A CLAVÍCULA DE SALOMÃO por Fernando H. F. Sacchetto – 25/05 - 21/10/2011
I Tudo começou com um camarada do Paulinho. “Tô te falando, o cara era um zero à esquerda”, ele estava explicando. “No catava mina nem com reza !rava. "... modo de dizer. #$ # $ te explico.” “%xplica o qu&'” Parecia mais uma das hist(rias compridas do Paulinho, e minha paci&ncia estava começando a se encher por antecipaço. “)eixa pra l$. * ne+(cio que ele era o maior man, e no era s( com mulher. Tava sempre duro. %le vivia no *-alle/-s pra pa+ar de !ur+u&s...” “0+ual a voc&, n'” “1aai se ferr “1 ferraar. as as ele s( chu hupi pinh nhav avaa de tod odoo mundo, fazia o poss2vel pra +alera pa+ar a !irita dele. %, quando ele pe+ava al+uma coisa, era s( dra+o.” “3eleza, entendi, era um loser . as e a2'” “42, esse s$!ado eu es!arrei com ele, na festa de uma prima da minha mina. ano, fiquei de cara. *u o malandro en+ana muito !em, ou ele t$ investindo pesado na 3olsa, e +anhando. )iz que, s( semana passada, ele faturou mais de 566 mil no intraday.” intraday.” “7, isso f$cil pra caram!a. 8ue cara essa' 9(+ico que : 8ualquer rid2culo pode encher a cara de !e!ida e dizer numa festa que faturou 566 ou ;66 mil com intraday ou intraday ou sei l$ o que mais.”
“T$, t$, tudo !em, mas o cara tava diferente. Tinha, sei l$, al+uma coisa nele...” “<& tava +amado, n' 1ai, fala a verdade, tava querendo dar uma sentadinha s entadinha'” '” “1ai te catar: Tô dizendo que tinha um monte de +atas em cima dele. =ei l$, ele vinha com uns papinhos m( nada a ver, e elas davam o maior mole.” “Tam!m, +anhando 566 pila por semana...” “<& no disse que era conversa' Te pe+uei, hein, manezo' %nfim, mesmo com roupa de marca e tal, ele tava sinistro. 1oc& no acreditava. acreditava. as o pior no isso.” “8ue foi, ele te levou pra casa'” “
e' 8ue nin+um previu, em lu+ar nenhum'” 4+ora estava começando começando a ficar interessante. “?, pra ser coincid&ncia, isso muita sorte. * cara te disse por que ele tinha comprado, como ele sa!ia'” “eu ami+o, a2 que o !icho pe+a. Por isso que eu hesitei quando eu falei de reza !rava.” “1ai me dizer que foi medalhinha de =anto %xpedito'” “No, mas tam!m no t$ lon+e disso. %nto, no sei se eu falei, mas ele participa de um tal dum clu!e de xadrez que mexe com uns ne+(cios meio esquisitos.”
“T$, t$, tudo !em, mas o cara tava diferente. Tinha, sei l$, al+uma coisa nele...” “<& tava +amado, n' 1ai, fala a verdade, tava querendo dar uma sentadinha s entadinha'” '” “1ai te catar: Tô dizendo que tinha um monte de +atas em cima dele. =ei l$, ele vinha com uns papinhos m( nada a ver, e elas davam o maior mole.” “Tam!m, +anhando 566 pila por semana...” “<& no disse que era conversa' Te pe+uei, hein, manezo' %nfim, mesmo com roupa de marca e tal, ele tava sinistro. 1oc& no acreditava. acreditava. as o pior no isso.” “8ue foi, ele te levou pra casa'” “e' 8ue nin+um previu, em lu+ar nenhum'” 4+ora estava começando começando a ficar interessante. “?, pra ser coincid&ncia, isso muita sorte. * cara te disse por que ele tinha comprado, como ele sa!ia'” “eu ami+o, a2 que o !icho pe+a. Por isso que eu hesitei quando eu falei de reza !rava.” “1ai me dizer que foi medalhinha de =anto %xpedito'” “No, mas tam!m no t$ lon+e disso. %nto, no sei se eu falei, mas ele participa de um tal dum clu!e de xadrez que mexe com uns ne+(cios meio esquisitos.”
“ais esquisito que simplesmente montar um clu!e de xadrez'” “=ei l$, do >eito que ele fala, nem parece que o ne+(cio deles xadrez mesmo. Parece que tudo meio secreto, um tipo de maçonaria. @ituais, e tal. %le s( soltou o que ele soltou no s$!ado s $!ado porque tava chapado.” chapado.” “?, meu ami+o, as coisas que se li!era quando se est$ !&!ado... a l$ o que for.” “Pode at ser, mas voltando ao tal clu!e... pelo que o su>eito falou, eles andam fazendo rituais com um ne+(cio que voc& nem ima+ina. 8uando ele falou isso, eu lar+uei a mo dele, muita !alela pra minha ca!eça.” “ais do que voc& t$ acostumado a contar' )if2cil acreditar.” “1oc& sacaneia, mas no foi voc& que teve que ficar ouvindo um cara falar que tem a dro+a da clav2cula do =alomo. )$ pra acreditar num troço desses'”
Tudo estava começando a se encaixar, ainda que no fizesse tanto sentido assim. “Na verdade... d$ pra acreditar tranquilamente, tranquilamente, sim.” “8u&': Pera2, meu chapa, a clav2cula do =alomo' teria vivido no meio do *riente dio faz sei 7m cara que teria vivido l$ quantos mil anos' % um !ando de trouxas pArapado que se reBne num se!o, aqui em =o Paulo, tem um osso dele':” %u sorri. 4 cara de incredulidade do Paulinho valeu a minha paci&ncia. “% quem foi que falou em osso' 0sso mesmo, no tem osso nenhum. %u acredito que esses caras t&m essa clav2cula >ustamente porque eu tam!m tenho.” “4h, rapaz, p$ra com isso: <& t$ me sacaneando, n' Pode desarmar essa cara de paisa+em, eu sei que voc& doido, mas no a esse ponto:” “Tô falando pra voc&, no tem nada de mais. No uma clav2cula no sentido de osso... na verdade, isso um livro. 4 e em dia dif2cil achar um livro que no t$ l$. =e quiser, eu te passo o P)C.” “=ai pra l$, no quero sa!er desses troços ma+ia ne+ra no, cara:” “8ue foi, t$ com medinho' T$ tremendo de medo do capeta, n'” “Nada, eu acho que isso tudo !a!aquice mesmo, mas vai sa!er... =e !em que desse >eito, P)Czinho num penAdrive do Para+uai, nem tem +raça. 4chava que esse
tipo de coisa era pra ser um livro, sinistraço, anti+o, sa!e como '” “=em +alho D s( imprimir, fazer uma capa !acaninha de couro, envelhecer o papel com ch$ de maç e meter uns +rampos. as t$, tudo !em, eu sei do que voc& t$ falando. 9ivro anti+o caro pra caram!a, item de colecionador, mas pra que +astar dinheiro se d$ pra pe+ar o scan na net de +raça'” “8ue se>a, tanto faz. as srio que voc& tem isso' 1oc&, @enato, o f2sico ateu, defensor da ci&ncia e inimi+o do o!scurantismo, com mestrado em quEntica e tudo' No por nada no, mas o que dia!o voc& t$ fazendo com um livro de ocultismo'” “8ual o pro!lema'
+ozador, mas no pôde esconder uma certa empol+aço quando o a!ri. !"#""$%& C!A'(C)!A S%!%#%&(S . “T$ vendo aqui'”, mostrei. “%ditado e material adicional por 4leister e tem o dedo desse cara. 4t o 3lacI =a!!ath tem uma mBsica so!re ele.” “4h, claro, porque isso que determina que...” %le parou no meio do caminho e olhou !oquia!erto quando desci para o c2rculo m$+ico. “os ou al+uma coisa assim. 8uase tudo aqui tem a ver com )eus ou an>os.” “Pera2, mas esse troço no era pra chamar demônios' a'” “a evan+lica, eles >o+am voc&, o livro, e at o seu cachorro na fo+ueira. *s caras acham que esto do lado de )eus, mas quem concorda com isso ou no outra hist(ria.” “% o que voc& acha' To com )eus ou no'”
“=rio que voc& t$ me per+untando isso' a, o patrono dos maconheiros. Nada de mais. Tem uns que te teleportam, ou tocam fo+o nos seus inimi+os.” “%nto voc& quer dizer que o cara l$ que eu tava falando desenhou um ne+ocinho desses e invocou o coisaA ruim'” “%u no quero dizer nada, voc& que t$ contando a hist(ria. as deve ser al+o nessa linha. 3em, na verdade !em mais complicado, tem todo um ritual, cheio de inscriçFes m$+icas, invocaçFes, incensos, sei l$ mais o qu&, mas por a2.” “as pera2... o que eu quero sa!er o se+uinteJ <& acha que realmente veio al+uma coisa' 4l+uma entidade, que deu poderes pra esse cara'” “* que eu acho que a psicolo+ia explica muita coisa. )e repente ele s( precisava de mais autoconfiança, sei l$. =( o ne+(cio da "elm!recht que t$ esquisito, mas ainda pode ser coincid&ncia. as o que eu realmente sei que eu s( tô me !aseando no que voc& disse, t$ me
entendendo' %u precisaria conhecer esse tal clu!e do xadrez pra sa!er o que exatamente t$ acontecendo por l$.” “1oc& t$ falando de se infiltrar no meio dos caras' Tipo, investi+aço mesmo'” “No via>a, ô man:” Na verdade, era !em o que eu estava pensando mesmo. “=( dar uma sapeada, de curiosidade. 4final, eu +osto de xadrez. 8ual o pro!lema de entrar pro clu!e' % eu aproveito pra sa!er como que ele fez pra +anhar esse dinheiro todo.” “T$ acreditando na historinha de ma+ia, n' 4h, rapaz, tô sa!endo que voc& !em que t$ com vontade de a>oelhar e !ei>ar o ra!o do capeta:” “%u s( estou tomando uma atitude cient2fica. )iante desse fenômeno curioso, eu pretendo o!serv$Alo cuidadosamente, classific$Alo, e derivar uma concluso equili!rada e imparcial com !ase nos princ2pios $ureos da no!re ci&ncia f2sica.” “T$ certo... %nto, quer que eu te apresente o cara' )e vez em quando ele aparece no miniA+olfe, eu posso te levar l$. * nome dele 3essa” “)emorou. * 3essa que me a+uarde, eu vou ensinar pra esses mans do xadrez um pouco so!re o que real e o que superstiço.” %ntretanto, quem estava prestes a aprender era eu, e a liço seria lon+a.
II %le tinha um ar insuport$vel de quem tinha muito privil+io e nada de !om para fazer com ele, como um menino que no aceita perder o >o+o s( porque o dono da !ola. 8uando encontramos com ele no miniA+olfe, eu >$ sa!ia quem era antes mesmo de o Paulinho nos apresentar. “Cilha da me”, disse eu, quando mandei a !ola para fora da $rea pela terceira vez. Cazia parte do plano. “)eve ter al+uma coisa errada com esse taco.” “o+ada foi razo$vel. 3essa se posicionou para sua tacada. “8ual, no esquenta,” disse ele, “acho que voc& t$ indo !em pra primeira vez.” “T$ !rincando' *ito pontos em tr&s !uracos, e com essa penalidade, >$ tô na quarta tacada pra esse aqui. @ealmente, esse troço no pra mim.” Paulinho sorriu. “?, meu chapa, tô falando. 1oc& como >o+ador de +olfe um (timo f2sico. *u nem isso... no presta nem pra calcular a tra>et(ria da dro+a da !ola:” “KAh, t$ !om. e d$ um feixe laser e um computador que eu resolvo esse pro!lema.” 3essa atravessou dois o!st$culos com sua !ola. “)e repente uma questo de talentos... deve ter outras coisas que voc& faz !em.”
%u sorri enquanto posicionava minha !ola. "avia che+ado meu momento. “* ne+(cio que isso aqui no tem nada a ver com calcular tra>et(ria de coisa nenhuma. ? s( ha!ilidade manual mesmo, +randes coisas.” o+o que precisa de racioc2nio, plane>amento, criatividade, como o xadrez... a2 sim, voc& vai ver o que profissional.” “L, 3essa,” Paulinho disse enquanto alinhava sua tacada, “voc& no tinha um tal dum clu!e de xadrez' Podia levar esse cara pra l$, que aqui ele t$ s( perdendo tempo.” * rapaz ficou meio sem >eito. “7... voc& nunca se interessou pelo clu!e, porque t$ per+untando dele a+ora'” “%u falei pra levar ele, no eu. Tô nem a2 pra xadrez, ô troço chato.” “Ta2, parece le+al,” disse eu, procurando mostrar interesse. “0sso sim, eu topo numa !oa. *nde voc&s >o+am'” “"...” %le parecia procurar al+o para dizer enquanto preparava sua tacada. “4cho que era !om ver com o pessoal l$, a a+enda de >o+os...” “4h, cala a !oca,” disse meu cole+a, com um +esto de a!orrecimento. “4t parece que tem uma fila enorme de +ente querendo entrar pro seu clu!inho.” “Nem que se>a s( pra assistir, at a!rir um >o+o,” ar+umentei. “%u aprecio uma !oa partida. %xiste toda uma !eleza no ato de usar o pensamento pra moldar uma realidade.” Paulinho deu um +runhido de repulsa pela pretenso do que eu disse, mas 3essa sorriu. 4 refer&ncia havia
surtido efeito. “T$ certo... acho que d$ pra voc& frequentar l$ um pouco. =( pra ver se voc& se adapta ao nosso pessoal.” “Tenho certeza que sim.” @etri!u2 o sorriso, mais pela satisfaço de ter conse+uido vencer a primeira !arreira. “%u sinto que vou ter +randes coisas pela frente nesse clu!e.” M M M Na terça se+uinte, l$ estava eu, rodeado por livros mais velhos que anti+osO e um !ando de caras com o mesmo olhar faminto de 3essa. * lu+ar ficava na =anta
*lhei incrdulo para meu “padrinho”. %le estava prestando uma enorme atenço no cho à sua frente. “No !em assim que eu descreveria,” expliquei, “mas acho que at d$ pra dizer isso. Na verdade eu sou analista de se+uros de uma empresa de consultoria, a 9... conhece'” * sorriso dele disse que ele no apenas no conhecia, como tam!m no li+ava a m2nima pra isso. “Perdo pela minha falta de modos. *r2+enes. @enato, certo'” “"... sim, meu nome @enato *liveira. Prazer.” “0+ualmente. Nome auspicioso... espero que se confirme. as che+a de conversar com palavras... h$ muito pouco que elas podem dizer. 8ue tal conversarmos de forma mais direta, de mente para mente'” %u >$ estava procurando a porta da sa2da e uma desculpa para me diri+ir a ela, quando perce!i que ele estava falando de >o+ar xadrez. 4liviado, sentei em frente ao ta!uleiro D um con>unto realmente lindo, de m$rmore, tanto o ta!uleiro em si quanto as peças. untar meus pensamentos, a!ri o >o+o. o+ando defensivamente, tomando cuidado para no deixar !rechas em minhas posiçFes, enquanto avaliava o >o+o dele. %le foi mais a+ressivo desde o princ2pio, e lo+o tomou a iniciativa do >o+o, forçandoAme a constantemente rea+ir a suas investidas. o+o r$pido e frentico... mas sacrificou a maioria de suas peças de valor
para faz&Alo. %ventualmente, deu um xeque com a torre, a qual capturei com o cavalo, resultando em xequeAmate. =eus peFes, pouco movimentados, facilitaram que eu o encurralasse. “%spl&ndido,” disse. “Por um momento eu ima+inei que seu medo o estivesse prendendo, impedindoAo de manifestar seu potencial. o que voc& ainda tem muito o que aprender... para começo de conversa, precisa se arriscar mais se quiser atin+ir a +randeza.” “*u perder o >o+o,” retruquei. “No sei se eu teria conse+uido +anhar se voc& conservasse mais a sua força.” *r2+enes +ar+alhou, enquanto viravaAse para os outros. “%sto vendo' %le no a!aixa a ca!eça. 4cho que voc& tem potencial afinal de contas, rapaz. %st$ começando a perder suas ini!içFes. 4cho que pode aprender uma coisa ou outra conosco.” *s outros inte+rantes finalmente começaram a olhar diretamente para mim. 4 tenso no am!iente aliviouAse de forma palp$velQ de repente, a pr(pria +ara+em onde o se!o estava instalado parecia maior. “4cho que sim,” disse afinal, ap(s a ficha terminar de cair. “4final... no s( xadrez que tem pra fazer aqui, n'” 7ma senhora com !em mais maquia+em e !i>uterias que o am!iente pedia virouAse para mim com um olhar malicioso. “* que voc& quer dizer com isso'” Resticulei à minha volta com um sorriso. “Todo esse conhecimento ao redor da +ente... quer lu+ar melhor pra ter discussFes aprofundadas so!re as mais diversas questFes'”
“No falei que era o cara certo'” 3essa tinha um ar triunfante. * l2der do +rupo levantou a mo. “$ conhece a mim e ao nosso ami+o 3essa. 4 =uzana,” ele +esticulou para a mulher que me fizera a per+unta, “ uma senhora cu>os modos suaves ocultam +rande força. 4qui temos o s$!io e +entil *scar,” disse, mostrando um senhor de meiaAidade de ar am$vel, “e por fim, apresento 9Bcio e Naiara, cu>o amor traz equili!ro ao nosso pequeno +rupo.” * casal consistia em um rapaz de ar insolente e uma moça que fazia um esforço admir$vel para esconder seu >eito su!ur!ano. 4cenei para cada um que era apresentado. “uito prazer, pessoal,” disse ao final. “%spero ter a oportunidade de detonar todos voc&s no ta!uleiro... no me levem a mal.” Corcei um sorrisinho. *s outros inte+rantes no riram da +racinha, mas responderam com sorrisos de expectativa, o que me deixou mais sem >eito ainda. “% a+ora, eu tenho que assinar al+uma coisa, fazer um >uramento, pa+ar trote, o qu&'” *r2+enes inclinouAse para a frente em sua cadeira. “ostre sua ha!ilidade de prever nossos movimentos. * que voc& acha que deve fazer'”
Pausei por al+uns se+undos, refletindo. * a+ora ou nunca, pensei. Arrisco, Ah ue se dane. Se eu icar enrolando nunca vou conse+uir. “* que eu devo fazer'” disse, levantando o olhar para ele. “* que eu quiser, claro. No essa a lei'” *s mem!ros do clu!e se entreolharam, intri+ados D com a exceço de seu l2der, que manteve seus olhos fixos em mim. * sil&ncio se estendeu por al+uns momentos tensos, sendo ento su!stitu2do por um !ur!urinho ainda mais an+ustiante. =enti +otas de suor se formando em meu pescoço. 4p(s um tempo que pareceu uma eternidade, a voz penetrante de *r2+enes cortou os sussurros, que se calaram instantaneamente. “)evo dizer que estou surpreso. 8uando 3essa disse que tinha al+um novo para o clu!e, a+uardei sem muito interesse D eu >$ esperava por essa not2cia, claro. Talvez por isso no tenha lhe dado seu devido valor, devo confessar. %sperava na melhor das hip(teses al+um i+norante mas com um m2nimo de potencial... no um erudito.” Ciz al+uns sons desa>eitados, tentando dizer que no sa!ia +randes coisas, mas ele me interrompeu antes que eu pudesse falar. “
7ma onda fria !or!ulhou em minha !arri+a. No tinha consci&ncia disso na poca, mas eu aca!ara de cruzar um horizonte de eventos. 4 partir daquele ponto, no era mais poss2vel voltar atr$s.
III “% ento'” )>alma olhava para mim ansiosamente. %ncolhi os om!ros. “7, ento nada. Todo mundo levantou, como eu disse, e eu fui pra casa.” “as e a2'” eu cole+a insistia. %le era pouco mais >ovem que eu, mas o !rilho em seus olhos o fazia parecer uma criança. “*s caras so sinistros mesmo' 1oc& viu al+uma coisa doida de ocultismo'” “Pô, cara, tô dizendo, eu fui em!ora lo+o em se+uida. 4inda no deu tempo de ver nada. 8uem sa!e amanh... pelo que o cara falou, deve ter al+um tipo de ritual, sei l$.” “% esse ne+(cio que voc& falou'
claro, mas... !em, quem sa!e foi s( pela surpresa. 4final, no todo mundo que conhece essas coisas, certo' *u que solta esse tipo de frase numa conversa normal so!re xadrez...” “1oc& t$ levando isso a srio mesmo, n'” irna, que completava nosso pequeno +rupo, per+untou suavemente. “8ue nada,” disse, talvez um pouco mais forçadamente do que +ostaria. “? s( curiosidade mesmo. % tam!m !om ter um pessoal pra praticar xadrez...” “T$ !om...” )>alma deu uma risada. “=e fosse eu, a Bltima coisa que eu ia pensar era xadrez: 0ma+ina se eles to invocando mesmo al+uma coisa...” 4lfredo tinha um ar +rave. “%u >$ expressei minhas reservas so!re esta sua empreitada... e, novamente, peço encarecidamente que reconsidere.” “8ual o pro!lema'” Procurei demonstrar naturalidade. “%m primeiro lu+ar, eu tô convencido de que no tem nada de mais nesse pessoal. =( queria sa!er como que eles ficaram sa!endo da alta nas açFes da "elm!recht. )eve ter al+um esquema a2. % depois, se eu perce!er que a coisa t$ ficando pesada... !em, s( pular fora, certo' al conheço esses caras.” * olhar de irna ficou um pouco mais srio. “%u que no sei que tipo de coisa que eles podem estar armando, mas se for al+uma coisa peri+osa... tem certeza que voc& vai perce!er a tempo' 8ue, quando voc& se der conta, no vai estar envolvido demais pra voltar atr$s'” “No esquenta no:” inha resposta foi r$pida. “? s( um !ando de malucos. )e qualquer >eito, vamos parar de enrolaço que o ne+(cio aqui srio.” Resticulei para a
parafern$lia de >o+o D dados, mapas, fichas, livros D que co!ria a mesa. “Tem um portal pra 3aator em al+um lu+ar da aldeia, e voc&s ainda to lon+e de achar a pista dele.” “8ue se dane a aldeia, esse ne+(cio de verdade:” )>alma estava incrdulo. “7m culto sinistro, com ma+ia, demônios, o escam!au: Na realidade: 8uem se importa com o >o+o' ? s( ima+inaço:” “%u no teria tanta certeza...” Pontuei a am!i+uidade do que disse com um sorriso ardiloso. “%, de qualquer >eito, no tem como avançar a aventura do clu!e de xadrez a+ora. as a aventura da aldeia de Rormund sim, e o tempo valioso.” M M M No dia se+uinte, resolvi ir mais cedo ao se!o para no atrasar e dar vexame, e aca!ei sendo o primeiro a che+ar. *r2+enes, que estava atendendo um fre+u&s, indicou uma das cadeiras no fundo da lo>a, onde hav2amos nos reunido da Bltima vez. Pe+uei um livro a esmo parecia ser al+o so!re a psican$lise so! a (tica da alquimia medievalO e me sentei, tentando em vo me concentrar na leitura. “3oa escolha,” ele me disse al+uns minutos depois, e se diri+iu à frente da lo>a. * fre+u&s >$ havia sa2do. “7m tanto quanto va+o e acad&mico, com certeza, mas uma introduço v$lida à su!lime ci&ncia.” %le desceu o porto de correr, e começou a preparar a porta que o atravessava. “% o elo com a psican$lise... muitos tradicionalistas podem torcer o nariz, mas eu particularmente s( ve>o !enef2cios no di$lo+o entre a ci&ncia dos anti+os tomos e a das universidades. No acha'”
“", acho que sim... afinal, NeHton era alquimista, no' Naquela poca, eles no faziam muito essa distinço.” %le apontou para mim, triunfante. “%xato: uita coisa se perdeu do homem renascentista, que !uscava uma viso completa do 7niverso. as parece que no preciso dizer isso para voc&, ah, no mesmo. o, voc& no trouxe preparativos.
sussurrei, enquanto avaliava minha apar&ncia !izarra no pequeno espelho. “*nde que voc& foi se meter' 4+ora no d$ mais pra passar o caro de sair correndo... mas, depois que essa loucura aca!ar e eu me mandar daqui, nunca mais piso nesse lu+ar:” 8uando emer+i do !anheiro, a!rindo lentamente a porta com minha roupa do!rada em!aixo do !raço, o senhor mais velho que participava do +rupo >$ havia che+ado, e estava afastando as cadeiras enquanto *r2+enes trocava sua roupa, vestindo um manto !ranco com um penta+rama ela!orado e cheio de inscriçFes no peito, !ordado em preto. “? @enato, n'” * homem *scar, conforme ele me lem!raria mais tardeO apresentava um sorriso acolhedor. “? a primeira vez que voc& faz isso' No se preocupe no, tudo !em tranquilo aqui. No fundo, no nada mais que uma sesso de oraço.” al sa!ia ele que, ao invs de me acalmar, isso apenas me deixou li+eiramente mais apreensivo. “? s( o!servar a +ente e acompanhar na medida do poss2vel. =e voc& fizer al+uma coisa fora do roteiro, no li+ue. Todo mundo >$ passou por isso.” “% quem sa!e, o desvio pode ser o resultado de forças superiores, diri+indo o ritual de formas que mal podemos prever.” *r2+enes voltara ao centro da $rea onde antes estiveram os assentos, com diversas velas e outros o!>etos nas mos. “
a,” disse em tom >ocoso. “4!ençoada se>a,” retri!u2, sendo lo+o acompanhado pelos outros. %sforceiAme para no olhar diretamente enquanto ela trocava de roupa no que ela fosse do tipo que desperta os instintos mais primitivos, mas ainda assim, valia ser educadoOQ ela, por seu lado, no fazia a menor questo de esconder seu corpo, mas pelo contr$rio, tinha al+o de provocante em seu >eito de se despir. *scar conversava animadamente com ela, aparentemente so!re al+um tipo de fofoca, e seu mentor prosse+uia pacientemente em seu tra!alho, colocando velas e incensos em um +rande e ela!orado penta+rama. *s outros mem!ros do +rupo no tardaram a che+ar primeiro 9Bcio e Naiara, e por Bltimo 3essaO, transformando aquele vestu$rio improvisado em uma roda de conversa, na qual me senti impelido a entrar. No foi dif2cil participar, pois eu era o tema principal da discusso D o que eu fazia, qual era minha formaço, se >$ havia participado de al+um “coven” ou outro tipo de c2rculo de ocultismo. )eixei claro que, at o momento, meu conhecimento do assunto era apenas te(rico D sem mencionar, claro, que >amais acreditei que houvesse qualquer coisa de real nisso. Notei que 9Bcio olhava avidamente para mim e para 3essa mas principalmente para mimO enquanto sua namorada se trocavaQ procurei, portanto, parecer completamente a!sorto na conversa enquanto isso ocorria.
9o+o o assunto pendeu para a le+itimidade da !ruxaria moderna, se ela era al+o inventado nos anos U6 ou no, e se isso realmente importavaQ este parecia ser um assunto delicado no +rupo, a >ul+ar pelos olhares e suspiros quando isso veio à !aila. Celizmente, *r2+enes interrompeu a discusso antes que ficasse acalorada demais, conclamando todos a tomar seus lu+ares no c2rculo, e apontando para mim um vrtice da fi+ura. =e+uindo a deixa dos outros, posicioneiAme lo+o atr$s de uma +rande vela preta. *s outros mem!ros, todos vestidos de preto com exceço do l2derO, se posicionaram nos outros vrtices da estrela de sete pontas desenhada no cho. * sacerdote caminhou para o centro do c2rculo, portando uma ada+a retorcida em suas mos. %le voltouAse para os quatro pontos cardeais, desenhando al+o com a ada+a no ar enquanto entoava palavras que no pude identificar, sendo acompanhado em se+uida pelo restante dos cultistas. Ciz o poss2vel para imitar o que diziam a partir da se+unda vez. 8uando terminou suas invocaçFes nas quatro direçFes, repetiu o procedimento mais duas vezes, primeiro apontando a ada+a para o alto, e depois tocando sua ponta no cho, no centro do c2rculo m$+ico. “4ssim como acima, tam!m a!aixo”, disse, sendo ecoado em se+uida por seus disc2pulos. %le voltouAse para mim. “8uem este que apresentaAse à porta'” 9evei al+uns se+undos para entender o que ele queria dizer. “@enato *liveira,” disse. “%stou aqui para me >untar a este c2rculo.” “% quem fala por este suplicante'” “%u falo por ele,” 3essa disse. “8ue se>am minhas suas trans+ressFes, caso no venha a n(s em perfeita
confiança.” "avia um leve tom de contrariedade em sua voz. “% o que !uscas no concili$!ulo, ( suplicante'” @efleti por um momento. 0sso parecia ser crucial para +anhar a aceitaço deles. “3usco conhecimento. 3usco sa!edoria.” *lhei !revemente à minha volta, e adicioneiJ “3usco poder.” “% >uras que vens a n(s puro de corpo e alma, em perfeito amor e perfeita confiança'” “#uro. Perfeito amor e perfeita confiança.” )essa vez, procurei imprimir o m$ximo de se+urança em minha voz. “%nto atravessa a porta e entra no c2rculo sa+rado.” Passei por cima da vela, tomando cuidado para no queimar o manto, e me diri+i ao centro da mandala. *r2+enes er+ueu a ada+a ao meu rosto e traçou uma fi+ura no ar. Por um momento, tive receio de que ele fosse me espetar D felizmente, no foi o caso, e ainda conse+ui evitar piscar. %le entoou outras palavras arcanas, sendo mais uma vez se+uido pelo restante do +rupo, e concluiu comJ “%u te saBdo, ( ma+o.” “%u te saBdo, ( ma+o,” repetiram os outros. “%u te saBdo, ( mestre,” disse eu. 9o+o em se+uida me arrependi, pensando que achariam que eu estava levando na !rincadeira, mas o sacerdote pareceu aprovar. “ "heie” !radou *r2+enes. “ Haioth #ethraton” %le invocou v$rios nomes, com os disc2pulos repetindo todos. Tentei repetir tam!m, mas ele estendeu um dedo em direço a meus l$!ios. 4p(s uma srie destas palavras arcanas, ele +esticulou para que eu sa2sse do c2rculo,
andando atr$s de mim. *s outros apenas olharam, enquanto ele me direcionou lentamente para os fundos do recinto, sempre entoando. 8uando ele me posicionou frente a uma porta e a a!riu, o coro repentinamente parou. “estre...” 4 voz era de 3essa. “Tem certeza que ele deve...” “Tenho,” o mestre interrompeuAo. “1oc& questiona seu mestre'” “Perfeito amor e perfeita confiança,” ele disse relutantemente, “mas... ele no est$ preparado...” “4 deciso no sua. % tampouco minha. %ste momento nos foi revelado, e assim que ele deve ocorrer. @ecomecem a invocaço.” %nquanto os mem!ros do c2rculo entoavam os nomes, *r2+enes voltouAse para mim. “Preste muita atenço, pois voc& no ouvir$ isso novamente. 1oc& dever$ entrar por esta porta sozinho, e descer a escada. No fundo, voc& encontrar$ um c2rculo e um triEn+ulo. %st$ me compreendendo'” 4cenei a ca!eça avidamente. No poderia falar nada, mesmo se quisesse. “Vtimo,” ele prosse+uiu. “8uando che+ar l$, voc& dever$ ficar no centro do c2rculo, de face para o triEn+ulo. No pertur!e as inscriçFes, as velas, ou qualquer outro o!>eto... e, no importa o que aconteça, no saia de dentro do c2rculo de forma al+uma. %st$ claro'” Ciz que sim com a ca!eça. %le continuou. “=u+iro que voc& se sente, em posiço de l(tus. 4lm de ser uma posiço poderosa, tam!m impede que voc& caia para fora.”
%n+oli em seco, enquanto olhava para a escadaria escura alm da porta. “%... o que eu vou encontrar l$'” “0sso eu no posso dizer. )irei apenas que voc& deve prestar muita atenço, e tomar cuidado. No confie em tudo o que ouvir... voc& no ouvir$ mentiras, mas h$ muitas maneiras de se ferir com a verdade. No se precipite, mas prossi+a com cautela, pois o risco +rande. 1oc& tem tudo a +anhar, e tudo a perder.” “as...” %le co!riu minha !oca com sua mo. “Tudo o que voc& realmente precisa sa!er est$ em seu coraço. %stamos clamando por sua se+urança. 4+ora v$.” * sacerdote voltou para o c2rculo, onde >untouAse ao coro. %ncarei a porta. Ah deia disso pensei. $ com medo de u3, &4o tem nada l emaio. $ tudo na cae6a desses doidos. @espirei fundo, e passei pela porta. al podia ver os de+raus so! meus ps, mas havia uma luz fraca vinda do fundo da escadaria que permitia que eu me orientasse. No final do lance de escadas, che+uei a um pequeno cômodo provavelmente um poro ou despensaO totalmente despido de mo!2lia. 4 Bnica fonte de luz eram as velas espalhadas por diversos pontos do c2rculo arcano, que reconheci como sendo aquele desenhado na Clavicula Salomonis, com uma serpente amarela enrolada ao redor de uma srie de hexa+ramas.
medo. * s8 passar um tempinho sentado aui. =em sa!er ao certo o que esperavam que eu fizesse, resolvi fin+ir que estava meditando. “4uuuuuuummmm,” entoei. “%stava esperando por sua che+ada.” )ei um so!ressalto. 9em!randoAme das palavras de *r2+enes, fiz um esforço para ficar parado. “8uem t$ a2'” “=ou aquele que voc& veio !uscar.” 4 voz era t&nue e distante, e parecia vir da minha frente. “8Aquem voc&'” *lhei nervosamente à minha volta. 4lm de mim, o poro continuava vazio. “* que voc& quer'” “4 verdadeira per+unta ... o que voc3 quer'” Ah ue se dane pensei. $ no inerno ara6a o capeta... nesse caso uase ue literalmente. “%u quero... !em, o que voc& pode me oferecer'” “Tudo o que voc& ousar pedir.” “Tudo'” Ponderei por um momento. %ssa era a hora de pôr à prova essa farsa toda. “%u quero a Teoria de Tudo. 4 verdadeira. 4quela que unifica a quEntica e a relatividade, e responde às questFes insolBveis da f2sica. 1oc& pode me fornecer isso'” 4 voz pareceu +ar+alhar. “Cacilmente. =e voc& conse+uir compreender este conhecimento, ele seu. 0sso tudo'” “8u&' No o !astante'” Se9a l uem or ue t a:endo isso acho ue n4o entendeu o tamanho do pedido. ;em vamos pa+ar pra ver. “=im... tudo.” “uito !em. *lhe em meus olhos.” “as eu no tô vendo nada...”
“@elaxe sua mente.” =enti uma ponta de frustraço. % ue ser ue eu tava esperando, &4o vai aparecer nada. %sperei um tempo, olhando para a vela à minha frente... at que um vulto começou a se formar das som!ras. )ei um pulo, e a viso desapareceu. <=elae sua mente> a voz insistiu, ap(s al+uns momentos. %ndireiteiAme no cho, fechei os olhos, e comecei a meditar novamente. 8uando a!ri os olhos, a fi+ura à minha frente voltou a +radualmente tomar forma. =eus contornos eram estranhos e dif2ceis de definir, mas minha atenço lo+o foi tomada por dois pontos !rilhantes que contrastavam com o vulto som!rio. Seus olhos. %les começaram pequenos e p$lidos, mas sua luz foi ficando cada vez mais forte e mais concentrada, como duas sin+ularidades c(smicas, crescendo, ofuscando o poro som!rio, en+olindo o mundo à minha volta, seu fo+o me consumindo, at que nada mais existisse.
IV *s dias se+uintes se passaram como um sonho. * domin+o mal foi re+istrado em minha mem(ria. 9em!ro de acordar em casa, vestido com minhas pr(prias roupas ao invs do manto ne+roO, pouco antes do meioAdia. No fazia a menor ideia de como havia che+ado l$, mas conclu2 mais tarde que devo ter voltado por conta pr(pria, pois meu carro estava na rua, em frente ao meu prdio, e a chave foi encontrada em meu !olso. %ntretanto, no tinha qualquer mem(ria de diri+ir de volta D minha Bltima
lem!rança antes de acordar fora o estranho encontro no poro do se!o. "avia al+o de importante que eu ficara sa!endo l$... al+o que eu provavelmente deveria escrever em al+um lu+ar, antes que me esquecesse... se eu conse+uisse me concentrar o suficiente para isso. %ntretanto, me sentia em uma espcie de ressaca D era como se minha ca!eça estivesse dentro de um aqu$rio. %u no conse+uia manter a atenço por mais do que al+uns se+undos, ou mesmo fixar o olhar em um ponto espec2fico. Passei o dia olhando para a televiso, sem compreender nada do que estava passando, parando às vezes para comer restos frios da +eladeira. 8ualquer +rande verdade que eu porventura tivesse aprendido, eu >$ havia esquecido na se+undaAfeira, quando fui tra!alhar. %u pensei em li+ar, dizendo que estava doente, mas quando me dei conta, >$ estava che+ando ao escrit(rio. Paulinho e )>alma me cercaram, cheios de per+untas so!re o s$!ado, que respondi com +runhidos va+os. %u tinha apenas uma leve noço da presença deles. Ciquei a manh toda analisando um al+oritmo que normalmente no levaria mais que dez minutos, refazendo meu tra!alho um nBmero incont$vel de vezes. 9$ pela quartaAfeira, meu racioc2nio finalmente havia voltado a um n2vel que me permitisse pensar so!re o ocorrido.
@esolvi no comentar so!re minhas experi&ncias com meus ami+os. No queria que eles achassem que eu era maluco, ou que havia tomado dro+as mesmo que contra minha vontadeO... e, alm do mais, eu mesmo no tinha certeza so!re o que tinha visto e ouvido. $ estava me recuperando. *s dois no pareceram muito convencidos, mas no questionaram nada. Na sextaAfeira, li+uei para 4lfredo e irna para cancelar o >o+o de @PR, pois no tivera condiçFes psicol(+icas de preparar nada ao lon+o da semana. 4lfredo fez questo de me visitar para conversar so!re o que acontecera no Bltimo s$!adoQ no entanto, insisti que no havia nada de estranho para relatar, e ele eventualmente se rendeu. irna apenas reiterou seu pedido de cuidado. @efleti por muito tempo se eu deveria ou no voltar ao clu!e de xadrez. Por um lado, eu havia prometido a mim mesmo que >amais pisaria l$ de novo... mas por outro, eu sentia que merecia al+um tipo de explicaço da parte deles. %les no podiam simplesmente me dro+ar, hipnotizar, ou se>a l$ o que for que fizeram sem ouvir umas !oas verdades, e eu queria tirar isso a limpo pessoalmente, olho no olho. 4ssim, compareci ao local no s$!ado, novamente che+ando !em mais cedo que o hor$rio previsto D mas desta vez de prop(sito. 8ueria confrontar *r2+enes sozinho, sem seus lacaios por perto. )esta vez, a lo>a estava vazia. %le estava no !alco, fechando suas contas. “*ra, salve:” ele disse, antes que eu
pudesse me expressar. “Cinalmente voc& voltou:
“uito !em, rece!i a mensa+em... mas n(s dois sa!emos que ela no verdadeira.” “* qu&': a, ele novamente começou seus preparativos. “4lm do mais, as respostas esto todas com voc& mesmo. %las viro quando voc& estiver preparado. 1amos, est$ na hora.”
*scar e =uzana che+aram enquanto eu estava me trocando, desta vez na $rea onde nos reun2amos. *scar me encarava com leve preocupaço, e =uzana com uma curiosidade famintaQ entretanto, am!os foram reticentes. No per+untaram ou comentaram so!re o que acontecera comi+o, e pouco conversaram entre si. "avia uma tenso palp$vel no se!o naquela noite. “*lha s(, o +rande ma+o est$ de volta:” %ra 3essa, em tom de esc$rnio. %le che+ara pouco depois. “% o +rande encontro, hein' T$ sa!endo todas as +randes verdades do mundo'” “Nosso ami+o ainda est$ lutando para compreender o que viu e ouviu,” *r2+enes respondeu por mim. “Tudo vir$ em seu devido tempo.” “? mesmo' %nto quer dizer que ele no tava pronto pra lidar com uma coisa desse porte' *lha s(, quem diria:” “%i, pera2:” e senti na o!ri+aço de protestar. “8uem voc& pra che+ar me aloprando desse >eito'” “)esculpa a2 se eu no sou o +rande escolhido...” “Paz, irmos:” * l2der er+ueu suas mos entre n(s. “* que se passou entre @enato e nosso +uia entre eles. No ca!e a n(s questionar o desenrolar da entrevista.” “Tudo !em,” o >ovem ar+umentou, “mas esse ne+(cio de colocar o cara l$ em!aixo da primeira vez no podia prestar:” “%u deixei isso !em claro na semana passada,” o sacerdote disse firmemente. “4 escolha no foi minha.” “T$ !om que no foi...”
“8ue foi, 3essa'” %ra 9Bcio, que havia aca!ado de che+ar com sua namorada. “T$ com ciuminho, s( porque voc& teve que esperar pra caram!a'” “@$: V quem fala, o senhor inse+urança, morre de medo de al+um olhar pra namoradinha...” 9Bcio deu um passo à frente. “T$ maluco' 8uer perder os dentes, ô man'” “Rente, +ente:” *scar suplicou. “4 +ente aqui t$ tudo >unto: Perfeito amor e perfeita confiança:” 3essa virouAse para ele com ar de desprezo. “Pra voc& tudo florido, n, sua !icha'” “<"%R4:” 4 voz de *r2+enes ecoou pelo recinto, sendo se+uida de um sil&ncio constran+ido. “Parem >$ com isso: 1oc&s so ma+os ou crianças'” 4p(s al+uns momentos, 9Bcio se arriscou a falar. “? s( esse palhaço do 3essa que...” “
*s disc2pulos sa2ram do se!o, ca!is!aixos, enquanto *r2+enes e eu tir$vamos nossos mantos e coloc$vamos nossas roupas comuns. “*lha...” Pi+arreei, enquanto !uscava minhas palavras. “)esculpa por tudo isso... eu tô perce!endo que o pro!lema todo começou depois que eu che+uei.” “Nem pense nisso.” %le começou a +uardar os apetrechos. “1oc& no fez nada que no fosse seu destino. No h$ nada do que se arrepender. 4lm do mais... eu deveria ter me preparado melhor para isso. %ra s( uma questo de tempo.” “estre...” %u tinha dificuldade em admitir que realmente estava levando o assunto a srio o suficiente para fazer a per+unta, mas no podia evit$Ala. “%u andei olhando na Clavicula... quem t$ l$ em!aixo quem eu tô pensando'” “=im... o vi+simoAquinto.” =ua expresso indicava que ele perce!ia o que isso implicava. “8uando eu voltei aqui pra cima... o que realmente aconteceu'” “1oc& estava completamente alterado... seus olhos estavam distantes, como se estivesse olhando muito alm do horizonte, e sua voz era !aixa e +rave. Parecia um sonEm!ulo. 1oc& disse al+umas coisas desconexas, que no conse+uimos entender. 8uando per+untei o que estava vendo, voc& murmurou al+o so!re...” %le apertou seus olhos, procurando se recordar. “* colapso das linhas de mundo. Coram essas as suas palavras.” “
“%xatamente. 0sso te diz al+uma coisa'” “9inha de mundo eu sei o que , e Wcolapso- pode ter v$rios sentidos, mas...” Tentei me concentrar. No conse+uia recuperar nenhuma lem!rança concreta, mas havia al+uns ecos, t&nues e dispersos. Tentei me a+arrar ao mais n2tido deles. “* 3essa... essa raiva dele no à tôa, n' %u falei al+uma coisa pra ele'” “%le te per+untou so!re quais papis da 3olsa estavam para su!ir.” *r2+enes suspirou. “1oc& respondeu somente que no fazia diferença... a linha dele estava pr(xima do fim.” 4!aixei a ca!eça, e me diri+i à sa2da sem dizer mais uma palavra. No podia ser verdade, era tudo muito fantasioso, muito a!surdo, contr$rio a tudo o que eu conhecia... no entanto, a hist(ria fazia sentido demais para se i+norar. 4final, o vi+simoAquinto demônio de =alomo era Rlas/aA9a!olas, conhecido no apenas por ensinar todas as artes e ci&ncias de forma instantEnea... mas tam!m por incitar as pessoas a derramamento de san+ue e matança.
V “Cico feliz de ouvir isso tudo de voc&.” 4lfredo se de!ruçava so!re seu prato quase intacto. “No pelo acontecido, claro, que me preocupa... mas por voc& ter finalmente decidido compartilhar tudo isso comi+o. 4ntes que fosse tarde demais.” exi lentamente as fatias de man+a de meu prato, que tam!m pouco havia sido tocado. “=ei l$... antes eu tava achando meio nada a ver contar essas coisas... parecia
hist(ria de doido, sa!e'” =oltei um riso desa>eitado. “as a+ora, depois desses Bltimos dias, t$ parecendo m( !o!eira, essa preocupaço.” “No h$ motivos para tanto. Todos n(s sa!2amos onde voc& estava se metendo. eito'” “V homemA!ule, h$ mais coisas entre o cu e a terra do que sonha nossa v filosofia... ou mesmo ci&ncia.” “
novidade, mas sei l$, me pareceu a coisa certa a fazer. * ne+(cio que, enquanto eu lia o livro... s( pra voc& entender, eu >$ tinha visto essa explicaço dBzias de vezes em v$rios lu+ares. as, dessa vez, al+uma coisa tava diferente. No sei como explicar... como se tivesse al+uma coisa de interessante ali, al+o que eu no lem!rava direito. %u folheei o livro todo umas tr&s vezes, procurando, mas no achei nada.” “
mem!ranas quadridimensionais, funçFesAonda... %nfim, levantei todo destru2do, s( com uns cochilos aqui e ali, l$ pelas duas. %u tava plane>ando ir na Castcon... lem!ra, aquela convenço que eu te falei'” * sorriso de meu ami+o se alar+ou. “Na ar+inal Tiet&' $ ima+ina o que aconteceu. =( perce!i a hora quando a tev& começou a mostrar o acidente, e eu lem!rei que era pra eu estar l$. as voc& no sa!e o pior...” *lhei !revemente ao nosso redor. “8uando eu vi a not2cia, eu tive a n2tida sensaço de que aquilo no era realmente novidade... como se eu estivesse, tipo, lemrando disso.” “)>àAvu.” “Pois . 3em, a coisa no para por a2.” “Por qu&' "ouve mais fenômenos do tipo'” “)$ pra dizer que sim... !em, ontem eu voltei pro tra!alho, mas mal dava pra concentrar. 4inda tava naquela n(ia de ler tudo quanto material de f2sica, principalmente supercordas, loop quEntico, esse tipo de coisa.
an$lise de risco. =em contar que um excelente treino pra modelos matem$ticos de previso.” “4h. Previso.” %le se reclinou. “Posso ima+inar aonde isso est$ levando.” No pude conter um +rande sorriso. “0sso a2... eu tava mexendo no meu corretor online, e resolvi !otar pra vender um papel que tava caindo. 7ma empresa chinesa de aço... 4cho que chama e...” %ncolhi os om!ros. “)e repente me deu vontade de almoçar em al+um lu+ar diferente, ento eu sa2 andando pela
“?... doideira, no'” “? s( uma questo de analisar o caso de maneira l(+ica. *s outros fatos que voc& me relatou... o que eles t&m em comum'” “"... eles aconteceram porque eu tava distra2do'” “% especificamente com seus estudos de f2sica, resultantes do conhecimento preternatural que, supostamente, voc& rece!eu daquela entidade. as, alm disso, am!os tiveram a faculdade de salv$Alo de um destino desa+rad$vel.” “* que voc& quer dizer'” Cranzi as so!rancelhas. “8ue voc& t$ aqui pra me prote+er de al+uma coisa'” “% eu !em desconfio do qu&.” %le inclinouAse em minha direço, com um ar srio. “@enato... voc& tem al+uma pretenso de retornar para o malfadado clu!e de xadrez'” “T$ !rincando comi+o' <& quer que eu simplesmente i+nore tudo o que aconteceu' %sses caras so uns mans, cada vez mais eu me convenço disso... mas tem al+uma coisa +rande acontecendo l$.” “No duvido, nem um pouco. % precisamente este o pro!lema. "$ al+uma coisa +rande... e malvola.” “4h, p$ra com isso. *s caras to nessa faz tempo e to numa !oa.” “No foi a impresso que ficou da Bltima reunio, pela sua narrativa.” “Nada a ver... s( ciuminho mesmo. %nfim, eu vou tentar li+ar de novo pra confirmar e...”
“Tentar de novo'” Dele me interrompeu. “os telefones eu tinhaO, mas no podia esperar mais. %u estava pr(ximo de alcançar al+um conhecimento importante, e as respostas que me faltavam estavam naquele poro. 8uando che+uei, o porto estava fechado D muito estranho, para um dia Btil D mas reparei que a porta estava destrancada. 3ati duas vezes, e entrei lo+o em se+uida. *r2+enes estava nos fundos, mexendo em seu arm$rio de apetrechos arcanos. “%stamos fechados,” ele +ritou, sem olhar para tr$s. “1olte amanh:” “=ou eu, @enato,” eu disse, cuidadosamente. %le parou o que estava fazendo, continuando voltado para o arm$rio. “%u devia esperar isso,” disse, com um suspiro. “4li$s, eu sa!eria, se ele falasse comi+o... se ualuer um deles respondesse minhas per+untas.” %le virouAse para mim. “as no assim que funciona, no mesmo'”
“%scuta...” e aproximei lentamente. “%u achei que o pessoal reunia aqui ho>e, sa!e, pra >o+ar xadrez...” “4h, por favor: No insulte a minha inteli+&ncia. %u sei o que voc& veio procurar aqui. 3em, meu caro, che+ou tarde demais.” “Tarde demais' * que voc& quer dizer'” “? isso mesmo. 4ca!ou tudo. No tem mais clu!e de xadrez, nem concili$!ulo, nem ritual, nem coisa nenhuma. %stou fechando o !oteco.” “Pera2, como assim' =( por causa daquela !ri+uinha do s$!ado' 1ai aca!ar tudo assim, desse >eito, de uma hora pra outra'” “1oc& no sa!e, n'” %le !alançou a ca!eça, pesarosamente. “%sto perdidos, todos. 9iteralmente. )ois mortos, e os outros fora+idos... exceto voc&. % a pol2cia no me deixa em paz.” “"ein':” inha expresso era de horror. “* que c& t$ me dizendo' * que dia!os foi que aconteceu aqui'” “4qui, nada alm do que voc& presenciou, felizmente.” %le voltou a arrumar seu material ritual2stico. “as, para o resto do clu!e, a coisa de+rin+olou radicalmente depois que sa2ram daqui naquela noite. %u mesmo sei muito pouco do que houve, pra minha sorte. 3em, na falta de disc2pulos, eu acho que o c2rculo aca!ou, no'” 1i que ele se diri+ia à porta do poro, e se+urei seu !raço. “as e quanto a... auilo' 1oc& no t$ pensando em simplesmente...” “%stou mais do que pensando, eu vou fazer neste exato momento.”
“as ento espera um pouquinho s(... vamos l$, me d$ dez minutinhos com ele: 8ue diferença vai fazer'” “Toda a diferença do mundo. No temos tempo a perder. 4 qualquer momento eles vo entrar aqui, e quando que!rarem o c2rculo...” 4ntes que eu per+untasse de quem ele estava falando, a resposta veio na forma de uma !atida repentina no porto. “=enhor *r2+enes =alazar:” Ddisse uma voz autorit$ria. “Pol2cia civil:” %le olhou para mim, aterrorizado. “%scuta aqui, no tem tempo de explicar:” %le empurrou os o!>etos que estava carre+ando D al+umas velas, um talism e uma ada+a D para minhas mos. “1oc& tem que invocar nomes divinos. (ehovah $etra+rammaton Anaphaeton @rimeumaton. ? vital que voc& faça isso, t$ me entendendo'” *lhei incrdulo para as ferramentas. “as como que...” “=%N"*@ =4944@:” 4 !atida veio de novo, mais forte. “Temos um mandado >udicial de !usca so!re todas as depend&ncias desse recinto:” “8uieto: No h$ tempo:” %le olhou nervosamente para a entrada da lo>a. “)i+a que ele tem licença para partir, de forma pac2fica e sem causar mal. ostre esse selo D” apontou para o amuleto D “e invoque os nomes. No perca tempo com per+untas. %le tem que ir em!ora antes deles che+arem l$ em!aixo.” 4 voz veio novamente, mais enr+ica. “@epetindo, senhor =alazar, n(s temos mandado: 1amos estar entrando a+ora mesmo:”
*r2+enes me empurrou porta adentro. “* c2rculo no pode ser que!rado:” disse aflitamente, enquanto fechava a porta atr$s de mim. )esci tropeçando os de+raus, com as vozes atr$s de mim cada vez mais distantes. 4 escadaria parecia !em mais escura que da Bltima vez. 8uando che+uei ao final, a luz das velas indicava o t&nue contorno do c2rculo. “RARlas/aA9a!olas'” disse, enquanto me posicionava no centro, voltado para o triEn+ulo. “1oc&... voc& pode partir. ", em nome de Tetra+rammaton. #A #eov$.” “@enato' 1oltou cedo.” 4 voz era fraca e a!afada, mas seu tom de satisfaço era claro. “1eio em !usca de mais conhecimento'” “Pode partir,” repeti, com voz tr&mula. 9evantei o talism. “1$ em paz. =em causar mal. $etra+rammaton.” “* que eu lhe concedi no foi o suficiente'” ais uma vez, um som que aparentava ser uma risada. “as nunca , no mesmo'” “%u... no lem!ro de nada:” ?ro+a =enato, me recriminei. &4o d trela “%u avisei que sua mente no comportaria tudo de uma vez. % voc& no esqueceu. %st$ tudo l$. as... voc& sa!e disso, no'” 4s vozes no andar de cima se aproximaram da porta. *uvi o !arulho da maçaneta. “1oc& precisa ir: %m nome de #eov$:” Se eu pelo menos lemrasse os outros nomes “1oc& diz isso... mas no quer mesmo que eu v$ em!ora, quer'”
“Por favor...” 4pertei o amuleto, molhado de suor, at os n(s de meus dedos ficarem !rancos. “No faz isso comi+o...” “* que voc& realmente quer sa!er'” *lhei para a entrada. 7ma fresta de luz se a!riu. “*... o ue voc&'” “4penas al+um que v& a verdade por tr$s das ilusFes que voc& chama de espaço e tempo.” *uvi passos descendo a escada. “4l+um livre das amarras de um universo linear como o seu.” 4 voz estava ficando mais distante. “=enhor:” *s intrusos estavam se aproximando de mim. “%spere:” disse. “as como que eu faço pra...” 4 Bltima coisa que vi foi a perna do policial derru!ando uma das velas... e, ento, apenas escurido.
EPÍLOGO 4cordei com um tranco. %u estava em um ôni!us malAcheiroso. *lhei pela >anelaQ o lu+ar era desconhecido. Tentei recapitular os eventos que me levaram àquela situaço, mas uma dor de ca!eça lancinante dificultava minha concentraço. 0ma+ens indistintas passavam rapidamente pela minha menteJ um local escuro, um cheiro forte de ervas, v$rias pessoas passando pra l$ e pra c$ por cima de mim. Ce!re e dor. )ecidi avaliar melhor meu estado atual. *lhei para !aixo, e vi que estava su>o, des+renhado, com as roupas um pouco ras+adas. Perce!i que a maior parte do fedor que eu
sentia devia vir de mim mesmo. inha !oca estava seca, com um +osto amar+o, e praticamente todo o meu corpo do2a. e espre+uicei e me esfre+uei um poucoQ no parecia estar ferido, ao menos no +ravemente. %ntretanto, vi marcas nos pulsos e tornozelos, como se tivesse sido amarrado, !em como manchas de san+ue que no parecia ser meu, pois eu no tinha ferimentos que as explicassem. Fui seuestrado, pensei. 1erifiquei os !olsos, e vi que nada tinha sido rou!ado, nem mesmo o dinheiro da minha carteira. "stranho pra carama. eu celular estava desli+adoQ quando o li+uei, perce!i que >$ era quartaAfeira, mais de quatro da tarde. "aviam se passado mais de vinte e duas horas desde minha Bltima lem!rança, no se!o de *r2+enes. “4mi+o,” per+untei para o co!rador. “*nde que a +ente t$ mesmo'” %le me olhou com certa desconfiança. “4venida =apopem!a.” @ut:. ue 7 ue eu tB a:endo num lu+ar desses, “e, hein, cole+a'” %ncolhi os om!ros. Se ele achar ue eu sou eum ue se9a. #elhor ue saer da verdade. “T$ fo+o... nem lem!ro de onde eu vim. Cazer o qu&, n'” “Pode cr&... %sse aqui o etrô 3elm.” “1aleu.” #etrB. timo pelo menos assim eu me locali:o. “%, h... c& lem!ra de como que eu entrei aqui'” * riso dele foi mais franco. “Te puseram pra dentro, l$ pro começo da avenida. 7m crioulo e uma mulata, m(
+ostosa.” 4 ima+em de uma moça passou rapidamente pela minha ca!eça, em!açada. “Tiraram a tua carteira do !olso pra pa+ar. %u tive que te colocar a2 na cadeira.” “% deixaram al+um nome, falaram al+uma coisa'” “Nada. =( disseram pra te deixar descansar. V, se eu fosse voc&, eu voltava l$ pra procurar a mina. Parece que ela foi com a tua cara...” Tentei recordar a ima+em que viera à tona, mas era indistinta, como al+um que se v& da >anela de um carro. “)eixa pra l$. =( quero voltar pra casa.” “<& que sa!e.” * co!rador manteve um sil&ncio prudente pelo resto da via+em. Pe+uei o metrô, e depois o ôni!us que costumava tomar para voltar para casa em dias de rod2zio. 8uando estava che+ando, o telefone tocou. %ra Paulinho. “e... Por isso que eu no fui pro tra!alho.” “
“No hospital,” inventei. %le sa!eria que eu no estava em casa, e sa!e l$ se tinham li+ado pra minha me ou pros outros parentes. “#$ sa2, tô aca!ando de voltar pra casa. )epois eu levo o atestado.” @ut: pra u3 eu disse isso, ?epois eu vou ter ue me virar com esse tal atestado. “No esquenta, descansa a2 que eu resolvo as coisas por aqui... mas o que voc& teve'” “0nfecço alimentar. Tava no !anheiro o dia todo. Tive que tomar uma p$ de soro pra reidratar.” * acho ue unciona. “*lha, desculpa de no ter avisado... aca!ou a !ateria do celular, e eu s( fui pensar em pôr pra carre+ar a+ora...” “3om, pelo menos a+ora voc& li+ou... cara, que susto c& passou na +ente: as e amanh, voc& vem'” Parei al+uns se+undos para analisar minha situaço. “=ei no... =e eu estiver sentindo melhor, eu vou. as no +aranto.” * ôni!us che+ou ao ponto. “Tô indo descansar a+ora, !eleza'” “Tranquilo. 4t amanh.” 4o che+ar em casa, fui direto para o !anho. inhas roupas estavam encardidas e cheirando a fumaça entre outras coisas pioresO, e as manchas de san+ue eram claras. #elhor eu mesmo lavar decidi. No chuveiro, enquanto procurava a muito custo remover a catin+a, aproveitei para avaliar melhor as condiçFes de meu corpo. 4lm das marcas de cordas, havia diversos hematomas no peito, !raços e pernas... mas nenhum ferimento a!erto. ?e onde veio esse san+ue ent4o, Carama em ue rouada ser ue eu me meti, inha me li+ou quando eu estava saindo do !anho, e meu chefe lo+o em se+uida. Procurei manter a mesma
hist(ria que havia contado para o Paulinho, pedindo desculpas pela falta de aviso e asse+urandoAos principalmente minha meO de que a+ora estava tudo !em. %ntretanto, o contato mais inesperado veio mais tarde, quando eu estava fazendo um lanche. 8uase derramei meu refri+erante na cozinha toda, de susto, quando a campainha tocou de repente, al+o pouco comum no meu condom2nio. “%vel/n,” disse, quando a!ri a porta. “1oc& por aqui'” “eito e deixa todo mundo de ca!elo em p: 4 sua me tem mais de sessenta anos, voc& parou pra pensar nisso' % se ela tem um troço'” “=rio que voc& t$ me dizendo isso' * que voc3 tem a ver com a minha me'” “7, e eu no posso simplesmente ser ami+a dela'” per+untou, indi+nada. “N(s duas sempre tivemos muita intimidade, e no pra menos. 4final, a +ente tinha que ficar cuidando do mesmo crianço irrespons$vel... !em, eu no preciso mais, mas a amizade fica, n'” eito. 1oc& no tinha dito que tava cansada de correr atr$s de mim'” “No foi nada disso que eu falei.” %la olhou para o cho. “%, com voc& sumido desse >eito, e a+ora dizendo que tava no hospital... eu tam!m fiquei preocupada. =a!e como .” “esmo'” Parei, surpreso. “8uer dizer... no achei que voc& fosse...”
“Pode tirar o cavalinho da chuva,” ela cortou, repentinamente. “No quer dizer nada. ? s( a simples empatia de um ser humano com outro. No todo mundo que vive a vida nem a2 pro que acontece ao seu redor, sa!ia'” “%scuta...” Pausei para >untar meus pensamentos e decidir como eu me sentia em relaço a isso, levantando a mo. “*!ri+ado por se importar, mas no o caso de...” “8ue isso'” %la se aproximou, olhando para meu pulso. “* que aconteceu a2'” “"ein' * qu&'” Tentei esconder as marcas, enver+onhado. “Nada de mais... acho que eles s( apertaram demais a faixa na hora de pôr o soro.” “@enato...” %la me encarou duramente. “%u sei quando voc& t$ mentindo.” “No tô mentindo:” e afastei repentinamente. “1oc& vem aqui de repente, sem nem li+ar pra sa!er se eu posso te rece!er...” “Calou o cara que some o dia todo sem avisar nin+um...” “'oc3 vem aui,” insisti, “do nada, e >$ começa a me ofender' e xin+ar, dizer que eu sou irrespons$vel, isso e aquilo, falar da minha me, e ainda me chama de mentiroso'” “as voc& quer que eu no questione isso,” %la apontou para meu pulso, indi+nada. “*lha s( os seus !raços:” “Pode parar com essa palhaçada.” 4!ri a porta, e antes que ela tivesse tempo para ar+umentar, continuei.
“%ssa a minha casa, e eu no vou admitir isso. 1oc& no quer mais fazer parte da minha vida, ento no faça.” “? assim, '” %la passou pela porta com um ar or+ulhoso. “Cique à vontade. =e voc& quer se pre>udicar, sei l$ como, v$ em frente. No me importo.” “3om sa!er.” 8uando minha exAnamorada finalmente se foi, no me senti satisfeito com isso, como eu achava que me sentiria... mas essa era uma preocupaço para outra hora. Terminei meu lanche, pus uma camisa de man+as compridas para evitar mais questionamentos, e sa2 pra pe+ar meu carro. 4l+o me dizia que ele no estava no meu prdio, o que foi confirmado por uma r$pida olhada. Tentei recordar onde o havia deixado da Bltima vez que o vi. Foi ontem uando eu ui l nauele maldito seo lem!rei. "u deiei na rua. &o mDnimo 9 rouaram. Cui para l$ de metrô, e lo+o achei o lu+ar onde eu tinha estacionado, a umas tr&s quadras do se!o. * carro estava l$ do mesmo >eito. %ntretanto, no fundo, eu sa!ia que no era isso que eu realmente queria ver... eu precisava voltar mais uma vez ao centro de todo esse mistrio. 4o che+ar ao local, vi que a casa onde *r2+enes mantinha sua lo>a estava em ru2nas. %ra uma pilha de escom!ros ene+recidos, envoltos em uma mancha de fuli+em que se estendia para a rua e os prdios vizinhos. 9em!rei do cheiro de fumaça em minhas roupas, e um frio correu por minha espinha. “* ne+(cio a2 foi feio.” %ra o dono de um !ar, do outro lado da rua, em frente ao qual eu tinha parado, enquanto olhava em!as!acado. “)uma hora pra outra
pe+ou fo+o em tudo, c& tinha que ver. Nem deu tempo dos !om!eiros che+arem.” “8uando que foi isso'” per+untei, >$ sa!endo a resposta. “Coi ontem, no fim da tarde. 4 pol2cia tava a2... parece que tinha uns ne+(cios meio esquisitos acontecendo l$, e eles tavam dando !usca. 7ns rituais de ma+ia ne+ra, satanismo, no sei... ouvi dizer que morreu +ente.” %le fez o sinal da cruz. “8uer dizer, antes do inc&ndio. Por isso que !aixou a pol2cia a2.” %n+oli em seco. “%... tinha mais +ente l$ dentro'” “Tinha um rapaz... sei no quem era.” Ainda em, pensei. “%le tinha entrado lo+o antes da pol2cia.” “as... no saiu'” “% deu tempo'” * homem !alançou a ca!eça, pesaroso. “Nin+um saiu. Nem o seu *r2+enes, nem os pol2cias, nem esse moço. 4inda to limpando as coisas l$. 1oc& conhecia'” “%u' No, no:” 3alancei a ca!eça veementemente. “=( tava passando por aqui e vi tudo aca!ado desse >eito... que coisa, n'” 1oltei correndo para meu carro e disparei para casa, tremendo. A+ora a coisa estava ficando esquisita. Como assim n4o saD de l, Dquestionei. Ser ue tinha uma saDda por trs, "u n4o lemro de ter visto nenhuma. " como ue eu ui parar em Sapopema, ?e uem era esse san+ue na minha roupa, % ue realmente aconteceu comi+o, %ssas per+untas queimavam em minha mente como !rasas ardentes. =enti que era inBtil vasculhar os escom!ros