamanho” sua conexão forma e quais territórios estão construídos ao seu redor. A religião se territorializa no ciberespaço explorando um lugar onde a não rigidez dos fluxos permitem discursos frouxos em relação as falas institucionalizadas do não-virtual. O apelo ao popular torna-se mais m ais “solto” e caminha sem a obrigação de uma intervenção pública após a enunciação. Se uma oração, num espaço institucional termina com um “amém” público e coletivo, a ciber-religião pode terminar com uma palavra silenciada, como os Posts analisados foram mesmo evidenciados que ouve, antes do silêncio um movimento. A ciberreligião é uma manifestação em um território de fluxos e não uma representação rígida, portanto, pode representar o que está no não-virtual, como construir a provocação de hiperligações. A ciber-religião não cria linhas de fuga, ela continua a ser um território, mutante, mutável, mas território, um território que se mostra num mapa.
Referências
ALVES, Rubem. O que é religião? Coleção Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Brasiliense, 1981.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Volume 1. Tradução de Aurélio Neto e Célia Pinto Costa. Rio de Janeiro: Editora 34, 2000. DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. Tradução de Eloísa Araújo Ribeiro, São Paulo: Escrita, 1998. LÉVY, Pierre. Cibercultura. Tradução Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 1999. ______. O que é virtual? Tradução de Paulo Neves. São Paulo: Editora 34, 1996. MIKLOS, Jorge. Ciber-religião: a construção de vínculos religiosos na cibercultura. Aparecida: Ideias e Letras, 2012. PASSOS, João Décio, e USARSKI, Frank ( Orgs.). Compêndio de Ciência da Religião, São Paulo: Paulinas/Paulus, 2013 RECUERO, Raquel. Redes sociais na internet . Porto Alegre: Sulina, 2009.